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Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Teoria Geral do Direito Civil 
Professora Doutora Maria Raquel Rei 
 
06-10-2020 
70% -> aulas práticas 
30% -> frequências (primeira frequência nos primeiros 15 dias de 
dezembro) 
 
• O que significa Jurisprudência? Jurisprudência é a palavra que tem sido 
usada para designar as decisões dos tribunais. A base de dados 
associada à jurisprudência é a DGSI. 
 
13-10-2020 
TPC: Ler o Tratado do Direito Civil, volume 1, do Menezes Cordeiro, da 
página 83 a 171 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
• O Direito civil constitui o corpo fundamental do Direito, na sua globalidade. 
• O Direito civil exprime, por excelência, o modo de viver do povo que o criou e que o aplica. 
• Direito é a Ciência que visa solucionar problemas concretos. 
• Torna-se difícil, perante qualquer “lei” civil, retirar dela, um sentido imediatamente útil. 
• O Direito civil é Direito privado comum, ou seja, Direito que regula as relações que se 
estabeleçam entre pessoas iguais e que, a esse nível, trata particularmente os níveis genéricos 
da regulação. 
• O Direito civil é delimitado por critérios de tipo histórico-cultural: abarca regras e princípios 
historicamente derivados do Direito romano e paulatinamente afeiçoados às relações mais 
diretas, estabelecidas entre pessoas que compartilhem uma vivência. 
• O Direito civil exprime uma área da Ciência do Direito: aquela que resolve casos concretos civis. 
• A Ciência do Direito civil equivale ao grande tronco comum da dogmática jurídica. 
• Ciência do Direito -> aparece no século II a.C. 
• Século XII -> aparecimento da nacionalidade 
• Finais do século XIII -> fundação da Universidade 
• Idade Média -> momento histórico mais decisivo para a formação do Direito civil lusófono 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
• Menos sensível a reformas legislativas do que diversos outros ramos normativos, o Direito civil 
evolui à medida que a elaboração científica permita novas composições. 
• Na Europa e desde o século XII, com o aparecimento das universidades, o Direito civil comporta 
uma evolução que, sendo eminentemente nacional, transcende quaisquer fronteiras linguísticas 
ou antropológicas. 
• O Direito civil lusófono tem, hoje, uma feição romano-germânica. É um Direito realizado, no 
Continente europeu, desde a Fundação; mas é um Direito vivo, reanimado por gerações de 
magistrados e de estudiosos universitários e, daí, vestido nas mais recentes leis civis, com relevo 
para os Códigos de 1966 e de 2002. O labor universitário, muito permeável a experiências 
estrangeiras, tomadas em aceção científica, permitiu que o nosso moderno Direito civil se 
aproxime da pureza latina, precisamente com apoios na Ciência jurídica que mais aperfeiçoou o 
Direito românico: a alemã. Todo o sistema atual do Direito civil lusófono deriva desse decisivo 
fator histórico, cultural e científico. 
• O tratamento germânico do Direito civil foi – e é – ele próprio, o fruto de múltiplas confluências 
históricas, científicas e universitárias. 
• O Direito civil tem um núcleo que, pura e simplesmente, adveio da História: o Direito romano. 
• Não faltaram tentativas de substitui o Direito puramente histórico, de racionalidade por vezes 
discutível, por um Direito racional: mais lógico e perfeito. De um modo geral, as tentativas 
falharam. Mas entre essas tentativas, uma houve que teve consequências: a levada a cabo, nos 
séculos XVII e XVIII, pelos racionalistas ou teóricos do Direito natural. 
• Os racionalistas intentaram substituir os esquemas tradicionais romanos por classificações e 
definições lógicas. Daí resultou todo um corpo de matéria, com reflexos acentuados domínio dos 
contratos. Esse campo não substituiu quaisquer outros que o antecedessem: somou-se a eles. 
• O Direito civil é, hoje, um Direito codificado: incluiu-se nos códigos civis. 
• Os códigos de tipo germânico – ou alguns deles – apresentam, logo no início, uma “parte geral”. 
Essa parte geral antecede o subsequente tratamento civil – as “partes especiais” (Direito das 
Obrigações, Direitos Reais, Direito da família e Direito das Sucessões) – em temos que não 
comportam uma articulação inteiramente lógica, mas, tão-só, histórico-cultural. 
• A contraposição entre o Direito público e o Direito privado remonta às compilações de Justiniano 
(século VI): o direito público é o que respeita ao Estado dos assuntos romanos; o privado o que 
pertence ao interesse privado, sendo tripartido (deriva de preceitos naturais, de [Direito] das 
gentes, ou de [Direito] civil). 
• Os digesta, em texto atribuído a Ulpiano, dizem que o Direito público é aquele que respeita ao 
Estado dos assuntos romanos; o privado ao interesse dos particulares. O interesse público 
consiste nas coisas santas, nos sacerdotes e nos magistrados; o privado é tripartido e provém ou 
dos preceitos naturais, ou das gentes, ou do civil. 
• Os dois pontos anteriores não têm precisão dogmática. 
• A ideia de Direito civil é anterior à de Direito privado. 
• O Direito civil é o Direito da cidade e dos cidadãos (cives), surgindo, no final da República romana, 
para designar o conjunto representado pelas XII Tábuas e pelas leis subsequentes. Contrapunha-
se ao ius gentium ou Direito das gentes, aplicável fora da cidade e a relações com não-cidadãos. 
O direito público (ius publicum) surgiu para designar o direito posto pelo populus, isto é: o Direito 
é a base legal, aplicável a todos. Já o Direito privado (ius privatum) 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
seria o proveniente de contratos entre os particulares: apenas a estes diria respeito. Ou seja, o 
próprio Direito civil, quando legislado, seria público. 
• De acordo com o espírito do Direito romano, a contraposição entre o Direito público e o Direito 
privado não tinha qualquer significado sistemático. Apenas se teria de lidar com o Direito civil, o 
qual incluiria o Direito público: simples tópicos – um e outro – ordenadores da grande matéria 
jurídica. 
• A contraposição entre o Direito público e o Direito privado manteve-se ao longo da História. 
• Na linha do fragmento de Ulpiano, o Direito público ocupar-se-ia do Estado, enquanto o Direito 
privado versaria os interesses dos particulares. 
• No Direito romano, o Direito público perdeu o seu significado com a queda do Império e com o 
desaparecimento da organização política clássica. Já o Direito privado subsistiu, assente na sua 
valia técnica e no prestígio da Antiguidade: non rattione imperii sed rationis imperio (não em 
razão do império, mas pela razão do império). 
• No período contemporâneo, principalmente logo após as revoluções liberais, desenvolveram-se 
as doutrinas do Estado e da Administração pública. A preocupação dos juristas já não era a de 
afirmar a autoridade do soberano: antes a de conter o Estado, mantendo uma esfera livre dos 
cidadãos. A diferença entre o Direito público e o Direito privado aprofunda-se: além das origens, 
temos, agora, técnicas distintas, jurisdições próprias e modos de ser diferentes. Finalmente, a 
ideia de Estado de Direito permite lançar a Ciência do Direito público, suplantando as (meras) 
teorias do Estado e da Administração. 
• Posições que relativizam ou negam a contraposição entre Direito público e Direito privado: 
1. Orientações sócio-comunitárias -> relevam, no Direito, o papel das organizações intermédias, 
das coletividades e das associações; as normas de ambos os setores estariam interligadas; 
2. Orientações normativistas analistas -> dissecam, nas diversas instituições, regras 
estruturalmente públicas, de acordo com o critério do interesse predominante e da presença 
de poderes de autoridade. Chegam à conclusão que, no seio do mais tradicional Direito 
privado, ocorrem situações públicas (Direito da família; o Estado a atuar de acordo com 
esquemas privados): distinção não éclara, podendo ser inconciliável com a ideia de Estado 
de Direito. 
3. Orientações totalitárias de extremos opostos/orientações antiliberais de cariz totalitário –> 
negam a contraposição entre Direito Público e Direito privado, pois é um modo fácil de 
suprimir a defesa que o Direito privado representa para as pessoas. (A ex-República 
Democrática Alemã foi a última experiência histórica deste tipo; O nacional-socialismo 
alemão e o fascismo italiano tomaram essa posição. 
• A contraposição entre o Direito público e o privado foi ainda posta em causa por estudiosos de 
disciplinas que vinham jogar com normas provenientes de ambos os setores. 
• O Direito do trabalho é considerado, predominantemente, como Direito privado. 
• A existência de uma contraposição entre o Direito público e o Direito privado é um dado 
existencial, imposto pela História e pela cultura. 
• A contraposição entre Direito público e Direito privado é explicada com recurso a diversas 
doutrinas. Todas elas são úteis, mesmo quando insustentáveis: contribuem para esclarecer a 
contraposição. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
• Teoria do interesse -> Ao Direito privado caberiam os interesses dos particulares enquanto, por 
simetria, o Direito público proporcionaria o interesse público. O interesse público respeitaria a 
uma generalidade de pessoas, podendo concretamente exigir o sacrifício dos particulares. A 
teoria faz sentido pelo prisma do Direito público: este, a ser caracterizado como um corpo 
normativo ao serviço do Estado e tendencialmente vocacionado para limitar a autonomia 
privada (Direito fiscal ou Direito público do Urbanismo) só pode mesmo justificar-se pelo 
interesse público. Pelo prisma do Direito civil, não é assim. Desde o Direito Romano há a clara 
perceção da presença de regras civis que, por estarem ao serviço do interesse comum, não 
podem ser afastadas pelos particulares. Estas regras são civis pela origem, pelos institutos em 
que se integram e pelo modo por que são aplicadas: parece haver, aqui, outros tantos critérios 
que se sobrepõe ao do interesse público. Além desta objeção, o moderno Direito administrativo 
(direito público interno) faculta outra: ao contrário dos inícios, sempre carecidos de legitimação, 
encontramos hoje direitos subjetivos públicos que, imediatamente, tutelam interesses 
particulares. O respeito pelas posições dos particulares é inevitável para a preservação da 
comunidade: para o interesse público; a tutela conveniente do interesse público acautela, em 
última instância, a posição de cada cidadão. O Direito público requer um plus de legitimação; 
não vale por si como o privado. 
• Teoria da importância (por Püttner) -> o Direito público corresponde a um setor mais importante 
do que o privado, ou seja, prevalece sobre ele havendo concurso. É uma versão mais assumida 
da teoria do interesse. O interesse público suplanta o privado. 
• Teoria da subordinação -> no Direito público, as relações jurídicas pautam-se pela superioridade 
de uma das partes sobre a outra (domina um vetor de autoridade); no Direito privado, os 
participantes estão, pelo contrário, em pé de igualdade. 
 
Teorias do Sujeito 
(apelo primordial ao tipo 
de sujeito da relação ou 
da situação jurídica) 
Teorias Materiais 
(distinção na 
natureza das próprias 
regras em si) 
Teoria do interesse 
Teoria da Importância 
Teoria da Subordinação 
Teoria da Soberania 
Teoria da Tradição 
Teoria do Sujeito Formal 
Teoria do Sujeito Material 
Teoria da Ordenação 
Teoria da Competência 
Teoria da Gestão Pública 
Teoria do Direito Especial 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
• Teoria da soberania -> admite uma ideia subjacente à da subordinação, mas procura ir mais 
longe; O Direito público funcionaria como um Direito especial, portador de autoridade, mas, 
para além disso, haveria que prever regras de legitimação – que apelam para a soberania – e 
normas de conflito. Esta teoria descura o Direito privado. 
• Teoria da tradição -> na base de diversas orientações, certas regras vêm a ser consideradas de 
Direito público e outras de Direito privado; basicamente acolhem-se como direito público 
aquelas que como tal já o eram consideradas; é muito funcional e realista: boa parte da 
conformação das fronteiras público-privadas é de índole histórico-cultural. 
• Teoria do sujeito formal -> o Direito público é o Direito do Estado ou, em rigor, também o de 
outros organismos públicos; verifica-se, no entanto, que o Estado pode agir como um simples 
sujeito privado (comprando, vendendo, arrendando, celebrando negócios), logo neste Direito 
público não basta falar em Estado: tem de falar-se em Estado com um plus distintivo. 
• Teoria do sujeito material -> haveria, no Direito público, uma atuação do Estado dotado dos seus 
atributos próprios. 
• Teoria da ordenação -> vê, no Direito público, um corpo especial de regras, um “conjunto de 
normas jurídicas que só legitimam ou obrigam os sujeitos de direito que se determinam 
exclusivamente através de normas ou atos de Estado”; esta teoria aproxima-se das teorias 
institucionais que veem no Direito público um corpo especial de regras destinadas a legitimar a 
atuação do Estado e dos organismos públicos, ou seja, é uma versão modificada da teoria do 
sujeito; ideia de exclusividade; não tem, hoje, absoluta consistência. 
• Teoria da competência -> no Direito privado todos são competentes para agir 
(Jedermannkompetenz); no Direito público, apenas o poderiam fazer as pessoas indicadas por 
uma norma de legitimação. 
• Teoria da gestão pública (por Achterberg) -> o Direito público seria a soma das normas relativas 
a relações nas quais um dos sujeitos, na base de uma situação legitimadora, atuaria como um 
gestor (Sachwalter) do “bem comum”; falha na definição daquilo que é o “bem comum” ou o 
“interesse comum”. 
• Teoria do Direito especial -> dominantes na atualidade; o Direito privado constituiria a base 
aplicável a todos os sujeitos; o Direito público diferenciar-se-ia pela sua especificidade, 
funcionando apenas perante determinadas ocorrências ou em face de entidades especialmente 
legitimadas, por lei, para usar as inerentes prerrogativas. 
• Todas as relações suscetíveis de se estabelecerem entre os seres humanos, por iniciativa destes, 
são objeto do Direito privado. O Direito privado vale por si: adere estritamente às pessoas, não 
carecendo de se justificar pelos fins que prossiga; advém da História – ius romanum -, estando 
menos dependente do legislador. 
• O Direito público surge como um Direito especial, pois é o Direito que regula a Administração, 
ou as Finanças públicas ou quaisquer outros domínios do Estado. Pode falar-se em Direito dos 
titulares de poderes de soberania, Direito dos princípios da organização do Estado ou em Direito 
especial do Estado. 
• O Direito público, enquanto Direito especial, atenderá ao denominado interesse público, dando 
corpo a situações de soberania e de subordinação. No seu âmbito de aplicação, prevalece sobre 
o Direito privado. As especificidades materiais do Direito público determinam-se, porém, apenas 
a nível do sistema (conjunto ordenado no qual ganham o seu sentido pleno). 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
• Nesse plano do sistema, podemos considerar que: nas situações jurídicas privadas, as 
atuações pautam-se pela igualdade e pela liberdade; nas situações públicas, as atuações 
desenrolam-se segundo a autoridade e a competência. 
• A figura do direito potestativo (poder de alterar, unilateralmente, através de uma 
manifestação de vontade, a ordem jurídica) documenta, em zonas pacificamente reconhecidas 
como privadas, a erupção dos vetores da autoridade e da competência. 
• Os parâmetrosda igualdade e da liberdade manifestam-se, apenas, a nível do sistema – ou 
subsistema – privado na sua globalidade e não, necessariamente, em cada situação jurídica 
privada em si. 
• A contraposição entre o Direito público e o Direito privado surge, hoje, reforçada, graças às 
aplicações da ideia e de sistema. Apuram-se, assim, novos fatores de diferenciação, que 
facultam uma separação nítida em relação ao Direito público. Por razões de exposição, tais 
fatores podem ordenar-se em culturais, teóricos, práticos e significativo-ideológicos. 
• Plano cultural -> o Direito privado radica na tradição românica; o Direito público assenta numa 
elaboração racionalista do tecido normativo, em obediência a inflexões diversas; ainda não 
tem uma verdadeira codificação devido à sua progressão científica. 
• Plano teórico -> o Direito privado apresenta-se como uma regulação de relações 
interindividuais; correspondendo aos avanços e recuos da civilização, ele é pouco sensível a 
modificações bruscas, antes acompanhando a evolução da Ciência jurídica; o Direito público 
figura o regime do relacionamento do Estado com os particulares e certos esquemas 
hierarquizados de distribuição dos bens. 
• Plano prático -> (??) 
• Plano significativo-ideológico -> o Direito privado corresponde à expressão cultural mais 
profunda de cada sociedade. Este tem vindo a ser reconhecido como uma eficaz garantia das 
pessoas e do seu espaço próprio – é o mais eficaz bastião de defesa da pessoa contra as 
arremetidas do Estado e o arbítrio dos grupos. 
• Pascoal de Mello -> trata o conjunto do Direito português como Direito Civil. Dentro do Direito 
Civil haveria que distinguir o público do privado: o público respeita à sociedade em geral, e 
determina os direitos dos imperantes e dos cidadãos; o Direito privado ou particular, é o que 
abrange as pessoas, as coisas e as ações. 
• Lobão -> distingue no Direito público o universal e o particular subdividindo-se este em Direito 
público civil e em eclesiástico; o Direito pátrio divide-se, por seu turno, em público e em 
particular. 
• Para os clássicos civilistas do século XIX, foi-se estabelecendo uma diferenciação entre o 
Direito civil e o Direito público. 
• Liz Teixeira -> tudo o que diz respeito à organização da massa ou corpo d’uma Nação; as 
individualidades só remotamente são por ele consideradas - Direito Público ou Político; O 
Direito Particular – Jus Privatum -, ou Direito civil em mais estreita aceção, diz respeito a todas 
as relações que se dão entre os membros da mesma Nação para os seus interesses 
particulares: atende de imediato às individualidades, à associação em remoto. (Dava já um 
estatuto mais elevado ao Direito público) 
• Coelho da Rocha –> o Direito público regula as relações dos cidadãos de cada nação com o seu 
governo, enquanto o Direito particular ou civil se ocupa dos direitos e obrigações dos cidadãos 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
uns para com os outros. Além do sentido expresso anteriormente, Direito civil abrange três outros 
sentidos: 1º Direito positivo por oposição ao natural; 2º Direito comum por oposição ao canónico; 
3º Direito particular, por oposição ao público e ao criminal. 
• O liberalismo veio dar uma grande importância ao Direito administrativo, recém-criado como 
disciplina reformadora do Estado e da Administração. 
• As referências ao Direito público foram-se enriquecendo, à medida que o liberalismo dotava o 
Estado de um moderno Direito administrativo. 
• No início, os publicistas nacionais limitaram-se a apresentar o Direito administrativo, sem 
especiais preocupações de integração sistemática. Justino António de Freitas -> Direito 
administrativo é a ciência da ação e da competência do poder central, das administrações locais 
e dos tribunais administrativos nas suas relações com os interesses dos administrados, e com o 
interesse geral do Estado. 
• Guimarães Pedrosa -> o Direito administrativo é o Direito do Estado ou o conjunto de disposições 
de Direito público que regulam o Estado. 
• A publicística tem mantido uma ligação preferencial com a teoria do interesse. O Direito público 
é apresentado como visando defender o interesse público ou coletivo, pelo menos em primeira 
linha. Mantém, no entanto, uma ideia de justificação significativo-ideológica por parte do Direito 
público: não vale apenas por existir, como facto ontologicamente irresistível, mas, antes, por ter 
uma valia que o faça sobrelevar-se além do Direito comum – o interesse público. 
• Manutenção do Direito público como o Direito especial, próprio de um determinado setor de 
atuação do Estado – o da função administrativa – bem delimitado em termos materiais e de 
tradição. O Direito privado será, em definitivo, o Direito comum nacional. 
• Perante qualquer situação carecida de tratamento jurídico, na ausência de regras especiais que 
tenham pretensão de aplicabilidade, há que recorrer ao Direito civil. 
• A distinção entre o Direito comum e o Direito especial é essencialmente relativa: ambos se 
afirmam um perante o outro e, na medida em que um exista, consubstancia-se o outro: pode 
acontecer que um mesmo complexo normativo seja, em simultâneo, especial e comum. 
• Dentro do Direito civil, a não haver nenhuma área específica implicada, caímos na parte geral ou 
no Direito das obrigações. 
• O Direito civil é o mais comum e o mais abstrato de todos os ramos do Direito. Constitui a base 
a partir do qual, por especialização, por negação, por complementação ou por inovação, se vão 
erguendo todos os demais ramos jurídicos normativos. 
• A elaboração geral de regras de determinação de fontes, sua delimitação no tempo e no espaço, 
sua interpretação, integração e aplicação são tarefa do Direito civil 
• Noções comuns/civis -> relação, direito subjetivo, contrato, prestação, adstrição, prazo, 
validade, eficácia… 
• Num País de Direito continental, o último Direito constitucional material acabará por ser o 
Direito civil. 
• O Direito civil enquanto Direito comum (ou Direito mais comum), tem aplicação subsidiária 
perante os diversos ramos jurídicos. 
• Para se chegar ao fundamento da aplicabilidade subsidiária do Direito civil no campo público e, 
particularmente, no administrativo, têm sido invocadas duas teses que não se excluem, mas sim 
documentam momentos distintos do processo de realização do Direito: a dos princípios gerais e 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
a da analogia. 
• Tese dos princípios gerais -> o Direito civil daria corpo aos princípios gerais do ordenamento; 
na falta de normas específicas, eles tenderiam a prevalecer. 
• Teoria da analogia -> o Direito civil seria chamado a depor quando regulasse um caso análogo 
ao carecido de regras públicas. 
• O Direito civil exprime, em si, a riqueza multidimensional da ordem jurídica a que pertença: é 
direito positivo na medida em que traduz regras jurídicas destinadas a facultar soluções de casos 
concretos surgidos no seu vasto âmbito de aplicação (quid iuris?); é Ciência do Direito na medida 
em que fixa o caminho que vai das fontes às soluções concretas dos problemas, fazendo-o em 
termos previsíveis, justificáveis e controláveis (quid ius?); é Cultura Jurídica pois comporta a 
linguagem, os conceitos, os institutos e as conexões presentes em todas as disciplinas jurídicas 
e que foram elaboradas no seu seio. 
• No atual momento histórico, a preservação e o aprofundamento do Direito civil lusófono 
constituem um desígnio nacional. O Direito civil corresponde, em simultâneo, ao cerne mais 
tradicional, mais característico, mais denso e mais avançado da nossa ordem jurídica. A 
autonomia do Direito lusófono e o seu nível geral valem o que valer a sua Ciência jurídico-civil. 
• O futuro da Nação Portuguesa numa Europa em integração crescente depende da manutenção 
da língua e do Direito, fundamentalmentecivil, apoiado nos demais Estados lusófonos. 
• O Direito civil é Direito romano atual. 
• As raízes romanas – entendidas através das receções – do atual Direito civil são fundamentais 
para exprimir a sua essência. Mas apenas por si, não a explicam: o Direito atual, apesar de 
semelhanças formais que vão até à identidade de proposições normativas, não é, efetivamente, 
Direito romano, tal como vigorou em sociedades há muito desaparecidas. A explicação reside 
na evolução entretanto registada na Ciência do Direito e na natureza constitutiva por esta 
assumida. 
• A dogmática jurídica está intimamente ligada à História, quer em termos puramente cognitivos, 
quer em moldes argumentativos. 
• A remissão do Direito civil, no seu progresso histórico, para o campo da evolução da própria 
Ciência do Direito, obriga a colocar os temas da tópica e da sistemática (complementares entre 
si). 
• A tópica traduz a técnica da justificação da solução dos problemas, enquanto a sistemática se 
propõe a resolver os problemas com recurso a princípios pré-elaborados. A tópica pressupõe 
que os problemas, desligados entre si, encontrem uma solução extracientífica; mas essa solução 
deveria, depois, ser fundamentada, de modo a permitir convencer as outras pessoas e, 
designadamente, o adversário numa discussão. A tópica ensinaria, então, a encontrar os lugares 
argumentativos para tanto necessários. 
• A sistemática, pelo contrário, apoia-se na existência prévia de princípios assentes, que 
comportariam as soluções múltiplas para os problemas possíveis. Colocada a questão restaria, 
por via dedutiva, obter uma saída justificada pelo modo da sua obtenção. 
• O Direito civil teve uma origem tópica. Quando, na antiga sociedade romana, se atingiu um 
desenvolvimento sociocultural mínimo, tornou-se necessário instituir instâncias de decisão para 
os conflitos que, porventura, surgissem no seu seio. As soluções para tais conflitos eram 
alcançadas caso a caso, com base em considerações de oportunidade e de bom senso: não havia 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
normas gerais e abstratas prévias que inculcassem vias de solução. E uma vez obtidas, tais soluções 
eram justificadas com recurso a referências – a tópicos – que concitassem a aprovação social. O 
decurso do tempo e o efetivo cuidado posto na decisão dos problemas permitiu o apuramento de 
certas regularidades de solução: as interações sociais, radicadas em estruturações minimamente 
estáveis, levam a que o igual seja resolvido de modo igual e o diferente de forma diferente, de 
acordo com a medida da diferença. Esta regularidade corresponde a uma certa lógica interna e 
faculta a formulação de regras que tornem previsíveis as soluções para litígios futuros. A esse 
conjunto de regras que facultem a obtenção – e a previsão – das soluções para os problemas que 
venham a colocar-se pode chamar-se sistema interno. 
• Quando as soluções para os problemas se concatenaram entre si, numa série de relações 
estáveis, de acordo com regras que habilitavam à sua previsão, nasceu a Ciência do Direito civil, 
identificada como o sistema interno. A tópica que levou ao nascimento do Direito civil foi, a 
nível interno, substituída por uma sistemática, necessariamente conectada com o próprio surgir 
da Ciência jurídica. 
• As coordenadas constituídas pelas contraposições sistema interno-sistema externo e tópica-
sistemática ditaram a génese e as alterações subsequentes no Direito civil e, a partir deste, na 
Ciência jurídica em geral. 
• A transposição do jusracionalismo – e da sistemática por ele pressuposta – para o Direito civil 
levantou dificuldades quase insuperáveis. O Direito civil é um dado cultural: ele é pré-dado, 
derivando da História; ontologicamente, ele não é deduzido de particulares princípios, numa 
situação rica em consequências. 
• A sistemática integrada ou terceira sistemática perdura até aos nossos dias. Lançada por 
Savigny, foi utilizada ao longo de todo o século XIX, no espaço jurídico alemão, em trabalhos 
desenvolvidos sobre os Digesta ou Pandekten. Conhece-se, por isso, também por pandetística. 
O êxito de Savigny ficou a dever-se à justeza da sua leitura e ao impacto direto que a sua obra 
teve na consecução de soluções concretas. Os cânones gerais da interpretação, ainda atuais e 
utilizáveis, foram fixados por Savigny. Hoje, eles já não são o coração da dogmática jurídica, mas 
sim a sua coluna: a herança de Savigny é universal. 
• As codificações civis modernas – as únicas que, verdadeiramente, merecem o título de 
“codificações” – surgiram quando a Ciência do Direito atingiu um nível que possibilitou a sua 
confeção e quando as condições sociopolíticas a tanto deram lugar. 
• Uma codificação civil só pode singrar quando o enorme trabalho de redução e síntese, que 
sempre implica, respeite o tecido interno, nas suas conexões e no seu teor fundamental. 
• A primeira codificação moderna é normalmente reportada ao Código Civil francês de 1804 ou 
Código Napoleão. Surgiu na sequência de um imenso trabalho levado a cabo durante os séculos 
XVII e XVIII e que visou o conhecimento e o redimensionar do material jurídico-civil. 
• Nos séculos XVII e XVIII, a doutrina continental procurou enfrentar e resolver três questões 
fundamentais: a unificação das fontes; a busca de uma sistemática racional; a adaptação dos 
institutos a novas realidades. 
• A unificação das fontes era um problema particularmente grave em França, dividida numa zona 
norte, de costumes – ainda que redigidos em termos romanizados – e numa zona sul, de Direito 
escrito – o Corpus Iuris Civilis. Mas para além disso, havia toda uma situação complexa gerada 
pela existência de compilações justinianeias, de inúmeras leis nacionais, do Direito canónico e 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
de diversos costumes e praxes jurisdicionais. 
• A busca de uma sistemática racional correspondia à necessidade de encontrar uma ordem para 
a compreensão e a aprendizagem do Direito, de aprontar um sistema externo que superasse as 
meras ordenações periféricas levadas a cabo pelos jurisprudentes elegantes. 
• A primeira codificação traduz apenas o ponto de chegada de uma evolução complexa iniciada 
com os comentaristas, renovada pelo humanismo e pela primeira sistemática e infletida pelo 
racionalismo. Entre a doutrina pré-revolucionária e o Código não há quebras ou, sequer, 
evoluções significativas; pelo contrário: o Código Napoleão pôs cobro a múltiplas inovações 
introduzidas durante o período revolucionário, adotando soluções anteriores. A adaptação dos 
institutos a novas realidades, aquando da efetivação de uma codificação civil, tem, pois, outro 
alcance: trata-se de generalizar segmentos já aproveitados e comprovados sectorialmente, de 
consagrar inovações preconizadas pela doutrina, de limar arestas em esquemas há muito 
conhecidos ou de erradicar fórmulas consideradas, de modo pacífico, como inúteis. 
• Os grandes pilares de fundo do Código Napoleão residiam nos seus artigos 544 e 1134/1, assim 
concebidos: “A propriedade é o direito de gozar e de dispor dos bens da forma mais absoluta, 
desde que não se faça deles um uso proibido pelas leis e pelos regulamentos” e “As convenções 
legalmente formadas valem como leis para aqueles que as fizeram (…)” 
• Estes preceitos tiveram, contudo, o simples mérito de proclamar com clareza aquilo que já era 
bem conhecido no Direito anterior. 
• O essencial das inovações integradas num novo estádio político-social cifrou-se, tudo visto, em 
supressões, como a das antigas corporações: a abertura do Direito privado, assente na ausência 
de regulações, facultou, por si, uma melhor atuação dos níveis económicos no plano privado. 
• Obedecendo aos parâmetros gerais que sempre justificam uma codificação, o Código Napoleão 
veio ainda acusar, de modo marcado, o influxo jusnaturalista.O Código apresenta-se como um 
produto terminal da segunda sistemática. 
• O Código Napoleão reparte-se por 3 livros: I- Das pessoas; II- Dos bens e das diversas 
modificações da propriedade; III- Das diferentes formas por que se adquire a propriedade. 
• Livro I – posição jurídica do indivíduo e de situações jurídicas familiares; Livro II – coisas, 
propriedade e outros direitos reais; Livro III – sucessões, doações, contratos em geral, 
casamento e regimes matrimoniais, contratos em especial, hipotecas e prescrição. 
• Toda a matéria se desenvolve, pois, a partir de ideias centrais simples e claras: a pessoa, 
enquanto indivíduo, carece de bens que movimenta, para sobreviver e se expandir. A aplicação 
destes postulados, por não atentar suficientemente nos elementos pré-sistemáticos que a 
cultura e a história sempre comportam, mostra-se pouco apta perante os regimes em jogo, 
como a evolução posterior acabaria por demonstrar. 
• O Código Napoleão surgiu como um monumento legislativo de primeira grandeza. Ele impôs-
se para além das suas fronteiras naturais, seja pela força das armas napoleónicas, seja por livre 
adoção (fenómeno de receção). 
• Hoje continua em vigor, embora muito alterado: a evolução das ideias e a pressão do Direito 
comunitário a tanto têm conduzido. 
• Centenário de 1904 -> foi ponderada, com cuidado, a eventualidade de uma revisão profunda: 
alguns Autores manifestaram-se a favor de tal revisão, enquanto outros optaram pela negativa. 
Os argumentos à revisão pareciam sérios e ponderosos, mas o Código Napoleão manteve-se. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
• A influência dominadora, científica e cultural, do Código Civil francês apenas esmoreceria 
perante o aparecimento, nos finais do século XIX, de uma nova codificação, assente em dados 
científicos mais perfeitos e avançados: o Código Civil alemão, conhecido pela sua sigla BGB 
(Bürgerliches Gesetzbuch) – corresponde ao ponto terminal de uma intensa atividade jurídico-
científica, que se prolongou por todo o século XIX. 
• Pandetistas -> levados a confecionar um novo sistema civil: as proposições jurídicas singulares, 
os institutos, os princípios e a ordenação sistemática sofreram remodelações profundas, 
aperfeiçoando-se, evitando contradições e desarmonias e multiplicando o seu tecido regulativo 
de modo a colmatar lacunas. 
• A doutrina francesa, presa a uma exegese intensa do texto napoleónico, perdeu terreno, até 
os nossos dias. 
• O Código Civil alemão tem, subjacentes, as estruturas científicas da terceira sistemática. 
• As preocupações imediatamente ideológicas – patentes no Código Napoleão e, em geral, nas 
codificações de inspiração liberal – desapareceram da Ciência do Direito, a favor de 
considerações de predomínio técnico. 
• Os trabalhos codificadores tiveram o seu início depois da proclamação, por Bismark, do 2º 
Império alemão. Estes vieram a prolongar-se por 23 anos de labor sério e intenso. 
• O BGB traduz “uma recolha do já existente e não uma criação de novidades” sintetiza a Ciência 
jurídica do século XIX, no que ela tinha de maus evoluído. 
• O BGB apresenta uma sistematização em 5 livros: Livro I- Parte geral; Livro II- Direito das 
ralações obrigacionais; Livro III- Direito das coisas; Livro IV- Direito da família; Livro V- Direito 
das sucessões. (classificação germânica do Direito civil) 
• Enfrentou, com êxito, os dois grandes desafios que lhe foram lançados: inexistência de normas 
associadas ao trabalho (o BGB estava, à partida, desatualizado) -> R: nasce o Direito do 
trabalho, como Direito privado especial; perturbações económicas e sociais profundas que não 
cessaram de aumentar depois da primeira guerra mundial -> R: desenvolvem-se institutos 
importantes no âmbito civil. 
• Com alterações, o BGB mantém-se a base do Direito privado alemão. 
• Publicação do BGB -> definitiva divisão dos Direitos de base românica em dois estilos: o estilo 
francês ou napoleónico e o estilo germânico ou pandetístico. 
• O Direito civil lusófono, com várias especificidades, oscilou entre os dois estilos: passou do 
napoleónico ao germânico. 
• As codificações tardias têm as seguintes características: são fruto da terceira sistemática; 
correspondem à universalização do Direito e da sua Ciência; têm em conta as críticas setoriais 
feitas à primeira e segunda codificação e consagram certos institutos novos obtidos já depois 
delas; apresentam desvios provocados pelas diversas realidades nacionais. 
• Foram precedidas pela receção e pelo desenvolvimento de uma Ciência jurídica de tipo 
pandetístico que, procurando evitar extremos de um Direito puramente racionalista ou de um 
Direito empírico no seu todo, efetuou a síntese integrada desses dois níveis jurídicos. 
• O Código Civil suíço apresenta a seguinte sistematização: Livro I- Direito das pessoas; Livro II- 
Direito da família; Livro III- Direito Sucessório; Livro IV- Direito das coisas; Livro V- Direito das 
obrigações. 
• O Código Civil grego, teve, na sua base, uma aplicação milenária do Corpus Iuris Civilis e, 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Designadamente, dos Digesta ou Pandektae. A influência alemã foi determinante, embora o 
Código suíço também tenha jogado. 
• O Código grego reparte-se pelas 5 partes germânicas. As críticas movidas à parte geral não 
obstaram à sua consagração, embora tivessem permitido corrigir alguns dos seus erros. 
• O Código Civil italiano, de 1942, é a mais autónoma das codificações tardias; sistematizou o 
Direito civil em termos mais aperfeiçoados: absorveu, por um lado, as novas criações jurídico-
cientificas do século e retomou, por outro, as mais finas construções romanistas; intentou a 
unificação do Direito privado, absorvendo o Direito comercial e do Direito do trabalho; reparte-
se da seguinte maneira: Livro I- Das pessoas e da família / Livro II- Das sucessões / Livro III- Da 
propriedade / Livro IV- Das obrigações / Livro V- Do trabalho / Livro VI- Da tutela dos Direitos; 
constitui um fruto notável da Ciência jurídica da primeira metade do século XX. 
• No século XIX, as necessidades da reunificação levaram a Itália a optar por uma codificação de 
tipo napoleónico: o Código Civil de 1865. 
• Nos finais do século XIX, assistiu-se a uma viragem definitiva da Ciência jurídica italiana para o 
modelo da terceira sistemática. 
• O segundo terço do século XX foi mesmo proclamado como a “idade da descodificação”: novos 
problemas encontravam solução legislativa à margem dos códigos civis tradicionais; temas 
antes incluídos nos códigos vieram a, deles, ser retirados. 
• A Ciência do Direito continental retomou, todavia, e com alguma facilidade, o seu ascendente 
sobre o Direito e a produção das leis. 
• Finais do século XX, princípios do século XXI -> aparecimento de 3 importantes códigos civis: 
Quebeque (1991), Holanda (1992), Brasil (2002). A reforma do Código Civil alemão, de 
2002/2002, é também importante neste contexto. 
• Pano de fundo destas codificações -> apoiam-se numa 3ªsistemática a qual, em vez de ser 
precedida pela pura e simples receção do pandetismo, pode ser alcançada através da evolução 
integrada do estilo napoleónico; apresentam uma preocupação envolvente, acolhendo, no 
Código Civil, ora matéria comercial (Brasil), ora matéria do consumo (Alemanha); ora ambas 
(Quebeque e Holanda). 
• O Quebeque adotou um direito de tipo continental pré-codificado, seguindo o “costume” de 
Paris. 
• Sir Georges-Étienne Cartier -> prepara o primeiro Código Civil do Quebeque (Código Civil do 
Baixo-Canadá); este código adotou uma sistematização napoleónica (I- Das pessoas; II- Dos 
bens, da propriedade e das diferentes modificações; III- Da aquisição e do exercício dos direitos 
de propriedade; IV- Leis comerciais); 
• O Código Civil do Baixo Canadá cumpriu admiravelmente a sua função, preservando, numuniverso de Common Law, uma ilha de Direito continental e provando, com isso, a capacidade 
de sobrevivência do Direito civil. 
• Thibaudeau-Rinfret -> a partir de 1955 prepara uma nova codificação que é aprovada, em 1991, 
como Código Civil do Quebeque; reparte-se por 10 livros (I- Das pessoas; II- Da família; III- Das 
sucessões; IV- Dos bens; V- Das obrigações; VI- Das prioridades e das hipotecas; VII- Da prova; 
VIII- Da prescrição; IX- Da publicidade dos direitos; X- Do Direito internacional privado); 
podemos considera-lo como o produto científico-cultural mais evoluído do estilo continental 
napoleónico. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
• Código Civil Holandês (Burgerlijk Wetboek) de 1838 correspondia ao figurino francês, 
distanciando-se o seu Direito civil, claramente, do alemão. 
• Dá-se uma reforma sendo aprovado, em 1991, e entrando em vigor em 1992, o novo Burgerlijk 
Wetboek que se reparte em 9 livros (I- Direito das pessoas e da família, II- Direito das pessoas 
coletivas, III- Direito patrimonial em geral, IV- Direito das sucessões, V- Direitos reais, VI- Parte 
geral do Direito das obrigações, VII- Contratos em especial, VII-A- Contratos em especial; 
continuação, VIII- Direito dos transportes) – contempla áreas sensíveis, como a da tutela do 
consumidor. 
• Brasil -> 1890 Coelho Rodrigues apronta um projeto (já haviam sido encarregadas outras 
pessoas para esta tarefa desde 1859), mas este foi rejeitado. 
• O novo Código civil do Brasil só é aprovado em 5 de janeiro de 1916 -> era um texto excelente, 
onde transparecia já um bom conhecimento do Direito alemão, em processo de superação do 
francês. 
• A evolução subsequente da realidade brasileira acaba por colocar a hipótese de preparação de 
um novo Código Civil -> surge um projeto em 1975 que acaba por ser promulgado a 10 de 
janeiro de 2002. Sistema: Parte Geral [Livro I- Das pessoas (1º a 78º); Livro II- Dos bens (79º a 
103º); Livro III- Dos factos jurídicos (104º a 232º)], Parte Especial [Livro I- Do Direito das 
obrigações (233º a 965º); Livro II- Do Direito da empresa (966º a 1195º); Livro III- Do 
Direito das coisas (1196º a 1510º); Livro IV- Do Direito da família (1511º a 1783º); Livro 
V- Do Direito das sucessões (1784º a 2027º)] e Livro Complementar – Das disposições 
finais e transitórias (2028º a 2046º). 
• O Código Civil brasileiro de 2002 acolheu o Direito comercial e procedeu a uma certa unificação 
do Direito privado. Ficaram de fora o Direito do trabalho e o Direito do consumo. 
• 11 de outubro de 2001 -> é aprovado, na Alemanha, um diploma denominado “Lei para a 
modernização do Direito das obrigações”. Esta lei alterou dezenas de parágrafos do BGB na sua 
área mais nobre: o coração do Direito das obrigações. 
• Esta reforma surgiu precedida por reformas importantes como a do Código de Comércio, de 
1998 e a do próprio BGB, de 2000. 
• Tocou nos seguintes pontos: regime de prescrição; Direito da perturbação das prestações; 
Direito da compra e venda; contrato de empreitada; contrato mútuo. Além disso, transitaram 
para o BGB diversas leis de tutela dos consumidores, com relevo para a das cláusulas 
contratuais gerais, para a das vendas a domicílio e para a das vendas à distância, 
complementadas com regras sobre o comércio eletrónico. 
• Reforma do Direito das obrigações -> início de agosto de 2000 é apresentado um projeto de 
reforma (Diskussionsentwurf). 
• Contra a reforma movimentou-se um poderoso esforço universitário. Particularmente notados 
seriam o simposium que teve lugar em Regensburg, no mês de novembro de 2000 e cujas 
participações foram publicadas e as jornadas Deutsche Zivilrechtslehrervereinigung, ocorridas 
em Berlim, em 30 e 31 de março de 2001. Manteve-se, no entanto, um forte impulso político 
favorável à reforma. 
• 6 de março de 2001 -> o Ministério da Justiça preparou uma “versão consolidada do projeto de 
discussão” 
• 9 de maio de 2001 -> o Governo adotou o projeto, o qual foi agendado, no Parlamento pelas 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Direito é um conjunto de orientações que disciplina a vida em sociedade. 
O Direito Romano é a grande matriz dos direitos na europa ocidental. 
Já os Romanos distinguiam, desde os tempos de Ulpiano (jurista 
Romano), o Direito Público do Direito Privado. 
• Ius Publicum -> conjunto de normas que se aplicavam a todos e que 
eram de conhecimento público 
• Ius Privatum -> cláusulas insertas nos contratos, testamentos, etc., cujo 
conhecimento se limitava às partes contratantes e não eram 
publicitadas. Incluía o direito civil (direito dos cidadãos – regulava tudo 
aquilo que lhes dizia respeito) e o ius gentium (direito dos estrangeiros); 
A distinção anteriormente apresentada não coincide com a doutrina 
moderna. Existem então, atualmente, 3 critérios para distinguir Direito 
Público de Direito Privado: Natureza dos interesses, Qualidade dos 
Sujeitos e Posição dos Sujeitos na Relação Jurídica. 
fações do SPD/Verdes. A primeira leitura pelo parlamento, ocorreu em 13 de julho de 2001. O 
Bundesrat ou Câmara Alta tomou o seu parecer em 13 de julho de 2001. A Comissão de Justiça do 
Bundestag apresentou o seu parecer em 25 de setembro de 2001. O projeto foi finalmente 
aprovado, em segunda e terceira leituras, pelo Parlamento (Bundestag), em 11 de outubro de 2001, 
pela maioria SPD/Verdes. 
• 1 de janeiro de 2002 -> versão revista do BGB entra em vigor (grande novidade jurídico-
científica, legislativa e civilística dos últimos 100 anos). 
• A reforma do BGB teve, ou vai tendo, um impacto crescente em áreas exteriores ao próprio 
Código Civil (ex. Direito comercial e diversas áreas do Direito das sociedades comerciais, com 
um relevo marcante na chamada aquisição de empresas). 
• Gustav Hugo (1764-1844) propõe a seguinte sistematização do Direito civil -> Introdução (§§ 1-
7); Ius in rem (§§ 8-30); Obligatio: ius in personam (§§ 31-81); Direito de família (§§ 82-96); 
Direitos que pressupõe uma morte (§§ 97-121); Processo (§§ 122-146) 
• Arnold Heise (1778-1851) faz a seguinte repartição -> Parte geral; Direitos reais; Direito das 
obrigações; Jura potestatis (correspondem ao Direito da família); Direito geral das sucessões; 
Restitutio in integrum (autonomizada: normalmente inserida nas obrigações). Verifica-se a 
presença da classificação germânica, com a inclusão da parte geral e a exclusão do processo. 
• Savigny (1779-1861) -> 7 livros (1- Fontes do Direito romano atual; 2- As relações jurídicas; 3- 
Domínio das relações jurídicas sobre as regras do Direito; 4- Direitos reais; 5- Direito das 
obrigações; 6- Direito da família; 7- Direito das sucessões. 
• A classificação germânica, ainda que por vezes criticada, veio a entrar nos hábitos de trabalho 
e de pensamento dos juristas nacionais. 
 
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• Segundo o critério da Natureza dos Interesses: 
1. Direito Público -> Tem como objetivo a satisfação dos 
interesses públicos; 
2. Direito Privado -> Tem como objetivo a satisfação dos 
interesses privados; 
NOTA: é, no entanto, muito difícil dizer se determinada norma regula 
interesses públicos ou privados. Ex. As normas que fixam as penas para 
diversos crimes procuram defender a segurança da coletividade e garantir 
a paz social e, nessa medida, tutelam interesses públicos, ao mesmo tempo 
que asseguram a defesa dos interesses individuais, a segurança de cada um 
de nós e o interesse moral e material de todo aquele que se considere 
lesado com a prática do crime. 
 
• Segundo o critério da Qualidade dos Sujeitos: 
1. Direito Público -> Normas que regulem as relações em que 
intervenha o Estado ou qualquer entidade pública em geral; 
2. Direito Privado -> Constituído por normas que regulam as 
relações entre particulares; 
NOTA: também foi alvo de críticas pois o Estado pode atuar nos mesmos 
termos que os particulares. Ex. quandocelebra um contrato de compra e 
venda. 
 
• Segundo o critério da Posição dos Sujeitos: 
1. Direito Público -> Conjunto de normas que regulam as relações 
em que intervenha o Estado (ou qualquer entidade pública, dotada de 
supremacia, ou seja, investida de imperium). Vigente o princípio da 
competência Ex. quando o Governo pretende construir uma estrada e quer 
celebrar um contrato de empreitada tem de recorrer a um concurso 
público; 
2. Direito Privado -> Constituído por normas que regulem as 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
relações entre os cidadãos, ou entre estes e o Estado (ou qualquer outro 
ente público), mas desde que desprovidos de imperium. Vigente o princípio 
da liberdade, ou seja, “posso fazer o que me apetecer, desde que chegue a 
acordo com o outro sujeito”. Ex. Estado arrenda um prédio. 
 
A sociedade, desde o direito Romano, tornou-se muito mais 
complexa e o Direito acompanhou essa mudança -> o Direito Civil começa 
a especializar-se e a adaptar-se a certas situações: 
• ex.1 -> na idade média houve um conjunto de pessoas que começa a 
ter relações comerciais, tendo necessidades que outros não tinham, assim, 
determinadas regras deveriam ser adaptadas quando se tratava de relações 
entre comerciantes -> surgiu, portanto, o direito comercial; 
• ex.2 -> sec. 18/19 [época da revolução industrial] na sequência desta 
revolução verifica-se que existiam trabalhadores que celebravam contratos 
com pessoas com muito mais poder que eles e frequentemente assistia se 
a uma exploração do primeiro, o que não pode, de todo ser -> nasce, assim, 
o direito do trabalho; 
 
Os direitos autonomizam-se. O Direito Civil é o que resta quando 
não há qualquer tipo de direito especial para determinada situação; é o 
direito comum a todo o direito (público e privado). 
No final do séc. XVIII, na Alemanha, houve um jurista chamado 
Gustav Hugo que dividiu o Direito Civil em 4 blocos: direito das obrigações, 
direito reais ou das coisas, família e sucessões (por influência de Savigny, 
esta divisão do Direito Civil foi consagrada pelo Código Civil Alemão 
[Bürgerliches Gesetzbuch – BGB] sendo, hojem em dia, conhecida em todo 
o mundo como classificação germânica do código civil). 
• Direito das Obrigações / Livro das Obrigações: é a parte mais 
extensa do Código Civil -> regula a generalidade dos contratos e a prática 
de atos ilícitos; dominantemente trata de situações jurídicas em que 
alguém é credor de uma pessoa, o dito devedor (ex. alunos são credores 
dos professores, cobram-lhes o dever de ensinar); esta parte do direito é 
muito romanizada, de estrutura antiquíssima. Há áreas que o direito das 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
obrigações absorveu (fenómenos de absorção – falados pelo Doutor 
Menezes Cordeiro na sua obra); podemos inventar sempre mais direitos. 
• Direitos Reais ou Direito das Coisas: regula a relação entre pessoas 
e coisas (ex. direito de propriedade, hipoteca, penhor, usufruto); é apenas 
o que é; divide-se em direitos de gozo (direito de propriedade), de garantia 
(hipoteca) e de aquisição (direito de preferência). 
• Direito da Família: conjunto de regras que pairam à volta da 
instituição família, que regulam as relações familiares; não é romanizada, 
tem antes origem medieval e canónica; direito instável e ideológico; 
• Direito das Sucessões: tem sobretudo origem românica e regula o 
que acontece quando uma pessoa morre 
 
Existe uma divisão muito significativa entre o direito ocidental e os 
direitos anglo-saxónicos. 
 
O atual Código Civil Português respeita a classificação germânica 
que, apesar de ser consensual, recebe muitas críticas: muitos pensam que 
a classificação germânica é pouco racional, pois, em vez de ter um único 
critério, tem dois -> critério estrutural (diz respeito ao Direito das 
obrigações e aos Direitos Reais) e critério institucional ou da fonte (diz 
respeito, essencialmente, ao o Direito da família e ao Direito das 
sucessões). É, então, uma classificação em 4 partes e o nosso Código Civil 
é baseado na mesma, tendo, no entanto, 5 partes. 
As últimas 4 partes já foram apresentadas; a primeira diz respeito à 
parte geral que, importante salientar, não representa um repositório de 
regras jurídicas, mas sim uma tentativa de construir uma teoria geral do 
direito que depois funcionasse na compreensão de todo o direito -> acaba 
por não resultar na totalidade. 
 
TPC: Ler Manual de Introdução ao estudo do direito do professor 
Inocêncio Galvão Telles – 2ºvolume, páginas 149 a 157 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Na Alemanha, até 1870, não havia um só país, mas sim vários que 
se relacionavam. Como faziam? Aplicaram, até essa altura, o direito 
romano. Este direito, era, no entanto, muito desajustado para uma 
sociedade do séc. XIX. 
 
Durante a idade média foi feita uma compilação de leis romanas -> 
corpus iuris civilis /pandectas. 
Os juristas alemães que aplicavam as pandectas, isto é, as leis 
romanas ficaram conhecidos por pandectistas; 
Os Pandectistas propuseram o conceito de relação jurídica como 
tentativa de compreender o direito -> é um vínculo entre duas pessoas 
que se caracteriza por uma ser titular de um direito perante a outra que 
se encontra adstrita a um dever -> garantida pela coercibilidade. 
Na relação jurídica temos 4 elementos essenciais: Sujeito, Objeto, 
Conteúdo e Garantia: 
• Sujeito: pessoas entre as quais se estabelece a relação jurídica; 
Titulares do direito subjetivo e dos passivos correspondentes – dever 
jurídico ou sujeição. 
• Objeto: tudo aquilo sobre que recaem os poderes do titular do 
Direito. Ex. coisas ou prestações. 
• Conteúdo (ou objeto imediato): direitos e adscrições que 
corporizam o vínculo entre os sujeitos. 
• Garantia: possibilidade de exercer coercibilidade jurídica. 
 
O nosso Código Civil está organizado de acordo com a norma jurídica. 
Se não encontrarmos uma regra, pensamos numa relação jurídica e mais 
facilmente a encontraremos. 
 
TPC: ler 1º volume do Tratado do Direito Civil, do doutor Menezes 
Cordeiro (das páginas 216 a 242) 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
A legislação originariamente portuguesa era escassa. A maior parte das 
regras era costumeira. Depois do Rei Afonso III, começa se a dar primazia 
as fontes do direito portuguesas, nomeadamente ao costume. 
A partir do séc. XV as regras portuguesas são compiladas numa 
coletânea: as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas. No Brasil 
vigoraram as Filipinas até 1916. Estas ordenações abrangiam todas as áreas 
do direito e não apenas o civil. Quando não havia ordenações portuguesas 
aplicava-se o direito romano, o canónico, a doutrina dos manuais de 
certos professores ou a opinião geral dos doutores. 
Isto foi assim até ao Marquês de Pombal que lança a Lei da Boa Razão 
(para resolver os problemas das pessoas devemos utilizar o direito 
português ou, quando este não existe, o direito das nações europeias 
civilizadas e só depois o direito romano, quando conforme à boa razão); 
Objetivo -> concentrar o poder do rei e reorganizar o Direito Português. 
 
Em 1867 surge o 1º Código Civil Português, o código de Seabra, que 
reflete os ideais da Revolução Francesa; embora com influências do mesmo, 
era mais perfeito que o código de Napoleão. 
Código de Napoleão reflete os ideias da Revolução Francesa e foi o 
primeiro com maior expansão no mundo. 
Em 1944 (período do Estado Novo) foi constituída uma comissão 
presidida por Adriano Vasco, para rever e fazer um novo código. O Código 
de Seabra já não servia porque era demasiado individualista -> surge, 
então, o Código Civil de 1966, entrando em vigor em 1967 
Depois da Revolução de 1974 o Código Civil é alterado, nomeadamente 
no âmbito do direito da família. Os direitos da família e de arrendamento 
são muitas vezes alterados. 
 
20-10-2020 
TPC: Ler Manual do prof. Carvalho Fernandes, 1º volume, páginas 77-106 
Instituto -> utilizando a definição do Menezes Cordeiro,é um “conjunto 
compactuado de normas e princípios que permite a formação típica de 
modelos de decisão”. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Institutos base da disciplina: 
• Instituto da Autonomia Privada 
× Designa os mecanismos jurídicos que, em cada ordenamento jurídico, 
permitem aos particulares revestir a sua vontade de eficácia jurídica; é 
um espaço de liberdade jurídico; é a tradução do mundo idílico da 
liberdade; possibilidade de cada pessoa orientar a sua vida como quiser; 
pode ser concedida com mais ou menos intensidade (do ponto de vista 
técnico há dois graus de autonomia privada – liberdade de celebração 
e liberdade de estipulação); 
ü Liberdade de celebração é o grau menos intenso de autonomia 
privada que permite que o sujeito produza efeitos jurídicos 
associados à sua vontade de celebrar um determinado ato; se a 
pessoa quiser os efeitos jurídicos produzem-se, se a pessoa não 
quiser, os efeitos jurídicos não se produzem (ex. perfilhação); 
ü Liberdade de estipulação diz-nos que há modelação do 
conteúdo, de acordo com a vontade dos que formam o negócio 
(ambas as partes estabelecem o conteúdo do contrato de acordo 
a sua vontade). 
NOTA: está errado dizer “a lei estipula que” ou num negócio unilateral “eu 
estipulo que” porque estipular vem do latim stipulatio e significa “chegar a 
acordo”. 
× Em cada época histórica a autonomia privada teve uma determinada 
configuração que variou muitíssimo, no entanto, existiu sempre, 
mesmo em regimes totalitários; o legislador sabe que há um nível de 
detalhe da vida pessoal das pessoas que não só não é possível controlar, 
como não é conveniente; 
× A extensão de autonomia privada também varia de país para país (ex. o 
nosso direito do trabalho, comparativamente ao de outros países, é uma 
zona em que há pouca autonomia privada, ou seja, há muitas normas 
imperativas; o direito americano é conhecido por ser o direito em que a 
autonomia privada é muito ampla); 
× No Direito Romano este princípio também existia, mas existia ainda 
outro principio aplicado à autonomia privada (contratos) que era o 
princípio da tipicidade (os cidadãos podiam produzir os contratos de 
acordo com a sua vontade, desde que previstos na lei, mas apenas de 
determinada maneira). Este princípio existe no direito português, 
relativamente ao negócio unilateral (artigo 457º do Código Civil); 
 
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× Um ato que seja fruto da autonomia privada chama-se negócio 
jurídico. 
× Artigo 405º do Código Civil diz respeito ao princípio da autonomia 
privada em matéria contratual. 
× Autonomia no direito civil varia: é máxima no direito patrimonial, por 
exemplo, mas não no direito da família e algumas áreas do direito das 
sucessões. 
× Limite geral à autonomia privada encontra-se no artigo 280º do 
Código Civil, mas há outros como os negócios usurários, o regime das 
cláusulas contratuais gerais, etc. 
 
• Instituto da propriedade 
× O Código Civil, não define o direito de propriedade, mas o art. 1305º 
caracteriza-o, dizendo que “o proprietário goza de modo pleno e 
exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe 
pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições 
por ela impostas”; 
× Tem associado um sentido de afetação de uma coisa a uma 
determinada pessoa; 
× Teve muitas alterações ao longo da história; 
× Tem uma carga ideológica muito forte: é vulgar encontrarmos 
ideologias que olham para o direito de propriedade de uma forma muito 
negativa, inclusive alguns sistemas jurídicos tentaram eliminar a 
propriedade privada (algumas comunidades religiosas também 
tentaram eliminar ou eliminaram mesmo a propriedade privada); 
× Algumas comunidades nem sequer conheceram a propriedade privada, 
conheceram outras formas de propriedade; 
× A propriedade é reconhecida no art. 62º da CRP (“A todos é garantido 
o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por 
morte, nos termos da Constituição). 
 
• Instituto da Responsabilidade Civil 
VER: Manual do Professor Antunes Varela “Das obrigações em Geral”, 
1ºvolume (páginas 518 a 544) 
× Dano corresponde à supressão ou à diminuição de uma vantagem de 
cumprir determinado direito; 
× Desde sempre que as pessoas sofrem danos e também desde sempre o 
direito tenta alterar esta realidade; inicialmente, a reação ao dano era 
uma reação coletiva e o dano era reparado não apenas pelo agressor, 
 
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mas por toda a sua família ou tribo; o direito civil e o direito penal 
confundiam-se. 
× Hoje, o que interessa para o direito civil é a reparação do dano (direito 
civil é ressarcitório) e não uma retaliação. 
× O princípio geral em matéria de reparação de danos é o de que cada 
pessoa sofre os danos que cabem na sua esfera jurídica (risco, aptidão 
para suportar danos) - princípio de justiça básica: ubi commodum, ibi 
incommodum (onde está a vantagem está a desvantagem) 
× Há exceções à regra do ubi commodum, ibi incommodum e são 
designadas por responsabilidade civil (corresponde ao instituto pelo 
qual alguém vai suportar na sua esfera jurídica um dano que ocorreu 
na esfera jurídica de outrem, através da indeminização). Para que isto 
aconteça é necessário que aconteça uma atuação ilícita e culposa 
causadora do dano (artigo 483º do Código Civil) 
× Artigo 483º/2 do Código Civil: só há responsabilidade sem culpa em 
duas situações (responsabilidade civil pelo risco e responsabilidade pelo 
sacrifício ou por factos lícitos) 
ü Responsabilidade civil pelo risco (responsabilidade objetiva) – 
prevista nos artigos 499º e seguintes do Código Civil – sobretudo 
a partir da Revolução Industrial o industrial o legislador entendeu 
que há determinadas realidades que são perigosas e que causam 
dano sem as pessoas terem qualquer culpa. Mas estas realidades 
também geram vantagens. Ex. vou a conduzir e rebenta-me o 
pneu e não consigo controlar o carro pelo que atropelo uma 
pessoa (artigo 503º do Código Civil) - se seguirmos a regra não 
acontece nada porque não tenho culpa, mas isto é injusto, por 
isso o legislador criou casos com responsabilidade pelo risco; 
ü Responsabilidade pelo sacrifício ou por factos lícitos - há 
responsabilidade civil mesmo se a conduta for lícita (ex. artigo 
339º ou 81º do Código Civil); exemplifica casos em que alguém 
pode, licitamente, provocar um dano, mas tem sempre que 
indemnizar 
 
Estudar pelo Carvalho Fernandes, 1º volume (páginas 125 a 339 e 391 a 
424) e 2º volume de Inocêncio Galvão Telles (páginas 157 e seguintes) 
 As pessoas são os destinatários das normas jurídicas. A pessoa é o 
fim do Direito, o Direito é feito para as pessoas. 
 
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Pessoa -> é um centro de imputação de normas jurídicos. É um ente 
destinatário das normas jurídicas. É o protagonista do Direito. Sem pessoa 
não há Direito. 
Personalidade jurídica -> qualidade de ser pessoa. Suscetibilidade de ser 
titular de direitos e encontra-se adstrito a deveres. Conceito qualitativo, 
ou seja, uma determinada entidade, ou é pessoa jurídica, ou não é. 
Pessoas coletivas -> centro de imputação de normas jurídicas que não 
corresponde à pessoa humana 
ü Pessoas coletivas de base pessoal: grupos de pessoas que se juntam 
para realizar uma determinada atividade (ex. clubes de futebol, 
partidos políticos, sociedades comerciais) 
ü Pessoas coletivas de base patrimonial -> massas de bens que 
prosseguem um determinado fim (ex. fundações) 
ü Pessoa rudimentar (conceito inserido por Menezes Cordeiro) -> 
centros de imputação, não de normas jurídicas em geral, mas de um 
pequeno conjunto de normas. Desafiam o conceito de pessoa 
jurídica porque não são pessoas coletivas, mas parece que são, em 
determinadas e limitadas situações (ex. condomínio de um prédio) 
NOTAS: 
• No Brasil as pessoas coletivas chamam-se pessoas morais; 
antigamente, no Código de Seabra, também se designavam pessoas 
morais; 
• No direito romano não existiaa pessoa coletiva. Apareciam apenas 
casos muito pontuais como o estado, o senado, etc.; 
• Uma fundação é um conjunto de bens afetado a um determinado 
fim. 
 
 A generalidade das normas aplica-se indistintamente a pessoas 
coletivas e a pessoas singulares. 
 Quando havia escravos, as normas que se aplicavam eram 
destinadas aos seus donos, como hoje em dia é a situação dos animais. 
Pessoa singular -> centro de imputação de normas jurídicas que 
corresponde à pessoa humana; 
 
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Capacidade jurídica -> ao contrário da personalidade jurídica, é um 
conceito quantitativo. Distingue-se quanto à capacidade: 
ü De gozo: medida dos direitos e deveres que alguém pode ser titular; 
ü De exercício: medida dos direitos e dever que alguém pode exercer 
pessoal e livremente; ao contrário da capacidade de gozo, é 
suprível. 
 
Legitimidade -> suscetibilidade de uma pessoa exercer uma situação 
jurídica que resulta não das qualidades da pessoa, mas da relação da 
pessoa e da situação jurídica em causa. 
 
Esfera jurídica -> Conjunto de direitos e deveres de que uma pessoa é 
efetivamente titular. Esta esfera jurídica varia constantemente de pessoa 
para pessoa quanto à: 
ü Esfera patrimonial -> contém todas as situações jurídicas que 
juridicamente sejam trocadas por dinheiro (ex. garrafa de água); 
ü Esfera pessoal: direito à honra, direito à vida privada. 
 
Património -> conjunto das situações jurídicas patrimoniais de que 
alguém é titular ou conjunto dos bens ou é a garantia geral dos credores. 
NOTAS: 
• Em matéria de patrimónios separados, por dívidas da herança responde 
o património da herança e não o meu; quando duas pessoas casam 
passam a ter um património comum que pode ser maior ou menor 
consoante o regime que escolham (há aqui 3 patrimónios, o do homem, 
o da mulher e o comum, havendo regras diferentes para cada um); 
• Quando contratamos com alguém é fundamental saber qual é o 
património da pessoa. 
Em Portugal, desde a época do Marquês de Pombal existe princípio 
da responsabilidade patrimonial que nos diz que quando alguém viola a 
sua obrigação, a única consequência que sofre é patrimonial, ou seja, a 
pessoa paga uma indeminização (em Direito Civil, em Direito Penal não é 
assim). Até ao Marquês de Pombal havia prisão por dívidas. 
 
 
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27-10-2020 
 
 
 
 
 
 
 
 
Personalidade Jurídica (artigo 66º do Código Civil) -> é a suscetibilidade de 
ser titular de direitos e estar adstrito a deveres. Esta personalidade 
adquire-se com o nascimento completo e com vida e cessa com a morte 
do indivíduo (artigo 68º do Código Civil) 
NOTA: Durante muitos anos em Espanha (até há muito pouco tempo, por 
exemplo), para adquirir personalidade jurídica era necessário que o bebé 
tivesse viabilidade, ou seja, que o nascimento ocorresse completo e com 
vida, mas que a vida fosse uma vida viável (se se soubesse que o bebé que 
ia nascer não tinha hipóteses de sobreviver ele não adquiria personalidade 
jurídica). Em Portugal isto não é assim: qualquer criança que nasça, mesmo 
que morra no minuto seguinte, adquire (e depois perde) personalidade 
jurídica. 
 
Nascituros -> bebés em gestação 
 Quais são os direitos destes bebes? É uma matéria que tem evoluído 
nos últimos séculos a par da evolução da medicina. 
Artigo 66º, nº2 do CC -> os direitos que a lei reconhece aos nascituros são 
típicos (é preciso que a lei reconheça os seus direitos); esses direitos 
dependem do nascimento (condição legal- da lei) -> ex. 952º, 1854º e 
2333º do Código Civil. 
Pessoas 
Coletivas Singulares 
(centros de 
imputação de 
normas jurídicas que 
correspondem a 
seres humanos) 
 
Acontece por exemplo no 
casamento. O património 
pertence a ambos. 
 
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Conceturo -> pessoa que ainda nem foi concebida 
 A palavra “nascituro” em sentido amplo inclui conceturos e 
nascituros. A figura dos nascituros e dos conceturos coloca o prolema de 
saber quem é o titular dos direitos dos nascituros entre o momento em 
que os direitos lhes são atribuídos e o momento em que eles nascem 
(2237º e 2240º do CC): 
• Pires de Lima e Antunes Varela -> consideram que antes do 
nascimento o nascituro não tem verdadeiramente personalidade e, 
assim sendo, não adquire qualquer direito subjetivo à herança logo à 
morte do de cujos, mas uma simples expectativa ao futuro 
chamamento. 
• Mota Pinto -> recusa admitir a personalidade pré-natal; considera 
direitos sem sujeito aqueles que são atribuídos por herança ou 
doação aos nascituros, até que ocorra o nascimento completo e com 
vida. 
• Galvão Telles -> defende que o nascituro, após a conceção passa a 
existir como ser vivo, que, todavia, não é tratado logo como sujeito 
de direito; carece de personalidade jurídica, mas goza de proteção 
jurídica; a personalidade só surge quando pode revestir eficácia 
perdurável (nascimento). 
• Carvalho Fernandes -> nega personalidade ao nascituro e considera 
sem sujeito os direitos que lhe advenham antes do nascimento por 
herança ou doação: se não nascer com vida não chega a ser deles 
titular, se nascer com vida adquire ao tempo do nascimento os 
referidos direitos, sem que ocorra qualquer retroação. 
• Oliveira Ascensão -> embora com cautela, admite que o nascituro já 
concebido tem personalidade jurídica desde o momento da 
conceção. 
• Menezes Cordeiro -> a personalidade deveria adquirir-se logo com o 
momento da conceção, em nome do princípio básico de que todo o 
ser humano é pessoa; defende que o nº2 do artigo 66º tem o sentido 
de supressão retroativa dos direitos dos nascituros quando este não 
chega a nascer com vida. 
 
Porque é que os nascituros e os conceturos só têm os direitos que a lei 
prevê e apenas se de facto nascerem? Se considerássemos que estes 
 
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indivíduos já tinham personalidade jurídica logo desde a sua conceção 
criaria uma grande confusão. 
Menezes cordeiro -> personalidade jurídica adquire-se no momento da 
conceção, mas que essa personalidade é restrita ao direito à vida (artigo 
24º da Constituição) e, portanto, o nascituro, durante a gestação tem 
direito à vida e nada mais. 
Os conceturos, enquanto tal, não têm direitos. Só têm algum interesse nos 
direitos sucessórios. 
 
Tratamento jurídico de danos que são provocados no feto: 
• durante a gravidez -> indemnizável se essa pessoa vier a nascer; 
• durante o parto -> indemnizável porque o bebé já adquiriu 
personalidade jurídica; 
NOTA: os danos da mãe também são indemnizáveis. 
 
Problema do dano vida -> parte do pressuposto que a vida humana não 
saudável é um dano (tem a ver com doença ou malformação grave, no 
sentido de que dá muita despesa). 
 Em Portugal, uma pessoa saudável e uma pessoa doente têm o 
mesmo valor jurídico; uma pessoa doente não é um dano. 
NOTA: quanto mais leis existam que relativizem a vida humana mais fácil é 
considerar-se a vida não saudável um dano. 
 
 Há determinados direitos que são atribuídos às pessoas só pelo 
facto de elas serem pessoas, são inerentes às pessoas (direitos de 
personalidade); São uma manifestação jurídica da identidade e da 
humanidade de cada pessoa. 
NOTA: nem todas as pessoas tem todos os direitos de personalidade (ex. 
um mudo não tem direito à voz) 
Artigo 70º do Código Civil -> estão protegidos todos os direitos que 
respeitem o corpo da pessoa e a moral. 
 
 
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Pessoas coletivas 
• Maria Raquel Rei: pensa que não têm direitos de personalidade (ex. 
o direito ao bom nome, nas pessoas coletivas tem uma aceção 
comercial, enquanto nas pessoas coletivas é algo interior, as pessoas 
podem ficar tristes, magoadas; direitos como o direito à vida nem são 
suscetíveis de ser adquiridos por pessoas coletivas). 
 
 Direitos de personalidade são um espaço de liberdade para que 
cada pessoa se desenvolva enquanto ser humano, mas o exagero destes 
direitos temprecisamente o efeito contrário porque se coloca em causa a 
dimensão ética destes direitos. 
 Direitos de personalidade são absolutos (não dependem de uma 
relação jurídica com outra pessoa) e pessoais (não podem ser trocados por 
dinheiro, juridicamente falando); alguns são ainda pessoalíssimos (tem a 
ver com realidades muito pessoais e íntimas) e indisponíveis (os titulares 
podem limitar alguns desses direitos, mas não podem aliená-los); também 
há direitos de personalidade remetidos (relacionados com o artigo 75º/1 
do Código Civil), patrimoniais (ex. algumas explorações do direito à 
imagem – há pessoas que comercializam a sua imagem); pode haver um 
certo grau de representação, ou seja, alguns direitos são suscetíveis de ser 
exercidos por representação (não são pessoalíssimos) e alguma 
disponibilidade (nos termos do artigo 81º do Código Civil) – quando 
alguém limita o seu direito de personalidade está a dispor de uma forma de 
exercício do mesmo. 
 Os direitos de personalidade são direitos subjetivos, ou seja, 
permissões normativas especificas de aproveitamento de bens de 
personalidade (corpo e honra). 
 Não existe tipicidade nos direitos de personalidade em Portugal -> 
artigo 70º, nº1 do Código Civil permite jus subjetivar todos os bens de 
personalidade; é possível, a partir deste artigo, criarmos direitos subjetivos 
relativamente a qualquer aspeto da personalidade física ou da 
personalidade moral. 
 
 
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 Os direitos de personalidade têm um regime muito restritivo em 
matéria de limitações -> previsto no artigo 81º do Código Civil que se 
desdobra em dois pontos principais: 
• São nulas, ou seja, não produzem efeitos jurídicos, todas as 
limitações que contrariem os princípios da ordem jurídica. 
• As limitações que sejam válidas podem ser revogadas pelo seu 
titular desde que haja uma indeminização (indeminização pelo 
sacrifício ou por atos lícitos) 
 
Artigo 70º, nº2 do Código Civil -> a lei estabeleceu uma regra que é uma 
exceção no nosso direito: o ofendido pode pedir uma indeminização ou 
uma outra coisa qualquer, como por exemplo um pedido de desculpas. 
878º e seguintes do Código do Processo Civil prevê a efetivação das 
reparações aos direitos de personalidade. 
 
A doutrina discute se no artigo 70º do Código Civil estamos perante um 
direito geral de personalidade (direito cujo objeto seria toda a pessoa) ou 
se estamos apenas perante um princípio geral que admite todos os direitos 
de personalidade (princípio de não tipicidade dos direitos de 
personalidade): 
• Maria Raquel Rei, Carvalho Fernandes e Menezes Cordeiro: tendem 
a considerar que estamos perante uma cláusula geral ou um princípio 
geral de todos os direitos de personalidade; não há um único direito 
de personalidade, há vários. 
• Capelo de Sousa: defende que existe um direito geral de 
personalidade, ou seja, existe um único direito cujo objeto é a pessoa 
na sua totalidade. 
 
 
 
 
 
Direito de Personalidade 
Direito subjetivo - 
permissão normativa 
especifica de 
aproveitamento de bens 
de personalidade (corpo e 
honra) 
 
Direito Fundamental 
Direito que vem previsto 
na Constituição 
(caracteriza-se não pelo 
seu objeto, mas pela sua 
fonte) 
 
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 Há direitos de personalidade que são direitos fundamentais (ex. 
direito à vida), mas não devemos confundir porque os direitos 
fundamentais têm um regime jurídico próprio 
 
Direitos humanos -> caracterizam-se quanto a sua fonte; são consagrados 
em convenções internacionais, tratados internacionais, enfim, documentos 
internacionais; visam proteger os seres humanos onde quer que eles 
estejam. 
Direitos humanos/direitos naturais num sentido filosófico -> aqueles que 
deviam existir para todos os seres humanos. 
 
Direitos pessoais -> não podem ser trocados por dinheiro; há direitos de 
personalidade que são pessoais, outros não (ex. podemos comercializar a 
nossa voz). 
 
Pessoas singulares -> enquadradas de acordo com categorias: 
• Identificação: elemento fundamental; desde o Direito Romano que 
se estabeleceu um conjunto de regras para estabilizar o modo de 
identificação de cada pessoa; a identificação principal de cada ser 
humano faz-se através do seu nome, no entanto, hoje em dia há 
outros fatores de identificação (ex. naturalidade, nacionalidade, 
domicílio, estado civil, residência, etc.); hoje, com as tecnologias, 
também é muito importante a identificação das pessoas através de 
números; existem regras para o furto dos nomes das pessoas, quer 
sejam singulares ou coletivas; há um registo público para as pessoas 
singulares (registo civil) e outro para as pessoas coletivas (registo 
comercial e registo nacional de pessoas coletivas); uma pessoa é um 
centro de produção de efeitos jurídicos pelo que é fundamental saber 
quem é pessoa e quem não é. 
 
Estado Civil (solteiro, casado, viúvo) -> cada um destes estados tem 
consequências associadas: há um regime jurídico significativo que se aplica 
em função do estado civil das pessoas; hoje em dia, deve acrescentar-se 
dois estados civis (unidos de facto e insolventes). 
 
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• Maria Raquel Rei: confessa ser muito crítica em considerar a união 
de facto um estado civil porque casar é uma liberdade (as pessoas só 
casam se quiserem); o conjunto de normas que hoje existem sobre 
as uniões de facto é uma forma de forçar as pessoas a uma coisa que 
elas não querem (ex. se eu quiser casar com uma pessoa e ter os 
direitos e obrigações de um casamento, eu caso; se eu não quero, 
não caso – a existência de muitas normas como as que temos hoje 
que se aplicam a pessoas que estão a viver juntas sem estarem 
casadas é o legislador a fazer pouco da liberdade das pessoas (é como 
se dissesse “bem, tu não queres casar, não é? Não queres ter os 
direitos e obrigações de um casamento? Mas vais ter, lol, olha-me 
este”) 
Insolvente -> pessoa que deixou de ter dinheiro para pagar todas as suas 
dívidas vencidas e que foi declarada como tal pelo tribunal; existe um 
conjunto de regras muito extensas que se lhes aplica. Discute-se muito, na 
doutrina, se a insolvência é ou não um estado civil. 
• Maria Raquel Rei: acha que a insolvência é um estado civil porque há 
um conjunto de regras que alteram a vida destas pessoas, de maneira 
muito semelhante daquelas que existem para o casamento; estas 
pessoas têm a sua vida afetada por causa da situação em que se 
encontram, tal e qual como no casamento, viuvez, etc. 
 
Domicílio -> local onde, para certos efeitos, é suposto uma pessoa 
encontrar-se; é extremamente relevante porque vivemos num espaço, 
existimos fisicamente. Há vários tipos de domicílios: 
• Geral: local onde a pessoa tem a sua residência habitual (artigo 
82º/1 do Código Civil); é possível uma pessoa ter domicílios 
alternados (viver com permanência em dois sítios ao mesmo tempo); 
NOTA: quando as pessoas não têm residência habitual, o seu domicílio é a 
residência ocasional ou paradeiro (artigo 82º/2 do Código Civil) 
• Especial: é, por exemplo, o domicílio profissional; 
• Eletivos: eu escolho o domicílio para determinados efeitos; 
• Obrigatórios: os menores têm domicílio na casa dos seus pais, por 
exemplo. 
 
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Ausência -> figura que corresponde à situação de alguém que 
desapareceu, não deixou representante e tem um património que é 
preciso cuidar (previsto nos artigos 89º e seguintes do Código Civil); 
permite que quando existe a ausência de alguém, o tribunal nomeie um 
curador provisório a essa pessoa – o tribunal faz a relação dos bens dessa 
pessoa que está ausente, o curador presta uma caução e depois o tribunal 
entrega os bens ao curador e o curador trata os bens dessa pessoa; o 
curador tem que prestar contas e será responsável pela administração 
que fizer dos bens do ausente; com a passagem do tempo a curadoria pode 
cessar, nos termos do artigo 98º do Código Civil (se for pela alínead. deste 
artigo, abre-se também algum testamento que o ausente tenha deixado e 
os curadores definitivos passam a ser tratados como herdeiros – o 
ordenamento jurídico começa a agir como se a pessoa tivesse morrido); a 
curadoria também pode cessar nos termos do artigo 112º do Código Civil. 
Morte presumida (artigo 114º e seguintes do Código Civil) -> declara-se se 
a pessoa não voltar passados 10 anos, ou passados 5 se tiver mais de 80 
anos; é um processo judicial e tem os efeitos da morte (artigo 115º do 
Código Civil) 
NOTA: estes institutos são muito pouco usados nos dias de hoje, mas são 
justificados pela história - portugueses iam para a guerra ou emigravam, 
etc., e depois nunca mais se sabia deles. 
 
Estudar a capacidade jurídica pelo 4º volume do Menezes Cordeiro 
(páginas 544 a 567), porque no Carvalho Fernandes está desatualizado 
na parte dos maiores acompanhados 
 
 
 
 
 
 
 
Capacidade Jurídica 
Capacidade de Gozo 
(medida das 
possibilidades de 
relações jurídicas de que 
uma pessoa pode ser 
titular) 
Capacidade de Exercício 
(medida das situações 
jurídicas que um sujeito 
pode exercer pessoal e 
livremente) 
 
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Capacidade de gozo 
 Tendencialmente, as pessoas singulares são genericamente capazes 
de gozo (artigo 67ºCC), mas há certas matérias excecionalmente previstas 
na lei em que isso não acontece: 
• As pessoas singulares com idade inferior a 16 anos não podem casar 
(artigo 1601º/a do Código Civil); 
• Os homens, até aos 16 anos, não têm capacidade de gozo de 
perfilhar (artigo 1850º/1 do Código Civil), ou seja, o estabelecimento 
da paternidade tem de ser feito de outro modo, tem de ser o 
ministério publico a estabelecer a perfilhação; 
• As pessoas singulares não podem testar até aos 18 anos ou até à 
emancipação (artigo 2189º/a do Código Civil); 
• Não é possível adotar até aos 25 ou 30 anos, conforme o estado civil 
das pessoas (artigo 1979/1 do Código Civil); 
• Há outras incapacidades fora do código civil, por exemplo, porte de 
arma, elegibilidade para Presidente da República, etc. 
 
 A incapacidade de gozo não é suprível, ou seja, não é possível os pais, 
ou outra pessoa, suprir a incapacidade de gozo. 
 
Capacidade de exercício -> medida das situações jurídicas que um sujeito 
pode exercer pessoal e livremente 
• Pessoal: é o próprio indivíduo que vai atuar por si mesmo (exemplo 
de uma atuação não pessoal: eu tenho um filho com 7 anos e vou 
comprar um imóvel em nome dele – eu é que assino a escritura, eu é 
que fisicamente compro o imóvel, mas juridicamente quem comprou 
o imóvel foi o meu filho; o meu filho atuou através de mim [instituto 
da representação]) 
• Livremente: o indivíduo atua porque quer (ex. eu quero vender a 
minha casa, vendo a casa e ponto / eu quero vender a casa do meu 
filho – calma lá que aí já não posso sem pedir autorização ao tribunal 
[assistência], aqui já não sou livre) 
 
Representação -> corresponde à substituição jurídica por virtude da qual 
uma pessoa age, mas os efeitos jurídicos produzem-se na esfera do 
representado. 
 
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Assistência -> é o modo de suprimento da incapacidade em que uma 
pessoa concorre com outra, através da autorização, para a validade do 
ato; aqui quem pratica o ato é a própria pessoa (há uma pessoa que assiste 
outra e essa outra pratica o ato por si, pessoalmente, mas não livremente). 
 
Há 3 grandes categorias de pessoas que são incapazes de exercício: 
• Menores; 
• Maiores acompanhados; 
• Incapacidade acidental. 
 
Menoridade -> é a situação daqueles que tem menos de 18 anos (artigo 
122 do Código Civil); os menores são genericamente incapazes de 
exercício (artigo 123º do Código Civil) e a incapacidade de exercício deles é 
suprida pelo poder paternal e subsidiariamente pela tutela (artigo 124º do 
Código Civil). 
 O conteúdo do poder paternal (responsabilidades paternais) vem 
densificado no artigo 1878º do Código Civil. 
 O poder paternal é um poder funcional ou poder-dever -> é uma 
situação jurídica ativa que é exercida, não no interesse dos pais, mas sim 
no interesse dos filhos (dissociação entre o titular do direito e o titular do 
interesse protegido pelo direito). 
 A incapacidade dos menores que é suprida pelo poder paternal, é 
suprida pela representação; só há a exceção do casamento que é mediante 
autorização dos pais, desde que maiores de 16 anos – aqui a incapacidade 
é suprida pelo poder paternal, mas por assistência. 
 A tutela é a forma subsidiária de suprimento de incapacidade dos 
menores; acontece quando os menores não têm pais, ou quando os pais 
estão inibidos de exercer o poder paternal; vem regulada nos artigos 
1921º e seguintes do Código Civil. 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 Os menores são genericamente incapazes de exercício, mas há 
exceções à sua incapacidade de exercício que vêm previstas no artigo 127º 
do Código Civil. 
• Menezes Cordeiro: acha que estas exceções são tão amplas que nem 
deviam ser chamadas exceções; 
• Maria Raquel Rei: não concorda com o Menezes Cordeiro porque 
acha que do ponto de vista metodológico é mais conveniente 
raciocinarmos desta forma; não obstante, concorda que algumas das 
exceções previstas no 127º são bastante amplas 
 A alínea b) do 127º é muito interessante porque tem 3 requisitos que 
são cumulativos e que permitem ao menor gradual autonomia. 
 
Artigo 128º do Código Civil -> consagra o dever de obediência dos menores 
aos seus pais. 
 O menor que tenha violado estas regras, ou seja, que tenha 
praticado atos fora das exceções aqui previstas, praticou atos anuláveis 
(artigo 125º e 287º do Código Civil) 
Anulabilidade -> é um vício menos grave; produz efeitos, mas pode ser 
destruído e se assim for deixa de produzir efeitos retroativamente; o titular 
do poder paternal ou tutor é quem tem o poder de anular um ato (pode 
fazê-lo até um ano depois de ter tido conhecimento do ato, ou até à 
maioridade ou emancipação do menor); há certas situações em que o 
menor ou os seus herdeiros também o podem fazer (o menor pode fazê-
lo no ano seguinte a ter obtido a maioridade ou emancipação, se ainda for 
possível anular). 
Nulidade -> um contrato ou outro negócio jurídico é nulo (padece de 
nulidade) quando, devido a um vício existente no momento em que foi 
celebrado, não produz os efeitos jurídicos que diz produzir (ex. negócio 
celebrado verbalmente quando a lei impõe que seja por escrito). A nulidade 
é uma forma de invalidade, contrapondo-se à anulabilidade. A nulidade é 
também uma forma de ineficácia, isto é, de não produção dos efeitos de 
um negócio. Nos termos do regime geral (artigo 286.º do Código Civil), a 
nulidade pode ser invocada a qualquer momento (isto é, sem prazo) por 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
qualquer interessado, e pode (deve) ser declarada oficiosamente pelo 
tribunal, ou seja, mesmo que ninguém lho peça. 
Artigo 125º, nº2 do Código Civil -> é possível confirmar os atos anuláveis, 
ou seja, a pessoa que os pode anular aceita-os como válidos. 
NOTA: a autorização não vale como confirmação. 
 
Artigo 126º do Código Civil -> o dolo do menor (menor finge que é maior 
ou emancipado para realizar determinado negócio jurídico) impede a 
anulabilidade do ato. Discute-se muito na doutrina se os pais devem estar 
incluídos neste impedimento: 
• Menezes Cordeiro: acha que a proibição não deve atingir os pais do 
menor; 
• Maria Raquel Rei: acha que os pais não podem anular este ato 
porque os pais agem em representação do menor, logo, se o menor 
não tem o direito de anular o negócio, os pais também não o poderão 
fazer. 
 
 A menoridade termina com a maioridade (artigo 130º do Código 
Civil). Há uma única exceção, prevista no artigo 131º do Código Civil que é 
uma ação pendente para tornar aquele menor num maior acompanhado 
– nestes casos a incapacidade mantém-se até ao final da ação. 
Instituto da emancipação -> hoje em dia, é raro osmenores serem 
emancipados (só dá pelo casamento - artigo 132º do Código Civil); a 
emancipação é a antecipação da capacidade jurídica geral – o menor que 
se emancipa torna-se maior, ou seja, adquire a capacidade de exercício. 
Se houver autorização dos pais para casar, os menores adquirem a 
capacidade jurídica plena, se não houver autorização dos pais, os menores 
podem pedir autorização ao tribunal. Se não houver nenhuma das 
autorizações e mesmo assim os filhos conseguirem casar, o casamento é 
válido, mas os menores não podem administrar os bens que levaram o 
casamento ou os bens que obtiverem enquanto estão casados (continuam 
a ser administrados pelos pais). 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
NOTA: antigamente a capacidade de exercício só se adquiria aos 21 anos e 
era muito vulgar os pais emanciparem os seus filhos, para eles poderem 
tirar a carta de condução. 
 
03-11-2020 
Incapacidade dos maiores -> área muito sensível juridicamente porque 
estamos a tirar a capacidade jurídica (possibilidade de alguém atuar por si 
no mundo do direito) a pessoas que juridicamente são consideradas aptas 
para modelarem a sua vida nos termos em que entenderem; aplica-se a 
maiores por definição, mas é possível, nos termos do artigo 142º do 
Código Civil requerer este regime no último ano da menoridade porque há 
pessoas que, infelizmente, nós já sabemos que não têm qualquer condição 
de exercer pessoal e livremente os seus direitos e cumprir as suas 
obrigações; para que seja declarada a maioridade acompanhada de 
alguém, é necessária uma sentença judicial. 
NOTA: No nosso país não existe a “morte civil”. A morte civil era utilizada 
com pessoas que praticavam crimes bastante graves (pena acessória). Esta 
significava que a pessoa morria juridicamente, deixava de ter direitos e 
deveres civis. 
 
Até ao ano passado (2019) tínhamos 2 sistemas de incapacidade de 
maiores: 
• Interdição: sistema mais limitador que se aplicava às pessoas com 
uma incapacidade natural mais intensa (ex. pessoas em coma em 
estado vegetativo, doentes mentais muito graves, etc.) 
• Inabilitação: aplicada a casos menos graves de pessoas que 
precisavam de algum apoio, mas que na maioria dos casos 
conseguiam organizar a sua vida ou pelo menos aquilo que dizia 
respeito à sua pessoa; precisavam de ajuda para governar o seu 
património, mas não o seu corpo. A inabilitação podia ser suprida 
pela assistência, mas não era uma prática muito comum. 
 
NOTA: este modelo é muito antigo, mas que se entende que está 
desatualizado, por um lado quanto aos fundamentos da incapacidade 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
(eram tabelados e alguns deles não são considerados verdadeiramente 
incapacitantes, ex. surdez-mudez, cegueira); para além disso, o sistema que 
tínhamos era rígido, não estava adaptado aos problemas que hoje temos 
relacionados com a velhice, com o prolongamento da vida e, portanto, com 
a degradação progressiva das capacidades das pessoas – entendeu-se 
então que devia ser criado um sistema em que a pessoa pudesse ser 
apoiada de forma gradual 
 
O sistema atual baseia-se em 2 princípios fundamentais: 
• Caráter transitório das limitações (periodicamente, o tribunal vai 
rever a situação daquela pessoa e vai constatar se ela continua ou 
não a precisar do acompanhamento e se sim, se aquele 
acompanhamento é adequado à sua condição ou se precisa de ser 
ajustado) 
• Preservação máxima da capacidade da pessoa (mesmo para um 
maior acompanhado, a regra é de que ele é capaz de tudo exceto 
aquilo que vier previsto na sentença; só se limita aquilo que for 
necessário para a situação transitória daquela pessoa) 
NOTA: este novo regime foi instituído pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto 
e entrou em vigor no dia 14 de fevereiro de 2019 
 
Artigo 138º do Código Civil -> há uma amplitude grande das causas de 
incapacitação; nas circunstâncias previstas no artigo é necessário que se 
requeira uma declaração de maior acompanhado. 
 A incapacidade dos maiores pode ser suprida por representação, 
por assistência ou por uma conjugação de ambas. Para além disso, pode 
ser declarada em termos totais ou de modo parcial. As medidas de 
acompanhamento podem abranger o património da pessoa, a própria 
pessoa ou as duas coisas, dependendo das necessidades dessa pessoa. 
Também quanto ao tempo, as medidas podem ser limitadas, sendo certo 
que são sempre transitórias (artigo 155º do Código Civil determina que há 
um máximo de 5 anos a partir dos quais a medida de acompanhamento tem 
que ser revista pelo tribunal). 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Maria Raquel Rei acha que há um problema de inconstitucionalidade no 
sistema implementado, no art. 147º do Código Civil porque pode ser 
interpretado como permitindo ao tribunal suprimir a capacidade de gozo 
de um maior; isto não é possível porque vai contra o art. 18º/3 da CRP que 
nos diz que as limitações aos direitos fundamentais têm que ser feitas 
através de uma norma geral e abstrata e uma decisão do tribunal não é uma 
norma geral e abstrata. A capacidade de exercício pode ser limitada, mas a 
pessoa pode sempre suprir essa limitação através dos esquemas de 
representação e de assistência – este artigo 147º, da maneira como está 
escrito, permite a interpretação de que o tribunal pode determinar que 
determinada pessoa não tem direito a x direito, ou seja, dá a impressão de 
que o tribunal pode limitar a capacidade de gozo de uma pessoa e isso é 
inconstitucional. Obviamente o artigo não poderá ser interpretado daquela 
maneira. 
 Como se resolve isto? A lei acaba por resolver quase todos estes 
problemas: 
• Quanto ao casamento, o artigo 1601º/b do Código Civil impede as 
pessoas que padeçam de demência notória (resolve porque, quase 
de certeza, um maior a quem o tribunal pretendeu retirar o direito 
de casar é porque mentalmente não está em condições de o fazer) 
• Quanto à perfilhação, temos a mesma coisa no 1850º do Código Civil 
(não podem perfilhar os homens que padeçam de uma perturbação 
mental notória) 
• Quanto ao testamento temos um problema porque o artigo 2189º 
do Código Civil refere apenas a limitação através da sentença 
proferida num processo de acompanhamento de maiores e por isso 
temos que recorrer ao 2199º do Código Civil, que nos diz que o 
testamento pode ser anulado se existirem incapacidade acidental do 
testador (é uma solução que não é muito fantástica porque têm que 
ser os interessados a demonstrar que ele estava numa situação de 
incapacidade acidental, o que pode ser difícil de comprovar) 
 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Há alguns princípios que podem ser observados ao longo do regime dos 
maiores acompanhados: 
• Supletividade (artigo 140º/2 do Código Civil) se uma pessoa tiver 
uma família que apoie a pessoa naquilo que ela precise e esse apoio 
for suficiente, não se deve requerer o estatuto de maior 
acompanhado; 
• O tribunal deve estabelecer as medidas estritamente necessárias ao 
suprimento da incapacidade natural daquela pessoa (artigo 145º do 
Código Civil) 
• Exceções à incapacidade (têm a ver, sobretudo com o exercício de 
direitos pessoais e com os negócios da vida corrente), previstas no 
artigo 147º do Código Civil 
• Prestação de contas (artigo 151º/2 do Código Civil) 
• Caráter gratuito do acompanhamento (artigo 151º/1 do Código 
Civil) 
• Os atos que venham a ser praticados pelo maior acompanhado em 
violação ao regime jurídico estabelecido na sentença são anuláveis 
(artigo 154º do Código Civil) 
 
Antes deste regime, quer a inabilitação quer a interdição eram públicos 
(inclusive o bilhete de identidade tinha essa nota) e havia pessoas que 
achavam que isto era estigmatizante e por isso o artigo 153º/1 do CC entra 
em cena, estabelecendo que pode haver publicidade na medida daquilo 
que é entendido ser necessário, de acordo com a situação da pessoa; o 
nº2 prevê o registo civil da medida de incapacidade, precisamente porque 
esta medida afeta o estado civildas pessoas (há um conjunto de normas 
muito significativas que passa a ser aplicado à vida civil deste indivíduo). 
 
Art. 156º CC -> permite que o maior, antes de ficar muito debilitado, 
celebre um mandato com outra pessoa, com vista a que essa pessoa o 
ajude futuramente, estabelecendo os termos desta ajuda. 
 
Lei nº25/2012 de 16 de julho -> consagra a figura do procurador para 
cuidados de saúde (pessoa que toma aquelas decisões difíceis em matérias 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
de saúde); criada ao mesmo tempo que a figura do testamento vital 
(documento em que a pessoa diz quais são os tratamentos médicos que 
quer ou não quer receber numa situação em que não se possa exprimir) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Incapacidade acidental (art. 257º CC) -> Menezes Cordeiro trata da figura 
nos vícios e Carvalho Fernandes trata nas incapacidades (é muito 
discutível); é uma figura muito ampla; esta pessoa não é um maior 
acompanhado, mas pontualmente é considerado incapaz porque não 
consegue compreender o que está a fazer (ex. casos de embriaguez e 
consumo de estupefacientes graves; casos de extrema perturbação); para 
permitir a anulabilidade do negócio tem que ser notória ou conhecida do 
destinatário da declaração (declaratário); aplica-se a qualquer pessoa (no 
caso dos maiores acompanhados existe expressamente uma remissão que 
vem no artigo 154º/3 do Código Civil que nos diz que antes do anúncio do 
início do processo, os atos podem ser anulados com recurso à incapacidade 
acidental) 
 
 
 
Novo regime dos maiores acompanhados 
Vantagens: 
• flexibilidade e possibilidade de 
maior adaptação a um 
conjunto de incapacidades 
naturais que passaram a existir 
na nossa sociedade e que não 
estavam contempladas no 
regime anterior. 
Desvantagens: 
• flexibilidade (decidir para a 
pessoa x o que é que é 
adequado e não existir um 
tabelamento, é necessário 
muito tempo); 
• é difícil arranjar uma pessoa 
disposta a acompanhar. 
 
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Termo da personalidade jurídica: 
Art. 68º, nº1 CC -> a personalidade jurídica cessa com a morte (uma pessoa 
está morta com a cessação irreversível das funções do tronco cerebral – 
definida na Lei 141º/99, de 28 de agosto, no artigo 2º. A morte tem que 
ser atestada por um médico. 
 
Art. 68, nº2 CC -> presunção de comoriência (quando duas pessoas com 
ligações sucessórias morrem em momentos muito próximos e não se 
consegue determinar quem morreu primeiro, presume-se que morreram 
ao mesmo tempo); é importante no âmbito das sucessões. 
Art. 68, nº3 CC -> morte declarada (não há duvidas de que determinada 
pessoa morreu, mas ainda não se encontrou ou reconheceu o cadáver) 
Artigos 114º a 119º do Código Civil -> morte presumida (tribunal declara 
que a pessoa está morta porque já não aparece há muitos anos e tudo 
indica que ela morreu) 
 
Efeitos da morte: 
• Extinção da personalidade jurídica 
• Abertura da sucessão (art. 2025º CC) 
• Tutela post mortem dos direitos de personalidade (art. 71º do CC) – 
permite aos herdeiros continuarem a defender direitos de 
personalidade do falecido (ex. direito ao bom nome); as pessoas que 
aqui vêm referidas podem requerer as providencias previstas no 
artigo 70º/2 (Menezes Cordeiro entende que não só podem 
requerer as providências, como também podem pedir a 
indeminização, mas Maria Raquel Rei pensa que não, pensa que a 
tutela post mortem se restringe às providências necessárias) 
NOTA: a generalidade dos direitos patrimoniais não se extingue com a 
morte, mas antes abre a sucessão 
 
Cadáver -> beneficia de uma tutela jurídica especifica; o cadáver 
juridicamente é uma coisa, mas é uma coisa especial porque já foi uma 
pessoa. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 Em matéria de direitos de personalidade, temos um problema que 
respeita às situações em que as pessoas são de alguma forma ofendidas 
porque a consequência da violação destes direitos é apenas a 
responsabilidade civil (artigo 70º/2 do Código Civil) (desde o tempo do 
Marquês de Pombal que as relações do ponto de vista civil têm como 
consequência apenas a responsabilidade civil, isto é, uma consequência 
indemnizatória). 
 Com frequência as violações aos direitos de personalidade 
constituem danos morais e este dano não é um bem juridicamente 
trocável por dinheiro. Quando alguém sofre um dano moral, a 
indeminização, a responsabilidade civil, traduz-se numa compensação e 
não tanto num equivalente. 
 É possível que, numa violação de um direito de personalidade, um 
sujeito sofra danos patrimoniais (ex. António é advogado e alguém fala mal 
dele < a sua fama, o seu bom nome enquanto advogado é atingido < perde 
clientes; aqui é uma violação de um direito de personalidade, o direito à 
honra, que teve consequências morais e patrimoniais). O inverso também 
é possível: violação de um direito patrimonial, mas que gera consequências 
morais (ex. celebro um contrato de empreitada com alguém < definimos 
um prazo < o senhor atrasa-se na obra < estou numa casa arrendada e acaba 
o contrato de arrendamento e eu não consigo suportar o preço de uma casa 
e o preço da empreitada < fico deprimida e ansiosa; uma coisa que em 
primeira linha é um dano patrimonial (não cumprimento do contrato) 
gera também danos morais (depressão, ansiedade). 
 Durante séculos os danos morais não eram indemnizáveis porque 
não era possível suprimir o dano; também havia quem dissesse que, 
mesmo que fosse possível, era imoral ser indemnizada por um dano 
moral. 
 
Indemnização: 
• Serve de apoio ao lesado; 
• Caráter punitivo para o que lesa; 
• Caráter dissuasor e preventivo. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
496º, nº1 CC -> admite a indeminização por danos morais, mas apenas se, 
pela sua gravidade, merecerem a tutela do direito 
• Menezes Cordeiro: é critico e propõe que a indeminização se admita 
sempre que um direito de personalidade for violado porque acha que 
todos os danos morais que resultem de violações de personalidade 
são sempre graves; 
• Maria Raquel Rei: acha que o artigo é mais equilibrado do que a 
solução do Menezes Cordeiro porque não faz sentido permitir uma 
indeminização por qualquer contrariedade, as pessoas não podem 
ser mariquinhas; a eliminação da palavra gravidade no artigo 
proporciona problemas jurídicos que não merecem tratamentos 
porque são bagatelas, não têm importância; os tribunais não têm que 
estar ao serviço de pessoas hipersensíveis, não é essa a sua função. 
• Extremo oposto à opinião de Menezes Cordeiro: interpretam que há 
indeminização por danos morais sempre que haja outros danos 
patrimoniais a serem indemnizados -> isto seria bastante 
desajustado 
As pessoas coletivas podem reclamar danos morais? 
• Maria Raquel Rei: pensa que não; as pessoas coletivas também 
sofrem danos em alguns direitos que têm muita semelhança com os 
danos morais, sobretudo quando se afeta o seu bom nome (artigo 
484º do Código Civil prevê esta situação), mas o bom nome da 
pessoa coletiva tem repercussões patrimoniais e não morais; os 
danos morais são danos que afligem uma pessoa porque ela é pessoa 
– uma pessoa coletiva, por definição, não tem este tipo de danos. 
 
Como se calcula uma indemnização por danos morais? 
Artigo 496º/4 do Código Civil remete para o 494º -> este artigo manda 
calcular a indemnização de acordo com a equidade e manda atender a 
alguns aspetos em particular (culpa, situação económica do lesante e do 
lesado, circunstâncias do caso) – é um dos poucos exemplos em que o 
tribunal está autorizado a resolver um caso de acordo com a equidade. 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Dano morte -> é a supressão da vida de uma pessoa; é o dano que é sofrido 
pelo morto 
• Há autores que entendem que o dano morte não existe porque se o 
morto já não existe como é que ele vai sofrer o dano? Para além disso 
para que serve este dano morte? 
• Há outra corrente maioritária (onde se inclui o professor Menezes 
Cordeiro) que entendeque o dano morte existe efetivamente e seria 
extremamente formalista (porque se baseava apenas no facto da 
pessoa já ter morrido) não admitirmos o dano morte; além disso 
violaria a harmonia do sistema jurídico admitir que a violação do 
direito à vida ficava sem indemnização (estragam-me o estojo têm de 
me indemnizar; matam-me, epa yha, tranquilo, não passa nada bro) 
– era estranho isto; para o professor Menezes Cordeiro, quando 
alguém perde o direito à vida, ganha o direito a ser indemnizado (a 
indemnização entra na sua esfera jurídica e vai para os seus 
sucessores); defende a aplicação normal da indemnização, através do 
artigo 483º do Código Civil em conjugação com o artigo 70º do 
Código Civil 
• Maria Raquel Rei e Antunes Varela (posição tradicional): concorda 
que é estranho termos que indemnizar alguém por, por exemplo, 
estragar-lhe um objeto, mas não termos que indemnizar se a 
matarmos, mas os outros autores que questionam como é que a 
pessoa pode ser indemnizada se no momento em que ela adquire o 
direito se extingue a personalidade jurídica também têm um ponto; 
o legislador verificou que o dano morte era um dano diferente dos 
outros e, por causa disso, criou um regime especial (artigo 496º/2 e 
3 do Código Civil) – existe o dano morte, mas quem o vai receber não 
é o de cujos, mas antes as pessoas mencionadas no artigo. Não vai 
dar ao mesmo que a opinião do professor Menezes Cordeiro porque 
na dele o dano morte pode passar para a esfera jurídica das pessoas 
em testamento, enquanto que aqui só passa para as pessoas 
referidas no artigo. 
 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
03-11-2020 (aula de compensação) 
• Menezes Cordeiro: entende que a par do direito do morto (de cujos) 
existe o direito das pessoas que estão indicados no artigo 496º/2 e 
3 do Código Civil a serem indemnizados pelo seu dano. 
• Maria Raquel Rei: acha que este direito existe, mas que está 
protegido no artigo 496º/4 do Código Civil 
 
Danos dos familiares -> são danos por reflexo ou danos por ricochete 
(matéria muito discutida na doutrina e na jurisprudência) 
• Existe um conjunto de autores que pretende estender os danos 
reflexos para além do dano morte; a existência destes danos é uma 
exceção ao princípio de que a responsabilidade é individual (admite-
se que o dano de alguém vai ter reflexo noutras pessoas). 
 
Estudar as pessoas coletivas pelo 1º volume do professor Carvalho 
Fernandes (páginas 425 a 624) 
Pessoas coletivas -> são centros de imputação de normas jurídicas que não 
são pessoas singulares; distinguem-se por exclusão de partes e são 
extremamente variadas. 
 
 O fim último do direito é o ser humano e as pessoas coletivas, de 
uma certa forma, também correspondem a estruturas jurídicas cujo 
objetivo é permitir que os seres humanos se organizem e prossigam os 
seus interesses da melhor maneira possível, da maneira mais eficaz, mais 
eficiente possível. 
• Menezes Cordeiro: tem uma expressão que a Maria Raquel Rei acha 
muito feliz que diz que “as pessoas coletivas correspondem a um 
modo de atuação de pessoas singulares, mas que é uma atuação em 
modo coletivo”; a pessoa singular age naturalmente, age por si 
própria, age independentemente do resto; no caso da pessoa 
coletiva, temos uma estrutura, pensada para servir as pessoas 
singulares, mas que é uma forma de atuação em modo coletivo das 
pessoas singulares também porque quem se prevalece dos 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
interesses, dos bens, enfim, de tudo o que existe numa pessoa 
coletiva, é, sem dúvida, uma ou um conjunto de pessoas singulares 
também. 
 Esta técnica de personificação de realidades que não são seres 
humanos é uma técnica extremamente útil na prática – nós como que 
ficcionamos que determinada realidade é uma pessoa e, portanto, 
permitimos que essa realidade atue no mundo do direito como se fosse 
um ser humano. 
 Esta forma de atuar em modo coletivo é uma forma de atuar que 
exige, do ponto de vista jurídico, um grau de sofisticação bastante 
significativo e, por isso, é uma forma de atuação que não existia no direito 
romano – há uma evolução histórica muito significativa para nós 
conseguirmos chegar ao ponto de personificar realidades que não são seres 
humanos. 
Ler, no manual do professor Menezes Cordeiro, um resumo daquilo que 
veio dar origem às pessoas coletivas 
 
Existem várias teses sobre aquilo que é uma pessoa coletiva, sobre como 
é que se compreende esta realidade: 
• Savigny, séc. XIX: nas pessoas coletivas temos uma ficção (analogia 
com o ser humano) - fingimos que uma sociedade, uma associação, 
etc., é uma pessoa singular (um ser humano) e esta ficção permite-
nos aplicar a estas entidades as regras das pessoas singulares, 
como se estivéssemos perante uma pessoa singular. A pessoa 
coletiva não existe, mas fingimos que existe para fins práticos. 
• Teses Realistas (Beseler): a pessoa coletiva de facto existe porque 
se considera que a personalidade se atribui a todo o sujeito de uma 
relação jurídica, ou seja, uma pessoa é tudo aquilo que é titular de 
relação jurídica (partem do objeto para o sujeito); desta feita 
conclui-se que as entidades que prosseguiam um mesmo objetivo 
eram considerados pessoa, neste caso, pessoa coletiva. 
• Teses negativistas (Ihering) -> a pessoa coletiva é um meio ao 
serviço do direito, mas em última analise os interesses que estão 
protegidos pelo direito são interesses de seres humanos (pessoas 
singulares); não existe propriamente uma pessoa coletiva, existe 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
uma forma de nós satisfazermos os interesses das pessoas 
singulares que passa pela admissibilidade de uma estrutura que 
pode ser titular de direitos e deveres: a pessoa coletiva. As pessoas 
coletivas existem para preservar a tutela de certos interesses das 
pessoas singulares. 
• Organicismo (finais do século XIX e primeira metade do século XX) 
-> foi uma corrente filosófica que também teve repercussões no 
direito, inspirada, em especial, pelas ciências da natureza (biologia) 
e que tentava ver algumas realidades jurídicas por comparação com 
o mundo da natureza; entendia que as pessoas coletivas eram 
organismos - tal como na natureza nós temos aqueles bichinhos 
todos, no mundo do direito também teríamos vários organismos: 
um deles era o ser humano, mas depois também tínhamos 
organismos que não eram seres humanos, eram pessoas coletivas; 
há vantagens e desvantagens na consideração das pessoas jurídicas 
como organismos, mas nós ainda hoje temos resquícios fortíssimos 
dessa corrente (ex. quando nós designamos as partes das pessoas 
coletivas como órgãos) 
 
Ler a tese do Dr. Diogo Costa Gonçalves sobre personalidade jurídica 
 
 O direito objetivo cria realidades específicas porque através de 
determinados mecanismos e, em último recurso, através do uso da força 
(por uma comunidade politicamente organizada), nós conseguimos impor 
determinadas noções. Há um conjunto de realidades que num primeiro 
momento até pode existir só no mundo do direito, mas que a seguir passa, 
efetivamente, para o mundo da realidade – para o mundo físico. 
 As pessoas jurídicas são uma realidade jurídica como as outras. As 
pessoas singulares têm uma particularidade de corresponder diretamente 
com uma pessoa real. 
 
 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Estudar classificações de pessoas coletivas nos manuais 
As pessoas coletivas podem ser muito variadas: 
ü Quanto ao seu fim: 
• Pessoas coletivas com fim lucrativo -> sociedades (civis ou comerciais) 
• Pessoas coletivas sem fim lucrativo -> associações ou fundações 
 
ü Quanto ao seu substrato (aquilo que está subjacente às pessoas 
coletivas, aquilo que justificou a personificação daquela entidade): 
• Pessoas coletivas associativas -> o seu substrato é um conjunto de 
pessoas que querem realizar determinada atividade em conjunto (ex. 
Benfica; sociedades) 
• Pessoas coletivas fundacionais -> o seu substrato é um conjunto de 
bens emregra bastante significativos afetos à prossecução de 
determinados fins (Sr. Gulbenkian) 
 
NOTA: por razões de interesse público (temos que saber a quem vamos 
pedir responsabilidades por determinados atos; o Estado tem que saber a 
quem cobra impostos), existe um numerus clausus para os tipos de pessoas 
coletivas – há o princípio da tipicidade em matéria de pessoas coletivas (os 
tipos de pessoas coletivas são apenas aqueles que estão previstos na lei) 
 
Comunhão -> por vezes a lei exige que determinados direitos e deveres 
sejam cumpridos em conjunto pelos vários titulares de uma situação 
jurídica; não há personalidade coletiva aqui (ex. comunhão hereditária – 
para vender um bem herdado por várias pessoas, todas têm de estar de 
acordo) 
 
 
 
 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Regras comuns a pessoas coletivas: 
Artigo 160º CC -> Princípio da tipicidade/especialidade: a capacidade de 
gozo das pessoas coletivas é limitada pelos seus fins (ex. o Benfica não 
pode realizar atos que não se integrem no fim que persegue) 
• Menezes Cordeiro: acha que este princípio não impede lá grande 
coisa; 
• Maria Raquel Rei: acha que dizer que não temos este principio é 
demais 
Artigo 162º CC -> Existência de órgãos que servem para exprimir a vontade 
das pessoas coletivas 
 São órgãos obrigatórios: 
ü Um órgão colegial e ímpar (na medida em que têm que ter um 
número ímpar de pessoas maior que 1) para a administração da 
pessoa coletiva – normalmente chama-se Conselho de 
Administração, mas pode também chamar-se Conselho Diretivo, 
Comissão Executiva, etc.; 
ü Órgão de fiscalização da pessoa coletiva 
 
Associação -> conjunto de pessoas que pretende desenvolver uma 
atividade não lucrativa em comum; 
 Ao longo dos séculos, as associações ganharam uma carga ideológica 
muito forte. Em Portugal, a liberdade de associação tem, inclusivamente, 
consagração na Constituição (artigo 46º). Este artigo garante a liberdade 
de associação, liberdade essa que é muito ampla porque as pessoas podem 
construir associações para praticamente tudo o que lhes apetecer. Este 
carinho do legislador pelas associações existe, em certa medida, como 
reação a um passado recente em que não havia, na prática, liberdade de 
associação – a liberdade de associação estava bastante restringida. Até 
1974, quando alguém queria constituir uma associação tinha que pedir 
autorização; agora isto não é necessário, desde que a associação não seja 
contra a lei. 
 As associações beneficiam de um sistema de aquisição automática 
de personalidade jurídica (a personalidade jurídica adquire-se 
automaticamente a partir do cumprimento do procedimento). 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 Existe também a tutela de liberdade de não pertencer a uma 
associação (ex. quero fazer-me sócia da AAFDL, faço; não quero, não faço). 
Há, no entanto, algumas exceções como a Ordem dos Advogados: se eu 
quero exercer a profissão tenho, necessária e obrigatoriamente de 
pertencer à Ordem. 
 
Como se constitui uma associação? 
Através de um contrato (acordo) entre todas as pessoas que estão 
interessadas em constituir-se como associação. 
Além disso, existe o estatuto ou pacto social que contém o 
regulamento da vida daquela associação. Os estatutos, do ponto de vista 
físico, são muitas vezes um documento aparte do contrato de associação, 
no entanto, quando a pessoa coletiva é muito simples, é possível que 
esteja tudo no mesmo documento. 
ü Contrato de associação: identificam-se as pessoas; formaliza-se o 
desejo de constituir, efetivamente, a associação, dizendo o nome 
dela; indica-se a sede; etc. 
ü Estatuto: quais são os órgãos da associação; maiorias necessárias 
para determinados atos; como se faz a eleição dos membros da 
administração; quantos votos tem cada associado; quantas 
assembleias pode haver por ano; etc. 
 Costuma discutir-se se, a par deste acordo para a formação da 
associação, é necessário também o animus personificandi (vontade de 
personificar). 
• Menezes Cordeiro e Maria Raquel Rei: as pessoas não são tolinhas 
por isso nós temos que ter atenção ao que elas fazem – se um grupo 
se dirige ao RNPC para pedir o nome (custa cerca de 70€), prepara 
um contrato, vai a um cartório, constitui a sociedade, paga mais 
500€, publica nos jornais que foi constituída a sua associação e etc.; 
com isto tudo, alguém tem dúvidas que esse grupo de pessoas quer 
efetivamente constituir uma pessoa coletiva? Não há dúvida 
nenhuma porque ninguém no seu perfeito juízo vai fazer este 
percurso para não constituir uma pessoa coletiva. Se eu quiser não 
constituir uma pessoa coletiva, o que eu faço é uma combinação com 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
o grupo para fazerem umas coisas relacionadas com o fim que 
pretendem e tal, mas não me vou dar ao trabalho de fazer todo o 
percurso como se fosse constituir uma associação, sendo que afinal 
não vou (isto só aconteceria se as pessoas fossem todas doidas, não 
é normal). Basicamente defendem que o animus personificandi é 
uma intenção que está subjacente à atuação da pessoa e não um 
requisito em si mesmo. 
 A constituição de uma associação dá lugar à aquisição automática de 
personalidade jurídica e é possível a constituição de uma associação para 
qualquer fim (desde que seja lícito) não lucrativo (artigo 157º do Código 
Civil). 
 
 É possível uma associação prosseguir atividades lucrativas, o que 
ela não pode é fazê-las com intuito lucrativo. O intuito lucrativo consiste 
em distribuir pelos associados os lucros da atividade (ex. se o Benfica quiser 
abrir um restaurante e aplicar o lucro na atividade desportiva pode fazê-lo) 
 Nas associações existe a necessidade de os associados contribuírem 
para a atividade social (através de quotas, de trabalho, etc.). 
 
 É vulgar qualificar-se o contrato de associação como um contrato 
normativo - em vez de estabelecer regras para um caso concreto, 
estabelece regras que têm uma aplicação muito parecida com a das leis, 
ou seja, geral e abstrata. Estes contratos normativos constituem um 
desafio grande ao jurista porque grande parte das regras sobre contratos 
não está pensada para estes contratos, mas antes para os de execução 
instantânea (o paradigma dos contratos é o contrato de compra e venda, 
não é o contrato normativo). No entanto, nós não devemos ser 
fundamentalistas com as normas, nós devemos permitir que a norma 
jurídica seja o mais rica possível e, de facto, as normas que regulam os 
contratos (tal e qual como as outras) também são gerais e abstratas e, 
portanto, é possível, ainda que com alguma dificuldade nalguns casos, 
aplicarmos aos contratos de associação e aos estatutos das pessoas 
coletivas as regras que regulam os contratos. Existe alguma polémica em 
matéria de interpretação: há quem entenda que os contratos de associação 
e os estatutos das pessoas coletivas devem ser interpretados não de acordo 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
com as regras dos contratos, mas sim de acordo com as regras que 
disciplinam a interpretação da lei – esta não é a opinião da Maria Raquel 
Rei, mas ela reconhece que o caráter normativo destes contratos cria 
dificuldades ao jurista. 
 Formalmente o contrato de associação deve ser constituído através 
de escritura pública (artigo 168º/1 do Código Civil) ou por constituição 
imediata da associação (o estado português, em 2006, adotou um conjunto 
amplo de medidas que ficou conhecido como simplex e que se destinou a 
simplificar muitos procedimentos na área do direito e da administração 
pública e uma destas normas foi a Lei nº 40/2007 que permitiu um 
processo simplificado de constituição de associações). Há algumas 
associações que não podem ser constituídas através desta Lei nº 40/2007 
(ex. partidos políticos, pessoas coletivas religiosas, pessoas coletivas de 
cariz militar ou relacionadas com as forças de segurança, associações de 
empregadores, sindicatos e associações de bombeiros). A constituição 
imediata apresenta como vantagenso facto de ser muito mais barata e 
muito mais rápida e apresenta como desvantagens o preço que se paga 
pela simplificação (o modo de constituir estas pessoas coletivas é um modo 
standartizado, portanto, só se pode fazer a pessoa coletiva de uma certa 
maneira, a associação tem que ter certas características, enquanto que 
quando vamos ao cartório podemos fazer a associação da maneira que 
entendermos, com os órgãos que quisermos, mais complexa, menos 
complexa, etc.). 
 Uma vez constituídas estas pessoas coletivas estão sujeitas a 
publicidade e registo (art.168º do Código Civil) – tem a ver com a 
necessidade de certeza jurídica (se há uma nova pessoa jurídica temos que 
saber que ela existe e em que termos é que ela existe; qualquer pessoa 
pode ir a uma conservatória e pedir uma certidão dos estatutos de uma 
determinada pessoa coletiva porque são públicos). 
 
 As pessoas coletivas têm órgãos e há uma grande liberdade quanto 
ao desenho desses órgãos: tem que haver os previstos no artigo 162º do 
Código Civil, mas além desses a pessoa coletiva pode ter muito mais 
órgãos. 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Nas associações existem por definição 3 órgãos (artigos 162º e 170º e 
seguintes do Código Civil): 
• Assembleia: reúne os associados; dispõe de competência residual 
(todas as competências que não estejam adstritas a um dos outros 
órgãos, pertencem à assembleia – artigo 172º do Código Civil); é o 
coração da associação; 
• Conselho de administração: é um órgão executivo, ou seja, cabe-lhe 
executar as deliberações da assembleia e a representação – para a 
pessoa coletiva praticar atos jurídicos tem de o fazer através de um 
órgão que é a administração (art. 163º/1 do Código Civil); a pessoa 
coletiva responde pelos atos deste órgão (artigo 165º do Código 
Civil); 
• Conselho fiscal: tem de ter um presidente; tem, necessariamente, 
funções de fiscalização. 
 
Artigo 182º do Código Civil -> extinção das pessoas coletivas. 
Artigo 184º do Código Civil -> quando a associação se extingue entra em 
liquidação (período em que a associação tem apenas os poderes 
necessários para preparar a extinção). 
Artigo 166º do Código Civil -> os bens da pessoa coletiva, quando ela se 
extingue, são entregues a uma pessoa coletiva com fins semelhantes. 
 
10-11-2020 
Artigo 980º do Código Civil -> Uma sociedade é um acordo, um contrato; a 
pessoas que firmam este acordo contribuem com bens ou serviços 
(obrigação de entrada); têm que exercer, em comum, uma atividade 
económica que não seja de mera fruição e que tenha uma finalidade 
lucrativa (ao contrário das associações) 
 
A sociedade constitui-se através de um contrato (980ºCC); não há uma 
forma especial para este contrato, exceto se as entradas dos sócios 
exigirem uma entrada especial (artigo 981º do Código Civil) 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Quanto aos órgãos – os artigos 980º e seguintes do CC, praticamente não 
falam dos órgãos da sociedade porque o legislador teve em vista um 
contrato e não uma pessoa coletiva. 
• Assembleia – o código não menciona, no entanto, em vários artigos 
(980º e seguintes do CC), se prevê matérias que devem ser tomadas 
pelos sócios (como já tínhamos visto para as associações, a 
assembleia é o conjunto dos associados, no caso das associações e 
dos sócios, no caso das sociedades) 
• Carvalho Fernandes: diz que a assembleia não tem que existir 
porque os sócios podem deliberar ad hoc, sem estarem 
reunidos; 
• Maria Raquel Rei: diz que talvez não seja uma assembleia, 
mas se tivermos reuniões por zoom ou reuniões telefónicas 
tende a dizer que continua a ser uma assembleia porque os 
sócios estão reunidos e deliberam. 
• Administração – a lei não fala dela, mas prevê a função dos 
administradores (artigo 985º do Código Civil); os administradores 
são o órgão executivo e gerem e representam a sociedade. 
 
Artigo 1007º do Código Civil -> formas voluntárias e não tão voluntárias da 
extinção da sociedade 
 Depois da extinção abre-se a fase de liquidação da sociedade – é 
necessário um determinado período de tempo para que os administradores 
(liquidatários) encerrem a atividade das sociedades. Ao contrário daquilo 
que se passa nas associações, em que os bens passam para uma associação 
semelhante, os bens que existem na sociedade quando a sociedade se 
extingue são partilhados pelos sócios (tem a ver com o fim egoísta, que 
existe na constituição da sociedade, durante a vida da sociedade e na 
extinção da sociedade). O fim egoísta é uma das razões para que as 
sociedades funcionem melhor que as associações (quanto melhor 
tratarem da sociedade, mais receberão no seu fim). 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
O debate sobre a personalidade jurídica das sociedades é uma matéria 
muito discutível: 
• Elemento Sistemático – as sociedades foram reguladas na parte dos 
contratos e não das pessoas coletivas; 
• Em sítio algum do 980º e seguintes do Código Civil nós temos um 
artigo que nos diga, sem sombra para dúvidas, que as sociedades 
têm personalidade jurídica; 
• Artigo 981º CC - a forma da sociedade é determinada pela forma de 
transmissão das entradas dos sócios (para haver transmissão de 
bens tem que haver duas pessoas jurídicas); 
• Artigo 984º CC – dá a entender que existem duas pessoas jurídicas 
• Artigo 990º CC – responsabilidade do sócio perante a sociedade (só 
pode haver responsabilidade se houver duas pessoas jurídicas; eu 
não sou responsável perante mim mesmo) 
• Artigo 996º do Código Civil – trata das relações da sociedade com 
terceiros (se ela se relaciona com terceiros é porque existe; implica 
que exista uma outra entidade diferente dos sócios com a qual os 
terceiros se relacionam) 
 
De facto, há doutrina nos dois sentidos. A maioria (Menezes Cordeiro, 
Carvalho Fernandes, Pedro Pais Vasconcelos, etc.) entende que a 
sociedade tem personalidade jurídica. 
• Menezes Cordeiro: têm uma opinião muito sensata no ponto de vista 
da Maria Raquel Rei que diz que, quando os sócios respeitam as 
regras dos artigos 157º e seguintes na constituição de uma 
sociedade então temos uma pessoa coletiva; se não respeitarem, não 
temos – ex. no totoloto em conjunto não há, no seu ver, uma pessoa 
coletiva porque não seguem os passos do 157º e seguintes; assim 
sendo, não há personalidade jurídica; se os sócios percorrerem os 
passos para a criação de uma pessoa coletiva, temos personalidade 
jurídica, mas se o não fizerem, ainda que possamos ter uma 
sociedade, não temos personalidade jurídica. 
 
 
não têm 
personalidade 
jurídica 
tê
m
 
pe
rs
on
al
id
ad
e 
ju
ríd
ic
a 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
NOTA: 
• Mesmo que uma sociedade tenha personalidade jurídica, as 
sociedades têm autonomia patrimonial imperfeita (artigo 997º do 
Código Civil) -> sócios tornam-se como que o garante do pagamento 
pela sociedade (se houver dívidas vai-se primeiro ao fundo comum, 
mas depois deste acabar são os sócios que entram) 
 
 As sociedades de advogados que eram sociedades civis, ou seja, 
eram sociedades feitas com base no artigo 980º do Código Civil (sociedades 
em que existia autonomia patrimonial imperfeita; os sócios respondiam na 
falta de bens da sociedade). Enquanto as sociedades de advogados foram 
sociedades civis com autonomia patrimonial imperfeita, ou não havia 
sociedades de advogados ou, quando havia, tinham muito poucos sócios 
porque é necessária confiança nas pessoas para aceitarmos responder 
com o nosso património pelos atos menos bons que elas possam praticar. 
 Hoje em dia, como a lei foi alterada, as sociedades de advogados são 
sociedades civis, mas com um regime especial (Lei das Sociedades de 
Advogados), tendo agora autonomia patrimonial perfeita (pelas dívidas da 
sociedade responde apenas a sociedade e não o património individual dos 
sócios). A partir daqui proliferam-se as sociedades de advogados. 
 Alem das sociedades civis existem sociedades comerciais. A 
sociedade comercial distingue-se dasociedade civil, em primeira linha, 
atendendo ao seu objeto: o da sociedade civil é não comercial, enquanto 
que o da sociedade comercial o é. Hoje em dia há poucas sociedades civis 
porque, devido ao fim lucrativo, se formam mais sociedades comerciais. 
 
Associações sem personalidade jurídica e comissões especiais: são 
entidades semelhantes às associações (quando são grupos de pessoas) ou 
às fundações (quando são património de afetação), mas sem 
personalidade jurídica; tem menos autonomia do que as pessoas coletivas 
normais; são relativamente vulgares (ex. associações de finalistas; 
comissão de festas; morgados – enfim, organizações pontuais para um fim 
determinado ou para receber dinheiro para situações de emergência, por 
exemplo); estruturas simples, normalmente temporárias, que se fazem e 
desfazem, com um determinado objetivo 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
• Maria Raquel Rei: pensa que estamos perante aquilo que o professor 
Menezes Cordeiro designa por pessoas jurídicas rudimentares 
(entidades que para efeitos muito pouco determinados são tratadas 
como se tivessem personalidade jurídica, apesar de não terem); acha 
um bocadinho violento dizermos que estas entidades têm 
personalidade jurídica quando a lei diz expressamente que não 
• Menezes Cordeiro: diz que as associações sem personalidade jurídica 
são verdadeiras pessoas coletivas e não apenas pessoas 
rudimentares 
 
Particularidades destas entidades: 
• Constituição extremamente informal, o que traz vantagens quando 
corre bem e desvantagens quando corre mal; 
• Responsabilidade das associações sem personalidade jurídica 
reguladas no artigo 198º do Código Civil -> o fundo comum responde 
em primeira linha, depois responde a pessoa que contraiu a dívida 
e, por fim, respondem os associados na proporção das entradas 
para o fundo comum. 
NOTA: a autonomia patrimonial é muito pequena e, portanto, os 
associados correm riscos muito grandes - se o objetivo destas pessoas for 
prolongado no tempo é melhor constituir uma associação porque oferece 
mais garantias. 
• Artigo 200º do Código Civil - Responsabilidade pessoal e solidária 
dos membros da comissão (todos respondem pela totalidade das 
dívidas); natureza fiduciária da relação (quando eu entrego dinheiro 
a uma pessoa para determinado fim, essa pessoa é responsável por 
esse dinheiro e por afetá-lo aos fins para os quais o dinheiro foi 
entregue). 
 
Fundações: é a pessoa coletiva mais difícil porque não é tao vulgar no nosso 
dia a dia; pessoa coletiva de base patrimonial (a lei personifica um 
património que foi afetado pelo ser proprietário a um determinado fim). 
Artigo 185º do Código Civil -> o fim das fundações não pode ser um 
qualquer (as associações e as sociedades podem), tem que ser um fim 
comunitário. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 Em 2012 o legislador tentou dinamizar as fundações: promulgou-se 
a Lei 24º/2012, de 9 de julho, designada por Lei Quadro das Fundações. 
Esta lei pretendeu promulgar o regime geral das fundações (sobrepõe-se ao 
Código Civil, mas não o revoga; é inclusive uma lei um pouco infeliz porque 
o legislador foi preguiçoso e, em vez de alterar o Código, decidiu escrever 
um novo documento que em algumas coisas diz exatamente o mesmo, 
outras diz coisas um bocadinho diferentes e outras acrescenta mais 
informação ao que já havia – foi prático para o legislador, mas na aplicação 
não é muito simples) 
 
Como se constituem as fundações? 
• Inter vivos: constituídas por acordo, por escritura pública (é o 
processo mais normal) ou de acordo com uma lei especial; 
• Mortis causa: constituídas por testamento 
 
Artigo 185º/4 do Código Civil -> existe publicidade. 
Artigos 186º e 187º do Código Civil -> pode-se dizer que se quer uma 
fundação, pôr património de parte para tal e deixar a feitura dos estatutos 
para mais tarde porque o essencial é afetar o património. 
 
 A Lei Quadro das Fundações dá vários exemplos de fins de interesse 
social no artigo 3º, o que nos ajuda a interpretar o artigo 185º do Código 
Civil, em relação ao conceito de interesse social. Há uma espécie de má 
vontade na Lei Quadro das Fundações quanto às fundações que se 
destinam a ser parqueamento de património familiar, o que tem a ver com 
a história das fundações em Portugal. 
 Em Portugal, nós temos duas realidades muito diferentes, mas que 
se conjugaram para criar uma grande má vontade relativamente às 
famílias: 
• Ordens religiosas e igreja em geral – tendo em conta a forma como 
Portugal se formou e o poder da igreja, verificou-se que esta 
acumulou grandes massas de bens; como a igreja é uma pessoa 
coletiva ela não desapareceu e, portanto, os bens que foram sendo 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
acumulados por ela ao longo destes 900 anos ficava ali; a partir de 
uma certa altura, começa-se a achar que os bens que estavam na 
posse da igreja eram bens muito pouco produtivos; procede-se então 
à expropriação destes bens de mão morta (ao longo dos tempos, a 
expropriação da igreja tem sido um clássico). 
• Fenómeno dos morgadios – o morgadio (hoje em dia já não existe) é 
uma forma de organização do património que era muito comum no 
nosso país, sobretudo a norte do Tejo (em certas famílias, havia 
determinadas massas de bens que faziam parte de um morgadio e 
que tinham regras de sucessão diferentes daquelas que existiam em 
relação ao restante património; o morgadio ia, na totalidade, para o 
rapaz mais velho [quando não havia rapazes ia para a rapariga mais 
velha]; o morgado recebia o património vinculado ao morgadio e 
uma parte do património não vinculado, em conjunto com os 
irmãos); começou a ser mal visto porque o morgado não podia 
vender os bens do morgadio mesmo que quisesse, uma vez que 
estavam vinculados à sua descendência (mais uma vez, eram bens de 
mão morta); no séc. XIX acabaram os morgadios 
 
Em 1966, havia pessoas a pensar que fazer fundações era ressuscitar os 
morgadios e é isso que determina o facto de elas só poderem servir fins 
públicos, explicitando-se mesmo que não podem prosseguir fins familiares. 
 
O património é o coração da fundação; tem que ser suficiente porque a 
sua insuficiência pode determinar fusão com outra fundação (artigo 
190º/2, alínea c do Código Civil) ou até mesmo a extinção. 
 
 A fundação só ganha personalidade jurídica (artigo 6º da Lei Quadro 
das Fundações) no momento do ato de reconhecimento e não no ato de 
instituição. Assim sendo, quem gere os bens entre estes períodos? 
Lei Quadro das Fundações, artigo 20º/3 -> no período de limbo entre a 
instituição e o reconhecimento os bens são administrados pelo fundador, 
pelos seus herdeiros ou pelo executor testamentário 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Lei Quadro das Fundações, artigo 20º/4 -> as pessoas mencionadas no 
ponto anterior são responsáveis pessoal e solidariamente pelos atos 
praticados em nome da fundação até à altura do reconhecimento. 
 
Reconhecimento (art. 188ºCC) -> é um ato que não existe nas restantes 
pessoas coletivas; é um ato de autoridade pública (governo) que reconhece 
a existência do fim social e a suficiência do património afetado pelo 
fundador à produção daquele fim; é um ato discricionário da autoridade. 
 A Lei Quadro das Fundações estabeleceu um processo de 
reconhecimento extraordinário e simplificado para determinar se há ou não 
há interesse social (artigo 22º, nº 6, 7 e 8). 
 Depois do pedido de reconhecimento, a instituição da fundação é 
irrevogável (artigo 185º /2 do Código Civil). 
NOTA: A necessidade de reconhecimento, de certa maneira, demonstra 
alguma má vontade do legislador contra as fundações. 
 
Órgãos da fundação (artigo 26º da Lei Quadro das Fundações) 
• Obrigatório: 
ü Órgão da administração; 
ü Órgão executivo (para a gestão corrente); 
ü Órgão da fiscalização; 
• Com frequência: 
ü Órgão consultivo (constituído por pessoas com determinadas 
qualificações aquela área) 
NOTA: O fundador não é um órgão da pessoa coletiva;dá vida a esta 
pessoa, mas é externo (apesar disso, é muito importante para certas coisas 
da fundação, ex. interpretação dos estatutos, modificação ou extinção da 
fundação, etc.). 
 
Extinção das fundações (artigo 192º do Código Civil) 
 Tal como as restantes pessoas coletivas, uma vez extinta, a fundação 
entra em liquidação (artigo 194º/1 do Código Civil). 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 O destino dos bens das fundações, uma vez que não há intuito 
lucrativo, é semelhante ao das associações: os bens da fundação são 
atribuídos a outra pessoa coletiva que prossiga aqueles fins, salvo 
indicação do fundador ou dos estatutos da fundação em contrário (artigo 
186º do Código Civil) 
NOTA: por vezes fala-se em extinção em sentido impróprio quando a 
fundação não consegue reconhecimento, mas se a fundação nem chegou a 
constituir-se não pode aqui falar-se em extinção. 
 
17-11-2020 
Pessoas coletivas não são titulares de direitos de personalidade: 
• Elementos sistemáticos -> A tutela dos direitos de personalidade 
vem regulada na secção II do capítulo I que diz respeito apenas às 
pessoas singulares; no Código do Processo Civil (artigo 878º) existe 
um processo especial para efetivar as medidas adequadas previstas 
no artigo 70º/2 do Código Civil e ele fala especificamente de pessoas 
singulares 
• Elemento literal -> art. 70º do Código Civil, que regula a tutela geral 
da personalidade é bastante clara quando se refere ao “indivíduo” (o 
indivíduo não é uma pessoa coletiva, é um ser humano); 
 
 Para além disto, os direitos de personalidade têm um nível 
axiológico muito forte que se encontra ligado aos bens de personalidade 
e à característica da inerência desses direitos de personalidade 
relativamente à personalidade humana. É completamente diferente nós 
falarmos do direito à vida, direito à honra, etc., relacionados com seres 
humanos do que dizermos que são direitos de todas as pessoas, sejam 
individuais, sejam coletivas. Se nós falarmos exclusivamente de pessoas 
singulares percebemos que existe uma carga valorativa, filosófica e até 
mesmo política, relacionada com estes direitos de personalidade que são 
direitos específicos de seres humanos, tendo em conta a dignidade e a 
relevância moral das pessoas – isso não acontece se estendermos os 
direitos de personalidade às pessoas coletivas. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 A maior parte dos direitos de personalidade previstos no Código 
Civil respeitam, necessariamente, a pessoas singulares (ex. artigo 70º fala 
de personalidade física ou moral – as pessoas coletivas não têm 
personalidade física e, de certa forma, também não têm personalidade 
moral; artigo 71º fala da proteção das pessoas falecidas – as pessoas 
coletivas não falecem, extinguem-se; cartas-missivas confidenciais [artigo 
75º] não são suscetíveis de ser escritas por pessoas coletivas; memórias 
familiares [artigo 77º], imagem [artigo 79º]; intimidade da vida privada 
[artigo 80º] – são tudo bens que não pertencem, por definição, a pessoas 
coletivas. A aplicação destes artigos a uma pessoa coletiva implicaria 
sempre uma certa adaptação, mas para quê se nós temos outros 
instrumentos que podemos aplicar a pessoas coletivas? Os direitos das 
pessoas coletivas (existem alguns que são até muito parecidos com estes 
das pessoas singulares) são direitos diferentes e têm um objetivo muito 
diferente – ex. artigo 484º do Código Civil é um artigo que se aplica quer a 
pessoas singulares, quer a pessoas coletivas e que protege o crédito e o 
bom nome quer de umas quer de outras. 
 De facto, a afetação do bom nome de uma pessoa coletiva pode ser 
extremamente prejudicial para a mesma, mas de uma perspetiva 
económica; não é prejudicial com o mesmo tipo de dano e/ou intensidade 
que quando se afeta a honra de uma pessoa singular. 
 No direito comercial há vários artigos que dão proteção as coletivas 
parecidos aos das pessoas singulares, mas não chamamos a esses direitos 
de proteção direitos de personalidade porque isso, de certa maneira, seria 
degradar os direitos de personalidade. 
• Menezes Cordeiro: é da opinião que os direitos de personalidade são 
para as pessoas coletivas e singulares. 
 
Estudar o levantamento da personalidade coletiva no manual do 
professor Menezes Cordeiro 
Levantamento ou desconsideração da personalidade coletiva: surge no 
séc. XX porque nessa altura se banalizou a utilização da personalidade 
coletiva. As pessoas coletivas, sobretudo as que têm responsabilidade 
limitada (portanto têm autonomia patrimonial perfeita) constituem uma 
enorme vantagem, sobretudo para as pessoas que realizem atividades 
económicas (ex. se eu estiver numa sociedade e praticar um ato ilícito, 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
quem vai responder é o património da sociedade e não o meu património 
pessoal) 
Sociedade: conjunto de pessoas que se junta e origina uma pessoa coletiva, 
cujo objetivo é o exercício da atividade económica, com vista a repartir os 
lucros entre todos. Nunca têm muito dinheiro, têm o dinheiro necessário à 
sua atividade. Não serve para acumular dinheiro: serve para ganhar 
dinheiro e distribuir pelos sócios. 
 
 Quando uma sociedade é responsável por alguma coisa, vamos ver 
o que ela tem e até esse limite paga-se; para lá desse limite não há, 
paciência. Na prática, a sociedade permite limitar a responsabilidade das 
pessoas que atuam no âmbito da mesma. 
 Tratar uma pessoa coletiva como sendo o nosso património pode 
dar problemas e é injusto que os credores da sociedade não possam vir 
reclamar alguma coisa do meu próprio património porque, durante toda 
a vida da sociedade, usei-a como se aquilo fosse um só património e não 
dois – ex. eu tenho uma sociedade e vou ao supermercado, faço compras 
com o cartão da sociedade e a sociedade não tem dinheiro e, portanto, eu 
avanço com o meu dinheiro; ou então não tem dinheiro e eu não pago e 
não quero assumir as responsabilidades (não faz sentido pedir 
responsabilidades à sociedade, a sociedade não come). 
 Também é problemática a existência de pessoas que constituem 
sociedades e as levam à falência, constituindo outra igual logo a seguir. 
Perante estes abusos dos mecanismos de personalidade jurídica foi 
necessário que os legisladores os limitassem: 
• Artigo 83º do Código das Sociedades Comerciais -> estabelecer a 
responsabilidade da sociedade dominadora; 
• Artigo 84º do Código das Sociedades Comerciais -> responsabilidade 
do sócio único (quando uma sociedade tiver um único sócio, esse sócio 
responde pelas dívidas da sociedade; na prática ele domina a 
sociedade); 
• Código da insolvência e recuperação de empresas -> tem regras que 
limitam a eficácia da personalidade jurídica tendo em conta a situação a 
que se chegou naquela sociedade; 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
• Instituto do levantamento ou desconsideração da personalidade 
jurídica -> é o instituto que originariamente tem duas tradições 
(Alemanha e Estados Unidos da América) 
 Em Portugal, o levantamento da personalidade jurídica coletiva faz-
se através do artigo 334º CC, ou seja, através do instituto de abuso de 
direito: 
• Há autores que pensam que há outras formas de desconsiderar as 
personalidades jurídicas coletivas; 
• Maria Raquel Rei: acha que não; não há outra base legal (enquanto 
instituto geral) que nos permita desconsiderar a personalidade 
jurídica coletiva. 
 O nosso ordenamento jurídico atribui a cada pessoa a possibilidade 
de se constituir pessoas jurídicas, mas esta possibilidade é conferida com 
determinados objetivos, ou seja, que cada um de nós prossiga fins 
(relacionados consigo próprios), que se realize através da constituição de 
pessoas coletivas. A constituição de pessoas coletivas também permite 
que as pessoas limitem, legitimamente, a sua responsabilidade. 
 No entanto, há quem abuse – a consequência está prevista no 334º 
CC (o caráter vago desta estatuição permite adaptar o artigo a 
determinadas consequências, designadamenteo levantamento da 
personalidade jurídica [se é ilegítimo usar a personalidade jurídica para 
isto, tu não a podes usar; como usaste vais ser tratado como se não 
houvesse pessoa coletiva] ex. no caso da conta do supermercado, se uma 
pessoa age como se a pessoa coletiva e ela fossem um só, então parece 
justo que se ponha a pessoa coletiva de lado e a pessoa responda pelo que 
fez) 
NOTAS: 
ü Este mecanismo é excecional, não o devemos banalizar; 
ü Maria Raquel Rei acha que o artigo 50º do Código Civil brasileiro é um 
mau artigo porque banaliza o levantamento da personalidade jurídica; 
ü A limitação da responsabilidade é uma vantagem muito grande, mas, 
como tudo na vida, tem desvantagens. 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Estudar a matéria das coisas no 1º volume do professor Carvalho 
Fernandes – páginas 665 a 741 
 É muito difícil definir uma coisa porque há inúmeras. 
Art. 202ºCC -> muito criticado por ser circular; é infeliz; ajuda pouco, mas 
não está errado 
 Uma coisa é aquilo que tem existência física (existência física ≠ 
existência corpórea) delimitada (tem princípio, meio e fim) e autónoma 
(ex. as páginas de um livro não têm autonomia, mas se as arrancarmos de 
lá passam a ter), não é uma pessoa nem animal, é apropriável (o ar que 
nós respiramos de forma natural não é uma coisa exatamente por não ser 
apropriável; as coisas fora do comércio não são apropriáveis – praias, 
estradas, etc.) e pode ser objeto de relações jurídicas. 
NOTAS: 
ü Há muitos direitos que não podem incidir sobre partes de coisa (ex. eu 
posso vender um livro, mas não posso vender uma página de um livro); 
ü Podemos arrendar um quarto, mas não podemos vender um quarto 
porque não é possível haver direitos de propriedade sobre partes de 
coisa; 
ü Os bens de personalidade não são coisas, a menos que tenham 
autonomia (ex. cabelo depois de cortado); 
ü Lei nº8/2017, de 3 de março veio alterar o Código Civil, estabelecendo 
o estatuto jurídico dos animais 
• Maria Raquel Rei: acha que esta lei é patética porque o legislador foi 
mexer no Código Civil sem compreender muito bem o que estava a fazer; 
criou um subtítulo autónomo que tem 3 artigos sobre os animais com 
artigos que explicam aquilo que já se sabia antes 
 
 As coisas têm um regime jurídico próprio (regime dos direitos reais); 
este regime é mais exigente do que o regime das prestações porque as 
coisas têm grande importância na vida das pessoas. 
 Tradicionalmente costuma-se falar de coisas imateriais – na 
definição apresentada, as coisas imateriais não estão incluídas porque não 
têm existência física. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Coisas imateriais: não se lhes aplica o regime jurídico das coisas; é algo 
que não tem matéria, não é um animal nem uma pessoa, tem autonomia, 
é delimitado e pode ser objeto de relações jurídicas (ex. software) 
NOTA: direitos às vezes são considerados coisas imateriais; hoje em dia, é 
considerado errado tratar os direitos como se fossem coisas 
Artigo 1303º CC -> direitos de autor e propriedade industrial são as regras 
que regulam a generalidade dos direitos imateriais; a própria legislação diz 
que os direitos imateriais estão sujeitos a um regime especial pelo que não 
faz sentido considera-los coisas. 
 
 O domínio público é uma área que tem tido uma evolução muito 
diferente ao longo dos séculos e de país para país. Há regras muito 
diferentes quanto ao domínio público nos vários países que dependem da 
sua tradição e até mesmo da política. 
 As pessoas coletivas públicas (Estado e outras entidades) podem ter 
bens do domínio público e bens do domínio privado. 
Bens de domínio público: estão afetos à satisfação do interesse público 
(ex. praias, estradas, mar); por vezes a utilização pelo público carece de 
autorização; enquanto os bens estiverem no domínio público não é 
possível aliená-los e não é possível serem objeto de apropriação 
individual, usucapião, etc. 
Bem: é uma expressão que nos veio da tradição jurídica francesa e tem um 
conceito mais amplo do que a coisa porque um bem é tudo aquilo que tem 
utilidade para o homem. 
 
As coisas são muito variadas, pelo que é um conceito difícil de definir. Assim 
sendo, estudamos as coisas através de classificações: 
• Coisas Corpóreas: quando têm um corpo 
 Artigo 1302º do Código Civil -> As coisas corpóreas são suscetíveis 
dos direitos reais – são sempre suscetíveis de posse (controlo material de 
uma coisa) e podem ser objeto de direito de propriedade. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
NOTA: posse é um conceito jurídico diferente do conceito de propriedade: 
o possuidor é aquele que controla materialmente a coisa, o proprietário é 
aquele que tem uma permissão normativa específica de aproveitamento da 
coisa. 
• Coisas incorpóreas: quando não têm um corpo; não são suscetíveis de 
posse (ex. eletricidade) 
• Coisas fungíveis (artigo 207º do Código Civil): coisas que se 
determinam pelo seu género, qualidade e quantidade, quando 
constituam objeto de relações jurídicas - ex. 2 bifes porque se 
determina pelo seu género (bifes), pela qualidade (do lombo, por ex.) e 
pela quantidade (2); não há relações jurídicas que se estabeleçam sobre 
uma coisa fungível quando ela não está determinada. Precisam de ser 
medidas (ex. 1kg de batatas, 1kg de mel); se eu for a uma loja e pedir 
um Fiat500 também é uma coisa fungível porque qualquer Fiat500 me 
serve; as coisas fungíveis acabam por ser substituíveis porque se 
determinam apenas pelo seu género, quantidade e qualidade 
• Coisas não fungíveis (ou infungíveis): coisas individualizadas pelas suas 
características próprias 
NOTAS: 
ü Pode haver coisas fungíveis e não fungíveis meramente subjetivas 
(ex. o casaco que eu quero adquirir é objetivamente fungível porque 
há vários na loja, mas se eu quiser adquirir especificamente o que a 
minha amiga já comprou por ser dela, o casaco passa a ser não 
fungível; o inverso também é possível, ex. eu sou muito rica e quero 
adquirir um Picasso – à partida o Picasso seria não fungível porque 
eu iria querer escolher de acordo com determinadas características, 
no entanto, eu nem gosto de Picasso, só quero mesmo para 
ostentação, então pode ser um qualquer, ou seja, passa a ser uma 
coisa fungível) 
ü As coisas fungíveis colocam muitas dificuldades - existe um regime 
próprio (artigos 539º a 542º do Código Civil) 
 
• Coisas consumíveis (artigo 208º): quando o seu uso regular importa a 
sua destruição (ex. maçã – o seu uso regular implica que eu a coma; 
gasolina) ou alienação; o consumo pode ser natural ou jurídico (ex. 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
dinheiro); o regime jurídico das coisas consumíveis é diferente; com 
frequência são suscetíveis de perda ou de deterioração 
• Coisas não consumíveis: admitem o uso reiterado sem destruição da sua 
substância 
 
17-11-2020 (aula de compensação) 
 
• Coisas móveis (artigo 205º do Código Civil) 
• Coisas imóveis (artigo 204º do Código Civil) 
 
§ Menezes Cordeiro: coisa imóvel é parte delimitada da crosta 
terrestre e tudo aquilo que a ela esteja ligado 
 
Coisas imóveis: 
- Prédios rústicos e urbanos (um prédio rústico é uma parte delimitada do 
solo e as construções nele existentes não têm autonomia económica – ex. 
uma casinha para guardar os equipamentos agrícolas inserida no pomar, 
uma vez que está a servir de apoio ao solo; um prédio é urbano quando 
consiste num edifício incorporado no solo com os terrenos que lhe sirvam 
de logradouro – ex. moradia com quintal; prédio; armazém; fábrica; parque 
de estacionamento alcatroado; estrada: aqui o que interessa é que o 
terreno seja totalmente secundário, ao contrário dos prédios rústicos) 
NOTAS: 
• logradouro é o termo técnico para designar aquilo que normalmente 
se designa por quintal ou jardim; é um espaço não edificado ao lado 
de imóvel. 
• No Código do Imposto sobre Imóveis e no Registo Predial a lei utiliza 
as palavras prédio rústico e prédio urbano de maneira diferentedo 
Código Civil; 
• O Registo Predial ainda acrescenta a noção de prédio misto (quando 
constituído por uma parte urbana e uma parte rústica) 
- A água de um rio é uma coisa imóvel quando corre no rio; se a pusermos 
numa caneca já não é. 
- Direitos inerentes aos imóveis (é uma classificação bastante infeliz 
porque, como já tínhamos visto, não se devem classificar os direitos como 
Importante porque há muitas 
normas em que é relevante saber 
esta distinção 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
coisas, muito menos como coisas imóveis; o que o legislador pretendeu foi 
aplicar aos direitos inerentes aos imóveis o regime jurídico das coisas 
imóveis) 
- As partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos são coisas que 
perderam autonomia e passaram a estar agregadas à coisa imóvel (se eu 
tiver um pomar e lhe colocar uma cerca, a cerca tinha autonomia, mas passa 
a ser parte integrante do pomar – quando eu vendo o pomar, eu vendo o 
pomar e a cerca); 
NOTA: também podemos ter coisas móveis com partes integrantes 
 
 A classificação entre coisas imóveis e móveis é especialmente 
importante, designadamente devido às regras de forma. Por norma, os 
negócios sobre coisas imóveis estão sujeitas a uma forma especialmente 
solene. 
 Por outro lado, há certos direitos que são privativos de coisas 
móveis ou de coisas imóveis: 
• Arrendamento, Superfície, a Propriedade Horizontal, a Hipoteca 
(exceto numa situação) são negócios que só existem tendo por 
objeto coisas imóveis 
• Aluguer, Penhor, etc. são negócios específicos das coisas móveis 
 
 As coisas imóveis estão sujeitas a registo público e os direitos que 
incidem sobre as coisas imóveis, para terem eficácia perante terceiros, 
carecem, precisamente, de estarem registadas. 
 Normalmente, para celebrar negócios em nome de outrem em 
relação a imóveis, é vulgar a lei exigir determinadas autorizações que não 
exige quando os negócios são relacionados com coisas móveis. 
 Também existem impostos especiais sobre imóveis (ex. IMI, IMT, 
etc.). 
 Há uma categoria “intermédia” quanto ao regime jurídico, entre as 
coisas móveis e as coisas imóveis que é a categoria das coisas móveis 
sujeitas a registo: em regra, o legislador sujeitou a registo público as coisas 
móveis que se mexem (ex. automóveis, aviões, navios, etc.). Como as 
coisas se mexem, o legislador criou, a par do registo, um sistema de 
matrícula: a matrícula é como se fosse o nome, é a identificação de cada 
uma destas coisas móveis, que permite identificar a coisa e os direitos que 
sobre ela incidem. O artigo 205º/2 do Código Civil manda-nos aplicar às 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
coisas móveis sujeitas a registo o regime jurídico das coisas móveis, exceto 
naquilo que não seja especialmente regulado. 
 
• Coisas divisíveis (artigo 209º do Código Civil): uma coisa é divisível 
quando sendo dividida não perde valor (claro que perde valor 
proporcionalmente, mas a soma das parcelas é igual à coisa na sua 
totalidade) – ex. chá numa garrafa é divisível porque ao pô-lo em 
copinhos, ao dividi-lo, não perde valor 
NOTA: no caso das coisas fungíveis, é possível haver, em alguns casos, 
divisibilidade objetiva e subjetiva (ex. se eu tiver que, por motivos de saúde, 
beber uma garrafa de litro e meio de água e alguém chegar e me pedir um 
pouquinho, apesar de objetivamente ser uma coisa divisível, para mim, ou 
seja, subjetivamente, não o é; uma situação inversa também é possível) 
• Coisas indivisíveis: ex. ao partirmos uns óculos a meio eles deixam de 
ser funcionais e, consequentemente, perdem valor – os óculos são 
indivisíveis. 
 
• Coisas futuras (artigo 211º do Código Civil): são as coisas que não estão 
em poder do disponente ou que este não tem direito, ao tempo da 
declaração negocial (ex. coisas que não existem – eu vendo ao Pingo 
Doce as minhas uvas do ano que vem; eu faço um contrato-promessa 
com uma amiga acerca da casa do meu vizinho – eu ainda não adquiri a 
casa, mas vou adquiri-la para efetivar a venda) 
• Coisas presentes: coisa que existe no momento da declaração negocial 
ou a que, nesse momento, esteja na disponibilidade do declarante. 
 
Benfeitoria (artigo 216º do Código Civil) 
 É uma despesa feita para conservar ou melhorar uma coisa (ex. 
pintar uma casa, remendar um casaco, construir uma piscina numa 
moradia, arranjar um carro, etc.). Podem ser: 
• Necessárias: quando evitam a perda, destruição ou deterioração da 
coisa (ex. remendar o casaco) 
• Úteis: quando não sendo indispensáveis para o valor da coisa, 
aumentam o seu valor (ex. forrar um casaco) 
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 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
• Voluptuárias: quando, não sendo indispensáveis para a conservação 
da coisa, nem lhe aumentando o valor de uso (a utilidade), servem 
apenas para deleite do benfeitorizante (ex. construir uma piscina 
numa moradia não aumenta o valor de uso da moradia nem é 
necessário – a menos que seja uma estratégia para valorizar o imóvel) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Quando falamos em benfeitoria estamos a ter em atenção uma despesa; 
quando falamos de parte integrante estamos a ter em atenção, não a 
despesa, mas sim a própria coisa e a função da parte integrante na coisa. 
A benfeitoria e parte integrante podem ser a mesma coisa, mas olhadas 
de perspetivas diferentes. 
 
Relações entre coisas: 
• Parte Componente: é uma parcela de uma coisa (ex. mangas de uma 
camisola são uma parte componente da mesma); é possível que 
algumas partes componentes antes tenham tido alguma autonomia 
(ex. parafusos da mesa), mas no momento não a têm. O regime da 
parte componente é o regime da coisa. 
• Parte Integrante: não é uma coisa porque não tem autonomia, mas já 
teve e se for separada da coisa pode voltar a ter autonomia – isto é 
importante porque há alguns negócios sobre partes integrantes e nesses 
negócios os efeitos reais só se produzem depois da parte integrante ser 
separada da coisa – artigo 408º do Código Civil (ex. eu hoje vendo a 
janela da minha casa à Joana e combino com ela que ela é que cá vem 
com o empreiteiro tirar a janela; amanhã vendo a minha casa à Sara; na 
Estas 3 classificações são importantes, sobretudo em casos em que o benfeitorizante (a pessoa 
que faz a despesa) não é o proprietário da coisa – ex. por vezes a pessoa que tem a posse da 
coisa não é proprietária (ex. arrendatário) e é vulgar que o inquilino faça algumas benfeitorias 
na coisa; às vezes as benfeitorias também podem ser feitas de má fé (ex. ladrão rouba 
computador todo estragado, arranja-o e é obrigado a devolvê-lo, mas quando o devolve, o 
proprietário já recebe o computador com uma série de benfeitorias incluídas – o computador 
sem os arranjos valia 100, com os arranjos vale 1000, o que fazer? O ladrão fica com o prejuízo? 
O dono paga a valorização? O ladrão retira as benfeitorias do computador? – esta matéria vem 
tratada nos artigos 1273º a 1275º do Código Civil e o regime jurídico associados às benfeitorias 
depende da sua classificação 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
semana que vem, a Joana bate à porta de casa, a Sara abre e a Joana diz-
lhe que veio buscar a janela; a Sara diz “bem, ela vendeu-me a casa com 
a janela, tu não vieste busca-la antes, por isso agora podes ir à tua 
vidinha” – como a janela não foi separada, a Joana não adquiriu a 
propriedade e neste momento o proprietário já não sou eu, é a Sara que 
já não está disponível para vender a janela, por isso a Joana celebrou o 
negócio, mas não vai ter a janela [problema de incumprimento]. Joana 
vem falar comigo para pedir explicações e, no limite, ser indemnizada. O 
direito da Joana sobre a parte integrante antes da separação é um mero 
direito de crédito,não é um direito real); o visor é parte integrante do 
telemóvel, por exemplo. 
• Fruto (artigo 212º do Código Civil): é tudo aquilo que a coisa produz 
periodicamente sem prejuízo da sua substância; nem todas as coisas 
são frutíferas; podem ser, consoante a produção resulte da natureza da 
própria coisa ou das relações jurídicas, naturais (ex. frutos das árvores e 
dos arbustos) ou civis (ex. juros, que são o fruto do dinheiro; a renda dos 
imóveis arrendados) 
NOTAS: 
ü a coisa imóvel produz uma renda, a coisa móvel produz um aluguer 
ü as regras dos frutos vêm previstas nos artigos 213º e 214 do Código 
Civil 
 
• Coisa acessória (artigo 210º CC): são coisas móveis que, não 
constituindo partes integrantes, estão afetas por forma duradora ao 
serviço ou ornamentação da coisa principal (ex. ferro e tábua; 
telemóvel e carregador; esferográfica e tampa); 
NOTA: o problema é exposto no artigo 210º/2 do Código Civil porque 
consagra a regra da autonomia dos regimes jurídicos. Qual é o problema 
disto? Há determinadas coisas principais que simplesmente não funcionam 
sem as coisas acessórias, assim como há coisas assessórias que não têm 
qualquer utilidade se não for ao serviço da coisa principal, pelo que, apesar 
do regime deste artigo ser o apropriado para certas coisas acessórias, para 
outras não é. Em virtude disto, aparecem várias teorias a tentar resolver o 
problema – as mais populares passam por considerar que as coisas 
acessórias têm categorias: 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
 
 
 
 
 Estes autores dizem que no 210º, na epígrafe, estavam coisas 
acessórias em sentido amplo; no 210º/1 estão previstas as coisas 
acessórias e as pertenças e no 210º/2, estão previstas apenas as coisas 
acessórias. Ou seja, eles dizem que o 210º/2 aplica-se às coisas acessórias, 
mas não se aplica às pertenças – o regime que se aplica às pertenças é o 
da coisa principal. 
 
Pertença: coisa acessória sem valor autónomo e sem a qual a coisa 
principal perde a sua utilizabilidade normal (ex. bainha de uma espada – a 
espada funciona na mesma, mas de forma menos fantástica) 
Coisa acessória stricto sensu: coisa acessória com valor autónomo, 
desafetável da coisa principal e sem a qual a coisa principal não perde a 
sua utilizabilidade normal 
 
 Vivemos numa sociedade que é muito pouco natural, muito pouco 
simples e, portanto, nós devemos olhar para as coisas como pessoas do séc. 
XXI – isto significa que quando eu penso numa caneta, eu não penso só na 
caneta, penso na caneta e na tampa (a tampa tem autonomia física da 
caneta, mas enquanto coisa não tem autonomia). 
 Uma coisa não é necessariamente constituída por um só artigo, há 
coisas que têm várias peças (ex. garrafa térmica e tampa – se comprarmos 
uma garrafa térmica sem tampa, a garrafa não serve para nada). O que 
acontece é que há determinadas partes componentes que não têm uma 
ligação material com a coisa principal (ex. chave da porta – a chave é uma 
coisa diferente, mas faz parte da porta, é componente daquela porta, só 
cabe naquela fechadura; atacadores dos sapatos – um sapato sem 
atacadores não funciona, os atacadores fazem parte do sapato, tal e qual 
como a sola do sapato) – apesar de poderem não ter ligação material à 
coisa principal, não deixam de ser componentes da mesma e, portanto, 
não deixam de estar abrangidos pelos negócios que se faz em relação à 
coisa principal (não se aplica o artigo 210º do Código Civil) 
 Há outros negócios que até estamos perante coisas acessórias, mas 
que recorrendo àquilo que é normal no mundo dos negócios e ao modo de 
interpretar a declaração das partes, temos que concluir que o negócio inclui 
Coisa Acessória (lato sensu) 
Coisa Acessória 
(stricto sensu) 
Pertença 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
quer a coisa principal, quer a coisa acessória (ex. eu vou comprar uma 
quinta que tem alfaias agrícolas –coisas acessórias- e estas alfaias agrícolas 
seguem o regime do artigo 210º/2 do Código Civil, ou seja, se as partes 
nada disserem segue-se este artigo, mas se disserem algo em contrário 
segue-se a vontade das partes. 
 Há negócios que incluem coisas acessórias por força da lei (ex. carro 
e triângulo, embora se calhar este não seja um bom exemplo porque acho 
que a lei já mudou) 
 
24-11-2020 
 
Artigo 206º do Código Civil -> contrapões coisas simples a coisas 
compostas 
• Essa não é a opinião maioritária: a doutrina contrapõe coisas simples 
(aquelas que não são constituídas por várias coisas, por vários 
elementos autonomizáveis) às coisas complexas (aquelas onde há uma 
agregação física ou jurídica de elementos autonomizáveis). Assim 
teríamos: 
ü Dentro das coisas complexas: 
§ Coisas compostas -> agregação física de elementos (ex. 
automóvel, porque é constituído por elementos fisicamente 
ligados – travões, motor, pneus, etc.) 
§ Coisas coletivas 
ü Dentro das coisas coletivas 
§ Coisas coletivas em sentido estrito -> as coisas que formam a coisa 
principal são tratadas em conjunto (ex. par de sapatos, baralho de 
cartas – se eu vender sapatos, vendo o par e não um só; a mesma 
coisa com o baralho) 
§ Universalidades de facto -> pluralidade de coisas móveis que 
pertencem às mesmas pessoas, tem um destino unitário, mas 
cada coisa pode ser tratada individualmente, são extensíveis e são 
fungíveis entre si (ex. rebanho, livros de uma biblioteca, coleções). 
 
Universalidades de direito: além de coisas, incluem também direitos – ex. 
estabelecimento comercial, herança, etc. 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Estudar a matéria dos animais no tomo 3 do professor Menezes Cordeiro 
(páginas 287 a 315) 
 
Artigo 201º-D do Código Civil -> diz-nos que, na ausência de uma lei 
especial, se aplica o regime das coisas aos animais, desde que não seja 
incompatível com a sua natureza. 
 
 Os animais foram sempre tratados de uma forma diferente das coisas 
precisamente por terem vida. A figura jurídica dos animais deve ser 
entendida num sentido histórico (não são nem as pessoas, nem os seres 
microscópicos). 
 
Lei nº 92/95, de 12 de setembro e decreto-lei nº 314/2003, de 17 de 
dezembro -> sobre os deveres das pessoas relativamente aos animais 
 
 
Estudar a Representação pelo 2º volume do professor Carvalho 
Fernandes (páginas 254 a 275) 
 
Representação: consiste numa substituição jurídica pela qual uma pessoa 
atua em nome, no interesse e por conta de outra, produzindo os efeitos 
da atuação diretamente na esfera do representado (ex. pais em 
representação dos filhos) 
 Requisitos: 
• Alguém atua em nome de outrem – invoca o nome de outra (ex. eu 
compro o casaco do Telmo em nome do meu irmão); 
• Atuar no interesse de outrem - atuar tendo em vista os interesses do 
representado, o que não significa que os negócios sejam sempre 
fantásticos; origina o fenómeno da prestação de contas (o 
representante deve prestar contas ao representado); não implica que 
os interesses do representante também não estejam envolvidos (ex. 
nenhum pai tem interesse em ter um filho malcriado, educam-nos para 
o interesse deles e para o seu próprio interesse); a atuação no interesse 
do representado faz com que a representação seja ou um poder-dever 
ou, em qualquer caso, um poder de exercício vinculado. 
• Atuação por conta do representado – tem em vista que as situações 
jurídicas passem para a esfera jurídica de outra pessoa (pode estar 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
associado ao mandato sem representação ou à interposição real de 
pessoas); não interessa ao representado que se saiba que ele está 
envolvido 
• Efeitos jurídicos produzem-se diretamente na esfera jurídica do 
representado (contemplatio domini) – tenta transmitir que o 
representante é como se fosse transparente (ex. se eu for ao café 
comprar o pão à minha mãe, o dono do café vai olhar para mim como se 
eu fosse a minha mãe) 
 
A representação é uma figura extremamente relevante porque é uma 
forma de aumentarmos as possibilidades de atuação de uma pessoa 
(permitem auma pessoa estar em vários sítios ao mesmo tempo, através 
do seu representante); possibilitam relações jurídicas profissionais. 
 
Dificuldades da representação: 
• normas jurídicas estão pensadas para a ausência de representação; 
quando introduzimos um fenómeno de representação temos que 
lidar com dois blocos de normas (ex. regras da compra e venda + 
regras de representação); 
• em vez de haver problemas em duas pessoas, pode haver em 3; do 
ponto de vista técnico complica sempre a vida de um jurista 
 
O representante deve ter sempre capacidade ou poder de decisão; o 
representado pode dar instruções, mas o representado é que decide o 
negócio. 
 
Núncio: pessoa que não tem poder de decisão, não é representante; é um 
mero transmissor da vontade do representado (ex. procuração para 
casamento – artigo 1620º/2 do Código Civil – uma pessoa pode casar por 
procuração, mas não é o procurador que escolhe o cônjuge, a única coisa 
que ele faz é dizer que sim) 
Artigo 250ºCC -> a figura que está prevista neste artigo é a do núncio 
 
Existem 3 tipos de representação: a legal, a orgânica e a voluntária – para 
qualquer uma delas, para haver representação, tem que haver um 
fundamento qualquer, é preciso uma fonte para essa representação. 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Representação legal: é uma representação típica; só existe, praticamente, 
quando a lei a prevê (daí o nome); tem que ser analisada caso a caso 
porque cada tipo de representação legal tem o seu regime (ex. 
representação paternal). 
 
Representação orgânica: é designada por algumas pessoas como 
representação imprópria porque ocorre quando alguém faz parte do 
órgão de uma pessoa coletiva e quando o órgão da pessoa coletiva atua 
não temos duas pessoas jurídicas a atuar, temos só uma que não age por 
conta de outrem, temos apenas a pessoa coletiva; aplicam-se-lhe as regras 
das pessoas coletivas 
• Alguns autores: quando o órgão da pessoa coletiva atua, não temos 
duas pessoas a atuar, temos apenas a pessoa coletiva e daí decorre 
que não se deveria chamar representação. 
• Maria Raquel Rei: acha que é preferível dizer que há representação 
orgânica porque há todas as semelhanças entre esta representação e 
as outras. 
 
Representação voluntária: é o paradigma de todos os fenómenos de 
representação; é a representação verdadeira; tem a sua origem na vontade 
de uma ou duas pessoas (radica na autonomia privada, na liberdade). 
 
No direito romano a representação voluntária não era muito favorecida – 
havia esquemas alternativos para conseguir aquilo que nós conseguimos 
através da representação. Propagou-se na Idade Média, período de 
extrema insegurança devido ao perigo e às invasões. Havia más 
comunicações o que implicava que as pessoas arranjassem soluções para 
estar num sítio diferente, mas sem sair do mesmo sítio onde já estavam. 
 
A representação voluntária funda-se na autonomia privada, ou seja, na 
vontade das pessoas. A fonte de uma representação voluntária é o negócio 
jurídico que confere poderes de representação. O negócio jurídico pode 
ser de 2 tipos: 
• Negócio Jurídico Unilateral: procuração (artigos 262º e seguintes do 
Código Civil) 
• Negócio Jurídico Bilateral: os poderes de representação podem ser 
expressos ou implícitos (ex. um balconista tem poderes implícitos de 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
representação); o mandato (artigos 1157º e seguintes do Código 
Civil) é um negócio jurídico bilateral 
Mandato: contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou 
mais atos jurídicos por conta da outra; pode ser celebrado com poderes de 
representação (ex. advogado) ou sem poderes de representação. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Discute-se na doutrina e na jurisprudência se o negócio jurídico da 
procuração não terá outro negócio subjacente, ou seja, se a procuração 
não será apenas uma fachada – dar poderes a uma pessoa para atuar na 
minha esfera jurídica é um ato gravíssimo pelo que isso não acontece sem 
uma explicação. 
 O art. 265º do Código Civil parece indicar que a procuração tem que 
ter um negócio que lhe serve de base, mas a última parte pode abrir a porta 
a razões abstratas. 
• Maria Raquel Rei: pensa que 99% das procurações têm um negócio 
de base subjacente, mas tem que admitir que possa acontecer sem 
um negócio de base, advertindo apenas que não é de aconselhar. 
 
A regra é que a procuração não tenha prazo, mas a pessoa pode 
estabelecê-lo e é prudente que o faça. 
 
Existem 2 grandes tipos de procuração: a procuração normal (ordinária) e 
a procuração no interesse de terceiro. 
 
 
 
As procurações são negócios com particularidades: 
• Capacidade do procurador (artigo 263º do Código Civil) – o 
procurador costuma ter apenas a capacidade necessária para 
entender aquilo que vai fazer 
Mandato 
• Bilateral 
• O mandatário tem o dever 
de celebrar negócios 
jurídicos 
 
Procuração 
• Unilateral 
• O procurador tem o poder 
de celebrar negócios 
jurídicos 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
• Falta ou vícios da vontade e estados subjetivos relevantes (artigo 
259º do Código Civil) - implica conjugar a vontade do procurador e 
do representado; é de difícil aplicação. 
• Forma da procuração (artigo 262º/2 do Código Civil e 116º a 118º 
do Código do Notariado) – a procuração tem a forma do negócio 
que o representado pretenda que o procurador celebre (ex. se eu 
passo uma procuração a alguém para me ir comprar um rissol ao café, 
essa procuração não precisa de nenhuma forma específica porque a 
compra e venda também não a tem; ao contrário, se eu passar a uma 
procuração a alguém para me ir comprar um imóvel, a forma dessa 
procuração tem que ser por escritura pública ou documento 
particular autenticado, porque é assim o regime dos imóveis); se a 
procuração tiver muitos atos, a forma vai ser a do mais solene. 
• O terceiro pode exigir a prova dos poderes representativos (artigo 
260º do Código Civil) – se o terceiro não exigir a prova dos poderes 
representativos, no caso de algo correr mal, a responsabilidade é 
dele. Este artigo constitui um poder ao terceiro, mas também o 
responsabiliza. 
• Artigo 264º do Código Civil – refere-se à substituição do procurador 
• Artigo 261º do Código Civil – prevê os negócios consigo mesmo que 
originam conflitos de interesse, permitindo que o seja anulado, se o 
representado não o tiver consentido especificamente na celebração. 
• Artigo 265º do Código Civil – refere-se à extinção da procuração; é 
vulgar perguntar qual é a relação jurídica que serve de base aos 
poderes de representação; a relação de base é a fonte dos poderes 
de representação; a relação de base é normalmente um mandato, 
um contrato de trabalho, um contrato de agência, etc. 
• Quando a procuração se extingue, o representante deve devolver o 
documento (medida de segurança) – artigo 267º do Código Civil 
• Artigo 266º do Código Civil - conjunto de regras de proteção de 
terceiros quando a procuração é alterada ou revogada – exige que o 
representado faça chegar aos terceiros notícias de que revogou a 
procuração. 
 
Institutos relacionados com a representação: 
• Representação sem poderes (artigo 268º do Código Civil) -> ocorre 
quando alguém invoca poderes de representação que não tem; tem 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
como efeito que um negócio sem poderes de representação é ineficaz 
ao representado (não produz efeitos na esfera jurídica do 
representado); o artigo permite a ratificação do negócio (aceitar um 
negócio que foi feito por alguém que não tinha poderes de 
representação); o terceiro pode revogar o negócio antes da ratificação 
(268º/3). 
• Abuso de poderes de representação (artigo 269º do Código Civil) -> há 
um procurador que se afasta daquilo que ele sabe que é o interesse do 
representado; quando as procurações são amplas é vulgar o procurador 
ter mais elementos de decisão do que aqueles que constam na 
procuração e se afaste do interesse do representado; se o terceiro 
souber do interesse do representadopodemos aplicar o artigo 268º do 
Código Civil porque no 269º o terceiro merece proteção, mas no 268º 
não merece. 
 
Aula para exame nº1 
Situações Jurídicas 
 
Estudar pelo manual do Professor Menezes Cordeiro – 1º volume 
(páginas 863 a 921) 
 
Situação jurídica: é o efeito jurídico perspetivado a partir da esfera jurídica 
de cada pessoa, ou seja, a situação jurídica é o resultado da aplicação do 
direito objetivo (normas jurídicas) a uma pessoa concreta numa 
determinada situação (ex. a norma que diz que é proibido matar dá origem, 
em termos de situação jurídica, ao dever de não matar; art. 879º CC está 
redigido a partir dos efeitos jurídicos, os efeitos da compra e venda – 
quando uma pessoa compra um bem, na sua esfera jurídica nasce o direito 
de propriedade, nasce o dever de pagar o preço e nasce o direito a receber 
a coisa, assim como na esfera jurídica do vendedor nasce a extinção por 
transmissão do direito de propriedade, o direito a receber o preço e o dever 
de entregar a coisa [são efeitos jurídicos que resultam da aplicação das 
regras da compra e venda]). 
 
Podemos trabalhar com situações jurídicas em todos os ramos do direito. 
Sucede, porém, que em Direito Civil, como lidamos sobretudo com as 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
atuações, os direitos dos particulares, é muito prático recorrer às situações 
jurídicas porque na sua atuação, normalmente os sujeitos pensam em si 
próprios e não nas normas (direito objetivo). 
 
Classificação das Situações Jurídicas 
Situação Jurídica Ativa: o titular da situação jurídica é destinatário de uma 
norma permissiva ou de uma norma que confere um poder (ex. direito de 
receber o preço – porque resulta da aplicação de uma norma permissiva ou 
do poder de reclamar o preço) -> cria situações que são vistas como 
vantagens do sujeito; 
Situação Jurídica Passiva: o titular da situação jurídica é destinatário de 
uma norma proibitiva ou de uma norma que impõe uma conduta, 
portanto, uma norma de obrigação (ex. dever de não matar – porque 
resulta da aplicação de uma norma proibitiva) -> criam circunstâncias que 
são sentidas como desvantagens. 
 
Situação Jurídica Absoluta: é aquela que existe por si só (ex. direito de 
propriedade); 
Situação Jurídica Relativa: é aquela que para existir precisa de outra de 
sinal contrário (ex. dever de pagar o preço / direito de receber o preço). 
 
Tipos de Situações Jurídicas 
NOTAS: 
• há uma carga doutrinal muito forte nesta matéria e existe muita 
flutuação (ex. há certos autores que chamam faculdade a realidades 
que outros autores chamam direito, poder…); 
• algumas situações jurídicas (pouquíssimas) têm uma determinada 
noção que está consagrada na lei e é aquela e ponto. 
 
Tipos de Situações Jurídicas Ativas 
× Direito Subjetivo: é o efeito jurídico ativo por excelência, o que 
significa que a carga ideológica associada à liberdade, à autonomia 
das pessoas é canalizada para esta noção; do ponto de vista técnico 
é a expressão da liberdade das pessoas no mundo do Direito; é 
muito importante do ponto de vista científico porque nos permite 
trabalhar através de permissões jurídicas, ou seja, através da 
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 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
atribuição a pessoas concretas de espaços de liberdade (ex. posso 
olhar para o direito numa perspetiva de legislador, portanto, a partir 
de normas, ou posso olhar a partir de pessoas concretas e das 
posições jurídicas que elas têm, trabalhando com o espaço de 
liberdade de cada pessoa e não com aquilo que o legislador diz e isso 
é ótimo); também é importante a muitos outros níveis (ex. para 
sabermos se uma pessoa tem direito a uma indemnização essa 
pessoa tem que ter um direito violado - artigo 483º CC - e é preciso 
que seja um direito, não basta que seja uma permissão genérica); 
podem distinguir-se em patrimoniais e não patrimoniais, 
disponíveis e não disponíveis, etc.; é uma construção jurídica do séc. 
XIX, cuja origem podemos associar a Savigny, à pandectística, 
enfim, é uma consequência do liberalismo, transportada para o 
mundo do direito. 
§ Maria Raquel Rei: é uma situação jurídica relativamente à qual 
já se escreveu muitíssimo, havendo definições para todos os 
gostos; aconselha a que decoremos uma definição e que a 
percebamos minimamente para conseguirmos falar sobre ela. 
§ Menezes Cordeiro: um direito subjetivo é uma permissão 
normativa específica de aproveitamento de um bem. 
Permissão Normativa: espaço de liberdade que tem como fonte uma norma 
Específica: é aqui utilizada em contraposição com as permissões genéricas 
(ex. liberdade de contratar ou de casar é uma permissão genérica); para ser 
específica é preciso que haja uma afetação de algum bem a uma pessoa 
concreta (ex. o meu telemóvel está afeto a mim então eu tenho um direito 
sobre ele, eu posso fazer o que quiser com ele porque o direito me permite 
que eu atue especificamente sobre ele) 
De aproveitamento de um bem: tem como objetivo salientar a concretude 
do direito subjetivo, isto é, o direito subjetivo não é um wishful thinking, 
tem um objeto concreto, ou seja, tem um bem sobre o qual ele incide (ex. 
mesmo no caso dos direitos de personalidade que não são tão palpáveis 
como o de propriedade, por exemplo, existe sempre um bem concreto que 
é afetado a uma pessoa: a honra, a saúde, etc.) 
§ Gomes da Silva: um direito subjetivo é uma afetação de um 
bem aos fins de uma pessoa individualmente considerada – 
coloca em evidência o caráter específico da liberdade que é 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
atribuída a uma determinada pessoa sobre um bem em 
concreto. 
 
× Poderes ou Faculdades: quando as posições jurídicas ativas são 
menos complexas (NOTA: não esquecer que há muita flutuação dos 
termos) 
§ Maria Raquel Rei: confessa não ser fundamentalista acerca dos 
temos – se a lei não estabelece regras não cabe aos doutores 
fazê-lo; por vezes é mais prático falar em poderes ou faculdades 
em vez de direito (a lei utiliza muitas vezes estas palavras com 
muita flutuação); o que é importante é perceber o que é um 
direito subjetivo, há direitos subjetivos mais complexos e 
outros menos complexos; a palavra poder é aquela que 
normalmente é utilizada para o direito subjetivo mais simples, 
mas isso às vezes não acontece (ex. poder paternal é um 
conjunto de situações jurídicas muitíssimo complexo) 
 
Dentro do Direito Subjetivo podemos ter: 
• Direito Comum – todos os outros que não são potestativos 
• Direitos ou Poderes Potestativos – é uma permissão normativa 
específica de aproveitamento do poder de, unilateralmente, 
produzir efeitos na esfera jurídica de outrem ou no ordenamento 
jurídico (o bem jurídico que está em causa no direito subjetivo 
potestativo); são direitos invioláveis – o que é violável é a situação 
jurídica subsequente; é absoluto (se eu celebrar o contrato de 
compra e venda com o António eu não posso violar o direito do 
António de produzir o efeito jurídico, mas posso violar o contrato de 
compra e venda, por exemplo não pagando o telemóvel); alguém 
pode produzir efeitos jurídicos na esfera jurídica de outra pessoa ou 
no ordenamento jurídico no geral, sem depender da vontade de 
outra pessoa (são mais parecidos com as situações de direito público 
do que com as situações de direito privada), ex. eu faço uma 
proposta ao António para lhe comprar o seu telemóvel, pelo que o 
António tem o poder potestativo de se disser que sim, 
automaticamente, portanto, através da sua vontade, o contrato 
forma-se e eu passo a ser a proprietária do telemóvel enquanto o 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
António deixa de o ser; eu passo a ter o dever de pagar o preço e o 
direito de receber o telemóvel – há um conjunto de efeitosjurídicos 
(art. 879º CC) que se produzem na minha esfera jurídica, inclusive, e 
neste caso também na do António, que se produzem apenas por 
vontade do António: se o António não quiser vender o telemóvel 
nada disto acontece. 
NOTA: não importa que já haja uma proposta pois ela por si só não produz 
efeitos jurídicos: só há efeitos jurídicos a partir da eficácia da declaração do 
António; o António com a minha proposta adquire o direito potestativo de 
produzir, ou não, efeitos jurídicos na minha esfera jurídica. 
§ Exceção - é um direito subjetivo potestativo que se caracteriza 
por constituir um contrapoder ao permitir ao seu titular, 
licitamente, recusar-se a cumprir uma situação jurídica a que 
está adstrito (ex. comprei o telemóvel ao António, mas não 
tenho o dinheiro para pagar, então o António só me entrega o 
telemóvel quando eu lho pagar – artigo 428º CC. Ora, nos 
termos do 879º CC, o António vendeu o telemóvel, logo, tem o 
dever de entregar o telemóvel [situação jurídica passiva], mas 
pode, licitamente, recusar-se a entregar [contrapoder] o 
telemóvel enquanto eu não pagar); é a possibilidade de uma 
pessoa paralisar o exercício do meu direito; vêm previstas no 
Código do Processo Civil 
• Dilatórias – quando atrasa, paralisa o direito alheio (ex. 
não me entrega o telemóvel até eu chegar com os 100€ 
do multibanco) 
• Perentórias - quando extingue o direito de outra 
pessoa ou paralisa-o por tempo indeterminado (ex. 
prescrição – após um determinado período de tempo 
sem que o credor tenha exercido o seu direito, a lei diz 
que ele já não o pode exercer mais; no nosso 
ordenamento jurídico o prazo geral de prescrição é de 
20 anos (artigo 309º CC) – o devedor pode dizer que não 
paga. 
 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
× Direito Funcional: posição jurídica ativa (resulta de uma norma que 
confere uma permissão ou um poder) e caracteriza-se por ser 
conferida em razão do exercício de uma função e, precisamente por 
isso, deve ser exercida no interesse da prossecução dessa função 
(ex. poder paternal) 
 
× Expectativa: é uma situação jurídica ativa; há muita divergência 
quanto à definição; é a situação de uma pessoa que ainda não é 
titular de uma determinada situação jurídica ativa, mas já beneficia 
de certos instrumentos jurídicos que protegem a eventualidade 
dessa pessoa, no futuro, vir a ser titular da situação jurídica em 
causa (ex. eu não tenho direito sobre os bens dos meus pais, mas sou 
filha única e, portanto, herdeira legitimária – não me podem afastar 
da sucessão pelo que apesar dos bens não serem meus, no futuro é 
muito provável que aqueles bens venham a ser meus. Assim sendo, 
a lei, no presente, estabelece determinados mecanismos jurídicos 
para proteger esta eventualidade de eu, no futuro, vir a ser 
proprietária daqueles bens – ex. se eu tivesse irmãos e os meus pais 
quisessem fazer-lhes vendas precisavam da minha autorização, 
artigo 877º CC; em certas circunstâncias posso impugnar alguns atos 
que os meus pais pratiquem) 
 
 
 
 
 
 
 
 
• Inocêncio Galvão Telles: definia a expectativa jurídica como 
sendo aquela que é própria de um processo, ou seja, há certos 
direitos que se adquirem não instantaneamente, mas na 
sequência de um processo. 
 
Expectativa Jurídica 
(é a anterior) 
Expectativa de Facto 
(é um desejo, uma esperança – 
ex. eu tenho uma tia solteira rica 
e tenho a esperança que ela faça 
um testamento em meu favor, 
mas a lei não protege isto) 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
× Proteção indireta: é uma situação jurídica ativa, mas é ainda mais 
ténue do ponto de vista da permissão que concede do que a 
expectativa; caracteriza-se por o bem jurídico da proteção indireta 
ser colocado à disposição do titular da proteção indireta não através 
de uma norma permissiva (que é o normal), mas sim através da 
proibição que é adjudicada às outras pessoas e que tem como 
resultado indireto que aquela pessoa vai ter um benefício, ou seja, o 
titular da proteção indireta não é protegido diretamente através de 
uma atribuição pelo ordenamento jurídico de uma permissão ou de 
um poder, mas antes proibindo-se os outros todos de fazer 
determinada coisa ou obrigando-se os outros todos a agir de 
determinada maneira que indiretamente acaba por beneficiar 
aquela pessoa (ex. a lei manda a que as pessoas que fabricam os 
iogurtes coloquem a data de validade em cada caixinha de iogurtes, 
ou seja, se um consumidor comer um iogurte que não tenha data de 
validade e que tenha um problema por causa disso, essa pessoa tem 
direito a uma indemnização – a pessoa não tem o direito de não ficar 
doente nem o direito de não comer comida estragada, no entanto há 
aqui uma proteção indireta que resulta do facto de os produtores de 
iogurtes terem que colocar a data de validade nos produtos [artigo 
483º CC]) 
 
× Proteções reflexas: o modo de funcionar é o mesmo das proteções 
indiretas, ou seja, há uma pessoa que beneficia não de uma 
permissão, mas sim do resultado de normas de obrigação ou de 
proibição que têm como destinatário todas as outras pessoas ou um 
conjunto grande de outras pessoas que dá como resultado uma 
vantagem para esta tal pessoa, mas nas proteções reflexas nós não 
temos associado a este efeito aquilo que vem previsto no 483º CC, 
isto é, o legislador, quando estabeleceu aquela proteção, não teve 
em atenção os interesses daquelas pessoas e, portanto, elas não 
têm direito a ser indemnizadas (o que acontece aqui é muito 
semelhante ao caso da expectativa de facto, isto é, há uma pessoa 
que beneficia reflexamente das normas de obrigação ou proibitivas 
destinadas a outras pessoas por sorte, porque essas normas existem, 
mas não tem qualquer pretensão decorrente da violação das normas 
pelas outras pessoas). 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
Aula para exame nº2 
Tipos de Situações Jurídicas Passivas: 
× Obrigação: é o paradigma das situações jurídicas passivas; remonta 
ao direito romano e têm, por isso, uma história muito maior do que 
o direito subjetivo; é a situação jurídica da pessoa que se encontra 
na necessidade jurídica de praticar, ou não, um determinado 
comportamento (ex. comprei um telemóvel pelo que tenho a 
obrigação de pagar o preço; a pessoa que me vendeu o telemóvel 
tem a obrigação de me entregar o telemóvel); podem ser mais ou 
menos complexas – quando são muito simples, normalmente, 
chamam-se deveres (não se dividem noutros – pagar o preço é um 
dever / dar uma aula é uma obrigação porque podemos dividi-la 
noutros deveres como preparar a aula, não falar muito depressa, 
esclarecer dúvidas, etc.) 
 
× Sujeição: é uma situação jurídica passiva e é, digamos assim, “a irmã 
gémea do direito potestativo” porque, tal como ele, também é uma 
situação jurídica absoluta, ou seja, também não depende de outra, 
designadamente do direito potestativo para existir, no entanto elas 
andam sempre a par porque quando há um direito potestativo 
também há uma sujeição. A sujeição é a situação jurídica daquele 
que pode ver a sua esfera jurídica alterada por efeito exclusivo da 
vontade de outrem (ex. eu propus ao António comprar-lhe o 
telemóvel - depois de fazer a proposta e enquanto ele não responder 
eu fico numa situação de sujeição, eu fico à mercê do António); é uma 
situação inviolável (só a situação jurídica que daqui resulta é que 
pode ser violada e não a sujeição em si) e absoluta, isto é, apesar de 
haver uma relação prática entre estas duas situações jurídicas, não 
há uma dependência estrutural, uma não depende da existência da 
outra. É a situação jurídica mais grave do ordenamento jurídico 
porque é a situação daquele que não pode fazer nada para alterar 
os efeitos jurídicos que se vão produzir na sua esfera jurídica quer 
ele queira quer não. 
 
• Ónus ou encargo: é a situação jurídica passiva na qual se 
encontra alguém que tem o dever de praticar uma 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
determinada conduta, no entanto, se não praticar a conduta 
a consequênciaé que essa pessoa não vai ter uma vantagem 
(ex. no caso do ónus da prova – eu tenho o ónus da prova e 
proponho uma ação sem ter provas, o que é que acontece? Eu 
vou perder porque eu não vou conseguir provar [eu tenho o 
ónus da prova, tenho a obrigação de provar, mas se eu não 
provar o que é que acontece? Perco a vantagem.]). 
• Autores no geral: estas duas palavras são sinónimos 
• Menezes Cordeiro: reserva a palavra “ónus” para o direito 
processual e entende que devemos chamar à situação jurídica 
civil “encargo” ou “ónus material”. 
§ Alguns autores: devido à ausência de sanção entendem que o 
ónus ou encargo é uma situação jurídica ativa, ou pelo menos 
é uma situação jurídica mista; 
§ Maria Raquel Rei e Menezes Cordeiro: incluem nas passivas 
porque historicamente o ónus ou encargo tem sido visto como 
um dever e não como uma vantagem e, além disso, nem todos 
os deveres têm uma sanção acoplada 
 
 As situações jurídicas encontram-se sujeitas, ao longo da sua vida, a 
determinadas vicissitudes. As vicissitudes das situações jurídicas são 
despoletadas por factos jurídicos, portanto, por ocorrências no mundo real 
que provocam alterações no mundo do direito. As vicissitudes podem ser 
de 3 tipos: 
× Constitutivas – quando dão origem a uma situação jurídica (ex. 
contrato de compra e venda porque se adquire o direito de 
propriedade) 
NOTAS: 
v podíamos dizer que o contrato de compra e venda é uma vicissitude 
transmissiva em relação ao direito de propriedade, mas por exemplo, 
em relação ao dever de pagar o preço é constitutivo; 
v isto é importante no âmbito do direito processual porque as pessoas 
quando apresentam um pedido a um tribunal têm que dizer qual é a 
origem do seu direito, ou seja, o advogado tem que indicar a causa do 
pedido – se o não fizer, vai perder. 
 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
× Modificativas – nos casos em que o facto jurídico modifica a 
situação jurídica (ex. eu comprei o telemóvel ao António por 100€ e 
fiquei de lhe dar o dinheiro para a semana; para a semana chego ao 
pé dele e digo-lhe que afinal não consigo arranjar os 100€, só consigo 
arranjar 95€ e, portanto, preciso de um desconto de 5€ - se o António 
aceitar fazer o desconto estamos perante uma vicissitude 
modificativa) 
 
× Extintivas – quando o facto jurídico extingue a situação jurídica (ex. 
eu e o António celebramos o contrato, mas arrependemo-nos e 
chegámos ao acordo de que o telemóvel fica com o António na 
mesma, eu não tenho que pagar o preço, enfim, extinguem-se todos 
os efeitos que o contrato de compra e venda envolvia) 
 
 As vicissitudes das situações jurídicas, grosso modo, correspondem 
ao seu regime jurídico, que pode ser um regime negocial (como os 
exemplos da compra e venda) ou um regime legal (quando os factos 
constitutivos, modificativos ou extintivos decorrem da lei – ex. 
responsabilidade civil: se eu provocar um dano noutra pessoa pela prática 
de um facto ilícito eu tenho que indemnizar, não porque eu quero, mas 
porque a lei diz que sim, ou seja, verificado aquele facto, aquele facto tem 
um efeito constitutivo de uma pretensão indemnizatória de uma pessoa e 
da obrigação de indemnizar por parte daquele que praticou o ato ilícito.) 
 
Exercício Jurídico 
Abuso do Direito – Estudar pelo Carvalho Fernandes (páginas 621 a 635) 
e ler artigo do Menezes Cordeiro publicado na revista da Ordem dos 
Advogados, ano 65 (2005), tomo II, setembro 
 
 O abuso de direito é uma figura que nasceu em França no final do 
séc. XIX. 
Casos que estão na origem do abuso de direito: 
1. Caso da Chaminé Falsa: X tinha má relação com o seu vizinho Y então 
resolveu construir na sua casa uma grande chaminé, mas que não se 
 
 Sendim Fernandes | FDUL 2020-2021 
destinava a fazer a função normal das chaminés, mas antes a tapar a 
janela de Y 
2. X tinha uma casa no campo e ao lado vivia Y que passou a ter um 
negócio de dirigíveis; X não achou graça, por isso construiu espigões 
altíssimos no seu terreno que se destinavam a furar os dirigíveis de Y 
quando eles lá passavam 
 
 De facto, as pessoas representadas com a letra X exerceram o seu 
direito uma vez que tinham permissão normativa para construir naquilo 
que é seu (não esquecer que isto aconteceu no século XIX e não era 
necessário pedir licenças), no entanto, apesar de estarem a exercer o seu 
direito, era um exercício injusto porque em ambos os casos era totalmente 
inútil, tendo somente a “utilidade” de fazer mal ao vizinho. 
 A utilização inapropriada do direito incomodou os juristas e surge 
então a figura do abuso de direito – não basta termos um direito, temos 
que fazer um uso adequado do mesmo. 
 
As teses acerca do abuso de direito dividem-se sobretudo em 2 grandes 
grupos: teses internas e teses externas. 
v Teses internas – o abuso de direito manifesta um limite interno do 
direito, isto é, o direito subjetivo de X tem um limite que não é só 
quanto à titularidade, ou seja, também há limites que impedem X de 
construir chaminés falsas e espigões 
v Teorias externas – o abuso de direito não é um limite ao direito 
subjetivo, é um limite ao exercício, ou seja, o direito existe e tem 
uma amplitude máxima, mas quanto ao exercício, nem todos os 
exercícios são possíveis e, portanto, os limites no exercício são limites 
externos ao próprio direito 
v Maria Raquel Rei – com toda a franqueza acha que ambas as teorias 
são um bocadinho estéreis: o que é importante aqui é nós 
percebermos o que está em causa e como é que funciona, ou seja, 
saber como é que esta figura apareceu no nosso ordenamento 
jurídico e como é que a fazemos funcionar no caso concreto. 
Podemos defender a que quisermos, o conveniente é sabermos 
aplicar o disposto no artigo 334º CC. 
 
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Artigo 334º CC -> não basta que analisemos o direito subjetivo na sua 
configuração enquanto situação jurídica, isto é, este artigo diz-nos que, 
para além da configuração do direito, também o exercício tem limites; é 
um artigo muito propenso à chamada jurisprudência do sentimento – não 
é isso que se pretende, ou seja, não se trata de fazer justiça dando asas à 
nossa poesia jurídica, pois este tipo de abordagem prejudica a técnica 
jurídica. 
v A palavra direito neste artigo não deve ser entendida no sentido 
técnico de direito subjetivo, mas sim como situação jurídica ativa, 
isto é, o legislador ao dizer “direito” utilizou a palavra numa acessão 
ampla. 
× Menezes Cordeiro: entende que o abuso de direito também se 
aplica a situações jurídicas passivas 
× Maria Raquel Rei: não concorda com MC porque, nos termos 
do artigo 9º CC não é possível interpretar a palavra direito 
como dever (é exatamente o antónimo jurídico) 
v Exceder manifestamente = exceder sem qualquer dúvida os limites 
impostos pela boa-fé (…) – ex. se X tivesse feito exatamente a mesma 
chaminé, mas com o propósito normal das chaminés e não para 
prejudicar Y, Y nada poderia fazer contra isso. 
v É necessário que o excesso se traduza na violação de um de 3 
conceitos (boa-fé, bons costumes e fim económico-social do direito) 
§ Bons costumes: correspondem a regras de moral sexual ou 
familiar, bem como a regras deontológicas de uma 
determinada comunidade 
§ Fim económico-social: corresponde ao objetivo económico-
social daquele direito; às vezes não existe um fim económico-
social 
§ Boa-fé: aqui está no sentido objetivo, ou seja, corresponde aos 
valores fundamentais do sistema jurídico, vocacionados para 
intervir no caso concreto; integra-se ou densifica-se, 
sobretudo, a partir de dois princípios distintos – princípio da 
tutela da confiança e princípio da primazia da materialidade 
subjacente. 
• Princípio da tutela da confiança aplicada ao abuso de 
direito – significa que uma pessoa não pode praticar 
determinado ato que, em princípio, está no âmbito da 
 
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permissão subjetiva de que essa pessoa é destinatária, 
se com isso violar o princípio da tutela da confiança;para 
que este princípio funcione, a doutrina e a 
jurisprudência identificaram 4 requisitos que se têm que 
verificar no caso concreto para que determinada pessoa 
venha a ser protegida: 
× Tem que existir uma situação de confiança e isso 
significa, na prática, que a pessoa que confia tem 
que se encontrar numa situação de boa-fé 
subjetiva ética, isto é, tem que ignorar que está a 
lesar um direito alheio, mas depois de ter tentado 
de alguma forma informar-se (quem acredita 
porque acredita não é protegido, temos que estar 
perante uma pessoa que acredita porque não tem 
uma razão para não acreditar naquilo depois de 
se ter informado) 
× É preciso que haja uma justificação para a 
confiança, isto é, é preciso que haja elementos 
objetivos que tenham conduzido a que aquela 
pessoa criasse a situação de confiança (o homem 
médio, naquelas circunstâncias, também 
acreditaria que aquilo aconteceria daquela forma) 
× É preciso que exista imputação da confiança, isto 
é, é preciso que os factos objetivos que conduzem 
à situação de confiança sejam atribuíveis à pessoa 
que vai sofrer as consequências da proteção da 
confiança 
× Investimento de confiança, isto é, não basta a 
pessoa acreditar, é preciso que a pessoa que 
acreditou num determinado estado de coisas 
tenha feito um investimento, tenha feito 
despesas ou tenha organizado a sua vida em 
função daquela situação 
 
Caso prático: 2 irmãos herdaram um terreno e não faziam nada com ele; X 
é despedido e decide montar a sua própria oficina no terreno herdado; X 
vai falar com o irmão Y e conta-lhe a sua pretensão, pedindo-lhe que façam 
partilhas; o Y diz-lhe que é melhor não as fazerem já porque pode correr 
 
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mal e que, portanto, seria melhor que ele começasse a arranjar já os carros 
lá e falarem sobre as partilhas se o negócio correr bem; X assim o fez e 
correu tudo bem pelo que foi falar com Y outra vez; Y diz-lhe que não lhe 
dá jeito tratar das partilhas agora e que não vale a pena estar a gastar 
dinheiro em tudo o que isso envolve, mas que ele pode montar lá a sua 
garagem à vontade; X pede um empréstimo, constrói a oficina, contrata 
pessoas, etc.; passaram-se já muitos anos desde que o X tem ali o seu 
negócio, mas os irmãos desentenderam-se e o Y quis ficar com a oficina do 
X; vão para tribunal e o tribunal diz que há aqui um abuso de direito por 
violação por parte de Y do princípio da tutela da confiança. 
× Situação de confiança – X pensava que não estava a violar o direito 
do Y porque foi ter com ele para fazer partilhas e foi o próprio Y que 
lhe disse que não era preciso e que podia fazer ali o seu negócio à 
vontade (X agiu de boa-fé subjetiva) 
× Justificação para a confiança – X tinha razões objetivas para acreditar 
que estava a fazer bem: as várias conversas com o irmão e o decorrer 
do tempo (qualquer pessoa nestas circunstâncias confiaria) 
× Imputação da confiança – Foi Y que lhe foi dizendo que estava à 
vontade, ou seja, a confiança de X residia no comportamento de Y 
× Investimento de confiança – X endividou-se para construir a 
garagem, investiu o seu trabalho ali, passou anos e anos a trabalhar 
ali, enfim, construiu a sua vida, o seu património em cima da 
confiança que depositou no irmão 
 
 
 
 
 
 
NOTA: o princípio da tutela da confiança “situa-se na terra de ninguém” 
porque por um lado não temos um contrato, existe um “pensar que” e por 
outro não podemos proteger todas as pessoas que “pensaram que”, 
protegemos confianças que não são tão fortes como aquelas em que existe 
de facto um direito 
 
A forma como Y está a exercer o seu direito, tentando expulsar Y 
do terreno é inadmissível porque está a violar a confiança que ele 
próprio deixou que X adquirisse ao longo dos anos. Assim sendo, 
neste caso, o tribunal não permitiu que Y expulsasse X do terreno 
 
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• Princípio da primazia da materialidade subjacente – o 
direito, quando estabelece determinadas normas, 
pretende que uma determinada consequência 
aconteça, isto é, não se basta com a aparência, com a 
forma, não basta cumprir formalmente as normas e 
materialmente os objetivos do direito não estarem 
preenchidos (ex. professor vem dar-nos a aula de 
matemática, mas fala da qualidade das chamuças do bar 
– formalmente está a cumprir a sua função porque veio 
dar a aula, mas materialmente não está porque veio 
falar-nos de coisas que não têm nada a ver com 
matemática). Aquilo que acontece em casos como o 
exemplificado é que a lei não permite o exercício do 
direito porque o titular do direito está a exercê-lo 
violando o princípio da primazia da materialidade 
subjacente, ou seja, está a exercê-lo apenas 
formalmente. 
 
 O abuso de direito é um mecanismo excelente para funcionar como 
válvula de segurança do sistema jurídico, isto é, há muitos casos que não 
conseguimos resolver de outra maneira senão através da aplicação da 
figura do abuso de direito, no entanto, quando existirem mecanismos de 
direito estrito para solucionar um determinado problema, ou seja, quando 
existir uma norma jurídica que resolva aquele problema em concreto, não 
vamos recorrer a uma cláusula geral como a do abuso de direito para 
conseguir uma solução que com toda a facilidade se consegue com uma 
norma de direito estrito. 
 Ao longo do tempo a doutrina e a jurisprudência foram 
identificando ocorrências típicas de casos de abuso de direito, isto é, 
situações concretas em que o abuso de direito adota determinadas 
formas que são quase sempre as mesmas. Então foram-se construindo 
figuras, que são figuras de abuso de direito, mas que o descrevem um pouco 
mais (nos manuais encontraremos uma listagem de casos abusivos). O mais 
famoso de todos é o venire contra factum proprium. 
Venire contra factum proprium – caso de abuso de direito no qual o abuso 
se concretiza em duas condutas contraditórias, ou seja, o sujeito faz uma 
 
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coisa e a seguir faz outra contrária à primeira (ex. o anteriormente falado 
dos irmãos e do terreno) 
NOTA: 
× as pessoas são completamente livres de mudar de ideias, o que não 
pode acontecer é a pessoa mudar de ideias e com isso violar a 
confiança que legitimamente criou, ou seja, se é para mudar de ideias 
eu não devo criar em alguém a expectativa de que não vou mudar de 
ideias 
× para além do venire existem mais uns 7 ou 8 casos, como por 
exemplo: exceptio doli; tu quoque; inalegabilidades formais; exercício 
em desequilíbrio (…). – são figuras doutrinárias, não têm 
consagração na lei; sempre que quisermos aplicar o abuso de direito 
podemos fazer uso dessas figuras porque elas muitas vezes ajudam-
nos, sobretudo a identificar o abuso de direito, mas quando estamos 
a fundamentar a resposta temos que fundamentar no 334º CC 
 
O que acontece quando há abuso de direito? 
 O artigo 334º CC diz-nos que a consequência é a ilegitimidade (aqui 
ilegitimidade é um conceito aberto que se destina a permitir que a 
consequência do abuso de direito seja a mais adequada ao caso concreto). 
A consequência pode ser: 
§ a paralisação do exercício jurídico (é ilegítimo o exercício, portanto 
significa que eu não posso exercer o direito daquela maneira, tenho 
que parar); 
§ quando o exercício jurídico se traduza na prática de atos jurídicos, 
é possível dizer que um exercício abusivo dá lugar a um ato nulo 
(artigo 294º CC); a regra da invalidade no direito civil é a nulidade, 
portanto, quando um ato é contrário à lei é nulo 
§ responsabilidade civil (consequência mais habitual) – para que um 
ato seja abusivo, o artigo 334º CC não exige que o ato seja 
praticado com culpa (a responsabilidade, como já vimos, só existe, 
fora dos casos especificamente previstos na lei, se houver culpa, o 
que significa que para que o ato abusivo seja um ato suscetível de 
responsabilidade civil é preciso que além de abusivo o ato seja 
culposo – temos que conjugar o disposto no artigo 334º CC com o 
 
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disposto no artigo 483º CC); o que acontece aqui é que o abuso de 
direito permite considerar que o ato abusivo é um ato ilícito e, 
portanto, através do artigo 483º CC, se o ato for ilícito e culposo é 
possível arbitrar uma indemnização à pessoa que sofreu danos com 
aquele ato. O artigo 334º CC, a propósito desta consequência da 
responsabilidade civil, nos últimos 15 anos (sensivelmente), tem sido 
bastante utilizado por alguma doutrina, designadamente pela 
professora Mafalda Miranda Barbosa para tentar fundamentar um 
novo tipo de responsabilidade civil, a par do artigo 483º CC da 
responsabilidade extracontratual e da responsabilidade contratual 
(artigo 798º CC) - isto não é nada pacífico, há muita gente que não 
concorda com este terceiro tipo de responsabilidade civil, mas seja 
como for é uma matéria que nos dias que correm está bastante “na 
ordem do dia” e é “ciência de ponta” a utilização do abuso de direito 
como nova forma de responsabilidade civil. 
 
Aula para exame nº3 
Colisão de Direitos 
Estudar pelo manual do professor Carvalho Fernandes, 2º volume, 
páginas 614 a 620 
O instituto da colisão de direitos já existia no Código de Seabra e é muito 
difícil de trabalhar na prática. 
 
Artigo 335º CC -> para aplicarmos este artigo temos que hierarquizar os 
direitos, temos que saber quais são os direitos superiores e os direitos da 
mesma espécie (isto é muito difícil e problemático porque não existe uma 
hierarquia dos direitos); há muitas propostas para a interpretação deste 
artigo, mas nenhuma delas é consensual. 
§ Maria Raquel Rei: acha que depende muito do caso concreto e da 
fundamentação que seja aplicada em cada caso, mas o que lhe 
parece pacífico é nós admitirmos que os direitos que têm dignidade 
constitucional, na medida dessa dignidade constitucional, e os 
direitos que tenham proteção penal, na medida, também, da 
proteção penal, são superiores aos que não a têm. Um direito que 
 
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tenha sido entendido como merecedor de consagração 
constitucional é, obviamente, superior a um que não tenha 
consagração constitucional, sobretudo se estiver no capítulo dos 
direitos, liberdades e garantias que são direitos especialmente 
protegidos, têm eficácia direta e determinam a inconstitucionalidade 
das leis que os pretendam violar. No caso da tutela penal o raciocínio 
é o mesmo. Estas regras de funcionamento do artigo 335º são regras 
que pressupõe distinção entre os direitos e que exigem na solução 
bastante bom senso. É uma norma que, tal como o abuso de direito, 
deve ser utilizada quando não existirem regras de direito estrito para 
aplicar 
Erros comuns: 
× Dizer que os direitos de personalidade são superiores aos outros. 
Alguns direitos de personalidade são superiores a outros direitos, 
mas não por serem direitos de personalidade (ex. direito à vida é um 
direito de personalidade superior aos restantes direitos na medida 
em que tem consagração constitucional e tutela penal; já o direito à 
imagem, que também é um direito de personalidade, não tem 
consagração constitucional nem tutela penal, pelo que é claramente 
inferior). Os direitos de personalidade podem ser entendidos como 
tendo alguma proeminência sobre os outros com base no artigo 
70º/2 CC – é um tipo de proteção que existe nos direitos de 
personalidade e que não existe nos outros, mas não é por isso que 
tem que prevalecer sempre. 
× Não é por um direito ser pessoal e outro ser patrimonial que o 
pessoal tem mais valor (ex. tenho uma casa com 3 quartos, mas só 
ocupo um, não é por isso que o vagabundo que vive na rua tem que 
vir dormir para um dos meus quartos – não há nada na lei que diga 
que o meu direito patrimonial é menos importante que o direito 
pessoal do sem abrigo) 
 
Coisas – Baldios 
Estudar pelo manual do professor Menezes Cordeiro 
 Os baldios são um tipo de coisas muito desafiante do ponto de vista 
jurídico porque estamos habituados a lidar com o conceito de propriedade 
 
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e até de direito subjetivo que implica a apropriação do bem e implica uma 
utilização em exclusividade (ex. o facto de alguém ter uma casa e não a 
utilizar na sua totalidade não faz com que o direito deixe de proteger o 
direito de a ter, mesmo que não a utilize na totalidade porque nos 
habituámos a que a propriedade, a que o direito seja um direito de afetação 
de uma coisa a uma pessoa, independentemente dessa pessoa usar ou não 
usar, portanto, existe uma apropriação, uma exclusividade no uso que é 
protegida pelo direito – esta forma de utilização dos bens é típica do direito 
romano e mostra um certo individualismo transposto para o direito e para 
a forma como nós nos relacionamos com as coisas; existe uma afetação dos 
bens aos fins das pessoas individualmente consideradas e o direito 
subjetivo também está ao serviço disto porque o direito subjetivo é uma 
afetação de um bem a uma pessoa, pessoa essa que tem a permissão 
normativa específica de utilização/aproveitamento dessa coisa). 
 No entanto, há formas de aproveitamento diferentes, que não 
passam pela apropriação, como por exemplo a comunhão conjugal – o 
marido e a mulher são titulares de bens que não são nem de um, nem de 
outro, são dos dois, mas são dos dois de uma forma estranha porque um 
deles não pode pedir ao outro a separação, ou seja, não pode dizer que 
afinal vão dividir; só se eles se separarem é que podem partilhar os bens, 
até lá os bens são comuns. 
 O baldio é uma forma de utilização de um bem que não passa pela 
apropriação. É um terreno ou uma parte de um terreno (lagar, moinho, 
forno, etc.) que é possuído e gerido por uma comunidade local e que em 
regra constitui aquilo que se designa pelo logradouro (logradouro = 
palavra jurídica para designar o quintal) comum dos compartes (compartes 
= pessoas que utilizam o baldio). Esta comunidade local utiliza a coisa na 
medida das suas necessidades. 
 O baldio tem uma origem muito difícil de traçar – há muitas teses, 
a única coisa que se sabe é que a origem é muito antiga. Há quem entenda 
que os romanos também tinham algo parecido com o baldio, mas a maior 
parte das pessoas entende que o baldio adveio dos povos germânicos que 
invadiram a Europa na baixa Idade Média. Há ainda quem entenda que tem 
origem árabe. A verdade é que ninguém sabe a origem. 
 Os baldios, por um lado devido a esta incógnita da origem, por outro 
lado devido ao romantismo associado a uma utilização sem apropriação 
 
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têm sido sempre envolvidos numa grande aura de poesia e romantismo em 
torno dos baldios como os terrenos das comunidades. Há muitos exemplos 
na literatura sobre os baldios, sendo o mais famoso em Portugal, os 
romances de Aquilino Ribeiro. 
 
Ler “Quando os Lobos Uivam”, de Aquilino Ribeiro (fala sobre as guerras 
dos baldios) 
 
 A realidade dos baldios tem uma carga política muito forte nas obras 
devido à dimensão comunitária do baldio. Hoje em dia, a carga política dos 
baldios tem a ver com uma errada compreensão dos mesmos: 
normalmente, na sociedade atual, os baldios são muito defendidos 
politicamente por ideologias de esquerda, mas a realidade dos baldios não 
tem nada a ver com realidades associadas tipicamente a filosofias políticas 
de esquerda, pelo contrário, até têm mais a ver com realidades que são 
mais típicas de direita. Seja como for, grande parte desta mística dos baldios 
é mais poesia do que outra coisa. 
 Do ponto de vista da ciência jurídica, o baldio é uma figura 
extremamente interessante e é uma figura que é muito relevante porque 
ainda hoje há cerca de 400 000 hectares de terrenos baldios em Portugal. 
Existe, sobretudo, no Norte. 
 Historicamente, o poder político sempre lutou contra os baldios por 
várias razões, mas fundamentalmente porque os baldios subaproveitam 
os terrenos precisamente porque o terreno baldio é de todos e não é de 
ninguém e o que não é de ninguém, normalmente, não éaproveitado 
intensivamente, não é cuidado da melhor maneira. Como fazer com o 
problema dos fogos? Quem é que tem a obrigação de limpar o baldio? 
Quem é que paga os impostos? – nós temos 400 000 hectares de terreno 
que não contribuem para o bem comum. 
 Outro problema dos baldios é suscitarem a cobiça e desde sempre a 
suscitaram. Os nossos primeiros reis sempre cobiçaram terrenos baldios e 
mesmo no Estado Republicano isso também acontece (ex. se se encontrar 
petróleo no subsolo de um terreno baldio, o mais provável é começarmos 
a ouvir dizer que afinal o terreno não era bem baldio, mas antes do Estado). 
 
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 No século XIX e sobretudo no século XX, os baldios passaram a ser 
administrados pelas autarquias, pelos municípios e depois, em 1976, 
houve uma lei (que, entretanto, já foi revogada) que restituiu os terrenos 
baldios às comunidades locais. 
× Maria Raquel Rei: acha esta lei um bocadinho estranha porque 
considera que manipula um bocadinho os baldios porque sempre se 
regeram por direito consuetudinário e a lei de 1976 exige, para que 
o baldio seja reconhecido, que as comunidades se constituam como 
comunidades baldias e que criem determinados órgãos que são 
estabelecidos na lei, ou seja, tentou-se democratizar o baldio que 
não é um sistema de utilização democrática. O que a lei de 1976 fez 
foi arranjar um meio termo entre o baldio tradicional e uma estrutura 
mais ou menos palatável para o homem do séc. XX com sistemas 
democráticos de eleição dos órgãos do baldio, com órgãos para 
tomar decisões em nome do baldio. 
 
 Aquilo que nós temos hoje é a lei nº 75/2017, de 17 de agosto, que 
faz um compromisso entre a figura democrática e a figura tradicional do 
baldio. 
Particularidades: 
§ Os bens sujeitos ao regime de baldio podem ser utilizados por 
qualquer morador da área do baldio, de acordo com os costumes 
ou as deliberações do baldio (artigo 3º da lei nº 75/2017). 
§ Não há uma utilização em comum como se de uma associação se 
tratasse, há uma utilização individual por parte de um conjunto de 
pessoas, ainda que existam algumas regras de utilização. 
§ Os bens dos baldios são bens que se encontram fora do comércio 
(artigo 6º/3 da Lei nº 75/2017 que depois entronca no artigo 202º 
CC). 
§ São bens inapropriáveis, indisponíveis, impenhoráveis, 
imprescritíveis e insuscetíveis de usucapião (artigo 6º/2 da Lei nº 
75/2017) – se os órgãos do baldio fizerem asneira, a pessoa que 
sofreu o dano não o vai ver ressarcido porque não há qualquer tipo 
de responsabilidade civil; quanto ao usucapião há problemas 
jurídicos significativos por causa da sucessão de leis no tempo (pelo 
 
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menos entre 1940 e 1976 era possível haver usucapião sobre 
terrenos baldios e depois de 1976 não é possível 
§ É possível atribuir a qualidade de comparte a alguém que não seja 
eleitor (artigo 7º/2 da Lei nº 75/2017) através de deliberação 
§ O baldio não tem personalidade jurídica, apesar de ter órgãos 
próprios (artigo 17º da Lei nº 75/2017) 
§ Correspondem àquilo que o professor Menezes Cordeiro chama 
“pessoas rudimentares” e têm autonomia patrimonial imperfeita 
(artigo 20º/3 da Lei nº75/2017) 
 
 Os bens dos baldios não são bens do domínio público. No domínio 
público quem pode utilizar é o público, mas no caso dos baldios não é 
qualquer pessoa que os pode utilizar, são os compartes, as pessoas que 
fazem parte daquela comunidade local. 
 Hoje em dia, tenta-se rentabilizar o baldio. Uma das formas com a 
qual se tenta fazer isso é através do arrendamento de alguns desses 
espaços para os aerogeradores. 
§ Maria Raquel Rei: acha muito duvidoso que isso possa ser feito 
porque o baldio não é uma associação e, portanto, não faz sentido 
nenhum rentabilizar o baldio a este nível. Para além disso, a lei trata 
o baldio como um logradouro comum, pelo que a sua utilização 
correta é uma utilização individual e não capitalista. Há muitos 
aproveitamentos políticos dos baldios porque há uma falta de 
compreensão do que é que é um baldio e existe muitas vezes uma 
promiscuidade grande entre pessoas que são eleitas para juntas de 
freguesia ou para câmaras municiais e pessoas que são eleitas para 
os órgãos dos baldios, nos sítios em que os baldios interessam por 
terem grandes potencialidades económicas – isto, do ponto de vista 
jurídico, é errado porque a lei do baldio não permite este tipo de 
utilização; não deixa, no entanto, de ser feito, porque não tem havido 
fiscalização ou porque a fiscalização é feita por estas pessoas. 
 
 Do ponto de vista subjetivo, hoje em dia, as pessoas que fazem parte 
dos baldios são os eleitores dos sítios onde existem baldios – isto também 
 
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não é muito fácil porque os baldios às vezes não correspondem 
necessariamente às freguesias. 
 Não há sucessão nos baldios (ex. se eu vivo em Coimbra e os meus 
filhos moram em Lisboa, se eu era titular do baldio e morro, os meus filhos 
não passam a sê-lo porque não moram lá) 
 
Natureza jurídica dos baldios: 
§ Menezes Cordeiro e Carvalho Fernandes: entendem que há um 
direito de propriedade com um regime subjetivo especial, portanto, 
seria um direito de propriedade, mas o titular desse direito de 
propriedade seria uma pessoa especial, seria a tal comunidade dos 
compartes. 
§ Maria Raquel Rei: não concorda, acha que não há um direito de 
propriedade, há um direito diferente, um direito de baldio. Há um 
regime subjetivo original, sem dúvida, que é a comunidade dos 
compartes, mas também há um regime objetivo original, portanto, 
não é um direito de propriedade como os outros porque não há 
apropriação enquanto que no direito de propriedade há uma 
afetação jurídica do bem a pessoas individuais.

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