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NEOPLASIAS DO TRATO GASTROINTESTINAL BASES DA CIRURGIA ONCOLÓGICA O câncer é o crescimento anormal de células em qualquer parte do corpo. Essas células anormais se reproduzem localmente, atravessam a barreira tissular e migram para todo o corpo. Durante muito tempo, a cirurgia foi o único tratamento para câncer, mas com o avanço dos estudos, drogas antineoplásicas, quimioterapia e radioterapia foram adicionados as terapêuticas. · Cirurgia e radioterapia: tratamento para câncer locorregional · Quimioterapia: tratamento sistêmico para os casos de metástase · Tratamento neoadjuvante: uso de quimio/radioterapia para diminuir o tumor antes da cirurgia · Tratamento adjuvante: uso de quimio/radioterapia após a cirurgia com intuito curativo A cirurgia oncológica segue os princípios halstedianos. CÂNCER DE ESÔFAGO EPIDEMIOLOGIA: - Entre as 10 neoplasias malignas mais incidentes no Brasil (benigno mais comum: leiomioma) - Predomina no sexo masculino (escamoso = 3:1; adenocarcinoma = 15:1) - Geralmente se apresenta a partir dos 40 anos de idade (a maior mortalidade é entre 60-70 anos) - O tipo escamoso é mais comum em negros; adenocarcinoma é raro neste grupo, sendo uma doença típica de brancos - Os países com maior incidência de Ca de esôfago são da Ásia e da África, nesses locais, o tipo mais comum ainda é o carcinoma escamoso TIPO HISTOLÓGICO: Atualmente, se reconhecem dois tipos histológicos principais: (1) carcinoma escamoso ou epidermoide: é derivado do epitélio estratificado não queratinizado, característico da mucosa normal do esôfago. Se origina principalmente no terço médio do órgão (em 50% dos casos). Fatores de Risco – etilismo e o tabagismo; Ingestão habitual de bebidas muito quentes (em torno de 65°C); alimentos ricos em compostos N-nitrosos (produtos defumados); contaminação com fungos produtores de toxina; deficiência de selênio, zinco, molibdênio e vitaminas (principalmente A). Acalásia; síndrome de Plummer-Vinson; estenose cáustica. Tilose palmar e plantar (raro distúrbio genético autossômico dominante, caracterizado por hiperceratose na palma das mãos e planta dos pés) nesses pacientes o risco se aproxima a 95%. Bulimia, infecções fúngicas crônicas, HPV, exposição à radiação, história pessoal de câncer no trato aerodigestivo (cabeça, pescoço e pulmão), presença de divertículos no esôfago e doença celíaca. (2) adenocarcinoma: é derivado do epitélio de Barrett – metaplasia intestinal que complica alguns pacientes com DRGE erosiva. Portanto, este tumor é localizado no terço distal do esôfago e, eventualmente, se confunde com o adenocarcinoma da cárdia (junção esofagogástrica). Está aumentando em incidência, em alguns países como os EUA já é o tipo mais comum de câncer de esôfago (70%). No Brasil e em outros países pobres, o tipo mais comum ainda é o escamoso. Fatores de Risco – presença do epitélio de Barrett, secundário à forma erosiva da esofagite de refluxo (10-15% dos pacientes com DRGE sintomática desenvolvem esôfago de Barrett e sesses, 1 a cada 200 pacientes-ano desenvolve adenocarcinoma de esôfago - incidência de 0,5% ao ano); Tabagismo e obesidade. O etilismo, por outro lado, NÃO está associado ao adeno (o consumo de vinho tinto, inclusive, parece reduzir a incidência de adenocarcinoma do esôfago). Acredita-se também que o uso de bisfosfonados orais (alendronato) esteja implicado no risco (tanto escamoso quanto adenocarcinoma). O FDA recomenda que esta classe de drogas seja contraindicada nos portadores de esôfago de Barrett. Raramente, o esôfago também pode ser sede de metástases de outros cânceres, em particular mama, pulmão e melanoma primário da pele. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: sintomas iniciais podem ser inespecíficos, como uma dor retroesternal mal definida ou queixas de “indigestão”. No entanto, a principal manifestação clínica é a disfagia, que geralmente se inicia para sólidos e evolui para líquidos. A perda ponderal é um achado clássico. (sintomas iguais aos de acalasia, diagnostico diferencial) Lesões mais avançadas apresentam-se com halitose e, às vezes, tosse após ingestão de líquidos. A rouquidão por envolvimento do nervo laríngeo recorrente e a hematêmese são sintomas menos comuns. Icterícia (infiltração hepática metastática) e dispneia (infiltração pulmonar metastática) são manifestações menos prevalentes, e indicam doença extremamente avançada. Infelizmente, para ter disfagia mecânica, o câncer já deve ter envolvido grande parte da circunferência esofágica (em geral > 2/3 do lúmen). DIAGNÓSTICO: bem diagnosticados pela análise conjunta da Esofagografia Baritada + endoscopia digestiva alta com biópsia. No exame baritado, a diferenciação entre estenose péptica e câncer de esôfago não é difícil: neste último, é nítida a irregularidade da mucosa e a súbita transição entre o esôfago normal e a obstrução (“sinal do degrau”). Em relação à localização do tumor, cerca de 50% encontram-se no terço médio, 25% no terço superior e 25% no terço inferior. ESTADIAMENTO: Feito com USG endoscópica. O câncer de esôfago se caracteriza por ter um comportamento extremamente agressivo, disseminando-se localmente e a distância. A rica rede linfática presente na lâmina própria e na submucosa (intramural) facilita a disseminação linfonodal precoce. A ausência de serosa facilita a disseminação do tumor para órgãos adjacentes (por contiguidade). Os tumores do terço superior e médio invadem a árvore traqueobrônquica, a aorta e o nervo laríngeo recorrente, enquanto os tumores do terço distal avançam sobre o diafragma, pericárdio e estômago.Cerca de 75% dos pacientes diagnosticados com Ca de esôfago já apresentam invasão linfática no momento do diagnóstico. As metástases à distância mais importantes são: fígado e pulmão, ocorrendo também para ossos e rins. O estadiamento do Ca de esôfago se baseia na escala TNM (T = tumor, N = linfonodos, M = metástase a distância). Nos últimos anos constatou-se que o tipo histológico também influencia o prognóstico e, por este motivo, o American Joint Committee on Cancer possui dois sistemas de estadiamento conforme o subtipo histológico. O chamado câncer de esôfago precoce é aquele que invade até a submucosa (T1 ou Estágio I). Infelizmente, esta é uma apresentação rara deste câncer. PROGNÓSTICO: A sobrevida em cinco anos do Ca de esôfago, de acordo com o estadiamento final (clínico + cirúrgico) é a seguinte: Estágio I: 60%; Estágio II: 30%; Estágio III: 20%; Estágio IV: 4%. TRATAMENTO: a estratégia cirúrgica curativa proposta pela maioria dos autores envolve a realização de esofagectomia + linfadenectomia regional, com margens de segurança de pelo menos 8 cm. A reconstrução do trânsito deve ser, sempre que possível, com o estômago. É crescente o uso de terapia neoadjuvante. T1 que é restrito a mucosa, pode ser retirado com endoscopia T4b e M1 já requerem cuidados paliativos As duas técnicas mais utilizadas para esofagectomia pelos cirurgiões torácicos são: 1. Esofagectomia Transtorácica: uma toracotomia látero-posterior é realizada e uma laparotomia mediana superior; O mediastino é examinado quanto à presença de metástases irressecáveis; se possível, o esôfago é ressecado com a margem tumoral adequada, juntamente com os linfáticos periesofágicos, linfonodos paratraqueais, pleura adjacente, veia ázigos e ducto torácico. O estômago é dissecado (juntamente com seus vasos) e “suspenso” para a cavidade torácica, para ser anastomosado no espaço paravertebral do mediastino posterior. A anastomose é realizada com grampeador. Para evitar uma obstrução gástrica pós-vagotomia, uma piloroplastia ou pilorotomia deve sempre ser confeccionada. O principal risco desta cirurgia é a deiscência da anastomose intratorácica (abaixo da clavícula), que leva à mediastinite grave, sepse e óbito em 50% dos casos. A mortalidade operatória varia entre 7-20%. 2. Esofagectomia Trans-Hiatal: nesta cirurgia, não há incisão torácica, ela é executada através de uma incisão abdominal e outra cervical. Pelo abdome, o estômago é mobilizado pela secção dos vasos gastroepiploico esquerdoe gástrico esquerdo, preservando as arcadas gastroepiploica direita e gástrica direita. A piloroplastia é realizada. O esôfago torácico inteiro (independentemente do nível do tumor), desde as clavículas até a cárdia, é dissecado pelo dedo do cirurgião, utilizando-se os acessos cervical e trans-hiatal (pelo hiato diafragmático). A monitoração da pressão arterial deve ser cuidadosa nesse momento, devido ao deslocamento cardíaco. O estômago, então, é transposto para o mediastino posterior e anastomosado com o esôfago cervical. As vantagens deste procedimento são: (1) evita-se uma toracotomia; (2) evita-se uma anastomose intratorácica, bem como o risco de uma mediastinite – a deiscência da anastomose cervical é de mais fácil controle; (3) reduz bastante a chance de refluxo gastroesofágico; (4) mortalidade operatória de 4-8%. As desvantagens da cirurgia são o risco de hemorragia mediastinal incontrolável no peroperatório e a incapacidade de realizar a dissecção completa dos linfonodos mediastínicos, para fins de estadiamento e cura. Cada estratégia de esofagectomia possui vantagens e desvantagens e, na prática, o que acaba prevalecendo é a experiência e preferência pessoal do cirurgião. TERAPIA CLÍNICA E NEOADJUVANTE · Radioquimioterapia neoadjuvante tem resultados mais favoráveis nos estágios II e III, tem o potencial de aumentar o tempo de sobrevida. O tipo de tumor que responde melhor à radioquimioterapia é o carcinoma de células escamosas. · Pacientes não candidatos à cirurgia, pelo alto risco cirúrgico ou por possuírem doença avançada, também podem se beneficiar da radioquimioterapia. O esquema é semelhante ao da “radioquimio” neoadjuvante, contendo 5-fluoracil + cisplatina + paclitaxel, acompanhado de irradiação externa durante 7 semanas, 5 dias por semana. TERAPIA PALIATIVA Para pacientes com tumor irressecável, prover conforto e qualidade de vida. · Dilatadores esofágicos ou stents permite a reconstituição do trânsito alimentar por um período curto (fistula traqueoesfofágica). · Terapia fotodinâmica utiliza uma substância sensibilizadora EV seguida pela aplicação do laser. A obstrução é cedida após necrose do tumor, com os fragmentos retirados na endoscopia. · Radioterapia é um excelente método paliativo, aliviando a disfagia em diversos pacientes durante alguns meses. A fístula esofagotraqueal ou esofagobrônquica contraindica a radioterapia, e deve ser paliada com a colocação de stents no esôfago e na árvore traqueobrônquica (melhor do que colocar o stent em apenas um local). · Casos mais difíceis ou refratários, uma gastrostomia ou jejunostomia pode ser necessária. CÂNCER GÁSTRICO EPIDEMIOLOGIA: É um dos tumores malignos mais comuns. Em certos países, é o câncer mais frequente e a principal causa de mortalidade oncológica. Os pacientes costumam procurar assistência médica tarde demais, porque os sintomas na fase inicial (potencialmente curável) são muitas vezes mínimos ou inexistentes. · No Brasil, é a 3ª causa de câncer no sexo masculino e a 5ª entre as mulheres. · Em todo o mundo, adenocarcinoma gástrico figura entre as principais causas de morte relacionadas ao câncer (segundo o Sabiston, é a segunda causa mundial de morte oncológica), ainda que sua incidência esteja diminuindo em países ricos. · É mais frequente no sexo masculino (2:1) · Pico de incidência entre 50-70 anos para ambos os sexos. O câncer gástrico é raro antes dos 35 anos de idade. · O tipo histológico mais comum (95% dos casos) é o adenocarcinoma gástrico. Aproximadamente 3% dos tumores malignos do estômago são do grupo dos linfomas. · O estômago é o sítio extranodal mais frequente do linfoma não Hodgkin. Os sarcomas, incluindo o leiomiossarcoma, lipossarcoma, sarcoma neurogênico e o fibrossarcoma são tumores malignos relativamente raros. O leiomiossarcoma representa cerca de 1% dos cânceres gástricos. (1) Adenocarcinoma gástrico A incidência deste câncer varia muito em diferentes partes do mundo A importância de fatores ambientais é inegável, e sua influência parece ser precoce na vida do indivíduo A incidência de adenocarcinoma de antro e piloro está diminuindo sensivelmente e a incidência de adenocarcinoma da cárdia aumenta de, principalmente em homens brancos que usam tabaco e álcool A classificação de Lauren (1965) para o adenocarcinoma diferencia histologicamente dois subtipos: · subtipo intestinal é um tumor bem diferenciado, com formação de estruturas glandulares (igual o adenocarcinoma de cólon - “intestinal”). Este subtipo é o mais comum no Brasil e em outros países, predominando em homens (2:1), em torno de 55-60 anos, e manifestando-se como lesões expansivas, polipoides e ulceradas na endoscopia, mais comumente encontrado no estômago distal. Sua disseminação é quase sempre hematogênica. Fatores de risco mais associados são a gastrite atrófica e anemia perniciosa. · subtipo difuso é um tumor indiferenciado sem formações glandulares, apresentando as famosas células em anel de sinete (acúmulo de muco no citoplasma deslocando o núcleo para a periferia). Comum em mulheres jovens do tipo sanguíneo A. É um tumor “infiltrativo”, manifestando-se na endoscopia com úlceras infiltradas ou linite plástica (infiltração difusa do órgão). Acomete mais o estômago proximal (cárdia) e tem prognóstico pior que o subtipo intestinal (maior probabilidade de metástases precoces, inclusive com disseminação intraperitoneal). Incide igualmente em ambos os sexos e a idade média de apresentação é mais precoce (em torno dos 40-48 anos). Sua disseminação se faz mais comumente por contiguidade (transmural) e pela via linfogênica (metástases nodais). Possui relação com o tipo sanguíneo A e existem relatos de casos familiares (1-3% dos casos têm transmissão autossômica dominante, relacionada à mutação CDH1 no gene da E-caderina). CLASSIFICAÇÃO MACROSCÓPICA 1- Câncer gástrico invasivo Com o passar dos anos, os tipos I e II estão diminuindo em incidência em relação aos tipos III e IV. Borrmann I ‒ Carcinoma Polipoide (ou “Fungoide”). Lesão bem demarcada com áreas de tecido normal a sua volta. Sobrevida média em cinco anos de 40%. Borrmann II ‒ Carcinoma Ulcerado, margens bem demarcadas e nenhuma infiltração. Esta lesão é impossível de ser diferenciada, somente pelo aspecto endoscópico, da úlcera gástrica benigna. Sobrevida média em cinco anos de 35%. Borrmann III ‒ Carcinoma Ulcerado e Infiltrante com margens rasas e pouco definidas; geralmente há infiltração da submucosa, muscular própria e serosa. Esta é a apresentação mais comum do câncer gástrico. Sobrevida média em cinco anos de 20%. Borrmann IV ‒ Carcinoma Infiltrativo difuso. Lesão difícil de ser definida. Ela se estende por todas as camadas do estômago e em todas as direções. A extensão é bem mais significativa do que a apreciada apenas pela inspeção e palpação. Quando há infiltração de todo o estômago, este tipo é chamado de Linitis plástica (linite plástica). Borrmann V ‒ Câncer gástrico, cuja definição não se encaixa em nenhuma das descritas acima. 2- Câncer gástrico precoce Tumores restritos à mucosa e submucosa, independente da presença ou ausência de linfonodos regionais acometidos O câncer gástrico precoce inclui três subtipos: · Tipo I (polipoide) · Tipo IIa (elevado em menos de 5 mm) Tipo IIb (superficial sem elevação) Tipo IIc (depressão inferior a 1,5 cm) · Tipo III (ulcerado). O tratamento Padrão-ouro é cirúrgico, mas certos subgrupos de pacientes podem ser curados apenas com a ressecção endoscópica. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: em estágios iniciais, o câncer gástrico precoce, é geralmente assintomático ou apresenta sintomas dispépticos inespecíficos. Quando os sintomas motivam o paciente a procurar o médico, o câncer já está mais avançado. Os sintomas mais comuns são a perda ponderal (62%), dor epigástrica (52%), náusea (34%), anorexia (32%), disfagia (26%), melena (20%), saciedade precoce (17%) e dor semelhante à da úlcera péptica (17%). – linfonodo de virchow/sinal de Troisier DIAGNÓSTICO · EDA: quando combinada com biópsia, tem precisãodiagnóstica de 98%. Indicada em todo paciente que apresenta dispepsia com idade > 45 anos ou “sinais de alarme” (perda ponderal, anemia, sangramento, disfagia, vômitos recorrentes, massa abdominalpalpável, gastrectomia prévia, história familiar de Ca gástrico). Pela endoscopia, é obtida a famosa classificação de Borrmann, com implicação prognóstica. O tumor Borrmann IV (linite plástica) pode não ser bem reconhecido neste exame, sendo melhor caracterizado no exame baritado. A localização mais comum do câncer gástrico é na mucosa da transição do corpo com o antro na pequena curvatura (incisura angularis), o mesmo local mais comum de úlcera péptica gástrica. Apesar disso, uma úlcera gástrica em local atípico, como na grande curvatura, é bem sugestiva de malignidade... A biópsia (obtida na base e nas margens da lesão) confirma o diagnóstico. · Exame Baritado (SEED)/Seriografia Esôfago-Estômago-Duodeno (SEED): foi aprimorada para que o radiologista seja capaz de distinguir lesões benignas de malignas e sugerir um diagnóstico histológico. Os sinais radiológicos que sugerem malignidade são: 1. Lesão em massa com ou sem obstrução luminal ou ulceração; 2. Úlcera com pregas irregulares; 3. Úlcera com fundo irregular; 4. Irregularidade de mucosa com perda da distensibilidade; 5. Pregas alargadas; 6. Massa polipoide. Quando está presente a linite plástica, pode-se observar um aspecto de “garrafa de couro”. A precisão do diagnóstico radiológico na distinção entre úlceras benignas e malignas oscila em torno de 80%. O exame baritado serve como triagem (por ser um exame de baixo custo) e, caso tenha achados suspeitos, sempre deve ser seguido pela endoscopia com biópsias. padrão-ouro de estadiamento é a USG endoscópica Tc é bom para avaliar metástases Videolaparoscopia avalia metástases ocultas/peritoneais – ascites indicam esse exame pois podem sugerir metastase TRATAMENTO 1- Cirurgia Curativa: A remoção cirúrgica do tumor oferece a única probabilidade de cura. Uma avaliação cuidadosa à procura de metástases à distância evita uma cirurgia desnecessária. Cerca de 20% a 50% dos pacientes possui doença avançada à apresentação, impossível de ser curada cirurgicamente. Sempre que possível, deve ressecar toda a extensão da neoplasia (mesmo no tumor T4). Devido à tendência do câncer gástrico em se disseminar de forma intramural, o tumor deve ser ressecado com uma ampla margem de segurança, de no mínimo 5 a 6 cm (8 cm no subtipo “difuso” de Lauren). No pós-operatório, alimentação com cateter nasoentérico. Os tumores de terço distal podem ser tratados com gastrectomia subtotal e reconstrução a Billroth II. Quando a margem de segurança pode ser obtida, a sobrevida em 5 anos após uma gastrectomia subtotal é a mesma que a de uma gastrectomia total... Os tumores de terço médio (corpo gástrico) a mais de 5 a 6 cm da junção esofagogástrica também podem ser abordados com gastrectomia subtotal e reconstrução a Billroth II. Nas situações descritas acima, outra possibilidade de reconstrução que tem sido cada vez mais empregada pelos cirurgiões oncológicos é a gastrectomia subtotal em Y de Roux. As neoplasias de terço médio a menos de 5 a 6 cm da junção esofagogástrica devem ser tratadas com gastrectomia total com reconstrução tipo esofagojejunostomia término-lateral em Y de Roux . As neoplasias do fundo gástrico são tratadas da mesma forma, ou seja, com gastrectomia total com reconstrução tipo esofagojejunostomia término-lateral em Y de Roux. Os tumores de cárdia são abordados com esofagectomia distal e gastrectomia total. A reconstrução do trânsito alimentar também se dá através de esofagojejunostomia término-lateral em Y de Roux. Terço distal: gastrectomia subtotal + BII ou Y de Roux Terço médio ou proximal: gastrectomia total + Y de Roux Ressecção linfonodal D2 é a que se faz no Brasil Todos os tumores necessitam de linfadenectomia profilática regional. Os níveis de ressecção são determinados pela localização do tumor: - Linfadenectomia a D1 ou R1: linfonodos perigástricos até 3 cm de distância das margens do tumor; - Linfadenectomia a D2 ou R2: linfonodos D1 mais os que acompanham as artérias mais próximas (gástrica esquerda, esplênica e tronco celíaco); - Linfadenectomia a D3 ou R3: linfonodos D2 mais linfonodos do ligamento hepatoduodenal, cabeça do pâncreas e raiz do mesentério do delgado. Se for possível, sem aumentar significativamente o risco da cirurgia, a linfadenectomia a D2 é preferida pelos cirurgiões brasileiros. Não se tem feito esplenectomia e pancreatectomia distal de rotina na cirurgia curativa do Ca gástrico, para reduzir a morbimortalidade operatória. Estas ressecções só estão indicadas quando o tumor estiver aderido ou invadindo tais estruturas, ou quando houver comprometimento de linfonodos adjacentes a elas. 2- Terapia Adjuvante: indivíduos submetidos à ressecção curativa, com o estadiamento cirúrgico mostrando acometimento linfonodal ou de órgãos adjacentes, estudos randomizados demonstraram benefício na sobrevida com a radioquimioterapia adjuvante (após a cirurgia). Tumores positivos para a mutação HER-2 se beneficiam do acréscimo de trastuzumab (anticorpo monoclonal direcionado contra o produto do gene HER-2). 3- Terapia Paliativa: o objetivo da terapia paliativa é fornecer alívio sintomático com a menor morbidade possível. A quimioterapia paliativa tem mostrado benefício quanto à redução dos sintomas e ao aumento da sobrevida. A gastrectomia paliativa deve ser oferecida aos pacientes com risco cirúrgico baixo, tendo como objetivo evitar sangramento, perfuração e/ou obstrução em decorrência do crescimento tumoral. Os dilatadores pneumáticos e stents são reservados para os pacientes com disfagia (tumor da cárdia). Um stent também pode ser colocado para aliviar a obstrução antropilórica nos tumores distais inoperáveis. A radioterapia é reservada para o controle do sangramento, dor ou obstrução (principalmente se associado à quimioterapia). Mais recentemente foi desenvolvida uma técnica endoscópica de recanalização do estômago utilizando raio laser. 4- Câncer Gástrico Precoce: com o screening populacional realizado no Japão e com a sofisticação dos métodos diagnósticos, o câncer gástrico precoce (envolvimento de mucosa e submucosa) é diagnosticado em cerca de 40-60% dos pacientes com a neoplasia maligna de estômago naquele país. A terapia de primeira linha é a gastrectomia com linfadenectomia a D2 (ou D1), com sobrevida em cinco anos superior a 85%. Nos últimos anos, com o avanço dos procedimentos em endoscopia digestiva alta, uma parcela desses indivíduos tornou-se candidata à terapia curativa endoscópica. Estudo publicado no Japão demonstrou que pacientes com adenocarcinoma de estômago que apresentam qualquer uma dessas variáveis – ulceração, tumor com ≥ 30 mm de diâmetro e invasão linfática – possuem elevado risco de comprometimento linfonodal. Por outro lado, no câncer gástrico que não demonstra esses achados, o risco de envolvimento linfonodal é desprezível (apenas 0,36%). Com base neste estudo, a ressecção endoscópica curativa do câncer gástrico precoce é permitida quando a neoplasia apresentar todos os seguintes achados: (1) tumor limitado à mucosa; (2) tumor não ulcerado; (3) ausência de invasão linfovascular; e (4) tumor com menos de 2 cm de diâmetro. PROGNÓSTICO A taxa de sobrevida em cinco anos depende do estadiamento TNM, complementado após a cirurgia, a média oscilando em torno de 15-30%. Veja a taxa de sobrevida em cinco anos após o estadiamento patológico: Estágio I: 88-93%; Estágio II: 68-81%; Estágio III: 36-54%; Estágio IV: < 15%. A chance de cura do subtipo intestinal é maior que a do subtipo difuso (26% versus 16%). (2) Linfoma gástrico Embora sejam os tumores mais frequentes depois do adenocarcinoma, os linfomas primários do estômago compreendem menos de 5% dos cânceres gástricos. O trato gastrointestinal é a localização extranodal mais comum dos linfomas, com a maioria ocorrendo no estômago (45%) e intestino delgado. Os dois tipos histológicos mais comuns são: · Linfoma difusode grandes células B (55% dos casos), um linfoma não Hodgkin agressivo · Linfoma de baixo grau de linfócitos B da zona marginal (40% dos casos), conhecido como linfoma MALT (Mucosa-Associated Lymphoid Tissue), um linfoma não Hodgkin indolente com alta chance de cura. Na avaliação endoscópica isolada, o linfoma parece indistinguível do adenocarcinoma, no entanto, a infiltração da submucosa está presente na maioria dos casos. Não existe um sítio específico de predileção para o surgimento da neoplasia. O DIAGNÓSTICO é obtido pela biópsia endoscópica. A TC permite a avaliação dos linfonodos acima e abaixo do diafragma e a ultrassonografia endoscópica é útil em determinar a invasão de mucosa e submucosa. TRATAMENTO: O linfoma difuso de grandes células B apresenta tratamento controverso. O tratamento tradicional é a gastrectomia total seguida de radio e quimioterapia. Atualmente, estudos têm demonstrado que a radioquimioterapia sem a cirurgia apresenta bons resultados. O linfoma MALT está profundamente relacionado à infecção pelo H. pylori. Os pacientes geralmente encontram-se no estádio IE ou, no máximo, estádio IIE, com menos de 10% dos indivíduos apresentando-se com doença avançada. O tratamento do linfoma MALT gástrico é feito com a erradicação do H. pylori. Apenas esta medida pode conseguir sobrevida em cinco anos superior a 80%. O paciente deve ser acompanhado com endoscopia seriada para avaliar a regressão do tumor e a possibilidade de recidiva. Os casos refratários ou recidivantes costumam apresentar a translocação t(11;18) e/ou a transformação de algumas áreas para o B difuso de grandes células. Estes merecem terapia multimodal, geralmente fundamentada na radio/quimioterapia, com ou sem ressecção cirúrgica associada. Estádios avançados (IIE, IIIE e IV), são candidatos à poliquimioterapia. A gastrectomia total com linfadenectomia D2 pode ser realizada na vigência de complicações como hemorragia e perfuração. CÂNCER COLORRETAL É, na maioria das vezes (95% dos casos), o adenocarcinoma, derivado do epitélio glandular colônico (criptas). No Brasil, estima-se algo em torno de 34.000 casos novos da doença por ano. A incidência é muito maior na região Sudeste quando comparada às regiões Norte e Nordeste. Mais da metade dos casos se manifesta em pessoas com > 60 anos. As síndromes de polipose familiar são consideradas fatores de risco inquestionáveis para o Ca colorretal. Hoje se reconhece também a existência de uma síndrome de câncer colorretal hereditário “não polipose”, a síndrome de Lynch. Contudo, a variedade mais comum da neoplasia é aquela conhecida como esporádica, presente em 75% dos casos; nesses pacientes, não existe uma história familiar importante de Ca colorretal e o câncer se origina de um pólipo adenomatoso esporádico (sequência adenoma-carcinoma). FATORES DE RISCO · Dietas ricas em calorias e gorduras de origem animal e/ou carboidratos refinados · Consumo de carne vermelha ao longo dos anos · Obesidade, predominantemente abdominal devido a hiperinsulinemia que eleva os níveis séricos de IGF-I, o que estimularia diretamente o crescimento de células da mucosa colônica (em particular aquelas que sofreram transformação maligna). · Tabagismo e o etilismo · História Pessoal ou Familiar de Adenoma Esporádico ou de Ca Colorretal Esporádico · História familiar de Ca colorretal esporádico em um familiar de primeiro grau · A presença de pólipo adenomatoso > 1 cm ou de adenoma colônico com histologia avançada (viloso ou túbulo viloso) em história familiar · Doença Inflamatória Intestinal (DII), a lesão precursora do Ca colorretal não é um pólipo e sim uma displasia epitelial que surge na parede colônica · Retocolite Ulcerativa Idiopática (RCUI) · Doença de Crohn (DC) colorretal · Câncer Colorretal Hereditário Não Polipose (CCHNP) ou Síndrome de Lynch. Existem dois subgrupos: Síndrome de Lynch I: a predisposição é apenas de Ca colorretal. Síndrome de Lynch II: a predisposição é para o Ca colorretal e para tumores ginecológicos, especialmente o carcinoma de endométrio (principal, ocorrendo em 45% das mulheres da família afetada) e de ovário. · Adenomatosa Familiar (PAF) e suas variantes (síndromes de Gardner e de Turcot) são as doenças com a maior probabilidade de desenvolver o Ca colorretal, chegando a 100% dos casos até os 40 anos de idade. · Pacientes submetidos à colecistectomia apresentam ao longo dos anos um leve aumento na incidência de Ca de cólon direito. · Radioterapia para tratamento de câncer de próstata e passado de tratamento para o linfoma de Hodgkin são condições relacionadas a uma maior incidência de Ca colorretal. FATORES PROTETORES · O consumo de grandes quantidades de frutas e vegetais (800 g/dia) parece reduzir a incidência de câncer de cólon distal. As fibras vegetais compõem o bolo fecal, acelerando o trânsito intestinal e, assim, reduzindo o contato do epitélio com os carcinogênios. · Consumo regular de peixe e ácido ômega 3 · Suplementação de cálcio ou a ingesta de uma dieta rica no mineral (laticínios não gordurosos) · Em mulheres, correlação inversa entre alto consumo de magnésio e aparecimento de adenomas colônicos e Ca colorretal · Consumo de altas doses de piridoxina (vitamina B6) · Suplementação de ácido fólico · Exercícios físicos regulares e o controle da obesidade · Aspirina e outros AINEs têm demonstrado reduzir a incidência do Ca colorretal em até 40%. Os mecanismos propostos incluem aumento da apoptose celular e inibição da COX 2, o que prejudica o crescimento de células tumorais. · Pravastatina e a sinvastatina · Terapia de reposição hormonal reduza a incidência de Ca colorretal, não deve ser recomendada única e exclusivamente para este fim devido a seus riscos inerentes PREVENÇÃO E RASTREAMENTO O rastreamento do Ca colorretal na DII, nas síndromes de polipose hereditária e na síndrome de Lynch já foi descrito antes e é tópico de fundamental importância. Já sabemos também o seguimento a ser realizado após a ressecção de um pólipo adenomatoso esporádico. Mas como devemos rastrear o Ca colorretal (esporádico) em indivíduos que não possuem história familiar? Esses pacientes são considerados de risco intermediário (average risk). Em tais casos, o rastreamento deve ser iniciado a partir dos 50 anos de idade e terminado por volta de 75/85 anos. Os melhores métodos de triagem são aqueles que envolvem visualização do cólon. As principais estratégias dentro deste grupo são: (1) Colonoscopia a cada 10 anos; OU (2) Colonoscopia virtual a cada 5 anos; OU (3) Retossigmoidoscopia a cada 5 anos. A colonoscopia é o exame de maior sensibilidade (quase 100%) para detectar pólipos ou cânceres colorretais. Contudo, é um método mais dispendioso, desconfortável e com possíveis complicações. O Colégio Americano de Gastroenterologia já está recomendando, como opção, a colonoscopia como método de rastreamento de escolha, devido à detecção crescente de neoplasias do cólon direito. A colonoscopia virtual é uma Tomografia Computadorizada (TC) helicoidal tridimensional que reproduz a imagem típica de como seria a colonoscopia daquele paciente. A retossigmoidoscopia flexível alcança até 60 cm do ânus, ou seja, até a flexura esplênica, detectando 60-70% de todos os cânceres colorretais (este número aumenta para 80% considerando que o encontro de um pólipo adenomatoso irá indicar uma colonoscopia). De uma forma geral, durante o exame rotineiro encontram-se pólipos adenomatosos em 10-20% dos casos e o câncer em 1%. O encontro de adenoma ou carcinoma é indicação absoluta de colonoscopia, para procurar lesões sincrônicas. Caso o paciente não possa se submeter aos exames descritos ou não queira realizá-los, métodos que avaliam a presença de sangue nas fezes podem ser empregados para rastreamento do Ca colorretal: (1) Pesquisa de sangue oculto nas fezes com guáiaco, utilizando três amostras, realizado a cada ano; OU (2) Pesquisa de sangue oculto nas fezes através de método imunoquímico, utilizando duas a três amostras, realizado a cada ano; OU (3) Teste de DNA de uma amostra de fezes,possivelmente a cada cinco anos (período ainda não estabelecido na literatura). O sangue oculto nas fezes baseia-se na propriedade da maioria dos adenocarcinomas e de alguns adenomas de eliminarem pequenas quantidades de sangue para o lúmen intestinal. Por tal eliminação ser intermitente, pode haver resultados falso-negativos. Quando realizado pelo método convencional (guáiaco), o sangue oculto deve ser examinado em três amostras consecutivas de fezes (dois slides de cada). O indivíduo deve restringir a ingestão 72h antes do exame os seguintes itens: carne vermelha, frango, peixe, nabo, rábano, AINE, AAS em doses > 325 mg/dia. Todos estes elementos podem provocar resultados falso-positivos. O consumo de vitamina C pode dar um resultado falso-negativo. Cerca de 1-5% da população rastreada apresenta resultado positivo. A presença de sangue oculto nas fezes deve indicar a realizaçãode uma colonoscopia. O adenocarcinoma é encontrado em 5-15% dos casos (geralmente em estágio precoce) e pólipos adenomatosos são vistos em 25-50% dos casos. Estudos prospectivos demonstraram que este tipo de triagem reduz em 15-43% a mortalidade por Ca colorretal. Como devemos rastrear o Ca colorretal (esporádico) em indivíduos que apresentam história familiar do câncer? É muito comum encontrarmos indivíduos que possuam um parente de primeiro grau (um dos pais, por exemplo) com história de Ca colorretal. Se este parente tiver desenvolvido a doença antes do 60 anos de idade, ou se houver dois parentes de primeiro grau acometidos, uma estratégia de rastreamento “diferenciado” deve ser implementada, iniciando-se (de preferência com uma colonoscopia) aos 40 anos ou em uma idade dez anos inferior à idade em que o parente mais jovem teve o câncer diagnosticado. Nestes casos, a colonoscopia deve ser repetida a cada cinco anos, e não a cada dez... Se a idade de surgimento do câncer no parente de primeiro grau for superior a 60 anos não se indica a estratégia “diferenciada”, devendo o rastreamento ser o mesmo que para a população geral (isto é, início aos 50 anos), ainda que alguns autores também sugiram um início mais precoce para esses indivíduos (isto é, aos 40 anos). PATOLOGIA E PATOGENIA Os adenocarcinomas colorretais podem ser de dois tipos: · Lesão polipoide: é mais comum no lado direito (ceco e cólon ascendente); · Lesão constritiva, que pode causar sintomas de obstrução, é mais comum no lado esquerdo (cólon descendente, sigmoide e reto). Em termos de localização, observamos uma recente “migração” do Ca colorretal do cólon esquerdo para o cólon direito. 38% no ceco e cólon ascendente 35% noretossigmoide, 18% no cólon descendente e 18% no cólon transverso Os cânceres colorretais se iniciam como lesões epiteliais intramucosas, a partir de pólipos adenomatosos (nem sempre), crescem, penetram na submucosa, invadem os linfáticos e ganham acesso aos linfonodos e tecidos vizinhos, assim como aos órgãos à distância. É importante lembrar que a mucosa do cólon não possui vasos linfáticos, então o tumor só é considerado invasivo quando alcança a submucosa (ultrapassa a muscular da mucosa). O carcinoma de cólon pode disseminar-se: (1) Através da parede do intestino até a gordura pericolônica e mesentério, invadindo órgãos adjacentes; (2) Através dos linfáticos para os linfonodos regionais; (3) Através da veia porta para o fígado; (4) Para toda a cavidade peritoneal, para os pulmões e ossos. O adenocarcinoma de cólon tem uma peculiaridade interessante no que diz respeito a sua instalação: a velocidade de crescimento é muito lenta quando comparada à imensa maioria das outras neoplasias malignas. O tempo médio que os cânceres de cólon levam para dobrar de tamanho gira em torno de 620 dias (mais de 20 meses). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Nas fases precoces, o Ca colorretal é totalmente assintomático. As principais manifestações do câncer de cólon são: sangramento (oculto ou exteriorizado), dor abdominal, alteração do hábito intestinal (constipação ou diarreia) e a presença de massa abdominal palpável. Mais raramente, o adenocarcinoma abre seu quadro com emagrecimento, obstrução mecânica, perfuração intestinal com sinais de peritonite, fístulas, ascite carcinomatosa ou sinais de metástase hepática. · Ca do cólon esquerdo (descendente, sigmoide) – predomina a alteração do hábito intestinal (constipação progressiva, ou constipação alternada com hiperdefecação ou diarreia), ocorrendo devido ao fato do cólon esquerdo ser de menor calibre e conter fezes semissólidas, em vez de líquidas. · Ca do cólon direito (ascendente, ceco) – predomina sangue oculto nas fezes e a anemia ferropriva. Muitos doentes apresentam perda ponderal e alguns, febre de origem indeterminada. Estes tumores são altamente sangrantes, mas raramente causam obstrução do fluxo fecal, devido ao maior calibre do cólon e por conter fezes líquidas. Geralmente, as lesões são maiores e mais invasivas ao diagnóstico. · Ca retal – predomina hematoquezia de pequena monta, persistente ou intermitente. Constipação, tenesmo, eliminação de muco e sintomas relacionados à invasão dos órgãos adjacentes (uropatia obstrutiva, hematúria, fístulas vaginais) podem dominar o curso da doença. As principais complicações das metástases são hepatomegalia dolorosa, ascite carcinomatosa, disfunção da bexiga, corrimento e sangramento vaginais e comprometimento pulmonar e ósseo. As metástases de pulmão resultam, em geral, de metástases hepáticas (exceto para o Ca de reto). DIAGNÓSTICO Anamnese: suspeitar de carcinoma colorretal em todo paciente (especialmente idoso) que desenvolva sangramento retal, dor abdominal, modificação dos hábitos intestinais, emagrecimento e ANEMIA FERROPRIVA. Exame físico: pode revelar evidências da síndrome de Peutz-Jeghers ou de Gardner (associação de pigmentação melanótica cutâneo-mucosa com pólipos hamartomatosos encontrados no trato digestivo), assim como pode evidenciar massa abdominal ou sinais de metástases (como hepatomegalia). Toque retal: permite o diagnóstico do câncer de reto distal e pode ser o primeiro indício da doença. Laboratório: pode confirmar anemia ferropriva ou revelar alterações das enzimas hepáticas, sugerindo doença metastática. Os EXAMES CONFIRMATÓRIOS são: (1) Retossigmoidoscopia flexível; (2) Clister opaco (enema baritado), com duplo contraste; costuma revelar apenas os tumores mais avançados, quando demonstra o famoso sinal da “maçã mordida”. (3) Colonoscopia – o melhor e mais completo. Exame obrigatório, sendo considerado o padrão-ouro para o diagnóstico. O método avalia com precisão a presença ou não de tumores sincrônicos (presentes em 3% dos casos) e de pólipos adenomatosos. Quando um tumor exerce efeito “estenosante” na luz do tubo digestivo, impedindo a passagem do colonoscópio, podemos lançar mão da colonoscopia virtual (reconstrução com imagens da TC) para delinear as características anatômicas da lesão antes de partir para a cirurgia. HISTÓRIA NATURAL E ESTADIAMENTO Os dois sistemas de estadiamento de que dispomos são o TNM e o antigo sistema de Dukes, posteriormente modificado por Astler-Coller. O American Joint Comitee on Cancer tem recomendado o primeiro. A Tabela 1 descreve o estadiamento TNM e faz uma correlação entre os dois sistemas. TRATAMENTO Na grande maioria dos pacientes a cirurgia curativa é possível. Mesmo nos casos de metástases à distância, o tumor colônico deve ser ressecado, para evitar complicações abdominais futuras, como obstrução ou perfuração. Em alguns casos de metástases hepáticas limitadas ou metástases pulmonares, existe probabilidade de cura após a ressecção dos implantes secundários. A abordagem operatória atual para o tratamento do carcinoma do cólon deve incluir: · excisão do segmento acometido, com amplas margens de segurança · ressecção dos linfáticos regionais (pelo menos 12 linfonodos devem ser ressecados), meso e suprimento vascular (ressecção em bloco). · Margens proximal e distal mínimas de 5 cm para o tumor de cólon e de 2 cm para o câncer de reto. · Manipulação mínima do tumor e ligaduras vascularesdevem ser realizadas no início da ressecção · O paciente deve ficar em posição de decúbito horizontal nas lesões do cólon direito e de litotomia (com colocação de perneiras) para as ressecções tumorais do cólon esquerdo ou reto. As ressecções tumorais podem ser realizadas tanto por via laparotômica (aberta) quanto por via laparoscópica. Esta última tem ganhado aceitação cada vez maior entre os cirurgiões oncológicos. Todavia, exige experiência por parte da equipe cirúrgica. · O uso de antibióticos profiláticos não deve ultrapassar 48 horas. O uso de antibióticos orais para esterilização do cólon não é mais prática adotada. · Preparo mecânico, com o emprego de laxantes, também não é recomendado na literatura. Contudo, alguns serviços utilizam o manitol ou sulfato de sódio quando o tumor é localizado em cólon esquerdo. · Durante a indução anestésica, administra-se a primeira dose de antibióticos profiláticos, que devem cobrir bactérias Gram-negativas e anaeróbicas. Aproximadamente 90% dos tumores podem ser adequadamente ressecados, e a mortalidade cirúrgica gira em torno de 2-10%. A cirurgia tem como princípios a restauração da continuidade e a manutenção, na medida do possível, da função intestinal. · Tumores no Ceco e Cólon Ascendente Ressecção de porção distal do íleo (8 a 10 cm proximal a válvula ileocecal), todo o ceco, colón ascendente e metade do colón transverso, procedimento conhecido como hemicolectomia direita. As ligaduras vasculares incluem as artérias ileocólica e cólica direita, junto à raiz da artéria mesentérica superior, e o ramo direito da artéria cólica média (FIGURA 3). A continuidade do trânsito se dá através de ileotransverso anastomose. · Tumores em Flexura Hepática e na metade direita do Cólon Transverso Hemicolectomia direita ampliada é recomendada. A anastomose é realizada entre o íleo e o restante do transverso. · Tumores na porção Média do Cólon Transverso Recomenda-se a transversectomia, com ligadura da artéria cólica média em sua raiz. Devido à proximidade do estômago com o cólon transverso, pode haver infiltração do órgão, o que pode requerer sua ressecção parcial. · Tumores da Metade Esquerda do Cólon Transverso e da Flexura Esplênica São abordados da mesma forma, com ligadura das artérias cólica média e cólica esquerda, assim como da veia mesentérica inferior. A ressecção envolve a metade esquerda do cólon transverso, quase toda a metade direita e o cólon descendente, tendo como margem distal o cólon sigmoide. · Tumores no Cólon Descendente A ressecção envolve a metade esquerda do cólon transverso, o cólon descendente e o cólon sigmoide. A anastomose é realizada entre o cólon transverso e o reto alto. A drenagem do cólon esquerdo acompanha a artéria mesentérica inferior (FIGURA 7). Este vaso deve ser ligado em sua origem na aorta; a veia mesentérica inferior é também ligada em seu trajeto por trás do pâncreas. · Tumores Localizados no Cólon Sigmoide A cirurgia inclui a ressecção do cólon sigmoide. A anastomose é realizada entre o cólon descendente e a porção superior do reto (FIGURA 8). Os ramos sigmoides da artéria mesentérica inferior são ligados. TUMORES LOCALIZADOS NO RETO O tratamento do adenocarcinoma localizado no reto difere um pouco daquele diagnosticado no restante do cólon. Sabemos que o reto está confinado à pelve e tem proximidade com órgãos urogenitais, nervos autonômicos e esfíncter anal, o que faz com que seu acesso cirúrgico seja mais difícil. É muito comum a indicação de terapia neoadjuvante (pré-operatória) com o objetivo de reduzir o tamanho tumoral para que uma determinada ressecção cirúrgica obtenha sucesso sem sacrificar estruturas em torno do órgão. A localização do reto faz com que altas doses de Radioterapia (RT) possam ser empregadas sem envolvimento do intestino delgado. Em tumores localizados no restante do cólon, altas doses de RT podem comprometer o delgado adjacente ocasionando a temida enterite actínica. · Excisão Local Transanal Consiste na retirada de um disco de reto contendo todo o tumor por via endoanal. Menos de 5% dos doentes com adenocarcinoma de reto são candidatos a esta modalidade terapêutica. Para indicarmos este método como terapia curativa, todas as características seguintes devem estar presentes: · o tumor deve ser móvel · ter menos de 4 cm de diâmetro · ocupar menos de 40% da circunferência da parede do reto · ser do tipo T1 · estar localizado dentro de 6 cm da margem anal Alguns autores aceitam a excisão local em tumores T2, todavia a taxa de recidiva é de 20%, o que torna estes pacientes maus candidatos ao procedimento. Para que a excisão local possa ser realizada devemos também afastar a possibilidade de envolvimento de linfonodos através de exames complementares (US transanal ou RM). Um problema desta abordagem é que os linfonodos para estadiamento patológico não são obtidos. Desta forma, o não envolvimento de linfonodos do mesorreto é avaliado apenas pelos métodos de imagem. · Ressecção Anterior Baixa com Anastomose Colorretal ou Coloanal (RAB) Envolve a ressecção do reto e cólon sigmoide em bloco, incluindo sua drenagem linfática (excisão total do mesorreto); ligadura da artéria mesentérica inferior é também realizada. A expressão “baixa” representa a ressecção de porção do reto abaixo de sua reflexão peritoneal anterior. A maioria dos tumores localizados a mais de 5 a 6 cm da margem anal ou cerca de 2 a 3 cm acima da junção anorretal (linha pectínea) podem ser tratados desta forma. A grande vantagem deste procedimento é a preservação esfincteriana. Uso de radioterapia e quimioterapia pré-operatória, a RAB eventualmente pode ser realizada em tumores de localização mais baixa. O trânsito intestinal se faz através de anastomose colorretal manual, empregando-se sutura contínua, ou mecânica, por meio de grampeamento circular. Dependendo da altura do tumor, todo o reto pode ser ressecado; nesses casos é realizada anastomose coloanal, com confecção de bolsa colônica (reservatório colônico). · Ressecção Abdominoperineal somada à Colostomia Definitiva (RAP ou Cirurgia de Miles) Envolve a ressecção de todo reto, mesorreto e cólon sigmoide por via abdominal e perineal, com colostomia definitiva. Ressecção anal e fechamento do orifício anal fazem parte da operação. A RAP se encontra indicada em tumores que invadem o complexo esfincteriano e em casos em que exista disfunção esfincteriana pré-operatória. Tumores que você sente no toque retal. A cirurgia apresenta um tempo abdominal e um tempo perineal que podem ser realizados por duas equipes cirúrgicas, de forma sincrônica. Trabalhos recentes têm demonstrado um pior prognóstico em pacientes submetidos à RAP quando comparados àqueles submetidos a procedimentos com preservação esfincteriana. Terapia Neoadjuvante: Todo o tratamento administrado antes de cirurgia curativa para tratamento de câncer é conhecido como terapia neoadjuvante. Os tumores T2, T3, T4 ou N1 são os que mais se beneficiam. Além disso, tumores localizados dentro de 5 cm da margem anal também devem se submeter à terapia neoadjuvante. O esquema envolve a administração de RT com 4.500 a 5.040 cGy em 5 a 6 semanas, somada à QT com o emprego de 5-fluoracil e leucovorin (ácido folínico). A cirurgia é realizada seis a 10 semanas após o término da RT. Terapia Adjuvante para Tumores de Cólon e Reto - realizada após a cirurgia de ressecção tumoral, visando exterminar possíveis micrometástases remanescentes. Usada se o paciente fez neoadjuvancia. · Cirurgia para as Metástases Hepáticas – A excisão de áreas de comprometimento neoplásico secundário em fígado, por exemplo, está associada à sobrevida de 25-40% em cinco anos. Antes a mortalidade era de 100% em três anos. Todavia, devemos ter em mente as contraindicações ao procedimento: Doença extra-hepática extensa e irressecável; Evidência radiológica de envolvimento de veia porta, artéria hepática ou grandes ductos biliares; Envolvimento extenso do fígado (mais de 70%, mais de seis segmentos ou de todas as três veias hepáticas); Baixa reserva hepatocelular.As ressecções têm que ser anatômicas, respeitando a divisão hepática por segmentos e manter uma margem de segurança de, no mínimo, 1 cm. Múltiplas lesões bilobares são abordadas com ressecções atípicas (ressecções que não seguem as cisuras hepáticas). O cirurgião deve ponderar se, após a ressecção, o fígado restante será suficiente para manter uma função hepática adequada. Nos casos em que este procedimento não pode ser realizado, estudos recentes mostraram benefício da quimioterapia intra-arterial e da crioterapia local. Pulmonares – aumentam a sobrevida em pacientes com Ca colorretal em estágio IV, existindo em alguns casos probabilidade de cura. Os seguintes fatores estão associados a um melhor prognóstico: número limitado de nódulos, valor normal de CEA pré-toracotomia, ausência de envolvimento de linfonodo regional, apresentação metacrônica da metástase (a lesão aparece após a detecção do tumor primário) e um tempo maior entre o diagnóstico do câncer e o surgimento da metástase. Geralmente os focos metastáticos que aparecem depois de um ano do diagnóstico do Ca colorretal apresentam uma menor taxa de recidiva em 3 anos após sua ressecção. Embora apresente um prognóstico pior em termos de sobrevida, a ressecção de metástases pulmonares e hepáticas concomitantes, ou a ressecção de doença pulmonar em pacientes que já tiveram sua metástase hepática operada, não são procedimentos contraindicados. SEGUIMENTO PÓS-OPERATÓRIO Nos pacientes que apresentam Ca colorretal em estágios II e III, taxas de recidiva tumoral de até 40% são descritas na literatura. Sendo assim, torna-se obrigatório um seguimento adequado desses doentes após o procedimento cirúrgico. Os sítios mais comuns de recidiva incluem o fígado, os pulmões, o leito do tumor primário, o peritônio e os linfonodos. O padrão de acompanhamento pós-operatório é variável de acordo com as diversas associações médicas relacionadas à Oncologia, Gastroenterologia e Endoscopia Digestiva, com repetidas mudanças ao longo dos anos. Isso se dá a partir do crescente conhecimento sobre a história natural do Ca colorretal... De forma geral, o risco de recidiva é maior nos 2 primeiros anos após a cirurgia. O seguimento pós-operatório é descrito abaixo: (1) Consulta médica e dosagem do CEA a cada 3-6 meses por 2 anos, depois, a cada seis meses até completar 5 anos. Um aumento do CEA maior do que 10 ng/dl ou 2 elevações persistentes normalmente indicam recidiva tumoral. Se os exames tradicionais (colonoscopia, tc) não detectarem recidiva, estará indicada a PET-TC; (2) Colonoscopia após 1 ano. Se negativa, repetir em 3 anos e, depois, a cada 5 anos. Se for encontrado algum pólipo, remover e repetir em 1 ano. Nos casos em que o Ca era obstrutivo e não permitia a avaliação do restante do cólon pelo colonoscópio, deverá ser realizado um novo exame 6 meses após a cirurgia; (3) Retossigmoidoscopia flexível nos pacientes submetidos à ressecção abdominal baixa para Ca de reto. O exame é realizado após 1 mês da cirurgia e repetido a cada 3 meses nos 2 primeiros anos; (4) Considerar tomografia de tórax, abdome e pelve anualmente nos pacientes com alto risco de recorrência (tumor indiferenciado ou com invasão de linfáticos/veias).