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LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS UNIASSELVI-PÓS Autoria: Adriana Prado Santana Santos Elis Gorett da Silveira Lemos Indaial - 2022 2ª Edição CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Copyright © UNIASSELVI 2022 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. S237l Santos, Adriana Prado Santana Língua brasileira de sinais. / Adriana Prado Santana Santos; Elis Gorett da Silveira Lemos. – Indaial: UNIASSELVI, 2022. 146 p.; il. ISBN 978-65-5646-367-4 ISBN Digital 978-65-5646-363-6 1. Linguagem por sinais. - Brasil. I. Lemos, Elis Gorett da Sil- veira Lemos. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 370 Impresso por: Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Marcelo Bucci Jairo Martins Marcio Kisner Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................5 CAPÍTULO 1 O Processo Cognitivo E A Língua De Sinais ..............................7 CAPÍTULO 2 Os Parâmetros Formativos Em Libras – Estudos Aplicados A Fonética E A Morfologia .........................................................61 CAPÍTULO 3 Interface Entre Sintaxe, Semântica E Pragmática ...............107 APRESENTAÇÃO Diferentemente das línguas orais que utilizam um canal oral auditivo na comunicação, as línguas de sinais utilizam o espaço e a visualidade para se comunicar, ou seja, o espaço e suas dimensões oferecem a constituição de seus mecanismos fonológicos, morfológicos, sintáticos e semânticos para veicular os sinais ou as palavras. Esta disciplina é referente à Língua de Sinais Brasileira que, em termos linguísticos, é definida como uma língua sinalizada, constituída pelas pessoas surdas, que tem identidade e cultura própria e que é compartilhada entre indivíduos ou coletivos das pessoas surdas. Um dos mais importantes pressupostos assumidos neste material é o de que a língua é restringida por determinados princípios (regras) que fazem parte do conhecimento humano independentemente da modalidade das línguas (falada ou sinalizada), para a formação das palavras, da construção das sentenças e da construção dos textos. Portanto, ao realizar um passeio por este material, você compreenderá o Surdo brasileiro como um sujeito cultural, empoderado por meio de sua língua, no caso da Libras regulamentada pelo decreto nº 5.626/2005 que demarca a sua diferença e toma posse de seu espaço de conhecimento, seja na área educacional ou social. No entanto, conforme o decreto, isso não isenta os surdos brasileiros de aprenderem a língua portuguesa na modalidade escrita, não só para uma melhor inclusão na sociedade, mas como característica de segunda língua, o que implica o ensino bilíngue para a criança surda desde a educação infantil até o ensino superior. Desse modo, no Capítulo 1, apresentaremos um contexto sobre as teorias de aquisição da linguagem e a importância dos estudos linguísticos e os profissionais relacionados às línguas de sinais como uma língua natural capaz de expressar qualquer conceito com suas propriedades criativas e expressivas. O aprendizado da criança surda em sua língua nativa como L1 (língua de sinais) e na modalidade escrita como L2 (língua portuguesa). Esse aprendizado em duas línguas implica uma filosofia bilíngue expressa em leis e documentos nacionais de inclusão para crianças surdas. Por fim viajaremos brevemente pela história, trazendo fatos e acontecimentos importantes sobre a chegada das línguas de sinais aqui no Brasil. A história nos revela que foram muitas décadas de proibição relacionadas ao não uso das línguas de sinais nas escolas de todo o mundo, inclusive aqui no Brasil com a nossa língua brasileira de sinais – Libras. Eram épocas de total domínio da filosofia oralista. “As narrativas sobre esse período, [...], ora são descritas somente como o triunfo do oralismo e a proibição da Língua de Sinais, ora são descritas como distanciadas dos sentidos da educação geral dos anos cinquenta no Brasil (ROCHA, 2010, p. 15). Mas conforme veremos nos nossos estudos, a Libras é uma língua natural composta de todos as características linguísticas. Em consonância com esse argumento, no Capítulo 2 apresentaremos os parâmetros formativos da língua brasileira de sinais e os estudos que são aplicados à morfologia da Libras; discutiremos os seus aspectos gramaticais e a sua importância para a criação lexical; e versaremos sobre as características reais de um determinado fato que a Libras é capaz de apresentar por meio da iconicidade e arbitrariedade. Na conclusão desse capítulo, polemizaremos acerca do processo que envolve a transcrição de enunciados e textos da língua brasileira de sinais e a importância de utilizar ilustrações para efetivar a comunicação de maneira mais clara e precisa. No Capítulo 3 seguiremos apresentando conteúdos específicos da gramática da Libras e discorreremos a respeito da interface entre a sintaxe, semântica e a pragmática. Transitaremos pelo campo dos verbos: auxiliares e manuais, verbos “com” e “sem” concordância, traremos a noção e o entendimento do papel dos verbos na estrutura frasal e no sistema promocional da Libras. Próximo ao encerramento desse capítulo, julgamos fundamental compreender a relação entre a semântica e a pragmática da Libras e a relação entre Sinônimos, Homonímia e Polissemia, observando suas particularidades. Após esta apresentação e sob a perspectiva linguística, convidamos-lhe para iniciar seus estudos sobre a disciplina de Língua Brasileira de Sinais – Libras. Viajaremos por uma estrada repleta de visualidade. Este material é um forte aliado na construção de seu conhecimento acerca da Língua de Sinais, aproveite-o, faça as leituras complementares com cuidado, seja determinado na execução das atividades de cada capítulo e aproprie-se do conteúdo para argumentar com segurança sobre a língua brasileira de sinais nos círculos nos quais seja a Libras o tema principal. Vamos iniciar! CAPÍTULO 1 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: • Compreender as diferentes teorias de aquisição da linguagem. • Refl etir sobre o que é língua e linguagem. • Apontar a importância dos estudos linguísticos para Língua de Sinais. • Apresentar toda a fl exibilidade das línguas de sinais como uma língua natural. • Conhecer e identifi car como se dá a aprendizagem da criança surda no contexto bilíngue. • Comparar as teorias de linguagem e os benefícios para os estudos das línguas de sinais. • Analisar como se dá o processo cognitivo da linguagem no contexto das línguas de sinais. • Valorizar as línguas de sinais e seu status linguístico. • Aplicar os estudos das línguas de sinais como parâmetro em pesquisas. • Examinar a importância do bilinguismo para o ensino dos surdos. 8 Língua brasileira de sinais 9 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO O desenvolvimento da linguagem deve ocorrer naturalmente em todas as crianças, isso se dá principalmente devido à interação com seus familiares, levando-as a adquirir uma língua de forma consciente e deliberada. Em geral, esse acaba sendo o primeiro passo para desenvolver a linguagem antes delas iniciarem a vida escolar. No caso da criança que nasce surda, o processo de aquisição da linguagem não dependerá só da família, mas, na maioria dos casos,precisará da intervenção de profi ssionais que direcionarão para uma forma melhor de aquisição de linguagem e o melhor meio para se comunicar. Nesse contexto, o quanto antes for diagnosticada a surdez, mais fácil será diminuir ou evitar as consequências no desenvolvimento emocional, social, cognitivo e de linguagem. FIGURA 1 – FALHA NA COMUNICAÇÃO FONTE: https://image.freepik.com/vetores-gratis/falha-na-comunicacao- balao-quebrado-ou-mensagem-desmoronar-conceito-de-mensagens- sem-exito_70921-697.jpg. Acesso em: 20 dez. 2020. Não existe um único método para auxiliar a criança com surdez ou com defi ciência auditiva a desenvolver a sua linguagem. Para aquelas que têm resíduos auditivos, pode ser oferecido um acesso por uma abordagem oral e com auxílio do Aparelho de Amplifi cação Sonora Individual (AASI), aquele que fi ca atrás ou dentro da orelha, inclusive hoje existem modelos bem modernos dele. Diferentemente, para aqueles que nasceram totalmente surdos, pode ser oferecido o aprendizado por meio das línguas de sinais como língua materna desde a infância. Essas abordagens têm implicado algumas controvérsias, pois de um lado, existe uma comunidade oralistas que acredita na normalização. Desse modo, eles 10 Língua brasileira de sinais preconizam integração e o convívio das pessoas com surdez com os ouvintes por meio das línguas oral e escrita, alegando que o acesso ao conhecimento e à socialização é muito mais amplo quando se lê e escreve bem nas línguas orais. Com isso, acreditam que se estabelece uma relação direta entre o desempenho na fala e a cognição, pois o sujeito que se expressa e compreende a linguagem por meio da linguagem oral tem a possibilidade de conquistar sua autonomia, pois tem mais acesso à cultura e às informações na sociedade. Nesse contexto, existe um grupo específi co: CODAs, que se destaca, pois, a maioria dos integrantes é criança ouvinte ou que tem um grau de defi ciência auditiva baixo, mas, que nasceu de pais surdos. Então, toda sua vida está envolvida com duas línguas: a de sinais e a língua oral. Desse modo, entendemos o motivo de muitos CODAs tornarem-se Tradutores e Intérpretes de Libras/LP (TILSP), conforme mostra Quadros (2007, p. 261) Como os CODAs usavam língua de sinais, eles tornavam-se intérpretes compulsoriamente, pelo menos para as próprias famílias. Para as famílias surdas, os CODAs são vistos como possíveis “pontes” entre os mundos surdo e ouvinte [...] CODA é uma sigla para o termo em inglês Children of Deaf Adults, que pode ser traduzido como fi lhos de adultos surdos ou fi lhos de pais surdos. Por outro lado, há os defensores do desenvolvimento da linguagem por meio das línguas de sinais, apontando que a pessoa com surdez, ao adquirir, espontaneamente, a LS por meio do convívio com seus pares, tem a possibilidade de se desenvolver nos campos cognitivo, emocional e social; além de ter a autoestima mais elevada, pois valoriza-se a língua materna dela, podendo, assim, lutar política e socialmente por seus direitos como minoria linguística. Nesse sentido, há os que defendem o “bilinguismo”, ou seja, o sujeito surdo ter acesso e dominar a sua língua natural (Língua de Sinais) como meio de comunicação e a Língua Portuguesa, na modalidade escrita. Conforme Skliar (1997, p. 144), [...] o modelo bilíngue propõe, então, dar às crianças surdas as mesmas possibilidades psicolinguísticas que tem a ouvinte. Será só desta maneira que a criança surda poderá atualizar 11 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 suas capacidades linguístico-comunicativas, desenvolver sua identidade cultural e aprender. Porém, entre esses grupos, alguns concordam que mesmo para os surdos bilíngues (usuários de Libras como L1 e Língua Portuguesa como L2 escrita), que têm resíduo auditivo, algumas vocalizações e gestos simultâneos à língua de sinais, os benefi ciam, dependendo do interlocutor a quem se direciona a fala. Mas, de forma geral, a pessoa escolhe a língua que será utilizada. Entenda melhor: o termo bilinguismo pode signifi car a capacidade do indivíduo de se comunicar por duas línguas. De acordo com o dicionário Oxford (2000 apud MEGALE, 2005, p. 1) bilíngue é defi nido como: “capaz de falar duas línguas igualmente bem porque as utiliza desde muito jovem”. 2 LÍNGUA E LINGUAGEM – BREVE CONCEITO A língua é social, ela transforma um povo, uma cultura, uma comunidade, por isso sempre foi interesse de estudos entre os povos. “As línguas não existem sem as pessoas que as falam e a história de uma língua é a história de seus falantes” (CALVET, 2002, p. 12). Os estudos científi cos que envolvem a língua e linguagem é a linguística. Parafraseando nosso mestre em estudos linguísticos Ferdinand Saussure, a linguística tem por único e verdadeiro objeto a língua. No entanto, é comum confundirem os conceitos de língua, fala e linguagem. Terra (1997, p. 13) apresenta a defi nição de língua como: “[...] a linguagem que utiliza a palavra como sinal de comunicação”. Nesse prisma entendemos, então, que a língua é uma característica da linguagem, que pertence a um grupo ou comunidade que, por sua vez, concretiza a sua comunicação através da fala e essa fala está convencionada às regras que estabelecem o uso de uma língua por meio de uma gramática. Como defi nir a linguagem? Epistemologicamente a linguagem é toda forma que o ser humano usa para se comunicar, ou seja, todo sistema formado por um conjunto de signos que serve de meio de comunicação e que podem ser percebidos pelos diversos órgãos dos sentidos (visão, audição, paladar, tato e olfato). Aqui trazemos o conceito de signo trazido por Peirce (2005, p. 46), o signo que constitui a linguagem “é aquilo que, sob certo aspecto ou modo, representa algo para alguém”. 12 Língua brasileira de sinais De acordo com Terra (1997), damos o nome de linguagem a todo sistema de sinais convencionais que nos permite realizar atos de comunicação, podendo ser classifi cada como verbal e não verbal. Além disso, ela pode ser formal como aquelas que encontramos em: (discursos de uma autoridade, apresentação de um trabalho acadêmico etc.); ou informal, aquela mais despojada, espontânea (conversa entre familiares e amigos etc.). É o caso das línguas de sinais, com sua fl exibilidade, permite ser expressa em todos os contextos formais e informais. A língua se mostra mais presente quando a colocamos em prática e a linguagem é um exercício que deve ser feito todos os dias, caso contrário a comunicação pode ter difi culdades de se estabelecer de maneira precisa com os falantes da mesma língua. FIGURA 2 – COMO O CÉREBRO APRENDE FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/287034176236304741/>. Acesso em: 22 dez. 2020. O aprendizado de uma nova língua é sempre complicado de início, mas, com o passar do tempo, fi ca mais fácil apreender outros idiomas. Um dos motivos é que toda língua é composta dos componentes linguísticos e existe a área da sintaxe que estuda as palavras quando estruturadas na frase, e esse componente é parecido em diversas línguas, facilitando o aprendizado de outras línguas. Para o ouvinte que fala a língua oral como nativa, claro que vai existir difi culdade em aprender uma língua sinalizada, principalmente para a transição no momento da tradução e compreensão das palavras, pois a tradução sempre faz relações linguísticas entre os elementos de uma língua e outra. 13 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 O estudo de uma língua sinalizada como Libras é um exercício que exige muita dedicação. É comum encontrarmos pessoas que, logo que aprendem Libras, usam o chamado português sinalizado que é bem diferente da gramática da língua de sinais. Todavia, sem dúvida, a melhor maneira de aprender uma língua depois de se dedicar aos estudos é ter contato com a comunidade usuária dessa língua. Com Libras isso não é diferente, quanto mais contatovocê tiver com os surdos usuários de libras e ouvintes que a usam há mais tempo do que você, melhor para o seu aprendizado. Independentemente do nível em que nos encontramos no aprendizado em Libras (iniciante, intermediário ou avançado), quanto mais treinamos, ganhamos mais confi ança e conhecimento. Nesse contexto, destacamos o tipo de linguagem mais utilizado pelo ser humano, conforme apresentado por Nicola (2009, p. 126), “[...] a linguagem verbal é aquela que utiliza a língua (falada ou escrita)”. O outro é a linguagem verbal que pode ser abordada sob duas modalidades: a língua escrita e a oral, sendo este o código mais usado pelos seres humanos a língua (escrita ou falada). Já a linguagem não verbal, segundo Terra (1997, p. 12), “[...] é aquela que utiliza para atos de comunicação outros sinais que não as palavras”. Na linguagem não verbal há vários códigos que são utilizados para comunicar as mensagens, entre eles símbolos, sons, gestos, mímicas e línguas de sinais. Porém, existe ainda a linguagem mista ou híbrida que envolve uma combinação das linguagens verbais e não verbais. FIGURA 3 – LINGUAGENS FONTE: <https://fi les.cursoenemgratuito.com.br/uploads/2019/08/Linguagem- verbal-n%C3%A3o-verbal-e-mista.jpg>. Acesso em: 20 dez. 2020. 14 Língua brasileira de sinais Sabemos que as Línguas de Sinais (LS) não são consideradas híbridas ou mistas, mas, existe uma parcela de pessoas com defi ciência auditiva que podem utilizar-se de muitos recursos para se comunicar ou se fazer entender, isso porque misturam sinais que não necessariamente estejam de acordo com a gramática de LS, gestos caseiros, mímicas ou mesmo a língua escrita. Entenda melhor: LÍNGUA DE SINAIS NÃO É MÍMICA, isso porque tanto a mímica como as línguas de sinais utilizam o canal viso-espacial para se comunicar e tem uma representação visual para sua exteriorização. Talvez por esse motivo exista a tendência de relacionar as línguas de sinais com a mímica. Desse modo a autora Perlin (2001), ao falar sobre estudos das identidades do povo surdo, reconhece que a comunidade surda também é constituída por aqueles que nasceram ouvintes e que, por alguma eventualidade, perderam a audição e são oralizados. Esses sujeitos vivem constantemente com a necessidade do uso da língua de sinais enquanto socializam com a comunidade surda e com o uso da língua oral quando se comunicam com seus pares ouvintes, mesmo que já não se utilize todos os vocábulos orais como antes de perder a audição. FIGURA 4 – DIVERSIDADE SURDA FONTE: <https://www.facebook.com/maosemacao.surdos/>. Acesso em: 22 dez. 2020. Assim, a linguagem envolve o ato de se comunicar e isso signifi ca ir além de um conjunto de palavras faladas e/ou escritas. Para se chegar à comunicação, implica um processo mental ou o uso da capacidade ou faculdade mental que apenas os seres humanos possuem. Dessa forma a linguagem e a comunicação é um sistema convencionado pelos seres humanos. Estudaremos o trabalho dos profi ssionais em linguística e a língua de sinais a partir de agora, mas antes, acesse o vídeo indicado a seguir e faça uma viagem pelos tipos de linguagens. 15 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Entenda os tipos de linguagens, aproveite e responda os exercícios no fi nal do vídeo intitulado Tipos de Linguagens: Verbal, Não-verbal e mista, disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=YNvdlp3-agQ>. 3 AS LÍNGUAS DE SINAIS E SUAS PROPRIEDADES LINGUÍSTICAS Como já foi apresentado, a língua é uma forma de estabelecer correlações entre um plano de expressão do emissor e um plano de conteúdo do receptor, por meio de um canal, associando sinais materiais a signifi cados mentais. Dessa forma, a língua contribui para a organização do pensamento, fornecendo uma direção por meio dos signos. Portanto, Mengarda (2012, p. 9) mostra que A língua é um aspecto da língua(gem) e trata-se de um sistema de natureza gramatical, pertencente a uma comunidade linguística, formado por um conjunto de signos linguísticos (união do sentido e da imagem acústica) e de regras para a sua combinação que formam palavras, frases e textos com sentido. Entendemos assim, que, segundo o autor, a ausência de um sistema de signos linguísticos e suas regras pode tornar a comunicação limitada. É por isso que os falantes de uma dada língua podem se entender entre si utilizando os mesmos signos. Em conformidade com Penteado (1977, p. 4): Ninguém se comunica consigo mesmo. O clássico exemplo do faroleiro ilustra esse princípio: – Na solidão em que vive, o processo da comunicação humana somente se completa quando o facho de luz – transmissor – atinge o navio que passa – receptor. Enquanto o facho de luz não é percebido de bordo, não existe comunicação humana. Bem, já que ninguém se comunica consigo mesmo, há de haver elementos constituintes para acontecer o processo de comunicação. As autoras Weiss et al. (2018, p. 24) mostram o circuito de comunicação e seus elementos para todas as línguas naturais. Vejam quais são eles a seguir. • EMISSOR: é o remetente, ou seja, o que envia uma mensagem e pode ser uma pessoa ou um grupo, um órgão, uma empresa, um canal de televisão, um site na internet e assim por diante. 16 Língua brasileira de sinais • RECEPTOR: é o destinatário da mensagem, isto é, para quem a mensagem foi ou será enviada. Pode ser para uma pessoa ou para um público-alvo ou ainda um animal ou uma máquina, como o computador. • MENSAGEM: “É o objeto de comunicação, ela é estabelecida pelo conteúdo das informações transmitidas. A mensagem é o elo dos dois pontos do circuito; é o objeto da comunicação humana e sua fi nalidade” (PENTEADO, 1977, p. 5). Chamamos ainda de mensagem o que o emissor transmite e o que o receptor recebe. • CANAL DE COMUNICAÇÃO: meio pelo qual a mensagem pode circular: jornal, revista, televisão, rádio, folheto, folder, outdoor e o próprio ar. • CÓDIGO/SIGNO: o código é o meio através do qual a mensagem é transmitida, isto é, através da fala, da escrita, dos gestos ou das imagens. De acordo com Penteado (1977, p. 5), “[...] um pedaço de papel coberto de garatujas não é uma mensagem, porque é ininteligível, não pode ser percebido pela inteligência”. Em suma, pode-se dizer que é o conjunto de elementos com signifi cado aceitos pelo emissor e receptor. • REFERENTE: é o contexto ou a situação a que a mensagem remete ou ainda é a situação na qual emissor e receptor estão inseridos. Assim, a linguagem adquirirá diversas funções, como a de emocionar, informar, persuadir, fazer refl etir, entre outras. FIGURA 5 – PROCESSO DE COMUNICAÇÃO EM QUALQUER LÍNGUA NATURAL FONTE: <https://pt-static.z-dn.net/fi les/dc8/492c33b47f12e870fdf8b4c5681ccbeb. png>. Acesso em: 20 dez. 2020. 17 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 De acordo com Vygotsky (2000, p. 11), “a comunicação sem signos é tão impossível quanto sem signifi cado”. Assim, quando estamos adquirindo a linguagem, estamos buscando signifi cados para tudo que enxergamos, ouvimos e expressamos a nossa volta e esses signifi cados trazem os conceitos das coisas, ou seja, a ausência de signos (palavras), as quais carregam os signifi cados, implica na impossibilidade de formação de conceitos. O conceito é impossível sem palavras, o pensamento sem conceitos é impossível fora do pensamento verbal; em todo esse processo, o momento central, que tem todos os fundamentos para ser considerado causa decorrente do amadurecimento de conceitos, é o emprego específi co da palavra, o emprego funcional do signo como meio de formação de conceitos (VIGOTSKI, 2009, p. 170). Assim, é através da utilização dos signos, sejam eles verbais ou não, que construímos conceitos e instrumentos culturais e que se defi ne o nosso comportamento diante da sociedade. Porém, é certo que quanto mais cedo a criança estiver em contato com a sua língua natural, de acordo com o seudesenvolvimento e suas capacidades, mais cedo ela se reconhece como indivíduo inserido na comunidade em que vive. Após essa breve contextualização sobre as línguas naturais e como se dá a comunicação, compreendemos que na língua de sinais, não é diferente, também é preciso a internalização dos signos pela criança surda. Campello (2008, p. 7) afi rma que “[...] o ato de “ver” ou de “olhar” o mundo exige uma mediação semiótica, uma interação entre a propriedade suprida pelo signo e a natureza do sujeito que olha ou observa”. Ou seja, acontece o que os linguistas chamam de semiose, que “é a produção de signifi cados, ou seja, o processo de formação de signifi cação onde a semiose é a “ação de qualquer signo” e o signo é “qualquer coisa que age assim” (NÖTH, 1995, p. 66). Vamos entender esse processo para uma pessoa surda, por meio do exemplo a seguir. O surdo que mora com uma família ouvinte come um bolo de laranja, olha o bolo e armazena, em sua mente, apenas o signifi cado, a imagem de um bolo comestível. Entretanto, não sabe o signifi cante, ou seja, do que esse bolo foi feito que está relacionado com o nome deste bolo (laranja). No entanto, se participar da produção desse bolo com todos os ingredientes inclusive com o uso das laranjas, o signifi cante se torna real. Ao discorrer sobre estes dois termos, signifi cante e signifi cado, Martelotta e Wilson (2010, p. 74) explicam que Esses dois elementos constitutivos do signo linguístico apresentam entre si uma relação arbitrária ou imotivada, ou seja, não há entre eles laço natural. Isso signifi ca que, no ato de nomeação, a língua não se reduz a um mero refl exo da 18 Língua brasileira de sinais realidade. Essa relação se estabelece internamente ao sistema linguístico, na relação do signo com outros signos. FIGURA 6 – CIRCUITO DE COMUNICAÇÃO LÍNGUA ORAL VERSUS LÍNGUA DE SINAIS FONTE: <https://pt.slideshare.net/andreconeglian/libras-aspectos- linguisticos-30661546>. Acesso em: 22. dez. 2020. Deste modo, podemos compreender que o desenvolvimento da língua e linguagem, em muito, dependerá da exposição da criança ao ambiente em que vive, a socialização em si, que pode ser presencial ou não, mas, quando essa presença é presencial, a probabilidade para a produção de uma atividade semiótica é mais concreta isso porque ela se realiza por meio de “um conjunto de funções discursivas diversas” (VIGOTSKI, 2009, p. 452). Barros e Café (2012, p. 2) citam que “A Semiótica é a ciência que se dedica ao estudo de todos os signos, nos processos de signifi cação na natureza e na cultura”. Para os surdos usuários nativos de línguas de sinais, dizemos que a semiose, conforme Campello (2008) disserta, acontece por um processo imagético, como assim? Entenderemos melhor contextualizando brevemente um recorte dos estudos da tríade de Peirce (2005), para acontecer a comunicação, segundo o autor, um signo representa alguma coisa para alguém, isso porque a relação entre a tríade, ou seja, o seu representâmen (signo), o seu objeto (imagem) e o seu interpretante (ideia produzida no cérebro). Dessa forma, na visão de Pierce (2005), entende-se um signo como icônico se ele representar um objeto principalmente por meio da similaridade. 19 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Essa interpretação da tríade, segundo Pierce (2005), mostra-nos uma conexão direta entre a língua de sinais e a pessoa que a usa ou o interpretante, dado a importância que, para conhecer e compreender qualquer coisa, a nossa consciência produz um signo, ou seja, um pensamento que é uma mediação irrecusável entre nós e os fenômenos (SANTAELLA, 1983). Sendo assim, muito embora a LS não seja uma língua exclusivamente icônica, a tríade de Pierce (2005) concorda que iconicidade da Língua de Sinais (LS) está na sua capacidade de reproduzir a forma dos objetos, seus movimentos e relação espacial ao se produzir o sinal o que torna a comunicação transparente e permite a motivação entre o signo e o objeto (QUADROS; KARNOPP, 2004). Assim como as línguas orais, já entendemos que as línguas de sinais não são universais, porém existe a possibilidade de se comunicar por meio de uma modalidade comunicacional em sinais chamada Gestuno (pronuncia-se Guestuno), ela é utilizada por diversos surdos e ouvintes de diferentes países. Rosenstock e Napier (2016, p. 4) defi nem o conceito Gestuno como sendo “referenciado aos gestos e ao senso de unidade”. Granado (2019, p. 3) apresenta que, “o Gestuno foi usado pela primeira vez no congresso da WFD na Bulgária e era incompreensível para os participantes surdos”. Aqui no Brasil, o Gestuno é pouco conhecido, mas ainda é utilizado nos encontros internacionais entre as comunidades surdas de todo o mundo, intitulando-se como Sinais Internacionais (SI). WFD signifi ca World Federation of the Deaf (Federação Mundial de Surdos). O Gestuno não pode ser considerado uma língua por várias razões, entre elas estão: “(1) não possui gramática própria; (2) não existem usuários nativos do Gestuno; (3) pouquíssimas pessoas são fl uentes nesta modalidade de comunicação, somente quando há oportunidade de usar ou praticar. (GRANADO, 2019, p. 3). Visto que a necessidade de se comunicar é universal, é importante que mesmo que estejamos nos comunicando com pessoas que falam outra língua, entendamos o que o outro diz. No caso de Língua de Sinais, vimos que o Gestuno ou as línguas de sinais internacionais cumprem esse papel, mostrando toda 20 Língua brasileira de sinais fl exibilidade, versatilidade, toda sua criatividade e produtividade entre outras características linguísticas. Na tabela a seguir é possível ver algumas das Línguas de sinais existentes pelo mundo. TABELA 1 – LÍNGUA DE SINAIS PELO MUNDO FONTE: <http://www.cidadaopg.sp.gov.br/cursonline/fi les/material_ apoio/2-libras-lingua-brasileira-de-sinais/Apostila_Libras_Curso_ Online_Seduc_PG.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2020. Embora a nossa língua de sinais seja conhecida como Língua Brasileira de sinais (Libras), Sassaki (2003) mostra que, “no índice linguístico internacional, os idiomas naturais de todos os povos do planeta recebem uma sigla de três letras como ASL (American Sign Language). Tal preocupação ainda não parece ter chegado na esfera do Brasil” (SASSAKI, 2003, p. 4). Porém, os linguistas a reconhecem como Língua de Sinais Brasileira (LSB). Diante dos contextos mencionados até aqui, entre a comparação das línguas orais e língua de sinais, trazemos as propriedades linguísticas das línguas de sinais por Quadros e Karnopp (2004 apud CAMPELLO, 2011). Observe a seguir e entenda por meio de exemplos que adaptamos para você segundo a explicação da autora: a) Flexibilidade e versatilidade: a língua de sinais, como outras línguas faladas, tem suas características próprias e signifi cativas. Diferentemente de outros códigos ou sistemas de comunicação, como o sistema de comunicação de teatro ou de mímica, a língua de sinais pode ser utilizada como meio de persuasão, de sugestão, de pedido, de ordenamento, de elaboração do pensamento no futuro, para fazer planos, emitir diversas 21 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 opiniões, cantar uma música rap ou hip-hop, infl uenciar a decisão dos outros e tudo o que existe na comunicação no dia a dia. Um exemplo de fl exibilidade e versatilidade são as poesias e músicas em libras. FIGURA 7 – EXEMPLO DE POESIA – DIA INTERNACIONAL DA MULHER POR RIMAR SEGALA FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=ZjVnIV1wDmE>. Acesso em: 22 dez. 2020. Veja alguns exemplos de poesias produzidas pelos próprios surdos e que tal após sua pesquisa fazer sua própria poesia em Libras? • Poesia e cultura própria dos Surdos em Libras, disponível em: <https:// www.youtube.com/watch?v=G4en44VX5QE>. • “Voo sobre Rio”, de Fernanda Machado, disponível em: <https:// cotidiano.sites.ufsc.br/cultura-surda-conheca-a-poesia-em-libras/>.• Poesia surda para sempre (libras), disponível em: <https://www.youtube. com/watch?v=M3-YzIzkPxU>. Hoje é muito comum por meio das redes sociais se ter acesso a músicas e histórias, fábulas interpretadas em libras por ouvintes e surdos. Confi ra algumas delas a seguir: • Rebeca Nemer Trem Bala (Ana Vilela) “LIBRAS” (ouvinte), disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=YYE4a1h_1wI>. • Chapeuzinho vermelho em Libras-INES, por Heloise Gripp Diniz (surda), disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=JuCVU9rGUa8>. 22 Língua brasileira de sinais b) Arbitrariedade: Os sinais da língua de sinais (os signos linguísticos) são convencionados e reconhecidos pela comunidade Surda, portanto, todos os sinais convencionados são arbitrários. Isso possibilita o enriquecimento da fl exibilidade e versatilidade da língua com o uso das imotivações entre a forma e o signifi cado; e motivação entre a forma e o signifi cado (iconicidade). Também existem atualmente as variações linguísticas de sinais de cada estado do Brasil, assim como as palavras da língua falada” (QUADROS; KARNOPP, 2004 apud CAMPELLO, 2011, p. 24). As características de arbitrariedade e iconicidade estão relacionadas diretamente aos estudos das línguas naturais. Nesse contexto, refl etimos sobre o conceito apresentado por França e Lage (2013, p. 6) “A arbitrariedade se refere à relação de pareamento forma-conteúdo, essencial para a linguagem”. Entenda melhor: [...] a língua é arbitrária, isto é, convencional, pois entre o nome e as ideias ou as coisas designadas não há transparências ou similaridade. Sócrates, por sua vez, tem o papel de fazer a integração entre os dois pontos de vista (MARTELOTTA; WILSON, 2010, p. 71). Note o exemplo dessa propriedade icônica e arbitraria nas fi guras a seguir. FIGURA 8 – EXEMPLO DE ARBITRARIEDADE FONTE: <http://www.cidadaopg.sp.gov.br/cursonline/fi les/material_ apoio/2-libras-lingua-brasileira-de-sinais/Apostila_Libras_Curso_ Online_Seduc_PG.pdf>. Acesso em: 22. dez. 2020. 23 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 FIGURA 9 – VARIAÇÃO LÍNGUISTICA DO SINAL VERDE EM LIBRAS FONTE: <https://www.slideshare.net/Marinelia/5-parmetros-da-libras>. Acesso em: 22 dez. 2020. c) Descontinuidade: apresenta sinais distintos entre eles e seus signifi cados são descontinuados através de parâmetros e níveis linguísticos diferentes. Esses sinais não permitem a confusão entre os signifi cados apresentados dentro do contexto no qual será sinalizado. Sobre a descontinuidade, Quadros et al. (2009) mostra que Na língua de sinais verifi camos o caráter descontínuo da diferença formal entre a forma e o signifi cado. Há vários exemplos que ilustram isso, por exemplo, o sinal de ‘MORENO’ e de ‘SURDO’ são realizados na mesma locação, com a mesma confi guração de mão, mas com uma pequena mudança no movimento, mesmo assim nunca são confundidos ao serem produzidos em um enunciado [...] (QUADROS et al., 2009, p. 10). Veremos os exemplos dos sinais ESTE, ESSE E AQUELE que tem a mesma confi guração de mãos como se fosse a LETRA G e na tabela do parâmetro confi guração de mãos (CM) LSB (fi gura a seguir) se refere a CM número (14), mas, o movimento e o ponto de articulação muda, o que resulta em sinais diferentes. Dessa forma, a descontinuidade pode ser uma mudança de unidade bem mínima, sem provocar uma importante diferença no signifi cado do sinal, não havendo confusão na compreensão do sinal e da mensagem. 24 Língua brasileira de sinais Fique atento, nos próximos capítulos, você irá se aprofundar nos parâmetros de Línguas de Sinais (LS), inclusive conhecerá mais tabelas de CM, pois conforme os sinais são criados, novas CM também são criadas. FIGURA 10 – CONFIGURAÇÃO DE MÃOS – LSB FONTE: <http://tertuliasdelibras.blogspot.com/2015/11/ confi guracoes-de-maos.html>. Acesso em: 22 dez. 2020. 25 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 FIGURA 11 – EXEMPLO DE SINAIS QUE MANTÊM SUA DESCONTINUIDADE SEM CONFUNDIR OS SIGNIFICADOS FONTE: <http://www.cidadaopg.sp.gov.br/cursonline/fi les/material_ apoio/2-libras-lingua-brasileira-de-sinais/Apostila_Libras_Curso_ Online_Seduc_PG.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2020. d) Criatividade e produtividade: Os sinais podem ser produzidos em infi nitas sentenças seguidos de um conjunto fi nito de regras gramaticais da língua de sinais. São produtivas e criativas, assim como quaisquer outras línguas de diversas modalidades (escrita, visual, falada, retórica etc.). Um exemplo é a literatura em escrita de sinais (SW) que é um exemplo clássico de toda criatividade e produtividade em Língua de sinais, conforme é possível observar na fi gura a seguir (QUADROS; KARNOPP, 2004 apud CAMPELLO, 2011, p. 27). FIGURA 12 – SINAIS DE LITERATURAS SURDA FONTE: <https://escritadesinais.wordpress.com/2010/08/30/ cinderela%C2%A0surda-e-rapunzel-surda/>. Acesso em: 22 dez. 2020. CINDERELA SURDA RAPUNZEL SURDA e) Dupla articulação: A língua de sinais só funciona quando as duas articulações formam uma combinação. Por exemplo, uma unidade mínima por si só não tem signifi cado, mas quando juntar outra unidade mínima, qualquer que seja a Confi guração de Mãos, Ponto de Locação ou Movimentos pode dar signifi cado e sentido. 26 Língua brasileira de sinais Lyons (1981) refere-se a essa característica da língua como “a propriedade de (a língua) possuir dois níveis de estrutura, de tal forma que as unidades do primeiro são compostas de elementos do segundo e cada um dos dois níveis tem seus próprios princípios de organização” (LYONS, 1981, p. 32) Um exemplo é a palavra: “AVISAR” que para ser formada acontece a junção das três unidades mínimas, veja na fi gura a seguir (QUADROS; KARNOPP, 2004 apud CAMPELLO, 2011, p. 27). FIGURA 13 – EXEMPLO DE DUPLA RTICULAÇÃO SINAL DE AVISAR FONTE: Capovilla e Raphael (2001, p. 348) Percebemos assim que os elementos ou as unidades mínimas que compõem o sinal, sozinhos, não possuem signifi cado algum, porém, quando todos eles se juntam, podem dar um signifi cado ao sinal ou à palavra. f) Padrão: a língua de sinais tem um conjunto de regras convencionadas pela comunidade Surda e não pode ser produzida de modo incorreto. Assim as regras devem ser observadas visualmente. Caso contrário, o sinal é produzido de maneira errada. Observe os exemplos a seguir do sinal AJUDAR, que deverá ser feito com uma mão em CM ‘S’ e a outra mão aberta, com os dedos juntos e encostando em cima da primeira mão, realizando um movimento de ambas as mãos para frente. Esse é um padrão do sinal AJUDAR, não podendo ser alterados os seus componentes ou unidades mínimas, se não o sinal se torna incorreto. É o caso da fi gura a seguir em que o parâmetro Ponto de articulação (PA) está no local diferente mudando totalmente a grafi a correta do sinal AJUDAR. Além disso, caso não siga o padrão correto do sinal ao formar uma sentença o teor da mensagem fi cará prejudicado. 27 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 FIGURA 14 – EXEMPLOS DE SINAIS COM REGRAS NÃO CONVECIONADAS E CONVENCIONADAS FONTE: <fi le:///D:/Downloads/2012_FabianeEliasPagy.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2020. a) Dependência estrutural: a língua de sinais, assim como outras línguas, tem suas relações estruturais entre os elementos e não ocorrem ao acaso ou aletoriamente, correndo o risco de não serem compreendidos. Isso pois, segundo Pagy (2012, p. 58), “Na Libras, como nas outras línguas de sinais, é necessário que os sinais sejam combinados corretamente, respeitando as regras e os critérios gramaticais daquela língua, tornando compreensível a mensagem para os participantes”. Assim, inicialmente, veremos os exemplos da Glosas em Libras. Observe a dependência de estrutura gramatical mesmo sem ela estar sendo sinalizada. Na primeira frase, o indivíduo de nome JÚLIO ama ou AMAR (no infi nitivo), por isso o verboAMAR fi ca como aspecto durativo, ou seja, TEM intensidade. Já na segunda frase o verbo AMAR vem antes de JÚLIO, porém não perde o sentido do aspecto durativo. • J-Ú-L-I-O AMAR ++++ (aspecto durativo) • AMAR++++ (aspecto durativo) J-Ú-L-I-O Wilcox e Wilcox (1997) defi nem glosa como sendo uma tradução simplifi cada de morfemas da língua sinalizada para morfemas de uma língua oral. 28 Língua brasileira de sinais Apresentamos também um exemplo de dependência estrutural gramatical, dessa vez sinalizada. Veja que é necessário que os sinais sejam combinados corretamente, respeitando as regras e critérios gramaticais em Libras, tornando compreensível a mensagem pelos interlocutores. Se formos fazer a tradução para a língua portuguesa escrita, fi caria assim: eu gosto de maçã e banana. FIGURA 15 – EXEMPLO DE SENTENÇA COM ESTRUTURA GRAMATICAL EM LIBRAS FONTE: <fi le:///D:/Downloads/2012_FabianeEliasPagy.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2020. Percebemos que tanto em Libras como na LP, seja para ouvintes ou surdos, a mensagem é perfeitamente entendida. Isso quer dizer que houve uma dependência estrutural tanto no primeiro exemplo em GLOSA, como no segundo exemplo sinalizado. Todo esse escopo linguístico a respeito das propriedades de Línguas de sinais nos fornece evidências claras de que as línguas de sinais são utilizadas para pensar, desempenhar diferentes funções, comunicar-se, enfi m, infi nitas possibilidades oferecidas por uma língua natural, assim como as línguas orais. 29 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Veja o que encontramos para você: um curta infantil intitulado Descobrindo Branca de Neve e os Sete Anões em sinais internacionais. Acesse-o em: <https://www.youtube.com/ watch?v=c8k-kPyDhxg&t=29s> e conheça mais sobre o Gestuno ou Sinais Internacionais – SI. 1 Ao refl etir sobre a língua e a linguagem, Mengarda (2012, p. 12) diz que se trata de um sistema de natureza gramatical, [...] formado por um conjunto de signos linguísticos [...]. No que diz respeito a determinar o que é uma linguagem natural e uma língua natural, analise as proposições a seguir: I- A linguagem como capacidade de expressão dos seres humanos é natural. II- Os humanos desenvolveram na fase adulta a aparelhagem anatômica que lhes permite falar. III- As línguas são convencionais (icônicas e arbitrárias). IV- A linguagem surge somente de condições históricas, ou seja, são fatos culturais. Estão corretos somente os itens: a) ( ) I e III. b) ( ) II e III. c) ( ) I e II. d) ( ) I e IV. e) ( ) II e IV. 2 Considerando o que você constatou nos estudos de Campello (2011) e Quadros et al. (2009) sobre a propriedade de descontinuidade nas línguas de sinais, descreva em suas palavras essa característica. 3 A arbitrariedade dentro dos estudos linguísticos em LS está convencionada e reconhecida pela comunidade Surda. A respeito 30 Língua brasileira de sinais do conceito de arbitrariedade, França e Lage (2013, p. 6) mostram que “A arbitrariedade se refere à relação de pareamento forma-conteúdo, essencial para a linguagem”. Considerando esse contexto, analise as sentenças a seguir: I- A arbitrariedade possibilita o enriquecimento da fl exibilidade e versatilidade da língua com o uso das imotivações entre a forma e o signifi cado. II- A motivação entre a forma e o signifi cado (iconicidade) não faz parte da arbitrariedade em LS. III- A arbitrariedade está nos estudos das variações linguísticas de sinais de cada estado do Brasil, assim como as palavras da língua falada. IV- As características de arbitrariedade e iconicidades estão relacionadas diretamente aos estudos das línguas naturais. Estão corretos somente os itens: a) ( ) Alternativas I, III e IV. b) ( ) Alternativas II e III. c) ( ) Alternativas I, II e III. d) ( ) Alternativas III e IV. 3.1 CENÁRIO DO PROFISSIONAL EM LINGUÍSTICA E AS LÍNGUAS DE SINAIS As línguas de sinais (LS) sugiram de forma espontânea na interação entre pessoas das mesmas comunidades, por isso ela é considerada natural. Além disso, sua estrutura gramatical permite expressar qualquer conceito, desde o mais simples até o mais complexo. Seus usuários podem utilizar os mecanismos estruturais que toda língua natural oferece para atingir seus objetivos linguísticos. Isso acontece pois, como todas as línguas de sinais, possui uma gramática própria, defi nida pelos seguintes sistemas: Quirológico (mãos); Morfológico (palavra/sinal ou item lexical); sintático (frase); Semântico (signifi cado) e Pragmático (uso do signifi cado/sentido). 31 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Campello (2011) mostra que o Dr. William C. Stokoe Jr. foi o primeiro a trabalhar diferente, mudando a mentalidade da área linguística sobre as LS, apresentando uma análise descritiva da Língua de Sinais Americana, através da metodologia transcrição de língua de sinais. Isso possibilitou, pela primeira vez, um linguista apresentar os elementos linguísticos de uma língua de sinais. Assim, as línguas de sinais passaram a ser vistas como línguas de fato e de direito linguístico da comunidade Surda. Em seus estudos, Stokoe (1960) deu ênfase aos três primeiros parâmetros e, depois de estudos posteriores, foram inseridos os elementos de Orientação direcionalidade (OD) e expressão facial e corporal/expressões não manuais (EF/C) foram inseridas como segundo parâmetro ou parâmetro complementar para formar e dar sentido aos sinais. FIGURA 16 – FOTOGRAFIA DE DR. WILLIAM C. STOKOE JR. FONTE: <http://repositorio.unicentro.br:8080/jspui/bitstream/123456789/1467/1/ STREIECHEN_Libras.pdf>. Acesso em: 25 dez. 2020. 32 Língua brasileira de sinais QUADRO 1 – PEQUENA BIOGRAFIA DO DR. WILLIAM C. STOKOE JR. Stokoe (1920-2000) era um linguista escocês que vivia e trabalhava nos Estados Unidos. Em 1955, ele se tornou professor do Departamento de Inglês do Gallaudet College, hoje conhecida como Gallaudet University. Nessa época, ele nada sabia de Língua de Sinais Americana (ASL). Ele teve que aprender alguns sinais, que usava ao mesmo tempo em que dava suas aulas em inglês, como a maioria dos outros professores. Nessa época, nem na Gallaudet havia aulas de ASL, pelo simples fato de que ninguém, nem mesmo os surdos, consideravam a sinalização como parte de uma língua autônoma. Stokoe não demorou a perceber que existia uma diferença entre a sinalização que ocorria quando um surdo se comunicava com outro e a que ele usava como acompanhamento de palavras em inglês, durante suas aulas. Por isso, Willian Stokoe é considerado o pai da Linguística da Língua de Sinais Americana (ASL). FONTE: <http://repositorio.unicentro.br:8080/jspui/bitstream/123456789/1467/1/ STREIECHEN_Libras.pdf>. Acesso em: 25 dez. 2020. De acordo com Campello (2011, p. 7) Os linguistas têm utilizando os termos fonética e fonologia para tratar de fenômeno natural ou social observável cientifi camente nas línguas de sinais, desconsiderando o signifi cado de sua raiz, fon-, que é som, elemento ausente da estrutura da língua de sinais americana. Stokoe, em 1965, no evento internacional de linguistas, propôs o termo “quirema”, retornando a pesquisa do Bulwer (1644), em substituição à terminologia “fonema”, para designar elementos linguísticos de língua de sinais. No início das pesquisas em línguas de sinais, suas unidades mínimas – Confi guração de Mãos (CM), Movimento (M), Ponto de Articulação (PA) – foram chamadas de "quiremas" (do grego, mãos). No entanto, nos estudos atuais sobre as LS, os pesquisadores têm usado o termo fonema para se referir não somente aos sons de uma língua, mas também às unidades menores que compõem os sinais (SILVA, 2011). 33 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 FIGURA 17 – ESTUDOS QUIROLÓGICOS EM (LO) VERSUS (LS) FONTE: <https://docplayer.com.br/15212897-Anais-2010-issn- 1808-3579-fonologia-da-libras-parametros-formacionais-da-lingua-brasileira-de-sinais-resumo.html>. Acesso em: 22. dez. 2020. O termo QuirEma (do grego xépi ou khéri: mão; nua ou ema; unidade mínima) foi cunhado por Stokoe (1960), para representar o correspondente, em língua de sinais, do FonEma em língua falada. Desse modo, o QuirEma estaria para a unidade da sinalização, assim como o fonema está para unidade da fala ou voz (CAPOVILLA; GARCIA, 2011, p. 85). Como toda língua natural, o alfabeto com suas letras e numerais também fazem parte da LS, ele é utilizado para soletrar ou (digitar) manualmente as palavras. É um recurso muito utilizado por falantes da língua de sinais, principalmente, para soletrar nomes próprios de pessoas ou lugares, siglas e algum vocábulo ainda não existente na língua de sinais. 34 Língua brasileira de sinais FIGURA 18 – ALFABETO EM LIBRAS E NUMERAIS FONTE: <https://pbs.twimg.com/media/A4EModvCYAIIh3v.jpg>. Acesso em: 25. dez. 2020. No entanto, enfatizamos que o fato de as línguas de sinais serem reconhecidas pelos estudiosos na área como uma língua que satisfaz todos os critérios científi cos para ser uma língua, por si só se constitui uma língua natural, ela é natural por ser a língua das comunidades Surdas. Veja o exemplo da nossa Língua Brasileira de Sinais – Libras, ela se torna a língua natural e materna dos surdos brasileiros, visto que é o meio que expressa de forma espontânea, suprindo todas as necessidades linguísticas para efetivar a comunicação com o meio em sua volta. Além disso, a nossa língua de sinais, a Libras, não é subordinada à Língua Portuguesa inclusive seu alfabeto, mas, assim como a aquisição de qualquer língua, é necessário passar por um processo cognitivo para o seu aprendizado. A partir de agora, conheceremos alguns linguistas que contribuíram grandemente para divulgação das línguas de sinais pelo mundo. Os primeiros pesquisadores linguistas surdos norte-americanos que se tem notícia foram Ted Supalla e Carol Padden. 35 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 QUADRO 2 – LINGUISTA SURDA CAROL PADDEN FONTE: <https://www.libras.ufsc.br/colecaoLetrasLibras/eixoFormacaoEspecifi ca/ linguaBrasileiraDeSinaisI/assets/459/Texto_base.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2020. Aqui no Brasil, podemos dizer que o primeiro pesquisador autodidata da Língua de Sinais Brasileira foi Flausino José da Gama, ex-aluno e repetidor do Instituto Nacional de Surdos-Mudos, atual Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES (Rio de Janeiro). Autodidata, pois ele não era formado em linguística, mas seu interesse nos estudos e divulgação das línguas de sinais ultrapassaram as barreiras acadêmicas. Assim, junto com o diretor do Instituto Nacional de Surdos-Mudos, publicou, em 1875, o livro intitulado Iconographia dos Signaes dos Surdos-Mudos, contendo fi guras dos sinais copiados da Língua de Sinais Francesa e legendas traduzidas para o português. O objetivo da produção do livro era difundir para a comunidade ouvinte a necessidade de aprender a Língua de Sinais Brasileira para poder comunicar-se com os Surdos brasileiros. Campello (2011) também demonstra que a introdução do sistema linguístico no Brasil, de língua de sinais, foi realizada pela linguista Lucinda Ferreira de Brito por volta dos anos 1980, famosa pelo pioneirismo em pesquisas com o livro Por uma Gramática Línguas de Sinais e desde então vem sofrendo várias adaptações por meio de pesquisas por vários estudiosos surdos e ouvintes, tendo contemporâneos de pesquisadores europeus. 36 Língua brasileira de sinais FIGURA 19 – LIVRO LUCINDA FERREIRA DE BRITO FONTE: <https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/ I/81kWbRXMqlL.jpg>. Acesso em: 22 dez. 2020. Atualmente, temos uma gama de material disponível para pesquisas em Libras, graças a estudiosos como as professoras surdas Myrna Salerno, Ana Regina e Souza Campello, Heloise Gripp Diniz, famosa pelas histórias interpretadas em Libras no INES, Nayara de Almeida Adriano, Ronice Muller de Quadros, que é outra grande pesquisadora da linguista em LS, buscando subsídios na Língua de sinais americana e adaptando suas pesquisas para nossa língua de sinais brasileira (LSB). FIGURA 20 – PESQUISADORA SURDA HELOISE GRIPP D. FONTE: <https://i.ytimg.com/vi/_zZWTfg7bxQ/mqdefault.jpg>. Acesso em: 22 dez. 2020. 37 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Além disso, Santos e Queriquelli (2018) destacam pesquisadores surdos como a professora Shirley Vilhalva, mestre em linguística, grande precursora dos estudos de língua de sinais indígenas brasileiras; e a professora Marianne Stumpf, doutora em Informática da Educação, com pós-doutorado na Universidade Católica Portuguesa, líder do grupo de pesquisa de estudos sobre o SignWriting no Brasil. FIGURA 21 – PESQUISADORAS EM LIBRAS – MARIANNE STUMPF (ESQUERDA); SHIRLEY VILHALVA (DIREITA) FONTE: <http://karinfeneis.blogspot.com/2009/06/>. Acesso em: 21 dez. 2020. Entre os professores ouvintes linguistas que se dedicam aos estudos das línguas de sinais, destacamos Fernando César Capovilla e Walkiria Duarte Raphael e outros pesquisadores da USP, frutos de um vasto programa de pesquisas em lexicografi a e lexicologia de Libras iniciado em 1994, no Laboratório de Neuropsicolinguística Cognitiva Experimental do Instituto de Psicologia da USP, tendo como coordenador o professor Fernando Cesar Capovilla, com desdobramentos de outras publicações na área. Eles são famosos por conta do dicionário trilíngue (Libras, inglês e Língua portuguesa) e seus verbetes, que hoje já está na terceira edição, pois novos sinais foram criados pela comunidade surda brasileira e inclusos. Entenda como funcionam as pesquisas que iniciaram há mais de 20 anos para a produção do dicionário trilíngue pela USP, acessando o site a seguir: <https://jornal.usp.br/cultura/dicionario-da-lingua-de- sinais-exigiu-25-anos-de-pesquisas/>. 38 Língua brasileira de sinais Audrey Gesser é autora do famoso livro intitulado LIBRAS? Que língua é essa?. Nessa obra, a autora desmitifi ca vários mitos como o fato de muitas vezes as línguas de sinais apresentarem formas icônicas em sua característica, como se fossem desenhos do referente no ar, talvez fazer com que elas sejam consideradas por alguns como uma língua agrafa, sem escrita. A autora deixa claro nesse livro que isso é um mito e, mais tarde, outros pesquisadores provaram que é possível escrever em língua de sinais. FIGURA 22 – LINGUISTA AUDREY GESSER FONTE: <https://www.facebook.com/ofi cinalibras/>. Acesso em: 25 dez. 2020. De forma que os autores sugeridos neste tópico apresentaram muitas informações sobre a língua de sinais daqui do Brasil, mostrando respeito à nomenclatura e a sua sigla de Língua de Sinais Brasileira (SBL). Concordando com o estudioso em inclusão, Sassaki (2003, p. 4) apresenta que Libras é um termo consagrado pela comunidade surda brasileira e com o qual ela se identifi ca. Ele é consagrado pela tradição e é extremamente querido por ela. A manutenção deste termo indica nosso profundo respeito para com as tradições deste povo que desejamos ajudar e promover, tanto por razões humanitárias quanto de consciência social e cidadania. Destacamos também que a iconicidade não é exclusividade das línguas de sinais, isso mesmo! As línguas orais também têm suas formas icônicas, por exemplo, quantas vezes, para falar o nome de um objeto, passamos a descrever oralmente as formas daquele objeto? Outro ponto é que a iconicidade das línguas de sinais também não é universal, mas, cada língua de sinais representa seus 39 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 referentes, ainda que de forma icônica, porém convencionalmente, pois cada lugar ou pais vê os objetos e eventos representados em seus sinais ou palavras sob perspectivas diferentes. Entenda melhor com os estudos de Brito (1995), do sinal de ÁRVORE, que em Língua Brasileirade sinais – Libras representa o tronco da árvore através do antebraço e os galhos e as folhas através da mão aberta e do movimento interno dos seus dedos. Já o conceito de ÁRVORE em CSL (língua de sinais chinesa) é representado como o tronco com as duas mãos semiabertas e os dedos dobrados de forma circular. Assim, muito embora os sinais icônicos estão intrinsecamente na gramática das línguas de sinais – LS, cada língua de sinais de cada país convenciona seus sinais conforme sua cultura, seus costumes, seu povo. Esse é um dos motivos de as línguas de sinais não serem consideradas universais, cada país possui sua própria língua de sinais. FIGURA 23 – ÁRVORE EM LIBRAS E LSC FONTE: <https://www.slideshare.net/Marinelia/5-parmetros- da-libras>. Acesso em: 22 dez. 2020. Que tal aumentar seus conhecimentos com a leitura a seguir? No artigo intitulado Um olhar sobre os aspectos linguísticos da língua brasileira de sinais, a autora apresenta um recorte dos estudos de pesquisas apresentando características de uma língua natural. Disponível em: <http://www.periodicoseletronicos.ufma.br/ index.php/littera/article/view/299>. 40 Língua brasileira de sinais Observamos que as línguas de sinais são capazes de criar palavras e estruturar novas sentenças a partir de palavras ou sinais já existentes. Dessa forma, durante o estudo deste material, veremos mecanismos gramaticais relacionados às línguas de sinais; enfatizando a nossa Língua sinais (LIBRAS); trazendo algumas semelhanças com a nossa língua portuguesa, tais como a variação linguística; e enfatizando suas diferenças, como a modalidade espacial/ visual e não falada. Todas essas colocações serão discutidas nos capítulos deste material, por meio de tópicos e subtópicos, teorizando e descrevendo os aspectos gramaticais da LIBRAS, raciocinando por meio de exemplos. Que tal pesquisar os alfabetos de outros países? Visite o SignumWeb, por meio do link a seguir: <https://blog.signumweb.com. br/curiosidades/linguas-de-sinais-pelo-mundo/> 1 A pesquisa de Stokoe (1960), na qual foram descritas as unidades mínimas constituintes dos sinais da Língua de Sinais Americana (ASL), foi fundamental para que se construísse uma nova compreensão a respeito das línguas de sinais em todo o mundo. Em relação à Língua de Sinais e sua estrutura gramatical, analise as sentenças a seguir. I- A modalidade gestual-visual-espacial pela qual a LIBRAS é produzida, muitas vezes, faz as pessoas pensarem que todos os sinais são o “desenho” no ar do referente que representam. II- Por decorrência da natureza linguística das línguas de sinais, a realização de um sinal pode ser motivada somente pelas características icônicas. III- A grande maioria dos sinais da LIBRAS é arbitrária, não mantendo relação de semelhança alguma. IV- As línguas de sinais possuem uma gramática própria, defi nida pelos sistemas: Quirológico (mãos); Morfológico (palavra/sinal ou item lexical); Sintático (frase); Semântico (signifi cado); e Pragmático (uso do signifi cado/sentido). Sobre as afi rmações acima, pode-se afi rmar que: 41 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 a) ( ) I, III e IV estão corretas. b) ( ) I e III estão corretas. c) ( ) Todas estão corretas. d) ( ) II, III e IV estão corretas. 2 A imagem representa um exemplo de iconicidade por quê? FONTE: CAPOVILLA, F.C; RAPHAEL, W.D. Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngue da Língua de Sinais Brasileira. Volume I: Sinais de A a L (Vol 1, pp. 1-834). São Paulo, SP: Edusp, Fapesp, Fundação Vitae, Feneis, Brasil Telecom, 2001. a) ( ) Sendo o sinal de igreja, pode-se perceber a semelhança ao formato convencional de uma torre de igreja. b) ( ) Sendo o sinal de rezar, indica como devem ser colocadas as mãos como se estivessem fazendo uma oração. c) ( ) O sinal é de pássaro, pois pode-se perceber a semelhança com o bico de uma ave nas mãos. d) ( ) Sendo o sinal de casa, pode-se perceber as mãos fechando semelhante com um telhado. 3 Os parâmetros primários ou as unidades mínimas em LS, Confi guração de Mão (CM), Locação da mão (L) e Movimento da mão (M) descobertos pelo linguista Stokoe (1960), contribuíram para o status das línguas naturais para comunidade Surda. Considerando esse contexto, assinale V para verdadeiro e F para falso. ( ) Esses parâmetros precisam estar sendo utilizados juntos para se formar o sinal. ( ) Esses parâmetros estão relacionados aos estudos fonológicos aplicados em LS. ( ) Eles não disponibilizam signifi cados de forma isolada. ( ) Os parâmetros só existem quando as línguas de sinais são escritas. Assinale a seguir a resposta CORRETA: a) ( ) V – V – V – F. b) ( ) F – V – V – F. 42 Língua brasileira de sinais c) ( ) V – F – F – V. d) ( ) F – V – F – V. 4 BILINGUISMO: O FATOR LINGUÍSTICO NA APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA SURDA No Brasil há hoje muitas escolas consideradas bilíngues que se propõe a oferecer como componente curricular o ensino de duas línguas durante todo o processo de aprendizagem concomitantemente ao aprendizado da língua materna desde os primeiros anos de escolaridade. Nesse contexto cabe considerar o conceito de bilinguismo: “um comportamento linguístico psicológico e sócio-cultural complexo e com aspectos multidimensionais” (BUTLER; HAKUTA, 2004, p. 114). Quando a criança é imersa desde muito cedo a uma proposta educacional bilíngue são […] indivíduos ou grupo de pessoas que obtêm habilidades comunicativas em diversos níveis de profi ciência, nas formas oral e escrita, com o propósito de interagir com falantes de uma ou mais línguas em uma determinada sociedade. [...] No qual dois ou mais códigos linguísticos (incluindo dialetos) são utilizados para a comunicação (BUTLER; HAKUTA, 2004, p. 115). Assim entendemos que o ensino bilíngue favorece as crianças em muitos aspectos, seja ele no âmbito familiar, social e acadêmico. No caso da comunidade surda, o bilinguismo propõe as Línguas de sinais como L1 ou primeira língua dessa comunidade e a segunda língua para o sujeito surdo ou L2, ou seja, no nosso país, a Língua Portuguesa na modalidade escrita. Essa proposta está em conformidade com a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que reconhece a Libras como meio legal de comunicação e expressão da comunidade Surda, defi nindo-a como um sistema linguístico de natureza visual- motora, com estrutura gramatical própria, que proporciona a transmissão de ideias e fatos pelas e para as pessoas surdas. 43 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 O Decreto nº 5.626/2005 regulamenta a lei de Libras e que a educação de surdos no Brasil deve ser bilíngue, garantindo o acesso à educação por meio da Língua de Sinais como primeira língua (L1) e o ensino da língua do grupo ouvinte majoritário, no caso a Língua Portuguesa, como segunda língua (L2). Conforme Brasil (2005), capítulo IV do uso e da difusão das libras e da língua portuguesa para o acesso das pessoas surdas à educação, inciso II, é obrigatório “ofertar [...] desde a educação infantil, o ensino da Libras e da Língua Portuguesa, como segunda língua para alunos surdos”. FIGURA 24 – ENSINO BILÍNGUE PARA CRIANÇA SURDA FONTE: <http://autobiografi ajoselito.blogspot.com/2016/11/ blog-post_52.html>. Acesso em: 22 dez. 2020. Embora, sempre houvesse os defensores do Bilinguismo como proposta de comunicação e educação dos surdos, ele só foi reconhecido a partir da década de 80. Partiu-se de pesquisas que mostraram que as Línguas de sinais é a língua materna/nativa para o sujeito surdo, devido as suas características gestuais e visuais compensando qualquer problema imposto pela defi ciência auditiva. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva – PNEEPI propõe uma nova concepção de escola, em que os princípios da inclusão são a base da educação (BRASIL, 2008). Dessa forma a construção de uma sociedade inclusivarequer que as escolas regulares desenvolvam meios efi cazes de combater atitudes discriminatórias, visando ao desenvolvimento pleno de todos os alunos o que inclui os surdos. A fi losofi a bilíngue também propõe que a criança surda tenha contato com surdos adultos fl uentes em Língua de Sinais para que estes lhe sirvam de modelo, ajudando na construção de uma identidade surda e para que se reconheça como participante de uma comunidade linguística igualmente aos ouvintes, sem deixar de participar da comunidade ouvinte. 44 Língua brasileira de sinais Além disso, alunos surdos incluídos em escolas regulares, nas turmas comuns, podem contar com o apoio do intérprete educacional em sala de aula e frequentar a Sala de Recursos Multifuncional – SRM, no contraturno, instituída pela lei Brasil (2009) que tem como objetivo apoiar e ofertar o Atendimento Educacional Especializado (AEE), que complementa o aprendizado do aluno surdo na modalidade escrita da L2 e a presença do instrutor ou professor surdo, que também podem atuar na sala regular (SR) como modelo de representação linguística e se necessário também “ensinar” a Libras contextualizando em diversas situações. Conforme Lacerda e Góes (2000, p. 53-4) A Educação Bilíngue reconhece que a criança surda terá um desenvolvimento cognitivo-linguístico equivalente ao da criança ouvinte, mantendo uma relação harmoniosa também com as crianças ouvintes, tendo acesso às duas línguas: Língua Portuguesa, preferencialmente na modalidade escrita, face à característica pela forma em apreender o mundo de forma visual-espacial. A Educação Bilíngue é entendida como um direito linguístico da pessoa surda a ter acesso aos conhecimentos sociais e culturais por meio de sua língua de domínio, a Língua de Sinais, e aprender a língua majoritária de seu país como segunda língua, tornando-se bilíngue. Porém mesmo, sendo a educação bilíngue um direito da comunidade Surda, ainda há muitas instituições e professores que seguem tentando alfabetizar e ensinar a Língua Portuguesa para o surdo com os mesmos métodos empregados aos alunos ouvintes, sem reconhecer as diferenças culturais e políticas dessa comunidade, o que difi culta muito a aprendizagem, uma vez que há inúmeras diferenças na organização dessas línguas de ordem fonética, sintática, semântica. Nesse contexto Skliar (1997, p. 7) mostra que A proposta de educação bilíngue para surdos pode ser defi nida como uma oposição aos discursos e às práticas clínicas hegemônicas características da educação e da escolarização dos surdos nas últimas décadas e como um reconhecimento político da surdez como diferença. Por isso, torna-se necessário considerar vários fatores que envolvem o ensino da fi losofi a bilíngue e, principalmente, ter profi ssionais capacitados para tal, que conheçam bem a língua de sinais, as construções cognitivas dos alunos surdos e as propostas de uma pedagogia visual que atendam às necessidades das crianças surdas. Que tal treinar os sinais por meio da atividade a seguir? 45 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Contextualizamos a fi losofi a bilíngue e sua importância para a vida acadêmica do Surdo. Agora é sua vez, observe as imagens com os sinais a seguir e responda: como fi caria esta frase que está em Libras se traduzíssemos para a língua portuguesa na modalidade escrita? Lembre-se de tomar o cuidado para não incorrer no bimodalismo, ou seja, o português sinalizado. FIGURA – BILINGUISMO FONTE: <https://absrp.webnode.com.br/>. Acesso em: 22 dez. 2020. A partir da compreensão do termo bilíngue/bilinguismo como sendo um sujeito conhecedor e efi ciente em duas línguas, para o surdo, conforme já enunciado, propõe-se como forma de ensino para a aquisição da segunda língu, a Língua Portuguesa – LP, que é a forma escrita da língua oral ensinada a partir de sua língua materna, que tem uma estrutura diferente da Língua Brasileira de Sinais – Libras. No caso da criança que biologicamente nasceu com surdez, mesmo sendo exposta ao ambiente oralizado, não desenvolverá a linguagem oral igualmente as pessoas a sua volta, obviamente em função de sua limitação auditiva, mas, será capaz de descobrir o signifi cado daquela palavra ao estar familiarizada com aquela pessoa, lugar e objetos e, se tiver um treinamento oral com um profi ssional da área desde muito cedo, aprenderá a fazer leitura labial ao prestar atenção à boca do interlocutor. No entanto, enquanto bebês, as crianças surdas e ouvintes produzem sons e gestos igualmente parecidos, porém até um determinado estágio, de acordo com Quadros (1997, p. 70-71) 46 Língua brasileira de sinais Nos bebês surdos, foram detectadas duas formas de balbucio manual: o balbucio silábico e a gesticulação. O balbucio silábico apresenta combinações que fazem parte do sistema fonético das línguas de sinais. Ao contrário, a gesticulação não apresenta organização interna. Os dados apresentam um desenvolvimento paralelo do balbucio oral e do balbucio manual. Os bebês surdos e os bebês ouvintes apresentam os dois tipos de balbucio até um determinado estágio e desenvolvem o balbucio da sua modalidade. As vocalizações são interrompidas nos bebês surdos assim como as produções manuais são interrompidas nos bebês ouvintes, pois o input favorece o desenvolvimento de um dos modos de balbuciar. A citação anterior refere-se ao chamado período pré-linguístico, assim, a autora disserta que independentemente de a modalidade da língua ser oral auditiva ou espaço visual, parece haver uma capacidade para a linguagem nata dos seres humanos e, ainda, ela destaca que “as crianças ouvintes, fi lhas de pais surdos, apresentam e desenvolvem os dois tipos de balbucio até chegarem à produção das línguas” (PIZZIO; REZENDE; QUADROS, 2010, p. 19). Entendemos assim que a criança desenvolve sua linguagem conforme as suas necessidades, pois buscará alternativas para atingir seus objetivos e começar a desenvolver sua língua natural e ser alfabetizada. Isso implica no convívio social como um aspecto muito importante conforme apresenta Ferreiro (1999, p. 47) “a alfabetização não é um estado ao qual se chega, mas um processo cujo início é na maioria dos casos anterior à escola e que não termina ao fi nalizar a escola primária”. No caso das crianças surdas usuária nativas de língua de sinais, quando ela recebe um ensino bilíngue naturalmente usará a LS na escola e como alternativa, na modalidade escrita, a Língua Portuguesa – LP. Leia o texto intitulado Língua brasileira de sinais VI e entenda o processo de aquisição de linguagem das crianças surdas. Disponível em: <https://libras.ufsc.br/old/public/colecaoletraslibras/ eixoformacaoespecifi ca>. 47 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 4.1 A LIBRAS NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO EM LÍNGUA PORTUGUESA PARA O SURDO Realmente pode ser desafi ador tanto para o professor que não entende a cultura do surdo como para o aluno surdo aprender a ler e escrever na Língua Portuguesa – LP. Assim, considerando o ensino da língua portuguesa escrita para crianças surdas, as autoras Quadros e Schmiedt (2006, p. 24) apresentam que há dois recursos muito importantes a serem usados em sala de aula: “primeiro o relato de estórias como sendo um meio especialmente rico em alfabetizar e letrar uma criança e segundo a produção de literatura infantil em língua de sinais”. Isso acontece, pois a comunidade surda tem um grande potencial para contar e produzir histórias espontâneas e piadas. De acordo com Quadros e Schmiedt (2006) a ideia está em não se reproduzir iletrados em sinais. Assim, para o surdo, a língua de sinais é “a” primeira língua e merece receber esse tratamento. Sendo assim, recuperar a produção literária da comunidade surda é um aspecto emergente para tornar efi caz o processo de alfabetização. Literatura em sinais é essencial para tal processo.Os bancos escolares devem se preocupar com tal produção, bem como incentivar seu desenvolvimento e registro. O que os alunos produzem hoje espontaneamente, pode se transformar em fonte de inspiração literária dos alunos de amanhã. O que os professores relatam hoje pode ser aperfeiçoado no dia de amanhã (QUADROS; SCHMIEDT, 2006, p. 25). Assim, segundo as autoras, os alunos surdos precisam tornar-se leitores primeiro na língua de sinais para se tornarem leitores na língua portuguesa. Por ser de modalidade gestual visual, as línguas de sinais podem trazer vários elementos exploratórios. A seguir, listamos algumas características que as línguas orais não oferecem de forma consistente para alfabetizar e letrar uma criança surda segundo Quadros e Schmiedt (2006, p. 26-27). • Estabelecimento do olhar. • Exploração das confi gurações de mãos. • Exploração dos movimentos dos sinais (movimentos internos e externos, ou seja, movimentos do próprio sinal e movimentos de relações gramaticais no espaço). • Utilização de sinais com uma mão, duas mãos com movimentos simétricos, duas mãos com movimentos não simétricos, duas mãos com diferentes confi gurações de mãos. 48 Língua brasileira de sinais • Uso de expressões não manuais gramaticalizadas (interrogativas, topicalização, focus e negação). • Exploração das diferentes funções do apontar. • Utilização de classifi cadores com confi gurações de mãos apropriadas (incluem todas as relações descritivas e preposicionais estabelecidas através de classifi cadores, bem como, as formas de objetos, pessoas e ações e relações entre eles, tais como, ao lado de, em cima de, contra, embaixo de, em, dentro de, fora de, atrás de, em frente de etc.). • Exploração das mudanças de perspectivas na produção de sinais. • Exploração do alfabeto manual. • Estabelecimento de relações temporais através de marcação de tempo e de advérbios temporais (futuro, passado, no presente, ontem, semana passada, mês passado, ano passado, antes, hoje, agora, depois, amanhã, na semana que vem, no próximo mês etc.). • Exploração da orientação da mão z especifi cação do tipo de ação, duração, intensidade e repetição (adjetivação, aspecto e marcação de plural). • Jogos de perguntas e respostas observando o uso dos itens lexicais e expressões não manuais correspondentes. • Utilização de “feedback” (sinais manuais e não-manuais específi cos de confi rmação e negação, tais como, o sinal CERTO, o sinal NÃO, os movimentos de cabeça afi rmando ou negando). • Exploração de relações gramaticais mais complexas (relações de comparação, tais como, isto e aquilo, isto ou aquilo, este melhor do que este, aquele melhor do que este, este igual àquele, este com aquele; relações de condição, tais como, se isto então aquilo; relações de simultaneidade, por exemplo, enquanto isto acontece, aquilo está acontecendo; relações de subordinação, como o fulano pensa que está fazendo tal coisa; aquele que tem isso, está fazendo aquilo). • Estabelecimento de referentes presentes e não presentes no discurso e o uso de pronominais para retomada de tais referentes de forma consistente, exploração da produção artística em sinais, usando todos os recursos sintáticos, morfológicos, fonológicos e semânticos próprios da LSB (tais recursos incluem, por exemplo, os aspectos mencionados até então). Todas essas orientações podem ser realizadas por professores surdos e ouvintes, pois o objetivo é a exploração de tais aspectos da língua de sinais. Nesse sentido qualquer criança que está sendo alfabetizada precisa dominar o funcionamento linguístico e aproveitar sua capacidade criativa e desenvolvimento cognitivo para aprender uma segunda língua que neste caso é a LP. 49 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Que tal ampliar seus conhecimentos? No seguinte site: <http:// www.librasgerais.com.br/materiais-inclusivos/livros.php>, você encontrará vários livros relacionados a contextos linguísticos, educacionais, entre outros, que poderão ser baixados gratuitamente. Além disso, os professores podem conhecer e confeccionar muitas atividades dependendo do contexto. Entre elas, atividades com alfabeto em Libras e LP e atividade com sinal, gravura e escrita. Aproveite essas atividades para ensinar os nomes e classifi car os objetos, sempre fazendo uso da imagem ou do referente, do sinal em Libras e da escrita na LP. São atividades que podem ser utilizadas em várias disciplinas e qualquer conteúdo. FIGURA 25 – RELAÇÃO SINAL, PALAVRA E ESCRITA FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=TuQT2btklfc>. Acesso em: 25 dez. 2020. Atividades como essas darão subsídios para o processo de aquisição da leitura e para o desenvolvimento da leitura e escrita do português como segunda língua. Sobre a importância desses recursos para alfabetização da criança surda usuária de LS e LP, Quadros e Schmiedt (2006, p. 29) mostram que ela fi ca imersa nas relações cognitivas estabelecidas por meio da língua de sinais para organização do pensamento, terá mais elementos para passar a registrar as relações de signifi cação que estabelece com o mundo. Diante da experiência com o sistema de escrita que se relaciona com a língua em uso, a criança passa a criar hipóteses e a se alfabetizar. 50 Língua brasileira de sinais Todavia, se a criança surda tem pais ouvintes e nenhum contato com a comunidade surda, é provável que não seja usuária de LS e, quando entrar na época de escolarização, terá algumas difi culdades no processo de alfabetização utilizando as línguas de sinais como meio para aprendizagem da Língua Portuguesa. Porém, todas essas atividades deverão estar pautadas em objetivos pedagógicos bilíngues, pois, quando falamos sobre a língua por meio da própria língua, passa a ter uma representação social e cultural para a criança elementos importantes do processo educacional. Os profi ssionais que recebem uma criança surda em sua sala devem entender que a percepção da produção acadêmica de uma criança que ouve e fala uma língua falada é totalmente diferente do aluno surdo que produzirá o que vê produzido pelo seu interlocutor visualmente e não pelos sons. Assim, quando a criança surda tem a oportunidade de explorar a própria produção por meio da leitura que ela mesma faz, isso estimula o desenvolvimento cognitivo dela que sustentará o processo de aquisição da leitura e escrita na língua portuguesa. Tenha dicas de como alfabetizar e letrar a criança surdo com o vídeo intitulado Compartilhando Práticas| - Refl exões sobre letramento e alfabetização de surdos 1, disponível em: <https:// www.youtube.com/watch?v=N7HWJc2wEY8>. 51 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 4.2 LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS – UM RESGATE DA HISTÓRIA FIGURA 26 – A HISTÓRIA DE LS NO BRASIL FONTE: <https://ensino.digital/blog/historia-da-lingua-brasileira- de-sinais-como-surgiu>. Acesso em: 25 dez. 2020. Os registros sobre a LS aqui no Brasil tiveram início a partir do segundo império, por meio de um convite do imperador Dom Pedro II ao professor que também fi cou surdo devido ao sarampo, o francês Ernest Huet. Segundo pesquisas, Huet estudou no Instituto Nacional de Surdos em Paris, formando-se professor. O imperador Dom Pedro II teve muito interesse que a LS chegasse no Brasil, muitos contam que o imperador tinha um neto surdo e queria que ele se desenvolvesse nos estudos acadêmicos. No entanto, outros relatos apontam que não era seu neto, mas sim um parente próximo que era surdo. Naquele tempo era bem comum que professores formados em institutos especializados na Europa serem convidados para irem a países como o Brasil com objetivo de ajudar a fundar instituições educacionais. De qualquer forma, o imperador que tinha muitas informações vindas da Europa encontrou no professor surdo Huet a solução para isso. Finalmente em 1855, Huet, após uma pesquisa de quantidade de surdos aqui no Brasil,apresentou um projeto de criação de uma escola para surdos na cidade do RJ por meio da Lei nº 839, de 26 de setembro de 1857, promulgada por Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, chamada de Imperial Instituto dos Surdos Mudos (IISM), hoje conhecido como Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). Observe que agora, na nomenclatura do instituto, não existe mais a palavra “mudo”. 52 Língua brasileira de sinais Assim, o professor francês Ernest Huet trouxe a Língua de Sinais francesa e implantou a Língua Nacional de Sinais, como fi cou conhecida na época. No entanto, eram poucos os surdos e ouvintes que conheciam as línguas de sinais como comunicação, assim, o método Comunicação Total foi muito utilizado, inclusive a escrita dactológica por meio do alfabeto manual em línguas de sinais francesa, pois o objetivo inicial era que os surdos conseguissem recuperar a comunicação expressiva dos seus sentimentos e convivessem com as pessoas ouvintes da melhor maneira possível. Em 1880 um congresso em Milão sobre surdez proibiu o uso das línguas de sinais no mundo, inclusive aqui no Brasil, acreditando que a leitura labial (oralização) era a melhor forma de comunicação para os surdos. Mesmo assim, os gestos e as línguas de sinais sobreviveram nos pátios do INES e aos poucos a língua de sinais francesa foi se mesclando com alguns sinais mesmo que caseiros já utilizados aqui no Brasil. Após apresentar uma contextualização de como surgiu a Língua Brasileira de Sinais – Libras no País, é interessante citar alguns marcos históricos no Brasil, tais como: • A criação da FENEIDA nos anos 70, que em 1987 passou a se chamar FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos). • O INES foi responsável por criar o primeiro curso de Especialização para professores na área de surdez, difundindo assim o Bilinguismo. • O reconhecimento da Libras como instrumento legal (ofi cial) no Brasil pela Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. • O decreto n° 5626, de 22 de dezembro de 2005, que reconhece a Libras como língua da comunidade Surda brasileira e a regulamentou. Aguarde que nos próximos capítulos vamos nos aprofundar de fato nos elementos linguísticos das línguas de sinais, especifi cando como cada parâmetro ou unidade mínima é necessário para formação do sinal e o contexto comunicativo em LS. Além disso, vivemos em uma época em que a tecnologia traz muitos conhecimentos e auxilia no aprendizado de qualquer língua. Dessa forma, aproveite todo esse aprendizado entre a teoria e o visual e amplie seu conhecimento em Libras. 53 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 Assista ao vídeo disponível em: <https://ensino.digital/blog/ historia-da-lingua-brasileira-de-sinais-como-surgiu> e entenda tudo sobre o surgimento de Língua Brasileira de sinais – Libras. 1 Em uma escola que utiliza a fi losofi a bilíngue para crianças surdas, os professores necessitam ensinar aos alunos surdos a Língua Brasileira de Sinais como (L1) e a Língua Portuguesa na modalidade escrita como (L2). No que diz respeito ao ensino da Língua Portuguesa escrita para o aluno surdo, é correto afi rmar que: a) ( ) deve ser ensinada por meio do uso da escrita do sistema sign writing, com o objetivo de fortalecer a escrita das pessoas surdas. b) ( ) deve ser ensinada com o objetivo de ser uma língua signifi cativa para as pessoas surdas, possibilitando a aquisição da habilidade de ler e produzir a escrita da Língua Portuguesa. c) ( ) deve ser ensinada com o objetivo de promover somente a aquisição da fala e da escrita exclusivamente na Língua Portuguesa como L1. d) ( ) deve ser ensinada com o objetivo de ser uma língua para as crianças surdas, inicialmente a obrigatoriedade à aquisição da oralidade, para depois acessar à escrita da Língua Portuguesa. 2 Observe a fi gura a seguir que retrata os tipos de contribuições para um ensino acadêmico e signifi cativo à criança surda. Quando esse tipo de atividade é usado pelo docente, as metodologias apresentadas refl etem qual abordagem? 54 Língua brasileira de sinais FIGURA – ENSINO PARA CRIANÇA SURDA FONTE: <https://wp.ufpel.edu.br/thaisgrutzmann/fi les/2020/08/616- 1815-1-PB-INES-Ts.pdf>. Acesso em: 14 dez. 2020. I- Pedagogia Visual. II- Comunicação total. III- Pedagogia oralista. IV- Sociolinguismo e Pragmatismo. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Apenas a alternativa I está correta. b) ( ) Apenas a alternativa III está correta. c) ( ) As alternativas III e IV estão corretas. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 3 O ano de 1880 marcou profundamente a história dos surdos em todo mundo, principalmente em questões educacionais e aqui no Brasil não foi diferente. Assinale a seguir a alternativa que apresenta corretamente o evento ocorrido no período mencionado. a) ( ) Em 1880, na Itália, foi criada a primeira língua de sinais do mundo que passou a ser utilizada em todos os países, inclusive aqui no Brasil. b) ( ) Em 1880 foi realizado na Europa um congresso de surdos no qual foi criada a primeira língua de sinais que seria posteriormente utilizada no Brasil. c) ( ) No ano de 1880, em um congresso ocorrido em Frankfurt, o método Oralista foi abolido, surgindo a fi losofi a do Bilinguismo na educação de surdos do mundo todo, vindo para o Brasil. 55 O PROCESSO COGNITIVO E A LÍNGUA DE SINAIS Capítulo 1 d) ( ) No ano de 1880, em um congresso ocorrido em Milão, optou- se pela imposição do método Oralista, que passou a ser o padrão adotado na educação e formação dos surdos de diferentes países no mundo, inclusive, foi adotado no Brasil. 5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Neste capítulo inicial, apresentamos o conceito de língua e linguagem; e o processo cognitivo por trás desses conceitos na aprendizagem de uma língua. Além disso, a língua de sinais foi apresentada como ponto de partida na construção da identidade cultural, social e educacional dos sujeitos Surdos. Destacamos a função extremamente importante dos linguistas pesquisadores em LS de registrar toda a gama de pesquisas direcionadas à língua de sinais como uma língua natural e cientifi camente aceita como expressão linguística da comunidade Surda. Contextualizamos a nossa língua Brasileira de Sinais – Libras, como instrumento legal (ofi cial) no Brasil pela Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, regulamentada como língua ofi cial da comunidade Surda Brasileira pelo decreto nº 5.626/2005. Compreendemos que as línguas de sinais não são universais, tampouco são considerados mímicas ou somente gestos, pois é mantenedora de sua própria gramática. Ela desenvolve-se em cada comunidade surda, em diferentes países do mundo com todas as propriedades linguísticas. Por isso, diferentemente da criança ouvinte, o bebê que nasce surdo nada assimila pelo ouvido, uma vez que há um impedimento, causado pela surdez. Dessa forma, o sistema nervoso central não decodifi ca o que representa o som, por isso, diz-se que as línguas de sinais são espaços visuais. Portanto, a Língua de Sinais não é somente uma língua sinalizada, mas um legítimo sistema linguístico que atende às necessidades de comunicação entre os indivíduos surdos e ouvintes usuários dela, capazes de se expressarem em qualquer contexto, desde o mais simples ao mais complexo. Diante desse contexto, é importante destacar que o Surdo não está inserido apenas na comunidade Surda, mas é considerado um sujeito bicultural, pois vivencia situações linguísticas e práticas no seu dia a dia em duas línguas, Línguas orais e Língua de sinais, no nosso caso, aqui no Brasil, Libras e LP na modalidade de leitura e escrita. Assim, é preciso que ele tenha acesso a todos os meios de interação durante sua convivência social, acadêmica e familiar, o que implica que interaja com o mundo que o cerca. Nesse sentido, entende-se que ele precisa ter competência 56 Língua brasileira de sinais em ambas as línguas,Libras e LP, tanto no âmbito acadêmico quanto social, ainda que com a LP seja apenas na modalidade escrita. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução nº 4, de 2 de outubro de 2009. Institui Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial, 2009. Disponível em: http://portal.mec. gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13684%3Aresolucoes- ceb#:~:text=Resolu%C3%A7%C3%A3o%20CNE%2FCEB%20n%C2%BA%20 4%2C%20de%202%20de%20outubro%20de,Nacionais%20para%20a%20 Educa%C3%A7%C3%A3o%20Infantil. Acesso em: 22 dez. 2020. BRASIL. Ministério da Educação. 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Learning to see: teaching american sign language as a second language. Gallaudet: University Press, 1997. CAPÍTULO 2 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: • Conhecer as principais interfaces gramaticais da língua brasileira de sinais. • Apresentar aspectos fonológicos em língua brasileira de sinais. • Identifi car os estudos morfológicos em língua brasileira de sinais. • Classifi car a morfologia e os fenômenos que classifi cam a Libras como uma língua natural. • Pesquisar a respeito da importância dos parâmetros para formação de palavras em Libras. • Analisar e aplicar a estrutura fonológica nos estudos das línguas de sinais. • Aplicar à prática o estudo da formação dos sinais em Libras e suas características. 62 Língua brasileira de sinais 63 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 1 CONTEXTUALIZAÇÃO No Capítulo 1, tivemos uma visão breve e geral a respeito da gramática das línguas de sinais e sua historicidade, principalmente no que diz respeito à Língua Brasileira de Sinais – Libras. Agora continuamos nossa viagem nos aprofundando nos parâmetros necessários para a criação dos sinais. Entende-se por parâmetro aquilo que é possível estabelecer uma comparação, um padrão que segue determinado modelo de regras antes fi xadas para aceitar/reconhecer algo ou alguma coisa como verdade. Acompanhamos no capítulo anterior os conceitos de língua/linguagem, objeto de estudos da Linguística, que busca argumentar que uma comunidade com indivíduos falantes de uma língua oral ou sinalizada possui sistemas linguísticos distintos, com sua própria estrutura. A Gramática Gerativa, teoria idealizada por Chomsky e outros linguistas, apresenta o modelo de princípios de parâmetros e afi rma uma estrutura pressuposta nas línguas. Tais particularidades convêm a todas as línguas orais ou sinalizadas e se posicionam a partir do ponto de vista da Gramática Universal (GU). FIGURA 1 – RAIZ DAS LÍNGUAS FONTE: <https://www.facebook.com/linguisticapraque/ photos/110626670293691>. Acesso em: 11 fev. 2021. Os parâmetros linguísticos de uma língua são a estrutura que representa o status formativo assim como as partes principais de uma árvore, cada elemento com sua fundamental importância. Para seguirmos a nossa refl exão acerca dos parâmetros em Libras, é importante destacarmos que o modelo de princípios e parâmetros idealizados 64 Língua brasileira de sinais por Chomsky e seus colaboradores apresenta uma excelente contribuição para o campo da linguística, favorecendo de maneira signifi cativa as línguas de sinais. Os dois tipos de princípios são: os rígidos e invariáveis, que são capazes de serem incorporados por todas as línguas; e os abertos/parâmetros, que são fi xados ao longo do processo de aquisição e oferecem até duas possibilidades de valores, dependendo dos estímulos que o ambiente linguístico oferece ao sujeito. As ponderações que faremos a partir desse pequeno exercício em relação aos parâmetros da Libras nos apresenta duas notórias autoras que se valeram da Teoria Gerativa para assim conceber suas análises linguísticas das línguas de sinais, mais especifi camente da Libras. Quadros e Karnopp (2004) nos presenteiam com uma excelente obra intitulada Língua Brasileira de Sinais: estudos linguísticos, na qual realizam importantes análises dos aspectos linguísticos da Libras. Esse material é considerado um referencial para os pesquisadores e estudantes de Libras. Considerando o grau de importância das autoras citadas para a área da linguística da Libras, assim como da obra por elas produzidas, julgamos pertinente fundamentar o tema aqui proposto embasados na bibliografi a dessas autoras/pesquisadoras, visto que os parâmetros que fundamentam a Libras estão ricamente representados no decorrer da obra. Já estudamos que a Libras é uma língua com sua estrutura gramatical organizada obedecendo alguns parâmetros diferentes linguisticamente, mas que oferecem a Libras o status de língua natural. A Libras possui uma estrutura gramatical, assim como as outras línguas de sinais, sua produção acontece pelo movimento das mãos, corpo e da face, todas as funções são fundamentais para a compreensão do sentido da comunicação. Ferreira-Brito (1995) aponta que a estrutura sublexical da Libras é constituída a partir de parâmetros que se combinam. Do ponto de vista de Quadros e Karnopp (2004), os principais parâmetros fonológicos são locação, movimento e confi guração de mão. Porém, as expressões faciais e corporais também constituem a estrutura da Libras. “Sublexial” considera-se as partes divisíveis de uma palavra, as unidades mínimas de um sinal. 65 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 2 PARÂMETROS DA LIBRAS A Gramática Universal é uma teoria linguística idealizada pela escola transformacional e gerativa, que se defi ne como um modelo de princípios e parâmetros criados por Chomsky, sendo um avanço na área da linguística. De acordo com esse modelo, a gramática gerativa deve ser composta de dois tipos de princípios: “alguns que são rígidos e invariáveis” (VIOTTI, 2008, p. 41), isto é, são imutáveis, esses princípios incorporam todas as línguas orais ou sinalizadas; já o segundo modelo proposto são os tipos abertos. Esses princípios abertos são chamados de parâmetros, os mesmo que utilizamos em Libras. A estrutura gramatical está organizada a partir desses parâmetros que estruturam a sua formação nos mais diversos níveis linguísticos. Apresentamos a seguir três dos seus maiores e ou principais parâmetros: Confi guração da(s) mão(s) (CM), o Movimento (M) e o Ponto de Articulação (PA); e outros três que constituem seus parâmetros menores: Região de Contato, Orientação da(s) mão(s) e Disposição da(s) mão(s). FIGURA 2 – SINAL DE VELHO FONTE: <https://ufsj.edu.br/portal2-repositorio/File/incluir/libras/ curso_de_libras_-_graciele.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2021. 2.1 CONFIGURAÇÃO DE MÃO (CM) A confi guração de mão é a disposição das mãos no momento da execução do sinal, sendo possível a representação por meio de letras, números ou classifi cadores. De acordo com pesquisas realizadas por Ferreira-Brito (apud QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 53) “A língua de sinais brasileira apresenta 46 CMs, um sistema bastante similar àquele da ASL, embora nem todas as línguas de sinais compartilhem o mesmo inventário de CMs”. Cabe destacar que não 66 Língua brasileira de sinais são todas as línguas de sinais que se valem do mesmo rol de CMs. A seguir apresentamos um quadro com 46 CMs apresentadas por Ferreira-Brito (1995) que foi uma das pioneiras nas análises da confi guração de mãos na língua de sinais. Atualmente, dispomos de outros autores que também apresentam outras confi gurações de mãos, que agregam os estudos que Brito já havia apresentado. Destacamos que neste capítulo versaremos sobre o rol de CMs da autora citada, mas, no Capítulo 3, apresentaremos outras discussões acerca do assunto. FIGURA 3 – SINAL DE TELEFONE CM [Y] FIGURA 4 – SINAL DE BRANCO CM [B] FONTE: <https://ufsj.edu.br/portal2-repositorio/File/incluir/libras/ curso_de_libras_-_graciele.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2021. FIGURA5 – SINAL DE VEADO CM [5] FIGURA 6 – SINAL DE ONTEM CM [L] FONTE: <https://ufsj.edu.br/portal2-repositorio/File/incluir/libras/ curso_de_libras_-_graciele.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2021. 67 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 Entenda melhor: já que as línguas de sinais não são universais, existem confi gurações de mão diferentes. Isso acontece também com o alfabeto manual, apesar de haver alguma semelhança na sinalização, como a Língua de Sinais Brasileira (LSB), Língua de Sinais Americana (ASL) e a Língua de Sinais Francesa (LSF), ainda assim, percebemos diferença na CMs de cada uma delas. FIGURA 7 – ALFABETO MANUAL EM LSB FONTE: <https://cursolibras.wordpress.com/2012/11/27/libras>. Acesso em: 23 fev. 2021. 68 Língua brasileira de sinais FIGURA 8 – ALFABETO MANUAL EM LSF E AS FONTE: <https://cursolibras.wordpress.com/2012/11/27/libras>. Acesso em: 23 fev. 2021. 69 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 FIGURA 9 – AS 46 CONFIGURAÇÕES DE MÃO DA LIBRAS POR FERREIRA BRITO (1995) FONTE: <https://www.libras.ufsc.br/colecaoLetrasLibras/eixoFormacaoBasica/ foneticaEFonologia/scos/cap15009/7.html>. Acesso em: 11 fev. 2021. Conforme Ferreira Brito (1995), a Língua de Sinais Brasileira (LSB) e a ASL possuem sistemas similares de confi guração de mãos, visto que na língua de sinais brasileira a autora apresenta 46 CMs, um sistema bastante similar àquele 70 Língua brasileira de sinais da ASL, porém, esse fato é curioso, pois essa similaridade não acontece com todas as línguas de sinais, considerando que nem todas partilham do mesmo inventário de CMs. A descrição apresentada surge de informações coletadas a partir da sinalização observada nas principais capitais brasileiras. O agrupamento vertical segundo a semelhança entre elas foi o critério adotado e não ocorreu identifi cação enquanto CMs básicas ou CMs variantes. Dessa forma, na língua brasileira de sinais, o conjunto de CMs refere-se apenas às manifestações de superfície, isto é, de nível fonético. 2.2 MOVIMENTO (M) Na Libras os sinais estáticos ou com movimentos se confi guram como uma das partes da estrutura gramatical. O movimento é como acontece o deslocamento espacial dos sinais no momento de sua execução, para tanto, é necessário haver objeto e espaço. As mãos do enunciador representam o objeto e a área de limitação corporal do enunciador é o espaço da execução do movimento. FIGURA 10 – MOVIMENTO (M) FONTE: <https://www.libras.com.br/images/artigos/os-5-parametros-da-libras/exemplos- de-sinais-com-movimento-e-sem-movimento.png>. Acesso em: 11 fev. 2021. Durante a articulação de um sinal, pode ocorrer a mudança ou não da CM, quando acontece essa alteração do movimento interno da mão, também observamos a mudança na confi guração dos dedos selecionados. Alguns sinais são estáticos enquanto outros seguem um movimento contínuo. Seguindo esse raciocínio, compreendemos que o parâmetro de movimento se 71 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 refere ao modo como as mãos se movimentam, sendo possíveis movimentos lineares, circulares, retilíneos, simultâneos ou alternados com ambas as mãos etc.; e para onde estão movimentando (para a frente, em direção à direita, esquerda etc.). HOMEM FONTE: <https://cursolibras.wordpress.com/2012/11/27/libras>. Acesso em: 23 fev. 2021. FIGURA 11 – GALINHA 2.3 DIRECIONALIDADE DO MOVIMENTO a) Unidirecional: quando o movimento é realizado em uma direção no espaço. Ex.: PROIBIR, SENTAR, MANDAR. b) Bidirecional: quando o movimento do sinal é realizado por uma ou ambas as mãos, em direções diferentes. Ex.: JULGAMENTO, GRANDE, DISCUTIR, TRABALHAR, BRINCAR. c) Multidirecional: no momento da realização de alguns sinais os movimentos podem explorar várias direções no espaço. Ex.: INCOMODAR, PESQUISAR. 72 Língua brasileira de sinais 2.4 TIPOS DE MOVIMENTOS FIGURA 12 – HELICOIDAL FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. Sinais como: alto (a), azeite e macarrão possuem esse tipo de movimento. FIGURA 13 – SINAIS REFERENTES FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. FIGURA 14 – RETILÍNEO FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. Sinais como: porque, encontrar e estudar utilizam esse movimento. 73 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 FIGURA 15 – SINAIS REFERENTES FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. FIGURA 16 – SEMICIRCULAR FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. Sinais como: surdo (a), sapo e coragem utilizam esse tipo de movimento. FIGURA 17 – SINAIS REFERENTES FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. FIGURA 18 – CIRCULAR FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. 74 Língua brasileira de sinais Sinais como: brincar, idiota e bicicleta utilizam esse tipo de movimento. FIGURA 19 – SINAIS REFERENTES FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. FIGURA 20 – SINUOSO FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. Sinais como: Brasil, rio e navio utilizam esse tipo de movimento. FIGURA 21 – SINAIS REFERENTES FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. 75 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 FIGURA 22 – ANGULAR FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. Sinais como: raio, elétrico e difícil utilizam esse tipo de movimento. FIGURA 23 – SINAIS REFERENTES FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 19 mar. 2021. 2.5 PONTO DE ARTICULAÇÃO O ponto de articulação é a área do corpo em que o sinal é executado. Na Libras, o espaço no qual acontece a enunciação é considerado o local em que todos os pontos estão dentro de um raio de alcance da sinalização, sendo que o número de locações pode ser limitado, visto que em alguns casos o ponto de articulação ocorre exatamente em determinado eixo, tais como o queixo, ponta do nariz, entre outros. Para Quadros e Karnopp (2004), espaço de enunciação é o espaço ideal, no sentido de que se considera que os interlocutores estejam face a face. Esse parâmetro é delimitado pela extensão dos braços do emissor e ocorre quando ele toca em alguma parte do corpo ou no espaço neutro, que é a região do meio do corpo até a cabeça ou para frente do emissor. É importante observar que em meio a uma sinalização normal, o espaço é limitado como se estivéssemos comparando a intensidade da voz humana. Para autores como Felipe e Monteiro (2007, p. 22), o local de articulação é considerado 76 Língua brasileira de sinais um parâmetro fundamental na estrutura da língua de sinais brasileira. Eles citam como exemplos de ponto ou local de articulação os sinais TRABALHAR, BRINCAR e PAQUERAR, realizados no espaço neutro e os sinais ESQUECER, APRENDER e DECORAR que são realizados na testa. FIGURA 24 – LOCAÇÃO FONTE: <https://www.libras.com.br/images/artigos/os-5-parametros-da-libras/ exemplos-de-ponto-de-articulacao.png>. Acesso em: 13 fev. 2021. É importante considerar que em algumas situações o espaço de enunciação pode sofrer alteração no campo no qual ocorre a sinalização, podendo ser reduzido ou até mesmo realocado. “Se um enunciador A faz sinal para B, que está fi sicamente distante,o espaço de enunciação será alterado” (QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 57). Cabe ressaltar que os pontos de articulação devem ter as posições relativas às do enunciado ideal. Entenda melhor: apesar da possibilidade de o espaço de enunciação sofrer alterações no campo de sinalização, o espaço em que o sinal é realizado deve seguir um padrão estabelecido linguisticamente. Não é possível sinalizar em qualquer espaço e sem observar os limites de sinalização, mesmo que em espaço imaginário. 77 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 Dentro da complexidade que existe na Libras, deve-se ainda observar onde estão os pontos de articulação e quais são as principais regiões das locações. Quadros e Karnopp (2004) buscam em Ferreira-Brito e Langevin (1995) a resposta para essa inquietação: as autoras brasileiras apresentam na obra delas intitulada Língua Brasileira de Sinais – Estudos Linguísticos as quatro regiões principais das locações do enunciador que são: cabeça, mão, tronco e espaço neutro. QUADRO 1 – LOCAÇÕES Cabeça Tronco Topo da cabeça Pescoço Testa Ombro Rosto Busto Parte superior do rosto Estômago Parte inferior do rosto Cintura Orelha Xx Olhos Braços Nariz Braço Boca Antebraço Bochechas Cotovelo Queixo Pulso Mão Espaço Neutro Palma Costas da mãos Lado do indicador Lado do dedo mínimo Dedos Ponta dos dedos Dedo mínimo Anular Dedo médio Indicador Polegar FONTE: Ferreira-Brito e Langevin (1995 apud QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 58) Os parâmetros apresentados representam a estrutura e a organização dos constituintes fonológicos, determinam as unidades mínimas formadoras dos sinais e estabelecem os padrões de combinação que combinam satisfatoriamente entre essas unidades. Sabemos que as línguas de sinais possuem uma modalidade gestual-visual que também denominamos por espaço-visual, visto que as informações recebidas se estabelecem pela visão enquanto que a produção de informações se dá pelas mãos. Essas particularidades das línguas de sinais provocaram a necessidade de um esquema linguístico que comprovasse o status de língua natural. 78 Língua brasileira de sinais O esquema linguístico proposto por Stoke em meados da década de 60 apresenta uma estrutura capaz de analisar a formação e a decomposição dos sinais na ASL (Língua de Sinais Americana) em três parâmetros. Os aspectos apresentados anteriormente (CM, L e M) são as unidades mínimas (fonemas) que constituem os morfemas nas línguas de sinais. Cientistas se debruçaram sobre as pesquisas de Stoke e descobriram que algumas análises das unidades que formam os sinais sugeriram incorporação de outros aspectos que também constituem a morfofonologia das línguas de sinais. A seguir discutiremos acerca desses parâmetros que foram adicionados aos estudos da fonologia de sinais e considerados secundários. 2.6 PARÂMETROS SECUNDÁRIOS • Disposição das mãos Na Libras os sinais podem ser realizados com a mão dominante ou com ambas as mãos, sendo a disposição em que as mãos se apresentam um dos parâmetros secundários da Libras. Ex.: BURRO (A), CALMA, DIFERENTE, SENTAR, SEMPRE E OBRIGADO (A). • Região de contato A região de contato é quando a mão toca uma parte do corpo, essa parte que foi tocada chamamos de região de contato. Ex.: Toque: MEDO, ÔNIBUS E CONHECER. Toque Duplo: FAMÍLIA, SURDO (A) E SAÚDE. Risco: OPERAR, JOSÉ (nome bíblico) E PESSOA. Deslizamento: CURSO, EDUCADO (A), LIMPO (A) E GALINHA. • Orientação de mão (Or) Defi nimos este parâmetro como a direcionalidade para a qual a palma da mão aponta no momento em que o sinal é executado. Alguns sinais quando 79 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 executados podem ter a mesma CMs, assim como o mesmo ponto de articulação e ainda com o movimento idêntico articulado, esses sinais se diferem apenas na orientação da mão. É o plano em direção ao qual a palma da mão é orientada. Alguns sinais têm a mesma confi guração, o mesmo ponto de articulação e o mesmo movimento e diferem apenas na orientação da mão. É importante perceber como a modifi cação de um único parâmetro pode alterar completamente o signifi cado do sinal. Segundo Felipe e Monteiro (2007) os verbos IR e VIR se opõem em relação à direcionalidade, como os verbos SUBIR e DESCER, ACENDER e APAGAR, ABRIR-PORTA e FECHAR-PORTA. FIGURA 25 – ORIENTAÇÃO DA MÃO (OR) FONTE: Felipe e Monteiro (2007, p. 23) 2.7 EXPRESSÕES NÃO-MANUAIS (ENM) Os movimentos da face, dos olhos, da cabeça ou do tronco são considerados como Expressões não-manuais. Alguns autores argumentam que essas expressões são complementos para a compreensão de alguns sinais, por vezes duas expressões podem ocorrer de maneira simultânea indicando, por exemplo, a marcação de interrogação e negação prestando-se a uma função sintática na sentença. Porém também cumpre o papel de diferenciação de itens lexicais, marcando referencias específi cos pronominais, partícula negativa, advérbio ou grau de aspecto. 80 Língua brasileira de sinais Veja no quadro a seguir as expressões não-manuais da língua de sinais brasileira, a luz do trabalho de Ferreira-Brito e Langevin (1995) e referenciado na obra de Quadros e Karnopp (2004 p. 60). QUADRO 2 – EXPRESSÕES NÃO-MANUAIS Rosto Parte superior Sobrancelhas franzidas Olhos arregalados Lance de olhos Sobrancelhas levantadas Parte inferior Bochechas infl adas Bochechas contraídas Lábios contraídos e projetados e sobrancelhas franzidas Correr da língua contra a parte inferior interna da bochecha Apenas bochecha direita infl ada Contração do lábio superior Franzir do nariz Cabeça Balanceamento para frente e para trás (sim) Balanceamento para os lados (não) Inclinação para frente Inclinação para o lado Inclinação para trás Rosto e cabeça Cabeça projetada para frente, olhos levemente cerrados, sobrancelhas franzidas Cabeça projetada para trás e olhos arregalados Tronco Para frente Para trás Balanceamento alterado dos ombros Balanceamento simultâneo dos ombros Balanceamento de um único ombro FONTE: Ferreira–Brito e Langevin (1995 apud QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 58) 81 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 Entenda os parâmetros em Libras e aproveite para exercitar a interpretação para compreender a sinalização assistindo ao vídeo disponível em: <http://tvines.org.br/?p=707>. Mas veja lá, hein?! Não vá olhar a legenda. Topa esse desafi o? 3 LIBRAS COMO LÍNGUA NATURAL No Capítulo 1, mostramos que a linguagem humana é essencialmente dialógica, diferentemente da linguagem animal em que o comportamento natural da espécie responde à estímulo comunicativo. Os seres humanos, ao se comunicarem, podem receber como resposta outra informação que vem a ser veiculada por meio da língua, que possibilita conversar dos mais diversos assuntos. Tais características são também encontradas nas línguas de sinais que possuem status de língua natural humana da comunidade surda, que possibilita comunicar todos os assuntos. A comunicação é a maneira mais efi caz para expressar pensamentos, sentimentos e a língua, como característica humana é a forma natura de interagir com o meio. Uzan, Oliveira e Leon (2008, p. 1) afi rmam que a comunicação é uma necessidade humana e as linguagens oral e escrita são as formas mais comuns de comunicação. Por isso, pode-se dizer que a linguagem é natural do ser humano e, através da linguagem, o ser humano estrutura seu pensamento, traduz o que sente, registra o que conhece, comunica-se com os outros, produz signifi cação e sentido. Já que a comunicação das pessoas com surdez acontece pelo canal visual- espacial, sendo essa a maneira natural de aquisição sem a necessidade de treinamento excessivo para adquiri-la, Rubio e Queuroz (2014, p. 14) atestamque “a língua de sinais é a única que pode ser adquirida naturalmente pelo surdo; basta que ele seja posto em contato com os seus pares. Já a língua oral pode ser aprendida, mas não adquirida espontaneamente”. Tal observação revela a problemática provocada pelo primeiro contato tardio com sua língua natural. As regras, as constantes mudanças, assim como a criação de novos sinais também é uma demonstração do status de língua natural e humana, que se 82 Língua brasileira de sinais confi rma quando se observa a complexidade e expressividade, na capacidade em transmitir conceitos concretos, abstratos, emocional ou racional, complexo ou simples. A fonologia, morfologia, sintaxe e a semântica estão fortemente marcadas no léxico e na estrutura da Libras que constituem o seu sistema linguístico. 1 A estrutura gramatical da Libras se desenha de forma natural como em todas as línguas humanas. Os movimentos combinados entre mãos, expressão facial e corporal são fundamentais para a compreensão comunicativa entre os falantes nativos e não nativos da língua. Ferreira-Brito (2010) aponta que a estrutura sublexical da Libras é constituída a partir de parâmetros que se combinam. Quadros e Karnopp (2004) defendem que alguns parâmetros são fonologicamente principais na Libras e buscam apresentar cada um deles de maneira específi ca. Com base na leitura do capítulo, é correto afi rmar que os parâmetros fonológicos da Libras, à luz das pesquisadoras Quadros e Karnopp (2004), são: a) ( ) Expressão facial e corporal aliadas à visão ampla. b) ( ) Locação, expressão corporal, expressão facial, ponto de movimento e espaço neutro. c) ( ) Locação; movimento e confi guração de mão; e expressões faciais e corporais que também constituem a estrutura da Libras. d) ( ) São cinco parâmetros principais: expressão corporal, expressão corporal, locação, verbos e espaço de sinalização. 2 A Gramática Universal (GU) propõe um modelo de princípios e parâmetros criado por Chomsky que vem a ser um avanço na área da linguística, inclusive na linguística das línguas de sinais, contribuindo fortemente para o reconhecimento e status de língua natural humana da comunidade surda. De acordo com o que você acompanhou até aqui, assinale V para verdadeiro e F para as sentenças falsas. ( ) A gramática gerativa é composta por apenas um tipo de princípio que é o tipo imutáveis. ( ) O princípio imutável incorpora apenas as línguas orais. ( ) O tipo de modelo aberto oferece em geral duas possibilidades de valores, que vão ser fi xados ao longo do processo de aquisição, 83 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 com base na informação obtida por meio do ambiente linguístico em que a criança de desenvolve. ( ) Esses princípios abertos são chamados de parâmetros, os mesmo que utilizamos em Libras. Assinale a seguir a alternativa que contém a sequência correta. a) ( ) V – V – V – V. b) ( ) V – F – V – V. c) ( ) F – F – F – F. d) ( ) F – F – V – V. e) ( ) F – V – V – F. 3 No decorrer deste capítulo, buscamos embasamentos em pesquisas consolidadas de Ferreira-Britto (1995), Quadros e Karnopp (2004). Apresentamos parâmetros linguísticos que estruturam a língua de sinais com o status de língua natural, estudos atuais que comprovam a descoberta de novas CMs em Libras. De acordo com o estudo deste capítulo, analise as sentenças a seguir. I- Confi guração da(s) mão(s), Movimento; Ponto de Articulação. II- Região de Contato; Orientação da(s) mão(s), Confi guração de mão(s). III- Movimento, Ponto de Articulação, Movimento da face e olhar. IV- Ferreira-Brito (1995 apud QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 53), defende que “A língua de sinais brasileira apresenta 46 CMs”. Assinale a seguir a alternativa correta. a) ( ) I, II e IV estão corretas. b) ( ) Todas as alternativas estão corretas. c) ( ) Apenas a alternativa IV está correta. d) ( ) Apenas a alternativa IV está incorreta. 84 Língua brasileira de sinais 3.1 O LÉXICO DA LIBRAS Léxico é o composto de palavras utilizadas em um determinado idioma para expressar de todas as maneiras suas intenções. O sistema léxico é um acervo geolinguístico transmitido entre seus pares, seja oralmente, por escrito ou por sinais. O léxico é diretamente responsável pela transmissão de conhecimento, experiência e vivência de uma sociedade inteira. Uma das principais características do acervo do léxico de uma determinada língua é a mutualidade, que transforma e encanta as relações sociais. Na mutualidade algumas palavras caem em desuso e alteram seu sentido de maneira tão imperceptível que uma sociedade inteira não consegue perceber tais transformações lexicais, que é um processo natural que garante a continuidade da língua. É possível afi rmar que o léxico é o conjunto de palavras que estão presentes em determinado idioma. Na Libras esse processor é exatamente igual, porém, os itens lexicais são os sinais que não são constituídos a partir do alfabeto manual que é muito utilizado na Libras, porém é considerado um recurso de transposição para o espaço aberto de grafemas de algumas palavras do Português. O léxico ou conjunto de palavras na Libras é o mesmo que o vocabulário, a quantidade de sinais e pode ser considerado um dos responsáveis para a base da língua de sinais brasileira. A Lexicologia estuda as unidades lexicais, ou seja, unidades gramaticais que constituem uma língua. Considerando que novas palavras e sinais surgem no decorrer do tempo, não é possível concluir que usuários de uma determinada língua conhecem por completo todas as formas de comunicação por meio das palavras e sinais. Esse fato corrobora para que entendamos que o léxico engloba diversos signifi cados e que comprova que a língua é viva, tudo isso depende muito de como a palavra/sinal é compreendida no contexto da linguística. O sistema de criação de sinais em Libras possui unidades mínimas com signifi cado, tais unidades também são conhecidas por morfemas passíveis de combinação. Quando falamos da estrutura linguística da Libras é importante assinalar que as palavras/vocábulos são consideradas os sinais. A complexidade das línguas de sinais é considerada como uma barreira para sua compreensão e aprendizagem, esse fato é confi rmado com as incorporações de palavras estrangeiras, o estrangeirismo linguístico e cultural e as soletrações que costumeiramente utilizamos como estratégias de esclarecimento dos sinais. 85 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 Para melhor compreender a Libras em seu léxico nativo e na construção lexical, dispomos dos classifi cadores, que podem constituir e signifi car de maneira mais assertiva a comunicação. Nas línguas de sinais, o empréstimo linguístico acontece por meio da soletração manual, com o uso do alfabeto manual, em inúmeras vezes, esse fato acaba por transformar em um sinal ofi cial. Usaremos como exemplo para melhor exemplifi cação o sinal de S-O-L, que pode tranquilamente ser sinalizado com apenas a soletração das letras S-L. As autoras brasileiras Quadros e Karnopp (2004) discorrem acerca de algumas situações que acontecem quando não temos um sinal específi co. Elas afi rmam que, quando não existe sinal a ser utilizado, a soletração é uma estratégia para contextualizar a palavra em um discurso realizado em Língua de Sinais. Vamos relembrar alguns desses pesquisadores a seguir: • Faria (2009), um pesquisador ativo das línguas de sinais, também nos presenteou com suas refl exões sobre o Léxico das línguas de sinais, apresentando um panorama histórico de como os sinais foram descritos e catalogados. • Stokoe (1978) é considerado por muitos pesquisadores da área de Libras o pioneiro nas questões estruturais das línguas de sinais. Ele estuda uma maneira de sistematizar e organizar os sinais pelo menos em três parâmetros:confi guração de mão, movimento e locação. Outros registros de sistemas lexicais também se uniram ao modelo de Stoke em diversas pesquisas, como o de Elis e Sign writing que lançaram mão de diversas estratégias para conseguir agrupar e catalogar novos itens lexicais na língua de sinais brasileira. Dentre as estratégias de registros dos léxicos das línguas de sinais, contextualizamos no capítulo anterior que no Brasil tivemos a elaboração e divulgação de diferentes dicionários. Em meados de 1875, teve início um compêndio do INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos), que abriu as portas para a criação de novos dicionários usados até os dias atuais, assim como a divulgação de outros volumes e a produção de ferramentas digitais e virtuais, como o do DEIT-Libras Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngue da Língua de Sinais Brasileira, que engloba Libras, Português e Inglês e dispõe de inúmeros itens lexicais da Libras, tais como as estruturas morfológicas: parâmetros, classifi cadores, morfemas-base, unidades lexicais. O DEIT-Libras é o primeiro Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngue da Língua de Sinais Brasileira, que engloba Libras, Português e Inglês, e teve sua primeira publicação em 2009. Temos agora a terceira edição ampliada do 'Novo Deit-Libras', extensão e desdobramento do único e pioneiro Dicionário da Língua de Sinais Brasileira (Libras). 86 Língua brasileira de sinais FIGURA 26 – DICIONÁRIO ILUSTRADO TRILÍNGUE FONTE: <https://imagens.usp.br/?attachment_id=17993>. Acesso em: 24 mar. 2021. É comum as pessoas pensarem que os sinais e as palavras são os mesmos que o alfabeto manual em Libras, para você compreender melhor a diferença existente entre os sinais e as palavras, a seguir apresentamos um exemplo de palavras que constituem sinais completamente diferentes da soletração manual. I- T-R-A-B-A-L-H-A-R II- P-A-U-L-A III- C-E-R-TO Ao observarmos com mais cuidado, é possível perceber que existe um grande equívoco nessa afi rmação. Assim cabe uma explicação mais detalhada do que acontece de fato com a soletração e os sinais. a) Quando utilizamos a soletração manual das letras de determinada palavra em Português, conforme está no primeiro exemplo com a palavra TRABALHAR, é apenas a transposição para o espaço, através das mãos, dos grafemas dessa palavra da língua oral. Isto é, podemos dizer que nesse caso é um tipo de empréstimo em Libras. Isso também acontece com o Português oral que costumeiramente faz uso de empréstimo linguístico de palavras da língua inglesa. Na primeira opção temos 87 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 representado as inúmeras possibilidades de empréstimos linguístico da Libras. b) No segundo exemplo apresentamos a soletração do nome próprio de PAULA, um nome aleatório escolhido para exemplifi car que em Português o nome de uma pessoa soletramos letra a letra, enquanto que em Libras o nome de alguém é apresentado diferentemente, por meio do sinal que essa pessoa possui, caso já tenha contato com a comunidade surda. Assim, quando uma pessoa quer apresentar alguém, primeiro soletrará seu nome em português (P-A-U-L-A) e, em seguida, seu sinal em Libras. c) Nesse caso temos a soletração de uma palavra em português para cujo conceito, naturalmente, há um sinal em Libras, porém esse sinal não é conhecido por um dos usuários, que na maioria das vezes é ouvinte. A: RESPOSTA CERTO (= A resposta está certa). B: O-QUE ISTO, CERTO (= O que quer dizer este sinal?). A: C-E-R-T-O (= certo). B: O-K (Ah! Ok). Outro exemplo é quando a palavra C-E-R-T-O é soletrada com o objetivo de esclarecer qual a grafi a correta da palavra em Português, caso haja dúvida na sua forma escrita. Nesse caso a soletração tem um papel de verifi cação, questionamento ou até mesmo de veiculação da ortografi a. Apresentamos a seguir o sinal para o conceito “certo” em Libras, seguido da soletração manual da mesma palavra. FIGURA 27 – SOLETRAÇÃO MANUAL X SINAL FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 20 fev. 2021. 88 Língua brasileira de sinais Ferreira Brito (2010) cita que os parâmetros linguísticos permitem segmentar os sinais em seus elementos constitutivos, apesar de alguns estudiosos questionarem atualmente essa verdade preferindo olhar os sinais como um conjunto de elementos sequenciais. Diferentemente de pesquisadores como Stokoe et al. (1976), Klima e Bellugi (1979), entre outros nomes que salientaram a disposição simultânea dos segmentos dos itens lexicais das línguas espaço- visuais ou visual-espacial. As palavras dos pares linguísticos Português e Libras se estruturam por unidades mínimas sonoras e espaciais distintas, visto que quando são substituídas criam uma nova forma linguística que apresenta um signifi cado diferente do inicial. Veja na fi gura a seguir um exemplo em Libras para compreender isso melhor. FIGURA 28 – SINAIS APRENDER E LARANJA FONTE: <https://www.libras.com.br/os-cinco-parametros- da-libras>. Acesso em: 23 fev. 2021. à Os dois sinais que apresentamos têm pontos de articulação e signifi cados diferentes, na única questão que são iguais é no movimento. O primeiro sinal (APRENDER) tem seu ponto de articulação na testa, enquanto que o segundo (LARANJA) é articulado na boca do emissor. Percebemos que existe uma característica que distingue os sinais que é o ponto de articulação, assim as especifi cidades que conferem a cada sinal, como /na testa/ e /na boca/, chamamos de unidades mínimas distintivas que equivalem aos fonemas das palavras mala e bala do português, /m/ e /b/, que também diferenciam as formas linguísticas e seus signifi cados. 89 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 As palavras APRENDER e LARANJA, em LIBRAS, e mala e bala, em português, são pares mínimos, pois, suas formas fonológicas são idênticas em tudo, exceto em uma característica espacial que é o ponto de articulação. Ainda nos referindo a pares linguísticos, concordamos que os exemplos apresentados, as palavras em Libras, também são constituídos a partir de unidades mínimas distintivas, conhecidas por fonemas nas línguas orais. Estudos apontam que o número dessas unidades é fi nitamente pequeno, pois, seguem o princípio de economia, eles se combinam para gerar um número infi nito de formas ou palavras. Corroborando essa ideia, entendemos que o léxico da língua brasileira de sinais se comporta como o léxico de qualquer língua, é infi nito no sentido de que sempre comporta a geração de novas palavras. Em tempos passados, era natural pensar que a Libras era uma língua inferior e até mesmo pobre, pois apresentava um número reduzido de sinais/palavras. Pode acontecer o fato de que uma língua que não é usada em todos os setores da sociedade ou que é usada em uma cultura bem distinta da que conhecemos não apresente vocábulos ou palavras para um determinado campo semântico, entretanto, isso não signifi ca que esta língua seja pobre porque potencialmente ela tem todos os mecanismos para criar ou gerar palavras para qualquer conceito que vier a ser utilizado pela comunidade que a usa (STROBEL; FERNANDES, 1998, p. 27). A criação dos sinais segue o fl uxo natural do desenvolvimento da língua. É importante registrar que não é aleatória a combinação de unidades mínimas distintivas para a formação de sinais. As restrições impostas pela própria língua limitam determinadas formas que não são aceitas em um sistema linguístico enquanto que em outro acontecem de maneira natural e progressiva. Um exemplo muito prático disso é que o padrão fonológico do Português é formado por CV (consoante + vogal) e qualquer outra forma de expressão não é identifi cada como parte da estrutura linguística do Português, diferentemente de outras línguas orais que aceitam esse tipo de formaçãonaturalmente. Uma palavra com três ou mais consoantes sequencialmente foge dos padrões fonológico do Português e causa estranheza aos falantes. Em Libras acontece a mesma situação, se um sinal for constituído a partir das unidades mínimas, o mesmo será aceito como válido se obedecer aos padrões linguísticos da língua. Por exemplo, em alguns sinais, aceita-se que ambas as mãos sejam principais na formação do sinal, como no caso do sinal de 90 Língua brasileira de sinais CACHORRO, VER e SURDO. Porém, o mesmo não é possível para o sinal de LEI, em que o articulador principal é a mão esquerda ou em que a mão direita é a mão de apoio. Essa sinalização não será considerada uma sequência sinalizada bem formada da Libras. No paragrafo anterior apresentamos nas palavras CACHORRO, VER e SURDO outros exemplos de unidades mínimas distintivas, pois, distinguem as palavras, como nos sinais, APRENDER e SÁBADO, que diferem apenas pelo ponto de articulação: testa e boca, respectivamente. O mesmo acontece com as palavras pata e bata, em Português, que se diferenciam pela fonética. Assim, /p/ e /b/ são duas unidades mínimas distintivas no Português, o que as diferem é a natureza das unidades que são modalidade oral-auditiva e a modalidade visual- espacial, obedecendo os parâmetros linguísticos estruturais da língua de sinais brasileira. 4 FONOLOGIA X MORFOLOGIA DA LIBRAS FIGURA 29 – ESTRUTURA LINGUÍSTICA FONTE: <https://cnte.org.br/index.php/menu/comunicacao/giro-pelos- estados/63465-mt-prefeito-fere-principios-da-educacao-e-direitos- humanos-em-uma-canetada>. Acesso em: 16 mar. 2021. 91 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 Nesse tópico versaremos sobre a diferença que existe primeiramente entre fonética, fonologia e, na sequencia, o que as distinguem da morfologia das línguas de sinais. Todas são áreas da linguística, porém as duas primeiras se dedicam a estudar as unidades mínimas dos sinais que não apresentam signifi cados isolados. A fonética investiga o aspecto físico das unidades mínimas, descreve as propriedades articulatórias da confi guração de mãos, movimento, locação e as expressões faciais e corporais das línguas de sinais. Logo, podemos afi rmar que a fonética é a área responsável pelo estudo das bases visuais e fi losófi cas que são relacionadas com a produção, independentemente da função que as unidades mínimas podem desempenhar. A representação das unidades básicas da fonética é transcrita entre colchetes e seu principal objetivo é perceber as diferenças produzidas que estão relacionadas aos diferentes signifi cados dos sinais que se opõem quanto à confi guração de mão, ao movimento e à locação, operando com seu próprio método. Em se tratando da fonologia, seu campo de pesquisa são os sistemas fonológicos das línguas, o conjunto de elementos abstratos relacionados entre si. 4.1 MORFOLOGIA APLICADA À LÍNGUA DE SINAIS O vocábulo morfologia signifi ca a junção de duas palavras de origem Grega, que são: Morfo= Forma e Logia= Estudo. Morfologia é a área que pesquisa como se constituem as unidades menores de signifi cado ou sentido que estão no interior das palavras/sinais. Anteriormente apresentamos que a fonética e a fonologia se preocupam com a percepção corporal para receber e produzir o input linguístico, tendo como foco principal os parâmetros. A morfologia investiga como a palavra/ sinal é constituído em pequenas unidades de signifi cados que são denominados morfemas que podem corresponder tanto a uma palavra quanto a um sinal com signifi cado real, visto que a característica fundamental no morfema é sua signifi cância, sem ela não há morfema. O sinal, assim como a palavra ou léxico, possui um radial que é o principal elemento que traz o signifi cado real desse sinal. No Português identifi camos sufi xos, prefi xos e radicais que são unidades constituintes das palavras, que se unem a um radical para dar novo sentido para a palavra original. Os processos de morfologia do Português são bastante similares com o que acontece com outras línguas, como a composição da língua japonesa e da Libras, em que esse processo acontece também de maneira natural. É possível observar que na língua japonesa um sinal ou kanji pode se transformar em uma nova palavra apenas pela incorporação de mais um sinal. Esse fenômeno também acontece na Libras, 92 Língua brasileira de sinais quando agregamos a um sinal completo mais um sinal para formar um novo conceito. Veja no quadro a seguir o que acontece com algumas palavras na língua japonesa. QUADRO 3 – SINAL X PALAVRA EM JAPONÊS FONTE: As autoras 木 Árvore 林 Bosque 森 Floresta Sendo os morfemas as unidades mínimas de signifi cado das palavras, é importante perceber que a composição de dois ou mais sinais faz surgir um novo signifi cado, uma nova palavra. Assim como em algumas línguas orais, outra característica importante que também está presente na língua de sinais é a existência de palavra/sinal com apenas um morfema enquanto que outros sinais podem apresentar dois ou mais morfemas. Algumas palavras/sinais possuem apenas um morfema, mas se agregar-se outros sinais a elas/eles, acaba por criar-se novos signifi cados. Esse fato é comum na língua de sinais. A seguir exploraremos como acontece a morfologia em língua de sinais, discutindo a questão da composição e incorporação entre outros conceitos morfológicos que constituem a língua de sinais e asseguram o status de língua natural humana. • COMPOSIÇÃO DO SINAL Sinais Monomorfêmicos, como caneta, fl or, casa e sol, possuem apenas um morfema, não existe a possibilidade de dividir essas palavras/sinal, porém, em alguns casos ao agregar outro sinal, um signifi cado diferente surge e transforma o conceito do radical. Isso acontece nas seguintes palavras: chaminé (casa + fogo no telhado da casa), espinho (fl or + CL de espinho no caule), pincel de quadro (caneta + CL de quadro com movimentos de escrita). Nota-se que nesses exemplos o uso de classifi cadores (CL) foi necessário para melhor compreensão do novo sinal. A composição do sinal para a formação de um novo conceito acontece de maneira natural na Libras e auxilia no léxico da língua. • INCORPORAÇÃO DO SINAL A incorporação do sinal surge com a mesma naturalidade que a composição, porém não é tão evidente. No entanto, incorporar sinais é fundamental para a formação linguística da Libras. Em alguns casos, a incorporação faz com que aconteça uma forma de resumo de dois ou mais sinais. Por exemplo, nos sinais de 2 horas, 3 horas, 4 horas, entre outros, não há necessidade de sinalizar o numeral e depois o sinal de horas (nesse caso hora percorrida), ao invés de toda essa manobra, costumamos confi gurar o sinal do numeral no ponto de articulação 93 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 do sinal de horas e com o mesmo movimento. Isso também é muito comum no sinal de 1 real e 2 reais. Na incorporação, as informações de ambos sinais já fi cam perceptíveis em apenas um único sinal, fazendo com que a incorporação aconteça naturalmente entre os usuários da língua. Na língua de sinais é muito comum também termos dois morfes com o mesmo signifi cado que compõe o mesmo morfema, esse fenômeno linguístico defi nimos como alomorfes. • ALOMORFES Os alomorfes são considerados variantes de um mesmo morfema, nesses casos, um sinal pode ser realizado com a confi guração de mãos diferente, ainda assim continua sendo o mesmo sinal. Isso acontece no caso do sinal de casa, quando a confi guração de mão pode estar aberta com o polegar afastado, ou em B, ambos com o mesmo movimento e mesmo ponto de articulação. Outro exemplo é o sinal de problema, em que uma mão está em L, enquanto a outra mão, responsável pelo movimento, pode estar em confi guração de mão em D ou também em confi guração de mão em L.Uma situação muito comum que acontece nas línguas de sinais é mais de um sinal para apenas um signifi cado, ou seja, uma palavra com mais de um sinal para representar o seu sentido. No morfema chão, por exemplo, é uma situação muito comum que podemos perceber essa particularidade. Avião pousar chão (o chão é representado pelo antebraço), pessoa fi car de pé chão (o chão é representado pela palma da mão virada para cima). Em ambos exemplos percebemos que o sinal de chão está representado de maneira diferente, porém, o sentido continua o mesmo, depende do contexto no qual está inserido. Esse fator acontece com vários morfemas nas línguas de sinais. 1 O parâmetro Movimento ocorre durante a articulação do sinal, podendo ocorrer mudanças na confi guração de mão, alterando o movimento interno da mão e também a confi guração dos dedos. Durante a leitura deste material, você estudou alguns dos tipos de movimentos na Libras. Assinale a seguir alternativa que corresponde à veracidade do conteúdo apresentado, marcando V para verdadeiro e F para falso. ( ) Movimentos linear e retilíneo. ( ) Movimentos circulares. ( ) Apenas movimentos simultâneos, alternando com ambas as 94 Língua brasileira de sinais mãos para a frente e em direção à direita e esquerda. ( ) Movimento linear, retilíneo, circular. ( ) Nenhuma das alternativas se aproxima da veracidade. 2 Em se tratando da direcionalidade dos sinais da Libras, a unidirecional ocorre quando o movimento é realizado em uma direção no espaço, já a bidirecional acontece quando o movimento do sinal é realizado por uma ou ambas as mãos, em direções diferentes, enquanto que a multidirecional se faz, quando no momento da realização de alguns sinais, os movimentos podem explorar várias direções no espaço. A direcionalidade é uma característica que vem a somar na formação da estrutura da Libras e, juntamente com as palavras/vocábulos, são considerados os sinais da Libras. De acordo com o material estudado, correlacione a coluna da direita com a coluna da esquerda, analisando a veracidade dos fatos. Direcionalidade Sinal/palavra (1) Multidirecional ( ) Julgamento, trabalhar (2) Unidirecional ( ) Incomodar (3) Bidirecional ( ) Proibido (a), aceitar • EXPRESSÕES NÃO-MANUAIS Na Libras a expressão não-manual compõe de maneira fundamental o sentido do sinal, favorece a compreensão e a organização da estrutura e composição da frase. Veja a seguir um quadro com a distribuição das expressões não-manuais à luz de Ferreira-Brito (1995). QUADRO 4 – EXPRESSÕES NÃO-MANUAIS ROSTO Parte superior ROSTO Parte Inferior CABEÇA ROSTO/CABEÇA Sobrancelhas franzi- das Bochechas infl adas Balanceamento para frente e para trás (sim) Cabeça projetada para a frente Ex.: O quê? Olhos arregalados Bochechas contraídas Balanceamento para os lados (não) Cabeça projetada para a frente, olhos levemente cerrados Ex.: Quando? Como? 95 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 Lance de olhos Lábios contraídos e projetados e sobrance- lhas franzidas Inclinação para a frente Cabeça projetada para a frente, sobrancelhas franzidas Ex.: Quando? Por quê? Sobrancelhas levan- tadas Correr da língua contra a parte inferior interna da bochecha Inclinação para o lado Inclinação para trás Cabeça projetada para trás e olhos arrega- lados Ex.: Quem? XXXXXXXXXX XXXXXXXXXX Apenas a bochecha direita infl ada XXXXXXXXXX XXXXXXXXXX XXXXXXXXXX Contração do lábio superior XXXXXXXXXX XXXXXXXXXX XXXXXXXXXX Franzir do nariz XXXXXXXXXX XXXXXXXXXX FONTE: Ferreira-Brito e Langevin (1995 apud QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 61) Prezado acadêmico, até o momento você aprendeu acerca da estrutura gramatical de Libras; conheceu os parâmetros; estudou sobre morfologia e fonologia da língua brasileira de sinais; e identifi cou como se estruturam as palavras das línguas Portuguesa e Libras a partir de suas unidades mínimas distintivas ou “fonemas”. Agora precisamos discutir sobre como se formam as palavras da Libras a partir de seus morfemas/unidade mínimas de signifi cação. • Morfemas lexicais e morfemas gramaticais Os morfemas em Libras se apresentam de maneira diferente e nem sempre aqueles que formam as palavras são equivalentes aos que formam as palavras no Português. Essas unidades podem apresentar em sua estrutura funções lexicais ou gramaticais, conforme ilustramos no quadro a seguir. Língua portuguesa 96 Língua brasileira de sinais QUADRO 5 – MORFEMAS LEXICAL E GRAMATICAL Morfema Lexical Morfema Gramatical Possível im (negação) Casa s (plural) Constru ção (nome) FONTE: <http://segredos-abominantes.blogspot.com/2012/11/ libras.html>. Acesso em: 29 fev. 2021. No entanto, quando falamos em língua de sinais brasileira, os morfemas se apresentam de maneira diferenciada, até porque a estrutura da língua é diferente da língua oral. Na sequência ilustramos alguns morfemas para melhor compreensão, à luz das pesquisas de Ferreira-Brito (1995), buscando apresentar alguns sinais/palavras que possibilitam que você faça relações e busque novos exemplos para favorecer sua aprendizagem. QUADRO 6 – MORFEMAS LEXICAL E GRAMATICAL DA LIBRAS Morfema lexical Morfema Gramatical SENTAR Movimento repetido Marca de nome BONITO Expressão facial Marca de grau aumentativo FALAR Mãos em movimentos longos Marca aspecto continuativo PEGAR CL de objetos redondos e grandes Marca tamanho PEGAR CL de objetos pequenos Marca tamanho SABER Movimento da mão para fora Marca aspecto continuativo NÃO SABER Movimento da mão para fora Marca aspecto continuativo de negação FONTE: <http://segredos-abominantes.blogspot.com/2012/11/ libras.html>. Acesso em: 29 fev. 2021. Veja na fi gura a seguir algumas ilustrações dos sinais gramaticais que pontuamos no quadro anterior. 97 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 FIGURA 30 – SINAIS REFERENTES AO QUADRO FONTE: <http://segredos-abominantes.blogspot.com/2012/11/ libras.html>. Acesso em: 29 fev. 2021. FIGURA 31 – SINAIS REFERENTES AO QUADRO FONTE: <http://segredos-abominantes.blogspot.com/2012/11/ libras.html>. Acesso em: 29 fev. 2021. 5 FORMAÇÃO DE SINAIS EM LIBRAS Não é possível desvincular a morfologia de Libras dos aspectos formativos de sinais e palavras, mas é importante saber acerca da estrutura interna dos sinais e as regras que norteiam a formação dos sinais que são reconhecidos pela comunidade surda. O número considerável de processos formativos dos sinais em Libras é revelado por meio de pesquisas acerca da estrutura morfológica e lexical da língua. Tais processos acontecem por meio da derivação, composição, incorporação de numeral e incorporação da negação. Ferreira-Brito (1995), Quadros e Karnopp (2004) e Felipe (2006) são pesquisadores que abordam os processos formadores dos sinais em Libras e pretendemos à luz desses autores discorrer de uma maneira geral o tema proposto no título. 98 Língua brasileira de sinais As línguas de sinais são fl exíveis por serem capazes de referenciar qualquer tempo ou coisa que se apresente, elas são arbitrárias visto que muitos sinais não estão ligados à forma ou modelagem daquele que intenciona a fala, na arbitrariedade, muitas vezes, o sinal não tem uma explicação lógica para a relação entre as formas, na confi guração de mãos e em seus respectivos signifi cados. A produtividade é uma marca também das línguas de sinais, pois vários são os enunciados que podem ser criados por meio das regras naturais da língua, a dupla articulação é outra marca evidente considerando que se organizam em duplo estratos que são: as unidades formacionais (correspondem às unidades de som nas línguas orais) e as suas combinações simultâneas. As regras e os parâmetros do léxico que é organizado de acordo com as normas internalizadaspelos falantes da língua contribuem igualmente para o status de língua natural humana. A complexidade gramatical na estrutura frasal de Libras revela importantes processos que são responsáveis pela criação de novos sinais. Exibe uma variedade lexical e inúmeras combinações entre os morfemas que possibilitam a formação de novos sinais. Essas combinações acontecem por meio da composição, aglutinação, justaposição e derivação, e os morfemas lexicais são (raízes/radicais) que se fi xam a morfemas gramaticais formantes que são (desinências e vogais temáticas) e/ou a derivacionais (afi xos e clíticos). À luz de Felipe (2006), concordamos com a autora quando ela afi rma que os cinco parâmetros das línguas de sinais expressam morfemas por meio de confi gurações de mão, movimentos, movimentos diferenciados, pontos de articulação na estrutura morfológica e na expressão facial com ou sem o movimento de cabeça que acompanha o sinal. As transformações desses morfemas são capazes de transformar o léxico da língua. A autora ainda afi rma que as alterações desses morfemas podem ser Lexicais, podendo ser uma raiz ou um radical (M3); morfemas derivacionais, que podem ser um afi xo (alterações em M e CM4); ou morfemas gramaticais, caracterizando uma desinência, ou seja, uma marca de concordância número pessoal (DIR5) ou de gênero (CM) (FELIPE, 2006, p. 201). Outra característica desses processos formadores da Libras é que os processos derivacionais são capazes de formar novas palavras tendo como base as palavras já existentes na própria língua e que acontecem por meio também da derivação, da composição e da incorporação. Versaremos individualmente, a seguir, sobre esses processos formativos, de maneira mais detalhada e pontual. 99 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 5.1 FORMAÇÃO DE SINAIS POR DERIVAÇÃO, COMPOSIÇÃO E INCORPORAÇÃO A derivação e a composição são elementos fundamentais na formação de sinais em Libras, sendo o mesmo processo que ocorre no Português, porém, as características da língua de sinais são naturalmente as de uma língua visual. Podemos fazer uso dos exemplos que apresentamos no subtópico anterior para exemplifi car a formação dos sinais tanto por derivação como por composição. A morfologia da Libras ocorre de maneira diferenciada daquela que estrutura as línguas orais, principalmente o Português, porém, estudos apontam que é comum os usuários da língua oral, no momento em que se deparam com os aspectos morfológicos da Libras durante seu uso, assumirem como referência os seus conhecimentos referentes à produção e percepção (fala e audição) de sua língua oral auditiva. No entanto, é importante ressaltar que os estudos linguísticos das línguas de sinais exigem uma compreensão diferenciada, visto que se trata de uma língua visual-espacial. Muitos estudiosos brasileiros apontam para um número reduzido de pesquisas acerca da morfologia da Libras. Esse fato contribui para novas análises em uma área específi ca dos fatos linguísticos da morfologia. • DERIVAÇÃO Do sinal SENTAR deriva o sinal de CADEIRA, porém o primeiro faz o movimento repetitivo. BONITÃO é derivado de BONITO. É a adjunção da expressão facial que marca o grau aumentativo. O sinal de BONITINHO também é derivado de BONITO e, por meio da adjunção do afi xo expressão facial Ô, marca o grau diminutivo. O sinal FALAR-SEM-PARAR é derivado do sinal de FALAR quando temos a adjunção da mão esquerda juntamente com alongamento. A repetição e a 100 Língua brasileira de sinais intensidade dos movimentos deixam marcado o aspecto continuativo. PEGAR-BOLA é um sinal que é derivado do sinal de PEGAR, em que temos a adjunção do afi xo que classifi ca objetos redondos grandes; enquanto que o sinal de PEGAR-AGULHA também é derivado do sinal de PEGAR, por meio da afi xação do morfema gramatical que classifi ca objetos menores e pequenos, como uma agulha. NÃO-SABER é derivado do sinal SABER e, através da afi xação de um movimento da mão para fora, marca fortemente o morfema negativo. Os sinais que buscamos apresentar é uma breve exemplifi cação do processo de derivação, que se formam por meio de seus radicais que se unem aos afi xos ou se juntam a morfemas gramaticais para formar novos sinais/palavras derivadas. O processo derivacional é aquele que deriva de nomes de verbos ou também de verbos nomes para a sua formação. Cabe ressaltar que em Libras temos o processo chamado de nominização que são os nomes que derivam de verbos. Quadros e Karnopp (2004), embasadas em pesquisas de Supalla e Newport (1978) sobre a Língua de Sinais Americana (ASL), revelam que na Língua Brasileira de Sinais nomes podem derivar de verbos por meio da mudança no tipo de movimento. O movimento dos nomes repete e o movimento dos verbos encurta, como em SENTAR (verbo) e CADEIRA (substantivo), exemplo que já citamos anteriormente. Os itens lexicais são diferenciados quanto a sua função nos contextos linguísticos em que estão inseridos. Entendemos então que o contexto linguístico é responsável por identifi car se o sinal corresponde a um verbo ou a um nome. Nos exemplos dos sinais DIRIGIR e CARRO, essa constatação se anuncia de maneira muito assertiva. O sinal DIRIGIR é utilizado em frases como: EU DIRIGIR (verbo) ÔNIBUS EMPRESA TRABALHAR. Enquanto que no sinal CARRO é utilizado em frases como: EU VENDER CARRO (substantivo) NOVO PRECISAR DINHEIRO. O que defi ne se o item lexical é substantivo ou verbo é o contexto da frase em que está inserido, visto que o substantivo e o verbo possuem a mesma confi guração de mão, locação e movimento. • COMPOSIÇÃO É importante sabermos que os sinais também podem se formar pela composição. Esse processo acontece pela adjunção de dois ou mais sinais simples. CASA + ONDE = MORAR, HOMEM + PEQUENO = MENINO, MULHER 101 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 + CASAR = ESPOSA. Para Felipe (2006), a composição no processo de formação de sinais em Libras pode se realizar de três maneiras: • Justaposição de dois itens lexicais como no sinal de ALMOÇAR, que é formado pela junção de MEIO-DIA + COMER. • Justaposição de um classifi cador com um item lexical como no sinal de FORMIGA, formado pela junção de INSETO + COISA PEQUENA. • Justaposição da datilologia da palavra em português com o sinal que representa a ação realizada pelo substantivo: AGULHA, formado pela junção de COSTURAR-COM-AGULHA com a datilologia de A-G-U-L- H-A. Cada sinal tem um signifi cado próprio quando realizado isoladamente. Ao se unirem para formar um novo sinal, passam a ter um novo signifi cado. Na maioria das vezes, tais sinais compostos têm o signifi cado bem distante do signifi cado dos sinais de base. Por isso, é correto afi rmar que, no resultado do processo de composição, não há como prever o signifi cado do novo sinal somente observando o signifi cado dos sinais de base. Quadros e Karnopp (2004) apontam que para além dessas três maneiras no processo de composição em Libras, temos ainda igual número de regras morfológicas utilizadas também na criação de sinais compostos. o Regra do contato: momento em que dois sinais ocorrem juntos para formar um sinal composto, mantendo o contato de ambos. Exemplo: o sinal composto IGREJA, formado pelos sinais CASA e CRUZ, em que o contato do primeiro e do segundo sinal é mantido no composto. o Sequência única: quando em sinais compostos o movimento interno ou a repetição do mesmo movimento é eliminada, diferentemente dos sinais separados que mantêm a repetição dos movimentos. Por exemplo: os sinais PAI e MÃE, quando se unem, formam o sinal PAIS e o movimento inicial é eliminado. o Antecipação da mão não dominante: a mão passiva do sinalizador antecipa o segundo sinal no processo de composição. Por exemplo: no sinal composto ACREDITAR, ESTUDAR, LEI,a mão não dominante fi ca no espaço neutro em frente ao sinalizador com uma confi guração de mão que faz parte do composto. • INCORPORAÇÃO A incorporação também é um processo muito comum que ocorre na formação 102 Língua brasileira de sinais dos sinais/palavras em Libras. Seguindo novamente pesquisas de Quadros e Karnopp (2004), encontramos dois tipos de incorporação na língua de sinais brasileira, que são: a incorporação de numeral e a incorporação da negação. As autoras revelam que os chamados morfemas presos, que são unidades mínimas com signifi cado que não ocorrem sozinhos, podem se combinar com um morfema livre para a composição de um novo signifi cado em Libras. • Incorporação de numeral: a alteração apenas da confi guração de mão (de 1 para 2, para 3 ou para 4) de um sinal pode transformar o número de meses, anos, dias e outros advérbios, sem a mudança dos outros componentes dos sinais. Esse fato acontece nos exemplos de UM-MÊS, DOIS-MESES, TRÊS-MESES e QUATRO-MESES. Esses sinais são formados por dois morfemas presos: um morfema signifi ca MÊS e abrange a orientação da mão, a locação e as expressões não-manuais; e o outro morfema é a confi guração de mão, que leva o signifi cado de um numeral. Nesse exemplo os morfemas são executados concomitantemente, formando o sinal UM-MÊS, DOIS-MESES, TRÊS-MESES ou QUATRO- MESES, dependendo do numeral que é incorporado. Quadros e Karnopp não estão isoladas em sua concepção acerca dessa constatação, pois Felipe (2006, p. 204) também confi rma a existência do processo de incorporação de numeral, afi rmando que: “a incorporação do numeral representando os numerais de um até quatro através de confi gurações de mão, acrescenta à raiz um quantifi cador”. Cabe observar que a autora orienta que a partir do numeral cinco ocorre a separação dos sinais. • Incorporação da negação: neste processo, o item lexical negado sofre alteração em um dos parâmetros (geralmente no movimento), resultando sem sua contraparte negativa (FERREIRA-BRITO, 1995). Embasadas em Felipe (2006), compreendemos sua constatação de que essa alteração ocorre da seguinte forma: o sufi xo de negação se incorpora à raiz de alguns verbos (que possuem uma raiz com um primeiro movimento), fi nalizando-os com um movimento contrário, como o verbo GOSTAR e a sua contraparte NÃO-GOSTAR. A negação por meio da expressão facial também é apresentada por Felipe (2006) e Ferreira-Brito (1995). As pesquisas desses autores apontam que a negação por meio da expressão facial pode ser incorporada ao sinal sem alterar os parâmetros. De acordo com Felipe (2006), o infi xo de negação se incorpora à raiz de alguns verbos por meio do movimento negativo da cabeça. Essa expressão facial é realizada simultaneamente ao sinal, como no verbo PODER e na sua contraparte NÃO-PODER, SABER, NÃO-SABER, GOSTAR E NÃO- GOSTAR. 103 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 1 Existem processos formativos dos sinais que compõe a estrutura gramatical da Libras em seu aspecto morfológico e lexical. No decorrer deste capítulo você estudou alguns desses processos e agora é necessário que revele sua compreensão do conteúdo apresentado. Ferreira-Brito (1995), Quadros e Karnopp (2004) e Felipe (2006) são pesquisadores que abordam os processos formadores dos sinais em Libras e foram a base principal para a escrita deste capítulo. Discorra de maneira geral como acontece os principais processos formativos da Libras à luz dos autores citados. 6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Neste capítulo, apresentamos questões acerca da estrutura gramatical das línguas de sinais, especifi camente da Libras. Buscamos embasamento teórico em estudiosos renomados para abrir a discussão sobre morfologia, fonologia, léxico e formação de sinais. Para além da conversa com esses importantes conceitos, compreendemos como acontece a formação das palavras/sinais e o processo cognitivo que acontece por trás de cada um na valorização da aprendizagem de uma língua gestual-visual. Com as particularidades apresentadas no decorrer deste capítulo buscamos apresentar especifi cidades de uma das partes da gramática de Libras, no entanto, muitos outros itens devem ser abordados para complementar seu aprendizado. A Libras e todas as línguas orais-auditivas ou viso-espaciais existentes no mundo possuem sua independência linguística e, com isso, apresentam processos responsáveis pela formação de novas palavras/sinais dessas línguas. Tal independência linguística torna a Libras uma língua viva e com movimento contínuo. REFERÊNCIAS BATTISON, R. Phonological deletion in american sign language. Sign Language Studies, v. 5, p. 1- 19, 1974. BATTISON, R. Lexical borrowing in american sign language. Silver Spring. MD: Linstok, 1978. 104 Língua brasileira de sinais CASTRO, A. R.; CARVALHO, I. S. Comunicação por língua brasileira de sinais: livro básico. 3. ed. Brasília: Senac/DF, 2011. DUBOIS, J. et al. Dicionário de linguística. Traduzido por Frederico Pessoa de Barros et al. São Paulo: Cultrix, 1989. FARIA-NASCIMENTO, S. P. Representações lexicais da Língua de Sinais Brasileira: uma proposta lexicográfi ca. Brasília. Tese (doutorado) – Instituto de Letras, Universidade de Brasília, 2009. FARIA-NASCIMENTO, S. P. Metáfora na LSB: por debaixo dos panos ou a um palmo de nosso nariz?. ETD. Educação Temática Digital, v. 7, n. 2, 2006. Disponível em: http://143.106.58.55/revista/v. Acesso em: 22 dez. 2020. FELIPE, T. A. O discurso verbo-visual na língua brasileira de sinais – Libras. 2013. 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Sistema Ferreira Brito-Langevin de Transcrição de Sinais. In: FERREIRA – BRITO, L. Por uma gramática de língua de sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1995. FERREIRA, L. Por uma gramática de língua de sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2010. 105 OS PARÂMETROS FORMATIVOS EM LIBRAS – ESTUDOS APLICADOS A FONÉTICA E A MORFOLOGIA Capítulo 2 FIGUEIREDO SILVA, M. C. Morfologia. Florianópolis: UFSC, 2009. Disponível em: http://www.libras.ufsc.br/colecaoLetrasLibras/eixoFormacao Basica/ morfologia/assets/430/Texto_Base_Morfologia_21_Fev_2009.pdf. Acesso em: 20 mar. 2021. KLIMS, E.; BELLUGI, U. Perception and Production in a Visually Based Language. In: AARONSON, D.; RIEBER, R. W. Rieber. Developmental Psycholinguistic and Communication Disorders. New York: The New York Academy of Sciences, 1975. KLIMS, E.; BELLUGI, U. The signs of language. Massachusetts: Harvard University Press, 1979. QUADROS, R. M.; KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos linguísticos. 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The derivation of nouns and verbs in american sign language. In: SIPLE, P. Understanding language through sign language research. New York: Academic Press, 1978. 106 Língua brasileira de sinais UZAN, A. J. S.; OLIVEIRA, M. R. T. O.; LEON, O. R. A importância da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) como língua materna no contexto da Escola do Ensino Fundamental. Paraíba-PB: XII Encontro Latino Americano de Iniciação Científi ca e VIII Encontro Latino Americano de Pós- Graduação – Universidade do Vale da Paraíba, 2008. Disponível em: http://www.inicepg. univap.br/cd/INIC_2008/anais/arquivosINIC/INIC1396_01_A.pdf. Acesso em: 3 mar. 2021. VIOTTI, E. Introdução aos estudos linguísticos. Texto-base: Letras Libras EaD – Universidade Federal de Santa Catarina, 2008. CAPÍTULO 3 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: • explorar a ordem das relações sintáticas em língua brasileira de sinais; • identifi car os tipos de sintagmas em Libras; • compreender ambiguidade lexical em Libras; • entender os estudos dos signifi cados e os signifi cantes aplicados à língua de sinais; • empregar os componentes sintáticos em Libras; • organizar os elementos de uma oração por meio dos sintagmas; • comparar e classifi car as expressões dêiticas em Libras; • examinar os sinais diferentes com os mesmos signifi cados. 108 Língua brasileira de sinais 109 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 1 CONTEXTUALIZAÇÃO No Capítulo 2, estudamos acerca da morfologia da Libras, viajamos pelos conceitos e estrutura da língua de sinais brasileira e buscamos compreender a importância dos parâmetros linguísticos que asseguram a criação dos sinais. Entendemos que o parâmetro da Libras é necessário para estabelecer a comparação e obedece a um modelo de regra pré-fi xada necessária para compreender o que é verdadeiro e aceitável em uma língua natural. Tais regras fazem parte de um sistema linguístico que possui outras tantas regras estruturais. Cabe-nos ainda versar sobre a sintaxe, pragmática e semântica, sem deixar de mencionar a formação das sentenças, os sentidos das palavras, a importância dos classifi cadores e dos verbos para formar o corpo estrutural da Libras. Sabemos que a limitação de linhas não nos permite abraçar profundamente todas essas e outras questões linguísticas, porém, traremos a base mais sólida possível para que o conhecimento desse assunto atinja o seu objetivo maior, que é a sua aprendizagem. 2 OS ASPECTOS RELACIONADOS À SINTAXE EM LIBRAS: A FORMAÇÃO DAS SENTENÇAS Uma das principais características das línguas humanas é proporcionar a comunicação entre os usuários. A comunicação é fundamental para que a vida em sociedade aconteça de maneira plena e tal interação se estabelece a partir do momento em que o sujeito entra em contato com o ambiente da sua linguagem natural por meio da interação entre os pares. Porém, em alguns casos, as barreiras de comunicação impedem o processo de aquisição da língua, prejudicando as relações sociais. A língua brasileira de sinais, nos últimos anos está com maior difusão e seu ensino acontece de maneira mais frequente com cada vez mais pessoas interessadas em seu aprendizado. A estrutura da Libras é rica em todas as suas partes e a sintaxe, semântica e a pragmática desenham de maneira formal a linguística da língua. • Sintaxe Entendemos a Sintaxe como a área que estuda as regras que orientam a construção e formação de frases nas línguas naturais. A linguística compreende que essa é a parte da gramática que se ocupa da disposição das palavras na frase e em seus discursos, realizando as combinações para que a compreensão dos signifi cados e a comunicação aconteçam de maneira satisfatória. 110 Língua brasileira de sinais Esse estudo da estrutura da frase comprova que existem infi nitas combinações de palavras que os falantes de uma língua são capazes de compreender e produzir. • Semântica É o estudo que aborda o signifi cado da palavra e da sentença. Trata da natureza do signifi cado individual e coletivo das palavras nas orações, observando as variações regionais e sociais nos mais diversos dialetos. Podemos dizer que a semântica aborda o signifi cado na linguagem em uso com suas imagens acústicas, ou visuais, porém também trata das mudanças de sentido e das escolhas de novas expressões. • Pragmática Quando falamos de linguagem no seu contexto comunicacional, estamos nos referindo ao ramo da pragmática que está para além da construção frasal e da signifi cação que as sentenças apresentam. O objetivo principal da pragmática é o estudo da comunicação em seu contexto. Assim a pragmática é o ramo da linguística que observa o uso concreto da linguagem pelos falantes de uma língua em seus contextos e situações mais diversas. FIGURA 1 – SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA EM LIBRAS FONTE: <http://www.letras.ihl.unilab.edu.br/wp-content/uploads/2017/09/97ce91db- d743-4685-80c0-be8148780686.jpg>. Acesso em: 29 mar. 2021. 111 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 No capítulo anterior vimos que a base dos primeiros estudos linguísticos da Libras surgiu das pesquisas realizados por Stokoe (1978), ao se referir à língua de sinais americana (ASL) como língua estruturada com aspectos fonológicos e morfológicos, com parâmetros primários e secundários devidamente estabelecidos. Estudos igualmente relevantes na área da sintaxe da Libras, que foram idealizados por Ferreira-Brito (1995); Quadros (1999); e Quadros e Karnopp (2004), revelaram que existem diversas possibilidades acerca da temática observando a ordem postural dos constituintes e as diferentes sentenças externalizadas por eles. Compreendemos que a sintaxe é responsável por identifi car as relações dos elementos estruturais da frase e das regras que regem as orações. Cabe agora a necessidade de refl etirmos sobre os níveis sintáticos da língua brasileira de sinais. É fundamental perceber que a análise da sintaxe da Libras depende muito do espaço de execução do sinal, visto que as relações sintáticas fazem uso do seu sistema pronominal e nominal. Na sequência optamos por apresentar fi guras que revelam a diferença que existe na execução do movimento dos verbos direcionais que acompanham o pronome que identifi ca quem é o executor da ação. FIGURA 2 – VERBO DIRECIONAL FONTE: Monteiro (2015, p. 12) Sobre esse ponto de vista é possível perceber que o discurso na língua brasileira de sinais apresenta a referência estabelecida em um local no espaço da área de sinalização, esse espaço é o local referente no momento da execução do discurso em si. Os pontos de localização dos referentes são considerados de acordo com a posição em que se encontram, visto que eles podem estar ou não em interação, porém, cabe destacar que, se os referentes estiverem nulos na cena da interação, os pontos de localização passam a ser representados de maneira abstrata. 112 Língua brasileira de sinais FIGURA 3 – REFERENTES PRESENTES FONTE: Adaptado de Lillo-Martin e Klima (1990) Na fi gura anterior observamos a presença de referentes à esquerda e à direita do receptor e do sinalizante, ao realizar a sinalização de qualquer um desses referentes no discurso,deve-se fazer uso da localização exata de onde estão posicionados os envolvidos e assim garantir a correta adequação sintática do enunciado. Outros aspectos importantes na sintaxe da Libras e que foram apontados por Quadros e Karnopp (2004) são os não-manuais. Visto que em alguns discursos os enunciados são possuidores de verbos com concordância, devemos observar com atenção a marcação da localização de cada referente. As autoras mencionam na pesquisa delas a existência de trabalhos que tratam da fl exibilidade da ordem das frases como uma importante marca da sintaxe, porém, orientam que há uma ordem primária que é considerada básica na construção frasal, que é Sujeito-Verbo-Objeto (SVO). Afi rmam ainda que a fl exibilidade dessa ordem está diretamente relacionada com o mecanismo gramatical não-manual que consiste na elevação das sobrancelhas, usado para enfatizar uma passagem especial no enunciado. Essa importante marcação não-manual da língua brasileira de sinais chamamos de topicalização. 113 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 Assista à LIVE sobre a sintaxe de Libras e faça os apontamentos de acordo com suas interrogações. Disponível em: <https://www. youtube.com/watch?v=eohpzRcn81M>. FIGURA – LIVE SOBRE A SINTAXE DE LIBRAS FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=eohpzRcn81M>. Acesso em: 10 mar. 2021. 3 SEMÂNTICOS E PRAGMÁTICOS: PARTICULARIDADES LEXICAIS Anteriormente discutimos o conceito de semântica e de pragmática separadamente, porém, para que você compreenda melhor o conceito de cada uma e a relação existente entre elas, optamos por trabalhar aqui a semântica e a pragmática conjuntamente. Cabe salientar que inúmeras vezes o sentido sofre a infl uência do contexto pragmático e que as circunstâncias em que a transmissão da mensagem acontece devem ser observadas. O signifi cado possui diversas possibilidades de investigação e uma das que mais possui destaque é o estudo da relação existente entre o mundo e as expressões linguísticas. Do ponto de vista de Fiorin (2010, p. 138-139) Não se pode negar que uma das características importantes das expressões linguísticas é que elas são sobre alguma coisa. [...] Esse mundo sobre o qual falamos quando usamos a linguagem pode ser tomado como o mundo real, parte dele ou mesmo outros mundos fi ccionais ou hipotéticos. 114 Língua brasileira de sinais Sob essa ótica, corroboramos a afi rmativa de Fiorin (2010) e compreendemos que o mundo dos signifi cados é a relação que se estabelece entre a fala e a linguagem real. Alinhamos nosso pensamento com o do autor quando ele expressa que, quando conhecemos a verdade sobre a sentença, entendemos também em que circunstância de mundo essa sentença é verdadeira ou falsa. Ao pensarmos na língua brasileira de sinais e nas questões linguísticas que a envolve, entendemos que o signifi cado dos enunciados em Libras é infl uenciado pelos aspectos linguísticos sintáticos da classe morfológica. Silva (2006) soma com essa constatação quando revela que essa classe morfológica infl uencia substancialmente as relações semânticas e pragmáticas da língua. Percebemos aqui a importância de compreender o sentido verdadeiro que o verbo possui nas sentenças em Libras; e entender como acontece o seu comportamento na sintaxe, semântica e pragmática, visto que tais propriedades verbais determinam o seu comportamento, diferenciando seu comportamento pelos elementos linguísticos que revelam os participantes do enunciado, tempo ou lugar, conhecidos por elementos dêiticos. Felipe (2001) evidencia que, quando classifi camos os verbos em Libras, considerando suas características semânticas e morfológicas, eles são emoldados de acordo com os exemplos a seguir: • Verbos com fl exão número-pessoal: o parâmetro de direcionalidade é um marcador de fl exão de pessoa do discurso. FIGURA 4 – VERBO COM FLEXÃO PESSOAL (EX.1: PERGUNTAR) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 79) 115 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 FIGURA 5 – VERBO COM FLEXÃO PESSOAL (EX.2: RESPONDER) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 55) • Verbos com fl exão para locativo: além da direcionalidade considera o ponto de articulação como parâmetro de fl exão. FIGURA 6 – FLEXÃO DE LOCATIVO FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 19) Complete a sinalização utilizando o sinal de COPO, o sinal de MESA e realizando o locativo adequado para a estrutura frasal de Libras. Lembre-se de sinalizar a mesa de acordo com aquela que você tem registrada em sua memória (redonda, quadrada, oval); de observar como o copo está posicionado (deitado, virado etc.); e de realizar o movimento do copo em direção à mesa. Use a sua imaginação. 116 Língua brasileira de sinais • Verbo com fl exão para gênero: quando os classifi cadores são responsáveis por identifi car o gênero em Libras. FIGURA 7 – FLEXÃO DE GÊNERO (EX.1: PESSOA) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 34) FIGURA 8 – FLEXÃO DE GÊNERO (EX.1: PESSOA) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 46) FIGURA 9 – FLEXÃO DE GÊNERO (EX.1: PESSOA) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 34) 117 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 FIGURA 10 – FLEXÃO DE GÊNERO 2 (EX.2: VEÍCULO + PESSOA) Veículo-engarrafamento FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 40) FIGURA 11 – FLEXÃO DE GÊNERO 2 FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 45) Pessoa-Sentar (repetir o movimento de acordo com o número de pessoas) FIGURA 12 – FLEXÃO DE GÊNERO 2 FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 54) Fila: Fila paralelas 118 Língua brasileira de sinais FIGURA 13 – FLEXÃO DE GÊNERO 2 FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 61) Reunião: reunião de pessoas FIGURA 14 – FLEXÃO DE GÊNERO 3 (EX.3: CACHORRO CAMINHANDO) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 73) FIGURA 15 – CACHORRO CAMINHANDO FONTE: <https://fofuxo.com.br/saude/passeios-recomendados- dia-cao.html>. Acesso em: 20 maio 2021. 119 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 3.1 O CONTEXTO EM LIBRAS É importante perceber que o contexto em que está acontecendo o enunciado transforma toda a cena, considerando que um dos principais objetivos da língua é comunicar, enquanto que o objetivo da comunicação é fazer-se entender para que a interação e a troca aconteçam de maneira satisfatória. Em Libras, para que os interlocutores estabeleçam uma comunicação compreensível, as regras convencionas devem ser respeitadas pelos usuários. Sobre a importância dessas convenções linguísticas, Bernardino (1999) nos revela que, quando um indivíduo deseja socializar informações, deve fazer uso de uma linguagem e, para se fazer compreender, é preciso que que ele use as regras convencionadas pelo uso social, ou seja, deve usar uma língua. O contexto em que está inserido o discurso é fundamental para que a troca interativa juntamente com a refl exão do conhecimento adquirido surja. Do ponto de vista de Fiorin (2010), o enunciado do discurso se faz em concordância com a situação combinada pelos atores da comunicação, pelo momento da enunciação e pelo lugar onde esse enunciado é produzido. Assim como nas línguas orais, o usurário da Libras necessita ter conhecimento do que está estabelecendo o objeto discutido em determinada cena, para que suas experiências visuais participem do contexto desse processo. Para essa refl exão, buscamos embasamento em Bernardino (1999), que assegura que, para estabelecer o contexto intrínseco ao processo, é importante que o receptor da mensagem saiba o que permeia os arredores do objeto discutido em uma cena. Nomeamos esse processo de contexto intrínseco e, quando as experiências do receptor se afi nam com todo processo, nomeamos de incidental. Na língua brasileira de sinais, a total compreensão da mensagem depende muito das experiências e conhecimento de mundo daquele que recebe a informação. A difi culdade na assimilaçãodos sinais e até mesmo a falta de vocabulário em Libras podem provocar uma total distorção dos fatos apresentados. Logo, três evidências são necessárias durante o processo de interação e comunicação em Libras e o emissor deverá identifi cá-las durante o processo. São elas: copresença física, copresença linguística e pertencer à mesma comunidade (BERNARDINO, 1999). Compreendemos que a copresença física é necessária para garantir que os interlocutores tenham conhecimento do evento no momento da interação, já a copresença linguística, trata da garantia de que estão discutindo sobre o mesmo assunto, usando o mesmo sistema linguístico e pertencentes da mesma comunidade, para garantir que o discurso tenha o mesmo signifi cado para todos os envolvidos (BERNARDINO, 1999). 120 Língua brasileira de sinais O conhecimento linguístico, diferentemente da aquisição da linguagem, não é uma característica inata do indivíduo, ele é adquirido no decorrer de sua existência, sendo responsável pela relação positiva da comunicação entre as pessoas e a construção do signifi cado que obtém das situações e relações. Muitos são os conhecimentos envolvidos na linguagem humana que se integram para desenvolver a cognição como um todo. A quantidade de informações envolvidas no processo favorece a confi ança na construção do signifi cado dessa linguagem. O conhecimento lexical e gramatical possui um papel importante nesse processo. No entanto, a relação de processos cognitivos capazes de promover a compreensão do signo linguístico, assim como o da criação do signifi cado também linguístico, tem um papel imprescindível que fundamenta e embasa o processo do conhecimento da linguagem, favorecendo, igualmente, a compreensão dos sentidos das palavras e a relação delas com toda a cadeia da linguagem, língua e linguística. 4 OS SENTIDOS DAS PALAVRAS: RELAÇÕES DE SINONÍMIAS, HOMONÍMIAS E POLISSEMIA A criação das palavras é algo inato do ser humano, porém existem regras que são necessárias para que a comunicação aconteça de maneira satisfatória e efetiva. Podemos afi rmar então que a criação nos remete a buscar a (re) signifi cação de conceitos já existentes. Esse processo se dá dentro de um determinado contexto semântico que se ocupa das signifi cações das palavras. Apresentamos a seguir uma breve explicação dos conceitos de Sinonímias, Homonímias e Polissemia na língua portuguesa, objetivando proporcionar uma base para melhor compreensão dessas relações em Libras pelo acadêmico. • Sinonímia: duas ou mais palavras com signifi cados semelhantes ou iguais. São sinônimas as palavras: cômico – engraçado; distante – afastado. • Antonímia: duas ou mais palavras com signifi cados contrários. São antônimas as palavras: economizar – gastar; bom – ruim. 121 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 • Homonímia: duas ou mais palavras com signifi cados diferentes, mas com a mesma estrutura fonológica. A classe das homônimas se divide em: o Homógrafas: iguais na escrita e diferentes na pronúncia, conforme os exemplos a seguir: gosto (verbo) e gosto (substantivo). o Homófonas: iguais na pronúncia e diferentes na escrita, conforme os exemplos a seguir: sela (verbo) e cela (substantivo). o Perfeitas: iguais na pronúncia e na escrita, conforme os exemplos a seguir: cura (verbo) e cura (substantivo). o Paronímia: duas ou mais palavras que possuem signifi cados diferentes, mas se parecem na pronúncia e na escrita. Conforme os exemplos a seguir: cavaleiro – cavalheiro; absolver – absorver. • Polissemia: quando a mesma palavra é capaz de apresentar diferentes signifi cados. Conforme os exemplos a seguir: ela ocupa o posto de diretora da escola de meu fi lho. Eu vi que ele estava com a moto estacionada no posto da rua principal. Os exemplos apresentados no Português representam a afi rmativa de Marcuschi (1999, p. 16) que aponta que “a semântica de línguas naturais tem a ver com algo mais do que o simples signifi cado de palavras [...]”. Em Libras tal fato acontece de maneira igualitária visto que temos uma língua natural com todas as estruturas linguísticas necessárias para o reconhecimento desse status. Corroborando a análise de Marcuschi (1999), buscamos, a seguir, apresentar as particularidades da Libras em se tratando das expressões de polissemia, homonímia e sinonímia, discutindo na prática as relações e interferências que essas expressões provocam não apenas na sinalização, mas em tudo que envolve esse universo de língua visual e espacial. 4.1 POLISSEMIA, HOMONÍMIA, SINONÍMIA E AS RELAÇÕES QUE ESTRUTURAM A LIBRAS Anteriormente discutimos acerca do conceito dessas expressões no Português. Essa base foi fundamental para compreender como acontecem as relações com a Libras. • POLISSEMIA: SIGNIFICANTES IGUAIS X SIGNIFICADOS DIFERENTES 122 Língua brasileira de sinais As expressões polissêmicas resultam dos signifi cados que só podem ser compreendidos dentro de um determinado conceito. A polissemia na Libras acontece quando temos o mesmo sinal em signifi cados diferentes, momento em que a compreensão do diálogo que originou essa expressão é fundamental. São exemplos de sinais polissêmicos: FIGURA 16 – SÁBADO FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 1) FIGURA 17 – LARANJA FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 14) FIGURA 18 – COR LARANJA/ALARANJADO FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 52) 123 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 FIGURA 19 – FRUTA: LARANJA FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 14) Nos pares polissêmicos de Sábado, Laranja cor e Laranja fruta, podemos observar que três são os aspectos idênticos, o SIGNIFICANTE é igual, porém, O SIGNIFICADO está diretamente ligado ao contexto do diálogo. A polissemia assume diferentes signifi cados dependendo sempre do contexto. Observe os sinais a seguir: FIGURA 20 – PEIXE FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 63) FIGURA 21 – SEXTA-FEIRA FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 1) Nos exemplos anteriores, é importante destacar o regionalismo que está presente, visto que, em alguns lugares do país, o sinal de peixe não segue essas características. No entanto, em determinada região, os pares Peixe e Sexta-feira são polissêmicos. 124 Língua brasileira de sinais • HOMONÍMIA: SIGNIFICANTES IDÊNTICOS X SIGNIFICADOS DISTINTOS Existe uma complexidade em diferenciar homonímia e polissemia, saber com precisão quando ocorre uma ou outra é algo bastante complicado. Na tentativa de estabelecer a distinção entre ambas, entendemos que uma determinada palavra possui vários signifi cados, ela pode ser tanto polissemia (uma palavra com vários signifi cados) ou homonímia (várias palavras com o mesmo signifi cado). Ao buscarmos na memória o léxico da Libras, é possível perceber que por vezes um sinal é responsável por representar duas palavras, sendo o mesmo sinal para signifi cados diferentes, porém, com movimento e expressão facial diversos. Percebemos que em muitos casos é difícil separar quando ocorre de fato polissemia ou homonímia, apesar de na primeira (POLISSEMIA) termos signifi cados diferentes, enquanto que na segunda (HOMONÍMIA) temos formas diferentes para representar o mesmo sinal, possibilitando signifi cados diferentes. Alguns estudiosos buscam na etimologia uma maneira de diferenciar polissemia e homonímia, reconhecendo tal difi culdade, sugerem ignorar tal distinção. Outros estudos preferem estabelecer uma maneira mais efi caz para compreender melhor tal diferença. Outras análises apontam que homonímia e polissemia estabelecem uma relação entre si e consideram que uma pode ser a outra e a outra por sua vez pode ocupar o lugar da primeira. Assim, podemos dizer que ambas ocupam e pertencem ao mesmo caso de signifi cação múltipla: um signifi cante com vários signifi cados, difi cultando assim, traçar uma linha divisória entre as palavras/sinais homônimos e polissêmicos. • SINONÍMIA:SIGNIFICANTES DIFERENTES X SIGNIFICADOS APROXIMADOS FIGURA 22 – VELHO (OBJETO) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 19) 125 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 FIGURA 23 – VELHO (IDOSO) FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 19) As palavras/sinais denominados de sinonímias ou sinônimas são aqueles que se diferenciam, mas possuem a mesma categoria gramatical e os sentidos se equivalem. São dois signifi cantes diferentes que representam signifi cados parecidos em que o signifi cado é utilizado em momentos que se parecem, considerando o seguinte contexto: VELHO (1) – (para objetos) para representar que são coisas usadas. VELHO (2) – (para pessoas/animais) como forma de representar o envelhecimento natural do corpo físico. Outro exemplo apresenta uma interessante refl exão e que devemos trazer para a discussão é o seguinte: FIGURA 24 – OBJETO NOVO FONTE: Capovilla (2012, p. 36) FIGURA 25 – PESSOA/ANIMAL NOVO FONTE: Capovilla (2012, p. 22) 126 Língua brasileira de sinais É importante ressaltar que o sinal apresentado anteriormente refere-se à palavra NOVO/ JOVEM e, naturalmente, como a língua não é estática e segue em movimento constante, esse sinal pode sofrer alterações regionais. Novamente é possível perceber que encontramos dois sinais diferentes (SIGNIFCANTE) que representam a mesma “palavra”, mesmo que o sentido (SIGNIFCADO) seja parecido, são dois sinais com o mesmo sentido, mas utilizados em situações diferentes. As discussões apresentadas nesta seção acerca dos aspectos da polissemia, homonímia e sinonímia e as relações que estruturam a Libras são mínimas diante da valorosa especifi cidade que a língua de sinais apresenta, assim, procuramos analisar a signifi cação dos sinais da Libras. É importante destacar que na Libras, comprovadamente uma língua natural, é possível relacionar o signifi cado e o signifi cante dos sinais e assim compreender os aspectos linguísticos, entender seus aspectos semânticos, assim como a infl uência que provocam no sentido dos sinais, formação de frases e contexto linguístico, favorecendo ao usuário da língua um desenvolvimento pessoal, social e linguístico muito mais efetivo. Os aspectos linguísticos da Libras são riquíssimos e a relação da polissemia, homonímia e sinonímia faz parte dessa riqueza juntamente com as novas confi gurações de mãos, os classifi cadores, as expressões faciais/gramaticais e os verbos. Considerando essa afi rmativa, queremos convidá-lo a mergulhar na última seção deste material e buscar adquirir ainda mais conhecimento acerca da estrutura gramatical da língua brasileira de sinais. 5 EXPRESSÕES FACIAIS/ GRAMATICAIS, CLASSIFICADORES E OS VERBOS NA LÍNGUA DE SINAIS Existem diferentes maneiras de expressarmos os pensamentos, vontades e emoções, muitas vezes, recorremos às expressões faciais para formalizar a comunicação seja em língua falada ou sinalizada. Se pensarmos em pessoas que não falam o mesmo idioma, fi ca fácil compreendermos essa afi rmativa, visto que alguma forma de comunicação terá de encontrar para que a comunicação se estabeleça. Todas as alternativas e estratégias serão lançadas, o apontamento de objetos, os desenhos, gestos e mímicas. Essas estratégias são comuns entre os seres humanos e as expressões faciais fazem parte desse arcabouço visto que fazem parte da natureza humana e são assim utilizadas em todas as línguas humanas. 127 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 Na Libras as expressões faciais ocupam um lugar de extrema importância, tendo papel fundamental e necessitando de atenção e detalhamento no momento em que são estudadas. Na língua brasileira de sinais, separamos dois grandes grupos para você compreender melhor as expressões faciais. FONTE: <https://rielcapastre.wordpress.com/2017/09/20/a- estrutura-gramatical-da-libras>. Acesso em: 19 abr. 2021. FIGURA 26 – EXPRESSÕES AFETIVAS Na fi gura anterior apresentamos algumas das inúmeras expressões faciais afetivas que o ser humano é capaz de demonstrar. São utilizadas para expressar os mais diversos sentimentos como: alegria, tristeza, raiva, angústia, entre muitos outros. A ocorrência delas pode se dar juntamente ou separadamente de outros itens lexicais, mas, é importante ressaltar que as expressões faciais não são uma exclusividade das línguas de sinais, as línguas orais também fazem uso constante das expressões faciais para melhor estabelecer as emoções na comunicação entre os interlocutores, e, não possuem, necessariamente, relação com a estrutura gramatical da língua. 128 Língua brasileira de sinais Em outra linha de raciocínio estão as expressões gramaticais, que estão relacionadas diretamente com algumas estruturas específi cas, tanto no nível da morfologia quando no nível sintático. Elas são consideradas obrigatórias em alguns contextos que aparecem na Libras e são uma especifi cidade das línguas de sinais. Portanto é necessário que façamos um detalhamento maior no estudo delas. 5.1 EXPRESSÕES FACIAIS GRAMATICAIS Na fi gura anterior apresentamos algumas das inúmeras expressões faciais afetivas que o ser humano é capaz de demonstrar. Elas são utilizadas para expressar os mais diversos sentimentos como alegria, tristeza, raiva, angústia, entre muitos outros. A ocorrência delas pode se dar juntamente ou separadamente de outros itens lexicais, mas, é importante ressaltar que as expressões faciais não são uma exclusividade das línguas de sinais, as línguas orais também fazem uso constante das expressões faciais para melhor estabelecer as emoções na comunicação entre os interlocutores e não possuem, necessariamente, relação com a estrutura gramatical da língua. Em outra linha de raciocínio estão as expressões gramaticais, que estão relacionadas diretamente com algumas estruturas específi cas, tanto no nível da morfologia quando no nível sintático. Elas são consideradas obrigatórias em alguns contextos que aparecem na Libras e são uma especifi cidade das línguas de sinais, portanto, é necessário que as detalhemos em nosso estudo. • Nível morfológico As expressões faciais de nível morfológico são conhecidas como aquelas que fazem as marcações não-manuais, acompanham determinadas estruturas e possuem fi nalidade específi ca. No nível morfológico, as marcações não-manuais estão relacionadas a diferentes graus e apresentam o objetivo sobre o sinal que está sendo realizado. Os adjetivos estão associados ao grau de intensidade. A seguir apresentamos exemplos desses adjetivos. BONITINHO-BONITO-MAIS BONITO-BONITÃO COITADINHO-COITADO-MAIS COITADO-COITADO 129 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 POBREZINHO-POBRE-MAIS POBRE-PROBREZÃO As expressões faciais podem ser incorporadas ao substantivo, sem a necessidade de estarem ligadas à produção de um adjetivo, ainda assim, possuem a função adjetiva. Nessas situações, os substantivos incorporam o grau de tamanho, conforme podemos observar no exemplo a seguir. CASINHA-CASA-MANSÃO BEBEZINHO-BEBÊ-BEBEZÃO CARRINHO-CARRO-CARRÃO • Nível da sintaxe Diferentemente do nível morfológico, as expressões faciais em nível da sintaxe da Libras possuem o papel de indicação de determinados tipos de construções, como as sentenças: negativas, interrogativas, afi rmativas, condicionais, relativas, construções com tópico e com foco. Assunto que discutiremos no decorrer deste sutópico. Muitas são as expressões faciais gramaticais utilizadas em Libras que assumem movimentos de cabeça, sobrancelhas, olhos e lábios. Movimentos com a cabeça assumem o papel tanto afi rmativo quanto negativo, confi rmados com a direção do olhar, a elevação das sobrancelhas, a elevação ou o abaixamento da cabeça, o franzir da testa, além de movimentos com os lábios que também indicam a negação e servem para diferenciar os tipos de interrogativas. A seguir apresentaremos um quadro queapresenta as expressões não- manuais da Língua de sinais brasileira que foram exploradas na pesquisa de Quadros e Karnopp (2004). 130 Língua brasileira de sinais QUADRO 1 – EXPRESSÕES NÃO-MANUAIS Expressões não-manuais da Língua de sinais brasileira (FERREIRA-BRITTO; LANGEVIN, 1995). Rosto Parte superior Sobrancelhas franzidas Olhos arregalados Lance de olhos Sobrancelhas levantadas Parte inferior Bochechas infl adas Bochechas contraídas Lábios contraídos e projetados e sobrancelhas franzidas Correr da língua contra a parte inferior interna da bochecha Apenas bochecha direita infl ada Contração do lábio superior Franzir do nariz Cabeça Balanceamento para frente e para trás (sim) Balanceamento para os lados (não) Inclinação para frente Inclinação para o lado Inclinação para trás Rosto e cabeça Cabeça projetada para frente, olhos levemente cerrados, sobrancelhas franzidas. Cabeça projetada para trás e olhos arregalados Tronco Para frente Para trás Balanceamento alternado dos ombros Balanceamento simultâneo dos ombros Balanceamento de um único ombro FONTE: Quadros e Karnopp (2004, p. 61) Todas essas expressões estão diretamente ligadas a uma estrutura sintática específi ca, sendo possível perceber mais do que uma marcação não-manual na mesma sentença, é importante observar que a ausência das expressões faciais pode tornar a sentença agramatical, visto que elas são fundamentais para a compreensão correta da sentença. 131 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 A seguir discutimos alguns exemplos de expressões faciais gramaticais de negação. Primeiramente, é possível realizar o movimento com a cabeça de um lado para o outro e em repetição, dessa maneira indicamos a negação, porém esse movimento não é considerado obrigatório em Libras, pois está diretamente ligado a questões discursivas da sentença. A segunda opção é quando utilizamos expressões faciais de negação, alterando algumas características da face. A boca é uma das áreas em que a alteração acontece fortemente, por exemplo, quando há modifi cação no contorno da boca (abaixamento dos cantos da boca ou arredondamento dos lábios), associada ao abaixamento das sobrancelhas e ao leve abaixamento da cabeça. Nessas situações as expressões faciais são um elemento obrigatório para marcar a negação em Libras, visto que estão diretamente relacionadas a questões da sintaxe da língua. O movimento de cabeça para a negação é possível com o marcador ‘não’, ao sintagma verbal e a toda sentença, podendo ainda se estender para além do último sinal realizado, sem prejuízo de compreensão. Porém, as expressões faciais negativas têm uma distribuição mais restrita. Elas não podem acompanhar a sentença toda, nem podem se limitar ao marcador de negação. Elas necessariamente devem coocorrer junto a todo o sintagma verbal, caso contrário, o prejuízo na compreensão da sentença é inevitável. Assim como a marcação não-manual de negação é importante para as sentenças em Libras, a marcação não-manual de afi rmação também possui um papel de extrema importância para a compreensão na ordem sintática. Os movimentos são realizados para cima e para baixo com a cabeça indicando afi rmação. Outra marcação não-manual que faz parte da Libras é a que representa as questões interrogativas nas sentenças. Existem quatro diferentes marcações interrogativas que estão diretamente ligadas às sentenças, essas dependem do tipo de questionamento que está sendo feito nos momentos do discurso, sendo uma delas a que há uma pequena elevação da cabeça, acompanhada do franzir da testa, a outra acontece quando há um leve abaixamento da cabeça, acompanhado da elevação das sobrancelhas. Quadros, Pizzio e Rezende (2009) nos revelam uma outra interrogativa: a que expressa dúvida e desconfi ança (pode ser feita com uma ou duas mãos), lábios comprimidos ou em protrusão, olhos mais fechados e testa franzida, leve inclinação dos ombros para um lado ou para trás e a última marcação é a que aparece em sentenças subordinadas sem a marcação não-manual interrogativa: que são os sinais para O-QUE e QUEM. Dentro da sentença são realizados com a marcação não-manual da própria sentença, ou seja, será afi rmativa ou negativa, faz uso da direção do olhar do direcionamento da cabeça e dos olhos para uma localização específi ca e simultaneamente com 132 Língua brasileira de sinais um e/ou mais sinais, para estabelecer a concordância correta para a efetiva compreensão da sentença. Outra característica das marcações não-manuais é que podem ser utilizadas como marcas do discurso em si e podem indicar a alteração no momento da fala entre os interlocutores envolvidos no discurso, alterando também o fl uxo da conversação. Pesquisas acerca desse tema são cada vez mais apresentadas por investigadores da área. Dentre elas citamos os estudos de Quadros, Pizzio e Rezende (2009) que aprofundam de maneira fundamental essa temática com o intuito de contribuir com a formação do aluno. Sugerimos a leitura do material a seguir a fi m de adquirir conhecimento sobre essa temática que é a gramática da Libras. QUADROS, R. M; PIZZIO, A. L; REZENDE, P. L. F. Língua Brasileira de Sinais IV. Licenciatura em letras-Libras na modalidade a distância. Santa Catarina: Universidade Federal de Santa Catarina, 2009. 6 OS CLASSIFICADORES As especifi cidades das marcas não-manuais contribuem para formar uma estrutura adequada para estabelecer as sentenças da Libras e trabalham junto com os classifi cadores que também são responsáveis pela compreensão da sinalização do discurso. 6.1 LÍNGUAS ORAIS-AUDITIVAS Tradicionalmente as línguas concretizam a signifi cação e apreensão do mundo ao observar características que são fundamentais para o processo de desenvolvimento e os sistemas semióticos são fortemente utilizados para que a refl exão cognitiva dessa categorização de fato se efetive. Podemos afi rmar que as palavras classifi cadas se combinam com as entidades de classe para então surgir todas as coisas que conhecemos e assim o universo seja representado. Por vezes em algumas línguas o sistema linguístico se apresenta de maneira 133 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 mais complexa e, para que aconteça a representação fonológica, morfológica, de semântica, de pragmática e de sintaxe, é necessário fazer subdivisões dessas classifi cações em grupos de coisas animadas (pessoas e animais) e outro grupo de coisas inanimadas (coisas e objetos). Entendemos assim como que essa sub classifi cação pode ser novamente reclassifi cada do ponto de vista de gênero, número, visibilidade ou proximidade, quanto ao formato. Felipe (2002), faz referência a essas classifi cações em seu artigo intitulado Sistema de fl exão verbal na Libras: Os classifi cadores enquanto marcadores de fl exão de gênero em que discute ricamente os aspectos que norteiam esse tema. A autora aponta que as línguas orais também são reclassifi cadas quanto ao gênero (masculino, feminino, neutro), quanto ao número (singular, dual, trial, plural, unidade, grupo); quanto à visibilidade ou proximidade em relação ao emissor (perto, mais ou menos distante, distante/visível, não-visível/ aqui, aí, lá), quanto ao formato, à consistência, ao tamanho, quanto ao caso (nominativo, acusativo, genitivo etc.), quanto ao papel temático (agente, paciente etc.); os eventos são reclassifi cados em ações, processos e estados, podendo ser mostrados também em relação ao modo, tempo, aspecto e seu sistema de fl exão para a concordância com seu(s) argumento(s). Do ponto de vista da pesquisadora, as línguas que fazem essas classifi cações e subclassifi cações, por meio das categorias gramaticais, são consideradas como línguas de classes nominais ou não-classifi cadoras. Ela menciona ainda que na língua, cujas características são as classes gramaticais de nomes, verbos, adjetivos, entre outros, tambémé natural fazerem uso de morfemas obrigatórios. Percebemos que o uso conceitual da palavra “classifi cador” geralmente é associado a seu aspecto morfológico, sem considerar as questões de sintaxe e de semântica, fazendo com que a signifi cação de sua função dentro de determinado contexto e sua representatividade no uso de uma língua seja prejudicado. Muitos estudos se debruçam sobre esse tema e um número considerável está na pesquisa da pesquisadora Felipe (2002), leitura que sugerimos para agregar os conhecimentos adquiridos até aqui. Os classifi cadores são diversos e as línguas fazem uso desse recurso de maneira regular na maioria das vezes associados ao papel morfológico e sintático da língua visto que ao classifi car alguma coisa, pessoa ou animal, acrescentamos um radical nominal ou verbal, tanto na derivação interna de raiz, ou no uso de todos os elementos frasais, naturalmente considerados como morfemas classifi cadores de concordância de gênero, número ou lugar. 134 Língua brasileira de sinais 6.2 CLASSIFICADORES NAS LÍNGUAS DE SINAIS As línguas de sinais também fazem uso de classifi cadores que assumem um papel de extrema importância nas marcas de concordância de número ou de caso, de lugar ou de gênero e podem naturalmente ser vistos como morfemas classifi cadores das línguas de sinais. Sob essa perspectiva morfo-sintática e observando as tipologias para as línguas orais, alguns estudiosos se debruçam sobre classifi cadores nas línguas de sinais e demonstram que elas possuem muitos tipos de classifi cadores e enriquecem com seus apontamentos e refl exões o nosso universo de conhecimento acerca do assunto. Diferentes pontos de vista estão sendo apresentados pelos mais diversos pesquisadores quando se trata das tipologias ou até mesmo quando especifi cam as funções que cada classifi cador exerce. Porém, as opiniões convergem em um único ponto em comum, que é na defi nição do classifi cador como confi guração de mãos que substitui os morfemas que por ventura marcam as especifi cidades de um objeto específi co. As pesquisas e estudos apresentados até aqui são de extrema importância para a área dos estudos da tradução e interpretação das línguas de sinais. Compreendemos que é necessário aprofundar o estudo de temas como esse que Felipe (2001) nos apresenta, visto que possuem aspectos morfológicos, fonológicos e sintáticos fortemente marcados. Uma das pesquisas que alicerçam de maneira signifi cativa a área da língua de sinais, em território nacional e internacional quando tratamos de classifi cadores, é a de Supalla (1986) que apresenta uma relação da tipologia e morfologia dos classifi cadores da ASL fazendo uma cuidadosa divisão por especifi cidades. Essa pesquisadora dispõe seus estudos precedentes e serve de referência para estudiosos e pesquisadores que se alinham a essa área de investigação. Na sequência apresentaremos como os classifi cadores foram divididos no estudo de Supalla (1986), que embasou a pesquisa de Felipe (2002), quando se refere especifi camente aos classifi cadores nas línguas de sinais. a) Especifi cadores de tamanho e forma: são confi gurações de mãos que representam vários aspectos do referente. Esses classifi cadores foram subdivididos em especifi cadores de tamanho e forma estáticos (SASSes): objetos longos, redondos etc.; e especifi cadores de tamanho e forma em traço: a mão, movendo-se no espaço, traça as linhas do referente em duas ou três dimensões. b) Classifi cador semântico: são confi gurações de mãos que representam os referentes enquanto categorias semânticas: classifi cadores de objetos 135 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 com pernas (pessoa, cachorro, aranha etc.); classifi cadores de objetos horizontais, verticais etc. c) Classifi cador corpo: todo o corpo do emissor pode ser usado para representar seres animados, sendo essa classe uma marca de concordância nominal. d) Classifi cador parte do corpo: a mão ou alguma outra parte do corpo do emissor é usada para representar uma parte do corpo de referente. A parte do corpo é uma localização. Esse tipo de classifi cador foi dividido em: especifi cadores de tamanho e forma de parte do corpo (dentes na boca, listras de um tigre) e classifi cadores dos membros (mãos e antebraço; pernas e pé). e) Classifi cador instrumento: uma representação mimética ou visual- geométrica do instrumento mostra o objeto sendo manipulado, mas este não é diretamente referido. Esse tipo foi subdividido em: classifi cador mão como instrumento (usados para contrastar os vários meios que a mão interage com objetos sólidos de tamanho e formato diferentes); classifi cadores ferramenta (usados para operar ferramentas manualmente). f) Morfemas para outras propriedades de classes de nomes: usados para mostrar consistência e textura (líquido, gasoso, macio etc.); integridade física (quebrado, espedaçado etc.); quantidade (coleção, muitas pessoas etc.); posição relativa (uma pessoa acima de outra, status etc.). Seguindo a linha de raciocínio de Felipe (2002) ao referenciar Supalla que apresenta a formação da raiz destes verbos como sendo formada por: um pequeno número de movimento possíveis (existência, localização ou movimento); um pequeno número de paths (linear, arco e círculo); um morfema classifi cador (mão ou outra parte do corpo, confi gurando uma forma particular e localizada em um lugar particular e orientada ao longo de um path) e relações locativas entre o nome central (objeto que move – tema) e o secundário (o objeto fundo), entendemos igualmente que o relacionamento desses classifi cadores com verbos de movimento e de localização dispõe também a forma da mão desses verbos e refere-se à classe do objeto que está envolvido no evento. Os classifi cadores nas línguas de sinais são aspectos que fundamentam de maneira signifi cativa a gramática da língua e a discussão que propomos deve ser um início para a busca de novas pesquisas e refl exões dos alunos, com objetivo de aprofundar-se no tema e adquirir maior conhecimento acerca do assunto. 136 Língua brasileira de sinais Os classifi cadores são também marcadores, porém esses trabalham enquanto marcadores de diferentes fl exões. Para aprofundar seu conhecimento acerca desse assunto, sugerimos a leitura de Felipe (2002) como base dos estudos concluintes deste material. Para tanto, acesse o endereço a seguir e boa leitura: <https:// www.libras.ufsc.br/colecaoLetrasLibras/eixoFormacaoEspecifica/ linguaBrasileiraDeSinaisIII/scos/cap15011/1.html>. FELIPE, T. Sistema de fl exão verbal na Libras: os classifi cadores enquanto marcadores de fl exão de gênero. Anais do Congresso Nacional do INES de 2002. 7 TIPOS DE VERBOS EM LIBRAS Diferentes estudiosos abordam a importância de analisar os verbos em língua de sinais. Um dos mais relevantes trabalhos para o estudo da morfologia das línguas de sinais foi realizado por Padden (1988). Em sua tese de doutorado, fez abordagens acerca da interação entre a morfologia e a sintaxe da língua americana de sinais (ASL), propondo a classifi cação dos verbos em três tipos – sendo essa classifi cação utilizada até hoje pela maioria dos pesquisadores. Após minuciosa análise, a autora identifi cou a existência de três diferentes tipos de verbos em ASL: os verbos simples, os verbos com concordância e os verbos espaciais. No entanto, existem outros verbos que são discutidos por outros pesquisadores. Para abordar essa temática, buscamos embasamento nos estudos de Quadros e Karnopp (2004), que apresentam análises e pesquisas sobre os verbos na Libras e afi rmam que os verbos na língua de sinais brasileira estão divididos nas seguintes classes: Verbos Simples, Verbos de Concordância e Verbos Espaciais. Do ponto de vista das autoras, os verbos simples não permitem apontamento, não é possível fazer a alteração em número, nem em pessoa, são conhecidos por não usaremafi xos de locação. Porém, os verbos de concordância se comportam diferentemente dos verbos simples, visto que a característica principal deles é fl exionarem-se em número, pessoa e aspecto. As autoras entendem fl exão como a utilização da direcionalidade e apontamento para melhor estabelecer a 137 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 referência. Em se tratando dos verbos espaciais, elas compreendem que estão diretamente ligados ao local. Dessa forma, entendemos que esses verbos não se fl exionam em pessoa, número ou aspecto. 7.1 VERBOS SIMPLES Os verbos simples são aqueles que se fl exionam em pessoa e número, porém não incorporam afi xos locativos. Alguns deles não possuem fl exão de aspecto e todos são ancorados no corpo, o que faz essa categoria receber o nome de verbos simples. É importante saber que alguns desses verbos são realizados no espaço neutro, conforme apresentamos a seguir. Exemplos de verbos simples são: compreender, apender, amar. FIGURA 27 – COMPREENDER FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 179) FIGURA 28 – APRENDER FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 153) 138 Língua brasileira de sinais FIGURA 29 – AMAR FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 54) 7.2 VERBOS COM CONCORDÂNCIA Os verbos de concordância são os que se fl exionam em pessoa, número e aspecto, porém, não incorporam afi xo locativo. Foram apresentados alguns esses verbos para sua melhor compreensão e a partir de então você conseguir relacioná-los com outras categorias verbais dentro de uma sentença frasal. Eles podem ser observados sob diferente ótica. Quadros (2004) afi rma que as línguas de sinais são marcadas pela concordância e a presença do elemento em determinada sentença necessita de outro elemento que está ligado a ele diretamente de maneira gramatical. Exemplos de verbos com concordância: DAR, ENVIAR, DIZER e PROVOCAR. Os verbos com concordância são subdivididos em concordância pura e reversa (backwards). Eles apresentam a direcionalidade e a orientação. A direcionalidade está associada às relações semânticas (source/goal), enquanto que a orientação da mão voltada para o objeto da sentença está associada à sintaxe, conforme apresentaremos nos exemplos a seguir. “Eu pergunto para você”. “Você pergunta para mim”. "Eu aviso você”. “Você me avisa”. 139 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 7.3 VERBOS ESPACIAIS + LOCATIVOS Como o próprio nome já aponta, esses são verbos que têm afi xos locativos e os exemplos dessa classe são: COLOCAR, IR e CHEGAR. Porém, também temos dentro dessa categoria os verbos manuais que são aqueles considerados como sendo os verbos classifi cadores, visto que eles usam os classifi cadores e incorporam a ação. A seguir apresentamos alguns exemplos dessa classe de verbos. FIGURA 30 – CHEGAR 1 FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 119) FIGURA 31 – CHEGAR 2 FONTE: Capovilla et al. (2012, p. 119) Os verbos são de extrema importância para a organização e compreensão das sentenças em Libras, por isso nosso objetivo foi assinalar e analisar a produção de verbos manuais na sinalização de diferentes discursos. 140 Língua brasileira de sinais Com o objetivo de aprofundar seus conhecimentos sobre o assunto, sugerimos que assista à live Gramática da Libras, proposta pela ABRALIN, com a palestrante Ronice Muller de Quadros. FIGURA – LIVE GRAMÁTICA FONTE: <https://aovivo.abralin.org/lives/ronice-quadros/>. Acesso em: 19 abr. 2021. Link de acesso: <https://aovivo.abralin.org/lives/ronice- quadros/>. Desejamos a você uma excelente palestra. 8 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Neste capítulo, apresentamos questões acerca da interface entre sintaxe a semântica e a pragmática na Libras. Buscamos embasamento teórico em pesquisadores para compreendermos como explorar as relações sintáticas e suas ordens em Língua brasileira de sinais; qual a melhor maneira para identifi car os tipos de sintagmas em Libras, compreendendo a ambiguidade lexical dentro da estrutura da língua por meio do amparo nos estudos dos signifi cados e os signifi cantes aplicados à língua de sinais. 141 INTERFACE ENTRE SINTAXE, SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 Com as particularidades apresentadas no decorrer deste capítulo, buscou- se apresentar e empregar os componentes sintáticos em Libras, organizando os elementos de uma oração por meio dos sintagmas e comparando e classifi cando as expressões dêiticas por meio do exame dos sinais diferentes, mas com o mesmo signifi cado em Libras. O objetivo das discussões apresentadas neste material foi apresentar as questões específi cas da Libras e assim incentivar você a buscar novas fontes para se aprofundar nas particularidades da Libras. A língua brasileira de sinais é rica em estrutura e em aspectos, assim como as línguas orais e merece a atenção e interesse de todos aqueles que simpatizam com uma língua visuoespacial puramente brasileira. 1 Anteriormente estudamos acerca dos parâmetros linguísticos da Libras, discorremos acerca de conceitos e estrutura da língua de sinais brasileira e buscamos compreender a estrutura necessária que obedece a um modelo de regra pré-fi xada indispensável para compreender o que é verdadeiro e aceitável em uma língua natural. Dentro dessa cadeia sistêmica, percebemos a importância da sintaxe, pragmática e semântica da Libras para a formação de sentenças e organização dos sentidos no discurso de uma língua natural. Felipe (2001) evidencia que, quando classifi camos os verbos em Libras considerando suas características semânticas e morfológicas, são: ( ) Verbos com fl exão número-pessoal: o parâmetro de direcionalidade é um marcador de fl exão de pessoa do discurso. ( ) Verbos com fl exão para locativo: além da direcionalidade, considera o ponto de articulação como parâmetro de fl exão. ( ) Verbo com fl exão para gênero: quando os classifi cadores são responsáveis por identifi car o gênero em Libras. ( ) Esse autor não faz referência à questão de verbos em Libras. De acordo com a leitura realizada, organize as sentenças relacionando com V para verdadeiro e F para falso. a) ( ) V – F – V – V. b) ( ) V – V – V – V. 142 Língua brasileira de sinais c) ( ) F – F – F – F. d) ( ) V – V – V – F. 2 Sabemos que o discurso na língua brasileira de sinais apresenta a referência estabelecida em um local no espaço da área de sinalização. Esse espaço é o local referente no momento da execução do discurso em si. Sabemos também que os pontos de localização dos referentes são considerados de acordo com a posição em que se encontram, visto que eles podem estar ou não em interação, porém, cabe destacar que, se os referentes estiverem nulos na cena da interação, os pontos de localização passam a ser representados de maneira abstrata. Observe a fi gura a seguir FONTE: Adaptado de Lillo-Martin e Klima (1990) De acordo com os conhecimentos adquiridos no decorrer das leituras do material apresentado, assinale a sentença que corresponde à fi gura. a) ( ) Há a presença de referentes na frente do receptor e nas costas do sinalizante, com objetivo de espelhar a imagem. b) ( ) Há a presença do sinalizante à direita e à esquerda do referente que ao realizar a sinalização de qualquer um desses referentes no discurso deve fazer uso da localização exata de onde estão posicionados os envolvidos e assim garantir a correta adequação sintática do enunciado. c) ( ) Há a presença de referentes à esquerda e à direita do receptor e do sinalizante, ao realizar a sinalização de qualquer um desses referentes no discurso deve fazer uso da localização exata de onde estão posicionados os envolvidos e assim garantir a correta adequação sintática do enunciado. d) ( ) Há a presença de todos os envolvido no processo em círculo e qualquer um desses referentes no discurso deve fazer uso da 143 INTERFACE ENTRE SINTAXE,SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA Capítulo 3 localização exata de onde estão posicionados os envolvidos e assim garantir a correta adequação sintática do enunciado. e) ( ) Há a presença de todos os envolvidos no discurso, porém apenas o sinalizante é capaz de estabelecer a localização exata de onde estão posicionados os envolvidos e assim garantir a correta adequação sintática do enunciado, visto que é responsável pelo discurso. 3 Estudamos, no decorrer do material, questões sobre sintaxe, semântica e pragmática da língua. Compreender esses conceitos é fundamental para estabelecer uma total relação com a aprendizagem das questões linguísticas. Para fi xar ainda mais seu aprendizado, marque as alternativas a seguir com V para verdadeiro e F para falso. ( ) A semântica assim como a sintaxe da língua são responsáveis pelas regras que orientam a construção e formação de frases nas línguas naturais. A linguística compreende que essa é a parte da gramática que se ocupa da disposição das palavras na frase e em seus discursos, realizando as combinações linguísticas. ( ) A Sintaxe é a área que estuda as regras que orientam a construção e formação de frases nas línguas naturais. A linguística compreende que essa é a parte da gramática que se ocupa da disposição das palavras na frase e em seus discursos, realizando as combinações para que a compreensão dos signifi cados e a comunicação aconteça de maneira satisfatória. Esse estudo da estrutura da frase comprova que existem infi nitas combinações de palavras que os falantes de uma língua são capazes de compreender e produzir. ( ) O léxico é o estudo que aborda o signifi cado da palavra e da sentença, trata da natureza do signifi cado individual e coletivo das palavras nas orações, observando as variações regionais e sociais nos mais diversos dialetos. Podemos dizer que a se iguala à sintaxe da língua, pois aborda o signifi cado na linguagem em uso com suas imagens acústicas ou visuais, porém também trata das mudanças de sentido e das escolhas de novas expressões. ( ) A pragmática é quando falamos de linguagem no seu contexto comunicacional, estamos nos referindo ao ramo da pragmática que está para além da construção frasal e da signifi cação que as sentenças apresentam. O objetivo principal da pragmática é o estudo da comunicação em seu contexto. Esse é ramo da linguística que observa o uso concreto da linguagem pelos falantes de uma língua em seus contextos e situações mais diversas. 144 Língua brasileira de sinais ( ) Todas as alternativas são verdadeiras de acordo com os estudos. a) ( ) F – F – F – V – V. b) ( ) V – V – V – V – F. c) ( ) F – V – F – V – V. d) ( ) F – V – F – V – F. REFERÊNCIAS BERNARDINO, E. L. A construção da referência por surdos na LIBRAS e no português escrito: a lógica no absurdo. Dissertação (Mestrado em Letras) – UFMG, Minas Gerais, 1999. Disponível em: http://www.letras.ufmg.br/profs/ elidea/data1/arquivos/Bernardino-Elidea-1999.pdf. Acesso em: 28 fev. 2021. CAPOVILLA, F. C.; RAPHAEL, W. D. Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngue da Língua de Sinais Brasileira. 2. ed. São Paulo: Edusp. p. 1479 – 1487, 2001. CAPOVILLA, F. C. et al. 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