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1 PSICANALISE CONTEMPORÂNEA INTEGRAL MÓDULO 02 MÓDULO 02: Parte 1: TEORIA – Parte 2: TÉCNICA de CURA – CATARSE - HIPNOSE – SUGESTÃO - ASSOCIAÇÃO LIVRE –Parte 3: PSICODINÂMICA PARTE I –TEORIA (AS DUAS TEORIAS DE FREUD) I.1-TEORIA INICIAL(CONSCIENTE – PRE - INCONSCIENTE) A PRIMEIRA TÓPICA: AS TRÊS INSTÂNCIAS DA MENTE CONSCIENTE – PRÉ-CONSCIENTE E INCONSCIENTE A teoria de Freud do inconsciente foi derivada de experiências do hipnotismo e catarse. O fenômeno de amnésia espetacular e o restabelecimento da memória na terapêutica faziam supor uma continuidade na possibilidade de poder representar as recordações, a perda do mesmo e a sua recuperação. Freud acreditou que as áreas mais escuras e inacessíveis deveriam ser estudadas por meio de hipótese menos rígida. Esta era a estratégia metodológica. Mas não julgava o inconsciente como uma teoria ou um postulado apriorístico; o inconsciente, disse, é reservatório que afasta os fatos de nossa observação. Nem as percepções nem a mobilidade não estão necessariamente conscientes. A pessoa pode perceber objetos sem perceber isto, como em uma cegueira histérica, e pode mover-se inconscientemente, como no sonambulismo. O menino recém nascido não tem consciência provavelmente, mas sem dúvida é sensível, isto é, percebe a dor e o prazer e reage a eles. É acreditado que tais percepções e reações imprimem marcas na memória. O inconsciente armazena recordações que são inacessíveis no estado de vigília, por exemplo, as recordações das primeiras experiências infantis. Muitas recordações da infância são impossíveis de realizar e, no entanto não desaparecem; muitos eventos são registrados na mente do menino e não obstante eles são incomunicáveis. É extraordinariamente difícil de estudar as capas profundas e pré-verbais do inconsciente. O que Freud fez realmente era uma análise indireta do inconsciente; nesta análise, os fenômenos observáveis dos sonhos, associações livres, lapsus linguae (atos falhos) e os sintomas os transtornos mentais eram estudados como algo representativo da grande província mental do inconsciente. A tensão conduz ao desenvolvimento do consciente. O desenvolvimento do consciente depende da crescente habilidade do menino de utilizar suas recordações. Neste momento as recordações se acumulam, dizer isto deste modo, na «superfície, do inconsciente, facilmente acessível e pronto a se tornar consciente. Esta parte do inconsciente constitui o Pré-consciente. 1-O CONSCIENTE: O CONSCIENTE pode abordar de diversos aspectos: 1.1- No Sentido DESCRITIVO: Seria a qualidade momentânea que caracteriza as percepções externas e internas no meio do conjunto dos fenômenos psíquicos. 1.2- Segundo a teoria metapsicológica de Freud, a consciência seria função de um sistema percepção- consciência (Pc-Cs). 1.3- Do ponto de vista TÓPICO, o sistema percepção-consciência está situado na periferia do aparelho psíquico, recebendo ao mesmo tempo as informações do mundo exterior e as provenientes do interior, isto é, as sensações que se inscrevem na série desprazer-prazer e as revivescências mnésicas. 2 1.4- Do ponto de vista FUNCIONAL, o sistema percepção-consciência opõe-se aos sistemas de traços mnésicos que são o inconsciente e o pré-consciente: nele não se inscreve qualquer traço durável das excitações. 1.5- Do ponto de vista ECONÔMICO, caracteriza-se pelo fato de dispor de uma energia livremente móvel, susceptível de sobreinvestir este ou aquele elemento (mecanismo de atenção). 1.6- Do ponto de vista do CONFLITO e TRATAMENTO, a consciência desempenha um papel importante na dinâmica do conflito. (a)- equitação consciente do desagradável; (b)- regulação mais discriminadora do princípio de prazer; (c) na Teoria do tratamento, a problemática da tomada de consciência: “O tratamento psicanalítico edifica-se sobre a influência do Cs no Ics, e mostra-nos em todo caso que esta tarefa, por árdua que seja, não é impossível”. Convém aqui mencionar os diferentes fatores que intervém no tratamento: 1- Rememoração e construção; 2- Repetição na transferência e perlaboração (ou elaboração); 3- Interpretação, cujo impacto não se limita a uma comunicação consciente na medida em que conduz as remodelações estruturais. 2- O INCONSCIENTE Então, o inconsciente é dividido em duas partes: o pré-consciente e o inconsciente propriamente ditam. Alguns processos inconscientes podem fazer-se conscientes sem qualquer dificuldade. Deles podem se lembrar e o indivíduo pode ter consciência deles com facilidade. Eles são como elementos convenientemente armazenados, facilmente acessíveis. O que é consciente é consciente durante pouco tempo, e pode passar ao pré-consciente com facilidade. Por outro lado, os processos mentais do pré-consciente podem ficar conscientes “sem qualquer atividade para nossa parte”. 2.1- O PRÉ-CONSCIENTE O pré-consciente constitui o que é inconsciente em um determinado momento, mas facilmente pode ficar consciente; está inconsciente de modo latente ou temporal. O lapsus linguae, o esquecimento de nomes e lugares muito famosos, os erros, os equívocos na colocação de objetos, etc., pertencem a esta categoria. A diferença da zona pré-consciente, as capas mais fundas do inconsciente são menos acessíveis e eles nunca podem ficar conscientes. O indivíduo está consciente ou ele percebe uma fração pequena dos processos mentais num tempo determinado. Assim o consciente - ou consciência - deveria ser o resultado de um processo seletivo. O inconsciente tende a fazer-se pré-consciente e eventualmente consciente, mas uma parte do mesmo se faz de fato consciente. Alguns impulsos e percepções podem fazer-se pré-conscientes ou conscientes por um certo tempo e então se afundar novamente no inconsciente. Em um princípio Freud atribuiu ao consciente e ao inconsciente, propriedades dinâmicas, mas finalmente baniu toda a dinâmica para os instintos e às “operações mentais” de ID, EGO e SUPER-EGO. Assim, os termos “consciente, pré-consciente, e inconsciente” não indicam qualquer força dinâmica da personalidade, mas, como Freud concluiu em última instância, essas «províncias mentais. São conceitos topográficos que indicam a «profundidade» dos processos mentais e a distância relativa da superfície. Aquilo que conhece o indivíduo é consciente; o que não conhece, mas pode facilmente conhecer alguma vez é pré-consciente; o que não pode conhecer sem um esforço definido ou não pode conhecer de modo algum, é inconsciente. PRÉ-CONSCIENTE: Do ponto de vista Metapsicológico, o Sistema Pré-consciente está situado entre o sistema inconsciente e a Consciência; está separado do Inconsciente pela Primeira Censura, que procura barrar aos conteúdos inconscientes o caminho para o pré-consciente e para a consciência. Freud submete a passagem do pré-consciente ao consciente à ação de uma Segunda Censura, mas distingue-se da censura propriamente dita (entre o Ics e Pcs) na medida em que deforma menos do que seleciona, visto que a sua função consiste essencialmente em evitar a vinda à consciência de preocupações perturbadoras. Favorece assim o exercício da atenção. 3 2.2- INCONSCIENTE: Pelas suas características podemos definir assim: 2.2.1- Os seus “conteúdos” são “representações” das pulsões (trieb). 2.2.2- Estes “conteúdos” são regidos pelos mecanismos específicos do processo primário, como a Condensação e o Deslocamento. 2.2.3- Fortemente investidos pela energia pulsional, procuram retornar à consciência e à ação (retorno do recalcado); mas não podem Ter acesso ao sistema Pcs-Cs senão nas formações de compromisso, depois de terem sido submetidos às deformações da censura. 2.2.4- São mais especialmente certos desejos da infância que conhecem uma fixação no inconsciente. O INCONSCIENTE SEGUNDO FREUD: Freud dizia que estava acostumado a tratar com a parte inconsciente da mente como algo real e tangível.Alguns dos sintomas dos neuróticos obsessivos dão a impressão até mesmo aos próprios pacientes de serem “poderosos visitantes” de outro mundo. Os sintomas obsessivos, disse Freud, indicam uma esfera da afetividade mental «separada do resto do mundo». Esta esfera é o inconsciente. O INCONSCIENTE FREUDIANO pode ser entendido assim: Na opinião de Freud, nossos atos cotidianos, nossa conduta de cada dia, podem revelar tendências inconscientes. As descobertas essenciais de Freud: existência de conflitos psíquicos, importância das tendências sexuais, relações entre sintomas e condutas de um lado, recalque e inconsciente, de outro. Freud disse: “O pré-consciente, suscetível de ser evocado pelo jogo normal das representações é, pois, muito diferente do inconsciente dinâmico, inacessível à evocação voluntária, que uma técnica especial (hipnose, psicanálise) pode tornar consciente”. Os fatos psíquicos latentes, isto é, inconsciente, no sentido descritivo da palavra, mas não no dinâmico, são, de fato, pré-conscientes, “e reservamos o nome dos INCONSCIENTES aos fatos psíquicos recalcados, isto é, dinamicamente inconsciente”. O que vem a ser, diante do exposto, a noção de inconsciente? Quando, na época heróica da psicanálise, Freud substantivava o inconsciente e o distinguia apenas do pré-consciente, considerava-o como o conjunto de fatos mentais recalcados.No capítulo dos “Ensaios” consagrados à consciência e ao inconsciente, após haver estabelecido que o “dinamismo psíquico se manifesta sempre sob duplo aspecto, consciente e inconsciente”, e que se tudo que é recalcado é inconsciente, “há elementos que são inconscientes sem serem recalcados”. Freud encontra-se “na necessidade de admitir a existência de um terceiro inconsciente, não recalcado”. Depois diria que é o ID. Freud jamais deixou de considerar os processos inconscientes, propriamente ditos, como aqueles que correspondiam ao recalque, - e permaneceu, portanto, fiel ao espírito de suas primeiras intuições. Lê-se nos Ensaios: “o que é recalcado é para nós o protótipo do inconsciente”; e em seu último escrito, a propósito dos elementos de si, que são recalcados: “é a este material que nós reservamos o nome de inconsciente propriamente dito”. DEFINIÇÃO DO INCONSCIENTE COMO SISTEMA: Características específicas: (1) processo primário (mobilidade dos investimentos, característica da energia livre); (2) ausência de negação, de dúvida, de grau de certeza; (3) indiferença perante a realidade e regulação exclusivamente pelo princípio de desprazer-prazer (visando este restabelecer pelo caminho mais curto a identidade de percepção). REDEFINIÇÃO DO Ics EM 1920: Sabe-se que em 1920, a teoria freudiana do aparelho psíquico é profundamente remodelada (na segunda tópica). São introduzidos conceitos como ID, EGO ESUPEREGO. A TEORIA DOS ISTINTOS NA PRIMEIRA TÓPICA 1 – PRIMEIRA FASE: TRIEB (pulsões - instintos) Freud denomina Trieb - geralmente traduzido como "instinto" - para a causa última de toda a atividade. Mas devemos notar que Freud usou o termo INSTINKT, no sentido clássico falando de “instinto dos animais”, de “conhecimento instintivo de perigos”, etc. E o termo TRIEB como “força impulsionante relativamente indeterminada quanto ao comportamento que induz e quanto ao objeto que fornece a satisfação”. 4 “PULSÃO” seria a tradução proposta para a palavra alemã TRIEB (substantivo correspondente ao verbo TRIEBEN= impelir). Para FREUD a PULSÃO é um processo dinâmico consistindo em um impulso que tem sua fonte numa excitação corporal localizada. Na teoria de Freud, os instintos representam a ponte entre os mundos mentais e físicos; embora enraizados no corpo humano, são forças que liberam energia mental. «Os instintos (pulsão) são seres míticos, maravilhosos na sua falta de definição. "Em nossa labor não podemos passar para alto nem um momento, e, no entanto nunca estamos seguros de vê-los com claridade", Freud escreveu em 1933. Os instintos (pulsão) são concomitantes psicológicos dos processos biológicos. Eles são conceitos fronteiriços entre o mental e o físico, e representam a demanda feita à mente como conseqüência da sua conexão com o corpo». Mas por que merece a pulsão ser considerada como um conceito-limite entre o psíquico e o somático? É claro que a fonte da pulsão está toda no lado somático; a meta também, pelo menos à medida que essa meta consiste na redução da tensão ao nível da fonte somática. Em compensação, a procura do objeto apto a reduzir esta tensão implica uma participação necessária da atividade psíquica. Exemplo: O primeiro de todos os objetos, o seio materno, não é procurado pelo recém-nascido: é-lhe fornecido. Durante algum tempo ele carece dos próprios meios, intelectuais e motores, para esta procura. Pode, quando muito, desde que a tensão somática renasça e que o objeto no momento esteja ausente, fazê-lo presente imaginariamente, de alguma maneira “sonhar” a sua presença. A primeira experiência de satisfação deixa efetivamente um traço mnésico que se reaviva quando a tensão renasce, e Freud considera que essa rememoração tem um caráter alucinatório, isto é, que a evocação mnésica de um acontecimento passado equivale, para o lactante, à percepção de um acontecimento presente. Há, pois, uma confusão entre lembrança e percepção, objeto imaginário e objeto real, como continua a se fazer no adulto quando sonha. O fim do instinto (pulsão) sempre consiste na restauração do equilíbrio, o que se realiza por transformações somáticas e é percebido como uma satisfação. Esta meta requer algum objeto por meio de qual é possível à satisfação. O objeto pode ser o próprio corpo ou um objeto externo. Por exemplo, nos lactantes, uma excitação libidinal ao nível de mucosa bucal (fonte) o incitará (impulso) a procurar o seio ou, à falta deste, seu próprio polegar (objetos), a fim de reduzir essa excitação por meio da sucção (meta). Desta definição resulta que existem tantas pulsões sexuais quantas possíveis fontes somáticas de excitação libidinal. 1– OS INSTINTOS SEXUAIS Todos os organismos vivos agem de acordo com dois propósitos, a própria conservação e a conservação da espécie. Por conseguinte, Freud distinguiu entre auto-conservação ou instintos do ego e instintos sexuais. Estas duas forças instintivas entram freqüentemente em conflito entre si. Os instintos sexuais são mais flexíveis que os instintos de auto-conservação; podem manter-se em suspenso - inibido no fim -, sublimar-se, dirigir-se por caminhos novos, distorcer-se e perverter-se; sua gratificação pode ser denegada ou substituída e seus objetos podem ser mudados com facilidade. «A opinião popular distingue entre fome e amor, considerando-os como representativos dos instintos dirigidos à auto-conservação e a reprodução da espécie respectivamente. Associando-nos a esta distinção clara, postulamos, na psicanálise, outra semelhante entre os instintos do ego ou auto-conservativos, por um lado, e os instintos sexuais, pelo outro; denominaremos " libido " - desejo sexual- à força pela que o Instinto sexual é representado na mente e consideraremos isto semelhante à força da fome, ou à vontade de poder, ou à outras tendências do eu. Freud disse: “Nós definimos o conceito de libido quantitativamente como uma força variável que poderia servir como medida dos processos e transformações que sobrevém no terreno da excitação sexual”. Distinguimos esta libido, tida a origem especial, da energia que, deveria ser suposto, está por baixo dos processos mentais em geral, de forma que também lhe atribuímos um caráter qualitativo. Freud não defendia uma simples exigência que conduzisse à fertilização e conservação da espécie. Opinava que existem numerosos instintos relativamente independentes que partem de origens somáticas diferentes. Todos eles lutam para uma gratificação na sua zona somática respectiva o prazer do órgão.5 Freud, na sexualidade, distinguia origem, objeto e fim. A origem é uma estimulação nascida em alguma parte ou zona do organismo. São denominadas zonas erotogênicas ou erógenas para essas partes do corpo que pode reagir antes dos estímulos sexuais. A zona erógena principal é o genital, mas, em certos casos, muitas outras partes do corpo como a boca ou o ânus podem fazer às vezes de zonas erógenas durante as fases pré-genitais do desenvolvimento do menino. O objeto habitual da exigência sexual é uma pessoa do sexo oposto, mas, freqüentemente, o objeto sexual pode ser uma pessoa do mesmo sexo, como na homossexualidade, ou o próprio indivíduo, como na masturbação. Freud ampliou o conceito de sexualidade para incluir as perversões e a sexualidade infantil, que não conduzem ao fim usual do sexo, quer dizer, para a fertilização e a reprodução. De fato, as perversões nunca tinham sido excluídas do terreno da sexualidade. Para regra geral, uma relação sexual perversa termina com um orgasmo e uma ejaculação de forma semelhante ao coito normal, que pode conduzir, além de ao orgasmo, para a fertilização e reprodução. Freud acreditou que a sexualidade normal é desenvolvida de um modo bem parecido às perversões, por meio da modificação de alguns elementos, a interrupção de outros e a incorporação de uns terceiros. Isto mesmo se aplica a qualquer desvio sexual. A contemplação, o palpitação, etc., de zonas erógenas constituem partes do jogo sexual geralmente aceitadas e amplamente praticadas. Se tais práticas ocupam o lugar do coito e excluem a união dos genitais, o jogo se torna uma perversão. Também, a fixação do interesse erótico em um objeto de vestimenta, por exemplo, em vez de faze-lo nos órgãos genitais, é fetichismo. A sexualidade perversa mostra o fato de que a sexualidade não se limita à reprodução e que a função dos órgãos genitais não é necessariamente heterossexual. Várias possibilidades existem relativo à origem, fim e objeto do sexo. Os órgãos genitais podem ser substituídos por outros órgãos na busca de satisfação, como acontece no beijo normal, ou por práticas perversas, ou pela conversão de sintomas da histeria. Uma vez Freud supôs que tanto a sexualidade normal como a anormal procediam da mesma origem, deveria concluir que os desvios sexuais constituem uma espécie de atraso ou impedimento do desenvolvimento sexual. Esta era uma hipótese de longo alcance. O estudo das perversões sexuais dos adultos e dos princípios biogenéticos conduziu ao estudo da sexualidade infantil. “Psicologicamente o menino é pai do homem”, Freud disse. A sexualidade infantil contém todas as potencialidades do desenvolvimento futuro que pode dirigir tanto para a sexualidade normal como para a anormal. O desenvolvimento normal tem lugar quando a origem, o objeto e o fim do sexo se combinam em um esforço consistente de unificação dos órgãos genitais de duas pessoas do sexo oposto. A origem sexual normal é constituída pelos genitais; o objeto, uma pessoa madura do sexo oposto; o fim, o coito heterossexual. O indivíduo normal atravessa umas fases de desenvolvimento e se, por qualquer razão, retém as características de uma de tais fases – “permanece fixo” -, é considerado anormal. O que é normal na infância é anormal na vida madura. Um indivíduo sexualmente anormal é um indivíduo sexualmente retardado. O menino é um “perverso polimorfo” que pode, ou não, se tornar um adulto bem adaptado. 1.2 – OS INSTINTOS DE AUTO-CONSERVAÇÃO: De acordo com Freud, toda a atividade dos homens se dirige a “procurar prazer e evitar dor”. Esta atividade é controlada pelo princípio do prazer. “Nós podemos aventurar-nos em dizer que o prazer está de alguma maneira relacionado com a diminuição, redução ou extinção da quantidade de excitação presente no aparato mental; e que a dor supõe uma elevação do mesmo. A consideração do mais intenso prazer que é capaz o homem, o prazer da realização do ato sexual, deixa poucas dúvidas neste respeito”. DIFERENÇA (a) Os instintos sexuais sempre seguem o princípio do prazer. Os instintos de auto-conservação, denominados às vezes instinto do eu(EGO), para regra geral fazem o mesmo. Porém, a tarefa de evitar a dor os força a adiar, ou, às vezes, até mesmo renunciar ao prazer. Esta capacidade para comprometer-se com a realidade e considerar o que deveria ser feito e o preço que teria que ser pago pelo prazer é o princípio de realidade. O princípio de realidade é uma modificação do princípio do prazer; aprova o prazer, mas não a qualquer preço e em qualquer momento. O princípio da realidade luta pelo prazer ao mesmo tempo para evitar a dor; é a capacidade para sacrificar um tipo de prazer para outro. 6 Aparentemente, a consideração das circunstâncias revela diferenças grandes entre ambos grupos de instintos. Por meio dos instintos do eu (EGO) aprendo a acomodar-me à realidade. O princípio de realidade normalmente adquire uma rápida influência sobre os instintos do eu; os instintos sexuais não são tão facilmente controlados e anos passam antes deles serem pelo menos parcialmente subordinados ao princípio da realidade. (b) A outra diferença entre sexo e instintos de auto-conservação estão relacionados com a sua flexibilidade. Os instintos de auto-conservação contam com uma flexibilidade limitada. A pessoa não pode mudar as zonas ou adiar a gratificação da fome ou a sede indefinidamente, nem existe modo de mudar substancialmente os objetos que satisfazem a fome ou a sede. Todos os objetos que satisfazem as necessidades básicas de ar, comida e líquidos deveriam conter oxigênio, elementos nutritivos e água. Os instintos sexuais podem modificar-se em relação com a zona, fim e objeto, e são suscetíveis de numerosos desvios, perversões, substituições e conflitos. Isto não é aplicável aos instintos de auto-conservação. 2-SEGUNDA FASE: Narcisismo (1914) Em 1914 Freud revisou a sua teoria dos instintos. Em um princípio acreditava que os instintos da libido ou do amor deveriam ser distinguidos dos instintos do eu ou do auto-conservação. Depois de vários anos de experiência clínica, descobriu que a libido pode dirigir-se a si mesmo e não só para os objetos externos necessariamente. O amor a si mesmo precede ao amor ao outro; o recém nascido não é capaz de amar aos outros. As crianças aprendem a separar principalmente parte do amor catequizado - investido - em si mesmos, para catequizá-lo em suas mães. Freud denominou narcisismo a este amor próprio, baseando-se no herói legendário Narciso grego que se apaixonou por si mesmo. O narcisismo ou amor de si mesmo constitui um fenômeno nunca terminado. Provavelmente começa na vida pré-natal e nos acompanha até o último dia da vida. Na primeira fase da vida é o único canal para catequizar a libido. No estado denominado por Freud narcisismo primário, todas as energias de que dispõem os instintos de amor que eles são investidos em si mesmo. Mais tarde, se o objeto amoroso é dificultado, a libido pode tornar a dirigir-se para a própria pessoa e estabelecer-se um narcisismo mórbido, secundário. A descoberta do fenômeno do narcisismo destruiu as barreiras das que separaram a libido dos instintos do eu. De agora em diante, os instintos do eu deveriam ser considerados como um caso especial das catequeses da libido, quer dizer como um investimento da libido na própria pessoa. Freud chegou deste modo a uma interpretação monista da vida instintiva: não existe mais que uma força instintiva, a força do amor, a libido. É narcisismo versus amor do objeto. Nos indivíduos bem adaptados um equilíbrio das catequeses acontece neles mesmos e nos outros, o que lhes permite proteger-se a si mesmo e tomar cuidado daqueles a quem amam. Em alguns indivíduos este equilíbrio se altera; alguns desenvolvem um narcisismo mórbido e secundário, depois de ter achado impedimentos sérios na evoluçãodas catequeses objetivas. Outros são incapazes de cuidar de si mesmos por um narcisismo insuficiente ou uma abundante catequese objetiva. 1.2-TEORIA DO EGO – ID – SUPEREGO A SEGUNDA TÓPICA: A PSICOLOGIA DO EGO O deslocamento da Psicologia do ID para a Psicologia do EGO teve lugar gradualmente, num período de muitos anos. Culminando com o artigo “O Ego e o Id (1923)”, onde ele propôs pela primeira vez a divisão tripartite do aparato psíquico em id, ego e superego. Por isso, para falar corretamente, desde 1923 toda a psicanálise tem sido psicologia do ego. APARELHO PSÍQUICO ou MENTAL: TEORIA DA PERSONALIDADE (2ªteoria segundo FREUD) Em 1921, Freud formulou um modelo novo de estrutura da personalidade baseado em considerações econômicas, topográficas e dinâmicas. 7 • ECONÔMICAS: Versado na distribuição, equilíbrio e interdependência mútua das duas (2) forças instintivas, Eros e Tanatos, e das energias à sua disposição, a libido e a energia destrutiva; isto é, sobre a economia da mente; • TOPOGRÁFICA: Versa sobre as três (3) províncias mentais, o inconsciente, o pré-consciente e o consciente, ou topografia da mente; • DINÂMICA: Versa sobre os três (3) mecanismos da personalidade, o ID, o EGO e o ID ou SUPEREGO, ou dinâmica da mente. 1 - O ID (das Es) O modelo novo de personalidade introduziu uma divisão da personalidade em três partes, o ID, o EGO e o SUPEREGO. O recém nascido só possui o ID; o eu e o superego é desenvolvido depois, durante a vida. Tudo aquilo que é herdado ou é fixado na constituição, e especialmente os instintos que têm sua origem na organização somática, acha sua primeira expressão mental no ID. • O ID é o vínculo tendido entre os processos somáticos e os mentais; está "em algum lugar em contato direto com os processos somáticos, assumindo deles as necessidades instintivas e lhes dando uma expressão mental, mas nós não podemos dizer em que substrato se realiza este contato". • O ID expressa a verdadeira intenção da vida do organismo individual, quer dizer, a satisfação imediata das suas necessidades inatas. Não pode ser atribuído ao ID propósito tal como se manter vivo a si mesmo ou ser protegido dos perigos por meio da angústia. • O ID não conhece precauções que asseguram a sobrevivência. De fato, uma gratificação imediata e incondicionada de uma demanda instintiva, intensamente perseguida pelo ID, pode levar a um choque perigoso com o mundo externo e à morte do organismo. Toda a energia mental acha-se armazenada no ID. • No princípio esta energia põe-se a disposição dos instintos orgânicos, formados pela fusão de duas forças primárias, o Eros e a destrutividade. • O único trabalho de todos os instintos, relacionados com os diferentes órgãos somáticos, é a satisfação ou descarga imediata de energia para suprimir a tensão e repor a calma. • Este é o que Freud denominou Lustprinzip, normalmente traduzido pelo princípio do prazer; é a demanda de uma descarga imediata de energia a que dá lugar à calma e o prazer imediato. O ID é completamente inconsciente e, por conseguinte, quando começa a vida de um indivíduo, tudo é inconsciente. • Devido à influência do mundo externo, parte do material inconsciente do ID se torna material pré-consciente e surge o EGO. • Nem todo material pré-consciente constitui uma propriedade permanente do eu; parte do mesmo se perde, parte se reprime. • Nos adultos, o material inconsciente do ID está composto tanto núcleo inconsciente original, inalterado e quase inacessível, como de um material relativamente mais jovem e mais facilmente mais acessível que foi reprimido pelo eu e banida ao ID. Os processos mentais do ID, os chamados processos primários, não estão sujeitos às leis da lógica. • Eles podem ou não ajudar à sobrevivência do indivíduo. • O ID se acha separado do mundo externo, mas leva a cabo funções perceptivas no seu próprio interior. • O fato evidente que o ID é governado pelo princípio do prazer, de forma que isto sempre age no sentido de procurar prazer e evitar o desagrado indica que o ID pode perceber. As percepções auto-dirigidas e os sentimentos concomitantes mostram a economia das tensões internas e o equilíbrio do aparato mental. Sempre que se perturba a economia ou equilíbrio do aparato mental, as forças instintivas reagem procurando uma descarga imediata de energia. Como nós dissemos, o ID obedece cegamente ao princípio do prazer. • Não conhece valor algum, nem o bom nem o mau, nem as normas morais, nenhumas considerações para o outro. • É uma caldeira onde ferve a excitação; • Freud disse: “A energia do ID é livre, fluída, capaz de ser descarregada depressa, condensada e deslocada com facilidade”. O ID não muda. • Os impulsos conativos (tendência de impulsos, propósito) que nunca saíram do ID, e inclusive as impressões que foram lançadas no ID por repressão, são virtualmente imortais e são conservados durante décadas inteiras embora tenham acontecido recentemente. • O reprimido não sofre alterações com o passo do tempo. 8 • Em sonhos voltam recordações esquecidas de tempo da infância, e na perturbação mental, as experiências da primeira infância jogam um papel decisivo. • Os restantes agentes da mente “, ou mecanismos da personalidade, como são o eu e o super-eu, surgem a partir do ID e ficam separados do mesmo”. • Todos são governados pelos mesmos princípios de economia e prazer. Freud, no último resumo de sua teoria, escreveu «que as auto-percepções governam os acontecimentos do ID com força dominante. • O ID obedece ao princípio inexorável do prazer. Mas não só o ID. Parece como se a atividade dos agentes restantes da mente só foracapaz de modificar o princípio do prazer, mas não de exterminá-lo; de forma que continua esboçada uma pergunta de grande importância teórica, e que ainda não foi liquidado: quando e como é possível superar o princípio do prazer? • As energias armazenadas no ID são os recursos livres, sem direção e sem controle da vitalidade de um indivíduo. • O ID conduz o indivíduo ao tipo de atos mais irresponsáveis semelhante aos de um recém nascido. Nos deixe imaginar um adulto-recém nascido, com todo o poder e a habilidade de um adulto, governado por uma caldeira onde ferve a excitação e nós teremos o retrato de um homem dirigido pelo ID. Quando os outros agentes mentais são desenvolvidos, o eu e o super-eu, suas energias vem do ID. Deveria ser assinalada uma vez mais que a única fonte de energia mental, tanto do Eros como do Tanatos, é o ID, parte dessas energias é investida nos agentes mentais. RELAÇÃO DO EGO COM O ID: O Ego é o agente do ID. De fato, é parte do Id, à parte que foi modelada e modificada por sua mais direta relação com o mundo externo. O ego é, assim, a sede da inteligência e razão, e, ao reprimir e, de certo modo, controlar os impulsos cegos do ID salva este de aniquilamento. Não obstante, diz Freud, o ego é frágil, tendo de extrair suas energias do próprio ID. 2- O SUPEREGO (ÜBER-ICH): O termo Über-Ich foi introduzido por Freud em O Ego e o Id. Uma das instâncias da personalidade tal como Freud a descreveu: o seu papel é assimilável ao de um juiz ou de um censor relativamente ao Ego. Freud vê na consciência moral, na auto-observação, na formação de ideais, funções do superego. Classicamente, o superego é definido como o herdeiro do complexo de Édipo; constitui-se por interiorização das exigências e das interdições parentais. Segundo Freud, a formação do Superego é correlativa do declínio do complexo de Édipo: a criança, renunciando à satisfação dos seus desejos edipianos atingidos pela interdição, transforma o seu investimento nos pais em identificação com os pais, interioriza a interdição. Freud disse: “A imagem do eu que intervém entre o ID e o mundo externo, que se faz cargo das demandas instintivas do primeiro para lhes dar satisfação, que percebe coisas no segundoque usa como recordações, que, para respeitar a sua auto-conservação, está sempre em guarda relativo às demandas excessivas de ambas direções, e que é governado em todas suas decisões pelas regras de um princípio do prazer modificado, esta imagem, que repito, só é aplicada para o eu realmente depois de concluir o primeiro período da infância, ao redor dos cinco anos de idade”. ORIGEM E FORMAÇÃO DO SUPEREGO: O novo agente mental, o SUPEREGO, é desenvolvido como resultado da fraqueza do eu infantil. Na fase anal o menino entra em conflito com os pais relativo ao treinamento anal. O medo para o castigo e a necessidade de afeto e proteção o força a aceitar as advertências paternas e para «internalizá-las”, isto é, os considerar como próprio. Por exemplo, o menino pequeno pode sofrer desgosto ao brincar com a fezes porque desagrada aos seus pais que não quer que faça deste modo”. Estas proibições interiorizadas e estas auto-restrições são “predecessoras do SUPEREGO”. A propósito que são muito fracos e, quando ninguém observa, eles são menosprezados facilmente pelo menino. No entanto, estes “predecessores” contêm os elementos principais do futuro SUPEREGO, quer dizer, o medo para o castigo e a conformidade com as demandas paternas. 9 O verdadeiro desenvolvimento do superego acontece para o fim do período fálico. O medo para o castigo paterno alcança seu ponto culminante no complexo de Édipo. O menino, hostilizado pelo medo à castração, é forçado a abandonar à sua mãe como objeto amoroso. A menina, debaixo da ameaça de perder o amor da mãe dela, é forçada a menosprezar ao pai como objeto amoroso. O menino frustrado de qualquer sexo volta da relação com o objeto à identificação por introjeção. O introjeção do objeto amoroso é um fenômeno comum da fase oral e aparentemente a regressão oral acontece durante a formação do superego. As figuras paternas introjetadas são idealizadas e parecem ser mais poderosas e mais gloriosas que na realidade. Em muitos casos, a imagem do pai joga um papel maior no SUPEREGO do menino que normalmente abrange as imagens de ambos os pais. Em princípio o SUPEREGO é um elemento novo somado ao eu e introjetado no mesmo, constituindo uma parte do eu; mais tarde se torna um agente mental independente, freqüentemente oposto ao eu. O SUPEREGO representa a voz dos pais» e suas normas morais da mesma maneira que eles são percebidos pelo menino. Então, o superego pode ser irracional e infantil, impondo restrições rígidas que persistem na vida adulta sem muita consideração para a situação atual. Um dos elementos do superego é o Eu-ideal. O Eu-ideal se origina em uma manifestação de admiração para os pais, para quem o menino atribui a perfeição. É uma luta pela perfeição e um esforço para viver segundo as expectativas dos pais. Freud descreveu isto como: “O eu-ideal compreende a soma de todas as limitações ante as que deve curvar- se o eu, e, por isto, a revogação do ideal necessariamente constituiria uma grande alegria para o eu, que novamente poderia sentir-se satisfeito de si mesmo”. CONFLITOS DO EGO COM O SUPEREGO: A atitude do eu para o superego se assemelha à atitude do menino para os seus pais. O eu precisa de afeto e indulgência. Sua auto-estima depende da aprovação do superego. Quando o eu enche a expectativa do superego, este reage com um sentimento de felicidade e orgulho. • Quando um conflito existe, as forças agressivas armazenadas no superego se tornam contra o eu com acusações que dão lugar a sentimentos de culpa e depressão. • A depressão é uma agressão dirigida contra si mesmo; é o resultado da desaprovação do eu por parte do superego, de um modo semelhante para os críticos paternas do comportamento do menino. • No transtorno maníaco-depressivo, o indivíduo oscila entre a alegria e a felicidade resultante da total aprovação do superego e as torturas do sentimento de culpabilidade e de depressão quando o superego se torna em sádico. • Na interferência maníaco-depressiva, o superego se faz excessivamente duro, abusa, humilha e faz adoecer ao seu desgraçado eu, o ameaça com os castigos mais severos, lhe reprova por atos durante muito tempo. • Na esquizofrenia latente, o eu se acha à mercê de um superego severo e exigente. As imagens paternas introjetadas assumem um controle despótico de todo o aparato mental até o eu não possa fazer outra coisa que abandonar a luta e se mergulhar no inconsciente dentro do quadro psicótico... • Nos adultos bem adaptados, o superego joga o papel, de auto-observador e representa a consciência e as normas morais; constitui os pontos de referência morais e sociais do indivíduo. A medida que o indivíduo cresce, o seu superego vai afastando-se gradualmente das imagens infantis dos pais e fica mais impessoal, mais relacionado com as pautas sociais e éticas que ele subscreve. Nos adultos bem equilibrados, conflito algum não acontece entre as regras morais da sociedade, representadas pelo superego, e a consideração realista de auto-proteção e sobrevivência, representada pelo eu e o princípio da realidade. 3 - O EGO arcaico: O recém nascido é exposto aos estímulos, mas é incapaz de perceber o que acontece claramente, ou de mover- se voluntariamente, ou de dominar as excitações criadas pelos estímulos internos ou externos. Estas três funções - percepção, motilidade voluntária e controle de tensões - se tornarão às funções eventuais do eu emergente. O recém nascido não possui o EGO. 10 • Está exposto a excitações que não pode dominar. De alguma forma tem uma obscura consciência delas e se sente aborrecido e desgraçado. Fome, sede, frio e outros estímulos produtores de tensão fluem por seu aparato mental produzindo um estado de angústia. • A primeira tendência mental que é desenvolvida no menino é livrar-se dos estímulos perturbadores. O próprio menino é incapaz de fazer isto deste modo. Está desvalido e não pode sobreviver sem que tenha cuidado dele. A ajuda vem de fora, e os estímulos perturbadores da fome desaparecem com a satisfação deste. O aparato mental do recém nascido, em opinião Freud, assemelha-se a um corpo flutuante na água. • Sua superfície está exposta para o mundo externo e recebe os estímulos externos e as moções de descarga. Em um princípio o aparato inteiro é ID. • Debaixo da influência das forças ambientais que agem na superfície do ID, tal superfície experimenta mudanças significativas e gradualmente se transforma numa parte separada do aparato mental denominado eu. Deveria ser sublinhado que a influência do ambiente produz modificações na parte externa do ID. • O material inconsciente do ID se torna o eu pré-consciente, no qual os processos mentais primários dão lugar à emergência dos processos secundários. • Este eu infantil, arcaico, só sabe e se ama a si mesmo. É narcisista. Nesta fase de narcisismo primário, o eu infantil só tem uma consciência escura do mundo externo. • O menino é envolto em si mesmo e nas suas necessidades; quando suas necessidades estão satisfeitas e a sua tensão suprimida, cai e dorme dentro de um sentimento de felicidade e onipotência. 4 – O EGO (ICH): A palavra alemã para o ego, “das Ich”, é a mesma para EU, enquanto o inglês emprega o termo latino EGO. O EGO é uma organização coerente da vida mental, derivada dessa estrutura primária, que é o ID, por meio de modificações impostas a este pelo mundo exterior. São as seguintes as suas características: • Não se distingue rigorosamente do ID; antes se radica no ID pela sua porção inferior. • Em parte, ele é inconsciente, em parte consciente. • Presta serviços a três mestres e está, conseguintemente, ameaçado por três perigos: o mundo exterior, a libido do ID e a severidade do SUPEREGO. • O ID produz a força motriz, enquanto o EGO detém nas mãos a roda do volante, para alcançar a meta desejada. • O EGO tem 2 (dois) deveres críticos diferentes,relativos ao ID: • (a) – vigiar o mundo exterior e aproveitar a ocasião mais oportuna para satisfazer, sem prejuízo, os impulsos do ID; • (b) – induzir o ID a modificar ou renunciar aos seus impulsos, ou então a substituir ou adiar a satisfação deles. • Do ponto de vista dinâmico, o EGO representa eminentemente no conflito neurótico o pólo defensivo da personalidade; põe em jogo uma série de mecanismos de defesa, estes motivados pela percepção de um afeto desagradável (sinal de angústia). • Do ponto de vista econômico, o EGO surge como um fator de ligação dos processos psíquicos; nas operações defensivas, as tentativas de ligação da energia pulsional são contaminadas pelas características que especificam o processo primário: assumem um aspecto compulsivo, repetitivo, desreal. • Também do ponto de vista econômico, “o ego deve ser considerado como um grande reservatório de libido, de onde a libido é enviada para os objetos e que está sempre pronto a absorver parte da libido que reflui dos objetos”. 4.1 – AS TAREFAS DO EGO: A tarefa principal do eu é o auto-conservação do organismo. • Leva a cabo esta tarefa com relação ao mundo externo “percebendo os estímulos de fora”, • Acumulando as experiências dos mesmos (na memória), • Evitando os estímulos excessivos (por meio da fuga), • Tentando com os estímulos moderados (por meio da adaptação) e, • Finalmente, aprendendo a promover as modificações apropriadas no mundo externo para seu próprio proveito (por meio da atividade). Para o que concerne aos eventos internos e relacionados com o ID, o eu leva a cabo sua tarefa. • Controlando as demandas dos instintos, • Decidindo a autorização para obter satisfação, 11 • Adia tal satisfação para tempos e circunstâncias favoráveis no mundo externo ou suprimindo suas excitações completamente. As suas atividades são governadas pela consideração das tensões produzidas pelos estímulos presentes no seu interior ou introduzidas nele. Por regra geral, o crescimento destas tensões se experimenta como desagrado e sua diminuição como prazer. O eu persegue o prazer e tenta evitar o desagrado. Um incremento do desagrado esperado é percebido como um sinal de angústia. O ego se ocupa da descoberta de métodos mais favoráveis e menos perigosos para obter satisfação. Neste zelo, o eu toma em consideração ao mundo externo. Também, o eu se rege pelo princípio do prazer. Mas, ao contrário do ID, o EGO é capaz de calcular as conseqüências do seu comportamento. • O ID é cego e procura a gratificação imediata das demandas instintivas, enquanto o EGO (eu) é capaz de racionamento lógico, de considerar as relações causais e de aprender pela experiência. • Devido a estas atividades intelectuais o EGO aplica um princípio do prazer modificado. • O EGO se agarra à tarefa do auto-conservação e adia ou suprime as demandas instintivas que ameaçam o existência do organismo. • O EGO não objeta a gratificação dos instintos, mas protege a existência do organismo que é a exigência de qualquer experiência agradável. • Para o eu (EGO), a saúde é anterior ao prazer. Em outras palavras, o ID não tem cuidado da vida que não oferece prazer, e o eu (EGO) não se preocupa do prazer que compromete a vida. • O ID se agarra aos anelos instintivos prescindindo dos resultados futuros; o eu (EGO) se agarra à realidade e procura a causa do prazer sempre que não haja nenhum perigo nisto. Esta busca modificada e limitada de prazer foi denominada por Freud princípio de realidade. 4.1.1 - As funções do eu: comprovação da realidade: O EGO é à parte da mente que adapta o organismo ao mundo exterior. • O eu realiza várias funções, e uma delas é o contato com a realidade. • O eu percebe os estímulos internos e externos, considera as possibilidades de gratificação afortunada - prazer ao máximo e mínimo desagrado - dos impulsos instintivos, e leva em consideração a totalidade dos recursos internos - habilidades, etc., a totalidade das circunstâncias. • Pode ser comparado o motorista de um veículo em uma mesma estrada convergida. O motorista (EGO), • 1) percebe o que acontece fora do automóvel; • 2) percebe (ou sabe) os recursos do veículo dele, isto é, potência, tamanho, peso, freio, etc. • 3) estuda as possibilidades para correr pela estrada e considera a adaptação necessária da própria velocidade e das manobras do automóvel às condições externas – estrada molhada, estrada escorregadia, outros carros passam por ela - e as condições do próprio veículo, • 4) exercita um controle apropriado do carro de próprio dele; • 5) se move pela estrada em direção a sua meta tentando fazer isto no possível menor tempo e pela estrada mais segura e mais econômica. Deveria ser somado isto que a tarefa do eu se complica pelo fato de que não é uma máquina, mas um vulcão em erupção que sempre não pode ser controlado e que no carro, simbolizando o organismo, existe um condutor no assento posterior, o super-eu (super-ego). Como já apontamos, a primeira e mais importante tarefa do eu emergente consiste no contato com o mundo externo, isto é, a percepção dos objetos. • A percepção narcisista de nosso próprio corpo é o primeiro passo nesta direção. • O menino percebe obscuramente algumas tensões como "algo de dentro". Isto conduz à formação da imagem do seu próprio corpo, que surge a partir das sensações desagradáveis e agradáveis do mesmo. A percepção do corpo de um como objeto definido é um passo importante na direção da percepção do mundo externo. • O eu se esforça por controlar à chegada de estímulos. Quando tal coisa é impossível, retorna ao ID dormindo ou desfalecendo. • A regressão é conseqüência do fracasso em dominar a realidade; é um sinal de que o eu é muito fraco e incapaz de proteger o organismo contra uma estimulação dolorosa. O processo de percepção dos objetos externos começa por meio da identificação primária; arcaica, com os objetos percebidos. 12 São várias as funções incluídas nesta identificação arcaica realizada pelo o eu emergente. O menino põe na sua boca os objetos percebidos, introjetando seus primeiros objetos amorosos. A introjeção oral do objeto indica que os processos perceptivos, motores e emocionais ainda estão em uma fase de indiferenciação mútua. A identificação compreende a imitação dos objetos percebidos; é um esforço para dominar os estímulos muito intensos, e os adapta o próprio corpo. SEGUNDA TEORIA DOS INSTINTOS TERCEIRA FASE: EROS E TÁNATOS (1920) Em 1920, Freud revisou sua teoria dos instintos novamente. Neste ponto escreveu o seguinte: “Depois de longas dúvidas e vacilações, nós decidimos supor a existência de dois instintos básicos, o Eros e o instinto destrutivo... Tánatos”. 1- EROS: Freud juntou sob o nome de “Eros” a todas as forças que procuram o prazer e que melhoram as funções vitais do indivíduo. O Eros abraça todos os impulsos sexuais e egoístas e, desde este momento, libido era o nome de todas as energias que se acham a disposição do Eros. (Pulsão da Vida) 2 - TÁNATOS: A finalidade do primeiro (Eros) destes instintos básicos consiste em sempre estabelecer unidades maiores e os preservar, isto é, uni-los (juntá-las); a finalidade do segundo (Tanatos), pelo contrário, consiste em desfazer conexões e, deste modo, destruir seres. Deveríamos supor que a meta final do instinto destrutivo é reduzir os seres vivos para o estado inorgânico. Por isto também podemos denominá-lo de “o instinto de morte”.(Pulsão da Morte) Esta hipótese nova de separar os instintos agressivos e destrutivos derivou principalmente do estudo do sadismo e o masoquismo. A gratificação sexual de um sádico depende da dor e o sofrimento infringido por ele a seu objeto amoroso, e a de um masoquista da dor infringido a ele por seu objeto amoroso. Era muito difícil de interpretar o sadismo em termos da teoria da libido, e a existência de um desejo de sofrer masoquistaconstituiu um desafio sério para a teoria da libido. Freud teve que achar outros fatores que incitaram infligir ou aceitar a dor. Este fator poderia estar relacionado com a libido e o Eros. A única solução possível era supor outra força diretora e outro poder instintivo que empurrava aos homens para causar dor a outros em uma situação polarizada para o objeto ou a infringir dor para si mesmo em uma situação polarizaram para eles mesmos. Tal uma força instintiva poderia ser feita responsável do desejo de matar, humilhar e destruir. A existência dele era suficientemente provada pela experiência diária e com o testemunho da história humana. Os seres humanos nascem para amar e odiar; se há energia - libido - a disposição do instinto do amor, há também energia a disposição do instinto agressivo. A meta final do instinto amoroso é criar a vida e a meta final do instinto agressivo é destruir a vida e retro-trazer para a natureza inorgânica. Quando a agressividade contra o mundo externo é dificultada e não pode achar satisfação, em certas circunstâncias, pode fazer-se interior. Pode, Freud disse, aumentar o volume do auto-destrutividade. Uma impedida agressão contém perigos muito sérios; parece que deveríamos destruir coisas e pessoas em ordem a não destruir-nos nós mesmos. Deveríamos achar alguns canais externos para a agressividade para nos proteger da tendência para a autodestruição. Como nós dissemos antes, todos os instintos vão dirigidos ao restabelecimento de um estado primitivo de coisas. Assim que um estado de coisas desaparece, um instinto surge para o recreá-lo. Freud denominou a esta tendência repetição-compulsão. Pode fazer-se mais forte que o princípio do prazer e freqüentemente supera isto. A repetição-compulsão explica a tendência para reproduzir em sonhos experiências desagradáveis e freqüentemente experiências traumáticas. A vida é tida desenvolvido a partir da matéria inorgânica. Uma vez iniciada a vida, surgiu um instinto dirigido ao restabelecimento do estado inorgânico e à destruição da vida. De acordo com Freud, isto é a origem do instinto destrutivo, cuja meta final é a morte ou o restabelecimento da natureza inanimada. Vida e morte estão inter-relacionadas; construção e destruição são inseparáveis. Nenhum processo vital pode ser liberado do instinto de morte. 13 Na vida de um indivíduo, Eros e Tanatos podem combinar seus recursos, mas freqüentemente eles lutam um contra o outro. Comer é um processo de destruição com o propósito de incorporação, e o ato sexual é uma agressão guiada à união mais íntima. A maioria dos impulsos da vida sexual poucas vezes é puramente erótica; os impulsos sexuais normalmente constituem uma combinação de demandas instintivas eróticas e destrutivas. A SEXUALIDADE: 1- TEORIA DA CAUSAÇÃO SEXUAL: Com a Teoria da Causação Sexual da Neurose, e a do desenvolvimento da sexualidade em geral, Freud penetrou no cenário mais amplo da crítica social. Enquanto os neurologistas acreditavam no Mito de que a doença mental era apenas uma variedade da patologia do cérebro, era pequeno o significado da neurologia e da psiquiatria para a civilização em geral. Mas se o sexo é uma fonte de perturbação nos neuróticos e na verdade em toda gente, como Freud logo veio a perceber, então o que está em jogo é toda a Estrutura da Sociedade, pois a sociedade moderna prescreve, mesmo atualmente, um rígido código de abstinência sexual. A orgulhosa moralidade das grandes nações, diz Freud em outras palavras, é um amontoado de mentiras, e produz um mundo de neuróticos. 2- FASES DE DESENVOLVIMENTO SEXUAL ou PSICOSSEXUAIS: Freud dividiu a vida sexual humana em três períodos: a - SEXUALIDADE INFANTIL (aproximadamente até os cinco anos de idade) Está ainda subdividida nas Fases ORAL, ANAL, e FÁLICA, culminando no COMPLEXO DE ÉDIPO (em algum momento entre as idades de 3 a 5 anos). b - PERÍODO DE LATÊNCIA e c - PUBERDADE Antes da fase de Édipo, o objetivo do Instinto sexual não está ligado a um objeto: o modelo para a gratificação é a MASTURBAÇÃO, e não a relação com outro ser humano. Contudo, Freud reconheceu alguns instintos (parciais) como: sadismo, voyeurismo e exibicionismo, isto é, os impulsos para a crueldade, para VER e para se EXPOR, que estão regularmente ligados a outras pessoas ou objetos. A SEXUALIDADE Infantil culmina no Complexo de Édipo, o desejo de Ter relações sexuais com o genitor do sexo oposto, e os correspondentes desejos antagônicos com relação ao genitor do mesmo sexo. FREUD ENCARAVA O COMPLEXO DE ÉDIPO COMO A FONTE DE TODA ESTRUTURA DE PERSONALIDADE, NEURÓTICA OU NORMAL. 3 – A SEXUALIDADE INFANTIL: O recém nascido: O nascimento é uma experiência traumática que perturba a vida muito equilibrada no útero. O nascimento, como primeiro trauma, é o protótipo de todos os sentimentos de angústia da vida posterior. O organismo é inundado de estímulos, as tensões chegam a um máximo, e o organismo desvalido destituído é exposto ao choque de nascer. Depois do nascimento, o aparato mental do recém nascido sofre estímulos muito superiores para sua capacidade de resolução. A tendência natural, por conseguinte, consiste em restabelecer a economia mental por meio de um afastamento da realidade caindo dormindo. Então uma vez suprimida a tensão desagradável, por exemplo, a fome, o menino fica dormindo com um sentimento de felicidade e delícia profunda. Só se desperta quando é estimulado pela fome, o frio ou algum outro mal-estar. O recém nascido é completamente narcisista. É a fase de narcisismo primário, os objetos externos quase não são apreciados. A gratificação das necessidades do menino se produz imediatamente e ele é impossibilitado distinguir entre desejo e realidade, de si mesmo e o mundo externo. Pode sentir-se tão onipotente quando está gratificado - depois de receber comida ou depois das evacuações - quanto miserável se aumenta à tensão. Os primeiros sinais da atitude do recém nascido para o mundo externo podem ser caracterizados como um desejo sem objeto de algo ou um tipo de anelo inconsciente de unificação com o mundo externo. 14 Freud denominou sentimento oceânico a este anelo nebuloso. É como se o menino desejava retornar ao útero ou, até mesmo mais longe, para a não existência. Eros e Tanatos estão unidos na luta por essa passividade agradável e total que em última instância significa a morte. Os primeiros objetos produtores de prazer com que o menino enfrenta são os bicos do peito da mãe ou a mamadeira. A primeira zona somática que experimenta a sensação agradável de chupar é sua boca. Então, depois do nascimento, começa a fase oral do desenvolvimento instintivo imediatamente. 4 - A FASE ORAL: Primeira Fase da evolução libidinal: o prazer sexual está então ligado de forma predominante à excitação da cavidade bucal e dos lábios que acompanha a alimentação. Abraham propôs subdividir-se esta fase oral em de duas atividades diferentes: sucção (fase oral precoce) e mordedura (fase oral-sádica). O seio materno é o objeto original de desejo sexual do infante. Durante a amamentação do infante revela-se a primeira manifestação do instinto sexual. A fonte é a zona oral; o objeto está estreitamente relacionado com o da alimentação; o alvo é a incorporação. Assim, a boca e os lábios, entre outras partes do corpo, constituem uma das zonas erógenas, áreas do corpo que proporcionam o prazer sexual. O menino polimorfamente perverso: • O princípio biogenético é uma das razões principais para supor que a sexualidade do menino é polimorfamenteperverso e que dirige por algumas fases de desenvolvimento até a sexualidade adulta e normal. • Outras razões para esta suposição derivam dos estudos clínicos que indicam que a sexualidade perversa e o normal são desenvolvidos a partir da mesma origem, a sexualidade infantil. • Tanto a sexualidade normal como a perversase dirige para o mesmo fim, o orgasmo. Ambas partem da sexualidade infantil desorganizada na que existem independentemente diferentes anelos e desejos. • Na sexualidade adulta, um dos componentes se faz dominante e toda a atividade sexual fica concentrada em uma área, sendo outras áreas excluídas ou banidas a papéis secundários. • Nos adultos normais domina a zona genital, nas perversões alguma outra. • Na infância, todas as áreas ou qualquer uma delas pode fazer um esforço para seu próprio prazer. • Alguns adultos cuja sexualidade permanece infantil continuam sendo uns polimorfos perversos. As primeiras excitações sexuais do menino estão relacionadas com o processo da alimentação. Quando o menino fica dormindo junto ao peito, totalmente satisfeito, “mostra uma expressão de perfeito contente à que retornará novamente, na sua vida posterior, depois da experiência do orgasmo sexual”. O menino pode continuar chupando embora ele não tome alimento algum; chupa pelo prazer de chupar. Chupar para alimentar-se constitui o “protótipo de toda satisfação sexual posterior”. O desejo de chupar inclui o desejo do peito da mãe que, por conseguinte, é o primeiro objeto do “desejo sexual”. O amor está relacionado com a fome, e chupar reporta gratificação tanto à fome como ao amor. No princípio o menino distingue o peito da mãe do próprio corpo dele. Quando começa a chupar por prazer, o peito é abandonado como objeto de amor e é substituído por uma parte de seu próprio corpo; ele chupa seu polegar ou sua língua, e o próprio corpo é seu objeto amoroso. Na fase oral da organização da libido, o objeto amoroso é ambivalente e contém tanto ao Eros como ao Tanatos. O anelado objeto é assimilado comendo ou deglutindo, ao mesmo tempo, sendo aniquilado. O menino quer deglutir o que ama e seu amor conduz para a destruição dos objetos amorosos. É uma tendência canibalista; um canibal, Freud disse, experimenta «um afeto devorador “para seus inimigos e devora as pessoas que aprecia”. Certos adultos que não superaram a fase oral podem reter estes elementos destrutivos no amor da sua vida adulta. Amam seus objetos amorosos na medida em que pode explorá-los e só amam se se produz exploração. Karl Abraham, um dos colaboradores excelentes de Freud, sugeriu dividir a fase oral em oral-passiva e oral- agressiva. A fase oral-passiva se estende durante vários meses do primeiro ano da vida; para o segundo ano - freqüentemente, bastante avançado já -, acontece a fase oral-agressiva do desenvolvimento da libido. O estagio oral-passivo ou oral-dependente é caracterizado pelo prazer derivado de chupar. Nesta fase, o menino não pode distinguir claramente entre ele mesmo e o mundo externo, e percebe no chupar uma experiência auto- gratificante e completamente lógico. Para regra geral, a fase oral-agressiva coincide com a dentição. A criança percebe que o peito da mãe não constitui uma parte de si mesmo, isto é, sempre não está disponível ou do modo que ele quereria. 15 Não pode dar por certo que terá o peito. Quando frustrado, força uma solução, agarra e morde e tenta receber a gratificação oral por meio de atos agressivos. Eros e Tanatos se combinam durante a toda a fase oral inteira nas canibalísticas tendências para o ato de deglutir. Não obstante, na fase oral-passiva, o menino não é fundamentalmente agressivo e ele dá por certo a provisão de leite. No estádio oral-agressivo, a agressividade se utiliza como arma para procurar gratificação. O menino deglute como antes, mas, também, ele enlata cuspir e morder, e estes são pautas de comportamento definitivamente agressivo. 5 - A FASE ANAL: Freud denominou sádico-anal à segunda fase do desenvolvimento da libido. Durante o segundo e muitas vezes terceiro ano de vida, o menino experimenta prazer considerável na excreção e ele aprende a aumentar tal um prazer retendo a fezes e estimulando as membranas mucosas do ânus. As crianças experimentam prazer na evacuação de urina e do conteúdo intestinal, e muito logo eles fazem um esforço para levar a cabo atos de forma que a excitação concomitante das membranas destas zonas erógenas possam proporcionar-lhes a máxima gratificação possível... O mundo externo intervém neste ponto como um obstáculo, como uma força hostil oposta ao desejo do prazer do menino... Não deveriam dar saída às suas excreções quando goste, mas no momento mostrado pelos outros... Deste modo, é precocemente exigido a trocar prazer por valor aos olhos dos outros. O menino estima suas fezes como uma parte do seu próprio corpo e não gosta desfazer-se deles. “Pode oferecer resistência às pressões sociais e sentir que as fezes são sua propriedade e que ninguém pode exercer controle sobre eles. Pode agir agressivamente por meio da evacuação; libido e ódio se combinam, dentro de um erotismo anal, no prazer de defecar e seu sádico 'desembaraçar-se das fezes. Quando o menino resiste ao treinamento intestinal e retém suas fezes, expressa de outro modo sua oposição aos adultos”. A fase anal conta com outra ambivalência à margem da expulsão-retenção. Nesta fase, a masculinidade e a feminilidade se distinguem pela atividade e a passividade respectivamente. Os impulsos masculinos são: scoptofilia - observar -, curiosidade, desejo de manipular e dominar, podendo todos eles terminar em crueldade e sadismo. A expulsão ativa das fezes é masculina. Os impulsos femininos representam um desejo passivo relacionado com a zona erógena anal e oca. O reto pode ser estimulado facilmente aceitando que penetre nele um corpo estranho. A ambivalência anal da expulsão masculino-ativa e a recepção feminino-passiva de um estranho podem conduzir a tendências bissexuais na vida ulterior. Abraham sugeriu dividir a fase anal na fase anal-expulsiva e a anal-retentiva. Na primeira fase e expulsiva, o menino não se preocupa do objeto externo e goza com a expulsão sádica das fezes. O folclore e o “jargão” dão testemunho desta tendência anal - agressiva que freqüentemente se mantém viva em jovens e adultos. Na última fase anal ou anal-retentiva, o menino pode experimentar afeto às fezes, que se tornam em seu objeto amoroso. Pode tratar de guardá-las e preservá-las. As fezes constituem a primeira possessão de que o menino se desprende, à margem do amor para a pessoa que cuida dele. As fezes são o protótipo de dom, e, por conseguinte do ouro e o dinheiro. Por outro lado, as fezes simbolizam os bebês, pois a maioria das crianças acredita que o nascimento de um bebê constitui um processo semelhante à defecação. Muitas vezes as crianças consideram o pênis de forma semelhante à coluna de fezes que ocupam o tubo mucoso do intestino. Acredita-se que a fase anal-retentiva é a origem da ternura. Freud aceitou as sugestões de Abraham neste ponto e elaborou o conceito de ternura em contradição com o tipo de amor oral. A ternura origina-se no desejo de guardar e preservar o objeto que reporta gratificação e de cuidar do mesmo. 6 - A FASE URETRAL: A fase de desenvolvimento uretral é um período introdutório à fase fálica, na qual os órgãos genitais se tornam no ponto focal de gratificação da libido. Tanto no homem como na mulher as áreas urinárias estão estreitamente relacionadas com as áreas genitais, de forma que as fantasias sexuais das crianças confundem freqüentemente a urina com o sêmen e a sexualidade com a micção. O erotismo uretral é principalmente erótico, pois o próprio corpo se torna no objeto amoroso. Este erotismo a outros objetos por meio de fantasias concernentes a urinar-se sobre eles ou ser urinado por eles. 16 Nas meninas, o erotismo uretral às vezes é desenvolvido de acordo com uma regra retentiva, mas em geral se dirige à expulsão da urina e ao prazer derivado de esvaziar a bexiga. A mesma micção pode ser ativa e agressiva como no caso de urinar-se em alguém. Nos meninos, conduz ao erotismo genitalativo e normal. Nas meninas leva a um conflito sobre o papel sexual e mais tarde está relacionado com o inveja do pênis. A natureza passiva da micção experimentada como um «deixa-o sair “ou uma perda do controle da bexiga conduz aos meninos a uma confusão sobre o seu sexo, de forma que muitas vezes pode achar-se uma ternura feminina em homens que se urinavam na cama durante a sua infância”. 7 - A FASE FÁLICA E O COMPLEXO DE ÉDIPO: Para regra geral, ao redor dos quatro anos o menino entra na fase fálica do desenvolvimento libidinoso. É a fase de organização infantil da libido que vem depois das fases oral e anal e caracterizada por uma unificação das pulsões parciais sob o primado dos órgãos genitais. Nesta fase o infante só conhece um único órgão genital, o órgão masculino, e a oposição fálico-castrado. A fase fálica corresponde ao momento culminante e ao declínio do complexo de Édipo; o complexo de castração é aqui predominante. A noção de fase fálica é tardia em Freud, pois só em 1923 aparece explicitamente. O termo fálico é derivado de phallos que significa pênis em ereção. A idéia de um primado do falo está já prefigurada em textos muito anteriores a 1923. Desde os “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade (1905)” em que se encontram duas teses: a) A libido é “de natureza masculina, tanto na mulher como no homem”. b) A zona erógena diretriz na criança do sexo feminino é localizada no clitóris, que é o homólogo da zona genital masculina (glande). Nesta idade, as sensações agradáveis nos órgãos genitais procuradas pela estimulação manual assumem um papel dominante. A Libido está «localizada agora nos órgãos genitais, de forma que toda excitação sexual se concentrará neles e por eles será descarregado. O fator mais importante que é desenvolvido durante a fase fálica é o Complexo de Édipo. Nesta fase o pênis se torna uma fonte de sensações agradáveis. Ao contrário do desejo de ser acariciado que acontece na fase uretral, nesta existe uma necessidade ativa de empurrar e introduzir o pênis. Tal coisa se torna uma preciosa de gratificação e orgulho. Por regra geral, a mãe percebe as atividades masturbatórias do menino, o proíbe brincar com o seu pênis, e ela pode ameaçar-lhe fazendo saber que o tiraria a menos que pare para se masturbar. Muitas vezes adverte ao menino que ela pode explicar isto ao pai e este lhe cortaria o pênis. O menino tem consciência da vulnerabilidade e inferioridade com relação ao pai, cujo pênis é maior. Teme que o pai possa castigá-lo e castrá-lo. Se tiver a oportunidade de apreciar a diferença existente entre os órgãos masculinos e femininos, a ameaça de castração se torna algo muito realista e estremecedor. Acredita que todas as pessoas tiveram um pênis, porém em alguns casos estava cortado pelo onipotente pai. Este medo à castração é muito mais forte que o medo oral a ser comido; o medo anal a perder o conteúdo intestinal; ou medo à castração força a criança a abandonar seus desejos incestuosos. Pode abandonar a masturbação para sempre e adotar uma atitude passiva semelhante à que atribui à mãe. Esta atitude passiva oculta seu crescente temor e ódio ao seu pai, que às vezes se traduzem mais tarde por uma atitude desafiante contra todos os homens que representam uma autoridade. O menino não abandona o afeto à sua mãe, que freqüentemente se torna em uma relação de dependência, em uma necessidade de ser amado. Esta atitude, com seus componentes femininos fortes e sua identificação parcial com a mãe, conduz a atitudes submissas no que se refere às mulheres. Freud descreve do modo seguinte as características masculinas e femininas: «Quando nós dizemos: masculino, nós queremos dizer uma regra ativa, e quando nós dizemos: feminino, nós queremos dizer uma regra passiva... A célula sexual masculina é ativa e móvel; busca à feminina, enquanto isto, o óvulo, é estacionário, e espera passivamente. Este comportamento dos organismos elementares do sexo é em linha geral um modelo do comportamento dos indivíduos de cada sexo na união sexual. COMPLEXO DE ÉDIPO: Conjunto organizado de desejos amorosos e hostis que a criança experimenta relativamente aos pais. Forma positiva: O complexo se apresenta como na história de Édipo-Rei: desejo da morte do rival que é personagem do mesmo sexo e desejo sexual da personagem do sexo oposto. 17 Forma negativa: Apresenta-se inversamente: amor pelo progenitor do mesmo sexo e ódio ciumento ao progenitor do sexo oposto. O Complexo de Édipo é vivido no seu período máximo entre os três e os cinco anos, durante a fase fálica; o seu declínio marca a entrada no período de latência e é superado com maior ou menor êxito num tipo especial de objeto. O Complexo de Édito desempenha um papel fundamental na estruturação da personalidade e na orientação do desejo humano. Os psicanalistas fazem dele o eixo de referência principal da psicopatologia, procurando para cada tipo patológico determinar os modos da sua posição e da sua resolução. Freud descobre a importância do Complexo durante a sua auto-análise que o leva a reconhecer em si o amor pela mãe e, para com o pai, um ciúme em conflito com a afeição que lhe dedica; em 1897 escreve a Fliess afirmando que o Mito Grego salienta uma compulsão que todos reconhecem por terem percebido em si mesmos vestígios da sua existência. E logo afirma “A todo o ser humano é imposta a tarefa de dominar o complexo de Édipo”. No menino: Em alguns casos é mais intenso o amor para o pai, e o menino reprime os desejos fálicos respeito à mãe. No lugar dele, experimenta um desejo pré-genital sexual, passivo, para o pai. Este complexo de Édipo negativo pode conduzir à homossexualidade. Nas meninas: o complexo de Édipo procede em ordem inversa. Nos meninos dá lugar ao temor da castração que conduz à sua resolução; nas meninas não há nenhum medo à castração. “... enquanto o complexo de Édipo do rapaz é minado pelo complexo de castração, o da menina é tornado possível e introduzido pelo complexo de castração”. Assim que a menina confira as diferenças entre os sexos, experimenta uma inveja do pênis que a empurra a amar o seu pai. Este é o complexo feminino de Édipo, Complexo denominado de Electra. • No princípio, a menina pequena acredita que todo o mundo é como ela. • Mas, quando descobre que algumas pessoas têm pênis, quer possuir um e lhe ocorre que ela teve um pênis, mas “o perdeu”. • Começa a fazer vãos intentos de fazer a mesma coisa que os meninos e mais tarde, com mais sucesso, faz um esforço para compensar em si mesmo tal defeito; tais esforços podem levar, em último instancia, para uma atitude feminina normal. • Amiúde se masturba e usa o clitóris como substituto do pênis. • Se a garota se agarra ao desejo possuir pênis, pode desenvolver tendências masculinas e tornar-se dominante e agressiva e, em ocasiões, homossexual. Porém, as coisas podem levar outra direção. • Pode mostrar-se hostil com a mãe porque não lhe deu um pênis ou lhe tirou o que possuía e porque a mãe possui ao pai. • O desejo que a menina experimenta de aniquilar a mãe dela e de possuir o pênis do pai é característica do complexo de Édipo feminino. • O amor pela mãe se torna ódio; já não constitui um objeto de amor, e a menina reage à perda do objeto amoroso identificando-se com ele. • Quer desempenhar o papel da sua mãe e em vez de possuir um pênis quer ter um bebê, que é substituto do pênis. • O papel dela faz-se agora passivo, receptivo; o caminho para a sexualidade feminina normal está livre. Neste estádio, a sexualidade da menina é centrada no clitóris. A masturbação clitoridiana é característica desta idade, e às vezes é acompanhado de fantasias masculinas nas que o clitóris joga no papel de um pênis. • No caso de um complexo de Electra negativo, pode sonhar a menina em tomar o papel de pai e que insere o clitóris na vagina da mãe, tendo um bebê comela ou no dizer de Freud, “a renúncia ao pênis só se realiza após uma tentativa para obter uma compensação”. • A menina resvala do pênis para o filho, e o seu complexo de Édipo culmina no desejo durante muito tempo alimentado de obter como presente um filho do pai, de lhe dar um filho. • Nos casos normais, o amor para o pai ou complexo de Electra positivo que dirige ao abandono de desejo de um pênis, à identificação com a mãe, na aceitação do papel feminino-receptivo, e para o desejo de ter - incorporar - um bebê. COMPLEXO DE ELECTRA: Expressão utilizada por Jung como sinônimo de Édipo feminino, para acentuar a existência nos dois sexos de uma simetria da atitude para com os pais. Freud declara não ver interesse de tal denominação. 18 8 – O PERÍODO DE LATÊNCIA: Na fase seguinte do desenvolvimento denominada por Freud período de latência, os sentimentos edípicos incestuosos são reprimidos e agressivos e esquecidos. Parte das forças instintivas são localizados atrás das proibições paternas e são utilizadas como forças anti-instintivas. As proibições paternas interiorizadas que constitui o super-eu, ameaçam o menino com castigos severos e mantêm debaixo de um controle forte os anelos edípicos reprimidos. O menino deveria identificar-se com a figura paterna ameaçadora que na maioria dos casos é o pai do mesmo sexo. O interesse sexual do menino diminui consideravelmente, especialmente por meio de inibições e sublimações. O amor dele aos seus pais se des-sexualiza e fica inibido no seu fim. Embora os elementos sensual-sexuais são conservados no inconsciente, são inibidos os fins sensuais da sexualidade dele e o menino experimenta para os seus pais alguns sentimentos mais bem ternos que apaixonados. Como conseqüência da inibição dos anelos edípicos, as crianças abandonam seu interesse por pessoas do sexo oposto. Durante o período de latência, por regra geral entre os seis e onze anos, os meninos brincam com meninos e as meninas com meninas. Os meninos tendem a associar-se e identificar-se com os pais, adultos e companheiros do mesmo sexo, e vão estabelecendo uns interesses que aumentam sua identificação com tal sexo e seus sentimentos de pertinência para o mesmo. 9 – O PERÍODO DA PUBERDADE Durante a puberdade, a libido está totalmente separada de sua relação primitiva com os pais. Para adaptar- se psicológica e socialmente, o menino deve dirigir sua libido fora da sua mãe, para um objeto amoroso externo, e resolver o conflito com o seu pai. Estes processos acontecem, por regra geral, aos dez anos de idade. As mudanças psicológicas provocam o desenvolvimento completo das demandas sexuais e conduzem a novas relações interpessoais. No período do rápido crescimento físico e das mudanças glandulares, os genitais se convertem na principal zona erógena e o desejo de contatos heterossexuais fica dominante. A identificação com o próprio sexo aconteceu durante o período de latência; agora o adolescente faz um esforço para levar a cabo uma ação reguladora pelos atos do pai do mesmo sexo. Em muitos casos, as tendências amorosas ocultas sensuais e "ternas” se unem na puberdade. O adolescente aprende a combinar as demandas sexuais livres e violentas com os sentimentos profundamente inibidos de cuidado, ternura e consideração para o seu objeto amoroso. Cresce na vida madura e, gradualmente, vai sendo feito mais apto para o matrimônio. Muitas vezes não acontece a unificação destes dois elementos ou está atrasado ou fracassa em parte. Em tais casos o adolescente, e o adulto, reservam seus sentimentos de ternura e sua admiração para as mulheres que não o excitam sexualmente, e se sente excitado e potente ante as mulheres para as que não sentem respeito nenhum nem sentimento de ternura. Em tais casos a maturidade está longe de estar completa, a união com a mãe afetuosa é inibida em seu fim, normal durante o período de latência, não foi superada dos 10 aos 20 anos e continua agindo como fator perturbador durante a vida adulta. Em alguns casos, quando o irresoluto complexo de Édipo permanece através de uma fixação muito intensa, o adolescente, em vez de abandonar o desejo da sua mãe, se identifica com ela. O objeto amoroso renunciado fica introjetado no eu, podendo desenvolver graves transtornos emocionais. A LIBIDO: Energia postulada por Freud como substrato das transformações da Pulsão sexual: • Quanto ao objeto (deslocamento dos investimentos), • Quanto ao alvo (sublimação, por exemplo) e, • Quanto à fonte da excitação sexual (diversidade das zonas erógenas). O termo Libido= (latim)= vontade, desejo. A teoria da libido evoluiu com as diversas etapas da teoria das pulsões. No entanto, Freud sempre lhe atribuiu duas características originais: 1- Do ponto de vista qualitativo, a libido não é redutível, como queria Jung, a uma energia mental não especificada. Embora possa ser “dessexualizada”, nos investimentos narcísicos, isto quando por uma renúncia ao alvo especificamente sexual. O caráter sexual da libido é sempre sustentado. 19 2- A libido afirma-se mais como um conceito quantitativo: na definição de Freud está claro: “Libido é uma expressão tirada da teoria da afetividade. Chamamos assim à energia, considerada como uma grandeza quantitativa – embora não seja realmente mensurável – das pulsões que se referem a tudo o que podemos entender sob o nome de amor”. A Libido–homóloga, quanto ao amar, da fome quanto ao instinto de nutrição. Na medida em que a pulsão sexual representa uma força que exerce uma “pressão”, a libido é definida por Freud como a energia dessa pulsão. AS DUAS MODALIDADES DE INVESTIMENTO DA LIBIDO: 1 – LIBIDO DO EGO: Quando pode tomar como objeto, a própria pessoa, é a libido do ego ou narcísica. 2 – LIBIDO OBJETAL: Quando pode tomar como objeto um objeto exterior, é a libido objetal. Segundo Freud, existe uma balança energética entre estas duas modalidades de investimento, em que a libido objetal diminui quando aumenta a libido do ego, e inversamente. Diante das várias mudanças introduzidas por Freud até 1922, podemos tentar uma interpretação coerente da seguinte maneira: A LIBIDO, enquanto energia pulsional, tem a sua fonte nas diversas zonas erógenas; o ego, como pessoa total, vai armazenar essa energia libidinal, de que é primeiro objeto; mas o “reservatório” comporta-se ulteriormente. Perante os objetos exteriores, como uma fonte, pois que é dele que emanam todos os investimentos. PARTE II:TÉCNICA de CURA:CATARSE-HIPNOSE–SUGESTÃO-ASSOCIAÇÃO LIVRE O Processo de Cura Psicanalítica: Pode-se dizer que a cura psicanalítica consta essencialmente de dois processos: (1) Trazer à consciência o material inconsciente, por meio da Técnica da Associação Livre, da Transferência, etc. Quando falamos deste processo, nos referimos a ele em termos de reações e experiências emocionais, e inclui a Interpretação do Material. (2) Assimilação ou digestão deste material pelo EU (EGO) consciente – processo que que poderíamos chamar de introspeção e que inclui a síntese e a integração. Nota-se que a psicanálise , mesmo que a palavra enfatize o aspecto analítico do processo, é realmente um processo de análise e de síntese. (3) A Postura Neutra: Nota-se também que no curso de uma análise, além de ter muito dos processos já descritos como forma específica de psicoterapia, na psicanálise, o indivíduo tende a ser profundamente influenciado por essa atitude do terapeuta que não emite juízos de valor nem crítica. Também são aspectos incidentais de uma terapia analítica, a confissão, o proporcionar oportunidade de estabelecer uma identificação sadia, o proporcionar informações, e muitos dos aspectos da reeducação. Também tem lugaroutros processos , tais como a dessensibilização e a compreensão da histeria da vida do paciente. Há certas formas de psicoterapias que não se incluem no processo analítico, mas podem ser usados comcerta ressalva: *A Sugestão: por exemplo, utiliza-se o menos possível porque a terapia sugestiva tende a ocultar os sintomas e as tendências da personalidade, e portanto, impede o desenvolvimento da necessária compreensão e elaboração de material importante. Que a psicanálise evita o uso da sugestão, é um fato não reconhecido por muitos. *O Hipnotismo: É um erro de interpretação em que incorre a maior parte dos médicos, ao pensar que a psicanálise é, mais ou menos similar ao hipnotismo, e que o psicanalista exerce sobre o paciente uma influência sugestiva. Na verdade, a sugestão hipnótica e a psicanálise são, em certos aspectos, métodos opostos no tratamento. 20 II-1 -CATARSE O período do método hipnocatártico. Até 1895. MÉTODO CATÁRTICO: Método de psicoterapia em que o efeito terapêutico procurado é uma “purgação” [catharsis], uma descarga adequada dos afetos patogênicos. O tratamento permite ao indivíduo evocar e até reviver os acontecimentos traumáticos a que esses afetos estão ligados, e ab-reagi-los. O termo catharsis é uma palavra grega tirada da religião que significa purificação, purgação. Foi utilizado por Aristóteles para designar o efeito produzido no espectador pela tragédia: “A tragédia é a imitação de uma ação virtuosa e realizada que, por meio do temor e da piedade, suscita a purificação de certas paixões”. Breuer e depois Freud retomaram este termo, que exprime para eles o efeito esperado de uma ab-reação adequada do traumatismo. Segundo a teoria desenvolvida em “Estudos sobre a Histeria (1895)”, os afetos que não conseguiram encontrar o caminho para a descarga ficam “coarctados (limitados)”, exercendo então efeitos patogênicos. Freud escreve mais tarde resumindo a teoria da catarse: “Supunha-se que o sintoma histérico tinha origem quando a energia de um processo psíquico não podia chegar à elaboração consciente e era dirigida para a inervação corporal (conversão)... A cura era obtida pela libertação do afeto desviado, e a sua descarga por vias normais (ab-reação)”. Historicamente, o Método Catártico pertence ao período (1880-1895) em que a terapêutica psicanalítica se define progressivamente a partir de tratamentos operados em estado hipnótico. Nos seus inícios, o método catártico está estreitamente ligado à hipnose. Mas o hipnotismo em breve deixa de ser utilizado por Freud como processo destinado a provocar diretamente a supressão do sintoma sugerindo- se ao doente que este não existe: serve para induzir a rememoração reintroduzindo no campo de consciência experiências subjacentes aos sintomas, mas esquecidos, “recalcadas” pelo indivíduo. Estas recordações evocadas e mesmo revividas com uma intensidade dramática fornecem ao indivíduo ocasião de exprimir, de descarregar os afetos que, originariamente ligados à experiência traumatizante, tinham sido logo reprimidos. A CATARSE nem por isso deixa de ser uma das dimensões de toda a psicoterapia analítica. Por um lado, de modo variável conforme as estruturas psicopatológicas, encontra-se em numerosos tratamentos uma intensa revivescência de determinadas recordações, acompanhada de uma descarga emocional mais ou menos tempestuosa; por outro lado, seria fácil mostrar que o efeito catártico se reencontra nas diversas modalidades da repetição ao longo do tratamento, e singularmente na atualização transferencial. Do mesmo modo, a PERLABORAÇÃO (ELABORAÇÃO), a SIMBOLIZAÇÃO pela linguagem, estavam já prefiguradas no valor catártico que Breuer e Freud reconheciam à expressão verbal: “... é na linguagem que o homem encontra um substituto para o ato, substituto graças ao qual o afeto pode ser ab-reagido quase da mesma maneira. Em outros casos, é a própria palavra que constitui o reflexo adequado, sob a forma de queixa ou como expressão de um pesado segredo (confissão!). (Elaboração=catarse)”. II-2 -HIPNOSE Freud formou-se em medicina em 1881 e após trabalhar como anátomo-patologista, especializa-se em neuropsiquiatria. Faz um estágio em Paris, com Charcot, médico influente que fez muitos adeptos da hipnose, muito por conta de seu método que mais poderia ser comparado a um espetáculo. Charcot reunia um grande grupo de espectadores médicos e lhes apresentava o funcionamento da hipnose utilizando uma de suas pacientes e também médicos voluntários da platéia, retirava sintomas (paralisias, cegueiras, tremores...) como se fosse mágica, mas era ciência, era a comprovação da existência de um inconsicente. Freud então teve um contato especial com a hipnose, que lhe pareceu a opção perfeita de tratamento para a histeria, afecção sem etiologia orgânica que incomodava médicos da época. Em 1886 abre seu consultório em Viena, onde aplica a hipnose nas pacientes histéricas. 21 Ocorre que Freud começa a verificar que a hipnose surtia efeito apenas temporário para a retirada dos sintomas histéricos. Logo eles retornavam ou iguais, a mesma paralisia, ou o mesmo tremor; ou diferentes, surgia um tremor sem etiologia orgânica em quem estava com paralisia antes da hipnose, por exemplo. Freud então constatou que a hipnose apenas servia para provar que conteúdos podem ser armazenados em um local da mente, o inconsciente e que este inconsciente pode ser mexido. Freud teria achado que a hipnose não era suficiente e que se a pessoa podia ter uma ab-reação, esta poderia ser provocada em estado consciente, o que seria muito melhor. As catarses mais profundas não se movimentam sob hipnose, mas podem se movimentar sob livre associação, dizia ele. Assim Freud criou a psicanálise e sepultou a hipnose, como método psicoterápico ou via de administração. Vamos estudar um pouco mais e ver o histórico de Freud na hipnose. Depois de concluir o curso de Medicina, Freud conclui que nada de novo poderia aprender em uma Universidade Alemã, depois de haver usufruído o ensino direto e indireto, em Viena, dos Professores TheadorMeynert (1841- 1905). Candidatou-se ao prêmio da Bolsa de Estudo do Fundo do Jubileu Universitário, referente ao ano 1885- 1886, e foi selecionado para continuar seus estudos de Neuropatologia no Hospice de laSalpêtriére, em Paris. A Escola Francesa de Neuropatologia, dirigida na ocasião pelo Professor Jean Martin Charcot (1895- 1893).Despertava o interesse e a curiosidade científica do jovem médico recém diplomado, novo ar do saber médico. No Salpêtriére, o trabalho de Freud fugiu do seu planejamento inicial, que era o estudo das doenças anatômicas, tinha escolhido o estudo da atrofia e degenerações secundárias que se seguem às afecções do cérebro em crianças. Freud viu um laboratório sem condições de trabalho para um pesquisador, devido a falta de recursos e qualquer organização. Freud desistiu do estudo de anatomia e teve que se contentar com o estudo dos núcleos da coluna posterior da medula oblongata. Abandonando o laboratório foi Freud trabalhar na Clínica, que apresentava, em contraste com o laboratório anatômico, um material novo e abundante, sob a batuta do Professor J.MartinCharcot. Nesta ocasião não perdi a oportunidade, dizia Freud em seu relatório, de adquirir um conhecimento pessoal dos fenômenos do hipnotismo, que são surpreendentes e aos quais se dá tão pouco crédito, e em especial, ao grande hipnotismo descrito por Charcot. Com surpresa, verifiquei que nessa área determinadas coisas aconteciam abertamente diante de nossos olhos e que era quase impossível duvidar deles, assim mesmo, eram tão estranhos que não se podia acreditar neles, e menos que delas se tivesse uma experiência pessoal. Charcot considerava o hipnotismo uma área de fenômenos que eles submetia à descrição científica, tal como fizera, muitos anos antes, com a esclerose múltipla e com a atrofia muscular. Seguramente esse entusiasmo inicial de Freud pela Hipnose, que buscava conhecimentos de Neurologia, foi o marco inicial, para a criação da Psicanálise. Para Charcot, o interessepela hipnose era inseparável do método anátomo-clínico, da identificação das alterações anatômicas passíveis de explicar ás doenças nervosas. Era uma perspectiva mais experimental do que terapêutica. Freqüentemente, eram necessários anos de espera paciente antes que nessas afecções crônicas que não levam diretamente à morte, chegasse a prova da alteração orgânica, e somente um asilo com Salpêtriére podia permitir o acompanhamento e manutenção dos pacientes por períodos tão longos. A primeira demonstração de esse gênero as ser feita por Charcot, aliás, ocorreu antes que ele dispusesse de um serviço. Para Charcot e seus alunos, do fenômeno só devem ser preservadas suas dimensões somáticas. Ao contrário, a Escola rival, a de Bernheim, em Nancy, usava a sugestão como “uma idéia concebida pelo operador ou hipnólogo, captada pelo hipnotizado e aceita por seu cérebro”. Quanto a Bernheim, ele fora aluno daquele que se pretendia não um médico, mas um curandeiro: Liébeault. Sobre a estada de Freud em Paris, muito já se disse, mas existe a possibilidade, que se o destino do jovem médico fosse Nancy, e não Paris, talvez a história fosse outra, e Freud não se achasse um mau hipnotizador e não a abandonasse. Pelo menos a forma convencional de hipnose que se praticava à época, mas, dentro da conceituação Ericksoniana moderna de hipnose, que leva em consideração uma forma bem indireta de transe hipnótico, é possível que Freud nunca tivesse abandonado totalmente a hipnose. Freud não adotou o método hipnótico já em seu retorno a Viena, e não consegiu fazer com que seus colegas aceitassem às conclusões de Charcot a propósito da histeria. 22 Por outro lado, quando em 1887, tornou-se “praticante” da hipnose, não foi do método catártico que ele se valeu inicialmente, mas da sugestão hipnótica, a maneira de Bernheim. Em 1890, num artigo dedicado “a sugestão hipnótica, Freud sublinhou que” a hipnose confere ao médico uma autoridade de tal ordem que é provável que nenhum padre ou tramaturgo jamais a tenha possuído, pelo fato de ela concentrar todo o interesse psíquico do hipnotizado na pessoa do médico “. E não hesitou em recomendar a todos os médicos de família, essa forma de terapia, que deveria ser situada no mesmo plano dos demais procedimentos terapêuticos e não ser considerada um recurso último”. A sugestão era aplicada aos sintomas que poderia ser assemelhada a uma “substância”, como tal destacável de um e “aplicável” ao outro, implicava que sua verdade coincidisse com a maneira como era posta em cena, como puro instrumento de ação, como relação de forças unilateral que “imprimia” uma “idéia-substância” estranha no cérebro do paciente. Essa representação abstraía aquilo que levava o paciente a obedecer ou, ao contrário, a resistir às ordens. Tal observação não constitui uma crítica em si. Antes, põe em evidência a originalidade da orientação freudiana: O cuidado com aquilo que uma técnica implica e pressupõe. Freud descreveu a sugestão como um técnico, no sentido de a utilização de um instrumento compromete aquele que a utiliza, situa-o em relação àquilo sobre que ele age. A sugestão, portanto, não levantava problemas como tal, e cabia-nos menos compreender seus efeitos do que aprender em que medida esses efeitos faziam dela um instrumento terapêutico eficaz. Foi também como técnico que Freud criticou, nesse mesmo artigo, a sugestão. A onipotência que ela parecia conferir ao hipnotizador era meramente ilusória: “Renunciei em pouco tempo à técnica da sugestão e, com ela, à hipnose, pois perdi a esperança de tornar os efeitos da sugestão suficientemente eficazes e duradouros para levar a uma cura definitiva... Em todos os casos graves, via a sugestão que lhes fora aplicada reduzir-se a zero, e ressurgir o mesmo problema ou algum outro”. Para responder a esta pergunta, cabe distinguir às razões pela quais Freud abandonou a sugestão hipnótica direta, das razões por que abandonou a hipnose propriamente dita, ou seja, evitar a confusão entre hipnose e sugestão, que ele mesmo estimulou. Essa é uma questão importante, já que, em 1893, foi a eficácia do processo hipnótico, e não da sugestão, que funcionou como prova de nova ordem de causalidade psíquica que Freud se empenhou em instituir. Certamente podemos invocar, em primeiro lugar, o motivo aparentemente racional e técnico proposto por Freud: “Quando constatei que, apesar de todos os meus esforços, só conseguia colocar em estado de hipnose uma pequena parcela de meus doentes, decidi abandonar esse método”. Também podemos formular explicações hipotéticas de ordem social e profissional. O próprio Freud falaria mais tarde, da satisfação que tirava de sua técnica: “O trabalho com a hipnose exercia um efeito real de sedução. Tínhamos superado, pela primeira vez, o sentido de nossa própria impotência, a reputação de taumaturgo era muito lisonjeira”. Em seus “Estudos sobre histeria”, Cecilie que era a baronesa Anna vonLieben, uma das mulheres mais ricas de Viena, e Freud a teria tratado desde 1888 até 1893, chegando a vê-la duas vezes por dia. Uma de suas pacientes, ao despertar do estado de hipnose, passou-lhe os braços em volta do pescoço, através do processo que foi denominado de transferência. Vejamos o que Freud falou do incidente: “Mantive a cabeça fria, para não atribuir a esse incidente a um encanto pessoal irresistível, e julguei ter captado a natureza do elemento misterioso, que estava em ação por trás da hipnose. Para colocá-lo fora do circuito, ou, pelo menos, para isolá-lo, era preciso abandonar a hipnose”. Posteriormente Freud desenvolveu o método da pressão e depois a Associação Livre. O conjunto dos elementos que haviam norteado Freud até então mudou de sentido. Com a noção de verdade, foi também a de cura que teve de ser modificada. Primeiro por ser perigosa, já que suscitava uma transferência afetiva descontrolada para a pessoa do analista. E segundo, porque a própria significação da cena terapêutica e da rememoração se havia modificado: “uma lembrança, por mais antiga e por mais carregada de afeto que fosse, podia ser uma” mentira “. A análise já não podia ter como finalidade reavivar a lembrança de um acontecimento real, a fim de esvaziá-la de sua carga afetiva, mas levar a uma conscientização dos conflitos psíquicos que explicavam, sobretudo, a possibilidade dessas lembranças. A lembrança era apenas o caminho para uma verdade cuja produção não podia efetuar, uma verdade que somente a análise dos conflitos psíquicos que investissem a cena analítica, tal como investiam toda a vida do paciente, poderia advir”. 23 No final da sua vida Freud falou da possibilidade de juntar o ouro da psicanálise ao bronze da sugestão hipnótica. O transe sonambúlico, que provocava amnésia, e a vontade crescente do descobrimento dos caminhos do inconsciente fizeram Freud abandonar a hipnose e partir para a Livre Associação. II-3 -SUGESTÃO O período do método sugestivo-catártico. De 1895 até 1899. O método sugestivo-catártico. Assim como o próprio nome sugere, também esse método tende a uma catarse, uma purgação, do sentimento reprimido. A hipnose porém, do primeiro período, foi substituída pela sugestão. Sugestão, vem da palavra latina suggero, que significa trago debaixo, trago secretamente. Entende-se por sugestão: fornecer, até impor idéias e pensamentos por meio de outro caminho do que o da convicção racional. A propaganda é rica em sugestões. Qualquer canção política sugere. A simples presença do médico sempre traz alívio por sugestão. Fala-se em auto-sugestão, quando, por um caminho não-racional, se conduz a si mesmo a uma expectativa ou convicção. Animar-se a si mesmo é um exemplo muito comum. Como Freud trabalhava com o Método Sugestivo-catártico: Freud trabalhava da seguinte maneira: no momento em que o paciente dizia não saber, por exemplo, onde e quando o sintoma neurótico surgira,ele colocava a mão em sua fronte ou lhe segurava fortemente a cabeça entre as mãos, e dizia: "Assim que eu retirar as mãos, virá a recordação que procuramos. Pronto! O que está lembrando? O que vê?" Imediatamente, o paciente narrava um acontecimento durante o qual o sintoma nascera.Raramente o método falhava. Quase sempre, o paciente se lembrava de um acontecimento, de uma circunstância que o colocara em dificuldades, tendo como conseqüência um sintoma relacionado. Como era possível isso? Parece adequada a pergunta. É de supor-se, naturalmente, que a sugestão evocava uma verdadeira lembrança. Assim pensava Freud no começo, e outros com ele. Mas logo verificou que nem toda narração - mais tarde dizia nenhuma - correspondia á verdade. Por que então o paciente contava o suposto fato? É necessário colocar-se no lugar do paciente. Após ter lutado , durante anos, com sintomas que ninguém compreendia, e para os quais os médicos consultados, por via de regra, mostravam pouco interesse, o paciente encontrava, finalmente, um médico que o escutava, que acreditava nele, que lhe garantia não carecerem de sentido seus sintomas e que, ainda, era crente de um método com o qual podia combatê-los. O paciente, dizia o psicoterapeuta, precisava apenas narrar o que lhe vinha à mente. Qualquer narração era bem-vinda, contanto que tivesse um conteúdo emocional, de preferência passional. Além do mais, o paciente não necessitava conhecer a narração. Tinha,que recordar a partir do inconsciente, era o que se dizia ao paciente. Com a vontade de melhorar, como também desejando ardentemente colaborar com esse psicoterapeuta tão compreensivo, o paciente tirava a narração do nada. Criava-a, inventava-a. Dificilmente podia fazer outra coisa. O relato inventado mostrava ter sempre, ou quase sempre, um conteúdo sexual. Também isso é lógico. O paciente devia narrar seu inconsciente, aquilo que estava oculto. Quanto mais profunda, tanto melhor a narração. O mais profundamente oculto, nos dias de Freud, era a sexualidade. Consequentemente, o paciente contava coisas de natureza sexual. Exemplo. Uma jovem sofre de afonia, somente conseguindo sussurrar. À pergunta, como chegou a isso, não sabe responder. Mas também à pergunta o que aconteceu?,fica sem resposta. O terapeuta do segundo período diz que ela sabe a resposta, mas que seu saber se tornou inconsciente. Ele, o terapeuta, fará com que encontre a resposta. Aplica então a sugestão, da maneira descrita, e, no momento em que retira as mãos da cabeça afônica e clama: Pronto! O que vê?,a paciente, ainda sussurrando, mas chegando ao fim talvez já com algum som, diz: "Terrível, é terrível, não posso contar; um homem vem na minha direção; estou ainda na cama . . . Esse homem, esse homem está sem roupa . . . Ele chega perto, quero gritar, mas não consigo. Não tenho voz, só consigo sussurrar. Estou desesperada de medo!" O relato parece ajustar-se ao sintoma. 24 Se aconteceu mesmo, pouco importa. A doente se recorda a partir do desconhecido. A narração pode continuar sendo desconhecida. Mas, se o médico quiser, não custa fazer com que a paciente diga: "Isso aconteceu comigo , eu estava em casa, vejo o quarto", e assim por diante. A narração explica a afonia da doente: O homem sem roupa deverá ter dado a impressão, para a paciente, que a queria violentar. Em resposta, a paciente fechou com tanta força a abertura do seu corpo, visada pelo malvado, que até a garganta, também uma abertura, se fechou. Desde então, fala sussurrando, através “de uma vagina cerrada". Explicando-se o ocorrido, de maneira conveniente, a paciente recuperará a voz. Não tenhamos dúvida de que o procedimento, do começo ao fim, é trabalho do terapeuta do período do método sugestivo-catártico. Dois motivos levaram Freud a abandonar também a sugestão. O primeiro consiste em que os pacientes, assim como ocorria na hipnose, se ligavam por demais, ao psicoterapeuta. A ligação, que se externava nas pacientes como uma paixão, tornava-se um sintoma, o único até. No seu amor, a paciente permitia ao terapeuta o favor de vencer todos os sintomas, menos esse novo sintoma, que era a sua paixão. O terapeuta sugestivo, com o artifício de suas mãos, não era capaz de combater esse sintoma; ao contrário, aumentava-o cada vez que aplicava a técnica. Precisava-se de outro método. O segundo motivo para deixar o método sugestivo consistia em que, como já foi dito, as narrações não eram verdadeiras. Todos os relatos de um trauma psíquico sexual eram inventados, escrevia Freud, que reconheceu ter sido, ele mesmo, vítima de seu método sugestivo. A importância dessa descoberta é tão grande, que parece justo dizer ainda o seguinte: 1 - A descoberta de 1899: Todas as narrações sobre traumas psíquicos sexuais, principalmente as da infância, eram inventadas. Freud não quis noticiar isso logo. No seu primeiro comunicado, de 1911, escreve que as narrações escabrosas, "em grande parte", não pareciam basear-se em algo. 2 - Em 1925, declara que todas eram inventadas. Freud anota também que , por causa da descoberta, ficou durante muito tempo perplexo.A palavra perplexo não deve ter sido exagero. Se antes eu pedia ao leitor para colocar-se no lugar do paciente, a fim de compreender sua resposta, agora meu pedido é para colocar-se na posição de Freud e, assim, entender sua perplexidade. 2.1- Durante alguns anos, Freud tornou-se antipático, por declarar que a neurose provém do comportamento sexualmente errôneo dos pais. Ninguém acreditava nisso. Não sem consternação, Freud teve que reconhecer terem razão seus opositores. Acrescente-se, ainda, que se tornou de novo obscuro como o sintoma neurótico podia surgir. Numa palavra, não se conseguiu nada. Nada? Não; conseguiu-se algo. 2.2- Os pacientes, mediante a terapia, perdiam seus sintomas. Tal ponto, de suma importância, continuou sendo verdadeiro. Por isso mesmo, Freud calou-se sobre a descoberta, enquanto o silêncio lhe era favorável; até que foi encontrada uma nova teoria, que esclarecia melhor a origem do sintoma e que indicava, também, o poder terapêutico para fazer desaparecer o sintoma. No que se segue, ficará clara que a nova teoria continuava carregada do mesmo preconceito; o preconceito médico segundo o qual um sintoma, seja qual for, provém de uma lesão ou de uma perturbação passada. Assim continuou o irrefletido ponto de partida de Freud: A neurose nasce no passado do paciente. II-4 –ASSOCIAÇÃO LIVRE O período da livre associação. Depois de 1899 ESBOÇO DA TEORIA AFETIVA DA ASSOCIAÇÃO DE IDÉIAS: 1. ASSOCIACIONISMO DE PLATÃO À ESCOLA INGLESA: Porque e como se associam as idéias e as imagens, porque que e como se evocam umas a outras, especialmente fora de qualquer elo racional e de qualquer esforço voluntário? Como compreender esta marcha espontânea, aparentemente caprichosa, de um espírito que sonha ou que no estado de vigília, quando não “pensa em nada”, sonha no entanto com mil coisas? Desde Platão e Aristóteles esta pergunta despertou o interesse de numerosos filósofos, porem a partir do empirismo de Locke tem-se preocupado especialmente deste problema a Escola Sensualista francesa (Condillac). Especialmente a Escola inglesa do século XIX que ficou com o nome de “associacionismo” (Hamilton, Stuart Mill, etc). 25 Para esses filósofos, a associação tinha efetivamente uma importância capital, pois as “idéiassimples”,as imagens eram consideradas como átomos, como se fossem unidades psíquicas elementares, cujas múltiplas combinações deviam explicar toda a vida da Inteligência. Como as Idéias associavam-se: Essas combinações, como se lembra realizavam-se seguindo as leis de “contigüidade”, semelhança, de contraste: duas imagens se associam quando os objetos são percebidos um ao lado do outro, quando se assemelham, quando contrastam. A essas leis gerais e vagas foram agregadas outras diferenciaçõesmais precisas. A força das Associações: Mede-se a força das associações (experiência de Muller); mede-se a velocidade. 2.O ASSOCIACIONISMO : Classificação: Por último se realizam esforços para classificá-las de acordo com os caracteres dos termos associados e as diferentes relações que podem manter entre eles: formas ou cores, coordenação ou subordinação,etc. No entanto, as grandes aspirações dos associacionistas pareciam tornar-se cada vez mais em decepções. Penetrava-se pouco a pouco na deficiência fundamental de sua teoria. Esta havia cometido a falta de querer explicar o jogo de imagens pelos caracteres dessas imagens, sem acudir a nenhuma força estranha, como um observador que ignorando a presença do ímã e de suas propriedades, se esforça em compreender a posição que tomam os grãos de limalha de ferro segundo as linhas de força que desenham, sem considerá-los mais que em si mesmos. A limitação do associacionismo: O postulado implícito que invalida o associacionismo é que a vida representativa deve explicar-se por si mesma, que as fantasias da imaginação devem compreender-se seguindo a natureza das imagens. Rapidamente percebeu-se que isso era insuficiente e arbitrário, e se teve a suspeita do lugar em que se encontrava o “ímã”: na vida afetiva. A teoria afetiva: Jouffroy, na época, como eclético, já tem o pressentimento das teorias afetivas modernas. No seu Curso de Estética, completa a teoria da associação com uma curiosa teoria do símbolo. Segundo Jouffroy, graças às associações, toda sensação, toda idéia é suscetível de evocar e significar estados de alma que a superam, converter-se portanto em símbolo, e esta propriedade é considerada uma das bases da expressão da arte. Até chega a dizer:“Tudo o que percebemos é simbólico, já que tudo o que percebemos excita em nós a idéia de alguma outra coisa que não percebemos”. Esta teoria do símbolo, na qual Jouffroy mostra que suspeita às obscuras ressonâncias afetivas de uma percepção ou de uma imagem, passou muito tempo sem ser notado: hoje , quando a psicanálise coloca em moda “o símbolo”, tende a ser assinalado. G Dwelshauvers escreve: “O associacionismo penetra na França recentemente com Taine e com Ribot, porem Joffroy já conhecia seus princípios e esta teoria lhe havia sugerido outra muito mais completa e mais profunda, que poderíamos chamar de O simbolismo” A associação afetiva: Com Ribot o recurso ao fator afetivo se converte em categórico. Um fato fundamental, cujo alcance percebeu claramente, está constituído pelo que nós chamaremos associação afetiva ou também condensação, e que descreveu nestes termos:“As representações que tem sido acompanhadas dum mesmo estado afetivo tendem a associar-se ulteriormente; a semelhança afetiva reúne e encadeia as representações discordantes. Este fato difere da associação por contigüidade, que é uma repetição da experiência, e da associação por semelhança no sentido intelectual. (isto é: semelhança objetiva (de forma, cor, etc ),única semelhança que tem presente a “lei da semelhança” dos associanistas). Os estados de consciência não se combinam porque anteriormente tenham acontecidos juntos, nem pelo fatode que nós percebamos entre eles relações de semelhança, senão que se combinam porque têm um tom afetivo comum. A alegria. A tristeza. O amor. O ódio. A admiração. O tédio. O orgulho. A fadiga, etc., podemnum centro de atração que agrupa representações ou acontecimentos sem relações racionais entre si, porem que têm a mesma marca emocional: alegre, melancólica, erótica, etc. Esta forma de associação é muito freqüente nos sonhos , isto é num estado do espírito em que a imaginação goza de plena liberdade ” Além da condensação, outro fato bem descrito por Ribot é o que chama transferência de um sentimento. A transferência seria um pouco, o inverso da condensação. Desta vez o sentimento em lugar de agrupar em torno de várias imagens diferentes, se desagrega sobre várias imagens associadas: 26 “Ela (transferência) pode ser produzida por semelhança; quando um estado intelectual tem sido acompanhado de um sentimento vivo, um estado semelhante ou análogo tende a suscitaro mesmo sentimento. A transferência pode ser produzida por contigüidade: quando certos estados intelectuais têm coexistido, se o sentimento unido ao estado inicial é vivo, tende a transferir-se aos outros. O amante transfere o sentimento primeiramente à pessoa amada, às suas vestes, aos seus móveis, à sua casa. Nas monarquias absolutas o culto pela pessoa do rei é transferida ao trono, aos emblemas do poder, a tudo quanto se refere a ele de perto ou de longe”. Isto não ocorre apenas na consciência, segundo Ribot, tudo ocorre como se tais operações tivessem lugar, porém no subconsciente(ou no inconsciente). Com muita razão Ribot une ao “fator afetivo” o “fator inconsciente” que está formado também, por outra parte, a base de afetividade latente. Para ele é: “primeiro , um trabalho inconsciente equivalente a uma série de juízos de valor e que procede por analogia. Logo é uma construção imaginativa, constituída por associações que irradiam em diversos sentidos, porém unificadas pela seleção inconsciente dum desejo predominante” Claparède descreve a evocação de uma idéia mediante um sentimento: “O sentimento joga aqui o papel de um elemento psíquico ordinário, e satisfaz as leis da associação. Quando os estados de consciência têm sido acompanhados de um mesmo estado afetivo, tendem a associar-se. O mesmo estado afetivo, que joga o papel de cimento, pode permanecer consciente ou, pelo contrário, pode desaparecer. Foi por meio de uma associação afetiva deste gênero como Flournoy explicou claramente os fenômenos de audição colorida”. E desde essa época (1903) Claparède percebe a importância dos primeiros trabalhos de Freud sobre esse problema: “O caráter principal da associação afetiva é o de ser particularmente tenaz; nota-se em certos casos patológicos. Um elemento psíquico que contraiu uma aliança com uma emoção tem dificuldade para entrar em novas combinações associativas; assim é como um indivíduo,que disse que não queria lavar mais a mão porque havia cumprimentado o rei; neste caso o elemento afetivo em relação à mão impede que esteja entre outras relações. 3. BREUER E FREUD E O ASSOCIACIONISMO: Breuer e Freud explicaram por meio deste fenômeno os tiques, as contrações e outros acidentes dos histéricos. Claparède toma ainda de Ribot sua teoria da transferência, e seus exemplos; distingue com ele uma transferência por contiguidade (exemplo: a raiva exercida sobre os objetos inanimados que pertencem ao inimigo) e uma transferência por semelhança( exemplo: uma mãe que sente simpatia por um jovem parecido com seu filho morto). Identifica nesse momento a palavra transferência com a palavra Verschiebung( deslocamento). O deslocamento que terá um grande papel na psicanálise, só que em Freud como algo mais complexo que a transferência de Ribot. Por meio do deslocamento não só o sentimento se transfere sobre um novo objeto, senão que se separa parcial ou totalmente de seu primeiro objeto. Esta substituição, o veremos com uma importância capital nos sonhos; e é um dos fatos que mais desorientam no seu estudo. Bergson, na sua filosofia, escreve: “Não discutimos, certamente, a “lei da similitude” porém... duas idéias quaisquer e duas imagens tomadas aleatoriamente, por mais longínquas se suponham, parecer-se-ão sempre em algum aspecto, já que sempre encontrar-se-á um gênero comum no qual estarão juntas” Brunschvicg assinala que tudo pode ser associado com tudo, e distingue no jogo das imagens, além de uma função de justaposição , uma função de fusão. Desde agora suspeitamos que a afetividade tem um papel nesta fusão. Ribot nos fala de estados que se combinam sob a influência afetiva, e posteriormente a palavra cimento aparecia no escrito de Claparède para designaro sentimento que reúne duas imagens. 3. A ASSOCIAÇÃO LIVRE E O MOVIMENTO PSICANALÍTICO: A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA TÉCNICA: A teoria de Breuer afirmava que uma idéia torna-se inconsciente por causa do estado mental acidental do paciente, ao passo que Freud, sempre defendia a existência de um motivo de esquecimento. - Concordaram ambos em que o estado de ser estranho à consciência influía na dificuldade patológica. - Por estarem dissociadas, as emoções relacionadas com o acontecimento, não poderiam ser adequadamente descarregadas nem assimiladas pelo resto da personalidade. - Portanto, concluíram que as curas deviam-se à conscientização da memória esquecida, relacionando esta com o resto da personalidade, de modo que sua energia podia ser descarregada e a experiência assimilada. 27 TORNAR CONSCIENTE O INCONSCIENTE: O problema, assim, era o de encontrar um meio de tornar consciente o inconsciente. - Para isso, a hipnose fora ineficaz, no caso de Ana O. e outros, mas alguns pacientes não podiam ser hipnotizados. - Foi no decurso de uma tentativa fracassada de hipnose que a paciente de Freud revelou um método que viria a ser a técnica fundamental da Psicanálise. - Essa paciente, embora não entrasse em estado hipnótico e manifestava aparentemente, sua plena consciência, agia de forma idêntica aos dos sujeitos hipnotizados. - Ela deixava seus pensamentos fluírem livremente e relatava, de maneira não-crítica, tudo o que perpassava por sua mente. - No curso do recital, ela reagia com adequada emoção aos pensamento que manifestava. Assim foi descoberta a livre associação de idéias, logo se evidenciando que tinha grandes vantagens sobre a hipnose,pelo fato do paciente permanecer consciente e não ter de ser informado, depois, do que acontecera. Esse primeiro métodode cura foi associado a uma catarse. Acreditava-se que bastava, simplesmente, extrair o material esquecido para realizar a cura. O processo era denominado ab-reação. BASE FISIOLÓGICA: O método da associação livre, é essencialmente, a aplicação de um fato claro: é impossível que o processo psicológico se mova de um pensamento a outro a menos que exista entre ambos uma conexão, da mesma maneira que lhe é impossível a um trem mover-se de uma estação a outra sem a existência de uma via férrea que una ambos os pontos. O velho ditado de que “um pensamento conduz a outro ” seria a afirmação popular do mesmo fato. Entretanto, sabemos que muitos elos associativos são inconsciente, e a missão da psicanálise é descobrir, mediante o estudo das livres associações do paciente, a natureza e significação, tanto dos elos conscientes como inconscientes. Por tanto, o analista não escuta simplesmente a lógica consciente do relato do enfermo, senão também a seqüência que no tempo tem seus pensamentos e sentimentos. 4. AS LEIS AFETIVAS DA ASSOCIAÇÃO: As concepções psicanalíticas da associação são muito semelhantes à de Ribot. Isto naturalmente não diminui os méritosde Freud (cujos trabalhos são contemporâneos aos de Ribot, ou anteriores), mas demonstra que as idéias de Freud não foram tão subversivas como se falavam na época. A originalidade de Freud, aqui para nossa matéria psicanalítica,consiste em ter sabido estudar a imaginação e a associação no sonho. Este terreno era o mais propício para apreender as leis afetivas, que ali atuam com particular força. Essas leis são paralelas às de Ribot, porém mais completas. A condensação, o deslocamento, o papel do subconsciente são as bases da teoriapsicanalítica do sonho. 4.1. CONDENSAÇÃO: (Verdichtung, de Freud). Ribotassinala que esta forma é “muito freqüente no sonho” e deu-se conta que por seu intermédio as imagens se combinam. A psicanálise considera esta combinação como a regra mesma do sonho: combinação tão íntima que é preciso olhar duas vezes para distinguir os elementos combinados. Nossos sonhos são como retratos compostos que se obtêm fotografando sobre uma mesma placa várias pessoas de uma mesma família com o fim de fazer evidente os “rasgos familiares”. O rasgo de família é aqui uma analogia de sentimento ou de emoção, que agrupa as diferentes recordações. Daí o sentimento freqüente de ter sonhado com uma pessoa ou com um objeto “que no entanto não eram completamente esta pessoa ou este objeto”. Daí a engraçada história do sonho de Mary(6 anos) ao contar ao pai um sonho que teve depois de ouvi-lo contar a história de Hércules: “Sonhei com o homem do leão. Não era meu pai, porém era um homem que era meu pai. Não tinha um leão, porém era como se tivesse um leão” A condensação manifesta-se sobre tudo no sonho. Freud chega a dizer que a condensação “não tem analogia nos estados conscientes”, e isto pode ser verdade, referindo-se às condensações fortes, para as quais Freud parece reservar o nome de Verdichtung e em que os elementos combinadosnão se distinguem diante dos olhos do sujeito. Efetivamente existem graus de condensação. 28 Há imagens compostas (Mischbildungen) análogas ao Centauro da fábula, e nas quais os componentes (homem e cavalo), mesmo formando um conjunto, se distinguem sem dificuldade. Há condensações muito mais fortes, como lembranças amalgamadas em que o sujeito crê ter vivenciado numa só cena, quando na realidadevivenciou em duas ou três datas bastante longínquas. No caso “Ketty” comprovou-se: confunde numa só lembrança o presente que recebeu quando fez 15 anos e o que recebeu aos 16 anos. 4.2. DESLOCAMENTO: ( Verschiebung) É um fenômeno de forma mais simples e mais nítida, ainda que seja mais estranho. O deslocamento do qual se trata é o do “afeto” ou ênfase afetiva. O sentimento ou a emoção se separam mais ou menos do seu objeto real para dirigir-se a outro objeto. Poderíamos falar que é transferência,com esquecimento mais ou menos completo do ponto de partida. Ribot nos fala do culto que se transfere da pessoa do rei ao trono, aos emblemas do poder. Porém, muitas vezes se esquece do ponto de partida: o culto à relíquia não se agregamas substitui o culto do santo; os ritos de uma religião, os costumes de um povo. 4.3. AS PRINCIPAIS LEIS AFETIVAS DA ASSOCIAÇÃO 4.3.1- EVOCAÇÃO(CLAPARÈDE): Ou associação afetiva. Duas idéias que têm a mesma coloração emotiva ou sentimental e tendem a evocar-se uma a outra. 4.3.2- CONDENSAÇÃO(FREUD): É o caso precedente, com a diferença de que as idéias (imagens) em lugar de associar-se se amalgamam. A condensação é a forma por excelência da associação afetiva. 4.3.3- TRANSFERÊNCIA(RIBOT): A emoção ou o sentimento que está unido a um objeto(ou idéia) se estende a outros objetos que lhe estão associados por meio das leis ordinárias da associação (contiguidade, semelhança, às vezes contraste) 4.4.4- DESLOCAMENTO(FREUD): É um conjunto de elementos representativos coloridos com o mesmo matiz afetivo(seja por condensação ou por transferência), mas desiguais em importância, chama-se deslocamento ao trabalho que tende a separar o sentimento ou a emoção do seu objeto principal para atá-lo a objetos acessórios(secundários). 4.4.5- SOBRE-DETERMINAÇÃO: (Charles Baudouin:Dá a essa palavra um sentido mais restrito do que Freud): Os elementos associados em virtude de um estado afetivo comum, estão comumente condensados, em virtude das leis objetivas da associação (contigüidade, semelhança, contraste). Como se pode observar, essas novas leis (afetivas), longe de pretender substituir às antigas leis (objetivas) dos associacionistas, apoiam-se sobre elas em várias ocasiões. Os trabalhos de discriminação e de medida empreendidas anteriormente sobre as associações, longe de perder seu valor, adquirem um novo valor e estimulam outros trabalhos que devem complementá-los. Bleuler compreendeu a claridade que as experiências de associação podem lançar “sobre o inconsciente e sobre o diagnóstico”. A Associação de CG Jung: Jung dirigiu em Zurich numerosas e engenhosasinvestigações sobre a associação, tal como se produz em sujeitos normais e nas enfermidades mentais. Estima ter obtido assim uma confirmação numérica das concepções de Freud. Os erros na reprodução de associações já feitas, as grandes diferenças por cima e para baixo do tempo médio de associação, constituema revelação da existência de complexos (gefühlsbetonteKomplexe). As leis precedentes valem para o estado de vigília e para o sonho. O sonho apresenta uma superabundância desconcertante de condensações rápidas e ricas, de deslocamentos instantâneos. 5. ASSOCIAÇÃO: DEFINIÇÃO Termo tirado do associacionismo e que designa qualquer ligação entre dois ou mais elementos psíquicos, cuja série constitui uma cadeia associativa. As vezes o termo é usado para designar os elementos assim associados. A propósito do tratamento, é a esta última acepção que nos referimos ao falarmos, por exemplo, das associações de determinado sonho>, para designarmos o que nas afirmações do indivíduo está em conexão associativa com esse sonho. No fundo, o termo <associações> designa o conjunto do material verbalizado no decorrer da sessão psicanalítica. 5.l.Não se pode compreender o sentido e o alcance do conceito de associação em psicanálise sem uma referência à experiência clínica de onde saiu o método das associações livres. Os Estudos sobre a Histeria (StudienüberHysterie; 1895) mostram como Freud foi levado a seguir cada vez mais as suas pacientes no caminho das associações livres, que estas lhe indicavam 29 Do ponto de vista da teoria das associações, o que ressalta da experiência de Freud nesses anos de descoberta da psicanálise pode esquematizar-se do seguinte modo: a)- Uma «idéia que ocorre> (Einfall) ao indivíduo, aparentemente de forma isolada, é sempre um elemento que na realidade remete, conscientemente ou não, para outros elementos. Descobrem-se assim séries associativas que Freud designa com diversos termos figurados: linha (Linie), fio (Faden), encadeamento (Ver- kettung), comboio (Zug), etc. Estas linhas tecem verdadeiras redes, que compreendem «pontos nodais (Knotenpunkten) onde muitas delas se cruzam. b)- As associações, tais como se encadeiam no discurso do indivíduo, correspondem, segundo Freud, a uma organização complexa da memória. Ele comparou esta a um sistema de arquivos ordenados segundo diferentes modos de classificação que se poderiam consultar seguindo diversos caminhos (ordem cronológica, ordem por assuntos, etc.) Essa organização supõe que a representação * (Vorstellung) ou o traço mnésico * (Erinnerungsspur) de um mesmo acontecimento se pode reencontrar em diversos conjuntos (a que, Freud chama ainda «sistemas mnésicos>). c)- Esta organização em sistemas é confirmada pela experiência clínica: existem verdadeiros <grupos psíquicos separados>, isto é, complexos de representações clivados do curso associativo: «As representações isoladas, contidas nestes complexos ideativos podem voltar constantemente ao pensamento, como notou Breuer. Só a sua combinação bem determinada se conserva banida da consciência. Freud, ao contrário de Breuer, não vê no estado hipnótico a explicação última deste fato, mas nem por isso deixa de afirmar a idéia de uma clivagem (Spaltung) no seio do psiquismo. O grupo de associações separado está na origem da noção tópica de inconsciente. d) Num complexo associativo, a «força> de um elemento não se lhe mantém imutavelmente ligada. O mecanismo das associações depende de fatores econômicos: a energia de investimento desloca-se de um elemento para outro, condensa-se nos pontos nodais, etc. (independência do afeto relativamente à representação). e) Enfim, o discurso associativo não é regido passivamente por leis gerais como as que o associacionismo definiu: o indivíduo não é um «polipeiro de imagens> (polipeiro: reunião ou agrupamento de pólipos, isto é, tipo de tumores). O agrupamento das associações, o seu isolamento eventual, as suas «falsas conexões>, a sua possibilidade de acesso à consciência, inscrevem-se na dinâmica do conflito defensivo próprio de cada um. 5.2. O Projeto de uma Psicologia (EntwurfeinerPsychologie, 1895) ilumina o uso freudiano da noção de associação e mostra, de um ponto de vista especulativo, como a descoberta psicanalítica do inconsciente vem dar um sentido novo aos pressupostos associacionistas em que Freud se apoia: a)O funcionamento das associações é concebido como uma circulação de energia no interior de um «aparelho neurônico> estruturado de forma complexa num escalonamento de bifurcações sucessivas. Cada excitação toma, em cada cruzamento, um caminho determinado de preferência a outro, em função das «facilitações> deixadas pelas excitações precedentes. A noção de facilitação não deve ser compreendida sobretudo como uma passagem mais fácil de uma imagem para outra, mas como um processo de oposição diferencial: tal caminho só é aberto ou facilitado em função da não-facilitação do caminho oposto. b)- Das hipóteses da qual Freud parte, não se trata de imagens no sentido de uma marca psíquica ou neurônica semelhante ao objeto real. Tudo começa por ser «neurônio> e «quantidade> . Não se pode deixar de aproximar esta concepção, que pode parecer muito distante da experiência pelo seu caráter mecanicista e pela sua linguagem neurofisiológica, da constante oposição, na teoria psicológica de Freud, entre a representação e o quantum de afeto. Como o neurônio, a representação é o elemento discreto, descontínuo, de uma cadeia. Como acontece com ele, o significado dela depende do complexo que constitui com outros elementos. Nesta perspectiva, poderia comparar-se o funcionamento do «aparelho neurônico> ao da linguagem tal como é analisado pela lingüística estrutural: constituído por unidades descontínuas que se ordenam em oposições binárias. 30 MÉTODO PARA O ESPECIALISTA: O Métododa Associação Livre é um dos instrumentos técnicos da psicanálise. Consiste em que o paciente comunique todos os pensamentos que lhe ocorrem; - verbalize suas reações, lembranças e emoções – - que sonhe acordado, em voz alta, em certo sentido -, - que possa prescindir de todo o controle lógico que exerce sobre sua conversação, e deixe emergir na consciência para comunicá-los, todos os pensamentos e fantasias que naturalmente rejeita, motivado pelo medo, a culpa ou a vergonha. - Segundo Freud, nenhuma idéia ocorre ao nosso pensamento sem uma causa qualquer, seja ela superficial ou profunda. - Colocado o paciente em uma situação que diminuaas excitações do ambiente – o isolamento em meio tranqüilo – pede-se que o paciente vá dizendo livremente as palavras que lhe vierem à mente. O ponto de partida de uma Associação Livre poderá ser uma palavra. Mas, qual a palavra. Esta poderá ser de 4 origens: - 1) Tratando-se de interpretar o sonho, a palavra , como ponto de partida para cada grupo de associações deve ser um dos elementos do sonho narrado. - 2) Pode ser uma palavra ou elemento de sonho de vigília contado. - 3) Um elemento ou palavra de lapsus linguae (atos falhos). - 4) Pode também usar o método jungiano de associação, conforme mais adiante na apostila, sugerindo deliberadamente uma série de palavras previamente escolhidas. - 5) Podemos também lançar mão de elementos, nomes de pessoas ou entidades que aparecem no círculo da ferramenta da primeira sessão. Disposição física: Geralmente o paciente recosta-se no divã, - de tal forma que não pode ver o analista, - com o propósito de poder alcançar um maior estado de relaxação, - diminuir os fatores que possam distrair sua atenção, - e aumentar suas possibilidades de espontaneidade, expressando-se de acordo com sua verdadeira estrutura, fora das influência que sobre ele possa exercer as expressões e a aparência do analista. Nestas circunstâncias, o analista pode reconhecer, - comfreqüência, o significado e as origens emocionaisda seqüência das associações, - já que as conexões lógicas foram deixadas de lado, até um certo ponto pelo menos. Alguns pontos podemos acentuar: 1) Reação do paciente: Os padrões espontâneos de reação do paciente, acontecem mais claros quando respondem a uma figura vaga e neutra que está fora da visão, como é a do analista, ao que pode atribuir suas próprias expectativas e distorções. 2) Origens emocionais: A interpretação das origens emocionais das sucessivas séries de pensamentos , e do caráter de sus padrões de reação, são partes importantes do processo analítico. 3) Rasgos significativos: A interpretação dos sonhos, dos lapsos de linguagem (atos falhos), e de rasgos significativos de conduta que demonstram ser reações emocionais a uma situação fundamentalmente neutra, são também instrumentos técnicos que o analista utiliza. 4) Análise Transferencial: Mas, o instrumento de trabalho essencial do psicanalista, é a análise da relação existente entre o paciente e o psicanalista. - O aspecto fundamental consiste em que o contato com o psicanalista, que conserva as características de uma figura moderadamente neutra, - provoca a emergência de muitas reações emocionais que , em lugar de ser um produto lógico da situação real, são claramente resultado das próprias tendências do paciente. - As análises de tais reações transferenciais pode ser um fator muito importante no processo de levar o paciente a uma verdadeiracompreensão e visualização dos padrões que constituem sua personalidade. - Esta compreensão pode conduzir a uma correta valorização, que vai mais ao lado intelectual, do papel interpretado pelas próprias tendências, na produção de sintomas e dificuldades. - Pode levar ao descobrimento de experiências infantis de importância etiológica, e pode trazer como resultado um fortalecimento do EU. 5- Análise das Defesas do paciente: Um dos aspectos importantes do procedimento técnico de uma sessão psicanalítica, - é a análise das defesas do paciente e das suas resistências a falar com liberdade. 31 - Isto leva o paciente à compreensão de suas formas de defesa normais e pode preparar o caminho, desta maneira, para uma melhor escolha de mecanismos defensivos. - Tanto a motivação emocional da conduta atual e anterior do paciente, como suas reações para com o psicanalista , são matéria de análise. 6. MÉTODO OU REGRA DE ASSOCIAÇÃO LIVRE Método que consiste em exprimir indiscriminadamente todos os pensamentos que acodem ao espírito, quer a partir de um elemento dado (palavra, número, imagem de um sonho, qualquer representação), quer de forma espontânea. O processo de associação livre é constitutivo da técnica psicanalítica. Não se pode indicar data exata para o seu descobrimento; ele foi acontecendo progressivamente entre 1892 e 1898, e por diversos caminhos. 6.1. Como é demonstrado pelos Estudos sobre a Histeria (StudienüberHysterie, 1895), a livre associação emana de métodos pré-analíticos de investigação do inconsciente que recorriam à sugestão e à concentração mental do paciente numa dada representação; a procura insistente do elemento patogênico desaparece em proveito de uma expressão espontânea do paciente. Os Estudos sobre a Histeria põem em evidência o papel desempenhado pelos pacientes nesta evolução. 6.2. Paralelamente, Freud utiliza o processo de associação livre na sua auto-análise e particularmente na análise dos seus sonhos. Aqui, é um elemento do sonho que serve de ponto de partida para a descoberta das cadeias associativas que levam aos pensamentos do sonho. 6.3. As experiências da Escola de Zurique retomam, numa perspectiva psicanalítica, as experiências mais antigas feitas pela escola de Wundt e que consistiam num estudo das reações e dos tempos de reação (variáveis segundo o estado subjetivo) a palavras indutoras. Jung põe em evidência o fato de que as associações que assim se produzem são determinadas pela «...totalidade das idéias em relação a um acontecimento particular dotado de uma coloração emocional> , totalidade à qual dá o nome de <complexo>. Freud, em <Para a História do Movimento Psicanalítico (ZurGeschichte der psychoanalytischenBewegung, 1914), admite o interesse destas experiências «para se chegar a uma confirmação experimental rápida das verificações psicanalíticas e para mostrar diretamente ao estudante esta ou aquela conexão que um analista apenas pode relatar>. 6.4. Talvez convenha ainda referir uma fonte que o próprio Freud indicou numa nota <Sobre a Pré-história da Técnica Analítica (ZurVorgeschichte der analytischenTechnik, 1920): o escritor Ludwig Börne, que Freud leu na juventude, recomendava, para alguém «se tornar um escritor original em três dias», escrever tudo o que acode ao espírito, e denunciava os efeitos da autocensura sobre as produções intelectuais. O termo «livre> na fórmula «associação livre> exige as seguintes observações: l. Mesmo nos casos em que o ponto de partida é fornecido por uma palavra indutora (experiência de Zurique) ou por um elemento do sonho (método de Freud em A Interpretação do Sonho [Die Traumdeutung, 1900]), pode considerar-se «livre> o desenrolar das associações, na medida em que esse desenrolar não é orientado e controlado por uma intenção seletiva; 2. Esta «liberdade> acentua-se no caso de não ser fornecido qualquer ponto de partida. E neste sentido que se fala de regra de associação livre como sinônimo de regra fundamental. Na verdade, não se deve tomar liberdade no sentido de uma indeterminação: 3.A regra de associação livre visa : 3.1. em primeiro lugar eliminar a seleção voluntária dos pensamentos, ou seja, segundo os termos do primeiro tópica freudiano, pôr fora de jogo a segunda censura (entre o consciente e o pré-consciente). 3.2. Ela revela assim as defesas inconscientes, quer dizer, a ação da primeira censura (entre o pré-consciente e o inconsciente). Por fim, o método das associações livres destina-se a pôr em evidência uma ordem determinada do inconsciente: «Quando as representações-metas * (Zielvorstellungen) conscientes são abandonadas, são representações-metas ocultas que reinam sabre o curso das representações>. 6.5- O que Freud nos relata da sua doente Emmy von N...: <à insistência de Freud na busca da origem de um sintoma, ela responde «...que não tem que lhe estar sempre a perguntar donde provém isto ou aquilo, mas deixá-la contar o que tem a contar> . 32 Dessa mesma doente, nota Freud que ela parece «...ter-se apropriado do seu processo>: <As palavras que me dirige [...] não são tão inintencionais como se poderia supor pela sua aparência; reproduzem antes fielmente as recordações e as impressões novas que sobre ela agiram desde a nossa última conversa e emanam muitas vezes, de modo inteiramente inesperado, de reminiscências patogênicas de que ela se liberta espontaneamente pela palavra>. 6.6- A diferença básica entre Freud e Jung no que se refere à Associação Livre consiste: - em que Jung parte de uma Palavra Indutora, - enquanto Freud parte de um elemento retirado do sonho (onírico ou de vigília), lapsus linguae (atos falhos) ou da própria elaboração do paciente. 7. A ASSOCIAÇÃO LIVRE COMO TÉCNICA O método que Freud aplicava no tratamento dos seus pacientes, passou, em poucos anos, por mudanças im- portantes, até consolidar-se, ainda antes de 1900, num método terapêutico que, com variações secundárias e acentuações diferentes, de acordo com cada psicoterapeuta, é usado até o dia de hoje. O período do método da livre associação. Quem dá livre curso ao seu pensamento salta de um assunto para outro. Não o faz, porém, desordenadamente, mas é dominado pelas leis da livre associação. Associação, vem de associare, do latim, que significa ligar. 1. Já Aristóteles enumerava diversas leis que regem a ligação dos pensamentos. Por exemplo: a lei da concordância, a lei da oposição, a lei da simultanei-dade, a leida conexão temporária. Mais tarde, acres- centaram-se outras leis. 2. Tornou-se famosa a experiência de associação de C. G. Jung. Este dirigia palavras para as pessoas que faziam o teste, as quais deviam responder com a primeira palavra que lhes surgisse na mente. 3. O tempo de reação entre a palavra-estímulo e a palavra da reação fica normalmente entre limites determinados. Um tempo de reação mais longo poderia indicar que a palavra-estímulo fosse desconhecida para a pessoa submetida ao teste. Juntando-se as palavras correspondentes a um tempo de reação anormalmente longo, pode muito bem ser que se obtenha uma visão da vulnerabilidade emocional da pessoa estudada. Era assim que Jung tentava descobrir onde se situa o complexo neurótico do paciente. A palavra complexo, nesse sentido, foi usada pela primeira vez por Jung. Freud e a associação livre: A regra básica da psicanálise, à qual o paciente, que associa livremente, deve-se submeter, resume-se: 1. Na exigência de que o paciente diga tudo, sem reserva, o que pensa na associação livre. 2. Pensamentos concomitantes, bem como os perturbadores, devem ser expressados. 3. Pensamentos dolorosos não podem ser omitidos, nem tampouco os pensamentos vergonhosos. 4. Essa exigência fundamental pode conduzir o paciente às maiores dificuldades. 5. Uma conseqüência inevitável, mas que se mostrou nociva, consistia em que o paciente, pela obrigação de manifestar também seus pensamentos mais desonrosos, destes se lembrava em primeiro lugar, com o que seu relato se tornava mais indecoroso, o que, no tempo de Freud, significava mais sexual do que os seus pensamentos e sua vida eram na realidade. 6. Há, ainda, outros inconvenientes: O convite a revelar todos os pensamentos que surgem pode fazer com que a narração degenere num conjunto sem sentido de pensamentos cortados e incoerentes. 7. Além disso, dizer o que se pensa, livremente, não é possível em sentido estrito, pois, pelo próprio fato de se dizer livremente o que se pensa , perde-se, a bem dizer, a liberdade do pensamento. 8. Afinal, existem pensamentos que se pensa livremente, mas que são ditos com pouca liberdade, não por serem maus, mas porque são pensados e ainda não ditos. 9. Enfim, uma observância rigorosa da regra básica transforma facilmente o método da associação livre numa caricatura. 10. Tornou-se, por isso, costume dar a conhecer a regra como uma recomendação, e não tanto como uma ordem. 11. Hoje existem até psicoterapeutas, que, conquanto utilizem o método da associação livre, nunca mencionam a regra básica. 33 8 – A PRÁTICA DA ASSOCIAÇÃO LIVRE A prática do método da associação livre: Pode ser descrita da seguinte maneira, após um certo número de entrevistas introdutórias: - O paciente é convidado a deitar-se no famoso sofá ou divã do psicoterapeuta, último remanescente do tempo do método hipnocatártico. - O paciente estende-se da maneira mais descontraída possível, o que, principalmente no início, não passará de um simples desejo. - O psicoterapeuta senta-se atrás do paciente ou meio de lado, provido de papel e caneta para fazer anotações. Uma vantagem dessa posição é que o paciente tem, mais ou menos, um campo de visão limitado e que o psicoterapeuta não se vê constantemente obrigado a prestar atenção ao que faz ou deixa de fazer. - O terapeuta observa o paciente, - suas palavras - e o sentido ou valor emocional das mesmas. - Tenta descobrir, naquilo que ouve, associações complexas, procurando encontrar o motivo neurótico. Em uma palavra, o psicoterapeuta trabalha racionalmente. - Mas também ao paciente pede-se que se aprofunde racionalmente nas suas dificuldades, apesar de estar envolvido em todas as emoções. - Se os primeiros dois períodos, da hipnose e da sugestão, eram épocas de uma metódica fundamentalmente afetiva ( a meta era o desabafo do sentimento reprimido), o terceiro período, o da associação livre, foi o de uma metódica acima de tudo racional. - A meta do terceiro período é: interpretar. Interpretar significa: dar sentido a, compreender racionalmente. Exemplo: Um paciente, durante o tratamento, pega com freqüência na gravata para ver se está direita. - Pedindo-se-lhe para fazer associações livres a respeito disso, - o paciente conta que lhe ocorre a torre Eiffel. - O terapeuta anima-o a continuar a falar sobre esse tema. - O paciente diz várias coisas sobre a torre Eiffel e encerra sua associação com a observação de que muita gente se lançou dessa torre. - O terapeuta pode, se o momento lhe parecer oportuno, dar a seguinte interpretação: - a)- a lembrança da torre Eiffel, que convida para o suicídio, b)- e o controle repetido da gravata são testemunhas de que o paciente anda com idéias suicidas. - Este pode aceitar a interpretação, que lhe trará então uma nova luz. - Também poderá rejeitá-la. - Nesse caso, o terapeuta terá que se interrogar se agiu certo interpretando naquele momento, o comportamento e as palavras do paciente. - Por via de regra, o terapeuta somente dará uma interpretação quando houver uma boa garantia de que o paciente a aceite. Enquanto o esclarecimento dos sintomas, - Nos primeiros dois períodos, se dava como por um toque mágico, - no terceiro período, tornou-se um trabalho cada vez mais difícil, de penosa interpretação; - consequentemente, a freqüência das consultas foi aumentada; - em breve tornou-se costume atender ao paciente todos os dias úteis, durante quarenta e cinco minutos. Alguns psicoterapeutas achavam até inconveniente não poderem utilizar também o Domingo, depois da Segun- da Guerra Mundial, houve uma mudança quanto a isso. Muitos psicoterapeutas atuais consideram suficientes três, ou no máximo quatro consultas por semana, tendo cada uma a duração de quarenta e cinco minutos, alguns acham também essa freqüência muito alta e recebem seus pacientes duas vezes, ou até uma vez, por semana. Entre esses últimos encontram-se psicoterapeutas que aboliram o divã e que tratam os pacientes, chamados preferivelmente de clientes, face à face. - O trabalho de pesquisar e interpretar fica, geralmente, mantido. Chama-se psicanálise. Psicanálise. Na literatura encontramos, muitas vezes, - a abreviatura psa, ou, com letras gregas, . - A palavra, formada por Freud em 1895, significa literalmente: decomposição da alma. - Análise, decomposição, interpretação e explicação da existência neurótica: eis o conteúdo do terceiro período na história da psicoterapia, designado, por isso mesmo, como período psicanalítico. - É muito importante distinguir bem o método psicanalítico da psicoterapia, usado pelo psicoterapeuta na sua prática, e a antropologia psicanalítica, ou concepção psicanalítica do homem, que Freud e sua escola desenvolveram a partir das experiências com seus pacientes. 34 OBSERVAÇÃO: - O temor de que o método análise ou até decomponha, irremediavelmente, em vez de sintetizar ou reunir, é infundado. - É impossível decompor a existência humana a tal ponto que não se forme, de novo, por força própria, uma outra unidade, - a não ser que o indivíduo já tenha entrado num processo de desintegração, por causa de uma psicose, por exemplo; mas, nesse caso, não deve ser submetido a uma psicanálise. Em geral, cada psicanálise é uma psicossíntese. Logo, não tem sentido procurar, separadamente, a psicossíntese. Tal coisa seria impossível. O psicoterapeuta pode, com a ajuda do seu paciente, analisar, mas nada mais. - O paciente é que fará, sem a ajuda do psicoterapeuta, uma psicossíntese. 9- ASSOCIAÇÃO LIVRE (Abordagem II – Jean Filloux(Psicanalista e Filósofo) Segundo este autor, Freud procurou outra técnica, diferente da hipnose, que seja capaz de “alargar o campo da consciência dos pacientes e de pôr à sua disposição, no momento de um comportamento normal, e não a favor de uma atividade sonambúlica e subconsciente, um saber até ali inconsciente”. - O mecanismo psicológicoque, em regra geral, preside à evolução das lembranças, tinha sido descrito desde muito tempo sob o nome de “associação das idéias”. - A associação das idéiasseria um processo, segundo o qual uma idéia ou imagem suscita a chegada à consciência de outra idéia ou imagem: - A (estado de consciência indutor) → evoca → B (estado de consciência induzido); B → comportando-se, por sua vez, como indutor, evoca → C... - Tal esquema simples da associação. Mas, este esquema deve ser complicado, provocando um estado indutor, não apenas um, porém muitos estados induzidos. - Como quer que seja, permite este mecanismo que se mergulhe na memória, pois imagens e idéias induzidas pertencem, necessariamente, à memória, entrando em contato com o INCONSCIENTE. 1- Associação PERCEPTIVA: Esta forma de Associação de Idéias consiste no despertar de lembranças, determinadas por uma situação presente, que elas contribuem para precisar (não sendo a percepção neste caso, senão uma oportunidade de se recordar, segundo a fórmula bergsoniana). 2- Associação IMAGINATIVA: Esta forma de Associação imaginativa ou errante, caracterizando-se por um como abandono do espírito às evocações sucessivas. A este tipo de associação, que Freud recorre para determinar, nos doentes, a evocação das lembranças antigas, que até então ele evocava por intermédio da hipnose. Este método é até, particularmente, adequado ao fim catártico que se tem em mira. Tomemos , com efeito, determinado indivíduo e peçamos-lhe que pense, profundamente, numa idéia ou numa imagem qualquer. A partir desta idéia ou imagem, é lícito fazê-lo “associar”. 10. PROVA DAS ASSOCIAÇÕES LIVRES Assim como a prova das associações condicionadas representava uma espécie de interrogatório condensado e dissimulado, mediante o qual explorávamos a atitude de reação que a pessoa analisada tem para os diversos estímulos intelectuais e afetivos, a prova das associações livres trata de produzir a confissão espontânea e involuntária das idéias e os desejos do indivíduo que foram reprimidos pela sua censura consciente, isto é, de seus complexos. - Com aquela prova íamos buscar o complexo; - com esta deixamos que ele se manifeste, ou antes, esperamos que ele nos venha , levado pelo livre curso das associações. Eis como procede FREUD para utilizar essa prova: 1- Faz deitar o paciente sobre um divã numa sala silenciosa e escura. 2- Pede-lhe que se coloque numa atitude de repouso completo, deixando relaxar os músculos e colocando seu espírito numa atitude puramente passiva.. : 3- A prova a que será submetida terá uma ação muito benéfica para seu estado e produzirá uma descarga natural de excesso de tensão de seu ânimo. 4- Então o analista senta-se detrás dele e lhe diz que deixe vagar a atenção e submerja numa espécie de révêrie dizendo ao analista tudo que lhe ocorrer. 5- A pessoa analisada não deve deter-se diante de um pensamento inesperado, nem devido a uma imagem obscena, inconveniente ou repugnante, nem por uma idéia que lhe pareça fútil. 6- Absolutamente tudo, o que lhe ocorrer deve ser dito - sem exercer a mínima crítica. 7- O indivíduo deve esforçar-se para se colocar na atitude de um espectador de seu próprio pensamento. 8- Em tais condições, o psicanalista se limita a dexá-lo falar, intervindo unicamente no caso em que veja claramente que a direção das associações não conduzirá a nada; 35 9- marcará então outro ponto de partida. 10-Feito isso, não deixará de anotar cuidadosamente tudo o que seu paciente dizer e ocasionalmente será conveniente que, a posteriori, peca-lhe uma ampliação ou explicação de algum ponto especial do monólogo. 11-Quando essa prova se faz numa pessoa normal, que não tenha nenhuma alteração mental, se obtém uma série de palavras que se encontram ligadas entre si pelas leis ordinárias da associação (continuidade espacial ou temporal e contigüidade espacial ou temporal) . 11. A ASSOCIAÇÃO LIVRE NA PRODUÇÃO DE MATERIAL 1- ASSOCIAÇÃO LIVRE: Na psicanálise clássica, para comunicar o material clínico, - o paciente tenta, como forma predominante de comunicação, a associação livre. - Geralmente, esse processo começa depois de concluídas as entrevistas preliminares. - Nas entrevistas preliminares, o analista pode chegar a uma avaliação da capacidade do paciente para trabalhar na situação analítica. - Parte da avaliação consistiu em determinar se o paciente, - em suas funções do ego, - dispunha de elasticidade para oscilar entre as funções mais regressivas do ego quando estas são necessárias na associação livre - e entre as funções do ego mais maduras, funções estas necessárias à compreensão das intervenções analíticas, - respondendo a perguntas diretas - e voltando à vida quotidiana no final da sessão. - Geralmente, o paciente associa livremente durante quase toda a sessão - mas ele pode também relatar sonhos - e outros acontecimentos de sua vida quotidiana ou do seu passado. Uma das características da psicanálise - é que se pede ao paciente que inclua suas associações quando narra seus sonhos - ou outras experiências. - A associação livre tem prioridade sobre todos os outros meios de produção de material na situação analítica. - Contudo, a associação livre pode ser usada erradamente para ajudar a resistência. - É tarefa, então, do analista, analisar tais resistências para restabelecer o uso adequado da associação livre. - Pode acontecer, também, que um paciente não consiga interromper a associação livre devido a um colapso das funções do ego. - Este é um exemplo de situação de emergência que surge no decorrer de uma análise. - O trabalho do analista, então, deveria ser o de tentar restabelecer o raciocínio do processo secundário e lógico do ego. - Ele talvez tenha de empregar a sugestão e ordens diretas para conseguir isso. - Esta é uma manobra não-analítica mas é indicada para o exemplo acima porque talvez estejamos lidando com uma reação psicótica incipiente. A associação livre é o método mais importante para a produção de material na psicanálise. - É utilizada em momentos preestabelecidos naqueles tipos de psicoterapia que buscam uma certa dose de volta do reprimido, as assim chamadas "psicoterapias orientadas psicanalitïcamente". - Não é empregada nas terapias antianalíticas, de apoio ou de encobrimento do reprimido. 2- COMUNICAÇÃO COM O PACIENTE: Vamos supor que o analista compreendeu o significado do material do paciente - através do uso da empatia, intuição e conhecimento teórico. - Seu trabalho seguinte é comunicar isso ao paciente. - Na verdade, ele deve decidir o que dizer ao paciente, quando e como o fará. - Voltemos àquele momento da sessão analítica em que o analista sente que entendeu o significado inconsciente do material do paciente. - Ele talvez só tenha entendido de maneira impressionista e meio vaga; - isso tem que ser formulado em palavras e idéias antes que se adote qualquer medida nova. - Surgem realmente situações, na análise, em que comunicamos noções vagas ou intuições a um paciente mas isso em geral só é feito quando o material é relativamente inócuo. - Normalmente, é necessário formular o material em palavras para sermos o mais claro e preciso que pudermos. O analista deseja estabelecer contato e causar um impacto no paciente. 36 - Assim, quer evitar ser mal-compreendido ainda mais porque as resistências do paciente estão sempre a postos para se aproveitar de uma situação dessas. - As palavras, a linguagem e o tom de voz desempenham um papel especial e fundamental para fornecer uma ponte que cubra o espaço entre o paciente e o analista, exatamente como outrora fizeram entre a mãe e a crian- ça, depois de ter havido a separação corpórea (Sharpe, 1940; Greenson, 1950; Loewenstein 1956; Rycroft, 1956; Stone, 1961). 3-A linguagem e a fala são funções do ego relativamente autônomas - mas são passíveis de regressão, - reinstintualização e reinvasão por conflitosneuróticos. - Isso pode acontecer naqueles pacientes que tiveram dificuldade em manter sua identidade separada - ou nos pacientes às voltas com uma neurose de transferência profundamente regressiva (Lóewald, 1960). O analista tem que formular em palavras o que deve dizer ao paciente. - Deve traduzir seu próprio raciocínio do tipo processo primário para o processo secundário. - Deve, então, decidir se isso pode ser dito ao paciente nessa ocasião. - Aqui, seu julgamento clínico e sua empatia têm que ser usados porque somente através dessas faculdades é que pode determinar, - primeiro, se a informação é valiosa - e segundo, se o paciente pode suportar essa compreensão sem ficar traumatizado. 4-O conhecimento intelectual vai ajudá-lo através da recordação de interpretações passadas semelhantes ou reparando na proximidade das separações acarretadas pelas férias etc. - Tem de decidir se não será melhor aguardar mais dados ou talvez esperar para que o próprio paciente chegue a essa interpretação. - Assim que o analista decidiu comunicar a interpretação, tem de pensar como formular essa informação. - Aproveito para dizer, aqui, que essa descrição detalhada não significa que cada um desses procedimentos irá, normalmente, ocorrer em separado, lenta e sucessivamente. Às vezes vai ser assim mas em geral eles vão acontecer rápida, automática e quase sempre simultaneamente. - A capacidade para a empatia é o instrumento mais valioso para avaliarmos tais questões. - A escolha de palavras e o tom de voz podem muito bem determinar se o contato e impacto em nível ótimo poderá ser feito, se favorecemos as resistências e se provocamos algum trauma. - O vocabulário do analista se deve dirigir ao ego racional do paciente. 5-O analista deve fazer-se esta pergunta; questionar-se: - a que proximidade do ego racional do paciente vai estar essa compreensão que quero transmitir. - Quanto mais inacessível o material, tanto maior o cuidado com as formulações e escolha de palavras. - Além disso, o vocabulário do analista não deve ser diferente do vocabulário do paciente, porque isso daria à intervenção uma sensação de irrealidade. Deve causar impacto e mesmo assim não ser chocante - valores que só podem ser determinados pela identificação empática do analista com cada paciente numa situação especial. - Muitas vezes, a força e entonação usadas são mais importantes que a escolha das palavras. - O tom e a entonação transmitem os sentimentos pré-verbais e não-verbais, muitas vezes as atitudes inconscientes do analista. - Além disso, a sensibilidade do tom e da entonação provêm das relações objetais mais primitivas quando a ansiedade era um fator fundamental. - O tom leva ao contato ou afasta o contato e é, portanto, muito importante para o equilíbrio confiança- desconfiança no relacionamento do paciente e analista (Loewald, 1960; Greenson, 1961). - Na situação analítica, um aspecto importante da arte de comunicar com o paciente é a habilidade do analista para usar o silêncio. 6-O silêncio do analista tem muitos significados para o paciente, - dependendo da situação transferencial do paciente assim como da contratransferência do analista. - Além disso, o silêncio é um dos grandes estresses que nossos pacientes têm de suportar na situação analítica - e deveria, assim, ser aplicado conscienciosamente, tanto na qualidade como na quantidade (Stone, 1961, pp. 45-55). - O silêncio é uma intervenção ao mesmo tempo ativa e passiva por parte do analista. - O paciente precisa de nossos silêncios porque pode necessitar de tempo para seus pensamentos, sentimentos e fantasias que vão emergir dentro dele. - Nosso silêncio também exerce uma pressão no paciente para que comunique e para enfrentar seus pronunciamentos e emoções sem estar distraído. - Ele pode sentir nosso silêncio ou como apoio e calorosidade ou como crítica e frieza (Nacht, 1964). - Isto talvez se deva às suas projeções transferenciais mas pode também resultar da sua percepção latente das nossas reações contratransferênciais (Greenson, 1961). 37 - O analista comunica ao paciente não só fazendo interpretações pelo silêncio mas também por outros meios e visando a inúmeros outros objetivos. - Antes que possamos interpretar, temos de demonstrar e esclarecer o material que está sendo examinado. - Por exemplo, antes que eu possa desvendar o significado inconsciente de uma resistência, a realidade da resistência tem que ser, primeiro, demonstrada e esclarecida para o paciente. PARTE III – PSICODINÂMICA PSICODINÂMICA – OS MECANISMOS DE DEFESA DO EGO Extensões do Conceito de Defesa: Breves Comentários sobre os Mecanismos de Defesa O conceito de defesa está incorporado na primeira afirmação analítica significativa de Freud (1894), que a neurose implica numa defesa contra idéias insuportáveis. Num sentido muito real, a história da psicanálise representa um desdobramento e alargamento desta fórmula. Ela continua sendo básica à compreensão dos indivíduos neuróticos e também normais. A existência humana parece envolver inevitavelmente algum conflito interior, mas permanece questionável se devido à necessidade biológica ou à pressão cultural. De início Freud limitou-se à repressão, embora ele também tenha descrito a sublimação, formação reativa e regressão. Depois ele aumentou a lista de defesas, com o correr do tempo. Quando Anna Freud escreveu sua obra chave, O Ego e os Mecanismos de Defesa (1936), ela relacionou nove deles e acrescentou alguns próprios, tais como a identificação com o agressor e a negação na fantasia e na realidade. Freud explorou tão completamente as neuroses que pouco teve de ser acrescentado de um ponto de vista teórico, exceto novos conceitos tais como a oralidade, hostilidade e estrutura do ego. Nas psicoses ele estava em terreno menos firme. A literatura posterior a Freud deu muita ênfase aos mecanismos de defesa mais destacados nas condições psicótica e fronteiriça, tais como a regressão, negação, clivagem e atuação. A lista oficial de mecanismos de defesa de maneira alguma esgota as formas pelas quais os seres humanos podem lidar com o conflito. Como se viu, Bibring e colaboradores relacionaram. Outros autores também descreveram repetida-mente mecanismos de defesa não contidos no inventário “oficial”. Greenson falou de fome de tela e defesas de tela (1958). Sachs (1973) considerou chorar, lamuriar-se e rir como defesas contra impulsos sexuais. Melanie Klein (1948a, passim) falou de defesas maníacas e da criatividade como reparação pelo mal fantasiado causado à mãe. Muitos teóricos retrataram as diversas reações à perda objetal em todas as fases da vida. Spitz (1945) viu o marasmus como um consumir-se devido à falta de amor materno; o mesmo fenômeno foi observado em animais. Bowlby (1953) delineou a seqüência de protesto-desespero-desligamento em reação à perda da mãe. Wolfenstein (1976) comunicou um debate sobre os efeitos, no adulto, da perda objetal nos primeiros cinco anos. Os participantes reportaram depressão, esquizofrenia e promiscuidade sexual entre outros problemas. Pinderhughes (1971) investigou as seqüelas sociais, somáticas e psíquicas da perda. Ele ressaltou o significado dos mecanismos paranóides em pessoas que sofrem uma perda. Podem-se citar numerosos outros artigos. Tornou-se lugar-comum encarar a hostilidade como defesa contra a sexualidade e encarar a sexualidade como defesa contra a hostilidade, a esquizofrenia como defesa contra o homossexualismo, o homossexualismo como defesa contra a esquizofrenia, e assim por diante. Em outras palavras, o conceito de defesa foi ampliado muito além de seu escopo original, para incluir virtualmente qualquer processo dinâmico em que haja ansiedade e uma maneira de afastar a ansiedade. A escola culturalista, conquanto verbalmente em divergência com os freudianos, apenas contribuiu com mais uma extensão do conceito de defesa, ao vinculá-lo aprocessos interpessoais, culturais e outros. Fromm, por exemplo considerou a personalidade “comercializadora” como característica dos americanos (1947). Mais tarde, juntamente com Maccoby (1970), ele integrou fatores interpessoais, culturais e intrapessoais em sua descrição de uma aldeia mexicana. Diamond (1974) encarou a esquizofrenia como defesa e moléstia característica da civilização ocidental. Miller e Swanson (1960) mostraram que a negação era mais comumente empregada pelos pobres, devido à natureza mais áspera de sua realidade social. Em geral, a escola da cultura-da-pobreza traz consigo a implicação de que os mecanismos de defesa são condicionados tanto socialmente como individualmente. 38 Alguns chegaram a sustentar que se pode persistir na pobreza por motivos psicológicos (Allen, 1970). Weinstein (1976) considera o assassinato de presidentes como um problema peculiarmente americano, por ter ocorrido tantas vezes. Pode-se afirmar que, neste tipo de extensão, a defesa, a perda de defesa e o sintoma confundem-se todos uns com os outros. Sua separação exata apresenta problemas tão espinhosos, contudo, dado o caráter circular da dinâmica da personalidade (por exemplo, a ansiedade leva ao homossexualismo, depois o homossexualismo leva à ansiedade; qual foi o primeiro?), que a maioria dos teóricos fica em desespero. Robbins (1955) considera a esquizofrenia como conflito e defesa, como Burnham et al. (1969), com sua delineação de esquizofrenia como um dilema necessidade-medo. O princípio básico continua sendo que a personalidade humana pode ser compreendida à luz da fórmula de Freud, usando defesas contra idéias insuportáveis. Muitas defesas típicas, tanto pessoais como sociais, podem ser descritas. Muitas outras são possíveis. A teoria psicanalítica, embora tenha oferecido profundas percepções do processo defensivo, ainda não atingiu o estágio de uma sistematização exata. Defesa e Doença Já desde o início Freud buscou definir a doença em termos dinâmicos; seu artigo histórico de 1894 sobre as “Neuropsicoses de Defesa” já introduz este esforço. À medida que se alterou seu esquema teórico, ele procurou a todo o momento corrigir a metapsicologia da doença (Brenner, 1957). Em 1926, em seu último resumo teórico importante, ele tentou ligar as três principais doenças, a que tinha devotado a maior parte dos esforços de sua vida, com suas defesas típicas: assim, a repressão é característica da histeria, enquanto a formação reativa e a regressão são características da neurose obsessiva-compulsiva. Logo se verificou que o que ele tinha feito foi descrever certas constelações típicas, mas não a personalidade inteira. Nas palavras de Fenichel: Na maioria dos casos... a análise tem sucesso em mostrar que uma atitude defensiva especial foi• forçada ao indivíduo diretamente, por uma situação histórica particular; ou foi a atitude mais adequada numa dada situação, e todas as situações posteriores despertam uma reação como se ainda fossem aquela patogênica, ou todas as outras atitudes possíveis foram bloqueadas numa dada situação, ou a atitude foi favorecida por algum modelo no ambiente da criança, com o qual ela se identificava, ou a atitude é exatamente oposta à de um modelo com o qual a criança não queria se parecer. O comportamento incomum muitas vezes pode ser verificado como devido a condições incomum no ambiente de infância. E as psicanálises de distúrbios do caráter certamente dão oportunidade de se estudar uma considerável seleção de “ambientes incomuns de infância” Na literatura subseqüente, coexistiram duas teorias referentes à defesa e doença. Uma afirma que as doenças neuróticas específicas (inclusive as psicóticas) caracterizam-se por defesas específicas e pontos de fixação específicos. Assim, a repressão, formação reativa e regressão são características das neuroses, enquanto a negação, clivagem (outrora chamada de isolamento) e a projeção são características das psicoses. O ponto de fixação para a histeria encontra-se na fase fálica, para a neurose obsessiva, na fase anal, e para a esquizofrenia e outras psicoses, na fase oral. A posição alternativa que, paradoxalmente, também se origina de Freud, afirma que a personalidade ó complexa demais para ser forçada em tais camisas-de-força rígidas, e que cada indivíduo deve ser julgado em termos de sua história particular. Assim, no artigo sobre “Tipos de Desencadeamento da Neurose” (1912), depois de descrever vários casos, Freud declara que “nenhum deles é um exemplo puro de qualquer dos quatro tipos de neurose”. E Depois conclui que “a psicanálise advertiu-nos que devemos abandonar o infrutífero contraste entre fatores externos e internos, entre a experiência e a constituição, e nos ensinou que invariavelmente encontraremos a causa do desencadeamento da doença neurótica numa situação psíquica particular que pode ser gerada por uma diversidade de maneiras”. Metapsicologia das Defesas As questões de por que são de todo necessários os mecanismos de defesa e que função eles desempenham na economia psíquica geral pertencem ao que pode ser chamado de metapsicologia da defesa. Uma série de tópicos que este título abrange foram considerados por diversos autores. A Organização Defensiva A teoria contemporânea do ego baseia-se no reconhecimento de que a organização é uma parte tão essencial do ser humano como o impulso, e que o ego é o aspecto organizador da personalidade. 39 Hoffer (1954) parece ter sido o primeiro a usar a expressão “organização de defesa” para fazer referência à totalidade de defesas usadas pelo indivíduo. Esta organização de defesa é uma faceta da organização do ego. Sua origem e pré-história são obscuras, mas sua função pode ser formulada com precisão, a saber, a regulação da ansiedade, não a evitação total da ansiedade. Ele viu uma estrutura hierárquica da organização defensiva que é inevitável nos primeiros esforços da infância e só pode ser resolvida muito Depois. Freud (O Problema da Ansiedade, 1926) já tinha comentado que a força das defesas está em sua ligação com o id, isto é, a defesa também satisfaz algum impulso. Hoffer afirma agora que, de um ponto de vista do ego, a defesa serve a um propósito tanto defensivo como construtivo. Por exemplo, a introjeção ajuda a evitar a sua destruição, a sublimação enriquece o ego (A. Freud, 1952). Pine levou mais adiante esta idéia (1970). Ele sustentou que há um relacionamento estruturalizado entre impulso e defesa que se torna parte da ordem e permanência da vida psíquica. Esta permanência está relacionada também com o princípio de funções múltiplas de Waelder (1936b), que postula que qualquer ato específico é uma tentativa de solução para problemas do ego vis-à-vis os impulsos, o superego, a realidade externa e a compulsão de repetir. Pine teorizou que posturas defensivas específicas que incluem oportunidades de gratificação de maneiras sintônicas com a consciência do indivíduo e com seu meio social podem ter um alto grau de permanência, que só pode ser rompido por uma mudança significativa nas pressões internas ou externas. Como a organização é parte essencial do ego, o relacionamento da defesa com a cognição deve ser considerado. Lichtenberg e Slap (1971) acreditam que o surgimento de mecanismos de defesa individuais é concomitante à maturação perceptual-cognitiva. Defesas e Processo de Tratamento Dedicou-se considerável atenção ao destino dos mecanismos de defesa no curso da psicanálise. Realizaram- se debates sobre este tópico nas Associações Psicanalíticas Internacional e Americana em 1954, 1966; 1970 e 1972. Uma escola de pensamento acreditou que uma análise bem-sucedida deve resultar no desaparecimento das defesas, enquanto outra sustentou que a análise resulta na modificação, não no desaparecimento, das defesas, e que, enquanto o individuo neurótico está primordialmente restrito ao usode um mecanismo de defesa em todas as situações, a pessoa analisada está livre para usar uma variedade de defesas, de maneira adaptativa (Krent, 1970). A divergência persistiu, embora a última posição tenda a ganhar terreno. Num estudo empírico realizado no Instituto San Francisco Windholz (Debate, 1972) verificou que as defesas não Desaparecem, mas tornam-se integradas no ego como mecanismos reguladores. Primeiros Protótipos e Precursores de Defesas Na medida emque os mecanismos de defesa são maneiras de se manter à distância estímulos provocadores de ansiedade, freqüentemente sugeriu-se que eles devem, de alguma forma, derivar-se dos primeiros tipos de experiência infantil, ou primeiros estados psíquicos. Em seu artigo de 193-7 sobre “Análise Terminável e Interminável”, Freud tinha novamente sugerido que pode haver -. bases constitucionais para os diferentes tipos de estrutura do ego. “Não temos razão para contestar a existência e importância das características distintivas originais, inatas do ego”. Dentre as originais, inatas, do ego resistências presumivelmente determinadas constitucionalmente, ele mencionou a viscosidade da libido, depleção da capacidade de mudar e uma libido particularmente móvel. Quanto aos precursores infantis, Freud já tinha mencionado a projeção como derivativa da primeira negação, ou o cuspir, enquanto a introjeção pode presumivelmente derivar-se do engolir. Federn (1929) viu o isolamento como relacionado com o tabu original do toque. Outros autores continuaram neste tipo de especulação com o conceito de “núcleos do ego” (Fenichel, 1945; Glover, 1925; Hendrick, 1938) sem, contudo, qualquer confirmação teórica ou clínica. Spitz (1961) ofereceu a discussão mais elaborada da questão dos primeiros protótipos das defesas do ego. Ele sugeriu que a repressão está ligada à barreira de estímulos inicial, e a negação pode derivar-se do fechamento de olhos. As duas principais questões por ele levantadas foram: Que tipo de relações mãe-filho favorecem e facilitam que tipo de mecanismos de defesa? Em que ponto as relações mãe-filho transformam o protótipo fisiológico no início de um mecanismo de defesa? Foram feitas diversas sugestões sobre como os mecanismos de defesa provêm da primeira experiência infantil (Fine, 1965b; Rubinfine, 1962), como na questão geral do relacionamento das primeiras experiências com a personalidade posterior e o desenvolvimento intelectual, mas as questões ainda são complexas demais para permitir uma resposta clara (Escalona, 1968; Fries, 1961). 40 Praticamente tudo que se pode dizer, de um ponto de vista teórico, é que a criança forma representações tanto da satisfação de desejos como de sua frustração, que mais tarde estruturalizam-se em representações internas dos objetos que satisfazem desejos (bons) e dos que os frustram (maus) (Rubinfine, 1962). Psicologia do Ego: Uma Visão Geral e Processos de Defesa O deslocamento da psicologia do id para a psicologia do ego teve lugar gradualmente, num período de muitos anos. Freud começou pela primeira vez a considerar sistematicamente o ego no artigo sobre narcisismo (1914). Seguiu-se uma série de artigos culminando com O Ego e o Id (1923), onde ele propôs pela primeira vez a divisão tripartite do aparato psíquico em id, ego e superego. Esta teoria tripartite, ou estrutural, mostrou-se tão convincente que se manteve desde então. Por isso, para falar corretamente, desde 1923 toda a psicanálise tem sido psicologia do ego. Em outro sentido, entretanto, o ego sempre foi parte da teoria psicanalítica. A palavra alemã para ego, das Ich, é a mesma para eu, enquanto o inglês emprega o termo latino. Assim, as considerações sobre o ego sempre estiveram presentes no pensamento de Freud. Foi somente por motivos históricos que o estudo do id tomou precedência no período de 1900 a 1914. Contudo, mesmo neste período alguns analistas falaram mais -sobre o ego, particularmente Adler. Em sua História do MovimentoPsicanalítico (1914), Freud deu a Adler crédito pelas suas contribuições à psicologia do ego, embora contrabalançasse este crédito apontando a relativa negligência do id por Adler. E apenas justo corrigir o erro histórico e dar a Adler crédito por ter sido um dos pioneiros da psicologia do ego. Se suas formulações careciam da precisão que teriam hoje, isto é, também é verdade quanto a todos que escreviam àquela época, inclusive Freud. O ego é definido como a parte da personalidade que lida com a realidade, interior e exterior. Freud deixou esta definição um tanto vaga. Em O Ego e o Id ele escreveu: Éfácil ver que o ego é à parte do id que foi modificada pela influência direta do mundo exterior, por intermédio da Pcpt. Cs. [percepção-consciência]; num certo sentido, é uma extensão da diferenciação superficial. Ademais, o ego busca trazer a influência do mundo externo sobre o id e suas tendências, e empenha-se em substituir o principio do prazer, que reina irrestrito no id, pelo principio de realidade. Para o ego, a percepção desempenha o papel que no id cabe ao instinto, O ego representa o que pode ser chamado de razão e senso comum, em contraste com o id, que contém as paixões. Tudo isto segue as distinções populares com que estamos todos familiarizados; ao mesmo tempo, no entanto, só deve ser considerado como válido em média, ou “idealmente”. Nesta definição, ou mais precisamente, descrição, Freud lançou a base para toda discussão futura nas funções do ego. Estas funções do ego vieram a abranger: os mecanismos de defesa, os afetos, a força e a fraqueza do ego; percepção e outras funções cognitivas (aprendizado, pensamento, memória); e lidar com a realidade. Estas últimas foram elaboradas por Hartmann (1939) e seus colaboradores em seu trabalho sobre autonomia do ego. Muitos aspectos do ego também foram abordados por outras disciplinas, oferecendo assim uma via de elaboração interdisciplinar com a fisiologia e as ciências sociais. Foi assim que o desenvolvimento posterior da psicologia do ego -abriu caminho para que a psicanálise se tornasse uma psicologia geral. A discussão da história da psicologia do ego pode ser melhor conduzida discutindo-se separadamente suas diversas funções (as referências bastante difundidas a uma “escola da psicologia do ego” ou aos “psicólogos do ego” provêm de uma concepção equivocada da história da psicanálise [Gedo, 1975]). Os Mecanismos de Defesa O conceito de defesa, que dominou os escritos de Freud na década de 1890, foi a primeira grande descoberta da psicanálise, e continua sendo uma de suas principais contribuições. Ele foi primeiro enunciado no artigo de 1894 sobre “As Neuropsicoses de Defesa”, que propôs a explicação que o neurótico (e o psicótico, à época mal distintos um do outro) defende-se contra idéias insuportáveis. Freud descreveu três métodos de defesa em três formas de doença, e Depois sugeriu uma explicação metapsicológica para o processo defensivo: Gostaria de me deter por um momento na hipótese de trabalho que utilizei nesta exposição das neuroses de defesa. Refiro-me ao conceito que, nas Junções mentais, há algo a distinguir — uma quota de afeto ou somatório de excitação — que possui todas as características de uma quantidade (embora não tenhamos meios de medi-la), que é capaz de aumentar, diminuir, deslocar-se e descarregar-se, e que é disseminada pelos traços de memória de idéias, como uma carga elétrica difunde-se pela superfície de um corpo. 41 Foi sobre as três idéias básicas neste artigo que foi construída a teoria dos mecanismos de defesa — os métodos de defesa (mais tarde designados de mecanismos de defesa), correlação da(s) defesa(s) com a doença e a explicação metapsicológica. Mais preocupado com outras questões, Freud abandonou então a idéia da defesa, limitando-se à repressão. Adler elaborou o que chamou de “ficções orientadoras”, que são variações dos mecanismosde defesa, embora não tivesse percebido as profundas ansiedades que subjaziam a estas ficções. Depois, em 1926, Freud retomou o que tinha abandonado em 1894 e voltou ao conceito de defesa, relacionando vários mecanismos de defesa (dos quais a repressão era apenas um) e tentando correlacionar a defesa com a doença. Assim, ele considerou a repressão como característica da histeria, a regressão e a formação reativa como características da neurose obsessiva, e a evitação na fobia. Quanto ao esclarecimento metapsicológico, neste livro (1926) ele evitou especular, afirmando apenas que “Depois de dezenas de anos de esforços psicanalíticos, estamos tão ignorantes quanto a este problema [da origem da neurose] como de início”. O passo seguinte veio com a publicação do clássico de Anna Freud, O Ego e os Mecanismos de Defesaem 1936. Ali ela observou que o “ódio da não-ortodoxia analítica” (leia-se Adler) já não mais se dirigia ao estudo do ego, e ela definiu a tarefa da análise como sendo adquirir o mais completo conhecimento possível de todas as três partes (id, ego e superego) e de aprender quais são suas relações mútuas e com o mundo exterior. Ela prosseguiu relacionando os novos mecanismos de defesa que Freud já tinha descrito em várias obras (regressão, repressão, formação reativa, isolamento, anulação, projeção, introjeção, voltar-se contra si próprio e reversão), às quais ela acrescentou um décimo: a sublimação, ou o deslocamento dos objetivos instintivos. Quanto à técnica, ela disse: “E tarefa do analista praticante descobrir até que ponto estes métodos mostram-se eficazes nos processos de resistência do ego e formação de sintomas que ele tem a oportunidade de observar em indivíduos.” Anna Freud não tentou correlacionar a defesa com a doença (além do que seu pai já tinha feito), nem tentou criar explicações metapsicológicas. Ela chamou atenção, contudo, para quatro outros mecanismos de defesa: negação (na fantasia e em palavras ou atos), restrição do ego, identificação com o agressor e uma forma de altruísmo (na adolescência). Uma revisão de outras obras revela as incoerências e diferenças habituais entre diversos autores. Quanto à lista de mecanismos de defesa; existem amplas variações. Fenichel acrescenta a negação à lista de Anna Freud, mas omite o voltar-se contra si próprio, a reversão, identificação, restrição do ego e altruísmo. Ele também diferencia entre as defesas contra a ansiedade e as defesas contra outros afetos, o que outros autores não fazem. Horney popularizou uma grande variedade de outros mecanismos do ego, como a necessidade neurótica de afeição, a busca de poder, prestígio e posse, e a competitividade neurótica (1937), sentimentos de culpa (1939), aproximação, afastamento e fuga das pessoas, e a externalização (1945), a busca de glória, o orgulho neurótico, o apelo do domínio e o apelo do amor (1950). Sullivan (1940) descreveu 10 síndromes de desenvolvimento: psicopatia, auto-absorção, incorrigibilidade, inadequação, homossexualismo e adolescência crônica. Laughlin (1969) acrescentou outras, como idealização, compensação, fantasia e a reação “Rei David”. A lista mais longa foi traçada por Bibring e colaboradores (1961) no Instituto Psicanalítico de Boston, em conexão com um estudo de mulheres grávidas. Eles dividiram as defesas em básicas, ou de primeira ordem, e complexas, ou. de segunda ordem. Terminaram com não menos de 39 defesas, das quais 24 de primeira ordem e 15 de segunda ordem. A lista parece incluir tudo, inclusive somatização, desligamento, pensamento mágico e mesmo brincadeiras, cair doente e assobiar no escuro. Ainda outros publicaram artigos descrevendo o choro, o riso e as risadinhas de adolescentes como defesas. Grand (1973) considerou o mecanismo como uma defesa de exposição dupla, assim como Menaker (1953). Modell (1975) retratou o narcisismo como uma defesa contra o afeto. Kohut (1971) fala de divisões verticais (repúdio ou negação) e divisões horizontais .(repressão). A extensão do conceito de defesa ampliou-se tanto que resta pouco conteúdo teórico além da observação inicial de Freud. Parece quase como se tudo pode ser usado como defesa contra outra coisa. Laplanche e Pontalis (1973) sustentam que a extensão do conceito pôs toda a -idéia em dúvida: Inevitavelmente, o uso generalizado do conceito de mecanismo de defesa levanta urna série de problemas. Quando operações tão diversas como, digamos, a racionalização, que põe em jOgo complexos mecanismos intelectuais, e o voltar-se contra si próprio que é uma “vicissitude” do objetivo instintivo, são atribuídas a uma única função.. . bem se pode perguntar se o conceito em questão é realmente operacional. 42 A despeito das dúvidas destes e de outros autores, e as enormes variações nos mecanismos de defesa relacionados, o conceito em si, que constitui um suporte dinâmico para a estrutura da personalidade, parecemanter sua grande utilidade e mesmo poder explanatório, em contraste com imagens mais estáticas da personalidade. Se não foi possível, como se pretendia originalmente, restringir as defesas a uns poucos estratagemas básicos, isto deve ser tomado como indicação de que a defesa pode ser tão ampla quanto a própria personalidade. Dentro desta variabilidade, contudo, tem sido possível focalizar certos tipos de operações de defesa. Dentre asdefesas conhecidas por Freud que receberam considerávelatençãoestãoasublimação,introjeção-projeção,regressãoenegação. Dentre as que praticamente não foram mencionadas por ele, e que receberam muita atenção, estão a atuação, neutralização, clivagem e identificação (inclusive a formação da auto-imagem). Cabem alguns comentários adicionais sobre cada uma destas. OS MECANISMOS DE DEFESA DO EGO Mecanismos de defesa do Ego são todas as operações utilizadas pelo Ego para controlar, dominar, canalizar e empregar forças que ameaçam sua integridade e sobrevivência, ou que possam conduzir à neurose, e que provêm do Id, do Super-ego e do mundo externo. 1 — ANULAÇÃO Mecanismos de defesa através do qual o indivíduo invalida pensamentos ou ações passadas e suas conseqüências, utilizando um comportamento ou pensamento com significação oposta. A anulação retroativa é uma compulsão de feição “mágica” encontrada particularmente na neurose obsessiva. 2 — DESLOCAMENTO Mecanismos pelo qual a carga psíquica é transferida de uma representação mental a outras por cadeia associativa; constitui, ao lado da condensação, um dos elementos do processo psíquico primário. Esse mecanismo, facilmente visto nos sonhos, encontra-se na formação dos sintomas psiconeuróticos e em qualquer formação inconsciente. O deslocamento, embora em essência pertença ao processo primário, tem função defensiva e, no sonho, pode surgir como efeito da censura, tal é a ligação que mantém com ela. A conversão é um mecanismode formação de sintoma somático, que consiste, segundo uma concepção econômica, na transformação da energia psíquica ligada à representação reprimida em energia de inervação. “Mas o que especifica os sintomas de conversão é a sua significação simbólica...”; neste sentido podemos entender a conversão como um tipo especial de deslocamento com características defensivas. 3 — DISSOCIAÇÃO (SPLITTING, CISÃO, DIVISÃO) Pode envolver o Ego e o Objeto, sendo que a primeira ocorre entre o que é “bom” e o que é “mau”, entre o amor e o ódio. A escola Kleiniana considera que a Dissociação de Objeto é sempre acompanhada de uma Dissociação Correlativa do Ego. Dissociação de Objeto: mecanismode defesa através do qual um objeto é cindido em um “bom” objeto e em um mau” objeto, de tal sorte que as atitudes emocionais em relação a eles são antitéticas. A Dissociação de Objeto evita a angústia do conflito entre os impulsos eróticos e destrutivos ao mesmo objeto. Dissociação do Ego: mecanismo de defesa pelo qual o Ego é cindido, geralmente, em dois,sendo apenas um deles experimentado como “Eu” e o outro como estranho ou inconsciente. O mecanismo de Dissociação tende a vincular-se à Negação e à Projeção, constituindo defesas esquizóides. A clivagem é um antigo conceito psiquiátrico adotado por Freud. Em sua época, o conceito da clivagem da consciência na histeria era uma descrição aceita comumente, embora as explicações variassem. Como mostraram Lichtenberg e Slap (1973), Freud, em seu trabalho subseqüente, usou o conceito de quatro maneiras diferentes: como um princípio organizador geral no desenvolvimento e funcionamento psíquico, a contrapartida patológica da síntese; como um processo especificamente ligado à organização do conteúdo mental; como um meio de funcionamento defensivo; e como um processo associado com a formação de conceitos psíquicos contraditórios coincidentes, como os do fetichista. “Clivagem” é um alargamento do conceito mais antigo de “isolamento”, que ele substituiu. Autores subseqüentes elaboraram um ou outro destes sentidos da clivagem. Nunberg (1930, 1931) o opôs à síntese, ressaltando a 43 função sintética do ego. A discussão mais recente centrou-se particularmente no desenvolvimento inicial da vida mental da criança, com a separação de objetos bons e maus (a mãe boa e má), e as investigações associadas da psicopatologia da clivagem psicótica foram conduzidas por Melanie Klein (1946) e Fairbairn (1941, 1954), mas Depois retomadas por muitos outros autores. Atualmente, a clivagem é extensamente discutida por Mahler (1975), Kernberg (1976) e Kohut (1977), assim como por kleinianos, sullivanianos e outros. Tanto Mahler como Kernberg esclarecem a idéia mais antiga de que as primeiras experiências infantis promovem uma organização de dois conjuntos de traços de memória, baseados na qualidade primordial de agradável-bom-recompensador e doloroso-mau-punitivo. Mahler (1968) afirma que eles existem como “ilhas de memória que contêm marcas de estímulos ‘agradável-bom’ ou ‘doloroso-mau ainda não alocados ao eu ou ao não-eu”. Sullivan (1940) afirmou que “a discriminação do padrão de acontecimentos da Mãe Boa e o padrão de acontecimentos da Mãe Má constitui uma bifurcação primária da experiência interpessoal, evidências da qual persistem na maioria das pessoas no transcurso de toda a vida”. Kernberg, numa obra recente (1975) resume de maneira excelente o processo de clivagem: Uso o termo “clivagem” num sentido restrito e limitado, que se refere apenas ao processo ativo de manter separadas introjeções e identificações de qualidade oposta. A clivagem.., é uma causa fundamental da fraqueza do ego, e como requer também menos contracatexia do que repressão, um ego fraco recorre facilmente d clivagem, e se cria um círculo vicioso, pelo qual a fraqueza do ego e a clivagem reforçam-se mutuamente. A manifestação clínica direta da clivagem pode ser a expressão alternativa de lados complementares de um conflito em certos distúrbios do caráter, combinada com uma vaga negação e falta de interesse pela contradição em seu comportamento e experiência interna por parte do paciente. Outra manifestação direta da clivagem pode ser uma “falta de controle de impulsos” seletiva em certas áreas, manifesta na irrupção episódica de impulsos primitivos que são ego-sintômicos durante o tempo de sua manifestação (e a clivagem prevalece na neurose impulsiva e nos vícios). Provavelmente, a manifestação mais conhecida de clivagem é a divisão de objetos externos em “completamente bons” e “completamente maus”, com a possibilidade concomitante de mudanças completas e abruptas de um objeto de um compartimento extremo para o outro; isto é, inversões sabidas e completas de todos os sentimentos e conceitualizações sobre uma pessoa particular. A oscilação extrema e repetitiva entre autoconceitos contraditórios pode ser também resultado do mecanismo de clivagem. 4 — FORMAÇÃO REATIVA Mecanismode defesa através do qual o indivíduo se contrapõe a um impulso inaceitável, pela intensificação de a uma antítese. A Formação Reativa defende o Ego do retorno reprimido, e se serve da Transformação no contrário (Inversão) dos instintos. 5 — IDEALIZAÇÃO Mecanismode defesa pelo qual as qualidades do “bom” objeto são levadas ao extremo (perfeição), evitando assim impulsos destrutivos às características não desejáveis do objeto. Essas características, por sua vez, são negadas, enquanto a libido é projetada no objeto; note-se, ainda, que a Idealização está também ligada ao mecanismo de Divisão. IDENTIFICAÇÃO A identificação é uma idéia velha e óbvia, e não pode ser considerada psicanalítica em si. Em todos os seus escritos, Freud fez uso dela. Já em 1897, numa carta a Fliess, ele escreve a respeito da multiplicidade das personalidades psíquicas (então um tópico muito significativo) que “o fato da identificação talvez nos permita tomar a frase literalmente”. No período pós-Primeira Guerra Mundial, Quando começou a refletir sobre os problemas dos relacionamentos interpessoais, Freud dedicou crescente atenção ao processo da identificação. Inicialmente, o sustentava, a catexia objetal e a identificação são indistinguíveis. Com o início do complexo de Édipo, as catexias objetais (desejo sexual pelos pais) têm de ser abandonadas; são então substituídas por identificações com os pais. Daí vem à fórmula: as catexias objetais regridem para identificações. “A autoridade do pai ou dos pais é introjetada no ego, e ali ela forma o núcleo do superego, que assume a severidade do pai e perpetua sua proibição contra o incesto, desta forma protegendo o ego do retorno da catexia objetal libidinal.” 44 Mais tarde, em 1936, Anna Freud descreveu uma variação da defesa, identificação com o agressor. Isto é visto por ela como ocorrendo numa variedade de contextos — na agressão física, na crítica, relacionamentos mãe- filho, e assim por diante. Há uma inversão de papéis — a vítima torna-se agressora. Isto explica a perpetuação de padrões de família, por exemplo, a filha, mal-tratada pela mãe, trata mal sua própria filha, por sua vez, por uma identificação com a agressora. Nunberg (1955) distinguiu entre identificações parcial e total e apresentou a mais clara exposição de todo o mecanismo de defesa e seu relacionamento com a identificação normal: O conceito da identificação como um mecanismo de defesa não exclui seu outro aspecto, o positivo. Há, de fato, também uma identificação resultante do amor, que nada tem a ver com a defesa. Como se frisou, a identificação pode ser ambivalente, e no contexto presente, vemos que o lado negativo de um processo ambivalente pode ser usado como uma defesa contra seu lado positivo. Como o amor reprime o ódio, o inverso também pode ocorrer: o ódio reprimindo o amor. Em qualquer caso, através da identificação, estabelece-se uma união entre o ego e o objeto ou instinto que se quer afastar, O que não pode ser afastado do ego é afastado através da assimilação, a síntese. Esta forma de defesa tem aproximadamente este significado: “Se não posso conquistar o inimigo de qualquer outra forma, unir-me-ei a ele e desta maneira torna-lo-ei inofensivo.”Após a publicação do livro de Erikson, Infância e Sociedade (1950), com sua extensa discussão de identidade e crise de identidade, assim como a difusão das idéias de Sullivan após a Segunda Guerra Mundial, o interesse dos analistas voltou-se para a auto-imagem (identidade, narcisismo) e as relações interpessoais. Da década de 1950 em diante, a identificação como um puro mecanismo de defesa fundiu-se crescentemente na discussão total de relacionamentos objetais e do eu, e o crescimento e desenvolvimento interpessoal. 6 — IDENTIFICAÇÃO Como defesa, pode ser: Secundária, Projetiva e Introjetiva. Identificação Secundária: o indivíduo identifica-se com o objeto que tem identidade independente dele, reduzindo assim a hostilidade entre si e permitindo quesejam negadas experiências de separação do objeto. O mecanismo de identificação com o agressor, isolado e descrito por Anna Freud, enquadra-se dentro da identificação secundária. Melanie Klein sempre considera a Identificação como produto de Introjeção e Projeção. Identificação Projetiva: mecanismopelo qual o indivíduo se identifica com o objeto de sua Projeção. A escola Kleiniana admite, ainda, como Identificação Projetiva o fato de o indivíduo perceber o objeto apenas como tendo adquirido as características projetadas (porém, no presente trabalho, para evitar confusão, consideramos Identificação Projetiva apenas a primeira definição). Existe ainda a Identificação Projetiva patológica, resultante da Projeção no objeto de partes do Ego em fragmentos diminutos. Identificação Introjetiva: mecanismopelo qual o indivíduo, tendo introjetado um objeto, se identifica com ele parcial ou totalmente. 7 — INTROJEÇÃO Mecanismopsicológico, através do qual a função de um objeto externo ou parte dele é assumida por sua representação mental. Faz parte do desenvolvimento psicológico normal, mas é defensivamente usado contra a angústia de separação. 8 — ISOLAMENTO Mecanismode defesa característico das neuroses obsessivas, pelo qual um pensamento perde suas conexões associativas e é despojado de seu significado emocional; ou duas idéias, sentimentos ou atos são separados por intervalos de tempo ou, ainda, dois ou mais objetos (que representam idéias) são impedidos de estabelecer contato entre si. 9 — NEGAÇÃO Mecanismode defesa pelo qual se dá como inexistente um impulso instintivo ou aspecto do Eu ou, ainda, uma experiência penosa. Segundo Melanie Klein, a Negação é seguida de Divisão e Projeção. NEGAÇÃO (RECUSA) “Negação” foi o termo usado por Freud a partir de 1923 para descrever a defesa pela qual o sujeito recusa-se a reconhecer a realidade. Freud usou-o primordialmente na descrição metapsicológica do fetichismo e da psicose. 45 Desde então ele tem sido usado mais freqüentemente no - sentido de uma negação da realidade, do mundo exterior, em contraste com a repressão, que bloqueia o mundo interior. Na verdade, Freud tinha descrito a defesa já -em seu- primeiro artigo sobre as neuropsicoses de defesa, em 1894, mas o termo não foi usado até a década de 1920. Na edição “Standard”, Strachey exortou ao uso do termo “disavowal” (“recusa”) em lugar de “negação”, e hoje as duas palavras podem ser usadas de maneira equivalente. Contudo, sua idéia não ganhou terreno, e “negação” é ainda a palavra mais comumente empregada. Trunnell e Holt (1974) chamaram atenção para as muitas ambigüidades no uso do termo por Freud e outros autores. Por exemplo, Jacobson (1957) encarou a negação como a forma mais primitiva de defesa, uma manobra global, em contraste com a repressão, que é mais específica; contudo, este uso difere do de Freud. Mais comumente, o termo é empregado na descrição do comportamento psicótico, no qual a realidade externa é negada; isto parece ter sido também a idéia principal de Freud. Por isso, a negação recebeu mais atenção por parte dos teóricos que se ocuparam basicamente com as psicoses. Searles (1963), por exemplo, explica grande parte da aparente privação sensorial do esquizofrênico como sendo devida ao uso na negação inconsciente. Ele cita um estudo de Brodey (1959) que mostrou que, na criação da criança que mais tarde desenvolve esquizofrenia, somente os ingredientes do que chamamos de realidade externa que apóiam significativamente (ou ameaçam significativamente) o “funcionamento interno” da mãe comprometem a realidade externa efetiva da criança; evidentemente, o restante da realidade externa, para todos os propósitos práticos, simplesmente não existe para ele. Searles também levanta a hipótese de que a negação inconsciente da realidade externa pelo esquizofrênico tem um aspecto restitutivo, ao propiciar-lhe uma tela mais ou menos branca sobre a qual pode-se efetuar agora uma necessária reprojeção dos introjetos patogênicos, uma externalização de conflitos internos do passado, de maneira semelhante à função da atmosfera de tela neutra promovida pelo analista no tratamento do indivíduo neurótico. Em A Psicanálise da Elação (1950), Lewin apresentou uma descrição magistral do uso da negação nos estados maníacos. Despersonalização é uma forma especial de negação (Jacobson, 1959). O que se nega é a identidade da pessoa, em lugar do mundo exterior em si. 10 — PROJEÇÃO Mecanismo de defesa, através do qual o indivíduo atribui a um objeto características que lhe são próprias, porém recusadas como suas. A Projeção é precedida pela Negação e, muito freqüentemente, é acompanhada pela Transformação no Contrário (Inversão). INTROJEÇÃO E PROJEÇÃO Embora Ferenczi tenha cunhado o termo “introjeção” em 1909 (em Artigos Reunidos, 1916) e Freud tivesse escrito dois artigos clássicos ‘sobre a projeção (“O Caso Schreber”, 1911; “Ciúme”, 1922), o significado da introjeção e projeção no primeiro período de vida mental não foi plenamente apreciado até que Melanie Klein descreveu-os detalhadamente (1934 e Depois, em Klein, 1948). Ela sustentou que o desenvolvimento da criança é governado pelos mecanismos de introjeção e projeção. Desde o início o ego introjeta objetos como sendo “maus” e “bons”, sendo o sei o da mãe o protótipo de ambos — para os bons objetos quando a criança o obtém, para os maus quando ele lhe falta. Na opinião de Klein, é porque o bebê projeta sua própria agressão nestes objetos que ele os sente como maus”, e não apenas porque eles frustram seus desejos; a criança os concebe como sendo realmente perigosos — em suma, como possivelmente abrangendo sua destruição por todos os meios que o sadismo pode conceber. De início, a descrição de Klein de tais complexos acontecimentos internos na mente de uma criança foi fortemente rejeitada, especialmente pelos psicanalistas norte-americanos (Bornstein, 1945; Glover, 1945; Kernberg, 1969; Zetzel, 1956). Nos últimos anos, deu-se a ela o crédito devido por seu trabalho pioneiro nas primeiras relações objetais (Mahler, 1968; Schafer, 1968; Sperling, 1974; Stoller, 1968; Volkan, 1976). A seqüência que ela primeiro descreveu, de introjeção-projeção-reintrojeção, está agora firmemente estabelecida como dinâmica básica da infância, embora continuem as discussões sobre a sua ocorrência no tempo (Axelrad e Brody, 1970). Uma importante variação da projeção primeiro descrita por Melanie Klein é a identificação projetiva. Nesta manobra, partes do eu e de objetos internos são separadas e projetadas no objeto externo, que se torna então possuído, controlado e identificado com as partes projetadas. A identificação projetiva tem múltiplos objetivos. 46 Pode dirigir-se para o mau objeto, para obter controle da fonte de perigo. Partes más do eu podem ser projetadas a fim de se ficar livre delas, assim como para atacar e destruir o objeto, e partes boas podem ser projetadas para evitar a separação ou mantê-las a salvo de coisas más dentro, ou para melhorar o objeto externo através de uma espécie de primitiva reparação projetiva. A identificação projetiva começa Quando é primeiro estabelecida a posição paranóide-esquizóide em relação ao seio, mas ela persiste e muito freqüentemente intensifica-se Quando a mãe é percebida como um objeto global e todo o seu corpo é penetrado pela identificação projetiva. 11 — RACIONALIZAÇÃO Mecanismo de defesa, através do qual o indivíduo apresenta uma explicação coerente do ponto de vista lógico, ou aceitável do ponto de vista moral, para alguma coisa sua (atitude, pensamento etc.), por não se aperceber dos verdadeiros motivos que a justificam. 12 — REGRESSÃO Mecanismo defensivo contra a angústia, pelo retorno a uma fase já ultrapassada do desenvolvimento libidinal ou do Ego.São os pontos de fixação que determinam a fase para a qual ocorre a Regressão. Como a ênfaseavassaladora de Freud nos processos de desenvolvimento, as defesas de regressão e sua complementar fixação desempenharam um papel necessariamente grande em seu pensamento. Já em 1897, numa carta a Fliess, ele tinha enunciado o princípio (desde então fundamental ao pensamento psicanalítico) de que a escolha da neurose varia com a profundidade da regressão, ou, como disse então, com a localização cronológica da onda de desenvolvimento. Na seção teórica, capítulo 7 da Interpretação dos Sonhos, ele distinguiu três tipos de regressão: tópico (ou topográfica), no sentido dos sistemas de consciente, pré-consciente e inconsciente; temporal, como uma regressão para formações psíquicas mais antigas; e formal, Quando modalidades primitivas de expressão e representação tomam o lugar das modalidades costumeiras. No caso do Homem dos Ratos (1909), Freud viu a regressão como uma característica específica da neurose obsessiva, descrevendo uma regressão da ação para o pensamento, assim como uma regressão do amor objetal para o auto-erotismo. Nas Conferências Introdutórias (1916-1917), Freud resumiu seu pensamento sobre a regressão como segue: No caso de toda tendência particular....algumas de suas porções particulares ficaram para trás nos primeiros estágios de seu desenvolvimento, embora outras porções possam ter atingido seu objetivo final... Propomo-nos a descrever este atraso como uma fixação, isto é, do instinto. O segundo perigo num desenvolvimento por estágios deste tipo está no fato de que as partes que segui,a,n adiante podem também retornar facilmente, retrogressivamente, a um destes estágios anteriores — o que descrevemos como regressão. A tendência será levada a uma regressão deste tipo se o exercício de sua função — isto é, o atingimento de sua satisfação— é confrontado, na sua forma posterior ou mais altamente desenvolvida, por poderosos obstáculos externos. É - plausível supor que a fixação e regressão não são mutuamente independentes. Quanto mais fortes as fixações no caminho do desenvolvimento, mais prontamente a função evitará as dificuldades externas, regredindo- às fixações — tanto mais incapaz, - por conseguinte, revela-se a função desenvolvida para resistir a obstáculos externos em seu curso. Considere-se que, se um povo que está em movimentodeixou atrás de si fortes destacamentos, em escalas na sua migração, é provável que os grupos mais avançados estarão inclinados a recuar para estas escalas se foram derrotados ou se defrontaram com um inimigo superior. Mas estarão também em maior risco de serem derrotados, quanto mais pessoas tiverem deixado para trás em sua migração. E importante para a sua compreensão das neuroses que não se perca de vista esta relação entre fixação e regressão. Depois do que aprenderam sobre o desenvolvimento da função libidinal, estarão preparados para ouvir que há regressões de dois tipos: um retorno aos objetos primeiro catexizados pela libido, que, como sabemos, são de natureza incestuosa, e um retorno da organização sexual, como um todo, a estágios anteriores. Ambos os tipos são encontrados nas neuroses de transferência, e desempenham um grande papel em seu mecanismo. Em particular, um retorno aos primeiros objetos incestuosos da libido é um aspecto encontrado em neuróticos com uma regularidade positivamente fatigante. Dez anos Depois, em Inibições, Sintomas e Ansiedade (1926), Freud apresentou outra explicação metapsicológica da regressão, em termos de sua teoria dupla dos instintos, encarando-a como uma “disfusão do instinto’, numa separação dos componentes eróticos que, com a entrada da fase genital, juntaram-se às catexias destrutivas pertencentes à fase sádica”. 47 Em 1964, Arlow e Brenner resumiram a visão da regressão segundo a psicologia do ego da seguinte forma: 1. Revimos a história do desenvolvimento do conceito de regressão e observamos como o significado deste termo expandiu-se gradualmente, para explicar diferentes tipos de fenômenos. 2. Descrevemos cinco maneiras diferentes com que o termo “regressão” foi usado: genética, sistêmica, instintiva, filogenética e biogenética. Consideramos os diferentes usos do conceito “regressão” dentro do esquema da teoria estrutural e concluímos que a regressão, no sentido filogenético e biogenético, é de uso limitado, cientificamente, e que o conceito de regressão sistêmica é inconsistente com a teoria estrutural. 2. A regressão é definida como ressurgimento de modalidades de funcionamento mental característicos de fases anteriores do desenvolvimento psíquico. 3. O processo de regressão pode afetar todas as três partes do aparato psíquico, o ego, o id e o superego. A regressão é uma tendência geral da vida mental. A regressão de impulsos e regressão do ego podem ser variáveis independentes. A regressão de impulsos, em si, não determina a regressão do ego. 4. A regressão afeta o funcionamento das partes constituintes do aparato psíquico, dê maneira seletiva. A regressão não- global. 5. As regressões são geralmente transitárias e reversíveis. A patologia não é determinada pela profundidade da regressão, mas sim por sua natureza irreversível, pelos conflitos que ela engendra e por sua interferência com o processo de adaptação. 6. Formas primitivas de funcionamento mental existem lado a lado com formas mais maduras. O que se observa nos fenômenos regressivos é um deslocamento no domínio da função. Nos fenômenos regressivos, os aspectos primitivos da função que foram controlados e mantidos sob controle vêm à tona. Está claro que, à parte uma limpeza de certos aspectos da teoria freudiana, como seu gosto pelas explicações biogenéticas e filogenéticas (que desde então foram abandonadas pela teoria psicanalítica), a abordagem da psicologia do ego à regressão não vai muito mais além de Freud, se é que chega a isto. Algumas das proposições de Arlow e Brenner são de validade duvidosa, como a afirmação de que as regressões são temporárias e reversíveis, ou que a regressão de impulsos e a regressão de ego podem ser independentes uma da outra. O tópico da regressão assumiu particular importância entre os mecanismos de defesa devido ao interesse grandemente aumentado pelas condições fronteiriças e psicóticas. Sob este aspecto, a noção anterior de Freud, de que a regressão é característica da neurose obsessiva, está certamente ultrapassada do ponto de vista da psicologia do ego. REGRESSÃO A SERVIÇO DO EGO Em 1936, Ernest Kris, num artigo sobre a caricatura, descreveu pela primeira vez a defesa da regressão a serviço do ego, que imediatamente repercutiu com agrado na literatura psicanalítica: Nos sonhos, o ego abandona sua supremacia e o processo primário obtém o controle, enquanto que no humor e na caricatura o processo permanece a serviço do ego. Basta esta formulação para mostrar que o problema em questão é mais geral: o contraste entre um ego subjugado por uma regressão e uma “regressão a serviço do ego”.., cobre unia vasta e impressionante faixa de experiências mentais. . . Parece que o ego tem sua supremacia tolhida sempre que é dominado por afetos, independente de ser um excesso de afeto ou sua própria fraqueza o responsável pelo processo. Mas o caso oposto, Quando o ego chama a seu serviço o processo primário e faz uso dele para seus propósitos, também é altamente significativo. Mais tarde Kris desenvolveu esta idéia, em Explorações Psicanalíticas na Arte (1952), na seção sobre os processos mentais pré-conscientes. Assim, a idéia confinava- se originalmente ao processo criativo e revelou-se útil para explicar a regressão do artista, que Depois pode retornar ao mundo normal, e do psicótico, que não pode. Em 1954, Bellak expandiu mais o conceito, conceitualizando o grau de participação do ego num contínuo de devaneios, fantasias, fenômenos de pegar no sono e fantasias pré-conscientes, na associação livre e técnicas projetivas. Em 1958 (citadoem Bellak et al., 1973), ele o redefiniu nos seguintes termos: 48 Há uma redução breve, oscilante e relativa de certas funções adaptativas do ego a serviço de [isto é, para facilitar] outras. especificamente as funções ‘sintéticas” do ego, O que ocorre é que as funções cognitivas seletivas e adaptativas são reduzidas; isto enfraquece as divisões nitidamente definidas entre figura e fundo, de relações lógicas, temporais espaciais e outras, e permite que elas se reordenem em novas configurações, com novas fronteiras, sob o escrutínio das forças adaptativas funcionando novamente com rigor. Nosso principal objetivo acima foi parar de falar do “ego” como uma entidade e falar de diferentes funções do ego em diferentes níveis de eficiência ao mesmo tempo. Bellak também considerou uma base metapsicológica de associação livre no processo terapêutico como sendo a regressão a serviço do ego (1961). Roy Schafer (1958) enumerou seis condições na personalidade que favorecem a regressão a serviço do ego: um conjunto bem desenvolvido de sinais de afeto; um senso seguro do eu e/ou uma identidade do ego bem definida; um domínio relativo de traumas antigos; pressões do superego suaves, e não severas; uma história de confiança e reciprocidade suficientes em relações interpessoais; e significação cultural decorrente dos resultados do processo. Um amplo corpo de literatura lidou com os diversos aspectos da conceitualização (Geleerd, 1964; Joffe e Sandler, 1968; Kubie, 1958; Pine e Holt, 1960; Schafer, 1968; Schnier, 1951; Waelder, 1960; Wangh, 1957; Weissman, 1961, 1968, 1969; Wild, 1965). Sua maior elaboração encontra-se num livro de Bellak et ai. (1973), que encaram a regressão adaptativa a serviço do ego como uma das 12 principais funções do ego, e a mediram em gente normal, neurótica ou esquizofrênica. Uma abordagem afim é a de Balint em O Defeito Básico (1968); ele distingue uma regressão benigna de maligna no processo terapêutico, considerando a última como o problema característico da psicose. A crítica mais convincente do conceito proveio de Marshall Bush (1969), que sente que o papel da regressão no pensamento criativo recebeu ênfase excessiva no discurso psicanalítico. Ele sustenta que um aspecto do pensamento primitivo, do ponto de vista do desenvolvimento, que se torna elaborado num aspecto altamente adaptativo e estável do teste -da realidade e pensamento da realidade, entra no ato criativo não como uma regressão a serviço do ego, mas como uma facilidade cognitiva especial do processo secundário. Bush observa que a discussão de Kris abrange três fenômenos diferentes: a remoção de barreiras anticatéxicas ou defensivas entre o ego e o id, que por sua vez afeta a formação de pensamento pré- consciente; um deslocamento de energia entre as funções do ego que pode envolver repressão a níveis mais primitivos do funcionamento do ego, mas que também pode envolver um deslocamento de prioridades entre diferentes operações do ego, que não ,é necessariamente de natureza regressiva; e a emergência de material pré-consciente (ou, em alguns casos, inconsciente) na consciência. Em sua opinião, outros autores não distinguem suficientemente entre o tipo de regressão em jogo Quando emergem à consciência novas idéias e os sentidos subjetivos da regressão no processo criativo. Em concordância com Bush, Fine (1967) e Fine e Fine (1977) também mostraram que, no processo criativo de mestres do xadrez e matemáticos, a facilidade cognitiva do processo secundário é uma explicação mais convincente dos fenômenos do que a regressão. A dificuldade parece surgir nos múltiplos sentidos do termo “regressão”. Arlow e Brenner (1964) observam que o sentido topográfico da regressão é inconsistente com a teoria estrutural, isto é, que o deslocamento de uma idéia ou sentimento do consciente para o inconsciente pode ser -explicado mais economicamente e mais eficazmente do que pela regressão topográfica. Se o sentido defensivo da regressão é mantido, de acordo com a teoria estrutural, contudo, a confusão pode ser evitada. A criatividade não pode ser classificada sob um título geral como “regressiva” ou “progressiva”; isto tem laivos da velha idéia de que um artista é um louco ou um gênio. Às vezes o indivíduo criativo regride, às vezes não; a distinção só pode ser feita com base num completo exame da estrutura do ego. Fine (1975b) sugeriu que uma distinção clara entre criatividade interior e exterior ajudaria a esclarecer os temas em questão. 13 — REPARAÇÃO Mecanismo de defesa contra a angústia depressiva e a culpa pela ação reparadora do dano que se sente ter causado a um objeto investido de amorou a ação de restaurar um objeto amado que foi danificado. 14 — REPRESSÃO Mecanismo defensivo que consiste em manter inconsciente um impulso instintivo ou uma representação mental inaceitável. Freud distingue a Repressão primária da Repressão secundária, a primeira agindo contra o impulso 49 instintivo inicial e a segunda agindo contra os derivados e as manifestações disfarçadas do impulso instintivo. 15 — SUBLIMAÇÃO Mecanismo psicológico, através do qual os impulsos instintivos sexuais e agressivos sofrem “dessexualização” e “desagressificação”, ao serem descarregados para objetos não sexuais ou agressivos, de tal forma que se tornam social-mente aceitáveis. Anna Freud relacionou a Sublimação como mecanismode defesa normal do desenvolvimento psicológico, à medida que fornece solução progressiva a conflitos infantis que poderiam causar neurose; além disso ela mostra como o processo de deslocamento auxilia o mecanismo de Sublimação. Sublimação (algumas considerações)Durante muito tempo considerou-se a sublimação como a principal solução normal para os conflitos que cercam os instintos. Freud definiu-a da seguinte maneira nos Três Ensaios (1905): A sublimação permite que excitações excessivamente fortes decorrentes de fontes particulares da sexualidade encontrem uma válvula de escape e uso em outros campos, de forma que resulta um aumento bastante considerável, em eficiência psíquica, de uma disposição que em si é perigosa. Temos aqui uma das origens da atividade artística; e de acordo com o grau da sublimação, uma análise caracterológica de um indivíduo altamente dotado, e em particular com uma disposição artística, pode revelar uma mistura, em todas as proporções, de eficiência, perversão e neurose. Uma subespécie de sublimação deve ser encontrada na supressão pela formação reativa, que, como vimos, começa durante o período de latência de uma criança e continua, em casos favoráveis, por toda a sua vida. Assim, para ele, a essência da sublimação era sua desejabilidade social. Conquanto este vínculo com a estrutura social parecesse apropriado em 1905, ele sofreu críticas crescentes após a Primeira Guerra Mundial, Quando os intelectuais ficaram chocados com a brutalidade dos regimes existentes (Bernfeld, 1922, 1931). Fenichel (1945) tomou mais tarde um curso algo diferente, refletindo estas críticas. Ele encarava a sublimação como caracterizada pela inibição do objetivo, dessexualização, uma absorção completa de um instinto em suas seqüelas e uma alteração dentro do ego. Não obstante, o peso da aprovação social, ainda que combinado com a descarga de instintos, continuou sendo um obstáculo. Com o correr do tempo, toda a noção de normalidade, com sua relação à estrutura social, seguiu linhas diferentes, de forma que se passou a dar menos ênfase à sublimação como a saída normal. Em 1962, Kubie ofereceu uma incisiva crítica de toda a estrutura conceitual. Ele observou que a sublimação tinha sido usada para implicar: a resolução, através do comportamento filantrópico, de uma constelação de processos inconscientes que podem induzir ao comportamento homossexual; a resolução, por um comportamento socialmente valioso, de tendências perversas polimorfas (no sentido original eingênuo de Freud) e também de impulsos e incitamentos libidinais provenientes de zonas erógenas hipoteticamente sobrecarregadas; o desvio para canais socialmente valiosos de um fluxo de “energias” psíquicas hipotéticas e, como sabemos agora, inexistentes, que se derivam de uma constelação de processos inconscientes, que de outra forma produziriam padrões de sintomas neuróticos socialmente destrutivos ou pelo menos inúteis; quaisquer padrões de comportamento coerente que se originam de tais fontes, mas são socialmente desejáveis; a substituição de uma meta instintiva por um impulso não-instintivo, com a implicação de que o impulso instintivo, em si, é desta forma atenuado. 16- NEUTRALIZAÇÃO A neutralização é uma expansão do conceito de sublimação, e foi explorado mais intensamente por Hartmann (1964b). Seguindo as fórmulas posteriores de Freud sobre a dessexualização em O Ego e o Id, Hartmann define a neutralização como mudança de energia libidinal e agressiva para fora do instintivo e em direção a uma forma não-instintiva. Ao usar “não-instintiva”, ele tenta evitar todas as ambigüidades e conflitos que cercam o termo sublimação. Hartmann postula que a neutralização de energia começa tão logo o ego se desenvolve como uma subestrutura mais ou menos demarcada da personalidade, o que teria lugar uns poucos meses após o nascimento. Embora ele atribua a neutralização tanto a impulsos libidinais como agressivos, ele frisa particular- mente a neutralização da agressão como fornecendo à pessoa uma saída para o amargo dilema de destruir os objetos ou a si própria. Ele também postula diferentes estágios ou graus de neutralização, isto é, estados transicionais entre a energia instintiva e plenamente neutralizada. Por vezes Hartmann fala de neutralização como se fosse apenas uma transformação de energia; em outras oportunidades ele fala como se ela fosse apenas um mecanismo de defesa. Como diz, 50 A neutralização, mesmo Quando é usada para a defesa, distingue-se de outras técnicas defensivas do ego na medida em que é especialmente definida por seu aspecto energético (entre outros), o que significa aqui pela transformação de uma forma de energia em outra. Que a sublimação não é realmente um “mecanismo’,’ no sentido comum, Fenichel (1945) lá viu claramente, e isto vale também para a neutralização em geral. Também a sua relação à contracatexia é diferente da que encontramos em outras formas de defesa. Contudo, não posso concordar com Fenichel Quando ele simplesmente iguala a sublimação com defesa bem-sucedida. Embora Hartmann oponha-se à idéia de que a sublimação é simplesmente uma defesa bem-sucedida, que deve ser abandonada devido às implicações sociais (Hartmann, 1964), ele parece desejar colocar a neutralização em seu lugar como a defesa bem-sucedida, a maneira pela qual o ego domina a realidade. Tal posição parece levantar o velho argumento sobre sublimação numa nova forma, visto que a neutralização parece desejável apenas em culturas que, como a nossa, desencorajam a expressão de afetos. A despeito do peso da autoridade de Hartmann, que dominou a teorização psicanalítica durante quase 20 anos, sua ênfase na neutralização foi rejeitada por uma série de autores. Como mecanismo de defesa, entretanto, ela mantém seu lugar entre os outros. À parte o domínio da realidade, as duas aplicações mais importantes da neutralização como defesa estão na esquizofrenia e na doença psicossomática. Num artigo sobre a metapsicologia da esquizofrenia (1953), Hartmann ressaltou que a capacidade de neutralização do esquizofrênico é reduzida. Em resultado, o ego é inundado de libido não-neutralizada. A autocatexia é sexualizada levando ao que ele chama de “superestimação sexual” do eu, e assim o é pelo menos parte das funções do ego, provocando problemas funcionais. Contudo, Hartmann não chega a ligar esta falha de neutralização a outros aspectos mais conhecidos da patologia esquizofrênica. A outra aplicação significativa do conceito de neutralização está na hipótese de Schur, que liga a ressomatização à prevalência de pensamento do processo primário e o uso de energia desneutralizada (1955). Ele descreveu um caso de dermatite psicossomática na qual ocorreu uma regressão fisiológica; a regressão do ego não se limitou a uma avaliação regressiva de perigo, mas em sua resposta o ego operou com energia desneutralizada, que correspondia ao ressurgimento de fenômenos de descarga somática. Assim, ele vinculou a somatização e regressão do ego ao fracasso em neutralizar a agressão. Tantos outros fatores estão em jogo nos fenômenos psicossomáticos que isto representaria apenas um aspecto da patologia total. 17 — TRANSFORMAÇÃO NO CONTRÁRIO (INVERSÃO) Mecanismo de defesa que transforma o impulso instintivo em seu contrário, de ativo a passivo e, num sentido puramente descritivo, de conteúdo. 18 — VOLTA CONTRA O EU Mecanismo psicológico que faz o próprio indivíduo o objeto do impulso instintivo. A Volta Contra o Eu foi relacionada, por Anna Freud, como mecanismode defesa para explicar o masoquismo moral, claramente observável nas neuroses obsessivas. 19- ATUAÇÃO A atuação é um mecanismo de defesa descrito pela primeira vez, em detalhes, após a Segunda Guerra Mundial, embora Freud a tivesse mencionado já em 1914, em seu artigo sobre “Recordar, Repetir e Elaborar”. Pode ser melhor definida como uma ação, geralmente de natureza repetitiva e compulsiva, e freqüentemente autodestrutiva, que serve ao propósito inconsciente de resolver um conflito interno reprimido por meios externos. Tal ação exibe geralmente um aspecto impulsivo relativamente deslocado nos padrões motivacionais normais do sujeito, e isolável com bastante facilidade das tendências globais de sua atividade. A atuação toma muitas vezes a forma de comportamento agressivo dirigido contra si próprio ou contra outros. O termo mais antigo “perversão” foi substituído de maneira geral por “distúrbios de atuação”. Reconheceu-se que uma ampla variedade de patologia comportamental pode receber esta rubrica. Como observou Anna Freud num debate em 1967, o termo tem sido sujeito a considerável confusão. Laplanche e Pontalis (1973) comentam também que ele traz em si uma ambigüidade que é intrínseca ao pensamento de Freud neste campo: ele não distinguiu entre os elementos da atualização na transferência e o recurso à ação motora, que não está necessariamente implícita na transferência. Fine (1973) reexaminou cuidadosamente as fontes originais e mostrou que o termo agieren, que não é a palavra alemã comum para ação, foi traduzida indiferentemente como “atuação” ou “ação”.