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Prof. Dr. Mário Martins As dimensões objetiva e subjetiva da desigualdade social A desigualdade objetiva Considerando a dimensão objetiva da desigualdade social, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), na pesquisa sobre indicadores de desenvolvimento sustentável, o Brasil permanece com elevado índice de Gini (0.531 em 2008). Esse índice mede o grau de concentração na distribuição de rendimentos da população e varia de 0 (zero), situação de plena igualdade a 1 (um), conjuntura de desigualdade máxima. Em condições reais, é muito difícil que o índice alcance esses valores extremos. Todavia, um 16 índice em torno de 0,5 é compreendido como um valor expressivo de fortes desigualdades na distribuição de renda na região analisada. Crescimento diminui a pobreza? O crescimento econômico no país, portanto, não reduziu a desigualdade social na mesma proporção. Dados do IBGE (2010) revelam, por exemplo, que entre 1996 e 2006, o PIB per capita cresceu 11,2%, enquanto o índice de Gini diminuiu 7,1%. Dados mais recentes, divulgados pela Fundação Getúlio Vargas na pesquisa intitulada “Desigualdade de Renda na Década” (Neri, 2011), destacam uma redução na pobreza de 50,64% entre dezembro de 2002 e 2010 e do índice que mede a desigualdade, que chegou ao mínimo em uma série histórica desde 1960. A consolidação objetiva da pobreza Fortes desigualdades na distribuição de renda implicam na consolidação da pobreza e vulnerabilidade social para ampla camada da sociedade e situam-se entre os problemas mais graves do país. Nesse sentido, é preciso reconhecer os avanços na área, sem reduzir os esforços para que se possa consolidar as mudanças empreendidas e encaminhar novas ações, com vistas às transformações necessárias. Sobre os avanços na área social, Pochmann (2010a) relata que a expansão da economia e por consequência do emprego, aliada a reorientação das políticas públicas aos segmentos de menor rendimento, produziram mudanças recentes à estrutura social brasileira. Da dicotomia à dialética Tradicionalmente, observa-se uma tendência de abordagem dicotômica ao problema, no sentido de uma polarização centrada em aspectos objetivistas, como se a desigualdade social se restringisse a diferenças na distribuição da renda. A dimensão subjetiva do fenômeno voltou-se, então, para os efeitos da desigualdade, representada na vasta gama de estudos sobre pobreza, vulnerabilidade social e seus correlatos. Progressivamente, contudo, foram se organizando estudos focados no entrelaçamento da vivência concreta dos sujeitos a aspectos de ordem subjetiva, debruçando-se sobre estilos de vida, gostos, valores, comportamentos e práticas A dimensão subjetiva da desigualdade Diante disso, "não se pode estudar a desigualdade social como se ela existisse apenas para além e fora dos sujeitos que se relacionam e constroem a desigualdade" (Bock & Gonçalves, 2009, p.149). As configurações subjetivas do social não aparecem, portanto, como algo externo, em contraposição às configurações das subjetividades individuais, pois estas se constituem mutuamente, uma vez que não é possível considerar a subjetividade de um espaço social desatrelada da subjetividade dos indivíduos que a compõem. De modo análogo, não é possível compreender a constituição da subjetividade individual sem apreciar a subjetividade dos espaços sociais que colaboram para a sua construção (Martínez, 2005). Exemplo: desigualdade entre bairros As mulheres do bairro de alto índice de exclusão social, em geral, explicam as causas da desigualdade social por fatores que estão associados prioritariamente às suas consequências, tais como diferenças no nível de escolarização, falta de oportunidades, aparência. Tendem a atribuir a produção do fenômeno a elementos de caráter individual, tais como esforço pessoal. Apresentam relatos de humilhação social (Gonçalves Filho, 1998), traduzidos na suposição de “ser menos” para os outros nas relações sociais. Nos projetos de futuro enfatizam a importância dos estudos, emprego e esperança de melhores condições de vida. Exemplo: desigualdade entre bairros O grupo dos homens neste bairro apresenta posição mais crítica sobre o tema, reconhecendo que a desigualdade tem raízes profundas e causas mais amplas, mas também focam o enfrentamento da situação de vulnerabilidade social no esforço individual. A educação é avaliada como elemento positivo que colabora nesta empreitada pessoal. Tanto as mulheres quanto os homens apresentam pouca clareza na descrição e explicação da desigualdade social, desconsiderando o papel da desigual distribuição de renda nesse processo, indicando naturalização do fenômeno. Percepção da desigualdade e ideologia Próxima aula (a) CRUZ, L.R.; GUARESCHI, N. Articulações entre a psicologia social e as políticas públicas na assistência social. In CRUZ, L.R.; GUARESCHI, N. (Orgs.) O psicólogo e as políticas públicas de assistência social, p.15-34. Para saber mais: (a) CRUZ, L.R.; GUARESCHI, N. A constituição da assistência social como política pública. In CRUZ, L.R.; GUARESCHI, N. (Orgs.) Políticas públicas e assistência social, p.13-40. (b) O Sistema Único de Assistência Social – SUAS: na consolidação da Assistência Social como política pública. In CRUZ, L.R.; GUARESCHI, N. (Orgs.) Políticas públicas e assistência social, p.41- 55. (c) BRASIL. Política Nacional de Assistência Social, 2004.