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<p>Reitora:</p><p>Berenice Quinzani Jordão</p><p>Vice-Reitor:</p><p>Ludoviko Carnascialli dos Santos</p><p>Diretor:</p><p>Luiz Carlos Migliozzi Ferreira de Mello</p><p>Conselho Editorial:</p><p>Abdallah Achour Junior</p><p>Daniela Braga Paiano</p><p>Edison Archela</p><p>Efraim Rodrigues</p><p>Luiz Carlos Migliozzi Ferreira de Mello (Presidente)</p><p>Maria Luiza Fava Grassiotto</p><p>Maria Rita Zoéga Soares</p><p>Marcos Hirata Soares</p><p>Rodrigo Cumpre Rabelo</p><p>Rozinaldo Antonio Miami</p><p>A Eduel é afiliada à</p><p>Catalogação elaborada pela Divisão de Processos Técnicos</p><p>Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina</p><p>Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)</p><p>I43</p><p>Informação e redes sociais [livro eletrộnico] / Maria Inệs Tomaél, Regina Maria Marteleto (orgs.). -</p><p>Londrina : Eduel, 2015.</p><p>1 Livro digital : il.</p><p>Inclui bibliogra�a.</p><p>ISBN 978-85-7216-769-7</p><p>1. Redes sociais - Análise. 2. Comunicação. 3. Informação Compartilhamento. 4. Ciệncia da</p><p>Informação. I. Tomaél, Maria Inệs. II. Marteleto, Regina Maria.</p><p>CDU 02:316.77</p><p>Direitos reservados à</p><p>Editora da Universidade Estadual de Londrina</p><p>Campus Universitário</p><p>Caixa Postal 6001</p><p>86051-990 Londrina PR</p><p>Fone/Fax: (43) 3371-4674</p><p>e-mail: eduel@uel.br</p><p>www.uel.br/editora</p><p>Depósito Legal na Biblioteca Nacional</p><p>2015</p><p>SUMÁRIO</p><p>APRESENTAÇÃO</p><p>ANALISAR AS ‘REDES SOCIAIS’ COMO DISPOSITIVOS</p><p>INFOCOMUNICACIONAIS: UMA PROBLEMÁTICA</p><p>REDES DE APRENDIZAGEM, GRUPOS E COMUNIDADES</p><p>A COMUNIDADE CIENTÍFICA DE ANALISTAS LUSÓFONOS</p><p>DE REDES SOCIAIS: QUAL O POTENCIAL PARA A AÇÃO</p><p>COLETIVA?</p><p>CARTOGRAFIAS DA ATIVIDADE CIENTÍFICA: NOTAS</p><p>TEÓRICAS E METODOLÓGICAS</p><p>REDES COLABORATIVAS NA CIÊNCIA: ESTUDOS DE</p><p>COAUTORIA E COCITAÇÃO</p><p>REDES, CAMPO CIENTÍFICO E PROCESSOS DE</p><p>INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO EM SAÚDE</p><p>ANÁLISE DAS LIGAÇÕES DE PESQUISADORES COM</p><p>CATEGORIAS INSTITUCIONAIS: UM ESTUDO DAS REDES DE</p><p>DOIS MODOS</p><p>REDES SOCIAIS COMO NOVO MARCO INTERPRETATIVO</p><p>DAS MOBILIZAÇÕES COLETIVAS CONTEMPORÂNEAS:</p><p>OUTRAS PERSPECTIVAS</p><p>DIÁLOGOS – A MEDIAÇÃO DA INFORMAÇÃO NA</p><p>PRODUÇÃO DO ESPAÇO: A EXPERIÊNCIA DO BAIRRO</p><p>JARDIM CANADÁ, NOVA LIMA</p><p>COMUNIDADES, REDES SOCIAIS E BIBLIOTECAS PÚBLICAS</p><p>A APLICAÇÃO DA METODOLOGIA DE ANÁLISE DE REDES</p><p>SOCIAIS EM PROGRAMAS DE SAÚDE: VIABILIDADES E</p><p>PERSPECTIVAS</p><p>REDE SOCIAL EM PIRAÍ DIGITAL</p><p>CURRÍCULOS DOS AUTORES</p><p>APRESENTAÇÃO</p><p>O livro Informação e Redes Sociais: interfaces de teorias, métodos e</p><p>objetos insere-se na programação de atividades do estágio de pós-</p><p>doutorado de Maria Inês Tomaél, docente da Universidade Estadual de</p><p>Londrina (UEL), realizado no período entre agosto de 2011 e janeiro de</p><p>2012, junto ao Grupo de Pesquisa Cultura e Processos</p><p>Infocomunicacionais, coordenado por Regina Maria Marteleto, naquele</p><p>momento vinculado ao Laboratório de Pesquisa em Comunicação e Saúde</p><p>(Laces/Icict), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O foco dos estudos</p><p>realizados durante o estágio foram a revisão e a atualização de teorias,</p><p>métodos e áreas de aplicação do conceito de redes sociais e da análise de</p><p>redes sociais (ARS), com vistas a ampliar as possibilidades de exploração</p><p>do conceito e dos seus métodos correspondentes em estudos dos processos</p><p>de informação e comunicação. As pesquisadoras já vinham estudando</p><p>conjuntamente esse instrumental analítico e metodológico, conscientes de</p><p>seu caráter transversal e interdisciplinar. Daí a proposta de alargar os</p><p>ângulos disciplinares de sua abordagem, não apenas no que se refere às</p><p>diferentes teorias em foco, mas ainda às questões, objetos, terrenos e</p><p>métodos.</p><p>Alguns dos pesquisadores convidados a colaborar nesta obra são</p><p>interlocutores mais diretos das organizadoras nos estudos e debates sobre</p><p>as redes, enquanto outros se incorporaram na medida de sua produção</p><p>relevante e de interesse sobre a temática. Como se verá, a formação</p><p>multidisciplinar dos autores, além de sua diversidade internacional e</p><p>institucional, propiciou a apresentação de um conjunto diversi�cado de</p><p>teorias e abordagens sobre redes, redes sociais e seus usos nas pesquisas a</p><p>partir de eixos disciplinares representados pelas áreas de Ciência da</p><p>Informação, Ciências Sociais, Saúde, Comunicação, Arquitetura e Estudos</p><p>Urbanos, o que demonstra a amplitude de usos da perspectiva reticular e</p><p>relacional nas pesquisas cientí�cas e nas práticas sociais.</p><p>No diálogo entre as diferentes perspectivas epistemológicas, o que</p><p>transparece de imediato é a complexidade que se con�gura quando se trata</p><p>de estudar os processos humanos de interação pelo referencial das redes e</p><p>das redes sociais. Observa-se, sobremaneira, a não redução dos fenômenos</p><p>observados – sejam eles da esfera da informação, da comunicação, da</p><p>saúde, dos movimentos sociais e das comunidades – à sua manifestação</p><p>natural ou técnica, como muitas vezes ocorre nas análises mais atuais.</p><p>Antes, tais fenômenos estariam ancorados no mundo vivido, porquanto se</p><p>encontrariam inseridos em práticas socioculturais.</p><p>O espectro multidisciplinar permitiu a re�exão sobre alguns marcos</p><p>importantes do pensamento relacional, além de realizar a crítica à adesão</p><p>pouco problematizada da ideia de redes e redes sociais para interpretar os</p><p>processos de interação e participação contemporâneos. Trata-se de</p><p>questioná-las, e o seu potencial para funcionar como novo marco</p><p>interpretativo das mediações da cultura, da política, da técnica realizadas</p><p>por novos atores e linguagens na atualidade. Nesse bojo, é relevante</p><p>observar a pluralidade de métodos nos quais se apoiam os estudos</p><p>relatados na obra, desde o exploratório-teórico, as técnicas informétricas,</p><p>passando pelos estudos de comunidades online e o�ine, a ARS</p><p>propriamente dita, até as ferramentas etnográ�cas e qualitativas. A</p><p>pluralidade ainda se expressa em relação aos terrenos de aplicação, com</p><p>destaque ao campo cientí�co, aos movimentos de participação social, às</p><p>comunidades colaborativas e de aprendizagem na web, às comunidades em</p><p>contextos urbanos, além da mediação das tecnologias.</p><p>As particularidades que mobilizaram esses autores re�etem-se nos</p><p>objetivos propostos para a produção da obra:</p><p>apresentar diferentes perspectivas disciplinares de abordagem</p><p>das redes sociais, suas interfaces e aplicações, priorizando as</p><p>Ciências Humanas e Sociais;</p><p>consolidar conceitos e métodos de redes sociais;</p><p>contribuir para a quali�cação teórica e metodológica dos</p><p>estudos de redes sociais.</p><p>O livro está organizado em três partes, compostas por 12 capítulos. A</p><p>parte 1 – Redes sociais: aspectos conceituais, inclui dois capítulos inaugurais</p><p>que se complementam pelo aporte crítico e distanciado do primeiro</p><p>capítulo em relação à maneira como as Ciências da Informação e da</p><p>Comunicação na França – além do senso comum midiático – muitas vezes</p><p>aceitam e empregam de forma acrítica a noção de redes sociais, enquanto o</p><p>segundo re�ete um caminho percorrido de pesquisa que adota o conceito</p><p>para estudar as novas formas e possibilidades de aprendizagem</p><p>colaborativa. O capítulo “Analisar as ‘redes sociais’ como dispositivos</p><p>infocomunicacionais: uma problemática”, de autoria de Yves Jeanneret,</p><p>enfatiza os processos infocomunicacionais ligados à ascensão de certos</p><p>dispositivos da Web à quali�cação de “redes sociais”, transformados em</p><p>categorias sociológicas. O autor propõe quatro grandes modos de elaborar</p><p>esse “objeto concreto” como “objeto de pesquisa”, o que consiste em</p><p>considerar as redes sociais pelos seguintes prismas: a) um episódio no</p><p>projeto de trans�gurar nosso meio ambiente cultural; b) um estado</p><p>particular da relação entre mídia e texto; c) um momento no quadro da</p><p>economia política da circulação de saberes; d) um questionamento da</p><p>relação entre o trabalho da pesquisa e a inovação tecnoindustrial. O</p><p>segundo capítulo da primeira parte,,denominado Redes de aprendizagem,</p><p>grupos e comunidades, de autoria de Caroline Haythornthwaite, explora os</p><p>princípios das redes sociais com vistas ao estudo da aprendizagem, com</p><p>especial atenção à estrutura e à dinâmica das redes online e suas</p><p>con�gurações em grupos e comunidades. A autora apoia-se no pressuposto</p><p>de que o eixo de estudos das redes sociais fornece um</p><p>por dispositivos online, especialmente em função de alguns</p><p>fenômenos gerados na internet. Podemos, por exemplo, observar as</p><p>interações no twitter;8 utilizar o ToughGraphs9 para observar as conexões</p><p>na internet ou comprar um livro no Amazon; analisar os links para criar um</p><p>“mapa do conhecimento” (BOLLEN et al. 2009).</p><p>Os softwares de análise de rede10 estão se tornando cada vez mais</p><p>acessíveis e fáceis de utilizar, sendo, também, integrados à análise e à</p><p>apresentação em ambientes de aprendizagem, como, por exemplo, a</p><p>ferramenta Social Network Adapting Pedagogical Practice11 (SNAPP)</p><p>(BAKHARIA; DAWSON, 2011).</p><p>Esses desenvolvimentos facilitam a produção e a apresentação dos</p><p>resultados em rede, aumentando a compreensão geral desses tipos de</p><p>resultados e as expectativas em torno de sua apresentação. Assim, o</p><p>momento é apropriado para incluir a análise da rede, seus resultados e</p><p>recursos para ambientes de aprendizagem, com o intuito de obter maior</p><p>entendimento de como as con�gurações de rede especí�cas correspondem</p><p>a diferentes tipos de aprendizagem.</p><p>PESQUISA SOBRE REDE SOCIAL</p><p>Diversas pesquisas sobre redes sociais têm sido desenvolvidas</p><p>(BORGATTI et al., 2009; SCOTT; CARRINGTON, 2010; WASSERMAN;</p><p>FAUST, 1994; CARRINGTON; SCOTT; WASSERMAN, 2005), inclusive</p><p>aquelas em que o ensino e a aprendizagem são relacionados (DALY, 2010;</p><p>HAYTHORNTHWAITE; DE LAAT, 2012). Sem a pretensão de apresentar</p><p>uma revisão da literatura, indicamos, a seguir, algumas especialidades que</p><p>podem contribuir com a aprendizagem.</p><p>Disseminação do conhecimento</p><p>Desde a difusão da inovação até a con�ança nas fontes de informação, a</p><p>disseminação do conhecimento vem sendo reconhecida como responsável</p><p>pela difusão de novas informações. Estudos têm mostrado a importância e</p><p>a adoção de novas práticas, ou seja, a demonstração de um novo</p><p>comportamento que sugere que o aprendizado aconteceu. Tanto pelas</p><p>ideias quanto pelas tecnologias, o testemunho con�ável dos nossos</p><p>semelhantes e as evidências da prática local fazem diferença em relação ao</p><p>que nós seguimos e incorporamos em nossas próprias práticas.</p><p>As pessoas mais próximas de nós são aquelas com quem mantemos</p><p>ligações fortes, ou seja, essas ligações são sustentadas por meio de uma base</p><p>de múltiplas relações e mantidas por vários meios de comunicação, com</p><p>interação frequente, experiência compartilhada, interesse mútuo,</p><p>reciprocidade nas trocas e autorrevelação. Essas pessoas são semelhantes a</p><p>nós, participam dos mesmos círculos sociais e são expostas a informações</p><p>similares. Tal semelhança facilita o intercâmbio entre nós quando</p><p>utilizamos a mesma linguagem ou o mesmo código para a comunicação, o</p><p>que reduz o trabalho que precisamos fazer para compartilhar informações</p><p>(CLARK; BRENNAN,1991). Sabemos mais um do outro e essa “memória</p><p>transativa” nos ajuda a distinguir quem sabe o quê por toda a nossa rede</p><p>(HOLLINGSHEAD, FULK; MONGE, 2002; WEGNER, 1987).</p><p>Em contraste, na rede mantemos também ligações fracas, ou seja,</p><p>ligações baseadas em relações mais instrumentais, com menor frequência</p><p>de interação, por meio de mídias mais restritas e, geralmente, essa ligações</p><p>são com atores diferentes de nós. Sabemos pouco sobre essas pessoas,</p><p>con�amos pouco em suas informações e é pouco provável que assumamos</p><p>suas ideias ou inovações. Essa diferença, no entanto, é considerada por</p><p>Granovetter (1973) a força das ligações fracas. Essas ligações são</p><p>provenientes de diversos círculos sociais e são capazes de transmitir</p><p>informações diferentes daquelas que conhecemos por meio de nossas</p><p>ligações fortes. Embora tal in�uência possa ser tênue, as ligações fracas são</p><p>importantes para criar consciência de novas oportunidades e conexões</p><p>entre as redes sociais distintas (PUTNAM, 2000; LIN, 2008).</p><p>No campo da computação, muitos esforços foram feitos para descrever,</p><p>projetar e conectar de maneira consistente os relacionamentos de trabalho</p><p>associados às ligações fortes. Áreas como o Trabalho Cooperativo</p><p>Suportado por Computador (Computer-Supported Cooperative Work -</p><p>CSCW) detalham as tarefas desenvolvidas por pares distribuídos com o</p><p>intuito de melhorar os sistemas que dão suporte a tais ligações. Estudos</p><p>sobre ambientes de trabalho (ENGESTRÖM; MIDDLETON, 1996; LUFF,</p><p>HINDMARSH, HEATH, 2000) são importantes para a descrição do</p><p>quotidiano do trabalho como uma forma de articular e estreitar as relações</p><p>nesse âmbito. Da mesma forma, as preocupações sobre comunicação</p><p>mediada por computador e comunidades virtuais concentram-se em como</p><p>as ligações fortes são afetadas, criam iniciativas de projetos técnicos e</p><p>sociais para aumentar a “presença” e dar a sensação de “estar lá” e/ou de</p><p>“estar lá com os outros”. De forma semelhante, a pesquisa sobre</p><p>“con�ança” também explora o desenvolvimento de ligações fortes, como</p><p>relacionamentos afetivos, por exemplo, à total lealdade a uma marca e</p><p>como isso afeta o compartilhamento de informação nas organizações e o</p><p>engajamento nas atividades online, como em e-commerce.</p><p>Na área de aprendizagem, as ideias de aprendizagem colaborativa têm</p><p>enfatizado a importância de termos contato com pessoas diferentes,</p><p>reunindo e partilhando opiniões diversas como forma de ampliar o ensino</p><p>e a aprendizagem (BRUFFEE, 1993), e isso pode ser feito prestando</p><p>atenção no papel das ligações fracas. Entretanto, mesmo em ambiente</p><p>colaborativo de aprendizagem, os requisitos para desenvolvimento de</p><p>projetos em grupo fazem com que o aluno tenha a necessidade de</p><p>estabelecer ligações de trabalho mais próximas com outros alunos. Assim,</p><p>a partir de uma perspectiva de rede, um mesmo argumento pode ser</p><p>utilizado para o fortalecimento de ambos – tanto das ligações fortes</p><p>quanto das fracas (HAYTHORNTHWAITE, 2002b). Portanto, as análises</p><p>que mostram como são os dois tipos de ligações e seus respectivos papéis</p><p>não consideram a aprendizagem e o compartilhamento de informações.</p><p>Configurações em Rede</p><p>A con�guração em rede é outra especialidade importante para as redes</p><p>e que aborda as consequências que as informações causam a con�gurações</p><p>especí�cas. Uma rede com alta densidade, por exemplo, tem muitas</p><p>ligações entre seus membros. Essa situação favorece a probabilidade do</p><p>surgimento de oportunidades de interação e também de</p><p>compartilhamento de informações ou boatos. Por outro lado, em uma rede</p><p>com baixa densidade, encontramos poucas ligações entre os atores, o que</p><p>aumenta, potencialmente, o tempo necessário para que a informação</p><p>atinja a todos os participantes.</p><p>As redes são estruturadas pela posição dos atores, especialmente em</p><p>torno de um ator central, isto é, con�gurada de tal forma que toda</p><p>informação passe por esse ator antes de chegar aos outros, tais como</p><p>atores “estrela na rede” ou mediadores que são atores com alto índice de</p><p>“intermediação”, posição que minimiza, desse modo, o buraco estrutural</p><p>da rede (BURT, 1992). Alguns atores estão posicionados de forma a</p><p>representar uma “ponte” que, se removida, divide a rede em várias outras.</p><p>O �uxo da informação na rede pode percorrer um longo caminho, de modo</p><p>que a informação tenha que passar por muitos atores para chegar de uma</p><p>extremidade da rede até a outra. Podemos perceber pela con�guração das</p><p>redes atores conectados em cliques ou atores isolados que não estão</p><p>ligados, de maneira alguma, ao �uxo geral de informação da rede.</p><p>Por si só, tanto a rede com alta densidade quanto com baixa densidade</p><p>não devem ser consideradas inquestionavelmente boas ou ruins para a</p><p>troca de informações. Redes densas facilitam o intercâmbio de fatos e</p><p>�cção. Elas promovem a visibilidade constante dos atores e de suas ações,</p><p>criando tanto os aspectos positivos quanto os negativos, como em uma</p><p>cidade pequena. A rede com baixa densidade pode ajudar a manter as</p><p>informações e as ações privadas, permitindo um anonimato relativo.</p><p>As conexões da rede requerem, ainda, um tempo considerável de</p><p>manutenção. Um indivíduo com muitas ligações pode �car sobrecarregado</p><p>pela quantidade de informações que chegam</p><p>e/ou pela responsabilidade de</p><p>reencaminhar essas informações. As estruturas que auxiliam na</p><p>identi�cação de quem deve receber qual tipo de informação e/ou a quem se</p><p>dirigir para obter informações especí�cas podem ser consideradas fontes</p><p>de informação – explícitas ou como redes sociais cognitivas – e reduzem o</p><p>trabalho que toda a rede necessita para acompanhar informações</p><p>importantes. Haythornthwaite (2000) desenvolveu estudos de redes de</p><p>aprendizagem e disseminou vários trabalhos com esse mote, um dos quais</p><p>trata da visão de uma rede pessoal, cuja análise consiste no número de</p><p>ligações e relações que um único estudante mantém; outras pesquisas</p><p>analisam as ligações de estudantes em redes completas</p><p>(HAYTHORNTHWAITE, 2002a; 2006). A autora publicou, ainda, uma</p><p>discussão mais aprofundada sobre as redes e o compartilhamento de</p><p>informações (HAYTHORNTHWAITE, 2010).</p><p>Os ambientes de aprendizagem precisam ser propícios e com uma</p><p>con�guração de rede adequada para obter resultados positivos. A questão</p><p>que emerge é qual tipo de con�guração é o mais adequado para os</p><p>resultados desejados? A conclusão de uma tarefa é, geralmente, o objetivo</p><p>principal na aprendizagem. Por exemplo, em projetos, a necessidade de</p><p>cliques densamente conectados pode ser mais efetiva, enquanto, para a</p><p>aprendizagem colaborativa, a alta densidade em torno de toda a rede pode</p><p>apresentar resultados mais signi�cativos. A ressalva é que as métricas</p><p>simples, como densidade, podem deixar de captar as nuances de conteúdo</p><p>relacional em torno da rede. Nessa perspectiva, as ligações entre os atores</p><p>tornam-se importantes para compreendermos uma ligação de</p><p>aprendizagem entre os atores e o que sustenta a comunidade de</p><p>aprendizagem, tanto para prover novas informações quanto para prover</p><p>apoio que facilite a aquisição e compreensão de novos conceitos e/ou</p><p>soluções para os problemas encontrados.</p><p>A partir desse panorama, descrevo, a seguir, alguns pontos de minha</p><p>pesquisa sobre redes de aprendizagem, em que esclareço os efeitos da rede</p><p>e como elas podem ser utilizadas para tornar visível a aprendizagem.</p><p>APRENDIZAGEM: DAS LIGAÇÕES PARA AS REDES</p><p>Antes de olharmos para as redes de aprendizagem, precisamos</p><p>entender o signi�cado das ligações de aprendizagem, isto é, o que conecta</p><p>as pessoas de forma que as leve a a�rmar “eu aprendi” com esse alguém</p><p>que é meu colega de turma ou membro de minha equipe etc.</p><p>Relações e ligações</p><p>Dois estudos têm buscado evidenciar os vários segmentos que ligam as</p><p>pessoas, tanto no trabalho quanto nos relacionamentos para</p><p>aprendizagem. No primeiro estudo de Haythornthwaite e Wellman (1998),</p><p>as interações foram analisadas entre os membros de um departamento</p><p>acadêmico. Os membros do grupo responderam a 24 questões sobre o seu</p><p>trabalho e as interações sociais com outros membros do grupo, bem como</p><p>sobre o tipo de trabalho e as ligações de amizade que mantiveram com cada</p><p>pessoa. A análise desses dados revelou seis dimensões de trabalho e de</p><p>interação social. Duas dessas dimensões estão relacionadas às práticas de</p><p>trabalho: receber e prestar serviços (com 57% cada); outras duas</p><p>relacionadas aos principais produtos: Escrita Colaborativa (32%) e</p><p>Programas para Computadores (56%); e, ainda, outras duas relacionadas a</p><p>apoio social: Sociabilidade (86%) e Apoio Emocional (7%).</p><p>Em estudo posterior, qualitativo, Haythornthwaite (2006) analisou</p><p>três equipes de pesquisa interdisciplinar. Para tanto, utilizou um roteiro de</p><p>entrevista semiestruturado a �m de coletar dados sobre a interação e a</p><p>aprendizagem entre o entrevistado e outros atores com quem interagia,</p><p>regularmente, na equipe de trabalho. A análise dos dados foi baseada nas</p><p>respostas às perguntas: “com quem você aprende ou de quem você recebeu</p><p>ajuda para compreender alguma coisa?”, a qual sugeriu nove categorias de</p><p>aprendizagem. Em termos de frequência de ocorrência entre as equipes,</p><p>quatro categorias principais foram encontradas: “conhecimento factual</p><p>sobre a disciplina”, “processo para o conhecimento”, “método de</p><p>conhecimento” e “engajamento na pesquisa conjunta”. Categorias</p><p>evidenciadas em menor frequência de troca incluem: conhecimento em</p><p>tecnologia; socialização; geração de novas ideias; redes para o trabalho e,</p><p>com poucas menções, foram identi�cadas ligações baseadas na</p><p>administração.</p><p>O propósito de mencionar esses estudos para a aprendizagem analítica</p><p>consiste em destacar que as relações de trabalho e de aprendizagem são</p><p>baseadas em uma série de relações, sendo algumas instrumentais, e outras,</p><p>sociais. A partir da visualização de dimensões relacionais, foi possível</p><p>evidenciar os tipos de trocas que necessitam de apoio social, pedagógico e</p><p>técnico e que podem fornecer apoio à aprendizagem.</p><p>Os dados da pesquisa também demonstram os tipos de relações</p><p>mantidas pelos atores na rede por meio de suas ligações. Salientamos que,</p><p>no estudo das equipes de pesquisa interdisciplinar, o conhecimento factual</p><p>foi compartilhado entre as disciplinas e, de forma mais efetiva, entre o</p><p>pessoal senior, enquanto o método do conhecimento foi compartilhado</p><p>entre outros envolvidos, por meio dos aspectos metodológicos que</p><p>envolveram o trabalho. Outro aspecto da análise das redes sociais pode ser</p><p>evidenciado na pesquisa, como identi�cação dos papéis e posições baseada</p><p>nos padrões de interação social e estrutura relacional. Os papéis e/ou</p><p>posições de estrela na rede, de mediador ou de gatekeeper tecnológico já</p><p>são bem conhecidos em redes o�ine. Os ambientes virtuais estão gerando</p><p>novos tipos de papéis e posições como assistentes (wizards), novatos</p><p>(newbies) e até mesmo trolls12. Na aprendizagem online, o papel de um</p><p>“aluno-líder” foi identi�cado por Montague (2006). Preston (2008)</p><p>identi�cou outros papéis no ambiente online que atribuiu a pessoas que</p><p>contribuem nas comunidades de aprendizagem online. Além disso, muito</p><p>do que é discutido sobre o ensino online e sobre o ensino colaborativo</p><p>aponta para o impacto das mudanças de papéis, ou seja, a posição de</p><p>facilitador na rede tornou-se mais comum do que ser autoridade no</p><p>conhecimento de uma especialidade.</p><p>Ligações e utilização de mídias</p><p>Os dados da pesquisa também revelaram como o compartilhamento é</p><p>estruturado no grupo e na mídia. Dados do estudo Cerise13 e dos estudos</p><p>de interação entre os membros da classe/turma virtual revelaram que os</p><p>pares que se comunicavam com pouca frequência eram amigos super�ciais</p><p>ou mantinham apenas ligações de trabalho e ainda utilizavam poucas</p><p>mídias em relação a outros atores pesquisados. Contrariando as</p><p>expectativas de um ajuste durante a tarefa, houve um relacionamento</p><p>ligação-mídia: com a força da ligação associada ao número de mídias</p><p>utilizadas, esse dado demonstrou o efeito de multiplicidade da mídia</p><p>(HAYTHORNTHWAITE, WELLMAN, 1998).</p><p>Os estudos posteriores com alunos em ambientes virtuais também</p><p>revelaram outro efeito. Estudos que observaram os ambientes virtuais de</p><p>aprendizagem e analisaram quem conversou com quem, sobre o que e qual</p><p>a mídia utilizada para a comunicação, demostraram que o emprego das</p><p>mídias para comunicação seguiram uma escala unidimensional. As</p><p>pesquisas indicam que, quando os atores utilizam apenas uma mídia, os</p><p>contatos não são frequentes e, em geral, esse meio foi estabelecido pelo</p><p>professor como o ponto de encontro fundamental para a aula, como, por</p><p>exemplo, uma aula em tempo real, envolvendo chats e/ou que requeiram</p><p>fóruns de discussão online.</p><p>Outras mídias foram incluídas de forma consistente em cada grupo</p><p>como, por exemplo, a adoção de e-mail e telefone para aprimorar os chats e</p><p>discussões. No grupo Cerise, no qual os integrantes tinham a</p><p>oportunidade de se encontrar e compartilhar face a face, o primeiro meio</p><p>de contato foi por meio de reuniões agendadas, depois foram marcadas</p><p>aulas ou reuniões de pesquisa por e-mail, telefone e outros meios.</p><p>A importância dos meios de comunicação primários estabelecidos para</p><p>tais grupos levou à proposição de que um conjunto médio de interações</p><p>para cada grupo forma a estrutura da ligação latente, em que aqueles que</p><p>ainda não se conhecem também podem construir ligações, primeiro fracas</p><p>e, depois, fortes (HAYTHORNTHWAITE, 2002a, 2005). É impressionante</p><p>que tais estruturas só podem ser organizadas e estabelecidas por outra</p><p>autoridade que não a dos participantes da classe ou do grupo – porque, na</p><p>fase inicial, os participantes não interagem entre si. No entanto, uma vez</p><p>que as ligações começam a se formar, as ligações fortes podem, então,</p><p>buscar meios próprios de interação e mídias, fortalecendo as opções e</p><p>oportunidades de contato e aumentando a resistência das ligações em face</p><p>das mudanças nos meios de comunicação de base ou das autoridades</p><p>responsáveis por essas mídias. Isso leva a minha proposta para grupos e</p><p>comunidades de aprendizagem online a partir de uma perspectiva da rede</p><p>social.</p><p>Redes para grupos e comunidades</p><p>Nos últimos tempos, o poder dos grandes grupos é reconhecido como</p><p>meio para aquisição de conhecimento. Após muitos anos observando as</p><p>ligações fortes de comunidades e percebendo que elas são possíveis e ativas</p><p>virtualmente, grandes grupos sociais requerem atenção também às</p><p>ligações fracas.</p><p>Entretanto, crowdsourcing14 traz à tona a questão da motivação e as</p><p>razões para os indivíduos contribuírem para as iniciativas de crowdsourcing.</p><p>Esta última seção sintetiza a minha perspectiva de rede para grandes</p><p>grupos e comunidades na qual proponho a conexão entre essas duas</p><p>formas de organização ao longo de uma dimensão de ligações fracas e</p><p>ligações fortes. A continuidade entre esses coletivos pode ser encontrada</p><p>na natureza das ligações das redes sociais, como também nas ideias de</p><p>ligações latentes e do papel das autoridades nesses grupos, como descrito</p><p>anteriormente.</p><p>Em suma, vejo grandes grupos como uma estrutura colaborativa de</p><p>“peso leve” na qual “peso” refere-se à conexão interpessoal que não envolve</p><p>a produção em curso e “leve”, porque os projetos de crowdsourced não</p><p>necessitam conhecer os outros projetos e trabalhar com eles diretamente,</p><p>como uma exigência de engajamento.</p><p>Em vez disso, muitas vezes, os grandes grupos demandam um pouco de</p><p>trabalho com o mínimo de exigências de aprendizagem, além de poucas</p><p>barreiras à entrada. Por outro lado, as produções “pesadas”, ou</p><p>colaborações, exigem conhecer outros projetos, prestando atenção em sua</p><p>�nalidade, nas opiniões e contribuições. A associação entre os pares é</p><p>envolvente e complexa, baseada em convenções sociais, reputações,</p><p>recompensas e visibilidade mútua. Enquanto alguns desses elementos</p><p>podem oferecer contribuições, a associação apenas consegue se manter</p><p>com um núcleo participantes comprometidos. A estrutura “leve” poderia</p><p>sobreviver a uma mudança completa de participantes, pois sua operação é</p><p>dependente de uma autoridade que de�ne e gerencia a atividade de</p><p>interação.</p><p>Ambas as ideias, leve e pesada, foram descritas com mais detalhes em</p><p>estudos de Haythornthwaite (2009; 2011). Em suma, o modelo “leve”</p><p>opera com base na discrição, contribuições uniformes apresentadas por</p><p>indivíduos que não mantêm ligações, como mencionado na revisão15 de</p><p>literatura dos textos. O modelo “leve” aceita contribuições semelhantes,</p><p>exigindo pouco aprendizado ou treinamento para sua apresentação, com</p><p>ligações fracas, ou não, entre as contribuições e o compromisso de</p><p>vinculação e contribuições futuras. Esse modelo depende de interesse para</p><p>se tornar um projeto global, mas não de um interesse dos demais</p><p>contribuintes.</p><p>Diferentemente, o modelo “pesado” opera com base na atenção dos</p><p>outros e com suas contribuições, assim como em indivíduos que adicionam</p><p>suas diferentes contribuições, como, por exemplo, na comunicação</p><p>acadêmica revisada. Esse modelo depende da atenção para que se consolide</p><p>a �nalidade da produção dos pares para com os membros associados à</p><p>comunidade. O modelo pesado depende de diferentes tipos e tamanhos de</p><p>contribuições. Para que ocorra a contribuição, há a necessidade de processo</p><p>de ensino e aprendizagem, com atenção à interconexão entre os</p><p>colaboradores e os materiais acrescentados por eles. Além disso, deve</p><p>haver um compromisso destes em participar, permanecer e contribuir de</p><p>forma contínua.</p><p>Fatores motivacionais para a contribuição em modelos de grande</p><p>participação podem estar ligados ao reconhecimento e à recompensa, mas</p><p>os fatores para a participação “leve” não são tão claros. Do ponto de vista</p><p>individual, entendo que a motivação para a participação deriva de</p><p>coorientação para o projeto crowdsourced – como o seu conteúdo, a sua</p><p>plataforma etc. Por exemplo, em um estudo sobre motivação relacionado à</p><p>contribuição para o OpenStreetMap,16 Budhathoki (2010) descobriu que</p><p>as ligações presentes em regiões locais e os princípios de open source</p><p>contribuem para esse projeto. Enquanto a carreira individual ou as</p><p>recompensas futuras podem ser vinculadas a esse tipo de contribuição, um</p><p>esforço extremo será necessário, dependendo do interesse comum para</p><p>transformar os participantes, ao mesmo tempo que essa ação modi�ca o</p><p>sentido do reconhecimento e se vê obrigada a fornecer recompensas para</p><p>manter seus membros.</p><p>As empresas de aprendizagem abrangem uma gama de sites de ajuda</p><p>online de conteúdo gerado pelo próprio usuário, para comunidades virtuais</p><p>de alunos e para a produção de conhecimento. As dimensões dos modelos</p><p>– pesado e leve – sugerem formas de organização para os diferentes tipos</p><p>de produção entre os pares. Mesmo que a ênfase seja nos modelos de</p><p>aprendizagem “pesados”, a estrutura “leve” proporciona meios para que</p><p>observadores não participantes (lurker), novatos e os novos membros</p><p>comecem a contribuir antes de assumir o comprometimento do modelo.</p><p>Esses dois eixos da produção coletiva sugerem tanto formas de modelagem</p><p>quanto de monitoramento da interação online, como, por exemplo,</p><p>constatar se o ambiente de aprendizagem tornou-se um modelo pesado, se</p><p>a comunidade é autossustentável ou se estagnou devido a questões como a</p><p>rotatividade dos membros, estruturas de autoridade ou falta de reputação</p><p>e estruturas de recompensa.</p><p>SÍNTESE</p><p>Esta breve consideração do aprendizado é feita mediante uma</p><p>perspectiva da rede social. Ela só pode ser aceita como geradora de ideias</p><p>para novas pesquisas e para a aplicação de aprendizagem analítica, com as</p><p>considerações geradas sobre a forma de integrar e combinar perspectivas</p><p>de rede social com o maior número de aprendizagem de técnicas analíticas.</p><p>Em resumo, vejo que a perspectiva de rede fornece as seguintes maneiras,</p><p>segundo as quais a aprendizagem manifesta-se ou pelas quais ela pode ser</p><p>representada e dirigida:</p><p>O aprendizado pode ser a relação que conecta pessoas;</p><p>O aprendizado pode ser a caracterização do vínculo, com base</p><p>em múltiplas relações contextualmente determinadas, que</p><p>apoiem o relatório de aprendizagem ou evidência de</p><p>aprendizado;</p><p>As relações de aprendizagem podem ser tomadas tanto para a</p><p>entrada para o projeto, seja social, seja técnico, quanto para a</p><p>análise das relações que mostra a mistura da interação</p><p>educacional e social que dá suporte à aprendizagem, ou quando</p><p>a tecnologia pode ser trazida para apoiar uma ou mais dessas</p><p>relações;</p><p>O aprendizado pode ser uma caracterização do resultado das</p><p>relações, como, por exemplo, quando um grupo se torna uma</p><p>comunidade de aprendizagem</p><p>O aprendizado como o resultado da rede de relações, o capital</p><p>social ou de aprendizagem da rede e, assim, examinados para o</p><p>apoio das interações do capital social de conhecimentos e da</p><p>avaliação contínua do conhecimento e da aquisição;</p><p>A aprendizagem como um contato com a in�uência do</p><p>ambiente, como a aprendizagem informal e ubíqua, que leva ao</p><p>interesse e à participação na produção de conhecimentos.</p><p>Embora grande parte da aprendizagem analítica possa incidir sobre a</p><p>classe e/ou a instituição de ensino, vejo também que há muitas</p><p>transformações acontecendo no aprendizado por meio da web, em</p><p>produções de pares de colaboração e aprendizagem</p><p>móvel e ubíqua, que</p><p>estão igualmente abertas ao exame da perspectiva de uma aprendizagem</p><p>em redes e da perspectiva da aprendizagem analítica. Para poder avançar</p><p>nos estudos de aprendizagem de uma perspectiva analítica de rede,</p><p>aguardo por novas pesquisas que abordem a aprendizagem no que se refere</p><p>às ligações das redes sociais, às redes e aos grupos e comunidades.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BAKHARIA, A.; DAWSON, S. SNAPP: A bird’s-eye view of temporal participant interaction. In:</p><p>INTERNATIONAL CONFERENCE ON LEARNING ANALYTICS AND KNOWLEDGE, 1., fev.-</p><p>mar./2011. Proceedings… Ban�, AB: LAK’11, 2011.</p><p>BOLLEN, J. et al. Clickstream data yields high-resolution maps of science. PLoS ONE, v. 4, n. 3, p.</p><p>e4803, 2009.</p><p>BORGATTI, S. T. et al. Network analysis in the social sciences. Science, n. 323, p. 892-895, 2009.</p><p>BRUFFEE, K. A. Collaborative Learning: Higher Education, Interdependence, and the Authority of</p><p>Knowledge. Baltimore: John Hopkins University, 1993.</p><p>BUDHATHOKI, N. R. Participants’ Motivations to Contribute Geographic Information in an Online</p><p>Community. 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New York: Springer-Verlag, 1987. p. 185-208.</p><p>6 Texto original em inglês - Learning networks, crowds and communities – publicado em LAK ‘11</p><p>Proceedings of the 1st International Conference on Learning Analytics and Knowledge. ACM New</p><p>York, NY, USA ©2011. p.18-22. Texto traduzido por Barbara Calixto Mimura.</p><p>7 Exemplos de visibilidades das redes são demonstrados no texto de Trier (2007) e no site Visual</p><p>Complexity. Disponível em : <http://www.visualcomplexity.com/vc/>.</p><p>8 Disponível em: <http://networkweaver.blogspot.com/2011_02_01_archive.html>.</p><p>9 Disponível em: <http://www.touchgraph.com/>.</p><p>10 Lista de softwares. Disponível em : <http://www.gmw.rug.nl/~huisman/sna/software.html>.</p><p>11 Disponível em: <http://research.uow.edu.au/learningnetworks/seeing/snapp/index.html>.</p><p>12 Nota da Tradutora: Gíria da Internet que denomina a pessoa que desestabiliza um espaço de</p><p>discussão.</p><p>13 Nota da Tradutora: Cerise é o pseudônimo que Haythornthwaite deu ao seu primeiro estudo, em</p><p>que pesquisou a utilização dos meios de comunicação entre pesquisadores acadêmicos</p><p>(HAYTHORNTHHWAITE; WELLMAN, 1998).</p><p>14 Nota da Tradutora: Expressão empregada na Internet para designar as contribuições coletivas</p><p>que geram conhecimento.</p><p>15 Disponível em: <http://www.pgdp.net>.</p><p>16 Nota da Tradutora: “O OpenStreetMap é desenvolvido por uma comunidade voluntária de</p><p>mapeadores que contribuem e mantêm atualizados os dados sobre estradas, trilhos, cafés, estações</p><p>ferroviárias e muito mais por todo o mundo.” Disponível em :</p><p><http://www.openstreetmap.org/#map=2/60.2/48.9>.</p><p>https://calibre-pdf-anchor.a/#a25</p><p>http://www.visualcomplexity.com/vc/</p><p>http://www.openstreetmap.org/#map=2/60.2/48.9</p><p>A COMUNIDADE CIENTÍFICA DE ANALISTAS LUSÓFONOS</p><p>DE REDES SOCIAIS: QUAL O POTENCIAL PARA A AÇÃO</p><p>COLETIVA?</p><p>Marta Pedro Varanda</p><p>Breno Fontes</p><p>Raquel Rego</p><p>Klaus Eichner</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>O crescimento exponencial da análise de redes sociais (ARS) nos países</p><p>anglo-saxônicos, em especial a partir dos anos 1970, tem sido</p><p>testemunhado por vários autores (SCOTT; CARRINGTON, 2011;</p><p>FREEMAN, 2004; KNOKE; YANG, 2008). Já o uso da ARS na comunidade</p><p>cientí�ca lusófona tem menos de 20 anos (VARANDA et al., 2012). Apesar</p><p>do atraso do seu desenvolvimento, a que não será alheio o próprio atraso</p><p>do desenvolvimento das ciências sociais de um modo geral, os autores</p><p>deste texto têm a percepção de que a ARS tem ganhado um novo fôlego.</p><p>Essa percepção foi formada a partir da nossa experiência</p><p>de dinamização</p><p>de iniciativas nessa área cientí�ca: encontros de analistas de redes sociais,</p><p>em Portugal, desde 2007, um grupo de trabalho em ARS no Congresso</p><p>Luso-Afro-Brasileiro em Ciências Sociais, no Brasil, em 2011, um painel de</p><p>conferência no SUNBELT de 2010, entre outros. Esses eventos têm</p><p>revelado que os investigadores, salvo algumas exceções, não se conhecem</p><p>e, não sendo uma comunidade cientí�ca no sentido de se relacionar,</p><p>compartilhar ou cooperar, veri�cam-se manifestações de interesse em criar</p><p>sinergias.</p><p>Ao fazermos uma ARS com essa comunidade, a nossa motivação é</p><p>precisamente perceber como as características estruturais afetam o</p><p>comportamento dos atores, indo além das descrições normativas, dos</p><p>atributos pessoais e das relações diádicas. Uma ARS concentra-se no</p><p>estudo de como os padrões de ligações numa rede afetam o acesso das</p><p>pessoas e das instituições a recursos como a informação, a riqueza e o</p><p>poder (WELLMAN, 1983).</p><p>O desa�o que nos colocamos foi o de olhar as estruturas de</p><p>interdependência da ARS lusófona do presente e re�etir sobre o seu</p><p>potencial de ação coletiva, isto é, a sua capacidade de desenvolver um</p><p>projeto com objetivos comuns, de difundir e institucionalizar a ARS no</p><p>meio cientí�co. Questionamo-nos, por exemplo, por que é que, ao longo</p><p>desses últimos 20 anos, a ARS lusófona não se institucionalizou? Que</p><p>constrangimentos têm impedido o seu desenvolvimento mais vigoroso?</p><p>Que evolução é expectável?</p><p>ENQUADRAMENTO TEÓRICO</p><p>Sobre os processos de Inovação e difusão de um novo campo</p><p>de saber</p><p>Nessa fase de desenvolvimento, a utilização de ARS pode ser vista</p><p>ainda como um comportamento inovador. Isso porque, e ainda com base</p><p>na nossa observação enquanto investigadores nessa área cientí�ca,</p><p>percebemos que, para muitos, a ARS é uma atividade ainda</p><p>frequentemente solitária e resultante de autodidatismo. Trata-se, por</p><p>conseguinte, de um investimento algo arriscado e com um componente</p><p>importante de incerteza, que implica escolher entre uma agenda com</p><p>pouca visibilidade (portanto, com maior possibilidade de fracasso na busca</p><p>de recursos) e outra, consolidada. Para muitos, a aposta na ARS tem um</p><p>potencial de retorno reduzido, pois não existe a possibilidade de ensino</p><p>dessas disciplinas – de um modo geral desconhecidas no meio universitário</p><p>e ausentes dos currículos –, o que limita também as oportunidades de</p><p>captação de estudantes.</p><p>Ora, a introdução de uma inovaçãos implica mudanças nos sistemas</p><p>sociais que estão geralmente estruturados para lhes resistir (CROZIER;</p><p>FRIEDBERG, 1977). No caso do subsistema cientí�co em análise, temos</p><p>que o status quo controla os departamentos que decidem sobre o</p><p>recrutamento, sobre os currículos universitários e sobre o �nanciamento a</p><p>ser atribuído a projetos. Como as ideias e práticas estabelecidas têm um</p><p>campo de recursos mais ou menos consolidado, um conjunto de apoiantes</p><p>e um orçamento próprio, implementar uma nova ideia ou prática envolve a</p><p>mobilização de adeptos e apoios para a realocação de recursos. Aqui, os</p><p>processos de in�uência social têm um papel importante. Embora esses</p><p>estudos foquem essencialmente a tendência para a conformidade</p><p>(FESTINGER, 1954; FESTINGER et al., 1950), sabe-se que a in�uência</p><p>social se pode exercer para modi�car o meio, substituindo o status quo. A</p><p>minoria inovadora, não tendo o poder nem as competências necessárias</p><p>para se impor à maioria, pode, ainda assim, tornar-se uma força ativa de</p><p>in�uência se assumir uma posição clara e coerente (DOMS; MOSCOVICI,</p><p>1992). O desenvolvimento, institucionalização e legitimação de uma nova</p><p>área cienti�ca implica, pois, um processo político e simbólico, no sentido</p><p>de que existem recursos a serem estrategicamente conquistados e que se</p><p>têm que promover saberes e práticas que vão contra o status quo (LAZEGA,</p><p>1992; PIÑA-STRANGER, 2011).</p><p>Desenvolvimento da ARS lusófona: um projeto coletivo?</p><p>O processo de desenvolvimento da ARS no seio da comunidade</p><p>cientí�ca lusófona será aqui abordado como uma ação coletiva cuja</p><p>viabilidade passa pela mobilização de investigadores e recursos e pela</p><p>coordenação de esforços, mas uma ação coletiva levanta diversos</p><p>problemas. Por um lado, sabe-se que os objetivos coletivos não podem ser</p><p>realizados individualmente (OLSON, 1965). Por outro lado, sabe-se que o</p><p>empenho na ação coletiva normalmente di�culta (ou pode mesmo ir</p><p>contra) a realização dos objetivos individuais, e, como tal, é difícil motivar</p><p>a participação e manter o compromisso dos indivíduos nesse projeto</p><p>(REYNAUD, 1997). Aqui, o problema dos caronas (free riders) pode</p><p>constituir um obstáculo considerável.</p><p>No âmbito dos estudos sobre ação coletiva, a nossa análise se bene�cia</p><p>das teorias de movimentos sociais, sobretudo no que diz respeito à</p><p>questão da mobilização de recursos (MCCARTHY; ZALD, 1977; SNOW et</p><p>al., 1980), além da questão da coordenação da ação, tratada na literatura</p><p>mais geral de ação coletiva (OLSON, 1965; REYNAUD, 1997; HECTHER,</p><p>1984; LAZEGA, 2001). Considera-se aqui que uma ação coletiva implica</p><p>dois processos: a mobilização ou recrutamento dos atores para a ação</p><p>coletiva e o seu compromisso ou empenho com uma estratégia</p><p>coordenada.</p><p>No que concerne à questão da mobilização, diversos estudiosos de</p><p>movimentos sociais (OBERSCHALL, 1993; TILLY, 1978) chamaram a</p><p>atenção para a importância das ligações fortes com participantes de um</p><p>projeto coletivo como elementos facilitadores da mobilização e</p><p>reconheceram que quanto mais a pessoa está integrada, mais fácil é</p><p>mobilizar. Só mais tarde surge uma conceptualização baseada nas redes</p><p>interpessoais (SNOW et al., 1980) e chama-se a atenção para as bases</p><p>“microestruturais” dos movimentos sociais17 (FERNANDEZ; MCADAM,</p><p>1988). Estes autores a�rmam, ainda, que, para além da integração em</p><p>redes pessoais, a integração em organizações relacionadas à atividade em</p><p>causa torna mais provável a mobilização. Ou seja, a identidade com o</p><p>grupo só se concretiza em mobilização quando existem laços</p><p>organizacionais que suportam essa participação.</p><p>No que diz respeito à questão da coordenação, o problema subjacente é</p><p>que o individuo tem de passar de uma ação concebida individualmente</p><p>para uma ação concebida coletivamente e, para tal, há que pôr em prática</p><p>mecanismos de cooperação. Com efeito, sabe-se há muito (CROZIER;</p><p>FRIEDBERG, 1977; REYNAUD, 1997; OLSON, 1965) que um coletivo de</p><p>indivíduos, com objetivos idênticos, não forma necessariamente um grupo</p><p>capaz de ação coletiva. Mesmo se o resultado da estratégia coordenada está</p><p>no interesse de todos (ou da maior parte), o esforço de coordenação, a</p><p>integração das diferentes estratégias em uma única e os custos que isso</p><p>gera podem colocar entraves à cooperação. Para que a ação coordenada</p><p>tenha sucesso, é necessário incentivar os não cumpridores (free riders) a</p><p>participarem – por meio de incentivos seletivos, positivos ou negativos (ou</p><p>sanções, isso no caso de se tratar de um pequeno grupo) (OLSON, 1965). É</p><p>sabido que, em um coletivo informalmente ligado (“loosely coupled”) e</p><p>composto por pares (professores e investigadores) – à medida que não</p><p>existe uma diferenciação hierárquica importante entre eles –, a concepção</p><p>e a colocação em prática de incentivos seletivos e sanções é muito difícil,</p><p>constituindo em si um problema de ação coletiva (o chamado problema do</p><p>carona – free rider – de segunda ordem) (HECHTER, 1984; LAZEGA,</p><p>2001). Nesse caso, temos que falar mais de incentivos positivos à ação</p><p>coletiva, sanções positivas (HECHTER, 1984), do que penalizações, ou</p><p>sanções negativas.18 Portanto, em sistemas sociais, como o que é aqui</p><p>estudado, a cooperação é mais difícil porque a criação das instituições e o</p><p>seu controle é um bem coletivo.</p><p>Mobilização e coordenação: duas dinâmicas em tensão</p><p>As dinâmicas subjacentes a cada uma das dimensões a considerar,</p><p>mobilização e coordenação, resultam de forças impulsionadoras que estão</p><p>em potencial tensão. Essas duas dimensões têm um peso diferente em</p><p>momentos diferentes</p><p>do desenvolvimento de uma ação coletiva, mas estão</p><p>sempre presentes, em maior ou menor grau. Essa tensão deve-se ao fato de</p><p>que investimentos relacionais diferentes têm que ser acionados durante as</p><p>diferentes fases da ação coletiva. Na fase de desenvolvimento da ação</p><p>coletiva é necessário captar novos recursos (humanos, �nanceiros,</p><p>conhecimento etc.) e, para isso, há que se abrir o sistema social ao exterior</p><p>(SNOW et al., 1980; GOULD, 1991). Nesse contexto, são os laços fracos</p><p>(GRANOVETTER, 1973) que têm maior preponderância, pois a capacidade</p><p>de bridging (PUTNAM, 2001) ou brokerage (BURT, 1992; 2005) é que vai</p><p>permitir o crescimento do sistema social. Um sistema social com</p><p>capacidade para crescer tem que incluir atores ligados por laços fracos a</p><p>outros sistemas sociais, laços que façam a ponte para esses outros sistema</p><p>sociais e que permitam o acesso a recursos desconhecidos e</p><p>potencialmente diferentes de diversos tipos, tais como informação, ideias,</p><p>�nanceiros etc. Esse tipo de laços é que facilita a ligação entre segmentos</p><p>da rede desligados entre si (segmentos esses que podem, no entanto, estar</p><p>fortemente ligados no seu interior). Ou seja, sem esse tipo de laços, as</p><p>diferentes comunidades ou grupos existentes em um sistema social não</p><p>teriam acesso ao conhecimento ou recursos de cada um.19</p><p>Por outro lado, um sistema social com maior capacidade de</p><p>coordenação, é composto por redes coesas em que atores estão ligados</p><p>entre si por laços fortes20 (COLEMAN, 1990). Isso porque, como vimos</p><p>antes, a criação e imposição de sanções é mais fácil em redes coesas, isto é,</p><p>com densidade mais alta, nas quais os custos de não respeitar as regras do</p><p>jogo são mais altos para os atores (FESTINGER et al., 1950). Sendo assim,</p><p>são os sistemas sociais coesos que têm uma maior capacidade de agir</p><p>coletivamente. Essa força para o fechamento da rede é muito forte,21 por</p><p>isso, os sistemas sociais, tendencialmente, mantêm o status quo.</p><p>O problema é que essa coesão implica uma diminuição da sua</p><p>capacidade de bridging/brokerage, de relação com o exterior, e tem como</p><p>consequência a redundância da informação e do conhecimento que circula</p><p>na rede, inibindo, assim, a inovação e o crescimento do sistema social. No</p><p>entanto, Burt (1992), com a teoria dos buracos estruturais, chamou a</p><p>atenção para os incentivos ao brokerage no contexto organizacional.</p><p>Segundo ele, os indivíduos cujas relações atravessam os buracos</p><p>estruturais22 (BURT, 1992) têm uma visão mais alargada dos problemas e</p><p>mais facilmente detectam oportunidades e desenvolvem novas ideias.</p><p>Esses indivíduos são normalmente recompensados, por isso, por exemplo,</p><p>acedendo à informação a que outros não têm acesso (ou, no contexto</p><p>organizacional, podem ter até recompensas �nanceiras e de estatuto).</p><p>Ainda assim, em contextos sociais fracamente estruturados (“loosely</p><p>coupled”), isto é, sem uma estrutura organizacional formal, as</p><p>recompensas ligadas ao bridging/brokerage podem não ser óbvias ou</p><p>imediatas, ou podem até ser inexistentes, pois estes são investimentos</p><p>relacionais mais imprevisíveis, porque desconhecidos.</p><p>A superação dessas tensões, ou seja, mobilizar, por meio de laços fracos</p><p>(bridging/brokerage) e coordenar fechando a rede (closure) por meio de laços</p><p>fortes, é que permite a um sistema social se desenvolver e se manter no</p><p>tempo. Recentemente, tem-se defendido que um misto de closure e</p><p>brokerage favorece a ação coletiva em diversos tipos de sistemas sociais.</p><p>Esse argumento está presente na literatura que enfoca as questões de</p><p>desenvolvimento de uma comunidade, relacionadas com o seu capital</p><p>social, mas também às organizações. Também Burt (2005) reconhece que,</p><p>enquanto a mediação/brokerage entre buracos estruturais adiciona valor, o</p><p>fechamento/closure pode ser crítico na realização do valor inscrito nos</p><p>buracos estruturais (BURT, 2005).</p><p>O papel da liderança nos processos de ação coletiva</p><p>Falta-nos, ainda, referir que, para a emergência e manutenção de uma</p><p>ação coletiva, são necessários indivíduos ou grupos de indivíduos que</p><p>assumam um papel de liderança por terem um especial interesse no</p><p>projeto coletivo e recursos su�cientes (materiais, mas também de</p><p>competência, conhecimento, experiência) para investir na sua</p><p>concretização (MARWELL; OLIVER, 1993). Uma liderança com essas</p><p>características tem a capacidade de criar uma identidade comum e de</p><p>transportar os indivíduos para visões de longo prazo, fazendo-os acreditar</p><p>que o esforço da coordenação da ação valerá a pena (MELUCCI, 1996).</p><p>Com uma liderança competente, os riscos de adesão a uma inovação – uma</p><p>nova área cienti�ca – diminuem, e cresce o sentimento de que existem</p><p>benefícios superiores aos custos. Mas, ao se considerar que a existência de</p><p>uma liderança dotada de recursos é uma condição necessária à ação</p><p>coletiva, nem todos os contextos favorecem a emergência e e�cácia de tal</p><p>liderança. Em alguns contextos, tais como os organizacionais, a liderança</p><p>traz muitos benefícios, tais como o reconhecimento, o estatuto social para</p><p>além das potenciais recompensas econômicas e �nanceiras, mas, em</p><p>outros contextos pouco estruturados (loosely coupled), como o estudado</p><p>aqui, ela pode ter mais custos que benefícios. Nesses, a liderança é</p><p>informal, exige geralmente maior sacrifício pessoal e mais demonstrações</p><p>de empenho e exemplo, sem que haja, necessariamente, os benefícios</p><p>correspondentes habituais em contextos organizacionais (OBERSHALL,</p><p>1993; MELLUCCI, 1996). Esses líderes informais não têm os recursos</p><p>necessários à realização dos objetivos coletivos, portanto, não podem</p><p>atribuir incentivos materiais (como, por exemplo, promoções, ou bolsas de</p><p>pesquisa ou �nanciamento para projetos) nem têm a capacidade de acionar</p><p>meios de coerção sobre quem não segue o projeto coletivo (como, por</p><p>exemplo, obstaculizar promoções, ou subtração dos meios necessários à</p><p>investigação). Esses líderes necessitam de estratégias informais,</p><p>psicológicas e de motivação para a cooperação, que são geralmente mais</p><p>difíceis de concretizar (LAZEGA, 1998).</p><p>Na literatura da ARS, os líderes de um sistema social são identi�cados</p><p>pela sua posição central na rede (FREEMAN, 1979). No caso particular dos</p><p>estudos sobre difusão de inovações, os líderes, no sentido de serem os que</p><p>adotam primeiro a inovação, estão em geral localizados na periferia da</p><p>estrutura relacional (MENZEL,1960) e têm alta centralidade de</p><p>intermediação, níveis de limiar baixos (threshold levels) (GRANOVETTER,</p><p>1978) e baixa densidade da ego-rede, isto é, a ego-rede estende-se a outros</p><p>grupos em vez de fechar o ator em um grupo só (VALENTE, 1995;</p><p>DEGENNE; FORSÉ, 1999). Já os atores que terão maior capacidade de</p><p>difundir a inovação são um tipo de líderes que têm de estar bem integrados</p><p>ao sistema, exercendo alta centralidade de grau, pois disso depende a sua</p><p>legitimidade e capacidade de in�uenciar os outros a adotar inovações que</p><p>implicam a mudança de ideias e comportamentos.</p><p>METODOLOGIA</p><p>Nesta investigação, o trabalho empírico de coleta de dados dividiu-se</p><p>em duas fases. Em um primeiro momento, �zemos pesquisa documental,</p><p>sendo o objetivo primeiro a identi�cação de (co)autores – lusófonos ou</p><p>radicados em países lusófonos – de artigos com ARS aplicada.23 Para o</p><p>caso do Brasil, usamos na pesquisa o Banco de Teses da CAPES, o Diretório</p><p>dos Grupos de Pesquisa do CNPq, o Banco de Informações bibliográ�cas do</p><p>SciELO, além de pesquisas no Google Acadêmico. Em Portugal, não</p><p>havendo nenhuma base que integre todas as publicações/investigadores, as</p><p>buscas tiveram de ser feitas em diferentes bases de dados. Recorremos,</p><p>ainda, a bases internacionais, como a SciELO, B-on, ISI web of knowledge.</p><p>Identi�caram-se no Brasil 62 e, em Portugal, 22 autores e coautores de</p><p>artigos cientí�cos com aplicação de ARS, ou seja, ao todo foram 84 autores</p><p>de língua portuguesa.</p><p>Em um segundo momento, disponibilizou-se um questionário online</p><p>dirigido aos autores daqueles artigos (de novembro 2010 a maio 2011). A</p><p>taxa de resposta �cou nos 55%: 51,6% (32 respondentes) no Brasil e 59%</p><p>(13 respondentes) em Portugal, ou seja, a nossa amostra é composta por</p><p>um total de 45 autores. Tendo em conta as médias praticadas nessa</p><p>modalidade de pesquisa, este resultado é satisfatório. Além disso, apenas</p><p>três autores no Brasil e um em Portugal, que foram nomeados por outros</p><p>como seus “conselheiros”, não responderam ao questionário. Portanto, só</p><p>esses quatro casos são considerados uma limitação importante do estudo.</p><p>Observa-se que, no que diz respeito à colaboração, outros sete nomeados</p><p>não responderam ao questionário, mas não constavam da nossa base.24</p><p>Uma das formas pragmáticas de lidar com o problema dos “missings”</p><p>tem sido a rede�nição da “fronteira”, estabelecida previamente</p><p>(KOSSINETS, 2006). Neste estudo, tomamos essa opção �cando assim</p><p>com uma matriz quadrada de 45x45, que foi analisada com o uso do</p><p>software UCINET V, versão 6.347 (BORGATTI; EVERETT; FREEMAN,</p><p>2002) e do Netdraw 2.111 (BORGATTI, 2002) para a representação grá�ca.</p><p>Tendo em conta o meio de coleta de dados, estabeleceu-se que o</p><p>questionário fosse o mais claro e curto possível. Por meio de dois grandes</p><p>grupos de questões, procurou-se conhecer o per�l sociográ�co e a</p><p>trajetória acadêmica e pro�ssional dos autores (coletaram-se dados como</p><p>idade, sexo, quali�cações acadêmicas, mas também �liação institucional,</p><p>área disciplinar de atividade, percurso pro�ssional) e obter dados relativos</p><p>à utilização da ARS, desde o estímulo inicial principal às iniciativas de</p><p>divulgação em que esteve envolvido, passando pelas redes de colaboração,</p><p>aconselhamento e coautoria.</p><p>Neste texto, daremos primordial atenção aos dados sociométricos,</p><p>utilizando só secundariamente os dados do per�l sociográ�co (mais uma</p><p>vez remetemos o/a leitora/a interessado/a em uma análise mais</p><p>abrangente para Varanda et al., 2012).</p><p>ANÁLISE E DISCUSSÃO DE DADOS</p><p>Tendo con�rmado um fraco desenvolvimento e lenta</p><p>institucionalização da área cientí�ca de ARS na lusofonia, procuramos</p><p>identi�car, por meio de uma ARS, os fatores que, na estrutura relacional</p><p>dos analistas de redes, permitem-nos dizer sobre o que tem inibido esse</p><p>crescimento, assim como os fatores que indiciam capacidade e potencial de</p><p>mobilização e de coordenação de esforços ainda não explorada. A análise</p><p>enfocará, em uma rede multiplexa, que nesse caso se refere à matriz criada</p><p>a partir da soma das três relações: colaboração, conselho e coautoria.25</p><p>Essa matriz multiplexa foi dicotomizada seguindo os critérios de que os 1’s</p><p>equivalem à existência de duas ou mais relações e os 0’s à existência de</p><p>uma só relação. Ou seja, incluímos aqui uma medida de força da relação,</p><p>visto que esta é um fator importante a considerar quando se analisam as</p><p>condições para a ação coletiva.</p><p>Caracterização das redes globais</p><p>Começamos por dar uma imagem da rede global. A simples visualização</p><p>da rede transmite-nos informação importante, designadamente as divisões</p><p>geográ�cas existentes que parecem di�cultar a interação entre</p><p>investigadores, resultando numa rede fragmentada.</p><p>Figura 1: Rede Global</p><p>Legenda: 1) São Paulo: circulo; 2) Paraná: quadrado; 3) Bahia: triângulo; 4) Minas Gerais: quadrado</p><p>com cruz; 5) Lisboa: triângulo invertido; 6) Santa Catarina: circulo dentro de quadrado; 7)</p><p>Pernambuco: diamante; 8) Funchal (Madeira): cruz; 9) Évora: Triângulos sobrepostos; 10) Coimbra:</p><p>quadrado com triângulo; 11) S. Miguel (Açores): Círculo com traço no meio; 12) Aveiro: Círculo com</p><p>cruz; 13) Rio de Janeiro: quadrado com traço invertido.</p><p>No Quadro 1, temos as medidas da rede global que nos permitem</p><p>aprofundar a informação já transmitida por meio da visualização.</p><p>Quadro 1: Medidas de caracterização da rede global</p><p>Densidade</p><p>Grau</p><p>médio</p><p>Coe�ciente de</p><p>clustering global</p><p>Isolados</p><p>a)</p><p>Reciprocidade Transitividade Centralização</p><p>0,0253 1,111 0.464 16 0.6250 21.74% 6.715%</p><p>n=45</p><p>Nota: para esta análise, as matrizes foram simetrizadas exceto na medida de reciprocidade e</p><p>transitividade.</p><p>a) Atores que têm menos de duas relações com outros.</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011).</p><p>Os valores da densidade (0,0253) e grau médio (1,111) apresentados</p><p>no Quadro 1 revelam a baixa interação entre os seus atores nas relações</p><p>mais fortes (que envolvem dois ou mais tipos de relação), que inclui 16</p><p>isolados (35,5% de atores que não têm qualquer relação com os outros ou</p><p>só uma relação entre as 3 contabilizadas). Se acrescentarmos que o</p><p>coe�ciente de agregação global (overall graph clustering coe�cient)26 é de</p><p>0,464, portanto, muito superior à densidade global do grafo, isso revela</p><p>que a atividade dessa rede se desenrola muito na vizinhança local dos</p><p>atores, ou seja, há uma forte tendência para clustering nessa rede</p><p>(HANNEMAN; RIDDLE, 2011). Ainda com base no Quadro 1, �camos</p><p>sabendo que existe uma reciprocidade considerável: 0,6250. Esse nível de</p><p>reciprocidade sugere que há um grau bastante razoável de relações</p><p>horizontais nessa população, ou seja, o fato de não predominarem as</p><p>relações assimétricas indica-nos que o tipo de relação entre atores tem um</p><p>caráter pouco hierárquico. No que diz respeito à transitividade,27 esta é</p><p>bastante baixa, 21,74%, o que nos indica que este é um sistema social</p><p>pouco estável e com baixa institucionalização, ou seja, um sistema social</p><p>em que as relações ainda precisam ser construídas, não sendo, pois, um</p><p>dado adquirido. É de notar, ainda, a baixa centralização28 da rede. O fato</p><p>de esta rede ser muito esparsa e muito descentralizada torna mais difícil a</p><p>coordenação da ação por esse conjunto de pesquisadores. Essa</p><p>con�guração da rede global é coerente com a da comunidade cientí�ca</p><p>internacional nos seus primórdios, tal como descrita por Freeman (2004).</p><p>Fatores potencialmente inibidores da coordenação da ação</p><p>Nesta seção, aplicaremos outras medidas de ARS que nos permitirão</p><p>reforçar a ideia de que esta é uma rede muito fragmentada, o que, como</p><p>vimos, é um fator inibidor da coordenação de esforços.</p><p>Por meio da análise de componentes, é facilmente perceptível essa</p><p>enorme fragmentação do sistema social.</p><p>Quadro 2: Caracterização das componentes</p><p>Nº componentes Nº componentes com ou 3 ou mais atores Nº isolados Fragmentação</p><p>24 5 16 0.949</p><p>Nota: para esta análise, as matrizes foram simetrizadas.</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011),</p><p>n=45.</p><p>No mesmo sentido, importa notar que em nenhuma das relações</p><p>analisadas existe uma componente de dimensão três, ou superior, que</p><p>reúna pesquisadores brasileiros e portugueses. As componentes de maior</p><p>dimensão são constituídas por: a) um conjunto de pesquisadores</p><p>pertencentes a centros de investigação da Universidade de São Paulo</p><p>(USP_SP); b) pesquisadores de Londrina (Lond_Par), Belo Horizonte (BH)</p><p>e Rio de Janeiro (RJ); c) pesquisadores da Bahia, de Curitiba (Cur_Par) e de</p><p>Pernambuco; d) pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica (PUC-</p><p>SP); e, �nalmente e) pesquisadores do ISCTE Instituto Universitário de</p><p>Lisboa (ISCTE_PT). A localização geográ�ca parece, pois, ter um papel</p><p>importante nessa fragmentação.</p><p>O papel da condicionante geográ�ca nos padrões de interação pode ser</p><p>analisado com base no índice E-I29 (KRACKAHRDT; STERN, 1988). Esse</p><p>índice dá-nos conta dos níveis de homo�lia num determinado sistema</p><p>social. O conceito de homo�lia pode ser simplesmente descrito como a</p><p>tendência de os atores sociais se relacionarem mais com os do mesmo</p><p>grupo, nesse caso, os �sicamente próximos e semelhantes (FESTINGER et</p><p>al., 1950; MCPHERSON et al., 2001; ROSSONI; GRAEML, 2009).</p><p>Quadro 3: Homo�lia: índice E-I</p><p>Total de laços 50</p><p>E-I -26.000</p><p>E-I índex -0.520</p><p>Signi�cância <0,05</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011),</p><p>n=45</p><p>Nessa rede condicionada às relações com intensidade superior a 1, a</p><p>homo�lia nacional é total, ou seja, não há qualquer ligação entre analistas</p><p>de rede brasileiros</p><p>e portugueses. Se dermos atenção à cidade onde</p><p>habitam os pesquisados, obtemos um índice de E-I de -0.520.30 Esse valor</p><p>revela a importância da cidade/estado onde se exercem funções no</p><p>condicionamento das interações. Existe de fato uma tendência para as</p><p>interações mais fortes com os que trabalham na mesma cidade, mas que</p><p>não é forte a ponto de excluir relações mais distantes.</p><p>O fato de estarmos trabalhando com um grupo relativamente pequeno</p><p>e geogra�camente distante é, sem dúvida, um dos aspectos a ser</p><p>considerado como elemento enfraquecedor da ação coletiva. Saliente-se</p><p>que existem componentes que juntam atores de origens geográ�cas</p><p>diferentes. Isso se deve, por um lado, à mobilidade pro�ssional desses</p><p>indivíduos, que, apesar de mudarem de instituição, mantêm as suas</p><p>relações e, por outro lado, a relações de orientação que se transformam em</p><p>relação de colaboração cientí�ca (VARANDA et al., 2012). Essa questão da</p><p>mobilidade pro�ssional como fator facilitador da integração de um coletivo</p><p>de investigadores foi demonstrada através da história da ARS</p><p>internacional (FREEMAN, 2004).</p><p>Em suma, pela visualização dos sociogramas destas redes, pela análise</p><p>de componentes e da homo�lia, podemos identi�car a fragmentação da</p><p>rede e explicá-la, parcialmente, com as distâncias geográ�cas.</p><p>Os subgrupos da rede como fatores potencialmente inibidores</p><p>da coordenação</p><p>Os subgrupos coesos são caracterizados por uma alta densidade de</p><p>interação, da qual se esperam altos níveis de in�uência mútua</p><p>(FESTINGER, 1954). Adicionalmente, esses grupos constituem espaços de</p><p>solidariedade fundamentais à coordenação da ação (COLEMAN, 1990,</p><p>LAZEGA, 2001) e são também um meio importante para a mobilização de</p><p>atores. Nessa rede, identi�camos só duas cliques, um formado por</p><p>investigadores da USP-SP e outro, por investigadores do ISCTE. O</p><p>reduzido número e pequena dimensão das cliques con�rmam os baixos</p><p>níveis de coesão nessa rede e a dispersão dos investigadores.</p><p>Se relaxarmos a condição de coesão máxima e utilizarmos a medida de</p><p>n-clans31, detectamos nove 2-clans que, com base na visualização da</p><p>análise de agregações hierárquicas, podem-se reduzir a cinco agregações</p><p>(clusters). Estas têm uma composição idêntica às componentes da rede com</p><p>três ou mais atores (Quadro 2).</p><p>Com efeito, demonstra-se mais uma vez que essa rede é constituída por</p><p>subgrupos de pequena dimensão, fechados em si, que revelam a reduzida</p><p>coesão ao nível global da rede. Por outro lado, esses subgrupos, e em</p><p>particular as cliques, demonstram a existência de pequenos grupos que</p><p>funcionam aparentemente com uma lógica de equipe, com uma solidez que</p><p>indicia relações de solidariedade que estão na base de qualquer ação</p><p>coletiva.</p><p>Figura 2: Agregação hierárquica (hierarchical clustering) da matriz de</p><p>sobreposição dos 2-clans</p><p>1 1 1 1 1 2 2 2 2 2 2 2 2 2 3 3 1 2 1 3 3 3 3 3 1 3 4 1 1 3 4 3 4 4 4 4</p><p>Level 6 8 0 1 2 4 7 1 2 3 4 5 6 7 9 0 8 0 1 4 3 6 9 7 9 4 5 6 7 9 3 2 0 1 5 8 8 2 2 3 1 5 3 4 5</p><p>----- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -</p><p>2.000 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XXX . . . . . . . . . . . . . . . . XXX . . .</p><p>1.667 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XXXXX . . . . . . . . . . . . . . . XXXXX . . .</p><p>1.000 . . . . . . . . . . . . . . XXXXX . . . XXXXXXX XXX . . . . XXXXX XXXXXXXXX . XXXXX . . .</p><p>0.750 . . . . . . . . . . . . . . XXXXX . . . XXXXXXX XXX . . . . XXXXX XXXXXXXXX XXXXXXX . . .</p><p>0.600 . . . . . . . . . . . . . . XXXXX . . XXXXXXXXX XXX . . . . XXXXX XXXXXXXXX XXXXXXXXX . .</p><p>0.500 . . . . . . . . . . . . . . XXXXX . . XXXXXXXXXXXXX . . . . XXXXX XXXXXXXXX XXXXXXXXX . .</p><p>0.000</p><p>XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX</p><p>X</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011),</p><p>n=45</p><p>Posicionamento dos indivíduos na rede e o seu potencial de</p><p>mobilização e coordenação do coletivo:</p><p>As medidas de centralidade são medidas que nos indicam a atividade, a</p><p>importância e o prestígio dos atores na rede relacionado ao seu acesso</p><p>diferenciado aos recursos. Demonstramos aqui as medidas de centralidade</p><p>de grau e intermediação (FREEMAN, 1979).</p><p>Quadro 4: Ranking das medidas de centralidade de grau</p><p>Ranking</p><p>Grau</p><p>1 USP-SP (4)</p><p>2 Bahia (3)</p><p>3 USP_SP(3)</p><p>4 USP –SP(3)</p><p>5 USP –SP(3)</p><p>6 CUR_PAR (3)</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011),</p><p>n=45</p><p>Veri�camos que os valores de grau são muito baixos, o que é mais uma</p><p>evidência da fraca atividade dessa rede intralusófona. Nota-se que não há</p><p>�guras líderes que se destaquem na ARS lusófona no seu todo. Há, sim, um</p><p>fechamento dos atores com maior grau de centralidade nos seus pequenos</p><p>grupos, estes, sim, ativos.</p><p>A centralidade de intermediação dá-nos, por seu turno, informação</p><p>sobre os atores que têm um papel relevante na ligação (bridging ou</p><p>brokering) entre os atores desse sistema social. Como no nosso caso, as</p><p>redes estão divididas em muitos e pequenos componentes, e a</p><p>intermediação é muito reduzida. Nota-se que existem 37 atores com</p><p>intermediação zero.</p><p>Quadro 5: Ranking das medidas de centralidade de intermediação</p><p>Ranking</p><p>intermediação</p><p>1 CUR_PAR</p><p>2 Bahia</p><p>3 Bahia</p><p>4 RJ</p><p>5 USP-SP</p><p>6 Lond_Par</p><p>7 BH_ MG</p><p>8 PUC_SP</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011),</p><p>n=45</p><p>Como se veri�ca pelo Quadro 5, no topo da centralidade de</p><p>intermediação, temos atores do Paraná (Curitiba e Londrina), Rio de</p><p>Janeiro, Bahia, Belo Horizonte (BH-MG) e só um ator de USP-SP. Recorde-</p><p>se que, no topo da centralidade de grau, temos fundamentalmente</p><p>investigadores da USP-SP (que têm alta centralidade em resultado da forte</p><p>coesão do seu grupo), um investigador da Bahia e outro do Paraná. Esse</p><p>fato demonstra que os atores com mais atividade na rede têm uma</p><p>atividade muito direcionada para dentro do próprio grupo – ligações fortes</p><p>que propiciam o fechamento do grupo ou closure – portanto, têm um papel</p><p>menor na ligação de atores que estão dispersos. A fraquíssima</p><p>intermediação dessa rede é, sem dúvida, um dos fatores que tem</p><p>contribuído para a falta de união de esforços no sentido do</p><p>desenvolvimento da ARS na comunidade lusófona.</p><p>A dimensão das ego-redes e o potencial de desenvolvimento</p><p>da ARS lusófona</p><p>Uma caracterização das ego-redes completas dos participantes da</p><p>pesquisa, que incluem autores estrangeiros e autores que não foram</p><p>identi�cados por nós como autores de artigos com aplicações de ARS,</p><p>revela outras dinâmicas que indiciam um potencial de crescimento dessa</p><p>comunidade. Ou seja, quando fazemos a análise do grau externo dos</p><p>participantes, sem condicionar a sua relação aos autores lusófonos com</p><p>artigos com aplicações de ARS, veri�camos que o grau externo médio da</p><p>matriz 45X45 é inferior ao grau externo médio das ego-redes completas</p><p>(Quadro 6). Isso signi�ca que a sua rede pro�ssional de relações</p><p>(relacionada com ARS) vai além dos analistas de redes que publicaram</p><p>utilizando ARS (e incluem estrangeiros, mas poucos). Essa abertura</p><p>relacional pode-nos fazer pensar no potencial de mobilização de outros que</p><p>não publicam, ainda, em ARS.</p><p>Segundo os dados do Quadro 6, a média do grau externo da ego-rede</p><p>completa de colaboração revela que os analistas de redes têm em média</p><p>3,93 colaboradores (3,44 lusófonos e 0,48 não lusófonos), o que é superior</p><p>ao grau externo patente na matriz 45X45, onde a média é de 1,33.32 Não</p><p>podemos deixar de notar que estes valores são baixos, o que naturalmente</p><p>di�culta o desenvolvimento da área. Mas aqui queremos frisar que, apesar</p><p>dessa baixa atividade, ela é um pouco mais alta – com os da mesma</p><p>nacionalidade e só na relação de colaboração – que a revelada olhando</p><p>simplesmente para as ego-redes obtidas mediante matriz 45x45. Já no</p><p>aconselhamento, os sinais de potencial de desenvolvimento da área são</p><p>menos otimistas e, dada a complexidade que pode implicar uma ARS,</p><p>deduzimos que os nossos respondentes</p><p>têm insu�ciente acesso ao</p><p>conhecimento existente, o que se traduz em uma aprendizagem muitas</p><p>vezes autodidata, geralmente mais lenta e menos rica.</p><p>Quadro 6: Valores médios de conselheiros e colaboradores</p><p>Tipo de relação</p><p>Grau externo da</p><p>ego rede (matriz</p><p>45x45)</p><p>Grau externo</p><p>da ego rede</p><p>completa</p><p>Lusófonos</p><p>Não</p><p>lusófonos</p><p>Colaboração 1,33 3,93 3,44 0,48</p><p>Aconselhamento32 1,33 1,76 1,2 0,5</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011).</p><p>Os atores de centralidade mais alta e o seu papel no</p><p>desenvolvimento da ARS lusófona</p><p>Focamos agora a atenção na caracterização dos atores que têm valores</p><p>de centralidade de grau e intermediação mais altos, os que consideramos</p><p>ter um potencial papel de liderança na mobilização e coordenação.</p><p>Consoante os dados dos Quadros 7 e 8 (em comparação com os do Quadro</p><p>6), vemos que esses atores, que têm um papel diferenciado na rede, têm</p><p>efetivamente uma atividade relacional muito superior à média, se nos</p><p>centrarmos nos contatos lusófonos. Já no que concerne à sua atividade</p><p>relacional internacional, esta não difere muito, ou é mesmo inferior (caso</p><p>dos atores que fazem a intermediação) que a média global. Portanto, os</p><p>atores que mais se destacam e que a princípio mais facilmente exerceriam</p><p>o papel de liderança do desenvolvimento da ARS lusófona têm, ainda</p><p>assim, insu�ciente acesso, por meio das suas relações pessoais, ao know</p><p>how internacional sobre análise de redes sociais.</p><p>Quadro 7: Valores médios de colaboradores dos seis atores no topo do</p><p>grau</p><p>Tipo de relação</p><p>Total</p><p>( grau externo da ego rede</p><p>completa)</p><p>Lusófonos</p><p>Não</p><p>lusófonos</p><p>Colaboração 6,3 5,3 1</p><p>Aconselhamento1 3,6 3 0,6</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011).</p><p>Quadro 8: Valores médios de aconselhamento dos oito atores no topo da</p><p>centralidade de intermediação</p><p>Tipo de relação</p><p>Total</p><p>( grau externo da ego rede</p><p>completa )</p><p>Lusófonos</p><p>Não</p><p>lusófonos</p><p>Colaboração2 6 5,9 0,14</p><p>Aconselhamento3 2,6 2,14 0,43</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011).</p><p>Outro aspecto a se considerar tem a ver com a força da relação (que no</p><p>nosso caso tipi�camos em “conhecido”, “amigo” e “grande amigo”) e com a</p><p>in�uência que pode ter na transferência de conhecimento livre e aberta,</p><p>fundamental para a aprendizagem. Tendo em vista a relação de</p><p>aconselhamento, vemos que 48,5% dos investigadores aconselham-se com</p><p>amigos e 45,5%, com grandes amigos (embora 12 não tenham</p><p>conselheiros). Veri�camos, também, que uma percentagem importante</p><p>dos investigadores colaboram com amigos (62,2%) ou grandes amigos</p><p>(43,2%), mas oito não têm colaboradores.</p><p>Essa tendência de aconselhamento entre os próximos e semelhantes é</p><p>importante e amplamente descrita na literatura organizacional e sobre</p><p>comunidades locais (BORGATTI; CROSS, 2003; BRASS, 1995; FESTINGER</p><p>et al., 1950). O que está na base dessa correlação é, portanto, por um lado,</p><p>a fácil acessibilidade (pedir conselho a quem colabora conosco) e a</p><p>proximidade emocional. Isso faz com que haja uma tendência para</p><p>fechamento nas redes de aconselhamento, portanto, maior probabilidade</p><p>em reproduzir do que produzir novidade.</p><p>Quadro 9: Colaboração e aconselhamento por tipo de relação informal</p><p>Colaboração Aconselhamento</p><p>Conhecido/a 40,5% (15) 33,3% (11)</p><p>Amigo/a 62,2% (23) 48,5% (16)</p><p>Grande amigo/ 43,2% (16) 45,5% (15)</p><p>N=37 N=33</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011).</p><p>No que diz respeito à caracterização da relação de colaboração e</p><p>aconselhamento na sua dimensão mais formal (Quadro 10), vemos que é</p><p>com os colegas que essas relações são majoritárias. Isso vai, por</p><p>conseguinte, ao encontro do que já tínhamos dito antes sobre o caráter</p><p>horizontal – pouco hierárquico – desse sistema social. Ou seja, estamos</p><p>abordando fundamentalmente relações entre pares que, como vimos,</p><p>criam desa�os adicionais a uma ação coletiva.</p><p>Quadro 10: Colaboração e aconselhamento por tipo de relação formal</p><p>Colaboração Aconselhamento</p><p>colega 89,2% (33) 81,8% (27)</p><p>Professor/a 43,2% (16) 30,3% (10)</p><p>Aluno/a 35,1%(13) 21,2%(7)</p><p>N=37 N=33</p><p>Fonte: Análise dos dados do questionário respondido pelos analistas lusófonos de redes (2011).</p><p>NOTAS CONCLUSIVAS</p><p>Nesse texto, propusemo-nos fazer uma re�exão sobre o potencial de</p><p>desenvolvimento da ARS lusófona. Dada a nossa participação enquanto</p><p>investigadores nessa área cientí�ca, foi-nos possível observar a sua</p><p>evolução e compreender alguns dos entraves que se lhe colocam. Em</p><p>função da dimensão que o tema já alcançou, e há várias décadas no mundo</p><p>cientí�co, em especial na América do Norte e Europa, esperar-se-ia uma</p><p>evolução mais rápida e uma difusão mais alargada em contextos</p><p>semiperiféricos como o nosso. Sustentamos que a institucionalização da</p><p>ARS, por exemplo, por meio da criação de posições de</p><p>professores/estudantes pós-graduados com essa especialidade, da</p><p>introdução da subárea cientí�ca nos currículos universitários, da</p><p>integração de especialistas nos painéis de avaliação de projetos etc.</p><p>bene�ciaria a todos. Mas, como dissemos, a implantação de uma nova área</p><p>do conhecimento é um processo político e simbólico, e o seu sucesso</p><p>depende de um projeto coletivo sólido e bem delineado, cujos obstáculos e</p><p>tensões inerentes foram enumerados. Uma das tensões que abordamos é a</p><p>que existe entre as duas dimensões – mobilizar por meio de laços fracos</p><p>(bridging) versus cooperar mediante laços fortes (closure), a tendência mais</p><p>forte para o fechamento que permeia o status quo.33 Sendo este um</p><p>coletivo fracamente ligado (loosely coupled) e composto por pares ou quase-</p><p>pares, é mais provável a aparição dos caronas (free-riders), por falta de</p><p>mecanismos institucionais que os inibam, e menos atrativa a ocupação de</p><p>posições de liderança, ambos fatores que obstaculizam uma ação coletiva.</p><p>Consideramos que, sendo a atividade cientí�ca, ela própria, resultado</p><p>de práticas de interação de atores em determinados campos de</p><p>sociabilidades, a ARS é a metodologia indicada para o seu estudo. Da</p><p>análise retiramos diferentes tipos de resultados que se nos revelam como</p><p>obstáculos ao crescimento dessa comunidade cientí�ca e outros que nos</p><p>permitem especular sobre o seu potencial de crescimento. Os resultados</p><p>obtidos que mais diretamente levantam dúvidas sobre o potencial</p><p>crescimento da ARS lusófona são:</p><p>a) Inexistência de �guras proeminentes, bem localizadas</p><p>estruturalmente, revelada pelos níveis de centralidade de grau muito</p><p>baixos; não há, pois, um grupo de atores com estatuto, recursos e forte</p><p>interesse na difusão da inovação, considerado por Marwell e Oliver (1993)</p><p>como condição necessária à ação coletiva.</p><p>b) Inexistência de pesquisadores com papel relevante de intermediação,</p><p>o que se traduz na incapacidade de mediação entre os vários subgrupos</p><p>que constituem o sistema social, e que impede o coletivo de coordenar a</p><p>sua ação. No que concerne à qualidade das suas relações, observamos que o</p><p>grau de colaboração e aconselhamento com pesquisadores internacionais é</p><p>muito baixo, o que di�culta o acesso a especialidades mais importantes na</p><p>área.</p><p>No que concerne à rede, como um todo, nota-se uma grande</p><p>fragmentação, portanto, uma grande inacessibilidade aos recursos que</p><p>circulam na rede, o que é consequência da pouca interação e até aparente</p><p>desconhecimento de muitos colegas investigadores. Esse desconhecimento</p><p>é importante nos processos de difusão de inovação, pois, segundo</p><p>Granovetter (1978), impede o funcionamento dos níveis de limiar como</p><p>fator motivador da adoção. Por outro lado, essa fragmentação indica a</p><p>existência de múltiplos grupos e a existência de espaços não utilizados no</p><p>�uxo de comunicação – buracos estruturais –, o que, sendo uma fraqueza</p><p>na construção de conhecimento na ARS lusófona, é, simultaneamente, um</p><p>sinal do potencial de crescimento e de valorização dessa área cientí�ca,</p><p>pois estes são potenciais fontes de informação</p><p>não redundantes (BURT,</p><p>2005). Outros resultados importantes são homo�lia intranacional, pois</p><p>praticamente não existe colaboração entre o Brasil e Portugal, re�exo dessa</p><p>baixa colaboração é a mobilidade internacional dos pesquisadores, que</p><p>também é reduzida (VARANDA et al., 2012).</p><p>Existem, no entanto, resultados da análise de redes que indiciam a</p><p>existência de um potencial de desenvolvimento da ARS lusófona. Por</p><p>exemplo, se a questão da homo�lia intranacional era preocupante, em</p><p>nível regional, e especialmente no caso do Brasil, o índice de I-E apresenta</p><p>valores que indiciam uma abertura de relações com outras regiões.</p><p>Também um índice de reciprocidade relativamente alto é facilitador do</p><p>conhecimento e da aprendizagem cruciais no meio cientí�co. É, pois, de se</p><p>esperar que as relações de trabalho sejam efetuadas na sua maioria com</p><p>amigos ou grandes amigos e também mais frequentes entre colegas. Esse</p><p>tipo de contexto torna mais provável a construção e partilha de saberes e</p><p>outros recursos, pois aqui a concorrência por estatuto e outros recursos</p><p>não tem um papel preponderante (LAZEGA, 2001).</p><p>Diante desses argumentos, é necessária uma combinação de laços</p><p>fortes e laços fracos para desenvolver e manter o processo de ação coletiva.</p><p>A densidade alta da rede, que favorece a coesão, é também facilitadora da</p><p>ação coletiva. Já a sua fragmentação, identi�cada pela existência de</p><p>pequenos grupos isolados entre si, di�culta a ação. Esse cenário de</p><p>fragmentação que caracteriza a comunidade cientí�ca da ARS lusófona</p><p>caracterizava também os primórdios da comunidade de analista de redes</p><p>internacionais. Como demonstra Freeman (2004), durante os anos 1930</p><p>aos 1970, a fragmentação, a independência e a reduzida cooperação, ou</p><p>mesmo fraco interconhecimento, eram características marcantes no campo</p><p>da ARS. Várias iniciativas foram levadas a cabo para a integração e</p><p>dinamização da ARS internacional, tais como a produção de software de</p><p>ARS que permitiu a estandardização da análise; a criação de uma versão</p><p>precursora da Internet para ligar as pessoas que faziam ARS; a criação de</p><p>uma associação; a organização de conferências que juntaram grupos que</p><p>estavam separados; a mobilidade de estudantes e investigadores/docentes</p><p>que criaram pontes entre os diversos grupos de analistas de redes; a</p><p>intervenção uni�cadora, sobretudo da Universidade da Califórnia – Irvine.</p><p>Mas, de todos esses, o fator destacado por Freeman (2004) é a mobilidade</p><p>de professores e estudantes que, conforme a análise de componentes, que</p><p>está aprofundada em Varanda et al. (2012), tem já alguma expressão na</p><p>comunidade lusófona.</p><p>Cremos que, para a comunidade lusófona, direções semelhantes serão</p><p>seguidas àquelas das comunidades cientí�cas norte-americanas e de alguns</p><p>países europeus. A crescente popularização desse ramo de conhecimento</p><p>estimula a inserção dessa disciplina nos currículos universitários, o que,</p><p>por sua vez, estimula o interesse de jovens doutorandos à pesquisa,</p><p>utilizando-se do instrumental teórico-metodológico das ARS.</p><p>Acreditamos, dessa forma, em um adensamento cada vez maior e</p><p>consequente estreitamento dos laços dessa rede de investigadores que</p><p>agora se apresenta espalhada em vários regiões de Portugal e do Brasil.</p><p>Nessa direção, o campo cientí�co, sendo cada vez mais institucionalizado,</p><p>minimiza o risco de adoção, motivando o ingresso de novos adeptos.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BORGATTI, S. P. NetDraw: graph visualization software. Harvard: Analytic Technologies, 2002.</p><p>______; CROSS, R. A Relational View of Information Seeking and Learning in Social Networks.</p><p>Management Science, v. 49, n. 4, p. 432-445, 2003.</p><p>BORGATTI, S. P.; EVERETT, M. G.; FREEMAN, L. C. Ucinet for Windows: software for social network</p><p>analysis. Harvard, MA: Analytic Technologies, 2002.</p><p>BRASS, D. J. A social network perspective on human resources management. Research in Personnel</p><p>and Human Resources Management, v.13, n.1, p. 39-79, 1995.</p><p>BURT, R. Brokerage and closure: an introduction to social capital. Oxford: Oxford University, 2005.</p><p>______. Structural Holes: the social structure of competition. Cambridge, MA: Harvard University,</p><p>1992.</p><p>COLEMAN, J. S. Foundations of Social �eory. Cambridge, MA: �e Belknap Press of Harvard, 1990.</p><p>CROZIER, M.; FRIEDBERG, E. L’Acteur et le Système. Paris : Éditions du Seuil, 1977.</p><p>DEGENNE, A.; FORSÉ, M. Introducing Social Networks. 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A in�uência da imersão institucional e regional</p><p>conjunto relevante</p><p>de contributos da teoria social e de técnicas de análise muito úteis para</p><p>compreender os processos de interação, contribuindo na aprendizagem e</p><p>na educação. Trata-se de empregar os contributos das teorias e métodos</p><p>das redes sociais para entender as modernas redes de aprendizagem.</p><p>A parte 2 - Redes na ciência: campos, métodos e objetos, reúne 5 capítulos</p><p>que analisam o campo cientí�co pela perspectiva relacional, valendo-se de</p><p>diferentes abordagens e métodos, tais como os próprios recursos da ARS,</p><p>os estudos de cocitação e de coautoria, as técnicas qualitativas para estudar</p><p>processos formais de difusão do conhecimento por meio da literatura</p><p>cientí�ca e pela interação entre os pesquisadores e entre estes e outros</p><p>atores sociais. O primeiro capítulo dessa parte, “A comunidade cientí�ca de</p><p>analistas lusófonos de redes sociais: qual o potencial para ação coletiva?”,</p><p>está baseado em estudo conduzido pelos pesquisadores de Portugal e do</p><p>Brasil, Marta Varanda, Breno Fontes, Raquel Rego e Klaus Eichner. Eles</p><p>empregam a metodologia de análise de redes ARS para investigar as</p><p>estruturas de interdependência da comunidade cientí�ca de pesquisadores</p><p>lusófonos que estudam redes sociais. O capítulo apresenta uma re�exão</p><p>sobre o potencial de ação coletiva desses estudiosos e sua capacidade de</p><p>desenvolver um projeto com objetivos comuns para difundir e</p><p>institucionalizar a ARS no meio cientí�co dos países de língua portuguesa.</p><p>No capítulo “Cartogra�as da atividade cientí�ca: notas teóricas e</p><p>metodológicas”, Nair Kobashi e Raimundo Nonato dos Santos mapeiam a</p><p>atividade cientí�ca como um empreendimento interdisciplinar. Nas</p><p>pesquisas de observação e análise da ciência, realizadas no âmbito do</p><p>Grupo Scientia, os autores associam os Estudos Sociais da Ciência à</p><p>Organização e Representação do Conhecimento e aos métodos</p><p>bibliométricos avançados. Por meio desse aparato teórico e metodológico,</p><p>procuram desenvolver estudos de institucionalização social e cognitiva da</p><p>atividade cientí�ca brasileira. Na perspectiva adotada, são igualmente</p><p>importantes as pesquisas de redes sociais, noção que remonta aos estudos</p><p>de citações e de coautoria. As redes na ciência também são abordadas no</p><p>capítulo “Redes colaborativas na ciência e os estudos de coautoria e</p><p>cocitação”, de Jacqueline Leta e Roberto Mario Canchumani. Os autores</p><p>explicitam que a comunicação escrita entre os pesquisadores vem sendo</p><p>feita, principalmente, por meio dos periódicos. Entre os principais</p><p>elementos pertinentes à comunicação cientí�ca, o capítulo destaca a</p><p>autoria e as citações que, segundo os autores, constituem-se em dois</p><p>elementos-chave para as pesquisas em redes colaborativas na ciência,</p><p>desenvolvidos no escopo da Informetria. Os dois capítulos que encerram</p><p>essa segunda parte, “Redes, campo cientí�co e processos de informação e</p><p>comunicação em saúde”, de autoria de Regina Marteleto e Marcus Vinicius</p><p>Silva, e “Análise das relações interinstitucionais: um estudo das redes de</p><p>dois modos”, de Maria Inês Tomaél e Regina Marteleto, apresentam</p><p>resultados e explorações metodológicas da ARS combinados com</p><p>instrumentos da metodologia qualitativa, empregados em pesquisa</p><p>aplicada em pesquisadores da área de saúde. O primeiro capítulo considera</p><p>as singularidades epistemológicas, políticas, sociais e históricas do campo</p><p>da saúde pública no Brasil, a �m de re�etir sobre o seu regime de produção</p><p>de conhecimentos e seus modelos de comunicação, informação e</p><p>divulgação, empregando as ideias de interdisciplinaridade e de</p><p>internacionalização. Conclui que o campo é con�gurado por con�itos</p><p>entre, de um lado, um domínio de conhecimentos e práticas no qual se</p><p>fazem presentes diferentes perspectivas disciplinares, com forte</p><p>implicação das questões locais de saúde. De outro, uma perspectiva</p><p>internacionalizada da atividade de pesquisa e produção de conhecimentos,</p><p>cada vez mais orientada por um sistema mundializado de edições e</p><p>publicações cientí�cas. Já o capítulo seguinte, ancorado no mesmo projeto</p><p>de pesquisa, mostra resultados da aplicação da análise de redes sociais de</p><p>dois modos no estudo das relações entre grupos de pesquisadores e</p><p>diferentes categorias de instituições nacionais e internacionais, com a</p><p>�nalidade de estudar os tipos de elos criados pelos pesquisadores entre si e</p><p>com instituições, correlacionando-os com as categorias de pesquisas que</p><p>desenvolvem e seu espaço de inserção no campo da saúde.</p><p>A terceira parte, denominada Redes, processos de intervenção social e</p><p>apropriação do conhecimento, contém três capítulos. O primeiro, de autoria</p><p>de Paulo Henrique Martins, intitulado “Redes sociais como novo marco</p><p>interpretativo das mobilizações coletivas contemporâneas: outras</p><p>perspectivas”, aborda as mudanças recentes produzidas pelos processos de</p><p>desterritorialização e reterritorialização nas sociedades complexas que</p><p>levam a novos tipos de atores, con�itos e mediações, sendo as redes uma</p><p>forma social exemplar dessas mudanças. Para o autor, as redes não se</p><p>impõem automaticamente como um novo marco interpretativo. É</p><p>importante lembrar que elas são objeto de embate no campo intelectual e</p><p>que podem conhecer leituras diversas, tanto utilitaristas quanto</p><p>antiutilitaristas. Outro capítulo constante da terceira parte é denominado</p><p>“Diálogos – a mediação da informação na produção do espaço: a</p><p>experiência do bairro Jardim Canadá, Nova Lima”. As autoras, Denise</p><p>Morado Nascimento e Marcela Silviano Brandão Lopes, partem de</p><p>re�exões teóricas e práticas acerca da informação em sua dimensão</p><p>comunicativa, que não se atém à mera e�cácia de transmissão, mas implica</p><p>um processo compartilhado de construção e constituição. O argumento</p><p>das autoras é a favor da mediação como o espaço em que a prática social</p><p>acontece. Nesse sentido, os arquitetos e a população, bem como todos os</p><p>outros envolvidos nos processos produtivos do espaço urbano, podem</p><p>tornar-se integrantes das práticas de mediação, agindo no processo social</p><p>de interlocução recíproca e desejada. Em seguida, Gilda Olinto e Ana Lígia</p><p>Medeiros comparam, no capítulo “Comunidades, redes sociais e bibliotecas</p><p>públicas”, os conceitos de redes e comunidade, assim como os estudos e</p><p>projetos de intervenção social. Sugerem que as tecnologias de informação e</p><p>comunicação são recursos que podem ser atualmente utilizados com</p><p>vantagem no desenvolvimento de redes e comunidades locais, à medida</p><p>que levam em consideração os processos comunitários e que a comunidade</p><p>é envolvida, de múltiplas maneiras, nas iniciativas propostas. Esse</p><p>envolvimento é particularmente relevante no caso de comunidades</p><p>carentes.</p><p>A quarta seção, Informação, políticas públicas e ações coletivas, comporta</p><p>dois capítulos em que os autores buscam re�etir sobre as ações coletivas</p><p>nas redes de mobilização, bem como sobre as políticas de saúde pela ótica</p><p>das redes e as políticas de implantação de programas de acesso a</p><p>tecnologias de informação e comunicação para o desenvolvimento local.</p><p>No capítulo “A aplicação da metodologia de análise de redes sociais em</p><p>programas de saúde: viabilidades e perspectivas”, Marcia Gomide Mello</p><p>tem o objetivo de demonstrar que, por meio da aplicação da análise de</p><p>redes sociais (ARS), é possível identi�car, descrever e prever o desfecho de</p><p>programas de saúde a partir das características das redes sociais</p><p>envolvidas. Para a autora, esses estudos poderiam fornecer dados e indicar</p><p>direções para os processos de avaliação dos programas de saúde,</p><p>contribuindo na busca de soluções para a de�nitiva descentralização dos</p><p>serviços, na qual se fundamenta o Sistema Único de Saúde – SUS. O</p><p>capítulo �nal, de autoria de Tamara Egler, “Rede social em Piraí digital”,</p><p>relata que o programa Piraí digital tem como objetivo produzir uma</p><p>política de desenvolvimento local, associada ao uso de tecnologias de</p><p>informação e comunicação. O estudo procurou penetrar na complexidade</p><p>do processo de formação de redes mediadas por tecnologia – as redes</p><p>sociotécnicas</p><p>na cooperação entre</p><p>pesquisadores no Brasil. REDES-Revista Hispana para el Análisis de Redes Sociales, v. 16, n. 9, p. 228-</p><p>249, 2009.</p><p>SCOTT, J.; CARRINGTON, P. J. �e SAGE Handbook of Social Network Analysis. Cambridge: SAGE</p><p>Publications, 2011.</p><p>SNOW, D. A. et al. Social Networks and Social Movements: a Microstrucutral Approach to</p><p>Di�erential Recruitment. American Sociological Review, n.45, p. 787-801, 1980.</p><p>TILLY, C. From Mobilization to Revolution. Reading, MA: Addison Wesley, 1978.</p><p>VALENTE, T.W. Network Models of the Di�usion of Innovations. New Jersey: Hampton Press Inc.,</p><p>1995.</p><p>VARANDA, M. et al. A análise de redes sociais no mundo lusófono: contributos para o</p><p>conhecimento de um campo cientí�co em desenvolvimento. REDES-Revista Hispana para el Análisis</p><p>de Redes Sociales, v. 22, n. 7, jun. 2012. Disponível em: <http://revista-redes.rediris.es/pdf-</p><p>vol22/vol22_7.pdf>. Acesso em: 10 set. 2012.</p><p>WASSERMAN, S.; FAUST, K. Social Network Analysis: Methods and Applications, Cambridge:</p><p>Cambridge University, 1994.</p><p>WELLMAN, B. Network analysis: some basic principles. Sociological theory, v. 1, p. 155-200, 1983.</p><p>17 De acordo com McAdam, McCarthy e Zald (1988), pode ser qualquer grupo pequeno em que</p><p>existem processos de atribuição coletiva associados a formas rudimentares de organização para</p><p>produzir mobilização para a ação coletiva.</p><p>18 Hechter (1984) fala de sanções positivas e negativas que podem ser de dois tipos: sociais (como o</p><p>prestígio, a honra, a estima, a solidariedade) ou materiais (como o dinheiro, poder ou posição).</p><p>19 A abertura a outros campos relacionais, em boa parte dos casos, faz-se a partir do mecanismo de</p><p>relé social, quer dizer, de redes que ativam redes. As relés, nesse sentido, ligam redes não</p><p>conectadas anteriormente. Quer dizer, atuam enquanto “brokers” entre estrangeiros ou grupos de</p><p>estrangeiros. Pessoas entram em contato com outras, mediante “pontes” estabelecidas a partir de</p><p>contatos sociais pré-estabelecidos (FONTES, 2011)</p><p>20 Segundo Granovetter (1973), uma ligação forte é baseada no tempo em que se investe na</p><p>relação, na intensidade emocional dessa relação, no grau de intimidade da relação e na reciprocidade</p><p>existente. Um dos indicadores plausíveis de força da relação, e também considerado por</p><p>Granovetter, é a multiplexidade da relação. Será esse o indicador utilizado aqui.</p><p>21 Por exemplo, o desenvolvimento de relações entre colegas que são amigos de amigos é mais</p><p>frequente que o desenvolvimento de relações entre colegas que são desconhecidos.</p><p>22 Existe um buraco estrutural quando dois contatos não redundantes estão separados na rede</p><p>(BURT, 1992).</p><p>23 Para mais detalhes sobre a coleta de dados, ver Varanda et al. (2012).</p><p>24 O que poderá ser uma evidência de que tenha havido colaboração com colegas sem competências</p><p>em ARS.</p><p>25 A análise e explicação mais detalhada destas relações são feitas em Varanda et al. (2012).</p><p>26 O coe�ciente de agregação global (overall graph clustering coe�cient) é simplesmente a média da</p><p>densidade das vizinhanças (neighbourhoods) de todos os atores (a vizinhança é o total de atores a</p><p>que ego está diretamente ligado) (HANNEMAN; RIDDLE, 2011).</p><p>27 A transitividade aqui considerada é a percentagem de todas tríades com pelo menos duas arestas</p><p>que têm três arestas (tal como obtido pelo procedimento Transitivity do UCINET V - 6.347)</p><p>28 Uma rede centralizada é uma rede que concentra em um pequeno número de membros grande</p><p>parte da atividade de interação da rede global; ao contrário, em uma rede descentralizada, a</p><p>interação está dispersa por entre os membros da rede.</p><p>29 O indíce E-I permite calcular o nível de homo�lia (ou hetero�lia) pela medição do número de</p><p>laços para o interior vs. exterior do grupo de�nido, nesse caso, a localização geográ�ca</p><p>(HANNEMAN; RIDDLE, 2005).</p><p>30 Os valores de homo�lia variam de -1 a 1, sendo que -1 é o valor máximo de homo�lia</p><p>(HANNEMAN; RIDDLE, 2005).</p><p>31 Utilizamos esta medida em vez do 2-clique pois em certas circunstâncias esta pode ser</p><p>insu�cientemente coesa (WASSERMAN; FAUST, 1994).</p><p>32 Esse valor é inferior à média global de nomeações de conselheiros, pois, como dissemos, não</p><p>tivemos respostas ao inquérito e vários dos conselheiros citados não tinham publicações com</p><p>aplicações de ARS (por nós identi�cados) ou eram de áreas disciplinares que não as ciências sociais.</p><p>33 Outra tensão, que não abordamos, mas que é comumente focada, é da existência de competição</p><p>entre os próprios investigadores e o seu impacto sobre a realização do projeto coletivo. Nesse caso</p><p>concreto, não consideramos premente a abordagem desse tema, pois, havendo competição, ela não é</p><p>importante entre os poucos analista de redes (que são o objeto do nosso estudo). Nessa fase de</p><p>crescimento, as dinâmicas da concorrência intracomunidade de ARS parecem ter um papel menos</p><p>preponderante que as da cooperação para acesso ao conhecimento. Os poucos analistas de redes</p><p>têm, ainda, na maioria dos casos, como desa�o primeiro, o ganho de legitimidade e crescimento</p><p>dentro das suas instituições.</p><p>CARTOGRAFIAS DA ATIVIDADE CIENTÍFICA: NOTAS</p><p>TEÓRICAS E METODOLÓGICAS</p><p>Nair Yumiko Kobashi</p><p>Raimundo Nonato Macedo dos Santos</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Simultaneamente às atividades de pesquisa, a comunidade cientí�ca, os</p><p>gestores de agências de fomento e os dirigentes de instituições de ensino</p><p>superior (IES) são instados a adotar instrumentos apropriados de</p><p>planejamento, avaliação e controle dos processos relacionados à produção</p><p>de conhecimento. Essas tarefas requerem, de um lado, o uso de</p><p>instrumentos robustos para mapear globalmente e de forma con�ável as</p><p>atividades de CT&I em diferentes contextos (LANE, 2010) e, de outro,</p><p>formar pesquisadores. Fontes de informação, ferramentas de pesquisa e</p><p>pesquisadores são, portanto, os componentes principais de um sistema de</p><p>avaliação e controle da pesquisa (KOBASHI; SANTOS, 2008).</p><p>Na pesquisa, eles demandam esforços consideráveis de de�nição de</p><p>conceitos e de métodos e desenvolvimento de fontes especializadas de</p><p>informação para a construção e publicação periódica de indicadores</p><p>(LANE, 2010). Em contrapartida, como amplamente discutido na</p><p>literatura especializada, a construção de conhecimentos quantitativos</p><p>sobre as relações ciência-tecnologia-sociedade deve estar inserida em um</p><p>modelo conceitual que represente tal sistema e seja capaz de descrever os</p><p>fenômenos que se propõe medir (GUSMÃO, 2005).</p><p>Em contextos institucionais, os pesados investimentos intelectuais e</p><p>�nanceiros em recursos de coleta e processamento de dados quantitativos</p><p>estão relacionados: i) ao desenvolvimento do aparato governamental das</p><p>políticas de CT&I, que ocupa posição central no conjunto das políticas</p><p>públicas; ii) às mudanças na visão sobre o papel da CT&I no</p><p>desenvolvimento e competitividade das economias nacionais; e iii) à</p><p>evolução teórica e metodológica das disciplinas que constituem os</p><p>chamados Estudos sociais da ciência (VELHO, 2001).</p><p>Os instrumentos para realizar os Estudos sociais da ciência, por sua</p><p>vez, devem ter portabilidade, serem de fácil utilização na exploração de</p><p>dados e agregar recursos de saída, particularmente indicadores</p><p>quantitativos e formas de visualização da informação. Essas</p><p>funcionalidades permitem analisar e compreender melhor o mundo da</p><p>CT&I. Dito de outro modo, eles nos capacitam a descrever e ver de forma</p><p>mais con�ável a natureza e a dinâmica dos fenômenos relacionados à</p><p>construção do conhecimento socialmente produzido.</p><p>No Brasil, a quantidade e a qualidade das fontes secundárias de</p><p>informação disponíveis impõem limites à construção de conhecimentos</p><p>sobre as relações ciência-tecnologia-sociedade. Com efeito, a obtenção de</p><p>dados atualizados e con�áveis, em níveis variados de exaustividade,</p><p>agregação e cobertura geográ�ca é um dos maiores desa�os para os que se</p><p>dedicam aos estudos métricos da informação. Decorrem daí as lacunas na</p><p>produção de estatísticas e indicadores para o planejamento da atividade</p><p>cientí�ca nacional (KOBASHI; SANTOS, 2006).</p><p>Para Gusmão (2005), há mais dois complicadores</p><p>na obtenção de dados</p><p>para a realização de estudos sobre a produção de CT&I: primeiro, a falta de</p><p>articulação entre os inúmeros agentes ou instituições produtoras de dados</p><p>primários, obstáculo que impede o estabelecimento e adoção de</p><p>referenciais comuns; segundo, a completa falta de interação entre</p><p>produtores e usuários �nais das informações disponibilizadas, o que</p><p>di�culta a incorporação de novas demandas e eventuais aperfeiçoamentos.</p><p>As questões colocadas indicam que o mapeamento da atividade</p><p>cientí�ca é um empreendimento interdisciplinar. Nas pesquisas de</p><p>observação e análise da ciência, realizadas no âmbito do Grupo Scientia,34</p><p>associamos os Estudos Sociais da Ciência, a Organização e Representação</p><p>do Conhecimento e Métodos Bibliométricos avançados. Com esse aparato</p><p>teórico e metodológico, procuramos desenvolver estudos de</p><p>institucionalização social e cognitiva da atividade cientí�ca brasileira. Na</p><p>perspectiva que adotamos, são igualmente importantes as pesquisas de</p><p>redes sociais, noção que remonta aos estudos de citações e de coautoria.</p><p>Contemporaneamente, os estudos de redes sociais se bene�ciam tanto de</p><p>modelos matemáticos quanto de softwares de tratamento e manipulação de</p><p>dados cujo cerne são os conceitos de entidade e relacionamentos (ACIOLI,</p><p>2007; MARTELETO; SILVA, 2004; MATHEUS; SILVA, 2009; TOMAEL,</p><p>2008), presentes igualmente nos Estudos métricos da informação.</p><p>ESTUDOS MÉTRICOS DA INFORMAÇÃO: REFERENCIAIS</p><p>TEÓRICOS</p><p>O uso de métodos estatísticos e matemáticos para mapear informações</p><p>não é fato novo, como aponta Boustany (1997), ao se referir a um autor</p><p>desconhecido, citado no Manuel du Bibliophile ou, Traité du choix des livres,</p><p>de 1823, de autoria de Gabriel Peignol, que pesquisou a produção universal</p><p>de livros no período compreendido entre a metade do século XV e início do</p><p>século XIX.</p><p>Lotka, Bradford, Zipf e Price são os autores que, no século XX,</p><p>contribuíram de forma signi�cativa para consolidar o campo dos estudos</p><p>quantitativos sobre a informação. A lei de Lotka (1926) sobre a</p><p>produtividade de autores de artigos cientí�cos, a lei de Bradford (1934)</p><p>sobre a dispersão de autores em publicações periódicas, e a lei de Zipf</p><p>(1935), sobre a frequência/ocorrência de palavras em textos longos, são</p><p>ainda hoje parâmetros utilizados nos Estudos métricos da informação.</p><p>Price (1969), por sua vez, valeu-se das propostas de Lotka, Bradford e</p><p>Zipf para formular a Cientometria, caracterizada como o estudo</p><p>quantitativo da atividade cientí�ca, cujos objetos empíricos são os</p><p>produtos e os produtores de ciência. Semelhante caracterização teve como</p><p>ponto de partida a percepção de que as leis econométricas relativas ao</p><p>cálculo de mão de obra poderiam explicar o comportamento da literatura</p><p>cientí�ca. Com base nesse raciocínio, Price a�rmou que os dados</p><p>quantitativos sobre revistas e artigos cientí�cos obedecem a regras</p><p>estáveis que operam como indicadores do estado da ciência.</p><p>Segundo Meadows (apud POLANCO, 1995):</p><p>�e key �gure in this new quantitative studies was Price, whose writings, especially Little</p><p>Science, Big Science had a major impact on thinking about the growth and evolution of</p><p>scienti�c journals. In part, he drew together ideas already under discussion. For example,</p><p>the rapid growth in the amount of scienti�c literature had been debated by librarians and</p><p>others since the First World War. Similarly, but separately, there had been work on relevant</p><p>statistical distributions, such as Lotka’s work on scienti�c productivity and Zipf’s on word</p><p>distributions. Price extended this earlier work to provide an integrated, quantitative picture</p><p>of the scienti�c literature [...]. One important area of Price’s work covered the applications</p><p>of citation analysis. In this, he relied on the contemporaneous activities of Gar�eld in</p><p>developing the concept of a citation index.35</p><p>Deve-se a Price (1969), portanto, a elaboração de um novo modelo que</p><p>integrou Bibliometria e Estudos da atividade cientí�ca, ou seja, a</p><p>formulação teórica da Ciência da Ciência, campo que propiciou o</p><p>desenvolvimento de importantes estudos interdisciplinares entre</p><p>Cientometria e Ciência da Informação. Da mesma forma, Small e Gar�eld</p><p>(1986) a�rmaram que Price antecipara, nos anos 1960, a ideia de</p><p>evidenciar, por meio de mapas da ciência, o grau de cobertura e a</p><p>importância relativa das revistas cientí�cas. Os referidos mapas têm por</p><p>base, segundo Price (1969), as “relações estruturais de uma rede de</p><p>referências e citações”, projeto que será desenvolvido no Institute for</p><p>Scienti�c Information (ISI), na década de 1970, por meio de métodos de</p><p>cocitação (apud POLANCO, 1995).</p><p>Os modelos bibliométricos e cientométricos utilizam os artigos</p><p>cientí�cos para examinar a atividade cientí�ca e realizar inferências sobre</p><p>o estado da ciência. Não se pode, porém, reduzir a atividade cientí�ca à</p><p>produção, circulação e consumo de artigos de periódicos e, muito menos,</p><p>confundir o crescimento quantitativo de artigos com o desenvolvimento</p><p>cognitivo da ciência. De fato, muitos autores já assinalaram que os</p><p>modelos tradicionais tinham como foco a quanti�cação de artigos, de</p><p>autores mais produtivos, de periódicos mais citados etc., porém, não</p><p>penetraram nas questões cognitivas, ou seja, no conhecimento contido</p><p>nesses objetos. Como assinala Polanco (1995),</p><p>le modèle bibliométrique de la science de Price ne saisit pas directement le contenu cognitif</p><p>des articles scienti�ques, autrement dit les connaissances qu’ils véhiculent. Les informations</p><p>présentes dans le titre de l’article, dans son résumé, ou dans le texte lui-même sont en réalité</p><p>ignorées dans l’approche scientométrique instauré par Price [...] De ce fait, un tel dispositif</p><p>ne réalise qu’une scientométrie “externaliste”. Par conséquent, le dé� est maintenant de</p><p>développer une scientométrie “internaliste” si l’on peut ainsi s’exprimer. Ce qui s’est fait en</p><p>France avec la mise au point de la méthode des mots associés au début des années quatre-</p><p>vingts, utilisant justement les mots-clés comme indicateurs de connaissance.36</p><p>A produção de ciência é uma atividade eminentemente social. É esse</p><p>enfoque que confere robustez aos estudos cientométricos, cujo objeto são a</p><p>produção, a circulação e o consumo dos resultados da atividade cientí�ca.</p><p>Trata-se, portanto, não apenas de quanti�car e constatar, mas de atribuir</p><p>sentido aos dados, quali�cando-os de forma a permitir que pesquisadores,</p><p>dirigentes e gestores de instituições de ensino superior possam melhor</p><p>planejar ações estratégicas, acompanhar a operacionalização de decisões,</p><p>avaliar os resultados dos esforços e recursos investidos em CT&I, seja do</p><p>ponto de vista de especialidade ou grupo de pesquisa, seja em contextos</p><p>mais abrangentes, regionais, nacionais ou mundiais.</p><p>A análise da produção, circulação e consumo da produção cientí�ca de</p><p>um país, de uma região ou mesmo de uma instituição é bastante complexa.</p><p>O crescimento da produção cientí�ca, por exemplo, pode ser in�uenciado</p><p>por fatores diversos como a quantidade e quali�cação dos pesquisadores,</p><p>os investimentos �nanceiros efetivos e as políticas públicas de</p><p>desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da inovação (SPINAK, 1996;</p><p>OKUBO, 1997; SPINAK, 1998; TRZESNIAK, 1998).</p><p>A produção de indicadores é uma das atividades mais importantes dos</p><p>Estudos métricos da ciência. Eles são comumente divididos em indicadores</p><p>de produção, indicadores de citação e indicadores de ligação (KOBASHI;</p><p>SANTOS, 2006). Os Indicadores de produção são construídos pela</p><p>contagem do número de publicações por tipo de documento (livros,</p><p>artigos, publicações cientí�cas, relatórios etc.), por instituição, área de</p><p>conhecimento e país. Os indicadores de citação são obtidos pela contagem</p><p>do número de citações recebidas por um periódico ou artigo de periódico. É</p><p>o meio mais reconhecido de atribuir crédito ao autor. Os indicadores de</p><p>ligação, por sua vez, são construídos pela análise de coocorrência de</p><p>autorias, citações e palavras, sendo aplicados na elaboração</p><p>de mapas de</p><p>estruturas de conhecimento e de redes de relacionamento entre</p><p>pesquisadores, instituições e países. Sua elaboração requer o emprego de</p><p>técnicas de análise estatística de agrupamentos (COURTIAL, 1990;</p><p>CALLON et al., 1993; NARIN et al., 1994; OKUBO, 1997; MACIAS-</p><p>CHAPULA, 1998; SPINAK, 1998).</p><p>O cálculo de coocorrências (de autores, de palavras, de instituições),</p><p>fundado em métodos de análise multidimensional é uma das áreas que</p><p>vem crescendo de forma acentuada. A análise multidimensional aplicada às</p><p>palavras-chave de registros bibliográ�cos con�gura-se como uma das</p><p>contribuições teóricas mais recentes aos métodos quantitativos. Baseado</p><p>no cálculo matricial e na álgebra linear, esse método supõe a classi�cação</p><p>automática dos dados e sua representação por meio de cartogra�as</p><p>temáticas, as quais são formas de visualização baseadas nos estudos de</p><p>percepção desenvolvidos no campo da Psicologia cognitiva (TUFTE, 1983).</p><p>Os recursos visuais de apresentação de informações digitais, em seus</p><p>diversos formatos (grá�cos, animações, multimídias, �guras interativas,</p><p>mapas interativos), vêm sendo utilizados de forma crescente para</p><p>identi�car estruturas de campos cientí�cos e visualizar as dinâmicas do</p><p>desenvolvimento cientí�co propriamente dito (HASCOËT, 2004; SANTOS;</p><p>KOBASHI, 2009). Convém ressaltar, no entanto, que a elaboração de</p><p>visualizações grá�cas são dependentes da qualidade dos dados de partida,</p><p>ou seja, do tratamento a eles dado na construção de repositórios.</p><p>A utilização de métodos bibliométricos na análise da produção</p><p>cientí�ca não é mera quanti�cação. De fato, os indicadores ganham</p><p>signi�cado ao serem interpretados no quadro das políticas cientí�cas</p><p>concretas. De nosso ponto de vista, os resultados das aplicações</p><p>bibliométricas, para serem validados, requerem interpretações baseadas</p><p>em teorias produzidas no âmbito dos estudos sociais da ciência.</p><p>A Sociologia do Conhecimento, uma das vertentes dos Estudos sociais</p><p>da ciência, foi instaurada como atividade estruturada, no início do século</p><p>XX, por sociólogos como Durkheim, Mauss, Manheim, Weber e Veblen</p><p>(BURKE, 2003). Os estudos da ciência vêm sendo continuamente</p><p>renovados, sob diferentes perspectivas, pela adesão de inúmeros</p><p>pesquisadores, tais como Bourdieu, Foucault, Lévi-Strauss, Kuhn, Latour,</p><p>entre os mais conhecidos na atualidade. As abordagens contemporâneas</p><p>podem ser sintetizadas nos seguintes pontos: a ênfase na ideia de ciência</p><p>como construção, em oposição à ideia de descoberta; o reconhecimento da</p><p>importância da linguagem, portanto, do simbólico na atividade cientí�ca; a</p><p>interferência dos aspectos políticos no trabalho cientí�co, ou seja, as</p><p>relações de poder que a permeiam e o interesse pelas comunidades</p><p>epistemológicas, vistas como as unidades fundamentais do processo de</p><p>produção e de difusão do conhecimento (BURKE, 2003, p. 17).</p><p>A metáfora da escavação arqueológica, proposta por Foucault (1986;</p><p>2000), tem sido explorada heuristicamente nos métodos bibliométricos de</p><p>análise de bases de dados (ALVARENGA, 1998; KOBASHI; SANTOS,</p><p>2008). Com efeito, semelhante análise é uma forma de escavação para</p><p>identi�car, descrever e interpretar a informação que se encontra submersa</p><p>em repositórios bibliográ�cos. A escavação e a interpretação do que está</p><p>documentado não podem ser feitas, porém, no interior de uma única</p><p>disciplina. Ao contrário, requerem abordagem interdisciplinar. Como</p><p>a�rma Burke (2003, p. 18) os estudos sobre a produção de conhecimento</p><p>constituíram-se, desde o início, “não como um campo especí�co, mas como</p><p>uma pluralidade de disciplinas ou subdisciplinas como bibliogra�a, história</p><p>da ciência, história da leitura, história intelectual”.</p><p>Dois conceitos operacionais sustentam os estudos do Grupo Scientia: a</p><p>institucionalização cognitiva e a institucionalização social, conceitos</p><p>propostos por Whitley (1974). A institucionalização cognitiva abarca os</p><p>aspectos epistemológicos, teóricos e metodológicos das disciplinas</p><p>cientí�cas. São seus objetos os graus de consenso sobre os conceitos da</p><p>área, a legitimidade e pertinência dos problemas propostos ao campo, o</p><p>grau de aceitabilidade das soluções encontradas e, �nalmente, o grau de</p><p>adequação dos métodos, técnicas e instrumentos de observação dos</p><p>fenômenos.</p><p>A institucionalização social relaciona-se às estruturas formais que</p><p>demarcam os membros de uma comunidade cientí�ca. Nessa dimensão,</p><p>são analisados o grau de organização de uma área do conhecimento, sua</p><p>integração às estruturas de legitimação (universidades, institutos de</p><p>pesquisa, instâncias de avaliação, sociedades cientí�cas etc.) e as condições</p><p>de acesso aos programas de �nanciamento da pesquisa.</p><p>NOTAS METODOLÓGICAS SOBRE PRODUÇÃO DE</p><p>INDICADORES DA CIÊNCIA</p><p>A produção de indicadores da atividade cientí�ca, em moldes</p><p>tradicionais, baseia-se na análise de artigos publicados em revistas de</p><p>prestígio internacional. A utilização desses dados é recorrentemente</p><p>criticada. Com efeito, não há relação direta entre a atividade intelectual</p><p>produtiva e a publicação em periódicos internacionais. Presume-se que há</p><p>um trabalho intelectual altamente produtivo que antecede a publicação de</p><p>artigos. Essas constatações solicitam a formulação de hipóteses</p><p>alternativas de trabalho adequadas para os contextos em que se</p><p>desenvolve a pesquisa cientí�ca.</p><p>O Grupo Scientia desenvolveu inúmeros estudos sobre dissertações e</p><p>teses, na hipótese de que eles pudessem revelar aspectos importantes da</p><p>atividade cientí�ca do país. As dissertações e teses são, por outro lado,</p><p>trabalhos produzidos e avaliados em instâncias acadêmicas altamente</p><p>organizadas e controladas. Certas áreas do conhecimento, como a da</p><p>Saúde, dispõem de repositórios exaustivos de artigos de periódicos</p><p>nacionais. Eles permitem realizar estudos analíticos con�áveis sobre o</p><p>estado da arte da atividade cientí�ca. Como exemplo, pode ser citada a</p><p>tese de Cibele Araújo Marques dos Santos, defendida em 2011, intitulada</p><p>Convergência temática entre produção cientí�ca e política nacional de pesquisa</p><p>em Saúde Pública: estudo com base em análise de artigos de periódicos</p><p>indexados. No entanto, são raras as áreas das Ciências sociais e humanas</p><p>que podem se bene�ciar de bases de periódicos para realizar estudos</p><p>métricos da informação, ou mesmo, estudos de redes sociais.</p><p>Outra di�culdade encontrada nos estudos de institucionalização da</p><p>atividade cientí�ca refere-se à etapa de coleta de dados, fato que se agrava</p><p>no contexto brasileiro. Os repositórios da produção cientí�ca nacional são</p><p>dispersos, pouco padronizados, apresentando inconsistências em</p><p>praticamente todos os atributos dos registros bibliográ�cos. Desse modo, a</p><p>reformatação dos dados obtidos nas fontes bibliográ�cas é parte</p><p>imprescindível dos estudos de produção cientí�ca. A reformatação dos</p><p>dados descritivos pode ser feita com softwares de padronização. A</p><p>reformatação dos dados de conteúdo (temas, metodologias, referenciais</p><p>teóricos etc.) requer procedimentos mais so�sticados, visto que os</p><p>repositórios são, via de regra, construídos para �ns de recuperação de</p><p>informação, baseados, portanto, em indexação realizada segundo o</p><p>princípio da especi�cidade. Em geral, a contagem dos descritores</p><p>utilizados na indexação original resulta em elevada quantidade de classes</p><p>de baixa frequência. Dito de outro modo, a distribuição estatística dos</p><p>descritores resulta em núcleo reduzido e alta dispersão. A reformatação</p><p>desses dados requer conhecimentos sobre a linguagem, a terminologia e a</p><p>conceptologia. É esse aparato teórico que permite estabelecer conjuntos</p><p>homogêneos e reorganizá-los com base em algum princípio de ordem que</p><p>autorize a substituição de descritores especí�cos por descritores de nível</p><p>mais genérico.</p><p>Na operação de generalização explicitada, neutralizam-se as diferenças</p><p>especí�cas, a partir de certo grau, para obter classes homogêneas de nível</p><p>mais abstrato. Semelhante tratamento elimina os problemas decorrentes</p><p>da indexação original</p><p>que pulveriza o corpus em classes muito especí�cas,</p><p>inadequadas para mapear a ciência. É importante relembrar as palavras de</p><p>Granger (1973) sobre a relação quantidade/qualidade. Segundo o �lósofo e</p><p>matemático francês, um conhecimento qualitativo não elimina a</p><p>quantidade, mas toma a medida como meio para compreender e explicar,</p><p>de modo a quebrar a clivagem entre o modo quantitativo e o modo</p><p>qualitativo de analisar objetos.</p><p>As principais inconsistências encontradas nos registros utilizados nos</p><p>estudos de produção cientí�ca são: falta de padronização dos nomes de</p><p>autores, orientadores e instituições. Quanto à descrição de conteúdo,</p><p>observa-se a falta de padronização gramatical dos descritores (singular,</p><p>plural), variações nas formas de expressão de conceitos semelhantes</p><p>(sinonímia, quase-sinonímia), problemas de gradação (atribuição de</p><p>descritores extremamente genéricos ou muito especí�cos) e número, ora</p><p>excessivo, ora insu�ciente de descritores.</p><p>Esses problemas exigem a construção de bases de dados ad hoc, com</p><p>estrutura que comporte novos campos de descritores padronizados:</p><p>a) Campo de descritores: para registrar os descritores atribuídos pelo</p><p>autor, porém padronizados quanto à forma.</p><p>b) Campo de Macrodescritores: para inserção de descritor de nível mais</p><p>genérico. Nesse caso, deve-se estabelecer um referencial terminológico</p><p>reconhecido e compartilhado pelos pesquisadores de um dado domínio.</p><p>Exempli�camos com os procedimentos utilizados em algumas pesquisas</p><p>desenvolvidas pelo Grupo Scientia: nos trabalhos de Ciência da</p><p>informação, os nomes dos Grupos de trabalho (GTs) da ANCIB (Associação</p><p>Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação) foram</p><p>utilizados como categorias organizadoras; no caso da Energia Nuclear,</p><p>recorreu-se às categorias do �esaurus INIS, na área da Saúde, aos</p><p>subtemas da Agenda Nacional de Pesquisa em Saúde.</p><p>Exemplos de cartografias de atividade científica</p><p>A atividade cientí�ca expressa por meio de cartogra�as permite</p><p>estabelecer retratos da produção cientí�ca de um dado período. São</p><p>recursos que promovem a apreensão de diferentes tipos de ligações entre</p><p>dados: pesquisadores e instituição, redes de colaboração, pesquisadores e</p><p>temas, entre outros. Nos exemplos a seguir são apresentados dados</p><p>preliminares do projeto Pesquisa brasileira em organização do</p><p>conhecimento: indicadores temáticos, de internacionalização e de redes de</p><p>colaboração (2002-2012) (KOBASHI, 2010).</p><p>As cartogra�as abaixo foram elaboradas com dados coletados na base</p><p>de dados ABCDM (VILAN FILHO, 2008) sobre a temática Organização da</p><p>Informação. As buscas foram realizadas em 19 de julho de 2011, data em</p><p>que a base contava com 6.868 registros de artigos de periódicos brasileiros</p><p>e portugueses, além das publicações constantes de nove anais do Enancib –</p><p>Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação, compreendendo</p><p>as seguintes áreas de informação: Arquivologia, Biblioteconomia, Ciência</p><p>da Informação, Documentação e Museologia.</p><p>As referências bibliográ�cas coletadas (638 registros) foram</p><p>armazenadas em uma base de dados ad hoc e reformatadas para</p><p>processamento bibliométrico (contagem de objetos) e análise</p><p>cientométrica (análise multidimensional da correlação Descritor e</p><p>Primeiro Autor).</p><p>Na primeira cartogra�a, sob a forma de dendograma, Figura 1, as</p><p>variáveis Descritores X Primeiro Autor foram agrupadas utilizando-se o</p><p>método Ward, a partir da distância de 1-r de Pearson. Para comparar os</p><p>agrupamentos, foi adotada distância igual a 1. Observa-se, na FIG 1, que</p><p>os nós estão agrupados dois a dois (Maria Luiza Almeida Campos,</p><p>Categorização) ou três a três (Comunicação Cientí�ca, Carlos Henrique</p><p>Marcondes, Publicações Eletrônicas) e, em princípio, pode-se veri�car em</p><p>cada agrupamento a coerência temática entre pesquisadores e referências</p><p>de trabalhos publicados.</p><p>Figura 1: Representação hierárquica de registros sobre Organização da</p><p>Informação – agrupamento Descritor X Primeiro autor.</p><p>Fonte: Elaborada pelo autor.</p><p>As cartogra�as na forma de visualização de Redes Sociais, Figuras 3, 4 e</p><p>5, apresentam agrupamentos expandidos “Descritor X Primeiro Autor”,</p><p>sendo que os pesquisadores constantes em cada agrupamento foram</p><p>selecionados segundo as instituições de origem (Universidade Federal</p><p>Fluminense, Universidade Estadual Paulista e Universidade de São Paulo).</p><p>Para tanto, na matriz quadrada de relacionamento, construída</p><p>previamente, os pesquisadores da mesma instituição receberam os</p><p>mesmos atributos.</p><p>Figura 2: Rede Social de registros bibliográ�cos sobre Organização da</p><p>Informação - agrupamento Descritor X Primeiro autor (UNESP)</p><p>Fonte: Elaborada pelo autor.</p><p>Figura 3: Rede Social de registros bibliográ�cos sobre Organização da</p><p>Informação - agrupamento Descritor X Primeiro autor (UFF)</p><p>Fonte: Elaborada pelo autor.</p><p>Figura 4: Rede Social de registros bibliográ�cos sobre Organização da</p><p>Informação - agrupamento Descritor X Primeiro autor (USP)</p><p>Fonte: Elaborada pelo autor.</p><p>As Figuras 2, 3 e 4 mostram os pesquisadores e seus temas de pesquisa</p><p>mais frequentes. Mostra também o universo dos temas de pesquisa, de</p><p>forma global, os temas mais relacionados a cada pesquisador e o</p><p>compartilhamento de interesses desses pesquisadores. De posse desses</p><p>dados, é possível elaborar outras visualizações: coautoria, redes de</p><p>colaboração institucionais, além de segmentar cronologicamente os dados</p><p>de modo a obter visão diacrônica da pesquisa sobre determinado tema.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Os países periféricos não dispõem, via de regra, de indicadores</p><p>consistentes sobre a sua atividade cientí�ca. Os estudos de produção</p><p>cientí�ca são limitados porque a infraestrutura de informação desses</p><p>países é precária. Sua produção também não está presente de forma</p><p>exaustiva nos repositórios internacionais. Nessa medida, os estudos sobre</p><p>a institucionalização da atividade cientí�ca, com pretensão de</p><p>representatividade, enfrentam diversos desa�os.</p><p>Compor o corpus da pesquisa é o primeiro desa�o, já que as</p><p>informações estão, em geral, dispersas em diferentes bases de dados,</p><p>construídas, por sua vez, segundo políticas especí�cas de descrição. Os</p><p>dados nem sempre são completos, o que requer coleta complementar de</p><p>informações. Em seguida, os dados coletados devem ser padronizados para</p><p>neutralizar as diferenças estruturais dos metadados.</p><p>A segunda di�culdade decorre dos critérios de tratamento temático</p><p>adotados em cada repositório. Os descritores são atribuídos pelos próprios</p><p>autores, não constituindo, portanto, classes rigorosas de assuntos</p><p>baseadas em repertórios terminológicos compartilhados. A dispersão</p><p>temática impede a realização de análise de tendências ou linhas de força</p><p>predominantes ou emergentes em cada campo cientí�co, ou mesmo a</p><p>análise de redes de colaboração sobre temas de pesquisa. Nesse sentido, as</p><p>operações bibliométricas tradicionais que selecionam o corpus com base</p><p>apenas em critérios estatísticos, sem a análise prévia da natureza dos</p><p>dados de partida, devem ser substituídas por critérios qualitativos e</p><p>adoção de procedimentos metodológicos e técnicos que promovam</p><p>consistência efetiva de dados. Critérios qualitativos são, portanto,</p><p>fundamentais para promover a con�abilidade dos estudos bibliométricos.</p><p>Os estudos de produção cientí�ca requerem abordagem</p><p>interdisciplinar, como já foi apontado por diversos pesquisadores. Os que</p><p>se dedicam aos estudos dessa área devem dispor de diferentes</p><p>competências, além das habilidades de identi�car, coletar e padronizar</p><p>dados. Com efeito, os métodos bibliométricos, se aplicados de forma cega,</p><p>produzem resultados pouco con�áveis, sendo necessário fazer a crítica</p><p>constante dos pressupostos, hipóteses e procedimentos utilizados. Uma</p><p>abordagem epistemológica do fazer cientométrico parece ser fundamental</p><p>para promover avanços no campo e superar a visão positivista dominante.</p><p>A compreensão de que a ciência é construção, em oposição à ideia de</p><p>descoberta, e o reconhecimento dos aspectos</p><p>políticos e simbólicos da</p><p>atividade cientí�ca, ou seja, as relações de poder que se instauram no</p><p>campo cientí�co devem ser igualmente consideradas.</p><p>Em resumo, os Estudos sociais da ciência são fundamentais para</p><p>interpretar os dados da atividade cientí�ca; os métodos da Organização da</p><p>Informação são necessários para reorganizar os dados em categorias aptas</p><p>a serem exploradas tematicamente; a crítica permanente de teorias, de</p><p>hipóteses e de métodos é um requisito essencial da pesquisa cientí�ca e,</p><p>�nalmente, a familiaridade com os instrumentos de pesquisa, softwares</p><p>bibliométricos, em particular, é também fundamental. Esse conjunto de</p><p>requisitos mostra a complexidade inerente aos estudos cientométricos</p><p>contemporâneos.</p><p>Os empreendimentos cientí�cos geram também resultados marginais</p><p>não desprezíveis. As metodologias sistematizadas, por exemplo, facilitam a</p><p>capacitação de pessoas para realizar estudos de produção cientí�ca. Essas</p><p>metodologias são igualmente úteis para analisar a qualidade das bases de</p><p>dados e promover seu aprimoramento. A multiplicação ou universalização</p><p>dessas competências deve ser objeto de ações especí�cas nas diversas</p><p>instâncias de formação universitária (cursos de graduação e pós-</p><p>graduação, iniciação cientí�ca, especialização e reciclagem pro�ssional).</p><p>Sinaliza-se, portanto, a necessidade de mobilizar os especialistas da área</p><p>para realizarem trabalho cooperativo de formação de pessoas altamente</p><p>capacitadas para desenvolver estudos cientométricos, produzirem</p><p>indicadores da atividade cientí�ca e aprimorarem a infraestrutura</p><p>informacional do pais.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ACIOLI, S. Redes sociais e teoria social: revendo os fundamentos do</p><p>conceito. Informação & Informação, Londrina, v.12, número especial, dez. 2007.</p><p>ALVARENGA, L. Bibliometria e arqueologia do saber de Michel Foucault: traços de identidade</p><p>teórico-metodológica. Ciência da Informação, Brasília, v. 27, n. 3, p. 253-261, 1998.</p><p>BOUSTANY, Joumana. 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Institucionalização da pesquisa cientí�ca no Brasil: cartogra�a temática</p><p>e de redes sociais por meio de técnicas bibliométricas. TransInformação, Campinas, v. 18, n. 1, p. 27-</p><p>36, 2006.</p><p>______. Arqueologia do trabalho imaterial: uma aplicação bibliométrica à análise de dissertações e</p><p>teses. Encontros Bibli, Florianópolis, número especial, p. 106-115, 2008.</p><p>LANE, J. Let’s make science metrics more scienti�c. Nature, London, v. 464, n. 7288, p. 488-489,</p><p>2010.</p><p>LOTKA, Alfred. �e frequency distribution of scienti�c productivity. Journal of the Washington</p><p>Academy of Sciences, v. 16, n. 12, p. 317-323, jun. 1926.</p><p>MACIAS-CHAPULA, C. A. O papel da informetria e da cienciometria e sua perspectiva nacional e</p><p>internacional. Ciência da Informação, Brasília, v. 27, n. 2, p. 134-140, 1998.</p><p>MARTELETO, R. M.; SILVA, A. B. O. Redes e capital social: o enfoque da informação para o</p><p>desenvolvimento local. 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Da mesma forma, mas separadamente, havia os trabalhos sobre</p><p>distribuições estatísticas relevantes, como o de Lotka sobre a produtividade cientí�ca e a de Zipf</p><p>sobre</p><p>as distribuições de palavras. Price ampliou esses trabalhos pioneiros de modo a dar uma visão</p><p>integrada, um quadro quantitativo da literatura cientí�ca [...] Uma área importante do trabalho de</p><p>Price são as aplicações da análise de citações. Neste caso, ele se baseou nas atividades de Gar�eld de</p><p>desenvolvimento do conceito de índice de citação” (Tradução).</p><p>36 “[...] o modelo bibliométrico de ciência de Price não captura o conteúdo cognitivo dos artigos</p><p>cientí�cos, ou seja, o conhecimento que eles transmitem. As informações presentes no título do</p><p>artigo, em seu resumo, ou no próprio texto são, na realidade, ignoradas na abordagem</p><p>cientométrica introduzida por Price [...] Portanto, tal dispositivo realiza uma cientometria</p><p>“externalista”. Desse modo, o desa�o agora é desenvolver uma cientometria “internalista” se assim</p><p>se pode falar, o que vem sendo feito na França, desde o início dos anos oitenta, por meio da análise</p><p>de palavras associadas, tendo as palavras-chave como indicadores de conhecimento” (Tradução).</p><p>REDES COLABORATIVAS NA CIÊNCIA: ESTUDOS DE</p><p>COAUTORIA E COCITAÇÃO</p><p>Jacqueline Leta</p><p>Roberto Mario Lovón Canchumani.</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>A ciência, tal como a conhecemos hoje, tem suas origens nos séculos</p><p>XVI e XVII. A busca por novos conhecimentos foi, aos poucos,</p><p>consolidando-se até tornar-se, em meados do século XIX, uma atividade de</p><p>amplo interesse social.</p><p>O processo de consolidação e de institucionalização da ciência moderna</p><p>ocidental é marcado por diversas mudanças que impactaram, de maneira</p><p>signi�cativa, essa atividade. Algumas destas mudanças afetaram a forma</p><p>como a ciência investiga os fenômenos e a natureza, entre elas: (i) o uso de</p><p>instrumentos cientí�cos que permitem aprimorar e sistematizar as</p><p>observações que inicialmente eram somente contemplativas; (ii) o uso da</p><p>matemática que permite identi�car regularidades entre e nos fenômenos</p><p>observados; (iii) o entendimento do fenômeno a partir das partes e não</p><p>mais do todo (concepção mecanicista); e (iv) o rigor do método que</p><p>(supostamente) permite uma análise objetiva e racional sobre o objeto</p><p>estudado. (RONAN, 1987; OLIVA, 2003; MARICONDA, 2006).</p><p>Outros fatores também foram importantes nesse processo e marcam a</p><p>forma de como a ciência passou a se relacionar com a sociedade. Em um</p><p>contexto de grandes transformações no modus operandi, a ciência do século</p><p>XIX passa a ocupar um novo espaço social, as universidades, o que lhe</p><p>confere reconhecimento e interesse da população. Ser cientista passa a se</p><p>constituir em ser um pro�ssional, ter status social. Essa nova pro�ssão</p><p>passou a atrair a atenção de um número cada vez maior de interessados e</p><p>também dos governos. Sobre isso recai outra característica da ciência</p><p>moderna: a nova forma de �nanciamento; a atividade deixou de ser</p><p>�nanciada por mecenas, indivíduos abastados e/ou interessados para ser</p><p>�nanciada essencialmente com recursos públicos, de governo</p><p>(MEADOWS, 1974; ZIMAN, 1976; TAYLOR et al., 2008).</p><p>Esses aspectos (e outros não mencionados) foram fundamentais para</p><p>levar a ciência à especialização, um processo de fragmentação do</p><p>conhecimento que se re�etiu, tanto na estrutura acadêmica e cientí�ca</p><p>como nos meios de divulgação do conhecimento cientí�co, especi�camente</p><p>nos periódicos. A passagem a seguir ilustra esse processo:</p><p>Research papers gradually became more specialised in the twentieth century, but the real</p><p>watershed was the period round the Second World War, when it became evident that</p><p>Professional geologists in di�erent specialisms could no longer fully understand each other.</p><p>Since then, the trend in publication has been away from general geological journals and</p><p>towards journals dealing with speci�c branches, such as geochemistry and geophysics37</p><p>(MEADOWS, 1974, p. 74).</p><p>Desde meados do século XVIII, a comunicação escrita entre os</p><p>pesquisadores vem sendo feita principalmente por meio dos periódicos, os</p><p>quais foram se especializando e incorporando alguns elementos próprios,</p><p>até chegarem ao formato que conhecemos hoje. Essa nova forma de</p><p>comunicar a ciência torna-se, após a Segunda Guerra Mundial, o elemento-</p><p>chave da pesquisa mundial, a partir do qual a ciência e os cientistas são</p><p>avaliados e reconhecidos por seus pares, o que pode ser convertido em</p><p>visibilidade e prestígio.</p><p>Assim, em um passado recente na história da humanidade, vimos</p><p>acontecer, de um lado, a especialização da ciência e dos periódicos e, de</p><p>outro, um aumento signi�cativo das instituições e do pessoal envolvidos</p><p>com a atividade. O resultado não poderia ser diferente: um aumento</p><p>também signi�cativo da produção cientí�ca de todo o mundo, estimado</p><p>principalmente pelo número de publicações originais, ou papers (UNESCO,</p><p>2001, 2004).</p><p>É importante ressaltar que a forma de comunicação da ciência se</p><p>transformou. Cartas e livros já foram os principais meios de divulgação de</p><p>novos conhecimentos. Desde o século XVII, no entanto, essa função</p><p>passou a ser dividida também pelos periódicos cientí�cos. A consolidação</p><p>desse veículo como nova forma de registro de�nitivo da ciência</p><p>(substituindo os livros e cartas) só ocorreu, no entanto, na segunda</p><p>metade do século XIX (MEADOWS, 1974; RUSNOCK, 1999; MEADOWS,</p><p>2004). Os primeiros periódicos eram constituídos de alguns artigos breves,</p><p>com poucas páginas, em que era resumido o processo de investigação,</p><p>possibilitando a divulgação precoce dos trabalhos desenvolvidos pelos</p><p>cientistas e garantindo a prioridade da descoberta. Hoje, os periódicos,</p><p>especialmente aqueles voltados à divulgação dos novos conhecimentos</p><p>oriundos das ciências experimentais, apresentam seus trabalhos em</p><p>formatos padronizados, buscando reproduzir, de forma irrefutável, a</p><p>sequência de etapas que permitiram aos pesquisadores, autores dos</p><p>trabalhos, chegarem àquele conjunto de novas informações.</p><p>Essa nova forma de divulgar o conhecimento gerado pela ciência traz à</p><p>tona diferentes elementos que caracterizam não apenas seu dinamismo,</p><p>mas também esse novo paradigma em que se transformou o paper. Entre</p><p>esses elementos, a autoria e as citações se constituem em dois elementos-</p><p>chave para os estudos de redes colaborativas na ciência,38 desenvolvidos</p><p>no escopo da Informetria.39</p><p>DE CIÊNCIA PEQUENA À CIÊNCIA GRANDE: O PAPEL</p><p>DAS MÚLTIPLAS AUTORIAS E CITAÇÕES</p><p>Em seu clássico trabalho, Little Science, Big Science, Solla Price (1963)</p><p>apresenta e discute, a partir de análises quantitativas, evidências sobre</p><p>como a ciência e a produção cientí�ca crescem, em um ritmo que, segundo</p><p>o autor, ocorre de forma exponencial. O estudo de Solla Price parte de uma</p><p>re�exão inicial sobre as transformações da atividade cientí�ca no século</p><p>XX que deixa de ser uma atividade pequena, conduzida por grupos</p><p>pequenos, com sólida identidade e de baixos recursos para uma atividade</p><p>grande, crescente em número e diversidade de técnicas e de especialidades</p><p>e, principalmente, com alta demanda por recursos. A percepção dessa nova</p><p>forma de organização da ciência foi originalmente apresentada e proposta</p><p>por Weinberg (1961).40 O trecho a seguir ilustra como o autor percebe a</p><p>Big Science:</p><p>When history looks at the 20th century, she will see science and technology as its theme; she</p><p>will �nd in the monuments of Big Science the huge rockets, the high-energy accelerators, the</p><p>high-�ux research reactors symbols of our time just as surely as she �nds in Notre Dame a</p><p>symbol of the Middle Ages41 (WEINBERG, 1961, p. 161).</p><p>Não há dúvida de que essa nova organização é uma marca da ciência do</p><p>século XXI. Vivemos um momento em que estamos cercados por inúmeros</p><p>projetos e produtos da Big Science, todos com grande potencial de impacto</p><p>e mudança na vida de todo o planeta. São exemplos os projetos: Genoma</p><p>Humano, o CERN (Projeto Nuclear Europeu) e o supercondutor de</p><p>partículas, o Observatório ALMA (Atacama Large</p><p>Millimeter/submillimeter Array) e os supertelescópios.</p><p>Nesse novo cenário, a organização social da ciência ganha novos</p><p>arranjos: os projetos em larga escala e de alta complexidade exigem não</p><p>apenas recursos �nanceiros mais volumosos, mas, e principalmente,</p><p>recursos humanos com múltiplas competências, tanto em áreas especi�cas</p><p>como também em técnicas. Diante dessas exigências, os cientistas</p><p>passaram a buscar, em diferentes partes do mundo, parcerias e</p><p>colaboradores que pudessem trazer, para seus grupos de pesquisa, algum</p><p>tipo de benefício.</p><p>Apesar de ter se intensi�cado nas últimas décadas, a colaboração entre</p><p>pesquisadores de diferentes nações é um fenômeno observado desde o</p><p>século XIX (BEAVER, 1978; KATZ, 1997). Diversas são as motivações que</p><p>estimulam a colaboração na ciência. A busca por parceiros especialistas em</p><p>determinado tema ou que possuam ou dominem determinada técnica ou</p><p>equipamento é, sem dúvida, uma razão justi�cada pela redução de recursos</p><p>e de tempo, frente a uma ciência cada vez mais complexa e competitiva.</p><p>Outras razões também aparecem na literatura, mas chama atenção a</p><p>relação que diferentes estudos apontam entre colaboração e aumento da</p><p>visibilidade, expressa pelo número de citações.42</p><p>Em um estudo brasileiro recente sobre o tema colaboração na ciência,</p><p>Vanz e Stumpf (2010) mostram como é complexa a conceituação desse</p><p>tema, ou seja, o que signi�ca colaborar na ciência. Mas, assim como</p><p>estudos internacionais, sugere uma relação dinâmica entre colaboração e</p><p>coautoria em trabalhos, sendo esta de�nida na ciência como o</p><p>compartilhamento da autoria e responsabilidade de um estudo cientí�co</p><p>por dois ou mais pesquisadores.</p><p>É certo que nem toda colaboração se expressa materialmente como</p><p>uma coautoria. No entanto, é de se esperar que por trás de uma coautoria</p><p>exista, de fato, algum nível de colaboração entre os autores. Entre os</p><p>diversos estudos que apresentam alguma base teórica para a relação entre</p><p>autoria e colaboração, Morris e Goldstein (2007) descrevem um modelo</p><p>para essa relação que é composto por três formas de equipes e um espectro</p><p>de possibilidades de autoria (Figura 1). Para os autores, as três formas</p><p>incluem: (1) equipe composta por um pesquisador solitário ou um grupo</p><p>pequeno de pesquisadores, que pouco utiliza e/ou necessita de</p><p>equipamentos para a condução de suas pesquisas, como, por exemplo, os</p><p>matemáticos; (2) equipe composta por pesquisadores de diferentes</p><p>instituições que se dedicam a um determinado projeto de pesquisa e que</p><p>dividem tarefas e responsabilidades para o desenvolvimento do projeto; e</p><p>(3) equipe composta por centenas de pesquisadores, reunidos em grupos</p><p>de diferentes nacionalidades, em torno de um projeto supranacional, típico</p><p>dos projetos da Big Science.</p><p>Figura 1: Diagrama de colaboração na ciência e sua correlação com o tipo</p><p>de tarefa, �nanciamento e autoria.</p><p>Fonte: Adaptado de MORRIS e GOLDSTEIN (2007).</p><p>Para Morris e Goldstein (2007), essas formas de trabalho em equipe se</p><p>concretizam na forma da autoria. Assim, equipes unitárias (os autores</p><p>chamam de “lobo solitário”) têm publicações de autoria única. Já equipes</p><p>compostas por diferentes pesquisadores, comuns nas áreas biomédicas e</p><p>biológicas, têm publicações com um grande número de autores, que pode</p><p>variar de 10 a 20, enquanto as equipes supranacionais (os autores chamam</p><p>de “rebanho de búfalos”) têm publicações que podem conter dezenas e até</p><p>centenas de autores.</p><p>Às coautorias somam-se as referências citadas no corpo da publicação</p><p>que se tornaram também elementos demarcadores da moderna</p><p>comunicação na ciência. A prática de referir trabalhos anteriores</p><p>consolidou-se em meados do século XIX, mas para Meadows (1974), ainda</p><p>nesse século, uma parcela signi�cativa das publicações não apresentava</p><p>lista de referências, assim como ainda não havia uma padronização na</p><p>forma de citá-las. Para o autor, as mudanças na forma de citar e a inclusão</p><p>cada vez maior de citações no corpo das publicações ocorreram,</p><p>gradualmente, e foram frutos do crescente volume da literatura cientí�ca.</p><p>Nesse processo, ainda para o autor, a incorporação das citações no texto</p><p>cientí�co representou a busca para a integração da literatura, uma vez que</p><p>já não era possível acompanhar, de perto, tudo o que estava sendo</p><p>publicado.</p><p>O enorme volume de conhecimento cientí�co novo, publicado e</p><p>disponível em periódicos especializados, torna, no entanto, mais complexa</p><p>a determinação das referências a serem utilizadas em uma comunicação</p><p>cientí�ca. Nesse cenário, a escolha das referências mais relevantes �ca</p><p>comprometida se o autor não tiver acesso e/ou leitura atualizada de todo o</p><p>corpo de conhecimento publicado sobre o tema de seu trabalho. Nessas</p><p>circunstâncias, a escolha das referências pode ser in�uenciada por fatores</p><p>de ordem subjetiva (social ou mesmo política) do pesquisador que cita</p><p>determinadas publicações em detrimento de outras que poderiam, até</p><p>mesmo, ser de maior qualidade ou relevância para a argumentação e</p><p>contextualização dos dados que apresenta em seu trabalho.</p><p>A literatura cientí�ca, especialmente a internacional, tem levantado</p><p>evidências empíricas sobre o que está por trás da escolha pela citação de</p><p>um dado trabalho. Wang e Soergel (1998), por exemplo, destacam que a</p><p>percepção do pesquisador sobre a conveniência e a utilidade potencial de</p><p>um trabalho, depende dos valores que o orientam no momento da escolha.</p><p>Esses autores identi�cam cinco tipologias para classi�car esses valores:</p><p>epistemológico, funcional, condicional, social e emocional. Também</p><p>Oppenheim e Renn (1978) elaboraram um modelo para contemplar os</p><p>motivos de citar diferentes trabalhos, chegando às seguintes classes:</p><p>contexto histórico; descrição de outros trabalhos relevantes; provisão de</p><p>informações ou dados sem �ns comparativos; provisão de informações ou</p><p>dados com �ns comparativos; uso de equação teórica; uso de metodologia;</p><p>teoria ou método não aplicável.</p><p>Estudos dessa natureza têm sido discutidos e contextualizados à luz de</p><p>diferentes correntes ou abordagens sociológicas. Para os “Mertonianos”,</p><p>por exemplo, as citações são um meio legítimo de agradecimento e</p><p>reconhecimento às contribuições anteriores de seus pares. Outra corrente</p><p>acredita que as citações constituem-se em um instrumento retórico, do</p><p>qual os pesquisadores se apropriam não apenas para dar suporte a suas</p><p>ideias e resultados, mas para convencer ou persuadir os leitores e seus</p><p>pares da validade e con�abilidade de seus achados. Nesse caso, a escolha</p><p>das citações parece priorizar trabalhos de grupos, periódicos e/ou</p><p>instituições de maior reconhecimento e prestígio. Essa corrente se alinha à</p><p>densa discussão, conduzida por Latour e Woolgar (1982), sobre a busca de</p><p>credibilidade na ciência, um processo em que os principais atores, os</p><p>pesquisadores, buscam e se apropriam de diferentes estratégias e</p><p>mecanismos que viabilizem a conversão de um crédito (dados, recursos,</p><p>artigos, citações etc.), em outro, em um ciclo incessante de busca de</p><p>reconhecimento e credibilidade.</p><p>Considerando as citações não apenas como um aspecto formal e</p><p>estrutural, mas essencialmente como um aspecto da dimensão social da</p><p>comunicação na ciência, é de se esperar que o número de publicações</p><p>citadas tenha acompanhado o crescimento das publicações. De fato, a</p><p>literatura internacional aponta para essa direção, ou seja, cresce cada vez</p><p>mais o número de referências citadas (PERSSON et al., 2004). Esse</p><p>crescimento, no entanto, não é uniforme, seja entre os periódicos, seja</p><p>entre as áreas de conhecimento, entre instituições ou países.</p><p>OS ESTUDOS DE REDES COLABORATIVAS E AS MÉTRICAS</p><p>DA COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA</p><p>Ao descrever a história e a consolidação dos estudos de redes nas</p><p>ciências sociais, Borgatti et al. (2009) destacam o trabalho pioneiro do</p><p>psiquiatra Jacob Moreno, que, em 1932, mapeou as redes de relações em</p><p>uma escola de meninas em Hudson, EUA. Nesse trabalho, o autor utilizou</p><p>técnicas sociométricas que permitiram visualizar gra�camente as relações</p><p>sociais em um determinado conjunto de indivíduos.</p><p>Depois de Moreno, inúmeros autores se debruçaram sobre o tema rede</p><p>social, seja para melhor caracterizá-lo teórica</p><p>e conceitualmente, seja para</p><p>investigá-lo empiricamente.43 Desses autores, merece destaque Barnes</p><p>(1954), que é por muitos considerado o primeiro a usar, de forma</p><p>sistemática, o conceito de rede ao estudar uma pequena comunidade</p><p>norueguesa de pescadores e fazendeiros. Barnes propôs uma primeira</p><p>de�nição do termo:</p><p>�e image I have is of a set of points some of which are joined by lines. �e points of the</p><p>image are people, or sometimes groups, and the lines indicate which people interact with</p><p>each other. We can of course think of the whole of social life as generating a network of this</p><p>kind44 (1954, p. 237).</p><p>Todo o arcabouço de conhecimento gerado em torno da temática “redes</p><p>sociais” favoreceu sua disseminação, tornando-a um fenômeno usualmente</p><p>compreensível, com potencial de retratar situações comuns, incluindo a</p><p>interação social (de indivíduos e instituições), relações, conectividade,</p><p>colaboração, ação coletiva, con�ança e cooperação (PROVAN et al., 2007).</p><p>Rede social é de�nida como um conjunto �nito de elementos (atores) e</p><p>de relações estabelecidas entre eles, em que a presença dessas relações é</p><p>uma característica crítica e determinante da rede, já que o importante nas</p><p>redes sociais não é o individuo, mas sua estrutura, que é de�nida como o</p><p>conjunto de indivíduos e suas conexões (WASSERMAN; FAUST, 1998). A</p><p>representação de uma rede deve conter um conjunto de objetos ou sujeitos</p><p>(em termos matemáticos, nós) e descreve as relações que existem entre</p><p>eles. A rede mais simples contém pelo menos dois objetos ou sujeitos e</p><p>uma relação entre eles. Considerando A e B como pessoas ou instituições e</p><p>que entre eles há um vínculo que os une (por exemplo, ter trabalhos</p><p>conjuntos), pode-se dizer que existe uma rede, nesse caso uma rede social,</p><p>uma vez que se trata de uma relação entre indivíduos.</p><p>Para visualizar essas relações, as análises de redes utilizam a técnica de</p><p>análise de correspondência, que se mostra adequada para analisar tabelas</p><p>de duas ou múltiplas entradas, levando em conta medidas de</p><p>correspondência entre linhas e colunas. Para isso, elaboram-se matrizes, as</p><p>quais podem ser quadradas ou retangulares em função do número de</p><p>linhas e colunas, e podem ser também idênticas, quando os nós são os</p><p>mesmos para as linhas e colunas. Em função do tipo de �uxos, as matrizes</p><p>podem ser normais (�uxos unidirecionais e bidirecionais) ou simétricas</p><p>(unicamente �uxos bidirecionais). A Figura 2 apresenta um esquema</p><p>simpli�cado que reproduz a análise de rede social.</p><p>Figura 2: Esquema da análise de redes sociais</p><p>Fonte: Adaptado de Iribarren-Maestro, 2006.</p><p>Considerando que a comunidade cientí�ca atual se estrutura cada vez</p><p>mais em um sistema integrado, cooperativo ou de rede, análises de redes</p><p>sociais podem ser úteis para identi�car a natureza e intensidade das</p><p>relações entre os membros da rede, assim como a sua estrutura global por</p><p>meio das características das interações entre os elementos (RODRIGUEZ,</p><p>1995). Quando realizadas no contexto dos estudos da Informetria, essas</p><p>análises buscam a representação dos laços colaborativos a partir das</p><p>informações contidas na produção literária, mais frequentemente a partir</p><p>da comunicação em formato de paper. Esse tipo de comunicação não</p><p>apenas apresenta uma nova contribuição em um dado assunto, mas revela</p><p>as tendências e o dinamismo de uma atividade muitas vezes distante do</p><p>grande público. Assim, a partir de uma série de informações bibliográ�cas,</p><p>que são exclusivas de cada paper, é possivel medir, estimar tendências,</p><p>lideranças e carências e também visualizar diferentes aspectos da ciência,</p><p>como as redes colaborativas, que são o foco deste capítulo.</p><p>A base das análises de redes colaborativas entre indivíduos na ciência</p><p>encontra-se nas informações de autoria, seja de pesquisadores que</p><p>compartilham a autoria de uma publicação (coautoria), seja de autores que</p><p>aparecem citados em uma mesma publicação (cocitação). É importante ter</p><p>clareza que tal como qualquer outro estudo de rede social, as análises de</p><p>coautoria e cocitação partem de informações sobre as relações existentes</p><p>entre pares de autores. Nesse caso, gera-se uma matriz de valores quadrada</p><p>ou simétrica, ou seja, com o mesmo número de linhas e colunas. Cada uma</p><p>dessas linhas e colunas se inicia com os nomes dos autores recuperados</p><p>nas respectivas consultas, produzindo uma coincidência recíproca e não</p><p>direcional entre todos eles. A matriz gerada terá uma dimensão de N por</p><p>N, onde N é o número de autores que compartilham autoria na produção</p><p>ou aparecem citados, simultaneamente, em uma publicação. Em ambos os</p><p>casos, para evitar possíveis repetições do nome de cada autor no mesmo</p><p>trabalho, é necessária a eliminação dos valores da diagonal principal. Para</p><p>a realização de cálculos ulteriores, análise e visualizações, utilizam-se os</p><p>valores absolutos de coautoria ou de cocitação que garantem a robustez da</p><p>medida.45</p><p>A Figura 3 permite visualizar os dois tipos de unidades de análise, a</p><p>coautoria e a cocitação, utilizados nos estudos de redes colaborativas na</p><p>ciência. Para a análise de coautoria, os autores 3 e 4 compartilham a</p><p>autoria de uma publicação, o documento 3.</p><p>Figura 3: Redes de autorias e de papers</p><p>Fonte: Adaptado de Rodriguez et al. (2010)46</p><p>Esses dois autores podem compartilhar muitas outras publicações e/ou</p><p>cada um deles pode compartilhar a autoria de outras publicações com</p><p>outros autores. Assim, uma análise de rede de coautoria considerará o</p><p>número de publicações que os pares de autores (autor 3 com autor 4; autor</p><p>3 com autor 5 etc.) aparecem juntos como autores. É importante</p><p>mencionar que esse tipo de análise pode também considerar não o autor,</p><p>mas sua instituição de a�liação ou país de origem. Para a análise de</p><p>cocitação (de autores), a �gura mostra que os autores 1 e 2 são citados</p><p>simultaneamente no documento 3. Da mesma forma que na coautoria,</p><p>esse par de autores pode ser citado em conjunto em outros trabalhos,</p><p>assim como cada autor individualmente pode ser citado com outros</p><p>autores, formando novos pares de cocitações. Nessa análise, então, é</p><p>considerado o número de publicações em que cada par de autores aparece</p><p>citado, conjuntamente.</p><p>Para Rodriguez et al. (2010), embora sejam semelhantes</p><p>metodologicamente, os dois tipos de unidades de análise diferem quanto à</p><p>sua natureza. Apesar das críticas e da pouca normatização sobre quem</p><p>deve ser coautor de uma publicação, para esses autores as análises de rede,</p><p>a partir das coautorias, indicam relações e laços sociais mais fortes entre os</p><p>pesquisadores quando existe um mínimo de conhecimento mútuo. O</p><p>mesmo não ocorre para os estudos de rede a partir das autorias das</p><p>citações (cocitações), uma vez que, segundo os autores, a citação de</p><p>diferentes trabalhos não signi�ca que seus autores se conheçam. De</p><p>qualquer forma, há também de se reconhecer que deve existir alguma</p><p>semelhança, temática ou de conteúdo, entre diferentes autores, quando</p><p>eles aparecem com grande frequência citados simultaneamente em outras</p><p>publicações.</p><p>Apesar dessas críticas, é fato que a pesquisa internacional em torno da</p><p>temática “redes colaborativas na ciência” no âmbito da Informetria e com</p><p>base nas informações de coautoria e de cocitação47 cresceu rapidamente</p><p>nas duas últimas décadas, sendo hoje desenvolvida por diferentes grupos e</p><p>nações. Uma consulta à base Web of Science,48 em março de 2012, mostra</p><p>que na comparação entre dois períodos, 1980/89 e 2000 a 2009, as</p><p>publicações na temática co-authorship passaram de 14 para 316 e as de co-</p><p>citation de 24 para 245, de 1980 a 1989.</p><p>Outro exemplo desse crescimento foi apresentado na última</p><p>conferência internacional de Cientometria, International Conference of</p><p>the International Society for Scientometrics and Informatrics (ISSI)</p><p>2011,49 pelo Dr. Olle Persson, que gentilmente disponibilizou os slides de</p><p>sua conferência. A Figura 4 mostra como em três décadas cresceram e se</p><p>espalharam as publicações com tema cocitação. No primeiro momento,</p><p>1973</p><p>a 1989, os estudos tinham origem nos EUA, principalmente. No</p><p>período seguinte, 1990 a 1999, esses estudos se intensi�caram e ganharam</p><p>novos territórios, especialmente na Europa e Ásia. No período mais</p><p>recente, é possível ver que, com exceção do continente africano, todos os</p><p>demais desenvolvem pesquisas sobre cocitação.</p><p>Figura 4: Mapa da distribuição dos estudos de cocitação publicados em</p><p>periódicos catalogados na Web Of Science, 1973 – 201050</p><p>Fonte: Persson (2011).</p><p>No Brasil, uma busca na internet51, por meio do motor Google, com o</p><p>termo “análise de co-citação” ou “análise de cocitação”, em páginas</p><p>brasileiras, somente foram encontrados 130 documentos. Desse total,</p><p>somente oito se apresentam na forma de comunicação cientí�ca,</p><p>publicados em periódicos ou em anais de congressos e reuniões cientí�cas.</p><p>Uma análise detalhada desses trabalhos revela que somente cinco aplicam,</p><p>de fato, as técnicas de cocitação em campos e contextos especí�cos da</p><p>ciência brasileira.52</p><p>Uma consulta semelhante com o termo “análise de coautoria” resultou em</p><p>mais de 200 documentos. No entanto, somente uma parcela pequena é de</p><p>trabalhos investigativos, em formato de comunicação cientí�ca, publicados</p><p>em periódicos ou em anais de congressos, e aplica, de fato, a técnica de</p><p>análise de redes. 53</p><p>REDES DE COAUTORIA E COCITAÇÃO: AS ORIGENS E AS</p><p>FERRAMENTAS MAIS UTILIZADAS</p><p>O trabalho de Smith (1958) foi pioneiro na análise de múltipla autoria</p><p>em psicologia. O autor mostra o crescimento do número de publicações</p><p>com mais de um autor, no período de 1946 a 1957. Propõe, assim, que os</p><p>artigos em coautoria sejam utilizados como dimensão aproximada da</p><p>colaboração entre pesquisadores. Além disso, o autor relaciona esse</p><p>aumento à nova forma de se estruturar da ciência:</p><p>�e trend toward multiple authorship in psychology and in the totality of the sciences may</p><p>also accelerate as more and more funds become available to conduct research on the larger</p><p>and more di�cult problems that now demand attention54 (SMITH, 1958, p. 599).</p><p>Solla Price (1965) veri�cou empiricamente as observações de Smith</p><p>sobre o aumento da múltipla autoria em ciência. O autor notou que ela</p><p>poderia ser identi�cada de diferentes formas e com regularidade no</p><p>âmbito de comunidades informais de pesquisadores que se comunicavam,</p><p>trocavam informações e experiências e publicavam formalmente seus</p><p>resultados de pesquisa, evidenciando, dessa forma, uma tendência de</p><p>aumento no número de trabalhos assinados em coautoria. No entanto, a</p><p>colaboração cientí�ca não ocorre de maneira uniforme. O estudo de Storer</p><p>(1970) revelou que a colaboração é uma medida que varia</p><p>signi�cativamente nas diferentes áreas do conhecimento, em função de</p><p>suas características cognitivas e organizacionais, identi�cando um maior</p><p>índice de cooperação nas ciências básicas e da natureza em relação às</p><p>ciências aplicadas e sociais. Mas foram Frame e Carpenter (1979) os</p><p>primeiros a usar a coautoria como indicador de colaboração, destacando os</p><p>diversos tipos de atividade colaborativa, tais como a participação de fontes</p><p>de dados, a troca de ideias, estâncias em centros de pesquisa no exterior ou</p><p>troca de artigos.</p><p>Os estudos de coautoria, na década de 1990, ganharam uma nova</p><p>dimensão: a identi�cação, apresentação e interpretação das diversas redes.</p><p>Esse novo direcionamento vem permitindo estabelecer como a estrutura</p><p>social dos pesquisadores determina o progresso do conhecimento</p><p>cientí�co e identi�car de que forma se organizam as comunidades</p><p>cientí�cas (EATON et al., 1999). Nesse sentido, estudos têm procurado</p><p>identi�car autores importantes em determinadas disciplinas (OTTE;</p><p>ROUSSEAU, 2002), descrever as divergências entre diferentes</p><p>comunidades cientí�cas (MOLINA; DOMENECH, 2002), analisar as</p><p>comunidades em relação ao gênero, situação geográ�ca e grau acadêmico</p><p>(RIVELLINI et al., 2006), caracterizar as redes de departamentos</p><p>acadêmicos para determinar a estrutura interna e seus grupos (VANRAAN;</p><p>PETERS, 1991).</p><p>É importante destacar, também, outros trabalhos que têm analisado a</p><p>rede mundial de colaboração entre países em um determinado momento</p><p>(PERSSON; MELIN, 1996) e aqueles que procuram mostrar a evolução</p><p>dessa mesma rede em diferentes períodos cronológicos (GLANZEL, 2001;</p><p>GLÄNZEL; SHUBERT, 2004) e as redes institucionais de colaboração entre</p><p>universidades (PERSSON et al., 1997; FECYT, 2005).</p><p>Já nos estudos de cocitação foi Solla Price (1965) quem demonstrou,</p><p>pioneiramente, que os padrões de citação usados pelos autores de artigos</p><p>cientí�cos podem de�nir as frentes de pesquisa, sendo aproveitados para</p><p>delinear uma topologia que re�etisse a estrutura da produção cientí�ca de</p><p>determinado domínio. Small (1973) deu signi�cativo avanço à construção</p><p>de mapas da ciência, ao propor de forma independente a cocitação de</p><p>documentos como variável de estudo na análise de citações da produção</p><p>cientí�ca.</p><p>De acordo com Small (2003), os estudos de cocitação tiveram</p><p>inicialmente como foco os documentos, identi�cando a precisão e</p><p>concentração dos vínculos de cocitação entre documentos mais citados e,</p><p>consequentemente, com mais robustez nos padrões obtidos ao compará-</p><p>los com suas amostras históricas. Assim, os mapas da ciência, nos quais</p><p>são mostradas as especialidades das ciências naturais e utilizam a cocitação</p><p>como unidade de relação ou vínculo, tornaram-se fundamentais no</p><p>desenvolvimento da representação de domínios cientí�cos.</p><p>Os estudos de cocitação a partir dos pares de autores tiveram início na</p><p>década de 1980 quando White e Gri�th (1981; 1982) propuseram a</p><p>análise de cocitação de autores como nova técnica para contribuir com o</p><p>conhecimento da estrutura intelectual das disciplinas cientí�cas,</p><p>alcançando ela maior destaque no início da década seguinte. De acordo</p><p>com McCain (1990a), esse tipo de análise permite identi�car a organização</p><p>das comunidades de um conjunto de autores e como é percebida pelos</p><p>citantes. Essa técnica tem sido usada para analisar determinadas áreas</p><p>cienti�cas, como, por exemplo, a macroeconomia (McCAIN, 1986),</p><p>genética (McCAIN, 1990b), comportamento organizacional (PAISLEY,</p><p>1990), matrimônio e família (BAYER et al., 1990), ciência da informação</p><p>(McCAIN; WHITE, 1998), entre outras.</p><p>O crescimento dos estudos de redes colaborativas na ciência, observado</p><p>ao longo das últimas décadas, foi possível graças ao desenvolvimento de</p><p>diferentes programas de computação. Para Cobo et al. (2011), os estudos</p><p>de redes na ciência podem utilizar ferramentas computacionais utilizadas</p><p>de forma mais generalizada nos estudos de redes sociais, tais como</p><p>UCINET, Pajek ou Cytoscape.55 No entanto, pesquisadores e especialistas</p><p>do campo da Informetria vêm desenvolvendo ferramentas mais</p><p>especí�cas, concebidas para o uso nos estudos de redes na ciência ou</p><p>science mapping, mas que podem, obviamente, ser utilizadas em estudos de</p><p>redes não cientí�cas. Uma ampla e detalhada análise de nove desses</p><p>programas foi conduzida com Cobo et al. (2011) e está resumida no</p><p>Quadro 1. Dos nove programas selecionados pelos autores, seis são</p><p>gratuitos e estão disponíveis nos sites de seus idealizadores. Entre eles, os</p><p>programas Bibexcel, Citespace e VOSViewer permitem análises completas</p><p>de coautoria (a partir dos pares de autores como também dos pares de</p><p>países ou instituições de vínculo) e de cocitação (a partir dos pares de</p><p>autores, documento ou periódico citados). O VantagePoint, um programa</p><p>comercial, é o único que segue esse grupo.</p><p>Quadro 1: Programas para análises de redes na ciência.</p><p>Nome do</p><p>Programa</p><p>Ano de</p><p>Criação</p><p>Instituição Acesso</p><p>Coautoria Cocitação</p><p>Autor Pais Inst. Autor Doc. Period.</p><p>Bibexcel1 2010 Univ. de Umeå Pub. X X X X X X</p><p>CiteSpace2 2010 Univ. de Drexel Pub. X X X X X X</p><p>CoPalRed3 2005</p><p>Univ.de</p><p>Granada</p><p>Priv. - - - - - -</p><p>IN-SPIRE4 2010</p><p>Lab. Nac.</p><p>Paci�co</p><p>Priv. - - - - - -</p><p>Leydesdor�’s</p><p>Software 5 ?</p><p>Univ. de</p><p>Amsterdam</p><p>Pub. X X X X - -</p><p>Network</p><p>Workbench6 2009</p><p>Univ. de</p><p>Indiana</p><p>Pub. - - - - X -</p><p>Science of Science</p><p>-Sci27 2010</p><p>Univ. de</p><p>Indiana</p><p>Pub. X - - X X X</p><p>VantagePoint8 2010</p><p>Cia. Pesq</p><p>Tecnol</p><p>Priv. X X X X X X</p><p>VOSViewer9 2010 Univ, de Leiden Pub. X X X X X X</p><p>1 Bibexcel: <http://www.umu.se/inforsk/Bibexcel>;</p><p>2 CiteSpace: <http://cluster.cis.drexel.edu/˜cchen/citespace></p><p>3 CoPalRed: <http://ec3.ugr.es/copalred/></p><p>4 IN-SPIRE: <http://in-spire.pnl.gov></p><p>5 Leydesdor�’s software: <http://www.leydesdor�.net></p><p>6 Network Workbench (NWB): <http://nwb.slis.indiana.edu></p><p>7 Sci2: <http://sci.slis.indiana.edu></p><p>8 VantagePoint: <http://www.thevantagepoint.com/></p><p>9 VOSViewer: <http://www.vosviewver.com></p><p>Fonte: Adaptado de Cobo et al. (2011).</p><p>É importante destacar que a maior parte desses programas também</p><p>permite análises de outros atributos, como o compartilhamento de</p><p>palavras (co-word) do título, resumo, palavra-chave ou texto integral.</p><p>Permite, ainda, o compartilhamento de informação das referências</p><p>(bibliographic coupling) e de link (co-link). Especialmente a análise de co-word</p><p>é processada por todos os nove programas listados no Quadro 1.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Ao longo das últimas décadas cresceu, signi�cativamente, o interesse</p><p>pelo mapeamento da ciência e/ou da literatura cientí�ca, o que se re�etiu</p><p>em uma nova área temática no campo da Informetria. Estudos dessa</p><p>natureza, especialmente aqueles com foco nas análises de coautoria e</p><p>cocitação, têm sido aplicados a uma gama de campos e áreas de estudo,</p><p>permitindo a pesquisadores e diferentes pro�ssionais, com destaque para</p><p>os gestores de ciência, a identi�cação de resultados e competências. Esses</p><p>estudos se constituem em importantes ferramentas de apoio a tomadas de</p><p>decisão, seja no âmbito do grupo de pesquisa, seja no âmbito institucional</p><p>ou de governo. Boyack et al. (2005) acreditam que os mapas de redes na</p><p>ciência, gerados por esses estudos, vão além das fronteiras cientí�cas,</p><p>podendo servir como um sistema de referência dessas competências e</p><p>sobre o qual pesquisadores e interessados conseguem ter uma visão global</p><p>e integrada da ciência. Diversas outras questões também movem esse tipo</p><p>de estudo, como a busca pela interdisciplinaridade da ciência no estudo</p><p>conduzido, recentemente, por Porter e Rafols (2009). Nesse estudo, os</p><p>autores caracterizaram quantitativamente, a partir das cocitações, o grau</p><p>de interdisciplinaridade de seis campos de pesquisa. O estudo revelou que</p><p>essa medida pouco cresceu ao longo de 30 anos de análise, resultado,</p><p>segundo os autores, do uso de citações muito restritas aos campos de</p><p>estudo do trabalho ou outros a�ns. A constatação de que a ciência está se</p><p>tornando transdisciplinar, mas ainda a passos curtos, merece re�exão</p><p>sobre o que está de fato acontecendo com esses campos.</p><p>Assim, se por um lado as análises métricas de redes colaborativas na</p><p>ciência possibilitam uma visualização global da dinâmica entre grupos,</p><p>instituições, campos, países etc., por outro lado elas podem abrir muitos</p><p>outros questionamentos. Isso faz da Informetria um campo múltiplo de</p><p>abordagens e de interações com outros campos.</p><p>Mergulhar no mundo dos estudos de mapas da ciência, no entanto, não</p><p>é tarefa fácil, demanda não apenas pessoal quali�cado, mas infraestrutura</p><p>computacional e acesso às bases de dados que catalogam a comunicação</p><p>cientí�ca. Talvez seja esse o gargalo que justi�ca a escassa produção</p><p>brasileira nessa temática. Iniciativas que promovam a difusão desses</p><p>estudos, a busca por colaboradores internacionais, a participação em</p><p>eventos internacionais como o ISSI são caminhos que podem reduzir o</p><p>grande hiato que existe em relação aos grupos estabelecidos e de grande</p><p>reconhecimento em países do hemisfério norte.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALVES, B. H. Análise de cocitação dos artigos produzidos pelos docentes do PPGCI na linha de</p><p>pesquisa “produção e organização da informação” da UNESP/Marília. 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Disponível em:</p><p><http://gar�eld.library.upenn.edu/papers/drexelbelver gri�th92001.pdf>.</p><p>GLÄNZEL, W. National characteristics in international scienti�c co-authorship relations.</p><p>Scientometrics, v. 51, n. 1, p. 69-115, 2001.</p><p>______; SHUBERT A. Analysing scienti�c networks through co-authorship. In: MOED, H;</p><p>GLANZEL, W.; SCHMOCH, U. Handbook of quantitative science and technology research: the use of</p><p>publication and patent statistics in studies of S & T systems. Dordrecht: Kluwer Academic</p><p>Publishers, 2004. p. 257-276.</p><p>GRANOVETTER, M. �e strength of weak ties. �e American Journal of Sociology v. 78, p. 1360-</p><p>1380, 1973.</p><p>HAYASHI, M. C. P. I.; HAYASHI, C. R. M; LIMA, M. Y. de. Análise de redes de co-autoria na produção</p><p>cientí�ca em educação Especial. Liinc em Revista v. 4, n. 1, p. 84-103, 2008.</p><p>HAYTHORNTHWAITE, C. Social network analysis: An approach and technique for the study of</p><p>information exchange. 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A possibilidade</p><p>de acesso ao conhecimento, entretenimento e pertencimento são</p><p>inovações que possuem potencial político para transformar a existência</p><p>social.</p><p>Por �m, gostaríamos de agradecer aos autores que aceitaram</p><p>compartilhar conosco suas re�exões e inquietações com respeito aos</p><p>impasses e às possibilidades das redes sociais, seus métodos e teorias para</p><p>a compreensão dos processos mais recentes de produção e apropriação do</p><p>conhecimento, compartilhamento, aprendizagem, inovação e participação</p><p>coletiva. Os agradecimentos se estendem à Fundação Oswaldo Cruz, que</p><p>acolheu o projeto do estágio de pós-doutorado, e à Fundação Araucária do</p><p>Estado do Paraná, que viabilizou a sua realização.</p><p>Maria Inês Tomaél</p><p>Regina Maria Marteleto</p><p>ANALISAR AS ‘REDES SOCIAIS’ COMO DISPOSITIVOS</p><p>INFOCOMUNICACIONAIS: UMA PROBLEMÁTICA</p><p>1</p><p>Yves Jeanneret</p><p>Há pouco tempo, falar de “redes sociais” evocava a ideia de relações, de</p><p>in�uência e de militância. Em alguns anos, no entanto, ao menos na</p><p>França, essa signi�cação quase desapareceu: as “redes sociais”, atual</p><p>obsessão das mídias, tornaram-se os dispositivos materiais de</p><p>comunicação na Internet. Pesquisadores já haviam observado, há cinco</p><p>anos, que “a participação social conhece, nos blogs e por causa deles, um</p><p>avatar editorial” (CANDEL; JEANNE-PERRIER, 2007, p. 58). Tal</p><p>observação alcança, atualmente, um status de evidência lexical. Tornou-se</p><p>mesmo necessário fazer a distinção de “redes humanas” para ser</p><p>compreendido quando se quer designar solidariedade, engajamento</p><p>coletivo e relação. O objetivo deste capítulo é tentar compreender o que</p><p>são realmente essas estruturas midiáticas e tecnológicas, como MySpace,</p><p>Facebook e Twitter, para citar apenas as plataformas que alcançaram um</p><p>sucesso considerável na França2 e, sobretudo, como vieram a ocupar o</p><p>lugar de categorias sociológicas nas re�exões.</p><p>A �m de descrever algumas problemáticas expressivas de pesquisa nas</p><p>Ciências da Informação e Comunicação francesas, abordo aqui esses</p><p>objetos a partir de duas posições. A primeira consiste em não dissociar as</p><p>formas midiáticas e textuais do universo de representações e de</p><p>imaginários que as acompanha. De�nir esses dispositivos como sendo</p><p>redes sociais por si mesmas, ou seja, por metonímia, não permite</p><p>descrever concretamente seu funcionamento; entretanto, o fato de serem</p><p>assim quali�cadas por seus atores mais diversos é um traço estruturante</p><p>de sua dimensão cultural. A segunda posição é a de me colocar em uma</p><p>escala de análise ampla o su�ciente para considerar a �liação técnica e</p><p>simbólica na qual se integraram tais redes durante várias décadas.</p><p>Tentarei, assim, identi�car certas estratégias mais signi�cantes de</p><p>problematização dos objetos e das práticas que parecem se destacar dessas</p><p>pesquisas.</p><p>Proponho identi�car quatro maneiras principais de transformar esse</p><p>objeto concreto em objeto de pesquisa (DAVALLON, 2004), as quais</p><p>consistem em considerar as “redes sociais” como um evento no projeto de</p><p>trans�gurar nosso ambiente cultural; como um estado de�nido da relação</p><p>entre mídia e texto; como um momento na economia política da circulação</p><p>dos saberes e como um questionamento da relação entre o trabalho de</p><p>pesquisa e a inovação tecnoindustrial.</p><p>Essas abordagens centram-se na pesquisa sobre a dimensão</p><p>infocomunicacional das práticas, abordada a partir das noções de mídia e</p><p>de documento. Existem, evidentemente, muitos outros pontos de vista:</p><p>técnicos, sociológicos, psicossociais etc.</p><p>UM EPISÓDIO PARTICULAR DE UMA SAGA</p><p>TAUMATÚRGICA</p><p>Permito-me abrir esta re�exão com um relato de experiência. Nos</p><p>encontros que experienciei com interlocutores sociais da universidade</p><p>(industriais, políticos, militantes etc.), ao longo de duas décadas, pude</p><p>constatar três processos paralelos: o retorno de certas tentativas</p><p>fundamentais que acompanham a re�exão sobre a comunicação; o</p><p>deslocamento dos equilíbrios nos modelos intelectuais de referência e a</p><p>concentração da atenção em certos dispositivos que, em diferentes</p><p>momentos, sucessivamente, possuíam a virtude de aparecer como o</p><p>verdadeiro lugar da comunicação. Posso citar, por exemplo, a</p><p>interatividade, o online, a web 2.0 e as redes sociais. Trata-se de entidades</p><p>que dizem respeito a diferentes níveis do processo de comunicação – e aos</p><p>quais retornarei mais adiante –, mas que reúnem a capacidade de ser</p><p>tomadas como mais reais que outras.</p><p>Frequentemente, essa focalização do olhar, que pode beirar a apoplexia,</p><p>toma a forma da “requisição” (LABELLE, 2007): o sentimento de se</p><p>confrontar com os verdadeiros lugares da comunicação, da necessidade de</p><p>“estar ali”, acompanhado de uma certa angústia quanto ao modo de</p><p>concretizar uma ação. Por isso, não me surpreendi quando, ao conduzir</p><p>recentemente uma série de entrevistas com atores no contexto de criação</p><p>de uma cátedra, ouvi responsáveis de museus, consultores de agências de</p><p>publicidade e jornalistas me explicarem que era indispensável atuar nas</p><p>redes sociais, porque ali se encontrava o público jovem, enquanto</p><p>manifestavam sua perplexidade sobre o que uma instituição ou uma</p><p>empresa poderia fazer nos referidos meios. Na mesma época, uma</p><p>estudante interveio no início de uma de minhas aulas para promover a</p><p>organização de uma noite de iniciação ao Twitter, a �m de corrigir o pouco</p><p>uso dessa ferramenta na escola e, diante de minhas perguntas, uma de</p><p>suas colegas confessou que era necessário frequentar esse tipo de rede,</p><p>pois os recrutadores excluíam aqueles que não participavam. Pouco tempo</p><p>depois, uma estudante de mestrado, ao concluir uma formação sobre as</p><p>teorias e as pro�ssões da comunicação, evocou em sua dissertação “um</p><p>mundo do qual muito se fala e cuja novidade parece um pouco</p><p>intimidante”, e acrescentou: “somos considerados como nativos digitais ou</p><p>digital natives […] e, no entanto, o tweet nos é bem menos familiar que a</p><p>revista semanal de atualidades comprada na banca”.</p><p>Esses episódios não pretendem sugerir que a posição dominante</p><p>atualmente ocupada, de fato, por alguns desses dispositivos seria arti�cial;</p><p>eles convidam a ampliar o contexto de análise para colocar essas inovações</p><p>recentes na linha de sucessão de inovações e requisições mais antigas, e</p><p>abordá-las como um composto (LE MAREC, 2002) que liga universo de</p><p>discurso, propriedades pragmáticas dos dispositivos, imaginários da</p><p>visibilidade social, envolvimento dos atores e dinâmica das trocas</p><p>comunicacionais. Destaco, aqui, dois fenômenos que marcam atualmente a</p><p>evolução das relações entre inovação midiática e usos: por um lado, essas</p><p>ferramentas, que também são marcas (por isso, serão doravante</p><p>denominadas “ferramentas-marca”), alcançam uma posição hegemônica</p><p>não habitual em um mundo onde o uso é comumente garantia de</p><p>imprevisto e de diferença; por outro lado, os usuários, promovidos a atores</p><p>voluntários de um “empowerment” ambíguo (BOUQUILLION;</p><p>MATTHEWS, 2010), são envolvidos no trabalho (DUJARIER, 2008) como</p><p>nunca. Tais tendências acabam tornando ilusório o esforço desenvolvido</p><p>outrora para distinguir o espaço dos dispositivos, aquele dos usos e aqueles</p><p>dos “discursos de acompanhamento”, os quais manifestamente mantêm</p><p>múltiplas interdependências.</p><p>O par especial das práticas e dos dispositivos determinados que as</p><p>estimulam produz um efeito conjunto de singularização e de confusão</p><p>paradoxal, embora explicável. A singularização resulta do fato de que essas</p><p>ferramentas-marca adquirem uma presença que as separa do espaço global</p><p>das mídias informatizadas (até então denominadas usualmente como</p><p>“(N)TIC”, apelação hoje em franco desuso). Toma-se consciência ao colocar</p><p>em série fórmulas que foram sucessivamente banalizadas: navegar na rede,</p><p>fazer um Powerpoint, googlar, ir ao Facebook, tuitar (verbo).</p><p>Evidentemente, a banalização dos produtos em ferramentas-marca não</p><p>é exclusiva das mídias informatizadas, como testemunham as expressões</p><p>Science. Milton Keynes: �e Open Univ. Press, 1982. p. 35-43.</p><p>LEYDESDORFF, L.; VAUGHAN, L. Co-occurrence matrices and their applications in Information</p><p>science: extending ACA to the Web environment. Journal of the American Society for Information</p><p>Science and Technology, v. 57, n. 12, p. 1616-1628, 2006.</p><p>MARICONDA, P. R. Galileu e a ciência moderna. Especiaria, Cadernos de Ciências Humanas, v. 9, n.</p><p>16, p. 267-292, 2006.</p><p>MCCAIN, K. Cocited author mapping as a valid representation of intellectual structure. Journal of</p><p>the American Society for Information Science, v. 37, n. 3, p. 111-122, 1986.</p><p>MCCAIN, K. 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Desde então, a tendência em publicação tem sido menos em revistas generalistas em</p><p>geologia e mais em revistas que tratam de ramos especí�cos, como a geoquímica e geofísica”</p><p>(Tradução).</p><p>38 A análise de co-word (em português, coocorrência de termos) também se constitui em elemento-</p><p>chave dos estudos de redes na ciência. Esse tipo de análise tem usado com mais frequência pares de</p><p>termos extraídos dos títulos, palavras-chave e resumo das publicações. Para esse texto, optamos por</p><p>não incluir esse tipo de análise uma vez que as relações entre indivíduos, quando existem, são</p><p>secundárias. São sugestões de leitura sobre co-word: Callon et al. (1983) e Borner et al. (2003).</p><p>39 O termo Informetrics (o�cialmente, não há uma tradução em português), cunhado por Nacke,</p><p>em 1979, delimita o campo cientí�co que investiga os aspectos quantitativos da informação, desde</p><p>sua produção, até a disseminação, forma e uso. Por ser de maior abrangência, o termo já vem sendo</p><p>aplicado em estudos de outros campos, como da Cientometria, Bibliometria, Webometria e</p><p>Cibermetria. Em uma recente revisão, Bar-Ilan (2008) apresenta as possibilidades de estudos</p><p>empíricos e teóricos da Informetria.</p><p>40 Weinberg aparece devidamente citado no trabalho de Solla Price (1963), que o reconhece em seu</p><p>livro, Little Science, Big Science, como o autor que cunhou o termo Big Science.</p><p>41 “Quando a história olhar para o século 20, ela verá ciência e tecnologia como um de seus temas;</p><p>ela encontrará entre os monumentos da Ciência Grande os enormes foguetes, os aceleradores de</p><p>alta energia, os reatores de alto �uxo de pesquisa, todos símbolos do nosso tempo tal como ela [a</p><p>história] vê na catedral de Notre Dame um símbolo da Idade Média” (Tradução).</p><p>42 São inúmeros os estudos que mostram o aumento das colaborações na ciência mundial, assim</p><p>como os que discutem as razões para esse aumento. O grande interesse nesse tema levou à criação,</p><p>em 2000, de um fórum de discussão com especialistas internacionais, o COLLNET (Collaboration in</p><p>Science and in Technology). É possível encontrar um grande volume de publicações do tema que estão</p><p>publicados nos compêndios dos eventos do COLLNET. Acesso em: <http://www.collnet.de/>.</p><p>43 Granovetter (1973); Rice e Richards (1985); Burkhardt (1994); Haythorntwaite (1996); Monge e</p><p>Contractor (2003).</p><p>44 “A imagem que tenho é de um conjunto de pontos alguns dos quais estão unidos por linhas. Os</p><p>pontos da imagem são pessoas, ou às vezes grupos, e as linhas indicam que as pessoas interagem</p><p>mutuamente. Podemos pensar que o conjunto da vida social gera uma rede deste tipo” (Tradução).</p><p>45 Neste ponto, convém lembrar que são vários os autores que destacam que a utilização de</p><p>medidas de normalização (correlação de Pearson, função cosseno etc.) produz distorções no</p><p>momento de distribuir a informação nos espaços de informação (WHITE, 2003). Essas medidas de</p><p>normalização são usadas para construir a matriz de proximidade no caso de dados que não são</p><p>medidas de proximidade. Sendo uma matriz de coocorrência per se, uma matriz de proximidade não</p><p>requer nenhum tipo de tratamento que, se aplicado, ocasionará distorção dos dados, das análises e</p><p>representações (LEYDESDORFF ; VAUGHAN, 2006).</p><p>46 Vale mencionar que na Figura 2 os autores utilizam o termo co-citation para designar o</p><p>compartilhamento de informações (por exemplo, dois trabalhos têm uma referência em comum)</p><p>entre dois documentos (1 e 2) citados, simultaneamente, no documento 3. Nesse caso, o termo mais</p><p>usualmente utilizado é bibliographic coupling, em português acoplamento bibliográ�co. As diferenças</p><p>entre co-citation e bibliographic coupling são amplamente descritas na literatura internacional. Um</p><p>exemplo é o trabalho de Gar�eld (2001). Também vale mencionar que, muito embora os autores não</p><p>indiquem na Figura 2, as análises de cocitação guardam grande analogia com as análises de co-link</p><p>(BJÖRNEBORN, L.; INGWERSEN, 2004), sobre as quais é possível visualizar as redes colaborativas</p><p>de um dado objeto/tema no ambiente de internet. Esta análise não será tratada neste capítulo.</p><p>47 Os termos science mapping e bibliographic mapping são frequentemente utilizados para designar</p><p>esta temática.</p><p>48 Acesso pelo link: <http://webofknowledge.com/>.</p><p>49 International Conference of the International Society for Scientometrics and Informetrics, ISSI.</p><p>Acesso da ISSI 2011 pelo link: <http://www.issi2011.uzulu.ac.za/>.</p><p>50 Os círculos nos mapas representam os estudos de cocitação.</p><p>51 Realizada em 13 de março de 2012.</p><p>52 Pinto et al. (2007); Rocha Custódio e Grácio (2010); Paulista, Campos e Turrioni (2010); Alves</p><p>(2011); Salles et al. (2011).</p><p>53 Hayashi, Haysahi e Lima (2008); Moura e Caregnato (2011); Espartel et al. (2011); Oliveira e</p><p>Gracio (2010).</p><p>54 “A tendência de autoria múltipla em psicologia e na totalidade das ciências também pode se</p><p>acelerar à medida que mais e mais recursos estão disponíveis para o desenvolvimento de pesquisas</p><p>sobre os problemas mais complexos e mais difíceis que agora exigem atenção” (Tradução).</p><p>55 Acesso pelos links: <https://sites.google.com/site/ucinetsoftware/home>; <http://vlado.fmf.uni-</p><p>lj.si/pub/networks/pajek/doc/pajekman.htm> e <http://www.cytoscape.org/>.</p><p>REDES, CAMPO CIENTÍFICO E PROCESSOS DE</p><p>INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO EM SAÚDE</p><p>56</p><p>Regina Maria Marteleto</p><p>Marcus Vinícius Pereira da Silva</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Os novos tempos advindos dos processos culturais, políticos e</p><p>econômicos globalizados, baseados nos �uxos de bens materiais e</p><p>imateriais mediados pelas modernas tecnologias de informação e</p><p>comunicação, con�guram uma cultura com foco na escrita, além de</p><p>inovadoras modalidades colaborativas de aprendizagem, produção e</p><p>apropriação de conhecimentos. Complementando esse enquadramento,</p><p>nas sociedades atuais o conhecimento adquire valor econômico e</p><p>geopolítico cada vez mais expressivo, e novos atores entram em cena nos</p><p>processos decisórios sobre as políticas, programas e pautas cientí�cas,</p><p>realçando a necessária articulação entre as diversas ciências e a sociedade.</p><p>Nesse novo contexto, os pesquisadores das diferentes disciplinas</p><p>cientí�cas precisam estar aptos a compreender essas novas dinâmicas de</p><p>produção do conhecimento e de inovação, como também a poder intervir,</p><p>como atores e cidadãos, abrindo o diálogo com outros atores sociais.</p><p>Do ponto de vista da sua institucionalização, a consolidação de um</p><p>campo de conhecimentos e de práticas depende essencialmente de sua</p><p>vitalidade. Esta última pode ser observada por meio da qualidade e da</p><p>amplitude do seu regime de produção de conhecimentos e pela capacidade</p><p>de compartilhar os saberes entre comunidade cientí�ca, comunidade</p><p>pro�ssional e os diferentes atores sociais. Dessa forma, nos processos de</p><p>produção de conhecimentos e de elaboração de práticas, o dinamismo de</p><p>um campo cientí�co é reconhecido pela qualidade da interatividade e das</p><p>mediações entre a pesquisa, o ensino e os processos sociais. Da mesma</p><p>forma, as publicações e as edições cientí�cas, os modos de comunicação e</p><p>os modelos de organização e circulação das informações funcionam como</p><p>vetores para a institucionalização e a renovação dos campos cientí�cos, ao</p><p>mesmo tempo que desempenham um papel de mediação estruturante na</p><p>elaboração de procedimentos, formas de produção e princípios de avaliação</p><p>que de�nem as instituições cientí�cas (JEANNERET, 2010).</p><p>Nesse quadro, o campo da saúde pública no Brasil possui</p><p>singularidades epistemológicas, políticas, sociais e históricas que precisam</p><p>ser consideradas a �m de se re�etir sobre o seu regime de produção de</p><p>conhecimentos e seus modelos de comunicação, informação e divulgação</p><p>dos conhecimentos, empregando-se as ideias de interdisciplinaridade e de</p><p>internacionalização. A primeira corresponde à constituição compósita do</p><p>campo entre a medicina clínica, a biomedicina e uma ciência social em</p><p>saúde. A segunda refere-se ao sistema universal ou mundializado de</p><p>avaliação e de organização do sistema de pesquisa cientí�ca e de produção</p><p>de conhecimentos por meio de modelos de divulgação e publicação válidos</p><p>para todos os países, apesar das especi�cidades relacionadas às questões</p><p>locais, sobretudo em um campo que se ocupa de um objeto multiforme</p><p>como a saúde, associado às culturas, representações e condições de vida</p><p>das populações.</p><p>No Brasil, o processo de autonomização do campo da saúde é marcado</p><p>por “formas de hibridações” (COUZINET, 2008) históricas, políticas e</p><p>epistemológicas que con�guram o campo interdisciplinar da “saúde</p><p>coletiva”.57 Na classi�cação o�cial das agências de gestão e avaliação da</p><p>pesquisa (CNPq/MCTI; CAPES/MEC; Finep/MCTI), a Saúde Coletiva é</p><p>uma subárea da grande área Saúde e está dividida em três domínios ou</p><p>disciplinas: Epidemiologia, Saúde Pública e Medicina Preventiva. A saúde</p><p>coletiva, assim con�gurada, designa um campo de saberes e de práticas que</p><p>compreende a saúde como fenômeno social e, logo, de interesse público.</p><p>As origens da constituição do campo remontam ao trabalho cientí�co,</p><p>social e político empreendido por pesquisadores e professores de</p><p>instituições universitárias e de escolas de saúde pública do Brasil e da</p><p>América Latina, a partir das últimas décadas do século XX. A saúde</p><p>coletiva é constituída por uma grande diversidade disciplinar e por atores</p><p>institucionais em torno do estudo das “condições de vida e de saúde da</p><p>população”. É um campo interdisciplinar no nível horizontal que reúne as</p><p>ciências da vida e as ciências sociais e humanas, e também no sentido</p><p>vertical, quando busca o necessário diálogo entre diferentes atores,</p><p>dispositivos e práticas: as sabedorias e culturas populares, as mídias</p><p>sociais, as esferas econômicas, políticas e gerenciais.</p><p>Observa-se essa diversidade, da mesma forma, quando se levam em</p><p>conta os modelos e critérios de produção, difusão e avaliação das</p><p>publicações no campo da saúde. Um dos maiores desa�os desse campo,</p><p>assim constituído, é fazer circular as informações entre as esferas</p><p>cientí�cas, pro�ssionais, as mídias sociais e a população, o que requer a</p><p>intervenção de mediações informacionais e comunicacionais em diversos</p><p>níveis, para promover a circulação e a apropriação dos conhecimentos e a</p><p>construção de práticas e saberes em saúde.</p><p>A partir desse escopo, o objetivo geral da pesquisa, cujos fundamentos,</p><p>análises e resultados fundamentam este capítulo, foi estudar as</p><p>cartogra�as dos conhecimentos e as redes de pesquisadores no campo da</p><p>saúde para perceber, por meio dos modos de produzir a pesquisa e</p><p>organizar a comunicação, o sentido dos �uxos das informações e as</p><p>possíveis apropriações dos conhecimentos por diferentes atores e esferas</p><p>sociais. O estudo foi ambientado empiricamente na Fundação Oswaldo</p><p>Cruz, vinculada ao Ministério da Saúde, onde foram selecionados</p><p>pesquisadores de quatro unidades de pesquisa para compor o objeto</p><p>empírico da pesquisa. A construção teórica e metodológica contemplou o</p><p>mapeamento das redes e as posições dos pesquisadores no campo da</p><p>saúde, suas composições discursivas sobre informação, comunicação e</p><p>divulgação cientí�ca em saúde, os veículos de divulgação e comunicação</p><p>cientí�ca utilizados e os principais atores e instituições presentes em suas</p><p>redes, de modo a perceber as mediações construídas para a apropriação</p><p>social dos conhecimentos.</p><p>Tendo em vista a premissa geral da interdisciplinaridade e da</p><p>internacionalização do campo da saúde coletiva na con�guração das redes</p><p>de pesquisadores, as questões que orientaram a construção do objeto</p><p>foram as seguintes: a) de que forma se estabelecem os modos de inserção</p><p>epistemológica, institucional e política dos pesquisadores no campo da</p><p>saúde?; b) quais são as mediações discursivas, acadêmicas, institucionais e</p><p>técnicas que permeiam suas atividades?; c) como se estabelecem os</p><p>espaços e elos discursivos com diferentes esferas sociais: mídias,</p><p>organizações civis, movimentos sociais, Estado, serviços de saúde, atores</p><p>econômicos etc.?; d) qual a relação entre os tipos de pesquisa e as formas</p><p>de difusão para a apropriação dos conhecimentos?</p><p>CAMPO, REDES E DOMÍNIOS DE CONHECIMENTOS</p><p>O conceito de campo, desenvolvido por Bourdieu (1983a; 1983b; 2001)</p><p>é empregado a �m de situar o lugar social e institucional dos atores sobre</p><p>os quais recaem as perguntas sobre a produção, as mediações e os</p><p>processos de apropriação de conhecimentos, em uma perspectiva</p><p>interpretativa com realce nos sujeitos, nas estruturas sociais e na</p><p>linguagem. Quando se associa o conceito de campo ao de redes, percebe-se</p><p>que cada campo cientí�co tem um interesse e uma historicidade, e sua</p><p>constituição deriva das institucionalizações de determinadas práticas e de</p><p>posicionamentos dos atores e dos elos que constroem. O conceito de</p><p>campo (re)lembra a virtude ou a necessidade da contextualização histórica</p><p>e social de cada ator, trazendo à luz o espectro das linguagens, discursos e,</p><p>fundamentalmente, as visões e interesses especí�cos dos sujeitos que o</p><p>compõem, estruturam e normatizam seus procedimentos.</p><p>O conceito de redes serve para perceber as interações dos atores-</p><p>pesquisadores inter e extra campo cientí�co com outros pesquisadores,</p><p>instituições, veículos, tecnologias, atores sociais e discursos, na</p><p>perspectiva de uma “ciência em rede”, fundamentada teoricamente em</p><p>duas correntes de estudos principais: a) os “estudos de laboratório” da</p><p>nova sociologia da ciência que deslocaram o estudo da ciência dos aspectos</p><p>institucionais (comunidade cientí�ca; disciplinas; papéis cientí�cos) para o</p><p>trabalho cientí�co, seus conteúdos e processos, apoiando a compreensão</p><p>da construção local dos fatos cientí�cos pelas pesquisas (LATOUR, 1995;</p><p>CALLON, 1989); b) os “estudos das redes e coletivos de pesquisa”,</p><p>complementares aos “estudos de laboratório”, no sentido em que</p><p>incorporam à compreensão da dimensão construída dos objetos e fatos</p><p>cientí�cos no ambiente dos laboratórios, a validação do conhecimento</p><p>pelos pares, a sua apropriação por outros pesquisadores ou atores</p><p>socioeconômicos, a sua tradução nos desenvolvimentos tecnológicos e sua</p><p>recepção, difusão e apropriação pela sociedade (VINCK, 2007).</p><p>O emprego complementar dos conceitos de campo e redes permite à</p><p>interpretação o alcance, tanto do aspecto estrutural quanto relacional e</p><p>re�exivo da informação, comunicação e divulgação em saúde: os níveis</p><p>individual, técnico, estruturante e os níveis relacionais e sociais que um</p><p>estudo de caráter qualitativo deve comportar para compreender as</p><p>con�gurações epistemológicas, políticas e históricas do campo da saúde e</p><p>as representações do que seja saúde de um ponto de vista informacional e</p><p>comunicacional.</p><p>Aliando essa abordagem trazida das ciências sociais ao campo de</p><p>estudos da informação, e a �m de complementar e estender a compreensão</p><p>dos processos de informação, comunicação e divulgação em saúde,</p><p>utilizou-se, de forma associada aos conceitos de campo e rede, a</p><p>abordagem da análise de domínio tal qual desenvolvida por Hjørland</p><p>(HJØRLAND; ALBRECHTSEN, 1995; HJØRLAND, 2002), segundo a qual</p><p>a unidade de análise da ciência da informação é formada pelos campos</p><p>coletivos de conhecimento ou domínios de conhecimento que o autor</p><p>denomina, conceitualmente, comunidades discursivas (discourse</p><p>communities). Essas comunidades não são entidades autônomas, mas</p><p>construções sociais distintas e compostas por indivíduos sincronizados em</p><p>pensamento e linguagem, constituintes de um modo de produzir</p><p>conhecimentos em ambientes socioculturais distintos e que possuem</p><p>estruturas especí�cas de comunicação, publicação, cooperação e</p><p>organização do conhecimento. (NASCIMENTO; MARTELETO, 2008).</p><p>Nesse sentido, a análise de domínio (documentos, divulgações, discursos)</p><p>visa ressaltar e investigar as diferenças existentes entre distintas</p><p>comunidades discursivas. No caso desta pesquisa, esse intento se re�ete</p><p>no estudo das cartogra�as dos conhecimentos construídos, do</p><p>posicionamento dos pesquisadores no campo da saúde e dos veículos de</p><p>comunicação e divulgação cientí�ca empregados, aproximando as questões</p><p>estudadas pelas ciências sociais e da informação à leitura</p><p>infocomunicacional da constituição e autonomização do campo da saúde.</p><p>CAMPO DA SAÚDE: COMUNICAÇÃO E DIVULGAÇÃO</p><p>DOS CONHECIMENTOS</p><p>Em 2007, o Ministério da Saúde, juntamente a dois organismos</p><p>internacionais, publicou o documento “Por que a pesquisa em saúde?” para</p><p>discutir e elaborar recomendações sobre as lacunas existentes entre a</p><p>produção de conhecimentos pelos setores da pesquisa e sua aplicação em</p><p>políticas e ações de saúde. De acordo com o documento,</p><p>Da mesma forma que em outros países, o principal desa�o, no Brasil, é a capacidade de</p><p>integração dos resultados das pesquisas pelos sistemas e serviços de saúde. Torna-se</p><p>necessário investir em estratégias e�cientes de difusão da informação a �m de reduzir o</p><p>hiato existente entre o novo conhecimento e seu uso para o benefício de toda a população</p><p>(BRASIL, 2007, p. 6).</p><p>No mesmo documento, por outro lado, se reconhecem a amplitude, a</p><p>extensão e a complexidade do espectro da pesquisa em saúde, tais como: a</p><p>biomedicina, a saúde pública, os sistemas e as políticas de saúde, a saúde e</p><p>o meio ambiente, as ciências sociais e comportamentais, a pesquisa</p><p>operacional e a pesquisa em saúde como componente da pesquisa geral em</p><p>“ciência e tecnologia” (BRASIL, 2007, p. 9). Empregando-se a de�nição de</p><p>saúde da OMS (Organização Mundial de Saúde), a qual precisa que a saúde</p><p>“é um estado completo de bem-estar físico, mental e social e não</p><p>unicamente a ausência de doença”, percebe-se que o leque de pesquisas</p><p>necessárias para proteger e promover a saúde e reduzir as doenças é muito</p><p>mais amplo e deve reconhecer as relações entre a saúde e os fatores sociais,</p><p>econômicos, políticos, legais, agrícolas e de meio ambiente, entre outros.</p><p>A diversidade disciplinar e a variedade de questões afetas à questão da</p><p>saúde nos níveis local, regional e internacional demarcam um campo</p><p>extenso para a compreensão do seu regime de produção de conhecimentos</p><p>e para o desenho dos modelos de informação, comunicação, divulgação e</p><p>publicação. Para dar conta dessa diversidade, seria necessário confrontar</p><p>os modelos de publicação nos circuitos editoriais da ciência (nos níveis</p><p>nacional e internacional), bem como a difusão para os serviços e sistemas</p><p>de saúde e a divulgação para a população. Da mesma forma, outros</p><p>modelos de publicação, comunicação e difusão das informações em saúde</p><p>seriam importantes de ser analisados como os da constituição da memória</p><p>e do patrimônio da saúde, assim como as formas mais recentes de</p><p>comunicação e de informação que se organizam em meio às redes da</p><p>sociedade civil e nas mídias sociais na Internet.</p><p>No entanto, uma questão que se coloca a propósito da diversidade dos</p><p>meios e dos modelos utilizados para a comunicação dos conhecimentos em</p><p>saúde é por que a revista cientí�ca ocupa um lugar tão importante e por</p><p>que é considerada como o meio principal de difusão e de avaliação da</p><p>produção cientí�ca. De acordo com Minayo (2007), a resposta é em</p><p>princípio simples, embora esconda uma série de interrogações e de</p><p>problemas. No campo da saúde, a maior valorização das revistas está</p><p>associada, como na ciência em geral, ao fato de que a pesquisa é o motor do</p><p>progresso cientí�co e tecnológico, e que efetuar a comunicação das</p><p>pesquisas é dar-lhes existência social. Conforme lembra Vessuri,</p><p>antropóloga venezuelana que realiza estudos sobre a ciência e a tecnologia</p><p>na América Latina,</p><p>Existe hoje um consenso na comunidade cientí�ca a propósito da necessidade de</p><p>compartilhar a ciência que é produzida nos laboratórios e pelos grupos de pesquisa, o que</p><p>leva a uma conclusão radical segundo a qual a ciência não-comunicada e divulgada de</p><p>maneira não adequada é uma ciência que não existe: ninguém pode adivinhar o que se passa</p><p>na sala de um pesquisador se a sua atividade de pesquisa não se torna pública por meio de</p><p>um formato consagrado internacionalmente (VESSURI, 2003, p. 313).</p><p>Uma atenção especial deve assim ser dirigida às revistas cientí�cas na</p><p>área de saúde, como forma de divulgação e publicação dos resultados das</p><p>pesquisas e, portanto, como meio de comunicação e validação dos</p><p>conhecimentos no contexto de uma ciência em rede.</p><p>O editor cientí�co de uma das cinco mais importantes revistas da área</p><p>– Cadernos de Saúde Pública – publicada pela Ensp/Fiocruz e indexada pelo</p><p>ISI/�omson, em editorial da revista, formula a seguinte questão: “A�nal,</p><p>quem é que de�ne nossas agendas de pesquisa?” (COIMBRA JR., 2004, p.</p><p>878) para chamar a atenção para o equilíbrio delicado entre interesse</p><p>“global” e interesse “regional” em ciência e o necessário aprofundamento</p><p>da discussão sobre a avaliação da produção cientí�ca na grande área da</p><p>saúde e, especialmente, na saúde coletiva. O editor refere-se à existência de</p><p>estudos que mostram um distanciamento entre as agendas de uma “ciência</p><p>de ponta” e as questões do cotidiano da saúde pública mundial, sobretudo</p><p>nos países do terceiro mundo: “Nesse contexto, as revistas editadas nos</p><p>países em vias de desenvolvimento ocupam uma posição estratégica na</p><p>difusão da produção cientí�ca da região, em relação com as linhas e</p><p>prioridades de pesquisa das instituições” (COIMBRA JUNIOR, 2004, p.</p><p>878).</p><p>Outro editor da revista publicada pela sociedade cientí�ca da área –</p><p>Ciência & Saúde Coletiva – igualmente indexada por ISI/�omson, observa</p><p>que para se manter no mercado editorial e ser indexada por uma base de</p><p>dados como MEDLINE, por exemplo, não é su�ciente que uma revista</p><p>publicada no Brasil possa preencher todos as condições</p><p>internacionalmente consagradas que regem e universalizam a comunicação</p><p>cientí�ca: “A revista vai concorrer com os critérios internos dos gestores</p><p>norte-americanos (porque se trata de uma base de dados americana, criada</p><p>por e para a comunidade médica norte-americana)” (MINAYO, 2007, p.</p><p>42).</p><p>Os critérios da Lista Qualis da CAPES/MEC para as revistas da área de</p><p>saúde mostram uma situação exemplar da produção cientí�ca na área.</p><p>Existe uma única lista para toda a grande área “Ciências da Saúde”. Na</p><p>avaliação trienal dos programas de pós-graduação, realizada em 2007, a</p><p>atualização da Lista Qualis/Saúde mostrou uma estrati�cação segundo a</p><p>qual a lista contém um total de 1.278 títulos de revistas. A distribuição</p><p>numérica entre os diferentes estratos (A1, A2; B1, B2, B3, B4, B5 e C) é</p><p>equilibrada, com uma variação de 130 títulos de revistas em A1 (o mínimo</p><p>de número de títulos) e 215 títulos em B1 (o máximo de número de</p><p>títulos). O que chama em princípio a atenção é a grande concentração de</p><p>revistas em língua inglesa e originárias dos Estados Unidos, em primeiro, e</p><p>do Reino Unido, em segundo, entre os indicadores mais elevados da lista.</p><p>De outro lado, a presença de títulos em português e publicados no Brasil</p><p>aumenta em sentido inverso ao dos estratos mais elevados. Essa situação</p><p>rea�rma a existência de uma “ciência escondida”, isto é, que não se enxerga</p><p>em nível internacional da comunicação cientí�ca, apesar da qualidade</p><p>editorial e de conteúdo da maior parte das revistas da área de saúde no</p><p>Brasil.</p><p>Pergunta-se, nesse caso: se essas revistas, os autores e os</p><p>conhecimentos que elas contêm não são divulgados nos grandes circuitos</p><p>editoriais em nível internacional, para que elas serviriam? Quem são seus</p><p>leitores? Qual seria o impacto dos conhecimentos nelas divulgados para as</p><p>políticas, programas e serviços</p><p>de saúde? E para melhorar as condições de</p><p>saúde da população? Por outro lado, a modelização e a classi�cação das</p><p>revistas cientí�cas apresentam problemas em um domínio como o da</p><p>saúde coletiva, que cultiva e/ou tem necessidade de modalidades de</p><p>produção, comunicação e difusão mais estendidas dos conhecimentos,</p><p>produzidos em diálogo com setores da pesquisa, da sociedade e dos</p><p>serviços e sistemas de saúde, apesar da universalidade que todas as</p><p>disciplinas cientí�cas precisam desenvolver.</p><p>Desta feita, observa-se a formação de dois sistemas que funcionam de</p><p>forma paralela: um sistema de pesquisa e de produção de conhecimentos</p><p>relacionados aos problemas de saúde e apropriáveis pelas diferentes</p><p>esferas pro�ssionais e sociais e um sistema de edições e de publicações que</p><p>estabelece uma hierarquia entre as revistas e, por consequência, entre os</p><p>conhecimentos que elas difundem.</p><p>O MÉTODO E O CAMPO EMPÍRICO</p><p>A instituição acadêmica selecionada para essa pesquisa é a Fundação</p><p>Oswaldo Cruz58, um dos maiores e melhor conceituados centros de</p><p>pesquisa em saúde pública da América Latina. Está situada em</p><p>Manguinhos, na área da Leopoldina, na cidade do Rio de Janeiro, região</p><p>composta por uma grande população de bairros e complexos de favelas</p><p>onde vivem cerca de 600 mil pessoas. Vinculada ao Ministério da Saúde, a</p><p>Fiocruz foi criada em 1900 com o nome de Instituto Soroterápico Federal,</p><p>tendo por missão combater os grandes problemas de saúde pública</p><p>brasileira. Em 1970, é instituída a Fundação Oswaldo Cruz, congregando</p><p>inicialmente o então Instituto Oswaldo Cruz, a Fundação de Recursos</p><p>Humanos para a Saúde (hoje Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio</p><p>Arouca – ENSP) e o Instituto Fernandes Figueira (IFF). As demais</p><p>unidades que hoje compõem a Fiocruz foram incorporadas ao longo dos</p><p>anos.</p><p>A Fiocruz abriga atividades que incluem o desenvolvimento de</p><p>pesquisas, a prestação de serviços hospitalares e ambulatoriais de</p><p>referência em saúde, a fabricação de vacinas, medicamentos, reagentes e</p><p>kits de diagnóstico, o ensino e a formação de recursos humanos, a</p><p>informação e a comunicação em saúde, ciência e tecnologia, o controle da</p><p>qualidade de produtos e serviços e a implementação de programas sociais.</p><p>Existe, assim, uma diversidade de grupos e unidades de pesquisa,</p><p>assegurando uma diversidade de enfoques de pesquisa em saúde, além de</p><p>elos interdisciplinares, interinstitucionais, intersetoriais e internacionais.</p><p>Ainda é necessária, no entanto, uma intensa comunicação entre</p><p>pesquisadores, serviços, órgãos públicos, políticas e programas de saúde e</p><p>as comunidades para alcançar as demandas das políticas públicas de saúde</p><p>e as necessidades sociais.</p><p>Considerando esse amplo espectro, selecionaram-se quatro unidades</p><p>para compor a amostra estudada, de acordo com os objetivos do estudo de</p><p>perceber as mediações construídas na produção e divulgação das pesquisas</p><p>para a apropriação social dos conhecimentos. Os grupos e/ou unidades</p><p>são:</p><p>a) Vigilância Civil da Saúde na Atenção Básica – uma proposta de</p><p>Ouvidoria Coletiva na AP 3.1, Rio de Janeiro, projeto de pesquisa inserido</p><p>no grupo de pesquisa Educação, Saúde e Cidadania, do Departamento de</p><p>Endemias Samuel Pessoa da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio</p><p>Arouca (DENSP/ENSP);</p><p>b) Centro Latino-Americano de Pesquisa sobre Violência e Saúde Jorge</p><p>Careli (Claves), vinculado à Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca</p><p>(ENSP). Seu objetivo é investigar o impacto da violência sobre a saúde da</p><p>população brasileira e latino-americana;</p><p>c) Museu da Vida, vinculado à Casa de Oswaldo Cruz (COC). Seu</p><p>objetivo é informar e educar em ciência, saúde e tecnologia, de forma</p><p>lúdica e criativa, por meio de exposições permanentes, atividades</p><p>interativas, multimídia, teatro, vídeo, laboratórios;</p><p>d) Instituto de Comunicação e Informação Cientí�ca e Tecnológica em</p><p>Saúde (ICICT) órgão responsável por formular políticas, desenvolver</p><p>estratégias e executar ações de informação e comunicação no campo da</p><p>ciência e tecnologia em saúde que respondam às demandas da sociedade,</p><p>do Sistema Único de Saúde (SUS) e de outros órgãos governamentais.</p><p>Em cada unidade, foram selecionados pesquisadores para compor uma</p><p>amostra qualitativa representativa, totalizando 25 sujeitos. Deste</p><p>conjunto, foram selecionados 19 pesquisadores para a realização de</p><p>entrevistas. Outros 6 pesquisadores foram selecionados para compor uma</p><p>amostra conjunta para o estudo das redes de pesquisa, por meio da análise</p><p>de dados da Plataforma Lattes do CNPq: Currículo e Diretório de Grupos</p><p>de Pesquisa. A análise de documentos produzidos pelos grupos e suas</p><p>unidades serviram de apoio ao processo da análise dos dados. As</p><p>categorias de análise foram estabelecidas de acordo com as seguintes</p><p>metas e intenções de condução da pesquisa empírica: a) mapeamento das</p><p>redes dos pesquisadores com diferentes inserções epistemológicas,</p><p>institucionais e políticas no campo da saúde; b) cartogra�a dos</p><p>conhecimentos e das mediações discursivas, acadêmicas, institucionais e</p><p>técnicas; c) delineamento dos espaços e elos discursivos estabelecidos por</p><p>esses grupos com diferentes esferas sociais: mídia, organizações civis,</p><p>movimentos sociais, Estado, serviços de saúde etc.; d) reunião de</p><p>elementos teórico-metodológico-aplicativos para a re�exão e prática da</p><p>difusão e apropriação social do conhecimento.</p><p>INSERÇÃO E POSIÇÃO NO CAMPO DA SAÚDE</p><p>Os pesquisadores foram primeiramente indagados a respeito da sua</p><p>posição e inserção no campo da saúde. Para esse �m, foi apresentada a</p><p>classi�cação da área da saúde na Tabela de Áreas do Conhecimento (TAC)</p><p>do CNPq/CAPES/Finep para que cada um indicasse em qual (ou quais)</p><p>subáreas da saúde coletiva estariam melhor situados em relação às suas</p><p>linhas de pesquisa. Em seguida, indagou-se a respeito da inserção do</p><p>pesquisador no campo epistemológico e, posteriormente, a sua relação</p><p>com o campo político e gerencial da saúde. Ainda nesse bloco de questões,</p><p>perguntou-se sobre o tipo de pesquisa realizada pelo respondente.59 Nos</p><p>blocos subsequentes, indagou-se a respeito da conformação de suas redes</p><p>de pesquisa por meio dos seguintes parâmetros de dados: a) os grupos de</p><p>pesquisa do Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq/MCTI a que</p><p>pertencem, dentro e fora da Fiocruz; b) os contatos que estabelecem com</p><p>outros pesquisadores e instituições nos níveis nacional e internacional; c)</p><p>os modos de divulgação dos conhecimentos e os veículos empregados; d) as</p><p>representações que constroem sobre os processos de informação,</p><p>comunicação e divulgação cientí�ca em saúde.</p><p>Para estudar o campo da saúde desse ponto de vista, é relevante</p><p>assinalar a pluralidade de per�s disciplinares dos pesquisadores,</p><p>orientados pelo objeto principal “saúde” a partir de diferentes lentes</p><p>epistemológicas, históricas e sociopolíticas, o que parece corresponder ao</p><p>fato de que não existe um conceito universalmente válido de saúde aos</p><p>indivíduos, aos grupos ou a toda a sociedade, e de que a saúde não é uma</p><p>�nalidade, isto é, uma pauta a ser realizada, pressupondo-se uma de�nição</p><p>prévia sobre normal e normalidade. De forma diferente, os pesquisadores</p><p>da saúde coletiva, de modo geral, buscam contextualizar os signi�cados da</p><p>saúde inerentes às representações e experiências sociais (MARTELETO;</p><p>STOTZ, 2009).</p><p>Dessa forma, assinalam-se as inserções diferenciadas dos</p><p>pesquisadores da saúde no campo, a partir de suas matrizes disciplinares.</p><p>Os epidemiologistas pesquisam para entender novos métodos e maneiras</p><p>de atuar na saúde coletiva, a partir de uma de�nição mais ampla,</p><p>abrangente e multidisciplinar para pensar a saúde como um objeto das</p><p>coletividades, e não unicamente ou necessariamente do Estado. No</p><p>entanto, assinalam que existem múltiplas interfaces entre epidemiologia,</p><p>medicina preventiva e saúde pública, mais do que fronteiras nítidas entre</p><p>elas. Para outros, que estudam questões como a violência e saúde, seus</p><p>objetos de pesquisa estão bem localizados e fundamentados na saúde</p><p>coletiva, uma vez que a violência não constitui um fato que pode ter uma</p><p>causa genética, ela é eminentemente social, pois ocorre nas relações</p><p>sociais. A saúde coletiva, nesse caso, opera com ações e representações que</p><p>demandam uma transdisciplinaridade, no sentido em que supera a</p><p>perspectiva unicamente biológica ou da medicina em si, da clínica, para</p><p>atuar em diversos aspectos, desde a prevenção até a promoção da saúde.</p><p>A inserção dos pesquisadores da informação, da comunicação e da</p><p>saúde se realiza por diferentes recortes disciplinares e de formação, uma</p><p>vez que não se conta com um per�l especí�co ou um “pro�ssional pronto”,</p><p>como existiria, por exemplo, na epidemiologia. Na visão desses</p><p>pesquisadores, a informação em saúde produzida no campo precisa ser</p><p>comunicada aos pares por meio das publicações, mas sem relevar a</p><p>importância da sua divulgação na mídia e a sua apropriação pelas</p><p>diferentes esferas sociais e pro�ssionais como apoio à formulação de</p><p>políticas públicas. Na geração mais comprometida com a Reforma</p><p>Sanitária das décadas de 1970 e 1980, acentua-se o elo da saúde com as</p><p>condições de vida e a democracia, porque se percebe a saúde além da sua</p><p>base biomédica, situando-a em território social, político, econômico e</p><p>cultural. O compromisso de realizar a reforma levaria as políticas de saúde</p><p>a guardar coerência em relação a esse processo e a con�gurar um per�l da</p><p>saúde coletiva comprometido com as políticas e a gestão da saúde.</p><p>Existiria, assim, um “mito fundador da nova saúde pública no Brasil”, caro</p><p>aos atores sociais e institucionais que vivenciaram a reforma sanitária no</p><p>país. Para outros, as pesquisas no campo da saúde coletiva estão pautadas</p><p>pela necessária interdisciplinaridade das temáticas e objetos, cada vez que</p><p>se formulam novas questões sobre os problemas da saúde pública. Embora</p><p>não assumindo a política como um campo de prática, reconhecem que a</p><p>produção do conhecimento na área está permeada pela política.</p><p>Os pesquisadores que atuam na museologia e divulgação cientí�ca em</p><p>saúde acreditam que o fato de o Museu da Vida se situar na Fiocruz não é</p><p>gratuito, lembrando o conjunto compósito e interdisciplinar da sua</p><p>formulação, aliado ao projeto político da saúde coletiva. Se assim não</p><p>fosse, o museu não teria um per�l interativo, ao mesmo tempo em que</p><p>preza a educação e a memória da saúde. A questão política na divulgação</p><p>cientí�ca, museologia e educação em saúde apresenta uma faceta peculiar,</p><p>referente ao diálogo às vezes delicado com o público, quando as produções</p><p>de divulgação precisam se orientar pela “fala do Ministério da Saúde”, por</p><p>exemplo, em questões polêmicas como o aborto, que abre uma pluralidade</p><p>de visões, preconceitos, crenças e vivências.</p><p>Os pesquisadores orientados em seus estudos pelos princípios da</p><p>educação popular e saúde comungam com os demais a respeito das bases</p><p>epistemológicas e históricas da reforma sanitária e dos princípios</p><p>humanitários e políticos de conformação do Sistema Único de Saúde –</p><p>SUS. Entre os quatro grupos de pesquisadores, é o que realiza uma</p><p>aproximação mais imediata com a população, por meio de ações de</p><p>produção do conhecimento aliadas às práticas de intervenção social e</p><p>mediação entre os grupos populares e o poder público, de modo a revelar</p><p>as condições de vida que normalmente não são percebidas ou são</p><p>ignoradas pelos órgãos públicos e, por via de consequência, pelas políticas</p><p>públicas em saúde. Para esse �m, os pesquisadores procuram estabelecer</p><p>uma forma dialógica e de escuta entre o conhecimento cientí�co e os</p><p>saberes e práticas populares.</p><p>REDES E TIPOS DE PESQUISA</p><p>A �m de caracterizar os tipos de pesquisa realizada no campo da saúde,</p><p>empregou-se o glossário Setenta termos para compreender a pesquisa em</p><p>saúde, publicado pelo Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães da Fiocruz</p><p>(FIOCRUZ, 2006). Entre as modalidades de�nidas no documento, as</p><p>pesquisas avaliativa, estratégica e epidemiológica representam os</p><p>principais modos de organização e produção dos conhecimentos pelos</p><p>pesquisadores, a partir das de�nições apresentadas no Quadro 1:</p><p>Quadro 1: Tipos de pesquisa na área da saúde60</p><p>Tipo de</p><p>pesquisa</p><p>De�nição</p><p>Avaliativa</p><p>Aplica métodos cientí�cos para analisar a pertinência, os fundamentos teóricos,</p><p>a produtividade, a e�ciência e os efeitos de uma intervenção, assim como as</p><p>relações existentes entre as intervenções e os contextos em que elas se situam,</p><p>com o objetivo de ajudar a tomada de decisão. Exemplos: avaliações das</p><p>intervenções em saúde pública, dos serviços e dos sistemas de saúde e das</p><p>políticas de saúde.</p><p>Estratégica</p><p>Associa os objetivos de geração de conhecimento à resolução de problema,</p><p>buscando acelerar e intensi�car a transferência de conhecimentos técnico-</p><p>cientí�cos da bancada do pesquisador para os serviços de saúde, garantindo</p><p>forte articulação com a pesquisa fundamental.</p><p>Epidemiológica</p><p>Tipo de pesquisa realizado por meio da produção, análise e interpretação de</p><p>dados decorrentes da observação e quanti�cação de eventos relacionados à</p><p>saúde e fenômenos correlatos, como os possíveis determinantes ou efeitos dos</p><p>processos saúde-doença nas populações.</p><p>Fonte: Fiocruz (2006)</p><p>Quanto mais próximos do campo de formação da saúde no sentido</p><p>estrito e disciplinar (epidemiologia, medicina), mais os pesquisadores</p><p>de�nem suas pesquisas como epidemiológicas e/ou estratégicas. Aqueles</p><p>que se posicionam nas fronteiras epistemológicas, cientí�cas e sociais</p><p>interdisciplinares do campo situam seus trabalhos principalmente na</p><p>pesquisa avaliativa e, em segundo lugar, na pesquisa estratégica.</p><p>Os tipos de pesquisa realizada estão, por sua vez, associados aos</p><p>veículos de divulgação empregados para a disseminação e às parcerias com</p><p>outros atores institucionais para a conformação de redes de pesquisa, as</p><p>quais se con�guram pelo pertencimento a grupos de pesquisa intra e</p><p>extrainstitucionais, e pelos contatos realizados no país e no exterior. Os</p><p>pesquisadores situados de forma mais próxima de uma ação política e</p><p>histórica no campo da saúde e a trabalhos de intervenção social tendem a</p><p>divulgar os conhecimentos produzidos na pesquisa em veículos nacionais</p><p>(revistas, eventos etc.) e abrem parcerias com outras esferas sociais, além</p><p>do campo cientí�co, ao mesmo tempo que possuem uma interação menor</p><p>em nível internacional.</p><p>Por outro lado, as pesquisas epidemiológicas e estratégicas parecem</p><p>abrir maiores perspectivas de parcerias e disseminação do conhecimento</p><p>no nível internacional, além do nacional. O caráter aplicado e mais recente</p><p>de certos campos de pesquisa, como, por exemplo, a divulgação cientí�ca</p><p>em saúde, leva a uma maior atuação em rede de pesquisadores e espaços de</p><p>prática, como os museus cientí�cos, de maneira a confrontar teorias e</p><p>práticas para a construção do conhecimento em interface com a sociedade.</p><p>Outros ressaltam as di�culdades de parcerias entre pesquisadores de</p><p>diferentes unidades da Fiocruz, o que gera a sobreposição de esforços e às</p><p>vezes leva ao isolamento entre grupos, o que se atribui à forma como se</p><p>conformou a instituição de pesquisa, pela reunião de unidades antes</p><p>isoladas, no decorrer dos anos 1970.</p><p>INFORMAÇÃO, COMUNICAÇÃO E DIVULGAÇÃO EM</p><p>SAÚDE</p><p>Em relação aos grupos estudados, existem maneiras próprias de</p><p>entender e praticar a informação, a comunicação e a divulgação cientí�ca</p><p>em saúde. Os atores institucionais mais alinhados e presentes na luta</p><p>histórica da reforma sanitária e da conformação do SUS, atuantes no</p><p>âmbito epistemológico da informação, comunicação e saúde, observam</p><p>que, na luta política dos anos 1980, ainda não se tinha presente a</p><p>relevância estratégica da informação e comunicação que se conduzia por</p><p>uma visão meramente instrumental. Ao mesmo tempo, observa-se que</p><p>essa visão ainda prevalece hoje, quando se considera a informação e a</p><p>comunicação como estratégicas e centrais, porém, de maneira</p><p>instrumental e linear. Ou seja, mudou-se a direção ideológica do campo em</p><p>direção a uma saúde coletiva e emancipatória,</p><p>porém, o modelo</p><p>transferencial e hierarquizado da informação e comunicação permaneceu o</p><p>mesmo.</p><p>Observa-se, ainda, que a população gera e detém dados e informações</p><p>ao desenvolver uma manifestação clínica, patológica ou mesmo ao</p><p>reivindicar direitos em saúde, e isso de certa forma é informação para a</p><p>pesquisa que produz, por sua vez, informações que se transformarão em</p><p>política pública, como o material informacional em forma de banco de</p><p>dados, de sistemas de informação, de material didático. Nesse contexto, o</p><p>trabalho do pesquisador no espaço das mediações para a apropriação social</p><p>de conhecimentos pelos serviços de saúde e a população – que é a grande</p><p>usuária dos conhecimentos produzidos nas pesquisas – é também o de</p><p>educador. Existe, por outro lado, um consumo de informação, mas falta</p><p>um mediador entre a informação e a população, para que ocorra a</p><p>comunicação de forma ampliada e direcionada aos fatos, ampliando as</p><p>mídias de informação e comunicação em saúde e a sua apropriação. Nesse</p><p>contexto, parte dos pesquisadores admite que divulga o conhecimento</p><p>principalmente aos pares, o que é considerado de fundamental</p><p>importância, desde que não direcionado ao produtivismo cientí�co. No</p><p>entanto, reconhecem o pouco investimento na disseminação do</p><p>conhecimento para a apropriação pelos serviços, políticas e gestão da</p><p>saúde e para a população.</p><p>Os processos de informação, comunicação e divulgação em saúde</p><p>passam ainda pela necessária “forma elegante de fazer as coisas”, ou seja,</p><p>pelo cuidado em repassar os conhecimentos de forma aberta, sem erros,</p><p>sem vieses, em linguagem cientí�ca revisada pelos pares e de forma</p><p>inteligível pela sociedade. Essas mediações de informação, por outro lado,</p><p>passam pela comunicação, que transforma uma informação complexa e às</p><p>vezes hermética em algo interessante e que um secretário de saúde, por</p><p>exemplo, resolva ler e levar à população. Enfatiza-se, ainda, que na Fiocruz</p><p>e na saúde em geral o objeto é a saúde. Desta feita, o que une divulgação,</p><p>informação, comunicação e educação é a saúde, e não basta ser jornalista,</p><p>não basta ser pedagogo: é necessário entender bem a questão do objeto</p><p>saúde – seus fundamentos, métodos e conceitos.</p><p>CONCLUSÕES</p><p>O estudo mostrou, de acordo com estudiosos da sociologia da ciência</p><p>como Bourdieu (1983a), Knorr-Cetina (1981) ou Latour e Woolgar (1989),</p><p>entre outros, que o campo da saúde, tal como a ciência e a tecnologia em</p><p>geral, con�gura um campo de interesses e de poder, associado aos</p><p>processos epistemológicos, históricos, sociais e políticos de sua</p><p>autonomização e institucionalização. E esse poder é mais forte na medida</p><p>em que a sociedade transforma a saúde, a ciência e a tecnologia nos</p><p>principais fatores de produção da sociedade pós-industrial (MINAYO,</p><p>2006). Os atores do campo da saúde disputam o reconhecimento, o</p><p>prestígio e os investimentos, bem como visões compartilhadas ou</p><p>segmentadas a respeito das questões e concepções de saúde. Tais visões,</p><p>por seu turno, re�etem as posições, interações e alianças nas redes de</p><p>pesquisa intra e interinstitucionais, em contextos cientí�cos locais,</p><p>regionais ou internacionais. As formas de divulgação cientí�ca e a</p><p>geopolítica de distribuição do poder cientí�co se fazem presentes também</p><p>no status e no ranking das revistas cientí�cas, mesmo quando esse</p><p>processo de aparência “naturalizada” pela cultura se apresenta</p><p>simplesmente como uma questão de mérito (MINAYO, 2007).</p><p>Nesse quadro, o campo da saúde é con�gurado por con�itos de</p><p>interesse entre, por um lado, um domínio de conhecimentos e práticas em</p><p>que se fazem presentes diferentes perspectivas disciplinares, com forte</p><p>implicação das questões locais de saúde. Por outro, uma perspectiva</p><p>internacionalizada da atividade de pesquisa e produção de conhecimentos</p><p>cada vez mais orientada por um sistema mundializado de edições e</p><p>publicações cientí�cas.</p><p>Se o lado internacionalizado do sistema de publicações faz renascer os</p><p>estudos bibliométricos e cientométricos para a avaliação da classi�cação</p><p>(ranking) das revistas, a face interdisciplinar das ciências da vida depende</p><p>dos estudos das mediações necessárias para a democratização e a</p><p>apropriação das informações e saberes em saúde. Essa poderia ser uma via</p><p>para o justo, senão desejável equilíbrio ou composição entre um campo</p><p>cientí�co pleno de con�itos e interesses divergentes e um domínio de</p><p>conhecimentos con�gurado por um sistema hierárquico e mundializado de</p><p>publicações, no contexto da atividade cientí�ca em redes internacionais de</p><p>pesquisa.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BOURDIEU, P. O campo cientí�co. In: ORTIZ, R. Pierre Bourdieu: Sociologia. São Paulo: Ática, 1983a,</p><p>p. 122-155.</p><p>______. Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Ed. Marco Zero, 1983b.</p><p>______. Science la science et re�exivité; cours du Collège de France 2000-2001. Paris: Raisons d’Agir</p><p>Ed., 2001.</p><p>BRASIL. Ministério da Saúde. Por que pesquisa em saúde? Brasília: Ministério da Saúde, 2007. 20p.</p><p>(Série B. Textos Básicos de Saúde. Série Pesquisa para Saúde: Textos para Tomada de Decisão).</p><p>CALLON, M. La science et sés réseaux: genèse et circulation des faits scienti�ques. Paris: Ed. La</p><p>Découverte, Conseil de l’Europe, UNESCO, 1989.</p><p>COIMBRA JUNIOR., C. E. A. Produção cientí�ca e impacto na saúde coletiva. Cadernos de Saúde</p><p>Pública, v. 20, n. 4, p. 878-879, jul/ago, 2004.</p><p>COUZINET, V. De la communication scienti�que à la médiation spécialisée: communication des</p><p>savoirs et formes d’hybridations. In: PAPY. F. Problématiques émergentes dans les sciences de</p><p>l’information. Paris: Hermès, Lavoisier, 2008, p. 57-85.</p><p>FIOCRUZ. Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães. Setenta termos para compreender a pesquisa em</p><p>saúde. Recife: CpqAM, 2006.</p><p>HJÆRLAND, B. Domain analysis in information science: eleven approaches traditional as well</p><p>innovative. Journal of Documentation, v. 58, n. 4, p. 422-462, 2002.</p><p>HJÆRLAND, B.; ALBRECHTSEN, H. Toward a new horizon in information science: domain-</p><p>analysis. Journal of the American Society for Information Science, v. 46, n. 6, p. 400-425, 1995</p><p>JEANNERET, Y. Un premier colloque, une multiplicité de pistes de recherche. In : COLLOQUE</p><p>EDITION ET PUBLICATION SCIENTIFIQUES EN SCIENCES HUMAINES ET SOCIALES: FORMES</p><p>ET ENJEUX. Anais... Avignon: Université d’Avignon et des Pays de Vaucluse, Laoartoire de</p><p>Communication et Culture, 2010, p. 9-16.</p><p>KNORR-CETINA, K. �e Manufacture of Knowlwedge: an Essay on the Constructivist and Contextual</p><p>Nature of Science. Oxford: Pergamon Press, 1981.</p><p>LATOUR, B. Le métier de chercheur, regard d’un antropologue. Paris: INRA, 1995.</p><p>LATOUR, B. ; WOOLGAR, S. La vie de laboratoire: la production des faits scienti�ques. Paris,</p><p>Pandore, 1989.</p><p>MARTELETO, R. M.; STOTZ, E. N. Apresentação. In: MARTELETO, R. M.; STOTZ, E. N. (Orgs.).</p><p>Informação, saúde e redes sociais: diálogos de conhecimentos nas comunidades da Maré. Rio de</p><p>Janeiro: Fiocruz; Belo Horizonte: UFMG, 2009.</p><p>MINAYO, M. C. S. Saúde e ambiente: uma relação necessária. In: CAMPOS, G. W. S. (Org.). Tratado</p><p>de Saúde Coletiva. São Paulo: Hucitec, 2006, p. 81-110.</p><p>______. A complexa dinâmica da divulgação cientí�ca: o caso da Revista Ciência & Saúde Coletiva.</p><p>RECIIS-Revista Eletrônica de Comunicação, Informação, Inovação e Saúde, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p.</p><p>35-44, jan./jun., 2007.</p><p>NASCIMENTO, D. M.; MARTELETO, R. M. Social �elds, domains of knowledge and informational</p><p>practice. Journal of Documentation, v. 64, n. 3, p. 397-412, 2008.</p><p>VESSURI, H. Ciência, comunicación y sociedad em América Latina. Interciencia, Caracas, v. 28, n. 6,</p><p>p. 313-315, jun. 2003.</p><p>VINCK, D. Sciences et société: sociologie du travail scienti�que. Paris: Armand Collin, 2007.</p><p>56 O capítulo está baseado em resultados do projeto de pesquisa “Informação, comunicação e</p><p>divulgação cientí�ca em saúde: apropriação de conhecimentos e mediações em redes sociais”,</p><p>�nanciado pelo CNPq/MCTI, desenvolvido de 2007 a 2010.</p><p>57 De acordo com Minayo, (2007, p. 37) “A palavra ‘saúde coletiva’, presente no nome da revista e</p><p>da associação cientí�ca (Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO) merece uma</p><p>explicação. De uma maneira simpli�cada ‘saúde coletiva’ é sinônimo de ‘saúde pública’ e todas as</p><p>vezes que se traduz o termo em inglês ou em outras línguas estrangeiras remete-se a essa</p><p>similaridade, uma vez que somente no Brasil utiliza-se a expressão “saúde coletiva” de maneira</p><p>institucionalizada. Como todo conceito que surge e se distingue historicamente, ‘saúde coletiva’ se</p><p>reporta aos processos de luta política da dita ‘Reforma Sanitária’ que começou durante a ditadura</p><p>militar no Brasil (1964-1979) e que tinha por objetivo a universalização do direito à Saúde para toda</p><p>a população brasileira”.</p><p>58 Portal/Fiocruz: <http://portal.�ocruz.br>.</p><p>59 Empregou-se a versão da Tabela de Áreas do Conhecimento – TAC CNPq/CAPES/Finep em vigor</p><p>no período da produção do estudo, disponível em:</p><p><http://www.cnpq.br/areasconhecimento/4.htm>. Acesso em : 10 dez. 2012.</p><p>60 Para estabelecer uma categorização dos tipos de pesquisa na área de saúde foram empregadas as</p><p>de�nições do Ministério da Saúde, disponíveis no Portal:</p><p><http://portal.saude.gov.br/portal/saude/default.cfm>.</p><p>E o documento: FIOCRUZ/Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães. Setenta termos para compreender a</p><p>pesquisa em saúde. Recife: CpqAM, 2006.</p><p>ANÁLISE DAS LIGAÇÕES DE PESQUISADORES COM</p><p>CATEGORIAS INSTITUCIONAIS: UM ESTUDO DAS REDES DE</p><p>DOIS MODOS</p><p>61</p><p>Maria Inês Tomaél</p><p>Regina Maria Marteleto</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>O estudo e a análise de redes de dois modos são um desa�o que</p><p>transcende as aplicações encontradas nas análises de redes de um modo. É</p><p>com essa perspectiva que apresentamos, neste capítulo, a exposição dos</p><p>percursos iniciais da ARS de dois modos, tanto dos aspectos conceituais</p><p>quanto de aplicações introdutórias que permitem visualizar redes</p><p>constituídas por dois conjuntos de atores distintos, neste caso,</p><p>pesquisadores e instituições.</p><p>O crescente interesse nos estudos de redes sociais tem impulsionado as</p><p>pesquisas nos mais diversos campos do conhecimento. Na área de Ciências</p><p>Sociais e, mais precisamente, na Ciência da Informação e Saúde, isso não é</p><p>diferente. Observamos que, na Ciência da Informação, a maior incidência</p><p>dos estudos está voltada ao compartilhamento, ao �uxo da informação e à</p><p>produção cientí�ca, e, na Saúde, as pesquisas centram-se em estudos</p><p>epidemiológicos e/ou em melhorias nas condições da própria saúde.</p><p>No Brasil, no campo de estudos da informação, a metodologia de</p><p>Análise de Rede Sociais (ARS) vem sendo empregada desde o início do</p><p>século XXI, a partir da divulgação do artigo de Marteleto (2001), no qual a</p><p>autora apresenta resultados de pesquisa sobre o �uxo e a transferência de</p><p>informação em movimentos sociais, organizados nos subúrbios da</p><p>Leopoldina, na cidade do Rio de Janeiro. Em decorrência da disseminação</p><p>do estudo de Marteleto, muitos outros surgiram com enfoques</p><p>diferenciados. Na Ciência da Informação, Bufrem (2009) analisou as</p><p>pesquisas que empregam a metodologia ARS tendo como base as relações</p><p>interinstitucionais e de autoria. Os resultados demonstram que os estudos</p><p>que empregam esta metodologia são amplamente adotados na área e</p><p>proliferam pelo país, especialmente em projetos que analisam a produção</p><p>cientí�ca.</p><p>Na área de Saúde, os pesquisadores brasileiros têm abordado temáticas</p><p>variadas, e o interesse pela metodologia é crescente, sendo que os estudos</p><p>epidemiológicos não têm sido a tônica principal das investigações. Em</p><p>grande parte, as pesquisas estão relacionadas com a promoção da melhoria</p><p>das condições de saúde. A análise de relatos de pesquisa presentes na</p><p>literatura evidencia que as aplicações dessa metodologia no Brasil</p><p>restringem-se a algumas métricas e maciçamente ao estudo das redes de</p><p>um modo, em que as relações são estudadas a partir das ligações entre</p><p>atores similares.</p><p>As redes de dois modos estudam conjuntos distintos de atores, em que</p><p>os atores (conjunto 1) estão ligados a entidades sociais (conjunto 2) e não</p><p>entre eles. Os atores, por exemplo, podem ser representados por pessoas,</p><p>enquanto as entidades sociais são representadas por grupos sociais, como</p><p>organizações, clubes, conselhos acadêmicos ou administrativos etc. Nas</p><p>redes de dois modos, também denominadas de redes de a�liação ou</p><p>bipartidas, os atores estabelecem relações sociais com pelo menos uma</p><p>entidade.</p><p>Com essa ênfase, este capítulo tem como objetivo explorar a aplicação</p><p>da análise de redes de dois modos por meio da identi�cação das ligações de</p><p>a�liação de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) com</p><p>categorias institucionais diversas. Para tanto, analisamos as ligações de 16</p><p>pesquisadores com instituições do Brasil e do exterior e, por meio dessa</p><p>análise, apresentamos uma introdução às redes de dois modos.</p><p>Os dados aqui analisados foram coletados no projeto “Informação,</p><p>Comunicação e Divulgação Cientí�ca em Saúde: apropriação de</p><p>conhecimentos e mediações em redes sociais”,62 no período de março de</p><p>2007 a fevereiro de 2010, com �nanciamento da CNPq/MCTI.</p><p>Apresentamos, neste capítulo, um breve panorama da literatura</p><p>relevante para fundamentar a análise desse recorte de dados e discutimos,</p><p>em maior detalhe, o método empregado no decorrer da descrição e análise</p><p>dos dados. Os dados de dois modos empregados neste trabalho são</p><p>analisados a partir das relações interinstitucionais, sendo o ponto</p><p>principal a tipologia institucional. Para a análise dos dados descrita, neste</p><p>capítulo, empregou-se o software UCINET63 (BORGATTI; EVERETT;</p><p>FREEMAN, 2002).</p><p>REDES SOCIAS</p><p>A noção de que as pessoas se inserem em teias de relações sociais e</p><p>interações constitui-se em uma das ideias mais importantes das Ciências</p><p>Sociais, a�rma Borgatti et al. (2009). A teoria das redes sociais oferece uma</p><p>resposta para uma questão que tem preocupado a �loso�a social desde a</p><p>época de Platão, ou seja, um problema de ordem social: como indivíduos</p><p>autônomos podem se juntar para criar resistência e para o funcionamento</p><p>das sociedades.</p><p>Nas Ciências Sociais, explica Marteleto (2000, p. 78), “a ideia de rede é</p><p>empregada para se referir à sociedade como um conjunto diverso de</p><p>relações e funções que as pessoas desempenham umas em relação às</p><p>outras”. A abordagem da análise de redes é uma das que mais crescem</p><p>nessa área, na qual “Acumulam-se evidências que a ação humana é afetada</p><p>pelas relações sociais em que os agentes estão imersos” (MIZRUCHI, 2006,</p><p>p. 82). E é pela estrutura das relações sociais que emergem o signi�cado e o</p><p>conteúdo dessas relações.</p><p>É nesse sentido que o antropólogo Barnes (1972), em 1954, introduziu</p><p>o conceito de redes sociais, e sua aplicação em pesquisas está sendo</p><p>consolidada, desde então. A ideia de rede social e seu emprego metafórico</p><p>enfatizam a criação e a manutenção das relações sociais de indivíduos. Seu</p><p>emprego analítico especi�ca a forma como essa rami�cação exerce</p><p>in�uência no comportamento das pessoas envolvidas na rede (MITCHELL,</p><p>1974).</p><p>As relações em que se pressupõe um sistema de “nós” e ligações “uma</p><p>estrutura sem fronteiras; uma comunidade não geográ�ca; um sistema de</p><p>apoio ou um sistema físico que se pareça com uma árvore” é considerado</p><p>por Marteleto (2001, p. 72) uma rede. As redes representam a estrutura</p><p>social e se desenvolvem conforme nos inserimos no mundo e ampliamos</p><p>nossos contatos. “Hoje o trabalho informal em rede é uma forma de</p><p>organização humana presente em nossa vida cotidiana e nos mais</p><p>diferentes níveis de estrutura das instituições modernas”.</p><p>Uma rede consiste em um conjunto de atores ou nós e um conjunto de</p><p>ligações de um tipo especí�co (como amizade) que os ligam. As ligações de</p><p>interconexão formam caminhos que ligam os “nós” (atores) direta e/ou</p><p>indiretamente. O padrão das ligações de uma rede gera uma estrutura</p><p>especí�ca e os “nós” ocupam posições dentro dessa estrutura. Muito da</p><p>riqueza teórica da análise de redes consiste em caracterizar as estruturas</p><p>de rede (rede de mundo pequeno) e as posições do “nó” (centralidade) para</p><p>relacioná-los aos</p><p>resultados de grupo e/ou “nó” (BORGATTI; HALGIN,</p><p>2011).</p><p>Para Borgatti e Halgin (2011), é importante perceber que é o</p><p>pesquisador quem de�ne uma rede ao escolher um conjunto de nós e um</p><p>tipo de vínculo. Muito da teoria de redes e da sua metodologia é baseada</p><p>no modelo de �uxo que serve para uni�car grandes partes da teoria de</p><p>rede. Para os autores, novos modelos de redes serão desenvolvidos e</p><p>podem, potencialmente, fundamentar outras pesquisas, mas as discussões</p><p>relacionadas aos conceitos e à teorização do modelo baseado em pesquisa</p><p>de rede ajudarão a esclarecer a teoria existente, bem como poderão facilitar</p><p>a geração de uma nova teoria.</p><p>Quando se aborda o tema rede, impregnado em seu conceito está a</p><p>concepção de cooperação, por serem as redes responsáveis pelas</p><p>articulações entre diferentes atores que interagem entre si e fortalecem</p><p>todo o conjunto “à medida que são fortalecidas por ele, permitindo-lhe</p><p>expandir-se em novas unidades ou manter-se em equilíbrio sustentável.</p><p>Cada nódulo representa uma unidade e cada �o um canal por onde essas</p><p>unidades se articulam por meio de diversos �uxos” (MANCE, 2000).</p><p>Os vínculos entre todos os membros da sociedade, ou parte deles,</p><p>unidos por propósitos comuns, pressupõem uma rede social (BARNES,</p><p>1972). Há mais de 35 anos, o estudo das redes sociais prolifera e conquista</p><p>adeptos no mundo todo e nas mais diferentes áreas. Resultados de</p><p>pesquisas demonstram, nesse período, a in�uência que as redes sociais</p><p>exercem sobre o comportamento humano (MIZRUCHI, 2006). Há cerca de</p><p>40 anos Barnes (1972) questionou, em artigo seminal na especialidade, se</p><p>o termo “rede” era uma palavra de moda e argumentou que, em muitas</p><p>instâncias o conceito de redes sociais, que subsiste até hoje, é aplicado com</p><p>seriedade.</p><p>O conceito atual de redes, na visão de Marteleto (2010), é onipresente</p><p>devido às multiplicidades de aplicações possíveis. A autora a�rma que esse</p><p>conceito pode ser empregado como recurso de gestão nas organizações,</p><p>cientí�co na academia e, na mídia, ocupa espaços diversi�cados e de</p><p>formas distintas. Ela introduz o conceito e ressalta seu emprego em dois</p><p>propósitos, inicialmente o de “con�gurar o espaço comunicacional” e em</p><p>seguida destaca o de “indicar mudanças e permanências nos modos de</p><p>comunicação e transferência de informações” (MARTELETO, 2001, p. 28).</p><p>Todo indivíduo, na sociedade, está conectado a outros por ligações</p><p>sociais que tanto reforçam quanto provocam o con�ito. A situação</p><p>encontrada – ordem ou desordem – em um meio social é resultante da</p><p>limitação que esses vínculos impõem às ações dos indivíduos. Barnes</p><p>(1972) destaca que essa ideia também é empregada em redes sociais como</p><p>um instrumento de análise. A re�exão que sustenta a metáfora de rede e a</p><p>análise de redes sociais é a de que a con�guração das ligações interpessoais</p><p>está relacionada às ações das pessoas no seu meio.</p><p>Segundo Freeman (2004), o padrão das relações entre as pessoas</p><p>envolvidas no desenvolvimento de um campo – sua rede social – é a chave</p><p>para a compreensão de como esse campo emergiu. Para o autor, a</p><p>abordagem de rede social está fundamentada na crença de que os padrões</p><p>das ligações sociais em que os atores estão inseridos têm consequências</p><p>importantes para os atores. Diante disso, analistas de rede procuram</p><p>descobrir diferentes tipos de padrões que possam determinar as condições</p><p>em que esses padrões ocorrem e seus efeitos.</p><p>Quatro características são delineadas por Freeman (2004) para a</p><p>análise de redes sociais na contemporaneidade, que para o autor, de�nem</p><p>esse campo de estudo:</p><p>a) fundamentada por uma perspectiva estrutural, baseada em laços que ligam os atores</p><p>sociais;</p><p>b) baseada em dados empíricos sistemáticos;</p><p>c) con�guradas por imagem grá�ca e</p><p>d) utiliza modelos matemáticos e/ou computacionais.</p><p>REDES DE DOIS MODOS</p><p>A análise de dados de dois modos examina as relações entre dois</p><p>conjuntos de atores, como pessoas e entidades. O emprego da análise de</p><p>dois modos oferece uma perspectiva diferente para estudar as relações em</p><p>rede, na qual um conjunto de atores mantém ligações com outro conjunto.</p><p>As redes de dois modos podem ser denominadas também de redes de</p><p>a�liação e redes bipartidas.</p><p>Redes sociais de dados de dois modos são constituídas quando uma</p><p>população de atores sociais tem conexões com um conjunto de entidades</p><p>sociais distinto, tais como comitês, conselhos ou clubes sociais</p><p>(BORGATTI, EVERETT, 1997; WASSERMAN, FAUST, 1994). O aspecto</p><p>principal na análise de dados de dois modos é aquele que não registra as</p><p>ligações diretas entre atores sociais nem entre as entidades sociais. As</p><p>ligações diretas caracterizam dados de um modo. Conjuntos de dados de</p><p>dois modos são representados em matrizes retangulares (n x k) e o número</p><p>de atores é quase sempre maior do que o número de entidades.</p><p>A Análise de Rede Sociais (ARS), na perspectiva de redes de dois</p><p>modos, é mais complexa por apresentar dois tipos distintos de atores. Por</p><p>exemplo, para visualizar as ligações entre postos de saúde e agentes</p><p>comunitários, deparamo-nos com dois tipos de “nós” e a ARS pode mapear</p><p>as relações existentes entre esses conjuntos e apresentá-las. A aplicação da</p><p>ARS em redes de dois modos inclui relações entre diferentes situações e</p><p>grupos sociais. Estudos com esse enfoque não são comuns na literatura</p><p>brasileira.</p><p>Por meio da participação em distintos grupos sociais, o indivíduo cria</p><p>um sistema de coordenadas em que cada novo grupo que constitui, amplia</p><p>seu campo de ação que lhe é peculiar. Quanto maior o número de grupos</p><p>de que um indivíduo participa, maior será a di�culdade de dois indivíduos</p><p>apresentarem a mesma combinação de grupos, ou seja, menor será a</p><p>probabilidade dos círculos se cruzarem em um mesmo ponto (SIMMEL,</p><p>2004).</p><p>A noção de círculo social foi delineada por Kadushin (1966) como um</p><p>importante tipo de entidade social, sem uma lista de adesão formal, regras</p><p>ou liderança. Wasserman e Faust (1994) ressaltam que o círculo social é</p><p>visto pelo autor como uma entidade não observável, que deve ser inferida</p><p>a partir de semelhanças comportamentais entre grupos de indivíduos.</p><p>Uma importante percepção de Kadushin (1996) é que os círculos sociais</p><p>proveem condições para o desenvolvimento de ligações interpessoais.</p><p>Círculos sociais são característicos da sociedade moderna e servem para</p><p>integrar grupos primários aparentemente desconectados dentro de</p><p>sociedades maiores. Essa assertiva é decorrente das re�exões de Kadushin</p><p>(2012) baseadas no conceito de Simmel (2004) de círculos sociais. Um</p><p>círculo social não é um grupo, visto que não tem limites nem uma</p><p>liderança formal. O conceito de círculo social para Kadushin (2012) está,</p><p>obviamente, relacionado ao de mundo pequeno, porque o mundo está</p><p>agrupado em círculos sociais sobrepostos, podendo, conforme sua</p><p>proporção, torná-lo maior ou menor.</p><p>Simmel é amplamente reconhecido como um dos primeiros teóricos a</p><p>discutir as implicações teóricas de a�liações de indivíduos com a</p><p>coletividade – os círculos sociais – ao argumentar que a a�liação a grupos</p><p>múltiplos (por exemplo, família, organizações voluntárias, grupos</p><p>ocupacionais) são fundamentais na de�nição da identidade social. O autor</p><p>a�rma que o indivíduo é determinado socialmente no sentido de que sua</p><p>interação com grupos ocorre em virtude de sua a�liação a esses coletivos</p><p>(WASSERMAN; FAUST, 1994).</p><p>Redes de a�liações são especialmente úteis no estudo de estruturas</p><p>sociais urbanas. Forster e Seidman (apud WASSERMAN; FAUST, 1994)</p><p>observam que, devido ao tamanho e à complexidade das redes, as</p><p>estruturas sociais urbanas não são descritas por cientistas sociais ou</p><p>residentes urbanos exclusivamente em termos de relações diádicas. Assim,</p><p>a maioria dos antropólogos tem reconhecido que um importante</p><p>componente da estrutura urbana surge a partir de coleções de</p><p>subconjuntos que se sobrepõem, tais como associações voluntárias e</p><p>grupos étnicos (WASSERMAN; FAUST, 1994).</p><p>Redes de a�liação diferem em vários aspectos das redes</p><p>sociais de um</p><p>modo. Wasserman e Faust (1994) destacam essas distinções: a) redes de</p><p>a�liação são redes de dois modos, que consistem em um conjunto de atores</p><p>que mantém ligações com um outro conjunto de entidades; b) redes de</p><p>a�liação consistem em subconjuntos de atores, em vez de simples pares de</p><p>atores, ou seja, descrevem as relações entre classes distintas de atores em</p><p>vez de simples ligações entre atores de um mesmo conjunto; c) redes de</p><p>a�liação permitem estudar as redes em perspectiva dupla, de atores e de</p><p>entidades.</p><p>Essas características das redes de a�liações distinguem a análise e a</p><p>interpretação dos dados de redes de dois modos dos dados das redes de um</p><p>modo. As entidades em uma rede de a�liação podem ser de uma grande</p><p>variedade de tipos especí�cos de ocasiões sociais, como, por exemplo,</p><p>clubes sociais em uma comunidade, organizações de tratados para países,</p><p>conselhos de administração das grandes empresas, comitês universitários,</p><p>e assim por diante.</p><p>Em muitos casos, quando dados de dois modos são coletados, o</p><p>interesse de análise é focado em redes de um modo. Pode ocorrer que</p><p>nenhum modo domine o foco de análise do pesquisador, e o interesse</p><p>principal esteja na correspondência de um modo para o outro. Borgatti</p><p>(2009) refere-se a esse contexto com o exemplo: uma universidade pode</p><p>pedir a sua faculdade que identi�que os cursos que prefere ensinar. Nesse</p><p>exemplo, o foco está na atribuição ideal de pessoas para com os cursos de</p><p>interesse, e não em compreender como professores estão relacionados uns</p><p>com os outros por meio de cursos nem em como os cursos estão</p><p>relacionados por intermédio da faculdade. No caso das relações sociais, os</p><p>dados que são coletados são atributos da relação, não da relação em si, por</p><p>exemplo, para o caso de relação de amizade. Pesquisadores podem estudar</p><p>a força dessa ligação, a duração, a razão de existir etc. (BORGATTI;</p><p>EVERETT, 1997).</p><p>O que de�ne a forma de análise de uma rede, se de um ou de dois</p><p>modos, é o objetivo da pesquisa. Se, por exemplo, coletarmos as ligações</p><p>românticas entre um grupo de pessoas de ambos os sexos, poderíamos</p><p>desenvolver uma análise a partir de uma matriz de dois modos. Se uma</p><p>ligação romântica for observada entre um homem i e uma mulher j, então</p><p>xij = 1, caso não xij = 0. Ou podemos construir uma matriz de um modo</p><p>em que as relações são indicadas pessoa-a-pessoa, também constituídas de</p><p>1s e 0s, na qual os 1s só ocorrem em células nas quais a linha e a coluna</p><p>correspondem a pessoas de sexo diferentes. O uso da matriz de homens</p><p>por mulheres indica que as relações do mesmo sexo eram impossíveis,</p><p>enquanto o uso da matriz de pessoa por pessoa sugere que as relações do</p><p>mesmo sexo podem ser, logicamente, possíveis, mesmo se não forem</p><p>observadas (BORGATTI, 2009).</p><p>Ambas as matrizes de dados – de um e de dois modos – podem ser</p><p>descritas como tendo duas dimensões ou formas, o que signi�ca</p><p>simplesmente que elas têm mais de que uma linha e mais de uma coluna. O</p><p>número de formas em uma matriz é apenas o número de índices</p><p>necessários para identi�car cada dado individual. Os conjuntos de dados</p><p>diferem do conjunto de dados tradicional, e os dois índices se referem a</p><p>dois diferentes conjuntos de entidades, pessoas e atributos. Assim, um</p><p>metodólogo pode descrever a ciência social tradicional como o estudo de</p><p>matrizes de duas formas e dois modos. Em contraste, no conjunto de</p><p>dados de rede de um modo, ambos os índices referem-se ao mesmo</p><p>conjunto de entidades ou pessoas. Nesse caso, o metodólogo poderia</p><p>descrever a análise de redes como o estudo que contém matrizes de duas</p><p>formas e um modo (BORGATTI; EVERETT, 1997).</p><p>PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS</p><p>A abordagem metodológica apresentada neste capítulo para analisar os</p><p>dados da rede de dois modos está fundamentada em Borgatti e Everett</p><p>(1997) no contexto da Análise de Rede Sociais (ARS). Esse método é mais</p><p>comumente aplicado em estudos de matrizes de um modo. Sua aplicação</p><p>em estudos de dois modos introduz uma série de desa�os, em particular, a</p><p>representação grá�ca da análise de correspondência entre dois conjuntos</p><p>distintos – pessoas e entidades.</p><p>A pesquisa empírica foi ambientada na Fiocruz, Rio de Janeiro,</p><p>instituto de pesquisa ligado ao Ministério da Saúde do qual foram</p><p>selecionados pesquisadores de quatro unidades de pesquisa para compor o</p><p>objeto empírico da pesquisa. No recorte deste capítulo, analisamos apenas</p><p>a parte dos dados coletados para o projeto pertinentes a redes sociais,</p><p>especi�camente as redes de dois modos, sendo um conjunto formado pelos</p><p>pesquisadores e o outro pelas principais instituições com as quais os</p><p>pesquisadores mantêm contatos em função de suas atividades de pesquisa.</p><p>Os dados primários utilizados neste capítulo são oriundos de</p><p>entrevistas e análise dos currículos Lattes/CNPq/MCTI de dezesseis</p><p>pesquisadores que pertencem a quatro diferentes grupos ou unidades de</p><p>pesquisa da Fiocruz:</p><p>Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli</p><p>(Claves) da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP)</p><p>A seleção do Claves para participar deste estudo deve-se ao tipo</p><p>de pesquisa que realiza, ou seja, estratégica, e por fornecer</p><p>indicadores para as políticas de saúde e, assim, tratar de uma</p><p>temática que aproxima os grupos de pesquisadores de situações</p><p>dramáticas de violência, o que gera grande envolvimento e</p><p>expectativa nas populações estudadas. Essas características</p><p>con�guram um grupo de pesquisadores que se aproxima de</p><p>diferentes setores sociais e do Estado. Três pesquisadores desse</p><p>Centro participaram deste estudo.</p><p>Instituto de Comunicação e Informação Cientí�ca e Tecnológica em</p><p>Saúde (ICICT)</p><p>O ICICT foi selecionado para ser a unidade responsável pela</p><p>sistematização da pluralidade de temas, enfoques e questões de</p><p>saúde que preenchem as agendas de pesquisa de uma instituição</p><p>como a Fiocruz, além do seu papel de destaque na produção de</p><p>conhecimentos e informações que incluem desde a pesquisa</p><p>básica até as aplicações dos conhecimentos nas políticas e na</p><p>assistência à saúde, nos processos educacionais e informativos</p><p>das campanhas de saúde, con�gurando um amplo espectro de</p><p>demandas e ações comunicacionais e informacionais. Seis</p><p>pesquisadores do ICICT participaram deste estudo.</p><p>Museu da Vida, Casa de Oswaldo Cruz (COC)</p><p>A seleção desse museu se deu por ser uma unidade que reúne</p><p>elementos de cultura, educação e divulgação cientí�ca em Saúde,</p><p>propícios a uma das facetas da análise interpretativa da</p><p>construção de redes sociais de conhecimentos/informações para</p><p>o público ampliado. Desse grupo, foram entrevistados três</p><p>pesquisadores.</p><p>Ouvidoria Coletiva em Saúde da ENSP</p><p>A escolha desse grupo se justi�ca seu interesse em dialogar,</p><p>sistematizar e organizar informações da população sobre as suas</p><p>condições de saúde, de modo a amparar os serviços de</p><p>atendimento e as políticas públicas de saúde, na perspectiva de</p><p>uma construção compartilhada de conhecimentos. Quatro</p><p>pesquisadores dessa unidade participaram deste estudo.</p><p>Os dados de interesse nos grupos estudados constituem-se pelas</p><p>ligações dos pesquisadores com distintas categorias de instituições do</p><p>Brasil e do exterior. Em outras palavras, a motivação desse estudo está na</p><p>exploração das redes de dois modos por meio da identi�cação das ligações</p><p>de a�liação de pesquisadores com categorias institucionais diversas para,</p><p>desse modo, reconhecer a diversidade e amplitude das relações presentes</p><p>no contexto dos quatro grupos/unidades aos quais se vinculam os</p><p>pesquisadores.</p><p>REDES DE DOIS MODOS: RESULTADOS DA PESQUISA</p><p>Os pesquisadores entrevistados indicaram as instituições, no Brasil</p><p>e/ou no exterior, com as quais mantiveram contatos nos últimos anos, em</p><p>função do seu trabalho de pesquisa. Excetuando as unidades da Fiocruz,</p><p>foram indicadas 67 instituições. Das indicadas, 18 instituições são do</p><p>exterior. Sete pesquisadores não citaram instituições no exterior, e um não</p><p>mencionou instituições brasileiras.</p><p>Categorizamos</p><p>“abrir o frigidaire” ou “colar um post it”. Mas esse processo assume uma</p><p>face peculiar, porque quali�ca entidades que se colocam como um universo</p><p>e não somente como uma ferramenta: estar no Facebook representa uma</p><p>forma de vida diferente de criar um sítio de internet, por exemplo. A</p><p>singularização também resulta paradoxalmente na indistinção, uma vez</p><p>que é muito difícil saber se o que é designado pela classe genérica “redes</p><p>sociais” é um aparelho técnico, um suporte, um protocolo de troca, um</p><p>coletivo ou uma cultura. É a forma especí�ca que assume a ideia de uma</p><p>relação privilegiada entre uma ferramenta, uma forma midiática e uma</p><p>cultura, uma “midiagenia” (fr.: “médiagénie”) particular de�nida como “o</p><p>encontro entre uma mídia e um tipo de discurso, de escrita e/ou de edição,</p><p>a primeira estando especialmente bem adaptada à comunicação do</p><p>segundo” (AÏM, 2006, p. 35). É assim que se assiste, de certa maneira, à</p><p>promoção de uma ferramenta à categoria de mídia e até mesmo de cultura</p><p>midiática. Sabe-se que os objetos mais diversi�cados são hoje considerados</p><p>como mídias (PATRIN-LECLERE, 2005); esse “tornar-se mídia’ refere-se</p><p>habitualmente a um processo de metaforização que faz da cidade, da loja</p><p>ou da empresa uma mídia (BERTHELOT, 2005). Nesse caso, é por</p><p>metonímia que uma panóplia documentária vem ocupar o lugar de toda</p><p>uma cultura midiática. É desse modo que, no discurso dos atores, as “redes</p><p>sociais” são colocadas em paralelo não com um outro sítio, mas com a</p><p>própria internet, como quando um entrevistado declara, por exemplo: “eu</p><p>não vou na internet, estou no Facebook”.</p><p>Os estudos sobre a escrita digital compreendem uma observação</p><p>etnográ�ca das práticas de leitura-escrita que começam frequentemente</p><p>por um olhar distanciado a respeito das telas dos monitores. Desde que o</p><p>acesso à rede se difundiu socialmente, no �m dos anos 1990, o observador</p><p>que entrasse em uma sala de consulta via telas muito diferentes que, de</p><p>longe, manifestavam claramente modalidades e níveis de apropriação de</p><p>hipertexto e de gra�smo muito diferenciados. Quando os programas de</p><p>edição corrente (CMS, “gestores de conteúdo”) apareceram, a generalização</p><p>de certas diagramações, livremente inspiradas na primeira página dos</p><p>jornais, denunciava certo mimetismo das escritas, compensado pela</p><p>heterogeneidade das estéticas grá�cas. Embora o fenômeno pareça recuar</p><p>atualmente, há dois ou três anos era possível entrar em uma sala de</p><p>computadores e ver em todo lugar a tela branca povoada de miniaturas,</p><p>como se fosse natural instalar-se diante do computador para ir ao</p><p>Facebook. Então, como se viu, trata-se de uma marca muito particular,</p><p>uma vez que ela encarna, ao mesmo tempo, uma mídia, um tipo de</p><p>ferramenta, um modo de comunicação e um espaço de encontro.</p><p>A indiscernibilidade crescente dos níveis de mediação não é, aliás,</p><p>exclusiva dessa ferramenta – muito menos do que alguns chamam de</p><p>“microblogging” –; ela caracteriza de modo bem mais geral uma cultura</p><p>atual da tela. Pensar em conjunto os discursos que anunciam essa</p><p>novidade e a engenharia dos dispositivos que lhe dão corpo esclarece a</p><p>dialética entre a autonomia crescente das ferramentas-marca e o caráter</p><p>indiscernível das categorias de mediação. O laço que une inovadores</p><p>tecnoindustriais, militantes da experimentação social e jornalistas em</p><p>busca de atualidade explica a necessidade de reativar constantemente um</p><p>imaginário recorrente de valor mítico no ritmo do aparecimento de novos</p><p>produtos. Nesse contexto, prolifera um léxico que tem como</p><p>particularidade autorizar um deslocamento metonímico constante entre</p><p>substrato material, escritas, usos e lógicas sociais.</p><p>Voltemos nossa atenção à formula “redes sociais”. Primeira observação:</p><p>essa fórmula é constituída de entidades muito conhecidas, pouquíssimo</p><p>inovadoras e que podem até mesmo ser consideradas como tautológicas. A</p><p>internet é uma rede de redes; a comunicação é um fato social. Sob esse</p><p>aspecto, a fórmula “redes sociais”, pressupondo a existência de uma</p><p>realidade não de�nida, é um desvio do que fez o sucesso da “sociedade da</p><p>informação” (LABELLE, 2001); do mesmo modo que todas as sociedades</p><p>repousam sobre as práticas infocomunicacionais, as redes sociais não são</p><p>mais redes do que a Web e não são mais sociais do que qualquer outra</p><p>produção midiática. Trata-se de uma “inscrição �xa que desempenha um</p><p>papel na a�rmação de um ser particular, essa nova sociedade ao mesmo</p><p>tempo evidente e fugaz” (LABELLE, 2011, p. 37). A polissemia do termo</p><p>“rede” (que designa objetos muito diferentes, desde um protocolo de</p><p>informática a relações de in�uência) e sua polivalência (que pode servir</p><p>para qualquer coisa, da troca de saberes às práticas ma�osas) são</p><p>conhecidas de longa data, notadamente sua aptidão em colocar, em um</p><p>mesmo plano, a técnica, a linguagem e a sociedade (SOUCHIER;</p><p>JEANNERET; LE MAREC, 2003). Essa última aparece de modo excepcional</p><p>em contextos sociopolíticos como o do Brasil, em que a fórmula (Redes</p><p>sociais) assume uma força cultural e militante especí�ca (MARTELETO;</p><p>THIESEN, 2008; COUZINET; COURBIERES, 2011). No campo da</p><p>engenharia dos dispositivos informatizados, o adjetivo “social” conhece</p><p>hoje, nesse espaço de discurso, uma usura (uma catacrese) que traduz a</p><p>promoção, em diferentes esferas sociais e econômicas, da tecnologia de</p><p>bases compartilhadas: indexação social, curation sociale (social media</p><p>curation), livro social, televisão social. Porém, o termo não perde sua força</p><p>simbólica, já que pode se encontrar associado, e até mesmo colocado em</p><p>equivalência, a categorias extremamente pesadas do pensamento �losó�co</p><p>e antropológico, como a “comunidade”. A fabricação de plataformas de</p><p>troca documentária simpli�cada cita todas as representações do coletivo,</p><p>da e�ciência do funcional à transcendência do identitário.</p><p>UM DISPOSITIVO INFOCOMUNICACIONAL QUE NÃO DIZ</p><p>SEU NOME</p><p>Para resumir, o quadro bastante esquemático esboçado anteriormente</p><p>convida a recolocar a chegada dos dispositivos intitulados “redes sociais”</p><p>em uma perspectiva extensa e a considerá-los um momento de várias</p><p>dinâmicas sociais: engenharia das formas midiáticas, vida dos imaginários</p><p>sociais, desenvolvimento das formas de troca social, emergência de</p><p>personagens do coletivo. Todos esses fenômenos fazem referência a uma</p><p>temporalidade mais longa que seu próprio aparecimento. Mas um exame</p><p>atento dos dispositivos infocomunicacionais (COUZINET, 2009) em sua</p><p>materialidade observável é indispensável, à medida que todo esse universo</p><p>de práticas, de representações e de formas de vida está associado,</p><p>primeiramente, ao uso difundido desses dispositivos.</p><p>Nesse caso ou em qualquer outro, privilegiar uma abordagem</p><p>comunicacional implica encarar o dispositivo em suas formas e conteúdos,</p><p>nos “meios que ele emprega e nos mecanismos que asseguram seu</p><p>funcionamento”3 (COUZINET, 2009, p. 20). Entretanto, como se viu, não</p><p>é a ideia de “rede social” que pode nos ajudar a identi�car o modo de</p><p>funcionamento desses dispositivos. É preciso tentar discernir uma</p><p>pragmática comunicacional para saber se, para além da reiteração de</p><p>motivos sociais em longo prazo, eles podem contribuir para deslocar as</p><p>práticas. Em uma análise, constatar-se-á que esses deslocamentos são</p><p>signi�cativos, ou até mesmo decisivos. O fato de tais inovações estarem</p><p>rodeadas por uma espécie de ecossistema ideológico não signi�ca que sua</p><p>chegada não afete realmente os diferentes planos de realidade antes</p><p>evocados: materialidade das trocas, natureza das linguagens, orientação</p><p>dos discursos, dinâmica das socializações. Entretanto, para compreender</p><p>de que modo isso acontece, é preciso distinguir os planos de mediação que</p><p>foram integrados até aqui e, antes, olhar atentamente em que consistem os</p><p>dispositivos por si mesmos e, assim, relacionar deliberadamente o estudo</p><p>preciso das mediações escritas da informação com a emergência de novas</p><p>de�nições da identidade individual e social (GOMEZ-MEJIA, 2011),</p><p>inserindo-as na perspectiva</p><p>as 67 instituições, denominadas a partir de agora por</p><p>entidades sociais, em dois grupos – Brasil e Exterior –, conforme os</p><p>pesquisadores indicaram (Quadro 1). Para a categorização, levamos em</p><p>consideração o tipo de instituição (universidades, institutos de pesquisa e</p><p>órgãos governamentais, além de museus) e sua vinculação – pública ou</p><p>privada.</p><p>Quadro 1: Categorias das Entidades Sociais Indicadas</p><p>Código4 Categorias – Entidades Sociais no Exterior No. Indicações</p><p>E1 Institutos Europeus 03</p><p>E2 Institutos Americanos 05</p><p>E3 Organizações Internacionais 03</p><p>E4 Universidades Europeias 03</p><p>E5 Universidades Americanas 04</p><p>Código Categorias – Entidades Sociais no Brasil No. Indicações</p><p>E6 Universidades Federais 14</p><p>E7 Universidades Estaduais 06</p><p>E8 Universidades Privadas 02</p><p>E9 Ensino Fundamental e Médio 01</p><p>E10 Museus 02</p><p>E11 Institutos de Pesquisa 18</p><p>E12 Ministérios da Presidência da República 04</p><p>E13 Secretarias da Presidência da República 01</p><p>E14 Secretaria de Estado 01</p><p>Fonte: Elaborado pelas autoras.</p><p>Os pesquisados mantêm contato com 18 organizações no exterior,</p><p>sendo que a maior incidência dos contatos é com as universidades</p><p>americanas – quatro ligações. Observamos que sete pesquisadores não</p><p>indicaram vínculos cientí�cos no exterior e nove estabeleceram e mantêm</p><p>esse tipo de ligação.</p><p>Das 49 entidades brasileiras indicadas, a maior incidência está nos</p><p>institutos de pesquisa – mesma categoria da Fiocruz, instituto de origem</p><p>dos pesquisadores participantes da pesquisa. Observamos que os contatos</p><p>com as entidades federais são em maior quantidade, quando comparadas</p><p>às entidades estaduais.</p><p>Os dados primários de interesse da rede são representados pela</p><p>a�liação do pesquisador a categorias de entidades sociais. Essa a�liação</p><p>está apresentada no quadro 2 por uma matriz de dois modos que</p><p>demonstra o número de entidades sociais às quais os pesquisadores (P1 a</p><p>P16) estão a�liados. As categorias de entidades estão representadas de E1</p><p>a E14, conforme indenti�cadas no quadro 1.</p><p>Quadro 2: Relação entre Pesquisadores e Categorias de Entidades Sociais</p><p>E1 E2 E3 E4 E5 E6 E7 E8 E9 E10 E11 E12 E13 E14</p><p>P1 0 0 0 1 0 1 1 0 0 0 2 0 0 0</p><p>P2 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0</p><p>P3 0 1 0 1 0 1 0 0 0 0 2 0 0 0</p><p>P4 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0</p><p>P5 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0</p><p>P6 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0</p><p>P7 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0</p><p>P8 0 0 0 0 0 1 1 1 0 0 1 0 0 0</p><p>P9 0 0 0 0 0 5 1 0 0 0 2 0 0 0</p><p>P10 1 1 0 0 1 1 0 1 0 0 0 0 0 0</p><p>P11 0 2 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0</p><p>P12 0 0 0 0 0 2 1 0 0 0 0 0 0 0</p><p>P13 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 2 3 1 0</p><p>P14 1 1 0 0 0 0 0 0 0 1 3 1 0 0</p><p>P15 1 0 1 0 0 0 0 0 1 1 5 0 0 1</p><p>P16 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 1 0 0 0</p><p>Fonte: Elaborado pelas autoras.</p><p>A maior incidência de contatos no exterior por pesquisadores, na rede</p><p>estudada, é de três organizações. Ou seja, por meio de dois pesquisadores</p><p>(P10 e P11), é possível o contato com seis organizações no exterior; cada</p><p>pesquisador mantêm três contatos – tanto na Europa quanto nos EUA.</p><p>Os atores P9 e P15 são os que estão a�liados ao maior número de</p><p>instituições de uma mesma categoria de entidades sociais. O P9 está</p><p>a�liado a cinco universidades federais, e o P15 está a�liado a cinco</p><p>institutos de pesquisas distintos.</p><p>Parâmetros de Análise</p><p>Uma importante propriedade das redes de a�liações é a dualidade do</p><p>relacionamento entre atores e entidades. O termo dualidade é empregado</p><p>em múltiplas formas para se referir ao relacionamento complementar</p><p>entre dois tipos de entidades. Entretanto, a dualidade em redes de a�liação</p><p>refere-se especi�camente à perspectiva pela qual cada ator está ligado</p><p>(indiretamente) a um outro ator por sua a�liação com entidades e, ao</p><p>mesmo tempo, esses atores estão ligados a entidades das quais são</p><p>membros. Wasserman e Faust (1994) destacam que há duas formas</p><p>complementares para estudar uma rede de a�liação: atores ligados por</p><p>entidades sociais ou entidades ligadas por atores.</p><p>A dualidade em uma rede de a�liação signi�ca, para Wasserman e Faust</p><p>(1994), que se pode estudar as relações entre os atores ou as ligações entre</p><p>as entidades sociais ou ambos. Por exemplo, na análise de dados de um</p><p>modo, o foco está nas relações entre atores, diferentemente, na análise de</p><p>dois modos, quando dois atores têm uma ligação (entre eles), signi�ca que</p><p>ambos estão �liados a uma mesma entidade social. Duas entidades têm</p><p>uma ligação se um ou mais atores estiverem a�liados com ambas</p><p>entidades.</p><p>A estratégia de análise de dois modos emprega a dualidade de pessoas e</p><p>entidades sociais. Neste estudo, as pessoas são representadas por</p><p>pesquisadores da Fiocruz; e as entidades sociais, por categorias</p><p>institucionais. A dualidade de pessoas e grupos foi conceituada,</p><p>inicialmente, por Breiger (1974) como uma relação mutuamente</p><p>constitutiva entre elementos de dois conjuntos distintos, no caso deste</p><p>capítulo, pesquisadores e categorias institucionais.</p><p>A �gura 164 apresenta a dualidade entre pesquisadores e categorias de</p><p>entidades sociais por meio de um grá�co bipartido, em que os nós em</p><p>cinza (quadrados) representam as categorias de entidades sociais e os em</p><p>preto (círculos) representam os pesquisadores. A �gura permite a</p><p>identi�cação visual da estrutura das relações sociais na rede, na qual</p><p>podemos observar que as entidades sociais do exterior, categorizadas por</p><p>E1 a E5, estão integradas à rede por 13 ligações com pesquisadores, sendo</p><p>que, dessas ligações, quatro são com institutos americanos. Das relações</p><p>mantidas com entidades sociais nacionais, as universidades federais</p><p>(representadas por E6) são as que mais são solicitadas para trocas e</p><p>compartilhamento.</p><p>Figura 1: Grá�co bipartido – pesquisadores e categorias de entidades</p><p>sociais</p><p>Fonte: Elaborado pelas autoras.</p><p>Distância Geodésica</p><p>A distância geodésica – menor distância entre dois pontos – constitui-</p><p>se na quantidade de ligações – graus – pelos quais uma informação passa</p><p>por um ator até atingir um outro. Neste estudo, a distância geodésica foi</p><p>calculada entre todos os atores da matriz bipartida (os dois conjuntos de</p><p>dados – pesquisadores e categorias de entidades sociais), ou seja, foram</p><p>considerados os dados de dois modos. A distância geodésica entre os</p><p>pesquisadores (e entre as categorias de entidades sociais) não pode ser</p><p>menor que dois, isso em virtude de pesquisadores não estarem</p><p>diretamente conectados a outros pesquisadores. O mesmo acontece com as</p><p>categorias de entidades sociais.</p><p>Quadro 3: Distância Geodésica</p><p>Fonte: Elaborado pelas autoras.</p><p>Observamos no quadro 3 que a menor distância entre os pesquisadores</p><p>(de P1 a P16) é de dois graus e a maior é de seis graus. Na rede de dois</p><p>modos, a menor distância entre atores de um mesmo conjunto é sempre</p><p>dois, isso em virtude de os atores não estarem ligados diretamente (o que</p><p>impossibilita a menor distância ser de um grau – contato direto). As</p><p>ligações entre atores, nas redes de dois modos, são sempre intermediadas</p><p>por uma entidade social. Os mesmos argumentos se aplicam às ligações</p><p>entre as entidades sociais. A menor distância entre elas, neste estudo, é de</p><p>dois graus e a maior é de quatro graus. Em outras palavras, podemos dizer</p><p>que, por intermédio de pesquisadores, as entidades sociais detêm ligações</p><p>indiretas entre si.</p><p>Entre os pesquisadores (P1 a P16) e as entidades sociais (E1 a E14), a</p><p>distância geodésica é de um a cinco graus de separação. Todos os</p><p>pesquisadores podem entrar em contato com as entidades sociais por meio</p><p>de suas ligações na rede, diretas e indiretas.</p><p>Para o cálculo da distância geodésica, foi necessário transformar a</p><p>matriz de dois modos em uma matriz de um modo. Enquanto a maioria</p><p>das medidas de rede são de�nidas para redes de um modo, redes de dois</p><p>modos têm, muitas vezes, que ser projetadas em redes de um modo para</p><p>serem analisadas (OPSAHL, 2013). Isso porque poucos são os</p><p>métodos/aplicações para estudar atores e entidades simultaneamente.</p><p>Métodos para o estudo de redes de a�liação de dois modos são bem menos</p><p>desenvolvidos do que os métodos para o estudo de redes de um modo.</p><p>Transformar</p><p>redes de dois modos em redes de um modo para análise é</p><p>naturalmente relevante, uma vez que essas projeções em estudo fazem</p><p>sentido e também codi�cam muita informação. Além disso, permitem, no</p><p>estudo de redes de dois modos, o uso de poderosas ferramentas e noções</p><p>clássicas previstas nas redes de um modo. Latapy, Magnien e Del Vecchio</p><p>(2008) argumentam que, na maioria dos casos, há um ganho signi�cativo</p><p>quando se considera a versão de dados bipartida e justi�cam as principais</p><p>razões para isso:</p><p>existe muita informação na estrutura bipartida que pode</p><p>desaparecer após a projeção (de dois modos para um modo).</p><p>Como no caso deste estudo, o fato de dois pesquisadores</p><p>trabalharem juntos em um instituto de pesquisa os coloca em</p><p>contato com as mesmas informações, que podem não estar</p><p>disponíveis na rede analisada por este estudo;</p><p>algumas propriedades podem ser perdidas no processo de</p><p>projeção. Por exemplo, ao considerar a projeção de um grá�co</p><p>bipartido, observa-se coe�cientes de agrupamento. Portanto, os</p><p>coe�cientes de agrupamento elevados em projeções não podem</p><p>ser vistos como propriedades signi�cativas. Da mesma forma, a</p><p>projeção pode conduzir a redes muito densas, mesmo que a</p><p>versão bipartida não seja densa.</p><p>Densidade</p><p>A densidade é a medida que possibilita a identi�cação do número de</p><p>ligações presentes em uma rede em relação a todas as ligações possíveis</p><p>entre os atores dessa rede. Borgatti e Everetti (1997) destacam que a</p><p>densidade é um dos mais básicos atributos das redes sociais.</p><p>Os autores a�rmam, ainda, que nas redes bipartidas esses</p><p>denominadores padrões não são adequados para explicar dados de dois</p><p>modos, uma vez que, na análise desses dados, as ligações entre um mesmo</p><p>conjunto de atores não são possíveis. Nas redes de a�liação, o número</p><p>máximo de ligações possíveis ocorre quando todos os vértices de um</p><p>conjunto estão ligados a cada um dos vértices do outro conjunto. Nessa</p><p>perspectiva, a densidade da rede analisada é de aproximadamente 21%, ou</p><p>seja, apenas 21% das ligações possíveis estão presentes na rede.</p><p>Subgrupos – Facção</p><p>Os métodos para a identi�cação de grupos em redes de dois modos</p><p>ainda não foram adequados para a análise de grá�cos bipartidos. Por</p><p>exemplo, as redes de dois modos não contêm cliques, a�rmam Luce e Perry</p><p>(apud BORGATTI; EVERETTI, 1997). Um dos problemas, ressaltam</p><p>Borgatti e Everetti (1997), para a identi�cação de grupos em grá�cos</p><p>bipartidos é que todos os nós do mesmo tipo estão a pelo menos duas</p><p>ligações de distância, enquanto nós de diferentes tipos podem ser</p><p>adjacentes, como, por exemplo, neste estudo, em que alguns pesquisadores</p><p>e as categorias de entidades sociais aos quais estão ligados estão em</p><p>posições de adjacência, como E6 e P1.</p><p>Borgatti e Everetti (1997) descrevem uma abordagem alternativa para</p><p>encontrar subgrupos, baseada na modelagem de blocos e na técnica</p><p>tradicional de cluster – rotina de facção disponível no Ucinet. A modelagem</p><p>de blocos é um particionamento das células de uma matriz em blocos, a</p><p>qual é induzida pela separação das linhas e colunas em classes, e a</p><p>classi�cação da matriz ocorre de tal forma que as linhas (e colunas)</p><p>pertencentes à mesma classe são próximas umas das outras (BORGATTI,</p><p>2009).</p><p>O agrupamento de atores, na rede, que têm relações similares – maior</p><p>coesão – é denominado de facção. Esse recurso possibilita a identi�cação</p><p>de subgrupos dentro da rede.</p><p>Figura 2: Facções na rede</p><p>Fonte: Elaborado pelas autoras.</p><p>Observamos, na �gura 2, quatro grupos. O grupo mais coeso é formado</p><p>por 12 pesquisadores e quatro categorias de entidades sociais (a). Nesse</p><p>grupo, estão as categorias de instituições que receberam o maior número</p><p>de indicações. O maior grupo, formado por 10 categorias de entidades</p><p>sociais e 12 pesquisadores (b), possui apenas seis ligações entre seus</p><p>membros, o que denota o baixo índice no �uxo de comunicação e</p><p>informação. No grupo em que participam quatro pesquisadores e 10</p><p>categorias de entidades sociais (d), 15 ligações estão presentes, porém,</p><p>cada categoria de entidades recebeu, no máximo, três indicações.</p><p>A �gura 3 demonstra o grupo mais coeso da rede, formado por</p><p>pesquisadores e categorias de entidades sociais. Esse grupo está</p><p>representado também na �gura 2 no quadro 1.</p><p>Figura 3: Grupo mais coeso</p><p>Fonte: Elaborado pelas autoras.</p><p>As categorias de entidades sociais brasileiras, representadas na �gura</p><p>3, são as mais centrais da rede, ou seja, retratam os tipos de instituições</p><p>com as quais os pesquisadores entrevistados mantêm mais contato em</p><p>função de suas atividades de pesquisa:</p><p>E11 – Institutos de Pesquisa: indicado 18 vezes pelos 16 pesquisadores</p><p>entrevistados; nesse grupo, �gura com seis contatos;</p><p>E6 – Universidades Federais: citadas 14 vezes; nesse grupo, apresenta</p><p>oito ligações;</p><p>E7 – Universidades Estaduais: dispõem de seis conexões na rede, todas</p><p>estão presentes nesse grupo.</p><p>A única categoria de entidade social no exterior presente nesse grupo é</p><p>a E4 (Universidades Europeias). Na rede total, três pesquisadores</p><p>indicaram essas universidades como contatos importantes para suas</p><p>pesquisas. Os três contatos estão presentes nesse grupo. Quatro</p><p>pesquisadores (P1, P3, P8 e P9) desse grupo indicaram três instituições</p><p>com as quais mantêm ligações cientí�cas. O número máximo de ligações</p><p>indicadas na rede total por pesquisadores foi de cinco.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Introduzimos neste capítulo as redes de dois modos, especialmente os</p><p>aspectos conceituais e aplicações básicas. Algumas estratégias foram</p><p>apresentadas para o tratamento de dados de dois modos:</p><p>projeção em dados de um modo – distância geodésica –, a análise de</p><p>dados de um modo é mais desenvolvida do que o tratamento estatístico</p><p>para dados de dois modos;</p><p>recursos para análise de dois modos – matrizes, representação da rede</p><p>em grá�co bipartido, densidade e subgrupos.</p><p>Considerar que a análise de dados de dois modos é um avanço quando</p><p>comparada à análise de um modo é um equívoco. A análise de dois modos é</p><p>mais um recurso para estudar redes sociais. O estudo de redes de a�liação</p><p>pode ser feito junto às redes de um modo ou em separado. O</p><p>desenvolvimento da pesquisa, a aplicação metodológica e os objetivos</p><p>pretendidos são os condutores da forma de análise. Observamos que a</p><p>análise de rede de dois modos está apenas no seu início, embora a evolução</p><p>possa ser identi�cada na literatura cientí�ca, em língua inglesa. Em relação</p><p>à análise de um modo, a de dois modos há ainda muito a evoluir. No Brasil,</p><p>poucas iniciativas foram encontradas com o emprego de análises de dados</p><p>de dois modos.</p><p>Observamos, na análise dos dados de dois modos apresentada, que os</p><p>pesquisadores entrevistados possuem uma rede de contato – em função de</p><p>suas atividades de pesquisa – bem mais desenvolvida no Brasil (cerca de</p><p>73%) do que no exterior. No Brasil, a rede alcança as regiões em que a</p><p>pesquisa em saúde é mais avançada e as relações com instituições federais</p><p>é mais intensa do que com as estaduais. Aproximadamente 27% das</p><p>ligações mantidas na rede são com instituições no exterior, em especial</p><p>nos EUA e na Europa.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BARNES, J. A. Social networks. Addison-Wesley Module in Anthropology, v. 26, p. 1-29, 1972.</p><p>BORGATTI, S. P. 2-Mode Concepts in Social Network Analysis. In: MEYERS, R. A. (Ed.).</p><p>Encyclopedia of Complexity and System Science. Heidelberg: Springer, 2009.</p><p>______.; EVERETT, M. G. Network analysis of 2-mode data. Social Networks, v. 19, n. 3, p. 243-269,</p><p>1997.</p><p>______.; FREEMAN, L. C. Ucinet for Windows: Software for Social Network Analysis. Harvard:</p><p>Analytic Technologies, 2002.</p><p>BORGATTI, S. P.; HALGIN, D. S. On Network �eory. Organization Science, abr. 2011.</p><p>BORGATTI, S. P. et al. Network Analysis in the Social Sciences. Science, v. 323, n. 5916, p. 892-895,</p><p>2009.</p><p>BREIGER, R. �e Duality of Persons and Groups. Social Forces, v. 53, n. 2, p. 181- 190, dez. 1974.</p><p>BUFREM, L. S. Relações interinstitucionais e autoria em artigos de revistas cientí�cas de Ciência da</p><p>Informação</p><p>no Brasil. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO</p><p>- ENANCIB, 10., 25 a 28 out. 2009, João Pessoa. Anais... João Pessoa, UFPB, 2009.</p><p>FREEMAN, L. C. �e development of social network analysis: a study in the sociology of science. North</p><p>Charleston: BookSurge, 2004.</p><p>KADUSHIN, C. �e friends and supporters of psychotherapy: on social circles in urban life.</p><p>American Sociological Review, v. 31, n. 6, p. 786-802, Dec. 1966.</p><p>______. Understanding social networks: theories, concepts, and �ndings. New York: Oxford</p><p>University Press, 2012.</p><p>LATAPY, M.; MAGNIEN, C.; DEL VECCHIO, N. Basic notions for the analysis of large two-mode</p><p>networks. Social Networks, v. 30, n. 1, p. 31-48, Jan. 2008.</p><p>MANCE, E. A. Revolução das redes: colaboração solidária como uma alternativa pós-capitalista à</p><p>globalização atual. Petrópolis: Vozes, 2000.</p><p>MARTELETO, R. M. Redes e con�gurações de comunicação e informação: construindo um modelo</p><p>interpretativo de análise para o estudo da questão do conhecimento na sociedade. Investigación</p><p>Bibliotecológica, México, v. 14, n. 29, p. 69-94, jul./dic. 2000.</p><p>______. Análise de redes sociais: aplicação nos estudos de transferência da informação. Ciência da</p><p>Informação, v. 30, n. 1, abr. 2001.</p><p>______. Redes sociais, mediação e apropriação de informações: situando campos, objetos e</p><p>conceitos na pesquisa em Ciência da Informação. Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da</p><p>Informação, v. 3, n. 1, p. 27-46, jan./dez. 2010.</p><p>MITCHELL, C. J. Social Networks. Annual Review of Anthropology, Palo Alto, v. 3, p. 279-299, jan.</p><p>1974.</p><p>MIZRUCHI, M. S. Análise de redes sociais: avanços recentes e controvérsias atuais. RAE - Revista de</p><p>Administração de Empresas, v. 46, n. 3, jul./set. 2006.</p><p>OPSAHL, T. Triadic closure in two-mode networks: rede�ning the global and local clustering</p><p>coe�cients. Social Networks, v. 35, n. 2, p. 159-167, 2013.</p><p>SIMMEL, G. O cruzamento de círculos sociais. In: CRUZ, M. B. da (Org.). Teorias Sociológicas: os</p><p>fundadores e os clássicos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 573-578. v. 1.</p><p>WASSERMAN, S.; FAUST, K. Social Network Analysis: Methods and Applications. Cambridge:</p><p>Cambridge University Press, 1994.</p><p>61 Agradecemos a Fundação Araucária – Apoio ao Desenvolvimento Cientí�co e Tecnológico do</p><p>Paraná –, que possibilitou a realização de Estágio Pós-doutoral na Fiocruz, onde foram</p><p>desenvolvidos os estudos de dois modos.</p><p>62 Projeto desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Cultura e Processos Infocomunicacionais</p><p>(Culticom).</p><p>63 <http://www.analytictech.com/ucinet/>.</p><p>64 A �gura foi gerada com o Netdraw, software disponibilizado junto com o Ucinet.</p><p>REDES SOCIAIS COMO NOVO MARCO INTERPRETATIVO</p><p>DAS MOBILIZAÇÕES COLETIVAS CONTEMPORÂNEAS:</p><p>OUTRAS PERSPECTIVAS</p><p>65</p><p>Paulo Henrique Martins</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Os rumos dos movimentos e mobilizações sociais e culturais na</p><p>contemporaneidade assinalam a debilitação dos antigos marcos teóricos</p><p>positivistas, os quais subordinavam a constituição das práticas identitárias</p><p>a certos conteúdos substantivos, como o da economia, que continua a ser</p><p>particularmente valorizado. As mudanças recentes produzidas pelos</p><p>processos de desterritorialização e reterritorialização nas sociedades</p><p>complexas (MATO, 2007) impõem novos tipos de atores, de con�itos e de</p><p>mediações, o que contribui para demonstrar que a constituição da</p><p>identidade social, coletiva e individual conhece in�uências mais amplas do</p><p>que as referências substantivas e reducionistas. Os con�itos e acordos</p><p>ultrapassam as esferas sociais, políticas e econômicas e incluem aquelas</p><p>culturais e simbólicas, dando profundidade às lutas por reconhecimento.</p><p>Para Bhabha (2003), o teoricamente inovador e politicamente crucial é a</p><p>necessidade de passar das narrativas originais e singulares (como as de</p><p>classe e gênero) para integrar novas subjetividades produzidas na</p><p>articulação das diferenças culturais, exempli�cadas pelas novas</p><p>orientações sexuais, as novas mobilizações étnicas e feministas, entre</p><p>outras. Há, então, no rastro do declínio da narrativa universalista</p><p>eurocêntrica, o surgimento de uma pluralidade de outras narrativas que se</p><p>abrem para a diversidade e para a complexidade de dispositivos de</p><p>reconhecimento e de organização do sujeito coletivo.</p><p>Essas mudanças teóricas e práticas assinaladas são importantes, pois</p><p>mostram que os movimentos sociais vivem, na atualidade, um processo de</p><p>diferenciação e de deslocamento decisivo, com outras modalidades de</p><p>mobilizações que escapam à hegemonia da lógica da economia e do</p><p>trabalho e do modo de fazer política (com ênfase na geogra�a nacional).</p><p>Tais mobilizações escapam das formas tradicionais de articulação política,</p><p>devido ao surgimento de unidades diversi�cadas e autônomas – os novos</p><p>grupos primários em forma de rede – que dedicam à solidariedade interna</p><p>uma parte importante de seus recursos (MELLUCI, 2001, p. 95). Isso nos</p><p>conduz a rede�nir os movimentos, nas sociedades complexas, como redes</p><p>invisíveis de grupos, de pontos de encontro, de “circuitos de solidariedade,</p><p>que diferem profundamente da imagem do ator coletivo politicamente</p><p>organizado” (MELLUCI, 2001, p. 97). Essas mudanças históricas e</p><p>sociológicas gerais tornam evidente, então, que estamos vivendo a</p><p>emergência de um novo paradigma sociológico,66 necessário para explicar</p><p>a passagem dos movimentos sociais da sociedade moderna para novos</p><p>movimentos sociais das sociedades complexas contemporâneas.67 Esse</p><p>novo paradigma ganhou visibilidade pelo reconhecimento da emergência</p><p>inquestionável das redes sociais, sistemas dinâmicos �exíveis que</p><p>funcionam como novos aparelhos reguladores dos con�itos, tensões e</p><p>acordos entre indivíduos e grupos minoritários.</p><p>A emergência desse novo marco interpretativo ocorre, de maneira</p><p>geral, pela superação do tradicional paradigma holista – que valoriza a</p><p>totalidade social e descuida do indivíduo – e do paradigma individualista –</p><p>que faz o contrário, por outro paradigma, o qual reforça o vínculo social e a</p><p>experiência direta. Há vários autores que se anteciparam na discussão</p><p>desse paradigma do vínculo social e, aqui, podemos lembrar, entre os</p><p>clássicos, Simmel (1999), com a ideia de sociação, ou M. Mauss (2003) com</p><p>a teoria da dádiva ou do dom, que foi sistematizada na sua obra clássica</p><p>Ensaio sobre o dom: forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. Nesse</p><p>texto, vamos apoiar nossas re�exões, sobretudo, nas contribuições de M.</p><p>Mauss, na medida em que o dom é um conceito operacional que nos</p><p>permite desenvolver uma re�exão antiutilitarista das redes sociais,</p><p>resgatando a importância dos aspectos políticos, morais e psicológicos do</p><p>agir humano sobre as diversas modalidades de associação no mundo da</p><p>vida. De fato, há uma relação muito estreita, no nosso entender, entre o</p><p>fenômeno das redes sociais e os sistemas de trocas diretas baseados no</p><p>dar, receber e retribuir o dom,68 que se torna cada vez mais visível nos</p><p>diversos domínios da vida social e cultural. As novas formas de</p><p>solidariedade nas diversas esferas da vida cotidiana, como as da economia</p><p>e da família, da política e da comunidade, revelam a presença dessas novas</p><p>modalidades mais �exíveis de organização de sociabilidades. Como o dom</p><p>é, por sua natureza, o que permite superar a antítese entre o eu e o outro,</p><p>entre obrigação e liberdade, entre utilidade e gratuidade, compreende-se</p><p>facilmente que pensar as redes sociais “de acordo com o dom implica</p><p>aprender a superar a tensão não-resolvida entre os dois grandes</p><p>paradigmas, nos quais se dividem as ciências sociais e boa parte da �loso�a</p><p>moral e política, dada a necessidade de resolver essas oposições” (CAILLÉ,</p><p>2000, p. 12). Pensar a ação social pelo dom signi�ca restaurar as</p><p>experiências de redes das pessoas e dos saberes práticos diversos na</p><p>organização das instituições sociais.</p><p>A tese central deste texto é que a emergência do novo paradigma dos</p><p>movimentos sociais, que é o de redes sociais, materializa-se, assim, pela</p><p>força crescente das relações face a</p><p>face no mundo da vida como respostas</p><p>às mudanças sociais e históricas gerais. Entendemos, no entanto, que o</p><p>reconhecimento mais amplo desse novo paradigma é impedido pela</p><p>presença de estratégias de colonização e de naturalização do fenômeno das</p><p>redes por movimentos intelectuais de inspiração utilitaristas que buscam</p><p>reduzir toda a ação coletiva e individual a motivações egoístas e</p><p>interessadas, como veremos a seguir. Temos uma hipótese que</p><p>gostaríamos de formular sobre as tentativas de captura e de colonização</p><p>das redes com vistas a colapsar sua dimensão social e politicamente</p><p>inovadora. No nosso entender, as tentativas de colonização das teorias de</p><p>redes têm um objetivo pragmático: o de limitar o entendimento do</p><p>fenômeno rede a um dispositivo causal necessário à organização de</p><p>metodologias para investigação do cotidiano e para manutenção de grupos</p><p>de poder dentro do campo cientí�co e articulados com os interesses de</p><p>reorganização dos dispositivos de biopolítica e de controle social. Assim,</p><p>pelas estratégias de recolonização, aquilo que é �m, a transformação dos</p><p>movimentos sociais em redes sociais que aconteceu nas últimas décadas, é</p><p>reinterpretado como um recurso meio, como um conjunto de métodos e</p><p>técnicas de investigação cienti�ca que se con�guram como rede somente</p><p>por causa das novas tecnologias ou por interesse dos pesquisadores em</p><p>organizar métodos algébricos para explicar certos �uxos de trocas nas</p><p>organizações sociais. Pelos dispositivos de colonialidade, perde-se de vista</p><p>a experiência vivida e valoriza-se a idealização da experiência. E a quem</p><p>interessa essa operação? À ciência moderna, que organizou sua</p><p>legitimidade sobre a redução da complexidade da vida humana e do</p><p>biossistema a uma �gura ideal de objeto, tendo esta redução sido</p><p>proporcionada pelo reducionismo cartesiano; ao capitalismo mercantil,</p><p>que se interessa em reduzir os cidadãos a mero consumidores; ao aparato</p><p>estatal autoritário, que interpreta os movimentos sociais e as mobilizações</p><p>coletivas como “caso de polícia”.</p><p>No entanto, as identidades sociais e culturais emergentes na sociedade</p><p>complexa atual são, por sua natureza, um testemunho decisivo contra as</p><p>teorias reducionistas que descartam a importância do sujeito social para</p><p>valorizar teorias individualistas e reducionistas. Não há como abstrair a</p><p>energia social que circula nos novos locais de produção de sociabilidades e</p><p>dizer que as redes são meros recursos metodológicos e tecnológicos.</p><p>Assim, o objetivo central deste artigo é desenvolver uma crítica teórica ao</p><p>colonialismo nas Ciências Sociais por meio da teoria das redes, pois estas</p><p>constituem o lugar de resistência mais efetivo da sociologia crítica e onde o</p><p>saber especializado e o saber comum se encontram como práxis e utopia.</p><p>Como veremos a seguir, a crítica aos processos colonizadores não é fácil,</p><p>pois são várias as vertentes e as interpretações sobre o uso das redes</p><p>sociais no interior do campo das Ciências Sociais, confundindo o</p><p>entendimento de seu caráter inovador. Acreditamos, no entanto, que a</p><p>revisão das teorias sobre as redes sociais pode nos levar a ajudar nos</p><p>esforços de sistematização da sociologia das redes sociais, pois esse campo</p><p>disciplinar é fundamental para que a sociologia possa se mirar mais</p><p>claramente no espelho da mudança social, que é sua razão primeira e</p><p>última de existir como ciência do social.</p><p>REDES SOCIAIS: USOS GERAIS E RECEPÇÃO NA</p><p>SOCIOLOGIA</p><p>O problema da naturalização da noção de redes sociais</p><p>A discussão em torno da pergunta se existe uma sociologia das redes</p><p>sociais e se ela aponta para um novo paradigma sociológico não é recente.</p><p>Já nos anos 1970, Leinhardt (1977) propunha que os estudos sobre redes</p><p>apontavam para um novo paradigma, mas esse debate não avançou muito</p><p>desde então. Silvia Portugal (2007), pensando especi�camente sobre o</p><p>caso do network analysis, propõe que, no sentido kuhniano, falta a esse</p><p>modelo de análise a força que teve o funcionalismo como movimento</p><p>paradigmático. Assim, a autora conclui que, devido à distância em que se</p><p>encontra o campo interno da disciplina de se constituir como teoria</p><p>uni�cada, não se pode falar da emergência de um novo paradigma.</p><p>Apesar de concordarmos com a autora no que diz respeito,</p><p>especi�camente, ao fato de que o network analysis não constitui a base de</p><p>um novo campo de pensamento, acreditamos que a questão continua</p><p>aberta e que é possível defender a perspectiva das redes sociais com base</p><p>em um novo paradigma sociológico. Para isso, temos de considerar dois</p><p>pontos. Um deles tem a ver com o fato de que a teoria social das redes</p><p>constitui um domínio de re�exão muito mais amplo que o do network</p><p>analysis, o qual é apenas um procedimento técnico e prático usado pelas</p><p>teorias utilitaristas para colonizar a realidade social, como veremos mais</p><p>adiante. Em segundo lugar, temos de considerar, na discussão sobre o tema</p><p>no interior das Ciências Sociais e da Sociologia, uma espécie de</p><p>naturalização da noção de redes sociais, que impede o desenvolvimento de</p><p>uma compreensão mais profunda do fenômeno. Isto é, um entendimento</p><p>re�exivo que permita explicitar os fundamentos normativos e expressivos</p><p>das mudanças sócio-históricas que estão na base da manifestação</p><p>fenomênica das redes a partir da segunda metade do século XX. A questão</p><p>da naturalização no campo cientí�co tem a ver com o processo de</p><p>transformação de dogmas históricos e culturais em crenças metafísicas. No</p><p>desenvolvimento da ciência moderna, o principal processo de</p><p>naturalização se deu a partir do culto a uma interpretação etnocêntrica do</p><p>mundo – cuja referência é Descartes –, segundo a qual a natureza se divide</p><p>em duas partes irreconciliáveis: por um lado, a natureza iluminada pela</p><p>razão humana; por outro, a natureza caótica e irracional do mundo não</p><p>humano. Grande parte do trabalho da �loso�a moderna do século XX foi o</p><p>de desconstruir esse entendimento etnocêntrico.69</p><p>A naturalização das redes no interior do campo humanista se realizou</p><p>com duas estratégias: uma delas ao importar o termo dos campos</p><p>discursivos de outras ciências, como a engenharia, sem proceder a uma</p><p>crítica mais sistemática da operação de tradução teórica;70 a segunda foi a</p><p>de adotar um sentido utilitarista de rede nas Ciências Sociais, sem</p><p>considerar que a complexidade da realidade histórica exige a integração de</p><p>um novo marco interpretativo que amplie as motivações dos indivíduos</p><p>pela associação e solidariedade coletiva, para além do simples lucro.</p><p>Quanto à primeira estratégia, deve ser assinalado que, com frequência, os</p><p>pesquisadores sociais se servem da ideia de rede para de�nir, sem maiores</p><p>questionamentos, todo o sistema formado pelo entrelaçamento de</p><p>informações técnicas entre indivíduos e grupos sociais. Pode-se dizer,</p><p>inclusive, que seu uso na engenharia de sistemas marcou sua difusão no</p><p>sentido comum e, como desdobramento, no campo das Ciências Sociais. A</p><p>partir dessa perspectiva, a rede social obedeceria à mesma lógica que todas</p><p>as outras noções correntes de redes nos diversos campos do conhecimento</p><p>e da vida cotidiana (rede óptica, rede de arrasto, rede neural, rede elétrica,</p><p>rede de espionagem, entre outras). Na sociedade contemporânea, a rede</p><p>aparece, como propõe Mance (2001), sob a forma de ideia simples,</p><p>autoevidente, de uso funcional. Tal a�rmação sobre a simplicidade das</p><p>redes, como veremos, não é nada simples. A simplicidade é apenas um</p><p>efeito de óptica, que emerge a partir da adoção de uma forma de</p><p>interpretação funcionalista simpli�cada das redes que contribui para</p><p>camu�ar a complexidade das novas formas de mobilizações coletivas da</p><p>sociedade contemporânea.71</p><p>No que diz respeito à segunda estratégia, a de naturalização da noção</p><p>de rede social produzida pela integração do sentido utilitarista de rede nas</p><p>ciências sociais, observamos que aqui ocorre a identi�cação do sentido de</p><p>rede com uma ideia de lucro material generalizado. Ou seja, o sentido</p><p>utilitarista de rede está muito in�uenciado</p><p>pela valorização de uma moral</p><p>do comportamento humano baseada no cálculo e no interesse, que não</p><p>considera outra compreensão mais solidária, generosa e humanista do</p><p>fenômeno.72 Esse segundo modo de naturalização da noção de rede nos</p><p>parece mais grave, já que contribui para uma crescente desumanização das</p><p>práticas sociais. Ao hipervalorizar a competência egoísta e a privatização</p><p>de riquezas materiais e simbólicas coletivas por indivíduos ou grupos, tal</p><p>abordagem não estimula outros entendimentos que ressaltam a força da</p><p>cooperação e da solidariedade social na organização de novas mobilizações</p><p>coletivas. Nas Ciências Sociais, abordagens como a do individualismo</p><p>metodológico, a da “rational choice” e a da análise institucionalista tendem</p><p>a incorporar a moral utilitarista na análise social de redes. No nosso</p><p>entender, como tentaremos demonstrar neste artigo, tais teorias são</p><p>veículos poderosos para a colonização do mundo das redes sociais</p><p>comunitárias por parte do sistema de pensamento dominante, mais</p><p>conhecido como neoliberalismo.</p><p>As di�culdades de as redes sociais se estabelecerem como um novo</p><p>marco teórico são reveladas, principalmente, “pela negligência com” os</p><p>fundamentos sócio-históricos das redes sociais na contemporaneidade,</p><p>consequência da perpetuação dos mecanismos de neutralização dessa</p><p>noção. E também pela in�uência de uma visão ideológica utilitarista que</p><p>reduz a complexidade dos motivos da prática social em redes a um valor</p><p>moral egoísta e calculista. Esse declínio leva os estudiosos de rede, em</p><p>geral, a esquecerem algo que Melluci (2001) já havia explicado com clareza,</p><p>mas que parece não ter sido devidamente registrado em uma perspectiva</p><p>integral, a saber, que existe uma relação estreita das redes com as novas</p><p>manifestações socioculturais e com os desdobramentos dos movimentos</p><p>sociais nas sociedades complexas.73 Queremos destacar a ideia de</p><p>entendimento integral para chamar a atenção sobre o fato de que a</p><p>legitimação das redes sociais, como um novo paradigma sociológico, exige</p><p>discutir a coerência entre as novas teses teóricas e a complexidade</p><p>crescente da realidade sócio-histórica, que já não pode ser explicada nem</p><p>pelos paradigmas tradicionais holistas – que identi�cam o movimento</p><p>social com totalidades identitárias da classe operária –, nem pelos</p><p>individualistas – que identi�cam o movimento social com as estratégias</p><p>individualistas, como o fazem as teorias colonizadoras que estamos</p><p>interrogando neste texto.</p><p>As evidências no cotidiano constituem um bom ponto de partida para</p><p>que retomemos os caminhos de uma re�exão mais profunda sobre o tema.</p><p>É evidente, por exemplo, o aumento do prestígio que as redes sociais vêm</p><p>ganhando entre os interessados nos debates sociológicos.74Elas</p><p>despertam um sentimento de emergência entre os que estudam a</p><p>emancipação da sociedade civil, a gestão social solidária e a democracia</p><p>participativa. As redes também atraem o interesse crescente dos</p><p>investigadores e dos editores de livros acadêmicos. A ideia de uma</p><p>sociologia relacional fundamentada em redes é estimulante para aqueles</p><p>que desejam superar o dilema sociológico clássico entre estrutura e</p><p>agência. Mas esse interesse teórico-prático pelo tema das redes vem sendo</p><p>neutralizado progressivamente por abordagens que não valorizam a</p><p>atualidade sócio-histórica e normativa do fenômeno. Daí a existência</p><p>atualmente de um processo intelectual orientado para o declínio de seu</p><p>caráter fenomênico e hermenêutico, ao mesmo tempo que se reforça sua</p><p>interpretação utilitarista e formalista, o que, sem dúvida alguma, interfere</p><p>negativamente no entendimento do caráter relacional das redes sociais.</p><p>Finalmente, essas diferentes leituras das redes nas Ciências Sociais não</p><p>contribuem, por conseguinte, para valorizar o caráter inovador da rede</p><p>como marco interpretativo das novas mobilizações sociais e culturais.</p><p>Acreditamos que o fato de se reconhecer a existência de uma produção</p><p>múltipla, inclusive caótica, não deve ser visto como um impedimento</p><p>estrutural para os esforços de sistematização de uma sociologia das redes</p><p>sociais que faça avançar concretamente o entendimento das novas</p><p>mobilizações coletivas em mundos territorializados. Nesse sentido,</p><p>pensamos que é possível avançar, desde que sejamos capazes de indicar os</p><p>aspectos que bloqueiam a discussão. Entre eles, como procuramos</p><p>demonstrar, encontram-se, em primeiro lugar, aqueles estudos que</p><p>destacam o declínio dos fundamentos discursivos, sócio-históricos e</p><p>morais do fenômeno das redes.</p><p>Uma primeira e provisória tentativa de classificar a</p><p>abundância caótica de estudos sobre redes sociais</p><p>Ao analisar a produção acadêmica sobre essa temática no campo</p><p>discursivo ibero-latino-americano, percebem-se alguns traços</p><p>signi�cativos: a) existe uma produção muito rica e diversi�cada sobre redes</p><p>sociais; b) apesar dessa riqueza diversi�cada, a produção se mostra</p><p>fragmentada, como um pensamento abundante e caótico, que impede</p><p>valorar corretamente os avanços efetivos nos estudos da área. Nesse</p><p>sentido, Portugal (2007) tem razão ao a�rmar que a multiplicidade de</p><p>perspectivas diferenciadas impediria a identi�cação de um novo paradigma</p><p>dominante.</p><p>Para que possamos desconstruir tal visão naturalizada das redes e fazer</p><p>a crítica correta do sujeito rede, temos de procurar oferecer um mínimo de</p><p>organização a esse conjunto amplo e diversi�cado de textos sobre o tema,</p><p>os quais apontam, em conjunto, para uma direção clara, aquela que busca</p><p>construir teorias mais complexas para explicar a crescente diferenciação</p><p>social. Tal empresa, certamente, não pode ter pleno êxito dentro dos</p><p>limites de um artigo como este. Mas os esforços de organizar</p><p>minimamente o campo discursivo exigem avançar na crítica teórica. Em</p><p>primeiro lugar, temos de discutir o critério adequado para promover a</p><p>organização do conjunto diversi�cado e caótico de estudos sobre o tema. E</p><p>o critério que consideramos apropriado para tal operação classi�catória</p><p>tem de ser, necessariamente, o da possibilidade de visualizar os níveis de</p><p>desconstrução das noções naturalizadas de redes sociais, tendo como</p><p>ponto de partida o mais simples, isto é, as noções menos elaboradas do</p><p>ponto de vista da discursividade. Com essa classi�cação, acreditamos ser</p><p>possível organizar provisoriamente a crítica antiutilitarista do modelo</p><p>hegemônico que vem in�uindo na qualidade da produção teórica sobre</p><p>redes, demonstrando também que a presença do utilitarismo não revela</p><p>apenas uma luta por signi�cações dentro do campo cientí�co, mas</p><p>manifesta igualmente a presença de um pensamento hegemônico e</p><p>autoritário que vincula a ciência com o imaginário do neoliberalismo.</p><p>Desde já podemos propor, preliminarmente, que a produção ibero-</p><p>latino-americana tende a se localizar em dois níveis de interpretação de</p><p>redes que, como demonstraremos, são insu�cientes por não produzirem</p><p>uma visão integral do fenômeno. Há um primeiro grupo de autores que</p><p>reproduzem, de certo modo, o sentido comum, ou seja, que consideram a</p><p>rede como algo simples: “uma articulação entre diversas unidades que, por</p><p>meio de certas conexões, intercambiam elementos entre si, fortalecendo-se</p><p>reciprocamente e que podem se multiplicar em novas unidades” (MANCE,</p><p>2001, p. 24). Nessa perspectiva, a ideia de redes não conhece maior</p><p>elaboração teórica, e se faz referência a elas principalmente pela sua força</p><p>metafórica, sem uma preocupação em aprofundar suas dimensões</p><p>históricas, culturais e simbólicas. Nesse grupo, estão aqueles que aplicam a</p><p>noção para descrever antigos e novos arranjos de poder (ADLER-</p><p>LOMINTZ, 1994; MACÍAS, 2002); também aqueles que consideram a rede</p><p>como um recurso a priori para descrever as novas mobilizações sociais e</p><p>práticas cotidianas (ALONSO DAVILA, 1992; REQUENA SANTOS, 1994;</p><p>MANCE, 2001; MADARIAGA; ABELLO LLANOS; CIERRA GARCÍA, 2005);</p><p>e os que usam a noção de redes para explicar as transformações das</p><p>organizações e do mundo do trabalho (REQUENA SANTOS, 1991;</p><p>RODRIGUEZ,</p><p>1995; MOLINA, 1995). É possível prolongar essa</p><p>classi�cação para incluir os estudos sobre gênero, etnia, violência, entre</p><p>outros.</p><p>O segundo grupo de autores, diferentemente do primeiro, não usa a</p><p>ideia de rede apenas como metáfora, mas busca teorizá-la com a �nalidade</p><p>de intervir na realidade social. Nesse caso, a ideia de rede se abre mais</p><p>claramente para a inclusão de sistemas funcionais articulados por</p><p>indivíduos e agências humanas, e os estudos teóricos tendem a se inspirar</p><p>em duas grandes linhas de pensamento. Uma delas, que podemos</p><p>denominar como técnico-pragmática (pragmatismo no sentido comum,</p><p>não �losó�co), inclui os autores que veem esses intercâmbios como redes</p><p>sociotécnicas (CALLON, 1989; MUSSO, 2003; LATOUR, 2005; CASTELLS,</p><p>2007). A outra linha, que podemos denominar como utilitarismo</p><p>individualista, abarca aqueles defensores da network analysis, para os quais</p><p>as redes são modalidades de mobilização causal de recursos e informações</p><p>que envolvem indivíduos autônomos – autonomia radical ou parcialmente</p><p>condicionada por estruturas – em torno de objetivos estratégicos e</p><p>interessados (GRANOVETTER, 1983; BOURDIEU, 1999; COLEMAN,</p><p>1990; LIN, 2001; PUTNAM, 2002). As teorias sobre o capital social, o</p><p>individualismo metodológico e a “rational choice”, em uso nos estudos de</p><p>rede na América Latina, se apoiam, em geral, nessa visão mais</p><p>propriamente utilitarista das redes.</p><p>Dependendo do caso, aqui a noção de recursos estratégicos adquire a</p><p>denominação de capital social, ou de cultura cívica. Esse segundo módulo</p><p>de saberes e práticas teve uma ampla aceitação entre aqueles autores de</p><p>língua portuguesa que se interessam pelas políticas públicas e por novas</p><p>modalidades de gestão do Estado e do território geossocial. No Brasil, em</p><p>particular, é signi�cativo o número de autores que utilizam a noção de</p><p>redes sociais com esse �m de plani�cação e intervenção, como, por</p><p>exemplo, Abramovay (2000) na agricultura, Marques (2002) nas políticas</p><p>de saneamento urbano, Fontes (2004) no terceiro setor, e Fleury e</p><p>Duverney (2007)75 nas políticas de saúde. Dentro da produção em língua</p><p>espanhola, há uma maior preocupação com a difusão de textos diversos</p><p>sobre as questões teóricas e metodológicas resultantes da abordagem</p><p>utilitarista e individualista de redes, como vemos em Canals (1991), que</p><p>tem interesse nos conceitos operatórios, Herrero (2000) com problemas de</p><p>de�nição e tradução, Pizarro (2000) e Gil e Schmidt (2002) com os usos de</p><p>rede.</p><p>Essa primeira aproximação, ainda imprecisa, é importante para revelar</p><p>o interesse que o tema das redes vem despertando no interior das Ciências</p><p>Sociais. Isto é, o fenômeno da rede tem claramente uma aceitação ampla e</p><p>crescente no mundo acadêmico e vem conhecendo uma teorização de certo</p><p>modo limitada pela força das argumentações utilitaristas no campo</p><p>humanista.</p><p>Algumas considerações iniciais sobre a crítica antiutilitarista</p><p>das redes sociais</p><p>Para que possamos desenvolver uma crítica antiutilitarista das redes</p><p>sociais, de modo a contribuir para desnaturalizar os usos correntes e</p><p>super�ciais dominantes, temos de centrar nosso enfoque no entendimento</p><p>das redes que promova a dupla hermenêutica lembrada por Santos (1989),</p><p>aquela da suspeita e da recuperação, pela qual não podemos compreender as</p><p>partes sem entender como “trabalha” o todo, e vice-versa. Tais atitudes de</p><p>suspeita e recuperação podem ser visualizadas em dois níveis de</p><p>complexidade teórica: entre o subjetivo e o objetivo, entre o saber</p><p>cientí�co e o saber comum. Uma abordagem racional e dialógica, que</p><p>atenda a tais requisitos paradigmáticos, deve ser capaz de articular os</p><p>motivos e condicionantes intersubjetivos dos sistemas de relação com as</p><p>modalidades objetivas de aparição das formas sociais, procurando</p><p>demonstrar que o plano objetivo está condicionado pelo subjetivo, como a</p><p>água, por exemplo, está condicionada pelas moléculas de oxigênio e</p><p>hidrogênio que a constituem objetivamente como substância líquida.</p><p>A abordagem interacionista que pretendemos desenvolver neste texto,</p><p>a qual valoriza uma perspectiva antiutilitarista, ou seja, aberta à</p><p>articulação do objetivo e do subjetivo, resulta de uma série de estudos que</p><p>avançam nessa direção, feitos de forma explícita, mas tradicionalmente de</p><p>modo discreto por autores como Simmel (1999) e Mauss (2003), e de</p><p>forma declarada por autores como Elias (1994) e Melluci (2001). Esse</p><p>último enfatiza o valor da qualidade dos intercâmbios, não para negar o</p><p>interesse das operações de base quantitativa, mas para evidenciar a força</p><p>do simbolismo e da diversidade de possibilidades intersubjetivas de</p><p>constituição da realidade social.76 Não se trata, deve-se esclarecer, de</p><p>estabelecer uma bipolaridade entre rede objetivada e rede subjetivada, mas</p><p>de superar tal dilema – que é falso – para propor uma visão de redes sociais</p><p>que responda, hermeneuticamente, aos princípios da interação e da</p><p>reciprocidade. Trata-se de abrir a concepção de rede para um</p><p>entendimento complexo que articula o instituído e o instituinte,</p><p>valorizando a in�uência do simbolismo sobre as práticas objetivadas. Tal</p><p>enriquecimento conceitual do uso sociológico de redes, a partir da</p><p>consideração dos elementos intersubjetivos, permite estabelecer as bases</p><p>para a crítica teórica do pensamento monolítico dominante. Essa crítica</p><p>busca demonstrar que tal pensamento é reducionista por articular um</p><p>entendimento fragmentado, funcionalista e individualista da realidade</p><p>social. E essa fragmentação tem um desvio ideológico, por induzir uma</p><p>leitura simpli�cada da prática social e um pensamento único e utilitarista</p><p>sobre as redes. Os resultados dessa crítica são o reconhecimento da</p><p>diversidade de possibilidades de organizações em redes, que podem surgir</p><p>em vários contextos sociais, históricos e culturais, a partir de lógicas</p><p>diversas, causais e não causais, contínuas, mas também descontínuas,</p><p>visíveis e invisíveis, lineares e reticulares.</p><p>Diferentemente das teorias utilitaristas, formadas por conjuntos de</p><p>saberes e práticas que são sistemas relativamente fechados, monitorados e</p><p>organizados a partir de uma lógica de causalidades mecânica e/ou</p><p>funcional, as teorias de redes interativas, na perspectiva antiutilitarista,</p><p>pressupõem a presença de sistemas paradoxais e abertos ao diálogo com</p><p>outros sistemas interativos (dimensão hermenêutica), a vivência dos</p><p>atores sociais (dimensão fenomenológica) e as obrigações coletivas que</p><p>nascem da dívida simbólica entre indivíduos e grupos (dimensão da</p><p>dádiva). O princípio do paradoxo, subjacente na visão interativa de redes,</p><p>permite enfatizar as multideterminações do fato social, a variedade</p><p>contraditória de motivações antropológicas que escapam a qualquer</p><p>racionalidade instrumental, motivações que são, sobretudo, expressivas e</p><p>dialógicas (MARTINS, 2004, p. 25).77</p><p>No plano das instituições humanas, há de se reconhecer que essa</p><p>perspectiva antiutilitarista, aqui adotada, permite revelar o tema das redes</p><p>sociais como se fossem a ponta de um iceberg, que nos mostra os sinais de</p><p>uma grande modi�cação dos formatos de organizações tradicionais e o</p><p>surgimento de formatos abertos a uma nova complexidade técnica,</p><p>cognitiva, emocional e simbólica, que tem como pano de fundo a</p><p>recon�guração dos contextos em que se desenham as relações humanas.</p><p>Os formatos tradicionais eram estruturas piramidais e centralizadas</p><p>em núcleos de poder e de comando, relativamente centralizados e rígidos.</p><p>Na modernidade, eles foram substituídos progressivamente por sistemas</p><p>descentralizados e �exíveis como são as redes.78 E, na atualidade,</p><p>podemos ver claramente que tal processo de diferenciação social, técnica e</p><p>cultural está se aprofundando, exigindo novas mediações políticas</p><p>culturais e organizacionais.</p><p>DIFICULDADES DA SOCIOLOGIA DE REDES PARA FIXAR</p><p>SEU PRÓPRIO CAMPO DE INVESTIGAÇÃO</p><p>O desenvolvimento do campo da sociologia das redes sociais apresenta,</p><p>de imediato, dois desa�os que necessitam ser enfrentados: um,</p><p>conceitual;</p><p>outro, metodológico. O conceitual diz respeito ao entendimento que os</p><p>autores têm a respeito do signi�cado das redes sociais. Aqui, podemos</p><p>fazer uma divisão entre duas tendências: uma, histórico-processual; e</p><p>outra, formalista. A primeira tendência entende as redes sociais como</p><p>fenômeno histórico, resultante da complexa diferenciação social e cultural</p><p>das sociedades complexas. Nesse caso, a experiência social é o fundamento</p><p>ontológico que inspira a transformação da sociologia dos movimentos</p><p>sociais e da sociologia das redes sociais. Essa primeira tendência re�ete</p><p>uma herança antiutilitarista e humanista ampla, a qual de�ne a rede a</p><p>partir de uma pluralidade de motivações, entre as quais o interesse é</p><p>apenas uma das razões que explicam por que as pessoas interagem e</p><p>formam a vida social. Esse pensamento não é hegemônico, contudo, como</p><p>veremos, ele oferece as condições teóricas e metodológicas reais para</p><p>pensar as redes como uma possibilidade de renovação do paradigma</p><p>sociológico.</p><p>A segunda tendência de�ne conceitualmente as redes como</p><p>dispositivos metodológicos arti�ciais criados pelos cientistas sociais para</p><p>mapear circuitos de informações diversos, cuja natureza é de�nida pelo</p><p>interesse de pesquisa. Nessa abordagem, a experiência direta dos atores</p><p>sociais é desconsiderada, sendo mais importante as manipulações grá�cas</p><p>e algébricas realizadas para demonstrar certas hipóteses pré-�xadas. Esse</p><p>segundo grupo se �lia à tradição da �loso�a utilitarista, segundo a qual</p><p>todos os indivíduos são, por essência, egoístas, e o �m da vida social é</p><p>atender a essas demandas individuais ou de grupos de interesse. Esse</p><p>grupo não concebe a perspectiva da sociedade como um ethos coletivo</p><p>superior à racionalidade individualista. Esse é o pensamento hegemônico</p><p>sobre redes.</p><p>O segundo desa�o de organização do campo da sociologia das redes</p><p>sociais é propriamente metodológico, sendo claro um desdobramento do</p><p>olhar sobre o fenômeno rede social lançado pelas duas tendências</p><p>conceituais anteriormente levantadas. Assim, quando consideramos as</p><p>redes como fenômenos históricos, então temos de ampliar tanto a</p><p>compreensão do fenômeno rede – com a incorporação de abordagens</p><p>fenomenológicas e hermenêuticas – como considerar o uso de outros</p><p>métodos e técnicas que permitam ampliar a atenção do observador para a</p><p>realidade empírica estudada e que existe independentemente da amostra</p><p>do pesquisador. Por outro lado, se descartamos o vínculo do fenômeno</p><p>redes sociais com aqueles anteriores dos movimentos sociais, então as</p><p>redes passam a ser meros artifícios técnicos. Aqui, a rede é um dispositivo</p><p>de operacionalização tecnológica de dados selecionados pelo pesquisador e</p><p>depende quase exclusivamente de modelos matemáticos que permitem a</p><p>realização dos cálculos estratégicos dos atores envolvidos. Essa segunda</p><p>ótica de entendimento e de manipulação dos métodos de rede não é</p><p>inconsistente do ponto de vista técnico, mas do ponto de vista conceitual.</p><p>Ao negar a importância da categoria ethos social como base das novas</p><p>dinâmicas de relacionamentos primários, essa abordagem descarta o valor</p><p>da experiência para a ação social e compromete, no nosso entender, o</p><p>próprio caráter normativo das Ciências Sociais e da Sociologia, que é o de</p><p>fornecer subsídios para que a sociedade re�ita sobre sua produção e sobre</p><p>sua reprodução sócio-histórica.</p><p>De todo modo, a atração crescente da ideia de redes sociais como</p><p>categoria analítica na Sociologia se justi�ca pela necessidade de explicações</p><p>mais dinâmicas, �uidas, interativas e necessárias para dar conta da</p><p>complexidade crescente das sociedades contemporâneas, tanto no plano</p><p>macrossocial como no meso e microssocial. A importância do</p><p>entendimento da sociedade contemporânea como um sistema complexo,</p><p>aberto a múltiplos tipos de interação com os ambientes exteriores –</p><p>movidos por pressões diversas resultantes de variados níveis de</p><p>organização das ações sociais e regulados por mecanismos como os da</p><p>democracia, dos movimentos sociais e culturais e pela economia de</p><p>mercado –, exige necessariamente novas modalidades de organização dos</p><p>vínculos sociais, como as das redes sociais.</p><p>Um ponto de partida: o plano mesosociológico</p><p>Para continuar nossa discussão, vamos buscar inscrever a discussão</p><p>sobre redes no plano mesosociológico, lembrando que na Sociologia, na</p><p>Psicologia e na Antropologia esse assunto vem sendo discutido há décadas.</p><p>Por exemplo, todo o desenvolvimento dos estudos sobre dinâmica de</p><p>grupos que hoje têm ampla aceitação na Psicologia e na Pedagogia vêm das</p><p>contribuições de Moreno (1987) sobre a assunto.79 Entretanto,</p><p>diferentemente do que ocorre nas “ciências exatas”, a aplicação prática da</p><p>ideia de rede, nos estudos do social, ainda é problemática, sugerindo</p><p>di�culdades importantes tanto no tratamento teórico como nas</p><p>metodologias de abordagem da realidade social.</p><p>No âmbito social, as teorias de redes surgem dos esforços para explicar</p><p>formas mesosociológicas que não podem ser visualizadas a partir de</p><p>abordagens macrossociológicas, delimitadas por grandes estruturas</p><p>explicativas, nem a partir de planos microssociológicos, centrados apenas</p><p>nas motivações individuais. A noção de rede emerge, por conseguinte,</p><p>como base de uma sociologia mesosociológica indispensável para os que se</p><p>preocupam em explicar os sistemas de relações humanas nos espaços do</p><p>cotidiano, tendo como objeto de estudo grupos pequenos e medianos ou</p><p>outros mais diversos, como redes de movimentos sociais, de estudantes, de</p><p>escritores, de simpatizantes de um time de futebol, redes familiares, entre</p><p>outros.</p><p>Na prática, contudo, há problemas diversos na aplicação das teorias</p><p>correntes de redes nesse plano mesosociológico. Entre esses problemas,</p><p>podem ser ressaltadas as di�culdades das abordagens dominantes de redes</p><p>para entender o caráter relacional propriamente dito da prática social em</p><p>grupos. M. Granovetter (2000) percebeu isso ao nos lembrar que, apesar</p><p>de a análise de redes dever permanecer à igual distância de concepções</p><p>“sobressocializadas”, como a do estrutural-funcionalismo de Parsons e de</p><p>concepções “sub-socializadas” como a do “reducionismo psicológico de G.</p><p>Homans, na prática, não é isso o que ocorre. Assim, ele nos recorda, as</p><p>duas concepções criticadas compartilham uma mesma concepção</p><p>atomizada da prática social, aquela de colocar em posição secundária a</p><p>dimensão relacional. Segundo a concepção “sobressocializada”, os</p><p>indivíduos seriam atomizados pela submissão mecânica a normas</p><p>exteriores; a “sub-socializada” vê os indivíduos atomizados por uma</p><p>tradição utilitarista que reduz as motivações individuais a uma lógica de</p><p>interesse mercantil (GRANOVETTER, 2000). Mas a própria posição</p><p>teórica de Granovetter a respeito desse problema epistemológico é</p><p>discutível. Sua tese, por exemplo, sobre laços fortes e laços débeis, não</p><p>parece escapar muito das abordagens “subssocializadas”. E, se não se apoia</p><p>nas teorias psicológicas de Homans ou de outros, acaba por adotar teorias</p><p>racionalistas e funcionalistas que, no fundo, não são tão distantes das</p><p>lógicas behavioristas de certas tendências da Psicologia, pois psicólogos</p><p>motivacionais e sociólogos racionalistas tendem a circunscrever a ação</p><p>humana a partir de mecanismos de causalidades de ação que são</p><p>insu�cientes para superar o dilema atual no uso das redes que o próprio</p><p>Granovetter apontou.</p><p>Por conseguinte, apesar de a noção de redes constituir uma inovação</p><p>sociológica inegável, acreditamos que a discussão teórica vem seguindo</p><p>rumos ambivalentes que deixam ver a sombra do utilitarismo. Os que</p><p>simpatizam com a abordagem estrutural tendem, de algum modo, a</p><p>incorporar os esquemas de totalidade presentes nas obras de Durkheim e</p><p>Parsons. Paralelamente, está aquele outro grupo de autores simpatizantes</p><p>do individualismo racionalista, que são in�uenciados pelo funcionalismo</p><p>sociológico e também pela psicologia behaviorista. Esses valorizam mais os</p><p>estudos sobre motivações</p><p>individuais utilitaristas, ao acreditarem que às</p><p>racionalidades dos atores se sobrepõem as ordens estruturais na formação</p><p>de redes.</p><p>Tanto estruturalistas como individualistas têm di�culdades em</p><p>compreender as práticas como articulação dinâmica do subjetivo com o</p><p>objetivo, mediante construção de narrativas que envolvem diretamente e</p><p>intersubjetivamente os atores sociais. Nesse sentido, é importante</p><p>assinalar os esforços daqueles que, in�uenciados pela antropologia</p><p>britânica e autores como Wolfe (1978), insistem na possibilidade de se</p><p>separar das abordagens estruturalistas e individualistas para se deter</p><p>diretamente na análise das relações sociais concretas. Mas tais esforços</p><p>oriundos da antropologia são limitados devido, sobretudo, às resistências</p><p>tradicionais de sociólogos, formados na escola positivista, de integrarem</p><p>os elementos simbólicos e intersubjetivos da prática social.</p><p>Utilitaristas e antiutilitaristas: lutas pelas significações das redes</p><p>no interior do campo sociológico</p><p>O surgimento de um pensamento hegemônico acerca de redes,</p><p>marcado pela in�uência moral do utilitarismo, �loso�a que elege o</p><p>interesse egoísta como motivo supremo no momento em que os indivíduos</p><p>decidem suas preferências no interior da sociedade,80 vem produzindo</p><p>novas divisões entre os estudiosos de redes e reproduzindo uma disputa</p><p>mais ampla no campo da sociologia (MARTINS, 2008). Os autores</p><p>utilitaristas entendem a rede social como um recurso estratégico e</p><p>arti�cial, acionado por indivíduos e grupos, com �nalidades instrumentais</p><p>e guiados por interesses racionalistas individuais e grupais, sendo a</p><p>experiência social reduzida somente a dados empíricos a serem agregados</p><p>para análise de um objeto formal de�nido pelo pesquisador. Essa</p><p>orientação contribui para reforçar o pensamento monolítico dominante.</p><p>No lado contrário, existe uma plêiade desorganizada de autores que</p><p>pretendem entender as redes não como instrumento, mas como um</p><p>pressuposto sistêmico da vida social. A rede aparece, aqui, como</p><p>racionalidade expressiva (e apenas secundariamente formal) das</p><p>experiências coletivas de diferenciação de práticas dentro de sociedades</p><p>complexas. Esses autores contribuem para o surgimento de pensamentos e</p><p>saberes contra-hegemônicos, na medida em que resgatam a experiência</p><p>como fonte de constituição re�exiva das instituições sociais. Nesse caso, as</p><p>redes são vistas como possibilidades fenomênicas e discursivas de</p><p>emancipação de saberes e práticas que se encontram reprimidos e/ou</p><p>inibidos.</p><p>Para situar mais claramente esse embate, podemos tomar como</p><p>exemplo o caso das mudanças veri�cadas no campo biomédico na</p><p>atualidade, a partir de pressões importantes exercidas por forças diversas:</p><p>por um lado, o saber biocartesiano utilitarista, que se propõe como o único</p><p>saber verdadeiro sobre a saúde; por outro lado, os diferentes saberes de</p><p>cura já existentes, como a medicina doméstica e a medicina xamânica,</p><p>construídos a partir de experiências vividas e reproduzidas pelas tradições</p><p>e memórias que foram reprimidas e perseguidas durante muito tempo e</p><p>que, inclusive, de forma desorganizada, vêm questionando o monopólio do</p><p>saber médico biocartesiano (MARTINS, 2003). Essas mudanças, no</p><p>interior do campo médico e em suas fronteiras, são re�exos de outras</p><p>mudanças que vêm ocorrendo na vida social, tendo como uma de suas</p><p>principais legitimações as novas redes interativas do cotidiano.</p><p>O fato de que as teorias hegemônicas sobre redes apenas entendem o</p><p>lado formal da prática social, o que é obtido pelo esvaziamento da</p><p>experiência direta, desestimula a variedade de discursos possíveis na</p><p>construção da realidade e contribui decisivamente para as di�culdades de</p><p>sistematização de teorias mais complexas sobre as redes sociais. Assim, de</p><p>uma ou de outra forma, o avanço no debate, no sentido de permitir a</p><p>estruturação desse campo disciplinar da sociologia das redes sociais, exige</p><p>ampliar a noção de rede, de modo que se considerem igualmente válidas as</p><p>dimensões objetivas e subjetivas, materiais e simbólicas e, sobretudo, a</p><p>experiência direta da vida social, pois, quando a experiência é evacuada, as</p><p>instituições sociais e aquelas da sociedade civil �cam sujeitas a todo tipo</p><p>de estratégias de colonização.</p><p>Assim, a integração das signi�cações subjetivas na análise de redes</p><p>exige, naturalmente, outras abordagens interpretativas mais complexas –</p><p>fenomenológicas e hermenêuticas –, que são desconhecidas pela maior</p><p>parte dos teóricos de redes. Essas últimas abordagens são mais adequadas</p><p>ao conhecimento profundo do cotidiano nas sociedades complexas da</p><p>atualidade. Ao colocar em relevo diferentes níveis de percepção da</p><p>realidade humana, de variedade de entendimentos das linguagens</p><p>socioculturais e de narrativas da vida cotidiana – que estão sempre</p><p>mescladas com apreciações lógicas e emoções incalculáveis –, revela-se</p><p>toda a complexidade do real. E, sem discussão sobre o simbolismo, toda a</p><p>análise de redes permanece, de certo modo, super�cial, já que são</p><p>eliminadas as signi�cações formadas pelas intersubjetividades que</p><p>fundamentam a vida social.</p><p>Como assinala Lemieux (1999), ao analisar os estudos sobre redes,</p><p>pode-se perceber que houve um excesso de modelização, com prejuízo do</p><p>entendimento das práticas dos atores envolvidos. Para Granovetter (2000),</p><p>simpatizante da tese de corte racional, a responsabilidade seria das teorias</p><p>de rede baseadas na análise estrutural, que teriam esvaziado os conteúdos,</p><p>prejudicando o entendimento da complexidade das situações individuais.</p><p>Ele reprova a análise estrutural pelo fato de ela perder-se nos detalhes das</p><p>análises quantitativas de redes até o sectarismo. De uma perspectiva</p><p>contrária, os simpatizantes da análise estrutural criticam aqueles que</p><p>acumulam dados descritivos sobre as trajetórias individuais sem nenhuma</p><p>força explicativa, como seria o caso dos individualistas metodológicos e</p><p>dos de corte racional. Mas, esclarece Mercklé (2004), essa propensão ao</p><p>dedutivismo é comum tanto nos adeptos da análise estrutural como</p><p>naqueles de corte racional, conduzindo frequentemente a formas</p><p>sociológicas particulares de raciocínio, nas quais o estatuto, de fato,</p><p>aparece algumas vezes como secundário. Como ambas as vertentes</p><p>desvalorizam a dimensão intersubjetiva e experiencial, por conseguinte, as</p><p>metodologias adotadas também carecem de valor, como métodos</p><p>orientados para a atenção a situações subjetivas, tais como histórias de</p><p>vida, grupos focais, pesquisas participantes, entre outras.</p><p>Nesses anos em que re�etimos sobre o caráter e a aplicabilidade das</p><p>redes, chegamos a constatar que a noção sofre, então, de uma inde�nição</p><p>crônica, produzida por suas múltiplas, contraditórias e super�ciais</p><p>leituras, o que compromete seu interesse prático para a compreensão da</p><p>natureza, dos sentidos e dos rumos dos novos grupos emergentes e de</p><p>suas identidades socioculturais. Na medida em que os elementos</p><p>intersubjetivos não são considerados seriamente na discussão sobre</p><p>hermenêutica das redes, o entendimento do que seja “racionalidade</p><p>humana” se limita fatalmente a uma visão técnica, desumanizada e</p><p>moralmente comprometida com o utilitarismo materialista e</p><p>individualista. Por conseguinte, na maioria das vezes, a noção de redes</p><p>serviu apenas para justi�car, mediante lindos grá�cos visuais e fórmulas</p><p>de álgebra aparentemente complexas, opiniões banais sobre a vida social</p><p>que denotam pouca clareza cientí�ca e revelam um compromisso suspeito</p><p>com as ideologias neoliberais. Essa é a herança do peso do utilitarismo no</p><p>debate sobre redes sociais.</p><p>Seguindo a proposta de Wilber (2006) acerca de conceitos super�ciais e</p><p>profundos, consideramos que aquelas leituras que apontam</p><p>particularmente para a dinâmica utilitarista, funcional e individualista são</p><p>rasas e conservadoras por construírem uma interpretação limitada da</p><p>realidade. Aquelas outras que revelam o amplo elenco de determinações</p><p>antiutilitaristas e que se preocupam em vincular a dinâmica</p><p>relacional e</p><p>não só os elementos objetivos e quanti�cáveis, mas, igualmente, os</p><p>motivos simbólicos e subjetivos da ação social, nós as denominamos</p><p>profundas e emancipadoras. As divergências entre ambas as tendências se</p><p>devem basicamente ao fato de que um pensamento de simpli�cação que</p><p>apenas dá conta de um aspecto da realidade – como é o caso das teorias</p><p>funcionalistas e utilitaristas – não pode cobrir a totalidade sistêmica</p><p>humana que exige mapeamentos teóricos e metodológicos mais amplos e</p><p>mais profundos do ponto de vista cognitivo, emocional, político, estético e</p><p>moral.</p><p>Alguns pontos para orientar o desenvolvimento do debate</p><p>A discussão sobre as perspectivas paradigmáticas das redes sociais</p><p>certamente não se esgota nos limites de um texto como este. Para</p><p>estimular o debate, gostaríamos de registrar alguns pontos que nos</p><p>parecem centrais nesta discussão.</p><p>a) Tanto as teorias de redes da análise estrutural como aquelas outras</p><p>baseadas na visão racional e no individualismo metodológico</p><p>compartilham um mesmo enfoque utilitarista, pragmático e unilateral</p><p>para explicar as racionalidades e interesses dos atores em situações sociais</p><p>de grupo, privilegiando, para isso, as análises dedutivas, baseadas em</p><p>modelos matemáticos e estatísticos. Tais métodos e técnicas não dão</p><p>conta, de fato, da complexidade das práticas sociais, do valor da</p><p>experiência vivida no cotidiano para o surgimento das instituições sociais,</p><p>e de que, hoje, as redes constituem um desdobramento sócio-histórico</p><p>importante dos movimentos sociais. Por conseguinte, os estudos atuais de</p><p>redes revelam a presença de um imbróglio de teorias – análise estrutural,</p><p>funcionalismo, visão racional, individualismo metodológico, teorias de</p><p>capital social, teoria de grá�cos e álgebra linear – que se comunicam sem</p><p>rigor teórico entre si, apenas se cruzando na valorização da eliminação da</p><p>experiência social como fonte para transformá-la em recurso tecnológico.</p><p>A hegemonia do utilitarismo, no campo cientí�co, vem signi�cando a</p><p>ampliação das distâncias entre a pretendida novidade teórica, que seria</p><p>dada pelas teorias de redes, e a pobreza das teorias estatísticas e</p><p>matemáticas, acionadas para provar a validade empírica – por dedução –</p><p>da pretendida racionalidade dos atores sociais nas redes. A análise das</p><p>redes sociais permaneceu, então, mais como domínio privilegiado da</p><p>formalização matemática e da simulação do que da investigação empírica,</p><p>mais de dedução que da indução, mais da modelação que da interpretação</p><p>(MERCKLÉ, 2004). Para fazer frente à sua insu�ciência explicativa, os</p><p>teóricos utilitaristas e individualistas vêm intensi�cando suas</p><p>investigações em duas direções: uma delas, no plano teórico, apoiando-se</p><p>nas teorias do capital social para realizar a tradução adaptativa necessária</p><p>das teses individualistas aos fenômenos de rede; a outra, no plano</p><p>metodológico, aproximando-se da engenharia de sistemas para incorporar</p><p>modelos matemáticos, sob o suposto erro de que as ciências “exatas”</p><p>podem cobrir, com suas teses positivistas, a incapacidade enfrentada pelo</p><p>utilitarismo para explicar o caráter expressivo do cotidiano no mundo</p><p>contemporâneo.</p><p>b) A aliança das teorias utilitaristas nas Ciências Sociais –</p><p>representadas, sobretudo, pelo individualismo metodológico e pela</p><p>“rational choice” – busca promover um novo campo teórico, o do Capital</p><p>Social, que, supõe-se, poderia aparecer como a síntese teórica máxima nos</p><p>estudos sobre redes sociais. Tal ambição esconde uma operação ideológica</p><p>dirigida para a sistematização de um pensamento único sobre as redes</p><p>sociais nas Ciências Sociais. O Capital Social é o termo que designa o</p><p>esforço de incluir teorias e autores simpatizantes do utilitarismo no amplo</p><p>processo de colonização das novas manifestações sociais, políticas e</p><p>culturais da sociedade civil organizada que surgem no contexto do declínio</p><p>dos antigos movimentos sociais, guardando um forte conteúdo</p><p>anticapitalista. O prestígio adquirido por essas teorias emerge das</p><p>tentativas de capturar e submeter signi�cações subjetivas</p><p>“anticapitalistas” – emocionais, afetivas, oníricas, estéticas, pulsionais – a</p><p>esquemas cognitivos e racionalizantes. Assim, ao generalizar o interesse a</p><p>todas as esferas da consciência – e da inconsciência –, tais autores</p><p>aparentam haver vencido a luta entre objetivistas e subjetivistas, provando</p><p>que tudo é interesse e cálculo. Desse modo, temas como amor, con�ança,</p><p>amizade, memória, entre outros, passam a ser vistos como recursos que</p><p>podem ser objeto de cálculo interessado, recursos do “capital”.</p><p>c) Uma questão que nos parece óbvia é que as teorias individualistas</p><p>que estão na base dessa estratégia colonizadora são su�cientemente</p><p>abstratas para dar conta do contexto sociocultural e histórico do fenômeno</p><p>das redes sociais. Daí a necessidade de um corpo teórico utilitarista que</p><p>tenha uma missão colonizadora e que apareça – na aparência – como um</p><p>sistema explicativo amplo que englobe todas as esferas do conhecimento e</p><p>da ação social, objetivas e subjetivas. Isto é, que se apresente como</p><p>abarcando o conjunto de determinantes sociais, culturais e históricos das</p><p>redes, não com o �m de promover uma compreensão hermenêutica e</p><p>solidária das redes, mas de capturar tais recursos coletivos com a</p><p>�nalidade de legitimar a visão monolítica, de corte individual e egoísta.</p><p>Desse modo, essas teorias se ajustam perfeitamente como dispositivos de</p><p>tradução da moral individualista na normalização e privatização de uma</p><p>ideia generosa, como a das redes sociais. As redes que originalmente são</p><p>construtos históricos e hermenêuticos que se �liam aos desdobramentos</p><p>das experiências sociais e políticas de grupos atuantes, são reduzidas pelo</p><p>utilitarismo a meros artifícios de análise, com objetivos de controle</p><p>autoritário da prática social e da esfera pública. As teorias do capital social</p><p>maquilam os fundamentos intersubjetivos da vida social – memórias,</p><p>valores, sentimentos etc. – com o �m justamente de negar sua existência</p><p>como fatores independentes dos elementos racionalizadores e</p><p>objetivantes.</p><p>d) Outro ponto a ser registrado é que a adoção de tais teorias na</p><p>investigação sociológica não é um ato ideologicamente neutro. Elas</p><p>constituem peças de um quebra-cabeça chamado network analysis, que se</p><p>popularizou razoavelmente em âmbito mundial. A ideia de tal análise</p><p>re�ete o esforço mais exitoso das ditas teorias: o desaparecimento da</p><p>dimensão fenomênica e comunocêntrica das redes sociais em favor da</p><p>construção de um dispositivo instrumental, egocêntrico e �ctício,</p><p>orientado para a colonização dos processos sociais coletivos. O network</p><p>analysis tem a função de completar o enunciado de cienti�cidade</p><p>pretendido pelos intelectuais utilitaristas, com vistas a completar o</p><p>trabalho de colonização da Sociologia, controlando manifestações sociais e</p><p>culturais que podem ameaçar as bases do pensamento monolítico (o qual é</p><p>articulado, por sua vez, com a dominação capitalista mais geral). Assim,</p><p>essas teses neopositivistas contribuem inevitavelmente para estabelecer</p><p>uma distância hierárquica e moral importante entre o observador</p><p>cientí�co externo e o observado. Reavivam o tradicional dualismo</p><p>metodológico, de inspiração cartesiana, pelo qual o sujeito e o objeto são</p><p>fenômenos estranhos entre si, com propósitos que têm menos um</p><p>interesse cientí�co e mais um objetivo ideológico. Criam uma distância</p><p>�ctícia que é politicamente conveniente para que o sujeito colonizador na</p><p>ciência possa controlar, a uma distância segura, o objeto de análise, a</p><p>saber, os sistemas de solidariedade humanos, para poder melhor organizar</p><p>o discurso utilitarista sobre a “verdade”. Segundo A. Gouldner (1989),</p><p>semelhante dualismo – entre observador e observado – signi�ca a traição</p><p>dos objetivos mais fundamentais de toda a Sociologia. Ele tem implicações</p><p>normativas resultantes da interação entre sujeito e objeto que não podem</p><p>ser subestimadas. De fato, na medida em que o dualismo reforça os</p><p>mecanismos de controle das elites tecnocratas – e assim, indiretamente,</p><p>das elites capitalistas –, inibe o surgimento de novas possibilidades de</p><p>construção do conhecimento que sejam dialógicas e plurais,</p><p>comprometidas com outro conhecimento produzido diretamente na</p><p>experiência vivida, coletiva e intersubjetivamente pelos atores sociais.</p><p>e) Por conseguinte, cabe aqui muito bem a consideração de K. Wilber</p><p>(2006) de que esses entendimentos de redes são restritivos e super�ciais,</p><p>por explicarem somente o lado visível das coisas observadas, o ISTO, sem</p><p>incluir os elementos culturais, morais e psicológicos presentes nas redes,</p><p>que constituem as dimensões do EU e do NÓS da ação social. Pensamos</p><p>igualmente que, além de super�ciais, são conservadores, pois privilegiam</p><p>uma compreensão egocêntrica da realidade, em detrimento de visões</p><p>comunitariocêntricas ou cosmocêntricas que permitiriam um</p><p>entendimento generoso e solidário da totalidade da vida social.81 Se a</p><p>sociologia das redes sociais fosse capaz de minimizar o peso do método</p><p>explicativo e dedutivo – organizado em torno da narrativa da network</p><p>analysis, em favor de metodologias compreensivas e interpretativas mais</p><p>complexas e capazes de superar tal dualismo metodológico –, veríamos,</p><p>como resultado imediato, o observador cientí�co sair de sua posição de</p><p>neutralidade para se aproximar do objeto. Assumindo o papel de</p><p>“protagonista” em um jogo no qual a “signi�cação da ação dos outros e, em</p><p>primeiro lugar, a trama da interação que o autor estabelece consigo mesmo</p><p>– ainda que isso se faça com certo distanciamento” (FREITAG, 1989) –, o</p><p>observador se vê implicado moralmente com a construção social</p><p>compreensiva da realidade. A posição de protagonista leva o observador a</p><p>buscar estabelecer uma mediação signi�cativa comum com o objeto, a qual</p><p>se materializa por certos procedimentos técnicos facilitadores da</p><p>interlocução, como a descrição, o relato, a imagem e a atenção. Há técnicas</p><p>que favorecem a aproximação entre as partes, como aquelas dos grupos</p><p>focais e das entrevistas em profundidade, permitindo o resgate das</p><p>memórias das redes.</p><p>Por �m, o problema central dessas teses sobre a análise de redes é que</p><p>elas veem apenas o �uxo social por uma lente ambivalente – indivíduo e</p><p>estrutura – que têm como eixo comum o interesse egoísta. Tais teses</p><p>pecam por um aspecto crucial, já inscrito em sua própria denominação, ou</p><p>seja, inspiram-se na ótica da privatização de um conjunto de recursos</p><p>materiais e funcionais por certos agentes, sem considerar que tais</p><p>recursos, como a con�ança, por exemplo, existem apenas a partir de um</p><p>contexto intersubjetivo – emocional, imaginativo, representacional – que</p><p>não pode ser reduzido a um recurso de mobilização estratégica, um</p><p>“capital”, como dizem seus adeptos.</p><p>As leituras conservadoras e super�ciais de redes, defendidas pelo</p><p>pensamento hegemônico, tendem a privilegiar metodologias</p><p>quantitativas, crendo, ilusoriamente, que a realidade se fundamenta em</p><p>leis positivas mensuráveis. Apoiam-se, principalmente, como nos recorda</p><p>Mercklé (2004), na teoria dos grá�cos e na aplicação da álgebra linear a</p><p>dados relacionais, com o propósito de medir as propriedades estruturais e</p><p>as leis �xas das redes. Assim, a crescente aceitação da teoria dos grá�cos e</p><p>da álgebra linear na análise de dados relacionais é diretamente</p><p>proporcional ao esquecimento, por parte da Sociologia, das dimensões</p><p>normativas e re�exivas da prática social.</p><p>Tal vitória de Pirro, no entanto, não tem grande impulso, e a realidade</p><p>– como sempre o faz – obriga o pensamento simpli�cador a submeter-se à</p><p>sua complexidade dialógica. Como diriam os sábios taoístas, quanto mais</p><p>se olha o dia, mais a noite se torna exuberante; quanto mais se deseja o</p><p>efeito solar, mais se prolonga a chuva; quanto mais se deseja controlar a</p><p>realidade externa, mais o mundo interno se torna um pesadelo.</p><p>Tendo em mente essas considerações gerais, nossa hipótese é a de que</p><p>as teorias do capital social, ao intentar adequar as teses utilitaristas a algo</p><p>que não é apenas uma noção conceitual, mas um fenômeno sócio-histórico</p><p>– a tendência de formação de grupos associativos de pequeno e médio</p><p>porte no interior do mundo da vida em sociedades complexas – tornam-se</p><p>prisioneiras de uma contradição insuperável. Tal contradição tem dois</p><p>aspectos: um deles, a simplicidade do corpo teórico-metodológico</p><p>utilitarista para explicar fenômenos sócio-históricos complexos como o das</p><p>redes; o outro, o de que os grupos oprimidos e os intelectuais não</p><p>hegemônicos, dentro e fora da academia, resistam a submeter-se a essa</p><p>hierarquia, que – se aceita – quebra a dimensão associativa generosa,</p><p>presente na ontologia das redes sociais nas sociedades complexas.</p><p>O caminho da sistematização das redes sociais como um novo</p><p>paradigma sociológico passa, assim, por esse esforço de desnaturalização</p><p>de noções da moda e, principalmente, pela busca de demonstrar que as</p><p>ideias “cientí�cas” não são neutras. Trata-se de mostrar que tais noções</p><p>estão relacionadas a certo pensamento moderno e utilitarista que teve</p><p>uma missão colonizadora importante na formação de públicos usuários</p><p>acadêmicos e não acadêmicos cativos. Contra esse esquecimento da relação</p><p>entre ciência e poder nas Ciências Sociais, cabem reações que contribuam</p><p>para desvelar a trama colonizadora, revelando outras possibilidades de</p><p>articulação do saber cientí�co e do saber comum, em torno da promoção</p><p>de uma sociologia mais re�exiva, interiorizada, interativa e orientada para</p><p>um entendimento mais generoso das novas mobilizações sociais e</p><p>culturais. Isso, em se tratando de América Latina, tem um valor especial.</p><p>Para nós, a base do novo paradigma sociológico de redes sociais já está</p><p>legitimada pelas novas mudanças históricas, pelas novas teorizações sobre</p><p>as modalidades de existência dos movimentos sociais como redes, como</p><p>bem a�rma Melluci (2001). Essas bases estão �xadas, sobretudo, pelas</p><p>novas teorias pós-coloniais, como as de Bhabha (2003) ou de Hall (2006),</p><p>as quais contribuem para denunciar os aspectos políticos do pensamento</p><p>colonizador, ao mesmo tempo que valorizam as diferenças culturais e a</p><p>emergência de novas identidades minoritárias nos novos locais, que</p><p>surgem nos planos transnacionais (reais ou virtuais). Certamente, a</p><p>evidência organizacional do novo paradigma de redes, conectada com o</p><p>novo paradigma associativo nas Ciências Sociais, que é o dom, como</p><p>explica Caillé (2000), não se traduz automaticamente em novas teses</p><p>universitárias. Ainda há um caminho a seguir na divulgação institucional e</p><p>organizacional do novo paradigma, de modo que ele possa in�uenciar mais</p><p>claramente as teses acadêmicas. Mas um dos problemas mais complicados,</p><p>o de separar quem é quem e o quê é o quê quando se fala de rede, para se</p><p>de�nir estratégias de descolonização dos saberes sobre redes, já está em</p><p>curso. Este artigo vai nessa direção. Por um lado, trata-se de demonstrar a</p><p>insu�ciência das teses colonizadoras para explicar “cienti�camente” a</p><p>complexidade dos movimentos sociais contemporâneos; por outro, de</p><p>liberar o debate sobre a importância da sociologia das redes sociais como</p><p>novo marco interpretativo das mobilizações contemporâneas.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ABRAMOVAY, R. A rede, os nós, as teias: tecnologias alternativas na agricultura. Revista de</p><p>Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 34, n. 6, p. 159-177, 2000.</p><p>ADLER-LOMNITZ, L. Redes sociales, cultura y poder: ensayos de antropología latinoamericana.</p><p>México: Miguel Ángel Porrúa, 1994.</p><p>ALONSO DAVILA, I. Nada de soledades: algunas notas sobre redes sociales entre mujeres: el casco</p><p>antiguo de Alicante. Canelobre: Revista del Instituto Alicantino de Cultura, Alicante, n. 23/24, p.</p><p>199-208, 1992.</p><p>ARNOLD-CHATALIFAUD, M.; THUMALA, D.; URQUIZA, A. Colaboración, cultura y desarrollo:</p><p>entre el individualismo y la solidariedad organizada. In: ______. (Org.). Colaboración, cultura y</p><p>desarrollo. Santiago: Universidad del Chile/Fundacion Sóles, 2007, p.</p><p>de longa duração dessa dialética entre</p><p>formatos documentários e �guração da relação social (WRONA, 2012).</p><p>Sob tal ótica, a criação desse tipo de dispositivo remete a uma</p><p>intervenção no transcurso das comunicações sociais que exprime uma</p><p>pretensão real de condicioná-las, instrumentalizá-las e regê-las.</p><p>Condicioná-las signi�ca con�gurar situações de comunicação que se</p><p>especi�cam em termos de linguagens mobilizadas, de espaço-tempo das</p><p>trocas, de papéis de�nidos, de modalidades de conservação, de</p><p>disseminação e de transformação dos textos. Instrumentalizá-las quer</p><p>dizer oferecer formatos de escrita, material signi�cante automatizado e</p><p>protocolos de reformulação. Regê-las4 signi�ca realizar modalidades de</p><p>delegação da enunciação, de coleta de textos e de publicação das</p><p>contribuições que asseguram a in�uência dos atores da plataforma sobre a</p><p>imagem do texto e as modalidades de troca midiática. Abordado sob esse</p><p>ponto de vista, o trabalho do designer de informática não opera em ruptura</p><p>com as disciplinas de arquivo, aquelas que de�nem o gesto editorial, o</p><p>comentário, a mediação documentária, ao contrário, em um jogo de</p><p>retomada, recon�guração e otimização dessas estruturas.</p><p>É por isso que uma descrição empírica das “redes sociais” pede que</p><p>estas sejam rede�nidas como dispositivos de instrumentação das trocas</p><p>documentárias de uma natureza particular, e que designarei, aqui, como</p><p>dispositivos microdocumentários. Estes exploram, regem e</p><p>instrumentalizam a transmissão rápida de mensagens curtas, a criação de</p><p>coleções compartilhadas de tipo antológico (DOUEIHI, 2008), a montagem</p><p>padronizada de conjuntos unindo o texto, a imagem, o formulário, o</p><p>pictograma, a citação. Trata-se de uma con�guração muito densa e</p><p>altamente automatizada de “pequenas formas” (CANDEL, JEANNE-</p><p>PERRIER ; SOUCHIER, 2012), formatos de escrita pré-formatados,</p><p>compactos e padronizados, combinados a uma lógica de fragmentação e de</p><p>miniaturização extremas. Essas ferramentas de escrita automatizadas</p><p>permitem o controle do não especialista sobre gestos documentários</p><p>simpli�cados e mínimos de coleta, de conservação, de transmissão e de</p><p>classi�cação de unidades textuais e documentais tornadas acessíveis, não</p><p>por uma mediação institucional de saber, mas pelo exercício de predileções</p><p>individuais e coletivas diversas. Uma espécie de escritório de curiosidades</p><p>aparelhado.</p><p>Logo, compreender-se-á, entretanto, que esses objetos não são</p><p>percebidos como tal pela maior parte das pessoas que os utilizam. A</p><p>densidade das mediações semióticas, logísticas e documentárias torna-se</p><p>invisível por seu material muito banal em favor de um espaço de encontro</p><p>onde se conversa, se cria comunidade e se mantém visibilidade. Tudo isso</p><p>se estrutura em um complexo mídia-texto especial que se apoia, ao mesmo</p><p>tempo, sobre as propriedades materiais e logísticas do suporte e sobre os</p><p>princípios semióticos, retóricos e poéticos de uma forma de expressão.</p><p>Assim encarados, esses dispositivos se inscrevem em uma série</p><p>histórica. Primeiramente, vê-se que não são tão diferentes das “gerações”</p><p>midiáticas precedentes. A transferência das ferramentas e gestos próprios</p><p>às diversas pro�ssões da informação e da comunicação para os amadores é</p><p>uma tendência há tempos identi�cada nos escritos da tela, como, por</p><p>exemplo, a cultura pro�ssional dos tipógrafos (SOUCHIER, 1996); ela</p><p>sempre foi acompanhada de uma forma de vulgarização desses gestos; a</p><p>fragmentação do texto e sua circulação por reprodução estão no centro da</p><p>informática desde o início do tratamento de texto; a descontextualização</p><p>dos enunciados já era o principal problema colocado pelas experiências do</p><p>hipertexto; a abstração das formas que permitem sua recon�guração</p><p>constante desempenhou um papel determinante na engenharia de</p><p>software “dinâmica”, o que possibilitou adaptar continuamente os objetos</p><p>documentários aos usos; a delegação da enunciação e a antologia</p><p>caracterizavam também as plataformas participativas (TARDY;</p><p>DAVALLON, 2012). Sob essa ótica, as “redes sociais” aparecem, sobretudo,</p><p>como a continuação do projeto de informatização da sociedade por outros</p><p>meios.</p><p>Por outro lado, a chegada desses dispositivos materializa certo tipo de</p><p>predileção na representação do potencial infocomunicacional das mídias</p><p>informatizadas: ela encontra seu lugar em uma série. Recuando algumas</p><p>décadas, constata-se que essas predileções foram objeto de valorizações</p><p>diversas e de instrumentalizações sucessivas. Tais mudanças exprimem</p><p>inclinações sucessivas que possuem valor de de�nição do social. Após a</p><p>época da combinatória de dados (“hipertexto”), veio aquela da imersão</p><p>ilusionista (“virtual”) e depois, a das escrituras criativas (“multimídia”). Os</p><p>anos 2000 acompanharam a rejeição do visual e o forte retorno do texto</p><p>contínuo: o essencial era a valorização da escrita colaborativa que, para se</p><p>desenvolver, solicitava o tratamento massivo da sequência de caracteres.</p><p>Estamos, hoje, com Facebook e Twitter, no regime do contato, sobre o qual</p><p>o que conta é o imediatismo do gesto; é o triunfo do “cutucar”, da “linha do</p><p>tempo” e da “tag”.</p><p>Essas diferentes evoluções manifestam, apesar de tudo, uma tendência</p><p>geral. Elas afetam a relação entre os diferentes níveis de estruturação da</p><p>troca infocomunicacional. A integração dos diferentes tipos de signos</p><p>sobre um mesmo suporte técnico e o uso constante trompe l’œil</p><p>redistribuem as relações e as hierarquias entre as entidades e seu nível de</p><p>integração. Com as “redes sociais”, a�rmam-se uma hierarquia e encaixes</p><p>particulares entre os níveis bem conhecidos do processo de comunicação,</p><p>como a situação, o formato, o signo, o texto, o discurso e o documento. A</p><p>enunciação é mínima porque é limitada pelo volume do texto e solicitada</p><p>pela facilidade do gesto de designação. O par formado pelo elo funcional</p><p>(logístico) e a designação (dêitica) dominam, visto que é mais fácil coletar e</p><p>assinalar do que argumentar ou narrar. A coleção de mônadas</p><p>constantemente recompostas (WRONA, 2012) de�ne um regime de</p><p>representação do social em que tudo, saber, representação e</p><p>pertencimento, tudo se torna instável, exceto os quadros do dispositivo.</p><p>Sob esse aspecto, essas plataformas documentárias mínimas aparecem</p><p>como resultado do princípio da panóplia (LABELLE, 2007, 2011) e revelam</p><p>uma coleção de roteiros de interação heterogêneos, mas todos</p><p>padronizados. A panóplia não se refere a um projeto global de domínio do</p><p>social, mas a uma tática de disseminação de pequenos cenários de práticas</p><p>por meio das ferramentas. É dessa forma que, nas panóplias integradas da</p><p>“plataforma”, as noções de discurso, de texto e de documento tornam-se</p><p>efêmeras ou indecidíveis: a discursividade é di�cultada pela proscrição do</p><p>desenvolvimento, a textualidade desloca-se do propósito para o contexto</p><p>da escrita e o documento tende a se cristalizar em per�s, miniaturas e</p><p>bilhetes. Em um universo como esse predominam o gesto de designação, a</p><p>enunciação mínima, o compartilhamento de objetos já construídos por</p><p>outros, a reciclagem de documentos produzidos no espaço privado, a</p><p>captura de discursos midiáticos em favor de um �uxo de comunicação de</p><p>segundo nível, o que contribui para uma de�nição da relação</p><p>infocomunicacional na qual a dimensão fática do contato prima sobre a</p><p>dimensão cultural do sentido. Isso não signi�ca, evidentemente, que um</p><p>pensamento social não seria eventualmente elaborado por meio dessas</p><p>trocas que, frequentemente, dão visibilidade a interpretações até então</p><p>inacessíveis, mas o dispositivo condiciona fortemente a forma que tomam</p><p>o comentário e a avaliação, com frequência, marcados pelo humor, pela</p><p>conivência e pela ironia (JEANNE-PERRIER, 2011).</p><p>A análise das mediações, no entanto, permanece decisiva, já que as</p><p>“redes sociais” são um lugar de experimentação na arte das transmutações</p><p>semióticas e manifestam o poder das operações que permite o jogo entre</p><p>as diferentes camadas da inscrição nas mídias informatizadas. Tais</p><p>dispositivos</p><p>15-34.</p><p>BARNES, J. Class and comittees in a norwegian island parish. Human Relations, London, n. 7, p. 39-</p><p>58, 1954.</p><p>BENTHAM, J. An introduction to the principles of morals and legislation. London: �e Athlone Press,</p><p>1970.</p><p>BHABHA, H. 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Essa enunciação editorial (SOUCHIER, 1998), de natureza</p><p>particular, assegura uma apreensão de unidades semióticas diversas,</p><p>podendo ser reunidas, tratadas, acumuladas, completadas, graças ao jogo</p><p>que permite a inscrição entre o código do programa, o cálculo, a base de</p><p>dados, o design grá�co das “interfaces”. Assim, os atos de escrita podem ser</p><p>contados para fazer aparecer os resultados; a ativação de sinais (clicar</p><p>sobre um pictograma “Curtir” ou sobre uma fotogra�a de um membro</p><p>inscrito) pode ser reescrita como uma representação social (popularidade,</p><p>amizade, comunidade); o acesso a coleções de formulários pode ser</p><p>apresentado como a prova de relação. Fulano começou uma nova amizade</p><p>com Fulana, diz “o alerta”. Assim, esse universo de inscrições circulantes,</p><p>constantemente recortadas e recompostas, oscila sem cessar entre três</p><p>regimes de sentidos diferentes: o da escrita, que incorpora um gesto e</p><p>suscita uma leitura, o do índice, que revela ou trai uma prática, e o do</p><p>rastro, que se oferece a todas as vigilâncias.</p><p>AS FERRAMENTAS-MARCA NO SEIO DE UMA ECONOMIA</p><p>POLÍTICA DA TRIVIALIDADE</p><p>Em um contexto como esse, no qual as pequenas formas se recompõem</p><p>sem cessar, é a trajetória dos objetos que domina, ao mesmo tempo que a</p><p>gramática dos pequenos gestos mantém o contato. Mas, paralelamente,</p><p>a�rma-se uma indústria do texto e da mídia que difunde e normaliza as</p><p>formas, os formatos, os scripts de ação, as rotinas discursivas (CANDEL;</p><p>JEANNE-PERRIER; SOUCHIER, 2012). Nesse contexto, compreende-se</p><p>que podem se desenvolver conjuntamente o simbólico, que une, e o</p><p>diabólico, que separa. Essas ferramentas envolvem sempre a manutenção</p><p>de uma comunicação relacional e criadora de conivência enquanto</p><p>fragmentam, uniformizam e banalizam as modalidades de enunciação.</p><p>Tomando certa distância, o lugar que ocupam hoje esses dispositivos</p><p>microdocumentários no espaço midiático das escritas na rede (às vezes</p><p>quali�cada de “self-media”) corresponde a um estado atual de</p><p>desenvolvimento das indústrias da comunicação. O modelo clássico da</p><p>produção de massa, a “indústria cultural”, descrita pelos teóricos da Escola</p><p>de Frankfurt, repousa sobre uma pretensão comunicacional particular</p><p>concentrada na força da mídia e do texto como lugar de desdobramento de</p><p>uma retórica e de um imaginário. A fábrica de sonhos de Hollywood e</p><p>Disney consiste em oferecer produtos culturais concebidos para ter todas</p><p>as chances de ir ao encontro das preferências de um público que os</p><p>especialistas aprenderam a observar e a antecipar. As “redes sociais”</p><p>encarnam outro modelo bastante diferente das indústrias da cultura e da</p><p>comunicação, completamente indiferente ao conteúdo das mensagens e</p><p>fundado na capacidade de fazer, de certas mediações, a passagem</p><p>obrigatória da socialização e da visibilidade.</p><p>Louis Marin (1981) analisou a maneira pela qual o historiador do rei</p><p>conseguiu fazê-lo acreditar na ideia da necessidade de seu trabalho,</p><p>convencendo o político que essa escrita capta o público (MARIN, 1981). A</p><p>plataforma microdocumentária Facebook conseguiu se tornar,</p><p>momentaneamente, a historiadora de uma geração, não por sua real</p><p>capacidade de escrever a história, o que é indiferente, mas por impor pouco</p><p>a pouco a ideia de que passar por essa mediação é indispensável para</p><p>entrar no espaço visível do “self-media”. A narrativa permanece uma</p><p>armadilha no universo da requisição (LABELLE, 2011), a qual carrega uma</p><p>concepção da comunicação como lugar onde se expõe, e não como</p><p>mensagem a transmitir. Por outro lado, é isso que explica o papel especial</p><p>que desempenham essas plataformas microdocumentárias na emergência</p><p>de um espaço de visibilidade, onde a posição do amador reconhecido se</p><p>torna um meio de conquistar o estatuto de especialista, mesmo que a</p><p>contribuição voluntária seja difícil de distinguir do modo de carreira. Em</p><p>certos casos, a exposição de uma “extimidade” (TISSERON, 2001), essa</p><p>intimidade superexposta – e por sinal, bem documentada – é a via</p><p>escolhida pelos indivíduos para conquistar, em troca de uma verdadeira</p><p>conduta de risco, a notoriedade midiática e pro�ssional (JEANNE-</p><p>PERRIER, 2012).</p><p>Como escreve Estrella Rojas (2009, p. 2), que baseia suas pesquisas na</p><p>natureza documentria do Facebook,</p><p>[as] mediações documentárias são orquestradas por dispositivos sociotecnicocognitivos [...]</p><p>Na plataforma de rede social digital Facebook, o compartilhamento documentário está</p><p>centrado nas práticas dos membros, ao mesmo tempo em que permanece estreitamente</p><p>ligado às práticas relacionais.</p><p>É o que explica o alcance cultural e político das práticas que surgem não</p><p>de uma intenção premeditada, mas das próprias modalidades de uma</p><p>prática do texto que une identidade pessoal, categorias culturais e espaços</p><p>de prática, como é o caso dos grupos engajados em uma rede�nição do</p><p>literário (GOMEZ-MEJIA; CANDEL, 2009).</p><p>O dispositivo microdocumentário apresenta certo número de</p><p>propriedades particularmente adaptadas a essa pretensão, que não</p><p>explicam como tal ferramenta-marca “pegou” mais que outra (muitas</p><p>tentativas fracassaram e é muito difícil saber o porquê), mas sim porque</p><p>esse tipo de dispositivo teve mais chances do que outros de se tornar um</p><p>modelo hegemônico de fato.</p><p>Inicialmente, a extrema comodidade de uma panóplia constituída de</p><p>formas mínimas “sob a mão” autoriza uma polivalência sem precedentes</p><p>das produções documentárias. Afastamo-nos do modelo “estratégico” das</p><p>pro�ssões da comunicação, em que nos aplicamos a fazer coincidir tanto</p><p>quanto possível uma �nalidade, um gênero, um tipo de discurso. Aqui, ao</p><p>contrário, o que alimenta o �uxo constante da atenção e da inscrição é a</p><p>plasticidade das formas que podem variar desde o espaço do saber ao do</p><p>testemunho particular e da troca comercial. Aqui, ainda, tal processo não</p><p>nasceu com as “redes sociais”, mas já havia se a�rmado nos portais de</p><p>informação local que, diferentemente dos sítios web institucionais,</p><p>apoiavam-se na oscilação entre encontro amigável, procedimento cultural e</p><p>transação comercial. Os atores comerciais, desejosos de intervir nos</p><p>espaços quotidianos de troca sem denunciar uma abordagem publicitária</p><p>(BERTHELOT-GUIET; DE MONTETY, 2009), preocupados em explorar a</p><p>“corretagem informacional” (MOEGLIN, 2007) baseada nas informações</p><p>fornecidas pelos internautas, ou ocupados em identi�car o “risco de</p><p>opinião”, (BEAUDOIN, 2001) encontram nesse tipo de espaço plástico uma</p><p>dimensão de ação especial.</p><p>Por outro lado, a retração da enunciação em gestos mínimos (coletar,</p><p>transmitir, destacar, etiquetar) favorece poderosamente o crescimento dos</p><p>�uxos de troca, que é uma das di�culdades maiores da internet</p><p>participativa, a “web 2.0”. A economia da trivialidade baseia-se na</p><p>participação dos internautas, o que permite obter “conteúdos” não pagos,</p><p>suscita a recomendação e capta a preocupação do contato. A lógica do</p><p>“conatus discursivo” (CANDEL, 2007), que conduz cada um a escrever algo</p><p>sobre si, é indispensável. Mas a primeira geração dos blogs e a experiência</p><p>dos fóruns e plataformas de escrita colaborativa não resultaram em uma</p><p>prática social ampla e durável, isso porque manter uma produção</p><p>documentária original demanda, ao mesmo tempo, talento e um</p><p>investimento considerável (REBILLARD, 2007). Sob esse aspecto, o fato de</p><p>prover panóplias de formas microdocumentárias e, em função disso,</p><p>solicitar enunciações mínimas (expressão lacônica, transmissão do já</p><p>escrito, empréstimos furtivos) permite desenvolver um espaço de presença</p><p>social abundante e diversa. É uma forma sociável de vigilância</p><p>mútua que</p><p>tende a se generalizar nos espaços midiáticos (AÏM, 2004), confere</p><p>interesse à singularidade dos gestos quotidianos, ainda que tão pobres e</p><p>recorrentes, porquanto são dinamizados por um contexto ativo.</p><p>En�m, uma análise das formas mais recorrentes mostra que a</p><p>nomeação de eventos, de espetáculos e de produtos – gesto de</p><p>recomendação mínima possibilitado pela comodidade do relacionamento e</p><p>a oferta frequente de ferramentas de apreciação imediata – assegura a</p><p>circulação das práticas e vínculos entre o �uxo permanente da</p><p>comunicação social e o espaço das indústrias culturais do espetáculo, do</p><p>lazer e dos produtos de marca.</p><p>Essa construção, que redistribui e envolve os níveis de pertinência da</p><p>mídia, do texto e do documento, segundo uma lógica contextual,</p><p>individualizada, fragmentada e marcada pela proximidade do gesto é,</p><p>assim, um dos avatares do projeto de racionalização e de otimização do</p><p>potencial comunicacional das mídias informatizadas. Ela concorre com</p><p>outras experiências, tais como a intenção panorâmica dos portais,</p><p>enciclopédias e cartogra�as (FLON; JEANNERET, 2010). Em relação a si</p><p>mesma, a rede social remete à �gura do labirinto, que se caracteriza pelo</p><p>fato de que a experiência está sempre restrita a um espaço particular e</p><p>inibe toda visão sintética. Os murais de posts e as linhas de “organização de</p><p>conteúdos” oferecem aos olhos telas heterogêneas, povoadas de uma</p><p>multidão de elementos em movimento, que ninguém lê de modo completo,</p><p>mas nos quais todo mundo deveria supostamente capturar o conjunto de</p><p>suas ideias sobre o mundo, onde está e no contexto dado, como o</p><p>personagem que caça pássaros no Teeteto.</p><p>Como conclusão, é a encarnação de uma economia singular das</p><p>próprias escritas. Michel De Certeau (1980) propôs uma antítese célebre</p><p>entre estratégia e tática, que demonstrou toda sua fecundidade em relação</p><p>aos primeiros desdobramentos das “tecnologias da informação” e pode ser,</p><p>para tal, incessantemente retomada e atualizada pelos estudos de uso. De</p><p>acordo com essa “economia escritural”, a escrita exprime o domínio de um</p><p>espaço próprio, enquanto a leitura, imagem do uso por excelência, joga</p><p>com as margens e alicia. Essa divisão binária é difícil de coibir no contexto</p><p>dos dispositivos aqui estudados, que também radicalizam o processo de</p><p>delegação de enunciação conduzido pelos sites participativos. As mídias</p><p>informatizadas abalaram, na escrita, uma massa considerável de práticas</p><p>que até então não substituíam a inscrição. Em tal contexto, não é difícil</p><p>que a indústria, por sua vez, esteja do lado da tática, dando a esse termo</p><p>um duplo sentido político e topológico. Muitos modelos de</p><p>desenvolvimento das ferramentas-marca fundam-se no fato de jogar com a</p><p>dimensão criativa dos usos, de recuperar a dinâmica para instrumentalizá-</p><p>la, enquanto asseguram a ocupação dos espaços da leitura, da escrita e da</p><p>atenção. Em resumo, uma arte de dispor as formas para dispor os</p><p>conteúdos.</p><p>Recolocados em uma história longa das indústrias da cultura e da</p><p>comunicação, as “redes sociais” aparecem então como uma das múltiplas</p><p>estratégias desenvolvidas pelos atores para criar valor com as mídias</p><p>informatizadas, em um universo em que as pretensões comunicacionais e</p><p>os modelos de negócios são objeto de constantes incertezas. Associando de</p><p>modo particularmente fácil e compacto, a requisição (a obrigação de</p><p>�gurar nesse espaço) e a panóplia (uma aparelhagem completa de gestos</p><p>documentários e relacionais mínimos), ou seja, unindo o dever fazer e o</p><p>poder fazer em uma proximidade e uma facilidade inéditas, as “redes</p><p>sociais” oferecem uma fórmula viável – pelo menos até que a facilidade não</p><p>se transforme em tédio.</p><p>Nessas condições, não é de se surpreender que se possa fazer leituras</p><p>muito contrastantes da natureza das transformações ocasionadas pelo</p><p>sucesso dos dispositivos microdocumentários como imagem atual das</p><p>“redes sociais”. Podem também ser analisadas como a invenção de um</p><p>novo tema da comunicação a partir de suas práticas documentárias</p><p>(ROJAS, 2009), como um espaço de socialização que funciona em eco com</p><p>a troca ordinária (GIACCARDI, 2010), como o desenvolvimento de uma</p><p>imagem do usuário ativo de uma indústria do conteúdo (BOUQUILLION;</p><p>MATTHEWS, 2010), como um espaço no qual os atores comerciais podem</p><p>avançar disfarçados sob o abrigo da “conversação” (PATRIN-LECLERE,</p><p>2011) ou como a produção de traços memoriais que necessitam de uma</p><p>política e uma vigilância especí�cas (MERZEAU, 2009). Em resumo, a</p><p>relação entre certa logística da escrita, ligada às disciplinas de arquivo</p><p>instrumentalizadas e exploradas, e certo estilo de representação do</p><p>indivíduo e de seu pertencimento produz um “face-book”, “um ‘livro de</p><p>rostos’ em linha: poder-se-ia traduzir assim o título escolhido por esse</p><p>dispositivo de comunicação, totalmente de�nido por uma introdução</p><p>logística das imagens individuais” (WRONA, 2012, p. 383). Todas essas</p><p>interpretações possuem sua pertinência, porque o lema principal do</p><p>capitalismo é o de que não existe valor de troca sem valor de uso – e poder-</p><p>se-ia acrescentar, hoje, que a troca adquire valor apenas pelo uso.</p><p>UM QUESTIONAMENTO DA POSTURA DA PESQUISA</p><p>5</p><p>Tal situação sugere um último olhar que diz respeito à maneira pela</p><p>qual a inovação nos dispositivos afeta as condições do trabalho de</p><p>observação e de pesquisa – e em particular o sentido que se pode dar a uma</p><p>postura analítica e crítica, em relação ao compromisso, ou melhor, ao</p><p>recrutamento, no projeto de transformação social evocado anteriormente.</p><p>Essas análises levam a enfocar, concomitantemente, os dispositivos, as</p><p>práticas e as representações. Compreender, por exemplo, como o desejo de</p><p>escrever é fomentado nos “sites participativos” (CANDEL, 2007) ou como</p><p>a construção das identidades se faz acompanhar por uma panóplia de</p><p>mediações (GOMEZ-MEJIA, 2011) pressupõe, ao mesmo tempo, afastar as</p><p>categorias promocionais para evitar a instrumentalização dos estudos e</p><p>levar a sério a comunicação (LE MAREC, 2004).</p><p>Entretanto, tal abordagem foi e permanece minoritária. Para</p><p>compreendê-la, é preciso examinar a maneira pela qual a pesquisa é</p><p>produzida e difundida. A obrigação de �nanciar a atividade obriga a</p><p>submissão a editais e a concorrer por marcas que impõem o recurso à</p><p>“sociedade da informação”, à “vida digital” e a outras “mídias sociais”. Por</p><p>outro lado, a obsolescência constante dos objetos e o culto da aceleração</p><p>(ROSA, 2010) tendem a traduzir um ato de julgamento (a crítica como</p><p>exercício público da razão) em um diagnóstico de desempenho (a crítica</p><p>como atraso e imobilismo). Em um mundo ameaçado de estar atrasado em</p><p>relação a si mesmo, a crítica está relacionada ao tardio.</p><p>Mais profundamente, o design de informática destaca três tendências</p><p>mais antigas, a saber, a coisi�cação dos usos, a implicação dos</p><p>pesquisadores na comunicação e as ligações entre pesquisa e indústria, o</p><p>que suscita pouco a pouco uma injunção de implicação no design</p><p>propriamente dito. Como os programas �xam cada vez mais normas</p><p>culturais e políticas, muitos pesquisadores militantes estimam que, em vez</p><p>de criticar essas construções tardias, as ciências sociais devem intervir na</p><p>concepção dos dispositivos. Essa posição, fundada em uma concepção</p><p>pragmática do político, conduz o pesquisador a ser envolvido na criação</p><p>dos dispositivos, por exemplo, para de�nir um “design orientado para a</p><p>sociedade” (RIEDER, 2006). Por outro lado, como é próprio às</p><p>ferramentas-marca integrar os usos como o principal motor da</p><p>industrialização da comunicação, as condições de observação deslocam-se</p><p>radicalmente. A de�nição desses dispositivos como lugares de</p><p>“comunidade” e de “encontro” induz o pesquisador à exposição de si</p><p>mesmo. Uma vez que a postura do observador não participante (lurker) é</p><p>estigmatizada, o pesquisador deve se fazer visível, se mediatizar. A força</p><p>da solicitação introduz rapidamente uma espiral vertiginosa entre o fato</p><p>de tomar as redes sociais como objeto de</p><p>análise, o fato de ali produzir uma</p><p>�gura pública do pesquisador-blogueiro e o fato de reconhecer, em sua</p><p>própria propagação midiática (o “buzz”), a medida de sua in�uência</p><p>intelectual. Mais um passo e chegamos à estigmatização da crítica. O novo</p><p>papel dos intelectuais seria o de participar na liberação geral da “fala”.</p><p>Trata-se de um discurso que pode conduzir a um questionamento das</p><p>próprias ciências humanas: face a essa cultura participativa,</p><p>qualquer crítica se torna impossível, porque seria a crítica da democracia [...] A participação</p><p>dos usuários conduz de fato ao esvaziamento de qualquer dimensão crítica, uma vez que</p><p>estão supostamente no centro da produção industrial e que ela se efetua em função de seus</p><p>gostos e de seus interesses (BOUQUILLION; MATTHEWS, 2010, p. 119).</p><p>De certo modo, é apenas uma intensi�cação das tensões que</p><p>atravessam há muito tempo a própria noção de uso, nascida no seio de</p><p>uma abordagem crítica das dependências e implicada na busca da</p><p>aceitabilidade social:</p><p>Atualmente, já dizia há algumas décadas Joelle Le Marec, uma parte dos estudos de uso se</p><p>desenvolve em um outro contexto: são objeto de solicitações prioritárias, no contexto</p><p>político da ‘sociedade da informação’, para sustentar o desenvolvimento do mercado de</p><p>tecnologias contribuindo, em situação paradoxal, ao reforço de uma ancoragem política da</p><p>pesquisa que está em ruptura com a perspectiva teórica que a funda (LE MAREC, 2004, p.</p><p>142).</p><p>Nessas condições, a nova economia escritural, descrita anteriormente,</p><p>feita de escritas encaixadas, de ferramentas poderosas e de produções</p><p>plurais, nos confronta a um movimento contraditório complexo a</p><p>esclarecer: por um lado, escribas cuja identidade é cada vez mais</p><p>heterogênea ganham acesso à escrita pública e apropriam-se das técnicas</p><p>de mediatização; por outro, esses discursos �uem em formas textuais que</p><p>impõem um material escrito cada vez mais pobre em suas invenções</p><p>formais. São assim as mesmas ferramentas que nos fornecem novas</p><p>capacidades de expressão e que nos tornam dependentes de formas cada</p><p>vez mais normalizadas.</p><p>Isso ocasiona uma rede�nição dos poderes e, sobretudo, uma nova</p><p>carga de lucidez para discernir esses últimos. Se, de um lado, os usos</p><p>sociais se tornam o motor visível das trocas, o domínio da própria</p><p>estrutura dessas trocas, de suas formas e de seus encaminhamentos</p><p>logísticos de�ne uma nova forma de indústria superpotente, porém, difícil</p><p>de notar atrás da superioridade aparente da troca entre autores e leitores.</p><p>Tal poder retira sua força capitalística do fato de vender não um “tempo de</p><p>cérebro disponível”, mas um lugar de exposição massiva. As ferramentas-</p><p>marca e os dispositivos microdocumentários saem vitoriosos desse</p><p>processo: são ao mesmo tempo gigantes econômicos e caixas de</p><p>ressonância da atividade comunicacional ordinária. É enquanto dispositivo</p><p>de logística documentária industrializado, conduzindo a trocar</p><p>“fragmentos de identidade” (TARDY; DAVALLON, 2012), mas vivido como</p><p>um espaço de encontro, que o Facebook conquistou sua posição</p><p>privilegiada, pelo menos por algum tempo, nas práticas sociais. E é isso</p><p>que explica a di�culdade de criticar essa ferramenta onipresente, sem</p><p>parecer criticar a própria sociedade.</p><p>Compreender melhor esse jogo é retomar o paradoxo constitutivo do</p><p>mito, assim como Barthes (1956, p. 247) o resumiu, perfeitamente, no</p><p>posfácio de suas Mitologias: “Navegamos sem cessar entre o objeto e sua</p><p>desmisti�cação, impotentes em captar sua totalidade; porque se</p><p>penetramos o objeto, nós o liberamos mas o destruímos; e se o deixamos</p><p>intocado, nós o respeitamos, mas o restituímos, ainda misti�cado”. Não se</p><p>pode de�nir melhor o dilema do analista de “redes sociais”.</p><p>REFÊRENCIAS</p><p>AÏM, O. Une télévision sous surveillance: enjeux du panoptisme dans les “dispositifs” de télé-réalité.</p><p>Communication & Langages, v. 141, n. 141, p. 49-59, set./2004.</p><p>______. La transparence rendue visible: médiations informatiques de l’écriture. Communication &</p><p>Langages, v. 147, n.147, p. 31-45, mar./2006.</p><p>BARTHES, R. Mythologies. Paris: Seuil, 1956.</p><p>BEAUDOIN, J-P. Être à l’écoute du risque d’opinion. Paris: Éditions d’Organisation, 2001.</p><p>BERTHELOT-GUIET, K.; MONTETY, C. de. Hyperpublicitarisation et dépublicitarisation. CIRCA: La</p><p>publicité d’aujourd’hui, n. 20, jul. 2009. p. 63-77.</p><p>BERTHELOT, P. Les médias magasins: du prétexte à l’implication. Communication & Langages, v.</p><p>146, n.146, p. 41-53, dez./2005.</p><p>BOUQUILLION, P.; MATTHEWS, J. Le web collaboratif: mutations des industries de la culture et de la</p><p>communication. Grenoble: Universitaires de Grenoble, 2010.</p><p>CANDEL, E. Autoriser une pratique, légitimer une écriture, composer une culture: les conditions de</p><p>possibilité d’une critique littéraire participative sur internet. 2007. �èse (Sciences de l’Information</p><p>et de la Communication) - Université Paris Sorbonne, Paris, 2007.</p><p>CANDEL, E.; JEANNE-PERRIER, V. Les blogs de peu et la politique ordinaire. Communication &</p><p>Langages, n. 151, p. 49-64, 2007.</p><p>CANDEL, E; JEANNE-PERRIER, V.; SOUCHIER, E. Petites formes, grands desseins: d’une</p><p>grammaire des énoncés éditoriaux à la standardisation des écritures. In: DAVALLON, J. (Org.).</p><p>L’économie des écritures sur le web. Paris: Hermès, 2012. p. 135-157.</p><p>COUZINET, V. (Org.). Dispositifs info-communicationnels: questions de médiations documentaires. Paris:</p><p>Hermès-Lavoisier, 2009.</p><p>______; COURBIERES, C. (Org.). Mediations Et Hybridations: Construction Sociale Des Savoirs Et</p><p>De L’information, 2., 2011, Toulouse. Anais... 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Título original em francês: “En quoi un reseau</p><p>est-il social? Sur une situation critique des sciences humaines”, Comunicazioni sociali, n. 2, 2012.</p><p>REDES DE APRENDIZAGEM, GRUPOS E COMUNIDADES</p><p>6</p><p>Caroline Haythornthwaite</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Nos últimos tempos, ouvimos muito sobre redes, desde as redes de</p><p>grande escala, como a internet até os sites de redes sociais. Há muitos tipos</p><p>de redes, como: redes de conhecimento, redes sociais, redes políticas, redes</p><p>de transporte, redes de compartilhamento de informação, redes de</p><p>aconselhamento e redes de comunicação. Há também redes organizadas</p><p>para prover informação – Web of Science –, rede alimentar, e claro, a World</p><p>Wide Web. Em geral, as redes têm grande apelo, em parte, devido à sua</p><p>visibilidade,7 a qual torna notável estruturas que antes eram invisíveis na</p><p>interação humana.</p><p>Em minhas pesquisas, venho examinando a interação online a partir de</p><p>uma perspectiva da rede social e, nessa abordagem, tenho como foco as</p><p>questões: De que forma as pessoas trabalham, aprendem e se socializam no</p><p>ambiente web? Como os padrões de interação das redes sociais de</p><p>informação dão suporte ao compartilhamento de informação e de</p><p>conhecimentos? Em especial, algumas das minhas pesquisas foram</p><p>baseadas na análise de quem fala com quem, sobre o quê e por quais meios</p><p>(HAYTHORNTHWAITE, 2002a; 2008). Em parte dessas pesquisas, estudo</p><p>os ambientes virtuais de aprendizagem, analiso o desenvolvimento de</p><p>redes pessoais dos estudantes; a percepção de sua participação em uma</p><p>comunidade de aprendizagem e do apoio que recebem dos colegas, assim</p><p>como, o quanto os projetos coletivos afetam quem fala com quem e as</p><p>rami�cações que ocorrem na estrutura da rede.</p><p>Este estudo fornece subsídios para a apreensão da análise da</p><p>aprendizagem (learning analytics). O ponto forte para a percepção da</p><p>dimensão das redes sociais está na compreensão da teoria social em</p><p>conjunto com as técnicas analíticas que podem auxiliar no entendimento</p><p>dos processos de interação, sendo especialmente útil ao ensino proativo, à</p><p>aprendizagem e à educação. Por estarmos no estágio inicial da pesquisa e</p><p>da compreensão das redes de aprendizagem, temos a oportunidade de nos</p><p>fundamentar em célebres estudos realizados sobre redes sociais. Este</p><p>capítulo provê um background baseado em meus próprios estudos sobre</p><p>ambientes de aprendizagem e redes, descrevendo, também, pesquisas</p><p>sobre redes sociais que fornecem embasamento para a aprendizagem</p><p>analítica em termos da teoria de grafo e de estudos do comportamento</p><p>social. Nesse sentido, os questionamentos que me interessam no momento</p><p>incluem: como as redes sociais podem ser empregadas para estudar os</p><p>processos de aprendizagem e de educação? O que precisa ser feito para</p><p>construir uma base analítica para as redes de aprendizagem? E o que pode</p><p>ser utilizado para alavancar a pesquisa de redes de aprendizagem, com o</p><p>que já é conhecido na pesquisa de rede social?</p><p>A discussão apresentada neste estudo demonstra uma visão analítica</p><p>sobre a rede social de aprendizagem, vinculando os aspectos da</p><p>aprendizagem e da rede como subsídios para o propósito da pesquisa em</p><p>aprendizagem analítica.</p><p>Breve Introdução às Redes Sociais</p><p>Atualmente, a ideia de redes sociais tem permeado as discussões sobre</p><p>interação online, devido à adoção de tecnologias conhecidas como “sites de</p><p>redes sociais”. No entanto, o foco aqui não é o estudo desse fenômeno, mas</p><p>uma abordagem do método Análise de Redes Sociais (SNA – Social Network</p><p>Analysis), entendido como um conjunto de técnicas e de conceitos que</p><p>podem ser aplicados ao estudo dos fenômenos sociais e, em especial, às</p><p>relações e estruturas sociais. A principal característica de análise das redes</p><p>sociais é a ênfase nas propriedades relacionais, em vez do comportamento</p><p>agregado.</p><p>As propriedades relacionais são apresentadas pela interação, transação,</p><p>comunicação ou colaboração, que ligam dois ou mais atores em uma rede.</p><p>As relações podem ser distinguidas por características como conteúdo,</p><p>direção e força, particularmente na transmissão de instruções e no</p><p>fornecimento de materiais versus o apoio social ou a colaboração em uma</p><p>parceria formal. Os atores ligados por essas relações podem ser indivíduos,</p><p>grupos ou equipes, centros, organizações, países etc. As ligações que</p><p>resultam da manutenção dessas relações podem ser distinguidas pelos</p><p>conjuntos que tais relações mantêm em suas composições, multiplicidade,</p><p>importância etc., assim como na forma como as relações são mantidas, por</p><p>exemplo, por meio de diversas mídias e com diferentes graus de</p><p>frequência, intensidade ou intimidade.</p><p>As redes são constituídas pelas interações diretas e indiretas e podem</p><p>ser entendidas com base nessas interações – em quem interage com quem</p><p>–, como também em torno da coparticipação ou da coassistência, como por</p><p>exemplo: as pessoas que frequentaram a mesma palestra, quer se</p><p>conhecem ou não, estão ligadas por uma experiência comum, pelo acesso à</p><p>mesma informação ou por um interesse em comum.</p><p>As redes podem ser encontradas em muitas de nossas atividades</p><p>diárias e, com uma frequência cada vez maior, podem ser facilmente</p><p>visualizadas</p>