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<p>Stress em crianças e</p><p>adolescentes</p><p>Marilda Emmanuel Novaes Lipp</p><p>(Org.)</p><p>>></p><p>http://www.papirus.com.br/</p><p>http://www.papirus.com.br/</p><p>Para meu inesquecível filho Daniel Moacyr,</p><p>cuja adolescência foi interrompida tão injustamente.</p><p>Daniel, you made the sun shine for us.</p><p>In memoriam.</p><p>Sumário</p><p>Prefácio</p><p>Lucia Emmanoel Novaes Malagris</p><p>PARTE I: CONCEITOS BÁSICOS</p><p>1. O diagnóstico do stress em crianças</p><p>Marilda Emmanuel Novaes Lipp</p><p>2. Raiva em crianças: Stress como fator desencadeante</p><p>Marilda Emmanuel Novaes Lipp</p><p>3. Diagnóstico do stress na adolescência</p><p>Valquiria Aparecida Cintra Tricoli</p><p>4. Diagnóstico e tratamento do stress nos transtornos afetivos</p><p>na infância e na adolescência</p><p>Cristiane von Werne Baes, Camila Maria Severi Martins e</p><p>Mario Francisco Juruena</p><p>PARTE II: FONTES DE STRESS</p><p>1. Stress na escola: Implicações para alunos e professores</p><p>Carmem Beatriz Neufeld e Carla Cristina Daolio</p><p>2. O TDAH como fonte de stress para crianças e pais</p><p>Joseana Azevedo Bargas</p><p>3. O stress emocional da modernidade: Reflexo das mudanças</p><p>Marilda Emmanuel Novaes Lipp</p><p>4. Estilos parentais e stress dos filhos: Quando a combinação</p><p>desses fatores pode levar ao desenvolvimento de transtornos</p><p>psicológicos</p><p>Paulo Eduardo Benzoni</p><p>PARTE III: O TRATAMENTO DO STRESS DA CRIANÇA E DO</p><p>ADOLESCENTE</p><p>1. O treino do controle do stress infantil</p><p>Márcia Bignotto</p><p>2. Como tratar o stress psicológico na adolescência</p><p>Valquiria Aparecida Cintra Tricoli</p><p>3. Recursos tecnológicos no tratamento do stress infantil</p><p>Maria Lúcia Rossi</p><p>4. A farmacologia do tratamento do stress em crianças e</p><p>adolescentes</p><p>Tania Y. Takakura</p><p>5. O uso da acupuntura no tratamento do stress da criança e do</p><p>adolescente</p><p>Louis Mario Novaes Lipp</p><p>6. Maus-tratos e transtorno de estresse pós-traumático na</p><p>infância e na adolescência</p><p>Renato Maiato Caminha, Marina Gusmão Caminha, Camila</p><p>Arguello Dutra e Eduardo Reuwsaat Guimarães</p><p>7. Intervenções da terapia do esquema no stress precoce</p><p>Ricardo Wainer</p><p>Sobre os autores</p><p>Notas</p><p>Outros livros da organizadora</p><p>Redes sociais</p><p>Créditos</p><p>Prefácio</p><p>A melhor maneira de tornar as crianças boas é fazê-las</p><p>felizes.</p><p>Oscar Wilde</p><p>O stress na infância e na adolescência tem sido negligenciado à</p><p>medida que explicações alternativas são dadas para os sintomas de</p><p>stress nessas fases da vida. Acreditava-se que o stress fosse um processo</p><p>que só acontecia com adultos. Pesquisas científicas têm corrigido essas</p><p>crenças distorcidas sobre o tema. Tal negligência contribuiu para o</p><p>atraso na realização de estudos na área e, consequentemente, na</p><p>identificação e no tratamento do stress em crianças e adolescentes. Um</p><p>livro que englobe aspectos diretamente relacionados ao tema revela-se</p><p>de grande valia, podendo orientar profissionais no atendimento a</p><p>crianças, assim como os pais no entendimento e na forma de lidar com</p><p>seus filhos quando estressados ou para prevenir a ocorrência do stress</p><p>excessivo. Desse modo, caminha-se na direção da reestruturação de</p><p>crenças distorcidas e saberes defasados que, infelizmente, ainda são</p><p>mantidos. Parece-me essa a principal contribuição da presente obra. O</p><p>livro Stress em crianças e adolescentes se organiza de modo bastante</p><p>didático, iniciando por apresentar conceitos básicos, prosseguindo por</p><p>esclarecer o que são consideradas fontes de stress para crianças e</p><p>adolescentes e avança para o tratamento do stress nesses dois momentos</p><p>do ciclo da vida.</p><p>No caso da criança, um passo fundamental para a compreensão e a</p><p>valorização adequadas do stress é um diagnóstico apurado. Apenas</p><p>conhecendo como o stress se manifesta na criança e identificando os</p><p>sintomas é possível o diagnóstico, pois, muitas vezes, os sintomas se</p><p>confundem com outros quadros de sofrimento físico e emocional.</p><p>Portanto, esta obra se inicia de modo exemplar, abordando o diagnóstico</p><p>do stress na criança.</p><p>A partir daí o livro se desenvolve e, no segundo capítulo, ainda</p><p>enfocando as crianças, discute como a raiva pode funcionar como um</p><p>fator desencadeante de stress, abordando suas implicações para a</p><p>qualidade das relações nos ambientes em que a criança transita. Ainda</p><p>nos conceitos básicos, o livro enfatiza o diagnóstico do stress na</p><p>adolescência, o que contribui para orientar as intervenções profissionais,</p><p>evitando, por meio do controle do stress, problemas decorrentes nos</p><p>âmbitos físico e emocional, de modo que o adolescente aprenda a</p><p>manejá-lo e usá-lo a seu favor.</p><p>É comum o stress estar relacionado a transtornos afetivos, e o tema</p><p>é abordado tanto na infância como na adolescência. Conforme pode ser</p><p>visto no capítulo que trata desse assunto, o stress pode funcionar como</p><p>um fator que contribui para o desenvolvimento de um transtorno</p><p>afetivo. A identificação das fontes de stress da criança e do adolescente</p><p>tem implicações práticas na prevenção dos transtornos afetivos que,</p><p>muitas vezes, também são negligenciados pelos pais, professores e, até</p><p>mesmo, por profissionais de saúde.</p><p>Quanto às fontes de stress, a obra não deixa de considerar o</p><p>contexto escolar como tendo importante papel na vida dos alunos,</p><p>enfatizando que o stress presente na escola é um fenômeno multivariado</p><p>e multicausal. Alerta para o fato de que o contexto escolar pode não ser</p><p>o único elemento que explica os índices de stress na escola, pois, muitas</p><p>vezes, ela pode ser o local onde a criança e o adolescente expressam o</p><p>stress decorrente de outros contextos.</p><p>Um aspecto muito atual valorizado neste livro é o transtorno do</p><p>deficit de atenção e hiperatividade (TDAH), pois tem sido observado</p><p>que ele pode se constituir em uma potente fonte de stress para a criança,</p><p>assim como para o ambiente familiar, social e escolar. O livro enfoca os</p><p>fatores estressantes específicos da criança com TDAH e acrescenta que</p><p>os pais precisam ser orientados sobre práticas que possam funcionar</p><p>como estratégias educativas que demonstrem aceitação e compreensão</p><p>diante das dificuldades decorrentes do TDAH. Algumas orientações aos</p><p>pais fazem parte do capítulo que aborda o tema.</p><p>O stress na modernidade é um interessante e importante tema</p><p>presente nesta obra. A tecnologia, a pressa de conhecer, de decidir e de</p><p>agir, as novas necessidades que surgem a cada minuto, relações</p><p>familiares e sociais que se baseiam em novos valores: todos esses</p><p>fatores e muitos outros são parte do mundo atual, alguns muito bem-</p><p>vindos, mas nem sempre bem-administrados e possíveis fontes de stress</p><p>para a criança e para o adolescente. O leitor terá a oportunidade de</p><p>entender como as mudanças refletem na qualidade de vida e ser</p><p>orientado em como enfrentar o stress da criança e do adolescente de</p><p>modo que possa contribuir para que eles se tornem resilientes perante as</p><p>mudanças e, assim, usufruam com prazer e parcimônia das novidades</p><p>do mundo atual.</p><p>Os estilos parentais e o stress dos filhos e suas implicações para o</p><p>desenvolvimento de transtornos psicológicos também são temas desta</p><p>importante coletânea. São enfatizadas práticas parentais definidas como</p><p>grupos de estratégias que os pais utilizam para orientar seus filhos.</p><p>Acrescentam-se a importância da sensibilidade límbica da criança e as</p><p>repercussões das estratégias dos pais em seus filhos, já que o sistema</p><p>límbico é o responsável pela regulação emocional e, por isso, está</p><p>associado à vulnerabilidade ao stress.</p><p>Além da relevante contribuição sobre conceitos básicos e fontes de</p><p>stress peculiares da infância e da adolescência, a obra também oferece</p><p>imensa e relevante contribuição quanto ao tratamento do stress, pois</p><p>aborda de modo muito abrangente e atual o treino de controle do stress</p><p>infantil, assim como o tratamento do stress psicológico na adolescência,</p><p>explicitando estratégias de manejo úteis para o profissional e para pais e</p><p>educadores. Extremamente atual, o livro apresenta recursos</p><p>tecnológicos desenvolvidos para o tratamento do stress infantil a fim de</p><p>facilitar a adesão às estratégias de manejo do stress para essas faixas</p><p>etárias tão envolvidas com a tecnologia. Traz também a contribuição da</p><p>farmacologia no tratamento de transtornos psiquiátricos associados ao</p><p>stress em crianças e</p><p>amedrontem ou façam extremamente feliz. O stress promove a</p><p>quebra da alostase e, quando isso ocorre, há um desconforto físico e</p><p>mental, como se ocorresse um desequilíbrio do organismo (Tricoli</p><p>2010).</p><p>O stress pode se manifestar tanto física como psiquicamente.</p><p>Quando uma pessoa está sob tensão, ela pode desenvolver doenças que</p><p>já ocorreram na família e para as quais tenha predisposição genética ou</p><p>que adquiriu em decorrência de seu estilo de vida (por exemplo,</p><p>diabetes, psoríase, ansiedade, depressão etc.). Assim, pode-se entender</p><p>por que os sintomas não são os mesmos para todas as pessoas. Convém</p><p>ressaltar que, embora no início os sintomas de stress sejam muito</p><p>parecidos, com o enfraquecimento do indivíduo, as diferenças ficam</p><p>evidentes e o stress se torna individualizado. Segundo a pesquisadora</p><p>Marilda Lipp (Lipp 1984), no início do processo de stress, mãos frias,</p><p>coração acelerado, tensão muscular e irritabilidade aparecem na maioria</p><p>das pessoas estressadas. Com o passar do tempo, surgem mais dois</p><p>sintomas típicos: memória prejudicada e dificuldade de levantar-se e</p><p>iniciar o dia. A partir de então, podem surgir pequenos acidentes, falta</p><p>de concentração, uso de drogas, infecções frequentes, apatia, problemas</p><p>dermatológicos, desânimo, problemas com a autoestima, ranger de</p><p>dentes, isolamento etc.</p><p>Stress na adolescência</p><p>Para verificar o stress na adolescência, é necessário identificar os</p><p>elementos relacionados ao stress nessa fase de desenvolvimento.</p><p>Quando o diagnóstico de stress se baseia na sintomatologia, há</p><p>necessidade de que os sintomas estejam presentes por um determinado</p><p>período de tempo e sejam um conglomerado, uma vez que sintomas</p><p>passageiros e isolados não podem ser tomados como base para o</p><p>diagnóstico. Cabe, ainda, certificar-se da inexistência de outra patologia</p><p>associada à sintomatologia. Como mencionado anteriormente,</p><p>alterações isoladas não podem configurar o diagnóstico de stress, razão</p><p>pela qual surgiu a necessidade de construir uma escala específica, a fim</p><p>de que uma avaliação mais precisa pudesse ser realizada por clínicos e</p><p>pesquisadores, como mencionei em outro trabalho (Tricoli 2010).</p><p>Segundo Cannon (1939), nos adultos e nas crianças, quando ocorre</p><p>uma excitação, diversas reações bioquímicas são desencadeadas e</p><p>alteram o funcionamento de quase todas as partes do organismo. Nesse</p><p>momento, as atividades neurovegetativas controladas pelo sistema</p><p>nervoso parassimpático são inibidas e o organismo se prepara para a</p><p>reação de “luta ou fuga”. Em um nível adequado, esse processo é</p><p>adaptativo, pois favorece ao indivíduo a prontidão para aprendizagem,</p><p>melhores tomadas de decisões, aumento de ânimo, de produtividade e</p><p>de energia. Nessa dosagem, o stress é considerado positivo, pois prepara</p><p>o ser humano para atuar diante das situações do dia a dia. Por outro</p><p>lado, o stress também pode se estender por um longo período e se tornar</p><p>mais intenso. Isso ocorre se uma situação considerada estressante</p><p>perdura ou quando não se consegue identificar o que está acontecendo</p><p>consigo mesmo. Essa duração mais prolongada pode desencadear sérios</p><p>problemas ao organismo. A sintomatologia tende a se agravar e a</p><p>demora no reequilíbrio é maior, o que exige do indivíduo um maior</p><p>desgaste na tentativa de se adaptar à situação estressante.</p><p>O diagnóstico de stress na adolescência contribui para orientar as</p><p>intervenções profissionais, propiciando a sua redução, o que poderá</p><p>evitar o desenvolvimento de problemas provocados pela presença de</p><p>stress excessivo. À medida que consegue perceber e identificar as fontes</p><p>de stress e desenvolver habilidades adequadas e eficientes para lidar</p><p>com as situações difíceis do dia a dia, o adolescente poderá manejar o</p><p>stress de maneira satisfatória, utilizando-o de modo positivo para sua</p><p>vida.</p><p>Sinais de stress</p><p>Na adolescência, o jovem fica exposto diretamente aos estímulos</p><p>ambientais. Assim, a presença de stress pode ser verificada de forma</p><p>indireta, identificando-se os fatores estressantes a que o jovem foi</p><p>submetido e que antecedem o quadro de stress. Os eventos estressantes</p><p>que ocorrem fora do indivíduo, sobre os quais ele não tem controle, são</p><p>denominados fontes externas. Acredita-se que o nível de stress</p><p>experimentado pelo adolescente esteja relacionado ao acúmulo de</p><p>mudanças que ele teve de enfrentar em um período de um ano.</p><p>Estudos apontam que o nível de stress se relaciona à magnitude dos</p><p>estressores e não à qualidade deles. Desse modo, as mudanças de vida</p><p>contribuem muito para o stress excessivo, acarretando o surgimento de</p><p>doenças físicas e/ou emocionais, geradas pelo desgaste do organismo</p><p>para atender às exigências adaptativas. Nesse contexto, a maneira mais</p><p>adequada para avaliar o stress é por meio de escalas que permitam</p><p>precisar o nível de stress a que o jovem está submetido e qual a</p><p>probabilidade de ele vir a apresentar problemas.</p><p>Um exemplo de instrumento que pode avaliar os acontecimentos</p><p>bons ou ruins que ocorreram na vida do adolescente, considerando os 12</p><p>meses anteriores, que exigiram dele uma maior energia adaptativa e que</p><p>geraram aumento da probabilidade de ele ser acometido por problemas</p><p>de saúde é a “Escala do Estudante”, elaborada pelos pesquisadores</p><p>Holmes e Rahe (1967). Essa escala é composta por 28 eventos da vida.</p><p>Cada evento tem uma pontuação que parte de 100 pontos (morte de um</p><p>membro íntimo da família), considerado o pior nível para essa fase,</p><p>passa por diversas outras situações, com diferentes pontuações, e chega</p><p>até a menor, de 11 pontos (violações menores da lei), nível avaliado</p><p>como o mais baixo para o stress na adolescência.</p><p>A soma da pontuação referente a cada evento estressor é que vai dar</p><p>a probabilidade de o adolescente adoecer em decorrência da redução de</p><p>resistência do organismo, que o deixa vulnerável a problemas de saúde</p><p>em decorrência do stress. Essa probabilidade pode ser média, moderada</p><p>ou severa. Um total entre 150 e 199 pontos indica que a carga de stress</p><p>atingiu nível médio. Uma somatória de 200 a 300 pontos indica que o</p><p>adolescente tem uma probabilidade acima da média de apresentar</p><p>alguma sintomatologia. Quando a pontuação estiver acima de 300,</p><p>significa que há uma forte probabilidade de o adolescente vir a</p><p>apresentar problemas de saúde ou de comportamento em virtude do</p><p>nível excessivo de stress a que está exposto no momento. A seguir,</p><p>encontramos a escala desenvolvida por Holmes e Rahe, salientando,</p><p>contudo, que é um material que não tem validação e não é padronizado</p><p>para a população brasileira. Isso posto, serve como dado qualitativo e</p><p>indicativo dos eventos aos quais o adolescente possa estar exposto e,</p><p>por isso, sofrendo os efeitos do stress excessivo.</p><p>Escala do estudante</p><p>Assinale as situações pelas quais você (adolescente) passou nos</p><p>últimos 12 meses:</p><p>Assinalar Eventos da vida Pontos</p><p>Morte de um membro íntimo da família 100</p><p>Prisão 80</p><p>Ano final ou primeiro ano da faculdade 63</p><p>Gravidez (sua ou causada por você) 60</p><p>Ferimento ou doença pessoal grave 53</p><p>Casamento 50</p><p>Quaisquer problemas interpessoais 45</p><p>Dificuldades financeiras 40</p><p>Morte de um amigo íntimo 40</p><p>Discussão com colega de quarto (com frequência) 40</p><p>Maiores desacordos com sua família 40</p><p>Mudanças significativas nos hábitos pessoais 30</p><p>Mudança no ambiente em que vive 30</p><p>Início ou término de emprego 30</p><p>Assinalar Eventos da vida Pontos</p><p>Problemas com seu patrão ou professor 25</p><p>Sucesso pessoal proeminente 25</p><p>Reprovação em algum curso 25</p><p>Exames finais 20</p><p>Namoro (início ou término) 20</p><p>Mudança nas condições de trabalho 20</p><p>Mudança em seu interesse (por algo) 20</p><p>Mudança nos hábitos de dormir 18</p><p>Férias de vários dias 15</p><p>Mudança nos hábitos de comer 15</p><p>Reunião em família 15</p><p>Mudança em atividades recreativas 15</p><p>Ferimento ou doenças menores 15</p><p>Menores violações da lei 11</p><p>Fonte: Holmes e Rahe (1967).</p><p>Probabilidade de ocorrência de problemas de saúde</p><p>Média (150-199 pontos) 37%</p><p>Moderada (200-300 pontos) 51%</p><p>Severa (acima de 300 pontos) 79%</p><p>Convém ressaltar que, além dos itens apresentados na escala, outros</p><p>eventos podem ser considerados</p><p>estressantes, por significar mudança na</p><p>vida do adolescente, e devem ser verificados, a fim de ampliar a</p><p>avaliação (Tricoli 2010). São eles:</p><p>• Atividades físicas e intelectuais em excesso: muitas vezes,</p><p>a necessidade de preparo para o mercado profissional</p><p>acarreta a inserção, na rotina do adolescente, de um</p><p>excesso de atividades extracurriculares. O que se percebe</p><p>é que o adolescente realiza essas atividades com muito</p><p>esforço ou começa a faltar a elas, não conseguindo</p><p>corresponder às demandas. As atividades complementares</p><p>são realmente importantes no preparo do adolescente para</p><p>a vida profissional, no entanto, a sobrecarga pode</p><p>desencadear o surgimento do stress excessivo, gerando</p><p>comportamentos inadequados, tais como: oposição,</p><p>mentira, agressividade, impaciência, apatia, hostilidade</p><p>etc.</p><p>• Transformações decorrentes do desenvolvimento do</p><p>adolescente, físicas, cognitivas e sociais: determinadas</p><p>transformações são esperadas, em razão das questões</p><p>hormonais; tais transformações vão exigir do adolescente</p><p>inúmeras adaptações às diferentes situações que surgirão a</p><p>partir desse momento. Um caso que pode ilustrar essa</p><p>situação é o da adolescente cujas mamas começam a se</p><p>desenvolver e ela muda sua postura, arqueando os ombros</p><p>para frente, na tentativa de esconder essa transformação do</p><p>corpo.</p><p>• Expectativas dos adultos e carga de responsabilidades</p><p>atribuídas ao adolescente: a falta ou o excesso de</p><p>responsabilidades podem ser fonte geradora de stress. O</p><p>jovem precisa ter responsabilidades e atividades em sua</p><p>rotina, por exemplo: arrumar o quarto, cuidar do animal de</p><p>estimação etc. No entanto, o excesso de expectativa dos</p><p>adultos pode desencadear irritabilidade, agressividade,</p><p>crença na incapacidade de atender às expectativas</p><p>impostas. Já a ausência de responsabilidades favorece o</p><p>desinteresse pelos outros, o egoísmo e a demanda</p><p>constante de que suas necessidades sejam supridas.</p><p>• Relacionamento com os progenitores: as exigências</p><p>excessivas, as críticas, os conflitos constantes, o excesso</p><p>ou a ausência de regras geram no adolescente a sensação</p><p>de que, por mais que faça, não satisfaz às expectativas dos</p><p>pais. Isso promove um afastamento entre pais e filhos, que</p><p>pode acarretar hostilidade, isolamento, uso de drogas,</p><p>envolvimento com grupos de risco, falta de credibilidade</p><p>em si, problemas com a autoestima, dentre outros.</p><p>• Brigas e/ou separação dos pais: essa situação geralmente</p><p>provoca, no adolescente, a ansiedade decorrente da</p><p>ameaça da perda do lar e da estrutura em que vive. Muitas</p><p>vezes, o adolescente também se sente responsável pela</p><p>situação.</p><p>• Relacionamento social: a adolescência é marcada pela</p><p>inserção em grupos, pelo convívio social intenso; assim, as</p><p>exigências ou a rejeição dos colegas podem ser muito</p><p>estressantes, acarretando, até mesmo, comportamentos</p><p>bastante danosos, a fim de ser aceito, por exemplo:</p><p>praticar certos atos para se inserir no grupo.</p><p>• Exigências sociais: as expectativas sociais impostas</p><p>atualmente aos adolescentes vêm desencadeando uma</p><p>aceleração no seu desenvolvimento, levando-os até a</p><p>preocupações muito antecipadas em relação a sua fase de</p><p>desenvolvimento: o culto à beleza, por exemplo, faz com</p><p>que garotos e garotas, na busca do corpo perfeito, queiram</p><p>frequentar academias, submeter-se a cirurgias plásticas,</p><p>utilizar anabolizantes, fazer dietas alimentares perigosas.</p><p>Isso pode desencadear stress excessivo, principalmente</p><p>nos que não conseguem atender a esses padrões e passam</p><p>a ser colocados à margem do grupo. Muitas vezes, eles são</p><p>alvo de brincadeiras e gozações, que podem desencadear</p><p>danos na autoestima, levando ao isolamento social e até</p><p>mesmo a problemas mais sérios, como fobia social,</p><p>transtornos alimentares, uso de drogas etc.</p><p>• Descoberta sexual/gravidez: o adolescente se inicia</p><p>sexualmente cada vez mais cedo e, na maioria dos casos,</p><p>sem os cuidados necessários para se prevenir da gravidez e</p><p>de doenças sexualmente transmissíveis, o que poderá</p><p>acarretar problemas para o jovem e sua família.</p><p>• Vestibular e escolha profissional: ao longo dessa fase,</p><p>também se espera que o adolescente realize sua escolha</p><p>profissional. Convém ressaltar que muitos não têm</p><p>maturidade necessária para essa opção e vão experimentar</p><p>o stress desse momento. Essa situação pode desencadear</p><p>ansiedade excessiva e insegurança, e o adolescente pode</p><p>experimentar os efeitos do stress negativo, que acarretam</p><p>queda de produtividade, o que pode levar a uma série de</p><p>fracassos. Assim, mesmo tendo investido muito, ele pode</p><p>não alcançar seu objetivo.</p><p>Esses e/ou outros acontecimentos na vida do adolescente podem ser</p><p>verificados por meio de entrevista, observação e histórico de vida do</p><p>próprio jovem ou dos pais. Considerando-se, ainda, a questão</p><p>ambiental, é relevante verificar situações do dia a dia que, na maioria</p><p>das vezes, tendem a não serem observadas. No entanto, pela frequência,</p><p>são fontes geradoras de stress para o adolescente e desencadeiam</p><p>desgastes significativos, tais como: promessas não cumpridas pelos</p><p>progenitores, atrasos frequentes na chegada à escola, espera recorrente</p><p>para ir aos lugares, proibições sem motivos claros, stress dos pais,</p><p>pressão escolar constante, competição com os colegas em esportes,</p><p>notas escolares, bullying, dentre outras.</p><p>O stress no adolescente pode ocorrer também pela forma como que</p><p>ele interpreta as situações que precisará enfrentar. Esse aspecto é</p><p>denominado de fonte interna de stress. As fontes internas se formam</p><p>com base na experiência de vida, nas mensagens de socialização</p><p>recebidas dos adultos significativos desde a infância, na visão de si, do</p><p>mundo e do futuro. Esse enfoque psicológico de stress sugere que os</p><p>eventos do ambiente influenciam somente os adolescentes que avaliam</p><p>a situação como estressora, pois decorre do significado que o jovem</p><p>atribui ao evento, bem como dos recursos que ele tem para enfrentá-la.</p><p>Algumas características pessoais devem ser consideradas:</p><p>• Personalidade: os adolescentes que apresentam menos</p><p>vulnerabilidade ao stress e, consequentemente, melhor</p><p>capacidade de enfrentamento são aqueles que sabem como</p><p>lidar com as emoções, que desenvolveram melhor</p><p>autocontrole, que valorizam as próprias habilidades e que</p><p>aceitam seus limites, tendo uma autoestima positiva.</p><p>• Visão sobre si mesmo e sobre o mundo: essa visão é</p><p>formada com base nas mensagens de socialização</p><p>recebidas em conjunção com o modo próprio de percebê-</p><p>las, gerando pensamentos funcionais ou disfuncionais que</p><p>atuarão nos comportamentos do dia a dia, por exemplo:</p><p>achar que deve ser bonzinho, que precisa agradar a todos,</p><p>que não é capaz, que os pais preferem um irmão menor</p><p>por ser mais inteligente etc.</p><p>• Valores adquiridos: a rigidez ou a ausência de regras ao</p><p>longo do desenvolvimento do adolescente servirão de</p><p>parâmetro para a avaliação dos acontecimentos que ele</p><p>precisará enfrentar.</p><p>• Rede de apoio: os adolescentes apresentam melhor</p><p>enfrentamento para as situações de stress se têm uma</p><p>família presente, que os apoie, demonstrando afeto e</p><p>colocando limites de modo claro e coerente, familiares</p><p>próximos que cultivem amizades e paixões (esporte,</p><p>música etc.) e amigos de sua faixa etária.</p><p>• Paixão por algo: o fato de o adolescente se dedicar com</p><p>empenho a algum esporte, instrumento musical, atividade</p><p>artística etc. pode favorecer a visão sobre si mesmo.</p><p>Essa perspectiva psicológica do stress não tem um instrumento de</p><p>avaliação mais precisa, no entanto, não podemos desconsiderá-la, pois</p><p>essas informações costumam servir de subsídio para um diagnóstico</p><p>preciso. Assim, para colher tais informações, o clínico pode usar</p><p>entrevista com o adolescente e com os pais, observação e questionários.</p><p>Outra perspectiva é a biológica, que enfoca a ativação dos sistemas</p><p>fisiológicos. O stress pode ser avaliado por medidas cardiovasculares,</p><p>técnicas eletrodérmicas e testes eletromiográficos. Porém, essas</p><p>medidas são pouco empregadas, por inúmeras razões, dentre elas: falta</p><p>de profissionais especializados, custo dos exames e falta de</p><p>equipamento.</p><p>A integração dos três enfoques</p><p>aqui apresentados na avaliação do</p><p>stress seria o ideal para um diagnóstico preciso. As três visões enfatizam</p><p>diferentes estágios do processo em que as situações ambientais</p><p>desencadeiam transformações psicológicas e físicas, aumentando a</p><p>probabilidade do desenvolvimento de doenças físicas e/ou emocionais.</p><p>Cabe ressaltar que o enfoque que mais tem favorecido o diagnóstico</p><p>do stress na adolescência e que contempla as diferentes abordagens de</p><p>avaliação para essa fase de desenvolvimento é a verificação da resposta</p><p>ao stress, mediante a sintomatologia apresentada pelo adolescente, bem</p><p>como o tempo em que tais sintomas estão presentes, considerando-se a</p><p>diferença entre os gêneros. Inúmeras pesquisas e estudos têm utilizado</p><p>esse tipo de medida, que vem trazendo informações precisas para a</p><p>realização de tal diagnóstico.</p><p>O stress precisa ser considerado uma resposta complexa do</p><p>organismo, que desencadeia reações bioquímicas, como definido por</p><p>Hans Selye (1979), e é capaz de provocar sintomas físicos,</p><p>psicológicos, cognitivos e interpessoais, como constatado em Tricoli e</p><p>Lipp (2006), que construíram, validaram e padronizaram uma escala</p><p>para avaliar o stress em adolescentes, denominada “Escala de Stress</p><p>para Adolescentes” (ESA). Ela abrange a faixa etária de 14 a 18 anos,</p><p>de ambos os sexos.</p><p>Com base em dados clínicos e pesquisas, verificou-se que os</p><p>sintomas mais frequentes de stress na adolescência se agrupam da</p><p>seguinte forma:</p><p>• Interpessoais: timidez, dificuldade para fazer parte de</p><p>grupos, dificuldade de relacionamento e de</p><p>estabelecimento de vínculos afetivos, isolamento e</p><p>gagueira.</p><p>• Psicológicos: tristeza, irritação, depressão, desânimo,</p><p>impaciência, intolerância, falta de esperança, sensibilidade</p><p>aumentada, insegurança, agressividade e ansiedade.</p><p>• Físicos: dores de cabeça e nas costas, enxaqueca, mãos</p><p>frias, transpiração excessiva, principalmente nas mãos,</p><p>tique nervoso, gripe frequente, ranger de dentes.</p><p>• Cognitivos: falta de concentração, dificuldades para</p><p>estudar e aprender, desinteresse pelas coisas, uso de</p><p>drogas, problemas de memória e de sono (o adolescente</p><p>fica pensando muito e não consegue dormir ou dorme</p><p>demais para evitar pensar).</p><p>Há evidências que relacionam o stress na adolescência a uma baixa</p><p>no sistema imunológico, tornando o adolescente mais suscetível a</p><p>gripes, resfriados, infecções de garganta etc. Apontam ainda o</p><p>desenvolvimento de obesidade, transtornos alimentares, problemas</p><p>dermatológicos e estomacais (gastrite, úlceras), disfunções psicológicas</p><p>e comportamentais (comportamento desafiador e opositivo,</p><p>delinquência, suicídio, alteração do humor, impulsividade acentuada,</p><p>transtorno do pânico), hipertensão arterial etc.</p><p>Escala de Stress para</p><p>Adolescentes</p><p>A Escala de Stress para Adolescentes (ESA) passou por estudo de</p><p>validação, padronização e normatização para a população brasileira. É</p><p>hoje um instrumento aprovado pelo Conselho Federal de Psicologia, o</p><p>que indica qualidades psicométricas necessárias para a avaliação de</p><p>stress na adolescência. Objetiva avaliar o stress emocional na faixa</p><p>etária de 14 a 18 anos, de ambos os gêneros, bem como determinar o</p><p>tipo de sintomatologia e a fase de stress em que o adolescente se</p><p>apresenta.</p><p>A escala é composta por 44 itens relacionados às seguintes reações</p><p>de stress: psicológicas, cognitivas, fisiológicas e interpessoais. O estudo</p><p>demonstrou que essas reações se referem a sintomas de stress na</p><p>adolescência, uma vez que a correlação encontrada entre elas faz supor</p><p>que exista o stress como um construto subjacente.</p><p>A escala objetiva, ainda, identificar a frequência com que os</p><p>sintomas aparecem, evidenciando as fases de stress, subdivididas em:</p><p>alerta (primeira fase, momento em que a pessoa começa a entrar em</p><p>contato com um estressor); resistência (o stress já se faz notar no</p><p>indivíduo; no entanto, a energia está presente, o indivíduo se sente</p><p>muito produtivo, ainda que haja falhas de memória e dificuldade para</p><p>levantar-se da cama); quase-exaustão (o organismo começa a sentir os</p><p>efeitos do stress, a produtividade se reduz e há o início do</p><p>adoecimento); e exaustão (fase em que as doenças mais sérias surgem e</p><p>a pessoa já não consegue produzir).</p><p>A ESA avalia os sintomas de stress, solicitando que o adolescente</p><p>assinale se não sente, raramente sente, às vezes sente, quase sempre</p><p>sente, sente sempre. Para identificar as fases, solicita-se que assinale:</p><p>não ocorreu, ocorreu nas últimas 24 horas, tem ocorrido na última</p><p>semana, tem ocorrido no último mês, tem ocorrido nos últimos seis</p><p>meses. As instruções são claras e é fundamental que o adolescente as</p><p>compreenda para evitar equívoco no processo de avaliação.</p><p>O jovem poderá receber o diagnóstico de stress significativo</p><p>quando contemplar os escores necessários, de acordo com a presença</p><p>dos sintomas e/ou o tempo em que o sintoma se apresenta; em seguida,</p><p>pode-se verificar o tipo de sintomatologia (psicológica, física, cognitiva</p><p>e interpessoal), bem como a fase em que se encontra (alerta, resistência,</p><p>quase-exaustão e exaustão).</p><p>Essa possibilidade de avaliação de stress permite identificar de que</p><p>forma o adolescente está sendo afetado. Convém ressaltar que,</p><p>utilizando-se a ESA como instrumento de avaliação, é recomendado que</p><p>sintomas isolados não sejam considerados, pois, para que se</p><p>diagnostique o stress em adolescentes, é importante que haja um</p><p>conjunto de sintomas presente por um determinado período de tempo.</p><p>Cabe ressaltar, ainda, que, com base na análise da escala, pode-se</p><p>verificar quando a maioria dos sintomas apresentados pertence apenas a</p><p>uma esfera e quando a frequência dos sintomas é significativa. Um</p><p>diagnóstico diferencial se faz necessário, pois o adolescente pode</p><p>apresentar uma patologia orgânica ou um transtorno psicológico</p><p>(depressão, transtorno de personalidade etc.). Considerando-se que a</p><p>adolescência é um período muito conturbado, marcado por inúmeras</p><p>alterações biológicas, psicológicas e sociais, o profissional precisará</p><p>estar bastante atento, pois o quadro deixa de ser simplesmente uma</p><p>reação ao stress.</p><p>É relevante considerar, ainda, os dados qualitativos, pois há</p><p>situações em que a avaliação da escala não corresponde</p><p>quantitativamente ao diagnóstico de stress. No entanto, há sintomas que</p><p>ocorrem em alta magnitude e por um longo período de tempo. Desse</p><p>modo, não se podem ignorar tais resultados, pois poderão servir de</p><p>indício para o diagnóstico de outras patologias. A ESA fornece também</p><p>a possibilidade de verificar a vulnerabilidade. Por exemplo, um</p><p>adolescente que responde que sente sempre os itens descritos a seguir</p><p>pode estar vulnerável à depressão:</p><p>• só vejo defeitos em mim;</p><p>• meus pensamentos são negativos;</p><p>• tenho dificuldade para iniciar o meu dia;</p><p>• estou agressivo.</p><p>Os itens seguintes podem indicar vulnerabilidade a reações</p><p>psicofisiológicas, de características tensionais:</p><p>• dores nas costas;</p><p>• dores no peito;</p><p>• enxaqueca;</p><p>• dores de cabeça.</p><p>Como pode ser verificado no manual da ESA, o conjunto de</p><p>sintomas precisa ser interpretado como indicador para avaliação</p><p>longitudinal, podendo ser utilizado para uma intervenção clínica mais</p><p>profilática. A análise da ESA possibilita avaliar os itens</p><p>quantitativamente, integrando-os a uma avaliação qualitativa, mesmo</p><p>durante as entrevistas clínicas com o adolescente e seus pais, o que</p><p>favorece a compreensão do quadro de stress de modo mais amplo.</p><p>É importante considerar que o diagnóstico preciso de stress na</p><p>adolescência só pode ser fornecido por profissionais especializados. No</p><p>entanto, os adultos que convivem com o adolescente (pais, avós,</p><p>médicos, professores, coordenadores escolares) ou mesmo os colegas</p><p>conseguem observar possíveis mudanças comportamentais, físicas e/ou</p><p>psicológicas significativas, e identificar o problema, o que possibilita</p><p>que a ajuda chegue mais rapidamente, diminuindo o sofrimento do</p><p>adolescente e reduzindo os efeitos do stress negativo em sua vida.</p><p>Frequentemente, ouvimos pais dizerem que o filho ou a filha</p><p>mudou e que não sabem o que está acontecendo com o jovem. Na</p><p>maioria</p><p>das vezes, as pessoas têm uma visão deturpada sobre o stress.</p><p>Pensam que ele só se desencadeia por fatos negativos. Isso é um mito,</p><p>pois o stress ocorre quando o indivíduo se depara com situações novas,</p><p>que vão exigir adaptação e que podem ser até muito agradáveis, por</p><p>exemplo: festa de 15 anos, intercâmbio cultural, último ano do ensino</p><p>médio, escolha profissional, chegada da inscrição do vestibular etc.</p><p>Assim, é muito importante que os educadores (pais, professores,</p><p>coordenadores escolares, diretores) presentes na vida do jovem estejam</p><p>atentos às necessidades dele, para que seja possível observar a presença</p><p>do stress e indicar ajuda quando necessária, evitando problemas mais</p><p>sérios na vida desse adolescente. Para a avaliação do stress, é necessário</p><p>o conhecimento sobre o stress e a sintomatologia peculiar a essa fase,</p><p>pois podem existir outras explicações e diagnósticos para os problemas</p><p>apresentados pelo adolescente, o que requer uma avaliação criteriosa,</p><p>feita por profissionais que tenham conhecimento sobre a síndrome e</p><p>sobre as peculiaridades da adolescência.</p><p>A avaliação do stress na adolescência é muito importante para que</p><p>problemas maiores possam ser evitados na vida do adolescente, que se</p><p>encontra em uma fase de significativa mudança. Se o stress for</p><p>controlado ou prevenido nessa fase, com certeza teremos adultos mais</p><p>saudáveis e, consequentemente, menos estressados.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>CANNON, W.B. (1939). The wisdom of the body. Nova York: Norton.</p><p>HOLMES, T.H. e RAHE, R.K. (1967). Type a behavior and your heart. Nova York: Alfred A.</p><p>Knopf.</p><p>LIPP, M.E.N. (1984). “Stress e suas complicações”. Estudos de Psicologia, 1(3-4), Campinas,</p><p>pp. 5-19.</p><p>LIPP, M.E.N. e MALAGRIS, L.E. (2001). “O manejo do stress”. In: RANGE, B. (org.).</p><p>Psicoterapia comportamental e cognitiva de transtornos psiquiátricos. Porto Alegre:</p><p>Artmed.</p><p>SELYE, H. (1979). Stress without distress. Filadélfia: Lipincott.</p><p>TRICOLI, V.A.C. (2010). “Diagnóstico do stress na adolescência”. In: TRICOLI, V.A.C.</p><p>(2010). Stress na adolescência: Problema e solução. São Paulo: Casa do Psicólogo, pp.</p><p>65-79.</p><p>TRICOLI, V.A.C. e LIPP, M.N.E. (2006). ESA: Escala de Stress para Adolescentes. São Paulo:</p><p>Casa do Psicólogo.</p><p>4</p><p>Diagnóstico e tratamento do</p><p>stress nos transtornos afetivos na</p><p>infância e na adolescência</p><p>Cristiane von Werne Baes</p><p>Camila Maria Severi Martins</p><p>Mario Francisco Juruena</p><p>As experiências traumáticas na infância e na adolescência,</p><p>principalmente nas fases iniciais do desenvolvimento, desempenham</p><p>um papel importante no desencadeamento de psicopatologias como a</p><p>depressão, a bipolaridade e a ansiedade (Carr et al. 2013; Tofoli et al.</p><p>2011; Scomparini et al. 2013).</p><p>Os transtornos afetivos em crianças e adolescentes são uma</p><p>condição clínica grave e exercem um impacto negativo no</p><p>funcionamento social, escolar e familiar desses grupos, com possíveis</p><p>repercussões graves na vida dos indivíduos. Além disso, estudos</p><p>demonstram que os transtornos afetivos com início na infância e na</p><p>adolescência podem ter continuidade na vida adulta (Harrington 2000).</p><p>O impacto do stress nos</p><p>transtornos afetivos em</p><p>crianças e adolescentes</p><p>As fontes de stress, ou estressores, são eventos que ocorrem na vida</p><p>da criança e do adolescente e que ultrapassam sua capacidade de</p><p>adaptação. Um stress intenso na vida da criança ou do adolescente pode</p><p>ser originário de fontes externas ou internas (comportamentos rígidos,</p><p>ensinados pelos pais ou por pessoas importantes na vida da criança,</p><p>como, por exemplo: não falhar, se errar será punida; ser boazinha ou</p><p>perfeita em tudo; pensar nos outros, para não ser egoísta, tornando a</p><p>criança passiva e não responsiva, sem saber se defender em situações de</p><p>stress) (Tricoli e Bignotto 2000).</p><p>O stress infantil, também denominado de stress precoce, engloba</p><p>experiências traumáticas na infância e na adolescência, como perda</p><p>parental (morte dos pais ou substitutos), divórcio dos pais, cuidadores</p><p>com transtornos psiquiátricos, doença infantil com hospitalizações</p><p>prolongadas, ausência de cuidados básicos, abandono, privação de</p><p>alimento e abrigo adequados, falta de encorajamento e suporte e</p><p>violência familiar (Zavaschi et al. 2002; Bernstein et al. 2003). Nesse</p><p>sentido, salientam Cardoso, Santana e Ferriani (2006) que as crianças e</p><p>os adolescentes, pelas características próprias de seu estágio de</p><p>desenvolvimento, são as principais vítimas de uma relação de poder</p><p>imposta pela violência. O agressor se utiliza da violência para impedir,</p><p>forçar, humilhar ou constranger a criança ou o adolescente, levando-os a</p><p>sofrer, praticar ou permitir que se pratiquem atos que fogem à sua</p><p>compreensão ou que lhes provoquem danos físicos e/ou psicológicos.</p><p>Desde Freud, que ampliou o conceito de trauma para o plano</p><p>psíquico, as situações de stress infantil vêm sendo estudadas. Outro</p><p>pesquisador importante para a compreensão do trauma infantil foi</p><p>Winnicott, que sugeriu que as “vivências infantis”, estruturantes do</p><p>psiquismo do bebê, eram modeladas por sua relação com a mãe</p><p>(Winnicott 1978). Além disso, estudos atuais têm demonstrado que</p><p>também as situações de superproteção materna e/ou paterna podem</p><p>provocar traumas no desenvolvimento biopsicossocial da criança, que é</p><p>privada de modelos de frustração. Nesse aspecto, Bowlby (1982)</p><p>descreve que o apego entre a mãe e o bebê é uma das interações mais</p><p>importantes no desenvolvimento infantil, pois compreende que a</p><p>relação entre mãe e bebê se desenvolve por intermédio do sentimento de</p><p>segurança. De acordo com essa teoria do apego de Bowlby, os modelos</p><p>cognitivos calcados em um padrão de interações negativas de maus-</p><p>tratos emocionais entre pais e criança levam a um conjunto de crenças</p><p>negativas e expectativas sobre os outros centrado em vergonha,</p><p>vulnerabilidade ao dano e ao autossacrifício, contribuindo para o</p><p>desenvolvimento de sintomas psiquiátricos posteriores.</p><p>Valendo-se desses trabalhos pioneiros, muitas pesquisas e muitos</p><p>trabalhos clínicos foram desenvolvidos para compreender a extensão do</p><p>trauma infantil no desencadeamento de psicopatologias. No Brasil, os</p><p>estudos sobre o stress infantil são liderados pelos pesquisadores</p><p>Grünspun (1980), Wolff (1981), Elkind (1982). Lipp e Lucarelli (1998)</p><p>desenvolveram e validaram no Brasil a “Escala de Stress Infantil”, o</p><p>que permitiu a ampliação dos estudos nessa área.</p><p>Com referência aos danos do stress infantil, Teicher (2002)</p><p>descreve que, durante a primeira infância e a adolescência, importantes</p><p>estruturas cerebrais estão sendo constituídas, de forma que as</p><p>consequências de eventos traumáticos levam a alterações duradouras e</p><p>negativas na neurobiologia do indivíduo que podem permanecer ao</p><p>longo da vida do indivíduo vitimizado. Os efeitos do stress precoce no</p><p>longo prazo podem afetar a função neuronal e o bem-estar afetivo</p><p>(Cohen, Brown e Smailes 2001; Fergusson, Swain-Campbell e</p><p>Horwood 2002; Zavaschi et al. 2002; Nemeroff et al. 2003; Grover et</p><p>al. 2007). Para Faravelli et al. (2010), o efeito do trauma na infância na</p><p>psicopatologia da vida adulta é atribuído ao eixo hipotálamo-pituitária-</p><p>adrenal (HPA), que, uma vez superativado nos processos de</p><p>desenvolvimento, permaneceria ininterruptamente instável,</p><p>hiperestimulado, vulnerável ou disfuncional (Uhart et al. 2006; Heim et</p><p>al. 2008; Faravelli et al. 2010; Baes et al. 2012). Os efeitos do stress</p><p>precoce influenciam negativamente o desenvolvimento infantil,</p><p>afetando todas as esferas: comportamental, emocional, social, cognitiva</p><p>e física. Em suma, o trauma ocasiona danos permanentes nas estruturas</p><p>cerebrais de crianças vítimas de violência, dados comprovados em</p><p>pesquisas científicas (Teicher 2002), demonstrando que o hemisfério</p><p>esquerdo dessas crianças sofre uma diminuição no tamanho original.</p><p>É importante ressaltar que as consequências imediatas do trauma</p><p>vivido na infância e na adolescência podem levar a um risco de</p><p>problemas comportamentais, incluindo comportamentos internalizantes,</p><p>que se refletem em sintomas de ansiedade, depressão, queixas somáticas</p><p>e inibição, bem como de comportamentos</p><p>externalizantes, que se</p><p>referem a alterações comportamentais como aumento da agressividade e</p><p>delinquência. Problemas relacionados a comportamentos sexuais</p><p>também se incluem nesse domínio (agressão, acting out) (Abramovitch,</p><p>Maia e Cheniaux 2008; Mello et al. 2009). Além disso, as</p><p>consequências psicológicas podem afetar de forma aguda a saúde</p><p>mental de um indivíduo até a entrada na idade adulta (Aded et al. 2006;</p><p>Brewerton 2007). Segundo Barnett (1997), nenhum outro fator de risco</p><p>tem associação tão forte com a psicopatologia do desenvolvimento</p><p>quanto o abuso ou a negligência sofridos por uma criança, já que</p><p>causam efeitos profundamente negativos no curso da vida.</p><p>As consequências de tais eventos aumentam as chances de</p><p>problemas imediatos ou tardios ao longo da existência do indivíduo. Os</p><p>imediatos são o stress pós-traumático e os transtornos emocionais.</p><p>Tardiamente, há o aumento da vulnerabilidade para uma ampla</p><p>variedade de doenças físicas, o baixo rendimento escolar, a gravidez</p><p>precoce, o desemprego, o maior número de divórcios e criminalidade, o</p><p>risco de drogadição, a exploração sexual, a promiscuidade, as queixas</p><p>somáticas, os distúrbios na sexualidade e as dificuldades de</p><p>relacionamento. Há evidências científicas de que as consequências</p><p>negativas relacionadas a abuso e negligência ocorridos na infância e na</p><p>adolescência incluem, além do desenvolvimento de transtornos</p><p>emocionais, problemas de saúde, problemas com a lei e problemas no</p><p>desempenho das atividades práticas diárias (Martins et al. 2011).</p><p>Assim, deve-se levar em consideração a existência de fatores de</p><p>risco e fatores de proteção associados ao stress precoce. Os fatores de</p><p>risco para o stress infantil são variáveis potenciais, que aumentam a</p><p>probabilidade da ocorrência de efeitos negativos no desenvolvimento do</p><p>indivíduo, incluindo-se nesse domínio a idade precoce da ocorrência do</p><p>abuso e sua frequência, o incesto, o uso da força e o maior número de</p><p>perpetradores, formas concomitantes de abuso, bem como a repetição e</p><p>a percepção do evento violento. Diversos estudos ainda apontam que os</p><p>agressores, geralmente, passaram por situações de abuso, demonstrando</p><p>o caráter intergeracional da violência (Braga 2011). Ademais, o estudo</p><p>de Roesler (1994) aponta que a reação de descrédito do primeiro adulto</p><p>a quem é revelado o abuso contribui para o agravamento da</p><p>psicopatologia na vida adulta. A pobreza excessiva, os baixos níveis</p><p>culturais, os problemas de saúde, o abuso de álcool e drogas, o baixo</p><p>nível de escolaridade e as famílias desprovidas de uma rede estruturada</p><p>de apoio social constituem outros fatores de risco apontados pela</p><p>literatura científica (Whipple e Webster-Stratton 1991; Cecconello,</p><p>Antoni e Koller 2003; Pires e Miyazaki 2005).</p><p>Em contrapartida, os fatores de proteção consistem em atributos</p><p>disposicionais do indivíduo que o protegem e modificam ou melhoram</p><p>respostas pessoais a determinados riscos de desadaptação. Inclui-se</p><p>nesses fatores a denominada resiliência, definida pela capacidade de</p><p>superação ou adaptação diante de uma dificuldade considerada um</p><p>risco, além da possibilidade de construção de novos caminhos de vida e</p><p>de processo de subjetivação (Junqueira e Deslandes 2003). Outros</p><p>fatores de proteção também são considerados relevantes em situações</p><p>de stress infantil: empatia, autonomia, orientação social positiva,</p><p>autoestima, facilidade de interação com os pares e com o ambiente,</p><p>constituição genética favorável, funcionamento harmonioso entre os</p><p>pais e/ou cuidadores, existência de um vínculo afetivo entre eles,</p><p>coesão, além de presença contínua e segura de afeto, supervisão e</p><p>compreensão por parte dos pais diante das situações estressoras</p><p>enfrentadas pelas crianças, distribuição equitativa de atenção e</p><p>privilégios entre os filhos e, ainda, suporte cultural e religioso, acesso a</p><p>educação e saúde, estes associados a um melhor prognóstico em</p><p>crianças e adolescentes (Rosário 2001).</p><p>Considera-se que os fatores de risco e de proteção interagem com o</p><p>ambiente, que pode ser facilitador ou dificultador para a criança ou o</p><p>adolescente, de forma que encontraremos crianças vulneráveis e</p><p>crianças resilientes. É importante destacar que as fontes de stress</p><p>infantil interagem, influenciando-se de maneira constante. Observa-se</p><p>que o impacto do stress precoce no organismo do indivíduo que sofre</p><p>abuso acontece de forma intensa, levando-o a uma vulnerabilidade</p><p>maior ao desencadeamento de transtornos psiquiátricos.</p><p>As consequências do stress infantil geram cicatrizes biológicas e</p><p>psicológicas que estão associadas a um espectro diverso de transtornos</p><p>psiquiátricos, como depressão, transtorno bipolar, transtorno de</p><p>ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático (Tept) e transtorno</p><p>abusivo de substância (Carr et al. 2013). Dada a importância do stress</p><p>no desenvolvimento de transtornos psiquiátricos, recentemente, o</p><p>Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5)</p><p>incluiu entre suas classificações uma categoria específica para o</p><p>diagnóstico de transtornos relacionados a trauma e estressores, na qual</p><p>são incluídos o transtorno de apego reativo e o transtorno de interação</p><p>social desinibida, que são transtornos específicos da criança, além de</p><p>outros que se manifestam em crianças e adultos (APA 2013).</p><p>Os eventos estressantes da vida desempenham um papel importante</p><p>no desencadeamento de episódios depressivos e estão bem estabelecidos</p><p>como precipitantes agudos de doenças psiquiátricas. O stress poderia</p><p>levar ao desencadeamento do primeiro episódio depressivo em</p><p>indivíduos geneticamente vulneráveis, tornando-o mais sensível à</p><p>repetição desses episódios diante de diferentes estressores (Post 1992;</p><p>Kendler et al. 2002; Cortez e Silva 2003; Joca, Padovan e Guimarães</p><p>2003; Margis et al. 2003). Ressaltam Mello et al. (2009) que crianças</p><p>que passaram por situações de stress têm risco moderadamente</p><p>aumentado de depressão na adolescência e na idade adulta. O curso da</p><p>depressão e o risco de suicídio ficam agravados em crianças e</p><p>adolescentes que vivenciaram experiências estressantes graves (Tunnard</p><p>et al. 2014).</p><p>Estudiosos apontam que a depressão na infância parece estar mais</p><p>associada a privações afetivas, circunstâncias familiares adversas e</p><p>estressores psicossociais (Harrington 1990 e 2000), assim como na</p><p>adolescência, especialmente no início, ela parece estar mais associada</p><p>ao ambiente familiar desfavorável (Garrison et al. 1990). Outro aspecto</p><p>importante ressaltado pela literatura é a falta de percepção de apoio dos</p><p>pais, altamente relacionada à presença de sintomas depressivos nos</p><p>jovens.</p><p>Nesse sentido, os estudos demonstram um aumento de sintomas</p><p>depressivos entre os jovens que vivem em abrigos de proteção</p><p>comparados com os que moram com as famílias, sugerindo que a maior</p><p>exposição a potenciais situações de risco, bem como a falta de apoio</p><p>familiar na mediação do impacto dos eventos estressores na vida dos</p><p>adolescentes institucionalizados, pode estar relacionada a um aumento</p><p>dos sintomas depressivos (Wathier e Dell’Aglio 2007).</p><p>Além disso, estudos sobre crianças de 5 a 14 anos internadas em</p><p>hospital psiquiátrico demonstram uma associação entre comportamento</p><p>suicida e um maior número de experiências estressantes, incluindo</p><p>eventos caóticos e eventos familiares disruptivos que resultam em perda</p><p>ou separação de pessoas importantes (Cohen-Sandler, Berman e King</p><p>1982). Dessa forma, os dados existentes na literatura sugerem que</p><p>situações estressantes como violência, abandono, falta de apoio social,</p><p>quebra de vínculos, entre outras, podem estar potencialmente associadas</p><p>ao desenvolvimento de sintomas depressivos desde a infância e a</p><p>adolescência (Tunnard et al. 2014).</p><p>Com relação à influência do stress infantil no transtorno bipolar, a</p><p>literatura científica demonstra dados consagrados acerca do impacto dos</p><p>eventos estressores, especialmente as situações de abuso e negligência</p><p>infantil, no desencadeamento de transtornos bipolares no adulto</p><p>(Leverich et al. 2002; Leverich e Post 2006). Porém, estudos sobre o</p><p>impacto imediato</p><p>dessas situações como gatilhos para desencadear a</p><p>bipolaridade em crianças e adolescentes começam a tomar corpo</p><p>científico apenas recentemente (Romero et al. 2009). Os achados do</p><p>estudo de Romero e seus colaboradores demonstram que o abuso físico</p><p>infantil está associado ao transtorno bipolar na infância, merecendo</p><p>destaque, ainda, a comorbidade com o transtorno de estresse pós-</p><p>traumático (Tept). Nessa mesma direção, a pesquisa conduzida por</p><p>Marchand, Wirth e Simon (2005), na qual foram avaliados adolescentes</p><p>com diagnóstico de bipolaridade, constatou que 30% dos jovens</p><p>sofreram algum tipo de abuso sexual na infância. Já no estudo de</p><p>McIntyre et al. (2008), 10% dos pacientes adultos com transtorno</p><p>bipolar relataram algum tipo de abuso sexual antes dos 17 anos, com</p><p>abuso físico concomitante. De um modo geral, podemos afirmar que</p><p>essa prevalência de abuso infantil em jovens e adultos bipolares</p><p>encontrada nos estudos gira em torno de 20% e 45% respectivamente.</p><p>Tal diferença pode ser explicada pelo fato de as pesquisas realizadas</p><p>com adultos apresentarem uma fidedignidade maior, em razão do</p><p>amadurecimento cognitivo e emocional, além da dificuldade de</p><p>mensuração do abuso na infância, algumas vezes realizada por pais,</p><p>cuidadores ou professores e, ainda, em virtude do fato de não se</p><p>registrarem dados de abuso em crianças menores.</p><p>Estudos extensivos ainda buscam compreender o papel do stress</p><p>infantil no desencadeamento de transtornos de ansiedade na infância e</p><p>na adolescência. Uma situação que se configura como fonte de stress</p><p>para a criança é a ansiedade de separação, caracterizada como uma</p><p>ansiedade excessiva, que envolve o afastamento de casa ou de figuras</p><p>importantes de vinculação (APA 2013). Outra fonte de stress infantil</p><p>advém do fenômeno denominado “sensação de desamparo”, em que a</p><p>criança se sente desprotegida diante de uma situação que não se</p><p>encontra apta para enfrentar e que gera nela forte sensação de pressão.</p><p>Além dessas, as crenças irracionais também são consideradas fontes</p><p>internas de stress infantil, já que tais comportamentos e maneiras fixas</p><p>de pensar modelam o comportamento do indivíduo, influenciando todo</p><p>o processo de amadurecimento da criança e do adolescente (Tricoli e</p><p>Bignotto 2000).</p><p>Há que se ressaltar, ainda, que diversas pesquisas têm apontado que</p><p>os eventos de vida estressores, chamados por alguns autores de life-</p><p>events (Holmes e Rahe 1967), desempenham um papel etiológico no</p><p>surgimento de sintomas de ansiedade quando há predisposição genética</p><p>para lidar de forma inadequada com esses eventos ou vulnerabilidade</p><p>aumentada, resultante de efeitos ambientais de doença mental parental</p><p>(Margis et al. 2003). O estudo de Romero et al. (2009) apontou que o</p><p>abuso sexual infantil está associado também ao aparecimento de</p><p>transtorno de ansiedade na infância. A coorte prospectiva de Reuter et</p><p>al. (1999) também analisou em 303 adolescentes de 12 e 13 anos a</p><p>relação das desavenças entre pais e filhos como evento estressor e o</p><p>surgimento de transtornos de ansiedade aos 19 e 20 anos, constatando</p><p>que a presença de sintomas crônicos de ansiedade funcionou como</p><p>preditiva de transtornos de ansiedade. Nessa mesma direção, outro</p><p>estudo apontou que a presença de abuso físico e apoio familiar</p><p>inadequado aumentou a razão de chances (odds ratio) de crianças</p><p>desenvolverem transtornos de ansiedade em torno de 2% e 2,22%,</p><p>respectivamente (Scomparini et al. 2013).</p><p>Dessa forma, o trauma precoce não só aumenta o risco de</p><p>psicopatologias, mas também pode precipitar o surgimento da doença,</p><p>aumenta a comorbidade, altera a eficácia dos tratamentos para essas</p><p>condições e ainda traz altos custos para os serviços de saúde e economia</p><p>global dos países (Valente 2011; Juruena 2007).</p><p>Tratamento do stress e</p><p>dos transtornos</p><p>afetivos em crianças e</p><p>adolescentes</p><p>Os objetivos do tratamento visam à identificação precoce de</p><p>situações de stress e ao manejo dessas situações, auxiliando na</p><p>prevenção do surgimento de transtornos afetivos, além do tratamento</p><p>propriamente dito dos transtornos afetivos já instalados. Assim,</p><p>contribuem para que a criança e o adolescente se desenvolvam</p><p>normalmente e melhorem a autoestima e a autoconfiança. De modo</p><p>geral, o tratamento é constituído por uma abordagem multidisciplinar,</p><p>que inclui orientação aos pais e à criança, tratamento psicoterápico, uso</p><p>de psicofármacos, terapia ocupacional e intervenções familiares.</p><p>Tratamento farmacológico</p><p>Embora ainda sejam escassas as evidências científicas de qualidade</p><p>sobre o tratamento farmacológico dos transtornos afetivos em crianças e</p><p>adolescentes, os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS)</p><p>são considerados as drogas de primeira linha no tratamento dos</p><p>sintomas depressivos e ansiosos nessas faixas etárias, em razão da</p><p>segurança e da tolerabilidade (Curatolo e Brasil 2005).</p><p>Com relação ao tratamento do transtorno bipolar em crianças e</p><p>adolescentes, os estabilizadores de humor (anticonvulsivantes e lítio)</p><p>são as drogas mais utilizadas. Entre os estabilizadores de humor, o lítio</p><p>é a única droga atualmente aprovada pela Food and Drug</p><p>Administration (FDA) para uso em crianças e adolescentes (Fu-I 2004).</p><p>Psicoeducação</p><p>A psicoeducação na infância e na adolescência, além ter de o</p><p>objetivo de melhorar o curso da doença e a adesão ao tratamento, exerce</p><p>também o importante papel de orientar e aumentar o conhecimento</p><p>acerca dos transtornos psiquiátricos por parte de familiares,</p><p>profissionais da saúde e profissionais envolvidos com crianças e</p><p>adolescentes, permitindo o reconhecimento precoce de sintomas</p><p>psiquiátricos e o encaminhamento correto para os serviços de saúde</p><p>(Beardslee et al. 2003).</p><p>Além disso, a psicoeducação objetiva também contribuir para a</p><p>orientação de familiares, profissionais de saúde e professores na</p><p>identificação de fontes de stress infantil, a fim de permitir o</p><p>estabelecimento de ações interventivas precoces nessas situações de</p><p>stress, prevenindo o surgimento ou o agravamento dos transtornos</p><p>psiquiátricos.</p><p>Tratamento psicoterápico</p><p>As abordagens de psicoterapia da linha da terapia cognitivo-</p><p>comportamental, da terapia interpessoal e da terapia familiar parecem</p><p>ser as mais utilizadas entre os clínicos no tratamento de transtornos</p><p>psiquiátricos em crianças e adolescentes, em virtude de sua eficácia</p><p>terapêutica (Aacap 2007). De acordo com estudiosos da área, o manejo</p><p>do stress na infância e na adolescência envolve a reestruturação</p><p>cognitiva, o treino assertivo, a técnica de parada de pensamento, os</p><p>exercícios de respiração profunda e as técnicas de relaxamento, no</p><p>intuito de instrumentalizar a criança ou o adolescente a lidar melhor</p><p>com as situações de stress.</p><p>É importante lembrar também que, no tratamento dos transtornos</p><p>psiquiátricos na infância e na adolescência, os pais têm papel de</p><p>extrema importância. Portanto, as abordagens psicoterápicas em</p><p>crianças e adolescentes devem, de alguma forma, envolver a</p><p>participação dos pais no tratamento. Assim, contribuirão para uma</p><p>melhora na adesão e na resposta terapêutica, levando ao sucesso do</p><p>tratamento (Beardslee et al. 2003).</p><p>Terapia ocupacional</p><p>A intervenção da terapia ocupacional em crianças e adolescentes</p><p>com transtornos afetivos ocorre por meio de brincadeiras e atividades</p><p>que promovem espaços para a narrativa do pensar, do sentir e do agir,</p><p>possibilitando o controle dos sintomas e a retomada do curso do</p><p>desenvolvimento saudável pela melhoria da autoestima do paciente e do</p><p>oferecimento de continência (Kudo et al. 1997; Brunello 2007). Além</p><p>disso, o profissional de terapia ocupacional também pode contribuir</p><p>para o tratamento, avaliando o cotidiano da criança e do adolescente e</p><p>intervindo nele, fazendo com que atividades rotineiras deixem de</p><p>acontecer ou de ser realizadas de maneira disfuncional, o que representa</p><p>uma ruptura importante no cotidiano. Dessa forma, a atuação da terapia</p><p>ocupacional será pautada na reestruturação do cotidiano da criança e do</p><p>adolescente, auxiliando na realização das atividades de vida diária</p><p>(AVDs), nas tarefas de desempenho ocupacional</p><p>caracterizadas pela</p><p>alimentação, pelo cuidado e higiene pessoal, pelo vestuário, assim como</p><p>das atividades instrumentais de vida prática (AIVPs), relacionadas à</p><p>capacidade da criança de brincar e de realizar atividades de lazer</p><p>(Spackman et al. 2002; Aota 2008). Nesse sentido, o profissional</p><p>estimulará a realização dessas atividades, que promovem a interação</p><p>social e o extravasamento das tensões e dificuldades enfrentadas pela</p><p>criança e pelo adolescente em um ambiente diferente do setting</p><p>terapêutico por meio da identificação das origens da doença, como o</p><p>stress infantil, e da criação de estratégias de resolução de conflitos</p><p>internos.</p><p>Também se faz importante a intervenção nos contextos escolares,</p><p>pois a escola é uma das principais atividades influenciadas pelo quadro</p><p>psicopatológico, em que a criança ou o adolescente perde o interesse e o</p><p>prazer de frequentar a escola, apresentando isolamento social. Nessas</p><p>situações, o terapeuta ocupacional orientará a família e os educadores,</p><p>com o objetivo de facilitar o diálogo entre eles e a criança, permitindo</p><p>um espaço de conhecimento e reconhecimento dos sintomas para</p><p>manejo nas situações de crise, bem como criará estratégias reais de</p><p>prevenção da doença mental na fase adulta (Rocha, Luiz e Zulian 2003;</p><p>Jurdi, Brunello e Honda 2004). É importante destacar que os pais e</p><p>cuidadores desempenham o papel de coterapeutas no processo de</p><p>tratamento, pois auxiliam as crianças e os adolescentes a executar</p><p>tarefas nos diferentes contextos que frequentam, como a escola, a</p><p>família, os espaços de lazer e esporte. A compreensão, permeada pelo</p><p>apoio afetivo das pessoas da rede social da criança e do adolescente,</p><p>interferirá no prognóstico favorável de crianças e adolescentes com</p><p>doenças afetivas.</p><p>Conclusões</p><p>Diversos estudos demostram o papel do stress infantil como gatilho</p><p>no desencadeamento e no desenvolvimento dos transtornos afetivos na</p><p>infância e na adolescência. Os transtornos afetivos são doenças graves,</p><p>que causam grande prejuízo no desenvolvimento e no crescimento</p><p>emocional da criança e do adolescente. No entanto, esses transtornos</p><p>muitas vezes não são devidamente identificados e encaminhados para os</p><p>serviços de saúde.</p><p>A detecção precoce dos transtornos afetivos e a compreensão dos</p><p>fatores que os desencadeiam possibilitam tratamento e</p><p>acompanhamento adequados, com a minimização de sequelas na vida</p><p>do indivíduo, da família e da comunidade. Tendo em vista o impacto do</p><p>stress no desenvolvimento dos transtornos afetivos na infância e na</p><p>adolescência, é importante que ele seja prontamente reconhecido e</p><p>tratado, a fim de evitar o surgimento de psicopatologias futuras. Dessa</p><p>forma, a identificação de fontes de stress infantil tem implicações</p><p>práticas na prevenção dos transtornos afetivos.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>AACAP – AMERICAN ACADEMY OF CHILD AND ADOLESCENT PSYCHIATRY (2007).</p><p>“Practice parameters for the assessment and treatment of children and adolescents with</p><p>bipolar disorder”. J. Am. Acad. Child Adolesc. Psychiatry. 46(1), pp. 107-125.</p><p>ABRAMOVITCH, S.; MAIA, M.C. e CHENIAUX, E. (2008). “Attention-deficit and</p><p>disruptive behavior disorders: Association with physical abuse in childhood”. Rev.</p><p>Psiquiat. Clini., 35(4), pp. 159-164.</p><p>ADED, N.L.O. et al. (2006). “Abuso sexual em crianças e adolescentes: Revisão de 100 anos</p><p>de literatura”. 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Psiquiatr., 24(4), pp. 189-195.</p><p>PARTE II</p><p>FONTES DE STRESS</p><p>1</p><p>Stress na escola: Implicações</p><p>para alunos e professores[2]</p><p>Carmem Beatriz Neufeld</p><p>Carla Cristina Daolio</p><p>Ao nos voltarmos para a questão do stress na infância e na</p><p>adolescência, não podemos deixar de mencionar o papel da escola e</p><p>suas implicações na vida dos alunos. É esperado que passemos boa</p><p>parte das nossas vidas na escola: a maior parte da infância (de 6 a 12</p><p>anos) e praticamente toda a adolescência (de 12 a 18 anos). Assim, a</p><p>instituição escolar passa a atuar como pano de fundo dos</p><p>acontecimentos cotidianos de crianças e jovens, assumindo importante</p><p>influência em suas vidas.</p><p>No Brasil, as diretrizes da educação básica apontam que a escola</p><p>deve visar trabalhar com a ética, a estética e os valores de cidadania.</p><p>Seu plano pedagógico não deve deixar de considerar o contexto social</p><p>em que a escola está inserida. Ela deve contribuir para a percepção de</p><p>que cada pessoa faz parte de um grupo e tem o seu papel nele, deve</p><p>permitir o acesso a todo conhecimento da base nacional e auxiliar a</p><p>estabelecer conexões entre ele e a prática na comunidade. O ensino deve</p><p>ser enriquecido com conhecimentos e locais, e o trabalho sempre deve</p><p>procurar se atualizar e se adaptar melhor às demandas do contexto</p><p>(Capanema s.d.).</p><p>A realidade, no entanto, mostra que muitos desses ideais não são</p><p>plenamente alcançados (ibid.), gerando complicações na estrutura</p><p>institucional e familiar (Gomide et al. 2005). A realidade escolar se</p><p>confunde com a cultura, a sociedade, a estrutura da comunidade. Trata-</p><p>se de uma realidade complexa de interação de diversos atores, que se</p><p>influenciam mutuamente. Dessa forma, não apenas os alunos mas</p><p>também professores (Goulart e Lipp 2008) e familiares podem tanto ser</p><p>vítimas de stress catalisado pela instituição escolar como contribuir para</p><p>a manutenção do stress dentro da escola. Neste capítulo, discorreremos</p><p>sobre o stress de alunos e professores, sempre da perspectiva relacional</p><p>destes com a escola.</p><p>A escola e o stress em</p><p>crianças</p><p>Diversos estudos têm sido conduzidos com o intuito de verificar</p><p>qual a porcentagem de crianças com sintomas importantes de stress</p><p>dentro das escolas. Em um deles (Lipp et al. 2002), constatou-se que</p><p>crianças de escolas municipais apresentavam maiores níveis de stress do</p><p>que crianças de escolas particulares. Nesse estudo, 12,5% de todas as</p><p>crianças participantes apresentaram sintomas significativos de</p><p>stress.</p><p>Além disso, os dados apontaram que as meninas eram mais estressadas</p><p>do que os meninos e que as crianças da primeira série apresentavam</p><p>maior stress, possivelmente porque a entrada na escola significa</p><p>adaptação a um novo ambiente.</p><p>Em outro estudo (Sbaraini e Schermann 2008), os resultados foram</p><p>semelhantes, com crianças de escola pública apresentando maiores</p><p>índices e maior quantidade de meninas estressadas do que meninos,</p><p>atingindo uma prevalência de 18,2% de crianças estressadas. Entretanto,</p><p>nesse caso, as crianças da quarta série apresentavam mais stress,</p><p>possivelmente pela proximidade da puberdade no caso das meninas. Um</p><p>terceiro exemplo com valores também altos é o de um estudo com</p><p>escolares de 1ª a 4ª série, em que 30,1% das crianças apresentaram</p><p>sintomas significativos de stress (Lemes et al. 2003). Por fim, em um</p><p>estudo de caracterização de amostra de crianças que passariam por um</p><p>programa de promoção de saúde, de 41 crianças de 3º ano, 32% foram</p><p>classificadas como portadoras de sinais significativos de stress (Daolio</p><p>2013).</p><p>Esses valores demonstram que a população infantil está</p><p>vivenciando stress dentro da escola. Mas como saber de onde vem esse</p><p>stress? Podemos afirmar que a escola tem relação com essas reações das</p><p>crianças?</p><p>Em primeiro lugar, cabe destacar algumas noções de</p><p>desenvolvimento. Durante a terceira infância (dos 6 aos 12 anos), a</p><p>escola passa a assumir papel preponderante na vida do indivíduo</p><p>(Papalia e Feldman 2013). O processo educacional formal passa a ser</p><p>mais exigente academicamente. Além disso, cada vez mais a escola</p><p>assume o lugar da socialização com outras crianças e outros adultos,</p><p>onde a criança passará a vivenciar e conhecer outros modelos que não o</p><p>familiar, todo um novo ambiente a que deverá se adaptar (Marturano,</p><p>Trivellato-Ferreira e Gardinal 2009). A entrada na 1ª série escolar passa</p><p>a ser, então, uma transição para uma nova fase do desenvolvimento</p><p>humano.</p><p>Detalhando mais a questão, ao entrar na 1ª série do ensino</p><p>fundamental, a criança, mesmo que já tenha passado pela educação</p><p>infantil, depara-se com desafios antes não vivenciados, geralmente</p><p>mudando de escola (Trivellato-Ferreira e Marturano 2008; Marturano,</p><p>Trivellato-Ferreira e Gardinal 2009). Em relação às dinâmicas</p><p>interpessoais, as crianças passam a ter de aprender a conviver e lidar</p><p>com possíveis conflitos com pares de idades diferentes e buscar a</p><p>aceitação por um grupo. Academicamente, toda uma agenda de novas</p><p>habilidades e novos conhecimentos deve ser adquirida. São colocadas</p><p>sobre a criança expectativas quanto a escolarização e socialização, de</p><p>forma que, enquanto essas mudanças ocorrem, tolera-se menos a</p><p>dependência e disponibiliza-se menos suporte (Trivellato-Ferreira e</p><p>Marturano 2008; Marturano, Trivellato-Ferreira e Gardinal 2009).</p><p>Esse período do desenvolvimento humano representa para os</p><p>alunos ingressantes no ensino fundamental mobilização por emoções</p><p>fortes, como excitação, ansiedade e medo, contribuindo para o stress</p><p>(Graziano et al. 2007). As crianças vivenciam a escola como uma fonte</p><p>de stress cotidiano, visto que se preocupam com as relações com amigos</p><p>e professores (Lehman e Repetti 2007), e, conforme aumenta a série</p><p>escolar, as preocupações com o desempenho acadêmico também</p><p>aumentam (Kraag et al. 2006).</p><p>Algumas situações do cotidiano escolar percebidas pelas crianças</p><p>como estressantes são: chateação por estar longe da mãe;</p><p>desentendimento com colegas e professores; baixo desempenho; briga</p><p>com os pais no momento das tarefas de casa; bilhetes da escola na</p><p>agenda; perda de objetos pessoais, entre outras. Quando há stress gerado</p><p>por situações como essas, as crianças demonstram menor desempenho</p><p>na escola e maior dificuldade de ajustamento. Quando essas situações</p><p>geram conflitos das crianças com os pais, dos pais com os professores e</p><p>dos professores com as crianças, formam-se relações contraproducentes</p><p>e afetos negativos, que podem se tornar problemas crônicos, fazendo</p><p>com que a criança não se ajuste nos anos seguintes (Marturano,</p><p>Trivellato-Ferreira e Gardinal 2009).</p><p>Existem recursos, entretanto, que podem contribuir para a previsão</p><p>do stress que será vivenciado na 1ª série. Pesquisas têm indicado que</p><p>práticas parentais positivas, recursos do ambiente familiar, inteligência,</p><p>consciência fonológica e participação na educação infantil podem, em</p><p>maior ou menor grau, contribuir para o ajustamento e desempenho da</p><p>criança. A presença desses recursos mostrou menor percepção subjetiva</p><p>de stress em crianças do primeiro ano. O apoio da família oferece</p><p>suporte à criança para enfrentar possíveis dificuldades, visto que, no</p><p>primeiro ano, a maior parte das competências dela foi construída pela</p><p>vivência familiar. A prévia inserção na educação infantil favorece a</p><p>criança, pois ela já desenvolveu algumas das habilidades acadêmicas e</p><p>de socialização. A inteligência e a consciência fonológica contribuem</p><p>para o melhor desempenho acadêmico (Trivellato-Ferreira e Marturano</p><p>2008).</p><p>Além disso, a entrada no primeiro ano do ensino fundamental é</p><p>geralmente associada à identificação das primeiras dificuldades de</p><p>aprendizagem e de problemas de comportamento. Alguns estudos</p><p>observaram que o conceito que a criança faz de si mesma pode ser</p><p>alterado em razão de seu desempenho escolar. Em geral, crianças com</p><p>dificuldades de aprendizagem (tenham elas problemas de</p><p>comportamento ou não), quando comparadas às crianças sem</p><p>dificuldade, apresentam autoconceito mais negativo. Podem se sentir</p><p>pouco capazes intelectualmente, com mais dificuldades de</p><p>comportamento para se ajustar às demandas do meio (Okano et al.</p><p>2004; Stevanato et al. 2003), mais ansiosas, com menos popularidade e</p><p>menos satisfeitas (Stevanato et al. 2003).</p><p>Um estudo que comparou crianças com dificuldades escolares a</p><p>crianças sem dificuldades mostrou que as primeiras se sentiam menos</p><p>capazes e menos populares e mais desajeitadas do que as colegas,</p><p>indicando que avaliavam a si mesmas de acordo com comparações que</p><p>fazem de seus pares. Pode ser que o fracasso em manter um bom</p><p>rendimento as faça se sentirem inadequadas e com baixa autoestima,</p><p>gerando conflitos que perpetuam a dificuldade para assimilar novos</p><p>conhecimentos. O curioso nessa pesquisa foi que as crianças sem</p><p>dificuldades escolares se apresentaram mais ansiosas, possivelmente</p><p>pelo esforço que empreendiam em se manter valorizadas socialmente</p><p>(Okano et al. 2004).</p><p>Outra pesquisa, além de comparar crianças com presença e ausência</p><p>de dificuldades de aprendizagem, avaliou crianças que, além de</p><p>problemas escolares, também tivessem problemas de comportamento. A</p><p>pesquisa indicou que o autoconceito das crianças foi mais prejudicado</p><p>pelas dificuldades acadêmicas do que pelas dificuldades</p><p>comportamentais. As crianças com problemas de comportamento e de</p><p>aprendizagem se sentiam mais populares do que crianças apenas com</p><p>dificuldades escolares. Na percepção das crianças, o comportamento</p><p>antissocial as torna populares, mascarando o constrangimento pelas</p><p>dificuldades acadêmicas. Esse fato é preocupante, visto que esse padrão</p><p>de comportamento pode contribuir para o desenvolvimento de</p><p>delinquência na adolescência (Stevanato et al. 2003).</p><p>Não raramente, os problemas de aprendizagem vêm associados a</p><p>outros tipos de problema, como as dificuldades comportamentais</p><p>mencionadas, a vivência de adversidades, o maior stress (Marturano,</p><p>Toller e Elias 2005) e o deficit no suporte e no recurso parental</p><p>(Marturano 1999; Ferreira e Marturano 2002; D’Avila-Bacarji,</p><p>Marturano e Elias 2005). Além disso, as práticas parentais positivas</p><p>(monitoria positiva e comportamento moral) parecem estar associadas a</p><p>índices mais elevados de habilidades sociais e escore menor de</p><p>depressão e stress nos filhos. Já as práticas parentais negativas (abuso</p><p>físico, punição inconsistente, disciplina relaxada, monitoria negativa,</p><p>negligência) se relacionam a repertório pobre de habilidades sociais e</p><p>altos níveis de stress e depressão (Gomide et al. 2005).</p><p>Detalhando a questão da família como associada às dificuldades de</p><p>aprendizagem,</p><p>percebeu-se que o ambiente familiar era diferente ao se</p><p>comparar crianças que, além de dificuldade de aprendizagem,</p><p>apresentavam problemas de comportamento. Os pais cujos filhos</p><p>exibiam queixas escolares acadêmicas e de comportamento mostravam</p><p>problemas nas relações interpessoais, falhas na supervisão, no</p><p>monitoramento e no suporte, indícios de menor investimento no</p><p>desenvolvimento da criança, práticas punitivas e modelos adultos</p><p>agressivos, denotando um ambiente familiar com menos recursos e mais</p><p>adversidades. Essas condições fazem com que as dificuldades escolares</p><p>aumentem a vulnerabilidade da criança para inadaptação psicossocial</p><p>(Ferreira e Marturano 2002).</p><p>Quanto aos recursos familiares, um estudo indicou que o nível de</p><p>elaboração escrita de crianças com dificuldades de aprendizagem foi</p><p>maior quando a família podia oferecer livros e brinquedos, ao passo que</p><p>o atraso escolar era mais baixo quando a família organizava rotinas e</p><p>oferecia oportunidades para compartilhar atividades com os filhos</p><p>(Marturano 1999). Por fim, o suporte familiar também se mostrou</p><p>importante em outro estudo. Comparando-se o suporte emocional,</p><p>acadêmico e desenvolvimental dado aos filhos, percebeu-se que o baixo</p><p>suporte desenvolvimental e emocional, com problemas nas práticas</p><p>educativas e relacionamento conflituoso entre pais e filhos, foi mais</p><p>presente nas crianças encaminhadas para clínica por dificuldades de</p><p>aprendizagem. Essas crianças tinham rendimento acadêmico mais baixo</p><p>e mais problemas de comportamento quando comparadas com crianças</p><p>não encaminhadas, mesmo recebendo quantidade semelhante de suporte</p><p>acadêmico (D’Avila-Bacarji, Marturano e Elias 2005).</p><p>Outro fator que contribui para o stress infantil na escola e que será</p><p>brevemente discutido é o bullying. Mais comum em crianças mais</p><p>velhas (mais ou menos a partir dos 10 anos), o bullying é um</p><p>comportamento agressivo direcionado a outros, podendo ser direto ou</p><p>indireto, físico ou verbal, por meio material ou virtual (Dornelles,</p><p>Sayago e Ribeiro 2012), podendo ser caracterizado como um estressor</p><p>crônico (Rigoli et al. 2012).</p><p>O bullying está relacionado ao stress e às estratégias de</p><p>enfrentamento a adversidades que as crianças praticam. Em geral,</p><p>crianças estressadas têm mais chance de praticar bullying do que</p><p>crianças não estressadas (Konishi e Hymel 2009). Entretanto,</p><p>estratégias de enfrentamento (estratégias ativas, voltadas para a</p><p>resolução do problema) como a busca por suporte de parentes e amigos</p><p>diminuem o poder preditor do stress para a prática de bullying. Já</p><p>estratégias mais passivas, como a distração (uso da distração para lidar</p><p>com um problema), podem aumentar a prática de bullying em crianças</p><p>estressadas. Outras estratégias associadas à prática de bullying entre</p><p>crianças foram agressão e autodestruição (estratégias negativas),</p><p>devendo-se atentar para que as crianças tenham a oportunidade de</p><p>desenvolver estratégias mais assertivas para prevenir esse tipo de</p><p>comportamento (Olafsen e Viemerö 2000).</p><p>Considerando o exposto, as crianças estão sujeitas a diversos</p><p>estressores dentro do ambiente escolar. Apesar de esse ambiente se</p><p>apresentar muitas vezes como prevalente na vida das crianças, não é</p><p>possível estabelecer uma relação simples entre o stress vivenciado pelas</p><p>crianças na escola e suas causas. A vivência do stress infantil é</p><p>multicausal e há muitas correlações complexas entre os fatores que</p><p>contribuem para o stress clínico em crianças.</p><p>A escola e o stress em</p><p>adolescentes</p><p>Muitos dos estudos sobre a prevalência de stress na adolescência</p><p>fazem menção ou referência ao momento do vestibular e da escolha de</p><p>carreira. Entretanto, deve-se lembrar que não apenas o vestibular e a</p><p>escolha são geradores de stress nos adolescentes em fase escolar, apesar</p><p>de a literatura ser mais consistente nesses aspectos.</p><p>Em Campinas-SP, por exemplo, um estudo encontrou altos valores</p><p>de stress em uma amostra de 295 estudantes de diferentes escolas.</p><p>Destes, 65,6% apresentaram sinais de stress, significativamente mais</p><p>presente em meninas (Calais, Andrade e Lipp 2003). Um estudo com</p><p>alunos de primeiro ano de universidade, período ainda tipicamente</p><p>associado às características adolescentes, encontrou 48,19% dos jovens</p><p>com altos índices de stress. A maioria se encontrava na fase de</p><p>resistência (Pellegrini, Calais e Salgado 2012). Dados ainda mais</p><p>preocupantes foram encontrados entre alunos de terceiro ano e de</p><p>cursinho. Em um dos estudos, cerca de 67,7% dos estudantes</p><p>apresentavam índices alarmantes de stress (Paggiaro e Calais 2009) e,</p><p>em outro, 61,7% dos adolescentes pontuaram acima da média em</p><p>instrumento de medida de stress (Peruzzo et al. 2008). Prevalência</p><p>menor foi encontrada em adolescentes mais novos (12,33 anos em</p><p>média), cuja porcentagem de stress foi de 13,46% em 52 adolescentes</p><p>que participariam de grupo de promoção de saúde (Neufeld 2009).</p><p>Tais estudos corroboram a hipótese de que a adolescência é uma</p><p>fase estressante na vida dos indivíduos. Ela é um período caracterizado</p><p>pela eclosão de grandes transformações e aquisições, na esfera física,</p><p>social, cognitiva e, particularmente, na definição da identidade e na</p><p>maior independência dos pais (Reichert e Wagner 2008). O jovem se</p><p>depara com responsabilidades que antes não lhe eram cobradas, o que</p><p>gera o enfrentamento de situações de stress (Peruzzo et al. 2008).</p><p>O stress psicossocial em adolescentes pode estar associado a</p><p>condutas de risco que aumentam na adolescência, como o consumo de</p><p>bebidas alcoólicas e o uso de drogas, gerando pensamentos e planos de</p><p>suicídio (Carvalho et al. 2011). Quando o adolescente está exposto a</p><p>fatores de risco desproporcionais aos fatores de proteção, isso pode</p><p>desencadear problemas em seu desenvolvimento, com risco para sua</p><p>saúde mental (Dias et al. 2008).</p><p>Dentro da escola, como acontece com as crianças, os adolescentes</p><p>podem vivenciar o bullying como fator de stress, dada a importância da</p><p>socialização nessa fase. Em um estudo com adolescentes noruegueses,</p><p>por exemplo, os dados apontaram que, quanto maior a crença de</p><p>autoeficácia, maior a prática do bullying (para os jovens de 14 anos),</p><p>mostrando a importância que os adolescentes dão à exibição social.</p><p>Nesse mesmo estudo, a alienação escolar foi associada ao risco</p><p>aumentado de bullying, ao passo que o apoio de colegas e professores</p><p>diminuiu o risco (Natvig, Albrektsen e Qvarnstrøm 2001).</p><p>Outro estudo investigou o quanto ser vítima de bullying na</p><p>adolescência pode afetar a resposta ao stress em adultos. Usando</p><p>medidas fisiológicas, os autores descobriram que, depois da</p><p>apresentação de um estímulo estressor, os adultos que sofreram bullying</p><p>na adolescência tiveram um aumento dos batimentos cardíacos quando</p><p>comparados com adultos que não sofreram. Mesmo entre os jovens que</p><p>sofreram bullying e que relataram não sentir raiva do agressor, a</p><p>resposta de stress fisiológico (níveis de cortisol salivar e de pressão</p><p>arterial) foi menor, concluindo que a experiência de bullying na</p><p>adolescência, de fato, provoca alterações de longo prazo no sistema</p><p>nervoso simpático, responsável pelas reações fisiológicas em momentos</p><p>de stress (Hamilton et al. 2008).</p><p>Além de todas as questões típicas da adolescência que vão se</p><p>refletir nos diferentes contextos de vida do jovem (escolar, familiar,</p><p>afetivo, social), ele se deparará com a questão da entrada na vida adulta</p><p>e a necessidade de tomada de decisões que afetarão profundamente o</p><p>seu futuro. Cada vez mais, o exame vestibular tem se configurado como</p><p>uma importante etapa na vida de adolescentes e jovens adultos</p><p>brasileiros (Rodrigues e Pelisoli 2008). Ele representa um ritual de</p><p>passagem, depois do qual o adolescente entrará no mundo adulto e do</p><p>trabalho (Dias et al. 2008; Fagundes, Aquino e Paula 2010; Paggiaro e</p><p>Calais 2009; Peruzzo et al. 2008; Rodrigues e Pelisoli 2008). A época</p><p>que o antecede se caracteriza como uma fase de turbulência e</p><p>insegurança (Rosenburg 2006). Muitas vezes, a prova contribui para o</p><p>surgimento de stress e psicopatologias como ansiedade e depressão</p><p>(Dias et al. 2008), pois</p><p>adolescentes, exemplificando o uso de fármacos</p><p>para alguns tipos de transtornos. Ainda mostrando seu viés de</p><p>atualização e criatividade, o livro apresenta o uso da acupuntura para o</p><p>tratamento do stress infantil e da adolescência enfatizando a</p><p>importância de se adotar o método holístico no tratamento, enfocando</p><p>os aspectos físicos e emocionais dessas faixas etárias. Além disso,</p><p>aborda os maus-tratos e o transtorno de estresse pós-traumático (Tept)</p><p>na infância e na adolescência como consequência, e as implicações para</p><p>a vida desses indivíduos até a idade adulta. A obra finaliza com as</p><p>contribuições da terapia do esquema no stress precoce, enfatizando que</p><p>esse modelo de psicoterapia é um relevante referencial para tratar</p><p>adultos que foram vitimados quando crianças ou adolescentes pelo</p><p>stress excessivo.</p><p>Trata-se de obra de grande relevância tanto pela sua atualidade,</p><p>abrangência e aprofundamento como pelo seu espírito inovador.</p><p>Psicólogos, educadores e pais poderão saber mais sobre alguns temas</p><p>muito presentes no seu dia a dia e que, constantemente, os afligem e</p><p>desafiam. O conteúdo deste livro pode contribuir também para amenizar</p><p>as dificuldades decorrentes dos desafios encontrados pelo caminho de</p><p>quem lida com o stress de crianças e adolescentes. Boa leitura!</p><p>Lucia Emmanoel Novaes Malagris[1]</p><p>PARTE I</p><p>CONCEITOS BÁSICOS</p><p>1</p><p>O diagnóstico do stress em</p><p>crianças</p><p>Marilda Emmanuel Novaes Lipp</p><p>Não é fácil admitir que um filho, às vezes ainda tão pequeno, está</p><p>apresentando sintomas de stress. O sentimento de culpa, a confusão dos</p><p>pais nesse momento é grande.</p><p>O espaço do mundo onde a criança transita é, em geral, pequeno e</p><p>determinado pela vontade dos seus responsáveis. Quando o stress</p><p>infantil ocorre, é natural que os adultos se questionem sobre sua</p><p>responsabilidade na construção do problema. Não há dúvida de que pais</p><p>estressados geram um clima de tal tensão emocional que todos ao seu</p><p>redor refletem a angústia e o desassossego que acompanham o quadro</p><p>de desequilíbrio hormonal, clínico e psicológico que se instala. Porém, é</p><p>importante lembrar que, concomitantemente à função da paternidade e</p><p>da maternidade, existe a condição pura e simples da própria</p><p>vulnerabilidade e falibilidade humana, mesmo na presença de boas</p><p>intenções. Raramente se encontram pais que perdem o instinto paterno e</p><p>causam dano premeditado aos filhos. O comum é que se erre e se corrija</p><p>o erro, que se erre novamente e se tente acertar mais uma vez. Nessas</p><p>tentativas de acerto, a criança pode se desenvolver em um adulto sadio e</p><p>feliz. Os pais não necessitam se sentir culpados se estão de fato se</p><p>esforçando para dar aos filhos o melhor que podem.</p><p>Há de se entender que nem sempre está dentro do poder dos pais</p><p>proteger os filhos de todos os estressores que ocorrem na vida. Doenças,</p><p>sequestros, perdas de emprego, término de relações amorosas, mudança</p><p>de cônjuge e família, nascimento de irmãos, troca de empregadas, de</p><p>escola e de professores, hospitalização da própria criança, além de</p><p>várias outras condições, contribuem para que o stress infantil se faça</p><p>presente. Nem sempre os pais são o fator desencadeante do stress dos</p><p>filhos.</p><p>O diagnóstico do stress infantil deve ser realizado por um psicólogo</p><p>familiarizado com o mecanismo do stress e com os instrumentos de</p><p>avaliação do stress, isto é, a Escala de Stress Infantil (ESI), de autoria</p><p>de Lipp e Lucarelli (1998), ou a Escala de Stress para Adolescentes</p><p>(ESA), de autoria de Tricoli e Lipp (2003). Mas, diante da hipótese de</p><p>que uma criança está estressada, pais e professores precisariam se munir</p><p>de algumas informações importantes para poder ajudar a reduzir o</p><p>quadro. Entender o que é o stress, quais são os estressores mais comuns</p><p>no mundo infantil e que sintomas podem ocorrer ajuda a traçar um</p><p>plano de ação para reduzir o stress infantil.</p><p>Stress infantil</p><p>A incidência de stress grave na população infantil não é conhecida,</p><p>porém, sabe-se que toda criança, inevitavelmente, enfrentará inúmeras</p><p>situações de stress, mais ou menos sério, ainda nos primeiros anos de</p><p>vida, além das tensões geradas pela necessidade sempre maior de se</p><p>controlar.</p><p>O stress é uma reação do organismo que tem componentes físicos</p><p>e/ou psicológicos, causados pelas alterações psicofisiológicas que</p><p>ocorrem quando a pessoa se confronta com uma situação que, de um</p><p>modo ou de outro, irrite-a (não ganhar o brinquedo que deseja),</p><p>amedronte-a (perder-se em um shopping), excite-a (uma festa de</p><p>aniversário), confunda-a (mudança de escola) ou mesmo que a faça</p><p>muito feliz (uma viagem), conforme exposto por Lipp (2000b). Isso</p><p>significa que o processo bioquímico do stress independe da causa da</p><p>tensão. O elemento primordial para o seu desencadeamento é</p><p>claramente a necessidade de adaptação a algum fato ou mudança.</p><p>Quando uma adaptação é exigida, o processo do stress pode ser</p><p>iniciado, dependendo da magnitude do esforço envolvido no</p><p>restabelecimento da homeostase interna. Para saber mais sobre o</p><p>tratamento do stress infantil, recomenda-se o capítulo deste livro</p><p>intitulado “O stress emocional da modernidade: Reflexo das</p><p>mudanças”, que oferece sugestões para os pais que precisam lidar com o</p><p>stress dos filhos.</p><p>Fontes de stress infantil</p><p>O que leva uma criança a ter stress pode variar, do mesmo modo</p><p>como ocorre com os adultos, porém, temos identificado, em pesquisas e</p><p>também no atendimento clínico, que há determinadas situações mais</p><p>frequentes na vida de crianças com stress (Lipp 2000b), o que indica</p><p>que sejam fontes poderosas de tensão infantil.</p><p>As situações ou os eventos que geram stress, ou seja, os estressores,</p><p>podem ser naturalmente debilitantes, como fome, dor, frio intenso, ou</p><p>podem ser produto de uma aprendizagem, como medos, fobias,</p><p>preconceitos etc. Uma situação pode ou não ser estressante para uma</p><p>criança, dependendo do estágio de desenvolvimento emocional em que</p><p>ela esteja. Aquilo que talvez tenha um efeito menos grave em um bebê</p><p>de três meses, que ainda não se percebe como um ente separado dos</p><p>outros, pode afetar drasticamente uma criança de 18 meses, como uma</p><p>separação da mãe. O nível de ansiedade e desconforto que essa</p><p>separação vai acarretar dependerá, certamente, do seu nível de</p><p>amadurecimento emocional/social e também do seu estágio de</p><p>desenvolvimento intelectual. Por um lado, porque o nível de</p><p>desenvolvimento emocional/social da criança influencia no modo como</p><p>ela percebe e sente o que se passa ao seu redor. Por outro, com suas</p><p>etapas às vezes difíceis de serem identificadas em cada criança,</p><p>apresenta seus próprios conflitos. Cada estágio desse desenvolvimento</p><p>apresenta seus próprios problemas e conflitos a serem resolvidos e suas</p><p>fontes específicas de ansiedade e stress. A criança, à medida que</p><p>amadurece, muda sua maneira primitiva de lidar com o stress e</p><p>incorpora em seu repertório novas estratégias de resposta.</p><p>As etapas de desenvolvimento intelectual, emocional e afetivo</p><p>trazem consigo a oportunidade de a criança desenvolver seu potencial</p><p>genético, porém, são também assinaladas por inúmeras situações</p><p>geradoras de tensão, muitas vezes incapacitantes para as crianças e para</p><p>o seu frágil mecanismo de combate ao stress, por exemplo, o treino de</p><p>toalete, a retirada da chupeta e o ingresso na escola.</p><p>Lipp et al. (1997) sugeriram dividir as causas do stress infantil em</p><p>dois tipos, como se segue.</p><p>Fontes externas</p><p>Certos acontecimentos na vida da criança, bons ou maus, ou certas</p><p>situações decorrentes de sua interação com outras pessoas podem vir a</p><p>se tornar o que chamamos de fontes externas de stress.</p><p>Mudanças como fonte de stress</p><p>Alguns autores afirmam que as mudanças que ocorrem na vida da</p><p>criança exigem que ela use, às vezes, muita energia para conseguir</p><p>superá-las e isso cria um desgaste no organismo que pode ocasionar</p><p>doenças sérias. Quanto mais mudanças há no período de um ano, maior</p><p>é a probabilidade de a criança vir a ter problema de saúde em razão de</p><p>stress. Existe até uma escala que permite medir, de acordo com o que</p><p>tem ocorrido na vida da criança, a quantidade de stress ao qual ela está</p><p>submetida</p><p>a grande pressão que exerce no estudante é</p><p>acompanhada pelo medo do fracasso e das escolhas malsucedidas, pela</p><p>disputa de vagas, pelo pouco tempo de preparo, pela sensação de que, se</p><p>falhar, terá perdido todo o ano de estudos (Paggiaro e Calais 2009), pela</p><p>pressão da família, de amigos e da sociedade (Dias et al. 2008;</p><p>Rodrigues e Pelisoli 2008).</p><p>Pode-se notar que a questão da escolha profissional também parece</p><p>interferir no bem-estar dos jovens nessa etapa da vida. O vestibular</p><p>inevitavelmente remete à escolha, que é multifatorial, envolve aspectos</p><p>políticos, econômicos, sociais, educacionais, familiares e psicológicos</p><p>(Fagundes, Aquino e Paula 2010; Paggiaro e Calais 2009). A escolha</p><p>pode motivar o adolescente a estudar e seguir um planejamento ou pode</p><p>se tornar um fator de ansiedade e stress, em virtude da necessidade de</p><p>conhecimento da área de atuação, do mercado de trabalho, da rotina, do</p><p>salário e de todos os acompanhantes da vida profissional (Rodrigues e</p><p>Pelisoli 2008).</p><p>Os últimos anos de escola, também etapa final da adolescência, são</p><p>marcados por essas fortes pressões sociais. Assim, o adolescente,</p><p>enquanto ainda está na escola, com todas as responsabilidades</p><p>acadêmicas, passa por todos os conflitos típicos dessa fase, além de ter a</p><p>necessidade de estudar mais para uma prova classificatória e de fazer</p><p>uma escolha decisiva. Percebe-se a escola como o espaço onde todos</p><p>esses conflitos se expressarão.</p><p>A escola e o stress de</p><p>professores</p><p>O ofício de ensinar tem passado por profundas transformações ao</p><p>longo dos anos. A profissão de professor, em nosso país, atravessou</p><p>fases distintas e atualmente tem logrado atenção diferenciada, tanto por</p><p>aspectos positivos (necessidade de revitalização do papel do professor)</p><p>quanto por aspectos negativos (desvalorização e desmotivação</p><p>profissional). O stress na escola perpassa necessariamente pelo stress do</p><p>professor. Diferentes pesquisadores têm se debruçado sobre o tema e</p><p>buscado avaliar o stress de docentes de diferentes níveis de ensino.</p><p>O primeiro estudo a ser apresentado foi feito com professores do</p><p>ensino fundamental de 25 escolas municipais de Maringá. Esse estudo</p><p>contou com a participação de 170 professores, dos quais 103</p><p>apresentaram sintomatologia importante de stress. Nesse estudo, 60,6%</p><p>dos professores apresentaram sintomas acima da média, com valores</p><p>altos de sintomas físicos e psicológicos (Pereira et al. 2003).</p><p>Em outro estudo, foram convidados a participar 175 professores de</p><p>escolas públicas de uma cidade do interior de São Paulo. Esses</p><p>professores ministravam aulas nas classes de 1ª a 4ª série, representando</p><p>70% dos professores dessa categoria no município. Os resultados</p><p>mostraram que 56,6% deles apresentavam sintomatologia de stress, dos</p><p>quais 80,8% se encontravam na fase de resistência com predominância</p><p>de sintomas psicológicos (Goulart e Lipp 2008).</p><p>A título de exemplo, um terceiro estudo investigou o stress em 517</p><p>professores de ensino fundamental e médio de escolas particulares e</p><p>públicas da cidade de Campina Grande-PB. Dentre eles, 39,3%</p><p>apresentaram índices de stress baixo ou regular e 60,4%, índices</p><p>razoavelmente elevados ou altos (Silva, Damásio e Melo 2009).</p><p>Existem diversos fatores relacionados ao alto stress vivido pelos</p><p>professores no Brasil. Observa-se que eles estão cada vez mais</p><p>insatisfeitos com a profissão, seja por motivos operacionais (falta de</p><p>condições estruturais adequadas para o ensino), seja pelo salário baixo,</p><p>pelo pouco reconhecimento, seja pelo desinteresse, pela agressividade e</p><p>pela indisciplina dos alunos (Pereira et al. 2003; Silva 2006; Canova e</p><p>Porto 2010). Mesmo quando os professores são capazes de encontrar</p><p>um sentido de vida em sua função profissional, os estressores existentes</p><p>nas escolas ultrapassam esse sentido, deixando-os altamente estressados</p><p>(Silva, Damásio e Melo 2009).</p><p>Autores como Silva (2006) ponderam que, comumente no contexto</p><p>de escolas públicas, os alunos enxergam a escola como mais do que um</p><p>espaço para o aprendizado, é o espaço onde vão se libertar da alienação</p><p>imposta pela própria condição social e pelas consequentes dificuldades</p><p>familiares. Quando a escola frustra essas expectativas, eles acabam se</p><p>desinteressando, agindo agressivamente e abandonando a escola. Esse</p><p>ciclo perpetua o stress em professores e alunos.</p><p>O magistério tem sido, então, reconhecido como uma profissão</p><p>estressante, cujo estado de tensão pode contribuir para o abalo da saúde</p><p>física e mental do profissional (Pereira et al. 2003; Goulart e Lipp 2008;</p><p>Silva, Damásio e Melo 2009). Apesar disso, muitas vezes, os</p><p>professores precisam continuar nessas condições estressantes por</p><p>necessidade de sobrevivência ou medo do desemprego (Pereira et al.</p><p>2003).</p><p>Algumas das queixas dos professores comumente encontradas em</p><p>pesquisas são pouco tempo para si mesmos, cansaço mental, dores no</p><p>corpo, problemas de voz (ibid.), irritação e cansaço constantes,</p><p>angústias e ansiedades diárias, pensamento constante nos problemas</p><p>(Goulart e Lipp 2003). Dados mostram que fatores como tempo de</p><p>profissão, estado civil e número de filhos podem influir na prevalência</p><p>de stress. Quanto maior a quantidade de responsabilidades assumidas</p><p>pelo profissional (tanto no âmbito acadêmico quanto no social e</p><p>familiar), maior o stress vivido (Goulart e Lipp 2003).</p><p>Pensando na escola como instituição com valores organizacionais</p><p>(o que a organização, no caso a escola, preza nos trabalhadores, no</p><p>trabalho e no desempenho), alguns fatores relacionados a esses valores</p><p>também podem gerar stress nos professores, principalmente quando os</p><p>valores pessoais (metas individuais dos professores) entram em conflito</p><p>com as metas organizacionais. Quando o professor percebe que a escola</p><p>valoriza o coletivo, ele também percebe menos o stress da profissão</p><p>(stress ocupacional), já que há um encontro no desejo de ajudar os</p><p>alunos, formá-los e integrá-los à sociedade. A autonomia também é</p><p>importante, evitando o stress ocupacional. Entretanto, se a organização</p><p>coloca o professor em atividades burocráticas com prazos curtos, o</p><p>stress se acentua (Canova e Porto 2010).</p><p>Quando o stress ocupacional chega a níveis alarmantes, algumas</p><p>pessoas podem desenvolver a síndrome de burnout. Ela é concebida</p><p>como a síndrome da desistência; relaciona-se à dor do profissional que</p><p>já não tem energia para cumprir suas obrigações. Seus componentes</p><p>principais são a exaustão emocional, a despersonalização e a redução da</p><p>realização profissional, levando muitas vezes ao abandono da carreira.</p><p>O professor com burnout passa a ser indiferente ao que ocorre no</p><p>ambiente escolar, torna-se inerte, não se envolve mais com a busca de</p><p>estratégias criativas de ensino (Silva 2006).</p><p>Em um estudo, descobriu-se que estratégias mais passivas de</p><p>enfrentamento de adversidades, com foco na emoção (fixação nas</p><p>emoções negativas), desligamento mental (busca de atividades que</p><p>desviem a atenção do estressor) e coping moderado (autocontrole para</p><p>agir impulsiva ou prematuramente), estão relacionadas a índices mais</p><p>elevados de burnout. Por outro lado, a estratégia de coping ativo e</p><p>reinterpretação positiva se mostraram fatores de proteção, prevenindo o</p><p>burnout, associando-se à maior realização profissional (Mazon, Carlotto</p><p>e Câmara 2008). Esses níveis alarmantes de stress e de burnout nos</p><p>professores também afetam os alunos, visto que, quando o professor não</p><p>está saudável física ou mentalmente, com a comunicação assertiva</p><p>prejudicada, desinteressado da profissão e frustrado, ele acaba</p><p>comprometendo a relação de ensino e aprendizado (Goulart e Lipp</p><p>2008; Silva, Damásio e Melo 2009).</p><p>Ao olhar para esses fatores de stress que os professores enfrentam,</p><p>percebe-se o mesmo que ocorreu com crianças e adolescentes na escola:</p><p>a relação entre os fatores é extremamente complexa, engloba não</p><p>apenas o ambiente escolar mas também o espaço familiar, pessoal,</p><p>social e cultural.</p><p>Conclusões</p><p>O stress presente na escola é um fenômeno multivariado e</p><p>multicausal. Apesar de o contexto escolar ter potencial para causar</p><p>stress em crianças,</p><p>adolescentes e professores, ele pode não ser</p><p>condição suficiente para explicar os índices de stress encontrados hoje</p><p>na comunidade escolar. Existe uma relação complexa de diversos</p><p>fatores geradores de stress na escola, que pode ser vista como um pano</p><p>de fundo sobre o qual o stress infantojuvenil se expressa. Ela contribui</p><p>com o stress quando a comunicação com os outros fatores (família,</p><p>ambiente sociocultural, questões de infraestrutura e recursos) é</p><p>contraprodutiva.</p><p>Os professores também estão implicados nessa rede complexa de</p><p>fatores. Servindo de modelo aos alunos, o stress alto que vivem afeta a</p><p>relação com os estudantes, reforçando a necessidade do cuidado com</p><p>seu bem-estar tanto quanto com o dos alunos. Os professores, assim</p><p>como a escola, não são, sozinhos, fonte de stress em crianças e</p><p>adolescentes, são mais um dos elementos, agindo principalmente como</p><p>perpetuadores do stress antes causado por toda a conjunção de fatores</p><p>diversos.</p><p>A escola e os professores, de fato, contribuem para o stress ao</p><p>participar da configuração específica de cada fase da vida das crianças e</p><p>dos adolescentes, com novas demandas de responsabilidades</p><p>acadêmicas e sociais. A família, no entanto, tem também importante</p><p>influência no stress vivenciado na escola, podendo contribuir para a</p><p>manutenção ou o amento das dificuldades vividas pelos filhos e pelos</p><p>professores. Evidenciam-se, assim, as relações causais e consequenciais</p><p>dos pais com o stress dos filhos.</p><p>Nesse contexto, a busca pela promoção do bem-estar deve se tornar</p><p>cada vez mais o foco do profissional da saúde e da educação. O</p><p>contexto sociocultural influi em todas essas instâncias e pode gerar</p><p>vulnerabilidades para o aparecimento de mal-estar social e</p><p>desenvolvimento de psicopatologias, bem como do stress. Ao avaliar o</p><p>stress infantil e adolescente na escola, é necessário estarmos atentos a</p><p>todas essas questões. O papel de todos os profissionais envolvidos é,</p><p>mais do que buscar culpados, oferecer suporte à comunidade escolar</p><p>como um conjunto.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>CALAIS, S.L.; ANDRADE, L.M.B. e LIPP, M.E.N. (2003). “Diferenças de sexo e escolaridade</p><p>na manifestação de stress em adultos jovens”. Psicologia e Reflexão Crítica, 16 (supl. 2),</p><p>pp. 257-263.</p><p>CANOVA, K.R. e PORTO, J.B. (2010). “O impacto dos valores organizacionais no estresse</p><p>ocupacional: Um estudo com professores de ensino médio”. Revista de Administração</p><p>Mackenzie, 11(5), pp. 4-31.</p><p>CAPANEMA, A.P.G.M. (s.d.). 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Percebem que o</p><p>filho é diferente das crianças de mesma idade e escolaridade e, então,</p><p>começam a buscar um profissional de saúde para ajudá-los a entender o</p><p>que está ocorrendo. É quando o diagnóstico ocorre. Juntam-se a esse</p><p>quadro a possibilidade de um dos pais também ter características desse</p><p>transtorno e o sentimento de inadequação da criança, que não</p><p>corresponde às expectativas dos pais, dos familiares e muito menos da</p><p>escola, sentindo-se inferior e rejeitada.</p><p>Nesse contexto, em que as relações familiares estão comprometidas</p><p>e há grande necessidade de adaptação, é que normalmente se procura a</p><p>orientação de um psicólogo. Quando falamos em adaptação,</p><p>necessariamente estamos falando em stress, e assim vamos</p><p>contextualizar teoricamente o problema.</p><p>Stress</p><p>O stress é inerente à vida e constitui, antes de tudo, um fenômeno</p><p>ou uma reação emocional natural, biologicamente adaptativa e</p><p>fundamental para sobrevivência dos organismos. Essa reação do</p><p>organismo tem componentes físicos e/ou psicológicos, causados pelas</p><p>alterações psicofisiológicas que ocorrem quando a pessoa se confronta</p><p>com uma determinada situação, amedrontadora ou muito feliz. É um</p><p>estado de tensão mental e física, que produz um desequilíbrio no</p><p>funcionamento global do ser humano. Quando excessivo, o stress</p><p>enfraquece o sistema imunológico, deixando-o sujeito a infecções e</p><p>doenças. Segundo Lipp (1996), o stress pode ter fontes internas e</p><p>externas. As fontes externas são os eventos que ocorrem no meio</p><p>ambiente e afetam a vida do indivíduo, tais como dificuldade financeira,</p><p>doença, morte, acidente e até as próprias relações interpessoais do</p><p>cotidiano. As fontes internas correspondem ao mundo interno da pessoa,</p><p>do qual fazem parte as cognições distorcidas, o nível de assertividade,</p><p>as crenças, os valores, o padrão de comportamentos, as</p><p>vulnerabilidades, a ansiedade, os esquemas de reação à vida, o</p><p>perfeccionismo, os sonhos inalcançáveis etc.</p><p>O stress, quando considerado positivo, ajuda a aumentar a</p><p>vitalidade, o entusiasmo, o otimismo, a disposição física, ocasionando a</p><p>adaptação. Isso ocorre na fase inicial, a fase de alerta. Existe também o</p><p>stress considerado negativo, quando o estímulo estressor dura muito</p><p>tempo o stress se torna excessivo, fazendo com que o organismo</p><p>ultrapasse seus limites e esgote sua capacidade de adaptação. O stress</p><p>tem as mesmas características nos adultos e nas crianças e se</p><p>desenvolve em quatro fases: alerta, resistência, quase-exaustão e</p><p>exaustão.</p><p>O desenvolvimento infantil gera mudanças físicas, cognitivas,</p><p>emocionais, afetivas e sociais. Essas mudanças naturais fazem com que</p><p>todas as crianças enfrentem situações de stress, mas, quando estas se</p><p>somam à necessidade de adaptação diante do TDAH, a capacidade de</p><p>amadurecimento da criança pode ser excedida, desencadeando o</p><p>processo de stress excessivo. O mesmo ocorre com os adultos nas</p><p>situações nem sempre fáceis do processo de educar. Essa tarefa, na sua</p><p>essência, já requer adaptação e se torna mais difícil quando a ela são</p><p>acrescidas as dificuldades impostas pelo TDAH.</p><p>O transtorno do deficit de</p><p>atenção e hiperatividade</p><p>O TDAH é uma síndrome heterogênea, de etiologia multifatorial,</p><p>que depende de fatores genéticos, adversidades biológicas e problemas</p><p>psicossociais (famílias desestruturadas). Ele é visto como um dos</p><p>principais transtornos neuropsicológicos da infância. Sua prevalência</p><p>estimada é de 3% a 5% entre as crianças em idade escolar no Brasil. A</p><p>prevalência do TDAH relatada em pesquisas depende de vários fatores,</p><p>tais como: métodos de avaliação utilizados, população estudada,</p><p>critérios diagnósticos empregados e fonte de informação utilizada. As</p><p>crianças com esse transtorno muitas vezes são descritas como</p><p>preguiçosas, mal-educadas, desobedientes e inconvenientes.</p><p>Apresentam dificuldades de adaptação ao meio em que vivem e não</p><p>conseguem corresponder às expectativas dos adultos. O impacto</p><p>causado pelo transtorno atinge não só a criança mas todas as pessoas</p><p>envolvidas, como a família e a escola. Geralmente, os pais se sentem</p><p>perdidos no manejo dessas crianças, necessitando de intervenções que</p><p>os capacitem para essa ação. O modo como os pais se relacionarão com</p><p>seus filhos faz toda a diferença no prognóstico do quadro. A literatura</p><p>da área aponta alguns dos fatores psicossociais que poderiam estar</p><p>relacionados ao desenvolvimento, ao agravamento e à manutenção de</p><p>comportamentos do TDAH. Dentre eles, destacam-se os aspectos</p><p>específicos da parentalidade como: inconsistência na disciplina</p><p>maternal, ausência ou inconsistência das normas, regras muito</p><p>restritivas, falta de oportunidades para formar vínculos estáveis, nível</p><p>de stress das mães, processo de socialização na família, expressão</p><p>negativa de emoções dos pais e TDAH nos filhos.</p><p>A discussão sobre as causas da desatenção e da hiperatividade é</p><p>muito complexa. Busca-se identificar os possíveis determinantes para</p><p>cada indivíduo. O mais provável é que o quadro de distúrbio atencional</p><p>e hiperatividade apareça por um somatório de fatores desencadeantes.</p><p>Sabe-se que esse é o transtorno neurocomportamental mais frequente na</p><p>população pediátrica, com grande impacto na vida familiar, escolar e</p><p>social.</p><p>O diagnóstico do TDAH se sustenta sobre dois pilares: a) os dados</p><p>da história clínica da criança; b) avaliações neuropediátrica e</p><p>neuropsicológica. O DSM-5 (APA 2013) define esse transtorno como</p><p>um problema de saúde mental, considerando-o um distúrbio</p><p>bidimensional, que envolve a atenção e a hiperatividade/impulsividade.</p><p>A característica essencial é um padrão persistente de desatenção e/ou</p><p>hiperatividade, mais frequente e severo do que aquele tipicamente</p><p>observado em crianças de mesma idade que estão no nível equivalente</p><p>de desenvolvimento. Alguns autores sugerem que os transtornos de</p><p>conduta também podem estar associados ao TDAH.</p><p>O diagnóstico é</p><p>baseado no predomínio dos sintomas apresentados:</p><p>a) TDAH com predomínio de sintomas de desatenção;</p><p>b) TDAH com predomínio de sintomas de</p><p>hiperatividade/impulsividade;</p><p>c) TDAH com apresentação de sintomas combinados.</p><p>Atenção</p><p>A atenção tem uma natureza multidimensional. Para as pessoas com</p><p>TDAH, as maiores dificuldades estão nos aspectos da atenção</p><p>relacionados à persistência do esforço e à vigilância. A capacidade de</p><p>manter atenção nas tarefas se reduz, ocasionando distração ou</p><p>propensão a responder a eventos externos não relacionados com tais</p><p>tarefas.</p><p>A desatenção se caracteriza pela capacidade reduzida da criança de</p><p>permanecer atenta a uma determinada tarefa, a fim de compreendê-la</p><p>e/ou realizá-la, ou seja, a criança tem curta fixação da atenção.</p><p>Hiperatividade</p><p>A segunda dimensão de fatores relacionados ao TDAH é a</p><p>desinibição comportamental e a hiperatividade a ela associada. Essas</p><p>dificuldades se devem ao deficit no controle inibitório, ou seja, ao</p><p>controle fraco das funções executivas, à incapacidade de retardar</p><p>respostas e gratificações ou inibir respostas dominantes. A</p><p>hiperatividade está relacionada a essa dificuldade de controlar os</p><p>impulsos. Pode ser observada em níveis de atividade excessivos ou</p><p>inadequados ao desenvolvimento, como inquietação motora, agitação,</p><p>movimentos corporais bruscos e desinibição verbal.</p><p>Dessa maneira, o TDAH se caracteriza pela execução inapropriada</p><p>dos mecanismos reguladores da atenção, da reflexibilidade e da</p><p>atividade motora. O início é precoce e a evolução tende a ser crônica,</p><p>com repercussões significativas no funcionamento do indivíduo em</p><p>diversos contextos de sua vida.</p><p>Normalmente, os sintomas aparecem antes dos 12 anos de idade,</p><p>podendo ser observados em situações familiares, na escola e em</p><p>ocasiões sociais. O diagnóstico geralmente acontece quando a criança</p><p>inicia o processo de escolarização. Acredita-se que, no ambiente escolar,</p><p>as dificuldades de atenção e inquietude sejam percebidas com mais</p><p>frequência. Os professores diferenciam tais comportamentos por meio</p><p>de comparações com as outras crianças da mesma idade no mesmo</p><p>ambiente.</p><p>Contudo, ao observarmos pessoas com traços do transtorno nas</p><p>mais diversas áreas profissionais, deparamo-nos com uma grande</p><p>questão: é possível que o funcionamento do TDAH não seja tão</p><p>desfavorável como parece, haja vista que, entre suas implicações, estão</p><p>a capacidade de melhorar o processo de criatividade e a desinibição</p><p>comportamental. A impulsividade, o hiperfoco e a hiper-reatividade</p><p>presentes no processo criativo são fatores positivos, conforme se segue:</p><p>• A impulsividade é responsável por selecionar uma</p><p>determinada ideia entre as inúmeras que circulam pelo</p><p>cérebro, pois, sem ela, “uma ideia não se transforma de</p><p>fato em uma ação criativa”.</p><p>• O hiperfoco é a habilidade do TDAH de se hiperconcentrar</p><p>em ideias ou ações específicas, motivado por um impulso</p><p>passional, durante horas e horas, o que possibilita a</p><p>realização do processo criativo até que a ideia inicial se</p><p>materialize.</p><p>• A hiper-reatividade é a capacidade da mente com TDAH</p><p>permanecer sempre em funcionamento, conectando-se a</p><p>tudo simultaneamente, tal qual uma antena parabólica em</p><p>permanente rastreamento, captando os mais diversos</p><p>estímulos exteriores e interiores e reagindo a si mesma.</p><p>A orientação terapêutica para um prognóstico favorável ao</p><p>desenvolvimento dessa criança envolve um trabalho de terapia</p><p>cognitivo-comportamental, que pode estar associado ao uso de</p><p>medicações e deve ser realizado por meio de psicoeducação com a</p><p>criança, a família e a escola.</p><p>Fatores estressantes</p><p>específicos da criança</p><p>com TDAH</p><p>As crianças com TDAH se mostram agitadas e com perturbações</p><p>motoras (equilíbrio, noção de espaço e tempo, esquema corporal etc.),</p><p>mudam muito de uma atividade para outra, apresentam problemas na</p><p>organização acadêmica e dificuldade de manter uma relação de amizade</p><p>com as demais crianças de sua idade. Observa-se também um excessivo</p><p>nível de atividade, que se manifesta como movimentos corporais</p><p>desnecessários, impulsividade, antecipação de respostas e inabilidade</p><p>para esperar um acontecimento. As dificuldades de aprendizagem</p><p>(presentes em 20% dessas crianças) e o fracasso escolar são</p><p>manifestações que acompanham o transtorno hiperativo.</p><p>Segundo Barkley (1997), o deficit mais importante no TDAH,</p><p>independentemente da hiperatividade e da desatenção, é a dificuldade</p><p>de inibição da conduta. Essa dificuldade tem grande impacto no</p><p>funcionamento cotidiano (pragmático), nas praxias do desempenho</p><p>escolar, social etc. Por praxias, o autor entende a memória de trabalho</p><p>(verbal e não verbal), o controle do afeto, a motivação, o estado de</p><p>alerta e tudo o que afete o autocontrole e a capacidade de conduta</p><p>dirigida para metas.</p><p>Devemos entender o TDAH como um funcionamento cerebral</p><p>diferenciado, com comportamentos típicos, responsáveis por suas</p><p>dificuldades de concentração e foco, e também com características</p><p>positivas, muitas vezes ignoradas, como a criatividade e o hiperfoco. As</p><p>pessoas com TDAH têm um funcionamento mental acelerado, inquieto,</p><p>que produz incessantemente ideias que se apresentam de forma</p><p>brilhante ou se agregam de maneira atrapalhada, quando não encontram</p><p>direcionamento correto.</p><p>Relação familiar</p><p>A educação dos filhos sempre foi uma tarefa complexa para os pais.</p><p>Quando a criança apresenta TDAH, ela se torna, sem dúvida, mais</p><p>dificultosa e perturbadora (estímulo estressor) para qualquer família. A</p><p>relação familiar, que é o fator mais importante de prognóstico, pode</p><p>desempenhar papel de proteção, contenção e apoio, mas também ser um</p><p>elemento potencializador de dificuldades e stress dos filhos.</p><p>As estratégias e técnicas que os pais utilizam para orientar o</p><p>comportamento dos filhos, objetivando o desenvolvimento de</p><p>independência, autonomia e responsabilidade, são denominadas práticas</p><p>educativas parentais, e denominamos seu resultado de estilo parental.</p><p>Estilos parentais</p><p>O estilo parental é um clima emocional que abrange os padrões</p><p>globais de comportamento dos pais e vai além das atitudes destes. Seu</p><p>objetivo é que as práticas disciplinares específicas sejam mais eficazes e</p><p>também atuem na predisposição dos filhos à socialização.</p><p>A primeira das dimensões compreendidas pelo estilo parental se</p><p>refere ao modo como os pais podem atingir um relacionamento</p><p>harmonioso e efetivo com os filhos. A segunda dimensão compreende</p><p>as práticas parentais que causam comportamentos antissociais. Nesse</p><p>âmbito, o desenvolvimento ou a inibição dos comportamentos</p><p>antissociais estão diretamente relacionados à frequência e à intensidade</p><p>com que os pais utilizam determinadas práticas educativas. Um modelo</p><p>teórico de estilo parental é composto por sete variáveis (práticas</p><p>parentais). Cinco dessas variáveis estão vinculadas ao desenvolvimento</p><p>de comportamentos antissociais e duas promovem comportamentos pró-</p><p>sociais.</p><p>As práticas educativas consideradas positivas estão descritas a</p><p>seguir:</p><p>• Monitoria positiva: série de comportamentos parentais de</p><p>atenção às atividades e à adaptação dos filhos.</p><p>Características: estabelecimento de regras claras,</p><p>frequência equilibrada da atenção, demonstração segura</p><p>do afeto, acompanhamento e supervisão das atividades</p><p>escolares e de lazer.</p><p>• Comportamento moral: seguindo o exemplo dos pais,</p><p>refere-se ao desenvolvimento do senso de justiça, da</p><p>empatia, da responsabilidade, da generosidade, do trabalho</p><p>e do conhecimento do certo e do errado.</p><p>As práticas educativas negativas são:</p><p>• Abuso físico e psicológico: o abuso físico é o resultado</p><p>potencial da punição corporal, caracterizado por socar,</p><p>espancar, chutar ou machucar a criança, ou seja,</p><p>caracteriza-se pela disciplina imposta por práticas</p><p>corporais negativas. As práticas parentais violentas são</p><p>consideradas um fator de risco para o desenvolvimento de</p><p>problemas sociais e psicológicos (condutas antissociais e</p><p>transtornos psiquiátricos). O abuso psicológico é o mais</p><p>frequente dos tipos de abuso infantil, no entanto, é mais</p><p>sutil e difícil de mensurar. Caracteriza-se</p><p>principalmente</p><p>por ameaça, chantagem de abandono e humilhação da</p><p>criança. O desenvolvimento da autonomia e das relações</p><p>sociais é prejudicado e pode haver baixa autoestima e</p><p>depressão.</p><p>• Disciplina relaxada: é caracterizada pelo relaxamento das</p><p>regras estabelecidas e considerada um fator de risco para</p><p>problemas de conduta e delinquência. As regras são</p><p>estabelecidas, os pais ameaçam e, quando se deparam com</p><p>comportamentos de oposição dos filhos, abrem mão de seu</p><p>papel educativo.</p><p>• Monitoria negativa: denominada também de supervisão</p><p>estressante, caracteriza-se pelo excesso de instruções e</p><p>regras, não importando se são cumpridas ou não, o que</p><p>torna o ambiente familiar hostil.</p><p>• Negligência: caracteriza-se pela ausência de atenção e</p><p>afeto. Os pais negligentes não são responsivos, retiram-se</p><p>de situações difíceis e ignoram a maioria dos</p><p>comportamentos e atividades das crianças. A negligência</p><p>acaba gerando sentimentos de insegurança,</p><p>vulnerabilidade e dificuldade nos relacionamentos sociais.</p><p>• Punição inconsistente: esse tipo de punição interfere</p><p>sobretudo na percepção que a criança desenvolve sobre si,</p><p>pois, ao utilizar essa prática, os pais se orientam pelo</p><p>humor do momento na hora de punir ou reforçar e não</p><p>pelo ato praticado pela criança.</p><p>O estilo parental de risco para o desenvolvimento de</p><p>comportamentos antissociais nas crianças é caracterizado pela</p><p>utilização, por parte dos pais, de várias práticas educativas consideradas</p><p>negativas como negligência, punição inconsistente e abuso físico, em</p><p>detrimento das positivas. Ao contrário, o uso predominante das práticas</p><p>consideradas positivas (comportamento moral e monitoria positiva)</p><p>caracteriza um estilo parental ótimo.</p><p>Estilos parentais, stress e TDAH</p><p>Compreender a influência das práticas parentais no</p><p>desenvolvimento das crianças com TDAH pode contribuir</p><p>significativamente na decisão quanto ao tipo de intervenção a ser</p><p>realizada para uma boa adaptação das crianças. Há muito já se tem</p><p>ciência de como o estilo parental influencia o desenvolvimento e a</p><p>consolidação das funções de regulação. Nos casos de TDAH, em que</p><p>essas funções são frequentemente prejudicadas, é mais importante</p><p>promover práticas parentais que colaborem para um melhor</p><p>funcionamento dos filhos. O tratamento do TDAH envolve uma</p><p>abordagem multifocal, que engloba intervenções psicossociais e</p><p>psicofarmacológicas. As pesquisas indicam a necessidade de apoio para</p><p>os pais, potencializando os recursos existentes nas famílias, para que</p><p>todos possam lidar melhor com as dificuldades inerentes ao TDAH.</p><p>Com base no conhecimento levantado por pesquisas científicas,</p><p>sabemos que:</p><p>• O nível de stress afeta a escolha do modo de tratar os</p><p>filhos com TDAH. Os pais estressados pela dificuldade na</p><p>educação dos filhos utilizam muitas estratégias coercitivas</p><p>e punitivas. O uso de disciplina errática pode levar ao</p><p>surgimento ou à exacerbação de comportamentos</p><p>agressivos ou de oposição nos filhos.</p><p>• O National Resource Center on ADHD (s.d.) – Centro</p><p>Nacional de Recursos sobre o TDAH – reconhece que</p><p>estilos parentais deficitários podem aumentar os sintomas</p><p>de hiperatividade, desatenção e impulsividade em crianças</p><p>com TDAH.</p><p>• O stress potencializa os sintomas de dificuldades</p><p>atencionais. Isso pode ser muito útil, pois abre caminho</p><p>para futuras intervenções que objetivem o treino do</p><p>controle do stress, tendo em vista que é possível diminuir</p><p>efetivamente os sintomas de desatenção de maneira não</p><p>medicamentosa. Atualmente, a reabilitação cognitiva para</p><p>o TDAH é feita com base na técnica de treino de função</p><p>cognitiva, objetivando a neuroplasticidade; na técnica de</p><p>compensação de função cognitiva, que busca</p><p>contrabalançar os deficit pela utilização de apoios</p><p>externos; nas orientações psicoeducativas para a família e</p><p>a escola e na terapia cognitivo-comportamental. O treino</p><p>do controle de stress seria mais uma ferramenta para a</p><p>reabilitação, na busca de auxiliar o desenvolvimento das</p><p>crianças desatentas e melhorar sua qualidade de vida.</p><p>• Pais mais estressados tendem a ter filhos com mais</p><p>sintomas de stress. As diversas formas de apoio social que</p><p>a criança recebe, principalmente dos pais, influenciam</p><p>diretamente os fatores de maior ou menor vulnerabilidade</p><p>ao stress na infância. A condição de vulnerabilidade ao</p><p>stress pode ser fortalecida pelo TDAH.</p><p>• Crianças com TDAH são mais vulneráveis ao stress</p><p>ocasionado por críticas e comentários negativos dos pais.</p><p>• Comportamentos de oposição aumentam na presença de</p><p>críticas e reclamações de pais já avaliados pelos filhos</p><p>como muito críticos.</p><p>• Quanto mais intenso é o nível de stress familiar, maior a</p><p>ocorrência de violência contra a criança.</p><p>• A prevalência de stress no gênero feminino pode ser</p><p>explicada pela exigência da sociedade com relação às</p><p>mulheres, o que gera para elas uma sobrecarga de</p><p>atividades: carreira (profissional ou acadêmica),</p><p>exigências pessoais, biológicas, hormonais, sexuais e</p><p>sociais.</p><p>• Crianças com TDAH do subtipo combinado apresentam</p><p>mais sintomas de stress, seguidas pelas crianças</p><p>hiperativas, ao passo que as crianças do subtipo desatento</p><p>parecem ser menos atingidas. Crianças com as duas</p><p>dificuldades somadas seriam as mais vulneráveis ao stress.</p><p>A desatenção também é um estímulo menos estressante</p><p>para as mães, já que a maioria das que têm filhos</p><p>desatentos não apresenta stress e, quando apresenta, há</p><p>predominância dos sintomas psicológicos. Já com as mães</p><p>de crianças hiperativas ocorre o oposto. Elas apresentam</p><p>sintomas de stress com predominância dos sintomas</p><p>físicos. Observa-se diferenciação nos sintomas do stress</p><p>materno em função do subtipo do TDAH. Possivelmente,</p><p>isso ocorre porque a criança com hiperatividade motora</p><p>demanda desgaste físico maior, o que poderia potencializar</p><p>os sintomas físicos.</p><p>• O nível de stress infantil aumenta com a utilização, por</p><p>parte das mães, de práticas parentais consideradas</p><p>negativas. Além disso, a maioria das mães com sintomas</p><p>de tensão excessiva utiliza práticas parentais de risco para</p><p>o desenvolvimento de comportamentos antissociais.</p><p>• Os pais estressados tendem a ser menos assertivos no</p><p>manejo do problema e contribuir de forma negativa para a</p><p>adaptação a essa situação. Muitas vezes, valorizam</p><p>demasiadamente o desempenho da criança. Ao perceber</p><p>que ela não corresponde a seu desejo, podem cobrar</p><p>desempenho de maneira exagerada, o que vai gerando na</p><p>criança um quadro de stress elevado e baixa autoestima,</p><p>que é uma das principais causas do stress infantil. Os pais</p><p>devem demonstrar aos filhos o valor que têm pela pessoa</p><p>que são, ou seja, devem demonstrar à criança que ela é</p><p>amada incondicionalmente.</p><p>As famílias necessitam de intervenções que as capacitem a lidar</p><p>com as dificuldades impostas pelo TDAH e as instrumentalizem para a</p><p>utilização de estratégias de direcionamento dos comportamentos dos</p><p>filhos para a autonomia, regras morais e sociais.</p><p>Como postulado por Ellis (1973), provavelmente, não são os</p><p>acontecimentos em si que provocam as emoções, mas a maneira como</p><p>se pensa sobre eles, ou seja, a interpretação que se dá a eles. Desse</p><p>modo, acredita-se que os pais tenham grande dificuldade em entender e</p><p>aceitar as dificuldades de seus filhos, interpretando a incapacidade de</p><p>forma errada, como desobediência para algumas atividades, e</p><p>potencializando tanto o próprio stress como o stress das crianças. Os</p><p>pais necessitam distinguir desobediência de incapacidade (dificuldade).</p><p>Sabe-se que a maioria dos comportamentos da criança com TDAH</p><p>ocorre em razão de suas dificuldades e não de teimosia. Quando os pais</p><p>aprendem a fazer essa distinção, conseguem reduzir punições</p><p>inadequadas e orientar a criança para comportamentos mais assertivos,</p><p>promovendo um desenvolvimento favorável de suas potencialidades. O</p><p>comportamento da criança e os aspectos da vida valorizados por ela são</p><p>frutos da educação recebida dos pais.</p><p>Orientação para os pais</p><p>As crianças, ao longo do seu desenvolvimento, enfrentam</p><p>momentos de tensão que podem alcançar níveis altos e até ultrapassar</p><p>sua capacidade, imatura para lidar com situações</p><p>conflitantes. Nesses</p><p>momentos, a reação acertada dos adultos próximos é fundamental, pois</p><p>pais que respondem às situações estressantes da vida com ansiedade e</p><p>angústia transmitem esse modelo de comportamento para a criança, ou</p><p>seja, quando a criança for confrontada com acontecimentos estressantes</p><p>agirá da mesma forma, terá a tendência imediata de se sentir ansiosa e</p><p>angustiada.</p><p>A maneira como os pais educam os filhos parece ser crucial na</p><p>promoção de comportamentos socialmente adequados; porém, com</p><p>frequência, as famílias acabam estimulando comportamentos</p><p>inadequados ao aplicar disciplina inconsistente, pouca interação</p><p>positiva, pouco monitoramento e supervisão insuficiente das atividades</p><p>da criança.</p><p>Pode-se perceber que os pais exercem o papel fundamental de</p><p>oferecer à criança uma orientação que lhe possibilite adquirir estratégias</p><p>de enfrentamento do stress ao longo da vida, para isso, necessitam</p><p>tomar algumas precauções, como:</p><p>1. Não sobrecarregar os filhos com atividades</p><p>extracurriculares. O recomendado é que a criança, além da</p><p>escola, tenha uma atividade esportiva de sua escolha. Ao</p><p>escolher a atividade esportiva, deve-se atentar para o nível</p><p>de competição que ela envolve, para que a valorização não</p><p>seja apenas do desempenho da criança.</p><p>2. Atribuir responsabilidades conforme a criança possa dar</p><p>conta, sem excesso, mas evitando a falta total de</p><p>responsabilidades, ou seja, o ritmo da criança deve ser</p><p>respeitado.</p><p>3. Não fazer comparação entre crianças.</p><p>4. Estabelecer regras firmes, claras e coerentes.</p><p>5. Não impor limites e disciplina utilizando a figura de Deus.</p><p>6. Fazer críticas construtivas, enfocando apenas o</p><p>comportamento indesejável e não a pessoa da criança.</p><p>7. Evitar brigas e discussões na presença da criança (Bignotto</p><p>2000).</p><p>Acredita-se que, no contexto do TDAH, os pais menos estressados</p><p>capacitem melhor os filhos a lidar com os estressores da vida. Ou seja,</p><p>essas crianças seriam menos estressadas, pois teriam uma criação com</p><p>autoestima, autoconfiança, habilidades sociais, entre outras</p><p>características positivas.</p><p>Algumas condutas dos pais podem contribuir para melhorar as</p><p>interações e diminuir o stress:</p><p>1. Os pais devem entender as causas do TDAH e buscar ver o</p><p>mundo através dos olhos dos filhos. Essa conduta auxilia</p><p>os pais a entender as necessidades diárias da criança e</p><p>diminuir o stress. Inúmeros pais creem que o filho é</p><p>desinteressado, preguiçoso, que não se esforça ou, ainda,</p><p>que é ruim ou teimoso. Muitas vezes, os pais culpam os</p><p>professores e a escola pelos fracassos escolares da criança,</p><p>ocasionando mudanças de escola frequentes. Desse modo,</p><p>acabam rivalizando com a escola ou o professor e</p><p>acarretando mais problemas para a criança. Para escolher</p><p>uma escola, os pais devem levar em conta a</p><p>sintomatologia do TDAH e entender os problemas sociais,</p><p>emocionais e escolares, para só então decidir por uma</p><p>escola que favoreça o melhor desenvolvimento nessas</p><p>áreas. Quando os pais conseguem identificar o que</p><p>ocasiona as atitudes do filho, podem assumir uma postura</p><p>de compreensão e ajudá-los.</p><p>2. A união entre pai e mãe na condução da educação e no</p><p>estabelecimento de limites claros para os papéis de cada</p><p>um traz coesão ao grupo familiar. A presença dos pais é</p><p>fundamental para orientar os filhos, para apoiá-los e tentar</p><p>identificar possíveis revoltas e dificuldades, evitando</p><p>problemas maiores em seu desenvolvimento.</p><p>3. Os pais devem se apresentar de comum acordo sobre a</p><p>conduta a ser adotada com os filhos.</p><p>4. Os pais devem aceitar as dificuldades da criança, conhecê-</p><p>las, para não maximizá-las ou minimizá-las; precisam ter</p><p>clareza de que o TDAH não é culpa de ninguém.</p><p>5. Os pais devem proporcionar apoio emocional, acolher o</p><p>sofrimento da criança quando enfrenta dificuldades,</p><p>mostrar a ela que entendem o sofrimento dela e que</p><p>também confiam que ela será capaz de ultrapassar os</p><p>obstáculos.</p><p>6. Os pais devem buscar a compensação ativa das</p><p>dificuldades da criança, buscar junto com ela atividades</p><p>nas quais ela tenha sucesso e, assim, possa desenvolver o</p><p>sentimento de êxito.</p><p>7. Os pais devem fornecer informações claras e prévias à</p><p>criança, norteando o seu agir em cada situação e, também,</p><p>devem oferecer informação sobre a punição que a criança</p><p>receberá se não seguir as orientações. A punição se</p><p>caracteriza pela consequência direta que a criança terá</p><p>com aquela ação. Para a criança, é mais fácil saber</p><p>antecipadamente o que é esperado dela em determinadas</p><p>situações. No início, os pais devem dar orientações que</p><p>dirijam a conduta dos filhos, até que estes possam,</p><p>sozinhos, desenvolver suas próprias orientações e</p><p>direções. Caso a criança desobedeça, são necessárias</p><p>pequenas punições, a fim de demonstrar a clara</p><p>insatisfação dos pais e, novamente, esclarecer o porquê da</p><p>punição.</p><p>8. Os pais necessitam fazer uma distinção entre</p><p>desobediência e incompetência (dificuldade). Sabe-se que</p><p>a maioria dos comportamentos da criança com TDAH é</p><p>provocada por suas dificuldades e não por teimosia.</p><p>Quando os pais aprendem a fazer essa distinção, eles</p><p>conseguem reduzir punições inadequadas e orientar a</p><p>criança para adotar comportamentos mais assertivos e</p><p>promover um desenvolvimento favorável de suas</p><p>potencialidades.</p><p>9. Os pais devem ter em mente que a rede de apoio mais</p><p>próxima durante a infância é a familiar. Ela age como um</p><p>importante fator de proteção, pois algumas características</p><p>da família, como afeto, intimidade e comunicação, podem</p><p>ajudar as crianças a manter um senso de estabilidade e</p><p>rotina diante das mudanças e situações estressantes</p><p>(Lohman e Jarvis 2000).</p><p>10. Os pais devem esclarecer, quantas vezes forem</p><p>necessárias, o que esperam de cada membro da família,</p><p>quais são as normas e regras e qual a consequência de não</p><p>cumpri-las. Devem se certificar de que a criança entenda</p><p>com clareza o que lhe é solicitado. Obrigá-la a cumprir o</p><p>regulamento familiar não é privá-la de liberdade, e sim</p><p>estimular a sua responsabilidade e auxiliá-la a aprender a</p><p>controlar seus impulsos.</p><p>11. Os pais não devem manter a criança afastada da família</p><p>ampliada.</p><p>12. Os pais devem determinar metas e problemas específicos</p><p>a serem superados.</p><p>13. Os pais devem realizar encontros familiares em que todos</p><p>possam sugerir livremente soluções para as dificuldades.</p><p>De acordo com os especialistas e estudiosos, os pais de crianças</p><p>com TDAH necessitam, como parte prioritária para o desenvolvimento</p><p>adequado dessas crianças, aprender a utilizar práticas parentais na forma</p><p>de estratégias educativas, que demonstrem aceitação e compreensão das</p><p>dificuldades decorrentes do transtorno. Esses pais também devem</p><p>oferecer apoio emocional a seus filhos, para que se sintam seguros para</p><p>enfrentar e superar os obstáculos.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>APA – AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (2013). DSM-5: Diagnostic and</p><p>statistical manual of mental disorders. Porto Alegre: Artmed.</p><p>BARBOSA, G.A. (1995). “Transtornos hipercinéticos”. 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Campinas: Centro de Ciências da Vida, Pontifícia Universidade Católica de</p><p>Campinas.</p><p>CAMPBELL, S.B. (2000). “Attention-deficit/hyperactivity disorder: A developmental view”.</p><p>In: SAMEROFF, A.J.; LEWIS, M. e MILLER, S.M. (orgs.). Handbook</p><p>of developmental</p><p>psychopathology. Nova York: Kluwer/Plenum, pp. 383-401.</p><p>http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-85572013000200002&script=sci_arttext</p><p>CHRISTIANSEN, H. et al. (2010). Does the cortisol response to stress mediate the link</p><p>between expressed emotion and oppositional behavior in Attention-Deficit/Hyperactivity-</p><p>Disorder (ADHD)?. [Disponível na internet:</p><p>http://www.behavioralandbrainfunctions.com/content/6/1/45, acesso em 23/8/2013.]</p><p>CYPEL, S. (2007). Déficit de atenção e hiperatividade e as funções executivas: Atualização</p><p>para pais, professores e profissionais da saúde. São Paulo: Lemos.</p><p>ELLIS, A. (1973). Humanistic psychology: The rational emotive approach. 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Porém, as</p><p>mudanças muito rápidas que ocorrem no mundo inteiro e que são</p><p>compartilhadas de imediato com toda a humanidade exigem do ser</p><p>humano uma capacidade de adaptação que nem todos têm para oferecer.</p><p>Como as mudanças ocorrem em cascata e velozmente, pouco tempo há</p><p>para absorver e consolidar novos valores e modos de interpretar o</p><p>mundo ao redor. Tão logo se familiarize com um determinado modo de</p><p>agir, incentivado pela sociedade líquida de hoje (Bauman 2003), o ser</p><p>humano já necessita absorver, entender e se adaptar ao novo, que</p><p>amanhã já estará ultrapassado. Nessa correnteza emocional,</p><p>desaparecem valores recém-adquiridos, modos de se comportar que mal</p><p>foram ensaiados e já são ultrapassados, desejos, conhecimentos e</p><p>sonhos cujo sabor não se conseguiu provar inteiramente, pois a pressa</p><p>os transformou em fugazes relances de indefinição.</p><p>Assim ocorre com as práticas parentais. De disciplina intransigente</p><p>do passado, que tanto mal trouxe para muitos, resvala-se para métodos</p><p>de maternidade e paternidade que, nem bem são implantados, já geram</p><p>dúvidas sobre eficácia, ética, adequação e valor. Os pais já não sabem</p><p>qual o seu papel, os filhos se tornam criaturas sem controle, sem limite</p><p>e sem objetivos. Vale o momento atual, vale o hedonismo imediato.</p><p>Tudo isso leva a uma geração que, em nome da qualidade de vida,</p><p>prefere a vida mais fácil, o caminho menos difícil, o que redunda em</p><p>um número grande de adultos que ainda moram com os pais e vivem da</p><p>renda deles com a naturalidade daqueles que têm certeza de que</p><p>merecem uma vida fácil e cheia de prazeres.</p><p>Pais que não sabem impor limites e guiar os filhos na busca do</p><p>sucesso fornecem tudo de material que podem conseguir, matriculam</p><p>filhos nas melhores escolas, pagam férias no exterior, oferecem cursos</p><p>extras, academias, festas e viagens, mas se esquecem de dar sua</p><p>presença, de educar e de se comunicar intimamente com seus filhos.</p><p>Pais bem-intencionados, que desejam dar aos filhos o sucesso em</p><p>bandeja de prata conseguida com o trabalho paterno, poupam-nos da</p><p>batalha – e infelizmente também o prazer – da conquista e da vitória. A</p><p>intenção é boa, pais que querem, a todo custo, dar tudo para os filhos.</p><p>Porém, trata-se de uma verdadeira violência contra as crianças e os</p><p>adolescentes, contra a estrutura dos jovens, que perdem a motivação e</p><p>podem passar a sentir um vazio existencial, pois nada objetivam além</p><p>de uma vida boa. Não se pode ser feliz sem ter primeiro desejos e,</p><p>depois, lutar para preencher as metas oriundas desses desejos (Lipp</p><p>2000).</p><p>Quando os pais permitem que as crianças e os adolescentes façam o</p><p>que bem desejarem no dia a dia e na vida, estão cometendo um ato de</p><p>negligência, pois a permissividade exagerada, para jovens que ainda não</p><p>sabem se autodeterminar, é uma violência velada, não intencional, mas,</p><p>mesmo assim, cruel e muitas vezes irreversível.</p><p>Do mesmo modo que permitir que os filhos assistam a programas</p><p>de televisão com temas adultos, incentivar namoro e sexo em idade</p><p>precoce, compartilhar problemas do casal, tratar filhos como amigos –</p><p>esquecendo que pai é pai e não somente um amigo –, deixar que os</p><p>filhos decidam se vão fumar, beber ou usar maconha, tudo isso se</p><p>constitui em violência contra a psique da criança e do adolescente.</p><p>Esses jovens, violentados em sua constituição emocional básica por pais</p><p>permissivos, legitimam essa violência contra si próprios, em virtude dos</p><p>ganhos do hedonismo imediato que acabam tendo e, assim, reivindicam</p><p>mais e mais independência e poder. Não sabem ainda o preço que</p><p>pagam por viver uma vida de adultos em corpo e mente de crianças e</p><p>adolescentes.</p><p>Igualmente danoso é para os pais esse papel de servidores do prazer</p><p>dos filhos, pais que abrem mão da autoridade intrínseca ao ato de ser</p><p>progenitor e do prazer que se tem de ver um filho motivado, dinâmico e</p><p>empenhado na busca, não só do sucesso profissional, mas também da</p><p>inteireza do ser ético, cidadão dedicado ao seu país e ser humano pleno.</p><p>Pais que agem como não pais passam a ser vistos como uma fonte de</p><p>segurança financeira, com obrigação de resgatar os filhos das</p><p>dificuldades que criam e atravessam. A relação entre pais e filhos se</p><p>torna objetal, não há sacralidade da figura do progenitor. Como um</p><p>objeto, os pais perdem o direito de serem eles mesmos e passam a ser</p><p>um joguete nas mãos de filhos que não têm consideração e não se</p><p>julgam na responsabilidade de retornar o amor que recebem.</p><p>Filho criado sem limites é filho órfão, sem pai e sem mãe. O limite</p><p>é expressão concreta do amor dos pais (Fabio Melo 2008) e estes não</p><p>podem ter medo de exigir disciplina e levar os filhos, mesmo a</p><p>contragosto, pelo caminho do certo e do bem no longo prazo. Podem-se</p><p>aceitar as mudanças da modernidade, porém não se pode isentar os pais</p><p>do direito e da responsabilidade de educar e guiar seus filhos na feitura</p><p>do ser (Lipp 2010).</p><p>O processo de ser pessoa envolve um aprendizado constante, que</p><p>modifica, melhora ou reduz as influências genéticas</p><p>que afetam a</p><p>construção da personalidade e geram um modo de agir definidor. Esse</p><p>processo é trabalhoso e árduo, pois esbarra em sacrifícios e lutas,</p><p>derrotas e vitórias que vão moldando a autoestima de cada um. Pais</p><p>desempenham um papel fundamental ao moldar esse caminho. Tanto a</p><p>disciplina exagerada como a negligente favorecem o surgimento de</p><p>problemas graves para a idade adulta. Importante é preparar a criança</p><p>para os embates da vida, deixando-a tomar contato com pequenos</p><p>estressores, de modo a inocular nela o preparo para as lutas maiores que</p><p>a vida envolve. Independentemente da época em que se viva, é</p><p>aconselhável que os pais permaneçam atentos aos estressores e aos</p><p>efeitos que eles podem ter na vida da família em geral.</p><p>Stress infantil e do</p><p>adolescente</p><p>Stress é o nome que se dá a um conjunto de reações que surgem</p><p>quando acontece algo que nos amedronte, excite ou nos faça</p><p>extremamente felizes. A nossa reação, nesse momento, contém</p><p>sensações físicas e psicológicas que causam mudanças químicas no</p><p>corpo. Qualquer situação que desperte emoção forte, boa ou má, que</p><p>exija mudanças no modo de agir da pessoa é um estressor, isto é, uma</p><p>fonte de stress.</p><p>Deve-se notar que não só coisas ruins causam stress,</p><p>acontecimentos bons, como Natal e aniversários, podem causar tensão,</p><p>pois exigem um esforço maior do que o exigido no dia a dia. Isso é</p><p>verdade tanto para o adulto como para o adolescente e para a criança.</p><p>O que ocorre quando a</p><p>criança está sob stress?</p><p>Em geral, o organismo humano mantém, automaticamente, todos os</p><p>órgãos funcionando normalmente. O coração pulsa, bombeando o</p><p>sangue com movimentos ritmados. Os pulmões, os rins, o estômago e as</p><p>glândulas realizam suas funções. O corpo funciona como uma máquina</p><p>bem-calibrada, em perfeito equilíbrio. Porém, quando a criança se</p><p>depara com algo estressante, seu cérebro, por meio do hipotálamo, ativa</p><p>o sistema nervoso simpático e a glândula pituitária. Simultaneamente,</p><p>as glândulas suprarrenais são acionadas e liberam a adrenalina, que</p><p>estimula o coração e faz com que a criança fique em estado de alerta,</p><p>como se estivesse prestes a enfrentar um perigo. Concomitantemente, as</p><p>atividades vegetativas (como digestão e sono) ficam inibidas, a criança</p><p>perde o apetite, dorme mal e pode ter dores abdominais.</p><p>Tudo isso acontece porque o equilíbrio interno do corpo foi</p><p>quebrado, no esforço que a criança fez para lidar com o estressor e se</p><p>adaptar a uma nova situação. Se o stress for muito intenso ou se</p><p>prolongar por um período muito longo, problemas sérios de saúde</p><p>podem ocorrer.</p><p>Consequências da falta de</p><p>stress na infância</p><p>Muitos pais, num esforço muito bem-intencionado, tentam</p><p>resguardar os filhos de toda e qualquer desilusão, frustração, tristeza e</p><p>tensão. Tal atitude é frequentemente observada nas lojas de brinquedos,</p><p>onde, diante da indecisão da criança entre dois brinquedos, os pais</p><p>compram ambos, não demonstrando a situação econômica ruim que</p><p>atravessam, para não decepcionar o filho.</p><p>Inúmeros exemplos são observados no dia a dia de pais que</p><p>superprotegem os filhos, na ilusão de os estarem criando bem. É preciso</p><p>lembrar que a vida não é só constituída de risos e alegrias. Muitas</p><p>tristezas, frustrações e desilusões são enfrentadas pelo ser humano na</p><p>trajetória de sua existência. Aqueles que, quando crianças, foram</p><p>expostos a pequenas doses de frustração e tensão, estarão muito mais</p><p>bem-preparados para enfrentar o stress adulto.</p><p>As pesquisas indicam que os adultos que melhor lidam com o</p><p>stress, os menos vulneráveis aos seus efeitos maléficos, são aqueles que,</p><p>na infância, adquiriram estratégias para lidar com as situações difíceis</p><p>da vida. A superproteção, no que diz respeito a poupar a criança em</p><p>demasia, leva a uma baixa tolerância à frustração e a uma alta</p><p>vulnerabilidade ao stress adulto.</p><p>Uma palavra de cautela é necessária aqui. Recomenda-se que os</p><p>pais deixem os filhos experimentarem frustração e stress como parte do</p><p>desenvolvimento normal, porém que os protejam dos excessos de stress</p><p>com os quais ainda não estejam aptos a lidar.</p><p>O que torna uma criança</p><p>resiliente ao stress?</p><p>Resiliência é a habilidade de lidar com o stress e com os traumas da</p><p>vida, recuperando-se e construindo um futuro (Lipp et al. 2009). É saber</p><p>se adaptar às mudanças significativas. É conseguir suportar as</p><p>frustrações e se recuperar. As pessoas passam por eventos traumáticos,</p><p>sofrem, angustiam-se, mas podem se recuperar e crescer</p><p>emocionalmente. A verdade é que a maioria das pessoas consegue não</p><p>só se recuperar, mas até se tornar mais forte após um trauma. A</p><p>resiliência pode ser aprendida no dia a dia, através dos anos, e o fator</p><p>mais importante para desenvolver a resiliência é saber manejar o stress</p><p>e as emoções turbulentas.</p><p>É importante saber que a vulnerabilidade das crianças ao stress</p><p>depende de inúmeros fatores. Temos notado que algumas chegam a</p><p>parecer invulneráveis, conseguindo lidar adequadamente com situações</p><p>extremamente estressantes. Além disso, observa-se frequentemente que</p><p>o mesmo evento pode ser muito estressante para uma criança e não</p><p>afetar outra de modo significativo, por isso, é importante entender o que</p><p>torna a criança mais ou menos resistente ao stress.</p><p>As crianças mais resistentes ao stress parecem ser aquelas mais</p><p>seguras de si próprias, com maior abertura para mudanças e que não</p><p>veem os fatos inesperados da vida como ameaças. Em geral, tiveram a</p><p>oportunidade de ser bem-sucedidas em algo, seja na habilidade de fazer</p><p>amigos, seja nas notas boas na escola, seja por serem aceitas como são</p><p>pelos pais. Essas crianças sentem, em sua maioria, que os pais as</p><p>protegem e as guiam, sem dominá-las ou superprotegê-las. Elas têm a</p><p>autoimagem adequada e se comunicam com os adultos, mesmo que não</p><p>sejam os pais. O que ajuda a criar esse estado especial de enfrentamento</p><p>adequado das adversidades é:</p><p>• ter elos afetivos e o apoio de amigos e parentes e procurar</p><p>esse apoio nas crises;</p><p>• ter a convicção de que saberá lidar com o problema e com</p><p>a vida;</p><p>• entender que crises passam e a ferida sentimental cicatriza;</p><p>• lidar com o stress de modo adequado, não usando drogas,</p><p>álcool, cigarro etc.;</p><p>• pensar positivamente, vendo sempre a esperança;</p><p>• procurar ajuda profissional de um psicólogo quando sentir</p><p>que precisa.</p><p>A contribuição dos pais</p><p>A literatura especializada parece indicar que os pais exercem</p><p>importante papel na vulnerabilidade e na resistência que o filho tem ao</p><p>stress, não só no que tange à hereditariedade, mas também nos fatores</p><p>ligados à aprendizagem. Sem dúvida, os pais exercem um papel</p><p>fundamental na aquisição, pela criança, de estratégias naturais para lidar</p><p>com o stress, especialmente na habilidade de ver a vida de modo mais</p><p>positivo, na interpretação saudável de eventos cotidianos e na percepção</p><p>de que se é capaz de lidar com o mundo ao redor de modo competente.</p><p>Alguns autores postulam que é o sucesso obtido em vários</p><p>momentos de crise o que possibilita à pessoa ter uma atuação adequada</p><p>em crises futuras. Os pais seriam, assim, de grande importância ao</p><p>auxiliar os filhos a atravessar as crises da infância e da adolescência de</p><p>modo bem-sucedido, a fim de que adquiram uma sensação de</p><p>competência perante os problemas da idade adulta.</p><p>Outros autores enfatizam as atividades de resolução de problemas e</p><p>reinterpretação de estressores que contribuem para a sobrevivência do</p><p>ser humano. Sugerem que a pessoa precisa crer que pode desempenhar</p><p>uma tarefa para poder realizá-la e que, uma vez bem-sucedida em seus</p><p>esforços para lidar com um estressor, mais confiança ela terá quando</p><p>precisar lidar com outros estressores. Essa aquisição de confiança em</p><p>sua própria atuação no mundo é adquirida, ou não, através de uma</p><p>história de reforço e punição, modelagem e modelação, fornecida</p><p>basicamente pelos pais. É inegável também a contribuição da</p><p>aprendizagem, com os pais, de crenças e valores que possam funcionar</p><p>como potentes fontes internas de stress. As crenças, por exemplo, de</p><p>que deve ser sempre perfeita e amada por todos, funcionam como</p><p>frequentes fontes de stress</p><p>para as crianças, em razão da frustração que,</p><p>infalivelmente, acarretarão quando a realidade for outra.</p><p>Outra característica adquirida durante o desenvolvimento, que</p><p>contribui para a maior ou menor vulnerabilidade ao stress, é o que se</p><p>conhece como padrão tipo A de comportamento. As características do</p><p>tipo A são, basicamente, a sensação de urgência de tempo (pressa), a</p><p>hostilidade facilmente despertada, a polifasia de pensamentos e ações, a</p><p>competitividade e o desejo intenso de obter realizações múltiplas.</p><p>Analisando a história de vida de inúmeras pessoas adultas do tipo</p><p>A, encontramos alguns pontos em comum. Em geral, o tipo A é</p><p>primogênito ou o primeiro homem após o nascimento de várias meninas</p><p>ou, ainda, filho único. Desde criança, ouvia os pais verbalizarem</p><p>grandes esperanças e expectativas de realizações, elogiando sempre os</p><p>“feitos” dessa criança e não dando tanta atenção ao “ser” dela. A</p><p>impressão que se tem é de que o tipo A percebeu, certa ou erradamente,</p><p>que o amor oferecido pelos pais era condicionado ao bom</p><p>comportamento, ao modo inteligente de agir, às boas notas, em suma, ao</p><p>fato de ter “realizado” algo. Assim, na idade adulta, colecionar</p><p>realizações passa a ser um modo de conseguir respeito, amor e</p><p>consideração dos outros. Essas pessoas, cujos dados forneceram</p><p>conteúdo para as interpretações aqui apresentadas, tinham uma história</p><p>de sucesso. Desde pequenas, quando pressionadas pelos pais a realizar</p><p>alguns empreendimentos, conseguiram ser bem-sucedidas. Sem dúvida,</p><p>esse sucesso aliado à aprovação recebida dos pais deve ter reforçado a</p><p>atitude voltada para realizações que se observa no tipo A. Seria</p><p>interessante pesquisar o que ocorre com aquelas crianças que, em face</p><p>das mesmas expectativas e pressões parentais, não conseguem êxito.</p><p>Os componentes do quadro que caracteriza o tipo A podem atuar</p><p>como fontes internas de stress, porém nem sempre isso ocorre, pois</p><p>depende não só da intensidade desses componentes como também da</p><p>existência, no repertório da pessoa, de técnicas ou estratégias eficientes</p><p>para lidar com o stress.</p><p>Há, ainda, uma outra fonte de stress que se deduz estar ligada às</p><p>atitudes parentais, que é a vulnerabilidade ao stress, oriunda de</p><p>frustrações. Por frustração, referimo-nos ao bloqueio de</p><p>comportamentos ou objetivos desejados. Ela ocorre quando algo impede</p><p>a realização dos nossos desejos. A resposta emocional natural é raiva ou</p><p>agressividade, acompanhada das reações hormonais correspondentes.</p><p>As pessoas variam na sua resistência à frustração. As mais vulneráveis</p><p>são as que sofrem os efeitos do stress originado na frustração, já as mais</p><p>resistentes são aquelas que têm uma flexibilidade mental acentuada, que</p><p>lhes permite buscar alternativas para satisfazer o desejo bloqueado, ou</p><p>aquelas que, em virtude de terem sido submetidas a um esquema de</p><p>reforço intermitente, aprenderam a ser persistentes.</p><p>Como se verifica, os pais são de grande importância na aquisição,</p><p>por parte dos filhos, de características pessoais que vão servir como</p><p>fontes potenciais de stress na vida adulta ou auxiliar a lidar com o stress</p><p>excessivo.</p><p>Não há dúvida de que as crianças, adequadamente criadas, são</p><p>menos vulneráveis ao stress e dele se recuperam com muito mais</p><p>facilidade, pois seu poder de adaptação e seus recursos internos são de</p><p>grande valia nas horas críticas. Desse modo, conclui-se que uma ação</p><p>preventiva quanto aos perigos do stress deveria necessariamente se</p><p>iniciar em trabalhos comunitários de orientação aos pais, que os</p><p>colocariam em prática na criação de seus filhos durante as várias etapas</p><p>de desenvolvimento.</p><p>Recomendações práticas</p><p>para pais e professores</p><p>Como prevenir o stress excessivo na criança</p><p>Em casa – Primeiramente, é necessário aceitar que nem sempre é</p><p>possível controlar o nível de stress de nossos filhos, como, por exemplo,</p><p>em situações de morte, acidente e doença. Quando for impossível evitar</p><p>o stress excessivo, nada mais resta a ser feito a não ser lidar com ele,</p><p>algo perfeitamente possível, seguindo as recomendações oferecidas no</p><p>próximo capítulo. No entanto, em grande número de situações, pode-se</p><p>evitar que o stress atinja níveis acima da capacidade da criança. Várias</p><p>sugestões já foram fornecidas neste livro sobre como os pais podem</p><p>prevenir o stress excessivo em seus filhos, principalmente nas seções</p><p>que discutiram as fontes externas de stress e a contribuição dos pais</p><p>para a resistência ao stress. Algumas se traduzem no seguinte:</p><p>1. Espace as mudanças na vida da criança.</p><p>2. Não a envolva em atividades extracurriculares em excesso.</p><p>3. Não a poupe demais, porém, não a sobrecarregue de</p><p>responsabilidades.</p><p>4. Tente evitar que ela presencie as brigas dos pais e, se for</p><p>necessário que se separem, a criança deve ser resguardada</p><p>do envolvimento excessivo e da situação de acusações</p><p>recíprocas.</p><p>5. Escolha a escola e ouça, com atenção, as queixas que a</p><p>criança fizer. Elas podem ser verdadeiras.</p><p>6. Não coloque o medo de Deus na criança; essa é uma causa</p><p>de muitos problemas emocionais.</p><p>7. Analise o método de disciplina que está usando. Evite as</p><p>incongruências, as irritabilidades e as confusões. Torne os</p><p>limites claros para a criança.</p><p>8. Lide com morte, doença, hospitalização e nascimento de</p><p>bebê do modo mais tranquilo e adequado possível.</p><p>9. Ensine à criança, previamente, como lidar com o stress, o</p><p>medo e a ansiedade.</p><p>10. Cuide do seu próprio stress, pois pais estressados, em</p><p>geral, criam filhos estressados.</p><p>Além do mencionado anteriormente, é importante que os pais</p><p>entendam a necessidade que as crianças experimentam de se envolver</p><p>em brincadeiras. Brincar é uma das coisas mais importantes na vida da</p><p>criança, especialmente na primeira infância. É tão vital que, das</p><p>brincadeiras e dos jogos, da forma como são conduzidos, depende</p><p>grande parte da coordenação motora, do espírito de equipe e da</p><p>cooperação do indivíduo adulto. É respeitando as regras do jogo que a</p><p>criança aprende as primeiras noções sobre os direitos alheios e a</p><p>sociabilidade. Em suma, uma criança que brinca à vontade, que tem</p><p>essa necessidade normalmente satisfeita, costuma ser mais resistente ao</p><p>stress excessivo.</p><p>Os pais devem perceber que cada criança tem um ritmo próprio</p><p>para comer, dormir, caminhar ou brincar. Apressar esse ritmo é violar</p><p>sua individualidade, o que pode ocasionar problemas emocionais sérios.</p><p>Existem crianças que, aos seis anos, já têm maturidade para ingressar no</p><p>ensino fundamental e outras, sem ser menos inteligentes, poderão nessa</p><p>idade experimentar ainda intensa necessidade de brincar, não</p><p>conseguindo aceitar normas escolares. Por isso, é importante os pais</p><p>identificarem a necessidade emocional de seus filhos. É preferível que</p><p>continuem brincando mais seis meses ou um ano, pois temos</p><p>comprovado que, depois, em pouco tempo, superam os companheiros e</p><p>aprendem rapidamente o que teriam levado um ano para aprender, se</p><p>forçadas. O jogo, enfim, é como um treino para a vida e tem suas fases,</p><p>que acompanham as próprias fases do desenvolvimento infantil. Não</p><p>adianta forçar uma criança a andar de bicicleta sem que ela tenha</p><p>condições para isso. Com impaciência, os pais somente conseguirão</p><p>estressar a criança, que levará muito mais tempo para aprender.</p><p>Outra regra geral a ser observada no jogo das crianças é que elas se</p><p>satisfazem muito mais com brinquedos simples, relacionados à</p><p>natureza. Os complicados brinquedos modernos são mais fascinantes</p><p>para os pais, raramente para os filhos. A terra, a água, as pedras, os paus</p><p>continuam a ser os aspectos mais atraentes na vida lúdica da criança. A</p><p>manipulação desses elementos faz com que ela se suje toda, mãos,</p><p>roupas, pés etc., o que não deve ser contestado, uma vez que a criança</p><p>sente prazer nisso.</p><p>Enfim, um modo adicional pelo qual os pais podem prevenir o</p><p>stress excessivo em seus filhos é permitindo-lhes que brinquem. Para a</p><p>saúde física e mental da criança, o jogo é útil, seja ele considerado uma</p><p>descarga de energia ou, pelo contrário, um descanso da fadiga imposta</p><p>pela rigidez dos estudos e pelas exigências familiares</p><p>e sociais.</p><p>Na escola – Muitas são as situações que desencadeiam o stress na</p><p>escola, já mencionadas em capítulos anteriores. Porém, podemos</p><p>destacar vários recursos que, se utilizados pelos professores, poderão</p><p>controlar o stress dos estudantes. Os pesquisadores indicam algumas</p><p>maneiras de garantir o sucesso, prevenindo o stress escolar:</p><p>1. Estabeleça um hábito de sucesso com os alunos</p><p>considerados mais “fracos”, dando-lhes questões mais</p><p>fáceis que, com certeza, serão respondidas.</p><p>2. Comemore o sucesso de cada criança, para que ela sinta</p><p>satisfação e possa ser bem-vista pelos colegas.</p><p>3. Encoraje cada criança a melhorar sua aparência pessoal e</p><p>manter sua carteira em ordem.</p><p>4. É importante que a sala seja atrativa, pois isso desencadeia</p><p>um efeito positivo na atitude mental dos alunos.</p><p>5. Seja firme, porém, simpático.</p><p>6. Encoraje cada criança para que tente superar seus próprios</p><p>obstáculos.</p><p>7. Associe o trabalho da aula com alguma coisa que as</p><p>crianças gostem de fazer.</p><p>8. Não sobrecarregue as crianças com atividades, fazendo</p><p>com que estas se tornem aversivas.</p><p>9. Elogie sempre a criança por seu esforço, ainda que o</p><p>sucesso não tenha sido totalmente alcançado.</p><p>10. Permita que a criança sinta que você confia nas</p><p>habilidades dela.</p><p>11. Demonstre sua sinceridade e dê à criança posições de</p><p>responsabilidade, como líder de grupo, monitora na</p><p>direção de outros, organizadora de atividades etc.;</p><p>12. Se possível, não permita atitudes que visem à</p><p>acomodação. Procure sempre um meio que possibilite à</p><p>criança experimentar algum sucesso.</p><p>13. Selecione as crianças, para que façam pequenas coisas na</p><p>sala de aula.</p><p>14. Comece as lições sempre com uma atitude ativa e não</p><p>passiva.</p><p>15. Indague à criança como você pode ajudá-la.</p><p>Essas são algumas recomendações que poderão ajudar o professor</p><p>na sala de aula, beneficiando as crianças e também o desenvolvimento</p><p>das atividades propostas. É importante que o professor possa levar tudo</p><p>isso em conta, pois o otimismo e a sinceridade são meios apropriados e</p><p>indispensáveis para o bom andamento de uma classe, favorecendo,</p><p>assim, um desempenho social sadio e prevenindo o stress oriundo das</p><p>atividades escolares.</p><p>O que fazer com a criança</p><p>estressada?</p><p>Em primeiro lugar, seria melhor que medidas preventivas fossem</p><p>implementadas, para que a criança não chegasse a sofrer de stress</p><p>excessivo. No entanto, nem sempre isso é possível. Assim, se notar que</p><p>está lidando com uma criança estressada, não desanime. Há inúmeras</p><p>medidas que podem ser tomadas para ajudá-la. Recomendações gerais:</p><p>1. Em primeiro lugar, muna-se de grande dose de paciência,</p><p>para poder lidar com a hipersensibilidade emotiva, a</p><p>impaciência, os medos e as malcriações da criança. Isso</p><p>não quer dizer que você deva aceitar tudo, porém é</p><p>necessário ter tolerância acima do normal, pois as</p><p>punições, nessa fase, podem agravar o stress. Haverá</p><p>tempo para discipliná-la mais tarde, se for necessário. Em</p><p>geral, passado o stress, a criança volta ao normal; às vezes,</p><p>porém, é preciso cuidado especial após a crise de stress,</p><p>para que a criança possa voltar à rotina de antes.</p><p>2. Tente diminuir ou eliminar a causa do stress infantil.</p><p>3. Facilite a comunicação da criança com alguém, de</p><p>preferência um adulto paciente e equilibrado, mas um</p><p>colega também pode ser útil. Isso, em geral, leva-a a</p><p>sentir-se menos tensa e amedrontada pelo que enfrenta.</p><p>Quando essa criança conversar com você (pais ou</p><p>professores) sobre seus problemas, não aproveite a</p><p>oportunidade para ensinar algo, doutriná-la ou repreendê-</p><p>la. É hora de somente ouvir e mostrar apoio. Se ela ainda</p><p>não souber falar sobre seus problemas, incentive-a a</p><p>desenhar o que sente.</p><p>4. Se a criança tem demonstrado agressividade em demasia,</p><p>tente deixá-la descarregar em alguma atividade física,</p><p>como ginástica, natação, bicicleta, caminhada ou futebol, e</p><p>a ensine a fazer respiração profunda e relaxamento.</p><p>5. Tente envolver a criança em atividades ligeiramente abaixo</p><p>de sua idade. O estressado não consegue se concentrar</p><p>bem, portanto, deve ler livros de nível de dificuldade</p><p>inferior ao que leria normalmente.</p><p>6. Jogue com ela baralho, banco imobiliário, jogo eletrônico</p><p>ou outro jogo da sua escolha.</p><p>7. Incentive-a a sair com colegas ou convidar amigos para</p><p>irem à sua casa, porém as visitas não devem ser</p><p>prolongadas.</p><p>8. Não discuta acontecimentos trágicos ou tristes com ela. É</p><p>o momento de poupá-la.</p><p>9. Não crie mais stress para ela, mencionando</p><p>constantemente o problema que a aflige. Deixe que ela</p><p>fale dele. Assegure-a sempre de que ela vai ficar boa.</p><p>10. Quando se está estressado, até as tarefas fáceis parecem</p><p>difíceis. Não faça cobranças em demasia. Deixe que a</p><p>criança faça uma coisa de cada vez. Não a apresse nem a</p><p>critique demais.</p><p>11. A criança deverá se envolver todo dia em alguma</p><p>atividade física (andar, praticar esporte etc.) com, pelo</p><p>menos, 20 minutos de duração e deverá ter alguma</p><p>recreação (TV, leitura, cinema, jogo etc.), também</p><p>diariamente.</p><p>12. É aconselhável que pais e professores ofereçam</p><p>oportunidades para que as crianças possam relaxar tanto</p><p>em casa quanto na sala de aula, em benefício de todos.</p><p>Na sociedade moderna, em que a pressa é a característica principal,</p><p>em que os valores são mutáveis como objetos descartáveis, é importante</p><p>que a família reflita sobre para onde deseja se conduzir e atente-se para</p><p>a construção de rotas práticas e emocionais que a levem a essa meta.</p><p>Família sem metas, sem destinos planejados, pode ficar à deriva e levar</p><p>os filhos a portos não desejáveis. É fundamental que os pais tenham</p><p>valores preestabelecidos para gerenciamento da família, ainda que com</p><p>flexibilidade de ajustá-los quando necessário. Não se propõe rigidez de</p><p>princípios, mas sim a elaboração de um código de ética, de valores e de</p><p>conduta que reflitam o que exatamente aquela família deseja nutrir para,</p><p>em conjunto, enfrentar os estressores da vida moderna e florescer com</p><p>os avanços extraordinários que o mundo inteiro está presenciando.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>ANTHONY, E.J. (1987). “Risk, vulnerability, and resilience”. In: ANTHONY, E.J. e COHLER,</p><p>B.J. (orgs.). The invulnerable child. Nova York: Guilford, pp. 3-69.</p><p>BANDURA, A. (1977). “Auto-eficácia: Objetivando uma teoria de mudança comportamental</p><p>unificada”. Psychological Review, 84(2), pp. 191-215.</p><p>BAUMAN, Z. (2003). Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar.</p><p>LIPP, M.E.N. (2000). Crianças estressadas: Causas, sintomas e soluções. Campinas: Papirus.</p><p>________ (2007). “Fácil para os outros, difícil para mim: Por quê?”. In: LIPP, M.E.N. (org.). O</p><p>stress está dentro de você. 2ª ed. São Paulo: Contexto, pp. 183-196.</p><p>________ (2010). “Educação afetiva: Orientação para pais”. In: LIPP, M.E.N. (org.). O</p><p>adolescente e seus dilemas. Campinas: Papirus, pp. 11-26.</p><p>LIPP, M.E.N. et al. (2009). “Depressão: Vulnerabilidade e resiliência”. In: LACERDA, A.L.T.</p><p>de et al. (orgs.). Depressão: Do neurônio ao funcionamento social. Porto Alegre: Artmed.</p><p>MELO, F. de (2013). Quem me roubou de mim?. Rio de Janeiro: Planeta Brasil.</p><p>YUNES, M.A.M. (2003). “Psicologia positiva e resiliência: O foco no indivíduo e na família”.</p><p>Psicologia em Estudo, 8, pp. 75-84.</p><p>YUNES, M.A.M. e SZYMANSKI, H. (2001). “Resiliência: Noção, conceitos afins e</p><p>considerações críticas”. In: TAVARES, J. (org.). Resiliência e educação. São Paulo:</p><p>Cortez, pp. 13-42.</p><p>4</p><p>Estilos parentais e stress dos</p><p>filhos: Quando a combinação</p><p>desses fatores pode levar ao</p><p>desenvolvimento de transtornos</p><p>psicológicos</p><p>Paulo Eduardo Benzoni</p><p>Falar sobre o stress em crianças e adolescentes da perspectiva dos</p><p>estilos e das práticas parentais é uma tarefa que nos remete à</p><p>experiência clínica, quando recebemos adolescentes psicologicamente</p><p>adoecidos, com nível de stress elevado e comprometimento nas áreas</p><p>afetiva, social, educacional e, por vezes, cognitiva.</p><p>Vários casos de final de adolescência e adultos jovens que chegam</p><p>ao meu consultório de psicoterapia levam-me a atentar para a</p><p>importância da atuação educativa dos pais no estabelecimento e no</p><p>desenvolvimento</p><p>e suas chances de ficar doente.</p><p>Para utilizar essa escala, que aparece no Quadro 1, basta somar o</p><p>total dos pontos de todos os acontecimentos da vida da criança nos</p><p>últimos 12 meses.</p><p>Uma soma de até 150 significa que a carga de stress atingiu nível</p><p>médio. Se a soma de pontos ficar entre 150 e 300, significa que a</p><p>criança tem uma probabilidade acima da média de mostrar alguns</p><p>sintomas de mal-estar. Mas, se a soma passar de 300 pontos, há uma</p><p>forte probabilidade de que a criança venha a sofrer uma séria mudança</p><p>de saúde e/ou comportamento, em virtude do stress excessivo a que está</p><p>sujeita no momento.</p><p>Quadro 1. Um teste de stress para crianças baseado em fontes</p><p>externas</p><p>ESCALA DE REAJUSTAMENTO SOCIAL</p><p>Morte de um dos pais 100</p><p>Divórcio dos pais 73</p><p>A criança é separada dos pais 65</p><p>Um dos pais viaja por razões de trabalho 63</p><p>Morte de parente próximo 63</p><p>Doença ou ferimento pessoal 53</p><p>Um dos pais volta a se casar 50</p><p>Um dos pais é dispensado do emprego 47</p><p>Os pais se reconciliam 45</p><p>A mãe vai trabalhar fora 45</p><p>Doença de um membro da família 44</p><p>A mãe fica grávida 40</p><p>Dificuldades na escola 39</p><p>Nascimento de um irmão 39</p><p>Reajustamento escolar (novo mestre ou classe) 39</p><p>Mudança nas condições financeiras da família 38</p><p>Ferimento ou doença de um amigo íntimo 37</p><p>Começa (ou muda) uma nova atividade extracurricular (lições de música, escotismo</p><p>etc 35</p><p>ESCALA DE REAJUSTAMENTO SOCIAL</p><p>Alternância de brigas com os irmãos 33</p><p>Ameaça de violência na escola 31</p><p>Furto de coisas pessoais 30</p><p>Mudança de responsabilidade em casa 29</p><p>Irmão ou irmã mais velhos deixam o lar 29</p><p>Aborrecimento com os avós 29</p><p>Realização pessoal extraordinária 28</p><p>Mudança para outra cidade 26</p><p>Ganha ou perde um bichinho doméstico 25</p><p>Mudança nos hábitos pessoais 24</p><p>Mudança no horário da babá ou creche 20</p><p>Mudança para uma nova casa 20</p><p>Mudança nos hábitos de brincar 19</p><p>Férias com a família 19</p><p>Mudança de amigos 18</p><p>Frequenta colônia de férias 17</p><p>Mudança nos hábitos de dormir 16</p><p>Mudança no número de reuniões em família 15</p><p>ESCALA DE REAJUSTAMENTO SOCIAL</p><p>Mudança nos hábitos de comer 15</p><p>Mudança no tempo de assistir TV 13</p><p>Festa de aniversário 12</p><p>Punição por não “dizer a verdade” 11</p><p>Nota obtida e probabilidade de problemas de saúde ocorrerem</p><p>Média (150-199 pontos) 37%</p><p>Moderada (200-300 pontos) 51%</p><p>Severa (acima de 300 pontos) 79%</p><p>Fonte: Elkind (1981).</p><p>Além dos itens da escala, há um número grande de acontecimentos</p><p>que podem levar uma criança a ficar estressada. Alguns exemplos se</p><p>seguem.</p><p>Atividades em excesso</p><p>A criança forçada a estudar e praticar várias atividades</p><p>extracurriculares pelas quais, muitas vezes, não tem interesse e que</p><p>satisfazem somente aos desejos dos pais pode se sentir bastante</p><p>estressada.</p><p>Além disso, alguns pais exigem desempenho perfeito em tudo o que</p><p>seus filhos fazem, como para compensar possíveis frustrações em certas</p><p>áreas sociais ou profissionais. Eles se orgulham do sucesso do filho nos</p><p>esportes, por exemplo, mas desconsideram que essa exigência excessiva</p><p>tira o brilho das atividades, que ficam destituídas de prazer e</p><p>espontaneidade.</p><p>A criança ocupada com obrigações desse tipo não tem tempo para</p><p>viver a infância, para as brincadeiras que lhe são próprias. Torna-se,</p><p>então, estressada, cansada e desmotivada com relação à escola, às</p><p>tarefas acadêmicas e às práticas esportivas, e é dominada pelo medo de</p><p>fracassar e decepcionar quem espera muito dela.</p><p>As atividades complementares são importantes e auxiliam no</p><p>desenvolvimento infantil, porém a sobrecarga pode desencadear um</p><p>stress excessivo que, na maioria das vezes, provocará na criança</p><p>comportamento de rebeldia, hostilidade e agressividade, incluindo</p><p>desrespeito à autoridade dos pais e professores. Muitas vezes, a criança</p><p>tem dificuldade para dormir, fica angustiada e entra em depressão.</p><p>Responsabilidade em excesso</p><p>A sociedade atual tem impulsionado a criança a assumir atitudes e</p><p>responsabilidades para as quais não está preparada. Em lares onde os</p><p>pais trabalham ou lares de um só progenitor, por vezes, a criança precisa</p><p>aprender a ser independente muito precocemente (Lipp 2011).</p><p>Brigas e/ou separação dos pais</p><p>Quando os pais brigam constantemente, as crianças ficam ansiosas,</p><p>porque pressentem o lar ameaçado e se sentem culpadas, colocando-se</p><p>no centro imaginário da discórdia familiar. Justificadamente ou não,</p><p>supõem que são a causa dos conflitos domésticos, especialmente</p><p>quando estes são muito frequentes.</p><p>Quando os pais se separam, situação bastante aceita atualmente</p><p>como solução para os conflitos matrimoniais, a criança pode ficar</p><p>estressada, não só pela separação em si, mas porque normalmente é</p><p>preciso que escolha entre um e outro progenitor. Isso acarreta sérias</p><p>consequências para o desenvolvimento de sua personalidade. Quando</p><p>rejeita o do mesmo sexo, fica sem um modelo de identificação; quando</p><p>rejeita o do outro sexo, pode crescer desconfiada e hostil em relação às</p><p>pessoas do sexo oposto.</p><p>Também acontece de a criança (isto lhe é especialmente doloroso)</p><p>desfazer e refazer laços com os pais repetidamente, porque estes, a fim</p><p>de ganhar a afeição da criança, frequentemente utilizam métodos</p><p>inadequados como subornos, adulações e mentiras. A criança que tenta</p><p>reconstruir seu mundo com cada um deles cresce com lealdades</p><p>divididas e conflitos permanentes (Vuelta 2014).</p><p>A escola</p><p>Outra fonte de stress aparece quando a criança vai à escola pela</p><p>primeira vez. É a primeira separação contínua dos seus pais.</p><p>Às vezes, para algumas crianças, a escola é o primeiro agente</p><p>socializante fora da família, pois têm de aprender a se adaptar e seguir</p><p>as regras e os limites impostos por outras pessoas que não os pais.</p><p>Em muitas situações, o próprio ambiente físico da escola é</p><p>estressante e causador de dificuldades para a criança. Isso se pode notar</p><p>de diferentes maneiras:</p><p>• sala de aula pequena e inadequada às atividades</p><p>pedagógicas a serem desenvolvidas;</p><p>• pouca iluminação;</p><p>• material pedagógico inapropriado;</p><p>• bancos ou carteiras desconfortáveis;</p><p>• excesso de ruídos.</p><p>Além disso, alguns jardins da infância, influenciados por novas</p><p>teorias motivacionais, pressionam prematuramente a criança, ao</p><p>introduzir a instrução formal em leitura e matemática em seus</p><p>currículos, sem verificar a maturidade do aluno para isso. Buscando</p><p>uma vantagem inicial, essas escolas satisfazem certos pais, que se</p><p>sentem envaidecidos por terem um filho precoce.</p><p>Criança imatura e/ou com distúrbios de aprendizagem, que sofre</p><p>lacunas de estimulação e encorajamento em casa, com professores</p><p>incompetentes e cobrança excessiva, acaba desenvolvendo alto nível de</p><p>ansiedade que, como um círculo vicioso, a distancia cada vez mais do</p><p>ritmo normal da classe. A criança se sente incapaz, fica desmotivada e</p><p>lenta. Mudança de professores ou professores instáveis também geram</p><p>stress.</p><p>A escola que não respeita os estágios de desenvolvimento ou é</p><p>insensível às diferentes expectativas, aos medos e anseios de seus</p><p>alunos, será fonte de stress para essas crianças.</p><p>Morte na família</p><p>A tragédia da morte repousa na sua irreversibilidade e, se é</p><p>inconcebível ao adulto, é um enigma para a criança, que reage à morte</p><p>de acordo com seu desenvolvimento emocional e intelectual. Somente</p><p>aos nove anos de idade, ela começa a entender a morte realisticamente,</p><p>como um fator biológico.</p><p>Crianças de seis meses até três anos reagem à perda como se fosse</p><p>uma separação temporária. Nessa faixa etária, elas não podem</p><p>compreender que a morte seja permanente.</p><p>Entre três e cinco anos, surpreendem por não reagir com dor e não</p><p>alterar sua atitude. Demonstram somente o medo de serem</p><p>abandonadas, mais do que tristeza por uma separação.</p><p>Entre cinco e oito anos, começam a questionar sobre a morte, mas</p><p>acabam dando explicações mágicas para o evento. Se a mãe ou um</p><p>membro da família morre, aparecem alguns distúrbios de</p><p>comportamento.</p><p>Depois dos nove anos, reações semelhantes às do adulto começam a</p><p>aparecer. Choro, dor, apatia, às vezes hostilidade contra determinadas</p><p>pessoas, por não ajudarem, são manifestações</p><p>de transtornos como o transtorno de ansiedade</p><p>generalizada (TAG), o transtorno de pânico (TP), o transtorno</p><p>obsessivo-compulsivo (TOC) e a depressão, entre outros. Meu objetivo</p><p>aqui não é discutir a etiologia, a origem de tais transtornos, mas sim,</p><p>baseado em evidências clínicas, científicas e no histórico clínico dos</p><p>adultos jovens que atendi com tais quadros, discorrer sobre a relação</p><p>das práticas parentais e da memória afetiva na modelagem do stress</p><p>recorrente.</p><p>A fim de organizar o caminho dessa discussão, vou conceituar o</p><p>stress, a neurobiologia da vulnerabilidade ao stress e, posteriormente, a</p><p>relação destes com as práticas e os estilos parentais. Finalmente,</p><p>apresentarei a relação e a influência desses fatores no surgimento, na</p><p>instalação e na manutenção dos transtornos apresentados.</p><p>O stress</p><p>O stress pode ser caracterizado e definido como uma reação do</p><p>organismo a eventos externos e internos tidos como ameaçadores, ou</p><p>seja, uma reação neuropsicofisiológica do organismo que o prepara, por</p><p>meio de alterações orgânicas e psicológicas, para reagir adequadamente</p><p>a esses eventos ameaçadores (Lipp 2002; Lipp 2003a e 2003b; Giles e</p><p>Richards 2001; García 1998; Fontana 1994 e Janisse 1988). Uma</p><p>quantidade adequada de stress é considerada necessária, e mesmo</p><p>fundamental, para a sobrevivência humana, pois prepara o organismo</p><p>para se proteger de ameaças externas, garantindo a integridade do</p><p>indivíduo. O stress foi fundamental para que a espécie humana</p><p>sobrevivesse ao longo dos tempos (Lipp 2003b). Há que se considerar,</p><p>então, até que ponto ele é benéfico ou prejudicial, pois uma carga</p><p>estressora prolongada, uma exposição constante do organismo a</p><p>situações estressantes, pode gerar um desgaste prejudicial ao indivíduo.</p><p>O que vai definir o grau do desgaste e a geração ou não de sequelas</p><p>do stress vivenciado é a capacidade de enfrentamento que tem o</p><p>indivíduo exposto às condições estressoras. Essa capacidade de</p><p>enfrentamento, também conhecida na literatura científica pelo termo</p><p>coping, corresponde a um repertório de comportamentos que possibilita</p><p>ao indivíduo enfrentar a situação estressora de forma eficaz, saindo dela</p><p>sem maiores desgastes físicos e emocionais ou sequelas. Para Lazarus e</p><p>Folkman (1984), todo empenho para lidar com o estressor seria uma</p><p>resposta de coping, independentemente do sucesso ou fracasso que se</p><p>obtenha. Ainda segundo esses autores, existem dois tipos principais de</p><p>coping: centrado no problema, que leva o indivíduo a resolver a</p><p>situação estressora, e centrado na emoção, que leva o indivíduo a se</p><p>entregar à situação emocional.</p><p>O coping eficaz recebe influência de características de</p><p>personalidade, Dunkley (2003) identificou que pessoas perfeccionistas</p><p>reagem de forma mais emocional a eventos estressores. O coping</p><p>também é influenciado por fatores culturais, como identificaram</p><p>O’Connor e Shimizu (2002), estudando japoneses e britânicos. Segundo</p><p>os autores, os japoneses apresentam um coping mais centrado na</p><p>emoção e os britânicos, mais centrado no problema. De qualquer forma,</p><p>o coping é considerado o principal fator para gerenciamento do stress</p><p>emocional e dos problemas afetivos (Somerfield e McCrae 2000). É</p><p>justamente no aprendizado de comportamentos de coping que ocorre a</p><p>maior influência das práticas parentais.</p><p>A neurobiologia da</p><p>vulnerabilidade ao stress</p><p>É no sistema límbico, uma região do cérebro, que se encontra a</p><p>base biológica da vulnerabilidade ao stress. O sistema límbico foi</p><p>inicialmente identificado como responsável pela regulação das emoções</p><p>em 1937, quando o neuroanatomista James Papez publicou um trabalho</p><p>ainda de cunho especulativo. Hoje, há consenso entre os pesquisadores</p><p>da área de que o sistema límbico é o responsável pela regulação</p><p>emocional no ser humano (Machado 2002).</p><p>Em seus trabalhos sobre transtorno de estresse pós-traumático</p><p>(TSPT), Everly (Everly e Lating 2004) identificou que a ocorrência</p><p>desse transtorno em uma pessoa e não em outra, quando ambas</p><p>passaram por eventos traumáticos, deve-se a uma hipersensibilidade do</p><p>sistema límbico nas pessoas que o desenvolvem, relacionada com um</p><p>elevado estado de estimulação desse sistema. Essa estimulação ocorre</p><p>no momento do evento traumático. Cabe aqui ressaltar que o trauma</p><p>propriamente dito, em meu entendimento, não precisa ser</p><p>necessariamente um evento agudo, mas sim uma sequência de eventos</p><p>negativos, constantes, que pode se tornar o que chamo de “situação</p><p>traumática crônica”.</p><p>Uma das características do TSPT é a lembrança constante do</p><p>episódio, o que faz sentido, uma vez que o hipocampo, estrutura que</p><p>compõe o sistema límbico, é comprovadamente responsável pela</p><p>memória. Graeff (2003, p. 4), em uma revisão de literatura sobre as</p><p>bases biológicas do stress pós-traumático, indica que as memórias</p><p>dotadas de conteúdo emocional são mais facilmente lembradas que as</p><p>neutras, “devido à liberação de hormônios e neurotransmissores,</p><p>liberados por ocasião das emoções e que promovem a consolidação dos</p><p>traços de memória”. Com base nisso, pode-se levantar a hipótese de que</p><p>situações, mesmo não traumáticas, da vida do indivíduo carregadas de</p><p>conteúdo emocional podem se fazer lembrar por toda a vida. Tal</p><p>lembrança não necessariamente seria clara, declarativa; com o passar do</p><p>tempo, poderia se modificar, carregando novas simbolizações e</p><p>significados cognitivos. Aqui se encaixa a ideia de “situação traumática</p><p>crônica” a que me referi, ou seja, uma sequência de eventos negativos</p><p>que ativam constantemente o sistema límbico e vão se marcando na</p><p>memória, sem uma relação clara da emoção com o evento, sem gerar</p><p>uma significação adequada e funcional.</p><p>Segundo Peres e Nasello (2005, p. 7), as memórias de experiências</p><p>traumáticas “são fenômenos heterogêneos, complexos e alteram-se com</p><p>o tempo de maneiras distintas”. Valendo-se, também, de uma revisão</p><p>sobre os achados de neuroimagem em TSPT, tais autores pontuam que</p><p>podem existir dois tipos de memória: as hipocampo-dependentes, que</p><p>seriam memórias declarativas, com estrutura narrativa, que “podem ser</p><p>editadas e miscigenadas mais facilmente com memórias</p><p>autobiográficas” (ibid.), de expressão emocional menos intensa; e as</p><p>não hipocampo-dependentes, “que se mostram fragmentadas</p><p>sensorialmente, sem estrutura narrativa desenvolvida” (ibid.) e,</p><p>portanto, mais difíceis de serem acessadas voluntariamente. Assim, uma</p><p>memória não hipocampo-dependente pode se formar por ocasião de</p><p>uma situação traumática crônica, tornando-se sensorialmente</p><p>fragmentada, não narrativa e de significação emocional disfuncional.</p><p>Falando sobre a neurobiologia da regulação do humor, Kapczinski,</p><p>Frey e Zannatto (2004) pontuam que o processo de geração de estados</p><p>afetivos complexos se desenvolve em três etapas: identificação do</p><p>significado emocional do estímulo; produção de um estado afetivo</p><p>específico como resposta ao estímulo; regulação de uma resposta</p><p>afetiva e comportamental que envolveria a modulação dos dois estágios</p><p>anteriores.</p><p>Esse processo, se relacionado ao aprendizado de um repertório</p><p>comportamental adequado para lidar com situações estressantes,</p><p>permite pensar que as práticas parentais adequadas ajudariam</p><p>sobremaneira os filhos a modular de forma saudável suas emoções e</p><p>enfrentar adequadamente as situações estressoras que podem vir a se</p><p>apresentar em situações traumáticas crônicas. Nesse sentido, Norman e</p><p>Shalice (1986 apud Butman e Allegri 2001, p. 3) propõem um modelo</p><p>atencional focado no córtex pré-frontal, composto por um “sistema</p><p>supervisor atencional, consciente e explícito, encarregado das condutas</p><p>não rotineiras e um programa de contenção, automático e implícito, que</p><p>intervém na manutenção das condutas sociais e emocionais apropriadas</p><p>ao meio”. Segundo Butman e Allegri (2001), conforme a criança vai</p><p>crescendo e passando pelos processos de socialização normal, vai</p><p>aprendendo como lidar com as emoções, regulando seus sistemas</p><p>atencional e de contenção. O desenvolvimento de uma correta cognição</p><p>social, portanto, passaria por estruturas do sistema límbico. Com base</p><p>nessa pressuposição, cabe</p><p>aqui comentar o papel das práticas de</p><p>educação, também chamadas de práticas parentais.</p><p>As práticas parentais em</p><p>combinação</p><p>com a vulnerabilidade</p><p>neurobiológica ao stress</p><p>As práticas parentais, ou a forma como os indivíduos são educados</p><p>para a vida, também denominadas de processo de socialização (Berger e</p><p>Luckmann 1985), ocorrem inicialmente no âmbito da família de origem.</p><p>A família é quem determina como vão se desenrolar as práticas de</p><p>cuidado e educação das crianças, compondo o ambiente em que esta vai</p><p>viver, desenvolver-se e, baseada em trocas afetivas intensas, formar-se</p><p>como ser humano (Biasoli-Alves 1999). Assim, as práticas educativas,</p><p>em combinação com a sensibilidade límbica, podem caracterizar maior</p><p>ou menor vulnerabilidade ao stress.</p><p>Os estilos parentais podem ser definidos como o conjunto de</p><p>estratégias e técnicas utilizadas pelos pais para orientar o</p><p>comportamento dos filhos (Gomide 2003). As práticas parentais podem</p><p>ser classificadas em grupos, segundo Gomide (2006). No Quadro 1,</p><p>procurei organizar de forma didática e esquemática as práticas parentais</p><p>e suas definições.</p><p>Quadro 1. Práticas parentais positivas e negativas, segundo</p><p>Gomide (2006)</p><p>Práticas parentais</p><p>POSITIVAS NEGATIVAS</p><p>Monitoria</p><p>positiva</p><p>Quando os pais apresentam</p><p>um comportamento atento às</p><p>necessidades sociais,</p><p>afetivas e acadêmicas dos</p><p>filhos.</p><p>Abuso físico e</p><p>psicológico</p><p>Quando se impõe disciplina</p><p>com práticas corporais</p><p>negativas ou chantagens</p><p>emocionais.</p><p>Relaxamento</p><p>da disciplina</p><p>Quando se leva a educação</p><p>dos filhos com disciplinas e</p><p>regras relaxadas.</p><p>Monitoria</p><p>negativa</p><p>Quando se caracteriza pelo</p><p>excesso de regras e</p><p>disciplina, o que torna o</p><p>ambiente estressante.</p><p>Comportamento</p><p>moral</p><p>Quando os pais fornecem o</p><p>modelo de comportamento</p><p>quanto ao desenvolvimento</p><p>do senso de justiça, do certo</p><p>e do errado.</p><p>Negligência</p><p>Quando se caracteriza pela</p><p>falta de atenção e afeto</p><p>com os filhos.</p><p>Punição</p><p>inconsistente</p><p>Quando os pais se</p><p>direcionam pelo próprio</p><p>humor para punir a criança,</p><p>dificultando a percepção,</p><p>por parte dela, de quando</p><p>deve ou não ser punida.</p><p>Quando uma criança com sensibilidade límbica acentuada é</p><p>educada por um conjunto de práticas parentais negativas, ela fica</p><p>exposta às inúmeras condições ambientais estressantes da vida e</p><p>dificilmente conseguirá desenvolver estratégias de coping eficazes.</p><p>Assim, vivenciará inúmeras situações de stress em seu desenvolvimento</p><p>social, que poderão se caracterizar como situações traumáticas crônicas</p><p>e evoluir para toda sorte de transtornos de humor ou ansiedade. O</p><p>processo seguiria o caminho apresentado no diagrama:</p><p>O caso mais característico que tenho presenciado na prática clínica</p><p>diz respeito ao bullying. A sociedade contemporânea cobra de forma</p><p>mordaz um conjunto de comportamentos às meninas e aos meninos. As</p><p>crianças que não conseguem atender a essas demandas da sociedade</p><p>tendem a desenvolver um processo de sofrimento psicológico muito</p><p>grande e, se não encontrarem nos pais um suporte para saber como lidar</p><p>com essas exigências sociais, acabam por desenvolver uma dificuldade</p><p>crônica para lidar com elas. Por outro lado, a sociedade continua o</p><p>processo, muitas vezes perverso, de cobrança sobre o indivíduo, que,</p><p>quando adolescente e adulto jovem, sentirá falta de um repertório</p><p>comportamental adequado para lidar com essas cobranças, o que leva a</p><p>um profundo sofrimento psicológico, que pode evoluir para um</p><p>transtorno psíquico, desembocando nos consultórios de psicologia.</p><p>Cabe aqui um caso ilustrativo. Obviamente, por questões éticas,</p><p>alguns dados foram alterados para preservar a identidade do paciente.</p><p>Carlos, um jovem de 24 anos, chegou ao meu consultório com</p><p>queixa de TAG. No início da terapia, ele estava em tratamento</p><p>medicamentoso com ansiolíticos. Sua vida social era praticamente nula;</p><p>ele não saía de casa e não tinha amigos. Profissionalmente, não</p><p>conseguia se estabelecer, apesar de ter formação acadêmica sólida na</p><p>sua área, uma área profissional com muitas ofertas de emprego.</p><p>Analisando a situação do momento e a dinâmica de relacionamentos</p><p>interpessoais, observei que Carlos tinha uma autoestima extremamente</p><p>baixa, acreditava que todos a sua volta estavam olhando para seus</p><p>supostos “defeitos” físicos e seu jeito esquisito – defeitos e jeito que não</p><p>correspondiam à realidade, pois o paciente não os apresentava. Sempre</p><p>que era exposto a uma situação de relacionamento interpessoal, fosse</p><p>ela social ou profissional, era disparado um gatilho de ansiedade que o</p><p>levava a experimentar stress e ansiedade tão elevados que culminavam</p><p>em reações físicas de sudorese excessiva e taquicardia.</p><p>Carlos interpretava todos os sinais emitidos pelas pessoas a sua</p><p>volta como reprovadores, como resposta à avaliação negativa que,</p><p>supostamente, as pessoas estariam fazendo dele e, ao mesmo tempo que</p><p>acreditava que era mesmo “esquisito”, não queria acreditar, pois, com</p><p>muita ansiedade e sofrimento, dizia que tinha o direito de ser um jovem</p><p>como outro qualquer. Essa luta cognitiva o levava a um sofrimento</p><p>psicológico muito intenso e à experimentação de um stress crônico.</p><p>A anamnese de Carlos revelou que ele fora vítima de bullying</p><p>durante o final do ensino fundamental e o ensino médio. Aluno de</p><p>escola particular frequentada por crianças de classe social superior à</p><p>dele, era rechaçado por ser economicamente menos privilegiado. De</p><p>temperamento naturalmente tímido, não se colocava de forma assertiva</p><p>nas relações durante a adolescência e relatou inúmeras situações em</p><p>que, na chamada, durante as aulas, falava baixo e todos riam dele</p><p>quando o professor pedia para falar mais alto. Na infância, relatou que o</p><p>irmão mais velho procurava evitá-lo, afastá-lo das brincadeiras,</p><p>estimulando que os demais meninos da rua em que moravam o</p><p>isolassem, o que foi lenta, mas intensamente, criando a imagem de que</p><p>ele era o estranho da rua.</p><p>Carlos sempre foi muito estudioso, tirava boas notas,</p><p>diferentemente do irmão, que dava mais trabalho nos estudos e,</p><p>consequentemente, exigia mais atenção dos pais.</p><p>Analisando as práticas parentais, observei que os pais eram pessoas</p><p>bastante rígidas em seus princípios morais e religiosos. Voltados a</p><p>construir um patrimônio, mínimo que fosse, para dar educação e</p><p>conforto aos filhos, acabavam por se afastar deles, acreditando que,</p><p>estabelecendo regras rígidas e cobrando o cumprimento delas, estariam</p><p>exercendo adequadamente seu papel de pais. A forma como lidaram</p><p>com a educação dos filhos pôde ser caracterizada como monitoria</p><p>negativa mesclada com negligência. Os pais não monitoravam</p><p>adequadamente as situações que Carlos vivenciava, até porque ele não</p><p>relatava aos pais o que estava sentindo, pois acreditava que aos pais</p><p>devia respeito e disciplina. Em razão do foco na construção de um</p><p>patrimônio, muitas vezes os pais negligenciaram as alterações de humor</p><p>de Carlos.</p><p>Esquematicamente, o caso pode ser conceituado como se segue:</p><p>Hipersensibilidade</p><p>do sistema límbico</p><p>Temperamento</p><p>tímido;</p><p>vivências</p><p>experimentadas com</p><p>muita emoção</p><p>negativa.</p><p>Situação</p><p>traumática</p><p>crônica</p><p>Bullying</p><p>Vivência</p><p>constante de</p><p>situações de</p><p>rechaço social,</p><p>com críticas</p><p>severas e</p><p>humilhações.</p><p>Formação</p><p>inadequada</p><p>do repertório</p><p>de coping</p><p>Inabilidade</p><p>para lidar com</p><p>as situações</p><p>de stress.</p><p>Crenças</p><p>disfuncionais</p><p>Falta de</p><p>repertório de</p><p>coping</p><p>adequado</p><p>Dificuldade nas</p><p>relações</p><p>interpessoais</p><p>sociais e</p><p>profissionais;</p><p>isolamento.</p><p>Interpretação</p><p>dos eventos da</p><p>vida</p><p>Interpretação</p><p>negativa com</p><p>base nos</p><p>conteúdos de</p><p>memória afetiva.</p><p>Práticas parentais</p><p>negativas</p><p>Monitoria negativa e</p><p>negligência;</p><p>rigidez e falta de</p><p>suporte emocional.</p><p>TAG</p><p>Resultado do</p><p>conflito entre</p><p>querer e não</p><p>conseguir, por</p><p>não ser ou não se</p><p>achar capaz.</p><p>As lembranças que Carlos trazia dos momentos de humilhação e</p><p>rechaço pelos quais passou eram extremamente carregadas de emoção</p><p>negativa, emoção essa que ele, pelos valores herdados dos pais, não se</p><p>sentia digno de sentir. Algumas lembranças puderam ser relatadas em</p><p>uma narrativa coerente, outras, porém, também muito intensas</p><p>emocionalmente, não eram possíveis de ser</p><p>identificadas de forma</p><p>coerente e clara. Observava-se claramente que emoções como, por</p><p>exemplo, raiva e desejo de revidar agressivamente, que tinha vivido nas</p><p>situações de humilhação da infância, não podiam ser extravasadas,</p><p>porque os princípios morais dos pais não possibilitariam sua aceitação</p><p>como um “bom garoto”. Esse conjunto de fatores foi, então,</p><p>contribuindo para a dificuldade de enfrentar situações estressoras no</p><p>âmbito social, culminando na instalação de um TAG.</p><p>O trabalho psicoterapêutico com Carlos seguiu no sentido de ajudá-</p><p>lo a compreender e ressignificar as situações de vida pelas quais passou.</p><p>Baseados nas situações estressantes vivenciadas no seu dia a dia,</p><p>durante a terapia, discutíamos as contingências estabelecidas e as</p><p>crenças disfuncionais envolvidas na interpretação negativa das</p><p>situações. Isso possibilitava o reforçamento positivo de comportamentos</p><p>mais adaptativos. Ao mesmo tempo, fomos trabalhando com treino de</p><p>assertividade, encorajamento para enfrentar novas situações e</p><p>recolocação social em grupos com os quais teria mais condições de</p><p>identificação, sempre reforçando positivamente os comportamentos de</p><p>sucesso social. Algumas vezes, foi necessário utilizar punição, por meio</p><p>de reações negativas do terapeuta, expressas no tom de voz, para</p><p>comportamentos recorrentes de esquiva social.</p><p>No decorrer do trabalho terapêutico, que durou um ano, com uma</p><p>sessão semanal, Carlos começou a se integrar socialmente, a conhecer</p><p>um novo mundo, um mundo visto como mais alegre, leve, menos</p><p>estressante e ansiogênico, e desenvolveu um repertório adequado para</p><p>enfrentar as situações de stress de forma mais eficaz, vencendo o TAG e</p><p>vivendo sem medicação ansiolítica.</p><p>Conclusão</p><p>Se as memórias dotadas de forte conteúdo emocional são mais</p><p>intensas e se as memórias traumáticas são heterogêneas e miscigenadas,</p><p>ao se considerar um indivíduo com sensibilidade límbica acentuada, que</p><p>tenha recebido práticas parentais inadequadas e passado por situações</p><p>traumáticas crônicas, ao processarem os conteúdos introjetados pelo</p><p>processo de socialização, os indivíduos podem gerar simbolizações</p><p>fragmentadas e miscigenadas, estabelecendo conteúdos desadaptativos</p><p>em seus bancos de memória e baixo repertório comportamental para</p><p>enfrentamento do stress.</p><p>A análise atenta da combinação desses fatores possibilita ao</p><p>terapeuta desenvolver uma adequada análise funcional dos</p><p>comportamentos trazidos para o setting terapêutico, bem como</p><p>compreender a origem de cognições presentes no paciente que o levam,</p><p>muitas vezes, não só ao sofrimento psíquico como também às</p><p>armadilhas cognitivas de manutenção dos sintomas.</p><p>Uma vez compreendida a relação existente, é possível iniciar um</p><p>processo de reestruturação cognitiva adequada, bem como a modelagem</p><p>de comportamentos mais eficazes, aumentando o repertório</p><p>comportamental do paciente para lidar com as situações estressantes do</p><p>cotidiano.</p><p>Aos pais, cabe a importante atenção à forma como estão</p><p>conduzindo a educação de seus filhos, estando atentos às emoções,</p><p>situações e dificuldades que eles enfrentam em seu cotidiano para,</p><p>adequadamente, ajudá-los no desenvolvimento de comportamentos</p><p>eficazes de enfrentamento.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>BERGER, P. e LUCKMANN, T. 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A sua identidade está sendo construída em uma</p><p>cultura caracterizada pela existência de uma indústria da informação, de</p><p>bens culturais, de lazer e de consumo, em que a ênfase está no presente,</p><p>na velocidade, no cotidiano, no “aqui e agora” e na busca do prazer</p><p>imediato.</p><p>As tecnologias da comunicação possibilitam que as crianças tenham</p><p>acesso às informações sem o controle dos progenitores. Assim, entram</p><p>desde cedo em contato com a violência, a exploração de conflitos</p><p>íntimos, o sexo, sem ter estrutura emocional para administrar essas</p><p>situações. Assim, estudos com crianças devem enfocar as fontes de</p><p>stress com as quais essa população possa estar lidando e, ao mesmo</p><p>tempo, averiguar os quadros de stress em razão dessa demanda.</p><p>Durante o desenvolvimento infantil, que abrange o físico, o</p><p>cognitivo, o emocional, o afetivo e o social, a criança pode ser obrigada</p><p>a enfrentar momentos em que a tensão de sua vida atinja níveis muito</p><p>elevados, que podem ultrapassar sua capacidade de amadurecimento</p><p>para lidar com as situações conflitantes (Lipp 2000a). Como</p><p>consequência dessas situações associadas ao limitado</p><p>repertório de</p><p>enfrentamento da criança para esses momentos, pode ser desencadeado</p><p>um processo de stress nesse ser ainda em desenvolvimento.</p><p>Franca e Leal (2003) acreditam que as transformações ocorrem em</p><p>grande quantidade e numa velocidade bem maior na criança do que no</p><p>adulto, com períodos propícios ao surgimento de nível de stress</p><p>elevado. Townsend (2002) postula que o estilo de vida da criança na</p><p>sociedade contemporânea favorece o desencadeamento de um quadro de</p><p>stress.</p><p>Na criança, o stress é semelhante ao do adulto. Os sintomas podem</p><p>acontecer no campo psicológico, físico ou em ambos. Lipp e Romano</p><p>(1987) apresentam como sintomas psicológicos: ansiedade, terror</p><p>noturno, pesadelos, dificuldades interpessoais, introversão súbita,</p><p>desânimo, insegurança, agressividade, choro excessivo e depressão.</p><p>Como sintomas físicos, podem ser encontrados: dores de barriga,</p><p>diarreia, tiques nervosos, dores de cabeça, náusea, hiperatividade,</p><p>enurese noturna, gagueira, tensão muscular e ranger de dentes.</p><p>A vulnerabilidade ao stress é explicada por fatores endógenos e</p><p>ambientais. O que determina qual resposta uma pessoa vai ter ao stress</p><p>é a forma como ela percebe os estímulos, os estressores, isto é, suas</p><p>cognições. Cognições são o que a pessoa pensa, sente, seus valores,</p><p>suas crenças e atitudes, que influenciam sua resposta comportamental</p><p>ao estressor (Range 1995).</p><p>As abordagens cognitivas ao stress dão ênfase ao papel das</p><p>diferenças individuais na avaliação de situações e reações de</p><p>enfrentamento, na determinação das respostas comportamentais e</p><p>emocionais às situações causadoras de stress (Beck 1984). As</p><p>avaliações da importância de um acontecimento, a disponibilidade e</p><p>eficácia das reações de enfrentamento interagem na determinação da</p><p>natureza das reações ao stress.</p><p>Kobasa (1979) sugerem que existe um fator, que denominam de</p><p>resistência, para explicar por que algumas pessoas adoecem e outras não</p><p>em face do mesmo grau elevado de stress. Trata-se de um conjunto</p><p>específico de atitudes diante da vida, como abertura para mudanças,</p><p>sentimento de envolvimento com a família e quaisquer</p><p>empreendimentos que a pessoa realize, assim como uma sensação de</p><p>controle sobre os eventos.</p><p>A reação do indivíduo resistente ao stress parece ser diferente da</p><p>dos indivíduos sensíveis ao stress. Quando exposto à mesma ameaça</p><p>severa, o resistente responde ao desafio de maneira controlada, sem ser</p><p>vencido por ele (Lazarus 1991).</p><p>Os estímulos que eliciam a resposta de stress tanto podem ser</p><p>positivos quanto negativos e são denominados estressores. O estímulo</p><p>que desencadeia a reação de stress se torna um estressor em virtude da</p><p>interpretação cognitiva, ou significado, que a pessoa passe a dar a ele.</p><p>Everly (1989) relata que os estressores podem ser eventos bons ou</p><p>ruins, mas o organismo reage independentemente de sua qualidade.</p><p>Segundo o mesmo autor, o que interfere na magnitude da resposta do</p><p>stress é a interpretação dada ao estímulo pelo organismo. Em razão da</p><p>presença do estressor, da interpretação que o organismo dê a esse</p><p>estressor, pode ocorrer a estimulação de um órgão no organismo,</p><p>causando doenças relacionadas ao stress.</p><p>Muitas vezes, o evento em si não torna o indivíduo irritável ou</p><p>tenso. É seu pensamento sobre o acontecido que causa o problema, e os</p><p>indivíduos podem mudar a maneira de pensar e agir. Portanto, o nível de</p><p>stress experimentado pelo indivíduo depende, em grande parte, da</p><p>interpretação dada ao evento, isto é, das crenças que tem quanto àquela</p><p>situação (Lipp et al. 1990). A interpretação racional dos eventos</p><p>favorecerá resultados positivos.</p><p>Na criança, o stress pode ter fontes externas (Elkind 1981) ou</p><p>internas, assim como no adulto (Ellis 1973; Lazarus 1966). Lipp et al.</p><p>(1991) definiram como fonte externa qualquer evento do mundo externo</p><p>que exija uma nova adaptação por parte da criança, requerendo muita</p><p>energia.</p><p>O stress infantil se torna de extrema importância quando são</p><p>analisadas suas consequências para a criança. Lipp e Malagris (1995)</p><p>acreditam que o stress infantil possa estar associado à patogênese de</p><p>distúrbios físicos e psicológicos. Os distúrbios psicológicos são</p><p>depressão, enurese, dificuldades de relacionamento, comportamentos</p><p>agressivos, desobediência inusitada, ansiedade, choro excessivo,</p><p>gagueira, dificuldades escolares, pesadelos, birras e insônia. Os</p><p>distúrbios físicos relacionados ao stress são obesidade, doenças</p><p>dermatológicas, cáries, asma, entre outros.</p><p>Berenchtein (2004), em sua dissertação de mestrado, investigou a</p><p>influência do stress na expressão clínica da asma e sua associação com</p><p>as crises em crianças. Nesse estudo, a autora observou que as crianças</p><p>com asma estavam mais estressadas que as crianças do grupo de</p><p>controle (crianças não asmáticas), principalmente aquelas com maior</p><p>gravidade da doença. Os resultados indicaram que a presença de stress</p><p>pode intensificar a frequência dos sintomas da asma, a limitação à</p><p>atividade física, o absenteísmo escolar e as interrupções do sono.</p><p>Concluiu que o stress é um fator importante no desencadeamento e</p><p>agravamento das crises de asma nas crianças.</p><p>Lipp et al. (2002) realizaram um estudo que objetivou pesquisar a</p><p>prevalência do stress infantil no contexto escolar, averiguar a diferença</p><p>no número de crianças estressadas de três tipos de escolas e nas várias</p><p>séries do ensino fundamental e estudar a diferença entre os gêneros no</p><p>que se refere ao stress. A amostra total era de 255 escolares, com idades</p><p>variando de 7 a 14 anos, oriundos de três escolas. No total, foram</p><p>testados 113 meninos e 142 meninas. A prevalência de stress na amostra</p><p>total foi de 12,5%, com 32 crianças com sintomas de stress grave. A</p><p>primeira série foi identificada como a mais estressante. A prova do qui-</p><p>quadrado revelou uma associação entre série frequentada e ter ou não</p><p>stress com um qui-quadrado = 5,9121 e p = 0,01. No que se refere à</p><p>diferença entre os sexos, a análise estatística, por meio da prova do qui-</p><p>quadrado, revelou uma associação significativa entre gênero e</p><p>prevalência de stress (qui-quadrado = 3,88, p = 0,04). A porcentagem de</p><p>meninas com stress era 9,02% e a de meninos, 3,53%. Portanto, o stress</p><p>era duas vezes mais comum nas meninas do que nos meninos.</p><p>Lipp (2000b) também aponta a ocorrência de consequências</p><p>sociais, por acreditar que uma criança vulnerável ao stress, sofrendo</p><p>suas consequências, sem o tratamento adequado, certamente se tornará</p><p>um adulto frágil, sem resistência às dificuldades da vida.</p><p>Após essas apresentações sobre o stress infantil e suas</p><p>consequências para a criança, percebe-se a importância da elaboração e</p><p>implementação de programas específicos para ensinar as crianças a lidar</p><p>com o stress de modo mais adequado, por meio do aprendizado de</p><p>estratégias de coping, para o enfrentamento das situações estressantes</p><p>da vida.</p><p>O termo coping, ou enfrentamento, é utilizado na literatura para</p><p>denominar o processo de lidar com demandas, internas ou externas,</p><p>avaliadas pela criança como algo além de seus recursos ou</p><p>possibilidades. A definição mais conhecida de coping é provavelmente a</p><p>proposta por Lazarus e Folkman (1984). Para esses autores, o</p><p>enfrentamento se refere a esforços comportamentais e cognitivos</p><p>realizados por uma pessoa para lidar com demandas ambientais ou</p><p>internas ou com um conflito entre ambas. Esses esforços influenciam e</p><p>também são influenciados pelo ambiente.</p><p>Em seu estudo, Raimundo e Pinto (2006) analisaram a relação entre</p><p>eventos estressantes entre pares e as estratégias de coping em 443</p><p>crianças e adolescentes portugueses. Os objetivos eram, por um lado,</p><p>analisar a prevalência e a intensidade percebida dos eventos estressantes</p><p>entre pares e a frequência e a eficácia percebida das estratégias de</p><p>coping utilizadas para lidar com esse estressor. Por outro lado,</p><p>investigar o valor que prediz as variáveis sociodemográficas (sexo,</p><p>idade e situação socioeconômica) relativamente às duas variáveis em</p><p>estudo (eventos estressantes entre pares e estratégias de coping). A</p><p>análise da estatística descritiva das variáveis</p><p>em estudo revelou a</p><p>existência de níveis moderados de stress, proveniente do conflito entre</p><p>pares, quer para a intensidade (M = 2.49; DP = .11), quer para o</p><p>resultado global de stress (M = 2.15; DP = 1.24) e níveis modestos para</p><p>a sua frequência (M = 1.83; DP = .15). As estratégias de coping ativas</p><p>foram as mais utilizadas (M = 1.75; DP = 2.51) e consideradas mais</p><p>eficazes (M = 2.20; DP = 2.27) pelos alunos, e as únicas a se situar</p><p>acima do ponto médio, além da eficácia percebida das estratégias de</p><p>distração cognitivo-comportamental (M = 1.69; DP = 5.17). O teste T de</p><p>diferenças entre médias permitiu encontrar diferenças significativas de</p><p>gênero, no sentido de as meninas evidenciarem níveis elevados nos</p><p>eventos estressantes entre pares (t = - 3.463; p</p><p>A terapeuta, com base no tema sobre os sentimentos,</p><p>introduz o tópico sobre identificação de pensamentos.</p><p>Tarefa de casa: No caderninho, anotar uma situação de</p><p>stress vivenciada e registrar os pensamentos que teve</p><p>sobre a situação e quais os sentimentos que percebeu em</p><p>si.</p><p>Encerra-se a sessão com o exercício de respiração</p><p>profunda (ibid.).</p><p>• 4ª sessão</p><p>Tema central: Associação situação-pensamento-</p><p>sentimentos.</p><p>Apresentação da tarefa de casa.</p><p>Explicação do tema central: Como a maneira inadequada</p><p>de pensar sobre os eventos da vida influencia a severidade</p><p>do stress.</p><p>Tarefa de casa: Fazer o exercício “Jardim de flor de</p><p>pensamento” (Friedberg e McClure 2008) no caderninho,</p><p>escolhendo uma situação vivenciada.</p><p>Realiza-se o relaxamento: Nuvem.</p><p>• 5ª sessão</p><p>Tema central: Fontes internas de stress (ansiedade,</p><p>autoestima prejudicada, timidez e medo da punição</p><p>divina).</p><p>Momento para discussão da tarefa de casa.</p><p>Explicar o conceito de fontes internas.</p><p>Discutir a ansiedade como uma fonte interna de stress.</p><p>Tarefa de casa: Escrever no caderninho três situações que</p><p>sejam geradoras de ansiedade.</p><p>Ao término, realiza-se o exercício de relaxamento de</p><p>Jacobson (Toledo e Bara Filho 2007).</p><p>• 6ª sessão</p><p>Tema central: O controle da ansiedade.</p><p>Apresentação da tarefa de casa.</p><p>Explicar o conceito de ansiedade e os sintomas integrados</p><p>a ela.</p><p>Enfocar como a ansiedade pode ser desencadeada pelo</p><p>fator cognitivo.</p><p>A técnica de parada de pensamento.</p><p>A técnica do controle de ansiedade.</p><p>Tarefa de casa: Treinar as duas técnicas ensinadas.</p><p>Relaxamento de Jacobson integrado ao exercício de</p><p>respiração profunda (Lipp et al. 1991).</p><p>• 7ª sessão</p><p>Tema central: Estratégias de enfrentamento para lidar com</p><p>as fontes externas de stress.</p><p>Retomada da tarefa de casa.</p><p>Atividade: o jogo “Guerra ao stress”, Casa do Psicólogo.</p><p>Discutir as estratégias de enfrentamento das fontes</p><p>externas de stress apresentadas no jogo.</p><p>Tarefa de casa: No caderninho, fazer uma lista de quais</p><p>dificuldades encontra no relacionamento com os amigos.</p><p>A sessão é finalizada com a prática de um exercício de</p><p>visualização.</p><p>• 8ª sessão</p><p>Tema central: Relacionamento com os amigos.</p><p>Momento para discussão da tarefa de casa.</p><p>O relacionamento interpessoal como fonte de stress.</p><p>Assertividade, expressão de sentimentos, empatia.</p><p>Tarefa de casa: No caderninho, a criança registra uma</p><p>situação em que procurou realizar algo para agradar um</p><p>amigo ou uma amiga.</p><p>Exercício de relaxamento: Nuvem.</p><p>• 9ª sessão</p><p>Tema central: Lidando com a pressão do grupo.</p><p>Apresentação da tarefa de casa.</p><p>Explicação do tópico “como lidar com as pressões do</p><p>grupo” (Os meus amigos querem, mas eu não!).</p><p>Tarefa de casa: Registrar no caderninho uma situação da</p><p>semana em que a criança consiga agir conforme a sua</p><p>vontade.</p><p>Relaxamento da luz (Lipp 2005).</p><p>• 10ª sessão</p><p>Tema central: Lidando com as diferenças.</p><p>Comentários sobre a tarefa de casa.</p><p>Explanação do tema lidando com as diferenças.</p><p>Tarefa de casa: No caderninho, fazer um desenho que</p><p>represente o sentimento de tristeza.</p><p>Relaxamento: Nuvem.</p><p>• 11ª sessão</p><p>Tema central: O sentimento de rejeição.</p><p>Momento para que a criança comente a tarefa de casa.</p><p>Explicação do tópico “o sentimento de rejeição”.</p><p>Apresentação em DVD de alguns desenhos que trabalhem</p><p>o tema da rejeição por ser diferente.</p><p>Discussão sobre os desenhos apresentados.</p><p>Tarefa de casa: Fazer uma lista, no caderninho, dos</p><p>apelidos que conheça.</p><p>Exercício de relaxamento: O barquinho (Lipp 2005).</p><p>• 12ª sessão</p><p>Tema central: Bullying (o quanto esse comportamento</p><p>prejudica o outro).</p><p>Discussão do conteúdo da tarefa de casa.</p><p>Explicação do termo bullying e da responsabilidade que</p><p>cada criança tem ao praticar esse comportamento.</p><p>Tarefa de casa: Fazer um desenho no caderninho de uma</p><p>situação em que a criança tenha feito algo que não queria</p><p>para agradar a um amiguinho ou para não se sentir</p><p>diferente.</p><p>Relaxamento: O tapete mágico (Lipp 2005).</p><p>• 13ª sessão</p><p>Tema central: A pressão do grupo para atos específicos que</p><p>a criança não queira fazer.</p><p>Apresentação do tópico: Quando a pressão do grupo é</p><p>prejudicial para a criança, por exemplo, fazer esportes de</p><p>que não goste, usar roupas que estejam na moda, mas de</p><p>que não goste etc.</p><p>Tarefa de casa: No caderninho, anotar duas atividades que</p><p>costuma fazer com a família.</p><p>Relaxamento da luz.</p><p>• 14ª sessão</p><p>Tema central: A família (hábitos de vida).</p><p>Momento para apresentação da tarefa de casa.</p><p>Explicação dos tópicos “hábitos de vida, como a família</p><p>influencia a formação dos hábitos de vida”.</p><p>Tarefa de casa: Registrar no caderninho os medos que tem.</p><p>Relaxamento: A grama (Lipp 2005).</p><p>• 15ª sessão</p><p>Tema central: Medos.</p><p>Apresentação da tarefa de casa.</p><p>Discutir como a maneira de pensar pode desencadear o</p><p>sentimento de medo.</p><p>Tarefa de casa: A criança deve pensar em tudo o que foi</p><p>aprendido no processo de tratamento e anotar no</p><p>caderninho aquilo de que mais gostou.</p><p>Relaxamento da luz.</p><p>• 16ª sessão</p><p>Fechamento.</p><p>Momento para a criança apresentar suas dúvidas.</p><p>Breve revisão do termo stress e de suas características.</p><p>Exercício de relaxamento: Nuvem.</p><p>O TCSI, além das 16 sessões realizadas com a criança, também</p><p>inclui quatro encontros com os pais. O primeiro ocorre após a quarta</p><p>sessão da criança; o segundo, após a nona sessão; o terceiro, após a 13ª</p><p>sessão; e o quarto e último encontro, após a 16ª sessão. A escolha da</p><p>época dessas sessões se baseia na experiência clínica da autora.</p><p>Os objetivos desses encontros são: informar os pais sobre o stress e</p><p>suas características; e instrumentalizá-los com técnicas específicas para</p><p>o manejo do stress de seus filhos. Assim, estarão aptos a auxiliá-los no</p><p>tratamento do stress.</p><p>A seguir, uma descrição breve dos encontros com os pais:</p><p>• 1º encontro</p><p>Temas abordados: stress infantil, fontes de stress (internas</p><p>e externas), os quatro pilares do controle do stress</p><p>(relaxamento, exercício físico, alimentação e</p><p>reestruturação cognitiva).</p><p>• 2º encontro</p><p>Temas abordados: o modelo teórico da terapia cognitivo-</p><p>comportamental (o sistema ABC/situação-pensamento-</p><p>sentimentos).</p><p>• 3º encontro</p><p>Tema abordado: o papel dos pais na prevenção do stress</p><p>infantil.</p><p>• 4º encontro</p><p>Tema abordado: breve revisão dos temas abordados.</p><p>O TCSI visa modificar o enfoque da criança sobre a própria vida e</p><p>favorecer o aprendizado das habilidades necessárias para o</p><p>enfrentamento dos estressores. Assim, a criança é capaz de se sentir</p><p>mais apoiada e fortalecida, pois passa a colocar em prática os assuntos</p><p>abordados e as estratégias aprendidas, desenvolvendo a sensação de</p><p>competência e melhorando a autoestima. Além disso, ela será capaz de</p><p>desenvolver novas cognições a respeito de si mesma.</p><p>No entanto, conforme citado na literatura, os ganhos em</p><p>treinamentos como esse dependem de os participantes continuarem a</p><p>implementar as habilidades aprendidas no dia a dia.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>ACHENBACH, T.M. (1991). Manual for the child behavior checklist/4-18 and 1991 profile.</p><p>Burlington: University of Vermont/Department of Psychiatry.</p><p>BECK, A.T. (1984). “Cognitive approaches to stress”. In: WOLL-FOLK, R. e LEHRER, E.P.</p><p>(orgs.). Principles and practice of stress management. Nova York: Guilford.</p><p>BERENCHTEIN, B. 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Na</p><p>verdade, dificilmente o stress é tratado em sua origem; geralmente, só</p><p>os sintomas recebem atenção médica. É fundamental verificar se há</p><p>debilidade no sistema imunológico e, se este parecer ser o problema,</p><p>precisa-se atentar para a possibilidade de um stress agudo ou crônico</p><p>estar presente. Cuidar do sintoma e do órgão afetado é extremamente</p><p>importante; no entanto, verificar se o stress não está enfraquecendo o</p><p>organismo é igualmente fundamental.</p><p>Os cuidados médicos, como o uso de medicações, são necessários,</p><p>porém, também é essencial ajudar o adolescente a entender o que se</p><p>passa com ele e a desenvolver estratégias para administrar os fatores</p><p>difíceis e conflitantes de sua vida. Tratar o sintoma do problema</p><p>promove alívio momentâneo no desconforto, preserva a saúde física e</p><p>mental, permite uma melhor qualidade de vida, mas não prepara o</p><p>jovem para lidar com o futuro. Haverá outras situações na vida desse</p><p>indivíduo em que ele precisará saber lidar com o stress. Com o</p><p>crescimento, as demandas aumentam, pois crescer significa se preparar</p><p>para ingressar no mundo dos adultos. Se não aprender um modo</p><p>adequado de lidar com a vida, o adolescente vulnerável ao stress será</p><p>provavelmente um adulto também vulnerável. Considerando-se a</p><p>possibilidade de um adolescente estressado vir a se tornar um adulto</p><p>estressado, torna-se muito relevante tratar o stress na adolescência, não</p><p>somente para preservar o bem-estar e a saúde nessa fase, mas com o</p><p>objetivo de garantir uma sociedade com adultos mais preparados para</p><p>enfrentar as situações do dia a dia, considerando-se que vivemos no</p><p>Brasil, um país em desenvolvimento, com a população frequentemente</p><p>exposta a crises. Quando o stress é tratado adequadamente, a criança, o</p><p>adolescente e também o adulto poderão desenvolver o stress positivo e</p><p>aprender a lidar com as situações de modo mais eficiente, utilizando o</p><p>stress a seu favor.</p><p>O stress na adolescência:</p><p>Suas consequências</p><p>O stress na adolescência é pouquíssimo abordado. É difícil</p><p>encontrar pesquisas e publicações sobre o tema tanto no Brasil como no</p><p>exterior. Há alguns trabalhos esparsos sobre o assunto, distribuídos por</p><p>diversas universidades brasileiras (PUC-Campinas, Unifesp etc.).</p><p>Durante seu processo de desenvolvimento cognitivo, afetivo, social</p><p>e emocional, o adolescente enfrenta diversos momentos de tensão, que</p><p>podem atingir níveis muito altos, às vezes transpondo a maturidade e a</p><p>capacidade do indivíduo para administrar tais situações. Com isso, ele</p><p>pode vir a experimentar os efeitos negativos do stress (cabe salientar</p><p>que nem todos os adolescentes tendem a sofrer com o stress excessivo)</p><p>(Arnett 1999). Para tanto, precisará de uma rede de apoio (familiares,</p><p>amigos e/ou professores), bem como de modelos para aprender como</p><p>administrar e resolver problemas de modo satisfatório.</p><p>Se, nas muitas situações pelas quais o adolescente passa, ele não</p><p>aprende a lidar com o stress e não tem uma rede de apoio, pode vir a se</p><p>tornar um adulto vulnerável ao stress e, consequentemente, uma pessoa</p><p>suscetível a várias patologias. Convém ressaltar que, mesmo jovens</p><p>mais sensíveis, que não adquiriram estratégias para administrar as</p><p>tensões na infância, podem vir a aprendê-las. É fundamental que as</p><p>pessoas mais próximas, como pais e professores, possam servir de</p><p>modelo positivo, bem como ensinar como administrar situações de</p><p>tensão. Estudos (Gomide 2011; Justo 2010, entre outros) comprovam</p><p>que os estilos parentais são uma das causas do stress na adolescência,</p><p>assim</p><p>como as atitudes dos professores. Compreende-se, assim, que pais</p><p>e professores estressados servem de exemplo negativo e de fonte de</p><p>stress para o jovem. Verifica-se, portanto, que os pais e os professores</p><p>são figuras relevantes na prevenção do stress na adolescência.</p><p>O mito da proteção total</p><p>Com ênfase no papel dos pais e nos estilos parentais no manejo do</p><p>stress, como já mencionei em outro trabalho (Tricoli 2010), torna-se</p><p>necessário salientar que não é recomendada a “proteção total”. O que se</p><p>vem observando atualmente é que os pais procuram suprimir as</p><p>dificuldades da vida dos filhos, suprindo-os em suas necessidades,</p><p>levando-os à dependência e à dificuldade para lidar com as pressões e</p><p>frustrações, deixando-os frágeis e incapazes de lidar com situações que</p><p>fazem parte dessa fase de vida. É importante que o adolescente entre em</p><p>contato com o stress próprio desse momento, para que adquira</p><p>estratégias para administrá-lo, bem como maior preparo para as</p><p>situações que vivenciará na vida adulta. Convém ressaltar que a</p><p>quantidade e o tipo de estressor a que o jovem está exposto é que</p><p>precisam ser proporcionais à habilidade e à maturidade dele. A proteção</p><p>contínua faz com que o adolescente não utilize essa fase como transição</p><p>para o crescimento e se torne um adulto dependente, com dificuldades</p><p>para amadurecer, vivendo na “adultescência”, não assumindo as</p><p>responsabilidades peculiares a seus pares. Outro aspecto observado é o</p><p>excesso de proteção na infância e a retirada abrupta dela na</p><p>adolescência, com o aumento de exigências e cobranças, o que promove</p><p>medo, ansiedade e insegurança, fontes internas de stress. Como se pode</p><p>ver, um adolescente excessivamente poupado não terá chances para se</p><p>preparar para o mundo atual, assim como um adolescente exposto a</p><p>stress em demasia não terá oportunidade de adquirir estratégias de</p><p>enfrentamento efetivas.</p><p>Consequências do stress</p><p>excessivo</p><p>O diagnóstico eficiente e adequado do stress é muito importante,</p><p>pois, além de propiciar tratamento, apresenta outras implicações,</p><p>relacionadas às consequências que o stress pode trazer ao adolescente</p><p>de imediato e na vida adulta, visto que é nessa fase que os transtornos</p><p>de personalidade se configuram e alguns problemas físicos mais sérios</p><p>podem se instalar, sem reversão. Desse modo, as consequências podem</p><p>ser emocionais, físicas e sociais.</p><p>Consequências emocionais</p><p>O stress excessivo pode favorecer comportamentos de risco, uso de</p><p>drogas, agressividade, depressão e até mesmo desencadear transtornos</p><p>alimentares, ansiosos e de personalidade.</p><p>Problemas escolares são muito comuns e surgem em decorrência da</p><p>dificuldade de atenção e concentração, acarretando desinteresse pelo</p><p>estudo, o que poderá interferir no preparo para a vida adulta.</p><p>Consequências físicas</p><p>O stress, quando é intenso e/ou prolongado, faz com que as</p><p>glândulas suprarrenais passem a produzir corticosteroides em grande</p><p>quantidade. Com o aumento dessas substâncias no organismo, o sistema</p><p>imunológico é diretamente afetado, o que acarreta a redução de sua</p><p>resistência, deixando-o vulnerável ao desenvolvimento de doenças</p><p>contagiosas e infecciosas (gripes, viroses, infecções diversas).</p><p>Concomitantemente com esse enfraquecimento, doenças a que o</p><p>indivíduo poderia ter predisposição, mas ainda não haviam se</p><p>manifestado, podem ser desencadeadas (diabetes, hipertensão,</p><p>problemas dermatológicos, dentre outros).</p><p>Consequências sociais</p><p>O adolescente que será o adulto de amanhã, se crescer vulnerável</p><p>ao stress ou com inúmeras sequelas dele, geradas nesse período de</p><p>desenvolvimento, não estará preparado para as exigências que virão</p><p>pela frente quanto a trabalho, família e inserção na sociedade.</p><p>Manejo do stress na</p><p>adolescência</p><p>Como se pôde verificar anteriormente, saber lidar com o stress é</p><p>fundamental para uma vida mais saudável. Assim, podemos intervir no</p><p>stress preventivamente (quando ele não está instalado) e</p><p>terapeuticamente (quando o adolescente já apresenta quadro de stress e</p><p>se faz necessária uma intervenção), como será explicado a seguir.</p><p>Prevenção</p><p>A rede de apoio é fundamental para a prevenção de stress na</p><p>adolescência. Organiza-se com a presença dos pais, a participação da</p><p>família na vida do adolescente, as práticas parentais positivas, o modelo</p><p>adequado para a resolução de problemas, o diálogo, a aceitação dessa</p><p>etapa de desenvolvimento, mesmo em situações de crise, e o afeto</p><p>genuíno. Pais que permitem aos filhos vivenciar desafios, a fim de se</p><p>sentirem apoiados e protegidos, não superprotegidos, favorecem, e</p><p>muito, a prevenção do stress no adolescente. Mostrar ao jovem que as</p><p>situações da vida podem ser resolvidas de modo prático se torna um</p><p>modelo para que ele enfrente as situações cotidianas de modo mais</p><p>efetivo.</p><p>O adolescente precisa encontrar algo que seja estimulante, que gere</p><p>nele “paixão” para se sentir motivado por algo positivo, que o complete,</p><p>ao mesmo tempo que o relaxe, e ocupe seus pensamentos (um esporte,</p><p>um instrumento musical, alguma atividade artística).</p><p>Os professores são muito importantes nessa fase, pois são modelos</p><p>e, na disposição para estar com o jovem, podem favorecer o despertar</p><p>de seu interesse por uma área do conhecimento, o que poderá facilitar a</p><p>escolha da futura profissão.</p><p>Como bem diz o escritor Rubem Alves (1995), os adolescentes se</p><p>assemelham às maritacas, pois vivem em bando, usam o mesmo tipo de</p><p>roupa e, quando chegam aos lugares, fazem o maior barulho. Esse</p><p>educador descreve o quanto fazer parte de um grupo, sentir-se aceito e</p><p>integrado, é fundamental para o adolescente. Assim, a escolha do grupo</p><p>e suas influências poderão ser mais um ponto forte na rede de apoio, se</p><p>o adolescente pertencer a um grupo capaz de lhe trazer experiências</p><p>positivas.</p><p>A prevenção do stress na adolescência, como se pode ver, envolve</p><p>diversas frentes, que precisam estar em harmonia. Além dos aspectos</p><p>psicológicos, a prevenção do stress na adolescência envolve a aquisição</p><p>de hábitos de vida saudáveis no que se refere à alimentação, ao horário</p><p>de sono, à atividade física, ao lazer e à visão adequada e realista das</p><p>situações cotidianas.</p><p>Intervenção</p><p>Quando o adolescente já se encontra sob os efeitos negativos do</p><p>stress, é aconselhável que se busque a ajuda de um profissional</p><p>especializado e, ainda, que se reduza a pressão sobre ele, seja de que</p><p>tipo for. No entanto, isso não significa que o adolescente deva ser</p><p>poupado de tudo. Se isso ocorrer, ele não desenvolverá as habilidades</p><p>necessárias para lidar com o stress. Convém ressaltar que o stress deve</p><p>ser proporcional à maturidade cognitiva, socioafetiva e à idade</p><p>cronológica do adolescente. Se não for possível essa proteção ao stress</p><p>excessivo, há necessidade de fortalecê-lo, possibilitando-lhe estratégias</p><p>para lidar da melhor maneira com a situação.</p><p>Diante de tudo isso, surge uma questão: como ajudar o jovem a</p><p>enfrentar o stress de modo efetivo?</p><p>Inicialmente, é necessário que ele e seus pais entendam o que se</p><p>passa. Explicar o que é o stress e como ele se manifesta é a primeira</p><p>atitude. É bom deixar claro que tudo o que o adolescente está sentindo é</p><p>resultado do stress e que, quando este estiver sob controle, vai se sentir</p><p>melhor novamente. É necessário que se tenha muita paciência ao lidar</p><p>com uma pessoa estressada, principalmente se for um adolescente, pois</p><p>o momento já é de extrema mudança, até hormonal, e tende a se</p><p>acentuar sob os efeitos do stress excessivo.</p><p>A seguir, são apresentadas algumas dicas, baseadas em</p><p>procedimentos indicados pela psicóloga Marilda Lipp para crianças e</p><p>associados à experiência clínica da autora (Tricoli 2010). Essas dicas</p><p>podem ajudar no trabalho com adolescentes que se encontrem sob os</p><p>efeitos negativos do stress excessivo.</p><p>Dicas para ajudar o</p><p>adolescente estressado</p><p>1. Procure identificar as fontes de stress a que o adolescente</p><p>possa estar exposto: analise minuciosa e objetivamente o</p><p>que mudou na vida dele recentemente ou o que está para</p><p>acontecer e que poderia estressá-lo.</p><p>2. Avalie se os estressores presentes na vida dele são</p><p>proporcionais</p><p>a sua idade e maturidade cognitiva e</p><p>socioafetiva. O excesso de stress pode ser danoso.</p><p>3. Quando possível, procure reduzir a pressão sobre ele; se</p><p>não for possível, ajude-o a ver a realidade de modo mais</p><p>adequado.</p><p>4. Possibilite a conversa do jovem com alguém que saiba</p><p>ouvi-lo de modo acolhedor e empático, sem críticas ou</p><p>cobranças, viabilizando a busca de soluções para o</p><p>problema.</p><p>5. Evite discussões e assuntos trágicos em sua presença, pois</p><p>ele pode estar com a sensibilidade aumentada e vir a reagir</p><p>de modo inadequado.</p><p>6. Diminua as cobranças, permitindo-lhe fazer as coisas em</p><p>um ritmo mais lento.</p><p>7. Enfatize que tudo vai passar e que ele vai ficar bem</p><p>novamente. Evite dramas. Não fique falando do problema</p><p>a todo instante e, se o adolescente vier a falar sobre o que</p><p>o aflige, procure ouvir e, se possível, ajudá-lo.</p><p>8. Estimule a prática de atividades físicas não competitivas,</p><p>que possam favorecer o relaxamento e o extravasamento</p><p>da raiva e da angústia.</p><p>9. Permita que ele assista à televisão e interaja com os</p><p>colegas.</p><p>10. Oriente-o a evitar jogos no videogame e no computador</p><p>que estimulem a raiva e a agressividade.</p><p>11. Ensine técnicas de relaxamento que ele possa praticar</p><p>diariamente ou o estimule a praticar ioga, meditação etc.</p><p>12. Estimule-o a alimentar-se de modo saudável (frutas,</p><p>sucos, leite, verduras e legumes).</p><p>13. Transmita tranquilidade e a certeza de que o stress vai</p><p>passar e de que tudo voltará ao normal e ele ficará bem.</p><p>Treino do controle de stress</p><p>Como mencionado pela psicóloga Marilda Lipp (Lipp 2003), é</p><p>fundamental que se identifiquem e modifiquem as fontes internas de</p><p>stress por meio da reestruturação cognitiva. O treino do controle de</p><p>stress (TCS) é baseado na intervenção cognitivo-comportamental, com</p><p>enfoque na terapia racional emotiva comportamental (Ellis 1973), nos</p><p>estudos de Lipp (1984), no treino de inoculação de stress (Meichenbaun</p><p>1985), nas pesquisas de Lipp e Malagris (1995 e 2001) e em uma</p><p>pesquisa realizada por mim sobre o treino de controle de stress com</p><p>escolares (Tricoli 2013a).</p><p>O TCS é focado, com duração de 15 a 16 sessões que se iniciam</p><p>com a avaliação do stress, utilizando a Escala de Stress para</p><p>Adolescentes (Tricoli e Lipp 2006), o levantamento de fontes externas</p><p>(Holmes e Rahe 1967) e fontes internas (por meio de entrevista e do</p><p>questionário de crenças irracionais de Ellis, além de entrevista e</p><p>anamnese com os pais). Com esses dados, realiza-se a análise funcional</p><p>cognitivo-comportamental (Tricoli 2013b) dos estressores do jovem. A</p><p>partir de então, trabalha-se com os quatro pilares de stress (alimentação,</p><p>atividade física regular que não envolva competição, mudanças</p><p>cognitivo-comportamentais, relaxamento físico e mental).</p><p>O treino tem caráter educativo e envolve o trabalho com resolução</p><p>de problemas, autocontrole, autoestima, utilização do tempo, educação</p><p>psicoafetiva, tarefas de casa (sem utilizar essa nomenclatura),</p><p>reestruturação cognitiva, favorecendo uma visão realista dos fatos,</p><p>follow-up e prevenção de recaídas.</p><p>O referido treino pode ser subdividido como no quadro a seguir.</p><p>Quadro 1. Itens do treino do controle do stress com adolescentes</p><p>Sessões 1 a 4</p><p>* Educação psicoafetiva</p><p>• Mapa das emoções</p><p>• Ampliação do vocabulário das emoções</p><p>• Jogo dos sentimentos</p><p>Sessões 5 a 9</p><p>* Educação cognitiva</p><p>• Identificação dos pensamentos</p><p>• Reestruturação cognitiva</p><p>Sessões 10 a 16</p><p>* Aplicabilidade</p><p>• Técnicas de relaxamento</p><p>• Resolução de problemas</p><p>• Autoestima</p><p>• Autocontrole</p><p>• Habilidades sociais</p><p>• Reaplicação da Escala de Stress para Adolescente (Tricoli e Lipp 2006)</p><p>• Revisão do treino com os pais e com o adolescente</p><p>O treino do stress com adolescentes precisa ser realizado por</p><p>profissional especializado no assunto no que se refere à avaliação, às</p><p>causas, às estratégias de enfrentamento, à compreensão de metas,</p><p>limites, competências e prioridades na vida do adolescente, pois visa</p><p>instrumentalizar o indivíduo para lidar com o stress de seu dia a dia,</p><p>bem como melhorar sua qualidade de vida, já que trabalha com a causa</p><p>do stress do jovem e não somente com o alívio da sintomatologia, como</p><p>mencionado por Lipp (2003) no tratamento com adultos.</p><p>É importante ressaltar que o psicólogo não vai trabalhar com os</p><p>sintomas físicos, mas sim com a estrutura cognitiva e emocional do</p><p>adolescente, levando-o à compreensão e ao manejo dos aspectos que</p><p>favoreceram o surgimento do stress. Em muitos casos, quando já</p><p>surgiram patologias, é importante o tratamento interdisciplinar, a fim de</p><p>que o trabalho seja efetivo.</p><p>O controle do stress, seja preventivo, seja terapêutico, tem sido</p><p>utilizado com eficiência no trabalho com adultos, crianças e em grupos</p><p>escolares. Porém, no tratamento do adolescente, ainda se percebe a</p><p>necessidade de mais estudos sobre o tema, apesar de os dados clínicos</p><p>comprovarem a eficácia da intervenção nessa população. Trata-se de</p><p>uma intervenção breve, baseada nas técnicas cognitivo-</p><p>comportamentais, que objetivam mudanças no modo estressante e no</p><p>estilo de vida do jovem.</p><p>Para que o trabalho seja efetivo, é fundamental a identificação das</p><p>causas, dos sintomas e da fase em que o stress se encontra. Outro</p><p>aspecto relevante é a orientação dos genitores, pois pais estressados</p><p>estressam os filhos, gerando um círculo vicioso na família.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>ALVES, R. (1995). “Sobre as aves e os adolescentes”. In: ALVES, R. Sobre o tempo e a</p><p>eternaidade. Campinas: Papirus, pp. 25-27.</p><p>ARNETT, J. (1999). “Adolescent storm and stress reconsidered”. American Psychology, 54(5),</p><p>pp. 317-326.</p><p>ELLIS, A. (1973). Humanistic psychology: The rational emotive approach. Nova York: Julian.</p><p>EVERLY, G.S. (1989). A clinical guide to the treatment of the stress response. Nova York:</p><p>Plenum.</p><p>GOMIDE, P.I.C. (2011). Inventário de Estilos Parentais – IEP: Modelo teórico, manual de</p><p>aplicação, apuração e interpretação. 2ª ed. Petrópolis: Vozes.</p><p>HOLMES, T.H. e RAHE, R.K. (1967). Type a behavior and your heart. Nova York: Alfred A.</p><p>Knopf.</p><p>JUSTO, A.P. (2010). “Stress na adolescência e estilo parental”. 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Psicoterapias</p><p>cognitivo-comportamentais: Um diálogo com a psiquiatria. Porto Alegre: Artmed, pp.</p><p>475-490.</p><p>TRICOLI, V.A.C. (2010). “Stress na adolescência: Sintomas, fontes e manejo”. In: TRICOLI,</p><p>V.A.C. Stress na adolescência: Problema e solução. São Paulo: Casa do Psicólogo, pp.</p><p>39-51.</p><p>________ (2013a). “Cognitive behavioral therapy applied in the prevention and control of</p><p>children’s emotional stress in the school”. Atas do 7th World Congress of Behavioral &</p><p>Cognitive Therapies, Lima, p. 28.</p><p>________ (2013b). “Análise funcional cognitivo-conportamental”. Sessão temática de</p><p>palestras. Palestra Instrumentos de avaliação em terapia cognitivo-comportamental,</p><p>Ribeirão Preto, IX CBTC.</p><p>TRICOLI, V.A.C. e LIPP, M.E.N. (2006). ESA: Escala de Stress para Adolescentes. São Paulo:</p><p>Casa do Psicólogo.</p><p>3</p><p>Recursos tecnológicos no</p><p>tratamento do stress infantil</p><p>Maria Lúcia Rossi</p><p>A tecnologia tem ocupado papel relevante na vida das pessoas,</p><p>notadamente na das crianças e dos adolescentes, que, desde muito cedo,</p><p>já têm incorporado no dia a dia o uso de tablets e celulares. Hoje, fica</p><p>até difícil imaginar o</p><p>mundo sem os recursos tecnológicos que cada vez</p><p>mais fazem parte da rotina das pessoas. A terapia não poderia ficar fora</p><p>dessa realidade e muitos profissionais de saúde mental estão mais e</p><p>mais mobilizados para incorporar esses recursos criativos à sua prática</p><p>clínica, a fim de obter maior adesão e motivação, mais empatia e</p><p>eficiência. Esse caminho inovador é ainda embrionário, porém bastante</p><p>promissor e, tal qual a própria tecnologia, está em constante e rápido</p><p>desenvolvimento.</p><p>A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é a que mais tem</p><p>programas computadorizados para crianças e isso se deve,</p><p>provavelmente, ao fato de essa abordagem ter os procedimentos mais</p><p>estruturados e ter sido amplamente estudada e validada, permitindo ao</p><p>terapeuta acessar esquemas cognitivos, emocionais e comportamentais</p><p>mais facilmente, motivando e aumentando a possibilidade de</p><p>memorização da sessão e a consequente generalização dos conceitos</p><p>aprendidos (Anderson, Jacobs e Rothbaum 2004; Proudfoot 2004). No</p><p>entanto, muitos terapeutas são resistentes aos potenciais benefícios da</p><p>tecnologia na psicoterapia, pois acreditam que a relação paciente-</p><p>terapeuta possa ficar comprometida. Preocupam-se com as questões</p><p>éticas e de segurança e com o impacto negativo da tecnologia sobre as</p><p>crianças e os adolescentes, como riscos de dependência de internet,</p><p>aumento da agressividade e da violência (Caspar 2004; Gentile et al.</p><p>2004). Seria inconcebível desconsiderar esses pontos e os inúmeros</p><p>estudos que veem a tecnologia como vilã, porém um crescente número</p><p>de pesquisas sobre recursos computacionais na área de saúde mental</p><p>tem mostrado um caminho positivo e promissor (Goss e Anthony 2003;</p><p>Marks, Cavanagh e Gega 2007; Coyle et al. 2007).</p><p>Jogos comerciais ou criados especificamente para terapia</p><p>começaram a ser utilizados na década de 1980 (Allen 1984; Clark e</p><p>Schoech 1984; Gardner 1991; Griffiths 1997; Oakley 1994; Resnick e</p><p>Sherer 1994), e as pesquisas evidenciam resultados relevantes: os</p><p>pacientes ficaram mais colaborativos e motivados, o estigma de ir à</p><p>terapia diminuiu, a relação com o terapeuta ficou mais próxima e</p><p>eficiente e a mediação com o computador parece ter melhorado os</p><p>sintomas do transtorno das crianças pesquisadas, aumentado suas</p><p>habilidades de resolução de problemas (Allen 1984). Esses resultados</p><p>devem ser vistos com reservas, pela falta de estudos controlados.</p><p>Gardner (1991) e Skinner et al. (2003) sugeriram a utilização de</p><p>jogos populares comerciais como ferramenta para ajudar a criança na</p><p>resolução de problemas. Griffiths (2003) descreveu o uso de</p><p>videogames na psicoterapia com crianças.</p><p>As intervenções computacionais podem ser diretas, com a presença</p><p>do terapeuta, ou em tempo real, através de chat, webcam,</p><p>teleconferência ou, ainda, de forma monitorada, usando mensagens de</p><p>texto, gravações de áudio ou vídeo (Barak et al. 2008).</p><p>Quando a intervenção é remota, o paciente (e sua família) acessa o</p><p>programa por meio um site que contém instruções e informações sobre</p><p>o tema escolhido de saúde mental e, geralmente, envolve questionários</p><p>e exercícios para serem feitos on-line, comumente sob a supervisão de</p><p>um terapeuta.</p><p>Para o stress infantil, é essencial que o profissional de saúde mental</p><p>use criatividade, recursos lúdicos e recursos tecnológicos. A criança</p><p>estressada chega ao consultório muitas vezes desacreditada por</p><p>familiares, pois o stress é visto pelos adultos como discutível, salvo em</p><p>eventos ou circunstâncias especiais, como divórcio dos pais, nascimento</p><p>de irmão, morte de ente querido. Cada criança, tal como um adulto,</p><p>percebe a situação de modo diferente. O que é stress para uma não</p><p>necessariamente o é para outra, ou seja, mesmo passando por situações</p><p>mais difíceis, não necessariamente a criança ficará estressada. O stress</p><p>infantil pode ser desencadeado por fatores externos cotidianos, como</p><p>excesso de atividades, falta de assertividade para lidar com colegas</p><p>(bullying), opressão de qualquer tipo ou por fontes internas, muitas</p><p>vezes relacionadas com o que a criança acha que “deve” ser feito versus</p><p>o que é realmente capaz de fazer.</p><p>Outro ponto relevante é que o stress infantil pode ainda ser</p><p>intensificado não pelo que está acontecendo na vida da crianças, mas</p><p>pelo que ela ouve dos pais ao falarem sobre problemas no trabalho,</p><p>preocupação com doença de um familiar ou ao travarem discussões</p><p>constantes em família. Notícias com imagens perturbadoras na TV,</p><p>desastres naturais, assaltos e sequestros podem causar stress nas</p><p>crianças, que passam a se preocupar com a própria segurança e a das</p><p>pessoas que amam. Crianças são muito sensíveis a mudanças a seu</p><p>redor. Os sintomas do stress comumente aparecem como físicos ou</p><p>comportamentais.</p><p>Mas nem todo stress é ruim. Quantidades moderadas de pressão</p><p>imposta por um professor ou um treinador, por exemplo, podem motivar</p><p>uma criança a melhorar suas notas na escola ou a participar mais</p><p>plenamente das atividades atléticas e aprimorar seu desempenho nos</p><p>esportes. O gerenciamento bem-sucedido de situações ou eventos</p><p>estressantes aumenta a capacidade de uma criança para lidar com o</p><p>stress no futuro.</p><p>Apresentamos a seguir alguns dos programas mais estudados para o</p><p>tratamento da ansiedade infantil, muitos ainda em desenvolvimento,</p><p>aperfeiçoamento e validação, assim como recursos computadorizados</p><p>que visam auxiliar o processo terapêutico. Cada um deles tem uma</p><p>especificidade, e introduzimos um programa que está sendo</p><p>desenvolvido aqui no Brasil e faz parte do programa de pós-graduação</p><p>da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, intitulado</p><p>“Projeto Transformador”, um protocolo computadorizado auxiliar na</p><p>TCC de crianças , a fim de tratar dos mais variados transtornos de saúde</p><p>mental da infância.</p><p>O Treasure Hunt foi criado no Centro de Psiquiatria Infantil e do</p><p>Adolescente da Universidade de Zurique, na Suíça, por Veronika</p><p>Brezinka, para ser usado em terapia cognitivo-comportamental de</p><p>crianças de 9 a 13 anos, exclusivamente por psicólogos e psiquiatras. É</p><p>composto de seis níveis, que correspondem a conceitos básicos da TCC,</p><p>como distinção entre pensamentos, sentimentos e comportamentos,</p><p>influência de pensamentos sobre sentimentos e noção de pensamentos</p><p>úteis e inúteis. O jogo se desenvolve a bordo de um velho navio, onde</p><p>vivem o capitão Jones, Félix, o gato do navio, e Polly, o papagaio. O</p><p>capitão Jones solicita a ajuda da criança para desvendar o mistério de</p><p>um antigo mapa do tesouro. A cada etapa resolvida, a criança recebe</p><p>uma estrela-do-mar e a coloca no mapa do tesouro. Ao final, recebe um</p><p>certificado por ter ajudado o capitão Jones e por ser ajudada. Foi</p><p>lançado em 2008 e está disponível em inglês, alemão, holandês e grego.</p><p>Foi feita uma avaliação da aplicabilidade e da adequação do jogo entre</p><p>setembro de 2008 e dezembro de 2009, por meio de questionários</p><p>enviados por e-mail aos terapeutas. Os 42 terapeutas que responderam à</p><p>pesquisa e que trataram as 218 crianças relataram que o Treasure Hunt</p><p>foi útil para a explicação de conceitos de TCC, foi usado como reforço</p><p>positivo – a sessão de terapia ficou estruturada – e foi fortalecida a</p><p>relação terapêutica com a criança. Os dados obtidos têm uma limitação</p><p>clara, pela falta de um grupo de controle (Brezinka 2014).</p><p>O Friends Game é um aplicativo interativo para aparelhos móveis,</p><p>elaborado por Dawson em 2013, para reforçar os conceitos aprendidos</p><p>no programa Friends for Life, desenvolvido por Paula Barret na</p><p>Austrália e reconhecido pela Organização Mundial da Saúde. Abrange o</p><p>conteúdo adequado para as crianças que participam do Friends for Life</p><p>(7 a 11 anos) e do Fun Friends (4 a 6 anos). Cada jogo tem um objetivo</p><p>diferente. O Emotion Match Game trabalha os sentimentos, ajudando a</p><p>identificar expressões faciais com emoções. O Watermelon Game ajuda</p><p>a identificar expressões vocais com emoções e ainda ensina as crianças</p><p>sobre nutrição, por meio da metáfora de uma árvore, para que</p><p>desenvolvam empatia com a natureza e identifiquem suas próprias</p><p>necessidades para serem saudáveis e fortes. Também propõe às crianças</p><p>desenhar</p><p>comuns.</p><p>De um modo geral, seja pelo medo de abandono e de não ser</p><p>amada, seja pela perda em si, o acontecimento é fonte de muito stress</p><p>para a criança.</p><p>Exigência e/ou rejeição dos colegas</p><p>À medida que a criança amplia o seu grupo social, precisa aprender</p><p>a se adaptar e a interagir com pessoas que não são seus pais. De início,</p><p>ela entra em contato com outros de forma amistosa. A partir daí,</p><p>caminha para vínculos mais profundos.</p><p>Quando a criança atinge seis ou sete anos, começa a se desapegar</p><p>dos pais. Aí, os pares passam a ser muito importantes. O seu</p><p>relacionamento interpessoal se intensifica. É o período em que é aceita</p><p>ou rejeitada pelos colegas e também aquele em que faz suas escolhas.</p><p>Pode ser muito estressante, quando enfrenta preconceitos diversos de</p><p>raça, idioma, situação socioeconômica, deficit de qualquer ordem, tanto</p><p>intelectual como físico, ou ainda quando carrega certos estigmas, como,</p><p>por exemplo, ser filha de mãe solteira ou de pais separados.</p><p>É na adolescência, entretanto, que os colegas passam a ter</p><p>importância vital na vida emocional e nas relações sociais, quando o</p><p>grupo começa a exercer maior pressão, exigindo coisas diferentes do</p><p>que os pais querem.</p><p>Disciplina confusa por parte dos pais</p><p>Com a mudança nos valores e modos de educar, os pais não sabem</p><p>impor disciplina às crianças. Educados que foram com rigor e</p><p>autoridade, hoje, muitos agem com hesitação e dúvida. Diante de um</p><p>mesmo comportamento indesejável, os pais ora punem, ora ignoram o</p><p>comportamento. É motivo de stress para a criança quando seu mundo se</p><p>torna imprevisível. Quando os pais não definem claramente qual o</p><p>comportamento aceitável e qual o inaceitável, as crianças se tornam</p><p>inseguras, por desconhecer os limites da ação permissível. Entranto,</p><p>quando os pais estabelecem muitas regras ou quando elas são</p><p>demasiadamente rígidas, é provável que não mantenham,</p><p>consistentemente, nenhuma delas.</p><p>As exigências ambíguas da sociedade</p><p>Durante o primeiro ano de vida, poucas exigências são feitas à</p><p>criança, mas, quando começa o treino de toalete, ela pode se tornar</p><p>oprimida pelos pais. Se esse treino começa muito cedo e a criança está</p><p>fisicamente imatura para atender aos desejos dos pais, geralmente, passa</p><p>a ter intensos sentimentos de ansiedade, que podem trazer</p><p>consequências psicológicas de longa duração, como medo e raiva dos</p><p>pais, ansiedade em relação aos órgãos genitais, insegurança etc.</p><p>Também quando a criança começa a falar, entre o 10º e o 18º mês</p><p>de vida, a expectativa é que fale clara e precisamente. Entretanto,</p><p>muitos se esquecem de que as habilidades linguísticas da criança só se</p><p>desenvolvem com o treino. Se a crítica dos pais fizer a criança se sentir</p><p>ansiosa sobre o ato de falar, poderá desenvolver gagueira.</p><p>Muitas vezes, os pais esperam dos filhos níveis de desenvolvimento</p><p>mais altos e comportamentos de independência e responsabilidade</p><p>muito precocemente. São os que passam a ser subitamente mais</p><p>autoritários e controladores quando os filhos chegam à adolescência.</p><p>Nota-se que os pais e a sociedade encorajam as crianças a crescer</p><p>rapidamente e se comportar como adultas, mas, quando adolescentes,</p><p>são impostas a eles regras institucionais como proibição de beber, fumar</p><p>ou dirigir antes de certa idade. Frequentemente, esses adolescentes se</p><p>sentem traídos por uma sociedade contraditória, que estimula o</p><p>crescimento precoce, mas os mantém crianças (Tricoli 2014).</p><p>Hospitalização e doença</p><p>A idade da criança influencia a maneira como a hospitalização e a</p><p>doença são vivenciadas. Em bebês ou crianças muito pequenas, esses</p><p>eventos são acompanhados de distúrbios nas funções vitais, tais como:</p><p>problemas com alimentação, enurese ou, ainda, interrupções do sono.</p><p>Por outro lado, quando a criança começa a diferenciar as pessoas</p><p>que habitualmente cuidam dela dos estranhos, a hospitalização é</p><p>experimentada num plano psicológico mais diferenciado e a resposta ao</p><p>stress passa a ser, entre outras, irritabilidade ou retraimento e apatia.</p><p>São vários os fatores ambientais que contribuem para que a</p><p>hospitalização seja vivenciada como estressante. Ao chegar ao hospital,</p><p>a criança se depara com um ambiente totalmente novo: a enfermaria ou</p><p>o quarto, o berço e o pijama são estranhos para ela. A própria doença</p><p>pode ser um fator a mais de stress, pois muitas vezes exige tratamento</p><p>doloroso.</p><p>Quando a tudo isso se somam negligência e/ou inabilidade da</p><p>equipe hospitalar ou dos próprios pais, a criança fica intranquila e mais</p><p>ansiosa, à mercê das próprias fantasias. Muitas vezes, crê que não vai</p><p>mais voltar para casa ou que está no hospital porque fez algo errado.</p><p>Nascimento de irmão</p><p>A chegada de um irmão pode representar uma grande crise na vida</p><p>de uma criança. Desde a gravidez, ela pressente que o bebê, embora</p><p>ainda não tenha chegado, já ocupou seu lugar na vida da mãe. Ter de</p><p>dividir o amor que antes era só seu se torna uma ameaça à sua</p><p>segurança, e a criança, então, pode passar a sentir ódio e ressentimento</p><p>do novo irmão.</p><p>Mas, ao mesmo tempo, a criança não descarta a ideia de que é bom</p><p>ter um irmãozinho. Na verdade, há um misto de raiva e amor: ela faz</p><p>carinhos na barriga da mãe, mostra-se interessada em perceber os</p><p>movimentos do bebê, mas também expressa vontade de bater ou chutar</p><p>a barriga da mãe. Ao mesmo tempo que diz que vai ficar muito contente</p><p>quando o irmãozinho nascer, também fala que vai jogá-lo na lata do lixo</p><p>ou dá-lo de presente para alguém.</p><p>Quanto mais dificuldade a criança tem de expressar seu ciúme,</p><p>mais este aparece na forma de sintomas e mau comportamento, como</p><p>reação ao stress.</p><p>As reações da família a esses comportamentos normalmente</p><p>causam mais stress do que o amenizam. O ressentimento da criança em</p><p>relação ao irmão mais novo aumenta quando, de repente, por ser maior,</p><p>ela passa a ser mais exigida, como se já não pudesse ter</p><p>comportamentos infantis, próprios da idade.</p><p>Fontes internas</p><p>Como proposto por Lipp et al. (1997), o stress pode também ser</p><p>criado pela própria criança, dependendo da maneira como ela enfrenta</p><p>as situações que ocorrem no dia a dia, de seus pensamentos, do tipo de</p><p>personalidade e de suas atitudes. Além disso, em cada fase do</p><p>crescimento da criança, existem necessidades específicas que, se não</p><p>preenchidas, podem levá-la ao stress.</p><p>A criança de até um ano de vida, por exemplo, tem muita</p><p>necessidade de contato visual, principalmente com os pais, além da</p><p>presença constante de uma pessoa que tome conta dela. Se isso não</p><p>ocorre, poderá sentir stress, passando a chorar excessivamente e quase</p><p>não se alimentando. No segundo ano de vida, há uma grande</p><p>necessidade de estimulação auditiva. Quando estressada, nessa idade, a</p><p>criança poderá se tornar hiperativa ou tímida ao extremo.</p><p>Na adolescência, se os pais não respeitarem a autonomia e a</p><p>privacidade do filho, ele poderá ficar apático, tornando-se rebelde ou</p><p>ansioso.</p><p>Outro fator importante está relacionado às emoções fortes e aos</p><p>sentimentos das crianças, que vão se tornando mais complicados à</p><p>medida que elas amadurecem, pois passam a conviver com outras</p><p>pessoas em diferentes grupos sociais e a receber influências dessas</p><p>pessoas. Assim, a família, a escola, a comunidade e as demais</p><p>instituições influenciam diretamente as crianças, levando-as a adquirir</p><p>certos comportamentos, que podem desencadear um stress mais intenso.</p><p>Dentre esses comportamentos, destacamos os que se seguem.</p><p>Timidez</p><p>Quando a criança é tímida, ela se torna mais dependente, em</p><p>virtude da tendência de evitar ou de fugir de algumas situações do dia a</p><p>dia. Nesses casos, a criança evita contatos com o ambiente, afasta-se de</p><p>relações com colegas, isola-se, demonstrando desinteresse, apatia e,</p><p>muitas vezes, fechando-se em seu próprio mundo. Esses</p><p>comportamentos são mais constantes nos anos escolares, principalmente</p><p>os primeiros, em que a criança tem contatos com outras de vários níveis</p><p>sociais, com hábitos e ideias diferentes, o que pode desencadear crises</p><p>de stress.</p><p>Ansiedade</p><p>A ansiedade pode ser o que cria o stress e, em outras ocasiões, pode</p><p>ser um sintoma de stress</p><p>para se expressar, ajudando a reforçar lições sobre sentimentos</p><p>e, por fim, incentiva as crianças a “dar um tempo” e movimentar-se. O</p><p>relaxamento e a consciência do corpo são trabalhados por meio de jogos</p><p>como Milkshake Breathing, Body Clues, Body Clue Match Game e</p><p>Robots, Jellyfish, Towers Game. O jogo I Can Try incentiva a</p><p>conscientização e ajuda as crianças a entrar em contato com seus</p><p>sentidos. Red & Green Thought ajuda-as a identificar “pensamentos</p><p>vermelhos e verdes”. O Step Plan Game incentiva a escolher</p><p>recompensas: após cada etapa, elas se recompensam, a fim de que</p><p>tentem dar o melhor de si. Do it Everyday reforça e revisa conceitos do</p><p>programa Amigo, e Smile lembra às crianças que devem sorrir e</p><p>identificar quem está na sua rede de apoio e quem as faz se sentirem</p><p>bem. Friends é um programa inovador, com inúmeros estudos validados</p><p>e está sendo utilizado no Brasil. O modelo teórico para prevenção e</p><p>intervenção precoce de ansiedade e depressão aborda a cognição, o</p><p>aspecto fisiológico e os processos de aprendizagem, que são trabalhados</p><p>nesse programa.</p><p>Think Feel Do é um programa interativo e multimídia, baseado no</p><p>livro Think good, feel good (Stallard 2003) para crianças e adolescentes.</p><p>Foi criado para ser usado com a ajuda de um facilitador (professor,</p><p>enfermeiro ou psicólogo). Baseado em princípios de TCC, o programa</p><p>consiste em seis sessões de 30-45 minutos. É psicoeducacional, com</p><p>personagens de desenho animado narrando e orientando os pacientes em</p><p>vários testes, materiais de autoajuda, exercícios práticos e clipes de</p><p>vídeo. Aborda temas como identificação da relação entre pensamentos,</p><p>sentimentos e comportamentos, desafiando padrões de pensamento</p><p>negativo, habilidades de resolução de problemas e formas de ajudar a se</p><p>sentir melhor. A pesquisa, desenvolvida entre novembro de 2008 a</p><p>meados de 2010, liderada por Paul Stallard, ao lado de Megan Attwood</p><p>e Thomas Richardson, foi uma das primeiras no Reino Unido a</p><p>examinar os efeitos da TCC computadorizada em crianças e</p><p>adolescentes. Foi feito um ensaio clínico piloto, randomizado,</p><p>comparando a eficácia do programa Think Feel Do com um grupo de</p><p>controle de lista de espera de crianças e adolescentes encaminhados</p><p>pelo Serviço de Saúde Mental da Criança e do Adolescente com</p><p>ansiedade e/ou depressão, que analisou a viabilidade e a aceitação desse</p><p>programa para o tratamento desses transtornos em 20 crianças e</p><p>adolescentes com idades entre 11 e 16 anos com resultados promissores.</p><p>Trata de tema específico (ansiedade e depressão) e pode ser</p><p>acompanhado por instrutor não necessariamente profissional de saúde</p><p>mental (psiquiatras e psicólogos).</p><p>Camp Cope-A-Lot: The Coping Cat CD-ROM, elaborado por</p><p>Khanna e Kendall em 2006, é um programa de processamento interativo</p><p>para tratar transtornos de ansiedade em crianças baseado nos</p><p>pressupostos da TCC. Propõe-se a reconhecer e compreender as reações</p><p>emocionais e físicas da ansiedade, perceber pensamentos e sentimentos</p><p>em situações de ansiedade, desenvolver planos de enfrentamento</p><p>eficazes, avaliando o desempenho, e a aprender o autorreforço. Destina-</p><p>se a crianças entre 7 e 13 anos que sofrem de ansiedade de separação,</p><p>ansiedade social ou transtorno de ansiedade generalizada. O programa é</p><p>cumprido em 12 sessões e exige pouco treinamento por parte do</p><p>paciente e do aplicador. As estratégias terapêuticas são as mesmas do</p><p>programa Coping Cat tradicional e incluem controle de emoção,</p><p>reestruturação cognitiva, solução de problemas, relaxamento e</p><p>exposição.</p><p>Nas primeiras seis sessões, a criança desenvolve o jogo por conta</p><p>própria e em seu próprio ritmo; nas seis últimas, desenvolve-o com a</p><p>ajuda do terapeuta (treinador), que não necessariamente precisa ser um</p><p>psicólogo. A quarta e a nona sessões incluem treinamento de pais. O</p><p>programa acontece em um acampamento de férias virtual onde o</p><p>paciente vive uma aventura repleta de situações que geram ansiedade,</p><p>como show de talentos, os atos de conhecer alguém, falar em público,</p><p>dormir no escuro, e outras. Pode ser utilizado em diferentes contextos,</p><p>como hospitais, clínicas, escolas etc. É apresentado atualmente, além do</p><p>original inglês, em chinês, húngaro, japonês, norueguês e espanhol. Um</p><p>dos estudos que validam esse programa teve 20 participantes de 7 a 12</p><p>anos e oito terapeutas de orientação cognitivo-comportamental (Khanna</p><p>e Kendall 2008). Um segundo estudo sobre a aceitabilidade, a</p><p>viabilidade e os efeitos desse software foi publicado em 2010 por</p><p>Khanna e Kendall, com uma amostra de 49 crianças de 7 a 13 anos com</p><p>ansiedade e um grupo de psicólogos de várias abordagens, com pouca</p><p>ou nenhuma experiência clínica de tratamento com TCC. Foram</p><p>formados três grupos de tratamento: 1) um grupo que recebeu o</p><p>programa de intervenção em CD-ROM; 2) um grupo que fez 12 sessões</p><p>de TCC individual tradicional; 3) um grupo de controle, que recebeu um</p><p>programa de apoio. Os resultados mostram que 70%, 81% e 19% dos</p><p>participantes em cada grupo, respectivamente, não apresentaram o</p><p>diagnóstico da causa primária de tratamento da ansiedade. Os terapeutas</p><p>também relatam que o nível operacional aumentou significativamente</p><p>entre as crianças dos dois grupos de tratamento versus as do grupo de</p><p>apoio.</p><p>Earthquake in Zipland Therapy Game for Children of Divorce é um</p><p>jogo para computador em forma de quest, elaborado em 2005 por Chaya</p><p>Harash, psicoterapeuta familiar de Israel, que auxilia crianças de 9 a 12</p><p>anos a lidar com os efeitos estressantes da separação dos pais, como a</p><p>raiva, a culpa, os conflitos de lealdade, as falsas esperanças, o conflito,</p><p>a vergonha, o medo da mudança, o abandono, a não aceitação, a</p><p>onipotência e outros efeitos emocionais do divórcio que as crianças</p><p>possam apresentar (McCauley 2007). O objetivo do jogo é desenvolver</p><p>estratégias de enfrentamento e fazer com que as crianças aprendam a</p><p>aceitar a nova realidade mais rapidamente e de forma saudável por meio</p><p>de uma aventura com personagens atraentes e tarefas desafiadoras, que</p><p>possibilitam a expressão de sentimentos muitas vezes encobertos.</p><p>Earthquake in Zipland oferece a possibilidade de lidar com as questões</p><p>do divórcio de forma lúdica, abre caminho para o diálogo e se torna</p><p>uma ferramenta valiosa para pais e terapeutas, pois diminui a culpa,</p><p>sugere alternativas terapêuticas e favorece a dessensibilização pelas</p><p>múltiplas repetições (Gardner 1992). É um recurso que pode ser usado</p><p>exclusivamente pela criança, pelos pais ou nas sessões terapêuticas,</p><p>com o auxílio do psicólogo. Disponível em inglês.</p><p>Biofeedback é um recurso terapêutico não invasivo que utiliza</p><p>instrumentos eletromecânicos ou eletrônicos para medir, amplificar e</p><p>apresentar os sinais fisiológicos (dar feedback) ao indivíduo. Foi criado</p><p>no final da década de 1960 e auxilia a pessoa a aprender a relaxar e</p><p>modificar seus processos fisiológicos. Ensina a mente a controlar o</p><p>corpo e, assim, regular o estado físico e emocional. Alguns dos</p><p>processos fisiológicos que podem ser regulados pelo biofeedback são as</p><p>ondas cerebrais, o tônus muscular, a condutância da pele, a frequência</p><p>cardíaca e a redução da dor. Funciona através de retroalimentação em</p><p>tempo real, que possibilita ao organismo tomar consciência das</p><p>informações obtidas e aprimorá-las por mecanismos de aprendizagem,</p><p>treinamento e autorregulação. O objetivo do biofeedback é monitorar as</p><p>respostas fisiológicas e devolvê-las ao paciente, para que ele seja capaz</p><p>de aprender a modulá-las. Muitas são as formas de biofeedback, mas</p><p>vamos apresentar o HRV (Heart Rate Variability), baseado na</p><p>variabilidade de frequência cardíaca (VFC – variação na frequência</p><p>cardíaca natural entre os batimentos cardíacos), que é o mais</p><p>frequentemente usado na prática clínica psicoterápica (Paul e Garg</p><p>2012). A retroalimentação se dá através do sistema nervoso autônomo</p><p>parassimpático (SNP) e simpático (SNA). Essa técnica utiliza sensores</p><p>colocados na ponta do dedo ou no lóbulo da orelha para captar os</p><p>batimentos cardíacos e a variação dessa frequência. A criança é</p><p>colocada na frente da tela do computador e, escolhido o jogo,</p><p>vai</p><p>percebendo seu desempenho, que é apresentado em uma figura e um</p><p>gráfico. O paciente vai modificando, para obter os resultados propostos.</p><p>O padrão gráfico mostra baixa coerência (picos irregulares), indicando,</p><p>portanto, níveis de stress e ansiedade elevados, ou alta coerência (ondas</p><p>suaves), que demonstram bem-estar e menor índice de stress. Com esse</p><p>monitoramento, podemos obter indicadores relacionados ao equilíbrio</p><p>de nossos sistemas de defesa e relaxamento e inferir nossa capacidade</p><p>de resiliência, adaptação às atividades físicas e cognitivas, assim como</p><p>nossa capacidade de relaxamento e bem-estar. Em crianças, auxilia na</p><p>percepção das alterações fisiológicas que ocorrem frequentemente em</p><p>conjunto com mudanças de pensamentos, emoções e comportamentos</p><p>(Jordanova e Gucev 2010). Após o uso de biofeedback, as técnicas de</p><p>relaxamento, respiração diafragmática e mindfulness são mais</p><p>facilmente assimiladas, o que torna o resultado da terapia mais eficiente</p><p>em menor tempo. Podem ser utilizadas nas mais variadas patologias ou</p><p>áreas, entre elas o gerenciamento da ansiedade e do stress, o controle da</p><p>raiva, problemas físicos como prisão de ventre, asma, dor e desempenho</p><p>físico. Dois estudos com crianças e adolescentes podem ilustrar o uso de</p><p>biofeedback. O primeiro foi um caso clínico de um paciente de 13 anos,</p><p>com diagnóstico de transtorno de ansiedade generalizada (TAG), que</p><p>apresentava vômitos como comorbidade. Foram usados biofeedback e</p><p>psicoterapia. Após 16 sessões de TCC, que envolveram psicoeducação,</p><p>identificação dos aliciadores do vômito, reestruturação cognitiva e</p><p>treinamento em biofeedback, o paciente apresentou redução</p><p>significativa dos sintomas (Slutsker, Konichezkya e Gothelf 2010). O</p><p>outro estudo analisado envolveu 135 estudantes do ensino médio,</p><p>sujeitos de uma intervenção cognitivo-comportamental associada a um</p><p>equipamento de biofeedback de VFC, com o objetivo de ensinar</p><p>técnicas de manejo de emoções, capacitando-os fundamentalmente a</p><p>lidar com o stress e a ansiedade. Foram observadas melhora na VFC dos</p><p>estudantes que receberam a intervenção e diminuição significativa de</p><p>parâmetros relacionados à ansiedade e ao stress pré-avaliados (Bradley</p><p>et al. 2010).</p><p>O biofeedback é um instrumento auxiliar na terapia, pouco utilizado</p><p>no Brasil e menos ainda com crianças e adolescentes. Isso pode ser, em</p><p>parte, explicado pela falta de equipamentos nacionais ou traduzidos em</p><p>nossa língua, como também pela pouca divulgação desse recurso entre</p><p>os profissionais da área de saúde mental.</p><p>O Projeto Transformador é um protocolo psicoterápico</p><p>computadorizado interativo baseado nos pressupostos da abordagem</p><p>cognitivo-comportamental, concebido após a constatação da falta de</p><p>programas completos, que possibilitassem a personalização e</p><p>estivessem em português, para tratar os mais diferentes transtornos.</p><p>Propõe-se a estruturar as sessões de terapia com crianças, facilitando o</p><p>uso por terapeutas, sejam eles iniciantes ou mais experientes, e</p><p>possibilitando a validação de futuras pesquisas na área. Além disso, tem</p><p>também como propostas motivar as crianças com recursos multimídia,</p><p>ser psicoeducativo no que se refere aos conceitos fundamentais da TCC</p><p>para a criança e seus pais e auxiliar nas tarefas de casa. Destina-se a</p><p>crianças de 6 a 11 anos. É disponibilizado on-line, através de licenças,</p><p>no site http://www.projetotransformador.com.br.</p><p>Figura 1. Logo</p><p>http://www.projetotransformador.com.br/</p><p>Está formatado em seis atividades. Cada uma delas corresponde a</p><p>uma etapa do tratamento cognitivo-comportamental.</p><p>Figura 2. Tela principal – 6 atividades</p><p>Esse programa foi baseado em programas validados e amplamente</p><p>utilizados no tratamento de crianças ansiosas como Friends (Barrett,</p><p>Lawry-Webster e Turner 2000), Coping Cat (Kendall 1990) e Think</p><p>good, feel good (Stallard 2003), para tratar crianças com distúrbios de</p><p>comportamento ou problemas no controle da raiva (Nelson e Finch</p><p>1996) e inspirado no programa computadorizado Treasure Hunt, criado</p><p>por Brezinka em 2008, que pretende dar suporte aos mais diferentes</p><p>transtornos (Brezinka 2010). O protocolo oferece relatórios de cada</p><p>atividade realizada e registra anotações do terapeuta ao final da sessão.</p><p>Como estamos falando de um tema específico, vamos descrever o</p><p>Projeto Transformador no tratamento do stress infantil. Alguns fatores</p><p>estressores são mais comumente vistos em crianças de seis meses a</p><p>cinco anos, como tirar as fraldas, compartilhar brinquedos, ouvir “não”,</p><p>ir à escola pela primeira vez. Crianças de seis a dez anos, estressam-se</p><p>usualmente por causa de mais regras na escola, mais disciplina imposta,</p><p>mais atividades diárias, mais responsabilidades e bullying.</p><p>O que mais estressa uma criança? Normalmente, o excesso de</p><p>crítica e a constante desaprovação de pais e/ou professores, o bullying e</p><p>o excesso de atividades extracurriculares.</p><p>O processo terapêutico no tratamento do stress infantil está baseado</p><p>na construção da resiliência, ou seja, trabalhar a capacidade de se</p><p>adaptar bem à adversidade, à tragédia, ao trauma, às ameaças ou mesmo</p><p>a fontes significativas de stress, e gerenciar os sentimentos de ansiedade</p><p>e incerteza. Ser resiliente não significa não ter dificuldades ou</p><p>sofrimento.</p><p>Como hoje a criança já nasce envolvida no mundo tecnológico,</p><p>utilizar tecnologia na terapia se tornou um caminho muito vantajoso e</p><p>eficiente no tratamento dos mais variados transtornos, notadamente no</p><p>do stress infantil.</p><p>A primeira sessão é feita somente com pais/cuidadores. Nela, é</p><p>apresentado um questionário, a ser respondido separadamente, com o</p><p>objetivo de conhecer a percepção que cada membro da família tem do</p><p>paciente. Na primeira sessão da criança, o programa é oferecido. O fato</p><p>de ser computadorizado auxilia no vínculo e na empatia inicial com o</p><p>terapeuta.</p><p>O Projeto Transformador se desenvolve com um personagem, o</p><p>“Ajudante de Problemas”, que é batizado por cada paciente com um</p><p>nome e interage com a criança continuamente em cada atividade. Esse</p><p>narrador supre a leitura de crianças ainda não alfabetizadas ou com</p><p>dificuldade de aprendizagem. Ele fará a intermediação entre a criança e</p><p>o terapeuta.</p><p>Figura 3. Apresentação</p><p>Nessa primeira sessão, portanto, é feita a “apresentação” do</p><p>personagem principal, o boneco narrador do jogo, e a explicação do que</p><p>faz um psicólogo, o que é terapia e o conceito de sigilo (Atividade 1)</p><p>para o paciente e os familiares. É uma atividade interativa e costuma ser</p><p>um início mais suave para o paciente. A criança recebe um boneco.</p><p>Os pais ou cuidadores são de importância fundamental na terapia</p><p>com crianças. O terapeuta introduz temas ao longo da terapia e propõe</p><p>novos comportamentos aos pais:</p><p>• Ouça – Incentive seu filho a falar. Se ele não sentir</p><p>vontade, deixe-o saber que você está ao lado dele e o</p><p>apoia.</p><p>• Entenda os sentimentos – Não há problema em se sentir</p><p>mal com alguma coisa ou em ter raiva. Compartilhe suas</p><p>emoções e seus pensamentos. Permita a expressão de</p><p>sentimentos.</p><p>• Ofereça conforto e distração – Tente fazer algo de que seu</p><p>filho goste, como jogar um jogo ou “colocá-lo em seu</p><p>colo”.</p><p>• Faça exercícios físicos – Exercícios físicos podem</p><p>melhorar o humor. Incentive-os. Compartilhe.</p><p>• Cuide da alimentação – Monitore os hábitos alimentares</p><p>da criança.</p><p>• Cuide da rotina e dos hábitos saudáveis – Equilibre</p><p>qualquer alteração (hora de dormir e fazer refeições,</p><p>tempo de brincar).</p><p>• Dê atenção às atividades extracurriculares – Assim como</p><p>os adultos precisam de algum tempo de inatividade depois</p><p>do trabalho e nos finais de semana, as crianças também</p><p>precisam de algum tempo sozinhas para descontrair.</p><p>• Limite a exposição a histórias violentas – Imagens</p><p>perturbadoras ou relatos de desgraças podem ser</p><p>interpretados de forma imperativa e distorcida. Explique à</p><p>criança que ela e as pessoas a quem ela ama não estão em</p><p>perigo.</p><p>• Ofereça o modelo – Mantenha o ambiente calmo e pacífico</p><p>em casa.</p><p>• Ajude na resolução de problemas – Incentive a criança a</p><p>perceber e registrar as vantagens e desvantagens de cada</p><p>titude (use a técnica</p><p>ensinada pelo terapeuta).</p><p>• Esteja junto – Passe tempo com seus filhos.</p><p>• Estabeleça regras – Negocie as regras de casa, incluindo</p><p>consequências para a quebra delas</p><p>(comportamento→consequência).</p><p>É introduzido o “Bate-papinho” (Atividade 2), cujo objetivo</p><p>terapêutico é fazer com que a criança use a linguagem verbal para se</p><p>colocar e especialmente se expressar melhor sobre suas emoções e falar</p><p>sobre seus problemas. O jogo se dá com perguntas feitas pelo</p><p>personagem, para iniciar uma conversação entre paciente e terapeuta. O</p><p>jogo tem um recurso que permite ao terapeuta fazer uma seleção prévia</p><p>das perguntas no banco de dados ou inserir uma nova pergunta,</p><p>personalizada para seu paciente. O programa fará um embaralhamento</p><p>das perguntas e, ao se acionar o botão “sortear”, o jogo começa.</p><p>Terapeuta e paciente respondem às perguntas, para que haja a</p><p>possibilidade também de modelagem para a criança. A presença de um</p><p>interlocutor facilita muito a interação na sessão com o terapeuta, e as</p><p>perguntas usuais em uma sessão de terapia convencional são mais</p><p>facilmente respondidas.</p><p>Sugestões de perguntas:</p><p>“Como você se sente hoje?”</p><p>“Você chorou para ficar na escola?”</p><p>“O que você fez de atividades fora da escola?”</p><p>“Seu amigo ri ou maltrata você?”</p><p>“Você ficou de castigo?”</p><p>Figura 4. Bate-papinho</p><p>A Atividade 3 é o “Jogo de memória”, em que o paciente vai</p><p>aprender sobre pensamentos, sentimentos e comportamentos. O</p><p>terapeuta escolhe um dos seis níveis de dificuldade, como número de</p><p>carta e tempo para executar a tarefa, de acordo com o paciente. O</p><p>programa sorteia cartões que contêm figuras alusivas a sentimentos</p><p>(cerca de 50 figuras diferentes), e o paciente, após executar a tarefa,</p><p>trabalha as cartas com o terapeuta, nomeando os sentimentos e falando</p><p>de si. O personagem ainda passa os conceitos principais de TCC de</p><p>forma divertida e interativa. Esse jogo visa auxiliar a criança a</p><p>identificar e classificar as emoções em relação às situações vivenciadas,</p><p>a fim de perceber a conexão entre pensamento, comportamento e</p><p>emoção. Ao perceber essas relações, é esperado que a criança reconstrua</p><p>as significações dadas para situações cotidianas e amplie sua capacidade</p><p>de emitir respostas comportamentais mais adequadas. Isso é</p><p>fundamental para trabalhar o stress infantil.</p><p>Figura 5. Jogo da Memória – 28 cartas</p><p>A Atividade 4 é a “Máquina transformadora”, que consiste em uma</p><p>máquina de “transformar” pensamentos.</p><p>Figura 6. Máquina Transformadora</p><p>As crianças reconhecem os pensamentos automáticos negativos</p><p>(pensamentos que “não ajudam” ou vermelhos), e são convidadas a</p><p>substituí-los por formas mais úteis de pensar (pensamentos que</p><p>“ajudam”, ou verdes). O pensamento disfuncional, “que não ajuda”,</p><p>vermelho, é digitado pela criança (se pequena, pelo terapeuta) e</p><p>colocado na máquina.</p><p>Figura 7. Máquina Transformadora – Pensamento vermelho</p><p>Figura 8. Máquina Transformadora – Pensamento verde</p><p>Após algumas interações com a criança, através de joguinhos</p><p>aleatórios para consertar a máquina, o paciente escreve, com o auxílio</p><p>do terapeuta, três pensamentos funcionais, “que ajudam”, verdes, e os</p><p>coloca novamente na máquina. Os pensamentos “saem modificados”.</p><p>Esse processo de reconstrução cognitiva é realizado com o paciente e o</p><p>terapeuta.</p><p>Atitudes positivas que podem ser trabalhadas com a criança</p><p>estressada:</p><p>• Faça amigos – Aprender a fazer amigos, incluindo a</p><p>habilidade de empatia (colocar-se no lugar do outro).</p><p>• Ajude o próximo</p><p>• Mantenha uma rotina diária</p><p>• Tenha um “tempo livre”</p><p>• Cuide-se – Alimentação adequada, exercício físico e</p><p>relaxamento.</p><p>• Mova-se em direção a seus objetivos – Metas razoáveis e</p><p>“fatiadas” são mais fáceis de atingir.</p><p>• “Voltando o filme” – Lembre como resolveu com sucesso</p><p>dificuldades no passado e use o mesmo procedimento em</p><p>desafios futuros.</p><p>• Confie em si mesmo</p><p>• Enxergue o futuro – Mantenha as coisas em perspectiva</p><p>esperançosa. Uma visão otimista e positiva permite ver as</p><p>coisas boas da vida e continuar, mesmo nos momentos</p><p>mais difíceis.</p><p>• Procure oportunidades para a autodescoberta – Tempos</p><p>difíceis são, muitas vezes, momentos em que as crianças</p><p>aprendem mais sobre si mesmas.</p><p>• Aceite que a mudança é parte da vida – Mudar, muitas</p><p>vezes, pode ser assustador para as crianças e os</p><p>adolescentes. Ver que a mudança é parte da vida e que</p><p>novas metas podem substituir os objetivos que se tornaram</p><p>inatingíveis ajuda muito.</p><p>Do ponto de vista interventivo, a TCC busca produzir mudanças no</p><p>pensamento e no sistema de crenças do paciente, independentemente de</p><p>sua faixa etária, com o propósito de promover mudanças emocionais e</p><p>comportamentais duradouras (Rangé 2001). Esse jogo possibilita ao</p><p>terapeuta trabalhar o desenvolvimento das habilidades da criança para</p><p>identificar e reestruturar os pensamentos disfuncionais, as emoções</p><p>negativas e os comportamentos desadaptados. A estratégia inclui a</p><p>“parada de pensamento” e o “desafio do pensamento” (pesando</p><p>evidências contra e a favor).</p><p>Essa atividade, assim como qualquer outra do Projeto</p><p>Transformador, pode ser repetida quantas vezes for necessário para que</p><p>ocorra a reconstrução cognitiva.</p><p>A Atividade 5 é a “Mala velha”, que tem como objetivo a resolução</p><p>de problemas. Após a atividade na “Máquina transformadora”, levamos</p><p>a criança a criar um plano para enfrentar as situações temidas, a fim de</p><p>resolver problemas.</p><p>A criança é convidada a digitar o pensamento disfuncional</p><p>trabalhado, colocá-lo em uma mala velha e despachá-lo definitivamente</p><p>para bem longe. Ela pode escolher o destino entre três opções, como</p><p>espaço, fundo do mar ou floresta.</p><p>Figura 9. Mala Velha</p><p>No entanto, sabemos que nem tudo o que é compreendido e</p><p>trabalhado na terapia é de fato resolvido. Alguns pensamentos e</p><p>comportamentos precisam de mais tempo; então, a criança os guarda</p><p>dentro de um “armário” só dela, para ser trabalhado posteriormente.</p><p>Figura 10. Armário</p><p>A Atividade 6 inclui “Relaxamento” e “Mindfulness”. Guiada pelo</p><p>personagem, o paciente aprende a relaxar fazendo a respiração</p><p>diafragmática, relaxamento muscular proposto por Jacobson, adaptado</p><p>pela autora.</p><p>Comprovadamente, essas técnicas auxiliam as crianças a</p><p>desenvolver a consciência e o controle de suas próprias respostas</p><p>fisiológicas e musculares. O “Relaxamento” ajuda a criança a perceber</p><p>emoções diferentes, posturas corporais e fazer a correlação entre as</p><p>cognições e as reações de seu corpo. O “Mindfulness”, além do já</p><p>descrito, ajuda a ter autocompaixão. O objetivo é que, pela</p><p>autorregulação e pelo autocontrole, o paciente consiga lidar com os</p><p>pensamentos negativos de forma assertiva.</p><p>As atividades podem ser seguidas nessa ordem ou modificadas pelo</p><p>terapeuta, conforme o paciente e a patologia. O Projeto Transformador</p><p>foi concebido para tratar os mais variados transtornos mentais, embora,</p><p>em nosso estudo, estejam em foco os transtornos ansiosos. Foi baseado</p><p>em programas de tratamento para distúrbios externalizantes, como o</p><p>comportamento agressivo e a violação de regras, e internalizantes,</p><p>caracterizados por retraimento, depressão, ansiedade, fobias e queixas</p><p>somáticas (Kendall 1990; Barrett, Lowry-Webster e Turner 2000;</p><p>Stallard 2003), para controle de raiva ou distúrbios de comportamento</p><p>(Nelson e Finch 1996).</p><p>Na fase inicial, tratou também crianças com transtorno do deficit de</p><p>atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno opositivo desafiador</p><p>(TOD) e síndrome de Asperger (ASD) (Weisz, Doss e Hawley 2005;</p><p>Lochman 1992). Abrange materiais físicos de apoio, como boneco,</p><p>cartas de sentimentos, chaves e tarefas de casa.</p><p>Figura 11. Relaxamento</p><p>Conclusão</p><p>A terapia infantil busca ser cada vez mais eficiente, dinâmica e</p><p>divertida para o paciente e para o terapeuta. Integrar recursos</p><p>tecnológicos aos processos terapêuticos convencionais é uma prática</p><p>ainda incipiente, porém promissora. Os recursos tecnológicos vieram</p><p>para ser incorporados definitivamente à psicoterapia, em virtude da</p><p>nova realidade em que as crianças e os jovens estão inseridos.</p><p>Proporcionam uma maior motivação para o tratamento, ajudam a</p><p>diminuir</p><p>o estigma da terapia, colaboram na compreensão dos conceitos</p><p>importantes da TCC e auxiliam no vínculo terapêutico. Ao estruturar as</p><p>sessões de terapia, os programas tecnológicos auxiliam novos terapeutas</p><p>ou terapeutas iniciantes na terapia infantil e na de adolescentes a</p><p>conduzir o tratamento com mais segurança, além de possibilitar</p><p>pesquisas científicas.</p><p>Os estudos disponíveis têm limitações metodológicas que não</p><p>permitem comparar ou comprovar sua eficiência cientificamente. Que</p><p>essa nova realidade estimule os terapeutas a pesquisar, estudar e criar</p><p>mais instrumentos tecnológicos.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>ALLEN, D.H. (1984). “The use of computer fantasy games in child therapy”. In: SCHWARTZ,</p><p>M.D. (org.). Using computers in clinical practice: Psychotherapy and mental health</p><p>applications. Nova York: Haworth, pp. 329-334.</p><p>ANDERSON, P.; JACOBS, C. e ROTHBAUM, B.O. (2004). “Computer-supported cognitive</p><p>behavioral treatment of anxiety disorders”. Journal of Clinical Psychology, 60(3), pp.</p><p>253-267.</p><p>APA – AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (2013). DSM-5: Diagnostic and</p><p>statistical manual of mental disorders. Porto Alegre: Artmed.</p><p>BARAK, A. et al. (2008). “A comprehensive review and a meta-analysis of the effectiveness of</p><p>internet-based psychotherapeutic interventions”. Journal of Technology in Human</p><p>Services, 26(2-4), pp. 109-160.</p><p>BARRETT, P.M. 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Alguns conseguem superar os</p><p>desafios, fortalecendo-se ao longo do processo, já outros não se saem</p><p>tão bem.</p><p>Diante de uma situação de stress, nosso organismo produz um</p><p>conjunto de respostas fisiológicas (reatividade fisiológica) altamente</p><p>integrado, que inclui a ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal</p><p>(HHA) e do sistema simpático-adrenomedular, com consequente</p><p>aumento dos níveis de hormônios do stress, como o cortisol, e ativação</p><p>de outros processos paralelos, envolvendo aumento de citocinas</p><p>inflamatórias (Shonkoff et al. 2012). A reatividade fisiológica varia</p><p>entre os indivíduos – influenciada por características individuais e</p><p>experiências prévias – e entre diferentes fases da vida de um mesmo</p><p>indivíduo, e seu efeito adaptativo pode variar de acordo com o contexto</p><p>(Portilla e Obradovic 2013).</p><p>A resposta de stress é classificada como positiva, tolerável ou</p><p>tóxica, de acordo com seu crescente potencial para danos duradouros ao</p><p>organismo (e não com a natureza do evento adverso). O contexto</p><p>(especialmente a qualidade do suporte parental) é um importante fator</p><p>moderador. O stress tóxico resulta da ativação excessiva, frequente ou</p><p>prolongada dos mecanismos de resposta ao stress, na ausência do efeito</p><p>protetor de um suporte parental adequado (NSCDC 2005-2014).</p><p>O cortisol está envolvido nos processos de aprendizagem, memória</p><p>e emoção, na armazenagem e na utilização da glicose, na regulação da</p><p>resposta inflamatória e da resposta imune celular, entre outros (Portilla e</p><p>Obradovic 2013). Os receptores de glicocorticoides estão presentes na</p><p>amígdala, no hipocampo e no córtex pré-frontal (CPF), estruturas</p><p>relacionadas à mediação de resposta de medo, aos processos de</p><p>memória e aprendizagem, à regulação autonômica, às funções</p><p>executivas (que envolvem, por exemplo, tomada de decisões, memória</p><p>operacional, autorregulação e controle dos impulsos), entre outras. O</p><p>stress tóxico pode levar a mudanças na reatividade fisiológica</p><p>(hiporregulação ou hiper-regulação da resposta ao stress) e a alterações</p><p>persistentes no padrão de secreção do cortisol. A plasticidade do cérebro</p><p>ao longo dos primeiros anos de vida o torna particularmente sensível, e</p><p>existem evidências de que níveis persistentemente elevados de</p><p>hormônios do stress estejam associados a alterações em sua arquitetura</p><p>(hipertrofia e hiperativação da amígdala e do córtex orbitofrontal e</p><p>perda de neurônios e conexões neurais no hipocampo e CPF medial em</p><p>consequência de stress crônico) (Shonkoff et al. 2012; NSCDC 2005-</p><p>2014; McEwen e Gianaros 2011).</p><p>Embora as alterações na reatividade fisiológica possam ser</p><p>protetoras em determinadas situações, a desregulação dos processos de</p><p>resposta ao stress pode ser um dos mecanismos que explicam a</p><p>associação entre experiências adversas precoces e dificuldades de</p><p>aprendizagem, problemas cognitivos, comportamentais e emocionais,</p><p>transtornos mentais e diversos problemas de saúde crônicos, incluindo</p><p>síndrome metabólica e doença arterial coronariana (Shonkoff et al.</p><p>2012; Portilla e Obradovic 2013; De Bellis et al. 2009).</p><p>De fato, diversos estudos têm demonstrado a associação entre</p><p>eventos adversos na infância e diversos transtornos mentais no curto e</p><p>no longo prazo (Moylan et al. 2010; Shonkoff et al. 2012). No Brasil,</p><p>Bordin et al. (2006) encontraram associação entre punição física grave e</p><p>problemas de saúde mental em crianças e adolescentes. É interessante</p><p>observar que a experiência materna de punição grave na infância esteve</p><p>associada à punição física grave dos filhos, o que sugere que esses</p><p>jovens vitimizados apresentem uma maior probabilidade de se tornarem</p><p>futuros agressores.</p><p>Crianças e adolescentes com elevado grau de exposição a eventos</p><p>adversos precoces (boa parte acolhida em abrigos e/ou com vivência de</p><p>rua, 58,4% com histórico de abuso físico e/ou sexual e praticamente</p><p>todos com histórico de negligência), atendidos em um serviço</p><p>especializado de São Paulo (Scivoletto, Silva e Rosenheck 2011)</p><p>apresentaram prevalência muito elevada de transtornos psiquiátricos</p><p>(88,9%), incluindo transtornos relacionados ao uso de substâncias</p><p>(40,4%), transtornos do humor (35,3%), transtornos hipercinéticos</p><p>(16,2%) e transtornos ansiosos (8,8%).</p><p>Alguns estudos sugerem que tanto o tratamento farmacológico</p><p>quanto o psicológico podem alterar as estruturas cerebrais afetadas no</p><p>transtorno de estresse pós-traumático (Tept) (Thomaes 2014), o que soa</p><p>bastante promissor.</p><p>O stress está associado a diversos transtornos psiquiátricos e estes</p><p>estão associados a níveis significativos de stress, visto que o diagnóstico</p><p>de um transtorno exige a presença de sofrimento ou prejuízo</p><p>clinicamente significativo. Assim, falar sobre o tratamento</p><p>farmacológico dos transtornos psiquiátricos associados ao stress em</p><p>crianças e adolescentes seria falar sobre toda a psicofarmacologia na</p><p>infância e na adolescência, o que foge ao objetivo deste capítulo.</p><p>Focarei inicialmente no tratamento dos transtornos relacionados ao</p><p>stress, a nova categoria do DSM-5 (APA 2013), que inclui o Tept e o</p><p>transtorno de estresse agudo (TEA), antes incluídos na seção dos</p><p>transtornos de ansiedade, além do transtorno reativo de vinculação da</p><p>infância, do transtorno do engajamento social desinibido e dos</p><p>transtornos de ajustamento. Posteriormente, falarei brevemente sobre as</p><p>diversas classes de psicofármacos e seu uso em crianças e adolescentes.</p><p>Algumas considerações</p><p>Deve-se ter em mente que o tratamento farmacológico é apenas</p><p>parte da abordagem terapêutica, especialmente na clínica de crianças e</p><p>adolescentes, uma vez que, nessa população, o tratamento não</p><p>farmacológico é de primeira escolha para a maioria dos transtornos</p><p>psiquiátricos de intensidade leve a moderada (Gleason et al. 2007). Em</p><p>geral, o plano terapêutico deve sempre incluir (ou ao menos considerar)</p><p>intervenções sociais, escolares, familiares e individuais. Outras</p><p>importantes considerações na avaliação e no tratamento de crianças e</p><p>adolescentes são:</p><p>1. A infância e a adolescência são períodos críticos do</p><p>desenvolvimento e, por isso, de maior vulnerabilidade ao</p><p>stress. Experiências adversas precoces podem</p><p>comprometer o desenvolvimento do indivíduo de modo</p><p>significativo, com potencial de dano maior e mais</p><p>duradouro.</p><p>2. A taxa de concordância entre cuidadores e</p><p>crianças/adolescentes em relação a sintomas</p><p>internalizantes é muito baixa. Assim,</p><p>a avaliação não deve</p><p>se basear apenas no relato do adulto, mesmo no caso de</p><p>crianças em idade pré-escolar.</p><p>3. Crianças e adolescentes apresentam menor repertório</p><p>verbal que os adultos, menor capacidade de regulação</p><p>afetiva e habilidades cognitivas e perceptuais menos</p><p>desenvolvidas. A avaliação e o tratamento devem</p><p>considerar a idade e estágio de desenvolvimento do</p><p>paciente.</p><p>4. A procura pelo tratamento normalmente depende do</p><p>adulto responsável pela criança ou pelo adolescente.</p><p>Assim, o vínculo do terapeuta com o cuidador é tão</p><p>importante quanto com o paciente.</p><p>5. Os pais/cuidadores têm uma função protetora contra o</p><p>stress traumático em crianças e adolescentes. Em muitos</p><p>casos, contudo, os cuidadores podem não conseguir</p><p>exercer essa função protetora por algum motivo (como no</p><p>caso de mães deprimidas) ou podem se mostrar resistentes</p><p>ou incapazes de colaborar com o tratamento.</p><p>6. A criança e o adolescente são parte do sistema familiar e</p><p>seus sintomas podem influenciá-lo e ser influenciados por</p><p>ele. Assim, é importante pesquisar o status e o histórico</p><p>desse sistema e de seus membros.</p><p>As crianças diferem dos adultos nas características</p><p>farmacocinéticas e farmacodinâmicas. Em geral, a taxa de absorção das</p><p>medicações nas crianças é mais rápida que a dos adultos, assim como o</p><p>metabolismo hepático (em média, duas vezes mais rápido em crianças</p><p>entre 6 e 10 anos), que se equipara ao dos adultos na adolescência, a</p><p>partir dos 15 anos, e a filtração glomerular (excreção renal, principal via</p><p>de eliminação dos fármacos). Assim, crianças menores tendem a</p><p>necessitar de doses relativamente maiores (em termos de mg/kg/dia)</p><p>que adultos. As particularidades farmacodinâmicas, como, por exemplo,</p><p>o estágio de maturação das vias neuronais, também podem ser</p><p>responsáveis por diferenças entre crianças e adultos na resposta às</p><p>medicações (Andrade, Boarati e Fu-I 2011).</p><p>Farmacologia dos</p><p>transtornos relacionados</p><p>ao trauma em crianças e</p><p>adolescentes</p><p>Intervenções farmacológicas precoces</p><p>Os dados existentes na literatura são insuficientes para apoiar o uso</p><p>preventivo (ou seja, na ausência sintomas significativos) de qualquer</p><p>medicamento em adultos, crianças ou adolescentes expostos a um</p><p>evento potencialmente traumático, assim como para o tratamento</p><p>precoce dos quadros relacionados, ou seja, para os casos de TSA e Tept</p><p>agudos (duração inferior a um mês) (Shalev et al. 2012). No entanto,</p><p>intervenções farmacológicas podem ser adequadamente indicadas em</p><p>certos casos, como, por exemplo, quando não se consegue um controle</p><p>dos sintomas de excitação/hipervigilância e dos distúrbios do sono</p><p>apenas com as intervenções psicológicas e a higiene do sono. Também</p><p>se pode considerar a indicação de tratamento medicamentoso para</p><p>indivíduos com antecedente psiquiátrico que manifestem um padrão</p><p>progressivo de sintomas clinicamente significativos (ACPMH 2013).</p><p>Intervenções farmacológicas no Tept</p><p>O tratamento psicoterápico do Tept infantil conta com estratégias</p><p>específicas e com eficácia demonstrada em diversos estudos, ao passo</p><p>que o tratamento farmacológico atualmente disponível não é nem</p><p>específico nem efetivo (Gerson e Rappaport 2013; Cohen, Scheid e</p><p>Gerson 2014).</p><p>Medicamentos de diferentes classes têm sido testados, contudo os</p><p>estudos que avaliaram seu uso em crianças e adolescentes são escassos</p><p>e pouco animadores: em geral, os resultados foram negativos ou</p><p>inconclusivos (ACPMH 2013; Gerson e Rappaport 2013; Gentile 2014).</p><p>É importante ressaltar que o Tept é um transtorno heterogêneo, com</p><p>apresentações clínicas bastante variadas. Os estudos realizados – tanto</p><p>em adultos quanto em crianças e adolescentes – não discriminam os</p><p>diversos perfis clínicos do Tept ao avaliar a eficácia dos tratamentos, e</p><p>existe a possibilidade de indivíduos com quadros clínicos distintos</p><p>responderem a um determinado tratamento de forma diferente. Além</p><p>disso, é frequente observarmos taxas de resposta ao placebo</p><p>relativamente altas, o que tende a diminuir o impacto do tratamento</p><p>ativo (ACPMH 2013). Esses fatores, entre outros, podem limitar a</p><p>interpretação dos resultados de tais estudos.</p><p>Considerados tratamentos de primeira linha para o Tept em adultos,</p><p>os antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina</p><p>(ISRS) são de uso limitado no Tept em crianças e adolescentes. Apenas</p><p>a sertralina e a fluoxetina foram testadas em ensaios clínicos</p><p>controlados nessa população (Robb et al. 2010; Cohen et al. 2007;</p><p>Robert et al. 2008), e não se mostraram mais eficazes que o placebo.</p><p>Por exemplo, Robb et al. (2010) avaliaram a eficácia da sertralina (50-</p><p>200 mg/d) em comparação ao placebo em 129 crianças e adolescentes</p><p>(6-17 anos) com Tept, vítimas de traumas variados, e não encontraram</p><p>diferenças significativas entre os grupos em relação aos sintomas de</p><p>Tept, aos sintomas depressivos e à qualidade de vida após dez semanas</p><p>de tratamento. Em outro estudo, Cohen et al. (2007) compararam a</p><p>associação de terapia cognitivo-comportamental (TCC) e sertralina</p><p>versus TCC e placebo em 24 indivíduos entre 10 e 17 anos vítimas de</p><p>abuso sexual e diagnóstico de Tept, sem um resultado conclusivo. Os</p><p>dois grupos apresentaram melhora comparável nos escores de</p><p>depressão, ansiedade, problemas de comportamento e na avaliação</p><p>parental, embora o grupo com a sertralina tenha apresentado uma</p><p>discreta vantagem, a interpretação desse dado não foi possível pelo</p><p>tamanho reduzido da amostra. No estudo de Robert et al. (2008) com</p><p>crianças e adolescentes (4 a 18 anos) vítimas de queimaduras que</p><p>desenvolveram Tept, a administração de fluoxetina (5 a 20 mg/d) e</p><p>imipramina (1 mg/kg) não foi mais eficaz que a do placebo. No entanto,</p><p>a duração muito curta do estudo (somente uma semana, tempo</p><p>insuficiente para que os efeitos terapêuticos dos antidepressivos sejam</p><p>observados) e a alta taxa de resposta ao placebo (55%) limitaram a</p><p>interpretação dos resultados. O citalopram foi eficaz em ensaios abertos,</p><p>mas não foi testado em estudos controlados.</p><p>Os antidepressivos tricíclicos (ATCs), como a imipramina, foram</p><p>usados com algum sucesso no tratamento do Tept em adultos no</p><p>passado, mas atualmente são menos prescritos, em virtude do perfil</p><p>desfavorável de efeitos adversos e dos riscos em overdose. Outros</p><p>antidepressivos apresentam dados limitados (nefazodona) ou</p><p>inconclusivos (inibidores da monoamina oxidase) ou não foram</p><p>estudados (inibidores de recaptação de noradrenalina e serotonina –</p><p>IRNS, bupropiona) (Strawn et al. 2010).</p><p>O uso de benzodiazepínicos não é recomendado. Além dos riscos</p><p>relacionados ao seu potencial de abuso e dependência, os</p><p>benzodiazepínicos (diazepam, alprazolam, clonazepam e lorazepam)</p><p>estão associados a maior risco de desinibição do comportamento em</p><p>crianças e adolescentes e seu uso no tratamento do Tept nessa população</p><p>não foi estudado (Gerson e Rappaport 2013).</p><p>Os antipsicóticos atípicos (como a olanzapina, a quetiapina e a</p><p>risperidona) são muitas vezes usados para tratar sintomas ansiosos,</p><p>instabilidade emocional, agressividade e sintomas psicóticos associados</p><p>ao Tept. Alguns estudos controlados em adultos têm demonstrado</p><p>resultados promissores; os dados disponíveis sobre seu uso para o Tept</p><p>em crianças e adolescentes, embora positivos, são escassos e baseados</p><p>em relatos de caso e estudos abertos (ibid.). Os estudos sugerem que os</p><p>antipsicóticos em monoterapia podem não ser eficazes no tratamento</p><p>dos sintomas psicóticos (alucinações e delírios) associados ao Tept,</p><p>sendo necessário o tratamento combinado com alguma intervenção</p><p>psicoterápica específica (Strawn et al. 2010). Considerando a falta de</p><p>evidências de sua eficácia e o risco de efeitos colaterais significativos –</p><p>incluindo síndrome metabólica, sintomas extrapiramidais,</p><p>hiperprolactinemia, prolongamento do intervalo QT (intervalo entre a</p><p>onda Q e a onda T no eletrocardiograma) corrigido e obesidade –, o uso</p><p>de antipsicóticos atípicos não está indicado como tratamento de rotina</p><p>do Tept em crianças e adolescentes.</p><p>Agentes que atuam sobre o sistema noradrenérgico – comumente</p><p>afetado no Tept – são frequentemente</p><p>utilizados com o objetivo de</p><p>reduzir a ansiedade e a excitação em adultos, mas os dados sobre o uso</p><p>de medicações antiadrenérgicas em crianças e adolescentes são</p><p>limitados (Gerson e Rappaport 2013). Em estudos abertos, a clonidina</p><p>(agonista alfa-2 adrenérgico) e o propranolol (betabloqueador)</p><p>reduziram a hipervigilância, os sintomas relacionados à revivência do</p><p>trauma e as alterações do sono, e, em um estudo de caso, o uso de</p><p>prazosin (agonista alfa-1 adrenérgico) pareceu eficaz na redução</p><p>pesadelos (Cohen et al. 2010; Strawn et al. 2010).</p><p>Pequenos ensaios abertos demonstraram algum benefício com o uso</p><p>de estabilizadores de humor como a carbamazepina, a oxcarbazepina e</p><p>o divalproato de sódio na redução dos sintomas do Tept e na</p><p>irritabilidade associada (Strawn et al. 2010). Um estudo controlado</p><p>(Steiner et al. 2007) encontrou redução significativa nos sintomas</p><p>intrusivos, nos comportamentos de esquiva e na agressividade,</p><p>associado ao tratamento com o divalproato de sódio em 12 adolescentes</p><p>do sexo masculino; mas a generalização desses resultados é limitada</p><p>pelo tamanho reduzido da amostra.</p><p>Assim, até o momento, não existem evidências consistentes que</p><p>justifiquem a indicação de qualquer fármaco para o tratamento do Tept</p><p>em crianças e adolescentes, e a intervenção psicoterápica com foco no</p><p>trauma é o tratamento de primeira escolha (ACPMH 2013; Gerson e</p><p>Rappaport 2013; Cohen, Scheid e Gerson 2014; Gentile 2014). No</p><p>entanto, o tratamento medicamentoso pode estar indicado, por exemplo,</p><p>para o manejo de determinados sintomas (como distúrbios do sono), nos</p><p>casos em que o tratamento psicoterápico não está disponível ou não é</p><p>suficiente e nos casos com comorbidades psiquiátricas (ACPMH 2013).</p><p>Tratamento do Tept associado a comorbidades</p><p>O Tept está frequentemente associado a outros transtornos</p><p>psiquiátricos, incluindo quadros internalizantes e externalizantes</p><p>(ACPMH 2013).</p><p>Nas crianças em idade pré-escolar, a comorbidade é comum. Pré-</p><p>escolares com diagnóstico de Tept após a passagem do furacão Katrina</p><p>(Scheeringa e Zeanah 2008), apresentaram as seguintes taxas de</p><p>comorbidade: 61% para transtorno desafiador opositivo (TDO), 21%</p><p>para transtorno de ansiedade de separação (TAS), 33% para transtorno</p><p>do deficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e 43% para transtorno</p><p>depressivo maior (TDM). O Tept em pré-escolares vítimas de</p><p>queimaduras também esteve associado à comorbidade com TDM, TDO,</p><p>TDAH, TAS e fobia específica (De Young et al. 2012).</p><p>Nas crianças maiores, o Tept é comumente visto em comorbidade</p><p>com outros transtornos de ansiedade, transtornos do humor</p><p>(principalmente TDM) e TDAH (Davis e Siegel 2000). Ideação suicida</p><p>e transtornos relacionados ao uso de substâncias (TUS) são menos</p><p>frequentes em crianças com Tept, mas comuns em adolescentes (Davis e</p><p>Siegel 2000; Reed, Anthony e Breslau 2007).</p><p>Em um dos maiores estudos de adolescentes sobreviventes de um</p><p>desastre avaliados de cinco a oito anos após o evento, foram</p><p>identificados diversos transtornos psiquiátricos, a maioria em</p><p>comorbidade com o Tept (Bolton et al. 2000). Mais de 40% da amostra</p><p>apresentou critérios para um transtorno de ansiedade, sendo: 24% fobia</p><p>específica, 12% transtorno de pânico, 7% TAS e 6% transtorno de</p><p>ansiedade generalizada (TAG). Da amostra, 38% dos envolvidos</p><p>preencheram critérios para um transtorno afetivo, sendo 34% TDM. O</p><p>risco para qualquer transtorno ansioso – com exceção do TAG – e</p><p>afetivo foi significativamente maior entre os adolescentes avaliados</p><p>quando comparado aos controles. Contudo, no subgrupo de</p><p>sobreviventes sem diagnóstico de Tept, as taxas de prevalência de tais</p><p>transtornos foram semelhante às observadas nos controles.</p><p>Comportamentos de risco, como fugas de casa, automutilação e uso</p><p>de substâncias, também estão associados ao Tept em adolescentes</p><p>(Mueser e Taub 2008).</p><p>Embora diversos estudos tenham avaliado a eficácia de tratamentos</p><p>em indivíduos com Tept e outros transtornos comórbidos, pouco se sabe</p><p>a respeito da sequência temporal mais adequada para a implementação</p><p>de cada tratamento (ACPMH 2013). Nos casos de comorbidade com</p><p>quadros de depressão leve a moderada, o tratamento eficaz do Tept está</p><p>associado à melhora dos sintomas depressivos (ibid.). Assim, quando</p><p>disponível, o tratamento do Tept deve ser considerado antes do</p><p>tratamento da depressão. No entanto, nos casos de depressão grave, em</p><p>que a aderência à abordagem psicoterápica está prejudicada ou existe</p><p>risco de suicídio, o tratamento antidepressivo e outras medidas</p><p>específicas devem ser priorizados.</p><p>Com relação ao Tept em comorbidade com TUS, o tratamento</p><p>concomitante das duas patologias parece ser mais eficaz do que o</p><p>tratamento isolado de cada uma (ibid.). Se, por um lado, a angústia</p><p>desencadeada pelo enfrentamento das lembranças traumáticas durante o</p><p>tratamento do Tept pode favorecer as recaídas, por outro, os sintomas de</p><p>abstinência e o repertório restrito de estratégias de enfrentamento</p><p>comumente observado nos TUS podem piorar os sintomas do Tept.</p><p>A psicofarmacologia na</p><p>infância e na adolescência</p><p>A identificação dos transtornos psiquiátricos na infância e na</p><p>adolescência e seu tratamento vêm ganhando destaque progressivo na</p><p>literatura científica, mas os estudos de eficácia e segurança dos</p><p>psicofármacos nessa população ainda são, na maioria dos casos,</p><p>insuficientes. Poucas são as medicações formalmente aprovadas, o que</p><p>em geral se deve à escassez de dados e não à comprovação de</p><p>ineficácia. Infelizmente, na prática clínica, muitos pacientes não</p><p>respondem às medicações aprovadas, ainda não têm a idade mínima</p><p>para a qual foram aprovadas ou, pior, apresentam um transtorno para o</p><p>qual nenhuma medicação foi aprovada até o momento. Assim, é preciso</p><p>ter em mente que grande parte dos psicofármacos é usada na psiquiatria</p><p>infantil de modo off label.</p><p>Antidepressivos tricíclicos</p><p>Doses baixas de ATCs (25-75 mg/d de imipramina) podem ser</p><p>usadas no tratamento da enurese moderada, embora se deva dar</p><p>preferência às abordagens comportamentais e ao uso de fármacos mais</p><p>específicos (desmopressina e oxibutinina) na maioria dos casos.</p><p>Também podem ser úteis no tratamento do TDAH, quando o uso de</p><p>psicoestimulantes estiver contraindicado ou não se mostrar eficaz.</p><p>Embora ainda controversas, existem algumas evidências de que a</p><p>imipramina possa facilitar o retorno à escola em crianças e adolescentes</p><p>que apresentem recusa escolar (Gentile 2014).</p><p>A clomipramina tem se mostrado eficaz no tratamento do transtorno</p><p>obsessivo compulsivo (TOC) e é aprovada pela agência norte-americana</p><p>Food and Drug Administration (FDA) em crianças a partir dos 10 anos,</p><p>em doses de até 200 mg/d.</p><p>A literatura não sustenta o uso de ATCs para o tratamento de outros</p><p>quadros de ansiedade e da depressão em crianças e adolescentes</p><p>(Goodman e Scott 2012).</p><p>Em doses baixas, os ATCs tendem a ser bem-tolerados, mas, em</p><p>doses mais elevadas, são comuns efeitos adversos como boca seca,</p><p>cefaleia e sonolência. Eventos adversos mais graves incluem convulsões</p><p>(pela diminuição do limiar convulsivo; maior risco em doses elevadas e</p><p>em indivíduos predispostos), arritmias cardíacas e morte súbita, sendo</p><p>importante avaliar antecedentes pessoais e familiares dessas condições.</p><p>Recomenda-se a avaliação eletrocardiográfica antes do tratamento para</p><p>avaliar distúrbios preexistentes de condução cardíaca e nos aumentos de</p><p>dose subsequentes, para monitoramento.</p><p>Inibidores seletivos da recaptação da serotonina</p><p>A prescrição dos ATCs vem sendo substituída pela dos ISRSs, que</p><p>apresentam um perfil de efeitos adversos mais favorável e são</p><p>relativamente mais seguros em overdose.</p><p>A fluoxetina (10-20 mg/d) é o único antidepressivo aprovado pela</p><p>FDA para o tratamento do TDM em crianças (a partir dos 8 anos). A</p><p>superioridade da fluoxetina em relação ao placebo é mais evidente no</p><p>tratamento da depressão grave, sendo seus benefícios menos</p><p>expressivos nos casos com sintomas leves a moderados. O escitalopram</p><p>(10-20 mg/d) é aprovado para o tratamento do TDM nos pacientes a</p><p>partir dos 12 anos de idade. Para os outros ISRSs,</p><p>os resultados dos</p><p>ensaios clínicos ainda são insuficientes.</p><p>A fluoxetina em combinação com a olanzapina (antipsicótico</p><p>atípico) também é aprovada no tratamento da depressão bipolar em</p><p>crianças e adolescentes (a partir de 10 anos). A segurança dessa</p><p>associação em doses acima de 12 mg de olanzapina e 50 mg de</p><p>fluoxetina não foi avaliada em estudos clínicos pediátricos.</p><p>Os ISRSs são os psicofármacos de primeira escolha nos transtornos</p><p>ansiosos, mas, até o momento, muito embora se mostrem bastante úteis</p><p>na prática clínica, seu uso nessa população é aprovado apenas para</p><p>tratamento do TOC.</p><p>Os ISRSs têm eficácia comprovada no tratamento do TOC em</p><p>crianças e adolescentes. Dentre eles, são aprovadas pela FDA a</p><p>sertralina (50-200 mg/d) a partir dos 6 anos, a fluoxetina (20-60 mg/d) a</p><p>partir dos 7 anos e a fluvoxamina (50-300 mg/d) a partir dos 8 anos,</p><p>embora existam evidências de que outros ISRSs (como a paroxetina, o</p><p>citalopram e o escitalopram) sejam também eficazes, e seu uso off label</p><p>seja bastante frequente (Aacap 2007).</p><p>Em relação aos outros transtornos ansiosos, existem evidências de</p><p>eficácia dos ISRSs na literatura apenas no tratamento de TAS, TAG e</p><p>fobia social. Para os demais, os dados são muito limitados.</p><p>No Child/Adolescent Anxiety Multimodal Study (Walkup, Albano e</p><p>Piacentini 2008), foram comparadas as eficácias da sertralina e da TCC</p><p>em monoterapia e do tratamento combinado em 488 crianças e</p><p>adolescentes (7 a 17 anos) com diagnóstico de TAS, TAG ou fobia</p><p>social. A sertralina (SER) e a TCC foram igualmente eficazes e</p><p>superiores ao placebo na redução dos sintomas, mas o tratamento</p><p>combinado (Comb) apresentou maior taxa de resposta. Os benefícios</p><p>obtidos no tratamento agudo (12 semanas) foram mantidos no</p><p>seguimento de 24 e 36 semanas (Piacentini et al. 2014), com o mesmo</p><p>padrão observado inicialmente (Comb > SER = TCC).</p><p>Em um estudo controlado com crianças e adolescentes (7 a 17 anos)</p><p>com fobia social (Beidel et al. 2007), tanto a fluoxetina quanto a terapia</p><p>de eficácia social para crianças (SET-C) se mostraram mais eficazes que</p><p>o placebo, embora a SET-C tenha demonstrado uma pequena vantagem</p><p>no que diz respeito à melhora das habilidades sociais.</p><p>Um estudo controlado (Birmaher et al. 2003) encontrou benefícios</p><p>com a fluoxetina no tratamento de curto prazo de crianças e</p><p>adolescentes (7-17 anos) com transtornos de ansiedade variados (mais</p><p>frequentemente, TAG).</p><p>A fluvoxamina se mostrou eficaz no tratamento de crianças e</p><p>adolescentes com fobia social, TAS ou TAG que não haviam</p><p>apresentado resposta ao tratamento psicológico (Walkup et al. 2001). O</p><p>estudo incluiu 128 indivíduos entre 6 e 17 anos, randomizados para</p><p>receber fluvoxamina (até 300 mg/d) ou placebo por oito semanas.</p><p>Os efeitos colaterais mais comuns dos ISRSs incluem sintomas</p><p>gastrointestinais, náuseas, insônia e cefaleia. Reações de “ativação” são</p><p>relativamente comuns (10-15%) no início do tratamento e após</p><p>aumentos de dose, principalmente em crianças menores. Embora seja</p><p>importante considerar a possibilidade de um diagnóstico de transtorno</p><p>bipolar (TB), especialmente em crianças mais velhas e nos</p><p>adolescentes, as “viradas maníacas” são incomuns nessa população (</p><p>sendo importante pesar tais riscos em pacientes que</p><p>demandem tratamento de longo prazo.</p><p>Psicoestimulantes</p><p>O uso de psicoestimulantes no TDAH é considerado um dos</p><p>tratamentos mais bem-estabelecidos na psiquiatria. No Brasil, apenas o</p><p>metilfenidato (Ritalina®, Ritalina® LA e Concerta®) e a</p><p>lisdexanfetamina (Venvanse®) estão disponíveis.</p><p>Os estimulantes atuam nos sistemas noradrenérgicos e</p><p>dopaminérgicos, produzindo melhora nos sintomas centrais do TDAH</p><p>(desatenção, inquietação e impulsividade), além de melhora na</p><p>motivação, na coordenação motora, na habilidade visomotora, no</p><p>aprendizado de curto prazo e na habilidade de convivência social (The</p><p>MTA Cooperative Group 1999).</p><p>Os principais efeitos adversos associados aos estimulantes são:</p><p>inapetência, insônia, cefaleia, ansiedade, irritabilidade, xerostomia,</p><p>náuseas e dores abdominais. Em geral, surgem nos primeiros dias do</p><p>tratamento ou após um aumento da dose, são de leve a moderada</p><p>intensidade e tendem a melhorar espontaneamente com o tempo de uso</p><p>ou com a redução da dose. Alguns jovens apresentam um efeito</p><p>“rebote” (piora dos sintomas do TDAH) ao término do efeito da</p><p>medicação, que tende a melhorar com a troca por apresentações de</p><p>liberação prolongada. A possibilidade de um impacto negativo dos</p><p>psicoestimulantes no crescimento ainda é controversa, mas se</p><p>recomenda monitorar o ganho ponderal e de estatura a cada seis meses.</p><p>É importante avaliar o risco de problemas cardiovasculares antes de</p><p>iniciar o tratamento e, na presença de fatores de risco pessoal ou</p><p>familiar de doença cardíaca (como antecedente de síncope, casos de</p><p>cardiopatia ou morte súbita na família) ou alterações no exame</p><p>cardiovascular, é recomendada a avaliação cardiológica. A piora de</p><p>tiques tem sido descrita com o uso de psicoestimulantes, mas não</p><p>contraindica o tratamento. Não existem evidências de que o uso de</p><p>psicoestimulantes aumente o uso de drogas; em pacientes com TUS,</p><p>recomenda-se o uso das formulações de liberação prolongada, menos</p><p>sujeitas a abuso (Cortese et al. 2013).</p><p>Lítio</p><p>Amplamente utilizado para o tratamento das diferentes fases agudas</p><p>e profilaxia do TB em adultos, a literatura sugere – embora não conclua</p><p>– que o lítio tenha eficácia semelhante em crianças e adolescentes</p><p>(Pavuluri et al. 2004; Kowatch et al. 2005; Patel et al. 2006; Findling et</p><p>al. 2008). O lítio também pode ser usado para o controle da</p><p>impulsividade e de crises de agressividade que não apresentaram</p><p>resposta à abordagem psicológica (Gerlach, Baving e Fegert 2006).</p><p>Atualmente, o lítio é aprovado para uso acima dos 12 anos.</p><p>Os principais efeitos colaterais associados ao lítio são: diarreia,</p><p>náuseas, sedação, tremores, poliúria, polidipsia, ganho de peso,</p><p>alterações renais e tireoidianas e acne. Recomenda-se manter níveis</p><p>plasmáticos entre 0,7-1,0 mEq/L; sintomas neurológicos mais graves</p><p>podem ocorrer em níveis séricos superiores a 3,0 mEq/L, sendo</p><p>fundamental o controle sérico periódico da medicação. Os sinais</p><p>precoces de toxicidade mais comuns são tremor grosseiro, sintomas</p><p>gastrointestinais persistentes e confusão mental leve (Goodman e Scott</p><p>2012).</p><p>Anticonvulsivantes</p><p>Embora o perfil de efeitos adversos e segurança dos</p><p>anticonvulsivantes em crianças e adolescentes seja bastante conhecido,</p><p>tais dados provêm de estudos de tratamento da epilepsia. Em</p><p>psiquiatria, os anticonvulsivantes têm sido usados no TB como</p><p>estabilizadores de humor e no manejo de agitação, irritabilidade,</p><p>agressividade e impulsividade em diferentes transtornos.</p><p>O divalproato de sódio tem eficácia comprovada no TB em adultos</p><p>e existem evidências de que seja também eficaz em crianças e</p><p>adolescentes (Andrade, Boarati e Fu-I 2011; Goodman e Scott 2012).</p><p>Os efeitos adversos mais comuns são aumento de peso, sedação, queda</p><p>de cabelo, ovários micropolicísticos e quadros com maior gravidade,</p><p>como discrasias sanguíneas, hepatotoxicidade e pancreatite. A</p><p>exposição fetal ao divalproato de sódio está associada a defeitos do tubo</p><p>neural e a deficit cognitivo futuro, sendo importante considerar a</p><p>possibilidade de gravidez nas adolescentes antes da sua introdução e</p><p>durante o tratamento.</p><p>Existem alguns estudos sugerindo a eficácia da carbamazepina nos</p><p>quadros agudos de mania e mistos do TB, mas não na depressão e na</p><p>manutenção, sendo considerada de segunda escolha no tratamento do</p><p>TB em crianças e adolescentes (Andrade, Boarati e Fu-I 2011). Os</p><p>efeitos adversos mais comuns são: tontura, sonolência, náuseas, ataxia e</p><p>tremores. Efeitos adversos mais graves: síndrome de Stevens-Johnson,</p><p>necrólise epidérmica tóxica, discrasias sanguíneas, arritmias,</p><p>hepatotoxicidade, hiponatremia e pancreatite. A exposição fetal à</p><p>carbamazepina está associada a malformações, especialmente defeitos</p><p>do tubo neural, sendo importante considerar a possibilidade de gravidez</p><p>nas adolescentes antes da sua introdução e durante o tratamento.</p><p>A lamotrigina é aprovada para o tratamento da epilepsia acima de</p><p>13 anos, mas alguns estudos apontam para a possibilidade de indicação</p><p>na depressão bipolar, como já ocorre no TB em adultos (Andrade,</p><p>Boarati e Fu-I 2011). Os efeitos adversos mais comuns são: tontura,</p><p>cefaleia, ataxia, náuseas, distúrbios visuais, sintomas gastrointestinais,</p><p>fotossensibilidade, sonolência/insônia e tremores. Contudo, efeitos</p><p>adversos mais graves incluem rash cutâneo e síndrome de Stevens-</p><p>Johnson, discrasias sanguíneas e hepatotoxicidade. A exposição fetal à</p><p>lamotrigina no primeiro trimestre da gestação foi associada à</p><p>malformação de lábio e palato, sendo também importante considerar a</p><p>possibilidade de gravidez nas adolescentes antes da sua introdução e</p><p>durante o tratamento.</p><p>Benzodiazepínicos</p><p>Embora comumente prescritos para crianças e adolescentes, seu uso</p><p>está entre os menos justificados (Goodman e Scott 2012), tanto pela</p><p>falta de evidência de eficácia quanto pelo potencial de desinibição</p><p>comportamental e dependência. Pontualmente, os benzodiazepínicos</p><p>podem ser úteis no manejo da ansiedade em situações específicas, como</p><p>antes de um procedimento médico ou odontológico.</p><p>Conclusão</p><p>Ao longo de seu desenvolvimento, as crianças enfrentarão,</p><p>inevitavelmente, muitos desafios previsíveis (como o primeiro dia de</p><p>aula) e imprevisíveis (como a perda de um ente querido). Esses desafios</p><p>dão à criança a oportunidade de aprender a lidar com o stress, regular</p><p>suas próprias emoções e desenvolver recursos sociais, comportamentais</p><p>e cognitivos de adaptação, necessários para superar os obstáculos. A</p><p>presença de cuidadores sensíveis e responsivos pode ajudar a criança a</p><p>adquirir as ferramentas necessárias para lidar com o stress de forma</p><p>saudável.</p><p>A infância e a adolescência constituem períodos de maior</p><p>vulnerabilidade, e a exposição precoce a experiências adversas pode</p><p>levar à desregulação do sistema de resposta ao stress e alterar a</p><p>arquitetura do cérebro em desenvolvimento, predispondo a dificuldades</p><p>de aprendizagem e problemas de saúde física e mental no curto e no</p><p>longo prazo.</p><p>A relação entre o stress e os transtornos psiquiátricos é bidirecional:</p><p>o stress é fator de risco para diversos transtornos psiquiátricos e os</p><p>transtornos psiquiátricos estão associados a níveis significativos de</p><p>stress. Assim, o tratamento do stress em crianças e adolescentes muitas</p><p>vezes envolve a identificação e o manejo de transtornos psiquiátricos</p><p>concomitantes. O tratamento farmacológico é apenas parte da</p><p>abordagem terapêutica, que deve incluir intervenções sociais, escolares,</p><p>familiares e individuais.</p><p>Embora se mostrem úteis e sejam amplamente utilizados no</p><p>tratamento dos diversos transtornos psiquiátricos na infância e</p><p>adolescência, boa parte dos psicofármacos carece de estudos de eficácia</p><p>e segurança nessa população. Assim, é importante que o</p><p>acompanhamento seja feito por profissional especializado, que realize</p><p>uma avaliação clínica criteriosa e esteja atento para os riscos</p><p>envolvidos.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>AACAP – AMERICAN ACADEMY OF CHILD AND ADOLESCENT PSYCHIATRY (2007).</p><p>“Practice parameter for the assessment and treatment of children and adolescents</p><p>with</p><p>anxiety disorders”. J. Am. Acad. Child Adolesc. 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A ansiedade se</p><p>manifesta por um estado de inquietação que pode ir aumentando</p><p>progressivamente e é, em geral, acompanhada de uma sensação de</p><p>perigo iminente, que parece ameaçar a segurança da criança.</p><p>Nas situações de ansiedade, ela pode experimentar (assim como o</p><p>adulto) um sentimento de antecipação, de expectativa de um perigo, que</p><p>poderá ocorrer a qualquer momento, porém, muitas vezes, existe um</p><p>desconhecimento da fonte desse perigo.</p><p>A ansiedade, geralmente, se manifesta por agitação, irritabilidade</p><p>generalizada e crises de agressividade. No caso de ser muito intensa,</p><p>interfere na tranquilidade e no equilíbrio emocional.</p><p>Várias são as situações que desencadeiam ansiedade nas crianças,</p><p>porém convém salientar as mais frequentes:</p><p>• A primeira está relacionada ao sentimento de desamparo,</p><p>quando a criança se sente desprotegida e precisa enfrentar</p><p>uma situação que vai além daquilo que pode tolerar.</p><p>Existem situações que as crianças podem superar com</p><p>tranquilidade, mas nem sempre o que é mais estressante</p><p>para uma o é para outra. Há crianças que sentem apenas</p><p>uma ligeira sensação de opressão, há outras mais</p><p>vulneráveis ao stress, que chegam a apresentar quadros de</p><p>angústia. A angústia se manifesta por uma sensação de</p><p>pressão tão intensa que a criança fica com dificuldade de</p><p>enfrentar a situação ameaçadora. Nesses casos, os</p><p>sintomas são semelhantes aos do adulto, ou seja, vômitos,</p><p>dores de cabeça, diarreias, falta de ar, tristeza excessiva,</p><p>inibição da manifestação das emoções, bloqueios com</p><p>paralização motora etc.</p><p>• Outra fonte comum de ansiedade que as crianças</p><p>apresentam ocorre quando reprimem sentimentos de</p><p>hostilidade. No que se refere à angústia, uma das causas</p><p>mais frequentes é a agressividade reprimida, experienciada</p><p>em relação a quem quer que seja: pais, professores ou</p><p>outras pessoas. De qualquer maneira, é importante</p><p>resolver o problema que desencadeia a angústia, para que</p><p>ela não se torne crônica e, mais tarde, na puberdade, venha</p><p>a se manifestar como uma neurose de angústia. É</p><p>importante dizer que pequenas manifestações de</p><p>ansiedade, quando solucionadas satisfatoriamente, são</p><p>como vacinas que imunizam, preparando as crianças para</p><p>a vida e tornando-as menos vulneráveis ao stress.</p><p>Outras fontes</p><p>Outras causas internas de stress infantil são o desejo de agradar a</p><p>todos, principalmente aos colegas; o medo de não ser bem-sucedido,</p><p>preocupação com as mudanças físicas que estão ocorrendo, crenças</p><p>religiosas que envolvem punição divina, dúvidas quanto à própria</p><p>inteligência e interpretações amedrontadoras de eventos comuns.</p><p>Diagnóstico do stress</p><p>infantil: Sintomas de</p><p>stress</p><p>O diagnóstico do stress infantil deve ser realizado por um psicólogo</p><p>que trabalhe com stress e que, dependendo da idade da criança ou do</p><p>adolescente, aplicará a Escala de Stress Infantil (ESI), de Lipp e</p><p>Lucarelli (1998), ou a Escala de Stress para Adolescentes (ESA), de</p><p>Tricoli e Lipp (2003), e verificará se a criança tem stress; se tiver, em</p><p>que fase do stress ela se encontra e qual a maior vulnerabilidade que ela</p><p>apresenta para o desenvolvimento de sintomas. Porém, é importante que</p><p>os adultos responsáveis pela criança passem a reconhecer os sintomas, a</p><p>fim de tentar reduzi-los no dia a dia.</p><p>A maioria das crianças reage ao stress com sintomas imediatos,</p><p>como birras, hiperatividade, enurese e medos excessivos. Os pais, em</p><p>geral, rapidamente percebem que o stress é demasiado e imediatamente</p><p>tentam diminuir a tensão à qual o filho está sujeito. Tudo isso</p><p>normalmente é feito de modo intuitivo, sem os pais sequer saberem que</p><p>estão lidando com o fenômeno “stress”. No entanto, quando a tensão é</p><p>grande ou quando os adultos deixam de entender os sintomas da</p><p>criança, a situação pode assumir proporções preocupantes. Nesses</p><p>casos, os danos emocionais e físicos podem ocorrer e se manter por</p><p>longos períodos de tempo.</p><p>Em razão do fato de que a resposta de stress se desenvolve ao longo</p><p>do tempo, dando origem a um enfraquecimento gradual do organismo,</p><p>os sintomas se agravam com o passar do tempo. De início, os sintomas</p><p>são bastante semelhantes nos adultos e nas crianças, com taquicardia,</p><p>sudorese excessiva, tensão muscular, boca seca e sensação de alerta.</p><p>Esses sintomas desaparecem quando o estressor é eliminado ou quando</p><p>a criança consegue lidar adequadamente com o que está ocorrendo.</p><p>Os sintomas de stress mais prevalentes em crianças são:</p><p>aparecimento súbito de comportamentos agressivos não representativos</p><p>do comportamento da criança no geral; desobediência inusitada;</p><p>depressão; ansiedade; choro excessivo; enurese; gagueira; dificuldades</p><p>de relacionamento; dificuldades escolares; pesadelos; insônia; birras; e</p><p>até o uso indevido de tóxicos pelo adolescente. Dentre os problemas</p><p>físicos relacionados ao stress, encontram-se: asma; bronquite;</p><p>hiperatividade motora; doenças dermatológicas; úlceras; obesidade;</p><p>cárie; cefaleia; dores abdominais; diarreia; tiques nervosos, entre outros.</p><p>É importante ressaltar que nenhum desses sintomas ou problemas,</p><p>isolado, pode ser interpretado como sinal de stress. O que deve servir</p><p>como base para o diagnóstico do stress infantil é um conglomerado de</p><p>sintomas.</p><p>Os sintomas de stress infantil não são sempre diagnosticados, e pais</p><p>e professores menos avisados tendem a se irritar com a criança que</p><p>mostra mudanças súbitas de comportamento ou queda no rendimento</p><p>escolar. A atitude dos adultos, de cobrança em situações como essa,</p><p>tende a agravar o quadro, pois se torna mais uma fonte de stress para a</p><p>criança, já confusa e estressada, sem entender o que se passa no seu</p><p>organismo.</p><p>Quando a criança está estressada, é sempre aconselhável que se</p><p>faça todo o possível para diminuir a pressão exercida sobre ela. Porém,</p><p>é importante que rotineiramente ela não seja poupada em demasia, pois</p><p>quem é muito protegido não desenvolve imunidade ao stress. Os</p><p>desafios e batalhas devem ser proporcionais à idade e ao</p><p>amadurecimento. Quando não for possível protegê-la do stress</p><p>excessivo (como no caso de morte na família, mudança de cidade etc.),</p><p>torna-se necessário fortalecê-la para lidar com a situação do melhor</p><p>modo possível.</p><p>Os sintomas podem ocorrer no campo psicológico, no campo físico</p><p>ou em ambos. As manifestações vão depender da fase de stress em que a</p><p>criança esteja. Os sinais mais fáceis de serem identificados são: mãos</p><p>frias e suadas; taquicardia; azia; falta de apetite; dores de barriga e de</p><p>cabeça, e outros menos aparentes. O Quadro 2 relaciona os mais</p><p>frequentes.</p><p>Quadro 2. Sintomas de stress em crianças</p><p>Sintomas psicológicos Sintomas físicos</p><p>Terror noturno Dor de barriga</p><p>Introversão súbita Diarreia</p><p>Medo excessivo Tique nervoso</p><p>Agressividade ou impaciência Dor de cabeça</p><p>Choro excessivo Náuseas</p><p>Pesadelos Hiperatividade</p><p>Ansiedade Enurese noturna</p><p>Dificuldades interpessoais Gagueira</p><p>Desobediência inusitada Tensão muscular</p><p>Depressão, desânimo Ranger de dentes</p><p>Hipersensibilidade Insegurança</p><p>É necessário repetir que nenhum desses sintomas, isolado, pode ser</p><p>interpretado como comprovação de que a criança tem stress. É preciso</p><p>verificar se vários desses sintomas começam a se manifestar de repente.</p><p>Como é feito o diagnóstico</p><p>Após o contato do psicólogo com os pais, a criança comparece a</p><p>uma sessão conduzida nos moldes típicos de uma terapia</p><p>comportamental infantil, utilizando-se massa, crayons, tinta, jogos etc.,</p><p>para facilitar o estabelecimento do rapport e a expressão de</p><p>sentimentos. A seguir, é aplicada a ESI ou a ESA, a fim de se chegar a</p><p>um diagnóstico diferencial quanto ao quadro típico do stress ou não.</p><p>Sempre se mantém em mente que a presença de um quadro</p><p>sintomatológico de stress não elimina outros diagnósticos que possam</p><p>coexistir no caso. O diagnóstico diferencial é naturalmente difícil, mas a</p><p>ESI e a ESA são instrumentos validados e aprovados pelo Conselho</p><p>Federal de Psicologia e muito úteis nesse sentido. Além da ESI, no caso</p><p>de crianças, utiliza-se o roteiro para a avaliação das condições do stress</p><p>infantil, constante do Quadro 3.</p><p>Quadro 3. Avaliação do</p><p>Trauma Outreach and Prevention Study”. Archives of General</p><p>Psychiatry, 69(2), pp. 166-176.</p><p>SHONKOFF, J.P. et al. (2012). “The lifelong effects of early childhood adversity and toxic</p><p>stress”. Pediatrics, 129, pp. e232-e246.</p><p>STEINER, H. et al. (2007). “Divalproex sodium for the treatment of PTSD and conduct</p><p>disordered youth: A pilot randomized controlled clinical trial”. Child Psychiatry Hum.</p><p>Dev., 38, pp. 183-193.</p><p>STRAWN, J.R. et al. (2010). “Psychopharmacologic treatment of posttraumatic stress disorder</p><p>in children and adolescents: A review”. J. Clin. 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Um</p><p>paciente fica enfraquecido, ao passo que outro se dedica arduamente ao</p><p>trabalho, não só porque os sintomas diferem na intensidade, mas pela</p><p>força de vontade de cada um ou em razão de sua homeostase relativa.</p><p>Quando se trata um paciente, é importante saber o estado do seu Qi</p><p>(pronuncia-se “chi”). Qi é o sopro vital ou a energia que corre dentro de</p><p>nosso corpo. Todas as atividades do corpo são explicadas pela</p><p>movimentação do Qi e por suas mudanças. Ele permeia o corpo,</p><p>alcançando-o em sua plenitude. Se o movimento do Qi se interrompe, a</p><p>atividade vital do corpo cessa. Qi abundante é base de boa saúde, a</p><p>fraqueza de Qi pode levar à doença.</p><p>A base da MTC, de acordo com Sohaku (1993), é a constante</p><p>influência de estímulos externos e internos, de natureza social, genética,</p><p>psicológica, ambiental ou física, sempre enfatizando os fenômenos</p><p>precursores das alterações funcionais e orgânicas que provocam o</p><p>aparecimento de sintomas e sinais, que se inicia em razão dos processos</p><p>de desequilíbrio da energia.</p><p>O pensamento chinês, de acordo com Ross (1994), considera que o</p><p>corpo e a mente são uma estrutura única e que as características</p><p>psíquicas são fatores que direcionam ao possível diagnóstico e</p><p>tratamento com a acupuntura. Esta tem ação no físico que repercute</p><p>inevitavelmente no estado psíquico.</p><p>Existem em nosso corpo o que chamamos de “meridianos”,</p><p>denominados pela teoria chinesa de canais de energia. Eles formam uma</p><p>rede na qual os órgãos e as vísceras se conectam, recebendo e</p><p>direcionando o Qi. Quando os sistemas orgânicos apresentam qualquer</p><p>desequilíbrio (interno ou externo), os meridianos recebem maior ou</p><p>menor quantidade de Qi, conforme descrito por Maciocia (1996).</p><p>O Qi pode assumir diferentes formas em seu estado de</p><p>condensação, formando o corpo material chamado de yin. Sua forma</p><p>dispersa se move e é chamada de yang. Portanto, o Qi é a base de todos</p><p>os processos fisiológicos. Cada parte do corpo humano apresenta um</p><p>caráter, yin ou yang. Lembrando que, pelas leis do yin-yang, todo</p><p>material vivo tem a interação de yin e yang; nada é tudo um ou outro.</p><p>Esse princípio tem um caráter relativo. Por exemplo, a região torácica é</p><p>yang em relação ao abdome, mas yin em relação à cabeça. Yin-yang</p><p>representa o equilíbrio.</p><p>Figura 1. Yin-yang</p><p>Na Figura 1, o branco representa o yang e o preto, o yin, ambos em</p><p>fluxo constante no sentido horário e sempre em equilíbrio. Pode-se</p><p>notar que, onde há maior concentração do preto (yin máximo), há, no</p><p>meio, um pequeno yang, e vice-versa. Isso pode ser aplicado a vários</p><p>conceitos, como o feminino e o masculino, ou o bem e o mal. São</p><p>opostos que se complementam, não se anulam. Na medicina chinesa,</p><p>não se aceita nenhum extremo, busca-se a linha entre os dois para o</p><p>equilíbrio perfeito do corpo e da mente.</p><p>Na teoria do zang fu (que se refere aos órgãos e vísceras) da MTC,</p><p>os zangs são de qualidade yin e os fus, yang. O pulmão é um órgão yin,</p><p>porém, em relação aos zangs (yin), é o mais yang. Já o pericárdio é mais</p><p>yang em relação ao coração, porém yin em relação ao pulmão.</p><p>Segundo Xinnong (2009), a energia está sempre em movimento,</p><p>nunca estática. O seu excesso desencadeia desequilíbrio, causando</p><p>desgastes que comprometem as funções fisiológicas do organismo. Por</p><p>um período prolongado de tempo, o excesso gera uma deficiência, que</p><p>será responsável pela ocorrência de patologias.</p><p>A MTC preconiza que os processos agudos são de característica</p><p>yang e os processos crônicos são de caráter yin.</p><p>Além dos conceitos de yin-yang e zang fu, a MTC também aplica a</p><p>teoria de cinco elementos que aparecem na Figura 2, desenvolvida pela</p><p>mesma escola do yin-yang e que corresponde às leis de geração,</p><p>controle/inibição e dominância.</p><p>Os cinco elementos se sucedem infinitamente. Formam o chamado</p><p>ciclo de sheng, geração ou lei da “mãe e filho”. Nesse ciclo, o fogo</p><p>queima e gera cinzas, que dão origem à terra. A terra dá origem ao</p><p>metal, porque o contém. O metal dá origem à água, por se liquefazer. A</p><p>água dá origem à madeira, por nutri-la. E a madeira dá origem ao fogo,</p><p>por ser o seu combustível, conforme explica Maciocia (1996). A</p><p>denominação “mãe e filho” é uma alusão à mãe que alimenta o filho.</p><p>Figura 2. Os cinco elementos, ciclos de geração e</p><p>controle/inibição</p><p>De acordo com Yamamura (2001), há uma lei de controle, também</p><p>chamada de lei de inibição, ciclo Ko, ou de destruição, em que cada</p><p>elemento inibe aquele que sucede seu filho. Por exemplo, o fogo funde</p><p>o metal, o metal corta a madeira, a madeira cobre a terra, a terra absorve</p><p>a água, a água extingue o fogo.</p><p>Decorre da lei de controle/inibição a lei da dominância. A relação</p><p>entre os elementos se chama relação dominante/dominado ou, também,</p><p>regra avô/neto, porque, na cultura chinesa, o avô impõe ordem ao neto.</p><p>Para cada órgão e víscera, existe um meridiano e um elemento</p><p>correspondente: fogo – meridiano do coração, pericárdio, intestino</p><p>delgado e triplo-aquecedor; terra – estômago e baço/pâncreas; metal –</p><p>meridianos do pulmão e do intestino grosso; água – meridianos da</p><p>bexiga e do rim; madeira – meridianos do fígado e da vesícula biliar.</p><p>Essas regras são muito importantes para desenvolver o tratamento</p><p>para cada paciente. Existem, entretanto, outros fatores a serem</p><p>considerados, como a estação do ano, por exemplo.</p><p>O objetivo primário do tratamento de acupuntura é gerar o</p><p>equilíbrio energético. Depois, ela pode se utilizar de pontos adicionais</p><p>ou extras para promover melhoras. Quando se produz equilíbrio</p><p>energético, problemas ainda desconhecidos podem estar se resolvendo.</p><p>Stress e acupuntura</p><p>Outros capítulos deste livro descrevem as quatro fases do stress.</p><p>Como elas se relacionam com a MTC? A pesquisadora Marília Doria</p><p>(2010) conseguiu</p><p>quadro do stress infantil</p><p>Nome da criança | Data de nascimento | Idade | Sexo | Escola que frequenta | Série</p><p>Nome da mãe | Idade | Profissão | Local de trabalho | Telefone</p><p>Nome do pai | Idade | Profissão | Local de trabalho | Telefone</p><p>Número de irmãos e idade | Nome do melhor amigo | Idade | Série</p><p>Número de atividades extracurriculares da criança (se mais de três, pode ser excessivo, se</p><p>uma ou nenhuma, pode ser de menos.)</p><p>Quantos amigos mais íntimos tem a criança?</p><p>Quando foi a última vez em que a criança foi convidada para: Festa de aniversário de</p><p>colega | Brincar na casa de um colega | Brincar na casa de um parente</p><p>Quando foi a última vez que a criança convidou um colega para sair ou brincar em sua</p><p>casa?</p><p>Quando um colega pede algo que a criança não quer dar ou fazer, como ela se comporta?</p><p>Cede e fica feliz | Cede e fica aborrecida | Diz não e fica feliz | Diz não e fica se sentindo</p><p>culpada | Briga | Faz e fica se lamuriando | Outro</p><p>Quando um adulto significativo pede à criança para fazer algo que ela não tem obrigação</p><p>ou vontade de fazer, como ela reage?</p><p>Cede e fica feliz | Cede e fica aborrecida | Diz não e fica feliz | Diz não e fica se sentindo</p><p>culpada | Briga | Faz e fica se lamuriando | Outro</p><p>Que responsabilidades a criança tem em casa? (Se não tiver nenhuma, é de menos, se</p><p>tiver responsabilidades de adultos, é demais.)</p><p>Existe pressão sobre a criança, por parte de colegas, para tomar drogas, “ficar”, fazer</p><p>bagunça etc.?</p><p>Existe acordo entre os pais sobre a maneira de disciplinar?</p><p>Existe acordo entre os pais quanto aos limites que devem ser impostos?</p><p>Se a criança tem irmãos, quando briga com eles, como os pais se comportam</p><p>tipicamente?</p><p>Os pais fazem uso de ameaças do tipo “Deus está vendo o que você está fazendo”, “Deus</p><p>castiga” ou equivalente?</p><p>A casa onde residem foi assaltada ou algum membro da família foi assaltado?</p><p>A criança sofreu violência de alguém? De quem?</p><p>Existe problema com a professora? | Com a escola? | Com os estudos? | Com irmãos? |</p><p>Com avós? | Com os pais?</p><p>Qual o nível de stress do pai? | Qual o nível de stress da mãe?</p><p>Fonte: Lipp (2000a).</p><p>Conclusão</p><p>O stress pode ser uma realidade na vida de uma criança ou de um</p><p>adolescente. É necessário reconhecer sua sintomatologia, verificar suas</p><p>causas e tomar as providências cabíveis para reduzir o impacto dos</p><p>estressores presentes, ao mesmo tempo que se deve também fortalecer a</p><p>criança, para que se torne cada vez mais resiliente aos percalços da vida.</p><p>Desse modo, ela não só lidará com os desafios do momento como</p><p>também estará fortalecida para se tornar adulta competente e capaz de</p><p>enfrentar as batalhas emocionais que a vida moderna a levará a travar.</p><p>Para que medidas curativas e preventivas possam ser tomadas, é</p><p>fundamental que o diagnóstico do stress seja feito correta e</p><p>cientificamente. Este capítulo oferece um guia para a identificação do</p><p>quadro de sintomas de stress por fase de agravamento. Os capítulos de</p><p>Márcia Bignotto e Valquiria Tricoli, neste livro, e o artigo de Lipp e</p><p>Lipp (2014) oferecem sugestões sobre como tratar o stress da criança e</p><p>do adolescente. A utilização do jogo “Guerra ao stress” pode ajudar na</p><p>aquisição de estratégias de enfrentamento infantil. Sabendo como</p><p>diagnosticar e tratar o stress, pais e profissionais poderão contribuir para</p><p>o desenvolvimento da resiliência em idade precoce.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>ELKIND, D. (1981). O direito de ser criança. São Paulo: Fundo Educativo Brasileiro.</p><p>LIPP, M.E.N. (2000a). “O tratamento do stress infantil”. In: SILVARES, E.F. de M. (org.).</p><p>Estudos de caso em psicologia clínica comportamental infantil. Campinas: Papirus, pp.</p><p>71-88.</p><p>________ (org.) (2000b). Crianças estressadas: Causas, sintomas e soluções. 5ª ed. Campinas:</p><p>Papirus.</p><p>________ (2011). “Educação afetiva: Orientação para pais”. In: LIPP, M.E.N. (org.). O</p><p>adolescente e seus dilemas: Orientação para pais e professores. Campinas: Papirus, pp.</p><p>11-26.</p><p>LIPP, M.E.N. e LIPP, L.M.N. (2014). “Relações interpessoais: Como combater o stress diário”.</p><p>In: LIPP, M.E.N. e TRICOLI, V.A.C. (orgs.). Relacionamentos interpessoais no século</p><p>XXI. Novo Hamburgo: Sinopsys, pp. 209-238.</p><p>LIPP, M.E.N. e LUCARELLI, M.D.M. (1998). Escala de Stress Infantil (ESI). São Paulo: Casa</p><p>do Psicólogo.</p><p>LIPP, M.E.N. et al. (1997). Como enfrentar o stress. 5ª ed. São Paulo: Ícone.</p><p>________ (2000). Guerra ao stress. São Paulo: Casa do Psicólogo.</p><p>TRICOLI, V.A.C. (2014). “Relacionamento interpessoal na adolescência e o stress emocional”.</p><p>In: LIPP, M.E.N. e TRICOLI, V.A.C. (orgs.). Relacionamentos interpessoais no século</p><p>XXI. Novo Hamburgo: Sinopsys, pp. 51-63.</p><p>TRICOLI, V.A.C. e LIPP, M.E.N. (2003). Escala de Stress para Adolescentes. São Paulo: Casa</p><p>do Psicólogo.</p><p>VUELTA, B.L. (2014). “Relacionamento familiar”. In: LIPP, M.E.N. e TRICOLI, V.A.C.</p><p>(orgs.). Relacionamentos interpessoais no século XXI. Novo Hamburgo: Sinopsys, pp.</p><p>81-118.</p><p>2</p><p>Raiva em crianças: Stress como</p><p>fator desencadeante</p><p>Marilda Emmanuel Novaes Lipp</p><p>Qualquer um pode ficar com raiva, isso é fácil, mas ficar</p><p>com raiva da pessoa certa, no ponto certo, na hora certa,</p><p>pela razão correta e do modo certo, isso não está no</p><p>poder de todos e não é fácil.</p><p>Aristóteles</p><p>Expressões súbitas de raiva em crianças de, às vezes, até menos de</p><p>um ano de idade causam surpresa, angústia e imensa preocupação nos</p><p>adultos que as presenciam. A raiva intensa pode surgir quando a criança</p><p>é disciplinada ou frustrada, é alvo de crítica ou gozação ou</p><p>simplesmente quando está cansada. Por vezes, o que deu origem ao</p><p>acesso não parece ser proporcional à ferocidade da expressão da raiva.</p><p>Morder (em criança pequena), quebrar brinquedos, empurrar, bater,</p><p>chutar, xingar ocorrem diante de eventos de menor importância,</p><p>deixando pais e professores pasmos perante a intensidade da reação. A</p><p>raiva em crianças necessita ser tratada com muita atenção, uma vez que</p><p>a tendência a responder ao mundo de modo agressivo não diminui com</p><p>a pura passagem do tempo. Profissionais da área da saúde mental se</p><p>preocupam com sua ocorrência, pois as consequências que ela produz</p><p>podem causar grande prejuízos para a comunidade e para a própria</p><p>pessoa, redundando em problemas graves, como violência doméstica,</p><p>brigas no trânsito e outros atos de agressividade.</p><p>Quando atinge níveis patológicos, o DSM-5 (APA 2013) classifica</p><p>a expressão da raiva excessiva como transtorno explosivo intermitente e</p><p>estabelece critérios diferenciais para seu diagnóstico. Torna-se</p><p>necessário diferenciá-la de outros transtornos, como o transtorno</p><p>opositivo desafiador, caracterizado por comportamentos de negação,</p><p>desafiadores, desobedientes diante de figuras de autoridade; do</p><p>transtorno de impulso, que se refere à inabilidade de resistir ao impulso</p><p>ou à tentação de executar um ato perigoso para a própria pessoa ou para</p><p>outras; e do transtorno do deficit de atenção e hiperatividade, que</p><p>envolve dificuldade de concentração, entre outros sintomas. Também é</p><p>importante entender a relação entre raiva e stress.</p><p>Deve-se frisar que nem toda criança que apresenta episódios de</p><p>raiva tem um transtorno mental. Na maioria das vezes, esses episódios</p><p>de raiva incontida têm causas diversas, que podem e devem ser tratadas</p><p>logo que possível, de modo que os hábitos de expressão indevida da</p><p>raiva não se estabeleçam através dos anos. Neste capítulo, discutiremos</p><p>como pais e outros adultos podem ajudar a criança e o adolescente a</p><p>lidar com seus sentimentos e atingir a regulação de emoções de modo</p><p>adequado.</p><p>O que é raiva?</p><p>A raiva é uma reação emotivo-psicobiológica, uma emoção</p><p>desconfortável, que vai desde irritação ou desagrado até a fúria e ocorre</p><p>quando a pessoa se sente ameaçada em seu poder, injustiçada, acuada</p><p>ou frustrada em algo que para ela seja importante. Raiva, como sugerido</p><p>por McKay, Rogers e McKay (2001), é um mecanismo de proteção</p><p>contra a perda de poder real ou imaginário, e, nesse caso, ela é útil. O</p><p>problema é que, às vezes, a ameaça, a injustiça ou o desafio não existem</p><p>de verdade, são fruto da interpretação errônea da pessoa.</p><p>Não é errado</p><p>sentir raiva, pois todo sentimento é importante, válido e correto.</p><p>Quando se tenta não sentir algo que genuinamente se deveria estar</p><p>sentindo, entra-se em um conflito perigoso, que dá margem ao</p><p>adoecimento do corpo e da mente. É preciso permitir que os</p><p>sentimentos sejam reconhecidos. O que é importante é saber lidar com</p><p>eles. E a criança necessita aprender desde cedo a se responsabilizar pelo</p><p>que sente e pelo uso que faz dos sentimentos.</p><p>A fisiologia da raiva</p><p>É no sistema límbico (SL), centro gerenciador das emoções,</p><p>localizado no sistema nervoso central (SNC), que se encontra o</p><p>elemento topográfico e anatômico da agressão. O sistema límbico é</p><p>formado de um conjunto de estruturas cerebrais que interagem</p><p>constantemente, envolvendo as seguintes partes: amígdalas (são duas,</p><p>uma em cada hemisfério cerebral), tálamo, epitálamo, hipotálamo,</p><p>hipocampo, cíngulo e região do septo. O SL, como um conjunto, pode</p><p>ser considerado o substrato neural das emoções. Todas as suas partes se</p><p>comunicam, talvez até por isso, muitas vezes, fique difícil identificar</p><p>exatamente o que estamos sentindo em certos momentos. Interessante é</p><p>também considerar que, em virtude do fato de os sistemas</p><p>neuroendócrino, neuroimune e neurovegetativo terem sua base no SL,</p><p>as emoções exercem uma influência importante sobre eles, o que</p><p>explica, pelo menos em parte, o notório vínculo entre o stress emocional</p><p>e as doenças psicofisiológicas.</p><p>Embora haja toda uma rede de intensa comunicação entre as várias</p><p>partes do SL, os cientistas descobriram que as emoções estão</p><p>localizadas, cada uma, especificamente em determinados lugares. A</p><p>raiva, por exemplo, parece se localizar nas amígdalas, e também é</p><p>influenciada pela estimulação de outras áreas. A amígdala é uma</p><p>estrutura que se parece com uma pequena amêndoa. Fica localizada no</p><p>meio da região do lóbulo temporal anterior e se liga diretamente com o</p><p>hipocampo. A amígdala é o centro de identificação de perigo e,</p><p>portanto, desempenha papel fundamental na preservação da vida;</p><p>quando ativada, elicia o medo, que é funcional para comportamentos de</p><p>autopreservação. Existe uma interação intensa entre a amígdala e o</p><p>hipotálamo, e o comportamento de agressão é produto dessa interação.</p><p>Como a raiva se</p><p>desenvolve?</p><p>Existe evidência científica de que sinais de raiva podem ser</p><p>identificados em crianças bem jovens, porém não se pode afirmar que a</p><p>tendência à raiva seja inata. O mais provável é que a criança aprenda a</p><p>sentir raiva durante o seu desenvolvimento emocional. Uma vez que</p><p>aprenda a reagir com raiva, é possível que desenvolva um</p><p>temperamento de raiva. Essas tendências são diferentes do puro estado</p><p>de raiva, que é algo transitório. Existem ainda modos diferentes de</p><p>expressar a raiva, por exemplo, a raiva para dentro, que se refere à</p><p>frequência com a qual os sentimentos de raiva são reprimidos e</p><p>guardados, e a expressão de raiva para fora, que é a maneira como as</p><p>pessoas expressam a raiva em relação a outras pessoas ou objetos do</p><p>meio.</p><p>Como se aprende a ter</p><p>raiva?</p><p>Existem pessoas com tendência a sentir raiva mais intensa do que</p><p>outras. Há evidência de que algumas crianças nascem mais irritáveis e</p><p>são mais facilmente levadas a sentir raiva. São crianças mais sensíveis a</p><p>frustrações, que reagem de um modo que, às vezes, assusta os pais.</p><p>Muitas delas se tornam adultas que experienciam raiva com muita</p><p>frequência, não necessariamente contra os outros, batendo, gritando ou</p><p>ofendendo, mas, sim, jogando a raiva para dentro. Ficam irritadas, são</p><p>sarcásticas, reclamam muito e adoecem. Mas, mesmo que alguém nasça</p><p>com uma tendência a sentir raiva, o meio ambiente pode ajudar a</p><p>controlar o impulso agressivo ou levar à expressão agressiva dos</p><p>impulsos. O exemplo de pessoas queridas e importantes na vida da</p><p>criança tem o extraordinário poder de moldar o modo de ver o mundo,</p><p>de sentir e de se comportar.</p><p>Um grande número de crianças que demonstram ter muita raiva</p><p>dentro de si tem em sua história de vida registros de terem sido vítimas</p><p>de alguma violência física ou psicológica. Abuso sexual ou moral pode</p><p>levar a criança a ficar permanentemente com raiva. Outras assistiram a</p><p>atos de violência dentro da própria casa, em geral, contra as mães ou</p><p>idosos. As pesquisas indicam que muitas das crianças agressivas não</p><p>sabem reconhecer seus sentimentos nem falar sobre eles. Muitas vezes,</p><p>apresentam deficit em habilidades sociais, isto é, não sabem procurar</p><p>amigos, estabelecer vínculos, ouvir os outros, responder-lhes sem</p><p>sarcasmo ou evitar agir de modo ameaçador.</p><p>A raiva pode ser baseada em uma desconfiança profunda das outras</p><p>pessoas e do mundo, que é adquirida na infância e leva a um padrão de</p><p>pensamento desconfiado e defensivo. Ser criado em uma família de</p><p>pessoas que expressam raiva de modo muito intenso e emocional, que</p><p>acusam, recriminam e punem excessivamente, leva a criança a se sentir</p><p>culpada. Essas são possíveis condições geradoras da tendência crônica a</p><p>responder ao mundo com raiva intensa. Outra situação familiar,</p><p>identificada na história de vida de pessoas com dificuldades em lidar</p><p>com a raiva, é terem sido criadas em famílias permissivas demais, nas</p><p>quais não há envolvimento emocional dos pais com a criança. Tal</p><p>prática parental pode levar tanto à apatia emocional como à tendência a</p><p>sentir raiva. Na verdade, a apatia, muitas vezes, nada mais é do que a</p><p>raiva virada para dentro, contra si mesmo.</p><p>Um aspecto social a ser levado em consideração é o efeito que a</p><p>exposição a atos de violência na TV ou a jogos possa ter no incentivo à</p><p>agressividade. O modelo não só da vida real, mas também da TV, pode</p><p>ser de importância, principalmente para as crianças mais vulneráveis.</p><p>Evidência quanto a isso pode ser encontrada no trabalho dos cientistas</p><p>Huesmann et al. (2003), da Universidade de Michigan, que</p><p>desenvolveram um estudo com 557 crianças residentes em Chicago.</p><p>Eles observaram como elas reagiam a filmes e desenhos violentos na</p><p>TV quando tinham de seis a dez anos de idade. Quinze anos depois,</p><p>conseguiram reavaliar 329 delas e verificaram que, independentemente</p><p>da classe socioeconômica e do sexo, aquelas que quinze anos antes, ao</p><p>verem episódios de violência na TV, identificaram-se com os</p><p>personagens violentos do mesmo sexo e acharam que a violência era</p><p>realística, mostraram muito maior tendência a agir com agressão no</p><p>presente do que as outras. Isso ocorreu independentemente do nível de</p><p>agressividade inicial da criança, do tipo de família na qual estava</p><p>inserida, de sua capacidade intelectual, das práticas parentais às quais</p><p>estavam sujeitas e do nível de agressividade dos pais. Sem dúvida,</p><p>estudos como esse levam a uma preocupação sobre os modelos aos</p><p>quais nossos filhos estão expostos não só na família e na escola, mas</p><p>também por intermédio dos meios de comunicação.</p><p>A interação de fatores</p><p>genéticos</p><p>com as práticas parentais</p><p>As práticas parentais, isto é, o modo como a família, direta e</p><p>indiretamente, educa os filhos, o meio em que a criança é criada, os</p><p>modelos sociais com os quais entra em contato, o reforço que recebe</p><p>para determinados comportamentos, a ética que prevalece ao seu redor,</p><p>os valores que lhe são passados, tudo isso constitui uma forte frente, que</p><p>interage com as estruturas físicas geneticamente determinadas com as</p><p>quais a pessoa nasce. Dessa interação, surge o modo de perceber os</p><p>acontecimentos e, consequentemente, de sentir e de expressar a raiva. A</p><p>tendência para se estressar e para sentir raiva constitui um quadro que</p><p>inclui distorções cognitivas, isto é, um modo inadequado de pensar e</p><p>avaliar os eventos da vida, expectativas ilógicas e exageradas,</p><p>vulnerabilidades pessoais e comportamentos observáveis eliciadores do</p><p>stress e da raiva. Inclui também uma hiper-reatividade fisiológica diante</p><p>de demandas psicossociais, que pode ser gerada por uma</p><p>hipersensibilidade do SL e conduz à produção excessiva de</p><p>catecolaminas, testosterona e cortisol.</p><p>Stress</p><p>O stress é um dos fatores que mais desencadeiam a raiva. Quem já</p><p>tem propensão a sentir e agir sob o domínio da raiva, ao</p><p>se estressar,</p><p>corre um risco muito maior de vir a ser dominado por ela. Isso ocorre,</p><p>principalmente, porque o stress hipersensibiliza as pessoas, e estas,</p><p>quando estressadas, tendem a reagir de modo infinitamente mais</p><p>emotivo do que quando não estão estressadas. A raiva seria, então, desse</p><p>ponto de vista, uma maneira de o stress emocional se manifestar. O</p><p>stress é capaz de desencadear a raiva por meio de um mecanismo de</p><p>mobilização do organismo que o prepara automaticamente para lutar</p><p>contra agentes ameaçadores ou para fugir deles. É por isso que algumas</p><p>pessoas reagem com agressão quando se sentem ameaçadas física ou</p><p>verbalmente e outras se magoam e choram. Os dois mecanismos são</p><p>oriundos da resposta do stress, porque o local no cérebro humano que</p><p>controla a raiva é o mesmo que controla também a mágoa.</p><p>Como é o stress na</p><p>criança?</p><p>Quando a criança confronta algo estressante, seu cérebro, por meio</p><p>do hipotálamo, ativa o sistema nervoso simpático e a glândula pituitária.</p><p>Simultaneamente, as glândulas suprarrenais são acionadas e liberam</p><p>adrenalina, que estimula o coração e faz com que a criança fique em</p><p>estado de alerta, como se estivesse prestes a enfrentar um perigo.</p><p>Concomitantemente, as atividades vegetativas (como digestão e sono)</p><p>ficam mais inibidas, a criança perde o apetite, dorme mal e pode ter</p><p>dores abdominais. Tudo isso ocorre porque o equilíbrio interno do corpo</p><p>foi quebrado no esforço que a criança fez para lidar com o estressor e se</p><p>adaptar a uma nova situação. Se o stress for muito intenso ou se</p><p>prolongar por um período muito longo, problemas sérios de saúde</p><p>podem ocorrer e a raiva pode surgir como defesa para o que está</p><p>ocorrendo. Na verdade, o stress infantil pode ser um fator</p><p>desencadeador da raiva, do mesmo modo como acontece com os</p><p>adultos.</p><p>Os pais exercem importante papel na vulnerabilidade e na</p><p>resistência que a criança tem ao stress, em relação não só à</p><p>hereditariedade, mas também aos fatores ligados à aprendizagem,</p><p>especificamente na aquisição, pela criança, de estratégias naturais para</p><p>lidar com o stress, especialmente na habilidade dela de ver a vida de</p><p>modo mais positivo, na sua interpretação saudável de eventos do dia a</p><p>dia e na percepção de que ela é capaz de lidar com o mundo ao seu</p><p>redor de modo competente.</p><p>É o sucesso obtido em vários momentos de crise que possibilita à</p><p>criança ter uma atuação adequada em crises futuras. Os pais seriam,</p><p>assim, de grande importância para auxiliar os filhos a atravessar as</p><p>crises da infância e da adolescência de modo bem-sucedido, a fim de</p><p>que adquiram a sensação de competência perante os problemas da idade</p><p>adulta. Essa aquisição de confiança na própria atuação no mundo é</p><p>adquirida, ou não, através de uma história de reforço e punição,</p><p>modelagem e modelação, fornecida basicamente pelos pais. É inegável</p><p>também a contribuição da aprendizagem, com os pais, de crenças e</p><p>valores que possam funcionar como potentes fontes internas de stress.</p><p>As crenças, por exemplo, de que deve ser sempre perfeita e amada por</p><p>todos, funcionam como fonte frequente de stress para a pessoa, em</p><p>razão da frustração que, infalivelmente, acarretarão quando a realidade</p><p>for outra.</p><p>Uma das possíveis causas do stress infantil é a disciplina confusa</p><p>por parte dos pais. Diante de um mesmo comportamento indesejável, os</p><p>pais ora punem, ora usam pressões e argumentos. É motivo de stress</p><p>para a criança quando seu mundo se torna imprevisível. Assim, não</p><p>sabendo o que acontecerá se agir de determinada forma, a dúvida a</p><p>deixa agitada e ansiosa. Quando os pais não definem claramente qual o</p><p>comportamento aceitável e qual o inaceitável, as crianças se tornam</p><p>inseguras, por desconhecer os limites da ação permissível. Por outro</p><p>lado, quando os pais estabelecem regras em excesso, é bem provável</p><p>que não mantenham, consistentemente, nenhuma delas.</p><p>A supertolerância ou a permissão de certos atos indesejáveis</p><p>também acabam gerando ansiedade e exigências crescentes de</p><p>privilégios, por parte das crianças, que muitas vezes não podem ser</p><p>satisfeitas. Criança criada em ambientes excessivamente tolerantes</p><p>tende a ser mimada e, muitas vezes, tem dificuldades nas relações</p><p>interpessoais. Isso ocorre, principalmente, porque, para haver um bom</p><p>relacionamento, precisamos saber nos colocar no lugar do outro, ouvi-lo</p><p>e valorizá-lo. A criança mimada e o adulto egocêntrico mostram</p><p>dificuldades em se doar e, assim, podem desenvolver dificuldades de</p><p>relacionamento com colegas.</p><p>A raiva na criança</p><p>Os pais devem analisar o que se passa na vida da criança agressiva,</p><p>a fim de que possam entender os sentimentos ocultos, às vezes</p><p>extremamente dolorosos, que dão substrato à raiva infantil. Muitas</p><p>vezes, a criança responde com raiva àquilo que sente como maus-tratos</p><p>e contra os quais nada pode fazer. São a descrença e o desespero se</p><p>expressando pela raiva e pelos atos agressivos.</p><p>Comportamento agressivo</p><p>Um pouco de agressividade é normal e até útil na preservação dos</p><p>direitos, desde que a agressividade seja mantida dentro dos limites</p><p>permitidos pela cultura em que se vive. A raiva é uma sensação normal;</p><p>o que se deve disciplinar é o que fazer com a raiva que se sente. É</p><p>normal, por exemplo, sentir raiva de uma professora, mas não se pode</p><p>agredi-la com gestos ou palavras. Punir fisicamente a criança que foi</p><p>agressiva de nada adianta, pois estamos dando a ela um modelo de</p><p>opressão aos mais fracos. O correto é ensinar-lhe modos adequados de</p><p>expressar a raiva e de saber lidar com o que está dando origem ao</p><p>sentimento de agressividade.</p><p>O stress excessivo frequentemente leva a uma situação de</p><p>ansiedade que, quando atinge níveis muito altos, pode ocasionar</p><p>episódios de agressividade física ou verbal. Quando o stress e a</p><p>ansiedade estão oprimindo em demasia a criança, esta, por uma</p><p>necessidade premente de diminuir o desconforto que está sentindo,</p><p>precisará utilizar algumas técnicas de controle do stress para aliviar o</p><p>mal-estar, o nervosismo ou a irritabilidade, através do choro, do</p><p>relaxamento, do riso, da respiração profunda ou do exercício físico. Se a</p><p>criança não sabe utilizar nenhuma técnica de controle de stress,</p><p>frequentemente usa a agressividade para aliviar a sensação de ansiedade</p><p>que a atormenta. Isso é também bastante comum nos adultos,</p><p>infelizmente. Ao externar sua raiva, ela acaba respirando fundo e</p><p>desabafando. Isso inegavelmente reduz a ansiedade e o stress daquele</p><p>momento, e, portanto, a agressividade passa a ser reforçada pela</p><p>sensação de alívio que produz. Mais tarde, é provável que ela se sinta</p><p>culpada e prometa não voltar a ser agressiva, porém, em outra ocasião,</p><p>voltará a usar a agressividade quando a ansiedade atingir níveis</p><p>insuportáveis, em virtude do alívio que sentiu no passado após uma</p><p>explosão de raiva.</p><p>O processo de ocorrência das explosões de agressividade, que são</p><p>geradas pelo stress, parece ser o que se mostra no Quadro 1 (Lipp</p><p>2005).</p><p>Uma das maiores dificuldades para pessoas cronicamente</p><p>estressadas é a de lidar com frustrações (Lipp 2008). Grande número de</p><p>pais procura satisfazer todos os desejos dos filhos, como se esse fosse o</p><p>objetivo da vida. A vulnerabilidade à frustração pode surgir de dois</p><p>tipos de práticas parentais inadequadas. Um é típico de pais muito</p><p>autoritários, que não permitem que a criança tome decisões sozinha,</p><p>decidem por ela; seria uma superproteção sem a possibilidade de</p><p>escolhas importantes. Outro são os pais permissivos demais.</p><p>Muitos pais, num esforço muito bem-intencionado, tentam</p><p>resguardar os filhos de toda e qualquer desilusão, frustração, tristeza e</p><p>tensão. No dia a dia, observam-se inúmeros exemplos de pais que</p><p>superprotegem os filhos, na ilusão de que os criam bem. A vida não é só</p><p>de risos e alegrias. Muitas tristezas, frustrações e desilusões são</p><p>enfrentadas pelo ser humano na trajetória de sua existência. Aquele que,</p><p>quando criança, foi exposto a pequenas doses de frustração e tensão</p><p>estará muito mais bem-preparado para enfrentar o stress adulto. As</p><p>pesquisas indicam que os adultos que melhor lidam com o stress, os</p><p>menos vulneráveis</p><p>aos seus efeitos maléficos, são aqueles que, quando</p><p>crianças, adquiriram estratégias para lidar com as situações difíceis da</p><p>vida. A superproteção, no que tange a poupar a criança em demasia,</p><p>leva a uma baixa tolerância à frustração e a uma alta vulnerabilidade ao</p><p>stress adulto.</p><p>Quadro 1. Mecanismo de agressividade</p><p>Fonte: Lipp (2005).</p><p>O que os pais podem</p><p>fazer para ajudar</p><p>a criança a lidar com a</p><p>raiva?</p><p>Uma preocupação muito válida dos pais é no sentido de evitar</p><p>reforçar involuntariamente a dificuldade dos filhos e saber o que fazer</p><p>para prevenir o aparecimento da raiva patológica. Uma maneira de</p><p>ajudar a criança é trabalhando com ela em três níveis:</p><p>1º) analisando as fontes do seu stress;</p><p>2º) ensinando técnicas de controle do stress e da ansiedade;</p><p>3º) ensinando a falar dos sentimentos (em vez de agir no</p><p>impulso), a controlar a raiva, a lidar com a crítica e a</p><p>frustração e a entender que existe mais do que um ponto</p><p>de vista em todas as polêmicas e que, por isso, nem</p><p>sempre as pessoas concordam.</p><p>Especificamente, pais que percebam que os filhos estão reagindo ao</p><p>mundo com raiva se beneficiarão, também, da implementação das</p><p>medidas sugeridas por Lipp (2005):</p><p>1. Mantenha o controle de suas emoções, mesmo durante os</p><p>episódios de raiva de seu filho, como exemplo de</p><p>autocontrole.</p><p>2. Não tente discipliná-lo, bater, gritar ou dar conselhos no</p><p>momento em que ele está tendo um episódio de</p><p>descontrole emocional. Espere até que se acalme, pois, na</p><p>hora da raiva, ele não vai conseguir entender o que você</p><p>está tentando ensinar.</p><p>3. Estabeleça normas para a expressão de raiva na família.</p><p>4. Puna o comportamento e não o sentimento de raiva. Se</p><p>ele xingar, quebrar objetos ou bater em alguém, espere até</p><p>que se acalme e administre uma punição, não porque ele</p><p>ficou com raiva, mas porque expressou de modo errado a</p><p>raiva que sentia.</p><p>5. A raiva ocorre, muitas vezes, por dificuldades da pessoa</p><p>de lidar com os outros no dia a dia, portanto, identifique se</p><p>seu filho tem o que se chama de inabilidade social, isto é,</p><p>veja se ele tem dificuldade para se relacionar com os</p><p>colegas. Se verificar que essa dificuldade existe, não se</p><p>angustie, tome atitudes sistemáticas para ajudá-lo.</p><p>Habilidades sociais podem ser aprendidas, principalmente</p><p>na infância. Quem tem habilidade social lida melhor com</p><p>situações de stress e de ameaça. Tente verificar que</p><p>habilidades estão faltando para ele ser mais competente</p><p>socialmente. Será que sabe esperar a vez ou ficar quieto e</p><p>prestar atenção genuína, ouvindo quando os colegas</p><p>falam? Ele age muito diferente no modo de responder e de</p><p>perguntar? Sabe incentivar os outros a falarem de si</p><p>mesmos?</p><p>6. Ensine seu filho a reconhecer os sinais físicos de que está</p><p>para explodir e o que fazer na hora.</p><p>7. Crianças e adolescentes precisam de modelos adequados.</p><p>Forneça o modelo para sanar a dificuldade específica</p><p>verificada. Se você também não tem aquela habilidade,</p><p>peça a alguém que a tenha para ser o modelo para seu</p><p>filho. Quanto a esse assunto, é também importante que</p><p>você verifique se alguém está fornecendo o modelo errado</p><p>para a criança ou o adolescente, pois, a partir de certa</p><p>idade, eles são muito influenciáveis por colegas e grupos.</p><p>8. Converse com a criança sobre os sentimentos dela, ajude-</p><p>a a identificá-los e dar nome a eles. Às vezes, ela se</p><p>confunde e só consegue identificar a raiva. Lembre-se de</p><p>que incentivar um filho a falar da raiva que sente não é o</p><p>mesmo que incentivá-lo a ter raiva ou agir sob a influência</p><p>dela.</p><p>9. Faça dramatizações em que a criança ensaie a nova</p><p>habilidade de lidar com situações sociais ou de raiva.</p><p>10. Reforce os sinais de progresso, bem como as tentativas</p><p>de acerto. Nunca reforce expressão inapropriada de raiva,</p><p>dando atenção, pedindo desculpa ou tentando fazer a</p><p>vontade da criança para que ela se acalme.</p><p>11. Ensine a criança a se reforçar pelas tentativas e pelos</p><p>acertos na dramatização e na vida real.</p><p>12. Verifique que tipo de pensamento inadequado pode estar</p><p>levando seu filho a se sentir sempre com raiva. Por</p><p>exemplo, ele acha que deveria sempre ser escolhido para</p><p>os jogos? Acha que merece algum privilégio especial</p><p>diante dos colegas? Quer ser o centro da atenção sempre?</p><p>Acha que está sendo injustiçado? O comportamento</p><p>humano é moldado pelo pensamento, de modo que, se</p><p>pudermos identificar a origem do problema, isto é, que</p><p>pensamento está inspirando a raiva, poderemos também</p><p>eliminar a raiva que seja injusta ou excessiva e que esteja</p><p>ocorrendo em virtude de alguma interpretação errônea da</p><p>realidade. Conforme sugerido por Huebner (2012), se</p><p>pudermos impedir o desenvolvimento dos pensamentos</p><p>instigadores de raiva, em situações em que não se</p><p>justifique responder com raiva, a criança conseguirá</p><p>controlar seus sentimentos.</p><p>13. Mostre como exercícios de respiração profunda podem e</p><p>devem ser utilizados para promover uma sensação de paz</p><p>e tranquilidade.</p><p>14. Ensine a criança a se afastar da situação que a está</p><p>levando a sentir raiva até conseguir recuperar o controle</p><p>por meio dos exercícios de respiração.</p><p>15. Verifique, com muito tato, se seu filho tem medo de</p><p>algo que ainda não lhe contou ou se alguém tentou</p><p>molestá-lo sexualmente ou se está sendo vítima de</p><p>bullying.</p><p>16. Ensine a criança a se manter firme e controlada diante</p><p>dos estressores e da raiva dos outros.</p><p>17. Ensine seu filho o que é uma ação responsável, isto é,</p><p>como se comportar a fim de resolver o problema que o</p><p>aborrece, sem criar um problema maior sendo agressivo.</p><p>18. Ensine respeito para com os sentimentos alheios e</p><p>mostre como negociar em uma discussão, pois nem todo</p><p>desacordo tem de terminar em briga.</p><p>19. Tente entender a sua própria raiva e aprender meios de</p><p>dominá-la. Lembre-se de que a criança aprende muito com</p><p>os modelos dos pais.</p><p>20. Ensaie, por meio de dramatizações, respostas assertivas</p><p>em vez de agressivas, mostrando como a criança deve se</p><p>comportar em situações de stress e de ameaça. Em vez de</p><p>dizer como não se comportar, é sempre melhor mostrar</p><p>qual o comportamento adequado.</p><p>21. Finalmente, mostre que ama e respeita seu filho, não o</p><p>agrida nem agrida os outros ao seu redor.</p><p>Ao mesmo tempo que pais de crianças com raiva precisam estar</p><p>sempre alertas, dando bons exemplos, tendo paciência e ensinando</p><p>comportamentos não agressivos para a expressão de raiva, não devem</p><p>abrir mão do direito e do dever de disciplinar e impor limites aos filhos.</p><p>Cabe aos pais assumir o controle da família e conduzir os jovens a uma</p><p>vida mais tranquila, com pensamentos mais sadios e menos raiva.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>APA – AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (2013). Dsm-5: Diagnostic and</p><p>statistical manual of mental disorders. Washington: American Psychiatric Association.</p><p>ARITA, H. (2009). “Brain mechanisms of poor anger management”. JMAJ, 52(3), pp. 184-190.</p><p>HUEBNER, D. (2012). O que fazer quando você se irrita demais: Um guia para as crianças</p><p>lidarem melhor com a raiva. Porto Alegre: Artmed.</p><p>HUESMANN, L.R. et al. (2003). “Longitudinal relations between children’s exposure to TV</p><p>violence and their aggressive and violent behavior in young adulthood: 1977-1992”.</p><p>Developmental Psychology,39(2), pp. 201-221.</p><p>LIPP, M.E.N. (2005). Stress e o turbilhão da raiva. São Paulo: Casa do Psicólogo.</p><p>________ (2008). Crianças estressadas: Causas, sintomas e soluções. Campinas: Papirus.</p><p>LIPP, M.E.N. e MALAGRIS, L.E.N. (2012). O treino cognitivo de controle da raiva. Rio de</p><p>Janeiro: Cognitiva.</p><p>McKAY, M.; ROGERS, P.D. e McKAY, J. (2001). Quando a raiva dói: Acalmando a</p><p>tempestade interior. São Paulo: Summus.</p><p>3</p><p>Diagnóstico do stress na</p><p>adolescência</p><p>Valquiria Aparecida Cintra Tricoli</p><p>Ao longo deste capítulo, pretende-se abordar o stress na</p><p>adolescência e a maneira como realizar um diagnóstico efetivo.</p><p>Stress</p><p>O stress baixa a resistência do organismo, mas não é uma doença. O</p><p>indivíduo torna-se vulnerável às doenças, de acordo com o estilo de</p><p>vida e a predisposição genética. A psicóloga Marilda Lipp (Lipp 1984)</p><p>definiu o stress como uma reação do organismo diante de situações que</p><p>excitem,</p>

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