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Elementos da Linguagem Visual Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Dr.ª Maria José Spiteri Tavolaro Passos Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Esquemas Compositivos • Introdução; • Esquemas Compositivos; • Princípios Organizacionais; • Leis da Gestalt; • Princípios Organizacionais; • Colocando em Prática. • Descrever os principais esquemas compositivos e suas variáveis; • Apresentar e descrever os princípios organizacionais na composição; • Descrever as Leis da Gestalt e seu impacto na percepção visual; • Comentar a infl uência da composição na Linguagem Visual. OBJETIVOS DE APRENDIZADO Esquemas Compositivos Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Esquemas Compositivos Introdução Compor significa arranjar, dispor, colocar, enquadrar os elementos de uma cena de forma mais eficiente, ou seja, de maneira que agrade (cau- se emoção) e permaneça na memória do observador. (TARNOCZY JUNIOR, 2010, p. 24) Nesta Unidade, vamos investigar como e de que maneira uma manifestação visu- al pode (ou deve) ser organizada para que cumpra de forma adequada seu objetivo. É sempre bom lembrar que a Linguagem Visual não está perdida no tempo e no espaço. Ela tem um objetivo muito claro: mostrar (ou narrar, explicar, inspirar, fruir ou afetar, tanto faz, como você julgar mais adequado) algo a alguém. Isso quer dizer que no momento da composição precisamos considerar duas grandes variáveis, a saber: a forma (é o “como” se expressar) e o conteúdo (é “o que” expressar). Consequentemente, ambas as variáveis devem se complementar de forma coe- rente e lógica, sob pena de não apresentar o que se deseja. A respeito da composição Dondis (2009, p. 25) afirma que: [...] o processo de composição é o passo mais crucial na solução dos problemas visuais. Os resultados das decisões compositivas determinam o objetivo e o significado da manifestação visual e têm fortes implicações com relação ao que é recebido pelo espectador. Se esse aspecto torna a Linguagem Visual complexa, há outra questão que complica um pouco mais a comunicação; diferente da Linguagem Verbal que pos- sui regras e sintaxe claras, a Linguagem Visual não possui sistemas estruturais absolutos que nos assegurem a exata compreensão da mensagem, cabe ao criador (artista, designer, fotógrafo etc.) “abordar o processo de composição com inteligên- cia e conhecimento de como as decisões compositivas irão afetar o resultado final” (DONDIS, 2009, p. 25). É por tudo isso que podemos afirmar que a maneira como colocarmos os ele- mentos e as relações que se estabeleçam entre eles poderá afetar e definir o signi- ficado e o conteúdo. Isso se torna fundamental, principalmente, quando observamos como será de- talhado mais adiante, que as decisões compositivas utilizadas podem influenciar positiva ou negativamente a percepção do observador: [...] não há regras absolutas: o que existe é um grau de compreensão do que vai acontecer em termos de significado se fizermos determinadas ordenações das partes que nos permitam organizar e orquestrar os meios visuais[...]. (DONDIS, 2009, p. 25) 8 9 Esquemas Compositivos Para estruturar uma composição, o primeiro passo é estabelecer quais elemen- tos e em qual ordem eles serão arranjados no espaço disponível. É por esse motivo que podemos estruturar um esquema compositivo elaborado com um conjunto de linhas-mestre que organizam o espaço em que se situarão os elementos. A maior parte das vezes não são perceptíveis de imediato ou são apenas a dire- ção normal de leitura (da esquerda para a direita e de cima para baixo). Outras ve- zes, porém, a composição é tão complexa que se torna difícil identificar o esquema utilizado pelo artista. Alguns dos esquemas compositivos mais simples e mais utilizados em obras vi- suais podem ser observados na Figura 1. Figura 1 – Esquemas compositivos simples A seguir, você encontra breves descrições de cada um deles, com os respecti- vos exemplos. • Simétrico: os elementos compositivos se encontram em equilíbrio ao redor de um eixo; • Triangular: os elementos apresentam uma base, mesmo quando sugerida; • Circular: desenvolvida ao redor de um eixo equidistante; • Oval: desenvolvida ao redor de um eixo com um dos lados mais estreito; • Forma de T: Duas linhas perpendiculares; • Forma de L: uma linha vertical grande que se une a uma linha horizontal menor; • Forma de S: aplicação de linhas sinuosas; • Forma de X: entrecruzamento de duas linhas; • Diagonal: a linha inclinada confere maior dinâmica à composição. A diagonal pode se apresentar em qualquer uma das direções (inclinada para a esquerda ou para a direita); • Ângulo: formato angular, tanto à direita quanto à esquerda; • Radial: série de raios como rodas de bicicleta; • Curvas: para qualquer direção, sempre oferecem a sensação de movimento. 9 UNIDADE Esquemas Compositivos Figura 2 – Exemplo de composição simétrica Fonte: PXhere Figura 3 – Exemplo de composição circular Fonte: PXhere Exemplo de composição triangular – Propaganda do seriado Law & Order na Romênia, dis- ponível em: https://bit.ly/2ZJKtZc Figura 4 – Exemplo de composição simétrica Fonte: PXhere 10 11 F igura 5 – Exemplo de composição em T. Diego de Velázquez (1632) – La crucifi xión Fonte: museodelprado.es F igura 6 – Exemplo de composição com linhas sinuosas Fonte: PXhere Exemplo de composição em L. Outdoor campanha contra a anorexia de Oliviero Toscani, Itália, 2007, disponível em: https://bit.ly/2LizdzZ Figura 7 – Exemplo de composição em S. Propaganda dos relógios Patek Philippe, 1997, Santiago (Chile) Fonte:Reprodução 11 UNIDADE Esquemas Compositivos Figura 8 – Exemplo de composição diagonal Fonte: PXhere Figura 9 – Exemplo de composição com linhas sinuosas Fonte: Getty Images Exemplo de composição angular. Propaganda da Volkswagen para o Polo Blue Motion (2008), disponível em: https://bit.ly/2DI1Q3q Figura 10 – Exemplo de composição com curvas Fonte: PXhere Princípios Organizacionais Psicólogos, filósofos e muitos outros estudiosos se dedicaram a investigar a razão e as causas de nossas respostas a determinados estímulos visuais, especialmente, para determinarem por que algumascomposições nos agradam mais do que outras. Uma tentativa (bem-sucedida) de explicar nosso comportamento frente às com- posições pode ser encontrada nas teorias da Gestalt. Seus princípios e fundamen- tos foram elaborados após numerosos estudos e pesquisas experimentais a respeito da percepção humana. 12 13 Importante! “Gestalt é uma escolada psicologia experimental. Considera-se que Christian von Ehrenfels, filósofo austríaco de finas do século XIX, foi o precursor da Psicologia da Gestalt. Mais tarde, por volta de 1910, teve seu início mais efetivo por intermédio de três nomes principais: Max Wertheimer (1880-1943), Wolfgang Kohler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1941), da Universidade de Frankfurt” (GOMES FILHO, 2008, p. 24). Você Sabia? Gestalt: (pronuncia-se guestalt) é uma palavra alemã que significa “forma” ou “Figura”; em inglês, espanhol e português é, geralmente, traduzida como estrutura, Figura, forma. Curio- samente, no design, o termo se vulgarizou significando “boa forma”. O impacto das teorias da Gestalt sobre os estudos da percepção e da Linguagem Visual foram tão significativos que merecem a nossa atenção. A seguir vamos co- nhecer alguns dos seus mais importantes princípios. Leis da Gestalt A Gestalt, após sistemáticas pesquisas, apresenta uma teoria nova a respeito da percepção. De acordo com ela, o que ocorre no cérebro não é igual ao que ocorre na retina. A estimulação cerebral não acontece em pontos isolados, mas por ex- tensão. Isso nos indica que na percepção não acontece um processo posterior de associação das várias sensações; a primeira sensação já é de forma, já é global e unificada (FRACCAROLI, 1952 apud GOMES FILHO, 2008, p. 25). Isso quer dizer que não vemos partes isoladas, mas relações; ou seja, uma parte na dependência de outra parte: “Em nossa percepção, que é resultado de uma sensação global, as partes são inseparáveis do todo e são outra coisa que não elas mesmas, fora desse todo” (GOMES FILHO, 2008, p. 26). Para a Gestalt, as relações psicofisiológicas são definidas assim: “Todo proces- so consciente, toda forma psicologicamente percebida está estreitamente relacio- nada às forças integradoras do processo fisiológico cerebral” (GOMES FILHO, 2008, p. 26). Para explicar a origem dessas forças integradoras, a hipótese da Gestalt atribui ao Sistema Nervoso Central um dinamismo autorregulador que, à procura da esta- bilidade, tende a organizar as formas em todos, coerentes e unificados. Por sua vez, essas organizações originárias da estrutura cerebral são es- pontâneas (não arbitrárias), independentemente de nossa vontade e de qual- quer aprendizado. 13 UNIDADE Esquemas Compositivos Duas forças atuarão no processo de percepção visual: as externas e as internas. • Forças externas: constituídas pela estimulação da retina por meio da luz pro- veniente do objeto exterior; originam-se nas condições de luz em que se en- contra o objeto; • Forças internas: são as que estruturam das formas numa determinada ordem, a partir das condições de estimulação (ou seja, das forças externas); a origem das forças internas está na estrutura cerebral e em seu dinamismo e plasticidade. A partir dos estudos realizados, os teóricos da Gestalt desenvolveram sete prin- cípios que servem como “suporte sensível e racional, espécie de abecê da leitura visual, que vai permitir e favorecer toda e qualquer articulação analítica e interpre- tativa da forma do objeto” (GOMES FILHO, 2008, p. 32). Os sete princípios da Gestalt são: • Unificação; • Segregação; • Semelhança; • Proximidade; • Fechamento; • Continuidade; • Pregnância da forma. Veja a Figura 11, que ilustra a relação entre esses princípios: Figura 11 – Leis da Gestalt Fonte: Wikimedia Commons Unidade Uma unidade formal pode ser identificada num único elemento, que se encerra em si mesmo ou como parte de um todo. Assim, pode ser compreendido como o conjunto de mais de um elemento que configura o “todo”, ou seja, o próprio objeto. 14 15 Essas unidades compositivas são percebidas por meio de relações (formais, dimensionais, cromáticas etc.) que se estabelecem entre si na configuração do objeto como um todo (GOMES FILHO, 2008, p. 32). Veja a Figura 12. Podemos destacar diversas unidades: o menino, o homem, a bola, o cubo, o chão, o céu, uma figura ao fundo à esquerda maior, outra figura ao lado menor, o cavalo mais ao fundo. Segregação A segregação corresponde à nossa capacidade perceptiva de separar, identificar ou destacar unidades formais num todo compositivo ou em partes desse todo, den- tro de relações formais, dimensionais, de posicionamento. Na leitura visual, podemos estabelecer níveis de segregação, por exemplo, iden- tificar apenas as unidades principais de um todo mais complexo, desde que seja suficiente para o objetivo desejado de análise e interpretação visual da forma do objeto (GOMES FILHO, 2008, p. 35). Veja a Figura 13. Embora haja vários outros elementos compositivos, por serem formas geométricas e se diferenciarem das demais, estão destacadas a bola e o cubo. Figura 12 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: Wikimedia Commons Figura 13 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: Wikimedia Commons Unificação A unificação da forma consiste na união pela igualdade ou semelhança dos estímu- los produzidos pelo campo visual; ela ocorre quando os princípios de harmonia, do equilíbrio visual e, principalmente, da coerência do estilo formal das partes ou do todo estão presentes num objeto ou numa composição (GOMES FILHO, 2008, p. 36). 15 UNIDADE Esquemas Compositivos Observe a Figura 14. Não é preciso ver a bola inteira para perceber sua esferici- dade; o mesmo ocorre com o cubo, mesmo incompleto, percebo sua forma inteira, completa. O mais significativo é que por serem geométricas e contrastarem com o todo, nossa percepção as une. A unificação é influenciada por dois fatores principais: a proximidade e a semelhança. Semelhança A igualdade de forma e de cor desperta a tendência de se construir unidades, ou seja, de estabelecer agrupamentos de partes semelhantes. Semelhança e proximidade são dois fatores que, além de auxiliarem na forma- ção de unidades, contribuem para a unificação do todo, daquilo que é visto, no sentido da harmonia e do equilíbrio visual (GOMES FILHO, 2008, p. 39). Veja a Figura 15. As curvas do corpo do menino repetem o ritmo sinuoso que nos transmite a sensação de leveza, suavidade. No corpo do homem, os ângulos retos nos produzem sensação de rigidez, peso, sobriedade. Figura 14 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: Wikimedia Commons Figura 15 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: Wikimedia Commons Proximidade Estímulos visuais próximos tendem a ser percebidos juntos e a constituir unida- des dentro do todo. Em condições idênticas os estímulos mais próximos entre si terão maior tendên- cia a ser agrupados e a constituir unidades. 16 17 Proximidade e semelhança são fatores que agem e se reforçam mutuamente, tanto para formar unidades como para unificar a forma (GOMES FILHO, 2008, p. 38). Veja a Figura 16. É fácil agrupar os dois personagens por sua proximidade; da mesma forma, as duas cabeças dos personagens se relacionam com o formato da bola, formando um triângulo de tensão entre si. Fechamento O fechamento concorre para a formação de unidades em “todos” fechados. Obtemos a sensação de fechamento visual da forma pela continuidade numa ordem estrutural definida. Importante não confundir a sensação de fechamento sensorial, de que trata a Gestalt, com o fechamento físico, contorno real, presente em praticamente todas as formas dos objetos (GOMES FILHO, 2008, p. 37). Veja a Figura 17. Os contornos fechados delimitam os corpos dos dois personagens. Assim, as linhas abertas da paisagem se tornam claramente o fundo da imagem. Figura 16 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: WikimediaCommons Figura 17 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: Wikimedia Commons Continuidade A continuidade ou continuação se define pela impressão visual de como as par- tes se sucedem por meio da organização perceptiva da forma de modo coerente, sem quebras ou interrupções em sua trajetória ou em sua fluidez visual. Significa, também, a tendência dos elementos de acompanharem uns aos ou- tros, oferecendo continuidade de um movimento para uma direção já estabelecida por meio de unidades formais (GOMES FILHO, 2008, p. 37). 17 UNIDADE Esquemas Compositivos Veja a Figura 18. Do ponto de vista perceptivo, embora estejam em planos dife- rentes, a perna do homem e o corpo do equilibrista se unem numa única linha, o que também ocorre com o cubo sobre o qual o homem está sentado e o seu corpo. Por outro lado,as linhas mais distantes, ao fundo da imagem, são percebidas como algo contínuo e, mesmo que algumas partes estejam ocultas pelos corpos dos persona- gens dos primeiros planos, criam um percurso visual e uma direção que apenas é intuída. Pregnância Pregnância é a base da percepção visual da Gestalt. Segundo João Gomes Filho: “As forças de organização da forma tendem a se dirigir tanto quanto o permitam as condições dadas, no sentido da harmonia e do equilíbrio visual. Qualquer padrão de estímulo tende a ser visto de tal modo que a estrutura resultante é tão simples quanto o permitam as condições dadas (GOMES FILHO, 2008, p. 40). Veja na Figura, 19 o equilíbrio, a clareza e a harmonia existentes na compo- sição, nas formas, nas cores e tonalidades empregadas. Tudo lhe confere beleza, leveza, proporcionalidade... olhando para ela, você não tem a impressão de que a criança se mantém de fato no ar? Figura 18 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: Wikimedia Commons Figura 19 – Menino equilibrista e a bola. Pablo Picasso (1905) Fonte: Wikimedia Commons Portanto, seguindo as orientações de João Gomes Filho (2008, p. 41) ao anali- sar uma composição quanto à sua pregnância, podemos concluir que: • Quanto melhor ou mais clara for a organização visual da forma do objeto, em termos de facilidade de compreensão e rapidez de interpretação, maior será seu grau de pregnância; 18 19 • Quanto pior ou mais complicada e confusa for a organização visual da forma do objeto, menor será seu grau de pregnância. No caso da imagem aqui utilizada como exemplo, podemos afirmar que a cla- reza utilizada pelo artista na distribuição dos elementos compositivos na ocupação do campo plástico, tornou a imagem de fácil assimilação e, portanto, com um bom nível de pregnância. Figura 20 Fonte: Pixabay Observe nesta imagem como, ao eliminar quaisquer distratores da atenção, o ilustrador conseguiu concentrar o foco na mensagem principal – a da incerteza e vulnerabilidade da posição do equilibrista sobre a corda bamba. E AGORA, COMO APLICAR? Talvez você esteja se perguntando como, a partir de todos esses conteúdos, pode- mos realizar a leitura visual de um objeto. Depois de muitos estudos a respeito dos trabalhos de teóricos ligados à Gestalt, em especial de Rudolf Arnheim, João Gomes Filho nos apresenta Gestalt do Objeto (2008, p. 104), um interessante passo a passo, como ponto de partida para aplicar os conceitos estudados em outras obras visuais. Vamos conhecê-lo? Sistema de Leitura Visual pelas Leis da Gestalt 1. Examine o objeto e tente identifi car suas partes ou unidades principais; Para efeitos de leitura visual, objeto significa qualquer tipo de manifestação visual passível de ser lida, em termos de imagens bi ou tridimensionais. 2. Decomponha essas unidades principais em suas outras subunidades com- positivas, e assim sucessivamente, até um nível considerado satisfatório; 3. Identifi que, analise e interprete cada uma das leis da Gestalt em cada uma das unidades originadas por segregação de natureza variada no objeto, 19 UNIDADE Esquemas Compositivos e as descreva, caracterizando-as, por exemplo, como segregações físicas por meio de suas massas ou volumes e também por outros tipos de segre- gações como um ou mais de um dos seguintes elementos: pontos, linhas, planos, cores etc. E, ainda, por características de acabamento como brilho, texturas, relevos positivos ou negativos, e assim por diante; 4. Para concluir a leitura visual, interprete a organização formal do objeto como um todo, atribuindo um índice de qualidade para sua pregnância formal como, por exemplo: baixo, médio ou alto, ou, se preferir, atribuir um índice de avaliação de 1 (ruim) a 10 (excelente). Princípios Organizacionais Como vimos, a composição e os princípios de organização nela aplicados são con- ceitos derivados ou desdobrados das Leis da Gestalt, que correspondem a determina- das organizações entre as partes, que permitem formular todos coerentes e integrados. Esses conceitos (ou categorias) têm como finalidade auxiliar na organização for- mal no momento de se definirem estratégias compositivas; além disso, dão suporte nos rebatimentos efetuados nas diversificadas manifestações visuais dos objetos. Vale ressaltar que cada autor ou teórico elabora uma classificação dessas categorias. Não cabe, aqui, questionar a veracidade ou a exatidão dessas classificações. Vamos, isso sim, assinalar as mais frequentemente aplicadas na Linguagem Visual. Harmonia Gomes Filho (2008, p. 53) nos ensina que “Harmonia diz respeito à disposição formal bem organizada e proporcional no todo ou entre as partes de um todo. Na harmonia plena, predominam o equilíbrio, a ordem, a regularidade visual, pos- sibilitando leitura simples e clara (Figura 21). Figura 21 – Exemplo de harmonia na composição Fonte: Getty Images É “[...] o resultado de (...) perfeita articulação visual na integração e coerência formal das unidades ou partes daquilo que é apresentado, daquilo que é visto”. 20 21 O mesmo autor nos caracteriza a desarmonia como “a formulação oposta da harmonia (...) é o resultado de uma desarticulação na integração das unidades ou partes constitutivas do objeto”. Ela pode ser causada por desvios (irregularidades, sobreposições) dos elementos ou por desnivelamento visual em partes ou no todo. Contraste O contraste “é a força que torna visível as estratégias da composição visual” (GOMES FILHO, 2008, p. 62) e, portanto, uma poderosa ferramenta de expres- são. Em todas as áreas que lidam com a visualidade, o contraste pode contribuir para intensificar o significado e para simplificar a comunicação. Por se contrapor à tendência do equilíbrio absoluto, ele pode desequilibrar, sa- cudir uma composição. Pensando assim, o contraste pode parecer algo ruim, mas se utilizado com sa- bedoria, pode estimular e atrair a atenção do observador. Como estratégia visual, o contraste pode aguçar o significado, dramatizá-lo e fazê-lo mais importante e mais dinâmico. João Gomes Filho (2008, p. 64-73), ao estudar o contraste na Linguagem Visu- al, destaca alguns elementos que podem ser explorados quanto ao uso do contraste. • Contraste de luz e tom: baseia-se nas sucessivas oposições de claro-escuro ou na combinação de sombra-luz; • Contraste de cor: está associado à iluminação natural, artificial ou às duas; a cor é a parte mais emotiva do processo visual. Figura 22 – Contraste de tom e cor Fonte: Getty Images Nesta imagem, ao mesmo tempo que acompanhamos as variações to- nais pela incidência de luz sobre os guarda-chuvas preto, temos um in- tenso contraste de cor pela presença de um único elemento alaranjado no conjunto. 21 UNIDADE Esquemas Compositivos • Contraste vertical/horizontal: a direção horizontal representa o mundo con- creto de ação humana, passam a sensação de solidez e estabilidade; a forma vertical se adapta ao eixo dominante do espaço, as formas verticais passam a sensação de leveza e menos estabilidade: Figura 23 – Promethée 33 – Ponte Jacques-Chaban-Delmas, Bordeaux, França, 2013 Fonte: Wikimedia Commons Observe como nesta imagemo contraste entre horizontal e vertical acen- tuou a imponência da ponte. • Contraste de movimento: é definido em função de velocidade e direção, relacio- nando-se com o Sistema Nervoso que cria a sensação de mobilidade e rapidez; • Contraste de dinamismo: está sempre relacionado a um movimento dinâmico, ou seja, trata-se de um movimento mais exacerbado, mais forte ou mais veloz: Figura 24 – Flamenco Fonte: Getty Images Nesta imagem, a posição da barra da saia da dançarina acentua a sensação de dinâmica na composição. O movimento visual também é direcionado por esse mesmo elemento, que faz com que nossos olhos percorram a composi- ção, partindo da saia que se ergue do chão, seguindo pelo rastro vermelho 22 23 do vestido e terminando na posição da mão que se ergue acima da cabeça da jovem. Assim, o fotógrafo nos induz a “sentir” um pouco do movimento circular dos passos da dança. A figura da dançarina em pleno movimento contrasta fortemente com os músicos atrás dela, embora tocando seus instrumentos, eles nos trazem mui- to mais uma sensação de repouso • Contraste de ritmo: é função do movimento; trata-se de movimento regrado medido e como um conjunto de sensações de movimentos encadeados ou de conexões visuais ininterruptas. O ritmo se dá pelas repetições na composição, sejam elas de cor, sejam de forma, de textura etc.; • Contraste de passividade: a passividade é definida como o estado natural de um ser que sofre uma ação sem reagir, é inerte e submisso, não toma parte ativa, não exerce ação. Figura 25 Fonte: Getty Images Nesta imagem, a repetição das cadeiras verdes, diminuindo de tamanho à medida em que se distanciam do observador, cria um ritmo cadenciado na composição. Ao mesmo tempo, a única cadeira vermelha do conjunto se destaca do grupo e, se fixa no espaço, enquanto todos os outros elementos parecem seguir o fluxo da perspectiva • Contraste de proporção: trata das relações entre as medidas do contorno de um campo visual ou de um objeto e as medidas das partes ocupadas por elementos nele dispostos. Figura 26 – Sheila Brown Fonte: publicdomainpictures.net 23 UNIDADE Esquemas Compositivos Nesta imagem, na intenção de destacar a pequena rã, o fotógrafo concen- tra o foco no personagem principal e, embora ele seja muito pequeno em relação a todos os outros elementos ao seu redor, ganha força e destaque na composição. • Contraste de agudeza: está relacionado à clareza e à acuidade visual, que é a capacidade de discriminar estímulos visuais a fim de obter nitidez de expressão da forma. Agora, retome as imagens anteriores (Figuras 23 a 28) e tente per- ceber em quais dos exemplos apresentados é possível verificar este contraste. Equilíbrio Gomes Filho (2008, p. 57) afirma que “O equilíbrio é o estado no qual as forças agindo sobre um corpo se compensam mutuamente”. O equilíbrio pode ser obtido por meio de duas forças de igual resistência, que puxam ou atuam em direções opostas, produzindo um tipo de “pausa” visual. Naturalmente, a tensão não é necessariamente o contrário do equilíbrio, e sim, uma força que modifica gradual ou repentinamente o aspecto de repouso carac- terístico do equilíbrio. É causada pelo desvio em relação à estabilidade dos eixos horizontal-vertical, com a alteração da posição ou direção das unidades, ou pela presença de unidades com pesos visuais dissonantes. Podemos obter o equilíbrio atuando sobre o peso, a direção, a simetria (GOMES FILHO, 2008, p. 58-61): • Peso e direção: peso e direção são propriedades que exercem particular in- fluência sobre o equilíbrio; o peso sofre influência da posição, uma posição forte sustenta mais peso do que fora do centro; o peso conseguido pela cor, por exemplo, pode ser contrabalançado pelo peso por meio da localização; a direção, por sua vez, pode ser equilibrada pelo movimento em direção ao centro de atração. Figura 27 Fonte: Getty Images Observe que esta imagem poderia ser facilmente entendida como um dese- quilíbrio, já que o lado direito da composição contém um número grande de 24 25 elementos (pessoas, peças de mobiliário, detalhes decorativos etc), contras- tando com o lado esquerdo, liso e plano. Como isso foi resolvido? Por meio de duas grandes áreas lisas de cor: uma branca e outra, de um laranja bem intenso. Para complementar, outros elementos da mesma cor foram dispos- tos no lado direito, em que se contrava o maior número de formas. • Simetria: trata-se de equilíbrio axial que pode ocorrer em qualquer um dos eixos; é a configuração que origina formulações visuais idênticas em ambos lados; configurações simetricamente organizadas tendem a ser percebidas com maior facilidade do que agrupamentos assimétricos, mas seu uso pode resultar em algo enfadonho, sem graça e estático: Figura 28 – Edifícios residenciais simétricos em Hong Kong, China Fonte: Getty Images A simetria axial pode se tornar muito monótona; no entanto, neste exem- plo, a gradação de tamanho obtida pelo próprio ângulo do qual foi tomada a imagem, criou uma noção de perspectiva que contrariou essa sensação de estaticidade. É importante observar que, por vezes, podemos considerar uma composição simétrica mes- mo que suas unidades não sejam exatamente iguais, ao longo dos eixos. Nesse caso, trata-se de uma simetria aproximada, em que os lados opostos apresentam uma equivalência; Como pudemos observar na Figura 27, é possível obter um equilíbrio em uma composição, ainda que ela seja totalmente assimétrica, desde que ocorra uma compensação entre os “pesos” de cada lado do campo visual; assim, cada lado,ainda que diferente,apresentará a mesma força visual. Outros pontos a se observar Neste momento, um bom exercício é retomar as imagens apresentadas nesta Unidade, observando além dos itens já apontados alguns outros detalhes como: • Quanto maior o tamanho da forma, maior o peso visual desse elemento (Fi- gura 22); • Formas regulares pesam mais que formas irregulares (Figura 4); 25 UNIDADE Esquemas Compositivos • Cores quentes pesam mais que cores frias (Figura 25); • Cores saturadas pesam mais que cores não saturadas ou neutralizadas – acin- zentadas (Figura 27); • Tonalidades escuras pesam mais que tonalidades claras (Figura 6); • Unidades localizadas no centro da composição ou próximas aos eixos horizon- tal e vertical centrais pesam mais do que afastadas desses locais (Figura 26); • Uma unidade isolada pesa mais do que uma semelhante próxima a outras unidades (Figura 23); • A atração entre os pesos vizinhos determina a direção das forças visuais da composição (Figura 28). Atração e Agrupamento Atração e agrupamento são princípios de organização diretamente ligados às Leis da Gestalt (lembre-se dos princípios de unificação e segregação) e nos remetem à uma tendência do ser humano para perceber os elementos ou as partes como todos unificados. Quando tratamos de composições visuais, a atração e o agrupamento são uma condição que cria interação entre as partes. Assim, as unidades que não apresentam simi- laridade ou que se encontram distantes em uma composição tendem a ser percebidas como se- paradas, como se uma força as afastasse mutua- mente e, desse modo, podem disputar a atenção do observador. A aproximação, por si, cria uma atração visu- al e esse efeito é intensificado pela similaridade entre as unidades, seja no tamanho, seja na for- ma ou na cor. O olho sempre tende a completar as lacunas entre as unidades para perceber um todo; porém, relaciona automaticamente e com maior força as unidades semelhantes (Figura 29): Figura 29 –Aproximação e similaridade geram atração visual Fonte: PXhere 26 27 Positivo e Negativo Positivo e negativo correspondem a uma sequência de visão alternada entre campos visuais. O positivo refere-se às unidades mais ativas que criam uma tensão visual e absorvem a atenção do espectador e o negativo, a tudo aquilo que se apre- senta de maneira mais passiva na composição – fundo (Figura 30). Figura 30 Fonte: PXhereObserve que, nesta Figura, embora as imagens das crianças estejam contra a luz e, portanto escurecidas, ainda as identificamos como figuras sobre o fundo colorido Colocando em Prática Nesta unidade, tomamos contato com diversas informações a respeito do uni- verso da composição visual e vimos, também, como as Leis da Gestalt podem ser usadas a favor de qualquer profissional que trabalhe com a imagem. Agora, procure observar ao seu redor, das mais simples logomarcas às mais complexas estruturas arquitetônicas, passando pelas imagens bidimensionais e pe- las formas da natureza. Verifique como os princípios compositivos estudados, que na maior parte das vezes tem suas raízes na própria natureza, podem ser identificados em todas as criações humanas e, a partir dessa experiência, procure incorporá-los às suas pró- prias criações. Que tal tentar? 27 UNIDADE Esquemas Compositivos Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Fundamentos da fotografia criativa PRÄKEL, D. Fundamentos da fotografia criativa. São Paulo: Gustavo Gili, 2015. Fundamentos de arte: teoria e prática OCVIRK, O. G. et al. Fundamentos de arte: teoria e prática. São Paulo: McGraw-Hill, 2015. Vídeos A mão livre – estrutura da composição – 12 Esse vídeo faz parte da série A mão livre – a linguagem do desenho. 24 programas de quinze minutos cada, exibidos pela TV Cultura na década de 1990, que apresentam os fundamentos, as técnicas e os processos criativos do desenho, além de sugerirem exercícios de composição. Um rico material para aprimorar sua percepção e expressão visual, assim como a sua criatividade. Conheça esse e outros vídeos da série no canal Amaolivre. https://bit.ly/2PTe5Pz Kazuo Okubo Neste vídeo, é possível tomar contato com o trabalho de Kazuo Okubo, em que o experiente fotógrafo na área de publicidade divide com o espectador um pouco do seu olhar e suas vivências na área: erros, acertos e desafios. https://bit.ly/2V1Weqd Nana Moraes (E16-T02) Neste vídeo, conheceremos o trabalho de Nana Moraes, além de tomarmos contato com o seu depoimento pessoal a respeito de sua atuação como fotógrafa publicitária, atuante, também, em outras áreas, vemos por meio de suas imagens como o fotógrafo constroi um olhar pessoal, que entre outros fatores envolve o modo como ele articula os elementos da Linguagem Visual. https://bit.ly/2H0saI0 28 29 Referências ARNHEIM, R. Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. DONDIS, D. A. Sintaxe da Linguagem Visual. Rio de Janeiro: Martins Fontes, 2009. FRACCAROLI, C. A Percepção da forma e sua relação com o fenômeno ar- tístico: o problema visto através da Gestalt. (Aula n. 30) São Paulo: Edusp, 1952. GOMES FILHO, J. Gestalt do objeto: sistema de leitura visual da forma. São Paulo: Escrituras, 2008. PRÄKEL, D. Composição. Porto Alegre: Bookman, 2010. TARNOCZY JUNIOR, E. Arte da Composição. 2.ed. Santa Catarina: Editora Photos, 2010. 29