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101 Relação equipe inteRdisciplinaR- paciente Objetivos • Interpretar o conceito de equipe interdisciplinar no contexto da saúde. • Analisar a importância da relação entre o profissional de saúde e o paciente. • Compreender variáveis da relação com o paciente para promover saúde. Conteúdos • Relação equipe interdisciplinar-paciente. • Variáveis psicossociais do tratamento. Orientações para o estudo da unidade Antes de iniciar o estudo desta unidade, leia as orientações a seguir: 1) Esta será a última unidade. No entanto, o tema abordado talvez seja um dos mais importantes para sua atuação profissional. De todos os aspectos psicológicos que foram discutidos até aqui, a relação entre você e seu unidade 4 102 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE paciente pode ser, muitas vezes, o único instrumento disponível para modificar comportamento e promover saúde. 2) Os Conteúdos Digitais Integradores são fundamentais para a compreensão integral dos assuntos abordados. Não deixe de acessá-los. 3) Entre os Conteúdos Digitais Integradores há um pequeno vídeo sobre empatia. Assista-o pensando no ambiente em que você futuramente trabalhará. 103© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE 1. INTRODUÇÃO Conforme foi visto na Unidade 1, o modo com entendemos saúde passou por importantes mudanças ao longo do tempo. Essas transformações influenciaram, também, o modo como entendemos o cuidado e como compreendemos a formação dos profissionais que cuidam da saúde. Segundo Corradi-Webster e Carvalho (2015): Pensar em saúde de modo positivo representa uma mudança grande de paradigma, já que o foco não é mais o déficit, a ausência da saúde ou ausência de enfermidade, e sim o bem estar biopsicossocial. Com base nesta visão, serviços de saúde vêm sendo criados e reestruturados, aproximando-se das comunidades, oferecendo cuidados que vão além da cura, incluindo a promoção, a prevenção e a reabilitação. Vem sendo ampliada a participação de profissionais não-médicos no cuidado, já que o médico deixou de ser a única figura central da assistência. O cuidado também começa a ser compreendido como integral, ou seja, considera-se que as pessoas devam ter acesso a todos os serviços de saúde necessários e que sejam considerados os aspectos emocionais, físicos e sociais dos usuários. Nesta perspectiva, o usuário passa a ser considerado não como uma unidade individual, mas como alguém que está inserido em uma família, em uma comunidade, em um contexto histórico e social definido. A fim de garantir a plenitude da assistência, os profissionais da área da Saúde não podem trabalhar sozinhos. O trabalho em equipe se faz fundamental, no qual profissionais com formações e experiências diversas discutem situações, ampliam o olhar e as possibilidades de intervenção (CORRADI-WEBSTER; CARVALHO, 2011). 104 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE 2. CONTeúDO BásICO De RefeRêNCIa O Conteúdo Básico de Referência apresenta de forma sucinta os temas abordados nesta unidade. Para sua compreensão integral, é necessário o aprofundamento pelo estudo dos Conteúdos Digitais Integradores. 2.1. O trabalhO em equipes de saúde O trabalho em equipe surgiu como uma estratégia para redesenhar o trabalho e promover a qualidade dos serviços. Entre esses processos, pode ser citado o planejamento de serviços, a formação de prioridades, a redução da duplicação dos serviços, a geração de intervenções mais criativas, a redução de intervenções desnecessárias pela falta de diálogo entre os profissionais, a redução da rotatividade, resultando na redução de custos, com a oportunidade de aplicação e investimentos em outros processos (STAUDT, 2008). A forma como os profissionais se agrupam e trabalham pode variar consideravelmente. O trabalho em equipes pode ocorrer dentro de um contínuo, que vai da atuação paralela à interdisciplinar. Na medida em que avança em direção à interdisciplinaridade, várias mudanças vão ocorrendo: • a comunicação entre os profissionais e entre estes e os pacientes aumenta e há uma tendência cada vez maior para que as decisões sejam tomadas por meio de um consenso; • a equipe torna-se mais complexa e há redução na hierarquia; 105© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE • existe uma preocupação crescente com a compreensão e os manejos dos problemas de saúde dentro de uma perspectiva biopsicossocial; • os resultados são cada vez mais complexos e incluem extensão de serviços, ensino, pesquisa e gestão (MIYAZAKI et al., 2011). Nem todas as equipes de saúde são interdisciplinares, mas isso não significa que as demais formas de trabalho não sejam eficientes. As equipes são dinâmicas e diversos aspectos podem afetar o seu funcionamento, como fatores pessoais e profissionais, intragrupo e organizacionais (MIYAZAKI et al, 2011). O conceito de interdisciplinaridade relaciona-se com outros termos, tais como multidisciplinaridade e transdisciplinaridade. Em um serviço de saúde, o trabalho em equipe pode estar organizado segundo uma dessas formas, que vamos detalhar a seguir. equipes multidisciplinares A multidisciplinaridade é a forma de organização de equipe tradicional. Equipes multidisciplinares são formadas por vários profissionais de diferentes áreas, que buscam abranger os diferentes aspectos de uma mesma situação, sem haver uma relação entre si, cada um dentro do seu saber. Neste tipo de organização de trabalho, cada profissional atua de maneira isolada em sua área específica, solicitando a intervenção de outro profissional quando julga necessário, mas sem que haja discussão ou cooperação nas decisões tomadas. Por exemplo, em uma unidade de saúde na qual a equipe médica tem a possibilidade de encaminhar o paciente para o 106 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE atendimento de outro profissional, tal como o enfermeiro, o psicólogo ou fisioterapeuta. Esse outro profissional atua como um consultor – cada especialidade atua de forma separada. Logo, não há um trabalho coordenado por parte dessa equipe e uma identidade grupal, ou seja, o médico, em geral, é o responsável pela decisão do tratamento, e os outros profissionais vão se adequar à demanda do paciente e às decisões do médico. A equipe multidisciplinar deve construir uma relação entre profissionais, considerando um atendimento humanizado. Dessa forma, foca-se nas demandas do paciente, e a equipe tem como finalidade atender a essas necessidades visando seu bem-estar; no entanto, de forma desmembrada, cada profissional em sua área de atuação (STAUDT, 2008). equipes interdisciplinares A interdisciplinaridade consiste no estabelecimento de associação intencional de duas ou mais áreas do saber, para alcançar um conhecimento mais amplo e diversificado. Nesta forma de organização, profissionais de diversas especialidades se reúnem para a resolução de um objetivo em comum. Pensando em equipe de saúde, profissionais de diferentes áreas discutem e tomam decisões em conjunto sobre os procedimentos e tratamentos indicados para cada paciente. Este tipo de organização, facilita a visão mais ampla do sujeito, de forma a integrar em cada decisão seu componente biológico, psicológico e social. Podemos pensar no exemplo de uma unidade de saúde na qual todos os profissionais envolvidos com o paciente se reúnem sistematicamente para a tomada de decisão sobre seu tratamento. Nesse caso, o médico informaria aos outros 107© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE profissionaissobre as questões clínicas do caso, enquanto o enfermeiro poderia esclarecer sobre a adesão ao tratamento, e a assistente social, acerca das condições familiares de dar suporte àquele paciente. Em equipe interdisciplinar, há um nível maior de relação entre as disciplinas. As decisões são normalmente tomadas por meio de trocas de informações de cada especialidade em reuniões de equipe que ocorrem sistematicamente. A perspectiva interdisciplinar pode possibilitar o exercício de um trabalho mais integrador e articulado, tanto no que diz respeito à compreensão dos trabalhadores sobre o seu próprio trabalho, como no que diz respeito à qualidade do resultado do trabalho. Na análise das relações de trabalho nas equipes interdisciplinares, considera-se o modo como se desenvolve o processo de trabalho e a compreensão acerca dos seus componentes (objetivo e métodos) com vistas à obtenção de um resultado, e a finalidade do processo de trabalho em saúde é, por meio de alguma ação terapêutica, promover saúde (STAUDT, 2008, n.p.). No entanto, embora a interdisciplinaridade seja a forma de organização de trabalho mais produtiva em saúde, sua aplicação ainda encontra desafios. A prática dos serviços de saúde ainda é extremamente hierarquizada e fragmentada. Além disso, a visão quantitativa ainda supera a qualitativa nas gestões em saúde. Transdisciplinaridade A transdisciplinaridade implica uma aplicação em várias disciplinas. Não pressupõe, necessariamente, trabalho em equipe ou coordenação, mas vai mais além: não se resume às interações e às reciprocidades entre as disciplinas, uma vez que propõe a ausência de fronteiras entre elas. 108 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE Unidade 4 – relação eQUipe interdisciplinar-paciente Não se trata de especialidade diferentes atuando de forma compartilhada, mas sim descrevendo uma nova forma de compreender os fenômenos. Assim, de acordo com Staudt (2008, n.p.): A necessidade da transdisciplinaridade decorre do desenvolvimento dos conhecimentos, da cultura e da complexidade humana. Ela se preocupa com uma interação entre as disciplinas, promove um diálogo entre diferentes áreas do conhecimento e seus dispositivos, visa cooperação entre as diferentes áreas e contato entre essas disciplinas. Podemos considerar que a saúde, pela complexidade de seu objeto, se enquadra neste campo. A definição de saúde, que passou por transformações importantes, é um exemplo de transdisciplinaridade. Ela partiu de uma concepção biomédica, baseada exclusivamente no aspecto físico, e avançou para uma definição que engloba as disciplinas biológicas, psicológicas e sociais, de modo a descrever uma nova forma de observar o fenômeno saúde. Observe a Figura 1: Figura 1 Diferença entre equipes multi, inter e transdisciplinares. 109© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE 2.2. relação profissional de saúde e paciente O nosso próximo assunto é de extrema importância para a formação na área de Saúde. Enquanto profissional, uma parte importante de suas atribuições será gerenciar e efetuar o cuidado com os pacientes. Esse cuidado por ser realizado de diversas formas, que vão desde um cuidado automático e impessoal até o estabelecimento de uma relação de ajuda. Existem diversas evidências científicas que mostram que a relação estabelecida entre o paciente e o profissional de saúde pode se tornar um adjuvante no processo de cura desse enfermo. Paciente Imagine uma pessoa que acaba de receber um diagnóstico de uma doença grave. Apesar de ainda estar chocada com a notícia, ela tem que tomar decisões rapidamente, pois como precisa ser operada com urgência, terá que ficar internada no hospital, e não terá tempo nem de voltar para casa para avisar sua família. Você consegue imaginar como ela se sente? Será que, se ela puder contar com algum profissional de saúde para ajudá-la a se organizar, faria diferença neste momento? Para o ser humano, a doença é a quebra da harmonia orgânica, interferindo, com todos os setores da sua vida, especialmente, na convivência com os familiares mais próximos. Quando a hospitalização se faz necessária, o indivíduo é retirado de seu ambiente familiar e no hospital encontra um mundo completamente estranho, onde rotinas e normas rígidas controlam e determinam suas ações. Ao ser hospitalizado, o paciente deixa sua família e seu ambiente para ser inserido em um mundo diferente, sendo obrigado, inclusive, a ter seus hábitos modificados para se ajustar às rotinas do hospital (PAULA; FUREGATO, SCATENA, 2000, p. 45). 110 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE Quando uma pessoa precisa de um serviço de saúde, ela se vê num ambiente totalmente diferente do que está acostumada, onde tem que seguir regras e consequentemente adotar novas atitudes. Nessas situações, a comunicação entre o profissional de saúde e o paciente pode favorecer a adaptação e promover mais bem-estar a este, principalmente se o contato estabelecido favorecer a criação de uma relação de ajuda. Relação de ajuda e o papel da comunicação Numa abordagem compreensiva sobre a questão de ajuda, Rogers (2015) afirma: A relação de ajuda é uma relação na qual pelo menos uma das partes procura promover na outra o crescimento, o desenvolvimento, a maturidade, o melhor funcionamento e maior capacidade de enfrentar a vida. Desse modo, quando alguém necessita de amparo e outra pessoa é capaz de prestar auxílio, temos uma relação de ajuda. Nesse tipo de relação, o próprio indivíduo é o instrumento terapêutico, por meio da relação interpessoal. Em contextos de saúde, profissionais podem estabelecer relações de ajuda pelo uso de seus conhecimentos técnicos, de forma a oferecer alívio físico, mas também pelo uso de suas habilidades interpessoais, para oferecer apoio afetivo e informações. Para que o relacionamento estabelecido seja de ajuda, é necessário que o profissional de saúde se coloque em uma posição de igualdade em relação ao paciente, abandonando a postura de especialista, e divida seu conhecimento com o paciente. A compreensão das estratégias de enfrentamento que o paciente utiliza e o não julgamento moral também são fundamentais para facilitar a aproximação com o paciente. Além 111© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE disso, é necessário cooperação, confiança, participação mútua e uma comunicação eficaz. A comunicação tem sido um dos pontos mais destacados quando falamos de relação profissional de saúde e paciente. Ela pode ter diversos efeitos sobre o seu bem-estar, entre outros, dos quais destacamos: • Uma comunicação eficiente pode facilitar que o paciente compreenda seu quadro clínico e as alternativas de tratamento. Muitas vezes, no momento em que o diagnóstico é dado, o paciente está absorto de grande emoção, pelo choque da notícia. Neste momento, dificilmente ele conseguirá compreender todos os detalhes dos procedimentos propostos. Cabe ao profissional de saúde ter a percepção sobre a compreensão do paciente e reorientá-lo em um momento mais oportuno. Além disso, muitos pacientes não conseguem compreender informações transmitidas em termos técnicos da medicina, principalmente quando estamos em um serviço de saúde pública. É necessário adequar as informações em uma linguagem acessível ao paciente e sempre verificar se ele de fato compreendeu as orientações. • O estabelecimento de uma comunicação eficaz, inserida em uma relação de ajuda, pode facilitar a expressão de sentimentos, desejos e dúvidas do paciente. Consequentemente, isso pode facilitar a escolha de estratégias de enfrentamento mais adaptativas. Além disso, pode aumentar a autonomia do paciente, dando-lhe mais controle sobre o cuidado de sua saúde, e gerar a sensação de ser compreendido e respeitado. 112 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE A comunicação é definida como sendo a principal característica para o relacionamento humano. E para que traga benefícios, o profissional de saúde deve estar consciente do seu papel nesse processo que exige, além de procedimentos técnicos, escuta e atenção adequada (TIGULINI; MELO, 2002). A comunicação na área da Saúde é uma estratégia de uso constante no cotidiano do profissional. Quando a comunicação faz parte do trabalho, o paciente passa a vê-lo como uma pessoa capaz de ajudá-lo e passa a estabelecer vínculo com esse profissional. Por exemplo, informar ao paciente que procedimentos estão sendo realizados, de forma empática e com uma linguagem acessível a ele, facilita a confiança e o vínculo com a equipe de saúde. No entanto, devido à sobrecarga e ao estresse que os profissionais de saúde enfrentam no trabalho, muitas vezes, não apresentam uma comunicação satisfatória com os pacientes submetidos aos seus cuidados. O profissional deve tomar cuidado para que o estresse ocupacional não prejudique seu relacionamento com os pacientes. Desse modo, ele deve buscar conhecê-los, de forma que ocorra o diálogo entre ambos. Deve cultivar a confiança do paciente por meio do respeito e da empatia empreendidos na assistência. Deve proporcionar um relacionamento que favoreça a diminuição da ansiedade da pessoa enferma, fazendo-a perceber que a comunicação pode contribuir no seu processo de restabelecimento. De acordo com Martins (2015), “a qualidade de um serviço assistencial está diretamente associada à qualidade da relação interpessoal que ocorre entre os pacientes e os profissionais encarregados da assistência”. Por meio de uma comunicação terapêutica e da formação de vínculo entre profissional de saúde 113© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE e paciente, é possível estimular sua autonomia e a autoestima, promovendo sua participação no cuidado e na proteção de sua saúde. 2.3. variáveis que atuam na prOmOçãO de saúde Tudo o que apresentamos até agora pode ser considerado como variáveis que qualificam o cuidado ao paciente e promovem saúde. Não há dúvidas que o atendimento em equipe interdisciplinar é capaz de oferecer ao paciente um cuidado mais integral e humanizado. Além disso, a relação entre o profissional de saúde e seu paciente interfere de forma significativa na recuperação deste. Descreveremos agora outras variáveis que têm sido sistematicamente relacionadas com a promoção da melhor saúde. Entre elas estão a empatia, a informação, a autonomia, o suporte social e a espiritualidade. empatia Segundo Hoffman (1981, n.p.) a empatia [...] é a resposta afetiva apropriada à situação de outra pessoa. Na psicologia e nas neurociências contemporâneas a empatia seria uma espécie de “inteligência emocional” e pode ser dividida em dois tipos: a cognitiva - relacionada à capacidade de compreender a perspectiva psicológica das outras pessoas; e a afetiva - relacionada à habilidade de experimentar reações emocionais por meio da observação da experiência alheia. Assim, a empatia pode ser definida como a habilidade de se colocar no lugar da outra pessoa, de sentir como se estivesse na mesma situação que ela. Podemos dizer que é olhar o momento com "o olhar do outro". 114 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE Por exemplo, diante de um paciente acamado, que se queixa de dor e que não responde aos questionamentos do enfermeiro que precisa orientá-lo, o profissional de saúde deve compreender que, diante daquela situação, talvez o paciente não tenha de fato condições físicas e psicológicas de responder e compreender naquele momento, e tentar outras estratégias, como voltar em outro horário ou orientar um familiar. A empatia é uma habilidade social de extrema importância, capaz de desenvolver a autoconsciência emocional. As pessoas empáticas estão mais sintonizadas com os sutis sinais sociais que indicam que o outro precisa de algo. Por meio da empatia, somos capazes não apenas de manter relações interpessoais mais próximas e equilibradas, como também temos a oportunidade de nos sensibilizarmos para além da nossa própria perspectiva. A empatia envolve, primeiramente, a percepção da condição de sofrimento do outro e, posteriormente, a expressão de apoio e tentativa de conforto. Estudos da Psicologia da Saúde apontam que se sentir compreendido e apoiado em situações de crise, como no tratamento de uma doença grave, facilita o processo de aceitação e enfrentamento do paciente, contribuindo, assim, para a melhora da saúde emocional. Além disso, pode aumentar a confiança na equipe e promover adesão ao tratamento (TAKAKI; SANTANA, 2004). Embora pareça um conceito simples, a empatia não é uma habilidade fácil de se colocar em prática. Se, neste momento, fosse descrito em detalhes o caso de um paciente com doença crônica e suas dificuldades para lidar com o tratamento, talvez você se sentisse sensibilizado e apresentaria empatia apenas ao ler uma descrição. No entanto, no ambiente hospitalar, o volume 115© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE de pacientes que necessitam de cuidado é grande, e, na maioria das vezes, apenas descobrimos as dificuldades enfrentadas pelos pacientes se lhes perguntamos diretamente. Na rotina corrida do cuidado em saúde, há pouco espaço para a percepção do outro. Ocorre que acabamos nos acostumando com esse cenário e perdemos um pouco nossa sensibilidade. É preciso tomar muito cuidado com essa habituação. Embora possa haver centenas de pacientes presentes na unidade de saúde na qual você se encontra, cada um é único e vivencia seu problema de saúde de forma intensa. O profissional de saúde que consegue manter o foco na relação interpessoal e estabelece vínculo empático com seu paciente, destaca-se e promove a saúde de forma humanizada. Informação O oferecimento de informações metodológicas a respeito do quadro clínico do paciente e das possibilidades de tratamento produz benefícios amplos (STRAUB, 2005). Entre estes, observa- se menos emoção negativa e diminuição do risco de não adesão ao tratamento. O paciente deve ser orientado, com riqueza de informações, sobre para que serve cada exame e procedimento médico, quais são as alternativas de tratamento e as possibilidades terapêuticas. Ao mesmo tempo, é necessário que as informações sejam transmitidas em linguagem clara e acessível ao paciente. Devem- se levar em conta as condições sociais e o nível de instrução do paciente para que as informações sejam compreendidas na totalidade. O uso de termos extremamente técnicos e complicados apenas dificultam o seu entendimento e atrapalha sua adesão ao tratamento. 116 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE Além de informá-lo sobre sua condição de saúde, é necessário incluí-lo no processo de tomada de decisão dos procedimentos que serão realizados. autonomia Outro aspecto importante quando falamos em saúde é a manutenção da autonomia do paciente. Algumas vezes, por conta de uma condição clínica delicada, os familiares e a equipe de saúde, na tentativa de poupar o paciente, acabam tomando decisões sem consultá-lo, ou mesmo tentam esconder deste a notícia de uma piora no quadro. Essas atitudes, na maior parte das vezes, acabam gerando sentimentos de desconfiança e incapacidade. O paciente tem direito à informação e deve participar das decisões que envolvem sua saúde e sua vida. Esse maior controle permite ofortalecimento das relações entre o paciente e os profissionais que cuidam de sua saúde, a criação de sentimento de responsabilidade no processo de recuperação, além de aumentar a confiança do paciente na equipe e em seus familiares. suporte social O estudo do suporte social também tem recebido bastante destaque na área de Psicologia da Saúde e tem demonstrado atuar como fator de proteção ao estresse psicológico causado pelo diagnóstico de doenças graves. Suporte social pode ser definido como o grau com que relações interpessoais atendem a determinadas necessidades. Refere-se aos recursos postos à disposição por outras pessoas em situações de necessidade e pode ser medido pela percepção 117© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE individual do grau com que relações interpessoais correspondem a determinadas funções (por exemplo, apoio emocional, material e afetivo) (GRIEP et al., 2005). O suporte social tem sido relatado como fator que exerce papel na prevenção contra doenças e na manutenção da saúde, e algumas pesquisas mostram que a forma como o grupo social percebe o surgimento de uma doença e a evolução de seu tratamento influencia a escolha dos recursos de enfrentamento que o paciente utilizará. Tem sido associado também ao bem- estar psicológico, ao maior grau de satisfação com a vida e à melhora na autoestima, bem como à menor ocorrência de ansiedade (GRIEP et al., 2005). espiritualidade Nos últimos anos, a religiosidade e a espiritualidade têm sido relacionadas a diversos efeitos benéficos à saúde e ao bem-estar. A própria Organização Mundial de Saúde (OMS) iniciou um aprofundamento das investigações sobre este aspecto, e, atualmente, o bem-estar espiritual vem sendo considerado como mais uma dimensão do estado de saúde, juntamente com as dimensões física, psicológica e social. Desde modo, a espiritualidade tem sido relatada com um importante fator no enfrentamento de enfermidades físicas e psicológicas. Lazarus e Folkman (1986) destacam que a fé parece ser uma importante aliada no processo de adaptação a situações de ameaça à existência, podendo auxiliar o indivíduo a obter ou conservar a esperança, além de ajudá-lo a encontrar um sentido para a vida e facilitar a emergência de recursos psicológicos importantes para combater a doença. 118 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE A prática religiosa está relacionada a um maior nível de satisfação com a vida e relatos de felicidade e a menores níveis de queixas psicológicas. Em uma revisão de literatura realizada por Panzini e Bandeira (2007), as autoras concluem que a maioria das pesquisas sobre o assunto indica que crenças e práticas religiosas estão associadas à melhor saúde física e mental, incluindo efeitos benéficos em relação à dor, debilidade física, doenças do coração, pressão sanguínea, funções imunológicas, doenças infecciosas, câncer e mortalidade, além de maiores níveis de satisfação com a vida, bem-estar, senso de propósito e significado de vida, esperança, otimismo, estabilidade nos casamentos e menores índices de ansiedade, depressão e abuso de substâncias. 3. CONTeúDOs DIgITaIs INTegRaDORes Os Conteúdos Digitais Integradores são a condição necessária e indispensável para você compreender integralmente os conteúdos apresentados nesta unidade. 3.1. relaçãO equipe de saúde e paciente Nesta unidade, estudamos a importância do estabeleci- mento de uma relação de ajuda com o paciente e algumas variá- veis que promovem saúde, como empatia e informação. O estudo dos materiais complementares é fundamental para aprofundar os conhecimentos e descobrir novos tópicos neste tema. Assim, acesse os Conteúdos Digitais Integradores indicados e complemente seus estudos. 119© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE • AME EDITORINHA. Empatia. Disponível em: <http:// www.youtube.com/watch?v=gPASDkS3F98>. Acesso em: 17 ago. 2015. • HOGA, L. A. K. A dimensão subjetiva do profissional na humanização da assistência à saúde: uma reflexão. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reeusp/ v38n1/02.pdf> . Acesso em: 17 ago. 2015. • MACIEL-LIMA, S. M. Acolhimento solidário ou atropelamento? A qualidade na relação pro- fissional de saúde e paciente face à tecnolo- gia informacional. Disponível em: <http://www. scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- -311X2004000200018>. Acesso em: 17 ago. 2015. 4. QUesTÕes aUTOaVaLIaTIVas A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar o seu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder as questões a seguir, você deverá revisar os conteúdos estudados para sanar as suas dúvidas. 1) Diante de um paciente que apresenta resistência ao tratamento, qual a forma mais adequada de um profissional da saúde atuar? a) Respeitar a vontade do paciente e não insistir no atendimento; somen- te prescrever o tratamento se o paciente demonstrar maior aceitação. b) Insistir no atendimento e na prescrição do tratamento, já que o mais importante é recuperar a saúde do paciente. c) Desenvolver uma boa relação profissional-paciente para conseguir identificar quais aspectos, internos e externos ao paciente, podem es- tar gerando esta resistência e intervir para modificar estes fatores. d) Solicitar a intervenção de um psiquiatra, tendo em vista que este é o único profissional responsável pela atenção aos aspectos emocionais dos pacientes. 120 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE 2) Qual a importância do trabalho interdisciplinar? a) A possibilidade de dividir tarefas, o que alivia a sobrecarga de alguns profissionais e aumenta a qualidade do serviço prestado. b) A chance de discutir os casos com profissionais de outras áreas e saber suas opiniões a respeito dos pacientes. c) A garantia de ter a quem fazer o encaminhamento quando o paciente apresentar alguma demanda que extrapole as atribuições do médico. d) A união de saberes de diferentes áreas, pois isto possibilita a atenção integral à saúde do sujeito, um ser biopsicossocial. 3) A falta de compreensão adequada sobre o quadro clínico e seu tratamen- to, pode ser aspecto determinante para a não adesão de pacientes com doenças crônicas. Desde modo, de que forma devem ser transmitidas as informações aos pacientes? 4) Que características são importantes para se estabelecer um bom relacio- namento com seu paciente? 5) Sobre equipe interdisciplinar, assinale a alternativa INCORReTa: a) Neste tipo de organização de trabalho, cada profissional atua de ma- neira isolada em sua área específica, solicitando a intervenção de ou- tro profissional quando julga necessário, mas sem que haja discussão ou cooperação nas decisões tomadas. b) Em equipes interdisciplinares há um nível maior de relação entre as disciplinas. As decisões são normalmente tomadas por meio de tro- cas de informações de cada especialidade em reuniões de equipe que ocorrem sistematicamente. c) Embora a interdisciplinaridade seja a forma de organização de traba- lho mais produtiva em saúde, sua aplicação ainda encontra desafios d) A interdisciplinaridade consiste no estabelecimento de associação in- tencional de duas ou mais áreas do saber, para alcançar um conheci- mento mais amplo e diversificado. gabarito Confira, a seguir, as respostas corretas para as questões autoavaliativas propostas: 121© PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE 1) c. 2) d. 3) Fornecer de informações detalhadas ao paciente sobre seu diagnóstico e seu tratamento; usar linguagem apropriada, compreensível ao paciente. 4) Uso de linguagem apropriada, estabelecimento de relacionamentocola- borativo, empatia, fornecimento de informações e disponibilidade para ouvir o paciente. 5) a. 5. CONsIDeRaÇÕes fINaIs “O importante e bonito do mundo é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam” (Guimarães Rosa). Chegamos ao final da nossa obra. Esperamos que as discussões e temas aqui levantados tenham servido de ocasião para a reflexão sobre a complexidade da figura central de toda a ciência sobre saúde: o paciente. Com esta proposta, a Área de Saúde trabalha com o objetivo de promover a saúde, prevenir a doença, restaurar a saúde e facilitar o enfrentamento da incapacitação e da doença. Enquanto profissional, você não deve se esquecer que todo paciente tem dimensões físicas, emocionais, sociais e espirituais. E, portanto, para se conseguir uma atenção integral em saúde, todos esses aspectos devem ser considerados. 122 © PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE UNIDADE 4 – RElAção EqUIpE INtERDIscIplINAR-pAcIENtE 6. e-ReFeRÊNCIAS CARL, R. R. As características de uma relação de ajuda. Disponível em: <https:// psicologadrumond.files.wordpress.com/2013/08/tornar-se-pessoa-carl-rogers.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2015 CORRADI-WEBSTER, C. M. ; CARVALHO, A. M. P. Diálogos da psicologia com a enfermagem em tempos de transição paradigmática. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S008062342011000400026>. Acesso em: 5 ago. 2015. MARTINS, M. C. F. N. Relação profissional-paciente: subsídios para profissionais de Saúde. Disponível em: <http://www.polbr.med.br/ano97/cezira.php>. Acesso em: 17 ago. 2015. SciELO. Scientific Electronic Library Online. Disponível em: <http://www.scielo.org/php/ index.php >. Acesso em: 12 jan. 2014. 7. RefeRêNCIas BIBLIOgRáfICas GRIEP, R. H.; CHOR, D.; FAERSTEIN, E. et al. Validade de constructo de escala de apoio social do Medical Outcomes Study adaptada para o português no Estudo Pró-Saúde. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 21(3), p. 703-714, maio, 2005. HOFFMAN, L. 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