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DIREITO PROCESSUAL PENAL Dr. Wagner Camargo Gouveia Gouveiaernandes GUIA DA DISCIPLINA 1 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 1. PRINCÍPIOS E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO PENAL Objetivos: Identificar o conceito de Direito Processual Penal; Conhecer as principais características e os princípios que norteiam a aplicação do Direito Processual Penal. Palavras-Chave: Princípios; Processo; Características. O Direito Processual Penal é o ramo jurídico que estuda o conjunto de princípios e regras que envolvem a aplicação jurisdicional do Direito Penal material. Vamos iniciar este primeiro bloco com a conceituação do Processo Penal e os fundamentos de sua existência. Em seguida, passaremos a analisar os princípios que regem a prática do Direito Processual Penal, como o contraditório, a ampla defesa, o devido processo legal e a presunção da inocência. Fonte da imagem: http://www.diariojurista.com/2013/11/controversia-curtir-processo-penal-e.html 1.1. Conceito de Direito Processual Penal O Direito Processual Penal é o ramo do direito público que normatiza a função do Estado de julgar as infrações penais. Em outras palavras, o processo penal pode ser visto como o meio que possibilita o exercício do direito de punir do Estado (o Direito Penal). O processo funciona por meio de um complexo de atos coordenados que visa à apuração de infrações penais e à aplicação das respectivas penas. Em suma, o Processo Penal visa concretizar o direito estatal de punir, ele materializa o Direito Penal. http://www.diariojurista.com/2013/11/controversia-curtir-processo-penal-e.html 2 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Dessa definição, extraímos algumas características. Trata-se de um ramo do Direito autônomo, com normas e princípios próprios. O Direito Processual Penal é instrumental, pois operacionaliza o exercício do Direito Penal. A finalidade a que se propõe o Direito Processual Penal é a de tornar efetivo e atuante o Direito Penal. A ideia de que toda pena desnecessária seria tirânica não é algo novo. Desde a Revolução Francesa e do Iluminismo já existia o entendimento de que a pena tem que ser necessária. Assim, uma vez constatada a culpabilidade do agente, que é o primeiro fundamento da pena, o juiz precisa avaliar a necessidade concreta de imposição da pena, nos termos do que dispõe o artigo 59 do Código Penal (o juiz deve aplicar a pena suficiente e necessária para a prevenção e reprovação do crime). Há casos em que o juiz reconhece a culpabilidade do agente, reconhece o fato punível, mas deixa de aplicar a pena por ser desnecessária. É o caso do perdão judicial, aplicável, por exemplo, no caso do pai que mata filho em acidente de trânsito culposo. O juiz irá proferir uma sentença que reconhece o crime e ao mesmo tempo a extinção da punibilidade (em razão do perdão judicial). 1.2. Princípios e Garantias Constitucionais 1.2.1. Princípio da Intervenção Mínima ou da Necessidade O Princípio da Intervenção Mínima, também chamado de princípio da necessidade, exerce enorme influência sobre o Direito Processual Penal (assim como no próprio Direto Penal). Por limitar um dos bens mais caros aos cidadãos, que é o da liberdade, o processo penal é apenas indicado quando outras esferas do direito não forem suficientes. Do ponto de vista da pena, esse princípio tem sido cada vez mais aplicado. Assim, sempre que há possibilidade de aplicação de outras formas de pena que não a privativa de liberdade, que possam funcionar de forma eficaz, o juiz deverá aplica-las. 1.2.2. Sistemas acusatório e inquisitório Há diferentes tipos de processo penal. O primeiro deles é o inquisitório. Nessa modalidade, o processo é sigiloso, não contraditório e reúne em uma mesma pessoa as funções de acusar, defender e julgar. O réu, nesse sistema é mero objeto de persecução e comumente a tortura é aceita. 3 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O segundo sistema que destacamos é o acusatório: é contraditório, público, imparcial e assegura ampla defesa. Nesse sistema há distribuição das funções de defender, de acusar e de julgar a órgãos distintos. É o sistema que adotamos atualmente. Por fim, o sistema misto envolve uma fase inicial que é inquisitiva, em que há uma investigação preliminar e uma instrução preparatória. Em seguida, há uma fase final, na qual se procede ao julgamento com todas as garantias do processo acusatório. 1.3. Princípio da Jurisdicionalidade O princípio também é conhecido como reserva da jurisdição. Significa que as práticas de determinados atos podem apenas resultar de decisão de um juiz. A discriminação material de competência jurisdicional está fixada no texto da Constituição Federal. Assim, por exemplo, no caso das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI), embora possuam “poderes de investigação próprios das autoridades judiciais”, pelo princípio da Jurisdicionalidade é que se veda às CPIs a prática de atos exclusivos do magistrado, tais como: A prisão, salvo flagrante (CF, art. 5°, LXI); A busca domiciliar (CF, art. 5°, X); - a interceptação ou escuta telefônica (CF, art. 5°, XII); Exercer o poder geral de cautela judicial: isso significa que a CPI não pode adotar nenhuma medida assecuratória real ou restritiva ao direito de liberdade, incluindo-se a apreensão, sequestro ou indisponibilidade de bens ou mesmo a proibição de se afastar do país. 1.3.1. Imparcialidade e poderes instrutórios Não haveria justiça se o magistrado designado para um processo fosse parcial ou se não se colocasse em situação de equidistância entre as partes. A isenção, em relação às partes e aos fatos da causa é condição indispensável para que se tenha um julgamento justo. O juiz deve se colocar entre os litigantes e acima deles: é a primeira condição para que possa exercer sua função dentro do processo. A imparcialidade do juiz é pressuposto para que a relação processual seja válida. Nesse sentido é que se diz que o órgão jurisdicional deve ser subjetivamente capaz. 4 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O juiz subjetivamente capaz é aquele que não tem sua imparcialidade afastada pelo impedimento ou pela suspeição. A imparcialidade do juiz resulta em garantia de ordem pública. É garantia não só das partes, que terão o conflito solucionado de forma justa, como também do próprio Estado, que possui interesse em que lei seja aplicada corretamente, e do próprio juiz, que ficará coberto de qualquer suspeita sobre seus atos (arbítrio ou parcialidade). Para garantir a imparcialidade do juiz, a Constituição lhe estipula garantias (CF, art. 95); vedações (art. 95, § único) e proíbe juízos e tribunais de exceção (art. 5º, inc. XXXVII). No mesmo sentido, o Código de Processo Civil, em seus artigos 134 e 135, enumera os motivos de impedimento e de suspeição do juiz. A imparcialidade do juiz é uma garantia de justiça para as partes. Por isso, têm elas o direito de exigir um juiz imparcial; e a esse direito subjetivo da parte, corresponde o dever do Estado, que reservou para si o exercício da função jurisdicional, de agir com imparcialidade na solução das causas que lhe são submetidas. 1.4. Princípio do Devido Processo Legal O devido processo legal está previsto no art. 5°, inciso LIV, da Constituição Federal. O dispositivo diz que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Em outras palavras, trata-se do direito de não ser privado da liberdade ou de algum bem, sem a garantia que supõe a existência de um processo desenvolvido nos termos legais. Esse princípio está intrinsicamente relacionado a outros princípios como o contraditório, a igualdade das partes,o contraditório é postergado para o processo. O Princípio da Ampla Defesa implica em duas regras básicas: a) Possibilidade de produzir provas; b) Possibilidade de recursos. 38 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Já o Princípio da Verdade Real relaciona-se à regra da liberdade de provas da seguinte forma: todos os meios probatórios em princípio são válidos para comprovar a verdade real. Mas esta regra é absoluta? Não. Esta regra não é absoluta, existem exceções, pois não são admitidas: a) Prova ilícita: são as provas adquiridas por meios ilícitos. Ex.: prova mediante tortura. b) Prova Ilegítima: são as provas colhidas com violação de normas processuais. Ex.: busca domiciliar sem ordem do juiz. O Princípio da Presunção de Inocência postula que todo acusado é presumido inocente até que se comprove a sua culpabilidade. Dele decorrem duas regras: a) Cabe a quem acusa o ônus de provar a culpabilidade; b) Regra de tratamento ao acusado: ele não poder ser tratado como condenado. Mas, tendo em vista este princípio, pode o acusado ser preso durante o processo? Seria está prisão inconstitucional? O acusado pode sim ser preso durante o processo, desde que o juiz fundamente a necessidade da sua prisão cautelar. Isso não fere nenhum princípio constitucional. Outro princípio relevante é o Princípio das fundamentações das decisões. Ele se funda na garantia que tem o acusado de saber quais os motivos do convencimento do juiz, ou seja, quais os motivos que levaram o juiz a decidir desta ou daquela maneira. É por meio deste princípio, aliado ao princípio da publicidade, que o acusado pode exercer o amplo exercício de princípios como o contraditório e a ampla defesa. Alguns autores também destacam a existência de alguns princípios específicos como: a) Imediatidade do juiz: a prova deve ser colhida perante o juiz e, como regra, esse juiz irá julgar (identidade física do juiz); b) Concentração: em regra as provas devem ser produzidas em uma única audiência; - Comunhão das provas: uma vez produzida, a prova pode ser utilizada por ambas as partes; ela não pertence apena à parte que a produziu. 39 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 6.3. Provas Ilegítimas e Ilícitas Outro princípio que merece grande destaque no processo penal é o Princípio da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos. Antes da Constituição Federal atual (CF/88), não havia, no país, regras claras impeditivas de produção da prova obtida por meio ilícito. A única regra nesse sentido era o Artigo 233 do CPP “As cartas particulares, interceptadas ou obtidas por meios criminosos, não serão admitidas em juízo”. No entanto, após a Carta Magna de 1988, tais condutas não são mais possíveis, em face do disposto no art. 5°, LVI. Assim, uma busca e apreensão feita de forma ilegal, uma interceptação telefônica, uma gravação de conversa, uma fotografia de pessoa ou pessoas em seu círculo íntimo, uma confissão obtida por meios de tortura e, enfim, toda e qualquer prova obtida ilicitamente, seja em afronta à Constituição, seja em desrespeito ao direito material ou processual, não será admitida em juízo. Trata-se de uma demonstração de respeito não só à dignidade humana, como, também, à seriedade da Justiça e ao ordenamento jurídico. 6.4. Princípio da Contaminação O princípio da contaminação condena a prova ilícita por derivação. A prova ilícita por derivação é aquela que é lícita se tida isoladamente, mas que por se originar de uma prova ilícita, contamina-se também de ilicitude (Artigo 157, § 1º, do CPP). O princípio se baseia em uma teoria com origem no Direito norte-americano, chamada “fruits of poisonous tree”, ou seja, teoria dos “frutos da árvore envenenada”. Trata- se de uma metáfora que ilustra com propriedade a ideia da prova ilícita: se a árvore é envenenada, seus frutos serão contaminados. Mas há exceções. Se não evidenciado o nexo de causalidade entre a prova subsequente e a prova anterior tida como ilícita, então ela será considerada lícita. Da mesma forma, se a prova em questão puder ser obtida por fonte independente da ilícita, também não será contaminada (Artigo 157, § 1º, do CPP). 6.5. Teorias da Fonte Independente e descoberta A teoria da fonte independente postula que se o órgão de persecução penal demostrar que alcançou de forma legítima novos elementos com base em uma fonte 40 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância autônoma de prova, ou seja, que não tenha qualquer relação de dependência, decorrência ou vínculo causal com a prova originariamente ilícita, tais dados probatórios são admissíveis, porque não foram contaminados pelo vício da ilicitude originária. Há ainda a teoria do descobrimento inevitável. De acordo com ela, não se impede a admissão de provas obtidas por meios ilícitos se essas provas teriam sido descobertas inevitavelmente por meio de atividades investigatórias lícitas, sem qualquer relação com a violação. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso; DELMANTO JR., Roberto; DELMANTO, Roberto. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito – Procedimento Policial. 12ª. Ed. Goiânia: AB, 2009. 41 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 7. PROVAS EM ESPÉCIE NO PROCESSO PENAL Objetivos: Explorar os princípios e teorias que orientam as provas no nosso processo penal; Analisar cada uma das principais espécies de prova. Palavras-chave: Provas; Partes: Documentos Eugênio Pacelli Oliveira define prova como reconstrução dos fatos investigados no processo, buscando a maior coincidência possível com a realidade histórica, isto é, com a verdade dos fatos, tal como efetivamente ocorridos no espaço e no tempo. (OLIVEIRA, 2003, p. 301). 7.1. Prova Pericial É o exame realizado por profissional com conhecimentos técnicos, a fim de contribuir com o julgador na formação de sua convicção. O laudo pericial é o documento elaborado pelos peritos, com base no que foi examinado na perícia. A perícia pode ser realizada na fase de inquérito policial ou do processo, a qualquer dia e horário. Os peritos têm o prazo de dez dias para a elaboração do laudo, prorrogável em casos excepcionais. A autoridade que determinar a perícia e as partes poderão oferecer quesitos até o ato (quesitos são perguntas a serem respondidas). A perícia deve ser feita por perito oficial, com diploma de curso superior. Se a perícia for complexa, envolvendo mais de uma área de conhecimento especializado, poderão ser designados dois peritos, nos termos do art. 159, § 7º, do CPP. Nota-se que tal designação é excepcional; a regra é a realização do exame por apenas um perito. Se não houver perito oficial, será elaborada a perícia por duas pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior e, de preferência, com habilitação na área em que for realizado o exame. 42 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Além de oferecer quesitos, as partes podem indicar assistente técnico. Este deve ser admitido pelo juiz e atuará após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelo perito oficial. 7.2. Exame de Corpo de Delito É o conjunto de vestígios deixados pelo crime. O exame de corpo de delito, direto ou indireto, é indispensável nas infrações que deixam vestígios, não podendo supri-lo nem mesmo a confissão do acusado, nos termos do art. 158 do Código de Processo Penal. Exceção: de acordo com o art. 167 do Código de Processo Penal, se não for possível a realização do exame, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhalpoderá suprir-lhe a falta. Se não for possível o exame direto, isto é, no próprio corpo do delito, admite-se a realização pela via indireta, por meio de elementos periféricos, como a análise de ficha clínica de paciente que foi atendido em hospital. 7.3. Interrogatório Interrogatório é o ato no qual o acusado é ouvido sobre a imputação a ele dirigida. Tem dupla natureza jurídica: é meio de prova, pois assim inserido no Código de Processo Penal e porque leva elemento de convicção ao julgador; é também meio de defesa, pois o interrogatório é o momento essencial para que o acusado possa exercer sua autodefesa, dizendo o que quiser e o que entender que lhe seja favorável. O interrogatório é ato não preclusivo, isto é, pode ser realizado a qualquer tempo. É permitida também a renovação do ato a todo tempo, de ofício pelo juiz ou a pedido das partes. O acusado será interrogado sempre na presença de seu defensor. Se não tiver um, deve ser nomeado um defensor público ou um defensor dativo, nem que seja apenas para acompanhar o ato. Antes do interrogatório, o juiz deve assegurar o direito de entrevista reservada com seu defensor. Antes ainda de se iniciar o ato, o acusado deve ser alertado do seu direito ao silêncio, podendo se recusar a responder às perguntas, sem que isso seja utilizado em seu desfavor (art. 5º, LXIII, da CF e art. 186 do CPP). 43 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância A regra para o interrogatório do réu preso é que ele seja realizado no estabelecimento prisional, em sala própria, desde que seja garantida a segurança para os profissionais que ali estarão presentes e a publicidade do ato. 7.4. Confissão Consiste na aceitação da acusação por parte do acusado. A confissão não é tida como prova de valor absoluto. Veja que uma pessoa pode confessar um crime que não cometeu por vários motivos (ex.: para proteger alguém, porque está sendo ameaçado, para obter vantagem financeira, etc). Por isso, ela deve ser avaliada em conjunto com os demais elementos de prova do processo, verificando-se sua compatibilidade ou concordância com eles. A confissão ocorre normalmente no ato do interrogatório, mas pode também ser realizada em outro momento do processo. Não existe confissão ficta no processo penal, ou seja, mesmo que o acusado não exerça a sua autodefesa, não se presumem verdadeiros os fatos a ele imputados. Estipula ainda o Código que a confissão será divisível, ou seja, o juiz pode aceitá-la apenas em parte, e será também retratável, isto é, o acusado pode voltar atrás na sua admissão de culpa. Costuma-se apontar duas espécies de confissão: a) simples, na qual o réu apenas reconhece a prática delituosa, sem qualquer elemento novo; b) qualificada, em que o réu reconhece que praticou o crime, mas alega algo em seu favor, como alguma causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade. 7.5. Das Declarações do Ofendido Sempre que possível o juiz deverá ouvir o ofendido, pois em muitos casos ele pode fornecer informações essenciais em relação ao fato criminoso. Se for regularmente intimado e não comparecer, o réu poderá ser conduzido de forma coercitiva. O ofendido será indagado sobre as circunstâncias de crime, se sabe quem é o autor e quais as provas que pode indicar, por exemplo. 44 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso e à saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem. O Código de Processo penal se preocupa também com a proteção do ofendido, dispondo que antes do início da audiência e durante a sua realização, será reservado espaço separado para ele. O juiz é obrigado a tomar providências necessárias à preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive, determinar o segredo de justiça em relação aos dados, depoimentos e outras informações constantes dos autos a seu respeito para evitar sua exposição aos meios de comunicação. Caso o juiz entenda necessário, poderá encaminhar o ofendido para atendimento, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de saúde, à custa do ofensor ou do Estado. 7.6. Da Prova Testemunhal Testemunhas são as pessoas, diversas das partes, que conhecem e são capazes de narrar os fatos em comento na causa penal. Características da prova testemunhal: a) oralidade: o depoimento é oral, não pode ser trazido por escrito (a lei apenas permite a consulta a apontamentos); b) objetividade: a testemunha deve responder o que sabe a respeito dos fatos, sem emitir sua opinião a respeito da causa; c) retrospectividade: a testemunha responde sobre fatos já ocorridos e não faz previsões. Toda pessoa poderá ser testemunha. A regra geral, porém, comporta algumas exceções. Estão dispensados de depor, o cônjuge, o ascendente, o descendente e os afins em linha reta do réu. Eles só serão obrigados a depor caso não seja possível, por outro modo, obter-se a prova. Neste caso, eles não terão compromisso de dizer a verdade; serão ouvidos apenas como informantes. O mesmo ocorre com os doentes mentais e as pessoas menores de 14 anos. 45 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Estão proibidas de depor as pessoas que devam guardar sigilo em razão de função, ministério, ofício ou profissão, salvo se, desobrigadas pelo interessado, quiserem dar seu depoimento (ex. psicólogo, advogado). Tecnicamente, testemunha é aquela pessoa que faz a promessa, sob o comando do juiz, de dizer a verdade sobre aquilo que lhe for perguntado, ou seja, a que assume o compromisso de dizer a verdade, sob pena de ser processada pelo crime de falso testemunho. As demais pessoas que venham a depor, sem prestar referido compromisso, conforme já adiantado anteriormente, são denominadas informantes do Juízo ou ainda declarantes. Na audiência, as testemunhas deverão ser ouvidas sem que uma ouça o depoimento da outra, para que não exista a possibilidade de influência. Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por videoconferência e, somente se não for possível, determinará a retirada do réu da sala de audiências, permanecendo seu defensor. A testemunha suspeita de parcialidade ou indigna de fé poderá ser contraditada, devendo o juiz, se for o caso, dispensar a testemunha ou ouvi-la como informante. 7.7. Reconhecimento de Pessoas e Coisas No reconhecimento, uma pessoa reconhece como certa a identidade de outra ou a característica de algo. Há um procedimento a ser seguido para o reconhecimento. Primeiro, a pessoa deve descrever aquele que será reconhecido. Sempre que possível o que será reconhecido deverá ser colocado junto com outras parecidas, para que o reconhecedor possa apontá-la, tomando-se cuidado para que uma não veja a outra, se houver temor. Entende-se que a semelhança deve ser física, não exatamente de fisionomia. Se forem várias as pessoas que irão fazer o reconhecimento, cada uma o fará em separado. Após o reconhecimento, é feito um termo por escrito, assinado pela autoridade, pela pessoa chamada para efetuar o reconhecimento e por duas testemunhas. O mesmo procedimento deve ser observado no que diz respeito e no que couber ao reconhecimento de coisas que tiverem relação com o delito. 46 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 7.8. Reconstituição do Crime A reconstituição do crime ou reprodução simulada dos fatos está prevista no art. 7º do Código de Processo Penal: "Para verificara possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública". Veja que se trata de um instituto usado pela autoridade investigadora para esclarecer determinados aspectos do fato supostamente delituoso de difícil elucidação quanto à forma de operar do agente. 7.9. Acareação É o ato processual em que se colocam frente a frente duas ou mais pessoas que fizeram declarações conflitantes sobre o mesmo fato. Pode ser realizada entre acusados, testemunha e vítimas. É pressuposto essencial que as declarações já tenham sido prestadas, caso contrário não haveria possibilidade de se verificar ponto conflitante entre elas. 7.10. Da Prova Documental O art. 232 do Código de Processo Penal considera como documentos: quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares. Instrumento é o documento constituído especificamente para servir de prova para o ato ali representado, por exemplo, a procuração, que tem a finalidade de demonstrar a outorga de poderes. O Código adotou o conceito de documento em sentido estrito. Mas, em sentido amplo podem ser considerados documentos: vídeos, fotos, CDs etc. Em regra, os documentos podem ser juntados em qualquer fase do processo. Dispõe a lei processual, contudo, que não será permitida a juntada de documentos no Plenário do Júri, sem comunicar à outra parte com antecedência mínima de três dias. Se o juiz tiver notícia da existência de documento referente a ponto relevante do processo, providenciará a sua juntada aos autos, independentemente de requerimento das partes. Os documentos em língua estrangeira deverão ser traduzidos por tradutor público. 47 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 7.11. Dos Indícios Indício, na definição legal, é toda circunstância conhecida e provada, a partir da qual, mediante raciocínio lógico, chega-se à conclusão da existência de outro fato. Em nosso Direito, a prova indiciária tem o mesmo valor que qualquer outra. Há quem sustente que um conjunto de fortes indícios pode levar à condenação do acusado, tendo em vista o sistema do livre convencimento motivado do juiz. 7.12. Da Busca e Apreensão A busca e apreensão é a ordem determinada por autoridade policial ou pelo juiz que visa conservar pessoas ou bens relacionados ao fato criminoso. É uma medida cautelar e coercitiva que pode ser tomada antes mesmo da instauração do inquérito. Ela pode ser determinada de ofício ou a requerimento das partes. O art. 240 do CPP autoriza a busca domiciliar, quando houver fundadas razões, para, por exemplo: prender criminosos; aprender coisas achadas ou produtos de crime; apreender instrumentos ou produtos de falsificação ou de adulteração; apreender armas e munições ou outros instrumentos destinados à prática de crime; descobrir objetos necessários à prova de crime ou defesa do réu; entre outras. O agente deve respeitar os limites das garantias constitucionais da inviolabilidade de domicílio (art. 5°, XI da CF). Mas se o morador se recusar a permitir a execução da medida, a entrada da autoridade poderá ser forçada. A busca pessoal consiste na revista do corpo da pessoa, suas roupas e demais acessórios e deve ser realizada quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma ou algum dos objetos mencionados nos parágrafos anteriores. Em regra, a busca pessoal em mulher deve ser feita por outra mulher, salvo se não havendo outra mulher, sua não execução possa acarretar em prejuízo da defesa. 7.13. Da Cadeia de Custódia Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte. 48 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância § 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio. § 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação. § 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal. Art. 158-B. A cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes etapas: I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial; II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime; III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento; IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando suas características e natureza; V - acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento; VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse; VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu; VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito; IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente; 49 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância X - descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial. Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial, que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de exames complementares. § 1º Todos vestígios coletados no decurso do inquérito ou processo devem ser tratados como descrito nesta Lei, ficando órgão central de perícia oficial de natureza criminal responsável por detalhar a forma do seu cumprimento. § 2º É proibida a entrada em locais isolados bem como a remoção de quaisquer vestígios de locais de crime antes da liberação por parte do perito responsável, sendo tipificada como fraude processual a sua realização. Art. 158-D. O recipiente para acondicionamento do vestígio será determinadopela natureza do material. § 1º Todos os recipientes deverão ser selados com lacres, com numeração individualizada, de forma a garantir a inviolabilidade e a idoneidade do vestígio durante o transporte. § 2º O recipiente deverá individualizar o vestígio, preservar suas características, impedir contaminação e vazamento, ter grau de resistência adequado e espaço para registro de informações sobre seu conteúdo. § 3º O recipiente só poderá ser aberto pelo perito que vai proceder à análise e, motivadamente, por pessoa autorizada. § 4º Após cada rompimento de lacre, deve se fazer constar na ficha de acompanhamento de vestígio o nome e a matrícula do responsável, a data, o local, a finalidade, bem como as informações referentes ao novo lacre utilizado. § 5º O lacre rompido deverá ser acondicionado no interior do novo recipiente. Art. 158-E. Todos os Institutos de Criminalística deverão ter uma central de custódia destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua gestão deve ser vinculada diretamente ao órgão central de perícia oficial de natureza criminal. § 1º Toda central de custódia deve possuir os serviços de protocolo, com local para conferência, recepção, devolução de materiais e documentos, possibilitando a seleção, a classificação e a distribuição de materiais, devendo ser um espaço seguro e apresentar condições ambientais que não interfiram nas características do vestígio. 50 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância § 2º Na central de custódia, a entrada e a saída de vestígio deverão ser protocoladas, consignando-se informações sobre a ocorrência no inquérito que a eles se relacionam. § 3º Todas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio armazenado deverão ser identificadas e deverão ser registradas a data e a hora do acesso. § 4º Por ocasião da tramitação do vestígio armazenado, todas as ações deverão ser registradas, consignando-se a identificação do responsável pela tramitação, a destinação, a data e horário da ação. Art. 158-F. Após a realização da perícia, o material deverá ser devolvido à central de custódia, devendo nela permanecer. Parágrafo único. Caso a central de custódia não possua espaço ou condições de armazenar determinado material, deverá a autoridade policial ou judiciária determinar as condições de depósito do referido material em local diverso, mediante requerimento do diretor do órgão central de perícia oficial de natureza criminal. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito – Procedimento Policial. 12ª. Ed. Goiânia: AB,2009. 51 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 8. PRISÃO Objetivos: Explorar os tipos de prisão existentes no ordenamento jurídico-penal Identificar os procedimentos adotados para o cumprimento da prisão Palavras-chave: Prisão; espécies; pena Você sabe a diferença entre prisão cautelar e definitiva? Quando um juiz permite que um réu responda ao processo em liberdade, quais são os fundamentos legais para tanto? Primeiramente, vamos entender o conceito de prisão: Segundo Fernando da Costa Tourinho em sua obra Manual de Processo Penal, prisão pode ser entendida como a privação, mais ou menos intensa, da liberdade ambulatória. Esse conceito abrange duas espécies de prisão: A prisão-pena, aquela decorrente de sentença penal condenatória irrecorrível e a prisão sem o caráter de pena, também conhecida como genérica de prisão sem pena. Mas o que é prisão-pena ou definitiva? Prisão-pena é aquela resultante da condenação transitada em julgado. Conforme leciona Tourinho é o sofrimento imposto pelo Estado ao infrator, em execução de uma sentença penal, como retribuição ao mal praticado, a fim de reintegrar a ordem jurídica injuriada. A finalidade da pena é reeducar, inserir novamente e reintegrar o condenado na sociedade. Tratando - se de contravenção, a única pena restritiva deliberada é denominada prisão simples, que, nos termos do artigo 6°da Lei das Contravenções Penais, deve ser cumprida sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial seção especial de prisão comum, em regime semiaberto ou aberto, casa de albergado. 52 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 8.1. Prisão sem Pena Ao lado prisão decorrente de sentença penal condenatória irrecorrível, temos ainda a prisão sem pena, que, como o próprio nome diz, não decorre de condenação. 8.2. Prisão Civil Atualmente no Brasil as únicas hipóteses previstas são para compelir alguém ao cumprimento da obrigação alimentar ou ao dever de devolver a coisa que está em seu poder em virtude de ser fiel depositário. O Supremo Tribunal Federal, em recente decisão, reconheceu estar revogada, conforme súmula 619 do Supremo Tribunal Federal, não mais se admitindo a prisão do depositário infiel, pouco importando tratar-se de depósito necessário ou voluntário. E em seguida foi editada a Súmula Vinculante n° 25 que dispõe: “É ilícita a prisão civil do depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. Em respeito ao princípio constitucional da inviolabilidade do domicílio, a prisão só pode ser efetuada no interior de residência durante o dia em razão de flagrante ou mediante apresentação de mandado judicial. Durante a noite, só pode haver prisão no interior da residência em caso de flagrante delito. Para que alguém seja recolhido à prisão, é necessário que seja apresentado o respectivo mandado ao diretor ou carcereiro responsável. O artigo 300 do CPP estabelece que os presos provisórios fiquem separados dos definitivamente condenados. Até o trânsito em julgado da sentença, o acusado deve ser considerado inocente. Por isso, a prisão temporária (ou processual) não pode ser encarada como um castigo. Assim, como já apontado, apenas a prisão cautelar é que pode ser considerada 53 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância constitucional. Ela não busca castigar, mas serve como instrumento para garantir o bom andamento do processo. Os artigos do Código de Processo Penal que tratam da prisão provisória precisam ser analisados com muito cuidado, pois tal diploma foi elaborado em regime não democrático, no qual era aceita a prisão processual como juízo de antecipação de culpabilidade. 8.3. Prisão Processual (Provisória) Provém de determinação judicial ou de flagrante, em virtude da persecução penal ou processo penal. Esse tipo de prisão visa garantir o bom desempenho do processo. Só é compatível com os princípios Constitucionais se tiver fundamento cautelar. 8.4. Procedimentos Adotados para o Cumprimento da Prisão Contempla a carta Magna em seu artigo 5º, caput, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Por isso, os atos praticados pela Polícia Judiciária devem ser pautados na legalidade, sem excessos, sob pena de causarem danos irreparáveis. Ensina o Professor Luiz Carlos Rocha que “o combate à criminalidade deve ser feito de uma posição eminentemente ética. O Delegado deve resguardar os direitos humanos, observando que o limite da função investigatória está nos direitos individuais do suspeito”. Segue dizendo que “uma sociedade hoje desperta para os seus direitos, - e o primeiro deles é a cidadania, o direito de ter direitos – já não convive com práticas abusivas”. Nos termos do artigo 282, I, do Código de Processo Penal, coma redação dada pela Lei 12.403/11 no que tange a aplicação das medidas cautelares, dever-se-á atentar, por primeiro, à sua necessidade para a aplicação da lei penal, para a investigação ou instrução criminal. E, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais. 54 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O artigo 319, II, VI e VII do Código de Processo Penal dispõe sobre esses casos. Para você entender melhor, descrevo abaixo o texto legal: Artigo 319. São medidas cautelares diversas da prisão: (Alterado pela L-012.403- 2011) I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; (Alterado pela L-012.403-2011) II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; (Alterado pela L- 012.403-2011) III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; (Alterado pela L-012.403-2011) IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; (Acrescentado pela L-012.403- 2011) V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi- imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII - fiança, nas infrações que a admitem para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica. O artigo 283 do CPP estabelece que a ordem deverá ser fundamentada pela autoridade judiciária competente. Se não for dessa forma, se não houver ordem, o agente incidirá no crime de exercício arbitrário ou abuso de autoridade, definido como crime na letra “a” da Lei n° 4898/65. Excetuam-se os casos de prisão em flagrante, bem como a recaptura do réu foragido, a qual poderá ser efetuada por qualquer do povo. As formalidades previstas no artigo 285 do mesmo diploma legal estabelece que a ordem deverá ser escrita e que fará expedir o respectivo mandado. Deverá ser expedido com cópia, e o executor deverá entregar ao preso, logo depois da prisão um dos http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm http://www.dji.com.br/leis_ordinarias/2011-012403/2011-012403.htm 55 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância exemplares, com declaração do dia, hora e lugar da diligência. Do recebimento o preso deverá assinar a cópia, e se se recusar, não souber ou não puder escrever o fato será certificado na declaração que será assinada por duas testemunhas. Procedimento importantíssimo, pois garante o cumprimento da ordem e que a cópia foi entregue ao preso. Há casos em que a pessoa que deva ser presa se encontre em qualquer lugar do território nacional, exceto naquele do Juiz que expedir o mandado. O momento para a realização da prisão conforme estabelece o parágrafo 1º do artigo 283 do CPP poderá ser em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio. O artigo 236 do Código Eleitoral dispõe que nenhum eleitor poderá ser preso cinco dias antes e 48 horas depois das eleições, salvo se for flagrante delito ou mandado de prisão decorrente de sentença penal condenatória irrecorrível. Tratando-se de mesários e candidatos, esse prazo é de 15 dias. Quando da realização da prisão, a regra geral é de que não será permitido o emprego da força. Mas o artigo 284 do Código de Processo Penal estabelece as exceções a esta regra. Poderá ser usada a força indispensável no caso de resistência; e, no caso de tentativa de fuga do preso. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito – Procedimento Policial. 12ª. Ed. Goiânia: AB,2009. 56 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 9. PRISÃO DE NATUREZA PROCESSUAL - REQUISITOS E ESPÉCIES Objetivos: Identificar as espécies de prisão provisória Identificar o conceito de conceito de liberdade provisória Conhecer os procedimentos adotados para se realizar a prisão em flagrante Palavras-chave: Prisão; Liberdade; Espécies. 9.1. Prisão por Flagrante A Prisão em flagrante justifica-se pela possibilidade da reação social imediata à prática da infração e à captação, também imediata, da prova. Dessa forma, a necessidade de parar a agressão, a facilidade na coleta das provas e a força dos indícios são os aspectos que justificam à princípio a custódia cautelar. As hipóteses de flagrantes estão descritas no artigo 302 do Código de Processo Penal. Nas infrações permanentes, o agente é visto em flagrante delito enquanto não cessar a permanência. É o caso do sequestro, por exemplo. Caso não haja testemunhas com o condutor (quem conduz o acusado à prisão), é preciso que pelo menos duas pessoas que tenham testemunhado a apresentação do preso assinem o auto da prisão em flagrante. Da mesma forma, se o acusado se recusar a assinar o auto, duas testemunhas assinarão após a leitura do conteúdo em voz alta ao acusado. O auto tem o prazo de 24 horas para ser lavrado e devem ser respeitados os direitos constitucionais, tais como o direito de permanecer em silêncio. Também existe o dever de comunicação à família e ao juiz. O preso tem ainda, o direito a um advogado e a identificação dos responsáveis por seu interrogatório. Se esses direitos forem desrespeitados, caberá a medida de relaxamento da prisão em flagrante ou habeas corpus. Vale ainda conceituar algumas modalidades de flagrante: Flagrante Preparado ou Provocado: Ocorre quando o agente é induzido à prática de um crime pelo agente provocador (“vitima”, policial ou terceiro). De acordo com os julgados do Supremo Tribunal Federal (STF), trata-se de uma hipótese de crime impossível, não se configurando o flagrante, pois não há verdadeira infração criminal. 57 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Flagrante Esperado: Trata-se de hipótese em que não há provocação para o crime. A polícia captura o agente ao executar a infração porque obteve informações sobre a prática do crime ou porque já vigiava o agente. Nesse caso a prisão em flagrante é admitida. Flagrante Forjado: É aquele em que a polícia ou terceiro qualquer planta prova falsa de um crime inexistente. O exemplo típico é o de quem tem substância entorpecente colocada em seu carro, que está sendo revistado. Veja que não há, nesse caso, crime consumado ou tentado, de forma que o flagrante não é admitido. Flagrante Postergado, Retardado ou Diferido: É aquele em que o agente policial pode não efetuar a prisão em flagrante no momento de seu acontecimento,nos crimes praticados por organizações criminosas. É possível que o policial retarde a prisão em flagrante para outro momento mais eficaz, visando obter melhores provas e informações contra os autores do delito. 9.2. Prisão Temporária A prisão temporária é modalidade de prisão provisória, de natureza cautelar, decretada pelo juiz, com o objetivo de investigar crimes mais graves. Essa modalidade de prisão não pode ser decretada de ofício pelo juiz. Ela somente pode ser decretada no curso da investigação criminal, antes de instaurado o processo penal judicial. Em outras palavras, nunca pode ser decretada durante a ação penal. O prazo de duração é de 5 (cinco) dias, prorrogáveis por mais cinco, em caso de extrema e comprovada necessidade. Se o crime investigado for hediondo (estupro, tráfico, tortura e terrorismo), o prazo será de 30 dias, prorrogável por mais 30, em caso de extrema e comprovada necessidade. Será solicitada e encaminhada ao juiz por requerimento do Ministério Público ou de representação da Autoridade Policial. A partir do recebimento da representação ou do requerimento, o juiz terá o prazo de 24 horas para decretá-la e fundamentá-la. Se houver representação da autoridade policial para solicitar a prisão temporária, o Juiz ouvirá o Ministério Público, titular da ação, antes de decidir, para opinar sobre a necessidade da prisão para a investigação. 58 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Há três hipóteses de cabimento da prisão temporária: I. Quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; II. Quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade; III. Quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos crimes de homicídio doloso; sequestro ou cárcere privado; roubo; extorsão; extorsão mediante sequestro; estupro; atentado violento ao pudor; epidemia com resultado de morte; envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte; quadrilha ou bando; genocídio; tráfico de drogas; crimes contra o sistema financeiro. A doutrina e a jurisprudência majoritária entendem, no entanto, que a prisão temporária somente será cabível quando combinados os incisos I ou II, com a hipótese do inciso III. Requisitos criados pelo STF: 1) for imprescindível para as investigações do inquérito policial, constatada a partir de elementos concretos, e não meras conjecturas, vedada a sua utilização como prisão para averiguações, em violação ao direito à não autoincriminação, ou quando fundada no mero fato de o representado não ter residência fixa; 2) houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado nos crimes descritos no artigo 1°, inciso III, da Lei 7.960/1989, vedada a analogia ou a interpretação extensiva do rol previsto; 3) for justificada em fatos novos ou contemporâneos; 4) for adequada à gravidade concreta do crime, às circunstâncias do fato e às condições pessoais do indiciado; 5) não for suficiente a imposição de medidas cautelares diversas, previstas nos artigos 319 e 320 do Código de Processo Penal (CPP). 59 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância A prisão temporária somente pode ser decretada para investigar um dos delitos taxativamente elencados. Qualquer outro delito fora desse rol taxativo não admite prisão temporária. O Juiz não pode decretá-la de ofício. Mas uma vez que o réu esteja preso, o Juiz poderá determinar de ofício que o preso lhe seja apresentado, solicitar informações e esclarecimentos da Autoridade Policial e submetê-lo a exame de corpo de delito. Decretada a prisão temporária, ela somente poderá ser executada depois da expedição de mandado judicial, devendo o preso ser informado de seus direitos constitucionais. Decorrido o prazo de cinco dias, o preso deverá ser posto imediatamente em liberdade, salvo se já tiver sido decretada sua prisão preventiva. Os presos temporários deverão permanecer separados dos demais detentos. Constitui crime de abuso de autoridade prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade. Em síntese, o atraso na liberação configura crime de abuso de autoridade. De acordo com o entendimento sólido do Superior Tribunal de Justiça, a prisão temporária não pode ser mantida após o recebimento da denúncia pelo juiz. Nesse momento, deve cessar imediatamente. Mesmo no caso da prorrogação da prisão temporária, não pode o juiz determiná-la de ofício; devendo, portanto, aguardar a provocação do Delegado de Polícia ou do membro do Ministério Público, pedindo a prorrogação. Na hipótese de pedido de prisão temporária realizado pelo Delegado de Polícia, o Juiz deverá, antes de decretá-la, ouvir o Ministério Público, titular da ação penal. Em todas as comarcas, deve existir plantão permanente de vinte e quatro horas do Poder Judiciário e do Ministério Público para apreciação dos pedidos de prisão temporária. 60 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 9.3. Prisão Preventiva A prisão preventiva é outra modalidade de prisão provisória, de natureza cautelar, somente devendo ser decretada pelo juiz nas hipóteses legais, comprovada a sua necessidade. Esse tópico deve ser tratado com algum cuidado, pois após a entrada em vigor da Lei 12.403/2011, ocorreram significativas alterações no Código de Processo Penal, principalmente com relação às prisões, fiança, liberdade provisória e as outras Medidas Cautelares, diferentes da Prisão. Uma das principais mudanças ocorridas na prisão preventiva é que ela passa a ser determinada apenas em último caso. Isto porque no ordenamento jurídico brasileiro, a regra é a liberdade e a prisão é uma exceção. Essa máxima decorre do Princípio da Presunção de Inocência (art. 5°, LVII, da Constituição Federal) e do Princípio do Devido Processo Legal (art. 5°, LIV, da CF). Assim, as mudanças introduzidas pela nova lei impõem que a prisão preventiva deve ser decretada pelo juiz apenas em caso muito extremos, de maneira fundamentada e cumpridas as exigências legais. De acordo com as alterações no CPP, a prisão preventiva apenas será decretada pelo juiz, de forma fundamentada, quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 282, § 6°, CPP). Isso porque, dentre as medidas cautelares, a prisão preventiva é a mais gravosa de todas. São três as exigências legais para que a prisão preventiva possa ser decretada. Devem ser observados: (a) os requisitos legais; (b) os pressupostos e; (c) os fundamentos. Vou elencar cada um deles de forma separada: 9.4. Requisitos Legais da Prisão Preventiva (Previstos no art. 313, do CPP): I. Só se aplica prisão preventiva a crimes 1) Dolosos, punidos com 2) Pena Privativa de Liberdade, 3) superior a 4 (quatro) anos. (art. 313, I, CPP); II. Se há condenação anterior por outro 1) crime doloso, 2) transitado em julgado, salvo o prazo de 5 anos do 3) Art. 64, I, CP3. (art. 313, II, CPP); III. Quando o crime envolver 1) violência doméstica e familiar contra 2) a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, 3) para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (art. 313, III, CPP); 61 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância IV. Quando houver 1) dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando 2) esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la. (art. 313, § ún., CPP). 9.5. Fundamentos da Prisão Preventiva I. Como Garantia Da Ordem Pública, 2) Da OrdemEconômica, 3) Por Conveniência Da Instrução Criminal, 4) Ou Para Assegurar A Aplicação Da Lei Penal. (Artigo 313, Caput, Cpp); II. Caso O Acusado Descumpra Qualquer Obrigação Imposta Como Medida Cautelar. (Artigo 313, § Ún., Cpp) 9.6. Pressupostos da Prisão Preventiva I. Exigência de que haja 1) prova da existência do crime e 2) indício suficiente de autoria. (artigo 313, parte final, CPP) A prisão preventiva poderá ser decretada em qualquer fase da investigação policial, por meio de representação da autoridade policial, requerimento do Ministério Público, do assistente de acusação ou do querelante. Mas ela nunca pode ser determinada de ofício pelo Juiz, quando ainda não existe processo. Assim, o Juiz só poderá decretá-la de ofício no curso da ação penal. A lei manda que seja feito um contraditório prévio sempre que se apliquei uma medida cautelar (art. 282, § 3°, CPP), salvo nos casos de urgência ou se isso implicar em risco de ineficácia da medida. O juiz não pode decretar a prisão preventiva, de forma alguma, se as provas indicar que o agente praticou o fato em uma das hipóteses de excludentes de ilicitude, previstas no artigo 23 do Código Penal. Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Não existe prazo fixado na Lei para a duração da prisão preventiva. Veja o caso recente do goleiro Bruno que ficou preso por tempo indeterminado, até o seu julgamento. Essa modalidade de prisão pode ser revogada a qualquer tempo, desde que não subsista mais a razão da sua decretação. 62 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Uma vez concedida a liberdade provisória, o juiz pode decretar nova prisão preventiva, desde que novas razões a justifiquem. O despacho que decretar ou negar a prisão preventiva deverá ser sempre fundamentado. 9.7. Outras Medidas Cautelares Previstas do Artigo 319 do Cpp Como afirmei anteriormente, a prisão preventiva é cabível quando não outra medida cautelar não for suficiente. Vou então falar apenas brevemente sobre as demais medidas cautelares previstas no artigo 319 do CPP. As medidas cautelares podem ser aplicadas durante o processo, isolada ou cumulativamente. Por exemplo: a) comparecimento periódico em juízo, por prazo determinado pelo juiz; b) proibição de frequentar determinados lugares (estádio, boate); c) proibição de manter contato com pessoa determinada; d) de ausentar-se da comarca; e) recolhimento domiciliar no período noturno e etc. Mas, como você já viu, além destas, continuam vigentes as medidas cautelares extremas de segregação, ou seja, prisão em flagrante, preventiva e temporária. Medidas cautelares podem ser decretadas durante o processo (por ordem judicial, de ofício ou a requerimento das partes); ou também durante a investigação criminal (por ordem judicial, mediante representação do Delegado ou requerimento do Ministério Público). Objetivo da nova lei (12.403/11) foi o de estender algumas proteções da Lei Maria da Penha para outros casos e evitar a aplicação da prisão provisória por falta de alternativa. Em outras palavras, essa lei positivou as medidas cautelares, ou seja, medidas de cunho judicial que visam resguardar a eficácia e utilidade do processo principal, visando, assim, aplicar apenas excepcionalmente a prisão processual provisória (prisão preventiva e temporária). Para decretar a cautelar o juiz deve ouvir a parte contrária. As cautelares são regidas pelo princípio da Fungibilidade. O juiz pode substituir a medida aplicada, cumular com outros e, excepcionalmente, decretar a preventiva. 63 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 9.8. Liberdade Provisória com e sem Fiança Como já vimos anteriormente, até que haja sentença condenatória definitiva, a liberdade é a regra e a prisão, a exceção. Você também viu que, apesar de antes da sentença penal condenatória com trânsito em julgado a liberdade ser a regra, há casos em que a lei autoriza que o acusado seja privado de sua liberdade antes disso, ou antes, mesmo da existência de um inquérito. São as hipóteses do artigo 283 do Código de Processo Penal que estudamos até agora: prisão em flagrante, prisão temporária e prisão preventiva. Para todos os demais casos, em atendimento ao art. 5°, LXVI, da Constituição Federal, ninguém será preso quando for possível a concessão da liberdade provisória, com ou sem fiança. Portanto, a concessão de liberdade provisória é obrigatória nos casos em que a decretação de prisão preventiva não for possível, mas isso não impede que outras medidas cautelares sejam aplicadas, desde que haja adequação e necessidade dessas medidas. Podemos dividir a liberdade provisória em 3 (três) categorias genéricas: obrigatória, permitida e proibida. 9.8.1. Obrigatória A liberdade provisória será obrigatória, sempre que estiverem ausentes os requisitos da prisão preventiva (artigo 312 e artigo 313, CPP), conforme previsão legal do Artigo 321, CPP. O Juiz deverá decretar a liberdade provisória, com ou sem fiança (Artigo. 310, III, CPP), ou verificando tratar-se de uma das excludentes de ilicitude do Artigo 23 do Código Penal. Artigo 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no Artigo 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste código. Mas a liberdade provisória também pode ser encontrada em outras leis. Na lei dos Juizados Especiais, o acusado permanecerá em liberdade, caso comprometa-se a comparecer ou caso seja encaminhado ao Juizado Especial. Na lei de trânsito também o acusado permanecerá em liberdade nos casos de acidentes de que resultem vítimas, se 64 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância prestar socorro à vítima. Por fim, na lei Antidrogas também o acusado permanece em liberdade quando for surpreendido com drogas para consumo próprio. Em suma, a obrigatoriedade da Liberdade Provisória, significa que o Juiz é obrigado a decretá-la, pois se trata de direito subjetivo do acusado, e não faculdade do Juiz. 9.8.2. Permitida Trata-se dos casos em que a liberdade provisória é faculdade, a ser decidida pelo juiz. Em outras palavras, são casos em que ela não é nem obrigatória, e nem proibida. Assim, por exemplo, o art. 282, § 4°, no caso de descumprimento de medidas cautelares, o juiz poderá substituir a medida por prisão preventiva. A decisão, é claro, deve sempre ser motivada. 9.8.3. Proibida São hipóteses em que a liberdade provisória não poderá ser concedida por dois motivos: (a) caso seja cabível prisão preventiva e; (b) caso a concessão da liberdade provisória seja expressamente proibida em lei (há casos previstos na Lei de Drogas e na Lei das Organizações Criminosas, etc.) CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito – Procedimento Policial. 12ª. Ed. Goiânia: AB,2009. 1. PRINCÍPIOS E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO PENAL 1.1. Conceito de Direito Processual Penal 1.2. Princípios e Garantias Constitucionais 1.2.1. Princípio da Intervenção Mínima ou da Necessidade 1.2.2. Sistemas acusatório e inquisitório 1.3. Princípio da Jurisdicionalidade 1.3.1. Imparcialidade e poderes instrutórios 1.4. Princípio do Devido Processo Legal 1.5. Princípio da Presunção de Inocência 1.5.1. Contraditório e ampla defesa 1.5.2. Fundamentação das Decisões Judiciais 2. LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO E NO ESPAÇO 2.1.Lei Processual Penal 2.2. Lei Processual no tempo 2.3. Lei processual penal no espaço. 2.3.1. Investigação Preliminar 2.3.2. Natureza Jurídica do inquérito policial 2.3.3. Características e eficácia probatória do inquérito policial 2.3.4. Forma dos atos 2.3.5. Ação Penal Pública Condicionada 2.3.6. Ação Penal Privada 3. AÇÃO PROCESSUAL PENAL 3.1. Ação Processual Penal 3.2. Condições da Ação Processual Penal 3.3. Possibilidade jurídica do pedido. 3.4. Interesse de agir 3.5. Legitimidade “ad causam”. 3.6. Espécies de Ação Penal 3.6.1. Ação Penal de Iniciativa Pública 3.6.2. Ação penal pública condicionada 3.6.3. Ação Penal de Iniciativa Privada 3.7. Ação Civil “ex delicto” 4. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA 4.1. Jurisdição 4.2. Princípios da Jurisdição Penal 4.3. Competência 4.4. Competência de Foro ou Territorial 4.5. Competência em Razão da Matéria (Natureza da Infração) 4.6. Competência da Justiça Especial Militar e Eleitoral 4.7. Competência da Justiça Comum: Federal e Estadual 4.8. Competência por Prevenção e Distribuição 4.9. Competência por Prerrogativa de Função (Em Razão da Pessoa) 4.10. Conexão e Continência 4.11. Conexão 4.12. Continência 5. QUESTÕES PREJUDICIAIS E PROCESSOS INCIDENTAIS 5.1. Questões ou Incidentes Processuais 5.2. Questões Prejudiciais 5.3. Processos Incidentes 5.4. Exceções Processuais 5.5. Exceções de Suspeição e Impedimentos 5.6. Exceção de Incompetência 5.7. Exceção de Litispendência 5.8. Exceção de Ilegitimidade da Parte 5.9. Exceção De Coisa Julgada 5.10. Conflito de Jurisdição e de Competência 6. TEORIA GERAL DAS PROVAS 6.1. Teoria Geral das Provas 6.2. Princípios da Prova 6.3. Provas Ilegítimas e Ilícitas 6.4. Princípio da Contaminação 6.5. Teorias da Fonte Independente e descoberta 7. PROVAS EM ESPÉCIE NO PROCESSO PENAL 7.1. Prova Pericial 7.2. Exame de Corpo de Delito 7.3. Interrogatório 7.4. Confissão 7.5. Das Declarações do Ofendido 7.6. Da Prova Testemunhal 7.7. Reconhecimento de Pessoas e Coisas 7.8. Reconstituição do Crime 7.9. Acareação 7.10. Da Prova Documental 7.11. Dos Indícios 7.12. Da Busca e Apreensão 7.13. Da Cadeia de Custódia 8. PRISÃO 8.1. Prisão sem Pena 8.2. Prisão Civil 8.3. Prisão Processual (Provisória) 8.4. Procedimentos Adotados para o Cumprimento da Prisão 9. PRISÃO DE NATUREZA PROCESSUAL - REQUISITOS E ESPÉCIES 9.1. Prisão por Flagrante 9.2. Prisão Temporária 9.3. Prisão Preventiva 9.4. Requisitos Legais da Prisão Preventiva 9.5. Fundamentos da Prisão Preventiva 9.6. Pressupostos da Prisão Preventiva 9.7. Outras Medidas Cautelares Previstas do Artigo 319 do Cpp 9.8. Liberdade Provisória com e sem Fiança 9.8.1. Obrigatória 9.8.2. Permitida 9.8.3. Proibidaa imparcialidade do juiz, entre outros. A ofensa a esse princípio acarreta uma consequência comum que consiste na nulidade. É possível também que a ofensa ao devido processo legal dê ensejo à impetração de habeas corpus para garantir a liberdade do preso. O devido processo legal é um princípio que não admite exceções. Falando em âmbito processual, esse princípio garante o direito de ser ouvido; à informação dos atos do processo e de sua publicidade; à defesa técnica; à manifestação posterior à acusação e em todas as oportunidades, à motivação das decisões; a ter um juízo natural; ao duplo grau de jurisdição; à revisão criminal e ao respeito à coisa julgada. 5 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Fonte da imagem: http://direito.folha.uol.com.br/blog/category/presuncao%20de%20inocencia34a22a89fe 1.5. Princípio da Presunção de Inocência O princípio da presunção da inocência está previsto pelo art. 5°, inciso LVII da Constituição Federal. De acordo com ele, o indiciado e o acusado são considerados inocentes até que haja o trânsito em julgado da sentença condenatória. Do princípio da inocência decorrem duas regras que o Estado deve cumprir em relação ao acusado. A primeira refere-se ao tratamento: o réu não pode sofrer restrições pessoais fundadas exclusivamente na possibilidade de condenação. A outra regra é de caráter probatório: estabelece que todo o ônus da prova relativo à existência do fato e à sua autoria deve recair exclusivamente sobre a acusação, restando à defesa a demonstração da eventual presença de fato caracterizador de excludente de ilicitude e culpabilidade. O estado de inocência proíbe a antecipação dos resultados finais do processo, inadmitindo toda privação de liberdade antes do trânsito em julgado que não tenha natureza cautelar, com a imposição de ordem judicial devidamente motivada. Mesmo para o indiciamento é possível reclamar a presença de justa causa. 1.5.1. Contraditório e ampla defesa O art. 5°, inciso LV da Constituição Federal, combinado com os artigos. 261 e 263 do Código de Processo Penal garantem a ampla defesa do acusado. De acordo com os dispositivos, o acusado deve ter assegurado seu direito de defesa sem qualquer restrição, assim como a acusação tem o direito de contraditar os argumentos colocados pelo réu. http://direito.folha.uol.com.br/blog/category/presuncao%20de%20inocencia34a22a89fe 6 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O contraditório não apenas representa a garantia do direito à informação de qualquer fato ou alegação contrária ao interesse das partes e o direito à contrariedade, como também a oportunidade de a resposta se realizar na mesma intensidade e extensão. Constitui verdadeiro requisito de validade do processo, na medida em que a sua inobservância pode inclusive gerar uma nulidade absoluta (ou seja, uma nulidade que não pode ser corrigida), quando em prejuízo do acusado. Isto porque, para garantir a proteção do cidadão diante do aparato persecutório penal, é preciso que os processos se desenvolvam de maneira justa e equitativa. Vale ressaltar que o contraditório apenas tem fundamento no processo penal, de forma que na fase pré-processual do inquérito não cabe o contraditório. Trata-se de um direito indisponível (ou seja, não é possível abrir mão desse direito). Dessa forma, caso o réu seja revel, o juiz irá nomear um defensor (chamado defensor dativo). A ampla defesa se realiza por meio da defesa técnica, da autodefesa, da defesa efetiva e por qualquer meio de prova hábil a demonstrar a inocência do acusado. 1.5.2. Fundamentação das Decisões Judiciais A fundamentação das decisões judiciais é uma garantia constitucional prevista no artigo 93, inciso IX, entre outros dispositivos. Como instrumento técnico processual, o princípio da motivação das decisões judiciais permite às partes avaliar a conveniência de recorrer. Também permite que os juízes de instâncias superiores compreendam melhor os fundamentos da sentença recorrida, pois a ausência de fundamentação dificulta andamento do processo na instância superior. Afinal, os juízes dos tribunais superiores poderiam enfrentar dificuldades para visualizar as razões que levaram o magistrado de primeira instância a decidir da forma que o fez, se isso não estivesse claramente disposto na motivação. Além disso, a decisão deficiente de motivação transforma-se num verdadeiro obstáculo ao exercício do direito ao contraditório pela parte que se sentir prejudicada, pois impede a formulação adequada das razões de um recurso. A interpretação do Direito é um contínuo exercício de persuasão. O juiz ao decidir, como todo comunicador, tenta convencer o seu interlocutor a acatar a sua argumentação. A decisão judicial, como ato de comunicação, precisa conter uma racionalidade, devendo 7 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância está não apenas ser demonstrada, mas comprovada, mediante um discurso bem construído em termos racionais. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso; DELMANTO JR., Roberto; DELMANTO, Roberto. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GRECCO FILHO, Vicente. Manual do Processo Penal. 9 ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 8 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 2. LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO E NO ESPAÇO Objetivos: Identificar a lei processual no tempo e no espaço; Reconhecer os mecanismos de atuação do Estado para a persecução penal; Identificar as diferenças entre as fases do inquérito policial e a ação penal. Palavras-chave: Lei; Tempo; Espaço. 2.1. Lei Processual Penal Uma vez praticada uma infração penal, nasce para o Estado o que chamamos de pretensão punitiva. Mas o que é isso? Trata-se de um direito e ao mesmo tempo um dever de aplicar a sanção penal ao autor da conduta ilegal. É nesse momento em que o direito de liberdade é subordinado ao direito de punir. Mas, a sanção penal, como todos sabemos, não pode ser aplicada de forma imediata. É necessário que haja um controle jurisdicional por meio de um processo. Nesse sentido destaco a máxima em latim segundo a qual “não há pena sem processo” (“nulla poena sine judicio”). Veja que o processo acaba funcionando como garantia aos acusados, pois assegura a defesa e protege o direito de liberdade. Para chegar a aplicação da pena, o Estado precisa percorrer duas fases: a investigação e a ação penal como veremos nos itens subsequentes. 2.2. Lei Processual no tempo Com relação à lei processual no tempo, foi adotado o princípio da aplicabilidade imediata. Isso significa dizer que todas as leis processuais terão aplicação imediata, assim que entrarem em vigor. A doutrina apenas faz uma ressalva. Se a lei processual penal trouxer matéria penal também, nesse caso ela é denominada lei processual penal mista e deverá observar as regras do direito penal. Ou seja, será necessário verificar se o procedimento beneficia ou prejudica o réu. Se prejudicar, somente se aplicará aos novos processos, permanecendo os anteriores até encerramento. 9 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 2.3. Lei processual penal no espaço. O artigo 1º do Código de Processo Penal determina que as regras processuais penais gerais sejam aplicadas apenas dentro do território nacional independente das regras de direito penal da extraterritorialidade. Isso porque em território estrangeiro poderá ser aplicada a lei penal, se compatível, porém jamais será aplicada a lei processual. A partir de agora, para agilizar nosso estudo, a expressão Código Processual Penal será abreviada para CPP. 2.3.1. Investigação PreliminarA investigação constitui atividade preparatória da ação penal e tem caráter preliminar e informativo. Ela visa fornecer fundamento para a propositura da ação penal, que por sua vez enseja o desenvolvimento de um devido processo legal. A ação penal implica um constrangimento da liberdade do acusado. Assim, para que ela seja proposta e instaurada, exige-se que haja uma justa causa, sob pena de a coação ser considerada ilegal. Mas o que seria essa justa causa? A justa causa significa a existência de elementos de convicção que ofereçam suporte fático e demonstrem a viabilidade de acusação. Em outras palavras, é necessário que haja: Prova da materialidade do crime, ou seja, prova de que o crime existiu; Indício de autoria (razões concretas que apontem o acusado como o autor do crime). Essa é a relevância do inquérito policial. Ele é o instrumento de investigação que verifica a existência de justa causa para a propositura da ação penal e protege os indivíduos contra perseguições e acusações levianas. 2.3.2. Natureza Jurídica do inquérito policial A fase de investigação tem natureza administrativa. Nesta fase o juiz deve permanecer absolutamente alheio, somente intervindo para tutelar violação ou ameaças de lesões a direitos e garantias individuais das partes, ou para resguardar a efetividade da função jurisdicional. 10 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O inquérito policial é um procedimento administrativo, com caráter inquisitivo e cunho investigatório, desenvolvido pela Polícia Judiciária para apurar infrações penais e suas respectivas autorias. Dessa forma, ele fornece subsídio para a propositura de ação penal. O inquérito é o principal instrumento por meio do qual se realiza a investigação. De forma imediata ele se destina ao titular da ação penal: que é o Ministério Público (nos casos de ação penal pública) ou o titular do direito de queixa (nos casos de ação penal privada). Mas o inquérito também se destina ao Juiz de Direito, que irá levar em conta seu conteúdo para decidir se recebe ou rejeita uma denúncia, se defere ou não uma medida cautelar e etc. 2.3.3. Características e eficácia probatória do inquérito policial Inquisitividade (unilateralidade): Dizer que o inquérito policial é inquisitivo significa reconhecer que ele não é regido pelos princípios do contraditório e ampla defesa. Diferente do que ocorre na ação penal, no inquérito as investigações são conduzidas unilateralmente pela autoridade policial, com discricionariedade da autoridade policial para deferir ou não as diligências requeridas pelo ofendido ou pelo indiciado. Já que não possui contraditório, o inquérito não possui valor probatório em ação penal. O art. 155 do CPP determina que o juiz deva formar sua convicção com base na apreciação de provas produzidas em contraditório judicial. O artigo ainda reforça que o juiz não pode embasar sua decisão em elementos informativos colhidos na investigação, exceto se eles forem provas cautelares, antecipadas que não possam ser repetidas, como por exemplo, as interceptações telefônicas, a busca e apreensão, entre outras. Obrigatoriedade Uma vez instaurado o inquérito policial que verse sobre crime de ação penal pública, a autoridade não pode mais arquivá-lo ao seu critério, pois o inquérito serve a alguém e não tem um fim em si mesmo. Somente o juiz pode determinar o arquivamento do inquérito policial, a requerimento do Ministério Público. Mesmo que a autoridade policial verifique a existência de extinção de punibilidade, atipicidade ou excludente de antijuridicidade, por exemplo, ele não poderá extinguir o inquérito. Ele deve apenas relatar e remeter o inquérito 11 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância ao juiz competente que decidirá, uma vez provocado pelo Ministério Público, já que a ação penal pública é obrigatória. Dispensabilidade O inquérito policial pode ser dispensável caso o titular da ação penal já possua elementos de convicção suficientes para evidenciar indícios de autoria e materialidade (ou seja, indícios de que a acusação é viável). Dessa maneira, é possível que a ação penal seja proposta sem que tenha havido um inquérito. Se a função do inquérito é justamente apurar tais indícios, é natural que se eles já existam não haja necessidade mais da instauração do inquérito. É possível que autoridades administrativas também investiguem a existência de infrações penais por procedimentos diversos do inquérito policial, como é o caso das CPIs – Comissões Parlamentares de Inquérito. Qualquer pessoa também pode fornecer peças de informação ao Ministério Público para que esse ofereça uma denúncia. Escrito Os atos do inquérito policial devem ser escritos e reunidos no que chamamos de autos do inquérito policial. Sigiloso Por fim, o inquérito pode ser sigiloso. A finalidade é resguardar a imagem e a honra do acusado, assim como assegurar o sucesso da investigação. Mas esse sigilo exclui o Ministério Público, o juiz e o advogado do indiciado. 2.3.4. Forma dos atos A instauração do inquérito policial pode ocorrer de formas diversas, dependendo da espécie de ação penal aplicável a cada tipo de infração penal. Ação Penal Pública Incondicionada A. Ex officio, por Portaria do Delegado de Polícia (art. 5°, I, CPP): A autoridade policial, quando toma conhecimento de uma infração penal, de forma direta Fonte da imagem: http://www.viamaxi.com.br/2011/07/rejeitada-permissao-para-acusado-interferir-no-inquerito-policial/ http://www.viamaxi.com.br/2011/07/rejeitada-permissao-para-acusado-interferir-no-inquerito-policial/ 12 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância ou indireta, pela comunicação de qualquer cidadão ou pela prática em sua rotina, tem a obrigação de instaurar o inquérito. Nessa situação a instauração é feita por um instrumento chamado Portaria. B. Por requisição do Ministério Público ou do Juiz (art. 5°, I, CPP): Os juízes ou Tribunais, ao tomarem conhecimento por documentos da ocorrência de crime de ação pública, devem enviá-los ao Ministério Público para que seja oferecida a denúncia, caso os documentos possuam os requisitos básicos para a propositura da denúncia. Se o documento carecer desses requisitos, o juiz poderá remeter a documentação à autoridade policial ordenando a instauração de inquérito policial. O mesmo ocorre com o Ministério público quando toma conhecimento de documentos que demonstrem uma prática criminosa. C. Por requerimento do ofendido ou de seu representante legal (art. 5°, I, 2ª parte, CPP): Os legitimados, neste caso, darão a notícia de um crime à autoridade policial, que solicitará a instauração do inquérito. O requerimento do ofendido deverá conter, sempre que possível, a narração dos fatos, a individualização do indiciado ou sua caracterização, indicar testemunhas e etc. D. Por auto de prisão em flagrante: Com a prisão em flagrante, a autoridade policial toma conhecimento de uma infração penal e de sua possível autoria. Assim, deve instaurar o inquérito policial de ofício. Caso o crime seja de ação penal pública condicionada ou privada, o Delegado deverá esperar a manifestação do ofendido ou de seu representante legal para instaurar o inquérito. 2.3.5. Ação Penal Pública Condicionada Nos crimes de ação penal pública condicionada, a representação do ofendido ou de seu representante legal é requisito indispensável para a instauração do inquérito policial. 2.3.6. Ação Penal Privada Nos crimes de ação penal privada, o requerimento escrito ou verbal (reduzido a termo) do ofendido ou de seu representante legal é requisito indispensável para a instauração do inquérito policial. 13 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília- Educação a Distância Prazos para o encerramento do Inquérito Policial: O art. 10, caput, do CPP fixa a regra geral com relação ao prazo para o encerramento do inquérito policial. A regra fixa o prazo de acordo com o estado de liberdade do indiciado: Se preso: 10 dias (contados da data da prisão em flagrante ou da prisão preventiva). Esse prazo é improrrogável. Se solto: 30 dias (contados da data da instauração do inquérito policial). Esse prazo é prorrogável a pedido fundamentado da autoridade policial. Como veremos adiante, essa regra é geral e vale quando não houver previsão específica diversa. Vejamos um exemplo de caso especial: Legislação de Drogas (11.343/06): Preso: 30 dias Solto: 90 dias Em ambas as circunstâncias esses prazos podem ser duplicados, por requisição da autoridade policial e ouvido o membro do Ministério Público. Em caso de indiciado, o excesso de prazo para o encerramento do inquérito policial enseja a medida de Habeas Corpus (art. 648, II, CPP) para o relaxamento da prisão. A medida pode ser impetrada perante qualquer juiz criminal contra o Delegado de Polícia. A situação jurídica do sujeito passivo. Mas vale salientar que o inquérito policial é um procedimento administrativo e não um processo. Não há nessa fase uma acusação formal, mas sim um “suspeito” ou um “indiciado”, se assim declarado pela autoridade policial no curso das investigações. A acusação formal apenas surge com o oferecimento da denúncia ou com o ajuizamento da queixa-crime. Nesse momento o órgão da acusação oficializa e fixa os limites da imputação a ser abordada na ação penal (processo propriamente dito). 14 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso; DELMANTO JR., Roberto; DELMANTO, Roberto. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito – Procedimento Policial. 12ª. Ed. Goiânia: AB, 2009. 15 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 3. AÇÃO PROCESSUAL PENAL Objetivos: Identificar o conceito de Ação Penal; Identificar as condições da Ação Penal; Conhecer as espécies da Ação Penal. Palavras-chave: Ação; Condições; Espécies 3.1. Ação Processual Penal Toda pessoa possui o direito de invocar a prestação jurisdicional penal ao Poder Judiciário. O direito à ação penal é a faculdade de proceder em juízo contra o autor de uma infração penal, visando que as sanções penais previstas em lei lhe sejam aplicadas. 3.2. Condições da Ação Processual Penal Para exercício do direito de ação penal, é necessário que se verifique a existência de alguns requisitos. A presença dessas condições não significa um juízo de condenação, mas sim a admissibilidade de apreciação da procedência ou improcedência da pretensão punitiva estatal. Supondo que um juiz receba um processo ignorando a inexistência de uma das condições da ação, tal processo será considerado nulo desde o início. Vou elencar essas condições de admissibilidade da ação abaixo: 3.3. Possibilidade jurídica do pedido. A primeira das condições da ação que iremos analisar é a possibilidade jurídica do pedido. Mas o que significa dizer que um pedido é juridicamente possível? Significa dizer que o pedido (pretensão formulada) é admitido pelo ordenamento jurídico. Afinal de contas, como vimos no primeiro módulo, o princípio da reserva legal prevê que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal” (art. 5°, XXXIX, CF e art. 1°, CP). Assim, por exemplo, se a acusação postular a imposição de uma sanção não contemplada ou vedada pelo ordenamento jurídico (como a pena de morte, pena de caráter 16 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância perpétuo, de trabalhos forçados) o pedido será juridicamente impossível. Assim, desde logo já se evita a perda de tempo que seria examinar os fatos narrados na inicial já que uma das condições da ação não estaria presente. O mesmo também ocorre quando o fato narrado na denúncia ou na queixa não constitui crime. Também se considera como impossibilidade jurídica do pedido a ausência das condições específicas da ação penal pública condicionada (representação do ofendido e requisição do Ministro da Justiça). 3.4. Interesse de agir O interesse de agir se subdivide em três aspectos: necessidade, utilidade e adequação. A necessidade consiste na obrigatoriedade do devido processo legal para a imposição da sanção penal ao acusado. A utilidade refere-se à potencialidade de o Estado exercer seu direito de punir e, para isso, é preciso que não haja causa de extinção de punibilidade. A adequação exige que a ação penal seja promovida de acordo com o procedimento estabelecido na legislação processual penal (exemplo: exige-se que a denúncia exponha os fatos minuciosamente, exige-se que haja justa causa, ou seja, indícios de autoria e materialidade, etc.). 3.5. Legitimidade “ad causam”. Significa a pertinência subjetiva (refere-se aos sujeitos ativos e passivos) da ação. A legitimidade ativa pertence ao titular da ação penal de acordo com a sua modalidade (se pública, a iniciativa da ação penal pertence ao Ministério Público; se privada, cabe ao titular do direito de queixa). Posto que o Estado possui o direito de punir, em princípio, a legitimação ordinária para promover a ação penal é do Ministério Público. Assim, nos casos em que a lei nada diz, o Ministério Público será o titular do direito de ação. Mas, em alguns casos, a lei transfere o direito de acusar a um ente privado (via de regra o ofendido). Trata-se de uma legitimação extraordinária. Na ação penal privada subsidiária, por exemplo, há uma legitimação extraordinária sucessiva, pois somente se admite a iniciativa do ofendido depois de o Ministério Público não ter se manifestado durante o prazo para oferecimento da denúncia. 17 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância A legitimidade passiva recai sobre a pessoa contra quem foram reunidos, durante a fase de investigação, os indícios de autoria ou de participação na infração penal. A pessoa precisa ser passível de receber a sanção penal. Assim, os menores de 18 anos, por exemplo, não possuem legitimidade passiva (estão submissos ao Estatuto da Criança e do Adolescente e não ao Código Penal e de Processo Penal). 3.6. Espécies de Ação Penal 3.6.1. Ação Penal de Iniciativa Pública A ação penal pública é aquela cujo titular é o Estado. Como eu já disse, é a regra geral. O Estado exerce este poder através do Ministério Público. A ação penal pública pode ser incondicionada ou condicionada. Esta modalidade de ação é regida pelos seguintes princípios: Obrigatoriedade: presentes os elementos probatórios (indícios de autoria e materialidade), o Ministério Público é obrigado a promover a ação penal pública, por meio do oferecimento da denúncia. Ele não pode deixar de oferecer a denúncia por razões de conveniência e oportunidade. Indisponibilidade: após o oferecimento da denúncia, o Ministério Público também não pode dispor, ou seja, desistir da ação penal pública. Isso se aplica também aos recursos. O Ministério Público não é obrigado a recorrer, mas uma vez que o fez, não pode desistir do recurso. – Oficialidade e oficiosidade: oficialidade significa que a ação penal pública é movida por um órgão oficial (Ministério Público). Oficiosidade consiste no fato de que a autoridade pública deve agir de ofício, ou seja, independentemente de qualquer provocação. Intranscendência: a sanção penal não pode transcender a pessoa do acusado. Divisibilidade: em caso de concurso de agentes,a ação penal deve abranger todos aqueles que cometeram a infração penal. Há, contudo, possibilidade de desmembramento do processo. A ação penal pública se inicia com o recebimento, pelo juiz, da denúncia oferecida pelo Ministério Público. A denúncia é, portanto, a petição inicial da ação penal pública, que formaliza a acusação. Ela determina o início da ação para o juiz e para o Ministério Público. 18 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Para o acusado, no entanto, a ação penal apenas se inicia com a citação válida. É a partir daí que ele se torna réu. A Ação penal pública incondicionada chama-se incondicionada justamente porque nessa modalidade de ação penal o Ministério Público não está condicionado, ou seja, não depende de qualquer autorização prévia para o oferecimento da denúncia. Ele age de ofício. É a regra geral. Em outras palavras, quando o Código de Processo Penal silenciar sobre a espécie de ação penal, o crime será de ação penal pública incondicionada. 3.6.2. Ação penal pública condicionada Nessa modalidade, a lei sempre exige uma condição para o exercício da ação penal. Ela é condicionada: (a) à representação do ofendido ou de seu representante legal; ou (b) à requisição do Ministro da Justiça. Quando for essa a modalidade cabível, a lei sempre dirá de modo explícito sob a expressão: “somente se procede mediante representação”. A representação é a manifestação da vontade do ofendido ou de seu representante legal no sentido de ter interesse em ver punido o autor do crime, autorizando assim, o Ministério Público a iniciar a ação penal. Trata-se, como já disse (acima), de uma condição específica para a propositura da ação penal. A partir dela, se houver indícios de autoria e materialidade, o Promotor de Justiça fica obrigado a oferecer a denúncia. A representação pode ser escrita ou oral (nesse caso deve ser reduzida a termo) e dirigida ao juiz, ao membro do Ministério Público ou à autoridade Policial. Via de regra, a representação é feita pelo ofendido. No caso de menor ou deficiente mental, contudo, o titular passa a ser o seu representante legal. Há possibilidade de nomear um curador caso os interesses do ofendido colidam com os de seu representante legal. Se o ofendido for morto, há possibilidade de direito de representação passar ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. O prazo para o exercício do direito de representação como regra é de 6 (seis) meses, contados do conhecimento da autoria delitiva. É possível se retratar da representação (desfazer), desde que isso ocorra antes do oferecimento da denúncia. Como já mencionei, a ação penal pública é indisponível e por isso, uma vez que o Promotor oferecer a denúncia, ele não poderá mais desistir da ação. 19 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Esse prazo é chamado de decadencial. Por se tratar de direito material ele é regido pelos termos do artigo 10 do Código Penal (inclui-se o dia do começo no cômputo do prazo), diferente da regra do artigo 798 Código de Processo Penal (que exclui o primeiro dia da contagem). O prazo nesse caso não se interrompe e não se suspende. Há exceção: no caso da Lei Maria da Penha (11.340/06) está retratação pode ocorrer até o recebimento da denúncia (ou seja, momento posterior ao oferecimento da denúncia). Vou falar um pouco em específico da (b) ação penal pública condicionada à requerimento do Ministro da Justiça. A requisição é um ato político. Há certos casos em que a conveniência da propositura de ação penal fica sujeita a um juízo político. Assim como a representação, a requisição é condição de procedibilidade, mas não obriga o Ministério Público a oferecer denúncia. A requisição é destinada diretamente ao chefe do Ministério Público, que é o Procurador-Geral. Como o Código de Processo Penal não menciona prazo, entende-se que pode ser exercida a qualquer tempo. Ela também é retratável até o oferecimento da denúncia. 3.6.3. Ação Penal de Iniciativa Privada A ação penal privada é aquela em que o Estado transfere a legitimidade da propositura da ação para o ofendido ou seu representante legal. A ação penal privada se inicia com o ajuizamento do que chamamos queixa-crime, que deve ser oferecida em juízo, por advogado habilitado na Ordem dos Advogados do Brasil, autorizado por procuração com poderes especiais. Via de regra o ofendido é o titular do direito de queixa, mas pode ocorrer a modificação do direito de queixa nas mesmas circunstâncias que mencionei quando tratei da representação. O prazo para o oferecimento de queixa é de 6 (seis) meses, contados a partir da data em que for conhecido o autor do crime. Mas há exceções que mencionam prazos diferentes. A ação penal privada é regida pelos seguintes princípios: Oportunidade e Conveniência: o ofendido pode ou não exercer o direito de queixa de acordo com sua conveniência (diferente da pública, que é obrigatória). 20 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Disponibilidade: a ação penal privada é disponível, mesmo depois de instaurada, até o trânsito em julgado da sentença condenatória. Intranscendência: assim como na ação penal pública, na privada a ação penal só pode ser instaurada contra a pessoa a quem se atribui a prática do crime. 3.7. Ação Civil “ex delicto” Além de despertar a pretensão punitiva do Estado, a prática de uma infração penal também pode ensejar o surgimento da pretensão de reparação do dano ex delicto, ou seja, do dano resultante da prática da infração penal. Essa obrigação de reparar é amparada pelo Código Civil (artigos 186 e 927). A pessoa lesada pela prática do dano ex delicto tem duas alternativas para buscar a reparação: (a) propor uma ação de conhecimento com pedido de condenação de indenização na esfera cível; ou (b) aguardar o término da ação penal para, em seguida, ingressar diretamente com uma ação de execução fundamentada em sentença penal condenatória com trânsito em julgado. A propositura da ação cível de conhecimento independe da instauração de qualquer processo penal. Caso exista ao mesmo tempo a ação penal e a ação civil ex delicto, é facultado ao juiz cível suspender o curso da ação até que haja julgamento em definitivo da ação penal. O prazo para a suspensão é de um ano. Com isso, visa-se evitar que haja decisões conflitantes. Se, contudo, já houver uma sentença penal condenatória transitada em julgado, essa decisão exercerá ingerência sobre a esfera civil da reparação do dano ex delicto, por força do art. 91, inc. I do Código Penal (veja que aqui há uma exceção à autonomia entre as jurisdições cível e criminal). Bom, falei do caso de haver condenação na ação penal. Mas e se houver absolvição? Qual seria a repercussão civil da absolvição criminal? Em regra, a absolvição em ação penal em nada prejudica a pretensão de reparação civil do dano ex delicto. Veja que o réu pode ser absolvido, por exemplo, por falta de provas. Isso não fornece qualquer certeza ao âmbito civil e, portanto, não afeta a possibilidade de na ação civil de conhecimento ser provada e reconhecida a existência do direito ao ressarcimento, de acordo com o grau de percepção e convicção próprios da esfera civil. 21 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Mas há duas hipóteses em que a absolvição penal impede a propositura da ação civil ou gera a sua extinção em razão da superveniência de coisa julgada. Isso acontece quando: (a) ficar reconhecida a inexistência material do fato (art. 66 do CPP); (b) reconhecida a excludente de ilicitude real (art. 65 do CPP). A legitimidade ativa para ingressar com a ação civil de conhecimento ou é execução para a reparação do dano ex delicto é conferida ao MinistérioPúblico, caso o titular do direito ao ressarcimento não tenha meios para propor e o requeira. Trata-se de uma legitimação extraordinária, na qual o Ministério Público irá atuar como substituto, agindo em nome próprio e em defesa de direito alheio. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso; DELMANTO JR., Roberto; DELMANTO, Roberto. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito – Procedimento Policial. 12ª. Ed. Goiânia: AB, 2009. 22 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 4. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA Objetivos: Reconhecer a organização da justiça penal no Brasil e os princípios que norteiam essa organização Identificar o conceito de Jurisdição e Competência Palavras-chave: Jurisdição; Competência; Constituição. 4.1. Jurisdição A palavra jurisdição vem do latim jurisdictio. Significa a prerrogativa de dizer o direito, de decidir. Em outras palavras, a jurisdição envolve a atribuição de um poder e, ao mesmo tempo, uma das funções do Estado. A jurisdição pode ser conceituada como um poder-dever do Estado de solucionar conflitos de interesses que são trazidos a sua apreciação, por meio de um processo. A finalidade última é, portanto, agir em prol da segurança jurídica para garantir a paz social. O poder jurisdicional é privativo do Estado-Juiz. Mas, em face de uma expansão territorial, de determinadas pessoas e de determinas matérias, o exercício desse poder de aplicar o direito (abstrato) ao caso concreto sofre limitações, nascendo daí a noção de competência jurisdicional. Já a competência pode ser brevemente definida como a medida da jurisdição. A competência delimita o âmbito de atuação de cada órgão jurisdicional no exercício de sua função. 4.2. Princípios da Jurisdição Penal A atividade jurisdicional é regida pelos princípios fundamentais. O Princípio do juiz natural diz que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente (art.5º, LIII, da Constituição Federal)”. Este princípio ainda garante a proibição do juízo ou tribunal de exceção (art. 5º, XXXVII, CF). Em outras palavras, a garantia do juiz natural significa que: (a) não haverá juízo ou tribunal ad hoc, isto é, tribunal de exceção; (b) todos têm o direito de submeter-se a julgamento (civil ou 23 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância penal) por juiz competente, pré-constituído na forma da lei; (c) o juiz competente tem de ser imparcial. Destaco também a influência do Princípio do devido processo legal, segundo o qual, “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (art.5º, LIV, CF)”. Há ainda o Princípio da investidura, segundo o qual a jurisdição só pode ser praticada por quem tenha sido regularmente investido no cargo e por quem esteja em exercício desse cargo. O Princípio da indeclinabilidade da prestação jurisdicional diz que nenhum juiz poderá se negar ao exercício da sua função jurisdicional. Este princípio ainda determina que o legislador não pode produzir leis que restrinjam o acesso ao Poder Judiciário (art.5º, XXXV, CF). O Princípio da improrrogabilidade, veda ao juiz invadir ou ter sua competência invadida por outro juízo. Conforme o Princípio da indelegabilidade, o juiz não poderá delegar sua jurisdição a outro órgão, exceto nos casos taxativamente permitidos. O Princípio da inevitabilidade ou irrecusabilidade, determina que as partes não poderão recusar o juiz que o Estado designou, salvo nos casos de incompetência, impedimento e suspeição. Há ainda o Princípio da inércia ou da titularidade. Significa que o poder jurisdicional só pode atuar se for evocado pelas partes. Ou seja, o juiz não pode instaurar ações penais de ofício (por sua iniciativa), pois dessa forma estaria agindo com parcialidade. O Princípio da correlação ou da relatividade, postula que deva haver uma congruência entre o objeto da ação e o objeto da sentença. Nesse sentido, o réu não pode ser condenado sem antes saber exatamente do que está sendo acusado. Isso porque a acusação vai determinar a abrangência da prestação jurisdicional. O que quero dizer com isso é que o juiz não poderá decidir além ou fora do pedido em que o órgão de acusação 24 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância formula. Assim, os fatos e o pedido narrados na denúncia ou queixa irão delimitar o poder jurisdicional. Por fim, destaco o Princípio da unidade e identidade da jurisdição. Ele significa que a jurisdição é única em si e em seus fins, diferenciando-se apenas no julgamento de ações penais ou cíveis. Fonte da imagem: http://www.positivoteceduc.com.br/palavra-do-especialista/competencia-materializacao- acao/ 4.3. Competência A legislação define a competência (âmbito dentro do qual o órgão irá exercer seu poder jurisdicional), de acordo com os seguintes critérios: Competência de foro (competência territorial): comarca ou seção judiciária competente, de acordo com a circunscrição territorial, para apreciação da infração penal. Competência de juízo: no caso de haver mais de uma vara (ou juízo) no mesmo foro. Competência de Justiça (em razão da matéria): Justiça Especial (Eleitoral ou Militar) ou Justiça Comum (Federal ou Estadual). Competência originária por prerrogativa de função: casos em que o acusado será processado e julgado, originariamente, perante o Tribunal competente. 4.4. Competência de Foro ou Territorial Trata-se da competência fixada pelo lugar da infração (art.69, I e II, do CPP). Em regra, é fixada pelo lugar em que se consumar o delito, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. http://www.positivoteceduc.com.br/palavra-do-especialista/competencia-materializacao-acao/ http://www.positivoteceduc.com.br/palavra-do-especialista/competencia-materializacao-acao/ 25 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância A competência de foro ou territorial (lugar da infração) determina qual será a comarca competente para o julgamento do fato criminoso. Competência pelo domicílio ou residência do réu também é conhecida como competência de foro subsidiário. Ela está descrita no artigo 72 do CPP. 4.5. Competência em Razão da Matéria (Natureza da Infração) Uma vez fixada a competência pelo lugar da infração ou pelo domicílio ou residência do réu, será necessário fixar a justiça competente em razão da natureza da infração, ou seja, em razão da matéria. A jurisdição (Justiça) pode ser Especial, que se divide em Justiça Militar e Justiça Eleitoral; e Comum, que se divide em Justiça Federal e Justiça Estadual. A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária (federal ou estadual), salvo a competência privativa do Tribunal do Júri, que é atribuída pela Constituição Federal. O Tribunal do Júri tem a competência para julgar os crimes dolosos contra a vida, por exemplo, o homicídio doloso, o infanticídio, previstos nos artigos. 121 e 123 do Código Penal. 4.6. Competência da Justiça Especial Militar e Eleitoral Em relação à jurisdição especial, a Constituição Federal determina que compete à Justiça Eleitoral (artigo 121, da Constituição Federal), julgar os crimes eleitorais e os seus conexos. A Constituição Federal também prevê a competência da Justiça Militar (artigo 124, da Constituição Federal), qual seja, processar e julgar os crimes militares previstos em lei. 4.7. Competência da Justiça Comum: Federal e Estadual A Constituição Federal também prevê a competência da jurisdição comum (federal ou estadual). Por exemplo, compete à JustiçaFederal processar e julgar os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar (art.109, IX, da Constituição Federal). 26 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância A Justiça Comum Estadual tem a competência residual. Em outras palavras, tudo o que não for de competência das jurisdições federal e especial será de competência da Justiça Estadual. 4.8. Competência por Prevenção e Distribuição Pode haver casos em que mais de um juiz é competente para uma mesma circunscrição judiciária. Nesse caso, a competência será fixada pela distribuição (Artigo 69, IV, do Código de Processo Penal). Dessa forma, se na mesma comarca existirem vários juízes igualmente competentes para o julgamento do caso, será considerado competente pelo critério da prevenção aquele que se adiantar aos demais quanto à prática de alguma providência processual ou extraprocessual (exemplo: a decretação da prisão preventiva, a concessão de fiança, etc.) 4.9. Competência por Prerrogativa de Função (Em Razão da Pessoa) A competência por prerrogativa de função (artigo 69, VII, do CPP) ou competência em razão da pessoa é determinada pela função da pessoa, ou melhor, é garantia inerente ao cargo ou função. A prerrogativa surge da relevância do desempenho do cargo pela pessoa e por isso, não pode ser confundida com o privilégio, já que privilégio consiste em um benefício concedido à pessoa. Tanto é que, a tal prerrogativa exige que a pessoa esteja exercendo aquela determinada função. A competência pela prerrogativa de função referente, por exemplo, ao Supremo Tribunal Federal (STF), está prevista na Constituição Federal. Vejamos: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: (...) b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice- Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no artigo 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente; (...). 27 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 4.10. Conexão e Continência Veja que a continência e a conexão são causas de prorrogação de competência e não de fixação. A existência de continência e conexão gera a reunião de processos e prorrogação da competência. Trata-se de uma medida de conveniência que viabiliza a compreensão completa da atividade criminosa e a produção conjunta de provas. Com isso também se evita a superveniência de decisões conflitantes sobre infrações penais que na prática estão intimamente vinculadas. 4.11. Conexão A conexão pressupõe a existência de uma pluralidade de infrações penais, que estão atreladas por um dos nexos inscritos no artigo 76 do CPP. Ocorre quando duas ou mais infrações estão ligadas por um liame, sendo que estes crimes devem ser julgados em um só processo em virtude da existência desse nexo. O inciso I do referido artigo elenca elos intersubjetivos de conexão entre infrações penais, que estão unidas pelo fato de terem sido praticadas: a) Por sujeitos ocasionalmente reunidos (ex.: ato de vandalismo praticado ocasionalmente por torcedores); b) Em concurso (ex: organizações criminosas como o pcc – primeiro comando da capital); c) Uns contra os outros (ex: lesão corporal recíproca); No inciso II, do artigo 76, o legislador trata da conexão com base nos elos objetivos que unem a infrações penais (e não mais nos sujeitos ativos). Por isso é denominada conexão material. Ele elenca 4 (quatro) possibilidades. Havendo duas ou mais infrações, se elas forem sido praticadas para: a) Facilitar umas às outras (ex. Criminoso que mata o marido para facilitar a execução do estupro da esposa); b) Ocultar umas às outras (ex. Agende provoca incêndio para destruir provas de um crime praticado anteriormente); c) Conseguir impunidade em relação a qualquer delas (ex. Agente sequestra uma pessoa e em seguida mata a única testemunha do fato como intuito de assegurar a impunidade); d) Conseguir vantagem e relação a qualquer delas (ex. Agente mata seu comparsa para usufruir sozinho do produto de um assalto que realizaram juntos). 28 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Veja que a conexão material ou objetiva ganha especial relevância nos crimes contra a vida, porque a competência do Tribunal do Júri se estende sobre os demais crimes, mesmo que eles não constituam crimes dolosos contra a vida. Por fim, no inciso III ocorre o que chamamos de conexão probatória ou instrumental. São hipóteses em que a prova de uma infração penal exerce influência sobre a prova de outras. Exemplo: no crime de receptação, é necessário que o objeto material da conduta de receptar seja produto de crime. Então, sem a prova do crime antecedente (ex. DVD pirata), não se comprova existência do crime de receptação. Outro exemplo é o crime de uso de documento falso em relação ao crime de falsificação de documentos. O primeiro não persiste sem a comprovação do outro praticado anteriormente. 4.12. Continência A continência estabelece uma relação entre o continente (algo mais abrangente, que contém outro objeto) e o conteúdo (algo menos abrangente, que é contido). Diferente da conexão, a continência não pressupõe a existência de uma pluralidade de infrações, mas sim uma unidade de infração penal (um único crime). Ela está descrita pelo Artigo 77 do CPP: O inciso I pressupõe prevê a hipótese de uma infração (praticada em concurso de agente) (uma ou mais pessoas). É a chamada continência por cumulação subjetiva. (Uma infração mais pluralidade de agente). Já o inciso II elenca as hipóteses de continência por cumulação objetiva. Ou seja, esse inciso reúne os casos de concurso formal ou ideal de infracções penais. Em suma, o inciso II pressupõe a pluralidade de infrações penais (cumulação objetiva), deflagrada por uma única conduta (concurso formal ou ideal de infracções penais). (Pluralidade de infrações + uma conduta). Em havendo mais de um crime praticado em conexão ou continência, são necessários critérios para fixar qual será o juízo competente. 1) Se houver crime de competência do Tribunal do Júri (crimes dolosos contra a vida), este deverá prevalecer. 2) Senão, prepondera: a) o local da infração mais grave (pena mais grave); 29 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância b) se de igual gravidade, o local onde ocorreu o maior número de infrações; Se os requisitos acima não forem suficientes, a competência será fixada em razão da prevenção. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso; DELMANTO JR., Roberto; DELMANTO, Roberto. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GRECCO FILHO, Vicente. Manual do Processo Penal. 9 ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 30 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 5. QUESTÕES PREJUDICIAIS E PROCESSOS INCIDENTAIS Objetivos: Identificar as questões prejudiciais e processos incidentais, bem como as exceções processuais; Reconhecer as espécies de incidentes processuais definidas pelo Código de Processo Penal; Identificar os impedimentos que afetam a imparcialidade do Juiz. Palavras-chave: Juiz; Impedimento; Incompetência É possível que, no curso do processo penal, a gente se depare com determinadas situações que são degrande relevância para a solução do conflito no processo principal. São situações secundárias, mas precisam ser solucionadas antes do desfecho da causa principal. É o que chamamos de questões ou incidentes processuais. 5.1. Questões ou Incidentes Processuais Os incidentes são pontos essenciais e vinculados ao direito material, que impedem o desenvolvimento normal do processo. Eles acarretam sua suspensão do processo até que sejam analisados e decididos pelo juízo competente, os pontos secundários referentes ao processo principal. Os incidentes processuais possuem algumas espécies que são definidas pelo Código de Processo Penal: questões prejudiciais; exceções; incompatibilidade e impedimentos; conflitos de jurisdição; restituição das coisas apreendidas; medidas assecuratórias e, por fim, incidente de falsidade. Vou abordar abaixo apenas algumas dessas espécies. Como você sabe, o processo penal tem como objetivo a resolução de conflitos e se preocupa com a materialidade e a autoria. Mas antes de adentrar no mérito desses conflitos, é preciso analisar os procedimentos secundários que incidem sobre o procedimento principal e que precisam ser decididos antes da causa principal. É o que chamamos de questões prejudiciais e processos incidentes. 31 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 5.2. Questões Prejudiciais As questões prejudiciais são os pontos estratégicos, relacionados ao direito material, que necessitam ser decididos antes do mérito da causa. Dessa forma, são considerados impedimentos ao desenvolvimento regular do processo. Em outras palavras, trata-se de um antecedente lógico que condiciona a decisão sobre a existência da infração penal. A decisão da questão prejudicada (posterior) depende da solução da questão prejudicial (anterior). Podemos classificar as questões prejudiciais em: a) questões prejudiciais homogêneas b) questões prejudiciais heterogêneas As homogêneas tratam da mesma matéria da causa principal, e devem ser decididas no próprio juízo penal (ex. no crime de calúnia, o juiz precisa primeiro verificar se não é o caso da exceção da verdade, pois se o fato criminoso que se imputa à outra parte realmente restou comprovado em outro processo, não há que se falar em calúnia). As heterogêneas vinculam-se a outras áreas do direito e devem ser decididas por outro juízo. (exemplo A acusa B de invadir a posse de seu imóvel – esfera civil. O juiz primeiro verifica se A realmente tem a posse do imóvel, pois se não tiver, a ação principal resta prejudicada). 5.3. Processos Incidentes Os procedimentos incidentes, por sua vez, compreendem: as exceções, conflitos de competência, restituição de coisas apreendidas, medidas assecuratórias, Incidente de falsidade e Incidente de Insanidade mental. Por limitação de espaço e tempo, elenquei apenas alguma para efeito do nosso estudo. 5.4. Exceções Processuais A parte, em um determinado processo, pode basear sua defesa em dois aspectos: a) atacando diretamente a acusação que lhe é feita (negando a autoria, por exemplo); ou b) atacando indiretamente o processo, com o objetivo de extingui-lo sem o julgamento do mérito ou de retardar o seu prosseguimento. A exceção é uma dessas formas de ataque ao processo. 32 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Mas há casos também, em que a exceção é conhecida pelo magistrado de ofício. Nessa hipótese ela é chamada de objeção. É o caso da exceção de impedimentos, de coisa julgada, incompetência, etc. De uma forma bem genérica, vou explicar o procedimento que o Código de Processo Penal adota para as exceções: apresentada a exceção, o juiz, se puder examiná-la de plano ou apenas com prova documental, pode fazê-lo nos próprios autos. Se entender que é o caso, ele irá se declarar suspeito ou incompetente, ou irá extinguir o processo independentemente da formação onerosa de procedimento em separado. Na primeira situação - Suspeito: previsto em lei, esta situação impede o juiz de atuar em determinado processo, por haver dúvida com relação à sua imparcialidade e independência. Exemplo: Juiz envolvido em causa em que uma das partes é seu irmão. Na segunda situação – Incompetente – Não faz parte da competência atribuída pela lei a determinado juiz. Se houver recusa da alegação e a necessidade de apresentação de prova, então o juiz determinará a autuação em anexo (apenso), a fim de que não atrapalhar o desenvolvimento do processo principal. Neste apenso serão juntadas as provas especiais daquela questão. E o que acontece, por exemplo, no caso de exceção de coisa julgada. Exceção de coisa julgado ocorre quando a mesma matéria já foi avaliada e houve trânsito em julgado em outro processo anterior. Via de regra, as exceções não suspendem o andamento do processo principal. Mas esse andamento poderá ser sustado se a parte contrária reconhecer o fundamento da alegação. O importante é que na decisão sobre a suspensão ou não, o juiz leve em conta o estado da causa e fatores como o possível perecimento da prova, a ocorrência da prescrição, etc. O artigo 95 do Código de Processo Penal prevê as seguintes exceções: suspeição, incompetência do juízo, litispendência, ilegitimidade de parte e coisa julgada. Vou avaliar cada uma de forma breve, para que você tenha uma noção do conceito, tudo bem? 33 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 5.5. Exceções de Suspeição e Impedimentos A suspeição e o impedimento afetam a imparcialidade do juiz. A suspeição pode ocorrer, por exemplo: (a) quando há um vínculo do julgador com uma das partes (ex: amizade íntima ou inimizade, parentesco, relação de débito ou crédito, tutela ou curatela, dentre outros); ou (b) quando há um vínculo ao assunto debatido na ação (por si ou por parente seu que responda por fato semelhante). O impedimento, quando o julgador tem vínculo direto ou indireto com o processo em julgamento (quando ele tenha participado do feito diretamente ou por parente seu). As exceções podem ser feitas de ofício pelo juiz que se declare suspeito ou impedido, por escrito e de forma fundamentada; ou podem também ser requeridas pelas partes. A exceção de suspeição e os impedimentos também podem ser dirigidos contra o órgão do Ministério Público e auxiliares da justiça. 5.6. Exceção de Incompetência A exceção de incompetência é a defesa indireta que a parte pode interpor contra o juízo, alegando sua incompetência para julgar a causa. Ela pode ser oposta verbalmente ou por escrito. Em outras palavras, trata-se de uma circunstância em que há inadequação do foro ou do juízo em face das regras de determinação da competência. O Código de Processo Penal em seu artigo 109 abre a possibilidade de reconhecimento da incompetência do juízo em qualquer fase do processo. Assim, por exemplo, se ao tomar conhecimento dos fatos no curso do processo o juiz (Justiça comum) perceber que se trata de um crime doloso contra a vida, ele irá se declarar incompetente e remeter os autos para o Tribunal do Júri. A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, persistindo os atos instrutórios (provas), que serão ratificados pelo Juiz competente. 5.7. Exceção de Litispendência É outra forma de defesa indireta e que pode apresentada por qualquer das partes. A litispendência consiste na existência paralela de duas ações penais (processos) que versam sobre o mesmo fato (vale aqui a ocorrência da realidade, pouco importante se as tipificações dadas pela acusação forem diversas). 34 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Nesse sentido, a exceção de litispendência, visa demonstrar que existe já uma causa idêntica em outro foro, aindanão julgada, razão pela qual o processo deve ser extinto. Pode ser feita a qualquer tempo, pois sua matéria não reclui. Pode ser feita de ofício. Ela visa evitar que haja decisões conflitantes para o mesmo impasse. 5.8. Exceção de Ilegitimidade da Parte A ilegitimidade da parte é a inadequação da titularidade legal da ação penal, ativa e passiva, à que, de fato, está sendo colocada no processo. Exemplo: autor entra com ação fundada em direito que não possui. A exceção de ilegitimidade da parte visa à extinção do processo ou o seu retardamento até que seja corrigido o vício de legitimidade. Ela pode ser feita a qualquer tempo. Também ocorre quando os pressupostos de validade do processo não foram preenchidos. Uma vez decretada a ilegitimidade, o processo pode ser o não anulado, conforme seja possível ou impossível a retificação do erro. 5.9. Exceção De Coisa Julgada A coisa julgada impede a repetição do processo penal sobre o mesmo fato contra o mesmo réu. É outra forma de defesa indireta contra o processo, visando sua extinção, tendo em vista que idêntica causa já foi definitivamente julgada em outro foro. Ela impede que ocorra o que em processo chamamos de bis in idem, ou seja, a dupla punição ou o duplo processo pelo mesmo fato, garantindo maior proteção ao indivíduo contra eventual abuso do Estado. As partes podem apresentar a exceção da coisa julgada a qualquer tempo, ou de ofício, em petição em separado, por qualquer das partes, sempre determinando a oitiva da outra. Admite-se a suscitação verbal, porém é mais incomum. 5.10. Conflito de Jurisdição e de Competência O conflito de competência é denominado no Código de Processo Penal como conflito de jurisdição. Ele ocorre quando dois ou mais juízes entendem ser competentes para apreciar a mesma causa, ou ainda quando nenhum juiz se declara competente. Na primeira hipótese acontece o que chamamos de conflito positivo; e no segundo caso, temos o chamado conflito negativo. 35 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Parte da doutrina prefere denominar conflito de jurisdição aquele que se estabelece entre juízes de diferentes órgãos, como ocorreria entre o juiz federal e o juiz estadual. Para eles, a expressão conflito de competência refere-se a conflitos entre magistrados do mesmo órgão, como ocorreria entre juízes estaduais de determinada Comarca. O conflito pode ser levantado pela parte interessada, pelo Ministério Público e por qualquer dos juízos ou tribunais que divergirem. Se positivo, será suscitado por requerimento da parte ou do Ministério Público, ou por representação do juízo ou tribunal envolvido diretamente perante o tribunal competente para dirimi-lo. Ao recebê-lo, o tribunal poderá determinar a suspensão do processo principal a fim de evitar a nulidade, requisitando informações dos órgãos jurisdicionais em divergência. Se negativo, poderá ser suscitado nos próprios autos, os quais serão remetidos ao tribunal para julgamento. Na instrução do incidente poderá ser determinada diligência probatória. O conflito de competência pode decorrer de atribuição quando a divergência é entre autoridades administrativas ou entre estas e autoridade judiciária. Quando se tratar de autoridade do mesmo estado, cabe o Tribunal de Justiça dirimi-los. Não havendo magistrado, cabe a instituição à qual pertencem. É de competência do Superior Tribunal de Justiça julgar os conflitos entre tribunais, ressalvada a competência do Supremo Tribunal Federal, ou entre tribunais e juízes a eles não vinculados e entre juízes subordinados a tribunais diferentes, como por exemplo, um juiz federal e um estadual. E compete ao Supremo Tribunal Federal a resolução dos conflitos de competência entre os Tribunais Superiores ou entre estes e qualquer outro tribunal. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 22ed. São Paulo: Saraiva, 2015. DELMANTO, Celso; DELMANTO JR., Roberto; DELMANTO, Roberto. Código Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito – Procedimento Policial. 12ª. Ed. Goiânia: AB, 2009. 36 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 6. TEORIA GERAL DAS PROVAS Objetivos: Conhecer as teorias que explicam as provas no Processo Penal Identificar a finalidade das provas Palavras-chave: Provas; Princípios; Teoria. 6.1. Teoria Geral das Provas O objetivo do Processo Penal é reconhecer e estabelecer uma verdade jurídica. As provas são justamente o meio que possibilita tal objetivo. Mas o que exatamente são provas? As provas são todos os dados produzidos pelas partes e pelo juiz em um processo com a finalidade de revelar a existência dos fatos. Assim a finalidade da prova é formar a convicção do magistrado, para que ele possa, baseado nas provas, proferir a decisão da causa. A decisão do juiz fica vinculada às provas dos autos, embora ele julgue de acordo com o sistema da livre apreciação (artigo 157 do CPP). Mas o que é a livre apreciação? Trata-se do sistema de apreciação de provas adotado como regra no Brasil, conforme artigo 155, caput, do Código de Processo Penal, conjugado com o art. 93, IX, da Constituição da República. Para você entender melhor transcrevo abaixo o texto da lei: Artigo 93, IX, da CF: todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. Art. 155, caput, do CPP: O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas 37 Direito Processual Penal Universidade Santa Cecília - Educação a Distância É fonte de prova tudo aquilo que possa fornecer indicações úteis das quais sejam necessárias comprovações. Pode ser considerado como meio de prova, tudo aquilo que servir, direta ou indiretamente, para a comprovação da verdade. O ônus da prova incumbe àquele que fizer a alegação (artigo 156 do CPP). O que isso quer dizer é que quem faz uma acusação é quem terá que provar o que está alegando, ou seja, não é o acusado que precisa comprovar o contrário. Com relação ao momento das provas, elas têm um tempo certo para serem propostas: (a) pela acusação, na denúncia ou queixa. A autoridade pode ou não deferi-la, ou seja, não autorizá-la; (b) pela defesa, em um momento processual chamado defesa prévia. Da mesma forma, a autoridade pode ou não deferi-la. Mas, atendendo aos princípios da verdade real e da ampla defesa, as provas também podem ser determinadas de ofício pelo juiz ou pela autoridade policial a qualquer tempo, se preciso. Se necessário à preservação da prova, ou seja, quando há risco de perecimento, é possível determinar a produção antecipada de provas (artigos 225 e 366 do CPP). 6.2. Princípios da Prova Os princípios constitucionais estudados no primeiro texto trazem algumas implicações práticas que se aplicam às provas. Vou destacar algumas abaixo: De acordo com o Princípio da Imparcialidade do Juiz, não há jurisdição sem imparcialidade. O juiz deve ser imparcial, neutro entre as partes. O Princípio do Contraditório permite que argumentos e provas sejam contrariados, contestados. Existem provas que são colhidas sem o contraditório, são as chamadas provas cautelares, como por exemplo, as perícias. Dizemos que as provas cautelares possuem o contraditório diferido, ou seja, adiado,