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Indaial – 2022 e Urbana Prof. Fabricio Estevo da Silva 1a Edição ecologia geral Elaboração: Prof. Fabricio Estevo da Silva Copyright © UNIASSELVI 2022 Revisão, Diagramação e Produção: Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI Impresso por: S586e Silva, Fabricio Estevo da Ecologia geral e urbana. / Fabricio Estevo da Silva – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 288 p.; il. ISBN 978-65-5663-943-7 ISBN Digital 978-65-5663-939-0 1. Ecologia. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 577 Este livro procura apresentar princípios, conceitos e simplificações acerca dos estudos de ecologia enquanto ciência que busca compreender o mundo real. A ecologia é de interesse prático desde o Início da história da humanidade, ou seja, desde que a espécie humana iniciou o seu processo de utilizador dos recursos naturais. O desafio é aprender a ver o ambiente e a sociedade como um sistema único. Esperamos que você utilize a obra como um texto básico sobre o tema ecologia. Trata-se de uma compilação das principais literaturas sobre o assunto com especial menção aos trabalhos dos irmãos Howard Thomas Odum e Eugene Pleasants Odum, considerados como os principais expoentes da ecologia moderna por agregaram em seus trabalhos pesquisadores de diversas áreas do conhecimento científico, e responsáveis pela ampla popularização do pensamento holístico nos estudos de ecologia dos ecossistemas. A literatura referência deste nosso trabalho é o livro “Fundamentos de Ecologia” de autoria de Eugene P. Odum e Gary W. Barrett, indicado também para o aprofundamento dos seus estudos sobre ecologia. O livro está dividido em três unidades. Na Unidade 1, abordaremos os aspectos elementares de ecologia enquanto ciência de relevante importância para a humanidade. As bases conceituais da ciência ecológica serão apresentadas de forma sequencial, a partir do conhecimento do conceito de ecossistema. Em seguida serão abordados os principais componentes funcionais dos sistemas ecológicos, bem como o processamento energético nos ecossistemas. Em seguida, na Unidade 2, estudaremos os componentes do ecossistema tais como os ciclos biogeoquímicos que são o movimento dos elementos e compostos inorgânicos, essenciais para a vida, por toda biosfera; além de entender a influência do clima nos ecossistemas, reconhecendo que os padrões globais de temperatura e precipitação são estabelecidos pela variação sazonal na energia da radiação solar; estudaremos como se processa a regeneração dos nutrientes, ou seja, os caminhos e transformações químicas e biológica que os elementos seguem através dos ecossistemas; e concluindo esta unidade, discutiremos os fatores que regulam os ecossistemas. Por fim, na Unidade 3, aprenderemos sobre as principais unidades da ecologia abordando os aspectos inerentes as interações entre as populações, comunidades biológicas e como se processa o desenvolvimento do ecossistema. Prof. Fabricio Estevo da Silva APRESENTAÇÃO Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – e dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, a UNIASSELVI disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos. GIO QR CODE Você lembra dos UNIs? Os UNIs eram blocos com informações adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento acadêmico como um todo. 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Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de ações sobre o meio ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Portanto, acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Junto à chegada da GIO, preparamos também um novo layout. Diante disso, você verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os seus estudos com um material atualizado e de qualidade. ENADE LEMBRETE Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conheci- mento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementa- res, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira, acessando o QR Code a seguir. Boa leitura! SUMÁRIO UNIDADE 1 - ELEMENTOS DA ECOLOGIA ............................................................................. 1 TÓPICO 1 - PROPÓSITO DA ECOLOGIA .................................................................................3 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................3 2 ECOLOGIA: SURGIMENTO E IMPORTÂNCIA .....................................................................3 3 HIERARQUIA DOS NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO ...................................................................5 4 O PRINCÍPIO DA PROPRIEDADE EMERGENTE .................................................................. 7 5 PROCESSOS DE CONTROLE ...............................................................................................8 6 INTERFACES DA ECOLOGIA ...............................................................................................9 7 MODELOS DE ESTUDOS ....................................................................................................10 RESUMO DO TÓPICO 1 ......................................................................................................... 16 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................. 17 TÓPICO 2 - SISTEMAS ECOLÓGICOS .................................................................................. 19 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................19 2 CONCEITO DE ECOSSISTEMA ........................................................................................ 20 3 ESTRUTURA TRÓFICA DOS ECOSSISTEMAS ................................................................ 26 4 GRADIENTES E ECÓTONOS .............................................................................................27 5 DIVERSIDADE DO ECOSSISTEMA ................................................................................... 30 6 CONTROLE BIOLÓGICO DO AMBIENTE GEOQUÍMICO ................................................... 32 7 CIBERNÉTICA DOS ECOSSISTEMAS ............................................................................... 33 RESUMO DO TÓPICO 2 .........................................................................................................37 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................. 39 TÓPICO 3 - ENERGIA NO ECOSSISTEMA ............................................................................ 41 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 41 2 AS LEIS TERMODINÂMICAS ........................................................................................... 42 3 RADIAÇÃO SOLAR ........................................................................................................... 45 4 PRODUTIVIDADE ............................................................................................................. 46 5 REPARTIÇÃO DE ENERGIA NAS CADEIAS ALIMENTARES ............................................ 50 6 QUALIDADE DE ENERGIA: eMergia ................................................................................ 53 LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................................................ 55 RESUMO DO TÓPICO 3 .........................................................................................................59 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................. 61 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 63 UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA .............................................................67 TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS ............................................................................. 69 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 69 2 TRANSFORMAÇÃO DA ENERGIA E A RECICLAGEM DOS ELEMENTOS .........................70 3 COMPARTIMENTOS INTERLIGADOS DOS ECOSSISTEMAS .......................................... 71 4 TIPOS CLÁSSICOS DE CICLOS BIOGEOQUÍMICOS .........................................................73 4.1 O CICLO DA ÁGUA .............................................................................................................................. 74 4.2 O CICLO DO CARBONO ......................................................................................................................78 4.2.1 A fotossíntese e a respiração .................................................................................................78 4.2.2 A troca oceano-atmosfera .................................................................................................... 79 4.2.3 A Precipitação de carbonatos .............................................................................................. 79 4.2.4 As mudanças no ciclo do carbono através do tempo ....................................................82 4.3 O CICLO DO NITROGÊNIO .................................................................................................................83 4.3.1 Amonificação ..............................................................................................................................87 4.3.2 A nitrificação e a denitrificação .............................................................................................87 4.3.3 A Fixação de nitrogênio ......................................................................................................... 88 4.4 O CICLO DO FÓSFORO ....................................................................................................................... 91 4.5 O CICLO DO ENXOFRE .......................................................................................................................95 RESUMO DO TÓPICO 1 .........................................................................................................99 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................ 101 TÓPICO 2 - VARIAÇÕES NO AMBIENTE FÍSICO E A CICLAGEM DE NUTRIENTES ............... 103 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................103 2 PADRÕES GLOBAIS DE TEMPERATURA E PRECIPITAÇÃO ..........................................103 2.1 CÉLULAS DE HADLEY .....................................................................................................................104 2.2 CONVERGÊNCIA INTERTROPICAL E O CINTURÃO SUBTROPICAL DE ALTA PRESSÃO ...106 2.3 VENTOS DE SUPERFÍCIE E SOMBRAS DE CHUVA ...................................................................106 3 AS CORRENTES OCEÂNICAS DISTRIBUEM O CALOR E A UMIDADE ...........................107 4 VARIAÇÃO SAZONAL DO CLIMA ...................................................................................108 5 O CLIMA SUSTENTA FLUTUAÇÕES IRREGULARES ......................................................109 6 CARACTERÍSTICAS TOPOGRÁFICAS E GEOLÓGICAS ..................................................111 7 O CLIMA E A FORMAÇÃO DOS SOLOS ............................................................................ 112 7.1 INTEMPERISMO ..................................................................................................................................114 7.2 A PODZOLIZAÇÃO OCORRE EM SOLOS ÁCIDOS ........................................................................115 7.3 LATERIZAÇÃO DOS SOLOS ..............................................................................................................115 8 TEMPOS DE RENOVAÇÃO E DE RETENÇÃO .................................................................. 116 9 CICLAGEM DOS ELEMENTOS NÃO ESSENCIAIS ............................................................117 10 CICLAGEM DE NUTRIENTES NOS TRÓPICOS .............................................................. 119 11 CAMINHOS DA RECICLAGEM: O ÍNDICE DE CICLAGEM .............................................120 11.1 O ÍNDICE DE CICLAGEM .................................................................................................................. 122 11.2 RECICLAGEM DE PAPEL ................................................................................................................ 123 RESUMO DO TÓPICO 2 .......................................................................................................124 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................126 TÓPICO 3 - REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES NOS AMBIENTES TERRESTRES E AQUÁTICOS..................................................................................................129 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................129 2 NUTRIENTES NOS ECOSSISTEMAS TERRESTRES .......................................................129 3 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS TERRESTRES ......................130 3.1 O CLIMA AFETA A TAXA DE REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES ............................................... 132 4 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTESEM ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS .......................133 4.1 A ESTRATIFICAÇÃO TÉRMICA NOS ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS ........................................ 134 4.2 OS NUTRIENTES E A PRODUÇÃO NOS OCEANOS .................................................................... 136 4.3 A REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES EM ÁGUAS PROFUNDAS ............................................. 136 4.4 NUTRIENTES EM AMBIENTES ESTUARINOS E MANGUEZAIS .............................................. 137 RESUMO DO TÓPICO 3 .......................................................................................................138 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 140 TÓPICO 4 - FATORES DE REGULAÇÃO NOS ECOSSISTEMAS .........................................143 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................143 2 CONCEITO DE FATORES LIMITANTES: A LEI DO MÍNIMO DE LIEBIG ...........................143 2.1 CONCEITO DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA .................................................................................144 3 COMPENSAÇÃO DE FATOR E ECÓTIPOS ....................................................................... 147 4 CONDIÇÕES DE EXISTÊNCIA COMO FATORES REGULATÓRIOS .................................148 5.1 TEMPERATURA ...................................................................................................................................150 5 OUTROS FATORES FÍSICOS LIMITANTES .....................................................................150 5.2 LUZ ........................................................................................................................................................151 5.3 RADIAÇÕES IONIZANTES ................................................................................................................ 152 5.4 ÁGUA .................................................................................................................................................... 155 5.4.1 Chuva ......................................................................................................................................... 156 5.4.2 Umidade .................................................................................................................................... 156 5.4.3 Poder de evaporação do ar .................................................................................................. 156 5.4.4 Suprimento de água superficial .......................................................................................... 157 5.5 ÁGUA SUBTERRÂNEA .....................................................................................................................158 5.6 AÇÃO CONJUNTA DE TEMPERATURA E UMIDADE .................................................................. 159 5.7 GASES ATMOSFÉRICOS ...................................................................................................................160 5.8 MACRONUTRIENTES E MICRONUTRIENTES .............................................................................. 162 5.9 VENTO E ENCHENTE ........................................................................................................................ 163 6 ESTRESSE ANTROPOGÊNICO COMO FATOR LIMITANTE .............................................164 6.1 POLUIÇÃO DO AR .............................................................................................................................. 165 6.2 POLUIÇÃO TÉRMICA ........................................................................................................................ 166 6.3 PESTICIDAS ........................................................................................................................................167 LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................169 RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................... 174 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................ 176 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................178 UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA ...........................................................................183 TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES .........................................................................185 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................185 2 PROPRIEDADES DA POPULAÇÃO ..................................................................................186 2.1 ÍNDICES DE DENSIDADE ..................................................................................................................186 2.2 DENSIDADE, BIOMASSA E RELAÇÕES TRÓFICAS .................................................................... 187 2.2.1 Metabolismo e tamanho dos indivíduos: lei da potência 3/4 ..................................... 187 2.2.2 Energética de escala e a lei dos retornos decrescentes ..............................................190 2.3 MÉTODOS PARA ESTIMAR DENSIDADES POPULACIONAIS ....................................................191 2.4 NATALIDADE ...................................................................................................................................... 192 2.5 MORTALIDADE ................................................................................................................................... 193 2.6 DISTRIBUIÇÃO ETÁRIA DA POPULAÇÃO ..................................................................................... 195 3 CONCEITOS BÁSICOS DE TAXA .....................................................................................196 4 TAXA INTRÍNSECA DE CRESCIMENTO ..........................................................................198 5 CONCEITO DE CAPACIDADE DE SUPORTE .................................................................. 200 6 FLUTUAÇÃO DE POPULAÇÃO E OSCILAÇÕES CÍCLICAS ........................................... 205 6.1 TAXAS EXTRÍNSECAS ...................................................................................................................... 206 6.2 TAXAS INTRÍNSECAS .......................................................................................................................207 6.3 VISÃO GERAL DO CICLO ................................................................................................................ 209 7 MECANISMOS DE REGULAÇÃO DA POPULAÇÃO INDEPENDENTE DE DENSIDADE E DEPENDENTES DE DENSIDADE ..................................................................................210 8 PADRÕES DE DISPERSÃO ..............................................................................................212 9 PRINCÍPIO DE AGREGAÇÃO E REFÚGIO ........................................................................215 10 ÁREA DE AÇÃO E TERRITORIALIDADE ........................................................................ 217 11 REPARTIÇÃO E OTIMIZAÇÃO DE ENERGIA: SELEÇÃO “r” SELEÇÃO “K” ................. 220 12 GENÉTICA DE POPULAÇÕES ....................................................................................... 224 RESUMO DO TÓPICO 1 ...................................................................................................... 229 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................231 TÓPICO 2 - EOLOGIA DE COMUNIDADES ........................................................................ 233 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 233 2 EOLOGIA DE COMUNIDADES: ASPECTOS GERAIS ......................................................233 3 CONCEITOS ESTRUTURANTES NO ESTUDO DE COMUNIDADES ............................... 235 3.1 COEVOLUÇÃO .................................................................................................................................... 236 3.2 EVOLUÇÃO DA COOPERAÇÃO: SELEÇÃO DE GRUPO ............................................................ 238 3.3 MEDIDAS DA ESTRUTURA DA COMUNIDADE........................................................................... 239 3.4 O TERMO COMUNIDADE TEM RECEBIDO MUITOS SIGNIFICADOS ...................................... 240 3.5 A COMUNIDADE COMO UMA UNIDADE NATURAL DE ORGANIZAÇÃO ECOLÓGICA ................241 3.6 AS RELAÇÕES DE ALIMENTAÇÃO ORGANIZAM AS COMUNIDADES .................................. 242 3.7 OS NÍVEIS TRÓFICOS SÃO INFLUENCIADOS DE CIMA PELA PREDAÇÃO DE BAIXO PELA PRODUÇÃO ......................................................................................................... 243 3.8 AS ESPÉCIES NAS COMUNIDADES BIOLÓGICAS VARIAM NA ABUNDÂNCIA RELATIVA .......................................................................................................... 244 3.9 NÚMERO DE ESPÉCIES E ÁREA MOSTRADA ............................................................................ 245 3.10 ÍNDICES DE DIVERSIDADE E A ABUNDÂNCIA RELATIVA ..................................................... 246 4 TIPOS DE INTERAÇÕES ENTRE ESPÉCIES .................................................................. 248 5 COMPETIÇÃO INTERESPECÍFICA E COEXISTÊNCIA ................................................... 249 6 INTERAÇÕES POSITIVAS/NEGATIVAS: PREDAÇÃO, HERBIVORIA PARASITISMO E ALELOPATIA ........................................................................................251 7 INTERAÇÕES POSITIVAS: COMENSALISMO, COOPERAÇÃO E MUTUALISMO .................253 8 CONCEITOS DE HABITAT, NICHO ECOLÓGICO É GUIDA .............................................. 256 9 DAS POPULAÇÕES E COMUNIDADES AOS ECOSSISTEMAS E PAISAGENS ................. 258 RESUMO DO TÓPICO 2 ...................................................................................................... 260 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................261 TÓPICO 3 - DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA ...................................................... 263 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 263 2 ESTRATÉGIAS DO DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA ....................................... 263 3 A SERE INCLUI TODOS OS ESTÁGIOS DA MUDANÇA SUCESSIONAL ......................... 264 3.1 A SUCESSÃO PRIMÁRIA COMEÇA EM HABITATS RECÉM-FORMADOS .............................. 265 3.2 A PERTURBAÇÃO INICIA UMA SUCESSÃO SECUNDÁRIA ..................................................... 266 4 A SUCESSÃO E AS MUDANÇAS NO AMBIENTE CAUSADAS PELOS COLONIZADORES ...............................................................................................267 4.1 FACILITAÇÃO ......................................................................................................................................267 4.2 INIBIÇÃO ............................................................................................................................................ 268 4.3 TOLERÂNCIA ..................................................................................................................................... 269 4.3.1 Aproximando-se do clímax .................................................................................................. 269 5 ESPÉCIES SUCESSIONAIS E SUAS ADAPTAÇÕES ..................................................... 270 6 COMUNIDADES CLÍMAX MANTIDAS POR CONDIÇÕES AMBIENTAIS EXTREMAS ............................................................................................... 272 7 CLÍMACES TRANSITÓRIOS E CÍCLICOS ....................................................................... 273 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................. 275 RESUMO DO TÓPICO 3 ...................................................................................................... 279 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 280 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 282 1 UNIDADE 1 - ELEMENTOS DA ECOLOGIA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • entender o surgimento e a importância da ecologia como ciência e suas interfaces tanto no campo natural quanto no campo econômico; • compreender os modelos e conceitos abordados em estudos de sistemas ecológicos e suas estruturas; • demonstrar como ocorre a transferência e a qualidade da energia em cadeias e teias alimentares nos diferentes níveis de um ecossistema; • entender os conceitos de capacidade de suporte e sustentabilidade. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – PROPÓSITO DA ECOLOGIA TÓPICO 2 – SISTEMAS ECOLÓGICOS TÓPICO 3 – ENERGIA NO ECOSSISTEMA Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 CONFIRA A TRILHA DA UNIDADE 1! Acesse o QR Code abaixo: 3 PROPÓSITO DA ECOLOGIA 1 INTRODUÇÃO A ecologia, como estudo da Terra, emergiu completamente de suas raízes nas ciências biológicas para se tornar uma disciplina integrativa do ambiente. É o estudo científico do ambiente natural e das relações dos organismos uns com os outros e com as suas redondezas. A rigor, Ecologia é a ciência que estuda as relações dos seres vivos entre si e com seu meio físico. Este, por sua vez, também denominado como elementos abióticos (solo, relevo, recursos hídricos, ar e clima), deve ser entendido como o cenário natural em que os seres vivos se desenvolvem. Independentemente das conquistas tecnológicas, os humanos sempre dependerão do ambiente natural para suas necessidades diárias, sejam elas de ordem vitais (ar, a água e alimento), ou para fins sociais de recreação, econômicos, entre outros serviços fornecidos pelo meio ambiente. Nesse sentido, estudaremos, no Tópico 1, o propósito da ecologia: abordaremos, incialmente, o surgimento e importância do estudo da ecologia (subtópico 2); posteriormente veremos como a interação dos organismos com o meio físico se processa através da hierarquia e dos níveis de organização (subtópico 3); a seguir, vamos entender o princípio da propriedade emergente como um subproduto da organização hierárquica dos componentes de um sistema ecológico (subtópico 4); na sequência, serão apresentadas algumas funções básicas que operam em todos os níveis hierárquicos, denominados de processos de controle (subtópico 5); além disso, por se tratar de uma disciplina ampla também quanto aos aspectos social, econômico e cultural, apresentaremos as interfaces da ecologia (subtópico 6); e finalmente vamos conhecer a linguagem e os modelos de estudos mais utilizados na abordagem dos ecossistemas (subtópico 7). 2 ECOLOGIA: SURGIMENTO E IMPORTÂNCIA O termo ecologia foi cunhado pelo biólogo e médico alemão Ernst Heinrich Haeckel (1834-1919), em sua obra Morfologia dos seres vivos, como proposta de uma disciplina científica, a partir dos radicais gregos oikos (casa ou doméstico) e logos (estudo). Dessa maneira, a ecologia passou a ser definida como “o estudo do ambiente natural, inclusive das relações dos organismos entre si e com seus arredores” (HAECKEL, 1869). TÓPICO 1 - UNIDADE 1 4 De forma simplificada, Ecologia é, assim, o “estudo da casa”, compreendida em sentido lato como o localde existência, o entorno, o meio. O estudo da casa ambiental inclui todos os organismos dentro dela e todos os processos funcionais que tornam a casa habitável. Literalmente, então, ecologia é o estudo da “vida em casa”, com ênfase na “totalidade ou padrão de relações entre os organismos e seu ambiente” (ODUM; BARRETT, 2008). É de interesse prático desde o Início da história da humanidade. Na sociedade primitiva, todos os indivíduos necessitavam conhecer seu ambiente, ou seja, entender as forças da natureza, as plantas e animais ao seu redor, para sobreviver. A ecologia enquanto ciência data do início do ano de 1900, mas somente nas últimas décadas a palavra se tornou parte do vocabulário geral. No início, o campo era claramente dividido em linhas taxonômicas (como ecologia vegetal e ecologia animal), mas os conceitos de comunidade biótica (CLEMENTS; SHELFORD, 1939), de cadeia alimentar (LINDEMAN, 1942), ciclagem de material (HUTCHINSON, 1944), e os estudos sobre lagos interiores (JUDAY, 1940), entre outros, ajudaram a estabelecer a teoria básica de um campo unificado de ecologia geral. Antes da década 1970, a ecologia era vista como uma subdisciplina da biologia. Aos poucos foi ampliando os limites estritos das Biociências para ganhar novos parâmetros científicos, em intercâmbio com outros saberes teóricos e práticos, de modo que hoje ela comporta especializações interdisciplinares. Surgiram, assim, denominações como: Ecologia Humana, Ecologia Social, Ecologia Urbana e outras. Todas essas ramificações denotam cada vez mais o papel ativo do ser humano no ordenamento do planeta Terra. Elas tendem a exemplificar melhor o papel consciente do homem em relação tanto aos ambientes naturais e construídos quanto à esfera da vida em sociedade. INTERESSANTE O movimento mundial de consciência ambiental eclodiu entre os anos de 1968 e 1970. Nesse período os astronautas tiraram as primeiras fotografias da Terra vista do espaço. Foi a primeira vez que o planeta foi visto de forma inteira e isolado na vastidão do universo. A década de 1970 foi chamada de “década do ambiente”, cujo início ocorreu com o primeiro “Dia da Terra”, em 22 de abril de 1970. 5 3 HIERARQUIA DOS NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO A ecologia moderna propõe o conceito de níveis de organização através de uma hierarquia ecológica, ou seja, uma disposição resultando em uma série classificada. Eles formam uma hierarquia de entidades progressivamente mais complexas. O organismo, a população, a comunidade, o ecossistema e a biosfera representam níveis de organização de estrutura e funcionamento ecológicos (Figura 1). A interação (energia e matéria) dos organismos com o meio físico a cada nível produz sistemas funcionais característicos. Um sistema, contendo os componentes vivos (bióticos) e não vivos (abióticos) constituem biossistemas, abrangendo desde sistemas genéticos (em nível celular e até mesmo molecular), até sistemas ecológicos. FIGURA 1 – PIRÂMIDE INVERTIDA COM A REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA HIERARQUIA DOS NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO ECOLÓGICA, PARTINDO DA CÉLULA COMO UNIDADE PRIMÁRIA ATÉ O NÍVEL HIERÁRQUICO SUPERIOR (ECOSFERA) FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 5) A ecologia preocupa-se de forma ampla com os níveis de sistema acima daqueles do organismo. Em ecologia, o termo população, originalmente cunhado para denotar um grupo de pessoas, foi ampliado para incluir grupos de indivíduos de qualquer tipo de organismo. Do mesmo modo, comunidade, no sentido ecológico (algumas vezes designada como “comunidade biótica”), inclui todas as populações que ocupam uma certa área. A comunidade e o ambiente não vivos funcionam juntos, como sistema ecológico ou ecossistema. A todos os indivíduos de uma espécie de organismos, se denomina população (que é o conjunto de indivíduos de uma mesma espécie, presente em determinado local, em um determinado tempo). Cada ecossistema contém diversas populações. Um ecossistema pode conter uma população de árvores, uma população de tucanos, uma população de gafanhotos, entre outras. 6 As partes vivas de um ecossistema são chamadas comunidades, ou seja, o conjunto de populações de diversas espécies que interagem em um determinado local, num determinado período. A comunidade é composta pelas populações de muitas espécies que interagem umas com as outras. Na Figura 1, o próximo nível na hierarquia ecológica (acima do ecossistema) é a paisagem. Em ecologia, a paisagem é definida como uma “área heterogênea composta de um agregado de ecossistemas em interação que se repetem de maneira similar por toda sua extensão” (FORMAN; GODRON, 1986). Uma bacia hidrográfica é uma unidade de paisagem conveniente para o estudo e gerenciamento em ampla escala porque geralmente tem limites naturais identificáveis. O bioma é um termo usado para uma grande para um grande sistema regional ou subcontinental caracterizado por um tipo principal de vegetação ou outro aspecto identificador da paisagem, como o bioma da florestal da mata atlântica ou bioma da plataforma continental oceânica. O sistema biológico maior e mais próximo da autossuficiência é muitas vezes denominado ecosfera, que inclui todos os organismos vivos da Terra interagindo com ambiente físico como um todo para manter um estado pulsante de autoajuste controlado de forma menos rígida. A biosfera inclui todos os organismos vivos e ambientes sobre a crosta da Terra e pode conter ecossistemas de diversos tamanhos como, por exemplo, bosques, campinas, lagos e estepes. ESTUDOS FUTUROS Os aspectos envolvendo população e comunidade serão abordados com maior profundidade nos Tópicos 1 e 2 da Unidade 3. O conceito de estado pulsante será visto mais adiante ainda no Tópico 1 dessa Unidade. Segundo Ahl e Allen (1996), a teoria hierárquica fornece um quadro conveniente para subdividir e examinar situações complexas no campo da ecologia e se configura como uma abordagem holística para entender e lidar com essas situações. A divisão hierárquica, em componentes expõe como cada nível da pirâmide de organização é “integrado” ou interdependentes de outros níveis; Organismo individual, por exemplo, não pode sobreviver muito tempo sem sua população, não mais que o órgão seria capaz de sobreviver por muito tempo como uma unidade isolada do seu organismo. De forma semelhante, a comunidade não pode existir sem a ciclagem de materiais eu fluxo de energia no ecossistema. 7 É muito importante enfatizar que as hierarquias da natureza são aninhadas, ou seja, cada nível é constituído de grupos de unidades de níveis inferiores (as comunidades são compostas por populações, que são compostas por grupos de organismos, por exemplo). NOTA O termo holístico é um adjetivo relacionado a holismo. Simplificando, o holismo é um campo da ciência que visa compreender os fenômenos em sua totalidade. Diz respeito ao entendimento de que um sistema não pode ser definido e caracterizado apenas pela soma de suas partes. Quando alguém diz que é preciso ter uma visão holística, portanto, está querendo dizer que você precisa ter uma visão do todo. 4 O PRINCÍPIO DA PROPRIEDADE EMERGENTE Todos os sistemas ecológicos obedecem a um princípio semelhante. Alguns dos mais importantes destes princípios enfocam os atributos físicos e químicos dos sistemas ecológicos, a regulação e função da sua estrutura, e as mudanças evolutivas. Odum e Barrett (2008), destacam que uma consequência importante da organização hierárquica é que, à medida que os componentes, ou subconjuntos, se combinam para produzir um aglomerado funcional maior (organismo população comunidade), emergem novas propriedades que não estavam presentes no nível inferior. Por conseguinte, uma propriedade emergente de um nível ou unidade ecológica não pode ser prevista com base no estudo dos componentes desse nível ou unidade. De acordo com esses autores, outra forma de expressar o mesmo conceito é a denominada propriedade não redutível, ou seja, uma propriedadedo todo não é redutível da soma das propriedades das partes. Argumentam ainda que, embora descobertas em qualquer nível auxiliem no estudo do próximo nível, nunca explicam completamente os fenômenos que ocorre nesse próximo nível, o qual deve ser estudado por si só para completar o panorama. Por exemplo, quando o hidrogênio e o oxigênio são combinados em uma certa configuração molecular, forma-se a água, um líquido com propriedades completamente diferentes (propriedades emergentes) dos seus componentes gasosos originais. No campo da ecologia, Odum e Barrett (2008) exemplificam a atuação de certas algas e animais celenterados que, ao evoluírem juntos para produzir um coral criam um eficiente mecanismo de ciclagem de nutrientes que permite ao sistema combinado (algas/celenterados) manter uma alta taxa de produtividade em águas com teor muito baixo de nutrientes. Dessa forma, a produtividade e diversidade dos recifes de coral são propriedades emergentes somente no nível das comunidades dos recifes e que não estão presentes individualmente ao nível de organismo. 8 Salt (1979) sugeriu uma distinção entre propriedades emergentes, como previamente definida, e propriedades coletivas, que são o somatório dos comportamentos dos componentes. Ambos são propriedades do todo, mas as propriedades coletivas não envolvem características novas ou únicas resultantes do funcionamento da unidade como um todo. As novas propriedades emergem porque os componentes interagem, e não porque a natureza básica dos componentes é modificada. De acordo com este autor, as partes não se “fundem” do modo que se encontram, mas se integram para produzir novas propriedades únicas. 5 PROCESSOS DE CONTROLE Ao passo que se espera que cada nível na hierarquia ecológica tenha propriedades emergentes e coletivas únicas, existem funções básicas que operam em todos os níveis (ODUM; BARRETT, 2008). O comportamento dos organismos, o desenvolvimento ontogenético, a diversidade biológica, a cadeia energética, evolução das espécies, a integração entre os distintos grupos (organismos, populações, comunidades) e a regulação são chamados de funções transcendentes. Algumas dessas funções (energética, por exemplo) operam do mesmo modo por toda a hierarquia, pois representa a transferência de energia desde os níveis inferiores até os níveis hierárquicos superiores. Entretanto, outras funções se manifestam de formas distintas nos diferentes níveis, por exemplo, a evolução das espécies por seleção natural, envolve mutações e outras interações genéticas diretas no nível do organismo, e que também podem envolver processos coevolutivos indiretos e de seleção de grupos em níveis mais elevados. Em outras palavras, todas as alterações em nível de organismos implicam, de forma indireta, em alterações nos níveis hierárquicos superiores. É especialmente importante enfatizar que embora retroalimentação positiva e negativa seja universal, do nível de organismo para baixo o controle é do tipo “ponto de viragem”, pois envolve controles genéticos, hormonais e neurais exatos sobre o crescimento e desenvolvimento, levando ao que é chamado de homeostase (homeostase: é a tendência a resistir a mudanças a fim de manter um ambiente interno estável, relativamente constante). Como observado no lado direito da Figura 2 não existem controles do tipo ponto de viragem acima do nível de organismo. Assim, o controle por retroalimentação é menos rígido, resultando em estados pulsante em vez de estáveis. O termo homeorese, de origem grega, significa “mantendo o fluxo”, foi sugerido para esse controle pulsante. Em outras palavras, não ocorrem equilíbrios estáticos (tais quais se observa em uma balança de contrapesos), nos níveis de ecossistema e ecosfera, mas existem equilíbrios pulsantes (também pode ser chamado de equilíbrio dinâmico), tais como entre a produção e a respiração, ou entre o oxigênio e o dióxido de carbono na atmosfera. Todos os sistemas ecológicos trocam matéria energia com a vizinhança. Quando as entradas e saídas estão equilibradas, disse que o sistema está num estado de equilíbrio dinâmico. 9 FIGURA 2 – O CONTROLE DO TIPO PONTO DE VIRAGEM NO NÍVEL DE ORGANISMO E ABAIXO E RÍGIDO DEVIDO A HOMEOSTASE. ORGANIZAÇÃO E FUNÇÃO NO NÍVEL DE POPULAÇÃO E ACIMA SÃO REGULADOS POR UM COMPORTAMENTO MAIS PULSANTE E CAÓTICO, CONTROLADOS POR RETROALIMENTAÇÃO POSITIVA E NEGATIVA (HOMEORESE) FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 6) De forma simples, entender a homeostase, significa dizer que as alterações que ocorrem nos organismos e em níveis abaixo (como sistemas de órgãos, órgãos, tecidos e células), são mais difíceis de acontecer porque processos genéticos, hormonais e neurais estão no controle dessas (não) alterações, ou seja, um organismo cresce, se desenvolve e potencialmente atinge determinado tamanho porque há uma “programação” biológica (ponto de viragem) que induz para que isso aconteça. Por outro lado, as flutuações nos níveis acima dos organismos estão mais sujeitas a influências externas (comportamento pulsante), tais como: alterações no clima, desastres naturais, predação, poluição, entre outros, que são fatores mais determinantes para estabelecer o tamanho e o desenvolvimento destes níveis superiores (“fluxo da natureza” – Homeorese). 6 INTERFACES DA ECOLOGIA Para Odum (1983), a ecologia é uma disciplina ampla, com vários níveis e, portanto, pode estabelecer interfaces com disciplinas mais tradicionais, e que tendem a ter foco mais estreito. Uma destas interfaces com grande importância na atualidade é a economia ecológica. Outras áreas que recebem bastante atenção, especialmente na gestão de recursos, são agroecologia, biodiversidade, ecologia da conservação, engenharia ecológica, saúde do ecossistema, ecotoxicologia, ética ambiental e ecologia da restauração. 10 No entanto, para que um campo de interface se torne uma nova disciplina, algo novo tem de emergir, como um novo conceito ou tecnologia. A esse respeito Daily (1997), e Mooney e Ehrlich (1997) destacam que o conceito de bens e serviços não negociáveis, por exemplo, foi um conceito novo que emergiu da área de economia ecológica, mas que inicialmente nem os ecólogos nem os economistas tradicionais apresentam em seus livros. O capital natural é definido como os benefícios e serviços fornecidos às sociedades humanas pelos ecossistemas naturais – ou providos “gratuitamente” pelos sistemas naturais não gerenciados. Esses benefícios e serviços incluem a purificação da água e do ar por processos naturais, a decomposição dos detritos, a manutenção da biodiversidade, o controle de insetos e pragas, a polinização de cultivos, a mitigação de enchentes e o fornecimento de beleza natural e recreação, entre outros (DAILY, 1997). O capital econômico é definido como os bens e serviços prestados pela humanidade ou pela força de trabalho humano, sendo geralmente expresso como produto interno bruto (PIB). O produto interno bruto é o valor monetário total dos bens oferecidos e serviços prestados em um país durante um ano. O capital natural é geralmente quantificado expresso em unidade de energia, ao passo que o capital econômico é expresso em monetárias. 7 MODELOS DE ESTUDOS A partir desse momento a ecologia será discutida em nível de ecossistema: começaremos pela descrição de versões simplificadas que engloba somente as propriedades e funções mais importantes ou básicas. As versões simplificadas do mundo real são chamadas de modelos, é apropriado introduzir esse conceito aqui. Um modelo (por definição) é a formulação que imita um fenômeno do mundo real e por meio do qual se pode fazer previsões. Na sua forma mais simples, os modelos podem ser verbais ou gráficos. No entanto, para que tenham uma aplicação importante do ponto de vista econômico, por exemplo, os modelos devem ser estatísticos ou matemáticos. Watt (1963, s.p.), afirmou que: “não precisamos de enormes quantidades de informação sobre muitas variáveis para construirmodelos matemáticos reveladores”. Apesar de os aspectos matemáticos da modelagem serem um assunto para textos avançados, apresentaremos os primeiros passos da construção de um modelo. A modelagem geralmente começa com a construção de um diagrama, ou “modelo gráfico”, que muitas vezes é um diagrama de blocos ou de compartimentos, como ilustrado na Figura 3. 11 FIGURA 3 – DIAGRAMA HIPOTÉTICO/GENÉRICO DE COMPARTIMENTOS E FLUXO DE ENERGIA FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 12) São mostrados na figura anterior alguns componentes básicos de interesse primário na modelagem de sistemas ecológicos, onde “E” = fonte de energia (forçante energética); “P1”, “P2”, “P3” = variáveis de estado; “F1” a “F6” = função de interação; “L” = alça de retroalimentação. As propriedades, “P1” e “P2”, interagem, “I”, produzindo ou afetando uma terceira propriedade, “P3” quando o sistema é acionado por uma fonte de energia, “E”. Além disso, estão presentes trajetórias de fluxo, “F”, em que “F1” representa entrada (até “F5”) e, “F6”, representa a saída do sistema. Trata-se de um modelo funcional simplificado de uma situação ecológica, cujos componentes são: (1º) Uma fonte de energia ou outra função de força externa, “E”; (2º) Propriedades chamadas de variáveis de estado, “P1”, “P2”,… “Pn”; (3º) Caminhos do fluxo, “F1”, “F2”… “Fn”, mostrando onde os fluxos de energia ou as transferências de material conectam propriedades entre si e com forças; (4º) Funções de interação, “I”, em que as forças e as propriedades interagem para modificar ampliar ou controlar os fluxos ou criar novas propriedades “emergentes”; e (5º) alças de retroalimentação, “L”. A Figura 3 poderia representar um ecossistema de campo natural em que “P1” representa as plantas verdes que convertem a energia do sol, “E”, em alimento. “P2” poderia representar um animal herbívoro que come plantas, e “P3” um animal onívoro que pode comer tanto herbívoros quanto as plantas. A função de interação, “I”, poderia representar situações em que o nível “P3” come tanto “P1” quanto “P2”, em função do que estiver mais disponível, ou que envolver menor gasto energético para obtenção do alimento. As alças de retroalimentação são características importantes dos modelos ecológicos porque representam mecanismos de controle, ou seja, mecanismos de reaproveitamento de uma parte da energia gerada e consumida, e que possa ser reciclada ou reaproveitada diretamente por algum componente do sistema, por exemplo, a reciclagem de nutrientes. No caso do exemplo apresentado no diagrama, “L” representa uma alça de retroalimentação que pode ser obtida através da reciclagem dos nutrientes 12 (nitrogênio e fósforo) provenientes do esterco dos animais através das raízes das plantas. A matéria orgânica de origem animal, rica em nutrientes, promove a fertilização natural do solo e propicia o desenvolvimento de novas plantas que servirão de alimento tanto para os herbívoros quanto para os animais onívoros, e assim sucessivamente. Os modelos de compartimentos podem ser bastante ampliados atribuindo-se funções gerais para cada um dos blocos do diagrama. A Figura 4 ilustra alguns símbolos da linguagem de energia mais difundida dentro da ecologia de sistemas proposta por Haward T. Odum (ODUM; ODUM, 1982; ODUM, 1996). A linguagem de fluxo de energia é baseada em uma série de módulos que representam processos e funções matemáticas, sendo conectados por linhas representando caminhos de transferência de energia, materiais ou informação. Ainda que estes símbolos tenham sido criados originalmente para fluxo de energia também se aplicam para fluxo de matéria. Como regra geral é permitido construir diagramas com fluxo de energia ou matéria (ou até combinação de ambos), desde que se tenha tornado explicito o que se está diagramando. Essa linguagem utiliza os seguintes símbolos descritos brevemente abaixo (Figura 4): FIGURA 4 – A SIMBOLOGIA DA LINGUAGEM DE ENERGIA DE H. T. ODUM AMPLAMENTE UTILIZADOS NOS DIAGRAMAS DE MODELO EM ESTUDOS DE ECOLOGIA 13 14 FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 14) A Figura 5 mostra que um determinado módulo pode ser o resultado da combinação de dois ou mais módulos que realizam trabalho, portanto deve incluir um sumidouro de calor. O módulo hexágono (consumidor) é mostrado como uma combinação dos símbolos estoque e interação. Desta maneira o módulo indica que os representantes dessa categoria têm a habilidade de estocar energia e usar a energia 15 estocada para poder se manter realizando trabalho, ou seja, a capacidade de usar sua energia para obter o alimento e usar a energia do alimento para manter o seu metabolismo. O símbolo de consumidor pode ser usado para representar um simples organismo vivo ou um grupo de organismos como uma população, ou uma cidade. FIGURA 5 – MÓDULOS FORMADOS PELA COMBINAÇÃO DE OUTROS MÓDULOS FONTE: Adaptado de Odum (1983) O módulo do produtor também é uma combinação de outros módulos. Todos os vegetais têm funções de manutenção dos seus metabolismos, como as populações animais também as tem, no entanto, os vegetais possuem mecanismos para capturar a luz do sol e usá-la para produzir compostos de carbono reduzido ricos em energia. Dessa maneira, o símbolo de produtor contém um módulo de manutenção, retroalimentado por um mecanismo receptor de energia pura, o qual está associado ao processo de ciclagem de componentes que ocorre numa estrutura específica denominada de cloroplasto. 16 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Ecologia é o estudo científico do ambiente natural e das relações dos organismos uns com os outros e com as suas redondezas. • O organismo, a população, a comunidade, o ecossistema e a biosfera representam níveis de organização de estrutura e funcionamento ecológicos. Eles formam uma hierarquia de entidades progressivamente mais complexas. • Todos os sistemas ecológicos trocam matéria energia com a vizinhança. Quando as entradas e saídas estão equilibradas, disse que o sistema está num estado de equilíbrio dinâmico. • As alterações que ocorrem nos organismos e em níveis abaixo são do tipo ponto de viragem controladas pela homeostase. • As flutuações nos níveis acima dos organismos estão mais sujeitas ao comportamento pulsante de influências externas (homeorese). • As versões simplificadas do mundo real são chamadas de modelos. Por definição, um modelo é a formulação que imita um fenômeno do mundo real e por meio do qual se pode fazer previsões. • Em ecologia, a modelagem de sistemas geralmente começa com a construção de um diagrama, ou “modelo gráfico”, que muitas vezes é um diagrama de blocos ou de compartimentos. • A linguagem de fluxo de energia, proposta por H. T. Odum, é baseada em uma série de módulos que representam processos e funções matemáticas conectados por linhas representando caminhos de transferência de energia, materiais ou informação. • Nos modelos de sistemas, o dinheiro está sempre no sentido contrário ao fluxo da energia. • Uma parte da energia produzida sempre será perdida através da geração de calor tal qual estabelece segunda lei da termodinâmica. • Um determinado módulo pode ser o resultado da combinação de dois ou mais módulos que realizam trabalho. RESUMO DO TÓPICO 1 17 1 De forma simplificada, ecologia é o “estudo da casa”, que inclui todos os organismos dentro dela e todos os processos funcionais que tornam a casa habitável. Nesse sentido, a ecologia moderna propõe o conceito de níveis de organização através de uma hierarquia ecológica, ou seja, uma disposição em uma série classificada. Sobre os estudos de ecologia envolvendo classificação hierárquica, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Um sistema, contendo os componentes vivos (bióticos) e não vivos (abióticos) constituem biossistemas. b) ( ) A ecologia preocupa-se de forma ampla com os níveis de sistema acima daqueles da população. c) ( ) Uma bacia hidrográfica é uma unidade de ecossistema e pode ser utilizadapara estudos em ampla escala devido a ocorrência de limites naturais identificáveis. d) ( ) A teoria hierárquica se configura como uma abordagem fragmentada das partes de um sistema. 2 Os processos de controle podem ser compreendidos como funções básicas que operam em todos os níveis hierárquicos, porém, de forma distinta em relação aos níveis superior e inferior do nível dos organismos. Com base no enunciado, analise as sentenças a seguir: I- Variações irregulares e imprevisíveis do clima podem causar grandes mudanças na temperatura e na precipitação e romper com a estrutura de populações ou comunidades biológicas; a esse respeito estamos falando do controle pulsante definido por homeorese. II- Homeostase é a incapacidade de a resistir a mudanças tornando o ambiente interno instável e, relativamente inconstante. III- Comportamento, desenvolvimento, diversidade, energética, evolução, integração e a regulação, são chamados de funções transcendentes. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) Somente a sentença III está correta. AUTOATIVIDADE 18 3 A ecologia é uma disciplina ampla, com vários níveis e, portanto, pode estabelecer interfaces com disciplinas mais tradicionais, e que tendem a ter foco mais estreito. De acordo essa afirmação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Uma destas interfaces com grande importância na atualidade é a economia ecológica. ( ) O capital econômico geralmente é expresso e quantificado em unidade de energia. ( ) O capital natural é definido como os benefícios e serviços fornecidos às sociedades humanas pelos ecossistemas naturais. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – F. b) ( ) V – F – V. c) ( ) F – V – F. d) ( ) F – F – V. 4 Todos os sistemas ecológicos obedecem a um princípio semelhante. À medida que os componentes, ou subconjuntos, se combinam para produzir um aglomerado funcional maior emergem novas propriedades que não estavam presentes no nível inferior. Disserte sobre o que são as propriedades coletivas. 5 Um modelo é a formulação que imita um fenômeno do mundo real e por meio do qual se pode fazer previsões. A modelagem dos sistemas ecológicos geralmente começa com a construção de um diagrama de blocos ou de compartimentos. Neste contexto, disserte brevemente sobre em que está baseada a linguagem de fluxo de energia de sistemas proposta por Haward T. Odum. 19 SISTEMAS ECOLÓGICOS 1 INTRODUÇÃO Acadêmico, no Tópico 2 (sistemas ecológicos), abordaremos a ecologia a partir do entendimento de que os organismos vivos e seu ambiente não vivo estão inter- relacionados, interagem uns com os outros e atuam sob a forma de sistemas ecológicos. Os ecossistemas são formações de vida e ambiente e sua compreensão se deu ao longo do século passado. Todo esse complexo de organismos e ambientes físicos que eles habitam envolvem a ciclagem de energia que resulta em implicações termodinâmicas (capacidade de realização de trabalho). Os modelos gráficos de ecossistema com a linguagem de energia de H. T. Odum demonstram que os ecossistemas não sejam apenas uma unidade geográfica, mas sim um de sistema funcional, com entradas e saídas (de matéria e energia), e fronteiras que podem ser tanto naturais quanto arbitrárias. As “fronteiras” são áreas de transição ambiental (ecótonos), onde entram em contato diferentes comunidades ecológicas, que faz parte de um mesmo ecossistema e suas interações. A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, diversidade das espécies, diversidade de habitat e diversidade dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos. Segundo a hipótese de Gaia as condições de vida na Terra e toda sua diversidade, não foram fruto de um mero acaso, e sim foram desenvolvidas pelos próprios organismos até o presente. O Tópico 2 está subdividido da seguinte maneira: (subtópico 2) abordaremos os estudos que levaram ao entendimento do conceito de ecossistemas; (subtópico 3) veremos a estrutura trófica dos ecossistemas; (subtópico 4) analisaremos os gradientes fronteiriços de um sistema ecológico, também denominados de ecótonos; (subtópico 5) discutiremos algumas caraterísticas que a diversidade nos ecossistemas; (subtópico 6) veremos como ocorre o controle biológico no ambiente geoquímico; e (subtópico 7) vamos estudar o conceito de cibernética dos ecossistemas. UNIDADE 1 TÓPICO 2 - 20 2 CONCEITO DE ECOSSISTEMA Durante a primeira parte do século XX, diversos novos conceitos surgidos levaram o estudo da ecologia a novas direções. Uma delas foi a percepção de que as relações alimentares reúnem os organismos em uma única entidade funcional. O primeiro entre os proponentes desse novo ponto de vista ecológico, durante os anos 1920, foi o ecólogo inglês Charles Elton. Elton (1927) argumentava que os organismos que viviam no mesmo lugar não apenas apresentavam tolerâncias semelhantes aos fatores físicos no ambiente, mas também integrariam uns com os outros e, o mais importante, o faziam de uma forma sistemática de relações alimentares que chamou de teia alimentar. Naturalmente, todos os organismos precisam se alimentar de algum modo para que possam ser nutridos, e cada organismo pode servir de alimento para algum outro. No entanto, considerar essas relações alimentares como uma unidade ecológica era uma ideia nova no início do século XX. Uma década mais tarde, o botânico inglês e pioneiro da ecologia vegetal Arthur G. Tansley avançou com a ideia de Elton, ao considerar os animais e plantas, junto com os fatores físicos no seu em torno, como sistemas ecológicos. Tansley (1935) chamou esse novo conceito de ecossistema, e o considerou a unidade fundamental da organização ecológica. Este autor visualizou os componentes biológicos e físicos da natureza juntos, unificados pela dependência dos animais e das plantas em seus ambientes físicos e por suas contribuições para a manutenção das condições e composição do mundo físico. Entretanto, o primeiro pesquisador que sugeriu que cada sistema pudesse ser descrito por um conjunto de equações que representam trocas de matéria energia entre seus componentes foi Alfred Lotka. Segundo esse autor, essas trocas incluem a assimilação de dióxido de carbono em compostos orgânicos de carbono pelas plantas, o consumo das plantas pelos herbívoros, e o consumo dos animais pelos carnívoros. Lotka (1925) acreditava que o tamanho de um sistema e as taxas de transformações de energia e matéria dentro dele obedeciam a certos princípios termodinâmicos que governam todas as transformações de energia. Todavia, somente em 1942 um pesquisador chamado Raymond Lindeman trouxe o conceito de ecossistema como um sistema transformador de energia. A estrutura de Lindeman com base em princípios termodinâmicos propostos por Lotka, adotou a noção de Tansley do ecossistema como unidade fundamental na ecologia e o conceito de Elton da teia alimentar, incluindo nutrientes inorgânicos na base, como as mais úteis expressões da estrutura do ecossistema. Lindeman (1942) visualizou uma pirâmide de energia nos ecossistemas, com menos energia alcançando sucessivamente cada nível tráfico superior. Ele argumentava que a energia é perdida em cada nível por causa do trabalho realizado pelos organismos naquele nível e pela ineficiência das transformações biológicas dessa energia (efeitos da segunda lei da termodinâmica). Desse modo, as plantas assimilam apenas uma porção 21 da energia luminosa disponível. Os herbívoros assimilam menos ainda dessa energia porque as plantas usam uma fração desta energia incorporada para manter o seu metabolismo e não para converter essa energia em biomassa vegetal, razão pela qual uma porção menor de energia encontra-se indisponível para os herbívoros. O mesmo pode ser dito sobre os consumidoresdos herbívoros e sobre cada nível acima que segue na cadeia alimentar. Entre 1950 e 1968, o biólogo alemão Ludwig von Bertalanffy utilizou a abordagem holística com a necessidade de integrar, sintetizar e interagir teorias anteriores e organizar conhecimentos, elaborou uma teoria interdisciplinar para proporcionar princípios gerais (físicos, biológicos, sociológicos, químicos, entre outros) e modelos gerais para todas as ciências envolvidas, de modo que as descobertas efetuadas em cada uma pudessem ser utilizadas pelas demais. Surgiu assim a “Teoria Geral dos Sistemas”. De forma simples, um sistema é um grupo de partes que estão conectadas e trabalham juntas (BERTALANFFY, 1968). De acordo com Bertalanffy (1950b; 1968), a teoria geral dos sistemas está baseada em três princípios básicos: a) Expansionismo: todo fenômeno é parte de um fenômeno maior; o desempenho de um sistema depende de como ele se relaciona com o todo; cada fenômeno é constituído por partes que pertencem ao todo; visão holística voltada para o todo, e não aos elementos. b) Pensamento sintético: cada fenômeno é parte de um sistema maior, explicado em termos do papel que desempenha nesse sistema maior; os órgãos do organismo humano são explicados pelo papel que desempenham no organismo e não pelo comportamento de seus tecidos ou estruturas de uma organização; maior interesse na integração de coisas, e não em sua separação. c) Teleologia: causa é uma condição necessária, mas nem sempre suficiente para que surja o efeito; relação causa-efeito não é uma relação determinística ou mecanicista, e sim, probalística; estudo do comportamento com finalidade de alcançar objetivos; o comportamento é explicado por aquilo que ele produz ou por aquilo que é seu propósito ou objetivo reproduzir; lógica sistêmica: procura entender as inter-relações entre diversas variáveis a partir de uma visão de um campo dinâmico de forças que atuam entre si; campo dinâmico de forças produz um emergente sistêmico: o todo é diferente de cada uma de suas partes; sistema possui características próprias que podem não existir em cada uma de suas partes integrantes; Sistemas visualizados como entidades globais e funcionais em busca de objetivos e finalidades. A partir do desenvolvimento de uma teoria geral sobre sistemas é que começou a se desenvolver o palco definitivo e quantitativo da ecologia de ecossistemas, cujos principais precursores e divulgadores são os irmãos Howard e Eugene Odum. Segundo Odum (1953), a ecologia de ecossistemas estabelece que a reciclagem de matéria e o fluxo de energia num ecossistema a ela associado proporcionam a base para a caracterização da estrutura e função daquele ecossistema. A ecologia de ecossistemas proposta por Odum (1953) estabelece que as medidas de assimilação de energia 22 e eficiência energética se tornam as ferramentas para exploração deste conceito termodinâmico de ecossistema: A energia e as massas dos elementos como o carbono é a “moeda” para comparar a estrutura e funcionamento de diferentes ecossistemas em termos de energia e matéria residentes e transferidas entre plantas, animais, micróbios e os componentes abióticos do ecossistema. Schäfer (1984), interpretando os conceitos de ecologia de ecossistemas proposto por Odum (1953), esclarece que um ecossistema não é apenas um agrupamento de organismos em um dado ambiente caracterizável, porque o surgimento de restrições anatômicas ou fisiológicas, por exemplo, podem promover a associação por conveniência desses organismos com o ambiente. Argumenta ainda que, para que um agrupamento de organismos se torne um ecossistema é necessário que o volume de trocas internas (interações) seja maior que as trocas periféricas de substâncias, ou seja, um ecossistema é um agregado de espécies que interagem por meio de uma organização mínima, capaz de permitir o armazenamento da energia que flui através de suas fronteiras físicas. Os ecossistemas são formações de vida e ambiente, caracterizadas por uma certa estabilidade e por circuitos internos de trocas de substâncias (ODUM, 1953). Tudo o que está recobrindo a Terra (coisas vivas e não vivas) interage formando sistemas, também chamados ecossistemas (ou sistemas ecológicos). Portanto, um ecossistema é qualquer unidade que inclui todos os organismos da comunidade biótica em uma dada área interagindo com ambiente físico de modo que um fluxo de energia é direcionado às estruturas bióticas e à ciclagem de materiais entre componentes vivos e não vivos. Um típico ecossistema contém coisas vivas (componentes bióticos) como por exemplo árvores e animais, e coisas não-vivas (componentes abióticos) como substâncias nutrientes e água O ecossistema é a primeira unidade na hierarquia ecológica (Figura 1, Tópico 1, Unidade 1) que é completa, ou seja, que tem todos os componentes (biológicos e físicos) necessários para sua sobrevivência. Assim, é considerada como uma unidade elementar de sistema funcional, com entradas e saídas, e fronteiras que podem ser tanto naturais quanto arbitrárias (ODUM; BARRETT, 2008). Um modelo gráfico de ecossistema pode consistir em uma “caixa preta” (cujo papel ou função geral no seu conteúdo interno não está especificado), denominado sistema, e que representa a área na qual estamos interessados, bem como duas estruturas chamadas de ambiente de entrada e ambiente de saída (Figura 6). Considerar os ambientes de entrada e saída é importante porque os ecossistemas são sistemas funcionais abertos (ODUM; BARRETT, 2008), ou seja, coisas estão constantemente entrando e saindo e, ainda assim, os ecossistemas mantém suas funções básicas praticamente constantes por longos períodos de tempo. 23 FIGURA 6 – MODELO DE ECOSSISTEMA, ENFATIZANDO O AMBIENTE EXTERNO, QUE DEVE SER CONSIDERADO PARTE INTEGRAL DO CONCEITO DE ECOSSISTEMA FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 18) O limite do sistema pode ser natural ou pode ser arbitrário (o que for conveniente ou de interesse). Em geral, fronteiras naturais, ou fronteiras políticas como os limites das cidades, são fronteiras convenientes, mas os limites também podem ser arbitrários (ODUM, 1983). No modelo, a caixa não é tudo para o ecossistema, porque se fosse um recipiente impenetrável, seu conteúdo vivo não sobreviveria a esse Isolamento por muito tempo. Um ecossistema funcional ou do mundo real deve ter uma entrada e, na maioria dos casos uma forma de exportar a energia e os materiais processados. Conforme Odum (1983), a extensão dos ambientes de entrada e saída é extremamente alterável e depende de outras variáveis, por exemplo, (1) tamanho do sistema (quanto maior o ecossistema, menos dependente do exterior); (2) intensidade metabólica (quanto maior a taxa metabólica, maior a entrada e saída); (3) equilíbrio autotrófico-heterotrófico (Quanto maior o desequilíbrio entre a relação presa/predador, mais exterioridades para equilibrar); e (4) Estágio de desenvolvimento (sistemas jovens diferem de sistemas maduros). Assim uma grande floresta tem ambientes de entrada saída muito menores que um pequeno rio ou uma cidade. Agora vamos olhar dentro dessa “caixa preta” (o ecossistema) que está no centro da figura 7, para ver em detalhes como ela está organizada e descobrir o que acontece com todas essas entradas. Para cada módulo do diagrama (Figura 7) atribui-se uma forma distinta quem indica sua função geral de acordo com uma linguagem de energia de H. T. Odum, conforme introduzida no Tópico 1 desta Unidade (Figura 4). A comunidade é representada como uma teia alimentar de produtores “P” (entendidos como produtores primários ou organismos autotróficos) e consumidores “C” (organismos heterotróficos), ligados por fluxos apropriados de energia, ciclos de nutrientes e depósitos “S” (ou estoque). As teias alimentares serão discutidas no Tópico 3 da Unidade 1. 24 FIGURA 7 – DIAGRAMA FUNCIONAL DE UM COM ÊNFASE NA DINÂMICA INTERNA ENVOLVENDO FLUXO DE ENERGIA E CICLOS DE MATERIAIS (S = DEPÓSITOS/ESTOQUE;P = PRODUTORES/AUTÓTROFOS; C = CONSUMIDORES/HETERÓTROFOS) FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 20) Para Odum e Odum (2000), a energia é uma entrada necessária. Esses autores argumentam que o Sol é a fonte de energia mais importante para ecosfera e sustenta diretamente a maior parte dos ecossistemas naturais da biosfera. No entanto, existem outras fontes de energia que podem ser importantes para muitos ecossistemas, por exemplo, vento, chuva, fluxo de água ou combustíveis fósseis (a principal fonte das cidades modernas). A energia também flui para fora do sistema como o calor e em outras formas transformadas ou processadas, como matéria orgânica (produtos alimentícios e resíduos) e poluentes. Água, ar e nutrientes necessários para a vida, bem como todos os outros tipos de materiais, entram e saem de forma contínua do ecossistema. E, naturalmente, organismos e seus propágulos (sementes e esporos), e outros estágios reprodutivos entram (imigram) ou sai (emigram). A Figura 8 exemplifica a construção de um modelo levemente complexo de ecossistema aquático em que ocorre uma pescaria comercial, a partir da linguagem de energia. Na área externa (forma circular), então localizados os suprimentos de energia (função forçante), tanto de origem natural, quanto humana (combustíveis, dinheiro). No interior do retângulo, encontram-se os principais componentes do ecossistema em questão e suas interações. Os produtores captam a energia solar e convertem essa energia em matéria orgânica (alimento) juntamente com os nutrientes que estão estocados no ecossistema. 25 FIGURA 8 – DIAGRAMA MODELO DE ECOSSISTEMA UTILIZANDO SÍMBOLOS DA LINGUAGEM DE COMPARTIMENTOS E FLUXO DE ENERGIA PARA UM AMBIENTE AQUÁTICO EM QUE OCORRE UMA PESCARIA COMERCIAL FONTE: Adaptado de Odum (1983) Os consumidores (no caso, os peixes herbívoros) se beneficiam dessa matéria orgânica para seu desenvolvimento. Ao realizarem a pastagem sobre os produtores, os peixes processam esse alimento de origem vegetal e regeneram nutrientes para o estoque do ambiente através da excreção (retroalimentação). A ação humana, após todo o esforço do ambiente em produzir os recursos que serão alvo da pescaria, envolve o uso de combustíveis fósseis para realização das capturas e posteriormente a comercialização do pescado, indicado pela seta a direita do retângulo, que representa a exportação do produto da pesca para fora do ambiente natural em direção a um sistema econômico promovido pela venda. O dinheiro utilizado na aquisição deste pescado possibilita a compra de mais combustível para realização de novas pescarias e consequente manutenção da atividade comercial. Nos modelos de sistemas, o dinheiro está sempre no sentido contrário ao fluxo da energia. Note que em todas as etapas, desde a entrada de energia solar até os produtores, a consequente produção e transferência dessa matéria orgânica para os consumidores até chegar na pesca (interação final), sempre há uma perda de energia potencial (sumidouro). Essa perda de energia significa que uma parte da energia produzida não foi capaz de gerar trabalho e foi perdida através da geração de calor, tal qual estabelece segunda lei da termodinâmica. De acordo com essa lei, nenhum sistema (natural ou artificial) é capaz de aproveitar integralmente 100% da energia a que tem disponível para ser convertida em trabalho, de modo que uma parte sempre será perdida na forma de calor. O sumidouro de energia é representado pela seta e barras na saída do retângulo (parte inferior do modelo). 26 3 ESTRUTURA TRÓFICA DOS ECOSSISTEMAS Conforme descrito em Odum e Barrett (2008), do ponto de vista da estrutura trófica (de trophe = “alimentação”), um ecossistema tem duas camadas: (1) um extrato autotrófico (que se auto alimenta) também chamado de “cinturão verde” de plantas e que contém clorofila, em que predominam a fixação de energia luminosa, ou uso de substâncias inorgânicas simples e a construção de substâncias orgânicas complexas; e (2) uma camada inferior que é o extrato heterotrófico (“alimentando-se de outros”) ou cinturão marrom de solos e sedimentos, matéria em degradação, raízes e outros, em que predominam o uso, o rearranjo e a decomposição dos materiais complexos. Na camada 1, os organismos são capazes de elaborar seu próprio alimento (seres autótrofos) a partir de produtos químicos (nutrientes), utilizando a energia solar; este processo se denomina fotossíntese. As plantas e outros organismos, que fazem os produtos alimentícios, a partir da fotossíntese, são chamadas produtores, como já visto anteriormente. O alimento produzido é utilizado por células vivas para fazer mais células e formar a matéria orgânica. Os produtos orgânicos de organismos vivos são algumas vezes denominados biomassa que é o peso da matéria viva. Na camada 2, encontram-se os organismos que consomem os produtos elaborados pelos produtores, a estes organismos se denomina consumidores. Os consumidores podem comer plantas (herbívoros), carne (carnívoros), ou assimilar matéria orgânica morta (decompositores, como fungos e bactérias). Logo que o consumidor digeriu e utilizou este alimento, restam poucos produtos químicos de descarte. Estes produtos de descarte, que são utilizados como fertilizante para plantas, são denominados nutrientes. Quando os consumidores liberam nutrientes que voltam a ser utilizados pelas plantas, nós dizemos que foram reciclados. A floresta é um exemplo de um típico ecossistema. As árvores e outras plantas produtoras utilizam a energia solar e os nutrientes químicos para elaborar matéria orgânica que é comida pelos consumidores e que devolvem os nutrientes à raiz das plantas. A classificação ecológica (produtores, fagótrofos, saprófagos – decompositores, entre outros) diz respeito à função, não às espécies em si. Algumas espécies ocupam posições intermediárias, outras podem deslocar seu modo de nutrição de acordo com as circunstâncias ambientais. Os saprófagos, por exemplo, são organismos que se alimentam de matéria orgânica morta. As atividades decompositoras dos saprótrofos liberam nutrientes inorgânicos que são usados pelos produtores; também fornecem alimento para macro consumidores e frequentemente excretam substâncias que inibem ou estimulam outros componentes bióticos do ecossistema. 27 A separação dos heterótrofos em grandes e pequenos consumidores é arbitrária, mas, segundo Odum e Barrett (2008), justificada na prática porque esses organismos necessitam de métodos de estudos muito diferentes. Os microconsumidores heterotróficos (bactérias, fungos e outros) são relativamente imóveis (geralmente inseridos no meio que está sendo decomposto), muito pequenos e têm altas taxas de metabolismo e renovação. Sua especialização funcional é mais evidente no aspecto bioquímico que no aspecto morfológico; como consequência, geralmente não se pode determinar seu papel no ecossistema por métodos diretos, como observação visual ou contagem de seus números. Os organismos designados como macro consumidores obtém sua energia por ingestão heterotrófica de matéria orgânica particulada, em grande parte, de origem animal. Essas formas superiores tendem a ser morfologicamente adaptadas para a busca ativa de alimento ou herbivoria, com desenvolvimento de sistemas de órgãos complexos nas formas superiores. Os microconsumidores ou saprótrofos têm sido designados como de compositores. No entanto, parece preferível não designar qualquer organismo particular como decompositor, mas considerar a decomposição como um processo envolvendo toda a biota. 4 GRADIENTES E ECÓTONOS A biosfera é caracterizada por uma série de gradientes, ou zonação, de fatores físicos. São exemplos os gradientes de temperatura desde o Ártico ou a Antártica até os trópicos, e desde o cume da montanha até o vale; gradientes de umidade do úmido para o seco ao longo dos principais sistemas de tempo; e gradientes de profundidade desde a margem até o fundo em corpos de água(ODUM; BARRETT, 2008). As condições ambientais, incluindo os organismos adaptados a essas condições, mudam gradualmente ao longo de um gradiente, mas é frequente ocorrer pontos de mudança abrupta, conhecidos como ecótonos. Um ecótono é criado pela justaposição de diferentes habitats ou tipos de ecossistemas. O conceito pressupõe a existência de interação ativa entre dois ou mais ecossistemas do que resulta em ecótonos tendo propriedades inexistentes em ambos os ecossistemas adjacentes (NAIMAN; DÉCAMPS, 1990). Ecótonos são lugares onde muitas espécies atingem os limites de suas distribuições. Assim, os ecótonos representam as fronteiras entre diferentes comunidades fechadas. Ecótonos são especialmente relevantes onde diferenças físicas agudas separam comunidades diferentes. Essas diferenças ocorrem na interface entre a maioria dos ambientes terrestres e aquáticos (especialmente marinhos) e onde as formações geológicas subjacentes fazem com que o conteúdo mineral do solo mude repentinamente (ODUM; BARRETT, 2008). Os ecótonos estão frequentemente associados com uma mudança repentina nas propriedades físicas dos habitats 28 adjacentes. Um ecótono é, portanto, uma região resultante do contato entre dois ou mais ecossistemas fronteiriços. São áreas de transição ambiental, onde entram em contato diferentes comunidades ecológicas, isto é, a totalidade da flora e fauna que faz parte de um mesmo ecossistema e suas interações. Em tese, o ecótono representa uma faixa variável entre dois habitats adjacentes. Na realidade, esta faixa apresenta, na maior parte das regiões, complexidade espacial razoavelmente grande, na qual dois aspectos importantes devem ser ressaltados: sua sinuosidade e sua resolução, aqui interpretada no sentido de escala (KOLASA; ZALEWSKI, 1995). Ecótonos podem ser zonas abruptas de variação de vegetação no espaço, como ocorre quando as temperaturas de crescem conforme a elevação aumenta a montanha acima. Os ecótonos podem ser também criados por atividades humanas. O desmatamento de florestas tropicais para criar pastos deixa uma fronteira abrupta ao longo da floresta que pode dramaticamente afetar a temperatura, a umidade, a luz e o Vento na fronteira floresta-pasto. De acordo com MALANSON (1997), dependendo do tipo de ecótono, suas funções básicas incluem: a) servir de habitats para muitas espécies, por isso sua importância para a manutenção da biodiversidade; b) são agentes modificadores de fatores abióticos (vento, luz, temperatura) e locais de elevada produção de matéria orgânica e de ciclagem de nutrientes; c) atuam como acumuladores/exportadores de nutrientes e matéria orgânica; d) agem como barreira ou área de isolamento com ecossistemas vizinhos. Os ecótonos podem ser examinados sob diferentes prismas, em macro, meso e microescala, e estão sujeitos a distúrbios de variada natureza, amplitude, frequência, duração e intensidade (HENRY, 2003). Segundo Holland (1988 apud MILAN; MORO, 2016), o ecótono é uma zona de transição entre sistemas ecológicos adjacentes com uma série de características definidas exclusivamente por escalas espaciais e temporais e pela intensidade das interações entre sistemas ecológicos adjacentes. HOLLAND (op. Cit.) considera ainda que regiões de descontinuidade dentro de um ecossistema uniforme podem assumir a função ecológica e as características de ecótonos. A aceitação literal desse ponto de vista amplia extraordinariamente a definição inicial de ecótonos como zonas de transição entre sistemas ecológicos adjacentes, colocando o conceito de ecótonos em escalas muito diversas, desde grandes unidades biogeográficas até micro-habitats. De acordo com Milan e Moro (2016), apesar da maioria dos autores definirem de forma semelhante um ecótono, algumas conceituações são muito abrangentes, possibilitando diferentes interpretações e permitindo que áreas diferentes sejam tratadas igualmente como ecótonos. Leopold (1933) incluiu na ponderação de ecótono o efeito de borda, ao caracterizar o ecótono por uma quantidade de indivíduos e espécies maior do que nos ecossistemas adjacentes. Da mesma forma, Coulson e Tchakerian (2011) afirmam 29 que ecótono é um conceito mais inclusivo do que borda, uma vez que abrange todo o gradiente de transição entre dois ecossistemas. Exemplificam que um campo e uma floresta estão separados por uma linha (borda, edge) e a área sob efeito desta borda, para dentro do campo e para dentro da floresta, por exemplo, constitui o ecótono. Para Odum e Barrett (2008), Hardt et al. (2013) e Coulson e Tchakerian (2011), as fronteiras antrópicas poderiam ser consideradas ecótonos, levando a uma larga definição do termo. Essa abordagem ecológica, baseada em análises de pequena escala se contrapõem à abordagem ao nível de paisagem, discutida por Forman e Moore (1992). A análise da paisagem permite uma visão mais ampla, em macroescala, integrando e convergindo diferentes conceitos de ambiente. Forman e Moore (1992) propuseram preceitos que incluiriam os limites antrópicos em teorias gerais de limites (fronteiras), classificando ainda a estrutura e função das fronteiras em vários grupos. Para Cadenasso e Pickett (2000), uma vez que bordas são definidas como limites entre tipos distintos de ambientes (habitat/não habitat ou fragmento natural/ matriz antrópica), sua identificação depende de como os fragmentos são definidos dentro da paisagem. A definição de fragmento pode ocorrer em uma ampla noção de escala, variando desde a escala local até continental. Milan e Moro (2016) alertam que a conceituação dos termos ecótono e borda levam à confrontação entre as diferentes definições adotadas ao longo de décadas. Com relação ao termo ecótono, há um consenso em referir-se ao mesmo como uma zona de transição entre ecossistemas diferentes, escala dependente. O conceito de borda, que surgiu paralelamente ao de ecótono, gerava mais ambiguidade quando os estudos estavam voltados a microescalas. Posteriormente, com análises tomando a paisagem como objeto de estudo, o conceito de borda estabeleceu-se como a delimitação espacial da variação de parâmetros entre ‘ambientes’ diferentes a partir de uma linha limite. Segundo Milan e Moro (2016), a fronteira, entendida como a linha que coincide com a borda, é um artefato que permite uma série de inferências quantitativas acerca das relações geométricas entre áreas adjacentes. Bordas, ecótonos e fronteiras não são, portanto, sinônimos, e sim aspectos diversos da representação da realidade. Ecótono é um conceito funcional ecológico e borda um conceito espacial geográfico. Um ecótono pode ser estudado unicamente por suas qualidades intrínsecas, enquanto bordas e fronteiras só têm sentido se estudadas em função de suas qualidades extrínsecas. Ou seja, pela variação entre elementos adjacentes, pelos fluxos existentes, ou não, de energia ou matéria, pelo efeito do afastamento espacial gradual a partir de um limite (MILAN; MORO, 2016). 30 5 DIVERSIDADE DO ECOSSISTEMA A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, diversidade das espécies, diversidade do habitat e diversidade dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos (ODUM; BARRETT, 2008). Existem dois componentes da diversidade: (1) o componente “riqueza” ou “variedade”, que pode ser expresso como o número de “tipos” de componentes (espécies, variedades genéticas, categorias de uso da terra e processos bioquímicos) por unidade de espaço; e (2) abundância relativa ou componente de repartição das unidades individuais entre os diferentes tipos. A manutenção de diversidade de moderada a alta é importante não somente para assegurar que todos os nichos-chaves funcionais, estejam operando, mas, especialmente, para manter a redundância e a resiliência no ecossistema, em outras palavras, para precaver- se contra momentos estressantes (como temporais, incêndios, doenças ou mudanças de temperatura), que ocorreram mais cedo ou mais tarde. ConformeOdum e Barrett (2008), o motivo pelo qual é importante levar em consideração tanto componente abundância relativa como componente riqueza é que dois ecossistemas podem ter a mesma riqueza, mas seria muito diferente porque a repartição dos tipos é diferente. Por exemplo, as comunidades em dois ecossistemas diferentes podem apresentar, cada uma delas, dez espécies, mas uma das comunidades pode ter aproximadamente o mesmo número de indivíduos (digamos, dez indivíduos) em cada espécie (alta uniformidade ou equitatividade), ao passo que, na outra, a maioria dos indivíduos pode pertencer a uma única espécie dominante (baixa uniformidade). A maioria das paisagens naturais tem uniformidade moderada, com algumas poucas espécies comuns (dominantes) em cada nível tráfico ou grupo taxonômico, e numerosas espécies raras. Em geral, as atividades humanas direta ou indireta mente aumentam a dominância e reduzem a uniformidade e a variedade. Hansky (1982) chamou a atenção para a associação entre a distribuição e abundância. Ele propôs a hipótese de espécies nuclear-satélite para explicar essa relação, notando que as espécies nucleares são comuns e distribuição ampla, já as espécies satélites são raras e locais na distribuição. De acordo com essa hipótese, a distribuição de frequências dos tamanhos das amplitudes deve ter um pico para as espécies nucleares que ocupam grandes áreas, e um segundo pico para as espécies satélites que ocupam amplitudes menores. Alguns dados de fato apresentam essa distribuição bimodal de tamanho de amplitudes (GOTELLI; SIMBERLOFF 1987), mas a maioria dos dados não é consistente com a hipótese nuclear satélite (NEE et al.,1991). Estatisticamente, a diversidade pode ser quantificada e comparada de dois modos: (1) calculando-se os índices de diversidade baseados na razão entre as partes em relação ao todo, ou ni/N, em que “ni” é o número ou porcentagem dos valores de importância (como números, biomassa, área basal, produtividade) e “N” é o total de 31 todos os valores da importância; e (2) construindo perfis gráficos semilog, chamados de curvas de dominância-diversidade, em que o número ou porcentagem de cada componente é lançado em sequência, do mais abundante para o menos abundante. Quanto mais inclinada curva menor a diversidade. A diversidade de espécies, ou biótica, pode ser dividida em componentes de riqueza e de repartição (Figura 9). O número total de espécies por unidade diária (m2 ou hectare) e o índice de diversidade de Margalef são duas equações simples usadas para calcular a riqueza de espécies. O índice de Shannon ( ) (SHANNON; WEAVER, 1949), e o índice de uniformidade de Pielou (PIELOU, 1966) são dois índices frequentemente usados para calcular a repartição das espécies. O índice de Simpson envolve a soma do quadrado de cada razão de probabilidade ni/N. O incide Simpson varia de 0 a 1, com os valores altos indicando forte dominância e baixa diversidade. O índice de Shannon ( )envolve transformações logarítmicas e é derivado da teoria da informação e representa um tipo de formulação muito usado para analisar a complexidade e o conteúdo de informação de todos os tipos de sistema. Em que “Pi” é a proporção dos indivíduos pertencentes à i-ésima espécie. Nesse índice, quanto maior o valor ( ), mais alta a diversidade. FIGURA 9 – DIAGRAMA MOSTRANDO AS EQUAÇÕES PARA A MEDIDA DA RIQUEZA DE ESPÉCIES E DA REPARTIÇÃO ENTRE ELAS FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 41) Uma vez calculado o valor ( ), a uniformidade, “e”, pode ser calculada dividindo- se o log do número de espécies por “ ”. O índice de Shannon e também razoavelmente independentemente do tamanho da amostra e tem distribuição normal, contanto que os valores de “N” sejam inteiros (HUTCHESON, 1970), portanto métodos estatísticos rotineiros podem ser usados para testar a significância das diferenças entre as médias. 32 A biomassa ou produtividade, que frequentemente é mais apropriada ecologicamente, pode ser usada se não se conhece o número de indivíduos por espécie. Em resumo, quanto maior for a dominância de uma espécie (uniformidade; índice de Simpson), menor será a diversidade de espécies (índice de Shannon). 6 CONTROLE BIOLÓGICO DO AMBIENTE GEOQUÍMICO Os organismos individuais não só se adaptam ao ambiente físico como, por sua ação combinada nos ecossistemas, também adaptam ao ambiente geoquímico a suas necessidades biológicas. O fato de a química da atmosfera, o ambiente físico fortemente tamponado da Terra e a presença de uma diversidade de vida aeróbica serem completamente diferentes das condições em qualquer outro planeta do nosso sistema solar levou a hipótese de Gaia. A hipótese de Gaia considera que os organismos, especialmente os micro-organismos evoluíram com o ambiente físico para proporcionar um sistema de controle intrincado e autorregulatório que mantém as condições favoráveis para vida na Terra (LOVELOCK, 1979). Há praticamente uma invariabilidade na constituição gasosa da atmosfera terrestre, apesar de todos os organismos efetuarem trocas gasosas com o meio. O ambiente marinho apresenta pH bastante estável, graças a um sistema químico de equilíbrio do íon HCO3, que envolve trocas gasosas do meio marinho com a atmosfera e a precipitação de organismos. Outro aspecto é a temperatura da superfície terrestre que, além de amena, possibilita a existência e formação de compostos orgânicos complexos, variabilidade climática bastante estreita quando comparada aos demais planetas do sistema solar (como Marte e Vênus), tanto ao longo do ano quanto geograficamente (LOVELOCK; MARGULIS, 1973). Tais fatos serviram de evidência para a formulação da hipótese de Gaia (Gaia é o termo grego para deusa da Terra) por Lovelock e Margulis (1973) e Lovelock (1979). Segundo esses autores, as condições da Terra, favoráveis ao desenvolvimento da vida, não foram fruto de um mero acaso, e sim foram cunhadas pelos próprios organismos, principalmente os microrganismos, através da atividade coordenada da vida primitiva até o presente. Em outras palavras, a atmosfera terrestre não desenvolveu sua capacidade de sustentar a vida apenas por interação casual de forças físicas, para a vida evoluir posteriormente, adaptando-se a essas condições. Ao contrário, desde o início os organismos desempenharam um papel principal no desenvolvimento e controle de um ambiente geoquímico favorável para eles mesmos. 33 Segundo Lovelock e Margulis (1973), a teia da vida de interações entre micro- organismos no planeta funcionaria de maneira unificada, formando um sistema cibernético complexo. No entanto, a hipótese de Gaia ainda não foi comprovada, apesar de existirem evidências como a de rede fel de 1958 de que a razão entre as concentrações de carbono nitrogênio e fósforo no ambiente oceânico seriam reguladas em funções das necessidades nutricionais do fitoplâncton. A hipótese de Gaia é difícil de ser comprovada, pois o mecanismo Integrado de controle desta ordem de grandeza abrangeria centenas de processos. A hipótese de Gaia represento planeta como um “superorganismo” trazendo à tona a ideia de um sistema biológico como uma entidade auto-organizada ao nível da biosfera. 7 CIBERNÉTICA DOS ECOSSISTEMAS Além do fluxo de energia e dos ciclos de material, os ecossistemas são ricos em redes de informação, incluindo fluxos de comunicação físicas e químicas que ligam todas as partes e dirigem ou regulam o sistema como um todo (ODUM; BARRETT, 2008). Portanto, os ecossistemas podem ser considerados cibernéticos (de kybernetes = “piloto” ou “governador”) em sua natureza, mas a cibernética acima dos níveis de organização de organismo é muito diferente daquela no nível de organismo ou de aparelhos de controle mecânico. As funções de controle na natureza são internas e difusas (sem pontos de ajuste) em vez de externas e especificadas (por ponto de ajustes), como nos aparelhos cibernéticos construídos por humanos. A falta de controle por pontos de ajuste resultaem um estado pulsante em vez de um estado estável. A variância, o grau no qual a estabilidade alcançada, muda amplamente dependendo do rigor do ambiente externo e da eficiência dos controles internos. É útil reconhecer dois tipos de estabilidade: a estabilidade de resistência (capacidade de permanecer “firme” diante do estresse) e a estabilidade de Resiliência (capacidade de se recuperar rapidamente); as duas podem estar relacionadas de modo inverso. A ciência da cibernética, como fundada por Norbert Wiener, abrange tanto os controles animados como inanimados. Os mecanismos de retroalimentação mecânicos são frequentemente chamados pelos engenheiros de servo mecanismos, ao passo que os biólogos usam a expressão mecanismos homeostáticos para se referir aos sistemas organismo micos. A homeostase (de homeo = “mesmo”, e statis = “permanecer”) no nível de organismo é um conceito conhecido em fisiologia. WIENER (1948), estabelece que nos servomecanismos e nos organismos, um “controlador” mecânico ou anatômico distinto tem um “ponto de ajuste” específico. Por exemplo, no sistema de aquecimento doméstico, o termostato controla o aquecimento; em um animal de sangue quente, um centro específico no cérebro controla a temperatura do corpo; e os genes controlam rigorosamente o crescimento e o desenvolvimento de células, órgãos e organismos. 34 Não existem termostatos ou quimiostatos na natureza; em vez disso, a interação entre os ciclos materiais e fluxos de energia, bem como as retroalimentações de subsistemas em grandes ecossistemas, geram homeorese autocorretiva (rhesis = “fluxo” ou “pulso”). Waddington (1975) cunhou o termo homeorese para denotar a estabilidade ou preservação evolutiva de um fluxo ou processo pulsante de um sistema como um caminho de mudança ao longo do tempo. A meta da homeorese é manter os sistemas alterando-se da mesma maneira como alteravam-se no passado. Mecanismos de controle operando no nível de ecossistema incluem subsistemas microbianos que regulam a armazenagem e liberação de nutrientes, mecanismos comportamentais e subsistemas predador-empresa, que controlam a densidade populacional, para mencionar apenas alguns exemplos. Uma dificuldade em perceber o comportamento cibernético no nível de ecossistema é que os componentes nesse nível estão acoplados em rede por meio de vários mensageiros físicos e químicos, que são análogos, mas muito menos visíveis que os sistemas nervosos ou hormonais dos organismos. Simon (1973) destacou que as “energias de ligações” que unem os componentes se tornam mais difusas e mais fracas com o aumento no tamanho do sistema e das escalas temporais. Na escala de ecossistema, essas ligações fracas, mas numerosas, de energia e informação química, foram chamadas de “fios invisíveis da natureza” (ODUM, 1971), e o fenômeno dos organismos respondendo dramaticamente a baixas concentrações de substâncias é mais que apenas uma fraca analogia ao controle hormonal. As causas de baixa energia produzindo efeitos de alta energia são onipresentes nas redes de ecossistemas (ODUM, 1996); por exemplo: insetos minúsculos, conhecidos como Hymenoptera parasita, representa uma porção muito pequena (geralmente menos de 0,1%) do metabolismo total da comunidade de um ecossistema de campo, porém eles podem ter um grande feito controlador no fluxo de energia primária total (produção), por conta do impacto de seu parasitismo sobre insetos herbívoros. Em um modelo de ecossistema de uma nascente, Patten e Auble (1981) descreveram uma alça de retroalimentação na qual somente 1,4% da entrada de energia para o sistema é retroalimentada para o substrato detrítico das bactérias. Em diagramas de sistema ecológico (Figuras 3, 5, 7 e 8), esse fenômeno é comumente mostrado como uma alça reversa (ou alça de retroalimentação), na qual uma baixa quantidade de energia “a jusante” é retroalimentada para um sistema “a montante”. De acordo com Odum e Barrett (2008), esse tipo de controle amplificado, em virtude de sua posição em uma rede, é extremamente difundido em indicar a intrincada estrutura global de retroalimentação dos ecossistemas. Nas cadeias alimentares, os herbívoros e os parasitas “componentes a jusante” frequentemente aumentam ou promovem o bem-estar de seus hospedeiros (componentes a montante) por meio de um processo de retroalimentação conhecido como retroalimentação por recompensa (DYER et al., 1993; DYER et al., 1995). Ao longo do tempo evolutivo, tais interações estabilizaram ecossistemas, prevenindo herbivoria do tipo “explosão e colapso”, oscilações presa- predador catastróficas, e assim por diante. 35 Além do controle por retroalimentação, a redundância entre os componentes funcionais também contribui para a estabilidade. Por exemplo, se diversas espécies de autótrofos estão presentes, cada uma com uma amplitude de temperatura operacional diferente, a taxa de fotossíntese da comunidade pode permanecer estável apesar das mudanças na temperatura. Holling (1973), e Hurd e Wolf (1974) sugeriram que as populações e, por inferência, os ecossistemas, apresentam mais que um estado de equilíbrio e frequentemente retornam a um equilíbrio diferente após uma perturbação. O dióxido de carbono introduzido na atmosfera por atividades humanas é em grande parte, mas não completamente, absorvido pelo sistema carbonado do mar e outros depósitos de carbono, mas conforme entrada aumenta, os novos níveis de equilíbrio na atmosfera são mais altos. Em muitas ocasiões, os controles regulatórios emergem somente depois de um período de ajuste evolutivo. Novos ecossistemas, como um novo tipo de agricultura ou novos arranjos hospedeiro-parasita, tendem a oscilar mais violentamente e têm mais probabilidade de desenvolver superabundância que os sistemas maduros, nos quais os componentes tiveram oportunidade de se ajustarem de maneira conjunta. Parte da dificuldade em lidar com o conceito de estabilidade é semântica. Uma definição do dicionário do termo estabilidade é, por exemplo, “a propriedade de um corpo que a causa, quando perturbado de uma condição de equilíbrio, para desenvolver forças ou momentos que restauram a condição original”. Isso parece bastante simples, mas, na prática, a estabilidade assume significados diferentes em profissões diferentes (como engenharia, ecologia ou economia), especialmente quando se tenta medi-la e quantificá-la. Segundo Odum e Barrett (2008), do ponto de vista ecológico podemos estabelecer dois tipos de estabilidade: a estabilidade de resistência indica a capacidade de um ecossistema de resistir as perturbações (distúrbios) e de manter sua estrutura e função intactas. A estabilidade de resiliência indica a capacidade de se recuperar quando o sistema tiver sido rompido por uma perturbação. Crescentes evidências sugerem que esses dois tipos de estabilidade podem ser mutuamente exclusivos; em outras palavras é difícil desenvolver ambos ao mesmo tempo. Assim, caso um ecossistema que apresente resistência ao fogo, devido as suas adaptações, sofrer um incêndio, este ambiente irá se recuperar muito lentamente quando queimar, ou talvez nunca se recupere. Em contraste, ecossistemas cuja vegetação se queima facilmente (baixa estabilidade de resistência), mas se recupera de maneira rápida em alguns anos, apresenta alta estabilidade de resiliência. Em geral, pode se esperar que os ecossistemas em ambientes físicos propícios apresentem mais estabilidade de resistência e menos estabilidade de resiliência, ao passo que oposto é válido em ambientes físicos incertos (ODUM; BARRETT, 2008). Em resumo, um ecossistema não é equivalente a um organismo; por não estar sob controle genético direto, um ecossistema está em um nível de organização supra organismo, mas não é um superorganismo, nem é parecido com complexo industrial (como uma usina atômica). Tem uma única coisa em comum com os organismos: o comportamento cibernético embutido, embora diferente. 36 IMPORTANTE O filósofo e matemáticoNorbert Wiener criou o termo “cibernética” para designar a ciência do controle, comunicação e cognição. Dos 3 aspectos da cibernética, o avanço das comunicações é o mais claramente visível no quotidiano. Uma resenha sobre o tema pode ser encontrada em: https:// estadodaarte.estadao.com.br/a-cibernetica-de-wiener/. 37 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Teia alimentar foi o conceito elaborado por Charles Elton que descreveu as comunidades biológicas em termos de suas relações alimentares como um princípio de organização dominante na estrutura da comunidade. • O termo ecossistema foi desenvolvido e utilizado pela primeira vez por Artur Tansley, para incluir os organismos e todos os fatores abióticos em um habitat. • O primeiro autor a fornecer uma perspectiva termodinâmica do funcionamento do ecossistema foi Alfred Lotka, mostrando que os movimentos e transformações de massa energia obedecem às leis termodinâmicas. • A ideia de que o ecossistema funciona como sistema transformador de energia foi popularizada por Raymond Lindeman, em 1942. • Entre 1950 e 1968, Ludwig von Bertalanffy utilizou a abordagem holística para desenvolver a Teoria Geral dos Sistemas baseada em três princípios básicos: Expansionismo; Pensamento Sintético; e Teleologia. • A ecologia de ecossistemas, estudada pelos irmãos Howard e Eugene Odum, estabelece que a reciclagem de matéria e o fluxo de energia num ecossistema a ela associado proporcionam a base para a caracterização da estrutura e função daquele ecossistema. • Do ponto de vista da estrutura trófica, um ecossistema tem duas camadas: (1) um extrato autotrófico (ou produtores) em que os organismos são capazes de elaborar seu próprio alimento a partir de nutrientes e luz solar (fotossíntese); e (2) o extrato heterotrófico alimentando-se dos produtores. • Embora ecótono seja considerado uma zona de transição entre ecossistemas diferentes, ele não é sinônimo de bordas ou fronteiras. Ecótono é um conceito funcional ecológico e borda é um conceito espacial geográfico. • A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, de espécies, de habitats e dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos. Quanto maior for a dominância de uma espécie, menor será a diversidade de espécies. • A hipótese de Gaia desde considera que desde o início os organismos desempenharam um papel principal no desenvolvimento e controle de um ambiente geoquímico favorável para eles mesmos. 38 • Os ecossistemas podem ser considerados cibernéticos porque são ricos em redes de informação, incluindo fluxos de comunicação físicas e químicas que ligam todas as partes e dirigem ou regulam o sistema como um todo. • Do ponto de vista ecológico podemos estabelecer dois tipos de estabilidade: a estabilidade de resistência (capacidade de um ecossistema de resistir as perturbações) e de manter sua estrutura e função intactas. A estabilidade de resiliência indica a capacidade de se recuperar quando o sistema tiver sido rompido por uma perturbação. 39 1 A ecologia de ecossistemas estabelece que a reciclagem de matéria e o fluxo de energia num ecossistema a ela associado proporcionam a base para a caracterização da estrutura e função daquele ecossistema. Sobre os estudos de ecologia envolvendo classificação hierárquica, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A energia e as massas dos elementos como o silício é a “moeda” para comparar a estrutura e funcionamento de diferentes ecossistemas. b) ( ) A ecologia de ecossistemas estabelece que as medidas de assimilação de energia e eficiência energética se tornam as ferramentas para exploração deste conceito termodinâmico de ecossistema. c) ( ) O ecossistema é a terceira unidade na hierarquia ecológica que é completa, ou seja, que tem todos os componentes (biológicos e físicos) necessários para sua sobrevivência. d) ( ) Nem tudo o que está recobrindo a Terra (coisas vivas e não vivas) interage formando sistemas. 2 Do ponto de vista da estrutura trófica, um ecossistema tem duas camadas: (1) um extrato autotrófico (ou produtores) em que os organismos são capazes de elaborar seu próprio alimento a partir de nutrientes e luz solar (fotossíntese); e (2) o extrato heterotrófico alimentando-se dos produtores. Com base no enunciado, analise as sentenças a seguir: I- A floresta é um exemplo de um típico ecossistema. As árvores e outras plantas produtoras utilizam a energia solar e os nutrientes químicos para elaborar matéria orgânica que é comida pelos consumidores e que devolvem os nutrientes à raiz das plantas. II- A classificação ecológica (produtores, fagótrofos, saprófagos - decompositores, entre outros) diz respeito à função, não às espécies em si. III- Os organismos designados como macro consumidores obtém sua energia através do sol. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) Somente a sentença III está correta. AUTOATIVIDADE 40 3 As condições ambientais, incluindo os organismos adaptados a essas condições, mudam gradualmente ao longo de um gradiente, mas é frequente ocorrer pontos de mudança abrupta, conhecidos como ecótonos. De acordo essa afirmação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) O ecótono é uma zona de transição entre sistemas ecológicos adjacentes. ( ) Ecótonos podem ser zonas abruptas de variação de vegetação no espaço, como ocorre quando as temperaturas de crescem conforme a elevação aumenta a montanha acima. ( ) Bordas, ecótonos e fronteiras são sinônimos, representam a realidade que divide os ecossistemas. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – V – F. b) ( ) V – F – V. c) ( ) F – V – F. d) ( ) F – F – V. 4 Os ecossistemas são formações de vida e ambiente, caracterizadas por uma certa estabilidade e por circuitos internos de trocas de substâncias. Disserte sobre por que um ecossistema não é apenas um agrupamento de organismos em um dado ambiente caracterizável? 5 A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, diversidade das espécies, diversidade do habitat e diversidade dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos. Existem dois componentes da diversidade: (1) o componente “riqueza” ou “variedade”; e (2) abundância relativa ou componente de repartição das unidades individuais entre os diferentes tipos. Neste contexto, disserte brevemente sobre por que é importante levar em consideração tanto componente abundância relativa como componente riqueza. 41 TÓPICO 3 - ENERGIA NO ECOSSISTEMA 1 INTRODUÇÃO No Tópico 3, estudaremos e os princípios dos sistemas energéticos, pois a energia é necessária para todos os processos. O fluxo de energia e a eficiência de sua transferência descrevem certos aspectos da estrutura de um ecossistema. A energia entra no ecossistema através da assimilação fotossintética de luz solar pelos autótrofos e através do transporte de matéria orgânica para dentro do sistema a partir de fontes externas. A variação do fluxo de radiação total entre os diferentes extratos do ecossistema, e de um local para o outro na superfície da Terra é enorme, e a distribuição dos organismos individuais responde da mesma forma. A fotossíntese une quimicamente dois compostos inorgânicos comuns, o dióxido de carbono e a água para formar o açúcar glicose, com a liberação de oxigênio. A energia total assimilada pela fotossíntese é chamada de produção primária bruta. As plantas usam parte dessa energia para sustentar a síntese de compostos biológicos e para se manterem. A energia acumulada nas plantas, e que está disponível para os consumidores, é chamada de produção primária líquida. A cada transferência de energia para os níveis tróficos seguintes, uma proporção da energia potencial é perdida como o calor. Portanto,quanto mais curta a cadeia alimentar (ou quanto mais próximo o organismo estiver do nível trófico de produtor), maior a energia disponível para essa população. Contudo, enquanto a quantidade de energia declina a cada transferência, aumenta qualidade da energia que é transferida. Finalmente, o desempenho da energia é apresentado de acordo com as leis termodinâmicas conforme a sequência de relações tróficas pelas quais a energia passa através de um sistema. A energia que flui para dentro dos ecossistemas não pode ser criada nem destruída. Tão pouco pode ser aproveitada ao máximo devido a entropia, que representa a tendência de degradação natural da energia, também conhecida como dispersão energética. UNIDADE 1 42 2 AS LEIS TERMODINÂMICAS A energia inicialmente entra no reino biológico do ecossistema via fotossíntese e produção vegetal, o que proporciona energia para os animais e micro-organismos não fotossintetizadores. A energia é definida como a capacidade de executar trabalho (ODUM; BARRETT, 2008), O comportamento da energia é descrito pelas seguintes leis: a primeira lei da termodinâmica, ou lei da conservação da energia, estabelece que a energia pode ser transformada de uma forma para outra, mas não pode ser criada nem destruída. A luz, por exemplo, é uma forma de energia: pode ser transformada em trabalho, calor ou energia potencial do alimento, dependendo da situação, mas nenhuma delas pode ser destruída. A segunda lei da termodinâmica, ou lei da entropia, pode ser exposta de várias maneiras, incluindo a seguinte: nenhum processo envolvendo transformação de energia irá ocorrer espontaneamente, a menos que haja a degradação da energia de uma forma concentrada para uma forma dispersa. Por exemplo, o calor em um objeto quente tenderá, espontaneamente, a se dispersar nos arredores mais frios. A segunda lei da termodinâmica também pode ser exposta da seguinte maneira: nenhuma transformação espontânea da energia (como a luz solar, por exemplo) em energia potencial (protoplasma, por exemplo) é 100% eficiente, porque alguma parte da energia sempre será dispersada sobre a forma de energia térmica não disponível. A entropia é uma medida da energia não disponível resultante das transformações; o termo também é usado como um índice geral da desordem associado à degradação da energia. De acordo com Odum e Barrett (2008), os organismos, ecossistemas e toda a ecosfera possuem a seguinte característica termodinâmica essencial: podem criar e manter um estado elevado de ordem interna ou uma condição de baixa entropia (uma baixa quantidade de desordem). Obtém-se a baixa entropia ao dissipar de forma contínua e eficiente a energia de alta utilidade (luz ou alimento, por exemplo) em energia de baixa utilidade (calor, por exemplo). No ecossistema, mantém-se a ordem em uma estrutura complexa de biomassa por meio da respiração total da comunidade, que “expulsa a desordem” continuamente. Assim, os ecossistemas e organismos são sistemas termodinâmicos abertos, em estado de não equilíbrio, que trocam energia de modo contínuo e matéria com ambiente para reduzir a entropia interna e aumentar a entropia externa (ficando, assim, em conformidade com as leis da termodinâmica). A energia que atinge a superfície da Terra como luz é equilibrada pela energia que deixa superfície do planeta como radiação invisível de calor. A essência da vida é a progressão de mudanças, como crescimento autoduplicação e a síntese de complexas combinações de matéria. Sem as transferências de energia que acompanham todas as mudanças não existiriam vida nem sistemas ecológicos. 43 As relações entre plantas produtoras e animais consumidores, entre predadores e presas, sem mencionar os números e tipos de organismo em um dado ambiente, são limitadas e controladas pelo fluxo de energia de formas concentradas para dispersas. Os sistemas vivos usam parte de sua energia interna disponível para se autorreparar e para “eliminar” as desordens. Quando a luz é absorvida por algum objeto, que como resultado se torna mais quente, a energia da luz se transforma em outro tipo de energia: a energia térmica. A energia térmica compreende as vibrações e movimentos das moléculas que compõem um objeto. Absorção diferencial dos raios do sol pela terra e água forma áreas quentes e frias, que resulta no fluxo de ar que pode tocar Moinhos de Vento e executar trabalho, como bombear água contra força da gravidade. Nesse caso, a energia da luz é modificada em energia térmica na superfície da Terra, e depois em energia cinética do movimento do ar, o que completa o trabalho de puxar água. A energia não é destruída pela elevação da água; pelo contrário, ela se torna energia potencial, pois a energia latente inerente a elevação da água pode ser transformada em algum outro tipo de energia ao permitir que a água caía de volta ao seu nível original. A sequência de relações tróficas pelas quais a energia passa através de um sistema é chamada de cadeia alimentar. Uma cadeia alimentar produz muitos elos (plantas, herbívoros e carnívoros), aos quais, Lindeman (1942) chamou de níveis tróficos (a raiz grega da palavra trófico significa “alimento”). A transferência de energia ao longo da cadeia alimentar de um ecossistema é chamada de fluxo de energia porque, de acordo com a lei da entropia, as transformações da energia são “unidirecionais”, em contraste com o comportamento cíclico da matéria. O alimento resultante da fotossíntese das plantas verdes representa a energia potencial, que modifica em outras formas de energia quando o alimento é usado por organismos. Como o montante de um tipo de energia é sempre equivalente em quantidade (mas não em qualidade) ao outro tipo no qual é transformado, podemos calcular um pelo outro. A energia “consumida” não é realmente gasta. Em vez disso, ela é convertida de um estado de energia de alta qualidade para um estado de baixa qualidade. A energia é necessária para todos os processos em um ecossistema. A quantidade de energia pode ser medida pelo calor liberado. Existem duas unidades comumente usadas para medir energia. A caloria é a quantidade de calor necessária para elevar a temperatura de um grama de água em um grau na escala Celsius. Uma quilocaloria representa mil calorias. Um corpo humano libera cerca de 2.500 quilocalorias por dia, energia proporcionada pelos alimentos consumidos. Por acordos internacionais, uma unidade de energia diferente se está utilizando com maior frequência, o Joule (J). Uma quilocaloria é equivalente a 4.186,8 joules. A floresta usa a energia do sol (energia solar) e pequenas quantidades de outras fontes. As fontes energéticas, depósitos e fluxos em um ecossistema florestal estão marcadas no diagrama da floresta na Figura 10 (as quantidades estão em joules). 44 FIGURA 10 – DIAGRAMA DE PRODUÇÃO FOTOSSINTÉTICA E DO CONSUMO ORGÂNICO NUMA FLORESTA, MOSTRANDO FONTES, FLUXOS DE ENERGIA, SUMIDOURO DE CALOR, RECICLAGEM E O BALANÇO DE ENTRADAS E SAÍDAS FONTE: Adaptado de Odum et al. (1987) O diagrama inclui alguns números elevados. Os números elevados com muitos zeros podem se representar como o produto da parte inicial do número multiplicado por 10 para cada zero. Por exemplo: 627 000 pode ser representado como: 6,27 .105; ou, pode se usar o seguinte formato nos programas de computação: 6.27 E5, onde E5 (5 exponencial) significa multiplicar 10 * 5. Isto é o mesmo que adicionar 5 zeros. Esta última notação é usada na Figura 10 para indicar o fluxo de joules. Uma boa maneira de ver como os materiais, energia ou dinheiro fluem dentro de um sistema, é escrever seus valores nos caminhos do diagrama. Por exemplo, os números nas linhas de fluxo na Figura 10 são as proporções de fluxo de energia por ano. A primeira é a Lei da Conservação de Energia, a qual declara que a energia não pode ser criada nem destruída. Em nosso caso, significa que a energia que flui para dentro de um sistema é igual à energia adicionada ao depósitomais aquela que flui para fora do sistema. Na Figura 10, os depósitos não estão mudando, a soma das entradas é igual à soma das saídas de energia; os joules de energia que entram no sistema das fontes externas, são iguais aos joules de energia que se dispersam pelo sumidouro. A segunda lei da termodinâmica trata da transferência de energia para um estado cada vez menos disponível e mais disperso. A segunda lei é a Lei de Dispersão de Energia. Esta lei declara que a disponibilidade para que a energia realize algum trabalho se esgota devido à sua tendência à dispersão (se degrada). A energia também se dispersa dos depósitos de energia. Quando apresentamos o símbolo do sumidouro de calor no último capítulo, dissemos que os sumidouros de calor eram necessários para todos os processos e depósitos. Os sumidouros de calor são necessários devido à segunda lei. 45 Observe os caminhos da dispersão de energia no diagrama da floresta na Figura 10, os joules de energia que fluem pelo sumidouro de calor não estão disponíveis para realizar mais trabalho porque a energia se encontra demasiadamente dispersa. A energia que se dispersa é energia utilizada, não é energia desperdiçada; sua saída do sistema é parte inerente e necessária de todos os processos, biológicos ou qualquer outro. A Terra não está em estado estável de energia, pois a entrada contínua do fluxo de energia do sol mantém enormes potenciais de energia e diferenças de temperatura. No entanto, o processo de buscar o estado estável é responsável pela sucessão de mudanças na energia que constitui o fenômeno natural da Terra. Quando a energia do sol atinge o nosso planeta, tende a ser degradada em energia térmica. Somente uma porção muito pequena (menos de 1%) da energia luminosa absorvida pelas plantas verdes é transformada em energia potencial ou de alimento: a maior parte torna-se calor, que então sai da planta, do ecossistema e da ecosfera. O restante do mundo biológico obtém sua energia química potencial por meio das substâncias orgânicas produzidas pela fotossíntese das plantas ou da quimiossíntese dos microrganismos. Um animal, por exemplo, pega energia química potencial do alimento e converte grande parte dela em calor a fim de permitir que uma pequena parte da energia se estabeleça como energia potencial química do novo protoplasma. A cada passo da transferência de energia de um organismo para o outro, uma grande parte da energia é degradada na forma de calor. No entanto, a entropia não é de todo negativa. Como a quantidade de energia disponível diminui, a qualidade de energia restante pode ser consideravelmente aumentada. 3 RADIAÇÃO SOLAR Os organismos que estão na superfície da Terra ou perto dela são constantemente irradiados pela radiação solar e térmica das ondas longas advindas das superfícies do entorno. Ambas contribuem para o ambiente climático (temperatura, evaporação da água, movimento do ar e da água). A radiação solar que atinge a Terra consiste em três componentes: luz visível, e dois componentes invisíveis (ondas curtas ultravioletas e ondas longas infravermelhas). Por causa de sua natureza diluída e dispersa, somente uma fração muito pequena (no máximo 5%) da luz visível pode ser convertida pela fotossíntese em energia muito mais concentrada da matéria orgânica para os componentes bióticos do ecossistema (ODUM; BARRETT, 2008). A radiação solar que atinge a superfície da Terra é muito alterada ao passar através da atmosfera, cobertura de nuvens, água e vegetação. A variação do fluxo de radiação total entre os diferentes extratos do ecossistema, e de um local para o outro na superfície da Terra é enorme, e a distribuição dos organismos individuais responde da mesma forma. A energia radiante que atinge a superfície da Terra em um dia claro é 46 por volta de 10% ultravioleta, 45% visível e 45% infravermelha. A radiação visível é menos atenuada ao passar através de densas camadas da atmosfera o que significa que a fotossíntese, que está restrita a faixa do visível, pode continuar em dias nublados e até em uma certa profundidade em águas límpidas. A radiação térmica, outro componente do ambiente de energia, vem de qualquer superfície ou objeto a uma temperatura acima do zero absoluto. Isso inclui não só o solo, a água e a vegetação, mas também as nuvens, que contribuem com uma parcela substancial de energia de calor irradiada para baixo, em direção aos ecossistemas. Por exemplo, a temperatura em uma noite nublada de inverno geralmente fica mais alta que em uma noite de céu limpo. A água e a biomassa tendem a reduzir as flutuações no ambiente e, assim, tornar as condições menos estressantes para a vida. Embora o fluxo de radiação total determine as condições de existência para os organismos, a radiação solar direta integrada ao extrato autotrófico é de interesse maior para a produtividade e a ciclagem dos nutrientes dentro do ecossistema. Essa entrada de energia solar aciona todos os sistemas biológicos ecológicos. Segundo Hurlbert (1984), o destino da energia solar que entrar na biosfera está distribuído da seguinte forma: 30% é energia solar refletida; 46% energia solar e convertida diretamente em calor; 23% da energia solar é direcionada para evaporação e precipitação; 0,2% da energia solar é utilizada para geração de ventos ondas e correntes; e somente 0,8% da radiação solar é utilizada para a fotossíntese. Ou seja, menos de 1% da energia solar é convertido em alimento e outras biomassas. Embora cerca de 70% ou mais dessa energia resulte em calor, evaporação, precipitação, vento e assim por diante, não significa que há perdas energéticas advindas da radiação solar, porque esses fluxos criam uma temperatura tolerável e acionam os sistemas meteorológicos e os ciclos de água necessários para vida na Terra. 4 PRODUTIVIDADE As plantas, algas e algumas bactérias captam a energia luminosa e a transformam em energia de ligações químicas nos carboidratos. Esse processo é chamado de produção primária e sua taxa é quantificada como produtividade primária. A fotossíntese une quimicamente dois compostos inorgânicos comuns, o dióxido de carbono (CO2) e a água (H2O) para formar o açúcar glicose (C6H12O6), com a liberação de oxigênio (O2). O balanço químico total da reação é: 6CO2 + 6H2O → C6H12O6 + 6O2 47 A fotossíntese transforma o carbono de um estado oxidado (de baixa energia) para um reduzido (de alta energia) nos carboidratos. Como é realizado o trabalho nos átomos de carbono para aumentar seu nível energético, a fotossíntese exige energia. Essa energia é fornecida pela luz visível. Em termos quantitativos, para cada grama de carbono assimilado, uma planta transfere 39 quilojoule (kJ) de energia da luz do sol em energia química dos carbonos nos carboidratos. Os pigmentos que captam a energia da luz para fotossíntese na verdade absorvem apenas uma pequena fração da radiação solar incidente. Além disso, por causa da ineficiência nas muitas etapas bioquímicas da fotossíntese, as plantas assimilam não mais do que 1/3 (geralmente muito menos que isso) da energia luminosa absorvida pelos pigmentos fotossintéticos. O restante é perdido como o calor. A fotossíntese supre os carboidratos e a energia de que uma planta precisa para construir tecidos e crescer. Reorganizadas e reunidas, as moléculas de glicose se transformam em gorduras, amidos, óleos e celulose. A glicose e outros compostos orgânicos (amidos e óleos, por exemplo, podem ser transportados através da planta ou armazenados como uma fonte de energia para as futuras necessidades. Combinados com o nitrogênio, o fósforo, o enxofre e o magnésio, os carboidratos simples derivados da glicose produzem um conjunto de proteínas, ácidos nucleicos e pigmentos. As plantas não podem crescer a não ser que tenham todos esses materiais de construção básicos. Por exemplo, o pigmento fotossintetizador clorofila contém um átomo de magnésio e, portanto, mesmo quando todos os outros elementosnecessários estão presentes em abundância, uma planta que não tenha magnésio suficiente não consegue produzir clorofila, então não é capaz de fazer fotossíntese. As plantas e os outros autótrofos fotossintetizadores formam a base de todas as cadeias alimentares, sendo então chamados de produtores primários do ecossistema. Os ecólogos estão interessados na taxa de produção primária porque ela determina a energia total disponível para o ecossistema. A energia total assimilada pela fotossíntese é chamada de produção primária bruta. As plantas usam parte dessa energia para sustentar a síntese de compostos biológicos e para se manterem, logo sua biomassa contém substancialmente menos energia do que a total assimilada. A energia acumulada nas plantas, e que está disponível para os consumidores, é chamada de produção primária líquida. A diferença entre a produção primária bruta e a líquida e a energia da respiração, ou seja, a quantidade utilizada pelas plantas para manutenção e biossíntese. Portanto, a produtividade primária de um sistema ecológico é definida como a taxa a que a energia radiante é convertida em substâncias orgânicas pelas atividades fotossintética e quimiossintética dos organismos produtores (principalmente plantas verdes). Há quatro passos sucessivos no processo de produção como segue: 1. Produtividade primária bruta (PPB): é a taxa total de fotossíntese, incluindo a matéria orgânica consumida na respiração durante o período de medição. Também é conhecida como fotossíntese total. 48 2. Produtividade primária líquida (PPL): é a taxa de armazenamento da matéria orgânica nos tecidos da planta que excede o uso respiratório, “R”, pelas plantas, durante o período de medição. Também chamada de assimilação líquida. Na prática, a quantidade de respiração da planta é geralmente adicionada a medição da produtividade primária líquida, a fim de estimar a produtividade primária bruta (PPB = PPL + R). 3. Produtividade líquida da comunidade: é a taxa de armazenamento da matéria orgânica não usada pelos e heterótrofos (ou seja, produção primária líquida menos o consumo heterotrófico) durante o período considerado, geralmente a época de crescimento ou um ano. 4. Finalmente, as taxas de armazenamento de energia nos níveis de consumidor são chamadas de produtividade e secundárias. Como os consumidores usam somente materiais alimentares já produzidos e com as devidas perdas respiratórias, e como convertem essa energia alimentar em tecidos diversos por um processo global, a produtividade secundária não deve ser dividida em quantidades brutas e líquidas. O fluxo total de energia nos níveis heterotróficos, que é análogo a produtividade bruta dos autótrofos, deve ser designado como assimilação, não como produção. Em todas essas definições, o termo “produtividade” e a expressão “taxa de produção” podem ser usados de forma alternada. Mesmo quando o termo produção designar uma quantidade de matéria orgânica acumulada, supõe-se ou subentende- se um fator temporal (por exemplo, um ano na produção de cultivo agrícola). Assim, para evitar confusão, devemos sempre referir o intervalo de tempo. De acordo com a segunda lei da termodinâmica, o fluxo de energia diminui a cada passo por causa da perda de calor que ocorre a cada transferência de energia de uma forma para outra. Elevadas taxas de produção, em ambos os ecossistemas, natural e agrícola, ocorrem quando os fatores físicos são favoráveis, especialmente quando subsídios de energia (como os fertilizantes) de fora do sistema aumentam o crescimento ou as taxas de reprodução dentro do sistema. Esses subsídios de energia também podem ser o trabalho do vento e da chuva em uma floresta, a energia das marés em um estuário ou de combustíveis fósseis, ou ainda a energia do trabalho animal ou humano usado no cultivo agrícola. Ao avaliar a produtividade de um ecossistema deve-se considerar a natureza e a magnitude não só dos prejuízos energéticos resultante dos estresses climáticos, de colheita, de poluição e outras, que desviam a energia do processo de produção, mas também dos subsídios de energia que aumentam ao reduzir a perda do calor respiratório que é a eliminação da desordem, necessário para manter a estrutura biológica. A produção primária é sensível a variações na luz e na temperatura. Para plantas que crescem em plena luz do sol, os níveis de luminosidade geralmente excedem o ponto de saturação de seus pigmentos fotossintetizadores; portanto, a taxa fotossintética destas plantas geralmente não é restringida pela disponibilidade de luz. Para plantas que crescem na sombra ou em grandes profundidades em sistemas aquáticos, no 49 entanto, a taxa de fotossíntese geralmente é limitada pela luminosidade. Além disso, as folhas nem sempre operam à sua taxa fotossintética máxima possível. A cobertura de nuvens, o sombreamento por outras folhas ou plantas e baixos níveis de luminosidade de manhã cedo e à tardinha mantém a taxa fotossintética abaixo de seu máximo. A eficiência fotossintética é a porcentagem de energia na luz do sol que é convertida para produção primária durante a estação de crescimento. Essa medida proporciona um índice útil das taxas da produção primária sob condições naturais. Quando a água e os nutrientes não limitam severamente a produção vegetal, eficiência fotossintética de um ecossistema como um todo varia entre 1% e 2%. O restante dessa energia luminosa é refletido ou convertida em calor. A taxa de fotossíntese geralmente aumenta com a elevação da temperatura pelo menos até determinado ponto. A temperatura ótima para fotossíntese varia de acordo com a temperatura prevalecente do ambiente (desde cerca de 16 °C em muitas espécies temperadas chegando até 38 °C em espécies tropicais). A produção líquida depende da taxa de respiração tanto quanto da taxa de fotossíntese, e a respiração geralmente aumenta com o incremento da temperatura foliar. Desse modo, a produção líquida, e, portanto, a assimilação líquida de CO2 pode realmente diminuir com aumento da temperatura. A combinação favorável de grande insolação, temperatura quente, precipitação abundante e grande quantidade de nutrientes em algumas partes dos trópicos úmidos resulta na maior produtividade terrestre do planeta. Em ecossistemas temperados e árticos, as baixas temperaturas e as longas noites de inverno reduzem a produção. Dentro de uma determinada faixa de latitude, onde a luz não varia sensivelmente de uma localidade para outra, a produção líquida está diretamente relacionada à temperatura e à precipitação anual. Acima de um determinado limite de disponibilidade de água, a produção líquida aumenta em 0,4 g de matéria seca por quilograma de água nos desertos quentes e em 1,1 g por quilograma em pradarias de gramíneas rasteiras e desertos frios. Desse modo, uma dada quantidade de água sustenta quase três vezes a mais produção de plantas em climas mais frios do que em climas mais quentes dentro de uma faixa latitudinal. A produção da vegetação terrestre é máxima nos trópicos úmidos e mínima nos habitats de tundra e deserto. Os ecossistemas brejosos e paludosos, que ocupam a interface entre os habitats terrestres e aquáticos, podem produzir tanta biomassa anualmente quanto as florestas tropicais, por causa da contínua disponibilidade de água e da rápida regeneração de nutrientes nos sedimentos lodosos em volta das raízes das plantas. 50 5 REPARTIÇÃO DE ENERGIA NAS CADEIAS ALIMENTARES A transferência de energia alimentar de sua fonte nos autótrofo os (plantas), por meio de uma série de organismos que consomem e são consumidos, é chamada de cadeia alimentar. A produção primária das plantas, algas e algumas bactérias forma a base das cadeias alimentares ecológicas. Animais, fungos e a maioria dos microrganismos obtém sua energia e a maior parte de seus nutrientes das plantas ou animais, ou dos restos mortais deles. Esses organismos, entretanto, possuem um papel duplo como produtores e consumidoresde alimentos. Esses papéis dão ao ecossistema uma estrutura trófica que é determinada pelas teias alimentares através das quais a energia flui e os nutrientes circulam. A cada transferência, uma proporção (frequentemente de até 80% ou 90%) da energia potencial é perdida como o calor. Portanto, quanto mais curta a cadeia alimentar (ou quanto mais próximo o organismo estiver do nível trófico de produtor), maior a energia disponível para essa população. Contudo, enquanto a quantidade de energia declina a cada transferência, aumenta qualidade ou a concentração da energia que é transferida. As cadeias alimentares são de dois tipos básicos: (1) cadeia alimentar de pastejo, que, iniciando em uma base de plantas verdes, segue para os herbívoros pastejadores (organismos que comem células ou tecidos de plantas vivas) e então para os carnívoros (que se alimentam de animais); e (2) cadeia alimentar de detritos, que segue da matéria orgânica não viva para microrganismos e, em seguida, para organismos que se alimentam de detritos (detritívoros) e seus predadores. As cadeias alimentares não são sequências isoladas elas estão interligadas. O padrão de interconexões é geralmente denominado de teia alimentar. Em comunidades naturais complexas, os organismos cuja nutrição é obtida do sol e com o mesmo número de passos são considerados pertencentes ao mesmo nível tráfico. Assim, as plantas verdes ocupam o primeiro nível (nível trófico produtor), os que se alimentam de plantas (herbívoros) ocupam o segundo nível (nível trófico de consumidor primário), e os carnívoros primários ocupam o terceiro nível (o nível trófico de consumidor secundário), e os carnívoros secundários ocupam o quarto nível (o nível trófico de consumidor terciário). Essa classificação trófica é relativa à função e não à espécie propriamente dita. Uma população de espécie em particular pode ocupar um ou mais níveis tróficos de acordo com a fonte de energia realmente assimilada. Conforme Lindeman (1942) destacou, a quantidade de energia que alcança cada nível trófico depende da produção primária líquida na base da cadeia alimentar e das eficiências das transferências de energia em cada nível trófico acima. As plantas utilizam entre 15% e 70% da energia luminosa assimilada pela fotossíntese para manutenção, tornando, portanto, essa fração indisponível para os consumidores. Os herbívoros e carnívoros são mais ativos do que as plantas e gastam correspondentemente mais 51 de sua energia assimilada para manutenção. Como resultado, a produção de cada nível trófico é tipicamente apenas de 5% a 20% daquela do nível inferior. Os ecólogos se referem à percentagem de energia transferida de um nível trófico para o outro como eficiência ecológica ou eficiência da cadeia alimentar. Para entender por que as eficiências ecológicas são de apenas 5 a 20% precisamos examinar como os organismos fazem uso da energia que consomem. A despeito de sua fonte alimentar, um organismo utiliza energia do alimento para se manter, como combustível para suas atividades e para crescer e se reproduzir. Uma vez ingerida, a energia do alimento segue diversas vias através do organismo. Para começar, muitos componentes do alimento não são facilmente digeríveis: pelos, apenas, exoesqueletos de insetos, cartilagens e ossos, em alimentos de origem animal, assim como celulose e lignina, em alimentos de origem vegetal. Essas substâncias podem ser eliminadas (via fecal ou regurgitadas) e a energia que elas contêm é chamada de energia egestada. Aquilo que um organismo digere e absorve constitui sua energia assimilada. A fração dessa energia assimilada utilizada para atender as necessidades metabólicas, cuja maior parte escapa do organismo como o calor, compõem a energia respirada. Os animais excretam outras partes, geralmente menores, da energia assimilada na parte de resíduos orgânicos nitrogenados (principalmente amônia, ureia ou ácido úrico), produzidos quando a dieta contém nitrogênio em excesso; a esta se denomina energia excretada. A energia assimilada retida pelo organismo se torna disponível para a síntese de novas biomassa (produção), através do crescimento e reprodução, que então pode ser consumida pelos animais que se alimentam no nível trófico seguinte. Desse modo, os vários componentes do balanço de energia de um organismo estão conectados uns aos outros nas seguintes relações: (energia ingerida - energia registrada = energia assimilada); e (energia assimilada - respiração - excreção = produção). A eficiência ecológica total da cadeia alimentar começa pela eficiência com a qual os organismos assimilam o alimento que consomem. A eficiência de assimilação é a razão entre a assimilação e a ingestão, geralmente expressa como uma percentagem. O valor energético das plantas para seus consumidores depende de sua qualidade alimentar, ou seja, de quanta celulose, lignina e outros materiais não digeríveis elas contêm. Os herbívoros assimilam cerca de 80% das energias das sementes e de 60% a 70% da vegetação jovem. A maioria dos pastejadores (elefantes, gato, gafanhotos) extraem de 30 a 40% da energia de seus alimentos. Os alimentos de origem animal são mais facilmente digeridos do que os de origem vegetal. As eficiências de assimilação de espécies predadoras variam de 60% a 90%. Presas vertebradas são digeridas mais eficientemente do que insetos, porque os exoesqueletos indigestos dos insetos constituem uma fração maior do corpo do que os pelos, penas, escamas dos vertebrados. As eficiências de assimilação de insetívoros variam entre 70% e 80%. 52 Cada organismo cresce e produz filhotes. A biomassa que ele acrescenta desse modo representa a produção do organismo e também potencialmente alimento para outros organismos. A razão entre a energia contida nessa produção e a energia total assimilada é chamada de eficiência de produção líquida, e é geralmente expressa como uma percentagem. Animais ativos de sangue quente apresentam eficiências de produção líquida baixas: a das aves é inferior a 1% e as dos pequenos mamíferos com altas taxas reprodutivas varia até 6%. Esses organismos utilizam a maior parte da energia assimilada para manter o equilíbrio salino, fazer sangue circular, produzir calor para a termorregulação e se movimentar. Por outro lado, animais sedentários de sangue frio, particularmente espécies aquáticas, direcionam até 75% de energia assimilada para o crescimento e reprodução. A eficiência de produção pode se basear na energia total ingerida em vez de na energia assimilada. Nesse caso, ela é chamada de eficiência de produção bruta, que é produto da eficiência de assimilação pela eficiência de produção líquida. A eficiência de produção bruta representa a eficiência energética total da produção de biomassa dentro de um nível trófico. A eficiência de produção bruta de animais terrestres de sangue quente raramente excede 5%, e a de algumas aves e grandes mamíferos é menor que 1%. Para os insetos, essa eficiência variar dentro de um intervalo de 5% a 15% e para alguns animais aquáticos esse de 30%. Portanto os animais mais ativos possuem as eficiências de produção líquida mais baixas. Além disso, a energia atravessa o ecossistema em velocidades diferentes. As eficiências ecológicas descrevem que a proporção da energia assimilada pelas plantas acaba alcançando cada nível trófico superior de um ecossistema. A taxa de transferência de energia entre os níveis tróficos ou, inversamente, seu tempo de residência em cada nível trófico, proporciona um segundo índice da dinâmica energética de um ecossistema. Para uma dada a taxa de produção, o tempo de residência da energia e o armazenamento de energia na biomassa viva e detritos estão diretamente relacionados: quanto maior o tempo maior acumulação de energia. O tempo médio de residência de energia em um determinado nível trófico é igual a energia armazenada dividida pela taxa em que a energia é convertida em biomassa. As plantas nas florestastropicais úmidas produzem matéria seca a uma taxa média de 1,8 kg por m2 por ano e possuem uma biomassa viva a média de 42 kg por m2. Inserindo esses valores na equação obtemos 23 anos (42 ÷ 1,8) como o tempo de residência médio da biomassa nas plantas. As razões de acumulação da biomassa para os produtores primários podem variar desde mais de 20 anos em ambientes florestais terrestres até menos de 20 dias em comunidades aquáticas de base fitoplanctônica. Em todos os ecossistemas, no entanto, alguma energia permanece durante um longo tempo, e alguma desaparece rapidamente. 53 Por exemplo, os comedores de folhas e de raízes consomem boa parte da energia assimilada pelas árvores de florestas durante o ano de sua produção, parte dela poucos dias antes de ter sido assimilada pela vegetação. A energia acumulada na celulose e na lignina nos troncos das árvores, por outro lado, pode não ser reciclada por séculos. O fluxo de energia e a eficiência de sua transferência descrevem certos aspectos da estrutura de um ecossistema: o número de níveis tróficos, a importância relativa de detritívoros e herbívoros, os valores de equilíbrio de biomassa e detritos acumulados e taxas de troca de matéria orgânica. A importância dessas medidas para compreensão do funcionamento do ecossistema foi defendida por Lindeman (1942), que constituiu o primeiro balanço energético para uma comunidade biológica inteira. O balanço energético total do ecossistema reflete o equilíbrio entre créditos e débitos, exatamente como numa conta bancária. O ecossistema ganha energia através da assimilação fotossintética de luz pelos autótrofos e através do transporte de matéria orgânica para dentro do sistema a partir de fontes externas. Materiais orgânicos produzidos fora do sistema são chamadas de entradas ou alóctones; a fotossíntese que ocorre dentro do sistema é chamada de produção autóctones. 6 QUALIDADE DE ENERGIA: eMergia A energia tem qualidade e quantidade. Nem todas as calorias (ou qualquer outra unidade de quantidade de energia que se empregue) são iguais, tais quantidades iguais de formas diferentes de energia variam amplamente em potencial de trabalho. As formas concentradas de energia, como combustíveis fósseis, têm uma qualidade muito mais alta que as formas mais dispersas de energia, como a luz do sol. Podemos expressar a qualidade de energia ou concentração quanto a quantidade de um tipo de energia (como a luz solar) necessária para desenvolver a mesma quantidade de outro tipo (como o petróleo). O termo eMergia (com M maiúsculo) foi proposto para essa medida. A eMergia pode ser definida, de modo geral, como a soma da energia disponível já usada direta ou indiretamente para criar um serviço ou produto. Ao comparar as fontes de energia de uso direto pela humanidade, deve-se considerar a qualidade e a quantidade de energia disponível, bem como, sempre que possível, equiparar a qualidade da fonte com a qualidade do uso. A medida de que a energia é transferida para cada nível trófico seguinte, a qualidade da energia aumenta ao passo que a quantidade diminui nas cadeias alimentares e em outras sequências de transferência de energia. A importância da concentração de energia ou o fator qualidade ainda ser pouco difundida se deve ao fato de, apesar de haver numerosos termos para a quantidade de energia (como calorias, joules e watts), não existem termos para qualidade de energia no uso geral. 54 Odum (1971) propôs o termo a energia incorporada (embodied energy), como uma medida de qualidade que foi rebatizada como eMergia. A eMergia foi definida como todas as energias disponíveis já usadas direta ou indiretamente, para criar um serviço ou produto (ODUM, 1906). Assim, se mil calorias de luz solar forem necessárias para produzir uma caloria de alimento pelas plantas, a transformação (ou transformidade) será mil calorias solar para uma caloria de alimento e, portanto, a eMergia do alimento é de mil calorias de energia solar. A eMergia pode ser considerada a “memória da energia”, pois é calculada adicionando se todas as energias transformadas para produzir o produto ou serviço final. Para efeito comparativo, todas as energias contributivas deveriam ser do mesmo tipo e, evidentemente, expressas nas mesmas unidades quantitativas. Sob outro ponto de vista, a qualidade da energia é medida pela distância a termodinâmica em relação ao sol. Se o componente de melhor nível (alimento, por exemplo) estiver disponível ou não para um consumidor, depende da qualidade do recurso. Segundo Odum (1971), para a energia solar fazer o trabalho que hoje é realizado pelo petróleo, ela deve ter seu nível melhorado em milhares de vezes. Em outras palavras, a luz solar (altamente dispersa) não faria funcionar um automóvel ou uma geladeira a menos que fosse concentrada no mesmo nível da gasolina ou da eletricidade. A energia solar pode ser usada diretamente, sem melhoria de seu nível, para realização de tarefas de baixa qualidade, como aquecimento domiciliar. Equiparar a qualidade da fonte do uso reduziria o atual desperdício de combustíveis fósseis e daria mais tempo às sociedades para mudar para outra possível fonte de energia concentrada. Em outras palavras, o petróleo deveria ser reservado para fazer funcionar maquinário, não queimado em fornos para aquecer uma casa quando o sol poderia fazer pelo menos parte deste trabalho. 55 PRODUÇÃO E PRINCÍPIO DA MÁXIMA POTÊNCIA H.T. Odum, E.C. Odum, M.T. Brown, D. LaHart, C. Bersok, J. Sendzimir, Graeme B. Scott, David Scienceman & Nikki Meith 1 INTRODUÇÃO Produção é o processo pelo qual dois ou mais insumos são combinados para formar um novo produto. Por exemplo, nutrientes do solo, água, dióxido de carbono e luz solar são combinados para formar matéria orgânica durante a fotossíntese. Geralmente, produção industrial envolve o uso de energia, trabalho, capital e matéria prima para formar produtos industrializados. Na figura a seguir se ilustra o processo de produção. Observe o símbolo de interação em questão, no qual entram insumos e saem produtos. Sempre que este símbolo é usado, significa que esse processo de produção está ocorrendo. LEITURA COMPLEMENTAR FIGURA 1 – PROCESSO DE PRODUÇÃO COM DOIS INSUMOS QUE SE INTERATUAM FONTE: Odum et al. (1987) Durante o processo de produção, cada entrada de insumos leva energia de diferentes tipos e qualidades. Enquanto ocorre a produção, essas energias são transformadas em uma nova forma. Parte dela é degradada e perdida através de calor. Transformações de energia como essa ocorrem durante processos de produção e são denominadas trabalho. 56 2 PRODUÇÃO BRUTA E LÍQUIDA Onde há um processo de produção seguido de um processo de consumo – como na fotossíntese e respiração de plantas – devemos distinguir entre produção e produção menos sua correspondente respiração. Na Figura 1, produção bruta é a taxa real de produção de matéria orgânica. Produção bruta é o fluxo que sai do símbolo de interação (5 gramas por dia, neste caso). Produção líquida é a produção realmente observada quando produção e algo de respiração ocorrem ao mesmo tempo. Na Figura 1, a taxa bruta de produção de biomassa é 5 gramas por dia e a taxa de respiração é 3 gramas por dia. A produção líquida é igual a produção bruta menos a respiração. Portanto, a produção líquida é 2 gramas por dia. FIGURA 2 – PRODUÇÃO BRUTA E LÍQUIDA. P, PRODUÇÃO; R, RESPIRAÇÃO FONTE: Odum et al. (1987) Em sistemas mais complexos, como na floresta, onde existem várias etapas de produção e consumo, há mais de um tipo de produção líquida. Por exemplo, produção líquida de madeira, produção líquida de serrapilheira etc. A produção líquida também depende do tempo em que é medida. Por exemplo, à noite muitas plantas consomem a maior parte daquilo que produziram durante o dia. Sua produção líquida durante o dia é grande, mas sua produção líquida, incluindo a respiração de noite, é muito pequena. Se considerássemos a produçãolíquida durante um ano inteiro, seria muito pequena ou então zero. 3 FATORES LIMITANTES A maioria dos processos de produção ocorrem rapidamente quando os insumos estão disponíveis em grandes quantidades. Contudo, a velocidade de uma reação é determinada pelo reativo/ componente menos disponível. Este reativo é chamado fator limitante. Por exemplo, a luz é necessária para a fotossíntese, portanto este processo se torna mais lento e se detêm durante a noite; a luz do sol é o fator limitante que controla esse processo. 57 Na Figura 3, ainda aumentando o abastecimento de nutrientes, não aumentará a produção. Este é um exemplo de um fator limitante externo; está fora do sistema. FONTE: Odum et al. (1987) Na Figura 2, aumentando a luz, os nutrientes se tornam limitantes porque eles ficam retidos na matéria formada e não se reciclam rápido. Este é um exemplo de fator limitante interno; limita porque a reciclagem não é suficientemente rápida. Na Figura 4, estão graficados vários valores de produção em função dos nutrientes. Conforme aumentam os nutrientes, a taxa de produção aumenta. Apesar disso, conforme a luz se torna limitante, a taxa de produção reduz seu aumento. Este é um gráfico típico de fatores limitantes. Esta curva também ilustra a lei do retorno decrescente em economia. FIGURA 4 – GRÁFICO DA TAXA DE PRODUÇÃO (P) DO PROCESSO DA FIGURA 3, CONFORME OS NUTRIENTES AUMENTAM E A LUZ SE TORNA LIMITANTE FONTE: Odum et al. (1987) 4 O PRINCÍPIO DA MÁXIMA POTÊNCIA O Princípio da Máxima Potência indica porque certos modelos de organização de sistemas sobrevivem e outros não. O princípio explica por que sistemas de êxito possuem redes de organização parecidos. Um projeto que teve êxito é aquele que sobreviveu à prova do tempo. O princípio diz que: Esquemas de sistemas que sobrevivem são aqueles organizados de tal modo, que trazem energia para si o mais rápido possível e utilizam essa energia para se retroalimentar e trazer mais energia. Outro modo de expressar este princípio é: Há sobrevivência no planejamento do sistema mais adaptado; que é aquele que pode extrair para si o máximo de potência, usando-a para satisfazer suas outras necessidades. 58 Os esquemas de sistemas que maximizam o poder de transformar energia em produtos de alta qualidade são aqueles que retroalimentam para ajudar a ganhar mais energia, e a usam o mais eficientemente possível sem que o processo reduza o ritmo de sua atividade. Diagramas de ecossistemas em capítulos anteriores têm exemplos de retroalimentação que aumentam o processo de produção. Os sistemas que maximizam a potência também são sistemas que retroalimentam a um sistema maior, do qual fazem parte. Por exemplo, as espécies em um ecossistema estão organizadas para ser parcialmente responsáveis pelo uso de todo o sistema de energia. Em sistemas grandes, como a floresta, uma árvore usa energia solar para que suas folhas aumentem em tamanho e em número, e possam captar mais energia do sol. O processo da árvore auxilia o sistema da floresta, produzindo nutrientes, construindo um microclima estável, reciclando nutrientes e proporcionando comida aos animais. Assim, a árvore maximiza ambos: sua própria potência e a potência de um sistema maior ao qual pertence. Para maximizar a potência em uma atividade econômica, recursos locais são usados e modificados por recursos adicionais. Por exemplo, consideremos uma fazenda na qual a safra é plantada na melhor época do ano. Os melhores fertilizantes são utilizados e quando a safra for colhida, as pessoas a comprarão. Esta fazenda produzirá suficiente retorno financeiro para que o fazendeiro viva bem, mantenha o solo e repita o processo ano a ano. Ele também poderá expandir seu sistema comprando fazendas menos eficientes. A exitosa administração da fazenda sobreviverá e será copiada por outros fazendeiros. Devido a que seu trabalho ajuda a incrementar o consumo da energia de toda a economia, este comportamento é sustentado pela economia e sobrevive. Durante o tempo de abastecimento abundante de energia, maximizar o crescimento, maximiza a potência. Assim, durante as etapas iniciais da sequência, as comunidades incrementam sua biomassa rapidamente. Quando o abastecimento de energia é estável, máxima potência significa menos competição e um aumento na diversidade e eficiência. Como os recursos energéticos que se tornam limitantes, o desenvolvimento da eficiência através da diversidade maximiza a potência útil. Em uma floresta madura, cada organismo tem seu nicho e há pouca competição. Os organismos tendem a cooperar entre si em lugar de competir. Em um sistema econômico maduro a cooperação também é mais comum que a competição. É de esperar, então, que quando os combustíveis fósseis estejam acabando e os países corram atrás de fontes alternativas de energia, a tendência de expansão e crescimento entre eles irá diminuir. As relações entre as nações serão, então, mais pacíficas. FONTE: ODUM, H. T. et al. Ambiente, Avaliação Energética, Economia, Micro-computadores, e Políticas Públicas. Programa de Economia Ecológica, Phelps Lab, Universidade da Florida, Gainesville, Julho de 1987. Tradutores e adaptadores da versão para Internet em português: Laboratório de Engenha- ria Ecológica e Informática Aplicada (LEIA). Disponível em: http://www.unicamp.br/fea/ortega/eco/index. htm. Acesso em: 1° jul. 2021. 59 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • A energia é definida como a capacidade de executar trabalho e entra no ecossistema via fotossíntese e produção vegetal. • A primeira lei da termodinâmica, ou lei da conservação da energia, estabelece que a energia pode ser transformada de uma forma para outra, mas não pode ser criada nem destruída. • A segunda lei da termodinâmica estabelece que nenhuma transformação da energia é 100% eficiente, porque alguma parte da energia sempre será dispersada sobre a forma de calor não disponível. • Os ecossistemas e organismos são sistemas termodinâmicos abertos, em estado de não equilíbrio, que trocam energia de modo contínuo e matéria com ambiente para reduzir a entropia interna e aumentar a entropia externa. • A entrada de energia solar aciona todos os sistemas biológicos ecológicos. • A variação do fluxo de radiação solar entre os diferentes extratos do ecossistema, e de um local para o outro na superfície da Terra é enorme, e a distribuição dos organismos individuais responde da mesma forma. • Menos de 1% da energia solar é convertido em alimento e outras biomassas. • As plantas assimilam não mais do que 1/3 da energia luminosa absorvida pelos pigmentos fotossintéticos. • As plantas e os outros autótrofos fotossintetizadores formam a base de todas as cadeias alimentares, sendo então chamados de produtores primários do ecossistema. • A produtividade primária de um sistema ecológico é definida como a taxa em que a energia radiante é convertida em substâncias orgânicas pelas atividades dos organismos produtores. • A produção primária é sensível a variações na luz e na temperatura de modo que taxa de fotossíntese geralmente aumenta com a elevação da temperatura, pelo menos até determinado ponto. • A produção primária das plantas, algas e algumas bactérias forma a base das cadeias alimentares ecológicas. 60 • A quantidade de energia que alcança cada nível trófico depende da produção primária líquida na base da cadeia alimentar e das eficiências das transferências de energia em cada nível trófico acima. • A cada transferência de nível trófico, uma proporção da energia potencial é perdida como o calor. • A eficiência ecológica total da cadeia alimentar começa pela eficiência com a qual os organismos assimilam o alimento que consomem. • A energia atravessa o ecossistema em velocidades diferentes. A energia acumulada na celulose e na lignina nos troncos das árvores pode não ser reciclada por séculos. • A energia tem quantidade (calorias, joules e watts) e qualidade(eMergia). • eMergia pode ser definida como a soma da energia disponível já usada direta ou indiretamente para criar um serviço ou produto. • A luz solar é altamente dispersa para fazer funcionar um automóvel e outros serviços mais complexos sem que seja concentrada no mesmo nível da gasolina ou da eletricidade. 61 1 A energia inicialmente entra no reino biológico do ecossistema via fotossíntese e produção vegetal, o que proporciona energia para os animais e micro-organismos não fotossintetizadores. Sobre as características termodinâmicas dos ecossistemas, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Os ecossistemas e organismos são sistemas termodinâmicos fechados, em estado de equilíbrio e sem trocas de energia. b) ( ) A cada passo da transferência de energia de um organismo para o outro, uma nova parte da energia é criada, conforme a primeira lei da termodinâmica. c) ( ) A Terra não está em estado estável de energia, pois a entrada contínua do fluxo de energia do sol mantém enormes potenciais de energia e diferenças de temperatura. d) ( ) De acordo com a lei da entropia, as transformações da energia são “multidirecionais”, semelhantes ao comportamento cíclico da matéria. 2 Os organismos que estão na superfície da Terra ou perto dela são constantemente irradiados pela radiação solar e térmica das ondas longas advindas das superfícies do entorno. A energia radiante que atinge a superfície da Terra em um dia claro é por volta de 10% ultravioleta, 45% visível e 45% infravermelha. Com base no enunciado, analise as sentenças a seguir: I- A radiação solar que atinge a superfície da Terra não sofre qualquer alteração ao passar através da atmosfera, poeiras ou gases. II- Praticamente 100% da energia solar é convertido em alimento e outras biomassas. III- A radiação solar que atinge a Terra consiste de três componentes: luz visível, e dois componentes invisíveis (ondas curtas ultravioletas e ondas longas infravermelhas). Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) Somente a sentença III está correta. AUTOATIVIDADE 62 3 As plantas, algas e algumas bactérias captam a energia luminosa e a transformam em energia de ligações químicas. Este processo é chamado de produção primária e sua taxa é quantificada como produtividade primária. De acordo essa afirmação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) A produção primária independe de variações na luz e na temperatura. ( ) As plantas e os outros autótrofos fotossintetizadores formam a base de todas as cadeias alimentares, sendo então chamados de produtores primários do ecossistema. ( ) devido à grande quantidade de nutrientes, a maior produtividade terrestre do planeta está localizada nas regiões temperadas e nos polos. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – V – F. b) ( ) V – F – V. c) ( ) F – V – F. d) ( ) F – F – V. 4 A produtividade primária de um ecossistema é definida como a taxa a que a energia radiante é convertida em substâncias orgânicas pelas atividades fotossintética e quimiossintética dos organismos produtores (principalmente plantas verdes). Disserte sobre a eficiência fotossintética e quanto ela pode variar. 5 A quantidade de energia que alcança cada nível trófico depende da produção primária líquida na base da cadeia alimentar e das eficiências das transferências de energia em cada nível trófico acima. Neste contexto, disserte brevemente sobre o fluxo de energia e a eficiência de sua transferência (balanço energético). REFERÊNCIAS 63 REFERÊNCIAS AHL, V.; ALLEN, T. F. H. Hierarchy theory: a vision, vocabulary, and epistemology. New York: Columbia University Press, 1996. BERTALANFFY, L. V. Teoria Geral dos Sistemas. 3. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1968. BERTALANFFY, L. V. An outline of general systems theory. British Journal of Philosophy of Science, v. 1, p. 139-164, 1950. CADENASSO, M.L.; PICKETT, T.A. Linking Forest Edge Structure to Edge Function: Mediation of Herbivore Damage. Journal of Ecology, v. 88, p. 31-44, 2000. CAPRA, F. A teia da vida: uma nova compreensão científicados sistemas vivos. 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Cybernetics: Or control and communication in the animal and the machine. New York: The Technology Press, John Wiley & Sons Ltd., 1948. 67 COMPONENTES DO ECOSSISTEMA UNIDADE 2 — OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • estudar o comportamento e o movimento dos principais elementos constituintes da matéria entre os compartimentos vivos e não vivos do ambiente; • demonstrar que as variações no ambiente físico e a ciclagem de nutrientes são a base da diversidade dos componentes biológicos dos ecossistemas; • entender que energia e matéria são dois componentes essenciais dos ecossistemas, entretanto, o primeiro é apena consumido dentro dos sistemas biológicos, enquanto o segundo pode ser reciclado e até regenerado; • compreender como ocorre a regulação natural do ambiente para a correta gestão e uso eficiente dos recursos naturais. Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer dela, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – CICLOS BIOGEOQUÍMICOS TÓPICO 2 – VARIAÇÕES NO AMBIENTE FÍSICO E A CICLAGEM DE NUTRIENTES TÓPICO 3 – REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES NOS AMBIENTES TERRESTRES E AQUÁTICOS TÓPICO 4 – FATORES DE REGULÇÃO NOS ECOSSISTEMAS Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 68 CONFIRA A TRILHA DA UNIDADE 2! Acesse o QR Code abaixo: 69 TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Os elementos químicos, incluindo todos os elementos essenciais para a vida, diferentemente da energia, tendem a circular na biosfera em caminhos característicos permanecendo dentro do ecossistema, onde continuamente circulam entre os organismos e o ambiente físico. Esses caminhos são conhecidos como ciclos biogeoquímicos. Os materiais usados para formar um composto biológico se originam nas rochas da crosta ou na atmosfera terrestre, mas dentro do ecossistema eles são reutilizados seguidas vezes pelas plantas, animais e micróbios antes de serem perdidos em sedimentos, cursos de água ou escapar para atmosfera como os gases. Embora toda energia assimilada pelas plantas verdes seja energia “nova” recebida de fora do ecossistema, a maioria dos materiais nutritivos assimilados pelas plantas já foi utilizada antes. A amônia absorvida do solo pelas raízes poderia ter sido lixiviada de folhas em decomposição no solo da floresta no mesmo dia. O dióxido de carbono assimilado por uma planta verde poderia ter sido produzido recentemente pela respiração animal, vegetal ou microbiana. O movimento dos elementos e compostos inorgânicos essenciais para a vida pode ser convenientemente designado de ciclagem dos nutrientes. Cada ciclo de nutriente também pode ser convenientemente dividido em dois compartimentos ou estoques: (1) estoque reservatório, um componente grande, de movimento lento e, em geral, não biológico; e (2) estoque lábio ou de ciclagem, uma porção menor, porém mais ativa, que faz permuta (move-se nos dois sentidos) rapidamente entre os organismos e seu ambiente imediato. Muitos elementos têm múltiplos estoques reservatórios e alguns (como o nitrogênio) têm múltiplos estoque lábeis. Do ponto de vista da ecosfera, os ciclos biogeoquímicos se enquadram em dois grupos básicos: (1) tipos gasosos, nos quais o reservatório está na atmosfera ou na hidrosfera (oceano); e (2) tipos sedimentares, nos quais o reservatório está na crosta terrestre. A dissipação de alguma forma de energia é sempre necessária para acionar os ciclos de materiais. 70 2 TRANSFORMAÇÃO DA ENERGIA E A RECICLAGEM DOS ELEMENTOS Os organismos ajudam a transportar os elementos através dos seus ciclos dentro do ecossistema sempre que executam transformações químicas necessárias para realizar seus processos de vida (ODUM, 1968). As transformações que incorporam formas inorgânicas de elementos nas moléculas de plantas, animais e micróbios são denominadas de processos assimilativos. Um exemplo de uma transformação assimilativa de um elemento é a fotossíntese, na qual as plantas usam energia para mudar uma forma inorgânica de carbono (dióxido de carbono) numa forma orgânica de carbono encontrada nos carboidratos. Na reciclagem geral do carbono, a fotossíntese é equilibrada pela respiração, um processo desassimilativo complementar que envolve a transformação de carbono orgânico de volta à uma forma inorgânica, acompanhada pela liberação de energia. Nem todas as transformações dos elementos no ecossistema são biologicamente mediadas, nem todas envolvem assimilação líquida ou liberação de quantidades úteis de energia (ODUM; ODUM, 2000). Muitas reações químicas acontecem no ar, no solo e na água. Algumas delas, como a intemperização do leitorochoso, liberam certos elementos (potássio, fósforo e silício, por exemplo) dos compostos na rocha e os tornam disponíveis para o ecossistema. Tempestade de raios produzem pequenas quantidades de nitrogênio reduzido (amônia, NH3) a partir do nitrogênio molecular (N2) e do vapor de água (H2O) na atmosfera, a qual as plantas e os micróbios podem assimilar. Estas reações podem ter-se envolvido na origem da vida propriamente dita. Outros processos químicos e físicos, como a sedimentação de carbonato de cálcio nos oceanos, removem elementos da circulação e os incorporam nas rochas na crosta da Terra, onde podem permanecer em tocados por milênios. A maioria das transformações de energia biológica estão associadas com a oxidação e a redução bioquímica do carbono, do oxigênio, do nitrogênio e do enxofre. Em química geral, um átomo é oxidado quando ele cede elétrons, e é reduzido quando ele aceita elétrons. Num certo sentido, os elétrons transportam com eles a porção do conteúdo energético de um átomo. Nas transformações biológicas, uma oxidação libertadora de energia é acompanhada com uma redução consumidora de energia, e a energia se transfere dos reagentes numa transformação para os produtos da outra. Tais transformações em paralelo são possíveis somente quando o lado da oxidação libera pelo menos tanta energia quanto o lado da redução possa consumir. As mudanças de energia associadas com várias transformações variam amplamente dependendo dos compostos envolvidos e do número de elétrons trocados. Está na natureza do mundo físico que a energia de duas transformações raramente é igual (ODUM; BARRETT, 2008). A energia suprida por uma reação de oxidação em excesso àquela demandada por uma reação de redução comparável não pode ser usada, e é perdida na forma de calor (ODUM; ODUM, 2000). Esses desequilíbrios são responsáveis pela ineficiência termodinâmica dos processos da vida. 71 Um acoplamento típico de transformações poderia envolver a oxidação do carbono num carboidrato (glicose, por exemplo), que libera energia, e a redução do nitrogênio-nitrato em nitrogênio-amônia (que forma os blocos de construção das proteínas), o que consome energia. Isto, como muitas transformações bioquímicas, conecta uma transformação liberadora de energia com a assimilação de um elemento (nitrogênio, neste caso, exigida para o crescimento e a reprodução). Nos animais, essas transformações bioquímicas são também usadas para manter um ambiente celular e para efetuar o movimento. Algumas destas transformações envolvem muitos passos intermediários conectados junto com uma via bioquímica. As plantas executam entrada inicial de energia no ecossistema por uma redução assimilativa de carbono na qual a luz, em vez de um processo desassimilativo acoplado, serve como fonte de energia. Uma parte da energia escapa dos sistemas biológicos em cada transformação subsequente. A troca de elementos entre as partes vivas e não-vivas do ecossistema é assim conectada com o fluxo de energia pelo acoplamento da parte desassimilativa de um ciclo com a parte assimilativa de outro. 3 COMPARTIMENTOS INTERLIGADOS DOS ECOSSISTEMAS A cada transformação bioquímica, um ou mais elementos são mudados de uma forma em outra. Cada forma de um elemento em um ecossistema pode ser pensada como um compartimento separado, do qual os átomos se movimentam conforme os processos físicos e biológicos os transformam. Para Odum e Odum (2000), o ecossistema inteiro pode ser pensado como um conjunto de compartimentos entre os quais os elementos circulam (Figura 1). Por exemplo, a fotossíntese transporta carbono do compartimento de carbono inorgânico para o compartimento de formas orgânicas de carbono (assimilação); a respiração o leva de volta para o compartimento inorgânico (desassimilação). Estes modelos de compartimentos de ecossistemas podem ser organizados hierarquicamente, tendo subcompartimentos dentro de compartimentos (ODUM; ODUM, 2000). O compartimento de carbono inorgânico inclui o dióxido de carbono tanto atmosférico quanto dissolvido na água, os íons carbonato e bicarbonato dissolvidos na água, e o carbonato de cálcio, na maioria das vezes e como um precipitado na coluna de água e nos sedimentos. O compartimento de carbono orgânico também tem muitos subcompartimentos: autótrofos, animais, microrganismos e detritos. Como os organismos se alimentam uns dos outros, eles transportam carbono entre estes subcompartimentos 72 FIGURA 1 – MODELO GERAL DE COMPARTIMENTOS NO ECOSSISTEMA FONTE: Ricklefs (2009, p. 136) De acordo com a Figura 1, em cada compartimento, podemos reconhecer subcompartimentos; por exemplo, o compartimento que representa as formas orgânicas disponíveis de nutrientes é ainda mais subdivido em compartimentos ocupados por autótrofos, animais, detritos e micróbios. O movimento dos elementos dentro e entre os compartimentos frequentemente envolve energia. A fotossíntese adiciona energia ao carbono, que podemos interpretar como subindo de elevador para o segundo andar de uma casa. Ao descer pela “escada” da respiração, o carbono libera esta energia química armazenada, que um organismo pode então usar para outros propósitos. Os elementos circulam rapidamente entre estes compartimentos de ecossistemas e muito mais lentamente entre outros. O movimento de um elemento entre os organismos vivos e as formas inorgânicas ocorre em períodos que variam de uns poucos minutos até vidas inteiras de organismos, ou sua existência subsequente como detritos orgânicos (ODUM; ODUM, 1982). Tanto as formas orgânicas quanto as inorgânicas dos elementos ocasionalmente deixam a rápida circulação que ocorre nos ecossistemas para compartimentos que não estão prontamente acessíveis para os agentes de transformação. Por exemplo, o carvão, o óleo e a turfa contêm grande quantidade de carbono orgânico que foi removido da circulação nos ecossistemas, muitas vezes por muitos milhões de anos. O carbono inorgânico é tirado de circulação nos ecossistemas aquáticos pela precipitação do carbonato de cálcio, que forma camadas espessas de sedimentos marinhos que podem no fim se transformar em calcário. Essas formas de carbono são retornadas para os compartimentos de circulação rápida nos ecossistemas somente pelos lentos processos geológicos do vulcanismo, do surgimento e da erosão. 73 4 TIPOS CLÁSSICOS DE CICLOS BIOGEOQUÍMICOS Em ecologia é essencial estudar não apenas organismos e suas relações com o ambiente, mas também um ambiente não vivo básico em relação aos organismos. As duas divisões do ecossistema (biótica e abiótica) evoluem e influenciam o comportamento entre si. Dos elementos que ocorrem na natureza, sabe se que entre 30 e 40 são exigidos pelos organismos vivos (elementos essenciais). Alguns elementos, como o carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, são necessários em grandes quantidades; outros, em pequenos ou até minúsculas. Seja qual for a quantidade necessária, os elementos essenciais exibem ciclos biogeoquímicos definidos. Os elementos não essenciais (elementos não exigidos para vida), apesar de menos ligados aos organismos, também circulam e frequentemente fluem com os elementos essenciais, pelo ciclo da água, ou porque tem afinidade química com eles. Bio refere-se a organismos vivos e geo refere-se a terra. A geoquímica está interessada na composição química da Terra e na troca de elementos entre diferentes partes da crosta terrestre, bem como em sua atmosfera e oceanos, rios e outros corpos d’água. O conceito de geoquímica é atribuído ao russo Polynov (1937) e é definido como o papel dos elementos químicos na síntese e decomposição de todos os tipos de materiais, com ênfase especial no intemperismo. A biogeoquímica, teve relevância reconhecida nas monografias de Hutchinson (1944, 1948, 1950), as quais envolvem o estudo da troca de materiais entre os componentes vivos e não vivos da ecosfera (VERNADSKIJ, 1998). Fortescue (1980) revisou a geoquímica de uma perspectivaecológica e holística em termos de geoquímica da paisagem. Os resumos dos artigos chave no desenvolvimento do campo da biogeoquímica são apresentadas por Butcher et al. (1992) e Schlensinger (1997). É importante enfatizar que alguma forma de energia deve ser gasta para reciclar os materiais (fato para ser lembrado quando se trata da crescente necessidade humana de reciclar água, metais, papéis e outros materiais). Dessa forma, a ciência da ecologia humana (estudo do impacto da humanidade sobre os sistemas naturais e sua integração com eles) tornou-se um componente vital na gestão de sistemas naturais e construídos pelo homem. Os elementos na natureza quase nunca estão distribuídos de forma homogênea nem estão presentes na mesma composição química em todo ecossistema. O ser humano necessita utilizar os 40 elementos essenciais além de elementos sintéticos. A humanidade acelerou a circulação de muitos materiais de modo que processos autorreguladores que tendem manter a homeorese estão oprimidos, ao passo que os ciclos de nutrientes tendem a se tornar imperfeitos ou acíclicos, resultando na situação paradoxal de “muito pouco aqui em excesso ali”. Por exemplo, os seres humanos exploram e processam as rochas fosfatados com tamanho descuido, que passam a ocorrer altos níveis de poluição perto de mim nas Indústrias de fosfato. Então, com a mesma perspicaz miopia, os seres humanos aumentam a entrada de fertilizantes nos sistemas agrícolas pouco considerando o inevitável aumento no escoamento superficial, o que estressa os cursos de água e reduz a sua qualidade. 74 A poluição foi frequentemente definida como recursos extraviados. O objetivo da conservação dos recursos naturais no sentido mais amplo é fazer que os processos acíclicos se tornem mais cíclicos. O conceito de reciclagem deve, cada vez mais, tornar- se uma meta importante da sociedade. A reciclagem da água é um bom começo, pois seu ciclo hidrológico puder ser mantido e reparado, existem melhores chances de controle dos nutrientes que se movimentam com a água. O ciclo do nitrogênio é um exemplo de ciclo do tipo gasoso muito complexo e bem tamponado; o ciclo do fósforo é um exemplo do tipo sedimentar mais simples, menos bem tamponado e regulado. Esses dois elementos muitas vezes são fatores importantes, que limitam ou controlam a abundância de organismos. Atualmente, a superfertilização com esses dois elementos vem criando graves efeitos adversos em escala global. O ciclo do enxofre foi escolhido para ilustrar: (1) as conexões entre o ar, a água e a crosta terrestre, porque existem ciclagens ativas dentro e entre cada um desses estoques; (2) o papel-chave desempenhado por microrganismos; e (3) as complicações causadas pela poluição industrial do ar. O ciclo do carbono e o ciclo hidrológico são cruciais para vida e vem sendo afetados cada vez mais pelas atividades humanas. 4.1 O CICLO DA ÁGUA A Terra difere de outros planetas do sistema solar por ter uma grande quantidade de água, a maioria em forma líquida, que sustenta toda a vida no planeta. O ciclo da água, ou ciclo hidrológico, está ligado ao movimento e à troca de água nos seus diferentes estados físicos, que ocorre na hidrosfera. Envolve o movimento da água nos oceanos (o maior reservatório) por evaporação para atmosfera (o menor reservatório) e, posteriormente, pela precipitação (chuva) de volta para superfície da Terra, com infiltração e escoamento nos continentes e eventual retorno aos oceanos. Parte da chuva volta para o ar por evaporação e transpiração da vegetação. Este movimento permanente deve-se ao Sol, que fornece a energia para elevar a água da superfície terrestre para a atmosfera (evaporação). Cerca de 1/3 da incidência de energia solar está envolvido na condução do ciclo da água. A gravidade faz com que a água condensada precipite de volta para a superfície do planeta e que circule através da rede hidrológica agrupada em rios, até atingir os oceanos pelo escoamento superficial, ou se infiltre nos solos e nas rochas, através dos seus poros, fissuras e fraturas (escoamento subterrâneo). Nem toda a água precipitada alcança a superfície terrestre, já que uma parte, na sua queda, pode ser interceptada pela vegetação e volta a evaporar-se. andre Destacar andre Destacar 75 O movimento da água (fluxo) também varia de lugar para lugar, e vem sendo cada vez mais afetado pelas atividades humanas. Ainda que hoje a quantidade global de água na terra seja igual à da era glacial, a quantidade congelada variou muito ao longo do tempo geológico. A quantidade de água e a velocidade com que ela circula nas diferentes fases do ciclo hidrológico são influenciadas por diversos fatores como, por exemplo, a cobertura vegetal, altitude, topografia, temperatura, tipo de solo e geologia. Dois aspectos do ciclo hidrológico devem ser enfatizados: (1) evapora mais água do oceano do que retorna a ele por meio da chuva no continente e vice-versa. Em outras palavras, uma parte considerável das chuvas que sustentam os ecossistemas terrestres, incluindo a maioria da produção de alimentos, vem da água evaporada do mar; (2) as atividades humanas tendem a alterar o índice pluviométrico (por exemplo, pela pavimentação do solo, abertura e represamento de rios, compactação do solos agrícolas e desmatamento), o que reduz a recarga do importante compartimento da água subterrânea (o terceiro maior reservatório global de água), que contém cerca de 13 vezes mais água que toda água doce os lagos, rios e solos. Os maiores depósitos de água subterrânea são os aquíferos que são camadas porosas subterrâneas, frequentemente de rocha calcária, areia ou cascalho, confinados por rochas ou argilas impenetráveis que retêm a água como um tanque amplo. A água proporciona o modelo físico de reciclagem de elementos no ecossistema. A água está envolvida quimicamente na fotossíntese, mas são a evaporação, a transpiração e a precipitação que dirigem a maior parte do movimento da água através dos ecossistemas terrestres. Estes processos físicos, contudo, acoplam o movimento da água com as transformações de energia. Assim, o ciclo hidrológico global ilustra muitas características básicas dos ciclos dos elementos. A energia da luz absorvida pela água executa o trabalho da evaporação. O vapor de água tem uma energia potencial, que é a energia de separação das moléculas individuais de água umas das outras. Quando o vapor de água atmosférico se condensa para formar nuvens, as moléculas de água se agregam e a energia potencial no vapor de água é liberada como calor, que finalmente escapa da Terra na forma de radiação de ondas longas. De um ponto de vista termodinâmico, a evaporação e a condensação se assemelham à fotossíntese e à respiração. O total de água na biosfera é de cerca de 1,4 bilhões de quilômetros cúbicos ou 1.400.000 × 1018 g. É difícil lidar com um número tão grande. 1018 g de água é 1 bilhão de vezes 1 bilhão ou um quatrilhão de gramas. Cada metro cúbico contém 106 g, ou 1000 kg (1 tonelada métrica, t) de água, e assim 1018 g é 1 trilhão (1012) de toneladas métricas, isso é uma teratonelada (Tt). Números da ordem de 1018 geralmente são reservados para astronomia, mas usaremos teratoneladas como uma unidade de água global para trabalhar com poucos números zeros. andre Destacar 76 A Tabela 1 mostra que as calotas polares e as geleiras das montanhas constituem o segundo maior estoque reservatório de água. Por causa do derretimento das bolsas de gelo globais, o nível do mar aumentou gradativamente durante o século passado. Cerca da metade desse aumento se deve a expansão térmica, pois a água mais quente ocupa mais espaço que a água muito fria ou o gelo. Esse pequeno, porém, perceptível aumento no nível do mar é o sinal mais evidente da tendência de aquecimento global. TABELA 1 – ESTOQUES GLOBAIS DE ÁGUA NO PLANETA TERRA Tamanhos dos reservatórios e tempos de renovação da água doce global (H2O) Reservatório Quantidade* Tempode renovação Oceanos 1.380.000 37.000 anos Calota polar, geleiras 29.000 16.000 anos Águas subterrâneas (trocadas ativamente) 4.000 300 anos Lagos de água doce 125 10 – 100 anos Lagos salinos 104 10 – 10.000 anos Umidade do solo 67 280 dias Rios 1,32 12 – 20 dias Vapor de água atmosférico 14 9 dias *Valores expressos em teratons. INTERESSANTE 1 teraton (Teratonelada, Tt) = 1000 gigatons (Gigatoneladas, GT); 1 gigaton = 1.000 megatons (Megatonelada, Mt); 1 megaton = 1.000 quilotons (Quilotoneladas, Qt); Portanto, 1 teraton = 1.000.000 megatons ou 1.000.000.000 quilotons. Isso é 50 milhões de vezes mais poderoso do que a bomba de Nagasaki. Mais de 97% da água na biosfera se encontra nos oceanos. Sobre a superfície da Terra, a precipitação (111 Tt/ano, que é 22% do total global) excede a evaporação e a transpiração (71 Tt/ano; 16% do total global). Sobre os oceanos, a evaporação excede a precipitação por uma quantidade semelhante. Muito da água que evapora da superfície nos oceanos é transportada pelos ventos para os continentes, onde é recapturada como precipitação sobre a terra. Este fluxo líquido de vapor de água atmosférico do oceano para a terra (40 Tt/ano) é equilibrado pelo escoamento da terra através dos rios de volta para as bacias oceânicas. 77 A evaporação determina quão rápido a água se move através da biosfera. Absorção de energia radiante pela água líquida para criar vapor de água se acopla com uma fonte de energia para o ciclo hidrológico. Podemos calcular a energia que dirige o ciclo hidrológico global multiplicando o peso total de água evaporada (456 Tt/ano) pela energia exigida para evaporar 1 g de água (2,24 kj). O produto, aproximadamente 1021 kj por ano (cerca de 32 bilhões de megawatts), representa cerca de 1/4 da energia total da radiação do Sol que atinge a Terra. A condensação de vapor de água para formar precipitação libera a mesma quantidade de energia como calor. A evaporação e a precipitação estão intimamente ligadas porque a atmosfera tem uma capacidade limitada de reter vapor de água; qualquer aumento na evaporação de água para atmosfera cria um excesso de vapor e causa um igual aumento de precipitação. A quantidade de vapor de água na atmosfera em qualquer tempo corresponde a uma média de cerca de 25 mm de água espalhada uniformemente sobre a superfície da Terra. Uma média de 650 mm de chuva ou neve cai a cada ano (o fluxo de água), que é 26 vezes a quantidade média de vapor de água. Assim, o conteúdo estacionário de água na atmosfera (o compartimento atmosférico) substitui a si mesmo 26 vezes a cada ano em média (inversamente, a água tem um tempo de residência médio na atmosfera de 1/26 de um ano, ou 2 semanas). Os solos, os rios, os lagos e oceanos contêm mais de 100.000 vezes a água que existe na atmosfera. Contudo, os fluxos através de ambos os compartimentos são os mesmos, em virtude de a evaporação equilibrar a precipitação. Assim, o tempo de residência médio da água na sua forma líquida na superfície terrestre (cerca de 2.800 anos) é cerca de 100.000 vezes maior do que o tempo de residência na atmosfera. As árvores da floresta absorvem grandes quantidades de água pelas raízes, e a conduz através dos troncos, para as folhas, e a expulsa mediante poros microscópicos nas folhas, em forma de vapor. Essa saída de água se chama transpiração. A quantidade de água que flui através das árvores pelo processo de transpiração é muito maior que a pequena quantidade de água usada na fotossíntese. Parte da água da chuva se evapora antes de alcançar o solo. A soma da transpiração e da evaporação é chamada evapotranspiração. A Figura 2 mostra os fluxos e depósitos de água em um metro quadrado de um ecossistema florestal. Pouca água é armazenada (em depósito) comparada com a quantidade que flui através de todos os sistemas (chuva, lixiviação e transpiração). 78 FIGURA 2 – DIAGRAMA DO CICLO DA ÁGUA: DEPÓSITOS E FLUXOS DE ÁGUA NO ECOSSISTEMA FLORESTAL (GRAMAS DE ÁGUA/M2/ANO) FONTE: Adaptada de Odum et al. (1987) 4.2 O CICLO DO CARBONO O ciclo do carbono está intimamente relacionado ao fluxo de energia através da biosfera. O ciclo do carbono se assemelha ao ciclo hidrológico no sentido de que a energia do Sol proporciona a sua força motriz. Em nível global, os ciclos do carbono e da água são ciclos biogeoquímicos muito importantes, pois o carbono é um elemento básico da vida e a água é essencial para toda a vida. Ambos os ciclos são caracterizados por pequenos, porém muito ativos estoques reservatórios atmosféricos, que além de vulneráveis às perturbações produzidas pelo homem, podem modificar o tempo meteorológico e o clima, de forma afetar muito a vida no planeta. O ciclo do carbono é muito mais complexo, contudo, devido as várias reações químicas do carbono (RILEY, 1944). Três desses processos fazem o carbono circular através dos ecossistemas aquáticos e terrestres: (1) reações assimilativas e desassimilativas de carbono, principalmente na fotossíntese e na respiração; (2) troca de dióxido de carbono entre a atmosfera e os oceanos; e (3) sedimentação de carbonatos. 4.2.1 A fotossíntese e a respiração A fotossíntese e a respiração são as grandes reações transformadores de energia da vida. Aproximadamente 85 bilhões de toneladas métricas (85 × 1015 g) de carbono entram nessas reações em todo o mundo a cada ano (1.000.000.000 de toneladas métricas igual uma gigatonelada, Gt). Durante a fotossíntese, o carbono ganha elétrons e é reduzido. O ganho de elétrons é acompanhado por um ganho na energia química. Uma quantidade equivalente de energia é liberada pela respiração, que resulta numa perda de elétrons e numa perda de energia química. 79 Embora seja difícil estimar o carbono total na matéria orgânica dentro da biosfera, ele provavelmente atinge algo como 2.650 Gt, incluindo tanto os organismos vivos como os detritos orgânicos e os sedimentos. Assim, considerando que 85 GT de carbono são assimiladas pela fotossíntese a cada ano, o tempo de residência médio do carbono em moléculas biológicas é aproximadamente de 2.650 Gt ÷ 85 Gt por ano, o que é igual a 31 anos. 4.2.2 A troca oceano-atmosfera A segunda classe de processos de reciclagem de carbono envolve a troca física de dióxido de carbono entre a atmosfera e os oceanos, lagos e correntes de água. O dióxido de carbono se dissolve prontamente na água; os oceanos contêm cerca de 50 vezes mais CO2 do que a atmosfera. A troca através da fronteira ar-água conecta os ciclos de carbono dos ecossistemas terrestres e aquáticos. O oceano é um repositório importante para o dióxido de carbono produzido pela queima de combustíveis fósseis. Conforme o conteúdo de CO2 da atmosfera aumenta, a taxa de solução do CO2 no oceano também aumenta, reduzindo assim a taxa de aumento de CO2 na atmosfera abaixo da qual ela poderia estar na ausência da troca ar-água. Do carbono total na atmosfera na forma de dióxido de carbono (640 Gt), aproximadamente 35 Gt são assimiladas pelas plantas terrestres e 84 Gt se dissolvem nos oceanos e em outras superfícies líquidas, a cada ano. A respiração e o escape de dióxido de carbono dissolvido da água para atmosfera substituem estas quantidades. No total, o tempo de residência médio do carbono na atmosfera é de cerca de cinco anos. Por causa deste tempo de residência curto, a quantidade de dióxido de carbono na atmosfera é muito sensível à taxa de produção de CO2, aumentando muito proximamente em paralelo com a queima de combustíveis fósseis. Por volta de 1990, a queima de combustíveis fósseis contribuía com cerca de 6 Gt de carbono anualmente, equivalente a quase 1% do dióxido de carbono atmosférico total e 1/6 da assimilação total de carbono pelas plantas terrestres. 4.2.3 A Precipitação de carbonatos A terceira classe de processos de reciclagem de carbono ocorre somente em sistemas aquáticos. Ele envolve a dissolução de compostos carbonados na água e sua precipitação (deposição) como sedimentos,particularmente calcário e dolomita. Numa escala global, a dissolução e a precipitação aproximadamente se equilibram entre si, embora certas condições que favorecem a precipitação tenham levado à deposição de extensas camadas de sedimentos de carbonato de cálcio no passado. A dissolução e a deposição nos sistemas aquáticos ocorrem cerca de 100 vezes mais lentamente do que a assimilação e desassimilação por sistemas biológicos. Assim, a troca entre sedimentos 80 e a coluna de água é relativamente pouco importante para reciclagem de curto prazo do carbono no ecossistema. Localmente e por longos períodos, contudo, ela pode assumir uma importância muito maior; a maioria do carbono dos ecossistemas está aprisionada nas rochas sedimentares. Quando o dióxido de carbono se dissolve na água ele forma ácido carbônico: CO2 + H2O H2CO3. Que rapidamente se dissocia em hidrogênio, bicarbonato e íons carbonato: H2CO3 H + + HCO3 - 2H+ + CO3 2- . O cálcio, quando presente, também se equilibra com os íons carbonato para formar o carbonato de cálcio: Ca2+ + CO3 2- CaCO3 O carbonato de cálcio tem baixa solubilidade sobre a maioria das condições, e rapidamente se precipita da coluna de água para formar sedimentos. Esta sedimentação efetivamente remove carbono dos sistemas aquáticos, mas a taxa de remoção é menor que 1% da reciclagem anual de carbono nestes ecossistemas, e essa quantidade é somada de volta para a entrada dos rios, que são naturalmente um tanto ácidos e tendem a dissolver os sedimentos calcários (carbonatos). A dissolução e a dissociação podem ser afetadas localmente pelas atividades dos organismos. No sistema marinho, sob condições de PH aproximadamente neutras, o carbonato e o bicarbonato estão em equilíbrio químico: CaCO3 (insolúvel) + H2O + CO2 Ca2+ + 2 HCO3 - (solúvel). A assimilação de CO2 via fotossíntese pelas algas e plantas aquáticas muda o equilíbrio para a esquerda, resultando na formação e precipitação de carbonato de cálcio. Muitas algas excretam este carbonato de cálcio para água circundante, mas algas construtoras de recife e algas coralinas o incorporam em suas estruturas corporais duras. No sistema como um todo, quando a fotossíntese excede a respiração (assim como faz durante os blooms algais) o cálcio tende a se precipitar para fora do sistema. A produção de carbonatos no mar também forma de dióxido de carbono como subproduto, como segue: Ca+2HCO3 CaCO3 + H2O+ CO2 81 Em função da redução no pH resultante do movimento dessa reação para direita, apenas 0,6 mol de CO2 por mol de carbonato é realmente liberado nas águas do mar (e, em última instância, na atmosfera). Os recifes de corais e outros organismos calcificantes são uma fonte, não o sumidouro de CO2. O mar desempenha um importante papel no sequestro do carbono (contém 40 atmosferas de carbono, sob a forma de bicarbonato e carbono orgânico dissolvido – COD), que funcionam como importantes reservas de carbono. Portanto, o mar é um eficiente tamponador de CO2 atmosférico, pois ele e a atmosfera equilibram-se entre si. Provavelmente, esse é o mecanismo de controle básico do CO2 atmosférico. Qualquer aumento maior futuro na queima de combustíveis fósseis, bem como as futuras reduções da capacidade dos cinturões verdes em remover o CO2, certamente resultarão em aumento contínuo do conteúdo de CO2 da atmosfera. Somadas ao CO2, duas outras formas de carbono estão presentes em pequenas quantidades na atmosfera: monóxido de carbono (CO), aproximadamente 0,1 ppm, e metano (CH4), cerca de 1,6 ppm. Tanto o CO como o CH4 surgem da decomposição incompleta ou anaeróbica da matéria orgânica; na atmosfera, ambos são oxidados para CO2. Uma quantidade de CO2 igual formada por decomposição natural é injetada no ar pela queima incompleta dos combustíveis fósseis, especialmente nos escapamentos dos automóveis. O monóxido de carbono (CO), um veneno mortal para o ser humano, não é uma ameaça global, mas está se tornando um preocupante poluente das áreas urbanas quando o ar fica estagnado. As concentrações de CO acima de 100 ppm não são incomuns em áreas de intenso tráfego de automóveis (um estresse que pode resultar em doenças circulatórias e respiratórias). O metano (CH4) é um gás incolor inflamável produzido de forma natural pela decomposição de matéria orgânica por bactérias anaeróbicas, especialmente em pântanos de água doce, campos de arroz inundados e no trato digestivo de ruminantes (como gado) e cupins. É também um importante componente do gás natural, portanto, as perturbações geoquímicas associadas às minerações e perfurações de combustíveis fósseis resultam na liberação de metano. Embora seja hoje um componente muito pequeno da atmosfera (2 ppm, comparado aos 370 ppm de CO2), a concentração de metano dobrou durante o século passado, na maioria das vezes por conta das atividades do ser humano, como aterros sanitários e o uso de combustíveis fósseis. O metano é um gás de efeito estufa que, se comparado molecularmente, absorve 25 vezes mais calor que o CO2. O tempo de residência na atmosfera é de cerca de nove anos, comparado aos seis anos do CO2. Em épocas passadas, a concentração de metano na atmosfera foi mais alta que a atual. O metano tem potencial para aumentar sua contribuição para o aquecimento global. Um dos reais perigos do aquecimento global contínuo seria a ocorrência de outra “explosão de metano” causada pelo derretimento dos hidratos metano no permafrost ou no assoalho do mar, e que já está começando a acontecer na Sibéria e no Alaska (THOMAS et al., 2002). 82 4.2.4 As mudanças no ciclo do carbono através do tempo Os geólogos podem estimar as quantidades de carbono removidas da atmosfera pela matéria orgânica enterrada e pela precipitação de carbonatos em sedimentos marinhos, assim como quando estes sedimentos foram formados. Dessa informação, podem estimar a concentração original de dióxido de carbono na atmosfera e sua mudança através do tempo. Estas estimativas indicam que durante a primeira parte da era paleozoica, grosseiramente 550-400 milhões de anos antes do presente a atmosfera reteve cerca de 15 a 20 vezes mais dióxido de carbono do que no presente. Essa quantidade decresceu rapidamente no início do período Devoniano, cerca de 400 milhões de anos antes do presente, e caiu para aproximadamente seus níveis atuais 300 milhões de anos antes do presente. Este declínio foi iniciado por um aumento agudo na taxa de intemperização dos ambientes terrestres, após o desenvolvimento de florestas na terra e pela deposição de grandes acúmulos de sedimentos orgânicos que formavam a maior parte dos leitos de carvão terrestres. Em direção ao fim da era paleozoica, cerca de 250 milhões de anos antes do presente, a concentração de CO2 na atmosfera novamente aumentou para cerca de cinco vezes o seu nível atual, permanecendo alta por aproximadamente 100 milhões de anos durante o início da era Mesozoica, e vem declinando continuamente desde então. O início das eras Paleozoica e Mesozoica foram verdadeiramente tempos de efeito estufa. As temperaturas médias por toda a Terra eram altas, e a vida tropical floresceu até mesmo nas altas latitudes. O declínio do CO2 no Devoniano estabeleceu o estágio para climas mais frios e glaciações extensas e, no fim da Era Mesozoica, muito semelhantes àquelas que a Terra experimentou durante o último milhão de anos. O atual aumento no CO2 atmosférico, preocupante como ele é, não trará a Terra às condições quentes dos tempos primitivos, pelo menos não em breve. A maior parte do carbono “geológico” tirado da atmosfera primitiva da Terra está ligado aos sedimentos calcários. Este carbono é retornado para atmosfera muito lentamente conforme o calcário é conduzido abaixo das bordas das plataformas continentais, os carbonatos são transformados em dióxido de carbono sob o intenso calor e pressão no fundo da terra e o dióxido de carbono é finalmente liberadoem erupções vulcânicas. Durante a segunda metade do século XX, a concentração de CO2 na atmosfera aumentou de forma significativa, assim como outros gases de efeito estufa que refletem o calor solar de volta para a terra. O depósito atmosférico de carbono é muito pequeno, se comparado com a quantidade de carbono presente no oceano, em combustíveis fósseis e outros depósitos da litosfera. A queima de combustíveis fósseis, aliada a agricultura e ao desmatamento, vem contribuindo para o aumento contínuo de CO2 na atmosfera. A perda líquida CO2 (adição de mais CO2 na atmosfera do que é removido) na agricultura intensifica esse processo porque o CO2 fixado por cultivos (muitos deles ativos apenas uma parte do ano) não compensa o CO2 liberado do solo, especialmente em consequência de frequentes aragens. 83 A remoção de florestas pode liberar o carbono armazenado nas matas recentemente queimadas, ao que se segue, com a exposição do solo (se a terra for usada para agricultura ou desenvolvimento urbano) ocorre a liberação de carbono por meio de oxidação de húmus. Em comparação, as florestas jovens de crescimento rápido são sumidouros de carbono, portanto, o reflorestamento em larga escala pode reduzir a taxa de aquecimento global, associado ao aumento atmosférico de CO2. Antes de 1850 (ou seja, antes da revolução industrial), a concentração de CO2 na atmosfera era da ordem de 280 ppm. Durante os últimos 150 anos, o CO2 atmosférico aumentou para mais de 370 ppm. Esse aumento levou a preocupação com o efeito estufa. O efeito estufa é o aquecimento do clima na Terra atribuído ao aumento da concentração de CO2 e de outros poluentes gasosos da atmosfera. Esses gases de efeito estufa (metano, ozônio, óxido nitroso e clorofluorcarbonos) absorvem a radiação infravermelha emitida pelo aquecimento solar da Terra e refletem a maior parte dessa energia térmica de volta para a Terra, resultando no aquecimento global. A rápida oxidação do húmus e a liberação de CO2 gasoso, normalmente retido no solo, têm efeitos mais sutis, inclusive na ciclagem de outros nutrientes. Os agrônomos hoje reconhecem que devem adicionar minerais-traço aos fertilizantes para manter o rendimento em várias áreas, porque os agrossistemas não regeneram esses nutrientes tão bem como os sistemas naturais. Em termos ecológicos, os fluxos entre os estoques reservatórios e os estoques permutáveis de muitos elementos estão sendo alterados pela atual em ingerência da paisagem. Existem práticas que podem ser utilizadas para compensar, por exemplo, a promoção de treinamento e prática no plantio direto para a conservação das lavouras, que reduz o escoamento erosão do solo. Se o ser humano reconhecer o que aconteceu e aprender a compensar, tais mudanças não precisam ser prejudiciais. Recorde como atmosfera da Terra chegou a ter esses conteúdos baixos de CO2 e altos de O2 a exemplo do que estabelece a hipótese de Gaia. 4.3 O CICLO DO NITROGÊNIO O nitrogênio assume muitos estados de oxidação no seu ciclo nos ecossistemas. A fonte em última instância de nitrogênio para vida está no nitrogênio molecular (N2) na atmosfera. Essa forma de nitrogênio se dissolve com alguma extensão na água, mas está ausente da rocha nativa. Descargas elétricas convertem algum nitrogênio molecular em formas, como a amônia, que as plantas podem usar, mas a maior parte entra nas vias biológicas do ciclo do nitrogênio (figura 3) através de sua assimilação por certos microrganismos em um processo denominado fixação de nitrogênio. Embora esta via (N2 NH3) constitua somente uma pequena fração do fluxo de nitrogênio anual terrestre, a maioria do nitrogênio reciclado biologicamente pode ser rastreado de volta 84 até a fixação do nitrogênio. O estado mais reduzido do átomo do nitrogênio tem o maior potencial de energia química. Uma vez no reino biológico, o nitrogênio segue vias mais complicadas do que aquelas do carbono, porque mais formas oxidadas e reduzidas são possíveis para usar átomos de nitrogênio. FIGURA 3 – DIAGRAMA ESQUEMÁTICO DAS TRANSFORMAÇÕES DE COMPOSTOS NO CICLO DO NITROGÊNIO FONTE: Ricklefs (2009, p. 142) O elemento químico nitrogênio é essencial para todas as formas de vida e seus produtos. É um dos elementos necessários para fazer proteínas (músculos em carnes, nervos, cabelos, tendões, pele, penas, seda, leite, queijo, sementes e nozes, enzimas), e estruturas genéticas. 78% do ar é composto por gás nitrogênio, mas a maioria dos organismos não podem utilizá-lo nesta forma. O nitrogênio em seu estado gasoso pode converter-se em formas utilizáveis (nitratos, nitritos e amônia) por processos especiais que necessitam de energia. Por exemplo, os processos industriais usam combustíveis para converter o gás nitrogênio para fertilizantes nitrogenados para fazendas. A energia nos relâmpagos converte o nitrogênio em nitratos na chuva. As plantas, algas e bactérias que podem fazer isto são chamadas fixadoras de nitrogênio. Algumas plantas e árvores possuem nódulos que fixam o nitrogênio usando açúcar que é transportado desde as folhas como fonte de energia. As algas azul-esverdeadas podem fixar o nitrogênio usando a luz solar. Algumas bactérias podem fixar o nitrogênio usando matéria orgânica como fonte de energia. A Figura 4 expõe com mais detalhes a circularidade dos fluxos de nutrientes e os tipos de microrganismos exigidos para troca básica entre os organismos e o ambiente. O nitrogênio do protoplasma é decomposto de formas orgânicas para inorgânicas por uma série de bactérias de compositores, cada uma delas especializadas em uma parte específica do ciclo. Parte do nitrogênio transforma-se em amônia e nitrato, as formas mais rapidamente 85 utilizadas pelas plantas verdes. A atmosfera é composta de aproximadamente 78% de nitrogênio, é o maior reservatório e a válvula de segurança do sistema. O nitrogênio está continuamente penetrando na atmosfera pela ação de bactérias denitrificantes, e sempre voltando ao ciclo por meio da ação de microrganismos fixadores de nitrogênio (biofixação), bem como pela ação de faíscas e outras fixações físicas. As etapas, das proteínas até os nitratos, fornecem energia para o organismo pela completa degradação, ao passo que as etapas de retorno exigem energia de outras fontes, tais como matéria orgânica ou luz solar. Por exemplo, as bactérias quimiossintetizantes Nitrossomonas (que converte amônia em nitrito) e Nitrobacter (que converte nitrito em nitrato) obtém energia da degradação da matéria orgânica, ao passo que as bactérias denitrificantes e fixadoras de nitrogênio requerem energia de outras fontes para completar a suas respectivas transformações. FIGURA 4 – CIRCULAÇÃO DO NITROÊNIO ENTRE ORGANISMOS E O AMBIENTE, APRESENTANDO OS MICRORGANISMOS RESPONSÁVEIS POR ETAPAS-CHAVE FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 145) Existe também um ciclo curto, mas importante, do nitrogênio na biosfera viva, na qual os organismos heterotróficos degradam as proteínas por meio de enzimas e excretam o nitrogênio incidente sobre a forma de ureia, ácido úrico ou amônia. As bactérias especializadas adquirem energia para seu sustento oxidando amônio para nitrito e o nitrito para nitrato. Todas as três formas (amônia, nitrito e nitrato) podem ser usadas como fontes básicas de nitrogênio pelas plantas. As plantas que utilizam 86 o nitrato precisam produzir enzimas para convertê-las de volta em amônia, pois, do ponto de vista das plantas, o nitrato é uma fonte mais cara em termos de energia do que o amônio. Dessa forma, a maioria das plantas utilizará preferencialmente a amônia quando esse estiver disponível. No oceano, a fixação de nitrogênio pela bactéria verde Trichodesmium é limitada pelo ferro. Como resultado, a fixação de nitrogênio é sazonal e controlada pelo padrão de queda de partículas de poeira provenientes dos desertos do Saara e de Gobi sobre o mar (e das ressurgências ou fontes costeiras). A fixação de nitrogênio por cianobactérias pode ocorrerem formas de vida livre ou em formas simbióticas com fungos, como em certos líquens, musgos, samambaias, e ao menos com uma planta com sementes. As frondes das samambaias aquáticas flutuantes Azolla contêm pequenos poros preenchidos com Anabaena simbiótica, que fixa ativamente o nitrogênio. Por séculos, essas samambaias desempenharam um papel importante no cultivo de arroz inundado no Oriente. Antes do plantio das plântulas de arroz os campos inundados das plantações são cobertos por samambaias aquáticos que fixam nitrogênio suficiente para prover o cultivo de arroz enquanto este matura. A chave para biofixação é a enzima nitrogenase, que catalisa a quebra de N2 (Figura 4). Essa enzima também pode reduzir acetileno a etileno e, assim, fornece uma maneira conveniente de medir a fixação de nitrogênio em nódulos, solos, a água ou qualquer lugar suspeito de estar ocorrendo a fixação. O método de redução de acetileno, em conjunto com uso de traçador isotópico ¥15N, revelou que a capacidade de fixar nitrogênio é bastante difundida entre os microrganismos fotossintetizantes, quimiossintetizantes e heterotróficos. Existe até evidências de que os microrganismos crescem em folhas e epífitas em florestas tropicais úmidas, fixando apreciáveis quantidades de nitrogênio atmosférico, e parte disso poderia ser utilizada pelas próprias árvores. Em resumo, há indícios de que a fixação biológica de nitrogênio caminhe tanto para o extrato autotrófico como heterotrófico do ecossistema, e tanto nas zonas aeróbicas como nas anaeróbicas dos solos e sedimentos aquáticos. A fixação de nitrogênio é um processo particularmente caro em termos de energia, pois é necessária muita energia para quebrar a tripla ligação molecular de N2 (N≡N) de forma que possa ser convertida (com adição do hidrogênio da água) em duas moléculas de amônia (NH3). Para biofixação por bactérias do nódulo de leguminosas são necessárias em torno de 10 g de glicose (cerca de 40 kcal), proveniente de fotossintato da planta, para fixar 1 g de nitrogênio (10% de eficiência). Os fixadores de nitrogênio de vida livre são menos eficientes e podem requerer até 10 g de glicose para fixar 1 g de nitrogênio (1% de eficiência). De modo semelhante, é necessário o dispêndio de muita energia de combustíveis fósseis na fixação industrial, motivo pelo qual os fertilizantes nitrogenados, comparado em peso, é mais caro que a maioria dos outros fertilizantes. 87 Em resumo, somente os procariotes (microrganismos primitivos) podem converter biologicamente o gás nitrogênio inútil em formas de nitrogênio exigidas para construir e manter células vivas. Quando esses microrganismos formam parcerias mutuamente benéficas com plantas superiores, aumenta muito a fixação de nitrogênio. A planta fornece um ambiente estável (os nódulos da raiz ou uma cavidade na folha), que protege os micróbios do excesso de O2 (que inibe a fixação de N2) e os supre com energia de alta qualidade. Em troca, a planta obtém o suprimento de nitrogênio fixado prontamente assimilável. Essa cooperação para benefício mútuo (uma estratégia de sobrevivência muito comum nos sistemas naturais) poderia ser imitada pelos sistemas feitos pelo homem. Os fixadores de nitrogênio trabalham com mais intensidade quando o suprimento de nitrogênio no seu ambiente é baixo; adicionar fertilizante nitrogenado à plantação de leguminosas encerra a biofixação. 4.3.1 Amonificação Inicialmente, o nitrogênio reduzido (orgânico) é encontrado nas proteínas. As plantas obtêm nitrogênio do solo, ou como amônia ou como nitrato, que elas devem então reduzir para uma forma orgânica. Deste ponto, o primeiro passo no ciclo do nitrogênio é a amonificação. A amonificação envolve a decomposição de proteínas em seus componentes aminoácidos por hidrólise e a oxidação do carbono naqueles aminoácidos. Isso resulta na produção de amônia (NH3). A amonificação é executada por todos os organismos. Embora o carbono seja oxidado, liberando energia, o átomo de nitrogênio propriamente dito não é oxidado, e assim sua energia potencial não muda durante a amonificação. 4.3.2 A nitrificação e a denitrificação A nitrificação envolve a oxidação do nitrogênio, primeiro de amônia para nitrito (NO2 -), depois de nitrito para nitrato (NO3 -), durante o qual os átomos de nitrogênio são destituídos de seis elétrons, e em seguida de mais dois de seus elétrons. Estes passos de oxidação liberam muito da energia química potencial do nitrogênio orgânico. Cada passo é executado somente por bactérias especializadas: NH3 NO2 - por Nitrosomonas no solo e por Nitrosococcus nos sistemas marinhos; NO2 - NO3 - por Nitrobacter no solo e Nitrococcus nos oceanos. A via total para a nitrificação é: NH3 NO2 - NO3 - Devido a ambas as partes da nitrificação serem oxidações, elas podem ocorrer somente na presença de agentes oxidantes poderosos, tais como o oxigênio molecular que podem agir como receptores de elétrons. Contudo, em solos e sedimentos anaeróbicos alagados, em alguns fundos de água, deplecionados de oxigênio, o nitrato e o nitrito estão mais oxidados do que o ambiente circundante, e eles próprios podem agir como receptores de elétrons (oxidantes). Sob tais condições, as reações de redução são termodinamicamente favoráveis, e o nitrogênio pode ser reduzido a óxido nítrico (NO): 88 NO3 - NO2 - NO Esta reação, chamada de denitrificação, é executada por bactérias como as Pseudomonas denitraficans. A denitrificação é importante para a decomposição de matéria orgânica em solos e sedimentos deplecionados de oxigênio, mas ela também resulta na perda de nitrogênio do solo porque alguns óxidos nítricos escapam como gás. Reações químicas adicionais sobre condições redutores anaeróbias no solo e na água podem produzir nitrogênio molecular, com a consequente perda de nitrogênio da circulação biológica geral: NO N2O N2 A denitrificação pode ser uma grande causa da baixa disponibilidade do nitrogênio em sistemas marinhos. Quando restos orgânicos de plantas e animais afundam para as profundezas dos oceanos, a sua oxidação por bactérias em águas profundas e sedimentos do fundo frequentemente é executada anaerobicamente, usando o nitrato como oxidante. Isso resulta na conversão de nitrato em nitrito nos gases dissolvidos NO e N2, que não podem ser utilizados pelas algas. 4.3.3 A Fixação de nitrogênio A perda de nitrogênio prontamente disponível para os ecossistemas por denitrificação é contrabalançada pela fixação de nitrogênio. Essa redução assimilativa de nitrogênio é executada por bactérias tais como Azotobacter, que é uma espécie de vida livre; Rhizobium, que ocorre em associação simbiótica com as raízes de algumas leguminosas (membros da família das ervilhas) e de outras plantas; e cianobactérias. A enzima responsável pela fixação de nitrogênio por estes microrganismos (nitrogenase) é desativada pelo oxigênio e funciona eficientemente somente sob concentrações extremamente baixas de oxigênio. Isso explica por que as bactérias Azotobacter, vivendo livremente no solo, apresentam somente uma pequena fração da capacidade fixadora de nitrogênio das bactérias Rhizobium, que são sequestradas nos núcleos relativamente anóxicos dos nódulos radiculares. Nestes nódulos, as células radiculares infectadas por Rhizobium formam estruturas limitadas por membranas chamadas de simbiossomas, dentro das quais as bactérias são mantidas. O oxigênio dentro de um simbiossomas é mantido num nível bem baixo, de modo a não interferir na atividade da nitrogenase. Esse nível de oxigênio limitaria severamente a respiração das células das raízes das plantas, mas é adequado para respiração de Rhizobium. Embora os simbiossomas contenham pouco oxigênio livre, eles de fato têm um suprimento abundante ligado a um tipo especial de hemoglobina. Esta assim chamada hemoglobina de leguminosas tem uma alta afinidade por oxigênio e, portanto, mantém a concentraçãode oxigênio livre bem baixa enquanto proporciona um contínuo suprimento para respiração. 89 A fixação de nitrogênio prossegue pela redução do nitrogênio e, portanto, demanda energia, embora não mais do que a conversão de uma quantidade equivalente de nitrato à amônia pelas plantas. A redução de um átomo de nitrogênio molecular em amônia demanda aproximadamente a quantidade de energia liberada pela oxidação de um átomo de carbono orgânico em dióxido de carbono. Os microrganismos fixadores de nitrogênio obtêm a energia e o poder redutor que eles precisam para reduzir o N2 à NH3 oxidando açúcares ou outros compostos orgânicos. As bactérias de vida livre precisam obter essas fontes pela metabolização de detritos orgânicos no solo, em sedimentos ou na coluna de água. Suprimentos mais abundantes de energia estão disponíveis para as bactérias Rhizobium que entram em relações simbióticas com plantas, que lhes proporcionam o malato, um carboidrato de quatro carbonos produzido como um produto final da glicose. Numa escala global, a fixação do nitrogênio equilibra aproximadamente a produção de N2 por denitrificação. Estes fluxos têm uma quantidade de cerca de 2% do ciclo total do nitrogênio através do ecossistema. Numa escala local, a fixação de nitrogênio pode assumir uma importância muito maior, especialmente em habitats pobres e nitrogênio. Quando a terra é primeiro exposta à colonização pelas plantas (como, por exemplo, áreas deixadas nuas por glaciares que retrocedem ou fluxos de lava recém-formados) as espécies com capacidades fixadoras de nitrogênio dominam a vegetação colonizadora. A Figura 5 mostra o ciclo do nitrogênio em um ecossistema terrestre, de acordo com símbolos da linguagem de compartimentos e fluxo de energia de H. T. Odum. Iniciando pelos organismos fixadores de nitrogênio, o nitrogênio passa às plantas, e logo para os animais, seguindo a cadeia alimentar. Nas plantas e nos animais, o nitrogênio se encontra em forma de compostos orgânicos como as proteínas. FIGURA 5 – DIAGRAMA DO CICLO DO NITROGENIO PARA UM ECOSSISTEMA TERRESTRE (“M” REPRESENTA OS MICRORGANISMOS) FONTE: Adaptada de Odum et al. (1987) 90 O nitrogênio retorna para o solo e a água em forma de dejetos animais e pela decomposição de plantas e animais. Várias substâncias de dejetos que contém nitrogênio, como a ureia na urina, são convertidas por bactéria em amônia, nitritos e nitratos; estes são usados novamente pelas plantas para fechar o ciclo. Alguns microrganismos devolvem o nitrogênio à atmosfera como gás nitrogênio. Isto se chama desnitrificação. É possível projetar geneticamente a formação de nódulos em milho e em outros cultivos de grãos, reduzindo a necessidade de fertilizantes minerais nitrogenados e a poluição resultante, pois esta tende a escoar mais que o nitrogênio fixado organicamente. Várias empresas comerciais de genoma estão trabalhando na inclusão de genes da fixação de nitrogênio no milho. Entretanto, haveria um custo para isso, o que reduziria a produtividade, pois parte da energia utilizada para a produção primária, que de outro modo iria para a produção de grãos, seria desviada para sustentar os nódulos, conforme observado anteriormente. Além disso, alguns efeitos prejudiciais do excesso do nitrogênio têm sido noticiados ao longo das últimas décadas. A produção e utilização de fertilizantes nos cultivos de leguminosas, e a queima de combustíveis fósseis depositam, em escala mundial, aproximadamente 140 ton./ano de nitrogênio novo no solo, na água e no ar (quantidade quase igual as estimativas de nitrogênio fixado de forma natural). O esgoto humano e os excrementos de animais domésticos contribuem com, talvez, a metade desse valor. Muito pouco dessas entradas são reciclados, pois elas escapam para o solo ou cursos de água, ou são misturadas a metais pesados e outras toxinas. A maioria dos ecossistemas naturais e a maioria das espécies nativas estão adaptadas aos ambientes com baixos teores de nutrientes. O enriquecimento com nitrogênio e outros nutrientes abre as portas para espécies oportunistas do tipo “daninhas”, que estão adaptadas às condições de altos teores de nutrientes. Por exemplo, nos campos naturais em Minnesota e na Califórnia, que tem sido enriquecidos com nitrogênio, quase todas as espécies de plantas nativas foram substituídas por espécies de ervas daninhas exóticas, resultando em biodiversidade reduzida (TILMAN, 1987; 1988). Baseados em extensas evidências de campo, Tilman et al. (1997) previram que a aplicação de nitrogênio provavelmente afetaria os processos do ecossistema. Aplicações anuais de nitrogênio em fertilizantes e esgotos municipais, bem como em comunidades de campo abandonados em Ohio também reduziram significativamente a diversidade vegetal, se comparada aos lotes de controle em bases de longo prazo (BREWER et al., 1994). Qualquer coisa que seja perniciosa para os ecossistemas naturais eventualmente também se torna prejudicial para os humanos, o que muitas vezes é o caso. O excesso de componentes nitrogenados na água de abastecimento, na comida, e no ar põe a saúde humana em risco. O excesso de nitrato na água de abastecimento também pode ser causado por leguminosas exóticas: por exemplo, a introdução da leguminosa 91 acácia-negra (Leucaena leucocephala), proveniente das Filipinas, após a Segunda Guerra Mundial, envenenou as águas subterrâneas de boa parte de Guam. Em resumo, o enriquecimento por nitrogênio vem reduzindo a biodiversidade e aumentando o número de pragas e doenças no mundo, além de afetar de maneira diversa saúde humana. 4.4 O CICLO DO FÓSFORO Substâncias químicas (nutrientes) são também necessárias para os depósitos e processos de um ecossistema. Um dos nutrientes mais importantes para a construção de organismos é o fósforo. Geralmente o fósforo é mais escasso que outros nutrientes, tais como o nitrogênio e o potássio. Se o sistema florestal não reciclasse o fósforo, este poderia ficar tão escasso, que limitaria o crescimento das plantas da floresta. Da mesma forma, no ambiente marinho a reciclagem do fósforo via ação animal tem importância relativa, mas não preponderante, como veremos a seguir. O ciclo do fósforo é quimicamente descomplicado e ocorre em menor número de formas químicas. Os ecólogos têm estudado intensamente o papel do fósforo nos ecossistemas porque os organismos demandam este elemento num nível relativamente alto (embora somente cerca de 1/10 daquele do nitrogênio). O fósforo é um grande constituinte dos ácidos nucleicos, das membranas celulares, dos sistemas de transferência de energia, dos ossos e dos dentes. Acredita-se que o fósforo limita a produtividade vegetal em muitos habitats aquáticos. Os influxos de fósforo em muitos rios e lagos na forma de esgoto escoamento superficial de terras cultivadas fertilizadas pode artificialmente estimular a produção em habitats aquáticos, que podem perturbar o equilíbrio dos ecossistemas naturais e alterar a qualidade destes habitats. A poluição por detergentes portadores de fósforo foi um grande contribuinte para este problema até que detergentes alternativos livros de fósforo fossem desenvolvidos. O ciclo do fósforo tem menos passos do que o ciclo do nitrogênio porque, exceto em muitas poucas transformações microbianas, o fósforo não passa por reações de oxirredução no seu ciclo através dos ecossistemas. As plantas assimilam fósforo como íons fosfato (PO4 3-) diretamente do solo ou da água eu incorporam diretamente em compostos orgânicos diversos. Os animais eliminam o excesso de fósforo de suas dietas através da excreção de sais de fosfato pela urina; bactérias fosfatizadoras também convertem o fósforo de nitritos em íons fosfato. O fósforo não entra na atmosfera sob qualquer forma que não seja poeira, e assim o ciclo do fósforo envolve somente solo e compartimentos aquáticos do ecossistema. A acidez afeta a disponibilidade de fósforo para as plantas. Em solos ácidos o fósforo seliga fortemente a partículas de argila e forma compostos relativamente insolúveis com o ferro e alumínio. Em solos básicos, ele forma outros compostos insolúveis (por exemplo, com calcário). Quando tanto o cálcio quanto o ferro ou alumínio estão presentes sob condições aeróbicas, a concentração mais alta de fosfato dissolvido (isto é, a maior disponibilidade de fósforo) ocorre num pH entre 6 e 7. Andrea Baptista da Silva Destacar Andrea Baptista da Silva Destacar 92 Em sistemas aquáticos bem oxigenados, o fósforo prontamente forma compostos insolúveis com ferro ou cálcio e se precipita na coluna de água. Assim, sedimentos marinhos e de água doce agem como repositórios de fósforo, continuamente removendo fósforo precipitado a partir da circulação rápida no ecossistema. Os compostos fosfóricos prontamente se dissolvem e entram na coluna de água somente em sedimentos aquáticos deplecionados de oxigênio e em águas de fundo. Sob tais condições, o ferro tende a formar sulfetos solúveis em vez de compostos fosfatados insolúveis. Como mostrado na Figura 6, o fósforo, um componente necessário do protoplasma, tende a circular com componentes orgânicos na forma de fosfato (PO4), elemento que é novamente disponibilizado para as plantas. Entretanto, o grande depósito de fósforo não é o ar, mas os depósitos minerais de apatita formados em épocas geológicas passadas (isto é, na litosfera). A poeira atmosférica e aerossóis devolvem, por ano, 5 × 1012 g de fósforo (não fosfato) ao ambiente terrestre, mas o fosfato volta sempre para o mar, onde parte dele é depositado nos sedimentos rasos e parte se perde nos sedimentos profundos. FIGURA 6 – DIAGRAMA DO MODELO DO CICLO DO FÓSFORO FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 151) As aves marinhas têm papel limitado na devolução de fósforo para o ciclo (observado através depósitos de guano localizados na costa do Peru). Essa transferência de fósforo e outros materiais do mar para o continente por intermédio das aves é contínua (provavelmente na mesma taxa que ocorria no passado), mas esses depósitos de guano têm sido explorados. Embora ninhos de aves em todo lugar produzam concentrações locais de fosfato de ácido úrico, a importância global é limitada. Hoje, resgatamos fosfato das antigas jazidas fossilíferas ricas em ossos, localizadas na Flórida e na Rússia. Andrea Baptista da Silva Destacar 93 Infelizmente, as atividades humanas parecem acelerar a taxa de perda de fósforo, o que diminui esse ciclo. Embora peixes marinhos sejam capturados em abundância, estima-se que apenas cerca de 60.000 toneladas de fósforo por ano retornem ao ciclo dessa maneira, comparadas com um ou dois milhões de toneladas de fosfato que são exploradas e usadas como fertilizante (grande parte é lavada pelas chuvas e perdida). Não existe razão para a preocupação imediata com o suprimento para o uso do homem, pois as reservas conhecidas de fosfatos são enormes. No entanto, a mineração e o processamento de fosfato para fertilizantes criam graves problemas de poluição local, como evidenciado na área da baía de Tampa, na Flórida, onde existem grandes depósitos. Walsh e Steidinger (2001) sugeriram que a mineração de fosfato é, provavelmente, parte da causa das marés vermelhas na Flórida; seria outro fator a poeira do Saara, que fornece ferro para fixação Marinha de N2. A hipótese de Walsh e Steidinger (2001) é que essa poeira do Saara atinge regularmente o Golfo do México, trazendo ferro, o que estimula a floração de Trichodesmium. O nitrogênio fixado dessa forma, mais o fosfato dos depósitos da Flórida, estimulam a floração geral do fitoplâncton. Em seguida, o zooplâncton devora todo o fitoplâncton não tóxico, deixando uma maré vermelha residual de Karenia brevis, que é tóxica. Além disso, o despejo no solo de água servida e esgoto é atualmente tão comum que está se tornando uma nova forma de poluição. O excesso de fosfato dissolvido nos sistemas aquáticos resultantes da crescente entrada por escoamento de materiais urbano industriais e agrícolas é a preocupação do presente. Em última instância, o fósforo terá de ser reciclado em grande escala para evitar falta de alimentos. De todos os macronutrientes (elementos vitais exigidos em grandes quantidades para vida), o fósforo é o mais escasso em termos de abundância relativa nos depósitos disponíveis na superfície da Terra. Fluxos e depósitos que contém nutrientes ricos em fósforo (P) em um ambiente de floresta estão incluídos na Figura 7. O diagrama mostra a chuva e as rochas como fontes externas de fósforo. Diagramas parecidos podem ser desenhados para cada substância química utilizada nos processos de produção e consumo, tais como o carbono e o oxigênio. Em resumo, os diagramas simbólicos são uma forma de representar os fluxos dentro dos ecossistemas incluindo energia, água e fósforo. 94 FIGURA 7 – DIAGRAMA DO CICLO DO FÓSFORO PARA O ECOSSISTEMA FLORESTAL (VALORES EM GRAMAS/M2/ANO) FONTE: Adaptada de Odum et al. (1987) O fósforo está presente como fosfatos inorgânicos que as plantas usam para produzir compostos orgânicos necessários para a vida. O fósforo nestes compostos, participa da biomassa que regressa a formas inorgânicas mediante os consumidores, quando eles usam a biomassa como alimento. O fósforo inorgânico liberado se torna parte do depósito de nutrientes no solo. Assim, o fósforo se move em um ciclo como mostra a Figura 7. Parte flui para fora do sistema com as águas que saem pela superfície do solo ou percolam para o lençol freático. Como dito anteriormente, o fósforo não tem fase gasosa em seu ciclo. Finalmente, a interação de nitrogênio fósforo merece especial atenção. A razão N/P na biomassa média é de cerca de 16 para 1 e, em cursos da água de rios, cerca de 28 para 1. Schindler (1977) relatou experimentos nos quais fertilizantes com razões N/P diferentes foram acrescentadas em um lago. Quando a razão N/P foi reduzida para 5, as cianobactérias fixadoras de nitrogênio dominaram o fitoplâncton e fixaram nitrogênio suficiente para aumentar a razão para valores encontrados em vários lagos naturais. Schindler (1977) apresentou a hipótese de que os ecossistemas de lagos desenvolveram mecanismos naturais para compensar as deficiências em nitrogênio e carbono, mas não a deficiência em fósforo, pois este não apresenta fase gasosa. Assim a produção primária em sistemas de água doce está frequentemente correlacionada com o fósforo disponível. 95 4.5 O CICLO DO ENXOFRE O enxofre existe em muitas formas oxidadas e reduzidas. O enxofre é a parte de dois aminoácidos (cisteína e metionina) e é por isso demandado pelas plantas e animais. Todavia, a importância do enxofre no ecossistema vai muito além disso. Como o nitrogênio, o enxofre existe em muitas formas reduzidas e oxidadas, e assim segue vias químicas complexas e afeta o ciclo de outros elementos. Assim como o nitrato e o fosfato, o sulfato (SO4) é a principal forma disponível biologicamente que é reduzida pelos autótrofos e incorporada às proteínas, sendo enxofre um componente essencial de certos aminoácidos. A forma mais oxidada do enxofre é o sulfato (SO4 2-); as formas mais reduzidas são o sulfeto de hidrogênio (H2S) e as formas orgânicas de enxofre, como aquelas encontradas nos aminoácidos. Sob condições aeróbicas, a redução assimilativa de enxofre consumidora de energia (SO4 2- S orgânico) equilibra a oxidação de enxofre orgânico de volta a sulfato, que ocorre ou diretamente ou com o sulfeto (SO3 2-) como um passo intermediário. Esta oxidação ocorre quando os animais excretam o excesso de enxofre orgânico de sua dieta e quando os microrganismos decompõem detritos vegetais e animais. Sob condições anaeróbicas, como aquelas em sedimentos alagados, sulfatos, como nitratos, podem funcionar como oxidantes. Em tais ambientes redutores, as bactérias de Desulfovibrio e Desulfomonas podem usar a redução de sulfato energeticamente favorável para oxidar o carbono orgânico. O acoplamentodestas reações disponibiliza alguma energia para os organismos. O enxofre reduzido pode então ser usado por bactérias fotossintetizadoras para assimilar carbono pelas vias análogas a fotossíntese nas plantas verdes. Nesta, as reações o enxofre assume o lugar do átomo de oxigênio na água como um doador de elétrons. Em consequência, o enxofre elemental (S) se acumula, a menos que os sedimentos estejam expostos à aeração o à água oxigenada, em cujo ponto o enxofre pode ser oxidado ainda mais por bactérias químioautotróficas aeróbicas, como Thiobacillus, para sulfeto e sulfato. O destino do enxofre reduzido produzido sob condições anaeróbicas depende da disponibilidade de íons positivos. Frequentemente, o sulfeto de hidrogênio (H2S) se forma; ele escapa de sedimentos rasos e solos lodosos como um gás, tendo o cheiro característico de ovos podres. Condições anaeróbicas geralmente favorecem a redução de íons férrico (Fe3+) em íon ferroso (Fe2+), que pode se combinar com íons sulfeto para formar sulfeto de ferro (FeS). Por essa razão, os sulfetos estão comumente associados com carvão e depósitos de óleo. Quando estes materiais são expostos à atmosfera em rejeitos de minas ou queimados para energia, o enxofre reduzido se oxida (com ajuda de bactérias Thiobacillus em rejeitos de minas) em sulfato. Esse enxofre oxidado se combina com água para reduzir o ácido sulfúrico (H2SO4), que leva a chuva ácida e à drenagem ácida das minas. 96 O enxofre não é mais requerido pelo ecossistema do que o nitrogênio e fósforo, assim como não é tão limitante para o crescimento de plantas e animais. Apesar disso, o ciclo do enxofre é uma das peças-chave nos padrões gerais de produção e decomposição. Por exemplo, quando sulfetos de ferro são formados nos sedimentos, o fósforo é convertido de modo insolúvel para solúvel, como descrito na Figura 3 e, dessa maneira, entra nos depósitos disponíveis para os organismos vivos. Essa é uma ilustração de como o ciclo de um nutriente regula o ciclo do outro. A recuperação do fósforo como parte do ciclo do enxofre é mais evidenciada nos sedimentos anaeróbicos das zonas alagadas, que também são locais importantes para a reciclagem do nitrogênio e carbono. A Figura 8 enfatiza o papel-chave desempenhado pelas bactérias de enxofre especializadas, que funcionam como uma “equipe de revezamento” na ciclagem do enxofre no solo, na água doce e nos brejos. Os processos conduzidos via micróbios em zonas anaeróbicas profundas em solos e sedimentos resultam dos movimentos ascendentes de gases de sulfeto de hidrogênio (H2S) em ecossistemas terrestres e pantanosos. A decomposição das proteínas também leva a produção de sulfeto de hidrogênio. Uma vez na atmosfera, essa fase gasosa é convertida em outras formas principalmente dióxido de enxofre (SO2), sulfato (SO4), dióxido de carbono (CO2) e aerossóis de enxofre (minúsculas partículas flutuantes de SO4). Os aerossóis de enxofre, diferentemente do CO2, refletem a luz do sol de volta para o céu, contribuindo para o resfriamento global e para a chuva ácida. FIGURA 8 – CICLO DO ENXOFRE EM AMBIENTES AQUÁTICOS, COM ÊNFASE NO PAPEL DOS MICRORGANISMOS FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 152) 97 A etapa 1 é a produção primária das plantas. Outros organismos, a maioria microrganismos especializados, conduzem os passos 2 até 7: 2 = decomposição por microrganismos heterotróficos; 3 = excreção animal; 4 e 5 = bactérias de enxofre incolores, verdes e púrpuras; 6 = bactérias anaeróbicas redutoras de enxofre, Desulfovibrio; e 7 = bactérias aeróbicas sulfeto-oxidantes Thiobacillus. O passo 8 representa a conversão de fósforo de uma forma indisponível para uma forma disponível, quando os sulfuretos de ferro são formados, ilustrando como a ciclagem de um elemento vital pode afetar o outro. Ambos os ciclos, de nitrogênio e enxofre, vêm sendo cada vez mais afetados pela poluição industrial do ar. Os óxidos gasosos de nitrogênio (N2O e NO2) e enxofre (SO2), diferentes de nitratos e sulfatos, são tóxicos em diversos graus. Normalmente, eles são apenas etapas temporárias em seus respectivos ciclos (na maioria dos ambientes estão presentes em concentrações muito baixas). A queima de combustível fóssil, entretanto, aumentou muito a concentração desses óxidos voláteis no ar, em especial nas áreas urbanas e nos arredores de usinas termoelétricas, a ponto de afetar de modo prejudicial importantes componentes bióticos e processos do ecossistema. Quando plantas, peixes, aves ou micróbios são envenenados, os homens também são afetados. Esses óxidos constituem cerca de 1/3 dos poluentes atmosféricos industriais liberados no ar dos Estados Unidos. A aprovação da “Lei do Ar Limpo”, lei federal norte americana (Clean Air Act de 1970, aperfeiçoada em 1990), que estreitou os padrões de emissão, apenas reduziu o levemente os volumes. As emissões pela queima de carvão e escapamento de automóveis são as principais fontes de SO2 e SO4 e, ao lado de outras combustões industriais, são fontes importantes de formas venenosas de nitrogênio. O dióxido de enxofre é prejudicial a fotossíntese, como foi descoberto no começo da década de 1950, quando verduras, árvores frutíferas e florestas apresentaram sinais de estresse na Bahia de Los Angeles. A destruição da vegetação nos arredores de fundições de cobre é, em grande parte, causada pelo SO2. Além disso, tanto os óxidos de enxofre como os óxidos nítricos interagem com o vapor da água para produzir gotículas diluídas dos ácidos sulfúrico e nitroso (H2SO4 e H2NO3 respectivamente) que caem em forma de chuva ácida, em um desenvolvimento alarmante (LIKENS; BORMANN, 1974a; LIKENS et al., 1996; LIKENS, 2001a). A chuva ácida tem maior impacto sobre lagos ou córregos, e também sobre solos já ácidos que carecem de tamponadores de pH (como carbonatos, cálcio, sais e outras bases). O aumento da acidez (redução do pH) em alguns lagos de Adirondack tornou os incapazes de manter peixes em suas águas. A chuva ácida também se tornou um problema na Escandinávia e em outras partes do norte da Europa. De várias maneiras, a construção de alta chaminés para usinas termoelétricas a base de queima de carvão (para reduzir a poluição local do ar) agravou o problema, porque quanto mais os óxidos permanecem nas camadas de nuvens, mais ácido é formado. Esso é um típico exemplo de “quebra galho” de curto prazo que produz problemas sérios em longo prazo (precipitações locais transformaram-se em precipitações regionais). A solução e longo prazo é gasificar ou liquefazer o carvão eliminando dessa forma, as emissões. 98 Os óxidos de nitrogênio também estão ameaçando a qualidade da vida humana. Eles irritam as membranas respiratórias de animais superiores e dos humanos. Além disso, reações químicas com os outros poluentes produzem sinergismo (efeito total da interação excede a soma dos efeitos de cada substância individualmente), o que aumenta o perigo. Por exemplo, na presença de radiação ultravioleta na luz do Sol, o NO2 reage com hidrocarbonetos não queimados (emitidos em grande quantidade pelos automóveis) para produzir os smog fotoquímico, que, além de fazer os olhos lacrimejarem, pode provocar lesões pulmonares. 99 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Diferente da energia, os nutrientes são retidos dentro dos ecossistemas, onde são reciclados entre os componentes físicos e bióticos. Os caminhos que os elementos seguem através dos ecossistemas dependem das transformações químicas e biológicas, as quais dependem elas próprias da química de cada elemento, das condições físicas e químicas do ambiente e dos modos pelos quais cada elemento é usado pelos vários organismos. • O movimento de energia através dos ecossistemas segue em paralelo com as vias de vários elementos, particularmente com a do carbono, cujas transformações ou demandam ou liberam energia. • As transformações energéticas em sistemas biológicos acontecem principalmenteno curso das reações de oxidação-redução. Um oxidante é uma substância que prontamente aceita elétrons; um redutor é aquele que prontamente doa elétrons. Ao ser reduzido, um átomo ganha energia junto aos elétrons que ele aceita; ao ser oxidado, um átomo libera energia junto com os elétrons que ele cede. • O ciclo de cada elemento pode ser pensado como um movimento entre compartimentos de ecossistemas. Os grandes compartimentos são organismos vivos, detritos orgânicos, formas inorgânicas prontamente disponíveis e formas orgânicas e inorgânicas indisponíveis, a maior parte aprisionada nos sentimentos. • O ciclo da água, ou ciclo hidrológico, proporciona uma analogia física para reciclagem de elementos nos ecossistemas. A energia é consumida para evaporar a água porque as moléculas de vapor de água têm um conteúdo energético mais alto do que as moléculas de água líquida. Essa energia é liberada como calor quando o vapor de água se condensa na atmosfera para produzir precipitação. • Todos os organismos precisam do carbono orgânico como a substância principal da vida. O carbono orgânico é também grande fonte de energia da maioria dos animais e microrganismo. O carbono troca entre formas orgânicas e compartimentos inorgânicos dos ecossistemas por meio da fotossíntese e da respiração. • O ciclo do carbono envolve processos não biológicos, como a dissolução de dióxido de carbono em águas superficiais. O dióxido de carbono dissolvido entra num equilíbrio químico com os íons bicarbonato e carbonato, que, na presença de cálcio, tendem a se precipitar e a formar sedimentos. Acumulações espessas destes sedimentos marinhos podem se tornar rocha calcária. andre Destacar 100 • O nitrogênio tem muitas formas reduzidas e oxidadas, e consequentemente segue muitos caminhos através dos ecossistemas. Quantitativamente, a maior parte do nitrogênio segue o ciclo que leva do nitrato, através do nitrogênio orgânico (após assimilação pelas plantas), da amônia, do nitrito (após nitrificação por bactérias) e então de volta a nitrato (após nitrificação adicional). Os últimos dois passos são executados por certas bactérias na presença de oxigênio. • Sob condições anaeróbicas em solos e sedimentos certas bactérias podem usar nitrato no lugar de oxigênio como um agente oxidante (denitrificação): neste processo, o nitrato leva a nitrito e (por fim) ao nitrogênio molecular (n2). Esta perda de nitrogênio do ciclo biológico geral é equilibrada pela fixação de nitrogênio por alguns microrganismos. • As plantas assimilam o fósforo na forma de íons fosfato (po4 3-). A disponibilidade de fósforo varia com a acidez e o nível de oxidação do solo ou da água. A energia potencial do átomo de fósforo não muda durante a sua reciclagem através dos ecossistemas. • O enxofre é um elemento importante em habitats anaeróbicos, onde pode servir como oxidante na forma de sulfato (so4 2-) ou como a gente redutor para bactérias fotoautotróficas nas formas de enxofre elemental e sulfeto. 101 1 Os elementos químicos, incluindo todos os elementos essenciais para a vida, diferentemente da energia, tendem a circular na biosfera em caminhos característicos permanecendo dentro do ecossistema, onde continuamente circulam entre os organismos e o ambiente físico. Esses caminhos são conhecidos como ciclos biogeoquímicos. Sobre a circulações e os movimentos dos elementos nos ecossistemas, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Os elementos circulam rapidamente entre determinados compartimentos de ecossistemas e muito mais lentamente entre outros. b) ( ) Os elementos circulam sempre com a mesma velocidade entre os compartimentos de ecossistemas. c) ( ) O movimento dos elementos dentro e entre os compartimentos ocorrem sem envolver energia. d) ( ) formas orgânicas e inorgânicas dos elementos estão sempre prontamente acessíveis para os agentes de transformação. 2 Dos elementos que ocorrem na natureza, sabe se que entre 30 e 40 são exigidos pelos organismos vivos (elementos essenciais). Alguns elementos, como o carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, são necessários em grandes quantidades; outros, em pequenos ou até minúsculas. Com base nos estudos de biogeoquímica, analise as sentenças a seguir: I- A humanidade acelerou a circulação de muitos materiais de modo que processos autorreguladores que tendem manter a homeorese estão oprimidos. II- Os elementos na natureza sempre estão distribuídos de forma homogênea. III- Os elementos na natureza quase nunca estão presentes na mesma composição química em todo ecossistema. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) Somente a sentença III está correta. AUTOATIVIDADE 102 3 O nitrogênio assume muitos estados de oxidação no seu ciclo nos ecossistemas. A fonte em última instância de nitrogênio para vida está no nitrogênio molecular (N2) na atmosfera. Essa forma de nitrogênio se dissolve com alguma extensão na água, mas está ausente da rocha nativa. De acordo com o ciclo biogeoquímico do nitrogênio, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) O elemento químico nitrogênio é essencial para todas as formas de vida e seus produtos. ( ) A fixação de nitrogênio é um processo particularmente caro em termos de energia, pois é necessária muita energia para quebrar a tripla ligação molecular de N2. ( ) A produção e utilização de fertilizantes nitrogenados vem aumentando a biodiversidade e reduzindo o número de pragas e doenças no mundo. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – F. b) ( ) V – V – F. c) ( ) F – V – F. d) ( ) F – F – V. 4 Durante a segunda metade do século XX, a concentração de CO2 na atmosfera aumentou de forma significativa, assim como outros gases de efeito estufa que refletem o calor solar de volta para a Terra. O depósito atmosférico de carbono é muito pequeno, se comparado com a quantidade de carbono presente no oceano. Disserte sobre como o carbono as atividades humanas contribuem para o aumento de CO2 atmosférico. 5 A água proporciona o modelo físico de reciclagem de elementos no ecossistema. A água está envolvida quimicamente na fotossíntese, mas são a evaporação, a transpiração e a precipitação que dirigem a maior parte do movimento da água através dos ecossistemas terrestres. Neste sentido, disserte sobre como estes processos físicos, acoplam o movimento da água com as transformações de energia. 103 VARIAÇÕES NO AMBIENTE FÍSICO E A CICLAGEM DE NUTRIENTES 1 INTRODUÇÃO O ambiente físico varia amplamente ao longo da superfície da Terra. As condições de temperatura, luz, substrato, umidade, salinidade, nutrientes do solo e outros fatores moldaram as distribuições e adaptações das plantas, animais e micróbios. A Terra possui muitas zonas climáticas distintas, cujas extensões são em grande parte determinadas pela intensidade da radiação solar e pela redistribuição do calor e da umidade pelo vento e pelas correntes de água. Nas zonas climáticas, fatores geológicos, como a topografia e a composição da rocha matriz, diferenciam ainda mais o ambiente numa escala espacial mais fina. O Tópico 2 explora alguns padrões de variação importantes no ambiente físico, que são a base da diversidade dos componentes biológicos dos ecossistemas. A superfície da Terra, suas águas e a atmosfera sobre ela compõem uma gigantesca máquina de transformação de calor. Os padrões climáticos se originam à medida que a Terra absorve a energia da luz do Sol. Conforme sua superfície varia desde rocha nua até solo florestado, oceano aberto e lagos congelados, sua capacidade em absorver a luz solar também varia, criando desse modo um aquecimento e resfriamento diferencial. A energia térmica absorvida pela Terra pode acabar sendo reenviada de volta para o espaço após sofrer transformações adicionais que realizam otrabalho de evaporar as águas e causar a circulação da atmosfera e dos oceanos. Todos esses fatores criaram uma grande variedade de condições físicas que, por sua vez, promoveram a diversificação dos ecossistemas. 2 PADRÕES GLOBAIS DE TEMPERATURA E PRECIPITAÇÃO Os padrões globais de temperatura e precipitação são estabelecidos pela energia da radiação solar. O clima da terra tende a ser frio e seco na direção dos polos e quente e úmido na direção do equador terrestre. Embora existam muitas exceções a essa regra geral, o clima exibe padrões amplamente definidos. A causa fundamental da variação global no clima é a intensidade de luz do Sol no equador maior do que nas latitudes mais altas. Essa é uma simples consequência do ângulo do Sol em relação à superfície da Terra em diferentes latitudes. O Sol aquece mais a atmosfera, os oceanos e a terra quando está posicionado diretamente acima, na vertical. Um raio solar se espalha UNIDADE 2 TÓPICO 2 - 104 por uma área maior quando o Sol se aproxima do horizonte, e também viaja um caminho mais longo através da atmosfera, onde boa parte de sua energia é refletida ou absorvida pela atmosfera e reirradiada para o espaço como o calor. A posição mais alta do Sol a cada dia varia de verticalmente acima das nossas cabeças nos trópicos até próximo ao horizonte nas regiões polares; desse modo, o efeito do aquecimento do Sol diminui do equador para os polos. Os padrões de mudança na temperatura e na precipitação são tão importantes para os sistemas biológicos como as médias de longo prazo. Os ciclos periódicos no clima seguem ciclos astronômicos: a rotação da Terra sobre seu eixo causa a periodicidade diária; a rotação da lua ao redor da Terra cria os ciclos lunares na amplitude das marés; e a rotação da Terra em torno do Sol traz a mudanças das estações. O equador terrestre tem uma inclinação de 23,5° em relação ao caminho que a Terra segue em sua órbita em torno do Sol. Portanto, o Hemisfério Norte recebe mais energia solar do que o Hemisfério Sul durante o verão boreal e menos energia durante o inverno boreal. A variação sazonal na temperatura aumenta com a distância a partir do equador, especialmente no Hemisfério Norte, onde existe menos área de oceano para moderar as mudanças de temperatura. Nas altas latitudes do Hemisfério Norte, as médias mensais de temperatura variam cerca de 30 °C, com extremos de mais de 50 °C anualmente. Por exemplo, a 60° N (latitude), o mês mais frio em média é de -12 °C e o mês mais quente em média, 16 °C, uma diferença de 28 °C. As temperaturas médias dos meses mais quentes e mais frios nos trópicos são muito superiores, elas diferem por somente 2 °C ou 3 °C. A inclinação do eixo da Terra também resulta numa mudança sazonal na área próxima ao equador que recebe a maior quantidade de luz solar. Esta área situa-se no equador solar, que é o paralelo de latitude localizado diretamente sobre o zênite solar. O equador solar alcança 23,5° N e em 21 de junho e 23,5° S em 21 de dezembro. IMPORTANTE Boreal refere-se ao hemisfério norte; austral refere-se ao hemisfério sul. 2.1 CÉLULAS DE HADLEY O ar aquecido se expande, torna-se menos denso, e tende a subir. À medida que o ar se aquece, sua capacidade de reter vapor de água aumenta, e a evaporação se acelera. A taxa de evaporação de uma superfície molhada quase dobra a cada aumento de 10 °C na temperatura. O calor do Sol aquece uma massa de ar nos trópicos que sobe e finalmente se espalha para o norte e para o sul nas camadas superiores da atmosfera. Este ar é substituído por ar ao nível da superfície vindo de latitudes subtropicais. A massa 105 de ar tropical ascendente se refresca à medida que irradia o calor de volta para o espaço. No momento em que esse ar se desloca para cerca de 30° ao norte e ao sul do equador, ele já se tornou denso o suficiente para descer de volta para a superfície terrestre e se espraiar para o norte e para o sul, completando desse modo uma reciclagem de ar na atmosfera. Esse tipo de padrão de circulação é chamado de célula de Hadley. O ar quente e úmido se eleva nos trópicos, e o ar seco e frio das latitudes subtropicais se move em direção aos trópicos para substituí-lo (Figura 9). A convergência intertropical é o cinturão latitudinal no equador solar dentro do qual os ventos de superfície convergem do norte e do sul. FIGURA 9 – O AQUECIMENTO DIFERENCIADO DA SUPERFÍCIE TERRESTRE CRIA AS CÉLULAS DE CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA FONTE: Ricklefs (2009, p. 72) Uma célula de Hadley se forma em torno da Terra imediatamente ao norte do equador e outra ao sul, como um par de cinturões gigantes envolvendo o planeta. O ar que desse das células de Hadley tropicais desencadeia células de circulação atmosférica secundárias nas regiões temperadas, as quais circulam na direção oposta (células de Ferrel – Figura 9). A circulação de células de Ferrel em latitudes temperadas (grosso modo entre 30°- 60° ao norte e ao sul do equador) faz com que o ar suba a cerca de 60° N e 60° S, o que por sua vez leva à formação das células de circulação atmosférica polares. Toda essa circulação de ar é movida pelo aquecimento diferencial da atmosfera em relação a latitude. As células de circulação atmosférica se ligam umas às outras pelo ar ascendente ou descendente nas extremidades norte ou sul das células. Desse modo, o movimento diário em cada célula circulação atmosférica ajuda a desencadear a circulação das células adjacentes. 106 2.2 CONVERGÊNCIA INTERTROPICAL E O CINTURÃO SUBTROPICAL DE ALTA PRESSÃO A região dentro da qual as correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul se encontram, perto do equador, e iniciam a subida sobre o aquecimento do Sol é chamada de convergência intertropical. À medida que o ar tropical carregado de umidade sobe e começa a resfriar dentro da área de convergência, a umidade se condensa para formar nuvens e precipitação. Desse modo, os trópicos são úmidos não porque exista mais água nas latitudes tropicais do que em qualquer outro lugar, mas porque a água circula mais rapidamente através da atmosfera tropical. O efeito do aquecimento do Sol faz com que a água evapore e as massas de ar aquecidas subam; o resfriamento do ar, à medida que ele sobe e se expande, causar a precipitação, porque o ar frio possui uma capacidade menor de reter água. A massa de ar que se movimenta no alto da atmosfera para o norte e para o sul, afastando-se da convergência intertropical, já perdeu grande parte de sua água via precipitação nos trópicos. Pode ter-se resfriado, esse ar se torna mais denso e começa a descer. Essa massa descendente de ar pesado criar uma alta pressão atmosférica, razão pela qual estas regiões ao norte e ao sul do equador são conhecidas como os cinturões subtropicais de alta pressão. À medida que o ar desse e começa a se aquecer novamente nas latitudes subtropicais, sua capacidade de evaporar e reter a água aumenta. Quando o ar desce ao nível do solo e se espalha para o norte e para o sul, ele retira a umidade da Terra, criando zonas de clima árido centradas nas latitudes de cerca de 30° norte e sul do equador. Todos os grandes desertos do mundo (o Arábico, Saara, Kalahari e Namíbia, na África; ou Atacama, na América do Sul; o Mojave, Sonoran a Chihuahua, na América do Norte; e o deserto Australiano) recaem dentro dos cinturões tropicais de alta pressão. 2.3 VENTOS DE SUPERFÍCIE E SOMBRAS DE CHUVA A rotação da Terra distorce os fluxos de superfície nas células de circulação atmosféricas porque a velocidade de rotação da Terra perto do equador é mais alta do que nas latitudes superiores. Consequentemente, os fluxos de superfície são deslocados para o oeste nos trópicos, onde o ar se move para longe do equador, e para leste nas latitudes intermediárias, onde o ar se move na direção do equador. Os padrões de vento resultantes, conhecidos como os ventos alísios e correntes de jato, respectivamente (Figura 9), ajudam a distribuir o vapor de águaatravés da atmosfera. As posições das massas de terras continentais exercem um efeito secundário no padrão global de precipitação. Em uma dada a latitude qualquer, a chuva cai mais abundantemente no Hemisfério Sul porque os oceanos e lagos cobrem uma proporção maior de sua superfície (81% em comparação a 61% no Hemisfério Norte). A água se evapora mais rapidamente de superfícies expostas de água do que do solo e da 107 vegetação. Pela mesma razão, o interior de um continente geralmente experimenta menos precipitação do que em sua área costeira, simplesmente porque se situa mais longe do principal local de evaporação de água, a superfície do oceano. Além do mais, os climas costeiros (marítimos) variam menos do que os climas interiores (continentais), porque a capacidade de armazenamento de calor das águas do oceano reduz as flutuações de temperatura. Por exemplo, as temperaturas médias mensais mais quentes e mais frias perto da costa do Pacífico dos Estados Unidos em Portland, Oregon, diferem apenas 16 °C. Mais para o interior, essa variação aumenta para 18 °C em Spokane, Washington; 26 °C em Helena, Montana; e 33 °C em Bismarck, Dakota do Norte. Os padrões globais de ventos interagem com outros aspectos da paisagem para criar precipitação. As montanhas forçam o ar para cima, fazendo com que ele resfrie e perca a sua umidade como precipitação na porção a barlavento de uma cadeia montanhosa. À medida que o ar desse as encostas a sotavento e viaja através das terras baixas além, ele retira a umidade e cria ambientes áridos denominados sombras de chuvas. Os desertos da grande bacia do oeste dos Estados Unidos e o deserto de Gobi da Ásia situam-se em zonas extensas de sombras de chuva de extensas cadeias montanhosas. INTERESSANTE Relativamente a um obstáculo, barlavento é o lado de onde vem o vento, o lado que encara o vento; sotavento é o lado para onde o vento vai, ou lado protegido do vento. 3 AS CORRENTES OCEÂNICAS DISTRIBUEM O CALOR E A UMIDADE As condições físicas dos oceanos, assim como as da atmosfera, são complexas. A variação nas condições marinhas é causada pelos ventos, que impulsionam as grandes correntes de superfície dos oceanos, e pela topografia subjacente da bacia oceânica. Além disso, as correntes profundas são estabelecidas por diferenças na densidade da água do oceano causadas por variações na temperatura e na salinidade. Em grandes bacias oceânicas, a água fria circula na direção dos trópicos ao longo das costas ocidentais dos continentes, e a água quente circula na direção das latitudes temperadas ao longo das costas orientais dos continentes. A corrente fria do Peru no Oceano Pacífico oriental, que se move para o norte a partir do Oceano Antártico ao longo das costas do Chile e Peru, criam ambientes frios e secos ao longo da costa oeste da América do Sul, na sombra de chuva das Montanhas Andinas, em toda a extensão até o equador. Como resultado, as costas setentrionais do Chile e do Peru possuem alguns dos desertos mais secos da Terra. Inversamente, a corrente quente do Golfo, originando-se a partir do Golfo do México, transporta um clima ameno para bem longe no norte da Europa ocidental e Ilhas Britânicas. 108 Qualquer movimento da água para cima no oceano é chamado de ressurgência. A ressurgência ocorre onde quer que correntes superficiais venham a divergir, como no Oceano Pacífico tropical ocidental. Quando as correntes superficiais se movem para longe uma da outra (se afastam na superfície), elas tendem a puxar água (localizada imediatamente abaixo) para cima a partir das camadas inferiores. Fortes zonas de ressurgência também se estabelecem nas costas ocidentais dos continentes onde as correntes de superfície se movem na direção do equador terrestre. Uma consequência curiosa da rotação da Terra é a deflexão dessas correntes para longe das bordas continentais, o que é auxiliado pelos ventos. À medida que essa água se move para longe dos continentes, ela é substituída por água de profundidades maiores. Como as águas profundas tendem a ser ricas em nutrientes, a zonas de ressurgência são frequentemente regiões de alta produtividade biológica. As mais famosas delas sustentam os ricos pesqueiros da Corrente de Benguela, ao longo da costa oeste da África meridional, e da corrente do Peru, ao longo da costa oeste da América do Sul. 4 VARIAÇÃO SAZONAL DO CLIMA A variação sazonal do clima é causada pelo movimento do zênite solar. Nos trópicos, o movimento sazonal do equador solar para norte e para sul determina a sazonalidade da chuva. A convergência intertropical segue o equador solar, produzindo um cinturão móvel de precipitação. Portanto, a sazonalidade da chuva é mais pronunciada em extensos cinturões latitudinais situados a cerca de 20° ao norte e ao sul da linha do equador. Mérida, localizada na península de Yucatán, no México, se situa a cerca de 20° ao norte do equador. A convergência intertropical alcança Mérida apenas durante os meses de verão do Hemisfério Norte, que são a estação chuvosa daquela região. Durante o inverno, a convergência intertropical se situa bem ao sul de Mérida, e o clima local passa a estar sob influência do cinturão subtropical de alta pressão. O Rio de Janeiro, na mesma latitude de Mérida, mas ao sul do equador, tem sua estação chuvosa durante o verão do Hemisfério Sul, aproximadamente seis meses depois de Mérida. Perto do equador, em Bogotá, Colômbia, a convergência intertropical está presente duas vezes por ano, no momento dos equinócios, resultando em duas estações chuvosas com picos de chuva em abril e outubro. Desse modo, à medida que as estações mudam, as regiões tropicais estão alternadamente sob a influência da convergência intertropical, que traz chuvas pesadas, e dos cinturões subtropicais de alta pressão, que trazem céus claros. O Panamá está situado a 10° N e, assim como Mérida, possui um inverno seco com muitos ventos e um verão úmido e chuvoso. O clima do Panamá é mais úmido no lado norte (Caribe) do istmo (a direção de onde vem os ventos alísios prevalecentes) do que no lado sul (Pacífico); as montanhas interceptam a umidade que vem do lado caribenho e produzem uma sombra de chuva. As terras baixas do Pacífico são tão secas durante os meses de inverno que a maioria das árvores perde suas folhas. Florestas ressecadas e galhos nus contrastam fortemente com a floresta mais tipicamente tropical úmida que floresce durante a estação úmida. 109 Mais para o norte, fora dos trópicos, os climas passam a estar sob a influência dos ventos ocidentais que sopram nas latitudes intermediárias. Nestas regiões, as temperaturas, assim como a precipitação, variam entre o inverno e o verão. Em algumas regiões temperada (em torno de 30° N), devido às condições geográficas, a estação chuvosa de concentra apenas no verão (Deserto de Chihuahua no México); em outras regiões, o inervo apresenta as maiores precipitações 9sul da Califórnia e o deserto de Mojave); e ainda há regiões que apresentam um padrão combinado de chuvas tanto no verão quanto o inverno (deserto de Sonora). 5 O CLIMA SUSTENTA FLUTUAÇÕES IRREGULARES A maioria dos aspectos do clima parece imprevisível. Todo mundo sabe que o clima é difícil de prever com muita antecedência. Frequentemente, observamos que um determinado ano foi particularmente mais seco ou mais frio em comparação com outros. As inundações do Vale do Mississipi e a crescente intensidade dos furacões ao longo da costa leste dos Estados Unidos nos últimos anos nos alertam dos caprichos da natureza. Tais condições extremas ocorrem com pouca frequência, mas podem afetar os organismos desproporcionalmente. A rica indústria pesqueira do Peruana se desenvolve com base nos abundantes peixes das águas ricas em nutrientes da Corrente do Peru, assim como fazem algumas das maiores colônias de aves marinhas do mundo. Esta corrente marítima é uma massa de água fria que flui para o norte ao longo da costa oeste da América do Sul efinalmente se desvia para longe da costa no equador, em direção ao arquipélago de Galápagos. A norte desse ponto, águas costeiras tropicais e quentes prevalecem ao longo da costa. A cada ano, uma contracorrente quente, conhecida como El niño (“O menino” em espanhol, um nome que se refere ao menino Jesus, porque este fenômeno surge por volta da época de Natal), se move para sul ao longo da costa na direção do Peru. Em alguns anos, a contracorrente fluí com força e extensão suficientes para forçar a fria Corrente do Peru a se desviar da costa, levando com ela o suprimento alimentar de milhões de aves. Durante os anos “normais” entre os eventos de El niño, um vento constante sopra através do Oceano Pacífico central equatorial, vindo de uma área de alta pressão atmosférica centrada no Taiti, para uma área de baixa pressão centrada em Darwin na Austrália. Um evento El niño parece ser desencadeado por uma reversão das áreas de pressão (a assim chamada Oscilação Sul) e dos ventos que sopram entre elas. Em consequência, as correntes equatoriais que fluem em direção ao oeste param, ou mesmo revertem. A ressurgência na costa da América do Sul enfraquece ou cessa, e a água quente (a corrente El niño) se acumula ao longo da costa da América do Sul. Registros históricos da pressão atmosférica no Taiti em Darwin, e das temperaturas da superfície do mar na costa do Peru revelam pronunciados eventos ENOS (El niño – Oscilação Sul) a intervalos irregulares de 2 a 10 anos. 110 Os eventos El niño são frequentemente seguidos por La Niña, um período de fortes ventos alísios que acentuam as correntes oceânicas normais e a ressurgência, e trazem climas extremos de um tipo diferente do El niño para boa parte do mundo. La Niña é caracterizada por chuvas fortes em muitas regiões dos trópicos, seca nas regiões temperadas do norte, e um aumento na atividade de furacões no Oceano Atlântico norte. Os efeitos climáticos e oceanográficos de um evento ENOS se estendem por boa parte do mundo, afetando ecossistemas em áreas tão distantes como a Índia, África do Sul, Brasil e oeste do Canadá. Um evento ENOS recorde de 1982/1983 interrompeu a pesca e destruiu leitos de algas na Califórnia, gerou falhas na reprodução de aves marinhas no Oceano Pacífico central, e resultou em mortandade generalizada de corais no Panamá. A precipitação também foi dramaticamente afetada em muitos ecossistemas terrestres. Os desertos do norte do Chile, normalmente o lugar mais seco da Terra, receberam o seu primeiro registro de chuva ao longo de um século. O evento ENOS de 1982/1983 chamou atenção do mundo para os efeitos de longo alcance das mudanças oceanográficas e climáticas em muitas partes do mundo. Por exemplo, dados do Zimbabué para o período 1970-1993 mostram variações notáveis na produção de milho. Como se poderia esperar, essas variações na produção estavam correlacionadas com variações na precipitação, porém, mais surpreendentemente, elas também estavam correlacionadas com as temperaturas da superfície do mar no Oceano Pacífico tropical oriental. Esse é um exemplo dos efeitos de longo alcance dos eventos El niño de 1982/1983 e 1991/1992. Durante o El niño de 1991/1992, a precipitação foi tão alta na Grande Bacia do oeste dos Estados Unidos que o escoamento superficial praticamente dobrou o volume de água no Great Salt Lake. Isto reduziu a salinidade do lago das 100 gramas de sal por litro (g/l) usuais (cerca de três vezes a água do mar) para 50 g/l, o que causou mudanças marcantes no ecossistema do lago. A redução na salinidade permitiu que os insetos predadores se deslocassem para as partes mais rasas do lago. Os insetos comeram o “camarão-de-salina” (brine shrimp, Artemia), que se alimenta de algas e normalmente domina o ecossistema. Com as quantidades de Artemia reduzidas, as algas aumentaram dramaticamente, transformando o lago num equivalente aquático de um gramado. Alguns dos efeitos mais impressionantes dos eventos El niño são evidentes no arquipélago de Galápagos, cujas ilhas se distribuem pela linha do equador a cerca de 1000 km de distância da costa oeste do Equador (país). O clima de Galápagos é fortemente influenciado pela Corrente do Peru, que traz água fria e períodos de extrema seca às ilhas. Quando a Corrente do Peru falha durante o El niño, a água quente invade o arquipélago, disparando uma drástica deterioração dos estoques pesqueiros de água fria locais e trazendo extraordinárias quantidade de precipitação. Assim, o El niño leva ao colapso das populações de aves marinhas e leões marinhos que dependem da abundância de peixes. Em terra, às fortes chuvas resultam no crescimento da 111 vegetação e na abundância de insetos e sementes para as populações de aves e répteis que dependem desses alimentos. Esta gangorra entre escassez e abundância possui consequências importantes para a dinâmica populacional evolução dos organismos no arquipélago de Galápagos. 6 CARACTERÍSTICAS TOPOGRÁFICAS E GEOLÓGICAS Características topográficas e geológicas provocam variações locais no clima. A topografia e a geologia podem modificar o ambiente numa escala local dentro de regiões que, de outro modo, teriam clima uniforme. Em áreas montanhosas, a inclinação da terra e a sua exposição ao sol influenciam a temperatura e o teor de umidade do solo. Os solos em encostas íngremes têm boa drenagem, frequentemente causando estresse de seca para a vegetação da encosta ao mesmo tempo em que a água satura o solo nas terras baixas vizinhas. Em regiões áridas, os córregos das terras baixas e os leitos de rios sazonais podem sustentar florestas ripárias bem desenvolvidas, o que acentua a contrastante desolação do deserto circundante. No Hemisfério Norte, as encostas voltadas para o sul encaram diretamente o Sol, cujo calor e poder de ressecamento limitam a vegetação a formas arbustivas e resistentes à seca (xerófilas). As encostas adjacentes voltadas para o norte permanecem relativamente frias e úmidas e abrigam a vegetação que exige umidade (mésica). INTERESSANTE No Hemisfério Sul: no sudeste brasileiro, por exemplo, as encostas voltadas para o norte são as que recebem maior insolação, portanto mais secas, e as voltadas para o sul, menor insolação, portanto mais úmidas. A temperatura do ar diminui com altitude por cerca de 6 °C a 10 °C para cada aumento de 1.000 m na elevação, dependendo da região. Essa diminuição da temperatura, que é causada pela expansão do ar nas pressões atmosféricas mais baixas em altitudes superiores, é chamada de resfriamento adiabático. Se você subir bastante, mesmo nos trópicos, encontrará temperaturas congelantes e neves eternas. Nos lugares onde a temperatura no nível do mar é em média de 30 °C, temperaturas congelantes são alcançadas a cerca de 5.000 m, ou seja, a altitude aproximada da linha de neve nas montanhas tropicais. 112 INTERESSANTE É o caso do Parque Nacional de Itatiaia, no Rio de Janeiro (estado tipicamente tropical): nas Agulhas Negras, a uma altitude de 2.600 m, ocorrem no inverno, a noite temperaturas abaixo de 0 °C. Nas latitudes temperadas do Norte, uma queda de 6 °C de temperatura para cada 1.000 m de altitude corresponde a mesma mudança de temperatura encontrada em um aumento de 800 km na latitude. Em muitos aspectos, o clima e a vegetação das altitudes superiores lembram aqueles dos locais ao nível do mar em latitudes mais altas. Todavia, em relação a suas similaridades, os ambientes alpinos geralmente variam menos de estação para estação do que os seus correspondentes de terras baixas em altas latitudes. As temperaturas em ambientes montanhosos tropicais permanecem praticamente constantes, e algumas dessas áreas ficam livres de gelo por todo o ano, o que torna possível para muitas plantas e animais tropicais viver nos ambientes frios encontrados ali. 7 O CLIMA E A FORMAÇÃO DOS SOLOS O clima e a rocha matriz subjacente determinam a diversificação dos solos. O clima afeta as distribuições de plantase animais indiretamente através de sua influência no desenvolvimento do solo, que proporciona o substrato no qual as raízes das plantas crescem e muitos animais se enterram. As características do solo determinam sua capacidade para reter água e para tornar disponíveis os minerais necessários para o crescimento das plantas. Desse modo, sua avaliação fornece uma chave para o entendimento das distribuições das espécies vegetais e da produtividade das comunidades biológicas. O solo desafia a elaboração de uma simples definição, mas podemos descrevê-lo como a camada de material alterado quimicamente e biologicamente que recobre a rocha ou outros materiais inalterados na superfície terrestre. Ele inclui minerais derivados da rocha matriz, minerais modificados recém- formados no solo, matéria orgânica fornecida pelas plantas, ar e água dentro dos poros, raízes vivas de plantas, microrganismos, e os grandes vermes e artrópodes que fazem do solo sua casa. Um corte vertical de solo demostra a ocorrência de camadas distintas em uma seção transversal, que são chamadas de horizontes. Um perfil de solo genérico, e um tanto quanto simplificado, possui quatro grandes divisões, os horizontes (O, A, B e C). O horizonte A tem duas subdivisões A1 e A2 (tabela 2). Cinco fatores determinam as características dos solos: clima, material parental (rocha subjacente), vegetação, topografia local e, até certo ponto, idade. Os horizontes do solo revelam uma diminuição da influência dos fatores climáticos e bióticos com o aumento da profundidade. 113 TABELA 2 – PERFIL DE SOLO GENÉRICO Características dos principais horizontes do solo Horizonte do solo Características O Principalmente serapilheira orgânica morta. A maioria dos organismos do solo habitam esta camada. A1 Uma camada rica em húmus, consistindo em material orgânico parcialmente decomposto misturado com solo mineral. A2 Uma região de lixiviação extensiva de minerais do solo. Em virtude de os minerais serem dissolvidos pela água (mobilizados) nesta camada, as raízes das plantas estão concentradas aqui. B Uma região de pouco material orgânico, cuja composição química se assemelha a àquela da rocha subjacente. Os minerais de argila e os óxidos de alumínio e ferro lixiviados para fora do horizonte A2 acima são às vezes depositados aqui. C Principalmente material pouco alterado, semelhante à rocha matriz. Carbonato de cálcio e de magnésio se acumulam nesta camada principalmente em regiões secas, às vezes formando camadas duras impenetráveis. FONTE: Ricklefs (2009, p. 84) Os solos existem em um estado dinâmico, modificando-se à medida que se desenvolvem sobre rochas recentemente expostas. E mesmo depois que atingem propriedades estáveis, permanecem num estado de fluxo constante. A água do solo remove algumas substâncias; outros materiais entraram no solo a partir da vegetação com a precipitação, como a poeira que se deposita, e a partir da rocha subjacente. Quando cai pouca chuva, a rocha matriz se decompõe lentamente e a produção vegetal acrescenta poucos detritos orgânicos ao solo. Desse modo, regiões áridas possuem tipicamente solos mais rasos, com o leito rochoso se estendendo próximo à superfície. Os solos podem nem mesmo chegar a se formar nos lugares onde o leito rochoso decomposto e os detritos são erodidos tão rapidamente quanto se formam. O desenvolvimento do solo também é pequeno nos depósitos aluviais, onde as camadas de silte depositadas a cada ano pelas enchentes soterram o material mais antigo. A maioria dos solos das zonas temperadas tem profundidades intermediárias, estendendo-se a uma média de aproximadamente 1 m. Por outro lado, a formação do solo avança rapidamente nos trópicos úmidos, onde as alterações químicas da rocha matriz podem se estender a profundidades de até 100 m. 114 7.1 INTEMPERISMO O intemperismo é a alteração física e química do material rochoso próximo à superfície da terra. Esta atividade ocorre onde quer que águas superficiais penetrem. O repetido congelamento e derretimento da água nas fendas quebra fisicamente a rocha em pedaços menores expõe uma grande área da sua superfície à ação química. Alterações químicas iniciais da rocha ocorrem quando a água dissolve alguns de seus minerais mais solúveis, especialmente o cloreto de sódio (NaCl) e o sulfato de cálcio (CaSO4). Outros materiais, como os óxidos de titânio, alumínio, ferro e silício, se dissolvem menos prontamente. O intemperismo do granito exemplifica alguns processos básicos da formação do solo. Os minerais responsáveis pela textura granulosa do granito (feldspato, mica e quarto) consistem em várias combinações de óxido de alumínio, ferro, silício, magnésio, cálcio e potássio, juntamente com outros compostos menos abundantes. A chave para o intemperismo está no deslocamento de certos elementos desses minerais (notavelmente o cálcio, magnésio, sódio e o potássio) por íons hidrogênio, seguido da reorganização dos óxidos remanescentes em novos minerais. Este processo químico proporciona estrutura básica do solo. Os grãos de feldspato e mica consistem em aluminosilicatos de potássio, magnésio e ferro. Os íons hidrogênio que percolam através do granito deslocam os íons potássio e magnésio, e o ferro, o alumínio e o silício remanescentes formam materiais novos e insolúveis, principalmente partículas de argila. Essas partículas são importantes para a capacidade de retenção de água e de nutrientes dos solos. O quartzo, um tipo de sílica (SiO2), é relativamente insolúvel e, portanto, permanece mais ou menos inalterado no solo como grãos de areia. Diferentes mudanças na composição química, à medida que o granito é intemperizado a partir das rochas para o solo em diferentes regiões climáticas, mostram que eu intemperismo é mais severo sob condições tropicais de alta temperatura e precipitação. Os íons hidrogênio os envolvidos no intemperismo vêm de duas fontes. Uma delas é o ácido carbônico que se forma quando o dióxido de carbono se dissolve na água das chuvas. Em regiões não afetadas pela poluição ácida, a concentração de íons hidrogênio na água da chuva produz um pH em torno de 5. A outra fonte de íons hidrogênio é a oxidação da matéria orgânica no próprio solo. O metabolismo de carboidratos, por exemplo, produz dióxido de carbono, e a dissociação do ácido carbônico resultante gera íons hidrogênio adicionais. Na floresta de Hubbard Book (New Hampshire) que é uma bacia hidrográfica particularmente bem estudada, esse processo é responsável por cerca de 30% dos íons hidrogênio necessários para o intemperismo do leito rochoso; o restante vem da precipitação. Nos trópicos, no entanto, as fontes internas de íons hidrogênio assume maior importância e podem levar ao intemperismo mais rápido. 115 7.2 A PODZOLIZAÇÃO OCORRE EM SOLOS ÁCIDOS Sob condições amenas e temperadas de temperaturas e precipitação, os grãos de areia e partículas de argila resistem ao intemperismo e formam componentes estáveis do solo. Em solos ácidos, no entanto, as partículas de argila que retém nutrientes no solo se decompõem no horizonte A, e seus íons solúveis são transportados para baixo e depositados em horizontes inferiores. Este processo, conhecido como podzolização, reduz a fertilidade das camadas superiores do solo. Os solos ácidos ocorrem principalmente em regiões frias, onde árvores aciculadas dominam as florestas. A lenta decomposição microbiana da serapilheira depositada por árvores como os abetos, produzem ácidos orgânicos. Além disso, a chuva geralmente é maior do que a evaporação em regiões de podzolização. Sobre essas condições úmidas, uma vez que a água continuamente se move para baixo através do perfil do solo, pouco material formador de argila é transportado para cima a partir do leito rochoso intemperizado. Na América do Norte, a podzolização avança ainda mais longe para dentro das florestas de abeto, na região da Nova Inglaterra, na região dos Grandes Lagos e ao longo deuma ampla faixa ao sul e oeste do Canadá. 7.3 LATERIZAÇÃO DOS SOLOS A laterização ocorre em climas quentes e úmidos. O solo se intemperiza até grandes profundidades nos climas quentes e úmidos de muitas regiões tropicais e subtropicais. Um dos aspectos mais distintos da intemperização sob essas condições é a decomposição das partículas de argila, que resulta na lixiviação da sílica do solo fazendo com que os óxidos de ferro e de alumínio predominem no perfil do solo. Este processo é chamado de laterização, e os óxidos de ferro e alumínio dão aos solos lateríticos sua coloração característica avermelhada. Muito embora a rápida decomposição da matéria orgânica nos solos tropicais contribua para abundância de íons hidrogênio, estes são rapidamente neutralizados pela decomposição dos minerais argilosos; consequentemente, os solos lateríticos geralmente não são ácidos. A laterização é intensificada em certo solos que se desenvolvem sobre material parental deficiente em quartzo (SiO2) mas rico em ferro e magnésio (basalto, por exemplo); estes solos contêm pouca argila, no início, porque não possuem silício. Independente do material parental, o intemperismo alcança maiores profundidades e o processo de laterização avança mais longe em solos nas baixadas, como os da bacia Amazônica, onde camadas superficiais altamente intemperizadas não são transportadas pela erosão e os perfis de solo são muito antigos. 116 Uma das consequências da laterização em muitas partes dos trópicos é que a capacidade do solo em reter nutrientes é muito baixa. Sem partículas de argila e húmus para reter nutrientes minerais, eles são rapidamente lixiviados para fora do solo. Nos lugares onde o solo é profundamente intemperizado, novos minerais formados pela decomposição do material parental estão simplesmente distantes demais das camadas superficiais do solo para contribuir para sua fertilidade. Além disso, as fortes precipitações mantêm a água se movimentando para baixo através do perfil do solo, impedindo movimento para cima dos nutrientes. Em geral, quanto mais profundas as fontes básicas de nutrientes na rocha matriz inalterada, mais pobres as camadas da superfície. Solos ricos, entretanto, se desenvolvem, de fato, em muitas regiões tropicais, particularmente em áreas montanhosas onde a erosão continuamente remove as camadas superficiais de solo deplecionadas de nutrientes, em áreas vulcânicas onde o material parental de cinza e lava é frequentemente rico em Nutrientes como o potássio. A formação do solo enfatiza o papel do ambiente físico, particularmente o clima, a geologia e as formas de relevo na criação da incrível variedade de ambientes para vida que existem na superfície terrestre e em suas águas. 8 TEMPOS DE RENOVAÇÃO E DE RETENÇÃO O conceito de taxa de renovação é útil na comparação entre as taxas de troca entre diferentes compartimentos de um ecossistema após o estabelecimento de um equilíbrio pulsante. A taxa de renovação é a fração da quantidade total de uma substância em um compartimento que é liberado (ou que entra) em um dado período de tempo; o tempo de renovação é o seu recíproco (isto é, o tempo necessário para substituir a quantidade da substância igual à sua quantidade no compartimento). Por exemplo, se estão presentes mil unidades no compartimento e dez saem ou entram por hora a taxa de renovação é 10/1.000 (0,01), ou 1% por hora. O tempo de renovação seria, então, 1.000/10 ou cem horas. O tempo de residência, termo utilizado na literatura geoquímica, é um conceito semelhante ao tempo de renovação: refere-se ao tempo que uma dada quantidade de substância permanece no compartimento designado de um sistema. O fluxo ou a taxa de movimentação de nutrientes para dentro ou para fora dos estoques é mais importante que a quantidade dentro dos estoques, em especial quando se entende como um ecossistema funciona. Por exemplo, Pomeroy (1960, s.p.) comentou que “um fluxo rápido de fosfato é mais importante que a concentração na manutenção de altas taxas de produção orgânica”. As estimativas de tamanhos e tempos de renovação de reservatórios hídricos nos ciclos globais estão listadas na Tabela 1. Apesar do tempo de renovação tender a ser mais curto nos estoques menores, a relação entre o tamanho e o tempo de renovação do estoque não é linear e dependerá muito da localização do reservatório. 117 Os avanços na tecnologia de detecção, que possibilitaram medições de quantidades muito pequenas de isótopos tanto radioativos como estáveis de todos os principais elementos biogênicos, estimularam os estudos de ciclagem nos níveis de paisagem, porque esses isótopos podem ser usados como traçadores ou marcadores para acompanhar os movimentos dos materiais. 9 CICLAGEM DOS ELEMENTOS NÃO ESSENCIAIS Embora os elementos não essenciais possam ter valor pequeno ou não conhecido para um organismo ou espécie, eles frequentemente passam de um lado para o outro entre os organismos e seu ambiente, da mesma maneira como fazem os elementos essenciais. Muitos desses elementos não essenciais estão envolvidos no ciclo sedimentar geral, e alguns encontram o seu caminho para atmosfera. Vários elementos não essenciais concentram-se em certos tecidos, às vezes em função da sua semelhança química com alguns elementos vitais específicos. Os ecólogos passaram a se preocupar com a ciclagem desses elementos principalmente porque as atividades humanas envolvem vários elementos não essenciais (ODUM, 1971). De fato, todos nós devemos nos preocupar com o crescente volume dos resíduos tóxicos que são descarregados ou escapam inadvertidamente para o ambiente e contaminam os ciclos básicos dos elementos vitais. Vários animais marinhos concentram, em seus tecidos, elementos químicos que não podem remover de seus ambientes. O arsênio (um análogo ao fósforo) é um exemplo disso. Determinados organismos transformam o arsênio em uma forma química inerte que permanece armazenada em seus tecidos. Alguns elementos, como o mercúrio, são transferidos por meio da cadeia alimentar. Dessa forma, grandes animais predadores tendem a acumular grandes concentrações do elemento. Esse processo, chamado magnificação biológica (ou biomagnificação), é a razão pela qual alguns peixes, como o peixe espada e o atum, contêm quantidades de mercúrio potencialmente prejudiciais. A maioria dos elementos não essenciais tem pouco efeito em concentrações encontradas em grande parte dos ecossistemas naturais, provavelmente porque os organismos adaptaram-se à sua presença. Portanto, seu movimento biogeoquímico seria de pouco interesse, a não ser que sejam subprodutos das indústrias de mineração, de manufatura, química e agrícola, que contêm altas concentrações de metais pesados, compostos orgânicos tóxicos e outros materiais potencialmente perigosos, que muitas vezes encontram seus próprios caminhos em direção ao ambiente (ODUM, 1953). A ciclagem de todos os elementos é importante. Até os mais raros podem tornar-se biologicamente preocupantes se tomarem a forma de compostos metálicos tóxicos ou de isótopos radioativos, pois uma pequena quantidade de tais materiais (do ponto de vista biogeoquímico) pode ter um efeito biológico notável. 118 O estrôncio é um exemplo de elemento que há tempos era praticamente desconhecido, mas que hoje precisa de atenção especial, porque a sua versão radioativa é perigosa para os humanos e outros animais vertebrados. O estrôncio se comporta como o cálcio. Disso resulta que o estrôncio radioativo entrar em contato íntimo com os tecidos produtores de sangue ricos em cálcio dos nossos ossos. Cerca de 7% do total do material sedimentar que flui pelos rios é cálcio. Para cada mil átomos de cálcio, 2,4 átomos de estrôncio se movem para o mar juntamente com o cálcio. Quando o urânio sofre fissão na preparação e teste de armas nucleares e usinas termonucleares, o processo produz estrôncio-90 radioativo como produto residual (apenas mais um de uma série deprodutos da fissão que decai com lentidão). O estrôncio-90 é um material relativamente novo acrescentado a biosfera. Ele não existia na natureza antes de o átomo sofrer fissão. Pequenas quantidades de estrôncio radioativos liberadas em precipitações radioativas em testes de armas nucleares e que escapam dos reatores nucleares têm agora acompanhado o cálcio, a água e o solo para o interior das vegetações, animais, alimentos e ossos humanos. A presença de estrôncio-90 nos ossos das pessoas pode ter efeitos carcinogênicos. O césio-137 radioativo, outro perigoso produto da fissão, se comporta como o potássio e, consequentemente, circula pela cadeia alimentar. A tundra ártica é um ecossistema sujeito a precipitações radioativas por causa de testes com armas nucleares no passado. A tundra ártica recebeu entrada de materiais radioativos depois da explosão da usina nuclear de Chernobyl, em 1986. Grandes quantidades de produtos de fissão radioativa estão agora armazenadas em tanques em instalações de energia atômica. A falta de conhecimento tecnológico para processar e armazenar esses resíduos com segurança limitou o uso pacífico da energia atômica. O mercúrio é um outro exemplo de elemento natural que, em função da sua baixa concentração e baixa mobilidade, tinha impacto pequeno sobre a vida antes da era industrial. A mineração e a manufatura mudaram isso e o mercúrio, assim como outros metais pesados (como o cádmio, chumbo, cobre e zinco), são agora graves problemas de poluição (BREWER et al., 1994; BREWER; BARRETT, 1995). INTERESSANTE Algumas plantas aquáticas têm a capacidade de sequestrar e armazenar em seus tecidos grandes quantidades de metais pesados tóxicos sem se prejudicar. 119 10 CICLAGEM DE NUTRIENTES NOS TRÓPICOS O padrão de ciclagem de nutrientes nos trópicos, especialmente no trópico úmido, é diferente do padrão das zonas temperadas do norte de maneiras relevantes. Em regiões frias, uma grande porção de material orgânico e de nutrientes disponíveis está sempre situada no solo ou sedimento. Nos trópicos, uma porcentagem muito maior está localizada na biomassa e é reciclada rapidamente no interior do sistema, auxiliada por algumas adaptações biológicas para a conservação dos nutrientes, incluindo simbiose mutualística entre microrganismos e plantas. Quando essa evoluída e bem-organizada estrutura biótica é removida (por exemplo, por desmatamento), os nutrientes são rapidamente perdidos por lixiviação, sob condições de altas temperaturas e de chuva intensa, em especial nos locais em que são originalmente pobres em nutrientes. Por isso, segundo ODUM (1971), as estratégias agrícolas das zonas temperadas do norte, que envolvem a monocultura de plantas anuais de vida curta, são inapropriadas para as regiões tropicais. Assim, faz-se necessário uma urgente reavaliação ecológica da agricultura e da gestão ambiental nos trópicos, caso se queira corrigir os erros do passado evitar desastres ecológicos no futuro. Ao mesmo tempo, a rica diversidade genética de espécies e de habitat dos trópicos deve ser preservada. Agricultura itinerante em diversas partes dos trópicos funciona melhor em regiões montanhosas úmidas. Quando uma floresta na zona temperada do norte é removida, o solo retém nutrientes e mantém sua estrutura, podendo ser cultivado por agricultura convencional por vários anos, o que envolve lavrar a terra uma ou mais vezes ao ano, bem como o plantio de espécies anuais e aplicação de fertilizantes inorgânicos. Durante o inverno, as temperaturas de congelamento ajudam a retenção de nutrientes e controlam as pragas e os parasitas. Nos trópicos úmidos, entretanto, a remoção da floresta retira a capacidade da terra de reter e reciclar nutrientes (e combater pragas) por conta das altas temperaturas durante o ano todo e dos longos períodos de chuvas lixiviantes. Frequentemente, a produtividade agrícola declina com rapidez e a terra é abandonada, criando um padrão de agricultura itinerante. O controle da comunidade em geral e a ciclagem de nutrientes em particular tendem a ser mais físicos nas zonas temperadas do norte e mais biológicos nos trópicos. Em outras palavras, a maior parte dos estoques de nutrientes em regiões temperadas está no solo e na serapilheira, ao passo que nos trópicos úmidos, os estoques de nutrientes estão na biomassa. Entretanto, é preciso notar que a agricultura itinerante pode ser sustentada enquanto a densidade populacional humana for baixa (como foi o caso no passado) e rotações de longo prazo forem lentas e contínuas. O problema da agricultura itinerante não é o processo, mas a superpopulação, que torna cada vez mais necessário o desmatamento e não permite intervalos de tempo suficientemente longo para que as áreas se recomponham e sejam desmatadas de novo. Nem todas as agriculturas de latitudes tropicais estão localizadas em florestas pluviais. Por exemplo, pessoas que vivem no Peru, no Equador em Papua-Nova Guiné praticaram agricultura sustentável por séculos 120 (RAPPAPORT, 1968). Essa breve consideração simplifica em demasia a complexidade da situação, mas revela a razão ecológica básica de as áreas tropicais e subtropicais, que sustentam florestas exuberantes ou outra vegetação altamente produtiva, renderem tão pouco sob métodos convencionais de gestão agrícola de região temperada. Jordan e Herrera (1981) salientaram que o grau em que as florestas tropicais “investem”, por assim dizer, em mecanismos de reciclagem de conservação de nutrientes, depende da geologia e da fertilidade básicas do terreno. Grandes áreas de florestas tropicais (como a maioria do leste e centro da bacia amazônica) estão sobre antigos solos pré-cambrianos altamente lixiviados ou depósitos de areia pobres em nutrientes. Apesar disso, esses locais oligotróficos sustentam florestas exuberantes e produtivas, como as encontradas em locais mais eutróficos (férteis): nas montanhas de Porto Rico e Costa Rica e nos sopés das montanhas andina. As simbioses intrincadas entre os autótrofos e os heterótrofos, envolvendo microrganismos intermediários especiais, são a chave para o sucesso desses ecossistemas de tipo oligotróficos. Em resumo, os ecossistemas tropicais pobres em nutrientes são capazes de manter alta produtividade sob condições naturais por meio de uma variedade de mecanismos de conservação de nutrientes. Esses mecanismos evolutivos proporcionam a ciclagem mais direta das plantas de volta para as plantas, como que desviando do solo. Quando essas florestas cedem lugar a agricultura de grande escala ou a plantações de árvores, esses mecanismos são destruídos e a produtividade declina muito rapidamente, assim como o rendimento das lavouras. Quando as clareiras são abandonadas, a floresta se recupera aos poucos. O desenvolvimento e testes de plantas agrícolas com micorrizos bem desenvolvidas e sistemas radiculares fixadores de nitrogênio, bem como o uso mais intenso de plantas perenes, são as metas ecologicamente prudentes para as áreas de altas temperaturas e clima tropical. As culturas de arroz são bem-sucedidas nos trópicos por causa de uma característica especial desse antigo tipo de agricultura: a retenção de nutrientes. Os campos inundados de arroz vêm sendo cultivados no mesmo lugar por mais de mil anos nas Filipinas (um recorde de sucesso que poucos sistemas de agricultura convencional em uso atualmente podem reivindicar). Uma certeza é aparente: a agrotecnologia industrializada, como a praticada nas zonas temperadas do norte, não pode ser transferida sem modificações para as regiões tropicais. 11 CAMINHOS DA RECICLAGEM: O ÍNDICE DE CICLAGEM A biogeoquímica em termos dos caminhos da reciclagem é importante na medida em que a reciclagem de água e de nutrientes é um processo vital em ecossistemas e vem se tornando cada vez mais uma importante preocupação para humanidade. Cinco principais caminhos da reciclagem podem ser distinguidos: (1) por decomposição microbiana; (2) por excreçõesanimais; (3) por reciclagem direta de 121 planta para planta por simbiontes microbianos; (4) por meios físicos, envolvendo ações diretas da energia solar; (5) pelo uso de energia combustível, como a fixação industrial de nitrogênio. A reciclagem requer a dissipação de energia de alguma fonte, como matéria orgânica, radiação solar ou combustíveis fósseis. A quantidade relativa de reciclagem em diferentes ecossistemas pode ser comparada calculando-se um índice de ciclagem baseado na razão entre a soma das quantidades cicladas entre os compartimentos dentro do sistema e o fluxo total. É apropriado focar na ciclagem de nutrientes na porção biologicamente ativa do ecossistema. Lembre-se de que a mesma abordagem foi usada para energia: a energia total do ambiente foi considerada primeiro e, então, a atenção foi colocada no destino das pequenas frações de energia envolvidas na cadeia alimentar. A discussão sobre a regeneração biológica também é relevante, porque a reciclagem vem se tornando cada vez mais uma meta importante para as sociedades humanas. Uma rede alimentar microbiana, composta por bactérias, fungos e microrganismos que consomem detritos orgânicos, está presente de maneira um pouco diferente em todos os solos e águas naturais. Tanto a matéria orgânica dissolvida como a particulada no solo e na água são em parte processadas por bactérias, algumas presas às partículas e outras que flutuam livremente na água. As bactérias são ingeridas pelos protozoários, que excretam amônia e fosfato; estes por sua vez, podem ser reutilizados pelas plantas. Essa teia alimentar é frequentemente denominada caminho do detrito ou ciclo dos detritos. As medidas de taxas de renovação indicam que os nutrientes liberados pelos protozoários durante seu tempo de vida são várias vezes a quantidade de nutrientes solúveis liberados por decomposição microbiana de seus corpos após sua morte (POMEROY et al., 1963). Essas excreções incluem compostos orgânicos e inorgânicos dissolvidos de fósforo, nitrogênio e dióxido de carbono, que são diretamente aproveitáveis por produtores sem nenhuma outra degradação química por bactérias. A reciclagem direta por microrganismos simbiontes, como dinoflagelados em recifes de corais, é supostamente importante em ambientes pobres em nutrientes ou oligotróficos, como nos oceanos. A água, como temos visto, é amplamente reciclada pela ação direta da energia solar e pelos processos de intemperismo e erosão associados aos fluxos de água descendentes que trazem os elementos sedimentares dos reservatórios abióticos para dentro dos ciclos bióticos. O ser humano entra em cena na reciclagem quando gasta energia de combustível para dessalinizar água do mar, produzir fertilizantes ou reciclar o alumínio ou outros metais. 122 O trabalho de reciclagem executado de maneira mecânica ou física pode fornecer um subsídio de energia para o sistema todo. No planejamento do sistema de descarte de resíduo humano e industrial, é vantajoso incluir entradas de energia mecânica para pulverizar a matéria orgânica e, dessa forma, acelerar a taxa de decomposição. A degradação física pelas atividades de grandes mamíferos pastejadores não confinados também é importante na liberação de nutrientes de partes resistentes do detrito (MACNAUGHTON et al., 1997). A reciclagem não é um serviço gratuito. Sempre há um custo de energia. Quando a luz do Sol e matéria orgânica são as fontes de energia para o trabalho de reciclagem, os humanos não precisam pagar pelo uso dos serviços prestados pelo capital natural. Uma vez que não são interrompidos ou envenenados, os mecanismos naturais de reciclagem podem fazer a maior parte do trabalho de reciclagem de água e nutrientes. No entanto, os materiais industriais (como os metais pesados) envolvidos em manufatura são um assunto completamente diferente. Sua reciclagem custa combustível e dinheiro, mas existem poucas opções quando as provisões se tornam limitadas ou quando os resíduos põem em risco a saúde humana. 11.1 O ÍNDICE DE CICLAGEM A ciclagem dentro do ecossistema pode ser definida em relação à proporção dos materiais de entrada que circulam de um compartimento ao outro antes de sair do sistema. A fração reciclada é a soma das quantidades circulada as por meio de cada compartimento, como segue: Em que “CI” é o índice de ciclagem, “TSTc” é a parte do fluxo total do sistema reciclado e “TST” é o fluxo total do sistema. O fluxo total é definido como a soma de todas as entradas menos a variação no armazenamento no sistema, se for negativo ou, alternativamente, todas as saídas mais a variação no armazenamento se for positivo. Finn (1978) calculou o índice de ciclagem para o cálcio na bacia hidrográfica de Hubbard Brook e obteve um valor entre 0,76 e 0,80. Isso significa que cerca de 80% do fluxo total do cálcio é reciclado. Os índices de ciclagem foram até maiores para o potássio e o nitrogênio. Os nutrientes nessa bacia hidrográfica parecem se reciclar na seguinte ordem de eficiência (do CI mais alto para o mais baixo): K > Na > N > Ca > P > Mg > S. Essa ordenação se relaciona com a entrada de cada elemento de fora do sistema, bem como a mobilidade do elemento e os requisitos biológicos da biota. Os índices de ciclagem são geralmente baixos para os elementos não essenciais, como o chumbo, ou para elementos essenciais que são requeridos em pequenas quantidades em relação a sua disponibilidade, como o cobre. Os elementos que as sociedades humanas consideram 123 valiosos, como a platina e ouro, são 90% ou mais reciclados. Como seria de esperar, o índice de ciclagem para energia (fluxo de calorias) é zero, porque como enfatizado anteriormente, por conta da segunda lei da termodinâmica, a energia passa direto pelo sistema e não pode circular. 11.2 RECICLAGEM DE PAPEL O papel fornece um excelente exemplo de como a reciclagem se desenvolve em sistemas urbanos-indústrias de maneira paralela à reciclagem de materiais importantes em sistemas naturais. A reciclagem nos ecossistemas naturais, como medido pelo índice de ciclagem, aumenta conforme os componentes bióticos do ecossistema se tornam maiores e mais complexos, o que ocorre à medida que os recursos nos ambientes de entrada se tornam escassos, ou ainda conforme os produtos residuais se acumulam no ambiente de saída em detrimento da vida dentro do ecossistema. Enquanto havia fartura de árvores, fábricas de papéis e terras devolutas para o descarte de papel usado, havia pouco incentivo fluindo pelos sistemas urbano- indústrias para investir em instalações e energia para reciclar o papel. Entretanto, conforme os arredores das cidades vão ficando congestionados, o valor dos terrenos sobe, tornando cada vez mais difícil e caro manter aterros sanitários ou locais para descarte. A pressão vem dos ambientes de entrada, quando suprimentos de madeira para polpa ou as produções das usinas de papel começaram a cair aquém da demanda. Nos dois casos isso foi a causa para considerar a reciclagem. Precisa existir um mercado (as usinas de reciclagem) de jornal e de papelão usados para o sucesso da reciclagem de papel. Tais usinas representam o mecanismo de reciclagem de economia de energia similar às estruturas dissipativas encontradas nos ecossistemas naturais, como as florestas e os recifes de coral. 124 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Os padrões globais de temperatura e precipitação resultam de aportes diferenciados de radiação solar em diferentes regiões e da redistribuição de energia térmica pelos ventos e correntes oceânicas. Os aspectos relevantes do clima terrestre compreende uma faixa de clima quente e úmido ao longo do equador e faixas de clima seco a cerca de 30° de latitude norte sul.inserir o texto aqui. • Avaliação no ambiente marinho é determinada em escala global pelas principais correntes oceânicas. Essas correntes redistribuir o calor pela superfície terrestre e afetam em grande parteos climas na terra. Correntes de ressurgência, causadas pelos ventos, pela topografia da bacia oceânica e por variações na densidade da água relacionadas a temperatura e salinidade, traz em água fria e rica em nutrientes para superfície em algumas áreas. • A sazonalidade dos ambientes terrestres é causada pela progressão anual do equador solar para o norte e para o sul e pelo movimento latitude now de cinturões associados de temperatura, vento e precipitação. Em altas latitudes, assista ações são expressas principalmente como ciclos anuais de temperatura; nos trópicos, a sazonalidade da precipitação é mais pronunciada. • Variações irregulares e imprevisíveis no clima, como os eventos de e n os, podem causar grandes mudanças na temperatura e na precipitação e romper com a estrutura das comunidades biológicas numa escala global. • A topografia e a geologia sobrepõem variações locais das condições ambientais aos padrões climáticos mais gerais. As montanhas interceptam a precipitação querendo sombras de chuvas áridas em suas encostas de só está vento. As condições nas altitudes superiores lembram as condições das latitudes superiores. • As características do solo refletem as influências do leito rochoso subi já senti e do clima e da vegetação acima dele. O intemperismo da rocha matriz resulta na decomposição de alguns dos seus minerais e em sua reconstituição em partículas de argila, que se misturam com detritos orgânicos que entrou no solo a partir da superfície. Esses processos de gradação vertical geralmente resultam em destino dos horizontes de solo. • Em solos ácidos (pode solicitados) de regiões frias e úmidas da zona temperada e nos solos tropicais profundamente em tem pery exatos (lateral usados), as partículas de argila se decompõem e a fertilidade do solo é bastante reduzida. 125 • Os ecossistemas tropicais pobres em nutrientes são capazes de manter alta produtividade sob condições naturais por meio de uma variedade de mecanismos de conservação de nutrientes. Esses mecanismos evolutivos proporcionam a ciclagem mais direta das plantas de volta para as plantas 126 1 Os padrões globais de temperatura e precipitação são estabelecidos pela energia da radiação solar. O clima da terra tende a ser frio e seco na direção dos polos e quente e úmido na direção do equador terrestre. Sobre a circulação atmosférica e padrões globais de ventos, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A região dentro da qual as correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul se encontram, perto do equador, e iniciam a subida sobre o aquecimento do Sol é chamada de células de Hadley. b) ( ) A região dentro da qual as correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul se encontram, perto do equador, e iniciam a subida sobre o aquecimento do Sol é chamada de convergência intertropical. c) ( ) As correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul é chamada de células de Ferrel d) ( ) A região das correntes superficiais de ar dos trópicos é chamada de correntes de jato. 2 A variação nas condições marinhas é causada pelos ventos, que impulsionam as grandes correntes de superfície dos oceanos, e pela topografia subjacente da bacia oceânica. Além disso, as correntes profundas são estabelecidas por diferenças na densidade da água do oceano causadas por variações na temperatura e na salinidade. Com base nos conhecimentos estudados sobre circulação oceânica, analise as sentenças a seguir: I- A água quente circula na direção do equador ao longo das costas orientais dos continentes. II- Quando as correntes superficiais se afastam na superfície, elas tendem a puxar água localizada imediatamente abaixo para cima a partir das camadas inferiores, esse fenômeno é conhecido como ressurgência. III- A rotação da Terra empurra as correntes em direção as bordas continentais, promovendo o empilhamento de água na costa com o auxílio dos ventos. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) Somente a sentença III está correta. AUTOATIVIDADE 127 3 Características topográficas e geológicas provocam variações locais no clima. A topografia e a geologia podem modificar o ambiente numa escala local dentro de regiões que, de outro modo, teriam clima uniforme. Com base no exposto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) O resfriamento adiabático é atingido a partir de altitudes superiores a 5.000 m, ou seja, a altitude aproximada da linha de neve nas montanhas. ( ) Em áreas montanhosas, a inclinação da terra e a sua exposição ao sol influenciam a temperatura e o teor de umidade do solo. ( ) As temperaturas em ambientes montanhosos tropicais são muito variáveis o que dificulta a sobrevivência de muitas plantas e animais nestas regiões. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – F. b) ( ) V – F – V. c) ( ) F – V – F. d) ( ) F – F – V. 4 O solo desafia a elaboração de uma simples definição, mas podemos descrevê-lo como a camada de material alterado quimicamente e biologicamente que recobre a rocha ou outros materiais inalterados na superfície terrestre. Disserte sobre como se dá o processo de laterização dos solos, como este fenômeno se intensifica e quais as consequências para os solos de regiões tropicais. 5 Estratégias agrícolas das zonas temperadas do norte, que envolvem a monocultura de plantas anuais de vida curta, são inapropriadas para as regiões tropicais. Neste contexto, disserte sobre o padrão de ciclagem de nutrientes nos trópicos e nas zonas temperadas e explique a alta produtividade sob condições naturais dos ecossistemas tropicais. 128 129 TÓPICO 3 - REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES NOS AMBIENTES TERRESTRES E AQUÁTICOS 1 INTRODUÇÃO Os elementos circulam através dos ecossistemas ao longo de vias traçadas por suas propriedades químicas, que determinam suas reações químicas e bioquímicas na biosfera. Essas reações são modificadas de modo único pelas condições físicas e químicas criadas em cada tipo de ecossistema terrestre e aquático. Como todos os organismos dependem da presença de nutrientes na forma que são usados, a reciclagem e a regeneração de nutrientes são importantes reguladores do funcionamento do ecossistema. Neste Tópico 3, discutiremos como os processos bioquímicos no solo, na água e no sedimento, influenciam a produtividade do ecossistema e a reciclagem de elementos nele. Os processos de regeneração de nutrientes são diferentes em sistemas terrestres e aquáticos. Ambos os sistemas apresentam transformações químicas e bioquímicas semelhantes: oxidação de carboidratos, nitrificação e oxidação quimioautotrófica de enxofre, entre muitas outras. Apesar disso, os sistemas terrestres e aquáticos diferem na base material para regeneração de nutrientes. Em ecossistemas terrestres, a maior parte do metabolismo do ecossistema é aeróbica, e a maioria dos elementos circula através de detritos na superfície do solo, onde as raízes das plantas têm acesso imediato aos nutrientes. Em habitats aquáticos, os sedimentos são a fonte essencial de nutrientes regenerados; estes sedimentos depositados nos fundos de lagos e oceanos são frequentemente originados de lugares afastados com produção primária em águas superficiais. 2 NUTRIENTES NOS ECOSSISTEMAS TERRESTRES A regeneração de nutrientes em ecossistemas terrestres ocorre principalmente no solo. Uma importante fonte de novos nutrientes em sistemas terrestres é a formação de solos por intermédio do intemperismo da rocha matriz e de outros materiais parentais. O intemperismo geralmente acontece abaixo das camadas mais profundas do solo, onde é impossível medi-lo diretamente. Contudo, os cientistas do solo podem estimar a taxa de intemperismo indiretamente, medindo a perda líquida de determinados elementos de um sistema. Íons positivos, como o cálcio (Ca2+),o potássio (K+), o sódio (Na+) e o Magnésio (Mg2+), são bons candidatos para essas medidas porque se dissolvem UNIDADE 2 130 prontamente na água e deixam o solo através do lençol de água e por fim nas correntes, onde podem ser medidos com facilidade. Quando um solo alcança o equilíbrio, como pode acontecer em áreas não perturbadas, a perda de um elemento do sistema é igual ao fluxo de entrada por intemperismo deste elemento. Além de ganhos de outras fontes, como a precipitação. Desse modo, é possível estimar a entrada do intemperismo é a partir de informações sobre os fluxos de entrada e perda total por precipitação. Durante os anos de 1960 e 1970 a entrada anual de cálcio na precipitação da bacia hidrográfica de Hubbard Brook, New Hampshire, foi em média de 2 quilogramas por hectare (kg/ha), enquanto a perda de cálcio dissolvido no fluxo dos cursos de água foi de 14 kg/ha. Portanto, a perda líquida do sistema foi de 12 kg/ha. As biomassas vegetais vivas e mortas aumentaram na bacia hidrográfica durante o período de estudo porque a floresta estava se recuperando de um desmatamento anterior. A assimilação líquida de cálcio na vegetação e nos detritos trouxe a remoção total de solo mineral para 21 kg/há/ano. Como o cálcio constitui cerca de 1,4% do peso da rocha matriz da área, atingir esta perda anual teria demandado intemperismo de cerca de 1500 kg (21/0,014) de rocha matriz por hectare, ou aproximadamente 1 mm de profundidade por ano. Análises posteriores do ecossistema da floresta de Hubbard Brook, que este foi um período de alta acidez e rápida lixiviação de íons do solo. Desse modo, o solo não estava em equilíbrio, e as entradas de cálcio através do intemperismo foram muito inferiores do que se pensava anteriormente. Esse exemplo ilustra quão pouco o lento intemperismo da rocha matriz contribui para assimilação anual de nutrientes pela vegetação. A maior parte desses nutrientes se torna disponível para as plantas pela decomposição de detritos e pequenas moléculas orgânicas no perfil do solo. Tipicamente, o intemperismo da rocha matriz proporciona apenas 10% dos nutrientes do solo assimilados pela vegetação a cada ano. 3 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS TERRESTRES A qualidade dos detritos vegetais influencia a taxa de regeneração dos nutrientes. As plantas assimilam os elementos presentes no solo muito mais rapidamente do que são gerados pelo intemperismo do material parental. Íons como Ca2+ (cálcio), Mg2+ (magnésio), K+ (potássio) e Na+ (sódio) não aparecem com destaque nas transformações bioquímicas, embora sejam necessários para o crescimento vegetal. Na grande maioria, as plantas assimilam esses íons com a água, que absorvem em grandes quantidades. Outros importantes nutrientes, como o nitrogênio, o fósforo e o enxofre são geralmente pouco abundantes no material parental. As rochas ígneas (granito e basalto, por exemplo) não contêm nitrogênio e possuem apenas 0,3% de fosfato e 0,1% de sulfato em massa. A maioria das rochas sedimentares contém um pouco mais. Portanto, o intemperismo adiciona pouca quantidade desses nutrientes ao solo; os fluxos de entrada através da precipitação e da fixação de nitrogênio também são pequenos. A produção vegetal, portanto, depende da rápida regeneração destes nutrientes a partir dos detritos e de sua retenção nos ecossistemas. 131 Os detritos orgânicos estão em toda parte, de modo mais notável nos habitats terrestres, onde as partes das plantas não consumidas pelos herbívoros se acumulam na superfície do solo, juntamente às excretas de animais e outros restos orgânicos. 90% ou mais da biomassa vegetal produzida em habitats florestais passam por estes reservatórios de detritos. Os processos de decaimento decompõem os detritos, liberando os nutrientes que contêm em formas que podem ser reutilizadas pelas plantas. A decomposição da serapilheira no chão das florestas ocorre de quatro maneiras: (1) lixiviação dos minerais solúveis em compostos orgânicos pequenos pela água; (2) consumo por grandes organismos detritívoros (minhocas, pulgões e outros invertebrados); (3) decomposição dos componentes lenhosos das folhas por fungos; e (4) decomposição de quase tudo por bactérias. Entre 10% e 30% das substâncias nas folhas recentemente caídas se dissolvem em água fria. A lixiviação remove rapidamente a maior parte dos sais, açúcares e aminoácidos da serapilheira, tornando-os disponíveis para os microrganismos do solo e raízes das plantas; carboidratos complexos, como a celulose, e outros compostos orgânicos grandes ficam para trás. Os grandes detritívoros tipicamente assimilam apenas 30% a 45% dessa energia disponível na porção foliar da serapilheira, e até menos da madeira. Eles, contudo, aceleram a decomposição além do que eles próprios extraem porque maceram os detritos vegetais em seus tratos digestivos, e as partículas mais finas de seus rejeitos egestados expõem novas superfícies para alimentação dos fungos e das bactérias. As folhas de diferentes espécies de árvores se decompõem em velocidades diferentes, dependendo de sua composição. Por exemplo, no leste do Tennessee, durante o primeiro ano após a queda das folhas, a perda de peso das folhas variou de 64% na amoreira até 39% no Carvalho, 32% no bordo de açúcar e 21% na faia norte americana. Os feixes de acículas de pinheiros e outras coníferas também se decompõe lentamente. Estas diferenças entre as espécies dependem em grande parte do teor de lignina das folhas, o que determina sua rigidez. As ligninas são cadeias longas e complexas de moléculas orgânicas. Elas conferem a madeira muitas de suas qualidades estruturais e são ainda mais difíceis de digerir do que a celulose. A taxa de decomposição dos detritos também depende do seu teor de nitrogênio, fósforo e outros nutrientes exigidos pelas bactérias e fungos para seu próprio crescimento. Quanto maior a concentração desses nutrientes, mais rápido os micróbios podem crescer e mais rapidamente eles decompõem os detritos vegetais. A resistência de alguns tipos de serapilheira à degradação evidencia o papel único dos fungos na regeneração de nutrientes. A maioria dos fungos consiste numa rede de estruturas filiformes chamadas de hifas, que podem penetrar na serapilheira vegetal e nas madeiras onde as bactérias não conseguem chegar. Os familiares cogumelos e orelhas-de-pau são simplesmente estruturas de frutificação produzidas pela massa de hifas no fundo da camada de restos foliares e madeiras. Assim como as bactérias, os fungos secretam enzimas no substrato e absorvem 132 açúcares simples e aminoácidos produzidos por esta digestão extracelular. Os fungos diferem das bactérias por serem capazes de digerir celulose (o que apenas umas poucas bactérias, protozoários em sistemas digestivos de térmitas e caracóis também podem fazer) e, especialmente, lignina. 3.1 O CLIMA AFETA A TAXA DE REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES A reciclagem de nutrientes difere em ecossistemas tropicais e temperados por causa dos efeitos dos diferentes climas sobre o intemperismo, as propriedades do solo e a decomposição de detritos. Os solos tropicais tendem a ser profundamente intemperizados e a possuir pouca argila, o que significa que não são bons na retenção de nutrientes. Como consequência, a menos que os nutrientes sejam rapidamente assimilados pelas plantas, eles são carregados para fora do solo. A despeito disso, as florestas tropicais frequentemente apresentam uma produção primária extremamente alta. Essa alta produtividade é sustentada por (1) rápida decomposição de detritos sobre condições quentes e úmidas, (2) rápida assimilação de nutrientes pelas plantas e outros organismos, a partir das camadas superiores do solo, e (3) retenção eficiente de nutrientes pelas plantas. Em ecossistemas tipicamente tropicais, a maior parte dos nutrientes é encontrada na biomassa viva, e não no solo, e os elementos são regenerados e assimilados rapidamente. Este padrão contém implicaçõesimportantes para a conservação e agricultura tropicais. Em extensas regiões nos trópicos com solos antigos e profundamente intemperizados, o plantio de produtos agrícolas como o milho, em áreas desmatadas, apresenta consequências adversas previsíveis para a fertilidade do solo. A prática de cortar e queimar árvores derrubadas libera muitos nutrientes minerais, que podem sustentar dois ou três anos de crescimento na plantação, mas estes nutrientes são lixiviados rapidamente do solo quando a vegetação natural não está mais presente para assimilá-los. Consequentemente, os níveis de nutrientes minerais no solo caem rapidamente. Além disso à medida que os solos tropicais expostos secam, o movimento da água para cima traz óxido de ferro e de alumínio para superfície, onde forma uma substância semelhante ao tijolo chamado de laterita (Tópico 2 – Unidade 2). O escoamento superficial da água sobre a laterita impenetrável acelera a erosão, deplecionando ainda mais os nutrientes e descarregando sedimentos nas águas correntes (assoreamento). A agricultura tradicional de derrubada e queima nesses solos tropicais geralmente alterna dois ou três anos de colheitas com 50 a 100 anos de regeneração da floresta para reconstituir a qualidade do solo. Nos locais em que a densidade populacional não permite mais essa prática, os solos não conseguem ser recompostos naturalmente e se deterioram rapidamente, a menos que sejam utilizados fertilizantes caros e ambientalmente danosos, além de cultivos intensivos. 133 Uma comparação entre ecossistemas de floresta eliminados para o uso agrícola no Canadá, Brasil e Venezuela demonstra a importância da matéria orgânica na manutenção da fertilidade do solo em condições de agricultura intensiva. O teor de carbono de solos não perturbados era de 8,8 kg/m2 numa pradaria do Canadá de 3,4 kg/m2 na caatinga no Brasil e 5,1 kg/m2 numa floresta úmida a venezuelana. Depois de 65 anos de cultivo, o teor de carbono do solo canadense havia reduzido em 51%, o que equivale a um declínio com uma taxa exponencial de 1% por ano. Em contraste, o teor de carbono do solo brasileiro havia diminuído em 40% após seis anos de cultivo (9% ao ano) e o solo venezuelano em 29% depois de três anos de cultivo (11% por ano). Este resultado sugere que os solos cultivados de regiões temperadas retêm matéria orgânica 10 vezes mais tempo que os solos tropicais, e, portanto, proporcionam um estoque mais persistente de nutrientes minerais que pode ser liberado lentamente por decomposição. Estudos comparativos da dinâmica de nutrientes em florestas temperadas e tropicais ilustram mais ainda suas diferenças. A serapilheira no solo da floresta contém, em média, cerca de 20% da biomassa total de vegetação (incluindo troncos e galhos) e detritos nas florestas temperadas de acículas, 5% nas florestas temperadas de madeiras duras, e apenas 1% a 2% nas florestas tropicais pluviais. A razão entre a serapilheira e a biomassa das folhas vivas fica entre 5-10: 1 em florestas temperadas, mas é menos de 1:1 em florestas tropicais. Do total de carbono orgânico no sistema como um todo, mais de 50% ocorrem no solo e na serapilheira de florestas setentrionais, mas menos que 25% em florestas tropicais pluviais. O resto está na biomassa viva. A serapilheira e outros detritos se decompõem rapidamente nos trópicos e não formam um reservatório de nutrientes tão substancial quanto nas regiões temperadas. Em resumo, nas florestas de regiões temperadas, a maior parte dos nutrientes encontra-se no solo, enquanto nas florestas tropicais os nutrientes estão presentes em grande parte na biomassa viva. 4 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS Em ecossistemas aquáticos, os nutrientes são regenerados lentamente nas camadas profundas de água e sedimentos. Como a maior parte da circulação de elementos acontece em meio aquoso, os processos químicos e bioquímicos envolvidos não diferem de modo marcante entre os meios terrestres e aquáticos. O que se destaca em relação à maioria dos rios, lagos e oceanos é o movimento de nutrientes para dentro das camadas inferiores de água e depósitos de sedimentos bentônicos, a partir dos quais são regenerados e retornam às zonas de produtividade de modo relativamente lento. Os sedimentos em sistemas aquáticos lembram superficialmente os solos terrestres, mas os papéis dos solos e sedimentos nos processos do ecossistema diferem de duas maneiras importantes. Primeiro, a regeneração de nutrientes a partir dos detritos terrestres acontece perto das raízes das plantas, onde os nutrientes são 134 assimilados. Por outro lado, as algas e plantas aquáticas, assimilam nutrientes da coluna de água nas camadas superiores iluminadas (fóticas), frequentemente removidos dos sedimentos do fundo. Segundo, a decomposição de detritos terrestres ocorre, na maior parte, aerobicamente, e, portanto, relativamente rápido. Por outro lado, os sedimentos aquáticos frequentemente se tornam deplecionados de oxigênio, o que retarda bastante a maioria das transformações bioquímicas e modifica os caminhos através dos quais alguns elementos são reciclados. A manutenção de uma alta produtividade aquática depende da proximidade entre os sedimentos de fundo e a zona fótica (zona luminosa) na superfície, ou da existência de algum meio de transporte para trazer os nutrientes regenerados nos sedimentos de volta para a zona fótica. A produtividade primária dos oceanos apresenta altas taxas de fixação de carbono em mares rasos, tanto nos trópicos (por exemplo, no mar de coral e as águas vizinhas da Indonésia) quanto nas altas latitudes (mar báltico e mar do Japão). Áreas que possuem fortes ressurgências, como as costas oeste da África e das Américas, também apresentam alta produtividade primária. A excreção e decomposição microbiana regeneram alguns nutrientes na zona fótica, onde assimilação e a produção acontecem, assim como ocorre nos solos terrestres. Em algumas situações, os elementos podem circular rapidamente através das camadas superficiais produtivas da coluna de água com pouca perda para a sedimentação. Por exemplo, um estudo conduzido em águas profundas no lago da costa oeste da América do Norte mostrou que o fitoplâncton assimila nitrogênio quase tão rapidamente quanto o zooplâncton o excreta, a maior parte na forma de amônia. Aproximadamente metade do nitrogênio presente era assimilado pela fotossíntese diretamente como amônia, e cerca de metade era primeiro nitrificado (NH4 + NO3 -) por bactérias e então assimilado pelo fitoplâncton. 4.1 A ESTRATIFICAÇÃO TÉRMICA NOS ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS A estratificação térmica impede a mistura vertical nos ecossistemas aquáticos. A mistura vertical da água requer muita entrada de energia para acelerar as massas de água e mantê-las em movimentos. Os ventos suprem a maior parte dessa energia, causando misturas turbulentas de águas rasas e correntes de ressurgência ao longo de algumas costas, embora as variações na densidade da água relacionadas à temperatura e salinidade estabeleçam correntes verticais em outros ecossistemas marinhos. O movimento vertical da água pode ser impedido em sistemas aquáticos quando a luz do Sol aquece a água da superfície, estabelecendo uma termoclina (região que separa águas quentes superficiais de águas geladas do fundo), ou quando a água doce flutua sobre a água salgada mais densa. Esta última situação acontece em estuários, nas bordas do gelo em derretimento e quando a chuva extremamente densa. Outros 135 processos promovem a mistura vertical. Em sistemas marinhos, quando a evaporação excede a entrada de água doce, as camadas superficiais de água se tornam mais salinas, portanto, mais densas, e literalmente caem através da água mais leve que está abaixo. Isso também ocorre quando o gelo se forma e o sal é excluído da água cristalizada (em regiões polares). Os lagos de zonas temperadas experimentam a revirada de outono quando suas águas superficiaisresfriam, se tornam mais densas e afundam através das camadas mais quentes e menos densas abaixo. A mistura vertical da água afeta a produção de duas maneiras opostas. Por um lado, a mistura pode trazer águas ricas em nutrientes das profundidades para a zona fótica e, portanto, promover a produção. Por outro lado, a mistura pode transportar fitoplâncton para baixo da zona fótica e assim reduzir a produção. De fato, quando a mistura vertical se estende para além da zona fótica, o fitoplâncton não consegue se manter, muito menos se reproduzir. Sob tais condições, a produção primária pode cessar completamente, resultando na aparente contradição de água rica em nutrientes sem produção primária. Uma situação típica de muitos lagos e lagoas de zonas temperadas é aquela em que a estratificação térmica durante o verão impede a mistura vertical; então, à medida que a sedimentação remove nutrientes das camadas superficiais, a produção diminui. Os nutrientes podem ser regenerados nas camadas mais profundas de um lago, mas eles não conseguem alcançar a superfície até que a estratificação seja rompida e a mistura vertical chegue com as temperaturas frias do outono. A estratificação térmica se desenvolve apenas fracamente, tanto, em lagos de altas e baixas latitudes. Em regiões árticas e subárticas, muito pouco calor entra no lago para estabelecer uma termoclina e bloquear as misturas turbulentas. Desse modo, coluna de água tende a se aquecer uniformemente, até o ponto em que a temperatura da água se eleva como um todo. Nos trópicos, a falta de um ciclo sazonal de temperatura pronunciado reduz a definição exata de uma estratificação térmica, porque o Sol e as temperaturas do ar constantemente altas aquecem a água uniformemente até as partes mais profundas do lago. Em sistemas marinhos, as correntes podem produzir condições mais complexas. Por exemplo, duas massas de água muito diferentes, uma estratificada e a outra não (mais homogênea), podem se encontrar em uma frente, e ali se misturarem para criar excelentes condições para o crescimento de fitoplâncton. Às vezes, na fronteira entre um sistema de águas rasas e um de águas profundas, massas de águas misturadas (profundas) e estratificadas (rasas) se juntam. No lado misturado, os nutrientes podem ser abundantes, mas o fitoplâncton pode não permanecer na zona fótica. No lado estratificado, os nutrientes podem ter sido deplecionados pelas águas superficiais. Nos locais em que os dois sistemas se encontram, uma parte da água misturada carregada de nutrientes pode penetrar na massa de água estratificada, criando condições ideais para produção. 136 4.2 OS NUTRIENTES E A PRODUÇÃO NOS OCEANOS Os nutrientes frequentemente limitam a produção nos oceanos. De modo geral, a produção primária em ecossistemas marinhos está intimamente relacionada com o suprimento de nutrientes, particularmente nitrogênio, nas camadas superficiais de água. Como resultado, os níveis mais altos de produção ocorrem em mares rasos, onde a mistura vertical alcança o fundo em áreas de forte ressurgência. Entretanto, algumas áreas de mar aberto possuem nitrogênio e fósforo em abundância, mas as concentrações de fitoplâncton e a produção primária são baixas. Essas condições sugerem a limitação por outros elementos, principalmente ferro e silício. O ferro é importante componente em muitas vias metabólicas. O silício é o principal material das conchas silicosas das diatomáceas, que são o tipo predominante de fitoplâncton nos oceanos. O silício é perdido na zona fótica, onde as diatomáceas morrem e suas conchas densas descem para o fundo. As altas densidades de fitoplâncton no Oceano Sul estão associadas com as fontes continentais de nutrientes nas proximidades: a forte produção de plâncton está concentrada nas águas da corrente descendente da Austrália e Nova Zelândia, América do Sul e península Antártica, e sul da África, onde os nutrientes são retirados de sedimentos de águas rasas. Nem todo o oceano da região sul, entretanto, é igualmente produtivo. As concentrações de nitrogênio e fósforo são altas o suficiente para sustentar altas densidades de fitoplâncton em toda a área. No entanto, o fitoplâncton é escasso em boa parte da região. Essa observação sugere limitação por outros nutrientes. Em particular, a área a oeste da região sul da América do Sul, entre 40°S e 50°S, parece ter pouco silício, provavelmente por ele ter se sedimentado e deixado a água mais rapidamente do que o nitrogênio e o fósforo, através da longa extensão do Pacífico Sul. 4.3 A REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES EM ÁGUAS PROFUNDAS A depleção de oxigênio facilita a regeneração de alguns nutrientes em águas profundas. Durante períodos prolongados de estratificação em lagos de água doce, a respiração bacteriana na camada abaixo da termoclina depleciona o suprimento de oxigênio nesta camada, desde que exista matéria orgânica suficiente para oxidação pelas bactérias. Nessas águas anóxicas (livres de oxigênio) de fundo, a respiração bacteriana continua reduzindo o sulfato em vez do oxigênio molecular. Isso resulta no aumento de concentrações de enxofre reduzido, principalmente na forma de sulfeto de hidrogênio. No ambiente deplecionado de oxigênio dos sedimentos de fundo e nas águas imediatamente acima deles, frequentemente inexiste oxigênio suficiente para que as bactérias nitrifiquem (oxidem) a amônia. Nessas regiões, os nutrientes são regenerados nos sedimentos aquáticos pela decomposição bacteriana da matéria orgânica. Condições 137 anaeróbias se desenvolvem abaixo da termoclina porque bactérias consomem oxigênio durante o processo. Além disso, elementos como ferro e o manganês passam de suas formas oxidadas para as reduzidas, o que afeta grandemente sua solubilidade. Em particular, à medida que o íon férrico (Fe3 +) é reduzido para ferroso (Fe2 +), complexos insolúveis de ferro fosfatados se tornam solúveis, e ambos os elementos tendem a se mover para dentro da coluna de água. 4.4 NUTRIENTES EM AMBIENTES ESTUARINOS E MANGUEZAIS Um intenso aporte de nutrientes externos e internos torna os estuários e áreas pantanosas salgadas (manguezais) altamente produtivos. Estuários rasos, que são regiões costeiras semifechadas nas embocaduras dos rios, estão entre os ecossistemas mais produtivos da Terra. As áreas pantanosas salinas, que são áreas onde crescem uma vegetação entre os níveis mais altos e mais baixos da maré, também são altamente produtivos, em especial os manguezais das regiões tropicais. A produtividade desses ecossistemas resulta da regeneração rápida e local dos nutrientes e dos insumos externos sob a forma de nutrientes trazidos pelos rios e fluxos das marés. Os efeitos da alta produção dos estuários e áreas alagadas costeiras se estende aos ecossistemas marinhos, em muitas áreas, através da sua exportação líquida de matéria orgânica. O manguezal exporta quase 10% de sua produção primária bruta, e quase metade de sua produção primária líquida para os ecossistemas marinhos vizinhos, na forma de organismos, detritos particulados e material orgânico dissolvido transportado pelas marés. Devido a sua alta produtividade e ao abrigo que oferecem contra organismos predadores, os manguezais e estuários são importantes áreas de alimentação para larvas e estágios imaturos de muitos peixes e invertebrados que posteriormente completam seus ciclos de vida no mar. 138 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Os ciclos de nutrientes nos ecossistemas terrestres e aquáticos resultam de reações químicas e bioquímicas semelhantes, expressas em ambientes físicos e químicos diferentes. • A regeneração de nutrientes em ecossistemas terrestres ocorre no solo. O intemperismo da rocha e a consequente liberação de novos nutrientes acontece lentamente se comparado com assimilação de nutrientes do solo pelas plantas. Portanto, a produtividade da vegetação depende da regeneração dos nutrientes da serapilheirae de outros detritos orgânicos. • Os nutrientes são regenerados a partir da serapilheira pela lixiviação de substâncias solúveis; do consumo por grandes detritívoros; dos fungos que decompõe a celulose e lignina; e da eventual mineralização de fósforo, nitrogênio e enxofre principalmente por bactérias. • Em muitos climas tropicais, os solos profundamente intemperizados retêm pouco os nutrientes. Nesses ambientes, a regeneração e a assimilação de nutrientes acontecem rapidamente, e a maioria dos nutrientes, especialmente o fósforo, está na vegetação viva. Quando a vegetação desses solos é eliminada para agricultura, eles imediatamente perdem sua fertilidade porque os nutrientes são removidos juntamente com a cobertura vegetal. A matéria orgânica no solo se decompõe rapidamente, e os nutrientes que são liberados e não assimilados são lavados do solo. • Os sedimentos dos fundos dos lagos e oceanos lembram os solos terrestres, mas diferem deles em dois importantes aspectos: os sedimentos aquáticos são espacialmente removidos dos locais de assimilação de nutrientes pelas plantas aquáticas e algas, e os sedimentos aquáticos frequentemente desenvolvem condições anóxicas (sem oxigênio) que retardam a regeneração de alguns nutrientes. • A produtividade primária dos sistemas aquáticos é mantida pelo transporte de nutrientes vindos dos sedimentos de fundo para superfície, como ocorre em águas rasas e áreas de ressurgência, pela reciclagem dos nutrientes regenerados dentro da zona fótica e pela importação de nutrientes de outros sistemas. • A mistura vertical é inibida pela estratificação térmica. A estratificação aumenta a produção aquática ao reter o fitoplâncton dentro da zona fótica, mas diminui a produção na medida em que a sedimentação de detritos carrega nutrientes abaixo da profundidade, onde a luz é suficiente para a fotossíntese. 139 • A produtividade primária dos sistemas marinhos é geralmente limitada pela disponibilidade de nutrientes. Os nutrientes limitantes podem ser o silício ou o ferro no mar aberto, onde ambos elementos tendem a deixar a coluna de água na forma de sedimentos: o silício nas conchas das diatomáceas e o ferro em complexos precipitados com outros elementos, como o fósforo. • As comunidades marinhas de águas rasas particularmente estuários e manguezais são extremamente produtivas por causa da rápida regeneração local de nutrientes e da entrada adicional de nutrientes externos dos sistemas terrestres e marinhas adjacentes. Os manguezais e os estuários são grandes exportadores tanto de carbono orgânico quanto de nutrientes minerais para os sistemas marinhos vizinhos. 140 1 Os processos de regeneração de nutrientes são diferentes em sistemas terrestres e aquáticos. Ambos os sistemas apresentam transformações químicas e bioquímicas semelhantes: oxidação de carboidratos, nitrificação e oxidação quimioautotrófica de enxofre, entre muitas outras. Apesar disso, os sistemas terrestres e aquáticos diferem na base material para regeneração de nutrientes. Com base no exposto, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As rochas ígneas (granito e basalto, por exemplo) são importantes fontes de nitrogênio para o solo através do intemperismo. b) ( ) Os ciclos de nutrientes nos ecossistemas terrestres e aquáticos resultam de reações químicas e bioquímicas diferentes. c) ( ) Uma importante fonte de novos nutrientes em sistemas aquáticos é o intemperismo que promove a liberação de cálcio (Ca2+), potássio (K+), sódio (Na+) e Magnésio (Mg2+). d) ( ) Em ecossistemas terrestres, a maior parte do metabolismo do ecossistema é aeróbica, e a maioria dos elementos circula através de detritos na superfície do solo. 2 Os nutrientes frequentemente limitam a produção nos oceanos. De modo geral, a produção primária em ecossistemas marinhos está intimamente relacionada com o suprimento de nutrientes, particularmente nitrogênio, nas camadas superficiais de água. Com base no exposto, analise as sentenças a seguir: I- Em águas profundas respiração bacteriana utiliza todo o oxigênio molecular para oxidar a amônia. II- Áreas que possuem fortes ressurgências, apresentam baixa produtividade primária. III- A produtividade primária dos oceanos apresenta altas taxas de fixação de carbono em mares rasos, tanto nos trópicos quanto nas altas latitudes. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) Somente a sentença III está correta. 3 A mistura vertical da água requer muita entrada de energia para acelerar as massas de água e mantê-las em movimentos. O movimento vertical da água pode ser impedido em sistemas aquáticos quando a luz do Sol aquece a água da superfície, AUTOATIVIDADE 141 estabelecendo uma termoclina ou quando a água doce flutua sobre a água salgada mais densa. Esta última situação acontece em estuários, nas bordas do gelo em derretimento e quando a chuva extremamente densa. Com base no exposto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Em regiões árticas e subárticas, devido à forte presença de águas geladas, a termoclina e mais pronunciada que em outras regiões do planeta. ( ) Uma situação típica de muitos lagos e lagoas de zonas temperadas é aquela em que a estratificação térmica durante o verão impede a mistura vertical. ( ) O movimento vertical da água pode ser impedido em sistemas aquáticos quando a luz do Sol aquece a água da superfície, estabelecendo uma termoclina. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – F. b) ( ) V – F – V. c) ( ) F – V – F. d) ( ) F – V – V. 4 A regeneração de nutrientes em ecossistemas terrestres ocorre principalmente no solo. As plantas assimilam os elementos presentes no solo muito mais rapidamente do que são gerados pelo intemperismo do material parental. Disserte sobre como a qualidade dos detritos em ecossistemas terrestres influencia a taxa de regeneração dos nutrientes. 5 Em ecossistemas aquáticos os nutrientes são regenerados lentamente nas camadas profundas de água e sedimentos pelo movimento de nutrientes para dentro das camadas inferiores de água e depósitos de sedimentos bentônicos, a partir dos quais serão regenerados e retornarão às zonas de produtividade. Disserte sobre as diferenças entre solos e sedimentos nos processos de regeneração de nutrientes. 142 143 TÓPICO 4 - FATORES DE REGULAÇÃO NOS ECOSSISTEMAS 1 INTRODUÇÃO O sucesso de um organismo, de um grupo de organismos ou de uma comunidade biótica inteira depende de um complexo de condições. Qualquer condição que se aproxime ou exceda os limites de tolerância é chamada de condição limitante ou fator limitante. Sob condições estáveis, o constituinte essencial disponível em valores que mais se aproxima da necessidade mínima tende a ser um limitante, um conceito chamado de lei do mínimo de Liebig. O conceito é menos aplicável sob condições transitórias, quando as quantidades e, portanto, os efeitos de muitos constituintes estão se modificando rapidamente. Este Tópico 4 apresenta breves revisões sobre aspectos naturais, físicos e químicos do ambiente que possam atuar como fatores limitantes para o desenvolvimento tanto de organismos quanto de ecossistemas. Para apresentar o que é conhecido nesse campo, seriam necessários vários livros especialmente sobre ecologia fisiológica ou ecofisiologia e está além do escopo do presente trabalho. Espécies com amplas distribuições geográficas quase sempre desenvolvem populações adaptadas localmente. Os limites de tolerância destes organismos estão ajustados às condições locais. Entretanto, em se tratando de aspectos nutricionais, o excesso de nutrientes apresenta-se tão danoso quanto a sua escassez. Situações provocadas pelo estresse antropogênico podem levar às condições de saturação e outros efeitos adversos tais como toxicidade do ambiente e nacadeia alimentar, perda de produtividade em sistemas agrícolas, e descontrole biológico no manejo de pragas. Compreender como ocorre a regulação natural do ambiente possibilita a correta gestão e uso eficiente dos recursos naturais. 2 CONCEITO DE FATORES LIMITANTES: A LEI DO MÍNIMO DE LIEBIG A ideia de que um organismo não é mais forte que o elo mais fraco de sua cadeia ecológica de exigências foi claramente expressa pelo Barão Justus von Liebig em 1840. Liebig foi um pioneiro nos estudos dos efeitos de vários fatores sobre o crescimento das plantas, especialmente de culturas domésticas. Ele descobriu, como os agricultores de hoje, que o rendimento dos cultivos estava frequentemente limitado não pelos nutrientes necessários em grandes quantidades, como o dióxido de carbono e água, UNIDADE 2 144 pois estes são geralmente abundantes no ambiente, mas por alguma matéria-prima (como o zinco) necessária em quantidades diminutas, mas muito escassa no solo. Seu enunciado de que “o crescimento de uma planta depende da quantidade de material alimentar que está presente em quantidade mínima” ficou conhecido como lei de Liebig. Um trabalho extensivo desde o tempo de Liebig mostrou que dois princípios auxiliares devem ser adicionados ao conceito para que esse seja útil na prática. O primeiro é uma limitação de que a lei do mínimo de Liebig é aplicável sob condições relativamente estáveis; ou seja, quando os fluxos médios de entrada de energia e materiais equilibram os fluxos de saída em um ciclo anual. A título de ilustração, vamos supor que o dióxido de carbono seja o principal fator limitante em um lago e, portanto, a produtividade seja controlada pelas taxas de abastecimento de dióxido de carbono vinda da degradação da matéria orgânica. Suponhamos, também, que a luz, o nitrogênio, fósforo e outros elementos vitais estejam disponíveis em excesso para o uso (portanto não são fatores limitantes). Se uma tempestade trouxesse mais dióxido de carbono para dentro do lago, a taxa de produção mudaria e dependeria também de outros fatores. Enquanto a taxa está mudando, é menos provável que haja apenas um constituinte mínimo. Em vez disso, a reação depende da concentração de todos os constituintes presentes, que nesse período de transição difere da taxa normal em que o constituinte menos abundante está sendo adicionado. A taxa de produção mudaria rapidamente conforme vários constituintes fossem sendo esgotados, até que algum constituinte, talvez de novo o dióxido de carbono, se tornasse limitante. O sistema lacustre estaria de novo operando a uma taxa controlada pela lei do mínimo. A segunda consideração importante é a interação de fator. Assim, uma alta concentração ou disponibilidade de alguma substância, ou ação de algum fator que não o constituinte mínimo, pode modificar a taxa de uso do fator limitante. Algumas vezes os organismos podem substituir, ao menos em parte, uma substância deficiente no ambiente por outra quimicamente relacionada. Assim, onde o estrôncio é abundante, os moluscos podem, em parte, substituir o cálcio pelo estrôncio em suas conchas. Algumas plantas parecem necessitar de menos zinco quando crescem na sombra do que quando crescem a luz plena do Sol, portanto uma baixa concentração de zinco no solo seria menos limitante para as plantas na sombra que para as plantas nas mesmas condições sob luz solar plena. 2.1 CONCEITO DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA Não somente algo de menos pode ser um fator limitante, como proposto por Liebig (1840) mas também algo em excesso (como no caso do nitrogênio documentado no ciclo do nitrogênio no Tópico 1 desta Unidade), como em fatores tais como luz, calor e água. Assim, os organismos têm um mínimo e um máximo ecológico; a amplitude entre esses dois representa os limites de tolerância. O conceito do efeito limitante máximo, assim como mínimo, de constituintes, foi incorporado à lei de tolerância de Shelford 145 (SHELFORD, 1913). A partir de então, muito trabalho tem sido feito na “ecologia do estresse”, de modo que os limites de tolerância nos quais várias plantas e animais podem existir são bem conhecidos. São de especial utilidade o que se pode chamar de teste de estresse, feitos em laboratórios e em campo, nos quais organismos são submetidos a uma série de amplitudes experimentais de condições (BARRETT; ROSENBERG, 1981). Tal abordagem fisiológica tem ajudado os ecólogos a entender a distribuição dos organismos na natureza; no entanto, isso é só uma parte da história. Todos os requisitos físicos podem estar bem dentro dos limites de tolerância de um organismo, o qual, ainda pode falhar por causa de interações biológicas, como competição ou predação. Os estudos em ecossistemas intactos devem acompanhar os estudos experimentais em laboratório, que isolam indivíduos das suas populações e comunidades. Alguns princípios auxiliares à lei da tolerância podem ser descritos como segue: (1) os organismos podem ter uma grande amplitude de tolerância para um fator e uma estreita amplitude para outro; (2) os organismos com grandes amplitudes de tolerância a fatores limitantes provavelmente terão distribuição geográfica mais ampla; (3) quando as condições não são ótimas para uma espécie em relação a um fator ecológico, os limites de tolerância podem ser reduzidos a outros fatores ecológicos. Por exemplo, quando o nitrogênio do solo é limitante, a resistência da gramínea à seca é reduzida (é necessário mais água para evitar que murche em níveis baixos de nitrogênio do que em níveis altos); (4) na natureza, é comum os organismos não viverem em uma amplitude ótima de um fator físico em particular. Em tais casos, algum outro ou outros fatores devem ter maior importância. Por exemplo, a gramínea marinha Spartina alterniflora, que domina as marismas da costa leste dos Estados Unidos, cresce melhor em água doce que em água salgada, mas na natureza é encontrada somente em água salgada, aparentemente porque pode exudar o sal de suas folhas melhor que outras plantas enraizadas de brejo (isto é, porque esse mecanismo possibilita à gramínea marinha vencer seus competidores); (5) a reprodução é um período crítico quando fatores ambientais parecem ser mais limitantes. Os limites de tolerância de indivíduos reprodutivos, sementes, ovos, embriões, plântulas e larvas são geralmente mais estreitos que os das plantas e animais adultos não reprodutivos. Assim, uma árvore de cipreste adulto vai crescer submersa na água ou em planaltos secos, mas não poderá se reproduzir a menos que haja umidade e solo não inundados para o desenvolvimento das plântulas. Siris azuis adultos e muitos outros animais marinhos podem tolerar água salobra ou doce que tem alto conteúdo de cloreto, por essa razão são frequentemente encontrados rio acima, a alguma distância. As larvas, no entanto, não podem viver nessas águas; portanto, essa espécie não pode se reproduzir no ambiente do rio e nunca se estabelece ali. Entre outros exemplos. Para um grau relativo de tolerância, entrou em uso uma série de termos em ecologia que usam os prefixos esteno, que significa “estreito”, e euri, que significa “amplo”. Assim: 146 • Estenotérmico-euritérmico: refere-se à tolerância estreita e ampla, respectivamente, da temperatura. • Estenoídrico-eurídrico: refere-se à tolerância estreita e ampla respectivamente, da água. • Estenoalino-eurialinos: refere-se à tolerância estreita e ampla respectivamente, da salinidade. • Estenofágico-eurifágico: refere-se à tolerância estreita e ampla, respectivamente, do alimento. • Estenoécio-euriécio: refere-se à tolerância estreita e ampla, respectivamente, da seleção de habitat. Esses termos se aplicam não somente ao nível de organismo, mas também nos níveis de comunidade e ecossistema. Por exemplo, os recifes de coral são muito estenotérmicos, ou seja, prosperam somente em uma estreita margem de temperatura. Uma queda de 2 °C prolongada é estressante, causa “branqueamento” ou perdadas algas simbióticas que possibilita aos corais prosperar em águas com o nível de nutriente muito baixo. O conceito de fatores limitantes é valioso porque abre uma oportunidade ao ecólogo para estudar ecossistemas complexos. As relações ambientais de organismos são complexas, felizmente, nem todos os fatores possíveis são importantes na mesma medida em uma situação para um organismo em particular. Se um organismo tem um amplo limite de tolerância ao fator relativamente constante presente em quantidades moderadas do ambiente, é provável que esse fator não seja limitante. Ao contrário, se é um fato conhecido que um organismo tem limites definidos de tolerância por um fator que também é variável no ambiente, então esse fator merece estudo cuidadoso, pois pode ser limitante. Por exemplo, o oxigênio é tão abundante, constante e disponível em ambientes da superfície terrestre que raramente é limitante para organismos terrestres, exceto para parasitas ou organismos que vivem no solo ou a grandes altitudes. No entanto, o oxigênio é relativamente escasso e variável na água; assim, é muitas vezes um fator limitante importante para organismos aquáticos, em especial animais. Um exemplo de fatores limitantes no nível de ecossistema é a descoberta de que dois nutrientes minerais, ferro e sílica, limitam a produção primária em áreas muito grandes dos oceanos abertos no mundo. Menzel e Ryther (1961) estão entre os primeiros a descobrir o ferro como fator limitante em seus estudos acerca das águas oceânicas ao longo das Bermudas. Martin et al. (1991) e Mullineaux (1999) revisaram a evidência de que o ferro é limitante em quase todas as partes do oceano aberto. Como as diatomáceas precisam de sílica para suas carapaças, e como esse micronutriente está presente em concentrações muito baixas na água do mar, a sílica é limitante onde as diatomáceas são parte importante do fitoplâncton (TRÉGUER; PONDAVEN, 2000). 147 3 COMPENSAÇÃO DE FATOR E ECÓTIPOS Organismos não são subjugados pelo ambiente físico; eles se adaptam e modificam o ambiente físico para reduzir os efeitos limitantes da temperatura, luz, água e outras condições físicas de existência. Essa compensação de fator é particularmente eficiente no nível de organização de comunidade, mas também ocorre dentro das espécies. As espécies com amplas distribuições geográficas quase sempre desenvolvem populações adaptadas localmente, chamadas de ecótipos, e que têm limites de tolerância ajustados às condições locais. Os ecótipos são subespécies geneticamente diferenciadas e que estão bem adaptadas a um conjunto de condições ambientais em particular. A compensação ao longo de gradiente de temperatura, luz, pH ou outros fatores geralmente envolve mudanças genéticas de ecótipos, mas tais mudanças também podem ocorrer por ajustes fisiológicos. As espécies que exploram um gradiente de temperatura, ou outras condições, geralmente diferem no aspecto fisiológico e, às vezes, no morfológico em diferentes partes de sua amplitude. No geral, envolve mudanças genéticas, mas a compensação de fator pode ser realizada sem alteração genética por meio de ajustes fisiológicos nas funções do órgão ou por conta de deslocamento nas relações enzima-substrato no nível celular. Os transplantes recíprocos fornecem um método conveniente de determinar a extensão na qual a alteração genética está envolvida nos ecótipos. Mcmillan (1956), por exemplo, descobriu que as gramíneas de pradaria da mesma espécie (e aparentemente idênticas) transplantadas em jardins experimentais de diferentes partes de sua amplitude responderam de maneira bastante diferente em relação a luz. Em cada caso, o tempo de crescimento e reprodução estava adaptado a área de onde as gramíneas foram trazidas. A importância da fixação genética em raças locais foi sempre esquecida na ecologia aplicada; a reposição ou o transplante de plantas e animais falham porque são usados indivíduos de regiões remotas em vez de estoque localmente adaptado. Muitas vezes o transplante também interrompe interações de espécies e mecanismos regulatórios locais. A compensação de fator ocorre tanto ao longo dos gradientes sazonais como dos geográficos. Um exemplo amplamente estudado é o do arbusto que domina os desertos quentes e de baixa altitude no sudoeste dos Estados Unidos. Apesar do arbusto ser uma planta que realiza a fotossíntese, mesmo não adaptado às condições quentes e secas, ela pode deslocar sua temperatura ótima para cima, do inverno para o verão, por aclimatação. As altas taxas de fotossíntese são mantidas por meio de aclimatação adicional ao estresse da seca, verificado através do potencial hídricos na folha. 148 Em ambientes pobres em nutrientes, a reciclagem eficiente entre os autótrofos e os heterótrofos compensa a escassez de nutriente. Os recifes de coral e as florestas pluviais são exemplos previamente citados. Os nutrientes nitrogenados nas águas do Atlântico Norte apresentam teores tão baixos que são difíceis de ser detectados por instrumentos padronizados. Mesmo assim, ocorre a fotossíntese do fitoplâncton a altas taxas. A rápida e eficiente tomada dos nutrientes liberados pela excreção do zooplâncton e da ação bacteriana compensa a escassez geral de nitrogênio. 4 CONDIÇÕES DE EXISTÊNCIA COMO FATORES REGULATÓRIOS Os organismos não só se adaptam ao ambiente físico no sentido de tolerá-lo, mas também usam as periodicidades naturais no ambiente físico para marcar o tempo de suas atividades e “programar” seus ciclos de vida para que possam se beneficiar de condições favoráveis. Realizam isso por meio de relógios biológicos, mecanismos fisiológicos de medida de tempo. A manifestação mais comum e, talvez mais básica, é o ritmo circadiano, (de circa = “cerca”, e dies = “dia”), ou a capacidade de cronometrar e repetir funções em intervalos de cerca de 24 horas, mesmo na ausência de situações ambientais bem definidas como a luz do dia. Quando se adicionam interações entre organismos e seleção natural recíproca entre espécies (co-evolução), a comunidade inteira se torna programada para responder à sazonalidade e a outros ritmos. O ritmo circadiano dos seres humanos fica transtornado quando sofremos o “jet lag“ após uma longa viagem de avião. O relógio biológico é estabelecido por meio de ritmos biológicos e físicos que permitem aos organismos antecipar periodicidades diárias, sazonais, de marés e outras. Existe evidência crescente de que o ajuste real é obtido mediante oscilações celulares que operam como uma alça de retroalimentação envolvendo genes (DUNLAP, 1998). Os ritmos circadianos e seus osciladores celulares subjacentes são onipresentes em organismos biológicos, sendo usados para antecipar o melhor momento para se alimentar, florescer (no caso das plantas), migrar, hibernar, e assim por diante. Uma situação confiável pela qual os organismos medem o tempo de suas atividades sazonais nas zonas temperadas é o comprimento do dia ou fotoperíodo. Em contraste com a maioria dos outros fatores sazonais, o comprimento do dia é sempre o mesmo para uma dada estação do ano e localidade. A amplitude do ciclo anual do comprimento do dia aumenta com aumento da latitude, fornecendo, assim, uma referência tanto latitudinal como sazonal. O fotoperíodo tem se mostrado o gatilho que dispara as sequências fisiológicas que causam o crescimento e a floração de muitas plantas; a troca de penas/pêlos, o acúmulo de gordura, a migração e a reprodução das aves e dos mamíferos; o início da hibernação ou diapausa (estágio de dormência) dos insetos. A fotoperiodicidade é acoplada com o relógio biológico do organismo para criar um mecanismo de contagem de tempo de grande versatilidade. 149 O comprimento do dia age por meio de um receptor sensorial, como o olho em um animal ou um pigmento especial nas folhas de uma planta, que, por sua vez, ativa um ou mais sistemas hormonais e enzimáticos integrados que produzem a resposta fisiológica comportamental.Apesar de animais e plantas superiores serem muito divergentes em sua morfologia, a conexão fisiológica com a fotoperiodicidade ambiental é similar. Entre as plantas superiores, algumas espécies florescem conforme aumenta o comprimento dos dias, são as plantas de dias longos; outras que florescem em dias curtos (menos de 12 horas) são conhecidas como plantas de dias curtos. De maneira semelhante, os animais podem responder tanto ao aumento como a redução dos comprimentos dos dias. Em muitos dos organismos sensíveis ao fotoperíodo, mas não em todos, a marcação do tempo pode ser alterada por manipulação experimental ou artificial do fotoperíodo. As aves migratórias são refratárias a estímulos por fotoperíodo por vários meses após a migração de outono. Os dias curtos do outono são aparentemente necessários para “reiniciar” o relógio biológico e preparar o sistema endócrino para responder aos dias longos. A qualquer momento após o fim do outono, um aumento artificial no comprimento do dia iniciará a sequência de troca de penas, deposição de gordura, inquietação migratória e aumento de gônada que normalmente ocorre na primavera. A fisiologia dessa resposta em aves foi documentada pela primeira vez por FARNER (1964 a 1964 b). Também a fotoperiodicidade em certos insetos e em sementes de plantas anuais é bem definida, porque proporciona um controle de natalidade. Por exemplo, nos insetos, os dias longos do fim da primavera e começo do verão estimulam o gânglio nervoso a secretar um hormônio que começa a produzir a diapausa ou os ovos de resistência que não irão eclodir até a próxima primavera, por mais favorável que seja a temperatura, o alimento ou outras condições. Assim, o crescimento da população é suspenso antes, em vez de depois, que a oferta de alimentos se torne crítica. Em contraste com o comprimento do dia, a chuva no deserto é bastante imprevisível, porém as plantas anuais dos desertos, que incluem o maior número de espécies nas floras de muitos desertos, usam esse fator como um regulador. Essas plantas anuais, conhecidas como efêmeras, persistem como sementes durante os períodos de seca, mas estão prontas para germinar, florescer e produzir sementes quando a umidade estiver favorável. As sementes, em muitas dessas espécies, contêm um inibidor de germinação que precisa ser lavado por uma certa quantidade de água de chuva. Esse aguaceiro fornece toda a água necessária para completar novamente o ciclo de vida até as sementes. As plantas jovens crescem com rapidez na brilhante luz do Sol no deserto que se segue à chuva. Elas começam a florescer e produzir sementes quase imediatamente. Permanecem pequenas, sem caules ou sistemas radiculares elaborados, com toda a energia dirigida para o florescimento e produção de sementes. Se essas sementes forem colocadas no solo úmido na estufa, não germinarão; no 150 entanto, o fariam ser tratadas com aguaceiro simulado com magnitude necessária. As sementes podem permanecer viáveis no solo por muitos anos, como que “esperando” pelo aguaceiro adequado, o que explica por que os desertos apresentam floração (se tornam rapidamente coberto por flores) logo após uma chuva pesada. 5 OUTROS FATORES FÍSICOS LIMITANTES O amplo conceito de fatores limitantes não se restringe aos fatores físicos, pois as inter-relações biológicas são tão importantes quanto esses fatores no controle da distribuição real e da abundância dos organismos na natureza. ESTUDOS FUTUROS Fatores biológicos serão considerados na Unidade 3 nos Tópicos 1 e 2 em que tratam os aspectos relevantes a populações e comunidades biológicas. A ecofisiologia é a parte da ecologia que diz respeito às respostas dos organismos individuais ou das espécies aos fatores abióticos, como a temperatura, luz, umidade, gases atmosféricos etc. Vamos abordar aqui alguns poucos fatores importantes que os ecólogos precisam apreciar para entender as relações abióticas e bióticas em níveis mais elevados da organização bioecológica. 5.1 TEMPERATURA Comparada com a amplitude de milhares de graus conhecidos que ocorrem no universo, a vida como conhecemos pode existir somente dentro de uma pequena faixa de cerca de 300 °C (de -200 °C até 100 °C). A maioria das espécies e das atividades estão restritas a uma faixa ainda mais estreita de temperatura. Alguns organismos, especialmente em um estágio de repouso, podem existir a temperaturas muito baixas, enquanto alguns microrganismos, principalmente bactérias e algas, podem viver e se reproduzir em nascentes hidrotérmicas, nas quais a temperatura está próxima do ponto de ebulição. A tolerância superior de temperatura para as bactérias de nascentes hidrotérmicas é de 80 °C para cianobactéria, comparada com os 50 °C para os peixes e insetos mais tolerantes. Em geral, os limites superiores são mais críticos que os inferiores, apesar de muitos organismos funcionarem de forma mais eficiente em direção aos limites superiores de suas amplitudes de tolerância. Amplitude de variação da temperatura tende a ser menor em água do que em terra, e os organismos aquáticos geralmente têm amplitudes mais estreitas de tolerância à temperatura que os animais terrestres. A temperatura, portanto, é importante como fator limitante. 151 A temperatura é um dos fatores ambientais mais fáceis de se medir. O termômetro de mercúrio, um dos primeiros e mais usados instrumentos de precisão científica, foi agora substituído pelos aparelhos (sensores) elétricos, como termômetros de resistência de platina, pares termoelétricos e termistores, que permitem não somente medir em lugares de difícil acesso, mas também registrar contínua e automaticamente as medidas. Além disso, os avanços na radiotelemetria tornam possível transmitir informações de temperatura do corpo de um lagarto no fundo de sua toca ou de uma ave migratória voando alto na atmosfera. A variabilidade de temperatura é extremamente importante do ponto de vista ecológico. Uma temperatura que flutua entre 10 °C e 20 °C, com média em torno de 15 °C, não tem necessariamente o mesmo efeito nos organismos com uma temperatura constante de 15 °C. Os organismos sujeitos a temperaturas variáveis na natureza (como na maioria das regiões temperadas) tendem a ser deprimidos, inibidos ou mais vagarosos quando estão sob temperaturas constantes. Por exemplo, SHELFORD (1929), em um estudo pioneiro, descobriu que os estágios de ovos e larvas (ou pupa) do bicho da maçã (Cydia pomonella) se desenvolveram 7% a 8% mais rápido sob condições de temperatura variável do que sob uma temperatura constante, com a mesma média. Assim, o efeito estimulante das temperaturas variáveis, nas zonas temperadas pelo menos, pode ser encarado como um princípio ecológico bem aceito, especialmente porque a tendência foi conduzir trabalho experimental no laboratório sobre condições de temperatura constante. 5.2 LUZ A luz coloca os organismos no cerne de um dilema: a exposição direta do protoplasma à luz causa morte, embora a luz do Sol seja a fonte fundamental de energia e sem a qual a vida não poderia existir. Consequentemente, muitas das características estruturais e comportamentais dos organismos estão preocupadas em resolver esse problema. De fato, como observado na discussão sobre hipótese de Gaia (Unidade 1), a evolução da biosfera tem envolvido a “adaptação” da radiação solar que a atinge, de modo que os comprimentos de onda úteis possam ser explorados, ao passo que os perigosos possam ser mitigados ou evitados. A luz, portanto, não é só um fator vital, é também um fator limitante, tanto no seu nível máximo como no mínimo. Não há, talvez, outro fator de maior interesse para os ecólogos. Duas faixas de comprimento de onda penetram de imediato atmosfera da Terra, a faixa do visível, com algumas partes das faixas adjacentes, e a faixa de rádio de baixa frequência, com comprimentos de ondas maiores que 1 cm. Não se sabe se as ondas longas de rádio são significantes no aspecto ecológico,apesar de alguns pesquisadores declararem existir efeitos positivos em aves migratórias ou outros organismos. 152 Do ponto de vista ecológico, a qualidade (comprimento de onda ou cor), a intensidade (energia real medida em gramas-calorias) e a duração (comprimento do dia ou fotoperíodo) da luz são reconhecidas como importantes. Tanto os animais como as plantas respondem a diferentes comprimentos de onda de luz. A visão de cores nos animais ocorre esporádicamente em diferentes grupos taxonômicos, sendo bem desenvolvida em certas espécies de artrópodes, peixes, aves e mamíferos, mas não em outras espécies do mesmo grupo (entre mamíferos, por exemplo, a visão de cor é bem desenvolvida somente em primatas). A taxa de fotossíntese varia com diferentes comprimentos de onda. Em ecossistemas terrestres, a qualidade da luz solar não variar o suficiente para ter um efeito diferencial importante na taxa de fotossíntese, mas quando a luz penetra na água, os vermelhos e os azuis são filtrados por atenuação, e a luz esverdeada resultante é pouco absorvida pela clorofila. As algas marinhas vermelhas (Rhodophyta), no entanto, apresentam pigmentos suplementares (ficoeritrunas), capacitando-as a usar essa energia e a viver em profundidades maiores do que seria possível para as algas verdes. A intensidade luminosa (entrada de energia) impingida à camada autotrófica controla o ecossistema inteiro por meio de sua influência na produção primária. O relacionamento entre a intensidade luminosa e a fotossíntese tanto nas plantas terrestres como nas aquáticas segue o mesmo padrão geral de aumento linear até um nível ótimo ou de saturação de luz, seguido, em muitas instâncias, por um decréscimo nas altas intensidades da luz solar plena. No entanto, algumas plantas, ao realizarem a fotossíntese, atingem a saturação a altas intensidades e não são inibidas pela luz solar plena. O fator compensação ocorre em relação a luz porque tanto as plantas individuais quanto as comunidades se adaptam a diferentes intensidades luminosas ao se tornarem plantas de sombra (atingindo a saturação em baixas intensidades) ou plantas de sol. As diatomáceas que vivem na areia da praia ou em planícies lodosas de maré são extraordinárias por que atingem a taxa máxima de fotossíntese quando a intensidade luminosa é menor que 5% da luz solar total. Ainda assim, essas diatomáceas são pouco inibidas pelas altas intensidades. As algas do fitoplâncton, ao contrário, são adaptadas à sombra e são muito inibidas pelas altas intensidades, o que explica o fato de o pico de produção no mar geralmente ocorrer abaixo em vez de logo na superfície. 5.3 RADIAÇÕES IONIZANTES As radiações de energia muito alta podem remover os elétrons dos átomos e fixá-los em outros átomos, produzindo com isso pares iônicos positivos e negativos, conhecidos como radiações ionizantes. A luz e a maioria das outras radiações solares não têm este efeito ionizante. Acredita-se que a ionização seja a principal causa dos danos da radiação à vida, e que a avaria é proporcional ao número de pares 153 iônicos produzidos no material absorvente. As radiações ionizantes são produzidas pelos materiais radioativos na Terra e também são recebidas do espaço. Os isótopos dos elementos que emitem as radiações ionizantes são chamados de radionucleídeos ou radioisótopos. A radiação ionizante no ambiente tem aumentado perceptivelmente pelos esforços humanos em usar a energia atômica. Os testes com armas nucleares injetam radionucleídeos na atmosfera que, depois, retorna à Terra como “chuva” global. Cerca de 10% da energia de uma arma nuclear é expendida em radiação residual. As usinas nucleares (e os processamentos de combustível e disposição de resíduos em outros locais), pesquisas médicas e outros usos pacíficos da energia atômica produzem “pontos quentes” locais e resíduos que frequentemente escapam para o ambiente durante o transporte ou o armazenamento. A falha em evitar as emissões acidentais e em resolver o problema dos resíduos radioativos são as principais razões por que a energia atômica não alcançou o seu potencial como fonte de energia para as sociedades humanas. Das três radiações ionizantes de interesse ecológico primário, duas são corpusculares (radiações alfa e beta) é uma eletromagnética (radiação gama e a radiação X relacionada). A radiação corpuscular consiste em correntes de partículas atômicas subatômicas que transferem sua energia para qualquer material que atingem. As partículas alfas são núcleos de átomos de hélio que viajam somente alguns centímetros no ar e podem ser barradas por uma folha de papel ou a epiderme da pele humana, mas quando isso ocorre produzem uma grande quantidade de ionização no local. As partículas betas são elétrons de alta velocidade (partículas muito menores que podem viajar vários metros no ar ou até alguns centímetros para dentro do tecido e liberam a sua energia ao longo de um trecho maior). As radiações eletromagnéticas ionizantes são de comprimentos de onda muito mais curtos que a luz visível; viajam grandes distâncias e penetram na matéria imediatamente, liberando sua energia em longos trechos (a ionização é dispersada). Por exemplo, os raios gama penetram facilmente em materiais biológicos; um raio gama pode atingir um organismo sem ter nenhum efeito ou pode produzir ionização sobre um longo trecho. O efeito dos raios gama depende do número e da energia do raio, bem como da distância que o organismo está da fonte, pois a intensidade decresce exponencialmente com a distância. A série alfa-beta-gama é de penetração crescente, mas de concentração de ionização medida no local decrescente, portanto, os biólogos classificam as substâncias radioativas que emitem partículas alfa ou beta como emissores internos, porque seu efeito máximo provável será quando for absorvido, ingerido ou de outra forma depositado dentro ou próximo do tecido vivo. Ao contrário, a substâncias radioativas que são primariamente emissoras gama são classificadas como emissores externos, porque são penetrantes e podem produzir efeitos sem que sejam ingeridas. 154 Outros tipos de radiação de interesse dos ecólogos incluem raios cósmicos, que são radiações de fora do espaço exterior e constam de uma mistura de componentes corpusculares e eletromagnéticos. A intensidade dos raios cósmicos na ecosfera é baixa, mas eles são um grande perigo nas viagens espaciais. Os raios cósmicos e a radiação ionizante de fontes naturais radioativas no solo e na água produzem o que é chamado de radiação de fundo, à qual as biotas atuais estão adaptadas. De fato, a biota pode depender dessa radiação de fundo para manter a fluidez genética. A radiação de fundo varia de três a quatro vezes em várias partes da ecosfera; seu valor é mínimo na superfície do mar ou abaixo dela, e é máximo em grandes altitudes, como nas montanhas graníticas. Os raios cósmicos aumentam a intensidade com aumento da altitude, e as rochas graníticas apresentam mais radionucleídeos (que ocorre naturalmente) do que as rochas sedimentares. Um estudo do fenômeno da radiação requer dois tipos de medidas: (1) uma medida do número de desintegrações que ocorrem em uma quantidade de substâncias radioativas; e (2) uma medida da dosagem de radiação em termos de energia absorvida que possa causar ionização e avaria. A unidade básica da quantidade de substância radioativa é o curie (Ci), definida como a quantidade de material no qual 3,7 x 1010 átomos desintegram a cada segundo, ou 2,2 × 1012 desintegrações por minuto. O peso real do material que forma um curie é muito diferente para um isótopo de longa vida e decaimento lento, comparado a um decaimento rápido. Como um curie representa uma quantidade relativamente grande de radioatividade do ponto de vista biológico, são muito mais usadas unidades menores: milicurie (mCi) = 10-3 Ci; microcurie (µCi) = 10-6 Ci; nanocurie (nCi) = 10-9 Ci; e picocurie (pCi) = 20-12 Ci. O curie indica quantaspartículas alfa ou beta, ou raios gama, são emitidos de uma fonte radioativa por unidade de tempo. A dosagem, outro aspecto importante da radiação, tem sido medida em diversas escalas. A unidade mais conveniente para todos os tipos de radiação é o rad, definido como uma dose absorvida de 100 ergs (10-5 joules) de energia por grama de tecido. Roentgen (R) é uma unidade mais antiga que, de modo rigoroso, deve ser usada somente para raios X e gama. Para os efeitos em organismos vivos, o rad e o roentgen são quase a mesma coisa. O roentgen ou rad é a unidade da dosagem total. A taxa de dosagem é a quantidade recebida por unidade de tempo. Assim, se um organismo está recebendo 10 mR por hora, a dose total em um período de 24 horas seria de 240 mR por hora, ou 0,240 R/h. O tempo em que uma dose é recebida é uma consideração importante. Em geral, os organismos superiores e mais complexos são mais facilmente prejudicados ou mortos pela radiação ionizante. Os seres humanos são um dos mais sensíveis. Doses altas únicas, liberadas em intervalos curtos (minutos ou horas), são conhecidas como doses agudas, em contraste com as doses crônicas de radiação subletal que podem ocorrer continuamente por todo o ciclo de vida. 155 A maioria dos estudos mostra que células em divisão rápida são as mais sensíveis à radiação (o que explica por que a sensibilidade diminui com a idade). Assim, qualquer componente que passar por crescimento rápido pode ser afetado por níveis baixos de radiação, independentemente das relações taxonômicas. Os efeitos das doses crônicas de baixo nível são mais difíceis de medir, porque podem estar envolvidos efeitos genéticos, assim como somáticos de longo prazo. Em plantas superiores, a sensibilidade às radiações ionizantes tem sido demonstrada como diretamente proporcional ao tamanho do núcleo da célula ou, mais especificamente, o volume de cromossomos ou conteúdo de DNA. No campo, outras considerações, como a proteção das partes sensíveis em crescimento ou regeneração (quando subterrâneas), determinariam a sensibilidade relativa. Quando os radionucleídeos são liberados no ambiente, geralmente são dispersos e diluídos, mas podem se concentrar em organismos vivos durante a transferência na cadeia alimentar, o que é classificado sob o título geral de magnificação biológica. A substâncias radioativas também podem se acumular em solos, a água, sedimentos ou ar se a entrada exceder a taxa natural de decaimento radioativo; assim, uma quantidade aparentemente inócua de radioatividade pode logo se tornar letal. A razão entre a quantidade de radionucleídeos em um organismo em relação ao ambiente é chamada de fator de concentração. O comportamento químico de um isótopo radioativo é essencialmente o mesmo do isótopo não radioativo do mesmo elemento. Portanto, a concentração observada no organismo não é o resultado da radioatividade, mas demonstra, de modo mensurável, a diferença entre a densidade do elemento em um ambiente e no organismo. Por exemplo, o iodo-131 radioativo (131I) se concentra na tireoide como um iodo não radioativo. Alguns radionucleídeos sintéticos também se concentram por causa de sua afinidade química com os nutrientes que são naturalmente concentrados pelos organismos. 5.4 ÁGUA A água é uma necessidade fisiológica para toda a vida, e do ponto de vista ecológico, um fator limitante nos ambientes terrestres e aquáticos nos quais a quantidade pode flutuar muito ou a alta salinidade provoca a perda de água dos organismos por osmose. A chuva, a umidade, o poder de evaporação do ar e o suprimento disponível de água superficial são os principais fatores medidos. 156 5.4.1 Chuva A chuva é determinada principalmente pela geografia e pelo padrão de grandes movimentos do ar ou de sistemas de condições meteorológicas. A distribuição de chuvas durante o ano também é um fator limitante muito importante para os organismos. Por exemplo, a situação proporcionada por uma chuva com volume de 890 mm, uniformemente distribuída ao longo do tempo, é bem diferente da fornecida por 890 mm de chuva que cai durante uma parte restrita do ano. Nesse último caso, plantas e animais devem ser capazes de sobreviver a longas secas (e a enchentes súbitas). A chuva tende a ser distribuída de forma desigual entre as estações nas regiões tropicais e subtropicais, muitas vezes resultando em estações bem definidas de chuva e seca. Nos trópicos, esse ritmo sazonal de umidade regula as atividades sazonais (em especial a reprodução) dos organismos, tanto quanto o ritmo sazonal da temperatura e da luz regula os organismos que vivem nas zonas temperadas. Nos climas temperados, a chuva tende a ser mais uniformemente distribuída ao longo do ano, apesar das muitas exceções. 5.4.2 Umidade A umidade representa quantidade de vapor de água no ar. A umidade absoluta é a quantidade real de água no ar expressa como peso de água por unidade de ar (gramas por quilograma de ar, por exemplo). Como a quantidade de vapor de água que o ar pode reter (na saturação) varia com a temperatura e a pressão atmosférica, a umidade relativa representa a porcentagem de vapor de água realmente presente, comparada com a densidade de saturação sob condições existentes de temperatura e pressão. Em geral, umidade relativa tem sido a medida mais usada no trabalho ecológico, apesar de o inverso da umidade relativa, déficit da pressão de vapor (diferença entre a pressão parcial de vapor de água na saturação e a pressão de vapor real), ser muitas vezes referido como uma medida das relações de umidade, porque a evaporação tende a ser proporcional ao déficit de pressão de vapor em vez de proporcional à umidade relativa. Por conta do ritmo diário da umidade na natureza (alta à noite e baixa durante o dia, por exemplo), bem como das diferenças verticais e horizontais, a umidade, a temperatura e a luz ajudam a regular as atividades dos organismos e a limitar sua distribuição. A umidade é importante pelo fato de modificar os efeitos na temperatura. 5.4.3 Poder de evaporação do ar O poder de evaporação do ar é importante do ponto de vista ecológico, especialmente para as plantas terrestres. Os animais podem, muitas vezes, regular suas atividades para evitar desidratação, mudando-se para lugares protegidos ou tornando- se ativos a noite; as plantas, no entanto, não podem se mover. Entre 97% e 99% da água que passa do solo para as plantas é perdida por meio da evaporação pelas folhas. Essa evaporação, chamada de evapotranspiração, é a característica única da energética 157 dos ecossistemas terrestres. Quando a água e os nutrientes não são limitantes, o crescimento das plantas terrestres é bastante proporcional ao suprimento total de energia na superfície do solo. Como a maior parte da energia é calor, e como a fração que fornece o calor latente para a transpiração é quase constante, o crescimento é também proporcional à transpiração. Apesar das muitas complicações biológicas e físicas, a evapotranspiração total está amplamente relacionada a taxa de produtividade. Por exemplo, Rosenzweig (1968) descobriu que a evapotranspiração é um descritor bastante significativo na previsão da produção primária líquida anual acima do solo (Pn) em comunidades terrestres maduras ou clímax de todos os tipos (desertos, tundras, campos e florestas); no entanto, a relação não é confiável em vegetação instável ou em desenvolvimento. A baixa correlação entre a energia assimilada e Pn nas comunidades em desenvolvimento tem lógica, pois essas comunidades não atingiram ainda as condições de equilíbrio entre os seus ambientes de energia e de água. A razão entre produção primária líquida e a quantidade de água transpirada é chamada eficiência de transpiração e é expressa em gramas de matéria seca produzida por 1000 g de água transpirada. Muitas espécies de produtos agrícolas (e uma grande amplitude de espécies não cultivadas) têm eficiência de transpiração de dois ou menos (ou seja, 500gramas ou mais de água perdida por grama de matéria seca produzida). Os cultivos resistentes à seca, como o sorgo (Sorghum bicolor) e o milho- miúdo (Panicum ramosum), têm eficiência de transpiração de até quatro. No entanto as plantas do deserto podem ter menos que essa eficiência. Sua adaptação singular envolve não a habilidade de crescer sem transpiração, mas a capacidade de se tornar dormente quando não há água disponível (em vez de murchar e morrer, como seria o caso das plantas não desérticas). As plantas de deserto que perdem suas folhas e expõem somente brotos ou caules verdes durante os períodos de seca mostram uma alta eficiência de transpiração. Os cactos que empregam o tipo específico de fotossíntese, reduzem a perda de água mantendo seus estômatos (estrutura biológica responsável por trocas gasosas) fechados durante o dia. 5.4.4 Suprimento de água superficial O suprimento de água superficial disponível está, certamente, relacionado com a chuva na área, mas existem discrepâncias por conta da natureza do substrato no qual a chuva cai. As dunas costeiras são exemplos de locais em que mesmo que ocorram chuvas abundantes na região, toda água é drenada com tanta rapidez através do solo poroso que as plantas, especialmente as herbáceas, encontram pouca água disponível na camada mais superficial desse solo. As plantas e os pequenos animais dessas áreas comportam-se como os organismos das regiões mais secas. 158 Além disso, o represamento artificial de água corrente através das represas ajudou aumentar a disponibilidade de suprimento hídricos local, assim como a criar recreação e energia hidrelétrica. No entanto, esse aparato de engenharia mecânica, por mais útil que seja, não deveria ser visto como substituto de práticas de uso de terra seguras como agricultura e silvicultura, que represam a água em suas fontes ou perto delas para maior utilidade. Do ponto de vista ecológico, a água como mercadoria cíclica no ecossistema é muito importante. Ainda, o orvalho pode contribuir de forma considerável e, em áreas de baixa precipitação, de forma vital para o fornecimento de água. O orvalho e o nevoeiro baixo são importantes em florestas costeiras e desertos. O nevoeiro na costa oeste dos Estados Unidos representa até duas a três vezes mais água que a precipitação anual. Árvores altas, como a sequoia costeira (Sequoia sempervirens), interceptam o nevoeiro costeiro que se move para o continente e podem colher até 150 cm de “chuva” que pinga dos galhos. 5.5 ÁGUA SUBTERRÂNEA Para a humanidade, a água subterrânea é um dos recursos mais importantes, porque temos acesso, em muitas regiões, a uma grande quantidade de água além daquela que cai como chuva. As cidades e a agricultura irrigada, localizadas em desertos e outras regiões secas, são possíveis graças ao acesso a água subterrânea. Infelizmente, muito dessa água foi armazenada em eras passadas e não está sendo reposta ou está sendo reposta a uma taxa mais lenta do que está sendo explorada. A água subterrânea de regiões áridas, assim como o petróleo, é um recurso não renovável. A água subterrânea fornece 25% da água doce usada para todos os propósitos nos Estados Unidos, e cerca de 50% da água de abastecimento. O uso da água em irrigação no país aumentou continuamente de 1965 a 1980 porque o uso da água em irrigação depende de fatores como a precipitação, disponibilidade de água, custos energéticos, preços de mercadorias agropecuárias, aplicação de tecnologia e práticas de conservação. A quantidade total de água usada para irrigação diminuiu de 1980 a 1995, embora a área total irrigada permaneça consistente em cerca de 23,5 milhões de hectares (PIERZYNSKI et al., 2000). Esses dados sugerem que fatores como práticas de conservação, uso reduzido de energia e tecnologias apropriadas podem diminuir significativamente a quantidade de água subterrânea usada em irrigação. Assim como no caso de outros capitais naturais abundantes, a água subterrânea tende a ser considerada como certa e foi muito pouco estudada até que sinais de seu esgotamento e poluição mostraram que fatores limitantes estavam envolvidos. Os maiores estoques de água subterrânea estão em aquíferos, estratos subterrâneos por porosos muitas vezes compostos de pedra calcária, areia ou cascalho, limitados por rochas ou argila impermeáveis que mantém a água como um tanque 159 gigante. A água entra por locais onde os estratos permeáveis estão próximos a superfície ou de alguma maneira cruzam o lençol freático superficial; a água pode sair do aquífero pelas fontes (mina d’água) ou outras descargas na superfície ou próximo dela. Onde o declive do aquífero segue em direção ao mar, vindo de áreas de recarga em altitudes maiores, a água no aquífero mais profundo fica sob pressão e jorra acima da superfície, como um chafariz ao se cavar um poço. A entrada (chuva ou recarga do cinturão de neve) e a saída (água que retorna para o ciclo hidrológico dos rios, oceanos e atmosfera) anuais para esse enorme reservatório estão estimadas em torno de uma e 120 partes do volume total. Apesar de as retiradas totalizarem somente cerca de 1/10 do volume de recargas, alguns aquíferos mais intensamente utilizados estão localizados em regiões de baixa ou nenhuma recarga. Por exemplo, cerca de 1/4 de todas as retiradas dos aquíferos são saldos negativos (que excedem a recarga), principalmente nas regiões agrícolas do oeste dos Estados Unidos. O esgotamento não é a única ameaça para água subterrânea. A contaminação por substâncias químicas tóxicas pode ser uma ameaça ainda maior. Pelo menos o problema de resíduos tóxicos tem soluções tecnológicas, se a sociedades quiserem e estiverem aptas a pagar o custo de proteger seus recursos hídricos que, em longo prazo, são mais preciosos que o petróleo ou ouro. De fato, pode-se discutir a proposta de que para a civilização água doce utilizável é potencialmente um fator limitante maior que energia. Os problemas com água variam conforme a região, mas nenhuma região está livre de ter algum tipo de problema com a água. Como a água é encarada como mercadoria não comercial, a opinião pública e a intervenção política são importantes para impedir tanto esbanjamento como o completo esgotamento desse recurso. Não há dúvida de que a água doce de qualidade está se tornando um grave fator limitante para os humanos em escala global (GLEICK, 2000). 5.6 AÇÃO CONJUNTA DE TEMPERATURA E UMIDADE Com base no conceito de ecossistema, evitamos criar a impressão de que os fatores ambientais operam independentemente uns dos outros. Este tópico tenta mostrar que a consideração dos fatores individuais é um meio de abordar os problemas ecológicos complexos, mas não é o objetivo final do estudo ecológico, que é o de avaliar a importância relativa dos vários fatores conforme operam em conjunto em ecossistemas reais. A temperatura e a umidade são tão importantes e interagem tão intimamente nos ambientes terrestres que são considerados os aspectos mais importantes do clima. A interação entre temperatura e umidade, assim como a interação entre a maioria dos fatores, depende tanto dos valores relativos como dos valores absolutos de cada fator. Assim, a temperatura exerce um efeito limitante mais severo nos organismos tanto quando há abundância como quando há pouca umidade, ou quando em condição moderada. Do mesmo modo, a umidade é crítica em extremos de temperatura. De certa 160 maneira, esse é outro aspecto do princípio da interação de fator. Por exemplo, o besouro- bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) pode tolerar melhor temperaturas mais altas quando a umidade é baixa ou moderada do que quando é muito alta. A condição quente e seca no cinturão de algodão é um sinal para os fazendeiros tomarem cuidado com aumento da população de besouros. A condição quente e úmida e menos favorável para o besouro, mas, infelizmente, não tão boa para a planta do algodão. Grandes corpos de água atenuam bastante os climas