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<p>19 lições de PEDOLOGIA Igo F. Lepsch oficina textos</p><p>de PEDOLOGIA</p><p>oficina 19 lições de PEDOLOGIA Igo F. Lepsch</p><p>© Copyright 2011 Oficina de Textos reimpressão 2013 Grafia atualizada conforme o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, em vigor no Brasil a partir de 2009. CONSELHO EDITORIAL Arthur Pinto Chaves; Cylon Gonçalves da Silva; José Galizia Tundisi; Luis Enrique Sánchez; Paulo Helene; Rozely Ferreira dos Santos; Teresa Gallotti Florenzano CAPA Malu Vallim PREPARAÇÃO DE TEXTOS Gerson Silva PROJETO GRÁFICO Douglas da Rocha Yoshida e Malu Vallim PREPARAÇÃO DE FIGURAS E DIAGRAMAÇÃO Allzone Digital Services Limited REVISÃO DE TEXTOS Felipe Marques, Ivana Q. de Andrade e Paula Marcele Sousa Martins REVISÃO TÉCNICA Zilmar Ziller Marcos IMPRESSÃO E ACABAMENTO Vida & Consciência Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Lepsch, Igo F. 19 lições de pedologia / Igo F. Lepsch. -- São Paulo : Oficina de Textos, 2011. Bibliografia. ISBN 978-85-7975-029-8 eISBN 978-85-7975-210-0 1. Ciência do solo I. Título. 11-08038 CDD-631.4 Índices para catálogo sistemático: 1. Ciência do solo: Pedologia 631.4 Todos os direitos reservados à Oficina de Textos</p><p>Rua Cubatão, 959 CEP 04013-043 - São Paulo - Brasil Fone (11) 3085 7933 Fax (11) 3083 0849 www.ofitexto.com.br e-mail: atend@ofitexto.com.br</p><p>P PREFÁCIO A ideia de escrever este livro começou quando, em 1998, comecei a ministrar a disciplina "Gênese, Morfologia e Classificação dos Solos" para estudantes de agronomia na Universidade Federal de Assim como outros colegas responsáveis por disciplinas idênticas em outras universidades, percebi que havia uma carência de material didático dirigido a estudantes brasileiros em relação aos aspectos básicos da Ciência do Solo, com ênfase àquela disciplina. Nos primeiros livros que escrevi sobre solos - Solos: formação e conservação (1972) e Formação e conservação dos solos (2002), sob a forma de "livro de bolso" -, procurei usar uma linguagem bem simples, precisa e acessível, adicionando muitas ilustrações. Neles, a intenção foi oferecer ao público em geral e a iniciantes do estudo das ciências da terra, principalmente os de colégios de nível técnico, alguns conhecimentos básicos sobre solos. Esses livros têm sido muito bem aceitos e, apesar de não terem sido destinados a alunos de graduação, passaram a ser utilizados como complemento de cursos como os de Agronomia, Geografia, Biologia etc. A convicção de que continuava havendo a necessidade de um livro- texto dirigido a estudantes universitários brasileiros que contemplasse, de maneira mais detalhada, os conhecimentos da Pedologia - aqui entendida como estudo do solo em seu ambiente natural -, fez com que eu me lançasse à tarefa de escrever o 19 Lições de Pedologia. Para realizar este trabalho, fui buscar inspiração nas aulas do saudoso Petzval O. da Cruz Lemos, meu primeiro professor de Pedologia no curso de Agronomia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, em 1959, e também no "audiotutorial" conhecido como Concepts in Soil</p><p>Science, desenvolvido pelo professor Maurice G. Cook, da North Carolina State University (EUA), ao qual muito agradeço por autorizar o uso da sua metodologia. Outras fontes de inspiração foram os colegas do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), com destaque para Bernardo van Raij e os saudosos Alfredo Küpper e Antônio C. Moniz; os colegas da Embrapa-Solos (RJ), em especial o saudoso Marcelo Nunes Camargo, e os colegas do CSIRO/Division of Soils (Austrália), com destaque para o saudoso Ray Isbell. Vários outros colegas contribuíram com observações teóricas, críticas bem fundamentadas, sugestões de leitura e tudo o mais que se abriga sob o teto generoso da amizade; são eles: Antônio C. Azevedo, Luiz R. F. Alleoni, Klaus Reichardt, Pablo Vidal-Torrado, Rubismar Stolf e Zilmar Z. Marcos. Não posso deixar de mencionar o trabalho de leitura feito por vários estudantes de graduação, pós-graduação e pós-doutoramento, a quem ofereci as primeiras versões de várias das lições aqui apresentadas, uma vez que ninguém melhor do que eles para saber se a linguagem do texto estava clara e adequada às suas necessidades de aprendizagem e ao ensino da Pedologia. Assim, e desde já desculpando-me por alguma inadvertida omissão de nomes, agradeço a Akenia Alkmim, Mariana Delgado, Marina Y. Reia, Mathilde A. Bertoldo, Rodrigo S. Macedo e Tatiana Rittl, e especialmente ao Gabriel R. P. Andrade, que elaborou a primeira versão de todas as questões e respostas inseridas nas lições. Pelas variadas fotos e outras ilustrações que enriquecem a presente obra, agradeço a Adriana C. G. de Souza, Adriano R. Guerra, Antonio G. Pires Neto, Eloana Bonfleur, Heloísa H. G. Coe, Júlio Gaspar, Marlen B. e Silva, Miguel Cooper, Mariana Delgado, Marston H. D. Franceschini, Osmar Bazaglia Filho, Rodrigo O. Zenero, Rodrigo E. M. de Almeida, Rodnei Rizzo e Pablo Soares. Destaco, ainda, as fotos enviadas pelos colegas John Kelley (United States Department of Agriculture / National Research Conservation Service); Stanley W. Buol (Emeritus Soil Professor, North Carolina State University), Mendel Rabinovitch (engenheiro agrônomo e ex-cineasta) e Márcio Rossi (Instituto Florestal, SP) Agradeço a todos professores da graduação e pós-graduação que me entusiasmaram no estudo dos solos; aos meus colegas do Instituto Agronômico do Estado de São Paulo (IAC); aos meus colegas e estudantes da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Estadual Paulista (FCAV-</p><p>Unesp), com destaque para a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (USP), em cuja Biblioteca Central passei grande parte do tempo na produção deste livro. Agradeço também àqueles que primeiro me apresentaram o solo e nele me ensinaram não só a plantar frutas, verduras e plantas ornamentais, mas principalmente a apreciá-lo na sua essência (com suas cores e texturas), despertando em mim o desejo de estudá-lo a fim de preservá-lo: meu pai, Jacob A. Lepsch (fazendeiro) e meu tio Reynaldo Lepsch (engenheiro agrônomo). Por fim, quero expressar minha profunda gratidão a Ivana, minha companheira, pelo seu estímulo à idealização e produção desta obra, e também pelo empenho na revisão do texto. Seu apoio foi imprescindível para que este livro, fruto de muito amor, pudesse ser completado. Igo F. Lepsch</p><p>A APRESENTAÇÃO O que é um livro? Que ideia traz à mente a palavra "livro"? Um feixe de páginas presas juntas num dos lados e envoltas por uma capa com maior espessura que as folhas, ostentando um título para indicar o seu conteúdo. Embora a essência do livro esteja nas páginas internas, é na capa que aparece a primeira indicação da intenção do autor ao escrevê-lo. Há livros escritos para entreter, outros para emocionar e ainda outros mais que são oferecidos para instruir o leitor na execução de uma tarefa, desde como montar seu próprio arsenal de mágicas até o seu próprio receptor de programas de televisão. Esses tipos de livros, além de outros que neste momento podem estar lhe ocorrendo, são de definição simples quando comparados a livros criados para a divulgação de conhecimentos codificados segundo os preceitos da Ciência. A razão é, salvo melhor juízo, que a Ciência, considerada como a busca incessante do conhecimento, está sujeita à interminável revisão e constante ampliação. De fato, mensalmente, se não diariamente, pelo mundo afora são publicadas centenas de revistas, cada uma com dezenas de relatórios de pesquisas realizadas, informando sobre novas descobertas, explicações, invenções e reparos de algum erro anteriormente divulgado. Esse ininterrupto manancial composto de leis, princípios, conceitos e dados é continuamente despejado no já vasto oceano do conhecimento científico. Quem poderá acompanhar com algum grau de eficiência tal dilúvio de páginas escritas? O erudito experiente aprendeu a satisfazer seu desejo de manter-se atualizado escolhendo uma fração da Ciência para acompanhar mais detalhadamente, dando do seu interesse ao restante, uma atenção mais superficial, por assim dizer caracterizando-se, em</p><p>relação a ele, como um generalista. Mas e quanto ao neófito, ao leigo, trazendo consigo, ainda, não mais do que noções vagas e superficiais recolhidas nos primeiros anos de estudo disciplinado? Atualizar-se com as publicações é como tentar abarcar, com a ajuda do cérebro, o passado completo ou percorrer esse Himalaia montado com folhas de papel. Como começar, e também como recompor, na mente, o conjunto, o panorama de um dos ramos ou divisões da Ciência que, como o todo do conhecimento, prossegue em constante ampliação? Para ele, a resposta está no livro didático, escrito com o declarado propósito de colocar ao seu alcance, mental e temporal, um compêndio contendo o essencial quanto a princípios, leis, conceitos, vocabulário, importância e significado para a humanidade. De quando em quando, algum ramo da Ciência é revisitado e um novo livro é produzido, tendo como alvo principal o aprendiz. A Pedologia, também um detalhe no panorama amplo do conhecimento, tem para oferecer muitas obras desse tipo. Constituem-se de uma exposição dos preceitos aceitos até o momento, contados de modo a captar a atenção e provocar o interesse do estudante em prosseguir a leitura com a dedicação de um estudioso. Agora, você tem diante de si o livro 19 Lições de Pedologia. A introdução escrita pelo autor, Igo F. Lepsch, na primeira pessoa, numa linguagem íntima e amistosa, prepara o leitor para sentir-se como se o professor estivesse lhe falando. O sumário mostra a posição do autor em relação ao leitor. Os tópicos são apresentados de modo a provocar a mente para antecipar a pergunta para a qual deverá estar preparado para responder, após ter feito a leitura de cada tópico assim como deve fazer o professor na sala de aula. Do ponto de vista pedagógico, essa é a didática adotada. Há pelo livro todo essa sensação de estar recebendo o texto ao vivo. Esse efeito é atingido pela montagem original das partes e pelas partições escolhidas. Até mesmo as repetições aparecem quase que sorrateiramente, não para surpreender o leitor, mas para atender à sua sentida vontade de um reforço nos pontos mais fundamentais e no que é peculiar e particular da Pedologia. Além disso, as citações bibliográficas, ao final de cada lição, não foram escolhidas para indicar a fonte original da informação, do conhecimento, mas para complementar o estudo. Creio que Igo F. Lepsch está nos contando, com o seu livro, que assim é como gostaria de ter estudado sobre os solos que estão</p><p>distribuídos sobre o nosso planeta. Zilmar Ziller Marcos ADAE/ESALQ</p><p>S SUMÁRIO INTRODUÇÃO 1 HISTÓRICO E FUNDAMENTOS DA CIÊNCIA DO SOLO 1.1 Os primeiros conhecimentos sobre solo 1.2 As primeiras civilizações: mesopotâmicos, egípcios, indianos, chineses, astecas e incas 1.3 Gregos e romanos 1.4 Os árabes e a Idade Média europeia 1.5 Os alquimistas e a busca pelo "espírito da vegetação" 1.6 A escola de Liebig e a "lei do mínimo" 1.7 A escola russa 1.8 Os primeiros congressos internacionais de Ciência do Solo 1.9 Subdivisões do estudo dos solos 1.10 Conceitos de solo 1.11 Funções ecológicas 2 ROCHAS E SEUS MINERAIS 2.1 Diferenças entre solo, regolito e saprólito 2.2 Diferenças entre um elemento químico, um mineral e uma rocha 2.3 Como se formam os minerais? 2.4 que são substituições isomórficas? 2.5 Quais são os elementos mais comuns nos minerais? 2.6 Propriedades físicas dos minerais</p><p>2.7 Quais os principais tipos de rochas? 2.8 Examinando melhor os três grupos de rochas 2.9 Composição química dos minerais 3 INTEMPERISMO DOS MINERAIS DAS ROCHAS E FORMAÇÃO DOS MINERAIS DE ARGILA 3.1 Intemperismo físico e químico 3.2 Como age intemperismo físico? 3.3 Como ocorre o intemperismo químico? 3.4 Por que algumas rochas se intemperizam mais rápida e profundamente que outras? 3.5 Os produtos do intemperismo 4 Os SÓLIDOS ATIVOS DO SOLO: ARGILA E HÚMUS 4.1 que são as argilas? 4.2 Classificação das argilas 4.3 De onde vêm as cargas das argilas? 4.4 que é (e como se forma) húmus? 5 CAPACIDADE DE TROCA DE ÍONS 5.1 Como acontecem as trocas de cátions do solo? 5.2 Como quantificar a CTC de uma amostra de solo? 5.3 Fatores que determinam maior ou menor retenção dos cátions nos coloides 5.4 Um exemplo de troca de íons 5.5 Quantificando as trocas ionicas 5.6 Fatores que afetam a CTC do solo 5.7 Capacidade de troca de ânions (CTA) 5.8 Perspectiva 6 FÍSICA DO SOLO I: GRANULOMETRIA, DENSIDADE, CONSISTÊNCIA E AR DO SOLO 6.1 Tamanho de partículas e sua distribuição (composição granulométrica) 6.2 Estrutura e seus agregados 6.3 Densidade (do solo e de partículas) e porosidade 6.4 Consistência 6.5 o ar do solo</p><p>7 FÍSICA DO SOLO II: RETENÇÃO E MOVIMENTO DA ÁGUA, TEMPERATURA ETC. 7.1 Estrutura e propriedades da água 7.2 Diferenças entre moléculas de água retidas por coesão e por adesão 7.3 Capacidade de campo 7.4 Ponto de murcha permanente (PMP) 7.5 Água disponível (AD) e capacidade de água disponível (CAD) 7.6 Como medir a quantidade de água contida em um solo? 7.7 Movimentos da água no solo 7.8 Permeabilidade do solo em fluxo saturado e não saturado 7.9 Relações solo-água-planta 7.10 Temperatura do solo 8 QUÍMICA DA FASE LÍQUIDA DO SOLO 8.1 As reações biogeoquímicas da fase líquida do solo 8.2 que é uma solução química? 8.3 Movimento dos íons: da fase sólida para a líquida 8.4 Principais ânions: cloretos, sulfatos, bicarbonatos e nitratos 8.5 Principais cátions: cálcio, magnésio, potássio, sódio e alumínio 8.6 Ácido silícico, compostos orgânicos e gases na solução do solo 8.7 Solução do solo e pedogênese 8.8 Influência das concentrações de oxigênio, cátions e sílica na formação das argilas 8.9 Como retirar amostra da solução do solo? 9 MORFOLOGIA: ORGANIZAÇÃO DO SOLO COMO CORPO NATURAL 9.1 Paisagens, corpos de solos e perfis de solos 9.2 Como descrever um solo? 9.3 Principais feições morfológicas 9.4 Denominações dos horizontes 10 ACIDEZ E ALCALINIDADE 10.1 que significa pH? 10.2 Por que existem solos ácidos e alcalinos? 10.3 Os diferentes tipos de acidez</p><p>10.4 Efeito do tipo de cátion básico sobre pH 10.5 Poder tampão dos solos 10.6 Importância da acidez do solo no crescimento das plantas 10.7 Ajuste do pH em solos agrícolas 10.8 Como calcular a quantidade de calcário necessária para neutralizar os níveis elevados de acidez? 10.9 Alcalinidade e salinidade 11 BIOLOGIA DO SOLO: ORGANISMOS VIVOS E MATÉRIA ORGÂNICA 11.1 Tipos de organismos 11.2 Macroanimais mais comuns do solo: artrópodes e vermes 11.3 Microfauna (nematoides, protozoários e rotíferos) 11.4 Microflora (algas, bactérias, fungos e actinomicetos) 11.5 Fatores que condicionam o tipo e a quantidade de micro- organismos do solo 11.6 Efeitos dos organismos no solo 11.7 Matéria orgânica 11.8 Relações carbono/nitrogênio 12 ANÁLISE DA FRAÇÃO SÓLIDA DO SOLO 12.1 Fertilidade versus produtividade do solo 12.2 Tecnologias que devem ser utilizadas para se conhecer solo 12.3 Análises químicas e físicas para fins pedológicos 12.4 Análises de solo para fins de recomendação de adubações 12.5 Perspectiva 13 PROCESSOS E FATORES DE FORMAÇÃO DO SOLO 13.1 Voltando no tempo 13.2 Principais processos de formação do solo 13.3 Fatores de formação do solo 13.4 Retrospectiva 14 CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS 14.1 Classificações técnicas e naturais 14.2 Atributos diferenciais dos solos 14.3 Primeiros sistemas naturais de classificação 14.4 Sistemas modernos de classificação - horizontes diagnósticos</p><p>14.5 Classificação norte-americana 14.6 Classificação da FAO/Unesco 14.7 Outros sistemas de classificação de solos 15 SISTEMA BRASILEIRO DE CLASSIFICAÇÃO DE SOLOS (SIBCS) 15.1 Estrutura hierárquica do SiBCS 15.2 As seis categorias do SiBCS 15.3 Visão geral dos solos brasileiros (ordens e subordens) 16 LEVANTAMENTOS DE SOLOS 16.1 Utilidades dos levantamentos pedológicos 16.2 Definição e modo de execução de um levantamento pedológico 16.3 Por que e como são feitos os mapas de solos? 16.4 Quais os diferentes tipos de unidades de mapeamento? 16.5 Os relatórios dos levantamentos de solos 16.6 Quais são os tipos de levantamentos pedológicos? 16.7 Mapas utilitários e interpretativos 16.8 Avanços recentes nos levantamentos de solos 17 SOLOS DO BRASIL 17.1 Solos da Amazônia 17.2 Solos do Nordeste 17.3 Solos da Região Centro-Oeste 17.4 Solos da Região Sudeste 17.5 Solos da Região Sul 17.6 Panorama dos solos do Brasil em relação à agricultura 18 SOLOS E CLIMAS DO MUNDO 18.1 Solos dos trópicos e subtrópicos úmidos 18.2 Solos dos trópicos com longa estação seca 18.3 Solos dos climas mediterrâneos 18.4 Solos das regiões montanhosas 18.5 Solos das zonas áridas 18.6 Solos das zonas temperadas 18.7 Solos da zona fria 18.8 Solos das zonas boreais e polares</p><p>18.9 Panorama dos recursos dos solos do mundo para a agricultura 19 DEGRADAÇÃO E CONSERVAÇÃO DOS SOLOS 19.1 A conservação dos solos 19.2 Causas do depauperamento dos solos 19.3 Erosão dos solos 19.4 Os métodos de conservação dos solos 19.5 Capacidade de uso e planejamento conservacionista das terras 19.6 Retrospectiva e perspectiva BIBLIOGRÁFICAS ÍNDICE REMISSIVO</p><p>I INTRODUÇÃO Olá! Seja bem-vindo(a) às nossas Lições de Pedologia. Mas, antes de iniciá-las, gostaria de contar-lhe algumas histórias e estórias. Histórias de como tudo começou com um imenso Big Bang e estórias de como tudo pode estar terminando em uma imensa "big bagunça". Segundo as mais modernas teorias, o Big Bang foi uma espécie de "gatilho" que, quando apertado, fez surgir, em menos de um segundo, todo o Universo. Cerca de 10 bilhões de anos depois, as primeiras formas de vida surgiram na Terra e foram evoluindo até que, perto de somente 100 mil anos atrás, surgiram a nossa espécie, o Homo sapiens, e suas primeiras aldeias. Você sabia que, na sociedade primitiva, na qual os homens começaram a formar as primeiras tribos, o conhecimento do nosso meio ambiente era compartilhado igualmente entre eles? Agora imagine você, membro de uma dessas tribos, à noitinha, reunindo-se em volta de uma fogueira com pessoas mais velhas e mais experientes que, entre outras coisas, lhe contam o que aprenderam nas suas andanças. Como um dos membros mais novos desse grupo, você os escuta com atenção e depois lhes faz perguntas para tirar algumas dúvidas. Se algo interessante lhe fosse revelado - como uma árvore com frutos mais saborosos, o local de um rio com peixes maiores, ou um solo com variados tons da cor vermelha para pintar seu corpo ou desenhar na parede de alguma caverna -, certamente você pediria que a novidade lhe fosse logo mostrada. Hoje as coisas mudaram: as aldeias transformaram-se em grandes cidades de populosas nações, e o conhecimento aumentou muito e se fragmentou em diversas áreas. Mas algo daquelas reuniões tribais ainda tece não só as histórias da humanidade, como também os avanços da</p><p>Ciência. Quando eu era um garoto, gostava de ouvir as histórias contadas pelos meus avós, pais, tios e professores, principalmente aquelas que falavam sobre a natureza. Assim, estimulado pelo que eles me ensinaram, eu me especializei em Pedologia, ou seja, no estudo da Ciência do Solo. Além disso, tive a oportunidade de conhecer muitas universidades e de cavar e examinar os solos de campos e matas de muitos locais deste nosso Brasil e do mundo afora. Hoje sou mais velho e mais experiente, e me sentindo como um ancião daquelas tribos primitivas, sinto necessidade e obrigação de compartilhar com você muito do que aprendi. Acredite, eu gostaria de fazê-lo da forma como nossos ancestrais faziam: num bom papo em volta de uma acolhedora fogueira e, depois, acompanhar você ao campo para cavar e mostrar as cores e os pendores dos solos (Fig. 1). Contudo, como nossas "tribos" e nossos territórios são agora muito grandes, resta-me a opção de escrever, a fim de compartilhar alguns dos meus conhecimentos. Além disso, aconselho que você sempre participe intensamente das aulas práticas promovidas pelos seus professores, principalmente aquelas que acontecerão em meio à natureza, onde você poderá conhecer in loco todos os aspectos da superfície e do interior do solo. Meu desejo é que, ao ler este livro, você aprenda a ver o solo não só com os olhos e as mãos, mas também com o coração.</p><p>Fig. 1 Modelo de ensino da forma como nossos ancestrais faziam: o começo se dá num bom papo em volta de uma acolhedora fogueira (Foto: Rodrigo O. Zenero) Desta forma, usando uma linguagem simples - mas sempre calcada em modernos dados técnico-científicos -, pouco a pouco tentarei ajudá- lo a decifrar e conhecer melhor as admiráveis partes que constituem o solo. Elas estão em íntimo contato com o ar da atmosfera, as rochas da litosfera, os organismos da biosfera e as águas da hidrosfera - dos quais a nossa vida muito depende. A maioria das pessoas, por exemplo, só consegue ver, das três dimensões do solo, apenas duas: comprimento e largura - as que formam a superfície e que estão mais próximas da atmosfera. Muitas vezes, porém, deixam de ver a profundidade. Por isso, insisto: familiarize-se também com esta terceira dimensão do solo. Vá ao campo e, sem medo de "sujar" as mãos, cave, escave, olhe e toque as suas camadas (que em Pedologia são chamadas de "horizontes"). Existem muitos solos diferentes, da mesma forma como existem diferentes climas, rochas, árvores e águas. Cada solo tem seu próprio arranjo de horizontes e, portanto, sua própria história - aquela que o condicionou a ter certas funções que estão refletidas nos seus atributos mineralógicos, biológicos, físicos e químicos.</p><p>Em nossas conversas, que organizei em forma de Lições de Pedologia, iremos contar essa história e estudar essas funções principalmente as relacionadas com o crescimento das plantas. Além disso, aprenderemos a examinar a aparência dos solos e a analisar e interpretar seus atributos. E como toda história tem um começo, que tal iniciarmos imaginando os efeitos de um "big bang" criador e de um "big estrago" destruidor? Acredito que você já tenha ouvido falar no Big Bang. Esse "instante criador", marcado por uma gigantesca explosão, aconteceu há cerca de 14 bilhões de anos, quando o espaço, o tempo e a matéria ainda não existiam. Da energia dessa "explosão" surgiu toda a matéria dos corpos celestes, entre os quais o nosso incandescente e resplandecente Sol e, em sua volta, nosso então também incandescente planeta Terra, que foi se esfriando e solidificando aos poucos até formar uma capa sólida ao seu redor. As temperaturas elevadas, que geravam altas pressões vindas do interior do nosso planeta, começaram a romper essa capa, expelindo inúmeros gases, os quais formaram uma protoatmosfera que, num primeiro momento, continha muito vapor d'água, gás carbônico e enxofre, e depois metano, amônia e nitrogênio, mas ainda quase nenhum oxigênio livre. Com a continuação do resfriamento dessa crosta ou litosfera -, os vapores d'água foram se condensando e ocorreram muitas chuvas. Tantas que acabaram formando os primeiros oceanos. Com as chuvas e os ventos, as rochas dessa litosfera começaram a se decompor, fragmentando-se e formando as primeiras areias e argilas dos antecessores dos primeiros solos os "protossolos". Como na atmosfera ainda não existia oxigênio livre e ozônio (O3), a vida só poderia ter início nas águas, entre as areias e argilas dos protossolos. As águas se acumularam e nelas, protegidas das radiações ultravioleta, as "células- vidas" puderam se originar. Primeiramente surgiram as "células- bactérias" - os procariontes -, com DNA, mas sem clorofila. Depois, "células-algas clorofiladas" as espirulinas. Estas então começaram, com a energia dos fótons, a sintetizar o gás oxigênio a partir da água, gás carbônico e outros nutrientes, como fosfatos, nitratos etc. Parte do oxigênio assim produzido, sob a ação dos raios ultravioleta, decompunha-se e formava gás ozônio, que se acumulou como uma camada protetora na estratosfera. Desse modo, as primeiras formas de vida multiplicaram-se. Provavelmente primeiro nas águas contidas nos poros que existiam ao redor das areias e argilas dos protossolos, e depois nos oceanos e mares.</p><p>Após alguns milhões de anos, o e o O3 assim formados já compunham boa parte da atmosfera. Com a morte dos indivíduos monocelulares que cresciam na água existente entre os pequenos fragmentos de rocha, matérias orgânicas foram incorporadas a boa parte da superfície sólida da Terra. Imagino que deva ter sido assim que o objeto maior de nosso estudo o solo começou a nascer e crescer: primeiro vieram os Neossolos, depois os Cambissolos e os Argissolos. Por último, os Latossolos (mais tarde veremos o significado desses "nomes científicos"). Como o solo estava se desenvolvendo, a Terra podia sustentar formas mais organizadas de vida, incluindo muitos organismos clorofilados, como as algas verdes. Depois, vieram os musgos briófitas e as samambaias pteridófitas. Estas últimas, embora ainda sem sementes, mas já com vasos condutores de seiva, usavam o solo, no qual fixavam suas raízes para dele extraírem água e nutrientes, o que contribuía, de forma significativa, para o fenomenal processo da fotossíntese e, consequentemente, para continuar a síntese de oxigênio, que era "turbinada" por outro fenômeno importante, que mais tarde veremos em detalhe: a capacidade de troca de íons do solo. Assim, o oxigênio da atmosfera aumentava à medida que o gás carbônico diminuía, isto porque seus átomos de carbono eram sequestrados em grandes quantidades de biomassa, boa parte da qual foi enterrada e fossilizada no que hoje conhecemos como petróleo e carvão mineral. Assim, à medida que os solos evoluíam, os vegetais também o faziam. As plantas, além de folhas clorofiladas, passaram a ter frutos e sementes, de acordo com o que está escrito em muitos livros sagrados, inclusive na Bíblia: "E a terra produziu erva, erva dando semente conforme a sua espécie, e a árvore frutífera, cuja semente está nela conforme a sua espécie" (Gn 1:12). Paralelamente, pouco a pouco foram surgindo espécies animais que se alimentavam não só da biomassa sintetizada pelos vegetais, como também de outros animais. Primeiro vieram os invertebrados, depois os vertebrados e, entre estes e por último, o homem biblicamente chamado "Adão" ("... e formou Deus o Homem do pó da terra...", Gn 2:7). Talvez você se interesse em saber que o nome "Adão" vem do hebraico adamá, que significa "solo vermelho" ou "do barro vermelho". E mais: foi dado a esse ser, considerado o ícone da criação divina, domínio sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra" (Gn 1:26). O Homem sapiens, somente há alguns milhares de anos, vem se</p><p>multiplicando e explorando uma natureza que levou tantos bilhões de anos para se formar. Ou seja, à custa dos recursos naturais, os indivíduos desta nossa espécie foram desordenadamente crescendo e, para criar condições favoráveis à sua vida, foram modificando a natureza, derrubando árvores, arando o solo, construindo estradas etc. Hoje, talvez não muito "sapiamente", a população aumenta cada vez mais e, portanto, consome cada vez mais água, alimentos e energia. Com isso, a maior parte das florestas e dos campos vem sendo substituída por áreas urbanas, lavouras e pastagens, a fim de atender à constante demanda de moradia e alimento dos quase seis bilhões desses novos Homo sapiens, cada vez mais famintos e exigentes em conforto. Para atender a toda essa demanda, o solo, que muito tempo levou para se formar, vem se desgastando rapidamente, enquanto o gás carbônico, também por tanto tempo captado pelas plantas, vem retornando à atmosfera, principalmente pela queima da matéria orgânica dos solos, do petróleo e do carvão. Por isso tenho dito que estamos fazendo um "big estrago" naquilo que começou com um resplandecente "big Com os dejetos produzidos nas cidades, as águas e o ar vêm sendo poluídos e, com o desgaste dos solos, os alimentos escasseiam, fazendo com que as fronteiras agrícolas avancem à custa de desmatamentos. Com a queima dos combustíveis fósseis e das florestas, o excesso de produz o efeito estufa e aumenta a temperatura da Terra, provocando o derretimento do gelo das calotas polares, a elevação do nível dos oceanos e o alargamento dos desertos. Uma possível consequência, por exemplo, é o desaparecimento de cidades em razão das doenças e ações violentas da natureza, como os as secas e as enchentes, que já estão sendo divulgados pela mídia. Ao tomarmos conhecimento desses fatos, muitos se perguntam: será que, por causa de tanto estrago que fizemos à terra que antes tão bem nos alimentava, agora, por vingança, ela nos destrói? Talvez uma solução seja passarmos a olhar o solo segundo o que ele tem de mais jovial e fecundo, o mesmo olhar de esperança com que poeta português Antônio Gedeão fala do caráter promissor da juventude. Desse modo poderemos perceber esta que, certamente, foi uma das maiores criações resultantes do disparo daquele "big gatilho": o solo. ROSA BRANCA AO PEITO</p><p>(Antônio Gedeão, Portugal, 1906-1997) Teu corpinho adolescente cheira a princípio do mundo. Ainda está por soprar a brisa que há de agitar a tua seara. Ainda está por romper a seara que há de rasgar o teu solo fecundo. Ainda está por arrotear o solo que há de sorver a água clara. Ainda está por ascender a nuvem que há de chover a tua chuva. Ainda está por arder o sol que há de evaporar a água da tua nuvem. Mas tudo te espera desde o princípio do mundo: a doce brisa, a verde seara, o solo fecundo. Tudo te espera desde o princípio de tudo: a água clara, a fofa nuvem, o sol agudo. Tu sabes, tu sabes tudo. Tu és como a doce brisa, a verde seara e o solo fecundo que sabem tudo desde o princípio do mundo. Tu és como a água clara, a fofa nuvem e o sol agudo que desde o princípio do mundo sabem tudo. O teu cabelo sabe que há de crescer e que há de ser louro. As tuas lágrimas sabem que hão de correr nas horas de choro Os teus peitos sabem que hão de estremecer no dia do riso. O teu rosto sabe que há de enrubescer quando for preciso. Quando te sentires perdida fecha os olhos e sorri. Não tenhas medo da Vida que a Vida vive por si. Tu és como a doce brisa, a verde seara e o solo fecundo que sabem tudo desde o princípio do mundo. Tu és como a água clara, a fofa nuvem e o sol agudo. A tua inocência sabe tudo. Em seu encontro com Édipo, na tragédia grega de Sófocles (496-406 a.C.), uma esfinge diz: "Decifra-me ou devoro-te". Talvez você esteja agora me perguntando: "O que devo eu decifrar para não ser devorado por esse 'big Poderia eu lhe responder: cada um pode fazer um pouco, como, por exemplo, compreender como os solos se formam e</p><p>como vêm funcionando ao longo dos tempos, pois é preciso conhecê-los para protegê-los, e é bom que isso seja feito desde a nossa infância (Fig. 2). Fig. 2 O ideal é que o conhecimento sobre o solo nos seja passado desde a mais tenra idade (Foto: Juliana Simões Lepsch) Da mesma forma como os antigos filósofos gregos diziam que o conhecimento, por meio da educação, leva o homem ao máximo possível de sua perfeição, eu lhe digo que o meu desejo é que os conhecimentos que aqui iniciei a compartilhar com você cresçam e se multipliquem, tal como uma semente boa em solo fecundo. Afinal, aprender a decifrar um pouco dos multicoloridos solos (Fig. 3) já é um bom passo para diminuir os muitos estragos que estamos fazendo ao nosso belo planeta verde- azul.</p><p>Fig. 3 As muitas cores dos solos brasileiros. Nas regiões de clima frio ou temperado (como o norte da Europa e das Américas), os solos não têm</p><p>as vivas cores amarelada, laranja e vermelha, muito comuns nos trópicos úmidos (Fotos: I.F. Lepsch e S. W. Buol) Parafraseando Milton Nascimento e Chico Buarque, faço a você o seguinte convite: venha comigo afagar a terra, conhecer os desejos da terra, pois a terra está no cio: esta é a propícia ocasião para fecundar o chão.</p><p>Lição 1 HISTÓRICO E FUNDAMENTOS DA CIÊNCIA DO SOLO (...) graças à conhecida posição do nosso planeta em relação ao Sol, graças à sua rotação e à sua forma esférica, o clima, a vegetação e a vida animal estão distribuídos na superfície da Terra, de norte a sul, em uma ordem estritamente determinada (...) que permite a divisão da esfera em zonas: polar, temperada, equatorial e assim por diante. E, uma vez que os agentes formadores do solo estão sujeitos a leis conhecidas que regem a sua distribuição, seus resultados (...) devem estar distribuídos na esfera terrestre em zonas definidas, que se situam mais ou menos (somente com alguns desvios) paralelas aos círculos das latitudes. (Dokuchaev, em Nossas estepes: passado e presente, 1892).</p><p>Vasilii V. Dokuchaev (1846-1903) Vamos começar revendo um pouco a história da Ciência do Solo e do seu ramo que mais completamente o estuda: a Pedologia. desenvolvimento dos estudos do solo pode ser entendido como passando por dois estágios: o primeiro, muitos séculos atrás, em que referências às práticas agrícolas são encontradas na literatura de antigos povos, muitas vezes com um sentido religioso; o segundo refere-se a tempos mais recentes, aos últimos dois séculos, fundamentado na experimentação e aplicação do método científico. No processo de revisão desses estágios poderemos entender melhor a evolução dos modernos conceitos da Pedologia e nos dar conta de que este ramo da ciência é dinâmico e tem</p><p>passado por muitas resistências a novas ideias. Trata-se de uma ciência relativamente nova, pois muito tempo demorou para que os primeiros naturalistas do século XIX a reconhecessem. Veja algo sobre esse assunto no Boxe 1.1. ALGUMAS DEFINIÇÕES IMPORTANTES Alquimia: forma da química na Idade Média que envolvia tentar descobrir como transformar metais comuns em ouro e obter o elixir da longa vida, um remédio que curaria todas as doenças e daria vida longa àqueles que o ingerissem. Atmosfera: camada de ar que recobre a Terra. A atmosfera não possui limite superior preciso, mas, para fins práticos, seu topo pode ser considerado como estando aproximadamante a 200 km de altitude. Biosfera: porção do ambiente da Terra na qual os organismos vivos habitam e interagem para produzir um sistema em estado de equilíbrio. Efetivamente, é um ecossistema de todo o planeta, ou seja, o conjunto de organismos em nível mundial. Ciência do Solo: ciência que considera o solo como recurso natural da superfície da Terra, incluindo: modo de formação, classificação, mapeamento, propriedades físicas, químicas, biológicas e fertilidade. Além disso, estuda essas propriedades em relação ao uso e manejo dos solos. Ecologia: estudo das relações entre seres vivos e seu ambiente. Edafologia: ciência que trata da influência dos solos em seres vivos, particularmente plantas, incluindo o uso da terra pelo homem para cultivar plantas. Hidrosfera: todos os corpos de água que estão na superfície da Terra ou próximos dela. Litosfera: camada sólida, oceânica ou continental, mais externa do planeta Terra, constituída por rochas e solo. É também denominada de crosta terrestre. Mecânica dos solos: em engenharia civil, é definida como o estudo do comportamento dos materiais que podem ser escavados em função das leis da mecânica, com vistas a projetos de construção e conservação de edificações neles fundamentadas. Método científico: conjunto sequencial de etapas comuns a toda a investigação científica, que passa por observações dos fatos, coleta de dados e formulação de uma hipótese que é testada com experimentos, podendo esta hipótese, no final, tornar-se uma lei universal. Ou seja:</p><p>fenômenos da natureza são observados, hipóteses são formuladas, experimentalmente testadas e conclusões são tiradas. Pedologia: (1) Estudo científico do solo no seu hábitat. (2) Parte da Ciência do Solo que trata da origem, morfologia, mapeamento e classificação do solo. (3) Sinônimo de Ciência do Solo. Pedosfera: camada mais externa da Terra que é composta por solo e sujeita a seus processos de formação. Assim, designa o conjunto dos solos em nível mundial. A pedosfera resulta da interação entre litosfera, atmosfera, hidrosfera e biosfera. Solo: (1) O material mineral ou orgânico inconsolidado imediatamente abaixo da superfície da Terra e que serve como meio natural para o crescimento das plantas terrestres. (2) O material mineral ou orgânico inconsolidado sob a superfície da Terra, o qual, durante certo tempo, sofreu a influência de fatores genéticos e ambientais do clima, de macro e micro-organismos, e foi condicionado pelo relevo. Boxe 1.1 POR QUE O SOLO EA CIÊNCIA DO SOLO-NOS IMPORTAM Muitas religiões antigas reconheciam a importância dos solos, e os costumes de seus seguidores evoluíram em uma especial ligação à mãe terra, como doadora da vida. Contudo, muitos dos estudiosos da natureza não deram a merecida atenção ao solo. Antigos cientistas famosos também o ignoraram. Por exemplo, o naturalista Alexander Von Humboldt (1769-1859) nunca comparou os solos dos diversos continentes onde estudou a distribuição das diferentes formas de vegetação, e essa atitude, de ignorar o solo, ainda ocorre. O livro História das Ciências Ambientais, escrito por Fontana (1992), não menciona o estudo dos solos como integrante dos ramos dos estudos ambientais, apesar de ter incluído vários outros. Será que o solo tem tão pouca importância em comparação com os outros recursos naturais, para não ser mencionado? Ou será pelas dificuldades em examiná-lo, porque para isso é necessário escavar um buraco no chão? Acreditamos que esse não seja o caso. Os solos estão cheios de vida. Selman Waksman (1888-1973), laureado com o prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina de 1952, isolou a estreptomicina da biota do solo. Estudos da biodiversidade dos solos podem ajudar futuras pesquisas similares. É bem plausível que a evolução biológica tenha sido influenciada e condicionada por atributos do ambiente</p><p>do solo, o que seria um tipo de estudo bastante atrativo. Mas é atuando como reguladores, transformadores, filtros da água e fontes de nutrientes para as plantas que os solos têm maior importância para a humanidade - um elo entre os ciclos biogeoquímicos da litosfera e a dinâmica dos sistemas atmosféricos. Temos muitas coisas a aprender acerca dos solos, mesmo aqueles não usados para agricultura, e devemos integrar nossos conhecimentos em uma visão holística da dinâmica do nosso planeta e suas transformações biogeoquímicas. Os solos são de muita importância sob o ponto de vista econômico e social. Podem mesmo apresentar algo belo: o famoso cientista do solo, Hans Jenny (1899-1992), ficava seduzido com os solos, pintando- os em quadros. Sendo assim, e parafraseando Leonardo da Vinci, poderíamos perguntar: por que será que conhecemos mais acerca dos distantes objetos celestiais do que do chão abaixo de nossos pés? Fonte: adaptado de Yaalon (2000) 1.1 Os primeiros conhecimentos sobre solo Os primeiros grupamentos humanos viam o solo apenas como um lugar por onde caminhavam, caçavam ou recolhiam alimentos, ou para obter algum barro para confeccionar objetos de cerâmica e pigmentos coloridos para suas pinturas (Fig. 1.1). Determinados solos podiam ser melhores para caminhar, fornecer os barros e os pigmentos, mas nenhum conhecimento adicional era necessário. Os homens tinham ar puro, águas límpidas e terras virgens de onde colhiam frutos do bem" - como no "Jardim do -, cujas propriedades naturais não precisavam ser decifradas, uma vez que não havia necessidade de gerar mais conhecimentos do que aqueles que eram transmitidos de geração para geração.</p><p>Fig. 1.1 Pintura rupestre em parede de caverna representando uma arara. Materiais de solo foram usados como pigmentos no desenho (Foto: A. Carias Frascoli) Contudo, em um período iniciado após a última era glacial, cerca de 10.000 anos atrás, uma boa parte dos humanos começou a agrupar-se em determinadas terras, onde aprenderam a domesticar plantas e animais (Fig. 1.2). De nômades, passaram a se fixar em determinados territórios, escolhidos pela qualidade do solo, do clima e da água. Sulcando esses solos com primitivos arados de madeira, plantavam sementes que germinavam e cresciam sob sua guarda. Foi assim que começaram a conhecer melhor o solo.</p><p>Fig. 1.2 O homem, depois de restringir-se a caçador e coletor, organiza-se em aldeias em cujos arredores começa a cavar, cultivar e conhecer o solo. Indígenas brasileiros em litogravura do século XVI, obra de Hans Staden, originalmente publicada em 1557 Da qualidade do solo desses primeiros grupos humanos dependia, portanto, o aumento da população e o grau de organização de sua sociedade. As transformações das pequenas aldeias para as primeiras grandes cidades foram, assim, atreladas a climas semiáridos e locais com solos férteis, próximos a rios que pudessem fornecer água de boa</p><p>qualidade para beber e irrigar as lavouras. Essas primeiras cidades desenvolveram-se nos vales dos rios Tigre e Eufrates na Mesopotâmia; hoje Síria e Iraque e no Nilo (Egito), formando o chamado "crescente fértil". Outras cidades organizaram-se na planície Indo-Gangética (hoje Índia, Paquistão e Bangladesh) e do rio Amarelo (China). Um dos principais fatores responsáveis pelo crescimento e pela organização social dessas primeiras aglomerações urbanas foram os fecundos solos daqueles vales. 1.2 As primeiras civilizações: mesopotâmicos, egípcios, indianos, chineses, astecas e incas Para compreender como as primeiras cidades das primeiras civilizações surgiram, imagine um tempo antes de Cristo e depois da última era do gelo, um grande rio (como o Nilo) cortando um grande deserto (como famoso Saara), perto da desembocadura de um famoso mar (como Mediterrâneo). Em torno desse rio existem várzeas, anualmente inundadas, regadas e fertilizadas, e que por isso contrastam com deserto, pois há muito verde, incluindo palmeiras de doces tâmaras. Como não existe ninguém nessas terras, um grupo de errantes primitivos humanos os "sem-terra" daquela época chega e monta um acampamento. Até então, eles viviam como caçadores-catadores. Acostumados a conviver com uma quase intocada natureza, todo o conhecimento adquirido com essas vivências era passado dos adultos para os jovens. Além disso, não tinham proles numerosas, pois o filhote- homem, ao contrário dos outros animais, demorava muitos anos para crescer e se defender. Muitos não sobreviviam em razão das contínuas andanças. Todos executavam todas as tarefas, ninguém mandava em ninguém e um não tinha conhecimento maior que outro da mesma idade. Com clima e água saudáveis, e não havendo ninguém para reclamar a terra, os indivíduos desse grupo que estamos a imaginar multiplicam-se muito mais do que no passado, já que a terra, o clima e a água dali são muito bons. Assim, morando, crescendo e comendo sempre no mesmo lugar, então o alimento apanhado, caçado ou pescado começa a faltar. Como consequência, alguns decidem domesticar determinadas plantas, cultivando-as para suprir a falta de alimentos, escolhendo solos mais próximos do rio, onde seria mais fácil irrigar as sementes. Para isso, eles têm que derrubar o verde ali existente, incluindo as palmeiras. Lá se vão os doces frutos e as caças desse local, mas, em contrapartida, aprendem a domesticar, a plantar e a colher produtos como cevada, lentilha, trigo,</p><p>linho e algodão. Algumas vezes colhem até mais do que o suficiente para alimentar suas famílias. Com as sobras, começam a fazer trocas com os que, preferindo domesticar animais, dedicam-se ao pastoreio. Questão 1 Por que o solo é considerado um tópico importante para o desenvolvimento do homem? O homem vem transformando a natureza ao longo de centenas de milhares de anos. O aprendizado sobre o solo se deu, primeiramente, de forma empírica, com a necessidade de se produzir pigmentos que eram usados em vasos de cerâmica e nas pinturas rudimentares encontradas em várias cavernas de diferentes continentes, e que mais tarde foram consideradas as primeiras manifestações culturais do ser humano. Depois o homem passou a tirar algumas conclusões a respeito das funções do solo, o que permitiu o desenvolvimento da agricultura, processo relativamente recente na história humana (aprox. 10.000 anos atrás). Desse modo, a espécie humana se constituiu como é atualmente por meio de sua tentativa constante de transformar a natureza ao seu redor, e isso inclui o solo, já que este se desenvolve naturalmente em condições de superfície do planeta. Portanto, à medida que o homem evoluía, ele usava o solo, direta ou indiretamente, para satisfazer suas necessidades, adquirindo, assim, conhecimentos a respeito desse corpo natural, que muito influenciaria o próprio destino do homem como espécie e como ser social. Inicia-se, desse modo, a prática da agricultura (Fig. 1.3) e do pastoreio, paralelamente à necessidade de decifrar os segredos dos solos ou aprender mais sobre eles. A partir daí, surgem as primeiras observações, como a de que os solos diferiam uns dos outros porque uns eram mais produtivos e outros menos para determinados cultivos ou pastagens um aprendizado advindo de erros e acertos, pois os solos pouco produtivos eram abandonados, até que fossem encontrados outros mais férteis e propícios às lavouras. A população foi então aumentando, assim como a procura por alimentos. A sempre verde vegetação ao longo do grande rio que corta o deserto vai, cada vez mais, desaparecendo para dar lugar às lavouras irrigadas e às pastagens mais distantes dos rios. Com o aumento das lavouras, os pastores vão sendo afastados para dar lugar aos agricultores que, eventualmente, têm que se retirar para exilar- se em outras paragens. Muitos que já não precisam mais catar, pescar ou caçar dedicam-se a diferentes atividades: comércio, música, pintura, religião etc. Porém, como as lavouras vão sendo fixadas cada vez mais</p><p>longe da margem do rio, cresce a dificuldade para regá-las. Começa então a haver disputas pelos solos mais férteis e pelo uso da água necessária para a sua irrigação. Fig. 1.3 Antiga representação egípcia de trabalhadores semeando e arando. Desenho a partir de pinturas da tumba de Nakht (século XIV a.C.) em Tebas, Egito Questão 2 Como os conhecimentos práticos a respeito do solo condicionaram a formação das primeiras grandes civilizações? Qual grande legado que elas deixaram para a agricultura moderna? Pela transmissão de conhecimentos práticos a respeito do manejo adequado do solo para a agricultura, os primeiros agrupamentos humanos, especialmente os concentrados próximo às planícies de grandes rios que atravessam regiões áridas e semiáridas (Nilo, Tigres, Eufrates, Ganges, Amarelo), desenvolveram-se de modo que fossem capazes de incrementar a produtividade da agricultura rudimentar, possibilitando o aparecimento da divisão social do trabalho (por meio dos excedentes da produção e subsequente surgimento do comércio), que culminaria com a formação de grandes cidades. Consequentemente, as primeiras civilizações foram se organizando política e economicamente, desenvolvendo cultura e religião próprias. Tudo isso foi apoiado em um conhecimento empírico de técnicas agrícolas que, apesar de rudimentares, eram capazes de reconhecer e alterar certos atributos do solo para oferecer benefícios notáveis à produção de alimentos. O grande legado dessas primeiras civilizações para a agricultura moderna foi a "invenção" de técnicas de irrigação, fundamentais para a sobrevivência e o crescimento daquelas civilizações e que ainda hoje são</p><p>essenciais para os ecossistemas agrícolas de alta produtividade. Por causa então do solo fértil e do clima saudável, surge a necessidade de organizar melhor aquelas terras e aquela sociedade, por meio da marcação de limites de propriedades e da construção de canais de irrigação, estradas etc., e, com isso, aparece a divisão de trabalho e de conhecimentos. Surgem assim os primeiros caciques, pajés e artesãos; depois os reis, fidalgos, súditos e escravos, e, mais tarde, grandes tribos urbanas formadas por políticos, médicos, engenheiros, militares, sacerdotes, advogados, professores e estudantes de agronomia, geografia, ciências florestais etc. O conhecimento, portanto, deixa de ser compartilhado igualmente por todos, passando a ser difundido pelos estudiosos das várias ciências, entre elas a Pedologia, objeto de nosso estudo. Perto daquele grande rio que estamos imaginando, paraíso do Jardim do havia terminado para que uma velha promessa pudesse cumprir-se: "Comerás o pão com o suor do teu rosto até que retornes ao solo de onde nasceste", como está escrito na Bíblia, na Torá e no Alcorão. Assim, não mais existindo bons frutos que "de graça" eram colhidos, necessário se fazia examinar e cultivar o solo, já que, também como está escrito, "dele viemos, nele suamos e para ele voltaremos". Muito do verde de muitas terras deixou de existir, mas, em compensação, cidades cresceram, com suas ruas, palácios, mercados e templos. Nos palácios, os reis e suas cortes enviavam cobradores de impostos para confiscar boa parte das colheitas dos que no solo suavam. Nos mercados, comerciantes procuravam pagar pouco pelas sobras do que era colhido para revendê-las por muito. Nos templos, sacerdotes ministravam ritos religiosos nos quais as alternâncias do verde para amarelo das lavouras agora no lugar do sempre verde eram evocadas como um deus que morria e ressuscitava: Osíris, Átis e Adônis eram os nomes de alguns desses deuses. No culto religioso mais popular na antiga Grécia, adorava-se a Demeter ou Ceres -, a deusa da terra cultivada, fundadora das leis, da família e do estado. Essas manifestações religiosas antecipavam também, como que por um misterioso instinto, alguns dos atuais conhecimentos científicos, que agora iremos estudar na Pedologia. Embora aqueles indivíduos urbanos das primeiras cidades pouco fossem ao campo, dentro dos templos faziam sacrifícios em honra a deusas como Demeter, porque acreditavam que suas almas estavam em</p><p>união com aquele solo fértil, sobre o qual os lavradores derramavam seu suor, pois sabiam que no solo havia vida e, portanto, dele muito dependiam. Os primeiros homens da ciência apareceram nas antigas cidades, mas deram pouca atenção ao solo, pois sequer o consideravam objeto de estudo: preferiam dedicar-se às estrelas e à geometria. Símbolo das escritas chinesa e japonesa para a palavra "solo", o qual evoca uma planta enraizada Os governantes aparentemente se preocupavam mais com os solos do que os primeiros cientistas. Na China, por exemplo, há 6.600 anos, o território foi subdividido em nove classes de solos para fins de cálculo do valor correspondente ao nosso imposto territorial, que era baseado na capacidade produtiva do solo. Os antigos agricultores eram bastante conscientizados acerca da natureza dos solos e da necessidade da produção de alimentos. Os solos irrigados com águas dos rios Indo e Ganges forneceram alimentos suficientes para sustentar grandes centros urbanos, fazendo florescer a primeira grande sociedade urbana, a Índia, perto de 2.500 a.C. Com o tempo e o contínuo aumento da população, surgiram muitos problemas de conflito de terras (pastagens X lavouras), tornando-se mais econômico utilizar os solos predominantemente para lavouras. Isso obrigou os pastores a se retirarem dessas planícies, fazendo diminuir a oferta de carnes nos mercados e levando boa parte da população a se tornar vegetariana. Nas Américas, em épocas pré-colombianas, os incas cultivavam batatas e tomates em terraços construídos nas escarpas andinas, enquanto</p><p>os maias, astecas e toltecas plantavam milho, muitas vezes colocando um pequeno peixe em cada cova, a fim de manter a fertilidade do solo (Fig. 1.4). Fig. 1.4 Terraços construídos pelos incas no Peru pré-colombiano, em forma de patamares. Os férteis solos dessa região semiárida eram irrigados por um sistema de canais e cultivados para a produção de alimentos 1.3 Gregos e romanos Na Grécia, há 2.500 anos, nos trabalhos de Hipócrates, um dos primeiros grandes médicos da Antiguidade, encontra-se a afirmação de que a terra está relacionada com as plantas, tal como o estômago com os animais. Conceito parcialmente correto, uma vez que o estômago transforma os alimentos para o crescimento e a manutenção do nosso corpo, da mesma forma que o solo transforma e cede nutrientes às plantas. As Letras e as ciências em geral progrediam na antiga Grécia; contudo, os territórios gregos foram dominados pelos romanos da vizinha Península Itálica, cujos variados solos tiveram importante papel no desenvolvimento do Império Romano. Veja mais sobre a importância dos solos na expansão</p><p>desse Império no Boxe 1.2. Boxe 1.2 QUE os SOLOS DA GRÉCIA E DE ROMA TÊM A VER COM SUCESSO DAS CONQUISTAS ROMANAS? A oeste da Grécia está a Península Itálica (onde se localiza Roma). Ela é longa, estreita e rodeada pelos mares Adriático e Jônico. Diferentemente dos solos da Grécia, os dessa península são, em geral, mais férteis e diversificados. Ao norte, no que é hoje a Itália, existem extensas planícies propícias ao cultivo de muitos cereais; mais para o centro e o sul, extensas áreas mais montanhosas, que incluem boas pastagens e solos vulcânicos propícios ao cultivo de videiras e oliveiras. Pelos muitos caminhos dessa península chegavam à cidade de Roma os mais diversos produtos de seus variados solos. Segundo muitos historiadores, esse fato fez dos romanos um povo muito unido e essencialmente agrícola durante a maior parte da sua história. Como, porém, a longa península era muito exposta a invasões, isso obrigou os romanos a darem importância também às atividades militares, para proteger melhor seus ricos solos. Desta forma, ao contrário dos gregos, que politicamente permaneceram divididos em várias Cidades-Estado, os romanos, por dependerem dos produtos de diversos solos, de diversas regiões da sua península, desenvolveram um grande, centralizado e unido estado. Partindo da capital, situada na cidade de Roma, eles continuaram a expandir o seu império para fora de sua península, sobre outros solos europeus, africanos e asiáticos. Fonte:<http://www.historylink101.com/lessons/farm-city/rome1.htm> Os antigos romanos mencionam também classificações de terras e descrevem os meios para obter melhores colheitas, misturando cinza de madeiras e esterco de animais à camada revolvida pelo arado. O escritor Catão, o Velho, há 2.200 anos, escreveu o Tratado da Agricultura, no qual enumerou nove tipos de terras, em ordem decrescente da qualidade de seus solos: o de melhor qualidade era fértil e quase plano, próprio para vinhas e bons vinhos, e o de pior qualidade era íngreme e pedregoso, próprio somente para pastagens. No auge do Império Romano, os</p><p>engenheiros construíram edificações muito pesadas, que exigiram soluções apropriadas para as fundações e obras de terra. O engenheiro romano Vitruvius (século I a.C.) mostrou, em sua obra intitulada Da arquitetura, composta de dez volumes, que já naquela época existiam bons conhecimentos de mecânica dos solos: "Nem todo tipo de solo ou de rocha é encontrado em todos os lugares: alguns são terrosos, outros pedregosos ou arenosos" (...) "As fundações destas obras, como grandes templos, devem ser escavadas até uma base sólida ser encontrada. Mas se esta não for alcançada, e o solo for fofo ou pantanoso, ele deve ser removido e refeito, adicionando-lhe estacas de carvalho e carvão". Contudo, quase nenhum conhecimento original sobre solos agrícolas foi adicionado nessa época porque, com o tempo, a maior parte da agricultura foi sendo praticada por escravos ou camponeses, à medida que as atividades culturais foram sendo centralizadas nos núcleos urbanos. 1.4 Os árabes e a Idade Média europeia Com o florescimento da cultura árabe no primeiro milênio d.C., surgiram vários tratados sobre manejo agrícola do solo, destacando-se os de sistemas de irrigação com base em princípios da hidráulica e alguns manuais ensinando novos cultivos introduzidos na Espanha e Portugal, como algodão, arroz, cítrus e Contudo, o restante da Europa cristã estava mergulhado na Idade Média (século V ao XV), um longo período com muitas épocas de fome, pestes e muita ênfase nos costumes religiosos; um período obscuro para o avanço das ciências. Pouco ou nenhum progresso no conhecimento científico aí aconteceu, e muito do que antes foi aprendido acabou sendo esquecido. Por exemplo, em Pisa, na Itália, no ano de 1174, uma grande catedral foi construída e, ao seu lado, uma torre para colocar os sinos. Aparentemente os ensinamentos a respeito da mecânica dos solos e dos cuidados com as escavações das fundações de edifícios, como antes descritos por Vitruvius, foram esquecidos. Resultado: o solo abaixo da torre cedeu, fazendo-a inclinar-se perigosamente (Fig. 1.5). Questão 3 Além de ser componente importante para a agricultura, que outras funções do solo podem ser observadas nos tratados formulados por sábios romanos? Como esses tratados auxiliaram no desenvolvimento da civilização romana?</p><p>As outras funções do solo observadas nos tratados romanos estão relacionadas à aplicação na engenharia civil e militar. O Império Romano possuía uma extensa área contínua e dependia de grandes aquedutos para a distribuição de água entre regiões distantes e as construções militares resistentes a ataques estrangeiros. Em razão dessa alta demanda por grandes obras de naturezas diversas, os engenheiros romanos enfatizavam a importância do solo como meio para suportar construções de maneira segura. Embora os fundamentos científicos da Ciência do Solo ainda estivessem longe de ser estabelecidos, a importância do tema nas obras de grandes pensadores denota o quão fundamental era o assunto. Sem a devida importância, diversas obras públicas que literalmente sustentavam o Império não atingiriam suas funções, o que afetaria o funcionamento econômico e militar dessa civilização. Um exemplo do tratamento diferenciado que os romanos davam ao solo, nesse sentido, pode ser percebido ainda hoje: muitos aquedutos, fortalezas, muralhas, torres e monumentos persistem até os dias atuais na Europa, África e Ásia - mesmo após 1.500 anos da dissolução do Império -, resultado do aprimoramento de fundações bem estabelecidas, que estão diretamente relacionadas ao conhecimento do comportamento dos solos.</p><p>Fig. 1.5 Torre de Pisa, Itália. O início da sua inclinação se deu antes de sua construção ser concluída. Condições do solo abaixo de seu alicerce, que não foram estudadas no projeto, fizeram seu alicerce ceder (Foto: Rodrigo E. M. de Almeida) consideram, porém, que da religiosidade exacerbada da Idade Muitos herdamos a fé e a crença de que tudo no Universo guarda daí um Média que pode ser descoberto e racionalmente dissecado, incluídas vindo nas a segredo convicção de que as observações do dia a dia, quando</p><p>diversas formas de pensamento, é que tornam possíveis a pesquisa e o conhecimento científico. Quando hoje, por exemplo, um pedólogo escava um solo para examiná-lo, o lavrador simples, que assim o vê fazer, pode não entender o porquê daquilo, mas sua fé o faz acreditar que aquele trabalho lhe trará algum benefício. 1.5 Os alquimistas e a busca pelo "espírito da vegetação" Após a Idade Média europeia, os alquimistas, além de procurarem o "elixir da vida eterna" e a "pedra filosofal" - aquele para rejuvenescê-los e esta para transformar em ouro tudo que tocassem -, ainda procuravam descobrir o que fazia as plantas crescerem. Talvez ainda influenciados pelas ideias da existência única de quatro elementos que formavam o Universo - terra, água, ar e fogo -, alguns começaram a pensar que a água era o "espírito da vegetação", ou seja, a única responsável pelo crescimento das plantas. O belga Van Helmont (1580-1664), por exemplo, plantou uma estaca de salgueiro pesando apenas cerca de 2 kg e cultivou-a durante cinco anos em um vaso, no qual ele nada adicionou, além de solo seco e água da chuva. No final, concluiu que toda a matéria vegetal se originava "imediata e materialmente da água do solo" (veja no Boxe 1.3 algo sobre sua vida e seu experimento). Questão 4 Você acredita que, se os conhecimentos das civilizações clássicas fossem disseminados durante a Idade Média, grandes episódios de fome poderiam ter sido evitados nesse período? É difícil prever o que aconteceria na história se isso acontecesse. Mesmo hoje, com conhecimentos avançados sobre química, mineralogia, física e biologia dos solos, há diversas áreas do planeta que sofrem com fomes contínuas e desastres relacionados ao manejo inadequado e à ocupação desordenada do solo. Contudo, é provável que os conhecimentos tivessem avançado, mesmo que de forma diferente da que observamos hoje, o que evitaria manejo inadequado, grandes perdas de produtividade, erosões intensas, ocupação inadequada do solo, construções inseguras (basta lembrarmos da acentuada inclinação da torre de Pisa, na Itália) e demais fatores que afetam diretamente a sobrevivência do homem. Assim, muitos problemas enfrentados pelo homem nos séculos que constituíram a Idade Média e nos séculos posteriores poderiam ter sido evitados ou amenizados. Contudo, isso é muito mais um exercício mental do que uma verdade bem fundamentada, pela imprevisibilidade dos fatos históricos, até</p><p>mesmo nos dias atuais, quando a ciência vem ganhando reconhecimento e importância notáveis na maioria das sociedades. Boxe 1.3 VAN HELMONT E SEU EXPERIMENTO PIONEIRO Jan Baptist van Helmont (1577-1644) é considerado o fundador da química dos gases. Foi o primeiro a compreender que existem gases distintos no ar atmosférico. Ele percebeu que um seu "gás silvestre" (dióxido de carbono) era emitido na queima de carvão e produzido por fermentação, e que, por vezes, torna o ar irrespirável nas cavernas. Para ele, ar e água eram os dois elementos primitivos. O fogo, ele explicitamente negava ser um elemento; e a terra também não o seria, porque, segundo ele, "poderia ser reduzido pela água". Van Helmont foi um homem de contradições. Por um lado, foi um discípulo de Paracelso, um místico e alquimista; por outro, foi influenciado pela nova aprendizagem com base na experimentação, a qual estava produzindo homens como William Harvey, Galileu Galilei e Francis Bacon. Van Helmont foi um atento observador da natureza; os dados coletados em seus experimentos sugerem que ele tinha um conceito de conservação da massa. Um de seus mais famosos experimentos foi feito para determinar de onde as plantas obtêm sua massa. Nesse experimento, ele plantou um pequeno ramo de salgueiro em um grande vaso preenchido com certa quantidade de material escavado de um solo, medindo, depois de cinco anos, o peso do solo, da árvore que nele cresceu e da água da chuva que ele acrescentou. Durante esse tempo, a planta tinha ganhado cerca de 164 quilos. Como a quantidade de solo foi basicamente a mesma que tinha sido colocada quando ele iniciou a sua experiência, Van Helmont deduziu que o ganho de peso da árvore viera da água. Ele então concluiu que isso aconteceu porque ao salgueiro nada mais tinha sido fornecido, além da água e do solo. Como o material do solo pesava praticamente o mesmo que no início do experimento, ele argumentou que o aumento de peso de madeira, casca e raízes deu-se unicamente a partir da água. Um importante experimento pioneiro, mas com uma "dedução" incompleta, já que uma grande parte da massa da árvore veio de dióxido de carbono atmosférico, e uma pequena parte, de nutrientes do solo que, em conjunto com a água, são transformados em hidratos de carbono, proteínas etc., por meio da fotossíntese.</p><p>Para verificar se realmente a água era o "espírito da vegetação", o naturalista inglês James Woodward (1665-1728) plantou ervilhas em frascos, cada um com um tipo diferente de água: da chuva, água do rio Tâmisa e de uma poça lamacenta de seu jardim. As ervilhas cresceram muito mal na água da chuva e muito bem nas outras águas. Ele então concluiu que esse "espírito" deveria ser a "terra", aquela contida nas "águas barrentas", isso porque se acreditava que tudo deveria ser explicado por uma única "panaceia": fogo, ar, água ou terra. No início do século XIX, somou-se a essas ideias a "teoria do húmus", segundo a qual as plantas, além da água, assimilariam diretamente do solo substâncias orgânicas nele contidas e liberadas diretamente às raízes pelo húmus. Questão 5 Apesar dos erros conceituais e da pouca validade científica de seus experimentos, qual a grande contribuição dos alquimistas para o nascimento da Ciência do Solo? Os alquimistas foram os primeiros a notar, mesmo que de forma equivocada, que o crescimento das plantas estava condicionado a alguns fatores específicos, como quantidade de água e tipo de solo, e que provinha da combinação destas "essências" (relacionadas aos quatro "elementos fundamentais": terra, fogo, ar e água) que compunham os vegetais. Alguns chegaram até a reconhecer a importância do e do húmus para a nutrição das plantas. Embora com conclusões errôneas e o reconhecimento simplista de que o solo era um mero reservatório de água, após a Revolução Francesa, as experiências dos alquimistas abriram caminho para uma busca mais avançada a respeito dos atributos fundamentais que estariam atrelados aos próprios avanços da química e da física, e que levaria, por fim, ao nascimento da Ciência do Solo nos moldes atuais. Esses pensamentos mudaram um pouco mais tarde, logo após a Revolução Francesa, quando houve um grande avanço das ciências. A atenção de muitos dos cientistas europeus voltou-se para a fertilidade do solo, porque produzir mais alimentos era uma necessidade crescente. A ciência médica, que se desenvolvia e salvava muitas vidas, fazia as populações crescerem muito rapidamente, mais do que o suprimento dos alimentos existentes. 1.6 A escola de Liebig e a "lei do mínimo" Em meados do século XVII, o químico alemão Justus von Liebig e sua</p><p>equipe emitiram vários conceitos científicos sobre como as plantas se nutriam do solo. Para isso, trabalharam com amostras de materiais removidos de diversos solos e colocados ou em frascos de ensaio, dentro de laboratórios, ou em vasos, dentro de casas de vegetação. A partir daí, muitas de suas teorias sobre a nutrição dos vegetais foram comprovadas, concluindo-se que as plantas se alimentam, além de água, também de muitos elementos minerais. Comprovou-se também que o húmus era somente um produto transitório entre a matéria orgânica e esses nutrientes minerais. As teorias derivadas dos estudos de Liebig são corretas e foram cientificamente revolucionárias, com grande aplicação prática, o que estabeleceu a base para o uso de fertilizantes minerais. Elas deram origem à "lei do mínimo", que até hoje é seguida (Fig. 1.6). Em seu livro Química e sua aplicação à agricultura e fisiologia, Liebig afirma que as plantas assimilam nutrientes minerais do solo e propõe o uso de fertilizantes minerais para fortificar solos deficientes. Com isso, iniciavam-se o aperfeiçoamento das técnicas de cultivo do solo utilizando conhecimentos de vários ramos da ciência, como a Química e a Geologia, e as técnicas de experimentação.</p><p>Boro Zinco Ferro Luz Água Produção máxima da planta Fig. 1.6 Uma das mais comuns ilustrações da "lei do mínimo" desenvolvida pela escola de Liebig: a quantidade de alimento produzida por uma planta está relacionada ao nutriente que se encontra no solo em menor - e insuficiente - quantidade. No barril, a aduela mais baixa impede o aumento da altura de água, tal como a deficiência de um dos nutrientes do solo impediria a elevação da colheita de uma lavoura Questão 6 Por que o químico Justus von Liebig foi tão importante para a Ciência do Solo? Em que contexto histórico seus experimentos ganharam notabilidade? Liebig realizou os primeiros experimentos relacionados a solos e nutrição das plantas com base em critérios científicos, apoiados nos conhecimentos avançados de sua equipe sobre química. Além disso, ele verificou a existência de nutrientes inorgânicos associados à nutrição das plantas e começou a investigar com maior</p><p>profundidade a natureza do húmus. Ele verificou também que existem nutrientes no solo imprescindíveis ao crescimento dos vegetais, e que a ausência de apenas um deles impede o crescimento adequado, o que ficou conhecido como "lei do mínimo". Liebig também propôs a adição de sais inorgânicos ao solo para aumentar a disponibilidade de nutrientes para as plantas uma prévia das práticas de adubação posteriormente desenvolvidas. Sua notabilidade e importância estão atreladas ao contexto histórico em que viveu: a Europa do século XIX vivia um período de transição política e econômica que culminou com a Revolução Industrial e o subsequente aumento da população. O reconhecimento dos atributos do solo, capazes de promoverem sua fertilidade, foi fundamental para o desenvolvimento de novos métodos de análise e manejo do solo, com base nas fertilizações. Sem a introdução desses novos métodos e conceitos, a capacidade do solo europeu em prover alimentos à sua população em franca expansão teria sido seriamente afetada, com a possibilidade de causar grandes tragédias humanas e econômicas. 1.7 A escola russa Enquanto os cientistas dos pequenos países da Europa estudavam, dentro de laboratórios, o solo como um pequeno barril onde nutrientes retirados pelas plantas tinham que ser compensados pela sua reposição com fertilizantes, os da Rússia o estudavam examinando-o no campo. Em 1877, um naturalista russo, de nome Vasily V. Dokuchaev (1846-1903), foi convocado pelo Tzar da Rússia para estudar os efeitos de uma grande seca que havia ocorrido nos campos, ou estepes, da província da Ucrânia, onde o clima era muito frio e relativamente seco (Fig. 1.7). Anos depois, Dokuchaev participou de estudos semelhantes, mas dessa vez nas florestas taiga da região de Gorki, local de clima mais quente e úmido. Ali ele se lembrou dos estudos feitos anteriormente na Ucrânia. Comparando os solos dessas duas regiões, constatou que eles eram bastante diferentes, mesmo quando desenvolvidos de rochas idênticas, e concluiu que isso era ocasionado, principalmente, pelas diferenças de clima. Dokuchaev verificou também que poderia observar as diferenças entre os solos dessas duas regiões, descrevendo uma sucessão de camadas quase horizontais da superfície até a rocha subjacente. Essas camadas, que ele denominou de horizontes, foram interpretadas como resultantes da reação conjunta de diversos fatores que deram origem ao solo.</p>