Prévia do material em texto
[Digite aqui] i Roberto Aguilar Machado Santos Silva Suzana Portuguez Viñas Autores Roberto Aguilar Machado Santos Silva Suzana Portuguez Viñas Santo Ângelo, RS-Brasil 2023 2 Supervisão editorial: Suzana Portuguez Viñas Projeto gráfico: Roberto Aguilar Machado Santos Silva Editoração: Suzana Portuguez Viñas Capa:. Roberto Aguilar Machado Santos Silva 1ª edição 3 A minha consciência tem milhares de vozes, / E cada voz traz-me milhares de histórias... William Shakespeare William Shakespeare (batizado em 26 de abril de 1564 - 23 de abril de 1616) foi um dramaturgo, poeta e ator inglês. Ele é amplamente considerado o maior escritor da língua inglesa e o dramaturgo mais proeminente do mundo. Ele é frequentemente chamado de poeta nacional da Inglaterra e o "Bardo de Avon" (ou simplesmente "o Bardo"). Suas obras existentes, incluindo colaborações, consistem em cerca de 39 peças, 154 sonetos, três longos poemas narrativos e alguns outros versos, alguns de autoria incerta. Suas peças foram traduzidas para todas as principais línguas vivas e são encenadas com mais frequência do que as de qualquer outro dramaturgo. Shakespeare continua a ser indiscutivelmente o escritor mais influente da língua inglesa, e as suas obras continuam a ser estudadas e reinterpretadas. 4 Autores Roberto Aguilar Machado Santos Silva Membro da Academia de Ciências de Nova York (EUA), escritor poeta, historiador Doutor Suzana Portuguez Viñas Pedagoga, psicopedagoga, escritora, editora, agente literária suzana_vinas@yahoo.com.br 5 Dedicatória ara todos os fonoaudiólogos, pedagogos, psicopedagogos, psicólogos, terapeutas, pais e mestres. Roberto Aguilar Machado Santos Silva Suzana Portuguez Viñas P 6 Quando fala o amor, a voz de todos os deuses deixa o céu embriagado de harmonia. William Shakespeare 7 Apresentação lgumas crianças têm dificuldade em desenvolver e utilizar os sons da fala. Isso pode tornar sua fala pouco clara para os outros. No entanto, nem todas as dificuldades sonoras da fala são iguais. É sobre esse assunto que o livro trata. Roberto Aguilar Machado Santos Silva Suzana Portuguez Viñas A 8 Sumário Introdução: sobre crianças com dificuldades de fala...............9 Capítulo 1 - Distúrbio do som da fala.......................................14 Capítulo 2 - Dispraxia verbal do desenvolvimento..................25 Capítulo 3 - Dislalia: sintomas, causas e tratamento..............33 Capítulo 4 - Gagueira..................................................................48 Capítulo 5 - Principais problemas fonoaudiológicos de personagens infantis..................................................................60 Epílogo.........................................................................................67 Bibliografia consultada..............................................................68 9 Introdução: sobre crianças com dificuldades de fala e acordo com o Serviço Nacional de Saúde (National Health Service, NHS, Reino Unido, 2023), algumas crianças têm dificuldade em desenvolver e utilizar os sons da fala. Isso pode tornar sua fala pouco clara para os outros. No entanto, nem todas as dificuldades sonoras da fala são iguais. A fala de algumas crianças pode ser simplesmente imatura, enquanto outras apresentam dificuldades mais graves e persistentes. Da mesma forma, nem todas as crianças enfrentam essas dificuldades da mesma forma. Alguns conseguirão gerir bem, demonstrando resiliência, mas outros, e particularmente aqueles com dificuldades mais graves e persistentes, poderão necessitar de mais apoio, uma vez que áreas como a auto-estima, o estabelecimento de amizades e o desenvolvimento da alfabetização podem ser afetadas. Dependendo da natureza e do grau das dificuldades nos sons da fala, as crianças podem necessitar de apoio extra nas seguintes áreas, a fim de as ajudar a desenvolver a sua literacia: D 10 • Escuta e atenção. As crianças podem precisar de trabalhar nestas competências antes de poderem melhorar a sua fala ou progredir com sucesso na sua alfabetização. • Aprender a ouvir diferenças entre sons. Os sons podem soar iguais para a criança e combinar sons com letras desafiadoras (correspondência fonema/grafema). • Aprender a dividir as palavras nos seus sons componentes e a misturar esses sons para ler palavras inteiras. A criança pode ter dificuldade em “manter” sons e palavras na memória. • Ortografia. • As crianças com dificuldades fonológicas precisarão de apoio extra para aceder à verificação fónica do primeiro ano porque não dominam as competências fonológicas necessárias para o desenvolvimento da fala e estas são as mesmas exigidas para a aprendizagem da alfabetização. • Aumentar a auto-estima de algumas crianças cuja consciência da sua própria dificuldade de fala pode ter impacto na sua vontade de participar em atividades baseadas na fala e na alfabetização. Outras maneiras de ajudar Idéias gerais • Dedicar mais tempo às primeiras fases de aprendizagem, por exemplo na 1ª fase de ‘Letras e Sons’, desenvolvendo, por exemplo, a atenção sustentada, a escuta no ambiente e a 11 consciência fonológica geral. Crianças com erros nos sons da fala têm dificuldades subjacentes com todas as habilidades de processamento da fala e, portanto, precisarão de muito apoio e prática extra com habilidades de consciência fonológica, incluindo: Discriminação sonora. Reconhecimento de rima. Produção de rima. Divisão de palavras em sílabas. Mistura de sílabas. Início e rima Divisão de palavras em sons e mistura de sons para formar palavras (excluindo misturas consonantais). • Forneça “modelos” claros de palavras-alvo para que as crianças tenham a oportunidade de ouvir como essas palavras devem soar. • Repita para a criança qualquer palavra que ela tenha dificuldade em dizer. Não faça a criança repetir, a menos que um fonoaudiólogo o aconselhe. • As crianças com dificuldades de fala podem precisar de mais tempo do que outras para responder às atividades e para completar tarefas. • Verifique se é apropriado em termos de desenvolvimento que a criança utilize um determinado som na sua alfabetização. 12 • Use o som e não o nome da letra, e diga o som sozinho, sem enfatizá-lo demais, o que muitas vezes pode adicionar um som de vogal a ele. • Verifique o conhecimento das letras/sons pedindo à criança que aponte para as letras que você diz (se ela não conseguir pronunciar os sons). A criança pode se distrair facilmente e ter dificuldade em perceber os sons da fala. → Use um ambiente tranquilo e sem distrações. Pode ser difícil saber se os erros da criança se devem ao desconhecimento do fonema associado ao grafema ou à incapacidade de pronunciar o som. Um distúrbio de linguagem é uma condição definida como uma condição que limita ou interrompe completamente a fala natural. Um distúrbio de linguagem pode ser de origem neurológica, física ou psicológica. A seguir está uma lista de distúrbios de linguagem. 13 Recurso de falaAusência de recurso Dificuldade Problema Fonação Anartria Disartria, disglossia Compreensão Agnosia, asemia, assimbolia Discurso (fala) Afasia, afrasia Disfasia, esquizofasia, logorréia Parafasia Entonação Aprosodia Disprosódia Pobreza de fala Alogia Leitura (processo) Alexia Dislexia Paralexia Linguagem escrita Agrafia Disgrafia, graforreia Paragrafia Linguagem falada Alalia Dislalia, coprolalia, ecolalia, glossolalia Palilalia Lembrar nomes Anomia Disnomia Distúrbio motor Apraxia Dispraxia Ortofonia Disfemia Ortografia Disortografia Sintaxe Agramatismo Paragramatismo Voz Afonia Disfonia 14 Capítulo 1 Distúrbio do som da fala m distúrbio dos sons da fala (SSD, do inglês Speech Sound Disorder) é um distúrbio da fala em que alguns sons (fonemas) não são produzidos ou usados corretamente. O termo "desenvolvimento fonológico prolongado" às vezes é preferido ao descrever a fala das crianças, para enfatizar o desenvolvimento contínuo e ao mesmo tempo reconhecer o atraso. Classificação Os distúrbios dos sons da fala podem ser subdivididos em dois tipos principais: distúrbios articulatórios (também chamados de distúrbios fonéticos) e distúrbios fonêmicos (também chamados de distúrbios fonológicos). No entanto, alguns podem ter um distúrbio misto no qual existem problemas articulatórios e fonológicos. Embora os distúrbios dos sons da fala estejam associados à infância, alguns erros residuais podem persistir na idade adulta. Distúrbios de articulação U 15 Os distúrbios de articulação (também chamados de distúrbios fonéticos ou simplesmente "distúrbios articulares") baseiam-se na dificuldade de aprender a produzir fisicamente os fonemas pretendidos. Os distúrbios da articulação têm a ver com os principais articuladores que são os lábios, os dentes, a crista alveolar, o palato duro, o véu palatino, a glote e a língua. Se o distúrbio tiver alguma relação com algum desses articuladores, então é um distúrbio articulatório. Geralmente há menos erros do que com um distúrbio fonêmico, e as distorções são mais prováveis (embora também possam estar presentes omissões, acréscimos e substituições). Freqüentemente, eles são tratados ensinando a criança como produzir fisicamente o som e fazendo-a praticar sua produção até que (espero) se torne natural. Os distúrbios de articulação não devem ser confundidos com distúrbios motores da fala, como disartria (na qual há paralisia real da musculatura da fala) ou dispraxia verbal do desenvolvimento (na qual o planejamento motor está gravemente prejudicado). Lista • Deltacismo (da letra grega Δ) é uma dificuldade em produzir o som /d/. • O etacismo é uma dificuldade na produção de som. • Gamacismo é uma dificuldade em produzir o som /ɡ/. • Hitismo é uma dificuldade em produzir o som /h/. • Iotacismo é uma dificuldade em produzir o som /j/. • Kapacismo é uma dificuldade em produzir o som /k/. 16 • Lambdacismo (da letra grega λ) é a dificuldade em pronunciar consoantes laterais. • Rotacismo é uma dificuldade em produzir sons consonantais róticos na pronúncia padrão do respectivo idioma. o Em tcheco existe um tipo específico de rotacismo chamado rotacismus bohemicus, que é uma incapacidade de pronunciar o som específico ⟨ř⟩ /r̝/. • Sigmatismo é uma dificuldade de produzir /s/, /z/ e sons semelhantes. • Tetacismo é uma dificuldade de produzir o som /t/. ● Tetismo é a substituição de /s/, /k/ e sons semelhantes por /t/ e de /z/ e sons semelhantes por /d/. Distúrbios fonêmicos Em um distúrbio fonêmico (também chamado de distúrbio fonológico), a criança tem dificuldade em aprender o sistema sonoro da língua, não conseguindo reconhecer quais contrastes sonoros também contrastam o significado. Por exemplo, os sons /k/ e /t/ podem não ser reconhecidos como tendo significados diferentes, então "chamar" e "alto" podem ser tratados como homófonos, sendo ambos pronunciados como "alto". Isso é chamado de colapso do fonema e, em alguns casos, muitos sons podem ser representados por um - por exemplo, /d/ pode substituir /t/, /k/ e /ɡ/. Como resultado, o número de sons de erro é frequentemente (embora nem sempre) maior do que nos 17 distúrbios articulatórios e as substituições são geralmente o erro mais comum. Os distúrbios fonêmicos costumam ser tratados com pares mínimos (duas palavras que diferem em apenas um som) para chamar a atenção da criança para a diferença e seu efeito na comunicação. Algumas crianças com distúrbios fonêmicos podem ouvir que dois fonemas são diferentes um do outro quando outras pessoas falam, mas não percebem que esses fonemas soam iguais quando elas próprias falam. Isso é chamado de fenômeno fis, em homenagem a um cenário em que um fonoaudiólogo diz: "Você disse 'fis', quis dizer 'peixe'?" E a criança responde: "Não, eu não disse 'fis', eu disse 'fis'." Em alguns casos, uma criança emite sons que, embora semelhantes, são acusticamente distintos. Outros não ouvem essa diferença, no entanto, porque os dois sons não são tratados como fonemas separados na língua falada. Embora os distúrbios fonêmicos sejam frequentemente considerados distúrbios de linguagem, pois é o sistema de linguagem que é afetado, eles também são distúrbios dos sons da fala, pois os erros estão relacionados ao uso de fonemas. Isso os torna diferentes do comprometimento específico da linguagem, que é principalmente um distúrbio da sintaxe (gramática) e do uso da linguagem, e não do sistema sonoro. Porém, os dois podem coexistir, afetando a mesma pessoa. Outros distúrbios podem lidar com uma variedade de maneiras diferentes de pronunciar consoantes. Alguns exemplos são deslizamentos e líquidos. Os deslizamentos ocorrem quando a 18 postura articulatória muda gradualmente de consoante para vogal. Os líquidos podem incluir /l/ e /ɹ/. Distúrbios mistos dos sons da fala Em alguns casos, erros fonéticos e fonêmicos podem coexistir na mesma pessoa. Nesse caso, o foco principal é geralmente no componente fonológico, mas a terapia articulatória pode ser necessária como parte do processo, uma vez que ensinar uma criança a usar um som não é prático se a criança não souber como produzi-lo. Erros residuais Embora a maioria dos distúrbios dos sons da fala possa ser tratada com sucesso na infância, e alguns possam até superá-los por conta própria, os erros às vezes podem persistir na idade adulta, em vez de apenas não serem apropriados para a idade. Esses erros persistentes são chamados de “erros residuais” e podem permanecer por toda a vida. Apresentação Os erros produzidos por crianças com distúrbios dos sons da fala são normalmente classificados em quatro categorias: 19 • Omissões: Certos sons não são produzidos – sílabas inteiras ou classes de sons podem ser excluídas. Isso difere de características como não roticidade, queda de h ou vocalização em l, que fazem parte de vários sotaques regionais, nacionais e étnicos e geralmente não são considerados distúrbios. • Adições (ou Epênteses): um som ou sons extras são adicionados à palavra pretendida. • Distorções: Os sons são ligeiramente alterados para que o som pretendido possa ser reconhecido, mas soe "errado" ou possa não soar como nenhum som do idioma. • Substituições: Um ou mais sons são substituídos por outro. Às vezes, mesmo para especialistas, dizer exatamente que tipo foi feito não é óbvio - algumas formas distorcidas de /ɹ/ podem ser confundidas com /V/ por um observador casual, mas podem não ser realmente sólidas, mas algo intermediário. Além disso, crianças com distúrbios graves dos sons da fala podem ser difíceis de compreender, tornando difícil dizer qual palavra realmente se destina e,portanto, o que há de errado com ela. Alguns termos podem ser usados para descrever mais de uma das categorias acima, como lisp, que muitas vezes é a substituição de /s/ por /θ/ (uma substituição), mas pode ser uma distorção, produzindo /s/ logo atrás do dentes resultando em um som em algum lugar entre /s/ e /θ/. Existem três níveis diferentes de classificação ao determinar a magnitude e o tipo de erro produzido: 20 1. Sons que o paciente pode produzir 1. A: Fonêmico - pode ser produzido facilmente; usado de forma significativa e contrastante 2. B: Fonética – produzida somente mediante solicitação; não usado de forma consistente, significativa ou contrastiva; não usado em fala conectada 2. Sons estimuláveis 1. A: Facilmente estimulável 2. B: Estimulável após demonstração e sondagem (ou seja, com um abaixador de língua) 3. Não é possível produzir o som 1. R: Não pode ser produzido voluntariamente 2. B: Nenhuma produção jamais observada Observe que as omissões não significam que o som não possa ser produzido, e alguns sons podem ser produzidos com mais facilidade ou frequência quando aparecem com outros sons: alguém pode ser capaz de dizer "s" e "t" separadamente, mas não "st", ou pode ser capaz de produzir um som no início de uma palavra, mas não no final. A magnitude do problema geralmente varia entre diferentes sons do mesmo falante. Causas A maioria dos distúrbios dos sons da fala ocorre sem causa conhecida. Uma criança pode não aprender como produzir sons corretamente ou pode não aprender as regras dos sons da fala 21 por conta própria. Essas crianças podem ter problemas com o desenvolvimento da fala, o que nem sempre significa que elas simplesmente superarão isso sozinhas. Muitas crianças desenvolvem sons da fala ao longo do tempo, mas aquelas que não precisam frequentemente dos serviços de um fonoaudiólogo para aprender os sons corretos da fala. Alguns erros nos sons da fala podem resultar de outras síndromes ou distúrbios, como: • perturbações do desenvolvimento (por exemplo, autismo). • doenças genéticas (por exemplo, síndrome de Down). • perda auditiva, incluindo perda auditiva temporária, como causada por infecções de ouvido. • fenda palatina ou outras anomalias físicas da boca. • doença. • distúrbios neurológicos (por exemplo, paralisia cerebral). Diagnóstico De acordo com o DSM-51, cerca de 50% da fala de uma criança típica de 2 anos pode ser inteligível. A fala de uma criança de 4 anos deve ser globalmente inteligível, e uma criança de 7 anos deve ser capaz de produzir claramente a maioria das palavras consistentes com as normas comunitárias para a sua idade. A articulação incorreta de certos sons difíceis pode ser normal até 1https://www.institutopebioetica.com.br/documentos/manual-diagnostico-e- estatistico-de-transtornos-mentais-dsm-5.pdf 22 os 8 anos. Crianças com distúrbio dos sons da fala apresentam dificuldades de pronúncia inadequadas para a idade, e as dificuldades não são causadas por problemas auditivos, deformidades congênitas, distúrbios motores ou mutismo seletivo. Os critérios diagnósticos do DSM-5 para transtorno dos sons da fala exigem uma dificuldade persistente na produção dos sons da fala desde uma idade precoce de desenvolvimento. Para o diagnóstico, isto deve levar a dificuldades na comunicação eficaz e a resultados sociais negativos tangíveis, como redução do desempenho académico ou profissional. O diagnóstico é descartado se a causa subjacente for um defeito congênito ou uma condição adquirida, como paralisia cerebral, fenda palatina, surdez ou perda auditiva e lesão cerebral traumática. Outros distúrbios da fala podem ser diagnosticados juntamente com o distúrbio dos sons da fala, embora o diagnóstico diferencial com mutismo seletivo possa ser difícil devido à fala normal ser observada apenas em alguns ambientes. Tratamento Para a maioria das crianças, o distúrbio não dura a vida toda e as dificuldades de fala melhoram com o tempo e o tratamento fonoaudiológico. O prognóstico é pior para crianças que também apresentam distúrbio de linguagem, pois isso pode ser indicativo de distúrbio de aprendizagem. 23 Incidência e prevalência A incidência de distúrbios dos sons da fala refere-se ao número de novos casos identificados em um determinado período. A prevalência de distúrbios dos sons da fala refere-se ao número de crianças que convivem com problemas de fala em um determinado período de tempo. As taxas de prevalência estimadas de distúrbios dos sons da fala variam muito devido às classificações inconsistentes dos distúrbios e à variância das idades estudadas. Os dados a seguir refletem a variabilidade: • No geral, estima-se que 2,3% a 24,6% das crianças em idade escolar tenham atraso na fala ou distúrbios dos sons da fala. • Um inquérito de 2012 do Centro Nacional de Estatísticas de Saúde (EUA) estimou que, entre as crianças com distúrbios de comunicação, 48,1% das crianças dos 3 aos 10 anos e 24,4% das crianças dos 11 aos 17 anos tinham apenas problemas de fala. Os pais relataram que 67,6% das crianças com problemas de fala receberam serviços de intervenção fonoaudiológica. • Estima-se que erros de fala residuais ou persistentes ocorram em 1% a 2% das crianças mais velhas e dos adultos. • Os relatórios estimam que as perturbações dos sons da fala são mais prevalentes nos rapazes do que nas raparigas, com uma proporção que varia entre 1,5:1,0 e 1,8:1,0. • As taxas de prevalência foram estimadas em 5,3% em crianças afro-americanas e 3,8% em crianças brancas. 24 • Os relatórios estimaram que 11% a 40% das crianças com distúrbios dos sons da fala apresentavam comprometimento de linguagem concomitante. • A fraca capacidade de produção de sons da fala em crianças do jardim de infância tem sido associada a resultados de alfabetização mais baixos. As estimativas relataram uma maior probabilidade de distúrbios de leitura (risco relativo: 2,5) em crianças com histórico pré-escolar de distúrbios dos sons da fala. 25 Capítulo 2 Dispraxia verbal do desenvolvimento dispraxia verbal do desenvolvimento (DVD, do inglês Developmental Verbal Dyspraxia), também conhecida como apraxia da fala na infância (CAS, do inglês Childhood Apraxia of Speech) e apraxia da fala no desenvolvimento (DAS, Developmental Apraxia of Speech), é uma condição na qual um indivíduo tem problemas para pronunciar sons, sílabas e palavras. Isto não é por causa de fraqueza muscular ou paralisia. O cérebro tem problemas para planejar mover as partes do corpo (por exemplo, lábios, mandíbula, língua) necessárias para a fala. O indivíduo sabe o que quer dizer, mas seu cérebro tem dificuldade em coordenar os movimentos musculares necessários para dizer essas palavras. A causa exata desse distúrbio geralmente é desconhecida. Muitas observações sugerem uma causa genética do DVD, já que muitos com o distúrbio têm histórico familiar de distúrbios de comunicação. O gene FOXP2 tem sido implicado em muitos estudos sobre a doença e, quando esta é a causa, a doença é herdada de forma autossômica dominante, porém cerca de 75% desses casos são de novo. A 26 A proteína P2 Forkhead (FOXP2) é uma proteína que, em humanos, é codificada pelo gene FOXP2. FOXP2 é um membro da família de fatores de transcrição forkhead box, proteínas que regulam a expressão gênica por meio da ligação ao DNA. É expresso no cérebro, coração, pulmões e sistema digestivo. FOXP2 é encontrado em muitos vertebrados, onde desempenha um papel importante na mimetismo em pássaros (como o canto dos pássaros) e na ecolocalização em morcegos. Não há cura para o DVD, mascom intervenção intensiva e apropriada, as pessoas com esse distúrbio motor da fala podem melhorar significativamente. Apresentação A apraxia da fala infantil (CAS, Childhood Apraxia of Speech) é um distúrbio neurológico da fala infantil (pediátrico) no qual a precisão e a consistência dos movimentos subjacentes à fala são prejudicadas na ausência de déficits neuromusculares (por exemplo, reflexos anormais, tônus anormal). A CAS pode ocorrer como resultado de comprometimento neurológico conhecido, em associação com distúrbios neurocomportamentais complexos de origem conhecida ou desconhecida, ou como um distúrbio neurogênico idiopático dos sons da fala. O comprometimento central no planejamento e/ou programação de parâmetros espaço-temporais de sequências de movimento resulta em erros na produção de sons da fala e na prosódia." De acordo com o Comitê Ad Hoc sobre Apraxia da Fala em Crianças da American Speech-Language-Hearing Association (ASHA, American Speech- Language-Hearing Association). 27 Existem três características significativas que diferenciam o DVD/CAS (do inglês Developmental Verbal Dyspraxia/ Childhood Apraxia of Speech)de outros distúrbios dos sons da fala na infância. Esses recursos são: • Erros inconsistentes em consoantes e vogais em produções repetidas de sílabas e palavras. • Transições coarticulatórias alongadas entre sons e sílabas. • Prosódia inadequada, especialmente na realização de acentos lexicais ou frasais. Embora o DVD/CAS seja um distúrbio do desenvolvimento, ele não desaparecerá simplesmente quando as crianças crescerem. As crianças com esse transtorno não seguem padrões típicos de aquisição da linguagem e precisarão de tratamento para progredir. Causas DVD/CAS é um distúrbio motor, o que significa que o problema está localizado no cérebro e em seus sinais, e não na boca. Na maioria dos casos, a causa é desconhecida. As possíveis causas incluem síndromes e distúrbios genéticos. Pesquisas recentes concentraram-se na importância do gene FOXP2 no desenvolvimento de espécies e indivíduos. Pesquisas relacionadas à família KE, onde metade dos membros da família extensa, ao longo de três gerações, exibiram dispraxia verbal de 28 desenvolvimento hereditária, descobriram que tinham uma cópia defeituosa do gene FOXP2 e estudos adicionais sugerem que o gene FOXP2, bem como outros problemas genéticos poderia explicar DVD/CAS, incluindo a síndrome de microdeleção 16p11.2. Novas pesquisas sugerem um papel para o canal de sódio SCN3A no desenvolvimento das áreas perisilvianas, que mantêm circuitos linguísticos importantes - Área de Broca e Wernicke. Pacientes com mutações no SCN3A apresentavam distúrbios motores orais da fala. Lesões no parto/pré-natal, bem como acidente vascular cerebral, também podem ser causas de DVD/CAS. Além disso, o DVD/CAS pode ocorrer como uma característica secundária a uma variedade de outras condições. Estes incluem autismo, algumas formas de epilepsia, síndrome do X frágil, galactosemia e translocações cromossômicas envolvendo duplicações ou deleções. Diagnóstico A dispraxia verbal do desenvolvimento pode ser diagnosticada por um fonoaudiólogo por meio de exames específicos que medem os mecanismos orais da fala. O exame dos mecanismos orais envolve tarefas como franzir os lábios, assoar, lamber os lábios, elevar a língua e também envolve o exame da boca. Um exame completo também envolve a observação do paciente comendo e falando. Testes como o teste Kaufman Speech Praxis, um exame 29 mais formal, também são utilizados no diagnóstico. Um diagnóstico diferencial de DVD/CAS muitas vezes não é possível para crianças com menos de dois anos de idade. Mesmo quando as crianças têm entre 2 e 3 anos, nem sempre pode ocorrer um diagnóstico claro, porque nesta idade, elas ainda podem ser incapazes de se concentrar ou cooperar com os testes de diagnóstico. Gerenciamento Não há cura para o DVD/CAS, mas com intervenção intensiva e apropriada, as pessoas com o transtorno podem melhorar significativamente. DVD/CAS requer várias formas de terapia que variam de acordo com as necessidades individuais do paciente. Normalmente, o tratamento envolve terapia individual com um fonoaudiólogo. Em crianças com DVD/CAS, a consistência é um elemento chave no tratamento. A consistência na forma de comunicação, bem como o desenvolvimento e uso da comunicação oral são extremamente importantes para auxiliar no processo de aprendizagem da fala de uma criança. Muitas abordagens terapêuticas não são apoiadas por evidências completas; no entanto, os aspectos do tratamento que parecem estar de acordo são os seguintes: • O tratamento precisa ser intenso e altamente individualizado, com cerca de 3 a 5 sessões de terapia por semana. 30 • Um máximo de 30 minutos por sessão é melhor para crianças pequenas. • Os princípios da teoria da aprendizagem motora e da prática motora fonoaudiológica intensa parecem ser os mais eficazes. • A terapia motora oral não fonoaudiológica não é necessária ou suficiente • Uma abordagem multissensorial à terapia pode ser benéfica: a utilização de linguagem gestual, imagens, sinais tácteis, estímulos visuais e comunicação aumentativa e alternativa (CAA ou AAC, do inglês Augmentative and Alternative Communication) pode ser útil. Estimulação integral Uma técnica frequentemente usada para tratar DVD/CAS é a estimulação integral. A estimulação integral é baseada na aprendizagem motora cognitiva, com foco no planejamento motor cognitivo necessário para a complexa tarefa motora da fala. É muitas vezes referida como a abordagem “observe-me, ouça, faça o que eu faço” e baseia-se numa hierarquia de estratégias de tratamento em vários passos. Esta hierarquia de estratégias permite ao médico alterar o tratamento dependendo das necessidades da criança. Utiliza diversas modalidades de apresentação, enfatizando os modos auditivo e visual. Os especialistas sugerem que a prática e a experiência extensivas com o novo material são fundamentais, portanto, centenas de estímulos-alvo devem ser obtidos em uma única sessão. Além 31 disso, o tratamento distribuído (mais curto, mas mais frequente) e aleatório, que mistura enunciados alvo e não-alvo, produz maior aprendizagem geral. As seis etapas da hierarquia sobre as quais a terapia de estimulação integral para crianças é organizada de forma flexível são: • "A criança observa e ouve e simultaneamente produz o estímulo com o clínico. • O médico modela e, em seguida, a criança repete o estímulo enquanto o médico o pronuncia simultaneamente. • O médico modela e fornece dicas e a criança repete. • O médico modela e a criança repete sem dar pistas. • O clínico provoca o estímulo sem modelagem, por exemplo, fazendo uma pergunta, com a criança respondendo espontaneamente. • A criança produz estímulos em situações menos direcionadas com incentivo clínico, como em dramatizações ou jogos”. Abordagem fonológica integrada Outra estratégia de tratamento que demonstrou ter efeitos positivos é uma abordagem fonológica integrada. Esta abordagem “incorpora práticas direcionadas de produção de fala em atividades de consciência fonológica e usa letras e pistas fonológicas para estimular a produção de fala”. McNeill et al. (2009) estudaram 12 crianças de 4 a 7 anos com DVD/CAS que 32 foram tratadas com essa abordagem duas vezes por semana durante dois blocos de seis semanas (separados por um bloco de abstinência de seis semanas). Eles encontraram efeitos positivos para a maioria das crianças nas áreas de produção de fala, consciência fonológica, decodificação de palavras, conhecimento de letras e ortografia. Esses resultados mostram que é clinicamente produtivo direcionara produção da fala, a consciência fonológica, o conhecimento das letras, a ortografia e a leitura, tudo de uma vez. Isto é particularmente importante porque as crianças com DVD/CAS muitas vezes têm problemas contínuos com a leitura e a ortografia, mesmo que a sua produção de fala melhore. 33 Capítulo 3 Dislalia: sintomas, causas e tratamento egundo Roger Morrison (2021), a dislalia é um dos distúrbios de linguagem mais comuns entre crianças durante a pré-escola e o ensino fundamental. É um distúrbio da articulação de diferentes fonemas ou grupos de fonemas. Na dislalia, os órgãos que intervêm na fala, também chamados de órgãos fonoarticulatórios (lábios, mandíbula, palato mole, língua, etc.), estão posicionados de forma incorreta, dando origem a uma pronúncia inadequada de determinados sons ou fonemas. A dislalia é caracterizada pela presença de erros na articulação dos sons da fala em pessoas que não apresentam patologia relacionada ao sistema nervoso central. Em algumas ocasiões, esse defeito de pronúncia derivado da má articulação pode tornar-se automatizado e normalizado, isso é evidenciado na linguagem escrita. A dislalia pode afetar qualquer consoante ou vogal. Porém, a alteração de pronúncia ocorre com maior frequência em alguns sons como /r/, pois sua articulação exige maior agilidade e precisão em seus movimentos. S 34 Também costuma ocorrer em /k/, porque o ponto de articulação não é visível e portanto a imitação é mais difícil, assim como em /s/, onde há uma deformação na posição articulatória da língua. Tipos de dislalia A dislalia pode ser classificada de acordo com sua etiologia. Assim, distinguimos entre: Dislalia evolutiva ou fisiológica Esse tipo de dislalia ocorre em algumas fases do desenvolvimento da fala infantil, onde as crianças ainda não articulam bem os diferentes sons ou distorcem alguns fonemas. As causas desse fenômeno podem ser imaturidade, ausência de discriminação auditiva, falta de controle do sopro, distúrbios respiratórios ou movimentos inadequados nos órgãos articulatórios. Dentro da evolução da maturidade da criança essas dificuldades são superadas, somente se persistirem entre os quatro ou cinco anos é que consideraríamos isso patológico. Dislalia audiogênica A etiologia da dislalia audiogênica reside na presença de déficit auditivo acompanhado de outras alterações de linguagem, como voz e ritmo. 35 Para articular adequadamente os sons, a audição adequada é essencial. Dislalia orgânica A dislalia orgânica origina-se por lesão do sistema nervoso central (disartria) ou por alteração orgânica dos órgãos periféricos da fala sem lesão do sistema nervoso central (disglossia). Dislalia funcional A dislalia funcional é gerada devido ao funcionamento inadequado dos órgãos articulatórios, sem evidências de danos ou lesões orgânicas. Entre as dislalias funcionais distinguimos os desvios fonéticos e os desvios fonológicos. Os distúrbios fonéticos são alterações na produção dos fonemas. A alteração está focada no aspecto motor da articulação. Os erros são estáveis, e é observável que os erros sonoros aparecem igualmente na repetição da linguagem espontânea. Não há alteração nos processos de discriminação auditiva. Os distúrbios fonológicos são alterações no nível perceptual e organizacional, ou seja, nos processos de discriminação auditiva, afetando os mecanismos de conceituação dos sons e a relação entre significado e significante. Nestes casos, a expressão oral da linguagem é deficiente e dependendo da gravidade pode tornar-se ininteligível. 36 Os erros costumam ser flutuantes. Isoladamente, os sons podem ser bem articulados, mas a pronúncia da palavra é afetada. Causas da dislalia funcional Entre as causas mais comuns de dislalia funcional encontramos: Má capacidade motora Há dificuldade na articulação da linguagem e na motricidade fina. Parece haver uma relação direta entre o atraso motor e o grau de atraso de linguagem nas alterações de pronúncia. Esta é a causa mais comum em casos de dislalia. Crianças com dislalia apresentam falta de jeito nos movimentos dos órgãos articulatórios e déficit na coordenação motora geral, que só é observável ao nível da motricidade fina. Dificuldades na percepção do espaço e do tempo Nestes casos, na pessoa com dislalia existem dificuldades na percepção e organização do espaço e do tempo. Se a criança tem dificuldade em percebê-lo e não internalizou as noções espaço-temporais, a linguagem fica difícil. Desenvolver essa percepção é importante para a evolução da linguagem. 37 Falta de compressão ou discriminação auditiva O indivíduo não consegue imitar sons porque não os percebe corretamente, ou seja, não é capaz de discriminar. Às vezes a criança ouve bem, mas analisa ou faz uma integração inadequada dos fonemas que ouve. Fatores psicológicos Existe uma grande variedade de fatores psicológicos que podem afetar o desenvolvimento da linguagem, como qualquer distúrbio afetivo, desajuste familiar, falta de afeto, ciúme entre irmãos, traumas ou ambientes superprotetores. Fatores ambientais Dentre os fatores ambientais, destacam-se situações de bilinguismo, superproteção materna, institucionalização da criança ou aprendizagem por imitação, bem como baixo nível cultural. Deficiência intelectual Nestes casos, a dislalia funcional seria secundária ao déficit intelectual. 38 Sintomas Os sintomas da dislalia variam dependendo do grau de envolvimento. A dificuldade de articulação pode variar desde um fonema específico até vários fonemas, tornando a língua ininteligível. A sintomatologia consiste na prática de erros. Os erros mais comuns cometidos na dislalia são: Substituição O erro de substituição consiste em substituir um som por outro. Por exemplo, o indivíduo não consegue pronunciar o som /r/ então o substitui por outro fonema que lhe seja mais fácil. Às vezes, a criança comete esse erro de substituição devido a um déficit na discriminação auditiva, ou seja, a criança percebe uma palavra de forma inadequada e emite esse som conforme é percebido. A substituição pode ocorrer no início, no meio ou no final da palavra. Distorção O erro de distorção consiste em dar-lhe uma forma incorreta ou deformada tentando aproximá-lo mais ou menos da junta adequada. 39 Devem-se principalmente ao posicionamento inadequado dos órgãos de articulação. Omissão O indivíduo omite o fonema que não consegue pronunciar, mas não o substitui. Às vezes essa omissão é de um único fonema como "osquilleta" em vez de "rosquilleta" e outras vezes a omissão é de uma sílaba completa "lota" em vez de "bola". No caso em que dois grupos consonantais devem ser pronunciados "bla", "cri", etc., a consoante líquida é omitida. Adição O erro de adição consiste em adicionar um fonema à palavra para facilitar a pronúncia. O problema desse tipo de erro é que ele pode se tornar automatizado e se transformar em apenas mais uma palavra. Inversão O erro de inversão consiste em modificar a ordem dos sons. Por exemplo, diz “cacheta” em vez de “jaqueta”. Avaliação 40 Para a avaliação da dislalia funcional em crianças devemos levar em consideração os seguintes aspectos: Entrevista com os pais A entrevista com os pais é de grande relevância para se obter uma anamnese do problema, tanto pessoal quanto familiar. Esta entrevista é o primeiro passo necessário em qualquer diagnóstico. Serão explorados não apenas dados estritamente linguísticos, mas também aqueles que se referem à maturação geral. Nesta entrevista serão coletadas informações relacionadas a dados pessoais como históriapessoal, desenvolvimento motor, personalidade, escolaridade, além de dados familiares. Articulação Para realizar a avaliação nas dislalias é necessário examinar a articulação para saber exatamente quais são os defeitos que o sujeito apresenta. Esta avaliação da pronúncia deve ser exaustiva e sistemática para não conduzir a um diagnóstico errado. Portanto, é necessário detalhar a situação do fonema-problema, se ele é inicial, intermediário ou final e a que tipo de expressão se refere, se linguagem repetida, dirigida ou espontânea, dependendo da frequência, variará sua articulação dificuldades de um para outro. outro. 41 É preciso considerar que aquelas dificuldades que surgem na linguagem repetida também aparecerão na linguagem dirigida e espontânea, pois presumimos que se a criança não consegue imitar, também não o conseguirá fazer espontaneamente. Para a avaliação da linguagem repetida, utiliza-se uma lista de palavras em que o som examinado está contido em todas as situações citadas. Para avaliar a linguagem dirigida, apresentamos alguns objetos ou figuras conhecidas da criança, cujos nomes contêm o fonema a ser examinado. Para avaliar a linguagem espontânea utiliza-se conversa informal, perguntas, etc. Assim, uma avaliação psicológica poderia ser considerada se houver disparidade entre a linguagem repetida e a espontânea, sendo a primeira elaborada corretamente, enquanto a fala espontânea torna-se ininteligível. Isso poderia nos levar a considerar um problema afetivo- emocional, caso em que seria necessário um exame psicológico da criança. Habilidades motoras Em muitos casos, um atraso motor pode ser um fator causal que favorece o aparecimento de uma dislalia funcional. Às vezes o atraso motor é generalizado e em outros casos a dificuldade está especificamente na movimentação dos órgãos articulatórios. Discriminação auditiva 42 É importante avaliar a capacidade de percepção auditiva no que se refere à discriminação de sons ambientais, articulações e palavras. Para realizar esta avaliação, serão propostos pares de cada uma das três áreas para examinar: Discriminação de sons ambientais Sons familiares, como folhas de jornal, são usados para avaliar a discriminação de sons ambientes. O estímulo A será o “rasgar uma folha de jornal” e o estímulo B será “amassar uma folha de jornal”, o sujeito de costas para o profissional deverá dizer qual som pertence a qual ação. Discriminação conjunta Para avaliar a discriminação de articulações escolheremos três sílabas semelhantes como “ba”, “da”, “ga”. Esses estímulos são apresentados aos pares e o indivíduo deve ser capaz de discriminar o que é cada som. Discriminação de palavras Para avaliar a discriminação de palavras, são escolhidas palavras para poder avaliar a capacidade de discriminar os sons da articulação inserida nas palavras. 43 Para isso, é solicitado que repitam as palavras que você está apresentando aos pares, se forem diferentes ou se forem palavras iguais, como “pequeno”, “boca” / “gato”, “pato /. ● Respiração A respiração é necessária para a emissão da voz e a articulação da linguagem. É importante conhecer a capacidade respiratória do indivíduo, se existem defeitos no processo respiratório e o controle e direcionalidade do ar expirado. Tônus muscular e relaxamento A tensão muscular desempenha um papel na articulação da linguagem. Principalmente na área oral, pois às vezes bloqueia a agilidade de articular palavras. Tratamento da dislalia funcional Para elaborar um programa de articulação devemos estabelecer: 1. O objetivo que pretendemos alcançar, no nosso caso, é a articulação correta de um fonema ou grupo de fonemas que não é possível espontaneamente. 2. Definir conduta: articulação correta de um ou mais fonemas em português. 44 3. Requisitos prévios: que a criança seja capaz de prestar atenção, imitar e seguir instruções orais. O ouvido e o aparelho de fala devem funcionar normalmente. Modelar é uma técnica operante usada para aumentar comportamentos. Esta técnica é indicada quando o comportamento que queremos alcançar não existe. Para isso, reforçaremos as abordagens (as partes em que dividimos o comportamento) até atingirmos o objetivo final. O reforçador deve ser contingente e deve ser entregue imediatamente após a conduta ser emitida. Para aplicar a moldagem é necessário: 1. Defina o comportamento final que queremos alcançar. 2. Selecione os reforços a serem utilizados. 3. Estabeleça a linha de base ou ponto de partida. 4. Estabeleça as aproximações sucessivas. 5. Saber utilizar outras técnicas comportamentais como instruções, modelação, orientação física ou indução situacional. 6. Reforce imediatamente. As fases que vamos seguir serão: 1. Linha de base: na fase de avaliação poderemos saber quais fonemas são os que causam problemas e em que posição da palavra causam maior dificuldade. 45 2. Moldagem da articulação do fonema: o profissional atua como modelo articulando o fonema duas vezes. 3. Formação de fonemas em linguagem repetida. Uma lista de palavras e frases é feita com o fonema de que estamos tratando. 4. Formação de fonemas em toques. Apresentamos objetos, fotos ou desenhos que contenham o fonema discutido. Passamos para a próxima fase após 10 respostas corretas. 5. Formação de fonemas em intraverbos. Elaboramos uma lista com dez questões cuja resposta implica o fonema intervencionado. 6. Avaliação final. Apresentamos as palavras que apresentamos para estabelecer a linha de base e assim saber se há diferenças entre o teste-reteste. 7. Generalização. Avaliamos outros ambientes da criança e treinamos professores, pais, etc. para atuarem como co- terapeutas da intervenção. 8. Rastreamento. Aproximadamente duas vezes por mês passaremos novamente no teste de linha de base para ver se a intervenção está sendo ideal. Cebolinha e a dislalia Cebolinha é um personagem de histórias em quadrinhos e tirinhas, criado em 1960 por Mauricio de Sousa.Sempre à procura de um jeito de pegar o coelhinho de sua amiga Mônica, o Sansão. Além de participar das histórias com a sua turma de amigos, 46 Cebolinha também participa das histórias do Louco, caracterizadas por situações completamente absurdas que não ocorrem nas histórias com a turma. Cebolinha também participa de histórias com Xaveco, personagem secundário da Turma da Mônica. Falar “elado” é uma característica marcante de um personagem muito conhecido nos gibis da Turma da Mônica. Na história, o Cebolinha troca a letra “R” pela “L”, causando certo constrangimento para ele em algumas situações. O que poucas pessoas sabem é que este personagem famoso tem o que chamamos de dislalia, conhecida também como troca de fonemas (Central da Saúde, 2023). Hortelino Troca-Letras e a dislalia 47 O Hortelino Troca-Letras (“Elmer Fudd”) do Looney Tunes, que sempre trocam o “R” (inicial e intervocálico) por “L”, no caso de Hortelino, o “R” final também é afetado (Clube da Fala, 2022). 48 Capítulo 4 Gagueira egundo o National Institute on Deafness and Other Communication Disorders (EUA, 2023), a gagueira é um distúrbio de fala caracterizado pela repetição de sons, sílabas ou palavras; prolongamento de sons; e interrupções na fala conhecidas como bloqueios. Um indivíduo que gagueja sabe exatamente o que gostaria de dizer, mas tem dificuldade em produzir um fluxo normal de fala. Essas interrupções na fala podem ser acompanhadas por comportamentos de luta, como piscar rápido dos olhos ou tremores nos lábios. A gagueira pode dificultar a comunicação com outras pessoas,o que muitas vezes afeta a qualidade de vida e as relações interpessoais de uma pessoa. A gagueira também pode influenciar negativamente o desempenho e as oportunidades no trabalho, e o tratamento pode ter um alto custo financeiro. Os sintomas da gagueira podem variar significativamente ao longo do dia de uma pessoa. Em geral, falar diante de um grupo ou falar ao telefone pode tornar a gagueira de uma pessoa mais grave, enquanto cantar, ler ou falar em uníssono pode reduzir temporariamente a gagueira. A gagueira às vezes é chamada de gagueira e, por um termo mais amplo, fala disfluente. S 49 Quem gagueja? Aproximadamente 3 milhões de americanos gaguejam. A gagueira afeta pessoas de todas as idades. Ocorre com mais frequência em crianças entre 2 e 6 anos de idade, à medida que desenvolvem suas habilidades linguísticas. Aproximadamente 5 a 10 por cento de todas as crianças gaguejarão durante algum período da sua vida, que dura de algumas semanas a vários anos. Os rapazes têm 2 a 3 vezes mais probabilidade de gaguejar do que as raparigas e à medida que envelhecem esta diferença de género aumenta; o número de rapazes que continuam a gaguejar é três a quatro vezes maior que o número de raparigas. A maioria das crianças supera a gagueira. Aproximadamente 75 por cento das crianças recuperam da gagueira. Para os restantes 25 por cento que continuam a gaguejar, a gaguez pode persistir como um distúrbio de comunicação ao longo da vida. Como a fala é normalmente produzida? Produzimos os sons da fala por meio de uma série de movimentos musculares precisamente coordenados que envolvem respiração, fonação (produção da voz) e articulação (movimento da garganta, palato, língua e lábios). Os movimentos musculares são controlados pelo cérebro e monitorados através dos sentidos da audição e do tato. 50 Quais são as causas e tipos de gagueira? Os mecanismos precisos que causam a gagueira não são compreendidos. A gagueira é comumente agrupada em dois tipos denominados de desenvolvimento e neurogênicos. Gagueira de desenvolvimento A gagueira do desenvolvimento ocorre em crianças pequenas enquanto elas ainda estão aprendendo habilidades de fala e linguagem. É a forma mais comum de gagueira. Alguns cientistas e médicos acreditam que a gagueira do desenvolvimento ocorre quando as habilidades de fala e linguagem das crianças são incapazes de atender às demandas verbais da criança. A maioria dos cientistas e médicos acredita que a gagueira do desenvolvimento decorre de interações complexas de múltiplos fatores. Estudos recentes de imagens cerebrais mostraram diferenças consistentes entre aqueles que gaguejam em comparação com seus pares que não gaguejam. A gagueira do desenvolvimento também pode ocorrer em famílias e pesquisas mostraram que fatores genéticos contribuem para esse tipo de gagueira. A partir de 2010, pesquisadores do Instituto Nacional de Surdez e Outros Distúrbios da Comunicação (NIDCD, do inglês National Institute on Deafness and Other Communication 51 Disorders, EUA) identificaram quatro genes diferentes nos quais mutações estão associadas à gagueira. Gagueira neurogênica A gagueira neurogênica pode ocorrer após um acidente vascular cerebral, traumatismo cranioencefálico ou outro tipo de lesão cerebral. Com a gagueira neurogênica, o cérebro tem dificuldade em coordenar as diferentes regiões cerebrais envolvidas na fala, resultando em problemas na produção de uma fala clara e fluente. Antigamente, acreditava-se que toda gagueira era psicogênica, causada por trauma emocional, mas hoje sabemos que a gagueira psicogênica é rara. Como a gagueira é diagnosticada? A gagueira geralmente é diagnosticada por um fonoaudiólogo, um profissional de saúde treinado para testar e tratar indivíduos com distúrbios de voz, fala e linguagem. O fonoaudiólogo considerará uma variedade de fatores, incluindo o histórico da criança (como quando a gagueira foi notada pela primeira vez e em que circunstâncias), uma análise dos comportamentos de gagueira da criança e uma avaliação das habilidades de fala e linguagem da criança. e o impacto da gagueira em sua vida. Ao avaliar uma criança pequena quanto à gagueira, um fonoaudiólogo tentará determinar se a criança provavelmente continuará com seu comportamento de gagueira ou o superará. 52 Para determinar essa diferença, o fonoaudiólogo considerará fatores como o histórico familiar de gagueira, se a gagueira da criança durou 6 meses ou mais e se a criança apresenta outros problemas de fala ou linguagem. Como a gagueira é tratada? Embora atualmente não haja cura para a gagueira, há uma variedade de tratamentos disponíveis. A natureza do tratamento será diferente, com base na idade da pessoa, nos objetivos de comunicação e em outros fatores. Se você ou seu filho gaguejam, é importante consultar um fonoaudiólogo para determinar as melhores opções de tratamento. Terapia para crianças Para crianças muito pequenas, o tratamento precoce pode evitar que a gagueira do desenvolvimento se torne um problema para toda a vida. Certas estratégias podem ajudar as crianças a aprender a melhorar a fluência da fala, ao mesmo tempo que desenvolvem atitudes positivas em relação à comunicação. Os profissionais de saúde geralmente recomendam que uma criança seja avaliada se gaguejar durante 3 a 6 meses, apresentar comportamentos de luta associados à gagueira ou tiver histórico familiar de gagueira ou distúrbios de comunicação relacionados. Alguns pesquisadores recomendam que uma criança seja avaliada a cada 3 meses para determinar se a gagueira está 53 aumentando ou diminuindo. O tratamento geralmente envolve ensinar aos pais maneiras de apoiar a produção de fala fluente de seus filhos. Os pais podem ser incentivados a: • Proporcione um ambiente familiar descontraído que permita muitas oportunidades para a criança falar. Isso inclui reservar um tempo para conversar, especialmente quando a criança está animada e tem muito a dizer. • Ouça atentamente quando a criança fala e concentre-se no conteúdo da mensagem, em vez de responder à forma como é dita ou interromper a criança. • Fale de uma forma ligeiramente lenta e relaxada. Isso pode ajudar a reduzir as pressões de tempo que a criança pode estar enfrentando. • Ouça atentamente quando a criança fala e espere que ela diga a palavra pretendida. Não tente completar as frases da criança. Além disso, ajude a criança a aprender que uma pessoa pode se comunicar com sucesso mesmo quando ocorre gagueira. • Fale aberta e honestamente com a criança sobre a gaguez se ela tocar no assunto. Deixe a criança saber que não há problema em ocorrer algumas interrupções. Terapia para gagueira Muitas das terapias atuais para adolescentes e adultos que gaguejam concentram-se em ajudá-los a aprender maneiras de minimizar a gagueira quando falam, como falar mais devagar, 54 regular a respiração ou progredir gradualmente de respostas monossílabas para palavras mais longas e frases mais complexas. . A maioria dessas terapias também ajuda a lidar com a ansiedade que uma pessoa que gagueja pode sentir em determinadas situações de fala. Terapia medicamentosa A Food and Drug Administration dos EUA não aprovou nenhum medicamento para o tratamento da gagueira. No entanto, alguns medicamentos aprovados para tratar outros problemas de saúde – como epilepsia, ansiedade ou depressão – têm sido usados para tratar a gagueira. Esses medicamentos geralmente apresentam efeitos colaterais que dificultam seu uso por um longo período de tempo. Dispositivos eletrônicos Algumas pessoas que gaguejam usam dispositivos eletrônicos para ajudar a controlar a fluência. Por exemplo, um tipo de dispositivo se encaixano canal auditivo, como um aparelho auditivo, e reproduz digitalmente uma versão ligeiramente alterada da voz do usuário no ouvido, de modo que soe como se ele estivesse falando em uníssono com outra pessoa. Em algumas pessoas, os dispositivos eletrónicos podem ajudar a melhorar a fluência num período de tempo relativamente curto. São necessárias pesquisas adicionais para determinar quanto 55 tempo esses efeitos podem durar e se as pessoas são capazes de usar e se beneficiar facilmente desses dispositivos em situações do mundo real. Por estas razões, os investigadores continuam a estudar a eficácia a longo prazo destes dispositivos. Grupos de autoajuda Muitas pessoas descobrem que alcançam seu maior sucesso por meio de uma combinação de auto-estudo e terapia. Os grupos de autoajuda proporcionam às pessoas que gaguejam uma forma de encontrar recursos e apoio à medida que enfrentam os desafios da gaguez. Que pesquisas estão sendo realizadas sobre a gagueira? Investigadores de todo o mundo estão a explorar formas de melhorar a identificação precoce e o tratamento da gaguez e de identificar as suas causas. Por exemplo, os cientistas têm trabalhado para identificar os possíveis genes responsáveis pela gagueira que tende a ocorrer nas famílias. Os cientistas do NIDCD identificaram agora variantes em quatro desses genes que são responsáveis por alguns casos de gagueira em muitas populações em todo o mundo, incluindo os Estados Unidos e a Europa. Todos esses genes codificam proteínas que direcionam o tráfego dentro das células, garantindo que vários componentes celulares cheguem ao seu local adequado dentro da célula. Tais 56 défices no tráfego celular são uma causa recentemente reconhecida de muitas doenças neurológicas. Os investigadores estão agora a estudar como este defeito no tráfego celular leva a défices específicos na fluência da fala. Os pesquisadores também estão trabalhando para ajudar os fonoaudiólogos a determinar quais crianças têm maior probabilidade de superar a gagueira e quais crianças correm o risco de continuar a gaguejar na idade adulta. Além disso, os investigadores estão a examinar formas de identificar grupos de indivíduos que apresentam padrões e comportamentos de gagueira semelhantes que podem estar associados a uma causa comum. Os cientistas estão usando ferramentas de imagem cerebral, como PET (tomografia por emissão de pósitrons) e ressonância magnética funcional (ressonância magnética) para investigar a atividade cerebral em pessoas que gaguejam. Os investigadores financiados pelo NIDCD também estão a utilizar imagens cerebrais para examinar a estrutura cerebral e as alterações funcionais que ocorrem durante a infância e que diferenciam as crianças que continuam a gaguejar daquelas que recuperam da gaguez. A imagem cerebral pode ser usada no futuro como uma forma de ajudar a tratar pessoas que gaguejam. Os investigadores estão a estudar se pacientes voluntários que gaguejam podem aprender a reconhecer, com a ajuda de um programa de computador, padrões de fala específicos que estão ligados à gaguez e a evitar a utilização desses padrões quando falam. 57 Gaguinho (Porky , em inglês) e a gagueira Gaguinho (Porky , em inglês) é um personagem dos desenhos animados dos Looney Tunes e Merrie Melodies para a Warner Bros Ele foi o primeiro personagem criado pelo estúdio á atrair o público, os animadores (especialmente Bob Clampett) criaram vários filmes aclamados pelos críticos de curtas com este pequeno porco gordo. Mesmo depois de ser suplantado por personagens posteriores, Gaguinho permaneceu popular com os fãs, e mais importante, entre os diretores da Warner, que incluíam-lo em papéis de mil negócios e funções do parceiro. Ele é conhecido por sua frase no final de cada curta: "Isso é tudo pessoal!" (Looney Tunes, 2023). 58 O grande motivo por trás da característica do personagem é que seu dublador original, o ator Joe Dougherty, que emprestou sua voz ao porquinho em sua estreia no programa animado “Merrie Melodies” (1935), também era gago (Recreio, 2023). A característica mais marcante de Porky é uma gagueira severa, que às vezes ele compensa substituindo as palavras; por exemplo, "O que está acontecendo?" pode se tornar "O que é guh-guh-guh-guh— ... o que está acontecendo?" A idade de Porky variou bastante na série; originalmente concebido como um leitão inocente de sete anos, Porky foi escalado com mais frequência como um adulto, muitas vezes sendo escalado como o homem hétero competente da série nos anos posteriores. No final de muitos desenhos animados do Looney Tunes, Porky Pig explode na cabeça de um bumbo, e sua tentativa de encerrar o show com "The End" se torna "Th-Th-The, Th-Th-The, Th-Th... Isso é tudo, pessoal!" Porky Pig apareceu em 153 desenhos animados na era de ouro da animação americana. Onde posso encontrar informações adicionais sobre a gagueira? Use as seguintes palavras-chave para ajudá-lo a encontrar organizações que possam responder perguntas e fornecer informações sobre a gagueira: • Gagueira • Fonoaudiólogos 59 • Referências de médicos/profissionais 60 Capítulo 5 Principais problemas fonoaudiológicos de personagens infantis egundo Enio Rodrigo B. Silva (2012), eles são caricatos, infantis e irreais. Porém diversos personagens infantis, das histórias em quadrinhos ou dos desenhos animados têm, na fala, características bastante humanas. E muitos deles poderiam dar um pulinho no consultório de um fonoaudiólogo para melhorar seus problemas de comunicação (que muitas vezes causam muita confusão). Afinal, não é porque se é um porquinho, um pato ou um coelho que é preciso conviver com estas condições relativamente simples de serem resolvidas. Conforme o mesmo autor, a convite do portal “O que eu tenho?”, a fonoaudióloga Débora Befi, coordenadora do Departamento de Linguagem da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia e pesquisadora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), esqueceu por alguns momentos que eles são personagens fictícios e analisou os principais problemas fonoaudiológicos em personagens de desenhos animados infantis. Eles não trocam a letra, trocam o som S 61 Cebolinha e Hortelino Troca-Letras estão separados por uma longa distância geográfica (sem contar que vivem em épocas diferentes, dependendo de suas aventuras). Mas estes dois personagens têm problemas fonoaudiológicos em comum. Ambos trocam, de forma similar, o som do “r” pelo “l”. “No caso do Cebolinha talvez seja mais compreensível, pois este tipo de troca ou confusão de sons é comum até certa idade. Até os quatro anos é perfeitamente normal ocorrer este problema, pois a criança está aprendendo a articular os sons da fala. Entre os quatro e os seis anos esse tipo de confusão de grupos consonantais já deveria estar sumindo. O Cebolinha está um pouco atrasado neste desenvolvimento, mas ainda é possível reverter este processo”, analisa Débora. “A dificuldade de vibração de ponta de língua, por exemplo, para produzir o “r” , na hora de falar, são estratégias bastantes simples que, com o auxílio de um profissional de fonoaudiologia, podem ter remissão rapidamente. Já no caso do Hortelino é mais difícil, pois ele já é um adulto. Vai precisar de mais tempo, mas também é possível esta readaptação da fala”, diz. Um problema nos músculos da língua. Patolino e Frajola são outros dois personagens com um problema em comum. Ambos têm o chamado ceceio, uma condição caracterizada por um tônus muscular mais fraco, ou seja, os músculos da língua não se fortaleceram o suficiente durante a fase de desenvolvimentoe, em consequência disso, pode haver projeção da língua durante a fala. 62 Além da projeção da língua, estes dois personagens podem ter problemas de deglutição (dificuldade para engolir alimentos). Talvez por isso o Frajola tenha tanta dificuldade de dar cabo de seu alimento predileto, o Piu-Piu (cuja fala infantilizada é provavelmente mais um problema para um psicólogo do que para o fonoaudiólogo). “O ceceio anterior – projeção da língua entre os dentes da frente – faz com que a produção de alguns sons (“s”, por exemplo), seja distorcida, no caso do Patolino. A saliva, que também é em parte controlada pelo movimento da língua, pode acabar saindo junto com o ar. Já o Frajola tem uma espécie de ceceio lateral, então o ar escapa por debaixo da língua nas laterais, parecendo que há um “xê” perdido em algumas palavras”, observa Débora. A reabilitação da força muscular e readequação da mastigação/deglutição são alguns aspectos que ajudam a reverter quadro. Sem vírgulas nas frases. 63 O mexicano Ligeirinho pode ser facilmente classificado como ansioso. Mas como ele não parece exatamente estressado o tempo todo – levando as situações problemáticas que enfrenta com bastante bom humor – então o mais provável é que ele tenha uma alteração de fluência pelo aumento da velocidade de fala que pode comprometer o entendimento do que ele diz. “Não há causa determinada para essa alteração de velocidade, pode até ser uma característica dele enquanto falante. Talvez o núcleo familiar seja de pessoas que falem rápido e ele só repete o modelo. Atividades específicas para promoção da fluência com profissional especializado podem ser o suficiente para ele”, indica a fonoaudióloga. Mickey, um campeão em vendagens de produtos ligados à sua imagem, pode ter um problema similar a outro campeão, o lutador Anderson Silva. A fala afinada pode ter origem em um simples atraso de muda vocal. “A voz se forma a partir de um conjunto de estruturas. Pulmão, cordas vocais, garganta, boca, língua são as principais. A voz fina, muitas vezes, pode ser decorrente de características da própria laringe. Outra causa, até certa idade, é um atraso na muda vocal. A muda vocal se dá na adolescência – caracterizada pela voz de ‘taquara rachada’ exatamente por esse motivo – mas em alguns casos podem demorar um pouco mais para se adequar, ou então não se adequar de maneira nenhuma e conviver com esse tom de voz. O Anderson Silva, pode ter uma dessas características, não se pode afirmar, deveria ser avaliado por um especialista. Já o Mickey é difícil ter uma ideia da sua 64 idade real, então não é possível ter certeza ainda. Apenas um especialista, a partir de testes em consultório poderia dar um diagnóstico mais preciso. Mas acho difícil isso acontecer”, brinca Débora. Pernalonga não poderia ficar fora dessa. O coelho é extremamente inteligente e tem um discurso que convence qualquer um. Mas a voz anasalada é característica de pessoas popularmente conhecidas como fanhosas. “É uma condição que pode ser causada por problemas anatômicos, ou ainda, uma dificuldade de movimentação do chamado ‘véu palatino’, que veda o nariz quando falamos evitando o escape do ar. O problema se caracteriza pelo escape dos sons orais através do nariz, criando uma sonoridade 65 reconhecida pela maioria das pessoas. Normalmente, a reabilitação fonoaudiológica é bastante eficiente para auxiliar na solução do problema”, afirma a especialista. Um personagem que pode estar em maus lençóis é o irritadiço Pato Donald. A especialista aponta que o problema que atinge a fala de Donald pode ser uma conjunção de fatores. “Primeiro me parece que o Donald tem uma alteração bastante grave na voz. Pode ser, inclusive, um nódulo vocal. A voz é muito rouca e muito forçada – o que agrava o quadro. Além disso, há a questão de fluência alterada, ou seja, pela velocidade excessiva da fala. O Donald seria caso para uma avaliação por uma equipe multidisciplinar em regime de urgência”, diz a fonoaudióloga. Outro que poderia ter algum problema mais complexo seria o Coiote Coió, um dos maiores consumidores de produtos Acme e cuja fixação pelo Papa-Léguas lhe rende galos na cabeça o tempo todo. “Ele ouve, mas não fala. Isso pode ser um indicativo de um problema complicado também, afinal a comunicação e a fala, em humanos, é algo natural. O que me faz ficar mais tranquila é que, no final das contas, ele é apenas um coiote, então não falar não é exatamente um problema”, brinca a especialista. O Gaguinho tem um problema fonoaudiológico nada difícil de descobrir. A gagueira, que pode se caracterizar pela repetição de sons, sílabas, bloqueios, longas pausas, entre outras características. Por ser muito impactante do ponto de vista social a gagueira não deveria ter graça alguma. Brincadeira, mas nem tanto 66 O texto acima, claro, é uma brincadeira. Afinal o que faz os desenhos infantis serem engraçados é a suspensão da realidade e a aceitação da caricatura dentro do contexto das histórias. Mas os problemas analisados são reais e vários deles podem comprometer a convivência social ou criar traumas em pessoas que não sabem a quem recorrer para reverter seu quadro. Os profissionais indicados para avaliar melhor estes problemas da fala são os profissionais de fonoaudiologia e os médicos otorrinolaringologistas, cuja especialidade de nome gigantesco também pode avaliar – encaminhar para outros especialistas – a maioria dos problemas citados. 67 Epílogo istúrbios dos sons da fala é um termo genérico que se refere a qualquer dificuldade ou combinação de dificuldades com a percepção, produção motora ou representação fonológica dos sons da fala e segmentos da fala - incluindo regras fonotáticas que regem sequências de sons da fala permitidas em um idioma. Os distúrbios dos sons da fala podem ser de natureza orgânica ou funcional. Os distúrbios orgânicos dos sons da fala resultam de uma causa motora/neurológica, estrutural ou sensorial/perceptual subjacente. Os distúrbios funcionais dos sons da fala são idiopáticos – não têm causa conhecida. D 68 Bibliografia consultada A Aldana, Y. Practical manual for teachers. Activities to work on functional dyslalias in children between 6 and 10 years of age. Maracaibo: ÚNICA. 2007. B BARROS, A.; FLORES, F. Dyslalia: language problem or speech problem? Rev. Chilena de Pediatría, v. 45, n. 6, p. 501-504, 1974. BAUMAN-WÄNGLER, J. A. Articulatory and phonological impairments: a clinical focus. 2 ed. Boston: Allyn and Bacon. 2004. 69 BRITANNICA. Sound production. Disponível em: < https://www.britannica.com/science/sound-production > Acesso em: 28 nov. 2023. C CENTRAL DA SAÚDE. Dislalia: entenda tudo sobre a “troca de fonemas”. Disponível em: < https://www.centraldasaude.com.br/ blog/dislalia-entenda-tudo-sobre-a-troca-defonemas/#:~:text=Na% 20hist%C3%B3ria%2C%20o%20Cebolinha%20troca,tamb% C3%A9m%20como%20troca%20de%20fonemas. > Acesso em: 28 nov. 2023. CLUBE DA FALA. 2022. Tudo o que você precisa saber sobre a dislalia. < https://www.clubedafala.com.br/blog/dislalia-troca -de-letras/#:~:text=Um%20caso%20cl%C3%A1ssico%20 caracter%C3%ADstico%20portador,R%E2%80%9D%20final%20t amb%C3%A9m%20%C3%A9%20afetado. > Acesso em: 28 nov. 2023. L 70 LOONEY TUNES. Gaguinho. Disponível em: < https://looney- tunes.fandom.com/pt-br/wiki/Gaguinho > Acesso em: 28 nov. 2023. M MCNEILL, B. C.; GILLON, G. T.; DODD, B. Effectiveness of an integrated phonological awareness approach for children with childhood apraxia of speech (CAS). Child LanguageTeaching and Therapy, v. 25, n. 3, p. 341-366, 2009. MORRISON, R. 2021. Dyslalia: symptoms, causes and treatment. Disponível em: < https://warbletoncouncil.org/dislalia-11434 > Acesso em: 28 nov. 2023. N NATIONAL INSTITUTE ON DEAFNESS AND OTHER COMMUNICATION DISORDERS. Stuttering. Disponível em: < 71 https://www.nidcd.nih.gov/health/stuttering > Acesso em: 28 nov. 2023. R RECREIO. Por que o porquinho de Looney Tunes gagueja? Disponível em: < https://recreio.uol.com.br/noticias/ entretenimento/por-que-o-porquinho-de-looney-tunes-gagueja. phtml > Acesso em: 28 nov. 2023. S SILVA, E. R. B. 2012.Principais problemas fonoaudiológicos de personagens infantis. Disponível em: < https://eniorodrigo.wordpress.com/2012/08/16/ principais-problemas-fonoaudiologicos-de-personagens-infantis/ > Acesso em: 28 nov. 2023. 72 73