Prévia do material em texto
1 EDUCAÇÃO EM SAÚDE: AVANÇOS, MÍDIAS DIGITAIS E DESAFIOS DO SÉCULO XXI DENNIS SOARES (Organização) 2 EDUCAÇÃO EM SAÚDE: AVANÇOS, MÍDIAS DIGITAIS E DESAFIOS DO SÉCULO XXI DENNIS SOARES (Organização) FICHA CATALOGRÁFICA 10.48209/978-65-00-17616-2 1.ª Edição - Copyright© 2021 do autor. CONSELHO EDITORIAL Msc. Ivanio Folmer - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/2379707211288456 Msc. Gabriella Eldereti Machado – UFSM – Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/5628308415823159 Dr. Adilson Tadeu Basquerot e Silva Centro Universitário para o Desenvolvi- mento do Alto Vale do Itajaí (UNIDAVI) http://lattes.cnpq.br/8318350738705473 Msc. Jesica Wendy Beltrán - UFCE- Colombia http://lattes.cnpq.br/0048679279914457 Dra. Fabiane dos Santos Ramos - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/0003382878348789 Dr. João Riél Manuel Nunes Vieira de Oliveira Brito - UAL -Lisboa- Portugal. http://lattes.cnpq.br/1347367542944960 Msc. Rodrigo de Morais Borges - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/4696236455119397 Dra. Alessandra Regina Müller Germani - UFFS- Passo Fundo/RS http://lattes.cnpq.br/7956662371295912 Dra. Micheli Bordoli Amestoy - UFSM - Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/7865042624189677 Esp. Thais de Melo Amaral Machado - UFV- Araxá/MG http://lattes.cnpq.br/2592090131289979 Dr. Everton Bandeira Martins - UFFS - Chapecó/SC http://lattes.cnpq.br/9818548065077031 Cássio Rodrigo Aguiar - UFSM- Santa Maria /RS http://lattes.cnpq.br/5541624029364072 Dr. Erick Kader Callegaro Corrêa- UFN - Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/2363988112549627 Dr. Pedro Henrique Witchs - UFES - Vitória/ES http://lattes.cnpq.br/3913436849859138 Msc. Luiza Carbunck Godoi - UFRGS- Porto Alegre/RS http://lattes.cnpq.br/4447866451051627 Msc. Alberto Barreto Goerch - UNISINOS-São Leopoldo/RS http://lattes.cnpq.br/7845816473131059 Dr. Mateus Henrique Köhler - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/5754140057757003 Msc. Yosani Morales Martínez - UFSM - Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/3656123692269129 Msc. Alisson Galvão Flores - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/1218196537137303 Dra. Liziany Müller Medeiros - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/1486004582806497 Dr. Camilo Darsie de Souza - UNISC- Santa Cruz do Sul/RS http://lattes.cnpq.br/4407126331414792 João Felipe Llehmen - UNISC- Santa Cruz do Sul/RS http://lattes.cnpq.br/9018174122542310 Msc. Claudionei Lucimar Gengnagel - UPF - Passo Fundo/RS http://lattes.cnpq.br/3676481979050032 Msc. Sandi Mumbach – UFSM – Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/0222637186466933 Esp. Ana Paula Visintainer Coelho - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/0410723770403484 Dra. Aline Ferreira Pain - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/5813893425276768 Msc. Itagiane Jost - IFFar - São Vicente do Sul/RS http://lattes.cnpq.br/7751407219167290 Msc. Flávio Cezar dos Santos -SMEDSC- Chapecó/sc http://lattes.cnpq.br/4711802547326257 Msc. Gabriel de Oliveira Soares - UFN - Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/5182622667860285 Dr. Dioni Paulo Pastorio - UFRGS - Porto Alegre/RS http://lattes.cnpq.br/7823646075456872 Msc. Sara Beatriz Eckert Huppes - SEDUC/RS- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/3412482515928321 Dra. Maria Cristina Rigão Iop - UNISC - Santa Cruz do Sul/RS http://lattes.cnpq.br/8028841762393298 Msc. Fagner Fernandes Stasiaki- URI http://lattes.cnpq.br/0614691997654146 Dr. Leonardo Bigolin Jantsch- UFSM- Palmeira das Missões/RS http://lattes.cnpq.br/0639803965762459 Dr. Leandro Antônio dos Santos- UFU– Uberlândia/MG http://lattes.cnpq.br/4649031713685124 Dr. Rafael Nogueira Furtado UFJF- Juiz de Fora/MG http://lattes.cnpq.br/9761786872182217 Adilson Cristiano Habowski- Universidade La Salle - Canoas/RS http://lattes.cnpq.br/2627205889047749 Dra. Angelita Zimmermann - UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/7548796037921237 Msc. Anísio Batista Pereira - UFU - Uberlândia/MG http://lattes.cnpq.br/5123270216969087 Esp. Dennis Soares Leite- UFSCar-São Carlos/SP http://lattes.cnpq.br/4205979645558904 Msc. Juliane Paprosqui Marchi da Silva- UFSM- Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/4553161791704500 Dra. Francielle Benini Agne Tybusch – UFN - Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/4400702817251869 Msc. Martiéli de Souza Rodrigues - UFSM – Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/1460690648891778 Msc. Taciana Uecker - UFSM – Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/9050445553522704 Msc. Helena Maria Beling - UFSM – Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/1552124711477113 Msc. Natana Pozzer Vestena – UFSM – Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/1615166675823511 Dra. Janete Webler Cancelier UFSM – Santa Maria/RS http://lattes.cnpq.br/7710315647430813 Msc. Francisco Odécio Sales Instituto Federal do Ceará (IFCE) http://lattes.cnpq.br/5358752623192820 Msc. Camila do Nascimento Cultri Universidade Federal de São Carlos http://lattes.cnpq.br/1283889033381595 APRESENTAÇÃO A educação em saúde ganha cada vez mais notoriedade no meio acadêmico e nas discussões externas que mostram a importância de sua prática integradora na so- ciedade. Quando pensamos em educação em saúde direcionamos a ideia de inter- venções pautadas no meio acadêmico ou limitada a espaços que trabalham com a saúde, certo? Entretanto, sabemos que a educação x saúde perpassa espaços caracterizados como dominantes do conhecimento e com isso surgiu a educação popular em saúde e todo o impacto para a sociedade contemporânea. A educação na saúde ainda precisa de mais reflexões frente as suas práticas e for- mas de aprendizagem, tentando integrar as mídias sociais frente as intervenções de ações, além de pensar os desafios nos espaços acadêmicos e prática profissional. O Ministério da Saúde possui a Política Nacional de Promoção de Saúde, que objetiva identificar os principais pontos de práticas para o cuidado integral e longitudinal. Além disso, não podemos limitar a educação em saúde direcionada apenas para profissio- nais de saúde, mas sim de forma transdisciplinar e consequentemente obtendo um maior impacto nas ações. O livro visa trazer algumas experiências espalhadas pelo Brasil sobre educação em saúde e reflexões direcionadas as mídias sociais e desafios no século XXI, que obje- tiva qualificar e propor ações para potencializar a educação em saúde. Boa leitura! SUMÁRIO REDES SOCIAIS NA INTERNET E A SAÚDE COLETIVA: ALGUMAS REFLEXÕES......................................................................................9 Julio Cesar de Lima Ramires CONSTRUÇÃO DE AÇÕES DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE NO ENSINO SUPERIOR.........................................................................................25 Sandrelena da Silva Monteiro Juliane Figueiredo Fonseca Gustavo Roberto de Lima Leandro Damasceno Kreutzfeld Nathalia Serra Antunes Raquel Rinco Dutra Pereira Ruthmary Fernanda de Souza Fernandes Sarah Menezes Rocha MUNDO INTERIOR DO ESPECTRO AUTISTA EM DISCUSSÃO: TÓPICOS ESPECIAIS EM DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DOS SINTOMAS..................................................................................37 Nicolle dos Santos Moraes Nunes Jacqueline Stephanie Fernandes do Nascimento Janie Kelly Fernandes do Nascimento Marcela de Moraes Mesquita Dellaiane Caroline Barbosa Livia Spala Tenorio Faria Antônio Marcos da Silva Catharino Marco Antônio Alves Azizi Marco Orsini O SOFRIMENTO PSÍQUICO EM ACADÊMICOS DE MEDICINA E O CONSUMO DE PSICOFÁRMACOS: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-CULTURAL................................................................57 Adaline Franco Rodrigues Silvia Segovia Araujo Freire Sonia da Cunha Urt Soraya Cunha Couto Vital Marília Camargo Souto CONCEPÇÕES DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE ACERCA DA SEXUALIDADE E PREVENÇÃO DE HIV/AIDS EM IDOSOS USUÁRIOS DE CENTRO DE CONVIVÊNCIA.....................................................84Adna Viviane Rocha Freire Ana Luiza Ferreira Martins Dennis Soares Leite Rodolfo Gomes do Nascimento Keila de Nazaré Madureira Batista SOBRE O ORGANIZADOR......................................................104 9 10.48209/978-65-00-17616-1 REDES SOCIAIS NA INTERNET E A SAÚDE COLETIVA: ALGUMAS REFLEXÕES Julio Cesar de Lima Ramires1 1 Professor Titular do Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia. Doutor em Geografia Humana pela USP. Especialista em Geografia da Saúde e Geo- grafia Urbana. E-mail: ramires_julio@yahoo.com.br. 10 INTRODUÇÃO Vivenciamos profundas transformações no mundo atual, afetando as diferentes dimensões da vida social, da política, da economia, da cultura, e também da orga- nização espacial. As novas tecnologias de informação e comunicação e a internet, como uma das suas expressões mais significativas, têm promovido concepções po- sitivas e negativas sobre suas implicações no modo de vida da sociedade contem- porânea. Essas posturas são embasadas, teoricamente, em diferentes enfoques e paradigmas das ciências sociais e humanas. A realização de eventos sobre novas tecnologias e saúde, indicam que essa área também está profundamente inserida nessa realidade, e tomando como exem- plo as edições do Congresso Brasileiro de Medicina de Telemedicina e Telessaúde realizado a cada dois anos, desde 2003, é possível verificar a riqueza de aplicações nos eixos de Tecnologia da Informação na Saúde (TIC), na Teleducação e na Teles- saúde. No evento realizado em 2019, por exemplo, procurou-se contemplar sete ei- xos para a apresentação dos trabalhos, a saber: Teleassistência e Telecuidado; TICs na Promoção e Prevenção à Saúde; TICs na Educação Médica e das Profissões da Saúde; TICs na Vigilância em Saúde; Tecnologias disruptivas em Saúde; Telemedici- na e Telessaúde aplicadas à Gestão na Saúde; Legislação e Normas em Telemedici- na, Telessaúde e Saúde Digital. Na 17ª edição do Congresso Brasileiro de Informática em Saúde definiu-se seis eixos: Informática Translacional, que trata dos métodos de armazenamento/aná- lise/processamento de dados clínicos, como o genoma e outros; Informática Clínica, que é o uso da tecnologia de informação e comunicação (TIC) no atendimento à saúde; Infoestrutura, Interoperatividade e Integração, que trata dos métodos para desenvolver, testar e implementar sistemas de captura, registro, compartilhamento e integração de dados clínicos; Saúde Digital Global e Mobilidade, que aborda os me- canismo da informática centrados no usuário; Educação, Treinamento e Formação profissional; Organização, Gestão, Avaliação, e Impacto Social da Informática em Saúde e da Saúde Global. No Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde realizado 11 em 2019, constatamos, por sua vez, apenas um Grupo de Trabalho sobre as novas tecnologias em saúde, denominado Internet, saúde e sociedade, subdividido, por sua vez, em três eixos: Avaliação de Qualidade de Informação em Saúde na Internet; Em- poderamento nas Redes Sociais de Saúde na Internet; Experiências de Educação em Saúde Online. Deve-se ressaltar, entretanto, que o tema da saúde e novas tec- nologias digitais está presente em várias disciplinas das ciências sociais e humanas, estabelecendo interfaces com a área da saúde. Com esses exemplos, podemos ilustrar como as novas tecnologias estão pre- sentes nas práticas de saúde, com tendência exponencial de crescimento. A conso- lidação da Internet nos últimos vinte e cinco anos permitiu uma profusão de informa- ções sobre a saúde, muitas com potencial de esclarecimento, mas também algumas de baixa qualidade. O tema medicina e saúde é um dos mais pesquisados nas redes sociais no Brasil, com fortes implicações na formação de comportamento em saúde. Paciente bem informado pode ser um paciente com papel ativo no seu processo de saúde/doença, questionando o saber médico unilateral e hegemônico. Essa é ape- nas uma, de um leque de possibilidades de uso da internet na área da saúde. Os sites de relações sociais se colocam como importantes ferramentas de co- nexão entre diversos atores, que foram potencializados de forma exponencial a partir da difusão do uso dos smartphones, impactando esferas da vida econômica, política, cultural de forma irreversível, e a consolidação de sites de redes sociais em escala planetária, ratificam a importância desse processo. Segundo dados divulgados pela plataforma Olhar Digital, o Brasil é o país mais conectado da América Latina com aproximadamente 88% da população acessando as principais redes sociais (Youtu- be, Facebook, Twitter, Instagram, Snapchat, Pinterest e LinkedIn), e grande parte dos desses acessos tem sido feita por meio de dispositivos móveis. Este trabalho procurou levantar algumas reflexões sobre a temática das redes sociais digitais na saúde coletiva, ilustrando com um recorte dos artigos publicados na Revista – Revista Eletrônica de Comunicação Informação Inovação em Saúde - RECIIS editada pela Instituto Fundação Oswaldo Cruz no Rio de Janeiro. 12 REDES SOCIAIS EM AMBIENTES DIGITAIS E A SAÚDE COLETIVA: ALGUNS CONCEITOS O crescimento do uso da internet a partir dos anos 1990 e a sua incorporação progressiva nas diversas esferas da vida econômica, social e cultural foi acompanha- do pelo interesse de estudiosos sobre esta temática. Concordamos com Fragoso, Recuero e Amaral (2011) que apontam que a internet pode ser vista como objeto de pesquisa, como local de pesquisa, bem como, instrumento de pesquisa. Com a revolução tecnológica o termo Saúde Digital passou a ser incorporado nas práticas cotidianas de saúde, abarcando todos os aspectos envolvendo a articu- lação da saúde e novas tecnologias digitais. A Sociedade Brasileira de Informática em Saúde - SBIS, em seu último evento realizado em dezembro de 2020, definiu a Saúde Digital da seguinte forma: área de conhecimento e prática, tem como foco o uso das tecnologias digitais para atender as necessidades de pacientes, cuidadores, cidadãos, gestores e profissionais de saúde. Idealmente, a Saúde Digital combina amplo potencial da tecnologia, as necessidades da Saúde e o comportamento, expectativas, habilidades e interesses do usuário dos serviços de saúde, em benefício de todos. (SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFORMÁTICA EM SAÚDE, 2020). O conceito de Saúde Digital começa a aparecer de forma mais constante nas discussões sobre as novas tecnologias digitais e a saúde, inclusive em estratégias e programas governamentais nacionais e internacionais. O Ministério da Saúde de nosso país, por exemplo, define a saúde digital nos seguintes termos: compreende o uso de recursos de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) para produzir e disponibilizar informações confiáveis, sobre o estado de saúde para quem precisa, no momento que precisa. O termo Saúde Di- gital é mais abrangente que e-Saúde e incorpora os recentes avanços na tecnologia como novos conceitos, aplicações de redes sociais, Internet das Coisas (IoT), Inteligência Artificial (AI), entre outros (MINISTÉRIO DA SAÚ- DE, 2020). A Organização Mundial da Saúde aprovou em 2013 uma resolução para que os países definissem estratégias de Saúde Digital com base nos padrões de intero- perabilidade, e desde então vem desenvolvendo esforços para a elaboração de uma Estratégia Global de Saúde Digital com iniciativas colaborativas entre países, organi- zações públicas e privadas e instituições de ensino e pesquisa. (SBIS, 2020). 13 De acordo com Tainan e Machado (2015, p. 144) “a relação entre tecnologia e cultura, torna-se fluída e dinâmica nas pesquisas da internet, onde os usuários utili- zam, adaptam, ressignificam e transformam tanto as tecnologias, quanto as práticas que nela realizam.” Segundo Aguiar (2006) os estudos das redes sociais no cenário internacio- nal pode ser periodizado em quatro grandes fases, a saber:entre os anos 1930 e 1970, com destaque para a Antropologia, a Sociologia e a Psicologia Social , com predomínio de análises socio métricas de organizações sociais, e preocupações como os padrões de vínculos interpessoais em contextos sociais específicos; o de- senvolvimento da “análise de redes sociais” como uma especialidade de pesquisa nas Ciências Sociais, entre os anos 1970-1990, utilizando da linguagem matemática e metodologias quantitativas facilitadas pelo desenvolvimento dos computares nas pesquisas acadêmicas; a partir de meados dos anos 1980, as pesquisas multidisci- plinares passaram a incorporar a complexidade da vida urbana e a grande expansão das tecnologias de informação e comunicação pelas comunicações mediadas por computador, interessando-se cada vez mais pelas interações entre pessoas, grupos humanos e organizações; no início dos anos 2000, período de divulgação do traba- lho da referida autora, quando há grande sofisticação da análise das redes sociais tende em vista o avanço das tecnologias computacionais. O conceito de redes sociais passou a ser diretamente associado ao uso dos ambientes virtuais de relacionamentos interpessoais, secundarizando a tradição teó- rica das Ciências Sociais que elaborou e continua reelaborando o seu conceito ao longo de várias décadas. Marteleto (2010, p. 38) assevera que as Redes sociais, além de constituírem um conceito, representam metáfora po- derosa para configurar e representar fenômenos de enredamento em dife- rentes planos da realidade, desde o biológico e o físico até o existencial e o social. Por outro lado, seu poder analítico e interpretativo se amplia com o emprego devidamente apropriado dos recursos teóricos e metodológicos das Ciências Sociais. Na visão de Mercado e Silva (2013) é importante diferenciar sites de redes so- ciais das próprias redes sociais. Assim sendo, Sites de redes sociais, são interfaces que possibilitam suporte para a comu- nicação na internet. São espaços virtuais nos quais se estabelecem os laços sociais, espaços que propiciam o estabelecimento de interações mútuas ou 14 reativa entre os atores da rede. (MERCADO; SILVA, 2013, p. 164). Os autores ainda afirmam que as mensagens trocadas entre o os usuários das redes sociais deixam rastros no ciberespaço, que ao serem quantificados, nos dão uma ideia da densidade dessas relações. Deve-se considerar que as interações, flu- xos e relações sociais tecidas no ambiente virtual são cada vez mais complexas. Aguiar (2006) procurou discutir a trajetória, as tendências e as lacunas dos es- tudos sobre redes sociais no Brasil, a partir da literatura acadêmica produzida nos úl- timos dez anos (1996-2006) por pesquisadores doutores com currículos disponíveis na Plataforma Lattes, contemplando dez disciplinas das Ciências Humanas e Ciên- cias Sociais Aplicadas, e naquela época, já mostrava um crescimento exponencial do interesse pelo tema a partir do ano 2000. As informações foram complementadas por pesquisa no Google sobre redes de ONGs ativas no país. Pode-se constatar, neste trabalho, algumas limitações por estar circunscrito ao período 1996- 2006, e, portanto, datado historicamente. Um conjunto de rápidas mudanças ocorreu no mundo das redes sociais e digitais nos últimos 14 anos, sendo necessárias algumas ponderações. A despeito disso, é uma referência relevante por traçar um panorama, um estado da arte das pesquisas sobre redes sociais nas redes digitais no período em que há uma aceleração do uso dessas redes no início dos anos 2000. Segundo Aguiar (2006) as pesquisas na Antropologia, Sociologia e Psicologia Social foram as que demonstraram maior densidade teórica e maior familiaridade com técnicas de análise de redes, ao contrário da área de Comunicação e Ciência da Informação, com menores densidades teóricas. Num esforço de síntese dos resultados alcançados pela autora, procurou-se no Quadro 1, reproduzir textualmente os focos temáticos que ela encontrou a partir dos materiais levantados, por julgarmos relevantes no sentido de podemos visualizar a riqueza dos temas já desenvolvidos e lançar pistas para que estudos futuros ampliem o seu escopo, com a incorporação de novos temas. Por meio dele podemos consta- tar que os três grandes focos foram concentrados na questão do acesso, na relação sociedade-Estado e nos processos expressão da cidadania, deseja de direitos políti- cos e subjetividades/sociabilidades. Também nos chama atenção o desenvolvimento 15 de temas ligados a exclusão/inclusão digital, o ciberativismo, a democracia eletrônica e à incorporação das práticas digitais na administração pública. Quadro 1 - Focos temáticos predominantes das pesquisas sobre redes sociais e redes digitais Foco Temas Acesso os meios de informação como direito Democratização da comunicação; democratização do conhecimento; direito à informação na Internet Acesso aos meios de informação como medida compensatória Inclusão digital; infoexclusão; inclusão informacional; exclusão digital; exclusão no mundo globalizado; digital devide; telecentro; redes comunitárias; periferia na cibercultura; competência informacional; Relação sociedade-Estado Governo eletrônico; e-Gov; e-goverment; portais governamentais; burocracia virtual; governança eletrôni- ca; governança interativa; gestão participativa em rede; cidades digitais; cidades virtuais; cibercidade; rede de cidades; Expressão da cidadania e dos direitos individuais Democracia eletrônica; ciberespaço e democracia; democracia na cibercultura; comunicação no ciberespa- ço; cidadania na Internet; cibercidadania; conversação civil na Internet; ciberespaço e espaço público; privaci- dade na Internet; Expressão e defesa de ideias políticas Ativismo político na Internet; webativismo; ciberativis- mo; ativismo na hipermídia; ativismo digital; ativismo em rede; participação política no ciberespaço; resistências digitais; ciberterrorismo; Expressão de subjetividades e sociabi- lidade Comunidades virtuais; encontros virtuais; interações telemáticas; comunicação no ciberespaço; sociabilidade no ciberespaço; conectividade e auto-organização; redes de relações no ambiente virtual; redes de conversação; redes sociais na Internet; relações ho- rizontais na Internet; espaços sociais colaborativos na Internet; boatos na Web; sites de relacionamento, chats, weblogs, webrings, Orkut. Fonte: Aguiar (2006, p. 36-37). Organização: Julio Cesar de Lima Ramires (2020). Em relação às questões teórico-metodológicas, Fragoso, Recuero e Amaral (2011, p. 178-179) destacam que ainda há muitos desafios da pesquisa empírica na Internet, sobre a Internet e com a Internet. O momento atual ainda exige uma reflexão mais densa com vistas a práticas de pesquisa consistentes e responsáveis que ultrapassem o nível da mera observação e coleta de dados utilizando ambientes digitais. A convocação à densidade descritiva e interpretativa, bem como a exposição mais clara das escolhas éticas tomadas durante o processo, são pontos que ainda necessi- tam de demarcações teóricas. Nossa posição também reforça as diferenças entre a pesquisa acadêmica e a pesquisa de mercado, bem como procurar levantar uma abordagem que talvez esteja mais relacionada aos estudos de marketing e administração (netnografia) do que à comunicação. 16 No âmbito ciências humanas, destaca-se a Antropologia, com seus estudos sobre o ciberespaço e a dinâmica social, apontando a netnografia como uma das ferramentas de análise. Segundo Vasconcellos e Araújo (2015, p. 5) A netnografia (nethnography, junção de net e ethnography) será um termo cunhado pelos pesquisadores americanos Bishop, Star, Neumann, Ignácio, Sandusky e Schatz, em 1995 para descrever o uso da comunicação mediada por computador, concebida para investigar comportamento de consumo de culturas e comunidades presentes na internet. Silva (2015), por sua vez, afirma queO termo netnografia foi cunhado pelo professor canadense Robert Kozinets por volta de 1995 durante a escrita de sua tese doutoral e já no ano de 1996 ele passou a publicar artigos e publicações sobre a temática. Há quase duas décadas pesquisadores ao redor do mundo têm se debruçado sobre a net- nografia, mas muitos inclusive desconhecem o estudo pioneiro de Kozinets. (SILVA, 2015, p. 38). Robert Kozinets teve um papel importante no panorama acadêmico sobre essa temática, tendo em vista seus esforços em sistematizar um método para ser apli- cado, principalmente nos estudos de administração e comunicação, destacando-se Kozinets (1997), e Kozinets (2014). O artigo denominado “I want to believe”: a net- nography of the X-philes subculture of consumption, publicado em 1997 é uma refe- rência clássica sobre a temática, que foi ampliado e sistematizado em livro, traduzido para a língua portuguesa em 2014. Ao longo de sua trajetória de pesquisa o autor procurou apontar as seguintes etapas a serem cumpridas, tais como: a investigação dos possíveis locais de campo online, a entrada em campo iniciando as observações; a coleta e análise de dados; o estabelecimento de garantias de interpretações confiáveis; a realização de proce- dimentos éticos, o retorno dos resultados aos atores que foram objeto da pesquisa, fortalecendo os mecanismos de validação da pesquisa. Para Correia, Alperster e Feurerschutte (2017, p. 164) a pesquisa netnográfica apresenta as seguintes características: baseia-se majoritariamente na análise de textos públicos; concentra-se nas interações particulares entre pessoas no ambiente virtual; parte da análise de arquivos das comunicações virtuais salvas, sendo, portanto, realizadas, a posteriori e analisadas de forma peculiar de interação privada, que se de- senrola no espaço público. 17 Diferentes estudos demonstram que os mundos online e offline não são reali- dade separadas, e que devem ser considerados como um continuum de uma mesma realidade. Assim sendo os procedimentos metodológicos precisam dar conta dessa complexa e mutante realidade. No âmbito das abordagens qualitativas, não existe consenso entre os diver- sos autores sobre a existência de uma etnografia específica para ser aplicada aos espaços virtuais. Alguns defendem a ideia de que simplesmente se utilize o termo “etnografia” também para as comunidades virtuais, destacando-se apenas as suas particularidades. Merece destacar o aparecimento na literatura acadêmica a expressão saúde móvel ou m-Health, definida como as práticas médicas e de saúde pública apoiadas por dispositivos móveis, tais como, os telefones celulares, os smartphones e os table- ts), com potencial para aumentar a qualidade e a eficiência dos cuidados de saúde, e o trabalho de Araujo et al. (2016) é uma referência importante nessa discussão. AS REDES SOCIAIS NA INTERNET E AS QUESTÕES DE SAÚDE: COMENTÁRIOS A PARTIR DA REVISTA ELETRÔNICA DE COMUNICA- ÇÃO, INFORMAÇÃO E INOVAÇÃO EM SAÚDE A Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde (Re- ciis) é editada, desde 2007, pelo Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), tendo caráter interdisciplinar com publicado trimestral e de acesso aberto. Publica textos sobre temas das áreas de Comunicação, Informação e Saúde Coletiva e a partir de 2019, a Reciis passou a editar dossiês temáticos que, dentro de uma edição específica e a partir de um tema motivador. Sua escolha levou em conta o fato de estar vinculada a uma importante instituição de saúde do país e ter seu foco na interface comunicação, informação e saúde coletiva. A Revista pode ser acessada pelo endereço http://reciis.icict.fiocruz.br. A partir do sistema de busca da revista utilizando-se a palavra-chave rede social, identificou- -se cinquenta e dois artigos, excluídos os editoriais e resenhas. Em seguida, pesqui- sou-se o conteúdo de cada artigo, e exclui-se aqueles que não guardavam relação direta com nosso objetivo, ou seja, uso e utilização das redes sociais e sua interface http://www.icict.fiocruz.br/ http://www.icict.fiocruz.br/ http://portal.fiocruz.br/ file:///C:\Users\julio\Downloads\ARTIGO-SAUDE-2020\A http://reciis.icict.fiocruz.br 18 com questões da saúde. Assim, nosso corpo de análise ficou restrito a quinze artigos arrolados no quadro 2. Constatou-se que a maioria dos artigos foram publicados após 2018, com maior número no ano 2020, o que pode ser associado ao fenômeno da pandemia mundial do coronavírus, momento em que a temática da saúde passou a ter grande impor- tância na vida cotidiana das pessoas e as redes sociais foram o principal veículo de comunicação de massa. Muitos artigos não registravam a palavra-chave rede social, mas seu conteú- do abarcava o tema selecionado. A leitura do resumo de cada artigo, nos ajudou no processo de seleção. Quadro 2 – Artigos selecionados da Revista Reciis sobre a temática das redes sociais digitais Autor Título Barcelos, Lima, Aguiar (2020) Blogs e redes sociais na atenção à saúde da família: o que a comunicação online traz de novo? Fernandes, Montuori (2020) A rede de desinformação e a saúde em risco: uma análise das fake news contidas em ‘As 10 razões pelas quais você não deve vacinar seu filho’ Oliveira, Quinan, Toth (2020) Antivacina, fosfoetanolamina e Mineral Miracle Solution (MMS): mapeamento de fake sciences ligadas à saúde no Facebook Teixeira e Costa (2020) Fake news colocam a vida em risco: a polêmica da campanha de vacinação contra a febre amarela no Brasil Barreto, Amorim e Al- meida (2020) Zika e microcefalia no Facebook da Fiocruz: a busca pelo diálogo com a população e a ação contra os boatos sobre a epidemia Silva e Gomes (2020) Disputas pela significação no discurso do HIV/aids: um percurso na ciência, na literatura, na militância LGBTI e nos canais do YouTube Pinto (2019) Marketing social e digital do Ministério da Saúde no Instagram: estudo de caso sobre aleitamento materno Prychodco e Bitten- court (2019) Redes sociais sobre Transtorno do Espectro Autista no Facebook como suporte interpessoal: implicações nos processos de governança em saúde Oliveira et al (2019) Esperança x sofrimento nas mídias sociais: o que motiva seguidores do Instagram a seguir a temática câncer? Stolarsk et al (2018) Blogueiros fitness no Instagram: o corpo e o merchandising editorial de suplementos alimentares Bilottiet al (2017) m-Health no controle do câncer de colo do útero: pré-requisitos para o desenvolvimento de um aplicativo para smartphones Antunes et al (2016) Arquivos visuais relacionados ao vírus Zika: imagens no Instagram como parte da constituição de uma memória da epidemia Sampaio, Silva, e Este- ves (2014) Proposta de metodologia para análise de redes sociais aplicadas a si- tes de saúde 19 Pessoni (2012) Uso da rede social Facebook como ferramenta de comunicação na área de educação em saúde: estudo exploratório produção científica da área – 2005 a 2011 Capretz et al (2009) Tecnologias de Internet em uma plataforma de colaboração para a pesquisa médica Fonte: Site da Revista Reciis (2020). Organização: Julio Cesar de Lima Ramires Nessa leitura procurou-se identificar a formação dos autores, a discussão teó- rico-conceitual, a descrição da metodologia e a apresentação dos resultados. Consi- derou-se apenas a última formação dos autores, indicada na introdução do trabalho, e nas edições em que não existia essa informação recorreu-se ao currículo lattes. Em nove artigos identificou-se formação diversificada de autores em um mes- mo artigo, e em seis trabalhos, os autores possuíam formação semelhante. Houve um predomínio de autores oriundos da área de Comunicação, Informática e Saúde, que pode estar associado a principal área de indexação da revista e a sua inser- ção noInstituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz. Outras áreas aparecem com baixa presença tais como, as Ciências Sociais, as Relações Internacionais, a História, a Química e a Linguísti- ca, com apenas um autor, e as Artes, a Educação e a Psicologia com dois autores. O Facebook e o Instagram foram as redes sociais mais estudadas, e tivemos apenas um registro sobre o WhatsApp. O Trabalho de Barreto, Amorim e Almeida (2020) analisou a abordagem da Zika Vírus e a macrocefalia pela página da Fundação Oswaldo Cruz no Facebook, apresentando os procedimentos metodológicos com muita clareza, podendo servir de exemplo para outras pesquisas dessa importante rede social. Na maioria dos artigos não há uma discussão teórico-conceitual densa, ampa- rada em pressupostos das Ciências Sociais, e alguns deles, a apresentação desse tópico foi bastante limitada. A Antropologia, por exemplo, possui uma grande baga- gem sobre a discussão da cibercultura e do ciberespaço, que não foram considera- das nos artigos ao abordar o tema das redes sociais. Entretanto, os trabalhos de Fernandes e Montuori (2020) e Prychodco e Bittencourt (2019) nos bridaram com boa discussão conceitual. Com relação aos procedimentos metodológicos há uma distribuição relativa- http://www.icict.fiocruz.br/ http://portal.fiocruz.br/ 20 mente equitativa entre as abordagens quantitativa, qualitativa e quali-quanti para o conjunto dos quinze artigos. No geral, há uma boa descrição dos procedimentos metodológicos e leitura dos dados. Nos chamou atenção os trabalhos de Oliveira, Quinan e Toth (2020), Barcelos, Lima e Aguiar (2020), Stolarsk et al (2018) e Antunes et al (2016), que apresentam com grande clareza a metodologia utilizada, bem como uma excelente descrição e análise dos dados. CONCLUSÃO A aproximação das Ciências Sociais e Humanas pode ser bastante produtiva para outras áreas do conhecimento, tendo em vista a gama de conceitos e procedi- mentos metodológicos sobre a dinâmica social e as redes sociais digitais. Deve-se lembrar, por exemplo, que o conceito de rede social faz parte da tradi- ção dessa ciência. As áreas da Comunicação e Informática, que veiculam a maioria dos artigos na Reciis poderão enriquecer suas análises a partir dessa associação. A Saúde Coletiva, também em foco nesta revista, já possuir maior tradição de aproxi- mação com as Ciências Sociais e Humanas. Não se pode considerar que o uso das redes sociais e as questões de saúde se processam de forma homogênea no ciberespaço, tendo em vista que em muitos países a exclusão digital é fato concreto, sendo necessário estratégias urgentes para a sua superação, tendo em vista as rápidas transformações tecnológicas, e a necessidade de empoderamento dos grupos sociais de baixa renda. Novas tecnologias informacionais e desigualdades socioespaciais se cruzam de forma aguda na contemporaneidade nos países periféricos, com destaque para as grandes desigualdades sociais do Brasil, com forte implicações na formação de um grupo social de reserva, despojados completamente do acesso à internet de baixo custo e de alta qualidade. O interesse da população em buscar informações sobre saúde nas redes so- ciais tem seu lado relevante, mas também levanta preocupações sobre a sua quali- dade e veracidade, e a grande proliferação de fake News envolvendo essa temática reforçam ainda mais nossas inquietações. A pesquisa da/nas redes sociais digitais levanta também um conjunto de refle- xões sobre ética, tendo em vista os paradoxos e ambiguidades envolvendo o público 21 e o privado no ciberespaço. O recorte de análise de apenas uma revista apresentou seus limites, mas apon- tou possibilidades de pesquisas futuras envolvendo um número maior de periódicos, utilizando-se de procedimentos bibliométricos mais sistematizados. Deve-se fomentar e valorizar as pesquisas que articulem de forma consistente a teoria, os procedimentos metodológicos e a descrição e análise dos dados e infor- mações coletadas. A boa pesquisa é aquela que prima por esta articulação. REFERÊNCIAS AGUIAR, Sonia. Redes sociais e tecnologias digitais de informação e comu- nicação. Relatório final de pesquisa, S.l. 2006. Disponível em: http://www.obser- vatoriodaimprensa.com.br/download/Redes_sociais_e_tecnologias_digitais%20.pdf. Acesso em: 12 de dezembro de 2020. ANTUNES, Michele Nacif et al. Arquivos visuais relacionados ao vírus Zika: ima- gens no Instagram como parte da constituição de uma memória da epidemia. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 10, n. 3, p. 1-13, jul./set. 2016. Disponível em: http://www.reciis.icict. fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1175/pdf1175. Acesso em: 21 de dezembro de 2020. ARAUJO, Alexandra Rodrigues et al. Saúde Móvel: desafios globais à proteção de dados pessoais sob a perspectiva do direito da União Europeia. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 10, n. 4, p. 1-12, out.-dez. 2016. Disponível em: Disponível em: http://www.reciis.icict. fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1125/pdf1125. Acesso em: 20 de dezembro de 2020. BARCELOS, Patrícia Estrella Liporace; LIMA, Tarcísio Valente, AGUIAR, Adriana Cavalcanti de. Blogs e redes sociais na atenção à saúde da família: o que a comunicação online traz de novo? Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p.126-149, jan./mar. 2020. Disponível em: Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/ article/view/1747. Acesso em: 19 de dezembro de 2020. BARRETO, Paloma da Silva, AMORIM, Luís, ALMEIDA, Carla. Zika e microcefalia no Facebook da Fiocruz: a busca pelo diálogo com a população e a ação contra os boatos sobre a epidemia. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informa- ção e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 18-33, jan./mar. 2020. Dispo- nível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1792. Acesso em: 19 de dezembro de 2020. BILOTTI, Carolina Correia et al. m-Health no controle do câncer de colo do úte- ro: pré-requisitos para o desenvolvimento de um aplicativo para smartphones. http://www.observatoriodaimprensa.com.br/download/Redes_sociais_e_tecnologias_digitais%20.pdf http://www.observatoriodaimprensa.com.br/download/Redes_sociais_e_tecnologias_digitais%20.pdf https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/76 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1175/pdf1175 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1175/pdf1175 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1125/pdf1125 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1125/pdf1125 https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/92 https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/92 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1747 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1747 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/179 22 Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, p. 1-18, jan./mar. 2017. Disponível em: http://www.reciis.icict. fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/2047. Acesso em: 26 de dezembro de 2020. BRASIL é o país que mais usa redes sociais na América Latina. Olhar Digital. 2019. Disponível em: http://www.olhardigital.com.br/2019/07/05/noticias/brasil/ brasil-e-o- pais-que-mais-usa-redes-sociais-na-america-latina. Acesso em: 20 dezembro de 2020. CONGRESSO BRASILEIRO DE TELEMEDICINA E TELESSAUDE, 9., 2019. São Paulo. Associação Brasileira de Telemedicina e Telessaúde. 2019. Disponível em: http://www.even3.com.br/ebtms9/. Acesso em: 27 de dezembro de 2020. CAPRETZ, Miriam Akemi Manabe et al. Tecnologiasde Internet em uma platafor- ma de colaboração para a pesquisa médica. Reciis – Revista Eletrônica de Co- municação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 3, n. 4, p. 210-225, mar. 2009. Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/ view/744/1387. Acesso em: 19 de dezembro de 2020. CORREIA, Rafaela Rodrigues; ALPERSTEDT, Graziela Dias; FEUERSCHUTTE, Si- mone Ghisi. O uso do método netnográfico na pós-graduação em administração no Brasil. Revista de Ciências da Administração, Florianópolis, v. 19, n. 47, p. 163- 175, abril 2017. FERNANDES, Carla Montuori; MONTUORI, Christina. A rede de desinformação e a saúde em risco: uma análise das fake news contidas em ‘As 10 razões pelas quais você não deve vacinar seu filho’. Reciis – Revista Eletrônica de Co- municação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 14, n. 2, p.444-460, abr./jun. 2020. Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/ view/1975. Acesso em: 21 de dezembro de 2020. FRAGOSO, Suely; RECUERO, Raquel; AMARAL, Adriana. Métodos de pesquisa para internet. Porto Alegre: Sulinas, 2011. KOZINETS, Robert V. “I want to believe”: a netnography of the X-philes subcul- ture of consumption. Advances in Consumer Research, [s.l.], v. 24, p. 470-475, 1997. KOZINETS, Robert V. Netnografia: realizando pesquisa etnográfica online. Porto Alegre: Penso, 2014. MARTELETO, Regina Maria. Redes sociais, mediação e apropriação de infor- mações: situando campos, objetos e conceitos na pesquisa em Ciência da In- formação. Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação, Brasília, v.3, n.1, p. 27- 46, jan./dez. 2010. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/2247/1/ Marteleto_redes%20sociais%20mediacao%20e%20apropriacao%20de%20informa- coes.pdf. Acesso em 15 de dezembro de 2020. MERCADO, Luis Paulo Leopoldo; SILVA, Ivanderson Pereira da. O Twitter na coleta https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/79 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/2047 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/2047 http://www.even3.com.br/ebtms9/ https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/62 https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/62 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/ http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/ http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1975 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1975 https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/2247/1/Marteleto_redes%20sociais%20mediacao%20e%20apropriacao%20de%20informacoes.pdf https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/2247/1/Marteleto_redes%20sociais%20mediacao%20e%20apropriacao%20de%20informacoes.pdf https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/2247/1/Marteleto_redes%20sociais%20mediacao%20e%20apropriacao%20de%20informacoes.pdf 23 de dados na pesquisa qualitativa. Informática na Educação: teoria & prática, Porto Alegre, v. 16, n. 1, p. 161-172, jan./jul. 2013. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Saúde Digital. Disponível em: http://saudedigital.saude. gov.br. Acesso em: 10 de dezembro de 2020. OLIVEIRA, Eloy Macchiute de et al. Esperança x sofrimento nas mídias sociais: o que motiva seguidores do Instagram a seguir a temática câncer? Reciis – Re- vista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 4, p. 784-802, out./dez. 2019. Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/ index.php/reciis/article/view/1776. Acesso em: 26 de dezembro de 2020. OLIVEIRA, Thaiane, QUINAN Rodrigo, TOTH Janderson Pereira. Antivacina, fos- foetanolamina e Mineral Miracle Solution (MMS): mapeamento de fake sciences ligadas à saúde no Facebook. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Infor- mação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, 14, n. 1, p. 90-11, jan./mar. 2020. Dis- ponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1988. Aces- so em: 21 de dezembro de 2020. PESSONI, Arquimedes. Uso da rede social Facebook como ferramenta de comu- nicação na área de educação em saúde: estudo exploratório produção científi- ca da área – 2005 a 2011. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 6, n. 4, p. 1-13, dez. 2012. Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/584/1225. Acesso em: 21 de dezembro de 2020. PINTO, Pâmela Araujo. Marketing social e digital do Ministério da Saúde no Ins- tagram: estudo de caso sobre aleitamento materno. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 4, p. 817-830, out./dez. 2019. Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/ reciis/article/view/1634. Acesso em: 27 de dezembro de 2020. PRYCHODCO, Robson Celestino, BITTENCOURT, Zelia Zilda Lourenço de Camar- go. Redes sociais sobre Transtorno do Espectro Autista no Facebook como su- porte interpessoal: implicações nos processos de governança em saúde. Re- ciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 4 p. 803-816, out./dez. 2019. Disponível em: http://www.reciis.icict. fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1670. Acesso em: 21 de dezembro de 2020. SAMPAIO, Ricardo Barros, SILVA, Luana P., ESTEVES, Elmo Fagner Sampaio. Pro- posta de metodologia para análise de redes sociais aplicadas a sites de saúde. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1, p. 9-19, mar. 2014. Disponível em: http://www.reciis.icict.fio- cruz.br/index.php/reciis/article/view/463/1115. Acesso em: 27 de dezembro de 2020. SILVA, Phelipe Rodrigues da, GOMES, Isaltina Mello. Disputas pela significação no discurso do HIV/aids: um percurso na ciência, na literatura, na militância LGBTI e nos canais do YouTube. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação http://saudedigital.saude.gov.br http://saudedigital.saude.gov.br http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1776 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1776 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1988 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/179 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1634 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1634 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1670 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1670 https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/40 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/463/1115 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/463/1115 24 e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 14, n. 4, p. 857-869, out./dez. 2020. Dispo- nível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/2199. Acesso em: 27 de dezembro de 2020. SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFORMÁTICA EM SAÚDE. Sobre o XVII CIBS. Dis- ponível em: http://www.sibs.org.br/cbis2020. Acesso em 28 de dezembro de 2020. TEIXEIRA, Adriana, COSTA, Rogério. Fake news colocam a vida em risco: a polê- mica da campanha de vacinação contra a febre amarela no Brasil. Reciis – Re- vista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1: p. 72-89. jan.-mar. 2020. Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/ index.php/reciis/article/view/179. Acesso em: 21 de dezembro de 2020. STOLARSK, Graciele et al. Blogueiros fitness no Instagram: o corpo e o mer- chandising editorial de suplementos alimentares. Reciis – Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 12, n. 4, p. p. 1-21, out./dez. 2018. Disponível em: http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/ article/view/1468. Acesso em: 19 de dezembro de 2020. Acesso em: 26 de dezem- bro. de 2020. TAINAN,Pauli Tomazetti; MACHADO, Alisson. Desafios epistêmicos e configurações teórico-metodológicas da etnografia virtual no campo da comunicação. Estudos em Comunicação, [s/l], n. 18, p. 133-158, maio de 2015. VASCONCELLOS, Marcelo Simão de; ARAÚJO, Inesita Soares. de Usos da Et- nografia em mundos virtuais baseados na imagem. RECIIS – Revista Eletrônica de Comunicação Informação Inovação em Saúde. Rio de Janeiro, v5, n.2, p.75-85, Jun. 2011. Disponível em: www.reciis.icict.fiocruz.br. Acesso em: 19 de dezembro de 2020. http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/2199 http://www.sibs.org.br/cbis2020 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/179 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/179 https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/87 https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/issue/view/87 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1468 http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1468 http://www.reciis.icict.fiocruz.br 25 10.48209/978-65-00-17616-A CONSTRUÇÃO DE AÇÕES DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE NO ENSINO SUPERIOR Sandrelena da Silva Monteiro2 Juliane Figueiredo Fonseca3 Gustavo Roberto de Lima4 Leandro Damasceno Kreutzfeld5 Nathalia Serra Antunes6 Raquel Rinco Dutra Pereira7 Ruthmary Fernanda de Souza Fernandes8 Sarah Menezes Rocha9 2 Pedagoga, Mestre e Doutora em Educação, pela UFJF. Professora do Departamento de Educação da UFJF. Coordenadora do Grupo Acolhe. sandrelenamonteiro@gmail.com 3 Arquiteta e Urbanista, Doutora em Arquitetura e Urbanismo, pela UFRJ. Professora do Departamento de Projeto, Representação e Tecnologia da FAU/UFJF. Vice-Coordenadora do Grupo Acolhe. julianeffarq@gmail.com 4 Licenciando em Ciências Sociais, pela UFJF. Bolsista do Grupo Acolhe. limaufjf@gmail.com 5 Graduando em Filosofia, pela UFJF. Bolsista do Grupo Acolhe. leandrodk@yahoo.com.br 6 Licencianda em Artes Visuais, pela UFJF. Bolsista do Grupo Acolhe. nathalia.serra@design. ufjf.br 7 Pós-Graduanda do PPGE/UFJF – Mestrado em Educação. Voluntária do Grupo Acolhe. raquelrincodutra@gmail.com 8 Graduanda em Pedagogia, pela UFJF. Bolsista do Grupo Acolhe. ruthmaryjf@gmail.com 9 Pós-Graduanda do PPGE/UFJF- Mestrado em Educação. Voluntária do Grupo Acolhe. sarahmenezesrocha@gmail.com 26 CONSTRUÇÃO DE UM CENÁRIO A entrada no ensino superior assume grande destaque no projeto de vida de muitos jovens brasileiros. A promessa de mobilidade social, com emprego, moradia e salário dignos faz com que muitos desses dediquem anos de suas vidas aos estudos escolares com um único objetivo: acesso ao ensino superior. No Brasil, especialmente nas últimas décadas temos assistido algumas mudanças concretizadas com a implementação de ações como o Programa de Financiamento Estudantil (FIES – 2001), o Programa Universidade para Todos (ProUni – 2004) e o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI – 2007). especialmente, com esse último, com a interiorização das universidades, com a criação do Sistema de Seleção Unificada SISU – 2010) e adoção de políticas de cotas étnicas, raciais e egressos do Ensino Médio público (Lei de Cotas – 2012). Com essas mudanças muitos grupos de jovens, anteriormente excluídos do ensino superior começam a ter acesso a ele, não obstante ser, ainda, de forma incipiente. Não raras vezes o projeto de entrada no ensino superior é gestado no âmbito da família, com grandes expectativas. No entanto, em todo esse planejamento, de anos e muita dedicação, comumente um item não é desenvolvido: aquele que contempla os desafios inerentes à vida acadêmica no ensino superior. Coulon (2017) nos ajuda a entender alguns destes desafios. Segundo esse autor, ao entrar no ensino superior, é exigido do estudante um aprendizado muito particular: aprender o ofício de estudante. Esse aprendizado implica a relação com as regras e saberes que exigem competências culturais e intelectuais. Há que se fazer uma ruptura com a cultura do Ensino Médio para adentrar “uma nova cultura, mais complexa, mais sofisticada, e, portanto, mais difícil de decodificar e de se apropriar posto que mais simbólica” (p. 1242). Essa ruptura não se faz apenas em uma questão pedagógica, mas também existencial, visto que lhe é exigida uma postura de maior autonomia não apenas diante do saber, mas nas decisões da vida. Para o autor, fazer as rupturas necessárias para adentrar a nova vida assemelha-se a um processo de afiliação, em que é cobrado dos estudantes “descobrir as rotinas, as evidências, as regras, os novos códigos da universidade. Por exemplo, o trabalho intelectual que não é explicitamente solicitado 27 pelos professores e que é, contudo, indispensável ao sucesso” (p. 1243). Diante das evidências pode-se inferir que se avançamos no acesso, ainda há muito o que se fazer para que todos os estudantes, independente de que caminhos os trouxeram ao ensino superior, tenham condições de existência que lhe permitam permanecer e concluir os estudos com qualidade de vida, especialmente qualidade em saúde mental. Tal advertência se faz pertinente frente aos números alarmantes que apontam para o adoecimento discente no ensino superior (VASCONCELOS et al, 2015; GONÇALVES et al, 2015; ANDRADE et al. 2016; ARCCOSI, 2015; SOUZA, CALDAS, DE ANTONI, 2017, MACHADO, 2018, MONTEIRO e PEREIRA, 2019). ” Os dois últimos relatórios do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Co- munitários e Estudantis (FONAPRACE - 2016 e 2018) apontam dados muito preo- cupantes quanto ao sofrimento psíquico revelado pelos estudantes. Em 2016, as principais queixas apontadas foram: ansiedade (58,3%), desânimo/falta de vontade persistente (44,7%), insônia/alteração do sono (32,5%), desamparo/desesperança (22,5%) e solidão (21,2) (FONAPRACE, 2016). Em 2018, 13,7% de estudantes pro- curaram atendimento psicológico, 9,7% declararam fazer acompanhamento psico- lógico e 39,9% fazem ou fizeram uso de medicação psiquiátrica. Em relação ao uso de substâncias psicoativas, 2,5% dos estudantes fazem uso de tabaco e derivados, 6,3% fazem uso regular de drogas ilícitas e 26,5% dos estudantes fazem uso fre- quente e eventual de álcool, o que evidencia um aumento no número de estudantes usuários de álcool (12,5%) em relação à pesquisa realizada em 2016 (FONAPRACE, 2018, p.202). Essas são respostas que jovens estudantes do ensino superior têm dado à vida. É diante deste cenário preocupante que o Grupo Acolhe: Estudos e Pesquisa em Educação, Desenvolvimento e Integralidade Humana, da Faculdade de Educa- ção da Universidade Federal de Juiz de Fora (Grupo Acolhe-FACED-UFJF) tem se constituído em um espaço-tempo de construção de ações de educação em saúde voltado a estudantes do ensino superior. Ao longo deste trabalho buscaremos apresentar um dos nossos projetos e ações que se desdobram no decorrer do ano de 2019, visando promover a Educação em Saúde entre os estudantes do ensino superior, especificamente no âmbito da Universidade Federal de Juiz de Fora (Campus Juiz de Fora). 28 CONSTRUINDO AÇÕES DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE Os resultados das pesquisas desenvolvidas pelo Grupo Acolhe sobre adoecimento discente não foram diferentes das já mencionadas: indícios de adoecimento discente, marcado especialmente pela presença de palavras como ansiedade, depressão, desânimo, medo, cansaço, suicídio (MONTEIRO, et al, 2019; MONTEIRO e PEREIRA, 2020). A realidade, na nossa Universidade, nos convocou a agir. Foi quando demos início ao primeiro Projeto de Extensão, nomeado “ACOLHE: construção de valores inclusivos e promoção de educação em saúde”, tendo como principal objetivo constituir-se em um espaço-tempo de acolhimento e vivências que se fundamentem em valores que vislumbram relações interpessoais mais humanas e menos excludentes, vivências nas quais o sentido de comunhão com as diferenças sefaça mister. Como meta, visávamos o desenvolvimento de ações de educação em saúde (CANDEIAS, 1997) com ênfase na promoção de fatores de proteção e resiliência (COIMBRA e MORAIS, 2015, GROTBERG, 2005) junto aos estudantes do ensino superior. Ao trazer para esse contexto a reflexão sobre resiliência, fazemos a partir de um entendimento de resiliência enquanto um “processo interativo entre o sujeito e o meio, sobretudo ao ser vista como uma alteração individual em resposta aos meca- nismos mediadores de risco” (COIMBRA e FRANCISCO, 2015, p. 68). Aqui, resiliên- cia é concebida como um processo dinâmico e flexível, implicado pelo meio em que a pessoa se encontra, uma vez que essa construção se dá nas relações interpessoais, transitando do “plano interpsíquico para o intrapsíquico. Ou seja, ao se dirigir para o interior. Potencializa tanto os recursos próprios do indivíduo, já consolidados, quanto sua atitude para recorrer àqueles de sua comunidade, os quais podem não estar sob seu alcance” (COIMBRA e FRANCISCO, 2015, p. 65). Em conformidade com essa perspectiva, buscamos dialogar também com Grotberg (2005), que apresenta resiliência como sendo a faculdade humana de en- carar e superar os desafios saindo deles transformado e fortalecido. Ao trazer a ideia de educação em saúde, corroboramos com Candeias (1997, p. 210) ao esclarecer o conceito nos seguintes termos: 29 Entende-se por educação em saúde quaisquer combinações de experiências de aprendizagem delineadas com vistas a facilitar ações voluntárias condu- centes à saúde. A palavra combinação enfatiza a importância de combinar múltiplos determinantes do comportamento humano com múltiplas experiên- cias de aprendizagem e de intervenções educativas. A palavra delineada distingue o processo de educação de saúde de quaisquer outros processos que contenham experiências acidentais de aprendizagem, apresentando-o como uma atividade sistematicamente planejada. Facilitar significa predis- por, possibilitar e reforçar. Voluntariedade significa sem coerção e com plena compreensão e aceitação dos objetivos educativos implícitos e explícitos nas ações desenvolvidas e recomendadas. Ação diz respeito a medidas compor- tamentais adotadas por uma pessoa, grupo ou comunidade para alcançar um efeito intencional sobre a própria saúde (CANDEIAS, 1997, p. 210) (grifos da autora). Ao construir suas ações, o Grupo Acolhe buscou por uma metodologia que atendesse a suas necessidades de ações e ao mesmo tempo desconstruísse barreiras hierárquicas tão comuns no mundo acadêmico. Nesse caminhar encontramos a proposta de Círculos de Cultura de Paulo Frei- re (2018), o qual nos inspirou para construção das Rodas de Conversa, e a encontrar os Temas Geradores (FREIRE, 2018) para as mesmas. O círculo de cultura – no método Paulo Freire – re-vive a vida em profundidade crítica. A consciência emerge do mundo vivido, objetiva-o, problematiza-o, compreendendo-o como projeto humano. Em diálogo circular, intersubjetivando-se mais e mais, vai assumindo, criticamente, o dinamismo de sua subjetividade criadora. Todos juntos, em círculo, e em colaboração, reelaboram o mundo [...] (FREIRE, 2018, p. 24) Essa construção se deu em diálogo e parceria com Centros Acadêmicos (CA’s) e Diretórios Acadêmicos (DA’s) de diversos cursos e áreas. Com essa escolha meto- dológica alcançamos uma prática interdisciplinar e intersetorial. À medida que as rodas de conversas iam acontecendo, foi ficando cada vez mais explicitado que falar de adoecimento discente configurava, ainda, tabu na universidade. Certamente, esse era o motivo pelo qual ainda ficava tão invisibilizado. Foi, novamente, o diálogo com Paulo Freire (2018) que nos fez compreender a necessidade de transformar o adoecimento discente em um percebido destacado. Visualizando a possibilidade de construção de estratégias de resiliência (GROTBERG, 2005, COIMBRA e MORAIS, 2015) como um inédito viável. E, assim, a construção de um sonho possível (FREIRE, 2014): a vida acadêmica em que o adoecimento não fosse condição sine qua non. 30 Nas rodas de conversa, inspiradas nos Círculos de Cultura, percebíamos a configuração de um ambiente coletivo e horizontal, de discussão e desvelamento da Cultura do Silêncio e do individualismo ainda predominante na vida acadêmica. A cul- tura do silenciamento, ao mesmo tempo em que fecha os indivíduos em si mesmos, alimenta um sentimento de solidão e desamparo generalizados. As rodas de conversa aconteciam com periodicidade quinzenal e eram itineran- tes, ou seja, aconteciam em lugares e horários diferentes, de forma alcançar o maior quantitativo possível de estudantes. Os lugares mais comuns eram: Jardim Pedagó- gico da Faculdade de Educação (FACED), Praça do Instituto de Ciências Humanas (ICH), Corredor da Faculdade de Engenharia, Galpão da Faculdade de Arquitetura Urbanismo (FAU), Praça da Reitoria. Imagem 1 – Roda de conversa no estacionamento da Faculdade de Engenharia. Fonte: Arquivo do Grupo Acolhe 31 Imagem 2: Roda de conversa no Galpão da Faculdade de Arquitetura Urbanismo Fonte: Arquivo do Grupo Acolhe (2019) De forma a criar uma imagem de identificação do local onde a roda de conversa estava acontecendo, o Grupo Acolhe construiu uma tenda, com TNT colorido, de tal forma que a presença da tenda sinalizava que ali estava acontecendo uma ação de promoção de educação em saúde. Imagem 3 – Tenda do Grupo Acolhe Fonte: Arquivo do Grupo Acolhe (2019 32 No ano de 2019, as ações ocorreram presencialmente, montávamos a tenda, muitas vezes, à sombra de alguma árvore, sentávamo-nos em roda e o diálogo se estabelecia. Aos poucos os estudantes iam chegando, se sentando e participavam da conversa. Alguns compartilhavam seus desafios, outros apenas escutavam, inte- ragiam pelo riso, olhar ou outra expressão corporal. As rodas tinham um tema gerador, o qual era sempre construído por um valor que se configurava como um convite à ação, uma ação crítica e autônoma diante da vida e dos desafios que a vida universitária apresenta. Ainda, nos adverte Frei- re (2018, p. 138) que, é “preciso que nos convençamos de que as aspirações, os motivos, as finalidades que se encontram implicitados na temática significativa são aspirações, finalidades, motivos humanos”. Foi com essa compreensão que, nas ro- das, Esperança, se configurava como prática de resistência; Solidariedade como prá- tica de proteção; Respeito como prática de humanização; Cooperação como prática de resiliência; Amizade como prática educativa e como prática de aprendizagem; De- cisão como prática de desenvolvimento. Por meio dessas ações, valores inclusivos apontavam caminhos para construção de estratégias de resiliência ante os fatores estressores presentes na vida acadêmica: competitividade, individualismo, desuma- nização, opressão, avaliação, exclusão. NOTÍCIAS EM NÚMEROS: UM BALANÇO NECESSÁRIO Todas as ações, não importa sua extensão ou complexidade, exigem, que de quando em quando se pare para um balanço. Uma avaliação, uma análise que permita visualizar o caminho percorrido, as construções feitas, mas também o que ainda não o é, mas precisa tornar-se. O adoecimento discente, fruto de adversidades inerentes à vida acadêmica é fato constatado. Resta agora encontrar, inventar se necessário for, estratégias e ações que permitam uma outra construção no mundo universitário em que o adoecimento não tenha tamanho protagonismo. Foi com esse ideal que o Grupo Acolhe se colocou a trabalhar. Fazendo o balanço das ações de 2019 temos algo apresentar. 33 Quadro 1 - Ações Grupo Acolhe – 2019 Ações Parcerias com DA’s e CA’s Rodas de conversa oficinas palestras Grupo Focal Em números 27 12 04 02 01 Presença de estudantes nas rodas de conversa Aproximadamente 140 Fonte: Arquivos do Grupo Acolhe (2019) As ações apresentadas no quadro 1 foram desenvolvidas no período de maioa dezembro de 2019. Nossa avaliação diante deste balanço é bastante positiva, tanto pelas ações realizadas, quanto pela participação dos estudantes. Paralelo a estas ações, que se voltavam a toda a comunidade acadêmica, semanalmente o Grupo Acolhe se reunia para sua formação interna, quando aconteciam os estudos teóricos, organização das ações, construção de trabalhos a serem apresentados e publicados em eventos acadêmicos e outros. A partir dos registros, na forma de narrativas, realizados ao final de cada roda de conversa, construímos um acervo de depoimentos dos estudantes que muito têm contribuído para a continuidade das ações. EDUCAÇÃO EM SAÚDE: A CONVERSA TEM QUE CONTINUAR... Finalizando essa escrita podemos destacar como um dos maiores aprendiza- dos no âmbito de nossas ações se refere ao trabalho em grupo. O trabalho em grupo, e, especialmente em um grupo interdisciplinar, intergeracional e intersetorial, faz uma grande diferença no sucesso ou insucesso de uma ação. Podemos afirmar que o es- forço conjunto de todos os envolvidos no projeto é a melhor e mais eficaz estratégia de promoção de saúde mental. Aprendemos a respeitar e aceitar as diferenças, os limites, ritmos e os tem- pos de aprendizagens. Aprendemos a fazer das diferenças uma grande aliada ao construir diálogos que intentam romper com as culturas instituídas, especialmente a 34 cultura do silenciamento e desumanização das relações interpessoais no cotidiano universitário. E, certamente, o aprendizado de maior impacto, nosso movimento de desconstrução do tabu que ainda envolve o adoecimento discente no ensino supe- rior, colocando-o na condição de fraqueza e menor valia. Aprendemos que educação em saúde não é conhecimento restrito à área mé- dica, mas sim, é responsabilidade de todas áreas de conhecimento. E, que saúde mental não pode ser tema apenas de campanha no Setembro Amarelo. A partir dos estudos internos no Grupo, das vivências dentro e fora da sala de aula, do contato com cada integrante que compõem a nossa Universidade, percebe- mos a importância de se falar em saúde mental. Acreditamos que este tema possui uma importância constante, devendo estar presente a cada dia do ano, a cada ação, a cada ato educativo. Nesse sentido, ações de Educação em Saúde devem fazer parte do cotidiano da vida universitária. REFERÊNCIAS ACCORSI, Michaela Ponzoni. Atencão Psicossocial no Ambiente Universitário: Um estudo sobre a realidade dos estudantes de graduação da Universidade Federal de Santa Catarina. Mestrado Mestrado Profissional em Saúde Mental e Atenção Psi- cossocial da Universidade Federal de Santa Catarina. - Florianópolis,SC, 2015.105p. ANDRADE, Antonio dos Santos, et al. Vivências acadêmicas e sofrimento psíquico de estudas de Psicologia. In: Psicologia: Ciência e Profissão. Out/Dez. 2016. v. 36, nº 4, p. 831-846, 2016. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pcp/v36n4/1982-3703-p- cp-36-4-0831.pdf Acesso em 25/02/2019. CANDEIAS, Nelly Martins Ferreira. Conceitos de educação e de promoção em saú- de: mudanças individuais e mudanças organizacionais. Revista Saúde Pública, v. 31, n. 2, p. 209-213, 1997. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v31n2/2249. pdf Acesso em 26/02/2019. COIMBRA, Renata Maria; MORAIS, Normanda Araújo de (Orgs.). A resiliência em questão: perspectivas teóricas, pesquisa e intervenção. Porto Alegre: Artmed, 2015. COIMBRA, Renata Maria; FRANCISCO, Marcos Vinícius. Resiliência em-si na pers- pectiva da teoria histórico-cultural: rompendo com visões neoliberais. In: COIMBRA, Renata Maria; MORAIS, Normanda Araújo de (Orgs.). A resiliência em questão: perspectivas teóricas, pesquisa e intervenção. Porto Alegre: Artmed, 2015. p. 57-82. http://www.scielo.br/pdf/pcp/v36n4/1982-3703-pcp-36-4-0831.pdf http://www.scielo.br/pdf/pcp/v36n4/1982-3703-pcp-36-4-0831.pdf http://www.scielo.br/pdf/rsp/v31n2/2249.pdf http://www.scielo.br/pdf/rsp/v31n2/2249.pdf 35 COULON, Alain. Ofício de Estudante: a entrada na vida universitária. IEducação e Pesquisa. São Paulo, v. 43, n. 4, p. 1239-1250, out./dez., 2017. p. 1239 a 1250. Dis- ponível em: http://www.scielo.br/pdf/ep/v43n4/1517-9702-ep-43-4-1239.pdf Acesso em: 13/11/2019. FONAPRACE. Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estu- dantis. IV pesquisa do perfil socioeconômico e cultural dos estudantes de gra- duação das instituições federais de ensino superior brasileiras 2014. Uberlân- dia: FONAPRACE, 2016. Disponível em: http://www.andifes.org.br/wp-content/uploads/2017/11/Pesquisa-de-Perfil-dos-Gra- duanso-das-IFES_2014.pdf Acesso em 26/02/2019. FONAPRACE. Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estu- dantis. V pesquisa do perfil socioeconômico e cultural dos estudantes de gra- duação das instituições federais de ensino superior brasileiras 2018. Brasília: FONAPRACE, 2019. Disponível em: http://www.andifes.org.br/wp-content/upload- s/2019/05/V-Pesquisa-Nacional-de-Perfil-Socioeconômico-e-Cultural-dos-as-Gra- duandos-as-das-IFES-2018.pdf. Acesso em: 22/03/2020 GONÇALVES, Dâmaris Versiani Caldeira, et al. Percepção sobre o adoecimento en- tre Estudantes de cursos da área de Saúde. In: Revista Brasileira de Educação Médica. Vol.39 (1) p. 102-111; 2015. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbem/ v39n1/1981-5271-rbem-39-1-0102.pdf Acesso em 25/02/2019. GROTBERG, Edith Henderson. Introdução: Novas tendências em resiliência. In: ME LILLO, A; OJEDA, E. N. S. e colaboradores. Resiliência: descobrindo as próprias fortalezas. Porto Alegre: Artmed, 2005. p. 15-22. MACHADO, Yane Ferreira, et al. Gerenciamento do estresse entre estudantes univer- sitários: relato de experiência com grupos. Anais V CONEDU – Congresso Nacional de Educação. 2018. Recife, PE. Disponível em: http://www.editorarealize.com.br/re- vistas/conedu/trabalhos/TRABALHO_EV117_MD1_SA18_ID300_02092018214543. pdf Acesso em 25/02/2019. MONTEIRO, Sandrlena da Silva et al. Perfil pedagógico de alunos e alunas que buscam atendimento na Assistência Estudantil da UFJF – campus Juiz de Fora. Relatório de pesquisa de Iniciação Científica, 2019. (não publicado) MONTEIRO, Sandrelena da Silva, PEREIRA, Nathália Nunes. Indícios de depressão em estudantes universitários: um estudo de caso na UFJF. In: Anais do IV CONA- CIR – Religião e Democracia: desafios no espaço público. 2019. Juiz de Fora- -MG. Disponível em https://drive.google.com/file/d/1bcuNHyW9AX7DV8GAOVAylgt- va3Cep3NZ/view acesso em: 20/07/2020. http://www.scielo.br/pdf/ep/v43n4/1517-9702-ep-43-4-1239.pdf http://www.andifes.org.br/wp-content/uploads/2017/11/Pesquisa-de-Perfil-dos-Graduanso-das-IFES_2014.pdf http://www.andifes.org.br/wp-content/uploads/2017/11/Pesquisa-de-Perfil-dos-Graduanso-das-IFES_2014.pdf http://www.andifes.org.br/wp-content/uploads/2019/05/V-Pesquisa-Nacional-de-Perfil-Socioeconômico-e-Cultural-dos-as-Graduandos-as-das-IFES-2018.pdf http://www.andifes.org.br/wp-content/uploads/2019/05/V-Pesquisa-Nacional-de-Perfil-Socioeconômico-e-Cultural-dos-as-Graduandos-as-das-IFES-2018.pdf http://www.andifes.org.br/wp-content/uploads/2019/05/V-Pesquisa-Nacional-de-Perfil-Socioeconômico-e-Cultural-dos-as-Graduandos-as-das-IFES-2018.pdf http://www.scielo.br/pdf/rbem/v39n1/1981-5271-rbem-39-1-0102.pdf http://www.scielo.br/pdf/rbem/v39n1/1981-5271-rbem-39-1-0102.pdf http://www.editorarealize.com.br/revistas/conedu/trabalhos/TRABALHO_EV117_MD1_SA18_ID300_02092018214543.pdf http://www.editorarealize.com.br/revistas/conedu/trabalhos/TRABALHO_EV117_MD1_SA18_ID300_02092018214543.pdf http://www.editorarealize.com.br/revistas/conedu/trabalhos/TRABALHO_EV117_MD1_SA18_ID300_02092018214543.pdf https://drive.google.com/file/d/1bcuNHyW9AX7DV8GAOVAylgtva3Cep3NZ/view https://drive.google.com/file/d/1bcuNHyW9AX7DV8GAOVAylgtva3Cep3NZ/view 36 FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do opri- mido. São Paulo: Paz e Terra, 2014. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 65ª ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2018.SOUZA, Marcella Ranheri de; CALDAS, Thuanny Carolina Gerhardt; DE ANTONI, Cla- rissa. Fatores de adoecimento dos estudantes da área de saúde: uma revisão sistemá- tica. In: Revista Psicologia, Saúde e Debate. Jan., 2017:3(1):99-126. Disponível em: https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=9&cad=r- ja&uact=8&ved=2ahUKEwjmocXXz9fgAhWQIbkGHbclAtQQFjAIegQIAhAC&url=h- ttp%3A%2F%2Fpsicodebate.dpgpsifpm.com.br%2Findex.php%2Fperiodico%2Far- ticle%2Fdownload%2F93%2F77%2F&usg=AOvVaw3Jcl4YDpaT76kQxGGKXdLQ Acesso em 25/02/2019. VASCONCELOS, Tatheane Couto de et al . Prevalência de Sintomas de Ansiedade e Depressão em Estudantes de Medicina. Rev. bras. educ. med., Rio de Janeiro , v. 39, n. 1, p. 135-142, Mar. 2015 . Available from <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0100-55022015000100135&lng=en&nrm=iso>. access on 15 Apr. 2018. http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v39n1e00042014 Acesso em 2/02/209. https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=9&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjmocXXz9fgAhWQIbkGHbclAtQQFjAIegQIAhAC&url=http%3A%2F%2Fpsicodebate.dpgpsifpm.com.br%2Findex.php%2Fperiodico%2Farticle%2Fdownload%2F93%2F77%2F&usg=AOvVaw3Jcl4YDpaT76kQxGGKXdLQ https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=9&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjmocXXz9fgAhWQIbkGHbclAtQQFjAIegQIAhAC&url=http%3A%2F%2Fpsicodebate.dpgpsifpm.com.br%2Findex.php%2Fperiodico%2Farticle%2Fdownload%2F93%2F77%2F&usg=AOvVaw3Jcl4YDpaT76kQxGGKXdLQ https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=9&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjmocXXz9fgAhWQIbkGHbclAtQQFjAIegQIAhAC&url=http%3A%2F%2Fpsicodebate.dpgpsifpm.com.br%2Findex.php%2Fperiodico%2Farticle%2Fdownload%2F93%2F77%2F&usg=AOvVaw3Jcl4YDpaT76kQxGGKXdLQ https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=9&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjmocXXz9fgAhWQIbkGHbclAtQQFjAIegQIAhAC&url=http%3A%2F%2Fpsicodebate.dpgpsifpm.com.br%2Findex.php%2Fperiodico%2Farticle%2Fdownload%2F93%2F77%2F&usg=AOvVaw3Jcl4YDpaT76kQxGGKXdLQ http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v39n1e00042014 37 10.48209/978-65-00-17616-3 MUNDO INTERIOR DO ESPECTRO AUTISTA EM DISCUSSÃO: TÓPICOS ESPECIAIS EM DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DOS SINTOMAS Nicolle dos Santos Moraes Nunes10 Jacqueline Stephanie Fernandes do Nascimento11 Janie Kelly Fernandes do Nascimento12 Marcela de Moraes Mesquita 13 Dellaiane Caroline Barbosa14 Livia Spala Tenorio Faria 15 Antônio Marcos da Silva Catharino16 Marco Antônio Alves Azizi17 Marco Orsini18 10 Graduanda de medicina na Universidade Iguaçu (UNIG), nicolle.nunes_@hotmail.com.br 11 Graduanda de medicina na Universidade Iguaçu (UNIG), jac.fn@hotmail.com 12 Graduanda de medicina na Universidade Iguaçu (UNIG), janiekelly@hotmail.com 13 Graduanda de medicina na Universidade Iguaçu (UNIG), celinhamoraes@yahoo.com.br 14 Graduanda de medicina na Universidade Iguaçu (UNIG), dellaianecaroline@gmail.com 15 Graduanda de medicina na Universidade Iguaçu (UNIG), livia.faria@hotmail.com 16 Médico, Neurologista, Professor titular da Universidade Iguaçu (UNIG), neurocurso@globo. com 17 Médico, Professor titular da Universidade Iguaçu (UNIG), marcoazizimed@gmail.com 18 Médico, Professor na escola de medicina da Universidade Iguaçu (UNIG), Instituto Caduceu – Escola de Pós-Graduação Médica Continuada. orsinimarco@hotmail.com 38 INTRODUÇÃO Os transtornos do espectro autista (TEA) correspondem à distúrbios complexos de neurodesenvolvimento, que se caracterizam por uma constelação de déficits na comunicação e interação social, padrões repetitivos de comportamentos e interesses restritos. Seus sintomas aparecem ainda na primeira infância, com início tipicamente antes dos três primeiros anos de vida, e predomínio no sexo masculino (BANERJEE S, RIORDAN M., BHAT MA, 2014; ZOGHBI HY, BEAR MF, 2012). A estimativa de prevalência relacionada à esses distúrbios demonstra cresci- mento expressivo nos últimos anos. Entre 2000 e 2014 o índice nos Estados Unidos da América foi de 1 em cada 150 crianças para 1 em cada 58 crianças com 8 anos de idade (CHRISTENSEN et al., 2016; ZABLOTSKY et al., 2015). Atualmente, o distúr- bio é considerado como uma condição bastante comum e heterogênea, e ainda que hoje mais pessoas com a doença estejam incluídas no convívio social, ao invés de em instituições, a maioria dos pacientes não viverá de forma independente na vida adulta, sendo necessário suporte vitalício (LORD, et al., 2018). Por mais que a etiologia específica associada ao TEA permaneça desconheci- da, considera-se fortemente a existência de uma relação genética e ambiental, haja vista que a herdabilidade no sentido restrito do autismo é de aproximadamente 52,4% (SEBAT et al., 2007; ABRAHAMS, GESCHWIND 2008; GAUGLER T, et al., 2014). A etiologia subjacente do TEA parece combalir vários genes que afetam as proteí- nas a jusante e substratos neurais, desencadeando as manifestações comporta- mentais dos pacientes (BELMONT, BOURGERON 2006 ; PERSICO, BOURGERON 2006 ; ABRAHAMS, GESCHWIND 2008). Uma vez que não existem evidências de um cromossomo ou loci genético ex- clusivamente ligado ao diagnóstico, acredita-se que interações multigênicas comple- xas sejam as causadoras do distúrbio (MOSS, HOWLIN, 2009; ZHAO ET AL., 2007). Alguns autores, no entanto, sugerem que a maior parte dos casos da doença sejam decorrentes de mutações na linha germinal paterna. (ZHAO et al. 2007). Embora os familiares, professores e provedores diretos representem os agentes com maior impacto na vida dos portadores do TEA, o médico desempenha um papel fundamental para esse indivíduo e seus cuidadores, tanto no direcionamento quanto 39 na estruturação e capacitação da família, que deve contribuir para o desenvolvimento da criança no âmbito domiciliar (ALMEIDA, LIMA, CRENZEL, ABRANCHES, 2016; LORD, et al., 2018). Dessa forma, o objetivo do presente estudo consiste em promo- ver uma discussão provocativa, com base na literatura vigente, sobre os principais tópicos relacionados à diagnóstico e tratamento sintomático de pacientes com TEA. DESENVOLVIMENTO Trata-se de um estudo exploratório descritivo que emprega o método de revi- são integrativa, categoria que consente explorar o conhecimento já definido, incluin- do pesquisas com diferentes técnicas. Realizou-se em janeiro de 2021 o levantamento de artigos indexados nas bases de dados eletrônicas PubMed, MedLine, e LILACS. Para se incluir o maior número de artigos possível que abordassem o foco temático, a busca foi realizada selecio- nando os termos relevantes. Dessa forma, foram utilizados os seguintes termos de busca, indexados no DECS e MESH, assim como seus respectivos correspondentes em inglês e espanhol: transtorno do espectro autista, transtornos mentais, transtor- no autístico, manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, diagnóstico, terapêutica, escala de avaliação comportamental, deficiências no desenvolvimento, citogenética, tratamento farmacológico, inibidores da receptação de serotonina, esti- mulantes do sistema nervoso central, metilfenidato, melatonina, ritalina, fluvoxamina, canabidiol. Assim, utilizou-se as seguintes chaves de busca: “transtorno do espectro autis- ta” OR “transtornos mentais” OR “transtorno autístico” AND “diagnóstico”; “transtorno do espectro autista” AND “terapêutica”; “transtorno do espectro autista” AND “escala de avaliação comportamental”; “transtorno do espectro autista” AND “deficiências no desenvolvimento” AND “citogenética”; “transtorno do espectro autista” AND “trata- mento farmacológico”; “transtorno do espectro autista” AND “inibidores da recepta- ção de serotonina”; “transtorno do espectro autista” AND “estimulantes do sistema nervoso central”; “transtorno do espectro autista” AND “metilfenidato”; “transtorno do espectro autista” AND “melatonina”; “transtorno do espectro autista” AND “ritalina”; “transtorno do espectro autista” AND “fluvoxamina”; e“transtornodo espectro autista” AND “canabidiol”. 40 Priorizou-se por aplicar como filtro de pesquisa “textos completos”, pois os au- tores entendem que é de suma importância o reconhecimento das obras disponíveis gratuitamente e, sobretudo, por considerarem que esses materiais são essenciais para promoverem acesso igualitário à informação. Os critérios de inclusão para a amostra foram: artigos que abordassem os tópi- cos de diagnóstico, testes de triagem, tratamento multidisciplinar e medicamentoso relacionados aos transtornos do espectro autista, disponíveis em português, inglês ou espanhol. Em contrapartida, os critérios de exclusão contemplaram artigos que não estivessem em concordância com a temática proposta, além de outros tipos de produção, como: dissertações, editoriais de revistas, teses, apresentação de pôste- res e anais de congresso. O processo de elegibilidade dos artigos para a amostra dessa revisão seguiu três etapas: leitura do título para adequação à temática; leitura do resumo; e leitura dos artigos completos no intuito de extração dos dados para posterior sumarização dos desfechos. Todos os artigos inclusos para a amostra abordavam aspectos diag- nósticos ou terapêuticos dos distúrbios do espectro autista, e os dados foram anali- sados mediante os resultados. Além disso, optou-se por realizar a busca reversa, que consiste em uma técnica de busca de artigos a partir da investigação das referências dos artigos selecionados para a amostra, no intuito de ampliar a busca e diversificar os resultados. RESULTADOS Através do cruzamento dos descritores nas bases de dados e aplicação dos filtros (texto completo disponível gratuitamente e seleção dos idiomas) foi encontra- do um total de 1413 publicações. Dentre essas, conforme os critérios de inclusão e exclusão, 1394 foram excluídas e 14 foram selecionadas para compor a amostra. Além desses, 5 artigos foram encontrados através de busca reversa. Dessa forma, a amostra foi composta de 19 artigos. 41 DISCUSSÃO DIAGNÓSTICO E TESTES DE TRIAGEM O Transtorno do Espectro Autista dispõe de um diagnóstico enigmático e de difícil desfecho, haja vista a complexidade na heterogeneidade etiológica e fenotípica dos quadros. Até a presente data, as bases biológicas responsáveis por justificar tal complexidade ainda não estão plenamente elucidadas, e por esse motivo, o reconhe- cimento e o diagnóstico de TEA fundamentam-se nas manifestações comportamen- tais e na história clínica do desenvolvimento pessoal (MERLLETI, 2018). O diagnóstico de TEA é essencialmente clínico, por intermédio da acurácia da avaliação clínica comportamental, entrevista com os pais, cuidadores e educadores, informações acerca da história do doente, meticulosa observação do indivíduo, o uso de instrumentos estandardizados eficientes em crianças com dois anos de idade ou mais, todos norteados pelos critérios diagnósticos da quinta edição do Manual Diag- nóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) e pelo CID10 (Classificação Estatística Internacional de Doenças e de Problemas Relacionados à Saúde) (KLIN, et al. 2005). O DSM-5 difundiu as três principais condições diagnósticas, associadas com o uso inapropriado, a interação social, déficits na comunicação da linguagem e o comportamento e interesses metódicos reincidentes (Gaiato, 2018). Cabe ressaltar que existem marcadores de reconhecimento precoce para o transtorno. Estes são identificados entre 12 e 24 meses e incluem modificações dos domínios de lingua- gem, interação e comunicação social, além de atividades repetitivas (SHATTUCK et al., 2009). Há uma pluralidade no que diz respeito aos testes utilizados para diagnós- tico. Dentre eles, destaca-se: o Questionário Modificado para Triagem do autismo em Crianças - Modified Checklist for Autism in Toddlers (M-CHAT-R) destinado para crianças de 16 até 30 meses, Social Comunnication Questionnaire (SCQ), e aqueles que se norteiam em avaliações clínicas em centros de terapia como (Observation Schedule (ADOS) (GRISIE-OLIVEIRA, SERTIÉ, 2017). Os instrumentos destinados para rastrear o TEA, possuem como intuito o reconhecimento de sinais de riscos pre- coces, e não diagnosticar o transtorno. As escalas de avaliação propiciam a mensu- 42 ração de condutas juntamente com o estabelecimento de um diagnóstico fidedigno. (HARRIS, WILLIAMS, 2017). O instrumento de rastreamento M-CHAT é uma entrevista executada com os pais e aplicada em crianças de 16 a 30 meses, não necessitando de capacitação prévia. A identificação de um resultado M-CHAT positivo não justifica uma avaliação rigorosa de TEA, todavia, mediante à positividade do mesmo, os pacientes costu- mam beneficiar-se do tratamento, pois há possibilidade da existência de outros atra- sos no desenvolvimento. A recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria é o Questionário Modificado para Triagem do autismo em Crianças entre 16 e 30 meses, Revisado, com Entrevista de Seguimento (M-CHAT-R/F) (ROBINS, et al, 2009). O instrumento ADOS-2 dispõe de melhores resultados, porém necessita de alto domínio sobre o método, o que pode dificultar sua realização (Costa, 2014). O Social Comunnication Questionnaire (SCQ) é uma ferramenta de triagem para o TEA direcionado para indivíduos com mais de 4 anos de idade e idade intelec- tual superior a 2 anos de idade. O SCQ percorre o desenvolvimento e os hábitos do quotidiano que vão da infância até a presente data, incluindo três domínios básicos de danos: a linguagem, sociabilidade comportamento (RUTTER et al., 2003). A determinação do diagnóstico de TEA pode ser retardada tendo em vista a variação expressiva dos sinais e sintomas do transtorno, os prejuízos na avaliação de pré-escolares, em virtude da necessidade de materiais específicos e evidentes ao que se tange sobre os comportamentos pessoais decorrentes da faixa etária, a au- sência de profissionais capacitados para identificar as apresentações prematuras do transtorno, além da escassez de serviços especializados (SIKLOS, KERNS, 2007). TESTES GENÉTICOS O TEA é caracterizado por ser uma patologia heterogênea e de tamanha com- plexidade em se tratando da questão genética, visto que esta apresenta variantes genéticos e padrões hereditários de causalidade (APA, 2013). A avaliação clínica do paciente deve ser bastante meticulosa, a julgar pela escassez de sinais clínicos sugestivos de alteração genética específica. Para tanto, é indispensável colher infor- mações que diz respeito a padrões hereditários, investigações de transtornos mono- gênicos e metabólicos o qual o TEA pode estar associado e, a partir disso, tornar o 43 diagnóstico e a determinação de testes moleculares mais fidedignos (DURAND et al, 2007). Via de regra, sugere-se que todos os pacientes sabidamente com diagnóstico de TEA necessitem realizar a investigação das variações nos números de cópias (CNV - copy number variations), aplicando análise cromossômica por microarray ge- nômico (SNP-array), também denominado de Hibridização Genômica Comparativa (CGH-array), pois conjectura-se que cerca de 10% dos doentes manifestem alguma CNV com importância clínica (Pinto et al, 2010). As CNV mais comumente visualizadas nos pacientes com TEA estão identifi- cadas em 15q11-13, 16p11 e 22q11-13, totalizando 3 a 5% de incidência. Como a cariotipagem apresenta baixa resolução quando comparado a análise cromossômica por microarray, no presente momento este teste citogenético é recomendado apenas quando houver suspeita de aneuploidia ou ainda relatos de abortamentos repetitivos, sugerindo a probabilidade de rearranjos cromossômicos (SANDERS, et al, 2015). Em função da alta prevalência entre sujeitos portadores de TEA, devem ser realizados testes moleculares a fim de se investigar uma possível síndrome do X frágil (gene FMR1) em pacientes do sexo masculino, a despeito da inexistência de manifestações clínicasque caracterizem a síndrome. Todavia, em pacientes do sexo feminino, tal exame só é aconselhado em caso de deficiência intelectual não identifi- cada com padrão de herança ligada ao X, falência ovariana precoce, histórico familiar de síndrome do X frágil. Preconiza-se, por sua vez, que pacientes femininas sejam submetidas à averiguação de mutações no gene MECP2, sendo necessário, portan- to, realizar seu sequenciamento. Tal gene é causador da síndrome de Rett, haja vista que 4% das mulheres com Transtorno do Espectro Autista e distúrbios intelectuais grave apresentem mutações danosas no devido gene (SCHAEFER et al, 2013). Por fim, mutações no gene PTEN devem ser investigadas através de seu se- quenciamento, uma vez que paciente com TEA e macrocefalia (perímetro cefálico maior do que > 2.5 desvios padrão superior à média para a idade) estão correlacio- nados com a síndrome do tumor hamartoma, uma condição que ocasiona macroce- falia/macrossomia, além de um risco elevado para tumorigênese (SCHAEFER et al, 2013). O Painel de genético do paciente portador de Transtorno do Espectro Autista 44 tem como objetivo a análise de 42 genes associados a doença. Dentre os genes, destacam-se: ANKRD11, ASH1L, SETD2, KMT2C, PTEN, NAA15, CHD2, ADNP, PPM1D, SYN1, TRIP12, MECP2, TBL1XR1, FOXP1, HNRNPH2, NEXMIF, SHANK1, TRIO, ARID1B, PTCHD1, UBE3A, RPL10, TBR1, CHD8, AUTS2, KMT5B, SHANK2, MBD5, SYNGAP1, SCN2A, GRIA1, MED12, EHMT1, GRIN2B, CAMK2A, NLGN4X, KMT2A, NLGN3, PACS1, POGZ, DDX3X, DYRK1A (Arking et al, 2008). NEUROIMAGEM: QUANDO PEDIR? A ressonância nuclear magnética (RNM) juntamente com a neuroimagem de- sempenharam importante papel nas pesquisas sobre modificações anatômicas no autismo, tais como: alargamento de ventrículos, hipoplasia dos lobos cerebelares (regiões VI e VII) por insuficiência de desenvolvimento de um órgão e alteração no tronco cerebral. Tais imagens são utilizadas como base para se entender os circuitos neurais que explicam o autismo. A tomografia por emissão de pósitrons, tomografia por emissão de fóton único e ressonância magnética funcional, possuem como intui- to ampliar o campo de visão para um estudo do desempenho de um cérebro normal e um patológico. Ambas as técnicas de tomografia por emissão permitem medidas não-invasivas e concisas do metabolismo da glicose cerebral e/ou do fluxo sanguí- neo cerebral (FSC) (MOURA et al, 2005). Devido a não existência de marcadores biológicos incumbidos pelo diagnóstico de TEA, os critérios diagnósticos são pautados em avaliações comportamentais. Ain- da que haja um avanço exponencial no que concerne às pesquisas, a compreensão sobre o fenômeno continua não esclarecida, por esse motivo, torna-se necessário o uso de exames de imagem que colaborem com o diagnóstico, tendo em vista que o advento de técnicas de imagem cerebral funcionais proporcionou um novo caminho para o estudo da disfunção cerebral no autismo infantil. Não obstante, os exames de neuroimagem apenas devem ser solicitados sob suspeita de condições concomitan- temente relacionadas, a fim de evidenciar ou descartar as mesmas (MOURA et al, 2005). 45 TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTÍSTICO E TRATAMENTO: UMA ABORDAGEM MULTIPROFISSIONAL Os principais pilares para o tratamento de TEA são a família, a equipe peda- gógica e a de saúde para a condução oportuna das crianças, com o propósito de promover aprendizado e alterações comportamentais trabalhadas por equipes inter- disciplinares, que incluem psicólogos, psicopedagogo, fonoaudiólogos, neurologis- tas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, educadores físicos (HALPERN, 2014), todos empenhados em proporcionar melhorias na tríade clínica de dificuldades, a saber: comunicação, interação social e comportamentos estereoti- pados, repetitivos e interesses limitados (COSTA, 2014). Os pais e cuidadores necessitam, todavia, de capacitação por parte desses profissionais visando contribuir para o desenvolvimento da criança também no âm- bito domiciliar. Estudos recentes corroboram que famílias previamente capacitadas em treinamento comportamental com base em ABA, obtiveram resultados expres- sivamente superiores nos mais variados contextos (ALMEIDA, LIMA, CRENZEL, ABRANCHES, 2016). O tratamento padrão-ouro para o Transtorno do Espectro Autista é a interven- ção precoce. Essa, constitui-se em um grupo de modalidades terapêuticas que al- mejam ampliar o potencial do desenvolvimento social e comunicação verbal e não verbal, preservar o desempenho intelectual reduzindo prejuízos, promover qualidade de vida e capacidade para autonomia (ANAGNOSTOU et al., 2014). Está relaciona- da a ganhos expressivos no desenvolvimento cognitivo, adaptativo e linguagem da criança. Baseado em estudos que reafirmam seu uso, é sabido que tal intervenção possui o potencial de inibir a manifestação plena do TEA, por suceder em um período do neurodesenvolvimento em que o cérebro se encontra maleável e altamente plás- tico (DAWSON, 2008). Dentre as modalidades terapêuticas três deles apresentam os resultados mais satisfatórios: o Método TEACCH - Treatment and Education of Autistic and related Communication-handicapped Children, a abordagem Floortime e a ABA - Applied Behavior Analysis (CASTANHA, 2016). A estratégia TEACCH propicia, primeiramente, o aprimoramento no uso da lin- guagem do paciente, frequentemente acometido no indivíduo com TEA. A habilidade 46 de compreensão e recepção da criança, na perspectiva da linguagem, é um dos prin- cipais pilares do método e, indubitavelmente, tal fato correlaciona-se ao considerável desenvolvimento nos autistas (DIAS, 2017; SILVA, BRITO, 2019). O método ABA é embasado na perspectiva de que há repertórios socialmente relevantes, assim como táticas de ensino e aprendizagem que propiciem ao autista progressos nesse processo, no ambiente escolar e em vários outros cenários do quo- tidiano (DIAS, 2017; SILVA, BRITO, 2019). A abordagem Floortime localiza-se dentro do modelo DIR - Developmental, Indi- vidual Difference, Relationship-Based - sendo sua principal estratégia. Ela represen- ta a principal técnica para sistematizar as atividades e promover evolução no tocante as etapas do desenvolvimento. Essa abordagem é fundamentada na concepção de que a emoção é primordial para o desenvolvimento neuronal e evolução intelectual e que tal progresso é adquirido por meio de interações ao solo (INTERDISCIPLINARY, 2010). MEDICAÇÕES SINTOMÁTICAS A intervenção farmacológica em pacientes com TEA deve ser considerada para o tratamento de comportamentos desadaptativos, como: agressividade, com- portamento autolesivo, comportamentos repetitivos, distúrbios do sono, labilidade emocional, irritabilidade, ansiedade, hiperatividade, desatenção, e outros sintomas perturbadores (SCOTT M. MYERS, CHRIS PLAUCHÉ JOHNSON, 2007). Além dis- so, em alguns casos, a presença desses sintomas associados às características es- pecíficas pode ser sugestiva de transtornos comórbidos, como transtorno bipolar, depressão maior ou transtorno de ansiedade, fazendo necessário que o paciente seja tratado com medicamentos específicos para essa condição associada (SCOTT M. MYERS, CHRIS PLAUCHÉ JOHNSON, 2007). A necessidade de medicação psicotrópica em crianças e adultos com TEA cor- responde, respectivamente, a 45 e 75%. (MYERS, JOHNSON, 2007; AMAM, LAM, COLLIER-CRESPIN, 2003; WITWER, LECAVALIER, 2005; TSAKANILOS et al., 2006). Os principais fatores relacionados à maior probabilidade de utilização dessas medicações são: maior idade, menores habilidades de adaptação e competência so- cial, além de níveis mais elevados de alterações de comportamento. (AMAM, LAM, 47 COLLIER-CRESPIN, 2003). As classes de medicamentos psicotrópicos mais comumente prescritos para pa- cientes com TEA envolvem inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), agentes antipsicóticosatípicos, estimulantes e agonistas do receptor alfa 2 adrenér- gicos (AMAM, LAM, COLLIER-CRESPIN, 2003). Os inibidores da recaptação de serotonina, fluoxetina e fluvoxamina, demons- traram eficácia para o tratamento dos comportamentos repetitivos, irritabilidade, sin- tomas depressivos, acessos de raiva, ansiedade, agressividade, dificuldade na inte- ração social, linguagem e transições. (HOLLANDER et al, 2005; MCDOUGLE et al., 1996, SUGIR et al, 2005) Os antipsicóticos atípicos, aripiprazol e risperidona, contemplam a classe dos antipsicóticos atípicos e representam os únicos medicamentos aprovados pela Food and Drug Administration dos Estados Unidos da América para tratamento dos trans- tornos autísticos. O aripiprazol é indicado para crianças portadoras de TEA entre seis e dezessete anos de idade, enquanto a risperidona é indicada para crianças entre cinco e desesseis anos. Seus principais benefícios estão associados à melhora da irritabilidade associada ao TEA, além de melhora na agressividade, comportamentos explosivos e automutilação (SANCHACK, THOMAS, 2016; CHING et al., 2012; JES- NER, AREF-ADIB, COREN, 2007). Dois grandes ensaios clínicos randomizados evi- denciaram a eficácia de curto prazo da risperidona em comportamentos perturbado- res de jovens com TEA, e os benefícios a longo prazo dessa droga foram sugeridos por outros dois estudos duplo-cegos (MCCRACKEN, et al., 2002; Shea, TURGAY, CARROL, et al., 2004; RESEARCH UNITS ON PEDIATRIC PSYCOPHARMACOLO- GY AUTISM NETWORK, 2005; TROOST, et al., 2005). Os estimulantes, como o metilfenidato, demonstram melhora na hiperatividade, impulsividade e desatenção em crianças com TEA (Troost PW, et al, 2005). Ainda assim, os estudos evidenciam que as taxas de resposta possuem tendencia a ser menos significativas em crianças com TEA do que em crianças portadoras de Trans- torno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) isolado (RESEARCH UNITS ON PEDIATRIC PSYCOPHARMACOLOGY AUTISM NETWORK, 2005). Por isso, alguns autores sugerem que o tratamento utilizando não estimulantes parece ter maior papel nos pacientes portadores de ambos os distúrbios, e ser menos associados à efeitos 48 adversos (DAVIS, KOLLINS, 2012). Na classe dos agonistas do receptor adrenérgico alfa 2, a clonidina apresentou benefícios, embora modestos, no controle da hiperatividade, irritabilidade e compor- tamentos explosivos em crianças com TEA (FANKHAUSER, et al., 1992; JASEL- SKIS, et al., 1992). Além desses, foram encontradas evidências de eficácia relacionadas à naltrexo- na, antidepressivos tricíclicos e agentes glutamatérgicos. (JOU, HANDEN, HARDAN, 2005; SCAHILL, AMAN, MCDOUGLE, et al., 2006). A naltrexona, um antagonista dos receptores opiáceos, foi associada à eficácia relativa no tratamento de comportamen- to autolesivo, hiperatividade, interação social, agitação e irritabilidade em pacientes com TEA (EISSA et al., 2018; HOWES et al., 2017). Ao mesmo passo, a clomipramina e a nortriptilina, pertencentes à classe dos antidepressivos tricíclicos, demonstraram melhora nos comportamentos repetitivos, hiperatividade e agressividade. Quanto aos agentes glutamatérgicos, amantadina e memantina, esses apresentaram benefícios no que tange à memória, hiperatividade, irritabilidade, linguagem, comportamento social e comportamento autolesivo, o que pode ser explicado haja vista que os níveis de glutamato tendem a ser excessivamente aumentados nos indivíduos com TEA. (EISSA et al., 2018; HOWES, et al., 2017) Por fim, diversos estudos abordam a correlação entre pacientes com TEA e anormalidades na fisiologia da melatonina e ritmo circadiano, o que justificaria os dis- túrbios do sono associados ao transtorno (DANIEL, ROSSIGNOL, RICHARD, FRYE, 2014). Nesses estudos, a suplementação exógena de melatonina é assocada à me- lhoras nos parâmetros de sono dos pacientes com TEA. Os benefícios trazidos aos pacientes por esse composto incluem não somente maior duração do sono, como também menos despertares noturnos, início de sono mais rápido e melhoras no com- portamento diurno (DANIEL, ROSSIGNOL, RICHARD, FRYE, 2014; LOFTHOUSE et al., 2012; GARSTANG, WALLIS, 2006; ROSSIGNOL, FRYE, 2011). Apesar dos possíveis efeitos benéficos de todas as medicações supracitadas, é válido ressaltar a importância de considerar o risco-benefício antes de instituir o uso desses fármacos, uma vez que esse pode induzir a efeitos adversos potencial- mente graves, como sedação, sintomas extrapiramidais e tremores (SANCHACK, THOMAS, 2016; CHING et al., 2012; JESNER, AREF-ADIB, COREN, 2007). Dessa 49 forma, faz-se necessária uma avaliação mais rigorosa da segurança e eficácia dos agentes psicotrópicos em crianças com TEA. TRANSTORNOS DO ESPECTRO AUTISTA E CANABIDIOL (CBD) O canabidiol, em sua forma pura, tem despertado interesses no tocante ao trata- mento complementar para os principais sintomas do Transtorno do Espectro Autista. Em pacientes portadores do transtorno, o sistema endocanabinóide, que correspon- de à uma rede neuromoduladora envolvida na regulação das respostas emocionais, reatividade comportamental, e interação social, é frequentemente combalido, desen- cadeando convulsões, ansiedade, comprometimentos cognitivos e distúrbios do pa- drão do sono (CHENG, 2014; ZAMBERLETTI, 2017). Além dos estudos de intervenção em humanos com canabidiol não demonstra- rem amplificação significativa de medidas psicopatológicas, este obtém resultados positivos em várias funções cerebrais, dentre a infinidade de propriedades se encon- tram os efeitos anticonvulsivos, sedativo, antipsicótico, hipnótico, antinflamatório e neuroprotetores (RONG, 2017). Dentro desse contexto, as pesquisas sugerem que a cannabis rica em canabidiol pode ajudar pacientes com TEA, incluindo seus efeitos ansiolíticos e propriedades antipsicóticas bem como seu efeito imunomodulador e seu impacto no sistema endocanabinóide. CONCLUSÃO O transtorno do espectro autista é composto por um grupamento de alterações no neurodesenvolvimento heterogêneos, determinado por distúrbios iniciais na co- municação social e por comportamentos e interesses repetitivos. A etiologia do TEA ainda é desconhecida, porém, há fortemente uma correlação com fatores ambientais e genéticos. O diagnóstico é essencialmente clínico, associado a utilização de testes de triagem, como o Social Communication Questionnaire (SCQ), Modified Checklist for Autism in Toddlers (M-CHAT-R) e a Applied Behavior Analysis (ABA). Além disso, é recomendado a investigação de transtornos monogênicos e metabólicos o qual o TEA pode estar associado por meio do uso de teste genéticos. Embora não haja tratamento farmacológico específico, alguns medicamentos, como inibidores seleti- vos da recaptação da serotonina, antipsicóticos atípicos e antidepressivos tricíclicos 50 podem ajudar em distúrbios comportamentais graves, bem como na atenuação dos sintomas. No entanto, o tratamento multidisciplinar e a abordagem firmada no com- portamento que encorajam a interação e a comunicação são as melhores ferramen- tas terapêuticas para o controle do TEA, promovendo melhor qualidade de vida aos pacientes. REFERÊNCIAS BANERJEE S, RIORDAN M., BHAT MA. Aspectos genéticos dos transtornos do es- pectro do autismo: percepções de modelos animais. Front Cell Neurosci. V. 8, n. 58, 2014. doi: 10.3389 / fncel.2014.00058. PMID: 24605088. ZOGHBI HY, BEAR MF. Synaptic dysfunction in neurodevelopmental disorders asso- ciated with autism and intellectual disabilities. Cold Spring Harb Perspect Biol. V. 4, n.3, 2012. doi: 10.1101/cshperspect.a009886. CHRISTENSEN DL, BAIO J, VAN NAARDEN BRAUNK, BILDER D, CHARLES J, CONSTANTINO JN, et al. Prevalence and Characteristics of Autism Spectrum Disor- der Among Children Aged 8 Years--Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, 11 Sites, United States, 2012. MMWR Surveill Summ. v. 65, n. 3, 2016, 1–23p. ZABLOTSKY B, BLACK LI, MAENNER MJ, SCHIEVE LA, BLUMBERG SJ. Estima- ted Prevalence of Autism and Other Developmental Disabilities Following Question- naire Changes in the 2014 National Health Interview Survey. Natl Health Stat Report. V.87, 2015, 1–20 p. LORD C, ELSABBAGH M, BAIRD G, VEENSTRA-VANDERWEELE J. Transtorno do espectro do autismo. Lanceta. V. 392, n. 10146, 2018, 508-520 p. doi: 10.1016 / S0140-6736 (18) 31129-2. SEBAT J, LAKSHMI B, MALHOTRA D, TROGE J, LESE-MARTIN C, WALSH T, et al. Strong association of de novo copy number mutations with autism. Sciencev. 20, n. 316, 2007, 445-9 p. doi: 10.1126/science.1138659. GAUGLER T, KLEI L, SANDERS SJ, BODEA CA, GOLDBERG AP, LEE AB, et al. Most genetic risk for autism resides with common variation. Nat Genet. v. 46, n. 8, 2014, 881-5 p.. doi: 10.1038/ng.3039. ABRAHAMS BS, GESCHWIND DH. Advances in autism genetics: on the threshold of a new neurobiology. Nat Rev Genet. v.9 n.6, 2008, 493 p. 51 ZHAO X, LEOTTA A, KUSTANOVICH V, LAJONCHERE C, GESCHWIND DH, LAW K, et al. A unified genetic theory for sporadic and inherited autism. Proc Natl Acad Sci U S A. 2007 v. 31;104(31):12831-6. doi: 10.1073/pnas.0705803104. PMID: 17652511; PMCID: PMC1933261. BELMONTE MK, BOURGERON T. Fragile X syndrome and autism at the intersection of genetic and neural networks. Nat Neurosci. v. 9, n.10, 2006, 1221-5 p. doi: 10.1038/ nn1765. PMID: 17001341. MOSS J, HOWLIN P. Autism spectrum disorders in genetic syndromes: implications for diagnosis, intervention and understanding the wider autism spectrum disorder po- pulation. V. 53, n. 10, 2009, 852-873 p. ALMEIDA RS, LIMA RC, CRENZEL G, ABRANCHES CD DE. Pediatria. Psiquiatria da Criança e do Adolescente [Internet]. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2016, 250 p. MERLLETI, C. Autismo em causa: histórico diagnóstico dos pais, prática clínica e narrativas. Psicologia USP. v.29, n.1, 2018, 146-151 p. KLIN A, SAULNIER C, TSATSANIS K, VOLKMAR F.R. Clinical Evaluation in Autism Spectrum Disorders 773. Handbook of Autism and Pervasive Developmental Disor- ders. 3rd ed. Hoboken, NJ: John Wiley & Sons; 2005. 772–98 p. GAIATO, M.S.O.S. Autismo: guia completo para entender o transtorno do espectro autista. São Paulo: Versos, 2018. 34 p. CHAKRABARITI, S. Early identification of Autism. Indian Pediatrics, v. 46, n 17, 2009, 412-414 p. CHAWARSKA, K., PAUL, R., KLIN, A., HANNIGEN, S., DICHTEL, L., VOLKMAR, F. Parental recognition of developmental problems in toddlers with ASD. Journal of Au- tism and Developmental Disorder. v. 37, 2007, 62-73 p. GRISIE-OLIVEIRA, K. SERTIÉ, A. L. Transtornos do espectro autista: um guia atua- lizado para aconselhamento genético. Revista Einstein. São Paulo. v.15. n.2. 2017. HARRIS, A. WILLIAMS, J.M. The Impact of a Horse Riding Intervention on the Social Functioning of Children with Autism Spectrum Disorder. Int J Environ Res Public Heal- th. V. 14, n. 7, 2017, 776 p. ROBINS D., FEIN D., BARTON M., RESEGUE R.M. (Trad. Questionário Modificado para a Triagem do Autismo em Crianças entre 16 e 30 meses, Revisado, com Entre- vista de Seguimento (M-CHAT-F/F)TM [Internet]. 2009. COSTA, D.C.F. Intervenção Precoce no Transtorno do Espetro do Autismo [Internet]. 52 Escola Superior de Educação João de Deus. 2014. RUTTER, M.; BAILEY, A.; LORD, C. Social Communication Questionnarie. Western Psycological Services, 2003. SIKLOS, S., KERNS, K. Assessing the diagnostic experiences of a small sample of parents of children with autism spectrum disorders. Research in Developmental Disa- bilities. V. 28, 2007, 9-22 p. SANDERS SJ, HE X, WILLSEY AJ, ERCAN-SENCICEK AG, SAMOCHA KE, CICEK AE, et al. Into autism spectrum disorder genomic architecture and biology from 71 risk loci. Neuron. 2015;87(6):1215-33. SCHAEFER GB, MENDELSOHN NJ; Professional Practice and Guidelines Commi- ttee. Clinical genetics evaluation in identifying the etiology of autism spectrum disor- ders: 2013 guideline revisions. Genet Med. V. 15, n.8, 2013, 669 p. PINTO D, PAGNAMENTA AT, KLEI L, ANNEY R, MERICO D, REGAN R, et al. Func- tional impact of global rare copy number variation in autism spectrum disorders. Na- ture. V.466, n.7304, 2010, 368-72 p. DURAND CM, BETANCUR C, BOECKERS TM, BOCKMANN J, CHASTE P, FAU CHEREAU F, et al. Mutations in the gene encoding the synaptic scaffolding protein SHANK3 are associated with autism spectrum disorders. Nat Genet. V. 39, n.1, 2007, 25-7 p. AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA). Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 5th ed. Washington (DC): American Psychiatric Association; 2013. ARKING DE, CUTLER DJ, BRUNE CW, TESLOVICH TM, WEST K, IKEDA M, et al. A common genetic variant in the neurexin superfamily member CNTNAP2 increases familial risk of autism. Am J Hum Genet. v.82, n. 1, 2008,160-4 p. MOURA, P. J.; SATO, F.; MERCADANTE, M. T. “Bases Neurobiológicas do Autismo: Enfoque no domínio da sociabilidade” in Caderno de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento. 2005. HALPERN R. Manual de pediatria do desenvolvimento e comportamento. Barueri, SP: Manole; 2014. 556 p COSTA, D.C.F. Intervenção Precoce no Transtorno do Espetro do Autismo [Internet]. Escola Superior de Educação João de Deus. 2014. ALMEIDA RS, LIMA RC, CRENZEL G, ABRANCHES CD DE. Pediatria. Psiquiatria da Criança e do Adolescente [Internet]. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2016, 250 p. 53 ANAGNOSTOU E, ZWAIGENBAUM L, SZATMARI P, FOMBONNE E, FERNANDEZ BA, WOODBURYSMITH M, et al. Autism spectrum disorder: advances in evidence- -based practice. CMAJ. V. 186, n. 7, 2014, 509–19 p. DAWSON G. Early behavioral intervention, brain plasticity, and the prevention of au- tism spectrum disorder. Dev Psychopathol. v. 20, n. 3, 2008, 775– 803 p. CASTANHA, J. G. Z. A trajetória do autismo na educação: da criação das associa- ções à regulamentação da política de proteção (1983-2014). Dissertação (Mestrado em Educação) –Universidade Estadual do Oeste do Paraná –Unioeste. Cascavel. 2016, 130 p. DIAS, N.S. Autismo: estratégias de intervenção no desafio da inclusão no âmbito es- colar, na perspectiva da análise do comportamento. Psicologia PT. 2017. SILVA, J. A. F. BRITO, W. V. A tessitura do debate sobre a inclusão nos casos do transtorno do espectro autista: TEA. Monografia (Licenciatura Plena em Pedagogia) –Universidade Federal de Alagoas. Maceió. 2019, 52 p. INTERDISCIPLINARY COUNCIL ON DEVELOPMENTAL AND LEARNING DISOR- DERS - ICDL. Bethesda. 2010. Myers SM, Johnson CP; American Academy of Pediatrics Council on Children With Disabilities. Management of children with autism spectrum disorders. Pediatrics. 2007 Nov;120(5):1162-82. doi: 10.1542/peds.2007-2362. Epub 2007 Oct 29. PMID: 17967921. AMAN MG, LAM KS, COLLIER-CRESPIN A. Prevalence and patterns of use of psy- choactive medicines among individuals with autism in the Autism Society of Ohio. J Autism Dev Disord. v. 33, n. 5, 2003, 527-34 p. doi: 10.1023/a:1025883612879. PMID: 14594332. WITWER A, LECAVALIER L. Treatment incidence and patterns in children and ado- lescents with autism spectrum disorders. J Child Adolesc Psychopharmacol. v. 15, n.4, 2005, 671-81 p. doi: 10.1089/cap.2005.15.671. PMID: 16190798. TSAKANIKOS E, COSTELLO H, HOLT G, BOURAS N, STURMEY P, NEWTON T. Psychopathology in adults with autism and intellectual disability. J Autism Dev Disord. v. 36, n. 8, 2006, 1123-9 p. doi: 10.1007/s10803-006-0149-3. PMID: 16855878. HOLLANDER E, PHILLIPS A, CHAPLIN W, ZAGURSKY K, NOVOTNY S, WASSER- MAN S. A placebo controlled crossover trial of liquid fluoxetine on repetitive behaviors in childhood and adolescent autism. Neuropsychopharmacology. v. 30, n.3, 2005, 582-9 p. doi: 10.1038/sj.npp.1300627. PMID: 15602505. MCDOUGLE CJ, NAYLOR ST, COHEN DJ, VOLKMAR FR, HENINGER GR, PRI- CE LH. A double-blind, placebo-controlled study of fluvoxamine in adults with au- 54 tistic disorder. Arch Gen Psychiatry. v. 53, n. 11, 1996, 1001-8 p. doi: 10.1001/ar- chpsyc.1996.01830110037005. PMID: 8911223.SUGIE Y, SUGIE H, FUKUDA T, ITO M, SASADA Y, NAKABAYASHI M. Clinical ef- ficacy of fluvoxamine and functional polymorphism in a serotonin transporter gene on childhood autism. J Autism Dev Disord. v. 35, n. 3, 2005, 377-85 p. doi: 10.1007/ s10803-005-3305-2. PMID: 16119478. MCCRACKEN JT, MCGOUGH J, SHAH B, CRONIN P, HONG D, AMAN MG, et al. Research Units on Pediatric Psychopharmacology Autism Network. Risperidone in children with autism and serious behavioral problems. N Engl J Med. v. 1, n. 5, 2002, 314-21 p. doi: 10.1056/NEJMoa013171. PMID: 12151468. SHEA S, TURGAY A, CARROLL A, et al. Risperidona no tratamento de sintomas comportamentais perturbadores em crianças com transtornos autistas e outros trans- tornos invasivos do desenvolvimento. Pediatria. v. 114, n. 5, 2004 . RESEARCH UNITS ON PEDIATRIC PSYCHOPHARMACOLOGY AUTISM NE- TWORK. Risperidone treatment of autistic disorder: longer-term benefits and blinded discontinuation after 6 months. Am J Psychiatry. v. 162, n. 7, 2005, 1361-9 p. doi: 10.1176/appi.ajp.162.7.1361. PMID: 15994720. TROOST PW, LAHUIS BE, STEENHUIS MP, KETELAARS CE, BUITELAAR JK, VAN ENGELAND H, et al. Long-term effects of risperidone in children with autism spectrum disorders: a placebo discontinuation study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry. v. 44, n.11, 2005, 1137-44 p. doi: 10.1097/01.chi.0000177055.11229.76. PMID: 16239862. JOU RJ, HANDEN BL, HARDAN AY. Retrospective assessment of atomoxetine in children and adolescents with pervasive developmental disorders. J Child Adolesc Psychopharmacol. v. 15, n.2, 2005, 325-30 p. doi: 10.1089/cap.2005.15.325. PMID: 15910217. FANKHAUSER MP, KARUMANCHI VC, GERMAN ML, YATES A, KARUMANCHI SD. A double-blind, placebo-controlled study of the efficacy of transdermal clonidine in autism. J Clin Psychiatry. v. 53, n. 3, 1992, 77-82 p. JASELSKIS CA, COOK EH JR, FLETCHER KE, LEVENTHAL BL. Clonidine treat- ment of hyperactive and impulsive children with autistic disorder. J Clin Psychophar- macol. v. 12, n. 5, 1992, 322-7 p. Aman MG, Findling RL, Hardan AY, Hendren RL, Melmed RD, Kehinde-Nelson O, Hsu HA, Trugman JM, Palmer RH, Graham SM, Gage AT, Perhach JL, Katz E. Se- gurança e eficácia da memantina em crianças com autismo: Estudo randomizado, controlado por placebo e extensão aberta. J Child Adolesc Psychopharmacol. Junho de 2017; 27 (5): 403-412. doi: 10.1089 / cap.2015.0146. Epub 15 de março de 2016. PMID: 26978327; PMCID: PMC5510039. 55 Eissa N, Al-Houqani M, Sadeq A, Ojha SK, Sasse A, Sadek B. Current Enlightenment About Etiology and Pharmacological Treatment of Autism Spectrum Disorder. Front Neurosci. 2018 May 16;12:304. doi: 10.3389/fnins.2018.00304. PMID: 29867317; PMCID: PMC5964170. Howes OD, Rogdaki M, Findon JL, Wichers RH, Charman T, King BH, Loth E, McAlonan GM, McCracken JT, Parr JR, Povey C, Santosh P, Wallace S, Simonoff E, Murphy DG. Autism spectrum disorder: Consensus guidelines on assessment, treatment and research from the British Association for Psychopharmacology. J Psychopharmacol. 2018 Jan;32(1):3-29. doi: 10.1177/0269881117741766. Epub 2017 Dec 14. PMID: 29237331; PMCID: PMC5805024. POSEY DJ, PUNTNEY JI, SASHER TM, KEM DL, MCDOUGLE CJ. Guanfacine treatment of hyperactivity and inattention in pervasive developmental disorders: a re- trospective analysis of 80 cases. J Child Adolesc Psychopharmacol. v. 14, n. 2, 2004, 233-41 p. doi: 10.1089/1044546041649084. SCAHILL L, AMAN MG, MCDOUGLE CJ, MCCRACKEN JT, TIERNEY E, DZIURA J, et al. A prospective open trial of guanfacine in children with pervasive develop- mental disorders. J Child Adolesc Psychopharmacol. v. 16, n. 5, 2006, 589-98 p. doi: 10.1089/cap.2006.16.589. SCAHILL L, AMAN MG, MCDOUGLE CJ, MCCRACKEN JT, TIERNEY E, DZIURA J, et al. A prospective open trial of guanfacine in children with pervasive developmental disorders. J Child Adolesc Psychopharmacol. v. 16, n.5, 2006, 589-98 p. doi: 10.1089/ cap.2006.16.589. SANCHACK KE, THOMAS CA. Autism Spectrum Disorder: Primary Care Principles. Am Fam Physician. v. 15, n. 12, 2016, 972-979 p. CHING H, PRINGSHEIM T. Aripiprazole for autism spectrum disorders (ASD). Co- chrane Database Syst Rev. n. 5, 2012. JESNER OS, AREF-ADIB M, COREN E. Risperidone for autism spectrum disor- der. Cochrane Database Syst Rev. n. 1, 2007. DAVIS NO, KOLLINS SH. Treatment for co-occurring attention deficit/hyperactivity di- sorder and autism spectrum disorder. Neurotherapeutics. v. 9, n. 3, 2012, 518–530 p. LOFTHOUSE N, HENDREN R, HURT E, ARNOLD LE, BUTTER E. A review of com- plementary and alternative treatments for autism spectrum disorders. Autism Res Treat. 2012. GARSTANG J, WALLIS M. Randomized controlled trial of melatonin for children with autistic spectrum disorders and sleep problems. Child Care Health Dev. v. 32, n. 5, 2006, 585–589 p. 56 ROSSIGNOL DA, FRYE RE. Melatonin in autism spectrum disorders: a systematic review and meta-analysis. Dev Med Child Neurol. v. 53, n. 9, 2011, 783–792 p. DANIEL A. Rossignol e Richard E. Frye, “Melatonin in Autism Spectrum Disorders”, Current Clinical Pharmacology. v. 9, 2014, 326 p. doi: https://doi.org/10.2174/157488 47113086660072 https://doi.org/10.2174/15748847113086660072 https://doi.org/10.2174/15748847113086660072 57 10.48209/978-65-00-17616-4 O SOFRIMENTO PSÍQUICO EM ACADÊMICOS DE MEDICINA E O CONSUMO DE PSICOFÁRMACOS: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-CULTURAL Adaline Franco Rodrigues19 Silvia Segovia Araujo Freire20 Sonia da Cunha Urt21 Soraya Cunha Couto Vital22 Marília Camargo Souto23 19 Doutoranda em Educação pela UFMS – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Mes- tre em Ciências Aplicadas à Saúde. Graduada em Fisioterapia. Professora da UniFimes – Centro Universitário de Mineiros, GO. Membro do GEPPE – Grupo de Estudo e Pesquisas em Psicologia e Educação da UFMS. E-mail: adalinefranco@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1605- 5391 20 Doutoranda em Educação e Mestre em Saúde e Desenvolvimento na Região Centro-Oeste – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Graduada em Psicologia (UFMS). Membro do GEPPE – Grupo de Estudo e Pesquisas em Psicologia e Educação da UFMS. E-mail: ssafsm@ gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0196-6945. 21 Doutora em Educação (UNICAMP), Mestre em Educação (PUC-SP), Brasil. Professora Titu- lar Aposentada dos Programas de Pós-Graduação em Educação e em Psicologia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Coordenadora do GEPPE – Grupo de Estudo e Pesqui- sas em Psicologia e Educação da UFMS. E-mail: surt@terra.com.br ORCID: https://orcid.org/0000- 0002-0309-3498 22 Doutoranda em Educação e Mestre em Psicologia – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Membro do GEPPE – Grupo de Estudo e Pesquisas em Psicologia e Educação da UFMS. Bolsista CAPES. E-mail: sorayavital@hotmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001- 5716-5605 23 Especialista em Psiquiatria pelo CENBRAP – Centro Brasileiro de Pós-Graduação Ltda. E-mail: mcs1901@gmail.com 58 INTRODUÇÃO O perfil da profissão médica como um caminho bem-sucedido e de sucesso, associado ao estigma de dedicação exclusiva e de renúncias, gera muitas vezes pressões e expectativas conflitantes e distantes da realidade, vindo a causar frustra- ções. Em sentido formativo, faz-se importante salientar que a formação médica trans- cende o fato de simplesmente ter conhecimento da proposta curricular da faculdade, do curso de graduação e os conteúdos dos vários programas disciplinares que o cur- rículo possa oferecer. Mais do que conhecimentos propriamente técnicos, cognitivos e de habilidades, identifica-se que os alunos apreendem uma postura que caracte- riza o futuro profissional, visto que a própria socialização e os exemplos seguidos durante a formação podem acarretar vícios de atitudes que os afasta da humanidade da profissão e os imerge na sociedade baseada no capital e nas relações de bens e consumo (CONCEIÇÃO et al, 2019; LAMPERT, 2002). Vê-se, por isso,que o avanço do consumo indiscriminado de drogas psicoati- vas, por exemplo, é uma dificuldade que gera consequências assoladoras à socieda- de, com predomínio de impactos biopsicossociais, que os qualifica como importante problema de saúde pública, principalmente entre os jovens. Quando se trata de es- tudantes universitários de Medicina, essa situação requer ainda mais atenção – quer pela falta de maturidade ou negligência ao conhecimento acerca dos riscos da utili- zação descontrolada de psicofármacos, quer pela facilidade de acesso a estes em ambientes hospitalares e de internato. Não obstante, os referidos estudantes têm apresentado taxas elevadas de so- frimento psíquico, esgotamento e, concomitante e consequentemente, de uso indis- criminado de psicofármacos, tanto pelo perfil do alunado e do curso quanto pela facilidade de acesso a essas medicações. Esse fenômeno da medicalização e da psi- copatologização vem sendo corriqueiro na atualidade, pelo fato de tratar como doen- ças ou “problemas médicos” processos ou questões que não são majoritariamente de cunho médico, mas sim de origem política, social ou próprias do desenvolvimen- to humano (AZEVEDO, ARAÚJO e FERREIRA, 2016; CHAGAS, 2018; GRANER, 2019). 59 À vista disso, o uso de psicofármacos tem sido alvo de diversos estudos, especialmente nesse público, e considera-se que seu consumo, de maneira geral, e o abuso, em particular, pode alterar a capacidade de aprendizagem e de desenvolvimento de aptidões, o que assume uma singular importância na população estudantil. Dos inúmeros estudos publicados na literatura especializada, grande parte centra-se na área dos psicotranquilizantes/ansiolíticos, como as benzodiazepinas e os psicoestimuladores, como metilfenidato, segundo afirmam Vasconcelos et al (2015) e Araújo et al (2009). Sendo assim, por considerar o crescente interesse nas produções acadêmi- cas em verificar a utilização dos mais diversos tipos de psicotrópicos por alunos de Medicina de todo o Brasil e seus fatores associados, o presente artigo justifica-se pela importância de mapear e discutir algumas produções, a fim de clarividenciar a situação atual desse cenário brasileiro mediante pesquisas acerca dessa temática. O objetivo é analisar as produções científicas sobre o uso de psicofármacos entre universitários brasileiros do curso de Medicina e refletir sobre os processos de medicalização e psicopatologização nesse grupo de acadêmicos. Para tal, foi realiza- do um levantamento de produções acadêmicas que, após selecionadas e descritas de forma sucinta, foram analisadas à luz da fundamentação teórica crítica e dialética da Psicologia Histórico-Cultural, constituída por Vigotski. Outros autores também respaldam o processo de análise das produções sele- cionadas, considerando a psicopatologização e a medicalização no âmbito escolar, a biologização e o reducionismo da compreensão do adoecimento psíquico como mecanismos de ocultar as ideologias e representações que sustentam o paradigma mercadológico e o status profissional médico. A BUSCA EM PRODUÇÕES CIENTÍFICAS E PRINCIPAIS ACHADOS Nesse primeiro momento, apresenta-se o levantamento de dados tão neces- sário à consolidação da reflexão sobre o sofrimento psíquico e a medicalização aca- dêmica. A metodologia exploratória foi utilizada por meio de pesquisa denominada estado do conhecimento, com o objetivo de mapear e discutir as produções acadê- micas, na tentativa de identificar que aspectos e dimensões vêm sendo destacadas e privilegiadas em diferentes épocas e lugares, e de que forma e em que condições 60 têm sido produzidas (FERREIRA, 2002). O levantamento das produções foi realizado nos bancos de dados SciELO, Google Scholar, Periódicos CAPES e Biblioteca Virtual de Saúde – BVS, no período que compreendeu janeiro e junho de 2020. A pesquisa utilizou as terminologias ca- dastradas nos descritores em Ciências da Saúde da Biblioteca Virtual em Saúde, a saber: psicotrópicos e acadêmicos de Medicina. Outros descritores foram associados a estes, na forma de filtros, para refinar a busca: psicofármacos, psicotrópicos líci- tos, drogas lícitas, estudantes de Medicina, universitários, acadêmicos de Medicina. Quando necessário também foram utilizadas as ferramentas AND/OR (e/ou) disponí- veis nas bases de dados. Para a inclusão foram utilizados os seguintes critérios: (a) pesquisas que se referissem a estudantes de graduação do curso de Medicina; (b) investigações que pesquisassem o uso de drogas lícitas de qualquer modalidade utilizadas por acadê- micos de Medicina; (c) artigos ou produções científicas publicadas em língua portu- guesa; (d) produções científicas realizadas em universidades brasileiras nos últimos 20 anos. A pesquisa ocorreu em três etapas: (1) leitura dos títulos dos artigos e seleção dos resumos; (2) leitura dos resumos e seleção daqueles cujos artigos completos se- riam buscados; (3) leitura integral dos artigos que atendiam ao critério de inclusão na pesquisa. As produções foram lidas com observação dos seguintes aspectos: tipo de estudo e de produção, ano da pesquisa, local em que foi desenvolvido, curso, públi- cos estudados e principais contribuições para a comunidade acadêmica e científica. Para análise dos dados foram utilizadas 22 (vinte e duas) produções do tipo pesquisa de campo investigativa e exploratória, em cortes longitudinais ou trans- versais, realizada em qualquer universidade brasileira e contendo estudantes de Medicina. Quanto à cronologia das publicações, optou-se por não delimitar espaço temporal, de forma que o levantamento contemplou qualquer publicação dentro dos critérios de inclusão. Apesar das produções de revisão bibliográfica não terem sido contempladas no levantamento de produção, algumas foram utilizadas como interfa- ce para a discussão dos dados. Pretende-se nesse tópico contemplar tão somente o levantamento das produ- ções em caráter descritivo, a fim de proporcionar ao leitor uma visão clara do cenário 61 atual sobre o uso de psicofármacos entre estudantes de Medicina. Faz-se importante destacar que todos os artigos encontrados, seguindo os critérios de seleção citados, configuram-se como pesquisas descritivas exploratórias de epistemologia quantitati- va, e suas discussões estão calcadas na denúncia do uso abusivo de psicofármacos, reflexão sobre os motivos pontuais de sua utilização e a importância de medidas que controlam esse uso. Tal constatação sugere que as pesquisas não esclarecem os contextos histó- ricos e culturais de onde emergem o fenômeno estudado, mas permitem denunciá- -lo e fomentam bases para superá-lo a partir de sua análise crítica, que será feita a posteriori, a partir do olhar da Psicologia Histórico-Cultural vigotskiana e respaldada por Zeigarnik e Leontiev, entre outros. Também não há intuito de esgotar os vieses de reflexão, mas sim apresentar as primeiras linhas de análise que compreendem tal fenômeno, intimamente relacionado ao contexto histórico e cultural do curso e da profissão de Medicina e do sentido e significado pessoal que esses acadêmicos agregam ao “ser médico”. Em relação aos psicotrópicos identificados na pesquisa, 10 obras analisaram o consumo de substâncias farmacológicas e não farmacológicas lícitas e ilícitas (ARAÚ- JO et al, 2009; KERR-CORRÊA et al, 1999; LUCAS et al, 2006; LEMOS et al, 2007; PEREIRA et al, 2008; MORAES et al, 2013; REGIS, 2015; RODRIGUES, FACCHI- NI e LIMA 2006; DAMBROWSKI, SAKAE e REMOR, 2017; MORAES et al, 2018); 06 estudos pesquisaram o consumo de psicofármacos em geral (LUNA et al, 2018; CORDEIRO e PINTO, 2018; MORAES et al, 2018; RAMBO, LIMA e ZORZI, 2019; NASCIMENTO et al, 2019; MARQUARDT e ANACLETO, 2019); 03 observaram o uso de antidepressivos (VASCONCELOS et al, 2015; RIBEIRO et al, 2014; CYBUL- SKI e MANSANI, 2017); e 03 verificaram o uso de psicoestimulantes (SILVEIRA et al, 2015;NUNES, 2017; MORGAN et al, 2017). De forma geral, as pesquisas evidenciaram um alto consumo de antidepressi- vos, ansiolíticos e psicoestimulantes entre os alunos de Medicina, independentemente e em comparação com outros cursos. Dentre as drogas consideradas psicofármacos foi avaliado o uso de benzodiazepínicos (BZD), cujas propriedades farmacológicas incluem ações ansiolíticas, sedativo-hipnóticas e/ou anticonvulsivantes, e observado que a utilização de tranquilizantes estava relacionada aos anos de curso médico, 62 notando-se um consumo maior no sexto ano. Ao contrário de outras drogas, o uso de tranquilizantes se deu, na maioria das vezes, após o início da faculdade. Os pes- quisadores também encontraram maior prevalência do uso e utilização precoce em estudantes do sexo feminino (KERR-CORRÊA et al, 1999). Já Lucas et al (2006) estudaram os universitários da área de saúde e suas características sociodemográficas: sexo, idade, faixa etária, nível socioeconômico, uso de drogas psicotrópicas lícitas e ilícitas; características do consumo e principais causas relacionadas a ele. Nesse estudo, realizado com 521 alunos, sendo 264 do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas, verificou-se a utilização de diversas drogas psicotrópicas lícitas e ilícitas. Dentre as classes farmacológicas, os pesquisadores incluíram anabolizantes, anfetamínicos, ansiolíticos, barbitúricos, opioides e anorexígenos. Constatou-se que os anfetamínicos e os ansiolíticos apre- sentavam o maior índice, juntamente com tabaco, cocaína, maconha e álcool. Houve significativo aumento do relato do uso contínuo de anfetamínicos e ansiolíticos nas faixas etárias acima de 22 anos. Pereira et al (2008) corroboram esses achados ao traçarem o perfil do uso de substâncias psicoativas entre os universitários do curso de Medicina do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo. Dentre os psicofárma- cos, verificou-se o uso de ansiolíticos, anfetamínicos e barbitúricos, sendo estes mais consumidos pelo sexo feminino, enquanto o uso de drogas, como álcool e tabaco, estava mais relacionado ao sexo masculino. Em 2007, Lemos e colaboradores analisaram o padrão baiano do consumo de substâncias psicoativas entre graduandos de Medicina e realizaram propostas para contribuir com a formulação de atividades preventivas. A pesquisa contou com 404 integrantes dos seis anos do curso de duas faculdades. Os psicofármacos pesqui- sados como drogas psicoativas foram da classe dos ansiolíticos (conhecidos como tranquilizantes), e verificou-se que o uso destes havia aumentado significativamente nos últimos anos (LEMOS et al, 2007). Divergindo desses achados, Araujo et al (2009) analisaram e compararam a prevalência do uso de álcool e psicotrópicos entre alunos do primeiro e do último ano do curso de Medicina da Universidade Estácio de Sá (UNESA). Em relação aos psicotrópicos, observaram que os alunos do primeiro ano faziam mais uso, enquanto 63 no sexto ano a porcentagem foi bem menor. Contudo, em ambos os grupos houve predominância dos benzodiazepínicos (BZD), seguidos pelos antidepressivos e os neurolépticos. Os pesquisadores chamaram atenção à maior tendência ao uso de BZD no primeiro ano de graduação, seguido, em ordem decrescente, por antidepres- sivos e neurolépticos, e sugeriram que essa diferença entre os anos do curso pode ocorrer devido às pressões e expectativas geradas com o início do curso e com a aprendizagem. Moraes et al (2013), objetivando detectar a prevalência do uso de drogas psico- trópicas pelos estudantes de Medicina do 1º ao 8º período da Universidade Federal do Tocantins (UFT), verificaram que entre as categorias farmacológicas foram signi- ficantes os usos de orexígenos e tranquilizantes. Com relação ao uso de tranquili- zantes e antidistônicos, os autores destacaram que a maior frequência de uso estava nos alunos que não trabalhavam. Em pesquisa realizada por Dambrowski; Sakae e Remor (2017), cujo objetivo foi descrever a prevalência do uso de substâncias psicoativas entre estudantes de cursos da área de saúde, verificou-se que, dentre as drogas, os hipnóticos e seda- tivos, juntamente com o tabaco e a maconha, apresentaram maior consumo diário. Nessa pesquisa, com participação de 120 sujeitos, sendo 29 do curso de Medicina, não houve alta prevalência do uso de anfetaminas. Já o estudo de Luna et al (2018), realizado em uma universidade do interior paulista cujo objetivo foi avaliar a diferença do uso de drogas psicoativas entre os alunos do primeiro e do sexto ano do curso de Medicina, demonstrou que os acadê- micos dos últimos anos utilizavam mais psicofármacos do que os ingressantes, evi- denciando a influência do curso sobre a medicalização. Dos entrevistados do primei- ro ano, 23% afirmaram fazer uso de algum tipo de psicofármaco – majoritariamente do sexo feminino. Já entre os entrevistados do sexto ano, 50% afirmaram fazer uso de psicofármacos no período em que os dados foram coletados – 62% eram do sexo masculino. A maioria, tanto do primeiro quanto do sexto ano, obteve receita do fárma- co por meio de consulta médica. Em relação ao período de uso desses medicamentos pelos estudantes do pri- meiro ano, a média de tempo encontrada foi de 20 meses, enquanto para os estudan- tes do sexto ano foram 29 meses. A maioria (65%) dos participantes do primeiro ano 64 alegou obter a receita do fármaco em uso por meio de consulta médica, 22% com amigos ou familiares e 13% de forma ilegal. Dos alunos do sexto ano, 64% afirmaram obter a receita por meio de consulta médica e 36% com amigos ou familiares. Além disso, os dados coletados evidenciaram que os psicoestimulantes foram os medica- mentos mais utilizados pelos estudantes de Medicina, tanto do primeiro quanto sexto ano – 65% e 34%, respectivamente. Enquanto os antidepressivos representaram a segunda classe mais relatada, 30% pelos voluntários do primeiro ano e 32% para os do sexto ano, os ansiolíticos estiveram mais presentes no sexto ano (34%) (LUNA et al, 2018). Esses achados convergem com um trabalho preliminar realizado no Paraná em 2018, que objetivou caracterizar o uso de medicamentos psicotrópicos e/ou substân- cias psicoativas em alunos de cursos da saúde – 197 do curso de Medicina. Quanto ao uso de substâncias psicoativas, 57% utilizaram algum antidepressivo durante a vida, destes 23,7% já usaram algum anorexígeno ou psicoestimulante e 36,9% utili- zaram ansiolítico ou antidepressivo. Desses últimos 57% utilizaram os medicamen- tos pelo período de um ano (até os dias de realização da pesquisa). Quanto à classe de sedativos ou barbitúricos, a prevalência foi de 6,1% (CORDEIRO; PINTO, 2018). Moraes et al (2018) determinaram a incidência da automedicação em 148 es- tudantes do curso de Medicina no noroeste do Espírito Santo, e evidenciaram que as frequências de automedicação entre alunos do primeiro e segundo anos e do terceiro e quarto anos foram maiores. Dos alunos que se automedicavam 36,3% indicariam o medicamento em uso para outrem. A classe de fármacos psicotrópicos, incluídos antipsicóticos, psicoestimulantes e ansiolíticos, somaram 6,85% das recomendações – a maioria por uso de psicoestimulantes (3,69%). Em estudo realizado por Rambo; Lima e Zorzi (2019), que objetivou identificar o uso de psicofármacos por 300 acadêmicos de Medicina e sua relação com o curso em uma universidade do sul do Brasil, 35,33% afirmaram que fazem ou já fizeram uso de psicofármacos, e 87,73% desses correlacionaram a necessidade do uso de psicofármaco com o curso de Medicina. Foi observada maior prevalência do uso em pessoas do sexo feminino, totalizando 70,75%. Com relação às classes de psicofármacos mais utilizados, evidenciaram-se os antidepressivos (59,16%), os ansiolíticos (27,50%) e os psicoestimulantes (8,33%). 65 Entre os antidepressivos os mais utilizados foram osInibidores Seletivos da Recap- tação da Serotonina (ISRS), como o Escitalopram (22,53%), a Sertralina (21,12%) e a Fluoxetina (18,30%). Quanto aos ansiolíticos, o Zolpidem (27,27%), que pertence à classe de Ansiolíticos Não Benzodiazepínicos, foi o mais referido, seguido pelos ben- zodiazepínicos – Alprazolam (18,18%) e Clonazepam (18,18%). No que se referiu ao uso de psicoestimulantes, o Metilfenidato (80%) foi o mais mencionado. Sobre as causas do uso, 20,12% referiram o humor depressivo, a tristeza, a perda do interesse ou do prazer e estar desanimado quanto ao futuro como causas principais. Consi- derando os fatores estressores, destacaram-se a exigência de um alto rendimen- to acadêmico, a rotina do curso e o ambiente médico demasiadamente competitivo (RAMBO; LIMA e ZORZI, 2019). A partir das produções pesquisadas pode-se perceber que, dentre os principais fatores relatados para o uso dos medicamentos estudados, o próprio curso é o fator desencadeador. Foi considerada também a falta de maturidade dos acadêmicos em relação aos riscos envolvidos no uso de substâncias psicoativas e as consequências pessoais, sociais e econômicas advindas do uso abusivo de tais substâncias. As pesquisas ainda destacaram a necessidade de programas de prevenção em relação à automedicação, ao uso indiscriminado de fármacos, aos efeitos colaterais dos psicofármacos e à assistência ao paciente fármaco-dependente. Com base nes- ses estudos serão tecidas a seguir algumas considerações a respeito do consumo de ansiolíticos, antidepressivos e estimulantes, e a visão psicopatológica e medica- mentosa que o circunda. MEDICALIZAÇÃO E PSICOPATOLOGIZAÇÃO – EVIDÊNCIAS SOBRE CONSUMO DE ANSIOLÍTICOS, ANTIDEPRESSIVOS E ESTIMULANTES O termo medicalização é utilizado para descrever o processo atual de tratar como doenças ou “problemas médicos” as questões que não são majoritariamente de cunho médico, mas sim de origem política, social ou própria do desenvolvimento humano (CONRAD, 2007; CHAGAS, 2018). Nesse cenário, retomando as palavras de Foucault (1977, 2003), medicalização se dá na implantação, pelo Estado, de prá- ticas e medidas de contenção, controle e registro de doenças, além da criação de condutas de higiene e saúde. A Medicina passa então a adquirir autoridade para 66 determinar e normatizar o que é doença, numa clara noção de adaptabilidade às nor- mas sociais e imposição destas sob o argumento da saúde. Dessa forma, o biopoder, instaurado a fim de estabelecer padrões e normas de adequação humana, representa uma estratégia biopolítica que se dá sobre o corpo, entendido como realidade biopolítica. Assim, o controle da sociedade sobre os indi- víduos não se opera simplesmente pela consciência ou pela ideologia, mas também se exerce no corpo, com o corpo. A medicalização se adensa, se amplia, e quanto mais incorpora a existência, a conduta, o comportamento e o corpo humano, menos se escapa à medicina (CHAGAS, 2018). Em outra análise, sobre patologização e medicalização da educação superior, que identifica a expressão patologização do processo ensino-aprendizagem, Chagas (2018) constata que a emergência de ambas se constituiu historicamente e se desen- volveu na operacionalização dos processos acadêmicos, e que, de maneira geral, teve apenas função de controle e vigilância, sem qualquer prática educativa. Além disso, objetivou manter a lógica de responsabilização individual do estudante pelo fracasso acadêmico e a medicalização no acolhimento ao discente com deficiência, dando a falsa ideia de inclusão. Nesse âmbito, ainda segundo Chagas (2018), ao tratar de patologização en- quanto processo surgido no ambiente educativo, toda a comunidade da saúde está envolvida, inclusive psicólogos, e há um reducionismo na compreensão dos fenôme- nos humanos. Essa proposta biologizante dos processos, por apresentar como pro- blemas individuais questões que são de determinação coletiva, omite que o processo saúde-doença é determinado pela inserção social do indivíduo, sendo, ao mesmo tempo, a expressão do individual e do coletivo. Isso reverbera no ambiente escolar, no qual se desenvolve o processo ensino-aprendizagem. Desloca-se “o eixo de uma discussão político-pedagógica para causas e so- luções pretensamente médicas, portanto inacessíveis à Educação” (COLLARES; MOYSÉS, 1997, p. 16) e desresponsabiliza, portanto, todo o sistema educativo de maneira eficaz e bem elaborada, e o ambiente educacional se coloca no papel de “vítima de uma clientela inadequada” (COLLARES; MOYSÉS, 2010, p. 197). Patto (1990) apresenta importante contribuições para pensar a medicalização na educação superior, ao discutir o abuso de drogas para aumento da produtividade 67 acadêmica mediante as exigências de uma sociedade capitalista: Atentamos para os anúncios que estas denúncias contêm: a necessidade de mudanças substantivas da Educação, que só se realizarão com uma ampla discussão sobre os impeditivos históricos de uma educação verdadeiramente comprometida com os princípios democráticos; com o estabelecimento de relações entre pais, alunos e profissionais apoiadas em participação iguali- tária, não verticalizada, na gestão educacional; com remuneração digna aos educadores, desincumbindo-os das jornadas descomunais de trabalho; com formação de qualidade que permita a estes profissionais um giro para fora do olhar tecnicista, coisificante, por meio de uma análise crítica das bases em que se assentam suas crenças, suas opções teórico-metodológicas. (PATTO, 1990, p. 11). Percebe-se, nesse cenário, a psicopatologização, na qual há uma biologização e/ou uma naturalização de processos relativos ao adoecimento psíquico. Tal expan- são da rotulação psiquiátrica tem sido capturada por discursos e práticas do saber médico-psiquiátrico e transformada em psicopatologias que passam a ser tratadas com o principal recurso disponibilizado pela Psiquiatria na contemporaneidade: os psicofármacos. Ou seja, uma circunstância de caráter coletivo e relacionado aos mais variados aspectos históricos e culturais, em que são perceptíveis sinais elementares de sofrimento psíquico, passam ser rotulados como uma patologia, cujo tratamento costuma ser a administração de psicofármacos (AMARANTE, 2007). Nessa prática, pode-se perceber uma tendência geral da Medicina como recur- so ideológico, em transformar em questão médica aquilo que é da ordem do social, do econômico, do político, do cultural (DUARTE, 2001; AMARANTE, 2007). Sobre tal visão, de homem reduzido à sua estrutura biológica, faz-se pertinente analisar a emergência do uso de recursos farmacológicos por acadêmicos de Medicina, tanto no controle de situações cujo sofrimento psíquico esteja atrelado à falta de motivação e problemas de consciência, a serem tratados pela utilização de antidepressivos, quanto na utilização de medicamentos, como a conhecia Ritalina, por exemplo, que estimulam a concentração a fim de aumentar a produção – característica enraizada pela sociedade hegemonicamente capitalista. Conceitualmente, a depressão é um transtorno de humor crônico e recorrente, complexo, que pode levar a complicações que atingem inúmeras esferas da vida de um indivíduo, com forte impacto em sua qualidade de vida e de seus familiares. Em contexto brasileiro, muitos estudos têm relatado os sintomas depressivos em estu- 68 dantes universitários e estima-se que durante sua formação acadêmica 15% a 25% apresentem algum transtorno psíquico. Nesse cenário, destacam-se os estudantes do curso de Medicina, e essa maior predisposição parece estar relacionada a diferen- tes fatores ao longo do curso (VASCONCELOS et al, 2015; REGIS, 2015; CYBULSKI e MANSANI, 2017; BAUCHROWITZ et al, 2019; CHEN e DILSAVER, 1996). A ocorrência de depressão tem se justificado por inúmeras razões: estigma as- sociado à utilização de serviços de saúde mental, custos e medo das consequênciasem nível curricular, elevada carga horária, grande volume de matérias, maior contato com pacientes portadores de diversas doenças e prognósticos, insegurança em re- lação ao ingresso no mercado de trabalho, cobrança da sociedade e da instituição de ensino, além da autocobrança típica desse curso (VASCONCELOS et al, 2015; RIBEIRO et al, 2014). As consequências desse processo patológico no meio acadêmico estão calca- das basicamente na redução do rendimento da aprendizagem nas tarefas cotidianas e na ocorrência de baixa autoestima e insegurança. Além disso, é demonstrada uma baixa resposta ao processo ensino-aprendizagem e frustrações quanto às expec- tativas do seu desempenho e da vida acadêmica, sugerindo que pode interferir no comportamento assertivo, tão importante durante a formação e o desempenho pro- fissional, no aprendizado da relação médico-paciente. A culminância patológica pode redundar em abandono do curso e até em suicídio. Isso sugere que a ocorrência de distúrbios de humor e ansiedade ainda na graduação, quando não detectados e ade- quadamente tratados, pode se perpetuar ou agravar durante a residência médica e na atividade profissional (VASCONCELOS et al 2015; ARAÚJO et al, 2009; Nunes, 2017; CYBULSKI e MANSANI, 2017). A literatura revela que o uso de psicofármacos tem aumentado nas últimas dé- cadas, principalmente dos antidepressivos. O aumento do consumo de antidepres- sivos nessa década pode estar relacionado ao surgimento de novas medicações, à ampliação das indicações terapêuticas e ao aumento de diagnósticos das doenças depressivas na população em geral, em especial nas mais jovens (RIBEIRO et al, 2014; RODRIGUES, FACCHINI e LIMA, 2006). Nas produções analisadas observou-se que as prevalências de consumo de psicofármacos por estudantes de Medicina variam entre 11% e 40%. A maioria das 69 pesquisas evidenciou que o uso de drogas psicoativas estava associado à presença de sintomas de ansiedade. Quanto às classes de medicamentos, os mais utilizados são os ansiolíticos (13,1%), sendo Clonazepam e Zolpidem as primeiras escolhas e, sequencialmente, anfetaminas de maneira geral (10,1%) (VASCONCELOS et al, 2015; REGIS, 2015; BAUCHROWITZ et al, 2019; MARQUARDT et al, 2019). Sobre o uso de antidepressivos, os mais utilizados foram os Inibidores Seletivos da Recap- tação de Serotonina (ISRS), sendo o Escitalopram e a Fluoxetina os medicamentos mais prevalentes (FLECK et al, 2009; O’DONNELL e SHELTON, 2012, CYBULSKI e MANSANI, 2017; RIBEIRO et al, 2014; BAUCHROWITZ et al, 2019). Em relação ao consumo de Ritalina no meio acadêmico, este não é uma novi- dade. Estudos apontam uma grande prevalência de automedicação ou mesmo pres- crições de médicas para o consumo de estimulantes. Esse consumo é praticado pelos acadêmicos como justificativa para o tratamento de distúrbios de atenção e memória, ou mesmo para aumentar tais capacidades devido ao extenso trabalho in- telectual que demandam. A necessidade de concentração e disposição do indivíduo também leva ao uso de substâncias psicoativas, para que consiga estudar por mais horas e otimizar a eficácia acadêmica (SILVEIRA et al, 2015). Para atender tal demanda, a Ritalina, cujo princípio ativo é o cloridrato de me- tilfenidato, é a droga mais usada por estudantes de Medicina. A substância estimula o sistema nervoso central e age bloqueando a recaptação de dopamina, liberando, dessa forma, dopamina e norepinefrina para a fenda sináptica. Esses fármacos tam- bém são estimulantes do sistema nervoso central, com estruturas semelhantes à an- fetamina, produzem ativação do córtex e aumento do nível de alerta. Seus principais efeitos colaterais são nervosismo, insônia, agitação e ansiedade, entre muitos outros (NUNES, 2017; O’DONNELL e SHELTON, 2012). Muitos estudos, como os de Nunes (2016), Moraes et al (2013), Silveira et al (2015) e Morgan et al (2017), têm verificado o consumo da Ritalina por estudantes de Medicina e suas implicações, tanto no âmbito da automedicação quanto na me- dicação prescrita descontroladamente. A maioria desses estudos evidencia a alta prevalência de uso de substâncias estimulantes por parte desses alunos, indicando que grande parte começa a usá-las durante a faculdade. De acordo com Moraes et al (2013), os principais motivos alegados para tal 70 consumo foram a compensação da privação de sono (47,4%) e a melhoria de racio- cínio, atenção e/ou memória. Em relação aos efeitos percebidos com o uso, foram relatados redução do sono, melhora na concentração, redução da fadiga, melhora no raciocínio e melhora do bem-estar. O SOFRIMENTO PSÍQUICO A SERVIÇO DE “SER MÉDICO” A compreensão que estas linhas assumem é de que a humanização só pode se concretizar quando em contato com o mundo objetivo e humanizado, transformado pela atividade real de outras gerações e por meio da relação com outros indivíduos. Assim o ser humano aprende a ser humano (LEONTIEV 1978). A partir de uma concepção ontológica do ser social, fundamentada em seus aspectos históricos e culturais, considera-se que o estudo de sistemas complexos, como saúde e doença, se tornaria demasiadamente raso se fosse analisado somente a partir de uma visão biológica e pontual. Desta feita, o adoecimento psíquico e o pro- cesso de medicalização enquanto expressão desse sistema, só são compreensíveis em sua profundidade se seus significados e sentidos são analisados como produzi- dos no contexto histórico cultural em que se desenvolvem. Estudiosos, como Traverso-Yépez (2001) e Minayo (1997), refletem que o pro- cesso saúde-doença é baseado em uma ordem de significações culturais socialmen- te construídas, que entusiasmam o uso que cada um faz do seu corpo, o modo como entende-o e as formas pelas quais o ser humano vivencia os seus estados de saúde e doença, a expressão dos sintomas, os hábitos e estilos de vida e as próprias práti- cas de atendimento à saúde. Assim, além de ser um fato biológico, é uma realidade construída tanto historicamente como no âmbito da expressão simbólica coletiva e individual. Uma vez que a Medicina define o que é normal ou patológico, e a patologia é entendida como o conjunto de sintomas padronizados, especificamente sobre as psi- copatologizações, as diversas expressões humanas, como tristeza, angústia e insô- nia, passam a ser compreendidas a partir de uma abordagem organicista e, portanto, tratadas com substâncias farmacológicas (RODRIGUES, 2003; AGUIAR 2004). Diante do cenário da alta prevalência de sofrimento psíquico e dos processos de psicopatologização e medicalização entre alunos de Medicina denunciados a par- 71 tir de diversos estudos, faz-se pertinente traçar reflexões a partir da fundamentação teórica da Psicologia Histórico-Cultural, fundamentada por Vigotski, que propôs o es- tudo do social em sua juntura aos processos psíquicos, permitindo compreensão da noção de unidade psicológica no curso dos fenômenos humanos (VIGOTSKI, 1994, 2009). O empenho de seus estudos para a elaboração teórico-metodológica da Psi- cologia Histórico-Cultural abriu novos caminhos à trajetória do pensamento científico da época, permeado pelas representações positivistas, biologicistas e reducionistas dominantes. Suas obras, e de demais estudiosos que se empenharam na compreensão do psiquismo humano na concepção histórico-cultural, calcadas no materialismo histó- rico-dialético marxista, possibilitam ao presente estudo avançar em relação às frag- mentações na produção do conhecimento, sobretudo no que se refere à dicotomia indivíduo e sociedade, que, tradicionalmente, marca diferentes perspectivas teóricas no âmbito da saúde (VIGOTSKI, 1991/1995; LEONTIEV, 1978; LURIA, 1991; ZEI- GARNIK, 1976/1981; GONZÁLEZ REY, 2004/ 2013). Partindo-se da referida fundamentação, o desenvolvimento cultural não con- jectura identidade entre a instância biológica e cultural, e sim um processo no qualo cultural supera o biológico por incorporação, porque tem-se que a cultura é o funda- mento ontológico do ser social. Dessa maneira, deve ser mantida a importância das apropriações sociais nesse desenvolvimento, voltando-se à relação dialética entre or- ganismo e meio social no estudo e na intervenção das alterações patológicas ao lon- go do desenvolvimento ontogenético do sujeito adoecido (ZEIGARNIK, 1976/1981). Há ainda que se refletir sobre as concepções de adoecimento psíquico fren- te aos paradigmas vigentes enraizados pela hegemonia capitalista, pois, conforme Leontiev (1978), os processos psíquicos devem ser considerados como distintas for- mas de atividade psíquica, formadas no desenvolvimento ontogenético. A atividade do sujeito é mediatizada e regulada pelo reflexo psíquico da realidade, que conduz as necessidades, os motivos, as finalidades e as condições de sua atividade, como também regula as ações e os modos de operação. Sobre tal premissa, considera-se então que quando um estudante de Medicina apresenta traços aumentados de ansiedade, estresse, avançando para depressão e até redução de seu desempenho acadêmico, há de se questionar realidades que 72 ultrapassam o currículo escolar. Como afirmam Ramos-Cerqueira e Lima (2002), a sociedade estabelece inúmeras atribuições ao médico, frequentemente deificando-o. “Manterei a minha vida e a minha arte com pureza e santidade; qualquer que seja a casa em que penetre, entrarei nela para beneficiar o doente; evitarei qualquer ato voluntário de maldade ou corrupção [...]”. Esse é um pequeno trecho do clássi- co juramento hipocrático, ainda repetido nas formaturas de graduação em Medicina, que exemplifica a idealização do Médico, contudo o embate que se dá entre tal idea- lização e a realidade da formação profissional sofrem contradições que alteram os sentidos e significados da escolha profissional e geram frequentemente problemas de consciência. Esses são vivenciados com diferentes graus de sofrimento emocio- nal. Já na escolha profissional há questões que podem desencadear o sofrimento psíquico dos jovens acadêmicos de Medicina, tanto em caráter comum a todos os outros cursos quanto nos específicos do curso médico. Não é segredo que a com- petição por uma vaga nas universidades, em especial as públicas, é uma batalha a ser enfrentada também em outras carreiras. Entretanto, desde cedo o estudante entra em contato com o ‘endeusamento’ que marca sua escolha, e há uma série de estigmas sociais que assolam a academia de Medicina e o futuro profissional, como o prestígio social, o prestígio do saber além dos demais profissionais, inclusive colegas da saúde, a necessidade de ser útil, a atração pelo dinheiro, pela responsabilidade ou pela reparação, o desejo de uma profissão liberal e a necessidade de segurança financeira (RAMOS-CERQUEIRA e LIMA, 2002). Todos os problemas de consciência e contradições entre os significados e sen- tidos da escolha profissional também são pronunciados na tentativa de esses alunos adotarem a postura de “médico” a partir da convivência com seus pares e com seus professores médicos. Muitas vezes, esses professores não atendem às demandas pedagógicas de maneira satisfatória e levam os alunos a entrarem em conflitos e inseguranças em relação à sua vocação e/ou à habilidade de ser médico. Aliado a isso, sentem-se na necessidade de espelharem-se em seus mentores, adotando as mesmas posturas. Essas posturas são adotadas, na maioria das vezes, mediante si- tuações vivenciadas na relação professor-aluno, que nem sempre são harmoniosas. Esse fenômeno pode ser analisado à luz das palavras de Leontiev (1978) ao 73 considerar o processo de apropriação da experiência acumulada pelo gênero hu- mano no decurso da história social, como possível apenas na relação com outros homens, o que permite a aquisição das qualidades, capacidades e características humanas e a criação contínua de novas aptidões e funções. De modo diferente dos animais, o homem garante suas aquisições, não se adaptando ao mundo dos objetos humanos, mas sim se apropriando deles. Assim, o social não apenas “interage” com o biológico, mas também é capaz de criar novos sistemas funcionais, que engendram novas formas superiores de ati- vidade consciente. Como indica Vigotski (1995), é preciso compreender o desenvol- vimento humano como um processo vivo, de permanente contradição entre o natural e o histórico, o orgânico e o social. A partir dessa perspectiva é que as expressões contemporâneas da medicalização e psicopatologização no ambiente da academia de Medicina são analisadas aqui. Todos os aspectos específicos do curso estão intrinsecamente relacionados ao aprender o “jeito de médico” fazendo parte de uma espécie de currículo oculto, que nas palavras de Santomé (1998) são conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que se adquirem mediante a participação em processos de ensino-aprendizagem e, em geral, em todas as interações que se sucedem dia a dia nas aulas e centros de ensino, cuja função geralmente é reforçar as necessidades e interesses da ideologia hegemônica, construindo implicitamente traços de personalidade apropriados para trabalhar em uma sociedade industrializada da economia capitalista. Valsechi et al (2019) declara que a principal finalidade da socialização dos es- tudantes de Medicina e dos médicos residentes, ao longo da formação médica, é incorporá-los efetivamente ao mundo do trabalho. Os sujeitos envolvidos com essa formação indicam permanentemente quais discursos, comportamentos, ideias e va- lores são mais adequados ao trabalho médico, muitas vezes em consonância aos interesses dos grupos dominantes. Assim, a escola médica contribui para naturalizar as desigualdades decorrentes das relações capitalistas de produção instrumentaliza- das pelo currículo oculto. Sem adentrar aos “problemas” desse currículo, que favorece a visão capita- lista, é necessário refletir na busca de tentar compreender como essas questões interferem na personalidade do indivíduo e culminam no sofrimento psíquico. Nesse 74 sentido, a personalidade constitui-se pela unificação e vinculação das atividades do sujeito em sua vida, dentro do sistema de relações objetivas da sociedade. Em outras palavras, é no processo de apropriação do mundo dos objetos e fenômenos criados pela humanidade, no processo de socialização, por meio da atividade humana, que aparecerão necessidades, motivos e interesses que constituem a formação da per- sonalidade do indivíduo. No seio das condições histórico-sociais. Nas palavras de Leontiev (1978, p. 137): “a personalidade não nasce, a personalidade se faz”. Sendo assim, o papel exercido pela atividade com sentidos e significados al- terados, mediados pela expectativa versus realidade do estudante, atuará em seu modo de vida e, desse modo, em sua personalidade. Em síntese, o processo de adoe- cimento psíquico faz com que os processos formados por motivos e necessidades sejam destruídos e incide na formação de novos motivos e de novas propriedades e características da personalidade. As contradições vivenciadas pelos estudantes e as tentativas de pertencimento do grupo social ‘privilegiado’ impila ao sofrimento mental, decorrente da alteração da estrutura da atividade humana, e faz com que os motivos percam sua função de criar significados e dar sentido pessoal à atividade humana, como alteram a função de autocontrole do comportamento. Como assunto complexo, há de se discutir também a medicalização em si e a concepção do que é e não é “normal” sentir, e o que é ou não necessário medicar. Além disso, é importante refletir sobre a medicalização e a psicopatologização des- sas crises de consciência. Apesar de a tristeza e os conflitos existenciais serem assuntos na pauta de alguns contextos sociais, ainda são frequentemente tratados como “sentimentos queas pessoas não deveriam vivenciar”. Em decorrência, há uma disseminação socio- cultural da tristeza vista como doença. Esses padrões favorecem a sutil e progressiva exclusão de determinados processos humanos que, não por acaso, passam a ser considerados como “patológicos”. A lógica biomédica implica a escolha pré-determi- nada dos sintomas que são socialmente aceitos e aqueles que devem ser evitados e, nesse sentido, associa-se a uma rígida e estreita perspectiva daquilo que é e deve ser considerado um desenvolvimento normal. Em outros termos, trata-se de postular a existência de uma concepção universal da natureza humana (AMARANTE, 1994; BASAGLIA, 1985; GONZÁLEZ REY, 2014). 75 Nesse sentido, González Rey (2014) observa que a permanência de um es- tado idealizado de felicidade torna-se imperativo, e tudo o que dele se desvia deve ser “ajustado”, de preferência com recursos externos que possam ser comprados. Nessa perspectiva, o modelo biomédico, em conjunto com o Capitalismo, promove implicitamente a busca por um império de sensações que visam a ocultar qualquer contradição possível da vida, minimizando o valor da emergência de certas emoções e, portanto, favorecendo um permanente estado de passividade do homem. Com o modelo biomédico, somente o médico sabe o que é importante para a saúde do indivíduo, e só ele pode fazer qualquer coisa a respeito disso, porque todo o conhecimento acerca da saúde é racional, científico, baseado na observação obje- tiva de dados clínicos. A autoridade do médico e sua responsabilidade pela saúde do paciente fazem-no assumir um papel paternal (GUEDES; NOGUEIRA e CAMARGO, 2006; CAPRA,1982). Tal visão, de autocentrismo médico, dentro do processo de medicalização entre acadêmicos de Medicina, denuncia um problema duplo. Primeiro, o do jovem indiví- duo totalmente dependente de ‘comprimidos da felicidade’, muitas vezes tomados mesmo sem prescrição ou atuação de um profissional, e justificados por conheci- mento e facilidades que o próprio aluno tem no manejo dessas drogas. E segundo, pelo exemplo tomado enquanto aluno-observador, que se espelha no profissional que prescreve a medicação e diagnostica a depressão ou outros processos patológi- cos quase numa posição de Deus, detentor do conhecimento e capaz de realizar tal diagnóstico a partir de alguns sintomas pontuais. O acadêmico então passa por dois processos mentais de construção histórico- -cultural estabelecidos: o da necessidade de camuflar os sentimentos, de desajuste, frustrações, medos e falta ou deturpações de sentido dentro da vivência acadêmica; e o da aquisição, por meio do convívio com seus pares e exemplos de mentores, a concepção reducionista dos sofrimentos psicológicos e a soberania sobre as nuan- ças emocionais de seus pacientes. A despeito do uso de estimulantes, como a Ritalina, a questão em pauta é a competição arraigada no ambiente acadêmico médico e a ideia da necessidade de se adquirir conhecimento para além da sua autocapacidade e da capacidade dos demais. Há ainda uma tendência de utilização como meio de mascarar a falta de 76 motivação no estudo, muitas vezes provenientes da insatisfação em realizar o curso baseado nas pressões familiares e sociais. A Ritalina, que é uma medicação originalmente utilizada para o tratamento de transtorno de atenção, especialmente em crianças, é bastante utilizada por acadêmi- cos, com uma grande prevalência pelos alunos Medicina, apesar de seus efeitos co- laterais. Sem entrar no campo da utilização por quem é diagnosticado com transtorno de déficit de atenção, pois isso proporcionaria outras inúmeras reflexões aqui cabe ressalvar que sua bula esclarece que seu mecanismo de ação no indivíduo não foi completamente esclarecido e o mecanismo pelo qual o multifenidato (princípio ativo) exerce seus efeitos psíquicos e comportamentais não está claramente estabelecido. Segundo os pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural, a atenção depende do desenvolvimento da capacidade humana de selecionar os estímulos e do controle voluntário do comportamento, sem os quais não seria possível aos homens desen- volver uma atividade coordenada com vistas a alcançar fins determinados (LURIA, 1991). Tal função psicológica depende da construção da consciência e do controle sobre seu próprio comportamento, de tal forma que ela possa propor-se, de modo intencional e deliberado, a focalizar sua atenção no processo de apropriação dos conteúdos curriculares. Fica claro então que as crises de significados e sentidos e a falta de motivação no curso acarretam alterações da atenção, sem contar que as pressões pelo alcance de determinados conhecimentos às vezes vão de encontro ao nível ou ao momento de desenvolvimento teórico e intelectual do aluno e são despejados sem seu real conhecimento da situação. CONSIDERAÇÕES FINAIS O ensino médico que não reflete sobre o ser humano que há no médico par- ticipa de modo altamente prejudicial nas deformações adaptativas do futuro profissional. (MARTINS, 1991, p. 363). Com o presente estudo pôde-se perceber o crescente interesse científico em identificar e analisar o consumo de fármacos por acadêmicos de Medicina e suas causas e implicações, correlacionando a seu estado de saúde mental e ao nível de sofrimento psíquico, qualidade de vida, uso de drogas, depressão e ansiedade, uma 77 vez que os resultados das diversas pesquisas trazem, em maioria, que a incidência de sofrimento mental entre os estudantes de Medicina é maior do que na população em geral. Os dados apresentados neste artigo comprovaram que as características e queixas típicas dos alunos do curso de Medicina podem estar contribuindo para o incremento de seu uso de substâncias psicoativas. Tais características incluem carga horária elevada, falta de tempo para estudar e privação da vida social nesse período. Além disso, as ansiedades e receios, as pressões familiares e do próprio curso, especialmente nos primeiros anos, as disputas inter e intrapessoais, as responsabili- dade quanto à cura do paciente, questões éticas, a morte de pacientes que estavam sendo acompanhados pelo aluno e o próprio acesso facilitado a certas drogas restri- tas aos profissionais de saúde, sugerem que o currículo médico pode desempenhar um papel importante no aumento da prevalência de sintomas depressivos nos estu- dantes de Medicina e no acesso indiscriminado ao uso de psicofármacos, destacan- do-se os antidepressivos e ansiolíticos e os psicoestimulantes, com destaque para a Ritalina. O surgimento do sofrimento psíquico e sua redução a fatores biologizantes ou naturalizantes, como costuma ser apresentado, é fruto de um paradigma sobre a profissão peculiar à sociedade de classes, marcada pelo sistema capitalista. O currículo expresso no cotidiano das faculdades de Medicina do país, além de muitas vezes não consistir na transmissão-assimilação de saberes objetivos, intenta formar propositalmente trabalhadores médicos desprovidos de consciência social crítica. E, mais que isso, pode-se dizer que há na educação médica um currículo oculto, no qual se aprende a “ser médico”. Esse texto, porém, fundamenta-se na tentativa de propiciar uma percepção mais clara, de que o sofrimento psíquico frente ao “estudar Medicina” não está restri- to ao âmbito escolar e seus programas curriculares, e sim ao aprender o “ser médi- co”. Tal “jeito de médico” (enquanto uma ação não revelada) está muito relacionado à complexidade dos processos sociais: de trabalho, de produção dos serviços, das condições do mercado de trabalho, da intervenção do estado, e das ideologias e representações que sustentam o paradigma mercadológico e de status profissional. Pretendeu-se, com esses e sua análise, possibilitar a afirmação da relação entre o desencadeamento do sofrimento mental na academia médica, além do estigma do 78 trabalho e do profissional médicosob os lençóis capitalistas, na constatação para- doxal entre a atividade educacional e de trabalho como fator de humanização, em termos ontológicos, e como este assume características desumanizadoras. Na relação direta e indissociável entre as condições objetivas de vida e a for- mação do psiquismo humano reflete-se a relação entre os processos sociais e o desencadeamento do adoecimento psíquico. Por isso, o desenvolvimento psíquico humano não pode ser descolado das relações de classe e de produção capitalistas, no caso do atual contexto histórico. Se as relações sociais, mediadas por instrumen- tos e signos, induzem ao desenvolvimento psicológico, em suas formas saudáveis e patológicas, como Zeigarnik (1976) afirma, estas linhas admitem o entendimento de que quanto mais patogênicas forem as relações mais susceptível estará o sujeito a adoecimentos psíquicos. Por fim, para compreender melhor esse fenômeno e abalizar estratégias de enfrentamento ao sofrimento psíquico, é necessário ir além dos parâmetros quanti- tativos, expandir os estudos longitudinais e qualitativos sobre o tema, percebê-lo em contexto histórico, cultural, político e de interesse da coletividade, abrangendo condi- cionantes importantes, como a educação médica e a cultura profissional dos médicos na sociedade brasileira. REFERÊNCIAS AGUIAR, Adriano Amaral de. A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da existência. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2004. AMARANTE, Paulo. (Org.). Asilos, alienados e alienistas: pequena história da psi- quiatria no Brasil. In: ______. Psiquiatria Social e Reforma Psiquiátrica. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1994. p. 73-84. AMARANTE, Paulo. Saúde Mental e Atenção Psicossocial. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2007. ARAÚJO, Cristiane Pinhão de; GOMES, Louise Pellegrino; CUNHA, Majoy Gonçal- ves Couto, et al. Uso de álcool e psicotrópicos e o sofrimento psíquico em estudantes de medicina da Universidade Estácio de Sá. Adolesc Saude, v. 6, n. 1, p. 28-32. 2009. AZEVEDO, Ângelo José Pimentel de; ARAÚJO, Aurigena Antunes de; FERREIRA Maria Ângela Fernandes. Consumo de ansiolíticos benzodiazepínicos: uma correla- ção entre dados do SNGPC e indicadores sociodemográficos nas capitais brasilei- 79 ras. Ciência & Saúde Coletiva, v. 21, n. 1, p. 83-90. 2016: Disponível em: https:// dx.doi.org/10.1590/1413-81232015211.15532014. BASAGLIA, F. As instituições da violência. In: ______. A instituição negada: relato de um hospital psiquiátrico. 3. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1985. p. 99-133. BAUCHROWITZ, Carolina; PAZ, Lohanne Elis Cordeiro; MÜLLER, Erildo Vicente et.al. Prevalência de uso de psicofármacos por acadêmicos: efeitos do processo de graduação. Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 11, p. 24915-24933. 2019. Dispo- nível em: https://doi.org/10.34117/bjdv5n11-170. BIRMAN, Joel. A psiquiatria como discurso da moralidade. Rio de Janeiro: Graal, 1978. CHAGAS, Julia Chamusca. Atuação da psicologia escolar frente à patologização e medicalização da educação superior. Tese Doutorado em Processos de Desen- volvimento Humano e Saúde, Universidade de Brasília, Brasília, 2018. CHEN Yuan-Who; DILSAVER Steven C. Lifetime rates of suicide attempts among subjects with bipolar and unipolar disorders relative to other Axis I disorders. Biol Psychiatry, v. 39, n. 10, p. 896-899. 1996. COLLARES, Cecília Azevedo Lima; MOYSÉS, Maria Aparecida Affonso. A transfor- mação do espaço pedagógico em espaço clínico: a patologização da educação. Re- vista Ideias, São Paulo, n. 23, p. 25-31. 1994. COLLARES, Cecília Azevedo Lima; MOYSÉS, Maria Aparecida Affonso. Diagnósti- co da medicalização do processo ensino-aprendizagem na 1ª série do 1º grau no município de Campinas. Em Aberto, v. 11, n. 53, p.13-28. 1997. COLLARES, Cecília Azevedo Lima; MOYSÉS, Maria Aparecida Affonso. Precon- ceitos no cotidiano escolar: a medicalização do processo ensino-aprendizagem. In: Conselho Regional de Psicologia de São Paulo & Grupo Interinstitucional Quei- xa Escolar Medicalização de Crianças e Adolescentes: conflitos silenciados pela redução de questões sociais a doença de indivíduos. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010. p. 193-213. CONCEIÇÃO, Ludmila de Souza; BATISTA, Cássia Beatriz; DÂMASO, Juliana Go- mes Bergo et al. Saúde mental dos estudantes de medicina brasileiros: uma revisão sistemática da literatura. Revista da Avaliação da Educação Superior, Campinas, v. 24, n. 3, p. 785-802, dez. 2019. Disponível em: https://dx.doi.org/10.1590/s1414- 40772019000300012. CONRAD, Peter. The medicalization of society: on the transformation of human con- ditions into treatable disorders. Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 2007. CORDEIRO, Silvia Nogueira; PINTO, Lara Balera Ferreira. O uso de medicamentos psicotrópicos entre alunos dos cursos de saúde. Anais do I Congresso do Pro- https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015211.15532014 https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015211.15532014 https://doi.org/10.34117/bjdv5n11-170 https://dx.doi.org/10.1590/s1414-40772019000300012 https://dx.doi.org/10.1590/s1414-40772019000300012 http://anais.uel.br/portal/index.php/ppgpsi/issue/view/15 80 grama de Pós-Graduação em Psicologia da UEL, 2018. CYBULSKI, Cynthia Ajus; MANSANI, Fabiana Postiglione. Análise da Depressão, dos Fatores de Risco para Sintomas Depressivos e do Uso de Antidepressivos entre Aca- dêmicos do Curso de Medicina da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 41, n. 1, p. 92-101. 2017. Disponível em: https:// dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v41n1rb20160034. DAMBROWSKI, Katherine; SAKAE, Thiago Mamôru; REMOR, Karina Valerim Tei- xeira. Prevalência do Uso de Substâncias Psicoativas em Estudantes dos Cursos da Área da Saúde em uma Universidade Privada do Sul do Brasil. Arquivos Catarinen- ses de Medicina, v. 46, n. 4, p 140-153. 2017. Disponível em: <http://www.acm.org. br/ acm/seer/index.php/arquivos/article/view/305>. DE LUNA, Ilanna Sobral et al. Consumo de psicofármacos entre alunos de medicina do primeiro e sexto ano de uma universidade do estado de São Paulo. Colloquium Vitae, v. 10, n. 1, p. 22-28. 2018. Disponível em: http://revistas.unoeste.br/index.php /cv/article/view/2167. FERRAZ, Lucimare; PIATO, Angelo Luis Stapassoli; ANZOLIN, Vinicius et al. Subs- tâncias psicoativas: o consumo entre acadêmicos de uma universidade do sul do Brasil. Momento – Diálogos em Educação, v. 27, p. 1, p. 371-386. 2018. Disponível em: https://doi.org/10.14295/momento.v 27i1.6850. FERREIRA, Norma Sandra de Almeida. As pesquisas denominadas estado da arte. Educação & Sociedade, v. 23, n. 79, p. 257-272. 2002. FIEDLER, Patrícia Tempski. Avaliação da qualidade de vida do estudante de me- dicina e da influência exercida pela formação acadêmica. Tese Doutorado em Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Pau- lo, 2008. Disponível em: doi:10.11606/T.5.2008.tde-10072008-161825. FIOROTTI, Karoline Pedroti et al. Transtornos mentais comuns entre os estudantes do curso de medicina: prevalência e fatores associados. J. bras. Psiquiatr, Rio de Janeiro, v. 59, n. 1, p. 17-23, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S004720852010000100003&lng=en&nrm=iso>. FLECK, Marcelo et al. Revisão das Diretrizes da Associação Médica Brasileira para o tratamento da depressão. Rev. Bras. Psiquiatria, São Paulo, v. 31, supl. 1, p. S7-S17. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php? FOUCAULT, Michel. O poder psiquiátrico: curso dado no Collège de France (1973- 1974). São Paulo: Martins Fontes, 2006. GUEDES, Carla Ribeiro; NOGUEIRA, Maria Inês; CAMARGO, Kenneth de. Os sofre- dores de sintomas indefinidos: um desafio para a atenção médica? Physis, v. 19, n. 3, p. 797-815. 2006. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0103-73312009000300014. KERR-CORREA, Florence et al. Uso de álcool e drogas por estudan- http://anais.uel.br/portal/index.php/ppgpsi/issue/view/15http://www.scielo.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edlibrary&format=iso.pft&lang=i&nextAction=lnk&indexSearch=AU&exprSearch=CYBULSKI,+CYNTHIA+AJUS http://www.scielo.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edlibrary&format=iso.pft&lang=i&nextAction=lnk&indexSearch=AU&exprSearch=MANSANI,+FABIANA+POSTIGLIONE https://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v41n1rb20160034 https://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v41n1rb20160034 http://www.acm.org.br/acm/seer/index.php/arquivos/article/view/305 http://www.acm.org.br/acm/seer/index.php/arquivos/article/view/305 http://revistas.unoeste.br/index.php https://doi.org/10.14295/momento.v27i1.6850 http://www.scielo.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edlibrary&format=iso.pft&lang=i&nextAction=lnk&indexSearch=AU&exprSearch=GUEDES,+CARLA+RIBEIRO http://www.scielo.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edlibrary&format=iso.pft&lang=i&nextAction=lnk&indexSearch=AU&exprSearch=NOGUEIRA,+MARIA+INES http://www.scielo.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edlibrary&format=iso.pft&lang=i&nextAction=lnk&indexSearch=AU&exprSearch=CAMARGO+JR.,+KENNETH+R.+DE https://doi.org/10.1590/S0103-73312009000300014 81 tes de medicina da Unesp. Rev. Bras. Psiquiatria, São Paulo, v. 21, n. 2, p. 95-100, jun. 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?s- cript=sci_arttext&pid=S1516-4446 1999000200005&lng=en&nrm=iso>. LAMPERT, Jadete Barbosa. Tendências de mudanças na formação médica no Brasil. Tese Doutorado em Saúde Pública, Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2002. LEMOS, Kleuber Moreira et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de Medicina de Salvador (BA). Rev. psiquiatr. clín., São Paulo, v. 34, n. 3, p. 118-124. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0 10160832007000300003&lng=en&nrm=iso>. LEONTIEV, Alexis Nikolaevich. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Horizon- te, 1978. LUCAS, Ana Cyra dos Santos et al. Uso de psicotrópicos entre universitários da área da saúde da Universidade Federal do Amazonas, Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 22, n. 3, p. 663-671, mar. 2006. Disponível em: <http://www.scielo. br/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102311X2006000300021&lng=en&nrm=iso>. LURIA, Alexander Romanovich. Curso de psicologia geral, v. 1 e 3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991. MACÊDO, Shirley. Sofrimento Psíquico e Cuidado Com Universitários: Reflexões e intervenções fenomenológicas. Estudos Contemporâneos da Subjetividade, v. 8, n. 2. 2018. MARQUARDT, Matheus; ANACLETO, Guilherme Brolesi. Alterações do sono em estudantes de medicina em uma universidade catarinense. Trabalho de Conclu- são de Curso, Universidade Estadual de Santa Catarina, 2019. MARTINS, Luiz Antônio Nogueira. Atividade médica: fatores de risco para a saúde mental do médico. Rev. Bras. Clín. Terap., n. 20, p.355-64. 1991. MINAYO, Maria Cecília de Souza. (Org.). Pesquisa social teoria, método e criati- vidade. Petropólis: Vozes, 1997. MORAES Lucas Grobério Moulim de; BERNARDINA Luiza Seidel Dala; ANDRIATO Luciano Castiglioni et al. Automedicação em acadêmicos de medicina. Rev. Soc. Bras. Clin. Med., v.16, n. 3, jul-set. 2018. Disponível em: http://www.sbcm. org.br/ ojs3/index.php/rsbcm/ article/view /361. MORAES, Diego Pereira Alves de; MEDEIROS, Greyce Mara Rodrigues de, CAL- DAS, Fabiane Alexandre Xavier Bernardes et al. Prevalência do uso de drogas psico- trópicas por estudantes de medicina da Universidade Federal do Tocantins. Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa Casa, São Paulo, v. 58, n. 3, p.127-33. 2013. MORGAN, Henri Luiz et al. Consumo de Estimulantes Cerebrais por Estudantes de Medicina de uma Universidade do Extremo Sul do Brasil: Prevalência, Motivação https://www.arca.fiocruz.br/browse?type=author&value=Lampert%2C+Jadete+Barbosa https://www.arca.fiocruz.br/browse?type=author&value=Lampert%2C+Jadete+Barbosa http://www.periodicoshumanas.uff.br/ecos/article/view/2844 http://www.periodicoshumanas.uff.br/ecos/article/view/2844 http://repositorio.unesc.net/browse?type=author&value=Marquardt%2C+Matheus http://repositorio.unesc.net/browse?type=author&value=Anacleto%2C+Guilherme+Brolesi http://www.sbcm.org.br/ojs3/index.php/rsbcm/issue/view/22 http://www.sbcm.org.br/ojs3/index.php/rsbcm/issue/view/22 http://www.sbcm.org.br/ojs3/index.php/rsbcm/issue/view/22 http://www.sbcm.org.br/ojs3/index.php/rsbcm/issue/view/22 about:blank about:blank 82 e Efeitos Percebidos. Rev. bras. educ. med., Rio de Janeiro, v. 41, n. 1, p. 102- 109, jan. 2017. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext& pid=S0100-55022017000100102&lng=en&nrm=iso>. NASCIMENTO, Camila Suica do. et al. Avaliação da automedicação entre estudan- tes de medicina de uma instituição de ensino de Alagoas. Revista de Medicina, v. 98, n. 6, p. 367-373. 2019. Disponível em: https://doi.org/10.11606/issn.1679-9836. v98i6p367-373. NUNES, Thiago Coronato. Investigação sobre queixas de memória e transtornos associados em acadêmicos de medicina da Universidade Federal Fluminense. Dissertação Mestrado, Universidade Federal Fluminense, Niteroi-RJ, 2017. O’DONNELL, James; SHELTON, Richard. Tratamento farmacológico da depres- são e dos transtornos de ansiedade. As bases farmacológicas da terapêutica de Goodman & Gilman. 12. ed. Porto Alegre: AMGH; 2012. p. 397-417. PATTO, Maria Helena de Souza. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. São Paulo: T. A. Queiroz, 1990. PEREIRA, Denis Soprani et al. Uso de substâncias psicoativas entre universitários de medicina da Universidade Federal do Espírito Santo. J. bras. psiquiatr., Rio de Janeiro, v. 57, n. 3, p. 188-195. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S004720852008000300006&lng=en&nrm=iso>. PEREIRA, Maria Amélia Dias. Sofrimento psíquico na formação médica: percep- ções e enfrentamento do estresse por acadêmicos do curso de Medicina. Tese Dou- torado em Ciências da Saúde, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2014. RAMBO, Raíra Roberta Leite; LIMA, Carlos Rogério Lopes de; ZORZI, Malu Regina. A utilização de psicofármacos por acadêmicos do curso de Medicina, em uma univer- sidade no Meio Oeste de Santa Catarina, matriculados em 2017. Revista da AMRI- GS, Porto Alegre, v, 63, v. 1, p. 43-48, jan-mar. 2019. RAMOS-CERQUEIRA, Ana Teresa de Abreu; LIMA, Maria Cristina Pereira. A forma- ção da identidade do médico: implicações para o ensino de graduação em Medici- na. Interface, Botucatu, v. 6, n. 11, p. 107-116, ago. 2002. Disponível em: <http:// www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141432832002000200008&ln- g=en&nrm=iso>. REGIS, Jacqueline Maria de Oliveira . Transtorno de ansiedade social e insatis- fação com a imagem corporal em estudantes de medicina: prevalência e fatores associados. Dissertação mestrado, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Medicina de Botucatu, 2015. Disponível em: <http://hdl.handle. net/11449/132504>. RIBEIRO, Aline Granada et al. Antidepressivos: uso, adesão e conhecimento entre estudantes de medicina. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 6, p. 1825- https://bsc.ua.edu/profiles/janis-m-odonnell/ https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_book_1?ie=UTF8&field-author=Maria+Helena+de+Souza+Patto&text=Maria+Helena+de+Souza+Patto&sort=relevancerank&search-alias=stripbooks https://repositorio.bc.ufg.br/tede/browse?type=author&value=Pereira%2C+Maria+Am%C3%A9lia+Dias https://repositorio.unesp.br/browse?type=author&value=Regis,%20Jacqueline%20Maria%20de%20Oliveira%20%5BUNESP%5D http://hdl.handle.net/11449/132504 http://hdl.handle.net/11449/132504 83 1833. 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext& pi- d=S1413-81232014000601825&lng=en&nrm=iso>. ROCHA, Manoel Otávio da Costa; PEDROSO, Enio RobertoPietra. Limitações do professor no desenvolvimento do currículo na graduação em medicina. Rev Med Mi- nas Gerais, v. 22, n. 4, p. 411-417. 2012. RODRIGUES, J. T. A medicação como única resposta: uma miragem do contempo- râneo. Psicologia em Estudo, v. 8, n. 1, p. 13-22, jan/jun. 2003. RODRIGUES, Maria Aparecida; FACCHINI, Luiz Augusto; LIMA, Maurício Sil- va de. Modificações nos padrões de consumo de psicofármacos em localidade do sul do Brasil. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 40, n. 1, p. 107-114, fev. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S- 0034-89102006000100017&lng =en&nrm=iso>. SANTOMÉ, Jurjo Torres. El curriculum oculto. 6. ed. Madrid: Morata, 1998. SILVEIRA, Viviane Iunes; OLIVEIRA, Rafael Jose Ferri, CAIXETA, Matheus Robin, et al. Uso de psicoestimulantes por acadêmicos de medicina de uma universidade do sul de Minas Gerais. Revista da Universidade Vale do Rio Verde. 2015. TRAVERSO-YEPEZ, Martha. A interface psicologia social e saúde: perspectivas e de- safios. Psicol. estud. v.6, n.2, p.49-56. 2001. Disponível em: https://doi.org/10.1590/ S1413-73722001000200007. VALSECHI, Daniel et al. Currículo oculto na escola médica: um mecanismo de repro- dução do trabalho médico no capitalismo. In: CONDÉ, Agatha Santos et al. (Orgs). Anais do XI Seminário Nacional do HISTEDBR, Uberlândia: Navegando Publica- ções, 2019. VASCONCELOS, Tatheane Couto de et al. Prevalência de Sintomas de Ansiedade e Depressão em Estudantes de Medicina. Rev. bras. educ. med., Rio de Janeiro, v. 39, n.1, p. 135-142, mar. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/ scielo.php? script=sci_arttext&pid=S0100-55022015000100135&lng=en&nrm=iso>. VYGOTSKY, Lev Semyonovich. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991. VIGOTSKI, Lev Semionovitch. Obras Escogidas, v. 3. Madrid, España: Visor. 1995. VIGOTSKI, Lev Semionovitch. O significado histórico da crise da Psicologia. In Vigo- tski, L. S. Teoria e método em psicologia, p. 203-417. São Paulo: Martins Fontes. 1996. ZEIGARNIK, Bluma Vulfovna. Introducción a la Patopsicologia. La Habana: Cien- tífico Técnica, 1979. ZEIGARNIK, Bluma Vulfovna. Psicopatologia. Madrid: Akal Editor, 1981. http://www.scielo.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edlibrary&format=iso.pft&lang=i&nextAction=lnk&indexSearch=AU&exprSearch=TRAVERSO-YEPEZ,+MARTHA https://doi.org/10.1590/S1413-73722001000200007 https://doi.org/10.1590/S1413-73722001000200007 84 10.48209/978-65-00-17616-5 CONCEPÇÕES DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE ACERCA DA SEXUALIDADE E PREVENÇÃO DE HIV/AIDS EM IDOSOS USUÁRIOS DE CENTRO DE CONVIVÊNCIA Adna Viviane Rocha Freire1 Ana Luiza Ferreira Martins2 Dennis Soares Leite3 Rodolfo Gomes do Nascimento4 Keila de Nazaré Madureira Batista5 1 Fisioterapeuta pela Universidade Federal do Pará, Pós-graduanda em Fisioterapia na Estra- tégia Saúde da Família na Universidade do Estado do Pará (UEPA). 2 Fisioterapeuta pela Universidade Federal do Pará (UFPA). 3 Fisioterapeuta pela Universidade Federal do Pará. Especialista em Saúde Coletiva pela Uni- versidade de São Paulo (USP). 4 Doutor em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará (UFPA) 5 Doutora em Doenças Tropicais pela Universidade Federal do Pará (UFPA) Endereço para correspondência: Passagem Santo Antônio, nº 75, Pedreira – CEP: 66080-480, Be- lém – Pará (PA), Brasil – Telefone: (91) 98353-6655 – E-mail: adnarocha1@gmail.com 85 INTRODUÇÃO O processo de envelhecimento populacional mundial, tanto nos países desen- volvidos como nos países em desenvolvimento, é uma realidade. No Brasil, é obser- vada uma mudança gradativa no perfil demográfico do país, decorrente da diminui- ção das taxas de natalidade e mortalidade nas últimas décadas. Na manutenção das hipóteses de queda futura dos níveis da fecundidade no País, estima-se que em 2050, haverá uma proporção de 226 idosos de 60 anos ou mais para cada 100 crianças e adolescentes, segundo o Instituto Brasileiro de Geo- grafia e Estatística (IBGE)¹. O crescimento da população idosa revela a necessidade de estruturação de um modelo assistencial que contemple o segmento idoso de for- ma integral, o sistema de saúde deve estar preparado para atender as novas deman- das sociais e de saúde. As pesquisas sugerem que uma parte considerável dos idosos gozam de uma vida sexual, embora possam enfrentar dificuldades físicas, sociais e psicológicas². Serviços ofertados a este público estimulam a convivência social, dentre eles os Centros de Convivência, os quais proporcionam um espaço onde são realizadas ati- vidades que estimulam o bem-estar físico e emocional do indivíduo, garantindo au- tonomia e melhor qualidade de vida, por meio de um envelhecimento ativo³. O enve- lhecimento saudável requer uma compreensão e abordagem de diversos aspectos como a sexualidade, reconhecendo que um maior número de idosos mantém uma vida sexualmente ativa, e em um ambiente onde a interação social é estimulada, os profissionais devem ser capacitados para orientar os idosos, proporcionando uma vida sexual saudável. Entretanto o despreparo dos profissionais desde sua formação e a visão que os mesmos têm da fase da velhice, bem como suas crenças e atitudes em relação ao idoso, influenciarão o envolvimento de todos na busca de soluções para os pro- blemas ligados ao processo de envelhecimento. Segundo Neri, Cachioni e Resende4 para propiciar melhores condições e qualidade de vida para os mais velhos é neces- sário que ocorra uma mudança nas atitudes diante da velhice, pois quando as con- dutas relacionadas aos idosos fundamentam-se em estereótipos negativos e mitos, a promoção do seu bem-estar é prejudicada. E se, durante a atuação profissional, 86 não há a aceitação de que o idoso possa manter uma vida sexual, então é imprová- vel que os problemas dessa ordem sejam efetivamente explorados, diagnosticados e reabilitados. Em relação ao envelhecimento e AIDS, o aumento da frequência de práticas sexuais entre idosos decorrentes de medicamentos que melhoram o desempenho sexual e reposição hormonal5; torna-se um risco pois não está associado ao uso do preservativo. A invisibilidade da sexualidade na velhice está intimamente relacionada ao preconceito e a falta de informação, pois a sexualidade está longe de ser vista como saudável e natural em idosos. Aumentando assim a vulnerabilidade do idoso para as infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), entre elas, o HIV/AIDS6. Os próprios profissionais de saúde dificilmente acreditam que os idosos possam ser con- taminados por alguma doença sexualmente transmissível, pois os consideram como sexualmente inativos. Anulando a possibilidade do diagnóstico precoce da AIDS, ao negligenciar a abordagem da sexualidade dessas pessoas e o exame imediato (soro- logia para o HIV), mesmo após a observação e o relato dos primeiros sinais e sinto- mas7. Sendo assim, é necessário um trabalho de prevenção e orientação direcionada a essa população8 e da própria quebra de tabu entre os profissionais da saúde sobre a vivência sexual da pessoa idosa. Portanto, tem-se por objetivo do estudo investigar as concepções relacionadas ao processo de envelhecimento: sexualidade e prevenção ao HIV/AIDS no idoso, que predominam entre os profissionais de saúde, integrados a Centro de convivên- cia, que atuam no Município de Belém. MÉTODOS Trata-se de um estudo descritivo observacional, com coleta transversal e abor- dagem quantitativa e qualitativa. A pesquisa foi realizada, no Palácio Bolonha Centro de Convivência para a Terceira Idade. O Palácio Bolonha atende um público na faixa etária a partir de 40 anos e promove atividades de convivência em grupo, atividades de manifestações artísticas, culturais, esportivas e de lazer, proporcionando maior autonomia ao idoso e inclusão e participação na comunidade e família.O Centro de Convivência para a Terceira Idade, é uma organização não-governamental, sem fins lucrativos e possui como objetivo garantir uma melhor qualidade de vida para os 87 idosos. O Centro de Convivência conta com uma equipe de 15 profissionais da saúde, no entanto, a pesquisa foi realizada com apenas oito profissionais de saúde, que tra- balham diretamente com o público de idosos da instituição. Cabe destacar que estes concordaram em participar da pesquisa voluntariamente por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Adotou-se como critério de ex- clusão desta pesquisa os profissionais de saúde que se recusaram (n=7) a participar do estudo. A coleta de dados foi realizada por dois pesquisadores, no mês de novembro e dezembro de 2017. Após assinarem o TCLE, os participantes receberam o questioná- rio para o autopreenchimento. Utilizou-se o questionário de perfil sociodemográfico e de atuação profissional, a Escala de Atitudes e Conhecimento sobre Sexualidade no Envelhecimento (ASKAS) e uma entrevista semiestruturada. O questionário de perfil sociodemográfico e de atuação profissional é um ques- tionário composto por 12 itens, criado pelos autores, que tem como objetivo definir o perfil sociodemográfico e de práticas profissionais dos participantes do estudo. Com- posto pelas seguintes variáveis: idade, sexo, cor, estado civil, religião, área de forma- ção, tempo de atuação como profissional de saúde, faixa etária com que teve maior dificuldade de trabalhar, se participou de algum programa de educação em saúde sobre sexualidade na velhice, se já orientou um idoso sobre sexualidade e prevenção de HIV/AIDS e se encontrou alguma dificuldade para abordar o tema com o idoso. A Escala de Atitudes e Conhecimento sobre Sexualidade no Envelhecimento (ASKAS) foi desenvolvida com a finalidade de medir o conhecimento sobre a sexua- lidade de idosos e atitudes relativas à sexualidade do idoso9. A versão brasileira da escala adaptada e validada consiste de 28 itens, 20 no formato “verdadeiro/falso/não sei” (verdadeiro = 1 ponto, falso = 2 pontos e não sei = 3 pontos) e oito itens com respostas numa escala tipo Likert de cinco pontos, variando de “discordo totalmente” e “concordo totalmente”. As 20 questões, falso/verdadeiro, avaliam o “conhecimento” dos respondentes sobre as mudanças que ocorrem na sexualidade, relacionadas à idade. A pontuação varia de 20 a 60 pontos, um escore baixo indica alto conhecimento sobre a sexua- lidade na velhice. As oito questões, “discordo/concordo”, avaliam as “atitudes” dos 88 respondentes em relação ao comportamento sexual de idosos. Com pontuação va- riando de 8 a 40 pontos. Um baixo escore indica uma atitude mais favorável à sexua- lidade da pessoa Idosa. A entrevista semiestruturada dos profissionais de saúde acerca de HIV/AIDS na velhice foi composta de seis perguntas abertas que contemplavam as seguintes te- máticas: atuação profissional; público-alvo e suas problemáticas; AIDS na população idosa; prevenção em relação HIV/AIDS para idosos e suas dificuldades; vulnerabili- dade da população idosa por infecção ao HIV/AIDS; aprimoramento do profissional de saúde visando ações de promoção em saúde destinadas ao público idoso acerca da prevenção ao HIV/AIDS. Cabe ressaltar que as entrevistas foram registradas com auxílio de gravador e, posteriormente, transcritas e digitadas na íntegra em Word Windows versão 2007. Em relação ao processamento e análise dos dados, inicialmente foram tabula- dos em planilhas do programa Microsoft Excel versão 2007, onde cada participante recebeu um código de modo a garantir seu anonimato. Para a análise dos dados foi utilizado o programa estatístico Epi Info versão 7.1, aplicou-se a estatística descritiva aos dados quantitativos através da distribuição da contagem de frequências simples e percentuais. Devido ao tamanho pequeno da amostra optou-se por utilizar o teste de correlação não paramétrico de Spearman. Quanto aos dados qualitativos, os dis- cursos foram transcritos de maneira integral para análise do seu conteúdo realizou- -se a análise temática, com ênfase na análise de conteúdo temático-categorial10. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital Universitário João de Barros Barreto – HUJBB, parecer nº 2.362.074. Todos os participantes da pesquisa assinaram o TCLE. RESULTADOS E DISCUSSÃO Caracterização dos participantes, atitudes e conhecimento sobre sexualidade A caracterização sociodemográfica dos profissionais incluídos na amostra do estudo é demonstrado na Tabela 1. A média de idade foi de 35,38 ± 7,05 anos, a proporção de sexo foi igual, portanto, quatro eram do sexo feminino e quatro do sexo masculino, eram em maioria solteiros e com prática religiosa católica. 89 Tabela 1: Caracterização sociodemográfica da amostra do estudo. Variáveis N % Gênero Masculino 4 50 Feminino 4 50 Idade 20 – 30 anos 2 25 31 – 40 anos 5 62,5 41 – 50 anos 1 12,5 50 anos ou mais 0 0 Cor Branca 2 25 Parda 3 37,5 Negra 3 37,5 Estado Civil 2 25 Casado(a) Solteiro(a) 6 75 Divorciado(a) 0 0 Viúvo(a) 0 0 Religião Catolicismo 4 50 Protestantismo 1 12,5 Candomblé 0 0 Ateísmo 0 0 Outros 3 37,5 Com relação à atuação profissional, todos eram profissionais graduados em Educação física, que atuavam no mercado de trabalho entre 2 a 5 anos (37,5%), rela- taram ter maior dificuldade em trabalhar com o público dentro da faixa etária de ado- lescentes entre 10 e 19 anos (37,5%). Ao serem questionados sobre a participação de algum programa de educação em saúde com o tema de sexualidade na velhice, 75% nunca participaram de um programa voltado a essa temática específica; apesar disso, os profissionais relataram que orientam os idosos a respeito de sexualidade e HIV/AIDS (62,5%) e não tem dificuldades em abordar esse tema com o público idoso (87,5%). 90 Os dados da Tabela 2 mostram os escores de média e desvio padrão entre os escores da Escala de Atitudes e Conhecimento sobre Sexualidade no Envelhecimen- to (ASKAS) e as características sociodemográficas e de práticas profissionais. 91 Com relação à escala ASKAS, os participantes do sexo masculino obtiveram um escore médio de 29,75 ± 2,06 e os do sexo feminino com 26,25 ± 3,30; enquanto que, referente às atitudes os escores médios para homens de 14,75 ± 2,79 e para mulheres foram de 9,25 ± 1,89, com p-valor igual 0,01, demonstrando que as mulhe- res apresentaram maior conhecimento em relação à sexualidade na velhice, e uma atitude mais favorável à sexualidade da pessoa idosa. Corroborando com o estudo de Semanas11, onde foi investigado o conhecimento e atitudes de profissionais que lidam diariamente com idosos e observou que os homens possuem atitudes ligeira- mente mais negativas face aos idosos, do que as mulheres, entretanto nos resulta- dos não foi observada diferença significativa, esses resultados podem ser reflexos da desconstrução de estereótipos de que a vida sexual ativa desaparece na mulher, e que esta deva ter uma vida mais conservadora do que os homens, até mesmo en- tre o público idoso, as mulheres demonstram ter maior conhecimento em relação à sexualidade12. A tabela 3 demonstra os dados dos escores médios da escala ASKAS com as variáveis sociodemográficas de acordo com a correlação do teste não paramétrico de Spearman, considerando o valor de p ≤ 0,05. Tabela 3. Escores de conhecimento e atitudes da ASKAS, conforme as variáveis so- ciodemográficas. Correlação do Teste não-paramétrico de Spearman (p≤0,05). Características Conhecimento Atitudes Total Sexo Masculino (n=4) M=29,75 DP=2,06 MED=29,5 M=14,75 DP=2,79 MED=14,5 P=0,01 M=44,5 DP=3,69 MED=44,5 P=0,005 Feminino (n=4) M=26,25 DP=3,30 MED=25 M=9,25 DP=1,89 MED=8,5 M=35,5 DP=2,88 MED=35,5 Estado Civil Casado(a) (n=2) M=24 DP=0 MED=24 P=0,025 M=10 DP=2,82 MED=10 M=34 DP=2,82 MED=34 Solteiro(a) (n=6) M=29,33 DP=2,34 MED=29,5M=12,66 DP=3,88 MED=12,5 M=42,0 DP=4,97 MED=42 92 Nesse presente estudo, foi identificado que os participantes casados apresen- taram maior conhecimento (24,0) em relação aos profissionais solteiros (29,33±2,34), com a diferença estatisticamente significativa (p = 0,025), além de atitudes mais favo- ráveis quanto à sexualidade na velhice (casados = 10,0±2,82 / solteiros= 12,66±3,88). Porém na pesquisa de Semanas11, foi observado que respondentes casados têm ati- tudes mais negativas em comparação com os solteiros, no entanto não houve uma diferença significativa. Compreende-se que a vivência proporcionada por uma relação estável, favore- ce a visão de sexualidade, para além do simples ato sexual, essa visão mais amplia- da propicia a adoção de atitudes mais positivas relativas à vida sexual na velhice11. Nessa linha de raciocínio, acredita-se que o estado civil pode ser considerado um importante fator de influência no conhecimento e atitudes dos profissionais, necessi- tando, portanto, ser mais bem estudado em estudos futuros. Com relação à postura religiosa, os participantes que se denominam católi- cos e protestantes apresentaram atitudes menos favorável à sexualidade na velhice, (13,75+4,03 / 12,0) respectivamente, comparado àqueles respondentes que profes- sam outras religiões, com pontuações médias para atitudes de 9,66±2,88. Apesar da diferença entre os participantes, esta não foi estatisticamente significativa. Sema- nas11 (2014) verificou que os participantes que professam alguma religião possuem atitudes negativas face à sexualidade dos idosos, do que os participantes que não professam nenhuma religião. A sexualidade está envolta em diferentes aspectos, se- jam eles culturais, emocionais ou religiosos. A religião pode influenciar as atitudes do indivíduo frente a sexualidade, e está constantemente associada a uma visão mais conservadora. Nesta pesquisa, os profissionais que atuam no mercado de trabalho cerca de 10 anos ou mais apresentaram melhor conhecimento e atitude mais favorável à se- xualidade do idoso, com pontuação média de 25,0+1,41 e 10,5+2,12, respectivamen- te, mas não foi estatisticamente significante em comparação com os outros partici- pantes. Este dado corrobora com Dogam13 que em sua pesquisa demonstrou que os médicos mais velhos tinham mais conhecimento quando comparados aos médicos mais jovens, apesar das atitudes semelhantes. A partir desses dados identifica-se a necessidade de aprimorar a formação dos profissionais de saúde para que estejam 93 capacitados para ofertar os cuidados necessários aos idosos no âmbito de sua se- xualidade. Concepções dos profissionais acerca do HIV/AIDS na velhice De acordo com a proposição do trabalho e mediante a análise das falas emer- giram 302 unidades de registro (frases) que deram suporte à categorização das cate- gorias e subcategorias para análise (Quadro 1). Neste processo, foi possível apreciar o objeto de estudo e traçar importantes inferências através das referências atribuídas pelos profissionais. Quadro 1 Resultado temático da análise categorial de relatos coletados por meio de entrevista semi-estruturada com os profissionais de saúde (categorias e subcatego- rias). A. Sobre o público idoso B. Percepção da incidência do HIV/AIDS no público idoso C. Fatores de vulnerabilidade C1. Sexualidade na velhice C2. Utilização de preservativos. C3. Viuvez e solidão C4. Ausência de informação adequada D. Como modificar ou prevenir os fatores de vulnerabilidade D1. Planejamento de ação em saúde destinada ao público idoso sobre o tema de Sexualidade e HIV/AIDS D2. Presença de dificuldades ao abordar essa temática com o idoso A. Sobre o público idoso Por meio da análise dos discursos dos profissionais, elegeram-se as caracte- rísticas mais relevantes do público atendido. Um dos aspectos observados foi uma maior porcentagem de idosas que integram as atividades do Centro Gerontológico, como percebido na fala de um dos profissionais: O sexo feminino impera, é muito grande, e não é só aqui não...chega a ser quase 90% ou se não é 90%. É 10% praticamente de homens (Entrevistado 3). 94 Este maior contingente de mulheres idosas na instituição estudada remete ao que conhece-se como “feminização da velhice”. No Brasil, o processo de velhice é nitidamente caracterizado por um maior contingente feminino, especialmente nos contextos urbanos14, estima-se que as mulheres vivam, em média, de cinco a sete anos a mais que os homens15. Sobre isso, ainda vale destacar que a “feminização” ocorre de modo semelhante ao que se tem registrado sobre o perfil epidemiológico dos portadores de HIV/AIDS no Brasil. De acordo com os discursos, as demandas clínicas mais percebidas pelos pro- fissionais neste grupo de idosos incluem as doenças crônicas não transmissíveis, característica esta bastante frequente em instituições com o mesmo perfil de atendi- mento. Muitas delas vêm com patologias você sabe a partir dos 60 anos são problemas cardíacos, diabetes, enfraquecimento dos ossos, todas as “oses” da vida e algu- mas vem com problemas de depressão, então a gente procura reintegrar elas, não deixar ninguém excluído sempre motivando. (Entrevistado 3). B. Percepção da incidência do HIV/AIDS no público idoso Alguns discursos dos profissionais revelaram uma percepção dialética entre a possibilidade da infecção, a atividade sexual e a velhice mais ativa, como observado na fala do Entrevistado 2: É provável mesmo que realmente esteja acontecendo isso, mas assim eu nunca identifiquei aqui no nosso centro, entre os meus alunos que alguém tenha adquirido, esteja vivenciando... entre os meus alunos eu ainda não identifiquei. Os tempos mudaram eles estão muito mais ativos (Entrevistado 2). É perceptível para os profissionais, as mudanças no estilo de vida dos idosos, que se tornam cada vez mais ativos em sua velhice, mantendo suas atividades sexuais e sociais. Segundo Gorinchteyn16 essas transformações decorrem de uma melhor qualidade e expectativa de vida com o acesso aos serviços de saúde, os avanços da medicina, que permitem uma maior longevidade e prolongam a vida sexual, tornando as pessoas idosas mais vulneráveis às infecções sexualmente transmissíveis, dentre elas, a infecção pelo HIV/AIDS. 95 C. Fatores de vulnerabilidade C1. Sexualidade na velhice Por meio dos discursos coletados, constata-se a percepção dos profissionais acerca da sexualidade do idoso, identificando a vida sexual na velhice como um aspecto presente no ambiente do centro de convivência. Compreender que o idoso continua tendo impulso e atividade sexual, apesar das alterações fisiológicas, as ex- pectativas socioculturais e os problemas de saúde associados6, constitui um passo importante para a abordagem da temática e a atuação em prevenção destes profis- sionais. Olha não é generalizando não, como eu te falei, assim como existem aqueles ido- sos que são cautelosos, que são cuidadosos, existem aqueles também que querem aproveitar agora a terceira idade, para curtir a vida. Principalmente os homens...a gente tem esse cuidado de estar falando sobre se preservar, porque eles querem estar saindo com as novinhas (Entrevistado 2). Hoje em dia como tá tudo mais avançado, não se privam mais do sexo...Sim, eles ficam se dando cantada, conversam, umas alunas brincam comigo: Égua professor ta bonito hoje, não sei o que (Entrevistado 1). Ao abordar a sexualidade dos idosos, muitos profissionais referiam-se ao re- lacionamento destes com parceiros mais jovens. Observa-se a preocupação de que estes possam estar envolvidos em algum tipo de engodo. Coelho et al.17 ressalta as diferentes posturas adotadas pela sociedade diante da procura dos idosos por par- ceiros sexuais de menor faixa etária, é mais aceitável que homens idosos se envol- vam com mulheres mais jovens, pois quando as idosas se relacionam com homens mais novos essa atitude é considerada insensataou absurda. C2. Utilização de preservativos Alguns relatos verbalizados neste estudo reforçam a preocupação com a rela- ção segura na velhice. Alguns discursos ilustram bem essa noção: [...] e porque eu escuto muito isso: É professor na nossa idade já estamos no fim da safra, então transar com camisinha já é como se fosse chupar um bombom com casca né? Elas falam assim... ah professor na nossa idade não tem mais porque está se privando disso a gente quer ter prazer, a gente quer se divertir (Entrevista- do 3). 96 É difícil você dar uma consciência para um homem vamos dizer que nunca usou, antigamente não tinha isso né? Não tinha essa questão de camisinha essas coisas, é difícil conscientizar hoje em dia a usar entendeu? (Entrevistado 5). A transmissão do HIV, no Brasil, entre idosos ocorre principalmente pela via sexual, sendo a maioria de orientação heterossexual18,19. Constituindo assim o uso de preservativo, tanto o masculino como o feminino, em uma atitude de prevenção eficaz, e estabelecendo a necessidade de testagem anti-HIV para essa população8. Entretanto, o não uso de preservativos é uma realidade entre os idosos e muitos só o utilizam após o diagnóstico de HIV20. A percepção dos profissionais sobre os moti- vos que influenciam a não adoção de atitudes de cuidados preventivos por parte dos idosos, envolvem a ideia de que o uso do preservativo influencia na capacidade de sentir ou dar prazer durante o ato sexual. Segundo Araújo21 os homens idosos temem perder a ereção e consideram ne- cessário o uso do preservativo apenas nas relações com as profissionais do sexo. Outro fator destacado pelos profissionais é que as idosas não reconhecem reais motivos para o uso do preservativo, não se identificam como em posição de risco. Santos e Assis22 descreve que as mulheres consideram não necessitar de prevenção, porque não tem mais a capacidade de engravidar. C3. Viuvez e solidão De acordo com os profissionais participantes do estudo, muitos idosos pos- suem a compreensão da viuvez como um momento de liberdade, de autonomia em busca do prazer e satisfação pessoal, como percebido em algumas falas: Se a gente for ver, muitas dessas mulheres são sozinhas e querem alguém que dá atenção, dá carinho e elas se entregam porque não tem ninguém... então há tam- bém fatores psicológicos, que influenciam nisso daí! (Entrevistado 7). Mas se tratando de idosos, principalmente mulher, chegam a uma certa idade... por exemplo tem idosas que são muito presas quando são casadas, então as vezes ficam viúvas ai faz com que elas se soltem... a procura de alguém, a procura de um parceiro, não quer ficar só. O que a gente percebe aqui é isso, elas querem sempre ter alguém (Entrevistado 4). 97 Segundo Leite, De Moura e Berlezi6 essa compreensão favorece a participação em grupos de terceira idade, proporcionando maiores oportunidades de encontros afetivos e amplia a possibilidade do idoso de se relacionar sexualmente com outra pessoa. O centro de convivência é responsável por estimular a criação de vínculos so- ciais, realizando a integração do indivíduo, para os profissionais muitos idosos são melhor acolhidos no centro do que em seu próprio círculo familiar, onde muitos se sentem solitários. A solidão está relacionada a um diálogo, a um convívio deficiente. A busca do idoso em manter vínculos é uma estratégia de combate à solidão. Este busca uma companhia com o qual possa compartilhar suas emoções e vivências11,23. C4. Ausência de informação adequada Com base na concepção dos profissionais foi possível notar lacunas em rela- ção ao acesso à informação sobre HIV/AIDS na velhice, como ilustra alguns discur- sos: [...] É a questão de não conhecer tanto, não conhecer sobre...eu acho que falta mais uma informação pra eles, pra esse público... e informação falta na TV a gente começar maciçamente a falar sobre isso... em redes de acesso mais fáceis pra eles (Entrevistado 7). [...] Outros aspectos? Falta de informação né? A falta de informação é uma delas e pelo fato de ser ainda um pouco acanhado, muitos idosos ainda preferem ficar pra eles, que eles ainda estão praticando, pela vergonha da sociedade, preconceito né? (Entrevistado 1). No campo assistencial, a invisibilidade da sexualidade do idoso se fez presente na área da saúde, sendo a vida sexual da pessoa idosa tratada como algo inexis- tente. Consequentemente, a possibilidade de uma pessoa com mais de 60 anos ser infectada pelo vírus HIV era considerada remota22. Constitui-se assim um grande desafio da prevenção do HIV/AIDS entre os idosos: a crença errônea de que não estão em risco de contrair HIV ou outras IST’s. Okuno12 relata que esta população se encontra pouco informada sobre a AIDS, estando pouco ou nada consciente sobre o modo de se protegerem, tornando-se vulneráveis à infecção. 98 D. Como modificar ou prevenir os fatores de vulnerabilidade Quando questionados sobre as estratégias de abordagem da temática entre os idosos, o conhecimento e a informação foram as soluções mais sugeridas por estes profissionais. Com certeza com palestras, com orientações, com conversas, esclarecimentos a respeito da importância do uso do preservativo do que pode acarretar na vida delas uma vez que ela possa adquirir a doença. (Entrevistado 3). Muita orientação...uma campanha maciça em relação a isso né? E eu acho que nós precisamos ter um olhar muito diferente pra isso, e começarmos a fazer... principalmente nós que trabalhamos com idosos... tenta fazer um trabalho muito importante no sentido de conscientizá-los. (Entrevistado 7). As ações de promoção de saúde podem auxiliar a promover um comporta- mento sexual seguro, amenizando a invisibilidade quanto à transmissão do HIV na pessoa idosa27. O Programa Conjunto das Nações Unidas HIV/AIDS (UNAIDS) sugere propos- tas de ação para diminuir o impacto da AIDS na terceira idade, como: a mudança do preconceito acerca da sexualidade na velhice; a inclusão de serviços que abordem a questão do HIV; a criação de programas educativos específicos para essas pessoas e a inclusão de idosos em pesquisas sobre prevenção e assistência28. Eu acho que tem que ser já! De imediato! Que isso não pode esperar mais! Eu acho que isso é um assunto muito pertinente que precisa de muitas discussões. Eu acho que no Centro, precisamos falar disso, né! E lá na faculdade precisam fazer um grupo pra falar disso... e nós, profissionais da área da saúde, precisamos ler mais, se informar mais... porque muitas pesquisas estão sendo feitos a respeito disso, tudo isso pra quê? Pra gente colher essas informações, né? Para que a gente pos- sa dar uma resposta pra essa comunidade (Entrevistado 7). D1. Planejamento de ação em saúde destinada ao público idoso sobre o tema de Sexualidade e HIV/AIDS Apesar dos participantes reconheceram a importância da temática desta pes- quisa, nunca realizaram alguma ação específica sobre o tema em relação aos ido- 99 sos, muitos relataram ter conversas informais com os alunos sobre sexualidade. Mas reconheceram necessitar de um melhor preparo para abordar a temática. Não, acho que aqui não, a gente nunca falou assim específico. Não específico as- sim de palestra essas coisas, assim sobre sexo não. (Entrevistado 5). Uma hora ou outra eu conversava sobre isso com alguma aluna, mas quando eu li sobre isso... de junho pra cá eu comecei a me preocupar com isso (Entrevistado 7). Eu mesmo assim preparado para falar sobre isso abordando alguém? Não. Eu te- nho que estudar muito sobre o assunto (Entrevistado 4). Não, pelo fato de não ter nenhum treinamento específico (Entrevistado 1). Portanto, afere-se que o sexo é um tópico difícil de ser abordado e discutido com idosos. Segundo Taylor e Gosney 2 os profissionais da saúde reconhecem seu papel crucial na saúde sexual, mas consideram que não foram devidamente treina- dos durante sua formação, sentindo-se despreparados para discutir ativamente osassuntos sexuais com seu paciente. D2. Presença de dificuldades ao abordar essa temática com o idoso As barreiras para a abordagem da sexualidade e prevenção do HIV em idosos referidas pelos profissionais englobam dois aspectos. Um destes foi a necessidade de enfrentar conceitos e entendimentos já enraizados nos idosos. No fato não seria a linguagem né? Porque eles já são pessoas adultas já passa- ram por isso já viveram o que a gente está vivendo hoje, nós jovens. De fato, a dificuldade seria mostrar ou conversar, o que é de hoje porque muita coisa passa, muita coisa que pra gente não é mito para eles ainda é mito, eles tem a mente um pouquinho mais rígida, não querem, não estão abertos a novidade (Entrevistado 1). O segundo obstáculo constitui-se na vergonha e o sentimento de culpa por possuírem desejo sexual, experimentado por muitos idosos, em decorrência do des- conhecimento e à pressão cultural24. Não, assim, tem algumas pessoas abertas né... tem umas que falam sim, aberta- mente, mas tem certas idosas que tem dificuldade, mas por causa da criação, pela educação que tiveram, pela coisa mais fechada mesmo... muitas delas não falam 100 porque... porque morrem de vergonha, tem vergonha dos filhos né, o que os filhos vão pensar dela falando isso... nós temos isso aqui (Entrevistado 7). Observa-se que os profissionais compreendem como a apreensão do idoso sobre a aceitação da sociedade sobre a sua sexualidade, além de outros aspectos culturais, torna o idoso inibido a assumir a permanência do desejo e o interesse pela busca de sua satisfação sexual. A vigilância e o temor do julgamento da sociedade, pode impedir o idoso de manifestar sua sexualidade25,26. Este estudo busca conscientizar acerca da importância de se capacitar os profis- sionais de saúde na abordagem do idoso no contexto da integralidade, reconhe- cendo os mais velhos como indivíduos que mantêm sua atividade sexual e, por- tanto, vulneráveis às IST’s. Pois em decorrência do preconceito e o tabu que rondam a sexualidade na terceira idade, somado à carência de políticas pú- blicas que abordem essa temática, muitos idosos não se percebem vulnerá- veis à infecção pelo HIV, e mantêm relações sexuais sem o uso do preservativo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Observamos através da aplicação da ASKAS que os profissionais de saúde participantes possuem lacunas em seu conhecimento acerca da sexualidade na ve- lhice, e que existem fatores que influenciam em suas atitudes frente a vida sexual do idoso. A análise dos discursos demonstrou a compreensão dos profissionais em re- lação aos fatores de vulnerabilidade do idoso ao HIV/Aids, mas estes consideram-se despreparados para abordar a sexualidade do idoso. Os profissionais abordados neste estudo não são responsáveis por realizar a testagem e o diagnóstico em si do HIV/AIDS, mas possuem o papel de desenvolver práticas que envolvam ações educativas, com enfoque em medidas preventivas na prática sexual, promovendo esclarecimento de temas como as Doenças Sexualmen- te Transmissíveis como o HIV/AIDS. 101 REFERÊNCIAS 1. IBGE. Indicadores Sociodemográficos e de Saúde no Brasil: 2009. Estudos e Pes- quisas Informação Demográfica e Socioeconômica. n. 25. Rio de Janeiro. IBGE, 2009. 2. Taylor A, Gosney MA. Sexuality in older age: essential considerations for healthca- re professionals. Age Ageing. 2011;40: 538–43. 3. Almeida EA, Madeira GD, Arantes PMM, Alencar MA. Comparação da qualidade de vida entre idosos que participam e idosos que não participam de grupos de convivên- cia na cidade de Itabira-MG. Rev Bras Geriatr Gerontol. [Internet] 2010; 13(3):435-44. Disponível em: http://revista. unati.uerj.br/pdf/rbgg/v13n3/v13n3a10.pdf. 4. Neri AL, Cachioni M, Resende MC. Atitudes em relação à velhice. In: Freitas, E.V. et al. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. 5. Lazzarotto, AR et al. O conhecimento de HIV/AIDS na terceira idade: estudo epidemiológico no Vale do Sinos, Rio Grande do Sul, Brasil. Cien Saude Colet.. 2008;13(6):1833-1840. 6. Leite MT, De Moura C, Berlezi, EM. Doenças sexualmente transmissíveis e HIV/ AIDS na opinião de idosos que participam de grupos de terceira idade. Rev Bras Ge- riatr Gerontol. 2007;10(3):339-354. 7. Pereira GS, Borges CI. Conhecimento sobre HIV/AIDS de participantes de um gru- po de idosos, em Anápolis-Goiás. Esc. Anna Nery Rev. Enferm, 2010;14(4):720-725. 8. BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Na- cional de DST e AIDS. Manual de Controle das Doenças Sexualmente Transmissí- veis.4 ed. Brasília: MS, 2006. 9. White CB. A scale for the assessment of attitudes and knowledge regarding sexua- lity in the aged. Archives of Sexual Behavior. 1982; 11(6): 491-502. 10. Bardin L. L’analyse de contenu. Paris: Presses universitaires de France, 1977; 69. 11. Semanas DFC. Atitude dos profissionais face à sexualidade nos idosos: Estudo exploratório realizado no Concelho de Cabeceiras de Basto [dissertação]. Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação. Universidade do Porto. Porto. 2014. 12. Okuno MFP et al. Knowledge and attitudes about sexuality in the elderly with HIV/ AIDS. Acta Paulista Enfermagem. 2012;25(1):115-121. 102 13. Dogan S, Demir B, Eker E, Karim S. Knowledge and attitudes of doctors toward the sexuality of older people in Turkey. International Psychogeriatrics. 2008, 20:5, 1019-1027. 14. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. 2010; 20 (03). Dispo- nível em: <https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/ default. shtm> 15. Nicodemo D, Godoi MP. Juventude dos anos 60-70 e envelhecimento: estudo de casos sobre feminização e direitos de mulheres idosas. Revista Ciência em Exten- são. 2010;6(1):40-53. 16. Gorinchteyn JC. AIDS na terceira idade. A Terceira Idade. 2008 Out;19(43):39-48. 17. Coelho DNP et al. Percepção de mulheres idosas sobre sexualidade: implicações de gênero e no cuidado de enfermagem. Revista da Rede de Enfermagem do Nor- deste. 2010;11(4):163-173. 18. Alencar DL, Marques APO, Leal MCC, Vieira JCM. Fatores que interferem na sexualidade de idosos: uma revisão integrativa. Cien Saude Colet. 2014;19(8):3533- 3542. 19. Prejean J et al. Estimated HIV incidence in the United States, 2006–2009. PLoS One. 2011;6(8):17502. 20. Alencar RA, Ciosak SI. O diagnóstico tardio e as vulnerabilidades dos idosos vivendo com HIV/AIDS. Revista da Escola de Enfermagem da USP. 2015;49(2):229- 235. 21. Araújo VLB et al. Características da AIDS na terceira idade em um hospital de referência do Estado do Ceará, Brasil. Rev Bras Epidemiol. 2007;10(4):544-554. 22. Santos AFM, Assis M. Vulnerabilidade das idosas ao HIV/AIDS: despertar das políticas públicas e profissionais de saúde no contexto da atenção integral: revisão de literatura. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2011;14(1):147-157. 23. Lopes RF, Lopes MTF, Câmara VD. Entendendo a solidão do idoso. Revista Bra- sileira de Ciências do Envelhecimento Humano. 2010;6, (3):373-381. 24. Vieira KF, Coutinho MP, Saraiva, E. A sexualidade na velhice: representações sociais de idosos frequentadores de um grupo de convivência. Psicologia: Ciência e Profissão. 2016;36(1):196-209. 103 25. Hernández M, Díaz P, Llerenas E. Estados clínicos y autopercepcíon de la sexua- lidade en ancianos con enfoque de género. Rev Cubana Enferm. 2009;25(1-2):0-0. 26. Ferreira K, Silva M, Cherem T, Araújo C. Percepção dos idosos perante o sexo na idade avançada. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2009;3(4):182-188. 27. Bertoncini BZ, Moraes KS, Kulkamp IC. Comportamento sexual em adultos maio- res de 50 anos infectados pelo HIV.J Bras Doenças Sex Transm. 2007;19(2):75-9. 28. United Nations Programme on HIV/AIDS. Report on the global AIDS epidemic. A UNAIDS 10th anniversary special edition. Geneva: UNAIDS, 2006. 104 SOBRE O ORGANIZADOR DENNIS SOARES Graduação em Fisioterapia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Aperfeiçoa-mento em Saúde Pública pela Faculdade do Método de São Paulo. Especialista em Saúde Coletiva com ênfase em saúde e trabalho pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-graduando em Gestão em Saúde pela Faculdade Metropolitanas Unidas (FMU) e Educação e Tecnologias pela Universidade Federal de São Carlos (UFS- Car). Foi pesquisador convidado em Saúde Coletiva na Universidad Nacional de La- nús (Buenos Aires/Argentina). Membro da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO). Atualmente, fisioterapeuta em cuidados paliativos, pesquisador da Fa- culdade de Medicina da USP/Centro de Referência em DST/Aids, fisioterapeuta do trabalho na Libbs Farmacêutica e Banco BTG, Professor universitário para os cursos de fisioterapia, educação física e odontologia. 105 www.arcoeditores.com contato@arcoeditores.com /arcoeditores @arcoeditores bookmark=id.gjdgxs bookmark=id.30j0zll bookmark=id.1fob9te _GoBack _1fob9te _3znysh7 _2et92p0 _tyjcwt _3dy6vkm _1t3h5sf _4d34og8 _GoBack