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MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 1 Apresentação ............................................................................................................................ 4 Aula 1: Mecanismos de solução alternativa de conflitos. Principais modalidades. Negociação. Conciliação. Mediação. Arbitragem. .......................................................... 5 Introdução ............................................................................................................................. 5 Conteúdo ................................................................................................................................ 6 Solução de conflitos .......................................................................................................... 6 Conceitos básicos em solução de conflitos ................................................................. 7 Ferramentas para solução de conflitos ......................................................................... 9 Negociação ......................................................................................................................... 9 Mediação ........................................................................................................................... 12 A medição prévia e a mediação incidental ................................................................ 13 Arbitragem ........................................................................................................................ 16 Distinção entre a função do árbitro e a do juiz togado ........................................... 17 Atividade proposta .......................................................................................................... 19 Aprenda Mais ....................................................................................................................... 19 Referências........................................................................................................................... 20 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 21 Notas ........................................................................................................................................... 25 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 26 Aula 2: Inovações legislativas. Aspectos do tema no Novo CPC. ............................. 28 Introdução ........................................................................................................................... 28 Conteúdo .............................................................................................................................. 29 A mediação no direito brasileiro................................................................................... 29 A escolha do mediador ................................................................................................... 30 Regulamentação da mediação judicial e extrajudicial ............................................. 32 Atualização da Lei de Arbitragem e apresentação do anteprojeto da Lei de Mediação ........................................................................................................................... 35 Mediação judicial, extrajudicial, pública e online ...................................................... 36 Análise das inovações legislativas em solução de conflitos.................................... 37 Mediação pública ............................................................................................................. 38 Mediação online ............................................................................................................... 39 Mudanças na arbitragem ............................................................................................... 48 Atividade proposta .......................................................................................................... 62 Aprenda Mais ....................................................................................................................... 63 MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 2 Referências........................................................................................................................... 63 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 66 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 68 Aula 5: Perspectivas no Direito Europeu. A questão da mediação obrigatória. ... 70 Introdução ........................................................................................................................... 70 Conteúdo .............................................................................................................................. 71 A mediação na Europa ................................................................................................... 71 Conceito de mediação ................................................................................................... 72 Regulamentação da mediação ..................................................................................... 73 A justiça europeia ............................................................................................................ 74 A obrigatoriedade da mediação ................................................................................... 75 Mediação consensual ..................................................................................................... 81 Interesse em agir ............................................................................................................. 83 O juiz e os processos de solução de conflitos ........................................................... 84 Rede colaborativa ............................................................................................................ 85 Atividade proposta .......................................................................................................... 85 Aprenda Mais ....................................................................................................................... 86 Referências........................................................................................................................... 86 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 87 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 90 Aula 6: As principais discussões em torno da intervenção jurisdicional na arbitragem. Procedimento arbitral. Recurso e execução da sentença arbitral. ... 91 Introdução ........................................................................................................................... 91 Conteúdo .............................................................................................................................. 92 Arbitragem no ordenamento brasileiro ...................................................................... 92 Arbitragem e inconstitucionalidade ............................................................................. 93 Limites objetivos e subjetivos para o uso da arbitragem ........................................ 95 Arbitragem envolvendo entidades de direito público .............................................. 96 Relação arbitragem e pessoa ........................................................................................96 Princípios da arbitragem ................................................................................................ 97 Convenção de arbitragem ............................................................................................. 98 Compromisso arbitral ................................................................................................... 101 Lei nº 9.307/96 ................................................................................................................ 102 Prolação da sentença .................................................................................................... 104 Nulidade da sentença ................................................................................................... 107 Medidas urgentes........................................................................................................... 108 MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 3 Atividade proposta ........................................................................................................ 109 Aprenda Mais ..................................................................................................................... 111 Referências......................................................................................................................... 111 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 113 Chaves de resposta ................................................................................................................... 116 Conteudista ............................................................................................................................... 117 MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 4 Esta disciplina visa apresentar as principais modalidades dos mecanismos alternativos de solução de conflitos. Vamos falar sobre a negociação, conciliação, mediação e arbitragem. Além dos princípios e regras básicas de cada instituto, vamos estudar as iniciativas legislativas, sobretudo os Projetos de Lei sobre mediação e arbitragem, já aprovados no Senado e hoje em discussão na Câmara dos Deputados, bem como os dispositivos do CPC projetado que tratam do tema. Sendo assim, essa disciplina tem como objetivos: 1. Apresentar aos alunos uma visão geral dos mecanismos alternativos de solução de conflitos. 2. Enfocar algumas das questões mais relevantes desses instrumentos, sobretudo da mediação e da arbitragem. 3. Capacitar o aluno a se preparar para a mudança legislativa a partir do exame das novas tendências doutrinárias e jurisprudenciais. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 5 Introdução Nesta aula vamos apresentar o panorama geral da matéria, enfocando a evolução histórica dos meios alternativos e as principais semelhanças e diferenças entre eles. Falaremos um pouco sobre a negociação, conciliação, mediação e arbitragem, demonstrando suas características e peculiaridades. Objetivo: 1. Apresentar uma visão geral dos mecanismos alternativos de solução de conflitos no direito brasileiro; 2. Examinar as principais ferramentas a partir de um exame comparativo entre elas. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 6 Conteúdo Solução de conflitos Um conflito pode ser solucionado pela via estatal (jurisdição) ou pelas vias chamadas alternativas. Classificamos as vias alternativas em puras e híbridas. Chamamos puras aquelas em que a solução do conflito se dá sem qualquer interferência jurisdicional; ao passo que nas híbridas, em algum momento, mesmo que para efeitos de mera homologação, há a participação do Estado- Juiz. São formas puras a negociação, a mediação e a arbitragem. São meios híbridos, no direito brasileiro: a conciliação, obtida em audiência ou no curso de um processo já instaurado; a transação penal; a remissão prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente e o termo de ajustamento de conduta celebrado em uma ação civil pública. Atenção Com efeito, é cada vez mais comum o uso dos meios alternativos durante o processo judicial. Como veremos nas aulas seguintes, tanto o novo CPC como o PL nº 7.169/2014 tratam das figuras da conciliação e da mediação judicial e preveem regras específicas para o seu uso. No intuito de registrar as principais diferenças entre os meios puros de solução alternativa, apresentamos, a seguir, alguns conceitos básicos. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 7 Conceitos básicos em solução de conflitos Por negociação entende-se o processo pelo qual as partes envolvidas no litígio, diretamente e sem a interveniência de uma terceira pessoa, buscam chegar a uma solução consensual. A negociação envolve sempre o contato direto entre as partes ou entre seus representantes; não há aqui um terceiro, um neutro, um mediador, um árbitro ou um juiz. Por meio de processos de conversação as partes procuram fazer concessões recíprocas, reduzindo suas diferenças, e através delas chegam à solução pacificadora. Obviamente, em razão do comprometimento emocional e, muitas vezes, da falta de habilidade dessas partes para chegar a uma solução, a negociação acaba se frustrando, razão pela qual se passa à segunda modalidade de solução alternativa: a mediação. Na mediação insere-se a figura de um terceiro, o qual, de alguma maneira, vai atuar no relacionamento entre as partes envolvidas de forma a tentar obter a pacificação do seu conflito. A forma e os limites que vão pautar a atuação desse terceiro vão indicar a modalidade da intermediação. Hoje, entende-se que essa intermediação pode ser passiva ou ativa. Trata-se apenas de uma diferença de método, mas com um mesmo fim: o acordo. Na primeira modalidade, passiva, aquele terceiro vai apenas ouvir as versões das partes e funcionar como um agente facilitador, procurando aparar as arestas sem, entretanto, em hipótese alguma, introduzir o seu ponto de vista, apresentar as suas soluções ou, ainda, fazer propostas ou contrapropostas às partes. Sua ação será, portanto, a de um expectador/facilitador. Função típica de um mediador. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 8 Numa segunda postura, encontramos o intermediador ativo que no direito brasileiro, recebe o nome de conciliador. Por conta da tênue diferença de método para se chegar ao acordo é que há, muitas vezes, a discussão terminológica entre mediação e conciliação. A conciliação ocorre, portanto, quando o intermediador adota uma postura mais ativa: ele vai não apenas facilitar o entendimento entre as partes, mas, principalmente, interagir com elas, apresentar soluções, buscar caminhos não pensados antes por elas, fazer propostas, admoestá-las de que determinada proposta está muito elevada ou de que uma outra proposta está muito baixa; enfim, ele vai ter uma postura verdadeiramente influenciadora no resultado daquele litígio a fim de obter a sua composição. Nunca é demais lembrar que a conciliação, no seu aspecto processual, é um gênero do qual são espécies a desistência, a submissão e a transação, conforme a intensidade da disposição do direito efetivada pela(s) parte(s) interessada(s). E, finalmente, temos a figura da arbitragem. [...] a prática alternativa, extrajudiciária, de pacificação antes da solução de conflitos de interesses envolvendo os direitos patrimoniais e disponíveis, fundada no consenso, princípio universal da autonomia da vontade, através da atuação de terceiro, ou de terceiros, estranhos ao conflito, maisde confiança e escolha das partes em divergência. A arbitragem, como se costuma dizer, é um degrau a mais em relação à mediação (conciliação), especificamente à intermediação ativa, pois o árbitro, além de ouvir as versões das partes, tentar uma solução consensuada, interagir com essas partes, deverá proferir uma decisão de natureza impositiva, caso uma alternativa conciliatória não seja alcançada. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 9 Vemos, desta forma, que a crucial diferença entre a postura do árbitro e a postura do mediador é que o árbitro tem efetivamente o poder de decidir, ao passo que o mediador pode apenas sugerir, admoestar as partes, tentar facilitar o acordo, mas não pode decidir a controvérsia. E em relação à conciliação, apesar da intermediação mais incisiva do terceiro, mesmo assim, o objetivo é fazer com que os interessados empreguem suas forças para uma solução amigável do conflito, enquanto que o árbitro pode ir além e, ultrapassada essa fase conciliatória, não se chegando ao acordo, pode impor uma solução. Ferramentas para solução de conflitos Agora que você já conheceu conceitos básicos da solução de conflitos, é hora de conhecer as principais ferramentas que podem ser utilizadas para a solução de conflitos de forma alternativa à jurisdição. São elas: negociação, mediação e arbitragem. Negociação A negociação é um processo bilateral de resolução de impasses ou de controvérsias, no qual existe o objetivo de alcançar um acordo conjunto, através de concessões mútuas. Envolve a comunicação, o processo de tomada de decisão (sob pressão) e a resolução extrajudicial de uma controvérsia. A negociação tem como principais vantagens evitar as incertezas e os custos de um processo judicial, privilegiando uma resolução pessoal, discreta, rápida e, dentro do possível, preservando o relacionamento entre as partes envolvidas, o que é extremamente útil, sobretudo em se tratando de negociação comercial. Quanto ao momento, a negociação pode ser prévia ou incidental, tendo por referencial o surgimento do litígio; quanto à postura dos negociadores e das partes, pode ser adversarial (competitiva) ou solucionadora (pacificadora). A Escola de Harvard tem-se notabilizado por pregar uma técnica conhecida como principled negotiation ou negociação com princípios, fundada nos seguintes parâmetros: MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 10 Em primeiro lugar, é importante diferenciar o interesse da posição. Normalmente as partes expõem sua posição, que não necessariamente coincide com seu interesse. Por falta de habilidade, não raras vezes, fala-se em números, valores ou situações concretas, em vez de dizer o que se pretende ao final, permitindo que a barganha se dê quanto aos meios necessários a se atingir aquele fim. FISCHER, Roger and William Ury, Getting to Yes: Negotiating Agreement without Giving In, Boston: Houghton Mifflin Co., 1981. Para isso, é preciso que ambas as partes (e seus negociadores) encarem o processo de negociação com uma solução mútua de dificuldades, na qual o problema de um é o problema de todos. Nessa linha de raciocínio é preciso separar o problema das pessoas, de modo a deixar claro que uma divergência de opinião não deve afetar o sentimento pessoal ou o relacionamento, que sempre são mais valiosos. Ademais, na busca da solução do problema, é preciso estar atento a três parâmetros: a percepção, a emoção e a comunicação. As atitudes dos negociadores, em relação a esses tópicos, podem ser assim sistematizadas: 1) Percepção: (i) coloque--se no lugar do outro e procure entender seu ponto de vista; (ii) não presuma que o outro irá sempre o prejudicar; (iii) não culpe o outro pelo problema; (iv) todos devem participar da construção do acordo; (v) peça conselhos e dê crédito ao outro por suas ideias; (vi) não menospreze as demandas do outro; e (vii) procure dizer o que a outra parte gostaria de ouvir. 2) Emoção: (i) os negociantes sentem--se ameaçados ‒ a emoção pode levar as negociações a um impasse; (ii) identifique suas emoções e o que as está causando; MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 11 (iii) deixe que o outro expresse suas emoções e evite reagir emocionalmente a seus desabafos ‒ não as julgue como inoportunas; e (iv) gestos simples podem ajudar a dissipar emoções fortes. 3) Comunicação: (i) fale ao seu oponente; (ii) não faça apresentação para o cliente; (iii) ouça o seu oponente; (iv) não planeje sua resposta enquanto o outro fala; (v) seja claro na transmissão da informação; (vi) utilize--se da escuta ativa (active listening); (vii) repita e resuma os pontos colocados ‒ mostre que está compreendendo; e (viii) compreender o oponente não significa concordar com ele. Observando esses conceitos, será possível identificar o real interesse, desenvolver diversas opções e alternativas e criar soluções não cogitadas até então, por meio de um procedimento denominado “brainstorming”. A partir daí, torna-se necessário utilizar critérios objetivos e bem definidos para avaliar as alternativas. Nesse momento, é preciso evitar a disputa de vontades, utilizar padrões razoáveis, baseados em descobertas científicas, precedentes legais ou judiciais e recorrer a profissionais especializados. O critério deve ser debatido a fim de gerar um procedimento justo e aceito por ambos os interessados. Importante, por último, ter sempre em mente que a negociação é apenas uma das formas de se compor o litígio. Normalmente é a primeira a ser tentada, até porque dispensa a presença de terceiros, mas, também por isso, possui forte vinculação emocional das partes que, nem sempre, conseguem se desapegar do objeto do litígio para refletir de forma racional sobre ele. As partes devem ter sempre em mente o limite do que é negociável. É o que a Escola de Harvard denomina BATNA – Best Alternative to a Negotiated Agreement. Se a negociação não sai como esperado, é possível deixar a mesa, a qualquer momento, e partir para outra forma alternativa ou mesmo para a MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 12 jurisdição tradicional. Em outras oportunidades, uma das partes simplesmente não colabora. Não faz propostas razoáveis, tem o ímpeto de conduzir o processo a seu bel prazer e inviabiliza qualquer chance de solução pacífica. Ou pior, lança mão de truques sujos, omite ou mente sobre dados concretos, simula poder para tomar decisões, utiliza técnica agressiva e constrangedora, faz exigências sucessivas e exageradas, ameaça etc. Ainda que se tente, ao máximo das forças, por vezes, é preciso reconhecer que um dos interessados não está preparado para uma solução direta negociada ou parcial (por ato das partes) dos seus conflitos. É o momento de “subir um degrau” na escada da solução das controvérsias e partir para a mediação. Mediação Entende-se a mediação como o processo por meio do qual os interessados buscam o auxílio de um terceiro imparcial que irá contribuir na busca pela solução do conflito. Esse terceiro não tem a missão de decidir (nem a ele foi dada autorização para tanto). Ele apenas auxilia as partes na obtenção da solução consensual. O papel do interventor é ajudar na comunicação através da neutralização de emoções, formação de opções e negociação de acordos. Como agente fora do contexto conflituoso, funciona como um catalisador de disputas, ao conduzir as partes às suas soluções, sem propriamente interferir na substância destas. No Brasil, a partir dos anos 90 do século passado, começou a haver um interesse pelo institutoda mediação, sobretudo por influência da legislação argentina editada em 1995. Por aqui, a primeira iniciativa legislativa ganhou forma com o Projeto de Lei nº 4.827/98, oriundo de proposta da Deputada Zulaiê Cobra, tendo o texto inicial levado à Câmara uma regulamentação concisa, estabelecendo a definição de MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 13 mediação e elencando algumas disposições a respeito. Na Câmara dos Deputados, já em 2002, o projeto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e enviado ao Senado Federal, onde recebeu o número PLC nº 94, de 2002. Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004 (conhecida como “Reforma do Judiciário”), apresentou diversos Projetos de Lei modificando o Código de Processo Civil, o que levou à um novo relatório do PL 94. Foi aprovado o Substitutivo (Emenda nº 1-CCJ), ficando prejudicado o projeto inicial, tendo sido o substitutivo enviado à Câmara dos Deputados no dia 11 de julho. Em 1º de agosto, o projeto foi encaminhado à CCJC, que o recebeu em 7 de agosto. Desde então, dele não se teve mais notícia até meados de 2013 quando voltou a tramitar, provavelmente por inspiração dos projetos que já tramitavam no Senado. O Projeto, em sua última versão, logo no Artigo 1º, propunha a regulamentação da mediação paraprocessual civil que poderia assumir as seguintes feições: prévia; incidental; judicial e extrajudicial. A medição prévia e a mediação incidental A mediação prévia poderia ser judicial ou extrajudicial (Artigo 29). No caso da mediação judicial, o seu requerimento interromperia a prescrição e deveria ser concluído no prazo máximo de 90 dias. A mediação incidental (Artigo 34), por outro lado, seria obrigatória, como regra, no processo de conhecimento, salvo nos casos: a) De ação de interdição; b) Quando for autora ou ré pessoa de direito público e a controvérsia versar sobre direitos indisponíveis; c) Na falência, na recuperação judicial e na insolvência civil; d) No inventário e no arrolamento; e) Nas ações de imissão de posse, reivindicatória e de usucapião de bem imóvel; MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 14 f) Na ação de retificação de registro público; g) Quando o autor optar pelo procedimento do juizado especial ou pela arbitragem; h) Na ação cautelar; i) Quando na mediação prévia não tiver ocorrido acordo nos cento e oitenta dias anteriores ao ajuizamento da ação. A mediação deveria ser realizada no prazo máximo de noventa dias e, não sendo alcançado o acordo, dar-se-ia continuidade ao processo. Assim, a mera distribuição da petição inicial ao juízo interromperia a prescrição, induziria a litispendência e produziria os demais efeitos previstos no Artigo 263 do Código de Processo Civil. Ademais, caso houvesse pedido de liminar, a mediação só teria curso após o exame desta questão pelo magistrado, sendo certo que eventual interposição de recurso contra a decisão provisional não prejudicaria o processo de mediação. Em 2010 o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 125, com base em algumas premissas: a) o direito de acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal além da vertente formal perante os órgãos judiciários, implica acesso à ordem jurídica justa; b) nesse passo, cabe ao Judiciário estabelecer política pública de tratamento adequado dos problemas jurídicos e dos conflitos de interesses, que ocorrem em larga e crescente escala na sociedade, de forma a organizar, em âmbito nacional, não somente os serviços prestados nos processos judiciais, como também os que possam sê-lo mediante outros mecanismos de solução de conflitos, em especial dos consensuais, como a mediação e a conciliação; c) a necessidade de se consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios; MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 15 d) a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já implementados no país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças; e) é imprescindível estimular, apoiar e difundir a sistematização e o aprimoramento das práticas já adotadas pelos tribunais; f) a relevância e a necessidade de organizar e uniformizar os serviços de conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos, para lhes evitar disparidades de orientação e práticas, bem como para assegurar a boa execução da política pública, respeitadas as especificidades de cada segmento da Justiça; O art. 1º da Resolução institui a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, com o objetivo de assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados, deixando claro que incumbe ao Poder Judiciário, além da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão. Para cumprir tais metas, os Tribunais deverão criar os Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, e instalar os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania. A Resolução trata ainda da capacitação dos conciliadores e mediadores, do registro e acompanhamento estatístico de suas atividades e da gestão dos Centros. Em 2009 foi convocada uma Comissão de Juristas, presidida pelo Ministro Luiz Fux, com o objetivo de apresentar um novo Código de Processo Civil. Na redação atualmente disponível do Projeto do novo CPC, podemos identificar a preocupação da Comissão com os institutos da conciliação e da mediação, MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 16 especificamente nos artigos 166 a 176. Atualmente, tramita na Câmara o Projeto de Lei n° 7.169/14 que trata do tema e será examinado mais a diante. Arbitragem A arbitragem surge como uma forma alternativa de resolução de conflitos, colocada ao lado da jurisdição. Sua tônica está na busca de um mecanismo mais ágil e adequado para a solução de conflitos, numa fuga ao formalismo exagerado do processo tradicional e no fato de que o árbitro pode ser uma pessoa especialista na área do litígio apresentado, ao contrário do juiz, que nem sempre tem a experiência exigida para resolver certos assuntos que lhe são demandados. Na arbitragem, as partes maiores e capazes, divergindo sobre direito de cunho patrimonial, submetem o litígio ao terceiro (árbitro), que deverá, após regular procedimento, decidir o conflito, sendo tal decisão impositiva. Há aqui a figura da substitutividade, existindo a transferência do poder de decidir para o árbitro, que por sua vez é um juiz de fato e de direito. A arbitragem pode ser convencionada antes (cláusula compromissória), ou depois (compromisso arbitral) do litígio, sendo certo ainda que o procedimento arbitral pode se dar pelas regras ordinárias de direito ou por equidade, conforme a expressa vontade das partes. Em comparação à arbitragem, na jurisdição, monopólio do Estado e o instrumento ainda mais utilizado na solução dos conflitos no Brasil, não há limites subjetivos (de pessoas) ou objetivos (de matéria). Ademais, ostenta a característica da coercibilidade e autoexecutoriedade, o que não ocorre na arbitragem. Mas, não custa lembrar, jurisdição é apenas monopólio do Estado e não da solução dos conflitos. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DECONFLITOS 17 Mostra-se então a arbitragem como o método mais adequado para a solução e a desformalização de determinados tipos de conflito, bem como para desafogar o Poder Judiciário. Como visto, a arbitragem consiste na solução do conflito por meio de um terceiro, escolhido pelas partes, com poder de decisão, segundo normas e procedimentos aceitos por livre e espontânea vontade das partes. A arbitragem, como se costuma dizer, é um degrau a mais em relação à conciliação, especificamente na intermediação ativa, pois o árbitro, além de ouvir as versões das partes, além de tentar uma solução consensual e de interagir com essas partes, deverá proferir uma decisão de natureza impositiva, caso uma alternativa conciliatória não seja alcançada. Vemos, então, que a crucial diferença entre a postura do árbitro e a postura do mediador é que o árbitro tem efetivamente o poder de decidir, ao passo que o conciliador tem um limite: ele pode sugerir, ele pode admoestar as partes, ele pode tentar facilitar aquele acordo, mas ele não pode decidir aquela controvérsia. Distinção entre a função do árbitro e a do juiz togado Qual seria a distinção entre a função do árbitro e a do juiz togado? É certo que o legislador quis transferir ao árbitro praticamente todos os poderes que o juiz de direito detém. O legislador, na Lei nº 9.307/96, chega a afirmar textualmente, no Artigo 18, que o árbitro é juiz de fato e de direito e a sentença que ele proferir não fica sujeita a recurso ou à homologação pelo Poder Judiciário. Esse dispositivo está em perfeita consonância com o Artigo 475-N, IV, do CPC, que diz ser a sentença arbitral um título executivo judicial. Em outras palavras, por força imperativa de lei, um título que originalmente não é oriundo de um processo jurisdicional, passa a ser tratado e equiparado a uma sentença. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 18 Assim se vê que o legislador deixa claro que tudo aquilo que foi examinado e decidido no procedimento arbitral recebe o mesmo tratamento das matérias que foram examinadas e decididas em um procedimento jurisdicional. Uma vez aberto o processo de execução elas não podem ser arguidas pela parte inconformada. Mas, voltemos ao ponto inicial do raciocínio, ou seja, o quantum de poder do juiz e do árbitro. Uma das características principais da jurisdição é a coercibilidade. O juiz, no exercício de seu mister, tem o poder de tornar coercíveis suas decisões, caso não sejam cumpridas voluntariamente. Ele julga e impõe sua decisão. O árbitro, assim como o juiz, julga. Ele exerce a cognição, avalia a prova, ouve as partes, determina providências, enfim, preside aquele processo. Contudo, não tem ele o poder de fazer valer suas decisões. Em outras palavras, se uma decisão do árbitro não é voluntariamente adimplida, não pode ele, de ofício, tomar providências concretas para assegurar a eficácia concreta do provimento dele emanado. Não vamos entrar aqui na discussão política e constitucional do legislador ao não transferir a coertio ao árbitro. É bem verdade que, se, de um lado, a opção legislativa representa um problema à efetivação da decisão arbitral, por outro, mantém o sistema de freios e contrapesos e a própria harmonia entre as funções do Estado, impedindo a transferência de uma providência cogente, imperativa, a um particular, sem uma forma adequada de controle pelos demais poderes constituídos, o que acabaria por vulnerar o próprio Estado Democrático de Direito. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 19 Assim sendo, pelo sistema atual, em sendo descumprida uma decisão do árbitro, deve a parte interessada recorrer ao Poder Judiciário a fim de emprestar força coercitiva àquela decisão arbitral. Atividade proposta Assista à apresentação de slides sobre a técnica de negociação da Universidade de Harvard. Nos slides é possível perceber os pontos mais importantes dos três livros básicos do programa: Getting to Yes, Getting past no e Getting it done. Após assistir ao conteúdo, escreva um resumo de 15 a 20 linhas sobre os fundamentos principais do método desenvolvido por Roger Fischer e seus colegas. Chave de resposta: Você deve apresentar os quatro fundamentos principais do método proposto pela escola de Harvard: 1. Separe as pessoas dos problemas; 2. Foque nos interesses e não nas posições; 3. Invente opções para ganhos mútuos; e 4. Insista no uso de critérios objetivos. Após, deverá discorrer sobre o uso do BATNA - melhor alternativa a um acordo negociado e as ferramentas para enfrentar o chamado jogo sujo do oponente. Aprenda Mais Material complementar Para saber mais sobre mediação e solução de conflitos, leia o artigo, A mediação e a solução de conflitos no Estado Democrático de Direito, disponível em nossa biblioteca virtual. Para saber mais sobre a arbitragem, leio o artigo, A arbitragem e o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, disponível em nossa biblioteca virtual. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 20 Referências AZEVEDO, Andre Gomma de. Políticas públicas para formação de mediadores judiciais. Meritum – Revista de Direito da Universidade FUMEC, v. 7, n. 2, julho a dezembro de 2012, Belo Horizonte: FUMEC, 2012, p. 103/140. GRECO, Leonardo. Instituições de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1. cap. 01-03. OST, François. Júpter, Hércules, Hermes: tres modelos de juez. DOXA, n. 14, 1993. p. 169-194. Disponível em: http://www.cervantesvirtual.com/buscador/?q=tres+modelos+de+j uez#posicio - Acesso em: 14 nov. 2009. PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Teoria geral do processo civil contemporâneo. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. cap. 25. ____. DURCO, Karol. A mediação e a solução dos conflitos no Estado Democrático de Direito. O “Juiz Hermes” e a nova dimensão da função jurisdicional. Disponível em: http://www.humbertodalla.pro.br RESTA, Eligio (trad. Sandra Vial). O direito fraterno. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2004. SPENGLER, Fabiana Marion. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. Ijuí: Unijuí, 2010. (Coleção direito, política e cidadania; 21). MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 21 Exercícios de fixação Questão 1 (Prova: FCC - 2009 - TJ-AP - Analista Judiciário) O recurso cabível da sentença que julga procedente o pedido de instituição de arbitragem e da sentença que confirma a antecipação dos efeitos da tutela é o de: a) Agravo de instrumento. b) Apelação, só no efeito devolutivo. c) Apelação, no efeito devolutivo e suspensivo e apelação só no efeito devolutivo, respectivamente. d) Apelação, só no efeito devolutivo e apelação, no efeito devolutivo e suspensivo, respectivamente. e) Apelação, no efeito devolutivo e suspensivo. Questão 2 (Prova: FCC - 2006 - BACEN - Procurador) Existindo convenção de arbitragem, o Juiz: a) Extinguirá o processo com apreciação do mérito. b) Suspenderá o processo até que o árbitro apresente seu laudo. c) De ofício, poderá extinguir o processo sem apreciação do mérito. d) Se alegada pelo réu, extinguirá o processo sem apreciação do mérito. e) Transformará o processo judicial em arbitragem, nomeando árbitro para dirimir o litígio. Questão 3 (Prova: TJ-SC - 2010 - TJ-SC - Juiz) Assinale a alternativa correta: I. O processo civil brasileiro adota a regra da eventualidade ao impor ao demandado o dever de alegar na contestação, a um mesmo tempo, todas as defesas que tiver contra opedido do autor, ainda que sejam incompatíveis ou contraditórias entre si, pois na eventualidade de o juiz não acolher uma delas, passa a examinar a outra. II. A convenção de arbitragem não é pressuposto processual por ser matéria de direito dispositivo que, para ser examinada, não dispensa a iniciativa do réu. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 22 Caso o réu não a alegue o processo prossegue e é julgado perante a jurisdição estatal. A ausência de alegação do réu torna a justiça estatal competente para julgar a lide e, por inexistir qualquer invalidade, o processo não será extinto. III. A competência absoluta do juízo é matéria de ordem pública sobre a qual não se opera a preclusão pois não está ligada ao princípio dispositivo uma vez que não se trata de direito disponível. A incompetência absoluta pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, compreendidos os graus de instâncias ordinárias, a saber, primeiro grau de jurisdição, apelação, embargos infringentes, recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça. IV. Em ação de reparação de danos por ato ilícito permite-se ao autor que formulara pedido de reparação de danos patrimoniais acrescer, até a citação do réu, sem audiência deste, ou depois da citação, com a aquiescência deste, o pedido de indenização por dano moral, desde que resultante do mesmo ato ilícito. a) Somente as proposições I e III estão corretas b) Somente a proposição III está correta c) Somente as proposições I e IV estão corretas d) Somente as proposições II e IV estão corretas e) Todas as proposições estão corretas Questão 4 (7º Exame para Estagiário – MPF/RJ). Assinale a alternativa correta: a) A jurisdição não é una, sendo dividida em vários órgãos jurisdicionais com competência repartida geograficamente e em razão da matéria. b) Jurisdição voluntária diferencia-se da jurisdição contenciosa porque nesta há sempre lide, enquanto naquela não. c) A arbitragem não é jurisdição, mas é considerada pela lei como sendo um equivalente jurisdicional, um meio alternativo de solução de conflitos. d) O direito de ação só existe se também existir o direito material alegado pelo autor. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 23 e) Na jurisdição brasileira, a ação não pode ser considerada um direito subjetivo, porque o juiz não tem qualquer dever em prestar a jurisdição. Questão 5 (Prova: TJ-SC - 2010 - TJ-SC - Juiz) Assinale a alternativa correta: I. O comparecimento espontâneo do réu, desde que se dê por citado, acarreta o suprimento do vício da inexistência ou invalidade da citação. Se o réu impugna a existência ou a validade da citação, considera-se citado apenas no momento em que seu advogado for intimado da decisão que reconhece o vício, hipótese todavia em que não se opera a devolução de todo o prazo para contestar mas apenas do termo que sobejar. II. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo- se o teor da anteriormente prolatada. Se o autor apelar é facultado ao juiz decidir, no prazo de cinco dias, por não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação. III. A convenção de arbitragem é o conjunto formado pela cláusula compromissória e pelo compromisso arbitral. A simples existência de cláusula compromissória pode ensejar a arguição da preliminar em contestação. O réu pode alegar que a demanda não pode ser submetida ao juízo estatal, quer diante apenas da cláusula ou compromisso, quer esteja em curso o procedimento arbitral. IV. A incompetência absoluta, em razão da matéria ou funcional (hierárquica) é tema passível de arguição como preliminar de contestação; é matéria de ordem pública não sujeita a preclusão; é alegável por qualquer das partes, a qualquer tempo e grau de jurisdição, sob qualquer forma, a saber, petição simples, exceção, preliminar de contestação, razões, contrarrazões de recurso. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 24 a) Somente as proposições I e IV estão incorretas b) Somente a proposição IV está incorreta c) Somente as proposições II e III estão incorretas d) Somente a proposição I está incorreta e) Todas as proposições estão incorretas MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 25 Desistência, submissão, transação: Tais figuras são acolhidas pelo nosso Código de Processo Civil nos Artigos 267, VIII (extinção do processo, sem resolução de mérito por desistência do autor), e 269, II (extinção do processo com resolução do mérito por reconhecimento, pelo réu, da procedência do pedido), III (transação das partes) e V (renúncia do autor ao direito sobre o qual se funda a ação). Vias alternativas: Tais vias alternativas são hoje largamente difundidas em diversos países, recebendo nomenclatura variada. No Brasil são chamados MASC – Meios Alternativos de Solução de Conflitos. Nos Estados Unidos foram batizados de mecanismos de ADR – “Alternative Dispute Resolution”. Na Argentina são identificados como meios de R. A. C. – Resolución Alternativa de Conflictos. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 26 Aula 1 Exercícios de fixação Questão 1 - B Justificativa: São hipóteses de apelação desprovida de efeito suspensivo, na forma do Artigo 520, incisos VI e VII, do CPC vigente. Questão 2 - D Justificativa: Na forma do Artigo 301, § 4º, c/c com 267, inciso VII, ambos do CPC, a chamada "objeção de convenção de arbitragem" deve ser alegada pelo réu (não pode ser conhecida ex officio pelo magistrado), e neste caso leva à extinção do processo sem exame do mérito. Questão 3 - E Justificativa: Todas as alternativas estão corretas e elencam regras adotadas no CPC vigente. Especificamente quanto à assertiva II, que nos interessa mais de perto neste momento, embora alguns autores classifiquem a convenção de arbitragem como pressuposto objetivo extrínseco do processo, e outros como condição genérica negativa para o regular exercício do direito de ação, fato é que se não for alegada a tempo pelo demandado, não pode ser examinada ex officio pelo magistrado. Nesse passo, a não alegação da matéria não gera qualquer nulidade no processo. Questão 4 - C Justificativa: A arbitragem é um meio paraestatal de solução de conflitos. Não é jurisdição, na concepção stricto sensu do termo, embora a sentença arbitral seja considerada como título executivo judicial pelo Artigo 475-N do CPC. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 27 Questão 5 - E Justificativa: A assertiva I está correta na forma do Artigo 214, § 1º, do CPC. A segunda proposição está correta, na forma do Artigo 285-A. A terceira está em consonância com o Artigo 301, § 4º e 267, inciso VII. Por fim, a quarta está em acordo com a norma do Artigo 113. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 28 Introdução Nesta aula vamos estudar os novos Projetos de Lei de mediação (PL 7.169/2014) e de arbitragem (PL 7.108/2014), bem como os dispositivos do novo CPC que regem a matéria. Nosso objetivo principal vai ser examinar a atual situação das inovações legislativas, bem como apresentar um quadro comparativo a fim de manter a sistemática entre todos esses diplomas. Objetivo: 1. Entender a sistemática da mediação e da arbitragem no CPC projetado; 2. Estudar os Projetos de Lei de mediação do Ministério da Justiça e do Senado Federal e oSubstitutivo apresentado pela Câmara dos Deputados. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 29 Conteúdo A mediação no direito brasileiro Na aula passada vimos a evolução legislativa da mediação no direito brasileiro, desde a década de 90 até a Resolução n° 125 do CNJ. Agora veremos o tratamento da matéria no CPC Projetado e nos Projetos apresentados no Senado Federal e que redundaram no PL 7.169/2014 e no Substitutivo recentemente apresentado. Em 2009 foi convocada uma Comissão de Juristas, presidida pelo Ministro Luiz Fux, com o objetivo de apresentar um novo Código de Processo Civil. Em tempo recorde foi apresentado um Anteprojeto, convertido em Projeto de Lei (nº 166/10), submetido a discussões e exames por uma Comissão especialmente constituída por Senadores, no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. Em dezembro de 2010 foi apresentado um Substitutivo pelo Senador Valter Pereira, que foi aprovado pelo Pleno do Senado com duas pequenas alterações. O texto foi então encaminhado à Câmara dos Deputados, onde foi identificado como Projeto de Lei nº 8.046/2010. No início de 2011 foram iniciadas as primeiras atividades de reflexão sobre o texto do novo CPC, ampliando-se, ainda mais, o debate com a sociedade civil e o meio jurídico, com a realização conjunta de atividades pela Comissão, pela Câmara dos Deputados e pelo Ministério da Justiça. Em agosto, foi criada uma comissão especial para exame do texto, sob a presidência do Dep. Fabio Trad. Já no ano de 2013, sob a presidência do Dep. Paulo Teixeira, foi apresentado um Substitutivo no mês de julho e uma Emenda Aglutinativa Global em outubro. De dezembro de 2013 a março de 2014 foram apresentados e votados diversos destaques. No dia 26 de março o Pleno da Câmara aprovou a versão MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 30 final, que foi remetida ao Senado para exame. Um novo Substitutivo foi apresentado e, finalmente, o texto foi aprovado e remetido à sanção. No dia 17 de março de 2015 foi publicada no DOU a Lei n° 13.105/2015 – Novo Código de Processo Civil. Na redação podemos identificar a preocupação da Comissão com os institutos da conciliação e da mediação, especificamente nos Artigos 165 a 175. O Projeto se preocupa, especificamente, com a atividade de mediação feita dentro da estrutura do Poder Judiciário. Isso não exclui, contudo, a mediação prévia ou mesmo a possibilidade de utilização de outros meios de solução de conflitos (Artigo 175). Atenção Resguardados os princípios informadores da conciliação e da mediação, a saber: (i) independência; (ii) neutralidade; (iii) autonomia da vontade; (iv) confidencialidade; (v) oralidade; e (vi) informalidade. A escolha do mediador É importante frisar, aqui, a relevância de a atividade ser conduzida por mediador profissional. Em outras palavras, a função de mediar não deve, como regra, ser acumulada por outros profissionais, como juízes, promotores e defensores públicos. Neste ponto específico, como um juiz poderia não levar em consideração algo que ouviu numa das sessões de mediação? Como poderia não ser influenciado, ainda que inconscientemente, pelo que foi dito, mesmo que determinasse que aquelas expressões não constassem, formal e oficialmente, dos autos? MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 31 No Artigo 165, §§ 2° e 34°, a Comissão de Juristas, após anotar que a conciliação e a mediação devem ser estimuladas por todos os personagens do processo, refere-se a uma distinção objetiva entre essas duas figuras. A diferenciação se faz pela postura do terceiro e pelo tipo de conflito. Assim, o conciliador pode sugerir soluções para o litígio, ao passo que o mediador auxilia as pessoas em conflito a identificarem, por si mesmas, alternativas de benefício mútuo. A conciliação é a ferramenta mais adequada para os conflitos puramente patrimoniais ao passo que a mediação é indicada nas hipóteses em que se deseje preservar ou restaurar vínculos. Importante ressaltar que a versão original do PLS nº 166/10 exigia que o mediador fosse inscrito nos quadros da OAB. Prestigiou-se o entendimento de que qualquer profissional pode exercer as funções de mediador. Esse registro conterá, ainda, informações sobre a performance do profissional, indicando, por exemplo, o número de causas de que participou, o sucesso ou o insucesso da atividade e a matéria sobre a qual versou o conflito. Esses dados serão publicados periodicamente e sistematizados para fins de estatística (Artigo 167 do Projeto). Aqui vale uma observação... É digno de elogio esse dispositivo por criar uma forma de controle externo do trabalho do mediador, bem como dar mais transparência a seu ofício. Por outro lado, é preciso que não permitamos certos exageros. Não se pode chegar ao extremo de ranquear os mediadores, baseando-se apenas em premissas numéricas. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 32 Um mediador que faz 5 acordos numa semana pode não ser tão eficiente assim. Aquele que faz apenas uma pode alcançar níveis mais profundos de comprometimento e de conscientização entre as partes envolvidas. Da mesma forma, um mediador que tem um ranking de participação em 10 mediações, tendo alcançado o acordo em todas, pode não ser tão eficiente assim. É possível que tenha enfrentado casos em que as partes já tivessem uma predisposição ao acordo ou mesmo que o "nó a ser desatado não estivesse tão apertado". Preocupa-me muito a ideia do apego às estatísticas e a busca frenética de resultados rápidos. Esses conceitos são absolutamente incompatíveis com a mediação. A Comissão, utilizando alguns dispositivos que já se encontravam no Projeto de Lei de Mediação, também se preocupou com os aspectos éticos de mediadores e conciliadores. Nesse sentido, fez previsão das hipóteses de exclusão dos nomes do cadastro do Tribunal, cabendo instauração de procedimento administrativo para investigar a conduta (Artigo 173). Quanto à remuneração, o Artigo 169 do Projeto dispõe que será editada uma tabela de honorários pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Como visto, a preocupação da Comissão é com a mediação judicial. O Projeto não veda a mediação prévia ou a extrajudicial, apenas opta por não regulá-la, deixando claro que os interessados podem fazer uso dessa modalidade recorrendo aos profissionais liberais disponíveis no mercado. Regulamentação da mediação judicial e extrajudicial Com o advento do Projeto do Código de Processo Civil, no ano de 2011 o Senador Ricardo Ferraço apresentou ao Senado o Projeto de Lei nº 517/11, MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 33 propondo a regulamentação da mediação judicial e extrajudicial, de modo a criar um sistema afinado tanto com o futuro CPC como com a Resolução n° 125 do CNJ. Em 2013 foram apensados ao PLS 517 mais duas iniciativas legislativas: o PLS nº 405/2013, fruto do trabalho realizado por Comissão instituída pelo Senado, e presidida pelo Min. Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, e o PLS nº 434/13, fruto de Comissão instituída pelo CNJ e pelo Ministério da Justiça, presidida pelos Mins. Nancy Andrighi e Marco Buzzi, ambos do STJ, e pelo Secretário da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Flavio Croce Caetano. PLS 517 Já com a Resolução 125 do CNJ em vigor, diante das perspectivas de regramento da mediação judicial pelo Novo CPC, e ante a necessidade de tratar de questões concernentes à integraçãoentre a adjudicação e as formas autocompositivas, em agosto de 2011, tivemos a oportunidade de apresentar sugestões ao Senador Ricardo Ferraço, então envolvido com os trabalhos da terceira edição do Pacto Republicano. Formamos grupo de trabalho ao lado das professoras Tricia Navarro e Gabriela Asmar e nos dedicamos à tarefa de redigir um novo Anteprojeto de Lei de Mediação Civil. Apos exame da Consultoria do Senado, foi apresentado o Projeto de Lei do Senado que tomou o número 5171, e que já segue o procedimento legislativo no Senado Federal. O Projeto trabalha com conceitos mais atuais e adaptados à realidade brasileira. Assim, por exemplo, no art. 2° dispõe que “mediação é um processo decisório conduzido por terceiro imparcial, com o objetivo de auxiliar as partes a identificar ou desenvolver soluções consensuais”. 1 O texto pode ser consultado no sítio do Senado Federal, em http://www.senado.gov.br. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 34 Quanto às modalidades, o art. 5° admite a mediação prévia e a judicial, sendo que em ambos os casos pode, cronologicamente, ser prévia, incidental ou ainda posterior à relação processual. É comum encontrarmos referências à mediação prévia e incidental, mas raramente vemos a normatização da mediação posterior, embora esteja se tornando cada vez mais comum (obviamente, há necessidade de se avaliar os eventuais impactos sobre a coisa julgada, o que não será analisado neste trabalho). Outra inovação pode ser vista no critério utilizado para conceituar a mediação judicial e a extrajudicial. Optou-se por desvincular a classificação do local da realização do ato, adotando-se como parâmetro a iniciativa da escolha. Assim, pelo art. 6°, “a mediação será judicial quando os mediadores forem designados pelo Poder Judiciário e extrajudicial quando as partes escolherem mediador ou instituição de mediação privada”. Não foram estabelecidas restrições objetivas ao cabimento da mediação. Basta que as partes desejem, de comum acordo, e que o pleito seja considerado razoável pelo magistrado (art. 7°). A mediação não pode ser imposta jamais, bem como a recusa em participar do procedimento não deve acarretar qualquer sanção a nenhuma das partes (§ 2°), cabendo ao magistrado, caso o procedimento seja aceito por todos, decidir sobre eventual suspensão do processo (§ 4°) por prazo não superior a 90 dias (§ 5°), salvo convenção das partes e expressa autorização judicial. Ainda segundo o texto do Projeto, o magistrado deve “recomendar a mediação judicial, preferencialmente, em conflitos nos quais haja necessidade de preservação ou recomposição de vínculo interpessoal ou social, ou quando as decisões das partes operem consequências relevantes sobre terceiros” (art. 8°). MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 35 Por outro lado, caso se verifique a inadequação da mediação para a resolução daquele conflito, pode o ato ser convolado em audiência de conciliação, se todos estiverem de acordo (art. 13). Enfim, sem ingressar nas questões específicas do Projeto, importante ressaltar a intenção de uniformizar e compatibilizar os dispositivos do Novo CPC e da Resolução n° 125 do CNJ, regulando os pontos que ainda estavam sem tratamento legal. Atualização da Lei de Arbitragem e apresentação do anteprojeto da Lei de Mediação Também no início de 2013 foi constituída comissão sob a Presidência do Min. Luis Felipe Salomão, integrante do Superior Tribunal de Justiça, com o objetivo de atualizar a Lei de arbitragem e apresentar anteprojeto de Lei de mediação. Este Projeto tomou o número 405/2013 e trata apenas da mediação extrajudicial física e eletrônica (mediação online). No texto, a mediação é definida no Artigo 1°, parágrafo único, como “a atividade técnica exercida por terceiro imparcial e sem poder decisório que, escolhido ou aceito pelas partes interessadas, as escuta, e estimula, sem impor soluções, com o propósito de lhes permitir a prevenção ou solução de disputas de modo consensual”. O Artigo 2º estabelece que pode ser objeto de mediação toda matéria que admita composição. Contudo, os acordos que envolvam direitos indisponíveis deverão ser objeto de homologação judicial, e havendo interesse de incapazes, a oitiva do Ministério Público será necessária antes da homologação judicial. O Artigo 15 determina que considera-se instituída a mediação na data em que for firmado o termo inicial de mediação e o Artigo 5° dispõe que “as partes interessadas em submeter a solução de seus conflitos à mediação devem firmar MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 36 um termo de mediação, por escrito, após o surgimento do conflito, mesmo que a mediação tenha sido prevista em cláusula contratual”. O termo final da mediação, firmado pelas partes, seus advogados e pelo mediador, constitui título executivo extrajudicial, independentemente da assinatura de testemunhas (Artigos 22 e 23), e as partes poderão requerer a homologação judicial do termo final de mediação, a fim de constituir título executivo judicial. Finalmente, o Artigo 21 autoriza a realização de mediação via Internet ou por outra forma de comunicação não presencial. Mediação judicial, extrajudicial, pública e online Em maio de 2013, o Ministério da Justiça, por intermédio da Secretaria de Reforma do Judiciário, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça, convocou uma comissão de especialistas para apresentar um anteprojeto de lei sobre mediação judicial, extrajudicial, pública e online. Em seu Artigo 3º o texto determina que pode ser objeto de mediação toda matéria que verse sobre direitos disponíveis ou de direitos indisponíveis que admitam transação. Caso os acordos versem sobre direitos indisponíveis, somente terão validade após a oitiva do MP e homologação judicial. Por outro lado, não haverá mediação judicial nos casos de: a) filiação, adoção, pátrio poder e nulidade de matrimônio; b) interdição; c) recuperação judicial e falência; e d) medidas cautelares. Isso porque, por força do Artigo 26, “a petição inicial será distribuída simultaneamente ao juízo e ao mediador, interrompendo-se os prazos de prescrição e decadência”. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 37 Quanto à mediação extrajudicial, o Artigo 19 determina que as partes interessadas em submeter a solução de seus conflitos à mediação devem firmar um termo inicial de mediação, por escrito, após o surgimento do conflito, mesmo que a mediação tenha sido prevista em cláusula contratual, e, ainda, no Artigo 25, que o termo final de mediação tem natureza de título executivo extrajudicial e, quando homologado judicialmente, de título executivo judicial. Atenção No que se refere à mediação pública, o Artigo 33 autoriza os órgãos da Administração Pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como o Ministério Público e a Defensoria Pública a submeter os conflitos em que são partes à mediação pública. Assim, poderá haver mediação pública nos conflitos envolvendo: a) entes do Poder Público; b) entes do Poder Público e o particular; c) direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos. Por fim, a mediação online, na forma do Artigo 36, poderá ser utilizada como meio de solução de conflitos nos casos de comercializações de bens ou prestação de serviços via Internet, com o objetivo de solucionar quaisquer conflitos de consumo no âmbito nacional. Análise das inovações legislativas em soluçãode conflitos Em novembro de 2013 foram marcadas audiências públicas com o objetivo de discutir os três projetos e amadurecer as questões controvertidas que ainda cercam o tema. O Relator da matéria do Senado, Sen. Vital do Rego, apesentou um Substitutivo ao PLS nº 517/11 com o objetivo de congregar o que há de melhor nas três iniciativas. Foram, então, apresentadas duas emendas pelo MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 38 Sen. Pedro Taques e três pelo Sen. Gim Agnello. A primeira emenda do Sen. Taques foi acolhida integralmente e a segunda, parcialmente. As três apresentadas pelo Sen. Agnello foram desacolhidas. Ultimada a votação, o texto do Substitutivo foi remetido à Câmara, onde foi recebido como Projeto de Lei nº 7.169/2014. Em junho de 2014 o Dep. Sergio Zveiter, integrante da CCJ da Câmara, apresentou um Substitutivo ao PL nº 7.169/2014. O Substitutivo foi aprovado na Câmara e seguiu para o Senado. Mediação pública Uma última palavra sobre duas modalidades presentes no Projeto n° 434/2013, oriundo da Comissão de Juristas convocada pelo Ministério da Justiça: a mediação pública e a mediação online. A primeira vem prevista nos Artigos 33 a 35 e pode ser utilizada sempre que o conflito envolver: a) entes do Poder Público; b) o Poder Público e o particular; c) direitos transindividuais. Há, ainda a previsão de utilização desta modalidade quando Ministério Público ou Defensoria Pública forem partes na demanda. Não há maiores detalhes sobre essa modalidade, o que, provavelmente, vai levar a regulamentações administrativas pela AGU e pelo CNMP. Quanto à Defensoria Pública, provavelmente será editado Decreto pelo Poder Executivo. Interessante notar que o uso da mediação pelo Poder Público já é uma realidade hoje, como se pode aferir pela Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal – CCAF, prevista no Artigo 18 do Decreto nº 7.392/2010. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 39 Ainda nessa linha de raciocínio o PLS nº 405/2013 também prevê tal modalidade nos Artigos 24 e 25, com redação muito semelhante à do PLS nº 434/13. Guardando simetria com esse posicionamento, o PLS nº 406/13, que propõe reforma e atualização da Lei de Arbiragem – Lei nº 9.307/96, prevê a possibilidade, já admitida em sede doutrinária e jurisprudencial, de uso da arbitragem pela Administração Pública no Artigo 1º, § 1º, do texto. Contudo, a hipótese de mediação em ações coletivas não restou contemplada na versão do Substitutivo ao PLS nº 517. Mediação online A segunda modalidade (mediação online) é inspirada na recente Diretiva n° 11/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia que normativa a resolução alternativa de litígios consumeristas, criando uma plataforma digital (RLL) para facilitar esta atividade. Ademais, recentemente houve a regulamentação da resolução de disputa virtual entre consumidores e comerciantes, por meio da PE-COS 80/12 e do Regulamento 524/13. Trata-se de providência extremamente salutar, sobretudo diante do crescimento exponencial dos atos de comércio eletrônico. Não custa lembrar que no Brasil existiam três Projetos de Lei que visavam atualizar o Código de Defesa do Consumidor (PLS nºs 281, 282 e 283 de 2012, que tratam, respectivamente, do comércio eletrônico, da ação coletiva e do superendividamento). Nesse sentido, o PLS nº 281/12 trazia regras específicas para a proteção do consumidor, embora não criasse um sistema eletrônico de prevenção e solução de conflitos. Seria interessante compatibilizar os Projetos nº 281, 405 e 434 de forma que houvesse não apenas uma cláusula geral, mas a previsão de um sistema eletrônico de solução alternativa de conflitos, não apenas para a mediação mas, MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 40 sobretudo, para a conciliação, que acreditamos seja mais adequada para a maioria dos conflitos consumeristas. E, pensando num futuro ainda um pouco distante, me agrada bastante a ideia da adoção de um sistema eletrônico de mediação e conciliação envolvendo direitos transindividuais consumeristas. Certamente haveria um enorme ganho de tempo e economia de recursos com a criação de uma plataforma que pudesse ser utilizada por empresas e consumidores, com eventual recurso ao Poder Judiciário, também em sede eletrônica, caso necessário. Em 27 de março de 2013 o Senado Federal concluiu a análise dos Projetos de modernização do CDC e aprovou apenas as regras sobre superendividamento e comércio eletrônico. Foram excluídas as disposições do PLS nº 282, que tratavam da ação coletiva e das hipóteses de acordos em tais ações. Este fato, aliado à rejeição do PL nº 5139/09, que tratava das ações coletivas, e ainda, a já mencionada omissão da mediação em tais ações no Substitutivo ao PLS nº 517/11, parecem deixar bem clara a posição refratária do Parlamento a esta ferramenta. Lamentamos profundamente tal posição, pois há enorme potencial no uso dos meios alternativos de conflito em sede de tutela coletiva, sobretudo de utilizados em conjunto com as ferramentas do processo eletrônico. Nesse sentido, de se registrar, ao menos, a bela iniciativa constante do Artigo 5º, incisos VI e VII, combinado com Artigo 104-A do Substitutivo ao PLS nº 283, que estabelece o uso de conciliação e mediação na prevenção e tratamento extrajudicial do superendividamento. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 41 Atenção Vistas essas considerações sobre a evolução histórica e as perspectivas para o marco legal da mediação no Brasil, passamos agora a examinar especificamente os dispositivos básicos do Substitutivo apresentado ao PL nº 7.169/14 na Câmara dos Deputados. Projeto de lei n° 7.169 de 2014 COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI Nº 7.169, de 2014. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da Administração Pública; altera a Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997, e o Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972; e revoga o § 2º do art. 6º da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997. O Congresso Nacional decreta: Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da Administração Pública. Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. CAPÍTULO I - DA MEDIAÇÃO MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 42 Seção I Disposições Gerais Art. 2º A mediação será orientada pelos seguintes princípios: I – imparcialidade do mediador; II – isonomia entre as partes; III – oralidade; IV – informalidade; V – autonomia da vontade das partes; VI – busca do consenso; VII – confidencialidade; VIII – boa-fé. § 1º Na hipótese de existir previsão contratual de clausula de mediação, as partes deverão comparecer à primeira reunião de mediação. § 2ª Ninguém será obrigado a permanecer em procedimento de mediação. Art. 3º Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação. § 1º A mediação pode versar sobre todo o conflito ou parte dele. § 2º O consenso das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas transigíveis, deve ser homologado em juízo, exigidaa oitiva do Ministério Público. (...) Seção III Do Procedimento de Mediação Subseção I Disposições Comuns MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 43 Art. 14. No início da primeira reunião de mediação, e sempre que julgar necessário, o mediador deverá alertar as partes acerca das regras de confidencialidade aplicáveis ao procedimento. Art. 15. A requerimento das partes ou do mediador, e com anuência daquelas, poderão ser admitidos outros mediadores para funcionarem no mesmo procedimento, quando isso for recomendável em razão da natureza e da complexidade do conflito. Art. 16. Ainda que haja processo arbitral ou judicial em curso, as partes poderão submeter-se à mediação, hipótese em que requererão ao juiz ou árbitro a suspensão do processo por prazo suficiente para a solução consensual do litígio. § 1º É irrecorrível a decisão que suspende o processo nos termos requeridos de comum acordo pelas partes. § 2º A suspensão do processo não obsta a concessão de medidas de urgência pelo juiz ou pelo árbitro. Art. 17. Considera-se instituída a mediação na data para a qual for marcada a primeira reunião de mediação. Parágrafo único. Enquanto transcorrer o procedimento de mediação, ficará suspenso o prazo prescricional. Art. 18. Iniciada a mediação, as reuniões posteriores com a presença das partes somente poderão ser marcadas com a sua anuência. Art. 19. No desempenho de sua função, o mediador poderá reunir-se com as partes, em conjunto ou separadamente, bem como solicitar das partes as informações que entender necessárias para facilitar o entendimento entre aquelas. Art. 20. O procedimento de mediação será encerrado com a lavratura do seu termo final, quando for celebrado acordo ou quando não se justificarem novos esforços para a obtenção de consenso, seja por declaração do mediador nesse sentido ou por MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 44 manifestação de qualquer das partes. Parágrafo único. O termo final de mediação, na hipótese de celebração de acordo, constitui título executivo extrajudicial e, quando homologado judicialmente, título executivo judicial. Subseção II Da Mediação Extrajudicial Art. 21. O Convite para iniciar o procedimento de mediação extrajudicial poderá ser feito por qualquer meio de comunicação e deverá estipular o escopo proposto para a negociação, a data e o local da primeira reunião. Parágrafo único. O convite formulado por uma parte à outra considerar-se-á rejeitado se não for respondido em até 30 (trinta) dias da data de seu recebimento. Art. 22. A previsão contratual de mediação deverá conter, no mínimo: I - Prazo mínimo e máximo para a realização da primeira reunião de mediação, contado a partir da data de recebimento do convite; II - Local da primeira reunião de mediação; III - Critérios de escolha do mediador ou equipe de mediação; IV – Penalidade em caso de não comparecimento da parte convidada à primeira reunião de mediação. § 1º A previsão contratual pode substituir a especificação dos itens acima enumerados pela indicação de regulamento, publicado por instituição idônea prestadora de serviços de mediação, no qual constem critérios claros para a escolha do mediador e realização da primeira reunião de mediação. § 2º Não havendo previsão contratual completa, deverão ser observados os seguintes critérios para a realização da primeira reunião de mediação: MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 45 I - Prazo mínimo de 10 (dez) dias úteis e prazo máximo de 3 (três) meses, contados a partir do recebimento do convite; II - Local adequado a uma reunião que possa envolver informações confidenciais; III - Lista de 5 (cinco) nomes, informações de contato e referências profissionais de mediadores capacitados. A parte convidada poderá escolher, expressamente, qualquer um dos 5 (cinco) mediadores. Caso a parte convidada não se manifeste, considerar-se-á aceito o primeiro nome da lista. IV - O não comparecimento da parte convidada à primeira reunião de mediação acarretará a assunção, por parte desta, de 50% (cinquenta por cento) das custas e honorários sucumbenciais caso venha a ser vencedora em procedimento arbitral ou judicial posterior, que envolva o escopo da mediação para a qual foi convidada. § 3º Nos litígios decorrentes de contratos comerciais ou societários que não contenham clausula de mediação, o mediador extrajudicial somente cobrará por seus serviços caso as partes decidam assinar o termo inicial de mediação e permanecer, voluntariamente, no procedimento de mediação. Art. 23. Se, em previsão contratual de clausula de mediação, as partes se comprometerem a não iniciar procedimento arbitral ou processo judicial durante certo prazo ou até o implemento de determinada condição, o árbitro ou o juiz suspenderá o curso da arbitragem ou da ação pelo prazo previamente acordado ou até o implemento dessa condição. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às medidas de urgência em que o acesso ao Poder Judiciário seja necessário para evitar o perecimento de direito. Subseção III Da Mediação Judicial MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 46 Art. 24. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação, pré-processuais e processuais, e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estipular a autocomposição. Parágrafo único. A composição e a organização do centro serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça. Art. 25. Na mediação judicial, os mediadores não estarão sujeitos à prévia aceitação das partes, observado o disposto no artigo 5º desta Lei Art. 26 As partes deverão ser assistidas por advogados ou defensores públicos, ressalvadas as hipóteses previstas na Lei nº 9.099 de 26 de setembro de 1995 e na Lei n.º 10.259 de 12 de julho de 2001. Parágrafo único. Aos que comprovarem insuficiência de recursos será assegurada assistência pela Defensoria Pública. Art. 27. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de mediação. Art. 28. O procedimento de mediação judicial deverá ser concluído em até 60 (sessenta) dias, contados da primeira sessão, salvo quando as partes, de comum acordo, requerem sua prorrogação. Parágrafo único. Se houver acordo, os autos serão encaminhados ao juiz, que determinará o arquivamento do processo e, desde que requerido pelas partes, homologará o acordo, por sentença, o termo final da mediação e determinará o arquivamento do processo. Art. 29. Solucionado o conflito pela mediação antes da citação do réu, não serão devidas custas judiciais finais. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 47 Seção IV Da Confidencialidade e suas Exceções Art. 30. Toda e qualquer informação relativa ao procedimento de mediação será confidencial em relação a terceiros, não podendo ser revelada sequer em processo arbitral ou judicial salvo se as partes expressamente decidirem de forma diversa ou quando sua divulgação for exigida por lei ou necessária para cumprimento de acordo obtido pela mediação. § 1º O dever de confidencialidade aplica-se ao mediador, às partes, a seus prepostos, advogados, assessores técnicos e a outras pessoas de sua confiança que tenham, direta ou indiretamente, participado do procedimento de mediação, alcançando: I – declaração, opinião, sugestão,promessa ou proposta formulada por uma parte à outra na busca de entendimento para o conflito; II – reconhecimento de fato por qualquer das partes no curso do procedimento de mediação; III – manifestação de aceitação de proposta de acordo apresentada pelo mediador; IV – documento preparado unicamente para os fins do procedimento de mediação. § 2º A prova apresentada em desacordo cm o disposto neste artigo não será admitida em processo arbitral ou judicial. § 3º Não está abrigada pela regra de confidencialidade a informação relativa à ocorrência de crime de ação pública. § 4º A regra da confidencialidade não afasta o dever das pessoas discriminadas no caput de prestar informações à Administração Tributária após o termo final da mediação, aplicando-se aos seus servidores a obrigação de manter sigilo MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 48 das informações compartilhadas nos termos do art. 198 da Lei n 5.172, de 25 de outubro de 1966. Art. 31. Será confidencial a informação prestada por uma parte em sessão privada, não podendo o mediador revelá-la às demais, exceto se expressamente autorizado. (...) Art. 48. Esta Lei entra em vigor após decorridos 180 (cento e oitenta) dias de sua publicação oficial.Sala da Comissão, em de de 2015. Mudanças na arbitragem Por fim, falemos um pouco das mudanças que estão por vir em matéria de arbitragem. O novo CPC trata da arbitragem de forma mais moderna e procura integrar o instituto à jurisdição. Apresentaremos a seguir um quadro comparativo entre os dispositivos do CPC vigente e o do projetado: O novo CPC traz diversos dispositivos relativos a arbitragem. Alguns deles são mera repetição de regras já existentes no CPC/73, com algum aperfeiçoamento na redação. Outros trazem inovações já em sintonia com o Projeto de Lei n° 7.108/14 que pretende atualizar a Lei n° 9.307/96, e que será comentado no próximo item. Tabelas comparativas Para facilitar o exame dos dispositivos, apresentamos abaixo uma tabela comparativa contendo a redação dos dispositivos que tratam da arbitragem no antigo e no atual CPC. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 49 CPC 1973 CPC 2015 Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1o É permitida a arbitragem, na forma da lei. O dispositivo, no caput, repete a norma constitucional contida no art. 5°, inciso XXXV e, no parágrafo 1° permite a utilização da arbitragem. Com isso fica positivado entendimento já manifestado pelo STF nos autos da SE 5206, e reproduzido pelo STJ em várias oportunidades. Ademais, fica claro que a arbitragem é chamada a ocupar seu lugar dentre as ferramentas de solução de conflitos, ao lado da jurisdição, da conciliação e da mediação, também expressamente referidas (art. 3°, § 3°). Art. 86. As causas cíveis serão processadas e decididas, ou simplesmente decididas, pelos órgãos jurisdicionais, nos limites de sua competência, ressalvada às partes a faculdade de instituírem juízo arbitral. Art. 42. As causas cíveis serão processadas e decididas pelo órgão jurisdicional nos limites de sua competência, ressalvado às partes o direito de instituir juízo arbitral, na forma da lei. Temos aqui mera atualização redacional, sem mudança de conteúdo. Art. 69. O pedido de cooperação jurisdicional deve ser prontamente atendido, prescinde de forma específica e pode ser executado como: (…) § 1o As cartas de ordem, precatória e MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 50 arbitral seguirão o regime previsto neste Código. Temos aqui a primeira grande inovação. O CPC / 2015 traz para o texto legal diversas normas administrativas já em vigor em matéria de cooperação internacional. Não custa lembrar que a ideia de cooperação, genericamente prevista no art. 6°, se projeta no âmbito internacional e nacional, atingindo todos os órgãos do Estado, bem como os jurisdicionados e seus patronos. Encontramos aqui também a primeira menção à carta arbitral. Trata-se de nova modalidade de comunicação de atos processuais, que se colocará ao lado das Cartas tradicionais (rogatória, precatória e de ordem). A carta arbitral vai concretizar os atos de comunicação originados do árbitro ou do tribunal Arbitral e destinados a um juiz de direito. Havendo a necessidade de comunicação de um árbitro estrangeiro a um juiz brasileiro (por exemplo o pedido de empréstimo de força coercitiva a um mandado de busca e apreensão a ser cumprido em território brasileiro, ou ainda um mandado de apreensão ou penhora de bem, em execução de decisão arbitral), o trâmite poderá ser agilizado em razão dos protocolos de cooperação internacional. Art. 155. Os atos processuais são públicos. Correm, todavia, em segredo de justiça os processos (...) Art. 189. Os atos processuais são públicos. Tramitam, todavia, em segredo de justiça os processos: (...) IV – que versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 51 Trata-se de salutar inovação, na medida em que as arbitragens, em regra, seguem o princípio da confidencialidade, sendo esta, inclusive, uma de suas maiores vantagens. Assim, de nada adiantaria ser confidencial a arbitragem, aí incluídos todos os atos praticados perante o tribunal Arbitral, se tal garantia não fosse estendida aos eventuais atos judiciais que vierem a ser praticados por solicitação do árbitro, via carta arbitral. Com isso, o princípio da publicidade, que rege os atos processuais, é excepcionado quanto o ato se refere ao procedimento arbitral. Embora o dispositivo não traga uma exceção (na verdade, exceção da exceção, o que, em última análise confirma a regra geral!), temos para nós que, se a arbitragem se engloba o Estado ou seus entes, não deve incidir a confidencialidade, razão pela qual não deve ser aplicado o art. 189, IV do novo CPC, sob pena de se violar o art. 37 da Carta de 1988. Art. 201. Expedir-se-á carta de ordem se o juiz for subordinado ao tribunal de que ela emanar; carta rogatória, quando dirigida à autoridade judiciária estrangeira; e carta precatória nos demais casos. Art. 237. Será expedida carta: (...) IV – arbitral, para que órgão do Poder Judiciário pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato objeto de pedido de cooperação judiciária formulado por juízo arbitral, inclusive os que importem efetivação de tutela provisória. Mais uma menção à carta arbitral. Dessa vez o novo CPC é mais específico quanto à finalidade da carta. Poderá ser ela utilizada quando houver necessidade de praticar ato que dependa de força coercitiva. Aí podem ser compreendidos, atos de condução de pessoas, apreensão de bens ou pessoas, penhora física ou eletrônica, ou mesmo atos de efetivação de MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 52 medidas de urgência (cautelares ou antecipatórias), denominadas pelo NCPC de tutelas provisórias. Os atos podem ser praticados pelo próprio juiz (por exemplo, a penhora eletrônica) ou podem ter seu cumprimento efetivado por outrem, por ordem do juiz (por exemplo, as obrigações de fazer, não fazer e desfazer). Art. 202. São requisitos essenciais da carta de ordem, da carta precatória e da carta rogatória: I - a indicação dos juízes de origem e de cumprimentodo ato; II - o inteiro teor da petição, do despacho judicial e do instrumento do mandato conferido ao advogado; III - a menção do ato processual, que Ihe constitui o objeto; IV - o encerramento com a assinatura do juiz. (...) Art. 260. São requisitos das cartas de ordem, precatória e rogatória: I – a indicação dos juízes de origem e de cumprimento do ato; II – o inteiro teor da petição, do despacho judicial e do instrumento do mandato conferido ao advogado; III – a menção do ato processual que lhe constitui o objeto; IV – o encerramento com a assinatura do juiz. (...) § 3º A carta arbitral atenderá, no que couber, aos requisitos a que se refere o caput e será instruída com a convenção de arbitragem e com as provas da nomeação do árbitro e da sua aceitação da função. Não há alteração de conteúdo na cabeça e nos incisos do art. 260. O § 3° dispõe serem aplicáveis à carta arbitral os mesmo requisitos das demais cartas. Contudo, acrescenta mais dois: a convenção de arbitragem e a prova de nomeação e aceitação do árbitro. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 53 Convenção de arbitragem, como já dissemos acima, é o gênero, do qual são espécies a cláusula compromissória e o compromisso. O ato que manifesta tal vontade deve acompanhar a carta, de forma que o magistrado possa ter a certeza que as partes de fato quiseram levar o exame da questão à via arbitral; podem ter feito isso, mediante a elaboração de uma cláusula ou de um compromisso específico e detalhado, ou simplesmente aderindo ao regulamento de um tribunal arbitral. Ademais, devem ser anexados os atos de nomeação e de aceitação do árbitro. Tais documentos são importantes a fim de que fique claro que as partes desejaram conferir tal poder àquele árbitro e que ele o aceitou formalmente. Não custa lembrar que no procedimento arbitral há uma extrema liberdade para a convenção de regras e atribuições dos árbitros. Daí o novo CPC, com aceto, ter exigido a apresentação de todos esses documentos. Art. 209. O juiz recusará cumprimento à carta precatória, devolvendo-a com despacho motivado: I - quando não estiver revestida dos requisitos legais; II - quando carecer de competência em razão da matéria ou da hierarquia; III - quando tiver dúvida acerca de sua autenticidade. Art. 204. A carta tem caráter itinerante; antes ou depois de Ihe ser ordenado o cumprimento, poderá ser apresentada a juízo diverso do que dela consta, a fim de se praticar o ato. Art. 267. O juiz recusará cumprimento a carta precatória ou arbitral, devolvendo-a com decisão motivada quando: I – não estiver revestida dos requisitos legais; II – faltar-lhe competência em razão da matéria ou da hierarquia; III – tiver dúvida acerca de sua autenticidade. Parágrafo único. No caso de incompetência em razão da matéria ou da hierarquia, o juiz deprecado, conforme o ato a ser praticado, poderá remeter a carta ao juiz ou ao tribunal competente. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 54 Não há aqui alteração substancial. Apenas a atualização da redação e a inserção da carta arbitral, para que possa ser regida pelas mesmas disposições aplicáveis à carta precatória. Art. 301. Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar: (...) IX - convenção de arbitragem; (...) § 4o Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de ofício da matéria enumerada neste artigo. Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar: (…) X – convenção de arbitragem; (...) § 5o Excetuadas a convenção de arbitragem e a incompetência relativa, o juiz conhecerá de ofício das matérias enumeradas neste artigo. § 6o A ausência de alegação da existência de convenção de arbitragem, na forma prevista neste Capítulo, implica aceitação da jurisdição estatal e renúncia ao juízo arbitral. O caput do novel art. 337 e seu inciso X não trazem alteração de conteúdo se comparados ao texto do antigo CPC. O novo § 5° insere a incompetência relativa no rol de matérias que não podem ser conhecidas ex officio pelo magistrado, apenas positivando entendimento há muito sumulado pelo STJ (verbete n° 33). O § 6°, por sua vez, deixa clara consequência que já era tranquilamente aceita pela doutrina e jurisprudência. Ou seja: a pré-existência de convenção de arbitragem deve ser expressamente alegada pelo réu. No silêncio, presume-se a renúncia do réu à arbitragem, observando-se que o autor já terá renunciado ao propor a demanda em juízo. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 55 Art. 447. Quando o litígio versar sobre direitos patrimoniais de caráter privado, o juiz, de ofício, determinará o comparecimento das partes ao início da audiência de instrução e julgamento. Art. 359. Instalada a audiência, o juiz tentará conciliar as partes, sem prejuízo do emprego de outros métodos de solução consensual de conflitos, como a mediação e a arbitragem. Embora seja improvável, em razão de todos os atos processuais já praticados, é possível que no momento de abertura da AIJ, as partes rejeitem a proposta renovada de mediação ou de conciliação, mas aceitem a ideia da arbitragem. Nesse caso, deve o juiz: (i) suspender o processo pelo prazo de até seis meses, por convenção das partes, na forma do art. 313, II e § 4°; ou (ii) extinguir o processo, sem resolver o mérito, assim que o juízo arbitral reconhecer sua competência, na forma do art. 482, VII, parte final, que será examinado a seguir. Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (...) VII- pela convenção de arbitragem Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (...) VII – acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer sua competência; O novo art. 485 repete a redação do antigo art. 267, VII e acrescenta mais uma hipótese de não resolução do mérito: o reconhecimento da sua competência por parte do juízo arbitral. Como discutido no IV Forum Permanente de Processualistas Civil, realizado em Belo Horizonte, no fim de 2014, e formalizado no Enunciado n° 235, “o MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 56 reconhecimento da competência pelo juízo arbitral é pressuposto processual negativo e acarreta a extinção do processo judicial”. Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: (...) IV – a sentença arbitral; Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: (...) VII – a sentença arbitral; Temos aqui mera atualização de redação, sem alteração substancial. Art. 575. A execução, fundada em título judicial, processar-se-á perante: (...) IV - o juízo cível competente, quando o título executivo for sentença penal condenatória ou sentença arbitral. Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante: (...) III – o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontram os bens sujeitos à execução ou onde deve ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitadaao juízo de origem. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 57 Temos aqui a repetição da regra geral quanto à competência no cumprimento de sentença originada em órgão diverso (sentença estrangeira, penal condenatória e arbitral). No parágrafo único, encontramos regra excepcional afinada com os princípios do acesso à justiça e da efetividade, flexibilizando, assim, a competência territorial inicialmente fixada. Art. 960. A homologação de decisão estrangeira será requerida por ação de homologação de decisão estrangeira, salvo disposição especial em sentido contrário prevista em tratado. (...) § 3o A homologação de decisão arbitral estrangeira obedecerá ao disposto em tratado e na lei, aplicando-se, subsidiariamente, as disposições deste Capítulo. O novo CPC ratifica a necessidade de homologação de decisões estrangeiras, sejam elas proferidas por juiz togado ou por árbitro. A homologação deve ser requerida ao STJ, observando-se as regras previstas nos arts. 216-A a 216-N do seu Regimento Interno, observadas as modificações introduzidas pela Emenda Regimental n° 18, de 17 de dezembro de 2014, acima referida. Art. 520. A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo. Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que: (...) Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1o Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 58 VI - julgar procedente o pedido de instituição de arbitragem. (Incluído pela Lei nº 9.307, de 23.9.1996) (…) IV – julga procedente o pedido de instituição de arbitragem; Temos aqui mera atualização de redação. Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento. Art. 1015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) III – rejeição da alegação de convenção de arbitragem; O novo Código trabalha com o sistema da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, como regra. Fica extinta a figura do agravo retido e, nas situações excepcionais previstas no Artigo 1015, fica admitida a interposição de agravo de instrumento. Da leitura do dispositivo, percebe-se que o legislador só autoriza o manejo do agravo nas situações em que a decisão interlocutória possa provocar prejuízo iminente, sendo, portanto, desaconselhável, aguardar a sentença para que o competente recurso de apelação possa ser interposto. Uma dessas hipóteses é justamente a rejeição de alegação de arbitragem. Imagine-se, por exemplo, que a arbitragem já esteja em curso e o juiz, provocado por uma das partes, rejeita a alegação formulada na forma do 337, MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 59 X. Com isso o processo prossegue, ao mesmo tempo em que a arbitragem já segue o seu curso. Se nenhuma providência for tomada, corremos o risco de enfrentar a desconfortável situação de coexistência de dois procedimentos, em instâncias diversas, sobre o mesmo fato. A propósito, o STJ, em decisão inovadora, já admitiu a possibilidade de existência de conflito de competência entre juízo de direito e juízo arbitral. STJ, CC 111.230-DF, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 08.05.2013, Informativo STJ, nº 522. Artigo 1.061. O Artigo 33, § 3º, da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação: “Artigo 33. ............................................................. § 3º A decretação da nulidade da sentença arbitral também poderá ser requerida na impugnação ao cumprimento da sentença, nos termos do Artigo 525 e seguintes do Código de Processo Civil, se houver execução judicial”. (NR) A última menção à arbitragem no novo CPC se encontra no Artigo 1.061, que modifica a redação do Artigo 33, § 3° da Lei n° 9.307/96 a fim de substituir a expressão embargos do executado por impugnação, além de fazer a referência ao dispositivo do novo Código. Na verdade, trata-se de atualização terminológica e com o objetivo de conferir uniformidade ao sistema, eis que o referido dispositivo, na sua redação original, ainda tinha por base o sistema executivo anterior à Lei n° 11.232/2005. Além do novo CPC, uma nova iniciativa legislativa foi apresentada no tocante à arbitragem. Desde o início deixando bem claro que não se tratava de uma nova Lei de Arbitragem, mas tão somente de atualizações pontuais, em 2013 foi apresentado o Projeto de Lei do Senado n° 406, fruto do trabalho da Comissão de Juristas presidida pelo Min. Luís Felipe Salomão, do STJ. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 60 Após rápida tramitação, o texto foi aprovado e remetido à Câmara dos Deputados, onde foi autuado como PL 7.108/2014 e ainda aguarda exame final e votação. No texto, é possível perceber a preocupação em preservar o sistema instituído pela Lei n° 9.307/96 e viabilizar a necessária atualização, a fim de compatibilizar o instituto da arbitragem com o texto do CPC e com a jurisprudência dominante nos Tribunais Superiores. Nesse sentido, o projeto vai disciplinar o uso da arbitragem nas relações com a Administração Pública (Artigo 1°,§ 1°), nos contratos consumeristas (Artigo 4°, § 3°), e nas relações trabalhistas (Artigo 4°, § 4°). Também vai viabilizar o uso da carta arbitral (Artigo 22-C), a fim de facilitar a comunicação entre árbitros e juízes togados, nos mesmos moldes preconizados pelo CPC/2015. O projeto traz ainda uma solução bem razoável para fixação de competência de árbitros e magistrados quando a arbitragem já foi pactuada, mas ainda não instituída (Artigo 22-A e B), a fim de solucionar eventuais conflitos de competência quanto ao deferimento ou não de medidas de urgência. Finalmente, regulamenta o direito de retirada do acionista dissidente que não concordar com a inserção da convenção de arbitragem no estatuto social das Companhias regidas pela Lei n° 6.404/76, inserindo nesse Diploma o Artigo 136-A. Artigos “Art. 1º (...) § 1º A Administração Pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis. § 2º A autoridade ou o órgão competente da Administração Pública direta para a celebração de convenção de arbitragem é a mesma para a MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 61 realização de acordos ou transações.” (NR) “Art. 2º (...) § 3º As arbitragens que envolvam a Administração Pública serão sempre de direito e respeitarão o princípio da publicidade.” (NR) “Art. 4º (...) § 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se for redigida em negrito ou em documento apartado. § 3º Na relação de consumo estabelecida por meio de contrato de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar expressamente com a sua instituição. § 4º Desde que o empregado ocupe ou venha a ocupar cargo ou função de administrador ou diretor estatutário, nos contratos individuais de trabalho poderá ser pactuada cláusula compromissória, que só terá eficácia se o empregado tomar a iniciativa de instituir a arbitragemou se concordar expressamente com a sua instituição.” (NR) “CAPÍTULO IV-B DA CARTA ARBITRAL. Art. 22-C. O árbitro ou o tribunal arbitral poderá expedir carta arbitral, para que o órgão jurisdicional nacional pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato solicitado pelo árbitro. Parágrafo único. No cumprimento da carta arbitral será observado o segredo de justiça, desde que comprovada a confidencialidade estipulada na arbitragem.” “CAPÍTULO IV-A DAS TUTELAS CAUTELARES E DE URGÊNCIA. Art. 22-A. Antes de instituída a arbitragem, as partes poderão recorrer ao Poder Judiciário para a concessão de medidas cautelares ou de urgência. Parágrafo único. Cessa a eficácia da medida cautelar ou de urgência se a parte interessada não requerer a instituição da arbitragem no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data da efetivação da respectiva decisão. Art. 22-B. Instituída a arbitragem, caberá aos árbitros manter, modificar ou revogar a medida cautelar ou de urgência concedida pelo Poder Judiciário. Parágrafo único. Estando já instituída MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 62 a arbitragem, as medidas cautelares ou de urgência serão requeridas diretamente aos árbitros.” Art. 3º A Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 136-A na Subseção “Direito de Retirada” da Seção III de seu Capítulo XI: “Art. 136-A. A aprovação da inserção de convenção de arbitragem no estatuto social, observado o quorum do art. 136, obriga a todos os acionistas da companhia, assegurado ao acionista dissidente o direito de retirar-se da companhia mediante o reembolso do valor de suas ações (art. 45). § 1º A convenção somente terá eficácia após o decurso do prazo de 30 (trinta) dias, contado da publicação da ata da Assembleia Geral que a aprovou. § 2º O direito de retirada previsto acima não será aplicável: I – caso a inclusão da convenção de arbitragem no estatuto social represente condição para que os valores mobiliários de emissão da companhia sejam admitidos à negociação em segmento de listagem de bolsa de valores ou de mercado de balcão organizado que exija dispersão acionária mínima de 25% (vinte e cinco por cento) das ações de cada espécie ou classe; II – caso a inclusão da convenção de arbitragem seja efetuada no estatuto social de companhia aberta cujas ações sejam dotadas de liquidez e dispersão no mercado, nos termos das alíneas “a” e “b” do inciso II do art. 137 desta Lei.” (NR) Atividade proposta Tendo em vista o texto do Substitutivo apresentado ao Projeto de Lei nº 7.169/2014, disserte sobre as principais características e aponte as diferenças entre a sistemática da mediação judicial e da extrajudicial. Chave de resposta: Devem ser apontadas as questões relativas aos limites objetivos e subjetivos ao uso da mediação, o momento, os requisitos para ser mediador, a necessidade de homologação judicial para acordos extrajudiciais em matéria de direitos indisponíveis. Por fim devem ser abordadas as questões relativas à duração do procedimento e às consequências do acordo. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 63 Aprenda Mais Material complementar Para saber mais sobre os assuntos tratados nesta aula, leia os artigos de Fabiana Gonçalves e de Fabiana Spengler, ambos publicados na Revista Eletrônica de Direito Processual, disponível em nossa biblioteca virtual. Referências ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezende de. O princípio da adequação e os métodos de solução de conflitos. Revista de Processo, Revista dos Tribunais: São Paulo, nº 195, ano 2010. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Breve noticia sobre la conciliación em el proceso civil brasileño. Temas de Direito Processual. 5ª série. Rio de Janeiro: Saraiva, 1994. p. 95/101. _______. Privatização do processo? Temas de direito processual. 7ª série. Rio de Janeiro: Saraiva, 2001. p. 7/18. CALMON, Petrônio. Fundamentos da mediação e da conciliação. Rio de Janeiro: Forense, 2008. CAPPELLETTI, Mauro [s/ indicação de tradutor]. Os métodos alternativos de solução de conflitos no quadro do movimento universal de acesso à justiça. Revista de Processo, v. 74, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 82/97. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 64 DUZERT, Yann. Mediação no Brasil: uma forma de negociar baseada na abordagem de ganhos mútuos. In: ARROW J. Kenneth et al. (Org.). Barreiras para resolução de conflitos. Saraiva: São Paulo, 2001. p. 327/349. ______. A mediação no direito brasileiro: evolução, atualidades e possibilidades no projeto do novo código de processo civil. In: JAYME, Fernando Gonzaga. FARIA, Juliana Cordeiro de. LAUAR. Maira Terra (Org.). Processo civil: novas tendências em homenagem ao Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Del Rey: Belo Horizonte, 2011. p. 295/313. ______. O Novo CPC e a mediação: reflexões e ponderações. Revista de Informação Legislativa, ano 48, nº 190, tomo I, abr.-jun. 2011, p. 219/236. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os conflitos como processo de mudança social. Revista de Direito Administrativo, n. 219, p. 219-227, jan./mar. 2000. GONÇALVES, Fabiana Marcello. Mediação pós-judicial: um caminho alternativo rumo à pacificação social. Revista Eletrônica de Direito Processual, v. IX, disponível em: http://www.redp.com.br MANCUSO, Rodolfo de Camargo. A resolução dos conflitos e a função judicial no contemporâneo estado de direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. MORAIS, José Luis; MARION SPENLGER, Fabiana. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição!. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 65 PELUSO, Antonio Cezar. RICHA, Morgana de Almeida [Coord.]. Conciliação e mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011. PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Mecanismos de solução alternativa de conflitos: algumas considerações introdutórias. Revista Dialética de Direito Processual, v. 17, p. 09/14, São Paulo: Oliveira Rocha, 2004. ______. (Org.). Teoria geral da mediação à luz do projeto de lei e do direito comparado. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. ______. Mediação: a redescoberta de um velho aliado na solução de conflitos. In: Acesso à justiça: efetividade do processo (Org. Geraldo Prado). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 105/124. ______. A mediação e o Código de Processo Civil projetado. Revista de Processo, ano 37, v. 207, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 213/238. RODRIGUES JÚNIOR, Walsir Edson. A prática da mediação e o acesso à justiça. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 66 Exercícios de fixação Questão 1 Assinale a alternativa que melhor define a mediação: a) É a atividade imposta às partes, que se obrigam a obedecer a decisão do mediador. b) É um sinônimo para conciliação, não havendo nenhuma diferença entre os institutos. c) É a atividade desempenhada pelo árbitro. d) É vedada no direito brasileiro. e) É a atividade de um terceiro neutro e imparcial que não tem o poder de decidir o conflito. Questão 2 De acordo com a sistemática do novo CPC, o juiz ao receber a petição inicial e verificando que é possível o consenso, pode determinar diversas providências. Neste momento, deve o magistrado dar especial atenção ao princípio da adequação. Marque, dentre as alternativas abaixo, aquela que indica providência que não pode ser determinadapelo juiz neste momento. a) Designar audiência de conciliação. b) Marcar sessão de mediação. c) Designar audiência especial com o magistrado. d) Determinar a realização de audiência de justificação para apreciar requerimento de tutela de urgência. e) Determinar a realização de arbitragem incidental. Questão 3 (BIO-RIO - 2014 - EMGEPRON - Advogado) Nos termos da lei de arbitragem, o árbitro deve: a) Ser de nível superior. b) Possuir ensino médio completo. c) Ser da confiança das partes. d) Sofrer nomeação pelo juiz. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 67 Questão 4 De acordo com as regras do PL 7.108/14, se já há convenção de arbitragem, mas esta não foi ainda formalmente instituída, a quem cabe decidir eventual requerimento de medida de urgência: a) Ao árbitro, pois as partes já manifestaram sua opção por essa forma de solução de conflitos. b) Ao juiz de direito, pois a arbitragem não foi instituída ainda e, assim sendo, vale a o princípio constitucional do acesso à justiça previsto no Artigo 5°, inciso XXXV, da Carta de 1988. c) Tanto ao árbitro como ao juiz, observada a regra de prevenção do CPC, aplicável por analogia. d) Nem ao árbitro e nem ao magistrado; neste interim não pode ser solicitada medida cautelar. e) Em princípio ao magistrado, por força do princípio do acesso à justiça, salvo se houver dispositivo expresso no contrato. Questão 5 Considere: I. Inépcia da petição inicial. II. Conexão. III. Defeito de representação. IV. Convenção de arbitragem. V. Falta de caução que a lei exige como preliminar. De acordo com a sistemática do CPC projetado, o juiz conhecerá de ofício as matérias enumeradas SOMENTE em: a) I, II e V b) I, II, III e V c) I, II, IV e V d) III e IV e) II, III e V MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 68 Aula 2 Exercícios de fixação Questão 1 - E Justificativa: O que distingue a mediação da arbitragem e da jurisdição é justamente a ausência do poder de decidir. O mediador tenta remover os obstáculos ao consenso, fazendo com que as partes reflitam melhor sobre o litígio e busquem, por elas próprias, as possíveis soluções. A qualquer momento, qualquer das partes pode desistir ou interromper o procedimento de mediação. Questão 2 - E Justificativa: O novo CPC se preocupa especialmente com o primeiro momento de tentativa de acordo, tanto que inverte a ordem adotada pelo CPC vigente para que ele ocorra antes da resposta do réu. Combinando-se o Artigo 139. Questão 3 - C Justificativa: O Artigo 13 da Lei nº 9.307/96 assim determina. Não há requisitos adicionais para que alguém seja árbitro. Normalmente será alguém que tenha expertise na matéria objeto do conflito, mas pelo texto da lei, basta que seja da confiança das partes. Questão 4 - B Justificativa: É a regra do Artigo 22-A do PL nº 7.108/2014 e que procura compatibilizar os poderes do árbitro e do magistrado neste momento em que já há a opção pela arbitragem mas ainda não houve a instauração formal do procedimento. Questão 5 - B Justificativa: Mantendo a mesma regra do CPC vigente, o novo Código também vai considerar a convenção de arbitragem como matéria que deve ser, MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 69 necessariamente, arguida pela parte interessada, sob pena de preclusão. Desta forma, não pode ela ser apontada como matéria de ordem pública. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 70 Introdução Nesta aula, examinaremos a questão da mediação obrigatória e os possíveis reflexos do tema no direito brasileiro, a partir da opção legislativa feita pela Itália em 2010. Veremos também como a questão é tratada no CPC projetado e as consequências para o sistema processual brasileiro da adoção desse instituto sob o prisma da efetividade do processo. Objetivo: 1. Examinar o instituto da mediação obrigatória, suas características e consequências a partir da sistemática do direito italiano; 2. Estudar como os projetos de lei brasileiros tratam do tema, desde o Projeto de Lei nº 94, passando pelo novo CPC e chegando ao Projeto de Lei nº 7.169/14. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 71 Conteúdo A mediação na Europa No sistema europeu, a política de valorização da solução consensual de conflitos entrou na ordem do dia na European Judicial Area, desencadeada a partir da edição da Diretiva 52, de 21 de maio de 2008, pelo Parlamento Europeu, oriunda da recomendação fundamental lançada em 1998 (98/257/CE) e em 2001 (2001/310/CE), obrigando cada estado-membro a refletir, inserir ou criar textos legais que contemplem os mecanismos de solução amigável dos conflitos, o que gerou uma série de alterações significativas nos ordenamentos nacionais de muitos países. Cabe festejar o inegável mérito da Comunidade Europeia ao reconhecer a importância dos meios alternativos de solução de conflitos, trazendo-os formalmente para o âmbito do Direito Comunitário Europeu no intuito de garantir a efetividade do acesso à justiça aos cidadãos europeus, especialmente por se tratar de um ordenamento comunitário que, como bem salientou Flávia Hill, mesmo tendo se originado da congregação de diferentes países, vem se mostrando mais aberto e sensível na detecção das expectativas do cidadão moderno a respeito de um Direito Processual mais ágil, apresentando mais respostas a essa legítima expectativa, do que em alguns de seus estados- membros isoladamente considerados. A diretiva é a primeira intervenção geral com o intuito de promover a resolução alternativa de conflitos e, consequentemente, um melhor acesso à justiça, mais simples e mais rápido, consagrando a mediação nos casos civis e comerciais como o passo necessário no sentido de permitir o desenvolvimento e o funcionamento adequado dos procedimentos extrajudiciais de resolução de litígios. Apesar de a norma, por ser comunitária, ter como foco imediato a regulação de conflitos transnacionais, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 72 entendem que a adoção da mediação, mesmo no cenário interno dos países, significaria: maior rapidez na solução das controvérsias; baixo custo a ser dispendido; a previsão de uma maior disposição das partes envolvidas no cumprimento espontâneo; e a preservação da relação amigável entre os interessados. Conceito de mediação Seguindo os parâmetros citados, a diretiva adotou como conceito de mediação, em seu Artigo 3º, tratar-se de um processo estruturado, independentemente da sua designação ou do modo como lhe é feita referência, através do qual duas ou mais partes em litígio procuram voluntariamente alcançar um acordo sobre a resolução do seu conflito com a assistência de um mediador. Esse processo pode ser iniciado pelas partes, sugerido ou ordenado por um tribunal ou imposto pelo direito de um estado-membro, excepcionando sua adoção em matéria tributária, administrativa e de responsabilidade civil do Estado. Destaca-se contudo que: A mediação deve ser precipuamente voluntária, gozando os litigantes de liberdade para a busca desse meio para a solução de seus conflitos, ressalvada a possibilidade de previsão de sua realização de forma obrigatória pelos estados-membros, desde que não venha impedir o acesso à justiça. A mediação também deve ser pautada pela informalidade, detendo as partesampla liberdade para organizar o procedimento a ser adotado na mediação. Os tribunais são autorizados a fixarem prazo máximo para duração das ações, pois, de outra forma, seria permitido às partes encerrarem a mediação a qualquer tempo. Há possibilidade de incentivo à mediação pelos tribunais, quando oportuno, bem como promoção de formação e capacitação de mediadores em cada estados-membro. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 73 Tem-se, com a normatização do ordenamento interno dos países, o intuito de dar executoriedade aos acordos obtidos na mediação e assegurar a confidencialidade da mediação – inclusive em relação à divulgação de informações para instrução de processo judicial, salvo quando esteja envolvido interesse de menor ou execução do acordo de mediação, situações em que será possível divulgar as informações. Regulamentação da mediação Seguindo o que preceitua o Artigo 12 da Diretiva 2008/52/CE, que prevê o dever dos estados-membros de criarem normas que lhe deem cumprimento, o Parlamento Italiano editou a Lei nº 69, de 18 de junho de 2009, que, além de dispor sobre matérias relacionadas ao desenvolvimento econômico e às alterações do Código de Processo Civil, trouxe no Artigo 60 o instituto da mediação, delegando ao governo, dentro do prazo máximo de seis meses a partir da entrada em vigor da referida lei, a edição de um decreto legislativo destinado a regulamentá-la nos âmbitos civil e comercial no ordenamento italiano. Exercendo então a delegação outorgada pela Lei nº 69/2009, o governo italiano editou o Decreto Legislativo nº 28, de 4 de março de 2010, a fim de regulamentar a mediação na Itália, seguindo as regras gerais preestabelecidas por aquela lei. São elas: A mediação deveria ser contemplada no decreto legislativo como meio de solução de litígios envolvendo direitos disponíveis; e deveria ser instituído um registro dos organismos de mediação mantido pelo Ministério da Justiça. A possibilidade de a Ordem dos Advogados e demais conselhos profissionais instituírem órgãos de mediação. A possibilidade de nomeação de peritos pelo mediador, caso entenda necessário; a previsão regulamentada dos honorários dos mediadores, a serem majorados, em caso de celebração de acordo. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 74 Previsão do dever conferido ao advogado de informar seu cliente sobre a possibilidade de mediação, antes da instauração do processo judicial. A previsão de vantagens fiscais para a celebração de acordo. Possibilidade de condenação do vencedor no processo judicial ao reembolso das despesas em favor do vencido, caso tenha recusado, na ocasião da mediação, proposta feita pelo mediador, cujo conteúdo corresponda inteiramente à decisão judicial. Vedação à duração superior a quatro meses para a mediação. Garantia de imparcialidade, neutralidade e independência do mediador, e previsão de que o acordo tenha eficácia executiva, revestido de título executivo para fins de hipoteca judicial. Atenção O Decreto Legislativo nº 28, que carrega em seu espírito o desejo de melhorar o sistema italiano de mediação, realmente o faz, mas com particularidades próprias, movendo-se no contexto europeu, que tem se demonstrado sensível à garantia de um melhor acesso à justiça e, por conseguinte, o acesso aos métodos judiciais e extrajudiciais de resolução de disputas. A justiça europeia O retrato da justiça europeia revela, como bem observado por Vincenzo Vigoriti, o que justifica a busca que tem se verificado na última década pela ADR nos ordenamentos que tradicionalmente dispensavam apreço pela solução de conflitos pela via judicial. Todavia, é inegável que o principal objetivo da reforma é usar a mediação como mais um instrumento para resolver uma grave crise na justiça civil, MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 75 tornando-se instrumento de diminuição da carga de trabalho dos juízes. Aqui está, contudo, a nosso ver, o grande equívoco, como será demonstrado à frente. Sem considerar a terminologia usada pelo legislador e as diferenças entre mediação e conciliação, o fato é que o decreto procura distinguir entre três tipos de mediação: mediazione obbligatoria, mediazione facoltativa e mediazione concordata. Contudo, o núcleo mais significativo que tem sido criticado é a introdução da mediação obrigatória, crítica realizada por juristas italianos que alegam ser inconstitucional a mediação alçançar a condição de admissibilidade do processo judicial como garantia do acesso à justiça. Assim, nos termos do Artigo 5º do Decreto Legislativo nº 28/2010, qualquer pessoa que pretenda levar uma ação a um tribunal versando sobre matéria elencada no rol de litígios enumerados deverá previamente experimentar o processo de mediação nos termos desse decreto ou o procedimento de conciliação previsto no Decreto Legislativo nº 179, de 08 de outubro de 2007, ou ainda o procedimento estabelecido nos termos do Artigo 128 da lei consolidada em matéria bancária e crédito referida no Decreto nº 385, de 1 de setembro de 1993, e em alterações posteriores. A exigência de experimentar a mediação prévia passou a ser exigida a partir de 20 de março de 2011, doze meses após a publicação do decreto. A obrigatoriedade da mediação O uso da mediação como uma condição indispensável para a obtenção de acesso à via judicial, e não como livre escolha das partes que desejam chegar a uma possível pacificação do seu conflito, tem provocado a perplexidade da comunidade jurídica italiana. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 76 A crítica está particularmente no fato de que o Artigo 60 da Lei nº 69/2009 simplesmente prevê a instituição da mediação visando a reconciliação, devendo tal regramento geral ser alcançado sem prejuízo ou redução do acesso à justiça, enquanto o Decreto Legislativo nº 28/2010, num sentido inverso, tem estabelecido, em muitos casos, a mediação como condição de admissibilidade da demanda (Artigo 5º), situação não prevista na Lei nº 69, e também em contraste com essa lei na medida em que a mediação não teria o condão de impedir o acesso à justiça. Obviamente tais limites criados pelo legislador têm suscitado questionamentos pela doutrina acerca de sua legalidade e validade face à Carta do Estado italiano, por conta das inevitáveis repercussões processuais que tal condição pode trazer, como, por exemplo, se essas regras devem englobar também o pedido de reconvenção ou ainda se devem ser aplicadas na intervenção de terceiros. Os argumentos lançados contra a obrigatoriedade da mediação se referem principalmente ao fato de ela se tratar de um obstáculo ilegítimo ao acesso à justiça e que pode retardar excessivamente o processo por quatro meses (tempo máximo estabelecido pelo decreto legislativo) para o exercício da tentativa de mediação. Ademais, há a preocupação com a proteção dos direitos individuais e processuais, bem como com uma possível redução de trabalho de advogados, principalmente em causas menores, pois o Decreto Legislativo nº 28/10 (Artigo 4º, § 3º) impõe ainda a esses profissionais a obrigação de informar ao cliente sobre a possibilidade ou necessidade de submissão à mediação prévia nos casos em que esse requisito é condição de admissibilidade da ação. Também há dúvidas com relação a possíveis problemas de estrutura e a logística que demandará organizar uma rede de órgãos permanentes, situados MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 77 no território nacional, uma vez que podem ocorrer desperdícios de recursos– principalmente na fase inicial. Por outro lado, a favor da obrigatoriedade militam aqueles que entendem que a experiência demonstra que a tentativa prévia de acordo não impede o acesso à justiça, que só é adiada ante o interesse das partes em se submeterem a um procedimento mais rápido e menos dispendioso. Ademais, deve ser considerado o interesse geral no sentido de promover o aperfeiçoamento da administração da justiça. Apesar da mediação forçada implicar numa condição de admissibilidade da demanda, os defensores da obrigatoriedade entendem que se trata de um requisito que pode ser tolerado, desde que o acesso não se torne extremamente difícil e não resulte numa demora sensível para a solução do conflito. Em oposição ao outro grupo, defende-se, por sua vez, que a obrigatoriedade da mediação possibilitará um incremento na oferta de oportunidade de trabalho para os advogados, cujas atividades se enquadrem no novo sistema. Diante disso, algumas associações profissionais ingressaram com ação em face do Ministério da Justiça e do Ministério do Desenvolvimento Econômico perante o TAR Lazio, que decidiu, em 2011, não serem infundadas as dúvidas suscitadas acerca de alguns dispositivos do Decreto Legislativo nº 28/2010 tais como a excessiva delegação constante no Artigo 5º e a mediação, como fase de pré-julgamento, traduzir-se em condição de admissibilidade da ação, impedindo efetivamente o acesso à justiça. Atenção Foi reconhecido o risco de comprometimento da eficácia da proteção judicial, pois o terceiro parágrafo do Artigo 60 da Lei nº 69/2009 exige, na verdade, que o exercício da delegação deveria MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 78 levar a cabo o princípio de que a mediação tem como objetivo principal a reconciliação de litígios relativos a direitos disponíveis, sem, todavia, excluir o acesso à justiça. A obrigatoriedade da mediação na justiça italiana A espera de ouvir o pronunciamento da Corte Constitucional acerca da validade de alguns dispositivos do decreto, algumas associações de advogados italianos solicitaram a não aplicação do instituto pelos tribunais, argumentando que o juiz, a pedido de qualquer uma das partes pode admitir o pedido, recusando- se a aplicar o artigo 5º do decreto por ser incompatível com a Carta Europeia dos Direitos do Homem. Nessa linha de raciocínio, diante da incompatibilidade do instituto face ao direito comunitário, acredita-se que os juízes nacionais podem afastar o conteúdo obrigatório da mediação por se tratar de violação a um princípio geral fundamental da União Europeia. Na verdade, embora o sistema obrigatório de mediação não seja uma novidade na Europa, a crítica que surge é que em nenhum outro país a lei aparenta ser tão invasiva e significativa quanto a prevista na Itália. Veja-se o exemplo extraído da regra contida no artigo 13 do decreto, que prevê a inversão do princípio da sucumbência se a decisão judicial coincidir integralmente com o conteúdo da proposta feita pelo mediador e refutada pela parte, sendo então vencida no julgamento. A regra traz um conteúdo intimidatório contra o advogado e às próprias partes e parece conferir à mediação um valor MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 79 estritamente paraprocessual e não de facilitador de um acordo pelas partes, que seria mais próxima da mediação puramente voluntária e que endossaria sua legitimidade, mesmo que tenha sido planejada como uma condição obrigatória de admissibilidade. No âmbito da União Europeia, o Parlamento Europeu decidiu realizar um balanço prévio, em vista do comunicado sobre a implementação da diretiva referente à mediação previsto para 2013, tendo em conta as maneiras pelas quais os Estados- membros adotaram as medidas para operacionalizar as disposicões da Diretiva 2008/52/CE, os problemas que surgiram e alguns aspectos mais específicos registrados em alguns países, levando a adoção de uma Resolução2, em 13 de setembro de 2011. Como não poderia ser diferente, o Parlamento cita a Itália e seu decreto legislativo n. 28/2010 apontando como ponto mais polêmico a regra que diz respeito à realização da mediação obrigatória em relação a uma série de disputas para as quais, portanto, o acesso à justiça fica condicionado à prévia tentativa de conciliação entre as partes. No entendimento do Parlamento, o parágrafo 2º do artigo 5º da diretiva comunitária permite aos Estados-membros a utilização da mediação de forma obrigatória ou a sujeite a incentivos ou sanções, tanto antes como após iniciado o processo judicial, desde que isso não impeça as partes de exercerem seu direito de buscar o sistema judicial. 2 O texto está disponível em http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=- //EP//TEXT+TA+P7-TA-2011-0361+0+DOC+XML+V0//PT&language=PT#def_1_1 MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 80 Observa ainda que o legislador italiano decidiu reformar seu sistema legal neste sentido com vistas a aliviar a carga de trabalho perante os tribunais, notoriamente congestionados, agilizando assim o tempo de duração dos processos que muitas vezes distorcem o conceito de justiça, traduzindo-se numa verdadeira negação de direitos. Entretanto percebe o Parlamento, que o mecanismo de mediação exigido na lei italiana que condiciona a admissibilidade da demanda judicial em alguns casos especificamente identificados, não tem sido bem recebido pelos operadores jurídicos, que tem impugnado o decreto, mas ressalta que em outros países aonde tornou-se a mediação obrigatória como na Bulgária e na Romênia, tem contribuído para uma disputa rápida, reduzindo a duração excessiva de uma demanda judicial. Apesar da Comissão Europeia ter emitido parecer com observações centralizadas especialmente sobre os mecanismos de sanções3 previstos nos artigos 11 e 13 do D.Lgs. 28/2010 em resposta ao questionamento da Corte de Justiça da UE, a Corte Constitucional Italiana decidiu, após audiência pública realizada em 23 de outubro de 20124, pela inconstitucionalidade de alguns dispositivos do D. Leg. 28/2010, cuja decisão (acórdão 272) publicada em 12 de dezembro de 2012 na Gazzetta Ufficiale5 confirma a existência de excesso de delegação legislativa. Nos termos dos artigos 30 da Lei n. 87/1953 (Norme sulla 3 Parecer formulado pela Comissão Europeia em resposta a Corte de Justiça sobre a mediação obrigatória diante do questionamento de incompatiilidade do D. Legs. 28/2010 com a normativa europeia: <http://www.mondoadr.it/cms/ wp-content/uploads/commissione-Ue-sanzioni- conciliazione.pdf> Acesso em: 14 ago. 2012. 4 Os detalhes sobre a audiência pública podem ser conferidos no site da Corte Constitucional: <http://www.cortecostituzionale.it/documenti/lavori/doc/CC_CL_CC_20121011125729.pdf> 5 Série especial n. 49 de 12/12/12. Disponível em: www.gazzettaufficiale.it. Acesso em: 15 dez. 2012. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 81 Costituzione e sul funzionamento della Corte Costituzionale) e 136 da Constituição Italiana, as disposições de uma norma, quando declaradas inconstitucionais, perdem a sua eficácia a partir do dia seguinte à publicação da decisão pelo tribunal constitucional. Assim, a partir de 13 de dezembro de 2012 a mediação obrigatória foi abolida do ordenamento italiano. Em junho de 2013 foi editado o Decreto legislativo 69, conhecido como "Decreto del fare), que alterou o D.L. 28, ere-introduziu a figura da mediação obrigatória, a partir dos parâmetros fixados pela Suprema Corte Italiana, superando assim o vício formal antes apontado, e refinando a linguagem imprecisa que constava na redação original do D.L. 28. Mediação consensual Apesar de toda a preocupação com o uso da mediação no processo judicial, e mesmo a percepção de suas vantagens, somos de opinião que o melhor modelo é aquele que admoesta as partes a procurar a solução consensual, com todas as suas forças, antes de ingressar com a demanda judicial. Não parece ser ideal a solução que preconiza apenas um sistema de mediação incidental muito bem aparelhado, eis que já terá havido a movimentação da máquina judiciária, quando, em muitos dos casos, isso poderia ter sido evitado. Por outro lado, não concordamos com a ideia de uma mediação ou conciliação obrigatória; é da essência desses procedimentos a voluntariedade. Essa característica não pode ser jamais comprometida, mesmo que sob o argumento de que se trata de uma forma de educar o povo e implementar uma nova forma de política pública. Mas é forçoso reconhecer que em certos casos a mediação e a conciliação devem ser etapas regulamentares do procedimento, na medida em que tais ferramentas se mostram as mais adequadas ao deslinde daquele conflito em especial. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 82 Pensar em uma instância prévia e obrigatória de conciliação, em hipóteses em que se discute apenas uma questão patrimonial, ou impor sanções pela não aceitação de um acordo razoável (como o pagamento das custas do processo ou dos honorários advocatícios, mesmo em caso de vitória, quando aquele valor é exatamente o que foi decidido pelo magistrado na sentença), podem ser soluções válidas – são exemplos do direito inglês e do direito norte-americano que merecem ser estudados. Os exemplos aludidos não devem ser considerados numa mediação, onde há questões emocionais profundas, muitas vezes inconscientes, que demandam tempo, amadurecimento e mútua confiança para serem expostas e resolvidas. Sujeitar a admissibilidade da ação a uma tentativa prévia e obrigatória de mediação, num caso de grande complexidade, acarretará uma das seguintes situações: a) As partes farão uma mediação simulada e, após duas ou três sessões, dirão que o acordo é impossível, preenchendo, dessa forma, a condição legal que lhes foi imposta; b) As partes se submeterão a um procedimento superficial, e verdadeira questão subjacente aquele conflito, que funciona como motor propulsor oculto de toda aquela litigiosidade, não será sequer examinada; c) As partes se recusarão a participar do ato, por saberem que não há condições de viabilidade no acordo, e o juiz rejeitará a petição inicial, por ausência de condição de procedibilidade, o que, provavelmente, acirrará ainda mais os ânimos. Nenhuma dessas hipóteses parece estar de acordo com a índole pacificadora da moderna concepção da jurisdição. Contudo, é forçoso reconhecer que é necessário buscar uma solução para a hipótese na qual a mediação é a solução mais indicada e as partes a recusam sem uma razão plausível. Não se pode permitir que o Judiciário seja utilizado, abusado ou manipulado pelos caprichos MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 83 de litigantes que, simplesmente, querem brigar ou levar o conflito a novas fronteiras. Interesse em agir Reafirmamos aqui nossa opinião no sentido de que as partes deveriam ter a obrigação de demonstrar ao juízo que tentaram, de alguma forma, buscar uma solução consensual para o conflito. Sustentamos, como já dito antes, ampliação no conceito processual do interesse em agir, acolhendo a ideia da adequação, dentro do binômio necessidade-utilidade, como forma de racionalizar a prestação jurisdicional e evitar a procura desnecessária pelo Poder Judiciário ou mesmo ou abuso do direito de ação. Poderíamos até dizer que se trata de uma interpretação neoconstitucional do interesse em agir que adequa essa condição para o regular exercício do direito de ação às novas concepções do Estado Democrático de Direito. Interessante observar que Neil Andrews remete em sua obra ao dever das partes de explicar o motivo da recusa em se submeter aos meios alternativos. Mas essa é apenas uma das facetas dessa visão. A outra, talvez a mais importante, é a consciência do próprio Poder Judiciário de que o cumprimento de seu papel constitucional não conduz, obrigatoriamente, à intervenção em todo e qualquer conflito. Tal visão pode levar a uma dificuldade de sintonia com o Princípio da Indelegabilidade da Jurisdição, na esteira de que o juiz não pode se eximir de sua função de julgar, ou seja, se um cidadão bate às portas do Poder Judiciário, seu acesso não pode ser negado ou dificultado, na forma do Artigo 5º, inciso XXXV, da Carta de 1988. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 84 O juiz e os processos de solução de conflitos O que deve ser esclarecido é que o fato de um jurisdicionado solicitar a prestação estatal não significa que o Poder Judiciário deva, sempre e necessariamente, ofertar uma resposta de índole impositiva, limitando-se a aplicar a lei ao caso concreto. Pode ser que o juiz entenda que aquelas partes precisem ser submetidas a uma instância conciliatória, pacificadora, antes de uma decisão técnica. E isso fica muito claro no Projeto do novo CPC, na medida em que o Artigo 139 confere uma série de poderes ao juiz, sobretudo no que se refere à direção do processo, mencionando expressamente a adequação e a flexibilização mitigada como instrumentos para se alcançar a efetividade. Nesse passo, é evidente que a maior preocupação do juiz será com a efetiva pacificação daquele litígio, e não apenas com a prolação de uma sentença, como forma de resposta técnico-jurídica à provocação do jurisdicionado. Se o novo CPC exige do juiz uma fidelidade absoluta aos princípios constitucionais, convertendo-se, de forma inquestionável, num agente preservador das garantias constitucionais, por outro lado, outorga-lhe instrumentos para que possa conhecer o conflito a fundo, compreendendo suas razões, ainda que metajurídicas, a fim de promover a sua pacificação. Atenção Nesse sentido, é preciso forjar um sistema equilibrado entre a mediação judicial e a extrajudicial, de modo a observar de forma intransigente a garantia do acesso à justiça e manter um Judiciário ágil, rápido e efetivo. Uma vez ajuizada a demanda, assim como temos desenvolvido um sistema de filtros para as causas repetitivas, temos que pensar também um sistema multiportas que se adapte a cada tipo de conflito. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 85 Rede colaborativa Outro ponto que me parece vital é a construção de uma rede colaborativa envolvendo órgãos do Poder Judiciário e setores da sociedade civil organizada que detenha a estrutura necessária para ofertar esse serviço em regime de cooperação. Isso se refere a cartórios extrajudiciais, universidades públicas e privadas, associações de classe, Defensoria Pública, Ministério Público e Advocacia Pública. Pensar apenas na mediação judicial não resolverá o problema da sobrecarga de trabalho, que hoje pesa sobre os ombros dos magistrados. Ao contrário, provavelmente causará um novo boom de demandas, assim como ocorreu com a edição do CDC em 1990 e com a instituição dos Juizados Especiais Civis, em 1995. Diante disso, forçoso reconhecer que, antes de editar nossa futura lei de mediação, temos que construir essa rede e deixá-la preparada para o volume de demandasque está por vir, sob pena de comprometermos esse instituto antes mesmo da sua vigência. Atividade proposta Tendo em vista o conteúdo visto sobre o eventual uso da mediação obrigatória no direito brasileiro, aponte as principais desvantagens apontadas pela doutrina, bem como os efeitos colaterais que podem daí advir. Chave de resposta: Podem ser apresentadas as seguintes considerações: a) Eventual problema de inconstitucionalidade, frente ao Artigo 5°, XXXV, da C.F.; b) Falta de efetividade diante da dificuldade de conseguir o acordo em alguns casos; c) Possível realização de ato simulado apenas para satisfazer a condição legal imposta; d) Possível comprometimento da celeridade; e) Aumento do nível de litigiosidade diante do uso inadequado dos meios alternativos. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 86 Aprenda Mais Material complementar Para saber mais sobre o tema da aula leia os seguinte textos: "O futuro da mediação na Itália", texto de Michele Paumgartten, publicado no vol. XI da Revista Eletrônica de Direito Processual. "Mediação obrigatória", texto de Michele Paumgartten e Humberto Dalla, publicado no XX Congresso Nacional do Conpedi. "Mediação obrigatória - um contra-senso", de autoria de Maria Rita Drummond. Referências ANDREWS, Neil. O Moderno Processo Civil: formas judiciais e alternativas de resolução de conflitos na Inglaterra. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. BONAFE-SCHMITT, Jean-Pierre. Os modelos de mediação: modelos latinos e anglo-saxões de mediação. Meritum – Revista de Direito da Universidade FUMEC, Belo Horizonte, vol. 7, n. 2, jul./dez. 2012, p. 181/228. COSTA E SILVA, Paula. A nova face da justiça: os meios extrajudiciais de resolução de controvérsias. Lisboa: Coimbra Editora, 2009. GABBAY, Daniela Monteiro. Mediação & Judiciário no Brasil e nos Estados Unidos: condições, desafios e limites para a institucionalização da mediação no Judiciário. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013. HILL, FLAVIA. A nova lei de mediação italiana. Revista Eletrônica de Direito Processual, vol. VI, p. 294-321. PAUMGARTTEN, Michele Pedrosa; PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. A Experiência Italo-Brasileira no uso da mediação em resposta à crise do MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 87 monopólio estatal de solução de conflitos e a garantia do acesso à justiça. Revista Eletrônica de Direito Processual, vol. 8, 2011, p. 443-471. Disponível em: http://www.redp.com.br PAUMGARTTEN, Michele Pedrosa; PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Mediación Obligatoria: una versión moderna del autoritarismo procesal. Revista Eletrônica de Direito Processual, vol. 10, p. 210-225, 2012. Disponível em: http://www.redp.com.br PAUMGARTTEN, Michele. O futuro da mediação na Itália após a decisão da Corte Constitucional da República. Revista Eletrônica de Direito Processual, vol. XI. Disponível em: http://www.redp.com.br Exercícios de fixação Questão 1 Tendo em vista a Diretiva n° 52 da Comunidade Europeia e a ideia de institucionalizar a mediação nos estados-membros, é correto afirmar que: a) A diretiva instituiu a mediação obrigatória em todos os países da Comunidade Europeia. b) Todos os países devem instituir mecanismos de solução consensual de conflitos. c) Cada país deve adotar as ferramentas adequadas às suas peculiaridades, desde que contemplem a mediação obrigatória para conflitos em matéria de pequenas causas. d) Os países devem fazer plebiscitos para adotar a mediação obrigatória. e) Nos conflitos em matéria patrimonial, entre partes maiores e capazes, deve ser, necessariamente, adotada a mediação obrigatória. Questão 2 No direito italiano, a mediação obrigatória foi instituída a partir do Decreto Legislativo nº 28 (DL nº 28), editado em março de 2010. Ocorre que, em 2012, a Suprema Corte daquele país considerou esse mecanismo inconstitucional porque: MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 88 a) Ofendia o princípio constitucional do acesso à justiça. b) Atenta contra o princípio da inércia jurisdicional. c) Continha vício formal. d) Dependia de norma regulamentadora até então não editada. e) Dependia de emenda constitucional. Questão 3 Tendo em vista as diretrizes do DL nº 28, aponte a alternativa falsa. a) A mediação deveria ser contemplada no decreto legislativo como meio de solução de litígios envolvendo direitos disponíveis; e deveria ser instituído um registro dos organismos de mediação mantido pelo Ministério da Justiça. b) A possibilidade de a Ordem dos Advogados e demais conselhos profissionais instituírem órgãos de mediação. c) A possibilidade de nomeação de peritos pelo mediador, caso entenda por necessário; e a previsão regulamentada dos honorários dos mediadores, a ser majorado em caso de celebração de acordo. d) Previsão do dever conferido ao advogado de informar seu cliente sobre a possibilidade de mediação antes da instauração do processo judicial. e) Vedação a que a mediação tenha duração superior a sessenta dias. Questão 4 Levando em conta as iniciativas legislativas brasileiras sobre mediação, aponte qual destes diplomas previu, em determinadas hipóteses, a figura da mediação obrigatória: a) Projeto de Lei nº 94/02 b) Projeto de Lei do Senado nº 517/11 c) Projeto de Lei do Senado nº 434/11 d) Projeto de Lei do Senado nº 405/13 e) Projeto de Lei do Senado nº 7.169/14 Questão 5 MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 89 Tendo em vista as disposições do CPC projetado e do PL nº 7.169/14, podemos afirmar que: a) Conciliação e mediação podem ser utilizadas pelo magistrado apenas nos casos expressamente autorizados em lei. b) A mediação obrigatória pode ser utilizada se determinada pelo magistrado. c) O novo CPC prevê apenas a conciliação obrigatória, mas não a mediação obrigatória. d) O novo CPC não prevê mediação obrigatória, mas o nº PL 7.169/14 sim. e) Nem o novo CPC e nem o PL 7.169/14 preveem a mediação obrigatória. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 90 Aula 5 Exercícios de fixação Questão 1 - B Justificativa: Embora alguns países, como a Itália, tenham feito uso da mediação obrigatória, por força de legislação interna, não há nenhuma regra na Diretiva nº 52 nesse sentido. Questão 2 - C Justificativa: Na decisão da Suprema Corte da Itália, ficou assentado que o vício era de forma, ou seja, a instituição da mediação obrigatória não poderia ser feita apenas por decreto legislativo. Posteriormente, em 2013, com a edição do DL nº 69, conhecido com Decreto del fare, o vício foi sanado. Questão 3 - E Justificativa: A última alternativa é falsa, pois o DL dispõe expressamente que a mediação pode ter duração de até quatro meses, sendo permitido, nesse período, que as partes se dirijam diretamente ao magistrado na eventualidade de necessitarem de alguma providência de urgência. Questão 4 - A Justificativa: Apenas o antigo Projeto nº 4.728, depois convertido no PL nº 94/02, previa, em seu Artigo 34 a obrigatoriedade da mediação em determinadas hipóteses. Questão 5 - E Justificativa: Nem o CPC projetado e nem o PL nº 7.169/14 contemplam a figura da obrigatoriedade, mas apenas a conciliação e mediação facultativas. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 91 Introdução Vamos fazer um exame panorâmico do procedimento arbitral a partir das hipóteses de intervenção jurisdicional, em seguida veremos a questão da constitucionalidade, a partir do julgamento da SE nº 5.206 pelo STF, bem como os principais tópicosrelacionados aos limites objetivos e subjetivos ao uso do instituto, à competência e ao procedimento arbitral, desde a fase cognitiva até a execução da sentença arbitral, que é tratada pela Lei nº 9.307/96 e pelo Código de Processo Civil (CPC) como título executivo judicial. Objetivo: 1. Estudar o instituto da arbitragem na legislação brasileira a partir da edição da Lei nº 9.307/96, enfocando, principalmente, a questão da constitucionalidade, dos limites objetivos e subjetivos para sua utilização e os princípios informadores; 2. Analisar as principais questões procedimentais e como elas são tratadas tanto pela Lei nº 9.307/96 como pelo CPC vigente. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 92 Conteúdo Arbitragem no ordenamento brasileiro O ponto central da discussão dizia respeito à autonomia da cláusula compromissória, ou seja, o pacto de arbitragem, feito antes do surgimento do litígio. Pela letra da Lei, declarada constitucional pelo STF, ainda que por maioria, a recusa em cumprir a cláusula daria ensejo ao ajuizamento de demanda especial, com o objetivo de obter em juízo o suprimento judicial da vontade não manifestada (realização da arbitragem). Alguns pontos da Lei nº 9.307/96 foram questionados em arguição incidental de inconstitucionalidade nos autos de homologação de sentença estrangeira, que tramitou pelo STF por mais de cinco anos. Após intensos debates, o Pretório decidiu, por maioria, pela constitucionalidade desses dispositivos, garantindo a efetividade da arbitragem no ordenamento brasileiro. Assim ficou redigida a ementa do julgado. Concluído o julgamento de agravo regimental em sentença estrangeira em que se discutia incidentalmente a constitucionalidade da Lei 9.307/96 – Lei de Arbitragem (v. Informativos 71, 211, 221 e 226). O Tribunal, por maioria, declarou constitucional a Lei 9.307/96, por considerar que a manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória no momento da celebração do contrato e a permissão dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar compromisso não ofendem o art. 5º, XXXV, da CF (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”). Vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence, relator, Sydney Sanches, Néri da Silveira e Moreira Alves, que, ao tempo em que emprestavam validade constitucional ao compromisso arbitral quando as partes de uma lide atual renunciam à via judicial e escolhem a alternativa da arbitragem para a solução do litígio, entendiam inconstitucionais a prévia manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória – dada a indeterminação de seu objeto – e a possibilidade de a outra parte, havendo resistência quanto à instituição da MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 93 arbitragem, recorrer ao Poder Judiciário para compelir a parte recalcitrante a firmar o compromisso, e, consequentemente, declaravam, por violação ao princípio do livre acesso ao Poder Judiciário, a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos da Lei 9.307/96: 1) o parágrafo único do art. 6º; 2) o art. 7º e seus parágrafos; 3) no art. 41, as novas redações atribuídas ao art. 267, VII, e art. 301, IX, do Código de Processo Civil; 4) e do art. 42. O Tribunal, por unanimidade, proveu o agravo regimental para homologar a sentença arbitral. Discutiu-se se não se trataria de uma mera cláusula de conteúdo obrigacional, que deveria resolver-se em perdas e danos apenas, não ensejando a obrigatoriedade da utilização da solução arbitral em detrimento da solução jurisdicional, sobretudo diante dos termos do Artigo 5º, XXXV, CF/88. Contudo, prevaleceu o entendimento de que a livre manifestação de vontade, a previsibilidade das consequências do ato e a existência de lei clara sobre a matéria seriam suficientes para afastar qualquer alegação de inconstitucionalidade. A questão foi ainda discutida sob o ângulo da autonomia da sentença arbitral e a desnecessidade de sua homologação pelo Poder Judiciário, na forma do Artigo 31 da Lei nº 9.307/96. Os principais argumentos utilizados para questionar a inconstitucionalidade são os seguintes: a) Impossibilidade de alguém ser processado ou sentenciado, senão pela autoridade competente (Artigo 5º, LIII, CF); b) Subtração do juiz natural das partes (Artigo 5º, XXXVIII, CF); c) Subtração do devido processo legal (Artigo 5º, LIV, CF) e d) Acesso às vias recursais (Artigo 5º, LV, CF). Arbitragem e inconstitucionalidade A tese da inconstitucionalidade, mesmo antes de ser derrotada no seio do Supremo Tribunal Federal, já era minoritária em sede doutrinária. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 94 Joel Dias Figueira Júnior, defensor da constitucionalidade dos dispositivos, concorda com o exposto acima e enumera ainda outras razões pelas quais deve ser considerada a Lei nº 9.307/96 apta a produzir efeitos: Considerações sobre a Lei nº 9.307/96 a) O acesso à jurisdição estatal não deixa de estar garantido às partes. Pelo contrário, está expressamente permitido no Artigo 33. Caberá à parte interessada demandar ao Judiciário a anulação da sentença arbitral ou interpor embargos à execução (Artigo 33, § 3º, da Lei nº 9.307/96 c/c o Artigo 741, CPC), sempre que haja ocorrido nulidade (Artigo 32) ou alguma das circunstâncias do Artigo 20, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.307/96; b) A execução forçada da sentença somente se dá através da provocação da jurisdição estatal, porque decisão é título executivo judicial, conforme Artigo 584, III, CPC c/c o Artigo 41 da Lei nº 9.307/96 (atente-se ao fato de que hoje o Artigo 584 encontra-se revogado pela Lei nº 11.232/2005. A norma passou a estar contida no Artigo 475-N, CPC). c) As tutelas de urgência acautelatórias, antecipatórias e inibitórias ou coercitivas somente poderão ser efetivadas pelos juízes togados, pois falta aos árbitros a executio. d) Surgindo questão que verse sobre direitos indisponíveis, o árbitro deverá suspender o procedimento arbitral, remetendo as partes às vias ordinárias até que se resolva a questão (Artigo 25 e parágrafo único); e) Caberá ao Poder Judiciário decidir a respeito da instauração do juízo arbitral quando houver cláusula compromissória e resistência de um dos litigantes em cumpri-la (Artigo 7º); f) Os laudos arbitrais estrangeiros estarão sempre sujeitos à homologação pelo STJ (Artigo 35, observado o disposto na EC nº 45/2004, que transferiu essa competência do STF para o STJ). A tese da inconstitucionalidade, mesmo antes de ser derrotada no seio do Supremo Tribunal Federal, já era minoritária em sede doutrinária. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 95 Vista essa questão, falaremos um pouco, agora, dos limites objetivos e subjetivos para o uso da arbitragem. Em relação à irrecorribilidade da decisão proferida pelo árbitro, não há o que se falar em afronta a princípios constitucionais, pois, ambas as partes acordaram em submeter seus litígios a árbitro de sua confiança. Presume-se, então, que haja total fidúcia das partes em relação à decisão que será proferida. Limites objetivos e subjetivos para o uso da arbitragem É bastante amplo o campo de atuação da arbitragem no Brasil. De acordo com o Artigo 1º da Lei nº 9.307/97, apenas podem ser objeto da arbitragem os direitos patrimoniais disponíveis, isto é, aqueles passíveis de conversão monetária e que se encontrem na livre disposição do seu titular. Ficam, portanto, excluídos da arbitragem os direitos não patrimoniais e os indisponíveis. São excluídas as matérias de natureza familiar ou de Estado,ou seja, relativas à capacidade da pessoa ou ao seu estado (p. ex., alimentos, filiação, pátrio poder, casamento etc.), bem como as de ordem fiscal e tributária. As causas de falência, concordata, que envolvam coisas fora do comércio ou que exijam a participação do Ministério Público, também não podem ser submetidas à solução pela via arbitral. As questões excluídas do objeto da controvérsia podem ser apreciadas incidentalmente, com o escopo de esclarecer ou servir de sustentação à matéria de fundo. Essa apreciação incidental não se confunde com a ação declaratória incidental. Se o árbitro não tem jurisdição para conhecer de determinada matéria em sede principal, tampouco a poderá conhecer em sede incidental.Questão controvertida na doutrina é a arbitragem envolvendo entidades de direito público... Veja a seguir. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 96 Arbitragem envolvendo entidades de direito público A questão analisa se os interesses da Administração Pública são sempre indisponíveis e, por isso, insuscetíveis de serem submetidos à arbitragem. O interesse público nem sempre se confunde com o interesse da Administração Pública e, mais do que considerá-lo indisponível, tem‑se que ressaltar que gera efeitos disponíveis. Como exemplo, temos a possibilidade de a Administração Pública transigir a respeito de interesses a ela referidos em processos judiciais, como acontece nos Juizados Especiais (Artigo 10 da Lei nº 10.259/2001). Dessa forma, em se tratando de direito disponível ou de direito com efeitos disponíveis, não há óbice que a Administração Pública se submeta à arbitragem. Com efeito, a edição da Emenda Constitucional nº 19/98, que alterou a redação do § 1º do Artigo 173 da Constituição Federal, abriu caminho para a inovação. Nesse sentido, encontramos a Lei nº 11.079/2004, conhecida como a Lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs) e a Lei nº 11.196, de 2005, que acrescentou dispositivos na Lei Geral da Concessão e Permissão de Serviços Públicos (Lei nº 8.987/2005). O Artigo 11 da Lei das PPPs e o novo Artigo 23-A da Lei de Concessões dispõem que tais contratos poderão “prever o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996”.Esse entendimento vem sendo prestigiado pela doutrina mais moderna e também pela jurisprudência. Relação arbitragem e pessoa Em relação ao sujeito, apenas podem se submeter à arbitragem pessoas capazes (Artigo 1º da Lei nº 9.307/96), sendo a capacidade não compreendida como a capacidade processual, mas sim como a capacidade civil plena, e as pessoas jurídicas. Exige-se, ainda, que os sujeitos possam livremente manifestar sua vontade, não bastando que apenas uma das partes deseje que o litígio não seja levado ao Poder Judiciário. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 97 As exceções a essa regra são os casos de sucessão de empresas e de cessão de contrato. Em se tratando de sucessão de empresas, a incorporadora da signatária da convenção de arbitragem ficará sub‑rogada na obrigação de se sujeitar à arbitragem, como, aliás, ocorre com todos os direitos e obrigações da incorporada (Artigo 1.116, CC). Já o caso de cessão de contrato ocorrerá quando no contrato cedido constar cláusula de sujeição obrigatória à arbitragem, que deverá ser respeitada. Princípios da arbitragem A seguir trataremos da principiologia da Arbitragem. Acompanhe. São princípios da arbitragem: Autonomia da vontade e autonomia privada: as partes maiores e capazes, pessoas físicas ou jurídicas, podem, por livre manifestação de vontade, decidir se submetem à arbitragem, escolhendo o juízo arbitral no lugar do juízo estatal, a lei aplicável (nacional ou estrangeira) ou até o julgamento por equidade, o número de árbitros, o procedimento da arbitragem e o prazo em que a sentença será proferida, caso seja frustrada a conciliação. Eleição da lei aplicável (nacional ou estrangeira): desde que não viole os bons costumes e a ordem pública (Artigo 2º da Lei da Arbitragem e Artigos 9º e 17 da LINDB). Processo legal: a escolha do procedimento não poderá ofender as garantias constitucionais da igualdade, do contraditório, da ampla defesa, da imparcialidade dos árbitros e do livre convencimento motivado. Efeito vinculante da cláusula arbitral: as partes ficam submetidas à sentença arbitral, qualquer que seja o resultado da demanda. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 98 Inevitabilidade dos efeitos da sentença arbitral: a sentença arbitral é acobertada pela coisa julgada material e constitui título executivo judicial, sendo vedado às partes rediscutir a questão no Poder Judiciário. Autonomia entre a cláusula arbitral e o contrato: eventual irregularidade ou invalidade do contrato não compromete a cláusula arbitral. Competência: cabe aos árbitros decidir sobre a existência, sobre a validade e sobre a eficácia da convenção da arbitragem. Convenção de arbitragem Passemos agora à convenção de arbitragem. Convenção de arbitragem é o acordo no qual as partes interessadas se submetem a solução de seus litígios ao juízo arbitral, seja por meio de cláusula compromissória, seja por meio de compromisso arbitral (Artigo 3º). A cláusula compromissória e o compromisso arbitral são, portanto, espécies de convenção de arbitragem. A cláusula compromissória refere‑se ao futuro, sendo inserida no contrato, para que qualquer litígio que se origine do contrato no qual está inserido a cláusula seja submetido à arbitragem, sendo, por isso, denominada antecedente natural da arbitragem. Deve sempre ser estipulada por escrito, nunca pode ser presumida (Artigo 4º, § 1º). Ao redigir a cláusula, os contratantes podem ou não instituir algum tribunal arbitral ou entidade especializada. Nesse caso, se ocorrer a necessidade de instauração da jurisdição privada, a sua instituição e processamento realizar‑se‑ ão de acordo com as respectivas regras internas da instituição escolhida. Essa é a chamada arbitragem institucional, que possui inúmeras instituições e escritórios de advocacia especializados na sua consecução, como a American MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 99 Arbitration Association e o International Chamber of Commerce. As partes poderão ainda estabelecer na própria cláusula, ou em documento diverso, a forma convencionada para a instituição da arbitragem, chamada arbitragem ad hoc. Cláusula Compromissória Diante do novo sistema, a cláusula compromissória reveste--se de força vinculante ou cogente. É obrigatória entre os contratantes e é autônoma em relação ao contrato em que é inserida, de modo que a nulidade do contrato não implicará a nulidade da arbitragem. Desse modo, uma vez eleita a via paraestatal da arbitragem, as partes não mais poderão recorrer ao Judiciário, salvo em caso de distrato ou pelas demais hipóteses específicas previstas em lei, como na hipótese de reconhecimento do pedido, suspeição, incompetência, nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção arbitral, nulidade da sentença arbitral. A cláusula compromissória pode ser inserida no contrato conforme a vontade das partes, onde convencionaram e se comprometeram a submeter à jurisdição privada os litígios, porventura surgidos, e decorrentes do contrato em questão (art. 4º). A cláusula pode estar em um documento anexo também. Contudo, em se tratando de cláusula compromissória em contrato de adesão, que são frequentes nas relaçõesde consumo, a cláusula compromissória só terá eficácia se observar um dos seguintes requisitos: a) redação em documento separado, firmado pela parte aderente; b) cláusula redigida em negrito, dentro do contexto contratual, com a assinatura ou com o visto do aderente, especialmente lançados para tal cláusula. Institui uma obrigação de fazer, isto é, de instaurar um procedimento arbitral quando do cumprimento do contrato incorrer em litígio. A lei, porém, prevê MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 100 duas situações distintas: uma, que o compromisso tenha disciplinado a matéria (cláusula compromissória cheia) ou quando tenha sido omisso a respeito (cláusula compromissória vazia). Será cheia quando estiverem determinados todos os elementos essenciais para a instituição da arbitragem, que poderá se vincular às regras de algum órgão institucional ou entidade especializada, disciplinar no contrato suas regras ou, ainda, sem previsão específica, seguir a disciplina procedimental do art. 7º da Lei da Arbitragem. Sendo a cláusula compromissória cheia, não será necessária a elaboração do compromisso arbitral, de que trata o art. 9º.6 Explica-se: não se foge à exigência legal do compromisso, mas apenas se percebe que suas disposições já constam na cláusula compromissória cheia. Será vazia quando tais elementos não estão contemplados, ficando sua estipulação diferida para o momento em que a arbitragem efetivamente se mostre necessária. No caso de cláusula compromissória vazia, uma vez nascida a controvérsia, as partes deverão cumprir a cláusula compromissória, firmando o compromisso arbitral. Caso uma das partes se recuse a firmar tal compromisso, a outra parte terá de buscar o Poder Judiciário para suprimento de vontade. A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que se encontra inserta. Trata--se, na verdade, de subcontrato ou contrato acessório, que se reveste de autonomia em relação ao vínculo principal, de forma que a nulidade deste não importa na nulidade daquela. Quem teria competência para declarar a nulidade da cláusula compromissória ou de um contrato que contivesse uma cláusula compromissória? A resposta 6 CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. São Paulo: Atlas, 2004, p. 103. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 101 envolve o estudo da autonomia da cláusula em relação ao contrato em que estiver inserida e o problema da “Kompetenz--Kompetenz”, i.e., competência dos árbitros para decidir sobre sua própria competência, teoria hoje largamente aceita. A convenção de arbitragem decorrente de cláusula contratual expressa e escrita tem por finalidade gerar entre os contratantes o compromisso inarredável de submeterem-se à jurisdição arbitral a solução dos conflitos que, por ventura, surjam em decorrência do contrato principal entre eles firmado, de maneira a excluir terminantemente a busca da tutela pretendida a ser conferida pelo Estado-Juiz. Compromisso arbitral No compromisso arbitral efetivamente se estipulam todos os elementos da arbitragem, dando ensejo à abertura do procedimento por árbitros. O compromisso arbitral pode ser judicial, quando celebrado perante a autoridade judiciária, tomado por termo nos autos, ou extrajudicial, quando se celebra fora de qualquer processo judicial e que se formaliza mediante instrumento público ou por instrumento particular, assinado por duas testemunhas. Qualquer que seja a sua forma, esse compromisso deve obrigatoriamente conter, sob pena de nulidade da arbitragem, os requisitos dos Artigos 10 e 11 da Lei nº 9.307/96 e está regulado no Artigo 9º do referido diploma legal. O compromisso não exige a previsão de arbitragem em cláusula contratual. No compromisso, as partes devem firmar a matéria posta à arbitragem, o que revela sua principal função. Será judicial quando instaurado perante o Estado‑ Juiz, em razão da demanda fundada no Artigo 7º da Lei nº 9.307/96, ou porque, no decorrer do processo principal de conhecimento, as partes, de comum acordo, assim resolveram dispor, extinguindo o processo judicial e iniciando o privado de arbitragem (Artigo 267, VII, CPC). Será celebrado por termos nos autos, em atenção aos requisitos contidos nos Artigo 10 e 21, § 2º, perante o juiz ou o tribunal por onde tramita o processo MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 102 (Artigo 9º, § 1º, Lei nº 9.307/96). Por sua vez, o compromisso extrajudicial será celebrado por escrito particular, firmado pelas partes e por duas testemunhas ou por instrumento público (Artigo 9º, § 2º, Lei nº 9.307/96). Lei nº 9.307/96 A lei brasileira não estabelece procedimento específico para o desenvolvimento da arbitragem, deixando ao alvitre dos interessados ou, subsidiariamente, do árbitro, a eleição do rito a ser seguido (Artigo 21 da Lei nº 9.307/96). Assim, obedecidos aos princípios estabelecidos no Artigo 21, § 2º, como o contraditório, a igualdade das partes, a imparcialidade do árbitro e seu livre convencimento, núcleos da garantia do devido processo legal, qualquer procedimento utilizado é considerado válido, especialmente porque estabelecido pela concordância das partes. Dessa forma, o que não se pode aceitar, ainda que em concordância das partes, é o estabelecimento de procedimento que restrinja o direito ao contraditório e à ampla defesa. Caso se faça necessária a cognição de questão prejudicial para o adequado deslinde da matéria apresentada, o feito deverá ser suspenso até manifestação do Estado-Juiz (Artigo 25, Lei nº 9.307/96). Não há limite de tempo estipulado para essa suspensão. Desenvolvimento da Arbitragem no Brasil Na petição inicial o autor indicará precisamente o objeto da arbitragem, ou seja, o conflito, a lide sobre a qual deverá incidir a arbitragem, acompanhada do documento que represente a cláusula compromissória (art. 7º, § 1º, Lei n. 9.307/96). O ex adverso será citado para comparecer a juízo, em dia e hora pré-determinados pelo juiz, a fim de lavrar o compromisso judicialmente, em audiência designada para esse fim específico (art. 7º, § 2º, Lei n. 9.307/96). MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 103 A ausência injustificada do autor, a essa audiência de lavratura do compromisso, importa em extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 7º, § 5º, Lei n. 9.307/96). Não comparecendo o réu, caberá ao juiz, após ouvir o autor, decidir a respeito do conteúdo do compromisso (art. 7º, § 6º, Lei n. 9.307/96). Aberta a audiência, o juiz tentará, inicialmente, compor a lide amigavelmente, através da transação e da conciliação. Frutificando o acordo, será reduzido a termo, homologado e assinado pelas partes, e valerá como título executivo judicial. Não sendo feliz a tentativa de obter a conciliação, o juiz procurará conduzir as partes à celebração do compromisso arbitral, em comum acordo (art. 7º, § 2º, Lei n. 9.307/96). Frutificado o acordo, será reduzido a termo, homologado e assinado pelas partes, e valerá como título executivo judicial. Não sendo feliz a tentativa de obter a conciliação, o juiz procurará conduzir as partes à celebração do compromisso arbitral, em comum acordo (art. 7º, § 2º, Lei n. 9.307/96). Se as partes não acordarem quanto aos termos do compromisso, o juiz ouvirá os litigantes e, em seguida, decidirá sobre sua celebração e conteúdo ou, não se sentindo habilitado, fará os autos conclusos e proferirá a decisão em 10 dias. Ao decidir, o juiz ficará adstrito aos termos da cláusula compromissória e atenderáaos requisitos definidos nos arts. 10 e 21, § 2º, da Lei de Arbitragem (art. 7º, Lei n. 9.307/96), e, no mesmo ato, nomeará os árbitros indicados na cláusula compromissória. Se por acaso esta for omissa, caberá ao juiz na sentença, nomear um árbitro único para dirimir o conflito em questão (art. 7º, § 4º, Lei n. 9.307/96). A sentença de mérito que acolher o pedido do autor valerá como compromisso arbitral, podendo o interessado vencedor, após o trânsito em julgado, instituir a jurisdição privada (art. 7º, § 7º, Lei n. 9.307/96). Da sentença que julgar MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 104 procedente o pedido de instituição da arbitragem caberá apelação, a qual será recebida sempre no efeito devolutivo (art. 42, Lei n. 9.307/96 c/c o art. 520, VI, CPC). O STJ entendeu que, caso ocorra, é possível o conflito de competência entre um órgão jurisdicional do Estado e uma câmara arbitral, já que a arbitragem tem natureza jurisdicional7. Não caberá ao Estado-juiz decidir acerca da existência, validade ou eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato que contenha a cláusula compromissória. Somente ao árbitro ou tribunal arbitral compete o reconhecimento dessas matérias, seja de ofício ou mediante provocação de qualquer das partes (art. 8º, parágrafo único). A arbitragem considera-se instaurada quando a nomeação do árbitro é aceita por ele, ou por todos os componentes do colegiado indicado, art. 19 (no caso de haver vários árbitros). O art. 22, § 2º, da lei permite que o árbitro requeira à autoridade judiciária, que seria competente para julgar a ação principal, que conduza a testemunha faltosa, desde que instrua o requerimento com a convenção de arbitragem. Dispõe, ainda, o art. 22, § 4º, que ressalvando o contido no § 2º do mesmo artigo, havendo necessidade de implementação de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá--las ao Poder Judiciário que seria competente para julgar a ação principal. Chega, então, a fase da prolação da sentença. Prolação da sentença O principal efeito das sentenças arbitrais é a produção de resultados concretos no plano material e do direito objetivo, reequilibrando a situação fática e 7 STJ, CC 111.230-DF, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 08-05-2013, Informativo STJ, n. 522. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 105 jurídica, constituindo um título executivo judicial, no caso das sentenças condenatórias, e encerrando o juízo arbitral (Artigo 31 da Lei nº 9.307). O árbitro publicará a decisão comunicando às partes, por qualquer meio idôneo, ou designará audiência destinada à leitura, intimação e publicação da sentença arbitral, entregando uma cópia às partes pessoalmente e mediante recibo (Artigo 29, Lei nº 9.307/96). Decorridos os cinco dias destinados à interposição de embargos de declaração (Artigo 30 da Lei nº 9.307/96), a sentença faz coisa julgada material, produzindo-se entre as partes litigantes e seus sucessores os mesmos efeitos de sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário, constituindo título executivo judicial, caso seja de natureza condenatória (Artigo 31). A ressalva é que a sentença arbitral não contém, entre seus efeitos, a expressão de imperium, por não se tratar de ato estatal. Dessa sentença não caberá nenhum tipo de recurso (ressalvados os embargos de declaração que serão dirigidos aos árbitros – Artigo 30), ou homologação pelo Poder Judiciário (Artigo 18); as partes não poderão, tampouco, submeter o mesmo litígio à apreciação do Estado-Juiz ou da jurisdição privada. A sentença deverá ser apresentada na forma escrita (Artigo 24, caput) e assinada pelo árbitro ou árbitros. Caberá ao presidente do tribunal arbitral, no caso de um ou alguns árbitros não poderem ou não desejarem assinar a sentença, certificar tal fato (Artigo 26, parágrafo único). São requisitos indispensáveis à sentença arbitral: a. Relatório: deve conter o nome das partes e um síntese do litígio e das principais ocorrências verificadas durante o procedimento; MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 106 b. Fundamentos da decisão: em que serão analisadas as questões de fato e de direito. Se o julgamento for fundado em equidade, os árbitros devem fazer menção a essa circunstância; c. Disposição ou parte dispositiva: é a conclusão sobre a qual o árbitro ou tribunal solucionou a lide. d. Data e local em que foi proferida. Com exceção deste último item, que é considerado erro material e pode ser corrigido a qualquer tempo, a inobservância dos demais importará em nulidade da sentença arbitral, que será assim declarada e desconstituída pelo Poder Judiciário, mediante provocação do interessado (Artigo 32, III, c/c o Artigo 33). No caso de tribunal arbitral, a sentença é tomada por maioria de votos, prevalecendo, no caso de dissidência invencível, o voto do presidente do tribunal (Artigo 24, § 1º). O árbitro vencido poderá declarar seu voto em separado, o que, todavia, não alterará a substância da decisão, nem terá repercussão em termos de impugnabilidade da sentença. A sentença será proferida no prazo acordado no compromisso ou, na falta dessa estipulação, no prazo máximo de seis meses, a contar da instituição da arbitragem. O prazo pode ser prorrogado quantas vezes as partes acharem necessário. Caso o prazo estipulado expire, a parte interessada comunicará ao árbitro por escrito, ou ao presidente do Tribunal, concedendo‑lhe 10 dias para prolatar e publicar a sentença, sob pena de extinção do compromisso arbitral. Se proferida fora do prazo, resultará em ato nulo (Artigo 32, VII). Concluída a sentença, as partes terão ciência de seu conteúdo, através do envio de cópia da decisão pessoalmente (com recibo), por via postal ou qualquer outro meio de comunicação, com prova de seu recebimento. Caso a sentença seja ultra, extra ou citra petita ela será declarada nula pelo Judiciário (Artigo 32 c/c o Artigo 33). MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 107 Proferida a sentença arbitral, notificadas as partes, pronta estará a decisão para ser cumprida, já que a Lei nº 9.307/96 dispensou de homologação pelo Poder Judiciário a decisão proferida pelos árbitros (Artigo 18). Nulidade da sentença O Artigo 32 da Lei da Arbitragem arrola as hipóteses de nulidade da sentença arbitral. A nulidade da sentença, diante das hipóteses previstas em lei, deve ser pleiteada perante o Poder Judiciário, em demanda que seguirá o rito ordinário, a ser proposta em até noventa dias da data de prolação da sentença arbitral ou de seu aditamento. Ao declarar a nulidade da sentença arbitral, o Poder Judiciário determinará que nova sentença seja proferida, salvo se o fundamento for a vedação da arbitragem naquela situação. Destaque-‑se que tais hipóteses são consideradas taxativas, até como forma de preservação da vontade livre manifestada das partes que desejaram ir ao Poder Judiciário, só podendo, portanto, a arbitragem ser anulada pelo Poder Judiciário, a partir de requerimento, quando houver previsão legal expressa. Contudo, a declaração de nulidade da sentença arbitral também poderá ser pleiteada através dos embargos à execução, hoje impugnação ao cumprimento de sentença, na hipótese de se exigir seu cumprimento em juízo. A nova lei de arbitragem, em seu Artigo 31, concede à sentença arbitral os mesmos efeitos, entre as partes e seus sucessores, da sentença proferida pela autoridade judiciária. Sendo a sentença de natureza condenatória, constituirá título executivo judicial,conforme o Artigo 475‑N, CPC, inserido pela Lei nº 11.232/2005, que revogou o Artigo 584, também do CPC. A sentença arbitral admite qualquer modalidade de execução (execução de quantia certa, de obrigação de fazer e não fazer ou de entrega de coisa). Findo o prazo fixado na sentença arbitral, sem cumprimento espontâneo do preceito MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 108 ali contido, será o título exigível judicialmente, cabendo a propositura da execução. Em se tratando de sentença arbitral estrangeira, porém, ela deverá ser homologada pelo STJ, como ocorre com qualquer sentença alienígena, antes de ser executada no Brasil. Medidas urgentes Tema mais controverso diz respeito à execução das medidas de urgência em sede de arbitragem. O Artigo 22, § 4º, da Lei da Arbitragem prevê que, havendo necessidade de medidas de urgência, o árbitro poderá solicitá-las ao Poder Judiciário. Dessa forma, existiria apenas a execução de sentença arbitral, mas não de uma medida de urgência em sede de arbitragem, já que as concessões da tutela de urgência na arbitragem, bem como sua execução, seriam de responsabilidade do Poder Judiciário, quando provocado pelas partes que se submeteram à arbitragem ou até pelo árbitro. Não obstante tal redação, diversos autores sustentam que o árbitro poderá conceder medidas de urgência, decidindo a seu respeito, e ficando a efetivação da tutela concedida a cargo do Poder Judiciário. De acordo com esse posicionamento, o juízo de concessão ou não da medida fica a cargo do árbitro, sequer podendo ser revista pelo Poder Judiciário, que apenas concretizará a ordem concedida pelo árbitro. De acordo com este último posicionamento, a decisão arbitral concessória de tutela de urgência, se não cumprida voluntariamente pela parte contrária, também deveria ser levada ao Poder Judiciário, para que lá seja coativamente cumprida. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 109 Atividade proposta Leia o julgado do STJ, discorra sobre o princípio denominado "competência- competência" que informa o procedimento arbitral. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E INTERNACIONAL PRIVADO. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA QUE DETERMINE A SUBMISSÃO DE CONFLITO À ARBITRAGEM. Pode ser homologada no Brasil a sentença judicial de estado estrangeiro que, considerando válida cláusula compromissória constante de contrato firmado sob a expressa regência da lei estrangeira, determine – em face do anterior pedido de arbitragem realizado por uma das partes – a submissão à justiça arbitral de conflito existente entre os contratantes, ainda que decisão proferida por juízo estatal brasileiro tenha, em momento posterior ao trânsito em julgado da sentença a ser homologada, reconhecido a nulidade da cláusula com fundamento em exigências formais típicas da legislação brasileira pertinentes ao contrato de adesão. É necessário ressaltar que estamos diante de um caso típico de competência concorrente. Assim, a primeira decisão que transita em julgado prejudica a outra. É da essência do sistema que, se transitar em julgado primeiro a sentença estrangeira, fica prejudicada a brasileira e vice-versa. Assim, a aparente exclusão da sentença estrangeira pelo fato do trânsito em julgado do julgamento brasileiro, sob invocação da soberania nacional, não se segue, porque se está diante de clara competência concorrente. Ademais, o ingresso do pedido de arbitragem anteriormente a todas as várias ocorrências judiciais deve pesar em prol da opção pela homologação da sentença estrangeira que prestigia a opção voluntária das partes pela arbitragem. O Juízo arbitral é que era competente, no início de tudo, para examinar a cláusula arbitral devido ao princípio Kompetenz-Kompetenz, e foi isso que a sentença estrangeira assegurou. Esse princípio, que remonta à voluntariedade da opção arbitral e realça a autonomia contratual, revela o poder do árbitro para analisar e decidir sobre sua própria competência, no que tange à validade e eficácia do pacto arbitral, que lhe outorgou a referida função julgadora. Assim, o tribunal arbitral tem competência para decidir sobre a validade da cláusula compromissória, ou seja, sobre sua própria competência. A propósito, o Protocolo de Genebra de 24/9/1923, subscrito e ratificado com reservas pelo Brasil em 5/2/1932, estabelece a prioridade do Juízo Arbitral sobre a Jurisdição Estatal, estabelecendo uma presunção de competência em favor do Tribunal Arbitral. De outro modo, a negação de homologação de sentença arbitral proferida há tempos em Estado estrangeiro sob o fundamento de ocorrência da anulação da cláusula arbitral por sentença proferida no Brasil significaria a abertura de largo caminho para a procrastinação da arbitragem avençada por parte de contratantes nacionais no exterior. Atente-se que, para bloquear tal arbitragem, bastaria ao contratante brasileiro, após o pedido de instauração da arbitragem no exterior, ingressar com processo anulatório da cláusula arbitral no Brasil MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 110 para, invocando peculiaridades da legislação brasileira, como as especiais exigências nacionais da cláusula de adesão (sobretudo diante do Código de Defesa do Consumidor, com inversão de ônus de prova e outros consectários do direito consumerista nacional), paralisar a arbitragem e judicializar toda a matéria contra a jurisdição estatal no Brasil. Cabe ressaltar que não há empecilho no julgamento brasileiro à homologação porque fundados o julgamento estrangeiro e o nacional em motivos técnico-jurídicos diversos, ou seja, o primeiro, na validade da cláusula arbitral ante os termos da legislação estrangeira, para contrato celebrado no estrangeiro, sem a consideração de restrições existentes no sistema jurídico brasileiro, e o segundo fundado em exigências formais de cláusula em contrato de adesão, típicas da legislação nacional. Inexiste, assim, impedimento à homologação das sentenças estrangeiras em virtude de coisa julgada nacional posterior. Pois, ajuizado o pedido de arbitragem, no Brasil ou no exterior, ao juízo arbitral competia julgar todas as matérias suscitadas pelas partes, inclusive a invalidade da cláusula arbitral, não se autorizando a prematura judicialização perante a atividade jurisdicional estatal. SEC 854-US, Rel. originário Min. Massami Uyeda, Rel. para acórdão Min. Sidnei Beneti, julgado em 16/10/2013. (Informativo n° 533 do Superior Tribunal de Justiça, disponível no sítio www.stj.jus.br.) Chave de resposta: Deve ser abordado o texto do Artigo 8º, parágrafo único, da Lei nº 9.307/96, que assim dispõe: "caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória". Nesse sentido, devem ser ressaltadas as dificuldades concretas de aplicação desse princípio quando no curso da arbitragem sobrevém demanda judicial MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 111 Aprenda Mais Material complementar Para saber mais sobre os assuntos tratados nesta aula, leia os textos de Andre Roque, texto de José Rogério Cruz e Tucci, disponível em nossa biblioteca virtual. Referências ANDRIGHI, Fátima Nancy. Arbitragem nas relações de consumo. Revista de Mediação e Arbitragem, vol. 09, ano 3, abr-jun/2006, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 13/21. BARROSO, Luís Roberto. Sociedade de economia mista prestadora de seviço público. Cláusula arbitral inserida em contrato administrativo sem prévia autorização legal.Invalidade. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, 19, p. 414-439. CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem, ano III. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 96, n. 350, p. 21/29, abr. jun. 2000. CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Aspectos processuais da nova lei de arbitragem. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 93, n. 339, p. 127/141, jul./set. 1997. DINAMARCO. Cândido Rangel. A Arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 112 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução: análise crítica da Lei 9.307, de 23.09.1996. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. LEMES, Selma Maria Ferreira. Arbitragem na concessão de serviços públicos. Arbitrabilidade objetiva. Confidencialidade ou publicidade processual? 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MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 113 Exercícios de fixação Questão 1 (VUNESP - 2013 - TJ-SP - Juiz) Acerca da arbitragem, é correto dizer que: a) É nula a sentença arbitral quando o julgamento de mérito nela contido contrariar lei federal ou alterar a verdade dos fatos. b) A nulidade do contrato no qual se estipulou a cláusula arbitral implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissária. c) A sentença arbitral brasileira não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário. d) Somente o Poder Judiciário pode decidir acerca da validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória, de sorte que, em caso de tal alegação, o Tribunal Arbitral deve submeter a questão ao juiz togado competente. Questão 2 (Prova: CESGRANRIO - 2010 - Petrobrás - Advogado) De acordo com a Lei no 9.307/96, que dispõe sobre a arbitragem, será denegada a homologação para o reconhecimento ou execução da sentença arbitral estrangeira, se constatado que: a) A decisão ofende a ordem pública nacional. b) A sentença arbitral foi proferida fora do território nacional. c) Os efeitos da decisão recairão sobre os sucessores das partes. d) Houve prévia denegação da homologação por vícios formais. e) Há voto em separado de árbitro divergente do da maioria. Questão 3 (CETRO - 2012 - TJ-RJ - Titular de Serviços de Notas e de Registros) Na arbitragem, é correto afirmar que: a) Se, durante o procedimento arbitral, um árbitro vier a ser substituído, a produção de provas não poderá ser repetida. b) A revelia da parte impedirá que a sentença arbitral seja proferida. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 114 c) A produção de provas no procedimento arbitral sempre dependerá do requerimento das partes. d) É nula a sentença arbitral se não decidir todo o litígio submetido à arbitragem. e) A demanda para a decretação de nulidade de sentença arbitral deverá ser proposta no prazo de até 2 (dois) anos após o recebimento da notificação da sentença arbitral ou de seu aditamento. Questão 4 (TJ-DFT - 2012 - TJ-DF - Juiz) Julgue as três proposições que se seguem e assinale a única alternativa correta. I - A sentença arbitral proferida no território nacional constitui título executivo judicial, independentemente de homologação por qualquer órgão do Poder Judiciário. II - A arbitragem pode dar-se por equidade, a critério das partes. Já na sentença judicial, o julgamento por equidade somente é possível nos casos previstos em lei. III - Em razão da eficácia preclusiva da coisa julgada, não se admite a possibilidade de rediscutir as questões que poderiam ter sido suscitadas mas não o foram. Assim, passada em julgado a sentença que julgou procedente o pedido de repetição de indébito, não pode o réu ajuizar ação com a alegação de prescrição para se eximir de cumprir aquela sentença. a) Somente as proposições II e III estão corretas. b) Somente a proposição I está correta. c) Somente a proposição II está correta. d) Todas as proposições estão corretas. Questão 5 (FCC - 2013 - TJ-PE - Titular de Serviços de Notas e de Registros) Sobre a arbitragem, de acordo com a Lei nº 9.307/96, é correto afirmar: a) A demanda para a decretação de nulidade da sentença arbitral seguirá o procedimento comum, previsto no Código de Processo Civil, e deverá ser MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 115 proposta pela parte interessada no prazo de até sessenta dias após o recebimento da notificação da sentença arbitral ou de seu aditamento. b) Sendo nomeados vários árbitros, as partes envolvidas elegerão o presidente do tribunal arbitral e, não havendo consenso entre elas, será designado presidente o mais idoso. c) No prazo de dez dias, a contar do recebimento da notificação ou da ciência pessoal da sentença arbitral, a parte interessada, mediante comunicação à outra parte, poderá solicitar ao árbitro ou ao tribunal arbitral que corrija qualquer erro material da sentença arbitral. d) Nada tendo sido convencionado pelas partes, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contado da instituição da arbitragem ou da substituição do árbitro, podendo ser prorrogado pelas partes e árbitros, havendo comum acordo. e) No procedimento arbitral, em caso de ausência sem justa causa de testemunha convocada para prestar depoimento poderá o árbitro ou o presidente do tribunal arbitral determinar a condução coercitiva da testemunha faltosa requerendo, se necessário, o auxílio de força policial. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 116 Aula 6 Exercícios de fixação Questão 1 - C Justificativa: Esta foi a grande inovação trazida pela Lei nº 9.307/96 e a regra está expressa no Artigo 31 desta Lei. Questão 2 - A Justificativa: É a regra do Artigo 36 da Lei nº 9.307/96, que remete aos Artigo 483 e 484 do CPC. Questão 3 - D Justificativa: Todas as afirmativas são corretas e encontram amparo no Artigo 475-N, III, do CPC e nos arts. 2º e 31 da Lei nº 9.307/96. Questão 4 - A Justificativa: Apenas o mais antigo Projeto, de nº 4728, depois convertido no PL 94 previa, no Artigo 34, a obrigatoriedade da mediação em determinadas hipóteses. Questão 5 - D Justificativa: É a norma prevista no Artigo 23 da Lei nº 9.307/96. Trata-se de prazo residual, uma vez que ao pactuar a arbitragem as partes podem estipular prazo diversos. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 117 Humberto Dalla Bernardina de Pinho é Pós-doutor em Direito (Uconn Law School). Mestre e Doutor em Direito (UERJ). Professor Associado na UERJ e Adjunto Titular na Estácio. Promotor de Justiça no RJ. http://www.humbertodalla.pro.br Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4709300Z6