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1 
 
VANGUARDA ARTÍSTICA EUROPEIA 
 
 
 
 
Vanguarda é o nome que se dá a uma tendência ou conjunto de tendências que, num determinado 
momento histórico, se opõe ao estilo vigente, especialmente no campo das artes. Portanto, o termo está 
associado a ruptura, a choque. 
Vanguardas Européias ou “Ismos”. Europeus (“ismo” é, no caso, o sufixo agregado aos nomes das escolas 
literárias) foram movimentos literários e estéticos radicais, cujos principais objetivos eram promover a 
ruptura com a tradição e a abertura a novas possibilidades artísticas, como as oferecidas pela vida urbana 
moderna e pela exploração do irracionalismo e do inconsciente. 
Na Europa, vários movimentos integram a chamada vanguarda do início do século: o Futurismo, o 
Cubismo, o Dadaísmo e o Surrealismo, principalmente. 
 
Contexto histórico 
O avanço científico e tecnológico do início do século XX mudou o cotidiano das pessoas, contribuindo para 
uma supervalorização do progresso e o enaltecimento da máquina. 
Por outro lado, assistia-se à crise do capitalismo, que conduziria à Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918), 
pondo fim à chamada belle époque e provocando a descrença nos sistemas políticos, sociais e filosóficos. 
Em 1929, uma gigantesca crise financeira estava gestando a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945). 
O período entre as duas guerras é conhecido como “os anos loucos”, em que predominou a ânsia de viver 
apenas o presente, e freneticamente, uma vez que não se podia garantir a permanência da paz. 
Foi nesse período de inquietação, contradição e insatisfação que surgiu a necessidade de interpretar e 
expressar a realidade de um modo novo, inédito. Dessa necessidade resultam os movimentos artísticos 
que integram a vanguarda européia e que exerceram considerável influência sobre o Modernismo 
brasileiro. 
 
Manifestações Artísticas: cronologicamente, são estas as mais importantes tendências da vanguarda: 
 
1. FUTURISMO (publicado em 1909) 
 
Leia o texto seguinte, composto de fragmentos extraídos de manifestos futuristas: 
 1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito à energia e à temeridade. 
2. Os elementos essenciais de nossa poesia serão a coragem, a audácia e a revolta. 
3. [...] nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, o passo ginástico, o salto-mortal, 
a bofetada e o soco. 
4. Nós declaramos que o esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova: a beleza da 
velocidade. Um automóvel de corrida [...] é mais belo que a Vitória de Samotrácia. [...] 
5. Não há mais beleza senão na luta. Nada de obra-prima sem um caráter agressivo. [...] 
6. [...] O Tempo e o Espaço morreram ontem. Nós vivemos já no absoluto, já que nós criamos a eterna 
velocidade onipresente. 
7. Nós queremos glorificar a guerra – única higiene do mundo –, o militarismo, o patriotismo, o gesto 
destrutor dos anarquistas, as belas idéias que matam, e o menosprezo à mulher. 
8. Nós queremos demolir os museus, as bibliotecas, combater o moralismo, o feminismo e todas as 
covardias oportunistas e utilitárias. 
9. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito à energia e à temeridade. 
10. Os elementos essenciais de nossa poesia serão a coragem, a audácia e a revolta. 
11. [...] nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, o passo ginástico, o salto-mortal, 
a bofetada e o soco. 
 
 
2 
 
2 
 
MARINETTI, Filippo-Tommaso. Apud TELES, Gilberto Mendonça. 
Vanguarda européia e Modernismo brasileiro. 3. ed. Petrópolis, Vozes, 1972. p.85-6. 
 
1. Na sua terceira fase, o movimento futurista torna-se porta-voz do fascismo. Identifique duas 
passagens do texto que se relacionam àquela ideologia. 
 
2. Um estudioso do período afirma que em todos os níveis sociais a dança tornou-se a arte do 
momento. Que palavras do manifesto têm relação de significado com essa arte? 
 
3. “[...] guerra – única higiene do mundo...” 
a) Localize um trecho do texto anterior que dê um significado possível para essa equivalência. 
b) Nesse contexto, a que expressão do trecho equivale o termo higiene? 
 
Na pintura e na escultura, os futuristas tentavam apreender não os objetos em si, mas o movimento 
desses objetos no espaço. 
Para conseguir os mesmos efeitos na literatura, os futuristas propunham a técnica conhecida como 
“palavras em liberdade”, abolindo a sintaxe, os tempos verbais e os adjetivos. A técnica da colagem 
também foi um recurso muito utilizado pelos futuristas. 
 
 CUBISMO ( 1907) 
Surgido na pintura, a partir das experiências de Pablo Picasso, o Cubismo propõe que o artista fracione 
o elemento da realidade que está interessado em representar e, em seguida, recrie-o através de planos 
geométricos superpostos. Graças a essa remontagem, o objeto poderia ser representado de diferentes 
ângulos ao mesmo tempo. Era o golpe radical na perspectiva tradicional, pois nesta o artista escolhia 
um plano para representar o objeto. 
 
Na literatura, uma das características fundamentais do Cubismo é a preocupação com a disposição 
gráfica do poema: o espaço da folha passa a ter importância, assim como os tipos empregados na 
composição do texto. 
Tradução literal do poema “Chove”, de Apollinaire: 
(1) Chovem as vozes das mulheres como se elas estivessem mortas mesmo na lembrança 
(2) É você também que chove gotículas de maravilhosos encontros de minha vida 
(3) E essas nuvens turbulentas se põem a relinchar todo um universo de cidades sonoras 
(4) Escute se chove enquanto o remorso e o desprezo choram por uma antiga música 
(5) Escute caírem os laços que te prendem no alto e embaixo 
 
Responda a respeito do texto: 
1. O texto de Apollinaire aproxima a poesia da pintura. Explique essa afirmativa. 
2. O jogo plástico com as palavras representa uma ruptura com a noção tradicional de estrofe e verso. 
Explique. 
 
DADAÍSMO (1916) Um grito de liberdade 
 
Nasce em plena guerra, em Zurique (Suíça). Total falta de perspectiva diante da guerra. Foi o mais radical 
dos movimentos de vanguarda. Tem como princípio a negação da lógica, da coerência e da cultura, numa 
espécie de protesto contra o absurdo da guerra. 
Tristan Tzara, romeno que viveu na França, foi o líder do movimento dadaísta. Afirma ele que dadá, palavra 
que encontrou casualmente num dicionário, pode significar: “rabo de vaca santa”, “mãe”; “certamente”; 
“ama-de-leite”. Mas o próprio Tzara acabou afirmando, no manifesto dadaísta: 
 
DADÁ NÃO SIGNIFICA NADA 
O texto seguinte resume a proposta literária dos dadaístas: 
3 
 
3 
 
Para fazer um poema dadaísta 
 
Pegue um jornal. 
Pegue a tesoura. 
Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema. 
Recorte o artigo. 
Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam este artigo e meta-as num saco. 
Agite suavemente. 
Tire em seguida cada pedaço um após o outro. 
Copie conscienciosamente na ordem em que as palavras são tiradas do saco. 
O poema se parecerá com você. 
E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda que incompreendido do 
público. 
In: TELES, Gilberto M., op. cit., p. 126. 
 
 
 
 
1. Em que modo estão os verbos do texto? Por que se empregou esse modo? 
2. Os dadaístas pretendiam abolir a lógica. Explique como se expressa essa idéia no texto. 
3. Os dadaístas revelavam desprezo total pela participação do leitor. Que trecho do texto evidencia 
essa idéia? 
 
Veja um poema dadaísta de Ludwig Kassak: 
A batalha 
Berr... bum, bumbum, bum... 
Ssi... bum, papapa bum, bumm 
Zazzau... Dum, bum, bumbumbum 
Prä, prä, prä... râ, äh-äh, aa... 
Haho!... 
In: TELES, Gilberto M., op. cit., p. 126. 
 
 
Expressionismo (1910) 
"A terra é uma paisagem imensa que Deus nos deu. Temos que olhar para ela de tal modo que ela 
chegue a nós sem deformação. A realidade tem que ser criada por nós, o universototal de artista 
expressionista torna-se a visão. Ele não vê, mas percebe, ele não descreve, acumula vivências, ele não 
reproduz, estrutura. Cada homem não é mais indivíduo ligado a obrigação, à moral, à sociedade... Nessa 
arte ele se torna somente o mais grandioso ou o mais humilhado: ele se torna homem." 
 Pintura: Van Gogh; 
 Expressão das emoções e do mundo interior do homem usando a distorção violenta, a cor forte, 
o traço exagerado; 
 Anita Malfatti (exposição em 1917) 
 Percepção; 
 Artista não descreve, acumula vivências; 
 Interessa ao artista exteriorizar as sensações,, captar o que está além dos fatos 
4 
 
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SURREALISMO (Paris, 1924). 
 
Criado por André Breton (ex-paricipante do Dadaísmo. Iniciou no período entre guerras, sobre as cinzas 
da 1ª guerra mundial e sobre a experiência acumulada de todos os movimentos. Próximo ao 
Expressionismo. 
 
Era uma vez uma realidade 
com suas ovelhas de lã real 
a filha do rei passou por ali 
E as ovelhas baliam que linda que está 
a re a re a relidade 
 
Na noite era uma vez 
uma realidade que sofria de insônia 
Então chegava a madrinha fada 
e realamente levava-a pela mão 
a re a re a realidade 
 
No trono havia uma vez 
um velho rei que se aborrecia 
e pela noite perdia seu manto 
e por rainha puseram-lhe ao lado 
a re a re a realidade 
 
CAUDA: dade dade a reali 
dade dade a realidade 
A real a real 
Idade idade da a reali 
ali 
A re a realidade 
Era uma vez a REALIDADE 
 
 
 
In: FORTINI, Franco. O movimento surrealista. 2 ediçãoLisboa., Editorial Presença,1980,p191-2 
 
A expressão “Era uma vez...” é muito comum em um tipo de texto. 
 
a) Qual? 
b) Qual é, portanto, a expectativa do leitor quando depara com essa expressão no início de um 
texto? No poema lido, essa expectativa se concretiza? 
 
O poema lido é um texto surrealista. 
O Surrealismo foi, cronologicamente, o último movimento da vanguarda européia do início do século XX. 
Veja como André Breton, autor do primeiro manifesto surrealista, define o movimento: 
 
Surrealismo. s. m. Automatismo psíquico pelo qual alguém se propõe a exprimir, seja verbalmente, seja 
por escrito, seja por qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento. 
5 
 
5 
 
 
Veja três passagens retiradas do manifesto de Breton, publicado em 1924, citado por Gilberto Mendonça 
Teles: 
 
1. “Se as profundezas de nosso espírito abrigam forças estranhas capazes de aumentar as da 
superfície [...] há todo interesse em captá-las, em captá-las desde o início, para submetê-las em 
seguida, se isto ocorrer, ao controle de nossa razão.” (p.174) 
2. “O sonho não pode ser também aplicado à solução das questões fundamentais da vida?” (p. 175) 
3. Conta-se que, diariamente, na hora de adormecer, Saint-Paul-Roux mandava colocar sobre a porta 
de sua mansão [...] “um aviso onde se lia: O POETA TRABALHA.” 
 
BRETON, André. Manifesto do Surrealismo. In: TELES, G.M., op. Cit. 
 
Os estudos psicanalíticos de Freud influenciaram no surgimento do Surrealismo. Além de valorizarem o 
sonho, os surrealistas propunham a “escrita automática”: o artista deveria deixar-se levar pelo impulso, 
registrando tudo que lhe viesse à mente, sem se preocupar com a lógica ou a ordem. 
Dessa forma, pretendiam atingir a realidade situada no plano do subconsciente e do inconsciente. 
 
1. Dos estilos de época que antecederam o Modernismo, com quais se identificam mais de perto as 
propostas surrealistas? Explique 
 
2. Que fragmento(s) do manifesto, entre os transcritos, identifica(m) esse propósito? 
 
3. Dos estilos de época que antecederam o Modernismo, com quais se identificam mais de perto as 
propostas surrealistas? Explique. 
 
Bibliografia: FARACO, C.E & MOURA, F.M. Língua e Literatura. São Paulo: Ática, 2004. 
 
 
FATOS PRECURSORES DA SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922 
 
Muitos fatores concorreram para a realização da Semana de Arte Moderna de 1922. Dentre os inúmeros 
acontecimentos, destacam-se: 
 
1911 
Oswald de Andrade, cidadão da alta burguesia paulista, funda a revista O Pirralho, cujo objetivo essencial 
era questionar a arte brasileira. Irreverentes composições, como as de Juó Bananére – pseudônimo de 
Alexandre Marcondes Salgado –, satirizavam textos consagrados da literatura brasileira. 
 
1912 
Oswald de Andrade retorna de sua primeira viagem à Europa, de onde traz as novidades promovidas pelas 
correntes de vanguarda, em especial as idéias futuristas de Marinetti, dentre elas o verso livre, as palavras 
em liberdade. 
 
1913 
O pintor expressionista Lasar Segall protagoniza a primeira exposição considerada modernista no Brasil, 
provocando a mentalidade conservadora da burguesia paulistana com quadros que retratavam imagens 
distorcidas. 
 
1917 
Nesse ano, Oswald de Andrade conhece Mário de Andrade e ambos tornam-se amigos. São publicadas 
várias obras que apresentavam inovações na linguagem e na temática, dentre elas: Juca Mulato, de 
6 
 
6 
 
Menotti del Picchia; Cinza das Horas, de Manuel Bandeira; Nós, de Guilherme de Almeida; Há uma Gota 
de Sangue em Cada Poema, de Mário de Andrade, obra que tem como tema a Primeira Guerra Mundial. 
Anita Malfatti retorna ao Brasil, após quatro anos de estudos na Alemanha e nos Estados Unidos, e faz 
uma exposição de suas pinturas de influências expressionistas e cubistas no salão de chá da loja Mappin, 
em São Paulo. No primeiro dia, a artista obteve relativo sucesso, conseguindo, inclusive, reservas de 
quadros, canceladas no segundo dia, quando Monteiro Lobato, então crítico de arte do jornal O Estado de 
S. Paulo, publica o artigo “Paranóia ou Mistificação”, no qual denigre o trabalho de Anita. Oswald de 
Andrade defende Anita e Mário de Andrade faz um poema ainda de formas parnasianas para homenageá-
la. Leia um trecho do artigo de Lobato: 
 
Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêem normalmente as coisas e em conseqüência 
fazem arte pura, guardando os eternos ritmos da vida, e adotando para a concretização das emoções 
estéticas os processos clássicos dos grandes mestres. [...] A outra espécie é formada dos que interpretam 
à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de 
todos os períodos de decadência; são frutos de fim de estação, bichados ao nascedouro. Estrelas 
cadentes brilham um instante, as mais das vezes com luz do escândalo, e somem-se logo nas trevas do 
esquecimento. Embora eles se dêem como novos, precursores duma arte a vir, nada é mais velha do que 
a arte anormal ou teratológica: nasceu com paranóia e com mistificação. [...] 
 
BRITO, Mário da Silva. História do Modernismo Brasileiro; 
Antecedentes da Semana de Arte Moderna. 
Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1971. 
 
 
1919 
Oswald de Andrade, Di Cavalcanti, Menotti del Picchia e Hélio Seelinger conhecem Victor Brecheret – o 
escultor adere ao grupo dos que articulariam a Semana de Arte Moderna. No mesmo ano, Brecheret vai a 
Paris, onde expõe no Salon d’Automne. Monteiro Lobato aprecia seu trabalho. 
 
1920 
A imprensa começa a publicar artigos que atacavam o academicismo e o passadismo, especialmente 
graças às participações ativas de Oswald, Menotti del Picchia, Cândido Mota Filho, Agenor Barata e Mário 
de Andrade. 
 
1921 
Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Armando Pamplona vão ao Rio de Janeiro buscar apoio para o 
movimento modernista. Conseguem as adesões de Manuel Bandeira, Ronald de Carvalho, Ribeiro Couto, 
Álvaro Moreira, Renato de Almeida, Villa-Lobos e de Sérgio Buarque de Holanda. 
Nesse mesmo ano, Mário de Andrade publicou sete artigos, sob o título “Mestres do Passado”, no Jornal 
do Comércio, nos quais atacava os escritores parnasianos Francisca Júlia, Raimundo Correia, Alberto de 
Oliveira, Olavo Bilace Vicente de Carvalho. Leia o fragmento final do último artigo: 
 
[...] Malditos para sempre os Mestres do Passado! Que a simples recordação de um de vós escravize os 
espíritos no amor incondicional pela Forma! Que um olhar passeando por acaso nos vossos livros se 
cegue à procura de um verso de ouro! Que uma flor tombada de umas mãos infantis sobre vosso túmulo 
rebente em silvas de tais espinhos que nelas se fira e sucumba a ascensão dessa infância! Que o Brasil 
seja infeliz porque vos criou! Que a Terra vá bater na Lua arrastada pelo peso dos vossos ossos! Que o 
Universo se desmantele porque vos comportou! 
 E que não fique nada! Nada! Nada! 
 
Em 1921, Graça Aranha retorna da Europa e participa dos movimentos culturais paulistanos. Villa-Lobos 
é convidado a participar de um evento em São Paulo para a divulgação das idéias modernistas. O maestro 
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gostou do projeto, mas alegou não ter dinheiro para viajar. Foi através do patrocínio de Paulo Prado – rico 
intelectual paulista, herdeiro de fazendas de café – que Villa-Lobos pôde contratar os melhores 
instrumentistas e vir para São Paulo. 
 
 
 
A SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922 
 
Ainda paira um mistério sobre quem teria dado a ideia propriamente da Semana de Arte Moderna de 1922. 
De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, de 18 de fevereiro daquele ano, a sugestão teria partido de 
Marinete Prado, esposa de Paulo Prado. 
Menotti del Picchia, um dos participantes do evento, conta que a idéia surgiu de uma conversa entre ele e 
Oswald de Andrade. Renato de Almeida, outro participante, diz que, estando em companhia de Ronald e 
de Elísio de Carvalho, foram chamados por Graça Aranha, que lhes disse que Di Cavalcanti lhe sugerira 
uma “grande festa de arte”, com bases modernas, com conferências, música, dança e poesia. 
Mário de Andrade, figura central do movimento, alega não saber: 
 
Quem teve a ideia da Semana de Arte Moderna? Por mim não sei quem foi, nunca soube, só posso garantir 
que não fui eu. O movimento, se alastrando aos poucos, já se tornara uma espécie de escândalo público 
permanente. Já tínhamos lido nossos versos no Rio de Janeiro; e numa leitura principal, em casa de 
Ronald de Carvalho, onde também estavam Ribeiro Couto e Renato de Almeida, numa atmosfera de 
simpatia, Paulicéia Desvairada obtinha o consentimento de Manuel Bandeira, que em 1919 ensaiara os 
primeiros versos livres no Carnaval. E eis que Graça Aranha, célebre trazendo da Europa a sua Estética 
da Vida vai a São Paulo, e procura conhecer-nos e agrupar-nos em torno da sua filosofia. Nós nos ríamos 
um bocado da Estética da Vida que ainda atacava certos modernos europeus da nossa admiração, mas 
aderíamos francamente ao mestre. E alguém lançou a ideia de se fazer uma semana de arte moderna, 
com exposição de artes plásticas, concertos, leituras de livros e conferências explicativas. Foi o próprio 
Graça Aranha? Foi Di Cavalcanti?... Porém o que importa era poder realizar essa idéia, além de audaciosa, 
dispendiosíssima. E o grande fautor¹ verdadeiro da Semana de Arte Moderna foi Paulo Prado. E só mesmo 
uma figura como ele e uma cidade grande, mas provinciana como São Paulo poderiam fazer o movimento 
modernista e objetivá-lo na Semana. 
 
¹Fautor: promotor, auxiliador 
 
A Semana de Arte Moderna ocorreu em 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São 
Paulo, com a apresentação de conferências, leituras de textos, dança e música. 
No saguão do teatro, estavam expostas pinturas de Anita Malfatti, Di Cavalcanti, John Graz, Zina Aita, J. 
F. de Almeida Prado e Vicente do Rego Monteiro; esculturas de Victor Brecheret; projetos de arquitetura 
de Antonio Moya e Georg Prsimembel. 
 
13 de fevereiro de 1922 
A primeira noite foi aberta com uma conferência de Graça Aranha – “A Emoção Estética na Arte Moderna”, 
na qual o escritor pré-modernista promoveu ataques ao conservadorismo e ao academicismo da arte 
brasileira. Sua reputação como membro da Academia Brasileira de Letras e os seus 54 anos não o 
pouparam de receber vaias do público. 
A conferência foi ilustrada por declamações de poemas e por números musicais regidos por Ernani Braga, 
que executou, dentre outras obras, D. Edriophtalma, de Eric Satie, paródia da Marcha Fúnebre de Chopin. 
Ronald de Carvalho fez uma palestra sobre “A Pintura e a Escultura Moderna no Brasil”, seguida de solos 
de piano interpretados por Ernani Braga, e três danças africanas de Villa-Lobos. 
 
15 de fevereiro de 1922 
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8 
 
Nesse dia, Guiomar Novaes, conhecida virtuose de piano, havia enviado ao jornal O Estado de S. Paulo 
uma carta, em que se manifestava contrária à sátira da Marcha Fúnebre de Chopin. Apesar do protesto, 
participou do evento e aproveitou um intervalo para tocar alguns clássicos consagrados, iniciativa 
aplaudidíssima pelo público. 
Menotti del Picchia proferiu uma conferência sobre estética e arte, ilustrada por textos de Oswald de 
Andrade, Mário de Andrade e outros. As leituras foram acompanhadas por relinchos e miados do público 
pagante. Em sua exaltada palestra, Menotti afirmava: 
 
Queremos luz, ar, ventiladores, aeroplanos, reivindicações, obreiras, idealismo, motores, chaminés de 
fábricas, sangue, velocidade, sonho na nossa arte. E que o rufo do automóvel, nos trilhos de dois versos, 
espante da poesia, o último deus homérico, que ficou, anacronicamente, a dormir e a sonhar, na era do 
“jazz-band” e do cinema, com a flauta dos pastores da Arcádia e os seios divinos de Helena. [...] 
 
Um dos pontos mais conturbados do segundo dia foi a leitura feita por Ronald de Carvalho do poema “Os 
Sapos”, de Manuel Bandeira, ausente no evento. O poema, um virulento ataque aos parnasianos, teve 
seu refrão acompanhado aos berros por uma parte do público, a outra parte latia, guinchava e miava. Ao 
primeiro latido, Ronald retrucou: “Há um cachorro na sala, mas não está do lado de cá”. Veja o refrão: 
 
[...] 
Em ronco que aterra, 
Berra o sapo-boi: 
- “Meu pai foi à guerra!” 
- “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”. 
 
[...] 
Urra o sapo-boi: 
- “Meu pai foi rei” – “Foi!” 
- “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”. 
 
Mário de Andrade proferiu, sob vaias, nas escadarias do teatro, uma palestra sobre estética. Sobre isso 
ele afirmaria depois: 
 
Não sei como pude fazer uma conferência sobre artes plásticas nas escadarias do teatro, cercado de 
anônimos que me caçoavam e ofendiam a valer. 
 
17 de fevereiro de 1922 
 
Foi o dia mais tranqüilo, com menos da metade da lotação do teatro. O único momento de constrangimento 
e vaias deu-se quando o maestro Villa-Lobos apresentou-se calçando, em um dos pés, um chinelo – ele 
estava com um calo inflamado. O público interpretou a atitude como “futurista”, um espectador da primeira 
fila abriu um guarda-chuva preto em sinal de protesto ao figurino do regente. 
No último dia, reafirmaram-se os três objetivos fundamentais do movimento modernista brasileiro: 
 
 Reivindicar o direito permanente à pesquisa estética, à atualização da arte brasileira, à 
estabilização de uma consciência criadora nacional; 
 Reagir contra o “helenismo” de Coelho Neto, contra o purismo de Rui Barbosa, contra o 
academicismo de uma maneira geral; 
Substituir o pieguismo literário, de métrica rígida e sentimentos catalogados, pela linguagem coloquial, 
pela livre expressão, pela valorização da realidade nacional, pela exaltação da psique moderna . 
 
 
 
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REPERCUSSÕES DA SEMANA DE ARTE MODERNA 
 
O Estado de S. Paulo – Seção livre 
 
São uns pândegos, filhos de famílias ricas, que decidiram ser modernos apenas porque não sabem rimar 
Poeta C. E. B., ajeitando seu pince-nez. 
 
Eu acabei de voltar da Europa, eu também, e posso dizer que tudo é imitação dos futuristas italianos e 
dos dadaístas franceses. Aliás, como é que se vai levar a sério um movimento modernista queé 
inaugurado por um diplomata aposentado e membro da Academia Brasileira de Letras? 
M. A. M., festejada professora de recitativo e canto, 
declarava a amigos, menos ofendida que decepcionada. 
 
Homessa! A cacofonia do sr. Heitor Villa-Lobos só engana quem não entende de música. Tal qual o sr. 
Igor Strawinsky: um confuso! 
V. H., emérita pianista portuguesa, assistiu do balcão simples. 
 
Representou-se ontem o último ato da bombochata futurista. O senhor Villa-Lobos, pelo seu talento 
musical, bem merecia não ter se metido com a meia dúzia de cretinos que transformaram o nosso 
Municipal em dois espetáculos memoráveis pela sandice, numa desoladora grita de feira. 
 
A Gazeta 
São Paulo – 22 de fevereiro de 1922 
 
Ao público chocado diante da nova música tocada na Semana, como diante dos quadros expostos e dos 
poemas sem rima [...] sons sucessivos sem nexo estão fora da arte musical: são ruídos, são estrondos, 
palavras sem nexo lógico estão fora do discurso: são disparates como tantos e tão cabeludos, que nesta 
semana conseguiram desopilar os nervos do público paulista, que raramente ri a bandeiras 
despregadas. 
 
Folha da Noite 
São Paulo – 16 de fevereiro de 1922 
 
Foi, como se esperava, um notável fracasso a récita de ontem da pomposa Semana de Arte Moderna, que 
melhor e mais acertadamente deveria chamar-se Semana de Mal – às artes. O futurismo tão decantado 
não é positivamente de futuro... No presente, diante da ignorância de tal semana por parte da sonolenta 
sociedade, ainda é possível que dê alguma coisa; depois, porém, de conhecer a droga, ninguém penetrará 
a botica em que foi transformado o Municipal, agora muito em voga com o caso do Sr. Nilo, que foi 
representado pelo poderio dos futuristas... Mas, no recital cabotiníssimo de ontem, tudo foi derrocado ou 
quase tudo. Pondo-se de parte a nossa excepcional patrícia, que interpretou sob protestos, aliás, trechos 
do pré-homem, o resto foi um atestado eloqüente e incisivo da morbidez teratológica de que nos falou 
ontem Pinto Serva. 
A sonolenta sociedade paulista foi sacudida duas vezes do seu torpor de atraso: uma, para vibrar com 
Guiomar Novaes, e outra, com mais intensidade ainda, quando soube repelir o cabotinismo. 
De tudo quanto vimos e observamos do tal futurismo, metidos sempre no nosso atraso mental, deduzimos 
que os modernistas possuem uma coisa: topete, muito topete, e tanto assim que já se anuncia para 
amanhã uma exibição teratologista. 
 
Jornal do Comércio 
Rio de Janeiro – 22 de fevereiro de 1922 
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É preciso que se saiba que nos manicômios se produzem poemas, partituras, quadros e estátuas, e que 
essa arte de doidos tem o mesmo característico da arte dos futuristas e cubistas soltos por aí. 
Oscar Guanabarino 
 
 
 
REVISTAS E MANIFESTOS PÓS-SEMANA DE 1922 
 
As ideias veiculadas pela Semana de Arte Moderna de 1922 estenderam-se por todo o país e encontraram 
inúmeros adeptos voltados para a renovação da arte brasileira. Nas palavras de Mário de Andrade: 
 
[...] se alastrou pelo Brasil o espírito destruidor do movimento modernista. Isto é, o seu sentido 
verdadeiramente específico. Porque, embora lançando inúmeros processos e idéias novas, o movimento 
modernista foi essencialmente destruidor. 
 
Vários grupos foram formados e diversas revistas e manifestos publicados. Vamos destacar, a seguir, os 
mais expressivos. 
 
 
REVISTAS 
 
Klaxon – Mensário de Arte Moderna 
Publicada em maio de 1922, em São Paulo, a Klaxon durou apenas nove números – o último em dezembro 
do mesmo ano. O nome da revista (Klaxon era o termo utilizado para referir-se à buzina dos automóveis), 
a capa, o projeto gráfico, a irreverência dos textos, as ilustrações e até mesmo os anúncios publicitários 
reafirmavam o processo que a arte brasileira estava vivenciando. 
Observe alguns princípios da revista, publicados no editorial do primeiro número: 
 
Klaxon sabe que a vida existe. E, aconselhado por Pascal, visa o presente. Klaxon não se preocupará de 
ser novo, mas de ser atual. Essa é a grande lei da novidade. 
 
*** 
 
Klaxon não é exclusivista. Apesar disso jamais publicará inéditos maus de bons escritores já mortos. 
Klaxon não é futurista. 
Klaxon é klaxista. 
 
*** 
 
Klaxon cogita principalmente de arte. Mas quer representar a época de 1920 em diante. Por isso, é 
polimorfo, onipresente, inquieto, cômico, irritante, contraditório, invejado, insultado, feliz. 
TELES, G. Mendonça. Vanguarda Europeia e Modernismo Brasileiro. 
Petrópolis, Vozes, 1994. 
 
Aberta a todo o tipo de inovações para encontrar um caminho para a arte brasileira, a revista foi palco de 
vários tipos de experimentação, como bem observa o crítico literário Alfredo Bosi: 
 
[...] pela análise dos textos publicados em Klaxon e das páginas mais representativas da fase inicial do 
Modernismo, depreende-se que foram os experimentos formais do futurismo, não só do italiano, mas e 
sobretudo do francês (Apollinaire, Cendrars, Max Jacob) que mais vigorosamente dirigiam a mão dos 
nossos poetas no momento da invenção artística. Do surrealismo tomaram uma concepção irracionalista 
11 
 
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da existência que confundiram cedo com o sentido geral da obra freudiana que não tiveram tempo de 
compreender. Do expressionismo, processos gerais de deformação da natureza e do homem. 
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. 
São Paulo, Cultrix, 1978. 
 
Participaram da Klaxon: Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Guilherme de Almeida, Manuel Bandeira, 
dentre outros. 
 
Revista de Antropofagia 
 
Publicada em São Paulo, a Revista de Antropofagia teve duas fases ou “dentições” – nomenclatura mais 
adequada segundo os antropófagos: a primeira, de maio de 1928 a fevereiro de 1929, e a segunda, de 
março a agosto de 1929 – os artigos foram publicados no jornal Diário de São Paulo. A Revista de 
Antropofagia “não tem orientação ou pensamento de espécie alguma: só tem estômago”. 
Na primeira fase, iniciada com o Manifesto Antropófago, observam-se tendências ideológicas 
contraditórias: ao lado dos artigos revolucionários de Oswald de Andrade, Alcântara Machado, Mário de 
Andrade e de Carlos Drummond, havia textos de Plínio Salgado, fortemente marcados por um 
nacionalismo ufanista, identificado com o fascismo. 
Na segunda fase da revista, ocorreram algumas dissidências entre os grupos modernistas, inclusive a 
ruptura entre Oswald e Mário de Andrade. Mantiveram-se antropófagos: Oswald, Raul Bopp, Tarsila do 
Amaral e Patrícia Galvão, a Pagu. 
Outras revistas: Estética (Rio de Janeiro, 1924), A Revista (1925/26, responsável pela divulgação do 
Modernismo em Minas Gerais), Terra Roxa e Outras Terras (São Paulo, 1926), Festa (São Paulo, 1927), 
Revista Verde (Minas Gerais, 1927). 
 
MANIFESTOS 
 
Manifesto da Poesia Pau-Brasil 
Publicado em 1924, por Oswald de Andrade, o Manifesto da Poesia Pau-Brasil propunha redescobrir o 
Brasil e produzir uma literatura genuinamente brasileira, voltada para o progresso e o momento presente, 
distante da linguagem retórica e vazia. Daí o nome sugestivo: pau-brasil – um típico produto brasileiro, e 
o primeiro a ser explorado comercialmente. 
Leia, a seguir, alguns trechos em que se evidenciam a essência da “poesia pau-brasil”. 
 
A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre nos verdes da Favela, sob o azul cabralino, 
são fatos estéticos. 
 
A Poesia Pau-Brasil. Ágil e cândida. Como uma criança. 
 
A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica. A contribuição milionária de todos os erros. 
Como falamos. Como somos. 
 
Só não se inventou uma máquina de fazer versos – já havia o poeta parnasiano. 
 
A Poesia Pau-Brasil é uma sala de jantar domingueira, com passarinhos cantando na mata resumida das 
gaiolas, um sujeito magro compondo uma valsa para flauta e a Maricota lendo o jornal. Nojornal anda 
todo o presente. 
 
Nenhuma fórmula para a contemporânea expressão do mundo. Ver com olhos livres. 
 
TELES, G. Mendonça. Op. cit. 
 
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Manifesto Antropófago 
 
Publicado em 1928, na Revista de Antropofagia, o Manifesto Antropófago foi assinado por Oswald de 
Andrade e tinha como proposta “devorar” a cultura e os valores europeus para deles emergir uma arte 
própria, autenticamente nacional. 
 
A origem do movimento antropofágico é curiosa. Em fins de 27, Oswald de Andrade e a pintora Tarsila do 
Amaral foram, com amigos, a um restaurante a fim de comer rã. Enquanto esperavam, começaram a 
inventar teorias imaginárias acerca da rã, e alguém disse, em tom jocoso, que a história da evolução 
humana passava pela rã. Quando o prato chegou, Tarsila comentou que naquele momento eles poderiam 
ser considerados uns “quase-antropófagos”. No aniversário de Oswald, Tarsila o presenteia com um 
quadro: “O homem plantado na terra”. Foram ao dicionário de tupi-guarani e deram um nome à tela: 
Abaporu. Aba: homem; poru: que come. Assim, nascia o movimento da Antropofagia, radicalmente 
primitivista. 
 
Eis alguns trechos do Manifesto: 
 
Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. 
Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas 
as religiões. De todos os tratados de paz. 
Tupy or not tupy that is the question. 
[…] 
Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade. 
Contra o índio de tocheiro. O índio filho de Maria, afilhado de Catarina de Médicis e genro de Antônio de 
Mariz. 
A alegria é a prova dos nove. 
[...] 
Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Carnaval. 
TELES, G. Mendonça. Op. cit. 
 
Manifesto Nhengaçu Verde-Amarelo 
 
Publicado no jornal Correio Paulistano, em 1929, o Manifesto Nhengaçu Verde-Amarelo também é 
denominado Manifesto do Verde-Amarelismo ou da Escola da Anta – em função de os manifestantes 
escolherem a anta como símbolo nacional. 
O grupo Verde-Amarelo, formado por Plínio Salgado, Menotti del Pichia, Guilherme de Almeida e Cassiano 
Ricardo, desde 1926 vinha criticando o “nacionalismo afrancesado” de Oswald de Andrade e apresentando 
propostas nas quais recusavam qualquer contato com idéias europeias e que remetiam ao Integralismo 
de Plínio Salgado – uma versão nacional das idéias nazifascistas. 
No Manifesto Verde-Amarelo, o grupo deixa clara a sua proposta de ir contra os princípios da Poesia Pau-
Brasil e da Antropofagia: 
 
O grupo “verdeamarelo”, cuja regra é a liberdade plena de cada um ser brasileiro como quiser e puder; 
cuja condição é cada um interpretar o seu país e o seu povo através de si mesmo, da própria determinação 
instintiva; - o grupo “verdeamarelo”, à tirania das sistematizações ideológicas, responde com sua alforria 
e a amplitude sem obstáculo de sua ação brasileira [...] 
TELES, G. Mendonça. Op. cit. 
 
Outros Manifestos 
 
Em 1926, um grupo de Recife, liderado pelo sociólogo Gilberto Freire, propôs “desenvolver o sentimento 
de unidade do Nordeste”; “trabalhar em prol dos interesses da região nos seus aspectos diversos: sociais 
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econômicos e culturais”. O pronunciamento dos ideais do grupo deu-se por ocasião da abertura do 1° 
Congresso Regionalista do Nordeste e ficou conhecido como Manifesto Regionalista de 1926. 
 
A partir de 1930, o regionalismo nordestino destacou-se sobremaneira, revelando romancistas como José 
Américo de Almeida, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz, Jorge Amado e o poeta 
João Cabral de Melo Neto. 
TELES, G. Mendonça. Op. cit. 
 
 
QUADRO GERAL: 1ª GERAÇÃO DO MODERNISMO BRASILEIRO 
 
INÍCIO: 1922 - evento da “SEMANA DE ARTE MODERNA” no teatro municipal de São Paulo. 
TÉRMINO: 1930 - publicação do livro “Alguma Poesia”, de Carlos Drummond de Andrade. 
 
CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS: 
 
• Definições de posições bem determinadas e próprias. 
• Rompimento com as estruturas do passado. 
• Caráter anárquico e destruidor. 
• Nacionalismo. 
• Pesquisa através da volta às origens. 
• Tentativa de criar uma língua brasileira; a língua falada nas ruas, pelo povo. 
• Repensar a história da literatura no Brasil através da paródia e do humor. 
• Valorização do índio-autêntico brasileiro. 
• É uma fase rica em manifestos: “Pau-Brasil”, Oswald de Andrade - "Verde-Amarelo", e do "Grupo 
da Anta", com Plínio Salgado, 
• Nacionalismo crítico x utópico. 
 
AUTORES: 
 
I) MÁRIO DE ANDRADE 
• Liberdade formal. 
• Combate a sintaxe tradicional. 
• Nacionalismo. 
• Procura da linguagem brasileira. 
• Tema principal: a cidade de São Paulo. 
• Expressões ítalo-paulistanas. 
• Linguagem coloquial. 
• Pesquisa folclórica. 
• Principais obras: “Paulicéia Desvairada” (1922); “Lira Paulistana” (1946); “Contos Novos” (1946); 
“Amar,Verbo Intransitivo” (1927); “Macunaíma” (1928); “A escrava que não era Isaura” (1925). 
 
II) OSWALD DE ANDRADE 
• Lançou o movimento "Pau-Brasil" (1924) e o "Antropofágico" (1927). 
• Linguagem telegráfica. 
• Rupturas sintáticas. 
• Capítulos curtos. 
• Neologismos. 
• Técnica cinematográfica. 
• Linguagem coloquial e sintética. 
• Humor, paródia. 
• Temas do cotidiano. 
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• Quebra de fronteiras entre a prosa e poesia. 
• Principais obras: “Memórias Sentimentais de João Miramar” (1924); “Serafim Ponte Grande” 
(1933); “A Morta” (1937); “O Rei da Vela” (1937). 
 
III) MANUEL BANDEIRA 
• No início, influências simbolistas com ligações parnasianas. 
• Fez poemas autobiográficos. 
• Tom melancólico e lírico. 
• É muito triste em seus textos. 
• Temas relacionados a doenças e mortes, principalmente a tuberculose. 
• Linguagem coloquial, tese social e folclore negro. 
• Às vezes usa a ironia. 
• Versos livres. 
• Rebeldia e sátira como no poema “Os sapos”. 
• Temas populares. 
• Saudade da infância. 
• Desejo de libertação. 
• Principais obras: “A cinza das horas” (1917); “Ritmo Dissoluto” (1924); “Libertinagem” (1930); 
“Estrela da Manhã” (1936); “Itinerário de Pasárgada” (1954). 
 
OUTROS AUTORES 
• Alcântara Machado: Brás, Bexiga e Barra Funda. 
• Cassiano Ricardo: Martim Cererê. 
• Guilherme de Almeida: A flor que foi um homem. 
• Menotti del Picchia: Juca Mulato. 
• Plínio Salgado: O cavaleiro de Itararé. 
• Raul Bopp: Cobra Morato. 
 
 
 
 
OSWALD DE ANDRADE (1890-1954) 
LEIA: 
 
1. Pronominais 
2. 
Dê-me um cigarro 
Diz a gramática 
Do professor e do aluno 
E do mulato sabido 
Mas o bom negro e o bom branco 
Da Nação Brasileira 
Dizem todos os dias 
Deixa disso camarada 
Me dá um cigarro 
(ANDRADE, Oswald. Poesia reunida. São Paulo, Martins, 1978. p. 125.) 
 
a. Qual das intenções modernistas o poema põe em destaque? 
b. Trata-se de um poema metalingüístico. Explique. 
c. No poema temos a defesa do padrão fonético brasileiro, diferente do padrão português. Explique. 
 
2. Vício na fala 3. Amor 
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Para dizerem milho dizem mio 
Para melhor dizem mió humor 
Para pior pió 
Para telha dizem teia 
Para telhado dizem teiado 
E vão fazendo telhados. 
 
4. O gramático 5. O Capoeira 
 - Qué apanhá sordado? 
 - O quê? 
Os negros discutiam - Qué apanhá? 
Que o cavalo sipantou pernas e cabeças na calçada. 
Mas o que mais sabia 
Disse que eraANDRADE, Oswald de. 
Sipantarrou. 
 
Esses cinco poemas de Oswald de Andrade ressaltam características tipicamente modernistas: 
valorização da “fala brasileira”, incorporação do cotidiano, emprego de versos livres, o poema-piada, 
o poema-síntese. 
Encontre em cada um pos poemas as características citadas. Justifique. 
 
6. Medo da senhora 
A escrava pegou a filhinha nascida 
Nas costas 
E se atirou no Paraíba 
Para que a criança não fosse judiada. 
 
a. Valendo-se do seu conhecimento de História do Brasil, explique a razão da atitude da escrava. 
b. O poema apresenta uma palavra cujo emprego seria, hoje, considerado politicamente incorreto. 
Qual? Por quê? 
 
 
 
MACUNAÍMA E MÁRIO DE ANDRADE 
 
 
 Na obra "Macunaíma", classificada na primeira edição como uma "rapsódia" (1) temos, talvez, a 
criação máxima de Mário de Andrade. A partir da figura de Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, 
temos o choque do índio amazônico com a tradição e a cultura europeia. 
 O romance pode ser assim resumido: Macunaíma nasce sem pai, na tribo dos índios Tapanhumas. 
Após a morte da mãe, ele e os irmãos (Maanape e Jinguê), partem em busca de aventuras. Macunaíma 
encontra Ci, Mãe do Mato, rainha das Icamiabas, tribo de amazonas, faz dela sua mulher e torna-se 
Imperador do Mato-Virgem. Ci dá à luz um filho, mas ele morre e ela também, (Ci se transforma na 
estrela beta do Centauro). Logo em seguida, Macunaíma perde o amuleto (muiraquitã) que ela lhe dera. 
 
Sabendo que o amuleto está nas mãos de um mascate peruano que morava em São Paulo e que na 
verdade é Piaimã, o gigante antropófago, Macunaíma, acompanhado dos irmãos (Jiguê e Maanape), 
rumam ao seu encontro. Após inúmeras aventuras em sua caminhada, o herói recupera o amuleto, 
matando Piaimã. Em seguida, Macunaíma volta para o Amazonas e, após uma série de aventuras finais, 
sobe aos céus, transformando-se na constelação da Ursa Maior. 
(1) rapsódia: 
1. Cada um dos livros de Homero 
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2. P. ext. Trecho de uma composição poética. 
3. Entre os gregos, fragmentos de poemas épicos cantados pelo rapsodo. 
4. Mús. Fantasia instrumental que utiliza temas e processos de composição improvisada tirados 
de cantos tradicionais ou populares: Fonte: Dicionário Aurélio 
 
 
O trecho abaixo é o início da obra: 
 
No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da 
noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a 
índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma. 
Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Si o incitavam 
a falar exclamava: 
- Ai! Que preguiça!... e não dizia mais nada. Ficava no canto da maloca, trepado no jirau de paxiúba, 
espiando o trabalho dos outros e principalmente os dois manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê na 
força de homem. O divertimento dele era decepar cabeça de saúva. Vivia deitado, mas si punha os olhos 
em dinheiro, Macunaíma dandava pra ganhar vintém. E também espertava quando a família ia tomar 
banho no rio, todos juntos e nus. Passava o tempo do banho dando mergulho, e as mulheres soltavam 
gritos gozados por causa dos guaimuns diz-que habitando a água-doce por lá. No mucambo si alguma 
cunhatã se aproximava dele pra fazer festinha, Macunaíma punha a mão nas graças dela, cunhatã se 
afastava, Nos machos guspia na cara. Porém respeitava os velhos e freqüentava com aplicação a murua, 
a poracê, o torcê, o bacorocô, a cucuicongue, todas essas danças religiosas da tribo. 
 
 ANDRADE, Mário. Macunaíma. 16. ed. São Paulo, Martins, 1978. p.9. 
Vocabulário: 
Tapanhuma: nome que designava os negros africanos que moravam no Brasil. 
Sarapantar: espantar 
Jirau: estrado de varas. 
Paxiúba: tipo de palmeira 
Espertar: despertar. 
Guaiamum: crustáceo marinho. 
Mucambo: habitação miserável. 
Cunhatã: o mesmo que cunha; cabocla; mulher adolescente. 
Graças: expressão popular que designa o órgão genital feminino. 
 
 
1. Ao escrever Macunaíma, Mário de Andrade tentou aproximar a escrita da fala, além de ter 
incorporado inúmeras frases feitas e provérbios. Identifique exemplos dessas ocorrências no 
texto. 
 
2. Ao nascer sem pai, Macunaíma incorpora uma tradição da literatura clássica e da mitologia. Você 
conhece essa tradição? Explique em caso afirmativo ou pesquise em caso negativo. 
 
3. “Era preto retinto...” Macunaíma é um índio negro. No capítulo V da obra, depois de banhar-se 
numa lagoa, ele fica branco. Considerando essas informações, o que Macunaíma pode 
simbolizar? 
 
4. Identifique, em cada trecho abaixo, traços do caráter de Macunaíma. Utilize apenas substantivos 
abstratos em sua resposta. 
a) “O divertimento dele era decepar cabeça de saúva.” 
b) “Vivia deitado [...]“ 
c) “[...] mas si punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dandava pra ganhar vintém”. 
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5. Que figura de estilo ocorre em “... Macunaíma punha as mãos nas graças dela...” Explique sua 
resposta. 
 
6. No capítulo 8 de Macunaíma, o Sol promete ao herói que se ele fosse fiel a uma de suas filhas, 
permaneceria eternamente jovem. O herói, no entanto, acaba “brincando” com uma portuguesa, 
quebrando a promessa e sendo castigado pelo Sol: perde a oportunidade de nunca envelhecer. 
Relacione essa passagem ao seguinte trecho do manifesto antropófago: “Antes dos portugueses 
descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade”. 
 
7. Ao classificar o livro, usando terminologia musical, Mário de Andrade chamou-a de rapsódia. 
Explique o porquê. 
 
 
8. Onde está o narrador na obra Macunaíma? Quem é ele? Justifique. 
 
9. Quando foi escrita a obra? Em que circunstâncias? 
 
10. Por que Macunaíma é considerada uma obra-prima? 
 
 
 
 
 
 
O Peru de Natal 
 
 Mário de Andrade 
 
 O nosso primeiro Natal de família, depois da morte de meu pai acontecida cinco meses antes, foi de 
conseqüências decisivas para a felicidade familiar. Nós sempre fôramos familiarmente felizes, nesse 
sentido muito abstrato da felicidade: gente honesta, sem crimes, lar sem brigas internas nem graves 
dificuldades econômicas. Mas, devido principalmente à natureza cinzenta de meu pai, ser desprovido de 
qualquer lirismo, de uma exemplaridade incapaz, acolchoado no medíocre, sempre nos faltara aquele 
aproveitamento da vida, aquele gosto pelas felicidades materiais, um vinho bom, uma estação de águas, 
aquisição de geladeira, coisas assim. Meu pai fora de um bom errado, quase dramático, o puro-sangue 
dos desmancha-prazeres. 
 
 Morreu meu pai, sentimos muito, etc. Quando chegamos nas proximidades do Natal, eu já estava que 
não podia mais pra afastar aquela memória obstruente do morto, que parecia ter sistematizado pra 
sempre a obrigação de uma lembrança dolorosa em cada almoço, em cada gesto mínimo da família. 
Uma vez que eu sugerira à mamãe a idéia dela ir ver uma fita no cinema, o que resultou foram lágrimas. 
Onde se viu ir ao cinema, de luto pesado! A dor já estava sendo cultivada pelas aparências, e eu, que 
sempre gostara apenas regularmente de meu pai, mais por instinto de filho que por espontaneidade de 
amor, me via a ponto de aborrecer o bom do morto. 
 
 Foi decerto por isto que me nasceu, esta sim, espontaneamente, a idéia de fazer uma das minhas 
chamadas "loucuras". Essa fora, aliás, e desde muito cedo, a minha esplêndida conquista contra o 
ambiente familiar. Desde cedinho, desde os tempos de ginásio, em que arranjava regularmente uma 
reprovação todos os anos; desde o beijo às escondidas, numa prima, aos dez anos, descoberto por Tia 
Velha, uma detestável de tia; e principalmente desde as lições que dei ou recebi, nãosei, de uma criada 
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de parentes: eu consegui no reformatório do lar e na vasta parentagem, a fama conciliatória de "louco". 
"É doido, coitado!" falavam. Meus pais falavam com certa tristeza condescendente, o resto da 
parentagem buscando exemplo para os filhos e provavelmente com aquele prazer dos que se 
convencem de alguma superioridade. Não tinham doidos entre os filhos. Pois foi o que me salvou, essa 
fama. Fiz tudo o que a vida me apresentou e o meu ser exigia para se realizar com integridade. E me 
deixaram fazer tudo, porque eu era doido, coitado. Resultou disso uma existência sem complexos, de 
que não posso me queixar um nada. 
 
 Era costume sempre, na família, a ceia de Natal. Ceia reles, já se imagina: ceia tipo meu pai, 
castanhas, figos, passas, depois da Missa do Galo. Empanturrados de amêndoas e nozes (quanto 
discutimos os três manos por causa dos quebra-nozes...), empanturrados de castanhas e monotonias, a 
gente se abraçava e ia pra cama. Foi lembrando isso que arrebentei com uma das minhas "loucuras": 
 
- Bom, no Natal, quero comer peru. 
 
 Houve um desses espantos que ninguém não imagina. Logo minha tia solteirona e santa, que morava 
conosco, advertiu que não podíamos convidar ninguém por causa do luto. 
 
- Mas quem falou de convidar ninguém! essa mania... Quando é que a gente já comeu peru em nossa 
vida! Peru aqui em casa é prato de festa, vem toda essa parentada do diabo... 
 
- Meu filho, não fale assim... 
 
- Pois falo, pronto! 
 
 E descarreguei minha gelada indiferença pela nossa parentagem infinita, diz-que vinda de 
bandeirantes, que bem me importa! Era mesmo o momento pra desenvolver minha teoria de doido, 
coitado, não perdi a ocasião. Me deu de sopetão uma ternura imensa por mamãe e titia, minhas duas 
mães, três com minha irmã, as três mães que sempre me divinizaram a vida. Era sempre aquilo: vinha 
aniversário de alguém e só então faziam peru naquela casa. Peru era prato de festa: uma imundície de 
parentes já preparados pela tradição, invadiam a casa por causa do peru, das empadinhas e dos doces. 
Minhas três mães, três dias antes já não sabiam da vida senão trabalhar, trabalhar no preparo de doces 
e frios finíssimos de bem feitos, a parentagem devorava tudo e ainda levava embrulhinhos pros que não 
tinham podido vir. As minhas três mães mal podiam de exaustas. Do peru, só no enterro dos ossos, no 
dia seguinte, é que mamãe com titia ainda provavam num naco de perna, vago, escuro, perdido no arroz 
alvo. E isso mesmo era mamãe quem servia, catava tudo pro velho e pros filhos. Na verdade ninguém 
sabia de fato o que era peru em nossa casa, peru resto de festa. 
 
 Não, não se convidava ninguém, era um peru pra nós, cinco pessoas. E havia de ser com duas 
farofas, a gorda com os miúdos, e a seca, douradinha, com bastante manteiga. Queria o papo recheado 
só com a farofa gorda, em que havíamos de ajuntar ameixa preta, nozes e um cálice de xerez, como 
aprendera na casa da Rose, muito minha companheira. Está claro que omiti onde aprendera a receita, 
mas todos desconfiaram. E ficaram logo naquele ar de incenso assoprado, se não seria tentação do 
Dianho aproveitar receita tão gostosa. E cerveja bem gelada, eu garantia quase gritando. É certo que 
com meus "gostos", já bastante afinados fora do lar, pensei primeiro num vinho bom, completamente 
francês. Mas a ternura por mamãe venceu o doido, mamãe adorava cerveja. 
 
 Quando acabei meus projetos, notei bem, todos estavam felicíssimos, num desejo danado de fazer 
aquela loucura em que eu estourara. Bem que sabiam, era loucura sim, mas todos se faziam imaginar 
que eu sozinho é que estava desejando muito aquilo e havia jeito fácil de empurrarem pra cima de mim 
a... culpa de seus desejos enormes. Sorriam se entreolhando, tímidos como pombas desgarradas, até 
que minha irmã resolveu o consentimento geral: 
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- É louco mesmo!... 
 
Comprou-se o peru, fez-se o peru, etc. E depois de uma Missa do Galo bem mal rezada, se deu o nosso 
mais maravilhoso Natal. Fora engraçado: assim que me lembrara de que finalmente ia fazer mamãe 
comer peru, não fizera outra coisa aqueles dias que pensar nela, sentir ternura por ela, amar minha 
velhinha adorada. E meus manos também, estavam no mesmo ritmo violento de amor, todos dominados 
pela felicidade nova que o peru vinha imprimindo na família. De modo que, ainda disfarçando as coisas, 
deixei muito sossegado que mamãe cortasse todo o peito do peru. Um momento aliás, ela parou, feito 
fatias um dos lados do peito da ave, não resistindo àquelas leis de economia que sempre a tinham 
entorpecido numa quase pobreza sem razão. 
 
- Não senhora, corte inteiro! Só eu como tudo isso! 
 
 Era mentira. O amor familiar estava por tal forma incandescente em mim, que até era capaz de comer 
pouco, só-pra que os outros quatro comessem demais. E o diapasão dos outros era o mesmo. Aquele 
peru comido a sós, redescobria em cada um o que a quotidianidade abafara por completo, amor, paixão 
de mãe, paixão de filhos. Deus me perdoe mas estou pensando em Jesus... Naquela casa de burgueses 
bem modestos, estava se realizando um milagre digno do Natal de um Deus. O peito do peru ficou 
inteiramente reduzido a fatias amplas. 
 
- Eu que sirvo! 
 
"É louco, mesmo" pois por que havia de servir, se sempre mamãe servira naquela casa! Entre risos, os 
grandes pratos cheios foram passados pra mim e principiei uma distribuição heróica, enquanto mandava 
meu mano servir a cerveja. Tomei conta logo de um pedaço admirável da "casca", cheio de gordura e 
pus no prato. E depois vastas fatias brancas. A voz severizada de mamãe cortou o espaço angustiado 
com que todos aspiravam pela sua parte no peru: 
 
- Se lembre de seus manos, Juca! 
 
Quando que ela havia de imaginar, a pobre! que aquele era o prato dela, da Mãe, da minha amiga 
maltratada, que sabia da Rose, que sabia meus crimes, a que eu só lembrava de comunicar o que fazia 
sofrer! O prato ficou sublime. 
 
- Mamãe, este é o da senhora! Não! não passe não! 
 
 Foi quando ela não pode mais com tanta comoção e principiou chorando. Minha tia também, logo 
percebendo que o novo prato sublime seria o dela, entrou no refrão das lágrimas. E minha irmã, que 
jamais viu lágrima sem abrir a torneirinha também, se esparramou no choro. Então principiei dizendo 
muitos desaforos pra não chorar também, tinha dezenove anos... Diabo de família besta que via peru e 
chorava! coisas assim. Todos se esforçavam por sorrir, mas agora é que a alegria se tornara impossível. 
É que o pranto evocara por associação a imagem indesejável de meu pai morto. Meu pai, com sua figura 
cinzenta, vinha pra sempre estragar nosso Natal, fiquei danado. 
 
 Bom, principiou-se a comer em silêncio, lutuosos, e o peru estava perfeito. A carne mansa, de um 
tecido muito tênue boiava fagueira entre os sabores das farofas e do presunto, de vez em quando ferida, 
inquietada e redesejada, pela intervenção mais violenta da ameixa preta e o estorvo petulante dos 
pedacinhos de noz. Mas papai sentado ali, gigantesco, incompleto, uma censura, uma chaga, uma 
incapacidade. E o peru, estava tão gostoso, mamãe por fim sabendo que peru era manjar mesmo digno 
do Jesusinho nascido. 
 
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 Principiou uma luta baixa entre o peru e o vulto de papai. Imaginei que gabar o peru era fortalecê-lo 
na luta, e, está claro, eu tomara decididamente o partido do peru. Mas os defuntos têm meios 
visguentos, muito hipócritas de vencer: nem bem gabei o peru que a imagem de papai cresceu vitoriosa, 
insuportavelmente obstruidora. 
 
- Só falta seu pai... 
 
 Eu nem comia, nem podia mais gostar daquele peru perfeito, tanto que me interessava aquela luta 
entre os dois mortos. Cheguei a odiar papai. E nem sei que inspiração genial, de repente me tornou 
hipócrita e político. Naquele instanteque hoje me parece decisivo da nossa família, tomei aparentemente 
o partido de meu pai. Fingi, triste: 
 
- É mesmo... Mas papai, que queria tanto bem a gente, que morreu de tanto trabalhar pra nós, papai lá 
no céu há de estar contente... (hesitei, mas resolvi não mencionar mais o peru) contente de ver nós 
todos reunidos em família. 
 
 E todos principiaram muito calmos, falando de papai. A imagem dele foi diminuindo, diminuindo e virou 
uma estrelinha brilhante do céu. Agora todos comiam o peru com sensualidade, porque papai fora muito 
bom, sempre se sacrificara tanto por nós, fora um santo que "vocês, meus filhos, nunca poderão pagar o 
que devem a seu pai", um santo. Papai virara santo, uma contemplação agradável, uma inestorvável 
estrelinha do céu. Não prejudicava mais ninguém, puro objeto de contemplação suave. O único morto ali 
era o peru, dominador, completamente vitorioso. 
 
 Minha mãe, minha tia, nós, todos alagados de felicidade. Ia escrever "felicidade gustativa", mas não 
era só isso não. Era uma felicidade maiúscula, um amor de todos, um esquecimento de outros 
parentescos distraidores do grande amor familiar. E foi, sei que foi aquele primeiro peru comido no 
recesso da família, o início de um amor novo, reacomodado, mais completo, mais rico e inventivo, mais 
complacente e cuidadoso de si. Nasceu de então uma felicidade familiar pra nós que, não sou 
exclusivista, alguns a terão assim grande, porém mais intensa que a nossa me é impossível conceber. 
Mamãe comeu tanto peru que um momento imaginei, aquilo podia lhe fazer mal. Mas logo pensei: ah, 
que faça! mesmo que ela morra, mas pelo menos que uma vez na vida coma peru de verdade! 
 
 A tamanha falta de egoísmo me transportara o nosso infinito amor... Depois vieram umas uvas leves e 
uns doces, que lá na minha terra levam o nome de "bem-casados". Mas nem mesmo este nome 
perigoso se associou à lembrança de meu pai, que o peru já convertera em dignidade, em coisa certa, 
em culto puro de contemplação. 
 
Levantamos. Eram quase duas horas, todos alegres, bambeados por duas garrafas de cerveja. Todos 
iam deitar, dormir ou mexer na cama, pouco importa, porque é bom uma insônia feliz. O diabo é que a 
Rose, católica antes de ser Rose, prometera me esperar com uma champanha. Pra poder sair, menti, 
falei que ia a uma festa de amigo, beijei mamãe e pisquei pra ela, modo de contar onde é que ia e fazê-
la sofrer seu bocado. As outras duas mulheres beijei sem piscar. E agora, Rose!... 
1. A que época literária pertence o autor do conto? 
2. Que características da época em questão aparecem no texto? Justifique com trechos do conto. 
3. Qual a importância da figura paterna na vida do filho? Justifique. 
4. O que significa para o filho a expressão “felicidade gustativa”? 
5. Faça a relação simbólica da figura paterna e o peru de Natal. Justifique com coerência 
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MANUEL BANDEIRA (1886 – 1968) 
 
A sombra da morte, que acompanhou bandeira desde a adolescência, sensibilizou-o para sempre, 
levando-o a observar a vida em seus aspectos miúdos, prosaicos e a encontrar neles uma beleza e um 
lirismo desmedidos. Existem três fases na obra de Bandeira: 
a) pós-simbolista: inclui seus três primeiros livros, Cinza das Horas, Carnaval e Ritmo Dissoluto. Nesse 
primeiro momento, o poeta ainda está influenciado pelo espírito do Simbolismo, bem como de sua 
musicalidade formal. 
b) modernista: inclui Libertinagem e Estrela da Manhã. Essa fase marca a adesão mais radical de 
Bandeira ao Modernismo. Os versos livres e brancos, que ele começou a ensaiar no livro Carnaval, 
tornam-se uma constante; o vocabulário intensifica a coloquialidade; enfim, o poeta adere às idéias de 
vanguarda que nortearam parte do primeiro momento modernista brasileiro. 
c) pós-modernista: concentra toda a produção a partir de Lira do Cinqüent’Anos. Nessa última fase, 
coexistem versos tradicionais rimados com versos livres e brancos, e são incorporadas formas 
populares, como o rondó - poema de apenas duas rimas e formado de três estrofes, em um total de 
quinze versos. 
Vou-me embora pra Pasárgada ( in Libertinagem) 
 
Vou-me embora pra Pasárgada 
Lá sou amigo do rei 
Lá tenho a mulher que eu quero 
Na cama que escolherei 
Vou-me embora pra Pasárgada 
 
Vou-me embora pra Pasárgada 
Aqui eu não sou feliz 
Lá a existência é uma aventura 
De tal modo inconseqüente 
Que Joana a Louca de Espanha 
Rainha e falsa demente 
Vem a ser contraparente 
Da nora que nunca tive 
E como farei ginástica 
Andarei de bicicleta 
Montarei em burro brabo 
Subirei no pau-de-sebo 
Tomarei banhos de mar! 
E quando estiver cansado 
Deito na beira do rio 
Mando chamar a mãe-d’água. 
Pra me contar as histórias 
Que no tempo de eu menino 
Rosa vinha me contar 
Vou-me embora pra Pasárgada 
Em Pasárgada tem tudo 
É outra civilização 
Tem um processo seguro 
De impedir a concepção 
Tem telefone automático 
Tem alcalóide à vontade 
Tem prostitutas bonitas 
Para a gente namorar 
 
E quando eu estiver triste mais 
triste 
Mas triste de não ter jeito 
Quando de noite me der 
Vontade de me matar 
- Lá sou amigo do rei 
Terei a mulher que eu quero 
Na cama que escolherei 
Vou-me embora pra Pasárgada
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BIOGRAFIA DE PASÁRGADA: Quando eu tinha os meus quinze anos e traduzia na 
classe de grego do Pedro II a Ciropedia fiquei encantado com esse nome de uma 
cidadezinha fundada por Ciro, o Antigo, nas montanhas do sul da Pérsia, para lá 
passar os verões. A minha imaginação de adolescente começou a trabalhar, eu vi 
Pasárgada e vivi durante alguns anos em Pasárgada. Mais de vinte anos depois, num 
momento de profundo desânimo, saltou-me do subconsciente este grito de evasão: 
“Vou-me embora pra Pasárgada! Imediatamente senti que era a célula de um poema. 
Peguei do lápis e do papel, mas o poema não veio. Não pensei mais nisso. Uns cinco 
anos mais tarde, o mesmo grito de evasão nas mesmas circunstâncias. Desta vez o 
poema saiu quase ao correr da pena. Se há belezas em “Vou-me embora pra 
Pasárgada”, elas não passam de acidentes. Não construí o poema; ele construiu-se 
em mim nos recessos do subconsciente, utilizando as reminiscências da infância - as 
histórias de Rosa, a minha ama-seca mulata, me contava, o sonho jamais realizado de 
uma bicicleta, etc. O quase inválido que eu era ainda por volta de 1926 imaginava em 
Pasárgada o exercício de todas as atividades que a doença me impedia: “E como farei 
ginástica... tomarei banhos de mar!” A esse aspecto Pasárgada é “ toda a vida que 
podia ter sido e que não foi.” 
1. No texto, há uma oposição entre um aqui e um lá, o tempo presente e um 
outro tempo. Isso indica que Pasárgada, na verdade, cidade lendária da 
antiga Pérsia, é um outro espaço e um outro tempo. Indique as figuras 
que mostram que o tempo de Pasárgada é um tempo similar ao da 
infância. 
 
2. O poeta afirma no verso 7 que aqui não é feliz. Caracterize, com 
substantivos abstratos, aquilo que o poeta busca em Pasárgada. 
 
3. “Vou-me embora” indica o afastamento de um “aqui” e um “agora” que 
não têm aquilo que o poeta busca em Pasárgada, e a ida para um “lá” e 
um “então”. Como poderia ser definido o tema da ida para Pasárgada? 
 
4. Uma passagem do poema faz referência ao fato de que, em Pasárgada, 
não prevalecem os princípios da lógica e do pensamento racional, já que 
lá coexistem certas relações absurdas e sem sentido. Indique os versos 
em que as figuras levam a deduzir esse tema. 
 
5. Pasárgada é um lugar e um tempo real ou imaginário? Justifique. Por que 
pode-se falar em “mítica Pasárgada? 
 
6. o verso “Lá sou amigo do rei” significa que o poeta quer fugir para um 
espaço e um tempo em que: 
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a. o regime político vigente seja monárquico; 
b. ele adquira o poder de fazer tudo o que desejar sem qualquer restrição;c. tudo seja menos moderno; 
d. ele tenha um papel político a desempenhar; 
e. a amizade seja bastante valorizada. 
7. O poeta, no texto, recusa todas as imposições sociais e afirma seu desejo 
de fazer o que quer, de expressar sua individualidade. Considerando essa 
afirmação, responda: 
a. Qual é a oposição semântica fundamental do texto? 
b. Qual dos termos dessa oposição é afirmado no “aqui” e qual é afirmado no “lá”? 
c. Que termo é negado quando o poeta diz “Vou-me embora”? 
d. Qual desses termos tem valor positivo?

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