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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/341422852 Direito dos desastres e políticas públicas: proteção jurídica de comunidades vulneráveis em termos socioambientais Thesis · January 2015 DOI: 10.13140/RG.2.2.11930.06088 CITATIONS 0 READS 244 1 author: Gabriel Antonio Silveira Mantelli University of São Paulo 39 PUBLICATIONS 37 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Gabriel Antonio Silveira Mantelli on 16 May 2020. 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PATRÍCIA FAGA IGLECIAS LEMOS __________________________________________ PROF. _________________________ À minha mãe e à minha irmã, as mulheres mais fortes que conheci na vida. AGRADECIMENTOS Em nome das minhas avós, agradeço à minha família pelo permanente suporte, pelo amor indiscutível e pelo pouso tranquilo. À minha mãe, Claudia, e ao meu pai, Pedro, muito obrigado por fazerem ser quem sou e pelo dom divino da vida. Aos meus irmãos Pedro Henrique, Matheus, Marina e João Guilherme, meus sinceros agradecimentos pelo sentimento sincero de união. Agradeço às minhas amigas e aos meus amigos pelos momentos bons e pelo excesso de sorrisos. Aos que trago comigo desde Votuporanga, àqueles com quem dividi felicidades nas Arcadas e aos maravilhosos profissionais em que me apoio nas horas de trabalho. A vocês, de todos os gêneros e amores, meu coração sorri. Agradeço às incríveis oportunidades que esta Faculdade me proporcionou: ao Departamento Jurídico XI de Agosto, por abrir meus olhos, à Academia de Letras, por me libertar e me dar voz, e à Clínica de Direito Ambiental Paulo Nogueira Neto, por me ensinar a aprender. Agradeço à minha orientadora, Professora Patrícia Iglecias, pelo apoio e pela confiança. Agradeço, por fim e mais uma vez, à minha mãe, por trazer e ser calmaria. Viver é muito perigoso... Porque aprender a viver é que é o viver mesmo... Travessia perigosa, mas é a da vida. (Guimarães Rosa) RESUMO MANTELLI, Gabriel Antonio Silveira. Direito dos desastres e políticas públicas: proteção jurídica de comunidades vulneráveis em termos socioambientais. 2015. 93 f. Tese de Láurea (Graduação) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015. Dada a realidade ecocomplexa da sociedade de risco, os desastres constituem umas das principais preocupações contemporâneas. Dentro dessa temática, a passagem de uma abordagem simplesmente consequencial para uma ética de gestão de risco é acompanhada pela evolução legislativa e jurídica do tratamento dos desastres. A vulnerabilidade socioambiental e a ausência de sistemas resilientes, juntamente com outros fatores potencializadores de riscos e custos, são situações que devem ser enfrentadas por um autônomo direito dos desastres. Um quadro principiológico norteado pela precaução e prevenção, assim como pela informação e pela proporcionalidade, norteia as normas brasileiras de prevenção e tratamento de desastres, na figura da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil e de outros diplomas correlatos de urbanismo, direito ambiental e institutos clássicos do direito privado. Ao lado da estruturação de um direito combativo, necessário que a atividade estatal, por meio de políticas públicas multidisciplinares, se adeque à crise climática e ambiental, trazendo o ideário da justiça ambiental para o centro das decisões político-institucionais. Atualmente, o Brasil se esforça para se ajustar, havendo iniciativas que levam em conta o cenário contemporâneo e a preocupação socioambiental, como o Programa Socioambiental da Serra do Mar. Em síntese, a questão do enfrentamento jurídico-institucional dos desastres é desafiadora e, tendo em vista que um sistema social capaz de prever e enfrentar as adversidades do desconhecido é um sistema mais sólido e perpétuo, tem-se que cabem ao direito dos desastres e à efetivação de políticas públicas as tarefas de proteger comunidades vulneráveis em termos socioambientais e de garantir a justiça ambiental. PALAVRAS-CHAVE: direitos dos desastres, políticas públicas, vulnerabilidade socioambiental, justiça ambiental. ABSTRACT MANTELLI, Gabriel Antonio Silveira. Disaster law and public policies: legal protection of vulnerable communities in social and environmental contexts. 2015. 93 p. Termpaper (Graduation) – Faculty of Law, University of São Paulo, São Paulo, 2015. Due to the environmentally complex reality of risk society, disasters constitute one of the main contemporary concerns. Related to such theme, the transition from a simply consequential approach to a risk management ethic is followed by legislative and legal developments on disasters’ treatment. Social and environmental vulnerability as well as the lack of resilient systems, along with other factors that enhance risks and costs, are issues that must be faced by an autonomous disaster law. A framework of legal principles guided by precaution and prevention, as well as for information and proportionality, guides Brazilian rules on prevention and treatment of disasters, mainly through the National Policy of Protection and Civil Defense and other related rules of urban planning, environmental law and classic institutes of private law. Aside from the structuring of an efficient legal system, it is necessary that the State, through multidisciplinary public policies, considers the climate and environmental crisis, bringing ideas of environmental justice to the center of political and institutional decisions. Currently, Brazil struggles to adapt, with initiatives that take into account not only the contemporary scenario but also social and environmental concerns, such as the Environmental Program of Serra do Mar. In summary, the issue of legal and institutional discussion related to disasters is challenging. Keeping in mind that a social system that is able to predict and deal with the adversities of the unknown is a more solid and perpetual system, it is possible to ensure the duty of the disaster law and the implementation of public policies to protect vulnerable communities in social and environmental contexts ensuring, thus, environmental justice. KEYWORDS: disaster law, public policies, social and environmental vulnerability, environmental justice. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 11 1 DESASTRES E RISCOS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA ................................................... 12 1.1 Dimensões histórico-social e conceitual aplicáveis aos desastres ................................. 12 1.2 Fatores contemporâneos de potencialização dos riscos e dos custos socioambientais dos desastres ............................................................................................................................... 16 1.2.1 Estrutura econômica dominante .................................................................................. 16 1.2.2 Crescimento populacional e ocupação do solo ........................................................... 18 1.2.3 Infraestrutura verde e construída ................................................................................ 19 1.2.4 Mudanças climáticas ................................................................................................... 20 1.3 Fatores transversais intrínsecos aos desastres ................................................................ 22 1.3.1 Vulnerabilidade ........................................................................................................... 23 1.3.2 Resiliência ................................................................................................................... 25 1.4 Acepção jurídica para os desastres ................................................................................ 27 2 DIREITO DOS DESASTRES ................................................................................................... 29 2.1 Características do direito dos desastres ......................................................................... 30 2.1.1 Unificação com o conceito de gestão de risco ............................................................ 30 2.1.2 Multidisciplinaridade .................................................................................................. 31 2.1.3 Estrita ligação com a lei reguladora ............................................................................ 32 2.2 Principiologia aplicável ................................................................................................. 32 2.2.1 Princípio da proporcionalidade ................................................................................... 34 2.2.2 Princípios da precaução e da prevenção ..................................................................... 35 2.2.3 Princípios da informação e da participação ................................................................ 37 2.2.4 Princípio da fundamentação ........................................................................................ 38 2.2.5 Princípio da adaptabilidade ......................................................................................... 40 2.3 Análise normativa .......................................................................................................... 40 2.3.1 Reflexão e preocupação no plano internacional ......................................................... 41 2.3.2 Legislação brasileira aplicável .................................................................................... 43 2.3.2.1 As Constituições brasileiras e os desastres .............................................................. 43 2.3.2.2 Política Nacional de Proteção e Defesa Civil .......................................................... 46 2.3.2.3 Estatuto da Cidade e Lei sobre o Parcelamento do Solo Urbano ............................ 48 2.3.2.4 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ..................................................... 49 2.3.2.5 Políticas sobre Mudança do Clima .......................................................................... 49 2.3.2.6 Código Florestal ....................................................................................................... 50 2.4 Conexões com o direito ambiental e os institutos clássicos do direito privado ............. 50 2.4.1 Estado Socioambiental e Democrático de Direito ...................................................... 51 2.4.2 Função socioambiental da propriedade ....................................................................... 52 2.4.3 Responsabilidade civil aplicável aos desastres ........................................................... 54 3 POLÍTICAS PÚBLICAS DE PROTEÇÃO A COMUNIDADES VULNERÁVEIS ............................... 59 3.1 Vulnerabilidade socioambiental e (in)justiça ambiental ................................................ 60 3.2 Regime jurídico das políticas públicas .......................................................................... 63 3.2.1 Apontamentos conceituais .......................................................................................... 63 3.2.2 Políticas públicas de proteção ambiental .................................................................... 66 3.3 Políticas públicas e defesa civil ..................................................................................... 67 3.3.1 Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil ............................................................. 68 3.3.2 Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil .......................................................... 69 3.3.3 Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres ........................................ 69 3.3.4 Sistema Integrado de Informações sobre Desastres .................................................... 70 3.3.5 Operação Carro-Pipa (Brasil) ..................................................................................... 70 3.4 Políticas públicas e urbanismo ....................................................................................... 70 3.4.1 Planejamento urbano ...................................................................................................72 3.4.2 Mapeamento das áreas de risco e Plano Diretor ......................................................... 72 3.4.3 Direito à cidade resiliente ........................................................................................... 74 3.4.4 Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar (SP) .............................. 75 3.4.5 Rio Resiliente (Rio de Janeiro, RJ) ............................................................................. 76 3.5 Políticas públicas, educação e participação ................................................................... 77 3.5.1 Programa Brigada Escolar (PR) .................................................................................. 79 3.5.2 Programa de Voluntariado (São Paulo, SP) ................................................................ 80 CONCLUSÃO.......................................................................................................................... 81 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................ 84 11 INTRODUÇÃO Ser vítima de um desastre é passar por uma experiência social bastante dolorosa e dramática, pois significa sofrer as consequências materiais e afetivas de algo a que o cidadão não deu causa. Não sofre só o ser humano, como também a natureza. A força simbólica dos desastres merece a atenção dos olhos jurídicos para que se possa preveni-los e para que se estabeleça um cenário normativo capaz de lidar com as complexidades advindas do pós-calamidade. Tendo essa premissa em mente, o presente trabalho buscará compreender, inicialmente, as dimensões conceituais aplicáveis aos desastres e aos riscos na sociedade contemporânea. Nessa oportunidade, refletirá sobre os fatores de potencialização desses eventos, dialogando com a transversalidade da resiliência e da vulnerabilidade. Com isso, poder-se-á buscar um sentido jurídico para o enfrentamento dessas questões. Assim feito, o estudo discorrerá sobre a eminência do direito dos desastres, elucidando suas características e principiologia que lhe podem garantir autonomia jurídica. Far-se-á uma breve análise no plano internacional para, à frente, diagnosticar a legislação brasileira inerente à temática, tanto no plano constitucional quanto no plano infraconstitucional. Embasado no ideário de justiça ambiental, o presente trabalho abordará toda a temática dos desastres tendo como norte o fato de que são as comunidades menos favorecidas economicamente aquelas que acabam sendo forçadas a habitar regiões mais propícias a riscos de desastres e, por essa e outras razões, são mais vulneráveis em termos socioambientais. Por fim, com a intenção de garantir maior solidez à presente discussão, avançar-se- á para o campo das políticas públicas. Nessa altura, o presente trabalho definirá do que se tratam e como o direito, enquanto regulamentador da atividade estatal, se debruça sobre os desastres por meio dos seguintes eixos: defesa civil, planejamento urbano, educação e participação. 12 1 DESASTRES E RISCOS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA A temática das ameaças ambientais e dos riscos associados aos desastres vem adquirindo relevância nas últimas três décadas, tanto na esfera acadêmica quanto no âmbito das políticas públicas. Embora tenha sido predominante o enfoque na resposta aos desastres, recentemente pode-se observar o desenvolvimento de uma abordagem mais integrada para a questão, por meio de eixos que consideram o conhecimento dos riscos, as ações prospectivas e corretivas para redução dos riscos e a preparação para manejo dos desastres, em um movimento circular e sistêmico de gestão. 1 Para iniciar, o presente capítulo trará um breve panorama histórico, social e conceitual aplicável aos desastres. 2 Em seguida, elencará que fatores potencializam os riscos e custos socioambientais dos desastres no cenário contemporâneo. Por fim, demonstrará que fatores transversais são importantes para se compreender adequadamente a temática, em busca de um sentido jurídico para o tema. 1.1 Dimensões histórico-social e conceitual aplicáveis aos desastres A noção de desastre se modifica com o desenvolvimento das sociedades, não sendo rara a coexistência de distintas definições para a expressão dentro de um mesmo contexto histórico e social. Fato é que desastres e calamidades estão presentes no cotidiano humano há tempos. Alguns deles, apesar de antigos, se transformam em problemas que são geridos até hoje, como nos célebres casos da contaminação radioativa de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986, e do furacão Katrina, nos Estados Unidos, em 2005. 3 Historicamente, podemos distinguir dois momentos no entender das causas de um desastre: uma inicial dimensão espiritual, em que o agente de um desastre se qualifica em 1 NOGUEIRA, Fernando Rocha; OLIVEIRA, Vanessa Elias de; CANIL, Katia. Políticas públicas regionais para gestão de riscos: o processo de implementação no ABC, SP. Ambient. soc., São Paulo , v. 17, n. 4, dez. 2014, p. 177. 2 Nesse sentido, Délton Winter de Carvalho clama por se ponderar para além da visão antropocêntrica e também se pensar nos danos estritamente ambientais ocasionados por desastres: “A construção do sentido de desastres, centrada nas consequências lesivas do evento, demonstra uma valoração antropocêntrica das consequências que ensejam a caracterização de um evento como tal. Esta perspectiva, apesar de sua função didática e adequação operacional, olvida, ou pelo menos subestima, as consequências ecológicas negativas que um desastre pode ocasionar.” (CARVALHO, Délton Winter de. Por uma necessária introdução ao direito dos desastres ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, ano 17, v. 67, 2012, p. 112). 3 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, pp. 19-20. 13 interpretações de ordem religiosa e ligadas à ideia não-mundana de destino; e uma posterior dimensão racional, em que se procura compreender o fenômeno dos desastres por meio de instrumentos científicos e embasados na razão. 4 Um marco histórico relevante é a ocorrência, em 1755, de um terremoto na cidade de Lisboa, capital portuguesa. Na ocasião, múltiplos focos de incêndio e um tsunami destruíram a cidade lusitana por completo. Devido à magnitude e as consequências pós- desastre, a doutrina especializada considera esse como o primeiro desastre moderno, “uma vez que foi a partir de sua ocorrência que, [...] durante as fases de resposta e de recuperação, os cidadãos passaram a demandar mais do governo e começaram a se ver como agentes de transformação do meio ambiente”. 5 Representa, portanto, a chave histórica de mudança da dimensão espiritual para a dimensão racional. Atualmente diversos estudos e pensadores propõem teorias explicativas de situações de desastres. De acordo com Santos, as teorias neomarxistas, alinhadas com a ecologia política, consideram que elas devem ser vistas como ocorrências que refletem as características das sociedades em que ocorrem, caracterizadas pela industrialização, urbanização, legados do colonialismo, política econômica e mecanismos de controle exercidos sobre o ambiente e a sociedade civil. Outras formulações, ainda conforme a mesma autora, partem da teoria do risco, desenvolvida por sociólogos como Niklas Luhmann e Ulrich Beck. Essa linha enfatiza o papel das decisões na criação do risco, as dimensões político-econômicas do risco, e as formas pelas quais as sociedades modernas produzem o risco. Nessa seara, tem-se que os riscos não são exclusivamente fenômenos naturais ou tecnológicos, mas também sociais, não sendo considerados efeitos colaterais do progresso, porém centraise constitutivos das sociedades modernas. 6 Agora passando para o quadro conceitual dado à temática dos desastres, Farber et al alerta para a possibilidade de se compreender esses eventos sob diferentes óticas. Dessa 4 Sob o mesmo ponto de vista, Carvalho sintetiza: “[...] há, nitidamente, na história, uma passagem de um momento em que os desastres eram compreendidos apenas como eventos divinos, incontroláveis e exteriores, para um momento em que estes servem como parâmetro que justifica à antecipação racional, seja a partir das informações científicas disponíveis ou mesmo dos aprendizados obtidos com o passado. Este processo é acompanhado pela superação de um paradigma da decisão pelo medo, aprisionado em observações místicas e religiosas, em direção a processos orientados a uma racionalização das incertezas inerentes aos riscos e perigosos catastróficos, inserido este em uma matriz construtivista (pró-ativa)” (CARVALHO, Délton Winter de. Por uma necessária introdução ao direito dos desastres ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, ano 17, v. 67, 2012, p. 109). 5 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 21. 6 SANTOS, Rúbia dos. Gestão de desastres e política de assistência social: estudo de caso de Blumenau/SC. 2012. 336 f. Tese (Doutorado em Sociologia Política) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, pp. 49-51. 14 forma, a doutrina norte-americana exemplifica a polissemia recorrendo à sociologia, que tende a definir desastres em termos de ruptura social causada por eventos destrutivos e extraordinários, e aos estudiosos da gestão de risco, que definem desastres em termos de resposta legal e amparo governamental requisitados para o enfrentamento dessas situações anômalas. 7 A conceituação adotada pela International Strategy for Disaster Reduction (UN- ISDR) considera desastre como uma grave perturbação do funcionamento de uma comunidade ou uma sociedade envolvendo perdas humanas, materiais, econômicas ou ambientais de grande extensão, cujos impactos excedem a capacidade da comunidade ou da sociedade afetada de arcar com seus próprios recursos. 8 Já o Centre for Research on the Epidemiology of Disaster considera desastre como sendo um evento que supera a capacidade local, a qual necessita de auxílio externo em nível nacional ou internacional; também pode ser um evento imprevisto e frequentemente súbito que causa grandes danos, destruição e sofrimento humano. 9 Em termos jurídicos nacionais, o conceito de desastres encontra guarida no art. 2º, II, do Decreto Federal nº 7.257/2010, em que é definido como “resultado de eventos adversos, naturais ou provados pelo homem sobre um ecossistema vulnerável, causando danos humanos, materiais ou ambientais e consequentes prejuízos econômicos e sociais”. De acordo com Carvalho e Damacena, em vista de tal conceituação, o ordenamento brasileiro apresenta uma maior abertura cognitiva aos múltiplos fatores socioambientais que compõem um desastre. 10 Ao formatar classificações para os diferentes tipos de desastres, em relação às causas, a doutrina especializada aponta que os desastres podem ser qualificados como naturais ou antropogênicos. Os desastres naturais “são aqueles decorrentes imediatamente de fenômenos naturais, atribuíveis ao exterior do sistema local” e nesse tipo se encaixam os desastres geofísicos (como os terremotos), meteorológicos (como os furacões), hidrológicos (como as inundações), climatológicos (como as secas) e biológicos (como as epidemias). Já os desastres antropogênicos são aqueles que decorrem de fatores humanos, sendo divididos em desastres tecnológicos (como os decorrentes do uso de tecnologia 7 FARBER, Daniel et al. Disaster law and policy. 2. ed. Nova York: Aspen Publishers, 2009, p. 3. 8 INTERNATIONAL STRATEGY FOR DISASTER REDUCTION – UN-ISDR. Terminology on disaster risk reduction. [S.1], 2009. Disponível em: <http://www.unisdr.org/we/inform/terminology>. Acesso em: 13 jun. 2015. 9 VOS, Femke et al. Annual disaster statistical review 2009: the numbers and trends. Bruxelas: CRED, 2010, p. 12. 10 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 27. 15 nuclear) e desastres sociopolíticos (como na ocorrência de refugiados ambientais). Ainda que relevante em termos pedagógicos, a distinção se apresenta como pouco prática, porque vê-se que “a grande maioria dos desastres decorre de uma sinergia de fatores naturais e antropogênicos (desastres mistos ou híbridos)”. 11 Pensando a realidade dos desastres, os números mais recentes são preocupantes. Do ponto de vista econômico, a cada dez anos, danos ligados às propriedades atingidas por desastres naturais nos Estados Unidos triplicam. 12 Além disso, o risco de se perder riquezas em desastres está superando a capacidade de criação de riquezas. 13 Do ponto de vista social, dados apontam que, no ano de 2013, desastres naturais desabrigaram 22 milhões de pessoas em todo o planeta, de acordo com relatório do Centro de Monitoramento de Deslocamento Internacional do Conselho Norueguês de Refugiados. 14 Vislumbrando o caso brasileiro, entre os anos 2000 e 2007, mais de um milhão e meio de brasileiros foram afetados por algum tipo de desastre. 15 E, de acordo com o documento Atlas Brasileiro de Desastres Ambientais – Volume Brasil, “os dados comprovam o discurso frequente sobre o aumento da ocorrência de desastres ao nos permitir observar os seguintes números: total de desastres, 31.909 | Década de 1990, 8.671 (27%) | Década de 2000, 23.238 (73%)”. 16 Dado o apresentado, passa-se a refletir quais são os fatores da contemporaneidade que acabam por ampliar a ocorrência dos desastres. 11 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, pp. 25-27. 12 Um dos casos emblemáticos no contexto norte-americano é do furacão Katrina, responsável por mais de 80 bilhões de dólares em prejuízos (FARBER, Daniel et al. Disaster law and policy. 2. ed. Nova York: Aspen Publishers, 2009, pp. 2-3). 13 Desde 1980, nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE), o risco de perdas econômicas provenientes de enchentes aumentou em mais de 160% e de ciclones tropicais aumentou 265%. Essas perdas estão aumentando mais rápido do que o PIB per capita. (ONU. Fatos sobre desastres. Disponível em: < http://www.onu.org.br/rio20/desastres.pdf>. Acesso em: 24 ago. 2015). 14 DESASTRES naturais desabrigaram 22 milhões de pessoas em 2013. Ambiente Brasil, 18 set. 2014. Disponível em: <http://noticias.ambientebrasil.com.br/clipping/2014/09/18/108879-desastres-naturais- desabrigaram-22-milhoes-de-pessoas-em-2013.html>. Acesso em: 05 jul. 2015. 15 Conforme informação oriunda do Ministério do Meio Ambiente, “em primeiro lugar figuram as inundações, com 58% das ocorrências; seguidas da seca, com 14%; e, logo após, dos deslizamentos de terra, com 11% das ocorrências” (LAVRATTI, Paula Cerski; PRESTES, Vanêsca Buzelato. Diagnóstico de legislação: identificação das normas com incidência em mitigação e adaptação às mudanças climáticas – Desastres. São Paulo: Instituto Planeta Verde, 2010, pp. 5-6). 16 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA. Atlas brasileiro de desastres naturais 1991 a 2010: volume Brasil. Florianópolis: CEPED UFSC, 2012, p. 28. 16 1.2 Fatores contemporâneos de potencialização dos riscos e dos custos socioambientais dos desastres Há a sinalização de que atualmente determinadosfatores e situações acabam por ampliar a chance de ocorrência de desastres e a potencializar os efeitos adversos deles. Focando nos aspectos sociais, Freire, Bonfim e Natenzon expõem que “o crescimento da população global, a pobreza, a escassez de terra e a urbanização em muitos países têm aumentado o número de pessoas que vivem em áreas propensas a desastres”. 17 Abarcando os fatores acima e também os ambientais, conforme a doutrina de Carvalho e Damacena, quatro fatores de amplificação dos riscos e dos custos socioambientais dos desastres podem ser elencados: (i) a estrutura econômica dominante, (ii) o crescimento da população humana e o modo como se decide ocupar o solo, (iii) a infraestrutura verde e construída; e (iv) a mudança do clima causada pela excessiva intervenção humana no meio ambiente. 18 1.2.1 Estrutura econômica dominante Destaca Édis Milaré que “os avanços proporcionados pela ciência e pela técnica não significam necessariamente uma elevação do progresso e do bem-estar, como se pensou a partir da Idade Moderna, na linha de uma espécie de ‘otimismo técnico’”. Explica, ainda, o autor que “a racionalidade técnica deixa de ser encarada como um instrumento neutro para a promoção de objetivos da humanidade, sendo indiscutível a sua potencialidade para se converter em mecanismo de opressão do homem sobre a natureza”. 19 Constatação essa que se reflete nos espaços econômicos de produção. Dentro desse panorama, pode-se atestar que as condições econômicas modernas, globalmente dominadas pela economia de mercado e pela industrialização, potencializam o risco de ocorrência de desastres em razão da matriz econômica just-in-time e da interdependência de infraestrutura. Em termos sociológicos, a imperatividade da sociedade de risco é outro fator de amplificação da possibilidade de ocorrência de eventos extremos. 17 FREIRE, Neison Cabral Ferreira Freire; BONFIM, Cristine Vieira do; NATENZON, Claudia Eleonor. Vulnerabilidade socioambiental, inundações e repercussões na Saúde em regiões periféricas: o caso de Alagoas, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 9, set. 2014, p. 3.756. 18 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 47. 19 MILARÉ, Édis. Amplitude, limites e prospectivas do direito do ambiente. In: MARQUES, José Roberto (Org.). Sustentabilidade e temas fundamentais de direito ambiental. Campinas: Millennium, 2009, p. 140. 17 O just-in-time é um sistema de administração de sincronia em produção, transporte e venda em tempo exato, tendo por princípio a produção industrial por demanda. 20 Quer dizer que nada deve ser produzido, transportado ou comprado antes da hora exata, o que faz com que os estoques sejam o mínimo suficiente para a continuidade do processo produtivo da indústria. Em situações de desastres, a falta de estoques pode quebrar as cadeias de fornecimento de bens, produtos e serviços básicos essenciais nessas situações de adversidade. A título exemplificativo, no Japão, onde o just-in-time impera devido à falta de espaço, quando ocorreu o terremoto de março de 2011, o país sofreu da falta de estoques para suprir as necessidades da população e para garantir a produção industrial. 21 Além disso, as relações do cenário industrial contemporâneo tornaram o quadro produtivo uma complexa rede interligada em que o prejuízo de um setor fundamental pode produzir um efeito em cadeia devastador. Se setores fundamentais são danificados, toda produção industrial é afetada. Dessa forma, a falta de setores como o de energia ou de transporte prejudica o funcionamento dos hospitais e o abastecimento de alimentos e medicamentos, que são essenciais em eventos catastróficos. Do ponto de vista sociológico, Morato Leite e Venâncio explanam que “a revolução industrial [...] foi o embrião [...] [da] sociedade de risco, potencializada pelo desenvolvimento tecno-científico e caracterizada pelo incremento na incerteza quanto às consequências das atividades e tecnologias empregadas no processo econômico”. 22 Sarlet e Fensterseifer também chamam a atenção para o advento do que se entende por sociedade de risco 23 , “uma fase do desenvolvimento da sociedade moderna em que os riscos sociais, políticos, ecológicos e individuais, criados pelo momento da inovação, iludem cada vez 20 SCHONBERGER, Richard J. Técnicas industriais japonesas: nove lições ocultas sobre simplicidade. 2. ed. São Paulo: Pioneira, 1984, p. 34. 21 Logística Descomplicada. Terremotos, vulcões e outros riscos para as cadeias de suprimentos. Disponível em: <http://www.logisticadescomplicada.com/terremotos-vulcoes-e-outros-riscos-para-as-cadeias-de- suprimentos/>. Acesso em: 20 ago. 2015. 22 MORATO LEITE, José Rubens; VENÂNCIO, Marina Demaria. O dano moral ambiental na perspectiva da jurisprudência do STJ: uma nova hermenêutica ambiental na sociedade de risco. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, v. 75, jul. 2014, p. 117. 23 Nesse sentido, explicam: “Os conhecimentos tecnológicos e científicos, que deveriam ter o desenvolvimento, o bem-estar social e a dignidade e qualidade da vida humana como suas finalidades maiores, passam a ser, em decorrência da sua instrumentalização inconsequente levada a cabo pelo ser humano, com todo o seu poder de criação e destruição, a principal ameaça à manutenção e à sobrevivência da espécie humana, assim como de todo ecossistema planetário, caracterizando um modelo de sociedade de risco, como bem diagnosticou o sociólogo alemão Ulrich Bech” (SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito constitucional ambiental: estudos sobre a constituição, os direitos fundamentais e a proteção do ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 31). 18 mais as instituições de controle e proteção da sociedade industrial”. 24 Nela, os desastres, que eram tradicionalmente vislumbrados somente sob a ótica casuística, passam a ganhar dimensões humanas. 25 E, nesse caso, a potencialização para a ocorrência de eventos adversos se dá como reflexo do aumento do risco e da incerteza. 1.2.2 Crescimento populacional e ocupação do solo A combinação de crescimento populacional com a ocupação do solo de forma desordenada corrobora para a intensificação de desastres. Nas palavras de Dill, o “crescimento [...] é causa e consequência da urbanização caótica, com [a presença d]os corolários indissociáveis: ocupação de fundos de vales e várzeas, poluição hídrica, destruição da flora e da fauna, esgotamento sanitário, drenagem, serviços e geração de empregos”. 26 Pensando na questão urbana, o relatório Perspectivas Globais de Urbanização, elaborado pela Divisão de População do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (DESA), destaca que, de 1990 até 2014, as megacidades, aquelas com população superior a 10 milhões de habitantes, saltaram do número de 10 para 28. 27 Para Carvalho, é inegável que os desastres que ocorrem em áreas densamente povoadas têm suas consequências ampliadas, tanto em aspectos físico-estruturais, como em pessoas afetadas e serviços ecossistêmicos danificados. Esse cenário se explica em razão dos riscos de desastres serem altamente concentrados geograficamente, fruto do crescimento populacional global e de uma tendência de concentração populacional em áreas ambientalmente vulneráveis. Em outras tintas, pode-se dizer que a característica destes desastres é marcada pela ocorrência de eventos que, apesar de pontuais, apresentam 24 LASH, Scott; SZERSZYNSKI, Bronislaw & WYNNE, Brian (Coord.). Risk, environment & modernity: towards a newecology. Londres: Sage Publications, 1998, p. 27. 25 Délton Winter de Carvalho explica que “[...] há, nitidamente, na história, uma passagem de um momento em que os desastres eram compreendidos apenas como eventos divinos, incontroláveis e exteriores, para um momento em que estes servem como parâmetro que justifica à antecipação racional, seja a partir das informações científicas disponíveis ou mesmo dos aprendizados obtidos com o passado” (CARVALHO, Délton Winter de. Por uma necessária introdução ao direito dos desastres ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, ano 17, v. 67, 2012, p. 108). 26 DILL, Silvana Oliveira. Populações vulneráveis e a suscetibilidade aos efeitos dos desastres ambientais: uma abordagem jurídica. 2013. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 53. 27 ONU. Cidades terão mais de 6 bilhões de habitantes em 2050, destaca novo relatório da ONU. Disponível em: < http://www.onu.org.br/cidadesterao-mais-de-6-bilhoes-de-habitantes-em-2050-destaca-novo-relatorio- da-onu/>. Acesso em: 05 set. 2015. 19 uma crescente magnitude em razão de sua ocorrência em áreas com grandes concentrações populacionais e bens econômicos vulneráveis. 28 Além disso, as decisões de ocupação do solo também consistem em fatores de incremento dos riscos e custos decorrentes dos desastres. A ocupação de áreas de risco 29 é um fator determinante para a ocorrência ou o agravamento de um evento à condição de desastre. É a partir da ocupação de áreas especialmente vulneráveis que se tem uma intensificação das probabilidades e magnitudes de riscos de inundações, deslizamentos, terremotos, incêndios, entre outros. Este fator de agravamento de riscos catastróficos é especialmente relevante no caso brasileiro, uma vez os desastres ambientais, cada vez mais constantes no país, apresentam relação direta com a ocupação irregular de áreas ambientalmente protegidas (vegetação em topo e encostas de morros, nas margens de rios, lagos e lagoas artificiais, etc.). 30 1.2.3 Infraestrutura verde e construída A doutrina especializada chama a atenção para a questão da infraestrutura verde e construída. Em consonância com Carvalho, “a importância da infraestrutura verde ou natural 31 , como elemento de proteção a desastres, se dá em razão dos serviços prestados pelos recursos naturais, justificando uma atenta manutenção e monitoramento destes bens”. 32 Estes bens podem ajudar a lidar com os desastres em duas formas: em primeiro lugar, atuarão como um bloqueio natural aos impactos de um desastre, diminuindo ou desviando as forças da natureza da direção das comunidades humanas; em segundo lugar, no cenário pós-impacto, servirão para prover bens e serviços de fundamental importância para a recuperação econômica e física do local atingido. 28 CARVALHO, Délton Winter de. Por uma necessária introdução ao direito dos desastres ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, ano 17, v. 67, 2012, p. 113. 29 “Áreas de risco são regiões onde é recomendada a não construção de casas ou instalações, pois são muito expostas a desastres naturais, como desabamentos e inundações. Essas regiões vêm crescendo constantemente nos últimos 10 anos, principalmente devido à própria ação humana.” (UNICAMP. Mapeamento de áreas de risco. Disponível em: < http://www.unicamp.br/fea/ortega/temas530/ricardo.htm>. Acesso em 28 ago. 2015). 30 Na mesma linha de discussão, vide: FERREIRA, Ximena Cardozo. Políticas públicas e áreas de preservação permanente: instrumentos de implementação. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n. 62, nov. 2008/ abr. 2009, pp. 69-92. 31 O sentido atribuído à infraestrutura verde é constituído em distinção àquilo que tradicionalmente se chama de infraestrutura (cinza ou construída), tendo como exemplo as barragens, as estradas e outras obras de engenharia civil. A infraestrutura natural tem como espécies as áreas alagadas, as florestas, os marismas, as dunas, as restingas, entre outros ecossistemas capazes de atuar como proteção a desastres naturais. 32 CARVALHO, op. cit., p. 115. 20 Sob esta perspectiva, a observação do meio ambiente como infraestrutura verde demonstra não apenas sua condição de bem ambiental, aqueles que, segundo Lemos, “são aqueles que têm relevância para a sadia qualidade de vida e devem ser preservados para as presentes e futuras gerações”, 33 mas também de serviços ecossistêmicos 34 , o que encoraja a uma maior valorização no monitoramento, manutenção e recuperação destas áreas. Assim como a infraestrutura natural, a construída também apresenta uma relevância essencial de serviço e função pública de proteção a desastres. Nesta espécie, que adota uma perspectiva mais tradicional, destaca-se a importância da qualidade da concepção, da construção e, sobretudo, da manutenção destas obras de engenharia civil. A potencialização de efeitos adversos ocorre quando estes bens, tanto os ambientais, quanto os construídos pelo fazer humano, não estão protegidos e preservados, para os casos dos serviços ecossistêmicos, ou quando não estão adequados à realidade dos locais em que foram edificados, para os casos da infraestrutura cinza. A título exemplificado, pode-se citar o caso de um conjunto habitacional que, após desmatamento da região do entorno, destruiu as nascentes, ficando sem água (falta de infraestrutura verde 35 ); ou, então, a construção de prédios, em regiões sujeitas a terremotos, sem a devida tecnologia para suportar os tremores (falta de infraestrutura construída adequada). 1.2.4 Mudanças climáticas O fenômeno das mudanças climáticas vem ocupando posição de destaque nas discussões internacionais e nas agendas de governos, de empresas e da sociedade como um todo. As evidências científicas fizeram com que os governos, no início da década de 1990, buscassem se mobilizar para enfrentar o desafio e seus impactos. 36 Para Carvalho e 33 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente e responsabilidade do proprietário: análise do nexo causal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 102. 34 Para uma melhor compreensão da importância dos serviços ecossistêmicos, vide: CARVALHO, Délton Winter de. Os serviços ecossistêmicos como medidas estruturais para prevenção dos desastres. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 52, n. 206, abr./jun. 2015, p. 53-65. 35 Para compreender a relação entre áreas verdes urbanas e justiça ambiental, vide: MORO, Carolina Corrêa; MANTELLI, Gabriel Antonio Silveira; PROVASI, Gisela; BURJATO, Juliana de Faria; NAKANO, Juliana Mary Yamanaka; REBELLO, Leonardo Fernandes; SIQUEIRA, Mariana Hanssen Bellei Nunes de; DUQUE, Vinicius. Áreas verdes urbanas e o ideário de justiça ambiental nas políticas públicas municipais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE DIREITO AMBIENTAL, 19., 2014, São Paulo. Anais… São Paulo: Instituto Planeta Verde, 2014, v. 2., p. 73-84. 36 BRACCINI, Bruna Zaccaro. O Poder Público e as mudanças climáticas: breve avaliação sobre a estrutura e os instrumentos adotados. In: LAVRATTI, Paula Cerski; PRESTES, Vanêsca Buzelato. (Org.). Direito e mudanças climáticas: estudos acadêmicos. Vol. 5. São Paulo: Instituto Planeta Verde, 2010, p. 109. 21 Damacena, “a mudança climática é um problema inerentemente intergeracional com implicações extremamente sérias para a equidade entre nós e as gerações futuras e entre as comunidades no presente e no futuro”. 37 Dentro desse contexto, a relação entre os desastres e as mudanças climáticas é clara e não pode ser ignorada. Em 1988, foi criado o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), órgão dasNações Unidas, cujo primeiro relatório, 38 datado de 1990, admite a alteração climática e incita a assinatura de um tratado para lidar com o assunto. Em razão dessas previsões, foi assinada, em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento (ECO/92), a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, com o objetivo de estabilizar a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático. Em 2007, por sua vez, especialistas do IPCC divulgaram paradigmático relatório sobre as mudanças climáticas, atribuindo às atividades humanas o aquecimento global. Em termos gerais, “o relatório traz previsões alarmantes, como, por exemplo, aumento da temperatura média global entre 1,8º C e 4º C até 2100, derretimento das geleiras e calotas polares, elevação do nível dos oceanos acompanhada de tempestades tropicais e de furações”. 39 Os estudos demonstram que “a alteração da frequência e intensidade dos estados atmosféricos extremos, juntamente com o aumento do nível do mar, teriam efeitos majoritariamente adversos sobre os sistemas humanos”. 40 O mais recente relatório do IPCC, datado de 2014, confirma o estado da arte na temática e sugere que sejam adotadas medidas urgentes para que a situação climática não se agrave ainda mais. 41 De acordo com Carvalho, “as mudanças climáticas podem ser tratadas como um fator global e transversal a todos os demais fatores na amplificação dos riscos e dos custos 37 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A intensificação dos desastres naturais, as mudanças climáticas e o papel do direito ambiental. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 49, n. 193, jan./mar., 2012, p. 87. 38 IPCC. Climate change - The IPCC Scientific Assessment. 1990. Disponível em: < https://www.ipcc.ch/ipccreports/far/wg_I/ipcc_far_wg_I_full_report.pdf>. Acesso em: 25 set. 2015. 39 FURLAN, Melissa. Mudanças climáticas e valoração econômica da preservação ambiental: o pagamento por serviços ambientais e princípio do protetor-recebedor. Curitiba: Juruá, 2010, p. 88. 40 LAVRATTI, Paula Cerski; PRESTES, Vanêsca Buzelato. Diagnóstico de legislação: identificação das normas com incidência em mitigação e adaptação às mudanças climáticas – Desastres. São Paulo: Instituto Planeta Verde, 2010, p. 6. 41 GREENPEACE. Relatório final do IPCC não deixa dúvidas: precisamos agir. 02 nov. 2014. Disponível em: <http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/Relatorio-final-do-IPCC-nao-deixa-duvidas-precisamos- agir-agora/>. Acesso em: 08 out. 2015. 22 envolvendo a ocorrência de desastres naturais e mistos”. Uma das causas do atual cenário de complexidade advém do fato de que “a potencialização da complexidade dos problemas postos pelas mudanças climáticas combinam questões tradicionais de controle de poluição com temas que dizem respeito a compensação, seguros e resiliência, numa dimensão de grande especificidade inerente a ocorrência de desastres”. 42 Para o autor, esse quadro refletirá na aproximação cada vez maior entre a tutela preventiva dos desastres com os mecanismos jurídicos do direito ambiental. 43 Fernandes afirma que “os efeitos diretos do aquecimento global repercutirão principalmente sobre atividades climato sensíveis, como a agricultura, piscicultura e o extrativismo, mas também terão efeitos indiretos sobre a saúde humana, segurança alimentar, cidades, habitação e indústrias”. Assim, estudar a questão da mudança do clima e formatar normas de prevenção e de adaptação é essencial em decorrência das consequências desse cenário extremo, porque “o aquecimento global e as mudanças climáticas podem conduzir à escassez de recursos naturais em certas regiões, prejudicando o sustento das pessoas”. 44 Em suma, portanto, e com base nos dados do cenário científico atual, as mudanças climáticas propiciam o aumento de eventos climáticos e meteorológicos extremos, principais causas de desastres em todo o globo. 1.3 Fatores transversais intrínsecos aos desastres Com a intenção de diminuir o número cada vez maior de desastres, a academia e as políticas globais têm trazido à tona a necessidade de se modificar a gestão dos riscos, voltando-se para o desenvolvimento de ferramentas capazes de antecipá-los. 45 Com isso em mente, tem-se que, em decorrência da complexidade em sua formação, um desastre 42 CARVALHO, Délton Winter de. Por uma necessária introdução ao direito dos desastres ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, ano 17, v. 67, 2012, p. 113. 43 Igualmente, afirma que “as mudanças climáticas irão, indubitavelmente, intensificar a conexão entre as questões envolvendo desastres e o meio ambiente, numa intensificação das relações entre a regulação dos desastres e o Direito Ambiental” (CARVALHO, op. cit., p. 114). 44 FERNANDES, Elizabeth Alves. Meio ambiente e direitos humanos: o deslocamento de pessoas por causas ambientais agravadas pelas mudanças climáticas. Curitiba: Juruá, 2014, p. 41. 45 DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A formação sistêmica de um direito dos desastres. 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 49. 23 pode ser considerado mais ou menos grave em razão de dois fatores transversais: grau de vulnerabilidade da comunidade impactada e grau de resiliência frente ao efeito adverso. 46 Entender os conceitos de vulnerabilidade e resiliência, a fim de diferenciá-los, é importante para configurar e quantificar riscos e possíveis danos socioambientais inerentes ao quadro de um desastre. É o que se passa a demonstrar. 1.3.1 Vulnerabilidade De acordo com a International Federation of Red Cross and Red Crescent Societies (IFRC), os desastres resultam de um perigo combinado com vulnerabilidade e a incapacidade para reduzir suas consequências negativas potenciais. Tendo em vista essa ideia, a conceituação de vulnerabilidade é essencial, pois ela é justamente a face explicativa da multicausalidade que gerará reflexos superpostos nos contextos de crise ambiental e nos efeitos socioambientais decorrentes dos desastres. 47 O termo vulnerabilidade, segundo Dill, foi elaborado dentro dos estudos da engenharia da estrutura com o fim de mostrar como as características construtivas poderiam fazer as edificações mais propensas a sofrerem danos. 48 Recentemente, esse conceito tomou caráter multidisciplinar ao contemplar não apenas aspectos estruturais, mas também sociais e humanos. Conforme a contribuição de Damacena, “por vulnerabilidade entende-se um rótulo, uma característica dos indivíduos, dos grupos e dos contextos em que vivem o que influencia sua capacidade de antecipar, lidar e resistir a um determinado desastre”. 49 Em um cenário global, utilizando as palavras de Fernandes, a questão da vulnerabilidade “parte da premissa de que os países e as pessoas não estão em posição semelhante no que se refere às condições ambientais disponíveis, bem como quanto à capacidade de 46 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 55-56. 47 IFCR. What is a disaster? Disponível em: <https://www.ifrc.org/en/what-we-do/disaster- management/about-disasters/what-is-a-disaster/>. Acesso em: 16 jun. 2015. 48 DILL, Silvana Oliveira. Populações vulneráveis e a suscetibilidade aos efeitos dos desastres ambientais: uma abordagem jurídica. 2013. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 57. 49 DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A formaçãosistêmica de um direito dos desastres. 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 50. 24 enfrentamento dos efeitos da degradação ambiental, desastres naturais e impactos das mudanças climáticas”. 50 Carvalho e Damacena apontam que uma das definições mais conhecidas da vulnerabilidade é a elaborada pela International Strategy for Disaster Reduction (UN- ISDR), em que “vulnerabilidade são as condições estabelecidas por fatores ou processos físicos, sociais, econômicos e ambientais, que aumentam a suscetibilidade de uma comunidade ao impacto dos riscos e perigos”. 51 Além disso, indicam que as tentativas teóricas de sistematização de modelos acerca da vulnerabilidade normalmente passam por uma abordagem atrelada à ideia de risco. 52 Sobre o risco, Jacob, citando Lenzi, explica que “o risco é inerente à vida e constitui-se uma construção social” e que, segundo Magnelli, Veyret e Richemond, “é um perigoso possível relacionado à probabilidade de ocorrência de efeitos adversos por meio da exposição e vulnerabilidade dos atores”. 53 Fragoso, por sua vez, recorre a Cutter para dispor que “os riscos a desastres são socialmente construídos e resultam da combinação de ameaças associadas às condições de como uma população pode lhe enfrentar”. E, por essa razão, “sua ocorrência resulta da probabilidade que um fenômeno ameaçador (natural ou antrópico) atua sobre um sistema socioeconômico com certo nível de vulnerabilidade, resultando num desastre”. 54 Ainda que variada a conceituação, 55 pode-se afirmar que existe certo consenso no sentido de que a vulnerabilidade é determinada não apenas pela falta de riqueza, porém por um conjunto complexo de fatores físicos, econômicos, políticos e sociais ou, ainda, pela predisposição de uma comunidade a danos causados por um fenômeno desestabilizador 50 FERNANDES, Elizabeth Alves. Meio ambiente e direitos humanos: o deslocamento de pessoas por causas ambientais agravadas pelas mudanças climáticas. Curitiba: Juruá, 2014, p. 25. 51 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 56. 52 CARVALHO; DAMACENA, op. cit., pp. 56-57. 53 JACOB, Amanda Martins. Vulnerabilidade socioambiental no município de São Paulo: análise das capacidades e liberdades humanas. 2013. 183 f. Dissertação (Mestrado em Ciência Ambiental) – Universidade de São Paulo, São Paulo, p. 37. 54 FRAGOSO, Maria de Lourdes de Carvalho. Desastre, risco e vulnerabilidade socioambiental no território da Mata Sul de Pernambuco/Brasil. 2013. 133 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, p. 47 e 48. 55 A Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei Federal nº 12.187/2009) traz a seguinte conceituação para vulnerabilidade (art. 2º, X): “grau de suscetibilidade e incapacidade de um sistema, em função de sua sensibilidade, capacidade de adaptação, e do caráter, magnitude e taxa de mudança e variação do clima a que está exposto, de lidar com os efeitos adversos da mudança do clima, entre os quais a variabilidade climática e os eventos extremos”. 25 envolvendo um perigo. 56 Além disso, apesar da inexistência de uma única definição do termo, há concordância no sentido de que no contexto de risco atual da sociedade, a medição do elemento vulnerabilidade é uma importante ferramenta de subsídio às ciências na passagem de transição para a diminuição eficaz do risco e promoção de uma cultura e política de resistência aos desastres. 57 1.3.2 Resiliência O conceito de resiliência está intimamente ligado à vulnerabilidade, sendo um importante instrumento de gestão em termos de desastres. Damacena chama atenção para o fato de que, em relação às palavras, “a linha que os une ou divide é tão tênue que muitos autores as consideram sinônimos. Uns consideram a falta de resiliência um dos fatores de aumento da vulnerabilidade, outros, ainda, apenas de não negarem a conexão dos termos, elencam algumas diferenças entre eles”. 58 Fernandes resgata a origem conceitual do termo e explana que “resiliência é um termo retirado da física, que consiste na capacidade dos materiais de resistirem a choques e de voltarem ao seu estado anterior depois de terem sofrido pressão ou de não deformarem após a pressão”. Segunda a autora, a ideia foi transferida para o campo da biologia com o significado de capacidade de recuperação dos ecossistemas. Reporta que “no âmbito da ecologia, o termo resiliência é bastante utilizado e constitui componente central na adaptação de indivíduos e grupos sociais, inclusive do direito, de resistir a choques e a tensões ambientais”. 59 O curso de Capacitação Básica em Proteção e Defesa Civil, desenvolvido pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC) em parceria com o Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres (CEPED/UFSC), recorre à International Strategy for Disaster Reduction (UN-ISDR) para explicar que a expressão resiliência é entendida como “a capacidade de um sistema, comunidade ou sociedade, 56 DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A formação sistêmica de um direito dos desastres. 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 51. 57 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, pp. 57-58. 58 DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A formação sistêmica de um direito dos desastres. 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 55. 59 FERNANDES, Elizabeth Alves. Meio ambiente e direitos humanos: o deslocamento de pessoas por causas ambientais agravadas pelas mudanças climáticas. Curitiba: Juruá, 2014, p. 149. 26 potencialmente exposta a ameaças, para adaptar-se, resistindo ou modificando, com o fim de alcançar ou manter um nível aceitável em seu funcionamento e estrutura”. O documento ainda aponta que a resiliência vem determinada “pelo grau em que o sistema social é capaz de organizar-se para incrementar sua capacidade de aprender com os desastres passados, a fim de proteger-se melhor no futuro e melhorar suas medidas de redução de riscos”. 60 Pode-se dizer, utilizando outras palavras, que a resiliência é a capacidade de indivíduos, comunidades, instituições, empresas e sistemas se adaptarem e crescerem para sobreviver, não importando que tipo de estresses e choques venham a experimentar. A resiliência permite que as pessoas e os sistemas se recuperem mais fortes, depois de tempos difíceis, e vivam melhor nos tempos bons. De acordo com Dill, “entende-se que resiliência é diferente de vulnerabilidade, pois aquela assume um papel importante após o fato (desastre) e está relacionada à reconstrução das comunidades destruídas”, sendo que “resiliência é a capacidade de voltar ao status quo ante, e isso requer extraordinários recursos humanos e materiais”. 61 Para exemplificar, pode-se citar o exemplo do Japão, país que é naturalmente vulnerável a terremotos, mas que é bastante resiliente porque possui instrumentos estruturais e não estruturais competentes para gestão dos riscos inerentes a tal situação. Um dos principais desafios contemporâneos é o decrescimento da vulnerabilidade e o crescimento da resiliência. A Organização das Nações Unidas, atenta a essa realidade, lançou em 2013 o relatório Povos resilientes, planeta resiliente – Um futuro digno de escolha, atestando que é preciso diminuir a vulnerabilidade por meio da garantia de princípios fundamentais, como a promoção dos direitos humanos e do avanço na igualdade de gênero,e que é necessário aumentar a resiliência por meio de redes sólidas de segurança, redução de risco de desastres e planos de adaptação. 62 60 FURTADO, Janaína et al. Capacitação básica em defesa civil. 5. ed. Florianópolis: CEPED UFSC, 2014, p. 48. 61 DILL, Silvana Oliveira. Populações vulneráveis e a suscetibilidade aos efeitos dos desastres ambientais: uma abordagem jurídica. 2013. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 73. 62 ONU. Povos resilientes, planeta resiliente: um futuro digno de escolha. Nova Iorque: Nações Unidas, 2012. 27 1.4 Acepção jurídica para os desastres Dado o exposto até o momento, pode-se afirmar que os desastres são eventos repentinos e dinâmicos, contemporaneamente potencializados por diversos fatores, afetando de forma mais intensa populações e sistemas vulneráveis. O quadro que se apresenta dificulta não apenas a nitidez da importância e da função do Direito no tratamento desses eventos, como também acaba por dificultar a própria operacionalidade deste no enfrentamento dessas situações extremas. Desastres geram instabilidade em diversos campos da atividade humana (socioambiental, econômica, institucional). Em outras palavras, “os desastres surgem como estímulos que causam um processo de auto-irritabilidade no Direito, na Política, na Economia e em outros sistemas sociais”. 63 Emoldurar um quadro jurídico, seguindo a doutrina especializada, se faz necessário porque o Direito tem a função de fornecer estabilidade pela normatividade, tanto para evitar como para responder ao caos trazido pelo desastre, provendo expectativas (regulação) às ações de antecipação e resposta por meio de instrumentos reguladores. Carvalho defende que “a ênfase desta estrutura normativa deve ser eminente preventiva, mediante a imposição de estratégias estruturais (obras de engenharia civil combinados com serviços ecossistêmicos) e não estruturais (mapas de risco, planos de contingência, etc.)”. 64 Damacena contribui para o debate afirmando a necessidade de um repensar jurídico para a questão. As novas questões ecológicas (desastres) entram cada vez mais em rota de colisão com o antropocentrismo, o individualismo e as estruturas tradicionais normativas do Direito, arraigadas a noção da certeza e do passado. Em viés totalmente oposto a essas noções, os desastres, fenômenos multicomplexos, requerem uma resposta do Direito que permita a assimilação dos riscos, que privilegie o antropocentrismo alargado e uma “epistemologia da complexidade”. Não há como responder adequadamente a casos complexos de maneira simples, com decisões orientadas por opções com base no passado. Os desastres exigem, por assim dizer, maior abstração e complexidade do Direito. Apenas de muitas vezes aparentarem 63 DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A formação sistêmica de um direito dos desastres. 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo – p. 127. 64 CARVALHO, Délton Winter de. Bases estruturantes da política nacional de proteção e defesa civil a partir de um direito dos desastres ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, v. 72, 2013, p. 18. 28 baixa probabilidade, alguns podem redundar em grandes magnitudes, pelo que não há como esperar sua ocorrência. 65 No caso brasileiro, em que historicamente as estruturas político-jurídicas se caracterizam pela deficiente preocupação com a temática, é fundamental que o Estado e o Direito se atualizem 66 para que, então reajustados, sejam eficazes na prevenção e na mitigação dos danos socioambientais desse novo panorama de excessiva interferência humana nos recursos naturais e de altos riscos de desastres. 65 DAMACENA, op. cit., p. 130. 66 É o que constata a mais sólida doutrina: “A inexistência de uma estrutura jurídica específica para o tratamento dos desastres ambientais (naturais e antropogênicos) bem como a intensificação de tais eventos no país, nos últimos anos, lança a necessidade da constituição de uma análise [...] destes eventos e sua relação com o direito ambiental. Da mesma forma, o déficit de estruturação deste tema nos diversos sistemas sociais (política, direito, economia, técnica) torna determinadas regiões do planeta ainda mais vulneráveis em relação a tais eventos.” (CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 24). 29 2 DIREITO DOS DESASTRES Segundo Carvalho e Damacena, “o Direito dos Desastres é um ramo multidisciplinar que se relaciona com diversas áreas de aplicação do Direito, tais como: propriedade, ordenamento do solo, [...] direito do ambiente, direito administrativo”.67 Os mesmos autores recorrem à doutrina norte-americana para expor que esse ramo do direito “consiste num complexo e multifacetado ramo do Direito que, ante uma premente necessidade de sistematização, apresenta uma abordagem ponderada para gerenciar o caos dos desastres”. 68 Ao longo do ciclo dos desastres, diversos ramos do direito são chamados para atuar, com a intenção de prevenir os danos catastróficos. Apesar da fragmentação das doutrinas e institutos jurídicos que recaem, muitas vezes, sobre a regulação dos desastres, esse ramo apresenta autonomia. Em primeiro lugar, essa autonomia se reflete na existência de um sistema específico formado de estatutos legais distintos. Em segundo lugar, a autonomia desse ramo consiste no fato de que as regras legais interagem em uma forma única, sempre em integração entre as fases do desastre. Não é possível, em termos de tratamento jurídico dos desastres, tratar isoladamente planejamento da ocupação do solo, resposta a desastres, mitigação e compensação a estes. De acordo com a doutrina, outros ramos não conseguem integrar estas estratégias adequadamente para a função de tratamento dos desastres, sendo necessária a especificidade funcional do Direito dos Desastres. A unidade singular deste ramo se dá na gestão de risco que, contínua e unificada, permeia a todas as fases de um desastre (ciclo do desastre) e de seu tratamento (circularidade da gestão do risco). 69 Tendo em vista tais definições iniciais, o presente capítulo se proporá a caracterizar esse ramo do direito e elencar os princípios jurídicos relacionados. Assim feito, elencará a legislação brasileira atinente à questão para, por fim, relacioná-la com o direito ambiental e os institutos clássicos do direito privado, haja vista a relevância desses dois ramos para a melhor operacionalização do direito dos desastres. 67 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p.119. 68 CARVALHO; DAMACENA, op. cit., p. 67. 69 CARVALHO, Délton Winter de. Bases estruturantes da política nacional de proteção e defesa civil a partir de um direito dos desastres ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, v. 72, 2013, p. 25. 30 2.1 Características do direito dos desastres A doutrina jurídica dos desastres “engloba um amplo corpo de pesquisa e procura informar as tomadas de decisões relacionadas a prováveis ocorrências de desastres”. Ela é caracterizada (i) pela unificação com o conceito de gestão de risco; (ii) pela multidisciplinariedade; e (iii) pela íntima ligação com a lei reguladora. 70 2.1.1 Unificação com o conceito de gestão de risco Os desafios da administração de riscos e de desastres exigem a constituição de um caminho queincorpore a gestão de riscos ao ordenamento territorial, desenvolvimento urbano, saúde, meio ambiente, mudanças climáticas, gestão de recursos hídricos, geologia, infraestrutura, educação, ciência e tecnologia e às demais políticas setoriais, tendo em vista a promoção do desenvolvimento sustentável. Em consonância com a doutrina especializada, a unificação com o conceito de gestão de risco seria a mais importante característica do direito dos desastres. Carvalho e Damacena recorrerem à lição de Daniel Farber et al para expor que isso “significa dizer que cada fase do ciclo de desastre – mitigação, resposta de emergência, compensação, assistência do governo e reconstrução – é parte deste portfólio de gerenciamento de risco”. 71 De acordo com o curso de Capacitação em Defesa Civil, 72 a questão da gestão de riscos surge metodologicamente após 1998, inspirada na realidade posta em evidência pelo desastre associado ao furacão Mitch e seus desdobramentos. 73 Foi a partir desse momento histórico que se começou a desenvolver um novo modelo que evoluiu da gestão de desastres (com ênfase na resposta) para a gestão de riscos de desastres, que envolve intenções muito bem fundamentadas de redução de risco e de desastres no contexto do planejamento do desenvolvimento. Dessa evolução, Amaral expõe que 70 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, pp. 32-34. 71 CARVALHO; DAMACENA, op. cit., p. 33. 72 FURTADO, Janaína et al. Capacitação básica em defesa civil. 5. ed. Florianópolis: CEPED UFSC, 2014, pp. 51-52. 73 O furacão Mitch afetou grandes áreas em Honduras, Nicarágua, El Salvador, Guatemala e Sul da Flórida, EUA, em outubro-novembro de 1988, causando mais de 6 bilhões de dólares de prejuízos e cerca de 18 mil mortes humanas. 31 [...] para o enfrentamento dos desastres, desenvolveu-se um ciclo de gestão do risco de desastres constituído por um conjunto de estratégias desenvolvidas em progressão, passando de planejamento de mitigação, a resposta de emergência, compensação à vítima e, finalmente, para a recuperação e reconstrução, e são desenvolvidas em progressão porque idealmente alimentam o planejamento de mitigação no sentido de que a reconstrução deve observar a prevenção de danos futuros. 74 Dentro desse ciclo, deve-se compreender que “os esforços de mitigação tentam diminuir o impacto potencial de eventos de desastres antes do fato, enquanto resposta tenta fazê-lo depois”. A compensação e a assistência governamental, por meio de seguros e de quadros jurídicos (como a responsabilidade civil), “proporcionam meios de difusão e transferência de riscos”. Por fim, a reconstrução “deve preocupar-se com o retorno ao status anterior, mas também com a possibilidade de um próximo desastre, o que envolve esforços de mitigação e de aplicação das lições de aprendizado”. 75 Vê-se um antes e um depois cíclico. A gestão corretiva do risco de desastre é qualquer atividade de gestão que aborda e busca corrigir ou reduzir o risco de desastre que já existe, por exemplo, reforçar a estrutura construtiva de um hospital que se encontra em uma área de risco de terremoto ou reposicionar uma escola que possui parte de sua construção dentro de uma área com risco de inundação. A gestão prospectiva do risco de desastre é qualquer atividade de gestão que aborda ou busca evitar o aumento ou o desenvolvimento de novos riscos de desastres – por exemplo, localizar uma área segura para construir uma nova escola ou hospital evitando riscos futuros. O que há em comum em todas estas etapas é exatamente a necessária gestão de riscos, em cada uma destas fases, em suas especificidades funcionais. Por essa razão, o direito dos desastres é unificado pela gestão do risco. Em outras palavras, o elo de ligação entre os elementos desta estrutura é fornecido por uma necessária gestão dos riscos em todos estes momentos, de forma circular. 2.1.2 Multidisciplinaridade 74 AMARAL, Marcia do. O papel do direito urbanístico na sociedade potencializadora de desastres. 164 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2013, p. 43. 75 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 33. 32 A multidisciplinariedade pode ser compreendida como o exame, avaliação e definição de um único objeto por meio de diversos olhares de diferentes disciplinas. Uma vez que os riscos e os desastres compreendem acontecimentos complexos, “a compreensão dos eventos determinantes para o seu desencadeamento requer o trabalho conjunto e complementar de equipes de pesquisa de áreas diferentes”. 76 No contexto do direito, é por meio do cruzamento das informações de diferentes áreas do conhecimento (engenharia, geologia, ecologia) que se desenvolvem estratégias e mecanismos jurídicos para a não repetição dos erros do passado e para a criação de pontes para a antecipação em relação aos riscos futuros. A legislação brasileira, conforme se pormenorizará a frente, leva em conta essa necessidade de intersecção de saberes quando, por exemplo, exige cartas geotécnicas (afetas à engenharia) para identificação e mapeamento de áreas de risco (exigência legal 77 ). 2.1.3 Estrita ligação com a lei reguladora Para a melhor doutrina, o direito dos desastres está intimamente ligado à lei reguladora, notadamente com o planejamento do uso do solo e com o controle de riscos socioambientais. 78 Além de não serem simplesmente acidentes ou atos de força maior, os desastres envolvem também outra espécie de participação humana: o fracasso do sistema legal para enfrentar eficazmente os riscos. Em situações como a dos riscos nucleares, por exemplo, vislumbra-se uma estreita relação entre um acontecimento súbito e catastrófico com um problema ambiental de longo prazo caracterizado pela falha regulatória. Nesse contexto, uma legislação ambiental eficaz diminui a probabilidade e gravidade dos desastres naturais. 2.2 Principiologia aplicável Pode-se dizer que princípios são juízos abstratos de valor que orientam a interpretação e a aplicação do Direito. Acentua Bandeira de Mello que princípio é, por 76 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 32. 77 Conforme art. 42 A, § 1º, da Lei Federal nº 12.608/2012. 78 CARVALHO; DAMACENA, op. cit., p. 34. 33 definição, mandamento nuclear de um sistema, “verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que ser irradia sobre diferentes normas, compondo o espírito delas e servindo de critério para exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo”. 79 Ao distinguir regras de princípios, Humberto Ávila expõe que as regras são normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência, sempre centrada na finalidade que lhes dá suporte ou nos princípios que lhes são axiologicamente sobrejacentes, entre a construção conceitual da descrição normativa e a construção conceitual dos fatos. Já os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção. 80 Ordenar a base principiológica aplicável ao direito dos desastressustenta o desenvolvimento da autonomia desse recente ramo do direito. Em consonância com os estudos de Carvalho e Damacena, “apesar da inexistência de uma principiologia consolidada para a gestão dos riscos ambientais a partir de decisões jurídicas, tem-se, na doutrina e em documentos normativos internacionais, a ‘fixação de valores limites’ que acabam por convergir em pontos comuns, a fim de formar um sistema de princípios jurídicos orientadores do controle dos riscos ambientais (administrativa e judicialmente)”. 81 Dentro do direito dos desastres, a doutrina brasileira elenca os princípios (i) da proporcionalidade, (ii) da precaução e da prevenção, (iii) da informação e da participação, (iv) da fundamentação e (v) da adaptabilidade 82 , os quais serão abordados a seguir. 79 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 98. 80 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. 9. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2009, p. 78. 81 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, pp. 35-36. 82 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, pp. 36-47. 34 2.2.1 Princípio da proporcionalidade O princípio da proporcionalidade acompanha toda a história e desenvolvimento do Estado de Direito. 83 De origem administrativista, conforme Barros, “o germe do princípio da proporcionalidade, pois, foi a idéia de dar garantia à liberdade individual em face dos interesses da administração”. 84 Na lição de Bandeira de Mello, o princípio analisado “enuncia a ideia [...] de que as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade correspondentes ao que seja realmente demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas”. 85 Hely Lopes Meirelles, por sua vez, atesta que o princípio da razoabilidade envolve o da proporcionalidade, dispondo que a conjugação dos dois “objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais”. 86 Aplicado na gestão dos riscos pelo direito dos desastres, esse princípio se apresenta por meio de dois sentidos: “um voltado [...] à formação de critérios para análise da magnitude destes [riscos] e, outro, atuando como condição de possibilidade para o Direito aplicar adequadamente (proporcional) as medidas preventivas impostas aos riscos ambientais objeto de gestão”. 87 Como se vê, os dois sentidos são complementares, de modo que o primeiro sentido, aos descrever e quantificar os riscos de desastres, dá subsídios para que, no segundo sentido, se possam aplicar corretamente medidas jurídicas e fáticas de precaução. 88 83 CAMPOS, Helena Nunes. Princípio da proporcionalidade: a ponderação dos direitos fundamentais. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico, São Paulo, v. 4, n. 1, 2004, p. 26. 84 BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direito fundamentais. 2. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 35. 85 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 113. 86 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 38. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 95. 87 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 36. 88 Na lição de Carvalho e Damacena, temos: “No primeiro caso (proporcionalidade dos riscos), o potencial lesivo deve ser levado em consideração a fim de determinar a incidência do princípio da precaução, isto é, quanto mais graves os efeitos esperados, maior a relevância de sua mitigação. (...) De outro lado, as medidas preventivas impostas devem ser proporcionais à gravidade dos riscos ambientais diagnosticados a fim de permitir que se atinja o nível de proteção pretendido” (CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 36). 35 Sendo assim, vê-se que o princípio da proporcionalidade dialoga de forma retroativa com o princípio da informação e com os princípios de prevenção e de precaução, princípios que serão explicados à frente. Para Carvalho e Damacena, o princípio da proporcionalidade tem “uma função sistêmica de formar um ‘equilíbrio de interesses’, mediante a análise de necessidade, adequação e proibição de excesso nas medidas adotadas”. Quer dizer, assim, que a proporcionalidade impõe a indispensabilidade das medidas adotadas serem condizentes ao nível de proteção pretendida. 89 2.2.2 Princípios da precaução e da prevenção Os princípios da precaução e da prevenção estão entre os princípios mais importantes do direito ambiental contemporâneo, haja vista a inserção da realidade social na presença dos riscos. Milaré ensina que De maneira sintética, podemos dizer que a prevenção trata de riscos ou impactos já conhecidos pela ciência, ao passo que a precaução se destina a gerir riscos ou impactos desconhecidos. Em outros termos, enquanto a prevenção trabalha com o risco certo, a precaução vai além e se preocupa com o risco incerto. Ou ainda, a prevenção se dá em relação ao perigo concreto, ao passo que a precaução envolve perigo abstrato. 90 A doutrina de Prieur segue caminho semelhante 91 . Em seu Droit de l’environnement, o francês distingue os dois princípios. No Capítulo 2 da Primeira Parte do livro, o autor trata do princípio da prevenção, que embasa as ações administrativas de cunho preventivo, inclusive a avaliação de impactos. É o fundamento corrente das autorizações e licenças que normalmente são requeridas. No Capítulo 7, por sua vez, aborda sucintamente o princípio da precaução, a partir da irreversibilidade de certas agressões ambientais e das incertezas científica que cercam tais casos, propondo, na prática, que, em tais circunstâncias, haja uma contra perícia, invocando a legislação francesa a respeito. Além disso, são princípios que se encontram positivados no direito internacional ambiental. Assim, o Princípio 8 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e 89 Ibid., pp. 36-37. 90 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 8. ed. São Paulo: RT, 2013, pp. 262-263. 91 PRIEUR, Michel. Droit de l’environnement. 5. ed. Paris: Dalloz, 2004, pp. 71-104 e 154-155. 36 Desenvolvimento 92 , ao estabelecer que “os Estados devem reduzir e eliminar padrões insustentáveis de produção”, explicita sinteticamente a noção de prevenção. Já o Princípio 15 do mesmo documento, ao dispor que “com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério da precaução conforme suas capacidades quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação do meio ambiente” explicita o conteúdo do princípio da precaução. 93 Não resta dúvida quanto à incorporação dos princípios em tela pela legislação brasileira. O Estudo de Impacto Ambiental (EIA), previsto no art. 225, § 1º, IV, da Constituição Federal é exemplo típico do princípio da prevenção e a Lei de Biossegurança (Lei Federal nº 11.105/2005), que estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados, faz menção ao princípio da precaução aodispor no art. 1º, caput, como diretriz “o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente”. No caso dos desastres, o princípio da precaução se centraliza numa lógica de análise probabilística dos riscos ambientais 94 e “atua como um programa de decisão orientado a impor a adoção de uma obrigação geral de cautela em contextos de incerteza científica quanto às possíveis consequências de uma atividade, produto ou tecnologia”. 95 Do ponto de vista legal, tal princípio se expressa no art. 2º, § 2º, da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC), instituída pela Lei Federal nº 12.608/2012, em que se prevê que “a incerteza quanto ao risco de desastre não constituirá óbice para a adoção das medidas preventivas e mitigadoras da situação de risco”. Em relação ao princípio da prevenção, ligado aos perigos, tem-se que estabelece a prioridade da adoção de medidas preventivo-antecipatórias em detrimento de medidas 92 Em 1992, o Rio de Janeiro sediou a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Conhecida como ECO-92, o encontro resultou numa série de documentos de ordem internacional ambiental. 93 ONU. Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em: < http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf>. Acesso: 25 ago. 2015. 94 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 37. 95 Ibid., p. 38. 37 repressivo-mediadoras. Na PNPDEC, o princípio aparece como norte de uma política de abordagem sistêmica, já que as situações de desastres devem ser mais evitadas do que remediadas. Sendo assim, é diretriz dessa política a “prioridade às ações preventivas relacionadas à minimização de desastres” (art. 4º, III). Nesse tocante, Paulo Affonso Leme Machado infere que “a novidade da Lei 12.608/2012 quanto ao princípio da precaução é a ampliação das hipóteses de sua aplicação”. Segundo o autor, “não será necessário que o risco de desastre possa causar danos sérios ou irreversíveis, bastando que se configure simplesmente a probabilidade de desastre”. 96 2.2.3 Princípios da informação e da participação O acesso à informação ambiental, seja ela científica, jurídica ou política, é essencial para que o cidadão possua um arcabouço de conhecimento capaz de inseri-lo em mecanismos de participação envolvendo questões ambientais. De pronto, observa-se que informação ambiental e participação político-popular constituem dois lados de uma mesma moeda. Com esse viés, atesta Paulo Affonso: A qualidade e a quantidade de informação irão traduzir o tipo e a intensidade da participação na vida social e política. Quem estiver mal informado nem por isso estará impedido de participar, mas a qualidade de sua participação será prejudicada. A ignorância gera apatia ou inércia dos que teriam legitimidade para participar. 97 Na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ficou assentado, entre vinte e sete princípios, um que sintetiza a ideia, aqui exposta, de relação necessária entre informação e participação ambiental. O Princípio 10 esclarece que A melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a participação popular, colocando as informações à disposição de todos. Será 96 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 69. 97 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à informação e meio ambiente. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 34. 38 proporcionado o acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que se refere à compensação e reparação de danos. 98 No ordenamento brasileiro, a participação, no tocante às decisões de interesse ambiental, é garantida por meio de instrumentos jurídicos como a audiência pública prevista no art. 3º, caput, da Resolução CONAMA nº 237/1997, no curso de processos de licenciamento ambiental que demandem a realização de EIA. Para a informação ambiental, pode-se citar a edição da Lei Federal nº 10.650/2003, comumente conhecida como Lei de Acesso à Informação Ambiental, que dispõe sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos ambientais de todo o país, e da Lei Federal nº 9.795/1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental. Para a doutrina brasileira especializada, o princípio da informação desenha, juntamente com a precaução e a prevenção, uma tríade principiológica básica do direito dos desastres. 99 Carvalho e Damacena chamam a atenção para o atual estágio das democracias industriais, dispondo que a “radicalização democrática da informação técnica exerce uma ‘desmonopolização’ das informações científicas ou técnicas e decorre, exatamente, das fundações de legitimação democrática do Estado de Direito”. 100 Na esfera normativa, a PNPDEC estabelece, em seu art. 5º, XV, a implementação de um sistema integrada de informações capaz de auxiliar na previsão e no controle dos efeitos negativos de eventos adversos sobre a população, os bens e serviços e o meio ambiente. Quanto à participação, a lei prevê, em primeiro lugar, que o Poder Público deverá estimular a participação de associações diversas nas ações envolvendo desastres e, em segundo lugar, que deverá promover a capacitação de voluntários para atuação conjunta no enfrentamento dessas situações (art. 8º, XV), questões que serão exploradas no capítulo de políticas públicas. 2.2.4 Princípio da fundamentação Aplicável ao direito processual e com salvaguarda no art. 93, IX, do diploma constitucional vigente, o princípio da fundamentação, também chamado de princípio da 98 ONU. Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em: < http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf>. Acesso: 25 ago. 2015. 99 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 43. 100 Ibid., pp. 43-44. 39 motivação das decisões, encontra guarida no fato de que “todas as decisões proferidas em processo judicial ou administrativo devem ser motivadas, sendo obrigatória aos julgadores a tarefa de exteriorização das razões de seu decidir” para que com isso sejam capazes de disponibilizar “a demonstração concreta do raciocínio físico e jurídico que desenvolveu para chegar às conclusões contidas na decisão”. 101 Na contundente doutrina de Dinamarco, “para cumprir seu objetivo político e atender às exigências da Constituição e da lei, a motivação deve [...] [trazer] ao leitor a sensação de que o juiz decidiu de determinado modo porque assim impunham os fundamentos adotados”. Ainda para o professor, “a exigência de motivação adequada figura como uma garantia constitucional das mais relevantes e insere-se no quadro de imposições ao juiz e limitações à sua liberdade de atuação”. 102 Na ótica dos direito dos desastres, o princípio em tela é “importante no gerenciamento administrativo ou judicial dos riscos ambientais, por consistir em pressuposto do próprio Princípio Democrático”, de acordo com Carvalho e Damacena. Utilizando das premissasde Canotilho, os mesmos autores postulam: A obrigatoriedade uma fundamentação transparente e imparcial da decisão que impõe medidas preventivas a riscos de desastres consiste em condição para, caso necessário, sejam aprofundados os elementos constituintes destes (probabilidade/magnitude) ou para a própria análise da proporcionalidade das medidas adotadas. Assim, sob o ponto de vista da necessidade de fundamentação nas decisões administrativas para controle dos riscos ambientais, pode ser dito que: “o facto de a realidade dada poder revelar-se insuficiente para justificar a decisão é suplantado pela força da realidade construída pela Administração na sua tarefa ponderativa. Quanto maior for a incerteza, maior o cuidado que a entidade decisora deverá colocar na explanação do percurso ponderativo que a levou a adotar tal medida”. 103 Para finalizar, tem-se que o princípio da fundamentação se radica em três razões fundamentais: “(i) controle da administração da justiça; (ii) exclusão do caráter 101 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 71. 102 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. I. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, pp. 248-249. 103 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 46. 40 voluntarístico e subjetivo do exercício da atividade jurisdicional e abertura do conhecimento da racionalidade [...]; (iii) melhor estruturação dos eventuais recursos”. 104 2.2.5 Princípio da adaptabilidade Seguindo a literatura francesa, para Jadot, o princípio da adaptabilidade, ou da atualização, é um princípio específico da gestão de risco. 105 A adaptabilidade de um sistema diz respeito a sua capacidade de reagir conforme o contexto. A verificação epistemológica da incerteza do futuro requer dos processos de gerenciamento dos riscos ambientais a envergadura de adaptação contínua das decisões no âmbito da prevenção. Para a doutrina especializada, “numa dimensão temporal, a decisão tomada no presente apenas poderá representar o futuro por meio do modo da probabilidade e da improbabilidade”. 106 Nesse contexto, haveria uma “previsão provisória, cujo valor não está na segurança que esta decisão outorga, mas na rapidez e especificidade da adaptação de uma realidade”. Em tal medida, “as medidas preventivas devem ter um caráter provisório na pendência de dados científicos mais aprofundados, devendo ser periodicamente objeto de reexame de modo a ter em conta os novos dados científicos disponíveis”. Assim, recorrendo à doutrina portuguesa, afirma-se que as circunstâncias de incerteza que circundam a decisão podem justificar a introdução de mecanismos de “moldabilidade a novos dados”, impondo um “contínuo dinamismo”. 107 2.3 Análise normativa O presente tópico realizará uma análise normativa dos diplomas jurídicos associados à questão dos desastres. No âmbito internacional, a preocupação com as consequências advindas dos desastres fez com que frentes políticas diversas estudassem a questão e propusessem soluções, regramentos e quadros institucionais para operacionalizar a temática. No contexto nacional, a ocorrência de recentes desastres trouxe a necessidade 104 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 46. 105 JADOT, Benoît. Ordre public écologique et droits acquis. Administration publique, Paris, 1983, p. 22. 106 CARVALHO; DAMACENA, op. cit., p. 47. 107 Idem. 41 de atualização legislativa, o que gerou reflexos não só no ambiente da defesa civil como em outras áreas atinentes, como urbanismo e educação. 2.3.1 Reflexão e preocupação no plano internacional Ao longo do tempo, a incapacidade humana de lidar com grandes catástrofes isoladamente fez surgir um modelo de solidariedade entre os povos. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, ocorreu, no plano internacional, a elevação do indivíduo, em razão do princípio da dignidade da pessoa humana, ao status de ator de direito internacional. Por causa das barbaridades cometidas pelo holocausto nazista, o ser humano recebeu, em 1948, especial atenção da Organização das Nações Unidas por meio de Declaração dos Direitos Humanos. 108 Em razão das diversas catástrofes e dos cenários de desastres que têm gerado impacto internacional, inúmeros Estados e Organizações Internacionais têm intensificado os debates em vista da construção de normas que versem acerca da resposta a desastres. Com isso, quadros internacionais de ajuda vêm sendo regulamentados, e alternativas adequadas para facilitar e regularizar a ajuda estrangeira estão sendo desenvolvidas cada vez mais. A Assembleia Geral da ONU, realizada em 1989, aprovou a Resolução 44/236 109 , que estabelecia o ano de 1990 como início da Década Internacional para Redução dos Desastres Naturais (DIRDN). Em 1999, foi criada a International Strategy for Disaster Reduction (UN-ISDR), atual ponto focal do sistema da Organização das Nações Unidas designado para coordenar a redução de risco de desastres e para assegurar sinergias entre as atividades da ONU e organizações regionais em torno da redução de desastres e atividades nos campos socioeconômicos e humanitários. 110 Entre outras ações, a UN-ISDR coordena os esforços internacionais na redução de risco de desastres, guiando, monitorando e informando sobre o progresso na 108 LOPES, Marcelo Leandro Pereira; LOPES, Sarah Maria Veloso Freire. Direito internacional de proteção em casos de respostas a desastres. Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod= de30cdee564cda7c>. Acesso: 08 ago. 2015. 109 ONU. A/RES/44/236, 85th plenary meeting, 22 December 1989. International Decade for Natural Disaster Reduction. Disponível em: <http://www.un.org/documents/ga/res/44/a44r236.htm>. Acesso em: 7 ago. 2015. 110 FURTADO, Janaína et al. Capacitação básica em defesa civil. 5. ed. Florianópolis: CEPED UFSC, 2014, p. 47. 42 implementação do Hyogo Framework for Action (HFA), instrumento adotado em 2005 pelos Estados Membros da ONU, desenhado após a devastação do tsunami do Índico. 111 Seu objetivo geral é aumentar a resiliência das nações e das comunidades frente aos desastres e reduzir consideravelmente as perdas que ocasionaram os desastres, tanto em termos de vidas humanos quanto aos bens sociais, econômicos e ambientais das comunidades e dos países. 112 O HFA foi planejado para ser o sustentáculo normativo das ações da UN-ISDR até 2015. No mesmo ano, por meio da 3ª Conferência Mundial das Nações Unidas sobre Redução de Riscos de Desastre em Sendai, no Japão, foi estabelecido um novo marco, o Sendai Framework for Disaster Risk Reduction (Marco de Sendai), que se estenderá até 2030. 113 O Marco de Sendai estipula sete metas globais 114 , como redução da mortalidade global por desastres, por meio de quatro prioridades de são: (i) compreensão do risco de desastres; (ii) fortalecimento da governança do risco de desastres para gerenciar o risco de desastres; (iii) investimento na redução do risco de desastres para a resiliência; e (iv) melhoria na preparação para desastres a fim de providenciar uma resposta eficaz e de reconstruir melhor em recuperação, reabilitação e reconstrução. 111 UN-ISDR. Hyogo Framework for Action 2005-2015: building the resilience of nations and commuities to disaster. Disponível em: < http://www.unisdr.org/files/1037_hyogoframeworkforactionenglish.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2015.112 O HFA oferece cinco áreas prioritárias para a tomada de decisões, em iguais desafios e meios práticos para aumentar a resiliência das comunidades vulneráveis aos desastres, no contexto do desenvolvimento sustentável: (i) a redução de risco de desastre deve ser uma prioridade; (ii) conhecer o risco e adotar medidas; (iii) desenvolver uma maior compreensão e conscientização; (iv) reduzir o risco; e (v) fortalecer a preparação em desastres para uma resposta eficaz, em todos os níveis. 113 UN-ISDR. Sendai Framework for Disaster Risk Reduction 2015-2030. Disponível em: <http://www .preventionweb.net/files/43291_sendaiframeworkfordrren.pdf>. Acesso em 05 out. 2015. 114 As sete metas globais são: (i) reduzir substancialmente a mortalidade global por desastres até 2030, com o objetivo de reduzir a média de mortalidade global por 100.000 habitantes entre 2020-2030, em comparação com 2005-2015; (ii) reduzir substancialmente o número de pessoas afetadas em todo o mundo até 2030, com o objetivo de reduzir a média global por 100.000 habitantes entre 2020-2030, em comparação com 2005- 2015; (iii) reduzir as perdas econômicas diretas por desastres em relação ao produto interno bruto (PIB) global até 2030; (iv) reduzir substancialmente os danos causados por desastres em infraestrutura básica e a interrupção de serviços básicos, como unidades de saúde e educação, inclusive por meio do aumento de sua resiliência até 2030; (v) aumentar substancialmente o número de países com estratégias nacionais e locais de redução do risco de desastres até 2020; (vi) intensificar substancialmente a cooperação internacional com os países em desenvolvimento por meio de apoio adequado e sustentável para complementar suas ações nacionais para a implementação deste quadro até 2030; e (vii) aumentar substancialmente a disponibilidade e o acesso a sistemas de alerta precoce para vários perigos e as informações e avaliações sobre o risco de desastres para o povo até 2030. 43 2.3.2 Legislação brasileira aplicável O Brasil, recentemente, aumentou o número de iniciativas relacionadas à redução de riscos de desastres. Tal mudança foi motivada, entre outras razões, pelos sérios episódios de desastres no país, como as inundações ocorridas em Santa Catarina em 2008 e os deslizamentos de terra ocorridos no Rio de Janeiro em 2011. Tais eventos resultaram em milhares de mortes e desabrigados, bem como geraram grandes debates político- legislativos relacionados a como o país pode lidar melhor com futuros desastres. 115 A análise passará de um olhar constitucional da atenção dada aos desastres para uma investigação na legislação brasileira em vigor que dialoga com a temática desse trabalho. 2.3.2.1 As Constituições brasileiras e os desastres Em primeiro lugar, faz-se necessário compreender os desastres por meio do histórico constitucional aplicável à temática. Paulo Affonso Leme Machado certifica que “as Constituições do Brasil não se omitiram em tratar dos desastres e das emergências ambientais”. 116 Conforme o levantamento feito pelo autor em questão, temos o seguinte quadro: A Constituição de 1824 afirmava: “A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida, pela Constituição do Império, da maneira seguinte: XXXI – A constituição também garante os socorros públicos” (art. 179). A Constituição de 1934 previu: “Art. 5º. Compete privativamente à União: XV – organizar defesa permanente contra os efeitos da seca nos Estados do Norte”. A Constituição de 1946 dispôs: “Art. 5º. Compete à União: XIII – organizar defesa permanente contra os efeitos da seca, das endemias rurais e das inundações”. A Constituição de 1967 dizia: “Art. 8º. Compete à União: XII – organizar a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente, a seca e as inundações”. 117 115 COSTA, Karen. Analysis of legislation related to disaster risk reduction in Brazil. Genebra: International Federation of Red Cross and Red Crescent Societies, 2012, p. 5. 116 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 64. 117 Ibid., pp. 64-65. 44 Pode-se afirmar que a proteção constitucional relacionada aos desastres, no âmbito brasileiro, se inicia com a salvaguarda setorial de determinados tipos de desastres, como a seca e as inundações. Além disso, vislumbra-se que a competência do ente federal passa de um momento de segurança extraordinária para um momento de defesa permanente 118 , o que se alinha com a evolução histórico-jurídica de passagem de um momento em que as estruturas institucionais focavam no pós-desastre para um quadro em se prioriza a prevenção de desastres, pensando em um ciclo de gestão do risco. Atualmente, a Constituição Federal de 1988 utiliza a palavra “desastre” em apenas uma ocasião, quando, ao dispor sobre a inviolabilidade domiciliar, no art. 5º, XI, prevê que “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. 119 Pensando em um escopo mais amplo, dentro dos conceitos relacionados aos desastres, o diploma constitucional utiliza do vocábulo “calamidade” em cinco momentos. À título de observação, nota-se que “a locução ‘calamidades públicas’, não obstante não estar definida nas Constituições, tem um conteúdo mínimo: as secas e as inundações fazem parte das calamidades públicas”. 120 A expressão “calamidade” se apresenta pela primeira vez no art. 21, XVIII, quando se determina que compete à União “planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações”. Como dito anteriormente, 118 Nesse sentido, Machado explica: “A expressão ‘socorros públicos’ mostra que o Poder Público não pode ficar indiferente diante de danos aos indivíduos e à sociedade. A Constituição de 1824 não explica em que situação a ajuda pública deve ser concedida. Na Constituição de 1934 aponta-se a obrigação de a União organizar uma defesa permanente contra a seca nos Estados do Norte. É inserido um dever que vai permanecer até hoje: organização de uma ‘defesa permanente’, evitando-se que a ação pública seja episódica. Na Constituição de 1967, há a inserção de um novo conceito, que, também, ficará: a defesa permanente contra as calamidades públicas” (MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 64). 119 Sarlet e Weingartner Neto, refletindo sobre o instituto da inviolabilidade do domicílio, explanam que: “Ao passo que as hipóteses de flagrante delito estão definidas na legislação (o ingresso no domicílio se legitima apenas quando e se configurada a figura do flagrante) - e serão tratadas especificamente a seguir, inclusive na sua relação com a ordem judicial de busca domiciliar -, as hipóteses de desastre e prestação de socorro são de definição mais difícil, não havendo parâmetro normativo fechado para sua devida compreensão e aplicação. É certo que por desastre se deve ter acontecimento (acidente humano ou natural) que efetivamente coloque em risco a vida e saúde de quem se encontra na casa, sendo o ingresso a única forma de evitar o dano. (SARLET, Ingo Wolfgang; WEINGARTNER NETO, Jayme. A inviolabilidade do domicílio e seus limites: o caso do flagrante delito. Revista de Direitos Fundamentais e Democracia, Curitiba, v. 14, n. 14, jul./dez. 2013, p. 551). 120 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 65. 45 na Constituição atual explicita-se o modo de ação doente federal, que deve ser focado no planejamento e na promoção da defesa permanente contra as calamidades públicas. Mais à frente, a expressão é utilizada duas vezes no art. 131, dispositivo que trata da instauração do estado de defesa, sendo que a ocorrência de calamidades públicas serve como liame circunstancial para a adoção dessa legalidade extraordinária. Por fim, tem-se a utilização da expressão em outras duas ocasiões, uma ligada a questões tributárias e outra dentro do direito financeiro. O art. 148, I prevê que a União poderá instituir empréstimos compulsórios para atender a despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública. Já o art. 167, § 3º estipula que “a abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública”. Vislumbrando o sistema de competências federativas, além de competir à União planejar e promover a defesa contra as calamidades, de acordo com o art. 22, XXVIII, compete privativamente à União legislar sobre defesa civil. Em termos de matéria ambiental, a competência para legislar é concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal, em consonância com o art. 24, VI. Sem embargo, os Municípios também poderão legislar sobre a matéria quando presente o interesse local ou para suplementar a legislação federal e estadual, conforme dispõe o art. 30, I e II. No que toca à competência para o ordenamento territorial – relevante para a análise da identificação de vulnerabilidades e áreas de risco – a Carta Magna estabelece, em seu art. 21, incisos IX e XX, que cabe à União elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social, além de instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano. Já os Estados possuem competência relacionada ao planejamento – inclusive territorial – nas zonas metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões por eles constituídas, consoante art. 25, §3º. Por fim, os Municípios ostentam competência para a realização do ordenamento territorial local, mediante o planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo, conforme determina o art. 30, inciso VIII. 121 Temas esses que dialogam com desastres, como se verá à frente. 121 LAVRATTI, Paula Cerski; PRESTES, Vanêsca Buzelato. Diagnóstico de legislação: identificação das normas com incidência em mitigação e adaptação às mudanças climáticas – Desastres. São Paulo: Instituto Planeta Verde, 2010, p. 6. 46 2.3.2.2 Política Nacional de Proteção e Defesa Civil As normas infraconstitucionais que regulamentam a atuação da defesa civil muito corroboram para a estruturação de um direito aplicável aos desastres. Nesse contexto, a atual Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC), instituída pela Lei Federal nº 12.608/2012, aparece como principal marco normativo. 122 Além da PNPDEC, a Lei Federal nº 12.340/2010 e o Decreto Federal nº 7.257/2010 também surgem como instrumentos legais basilares para a temática dos desastres. Carvalho e Damacena expõem que, em sua concepção original, a Política Nacional de Defesa Civil brasileira, descrevia suas funções e objetos do tratamento dos desastres de forma estanque, sem destacar a circularidade necessária ao gerenciamento dos riscos que permeiam todas as etapas de um desastre. Já a atual PNPDEC, segundo os autores, “avança em alguns aspectos, especialmente quando dentre suas diretrizes observa-se o mandamento de abordagem sistêmica das ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação”. 123 Paulo Affonso relata o mesmo ao expor que “a Lei 12.608/2012 insere-se na contemporaneidade do tratamento dos riscos e desastres, preconizando a adoção de medidas preventivas e de medidas mitigadoras, mesmo diante da incerteza”. 124 A PNPDEC emprega o termo “desastre”, pelo menos, cinquenta e seis vezes. Algumas vezes no sentido de situação de desastre e, na maioria das vezes, como risco de desastre. O Decreto Federal nº 7.257/2010, por sua vez, traz, em seu art. 2º, II, o conceito normativo de desastre: “resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem, sobre um ecossistema vulnerável, causando danos humanos, materiais ou ambientais, e consequentes prejuízos econômicos e sociais”. Consta como princípio geral inicial da PNPDEC o dever de a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios adotarem medidas necessárias à redução dos riscos de desastre. Esse princípio norteador de toda a defesa civil é o da redução dos riscos de desastre, o que equivale a reduzir as possibilidades do surgimento de eventos graves ou o agravamento de tais eventos como inundações, deslizamentos, radiações tóxicas ou nucleares, secas e terremotos. 122 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 82. 123 Ibid., p. 77. 124 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 64. 47 As diretrizes são as estradas pelas quais há de se caminhar na implementação da Política Nacional de Proteção e de Defesa Civil. Enfatiza-se a atuação articulada dos entes federados; o planejamento com base em pesquisas e estudos; a participação da sociedade civil; a abordagem sistêmica das ações de prevenção com outras ações e a prioridade das ações preventivas relacionadas à minimização dos desastres. Dentre as diretrizes e os objetivos, destacam-se três obrigações de fazer: (i) a identificação das ameaças, suscetibilidades e vulnerabilidades a desastres; (ii) a avaliação das ameaças, suscetibilidades e vulnerabilidades a desastres; e (iii) a produção de alertas antecipados. A prevenção vai ampliando seu conceito, consistindo em colocar em questão os esquemas de desenvolvimento e pôr em relevo as causas profundas das catástrofes. Em relação à Lei Federal nº 12.340/2010, ela dispõe principalmente acerca dos seguintes aspectos: suporte financeiro do Poder Executivo Federal aos demais entes federativos afetados por desastre; requisitos para a transferência de recursos, fiscalização dos repasses de valores entre os entes federados, cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto e inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. 125 Por fim, ainda na esfera federal, relevante a menção ao Manual para a Decretação de Situação de Emergência ou Estado de Calamidade Pública, instituído pela Resolução CONDEC nº 3/1999. O documento normativo traz informações necessárias para orientar as autoridades a atuar em casos deve ser decretada situação de emergência 126 ou estado de calamidade pública 127 . A observação dos procedimentos dispostos no Manual propicia uma ação mais rápida e coordenada entre os três níveis de governo, além de permitir acesso aos recursos financeiros para fazer frente às adversidades do momento. 128 Dada a importância da atuação da defesa civil na gestão dos riscos inerentes aos desastres, retomar-se-á a discussão sobre, oportunamente no âmbito das políticas públicas. 125 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 83. 126 Em consonância com o art. 2º, III, do Decreto Federal nº 7.257/2010, a situação de emergência é a “situação anormal, provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento parcial da capacidade de resposta do poder público do ente atingido”. 127 Em consonância com o art. 2º, IV, do Decreto Federal nº 7.257/2010, o estado de calamidadepública é a “situação anormal, provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento substancial da capacidade de resposta do poder público do ente atingido”. 128 LAVRATTI, Paula Cerski; PRESTES, Vanêsca Buzelato. Diagnóstico de legislação: identificação das normas com incidência em mitigação e adaptação às mudanças climáticas – Desastres. São Paulo: Instituto Planeta Verde, 2010, p. 15. 48 2.3.2.3 Estatuto da Cidade e Lei sobre o Parcelamento do Solo Urbano A Lei Federal nº 10.257/2011, que instituiu o Estatuto da Cidade, foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro como o objetivo de regulamentar os mandamentos constitucionais contidos nos art. 182 e 183 da Lei Fundamental para, em conformidade com a análise de Paulo de Bessa Antunes, “regular o uso da propriedade urbana em benefício da coletividade, da segurança e do bem-estar dos cidadãos e, também, o equilíbrio ambiental”. 129 A Lei Federal nº 12.608/2012 (PNPDEC) trouxe alterações relevantes para o Estatuto da Cidade por meio da inclusão de dois novos artigos: 42-A e 42-B. Carvalho e Damacena resumem as novidades legislativas, dispondo que: [...] ambos estabelecem novos requisitos no plano diretor do município, quais sejam: (i) obrigatório mapeamento das áreas de risco para os municípios que fizerem parte do cadastro nacional; (ii) estipulação de parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, que promovam a diversidade de seu uso e a contribuição para geração e emprego e renda; medidas de drenagem urbana, com vistas à prevenção e mitigação de impacto de desastres; (iii) planejamento de ações de prevenção e realocação de populações em áreas de risco; (iv) diretrizes para a regulamentação fundiária de assentamentos irregulares, nos termos da Lei 11.977/2009 e previsão de áreas para habitação de interesse social. 130 Além das alterações ocorridas no Estatuto da Cidade, houve alteração na Lei sobre o Parcelamento do Solo Urbano (Lei Federal nº 6.766/1979), sendo que, conjuntamente, passaram a observar os seguintes princípios: (i) incorporação, nos elementos da gestão territorial e do planejamento das políticas setoriais, da redução de risco de desastre; (ii) estímulo ao desenvolvimento de cidades resilientes, aos processos sustentáveis de urbanização, ao ordenamento da ocupação do solo urbano e rural, tendo em vista sua conservação e a proteção da vegetação nativa, dos recursos hídricos e da vida humana e a moradia em local seguro; e (iii) extinção da ocupação de áreas ambientalmente vulneráveis e de risco e promoção da realocação da população residente nessas áreas. A legislação atinente ao direito urbanístico se conecta com a questão dos desastres de forma sistêmica: uma cidade sem vulnerabilidades e mais resiliente é um local mais 129 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 321. 130 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, pp. 92-93. 49 seguro para o ambiente humano e natural. Por tal razão, à frente, no capítulo dedicado ao estudo das políticas públicas, serão elencadas as relações pertinentes entre urbanismo e prevenção de desastres. 2.3.2.4 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional A PNPDC trouxe outra alteração importante, dessa vez no âmbito da informação e da educação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal nº 9.394/1996) passou a dispor que os currículos do ensino fundamental e médio devem incluir os princípios da Proteção e Defesa Civil e a Educação Ambiental de forma integrada aos conteúdos obrigatórios. À frente, um tópico sobre políticas públicas e informação explorará melhor essas questões. 2.3.2.5 Políticas sobre Mudança do Clima No âmbito paulista, a Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC), instituída pela Lei Estadual nº 13.798/2009 131 , inovou no plano normativo ao trazer debate da mudança do clima para o cenário jurídico-institucional. A PEMC tem por objetivo geral estabelecer o compromisso estadual paulista frente ao desafio das mudanças climáticas globais, ao dispor sobre as condições para as adaptações necessárias aos impactos derivados das mudanças climáticas, bem como contribuir para reduzir ou estabilizar a concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera. 132 No plano federal, a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), positivada pela Lei Federal nº 12.187/2009, demonstra a sensibilização legislativa brasileira a uma preocupação mundial e, também, a assunção de metas e compromissos objetivando sua mitigação. Para alcançar os objetivos da PNMC, o país adotou como compromisso nacional voluntário ações de mitigação das emissões de gases de efeito estufa, com vistas a reduzir entre 36,1% e 38,9% suas emissões projetadas até 2020. A projeção das emissões 131 A lei é regulamentada pelo Decreto Estadual nº 55.947/2010 e atua em sintonia com a Convenção do Clima da ONU. 132 SISTEMA AMBIENTAL PAULISTA. PEMC – Política Estadual de Mudanças Climáticas. Disponível em: <http://www.ambiente.sp.gov.br/o-que-fazemos/politicas/pemc-politica-estadual-de-mudancas- climaticas/>. Acesso em: 13 out. 2015. 50 para 2020, assim como o detalhamento das ações para alcançar os objetivos expressos, estão previstos no Decreto Federal nº 7.390/2010. 133 Dentro da inter-relação entre intensificação dos desastres e mudanças climáticas, vale a menção de uma das diretrizes da PNMC que é justamente a promoção e o desenvolvimento de pesquisas científico-tecnológicas e a difusão de tecnologias, processos e práticas orientados a, dentre outras finalidades, identificar vulnerabilidades e adotar medidas de adaptação adequadas. Nesse sentido, é o que dispõem as alíneas “b” e “c” do art. 5º, VI, da lei em questão. 134 2.3.2.6 Código Florestal Ainda que em nenhum momento trate especificamente de desastres ou eventos extremos, é relevante a menção ao Código Florestal (Lei Federal nº 12.651/2012). Como se sabe, grande parte dos desastres ocasionados por enchentes e deslizamentos de terra se dá justamente em função da ocupação de áreas de risco, as quais coincidem, na maior parte dos casos, com as Áreas de Preservação Permanente (APP) dispostas no art. 4º do diploma florestal 135 . Tais áreas, especialmente as encostas e as margens de cursos d´água, são altamente suscetíveis a episódios de precipitação intensa, aumentando sobremaneira a vulnerabilidade das populações ali localizadas e de seu patrimônio. O fato de que a pobreza geralmente vem associada a este tipo de ocupação só faz agravar o quadro. 2.4 Conexões com o direito ambiental e os institutos clássicos do direito privado Como forma de integralizar dois campos do direito de fundamental importância, o direito ambiental e o direito civil, o presente tópico refletirá sobre a formação de um 133 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A intensificação dos desastres naturais, as mudanças climáticas e o papel do direito ambiental. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 49, n. 193, jan./mar., 2012, p. 86. 134 LAVRATTI, Paula Cerski; PRESTES, Vanêsca Buzelato. Diagnóstico de legislação: identificação das normas com incidência em mitigação e adaptação às mudanças climáticas – Desastres. São Paulo: Instituto Planeta Verde, 2010, p. 6. 135 As APP consistem em espaços territoriais legalmente protegidos, ambientalmente frágeis e vulneráveis, podendo ser públicas ou privadas, urbanas ou rurais, cobertas ou não por vegetação nativa. Entre as diversas funções ou serviços ambientais prestados por esses espaços, pode-se citar:a proteção do solo prevenindo a ocorrência de desastres associados ao uso e ocupação inadequados de encostas e topos de morro; e a proteção dos corpos d'água, evitando enchentes, poluição das águas e assoreamento dos rios. 51 Estado Socioambiental de Direito, sobre a função socioambiental da propriedade e sobre a responsabilidade civil na ótica dos desastres. 2.4.1 Estado Socioambiental e Democrático de Direito No processo de tensionamento das estruturas jurídicas em decorrência das modificações advindas da sociedade de risco, Carvalho, recorrendo à teoria dos sistemas de Luhman, argumenta que o diploma constitucional atua como link intersistêmico fomentando o diálogo entre os sistemas político e jurídico. Dentro desse cenário, ocorre que: Do acoplamento entre os sistemas sociais e da assimilação da ecocomplexidade resultou uma ecologização do direito, a qual consiste exatamente num processo dinâmico de auto sensibilização e alteração das estruturas dogmáticas do Direito e seu aporte teórico, para fazer frente às demandas sociais oriundas da produção de riscos globais na nova estrutura social, Sociedade de Risco. 136 Em outras palavras, tem-se que a formatação da Constituição, de um aparato estatal, funciona como uma ligação entre o sistema político e o jurídico. No contexto de crise ambiental e climática atual, surge a ideia de que o Estado deve encarar essa realidade adversa para que consiga propor soluções aos cidadãos e garantir a eficácia dos direitos fundamentais. Fensterseifer elucida de forma sintética a passagem de um formato estatal e constitucional liberal para o Estado Socioambiental: [...] a proteção ambiental projeta-se como um dos valores constitucionais mais importantes a serem incorporados como tarefa ou objetivo do Estado de Direito neste início século XXI, porquanto, diante dos novos desafios impostos pela sociedade de risco diagnosticada por Beck, diz respeito diretamente à concretização de uma existência humana digna e saudável e marca paradigmaticamente a nova ordem de direitos transindividuais que caracterizam as relações jurídicas cada vez mais massificadas do mundo contemporâneo. O processo histórico, cultural, econômico, político e social gestado ao longo século XX determinou o momento que se vivencia hoje no plano jurídico-constitucional, marcando a passagem do Estado Liberal ao Estado Social e chegando-se ao Estado Socioambiental (também Constitucional e Democrático), em vista do surgimento de direitos de 136 AMARAL, Marcia do. O papel do direito urbanístico na sociedade potencializadora de desastres. 2013. 164 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 62. 52 natureza transindividual e universal que têm na proteção do ambiente o seu exemplo mais expressivo. 137 No quadro constitucional vigente, ao analisar o art. 225, Paulo de Bessa Antunes afirma que o dispositivo é “o centro nevrálgico do sistema constitucional de proteção ao MA [meio ambiente] e é nele que está muito bem caracterizada e concretizada proteção do meio ambiente como um elemento de interseção entre a ordem econômico e os direitos individuais”. 138 Com base nesse cenário, a atuação do direito ambiental diante dos desastres exige novas formas de observação e de operacionalização dos sentidos pela sociedade. Por tal razão, é que se afirma um Estado Socioambiental e Democrático de Direito, para que este seja capaz de enfrentar os desafios contemporâneos da sociedade de risco. 2.4.2 Função socioambiental da propriedade Dar função ao direito de propriedade é tirá-lo da inércia individualista dos tempos passados. É possível dizer que a função social da propriedade consiste no fato de que ela deve cumprir o destino economicamente útil, produtivo, de maneira a satisfazer as necessidades sociais atingíveis em sua espécie. Em outras tintas, a função social é o exercício regular, normal e racional da propriedade, com base nos interesses da sociedade: significa que o proprietário deve dar destinação útil à propriedade, sem a mera especulação. Toshio Mukai recorre à Léon Duguit, em seu célebre Las Transformaciones Generales del Derecho Privado, para afirmar que “a propriedade não é mais o direito subjetivo do proprietário; é a função social do detentor da riqueza”. 139 Na mesma direção, sintetiza Patrícia Faga Iglecias Lemos, de forma didática, a evolução da concepção do direito de propriedade. Segundo ela, essa concepção evoluiu ao encontro dos ideários de proteção ambiental: A propriedade afasta-se de sua abrangência clássica como direito absoluto, e a Constituição Federal de 1988 impõe o cumprimento de sua função 137 FENSTERSEIFER, Tiago. Estado socioambiental de direito e o princípio da solidariedade como seu marco jurídico-constitucional. Revista Direitos Fundamentais & Justiça, Porto Alegre, n. 2, jan./mar. 2008, p. 135. 138 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 64. 139 MUKAI, Toshio. Temas atuais de direito urbanístico e ambiental. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 19. 53 social quando dispõe a utilização do bem não mais de forma individualista, mas em consonância com os interesses da sociedade, e ao prever a proteção ao meio ambiente no art. 225 também reconhece uma função ambiental à propriedade, sendo o mesmo raciocínio válido para a posse. 140 Em tintas normativas, a Constituição Federal de 1988 dispõe no art. 5º, XXIII, que “a propriedade atenderá a sua função social” e no art. 170, III, eleva a função social da propriedade como um dos princípios fundamentais da Ordem Econômica. Para que essa função seja implementada no espaço urbano, “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”. No espaço rural, de acordo com o art. 186 do diploma constitucional vigente, a função social quando a propriedade rural atende, ao mesmo tempo, os seguintes requisitos: “I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores”. No âmbito das cidades, aliando os quadros jurídicos do direito privado com os do direito urbanístico, Mukai explica que “passa, assim, o direito de propriedade a ser restringido pelo interesse social da coletividade, devendo adequar-se às relações de vizinhança impostas pelo Direito Civil e ao interesse social concretizado nas limitações urbanísticas à propriedade particular”. 141 O mesmo autor clareia que as exigências constitucionais relativas à função social da propriedade urbana “estão consubstanciadas nas dezesseis diretrizes elencadas no art. 2º da Lei nº 10.257/01 (Estatuto da Cidade), diretrizes essas que, obrigatoriamente, deverão estar contidas no plano diretor, segundo dispõe o art. 39 do Estatuto”. 142 No estágio atual, para além da função social, a propriedade deve atender à função ambiental. Amalgamadas, tem-se o desenvolvimento da função socioambiental da propriedade, expresso no art. 1.228 do Código Civil (Lei Federal nº 10.406/2002): “o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o 140 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Resíduos sólidos e responsabilidade pós-consumo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 76. 141 MUKAI, op. cit., pp. 19-20. 142 MUKAI, Toshio. Temas atuais de direito urbanístico e ambiental.Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 20. 54 estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”. 143 Desse modo, a função socioambiental da propriedade compreende uma série de direitos e deveres que cerceiam o uso, gozo, disposição e fruição do domínio ou posse de um determinado espaço público ou privado, seja ele rural ou urbano. Esse modo de operar, notadamente em favor não só de interesses particulares, mas também de interesses sociais, se justifica na necessidade de realizar, dentro de um regime democrático de direito, o objetivo primordial de suprir carências básicas de todos os indivíduos de uma sociedade, indistintamente. 144 Na lição de Lemos: Tanto o direito de propriedade quanto a função socioambiental, bem como o princípio da livre iniciativa e a garantia de um meio ambiente sadio e equilibrado, concorrem para assegurar a todos uma existência digna, razão pela qual a propriedade deve assegurar a realização dos interesses individuais, sociais e ambientais. 145 No âmbito da gestão de risco e da prevenção da ocorrência de desastre, pode-se vislumbrar que atenderá a função socioambiental da propriedade os titulares que seguirem os padrões da segurança relativos à diminuição de riscos previstos na PNPDC. No caso das propriedades urbanas, merece especial atenção à questão dos regramentos locais estipulados pelo Plano Diretor. 2.4.3 Responsabilidade civil aplicável aos desastres A responsabilidade civil consiste em um instrumento jurídico de estímulos comportamentais, inibindo pela punição e aliviando condutas pelas excludentes. 146 Nas palavras de Lemos, “a responsabilidade civil é fonte das obrigações de extrema relevância, estendendo seus efeitos sobre as relações obrigacionais, sejam elas contratuais ou 143 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Reflexos da consagração da função socioambiental da propriedade no código civil de 2002. Revista do Advogado, n. 98, jul. 2008, p. 178. 144 GOMES, Magno Federici; PINTO, Wallace Douglas da Silva. A função socioambiental da propriedade e o desenvolvimento sustentável. Revista Magister de Direito Ambiental e Urbanístico, Porto Alegre, v. 10, n. 57, dez./jan. 2014, p. 30. 145 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiental e responsabilidade civil do proprietário: análise do nexo causal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, 92. 146 Para análise da responsabilidade civil e proteção ambiental, vide: LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Diteito ambiental: responsabilidade civil e proteção ao meio ambiente. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. 55 extracontratuais”. Nesse âmbito, a responsabilidade extracontratual é aquela que “decorre da violação dos deveres gerais de abstenção, omissão ou não ingerência que correspondem aos direitos absolutos” e a responsabilidade contratual é aquela que “decorre do descumprimento dos deveres relativos próprios das obrigações”. 147 Em termos de evolução histórica da responsabilidade civil, pode-se assegurar que ela é “marcada pela tendência de flexibilização de seus elementos caracterizadores, em claro movimento protetivo da vítima”, o que “fez com que o foco da disciplina passasse a ser gradativamente o de qualificar os eventos danosos merecedores de tutela pelo ordenamento jurídico”. 148 Tereza Ancona Lopez, nesse âmbito, mostra a evolução de paradigmas que fundamenta esse novo enfoque da responsabilidade civil: no século XIX, a responsabilização; no século XX, a solidariedade e; no século XXI, o nascimento de um novo paradigma, a segurança. 149 O fundamento da segurança, atrelado à evolução da responsabilidade civil, dialoga com a atual questão dos riscos. Em posse da doutrina portuguesa, pode-se refletir sobre o conceito de risco para o direito privado por meio de duas distinções: Com efeito, no Direito Civil, podemos começar por distinguir duas situações que envolvem o conceito de risco: (a) o risco (ou a sua gestão) como objecto do contrato (por exemplo, no contrato de seguro); (b) o risco (ou a sua distribuição) como elemento, implícita ou explicitamente, integrante do contrato. Neste segundo caso, há que diferenciar entre as consequências do estado de incerteza para os contraentes: (i) o risco surge como possibilidade de obtenção de um proveito para uma das partes, que tem como contrapartida a ocorrência de um prejuízo na esfera jurídica da outra parte: estamos no domínio dos contratos aleatórios, no qual estes efeitos se apresentam como típicos e são eles próprios os dinamizadores do contrato (v.g., contrato de aposta); (ii) o risco identifica-se com a possibilidade de ocorrência de um evento que pode pôr em causa as perspectivas de ganho de qualquer das partes relativamente ao contrato, mas que, por se conter dentro de determinadas margens de previsibilidade, não põe em causa a sua validade, nem justifica a sua modificação (v.g., num contrato de aluguer de uma bicicleta, o locatário torce um pé). 150 147 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Resíduos sólidos e responsabilidade pós-consumo. 3. ed. São Paulo: RT, 2014, p. 135. 148 LEMOS, 2014, op. cit., p. 136. 149 LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. São Paulo: Quartier Latin, 2010. 150 GOMES, Carla Amado. Subsídios para um quadro principiológico dos procedimentos de avaliação e gestão do risco ambiental. Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente, n. 17, jun. 2002, p. 141. 56 O aspecto privatista do risco contratual, ligado à ideia de incerteza de adimplemento, dialoga com as adversidades decorrentes dos desastres. Mesmo que sociologicamente estejam em planos diferentes, a responsabilidade decorrente das situações tipicamente civis reverbera para o campo da responsabilidade civil aplicável aos danos causados aos atingidos por desastres. Fensterseifer analisa a responsabilidade (objetiva) do Estado por danos causados a indivíduos e grupos sociais em razão de eventos climáticos extremos resultantes do fenômeno das mudanças climáticas, considerando os aspectos socioeconômicos que lhe são correlatos e a atuação omissiva ou insuficiente do ente estatal em face dos deveres de proteção ambiental que lhe são impostos pela legislação nacional. De acordo com o autor, “o marco normativo da justiça ambiental (e também social) serve de fundamento à responsabilidade do Estado de indenizar e atender aos direitos fundamentais das pessoas atingidas pelos desastres ambientais decorrentes dos efeitos das mudanças climáticas”. 151 Tal responsabilidade seria ensejada pela não atuação ou atuação insuficiente do Estado no tocante a medidas voltadas ao combate às causas geradoras e agravadoras do aquecimento global. Analisando as três grandes matrizes do nexo de causalidade na responsabilidade do Estado (teoria da equivalência das condições, teoria da causa próxima e da causa direta, ou teoria da causalidade adequada), inclusive à luz do art. 403 do Código Civil, vislumbra-se tendência aproximativa da jurisprudência nacional à teoria da causalidade adequada, no sentido que somente os danos direta e imediatamente vinculados ao ato ou a omissão antijurídicos praticados pela parte que de causa a eles podem ser objeto de responsabilização. Nesse sentido, tem-se decisão do Supremo Tribunal Federal 152 que aponta à necessidade de que a responsabilidade do Estado, em especial por omissão, se dê a partir da sua dimensão normativo, no sentido de aferir se ele tinha ou não o dever legal (ou constitucional) de impedir o resultado, o que vem ao encontro da interpretação da 151 FESTENSEIFER,Tiago. A responsabilidade do estado pelos danos causados às pessoas atingidas pelos desastres ambientais associados às mudanças climáticas: uma análise à luz dos deveres de proteção ambiental do Estado e da proibição de insuficiência na tutela do direito fundamental ao ambiente. Revista Magister de Direito Ambiental e Urbanístico, São Paulo, Lex Magister, n. 49, ago./set., 2013, p. 59. 152 STF. RE 372472, Relator: Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, julgado em 04/11/2003, DJ 28-11-2003 PP-00033 EMENT VOL-02134-05 PP-00929. 57 observância do princípio da legalidade inscrito no art. 37 da Carta Magna, no sentido de que ao Estado só e dado agir quando a lei previamente o permitir. 153 Para Machado, a ocorrência de desastres não gera automaticamente a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público. Recorrendo à doutrina especializada, o mesmo autor pontua que “a reponsabilidade da Administração Pública será sempre submetida à demonstração se foi o serviço público que causou o dano sofrido pelo autor, pois não está obrigado o Estado a indenizar se inexiste vínculo entre a omissão ou falha e o dano causado”. 154 Tendo em vista a vigência da PNPDC, aos entes federados competem inúmeros deveres diante da gestão de risco e da prevenção contra desastres. Sendo assim, assevera-se que “quando os Poderes Públicos deixarem de alertar os moradores de locais inundados, são eles responsáveis” e, assim como, “quando houver deslizamentos e os poderes públicos não tenham feito a evacuação das vítimas e dessa omissão tenham ocorrido danos pessoais ou matérias, inegável a responsabilidade civil do Estado”. 155 Carvalho e Damacena colaboram ao afirmar que, dado o contexto social do risco, em que na maioria dos desastres se encontram fatores antropogênicos, há [...] uma maior dificuldade na delimitação do que se trata de act of God e o que seria decorrente de act of Man, para fins de delimitação da previsibilidade ou não de um evento e, consequentemente, da incidência deste fenômeno como excludente de responsabilidade (especialmente civil e administrativa) de entes públicos e privados. 156 De acordo com Carvalho, “o aumento do conhecimento científico (sobre questões climáticas) gera uma ampliação dos deveres de proteção aos entes estatais, com a respectiva intensificação na incidência da responsabilidade civil do Estado por atos omissivos”. 157 Assim, nota-se, para esses casos, o encolhimento da força maior, devido às exigências legais de maior prevenção e o desenvolvimento de conhecimento técnico para prever desastres. 153 LEAL, Rogério Gesta. A responsabilidade civil do Estado brasileiro por omissão em face de desastres e catástrofes naturais causadores de danos materiais e imateriais a terceiros. Revista da AJURIS – Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, AJURIS, v. 37, n. 119, set., 2010, pp. 119-120. 154 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 87. 155 MACHADO, op. cit., p. 88. 156 CARVALHO, Délton Winter de; DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. Direito dos desastres. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 25. 157 CARVALHO, Délton Winter de. Responsabilidade civil do Estado por desastres naturais: critérios para configuração da omissão estatal face ao não cumprimento de deveres de proteção. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, ano 20, v. 77, jan./mar. 2015, p. 167. 58 No campo da responsabilidade das pessoas físicas e das empresas em relação aos desastres (quando estes são os causadores), Paulo Affonso, baseado também em orientação jurisprudencial, assevera que a incidência da teoria do risco integral, corporificando a responsabilidade civil independente de culpa. 158 Focado na questão dos empreendimentos e das atividades industriais, o mesmo autor chama a atenção para o fato de que “na fase do licenciamento ambiental deve ser analisada a capacidade de o requerente do licenciamento tratar o risco de desastre”, o que deve ser feito no âmbito dos estudos ambientais. Com isso, decorre a obrigação de serem feitas exigências “contra incêndios, a vazamentos de substâncias, à prestação de primeiros socorros e à realização da evacuação dos empregados e dos atingidos por acidentes e albergamento provisório das vítimas necessitadas”. 159 Em suma, portanto, ao relacionar responsabilidade civil com desastres, vislumbra- se que, no caso da responsabilidade estatal, há a tendência doutrinária e jurisprudencial de se mitigar a excludente de força maior, dado o atual cenário normativo, climático e social. Para os casos de pessoas físicas e empresas, acompanha-se a discussão ambiental quanto à teoria do risco integral, cabendo, portanto, maior tutela preventiva em todas as ações que incorrerem. 158 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 88. 159 MACHADO, op. cit., pp. 88-89. 59 3 POLÍTICAS PÚBLICAS DE PROTEÇÃO A COMUNIDADES VULNERÁVEIS Uma das grandes ameaças quanto aos riscos e a ocorrência de desastres, consoante disciplina Porto, reside quando os cidadãos e as comunidades expostas ao risco não são capazes de percebê-los, analisá-los e enfrentá-los adequadamente, intervindo em suas origens mais profundas. 160 Infelizmente, em muitas sociedades, persiste o conformismo, a imprevidência e o paternalismo político, que são os principais responsáveis pelo imobilismo e pela estagnação econômica, social, cultural e política. No caso brasileiro, vê-se que ainda são deficientes as políticas públicas que incorporem com eficiência uma cultura de prevenção de riscos aos desastres. Em casos de ocorrência de tragédias provocadas por desastres, as atitudes normalmente são focadas em ações emergenciais. As políticas que agem na redução dos efeitos dos desastres atuam de forma desarticulada, despendendo recursos públicos em soluções paliativas. 161 Como se demonstrou, a legislação atinente aos desastres modificou seu eixo norteador da resposta para a prevenção, adequando-se aos preceitos da gestão circular de riscos. Além disso, o entendimento das questões socioambientais relacionadas aos episódios extremos deve também ser levado em conta nas tomadas de decisão no âmbito jurídico e no cenário político de ação governamental. Quer dizer que considerar a percepção dos atores sociais é um indicativo importante na elaboração de políticas públicas de desastres. Assim sendo, é imprescindível promover a integração de políticas públicas, para atuar de forma eficiente sobre os problemas que são ocasionados pelos desastres no Brasil, sobretudo no que diz respeito à vulnerabilidade socioambiental das populações aos respectivos acontecimentos. Uma publicação recente da International Strategy for Disaster Reduction (UN- ISDR), intitulada Risk and poverty in a changing climate, identifica quatro estratégias para que as políticas de desenvolvimento reduzam fatores de risco de desastre, facilitem a adaptação às mudanças climáticas e favoreçam o desenvolvimento sustentável: (i) planos 160 PORTO, Marcelo Firpo de Souza. Uma ecologia política dos riscos – princípios para integrarmos o local e o global na promoção da saúde e da justiça ambiental. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2007, p. 49. 161 VENDRUSCOLO, S.; KOBIYAMA, M. Interfaces entre Política Nacional de Recursos Hídricos e a Política Nacional de Defesa Civil, com relação aos desastres hídricos no Brasil. In: PROHIMET - Jornada Internacional de Gestão de Risco de Inundações e Deslizamentos, São Carlos. PROHIMET. São Carlos: USP/EESC/DHS/NIBH, 2007, p. 15. 60 de manejo ambiental, recuperação ecuidados ambientais dos ecossistemas; (ii) ordenamento territorial e planejamento do uso do solo; (iii) fortalecimento dos meios de vida e condições sociais em zonas urbanas e rurais; (iv) e governança e governabilidade em todos os níveis de governo (nacional, estadual, municipal, local) com ampla participação da sociedade. 162 Delimitado tal cenário, o presente capítulo irá expor como a questão da vulnerabilidade, elemento transversal do direito dos desastres, aparece no âmbito socioambiental, relacionando-a com o ideário do movimento por justiça ambiental. Feito isso, passar-se-á a conceituar as políticas públicas, articulando a legislação apresentada no capítulo anterior com os temas abordados ao longo deste trabalho, quais sejam: defesa civil, urbanismo, informação, educação e participação. Ao longo da explanação, serão oportunamente apresentados programas governamentais que, na prática, inter-relacionam o direito dos desastres com a proteção de comunidades vulneráveis. Busca-se demonstrar que uma comunidade dotada de uma defesa civil eficiente, pertencente a um espaço urbano ordenado e seguro, com acesso à informação, educação e participante das decisões políticas é uma comunidade mais protegida dos efeitos adversos dos desastres. 3.1 Vulnerabilidade socioambiental e (in)justiça ambiental Como já apresentado, a sociedade contemporânea mostra-se, cada vez, carregada de riscos, ameaças e incertezas que afetam a totalidade dos aspectos da vida social. Além dos desastres que assombram populações e comunidades inteiras, as desigualdades sociais e a pobreza consubstanciam-se em meio à riqueza. Pensando no meio urbano, a segregação espacial das cidades, onde as áreas de degradação ambiental coincidem com áreas de degradação social, acaba por potencializar outros riscos e amplificar seus efeitos adversos e os danos decorrentes deles. Seja no domínio acadêmico-científico ou na arena jurídico- 162 UN-ISDR. Risk and poverty in a changing climate: invest today for a safer tomorrow. Disponível em: <http://www.asia-pacific.undp.org/content/dam/rbap/docs/Research%20&%20Publications/CPR/APRC- CPR-2009-GAR-DRR.pdf>. Acesso em: 5 mai. 2015. 61 governamental, a vulnerabilidade socioambiental apresenta-se como importante condutora das ações, análises e propostas. 163 Damacena atenta para um aspecto indiscutível: a de que as populações mais pobres são e serão as mais atingidas pelas problemáticas socioambientais. Em termos globais, a exteriorização da vulnerabilidade fica transparente quando se verifica que o impacto mais severo das mudanças climáticas, por exemplo, está sendo durante sentido pelas populações mais vulneráveis que menos contribuíram para o problema. O relatório da ONU – Millennium Development Goals Report demonstra que o risco de morte ou invalidez, e as perdas econômicas devido a desastres naturais estão aumentando globalmente, concentrados, principalmente, nos países mais pobres. Segundo o mesmo documento, estima-se que 97% do risco global de mortalidade por desastres naturais é enfrentado pelas populações de baixa renda. 164 Farber et al analisa a vulnerabilidade a partir da estreita relação entre desastre e desigualdade. Nesse escopo, o autor pondera que apesar de os terremotos e furacões não serem produtos da desigualdade, seus impactos podem cair de forma muito desigual em diferentes segmentos da sociedade. Logo, a proporção no impacto de um desastre está intimamente relacionada a fatores como gênero, idade e raça. Aqueles que já sofrem naturalmente são mais propensos a estar em perigo e são menos capazes de tomar medidas defensivas ou reconstrutivas de duas vidas depois de uma catástrofe. 165 Para se compreender melhor esse cenário, recorre-se às ideias do movimento por justiça ambiental. Em termos históricos, Rammê explana que a origem da expressão “justiça ambiental” remonta aos movimentos sociais norte-americanos que, na década de 1960, passaram a reivindicar direitos civis às populações afrodescendentes existentes nos Estados Unidos, bem como a protestar contra a exposição humana à contaminação tóxica de origem industrial. 166 163 Na mesma linha, vide: “Em muitas situações, os desastres estão relacionados a ações antrópicas continuamente produzidas nos contextos sociais. O aumento das desigualdades sociais, da pobreza, da ocupação do solo em áreas inadequadas - como em encostas instáveis ou em planícies inundáveis - edificações sem infraestrutura e saneamento básicos, falta de espaços comunitários para sociabilidade são alguns dos muitos fatores que interferem no processo de gestão de riscos e de desastre” (FURTADO, Janaína et al. Capacitação básica em defesa civil. 5. ed. Florianópolis: CEPED UFSC, 2014, p. 49). 164 DAMACENA, Fernanda Dalla Libera. A formação sistêmica de um direito dos desastres. 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 50. 165 FARBER, Daniel et al. Disaster law and policy. 2. ed. Nova York: Aspen Publishers, 2009, p. 15. 166 RAMMÊ, Rogério Santos. A justiça ambiental e sua contribuição para uma abordagem ecológica. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Revista dos Tribunais, vol. 69, jan. 2013, p. 90. 62 No emblemático O ecologismo dos pobres, Alier explica que os princípios de justiça ambiental, de uma forma geral, asseguram que nenhum grupo de pessoas, sejam grupos étnicos, raciais ou de classe, suporte uma parcela desproporcional de degradação do espaço coletivo. Segundo o autor, a ética desse movimento nasce uma demanda por justiça social, que se expande internacionalmente, na exata proporção em que se expande a economia globalizada, aumentam os impactos sobre o meio ambiente e crescem as desigualdades sociais. 167 Nesse sentido, deve-se ressaltar que esse princípio ou ideal tem se fortalecido no contexto global de crise ecológica. Ele está intimamente relacionado a uma sociedade desigual em parâmetros de qualidade ambiental, na qual determinados grupos sociais suportam uma parcela desproporcional das externalidades ambientais negativas resultantes da produção. Na lição de Acselrad, Herculano e Pádua, [...] o tema da justiça ambiental – que indica a necessidade de trabalhar a questão do ambiente não apenas em termos de preservação, mas também de distribuição e justiça – representa o marco conceitual necessário para aproximar em uma mesma dinâmica as lutas populares pelos direitos sociais e humanos e pela qualidade coletiva de vida e sustentabilidade ambiental. 168 O fortalecimento da luta por justiça ambiental no Brasil transporta justamente essa mensagem, ou seja, de que assim como os custos sociais do desenvolvimento recaem de modo desproporcional sobre a população carente, também os custos ambientais desse mesmo processo oneram de forma injusta a vida das pessoas mais pobres. A ideia de justiça ambiental, portanto, é fundamental para justificar a responsabilidade do Estado, por meio de políticas públicas, de atender aos direitos fundamentais das pessoas atingidas pelos desastres ambientais decorrentes dos efeitos das mudanças climáticas e da sociedade de risco, já que, na maioria das vezes, as pessoas mais expostas a tais fenômenos (enchentes, deslizamentos de terra, secas, etc.) serão aquelas integrantes do grupo mais pobre e marginalizado da população, as quais, após a ocorrência do episódio, terão perdido o pouco que possuíam e não terão condições econômicas de acessar os bens socioambientais necessários a uma vida digna. 167 ALIER, Joan Martínez. O ecologismo dos pobres. São Paulo: Contexto, 2009, p. 34. 168 ACSELRAD, Henri; HERCULANO, Selene; PÁDUA, José Augusto (Org.).Justiça ambiental e cidadania. 2. ed. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004. p. 16. 63 3.2 Regime jurídico das políticas públicas A fórmula basilar do contemporâneo Estado de Direito abarca um conjunto de características que, em verdade, representam a ruptura com um modelo estatal vigente antes das revoluções francesa e inglesa. Como resposta, então, ao regime absolutista, engendrou-se um modelo de Estado que teria como pedras fundamentais a submissão ao império da lei, a separação de poderes e a consagração de direitos e garantias individuais. 169 Em termos históricos, a emergência do Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) faz com que o Estado passe a assumir como obrigação, mais intensamente, o oferecimento de prestações positivas ao cidadão. Com o Estado Social, Bercovicci assinala que “o government by policies substitui o government by law do liberalismo”. 170 Pensando no cenário brasileiro, com a ampliação dos direitos fundamentais decorrentes do modelo estatal estabelecido pela Constituição Federal de 1988, incluindo-se os direitos sociais – e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado – o Estado passa a se portar de forma mais prestacional (um corpo estatal mais ativo que passivo) em relação à consecução e fruição destes direitos. Nessa esteira, para a realização desta ampla gama de direitos fundamentais, surge a necessidade de se intensificar a ação estatal. 171 Dentro desse quadro, é dever do Poder Público concretizar os comandos gerais contidos na ordem jurídica e, para isso, cabe-lhe implementar ações, programas e políticas dos mais diferentes tipos. 3.2.1 Apontamentos conceituais As políticas se desenvolveram originalmente como área do conhecimento da ciência política, passando a adquirir autonomia na metade do século vinte, em razão dos desdobramentos de trabalhos que, na academia norte-americana enfocavam a ação dos 169 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 89. 170 BERCOVICI, Gilberto. A problemática da constituição dirigente: algumas considerações sobre o caso brasileiro. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 36, n. 142, abr./jun. 1999, p. 37. 171 RAMOS, Marina Courrol. Políticas públicas de adaptação às mudanças climáticas em face das populações vulneráveis e da justiça climática. 2015. 127 p. Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, pp. 59-60. 64 governos e na Europa privilegiavam a questão do papel do Estado e suas instituições, de acordo com Rodrigues. 172 Ainda que atualmente como fenômeno multidisciplinar, para Dallari Bucci, a análise e compreensão das políticas públicas necessitam do diálogo entre a ciência política, a ciência da administração, a economia, o direito, entre outros campos do conhecimento. 173 Baseado na doutrina brasileira, pode-se dizer que o conceito de políticas públicas é algo indeterminado e fluido. Isso acontece porque a expressão políticas públicas é polissêmica em razão das várias dimensões do fenômeno social que busca definir. Desta feita, as definições encontradas se modificam de acordo com o enfoque teórico eventualmente adotado e o respectivo contexto social e político. Na lição de Maria Paula Dallari Bucci, as políticas públicas são “programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e às atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados”, 174 quadro conceitual que a autora posteriormente adita para explanar que esse programa “resulta de um processo ou um conjunto de processos juridicamente regulados” e que ela “deve visar a realização de objetivos definidos, expressando a seleção de prioridades, a reserva de meios necessários à sua consecução e o intervalo de tempo em que se espera o atingimento dos resultados”. 175 Ada Pellegrini Grinover recorre a Oswaldo Canela Junior esclarecendo que políticas públicas são “o conjunto de atividades do Estado tendentes a seus fins, de acordo com as metas a serem atingidas. Trata-se de conjunto de normas (Poder Legislativo), atos (Poder Executivo) e decisões (Poder Judiciário) que visam à realização de fins primordiais do Estado”. 176 Também Alice Gonzalez Borges se manifestou assinalando que “esse programa de ação governamental consiste em uma atividade, isto é, um conjunto organizado de atos e normas, conjugados para a realização de um objetivo determinado”. 177 172 RODRIGUES, Marta M. Assumpção. Políticas públicas. São Paulo: Publifolha, 2010, p. 29. 173 BUCCI, Maria Paula Dallari. Notas para uma metodologia de análise de políticas públicas. In: FORTINI, Cristiana; ESTEVES, Júlio César dos Santos; DIAS, Maria Tereza Fonseca (Org.). Políticas públicas, possibilidades e limites. Belo Horizonte: Editoria Fórum, 2008, p. 226. 174 BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito administrativo e políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 241. 175 BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em direito. In: ______ (Org.). Políticas públicas: reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 39. 176 GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle das políticas públicas pelo poder judiciário. Revista do Curso de Direito da Faculdade de Humanidades e Direito, São Paulo, v. 7, n. 7, 2010, p. 14. 177 BORGES, Alice Gonzalez. Reflexões sobre a judicialização de políticas públicas. Revista Brasileira de Direito Público, Belo Horizonte, v. 7, n. 25, 2009, p. 35. 65 Para finalizar, tem-se que, de acordo com Campos da Silva, a política pública é “o instrumento de ação do Estado e de seus poderes constituídos, [...] de caráter vinculativo e obrigatório, que deve permitir divisar as etapas de concreção dos programas políticos constitucionais voltados à realização dos fins [...] do Estado Democrático de Direito”. 178 Ainda que se trate de complexa definição por parte da doutrina especializada, vez que o conceito de políticas públicas pode incluir o campo de atividade, propósito político ou mesmo um programa de ação, pode-se definir política pública como o conjunto de ações estatais, diretas ou indiretas, voltadas à satisfação de um interesse público politicamente relevante 179 , ou, como abaixo, reproduzir o conceito normativo estabelecido pelo Ministério da Saúde: Políticas públicas configuram decisões de caráter geral que apontam rumos e linhas estratégicas de atuação governamental, reduzindo os efeitos da descontinuidade administrativa e potencializando os recursos disponíveis ao tornarem públicas, expressas e acessíveis à população e aos formadores de opinião as intenções do governo no planejamento de programas, projetos e atividades. 180 Schmidt discorre sobre políticas públicas colocando-as como instrumento indicativo aos cidadãos sobre as intenções de cada governo. Posiciona-se no sentido de entender necessária uma análise conjunta sobre os rumos do Estado e da sociedade para que melhor se compreenda as políticas públicas como instrumentos de orientação das ações governamentais, reduzindo a descontinuidade administrativa, típica de regimes democráticos, bem como potencializando os recursos disponíveis ao tornar visível e acessível a toda sociedade às intenções desses governos. 181 Ainda, para esse autor, a mais conhecida das classificações segue a proposta de Theodor Lowi, segundo a qual há quatro tipos de políticas: as distributivas, que “consistem na distribuição de recursos da sociedade a regiões ou segmentos sociais específicos”; as redistributivas, que “consistem na redistribuição de renda, com deslocamento de recursos das camadas sociais mais abastadas para as camadas pobres”;as regulatórias, que “regulam 178 SILVA, Guilherme Amorim Campos da. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Método, 2004, p. 104. 179 FORTES JUNIOR, Mario Jorge Tenorio; VERAS, Gustavo de Macedo. Política pública socioambiental: da extrafiscalidade como instrumento eficaz de proteção ambiental e consumo consciente. In: FERREIRA, Heliene Sivini; MAMED, Danielle de Ouro; STEFANELLO, Alaim Giovani Fortes. (Coord.). Perspectivas para a implementação do socioambientalismo. Curitiba: Letra da Lei, 2013, p. 319. 180 MINISTÉRIO DA SAÚDE. Política nacional de plantas medicinais e fitoterápicas. Brasília: Ministério da Saúde, 2006, p. 9. 181 SCHMIDT, João Pedro. Para entender as políticas públicas: aspectos conceituais e metodológicos. In: LEAL, Rogério Gesta; REIS, Jorge Renato dos. (Org.) Direitos sociais e políticas públicas: desafios contemporâneos. Tomo 8. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008, p. 2312-2313. 66 e ordenam, mediante ordens, proibições, decretos, portarias”, podendo atender a interesses sociais ou distribuir de forma equilibrada custos e benefícios a grupos e setores sociais; e as constitutivas ou estruturadoras, que “definem procedimentos gerais da política”, afetando as condições pelas quais são negociadas as demais políticas. Além disso, identifica a existência de cinco fases no ciclo de uma política pública: percepção, inclusão na agenda política, formulação, implementação e avaliação. 182 Conclui-se que a relação com o direito é evidente no caso das políticas públicas, uma vez que elas devem obedecer aos trâmites legislativos constitucionalmente disciplinados. Em outras tintas, o desenvolvimento de uma política pública exige que esta seja debatida e aprovada pelo poder legislativo e, posteriormente, seja encaminhada ao executivo para que execute as determinações. 3.2.2 Políticas públicas de proteção ambiental O que se verifica, com certa frequência, é a omissão estatal em implementar políticas públicas que atendam de modo adequado e suficiente à tutela do ambiente, especialmente no tocante à questão climática, o que ocorre no caso de o ente estatal não fiscalizar e coibir o desmatamento de florestas e a emissão dos gases responsáveis pelo aquecimento global. A mesma conduta omissiva do Estado – no caso do Poder Legislativo – ocorre quando ele não atua no sentido de estabelecer marcos regulatórios adequados ao combate das adversidades socioambientais contemporâneas, de modo a compatibilizar as atividades produtivas a padrões ecologicamente sustentáveis. Para reverter esse quadro, é precisamente por meio das políticas públicas que o Estado será capaz de, abrangente e sistematicamente, realizar os objetivos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988 183 , aos quais se acresce o princípio da prevalência dos direitos humanos, sobretudo no que diz respeito à concretização dos direito 182 SCHMIDT, João Pedro. Para entender as políticas públicas: aspectos conceituais e metodológicos. In: LEAL, Rogério Gesta; REIS, Jorge Renato dos. (Org.). Direitos sociais e políticas públicas: desafios contemporâneos. Tomo 8. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008, p. 2313-2314. 183 Os objetivos fundamentais da Constituição Federal estão previstos no art. 3º: “Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. 67 fundamentais que dependam de ações para sua promoção, caso dos direitos sociais e do meio ambiente ecologicamente equilibrado. As políticas públicas ambientais podem ser entendidas, conforme Ferreira, como “a exteriorização das funções estatais a fim de possibilitar o atendimento dos interesses difusos de natureza socioambiental”. 184 Em outras palavras, utilizando da lição de Carmello Junior, elas “devem ser instrumentos capazes de oferecer respostas à grandes questões que envolvem o meio ambiente, como sustentabilidade, prevenção e precaução”. 185 Em didático raciocínio, Campos dispõe que Estudar políticas públicas na seara ambiental não é uma tarefa simplista, pois envolve um grande número de atores sociais que necessitam da organização e força de um maior e legítimo. Ademais, adotar decisões dentro desta temática, pressupõe conhecimento científico do problema e suas possíveis consequências. Motivo pelo qual, muitas das vezes o único disposto a arcar com os custos deste conhecimento prévio e necessário é apenas o Estado. 186 Isso quer dizer que a complexidade inerente à gestão jurídica das questões ambientais também se projeta para o campo das políticas públicas. A fim de estudar a fundo os campos jurídico-normativos atinentes à temática dos desastres, passa-se a relacioná-los com políticas públicas e programas governamentais. 3.3 Políticas públicas e defesa civil A Defesa Civil é o órgão encarregado por excelência para atuar em caso de desastres no Brasil. Em termos conceituais, a defesa civil “visa a proteger a sociedade como um todo, incluindo cada pessoa e o corpo social, inclusive, a parte material da sociedade – edifícios privados ou públicos, quaisquer que sejam”. 187 A legislação vigente dispõe que a União deve elaborar o Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil contendo, no mínimo: a identificação dos riscos de desastres nas 184 FERREIRA, Ximena Cardozo. Políticas públicas e áreas de preservação permanente: instrumentos de implementação. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n. 62, nov./abr., 2008/2009, p. 72. 185 CARMELLO JUNIOR, Carlos Alberto. As políticas públicas ambientais e a ação civil pública. 2013. 124 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Católica de Santos, Santos, p. 26. 186 CAMPOS, Ana Luiza Garcia. Políticas públicas ambientais: conservação da biodiversidade e gestão dos serviços ecológicos. 2013. Dissertação (Mestrado em Direito Econômico e Financeiro) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013, p. 8. 187 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 65. 68 regiões geográficas e grandes bacias hidrográficas do País e as diretrizes de ação governamental de proteção e defesa civil no âmbito nacional e regional, em especial quanto à rede de monitoramento meteorológico, hidrológico e geológico e dos riscos biológicos, nucleares e químicos e à produção de alertas antecipados das regiões com risco de desastres (art. 6º, VIII e § 1º, da Lei Federal nº 12.608/2012). Desde 2007, o Brasil possui um Plano Nacional de Defesa Civil (PNDC). De acordo com Carvalho e Damacena, atualmente o documento está em reforma, porém continua em vigor. O plano orienta a atuação da Defesa Civil a partir da concorrência efetiva de quatro aspectos, denominados Planos Diretores da Defesa Civil: prevenção; preparação para emergência e desastres; resposta aos desastres; e reconstrução. 188 Conforme abordado no item de análise normativa, atualmente o ordenamento conta com a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, que tem como finalidade orientar o gerenciamento de riscos e de desastres abrangendo as ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação e demais políticas setoriais, com o propósito de garantir a promoção do desenvolvimento sustentável. 3.3.1 Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil A PNPDEC estabelece o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (SINPDEC), constituído pelos órgãose entidades da administração pública federal, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e pelas entidades públicas e privadas de atuação significativa na área de proteção e defesa civil, sobre a centralização da Secretaria Nacional de Defesa Civil, órgão do Ministério da Integração Nacional. O SINPDEC é integrado: (i) pelo Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil (CONPDEC); (ii) pela Secretaria Nacional de Defesa Civil do Ministério da Integração Nacional, como órgão central e responsável por coordenar o planejamento, articulação e execução dos programas, projetos e ações de proteção e defesa civil; (iii) pelos órgãos regionais estaduais e municipais de proteção e defesa civil responsáveis pela articulação, coordenação e execução do SINPDEC em cada nível; e (iv) pelos órgãos setoriais dos três níveis de governo. 188 BRASIL. Plano Nacional de Defesa Civil. Ministério da Integração Nacional – Secretaria Nacional de Defesa Civil, Brasília, 2007, pp. 15-18. 69 3.3.2 Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil O CONPDEC é o órgão colegiado do sistema, de natureza consultiva, cujas atribuições relacionam-se com a proposição de diretrizes para a política nacional de defesa civil, partindo dos seguintes objetivos: planejar e promover ações de prevenção de desastres naturais e tecnológicos, de maior prevalência no país; realizar estudos, avaliar e reduzir riscos de desastres; atuar na iminência e em circunstâncias de desastres; e prevenir ou minimizar danos, socorrer e assistir populações afetadas, e restabelecer os cenários atingidos por desastres. Além desses órgãos, a PNPDEC dispõe de mais duas importantes ferramentas institucionais que são o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (CENAD) e o Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2ID). 3.3.3 Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres Criado em 2005, o CENAD, pertence ao Ministério da Integração Nacional e é coordenado pela Secretaria Nacional de Defesa Civil. Sua estrutura conta com duas frentes de trabalho. A primeira delas é a “articulação, estratégia, estruturação e melhoria contínua”, responsável pela preparação e resposta a desastres, sendo sua principal atividade a mobilização para atendimento às vítimas; e a segunda é “ação permanente de monitoramento, alerta, informação, mobilização e resposta”, que corresponde ao monitoramento de informações sobre possíveis desastres em áreas de risco, com o objetivo de reduzir impactos e preparar a população. Esse monitoramento é realizado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN). Liderado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, o CEMADEN está localizada na cidade de Cachoeira Paulista, no estado de São Paulo, sendo responsável por gerenciar as informações a partir de dados emitidos pelo radar, pluviômetros e previsões meteorológicas. 189 189 CARVALHO, Délton Winter de. O papel do direito e os instrumentos de governança ambiental para prevenção de dos desastres, Revista de Direito Ambiental, São Paulo, vol. 75, jul. 2014, p. 45. 70 3.3.4 Sistema Integrado de Informações sobre Desastres O Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2ID) integra diversos produtos da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, com o objetivo de qualificar e dar transparência à gestão de riscos e desastres no Brasil, por meio da informatização de processos e disponibilização de informações sistematizadas dessa gestão. Trata-se de uma plataforma online, mantida pelo governo federal, que permite ao cidadão acessar as informações em questão. 190 3.3.5 Operação Carro-Pipa (Brasil) Como exemplo de programa governamental que opera no âmbito da defesa civil, tem-se que, no enfrentamento das situações de seca, o Governo Federal dispõe de um programa de distribuição de água chamado Operação Carro-Pipa. A ação é uma parceria do Ministério da Integração Nacional, por meio da Secretaria Nacional de Defesa Civil, com o Exército Brasileiro. 191 De acordo a legislação regulamentar da União, o programa em questão visa “a realização de ações complementares de apoio às atividades de distribuição emergencial de água potável, prioritariamente às populações rurais atingidas por estiagem e seca na região do semiárido nordestino e região norte dos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo”. 192 A delimitação geográfica do programa, ao se compatibilizar com os dados de vulnerabilidade climática e socioambiental, faz com que a proteção jurídica se dê de modo justo, o que, pode-se afirmar, atenderia aos preceitos da justiça ambiental. 3.4 Políticas públicas e urbanismo Refletir sobre o processo de urbanização no Brasil se inicia com a premissa de que ele não foi adequadamente acompanhado pelas políticas públicas de ordenação e 190 O S2ID está disponível em: < http://s2id.mi.gov.br/>. 191 PORTAL BRASIL (GOVERNO FEDERAL). Operação carro pipa. Disponível em: <http://www.brasil. gov.br/observatoriodaseca/operacao-carro-pipa.html>. Acesso em: 07 out 2015. 192 De acordo com a Portaria Interministerial MI/MD nº 1/2012. 71 planejamento do espaço urbano, fruto da rápida urbanização decorrente do êxodo rural e da industrialização. A consequência disso é a existência de cidades excludentes e bastante desiguais em termos socioambientais. Nessa linha, Raquel Rolnik atesta que “se tivéssemos que apontar apenas um elemento [...] para definir cidades brasileiras histórica e regionalmente distintas, esta seria sem dúvida a existência [...] de contrates profundos entre condições urbanas radicalmente distintas convivendo [...] no interior da mesma cidade”. 193 Ainda segundo a urbanista, o problema do crescimento desordenado das cidades pode ser entendido não como a “falta de planejamento”, porém como uma “opção de planejamento, de políticas urbanas e práticas políticas que construíram um modelo excludente” em virtude da crença de que o crescimento econômico, puro e simplesmente, seria capaz de financiar o desenvolvimento urbano. 194 Trazendo para o escopo do presente estudo, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), os desastres ambientais que mais ocorreram no Brasil são deslizamentos de terra e inundações. 195 Para Dill, “a carência de programas habitacionais propiciou a ocupação desordenada”, sendo que as populações urbanas “estão cercadas pelos riscos de deslizamento de terra, desabamento, transmissões de doenças, acessibilidade, segurança, mobilidade, fome, habitação, alagamentos, praticamente todos os serviços básicos garantidos pela constituição”. 196 Do ponto de vista socioeconômico, pode-se refletir que as ocupações irregulares têm outra questão relevante que é a pobreza, uma vez que a falta de planejamento faz com que os cidadãos com limitação de recursos financeiros migram para as grandes metrópoles em busca de emprega e renda. Essas pessoas, muitas vezes, em função dos recursos escassos, acabam por construir suas moradias em áreas de risco como as encostas, margens de rios e morros (regiões que o direito ambiental protege, inclusive). A fim de se superar esse drástico cenário, vê-se que cidades melhor estruturadas e dimensionadas para fazer frente ao aumento da frequência de episódios climáticos 193 ROLNIK, Raquel. Instrumentos urbanísticos contra a exclusão social. In: ______, CYMBALISTA, Renato. (Org.). Instrumentos urbanísticos contra a exclusão social. São Paulo: Pólis, 1997, p.7. 194 ROLNIK, Raquel (Coord.). Estatuto da cidade – guia para implementação do estatuto da cidade. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001, p. 24-26.195 MARCELINO, Emerson Vieira. Desastres naturais e geotecnologias: conceitos básicos. São José dos Campos: INPE, 2008, p. 6-7. 196 DILL, Silvana Oliveira. Populações vulneráveis e a suscetibilidade aos efeitos dos desastres ambientais: uma abordagem jurídica. 2013. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, p. 53. 72 extremos podem contribuir para reduzir, de forma significativa, a ocorrência. As políticas públicas, portanto, devem planejar o espaço urbano, adequar o Plano Diretor à realidade ecocomplexa vigente, mapeando áreas de risco em busca de uma cidade socioambiental justa e resiliente. 3.4.1 Planejamento urbano Para Mukai, “a ocupação e o desenvolvimento dos espaços habitáveis, sejam eles no campo ou na cidade, não podem ocorrer de forma meramente acidental, sob as forças dos interesses privados e da coletividade”. Para o doutrinador, “são necessários profundos estudos acerca da natureza da ocupação, sua finalidade, avaliação da geografia local, da capacidade de comportar essa utilização sem danos para o meio ambiente” para, com isso, “permitir boas condições de vida para as pessoas, permitindo o desenvolvimento econômico-social, harmonizando os interesses particulares e os da coletividade”. 197 Portanto, para que essas variáveis sigam o mesmo caminho, mister a realização de um planejamento urbano. 3.4.2 Mapeamento das áreas de risco e Plano Diretor A expressão “área de risco” é encontrada várias vezes na PNPDEC. Na modificação da Lei Federal nº 12.340/2010, foi instituído o cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. Dessa forma, pode-se afirmar que uma área de risco contém, pelo menos, áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. Os mapas de risco se configuram como políticas públicas de importante relevo. Carvalho expõe que: Os mapas de risco devem ser diagnósticos socioambientais que, baseados em cartas geotécnicas, devem ser visualmente didáticos, em linguagem sistematiza, clara e objetiva. Confeccionados por equipe multidisciplinar, devem levar em consideração não apenas as informações técnicas 197 MUKAI, Toshio. Temas atuais de direito urbanístico e ambiental. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 29. 73 (proveniente das cartas geotécnicas), mas também as vulnerabilidades sociais. A exemplo do que acontece com o Estudo de Impacto Ambiental – EIA, as cartas geotécnicas e seus respectivos mapas de risco limitam a discricionariedade administrativa dos gestores públicos no exercício de políticas de desenvolvimento urbano. 198 Nessa esteira, o Plano Diretor do Município é o instrumento apto para incluir, entre outras normas, o mapeamento contendo as áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. Além desse mapeamento, o Município apontará nas áreas mapeadas as que não são edificáveis. O Município deverá considerar a legislação federal e estadual sobre o ordenamento do território, a legislação florestal (principalmente as Áreas de Preservação Permanente nas margens dos cursos de água e nas montanhas), levando-se em conta que, na designação das áreas de risco, o Município pode ser mais exigente que as leis dos outros entes federados, mas não menos exigente. 199 Em consequência dessa dupla ação – mapeamento mais impossibilidade de construir – entende-se que a licença de construção ou alvará de construção está proibida nas áreas de risco. A impossibilidade de expedir-se alvará de construção nos imóveis situados na área de risco ajuda o Município e seus funcionários ou agentes públicos a terem probidade administrativa, cabendo aos Municípios “vedar novas ocupações” nas áreas de risco de desastre (em consonância com o art. 8º, V, da Lei Federal nº 12.608/2012). Em termos de políticas públicas de proteção às comunidades vulneráveis, a administração deve estar atenta a tal cenário. Assim, verificada a existência de ocupação pré-existente destas áreas de risco, o município deverá adotar medidas de redução de riscos de desastres, mediante a execução de plano de contingência e de obras de segurança. Para os casos de ocupações de áreas de risco já consolidadas e quando estritamente necessário para a segurança dos moradores, a remoção das edificações e o reassentamento dos ocupantes em local seguro estará condicionada os seguintes procedimentos: realização de vistoria no local e elaboração de laudo técnico que demonstre os riscos da ocupação para a integridade física dos ocupantes ou de terceiros; e notificação da remoção aos ocupantes 198 CARVALHO, Délton Winter de. O papel do direito e os instrumentos de governança ambiental para prevenção de dos desastres, Revista de Direito Ambiental, São Paulo, vol. 75, jul. 2014, p. 52. 199 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, pp. 76- 76. 74 acompanhada de cópia do laudo técnico e, quando for o caso, de informações sobre as alternativas oferecidas pelo poder público para assegurar seu direito à moradia. Após tal remoção, a municipalidade deverá adotar medidas para impedir novas ocupações da área. 200 3.4.3 Direito à cidade resiliente De acordo com o preâmbulo da Carta Mundial pelo Direito à Cidade, fruto do V Fórum Social Mundial, o direito à cidade se define como o usufruto equitativo das cidades dentro dos princípios da sustentabilidade e da justiça social. Dirigida aos grupos vulneráveis e desfavorecidos, pressupõe o direito à cidade o exercício pleno e universal de todos os direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos previstos em Pactos e Convênios Internacionais de Direitos Humanos. 201 O documento em questão reconhece que os modelos de desenvolvimento implantados na maioria dos países subdesenvolvidos se caracterizam por estabelecer padrões de concentração de renda e de poder assim como processos acelerados de urbanização que contribuem para a depredação do meio ambiente e para a privatização do espaço público, gerando empobrecimento, exclusão e segregação social e espacial; estabelece o compromisso das cidades a adotar medidas de prevenção frente à ocupação desordenada do território e de áreas de proteção e a contaminação, incluindo acústica, economia energética, a gestão e reutilização dos resíduos, reciclagem e a recuperação das vertentes para ampliar e proteger os espaços verdes. Desse modo, o atendimento a função socioambiental da cidade não só viabiliza o direito à moradia, mas também o direito ao meio ambiente equilibrado, sendo possível esse duplo atendimento mesmo em assentamentos irregulares por meio de políticas públicas que integrem essas habitações às cidades, promovendo ações infraestrutura social, ambiental e habitabilidade. Nesse sentido, inclusive, a doutrina de Paulo Affonso Leme Machado destaca que é um dos objetivos da PNPDC estimular o desenvolvimento de cidades resilientes e os 200 CARVALHO, Délton Winter de. O papel do direito e os instrumentos de governança ambiental para prevenção de dos desastres, Revista de Direito Ambiental, São Paulo, vol. 75, jul. 2014, p. 60. 201 CARTA Mundial pelo Direito à Cidade. Disponível em: < http://www.polis.org.br/uploads/709/709.pdf>. Acesso em 07 out. 2015. 75 processos sustentáveis de urbanização, conforme disposto no art. 5º, VI, da Lei Federal nº 12.608/2012. Para o mesmo autor, A prevenção é um dos elementos paraa formação da cidade resiliente, pois antes de ocorrer o desastre, contribui para que a cidade ou o município tenha pessoal capacitado e equipamentos físicos, entre outros, caminhões, tratores, ambulâncias, abrigos, hospitais e vias de evacuação. Os fenômenos da natureza não podem, algumas vezes, ser impedidos ou evitados, mas os seus efeitos poderão ser reduzidos ou mitigados. Uma cidade resiliente não é aquela não sofre nenhum desastre natural, mas aquela está preparada para reagir e recuperar-se com maior rapidez e eficiência. 202 A ideia de resiliência, como abordado anteriormente, se aplicada às estruturas urbanas, deve ser compreendida como o fortalecimento da capacidade de resposta às adversidades socioambientais. No tocante aos desastres e eventos extremos, essa junção de conceitos ganha ainda mais relevância e deve ser norte para a execução de políticas públicas ambientais. 3.4.4 Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar (SP) Aliando proteção ambiental com a garantia de melhores condições de moradia, vislumbra-se o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar, projeto idealizado pelo governo estadual paulista. Iniciado em meados de 2007, ele é fruto de uma parceria entre as Secretarias do Meio Ambiente e de Habitação do Estado de São Paulo. Tem como principais objetivos, dentre outros, a recuperação do Parque Estadual da Serra do Mar, a maior área contínua de Mata Atlântica no Brasil, e a regularização fundiária das populações que viviam na região, realocando-os de assentamentos habitacionais precários e com altos riscos socioambientais para CDHUs na região. De acordo com o Informe de Gestão Ambiental e Social do Programa, o programa inova em termos de operações de ambiental e manejo de recursos naturais pela integração dos aspectos sociais e ambientais presentes na região. Além disso, diversos fatores auxiliaram na concepção da estratégia ambiental do projeto, sendo: “(i) o saneamento de situações de conflito fundiário de longa data; (ii) a recuperação ambiental de áreas degradadas e perturbadas; (iii) a comunicação social e educação ambiental; e (iv) os 202 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 77. 76 incrementos substanciais na capacidade institucional das UCs [Unidades de Conservação] envolvidas”. 203 Atualmente, de acordo com as informações disponibilizadas pelo Poder Público, mais de cinco mil famílias que viviam em áreas de risco ou de preservação ambiental foram atendidas, com moradias e obras de urbanização, que incluem programas de capacitação profissional. 204 Além disso, o programa foi ampliado na fase atual, com a alcunha de Litoral Sustentável, cujo objetivo é trabalhar com todas as situações de risco no litoral paulista. 3.4.5 Rio Resiliente (Rio de Janeiro, RJ) A busca por cidades mais resilientes encontra pouso em um projeto do capital fluminense, intitulado Rio Resiliente. Segundo informações governamentais, a necessidade de se pensar na resiliência do Rio de Janeiro se deu em função de suas características geológicas e geográficas, dadas à ocorrência de precipitações pluviométricas intensas, somado ao fato de ser uma cidade bastante adensada, com crescimento desordenado e diversas construções executadas em áreas de risco. 205 O documento Rio de Janeiro em busca da resiliência frente chuvas fortes dispõe que o projeto é uma campanha da International Strategy for Disaster Reduction (UN- ISDR) em pareceria com a Secretaria Nacional de Defesa Civil. Focado na melhoria da resistência às fortes chuvas, propõe diversas medidas para melhoria da infraestrutura estrutural e não estrutural. Entre elas, pode-se citar: a inauguração de um novo radar meteorológico, a realização do mapeamento das áreas de risco da cidade, a aprovação de um novo Plano Diretor e o reassentamento de moradores das áreas de alto risco (com auxílio federal do Programa Minha Casa, Minha Vida 206 ). 203 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e do Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica - informe de gestão ambiental e social do programa. Disponível em: <http://www.habitacao.sp.gov.br/secretariahabitacao/downloads/serra_do_mar/idbdocs.pdf>. Acesso em: 25 ago. 2015. 204 SISTEMA AMBIENTAL PAULISTA. Secretária Patrícia Iglecias visita bairros-cota em Cubatão. Disponível em: <http://www.ambiente.sp.gov.br/blog/2015/09/14/secretaria-patricia-iglecias-visita-bairros- cota-em-cubatao/>. Acesso em: 26 ago. 2015. 205 PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro Resiliente. Disponível em: <http://www.rio.rj.gov.br/web/defesacivil/rio-resiliente>. Acesso em: 15 set. 2015. 206 O Programa Minha Casa, Minha Vida está disposto na Lei Federal nº 11.977/2009 e “tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de 77 Recentemente, a administração carioca tem se empenhado para se colocar nas discussões internacionais sobre a construção de cidades resilientes. Fruto disso é o fato de que atualmente a cidade presidente do C40 Cities Climate Leadership Group. 207 Dentro desses apontamentos, de acordo com o documento Rio Resiliente – diagnóstico e áreas de foco, um diagnóstico baseado em entrevistas com órgãos municipais e empresas envolvidas nos serviços básicos e na gestão da mobilidade, assim como em uma ampla análise do Plano Estratégico da Cidade, definiu-se algumas áreas para ação futura inseridas no contexto das mudanças climáticas: gestão resiliente, comportamento resiliente e resiliência socioeconômica. 208 3.5 Políticas públicas, educação e participação Paulo Affonso Leme Machado assevera que a participação social e o acesso à informação são tônicas da atualidade. O engajamento político ativo dos cidadãos é de relevante importância, registrando-se o acesso a outros fóruns centrais da subpolítica – o judiciário e a mídia -, visando a tomar consciência de seus interesses (na proteção do meio ambiente, no movimento contra a energia nuclear, no domínio da Informática e das liberdades) – consoante Ulrich Beck, ao falar de uma “nova cultura política”. 209 A educação é um dos meios de propiciar informação ao cidadão. No âmbito da proteção socioambiental, tem-se que a educação ambiental é ressaltada na Carta Magna, no art. 225, § 1º, VI. No dispositivo, dispõe-se que é incumbência do Poder Público a promoção da educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente. 210 Em relação à participação, vê-se que: imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, para famílias com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais)”. 207 O C40 é um grupo de grandes cidades mundiais, empenhado em debater e combater a mudança climática. O grupo foi fundado após uma reunião de delegações de 18 cidades em outubro de 2005. 208 PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO. Rio Resiliente – Diagnóstico e áreas de foco. Disponível em: <http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/126674/4134832/Resiliencia.pdf>. Acesso em: 5 out. 2015. 209 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à informação e meio ambiente. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 34. 210 Sobre essa temática, vide: MORIMOTO, Isis Akemi. Direito e educação ambiental: estímulo à participação crítica e à efetiva aplicação de normas voltadas à proteção ambiental no Brasil. 2014. 501 f. Tese (Doutorado em Ciência Ambiental) – Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental, Universidadede São Paulo, São Paulo. 78 [...] um dos grandes desafios impostos à ciência, neste cenário de incertezas, controvérsias e complexidade, tão característico das mudanças ambientais e eventos extremos, parece ser o de fazer uma reflexão sobre suas possibilidades de atuação mais efetiva nas arenas de risco e de envolvimento de outros atores sociais na produção, validação e utilização do conhecimento científico. 211 Vislumbra-se como fundamental a inserção da comunidade na reflexão da temática dos desastres. Em artigo que explora programa de superação da pobreza, Ferrarini conclui que: A participação foi elemento central para o empoderamento sociopolítico da população envolvida; não se trata de consultar a população, mas dar-lhe ferramentas para enunciar de forma coletiva suas necessidades, prioridades e soluções - o que não significa prescindir do saber técnico, mas tê-lo a seu serviço, desconstruindo a tradicional hierarquia pautada no exclusivismo epistemológico do conhecimento científico e especializado, bem como a hierarquia estanque entre global e local. 212 No âmbito da PNPDC, em três incisos muito expressivos (art. 6º, XI, XII e XIII, da Lei Federal nº 12.608/2012), é dada à União a competência de incentivar a instalação de centros universitários de ensino e pesquisa sobre desastres e de núcleos multidisciplinares de ensino permanente e à distância, destinados à pesquisa, extensão e capacitação de recursos humanos, com vistas no gerenciamento e na execução de atividades de proteção e defesa civil e em fomentar a pesquisa sobre os eventos deflagradores de desastres. Em concordância com Machado, ressalta-se duas grandes avenidas educacionais: a capacitação de recursos humanos para as atividades de proteção e defesa civil e a instalação de centros universitários destinados ao ensino e pesquisa sobre desastres. Isso porque “sem capacitação prévia, os agentes públicos e a sociedade civil improvisarão e não saberão agir, com eficiência”. 213 Apoiar a comunidade docente no desenvolvimento de material didático-pedagógico relacionado ao desenvolvimento da cultura de prevenção de desastres é uma vertente preconizada pela Lei, assim como desenvolver cultura nacional de prevenção de desastres, 211 DI GIULIO, Gabriela Marques et al. Propostas metodológicas em pesquisas sobre risco e adaptação: experiências no Brasil e na Austrália. Ambient. soc., São Paulo, v. 17, n. 4, dez. 2014, p.47. 212 FERRARINI, Adriane Vieira. Desenvolvimento local integrado e sustentável: uma metodologia para políticas e programas de superação da pobreza. Interações (Campo Grande), Campo Grande, v. 13, n. 2, dez. 2012, p. 240. 213 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de direito ambiental 2. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 81. 79 destinada ao desenvolvimento da consciência nacional acerca dos riscos de desastre no País. Sem a cultura da prevenção os desastres não serão evitados devidamente, mas somente será tentado enfrentar os danos que se estão produzindo ou já produzidos. Na esteira dessa discussão, os currículos do ensino fundamental e médio devem incluir os princípios da proteção e defesa civil e a educação ambiental de forma integrada aos conteúdos obrigatórios. Vê-se que é uma inovação altamente necessária a presença não só da educação ambiental, como da educação para a proteção e defesa civil, nos currículos do ensino fundamental e médio. 3.5.1 Programa Brigada Escolar (PR) Um dos exemplos de política pública capaz de inter-relacionar educação com a prevenção de desastres é o Programa Brigada Escolar, instituído em 2012 pelo governo paranaense. Trata-se de uma parceria da Secretaria de Estado da Educação com a Casa Militar da Governadoria – Divisão de Defesa Civil que visa promover a conscientização e a capacitação da comunidade escolar do Estado do Paraná, para ações de enfrentamento de eventos danosos. 214 Em 2015, o programa foi institucionalizado por meio da Lei Estadual nº 18.424/2015. Sob a denominação de Programa Brigadas Escolares – Defesa Civil na Escola, o art. 2º da lei prevê que o programa “consiste no desenvolvimento de ações mitigadoras e de enfrentamento a emergências e/ou desastres, naturais ou provocados pelo homem, por meio da capacitação de servidores e alunos, bem como de promover adequações nas edificações das instituições estaduais de ensino”. De acordo com informações institucionais, em 2012, foram elaborados os planos de abandono das mais de duas mil escolas estaduais e conveniadas. Além disso, a Secretaria da Educação instalou nas escolas milhares de novos e modernos equipamentos de segurança, como extintores, placas de sinalização e luzes de emergência. 215 214 GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ. Programas e Projetos - Programa Brigada Escolar: Defesa Civil na Escola. Disponível em: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/modules/conteudo /conteudo.php?conteudo=242>. Acesso em: 22 jun. 2015. 215 SECRETARIA DA EDUCAÇÃO (PARANÁ). Paraná transforma em lei o programa Brigada Escolar. Disponível em: <http://www.educacao.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=5728>. Acesso em: 08 set. 2015. 80 3.5.2 Programa de Voluntariado (São Paulo, SP) No tocante à participação comunitária, cita-se o exemplo do Programa de Voluntariado da Coordenadoria Municipal de Defesa Civil (COMDEC) 216 do município de São Paulo. Trata-se de um projeto desenvolvido pela Divisão de Mobilização, Voluntariado e Parcerias da COMDEC, com o objetivo de reforçar no Sistema Municipal de Defesa Civil, a participação da sociedade civil. 217 Em termos normativos, o embasamento para a instituição dessa política pública encontra chancela no art. 6º, XII, do Decreto Municipal nº 47.534/2006, que reorganiza o Sistema Municipal de Defesa Civil, aos dispor que compete à COMDEC, entre outros, “implantar programas de treinamento de voluntários”. Com base no programa, podem ser voluntários todos os cidadãos, respeitando a legislação vigente sobre o assunto. Os voluntários podem apoiar as ações de proteção e defesa civil em três segmentos: (i) na prevenção, como multiplicadores dos preceitos de proteção e defesa civil nas comunidades localizadas em áreas de risco; (ii) na resposta, apoiando ações de emergência; e (iii) na ajuda humanitária, dando especial atenção às necessidades mais imediatas das pessoas em situações de emergência. 216 De acordo com o art. 3º do Decreto Municipal nº 47.534/2006, “a Coordenadoria Municipal de Defesa Civil, dirigida e presidida pelo Coordenador Geral diretamente designado pelo Chefe do Executivo, é o elemento de articulação permanente com os órgãos do Sistema Nacional de Defesa Civil e do Sistema Estadual de Defesa Civil.” 217 PREFEITURA DE SÃO PAULO. Divisão de Voluntariado desenvolve programa para reforçar Defesa Civil. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/defesa_civil/ index.php?p=202250>. Acesso em: 25 set. 2015. 81 CONCLUSÃO Os desastres constituem uma das principais preocupações contemporâneas. Definir a ocorrência de um desastre passa por abarcar conceitos multidisciplinares. Historicamente, passou-se de uma visão divina para se buscar uma racionalidade por detrás da ocorrência de calamidades e situações extremas adversas. Hoje em dia, a questão dos desastres está intimamente ligada à gestão circular dos riscos e à percepção de vulnerabilidades socioambientais. A realidade contemporânea potencializa os riscos e os custos socioambientais dos desastres. A estrutura econômica, na face do just-in-time e na interdependência estrutural dos sistemas de produção, e a conceituação sociológica da sociedadede risco representam um dos fatores de ampliação de perigos. Além deles, o crescimento populacional desenfreado, a ocupação desordenada do solo e a falta de infraestrutura verde protegida e de cinza construída de forma correta também corroboram para esse cenário. Por fim, e não menos importante, o evidente quadro de crise climático-ambiental é fator que implica em mais efeitos naturais adversos e, portanto, mais riscos. A vulnerabilidade e a resiliência se apresentam como fatores transversais aos desastres. Quanto mais vulnerável um ambiente é, mais suscetível a perdas socioambientais e econômicas ele estará; quanto mais resiliente, melhor capaz de receber os impactos, de se adaptar e de voltar a funcionar de forma satisfatória. Essa quebra de instabilidade, aliás, é um dos motivos que dá ao direito o sentido de atuar nesses eventos. Isso porque é por meio de um quadro institucional e jurídico bem formatado que poderá se antecipar, prever e lidar melhor com os riscos e as calamidades públicas. Assim sendo, o desenvolvimento de um direito aplicável aos desastres se apresenta como desafio ao jurista (não só ao ambiental) da atualidade. Vê-se que esse ramo do direito é multidisciplinar, ao dialogar com a engenharia, à ecologia e à sociologia, e que não poderia existir sem o conceito de gestão de risco. Tal conceito é circular e se retroalimenta nas etapas de mitigação, resposta de emergência, compensação, assistência do governo e reconstrução. Também dentro desse contexto, o direito dos desastres está estritamente conectado com a lei reguladora, uma vez que, por exemplo, ausente um direito ambiental eficiente, haverá maior vulnerabilidade para a ocorrência de desastres. 82 O paradigma atual da segurança reforça os princípios da precaução e da prevenção no âmbito jurídico-ambiental. Além desses, vislumbra-se que os princípios da proporcionalidade, da informação, da participação, da fundamentação e da adaptabilidade foram o quadro principiológico aplicável aos desastres. O Brasil vem mudando de forma bastante madura o seu quadro legislativo para prevenir e combater riscos e desastres. A evolução constitucional demonstra uma crescente preocupação com a temática e a legislação ordinária refletiu a mudança de uma ausência de preocupação, tratando os desastres apenas quando já ocorridos, para um foco na prevenção, na instrumentalização de diversos meios institucionais e legais de tratamento da questão. A Política Nacional de Proteção e Defesa Civil é o centro nevrálgico das políticas de prevenção e gestão de desastres, em que se irradiam conexões com diversas áreas tradicionais do Direito. Para tratar da temática, recorre-se também ao direito urbanístico, no Estatuto da Cidade e na Lei sobre o Parcelamento do Solo Urbano, assim como ao direito ambiental, na Política Nacional sobre Mudança do Clima e no Código Florestal. Ainda pensando nas múltiplas relações possíveis entre desastre e ramos do Direito, vê-se que a formatação de um Estado Socioambiental e Democrático de Direito, em que se assegura a função socioambiental da propriedade e garanta que os institutos de direito privado, principalmente o da responsabilidade civil, se atualizem, é um passo jurídico- normativo necessário para o enfrentamento da realidade ecocomplexa da atualidade. Esse novo formato jurídico-estatal precisa ser capaz de efetivar o Direito por meio de políticas públicas que levem em conta o ideário de justiça ambiental e se atente para a existência de vulnerabilidades socioambientais latentes. As populações mais pobres são, de longe, as que mais sofrem com problemas ambientais e com as consequências da ocorrência de calamidades e desastres. Dada a existência de um quadro jurídico focado na prevenção e na gestão do risco, na figura Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil, deve a Defesa Civil estar preparada para cumprir suas funções institucionais. Da mesma forma, devem estar preparados os agentes públicos locais na implantação de políticas sustentáveis de urbanismo, seguindo à risca a legislação aplicável. E, por fim, o Estado deve dar reais condições de acesso à informação, à participação e à educação aos cidadãos e às cidadãs, para que se crie uma cultura de resiliência socioambiental. 83 Programas governamentais que atuam nessas esferas do conhecimento e da prática humana estão sendo realizados pelo país. A Operação Carro-Pipa, do governo federal, e o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar, do governo paulista, são emblemáticos exemplos de conjunção entre percepção das adversidades socioambientais com resposta estatal eficiente e adequada. Além deles, os programas Rio Resiliente, da administração carioca, o Programa Brigada Escolar, do governo paranaense, e o Programa de Voluntariado, da administração paulistana, são também modelos de empoderamento socioambiental por meio de instrumentos público-estatais. A questão do enfrentamento jurídico-institucional dos desastres é, enfim, desafiadora. Dado o exposto e para se concluir, pode-se afirmar que um sistema social capaz de prever e enfrentar as adversidades do desconhecido é um sistema mais sólido e perpétuo, sendo que, nesse quadro, cabem ao direito dos desastres e à implantação de políticas públicas as tarefas de proteger comunidades vulneráveis em termos socioambientais e de garantir a justiça ambiental de todas e todos. 84 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACSELRAD, Henri et al. O que é justiça ambiental. Rio de Janeiro: Garamond, 2008. ______; HERCULANO, Selene; PÁDUA, José Augusto (Org.). Justiça ambiental e cidadania. 2. ed. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004. 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