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1 DISCIPLINA: CRIMES EM ESPÉCIE I PERÍODO: 4º CARGA HORÁRIA: 40 H Teórica presencial INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO OU AUXÍLIO A SUICÍDIO OU A AUTOMUTILAÇÃO Introdução O crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio é previsto no art.122 do Código Penal e tomou mais relevância nos concursos públicos após o jogo Baleia Azul, desafio da internet que instigava jovens e crianças a se automutilarem e cometerem suicídio. Então, a Lei nº 13.968/13 alterou o art.122 do Código Penal para abarcar essa realidade. O tema há muito não gerava grandes discussões, porém, em tempos recentes, especialmente com o crescimento de plataformas de interação pela internet como Facebook, Twitter e WhatsApp, o induzimento e a instigação (principalmente) vieram aos temas de frequente debate pelo público geral após casos em que pessoas teriam ceifado diversas vidas ou, pelo menos, tentado fazê-lo, através de “desafios” como o Baleia Azul e, mais recentemente, as aparições da assustadora boneca “Momo”, criação de um artista japonês que apareceria em diversos vídeos infantis na internet, ofertando ideias suicidas a crianças e adolescentes. Suicídio é a deliberada destruição da própria vida. Embora a vida seja um bem jurídico indisponível, o direito não pune aquele que, com sua conduta, tira ou tenta tirar aquilo que tem de mais precioso: sua própria vida. Assim, o suicídio consumado não é crime pela impossibilidade de aplicação de sanção penal, e na forma tentada, por razões de política criminal como também, em ambos os casos, pelo fato do suicida ser, na realidade, considerado vítima e não autor. 2 Embora não seja crime, a conduta suicida é antijurídica porque ninguém tem direito de dispor da própria vida. Neste sentido, verifica-se que não configura constrangimento ilegal, a conduta daquele que exerce coação contra quem tenta suicidar-se (CP, art.146, § 3º,II). Por analogia, entendemos que este dispositivo também se aplica nos casos de coação contra quem tenta se automutilar. Automutilação (ou lesão autoprovocada intencionalmente) consiste em qualquer lesão intencional e direta dos tecidos do corpo provocada pela própria pessoa, sem que esta tenha a intenção de cometer suicídio. O desejo reiterado de provocar lesões em si próprio é considerado uma doença de acordo com a Classificação Estatística Internacional de Doenças (CID-10). Trata-se de um sintoma relativamente comum nos casos de perturbações da personalidade e perturbações mentais, a exemplo da depressão, ansiedade, esquizofrenia e abuso de substâncias. A automutilação, tentada ou consumada, também não é punida criminalmente. Entretanto, a participação em suicídio ou automutilação, é punida nos termos do art. 122, do Código Penal, que dispõe: “Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de 6 (meses) a 2 (dois) anos”. Conduta simples e pena Art. 122, CP. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça: (Redação dada pela Lei nº 13.968, de 2019). Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. (Redação dada pela Lei nº 13.968, de 2019) A pena será cominada a quem: • Induzir: criar a ideia para quem não estava pensando nisso. • Instigar: estimular a ideia que já existe na vítima. https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621886/artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621757/paragrafo-3-artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621682/inciso-ii-do-paragrafo-3-do-artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 3 • Auxiliar: ajudar quem quer se suicidar, prestando auxílio. Qualificadoras As qualificadoras aumentam a pena mínima e máxima para, respectivamente, 1 a 3 anos, ou 2 a 6 anos. As hipóteses são: • Resultar em lesão corporal grave ou gravíssima: reclusão de 1 a 3 anos. • Resultar em morte: reclusão de 2 a 6 anos. Causas de aumento de pena A pena será duplicada quando: • O crime é praticado por motivo fútil ou torpe • A vítima é menor de idade ou tem a capacidade de resistência reduzida. A pena será aumentada até o dobro quando a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitida em tempo real. Essa causa de aumento foi criada por conta do alcance das redes sociais, que aumenta os danos da instigação. A pena era aumentada em metade se o agente é líder ou coordenador de grupo ou de rede virtual. Essa majorante também foi criada para coibir atitudes como a dos grupos voltados à disseminação de automutilação, como ocorreu no Baleia Azul e ocorre nos canais de Discord. Entretanto, a Lei 14.811/2024 alterou o artigo, com a pena agora sendo dobrada nesse caso: § 5º Aplica-se a pena em dobro se o autor é líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou por estes é responsável. (Redação dada pela Lei nº 14.811, de 2024). Atenção para a vítima A lei exige, para fins do art.122, que a vítima tenha que ter maturidade e autodeterminação sobre as consequências do suicídio ou da automutilação. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2024/Lei/L14811.htm#art5 4 Se o crime resultar em lesão corporal grave ou gravíssima (§1º) e for praticado contra menor de 14 anos, ou contra quem não tenha discernimento para a prática do ato ou não pode oferecer resistência, o agente responderá como se tivesse praticado a modalidade que resulta em morte (§2º), cuja pena é 2 a 6 anos. Se o crime resultar na morte de menor de 14 anos ou de quem não tenha discernimento para a prática do ato ou não pode oferecer resistência, o autor responderá pelo crime de homicídio (art. 121). Crime hediondo A partir da Lei 14.811/2024, que alterou a Lei de Crimes Hediondos (Lei 8072/90), passou a ser hediondo o crime de indução ao suicídio feito através da internet: Art. 1º São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: X - Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação realizados por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitidos em tempo real (art. 122, caput e § 4º); (Incluído pela Lei 14.811, de 2024) 2. Classificação doutrinária Trata-se de crime comum (aquele que pode ser praticado por qualquer pessoa), plurissubsistente (costuma se realizar por meio de vários atos), comissivo (decorre de uma atividade positiva do agente “induzir, instigar ou auxiliar”), de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio de execução, menos a omissiva), de ação múltipla (ou de conteúdo variado, porque o tipo penal descreve três modalidades de realização: induzir, instigar e auxiliar), formal (se consuma sem a produção do resultado naturalístico previsto no tipo penal: morte ou lesão corporal de qualquer natureza), instantâneo (uma vez consumado, está encerrado, ou seja, a consumação não se prolonga), monossubjetivo (pode ser praticado por um 5 único agente), simples (atinge dois bens jurídicos alternativos: vida ou integridade corporal e, por isso, não é crime complexo), doloso (o agente quer ou assume o risco de produzir o resultado morte ou lesão corporal de qualquer natureza. 3. Objetos jurídico e material O objeto jurídico é alternativo: é a proteção do direito à vida ou a integridade corporal. Objeto material é a pessoa sobre a qual recai a conduta criminosa do agente que consiste no induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação. 4. Natureza jurídica da morte e das lesões corporais de natureza grave Existem duas correntesdoutrinárias: Para uma delas, o resultado morte ou lesão corporal de natureza grave constituem condições objetivas de punibilidade do crime de participação em suicídio. Nélson Hungria afirma que, “embora o crime se apresente consumado com o simples induzimento, instigação ou prestação de auxílio, a punição está condicionada à superveniente consumação do suicídio ou, no caso de mera tentativa, à produção de lesão corporal de natureza grave na pessoa do frustrado desertor da vida”. Para a outra corrente, na qual nos filiamos, a morte e a lesão corporal de natureza grave não constituem condições objetivas de punibilidade e, sim, elementares do tipo, pelo fato de que as condições objetivas de punibilidade se situam fora da descrição típica do crime e sua ocorrência não depende do dolo do agente. Nos ensinamentos de Fernando de Almeida Pedroso, a morte e as lesões graves no crime de participação em suicídio, “não constituem condições objetivas de punibilidade, pois representam o objetivo e propósito a que se direcionava e voltava o intento do agente. Trata-se no caso, portanto, do resultado naturalístico ou tipológico do crime”. 6 Nessa mesma corrente, Damásio de Jesus, afirma que “a morte e as lesões corporais de natureza grave devem estar no âmbito do dolo. Logo, constituem o tipo e não se revestem dos caracteres das condições objetivas de punibilidade”. 5. Sujeitos do delito O sujeito ativo do crime de participação em suicídio ou a automutilação pode ser qualquer pessoa, não se exigindo nenhuma condição especial, pois, trata-se de crime comum. O sujeito passivo será a pessoa induzida, instigada ou auxiliada. Pode ser, da mesma forma, qualquer pessoa com plena capacidade de discernimento, pois, caso contrário é crime de homicídio ou de lesão corporal, praticado por meio de autoria mediata. Embora seja o crime de participação em suicídio ou a automutilação, verifica-se que o mesmo admite tanto a coautoria quanto a participação em sentido estrito. Exemplos: (a) Se A induz B a se automutilar. A será autor do crime de participação em suicídio ou a automutilação; (b) Se A e B induzem C a suicidar-se. A e B serão coautores do crime de participação em suicídio ou a automutilação; (c) Se A induz B a instigar C a se automutilar. Teremos, A (indutor) como partícipe, e B (instigador) como autor do crime de participação em suicídio ou a automutilação, pois este realizou uma das condutas típicas do delito em estudo. Verifica-se, então, que induzir, instigar ou auxiliar, constituem, em regra, atividades de partícipe. No crime de participação em suicídio ou a automutilação, essas atividades constituem o núcleo do tipo penal, ou seja, quem as pratica será autor ou coautor e não partícipe, de acordo com a concepção restritiva, onde autor é somente aquele que realiza a conduta típica. 6. Conduta típica 7 O núcleo do tipo penal é representado pelos verbos induzir, instigar ou auxiliar. Desta forma, a participação em suicido ou a automutilação pode ser moral (no induzimento ou na instigação) ou material (no auxílio). Mesmo que o agente realize todas as condutas, responde por crime único, pois se trata de crime de ação múltipla ou de conteúdo variado. Induzir – consiste em fazer nascer, criar na mente de alguém, a ideia de autodestruição ou de autolesão até então inexistente. Desta forma, o agente indutor acaba, por qualquer meio, criando em alguém uma vontade que o leva ao suicídio ou a automutilação. Instigar – consiste em reforçar, estimular uma ideia de autodestruição ou de autolesão já existente. O agente instigador provoca, por qualquer meio, a vontade já existente da vítima, mas não toma parte nem da execução nem do domínio do fato. Auxílio – pressupõe a participação material ao suicídio ou a automutilação, de forma meramente secundária, como, por exemplo, o fornecimento de veneno ou de qualquer objeto ou instrumento para a prática de autolesão, empréstimo do punhal, do revólver, a indicação de um local ideal para o suicídio ou a automutilação etc. De qualquer forma, o auxílio deve ser material e não moral, ou seja, o auxílio moral caracteriza forma de participação por induzimento ou instigação. Embora existam opiniões contrárias, o auxílio é sempre prestado por uma ação ou atividade positiva de fazer e, por isso, entendemos não ser possível prestar o auxílio por omissão. Neste sentido, Damásio de Jesus afirma que “mesmo que o sujeito tenha o dever jurídico de impedir o resultado, como no caso do soldado que assiste passivamente à vítima dar cabo à própria vida, não existe delito de participação em suicídio por atipicidade do fato”. De qualquer forma, para caracterizar o crime de participação em suicídio ou a automutilação, é necessário que a conduta do agente seja dirigida a pessoa ou pessoas determinadas, e não quando são praticadas de modo 8 geral. Exemplo: não comete o crime em estudo, quem escreve um livro induzindo os leitores ao suicídio ou a automutilação como única forma de solução de seus problemas amorosos. 7. Elemento subjetivo O elemento subjetivo do delito é o dolo, direto ou eventual, consistente na vontade livre e consciente de induzir, instigar ou prestar auxílio para que a vítima se suicide ou pratique a automutilação. Não há previsão da modalidade culposa. Na modalidade de dolo eventual, é possível o agente assumir o risco de alguém praticar o suicídio ou a automutilação? Sim, é possível. É o caso do agente que pratica reiteradas sevícias (ofensas, maus tratos, crueldade) contra a esposa, sabendo-se que a mesma se encontra na iminência de praticar o suicídio ou a automutilação. Se ele continuar a seviciar a esposa, vindo a mesma a suicidar-se ou a se automutilar, estará configurado o crime de participação em suicídio ou a automutilação, a título de dolo eventual. Magalhães Noronha exemplifica muito bem, o caso do “pai que expulsa de casa a filha desonrada, tendo poderosas razões para supor que ela se suicidará, com esse gesto, assume o risco de produzir o resultado”. 8. Consumação e tentativa O crime de participação em suicídio ou a automutilação se consuma sem a produção do resultado naturalístico (morte ou lesão corporal de qualquer natureza), previsto no tipo penal, embora ele possa ocorrer, pois, quanto ao resultado, trata-se de crime formal, da mesma forma da extorsão mediante sequestro, no qual o recebimento do resgate exigido é irrelevante para a plena realização do tipo. Trata-se, ainda, quanto à conduta, de crime comissivo porque decorre de uma atividade positiva do agente “induzir, instigar ou auxiliar” e de crime 9 plurissubsistente porque costuma se realizar por meio de vários atos. Desta forma, a tentativa, embora de difícil configuração, é teoricamente possível, como, por exemplo, se o agente, utilizando-se de uma rede social, induz a vítima a suicidar-se ou a se automutilar, mas o fato não chega ao conhecimento da mesma. É oportuno observar que, antes do advento da Lei 13.968/2019, quando ainda não havia a criminalização das condutas de induzir ou instigar a automutilação, o crime de auxílio ao suicídio consumava-se com o resultado morte ou lesão corporal de natureza grave, pois, quanto ao resultado, tratava-se de crime material. Assim, se a vítima tentasse se suicidar e viesse a falecer, o participante seria punido com pena de reclusão de 2 a 6 anos. Se da tentativa de suicídio resultasse lesão corporal de natureza grave, o participante seria punido com pena de reclusão de 1 a 3 anos. Entretanto, se da tentativa de suicídio a vítima sofresse lesão corporal de natureza leve ou não sofre nenhuma lesão, o participante não respondia por nenhum crime porque o fato era atípico. Assim, não existia tentativa de participação em suicídio porque o legislador anterior havia condicionadoa imposição de pena à produção do resultado morte ou lesão corporal de natureza grave. 9. Figuras típicas qualificadas São aquelas em que a lei acrescenta alguma circunstância ao tipo básico com a finalidade de agravar a pena. No crime de participação em suicídio ou a automutilação, em estudo, existem duas figuras qualificadas, a saber: 9.1 Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima Nos termos do § 1º, do art. 122, do Código Penal, a pena é de reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, “Se da automutilação ou da tentativa de suicídio 10 resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 129 deste Código”. As lesões corporais de natureza grave, estão previstas nos quatro incisos do § 1º, do art. 129, do Código Penal, e são elas: I – incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias; II – perigo de vida; III – debilidade permanente de membro, sentido ou função; IV – aceleração de parto. As lesões corporais de natureza gravíssima, estão previstas nos cinco incisos do § 2º, do art. 129, do Código Penal, e são elas: I – incapacidade permanente para o trabalho; II – enfermidade incurável; III – perda ou inutilização de membro, sentido ou função; IV – deformidade permanente; V – aborto. Desclassificação para lesão corporal gravíssima: nos termos do § 6º, do art. 122, do Código Penal, se da automutilação ou da tentativa de suicídio que resulta lesão corporal natureza gravíssima (observa-se que não inclui a lesão de natureza grave) e o delito é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, o agente não responde por este crime qualificado de participação em suicídio ou a automutilação (que tem pena prevista de reclusão, de 1 a 3 anos) e, sim, pelo crime de lesão corporal gravíssima (CP, art. 129, § 2º), cuja pena é sensivelmente superior: reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos. 9.2 Se resulta morte em razão do suicídio ou da automutilação Nos termos do § 2º, do art. 122, do Código Penal, a pena é de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, “Se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte”. https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10624670/artigo-129-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10624438/paragrafo-2-artigo-129-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 11 Desclassificação para homicídio: nos termos do § 7º, do art. 122, do Código Penal, se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte e o delito é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, o agente não responde por este crime qualificado de participação em suicídio ou a automutilação (que tem pena prevista de reclusão, de 2 a 6 anos) e, sim, pelo crime de homicídio (CP, art. 121), cuja pena é sensivelmente superior: reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. 10. Causas de aumento de pena No crime de participação em suicídio ou a automutilação, em estudo, existe e a possibilidade de três aumentos de pena, aplicados distintamente em diversas causas de aumento, a saber: Nos termos do § 3º, do art. 122, do Código Penal, “a pena é duplicada: I – se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil; II – se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência”. Verifica-se, então, as seguintes hipóteses: (a) Motivo egoístico – entende-se o motivo que decorre do exclusivismo que faz o sujeito referir tudo a si próprio, sem consideração aos interesses alheios. Exemplo: agente induz a vítima ao suicídio para ficar com a sua herança, com seu cargo, com sua esposa, para receber o seguro de vida etc. Guilherme de Souza Nucci define o motivo egoístico como sendo o de “excessivo apego a si mesmo, o que evidencia o desprezo pela vida alheia, desde que algum benefício concreto advenha ao agente”. (b) Motivo torpe – é aquele baixo, ignóbil (que inspira horror do ponto de vista moral) e repugnante que deixa perplexa a coletividade. (c) Motivo fútil – é aquele insignificante, banal, sem importância, totalmente desproporcional em relação ao crime praticado. https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625629/artigo-121-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 12 (d) Vítima menor – quando a lei fala de vítima menor, está se referindo àquela maior de 14 anos e menor de 18 anos, que ainda não atingiram a maioridade penal (CP, art. 27). Se a vítima for menor de 14 anos, haverá presunção da sua incapacidade de discernimento. (e) Vítima com diminuída capacidade de resistência– em razão de enfermidade física ou mental (vítima embriagada, sob o efeito de tóxicos, angustiada, deprimida, com idade avançada, com algum tipo de enfermidade grave etc.) É necessário que a capacidade de resistência da vítima esteja diminuída. Exemplo: agente induz ao suicídio alguém embriagado. Entretanto, se a vítima tiver totalmente sem capacidade de discernimento e resistência, estará configurado o crime de homicídio e não de participação em suicídio ou a automutilação qualificada. Nos termos do § 4º, do art. 122, do Código Penal, “A pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitida em tempo real”. Verifica-se, então, as seguintes hipóteses: (a) Rede de computadores – neste caso, o agente pratica a conduta típica por meio de um conjunto de dois ou mais computadores que usam determinadas regras (protocolo) em comum para compartilhar, especialmente, a troca de mensagens entre si, utilizando-se de uma conexão por meio de fio de cobre, fibra ótica, ondas de rádio e também via satélite. Exemplos: a internet; a intranet de uma empresa; uma rede local doméstica etc. (b) Rede social – é uma estrutura social composta por pessoas ou organizações, conectadas por um ou vários tipos de relações, que compartilham valores e objetivos comuns. Uma das fundamentais características na definição das redes é a sua abertura, possibilitando relacionamentos horizontais e não hierárquicos entre os participantes. Exemplos: Facebook, YouTube, WhatsApp, Messenger, Instagram, Twitter, Snapchat, LinkedIn etc. https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10637112/artigo-27-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 13 (c) Transmitida em tempo real - é uma expressão utilizada na reportagem, no meio televisivo ou radiofónico para indicar que um programa ou evento está sendo transmitido em tempo real, simultaneamente enquanto ocorre. No caso do delito em estudo, o agente se utiliza de qualquer meio de comunicação (falado ou escrito) para praticar a conduta delituosa em tempo real. Nos termos do § 5º, do art. 122, do Código Penal, “Aumenta-se a pena em metade se o agente é líder ou coordenador de grupo ou de rede virtual”. Verifica-se, então, as seguintes hipóteses: (a) Líder ou coordenador – é o indivíduo que tem autoridade para comandar ou coordenar outros, ou seja, é a pessoa cujas ações e palavras exercem influência sobre o pensamento e comportamento de outras. (b) Grupo ou rede virtual – é um espaço específico na Internet que permite compartilhar, aos respectivos participantes, dados e informações sendo estas de caráter geral ou específico, das mais diversas formas (textos, arquivos, imagens, fotografias, vídeos etc). 11. Casos especiais (a) Automutilação – tambémconhecida como autolesão, não é punida pelas mesmas razões de política criminal em relação ao suicídio, ou seja, não comete crime o sujeito que ofende a própria integridade corporal. Entretanto, a conduta de se auto lesionar, dependendo do propósito do agente, pode ser meio de execução utilizado pelo mesmo para praticar outros crimes. Assim, se o agente lesa o próprio corpo, ou agrava as consequências da lesão existente, com a finalidade de receber indenização ou valor de seguro, responde por estelionato (CP, art. 171, § 2º, V). Se o agente cria ou simula incapacidade física que o inabilite para o serviço militar, responde pelo crime de criação ou simulação de incapacidade física, previsto no art. 184, do Código Penal Militar (Decreto-lei nº 1.001/1969). https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10617301/artigo-171-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10617176/paragrafo-2-artigo-171-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10616971/inciso-v-do-paragrafo-2-do-artigo-171-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91699/codigo-penal-militar-decreto-lei-1001-69 14 (b) Greve de fome – especialmente dentro do sistema prisional, o médico tem o dever de zelar pela vida do grevista de fome, ou seja, ele está na posição de garantidor, onde sua omissão o fará responder pela morte do grevista (CP, art.13,§ 2º). Assim, chegará o momento em que a intervenção médica para ministrar alimentação ou medicamento se torna inevitável para que o grevista não venha morrer ou sofrer lesões irreversíveis. Neste caso, a coação exercida pelo médico para impedir o suicídio do grevista não caracteriza o crime de constrangimento ilegal (CP, art. 146, § 3º, I). Situação análoga ocorre com as testemunhas de Jeová que, por motivos religiosos, são contra as transfusões de sangue. Assim, a transfusão determinada pelo médico, quando necessária para salvar a vida do paciente, também não caracterizará o crime de constrangimento ilegal (CP, art. 146, § 3º, II). (c) Pacto de morte – também chamado de suicídio a dois, ocorre quando duas pessoas combinam, por qualquer razão, o duplo suicídio e, para tanto, ficam em um cômodo da casa hermeticamente fechado, com o gás de cozinha aberto. Entretanto, se um ou ambos sobreviverem, teremos as seguintes situações: Se um sobrevive e foi ele quem abriu o gás, responde pelo crime de homicídio (CP, art.121), pois realizou o ato executório de matar; Se um sobrevive e não foi ele quem abriu o gás, responde pelo crime de participação em suicídio ou a automutilação (CP, art. 122); Se os dois sobrevivem, havendo lesão de natureza grave: quem abriu o gás responde por homicídio tentado (CP, art. 121, caput c/c art. 14, II), e quem não abriu responde pelo crime de participação em suicídio ou a automutilação (CP, art. 122); Se os dois sobrevivem, e não há lesão de natureza grave: quem abriu o gás responde por homicídio tentado (CP, art. 121, caput c/c art. 14, II), e quem https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10638340/artigo-13-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10638280/paragrafo-2-artigo-13-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621886/artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621757/paragrafo-3-artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621725/inciso-i-do-paragrafo-3-do-artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621886/artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621757/paragrafo-3-artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10621682/inciso-ii-do-paragrafo-3-do-artigo-146-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625629/artigo-121-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 15 não abriu pelo crime de participação em suicídio ou a automutilação (CP, art. 122); Se os dois sobrevivem e ambos abriram a torneira do gás: ambos respondem por homicídio tentado (CP, art. 121, caput c/c art. 14, II). (d) Duelo americano ou roleta russa – no duelo americano existem duas armas e só uma delas está carregada e os agentes escolhem uma delas; na roleta russa, a única arma tem um só projétil, devendo ser disparada pelos agentes cada um em sua vez. Nestes casos, o sobrevivente responde pelo crime de participação em suicídio ou a automutilação (CP, art. 122). (e) Erro na execução ou aberratio ictus – ocorre quando o agente pretende atingir determinada pessoa, efetua o golpe, mas, por má pontaria ou qualquer outro motivo, acaba atingindo pessoa diversa da que pretendia. Assim, se um suicida dispara uma arma sobre si mesmo e acaba errando, atingindo e matando uma terceira pessoa, responde pelo crime de homicídio culposo. 12. Pena, competência e ação penal As penas cominadas ao crime de induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação (CP, art. 122) são as seguintes: (a) Na figura simples (caput), a pena é de reclusão de 6 meses a 2 anos; (b) Na figura qualificada pela lesão corporal de natureza grave ou gravíssima (§ 1º), a pena é de reclusão de 1 a 3 anos; (c) Na figura qualificada pelo resultado morte (§ 2º), a pena é de reclusão de 2 a 6 anos; (d) Causas de aumento de pena (§ 3º), a pena é duplicada; (e) Causas de aumento de pena (§ 4º), aumento até o dobro; (f) Causas de aumento de pena (§ 5º), aumento de metade. O bem jurídico protegido é a vida (no caso de suicídio) e a integridade corporal (no caso da automutilação). Desta forma, se a conduta do agente consiste em induzir, instigar ou prestar auxílio material ao suicídio, a https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 16 competência é do Tribunal do Júri que julga os crimes dolosos contra a vida (homicídio, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e aborto), na forma tentada ou consumada (CF, art. 5º, XXXVIII, alínea d, c/c CPP, art. 74, § 1º). O Júri é também competente para julgar os crimes conexos, mesmo quando o réu tenha sido absolvido da imputação principal. E, no caso de concurso entre a competência do Júri e de outro órgão de jurisdição comum, prevalecerá a competência do Júri (CPP, art. 78, I). A ação penal é pública incondicionada, cujo oferecimento da denúncia para iniciar a ação penal não depende de qualquer condição de procedibilidade.O ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO PENAL. Conforme Capez (2016, páginas 122 e 124), o elemento subjetivo, em sentido amplo, compreende a vontade efetiva do agente de produzir o resultado naturalístico, também conhecido como dolo. Seguindo esta linha, o autor assinala: O elemento subjetivo do delito de participação em suicídio é somente o dolo, direto ou eventual, consistente na vontade livre e consciente de concorrer para que a vítima se suicide (CAPEZ, 2016, p. 122). Faz-se necessário que entre a ação do dolosa do agente (participação moral ou material) e o suicídio haja nexo de causalidade. A participação há de revelar-se efetiva, como causa do atentado levado a efeito pela própria vítima (CAPEZ, 2016, p. 124). O artigo 122 do Código Penal prevê que o agente deve, para a configuração do delito, ter a vontade consciente de causar a morte da vítima ou, pelo menos, de ajudar a vítima a consumar seu intento suicida (BRASIL, 1940). https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91622/codigo-processo-penal-decreto-lei-3689-41 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10672958/artigo-78-do-decreto-lei-n-3689-de-03-de-outubro-de-1941 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10672904/inciso-i-do-artigo-78-do-decreto-lei-n-3689-de-03-de-outubro-de-1941 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 17 Quando o agente auxilia na produção da morte da vítima, por exemplo, ao fornecer um objeto com o qual sabe que a vítima irá se ferir, o agente deve ter a intenção e a consciência do motivo pelo qual a vítima tomou posse do objeto, não bastando a desconfiança (CAPEZ, 2016, p. 124). Seguindo, quanto à modalidade da instigação, o acusado deve ter a intenção de, ao proferir palavras as quais possam trazer à vítima o sentimento de tristeza (ou qualquer que seja o sentimento o qual leva a vítima a tirar sua vida), esta inevitavelmente fomentando os pensamentos suicidas da vítima, com o intento de levar-lhe a se matar (NUCCI, 2018, p. 81). Por fim, a imputação no sentido do cometimento do verbo “induzir”, traz à baila a necessidade inarredável de que seja comprovada a intenção de criar a ideação suicida na consciência da vítima, ao passo em que profere palavras ou age de forma a fazer com que a vítima comece a pensar que sua vida não mais detém valor, iniciando, assim, todo o pensamento suicida (CAPEZ, 2016, p. 123). Em qualquer dos verbos contidos no tipo penal, em suma, o agente tem o dolo de produzir a morte da vítima, independentemente do meio do qual se utiliza para “ajudar” o ofendido na empreitada mortal (CAPEZ, 2016, p. 123). Aliás, é nesse sentido que assinalou Nucci: Registre-se o alerta de Bento de Faria no sentido de que qualquer forma de convencimento deve ser real e séria, mas são indiferentes os meios de persuasão, desde que não envolvam qualquer espécie de coação ou expressem prática suscetível de excluir a consciência ou a liberdade do sujeito passivo (NUCCI, 2018, p. 84; e NUCCI, 2019, s/p). 18 Interessa se perceber que Nucci, no trecho acima citado, refere que não pode ser constatado o afastamento da livre vontade do sujeito passivo, ou seja, a vítima ainda deve ter a vontade consciente de tirar sua própria vida, não cabendo ao agente a tarefa de forçar-lhe a nada, sob pena de incorrer- se em outro tipo penal que não o previsto no artigo 122 (NUCCI, 2018, p. 84). MEIOS DE PROVA QUANTO AO ELEMENTO SUBJETIVO. Feita a definição acerca do elemento subjetivo, se faz necessário estabelecer qual a natureza das provas a serem produzidas no processo penal com o intuito de penalizar os acusados pela prática do crime em comento (NUCCI, 2018, p. 83). Conforme já citado, uma das formas para se chegar à comprovação acima de dúvida razoável seria a realização de diversas avaliações psicológicas, tanto na vítima (se sobrevivente, ou de forma indireta), quanto no acusado. O intuito dessas avaliações seria o de estabelecer o “peso” das ações do agente para que se chegasse à morte da vítima (NUCCI, 2018, p. 83). A avaliação traria ao processo (e aos jurados, em último momento) uma espécie de “panorama” da psique de acusado e vítima, mostrando tecnicamente, com a maior precisão possível, a forma como funcionava o raciocínio da vítima e, ainda, do acusado, mostrando efetivamente o quanto o acusado poderia ter “impulsionado” a vítima a cometer suicídio (inclusive sendo possível delimitar, durante a avaliação, se houve a presença do induzimento ou da instigação ao suicídio) (WERLANG, 2012. s/p). Quanto a avaliação psicológica da vítima do suicídio, de acordo com Werlang: Então, a autópsia psicológica é uma estratégia utilizada para delinear as características psicológicas de vítimas de morte violenta, sendo utilizada durante o curso de uma investigação de morte, para auxiliar a determinar 19 o modo de morte de um indivíduo, especialmente em casos duvidosos. Com o passar do tempo, este recurso que muito auxiliou a médicos legistas e profissionais da área do direito penal e cível, passou, também, a contribuir na corroboração e/ou identificação de novos fatores de risco e correlatos sociodemográficos do suicídio (WERLANG, 2012, s/p). A comunidade de profissionais da psicologia e da psiquiatria vem, há tempos, estudando o fenômeno do suicídio, mas, ainda conforme Werlang, encontra ainda diversos obstáculos no estudo, principalmente pelo estigma atrelado ao tema (WERLANG, 2012, s/p). De qualquer forma, é de suma importância para a investigação de cada caso que seja estabelecido um perfil psicológico da vítima para, daí, se passar à análise do impacto causado pelo agressor (NUCCI, 2018, p. 84). A análise do perfil psicológico do acusado já é prática conhecida no Brasil, no entanto, é mais comum em casos de instauração de incidente de insanidade mental, no intento de verificar a imputabilidade (ou não) dos acusados. Justamente devido ao caráter corriqueiro desse tipo de estudo psicológico é que não seria de grande ônus aplicá-lo, também, aos acusados da prática do delito previsto no art. 122 do Código Penal (NUCCI, 2018, p. 84). Há ainda que se frisar que as avaliações psicológicas já são velhas conhecidas dos apenados brasileiros pois, conforme preceitua a Lei de Execuções Penais, também são sujeitados os apenados a avaliação psicossocial. Nesse caso, os apenados são submetidos à entrevista psicológica para que seja mais fácil avaliar suas condições para recebimento de benesses como a progressão de regime carcerário, saídas temporárias e livramento condicional (BRASIL, 1984, s/p). Conforme citado, a Lei de Execuções preceitua, ainda que de forma tácita (e há discussão acerca da necessidade das avaliações psicológicas para https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/109222/lei-de-execucao-penal-lei-7210-84 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/109222/lei-de-execucao-penal-lei-7210-84 20 fins de progressão de regime), a confecção de laudos psicossociais, os quais relatam o comportamento carcerário dos apenados, assim ditando a LEP: Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. § 1o A decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Públicoe do defensor. § 2o Idêntico procedimento será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutacao de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes (BRASIL, 1984, s/p, GRIFEI). O fato de que já se utiliza da avaliação psicológica também reforça o preparo já existente no sistema judicial para absorver a demanda oriunda da aplicação do método avaliativo nos acusados de participação em suicídios (BRASIL, 1984, s/p). Sobre a avaliação psicológica, propriamente dita, a Cartilha de Avaliação Psicológica, do Conselho Federal de Psicologia preceitua: A avaliação psicológica é um processo técnico e científico realizado com pessoas ou grupos de pessoas que, de acordo com cada área do conhecimento, requer metodologias específicas. Ela é dinâmica, e se constitui em fonte de informações de caráter explicativo sobre os fenômenos psicológicos, com a finalidade de subsidiar os trabalhos nos diferentes campos de atuação do psicólogo, dentre eles, saúde, educação, trabalho e outros setores em que ela se fizer necessária. Trata-se de um estudo que requer um planejamento prévio e cuidadoso, de acordo com a demanda e os fins aos quais a avaliação se destina (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2007, s/p). https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/109222/lei-de-execucao-penal-lei-7210-84 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/95100/lei-do-indulto-decreto-5993-06 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/820769/lei-do-indulto-natalino-decreto-7046-09 21 Voltando o foco à questão da prova material, o Código de Processo Penal, em seus artigos 155 e seguintes, bem como, em analogia, o Código de Processo Civil, em seus artigos 369 e seguintes, preceituam que serão admitidos diversos tipos de provas, desde que oriundas de meios de obtenção legais e não provenientes de outra prova considerada ilegal (BRASIL, 1941, s/p). A aplicação analógica do Código de Processo Civil, vale lembrar, encontra resguardo no art. 3º do Código de Processo Penal, quando o dispositivo afirma que “a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito” (BRASIL, 1941, s/p). Conforme o Código de Processo Civil de 2015, aqui em uso analógico, no Processo Penal: Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz. Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório (BRASIL, 2015, s/p). https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91622/codigo-processo-penal-decreto-lei-3689-41 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10667014/artigo-155-do-decreto-lei-n-3689-de-03-de-outubro-de-1941 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/174276278/lei-13105-15 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/174276278/lei-13105-15 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/28893070/artigo-369-da-lei-n-13105-de-16-de-marco-de-2015 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/174276278/lei-13105-15 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10679062/artigo-3-do-decreto-lei-n-3689-de-03-de-outubro-de-1941 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91622/codigo-processo-penal-decreto-lei-3689-41 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/174276278/lei-13105-15 22 Assim, se utilizando de provas materiais como gravações em que o acusado incita a vítima a tirar sua vida ou lhe faz sentir como se precisasse o fazer, vídeos demonstrando o acusado, saindo de um supermercado com uma corda, a qual foi utilizada para que a vítima se enforcasse, por exemplo, seria possível estabelecer e, mais importante, provar que o acusado usou de determinado meio para, com animus necandi (intenção de matar), fazer com que a vítima tirasse sua vida (BRASIL, 1940, s/p). O meio material é o mais simples para a obtenção de uma condenação no processo penal, no entanto, no caso das investigações ligadas a um suicídio, seria necessária, de igual forma, mesmo que de maneira indireta, uma avaliação por parte do Conselho de Sentença, no sentido de atribuir às provas seu devido valor (BRASIL, 1941, s/p). As provas materiais, aliás, constituem o meio mais utilizado pela acusação com a finalidade de imputar ao acusado sua devida parcela de culpa, sendo inclusive os elementos materiais de prova usados de uma maneira quase que subjetiva no âmbito do julgamento do caso particular (BRASIL, 1941, s/p). Sobre o tema, vale a explicação de que o julgador tem o condão – e até a necessidade – de avaliar o “peso” dos elementos de convencimento usados pelo acusado no intuito de induzir ou instigar a vítima a tirar sua vida. Esta incumbência é uma extensão do livre convencimento motivado, pelo qual o julgador deve avaliar o peso das provas a ele apresentadas no decorrer da instrução julgando usando-se da prova para fundamentar sua decisão (BRASIL, 2015, s/p). Vale ainda destacar que dentre as provas mais comuns e, ao mesmo tempo, de maior potencial de eficácia, estão as oitivas das testemunhas ligadas à vítima e ao acusado. Estas seriam as pessoas as quais, sem dúvida, teriam a maior noção do que ocorria no convívio social das partes no processo, podendo afirmar, sem risco de viés para qualquer dos “lados”, como a vítima vinha se comportando, como o acusado interagia com o ofendido e, talvez mais importante, como a própria sociedade afetava o âmbito psicológico da vítima (WERLANG, 2012, s/p). 23 Novamente seria o intuito da prova o de demonstrar as características da rotina diária da vítima e do agressor, delimitando todos os elementos os quais podem ter exercido alguma influência na psique da vítima até o momento de sua morte (NUCCI, 2018, p. 84). Devem ser sopesadas as ações do acusado com o âmbito do convício social da vítima, nas interações que com ela tinha, a fim de se chegar o mais próximo possível da verdade real dos fatos, visto que a vítima não se faz mais presente para elucidar quais os motivos que a levaram a cometer o suicídio (NUCCI, 2016, p. 84). ANÁLISE DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL E DOUTRINÁRIO ACERCA DA COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DO NÚCLEO DO TIPO PENAL. Adentrando a discussão acerca do entendimento jurisprudencial quanto ao assunto abordado no presente artigo, primeiramente, é trazido o julgamento do Recurso em Sentido Estrito nº 00081814220068190206 RJ 0008181-42.2006.8.19.0206, cujo acórdão foi proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no ano de 2015. No acórdão, a oitava câmara criminal entendeu que demonstradas autoria e materialidade no sentido de que a então acusada teria, através de correspondências enviadas ao ex-companheiro, lhe instigado a tirar sua própria vida. Inclusive, ao ser lida a decisão proferida pelos desembargadores, é possível se perceber que a acusada chegou a descrever para a vítima como esta poderia se utilizar de um lençol para se enforcar como, de fato, o fez, indo a óbito algum tempo depois da tentativa de suicídio em consequência de complicações causadas justamente pelos ferimentos (RIO DE JANEIRO, 2015, s/p). Ainda no caso acima, foi suscitado pelo Ministério Público que a vítima seria incapaz, em função de doença mental. No entanto, de acordo com os https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/205915914/recurso-em-sentido-estrito-rse-81814220068190206-rj-0008181-4220068190206https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/205915914/recurso-em-sentido-estrito-rse-81814220068190206-rj-0008181-4220068190206 https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/205915914/recurso-em-sentido-estrito-rse-81814220068190206-rj-0008181-4220068190206 24 desembargadores, era ônus da acusação comprovar que a vítima, de fato, sofria de transtornos mentais, o que não fez (RIO DE JANEIRO, 2015, s/p). A falta de provas acerca dos supostos transtornos mentais enfrentados pela vítima no caso julgado pelo TJ-RJ seria sanada se, por exemplo, o Ministério Público tivesse pedido pela realização de avaliação psicológica indireta na vítima. O laudo seria utilizado como subsídio, repisa-se, para lastrear as alegações ministeriais, evitando incertezas (RIO DE JANEIRO, 2015, s/p). No Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado no ano de 1995, o Ministro Marco Aurélio Melo manifestou-se na relatoria do HC nº 72.049/95, no sentido de definir que não existe a modalidade de “provocação indireta ao suicídio”, em resposta a parte do recurso em que foi levantada a possibilidade de que existisse uma espécie de modalidade culposa para o delito previsto no art. 22 do Código Penal (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 1995, s/p). O precedente é de suma importância, pois, ao delimitar a possibilidade de culpabilização do agente, o STF fez com que não fosse possível, por exemplo, punir-se uma pessoa que inadvertidamente causa as ideações suicidas na pessoa da vítima, ausente o dolo por parte do agente, que poderia inclusive nem saber quem era a vítima. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 1995, s/p). Destaca-se também o acórdão proferido pela Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Espírito Santo no bojo da apelação criminal nº 00017897320098080049, publicado no ano de 2013. A decisão, de surpreendente simplicidade, deixa nítida a necessidade de comprovação do elemento subjetivo (dolo), indo em conformidade com a decisão proferida pelo STF, no sentido de afastar a participação indireta no crime do artigo 122 (ESPÍRITO SANTO, 2013, s/p). https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://tj-es.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/385485414/apelacao-apl-17897320098080049 25 No julgado do estado do Espírito Santo, o acusado teria vendido à vítima uma arma de fogo, sem saber que, na verdade, a vítima pretendia usar o armamento bélico para ceifar sua própria vida. Surge, dessa forma, a discussão pacificada pelo TJ-ES pois, de acordo com a acusação naquele caso, o vendedor da arma (acusado), deveria prever que o ofendido iria praticar o suicídio, incorrendo (de acordo com a acusação) na ficção da modalidade tentada do artigo 122 do Código Penal (ESPÍRITO SANTO, 2013, s/p). O entendimento jurisprudencial tem sido bastante fiel ao texto do próprio Código Penal, evitando, de uma forma geral, a “discricionariedade” dos julgadores em interpretar o dispositivo legal, sendo que este não tem sido objeto de recorrentes discussões e novas interpretações ao longo dos anos (NUCCI, 2018, p. 84). Assim, foi possível perceber que, em função do parco conjunto de julgados pelos tribunais do país, não foram acrescentadas inovações no âmbito da investigação e julgamento de denúncias referentes ao delito previsto no artigo 122 do Código Penal, sendo admitidas, todas as provas aptas a delinear entendimento acerca da culpa do acusado, desde que obtidas de forma legal (CAPEZ, 2016, p. 123). CONSIDERAÇÕES FINAIS. O delito de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio e, mais especificamente, os meios de prova utilizados no âmbito judicial e inquisitorial, a fim de buscar a condenação dos agentes que praticam os verbos previstos no tipo penal foram o ponto de partida para a presente pesquisa, conforme explanado. O tema do suicídio – e, por consequência, do induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio – tem sido noticiado com maior frequência nos últimos anos, especialmente com o lançamento de seriados como 13 reasons why e da ocorrência de “jogos” como o Baleia Azul. A dificuldade em se falar https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 26 sobre o assunto do suicídio, principalmente sobre o que levou as vítimas a tirarem suas vidas é, também, o motivo que gera interesse no assunto, justamente por se tratar de um assunto tão pouco abordado. Delimitando-se o tema do artigo, se chegou à necessidade de estabelecer como o judiciário procedia para provar, acima de dúvida razoável, que uma pessoa qualquer teria a capacidade de influenciar de maneira tão extensa na psique de outra pessoa (como ocorre nas modalidades de induzimento e instigação). O objetivo era entender quais eram os argumentos, em especial da acusação, utilizados como lastro para que seja requerida a condenação do ofensor em casos dessa natureza. Não só era pretendido o entendimento acerca de quais os argumentos utilizados, mas, principalmente, quais são efetivamente recebidos pelos tribunais brasileiros, visto que é sabido que nem todas as teses acusatórias são acolhidas, por mais que pareçam convincentes. Então, foi dessa forma que se procedeu para a formulação do problema: apontando para a necessidade de entender quais eram os meios de prova utilizados para a consecução do tipo penal, se iniciou a pesquisa pelos julgados nas cortes do país e, em uma abordagem talvez inversa ao que se esperasse, depois, prosseguiu-se à pesquisa doutrinária, em busca das definições necessárias para a explicação do tipo penal propriamente dito e, após, dos meios de prova empregados nos casos levantados durante a pesquisa jurisprudencial. As hipóteses foram justamente os meios de provas mais encontrados durante as pesquisas realizadas. Dessa forma, foi possível se constatar que as avaliações psicológicas, realizadas na vítima e no acusado, a prova material e a prova testemunhal foram usadas inúmeras vezes como subsídios para o alicerce decisório. Começando pelo método mais “comum” de prova, a prova material foi encontrada com certa frequência nos julgados levantados durante a pesquisa, foram encontradas menções de cartas e e-mails, correspondências as quais contavam a história de pressão psicológica sustentada pelas vítimas do crime do artigo 122 do Código Penal. https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 27 O fato de terem sido observados casos em que a prova material foi a principal – senão a única – forma de buscar-se a condenação é de grande valia, tendo em vista que afasta definitivamente a noção de que as provas materiais seriam de difícil ou rara ocorrência. O fato é que a prova material, apesar de sua natureza, foi utilizada como se fosse subjetiva, ou seja, os julgadores, nos casos analisados, invariavelmente deveriam analisar o grau de influência das provas apresentadas no psicológico da pessoa vitimada pelo delito. Continuando, chegou-se à prova testemunhal, no ponto não houve grandes surpresas, visto que conforme esperado as testemunhas eram, na maior parte dos julgados analisados durante a pesquisa, pessoas ligadas à vítima, as quais presenciavam as agressões verbais e físicas feitas pelos agressores. Foram vistos casos em que os vizinhos das vítimas afirmavam que os agressores,seus genitores não raras vezes, criavam um ambiente no qual a vítima sentia como se não houvesse saída senão a do suicídio. Este ponto da pesquisa também foi de grande valia, pois foi possível se verificar que os agressores poderiam ser inclusive pessoas encarregadas da proteção das vítimas. Enfim, adentrando o meio de prova no qual o presente trabalho mais se resguardou, o laudo de uma avaliação psicológica extensa realizada com a vítima e com o acusado, bem como com todas as pessoas com quem ambos conviviam antes dos fatos. Na discussão do assunto, foi possível perceber que, em verdade, o meio de prova já é empregado por diversas áreas do Direito, inclusive no âmbito processual penal, mais especificamente na execução de penas privativas de liberdade. Aliás, manteve-se após a pesquisa a conclusão de que a avaliação serviria como um meio de prova convincente o suficiente para sanar a subjetividade da qual é dotado o crime previsto no artigo 122 do Código Penal. Entretanto, para que fosse possível ser entendido o método usado pelos avaliadores em casos como esse, foi necessário verificar-se como e o que é https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 28 a avaliação psicológica, realizando-se pesquisa inclusive em artigos e cartilhas do Conselho Nacional de Psicologia do Brasil, a fim de que se pudesse entender como seria procedida a avaliação e, posteriormente a lavratura do laudo do exame psicossocial realizado. Delineados os meios de prova (hipóteses de resposta ao problema formulado pela delimitação do tema do artigo), procedeu-se ao objetivo geral do trabalho, o qual era justamente o de entender aqueles meios de prova e constatar qual seria sua eficácia no processo penal, no sentido de condenar ou absolver eventuais acusados. Assim, foi possível perceber no decorrer da pesquisa que os tribunais brasileiros ainda não utilizam com grande frequência a prova pericial nos casos de instigação, induzimento ou auxílio ao suicídio, dependendo mais da prova material do que de qualquer outro elemento. No entanto, foi igualmente possível se perceber que os Tribunais já lançam mão da prova pericial de natureza psicológica para a análise de diversos outros tipos de processos, não necessariamente criminais, inclusive. Aliás, também foi possível perceber a escassez de processados pelo delito, encontrando-se, por exemplo, no sítio do Supremo Tribunal Federal, apenas UM julgado, do ano de 1995, o qual versava sobre o crime em debate. Sendo analisado o julgado, no entanto, foi possível se extrair o entendimento da Corte sobre o crime previsto no art. 122 do Código Penal e, mais ainda, sobre como são analisadas as provas pelo STF nos casos dessa natureza, sendo possível a leitura de votos dos ministros na sua integralidade, trazendo estes as explicações utilizadas pelos julgadores no julgamento da causa. Nos Tribunais de Justiça foram encontradas mais ocorrências do crime, especialmente na modalidade de instigação, na qual o agente apenas “alimenta” a ideia já preexistente na vítima, de se matar. Naqueles julgados analisados, novamente, em conformidade com os demais estados analisados e com o próprio Supremo Tribunal Federal, constatou-se que a prova material, seguida da prova testemunhal, como de praxe, é a o meio de prova mais “confiável” de acordo com o https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10625219/artigo-122-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91614/codigo-penal-decreto-lei-2848-40 29 entendimento jurisprudencial, prática que provavelmente se deva ao costume do judiciário de imputar pouco valor às avaliações psicológicas no âmbito do processo penal, salvo em casos nos quais esta é exigida. No entanto, foi possível se extrair dos diversos julgados analisados o fato comum de que, em todos, os julgadores tentavam entender qual era o estado de espírito da vítima no momento de sua morte e, mais ainda, quais foram os motivos que a levaram a tirar sua própria vida, adentrando claramente no cerne da psicologia, mesmo que, talvez, sem que percebessem. Em suma, a pesquisa realizada trouxe constatações, na maioria das vezes, surpreendentes, ao passo em que as pré concepções advindas da fase de projeto foram em grande parte derruídas, aqui vindo o destaque da utilização da prova material, a qual era tida como de difícil obtenção e, na verdade, é a modalidade mais comum utilizada pela acusação para alicerçar seus pedidos em face dos acusados. Porém, também de grande benefício foi constatar que, apesar de não utilizada diretamente como forma primária de obtenção da verdade real dos fatos nos processos relativos ao crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, a avaliação psicológica da vítima, do acusado e das pessoas a elas ligadas é feita, mesmo que de forma indireta e “não oficial” pelos julgadores, ao passo em que se utilizam não raramente da prova material para tecer sobre o contexto de vida dos envolvidos nos processos. Introdução Conduta simples e pena Qualificadoras Causas de aumento de pena Atenção para a vítima Crime hediondo