Prévia do material em texto
Precedentes jud SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................... 2 1. PRECEDENTE ....................................................................................... 3 1.1 TÉCNICAS DE SUPERAÇÃO DE PRECEDENTES ............................. 5 1.2 Princípios da segurança jurídica e da boa-fé objetiva ......................... 10 2. O INCIDENTE PROCESSUAL DE DEMANDAS REPETITIVAS ........ 16 2.1 Legitimidade: ....................................................................................... 22 2.2 A desistência do IRDR e seu julgamento ............................................ 23 2.3 Efeitos .................................................................................................. 31 2.4 Reclamação ......................................................................................... 35 2.5 Eficácia vinculante ............................................................................... 39 4 Referências bibliográficas: ............................................................... 42 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 3 1. PRECEDENTE Precedente é qualquer julgamento utilizado como fundamento para postular outro julgamento proferido em um momento futuro. O precedente possui caráter objetivo, pois se trata de uma decisão específica a qual será utilizada como fundamento de outras decisões. Neste sentido, o doutrinador Assumpção explica o seguinte: Dessa forma, sempre que um órgão jurisdicional se valer de uma decisão previamente proferida para fundamentar sua decisão, empregando-a como base de tal julgamento, a decisão anteriormente prolatada será considerada um precedente. (Assumpção, 2016. p.1973) Ainda assim o doutrinador Didier, tem também um excelente conceito relativo aos precedentes: À luz das circunstâncias específicas envolvidas na causa, interpretam-se os textos legais (lato sensu), identificando a norma geral do caso concreto, isto é, a ratio decidendi, que constitui o elemento nuclear do precedente. Um precedente, quando reiteradamente aplicado, se transforma em jurisprudência, que, se predominar em tribunal, pode dar ensejo à edição de um enunciado na súmula da jurisprudência deste tribunal (…). Demandas repetitivas são aquelas ações cujo aspecto objetivo: causa de pedir e pedido envolvam questões essencialmente de direito. (DIDIER, 2015. p. 487) Já a jurisprudência, é genérica, possui caráter abstrato. Refletindo, em um conjunto, ou seja, uma quantidade de decisões judiciais as quais foram 4 proferidas pelos tribunais em um mesmo sentido diversas vezes sobre a mesma matéria. O doutrinador Peixoto explica a diferença entre jurisprudência e precedentes da seguinte forma: Não pode ser confundido com o termo jurisprudência, utilizado para definir um conjunto de decisões judiciais. A diferenciação é essencialmente quantitativa, já que a utilização do termo precedente faz referência a uma decisão relativa a um caso particular, enquanto na utilização de jurisprudência essa referência se dirige a uma “pluralidade, frequentemente bastante ampla, de decisões relativas a vários e diversos casos concretos”. (PEIXOTO, 2016. p. 137-138) Diferenciando ainda as súmulas do precedente, Didier especifica: [...} como já colacionado anteriormente, traduzem-se em um enunciado que expressa a razão de decidir ou o fundamento da jurisprudência dominante de um determinado tribunal sobre determinada matéria, jurisprudência esta que é, por sua vez, a aplicação de um determinado precedente de forma repetida, sob o ponto de vista de (DIDIER, 2015. p. 487). Para que se crie um precedente, no entanto é necessário que se parta dos conceitos supra- citados até a criação de uma súmula, portanto, é possível observar que cada um dos conceitos originalmente analisados constituem progressões. Progressões estas que seguem uma ordem crescente, da fundamentação de uma decisão até se tornar um precedente, o qual foi acolhido e aplicado diversas vezes por um tribunal até se consolidar como jurisprudência. Uma vez esta jurisprudência, prevalecendo como a dominante e permanecendo relevante, é consagrada em uma súmula. Súmula essa que possui, assim, a finalidade última de cristalizar um entendimento primeiramente estabelecido por um precedente. 5 Fonte: https://www.istockphoto.com/br/foto/ 1.1 TÉCNICAS DE SUPERAÇÃO DE PRECEDENTES Para se superar um precedente parte-se de três modalidades: distinção (Distinguishing); superação (Overruling); e overriding. a) Distinção ou Distinguishing: A Distinção, ou Distinguishing no direito norte-americano, é a comparação entre o caso concreto e o paradigma ou seja ao precedente utilizado como referência, que permite ao magistrado deixar de aplica-lo em virtude da existência de alguma distinção entre o caso concreto e o precedente. 6 Conforme o entendimento de Assumpção: nesta hipótese a aplicação do precedente será excluída em razão de “determinadas peculiaridades fáticas e/ou jurídicas, mantendo-se o precedente válido e com eficácia vinculante para outros processos”. (ASSUMPÇÃO, 2016. p. 1.818) Para realizar a distinção deverá ser realizada quando um dos sujeitos processuais invocar um precedente e alegar sua aplicabilidade ao caso concreto. Dentro do direito processual, caberá à parte contrária argumentar pela não aplicação deste precedente, caso este seja seu interesse. E ao juiz restará, enfim, o dever de decidir sobre a adequação do precedente invocado ao caso concreto. (PEIXOTO, 2016, p. 187). Caso haja necessidade de se afastar o precedente pela distinção, caberá ao magistrado proferir decisão diversa daquela enunciada no precedente invocado pela parte. No entanto, a doutrina ensina que a distinção pode ser aplicada também de forma ampliativa ou restritiva. Nos casos, onde houver a necessidade de ampliar ou restringir o precedente não haverá a criação de uma tese jurídica nova, nem mesmo o precedente deixará de ser aplicado em virtude da distinção, haverá sim, uma modificação no âmbito de sua incidência. Distinção ampliativa e distinção restritiva Quanto a distinção ampliativa ou restritiva, Peixoto preleciona: A denominada distinção ampliativa ocorre quando um determinado precedente passa a ser aplicado, por meio de decisões posteriores, a fatos em relação aos quais não tinha a decisão originária feita 7 menção. Nessa situação ocorre uma expansão silenciosa do precedente originário. Por outro lado, a distinção restritiva será identificada quando fatos substanciais sejam retirados de uma ratio decidendi, diminuindo, assim, o seu âmbito de incidência, técnica que deve ser utilizada com cuidado, sob pena de haver tentativade superação por órgão jurisdicional incompetente para tanto. (PEIXOTO, 2016. p. 191) Peixoto, ainda distingue o risco de superação que, diferentemente da superação, a distinção não possui uma competência específica. Destarte, Didier entende que o distinguishing é considerado uma técnica de confronto, interpretação e aplicação do precedente. Ou seja, não de sua superação, porque o precedente apenas deixará de ser aplicado, sem, contudo, ser superado. (DIDIER, 2015. p. 491) Entende-se, então que a distinção nada mais é que a forma através do qual é feito o confronto entre o caso concreto e o paradigma o qual objetiva verificar a possibilidade da aplicação deste último ao caso concreto. Todavia, caso deste confronto advenha um resultado negativo, ter-se-á a “distinção” dos elementos confrontados. E isto permitirá ao magistrado afastar o precedente ou justificar sua não aplicação em virtude da superação deste. b) Superação ou Overruling: A técnica da Superação também conhecida como Overruling no direito norte-americano, é considerada um dos institutos mais importantes no sistema de precedentes vinculantes (stare decisis). E permite, dessa maneira, a evolução do sistema ao trazer a possibilidade de superação de um precedente. Retira-lhe, então, os efeitos vinculativos e substitui-os por outro sobre o mesmo objeto em julgamento. (PEIXOTO, 2016, p. 170). 8 Didier utiliza simples palavras ao dizer que “overruling é a técnica através da qual um precedente perde a sua força vinculante e é substituído (overruled) por outro precedente”. (DIDIER, 2015, p. 494) Neves ainda traz o seguinte entendimento: [...] o precedente superado é na realidade uma decisão judicial transitada em julgado. E somente perderá seus efeitos vinculantes e persuasivos enquanto precedente invocado para as causas futuras, e não as já resolvidas de forma definitiva. (NEVES, 2016, p. 1.819), A superação em contrapartida ao que ocorre na distinção, possui um critério de competência, onde somente a Corte é competente para criar o precedente e a Corte a ela superior detêm competência para superá-lo. Assim, Peixoto traz o entendimento de que: Ao ser utilizada a técnica da superação, são criadas duas novas regras impositivas: uma relativa ao entendimento superado e uma de natureza processual, relativa ao precedente, afirmando que agora este é o novo precedente e que deterá eficácia concedida pelo ordenamento jurídico. Tal formulação tem por objetivo ressaltar que apenas a Corte competente para fixar aquele entendimento ou a Corte a ela superior (ao menos em termos de matéria) poderá alterá- lo. Mesmo que uma determinada Corte incompetente para tanto não adote aquele entendimento, ela não terá poder para modificar a eficácia do precedente, inexistindo, por consequência, sua superação, permanecendo a ratio decidendi em vigor. No máximo, essa não aplicação será caracterizada como uma superação antecipada. Em sendo aplicável, e não sendo a hipótese de superação antecipada, tratar-se-á de decisão em error in judicando ou in procedendo. (PEIXOTO, 2016. p. 171): É possível concluir então que os tribunais inferiores não possuem competência para superar precedentes das cortes a eles superiores, sob pena de tornar facultativo aquilo que deveria ser obrigatório. 9 Da mesma forma que o Poder Judiciário “não pode deixar de aplicar a legislação por discordar de seus méritos (salvo situações de inconstitucionalidade), as Cortes inferiores não possuem competência para questionar os méritos dos precedentes das Cortes superiores por meio da superação”. (Peixoto, 2016 p. 171) A nova redação do art. 927 do Novo CPC para Assumpção chama a atenção para o §4º do art. 927 do Código de Processo Civil. O dispositivo estabelece, assim, que a modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica. E considerando, enfim, os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia. (ASSUMPÇÃO, 2016. p. 1821, 1822) Este dispositivo supra- citado veio para fortalecer art. 93, IX, da Constituição da República, o qual institui a obrigatoriedade de todas as decisões judiciais serem devidamente motivadas. Mas Assumpção, observa-se que a fundamentação requerida para motivar a superação de um precedente deve ser ainda mais aprofundada. Mas ao exigir que a fundamentação seja específica o legislador parece realmente ter inovado, criando uma especialidade quanto à motivação da decisão que supera súmula com eficácia vinculante e precedente obrigatório. Entendo que essa fundamentação específica exija do tribunal a demonstração de que a nova tese adotada em superação da anterior é melhor e/ou mais adequada, além de existirem mais fortes razões para alterar o entendimento do que para mantê-lo, mesmo que com sacrifício da ideia de segurança jurídica. (Assumpção, 2016. p. 1.822) 10 1.2 Princípios da segurança jurídica e da boa-fé objetiva Fonte:https://stock.adobe.com/pt/search? O motivo pelo qual o processo de superação deve ser realizado com extremo cuidado e ponderação. E deve-se pautar vez que pautado nos princípios da segurança jurídica e boa-fé objetiva. Se o principal objetivo do sistema de precedentes é que os tribunais uniformizem sua jurisprudência, mantendo-a estável, íntegra e coerente, nos moldes do art. 926 do Código Processual, a mudança de um entendimento sem a devida motivação poderia gerar a quebra da confiança dos jurisdicionados e operadores do Direito em relação ao Poder Judiciário. Aliás, ao sistema de precedentes como um todo. Afinal, estariam concretizando o oposto daquilo que seria o ideal, a violação da segurança jurídica ao invés de sua promoção. (NEVES, 2016, p. 1.819-1.823). Peixoto e Didier ensinam que a doutrina classifica a técnica de superação de precedentes em várias categorias. É possível classificá-la, por exemplo, em: explícita e implícita; difusa e concentrada; ou ainda antecipada. 11 A primeira classificação diz respeito à forma como a superação é realizada. Já a segunda tutela a instância ou local, semelhantemente ao que ocorre nos controles de constitucionalidade difuso e concentrado. Para finalizar, a antecipação traz regras específicas as quais regem tanto uma forma especial de superação quanto as instâncias envolvidas, vez que requer a participação da Corte superior competente para a criação do precedente juntamente com as inferiores deixando de aplicá-lo. Didier leciona que [...] a superação será expressa quando determinada Corte resolve, expressamente, adotar uma nova orientação jurídica, abandonando a anterior. Já a superação tácita ou implícita ocorre quando a Corte adota um posicionamento contrário ao seu próprio precedente sem, porém, substituí-lo. (DIDIER, 2016, p. 494) Ainda de acordo com o entendimento de Didier: Quando se fala em superação difusa e concentrada, conforme supra- citado, equiparam-se aos sistemas de controle de constitucionalidade, no sentido de que superação difusa pode ocorrer em qualquer processo que, chegando ao tribunal competente, permite a superação do precedente anterior, já a concentrada se dará em virtude da instauração de procedimento próprio, o qual será definido pelo regimento interno de cada tribunal, com o objetivo específico de discutir a revisão de um entendimento consagrado no tribunal. (DIDIER, 2015. p. 496). Peixoto preleciona sobre o assunto da seguinte forma: Quando se fala em superação antecipada, esta ocorre quando as Cortes inferiores são induzidas pelas Cortes superiores a deixar de aplicar um precedente supostamente vinculante ao caso concreto como meio de antecipar umasuperação futura pelas Cortes competentes. (PEIXOTO, 2016. p. 203 e 204) 12 O que não significa uma permissão para a não aplicação de precedentes vinculantes pela discordância quanto ao seu conteúdo. Independentemente do grau da mera discordância, não autoriza às Cortes inferiores a não aplicação do precedente, quando aplicável ao caso em julgamento. Uma vez que o precedente seja vinculante, ele só não será aplicado quando demonstrada a distinção, assim, não cabe aos órgãos a ele sujeitos a elaboração de um juízo de valor. Quanto a superação antecipada ela é uma medida que possui requisitos diferentes dos da superação, que lida com a própria discussão do conteúdo da decisão, uma discordância quanto a ela. O que se pode entender como uma espécie de exercício de previsibilidade, justamente porque não incumbe aos tribunais inferiores o poder de superar os precedentes das Cortes superiores. Ainda há muita polêmica quanto à aceitação da técnica de superação antecipada pelo ordenamento jurídico brasileiro, vez que deveria caber somente às Cortes superiores decidir sobre a superação de seus próprios precedentes. Todavia, como muito bem apontado por um dos principais elementos do sistema de precedentes é a promoção do princípio da segurança jurídica, o qual permite a previsibilidade das ações ou posicionamentos do Poder Judiciário. (PEIXOTO, 2016. p. 206) Existem ainda algumas categorias da superação e evolução do Direito conforme o doutrinador especifica: Nestes termos, quando uma Corte inferior prediz uma possível alteração do precedente pela Corte superior, ela estará agindo dentro dos limites daquilo que o próprio sistema defende como um todo, utilizando-se da possibilidade de prever o que poderá acontecer no futuro, em termos de segurança jurídica, ante a constante evolução do Direito. (PEIXOTO, 2016. p. 206). 13 Entende-se que as técnicas de superação são o elemento essencial para que o sistema de precedente permita a evolução do Direito, adaptando o entendimento das Cortes às mudanças sociais, políticas, econômicas e legislativas do país, sempre visando promover, como objetivo máximo, a segurança jurídica dos jurisdicionados e demais operadores do direito. Similarmente à superação e à distinção, há o instituto do Overriding, sem tradução conferida pela doutrina. Este é o nome dado à adequação de um precedente a uma nova realidade jurídica, a qual pode ter sido modificada pela superveniência de uma regra ou um princípio legal. (NEVES, 2016. p. 1.820). Por tratar-se de uma adequação Neves defende não tratar- se de superação do precedente, mas quando muito, apenas uma superação parcial, motivo pelo qual o instituto não deve ser confundido com o Overruling, a técnica de superação propriamente dita. (NEVES, 2016. p. 1.820) Segundo o posicionamento de Didier o qual é semelhante ao de Assumpção, explicam que na aplicação do Overriding não há a substituição da norma contida no precedente, de forma que a tese jurídica (ratio decidendi) permanece a mesma, havendo a restrição de sua incidência sob o caso concreto, sendo esta técnica muito mais assemelhada à técnica da distinção do que à da superação. Há aproximação, porém não identidade; trata-se de técnicas distintas. Verifica-se que, ao passo que no distinguishing, uma questão de fato impede a incidência da norma, no overriding é uma questão de direito (no caso, um novo posicionamento) que restringe o suporte fático. Ou seja, no primeiro são os fatos materialmente relevantes do novo caso concreto que afastam o precedente, por não terem sido considerados quando da sua formação, enquanto que, no segundo, o afastamento é decorrente de um novo entendimento; portanto, de um elemento externo à relação jurídica discutida. (DIDIER JR. 2015, p. 507). 14 Destarte, cada técnica analisada possui características próprias, apesar de haver algumas semelhanças existentes, as quais permitem, portanto, sua distinção. Tornando possível defini-las como um meio próprio de proceder à análise, aplicação, interpretação, distinção e superação dos precedentes. Quando se fala em superação de precedentes em face da segurança jurídica Como já mencionado anteriormente, o principal objetivo da instituição de um sistema de precedentes vinculativos é o de promover a segurança jurídica, conferindo aos jurisdicionados a possibilidade de prever o comportamento das Cortes ao passo em que estas cumprem com seu dever de uniformizar sua jurisprudência. A uniformização da jurisprudência pelas Cortes gera nos jurisdicionados uma expectativa legítima de que o Poder Judiciário continuará a pautar-se de acordo com suas súmulas e seus precedentes. Todavia, é necessário que o sistema evolua. E do mesmo modo, que se adapte às novas realidades enfrentadas pelo Direito. Ao superar um entendimento, corre-se o risco de romper com a segurança das pessoas que pautaram suas condutas baseadas em um entendimento que deixará de ter eficácia vinculante, sendo substituído por outro com fundamentações diversas daquela anteriormente esperada. (NEVES, 2016, p. 1.822-1.823). Com o fim de solucionar esta quebra de confiança, no NCPC de 2015, instituiu-se o §3º do art. 927, o qual estabelece que: “[...] na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica”. (BRASIL, 2015.) Como bem fundamentado por Didier 15 [...] o Poder Judiciário, como ente da Administração Pública, deve sujeitar-se ao princípio da não-surpresa. E por isso, velar pela preservação da confiança depositada na Administração pelo administrado. Para reforçar seus argumentos, o doutrinador lembra que há dispositivos de lei sobre a sujeição da Administração Pública ao princípio da confiança. É o caso, por exemplo, do art. 2º, parágrafo único, XIII, da Lei n. 9.784/1.999 e o art. 146 do Código Tributário Nacional. Os dispositivos, dessa maneira, prescrevem, respectivamente: (DIDIER, 2015. p. 500 e 503), Conforme versa o art. 2º da Lei 9784 de 1999 A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: XIII – interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação. (BRASIL, 1999) Existe ainda o princípio da irretroatividade o qual não permite que a lei retroaja de forma a prejudicar Semelhantemente, o próprio princípio da irretroatividade da lei pode ser considerado como derivado ou vertente da segurança jurídica, da boa-fé e da confiança impostas à Administração pela sociedade. (DIDIER JR., 2015, p. 501). Assim, alinhando os efeitos da superação ante a segurança jurídica, Assumpção observa o seguinte: Registre-se que, além de preservar a confiabilidade e a segurança jurídica, a possibilidade de modulação de efeitos da superação do precedente permite aos tribunais uma superação com mais tranquilidade, porque em sistemas em que não se admite tal modulação o trauma gerado pela superação do precedente funciona como impeditivo de tal superação. No direito pátrio, o tribunal poderá 16 dimensionar temporalmente o alcance da quebra da confiança no entendimento consolidado e pela modulação limitar os problemas advindos pela superação para aqueles sujeitos que se portaram no sentido do precedente ou súmula superada. (ASSUMPÇÃO, 2016. p. 1.823)A partir da aplicação das técnicas de superação de precedentes, a possibilidade da modulação de efeitos permitirá, de certo, uma nova conduta ainda mais segura para o jurisdicionado o qual em face da mutação de um precedente, permitirá, assim, que o sistema evolua sem muitos impactos traumáticos no decorrer dos processos. 2. O INCIDENTE PROCESSUAL DE DEMANDAS REPETITIVAS Fonte:https://stock.adobe.com/pt/search?filters A instauração do incidente processual de demandas repetitivas se dá quando existe um número considerado de ações iguais as quais serão definidos pelas jurisprudências dos tribunais superiores. O chamado incidente processual de demandas repetitivas é de competência dos tribunais de segundo grau os quais objetivam à criação de uma tese jurídica para aplicação obrigatória em processos repetitivos. 17 Criou-se a partir do CPC de 2015 o mecanismo de resolução de demandas repetitivas, com o objetivo de acabar com o abarrotamento de processos: O Conselho Nacional de Justiça revela que a quantidade de casos pendentes de solução definitiva (estoque de processos) nos tribunais brasileiros tem crescido, em média, 3,4% por ano desde 2009. Em 2013, o número de processos acumulados e que aguardavam uma decisão final no Judiciário chegou a 66,8 milhões. (TEIXEIRA, 2016. p. 2) Por causa do excesso de processos o Estado precisou criar mecanismos buscando dar celeridade a máquina jurisdicional, observe a constatação de Teixeira sobre a necessidade da instauração deste. O panorama atual é de visível incompatibilidade entre litigiosidade a capacidade do Poder Judiciário em absorver tal demanda. Mais do que um problema de natureza processual, trata-se de um problema de Estado, que presta jurisdição morosa, descumprindo direito fundamental do cidadão. Trata-se, ainda, de um problema de governo, vez que parte da solução deveria advir de um melhor aparelhamento do Judiciário, em nível federal e especialmente estadual. Curioso constatar que a facilitação do acesso à Justiça verificado nas últimas décadas sob o estímulo do Estado, em realização de sua própria incumbência constitucional, com medidas exitosas como o fortalecimento das defensorias públicas, ampla concessão da gratuidade da Justiça, implementação do procedimento sumaríssimo (Juizados Especiais), é justamente uma das principais causas do abarrotamento do Judiciário. A ampliação do acesso à Justiça desacompanhado de uma gestão eficiente acarretou prejuízo à qualidade e à tempestividade da jurisdição. A solução virou problema. O Estado não está obrigado a prestar qualquer jurisdição mas uma tutela justa, efetiva e adequada. Como sabido, a garantia do acesso à Justiça não se resume a acessar o Judiciário em busca de tutela (acesso formal), mas a receber uma resposta efetiva e tempestiva, representativa do conceito atual do acesso à Justiça em sentido material e substancial. (TEIXEIRA, 2016. p. 2) Com o objetivo de tentar resolver o problema do excesso de demandas que versam sobre o mesmo tema, uniformizando assim o entendimento criou-se o instrumento chamado incidentes processuais de demandas repetitivas. 18 O novo Código de Processo Civil reconhece, de modo expresso, sua função de concretizar o modelo constitucional de jurisdição e do processo, a servir de instrumento idôneo para a solução de conflitos e tutela adequada dos mais variados direitos, aí incluídos os direitos individuais homogêneos, presentes no fenômeno da proliferação de demandas repetitivas. Nesse diapasão, um dos principais eixos do novo Código de Processo Civil consiste na valorização de precedentes, mediante diferentes mecanismos, todos vinculantes, dentre estes o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) objeto do presente artigo. Privilegia-se, aqui, o valor segurança jurídica valorizando-se a previsibilidade e a estabilidade das decisões judiciais. Neste incremento da autoridade dos precedentes judiciais percebe-se certa aproximação entre os sistemas jurídicos da civil law e da common law. (TEIXEIRA, 2016. p. 4) No entendimento de Teixeira o NCPC criou uma terceira via de tutela, um incidente específico [...] instaurado a partir de um processo individual representativo da controvérsia, para firmar o precedente vinculante para a tutela uniforme de direitos individuais repetitivos e homogêneos, disciplinado nos arts. 976-986 do CPC/2015. Desse modo, o IRDR destina-se a trazer solução parcial aos males de insegurança jurídica, associados à ausência de previsibilidade e estabilidade da jurisdição diante de demandas individuais repetitivas, com idêntica questão de direito. Trata-se de incidente em demanda individual (causa-piloto) vocacionado para firmar a tese jurídica a respeito de determinada controvérsia. (TEIXEIRA, 2016. p. 5) Esse incidente de demandas repetitivas foi criado então com o objetivo de uniformizar jurisprudência mediante estabilização da tese jurídica firmada em precedente vinculante, em controvérsias que são individuais, porém com a mesma questão de direito. Com o objetivo de assegurar garantias constitucionais: segurança jurídica, isonomia e duração razoável do processo. 19 Atenta a tal realidade, o rol de garantias constitucionais foi ampliado por força de EC 45/2014, garantindo a todos, no plano ideal dos princípios, "a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação." Imbuído desse propósito, o Código de Processo Civil de 1973 recebeu inúmeras reformas voltadas a incrementar a efetividade, entendida como aptidão do processo em produzir resultados. Foi e será preciso racionalizar a distribuição da tutela jurisdicional, cuidando-se de solucionar questões de direito repetitivas de modo eficiente, assegurando igualdade, previsibilidade e relativa estabilidade na resposta jurisdicional, tutelando de forma idêntica controvérsias jurídicas idênticas, típicas da sociedade de massa, sob pena de grave descrédito do sistema judicial de resolução de conflitos. Concorda-se com o diagnóstico de que "sendo o processo instrumento de pacificação social, a adoção de soluções jurídicas diversas para uma mesma situação jurídica acarreta inegável insegurança jurídica, incerteza do direito e efetivo descrédito no Poder Judiciário" (TEIXEIRA, 2016. p. 6) O propósito é a busca da valorização da jurisprudência, adotada como precedente, verificável como dominante ou transformada em súmula. Para alcançar tal objetivo criou-se normas que vão direcionar o incidente de resolução de demandas repetitivas. A exemplo do que institui o art. 978 do NCPC de 2015: O julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles responsáveis pela uniformização de jurisprudência do tribunal. Parágrafo único. O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente. (BRASIL,2015) Este tipo de julgamento cria um precedente vinculante que contém eficácia limitada à competência territorial do tribunal de segundo grau competente para seu julgamento. A eficácia vinculante nacional do precedente formado no IRDR é obtida através do julgamento do recurso especial e/ou extraordinário cabível contra o acórdão que julga o incidente. 20 Os requisitos para o cabimento do incidente processual de demandas repetitivas estão previstos no art. 976, do CPC de 2015: Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente: I - efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; II - risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. § 1º A desistência ou o abandono do processo não impede o examede mérito do incidente. § 2º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono. § 3º A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja o incidente novamente suscitado. § 4º É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva. § 5º Não serão exigidas custas processuais no incidente de resolução de demandas repetitivas. (BRASIL, 2015) A ofensa à isonomia decorrente de decisões desiguais sobre idêntica questão de direito estará sempre presente diante da multiplicação de demandas repetitivas. O risco à isonomia, portanto, será uma decorrência natural dos pressupostos legais antecedentes (demandas repetitivas e controvérsia sobre idêntica questão de direito). Diante da proliferação de dezenas, centenas, milhares de processos sobre idêntica questão de direito será difícil negar o risco de decisões divergentes, a partir da natural abertura do direito, do emprego de conceitos indeterminados, do princípio do livre convencimento, da diversidade de princípios invocáveis, da possível colisão entre normas, ou seja, dentre tantas intepretações e respostas possíveis. (TEIXEIRA, 2016. p. 6) Para que haja um entendimento melhor sobre o incidente processual de demandas repetitivas Neves explica: 21 Há dois requisitos cumulativos positivos e um requisito negativo de cabimento do IRDR. O art. 976 do Novo CPC prevê em seus dois incisos os requisitos positivos. A efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito afasta do IRDR natureza preventiva, porque exige que efetivamente a mesma questão esteja sendo discutida em múltiplos processos em trâmite. O risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica pode ser compreendido de duas formas: considerado em abstrato, o risco existirá pela mera razão de uma mesma questão jurídica estar sendo discutida em múltiplos processos; considerado em concreto, será necessária não só uma quantidade razoável de decisões sobre a mesma questão jurídica, mas que tais decisões não tenham uma solução uniforme. Entendo que o risco de dano deva ser considerado em concreto, porque sua consideração em abstrato torna o requisito inútil, já que contemplado pelo preenchimento do requisito previsto no art. 976, I, do Novo CPC. O requisito negativo está disposto no art. 976, § 4º, do Novo CPC, que prevê a inadmissão do IRDR quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva. (NEVES, 2018. p. 412). Entende-se por esse requisito negativo pelo fato de que o precedente criado no IRDR terá eficácia vinculante nos limites territoriais do tribunal de segundo grau, já quanto ao recurso especial ou extraordinário repetitivo 22 precedente formado terá eficácia vinculante em todo o território nacional. Fonte:https://www.google.com/search?q=precedentes+judiciais+e+demandas+repetitivas 2.1 Legitimidade: Quem tem legitimidade para propor o incidente processual de demandas repetitivas estão elencados no art. 977 do NCPC de 2015: Art. 977. O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente de tribunal: I - pelo juiz ou relator, por ofício; II - pelas partes, por petição; III - pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição. Parágrafo único. O ofício ou a petição será instruído com os documentos necessários à demonstração do preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente. (BRASIL, 2015) 23 O entendimento de Neves sobre a legitimidade para propor o incidente processual de demandas repetitivas é de [...] que, sendo o objetivo do incidente ora estudado a formação de um precedente vinculante, com o que se estará preservando a previsibilidade, a segurança jurídica e a isonomia, a legitimidade do Ministério Público para suscitar o incidente de assunção de competência é universal, já que, sendo fiscal da ordem jurídica, poderá sempre atuar para preservar os valores que justificam a criação de um precedente vinculante. Não é essa, entretanto, a conclusão quanto à legitimidade da Defensoria Pública, que não tem entre suas finalidades institucionais a defesa da ordem jurídica. Não tenho dúvida de que, sendo a questão jurídica a ser resolvida de interesse de hipossuficientes econômicos, a Defensoria Pública terá legitimidade para suscitar o incidente, não sendo nesse caso necessário que todos os interessados sejam hipossuficientes econômicos e muito menos que as partes do processo tenham tal espécie de hipossuficiência. Mais polêmica será a defesa de legitimidade da Defensoria Pública no caso de admitir-se entre suas funções atípicas a defesa do hipossuficiente organizacional. Entendo que um bom parâmetro para a definição dos contornos da legitimidade da Defensoria Pública para suscitar o incidente de assunção de competência seja sua competência para a propositura de ação coletiva. (NEVES, 2018. p. 414) Por se tratar de uma ação de grande previsibilidade e como dito anteriormente, que se tornará com eficácia vinculante imutável é necessário para que haja segurança jurídica um rol específico de interessados em garantir essa segurança. O art. 976, § 5º, do Novo CPC prevê expressamente que não serão exigidas custas processuais no incidente de resolução de demandas repetitivas. Também não haverá condenação ao pagamento de honorários advocatícios. 2.2 A desistência do IRDR e seu julgamento Caso o autor do processo o qual foi instaurado o IRDR venha a desistir do processo, não poderá evitar que o tribunal julgue o incidente, o art. 976, § 24 1º, do Novo CPC prevê que a desistência ou abandono do processo não impede o exame do mérito do incidente. Assim como a inadmissão da propositura do incidente processual de demandas repetitivas é de competência exclusiva do órgão colegiado, não sendo competente, portanto, o relator do incidente para inadmiti-lo monocraticamente. Desse acórdão será cabível apenas o recurso de embargos de declaração, não sendo cabíveis os recursos especial e extraordinário, porque a decisão não decide a causa, limitando-se apenas a decidir pela não solução do mérito do incidente diante do não preenchimento de seus requisitos positivos (incisos do art. 976 do Novo CPC) ou da presença de seu requisito negativo (art. 976, § 4º, do Novo CPC). Como o julgamento não será de mérito, é possível a repropositura do IRDR, mas para tanto o art. art. 976, § 3º, do Novo CPC prevê que ela está condicionada à presença dos requisitos faltantes no primeiro julgamento. (NEVES, 2018. p. 415) Já o art. 978 vai informar que o órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária do qual se originou o incidente Art. 978. O julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles responsáveis pela uniformização de jurisprudência do tribunal. Parágrafo único. O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente. (BRASIL, 2015) No entender de Neves, essa regra gera duas dificuldades práticas consideráveis: 25 A primeira é explicar a legitimidade do juiz de suscitar o incidente, jáque o dispositivo sugere que ele só pode ser suscitado em segundo grau de jurisdição, por depender da existência de um recurso, reexame necessário ou processo de competência originária do tribunal. Entendo que a legitimidade do juiz é limitada ao momento posterior à interposição de apelação contra sua sentença, porque nesse caso, ainda que o processo ainda esteja no primeiro grau, será necessariamente remetido ao tribunal de segundo grau diante da falta de competência do juízo sentenciante para analisar a admissibilidade do recurso de apelação. A segunda dificuldade é a suscitação do IRDR nos Juizados Especiais, porque nesse caso, mesmo que haja recurso inominado em trâmite, o tribunal de segundo grau é absolutamente incompetente para o seu julgamento. (NEVES, 2018. p. 416) Os processos em tramite perante os juizados especiais serão afetados pelo incidente processual de demandas repetitivas dar-se-á em dois momentos. No primeiro momento, com a suspensão dos processos repetitivos determinada pelo relator conforme versa o inciso I do art. 982, do Novo CPC: “Admitido o incidente, o relator: I - suspenderá os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região, conforme o caso”. Os processos pendentes serão suspensos pelo prazo de 1 (um) ano, ressalvados aqueles que envolvem réu preso ou habeas corpus. Superado este prazo cessará a suspensão, salvo decisão fundamentada do relator (art. 980, caput). A limitação do prazo de suspensão dá-se pela razão de que repercutirá - e retardará – o trâmite de todos os processos pendentes. Sob pena de ofensa ao princípio da duração razoável do processo, não se poderá admitir a postergação indefinida ou irrazoável do julgamento, que inclusive deverá ter preferência sobre os demais processos. Ultrapassado o prazo de suspensão e não fundamentada sua postergação, será natural que os julgadores dos processos inicialmente suspensos não se sintam "estimulados" a decidir, cientes de que seu entendimento pessoal poderá ser revisto quando da fixação da tese no incidente. Discute-se, acerca da inconstitucionalidade da suspensão compulsória das demandas repetitivas e de seu efeito vinculante, 26 ambos destituídos de prévia autorização constitucional, tal como ocorre em relação às sumulas vinculantes (CF, art. 103-A). Com efeito, a decisão firmada em IRDR apresenta a mesma carga de eficácia das súmulas vinculantes, contudo, sem autorização constitucional. A questão requer maior aprofundamento para a devida análise, escapando aos limites deste breve artigo. Note-se que o fenômeno da suspensão compulsória de casos repetidos e sua eficácia vinculante também ocorre no julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos (art. 1.036, § 1.º), que também não apresentam permissão constitucional, a merecer, por coerência, igual solução na análise de sua compatibilidade com a Constituição. Ou ainda pelo tribunal superior conforme institui o art. 982, §§ 3º a 5º, do Novo CPC: § 3º Visando à garantia da segurança jurídica, qualquer legitimado mencionado no art. 977, incisos II e III, poderá requerer, ao tribunal competente para conhecer do recurso extraordinário ou especial, a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos em curso no território nacional que versem sobre a questão objeto do incidente já instaurado. § 5º Cessa a suspensão a que se refere o inciso I do caput deste artigo se não for interposto recurso especial ou recurso extraordinário contra a decisão proferida no incidente. (BRASIL, 2015) No segundo momento, com a eficácia vinculante do precedente a ser criado pelo julgamento do IRDR de acordo com o inciso I do art. 985, do Novo CPC: Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada: I - a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região; (BRASIL, 2015) Ainda segundo o art. 980, caput, do Novo CPC, existe o prazo de um ano para o julgamento do IRDR e, para que o mesmo possa ser cumprido, o mesmo dispositivo prevê a preferência em seu julgamento, salvo nos processos que envolvam réu preso e nos pedidos de habeas corpus. 27 Uma vez vencido esse prazo sem o julgamento do incidente, o parágrafo único do art. 980 do Novo CPC prevê a cessação da suspensão dos processos repetitivos. Para Neves, esse efeito previsto no caput do art. 980, do NCPC/15 Ocorre, entretanto, que esse efeito não é inexorável, porque o mesmo dispositivo legal estabelece que, havendo decisão fundamentada do relator justificando o não cumprimento do prazo, os processos repetitivos continuarão suspensos. (NEVES, 2018. p. 418) Ainda, o art. 982, I, do Novo CPC de 2015 dispõe que, em decorrência da admissão do incidente pelo órgão colegiado, o relator suspenderá os processos pendentes, individuais ou coletivos que tramitam no Estado ou na região, conforme o caso. Ainda nos dizeres de Neves: O ministro relator do tribunal superior poderá suspender os processos repetitivos em razão do IRDR em dois momentos: quando for provocado a tanto, nos termos dos §§ 3º e 4º do art. 982 do Novo CPC, mesmo antes da interposição de recurso especial ou extraordinário, ou com a remessa ao tribunal superior de tais recursos quando a suspensão ainda estiver limitada pela competência territorial do tribunal de segundo grau. No primeiro caso, entendo tratar-se de decisão interlocutória monocrática, porque o ministro do tribunal superior estará efetivamente sendo chamado a proferir uma decisão sobre a expansão da suspensão dos processos repetitivos para todo território nacional. E, tratando-se de genuína decisão interlocutória monocrática, entendo ser cabível o agravo interno, nos termos do art. 1.021, caput, do Novo CPC. No segundo caso, acredito tratar-se de mero despacho, porque, sendo admitido o recurso especial ou extraordinário interposto contra o acórdão que julgou o IRDR, a suspensão dos processos repetitivos em todo território é imperativa, não cabendo ao relator do recurso excepcional decidir sobre o tema, apenas determinar a suspensão em estrito cumprimento da exigência legal. (NEVES, 2018. p. 419) 28 Destarte, não será cabível o agravo interno, nos termos do art. 1.001 do Novo CPC. Cabe ainda observar que por ser um caso de grande visibilidade e repercussão a intervenção de amicus curiae no incidente de processual de demandas repetitivas observa-se o art. 138, caput, do Novo CPC, o qual prevê a admissão do amicus curiae em razão da relevância da matéria, da especificidade do tema objeto da demanda ou da repercussão social da controvérsia. Observa-se ainda no art. 983, caput, do Novo CPC, onde a previsão de que o relator do incidente processual de demandas repetitivas deverá ouvir os órgãos e entidades com interesse na controvérsia. Conclui-se então pela admissão do amicus curiae no IRDR, de acordo com Neves que: O art. 938, caput, do Novo CPC é o interesse institucional na melhor qualidade possível da prestação da tutela jurisdicional, e não um interesse pessoal, o que desvirtuaria a função do amicus curiae no processo. Nunca é demais lembrar que o julgamento do IRDR será um precedente vinculante, a ser utilizado como fundamento do decidir em múltiplos processos, afetando dessa forma muitos sujeitos que não terão participado do IRDR. Essa eficácia ultra partes do precedente vinculante formado no IRDR exige a qualificação da formação do convencimento dos julgadores, sendo justamente nesse sentido a justificativa da intervenção de terceiro como amicus curiae. (NEVES, 2018. p. 421) O Julgamento acontecerá da seguinte forma nos dizeres de Sales: O relator, lerá seu relatório onde fará a exposiçãodo objeto do incidente em seguida as partes do processo original poderão fazer sustentação oral pelo prazo de 30 minutos para cada um sendo, primeiro o autor e depois o réu, em seguida o Ministério Público poderá sustentar pelo prazo de 30 minutos. Todos os interessados poderão ainda fazer sustentação oral, desde que se inscrevam com dois dias de antecedência, pelo prazo de 30 minutos, minutos estes que serão divididos entre todos os inscritos. Após o ato contínuo passa-se a colheita dos votos dos desembargadores, formando assim 29 o acórdão, que deverá abranger a análise de todos os fundamentos levantados pelas partes e pelos intervenientes, referentes à tese debatida, seja, eles favoráveis ou não. (SALES, 2018. p. 533) O julgamento do IRDR será recorrível por meio de embargos de declaração, sendo também cabível o recurso especial e extraordinário, por expressa previsão do art. 987, caput, do Novo CPC. Assim, é interessante a necessidade de alterar o conceito de causa para afastar o dispositivo legal de inconstitucionalidade, uma vez que o texto constitucional exige a decisão da causa para o cabimento dos recursos excepcionais. Quando se fixa uma tese jurídica no julgamento do IRDR não gera tecnicamente sucumbência a nenhuma das partes do processo no qual foi instaurado o incidente, porque, segundo Neves: [...]ao fixar tese jurídica, o tribunal não frustra qualquer pretensão das partes. Dessa forma, o interesse recursal para os recursos especial e extraordinário contra o acórdão que julga o IRDR não pode ser analisado sob a ótica da sucumbência. Correta lição doutrinária ensina que o interesse recursal é demonstrado quando o provimento do recurso é capaz de melhorar a situação prática do recorrente, e, sendo a parte envolvida no incidente afetada em outros processos em razão do precedente vinculante, não tenho dúvida de seu interesse recursal, ainda que a tese jurídica lhe beneficie, na interposição do recurso especial e extraordinário. Não custa lembrar que o IRDR, ao ser julgado pelo tribunal de segundo grau, cria um precedente vinculante com efeitos limitados à competência territorial desse tribunal, só havendo eficácia nacional com o julgamento dos recursos excepcionais nos tribunais superiores. (NEVES, 2018. p. 422) Dessa forma entende-se que o processo em que foi instaurado o IRDR quando demonstrar que também é parte em processos repetitivos em trâmite em estados ou regiões distintas daqueles em que foi julgado o IRDR, o interesse de agir pode se limitar a tornar nacional a eficácia local do precedente. 30 Quanto a possibilidade de se afastar a suspensão do processo gerado pela instauração do IRDR Neves explica: A única forma é a parte interessada convencer o juiz do processo da distinção, ou seja, demonstrar que o processo suspenso tem alguma especialidade fática ou jurídica que o distingue da situação fático- jurídica que será resolvida pelo IRDR. Nesse caso, havendo realmente causa para a distinção, a decisão do processo não estará vinculada ao precedente a ser criado no IRDR, não tendo sentido, portanto, mantê-lo suspenso à espera de um julgamento que não o afetará. O pedido de afastamento da suspensão do processo deve ser feito por meio de mera petição, devidamente fundamentada. Sendo elaborada em primeiro grau de jurisdição, a decisão interlocutória que o resolver não é recorrível por agravo de instrumento, já que não há previsão expressa nesse sentido e tal decisão não consta do rol do art. 1.015 do Novo CPC. Como deixar para impugnar tal decisão na apelação ou contrarrazões, nos termos do art. 1.009, § 1º, do Novo CPC, parece ser inútil, pode-se cogitar do cabimento de mandado de segurança contra a decisão. (NEVES, 2018. p. 425) No em que o processo suspenso esteja no tribunal, a decisão que resolver o pedido será monocraticamente proferida pelo relator, sendo nesse caso cabível o recurso de agravo interno, nos termos do art. 1.021, caput, do Novo CPC. Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal. § 1º Na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada. § 2º O agravo será dirigido ao relator, que intimará o agravado para manifestar-se sobre o recurso no prazo de 15 (quinze) dias, ao final do qual, não havendo retratação, o relator levá-lo-á a julgamento pelo órgão colegiado, com inclusão em pauta. § 3º É vedado ao relator limitar-se à reprodução dos fundamentos da decisão agravada para julgar improcedente o agravo interno. § 4º Quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa. § 5º A interposição de qualquer outro recurso está condicionada ao depósito prévio do valor da multa prevista no § 4º, à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que farão o pagamento ao final. (NEVES, 2018.p. 426) 31 Assim, após decisão final o incidente processual de demandas repetitivas gera então um precedente vinculante de eficácia geral. 2.3 Efeitos Fonte:https://www.google.com/search? Após o julgamento do incidente de demandas repetitivas, firma-se a tese jurídica, assim, essa decisão deverá ser aplicada: a todos os processos pendentes que tratam da mesma matéria, na área de competência do tribunal, inclusive dos juizados especiais; aos processos futuros que tratam da mesma matéria e que venham a tramitar na área de competência do tribunal, a não ser que haja revisão da tese, na forma do art. 986 do Novo Código de Processo Civil. (SALES, 2018. p. 533) Em relação aos casos futuros, deverá o julgador do caso concreto aplicar eventual distinção do julgado em exame em relação à tese firmada no IRDR (arts. 489, § 1.º, V e VI, art. 927, § 1.º). Se for este o caso, o precedente não deverá ser aplicado. Do contrário, tratando- se de julgado sobre idêntica questão de direito fixada no precedente, este deverá ser aplicado, de modo que "a fundamentação originária do julgamento do incidente se incorporará automaticamente à própria 32 decisão que o invoca, sem a necessidade de repeti-la ou elaborá-la, razão pela qual não é exigível a observância do art. 489, § 1.º, IV". Em síntese, o precedente firmado no âmbito do IRDR é dotado de autoridade vinculante (binding autority), produzindo o efeito de vincular os julgados que, em situações idênticas, lhe forem supervenientes. A norma geral estabelecida na fundamentação deste julgado (ratio decidendi) terá a eficácia de vincular decisões posteriores, obrigando os órgãos jurisdicionais a adotarem aquela mesma tese na fundamentação dos julgados sob sua jurisdição, conquanto repouse a controvérsia sobre idêntica questão de direito, em obediência aos princípios da isonomia e segurança jurídica. (TEIXEIRA, 2016. p. 10) Art. 986. A revisão da tese jurídica firmada no incidente far-se-á pelo mesmo tribunal, de ofício ou mediante requerimento dos legitimados mencionados no art. 977, inciso III. (BRASIL, 2015) Art. 489. São elementos essenciais da sentença: § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotadapelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.(BRASIL, 2015) Os juízes deverão observar a partir de então a tese firmada pelo tribunal conforme se lê no artigo que se segue: Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os 33 acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. § 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º, quando decidirem com fundamento neste artigo. § 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese. § 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. § 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia. § 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores. (BRASIL, 2015) Caso os juízes entendam por não seguir a tese firmada a parte inconformada poderá interpor Reclamação conforme versam os arts.988 a 993 do NCPC/15. Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III - garantir a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência) IV - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência; (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência) § 1º A reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal, e seu julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir. § 2º A reclamação deverá ser instruída com prova documental e dirigida ao presidente do tribunal. § 3º Assim que recebida, a reclamação será autuada e distribuída ao relator do processo principal, sempre que possível. § 4º As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam. § 5º É inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão. § 5º É inadmissível a reclamação: (Redação dada pela Lei 34 nº 13.256, de 2016) (Vigência) I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada; (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência) II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência) § 6º A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação. (BRASIL,2015) Conforme mencionado acima, um dos objetivos de se interpor a reclamação é para manter a ordem jurídica, preservando a competência do tribunal, a qual busca garantir a autoridade das decisões do tribunal. Art. 989. Ao despachar a reclamação, o relator: I - requisitará informações da autoridade a quem for imputada a prática do ato impugnado, que as prestará no prazo de 10 (dez) dias; II - se necessário, ordenará a suspensão do processo ou do ato impugnado para evitar dano irreparável; III - determinará a citação do beneficiário da decisão impugnada, que terá prazo de 15 (quinze) dias para apresentar a sua contestação. (BRASIL, 2015) O relator deverá observar os prazos ao despachar a reclamação. O fato de se interpor a reclamação porque a decisão do juízo não foi de acordo com a tese firmada de incidente de resolução de demandas repetitivas não quer dizer que o tribunal irá decidir da mesma forma, pois a tese poderá ser revista, uma vez que o conforme preleciona Sales: O direito é uma ciência social e, como tal, está sujeito a mudanças conforma mude a própria sociedade. Assim também ocorre as decisões judiciais. Por isso não é de se imaginar que a tese firmada no IRDR seja eterna e permanente. Ela também está sujeita a alterações, podendo ser revista. A revisão da tese pode ser feita pelo próprio tribunal, que proferiu a decisão no IRDR que a originou. Ela pode se dar de ofício, ou seja, por iniciativa do próprio tribunal, ou por requerimento do MP ou da Defensoria Pública. (SALES, 2018. p. 533, 534) 35 Fonte: SALES, manual de direito processual civil, 2018. P.531. Contra o acórdão que julga o incidente de resolução de demandas repetitivas, caberá recurso extraordinário ou especial, conforme o caso se trate de matéria constitucional ou infraconstitucional, de forma excepcional, nesses casos o recurso especial e extraordinário será dotado de efeito suspensivo, para fins de conhecimento do recurso extraordinário, haverá então a presunção de repercussão geral da questão constitucional eventualmente discutida. Quando acontecer de os recursos serem conhecidos e apreciados pelo mérito, a decisão adotada pelo STF ou STJ, conforme o caso, será aplicada em todo o território nacional, em todos os processos que versem sobre a mesma matéria, sejam eles individuais, sejam eles coletivos. (SALES, 2018. p. 534) 2.4 Reclamação A partir do advento do Novo Código de Processo Civil, a reclamação ganha novos contornos, cabendo para todo e qualquer tribunal, e não apenas para os superiores sempre que houver pretensão. 36 Essa reclamação como supra- citado visa: a) preservar a competência do tribunal, quando o juiz ou tribunal, julga causa ou recurso de competência deste; b) garantir a autoridade das decisões do tribunal, quando decisão, monocrática ou colegiada, do tribunal não estiver sendo respeitada ou cumprida por autoridades judiciárias ou administrativas; c) garantir a observância do enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade, quando uma súmula vinculante ou uma decisão não estiver sendo respeitada ou cumprida por autoridades judiciárias ou administrativas; d) garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de precedenteproferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência, quando a súmula ou precedente não estiver sendo cumprido ou respeitado por autoridades judiciárias ou administrativas; e e) garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de IRDR ou de assunção de competência. As hipóteses c e d compreendem tanto a aplicação indevida da tese jurídica quanto a sua não aplicação aos casos que a ela correspondam. (SALES, 2018. p. 535) Com estes novos contornos objetiva-se dar garantia jurídica as teses formadas pelos tribunais. Quanto a competência e processamento da reclamação, ela deverá ser ajuizada, pela parte interessada, perante qualquer tribunal, cabendo o seu julgamento ao órgão cuja competência foi usurpada ou cuja autoridade se quer garantir, visto que, ao ser recebida e atuada, ela deverá ser distribuída, sempre que possível, ao relator do processo principal. A reclamação deve ser distribuída, sempre que possível, ao relator do processo principal, devendo ser instruída com os documentos necessários a fim de comprovar a matéria alegada e ser dirigida ao Presidente do tribunal. Conforme o entendimento do STF: STF, Súm. Nº 734. Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal. (SALES, 2018. p. 536) 37 Também não caberá reclamação para garantir observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recurso especial ou extraordinário repetitivo, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. Interessa observar a preocupação do legislador para com a coerência do microssistema de vinculação aos precedentes (art. 927) ao dispor que será incabível o IRDR quando tribunal superior já tiver afetado recurso repetitivo (arts. 1.036-1.042) sobre a mesma questão de direito objeto do incidente posteriormente instaurado (art. 976, § 4.º). Neste caso, em favor da racionalidade da jurisdição, prevalecerá a decisão do recurso repetitivo somente porque afetado anteriormente, uma vez que inexiste hierarquia entre tais mecanismos de uniformização de jurisprudência, inseridos - não por acaso - no mesmo inciso do art. 927, ao estabelecer a ordem dos precedentes à brasileira. A propósito, em breve parêntesis, a expressão precedentes à brasileira bem denota a existência de uma sistema de precedentes único, com peculiaridades distintas daquelas observadas em países com maior tradição no assunto. Verifica-se, exemplificativamente, em relação ao IRDR, um precedente fruto de um único julgamento e cuja decisão será de aplicação obrigatória a todos os demais, em qualquer grau de jurisdição, sob pena de reclamação ao órgão jurisdicional que firmou o precedente. Já em relação às súmulas, presentes no topo da cadeia do sistema de uniformização brasileiro, impõe-se admitir sua pobreza de sentido diante da riqueza presente na ratio decidendi de um precedente. As súmulas são naturalmente generalizantes e abstratas, especialmente se ignorados os julgados que lhe deram sustentação. Como bem adverte Lênio Luiz Streck acerca do objetivismo das súmulas, eles são "respostas a priori, oferecidas antes das perguntas", são uma espécie "de 'antecipação de sentido, uma tutela antecipatória das palavras', ou, ainda, uma atribuição de sentido inaudita altera parte". O tema escapa aos modestos limites do presente artigo e requer maior aprofundamento. Ressente-se, na realidade, de uma teoria própria de precedentes conforme as particularidades do ordenamento jurídico nacional. (TEIXEIRA, 2016. p.7) Relativo ao processamento, uma vez recebida e distribuída a reclamação, o relator deverá despachá-la adotando as providências que se seguem: 38 a) requisitará informações à autoridade a quem foi imputada a prática do ato impugnado, providência essa que é obrigatória. As informações deverão ser prestadas no prazo de dez dias; b) poderá ordenar a suspensão do processo ou do ato impugnado, para evitar dano irreparável, se entender necessário, sendo isso ato discricionário do relator, que deverá, em todo caso, fundamentar a decisão; e c) determinará a citação do beneficiário do ato impugnado, para que apresente contestação no prazo de 15 dias, ato obrigatório do relator para garantir o direito ao contraditório. (SALES, 2018. p. 536) Conforme versa o inciso III, do art. 989, do NCPC além do beneficiário, que será citado para apresentar contestação, qualquer pessoa que tiver interesse jurídico na questão reclamada poderá impugnar o pedido do reclamante. Quando o Ministério Público não for o autor da reclamação, o relator deverá intimá-lo tendo vista dos autos pelo prazo de 5 (cinco) dias, após o prazo das informações e da contestação, podendo, se quiser, manifestar-se no feito, uma vez que a manifestação do Ministério Público não é obrigatória, construindo ato discricionário. Já conforme os atos do julgamento da reclamação, o tribunal poderá adotar, em face do ato impugnado, a medida que entender adequada para solucionar a controvérsia. De acordo com o que institui o art. 922 do NCPC/15, Convindo as partes, o juiz declarará suspensa a execução durante o prazo concedido pelo exequente para que o executado cumpra voluntariamente a obrigação. Parágrafo único. Findo o prazo sem cumprimento da obrigação, o processo retomará o seu curso. (BRASIL, 2015) Uma vez julgada procedente a reclamação, o tribunal, fará cessar a decisão exorbitante de seu julgado determinando à medida adequada a 39 solução da controvérsia, o que possibilita o tribunal a agir da maneira mais ampla possível, a fim de coibir a usurpação da sua competência, ou, a não observância de suas decisões ou das súmulas e precedentes dos tribunais superiores. Depois de julgada procedente a reclamação, o presidente do tribunal fará com que se cumpra de imediato, deixando o acórdão para ser lavrado em momento posterior. (SALES, 2018. p. 536) 2.5 Eficácia vinculante Fonte:https://www.google.com/search? O precedente gerado pelo IRDR produz uma força vinculante do precedente gerado a partir do julgamento do mérito que se revela na afirmação textual contida no art. 985 [...] de que a tese fixada será aplicada (i) a todos os processos individuais e coletivos que versem sobre idêntica questão de direito, (ii) aos processos no âmbito dos juizados especiais do respectivo Estado ou região; (iii) aos casos futuros que versem sobre idêntica questão de direito; (iv) caso o precedente não seja observado caberá reclamação; (v) terá sua aplicação fiscalizada pela agência reguladora competente caso o precedente firmado diga respeito à 40 prestação de serviço público concedido, permitido ou autorizado; (v) terá aplicação obrigatória salvo revisão do próprio tribunal que julgou o incidente em definitivo. A força vinculante do precedente firmado em IRDR dependerá apenas do julgamento do mérito do mesmo, não obstante em favor ou em desfavor dos interesses do autor da demanda originária. Registre-se que ao autor da demanda individual ou coletiva suspensa por versar sobre idêntica questão não será outorgado a possibilidade direito de fugir à eficácia vinculante da decisão fixada no IRDR (coisa julgada pro et contra). Trata-se de característica diversa do que se observa no microssistema processual das ações coletivas, no qual é reconhecido ao autor o direito de opt- out, ou seja, de prosseguir com a sua demanda e não sujeitar-se aos efeitos da sentença coletiva caso lhe seja desfavorável (coisa julgada secundum eventum litis). Ataca-se, com isso, uma das principais causas da ineficiência do ordenamento processual no trato de litígios individuais massificados. Cuida-se de decisiva diferenciação do precedente firmado no âmbito do IRDR em comparaçãoà coisa julgada formada em ação coletiva, outorgando-se àquele capacidade infinitamente superior de racionalizar o sistema e uniformizar a jurisdição, ao negar ao jurisdicionado o direito de não se submeter à tese fixada no incidente. (TEIXEIRA, 2016. p. 12) Essa eficácia sustenta-se de forma saudável e necessária com eficiência estabilizadora, em muito superior à organização das ações coletivas. O IRDR foi criado como uma ferramenta eficaz que busca trazer eficiência a prestação jurisdicional a principal contribuição do incidente de resolução de demandas repetitivas ao aperfeiçoamento da prestação da tutela jurisdicional no Brasil Nossa convicção parte da constatação de que a tese fixada no IRDR não afastará a necessidade de que os titulares do direito reconhecido no precedente repetitivo tenham que ajuizar suas ações individuais ou mesmo coletivas a fim de obter o reconhecimento judicial do seu direito, para só então efetivá-lo. Significa dizer que o julgamento da questão de direito repetitiva via IRDR não importará em uma redução no número de ações futuras em torno daquela mesma questão. Ao inverso, um muitos casos, a solução afirmativa de um direito homogêneo provocará um incremento de ações individuais de parte de todos os seus titulares em busca de seu reconhecimento efetivação judicial. Desnecessário esforço de imaginação para projetar-se um IRDR afirmativo de direito de consumidor, de larga escala, para que milhares de demandas repetitivas desaguem no Judiciário, fortemente estimuladas pela classe dos advogados. Não resta dúvida, entretanto, que esta corrida ao Judiciário será por 41 demais salutar à realização de direitos subjetivos, distribuindo-se farta e igualitária jurisdição. O que não se pode imaginar, no entanto, é que a fixação de tese em IRDR irá reduzir a litigiosidade, irá, isso sim, racionalizar e tornar mais igualitária a distribuição da Justiça. (TEIXEIRA, 2016. p. 12) Vale reforçar que as demandas suspensas deverão seguir seu trâmite regular tão logo cessado sua interrupção, mesmo que somente para aplicar a tese firmada no incidente. Em poucas palavras, a fixação da tese via IRDR não afastará a necessidade de que as ações suspensas sejam julgadas até seu trânsito em julgado, com a apresentação de todos os recursos previstos. A preexistência de tese fixada em IRDR trará, contudo, consequências em favor da celeridade do procedimento, podendo ensejar (i) o deferimento de tutela da evidência quando o pedido estiver fundado em tese firmada no precedente; (ii) a dispensa de remessa necessária quando a sentença estiver alinhada ao precedente (art. 496, § 4.º, II); (iii) a improcedência liminar do pedido (art. 332, III), (iv) o julgamento monocrático do mérito de parte do relator (art. 932, IV, b e V, c); bem como (iv) a dispensa de caução no cumprimento provisório de sentença alinhada ao precedente (art. 521,IV (TEIXEIRA, 2016. p. 12) Uma vez firmada a tese jurisprudencial todos os demais juízes dentro do mesmo tribunal deverão observa-las a fim de dar celeridade e eficácia a demanda analisada. 42 4 Referências bibliográficas: NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo CPC para Advogados: perguntas e respostas para a prática profissional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018. SALES, Fernando Augusto de Vita Borges de. Manual de direito de processo civil. 2 ed. São Paulo: Rideel. 2018. TEIXEIRA, GUILHERME PUCHALSKI. Incidente de resolução de demandas repetitivas: Projeções em torno de sua eficiência. In: Revista de Processo. Repro vol. 251. 2016. JESUS, Priscilla S. Teoria do precedente judicial e o Novo Código de Processo Civil. Revista Direito UNIFACS – Debate Virtual, n. 170, 2014. Disponívelem:<http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/324 0/2321>. Acesso em 18 de novembro de 2017. DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula S.; OLIVEIRA, Rafael A. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 10ª ed. Salvador: vol. 2. JusPodvim. 2015. CUNHA, Leonardo C. Curso de direito processual civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 13ª ed. reform. v.3 Salvador: JusPodvim. 2016. 43 NEVES, Daniel A. A. Manual de Direito Processual Civil – Volume Único. 8ª ed. Salvador: JusPodvim. 2016. PEIXOTO, Ravi M. Superação do precedente e segurança jurídica – Conforme Novo CPC. 2ª ed. rev. amp. e atual. Salvador: JusPodvim. 2016. Henrique Castro Santos, graduado em Direito pela Universidade Paulista – UNIP. Pós-graduando em Direito Tributário. Advogado. Técnicas de superação de precedentes no Novo CPC. E-mail: henriquehcsd@gmail.com.disponível em: https://blog.sajadv.com.br/superacao-de-precedentes/ BRASIL, Lei 9.784 de 29 de janeiro 1999. Lei de Administração Pública Federal. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9784.htm. BRASIL, Lei 13.105 de Março de 2015, Código de Processo Civil. Promulgada em 16 de março http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm.