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Rede de Atenção Materno Infantil (RAMI) Visão geral, objetivos e estrutura Profª: Milena Fernandes Contexto Histórico da RAS Origens na década de 20, no Reino Unido, a partir da concepção dawsoniana de sistemas públicos de saúde. No início dos anos 90, nos Estados Unidos surge uma proposta de sistemas integrados de saúde, difundida com as adaptações necessárias, a sistemas de saúde públicos e privados de outros países. A Organização Mundial da Saúde (World Health Organization, 2000), através do relatório anual sobre a saúde do mundo, propõe critérios para o desenho das redes de atenção à saúde, ainda que não mencione especificamente a palavra rede, mas integração do sistema. (REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE/2007 – EUGÊNIO VILAÇA) Ministério da Saúde, 2004 pela Portaria nº 1.169/GM,instituiu a Política Nacional de Atenção Cardiovascular de Alta Complexidade. Essa política se operacionaliza por meio da organização e implantação de Redes Estaduais e/ou Regionais de Atenção em Alta Complexidade Cardiovascular. Ministério da Saúde, 2005), instituiu através da Portaria nº 2.439/GM, de 8 de outubro de 2005, a Política Nacional de Atenção Oncológica. (REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE/2007 – EUGÊNIO VILAÇA) 3 Apesar dos avanços alcançados pelo SUS nos últimos anos, era evidente a dificuldade em superar a intensa fragmentação das ações e serviços de saúde e qualificar a gestão do cuidado. Modelo de atenção à saúde vigente fundamentado nas ações curativas, centrado no cuidado médico e estruturado com ações e serviços de saúde dimensionados a partir da oferta. 4 A RAS é uma proposta de inovar o processo de organização do sistema de saúde, redirecionando suas ações e serviços para produzir impacto positivo nos indicadores de saúde da população. Objetivo Superar a fragmentação da atenção e da gestão nas Regiões de Saúde e aperfeiçoar o funcionamento político-institucional do Sistema Único de Saúde (SUS,) com vistas a assegurar ao usuário o conjunto de ações e serviços que necessita com efetividade e eficiência. 5 Redes Regionalizadas de Atenção à Saúde APS Segundo a Portaria nº 4.279/2010 do Ministério da Saúde, a RAS é: “Um arranjo organizativo dos serviços de saúde, de diferentes densidades tecnológicas, que integrados por meio de sistemas de apoio técnico, logístico e de governança, buscam garantir a integralidade do cuidado.” Não há uma hierarquização entre os distintos pontos de atenção nem entre eles e o centro de comunicação, apenas uma diferenciação dada por suas funções de produção específicas e por suas densidades tecnológicas respectivas. Arranjos organizativos de ações e serviços de saúde Fundamenta-se na compreensão da APS como primeiro nível de atenção, enfatizando a função resolutiva dos cuidados primários sobre os problemas mais comuns de saúde e a partir do qual se realiza e coordena o cuidado em todos os pontos de atenção. 6 A partir do referencial na Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010 (BRASIL, 2010), foram discutidas no Grupo Técnico de Atenção (GTA) e pactuadas na Comissão Intergestores Tripartite (CIT), em 2011 e 2012, as seguintes temáticas das Redes de Atenção à Saúde: Rede de Atenção Materno Infantil (RAMI) Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE) Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência (RCPD) Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas (RAPDC) 7 Contexto Histórico da Rede Cegonha O Brasil enfrentava sérios desafios na atenção à gestante e ao recém-nascido, como: Alta mortalidade materna e infantil; Acesso desigual aos serviços de saúde; Falta de vagas para partos humanizados; Deficiências na continuidade do cuidado; Fragmentação das ações de saúde da mulher e da criança. Esse cenário demandava uma resposta mais integrada, regionalizada e humanizada por parte do Sistema Único de Saúde (SUS). Contexto Histórico e Justificativa A Rede Cegonha foi instituída pelo Ministério da Saúde por meio da Portaria nº 1.459, de 24 de junho de 2011 e foi pensada como uma linha de cuidado articulada e contínua, com base em quatro componentes principais: Pré-natal: Ampliação do acesso e da qualidade do acompanhamento da gestante. Parto e nascimento: Garantia de parto seguro e humanizado, com direito à acompanhante e a boas práticas obstétricas. Puerpério e atenção integral à saúde da criança: Acompanhamento da mãe e do bebê após o nascimento. Sistema logístico: Transporte sanitário, regulação e acesso oportuno aos serviços de referência. Objetivos da Rede Cegonha Reduzir a mortalidade materna e neonatal; Promover o parto humanizado, com protagonismo da mulher; Melhorar o acesso, acolhimento e qualidade dos serviços de saúde; Fortalecer a regionalização e a organização em redes de atenção. Implantação da Rede Cegonha A implantação da Rede Cegonha ocorre de forma regionalizada e pactuada entre estados, municípios e o Ministério da Saúde, com investimentos destinados à: Construção ou reforma de Casas da Gestante, Bebê e Puérpera; Qualificação de maternidades e centros de parto normal; Formação de profissionais em boas práticas obstétricas e neonatais; Fortalecimento dos sistemas de regulação e transporte sanitário. Implantação da Rede Cegonha Etapa Ação Principal Adesão Pactuação política e administrativa Diagnóstico Levantamento de dados regionais Plano de Ação Planejamento da rede de serviços Financiamento Repasses do MS e contrapartidas locais Formação e Qualificação Treinamento e sensibilização dos profissionais Organização da Linha de Cuidado Definição clara dos fluxos e serviços por onde passarão gestantes e bebês Monitoramento Avaliação de indicadores e revisão de estratégias Implantação da Rede Cegonha em São Luís – MA Exemplo prático da estratégia materno-infantil do SUS 1. Caracterização da Região Regionalização no Maranhão O estado do Maranhão foi organizado em 19 Regiões de Saúde, conforme diretrizes do SUS, para planejar e implantar ações conforme as realidades locais. A Grande Ilha de São Luís (incluindo São José de Ribamar, Paço do Lumiar e Raposa) integra a Região Metropolitana, que concentra uma parte importante da população e dos leitos obstétricos. A implantação da Rede Cegonha nessa região seguiu a lógica da regionalização, ou seja, o cuidado às gestantes e bebês foi organizado considerando fluxos entre municípios e unidades de referência da capital. 1. Exemplo Concreto Unidade ou ação Nível de atenção Inserção na Rede Cegonha CPN do Maiobão (São José de Ribamar) Atenção secundária Unidade de parto normal implantada com apoio da Rede Cegonha; permite parto humanizado e seguro próximo da comunidade Hospital da Mulher (São Luís) Alta complexidade Referência regional para gestação de alto risco; parte da rede regulada UBSs de São Luís e região metropolitana Atenção primária Realizam o pré-natal, exames, planejamento reprodutivo e acompanhamento pós-parto Casa da Gestante Bebê e Puérpera (CGBP) Acolhimento complementar Oferece hospedagem e suporte para gestantes e puérperas que moram longe da unidade hospitalar Serviço de transporte sanitário regulado Logística Integrado à Rede Cegonha para garantir acesso ao parto e ao pré-natal de alto risco Uma gestante moradora de Paço do Lumiar: Inicia pré-natal na UBS local; É identificada como gestação de risco; É regulada para o Hospital da Mulher (São Luís); Se necessário, se hospeda na Casa da Gestante; Após o parto, retorna ao município para acompanhamento no CRAS e na UBS. Esse fluxo coordenado e pactuado entre município, estado e MS é exatamente o que a Rede Cegonha propõe com base em regionalização e pactuação. 2. Diagnóstico Situacional Problemas identificados: Alta taxa de mortalidade materna e neonatal (acima da média nacional em alguns anos); Superlotação das principais maternidades de referência (como a Maternidade Benedito Leite e Maternidade Marly Sarney); Falta de vinculação da gestante à maternidade de referência;Baixa cobertura de pré-natal de qualidade e atraso no início do acompanhamento; Déficit de leitos de UTI neonatal e UCIN. 3. Plano de Ação Regional Objetivos: Garantir o acesso precoce e integral ao pré-natal; Organizar uma linha de cuidado materno-infantil regionalizada e articulada; Ampliar a oferta de partos humanizados, com protagonismo da mulher; Reduzir a mortalidade perinatal. Ações estratégicas: Fortalecimento da Atenção Primária à Saúde (APS) nas UBS da zona rural e periferia urbana; Vinculação da gestante à maternidade de referência já no 1º trimestre de gestação; Implantação de um Centro de Parto Normal (CPN) na região do Maiobão (Paço do Lumiar); Construção de uma Casa da Gestante, Bebê e Puérpera próxima ao Hospital Universitário da UFMA (HUUFMA); Ampliação dos leitos de UTI neonatal e UCINco no Hospital da Criança; Criação de protocolo de transporte sanitário regulado, com ambulâncias dedicadas ao pré-parto. 4. Apoio Financeiro O Ministério da Saúde repassou recursos federais com base na pactuação do plano regional, priorizando: Reestruturação física da Maternidade Marly Sarney; Equipagem da nova Casa da Gestante; Formação em boas práticas obstétricas e neonatais via parceria com a UNASUS-UFMA; Implantação de software de regulação regional de leitos obstétricos. 5. Qualificação Profissional Capacitação de equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF) no rastreamento de risco gestacional; Formação continuada de enfermeiras obstétricas e obstetrizes para atuação no CPN; Adoção do modelo "parto adequado" com rodas de conversa e plano de parto. 6. Linha de Cuidado na Prática Entrada na UBS do bairro → Cadastramento e início do pré-natal; Classificação de risco → Gestantes de risco habitual são vinculadas ao CPN; gestantes de risco são referenciadas à Maternidade Benedito Leite ou HUUFMA; Transporte sanitário regulado em caso de intercorrência; Parto assistido em unidade de referência, com direito à acompanhante e boas práticas; Acompanhamento pós-parto e puericultura até os 2 anos na UBS. 7. Monitoramento e Metas Indicador Situação Inicial Meta em 2 anos Início do pré-natal até 12ª semana 55% 80% Partos humanizados com acompanhante 42% 90% Mortalidade neonatal precoce (materno Óbitos evitáveis Desafios Atuais da RAMI Desigualdades regionais Acesso ao parto humanizado e à atenção especializada ainda é desigual entre regiões e municípios. Falta de leitos especializados e transporte sanitário Muitas regiões não possuem leitos suficientes de UTI neonatal, UCINCo e UCINCa, dificultando o cuidado de recém-nascidos de risco. Também faltam leitos obstétricos em hospitais de referência, especialmente para partos de alto risco. O transporte sanitário (ambulâncias e regulação), essencial para garantir o acesso a esses serviços, é precário ou inexistente em diversas localidades. Integração de sistemas de informação Os dados assistenciais estão muitas vezes fragmentados entre diferentes plataformas (SISREG, e-SUS, SIM, SINASC, etc.), dificultando o acompanhamento da gestante e do bebê ao longo da linha de cuidado. Capacitação irregular dos profissionais Há grande variação na formação e atualização das equipes, o que compromete a qualidade e a segurança do cuidado prestado. Rede ALINE A Rede ALINE (Ação Local Intersetorial pela Primeira Infância) é uma estratégia nacional articulada pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), com apoio de parceiros como o UNICEF, a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal e a ANDI – Comunicação e Direitos. Seu objetivo é fortalecer a atuação conjunta dos serviços públicos de saúde, educação, assistência social e outros setores em nível municipal e comunitário, com foco no desenvolvimento integral de crianças de 0 a 6 anos e na promoção de seus direitos. Princípios da Rede ALINE Intersetorialidade: articulação entre diferentes políticas públicas (saúde, educação, assistência social, cultura, justiça etc.). Territorialidade: foco em comunidades específicas, com mapeamento de demandas e redes de apoio. Equidade: enfrentamento das desigualdades que afetam o desenvolvimento infantil (pobreza, racismo, deficiência, violência). Participação social: envolvimento das famílias, lideranças comunitárias, trabalhadores e gestores. Promoção da parentalidade positiva: apoio à criação de vínculos afetivos, proteção e estímulo precoce à criança. Impacto Esperado Aumento do acesso a serviços públicos por crianças em situação de vulnerabilidade; Redução da duplicidade de ações e lacunas de cuidado; Melhora nos indicadores de desenvolvimento infantil; Fortalecimento do trabalho em rede nos municípios; Valorização dos saberes comunitários e da escuta ativa das famílias. Exemplo Prático Em municípios onde a Rede ALINE foi implantada: As equipes do CRAS e da UBS fazem reuniões conjuntas para planejar o acompanhamento de famílias com crianças em risco. Escolas notificam precocemente casos de ausência ou sinais de negligência. Famílias recebem apoio psicossocial, orientações de cuidado e acesso a benefícios sociais. As comunidades passam a atuar como espaços de proteção e estímulo ao desenvolvimento infantil. Situação Prática de Integração RAMI + Rede ALINE 📍Contexto Territorial Município de médio porte, região periférica chamada Bairro Nova Esperança, com alta incidência de: Gestantes adolescentes; Crianças fora da creche; Violência doméstica; Desnutrição infantil e baixo peso ao nascer; Baixa adesão ao pré-natal. O território possui: 1 UBS, 1 CRAS, 1 escola municipal, 1 creche, 1 Casa de Parto e visitas domiciliares do Programa Criança Feliz. Situação Prática de Integração RAMI + Rede ALINE Personagem Central: Maria, 17 anos Gestante de 6 meses, identificada em uma consulta de demanda espontânea na UBS; Mora com a mãe, desempregada, e dois irmãos pequenos; Sofre violência psicológica do companheiro; Nunca realizou pré-natal e está fora da escola; Situação Prática de Integração RAMI + Rede ALINE Setor Ação Realizada Rede envolvida UBS (Saúde - RAMI) Realiza a classificação de risco gestacional, inicia pré-natal e vincula Maria à maternidade de referência. Suspeita de sofrimento psíquico e vulnerabilidade social. RAMI CRAS (Assistência - ALINE) UBS envia notificação compartilhada ao CRAS.O CRAS faz visita domiciliar com assistente social e inclui a família no PAIF (serviço de proteção e apoio integral à família). ALINE Escola e Secretaria de Educação A rede ALINE identifica que Maria abandonou a escola. A equipe busca reintegrá-la à EJA ou a ações de apoio educacional. ALINE Rede de Proteção (intersetorial) Caso é discutido na reunião mensal da rede local (UBS, CRAS, escola, Conselho Tutelar). São definidos compromissos conjuntos, como apoio psicológico e mediação familiar. RAMI + ALINE Criança Feliz Maria é incluída no programa de visitação domiciliar.Orientações sobre maternidade, aleitamento e estímulo precoce são repassadas desde a gestação. ALINE Puerpério e Infância Após o parto, Maria recebe acompanhamento no pós-parto pela equipe da UBS (RAMI) e continua recebendo visitas domiciliares (ALINE).Seu bebê é inserido na linha de cuidado da criança até 5 anos. RAMI + ALINE Situação Prática de Integração RAMI + Rede ALINE Resultados Esperados Maria conclui o pré-natal e tem parto seguro com acompanhante; O bebê nasce com peso adequado e recebe todas as triagens neonatais; A família é acompanhada pelo CRAS com fortalecimento de vínculos; Maria volta a estudar com apoio da rede; A criança é acompanhada com foco no desenvolvimento até os 5 anos; O território fortalece o fluxo de atenção com responsabilidade compartilhada.