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NOVE	OLHARES
SOBRE	A	SUPERVISÃO
Celestino	Alves	da	Silva	Junior
Mary	Rangel	(orgs.)
>>
http://www.papirus.com.br
COLEÇÃO	MAGISTÉRIO:
FORMAÇÃO	E	TRABALHO	PEDAGÓGICO
Esta	coleção	que	ora	apresentamos	visa	reunir	o	melhor	do	pensamento	teórico
e	crítico	sobre	a	formação	do	educador	e	sobre	seu	trabalho,	expondo,	por	meio
da	diversidade	de	experiências	dos	autores	que	dela	participam,	um	leque	de
questões	de	grande	relevância	para	o	debate	nacional	sobre	a	educação.
Trabalhando	com	duas	vertentes	básicas	–	magistério/formação	profissional	e
magistério/trabalho	pedagógico	–,	os	vários	autores	enfocam	diferentes	ângulos
da	problemática	educacional,	tais	como:	a	orientação	na	pré-escola,	a
educação	básica:	currículo	e	ensino,	a	escola	no	meio	rural,	a	prática
pedagógica	e	o	cotidiano	escolar,	o	estágio	supervisionado,	a	didática	do	ensino
superior	etc.
Esperamos	assim	contribuir	para	a	reflexão	dos	profissionais	da	área	de
educação	e	do	público	leitor	em	geral,	visto	que	nesse	campo	o	questionamento
é	o	primeiro	passo	na	direção	da	melhoria	da	qualidade	do	ensino,	o	que	afeta
todos	nós	e	o	país.
Ilma	Passos	Alencastro	Veiga
Coordenadora
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
1.	SUPERVISOR	ESCOLAR:	PARCERIA	POÍTICO-PEDAGÓGICO	DO
PROFESSOR
Antonia	da	Silva	Medina
2.	O	PABAEE	E	ASUPERVISÃO	ESCOLAR
Edil	V.	de	Paiva
Léa	Pinheiro	Paixão
3.	O	DIREITO	AO	SABER	COM	SAOR.	SUPERVISÃO	E	FORMAÇÃO	DE
PROFESSORES	NA	ESCOLA	PÚBLICA
Célia	Frazão	Linhares
4.	ORGANIZAÇÃO	DO	TRABALHO	NA	ESCOLA	PÚBLICA:	O
PEDAGÓGICO	E	O	ADMINISTRATIVO	NA	AÇÃO	SUPERVISORA
Celestino	Alves	da	Silva	Junior
5.	A	OPÇÃO	DA	SUPERVISÃO	DIANTE	DA	AMBIVALÊNCIA
Marileusa	Moreira	Fernandes
6.	PARADIGMA	DE	AVALIAÇÃO	EMANCIPATÓRIA	E	A	AÇÃO
SUPERVISORA:	CIDADANIA	E	ESPAÇO	PÚBLICO
Marilu	Fontoura	de	Medeiros
7.	CONSIDERAÇÕES	SOBRE	O	PAPEL	DO	SUPERVISOR,	COMO
ESPECIALISTA	EM	EDUCAÇÃO,	NA	AMÉRICA	LATINA
Mary	Rangel
8.	JOSÉ	–	DE	DIA	ALUNO	DA	ESCOLA,	DE	NOITE	MENINO	DE	RUA
Regina	Leite	Garcia
NOTAS
SOBRE	OS	AUTORES
OUTROS	LIVROS	DOS	AUTORES
REDES	SOCIAIS
CRÉDITOS
APRESENTAÇÃO
Nove	olhares	sobre	a	supervisão	reúne	textos	que	oferecem	subsídios	às
reflexões,	no	interesse	de	que	se	possam	compreender,	mais	amplamente,	a
escola,	o	“especialista”	e	a	ação	supervisora.
Antonia	da	Silva	Medina	(PUC/RS),	Edil	V.	de	Paiva	(Uerj),	e	Léa	Pinheiro
Paixão	(UFF),	Celestino	Alves	da	Silva	Júnior	(Unesp),	Célia	Frazão	Linhares
(UFF),	Marileusa	Moreira	Fernandes	(Supervisora	da	rede	pública	estadual	de
São	Paulo),	Marilu	Fontoura	de	Medeiros	(PUC/RS	e	UFRGS),	Mary	Rangel
(UFF	e	Uerj)	e	Regina	Leite	Garcia	(UFF)	aproximam-se,	por	caminhos
diversos,	do	espaço	escolar	e	chegam	à	supervisão	por	óticas,	fundamentos,
paradigmas	que	instigam	a	ir	“mais	a	fundo”	no	seu	entendimento.
Assim,	Medina	prevê	a	“reinauguração	da	ação	supervisora”,	propondo	o
supervisor	escolar	como	parceiro	político-pedagógico	do	professor.	Paiva	e
Paixão,	em	O	Pabaee	e	a	supervisão	escolar,	discutem	a	influência	do	Programa
de	Assistência	Brasileiro-Americana	ao	ensino	elementar	na	institucionalização
da	ação	supervisora	no	ensino	primário	brasileiro.	Silva	Júnior	focaliza	a
Organização	do	trabalho	na	escola	pública:	O	pedagógico	e	o	administrativo	na
ação	supervisora,	numa	análise	crítica,	histórica,	política,	que	se	conclui	pelo
exame	da	concepção	e	da	construção	da	cidadania	e	da	democracia.	Linhares
aprofunda	questões	que	revelam	que	os	caminhos	emancipatórios	da	supervisão
estão	entrelaçados	com	a	afirmação	de	sujeitos	da	instituição	escolar	que
precisam	ser	nutridos	pela	apropriação	da	memória	e	pelo	exercício	da	narração.
Fernandes	busca	na	sua	prática	os	dados	que	submete	ao	tratamento	crítico,
sintetizando-os	no	texto	A	opção	da	supervisão	diante	da	ambivalência.
Medeiros	recorre	a	pensadores	como	Habermas	e	Castoriadis	para	refletir	sobre
o	Paradigma	de	avaliação	emancipatória	e	a	ação	supervisora:	Cidadania	e
espaço	público.	Rangel	traz	Considerações	sobre	o	papel	do	supervisor,	como
especialista	em	educação,	na	América	Latina,	discutindo	conceitos,
questionamentos	e	contribuições	da	pesquisa,	com	atenção	ao	estudo	da
representação	social.	Garcia	toca,	com	sensibilidade,	a	vida	na	supervisão	e	na
orientação	educacional,	através	de	José	–	De	dia	aluno	da	escola,	de	noite
menino	de	rua.
Esses	“olhares”,	portanto,	fazem-se	à	luz	de	referentes	capazes	de	estendê-los,
levando-os	além	dos	limites	das	especificidades	da	“função”	supervisora,	para
que	se	possam	alcançar	seus	entornos	e	suas	implicações.
No	conjunto	desses	aportes	confirma-se	o	princípio	de	que	não	se	pode	“olhar”	a
supervisão	sem	olhar	a	sociedade	e	seus	reflexos	na	formação	em	conformação
da	escola,	dos	professores,	dos	“especialistas”.	Acentua-se,	finalmente,	a
necessidade	de	bases	teóricas	indispensáveis	a	que	os	“olhares”	sobre	a
supervisão	não	se	detenham	na	sua	superfície,	mas	alcancem	camadas	mais
profundas,	onde	se	encontram	raízes	de	questões	que	envolvem	o	trabalho
educativo,	seus	serviços	e	compromissos.
Celestino	Alves	da	Silva	Junior
Mary	Rangel
1
SUPERVISOR	ESCOLAR:	PARCEIRO	POLÍTICO-
PEDAGÓGICO	DO	PROFESSOR
Antonia	da	Silva	Medina
Este	texto	resulta	de	minha	tese	de	doutorado.[1]	O	trabalho	foi	desenvolvido
com	um	grupo	de	supervisoras	que	comigo	se	dispuseram	a	participar	da
“reinauguração”	da	ação	supervisora	no	interior	da	escola,	visando	a	ensino	e
educação	de	qualidade.
Reinaugurar	a	ação	supervisora	na	escola	e	nos	sistemas	de	ensino	significou
para	nós	fazer	uma	viagem	de	retorno	às	ações	próprias	do	supervisor	no
exercício	do	trabalho	já	realizado,	do	que	vem	realizando	e	do	que	poderá	vir	a
realizar.
A	revisão	dessa	ação	consistiu	num	processo	de	desestruturação	da	atividade
supervisora,	na	medida	em	que	posições	tradicionais	foram	sendo	questionadas	e
em	seu	lugar	outras	foram	surgindo.	Com	este	compromisso	e	tendo	como	utopia
a	mudança	social	e	educacional,	fiz	uma	opção	de	pesquisa	e	tomei-me	de
coragem,	trilhando	os	caminhos	da	pesquisação.
Num	movimento	de	ação/reflexão,	reflexão/ação	o	trabalho	foi	avançando	e
deixando	marcas	distintas	que	identifico,	neste	capítulo,	como:	o	caminho	inicial
do	grupo	de	pesquisa,	no	qual	registro	o	que	vinha	ocorrendo	em	matéria	de
supervisão	nas	escolas	pesquisadas,	o	deslocamento	do	eixo	das	verdades	à	luz
de	alguns	princípios	teóricos	e	as	sínteses	a	respeito	do	espaço	e	do	objeto	de
trabalho	do	supervisor	no	interior	da	escola.	Encerro	o	texto	com	algumas
provocações	para	reflexões,	discussões	e	debates	a	respeito	da	ação	supervisora.
Caminhada	inicial	do	grupo	de	pesquisa
Com	o	grupo	de	supervisoras/pesquisadoras	que	se	autointitularam
colaboradoras,	a	pesquisa	começou	a	ser	elaborada	com	base	nas	concepções
apontadas	pela	literatura,	ao	longo	da	história	já	contada	da	supervisão	escolar,
nas	minhas	experiências	de	estudos	e	trabalho.	Foram	utilizados	procedimentos
científicos	associados	a	diversas	maneiras	de	ação	coletiva,	objetivando
responder	às	seguintes	questões:
a)	existe	um	espaço	possível	de	ser	ocupado	pelo	supervisor	no	interior	da
escola,	relacionado	com	seu	real	objeto	de	trabalho?
b)	o	trabalho	do	supervisor	na	escola	está	contribuindo	para	o	trabalho	do
professor	na	sala	de	aula?
c)	é	possível	rever	a	natureza	do	poder	e	do	controle	na	escola?
d)	qual	é,	afinal,	o	objeto	de	trabalho	do	supervisor	na	escola?
As	respostas	a	essas	questões	foram	desdobradas	em	inúmeros	questionamentos,
confrontando	situações	localizadas	na	literatura	com	as	situações	vividas	no
cotidiano	do	trabalho.	Num	movimento	no	qual	teoria	e	prática	se	interligavam
na	busca	da	construção	de	uma	nova	prática	e	de	referências	para	a	construção
de	uma	nova	teoria,	a	pesquisa	foi	se	desenvolvendo	em	forma	de	espiral,	na
qual	o	confronto	entre	ideias,	as	indagações,	as	formulações	de	perguntas	e	os
encaminhamentos	de	respostas	encadeavam	e	ampliavam	horizontes	de
compreensões,	alimentando	perspectivas	e	aprofundando	ou	rejeitando
concepções.
Assim,	quando	iniciamos	a	pesquisa,	o	grupo	de	supervisoras	estava	convicto	de
que	a	atuaçãodos	supervisores,	no	interior	das	escolas,	era	uma	necessidade
indiscutível,	atrelada	à	forma	de	administrar	imprimida	pelo	diretor	da	escola.
Primeiramente,	disseram	que	o	supervisor	é	o	profissional	que	sustenta	a
proposta	pedagógica	da	escola	através	da	ação	de	orientar,	acompanhar,
controlar	e	avaliar	o	trabalho	dos	professores.
Entendiam	essa	atuação	ocorrendo	ora	com	e	ora	sem	a	participação	dos
professores	regentes	de	classe.	As	colaboradoras	definiram	a	atuação	com	os
professores	regentes	como	atividades	de	grupo	(reuniões)	ou	individuais	(visitas
de	observação	em	sala	da	aula	e	entrevistas	com	professores	das	escolas).
Declararam	que	a	ação	do	supervisor	visa	o	professor;	por	isso,	pode-se	dizer
que	se	desenvolve	de	maneira	direta	quando	há	a	presença	física	do	professor,	e
indireta	quando	não	há	essa	presença.	As	ações	diretas	concretizam-se	em
reuniões,	visitas	e	entrevistas.	As	ações	indiretas	incluem	as	seguintes
atividades:
•	elaborar	o	plano	do	setor	de	supervisão,	a	documentação	do	setor	(regimento,
leis,	pareceres,	regulamentos,	normas	e	instruções),	cronograma	de	atividades
para	a	escola,	instrumentos	para	observar	as	salas	de	aula,	as	pautas	das
reuniões;
•	controlar	o	cumprimento	da	carga	horária	dos	professores	e	as	aulas	dadas	e
previstas	na	grade	curricular;
•	realizar	levantamentos	estatísticos	de	rendimento	dos	alunos;
•	organizar	o	mural	da	escola;
•	realizar	trabalho	de	reforço	para	ser	aplicado	aos	alunos;	
•	organizar	turnos	de	trabalho	e	horários	para	os	professores;
•	revisar	notas,	conceitos	e	pareceres	descritivos	do	desempenho	dos	alunos;
•	controlar	o	preenchimento	do	diário	de	classe	(livro	de	chamada)	dos
professores;
•	providenciar	substituição	de	professores	regentes	de	classe,	nos	casos	de
absenteísmo;
•	confeccionar	material	didático	para	os	professores	regentes;	elaborar	a
correspondência	da	escola;
•	examinar	e	distribuir	a	correspondência	que	chega	à	escola.
As	colaboradoras	apontaram	essas	atividades	diretas	ou	indiretas	como	as	mais
comuns	no	elenco	das	atribuições	assumidas	pelo	supervisor	na	escola.
Lembraram	que	as	atividades	indiretas	dizem	respeito	à	atuação	dos	professores
regentes	e	poderão	ser	transformadas	em	assuntos	para	serem	tratados
diretamente	com	os	professores	em	reuniões,	visitas	ou	entrevistas.
As	colaboradoras	classificaram	as	reuniões	gerais	da	escola	em	pedagógicas	e
administrativas.	Chamaram	de	pedagógicas	as	reuniões	coordenadas	pelo
próprio	supervisor	e	classificaram-nas	como	reuniões:
•	gerais	de	planejamento	curricular	com	todo	o	grupo	de	professores	regentes	de
classe;
•	com	os	professores	de	classes	paralelas;
•	com	os	professores	de	uma	mesma	disciplina;
•	com	os	professores	que	atuam	numa	mesma	série;
•	com	os	professores	para	relato	de	determinadas	experiências;
•	reuniões	de	estudos;
•	de	avaliação	(conselhos	de	classe).
Foram	chamadas	de	reuniões	administrativas	as	coordenadas	pelo	diretor	da
escola	identificadas	como	reuniões	gerais	da	escola;	reuniões	com	a	equipe
diretiva	(diretor	e	vice-diretor,	supervisor,	orientador	e	secretário);	reuniões	com
os	diferentes	setores	que	atuam	na	escola	(biblioteca,	promoções	culturais,
nutrição,	banco	do	livro,	serviços	gerais,	círculo	de	pais	e	mestres,	clube	de
mães);	reuniões	com	o	Conselho	Administrativo	e	Pedagógico	da	escola	(CAP).
[2]
As	colaboradoras	revelaram,	em	segundo	lugar,	que	sua	atuação	não	se	dá
somente	com	os	professores	regentes	de	classe.	Disseram	que	trabalham	com	a
direção	da	escola,	participando	de:
•	atividades	de	elaboração	do	plano	global	da	escola;	
•	organização	do	quadro	de	pessoal;
•	planejamento	do	calendário	escolar;
•	distribuição	dos	professores,	conforme	turmas	ou	classes;
•	planejamento	dos	eventos	culturais	e	recreativos	da	escola;	planejamento	das
atividades	extraclasse	(passeios,	visitas,	exposições);
•	planejamento	das	reuniões	administrativas;
•	tomada	de	decisões	a	respeito	das	questões	tanto	administrativas	quanto
pedagógicas;
•	tomada	de	decisões	para	atender	às	solicitações	dos	professores	da	escola	ou	da
própria	RME.
As	colaboradoras	afirmaram,	também,	que	suas	presenças	às	reuniões	são
frequentes	e,	ainda,	que	atendem	os	pais	dos	alunos	quando	o	assunto	diz
respeito	ao	desempenho	do	professor	e	aos	alunos	com	problemas	disciplinares
enviados	pelos	professores	à	secretaria	da	escola.
As	colaboradoras	declararam,	ainda,	que	apoiam	e	assessoram	o
desenvolvimento	da	programação	dos	demais	setores	da	escola	e	ajudam	a
organizar	atividades	que	oportunizem	maior	integração	entre	os	elementos	da
comunidade	escolar	como,	por	exemplo,	as	promoções	do	Círculo	de	Pais	e
Mestres.
Convictas	de	terem	revelado	as	ações	reais	dos	supervisores	que	atuam	na	RME
as	colaboradoras	assinalaram	que	a	sustentação	para	realizar	o	que	lhes	é
atribuído	resulta	das	condições	pessoais	e	técnicas	de	cada	supervisor.
As	condições	pessoais	dizem	respeito	à	capacidade	de	adaptação	ao	trabalho	nas
escolas	da	RME,	e	ao	desejo	de	cooperar	para	que	a	escola	atinja	os	objetivos
previstos	no	seu	Plano	Global,	tais	como:
•	ter	entusiasmo	pelo	trabalho	da	escola;	ser	otimista	com	relação	à	possibilidade
de	atendimento	às	necessidades	da	escola;
•	gostar	de	conviver	com	os	professores	e	os	demais	elementos	da	comunidade
escolar;
•	ter	a	capacidade	de	compreender	as	pessoas	com	as	quais	trabalha;	ter
iniciativa	e	liderança;
•	saber	se	colocar	no	lugar	do	professor;
•	ser	uma	pessoa	com	capacidade	de	autocontrole;
•	ser	discreta,	ponderada,	modesta;
•	estar	disponível	para	o	professor	ou	outra	pessoa	da	escola;
•	saber	ouvir	o	que	o	professor	deseja	comunicar,	ser	assídua,	pontual	e	inspirar
confiança.
As	condições	técnicas	abrangem	a	formação	acadêmica	relacionada	ao
conhecimento:	das	questões	do	ensino	e	da	educação;	das	questões	políticas	que
“enlaçam”	as	instituições	escolares;	das	metodologias	que	podem	ser	utilizadas
pelos	professores	regentes	de	classe.	Abrangem,	também,	o	esforço	que	o
supervisor	despende	para	se	manter	atualizado:
•	o	modo	como	lidera	os	professores;
•	a	forma	como	utiliza	o	controle	do	trabalho	escolar;
•	a	forma	de	poder	e	autoridade	exercidos	sobre	os	professores	e	os	demais
setores	da	escola;
•	o	modo	como	se	comunica.
Acreditando	que	os	supervisores	da	RME	empenham-se	na	busca	constante	de
tais	qualidades,	as	colaboradoras	declararam	que	os	diretores	tratam	os
supervisores	de	forma	diversificada,	como	se	explica	a	seguir.
Há	diretores	que	agem	de	forma	democrática.	Permitem	aos	supervisores	atuar
de	“igual	para	igual”	na	equipe	administrativa.	Com	esses	diretores,	os
supervisores	podem	opinar,	dialogar	e	ter	certeza	de	que	estão	sendo	aceitos
como	sujeitos	que	têm	contribuição	positiva	para	dar	à	escola.	Diante	dos
professores,	esses	diretores	tratam	o	supervisor	com	respeito,	elevando	ou
tecendo	críticas	construtivas	ao	trabalho	que	o	supervisor	realiza	na	escola.
Há	diretores	que	conversam	harmoniosamente	com	os	supervisores,	delegando
as	funções	que	lhes	são	próprias	e	não	fazem	intervenções	do	tipo	ditatorial	ao
seu	trabalho.	Sempre	que	precisam	de	ajuda	para	resolver	qualquer	problema	ou
tomar	alguma	decisão,	procuram	o	supervisor.
Há	diretores	que	não	permitem	que	seja	criado	espaço	para	o	supervisor
trabalhar.	Discutem	de	forma	arrogante	com	os	supervisores;	tecem	críticas
destrutivas	a	respeito	do	trabalho	do	supervisor	para	os	professores	regentes	de
classe;	desautorizam	o	supervisor	diante	dos	professores;	determinam	o	que	e
como	o	supervisor	deve	atuar	na	escola;	estabelecem	uma	relação	de	competição
com	o	supervisor.
As	colaboradoras	iniciaram	sua	participação	no	grupo	de	pesquisa	afirmando	que
a	aceitação	do	trabalho	do	supervisor	pelos	professores	era	desencadeada	pela
forma	como	o	diretor	o	tratava	e	via	seu	trabalho.	Disseram	que,	na	escola	onde
o	diretor	tratava	bem	o	supervisor,	os	professores	respeitavam	seu	trabalho	e
acreditavam	nele.	Nessas	escolas	os	professores	procuravam	os	supervisores,
pediam	sugestões	e	mantinham	uma	relação	de	amizade	e	de	trabalho.Porém,
nas	escolas	onde	os	diretores	não	aceitavam	o	trabalho	do	supervisor,	os
professores	mostravam-se	hostis	à	sua	atuação,	rejeitando	qualquer	iniciativa
sua.
As	posições	de	aceitação,	não	aceitação,	hostilidade	ou	indiferença	por	parte	do
diretor,	assumidas	diariamente	em	cada	escola,	fortaleciam	os	pronunciamentos
feitos	nas	reuniões	com	as	colaboradoras	a	respeito	da	convicção	de	que	o
trabalho	do	supervisor	está	na	dependência	de	o	diretor	concordar	que	este	atue
nas	escolas.
Juntava-se	à	ideia	da	necessidade	de	aceitação	do	diretor	a	certeza	de	que	as
atividades	do	setor	de	supervisão	se	caracterizam	como	atividades	grupais
integradas	com	os	demais	setores	da	escola,	sobretudo	com	o	setor	de	orientação
educacional.	As	colaboradoras	declaravam	como	absoluta	a	ideia	de	que	o
supervisor	atende	o	professor	e	o	orientador	atende	o	aluno,	mas	ambos	precisam
estar	integrados,	pois	a	razão	de	o	professor	estar	na	escola	é	o	aluno	e,	portanto,
os	“problemas	de	desempenho	do	professor	recaem	sempre	no	aluno”.
Com	essas	certezas,	portanto,	as	colaboradoras	marcaram	o	que	foi	denominado
de	primeiro	momento	das	discussões	de	grupo.
Deslocando	o	eixo	das	verdades
À	medida	que	essas	certezas	foram	tendo	como	eco	questionamentos	com
tentativas	de	respostas,	sérias	questões	foram	surgindo	e	deslocando	o	eixo	das
verdades:	Por	que	nas	nossas	falas	e	na	literatura	surgem	com	frequência	as
expressões	normativas	do	tipo	“dever	ser”,	“tem	que	ser”	ou	“é”?	Por	que
atribuímos	ao	diretor	a	capacidade	de	fazer	o	supervisor	avançar	ou	regredir	na
sua	atuação?	Por	que	proclamamos	a	supervisão	como	sendo	um	trabalho
eminentemente	de	grupo?
Quando	as	colaboradoras	iniciaram	o	movimento	de	expressar	verbalmente
respostas	a	essas	questões,	perceberam	que	o	eixo,	até	então	considerado	firme
pelas	suas	verdades,	começava	a	sofrer	desequilíbrio,	indicando	a	necessidade	de
um	tipo	de	movimento	reflexivo	diferente	do	anterior	e	que	levasse	a
desequilibrar	num	processo	continuado	de	equilibração.	À	medida	que	essa
constatação	foi	se	tornando	evidente,	o	grupo	passou	a	revelar	resistência	através
das	seguintes	reações:
•	irritação	com	o	local	inadequado	para	as	reuniões;
•	demonstração	de	que	estavam	sofrendo	tensão	provocada	pelos	seus	próprios
pensamentos	a	respeito	de	sua	atuação	como	supervisor;
•	insatisfação	com	a	atuação	do	diretor	da	escola;
•	insatisfação	com	o	desempenho	dos	professores	e	o	tratamento	que	muitos
deles	dispensavam	ao	supervisor;
•	insatisfação	com	outros	profissionais	da	escola	a	respeito	do	tratamento	dado	à
atuação	dos	supervisores;
•	insatisfação	com	o	próprio	andamento	da	pesquisa	e	seus	possíveis	resultados;
•	demonstração	de	comportamentos	dispersivos	nas	reuniões;
•	repetições	de	assuntos,	parecendo	não	haver	avanços	nas	reflexões;
•	citação	de	problemas	observados	no	cotidiano	da	escola	e	que	possibilitassem
reforçar	suas	“certezas”;
•	insistência	em	relacionar	a	resolução	dos	problemas	vividos	na	sua	escola	com
as	percepções	colhidas	nas	escolas	onde	seus	filhos	estudavam;
•	insistência	em	transformar	as	reuniões	do	grupo	de	pesquisa	em	momentos	de
discussão	de	assuntos	de	ordem	familiar	ou	social.
Na	luta	travada	entre	as	certezas	de	querer	descobrir	o	novo	e	o	medo	de	perder
as	referências	tradicionais,	as	indagações	começaram	a	projetar	dúvidas,
perguntas,	esclarecimentos	e	respostas	nem	sempre	desejados	e	esperados.
Lembraram	que	não	interessava	discutir	no	grupo	se	a	supervisão	era	ou	não
necessária	nas	escolas	da	RME.	Importava,	sim,	saber	o	que	seria	útil	ou
prejudicial,	o	que	seria	conveniente	ou	inconveniente,	o	que	seria	contrário	ou
não	à	atuação	dos	supervisores	na	referida	rede.
Assim,	as	colaboradoras	insistiram	em	declarar	que	o	espaço	de	atuação	do
supervisor	na	escola	era	bloqueado	pelo	diretor.	Essa	discussão	revelou	que	o
espaço	de	atuação	do	supervisor	não	consistia,	simplesmente,	na	criação	de	um
ambiente	físico	e	sim	na	forma	de	ir	e	vir	do	supervisor,	no	movimento	que	ele
faz,	com	quem	faz,	como	o	faz	e	para	quem	o	faz	na	escola.
No	confronto	entre	as	ideias	que	emergiram	da	discussão	a	respeito	do	espaço
surgiram	afirmativas	como:
•	o	supervisor	está	na	escola	para	atender	o	aluno;
•	o	supervisor	está	sempre	ao	lado	do	professor;
•	o	supervisor	conquista	o	professor;
•	o	supervisor	atende	ao	pedagógico	da	escola;
•	o	supervisor	é	o	sujeito	que	faz	a	leitura	da	escola	na	sua	totalidade;
•	o	supervisor	cria	necessidades	para	o	professor;
•	o	supervisor	tem	seu	papel	na	escola.
Surgiu,	igualmente,	o	tema	a	respeito	do	setor	de	supervisão	da	escola,	com	os
seguintes	desdobramentos:	a	supervisão	é	trabalho	de	grupo;	existe	um	buraco
que	separa	o	setor	de	supervisão	da	ação	dos	professores.
À	medida	que	esses	temas	foram	tramando	as	discussões	no	grupo	de
colaboradoras,	surgiu	uma	questão	nova	para	algumas	e	antiga	para	outras:	Que
trabalho	faz	o	supervisor?
Para	responder	a	essa	indagação,	as	“verdades”	referidas	no	primeiro	momento
foram	trazidas	novamente	para	discussão	e	apareceram	questões	novas	a	respeito
da	atuação	do	supervisor	como,	por	exemplo,	a	questão	do	trabalho.	As
colaboradoras	declararam	que	essa	questão	nunca	fora	discutida	pelos
supervisores;	esclareceram	que	a	palavra	trabalho	era	usada	como	um
substantivo	qualquer,	para	indicar	o	fazer	diário	do	supervisor;	lembraram	que	já
haviam	discutido	muito	a	respeito	da	didática,	da	pedagogia,	das	relações	entre
as	pessoas,	dos	modelos	de	supervisão,	mas	nunca	sobre	trabalho	e	como	esta
questão	é	analisada	e	compreendida	pelos	componentes	da	comunidade	escolar
na	qual	se	incluíam.
Na	discussão	a	respeito	do	tema	“trabalho”	emergiu	outra	questão:	Qual	é	o
objeto	de	trabalho	do	supervisor?	Referindo-se	às	antigas	certezas,	as
colaboradoras	determinaram	que	o	objeto	de	trabalho	do	supervisor	é	o	aluno.
Esta	questão	foi	polêmica	e	suscitou	discussões	com	argumentos	que
confirmaram	o	aluno	como	objeto	de	trabalho	do	supervisor.	Mesmo	assim,	a
discussão	tomou	várias	reuniões	e	por	intermédio	de	gráficos,	pensamentos
escritos	ou	em	conversas	com	outros	supervisores,	experiências	e	vivências
reforçaram	a	resposta	correta	a	respeito	do	objeto	de	trabalho	do	supervisor:	é	o
aluno.	Desta	forma,	a	discussão	recaiu	naturalmente	sobre	o	objeto	de	trabalho
dos	setores	da	escola,	numa	lógica	de	raciocínio	cujo	axioma	fundamental	era	de
que	a	escola	está	na	comunidade	para	atender	o	aluno.	Aplicaram	esta	linha	de
raciocínio	para	todos	os	setores,	obtendo	sempre	a	mesma	resposta:	aluno.
Assim,	quando	as	respostas	levaram	à	identificação	do	mesmo	objeto	de	trabalho
para	todos	os	setores,	o	grupo	começou	a	duvidar	de	suas	“verdades	absolutas”	a
respeito	de	seu	objeto	de	trabalho.
No	entrecruzar	das	dúvidas,	apareceram	respostas	tidas	ora	como	certas,	ora
como	incertas,	instaurando	conflitos	e	provocando	impasses.	Nesse	momento	de
perplexidade,	uma	colaboradora	declarou	que	não	havia	respostas	e	que	o	objeto
de	trabalho	não	existia,	por	isso,	ele	nunca	fora	tratado	na	RME.	Essa	resposta
desencadeou,	novamente,	o	movimento	de	discussão	no	qual	todas	as
colaboradoras	se	declararam	aptas	para	encontrar	situações	cuja	análise
encaminhasse	possíveis	respostas.	No	vaivém	das	discussões	surgiu	a	expressão
“objeto	é	o	que	não	é	sujeito”.	Com	base	nessa	premissa	e	contrariando	o	axioma
anterior,	o	grupo	concluiu	que	o	aluno	não	constitui	objeto	de	trabalho	de
nenhum	setor	da	escola.	Na	escola,	o	objeto	de	trabalho	para	qualquer	setor	é	o
resultado	de	uma	ação	possível	de	ser	quantificada.
Esta	constatação	veio	acompanhada	de	um	movimento	mais	descontraído,	no
qual	as	colaboradoras	tentavam	especificar	os	meios	possíveis	de	se	identificar	o
objeto	de	trabalho	do	supervisor	no	interior	da	escola.	Nessa	busca	de
especificação,	outros	temas	foram	emergindo:
•	produção;
•	produto;
•	trabalho	assalariado;
•	quem	é	trabalhador;
•	o	professor	é	ou	não	é	um	trabalhador;
•	a	escola	é	ou	não	é	igual	a	uma	fábrica;
•	o	que	se	faz	em	uma	fábrica	e	o	que	se	faz	na	escola;
•	o	significado	do	termo	“objeto”para	o	supervisor.
Tais	temas	passaram	a	compor	as	discussões	que	encaminharam	questões,
possibilitando	aproximações	mais	nítidas	a	respeito	do	objeto	de	trabalho	do
supervisor.
No	confronto	de	perguntas,	respostas	e	indagações	e	por	intermédio	da	reflexão,
as	colaboradoras	demonstraram	que	seu	objeto	de	trabalho	não	era	o	aluno	e	que,
até	aquele	momento,	o	objeto	de	trabalho,	identificado	pelos	agentes
educacionais	como	sendo	a	pessoa	do	aluno,	vinha	sendo	confundido	com	a
finalidade	da	escola	como	segmento	da	sociedade	organizada.
Apontaram,	então,	como	objeto	de	trabalho	do	supervisor,	o	resultado	da	relação
que	ocorre	entre	o	professor	que	ensina-e-aprende	e	o	aluno	que	aprende-e-
ensina.	Disseram	que	esse	resultado	se	apresenta	sob	a	forma	de	uma	produção
gerada	no	seio	da	relação	professor/aluno,	possível	de	ser	quantificada,
conhecida	como	aprendizagem	(conteúdos	e	situações	que	passam	a	fazer	parte
do	conhecimento	que	o	aluno	ou	alunos	sistematizam	na	sala	de	aula,	em	face	da
qualidade	do	desempenho	do	professor	regente	de	classe).
As	colaboradoras	transformaram	sua	posição	a	respeito	do	objeto	de	trabalho	do
supervisor,	passando	de	uma	verdade	absoluta	a	outra	verdade,	também	absoluta.
Declararam-se	convictas	de	que	o	objeto	de	trabalho	do	supervisor	é	a	síntese	da
relação	professor/aluno,	expressa	sob	a	forma	de	relações	e	conteúdos
ministrados	pelo	professor	e	adquiridos	pelos	alunos.	O	resultado	dessa	relação
foi	denominado	produção,	entendendo-se	que	essa	produção	do	professor	com	os
alunos	constitui	objeto	específico	de	trabalho	do	supervisor	escolar.	Com	essa
convicção,	desapareceu,	temporariamente,	a	questão	do	“buraco”	existente	entre
supervisor	e	professores.	E	o	espaço	de	trabalho	transformou-se	no	jeito	concreto
de	como	o	supervisor	costuma	mover-se,	agindo	e	refletindo	a	respeito	de	seu
dia	a	dia,	tendo	na	visão	total	da	escola	a	especificidade	do	trabalho	que	o
professor	realiza	com	seus	alunos.
A	partir	desse	momento,	a	pesquisadora	e	as	colaboradoras	passaram	a	levar	para
as	escolas	essas	ideias,	iniciando	um	processo	diferente	de	reflexão	e
abandonando,	aos	poucos,	a	ação	supervisora	até	então	defendida,	denominada
“tradicional”.	A	tentativa	de	renovar	a	ação	supervisora	começou	a	ser
questionada	pelos	diretores	e	demais	supervisores	das	escolas,	levando	algumas
colaboradoras	a	duvidar	de	sua	capacidade	de	enfrentar	o	novo	desafio.
Prepararam-se	para	enfrentar	esse	desafio	na	escola	por	meio	da	discussão	sobre
temas	tais	como:
•	De	que	tratam	a	pedagogia	e	a	didática	conforme	proposta	da	rede?
•	É	possível	andar	na	contramão	da	supervisão	tradicional?
•	É	possível	manter	ou	mudar	a	supervisão	na	RME,	cuja	tradição	é	reconhecida
pelos	professores	e	proclamada:	“Sempre	foi	assim”?
•	É	possível	olhar	as	escolas	considerando	suas	dificuldades?
•	O	trabalho	nas	escolas	sofre	com	a	divisão	em	setores?
•	Cada	setor	analisa	a	escola	unicamente	com	base	em	sua	própria	percepção
(lados	da	escola)?
•	As	pessoas	que	atuam	nas	escolas	são	trabalhadores	ou	pessoas	voltadas	para	a
ação	de	filantropia?
•	O	que	se	entende	por	saber	e	conhecimento?
•	O	desejo	é	necessário	ao	trabalhador	em	geral	e	em	especial	aos	professores?
•	A	integração	das	atividades	dos	demais	setores	da	escola	é	ou	não	é	uma
questão	que	importa	para	a	atuação	dos	supervisores?
•	O	supervisor	desempenha	seu	trabalho	democraticamente,	ou	demonstra
ausência	de	autoridade?
•	Por	que	o	supervisor	faz	e	como	faz	seu	trabalho?
•	O	que	o	supervisor	observa,	o	que	ouve	e	o	que	pensa	a	respeito	de	sua	ação	na
escola?
Declararam,	as	colaboradoras,	que,	nessa	maneira	de	ação	supervisora	que
estavam	tentando	implementar	na	escola,	o	supervisor	não	é	mais	aquele	sujeito
que	possui	um	“superpoder”	de	assessorar,	acompanhar,	controlar	e	avaliar	o
trabalho	que	os	professores	realizam	nas	escolas,	mas	aquele	que	constrói	com
os	professores	seu	trabalho	diário.	Lembraram	que	essa	construção	se	faz	a	partir
do	“desmascaramento	das	realidades	existentes	na	escola”.
Trouxeram,	ainda,	para	as	discussões,	uma	forma	de	supervisão	na	qual	o
supervisor	aparece	como	elemento	integrante	e	integrador	do	trabalho	que	os
professores	regentes	de	classe	realizam	na	escola.	Como	integrante	e	integrador
do	trabalho	do	grupo,	o	supervisor	procura	manter	um	nível	significativo	de
dinâmica	no	trabalho	da	escola	como	instituição	formal.	Visualiza,	reflete	e	age
na	e	com	a	totalidade	da	produção	dos	professores	regentes,	em	geral,	e,	em
particular,	com	cada	professor	conforme	sua	classe	de	alunos.
O	papel	do	supervisor	passa,	então,	a	ser	redefinido	com	base	em	seu	objeto	de
trabalho,	e	o	resultado	da	relação	que	ocorre	entre	o	professor	que	ensina	e	o
aluno	que	aprende	passa	a	constituir	o	núcleo	do	trabalho	do	supervisor	na
escola.	A	forma	fácil	ou	difícil	usada	pelo	professor	para	que	o	aluno	aprenda
será,	portanto,	o	foco	da	pesquisa,	do	estudo	e	da	reflexão	por	onde	flui	o
trabalho	do	supervisor.	O	supervisor,	fazendo	uso	da	observação	participante,
poderá	encontrar,	no	diálogo	com	os	professores,	formas	próprias	de	intervir	na
qualidade	do	trabalho	que	os	regentes	realizam	na	sala	de	aula	com	seus	alunos,
negando,	assim,	o	“receituário	das	transcrições	diretas	e	indiretas”,	tão
fortemente	difundido	nas	discussões	iniciais	do	grupo	de	colaboradoras.
Para	que	tal	intervenção	aconteça,	as	colaboradoras	apontaram	para	a
necessidade	de	os	supervisores	buscarem,	constantemente,	saberes	e
conhecimentos	concernentes	às	várias	formas	de	construir	metodologias.	Essas
metodologias	devem	facilitar	o	ato	de	ensinar	e	de	aprender,	considerando	a
realidade	da	vida	e	das	experiências	dos	alunos	da	RME,	embora	ainda	não
tenham	estabelecido	plano	próprio	para	tais	metodologias.	Ao	contrário,	operam
com	uma	rotina	de	trabalho	que	é	planejada	no	dia	a	dia	com	os	alunos,	levando
em	conta	os	recuos	e	os	avanços	de	ambos	e	do	próprio	supervisor,	que	passa	a
participar	da	construção	do	processo	de	ensinar	e	aprender,	deixando	de	ser	o
reprodutor	de	um	saber	adquirido	fora	da	realidade	dos	alunos	da	RME.
As	colaboradoras	estabeleceram,	também,	que	o	trabalho	do	supervisor
independe	do	aceite	ou	não	do	diretor	da	escola.	No	âmago	do	trabalho	de	quem
ensina	e	aprende,	existe	uma	necessidade	que	intitularam	“par	de	olhos”	para
focalizar	o	trabalho	do	professor,	no	ato	de	discutir	e	refletir	sobre	sua	qualidade.
Disseram	que	essa	avaliação	gira	em	torno	não	só	da	realidade,	mas
principalmente	das	situações	ainda	não	descobertas	ou	não	percebidas	pelo
professor	e	que	se	fazem	presentes	na	produção	gerada	na	relação	do	professor
que	ensina-e-aprende	com	o	aluno	que	aprende-e-ensina.	Lembraram	que	essas
situações	(observando-se	lacunas)	são	identificadas	pela	ação	de	pesquisar	o
cotidiano	dos	alunos	da	escola,	suas	experiências,	o	que	esperam	da	escola	e	em
que	condições	a	escola	pode	contribuir,	didaticamente,	para	sistematizar	seus
saberes	e	introduzi-los	nos	princípios	do	conhecimento	científico.
Quanto	às	metodologias	do	ensinar	e	do	aprender,	são	construí-das	à	medida	que
se	dá	o	confronto	das	forças	que	interagem	na	escola	e	não	construídas	a	priori.
Consideraram	o	confronto	dessas	forças	que	expressam	realidades	diversas,
muitas	vezes	contrárias,	como	sendo	o	“ponto	desencadeador”	do	processo	de
ensinar	e	aprender,	pois	partindo	desse	ponto	desencadeador,	a	socialização	do
ensinar	e	do	aprender	acontece	e	a	qualidade	dessa	socialização	é	acompanhada,
refletida	e	estudada	pelo	supervisor	e	discutida	com	o	professor	ou	os
professores	regentes	de	classe.
Foram	incluídos	nessa	socialização	não	só	os	problemas	específicos	da	didática,
envolvendo	o	ensinar	e	o	aprender,	mas	também	os	temas	que	a	circundam,
como	por	exemplo	a	agressividade,	a	sexualidade,	a	religião,	a	morte,	a	raça	e	o
gênero.	Lembraram	que	esses	temas,	embora	circundantes	da	didática,	atingem	a
essência	do	aprender.
As	colaboradoras	disseram	que	os	professores	regentes	de	classe	estão
envolvidos	com	os	problemas	de	regência,	ligados	à	didática	de	tal	forma	que
não	conseguemperceber	esta	outra	dimensão	do	processo	de	ensinar	e	aprender.
Revelaram	que	na	produção	do	professor	estão	embutidos	os	aspectos	que
circundam	a	didática	e	que	estes	são,	também,	focos	de	observação	do
supervisor.	Lembraram	que	os	dados	colhidos	nessas	observações	constituem
pauta	para	reuniões	com	os	professores,	roteiros	de	entrevista	e	focos	para	as
visitas	de	observação	em	sala	de	aula.
Com	essas	novas	certezas,	as	colaboradoras	apontaram	para	o	que	foi	chamado
segundo	momento	de	discussões	do	grupo.
Sínteses	preliminares
A	passagem	do	segundo	para	o	terceiro	momento	foi	marcada	por	uma	discussão
que	já	tinha	margeado	os	dois	momentos	anteriores	e	dizia	respeito	ao	lugar	ou
espaço	que	ocupa	o	supervisor	no	interior	da	escola.	As	colaboradoras
declararam	que	este	lugar	não	ficava	no	vazio,	“no	ar”:	ele	ficava	dentro	de	uma
instituição,	determinada	por	um	sistema	político	e	administrada	por	uma
entidade	mantenedora,	no	caso,	a	Secretaria	Municipal	de	Educação	de	Porto
Alegre,	administradora	das	32	unidades	escolares	que	faziam	parte	da	pesquisa.
Disseram	que	estas	unidades	não	são	iguais;	todas	são	diferentes.
As	colaboradoras	chegaram	a	esta	conclusão	quando	descobriram,	comparando
sua	escola	com	o	que	era	dito	sobre	as	outras,	que	as	escolas	da	RME	são
diferentes,	têm	peculiaridades	muito	próprias.	Até	então,	as	escolas	sempre
haviam	sido	pensadas	como	homogêneas.	Essa	homogeneidade,	própria	da
estrutura	administrativa	das	escolas	e	da	legislação	que	as	sustenta,	foi
confundida	com	relações,	laços	afetivos,	pactos	e	alianças	que	regiam	cada
unidade	escolar,	em	particular.	Portanto,	descobria-se	que	a	legislação	e	a
administração	dos	recursos	humanos	e	financeiros	eram	os	únicos	aspectos
tratados	com	igualdade	em	todas	as	escolas	da	rede.
Indicaram	que	estas	diferenças	estão	centradas:
•	na	realidade	da	comunidade	onde	a	escola	está	inserida;	na	realidade	vivida	e
experienciada	pelos	professores	regentes	de	classe;
•	na	forma	da	campanha	realizada	para	a	eleição	do	diretor;
•	na	forma	como	os	diferentes	grupos	que	atuam	na	escola	se	autoavaliam	e	se
autocriticam;
•	na	forma	como	as	classes	estão	organizadas	em	sala	de	aula;
•	no	modelo	de	disciplina	que	circula	na	escola;
•	no	tipo	de	expressão	verbal	emitida	nos	corredores,	na	sala	dos	professores	e
no	pátio	da	escola;
•	na	postura	didático-pedagógica	e	administrativa	que	caracteriza	as	vivências
diárias	da	escola	como	um	todo	(desde	a	secretaria,	passando	pelos	setores	até	a
saída	dos	alunos	do	pátio	da	escola	para	suas	casas).
Consideraram,	ainda,	que,	para	tratar	com	todas	essas	diferenças,	o	supervisor
precisa,	além	da	formação	pedagógica,	do	conhecimento	de	outras	áreas
(antropologia,	filosofia,	linguística,	sociologia)	e	do	aprofundamento	de	outros
temas	(agressividade,	sexualidade,	morte,	raça	e	gênero).
As	discussões	a	respeito	dessas	necessidades	apontaram	para	um	“erro”	contido
nas	reflexões	do	segundo	momento,	quando	foi	dito	que	no	interior	da	pedagogia
e	da	didática	apenas	seriam	encontrados	suportes	para	o	trabalho	do	supervisor
em	relação	ao	professor.	O	exercício	da	função	supervisora	que	se	constrói	tendo
por	base	a	produção	do	professor	não	se	sustenta	somente	com	a	didática	e	a
pedagogia,	pois	ele	precisa	de	outras	referências.	Essa	constatação	revelou	ao
grupo	a	fragilidade	de	suas	certezas	e	a	necessidade	de	“estudar”,	de	avançar	no
que	diz	respeito	ao	trabalho	produzido	no	interior	da	escola.
Foi	dito,	também,	que	a	expressão	que	atribui	à	escola	a	função	de	ensinar	e
educar,	por	ter	sido	usada	indevidamente,	perdeu	seu	real	significado.	Essa
descoberta	trouxe	à	discussão	a	comparação	de	que	as	respostas	dadas	às
questões	que	vinham	sendo	levantadas	pelo	grupo	são	necessariamente
provisórias.	No	decorrer	das	discussões,	as	colaboradoras	experienciavam,	de
início,	a	convicção	de	que	as	respostas	encontradas	estavam	certas;	entretanto,
imediatamente	após	a	reflexão	a	respeito	da	ação	diária,	encontravam	outras
referências	que	desequilibravam	tais	certezas,	o	que	levou	o	grupo	à	afirmação
de	que	“não	há	resposta	que	dure	por	muito	tempo”.
Lembrando	o	histórico	do	grupo,	as	colaboradoras	apontaram	para	três	respostas
(a	supervisão	como	vem	sendo	desenvolvida	na	RME	é	necessária;	o	objeto	de
trabalho	do	supervisor	é	o	aluno,	resultante	de	sua	relação	com	o	professor	e
com	os	conteúdos	aprendidos;	o	objeto	de	trabalho	do	supervisor	é	a	produção
do	aluno)	que	haviam	emergido	nas	discussões	como	sendo	as	verdadeiras	até
aquele	momento	e	que	foram	perdendo	esse	sentido	nas	reuniões	a	respeito	do
agir	do	supervisor	na	escola.	Na	constatação	de	que	não	existem	respostas	que
durem	por	muito	tempo,	lembraram	que	isso	ocorre	porque	o	ato	de	observar,
refletir	e	agir	dentro	da	escola	vai	trazendo	fatos	novos	e,	com	estes	fatos,	um
tipo	de	pensamento	que	supera	o	pensamento	anterior.	Essa	reflexão	levou	o
grupo	a	verificar	que	aqueles	professores	que	procuram	respostas	prontas	e
definitivas	para	melhorar	sua	produção	em	sala	de	aula	dificilmente	as
encontrarão	e	o	supervisor	que	procura	na	administração	da	RME	uma	resposta
acabada	para	o	agir	do	supervisor	na	escola	também	terá	dificuldades.
Foi	levantada	a	suposição	de	que	a	ideia	de	provisoriedade	das	respostas	seria	a
responsável	pela	postura	do	supervisor	definida	como	de	“braços	cruzados”.
Diante	da	possibilidade	de	buscar	respostas,	levantar	dúvidas	e	encaminhar
posições	baseadas	na	reflexão	e	no	estudo	do	fazer	diário,	o	supervisor	entrou
num	processo	de	conflito	cuja	saída	se	mostrou	possível	para	alguns	e
impossível	para	outros.	Apontaram	como	base	para	uma	possível	saída	a	criação
de	um	modo	próprio	de	pensar	a	escola	que	levasse	em	consideração	sua
singularidade.	Para	isso,	assinalaram	a	historicidade	do	trabalho	de	supervisão	na
RME,	marcando	uma	espécie	de	reencontro	com	a	história	da	primeira	proposta
de	trabalho	divulgada	nos	anos	60	e	a	proposta	que	estava	sendo	divulgada	no
momento	da	pesquisa.	Nesse	momento,	o	grupo	deparou	com	as	seguintes
questões:
•	Como	trabalhavam	os	supervisores	da	RME	e	como	estão	trabalhando?
•	Que	interpretação	a	escola	e	a	RME	davam	e	atualmente	dão	à	supervisão	e	ao
supervisor?
•	Como	faziam	e	como	fazem	o	trabalho	de	supervisão	na	escola?
•	Que	sustentação	teórica	tinha	e	tem	o	trabalho	de	supervisão,	hoje?
•	Que	pressupostos	políticos,	sociais	e	econômicos	davam	e	dão	sustentação	a
esse	trabalho?
•	Que	ideias	sustentavam	e	sustentam	o	pensamento	a	respeito	das	classes
populares?
Ao	confrontarem	as	propostas,	começaram	a	traçar	uma	espécie	de	paralelo	entre
o	que	chamaram	ação	supervisora	“tradicional”	e	ação	“supervisora	renovada”,
conforme	explicitado	no	quadro	que	segue:
QUADRO	I	–	AÇÃO	SUPERVISORA
TRADICIONAL
Ter	como	objetivo	a	harmonia	do	grupo Explicitar	as	contradições,	trabalhando	o	conflito	com	o	objetivo	de	estabelecer	relações	de	trabalho	no	grupo	da	escola
Buscar	a	igualdade	num	processo	de	mascaramento	da	realidade
Trabalhar	tendo	como	base	seu	próprio	desejo
Ter	a	mesma	leitura	para	todas	as	escolas
Produzir	modelos	de	conhecimento
Enfatizar	procedimentos	linearizados Enfatizar	a	produção	do	professor	no	interior	da	escola,	num	movimento	de	ensinar	e	aprender
Ser	um	facilitador
Ter	o	conhecimento	como	um	dado	absoluto
Ver	na	proposta	pedagógica	mais	uma	forma	de	modismo
Ter	comportamento	de	neutralidade
Trabalhar,	tendo	em	vista	um	tipo	ideal	de	homem
É	preciso	dizer	que	este	quadro	não	é	apresentado	como	um	modelo	de
supervisão	transformadora,	mas	como	síntese	realizada	após	um	período	de
reflexão,	com	base	no	repensar	já	vivido.	Acredito	que,	se	estas	reflexões
tiverem	prosseguimento,	certamente	o	quadro	sofrerá	ainda	inúmeras	sínteses
diferentes	da	que	foi	até	aqui	apresentada.
Os	supervisores	constataram	que	a	transformação	de	uma	posição	para	a	outra
requer	tempo,	para	que	o	supervisor	possa	mudar	as	representações	e	as	práticas
construídas	ao	longo	de	sua	trajetória	de	trabalho.	Assinalaram	que	o	supervisor
tido	como	tradicional	“arma-se”	com	uma	série	de	afirmações	que	situamsuas
ações	no	plano	do	comodismo,	da	falta	de	esperança,	do	ver-se	impotente	diante
do	que	está	ao	seu	redor	e	que	determina	sua	ação.	Vejam-se	os	exemplos	das
palavras	a	seguir:
•	“sempre	trabalhei	assim	e	deu	resultados”;
•	“o	diretor	não	me	dá	apoio”;
•	“os	professores	não	colaboram”;
•	“a	comunidade	é	pobre	e	precisa	ser	ajudada”.
Estas	e	outras	características	geraram	mecanismos	de	defesa	sustentados	pela
argumentação	“racional”,	dificultando	e	tornando	moroso	o	avançar	para	novas
posições.
As	colaboradoras	afirmaram	que	o	avanço	nas	posições	se	dá	em	meio	a	um
conflito	consigo	mesmas	como	pessoas	e	com	o	trabalho	que	realizam	na	escola.
A	observação	a	respeito	de	sua	própria	ação	e	a	reflexão	avaliativa	a	respeito
dessa	ação	é	que	poderão	convencer	ou	não	o	supervisor	a	desestruturar	aquelas
práticas	e	representações	que	não	correspondem	à	realidade	de	sua	escola.	Esta
desestruturação	desequilibra,	“desmascara”,	“desmente”,	questiona	e,	assim,
possibilita	a	construção	de	novas	representações	e	novas	práticas	que	poderão
encaminhar	a	uma	supervisão	repensada	no	cotidiano	das	escolas.
Dos	impasses	produzidos	nessas	reflexões,	emergem	conflitos	típicos	de	pessoas
que	confrontam	seus	saberes,	conhecimentos	e	práticas.	Experienciei,	teorizei,
apliquei	e	vivi	a	situação	de	que	a	prática	não	pode	ser	apropriada	pelo
supervisor	se	ele	não	reflete	sobre	ela.	Por	isso,	afirmo	que	repensar	a	supervisão
escolar	é	perguntar,	responder,	achar,	perder,	desejar,	expulsar,	encontrar,	enfim,
problematizar	a	ação	supervisora,	criando	um	movimento	no	qual	os	eixos	–
aluno,	professor	e	supervisor	–	incorporam	e	defendem	o	mesmo	ato:	ensinar	e
aprender	ou	aprender	e	ensinar.
Entendo	supervisão	escolar	como	ação	(ação	compreendida	como	um	fazer
coletivo	envolvendo	reação)	pensada	com	base	na	prática	cotidiana	da	escola.
Isto	não	é	nenhuma	novidade.	Esta	fala	é	antiga	e	pode	parecer	para	alguns	que
está	reaparecendo	com	roupagens	novas.	A	experiência	de	pesquisar	a	ação
supervisora	me	faz	perceber	que	quando	se	repensa	a	prática	cotidiana	do
supervisor	escolar	percebe-se	que	a	ênfase	dada	à	divulgação	do	trabalho	do
supervisor	foi	num	momento	histórico	em	que	o	conhecimento	era	projetado	por
ideias	e	pensamentos	envolvendo	expressões	do	tipo	“deve	ser”	ou	“é”.
Nessa	época	de	concepção	linear	voltada	para	princípios	positivistas	de	ciência	e
funcionalistas	de	mundo,	a	ação	supervisora	era	divulgada	como	realizada	no	dia
a	dia	de	uma	escola	imaginária	sustentada	pelo	discurso	do	devia	ser	ou	era.
O	momento	histórico	vivido	hoje	por	nós	supervisores	impõe	a	fala	deste	mesmo
cotidiano	de	ações	e	reações	do	dia	a	dia	da	escola,	sempre	recomeçado.
Pensar,	agir	e	reagir,	elaborando	sínteses	a	respeito	da	ação	supervisora,	implica
ter-se	uma	concepção	clara	a	respeito:
•	da	escola	como	instituição	social	fincada	numa	sociedade	que	tem	sua	base	no
sistema	capitalista;
•	do	sentido	que	têm	a	educação	e	o	ensino	para	este	país;
•	da	posição	que	o	sistema	de	ensino	atribui	para	o	supervisor	como	um	dos
agentes	educacionais;
•	da	posição	que	o	próprio	supervisor	se	atribui	como	agente	do	ensino	e	da
educação;
•	do	objeto	específico	de	trabalho	do	supervisor	escolar	e	da	capacidade	de
observar	o	cotidiano	para,	através	dele,	transformar	sua	ação.
Por	esta	razão,	pensar	a	prática	cotidiana	da	escola	requer	profundo	esforço
prático-teórico	e	teórico-prático	por	parte	do	supervisor.	Este	esforço	contribui
significativamente	para	compreender	a	realidade	escolar,	sugerindo	perguntas	e
indicando	possibilidades.	Este	esforço	é	feito	em	parceria	com	os	demais	agentes
educacionais[3]	que	atuam	na	escola,	especialmente	o	professor	regente	de
classe.[4]
Compreendo	o	professor	regente	de	classe	como	um	profissional	da	educação
que	regula	e	administra,	diretamente	com	os	alunos,	o	trabalho	didático-
pedagógico	da	sala	de	aula.	Compreendo	o	supervisor,	também	como
profissional	da	educação,	professor	que	já	foi	e	ainda	pode	ser	regente	de	classe.
Como	regente	de	classe,	o	supervisor	vivenciou	experiências	que	o	professor
está	vivenciando.
As	experiências	e	os	estudos	de	aprofundamento	realizados	pelo	supervisor	é
que	irão	desencadear	um	trabalho	visando	compreender	o	desempenho	do
professor	no	cotidiano	da	escola,	especialmente	na	sala	de	aula.	No	movimento
para	compreender	o	trabalho	do	professor,	o	supervisor	levanta	interrogações,
faz	afirmações,	confronta	ideias,	tentando	com	o	professor	descobrir	a	melhor
maneira	de	ensinar,	aprender	e	educar	uma	determinada	classe	de	alunos.
Entendo	que	a	aproximação	do	trabalho	do	supervisor	com	o	trabalho	do
professor	regente	de	classe	é	possível,	desde	que	se	considere	a	escola	como
local	de	trabalho	produtivo.	Sendo	local	de	trabalho,	a	união	entre	supervisor	e
professor	regente	de	classe	se	faz	tendo	por	base	a	compreensão	de	que	ambos
são	profissionais	e	trabalham	em	instâncias	diferenciadas	de	uma	mesma	escola.
De	acordo	com	estas	instâncias,	um	profissional	–	professor	–	constrói
conhecimentos	numa	relação	de	ensinar	e	aprender	com	um	aluno	que	aprende-
e-ensina.	Ambos	imbricados	em	processos	simultâneos	de	ensinar,	aprender	e
educar	geram	uma	produção	específica	–	aprendizagem	–	do	aluno.
Esta	aprendizagem	passa	a	ser	o	objeto	de	trabalho	do	outro	profissional	–
supervisor	–	que	a	problematiza,	pondera,	discute	e	acompanha	com	o	professor
o	tratamento	dado	aos	conteúdos	lógicos	e	aos	conteúdos	relativos	às	condições
existenciais	dos	alunos.
É	na	compreensão	e	no	entendimento	da	forma	de	tratamento	dado	pelo
professor	aos	conteúdos	e	às	condições	de	existência	dos	alunos	que	o	supervisor
sistematiza	seu	trabalho	no	interior	da	escola.	Estas	duas	dimensões	configuram
o	processo	de	ensinar	e	aprender,	que	se	dá	numa	relação	entre	o	professor	que
ensina-e-aprende,	o	aluno	que	aprende-eensina	e	o	supervisor	que	orienta-
aprende-e-ensina,	embora	não	se	possa	identificar	com	precisão	quem	inicia	este
processo.	Este	processo	está	sendo	por	mim	denominado	como	“parceria”.
Para	poder	focalizar	a	realidade	do	processo	de	ensinar	e	aprender	é	preciso	que
o	supervisor	se	utilize	de	metodologias	que	possibilitem	um	trabalho	voltado
para	a	ação	diária	do	fazer	do	professor	como	regente	de	classe.
O	trabalho	do	supervisor,	centrado	na	ação	do	professor,	não	pode	ser
confundido	com	assessoria	ou	consultoria,	por	ser	um	trabalho	que	requer
envolvimento	e	comprometimento.
O	supervisor,	tomando	como	objeto	de	seu	trabalho	a	produção	do	professor,
afasta-se	da	atuação	linear,	hierarquizada,	burocrática	que	vem	sendo
questionada	por	educadores	e	passa	a	contribuir	para	um	desempenho	docente
mais	qualificado.
Nesse	processo,	professor	e	supervisor	têm	seu	objeto	próprio	de	trabalho:	o
primeiro,	o	que	o	aluno	produz;	e	o	segundo,	o	que	o	professor	produz.	O
professor	conhece	e	domina	os	conteúdos	lógico-sistematizados	do	processo	de
ensinar	e	aprender;	o	supervisor	possui	um	conhecimento	abrangente	a	respeito
das	atividades	de	quem	ensina	e	das	formas	de	encaminhá-las,	considerando	as
condições	de	existência	dos	que	aprendem	(alunos).	Nesta	relação,	o	professor
não	perde	o	controle	sobre	seu	trabalho,	uma	vez	que	este	é	condição	essencial
da	ação	de	ensinar.	No	diálogo	do	professor	com	o	supervisor	surgem	as	formas
para	encaminhar	o	acompanhamento	da	aprendizagem	dos	alunos.	Estas	formas
serão,	em	alguma	medida,	diferentes	das	que	têm	sido	proclamadas	como
específicas	do	supervisor	ou	enquadradas	no	elenco	típico	de	técnicas	diretas	e
indiretas,	indicadas	na	bibliografia	existente	a	respeito	da	ação	supervisora.	As
formas	de	ação	que	provocam	reações	que	encaminham	as	aprendizagens	terão
de	ser	inventadas	ou	recriadas	com	base	nas	experiências	vividas	pelo	supervisor
e	pelo	professor	no	interior	da	sala	de	aula.
Considerando	as	características	próprias	do	professor,	o	supervisor	desenvolve
com	ele	as	formas	possíveis	de	controlar	o	processo	de	aprender	e	de	ensinar.	O
supervisor	abdica	de	exercer	poder	e	controle	sobre	o	trabalho	do	professor	e
assume	uma	posição	de	“problematizador”do	desempenho	docente.
Problematizar	o	desempenho	docente	significa	assumir	com	o	professor	uma
atitude	de	indagar,	comparar,	responder,	opinar,	duvidar,	questionar,	apreciar	e
desnudar	situações	de	ensino	em	geral	e,	em	especial,	as	da	classe	regida	pelo
professor.
Assim,	o	supervisor	torna-se	um	parceiro	político-pedagógico	do	professor	que
contribui	para	integrar	e	desintegrar,	organizar	e	desorganizar	o	pensamento	do
professor	num	movimento	de	participação	continuada,	no	qual	os	saberes	e	os
conhecimentos	se	confrontam.	As	sínteses	colhidas	nos	confrontos	são
referências	que	sustentam	a	ação	do	professor	como	regente	de	classe.	Nesta
problematização	está	implícita	a	ação	que	integra	o	professor	e	o	supervisor	com
a	comunidade	na	qual	a	escola	se	insere.
Provocações	para	reflexões,	discussões	e	debates
Entendo	que	o	trabalho	do	supervisor	é	determinado	pelas	demandas	do	trabalho
do	professor	regente	de	classe.	Sendo	assim,	a	ação	do	supervisor	com	o
professor	configura-se	numa	parceria	na	qual	ambos,	politicamente,	têm
posições	definidas	com	base	nas	quais	refletem,	criticam	e	indagam	a	respeito	de
seus	desempenhos	como	profissionais	que	trabalham	numa	instituição	social
chamada	escola,	e	em	nível	curricular	específico.
Afirmo,	sem	receio,	que	é	o	trabalho	do	professor	regente	de	classe	que	dá
sentido	ao	trabalho	do	supervisor	no	interior	da	escola.	O	trabalho	do	professor
abre	o	espaço	e	indica	o	objeto	de	ação/reflexão,	ou	de	reflexão/ação	para	o
desenvolvimento	da	ação	supervisora.	Impugna-se,	portanto,	a	concepção	de
uma	ação	supervisora	centrada	no	controle	puro	e	simples	do	trabalho	do
professor	e	em	seu	lugar	apresenta-se	como	uma	possibilidade	de	ação	conjunta
voltada	para	a	produção	do	trabalho	do	professor	em	sala	de	aula	como	sujeito
que	ensina-e-aprende.
Para	compreender	este	processo	o	supervisor	necessita:
a)	superar	os	impasses	conceituais	do	termo	supervisão;
b)	compreender	a	escola	como	local	de	trabalho;
c)	identificar-se	como	trabalhador	da	escola;
d)	conceber	o	professor	como	um	dos	trabalhadores	da	escola;
e)	desmistificar	a	figura	do	supervisor	escolar;
f)	conceber-se	como	um	sujeito	que	produz,	reproduz	e	pesquisa	diferentes
maneiras	de	ensinar,	de	aprender	e	também	de	orientar;
g)	admitir	que	o	professor	na	sua	sala	de	aula	tem	sua	própria	produção;
h)	identificar	a	produção	do	professor	na	interação	professor-aluno;
i)	estar	convencido	de	que	saber	e	conhecimento	são	predicativos	de	todos	os
seres	humanos;
j)	admitir	que	é	na	interação	do	professor	que	ensina-e-aprende	e	do	aluno	que
aprende-e-ensina	que	se	encontra	o	eixo	principal	da	aprendizagem
sistematizada	na	escola.
Concebendo	este	eixo	como	impulsionador	das	ações	coletivas	e	das	reflexões
que	acontecem	nas	reuniões	com	os	professores,	estas	reuniões	deixam	de	ser
encontros	para	declinar	avisos	de	toda	ordem	e	sustentar	o	controle	cerrado,	para
se	transformarem	em	focos	de	discussões	e	reflexões,	capazes	de	realimentar	as
ações	exercidas	pelos	diferentes	agentes	educacionais	e	projetar	ações
repensadas	para	a	escola.
É	também	indispensável	que	se	entenda	que	o	espaço	ocupado	pelo	supervisor
na	escola	não	lhe	garante	privilégios,	pelo	fato	de	não	estar	regendo	classe;	ao
contrário,	atribui-lhe	um	trabalho	amplo	na	escola,	envolvendo	a	ação	dos
professores,	o	anseio	da	comunidade	e	o	desejo	dos	alunos.	Essa	ação	requer	do
supervisor	habilidades	e	conhecimentos	para	participar.	Ao	mesmo	tempo,	é
interessante	que	o	supervisor	observe	o	que	se	desenvolve	no	dia	a	dia	da	escola,
sempre	recomeçado,	registre	as	falas	que	ouve,	os	gestos	que	revelam	os
pensamentos	necessários	para	o	refletir	da	ação	vivida	pelos	professores	que,
como	homens	e	mulheres	trabalhadores(as),	carregam	o	fardo	da	sociedade
capitalista.	Esta	sociedade	tem	uma	forma	própria	de	organizar	suas	instituições
sociais,	forma	esta	na	qual	se	enquadra	a	escola,	encarregada	de	desenvolver
ensino	e	educação.	Partindo	dessa	sociedade,	com	suas	contradições,	o
supervisor	atua	como	“um	par	de	olhos”	para	focalizar,	com	os	professores,	o
contexto	no	qual	trabalham,	por	que	trabalham,	como	trabalham	e	para	quem
trabalham.
O	supervisor	parte	do	esclarecimento	a	respeito	da	ação	diária	que	caracteriza	o
trabalho	realizado	na	escola.	O	conhecimento	que	é	gerado	por	essa	ação	poderá
ser	apropriado	por	intermédio	de	atividades	de	investigação	da	prática	do
professor	como	regente	de	uma	determinada	classe	de	alunos.	Esse
conhecimento,	por	si	só,	não	basta;	impõe-se	a	necessidade	de	considerar	as
exigências	determinadas	pela	escola	como	instituição,	a	concepção	que	o
professor	tem	de	seu	trabalho	e	o	prazer	ou	desprazer	que	experimenta	ao
exercê-lo.
Acredito	que	o	supervisor,	por	intermédio	de	atividades	baseadas	na	pesquisa	do
trabalho	realizado	no	dia	a	dia	da	escola,	identifica	os	espaços	que	pode	ocupar
ao	problematizar	o	trabalho	do	professor	regente	de	classe.	Por	ser	o	trabalho	do
professor	o	que	dá	sentido	ao	trabalho	do	supervisor,	este	não	pode	ser
predeterminado	ou	preanunciado	como	sendo	necessário.	O	trabalho	do
supervisor	está	tramado	na	ação	do	professor.
Como	as	escolas	não	são	iguais	–	são	unidades	diferentes	ligadas	a	um	mesmo
sistema	de	ensino	–,	a	forma	que	o	supervisor	utiliza	para	investigar	seu	espaço
não	pode	ser	a	mesma.	Cada	escola	possui	especificidade	em	termos	de
comunidade,	alunos,	professores	e	administração.	A	forma	como	a	escola	foi
construída,	a	disposição	dos	pavilhões,	das	salas	de	aula,	das	classes	para	os
alunos	sentarem,	dos	corredores,	do	pátio	(em	relação	ao	espaço	que	a	circunda)
e,	ainda,	a	receptividade	e	a	disponibilidade	da	comunidade	para	com	a	escola	e
da	escola	para	com	a	comunidade	apresentam	diferenças	acentuadas	de	uma
escola	para	outra.	Isto	indica	a	impossibilidade	de	existir	atuação	igual	para	o
supervisor	em	todas	as	escolas.
Cada	escola	tem	sua	forma	própria	de	encaminhar	o	trabalho	do	supervisor,
considerando	suas	necessidades,	seus	desejos	e	os	projetos	de	desenvolvimento
como	unidade	do	sistema	de	ensino.
As	escolas	são	unidades	que	têm,	como	matrizes,	hábitos	arraigados	de	uma
história	contada	como	“bem-sucedida”.	Essa	história	pode	encobrir	a	realidade
cotidiana	e	impedir	seu	repensar	como	instituição	social	destinada	ao
atendimento	de	todas	as	classes	sociais.
Por	meio	do	conhecimento	que	adquiri	e	de	pesquisas	que	realizei	ao	longo	da
minha	trajetória	de	mulher	professora	e	supervisora,	afirmo	que	existe	espaço
para	a	ação	supervisora	e	este	espaço	pode	ser	ocupado	por	aqueles	supervisores
que	desejarem	problematizar,	responder	e	duvidar,	refletir/reagir	e	agir	a	respeito
de	seu	próprio	trabalho,	cujo	objeto	é	a	produção	do	professor	e	do	aluno	no	ato
de	ensinar	e	aprender.
2
O	PABAEE	E	A	SUPERVISÃO	ESCOLAR
Edil	V.	de	Paiva
Léa	Pinheiro	Paixão
É	impossível	realizar	a	reconstrução	histórica	da	escola	primária	no	Brasil	sem
referência	ao	Programa	de	Assistência	Brasileiro-Americana	ao	Ensino
Elementar,	conhecido	pela	sigla	Pabaee,[5]	cuja	importância,	no	perfil	de	várias
das	dimensões	que	aquele	nível	de	ensino	assumiu,	é	destacada	por
pesquisadores.	Em	particular,	é	reconhecido	o	papel	que	o	referido	Programa
desempenhou	na	incorporação	de	uma	perspectiva	tecnicista	na	análise	das
questões	educacionais	nos	anos	60.	Por	meio	das	ações	do	Pabaee	e	da	dos
profissionais	que,	direta	ou	indiretamente,	sofreram	sua	influência,	o	Programa
contribuiu,	de	maneira	significativa,	para	enfatizar	metodologias	e	técnicas	de
ensino	como	soluções	para	os	problemas	que	o	então	ensino	primário	enfrentava,
tais	como	os	da	evasão	e	da	repetência	(Barreto	1979;	Moreira	1990;	Libâneo
1989).
A	avaliação	positiva	do	Pabaee	foi	lembrada	para	justificar	os	acordos	MEC-
Usaid	que	movimentaram	o	cenário	educacional	nos	anos	60	(Santos	1981).
Dentre	as	dimensões	da	influência	daquele	Programa,	uma,	em	particular,	tem
sido	objeto	de	estudos:	a	da	supervisão	associada	ao	currículo.	Vale	a	pena
recapitular,	de	forma	breve,	três	dessas	reflexões	que	tomaram	como	referência	a
história	da	supervisãoeducacional	nos	estados	de	São	Paulo,	Minas	Gerais	e
Goiás.
Silva	Junior	(1986)	localizou	historicamente	o	início	das	atividades	de
supervisão	educacional	em	São	Paulo	ao	final	dos	anos	50/início	dos	anos	60.
Num	primeiro	momento,	as	ideias	sobre	supervisão	começaram	a	ser	divulgadas
em	cursos	promovidos	pelo	Serviço	de	Expansão	Cultural	da	Secretaria	de
Educação.	Neles	as	propostas	e	os	materiais	produzidos	pelo	Pabaee	eram
veiculados.
Segundo	o	autor,	o	Pabaee	era	visto	de	forma	positiva:
Importa	destacar	aqui	a	atitude	reverencial	que	sua	simples	existência	despertava
em	muitos	educadores	brasileiros	da	época	e	a	condição	de	autoridade	inconteste
que	era	automaticamente	conferida	aos	seus	mentores.	Como	corolário	da
situação,	textos	e	documentos	originários	do	Pabaee	eram	tidos	para	todos	os
efeitos,	como	material	de	primeira	ordem	e	fonte	obrigatória	de	atualização	e
aperfeiçoamento	profissional.	(p.	50)
Em	Goiás,	na	análise	realizada	por	Bernardes	(1983),	a	institucionalização	da
supervisão	escolar	adotou	modelo	defendido	pelo	Pabaee.	O	trabalho	realizado
no	Centro	de	Treinamento	do	Magistério	(CTM),	em	Inhumas,	revelou	as
estreitas	relações	tecidas	entre	a	supervisão	em	Goiás	e	o	Pabaee.	Criado	no
âmbito	de	uma	política	nacional	coordenada	pelo	Inep	visando	à	formação	de
supervisores	de	ensino	primário,	aquele	Centro,	organizado	em	departamentos
por	área	de	especialização,	como	o	Pabaee,	iniciou	seu	funcionamento	com	a
colaboração	de	oito	professoras	do	Pabaee	cedidas	pelo	governo	mineiro	para
“planejar	e	ministrar	o	primeiro	curso	de	Formação	de	Supervisores	de	Goiás”
(p.	85)	em	1963.	Esse	grupo	manteve-se	em	Inhumas	e	só	começou	a	ser
substituído,	ao	final	de	1965,	por	professoras	goianas	que	haviam	concluído
curso	de	especialização	no	Pabaee,	em	Belo	Horizonte.
A	estratégia	de	organização	do	Centro	de	Inhumas	pautou-se	pela	experiência	do
Centro	Piloto	de	Belo	Horizonte.	A	análise	do	conteúdo	dos	cursos	e	as	ideias	de
supervisão	escolar	veiculadas	então	orientaram,	segundo	Bernardes,	a	supervisão
escolar	institucionalizada	em	Goiás.
Segundo	as	conclusões	da	autora	em	pauta,	o	peso	da	influência	das	ideias	do
Pabaee	na	institucionalização	da	supervisão	escolar	ultrapassou	os	limites	de	seu
estado.
Fica	evidente	que	a	Supervisão	Escolar	institucionalizada	em	Goiás	nasce,	como
a	Supervisão	Brasileira,	ligada	à	ajuda	técnico-financeira	dos	Estados	Unidos	e
de	outros	organismos	internacionais.	Seu	modelo	é	coerente	com	a	teoria	de
educação	para	o	desenvolvimento,	de	inspiração	liberal	e	tecnicista,	já
impregnada	na	mentalidade	dos	educadores	do	Pabaee.	(p.	76)
Essa	generalização,	no	entanto,	foi	contestada	por	Garcia	(1988)	tomando	como
objeto	o	caso	de	Minas	Gerais.	Naquele	estado,	a	institucionalização	da
supervisão	escolar	verificou-se	precocemente,	pelo	menos	em	relação	a	Goiás	e
São	Paulo.	Ali	a	supervisão	surgiu	com	as	reformas	de	1906	implantadas	no
governo	de	João	Pinheiro	que	criou	o	grupo	escolar	e	introduziu	a	figura	do
inspetor	técnico,	precursor	do	supervisor	atual,	que	deveria	desempenhar
funções	técnicas	nos	grupos	escolares.	A	consolidação	das	atividades	de
supervisão	no	sistema	escolar,	no	entanto,	realizou-se	com	as	reformas	de	cunho
escolanovista	de	Francisco	Campos	(secretário	do	Interior)	ao	final	dos	anos	20.
Foi	então	criada	a	Escola	de	Aperfeiçoamento	em	1929[6]	quando	se	realizavam
cursos	de	duração	de	dois	anos,	em	tempo	integral,	visando	à	formação	de
docentes	para	os	Cursos	Normais	e	à	assistência	técnica	ao	ensino	nos	grupos
escolares.	Pretendia	assim	o	governo	mineiro	formar	os	quadros	necessários	ao
seu	projeto	de	renovação	pedagógica	no	ensino	primário	e	no	Normal.
Realizavam	o	curso	professoras	primárias	que,	ao	voltarem	às	escolas,	deveriam
atuar	entre	as	colegas	“na	implantação	dos	novos	métodos,	dando	início	assim
aos	trabalhos	de	supervisão	nas	escolas	mineiras”	(Peixoto	1983,	p.	147).
Quando	o	Pabaee	instalou-se,	em	1957,	no	Instituto	de	Educação	em	Belo
Horizonte,	encontrou,	no	estado,	um	sistema	articulado	de	supervisão	nas
escolas	primárias.	Portanto,	não	se	pode	dizer	que,	naquele	estado,	o	Pabaee
tenha	sido	fator	importante	na	institucionalização	daquela	atividade.
Isso	significa	que	justamente	o	estado	que	sediava	o	Centro	Piloto	não	deixou
sua	marca?	Para	Garcia	(1988),	essa	marca	existia	e	foi	constatada	na	alteração
da	função	desempenhada	pelos	agentes	que	atuaram	como	supervisores	nas
escolas.	A	supervisão	existente,	gestada	no	âmbito	das	reformas	escolanovistas
de	Campos,	tinha,	como	eixo	de	suas	atividades,	a	escola.	Esperava-se	que	as
supervisoras	atuassem	sobre	o	trabalho	do	professor	nas	escolas,
interferindo,	diretamente,	no	que	ensinar,	no	como	ensinar	e	avaliar,	educando
professores	e	alunos	para	uma	organização	escolar	fundada	na	ordem,	na
disciplina	e	na	hierarquia	e	cimentada	na	visão	liberal	cristã...	(p.	75)
Garcia	(1988)	defendia	que	a	orientação	de	supervisão	introduzida	pelo	Pabaee
respondia	a	transformações	na	organização	do	trabalho	na	escola	naquele
período	histórico	marcado	pela	desqualificação	e	pela	parcelização	do	trabalho
docente.
Pois	bem,	no	meu	entendimento,	com	o	Pabaee,	a	supervisão	em	Minas	Gerais
assume	uma	outra	função	e	ganha	um	novo	espaço	de	atuação.	A	função	passa	a
ser	a	redefinição	dos	currículos	e	o	espaço	de	atuação	–	os	órgãos	centrais	do
Sistema	de	Ensino.	(p.	63)
A	hipótese	com	que	Garcia	trabalhou	foi	a	de	que	“com	o	Pabaee,	se	iniciava
uma	nova	fragmentação	do	processo	de	ensino,	retirando	dessa	vez,	da	própria
escola,	a	função	do	planejamento	curricular”	(p.	72).	Para	isso,	enfatizava-se	a
discussão	sobre	currículo	e	buscava-se	a	formação	de	lideranças	educacionais
que	pudessem	se	ocupar	da	reformulação	de	currículos	nos	órgãos	centrais
encarregados	do	planejamento,	da	coordenação,	da	avaliação	e	da	administração
do	ensino	nos	estados.
Ao	criar	um	departamento	de	supervisão	e	currículos,	o	Pabaee,	ainda	na	visão
de	Garcia	(1988),
acabou	conferindo	a	essas	áreas	um	espaço	acadêmico	e	científico	próprio,	como
áreas	de	conhecimento,	que	elas	não	tinham	nem	nos	cursos	de	Pedagogia	da
época	e	que	só	passaram	a	ter	em	1969,	com	a	reformulação	dos	cursos	de
Pedagogia.	(p.	67)
A	exposição	de	algumas	ideias	desses	três	estudos	revela,	em	primeiro	lugar,	o
reconhecimento	do	peso	da	influência	do	Pabaee	na	história	da	supervisão
escolar	naqueles	estados	que	apresentavam,	provavelmente,	semelhanças	com	o
que	se	passou	em	outros.	Observa-se	a	tendência	de	avaliar	as	orientações	sobre
supervisão	como	produto	do	Programa,	da	influência	americana,	tendência	essa
exacerbada	em	Bernardes	(1983),	cujo	estudo	assume	a	existência	de	uma
conspiração	imperialista	americana	que	procurava	impor	seus	valores	e	seu	way
of	life	ao	Brasil.
Garcia	(1988)	avaliou	que	a	preocupação	com	o	currículo/supervisão,	na
verdade,	suplantava	os	objetivos	com	os	métodos	de	ensino.	“Apesar	da	tão
propalada	ideia	de	que	o	Pabaee	visava	impor	novos	métodos	e	técnicas,	minha
hipótese	é	que	a	questão	central	para	o	Programa	era	o	Currículo”	(p.	63).
Como	se	vê,	a	participação	do	Pabaee	na	trajetória	da	supervisão	escolar	merece
discussão.	Neste	capítulo,	pretendemos	contribuir	para	essa	discussão,
fornecendo	informações	e	formulando	algumas	análises,	fruto	de	uma
pesquisa[7]	mais	ampla	de	reconstrução	histórica.
Diante	do	que	foi	exposto,	parece-nos	pertinente	trabalhar	alguns	pontos	que	se
referem	aos	objetivos	do	Pabaee:	Privilegiou-se	a	questão	currículo/supervisão?
Como	se	articulam	as	propostas	americanas	no	campo	educacional	brasileiro?
Nossas	leituras	de	documentação	do	Pabaee	(relatórios,	memorandos,	ofícios,
cartas)	permitem-nos	afirmar	que:
•	no	projeto	inicial	do	Pabaee	e	em	seus	primeiros	anos	de	funcionamento,	os
objetivos	não	privilegiavam	ações	visando	o	campo	de	supervisão/currículo;
•	na	alteração	desses	objetivos,	ao	final	dos	anos	50/início	dos	anos	60,	aí	sim,
incluíram-se	investimentos	em	supervisão/currículo.
A	pergunta	que	nos	fazemos	versa	sobre	o	significado	dessa	alteração	nas
prioridadesque	se	realizavam	com	o	Programa	em	desenvolvimento	no	solo
brasileiro.	Para	nós,	a	valorização	dessa	atividade	e	a	visualização	da
necessidade	de	se	implantarem	sistemas	de	supervisão	compunham	o	universo
de	preocupações	de	educadores	brasileiros.
O	treinamento	de	treinadores	de	professores	primários
A	função	do	Pabaee	no	âmbito	do	ensino	primário	supõe	uma	abordagem	de	seus
problemas	e	uma	estratégia	de	ação	que	foram	assim	explicitados:[8]
1.	Introduzir	e	demonstrar,	a	educadores	brasileiros,	métodos	e	técnicas
utilizados	na	educação	primária,	promovendo	a	análise,	aplicação	e	adaptação
dos	mesmos,	a	fim	de	atender	às	necessidades	comunitárias	em	relação	à
educação,	por	meio	de	estímulos	à	iniciativa	do	professor	no	sentido	de	contínuo
crescimento	e	aperfeiçoamento.
2.	Criar,	demonstrar	e	adaptar	material	didático	e	equipamento,	com	base	na
análise	de	recursos	disponíveis	no	Brasil	e	em	outros	países,	no	campo	da
educação	primária.
3.	Selecionar	professores	na	base	de	competência	profissional,	trabalho	e
conhecimento	da	língua	inglesa,	a	fim	de	serem	enviados	aos	Estados	Unidos
para	cursos	avançados,	no	campo	da	educação	primária.	(Hart	e	Renault	1957,	p.
1)
A	leitura	desse	texto	evidencia	as	ideias	que	alimentavam	o	projeto	de
assistência	técnica	ao	ensino	elementar.	Há,	em	seu	núcleo,	um	alvo	central	–	o
professor	primário,	a	quem	se	pretende	dotar	de	um	instrumental	considerado
eficiente	e	necessário	ao	exercício	de	suas	atividades:	o	domínio	de	novos
métodos	e	de	técnicas	de	ensino.	Modernizar	o	ensino	primário	é,	na	perspectiva
do	Programa,	trazer	para	o	Brasil	as	inovações	no	campo	da	metodologia	das
áreas	de	ensino	existentes	nos	Estados	Unidos	e	procurar	adaptá-las	às
especificidades	do	nosso	país.	Os	multiplicadores	considerados	adequados	a
disseminar	as	inovações	seriam	os	professores	que	atuavam	nas	escolas
incumbidas	da	formação	do	professor	primário:	as	Escolas	Normais.
Esse	objetivo	supunha	a	colaboração	entre	brasileiros	e	americanos	na
montagem	de	um	Centro	Piloto.	Para	tanto,	já	que	não	havia	brasileiros
competentes	na	tarefa,	tornou-se	necessário	enviar	grupos	de	professores	que	se
especializariam	na	universidade	americana,	antes	de	se	associarem	aos
americanos	na	empreitada.
Os	principais	produtos	dessa	associação	seriam	os	cursos	destinados	a	formar
“instrutores”	para	as	Escolas	Normais	mais	importantes	do	Brasil	e	o	material
apropriado	às	novas	formas	de	ensinar.
Não	pairam	dúvidas	na	formulação	dos	objetivos	de	que	havia,	como
balizamento	geral	do	Programa,	a	ideia	de	que	a	introdução	de	novas	técnicas	de
ensino	seria	uma	resposta	aos	problemas	do	ensino	primário.	Essa	introdução
supõe	um	projeto	de	“treinamento”	que	se	faria,	prioritariamente,	via	cursos
incumbidos	da	qualificação	desse	profissional.
Tal	clareza	de	rumos	não	se	esgotou	na	formulação	de	objetivos.
Acompanhando-se	a	efetivação	desse	propósito	nas	estratégias	empregadas	na
implantação	do	Programa,	ela	se	confirma.	Para	constituir	o	grupo	que	atuaria
em	Belo	Horizonte,	foram	enviados	14	professores,	como	bolsistas,	à
Universidade	de	Bloomington,	estado	de	Indiana,	em	1956,	os	quais	retornaram
ao	Brasil	em	dezembro	do	ano	seguinte:	13	deles	foram	imediatamente
incorporados	ao	Programa.	Aqui	eles	encontraram	quatro	especialistas
americanos	chegados	alguns	meses	antes	(entre	agosto	e	outubro	de	1957)	que
deveriam	ocupar-se	da	administração	do	Programa,	em	colaboração	com	o
diretor	do	Instituto	de	Educação	(Charles	M.	Long)	e	funcionar	como
orientadores	nos	departamentos	de	Aritmética	(Evelyn	Bull),	Linguagem	(Luella
Keithahn)	e	Psicologia	(Louis	A.	Fitzgerald).
Antes	mesmo	de	sair	do	Brasil	em	direção	aos	cursos	na	universidade	americana,
os	brasileiros	assumiram	compromissos	com	o	futuro	trabalho	no	Centro	Piloto.
Cada	um	deles	seguiu	programação	visando	a	uma	especialidade	e	foi	alocado,
na	volta,	nos	seguintes	departamentos:	Magdala	Bacha:	Linguagem;	Rizza
Araújo	Porto:	Aritmética;	Wellington	Armanelli:	Ciências;	Maria	Onolita
Peixoto:	Estudos	Sociais;	Marina	Couto:	Currículo	e	Supervisão;	Nazira	Feres
Abi-Saber:	Pré-primário;	Maria	Luiza	A.C.	Ferreira:	Psicologia;	Nelson
Hortman:	Audiovisual;	Terezinha	Nardelli:	professora	de	5ª	série;	Maria	de	A.
Passos:	professora	de	4ª	série;	Beatriz	Costa:	professora	de	3ª	série;	Marília
Guimarães	Assunção:	professora	de	2ª	série	e	Terezinha	Casasanta:	professora
de	1ª	série.
A	inclusão,	entre	os	bolsistas,	de	cinco	professoras	que	assumiriam	turmas	no
ensino	primário	(cinco	entre	13)	revela	a	importância	dada,	na	estratégia	do
Pabaee,	às	classes	de	demonstração.	Essas	professoras	foram	contempladas	com
o	mesmo	tipo	de	formação	que	as	futuras	“formadoras”	dos	“formadores”.
Com	os	13	brasileiros	formados	nos	Estados	Unidos	e	os	quatro	americanos,	foi
possível	a	montagem,	no	Centro	Piloto,	dos	departamentos	(Linguagem,
Aritmética,	Ciências,	Estudos	Sociais,	Currículo	e	Supervisão,	Pré-primário	e
Psicologia),	de	um	Serviço	Audiovisual	e	de	classes	de	demonstração	na	escola
primária	do	Instituto	de	Educação.	Também	exigiram	muitos	esforços	da	direção
as	negociações	em	torno	da	utilização	da	gráfica	da	Escola	de	Direito	da
Universidade	de	Minas	Gerais,	para	produção	de	material.	Assim,	foi	possível
dar	início	à	execução	das	prioridades	do	Pabaee:	cursos,	demonstração	e
produção	de	materiais.
É	necessário	chamar	a	atenção	para	as	áreas	que	contavam,	no	início,	com	a
participação	dos	quatro	especialistas	americanos;	um	deles	assumiria	a
administração	do	Programa	em	Belo	Horizonte	em	coparticipação	com	o	diretor
do	Instituto	de	Educação,	e,	juntos,	os	dois	se	responsabilizariam	pela	direção
técnica.	Hierarquicamente	superiores,	os	codiretores	do	Programa	eram	Hart	(da
Divisão	de	Educação	da	Usom)	e	Renault	(secretário	de	Educação	de	Minas
Gerais).[9]	Apenas	três	departamentos	contaram	com	a	participação	de
especialistas:	o	de	Psicologia,	o	de	Aritmética	e	o	da	Linguagem.	É	possível
deduzir	que	essas	áreas	foram	consideradas	prioritárias,	dada	a	percepção	que	se
nutria,	no	âmbito	do	Programa,	acerca	das	tarefas	dos	americanos	e	dos
brasileiros.	Em	documentos	redigidos	para	circulação	entre	os	técnicos
americanos,	a	expectativa	da	contribuição	a	ser	dada	por	ambos	foi	claramente
anunciada.
Neste	Programa	de	cooperação,	os	brasileiros	são	inteiramente	os	elementos
ativos.	Os	americanos	sugerem	e	aconselham,	os	brasileiros	executam.	Os
brasileiros	entram	em	ação	somente	depois	de	estarem	convencidos	de	que	as
idéias	ou	efeitos	são	adaptáveis	ao	local	ou	ambiente.	(Pabaee	1957,	p.	1)
Naquele	momento	de	implantação,	esperava-se	dos	brasileiros	que
desempenhassem	a	função	de	tradutores	das	inovações	às	condições	locais.
Houve	uma	clara	definição	da	divisão	de	trabalho:	os	americanos	detinham	o
conhecimento	técnico	que	o	país	precisava	utilizar,	mas	apenas	os	brasileiros
podiam	tornar	viável	a	aplicação	desse	conhecimento	técnico.	Essa	divisão	de
tarefas	que	orientou	os	preparativos	para	implantação	do	Programa	foi	assumida
também	por	Renault,	tal	como	se	pode	verificar	pela	leitura	de	documentos
assinados	por	ele	e	Hart,	em	1957:
Os	técnicos	estrangeiros	podem	possuir	mais	conhecimento	técnico	e	um	ponto
de	vista	mais	amplo;	entretanto	os	técnicos	do	outro	país	(o	Brasil,	neste	caso)
conhecem	as	condições	locais	melhor	e	podem,	portanto,	introduzir	e	adaptar
novas	técnicas	em	certos	ambientes	locais,	de	uma	forma	extremamente	mais
eficiente	do	que	qualquer	estrangeiro	no	mesmo	caso.	(Hart	e	Renault	1957,	pp.
4-5)
A	estratégia	de	assistência	técnica	então	adotada	previa	que,	no	desenvolvimento
do	Programa,	em	contato	com	os	americanos,	trabalhando	juntos	com	eles,	os
técnicos	brasileiros	fossem	se	qualificando	para,	aos	poucos,	assumir	o	controle
total,	tornando	desnecessária	a	presença	dos	estrangeiros.	Foi	o	que	aconteceu:
em	1964	cessou	a	participação,	direta,	americana,	mas	as	atividades	tiveram
continuidade	sob	a	direção	de	Lyra	Paixão.
A	digressão	sobre	as	expectativas	em	relação	a	brasileiros	e	americanos	fez-se
necessária	para	evidenciar	a	existênciade	prioridades	nos	cuidados	que
antecederam	a	instalação	do	Centro	Piloto	em	Belo	Horizonte.	Supondo	que	os
americanos	detinham	os	conhecimentos,	sua	participação	era	fundamental	para
garantir	que	as	novas	ideias,	as	novas	técnicas,	os	novos	métodos	aqui
desabrochassem.	Apenas	três	departamentos,	no	entanto,	puderam	contar,	desde
o	início,	com	a	orientação	dos	americanos,	o	que	leva	a	deduzir	que	suas
atividades	eram	consideradas	prioritárias.	Com	efeito,	é	possível	compreender	a
prioridade	dada	às	duas	áreas	de	ensino	consideradas	básicas	no	ensino	primário
(Linguagem	e	Aritmética)	e	a	Psicologia	que	lhes	fornece	fundamentos.
A	reconstrução	da	história	do	Pabaee	fornece	outras	evidências	que	puderam	ser
apresentadas	na	defesa	da	tese	de	que,	no	início,	a	estratégia	formulada	nos
objetivos	revelara	que	o	alvo	prioritário	das	atividades	do	Programa	fora	a
instrução	de	professores	de	Escolas	Normais,	e	o	conteúdo	dessa	instrução,	a
metodologia	do	ensino.
Em	1958,	Long,	em	Memorando	nº	161/58,	manifestou	sua	preocupação	quanto
à	necessidade	de	se	ampliar	a	área	de	influência	do	Pabaee;	isso	porque,	em
decorrência	de	problemas	enfrentados	com	setores	católicos	mineiros	e	com	a
maior	capacidade	de	influência	do	grupo	do	Instituto	de	Educação,	os	primeiros
cursos	oferecidos	não	atenderam	apenas	os	professores	de	Escolas	Normais
Oficiais,	mas	também	as	professoras	primárias	(140	em	dezembro	de	1957),
freiras-professoras	de	metodologia	(120	entre	janeiro	e	fevereiro	de	1958),
diretoras	de	grupos	escolares	(49	entre	abril	e	maio	de	1958),	professoras	de
jardim	de	infância	(70	em	outubro	e	novembro	de	1958).
Em	seu	memorando,	Long	referiu-se	à	conversa	com	Casasanta	sobre	a
conveniência	de	oferecer	um	curso	mais	longo	para	professores	de	Escolas
Normais	selecionados	entre	os	mais	destacados	no	país.	Duas	correções	nos
rumos	que	tomaram	as	ações	em	1957	e	1958	são	enfatizadas:	(1)	a	procura	da
dimensão	nacional	do	Programa,	atendendo	outros	estados,	além	de	Minas
Gerais.	Até	então,	os	cursos	atenderam	às	demandas	mineiras,	com	exceção	do
curso	para	freiras	que,	além	de	alunas	mineiras,	contemplou	interesses	do	ensino
católico	no	Espírito	Santo	e	em	Goiás;	(2)	a	prioridade	concedida	ao	treinamento
de	professores	de	Escolas	Normais.
Essas	duas	correções,	segundo	Long,	impuseram-se	para	concretizar	o	objetivo
do	acordo,	qual	seja	o	de	preparar	pessoal	docente	para	as	Escolas	Normais	do
país.
As	palavras	de	Long,	ao	analisar	a	conveniência	de	atender	à	demanda	de
realização	de	curso	para	professoras	primárias	vinculadas	às	Escolas	Normais
mantidas	por	congregações	religiosas,	merecem	ser	apresentadas:
[...]	questionamos	seriamente	a	sensatez	de	oferecer	trabalho	para	professoras	de
Escolas	de	Demonstração	antes	de	tentar	alcançar	os	professores	de	Metodologia
das	escolas	normais	públicas	e	dos	institutos	de	educação	mantidos	pelo	poder
público.	Nós	recomendamos	firmemente	que	um	curso	consistente	em
Metodologia	e	disciplinas	relacionadas	seja	oferecido	primeiro	para	estes
professores.	(Long,	C.M.	18/4/1958,	p.	1)
A	seguir,	Long	explicitou	as	razões	que	determinaram	a	adoção	daquela
prioridade:
Primeiro	nós	estamos	informados,	de	modo	confiável,	que	os	professores	de
Metodologia	exercem	grande	influência	nas	Escolas	de	Demonstração.
Conseqüentemente,	parece	ser	um	imperativo	trabalhar	primeiro	com	as	pessoas
que	mantêm	e	exercem	liderança.	Segundo,	os	Acordos	Básicos	do	Pabaee
demandam	que	o	programa	de	atividades	tenha	como	foco	o	professor	educador.
Em	nossa	opinião	os	fundadores	do	Pabaee	foram	sábios	ao	enfatizar	a	educação
dos	professores.	O	Brasil	é	um	país	extenso	e	o	Pabaee	é	um	projeto,
relativamente,	pequeno.	Os	fundos	e	recursos	do	Programa	devem	ser	gastos	em
projetos	que	influenciarão	o	maior	número	de	pessoas.	Isto	indica	claramente
que	devemos	trabalhar	com	pessoas	que	preparam	professores,	em	vez	de
trabalhar	com	professores	regentes	de	classes.	(Idem,	ibid.,	p.	12)
Efetivamente,	no	primeiro	semestre	de	1959,	foi	realizado	um	curso	que	recebeu
professores	de	Escolas	Normais	oficiais	do	país.	Esse	tipo	de	curso	mais	longo
constituiu-se	em	umas	das	atividades	sistemáticas	mais	importantes	do	Pabaee
durante	sua	existência	e	teve	continuidade	na	DAP/Centro	Regional	de	Pesquisas
Educacionais.
Uma	dimensão	das	prioridades	do	Pabaee	emergiu	do	texto	de	Long:	o	ensino
público.	O	Pabaee	privilegiou	o	sistema	público	de	ensino.	Os	primeiros	cursos
destinados	a	freiras	compunham	a	estratégia	do	Programa	para	enfrentar	as
dificuldades	vivenciadas	pelos	setores	educacionais	católicos	mineiros	que	o
questionavam	em	decorrência	da	orientação	pragmatista	da	educação	americana.
Mereceu,	ainda,	destaque,	no	texto	de	Long,	a	referência	à	necessidade	de
trabalhar	com	pessoas	que	mantinham	e	exerciam	lideranças.	A	avaliação,
naquele	momento,	foi	a	de	que	essa	liderança,	considerando	a	necessidade	de
modernizar	o	trabalho	do	professor	primário,	era	exercida	pelos	professores	de
Escolas	Normais,	sobretudo	por	professores	que	lecionavam	metodologias	de
ensino.
Tal	avaliação	do	exercício	de	liderança,	no	decorrer	do	contato	com	a	realidade
educacional	brasileira,	sofreria	alterações,	levando	à	inclusão	da	categoria	dos
supervisores	como	agentes	multiplicadores.
Antes	de	concluir	a	parte	ora	enfocada,	fazem-se	necessárias	algumas	palavras
sobre	as	atividades	que	se	realizavam	no	Departamento	de	Currículo	e
Supervisão	que	compunha	o	desenho	do	Centro	Piloto.	Para	trabalhar	nesse
Departamento,	foi	enviada	aos	Estados	Unidos	a	bolsista	Marina	Couto.	Com	ela
se	iniciaram	as	atividades	de	currículo	e	supervisão,	sem	a	orientação	de
especialista	americano.
Nos	primeiros	anos,	a	participação	desse	departamento,	de	forma	prioritária,
realizou-se	em	duas	grandes	frentes.	Uma	delas	era	a	de	que	seus	técnicos	se
encarregassem	da	organização	dos	trabalhos	das	classes	de	demonstração	para
que	elas	garantissem	o	apoio	necessário	aos	cursos	e	a	outras	tarefas	do	Pabaee.
Nele,	as	professoras	primárias	responsáveis	pelas	classes	de	demonstração,	que
trabalhavam	em	tempo	integral,	passavam	parte	do	tempo	extraclasse	preparando
e	organizando	suas	atividades.	O	trabalho	dos	técnicos	do	departamento	não	era
diferente	daquele	realizado	por	supervisoras	das	escolas:	tinha,	como	alvo,	a
prática	pedagógica	na	escola	primária.
A	outra	frente	de	trabalho	do	departamento	de	currículo	e	supervisão	referia-se
aos	cursos	oferecidos	aos	professores	de	Escolas	Normais	iniciados	em	1959
(Cappen	–	Curso	de	Aperfeiçoamento	para	Professores	de	Escolas	Normais).
Tais	cursos	tinham	em	seu	currículo	conteúdos	que	permitiam	uma	visão	das
diferentes	metodologias	de	ensino	(linguagem,	aritmética,	estudos	sociais	e
ciências),	dos	métodos	audiovisuais,	psicologia,	administração,	currículo,	jardim
de	infância	e	avaliação.	Além	desses	cursos,	cada	aluno	especializava-se	em	uma
área	de	metodologia.	Eram	destinadas	252	horas	para	essa	especialização	e,
aproximadamente,	250	horas	para	os	demais	conteúdos.
Nessa	etapa,	a	supervisão	não	se	constituía	em	opção	de	especialização.	A
participação	dos	professores	do	departamento	nos	cursos	para	professores	de
Escolas	Normais	restringia-se	a	uma	disciplina	com	15	horas	de	duração	(2,8%
do	total)	sobre	currículo.	Nela,	incluíam-se	uma	visão	geral	de	um	curso	de
formação	de	professores	primários,	o	currículo	funcional	do	curso	de	formação	e
os	objetivos	do	ensino	na	escola	primária.
A	primeira	especialista	americana	a	trabalhar	naquele	departamento	foi	Rebecca
Barnhart,	que	chegou	em	outubro	de	1959	e	retornou	aos	Estados	Unidos	em
setembro	de	1961.	Ela	é	identificada,	no	Relatório	do	Pabaee,	como	“especialista
em	currículo”.	No	relatório	que	encaminhou	ao	ICA	(International	Cooperation
Administration)	ao	retornar	aos	Estados	Unidos,	Barnhart	sumarizou	as
principais	atividades	realizadas	pelo	Departamento	de	Currículo	e	Supervisão;
nelas,	incluiu	os	cursos	para	professores	de	Escolas	Normais,	a	organização	das
atividades	na	Escola	de	demonstração,	o	treinamento	das	especialistas	brasileiras
do	próprioPrograma,	a	produção	de	publicações	referentes	à	área	de	currículo.
Esse	relatório	deu	conta	da	emergência	de	atividades	visando	um	novo	tipo	de
público:	as	supervisoras	de	ensino.	Provavelmente	a	especialista	foi	testemunha
de	alterações,	na	prática,	dos	objetivos	do	Programa,	alterações	que	impuseram
nova	redação	à	revisão	do	acordo	assinado	em	31-12-1961.
A	incorporação	do	treinamento	de	supervisores
A	redação	dos	objetivos	do	Pabaee	na	extensão	do	acordo	de	1961	incluía	a
formação	de	supervisores	do	ensino.	A	justificativa	apresentada	para	essa
ampliação	dos	raios	de	influência	do	Programa	era	a	necessidade	de	assistir	os
professores	já	treinados	e	de	instituir	um	programa	de	treinamento	em	serviço
em	outras	escolas	elementares	e	centros	regionais.	Assim	ficaram	estruturados	os
objetivos:
1.	Treinar	quadros	de	instrutores	de	professores,	orientadores	e	administradores
para	várias	das	Escolas	Normais	mais	importantes	do	Brasil.
2.	Elaborar,	publicar	e	adquirir	materiais	didáticos,	tanto	para	as	escolas	normais,
quanto	para	as	elementares	do	Brasil.
3.	Fornecer	treinamento	em	serviço	através	de	demonstrações	a	outras	escolas
elementares	e	centros	regionais	do	Estado.
4.	Prestar	assistência	através	de	demonstrações	e	treinamento	em	serviço,	no
planejamento	e	construção	de	edifícios	escolares	funcionais	e	econômicos	e	na
projeção	e	produção	de	seu	respectivo	aparelhamento.
5.	Fornecer	assessoria	e	treinamento	em	serviço	na	organização	de	equipes	nas
comunidades,	para	um	programa	de	construção	de	escolas,	através	da	autoajuda.
6.	Enviar	aos	Estados	Unidos,	na	qualidade	de	bolsistas,	grupos	de	professores
de	escolas	elementares	e	normais,	recrutados	em	regiões	típicas	do	Brasil,	os
quais	retornarão	a	suas	respectivas	escolas	para,	sob	contrato,	integrarem	os
quadros	de	instrutores	de	professores,	pelo	prazo	mínimo	de	dois	anos,	e	enviar
aos	Estados	Unidos	autoridades	governamentais	de	educação,	para	observação	e
treinamento,	as	quais	estarão	capacitadas	a	exercer	uma	atividade	mais	influente
no	ensino	elementar	do	País,	após	o	seu	regresso.	(Acordo,	revisão	nº	1,	p.	2)
Comparando	esses	objetivos	aos	explicitados	no	acordo	inicial	(1956),	observa-
se	uma	ampliação	considerável	no	âmbito	de	ação	do	Programa:	no	acordo	de
1956,	o	treinamento	destinava-se	a	professores	de	Escolas	Normais,
consideradas	as	lideranças	que	promoveriam,	via	Cursos	Normais,	treinamento
dos	professores	primários.	Esses	professores	de	Escolas	Normais	constituíam-se
em	fatores	de	multiplicação	do	trabalho	do	Pabaee.	Na	revisão	de	1961,	o
treinamento	foi	estendido	aos	orientadores	e	aos	administradores.	A	modalidade
de	“treinamento	em	serviço”	foi	agregada	à	estruturação	original.	Anunciou-se	o
desenvolvimento	de	ações	para	o	planejamento	de	construções	escolares,
assessoria	e	treinamento	para	o	Programa	nas	comunidades	e	construção	de
escolas.	Além	dos	orientadores	e	dos	administradores,	a	revisão	do	acordo
incluía	bolsas	nos	Estados	Unidos	para	treinar	autoridades	educacionais
influentes	no	ensino	primário	brasileiro,	ou	seja,	para	treinamento	de	lideranças
que	atuavam	em	nível	de	sistemas	de	ensino.
Sem	diminuir	seu	investimento	no	treinamento	de	professores	de	Escolas
Normais,	a	revisão	do	acordo	acrescentava	novas	preocupações,	que	indicavam	a
incorporação	de	objetivos	de	novo	tipo.
Tratava-se	agora,	também,	de	treinar	profissionais	que	ocupassem	ou	pudessem
ocupar	posições	de	liderança	na	administração	do	ensino	e	aqueles	responsáveis
pelas	atividades	de	supervisão	em	escolas,	em	delegacias	regionais	de	ensino	ou
em	órgãos	de	planejamento	públicos.	Assim,	o	Pabaee	ampliou	sua	estratégia	de
resposta	aos	problemas	do	ensino	primário.
A	inclusão	das	construções	escolares	como	objeto	de	estudos	do	Pabaee	tinha
uma	explicação.	Renault,	que	continuava	na	codireção	da	Programação,	havia
assumido	a	coordenação	da	Campanha	de	Reparo	e	Restauração	de	Prédios
Escolares	após	sua	demissão	do	cargo	de	secretário	de	Educação,	em	março	de
1959.	Por	outro	lado,	o	Inep	estava	envolvido	em	programas	de	construções
escolares.
Na	verdade,	os	novos	objetivos	do	Pabaee	formalizavam	a	incorporação	de
atividades	que	vinham	se	realizando,	de	alterações	que	emergiram	no	contexto
educacional	onde	o	Programa	se	implantou.	Elas	responderam	a	demandas	do
campo	educacional	brasileiro.
De	fato,	o	Pabaee	vinha	ministrando	cursos	intensivos	de	supervisão	desde	o
primeiro	semestre	de	1960,	atendendo	à	solicitação	da	Secretaria	de	Educação	de
Minas	Gerais.
O	primeiro	desses	cursos,	realizado	em	janeiro	de	1960,	teve	como	alunas	28
inspetoras	de	ensino	do	interior	de	Minas	Gerais.	Segundo	relatos,	procurou-se,
nesse	curso,	deslocar	a	referência	à	“função	de	inspeção”	para	a	“função	de
supervisão”.	Schwab	referia-se	aos	participantes	como	“novos	supervisores”
(Relatório	mensal	de	atividades	de	janeiro	e	fevereiro	de	1960).
Os	planos	da	Secretaria	de	Educação	para	organizar	um	trabalho	de	supervisão
nas	inspetorias	regionais	incluíram	a	criação	de	núcleos	para	o	treinamento	do
professor	primário	nos	sete	agrupamentos	de	inspetorias	mineiras	e	geraram
demanda	de	vagas	para	possibilitar,	a	quatro	representantes	desses
agrupamentos,	a	realização	do	Curso	de	Aperfeiçoamento	para	Professores	de
Escolas	Normais	(Cappen).
Os	documentos	consultados	revelaram,	naquele	momento,	entre	membros	da
equipe	técnica	do	Pabaee,	uma	reação	ao	atendimento	às	demandas	da
Secretaria,	interpretadas,	ao	que	parece,	como	desvio	dos	objetivos	do	Programa,
que	previam	a	priorização	de	seus	investimentos	em	cursos	destinados	a
professores	de	Escolas	Normais.
Como	diretor	técnico	substituto,	Searles	(1960,	p.	1)	registrou	o	seguinte
comentário	no	relatório	de	atividades:
Tem	havido	discussão	sobre	o	que	algumas	pessoas	chamam	de	desvio	de	nossos
objetivos	formulados	como	um	Programa.	Talvez,	caso	exista	tal	desvio,	ele
existe	mais	nas	palavras	do	que	no	espírito,	visto	que	estaria	ajudando	a
educação	brasileira	e	obtendo	um	efeito	multiplicador.
As	resistências,	se	existiram,	foram	vencidas,	porque	a	partir	do	segundo
semestre	de	1960,	o	Pabaee	passou	a	incluir	na	listagem	das	especializações	do
Cappen,	a	opção	“Currículo	e	Supervisão”.	Aí,	sim,	pode-se	dizer	que	o	duo
currículo/supervisão	se	equiparara,	em	termos	de	prestígio,	às	metodologias	de
ensino.
O	contexto	educacional	brasileiro	e	a	ampliação	dos	objetivos
Como	se	explica	esta	alteração	dos	objetivos	do	Pabaee?	Uma	pista	interessante
para	a	resposta	a	essa	questão	encontra-se	no	relatório	de	Barnhart	(1961).	Ao
avaliar	sua	própria	participação	no	Departamento	de	Currículo	e	Supervisão	no
período	em	que	a	ele	esteve	vinculada	(1959-1961)	e	a	atuação	do	Programa	em
geral,	Barnhart	apresentou	duas	categorias	de	atividade:	dentro	e	fora	do	Pabaee;
no	item	referente	a	“fora	do	Pabaee”	observa:
O	interesse	em	algum	dos	tipos	de	assistência	do	Pabaee	vem	crescendo
rapidamente,	no	último	ano,	em	comunidades	distantes,	cidades	e	estados.	Onde
quer	que	se	encontre	um	aluno,	podem	ser	encontradas	evidências	do
treinamento	do	Pabaee	–	e	lá	se	faz	necessário	mais	assistência	para	fortalecer	e
ampliar	os	campos	de	atividades	(do	Programa).	Muitas	solicitações	vêm	ao
Pabaee	de	Instituições	que	não	enviaram	candidatos	(aos	cursos),	buscando
ajuda	na	revisão	de	currículos,	no	treinamento	de	professores,	seminários,	cursos
intensivos	para	professores	“em	serviço”.	É	um	desenvolvimento	significativo	e
revelador	do	programa	do	Pabaee,	que	alcançou	tais	proporções	que	justificam	a
coordenação,	por	uma	pessoa,	em	tempo	integral,	das	atividades	de	extensão.
(Barnhart	1961,	p.	10)
Barnhart,	dedicando	o	período	de	1959	a	1961	ao	Pabaee,	demonstrou	como	a
atividade	central	do	curso	gerou	novas	demandas	para	o	Programa,	entre	elas	a
colaboração	na	revisão	do	currículos	nos	estados	e	nas	cidades.	Evidentemente
as	professoras	que	realizavam	cursos	de	especialização,	ao	retornar	aos	seus
estados,	então	carentes	de	profissionais	com	competências	em	técnicas	de
ensino,	organização	de	programas	e	currículos	da	escola	primáriae	da	Escola
Normal,	eram,	com	frequência,	chamadas	a	participar	de	atividades	ligadas	às
Secretarias.	Não	existiam,	em	muitos	estados,	programas	e	currículos	com
objetivos,	conteúdos	e	metodologias	claramente	formulados,	como	se	aprendia
no	Pabaee.	Ao	assumirem	novas	responsabilidades,	os	órgãos	de	planejamento
solicitavam	assistência	aos	antigos	professores,	aumentando-lhes	as	tarefas,	a
que	Barnhart	considerou	“extensão”.
É	significativo	também,	nesse	movimento	do	Pabaee,	o	aumento	da	demanda	da
Secretaria	de	Educação	do	Estado	de	Minas	Gerais.	Como	já	foi	dito,	a
supervisão	em	escolas	primárias	institucionalizara-se	muito	cedo,	em
decorrência	das	reformas	de	Francisco	Campos,	ao	final	da	década	de	1920.	Ali
existia	o	cargo	de	supervisão,	exercido	por	profissionais	qualificadas	em	curso
pós-médio.	Ora,	era	natural,	então,	uma	certa	pressão	para	que	as	supervisoras
pudessem	usufruir	dos	cursos	oferecidos	pelo	Pabaee.	Os	planos	de
reorganização	do	sistema	estadual	de	ensino	geraram	também,	como	se	expôs,
demandas	de	atendimento	às	inspetoras	que,	esperava-se,	passassem	a
desempenhar	funções	mais	próximas	da	supervisão.
O	contato	com	a	realidade	educacional	brasileira	também	mostrou	que	o	poder
de	divulgar	as	novas	técnicas	não	se	restringia	aos	professores	de	Escolas
Normais,	considerando-se	que,	nas	décadas	de	1950/1960,	os	professores	leigos,
que	constituíam	boa	parte	da	população	docente,	não	passavam	pelas	Escolas
Normais.	Nesse	caso,	a	atuação	de	supervisores	funcionaria	para	o	chamado
“treinamento	em	serviço”.
Foi,	então,	o	contato	com	a	realidade	que	obrigou	o	Pabaee	a	um	esforço	de
adequação,	ampliando	sua	atuação	e	investindo	na	área	de	supervisão.	Essa	é
também	a	opinião	de	Paiva	(1979,	p.	45):
Os	primeiros	cursos	ministrados	pelo	Pabaee	tiveram	por	objetivo	proporcionar
estudo	especializado,	em	Metodologia	e	Psicologia	Educacional,	a	professores
de	Escolas	Normais.	À	medida	que	se	estudava	a	situação	educacional	no	Brasil,
a	natureza	dos	cursos	foi	sofrendo	modificações,	de	maneira	a	atender	também
às	necessidades	dos	supervisores,	diretores	de	escola,	regentes	de	classe	e
responsáveis	pelo	currículo.
A	atenção	dada	às	demandas	da	Secretaria	de	Educação	que	resultaram	no	curso
para	supervisores	foi	a	chave	para	quebrar	as	reservas	havidas	quanto	ao
Programa,	mantidas	por	autoridades	educacionais	do	estado,	segundo	Schwab,
no	relatório	dos	meses	de	janeiro	e	fevereiro	de	1960.
No	cenário	nacional	reaparecia,	segundo	Medeiros	e	Rosa	(1985),	a	inspeção,	de
forma	“modernizada”,	sob	a	denominação	de	supervisão	escolar.	No	início	da
década	de	1960,	iniciavam-se	ações	visando	à	constituição	de	Centros	de
Treinamento	do	Magistério	nos	estados.	A	ação	do	Pabaee	em	cursos	para
supervisores	que	atuariam	no	nível	dos	sistemas	de	ensino	foi	expandida	com
essa	política.	O	MEC	propôs	a	criação	de	dois	desses	Centros	em	cada	estado,	no
Programa	de	Emergência	(1962)	e,	posteriormente,	no	Plano	Nacional	de
Educação.	O	Plano	Trienal	de	Educação	(1963-1965)	previa	a	criação	de	40
Centros	de	Treinamento	do	Magistério	a	serem	mantidos	pela	União	e	a
formação	de	“professores	supervisores”,	que	dariam	assistência	a	professores
leigos	ou	regentes	de	ensino,	tomando	a	seu	encargo	o	acompanhamento	dos
trabalhos	em,	no	máximo,	dez	classes	primárias.
Observações	finais
Como	se	constata	pelo	relato	ora	apresentado,	o	Pabaee	não	trazia,	como	projeto,
ao	se	implantar	em	Belo	Horizonte,	uma	proposta	de	atuação	significativa	em
relação	à	supervisão	escolar.	Sua	prioridade	era	influir	na	prática	pedagógica	das
professoras	primárias	da	rede	pública	de	ensino,	utilizando,	como	via
preferencial,	o	trabalho	realizado	pelas	professoras	de	metodologia	de	ensino	das
Escolas	Normais.
As	ideias	sobre	a	necessidade	de	implantação	de	sistemas	de	supervisão
emergem	do	contexto	educacional	brasileiro.	É	verdade	que	elas	se	gestaram	no
convívio	direto,	com	a	experiência	de	outros	países,	em	particular	a	dos	Estados
Unidos,	e	nos	contatos	e	nos	compromissos	decorrentes	da	participação	do	Brasil
nos	órgãos	internacionais	de	cooperação.
É	no	contato	com	a	realidade	dos	problemas	do	sistema	de	ensino	brasileiro	que
o	Pabaee	se	abre	para	se	ocupar	da	supervisão,	evidentemente,	imprimindo	sua
marca,	ou	seja,	baseando-se	na	perspectiva	tecnicista	que	considerava	a	resposta
moderna	e	adequada	ao	enfrentamento	dos	problemas	do	ensino	primário
brasileiro.	A	supervisão	que	se	dissemina	com	a	ajuda	do	Pabaee	supervaloriza
métodos	de	ensino	das	disciplinas	como	questões	fundamentais,	em	detrimento
de	uma	análise	mais	ampla	das	causas	dos	problemas	da	escola	primária.	A
supervisão	adota	como	solução	a	técnica	de	ensinar	linguagem,	aritmética,
ciências,	estudos	sociais.
Não	cabe,	no	âmbito	deste	texto,	analisar	o	significado	da	via	que	a	supervisão
dissemina	sob	a	influência	do	Pabaee,	mas	interessa	assinalar	que,	no	Inep,
quando	se	instala	o	Pabaee,	estavam	sendo	gestadas	explicações	sobre	os
problemas	da	escola	primária	numa	outra	perspectiva,	as	quais,	no	entanto,	não
frutificaram,	como	o	tecnicismo	do	Pabaee,	mais	adequado	aos	rumos	que	o	país
tomava	sob	a	presidência	do	mineiro	Juscelino	Kubitschek.
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3
O	DIREITO	AO	SABER	COM	SABOR.	SUPERVISÃO	E
FORMAÇÃO	DE	PROFESSORES	NA	ESCOLA	PÚBLICA
Célia	Frazão	Linhares
Não	te	percas	tão	miseravelmente	em	teus	pensamentos.
Lady	Macbeth/Shakespeare
...	o	pobre	é	a	garantia	de	uma	visão	de	futuro.
Milton	Almeida	dos	SantosA	maior	tragédia	da	escola	pública	brasileira	é	que	ela	convive	com
o	conformismo	da	sociedade
Em	meio	a	tantas	informações	e	teorias	que	se	autodefinem	como	verdadeiras	e
científicas	que	não	param	de	se	amontoar,	trazendo	a	impressão	de	que	algo	de
importante	e	decisivo	está	para	ser	descoberto,	inventado,	anunciado,	a	crise	da
escola	pública	–	que	reflete	e	aprofunda	a	perda	do	exercício	ético	entre	nós	–
continua	a	desafiar	nossa	capacidade	de	formulação	e,	por	conseguinte,	de
intervenção.
O	desastre	educacional	produzido	dentro	da	escola,	que	todos	sabemos	estar
interligado	aos	processos	crescentes	de	exclusão	social,	vem	sendo	pouco
referido	à	sua	dimensão	simbólica,	à	construção	histórica	de	valores	e
significados	comuns	sem	os	quais	não	é	possível	elaborar	um	projeto
pedagógico.
A	problemática	educacional	tem	sido	tratada	como	uma	subsidiária	das	questões
econômicas	e	financeiras,	tanto	na	perspectiva	conservadora	e	liberal	–	com	que
se	alinha	a	nova	direita	–	quanto	no	tratamento	elaborado	pelas	versões	vulgares
do	socialismo	e	do	materialismo	histórico-dialético	que	se	articulam	no	campo
progressista.
Em	outras	palavras:	se	dependemos	quase	exclusivamente	das	análises
econômicas	para	nossos	estudos	e	nossas	explicações	do	processo	social	e
educativo,	é	importante	sublinhar	que	a	esfera	da	produção	não	saiu	ex	nihilo,
mas	vem	sendo	partejada	por	embates	tramados	historicamente,	quer	dizer,
fermentados	na	cultura,	marcados	pelo	acervo	da	memória	social,	saturados	de
imagens	que,	por	serem	pouco	discutidas,	funcionam	como	a	priori,	legitimando
alguns	exercícios	do	poder	em	detrimento	de	outros.
Agora,	por	exemplo,	a	classe	dirigente	insiste	em	apresentar	promessas	de
solução	para	as	graves	questões	nacionais,	apontando	as	privatizações	e	as
políticas	neoliberais,	enquanto	nega	à	sociedade	brasileira	a	participação	na
construção	de	um	processo	civilizatório.	Na	atual	refundação	capitalista,	não	há
lugar	para	escolhas	de	sujeitos	históricos:	a	opção	colocada	está	presa	na	lógica
da	competição	sem	trégua,	em	que,	por	um	lado,	impõe-se	a	vitória	dos	mais
fortes	–	num	verdadeiro	darwinismo	social	–,	para	ser	consolidada	com	a
legitimação,	ainda	que	dada	de	forma	passiva	pelos	derrotados	e,	por	outro,
profetiza-se	a	aproximação	do	caos,	da	barbárie.	O	dilema	estabelecer-se-ia	com
a	seguinte	“escolha”:	engole-se	a	tirania,	o	que	corresponderia	a	resignar-se	com
ela,	ou	sua	exacerbação	vai	acabando	por	aniquilar	o	que	ela	própria	proclama
defender,	ou	seja,	as	possibilidades	de	vida	social.
Ao	minimizarmos	o	esforço	humano	e	social	para	submeter	a	ordem	cotidiana	a
um	exercício	de	reinvenção	–	em	que	a	memória	seja	restaurada	como	um	baú	de
sonhos	não	realizados,	de	conflitos	ainda	não	extintos	e,	portanto,	de	fonte	de
criação	que	tensiona	o	instituído	no	sentido	de	sua	superação	em	busca	de	maior
solidariedade[10]	–	perdemos	um	solo	ético	de	fundamental	importância	para	a
educação.
Como	podemos	olhar,	descrever,	estudar	a	questão	da	escola	pública	sem
estremecer	diante	dela?
Como	podemos	nos	perder	tão	miseravelmente	num	jogo	de	pensamentos	que	se
dissolvem	em	aplausos	ou	em	efeitos	de	eco,	sem	que	as	elaborações	sejam
seriamente	assumidas	como	instrumentos	de	intervenção	da	realidade?	Afinal,
como	a	escola	pública	se	encontra	já	representa	um	intenso	argumento
inviabilizando	as	esperanças	de	diálogo	e	interlocução,	sem	as	quais	a	escola	não
encontra	sustentação	possível.
Só	mesmo	uma	forte	naturalização	das	desigualdades	–	que	nos	esconde	seu
profundo	enraizamento	histórico,	com	que	vai	se	alimentando	a	razão	cínica[11]
que	nivela	todos	os	atos	a	uma	avaliação	utilitária	e	particularista	–	é	que	torna
possível	que	não	nos	assustemos	com	a	desintegração	da	escola	pública.	Sem
escola	pública	que	possibilite	uma	aprendizagem	do	conhecimento	como	uma
tensão	emancipatória,	como	realizar	o	fundamental	exercício	de	escolhas	em	que
cada	nação	define	concretamente	sua	presença	nessa	rede	de	interdependências
que	vai	se	tornando	cada	vez	mais	intensa?
Não	podemos	minimizar	a	importância	que	a	escola	e	a	cultura	letrada	exercem
no	sentido	de	frear	os	imediatismos	das	reações	e	de	ampliar	os	instrumentos	não
só	para	a	sobrevivência	humana	mas,	sobretudo,	para	a	compreensão	da	trama
histórica	e	das	escolhas	alternativas	de	respostas	que	cada	sociedade	pode	ter	e
que	podem	constituir-se	como	projetos.
Mas	bem	sabemos	que	não	é	qualquer	escola	que	irá	nos	ajudar	a	responder	às
graves	questões	intensificadas	nesse	período	de	crise.	Sem	uma	escola	pública
que	nos	permita	aceder	à	palavra,	desnaturalizar	as	iniquidades	com	que	fizemos
nossa	história,	elaborar	projetos	coletivos	e	individuais,	ou	seja,	sonhar	outros
mundos,	será	bem	mais	difícil	sair	deste	abismo	onde	a	miopia,	própria	da	luta
pela	sobrevivência,	nos	mantém.
A	rigor,	sob	intensas	ameaças	da	excludência	física	e	moral,	a	ânsia	de
sobreviver,	que	marca	este	final	de	século,	aproxima-se	da	selvageria	com	que	o
capitalismo	se	estruturou	no	século	XVII,	que	fez	Hobbes	concluir	que	“o
homem	é	o	lobo	do	homem”.
Em	países	de	capitalismo	periférico	como	o	nosso,	em	que	os	direitos	civis,
sociais	e	humanos	sempre	primaram	por	sua	função	de	adereços,	pendentes	de
uma	retórica	que	primou	pela	convivência	com	a	iniquidade	e	com	a	injustiça,
legitimadas	por	usos	e	costumes,	a	organização	da	sociedade	e	a	noção	da
própria	humanidade	foram	se	impregnando	de	hierarquias	e	conflitos.	Uns
seriam	mais	humanos	que	outros.
Roberto	da	Matta	explorou	a	expressão	“sabe	com	quem	está	falando?”	para	nos
mostrar	os	limites	das	discussões	em	face	de	um	escalonamento	de	privilégios,
muito	assentado	na	nossa	estrutura	social.
Darcy	Ribeiro	(1995),	remexendo	nossa	herança	coletiva,	registrou	que
“levamos	sempre	conosco	a	cicatriz	de	torturador,	impressa	na	alma	e	pronta	a
explodir	na	brutalidade	racista	e	classista”
Em	consequência	de	tudo	isso,	a	indignação	parece	cabível	quando	privilégios	já
naturalizados	são	feridos	ou	ameaçados.	Só	alguns	poucos	têm	espaço	para	a
indignação[12]	–	com	seus	mecanismos	de	terrores	–,	enquanto	para	os	demais
caberia	esperar	pelas	concessões	e	pelos	favores.	Oscila-se	assim	entre	a
violência	ativa,	ora	dirigida	aos	destituídos	de	poder,	ora	por	eles	acionada,	e	a
violência	passiva,	autodirigida	pelas	próprias	vítimas,	e	que	redunda	em	um
conformismo	que	só	cresce	com	o	crescimento	das	excludências	e	suas	ameaças.
Uma	e	outra	exprimindo	a	banalização	da	vida;	uma	e	outra	oscilando	em
manifestações	de	aplausos	e	de	condenação.	Isto	equivale	à	alternância	das	duas
faces	de	uma	mesma	moeda:	a	moral	da	sobrevivência	e	o	jogo	de	luz	do
espetáculo	narcísico.	Afinal,	não	podemos	nos	esquecer	de	que,	entre	nós,	o
limite	que	separa	o	herói	do	vilão	é	sempre	poroso,	precário.
Somente	a	pulverização	dos	significados	sociais	pode	nos	atirar	nesse	vale-tudo
e,	portanto,	nesse	vale-nada,	fazendo-nos	espectadores	de	um	processo	como	o
que	vem	vivendo	a	escola	pública	brasileira,	quando	se	lhe	arranca	uma
identidade	social,	denegando,	a	alunos	e	professores,	o	acesso	a	saberes	e
conhecimentos,	a	uma	elaboração	de	um	autoconhecimento	pela	partilha	das
experiências	coletivas,	como	matrizes	de	projetos,	expectativas	e	esperanças,
com	que	viabilizaríamos	nosso	presente,	que	sempre	se	faz	como	uma	travessia
para	o	futuro.
No	nosso	caso,	para	qual	futuro?
Numa	época	em	que	o	próprio	exercício	ético	exige	um	nível	complexo	de
organização	de	conhecimento,	quando	a	identidade	nacional	supõe	a	elaboração
coletiva	de	símbolos	e	significados	sociais	(Castells	1990),	é	preciso	encarar	que
um	tipo	de	educação	escolar	que	não	atinge	os	sujeitos	históricos	obstrui	nossa
participação	nacional	nesse	processo	de	independência	da	cultura	e	da	economia,
que	nos	vem	sendo	imposto	num	circuito	homogeneizador	e	opressivo.
Isto	nos	lança	um	desafio	em	dose	dupla:	ampliar	a	escola,	ampliando
internamente	seus	espaços	de	atuação	de	sujeitos.
Sabemos	que	o	sujeito	é	sempre	conquista	contra	o	assujeitamento:
assujeitamento	material,	mas	também	assujeitamentomoral,	que	são	operados
simultânea	e	interligadamente.	A	servidão	se	faz	norma	quando	os	“educados”
comandam	o	espetáculo	social,	exibindo	instrumentos	de	cálculos	e	planos,
justificando	suas	durezas	pela	suposta	função	de	impedir	o	caos,	a	exclusão	e	as
guerras	que	não	param	de	promover.	Guerras	que,	mais	que	bens	materiais,
destroem	hoje	sociedades,	classes	e	grupos	sociais	e	pessoas	em	verdadeiros
assassinatos	culturais,	para	usar	uma	expressão	de	Glauber	Rocha.
Não	podemos	nos	esquecer	de	que	são	os	que	dispõem	de	um	alto	nível	de
escolaridade,	e	que	pertencem	às	classes	dirigentes,	que	comandam	os	grandes
crimes	contra	a	humanidade,	embora	a	imagem	do	ladrão	e	do	delinquente	seja
atribuída,	com	frequência,	aos	pobres,	aos	negros	e	mestiços,	aos	gays.	Contra
eles,	é	imputada	a	responsabilidade	sobre	os	problemas	nacionais:	são	eles
apontados	como	a	causa	da	violência	urbana,	do	desemprego,	do	atraso	nacional,
das	endemias	e	epidemias,	da	falta	de	aprendizagem	escolar	e	por	aí	vai...
São	ainda	os	altamente	escolarizados	que	vão	forjando	a	tecnologia,	como	arma
de	luta,	à	sua	imagem	e	semelhança,	e	logo	impondo	sua	eficiência	e	sua	frieza
como	modelo	da	e	na	produção	social.	Homens	e	mulheres-máquina,	em
diferentes	locais	da	sociedade,	acionam	botões	propulsores	de	uma	produção
acumulativa,	competitiva,	que	se	exibe	em	guerras	“cirúrgicas”	e	técnicas,	como
a	do	Golfo,	que	vimos	tão	recentemente	pela	televisão.	Uma	alegoria	do	produto
escolar?	Escolarizados	que	sabem	engendrar	esquemas	potentes	de	destruição,
que	conhecem	como	intensificar	os	mecanismos	de	acumulação,	mas	desprezam
a	vida,	são	reféns	de	uma	cultura	que	alterna,	como	faca	de	dois	gumes,	a
permissão	de	matar	e	a	de	sobreviver	(Canetti	1995;	Ensensberger	1995).
Se	o	momento	é	de	crise	da	própria	civilização,	dela	só	sairemos	com	uma
escola	que	se	refaça,	escapando	da	reprodução	do	já	feito	mas	sem	abandonar	a
longa	estrada	percorrida.	Até	porque	sabemos	que	o	passado	não	nos	condena,
desde	que	aprendamos	a	conjugar	a	tradição,	extirpada	de	seu	entulho
conformista,	com	o	esforço	de	criação	do	novo.
Sem	um	processo	de	escolarização	vivo	e	duradouro,	qualquer	processo	de
democracia	e	desenvolvimento	sofrerá	de	artificialidades	intransponíveis.
A	perversão	do	conformismo	social	com	a	negação	escolar	é	tão	mais	grave
porque	vai	conformando	uma	opção	de	escola	que,	desde	o	início,	vem
marcando	a	sociedade	brasileira:	uma	escola	dual	que	agora	toma	a	forma	de
escola	apartada	(Buarque	1994),	fraturada	e	distanciada	em	suas	partes,	por
abismos	que	não	param	de	se	aprofundar.
Sem	que	a	sociedade	brasileira	assuma	a	escola	como	uma	questão	fundamental,
continuaremos	sem	direção	para	o	próprio	sistema	de	produção	e	para	o	próprio
sistema	político.
Produzir	para	quê?
Controlar	com	que	direção?	Em	que	sentido?
Ingressar	nos	processos	de	mundialização	só	nos	interessa	se	pudermos	escolher
a	forma	específica	de	nossa	contribuição,	como	um	exercício	de	liberdade	e
libertação,	próprio	de	sujeitos	coletivos	em	tensão	com	sujeitos	individuais.
Até	agora	o	crescimento	da	economia	brasileira	fez	se	pari	passu	com	a
concentração	de	bens	e	a	ampliação	da	miséria.
***
Segundo	divulgação	do	Unicef,	o	Brasil	é	o	6º	país,	entre	os	piores	do	mundo,
em	matéria	de	evasão	escolar.	Apenas	39%	dos	que	ingressam	na	1ª	série
atingem	a	5ª	série.	Os	companheiros	recordistas	em	expulsão	escolar	(expressão
que	arranca	esta	realidade	do	eufemismo	usual,	que	é	a	evasão	escolar)	são
pequenos	países	africanos,	alguns	com	recentes	processos	de	independência
política,	muitos	em	guerra	interna	e	com	economia	absolutamente	insignificante,
portanto	em	nada	comparáveis	ao	Brasil.	Vale	a	pena	reconhecê-los:	Guiné
Bissau	(20%),	Etiópia	(31%),	Moçambique	e	Angola	(34%),	Madagascar	(38%).
Os	números	que	retratam	essa	realidade	assustadora	para	um	país
reconhecidamente	pujante	como	o	Brasil,	com	ilhas	de	sofisticação	e
prosperidade,	não	podem	vir	isoladamente.	No	ranking	internacional,	o
professorado	de	São	Paulo,	o	estado	mais	rico	da	Federação,	ocupa	uma	posição
inferior	ao	de	Bombaím	–	considerada	na	Índia	como	a	cidade	da	miséria.	Mas
as	comparações	não	param	aí.	Confrontado	com	o	que	foi	há	30	anos,	o	salário
do	professor	sofreu	uma	redução	de	um	quarto	de	seu	valor	(Veja,	20/11/1991),
ocupando	um	dos	últimos	lugares	entre	os	mais	baixos	salários	do	mundo.
Afinal,	este	é	um	problema	em	que	as	evidências	vão	exibindo	um	nível	de
gravidade	que	não	pode	passar	despercebido.	Quando	comparado	aos	garis	e
mesmo	a	certos	tipos	de	empregados	domésticos,	o	professor	do	ensino	básico
público,	na	maioria	dos	casos,	fica	em	desvantagem	financeira.[13]
O	número	de	pedidos	de	demissão	da	escola,	depois	de	um	concurso	público,	e
até	com	a	estabilidade	garantida,	bem	nos	dá	a	medida	do	desespero	desses
professores,	frustrados	em	suas	expectativas	coletivas	e	individuais	como	classe
popular,	como	mestiços	e	como	mulheres.
No	Rio	de	Janeiro,	20	pedidos	diários	de	demissão	da	rede	municipal	e	estadual
(Veja,	24/5/1995)	mostram	uma	realidade	que	se	inscreve	como	frustração	no
cotidiano	escolar.	Para	confirmar,	como	exceção	à	regra	–	capturada	por	Chico
Buarque	de	Holanda	–	,	a	dor	do	povo,	dos	professores,	aqui	e	acolá,	começa	a
sair	nos	jornais,	assinalando	incorporações	à	população	que	mora	nas	ruas,	como
foi	o	caso	notório	da	professora	de	Campos	que	se	alojou	debaixo	da	ponte	(JB,
22/8/1989).
Mas	ainda,	na	grande	imprensa,	começam	a	aparecer	publicidades	assinadas	por
empresas,	às	vésperas	das	eleições	de	1994,	destacando	o	orçamento	de	10
bilhões	de	dólares	gastos	com	alunos	repetentes,	como	uma	maneira	de	precaver
aqueles	que	com	“boa-fé”	compõem	a	elite,	que	têm	negócios	ou	empregos	e	que
portanto	pagam	a	despesa	com	programas	populares	de	educação,	para	o	fato	de
que	deveriam	estar	alertas	em	relação	à	má	administração	pública	e	a	todo	aquele
desperdício.	Mas	não	param	aí.	Insinuam	o	prejuízo	de	tentar	dar	escola	a	quem
não	quer	aprender.	Velha	tecla	de	culpabilização	da	vítima.
***
Num	país	com	uma	pós-graduação	que	já	conta	com	a	produção	de	mais	de	seis
mil	dissertações,	as	quais	alimentam	um	movimento	editorial	respeitável	que
garante	uma	expressão	dentro	e	fora	do	Brasil,	como	convivemos	com	este
descalabro	público?
Enquanto	se	difundem	as	comunicações	via	satélite,	televisão	a	cabo	e	antenas
parabólicas	emprestam	às	cidades	e	às	suas	periferias	o	aspecto	de	uma	horta	de
cogumelos	gigantes	(Macaé	constitui	um	exemplo	concentrado	deste	tipo	de
paisagem),	a	escola	pública	se	esvai,	perdendo	sua	credibilidade	e	a	identificação
social	de	seu	trabalho.
Esta	constatação	e	este	espanto	fazem-se	mais	agudos	quando	confrontamos	o
alto	teor	de	inventividade	que	percorre	a	cultura	nacional:	uma	inventividade
posta	à	prova	neste	exercício	diário	de	driblar	ameaças	de	morte.	Uma
inventividade	que	parece	condenada	a	ser	mantida	fora	da	escola,	privando-a	do
trabalho	de	traduzir	problemas	que	são	ocultados	como	enigmas	invisíveis	em
desafios	formulados	e	discutidos	pedagogicamente.
Como	produzimos	uma	escola	tão	excludente	que	à	medida	que	cresce
fisicamente	desintegra-se	internamente?	Como	mantemos	uma	instituição
escolar	que	exclui	do	exercício	de	fazer-se	sujeito	de	conhecimento	mesmo
aqueles	que	inclui	dentre	seus	pertencentes:	professores	e	alunos?
Com	o	pulso	escravocrata,	o	Brasil	reservou	a	aprendizagem	letrada	para	a
classe	dirigente,	tanto	que	até	na	década	de	1920,	apenas	25%	da	população
brasileira	sabiam	ler	e	escrever.	Os	restantes	75%	constituíam-se	de	analfabetos
(Anuário	Estatístico	do	Brasil	1936,	citado	por	Ribeiro,	M.L.	1982).	Agora	que
os	pobres,	sempre	considerados	a	ralé	que	nada	merece,	entraram	na	escola,	ela
torna-se	diluída	em	ensinamento	e	perdida	em	termos	de	significação,	sentido	de
vida,	incapaz,	portanto,	de	vertebrar	um	projeto	pedagógico	potente.
A	escola	ficou	vazia.	Até	então,	mesmo	livresca,	repetitiva,	autoritária,	ela
veiculava	os	interesses	da	classe	que	ocupava	as	posições	de	mando	e	que,
portanto,	controlava	a	sociedade	brasileira.Agora,	os	que	estão	dentro	dela	têm	cultura	e	interesses	diferentes	daqueles
primeiros.	Não	lhes	interessa	conservar	os	privilégios	que	sempre	os	excluíram,
mas	fazer	do	saber	escolar	algo	vivo,	para	ser	refeito,	que	lhes	ajude	a	entender
mais	de	si	mesmos,	entendendo	mais	os	movimentos	que	o	Brasil	vem
produzindo;	um	saber	escolar	que	contribua	na	ampliação	de	escolhas,	um	saber
aberto	a	virar	ferramenta	em	suas	mãos,	para	que	possam	formatar	espelhos
capazes	de	os	refletir	inteiros,	em	suas	lutas	e	dificuldades,	em	seus	sonhos	e
pesadelos,	em	suas	alegrias	e	em	seus	infortúnios;	um	saber	que	possa	ser
traduzido	em	narrativas,	em	que	o	ser	popular	e	o	ser	pobre	não	sejam
incompatíveis	com	a	dignidade	humana.
Mas	é	neste	enclave	que	a	proposta	de	uma	escola	verdadeiramente	pública	cai
numa	rota	de	colisão	com	o	capitalismo	e	suas	marcas	próprias	dentro	da	cultura
brasileira,	ambos	forjados	pela	excludência:	se	na	escola	entram	os	pobres,	a
escola	deve	ser	pobre	–	eis	a	conclusão	perversa.
Nesta	colisão,	ainda	está	presente	mais	um	agravante:	a	democracia	como	um
projeto	de	direitos	universais,	que	precisava	de	professores	para	a	difusão	de
ensinamentos	cívicos,	morais	e	racionais,	considerados	indispensáveis	para	a
participação	cidadã,	vem	sofrendo	processos	de	encolhimento.	Atualmente,	sua
imagem	tem	um	ar	constrangido	de	quem	se	faz	e	se	refaz	em	gabinetes
fechados,	definindo	regras	para	legalização	de	sucessivas	retiradas	de	direitos
populares.
É	em	meio	a	esses	movimentos	que	se	pode	entender	o	problema	da	escola
pública:	abandonada	pelos	governos,	denegrida	pela	rede	de	informação	social,
escanteada	do	debate	público,	esvaziada	teoricamente,	ocupada	transitoriamente
por	profissionais	que	tentam	conciliar	a	própria	sobrevivência	com	sua
permanência	na	escola,	sistematicamente	corroída	pela	profecia	do	não	tem	mais
jeito.
Os	velhos	esquemas	de	luta,	como	a	greve	por	exemplo,	parecem	não	responder
à	magnitude	do	problema.	A	convicção	de	que	é	urgente	instituir	uma	nova
concepção	e	uma	nova	prática	de	escola	só	não	é	maior	que	a	ausência	de	pistas
concatenadas,	por	deficiência	de	uma	reflexão	teórico-pedagógica	que	conjugue
os	avanços	do	pensamento	filosófico,	das	ciências	sociais,	da	psicanálise	e	da
literatura	com	o	desejo	de	compartilhar	o	saber	como	um	exercício	de
engrandecimento	da	vida	humana	e	social.
Para	não	admitir	o	próprio	e	incômodo	vazio,	a	escola	se-faz	arrogante,	como	se
herdasse	a	empáfia	da	classe	patrimonialista	e	escravocrata	que	a	mantinha
ocupada	e	controlada.	Por	isso,	além	de	vazia,	a	escola	assume	um	ar	pedante,
distante	de	sua	realidade	social,	dos	pais	de	seus	alunos,	sobretudo	dos	mais
pobres,	fazendo-se	um	espaço	por	onde	ecoam	gritos	para	manter	a	disciplina	e
por	onde	os	silêncios	significam,	com	frequência,	negação	de	presenças
indesejadas,	impossibilidade	de	intervenções	mais	efetivas	e	criadoras.	Mesmo
sabendo	das	contradições,	a	força	da	hegemonia	vai	confirmando	medrosos,
fracassados	e	revoltados:	uns	e	outros	marcados	por	um	espelho	que	os	reflete	no
que	eles	têm	de	possibilidades,	as	mais	negativas,	devolvendo-lhes	assim	uma
imagem	autodesprezível.
Esta	é	a	nossa	tragédia.	Tragédia	tão	mais	funda	que	se	recusa	a	ser	aliviada	com
unguentos	tecnicistas.	Tragédia	da	qual	não	podemos	nos	livrar	sem	contarmos
com	os	movimentos	instituintes	com	que	os	insatisfeitos	buscam	instalar
caminhos	de	emancipação	na	sociedade	e	na	escola.
Se	nossa	sociedade	e	nossa	escola	não	tivessem	que	responder	à	demanda	dos
pobres,	desses	“trabalhadores	sem	trabalho”,	desses	“estudantes	sem	estudo”,
desses	lavradores	sem	terra,	desses	que,	com	dificuldade,	entram	na	emergência
dos	“hospitais	sem	a	esperança	da	saúde”,	bastariam	remendos	leves	na	política
econômica,	social	e	educacional.	Mas	pobres	e	miseráveis	penetram	na	cidade,
na	escola,	e	sacodem	o	presente	e	nos	fazem	olhar	o	futuro,	num	exercício
ousado	de	instituir	o	novo	ou	abdicar	da	democracia,	da	convivência,	da	própria
humanidade.
Portanto,	uma	tragédia	que	não	pode	ser	enfrentada	só	com	os	que	estão	dentro
da	escola	–	professores	e	alunos,	supervisores,	orientadores,	administradores	e
seus	auxiliares	–,	mas	que,	sem	eles,	também	não	será	resolvida.	A	eles	cabe
traduzir	em	saberes	e	fazeres	escolares	os	projetos	populares	que	vão	sendo
gestados	pelos	sujeitos	históricos.
As	pressões	sociais	para	que	um	número	crescente	de	pessoas	possa	usufruir	do
conhecimento	escolar	vêm	sendo	respondidas	com	escolas	públicas	desfibradas.
As	escolas	tornam-se	um	tipo	de	confinamento	institucionalizado,	cuja	vantagem
seria	ocupar	as	crianças,	transmitindo-lhes	um	saber	sem	sabor,	impotente	para
fazê-las	descobrirem-se	vivas.	Sua	tarefa	é	impor	aos	alunos	um	tipo	de
disciplina	e	persistência	que	os	dispõe	para	lutar	só	pela	sobrevivência	e	que	se
entrelaça	com	um	processo	de	aniquilamento	moral,	empurrando-os	à	resignação
do	perdedor.
Assim,	vai	se	delineando	uma	nova	taxionomia	para	as	instituições	escolares
(Apple	1993;	Zemelman	1993):	a	destinada	aos	herdeiros	dos	triunfos	da	classe
dirigente,	com	ciência,	tecnologia	e	inventividade,	capitaneadas	para	a
competição	–	a	chamada	escola	de	mercado;	as	mantidas	para	preparar	as
“formigas”	que	engrossarão	as	filas	dos	candidatos	aos	empregos	–	a	chamada
escola	mínima;	e,	finalmente,	identificamos	um	tipo	mais	degredado	de	escola,
que	mais	se	assemelha	a	um	depósito	de	crianças	e	jovens,	que	prepara
perdedores	conformados	–	a	subescola.	Uma	subescola	para	uma	subclasse:	os
excedentes	da	sociedade	de	consumo.
Em	primeiro	lugar,	não	podemos	extirpar	da	crise	nem	os	riscos	nem	as
oportunidades	com	que	as	encruzilhadas	são	feitas:	nem	só	sonhos	bons,	mas
tampouco	pesadelos	todas	as	noites.
É	preciso,	sim,	indignar-se	com	os	desacertos	e	os	blefes	consentidos,	e	temer,
responsabilizar-se	e	atuar	para	encontrar	caminhos	novos	para	a	escola	brasileira.
Como	despertar	se	o	pesadelo	nos	maltrata?
Uma	das	árias	da	ópera	em	que	foi	traduzido	Werther,	a	obra	apaixonada	do
jovem	Goethe,	tem	um	título	muito	expressivo:	“Por	que	despertar	se	o	sonho	é
tão	bom?”
Recentemente,	retomando	meu	contato	com	essa	ópera,	refleti	o	quanto	o
embalo	do	sonho,	fechado	nele	mesmo,	pode	desviar	do	contato,	às	vezes
doloroso	mas	sempre	rico,	da	própria	realidade.	Se	tudo	está	bem	para	que
despertar?	Lembrei-me,	então,	de	Milton	Almeida	dos	Santos	(Veja,
16/10/1994),	em	recente	entrevista,	depois	do	recebimento	do	prêmio
internacional	“Vautrin	Lud	Vali”,	em	que	ele	credita	aos	pobres	a	maior
esperança	de	projetarmos	uma	sociedade	mais	solidária,	pois	sua	presença	nos
faz	perceber	que	não	bastam	remendos,	mas	sim	que	é	preciso	pensar	o	novo.
Não	podemos	embarcar	no	acalanto	de	sonhos	que	nos	impeçam	de	ver	e
enfrentar	a	realidade.	Sofremos	de	uma	outra	ameaça	–	um	pesadelo	–	que
igualmente	nos	priva	de	uma	intervenção	efetiva,	tanto	mais	quando	nos	mantém
em	estado	de	tensão	e	até	nos	impede	de	sonhar.
Robert	Kurtz	(1992)	tem	apontado	que	o	colapso	da	modernidade	vai	arrastando
um	esgotamento	de	sonhos,	de	expectativas,	de	esperanças	com	que	se	alimentou
a	vida	social.	Dentro	da	problemática	escolar,	podemos	ver	o	crepúsculo	de	uma
escola,	forçada	a	declinar	com	um	cerco	material	e	cultural	de	seus	professores.
Dentro	dela,	o	foco	dos	olhares	parece	ser	a	porta	da	saída.[14]	Alguns	esperam
a	aprovação	no	mestrado	para,	com	a	obtenção	de	uma	bolsa,	se	prepararem	para
avanços	na	carreira,	atingindo	a	docência	na	educação	superior;	outros	buscam
um	novo	emprego;	outros	pedem	deslocamento	para	o	trabalho	administrativo;
finalmente,	outros	requerem	exoneração,	aposentadoria	precoce	ou	abandonam	o
emprego.	Quem	permanece	na	escola	ainda	desfruta	de	um	horizonte,	onde	seja
possível	desenhar	projetos	coletivos	de	um	trabalho	pedagógico?
Para	onde	foram	as	perspectivas	de	uma	escola	universal,	interagindo	com
processos	de	democratização,	de	ampliação	de	direitos	civis	e	políticos,
traduzindo-se	no	mundo	do	trabalho,	na	participação	cidadã?
A	escola	parece	agora	não	ter	espaços	para	sonhos	tão	bons.	Parasobreviver,	foi
cedendo	às	imposições	burocráticas,	tecnicistas,	imediatistas,	particularistas,
levada	pelo	comando	capitalista,	abdicando	de	perspectivas	utópicas.
A	aprendizagem	escolar	implica	transmissões	e	aquisições	que	só	são
consolidadas	mediante	práticas	recorrentes,	em	que	o	esforço	de	descoberta	e
elaboração	própria	precisa	ser	insistentemente	empenhado.	Daí,	todo	o	edifício
da	educação	estar	assentado	num	investimento	que	tem	o	futuro	como	alvo.
Não	podemos	perder	de	vista	que	são	os	projetos,	portanto	as	referências	que
ultrapassam	o	presente,	que	lhes	dão	sentido	e	organização.	O	próprio	caos	só
pode	ser	organizado	se	visto	para	além	da	confusão	aparente,	pelo
estabelecimento	de	relações	que	ideias,	conjecturas	e	imagens	podem
potencializar.	São	essas	pistas,	ainda	que	fugazes,	que	vão	nucleando	a
constituição	de	um	sentido,	uma	direção	para	a	conduta,	um	significado	para	as
ações	humanas,	sociais.
Quer	sob	as	ameaças	do	pesadelo	ou	sob	o	embalo	do	sonho,	há	a	tentação	de
deixar	escapar	o	real.	Este,	indomável	por	qualquer	teoria	e	planejamento,	está
ancorado	num	movimento	de	fabricação	de	sentidos,	que	não	para	de	se	retecer,
de	se	realinhar,	de	nos	surpreender	pelas	novas	direções	assumidas,	frutos	de
ações	complexamente	interligadas,	que	vão	demarcando	as	configurações
históricas,	sempre	em	movimento.
Mergulhados	no	sonho,	podemos	escapar	da	realidade	para	melhor	enfrentá-la;
podemos	também	nos	fazer	ausentes	da	trama	histórica	e	acabar	por	perdê-la.
Por	outro	lado,	quando	os	sonhos	se	ausentam,	o	presente	se	desorganiza,	as
perspectivas	que	abrem	o	horizonte	do	amanhã	se	fecham,	o	hoje	nos	asfixia.
Todos	sabemos	que	não	arbitramos	a	hora	de	despertar	do	pesadelo;	que	ele	nos
mantém	como	reféns	de	acontecimentos	imaginários	de	alta	densidade	dramática
nos	quais	não	podemos	interferir.
Seria	exagerado	afirmar	que	estamos	vivendo	um	pesadelo	na	escola	pública
brasileira?
Ninguém	deseja	permanecer	no	pesadelo,	mas	a	saída,	também,	não	depende	de
atos	deliberados	só	pela	consciência,	pela	vontade.
Para	alguns	professores,	para	acordar	do	pesadelo	é	preciso	sair	da	escola.
Entre	o	permanecer	no	pesadelo	e	o	desligar-se	da	escola,	há	registros	que	nos
interessam	investigar.
Como	despertar,	como	organizar	um	alarme	conjunto	que	em	vez	de	sustos	e
precipitações,	arme-nos	para	uma	construção	de	larga	duração	histórica?
Com	que	instrumentos	a	supervisão	pode	contribuir	para	a	saída	do	pesadelo?
Como	se	entrelaçariam,	nesse	trabalho,	os	supervisores	e	os	professores?
Para	que	a	supervisão?	Entre	o	desgaste	retórico	da	questão	e	o
confinamento	utilitário
Como	em	outros	temas,	a	problemática	dos	especialistas	em	educação	parece
uma	questão	desgastada.	Tantas	publicações,	tantas	polêmicas,	que	parecem
resultar	inócuas.	O	assunto	parece	desaparecer	da	cena	dos	debates	–	mesmo
sem	estar	resolvido.
Em	outra	direção,	ocorrem	movimentos	que	atribuem	tarefas	pontuais	à
supervisão	ou	aos	especialistas,	como	se	todo	esse	encaixe	de	trabalhos	pudesse
se	isolar	das	interligações	em	que	a	própria	identidade	da	escola	se	entrelaça
com	os	rumos	da	sociedade.
Muito	já	se	escreveu	sobre	a	divisão	de	trabalho	escolar	e	sobre	a	hierarquização
de	competências	para	combater	os	especialismos	pedagógicos.
Embora	não	sejam	nem	um	pouco	desprezíveis	as	condições	de	nascimento	da
supervisão	e	das	demais	habilitações	em	que	a	pedagogia	se	especializou	no
período	da	ditadura,	entendo	que	a	complexidade	da	sociedade	e	da	escola
brasileira	comporta	uma	divisão	técnica,	desde	que	usada	para	fortalecer	o
trabalho	pedagógico,	vincado	por	um	projeto	de	escola	que	não	se	mediocrize,
que	não	renuncie	a	si	mesma	em	sua	especificidade	de	instituição	de	ensino	e
aprendizagem	que	não	pode	deixar	de	responder	aos	apelos	éticos	que,	de	forma
intensa,	atravessam	a	atual	crise	da	civilização.
A	crítica	pedagógica	já	denunciou	também,	com	insistência,	a	exclusão	dos
trabalhadores	e	dos	pobres	da	escola.	Muito	menos	se	tem	falado	de	uma
exclusão	mais	sutil,	presente	no	próprio	processo	de	inclusão,	que	vai	demitindo
e	amortecendo	alunos	e	professores:	o	engessamento	dos	sujeitos	na	escola,	sua
paulatina	reificação,	sua	redução	a	objetos	repetidores.
Para	encaminhar	minha	reflexão	sobre	a	supervisão	e	a	educação	de	professores
no	Brasil,	vou	tentar	levantar	duas	questões,	intrinsecamente	interdependentes,	e
que	percebo	tecidas	por	uma	densa	multiplicidade	de	relações	político-
pedagógicas:	a	questão	do	sujeito	e	a	questão	do	conhecimento	escolar,	para	me
aproximar	de	algumas	pistas	que	vão	se	delineando	como	possíveis	para
professores,	supervisores,	orientadores,	dirigentes,	alunos	e	auxiliares	da	escola
organizarem	um	solo	de	experiências	e	reflexões	partilhadas,	de	onde	possam	ser
partejadas	perspectivas	de	futuro.
A	questão	do	sujeito	e	a	questão	do	conhecimento	escolar
Na	Grécia	de	Péricles	(IV	a.C.)	vamos	encontrar	o	debate	sobre	a	quem	cabe	ser
o	sujeito	da	Verdade	e	quais	as	relações	com	a	política	e	os	valores	que	o
processo	de	conhecer,	ensinar	e	argumentar	deve	manter.
Para	os	filósofos,	a	apreensão	da	Verdade	dependeria	da	contemplação	de
essências	que	deveriam	ser	traduzidas	com	rigor,	o	que	só	o	pensamento
conceitual	poderia	realizar.
Extremas	exigências	pairavam	sobre	os	filósofos,	que	deveriam	pautar	sua	vida
por	um	entranhamento	entre	saber	e	fazer,	pela	busca	de	aproximação	dos
valores,	preservando	o	conhecimento	de	vínculos	com	os	interesses	subjetivistas
e	particularistas.	A	Verdade,	como	derivada	de	essências	invariáveis,	não	poderia
transmutar-se	segundo	o	gosto	e	os	interesses	do	auditório.
Seriam	os	filósofos	os	únicos	habilitados	e	legitimados	a	traduzir	as	essências
em	conhecimentos,	estes	sim	passíveis	de	serem	ensinados?
Já	os	sofistas	ensinavam	a	qualquer	um,	sem	preocupações	com	a	Verdade,	mas
“de	olho”	na	retórica	do	convencimento	que	garantisse	a	defesa	de	seus
interesses.	Para	eles,	o	sujeito	humano	seria	o	espelho	da	realidade	e,	como	esta
é	múltipla,	também,	ele	poderia	abrigar	uma	série	de	perspectivas	de
conhecimento.	Daí	a	célebre	afirmação	de	Protágoras	“O	Homem	é	a	medida	de
todas	as	coisas”,	que	Pirandelo	dramatizou	com	sua	obra	teatral	Assim	é	se	lhe
parece.
Na	perspectiva	sofística,	portanto,	o	conhecimento	poderia	ser	sempre	usado,
sem	preocupações	como	ideal	da	Verdade,	mas	não	poderia	prescindir	do
referendum	das	multidões.	A	verdade	nem	seria	eterna	nem	variável;	a
neutralidade	seria	impossível,	diríamos	numa	linguagem	atual,	e	todos	os
cidadãos	teriam	direito	a	disputar	o	consenso	e	tentar	persuadir	os	demais	sobre
seus	direitos,	independentemente	de	qualquer	conhecimento	prévio.
Datam,	desta	velha	discussão,	embates	que	continuam	absolutamente	vivos	e	que
carecem	ser	rediscutidos	e	revitalizados	na	escola.	O	que	é	conhecer?	Quem
pode	conhecer?	Para	que	se	procura	conhecer?
Como	o	conhecimento	se	torna	cúmplice	dos	poderes?	Quais	as	dimensões	éticas
do	conhecimento?	Quais	as	relações	entre	conhecimento	e	verdade?	O	que
significa	a	curiosidade	por	conhecer?	Como	o	desejo	de	conhecer	abre	caminhos
de	descoberta,	potencializadores	da	ação	humana?	Por	que	o	saber	e	o	desejo	se
condensam	na	composição	da	alegria,	da	felicidade?
É	possível	ler	no	cotidiano	escolar,	como	no	discurso	pedagógico,	a	presença
daqueles	dois	antagonistas:	sofistas	e	filósofos.	Só	que	a	história	foi
acrescentando	outras	dimensões	àqueles	embates	gregos.
O	conhecimento	como	algo	externo,	no	estilo	de	uma	bagagem	cada	vez	mais
volumosa	que	temos	que	adquirir,	está	apoiado	num	tipo	de	razão	onipotente	e
acumuladora	de	informações.	Uma	razão	“educada”	como	conquista	e	privilégio
de	uma	elite,	com	a	qual	os	outros	–	“os	não	educados”	–	deveriam	aprender,
ainda	está	em	vigência.	O	mecanismo	de	produção	e	consumo	do	capitalismo
industrial	vem	reforçando	a	concepção	do	conhecimento	como	bagagem.	O
interacionismo	como	uma	transação	entre	objeto	e	sujeito	que	evite	tanto	o	jugo
do	dado,	presente	no	empirismo	e	no	positivismo,	quanto	o	voluntarismo,	forte
nos	racionalismos	e	nos	idealismos,ainda	tem	pouco	vigor	na	escola,	embora
recorrentemente	apareça	no	discurso	pedagógico.	Para	a	grande	maioria	dos
professores,	a	concepção	interacionista	não	ultrapassa	a	esfera	celebrina.
Em	estudo	extremamente	interessante,	realizado	na	Argentina,	a	pesquisadora
Alícia	Entel	(1989)	confirma	o	quanto	a	concepção	de	conhecimento	na	escola
está	carregada	por	uma	imagem	de	“ente”	exterior,	um	tipo	de	uma	bagagem.
O	culto	dessa	bagagem,	a	ênfase	na	sua	independência	e	na	sua	neutralidade,	as
promessas	de	um	progresso	sem	limites,	o	investimento	em	projetos	onipotentes
de	domínio	e	submetimento	da	natureza,	para	um	possível	e	sempre	transferido
benefício	da	humanidade	como	um	todo,	foram	marcos	no	desenvolvimento
moderno	dessa	concepção.
Quando	o	humano	foi	considerado	como	alvo	da	ciência,	um	tipo	de	realismo
psicológico	localizou	a	essência	como	algo	individual,	interno	e	congênito,	que
deveria	ser	atendido,	esculpido	e	libertado.
Mas	toda	a	discussão	sobre	o	conhecimento,	os	conteúdos	e	os	métodos
escolares	parece	ter	desaquecido	a	problemática	da	verdade	e	da	polifonia	que	a
envolve.
Com	a	complexidade	social,	que	implica	mediações	e	afastamentos	entre	os	que
produzem	conhecimentos	e	os	grupos	que	os	absorvem	e	os	consomem,	o
retorno	à	filosofia	aparece	como	uma	urgência	para	desfetichizar	as	ciências
sociais	(Heller	1991).
Sem	discutirmos	as	relações	entre	o	conhecimento	e	a	verdade,	perdemos	o	solo
natural	para	arguirmos	os	programas	escolares.	Quem	os	define?	Com	que
critérios?	Como	neles	estão	inscritos	os	interesses	de	uma	sociedade	em	conflito,
que	não	pode	ser	identificada	só	com	os	interesses	dos	triunfadores?	Qual	o
lugar	para	as	lutas	que	buscaram	construir	uma	sociedade	mais	justa?	Como
retornar	o	legado	de	projetos	e	esperanças	que	animaram	a	história?	Como
recolocar	em	pauta	os	anseios	dos	que	foram	derrotados?	Como	aurir	dos
conflitos	sua	força	criadora?
Nunca	é	demais	repetir	que	a	crise	ética	se	expressa	e	se	aprofunda	com	os
obstáculos	à	própria	comunicação	humana.
Se	a	verdade	não	é	mais	imutável	e	independente	dos	objetos	e	sujeitos,	mas
produzida	continuamente	pela	história,	sempre	em	movimento,	a	elaboração	dos
conhecimentos	se	faz	num	campo	de	batalhas	onde	os	interesses	de	classe	e	de
grupos	se	confrontam	em	conflitos	abertos	ou	camuflados.	A	ciência	e	a	filosofia
passam	a	ser	vistas,	não	como	uma	contemplação	ou	captação	de	essências,	mas
como	uma	produção	histórica	que	envolve	processos	de	racionalização	e
abstração	e	que,	portanto,	não	pode	prescindir	da	prática	social,	da	ação	coletiva.
Os	valores	não	são	entidades	superiores	à	história,	que	estariam	magnetizando	os
humanos	como	deuses	no	Olimpo.	Avaliar	o	que	é	verdadeiro	e	falso	não
depende	de	medidas	externas,	às	quais	vamos	confrontar	fatos	e	as	posições	com
as	quais	tentamos	traduzi-los.	A	expectativa	de	que	o	conhecimento	pudesse
repousar	em	certezas	traduzidas	em	resultados	insofismáveis	e	exatos	que
privilegiaram	a	matemática	como	a	linguagem	preferencial,	e	até	exclusiva,	com
que	os	cientistas	poderiam	ter	acesso	aos	segredos	e	aos	mistérios	da	criação	já
está	incluída	no	acervo	de	mitos	ultrapassados.	Deles	sobram	sentimentos	que	se
aproximam	ao	de	uma	certa	orfandade:	Quem	irá	sancionar	nossos	acertos	e
nossos	erros?	Qual	é	o	peso	e	a	leveza	de	sermos	sujeitos	de	nosso
conhecimento?	Com	quem	vamos	dividir	a	responsabilidade	de	nossas	escolhas,
de	nossas	ações?	Com	quem	podemos	buscar	pistas,	as	mais	satisfatórias,	para
vencer	as	inseguranças,	as	confusões,	as	ambiguidades,	já	que	todo	discurso	é
por	si	mesmo	polissêmico?
As	verdades	e	os	conhecimentos	são	produzidos	socialmente,	dentro	das	lutas
nas	quais	as	condições	da	existência	são	engendradas.
Como	manter	a	objetividade,	se	a	luta	por	construir	conhecimentos	e	defender	a
verdade	passa	por	interesses	em	conflito,	nos	quais	estamos	ineludivelmente
implicados?
Como	renunciar	à	objetividade,	sem	fazer	da	Verdade	uma	causa	menor,
esvaziada	de	sua	dimensão	moral	e	ética?
Quais	as	implicações	de	aceitarmos	concepções	como	“Verdade	absoluta”	e
“Verdade	relativa”?
Se	a	Verdade	não	se	localiza	fora,	mas	dentro	da	própria	história,	a	neutralidade
não	será	possível,	mas	não	estamos	nunca	isentos	da	responsabilidade	de
tecermos	a	emancipação	social,	humana.
Em	nome	de	que	e	de	quem	um	conhecimento	pode	ser	declarado	verdadeiro?
Quais	os	limites	éticos	que	separam	a	argumentação	da	empulhação?
Se	os	valores	se	fazem	nossos	à	medida	que	os	traduzimos	em	ações	e	palavras,
ou	em	palavras	como	ações,	seria	também	por	aí	que	eles	seriam	construídos	e
confirmados,	nessa	interação	entre	o	sujeito	que	conhece	e	que	se	exprime	e	age
e	o	objeto	que	vai	sendo	conhecido.	Essa	interação,	feita	por	indivíduos,	carrega
a	tensão	social,	coletiva,	histórica,	as	marcas	da	cultura	com	que	é	produzida	e
da	liberdade	com	que	o	ser	humano	se	define.	Aí	reside	nossa	responsabilidade
de	sujeitos	morais	que	somos.
O	saber	com	sabor	na	construção	do	sujeito	do	conhecimento
Com	a	concepção	de	conhecimento	como	uma	carga	externa	que	devemos
adquirir	e	que	nós,	professores,	precisamos	permanentemente	obter	e	transmitir
para	fazer	de	nossos	alunos	seres	“educados”,	a	escola	vem	funcionando	como
uma	usina	de	moer	sonhos	e	fibras	de	sujeitos.	O	conhecimento	–	que	deveria
auxiliar	os	estudantes	a	se	conhecer,	conhecendo	a	história	e	os	conflitos	de	seu
povo	–	da	forma	como	vem	sendo	ensinado	acaba	por	funcionar	como	mais	uma
rede	de	amordaçamento	da	voz	e	atrofia	do	pensamento.
Sem	os	sujeitos	do	ensino	e	da	aprendizagem,	ou	contra	eles,	contra	seus
interesses,	o	saber	se	faz	amargo	e	com	o	sabor	de	derrota,	como	se	fosse	preciso
quebrar-se	a	si	mesmo	para	aprender.
Essa	é	uma	das	lições	que	Freire	(há	mais	de	quatro	décadas)	insistentemente
nos	ensina:	“A	da	paixão	de	conhecer	que	nos	insere	numa	busca	prazerosa	ainda
que	nada	fácil”	(1967,	p.	11).
É	impressionante	o	número	de	cientistas	e	pensadores	que,	revendo	suas
trajetórias	de	vida,	param	nas	lembranças	da	escola	para	focalizar	o	desperdício
da	paixão	de	aprender	e	o	desvio	da	curiosidade	e	do	interesse	de	buscar
respostas,	como	forma	potente	de	contribuir	com	a	vida.
Há	toda	uma	intersubjetividade	escolar,	educacional,	que	precisa	ser	recuperada,
rememorada	para,	nesse	exercício,	repensarmos	as	camadas	da	história	que
foram	se	naturalizando	num	senso	comum	pedagógico.
Na	memória	secular	da	escola	e	seus	antecedentes	podemos	encontrar	tanto
jograis,	trovadores,	cantadores	épicos,	bufões,	narradores	e	poetas,	que	ora
vagavam	de	lugar	em	lugar,	como	detentores	de	um	tipo	de	palavra	pública,	ora
serviam	em	cortes,	casas	feudais	e	abadias,	ou	ensinavam	ao	ar	livre,	perto	dos
mercados	(Manacorda	1989),	como	aqueles	copistas	que	caprichavam	na
caligrafia	artística	como	uma	forma	de	obter	penitência	e	descontar	pecados	(Le
Goff	1989).
Tanto	remetendo	ao	riso	–	que	Rabelais	já	havia	entendido	como	uma	forma	de
afirmação	da	vida	–	quanto	ao	grotesco	–	tão	presente	na	cultura	medieval	–
aquelas	vozes	itinerantes	estremeciam	a	estabilidade	dos	dogmas	pela	circulação
de	uma	“literatura”	que	era	recriada	em	cada	apresentação	e	que	se	renovava	em
múltiplos	contatos.	Vozes	que	retrataram	a	posição	da	mulher:	seus	conflitos,
suas	condições	de	vida,	suas	resistências,	suas	surpresas,	seus	desejos,	suas
reversões.	Vozes	potentes	que	ameaçavam	e	que	pagaram	pela	partilha	da	alegria
instituinte	também	nos	tribunais	da	Inquisição.[15]	Vozes	que	vão	expressando	o
declínio	do	feudalismo	e	do	imediatismo	das	reações	guerreiras	e	que	abrem
canais	para	um	outro	estilo	de	paixões	em	que	o	lirismo	e	a	conquista	das
mulheres	passam	por	uma	economia	dos	afetos	que	foi	redefinindo	as	relações
amorosas	em	meio	a	um	interligamento	de	funções	político-econômicas	que
conhecemos	como	“processo	civilizador”	(Elias	1994).
Não	podemos	nos	esquecer	de	que	o	auge	desta	vocalidade	criadora
correspondeu	a	um	período	dos	mais	brilhantes	da	literatura	medieval	(Zumthor
1993).
Talvez	seja	oportuno	lembrar,	como	faz	Ensensberger	(1995,	p.	44),	nossasgrandes	dívidas	para	com	as	culturas	analfabetas,	posto	que	foram	elas	que
inventaram	a	literatura,	com	suas	“formas	elementares,	do	mito	à	canção	de
ninar,	do	conto	de	fadas	ao	canto,	da	oração	à	charada	[...].	Sem	a	transmissão
oral	não	existiria	a	poesia,	e	sem	os	analfabetos	não	haveria	livros”.
Mas	se	recuarmos	um	pouco	mais	no	tempo,	poderemos	surpreender	na	história,
nos	fins	do	século	VIII	e	começo	do	IX,	o	que	alguns	historiadores,	como	Le
Goff,	denominam	de	Renascença	Carolíngia.	Período	marcado	por	uma	extensa
atividade	de	compilação	das	obras	antigas	que	se	fazia	simultaneamente	ao
fechamento	das	escolas	externas	aos	mosteiros.	Uma	produção	considerável	de
manuscritos	respondia	a	um	exercício	de	entesouramento	e,	portanto,	sem	a
circulação	e	a	divulgação	que	vitalizassem	as	obras.	Apenas	representavam	valor
econômico,	como	os	utensílios	de	prata.	Mas	a	própria	feitura	dos	livros	também
representava	uma	obra	de	sacrifício	e	penitência	que,	no	fundo,	respondia	a	uma
exigência	de	mortificação	que	poderia,	numa	contabilidade	funesta,	ser	trocada
pela	garantia	do	céu.
Desta	rápida	olhada	nesse	“renascimento”	tão	avarento,	recolhemos	dois
registros	importantes:
1)	como	a	escrita,	os	títulos	escolares	e	acadêmicos	não	podem	ser	considerados
um	valor	em	si,	posto	que	eles	se	referem	a	uma	compreensão	da	realidade	e	a
uma	atuação	na	vida,	a	que	muitas	vezes	eles	servem	como	obstáculos.
2)	como	são	profundas	as	raízes	que	tentam	enlaçar	os	livros	com	o	sacrifício
sem	grandeza,	arrancando	do	processo	de	conhecimento	seu	mais	potente	vigor:
a	alegria	da	criação	que	se	sustenta	em	sujeitos	que	conjugam	saber	e	desejo.
Os	dois	registros	servem	para	nos	mostrar	como	foi	se	preparando	essa	atual
política	de	conhecimento	que	hierarquiza	sem	parar	os	saberes,	desqualificando
a	vida	em	favor	do	cálculo	utilitarista.	De	tudo	isso,	resulta	a	expulsão	da
alegria,	como	expressão	de	afirmação	e	criação	da	vida,	para	consolidar	um
adestramento	de	seres	coisificados,	verdadeiros	objetos	com	movimento,
submetidos	às	conveniências	de	uma	“sobrevivência	com	alto	padrão	de
qualidade	e	conforto”.
Já,	no	século	XVI,	Montaigne	retoma	de	Rabelais	a	crítica	da	escola	livresca,
copista	e	burra,	que	empanturra	o	aprendiz	de	receitas	e	informações	que	só
servem	para	impedi-lo	de	ser	gente.	O	autor	de	Gargantua	e	Pantagruel,	que
havia	liberado	ironia	nesta	novela,	mostrou	o	necrotério,	em	que	ritos	vazios	iam
enterrando	a	esperança	e	a	vida	num	extraviado	processo	de	educação	que	nada
significava	para	o	educando	senão	um	exercício	de	negação	que	culminava	com
sua	própria	coisificação.	Contra	este	desperdício	de	vida	humana,	Rabelais
propôs	o	jogo,	a	brincadeira.
“Ciência	sem	consciência	não	é	senão	ruína	da	alma.”
Na	própria	ação	do	sujeito,	Montaigne,	como	Rabelais,	vincula	a	alegria	de
conhecer.	Mas	recusa	com	maior	veemência	o	ideal	enciclopédico,	de	“cabeça
bem	cheia”,	enfatizando	a	“cabeça	bem	feita”.	Para	isto,	ele	acreditava	ser
essencial	livrar-se	das	ideias	já	prontas	e	das	lições	fechadas,	pela	provocação	da
curiosidade	do	aluno,	aproveitando	a	matéria	simples,	que	a	própria	vida	e	a
experiência	nos	vão	fornecendo.
No	fundo,	sua	indignação	dirige-se	contra	os	processos	que,	em	nome	de	uma
cultura	erudita	e	refinada,	vão	minando	a	força	dos	jovens	e	fazendo-os	abatidos,
passivos,	acovardados.	Com	base	neste	entendimento,	o	autor	de	“Ensaios”
contrapõe-se	aos	pedantismos	das	supostas	culturas	superiores	e	defende	o
direito	da	palavra	do	jovem	aprendiz,	e	com	ele	a	aventura	de	aprendizagens	que
fujam	aos	cânones	da	mesmice.	Basta	de	enfeitar	a	sabedoria	com	este	adorno
pobre	e	feio,	que	é	uma	suposta	seriedade,	que	tem	a	aparência	de	tristeza.
Apesar	do	óbvio	que	este	apelo	trouxe,	fortes	razões,	enraizadas	em	interesses	e
hábitos,	contrapuseram-se,	e	ainda	continuam	em	vigência,	à	entrada	das	forças
de	criação	no	conhecimento	escolar,	que	o	tornariam	potente	para	quem	o
organiza,	o	ensina	e	o	aprende.
A	tristeza,	a	sisudez	e	o	tom	de	sacrifício,	que	de	longas	datas	envolvem	a	escola
e	que	fizeram	com	que	Shakespeare	afirmasse	“o	amor	corre	para	o	amor,	como
as	crianças	fogem	da	escola”,	não	podem	ser	deslocados	só	pela	força	das
novidades	tecnológicas	e	do	consumo	pedagógico.
Em	vez	de	afirmar	que	as	brincadeiras	ou	as	novidades	facilitariam	o	trabalho
escolar	e	por	isso	deveriam	ser	injetadas	no	processo	de	ensino-aprendizagem,
entendo	que	é	a	própria	concepção	de	conhecimento	e	de	escola	que	está	em
questão:	um	conhecimento	sem	mistério	e	sem	enigmas,	que	deve	ser	carregado
como	um	peso	pela	vida	afora,	subjugando,	subalternizando,	ou	um	processo
escolar	que	participe	da	aventura	humana,	que	não	pode	ser	engessada	num	rol
de	utilidades	imediatas,	mas	que	nos	proponha	questões,	para	cujas	respostas
possamos	dialogar	permanentemente	com	a	vida,	num	exercício	de	vida.
Por	que	a	sabedoria	vai	se	tornando	antagônica	aos	bancos	escolares?
Se	esta	questão	tem	sido	respondida	pela	argumentação	da	força	dos	interesses
capitalistas,	exigentes	de	um	processo	disciplinador	que,	dominando	a	escola,
aniquila	a	imaginação	e	o	idealismo	de	lutar	contra	as	opressões	e	de	criar	laços
solidários,	considerados	até	poucos	anos	atrás	como	uma	característica	dos
jovens,	eles	não	podem	quebrar	o	vigor	do	saber	empenhado	em	resolver
desafios,	investindo	em	esperanças	e	projetos	de	quem	ensina	e	de	quem	estuda.
Memória	e	narração:	Biografia	da	escola
Começamos	esta	comunicação	falando	do	desastre	que	vem	extraviando	a	escola
pública,	discutimos	como	professores	e	surpervisores	vivem	um	período	de
extremas	dificuldades	dentro	da	escola,	posto	que	os	problemas	se	acumulam	e
se	exprimem	com	um	tal	nível	de	intensidade	que	cada	susto,	ainda	sem	ser
ultrapassado,	confronta-se	com	a	presença	de	outras	ameaças	mais	assustadoras:
ao	desmonte	da	escola	e	da	preparação	do	professor	dos	anos	70,	que
correspondeu	a	uma	massiva	evasão	de	alunos,	vem	se	seguindo	a	extrema
dilapidação	do	professor	e	de	suas	condições	de	trabalho,	que	o	faz	conviver
com	escolas	modernas	e	monumentais	sem	recheio	pedagógico,	e	com	espaços
obsoletos	e	mal	conservados.	Nos	anos	80	deu-se	a	evasão	do	professor,	que
continua	aumentando.	Nos	anos	90,	a	violência	urbana,	as	quadrilhas
contraventoras	decidem	sobre	o	fechamento	da	escola	e	o	crime	e	a	morte
convivem	e	agravam	velhos	problemas	escolares.
Mas	nessa	situação	de	caos	e	portas	fechadas,	inscreve-se	um	esgotamento	de
sonhos	dentro	da	escola,	que	evoca	a	grande	ameaça	de	convulsões	intestinais,
embates	pela	sobrevivência	sempre	posta	a	perigo,	e	que	vai	produzindo	uma
miopia	que	retém	no	miúdo,	no	retalho,	nas	migalhas,	nas	soluções	imediatistas,
os	problemas	da	escola.
A	trajetória	de	vida	dos	professores	vem	sendo	estudada	na	literatura
internacional,	através	dos	ciclos	de	vida,	como	correspondendo	a	fases	como:
tensão	e	descoberta,	estabilização	e	preocupação	didática,	sedimentação	da
experiência	com	emergência	de	novas	ideias,	autoquestionamento,	serenidade	e
distanciamento	afetivo,	conservantismo	e	desinvestimento	(Nóvoa	1992).[16]	Na
escola	brasileira,	tal	é	a	provisoriedade	do	vínculo	de	trabalho	que	aqueles
professores	com	mais	de	15	anos	de	exercício	profissional	já	se	tornam	quase
figuras	raras.
Sabemos	todos	que	um	campo	de	conhecimento,	de	saber	e	fazer,	não	se
desenvolve	se	não	contarmos	com	indivíduos	que	invistam	na	sua	construção,
construção	que	não	tem	uma	visibilidade	imediata.[17]	A	provisoriedade	como
norma	funciona	como	uma	espécie	de	ácido	corrosivo	para	a	constituição	de
qualquer	instituição	social,	tal	como	o	próprio	campo	de	conhecimento
pedagógico,	que	se	relaciona,	de	diferentes	maneiras,	com	o	status	e	as
possibilidades	da	carreira	profissional.
Para	que	os	professores	exerçam,	com	autonomia,	a	docência,	precisam	ir	com
ela	construindo	o	reconhecimento	da	importância	de	sua	função	pela	sociedade,
da	qual	o	salário	e	as	condições	de	trabalho	são	expressões.	É	este
reconhecimento	que	garante	e	abastece	de	autoridade	a	função	pedagógica,
oferecendo-lhes	um	espelho,onde	a	imagem	da	profissão	pode	ser	retocada	e
redefinida,	num	tipo	de	negociação	com	a	sociedade,	com	a	escola	e	com	o
próprio	profissional.
A	política	de	desqualificação	da	educação	pública,	em	vigência	em	nosso	país,
vai	cortando	as	possibilidades	de	autonomia	do	professor.	Sem	salário,
pertencendo	a	uma	classe	subalternizada,	sem	relação	instituinte	com	o	saber,	a
autoridade	pedagógica	enfrenta	extremos	dasafios	e	ameaças.
Na	medida	em	que	o	percurso	do	professor	dentro	da	escola	torna-se	algo
passageiro,	revestido	de	um	caráter	transitório	em	face	das	condições	de	trabalho
que	lhe	são	impostas,	a	convivência	com	os	colegas	torna-se	rarefeita	e
amargada	pelas	desilusões	de	um	tipo	de	experiência	sofrida	que	ainda	não	foi
trabalhada	para	libertar	o	sentido	de	dignidade	presente	na	luta	de	grande	parte
dos	professores	e,	pior	ainda,	destes	muitas	vezes	ocultada.
Agravando	essa	situação,	quase	inexistem	mecanismos	para	“amortecer”	o
choque	da	entrada	dos	professores	na	escola.	Se	a	primeira	fase	da	vida	do
professor,	conforme	a	literatura	especializada	e	já	mencionada,	aparece	como
sendo	de	tensão	e	descobrimento,	mesmo	nos	países	onde	a	escola	tem	uma
história	de	maior	solidez,	nos	relatos	de	professores	brasileiros	o	exercício	inicial
consiste	em	verdadeiro	ritual	de	golpes	que	poderíamos	chamar	a	peito	aberto.
Golpes	tanto	mais	fortes,	que	parecem	não	contar	com	uma	rede	de	significações
que	se	entrelacem	em	projetos	pedagógicos,	quer	de	caráter	político	e,	portanto,
social,	coletivo,	quer	de	caráter	individual.
Sabemos	que	a	estrutura	institucional	muda	com	mais	rapidez	do	que	as
expectativas	e	as	imagens	que	sobre	ela	guardamos.	Até	bem	pouco	tempo,	ser
professora	arrastava	um	alto	prestígio	social	que	levou	as	classes	populares	a
investir	neste	tipo	de	formação,	imaginando	através	da	carreira	do	magistério
alcançar	prestígio	e	acesso	a	um	tipo	de	intelectual	intermediário	(expressão	de
Gramsci	1978),	mas	também	ajudar	no	sentido	de	que	as	jovens	pobres
escapassem	do	trabalho	manual	que,	além	de	pesado,	mantém-se	com
conotações	muito	negativas	na	cultura	ibero-americana.
Com	uma	formação	deficiente	e	ainda	com	algumas	idealizações,	os	professores
ingressam	na	carreira	sem	maiores	respaldos.
Em	contraste	com	o	campo	educacional,	encontramos	nas	profissões	de
prestígio,	como	medicina	e	direito,	espaços	organizados	para	favorecer	a
aprendizagem	do	que	a	tradição	foi	demarcando	como	essencial	para	os
iniciantes.
No	caso	da	escola,	o	supervisor	poderia	assumir	esse	trabalho,	fazendo-se
mediador	entre	os	novatos	e	a	experiência	docente:	experiência
institucionalizada,	vitalizada	pela	reflexão.
Uma	das	características	de	períodos	históricos	de	intensa	mutação,	como	o
nosso,	é	o	requerimento	de	qualificação	e	aperfeiçoamento	continuados.	O	nível
desta	qualificação	(mais	criativa	e	autônoma,	com	o	envolvimento	do
pensamento,	ou	mais	reprodutora,	adestradora	e	mecânica)	tem	sua
correspondência	com	as	hierarquizações	concretizadas	no	mundo	do	trabalho.
Para	redefinirmos	os	rumos	da	escola,	para	o	fazermos	como	um	exercício	de
sujeitos,	poderíamos	entranhá-la	de	memória	e	narração.
Os	parâmetros	do	conhecimento	escolar	estão	assim	contaminados	pelo	consumo
da	informação	jornalística,	pela	própria	acumulação	e	fragmentação	capitalista,
pelo	tecnicismo	mecânico	e	por	um	tipo	de	positividade	que	é	a	de	impor	a
resignação,	que	se	manifesta	na	concessão	de	sua	própria	domesticação	–	feita
sob	controle	rigoroso	ou	como	negligência	oficializada.	Tudo	isto	leva	a	escola	a
sepultar	as	possibilidades	de	narração	e	de	promoção	de	um	tipo	de	processo	de
ensino	e	aprendizagem	que	investigue	as	necessidades	históricas	dos	que	buscam
o	saber,	conjugando	seus	apelos	coletivos	com	os	individuais.
O	entranhamento	de	memória	e	narração	poderia	fazer	a	escola	recriar-se	como
uma	comunidade	narrativa,	em	que	a	biografia	de	cada	instituição	escolar
servisse	de	fio	condutor	para	que	professores	e	alunos	fossem	tomando	contato
com	as	lutas	de	instalação	da	escola	e	com	aquelas	outras	em	que	vai	se
desdobrando	seu	desenvolvimento.	Isto	implicaria	retomar	antigos	problemas,
cujas	soluções	decorreram	de	árduo	trabalho	pedagógico,	que	foi	absorvido	a
ponto	de	ser	naturalizado,	mas	também	restaurar	embates	ainda	não	resolvidos	e
que	esperam	novas	oportunidades	de	discussão	e	ação	(Benjamin	1985).
Entrelaçados	com	o	desenvolvimento	da	escola,	os	pólos	de	memória	e	narração
poderiam	provocar	as	narrativas	de	professores,	suas	histórias	profissionais,	os
acontecimentos	que	eles	testemunharam,	os	eventos	sociais,	os	avanços	e	os
recuos	de	cada	época.	Enfim,	a	própria	materialidade	da	escola	seria	explorada
por	um	inventário	(Gramsci)	de	marcas	constituintes	de	nossa	história,	da
história	partilhada,	como	um	campo	onde	pudéssemos	revisitar	nossas	trajetórias
e	as	singularidades	de	cada	período	(com	suas	turmas	de	professores	e	alunos),
com	suas	conquistas	e	frustrações.	Nesse	tecido	narrativo,	iriam	aparecendo
teorias	e	instituições	e	suas	entradas	e	saídas	ou	permanências	e	modificações,
vividas	na	e	pela	escola.
Todo	esse	material,	além	de	comunicado	oralmente,	poderia	ser	registrado	por
escrito,	facilitando	análises	que	tenham	um	tal	tipo	de	assentamento	e	distância,
que	ajudem	a	escola	a	escapar	das	fantasias	onipotentes	das	lembranças,	sempre
encantadas,	de	um	“tempo	de	ouro”	em	que,	supostamente,	a	escola	seria
perfeita.	Como	lembra	Ginsburg	(1987),	essas	idealizações	são	alimentadas	pela
ausência	de	material	escrito.
Instigando	a	escola	a	encontrar-se	com	seu	presente	e	seu	futuro	pela	via	da
restauração	dos	caminhos	históricos,	sociais	e	humanos	de	sua	construção	e	pela
apropriação	partilhada	de	crenças	e	desejos	para	enfrentar	medos	e	desafios,
podemos	levá-la	também	a	se	organizar	para	um	processo	autodefinido	de
avaliação	e	realinhamentos	na	concepção	e	nos	procedimentos	didáticos.
Se	professores	e	alunos	se	assumissem	como	narradores	e	passassem	a	usufruir
de	um	exercício	de	construção	de	narrativas,	escolhendo	o	que	lembrar,	o	que
destacar,	o	que	minimizar,	o	que	esquecer,	todo	um	tecido	vivo	ficaria	mais
aberto	à	formação	de	vincos	por	onde	o	ensinar	e	o	aprender	ganhariam	sentido
capaz	de	fertilizar	procedimentos	didáticos.
Os	que	estamos	dentro	da	escola,	para	melhor	conhecê-la	e	nos	conhecermos
dentro	dela,	precisamos	abrir	espaços	para	recuperar	a	memória,	para	exorcizar
tanto	esquecimento.	Quem	sabe,	quando	nos	apropriarmos	da	escola	pelas	suas
entranhas,	teremos	razões	para	comemorar	as	significações	que,	dentro	dela,	nos
orgulharemos	de	construir.
É	impressionante,	por	exemplo,	quando	revisitamos	os	registros	de	política
educacional	ou	de	história	da	educação	brasileira,	a	ausência	de	movimentos
docentes	no	Brasil	que	tenham	uma	articulação	aberta	com	os	trabalhadores,
antes	da	década	de	1970.
Tanto	na	Argentina[18]	quanto	no	Uruguai,[19]	com	um	sistema	escolar	mais
fortalecido	–	consequência	de	uma	outra	história	econômica	e	política	–,
encontramos,	desde	o	começo	deste	século,	organizações	de	maestros	mais
articulados	aos	movimentos	populares.
Mas	o	silêncio	do	professorado	brasileiro	pode	exprimir,	tanto	a	ausência	de
movimentos	orgânicos,	como	a	pobreza	de	instrumentos	epistemológicos
capazes	de	captar	processos	de	resistência	e	contraposição	hegemônica	ainda
incipientes.
Se	o	movimento	da	Nouvelle	Histoire	libertou	a	História	do	registro	positivista
das	grandes	batalhas	sempre	protagonizadas	em	nome	dos	que	ocupam	lugares
oficializados	de	poder,	semelhante	esforço	precisa	ocorrer	dentro	das	escolas
para	restaurar	o	cotidiano	de	professores	e	professoras	que,	ao	lado	dos	alunos	e
do	corpo	administrativo,	dão	vida	à	escola.
Sabemos	muito	bem	que	a	escola	só	funciona	porque	dentro	dela	estão
professores	e	servidores	que	insistem	em	torná-la	real,	em	reinventá-la	a	despeito
das	negações	de	todas	as	ordens.
Quantas	histórias	surpreendentes	têm	professores,	supervisores,	orientadores,
servidores	e	alunos	para	narrar?
Apesar	de	sermos	uma	instituição	que	não	pode	prescindir	do	exercíciode	vozes,
parece	que	abafamos	as	vozes	que	lhes	dão	vida,	fazendo	delas	eco	de	vozes
distantes,	que	foram	cristalizadas	nos	livros	ou	burocratizadas	nas	pautas	de
controle	das	secretarias.
Através	de	narrativas	abertas,	que	pedem	outras	narrativas,	que	tanto	podem
fecundar	a	organização	escolar,	como	a	ação	de	currículos	e	programas	como,
ainda,	ganhar	espaços	privilegiados,	verdadeiros	polos	de	memória	e	narração,	a
escola	poderá	apropriar-se	de	seu	legado.	Um	dos	mais	importantes,	que	nem	é
considerado	nos	planos	orçamentários,	o	alto	investimento	de	vida,	feito	por
sujeitos	históricos,	buscando	atiçar	as	fagulhas	do	conhecimento,	como
desdobramentos	da	curiosidade	de	saber,	da	necessidade	de	ter	respostas	e
alegrias	para	o	exercício	de	sua	emancipação	humana,	sedenta	de	novos
caminhos	de	solidariedade.
Provocando	a	restauração	da	memória	dada	como	perdida,	o	supervisor	entrará
em	contato	com	elementos	que	lhe	ajudarão	a	entender	a	escola	como	um
inventário	de	procedimentos	pedagógicos	que	a	academia	nem	pressente	existir,
até	porque	escapa	a	deduções	e	induções	de	pequeno	alcance;	este	inventário,
menos	visível,	conjuga-se	com	sonhos	que	insistem	tenazmente	em	emergir,
animando	as	lutas	escolares:	projetos	dessa	intersubjetividade	de	professores	e
alunos	que	se	encontraram	e	se	encontram	na	escola.
Através	de	polos	de	memória	e	narração,	talvez	se	possa	devolver	a	voz	aos
professores,	retirá-los	de	um	exercício	em	que	sua	voz	é	modelada	como
autoridade	diante	de	uma	sala	de	alunos	pequenos,	portanto	uma	voz
hierarquizada,	para	fazê-la	soar	singularmente,	compondo	uma	comunidade	de
pares	que	entram	em	contato	com	outras	dimensões	do	tempo	escolar:	um	tempo
pretérito,	em	que	uma	tradição	e	uma	especificidade	começam	a	ser	produzidas,
cobrando	permanentes	definições	de	rumo.
Além	da	especificidade	do	escolar	que	vai	aparecendo,	cada	biografia	da	escola
abre	um	registro	de	perdas	e	ganhos	que	representará	um	material	rico	para	atuar
e	revitalizar	o	ensino-aprendizagem.
Por	meio	desses	núcleos,	internamente	as	escolas	poderão	usufruir	de	um	espaço
pedagógico	que	fuja	da	carga	administrativa	que	pesa	nos	Conselhos	de	Classe;
por	meio	desses	núcleos,	uma	rede	de	relações	entre	as	escolas	e	as	famílias	de
alunos	e	as	comunidades	pode	ser	estabelecida,	mas	também	entre	as	diferentes
escolas	e,	ainda	mais,	entre	estas	e	as	universidades.
Dentro	deles	poder-se-ão	articular	os	diferentes	níveis	da	docência,	atualmente
tão	segmentados,	conjugando	histórias	de	professores,	ex-professores	e	de
professores	de	educação	básica,	às	de	professores	universitários.
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4
ORGANIZAÇÃO	DO	TRABALHO	NA	ESCOLA	PÚBLICA:	O
PEDAGÓGICO	E	O	ADMINISTRATIVO	NA	AÇÃO
SUPERVISORA
Celestino	Alves	da	Silva	Junior
Organizar	o	trabalho	nas	unidades	escolares	sob	sua	responsabilidade	constitui
tarefa	precípua,	mas	não	exclusiva	do	supervisor	escolar.	Nem	o	supervisor	é	o
único	responsável	pela	tarefa,	nem	a	tarefa	é	a	única	pela	qual	o	supervisor	deve
responder.
A	multiplicidade	das	tarefas	pelas	quais	responde	habitualmente	o	supervisor	é,
em	realidade	e	paradoxalmente,	a	razão	maior	de	sua	dificuldade	em
compartilhar	com	os	demais	educadores	a	grande	tarefa	da	organização	coletiva
do	trabalho	na	escola	pública.	Seus	problemas	iniciam-se	com	a	não	delimitação
de	seu	próprio	local	de	trabalho,	necessariamente	móvel	e	variável	conforme	as
tarefas	a	desempenhar,	e	crescem	exponencialmente	com	a	ausência	habitual	da
necessária	localização	do	trabalho	de	seus	companheiros	professores,	obrigados
à	fragmentação	de	sua	jornada	e	à	consequente	multiplicação	dos	locais	em	que
ela	se	realiza.
Pensada	como	um	local	de	trabalho,	a	escola	pública	de	São	Paulo,	em	suas
condições	atuais,	constitui	um	permanente	desafio	para	a	realização	efetiva	da
ação	supervisora.	Quatro	negações,	quatro	afirmações	e,	por	último,	quatro
indagações	podem	caracterizar	a	complexidade	da	situação	a	ser	enfrentada.
As	negações	dizem	respeito	às	peculiaridades	da	escola	pública	paulista	como
local	de	trabalho.	Trata-se	de	um	local:	a)	não	padronizado;	b)	não	unificado;	c)
não	delimitado;	e	d)	não	pesquisado.	Nossas	escolas	públicas	foram	instituídas	e
edificadas	aleatoriamente,	sem	referência	a	padrões	de	qualidade	ou	de
quantidade	de	salas	de	aula,	de	alunos	e	de	professores.	Os	professores	que	nelas
trabalham	frequentemente	multiplicam-se	por	várias	delas	porque	a	remuneração
por	hora-aula	e	a	condição	de	ACT	(Admitido	em	Caráter	Temporário)	ainda	são
as	marcas	das	relações	de	trabalho	no	magistério	público	paulista.	Um	certo
número	de	horas-atividade,	definido	por	critérios	de	proporcionalidade
numérica,	estende	o	tempo	de	trabalho	do	professor	a	locais	inacessíveis	ao
supervisor	ou	admiteque	esse	trabalho	simplesmente	não	aconteça	e,	finalmente,
o	cotidiano	das	escolas	públicas	apenas	muito	recentemente	passou	a	ocupar
espaço	nas	agendas	de	pesquisa	de	nossos	professores	universitários.
As	afirmações	referem-se	aos	professores	e	demais	trabalhadores	da	escola
pública	paulista.	São	educadores:	a)	relativamente	especializados;	b)
precariamente	formados;	c)	frequentemente	improvisados;	e	d)	dificilmente
agrupados.	As	dificuldades	de	reunião	devem-se	às	razões	já	aqui	apontadas.	Um
trabalhador	que	ainda	precisa	ser	promovido	à	condição	de	trabalhador	comum
também	não	dispõe	de	tempo	e	condições	favoráveis	para	reunir-se	com	seus
companheiros.	Por	outro	lado,	a	especialização	(relativa),	a	formação	(precária)	e
a	improvisação	(frequente)	constituem	limitações	qualitativas	que	oneram	a	um
só	tempo	os	próprios	professores,	o	supervisor	e,	principalmente,	a	conjugação
de	seus	esforços.
A	adversidade	de	todas	essas	condições	conduz,	no	limite,	a	uma	interrogação
central	que	se	desdobra	em	quatro	em	virtude	das	possibilidades	de	resposta	que
encerra:	Quais	devem	ser,	afinal,	os	organizadores	do	trabalho	na	escola	pública
paulista	–	as	autoridades	governamentais,	as	autoridades	do	sistema	escolar,	as
autoridades	da	unidade	escolar	ou	o	conjunto	dos	trabalhadores	da	unidade
escolar	como	autoridades	pedagógicas	em	que	todos	se	constituem,	neles
incluído	o	supervisor	por	sua	participação	e	por	suas	competências	específicas?
Admitindo-se	a	consciência	da	necessidade	de	se	privilegiar	a	última	hipótese	e
reafirmando-se	o	propósito	da	construção	coletiva	de	um	projeto	para	a	escola
pública,	faz-se	necessário,	então,	um	exercício	de	revisão	histórico-crítica	da
prática	da	supervisão	escolar	no	Brasil	e,	em	especial,	no	estado	de	São	Paulo.
Para	repensar	a	história
Poucas	práticas	profissionais	terão	pago	um	tributo	tão	alto	às	condições	do
tempo	em	que	começaram	a	se	desenvolver	no	Brasil	tal	como	ocorreu	com	a
supervisão	escolar.	Concebida	como	parte	de	um	processo	de	dependência
cultural	e	econômica	e	integrada	a	seguir	a	um	projeto	militarista-tecnocrático	de
controle	do	povo	e	da	nação,	a	supervisão	escolar	apenas	recentemente	passou	a
emitir	sinais	de	que	seu	significado	e	seus	propósitos	tornavam-se	objeto	de
discussão	entre	seus	praticantes.
Em	seu	início	a	supervisão	escolar	foi	praticada	no	Brasil	em	condições	que
produziam	o	ofuscamento	e	não	a	elaboração	da	vontade	do	supervisor.	E	esse
era,	exatamente,	o	objetivo	pretendido	com	a	supervisão	que	se	introduzia.	Para
uma	sociedade	controlada,	uma	educação	controlada;	para	uma	educação
controlada,	um	supervisor	controlador	e	também	controlado.
Para	que	esse	supervisor	se	fizesse	possível	foi-lhe	dito	e	sugerido	que	o	controle
é	sempre	atributo	dos	que	decidem,	e	foi-lhe	dito	e	sugerido	também	que	decidir
é	atributo	privativo	dos	que	detêm	o	poder;	foi-lhe	dito	e	sugerido	ainda	que	não
cabe	perguntar	sobre	como	as	pessoas	chegam	ao	poder,	e	foi-lhe	dito	e	sugerido
também	que	o	poder	é	inamovível,	imperturbável	e	sábio.	Foi-lhe	dito	e
sugerido,	finalmente,	que	a	melhor	maneira	de	servir	aos	homens	é	ensiná-los	a
submeterem-se	ao	poder	que	determina	suas	vidas.
Esta	foi	a	lição	de	autoritarismo	que	o	supervisor	e	a	supervisão	receberam	logo
após	seu	nascimento.	Mas	as	pessoas	e	as	instituições	crescem,	interrogam-se	e
interrogam	suas	circunstâncias.	É	possível	não	ser	autoritário?	É	possível	ser
educador	e	autoritário?	Por	que	não	ser	solidário?	É	possível	ser	educador	sem
ser	solidário?	As	perguntas	foram	crescendo	de	tom	e	mudando	de	direção.	Aos
poucos	o	supervisor	foi	se	integrando	ao	clamor	do	povo	e	dispondo-se	à
participação	no	debate	educacional	que	se	estabelecia.	O	supervisor/educador	foi
se	dando	conta	de	que	a	verdade	não	estava	pronta	e	depositada	em	suas	mãos
para	que	ele	a	distribuísse	aos	professores	que	só	poderiam	conhecê-la	por	seu
intermédio;	o	supervisor/educador	foi	descobrindo,	tal	como	Guimarães	Rosa,
que	“mestre	não	é	quem	sempre	ensina,	mas	quem,	de	repente,	aprende”;	o
supervisor/educador	foi	percebendo,	enfim,	que	sua	tarefa	não	era	transmitir	uma
mensagem	pronta	e	acabada,	mas	reunir	os	educadores	para	que	eles	pudessem
elaborar	sua	própria	mensagem	e	com	ela	tentar	mudar	para	melhor	a	vida	de
todas	as	pessoas	a	quem	a	mensagem	pudesse	ser	apresentada.
De	mensageiro	oficial	a	articulador	voluntário,	o	supervisor	iniciou	seu	próprio
caminho	de	renúncias.	Orientado	para	o	controle,	desorientou-se	com	o	cerco	a
que	acabou	submetido.	Cerco	teórico-político	nas	universidades	que	propunham
a	extinção	de	seu	processo	de	formação	e	cerco	prático-político	nos	movimentos
de	massa	do	professorado	que	não	conseguia	ver	no	supervisor	um	companheiro
comum	de	jornada.
Para	o	professor	a	equação	competência	técnica	igual	a	compromisso	político	foi
logo	estabelecida.	Ruidosamente	estabelecida,	aliás.	Aplacaram-se	em	seguida
as	preocupações	e	as	consciências.	Se	formos	professores	–	tranquilizavam-se	os
mestres	–	nosso	compromisso	político	estará	resolvido,	já	que	sabemos	agora
que	ensinando	competentemente,	a	escola	brasileira	estará	esgotando	os	limites
de	sua	contribuição	à	libertação	do	povo.	Mãos	à	obra,	pois,	e	tratemos	de	nos
livrar	dos	perversos	especialistas	que	se	interpõem	em	nosso	caminho.	De
ameaçador,	o	supervisor	passou	a	ameaçado.	Para	que	a	educação	brasileira	se
reorganizasse	em	direção	à	transformação	social	seria	preciso	livrá-la	do
“reacionarismo”	de	seus	especialistas.	Até	hoje	há	quem	pense	nesses	termos,
sem	atentar	para	o	fato	de	que	ensinar	competentemente	significa	exercer
domínio	sobre	uma	tarefa	especializada,	ou	seja,	significa	comportar-se
adequadamente	como	especialista.
A	“superação	dos	especialismos”	só	viria	a	ser	batizada	com	esse	nome	em	1986,
mas	desde	então	uma	paradoxal	estirpe	vem	se	constituindo:	a	dos	especialistas
em	superalismos.	Dentro	dessa	visão,	os	especialistas	são	“os	novos
responsáveis	pelo	fracasso	escolar”,	tal	como	assinalou	com	muita	propriedade
Regina	Leite	Garcia	(1986).	Não	percebem	aqueles	a	quem	Regina	critica	que
estão	se	transformando	na	negação	da	negação	que	pretendem.	No	seu	fervor
antiespecialização	acabam	se	comportando	como	especialistas	em	desagregação
de	esforços	e	em	evocação	de	ressentimentos.	A	superação	que	postulam	se
reduz	aos	“superalismos”	de	que	falo,	porque	não	encontra	respaldo	no
movimento	real	das	unidades	e	dos	sistemas	escolares.
Visões	estereotipadas	como	essas	que	venho	destacando	contribuíram	ao	longo
do	tempo	para	a	criação	de	um	quase	antagonismo	entre	supervisores	e
professores.	Em	contraposição	à	ideologia	da	competência	que	se	foi
desenvolvendo,	desenvolveu-se	também,	conforme	já	indiquei	anteriormente,	a
“ideologia	da	incompetência	do	outro”.	Se	existem	problemas,	pensaram	todos	e
pensou	cada	um,	eles	certamente	são	determinados	pela	desqualificação	dos
demais	educadores.	Nunca	pela	clarividente	categoria	a	que	“eu”	pertenço.	Mas
não	ficamos	por	aí.	Se	o	compromisso	político	é	insuficiente,	isto	também	se
explica	pelo	temor,	pela	visão	menor	ou	pela	irresponsabilidade	dos	demais
educadores.	Nunca	o	seria	pela	atitude	irrepreensível	dos	que	se	colocam	a
“meu”	lado.
Essa	pretensão	ao	monopólio	do	compromisso	político	tem	se	constituído	no
obstáculo	maior	à	elaboração	do	projeto	coletivo	dos	educadores	brasileiros.	Em
vários	estados	da	Federação	o	vínculo	partidário	diferente	do	esquema	no	poder
produz	a	exclusão	e	a	marginalização	de	educadores	que	têm	muito	a	dizer	e	a
propor	sobre	a	caminhada	comum	a	ser	encetada.	No	entanto,	se	estivermos
todos	comum	e	efetivamente	empenhados	na	construção	de	um	ensino	de
qualidade	para	as	grandes	camadas	da	população,	aí	sim	encontraremos	uma
superação	a	ser	promovida.	A	superação	da	pretensão,	da	autossuficiência	e	da
arrogância	dos	que	se	imaginam	providenciais	e	indispensáveis	a	toda	ação
coletiva	que	se	venha	a	organizar.
Escrevi	há	algum	tempo	que	“ordenar	a	reflexão	educativa	é	a	expressão-síntese
das	alternativas	que	se	apresentam	ao	supervisor”	(Silva	Jr.	1984).	Parece-meimportante,	nas	condições	de	negociação	e	de	luta	que	se	desenvolvem	hoje	na
sociedade	brasileira,	retomar	essa	afirmação	a	fim	de	tentar	situá-la	em	seus
contornos	e	em	seus	desdobramentos.	Ao	se	dedicar	à	tarefa	de	organizar	uma
sólida	reflexão	sobre	o	momento	atual	da	educação	e	da	sociedade	brasileira,	não
poderá	o	supervisor	desconsiderar	a	necessidade	do	alargamento	dos	limites	da
reflexão	que	pretende.
Se	não	cabe	ao	supervisor	impor	soluções	ou	estabelecer	critérios	obrigatórios	de
interpretação,	cabe-lhe,	sem	dúvida,	por	ser	brasileiro	e	por	ser	um	educador
responsável,	ajudar	na	construção	da	consciência	histórico-política	necessária	à
luta	contra	a	dominação.	Isso	implica	uma	posição	de	profunda	atenção	aos	fatos
do	cotidiano	escolar	e	do	cotidiano	da	sociedade	que	lhe	assegure	condições	de
análise	adequada	do	significado	das	ocorrências	que	se	vão	acumulando.
Coordenando	necessidades	e	aspirações,	o	supervisor	certamente	não	pode
permitir	que	se	revigore	seu	antigo	papel	de	controlador	a	serviço	dos	interesses
estabelecidos.	Mas	há	interesses	a	estabelecer	e	necessidades	a	atender.	Estes	são
claramente	os	interesses	da	transformação	social,	mais	uma	vez	postergados	pela
nova	“conspiração	das	elites”	que	se	arma	e	que	se	acirrará	com	certeza	à
medida	que	nos	aproximarmos	da	redação	final	da	atual	Constituição.
Coordenador	de	uma	escola	que	busca	a	elaboração	de	uma	nova	visão	de
mundo,	o	supervisor	responde	também	pela	oportunidade	da	análise	consciente	e
pela	erradicação	do	arbítrio	e	do	dogmatismo.	Não	conseguirá	isso	sozinho,
evidentemente,	e	é	a	própria	impossibilidade	da	ação	individual	que	deverá
orientá-lo	para	a	necessidade	do	trabalho	coletivo	e	do	respeito	às	necessidades
da	maioria.	Este	supervisor,	orientado	para	e	pela	solidariedade,	enfrentará,	por
isso	mesmo,	seu	grande	desafio:	“cabe-lhe	ser	solidário	numa	sociedade
competitiva,	afirmando	pela	convicção	sua	individualidade	e	negando	com
convicção	o	domínio	sobre	a	individualidade	do	outro”;	reconhecendo	o
indivíduo	como	a	“síntese	de	múltiplas	determinações”	e	ajudando	a	construir	a
“vontade	coletiva	que	transforma	a	necessidade	em	liberdade”	(Silva	Jr.	1986).
Se	este	for	seu	compromisso	político,	será	em	torno	desse	compromisso	que	sua
presumível	competência	deverá	se	manifestar.
Para	reinaugurar	a	existência
Pensar	e	fazer,	cumulativa	e	interligadamente,	é	a	marca	necessária	da	prática
coletiva	a	se	estabelecer	entre	os	educadores.	Falamos	dessa	prática	e	da
necessidade	da	contribuição	do	supervisor	para	que	ela	se	estruture	e	se
solidifique.	Mas	ela	não	pode,	obviamente,	ser	pura	prática.	Pouco	teremos
avançado	se	passarmos	apenas	do	plano	das	práticas	isoladas	e	conflitantes	para
o	plano	das	práticas	articuladas	e	congruentes.	O	que	vai	assegurar	essa
articulação	e	essa	congruência	é	a	reflexão,	é	a	elaboração	do	sentido	do	trabalho
coletivo	que	se	quer	desenvolver.	Elaborar	uma	prática	coletiva	em	supervisão
implica,	necessariamente,	a	reelaboração	da	relação	teoria	e	prática	em
supervisão.
Como	a	grande	maioria	das	agências	sociais,	a	escola	pública	também	se
encontra	impregnada	pela	lógica	da	organização	capitalista	do	trabalho.	Para	esta
lógica,	a	proposta	do	trabalho	coletivo	se	reduz	ao	conceito	de	trabalhador
coletivo,	ou	seja,	exatamente	ao	oposto	daquilo	em	que	o	trabalho	e	o
trabalhador	pedagógico	devem	se	constituir.	“Trabalhador	coletivo”	nesta	lógica
nada	mais	significa	que	a	abstração	da	pessoa	do	trabalhador,	abstração	esta
possível	e	necessária	uma	vez	que	a	orientação	geral	e	o	controle	da	produção
constituiriam	prerrogativas	da	administração.
Apenas	a	referência	acima	deveria	ser	suficiente	para	o	reconhecimento	da
inviabilidade	da	organização	do	trabalho	na	escola	pública	com	base	em
pressupostos	de	uma	pretendida	“Ciência”	da	administração	de	base	genérico-
empresarial.	Orientada	para	o	lucro	e	a	acumulação	privada,	essa	ciência
simplesmente	não	tem	como	dar	conta	das	questões	de	interesse	público.	No
entanto,	ela	ainda	se	constitui	na	referência	principal	nas	instâncias	de	formação
e	de	atualização	do	supervisor	de	ensino.
Rediscutir	o	vínculo	teoria-prática	em	supervisão	implica	algumas	indagações
obrigatórias:	Qual	a	relação	da	prática	do	supervisor	com	a	práxis	desejável	do
educador?	Que	teoria,	afinal,	dá	conta	dessa	prática	controvertida?	De	que	forma
a	intervenção	teórica	encaminha	essa	prática	até	o	horizonte	da	práxis
propriamente	dita?
A	existência	de	uma	teoria	é	uma	decorrência	da	análise	da	realidade	e	não	se
constitui	apenas,	como	muitas	vezes	se	sugere,	como	uma	derivação	de	outras
teorias	preexistentes.	Como	sabemos,	foi	esta	última	maneira	de	se	lidar	com	a
teoria	que	acabou	por	preponderar	nas	tentativas	até	aqui	realizadas	de	se
implantar	a	prática	da	supervisão	no	sistema	escolar	do	estado	de	São	Paulo.	Não
há	nada	de	muito	surpreendente	nessa	constatação	quando	se	considera	que
ainda	se	mantém	como	hegemônica	a	concepção	positivista	de	ciência	que
inspirou	o	trabalho	desenvolvido.	Em	relação	a	esse	aspecto,	devo	registrar	meu
entusiasmo	para	a	discussão	das	potencialidades	da	pesquisação	como	fonte	para
uma	nova	ação	supervisora.
Escrevi	anteriormente	que	“há	um	lugar	para	o	bom	senso	em	supervisão”	e	que
“esse	lugar	deve	ser	percorrido	pelo	intelectual	que	se	propõe	a	traduzir	e	a
elaborar	conceitualmente	as	necessidades	dos	trabalhadores	e	do	trabalho	a	ser
desenvolvido”.	Mais	recentemente	me	referi	ao	fato	de	que	“em	decorrência
mesmo	da	lógica	do	capital,	as	necessidades	do	trabalho	e	as	dos	trabalhadores
nem	sempre	caminham	paralelamente”	(Silva	Jr.	1986).	Não	tem	sido	fácil	o
caminho	dos	trabalhadores	da	educação	que	se	dedicam	ao	trabalho	de
supervisão.	Menos	fácil	ainda	tem	sido	o	caminho	de	outros	trabalhadores	da
educação,	os	professores	que	nas	salas	de	aula	expressariam,	de	alguma	forma,	a
validade	do	trabalho	desenvolvido	pela	supervisão.	Ainda	amarrados	a
fragmentos	teóricos	superficialmente	visualizados	e	a	posições	políticas
insuficientemente	elaboradas,	que	quase	sempre	acabam	por	desaguar	na
“ideologia	da	incompetência	do	outro”,	nossos	trabalhadores	do	ensino,	sejam
eles	supervisores	ou	professores,	pouco	avançaram	na	construção	de	uma	visão
de	mundo	e	de	educação	adequada	às	necessidades	do	trabalho	a	ser
desenvolvido.	Se	a	prática	desordenada	ainda	parece	longe	da	práxis	consistente
e	articulada	que	se	deseja,	isto	certamente	decorre,	em	grande	parte,	dos
problemas	enfrentados	no	processo	de	formação	percorrido.
Tais	problemas,	no	que	dizem	respeito	aos	supervisores,	manifestam-se	tanto	no
plano	teórico-conceitual,	a	que	já	me	referi,	como	também	e,	principalmente,	no
plano	prático	institucional.	Não	se	sabe	bem	o	que	ensinar	ao	futuro	supervisor	e
também	não	se	examinam	bem	as	condições	em	que	a	grande	maioria	dos
supervisores	é	formada.	Paradoxalmente,	devo	registrar	que	o	processo	de
formação	de	supervisores	da	educação	não	é,	ele	próprio,	objeto	de	nenhuma
supervisão	institucional.
Em	seu	sentido	mais	estrito,	o	conceito	de	formação	liga-se	necessariamente	à
ideia	de	ensino.	Por	aí	se	dá	a	aquisição	de	conhecimentos,	técnicas	e
habilidades	que	preparam	a	inserção	produtiva	em	algum	setor	da	organização
social.	Em	seu	sentido	mais	abrangente,	porém,	a	formação	compreende	a
própria	assimilação	da	experiência	humana	acumulada	e	codificada.	Assim
entendida,	conforme	assinala	José	Misael	Ferreira	do	Vale	(1985),	a	formação
confunde-se	com	o	projeto	político	de	uma	sociedade	e	reflete,	em	verdade,	as
condições	de	existência	nessa	sociedade.	Nestes	termos,	organizar	um	processo
de	formação	de	supervisores	escolares	adequado	às	necessidades	atuais	da
sociedade	brasileira	significa	pensar	uma	proposta	de	trabalho	que	se	inicie	pela
consideração	das	aspirações	e	das	necessidades	dos	alunos	e	dos	professores	ao
lado	dos	quais	o	futuro	supervisor	vai	construir	sua	prática	profissional.
Significa,	consequentemente,	formar	para	a	prática	coletiva	e	para	a	organização
da	vontade	coletiva.
Um	tal	propósito	de	formação	obriga	a	um	esforço	especialpor	parte	dos
professores	que	trabalham	com	a	habilitação	em	supervisão	escolar	em	nossas
instituições	de	ensino	superior.	Diferentemente	do	que	acontece	em	outras	áreas
de	conhecimento	já	consolidadas,	o	professor	de	supervisão	escolar	não	pode	se
valer	de	autores	“clássicos”	no	campo,	de	obras	consagradas	ou	de	uma
bibliografia	variada	e	estimulante.	Não	há	em	supervisão	escolar	um	“saber
historicamente	acumulado”	que	corresponda,	por	exemplo,	ao	suporte	teórico
que	a	biologia	representa	para	a	formação	do	médico,	ou	a	física	para	a	do
engenheiro.	O	pouco	saber	que	até	aqui	se	acumulou	é	um	saber	comprometido
com	os	valores	e	os	interesses	predominantes	na	sociedade	em	que	ele	se
acumulou;	é	um	saber	que	vem	de	encontro	e	não	ao	encontro	das	necessidades
de	transformação	da	sociedade	brasileira.
Ensinar	supervisão	no	Brasil	hoje	significa	necessariamente	pesquisar
supervisão.	Pesquisar	“a”	e	“para”	a	supervisão.	Significa,	consequentemente,
examinar	criticamente	a	prática	que	se	desenvolve	e	investigar	as	situações	e	as
condições	que	possam	contribuir	para	o	desenvolvimento	qualitativo	dessa
prática.	A	ciência	da	supervisão,	já	o	disse	também	anteriormente,	será
construída	sem	abrigar	a	pretensão	da	objetividade	absoluta.	É	da	unidade
dialética	das	atividades	teórica	e	prático-experimental	que	deverá	resultar	a
supervisão	da	educação	adequada	ao	atendimento	das	necessidades	reais	do
conjunto	da	população.
Para	que	esse	saber	estruturado	sobre	supervisão	escolar	se	acumule	e	se
aperfeiçoe	será	necessário,	entretanto,	enfrentar	também	adequadamente	as
dificuldades	que	se	colocam	no	plano	prático-institucional.	Nas	universidades
brasileiras	é	ainda	extremamente	reduzido	o	número	de	pesquisadores	que	fazem
da	supervisão	escolar	seu	objeto	de	estudo	preferencial.	Essa	extrema	carência	se
expressa	na	reduzida	produção	acadêmica	sobre	supervisão	e	na	pequena
participação	dos	especialistas	em	supervisão	no	debate	sobre	as	grandes	questões
da	educação	brasileira.	Essa	produção	e	essa	participação	insuficientes	têm
permitido	a	continuidade	de	uma	visão	duplamente	equivocada:	porque
elaborada	com	base	na	apreensão	acrítica	dos	referenciais	teóricos	existentes	e
porque	desligada	em	seus	fundamentos	das	referências	necessárias	da	realidade
educacional	brasileira.
O	número	de	supervisores	já	existentes	em	nossos	sistemas	e	em	nossas	unidades
escolares	faz	supor,	à	primeira	vista,	uma	perspectiva	de	superação	na	prática	das
deficiências	observadas	em	seu	processo	de	formação.	É	sempre	possível
elaborar	coletivamente	a	reflexão	necessária	à	determinação	do	sentido	da
prática	que	se	desenvolve.	Para	isso	é	preciso	que	se	organizem	as	situações	de
encontro	entre	os	praticantes	e	esta	situação	em	que	nos	encontramos	indica	bem
o	caminho	a	ser	percorrido.	No	entanto,	é	preciso,	por	outro	lado,	ter	presente	a
necessidade	da	extensão	e	do	aprofundamento	do	processo	de	formação	prévia
dos	supervisores	escolares	em	nossas	universidades.	Nas	universidades
propriamente	ditas	não	é	pequeno	apenas	o	número	de	professores	que	se
dedicam	à	supervisão.	É	também	pequeno	o	número	de	seus	cursos	de
habilitação.	Isso	quer	dizer,	ao	menos	no	estado	de	São	Paulo,	que	a	formação	de
supervisores	é	tarefa	quase	que	totalmente	entregue	às	muitas	“instituições	de
ensino	superior”	isoladas	que	se	distribuem	por	seu	território.	Não	é,	pois,	a
escola	pública	de	educação	superior	que	prepara	os	supervisores	da	escola
pública	de	educação	básica.
Muitas	são	as	implicações	da	situação	acima	apontada.	Mesmo	que	não	se
considerem	os	casos-limite	(cursos	vagos,	fraudes	e	simulações	de	diversas
ordens)	é	ainda	assim	necessário	reconhecer	que	as	condições	de	trabalho
oferecidas	aos	professores	dessas	faculdades	inviabilizam	totalmente	a
perspectiva	de	uma	investigação	profícua	e	original	sobre	supervisão	escolar	ou
qualquer	outro	objeto	de	estudo.	Ministrando	seus	cursos	invariavelmente	em
um	único	período	(quase	sempre	o	noturno)	e	remunerando	seus	professores
apenas	pelas	horas-aula	ministradas,	não	podem,	evidentemente,	essas
instituições	assegurar	as	condições	de	elaboração	teórica	ou	de	revisão	crítica	de
um	campo	do	conhecimento	humano.	Na	verdade,	em	que	pese	toda	sua	boa
vontade,	o	praticante	de	supervisão	escolar	que	na	condição	cumulativa	de
professor	dedica-se	à	formação	de	novos	supervisores	apenas	pode	oferecer	aos
seus	futuros	colegas	o	relato	criterioso	de	sua	própria	prática.	Foi	essa	prática
que	o	levou	à	condição	de	professor,	mas	as	condições	de	que	dispõe	como
professor	não	lhe	possibilitam	a	reflexão	mais	aprofundada	sobre	o	sentido	da
prática	que	desenvolve.	O	que	de	melhor	se	pode	esperar	de	uma	tal	situação	é
apenas	a	continuidade	da	prática	que	atualmente	se	desenvolve,	o	que	certamente
é	muito	pouco	à	vista	das	enormes	carências	e	das	muitas	expectativas	que
envolvem	a	ação	das	escolas	públicas	de	educação	básica.
Se	em	relação	às	condições	de	trabalho	dos	professores	que	dela	se	incumbem	e
das	instituições	que	a	oferecem	a	formação	de	supervisores	defronta-se	com
problemas	da	magnitude	dos	que	estamos	analisando,	em	relação	aos	alunos	que
a	buscam	para	se	prepararem	para	o	exercício	futuro	da	supervisão	a	situação
também	não	é,	infelizmente,	mais	favorável.	Sobrecarregados	pelo	excessivo
número	de	seus	encargos	atuais	como	professores,	coordenadores	ou	diretores
das	escolas	públicas	de	educação	básica,	os	futuros	supervisores	não	podem
dedicar	a	seus	cursos	de	formação	o	tempo	e	o	empenho	indispensáveis	a	uma
preparação	criteriosa	à	nova	função	a	que	aspiram.
Como	se	observa,	a	hipertrofia	da	administração	sobre	o	ensino	manifesta-se
duplamente	em	nossos	sistemas	escolares.	De	um	lado,	a	administração
institucionalizada	prepondera	sobre	a	preocupação	e	a	própria	realização	do
ensino	nas	salas	de	aula;	de	outro,	a	administração	como	objeto	de	estudo	não
chega	a	sofrer	a	investigação	e	a	análise	que	possibilitariam	a	revisão	crítica	de
seu	significado.
Falo	da	administração	ao	mesmo	tempo	que	da	supervisão	porque	não	considero
que	as	duas	práticas	se	distingam	substancialmente.	Supervisionar	uma	escola	é
orientar	sua	administração	para	a	realização	do	ensino,	seu	objetivo	precípuo.
Como	conseguir	efetivamente	essa	realização	deve	ser	a	preocupação	central	do
processo	de	formação	dos	supervisores.	Já	vimos	que	o	ensino	não	tem	se
beneficiado	desse	processo,	em	razão	das	circunstâncias	que	têm	envolvido	sua
concretização.	Resta-nos,	então,	considerar	como	a	práxis	do	supervisor	poderá
ajudá-lo	a	superar	as	deficiências	de	sua	formação,	contribuindo	decisivamente
para	o	reconhecimento	de	seu	papel	de	articulador	do	projeto	pedagógico	de	uma
coletividade.
Para	reelaborar	a	significação
Perplexidade,	desalento	e	impotência	têm	sido	as	marcas	habituais	do	cotidiano
do	supervisor	paulista.	Enredado	na	multiplicidade	das	tarefas	que	lhe	são
estipuladas	e	das	que	deve	estipular	e	cobrar,	parece-lhe	extremamente	remota	a
perspectiva	de	direcionar	seu	trabalho	de	forma	a	transformá-lo	em	um
complemento	desejável	da	ação	do	professor.	É	preciso	reconhecer	inicialmente
a	prisão	burocrática	no	interior	da	qual	o	supervisor	se	movimenta.	As
dimensões	dessa	prisão	estabelecida	de	fato	pelos	critérios	usuais	de
funcionamento	do	sistema	acabam	muitas	vezes	hipertrofiadas	pela	visão	de
mundo	e	de	educação	insuficientemente	elaboradas	nos	cursos	de	formação.
Uma	interpretação	crítica	da	burocracia	em	que	se	movimenta	é,	pois,	a	primeira
grande	conquista	a	se	esperar	de	uma	práxis	criativa	do	supervisor.	Não	se	trata
de	uma	expectativa	infundada.	Até	mesmo	a	burocracia	se	renova	e	se	contém
quando	os	que	a	integram	recusam-e	a	ser	simplesmente	burocratas.	Como
organização	social	que	é,	a	escola	sustenta-se	necessariamente	em	uma	certa
burocracia	instalada.	Como	organização	voltada	ao	estudo	e	à	reflexão,	no
entanto,	ela	só	se	realizará	efetivamente	se	se	dedicar	à	análise	e	à	crítica	da
própria	realidade	em	que	se	constitui,	e	isso	passa,	naturalmente,	pela	burocracia
que	a	atravessa.
Ocorre	que	a	burocracia	passa,	frequentemente,de	modo	de	organização	a	modo
de	pensamento	e	é	nesse	sentido	que	ela	quase	sempre	se	revela	insuperável.
Pensar	burocraticamente	é	não	pensar,	é	assumir	a	impessoalidade	e	renunciar,
consequentemente,	à	expressão	pessoal.	É	indispensável	que	o	supervisor	da
escola	se	expresse	como	educador	e	como	especialista.	Do	supervisor	espera-se
que	aja	como	“o	cimento	possível	da	passagem	para	a	coletividade	dos
educadores	daquelas	iniciativas	e	realizações	que	os	pequenos	grupos	das
escolas	conseguirão	produzir	por	seu	apoio	e	orientação”	(Silva	Jr.	1984).
Do	“caos	teórico-político-institucional”	com	que	hoje	se	debate	o	supervisor
deverá	emergir	uma	“práxis”	essencialmente	pedagógica	na	qual	o	ponto
obrigatório	de	referência	constituir-se-á	no	encaminhamento	das	soluções
possíveis	para	as	grandes	questões	do	cotidiano	do	ensino.	Essas	soluções	terão
que	ser	construídas	em	conjunto	pelos	educadores.	No	processo	dessa	construção
coletiva	encontrará	o	supervisor	os	contornos	desejáveis	de	sua	prática
profissional.	Tornar-se-á	ele	o	organizador	dessa	grande	reflexão	educativa	da
qual	participará	em	igualdade	de	condições	com	os	demais	educadores.	Para
tanto,	o	supervisor	terá	que	repensar	sua	relação	com	os	professores	de	modo	a
recredenciar-se	em	seu	conceito.	Colocar-se	a	serviço	do	serviço	que	os
professores	devem	prestar	a	seus	alunos	constitui-se	na	melhor	maneira	de
superar	o	atual	desencontro,	“transformando-o	em	um	encontro	necessariamente
educativo,	porque	realizado	entre	educadores”	(Silva	Jr.	1984).
Alguns	pontos	fundamentais	devem	também	ser	repensados	e	aclarados,	se
efetivamente	pretendemos	reordenar	a	práxis	do	supervisor	e,	com	base	nela,
influenciar	a	reelaboração	de	seu	processo	de	formação	e	de	atuação
profissional.	Em	primeiro	lugar	é	preciso	reafirmar	que	“se	a	educação,	em	seu
significado	mais	profundo,	é	incompatível	com	os	valores	da	sociedade
capitalista,	ela	também	o	é	com	as	formas	de	administração	que	essa	sociedade
gerou”	(Silva	Jr.	1990).	Se	a	educação	que	se	pretende	orienta-se	pelo	princípio
da	solidariedade,	não	serão	o	“taylorismo”	clássico	ou	moderno,	o	“fordismo”,
os	arremedos	de	“cogestão”	ou	suas	muitas	derivações	que	deverão	se	constituir
em	critérios	para	a	organização	do	trabalho	nas	escolas	públicas.	O	controle	da
produção	pela	administração,	a	parcelarização	das	tarefas	e	a	separação	das
especialidades,	que	essas	teorias	pressupõem,	apenas	conduzem	à	inviabilização
do	caráter	necessariamente	pedagógico	do	trabalho	escolar.
Em	segundo	lugar,	é	preciso	considerar	que	a	inadequação	das	teorias	atualmente
disponíveis	não	significa	que	a	elaboração	teórica,	como	tal,	seja	inviável	ou
desnecessária	como	suporte	para	uma	nova	prática	supervisora.	Isso	apenas
significa	que	é	necessário	construir	novas	referências	teóricas	que	decorram	da
análise	da	prática	do	supervisor	e,	ao	mesmo	tempo,	observem	a	natureza
peculiar	do	trabalho	pedagógico	como	princípio	orientador	do	trabalho	a	ser
desenvolvido.
Exercício	de	convicção,	por	natureza,	o	trabalho	pedagógico	não	tem	como	ser
objetivado.	Isso	também	não	significa	que	a	objetividade	seja	um	valor	a	ser
descartado	ou	que	o	pleno	exercício	da	subjetividade	constitua	o	critério
universal	para	a	organização	do	trabalho	pedagógico.	Subjetividade	e
objetividade	precisam	ser	retomadas	em	seus	significados	essenciais	para	que
suas	relações	se	estruturem	adequadamente	em	favor	da	realização	da	finalidade
da	escola	pública.
Dizia	Gramsci	(1978)	que	objetivo	significa	sempre	“humanamente	objetivo”,	o
que	pode	exatamente	corresponder	a	“historicamente	subjetivo”,	isto	é,	objetivo
significaria	“universal	subjetivo”.
O	que	Gramsci	nos	ensina	e	Michel	Löwy	(1978)	reafirma	e	destaca	é	que	a
objetividade	não	é	a	impessoalidade	ou	a	neutralidade.	Objetividade	é	a
resultante	da	confluência	das	ações	dos	sujeitos	da	história,	é	uma	construção,
um	ponto	de	convergência	dos	resultados	das	múltiplas	pesquisas	teórico-
práticas	da	humanidade.	Objetividade,	enfim,	diria	eu,	é	aquilo	sobre	o	que	a
humanidade	se	acertou.	E	a	humanidade	ainda	não	se	acertou	sobre	o	modo	pelo
qual	o	trabalho	pedagógico	deva	ser	organizado	e	menos	ainda	acertou	quando
pretendeu	que	esse	trabalho	fosse	“objetivado”,	ou	seja,	tivesse	a	sua	concepção
e	o	controle	de	sua	realização	retirados	da	pessoa	naturalmente	encarregada	de
promovê-los,	que	é,	indiscutivelmente,	o	professor.
Chegamos,	assim,	ao	ponto	central	da	relação	trabalho	pedagógico/trabalho
administrativo.	Sabemos	já	que	o	que	dá	sentido	ao	trabalho
administrativo/supervisor	em	educação	é	o	seu	caráter	de	suporte	ao	trabalho
pedagógico.	Sabemos,	também,	por	isso	mesmo,	ver	o	trabalho	pedagógico
como	um	determinante	do	trabalho	administrativo.	O	que	nos	falta,	para
organizar	melhor	a	confluência	de	nossas	subjetividades,	é	considerar	que	o
aspecto	administrativo	é	também	um	componente	do	trabalho	pedagógico.
Quando	o	professor	“ministra”	sua	aula	ele	também	“administra”	essa	sua	aula.
Ele,	que	a	planejou	anteriormente,	vai	agora	“executá-la”.	Para	isso,	vai	cumprir
e	distribuir	tarefas,	semelhantes	ou	diversificadas,	utilizando	diretamente	ou
determinando	a	utilização	dos	recursos	disponíveis	de	modo	a	possibilitar	que
desse	esforço	humano	coletivo	por	ele	coordenado	resulte	o	alcance	da
finalidade	pretendida	por	todos:	a	aprendizagem	dos	alunos.	Podemos	chamar	a
isso	de	ensinar,	mas	também	podemos	chamar	a	isso	de	administrar.	O	ensino	em
geral	não	é	substancialmente	diferente	da	administração	em	geral.
Foi	a	busca	da	substancialidade	própria	da	administração	que	de	alguma	forma	a
afastou	do	ensino.	Em	busca	de	sua	identidade	a	administração	escolar	e,	por
extensão,	a	supervisão	afastaram-se	do	ensino	para	não	ser	com	ele	confundidas.
A	procura	teórica	frequentemente	deu	origem	à	distância	pessoal:	“como”
administrador	ou	supervisor	não	me	cabe	pensar	as	situações	de	sala	de	aula.
“Como”	professores	não	cabe	a	“eles”	pensar	os	problemas	da	administração.
Logo,	“como”	supervisor,	meu	interlocutor	“natural”	e	exclusivo	na	escola	será	o
diretor,	aquele	que	não	se	ocupa	do	trabalho	docente...
A	reelaboração	do	sentido	da	ação	supervisora	só	se	fará	possível,	como	se
observa,	com	a	necessária	revisão	crítica	da	relação	de	trabalho	entre	o	diretor	da
escola	pública	e	os	professores	de	seu	corpo	docente.	Essa	relação,	por	sua	vez,
só	se	realizará	em	plenitude	na	medida	em	que	o	corpo	docente	da	escola	se
reinstale	como	figura	política	e	material,	ou	seja,	na	medida	em	que	o	corpo
docente	readquira	identidade	própria,	decorrente	de	sua	constituição	e	de	sua
estabilidade.	Ironicamente,	uma	das	tarefas	mais	complexas	a	que	o	supervisor
se	dedica,	a	atribuição	de	aulas,	é	também	o	indicador	mais	completo	da
fragilidade	de	sua	ação	institucional.	“Recebendo”	intermitentemente	as	aulas
que	lhe	são	“atribuídas”,	o	professor	reduz-se	à	condição	de	trabalhador	horista	e
eventual.	Promovido,	como	se	faz	necessário	à	condição	de	trabalhador	comum,
será	esse	professor	remunerado	pelo	seu	tempo	total	de	trabalho	mensal,
distribuído	pela	duração	normal	de	uma	jornada	comum	de	trabalho,	na	qual
estará	contido	o	número	de	horas-aula	a	serem	ministradas.	“HTPs”	(Horas	de
Trabalho	Pedagógico)	serão	então,	simplesmente,	todas	as	horas	do	dia	de
trabalho	do	professor,	independentemente	do	número	de	horas-aula	desse	dia.
Não	há	sentido	em	um	trabalho	docente	que	não	seja	concebido	direta	ou
indiretamente	como	um	trabalho	pedagógico.
Com	professores	presentes	durante	todo	o	dia	de	trabalho	em	uma	escola,	e
apenas	nela,	estarão	colocadas	as	condições	para	a	reelaboração	do	sentido	da
ação	supervisora.	A	fusão	do	“administrativo”	com	o	“pedagógico”	sustentará	o
projeto	organizacional,	instrumento	efetivo	para	a	materialização	do	projeto
político-pedagógico.
Para	concluir,	lembrando	a	cidadania	e	a	democracia
A	materialização	da	finalidade	da	escola	pública	tem	sido	confortavelmente
reduzida	ao	processo	de	construção	da	cidadania.	Digo	“confortavelmente”
porque,	no	contexto	em	que	vem	sendo	discutida,	cidadania	confunde-secom
democracia,	que	por	sua	vez	confunde-se	com	exercício	de	direitos	individuais.
Esta	é	apenas	uma	pobre	forma,	embora	indispensável,	de	democracia:	a
democracia	da	representação.	Como	tal,	ela	é	necessária,	mas	não	é	suficiente
para	a	resolução	dos	problemas	da	administração	e	da	supervisão	da	escola
pública.
A	insistência	quase	exclusivista	na	discussão	sobre	a	qualidade	dos	mecanismos
de	representação	reduz	a	perspectiva	da	democracia	na	escola	pública	a	um
processo	de	interesse	imediato	daqueles	que	povoam	seu	interior.	A
preponderância	de	sua	manifestação	faz	com	que	a	discussão	se	circunscreva	ao
aspecto	político	em	sentido	restrito,	desconsiderando	a	democracia	como	forma
de	existência	social.	Vista	por	esse	ângulo,	a	discussão	sobre	a	democracia	e	a
escola	recolocaria	em	seu	horizonte	de	considerações	os	problemas	da
exploração	econômica,	da	separação	entre	produtores	e	proprietários,	entre
dirigentes	e	executantes,	“governantes	e	governados”,	como	Gramsci	não	se
cansava	de	registrar.	A	compreensão	do	sentido	de	democracia	possível	no
interior	da	escola	pública	só	se	estabelecerá	na	medida	da	articulação	necessária
entre	as	lutas	específicas	de	seus	trabalhadores	e	as	lutas	genéricas	e	coletivas
pela	construção	de	uma	sociedade	verdadeiramente	democrática,	ou,	para	ser
mais	explícito	e	incisivo,	pela	construção	do	socialismo	democrático.
Por	isso	escrevi	em	1977	que	“as	escolas	não	existem	para	ser	administradas	ou
inspecionadas.	Elas	existem	para	que	as	crianças	aprendam”.	Não	estava	ali
desqualificando	a	necessidade	ou	a	possibilidade	da	administração	da	educação
ou	de	sua	supervisão.	Se	estivesse,	não	teria	imprimido	a	meu	trabalho	posterior
a	marca	da	tentativa	de	revisão	crítica	da	questão	da	especialização	em	educação
que	de	alguma	maneira	o	caracteriza.	Também	não	estava	hipertrofiando	o	plano
didático-pedagógico	da	vida	escolar	ao	me	referir	à	necessidade	da
aprendizagem.	Estava	sim,	como	até	hoje,	preocupado	com	a	significação	social
da	escola,	seus	limites	e	suas	possibilidades	de	contribuição	para	a	resolução	da
questão	maior	da	educação	popular.	Também	por	isso	me	rejubilei	interiormente
quando	Luiz	Carlos	de	Freitas	escreveu	em	1989	algo	muito	semelhante:
“Centrar	a	discussão	do	problema	na	eleição	do	diretor	ou	em	termos	da
presença	ou	não	de	especialistas	na	escola	tem	ofuscado	este	ponto	central	da
questão,	ou	seja,	o	fato	de	o	aluno	ser	o	principal	protagonista	da	escola;	o	fato
de	a	escola	existir	para	o	aluno”	(grifos	do	autor).
Marilena	Chauí	houvera	escrito	em	1982	(p.	68)	que	“a	questão	democrática,
antes	de	ser	discussão	sobre	a	cidadania	como	direito	à	representação,	deveria
ser	a	questão	da	concreticidade	da	própria	cidadania”.	Miguel	Arroyo	(1987)
também	já	escrevera	que	“a	ênfase	na	educação	para	a	cidadania	se	alimenta	de
uma	concepção	da	história	como	progresso	inexorável	da	barbárie	à	civilização,
da	miséria	à	felicidade	de	todos,	da	exploração	à	liberdade,	processo	que	se
consuma	na	sociedade	industrial-capitalista	moderna”,	para	em	seguida
perguntar:	“Como	manter	essa	concepção	linear	e	triunfalista	do	progresso
capitalista	numa	realidade	como	a	nossa,	onde	a	exploração	e	a	miséria	da
maioria	são	tão	evidentes,	e	quando	a	história	mostra	que	as	promessas,	sempre
repetidas	pela	burguesia,	seus	gestores	e	intelectuais,	não	só	não	se	realizam,
mas	são	irrealizáveis?”
Entre	a	afirmação	de	Chauí	e	a	indagação	de	Arroyo,	Saviani	(1983)	já	havia
colocado	sua	hoje	clássica	constatação:	“Quando	mais	se	falou	em	democracia
no	interior	da	escola,	menos	democrática	foi	a	escola;	quando	menos	se	falou	em
democracia,	mais	a	escola	esteve	articulada	com	a	construção	de	uma	ordem
democrática.”
É	essa	construção	da	ordem	democrática	que	se	constitui	no	horizonte	da
construção	social	da	escola.	Daí	a	preocupação	que	registrei	quanto	a	uma	certa
empolgação	“eleitoralista”	ou	“eleitoral-participacionista”	evidenciada	no	debate
político-pedagógico	dos	anos	iniciais	da	década	de	1980.	Daí	também	as
reservas	com	que	vejo	o	que	chamei	de	“ideologias	de	conveniência”,	tais	como
a	“descentralização”,	a	“participação”,	a	“municipalização”	e	a	“ação
comunitária”.	Repito	aqui	o	que	disse	anteriormente:	em	todas	elas	o	Estado
“despubliciza”	suas	responsabilidades,	ao	mesmo	tempo	em	que	aparenta
favorecer	o	público	com	a	possibilidade	que	lhe	abre	de	interveniência	em	suas
decisões.	Creio	que	os	trabalhadores	da	escola	pública,	sejam	eles	professores,
administradores	ou	supervisores,	vêm	elaborando	de	forma	crescente	sua
consciência	e	sua	compreensão	desses	problemas.	Creio	também	que	a
unificação	de	seus	locais	de	trabalho,	que	começa	a	se	manifestar	como	bandeira
de	suas	lutas,	constitui	um	requisito	indispensável	para	a	elaboração	de	sua
vontade	coletiva.	Como	também	já	afirmei,	sem	a	presença	física	do	trabalhador
individual	o	“trabalhador	coletivo”	não	se	constitui,	mas	também	o	projeto
político	não	se	elabora.	As	relações	de	trabalho	e	o	próprio	trabalho	são,	pois,	na
escola	pública,	assim	como	têm	sido	na	história	da	humanidade,	a	fonte	e	o
princípio	do	processo	de	organização	da	vida	democrática.	O	“trabalho	como
princípio	educativo”	terá	que	passar	de	objeto	de	estudo,	ou	de	referência	formal
na	legislação	do	ensino,	a	princípio	prático	de	ação	no	cotidiano	dos
trabalhadores	da	escola	pública.	Por	ele	e	com	ele	poderemos	percorrer	o
caminho	de	sua	democratização.
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v.	3,	jul./dez.	1985,	pp.	61-70.
5
A	OPÇÃO	DA	SUPERVISÃO	DIANTE	DA	AMBIVALÊNCIA
Marileusa	Moreira	Fernandes
Iniciando	a	discussão
O	lócus	central	da	qualidade	de	ensino	é	a	escola.	Dentre	as	diversas
modalidades	dessa,	a	escola	pública	de	ensino	fundamental	ganha	importância,
não	só	pelo	grande	contingente	de	alunos	e	profissionais	que	abriga,	como
também	pela	relevante	função	social	que	lhe	cabe	desempenhar.
É	na	escola	que	ocorrem	as	relações,	não	só	dos	atores	mais	diretamente	ligados
à	ação	educativa	(alunos	e	professores),	mas	também	as	relações
especificamente	ligadas	ao	ensino	e	à	administração,	ao	técnico	e	ao	político,	à
sala	de	aula	e	ao	sistema	educacional,	à	educação	sistemática	e	à	assistemática,
ao	Estado	e	à	sociedade.	É	na	escola	que	todas	essas	questões	ganham
concretude;	onde	o	micro	e	o	macro	se	integram,	interagem,	dando	cor	e	forma	a
valores,	ideais,	interesses	e	necessidades	de	diferentes	grupos.	É	também	nela
que	as	pressões	vindas	das	diferentes	categorias	de	profissionais	ligados	à
educação,	na	luta	por	melhores	condições	de	trabalho,	bem	como	de	famílias,
entidades	e	grupos	sociais	que	defendem	os	interesses	dos	alunos,	fazem-se
sentir	com	maisvigor	e	energia.
Por	essa	razão,	debruçar-se	sobre	ela	para	compreendê-la	na	sua	complexidade,
tendo	em	vista	a	transformação	necessária	e	possível,	é	tarefa	fundamental	no
enfrentamento	dos	problemas	educacionais.
A	essa	tarefa	têm	se	dedicado	inúmeros	teóricos	e	pesquisadores.	Alguns
estudam-na	de	forma	isolada;	outros	adotam	uma	configuração	mais	abrangente
e	inter-relacionada.	Análises	no	plano	funcional,	estrutural	e	formal	têm	sido
empreendidas,	muitas	vezes	tomando	essas	decisões	de	forma	dogmática,
impossibilitando	uma	compreensão	mais	significativa	da	realidade	escolar.
Dentre	os	estudos	mais	recentes,	a	análise	do	cotidiano	tem	possibilitado	ricas
apreensões	da	realidade.	Penin	(1987,	p.	161)	afirma	que
o	conhecimento	do	cotidiano	escolar	é	necessário	por	duas	razões.	Primeiro,
porque	sendo	conhecido	é	possível	conquistá-lo	e	planejar	ações	que	permitam
transformá-lo,	assim	como	lutar	por	mudanças	institucionais	no	sentido	desejado
[...]	Segundo,	porque	o	cotidiano,	sendo	conhecido,	pode	fornecer	informações	a
gestões	institucionais	democráticas	que	queiram	tomar	medidas	adequadas	para
facilitar	o	trabalho	ao	nível	cotidiano	das	escolas	e	melhorar	a	qualidade	do
ensino	aí	realizado.
Além	do	mais,	esse	tipo	de	análise	possibilita	um	enriquecimento	na	teoria
educacional,	quer	quanto	a	seus	fundamentos,	quer	com	relação	a	questões	de
ordem	metodológica.
Acreditando	que	a	qualidade	do	ensino	não	se	esgota,	mas	também	passa	pelo
saber-fazer	dos	diferentes	educadores,	e	levando	em	conta	as	reiteradas
colocações	acerca	da	importância	da	supervisão	para	o	alcance	dessa	qualidade,
gostaríamos	de	enfrentar	dois	desafios:
•	rediscutir	questões	teóricas	ligadas	à	supervisão,	com	base	na	prática	dos
supervisores;
•	equacionar	questões	relativas	à	ação	supervisora	do	ponto	de	vista	da	escola.
Dessa	forma,	gostaríamos	de	analisar	a	prática	de	professores-coordenadores,
vistos	como	elementos	do	sistema	de	supervisão	e	que	nos	últimos	anos	têm	sido
alocados	nas	escolas	públicas	estaduais	paulistas	por	meio	de	diferentes	projetos.
Analisar	o	cotidiano	desses	profissionais,	enfocando-o	do	ponto	de	vista	das
relações	que	mantêm	no	interior	da	escola	e	com	o	sistema	de	supervisão	(na
tentativa	de	provocar	as	mudanças	e	fornecer	as	informações	de	que	nos	fala
Penin),	bem	como	rediscutir	questões	teóricas	relacionadas	à	supervisão	e	à
formação	de	supervisores	com	base	na	pesquisa	da	realidade,	é	a	proposta	do
presente	estudo.
Assim,	as	reflexões	aqui	contidas	partem	de	e	retornam	a	colocações	teóricas	e
apoiam-se	nos	dados	de	uma	pesquisa	de	campo	levada	a	cabo	nos	anos	de	1991
e	1992	em	uma	Delegacia	de	Ensino	da	capital	paulista.
Refletindo	sobre	o	cotidiano	da	supervisão	na	escola
O	trabalho	de	supervisão	em	nível	de	unidade	escolar	levado	a	cabo	pelos
professores-coordenadores	e	pela	equipe	de	supervisão	da	Delegacia	de	Ensino
tem	sido	realizado	em	conformidade	com	a	organização	burocrática	do	sistema.
Mais	que	isso:	o	modo	burocrático	de	pensar	tem	levado	esses	profissionais	a
desempenhar	um	papel	que	nitidamente	subordina	as	necessidades	da	escola	e
das	pessoas	que	lá	atuam	às	determinações	dos	órgãos	centrais.	Dessa	forma,
faz-se	mister	repensar	o	conteúdo	e	a	finalidade	da	ação	supervisora.
O	tema	central	das	relações	que	se	estabelecem	entre	a	equipe	de	supervisão	e	os
coordenadores	e	desses	com	os	professores	nas	escolas	é	o	da	capacitação.
A	falta	de	reflexão	sobre	sua	prática	não	tem	levado	esses	profissionais	a	definir
com	precisão	o	sentido	e	a	finalidade	dessa	capacitação.	Assim,	à	diferença	entre
as	pessoas	imprime-se	uma	conotação	de	inferior/superior,	dependendo	do	cargo
ocupado	na	hierarquia	do	sistema.	A	partir	daí,	sem	apoio	em	nenhum	dado
objetivo,	as	decisões	e	as	ações	desenvolvem-se	tendo	como	pano	de	fundo	o
pressuposto	da	incompetência	dos	elementos	que	se	situam	no	nível	abaixo
daquele	que	está	em	questão	na	escala	hierárquica	da	Secretaria	da	Educação.
Dessa	forma,	define-se,	sem	e	apesar	das	pessoas	e	situações	envolvidas,	o
conteúdo	daquela	capacitação.	A	decisão	quanto	a	temas,	estratégias	e	recursos	a
serem	utilizados	não	leva	em	conta	sua	validade	para	essas	pessoas	e	situações	e
muito	menos	para	a	finalidade	da	capacitação:	o	saber-fazer	dos	diferentes
educadores	diante	da	função	social	da	escola,	diante	da	necessidade	de	um
ensino	de	qualidade	para	a	maioria	da	população.	As	decisões	ficam	ao	sabor	da
vontade	ou	da	preferência	de	cada	elemento	que	tem	o	poder	de	decidir.	Muitas
vezes	se	constitui	em	reprodução	acrítica	dos	temas	desenvolvidos	por	outras
instâncias	do	sistema	numa	aceitação	passiva	de	que	aquilo	que	os	órgãos
superiores	determinam	tem	validade	por	si	só.	Por	trás	dessa	atitude,	na	verdade,
pode-se	perceber	a	presença	de	mitos	que	permeiam	a	formação	do	educador.
Parte-se	sempre	de	pressupostos	de	formação	tidos	como	verdadeiros,	o	que	leva
à	transmissão	de	“saberes	científicos”	tidos	como	inquestionáveis.
Assim,	coordenadores	receberam	treinamento	específico	em	componentes
curriculares	ou	em	teorias	de	administração	e	supervisão	transplantados	de
outros	países	ou	de	outros	setores	que	não	o	escolar,	esquecendo-se	a
especificidade	da	tarefa	educativa	e	do	trabalho	desenvolvido	na	escola.
A	total	desvalorização	do	saber	da	prática,	da	reflexão	sobre	o	cotidiano	de	sua
ação,	norteada	pela	sua	finalidade	educativa,	faz	com	que	esse	tipo	de
capacitação	leve	ao	imobilismo	e	à	dependência,	que	vêm	justificar	a	tomada	de
decisão	não	compartilhada,	baseada	na	falta	de	iniciativa	e	competência	que	a
relação	vertical	e	autoritária	esmaga	e	corrompe,	transformando-se	numa
profecia	“autorrealizável”.
Como	não	existe	em	supervisão	educacional	um	“saber	acumulado”,	como	em
outros	ramos	do	conhecimento,	que	possa	ser	transmitido,	formando	e
preparando	profissionais	competentes,	e	como	esse	saber	é	buscado	fora	da
atuação	e	da	realidade	em	que	trabalham	esses	profissionais,	essa	capacitação	em
serviço	converte-se	num	engodo.
Na	verdade,	o	conteúdo	refere-se	ao	“saber-fazer”	dos	diferentes	profissionais	e
traz	em	si	a	conotação	de	saber	fazer	bem,	para	o	que	não	há	regras	exaustivas,
ou	seja,	garantidoras	do	sucesso.	Primeiro,	porque	não	há	um	conteúdo	definido
a	priori;	segundo,	porque	não	existe	uma	metodologia	que	abstratamente	o
garanta.	Objeto	e	método	só	ganham	sentido	quando	se	constroem
conjuntamente	diante	de	uma	realidade	concreta.
Assim,	a	equipe	de	supervisores	da	Delegacia	de	Ensino	não	tem	um	“o	quê”	e
um	“como”	para	ensinar	o	coordenador	a	fazer	bem	seu	trabalho,	da	mesma
forma	que	este	também	não	possui	um	conteúdo	e	uma	metodologia	dados
aprioristicamente	para	tratar	com	o	professor.	Trata-se,	portanto,	de	um	saber	a
ser	construído	e	a	possibilidade	dessa	construção	só	se	verifica	quando,	situando-
se	lado	a	lado,	cada	um	coloca	o	saber	que	domina	para	conhecer	a	realidade
concreta	e	atuar	nela	com	vistas	a	um	fim	comum.
Enquanto	cada	elemento	quiser	passar	ao	outro	o	conhecimento	que	domina	ou
julga	interessante,	sem	ter	claro	como	esse	conhecimento	se	explicita	no	fazer	do
outro,	este	poderá	até	“aprendê-lo”	mas	dificilmente	irá	utilizá-lo	em	seu
trabalho.	Assim,	o	conhecimento	que	não	pediu	vem	se	justapor	aos	que	possui,
numa	somatória	que	não	se	integra,	interferindo	em	seu	fazer.	Na	relação	vertical
estabelecida,	em	que	o	diferente	é	tratado	como	inferior	ou	superior,	mas	sempre
distante,	“de	fora”,	os	profissionais	transformam	seu	saber	específico	em	um	fim
em	si	mesmo	e	não	em	um	meio	para	auxiliar	o	outro	a	interpretar	sua	realidade
e	atuar	segundo	ela,	recorrendo	ao	conhecimento	necessário	em	cada	momento
da	ação.	Cada	qual	responde	solitariamente	à	pergunta	que	não	lhe	foi	feita	e,
portanto,	sem	ressonância	no	comportamento	do	outro.
Tornam-se	necessários	o	rompimento	da	relação	existente	e	o	estabelecimento	de
uma	relação	horizontal,	em	que	o	supervisor,	debruçando-se	sobre	o	seu	fazer,
possa	entendê-lo	e	encontrar	os	caminhos	para	transformá-lo	num	“saber-fazer-
bem”.	Esse	é	um	conhecimento	construído	coletivae	incessantemente	porque
envolve	situações	dinâmicas,	cambiantes	em	cada	momento	em	que	cada	relação
se	dá.	Essa	relação	pressupõe	que	se	alternem	as	posições	dos	elementos	do
grupo	porque	não	existe	um	que	sabe	e	ensina	e	outros	que	vão	aprender.	Cada
qual,	em	determinado	momento,	coloca	seu	saber	para	a	construção	do	novo
conhecimento,	que	direcione	a	ação.	O	questionamento	da	atuação	de	cada	um,
dos	conteúdos	e	dos	meios	que	utiliza,	da	forma	como	participa	e	da	participação
que	permite	aos	outros	(portanto,	a	reflexão	sobre	a	prática	concreta	em	sua
relação	com	o	objetivo	que	a	orienta)	torna-se	fundamental.
Tem-se,	assim,	uma	situação	peculiar	em	que	a	descoberta	dos	caminhos
pressupõe	o	rompimento	da	relação	estabelecida,	mas	dialeticamente	esse
rompimento	só	ocorre	pela	descoberta	desses	caminhos.	O	interlocutor
qualificado	é	fundamental	para	essa	mudança	radical,	mas	ele	também	não	está
dado.	A	hierarquia	do	sistema	não	garante	sua	definição.	Provocador	dessa
mudança,	ele	só	surge	no	decorrer	da	própria	mudança.	Não	há	como	se	ter	a
segurança	de	verdades	aprioristicamente	dadas.	Caminhar-se-á	para	a
transformação	caminhando	e,	assim,	a	reflexão	contínua	sobre	a	prática,
amparada	pelo	seu	fim,	é	condição	necessária	para	a	construção	da	práxis	das
pessoas	envolvidas.	Sem	isso,	tudo	indica	que	a	prática	continuará	descontínua,
na	dependência	de	um	ou	outro	elemento,	não	promovendo	a	transformação	do
grupo	como	tal	e	levando	à	insatisfação	tantas	vezes	detectada.
Por	outro	lado,	observa-se,	em	muitos	coordenadores	e	supervisores,	um
“querer”	que	não	tem	se	submetido	e	que	busca	desesperadamente	os	caminhos
do	“saber-fazer”.	O	poder	está	em	provocar	as	mudanças	sem	ser	lançado	fora	do
processo.	Mudanças	são	válidas,	não	por	si	mesmas,	como	elementos	de	poder
para	manter	uma	posição,	mas	sim	para	revelar	a	percepção	de	que	a	prática	não
tem	conduzido	ao	fim	perseguido,	mas	pode	conduzir	a	ele	se	provocar	uma
análise	radical.	Dessa	forma,	a	resistência	não	pode	ocorrer	de	forma	defensiva	e
acrítica.	É	necessário	que	o	coordenador	defina,	com	clareza,	para	si	próprio,	que
objetivos	persegue,	que	papel	se	propõe	a	desempenhar.
A	relação	estabelecida	de	forma	autoritária	busca	“encaixar”	o	coordenador	em
um	papel	não	explicitado:	o	de	reprodutor,	na	escola,	das	decisões	tomadas	pela
Delegacia	de	Ensino	e	demais	instâncias	do	sistema.	Paralelo	a	esse,	há	a
expectativa	declarada	de	que	ele	seja	um	elemento	criativo,	com	iniciativa,
dinâmico,	a	fim	de	encontrar	os	momentos	adequados	para	agir	e	provocar	o
trabalho	cooperativo	dos	professores.	Só	não	se	declara	com	que	objetivo	ele
deve	exercer	essas	qualidades,	mesmo	porque	as	pessoas	não	têm	essa
percepção.	Na	prática,	discurso	e	ação	parecem	se	chocar,	deixando	o
coordenador	confuso,	na	medida	em	que	ele	também	quer	se	“encaixar”	em	um
papel.	Mas	que	papel?
Na	escola,	além	de	tudo,	ele	vive	o	conflito	de,	ao	mesmo	tempo,	ser	professor	e
coordenador;	ligar-se	ao	diretor,	assessorando-o	no	cumprimento	de	tarefas
administrativo-burocráticas	de	que	esse	se	ocupa	e	ao	professor,	que	dele	espera
“receitas	milagrosas”	para	seu	fazer	pedagógico.
Ter	um	papel	claramente	definido	é,	para	muitos	pesquisadores	que	investigaram
a	supervisão	em	nível	de	unidade	escolar,	condição	essencial	para	a	realização
do	trabalho.	Essa	é	para	nós	uma	faca	de	dois	gumes.	O	coordenador	pode,
diante	de	um	papel	claramente	definido,	viver	a	estereotipia	do	papel	de	forma
limitadora	de	sua	individualidade.	Seu	comportamento	pode	orientar-se	pelo
cumprimento	das	normas	relativas	a	esse	papel,	conformando-se	alienadamente	a
elas.	Pode,	por	outro	lado,	fazer	sobressair	a	dimensão	subjetiva	do	exercício	do
papel,	rompendo	a	camisa	de	força	da	burocracia.
Colocados	no	centro	de	diferentes	expectativas,	algumas	antagônicas,	o
coordenador	e	o	supervisor	vivem	uma	situação	privilegiada,	notadamente	se
considerarmos	a	possibilidade,	mínima	que	seja,	de	reunião	com	os	professores.
Transformar	esse	espaço	instituído	em	realidade,	no	exercício	de	uma	função
realmente	comprometida	com	uma	proposta	política	e	não	com	o	cumprimento
de	um	papel	alienadamente	assumido,	é	uma	possibilidade	que	se	coloca	a	esses
profissionais.	A	transgressão	responsável	da	relação	estabelecida,	tendo	como
apoio	o	discurso	instituído,	é	uma	tarefa	que	eles	não	vêm	realizando,	mas	que	se
abre	como	uma	possibilidade	na	busca	de	sua	identidade,	possibilidade	essa	que
se	realizará,	não	somente	(embora	também)	através	de	seu	preparo	técnico,	mas
no	seu	cotidiano	por	meio	de	uma	práxis	politicamente	comprometida.
Isso	não	ocorrendo,	cria-se	uma	dependência	e	uma	subserviência	ao	sistema	e
este	se	converte	em	sua	própria	finalidade.	Esvaziado	de	sua	finalidade	educativa
e	ganhando	vida	própria,	o	sistema	precisa	se	justificar	e	isso	leva	a	um	“frenesi”
de	atividades	que	se	aceleram	cada	vez	mais,	impedindo	a	reflexão.	De	um	lado,
as	instâncias	intermediárias,	entre	a	cúpula	e	as	escolas,	“incham”	cada	vez	mais;
de	outro,	nas	unidades	escolares	acrescentam-se	mais	e	mais	elementos	da
supervisão	e	da	administração	que	se	desdobram	em	mil	e	uma	atividades,
atendem	inúmeras	necessidades	criadas	pelo	sistema,	e	desviam-se	cada	vez
mais	da	finalidade	precípua	da	escola.	Mais	grave	ainda:	professores	são
alocados	e	retirados	continuamente	das	funções	de	supervisão,	recebendo
treinamento	nos	moldes	acima	explicitados,	passando	a	integrar	o	imenso
contingente	de	educadores,	não	só	acostumados	ao	sistema	burocrático	de
organização,	como	a	pensar	burocraticamente,	levando	essa	forma	de	atuar	para
seu	relacionamento	com	o	aluno.
Aliás,	dever-se-ia	questionar	o	sistema	acerca	dessa	precária	situação	de
trabalho:	o	coordenador	exerce	uma	função;	a	coordenação	não	se	constitui	num
cargo.	Isso	favorece	a	descontinuidade	do	trabalho	a	ser	desenvolvido	nas
escolas,	ao	mesmo	tempo	em	que	coloca	o	coordenador	numa	posição	bastante
frágil;	não	se	submetendo	às	determinações	e	às	expectativas	do	sistema,	ele	é
afastado	da	função.	A	situação	que	lhe	é	imposta,	embora	não	explicitada,	já	traz
em	si	a	sua	submissão	ao	sistema	de	supervisão,	de	um	lado,	e	à	direção	da
escola,	de	outro,	o	que	lhe	confere	uma	estreita	margem	de	ação.
Por	outro	lado,	se	sua	capacitação	em	serviço,	nos	moldes	apontados,	tiver	um
mínimo	de	sucesso,	estará	o	sistema	formando	uma	nova	categoria	de	professor:
aquele	acostumado	a	pensar	e	agir	burocraticamente,	esvaziando	seu	próprio
trabalho	como	docente.	Daí	nos	preocupar	muito	a	afirmação,	já	corrente	nas
escolas,	de	que	todo	professor	deve,	pelo	menos	por	algum	tempo,	exercer	as
funções	supervisoras,	em	alguma	instância	do	sistema;	“ele	terá	uma	outra
visão”,	dizem.	Se	esta	for	uma	“Super	Visão”,	que	lhe	permita	enxergar	mais	o
microespaço	da	sala	de	aula	e	compreender	melhor	as	relações	dessa	com	o
social	mais	amplo,	ótimo!	Mas,	se	essa	outra	visão	lhe	ofuscar	a	mirada	e
enrijecerlhe	o	pensamento,	então	a	situação	criada	será	de	um	prejuízo
descomunal	para	a	educação.
A	avaliação	poderia	ser	uma	chave	para	impedir	tal	situação.	No	entanto,	ao
entrar	como	tema	para	essa	forma	de	capacitação,	também	se	transfigurou:	de
referencial	para	etapas	seguintes	e	elemento	de	reflexão,	converteu-se	em	uma
etapa	obrigatória	e	burocratizada	do	trabalho;	passou	a	ser	sinônimo	de	dados	a
serem	tabulados,	transformados	em	tabelas	e	gráficos	e,	graças	à
“modernização”	da	Secretaria	de	Educação,	implantados	em	computador.	Uma
vez	executado	todo	o	ritual	traçado,	sua	função	já	está	cumprida.	“Para	que”	e
“por	que”	os	dados	são	levantados	resumem-se	na	justificativa	de	que	“devem
constar	do	Plano	Diretor”!
Resta-nos	recorrer	à	participação.	E	o	que	constatamos?	Ela	também	ganhou
outras	concepções	e	converteu-se	em	“participacionismo”,	que	se	revela	na
participação	formal	e	funcional.	Assim,	a	simples	presença	física	num	encontro
ou	reunião	ou	o	pertencer	a	um	colegiado	como	o	Conselho	de	Escola,	por
exemplo,	responde	pela	participação	que	efetivamente	não	ocorre.	Outras	vezes
a	participação	é	para	referendar	decisões	játomadas	ou	simplesmente	opinar
sobre	questões	pouco	substantivas,	como	horário	e	local	de	ações	já	definidas.
Todas	essas	constatações	levam	a	repensar	o	conteúdo	da	ação	supervisora,	a
forma	como	participa	e	o	tipo	de	participação	que	favorece	seus	representantes.
Esses	dados	apontam-nos	para	o	tipo	de	compromisso	que	a	supervisão	assume	e
a	que	interesses	serve.
Se	nos	interessa	o	exercício	de	uma	profissão	autônoma,	a	formação	de	uma
identidade	profissional	refletida,	não	ingênua	ou	alienada,	é	preciso	estarmos
atentos	às	dimensões	coletivas	da	produção	dos	saberes	e	dos	valores.	E	os
valores	precisam	ser	vivenciados	na	prática,	refletindo	a	finalidade	da	ação
supervisora	e	seu	papel	emancipador.
Se	os	coordenadores,	de	forma	consciente,	crítica	e	comprometida,	não
assumirem	sua	posição	na	equipe	de	educadores	de	sua	escola	na	organização
coletiva	de	um	projeto	pedagógico	que	atenda	às	necessidades	concretas	da
população	a	que	assistem;	se	eles	continuarem	levando,	de	forma	acrítica,	para	a
escola,	as	determinações	e	os	conhecimentos	produzidos	e	selecionados	fora
dela,	em	vez	de	tornarem	a	escola	o	foco	de	atenção,	indo	buscar	e	cobrar	nas
diferentes	instâncias	do	sistema	os	elementos	que	essas	podem	oferecer	para
viabilizar	esse	projeto,	terão	perdido	uma	oportunidade	histórica	de	participar	da
construção	social	da	escola.
Na	mesma	posição	estará	a	equipe	da	Delegacia	de	Ensino	que,	ao	se	propor	à
capacitação	em	serviço	do	coordenador,	precisa	considerá-lo	sujeito	do	processo
de	construção	de	sua	identidade,	processo	esse	que	ela	favorecerá	quando
efetivamente	se	propuser	a	estar	com	ele,	quando	mergulhar	nas	situações	reais
que	ele	vive	no	cotidiano	de	sua	escola,	em	vez	de	definir	características	e
formas	de	atuação	para	o	coordenador	baseadas	num	saber	nebulosamente
estabelecido.
Discutindo	a	opção	diante	da	ambivalência
A	teoria	de	supervisão	e	a	atuação	dos	supervisores	nos	diferentes	níveis,	alguns
imbuídos	do	papel	fiscalizador,	outros	apoiados	na	eficiência	da	metodologia	e
dos	saberes	científicos,	produziram	um	discurso	centrado	na	mudança,	mas
revelaram	uma	face	essencialmente	conservadora.
O	controle,	característico	da	função,	exerceu	seu	poder	em	benefício	do	sistema
educacional,	o	que	não	equivale	a	dizer	da	educação.	A	hierarquia	sustentada
pela	legislação	e	pelas	normas	definiu	seu	modelo	e	exerceu	sua	função
reguladora	na	intenção	de	manter	a	eficiência	do	sistema.	Mas,	por	que
desejamos	eficiente	um	sistema	que	tem	como	função	a	exclusão	de	uma	grande
camada	da	população	e	preocupa-se	com	a	transmissão	de	valores	compatíveis
com	o	papel	de	subordinados?
A	ação	que	desmente	o	discurso	ou	é	alienada,	ou	cínica.	De	uma	forma	ou	de
outra,	provoca	a	crise	no	sistema.	Essa	surge	como	uma	oportunidade:	a	de	se
definir	um	papel	que	resgate	o	educativo	da	função	e	do	sistema.	A	dicotomia
ação/discurso	retoma	seu	caminho	de	unicidade	na	dimensão	ética:	os	valores
explicitados	precisam	ser	vivenciados	e	assumidos	na	ação.
A	competência	a	ser	construída	pelos	supervisores,	em	qualquer	nível	que	atuem,
deve	se	revelar	primeiro	na	sua	capacidade	de	visualizar	claramente	qual	pode	e
deve	ser	o	papel	da	supervisão	exercida	por	um	educador.	Essa	competência
compartilhada	precisa,	em	cada	momento	e	espaço,	assumir,	na	ação,	a	dimensão
técnica	e	o	compromisso	político	do	saber-fazer.
O	compromisso	com	a	mudança,	para	nós,	define	o	olhar	voltado	para	os	fins	da
educação,	para	o	ensino,	para	o	aluno	e	não	a	“fidelidade”	ao	sistema.	A
coerência	com	esse	compromisso	impulsiona	a	ação	para	a	vivência	de	valores
que	rompam	efetivamente	com	o	vínculo	de	submissão,	com	a	relação
estabelecida	com	função	reguladora	e	normativa,	que	impõe	um	saber	vindo	de
fora,	em	vez	de	auxiliar	a	construção	de	um	saber	coletivamente	refletido	e
autoconstruído.
Os	valores	dessa	ordem,	vivenciados	na	prática,	colocarão	os	supervisores	ao
lado	dos	professores	para,	juntos,	montarem	um	projeto	de	escola	que	possibilite
ao	aluno,	qualquer	que	seja	ele,	a	compreensão	do	significado	do	saber
construído	pela	humanidade.
É	preciso	que	o	compromisso	político	do	educador-supervisor	faça	uso	do
discurso	e	dos	espaços	instituídos,	fazendo	uma	reinterpretação	crítica	da
burocracia	imperante	no	sistema,	a	fim	de	colocá-la	a	serviço	da	finalidade
educativa	da	escola.
Provocando	a	reflexão	sobre	sua	prática,	tendo	em	vista	a	qualidade	do	ensino	a
ser	oferecido	à	grande	massa	da	população	brasileira,	o	supervisor	terá	a
oportunidade	de	redefinir	seu	papel,	revertendo	o	fluxo,	colocando	o	sistema	a
serviço	da	escola,	impedindo	que	ela	continue	“tarefeira”	do	sistema,	desviando-
se	cada	vez	mais	de	sua	função	social.
Referência	bibliográfica
PENIN,	Sonia	T.	de	Souza.	“Escola	e	cotidiano:	A	obra	em	construção;
confronto	entre	as	condições	objetivas	e	representações	de	professores,	diretores
e	pais	em	quatro	escolas	públicas	de	1º	grau	de	São	Paulo”.	Tese	de	doutorado
em	Educação.	São	Paulo:	Feusp,	1987.
6
PARADIGMA	DE	AVALIAÇÃO	EMANCIPATÓRIA	E	A	AÇÃO
SUPERVISORA:	CIDADANIA	E	ESPAÇO	PÚBLICO
[20]
Marilu	Fontoura	de	Medeiros
Trabalhar	com	temas	como	cidadania,	emancipação	e	espaço	público	exige,	na
perspectiva	habermasiana,	a	concreticidade	da	teoria	e	da	prática	na	ação	que	se
constrói	no	cotidiano.	Sem	o	nexo	entre	ambas,	pouco	estaremos	fazendo	pela
cidadania	em	seu	processo	de	emancipação,	que	se	efetiva	na	construção
socioindividual	crítica	e	reflexiva	da	liberdade	(Habermas	1990a,	1993).
Como	já	afirmaram	alguns	autores,	falar,	de	forma	teórica,	na	luta	pela
democracia	com	uma	prática	autoritária	evidencia,	em	certa	medida,	a	antítese	da
própria	democracia.	Somente	com	práticas	genuinamente	democráticas,
instauradas	em	espaços	públicos	de	forma	transparente,	processual,	falível	e
intersubjetiva,	estaremos	realmente	lutando	pela	instauração	–	passo	a	passo	–	de
espaços	democráticos	(Habermas	1991).
Uma	ação	concreta	–	seja	a	ação	supervisora,	ou	a	mediação	estabelecida	na
ação	orientadora	ou	na	administrativa	–	exige	o	compromisso	real	com	a
construção	da	autonomia	de	“cada	um”	e	de	“todos”	(Habermas	1990b;
Castoriadis	1985).
Neste	contexto,	apresentamos	a	proposta	concretizada	de	construção	de	um
paradigma	de	avaliação	emancipatória	em	contexto	concreto	de	um	curso	de
especialistas	em	educação,	realizado	em	uma	universidade	federal	do	sul	do	país.
Construindo	um	paradigma	emancipatório
A	proposta	que	apresentamos	é,	por	sua	própria	natureza,	mediada	por	um
processo	teórico-prático.	Nele,	trazemos	o	aporte	da	teoria	crítica	de	sociedade
defendida	por	Jürgen	Habermas,	na	qual	propõe	uma	ruptura	dos	paradigmas
tradicionais,	reportando-se	à	retomada	da	construção	do	sujeito	em	um
paradigma,	agora,	enfaticamente	intersubjetivo,	baseado	na	interação,	na
linguagem	e	na	comunicação;	por	outro	lado,	este	processo	está	relacionado	ao
desvelamento	dos	interesses	que	orientam	o	uso	do	conhecimento	empregado	em
nosso	cotidiano.
A	mediação	teoria	e	prática	complementa-se	na	medida	em	que	nos	desafiam	a
reconstruir	e	aplicar	o	paradigma	habermasiano	a	contextos	socioeducacionais.
Neste	sentido,	alguns	trabalhos	de	pesquisa	têm	sido	objeto	de	nossa
atenção[21]	e	da	tentativa	de	buscar	a	relação	na	prática	pedagógica,
evidenciando	e	refletindo	os	nexos	ou	interesses	que	mediaram	nossa	ação	e	a
dos	objetos	de	pesquisa	que	construímos	no	cotidiano	da	pesquisa.[22]
Como	parte	deste	desafio,	buscamos,	inerente	à	natureza	da	própria	teorização,
estabelecer	um	processo	contínuo	de	reflexão,	construindo	na	relação	teoria-
prática	um	paradigma	de	avaliação	emancipatória,	com	base	em	uma	teoria
crítica	de	sociedade,	advinda	das	teses	de	Habermas;	esse	paradigma	inspira
propostas	que	assumem	seu	significado	mais	explícito,	pressupondo	um	processo
de	validade	e	legitimação,	na	medida	em	que	o	seu	contexto	se	caracterize	pela
instauração	e	ampliação	de	espaços	públicos	de	discussão.
Esta	questão	tem,	ainda,	relação	com	a	abordagem	construtivista/reconstrutivista
do	conhecimento	(Habermas	1989;	Flickinger	e	Neuser	1984),que	pressupõe	a
mudança	e	a	superação	de	um	paradigma	do	sujeito	ou	da	consciência	para	uma
proposta	centrada,	processualisticamente,	na	produção	que	se	efetiva	dia	a	dia,
desvelando	e	refletindo	não	somente	sobre	os	interesses,	mas	questionando	os
próprios	interesses	que	norteiam	e	constroem	nossas	ações	no	cotidiano	(ver
Esquema	I,	Medeiros	1994).
É	a	relação	que	o	sujeito	cognoscente	tem	com	a	natureza	que	define	os	dois
paradigmas.	No	da	consciência,	o	sujeito	assume,	em	relação	ao	mundo	dos
objetos	possíveis,	uma	ação	voltada	para	o	conhecimento	e	o	agir	sobre	estes
objetos	para	torná-los	como	deveriam	ser.	A	lógica	que	o	dirige,	em	essência,
ainda	é	a	de	agir	sobre	o	mundo/natureza	para	“comandar”	o	desenvolvimento,
mesmo	que	em	direção	a	uma	transformação	social	coletivizada	da	denominada
igualdade	social.
É	interessante,	então,	perceber	a	questão	do	“Conhecimento	obtido	pela
racionalidade	centrada	na	comunicação”	no	esquema	que	se	segue:
ESQUEMA	I
Paradigmas	do	conhecimento	com	vistas	à	proposta	de	crítica	de	Jürgen
Habermas
O	paradigma	emancipatório	representa,	na	perspectiva	da	teoria	habermasiana,	a
retomada	da	razão	ampliada,	na	qual	se	incluem	o	logos	e	o	pathos	e	que	sinaliza
para	o	redimensionamento	de	um	sujeito	monológico,	na	direção	de	um	sujeito
dialógico.	De	novo,	um	paradigma	é	superado	pela	retomada	de	uma
subjetividade	que	constrói,	reflexivamente,	sua	liberdade,	autonomia	e
emancipação	em	um	processo	socioindividual.
Instaura-se	a	lógica	da	razão	comunicativa,	base	do	paradigma	avaliativo,	que	se
efetiva	num	processo	argumentativo	baseado	em	atos	de	fala,	no	qual	são
questionadas	pretensões	de	validade	que	podem	ser	aceitas	ou	não,	legitimadas
pela	força	de	argumentação.	É	nesta	linha	que	trazemos	Rouanet	(1987),	quando
afirma	que	quem	tem	sido	oprimida	até	hoje	é	a	intersubjetividade,	não	a
subjetividade,	e	que,	além	disso,	a	totalidade	do	processo	histórico-social	só
pode	ser	compreendida,	criticada	e	transformada	quando	o	crítico	usar	a
linguagem	da	razão	intersubjetiva	e	não	as	“armas”	oferecidas	pela	razão
subjetiva.
Explicitamos	no	Esquema	I,	a	passagem	de	um	paradigma	que	privilegia	uma
relação	Sujeito-Objeto	(S-O)	para	um	paradigma	que	privilegia	uma	relação
Sujeito-Sujeito	(S-S).	Neste,	é	retomada	a	dimensão	de	liberdade,	de	construção
democrática	e	processualística	dos	espaços	de	cidadania,	do	sujeito,	dos	grupos-
sujeito	e	do	sujeito	no	(e/ou)	coletivo.	Há	como	que	uma	superação	da	ação	do
sujeito	que	usa	sua	perspectiva	particular	(mesmo	que,	contraditoriamente,
apontada	ou	defendida	como	se	fosse	coletiva)	como	critério	de	verdade	para
conhecer	e	dominar	objetos,	sejam	estes	coisas	ou	pessoas;	há	um	usar	de
perspectivas	reciprocamente	entrecruzadas	entre	o	“eu”,	o	“tu”	e	o	“outro”	para
conhecer	e	transformar	estas	três	perspectivas	(Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993;
Medeiros	1994).
Tais	condições	e	pressupostos	consubstanciam-se	nas	propostas	expressas	na
teoria	da	ação	comunicativa	(Habermas,	1988,	1989),	suportada	pelo	que
Habermas	e	outros	adeptos	da	teoria	crítica	denominam	como	racionalidade
crítico-emancipatória.	No	contexto	da	avaliação	(Klein,	Lovatel	e	Medeiros
1993)	estabelecem-se	parâmetros	e	categorias	os	quais	nos	facilitaram	o
mergulho	de	forma	abrangente	e	orgânica	numa	proposta	de	avaliação
emancipatória	de	um	curso	de	formação	de	supervisores,	orientadores	e
administradores	em	educação.	Esta	racionalidade	a	que	nos	referimos,	com	seu
interesse	centrado	nas	dimensões	de	democracia	radical,	de	crítica	dialética
argumentativa,	de	espaço	público,	de	transformação	socioindividual,	conduz	à
possibilidade	da	construção	intersubjetiva	da	liberdade	num	processo	de
autonomia	crítica	e	reflexiva,	caracterizando	uma	avaliação	que	se	propõe
teórica	e	praticamente	emancipatória.
É	oportuno,	então,	observar	a	“Teoria	crítica	de	sociedade”,	no	esquema	que	se
segue:
ESQUEMA	II
Teoria	de	sociedade
O	paradigma	de	avaliação	emancipatória	traz,	em	sua	relação	teórico-prática,
algumas	categorias,	não	excludentes,	tais	como:
•	superação	de	um	paradigma	do	sujeito	e/ou	da	consciência	por	um	paradigma
do	entendimento	(que	não	o	praticado	no	funcionalismo)	e/ou	da	comunicação;
•	o	desvelamento	ideológico	feito	através	da	crítica	dialética,	que,
processualisticamente,	auxilie	na	construção	do	melhor	argumento	e	na	liberdade
do	sujeito	em	oposição	à	crítica	dogmática;
•	a	centração	no	desvelamento	dos	reais	interesses	que	norteiam	o	uso	do
conhecimento;
•	a	compreensão	do	uso	do	conhecimento	como	expressão	de	uma	“razão
ampliada”,	na	qual	se	incluem	tanto	o	logos	quanto	o	pathos	expressos	em
vivências,	fatos	e	normas;
•	a	busca	de	uma	ação	que	contemple	o	outro	como	par,	como	iguais
diferenciados;
•	a	qualificação	democrática	do	argumento,	configurando	o	assumir	verdades
falíveis	nas	esferas	da	vida	e	que	englobam	questionamentos	tanto	dos	meios
quanto	dos	fins	e	da	ação	em	si	mesma;
•	a	pressuposição	da	ação	não	mediatizada	por	coerção,	coação,	cooptação,
persuasão,	patrulhamento	ou	admoestação	que	impeçam	a	manifestação	da
autenticidade,	da	verdade,	da	justiça	e,	consequentemente,	da	luta	pela
legitimidade;
•	a	pressuposição	de	uma	crítica	não	dogmatizada	em	fundamentalismos	(sejam
filosóficos,	religiosos	ou	político-partidários),	avançando	na	construção
intersubjetiva	da	liberdade;
•	a	valorização	da	linguagem	(não	em	sua	formalização),	via	atos	de	fala,	como
suporte	para	o	“dar-se	a	entender”	numa	ação	intersubjetiva;
•	a	ênfase	não	só	na	gênese	e	no	uso	do	conhecimento,	mas	na	busca	de
pretensões	de	validade	construídas	argumentativamente;
•	o	entendimento	e	a	diferenciação	de	tipos	de	ações	em	suas	racionalidades,
sejam	elas	técnico-instrumentais,	estratégicas	ou	emancipatórias,	expressando
interesses	diversificados	e	preponderando	no	mundo	do	sistema	ou	no	mundo	da
vida;
•	a	consciência	da	interação	entre	o	mundo	do	sistema	e	o	mundo	da	vida,	com
suas	óticas	diferenciadas	e	da	necessidade	de	privilegiamento	do	último;
•	a	consciência	de	que	as	ações	técnico-instrumentais	e	as	estratégicas	não
possibilitam	a	construção	socioindividual	da	liberdade,	da	autonomia,	da
emancipação;
•	a	certeza	de	que	esta	construção	só	se	valida	em	um	processo	centrado	na
reflexão	crítica,	que	implica	“pensar	o	pensamento”,	“pensar	por	si	mesmo”	e
“pensar	com	o	outro”;
•	a	ligação	indissociável	entre	emancipação,	reflexão	crítica	e	desvelamento
ideológico,	como	processos	em	sua	força	esclarecedora;
•	a	clarificação	de	que	este	processo	de	emancipação	opera-se	pela
“ressimbolização	do	mundo	da	vida”	(empobrecido	pelos	valores	e	ótica	do
mundo	do	sistema)	via	“ampliação	de	espaços	públicos”,	como	processos	de
transparência,	nos	quais	se	fazem	presente	a	resistência	e	a	ressonância;
•	a	luta	pela	reabilitação	da	esfera	pública,	na	qual	as	pessoas	possam	decidir
como	sujeitos,	sem	imposições,	mas	por	uma	disposição	argumentativa;
•	a	certeza	de	que	a	reabilitação	desta	esfera	passa	pela	construção	do	“eu
competente”,	que	pressupõe	uma	ética	discursiva,	com	a	necessária	descentração
do	eu;
•	a	consciência	de	que	a	emancipação	e	a	autonomia	só	podem	ser	entendidas
como	legítimas	se	em	suas	dimensões	de	“autenticidade”,	de	“verdade”	e	de
“justiça”	contemplarem	a	“todos”	e	a	“cada	um”.
As	categorias	presentes	na	proposta	habermasiana	foram	por	nós	interpretadas
(Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993)	para	a	construção	do	paradigma	de	avaliação
emancipatório.	A	avaliação	emancipatória,	em	nossa	percepção,	exige	a	validade
de	conceitos	como	democracia	radical,	espaço	público,	transformação
socioindividual	e	crítica	dialética/argumentativa.
Emancipação	está	intimamente	associada	ao	processo	de	desenvolvimento	da
consciência	moral,	de	uma	heteronomia	para	a	autonomia,	envolvendo
dimensões	linguísticas,	cognitivas	e	interativas	que	potencializam
processualisticamente	a	“maioridade”	que	se	concretiza	no	processo	de
construção	do	“eu	competente”.	Emancipação	relaciona-se	com	“libertação	em
relação	a	parcialidades	[...]	e,	nela,	os	processos	de	autoentendimentose
entrecruzam	com	um	ganho	de	autonomia”	(Habermas	1993,	p.	99);	relaciona-
se	com	a	possibilidade	simbólica	de	falar	e	de	ser	ouvido	(o	que	se	relaciona
com	o	interacionismo	simbólico	processual	e	não	substantivo	de	Mead	e	de
Searle);	de	expressar	o	pensamento	num	nível	comunicacional	entre	dois	ou
mais	sujeitos	(o	que	implica	processar	o	desenvolvimento	sociocognitivo,	com
influências	piagetianas);	de	estabelecer	interação	entre	diferentes	agentes	de
fala	(o	que	caracteriza	as	dimensões	interativa	e	linguística	com	base	em	Searle
e	Austin)	e,	finalmente,	de	potencializar	ao	longo	da	vida	os	processos	de
desenvolvimento	moral,	de	uma	ação	heteronômica	crítica	para	uma	ação
autônoma	crítica-reflexiva	em	seu	aporte	socioindividual	(o	que	traz
contribuições	marxianas	e,	principalmente,	de	Kohlberg	e	de	Piaget	com	as
superações	neomarxistas	propostas	por	Habermas).
Entendemos	democracia	radical	como	processo	de	comunicação	política	que	se
desenvolve	com	ausência	de	violência	numa	moldura	argumentativa,	na	qual	são
contemplados	tanto	o	dissenso	quanto	o	consenso.	Nesse	processo,	são
levantadas	pretensões	de	verdade.	A	condição	que	lhe	dá	origem	ocorre	com	um
desenvolvimento	responsável	e	compartilhado	pelas	perspectivas	do	“eu”,	do
“tu”	e	da	construção	do	“outro”	qualitativamente	diferenciada.	O	processo	de
busca	perene	e	radical	da	verdade	dos	fatos,	da	adequação	das	normas	e	da
veracidade	do	locutor	pode	ser	questionado,	exigindo	validação
intersubjetivamente	estabelecida	e	deflagrando	a	necessidade	de	processualizar	a
legitimidade.	Por	sua	vez,	este	questionar-se	exige	a	construção	do	que	é
denominado	como	“eu	competente”	(Habermas	1989,	1990a)	em	uma
perspectiva	radicalmente	democrática.	Representa	uma	luta	cotidiana	de
conquista	que	só	se	substantiva	em	uma	clivagem	de	argumentação	livre	de
coerção,	com	transparência,	com	uso	de	espaços	públicos	e	de	campos	de
ressonância	destes	espaços	e	processos	(Habermas	1990a,	1991).
Espaço	público	refere-se	à	dimensão	de	transparência	(Habermas	1989)	e	de
ressonância	das	tematizações	e	das	argumentações,	tanto	dos	meios	quanto	dos
fins	da	prática	social,	quando	esses	temas	não	forem	considerados	legítimos	em
sua	autenticidade,	verdade	e	justiça	(Habermas	1991).
Transformação	socioindividual	ocorre	a	cada	momento	do	cotidiano	à	medida
que	se	configurar	a	alteração	qualitativa	do	real	quanto	ao	significado	e	à
legitimidade	das	vivências,	dos	fatos	e	das	normas	que	estão	sendo	tematizados
e,	nestas	condições,	negociados,	renegociados,	alterados	e	reinstaurados	num
processo	intersubjetivo	argumentativamente	estabelecido.
Crítica	dialética	e	argumentativa,	em	nossa	pretensão,	é	garantida	somente	se
nela	preponderar	a	dimensão	na	qual	o	criticado	não	se	sente	oprimido,
persuadido,	coagido,	cooptado,	mas	liberto	para	argumentar	com	seus	pares.
Desvelando	a	dimensão	do	nexo	teórico-prático,	categoria
fundamental	do	paradigma
Habermas	propõe,	em	sua	análise	de	uma	teoria	crítica	de	sociedade	(seja	tanto
do	capitalismo	como	do	socialismo	burocrático),	uma	ruptura	paradigmática
entre	lógicas	(Habermas	1982,	1987,	1988),	conforme	análise	em	trabalho
anterior	(Medeiros	1994),	ao	lidar	com	os	nexos	entre	“interesses	e
conhecimentos”	como	determinadores	e	desveladores	de	racionalidades.	Opera,
neste	sentido,	“com	nexos	entre	teoria	e	prática	como	expressão	de
racionalidades”	(Medeiros	1994),	fundadas	em	um	processo	de	permanente
reflexão	entre	o	que	propugnamos	como	teoria	e	o	que	executamos	como	prática.
Tal	ação	desvela	uma	outra	lógica,	que	denominamos	como	“lógica	interna”,
assumindo	seu	critério	de	verdade	com	base	na	lógica	que	impera	em	nossa
prática	(Austin	1992;	Habermas	1993).	Isto	significa,	em	outras	palavras,	que
uma	intenção	emancipatória	só	o	será	realmente	quando	cumprir,	na	prática	(e
não	só	na	teoria),	seus	supostos.
Este	foi	o	pressuposto	perseguido	em	todo	o	trabalho	de	construção	e
reconstrução	do	paradigma	de	avaliação	no	decorrer	da	pesquisa	que	tratou	da
figura	concreta	do	especialista	em	educação.	Da	mesma	forma,	também,
influenciou	a	perspectiva	já	difundida	por	Habermas	(1987)	e	Matos	(1989)	de
que,	quando	se	estuda	um	objeto	particular	(em	nosso	caso,	o	próprio	curso),
procura-se	vê-lo	não	como	um	sistema	estabelecido,	mas	como	um	produto
histórico	do	passado	e	como	aspiração	de	realizações	no	futuro.	Não	se	reduz	a
uma	autocrítica	interna:	a	crítica	passa,	então,	a	ser	o	elemento	que	permeia	o
processo	de	conhecimento,	não	somente	pondo	em	questão	uma	hipótese
explicativa	ou	transformadora	de	um	problema,	mas	suscitando	uma	atitude
diante	do	conhecimento,	como	tal,	em	sua	totalidade	(na	qual	incluímos	todos
nós),	cujo	objeto	e	resultado	são	permanentemente	questionados.
Essa	forma	específica	de	interação	caracteriza-se	pela	presença	de	uma
multiplicidade	de	interlocutores	que	buscam,	juntos,	pelo	argumento,	tornar
transparentes	os	contextos	internos	e	externos	de	dominação,	questionando
meios	e	fins	que	se	prestem	a	esta	dominação.	O	processo	avaliativo,	longe	de
constituir-se	numa	busca	de	verdades	absolutas,	caracteriza-se	pela	consideração
de	todas	as	razões	que	justifiquem	as	pretensões	de	verdade	levantadas	pelos
participantes,	relativas	a	qualquer	dimensão	factual,	de	vivência	ou	de	norma	do
objeto	construído	na	avaliação.	Visa,	portanto,	a	um	mundo	legitimado	pela
própria	dinâmica	de	busca	de	verdades.
Fica	claro	que	a	reflexão	crítica	só	é	emancipatória	quando	feita	por	meio	de	atos
de	fala	dirigidos	ao	entendimento,	conforme	vivenciamos	em	diferenciados
contextos	de	construção	dos	objetos	de	pesquisa	(Medeiros,	Colla	e	Martins
1993;	Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993;	Medeiros	1994).
A	distinção	entre	crítica	dogmática	–	que	oprime	a	quem	é	criticado	–	e	crítica
dialética	–	que	liberta	a	quem	critica	e	a	quem	é	criticado	–	pareceu-nos
fundamental	para	a	compreensão	de	uma	participação	verdadeiramente
libertadora.	Enquanto	a	crítica	dogmática	procura	impor	ao	que	é	criticado	a
própria	visão,	sempre	exterior	ao	objeto	criticado,	a	crítica	dialética	debruça-se
sobre	o	que	vai	ser	criticado	e	recebe	do	objeto,	no	momento	da	crítica,	impulsos
de	pensamento	que	nascem	precisamente	das	brechas	e	contradições.	Aos	olhos
da	crítica	dialética,	as	contradições	não	constituem	indícios	de	fraqueza	do
pensamento	do	autor	tratado,	mas	indicadores	de	um	determinado	problema	que
ainda	não	foi	resolvido	definitivamente	ou	que	está	encoberto.	(Siebeneichler
1989,	p.	27)
É	uma	crítica	que,	longe	de	oprimir	o	que	é	criticado,	consiste	numa	ajuda,	num
enfrentamento	democrático,	visando	construir	argumentos	e	explicações	para
facilitar	a	compreensão	e	a	transformação	da	realidade,	por	meio	de	um
movimento	dialógico.	A	crítica	dialética	pressupõe	o	exercício	de	uma
racionalidade	que	busca	incessantemente,	num	movimento	de	ir	e	vir,	de	negar	e
afirmar,	de	argumentar	e	contra-argumentar,	a	verdade	das	proposições,	a
autenticidade	subjetiva	e	a	correção	de	normas.	Difere	da	racionalidade	cujas
medidas	de	critérios	de	verdade	estão	associadas	ao	conhecimento	de	objetos	e
ao	domínio	sobre	estes	objetos.	E,	neste	sentido,	usar	um	ou	outro	tipo	de
racionalidade	nas	ações	humanas	não	é	indiferente	para	o	benefício	social	das
ações	dos	especialistas-supervisores	nas	escolas.
Segundo	Habermas	(1987	e	1988),	as	racionalidades	apresentam-se	como	ações
orientadas	ao	êxito	e	como	ações	comunicativas.	Denomina	de
instrumental	uma	ação	orientada	ao	êxito,	quando	a	consideramos	sob	o	aspecto
de	observância	a	regras	de	ação	e	avaliamos	o	grau	de	eficácia	da	intervenção
em	um	estado	físico;	em	troca,	denominamos	estratégicas	a	uma	ação	orientada
ao	êxito,	quando	a	consideramos	sob	o	aspecto	da	observância	de	regras	de
eleição	racional	e	avaliamos	o	grau	de	eficácia	no	intento	de	influir	sobre	as
decisões	de	um	oponente	racional.	As	ações	instrumentais	podem	estar
associadas	às	interações	sociais;	as	ações	estratégicas	são	ações	sociais.
(Habermas	1988,	pp.	384-385)
Seria,	nas	suas	devidas	proporções,	o	questionamento	de	Rouanet	(1987,	p.	158)
sobre	o	quetem	sido	feito
para	legitimar	um	sistema	injusto,	quando	se	esgotou	o	estoque	de	legitimação
disponível	–	as	de	baixo,	vindas	do	mercado,	as	de	cima,	vindas	da	tradição.	A
solução	é	transformar	medidas	práticas	em	medidas	técnicas,	apresentar	as
tarefas	do	Estado	como	tarefas	prioritariamente	administrativas,	sujeitas	a	regras
que	não	precisam	de	qualquer	justificação	senão	a	sua	[suposta]	própria	eficácia,
e	não	normas,	que	exigiriam	uma	tematização	inconveniente,	que	acabaria	por
tornar	transparentes	as	estruturas	de	dominação,
como	testamos	em	pesquisa	sobre	autonomia,	educação	ambiental	e	consciência
moral	(Medeiros,	Biaggio,	Ribeiro	e	Kronbauer	1985).
Assim,	ficava	claro	para	nós	que	o	nexo	entre	teoria	e	prática	evidenciava	a
presença	de	uma	outra	lógica	fundada	numa	relação	com	o	que	fazemos	e	muito
menos	com	o	discurso[23]	(empregado	neste	momento	em	um	sentido	não
habermasiano)	que	supomos	ou	desejamos	defender.	Neste	ponto,	Guattari
(1986)	apresenta	uma	posição	semelhante	à	de	Habermas,	ao	defender	a	ideia	de
que	podemos	apresentar	uma	postura	democrática	e	progressista,	mas	sermos,	na
verdade,	fascistas	em	nossa	prática.	Para	os	dois,	o	fazer	seria	a	autenticação	de
nosso	real	pensar	e	de	nossos	desejos.	Como	defende	Austin	(1992),	somos	o
que	fazemos	e	não	o	que	dizemos	que	desejamos	fazer.	Repetindo,	esta	condição
é	determinante	para	reafirmar	que	o	uso	de	uma	ou	outra	racionalidade	não	é
indiferente	ao	benefício	social.
Dessa	forma,	o	processo	avaliativo,	por	nós	construído	na	pesquisa,
tem	como	pressupostos	teórico-metodológicos	princípios	habermasianos,
fundados	em:	(1)	busca	de	uma	comunidade	de	comunicação	com	o	intuito	de
tematizar,	questionar	vivências,	fatos	e/ou	normas	na	perspectiva	de	atos	de	fala
(verbais	e	não-verbais)	que	incluam	o	“eu”,	o	“tu”	e	o	“outro”;	(2)	inclusão	de
“todos	e	de	cada	um”	em	espaços	públicos,	como	condição	de	construção,
consolidação	e	aperfeiçoamento	da	radicalidade	do	processo	democrático;	(3)
aceitação	dos	contrários	e	da	diferença	no	espaço	público,	de	transparência,
visando	ao	embate	no	uso	do	conhecimento/tematização	das	verdades;	(4)	valor
do	discurso	argumentativo	e	da	não-violência,	mesmo	que	simbólica;	(5)
desvelamento	ideológico	das	contradições	e	da	“lógica	interna”	no	uso	do
conhecimento,	desocultando	os	reais	interesses	e,	neste	processo,	o
desocultamento	do	ilegítimo,	pelas	suas	dimensões	de
inautenticidade/autenticidade,	verdade/inverdade,	justo/injusto;	(6)	assunção	da
reflexão	não	como	monólogo	reflexivo,	mas	como	processo	que	se	instaura	com
o	outro,	numa	ação	descentrada,	intersubjetiva;	(7)	crítica	dialética	em	oposição
à	crítica	dogmática;	(8)	condição	da	construção	socioindividual	da	liberdade
como	mediadora	e	resultante	de	um	processo	emancipatório,	autônomo,	crítico	e
reflexivo,	construindo	uma	sociedade	processualisticamente	mais	legítima.
(Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993,	p.	113)
O	processo	de	pesquisa	como	imanente	ao	processo	avaliativo
emancipatório
Enfrentando	o	processo	de	construção	de	uma	avaliação	emancipatória	na
fronteira	demarcada	pela	construção	radical	da	democracia	em	sua	vontade
coletiva	(Habermas	1988,	1990a,	1991),	buscamos	analisar	as	possibilidades	de
ação	no	mundo	do	sistema,	tendo	como	ênfase	os	valores	e	a	lógica	do	mundo
vivido.	É	pressuposto	que	as	ações	dominadas	pelo	mundo	do	sistema,	que
envolvem	o	Estado	e	a	economia,	assumem	a	lógica	e/ou	racionalidade	do
capital,	do	lucro,	do	poder,	do	domínio,	não	abrindo	perspectivas	naturais	para	o
exercício	da	ação	comunicativa.	Deste	“mundo”	fazem	parte,	quase	sempre,	as
ações	técnico-instrumentais	e	as	ações	estratégicas.	O	mundo	vivido	abrange	a
ciência,	a	moral	e	a	arte,	em	suas	essências,	sendo	dele	a	possibilidade	de	uma
ação	comunicativa,	única	capaz	de	abrir	perspectivas	à	construção	intersubjetiva
da	liberdade	e	da	autonomia	(Habermas	1988,	1990a;	Klein,	Lovatel	e	Medeiros
1993).
Por	sua	vez,	partindo	da	interdependência	destes	dois	mundos	na	sociedade
concreta	e	historicamente	situada,	procuramos	usar	do	conhecimento	na
avaliação	e	na	construção/reconstrução	de	um	curso	de	especialização	para
habilitação	de	especialistas	em	educação	em	um	processo	interativo	entre	teoria
e	prática.
O	tripé	“processo	dialógico,	ação	administrativa	e	construção/vivência	de	um
processo	avaliativo”,	presente	na	pesquisa	supracitada,	é	assumido	como
essencialmente	político,	uma	vez	que	pressupõe	uma	modalidade	de	ação
caracterizada	pelo	discurso	argumentativo.	Esse	processo	discursivo	objetiva,
reflexivamente,	examinar	normas,	fatos	e/ou	vivências,	discuti-los,	revê-los,
refutá-los,	desde	que	buscando	a	emergência	de	espaços	públicos	com	base
nessas	ações,	inclusive	com	a	reinstauração	desses	fatos	ou	normas	em	novas
bases	argumentativamente	estabelecidas.	Meios	e	fins	são	desvelados
ideologicamente	na	medida	em	que	são	questionados	em	suas	pretensões	de
verdade,	isto	é,	na	medida	em	que	não	sejam	considerados	legítimos.	Qualquer
verdade	merece	ser	encarada	como	falível,	seja	expressa	no	campo	das	esferas
das	vivências	como	verdade	subjetiva,	dos	fatos	como	verdades	objetivas,	ou	da
esfera	das	normas	como	verdades	sociais;	qualquer	sujeito,	pela	condição	de
simetria	de	fala,	qualifica-se	para	fazer	valer	o	processo	de	argumentação,	como
base	para	a	falibilidade	das	verdades.	A	ausência	de	violência	simbólica	e	a
presença	da	moldura	argumentativa	são	condições	mínimas	para	a	existência
dessa	comunicação	política,	base	da	ação	democrática	e	emancipatória
(Habermas	1993).
Assim,	emancipação,	reflexão	crítica	e	desvelamento	ideológico	estão
indissociavelmente	ligados,	expressando	nexos	entre	teoria	e	prática.	Estes	três
processos	manifestam-se	via	atos	de	fala	que	se	configuram	como	unidades	de
análise	para	o	entendimento	do	“estado	de	coisas”	e	a	possibilidade	de
construção	de	espaços	públicos,	por	sua	natureza	transparentes	e	democráticos.
É	o	ato	de	fala	que	possibilita	a	ação	comunicativa	entre	sujeitos	que	se
relacionam,	sujeitos	capazes	de	falar	e	de	agir,	definido	este	ato	como	“a	menor
sequência	verbal	nas	emissões	de	um	falante	em	um	contexto	de	comunicação,
que	resulta	tanto	inteligível	como	aceitável	para,	pelo	menos,	outro	sujeito	capaz
de	linguagem	e	ação”	(Habermas	1988,	p.	172).	Esses	atos	de	fala	pressupõem
critérios	de	argumentação	discursiva,	implicando	uma	distribuição	simétrica	de
chances	de	prática	da	palavra	que	se	fundam	em	cinco	postulados,	como	bases
para	o	processo	democrático	e,	consequentemente,	para	o	processo	avaliativo
emancipatório:	(1)	postulado	de	igualdade/simetria	comunicativa:	todos	os
possíveis	participantes	do	discurso	argumentativo	necessitam	de	igual	chance
para	usar	atos	de	fala	comunicativos;	(2)	postulado	de	igualdade	de	fala:	todos	os
participantes	do	discurso	têm	a	mesma	chance	de	proceder	a	interpretações,	fazer
asserções,	recomendações,	explicações,	justificativas,	bem	como	problematizar
pretensões	de	validade;	(3)	postulado	de	veracidade	e	sinceridade:	os	falantes
aceitos	no	discurso	necessitam	ser	autênticos	em	suas	relações	consigo	mesmos
e	com	os	demais,	tornando-as	transparentes	aos	demais;	(4)	postulado	de
verdade:	os	falantes	praticantes	do	discurso	argumentativo	têm	a	mesma	chance
de	utilizar	atos	de	fala	capazes	de	expressar	ideias,	conhecimentos,	fatos	que
sejam	verdadeiros;	(5)	postulado	de	correção	das	normas:	no	discurso,	os	agentes
têm	igual	chance	de	empregar	atos	de	fala	que	expressem	opor-se,	permitir	e
proibir,	fazer	e	retirar	promessas	que	podem	ser	justas.
A	ação	da	pesquisa	sobre	especialistas	em	educação	orientada	nesta	direção	traz
em	seu	aporte	a	valoração	das	ações	que	possam	promover	o	entendimento	e	a
construção	de	uma	nova	realidade,	com	apoio	numa	relação	intersubjetiva	de
enfrentamentos	de	dissensos	e	de	pontos	comuns,	visando	alcançar	níveis	de
consenso	racional	e	dialeticamente	determinados	em	sua	dinâmica	e	em	suas
possibilidades,	uma	vez	que:
vistos	na	perspectiva	dos	participantes,	os	dois	mecanismos,	o	do	entendimento
motivador	de	convicção	e	o	de	influenciação	(grifodo	autor)	via	coerção,
coação,	persuasão,	que	induz	o	comportamento,	excluem-se	mutuamente.	Ações
da	fala	não	podem	ser	realizadas	com	a	dupla	intenção	de	chegar	a	um	acordo
com	um	destinatário	sobre	algo	e,	ao	mesmo	tempo,	produzir	algo	nele,	de	modo
causal	(grifo	do	autor).	Na	perspectiva	de	falantes	e	ouvintes,	um	acordo	não
pode	ser	imposto	de	fora	e	nem	ser	forçado	por	uma	das	partes	–	seja	através	da
intervenção	direta	na	situação	da	ação	[interesse	técnico-instrumental,	inclusão
nossa],	seja,	indiretamente,	através	de	uma	influência	calculada	sobre	os
enfoques	proposicionais	de	um	oponente	[interesse	estratégico,	inclusão	nossa].
Aquilo	que	se	obtém	visivelmente	através	de	gratificações	ou	ameaças,	sugestão
ou	engano,	não	pode	valer	intersubjetivamente	como	acordo,	pois	tal	intervenção
fere	as	condições	sob	as	quais	as	forças	ilocucionárias	[interesse	crítico-
emancipatório,	inclusão	nossa]	despertam	convicções	e	geram	contatos.
(Habermas	1990a,	pp.	70-71)
A	proposta	pedagógica	da	construção	do	paradigma	avaliativo,	objeto	da
pesquisa,	foi	visualizada	na	sua	parcialidade/totalidade,	quando	temas	polêmicos
foram	tematizados	sob	óticas	diferenciadas,	num	espaço	de	não	coerção	e	de	não
violência.[24]	O	processo	avaliativo	foi	acontecendo,	basicamente,	durante
discursos	argumentativos,	nos	quais	meios	e	fins	foram	problematizados	e
refletidos,	sendo	colocadas	em	discussão	pretensões	de	validade,	erguidas	quanto
à	autenticidade	das	vivências	subjetivas	e	à	veracidade	dos	fatos	e	das	normas
percebidas	como	justas	e	corretas.
O	desvelamento	público	ideológico	e	a	tematização	das	verdades	constituem-se,
ao	mesmo	tempo,	ideológicos	e	contraideológicos,	capazes	de	impedir	que
sujeito	e	coletivo	sejam	usados	técnica	e/ou	estrategicamente.
Como	já	afirmamos	(Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993),	é	desse	processo	político
que	emerge	a	condição	do	espaço	público,	local	por	excelência	da	palavra,	no
qual	se	supõem	estruturas	de	consciência	capazes	de	transcender	seus	próprios
limites,	abrindo-se	para	os	pontos	de	vista	de	todos	os	participantes	do	processo
comunicativo;	movimento	esse	que	é	concretizado	pelo	descentramento
defendido	por	Habermas	(apoiando-se	em	Piaget	e	em	Kohlberg),	como
condição	essencial	para	a	ação	comunicativa.
Este	espaço	público	propicia	moldura	argumentativa	para	a	pretensão	de
validade	das	verdades	democraticamente	postadas,	pois,	como	afirma	Rouanet
(1987,	p.	306),
não	se	trata,	como	na	cidade-estado,	de	uma	democracia	que	se	define	pelo	que
ela	exclui	[...]	nem	como	nas	democracias	populares,	de	uma	fórmula	para
legitimar	a	dominação	pelos	aparelhos.	Nem,	finalmente,	de	uma
semidemocracia,	moldura	liberal	enquadrando	todos	os	autoritarismos	[...].	É
uma	democracia	capaz	de	assegurar,	no	sentido	mais	preciso,	a	liberdade	de
opinião,	fórmula	consagrada	que	agora	recebe	uma	significação	absolutamente
literal.	Se	a	opinião	é	a	essência	da	democracia,	esta	é	essencial	para	assegurar	a
opinião.	A	democracia	não	é	o	reino	da	opinião	verídica,	mas	da	opinião	tout
court;	cenário	em	que	se	encontram	todos	os	interlocutores,	e	que	proporciona	as
condições	formais	para	que	os	interesses	gerais,	confrontando-se	com	os
particulares,	sejam	capazes	de	produzir	opiniões	verdadeiras.
A	conceptualização	teórico-prática	do	educador-especialista
construída	no	contexto	concreto	do	paradigma
Como	parte	do	trabalho	de	pesquisa	sentíamos	a	necessidade,	no	projeto
referido,	de	redefinir	a	concepção	do	especialista	em	educação,	ampliando-a	em
horizontes	teórico-práticos	mais	esclarecedores	e	como	resultado	da	ação
individual	e	coletiva	(Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993).	A	ideia	refletida	nessa
concepção-ação	nasceu	associada	à	construção	do	paradigma	avaliativo
emancipatório.	Apoiando-se	na	teoria	habermasiana	como	suporte	ao	processo
avaliativo,	a	equipe	de	pesquisa	refletiu	sobre	a	possibilidade	de,	utilizando-se
de	pressupostos	e	conceitos	desta	teoria,	ampliar	e	redefinir	do	conceito	à	ação
do	especialista.	Para	tanto,	seguiu	pelo	caminho	do	desdobramento	dos	conceitos
de	emancipação	e	autonomia	que	estavam	associadas	à	nossa	crença	e	à	ideia
defendida	por	Castoriadis	(1985)	de	que	“o	especialista	só	tem	sentido	se	nas
suas	ações	estiverem	implícitas	as	dimensões	de	cogestão,	de	respeito	ao	outro	e
da	busca	de	autonomia”.
Como	bem	definiu	esse	autor	(Castoriadis	1985),	a	autonomia	só	o	é,	se	nela
estiverem	contemplados	cada	um	e	todos	os	sujeitos,	processo	no	qual	o	outro
não	é	visto	como	um	objeto	da	engrenagem	social.
Da	mesma	forma,	Habermas	(1990b),	ao	trazer	a	noção	de	emancipação	e
autonomia,	deixa	margens	para	trabalhar	a	figura	do	especialista	vinculada	a
dimensões	de	ações	intersubjetivas,	livres	de	coerção,	persuasão	ou
dogmatização.
De	qualquer	maneira,	os	dois	autores	concordam	que
a	práxis	tem	em	vista	promover	a	autonomia	da	qual	nasceu,	implicando	em	que
o	que	se	pretende	atingir	(o	desenvolvimento	da	autonomia)	está	em	estreita
relação	com	o	meio	para	o	atingir	(o	exercício	da	autonomia)	e,	neste	caso,	o
exame	depende	de	como	se	operam	a	prática	e	o	desvelamento	do	outro.
(Castoriadis	1975,	p.	129,	apud	Habermas	1990b,	p.	301)
Como	já	afirmamos	no	projeto	(Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993),	a	ideia	de	um
especialista/educador,	cujas	ações	devem	ser	de	respeito	ao	outro	e	de	busca	de
autonomia,	fez-nos	pensar	num	sujeito	que	pode	transformar	relações	que	são,
tradicionalmente,	de	poder	e	de	domínio	–	com	verdades	impostas	e/ou
inquestionáveis	–	em	relações	de	entendimento	sobre	verdades	do	mundo	em	sua
falibilidade	e	processualidade	intersubjetiva.
Acreditamos	ser	a	racionalidade	usada	pelos	sujeitos	na	busca	dessas	verdades	o
que	possibilita	uma	outra	situação.	Se	a	busca	de	verdades	sobre	o	mundo
contrapuser	homem	e	mundo,	homem	e	outros	homens,	abrem-se	possibilidades
de	controle	de	um	homem	sobre	outro	homem.	Nesse	contexto,	supostamente,	o
sujeito	aparece	como	fonte	de	determinação	de	toda	a	realidade.	Se,	numa
perspectiva	de	concepção	dialética	de	mundo,	a	busca	de	verdades	for	feita
através	da	formação	radical	de	vontade,	na	conexão	entre	sujeito	e	mundo,	entre
sujeitos	e	outros	sujeitos,	através	da	crítica	e	da	reflexão	intersubjetiva,	criam-se
condições	para	o	desvelamento	das	ilegitimidades,	sem	se	cair	no	funcionalismo
consensual,	no	denominado	pessimismo	dos	primeiros	frankfurteanos	ou	no
determinismo	histórico	do	marxismo	burocrático	(Hobsbaum	1992;	Habermas
1992).
A	obra	de	Jürgen	Habermas	ofereceu-nos	a	possibilidade	do	salto	qualitativo	da
razão	crítica	para	uma	razão	comunicativa	intersubjetiva.
Com	base	nesse	conceito	de	razão,	são	racionais,	como	afirmamos	ao	longo	do
texto,	tanto	as	proposições	que	correspondem	à	verdade	objetiva	dos	fatos,	como
as	que	forem	validadas	no	processo	argumentativo	em	que	o	consenso	for
alcançado	sem	deformações	internas	nem	externas,	invocando	pretensões	de
validade	com	relação	a	três	tipos	de	proposições:	as	que	se	referem	ao	mundo
objetivo	das	coisas,	ao	mundo	social	das	normas	e	ao	mundo	subjetivo	das
vivências	e	das	emoções.	Como	afirma	o	autor	(Rouanet	1987),	o	sujeito
envolvido	na	comunidade	de	comunicação	está	alegando	que	suas	afirmações
sobre	fatos	são	verdadeiras,	que	as	normas	que	propõe	são	justas	e	que	a
expressão	de	seus	sentimentos	é	veraz.	Estas	afirmações	podem	ser	aceitas	ou
contra-argumentadas	até	a	possibilidade	de	um	consenso	fundado	neste	mesmo
processo	argumentativo,	ao	que	Habermas	(1991)	denomina	de	ética	discursiva,
construída	com	pressupostos	de	não	violência	física	ou	simbólica.
No	mesmo	sentido,	Oliveira	(1986,	p.	11)	afirma	que:
reconhecer	alguém	como	membro	de	uma	comunidade	de	argumentação
significa	reconhecê-lo	em	sua	autonomia	inalienável,	portanto,	em	sua	liberdade
originária.	Daí	a	inconciliabilidade	entre	argumentação	e	repressão.
Dessa	forma,	a	racionalidade	empregada	comporta	conotações	de	força	não
coercitivamente	unificadoras,	geradoras	de	consenso,	de	um	discurso,	cujos
participantes	ultrapassam	suas	opiniões,	a	princípio	limitadas	subjetivamente,	a
favor	de	um	acordo	racionalmentemotivado.	A	razão	comunicativa	expressa-se
num	entendimento	descentrado	do	mundo,	capaz	de	transformar	o	contexto	pela
transformação	do	sujeito	em	intersujeito.	Isso	se	concretiza	quando,	numa
comunidade	de	comunicação,	os	consensos	transformadores	derivam	de	críticas
dialéticas	que,	diferentemente	das	críticas	dogmáticas,	não	destroem	o	que	é
criticado	(Habermas	1990a).
Delineou-se,	assim,	para	nós	(Klein,	Lovatel	e	Medeiros	1993),	o
especialista/educador/transformador	que	buscamos	construir	na	e	com	a	prática:
um	sujeito	comprometido	com	a	crítica	dialética,	capaz	de	não	só	“pensar	por	si
mesmo”	mas	de	“pensar	o	pensamento”,	além	de	“pensar	com	o	outro”
reflexivamente,	capaz	de	falar	e	de	agir	envolvendo	as	dimensões	moral,
linguística	e	interativa,	construindo	socioindividualmente	a	liberdade.	Essa
competência	comunicativa,	assegurada	pelo	plano	intersubjetivo	da	ação	e	da
linguagem,	permite	que	os	sujeitos,	em	seu	discurso,	superem	a	heteronomia
imposta	pelo	concreto	histórico	socialmente	instaurado,	através	do
questionamento	das	pretensões	de	validade	geralmente	presentes	na	linguagem
institucional.	É	o	que	denominamos	como	a	possibilidade	de	“superação	de
contextos	normativamente	assegurados,	por	contextos	comunicativamente
obtidos”.
Assim,	os	interesses	condutores	do	conhecimento	que	orientam,	no	caso,	a	ação
supervisora,	no	desenvolvimento	da	prática	pedagógica,	são	aqueles
comprometidos	com	a	transformação	social,	construídos	via	ação	comunicativa,
através	da	qual	os	fatos,	as	normas	e	as	vivências	são	constantemente
submetidos	a	questionamentos	e	críticas,	por	meio	de	processos	argumentativos.
Reafirmamos	(Medeiros	1993)	que	essa	transformação	de	fundo	a	que	nos
propusemos	representa	o	que	Habermas	defende	como	a	noção	do	“eu
competente”,	superadas	as	contradições	presentes	nos	atributos	sistêmicos,
funcionalistas	ou	behavioristas,	já	atribuídos	ao	termo	“competência”.	Retoma,
nesses	termos,	a	defesa	apresentada	por	Freitag	(1990,	p.	24)	como	instando	ser
esse	o	Telos	de	qualquer	ação	educativa:
todo	esforço	pedagógico	pode	e	deve	concentrar-se	em	permitir	o
desenvolvimento	de	todas	as	competências	do	“eu”	(cognitiva,	moral,	lingüística
e	interativa).	Todo	o	esforço	deve	concentrar-se	em	assegurar	uma	competência
interativa	cada	vez	maior	dos	indivíduos,	ampliando	o	seu	grau	de	liberdade	de
opiniões	de	fatos,	normas	legítimas	de	normas	absurdas,	mentiras	de	verdades.
Somente	assim	teremos	adultos	psiquicamente	maduros	que	saibam	distinguir
seus	desejos	e	projeções	(das	possibilidades	de	satisfação	individual	e	coletiva),
adultos	capazes	de	utilizar	racionalmente	os	recursos	da	natureza,	cidadãos
capazes	de	reorganizar	sua	sociedade	em	bases	justas	e	igualitárias.
Graças	a	essas	competências,	os	sujeitos	constroem	condições	de	reconstruir	as
leis	que	regem	o	mundo	por	meio	da	busca	argumentativa	e	processual	da
verdade.	São	sujeitos	que	não	se	conformam	com	o	sistema	de	normas	que
vigora	na	sociedade,	tendo	condições	argumentativas	de	questioná-lo,	buscando,
no	interior	de	uma	ética	discursiva,	novos	princípios	normativos	para	a	ação
individual	e	coletiva,	à	base	do	melhor	argumento.
Em	resumo,	esse	arriscar-se	num	jogo	dialético	de	verdades	falíveis	em	seus
meios	e	em	seus	fins,	consubstancia	a	luta	pela	superação	processualística	de
contextos	normativamente	assegurados	(e	pouco	questionados)	por	contextos
argumentativamente	obtidos,	numa	ação	permanente	de	construção
intersubjetiva	de	espaços	públicos	de	liberdade,	que	abrem	perspectivas	para	a
processualidade	da	ação	cidadã.
À	guisa	de	conclusão:	Lições	que	emergiram	da	construção	crítica
do	paradigma	de	avaliação	emancipatório	e	a	ação	supervisora
Em	resumo,	no	processo	de	pesquisa	trabalhamos	com	quatro	grandes	objetivos
que	contemplaram:	o	acompanhamento	e	a	avaliação	do	curso	implementado;	a
análise	da	proposta	pedagógica	e	seu	nexo	com	a	prática;	a	análise	do	currículo
em	termos	da	formação	do	especialista	e	a	“formação	radical	da	vontade”
democraticamente	instaurada;	a	testagem	de	um	paradigma	de	avaliação	que
possibilitasse	a	emergência	de	ações	emancipatórias	socioindividualmente
construídas,	sendo	sobre	este	último	objetivo	que	nos	debruçamos	na	presente
reflexão.
Uma	das	lições	que	tiramos	de	um	processo	vivenciado	ao	longo	do	curso
avaliado	foi	a	de	que	o	processo	de	democratização	qualificada	e	a	instauração
de	um	processo	emancipatório	e	de	autonomia	reflexiva	e	socioindividual
(Habermas	1990b;	Guattari	e	Negri	1987;	Castoriadis	1985)	se	dão,	uma	vez	que
exista	um	nexo	entre	os	pesquisadores,	os	professores,	os	alunos	e	um	nexo	entre
a	teoria	e	a	prática	de	cada	um.	Assim,	fez-se	necessário	que	o	desejado	como
parte	do	paradigma	avaliativo	fosse,	também,	parte	de	nossa	prática	cotidiana.
Isso	significa	que	não	podemos	apresentar	uma	fala	ou	um	discurso,	em	seu
sentido	lato,	se	não	o	mantivermos	na	prática;	neste	caso,	estaremos	em	uma
outra	lógica,	uma	lógica	interna,	manifestando	nosso	real	nexo	de	ação.
Significa,	também,	que	não	podemos	propor	uma	ruptura	em	direção	à
transformação	emancipatória,	se	nela	não	estivermos	imersos,	indicando	a
coerência	entre	o	pensar	e	o	dizer/fazer.	A	tematização	de	fatos,	de	vivências
e/ou	de	normas	necessita	ser	constante	em	nossas	ações,	assumindo-se	nas	ações
a	proposta	da	falibilidade	da	verdade	(Habermas	1988).
Da	mesma	forma,	tivemos,	constantemente,	presente	que	a	lógica	e	a	verdade
não	se	instauram	no	discurso	(do	que	é	falado),	mas	na	prática	do	dia	a	dia.	Tal
pressuposto	auxiliou	a	analisar	nossa	própria	prática,	a	da	instituição	como	um
todo,	a	dos	alunos	e	dos	professores	em	relação	à	proposta	do	curso;	permitiu
que	novas	verdades,	argumentativamente	estruturadas,	fossem	criadas,
negociadas,	renegociadas	e	reinstauradas,	no	que	se	refere	tanto	à	proposta
sociopedagógica	do	curso,	como	ao	redimensionamento	da	figura	do
especialista/educador/transformador	e	à	ação	cotidiana	dos	alunos	em	sua
práticas	como	profissionais.
Além	disso,	o	paradigma	auxiliou	a	que	professores,	alunos/especialistas,	a
administração,	a	coordenação	e	os	pesquisadores	desenvolvessem	uma	estrutura
argumentativa,	resgatando	dimensões	da	cidadania	e	do	processo	de	legitimação
do	real	em	sua	concretude.
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7
CONSIDERAÇÕES	SOBRE	O	PAPEL	DO	SUPERVISOR,
COMO	ESPECIALISTA	EM	EDUCAÇÃO,	NA	AMÉRICA
LATINA
Mary	Rangel
“Supervisor”	o	que	procura	a	“visão	sobre”,	no	interesse	da	função
coordenadora	e	articuladora	de	ações	é	também	quem	estimula	oportunidades
de	discussão	coletiva,	crítica	e	contextualizada	do	trabalho.	Esta	discussão,	na
América	Latina,	se	faz	especialmente	necessária,	considerando	a	importância
do	movimento	de	emancipação	social.	E	o“especialista”	supervisor,	como
educador	e	profissional,	tem	o	seu	papel	estreitamente	vinculado	e
comprometido	com	este	movimento.
Mary	Rangel
Ao	refletir	sobre	o	supervisor,	como	“especialista”	em	educação	na	América
Latina,	as	questões	que	se	apresentam	são	muitas	e	complexas.
Pretendendo-se	pontuar	apenas	alguns	aspectos	relativos	ao	papel	“supervisor”,
observam-se	elementos	conceituais,	a	discussão	do	“especialista”	e	das
“especialidades”	pedagógicas,	a	questão	do	currículo,	como	um	dos	objetos	de
trabalho	da	supervisão,	e	a	importância	da	pesquisa,	com	atenção	às	possíveis
contribuições	da	representação	social.
Todos	esses	aspectos	adquirem	um	sentido	particular	na	América	Latina,
notando-se	a	importância	do	momento	histórico	de	emancipação	sociocultural,
política	e	econômica.
A	consciência	da	necessidade	do	movimento	emancipatório	(da	superação	da
dependência	de	grupos	e	países	hegemônicos)	é	condição	e	qualidade	de	ser	e
estar	educador	(em	suas	diversas	funções,	incluindo,	portanto,	a	supervisão)	na
América	Latina.	É	este	sentido	de	consciência	que	preside	todas	as
considerações	deste	texto,	que	se	inicia	pelos	elementos	conceituais	da
supervisão.
Supervisão:	Elementos	conceituais
A	consideração	ao	conceito	de	“supervisão”	incorpora	elementos	da	função	e	do
trabalho	do	supervisor,	sublinhando-se	o	seu	papel	de	educador	e,	portanto,	de
profissional	comprometido	com	o	significado	e	as	implicações	sociopolíticas	da
educação.
“Supervisão”	encaminha	o	sentido	de	“visão-sobre”,	necessária	à	percepção
ampla	dos	aspectos	e	dos	componentes	das	atividades	supervisionadas.
Tratando-se	das	atividades	escolares	e	da	supervisão	pedagógica	(aqui	entendida
como	supervisão	que,	na	escola,	se	faz	no	âmbito	do	processo	de	ensino-
aprendizagem),	a	“visão-sobre”	alcança	os	fatores	inerentes	às	relações	entre
alunos,	professores,	conteúdos,	métodos	e	contexto	do	ensino.
As	relações	que	se	estabelecem	no	processo	de	ensino-aprendizagem	convocam
a	atenção	dos	educadores,	pela	importância	social	do	conhecimento	–	objeto
desse	processo	–	e	dos	sujeitos	a	quem	esse	conhecimento	se	destina.	No	caso
dos	educadores-supervisores,	pela	especificidade	de	seu	trabalho,	solicita-se	uma
atenção	especial	às	oportunidades	de	estudo	(de	reflexão	teórico-prática)	e	de
coordenação	(organização	comum	do	trabalho),	no	interesse	de	que	as	decisões	e
as	ações	referidas	ao	ato	de	ensinar	e	aprender	se	façam	de	modo	fundamentado
e	articulado.
Com	referência	ao	estudo,	o	supervisor	apresenta-se,	então,	como	um	líder
(reconhecido	pela	competência,	pela	identificação	com	os	interesses	coletivos)
que	mobiliza,	que	dinamiza	encontros	para	discussão	e	atualização	teórica	das
práticas.	E,	entre	os	vários	objetivos	desta	“mobilização”	ao	estudo,	destacam-se,
novamente,	a	consciência	do	propósito	das	ações	e	a	ampliação	(político-social)
dos	princípios	e	dos	conceitos	que	as	orientam.
Desse	modo,	evitam-se	a	rotinização	e	a	mecanização	das	ações,	entendendo-se
que	o	processo	de	ensino-aprendizagem	é	contextualizado	e	socialmente
comprometido.	Assim,	ao	se	“estudar”	este	processo,	observam-se	as	suas
implicações,	os	seus	“porquês”	e	para	quem.
Nos	“porquês”	e	para	quem	se	realiza	o	ensino-aprendizagem	na	América
Latina,	sublinham-se	as	necessidades	das	camadas	majoritárias	da	população	e	a
estreita	–	a	íntima	–	relação	entre	conhecimento,	consciência	da	realidade	e
condições	de	emancipação.
O	estudo	do	ato	de	ensinar	e	aprender	(mobilizado,	dinamizado,	liderado	pelo
educador-supervisor)	leva,	então,	em	conta	o	compromisso	de	garantir	o	alcance
do	conhecimento	pelo	aluno	(e	também	pelo	professor),	entendendo-se	a
importância	desse	conhecimento	para	a	prática	social.
E	porque	a	prática	social	se	impõe	como	origem	e	finalidade	da	prática
pedagógica,	o	estudo	(as	oportunidades	de	encontros,	neste	sentido,
“coordenados”	e	mobilizados	pelo	supervisor)	encaminha-se	na	direção	de
compreender	e	praticar	o	ensino,	no	interesse	de	assegurar	a	aprendizagem	do
conhecimento	crítico-social.
E	os	conceitos	serão,	portanto,	ampliados.	A	técnica	–	o	“como	fazer”	o	ensino-
aprendizagem	–	adquire	significado	pela	vinculação	aos	seus	motivos	sociais.
Assim,	articulam-se	competência	e	consciência,	alargando	as	visões	(e	ações)	do
processo	de	ensino-aprendizagem.
Pela	iniciativa	de	abrir	espaço	a	discussões,	ao	estudo,	e	pela	liderança
consciente,	o	supervisor	traz	contribuições	relevantes	na	perspectiva	da	relação
educação-sociedade.
Na	relação	entre	educação	e	sociedade	é	preciso	notar	não	só	os	compromissos
da	educação	(com	o	conhecimento	e	a	sua	finalidade	crítico-social),	como
também	os	compromissos	do	Estado	com	a	educação.	É	este	mais	um	sentido,
uma	direção,	um	motivo	da	liderança	do	supervisor	na	América	Latina.
Daquele	que	se	propõe	(conceitualmente)	à	visão-sobre,	à	coordenação
(“ordenação”	comum,	coletiva,	do	trabalho,	observando	as	articulações	das
diversas	atividades	e	a	consciência	dos	seus	fins)	espera-se,	também,	que	lidere
as	reivindicações	do	direito	da	educação	e	dos	educadores	ao	dever	(que	se
realiza	no	apoio,	nos	recursos,	nas	prioridades)	do	Estado.
A	qualificação	do	trabalho	educativo	e	dos	profissionais	que	o	realizam	inclui-se,
então,	como	meta	e	motivação	da	liderança	que	o	supervisor	assume	na
especificidade	(e	na	competência	e	no	compromisso)	de	seu	papel.
Assim,	quando	se	discute	a	liderança	na	função	supervisora,	é	menos	importante
configurar	“tipos”	de	líderes	(“carismáticos”,	ou	não)	ou	“habilidades”	de
relações	humanas	(interpessoais)	do	que	o	sentido,	a	direção,	o	significado	dessa
liderança.
Volta-se,	portanto,	ao	objetivo	de	ampliação	(sociopolítica)	de	conceitos,
aplicando-a	à	compreensão	do	“líder”,	que	se	faz	pela	competência	e	pelo
compromisso	com	os	interesses	coletivos.
Confirmam-se,	então,	a	ideia	e	o	princípio	de	que	o	supervisor	não	é	um
“técnico”	encarregado	da	eficiência	do	trabalho	e,	muito	menos,	um
“controlador”	de	“produção”;	sua	função	e	seu	papel	assumem	uma	posição
social	e	politicamente	maior,	de	líder,	de	coordenador,	que	estimulao	grupo	à
compreensão	–	contextualizada	e	crítica	–	de	suas	ações	e,	também,	de	seus
direitos.	É	com	este	conceito	do	papel	supervisor	que	se	chega	à	discussão	do
significado	de	“especialista”	e	da	“especialidade”	pedagógica.
O	“especialista”	e	a	“especialidade	pedagógica”
Na	literatura	educacional	produzida	ou	divulgada	na	América	Latina	é	possível
encontrar,	com	frequência,	questionamentos	ao	“especialista”	e	às
“especialidades	pedagógicas”,	remetendo-os	e	fundamentando-os	na	crítica	à
divisão	do	trabalho,	que,	por	sua	vez,	é	remetida	à	crítica	à	divisão	de	classes.
Entretanto	(mais	uma	vez	recorrendo-se	a	conceitos),	não	se	podem	associar,
forçosamente,	a	condição	(e	função)	de	“especialista”	e	as	“especialidades
pedagógicas”	às	“divisões”	ou	“elitizações”	que	prejudicam	o	sentido	comum	e
coletivo	do	trabalho.
No	caso	do	especialista	em	educação,	é	interessante	observar	que	essa	condição
não	se	aplica,	apenas,	a	quem	exerce	funções	como	as	de	administração,
orientação	educacional	ou	supervisão.	Na	verdade,	são	também	“especialistas”
(no	sentido	de	quem	domina,	especificamente,	uma	determinada	área	de
trabalho)	os	professores	de	modo	geral,	no	âmbito	de	seus	conteúdos	específicos.
As	propostas	em	favor	dos	“generalistas”	encontram	obstáculos	na	realidade	da
evolução	e	da	especialização	do	conhecimento,	sua	produção,	suas	formas	de
aplicação,	em	todos	os	campos.
Não	se	podem	negar	as	especificidades	do	saber	e	do	trabalho.	Contudo,
“especificidade”	não	significa,	necessariamente,	desarticulação,	até	porque	os
fatos	(e	atos)	“específicos”	inserem-se	em	circunstâncias	e	situações	mais
amplas;	é	o	que	se	entende	pelo	princípio	da	relação	entre	especificidade	e
totalidade.
Levando-se	essas	considerações	à	supervisão	(produção	do	conhecimento	e
práticas)	reafirma-se	a	ideia	de	que	a	especialidade	refere-se	à	especificidade	e
não	à	divisão	do	trabalho.	Um	dos	argumentos	a	esta	afirmação	encontra-se	no
fato	de	que	a	“co-ordenação”	(lembrando-se,	novamente,	o	sentido	de
organização	em	comum	e	articulação	do	trabalho)	é	uma	das	“especificidades”
da	função	supervisora.	E	a	“co-ordenação”	é	uma	necessidade	do	trabalho;	esta
necessidade	(aplicada	à	educação	e	à	escola)	permite	observar	que,	mesmo	que
se	eliminasse	a	“figura”	do	supervisor	“especialista”,	não	se	poderia	prescindir
da	coordenação,	como	serviço	que	garanta	as	articulações	indispensáveis	ao
ensino-aprendizagem.
As	articulações	no	processo	de	ensino-aprendizagem	são	necessárias	às	decisões
(coletivas)	sobre	programas,	material	didático,	procedimentos	de	ensino,
avaliação,	recuperação	e	contextualização	do	processo,	tanto	quanto	ao	estudo	(à
discussão	e	à	consciência)	de	seus	fundamentos.
Pode-se,	então,	reafirmar	que	a	“especificidade”	da	função	supervisora	não
implica	“divisões”	que	dissociam,	desarticulam	ou	elitizam	as	atividades
pedagógicas;	ao	contrário,	a	ação	(específica)	do	supervisor	se	faz	no	sentido	de
fortalecer	os	elos	entre	as	ações	e	os	sujeitos	que	as	realizam.	Esses	elos	também
se	destacam,	quando	se	pensa	o	currículo	como	um	dos	objetos	de	trabalho	(e
estudo)	da	supervisão.
O	currículo	como	objeto	de	trabalho	da	supervisão
Quando	se	reflete	sobre	a	supervisão	e	o	currículo	na	América	Latina,	retorna-se
à	questão	do	compromisso	dos	educadores	com	a	garantia	de	que	as	camadas
populares	alcancem	o	conhecimento.
Observando-se	que	o	conhecimento	é	a	própria	substância	do	currículo,	entende-
se	o	valor	da	participação	dos	supervisores	nas	decisões	sobre	sua	constituição,
sua	prática	e	sua	avaliação	nas	escolas.
Além	das	determinações	normativas	(a	serem	analisadas,	discutidas,	sujeitas	às
questões	que	se	apresentam	no	cotidiano	da	escola),	incluem-se	nas	atenções	dos
supervisores	a	organização	e	a	coordenação	de	oportunidades	em	que
professores,	alunos	e	pais	possam	estudar,	discutir,	avaliar	a	qualidade	do
conteúdo	e	da	prática	do	currículo.
Submetem-se,	então,	às	discussões	(que	podem	ser	estimuladas	e	coordenadas
pelos	supervisores)	a	oferta	de	disciplinas,	sua	posição	(e	seu	interesse)	em	cada
série	e	em	cada	nível	de	escolaridade,	sua	carga	horária,	a	relação	entre	o
currículo	e	a	realidade	dos	alunos	e	da	comunidade	a	que	se	destina.
Ainda	na	“seara”	do	currículo	–	e	da	ação	supervisora	–	inclui-se	a	articulação
dos	diversos	setores	da	escola;	é	o	momento	em	que	as	chamadas
“especialidades	pedagógicas”	do	currículo	–	a	administração	escolar,	a
orientação	educacional,	a	supervisão	–	“afinam”	seus	projetos	específicos	de
trabalho	com	o	projeto	maior,	da	escola,	da	educação,	da	sociedade.	Esse
“afinamento”	de	propósitos	adquire	consistência	e	significado	na	América	Latina
pela	inserção	no	projeto	mais	amplo,	de	emancipação,	de	promoção	social.
E	é	importante,	então,	que	todas	essas	questões	–	da	supervisão	e	do	currículo,
com	atenção	à	América	Latina	–	constituam-se	em	objetos	de	pesquisa	e,
portanto,	em	objetos	a	serem	construídos	científica	e	coletivamente.
Da	importância	da	pesquisa	aos	referentes	da	investigação	de
representações	sociais
A	supervisão,	seus	conceitos,	seus	elementos	teórico-práticos	e	seu	papel	entre
as	demais	“especialidades”	pedagógicas	na	América	Latina	merecem	e
convocam	um	aprofundamento	que	estimula	e	solicita	a	pesquisa,	a	construção
(científica	e	coletiva)	de	seus	objetos	de	conhecimento	e	trabalho.
A	pesquisa	apresenta-se	como	uma	das	alternativas	à	ampliação	do	alcance
(social,	político,	histórico)	da	supervisão	e	de	suas	condições,	suas
circunstâncias	e	seus	compromissos	na	América	Latina.	A	pesquisa	supõe	e
requer	a	participação,	o	envolvimento	de	todos	os	sujeitos	interessados	ou
“praticantes”	da	supervisão:	professores,	alunos,	pais,	pessoas	da	comunidade,
“especialistas”,	e	aqueles	que	ocupam	postos	de	decisão	no	sistema	oficial	da
educação	ou,	ainda,	de	outras	áreas,	considerando	a	abrangência	das	relações
entre	a	função	supervisora	e	a	sociedade.
Retornando	ao	princípio	e	ao	critério	de	que	a	prática	social	é	origem	e
finalidade	da	prática	pedagógica,	é	interessante	notar	as	possibilidades	de
contribuição	da	representação	social,	como	uma	das	perspectivas	teórico-
metodológicas	da	pesquisa	em	supervisão.
A	representação	social	admite	uma	diversidade	de	concepções,	de	acordo	com	o
campo	de	estudo,	a	exemplo	da	psicologia	cognitiva,	da	sociofilosofia	marxista,
das	investigações	do	imaginário	e	da	psicologia	social.
Entretanto,	especialmente	no	caso	da	base	marxista,	do	estudo	do	imaginário	ou
da	psicologia	social,	a	pesquisa	de	representações	oferece	elementos	e	referentes
que	podem	trazer	à	construção	do	conhecimento	sobre	supervisão	informações
significativas	sobre	o	pensamento	e	a	conduta	dos	sujeitos	que,	direta	ou
indiretamente,	estão	envolvidos	com	a	função.
As	percepções	dos	sujeitos	(de	acordo	com	sua	inserção,	com	seu	lugar	social,
com	sua	experiência	com	o	ato	supervisor)	interessam,	de	modo	especial,	às
pesquisas	movidas	pela	preocupação	com	o	contexto,	com	as	circunstâncias,
com	os	fatos	da	realidade,	com	a	consistência	pedagógica	e	política	da
supervisão.
Seja	na	concepção	marxista,	que	associa	as	representações	à	ideologia,	seja	no
estudo	do	imaginário,	que	procura	ir	“a	fundo”	na	raiz	(etimológica,	mitológica)
de	conceitos,	seja	na	psicologia	social,	em	que	se	focaliza	a	representação	como
conhecimento	prático	(veiculado	por	conceitos	e	imagens	que	constituem
categorias	explicativas	dos	fatos)	seja,	ainda,	pelos	processos	de	conhecimento,
investigados	na	formação	de	representações,	no	enfoque	da	psicologia	cognitiva,
esta	perspectiva	de	estudo	pode	contribuir	com	as	produções	sobre	supervisão	e
com	o	aperfeiçoamento	de	sua	inserção	na	realidade	da	América	Latina.
A	pesquisa	de	Santos	(1992)	exemplifica	os	subsídios	da	investigação	de
representações,	como	também,	pelos	seus	achados,	reforça	e	ilustra	a	discussão
conceitual	com	que	se	introduziu	este	texto.
Em	20	escolas	distribuídas,	duas	a	duas,	por	dez	distritos	de	educação	e	cultura
do	município	do	Rio	de	Janeiro,	foram	pesquisadas	representações	da	supervisão
(seu	papel,	sua	concepção)	formadaspor	professores,	diretores,	supervisores	e
orientadores	educacionais.
Na	justificativa	teórica	do	estudo	incluem-se	Araújo	(1987)	e	Silva	Junior
(1986),	quando	enfatizam	a	importância	da	análise	de	percepções,	conceitos	e
papéis	atribuídos	ao	supervisor.	Na	configuração	do	problema	inclui-se	o
esvaziamento	(de	fundo	político-partidário)	da	supervisão,	ocasionando	a
redução	ou	a	eliminação	(como	é	o	caso	dos	Centros	Integrados	de	Educação
Pública	–	no	Rio	de	Janeiro)	da	“categoria”	de	supervisores.
E	assim,	Santos	(1992)	entra	nas	escolas	(mesmo	nas	cinco	que,	das	20,	não
possuíam,	naquele	momento,	supervisores)	e	pergunta	sobre	o	conceito	e	a
imagem	do	supervisor.
Os	dados	que	esse	estudo	oferece	permitem,	então,	a	análise	das	dimensões	da
representação	do	supervisor,	tomando-se	por	base	o	campo	da	psicologia	social,
na	linha	moscoviciana.
Em	Moscovici	(1978;	1981;	1992;	1994)	–	aprofundado	e	confirmado	por
pesquisadores	como	Spink	(1993),	Vala	(1993),	De	Rosa	(1993),	Duveen	(1993),
Wagner	e	Elejabarrieta	(1994),	e	Farr	(1991)	–	as	dimensões	da	representação
compõem-se	da	atitude,	da	informação	e	do	campo	de	representação	ou	imagem.
A	atitude	expressa	o	julgamento	do	valor,	a	posição	do	sujeito	diante	do	objeto
da	representação;	a	informação	revela	a	organização	do	conhecimento	sobre	o
objeto;	o	campo	de	representação	remete	à	ideia	de	“imagem”,	de	“modelo
social”	(Moscovici	1978,	p.	69).
Tomando-se	os	achados	de	Santos	(1992),	é	possível	identificar	(nas	diversas
escolas,	nos	diversos	sujeitos)	alguns	elementos	comuns	que	sublinham	o
traçado	das	dimensões	da	representação	do	supervisor.
Desse	modo,	a	atitude	expressa-se	por	traços	de	valorização	do	desempenho:
traços	que	se	mostram	mesmo	na	ausência	do	supervisor,	quando,	por	exemplo,	a
diretora	é	compelida	a	assumir	sua	função:
neste	momento,	atuando	como	diretora	da	escola	e	sendo	obrigada	pelas
circunstâncias	a	desenvolver	um	trabalho	específico	da	supervisão,	vejo,	mais	do
que	nunca,	a	sua	necessidade...	(Diretora	de	escola	pública	do	município	do	Rio
de	Janeiro,	apud	Santos	1992,	p.	136)
Buscando-se,	na	atitude,	os	aspectos	da	conduta	do	supervisor	que	sustentam	a
valorização	positiva,	encontra-se	a	“co-ordenação”	(a	organização	“com”	e,
portanto,	coletiva	do	trabalho)	a	integração	(a	articulação	das	especificidades	do
planos	e	das	ações),	o	encaminhamento	de	estudos,	através	dos	quais	se	estimula
a	consciência	crítica	e	a	ampliação	do	entendimento	(social	e	pedagógico)	dos
princípios	e	dos	projetos.
Na	informação,	corroboram-se	os	aspectos	que	movem	a	atitude	positiva.	E	o
supervisor	é,	então,	“informado”	como	aquele	que	promove	um	trabalho
associativo,	procurando	trazer	a	diversidade	das	disciplinas	e	suas	questões
específicas	para	a	discussão	do	grupo,	para	o	estudo,	para	espaços	comuns	de
reflexão,	indispensáveis	a	que	se	partilhem	e	consolidem	os	princípios	e	os
projetos.
Esses	mesmos	elementos	“afiguram”	o	supervisor.	Nesta	“afiguração”,
encontram-se	imagens	que	se	delineiam	por	expressões	como	“elo	de	ligação”,
“colega	educador”,	“elo	integrador”,	“formador	de	laços”,	“articulador”,
“mobilizador”.
Voltando,	com	os	achados	de	Santos	(1992),	ao	vetor	teórico,	moscoviciano,	da
representação,	reencontra-se	o	dado	da	coerência	entre	as	três	dimensões
(Moscovici	1978,	1994).
A	coerência	da	representação	do	supervisor	revela-se,	na	investigação	de	Santos
(1992),	através	das	ideias	de	articulação,	coordenação	e	mobilização.
Observando-se	que,	na	representação,	as	imagens	concretizam,	ilustram	o
conceito	e	“ajudan	a	que	las	personas	se	forjen	una	visión	menos	abstrata	del
objeto	representado”	(Ibánez	1988,	p.	48),	compreende-se	a	importância	do
significado	de	“articulador”	e	“mobilizador”	–	que	se	associam	a	“elos	e	laços”	–
como	figuras	“representativas”	do	supervisor.
As	imagens	projetam	e	“retratam”,	portanto,	a	informação	na	qual	se	pode
perceber	que	a	organização	do	conhecimento	sobre	o	trabalho	supervisor	se	faz
no	sentido	de	associar,	de	tornar	comuns,	coletivas,	partilhadas,	as	ações.
Na	dimensão	de	atitude	revela-se,	então,	o	julgamento	positivo	do	valor	e	da
necessidade	da	função	supervisora.
Assim,	mesmo	considerando	os	limites	da	pesquisa	de	Santos	(1992),	a	teoria
das	representações	na	psicologia	social	leva	a	considerar	a	relevância	de	cada
uma	das	afirmações	sobre	o	supervisor,	como	resultante	de	uma	formação	social,
cujo	processo	inclui	a	comunicação,	a	interação,	a	experiência.	Spink	(1993)
subsidia	essa	reflexão,	observando	que	“é	necessário	entender	sempre	como	o
pensamento	individual	se	enraíza	no	social	[...]	e	como	um	e	outro	se	modificam
mutuamente”	(p.	4).
Pontuando	essa	mesma	questão,	Jodelet	(1989)	esclarece	que	o	social	intervém
na	formação	individual	da	representação	de	várias	maneiras:	pelo	contexto	em
que	as	pessoas	se	situam,	pela	comunicação	que	se	estabelece	entre	elas,	pela
matriz	cultural,	pelos	valores	ligados	às	posições	ou	“pertenças”	dos	sujeitos	a
grupos	com	interesses	específicos.	Essa	mesma	discussão	é	feita	por	Moscovici	e
Doise	(1991)	quando	tratam	“das	representações	individuais	às	representações
sociais”	(pp.	206-212),	e	retomada	por	Vala	(1993)	no	questionamento	às	teorias
que	ignoram	a	influência	mútua	entre	contexto	social	e	pensamento	individual.
A	interação	e	a	comunicação	social	são	processos	de	veiculação	e	produção
(coletivas)	de	representações.	Assim,	“as	representações	sociais	são	um	produto
das	interações	e	dos	fenômenos	de	comunicação	no	interior	de	um	grupo	social”
e,	dessa	forma,	“refletem	as	situações	desse	grupo,	os	seus	projetos,	problemas	e
estratégias”	(Vala	1993,	p.	7).
Chega-se,	nesse	ponto,	à	importância	da	experiência,	da	vivência	cotidiana	dos
sujeitos,	na	formação	de	representações.	É	com	essa	compreensão	que
Moscovici	(1978,	1981)	fala	das	representações	como	conhecimento	que	as
pessoas	utilizam	no	seu	dia	a	dia,	referindo-se	à	“realidade	que	conhecemos	por
experiência”	(p.	27).
Trazendo	essas	referências	teóricas	ao	estudo	de	representações	da	supervisão,
reafirma-se	a	possibilidade	de	que	traga	subsídios	à	investigação	de	como	os
sujeitos	percebem	e	conceituam	seu	papel.
A	preocupação	com	o	conceito	de	supervisão	–	preocupação	que	se	realça	em
vários	estudos,	a	exemplo	do	de	Mendes	(1987),	Franz	(1990),	Pereira	(1989)	–
acentua-se	num	momento	em	que	se	(re)indaga	sobre	a	necessidade	de	sua
presença	e	sobre	a	sua	importância.	Portanto,	seja	na	perspectiva	da
representação,	seja	em	outras	perspectivas	teóricas,	é	relevante	procurar	na
prática,	na	escola,	na	comunicação,	na	experiência,	como	se	revela	o	trabalho
supervisor	e,	principalmente,	como	se	pode	aperfeiçoá-lo.
Desse	modo,	se	a	opção	da	pesquisa	se	der	pela	ótica	da	representação	social,	é
preciso	firmar	o	entendimento	de	que	a	configuração	de	representações	é	um	dos
meios	pelos	quais	se	podem	obter	elementos	à	análise	crítica	e	ao	avanço	de
concepções	e	critérios	que	orientam	as	condutas.
Essas	ponderações	sugerem,	também,	recorrer	à	discussão	do	real	e	do	ideal	nas
representações,	ou	seja,	ao	componente	de	realidade	–	do	que	se	vivencia,	do	que
se	integra	às	comunicações	e	às	interações	–	e	ao	componente	de	aspiração,	ou
seja,	do	que	se	espera	que	seja.
O	que	se	quer	dizer,	portanto,	é	que	no	“ato	de	pensamento”	pelo	qual	se
representa,	mesclam-se	o	ideal	e	o	real.	Esses	dois	planos	da	representação
esclarecem-se	em	Moscovici	(1978).	Reconhece-se	o	plano	ideal,	quando	o	autor
observa	que	“as	representações	individuais	ou	sociais	fazem	com	que	o	mundo
seja	o	que	pensamos	que	ele	é	ou	deve	ser”	(p.	59).	Reconhece-se	o	plano	real,
quando	Moscovici	(1978)	assinala	que	“as	representações	constituem	uma	das
vias	de	apreensão	do	mundo	concreto	circunscrito	em	seus	alicerces	e	suas
consequências”	(p.	44).
Jodelet	(1989)	sustenta	essa	mesma	posição	quando	assinala	que	a	representação
não	é	“cópia”	do	real,	nem	“cópia”	do	ideal,	nem	a	parte	subjetiva	do	objeto,
nem	a	parte	objetiva	do	sujeito;	ela	é	o	processo	pelo	qual	se	estabelece	sua
relação.	Nesse	mesmo	sentido,	Vala	pontua,	nasrepresentações,	a	“atividade
concreta	dos	grupos	sociais”	(1986,	p.	2)	e,	portanto,	o	real,	concomitante	com	o
ideal,	pelo	“fato	de	as	representações	incluírem	modos	desejáveis	de	ação”
(1993,	p.	15).
Para	compreender	a	concomitância	do	real	e	do	ideal	na	formação	e	na	expressão
das	representações,	é	preciso	também	entendê-las	como	“teorias”	destinadas	à
“explicação	e	à	elaboração	do	real”	(Moscovici	1978,	p.	50).	No	processo	de
representar,	“edifica-se”	uma	“doutrina”,	que	permite	explicar	e	prever	os	atos:
Representar	não	consiste	somente	em	selecionar,	completar	um	ser
objetivamente	determinado	com	um	suplemento	da	alma	subjetiva.	É,	de	fato,	ir
mais	além,	edificar	uma	doutrina	que	facilite	a	tarefa	de	decifrar,	predizer	ou
antecipar	os	seus	atos.	(Moscovici	1978,	p.	27)
Assim,	as	“categorias	explicativas”	do	objeto	da	representação	decorrem	de
“teorias	implícitas”	sobre	esse	objeto.	Por	isso,	Vala	(1993)	refere-se	às
representações	como	“teorias	sociais	práticas”(p.	7)	ou	“processos	através	dos
quais	os	indivíduos	em	interação	social	constroem	teorias	sobre	os	objetos
sociais,	que	tornam	viáveis	a	comunicação	e	a	organização	dos
comportamentos”(Moscovici	apud	Vala	1993,	p.	2).
Trazendo	essas	referências	teóricas	à	análise	dos	dados	da	pesquisa	de	Santos
(1992),	observa-se	que	a	“teoria”	sobre	o	supervisor	–	“teoria”	formada	na
prática,	no	curso	das	interações	e	das	comunicações	sociais	–	“explica”	seu	papel
coordenador,	integrador,	articulador.
E	se	no	ato	de	representar	mesclam-se	o	real	(o	componente	da	experiência,	do
dia	a	dia,	do	que	se	vivencia	no	concreto	das	situações)	e	o	ideal	(o	que	se
deseja,	o	que	se	espera),	é	possível	também	acreditar	que	este	“elo	de	ligação”
ou	“elo	integrador”,	ou	“formador	de	laços”,	“articulador”,	“mobilizador”,	ou,
ainda,	“colega	educador”,	seja	alguém	que	se	revelou	na	vivência,	no	convívio,
na	realidade	do	trabalho,	ou	alguém	que	corresponde	às	aspirações,	à	vontade,	ao
ideal	do	grupo.
Mesmo	que	se	submetam	as	referências	teóricas	da	representação	(que	neste
estudo	se	formulam	no	campo	da	psicologia	social)	aos	questionamentos
oriundos	da	análise	da	ideologia,	permanecem,	nas	expressões	dos	sujeitos	–	nas
suas	“teorias	explicativas”	do	papel	do	supervisor	–,	sua	visão	e,	na	dimensão	de
atitude,	seu	sentimento,	que,	qualificados,	trazem	informações	significativas	ao
estudo	da	função	supervisora.
Todas	essas	considerações	esclarecem	e	sustentam	a	observação	que	se	fez	ao
introduzir	este	segmento	em	que	se	tratou	da	importância	da	pesquisa,	com
atenção	aos	referentes	da	investigação	de	representações,	confirmando-se,
portanto,	suas	possibilidades	de	contribuição,	como	uma	das	alternativas	teórico-
metodológicas	de	produção	do	conhecimento	sobre	o	supervisor:	uma	produção
necessária	quando	se	pretende	discutir,	com	fundamento	e	consistência	teórico-
prática,	a	percepção,	o	conceito,	a	imagem	do	supervisor,	em	contextos
específicos	como	o	da	América	Latina,	seus	problemas	e	seus	desafios
pedagógicos	e	sociais.
Portanto,	é	com	este	registro,	com	este	reconhecimento	da	importância	da
pesquisa,	da	produção	crítica	e	contextualizada	do	conhecimento,	notando-se	as
contribuições	da	representação	social,	que	se	concluem	estas	considerações
sobre	o	papel	do	supervisor,	como	“especialista”	em	educação	na	América
Latina.
Lembrando,	entretanto,	que	um	texto	traz	subsídios	quando	não	se	conclui	em	si
mesmo,	seja	porque	retorna	à	prática,	seja	porque	provoca	novas	construções
teóricas,	espera-se	que	essas	reflexões	possam	acrescentar	incentivos	à
continuidade	das	discussões	sobre	o	“especialista”	supervisor	e	as	solicitações
que	a	realidade	latino-americana	lhe	encaminha.
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8
JOSÉ	–	DE	DIA	ALUNO	DA	ESCOLA,	DE	NOITE	MENINO	DE
RUA
Regina	Leite	Garcia
José,	aluno	de	uma	escola	pública,	cursava	a	4ª	série	do	ensino	fundamental.
A	escola	estava	localizada	num	bairro	de	classe	média	da	cidade	do	Rio	de
Janeiro,	cercado	de	morros	e	favelas,	além	de	na	parte	baixa	do	bairro	haver	um
número	grande	de	casas	de	cômodos,	forma	de	ocupação	pela	população	pobre
de	antigos	casarões	abandonados	pela	aristocracia	carioca	decadente.
Sua	professora,	Joana,	jovem	de	classe	média,	pouco	experiente,	tanto	das	coisas
da	vida,	quanto	das	coisas	da	escola,	num	determinado	dia,	procurou	a
orientadora	educacional,	pedindo-lhe	auxílio.	Segundo	ela,	José	chegava
atrasado	quase	todas	as	manhãs,	o	que	lhe	parecia	desinteresse	de	sua	parte.	Seu
desinteresse	era	tal	que	muitas	vezes	chegava	até	a	dormir	na	sala	de	aula.	E	–	o
que	considerava	mais	grave	–	não	fazia	os	deveres	de	casa.	Embora	ela	já
houvesse	chamado	“o	responsável”,	ninguém	apareceu.	Sem	saber	o	que	fazer,
buscou	o	auxílio	da	orientadora,	“especialista”	em	resolver	os	problemas	dos
alunos.
Marta,	a	orientadora	educacional,	surpreendeu-se,	pois,	ao	chegar	à	escola,
convidara	os	professores	para	uma	reunião,	em	que	deixara	claro,	ou	pelo	menos
acreditava	ter	deixado	claro,	que	o	papel	da	orientação	educacional	não	era	mais
de	“atendimento	de	caso”,	como	por	tanto	tempo	fora.	Fizera	a	crítica	do	papel
que	a	orientação	educacional	cumprira	na	manutenção	do	status	quo.	Após	fazer
acrítica	teórica	de	tal	ação	conservadora,	apresentara	a	nova	orientação
educacional,	comprometida	com	a	construção	coletiva	de	uma	escola	de
qualidade	para	a	classe	trabalhadora.	Mostrara	como	e	por	que	a	orientação
educacional	e	a	supervisão	haviam	sido	criadas,	que	papel	haviam	cumprido,	e
quais	os	fundamentos	teóricos	e	a	ideologia	subjacentes	às	ações	dos	dois
“especialistas”.	Recuperara	a	trajetória	desses	profissionais,	que	partiram	de	uma
ação	conservadora	baseada	no	psicologismo,	no	caso	da	orientação	educacional,
e	no	tecnicismo,	no	caso	da	supervisão.	E,	no	momento	atual,	aproximaram-se,
atuando,	ambos,	numa	linha	sociopolítico-pedagógica.
De	controladores,	o	supervisor	do	trabalho	docente	e	o	orientador	dos
comportamentos	punham-se	a	serviço	dos	professores	e	dos	alunos,	no	sentido
de	que	os	professores	melhor	ensinassem	para	que	todos	os	alunos	aprendessem,
pois	para	isso	é	que	há	escola.
No	entanto,	apesar	do	discurso	enfático	da	orientadora,	eis	que	lhe	aparecia	“um
caso”	a	ser	resolvido.
Em	conflito,	Marta	pôs-se	a	pensar	sobre	o	que	fazer,	pois	se	nada	fizesse,
naturalmente	cairia	no	descrédito	dos	professores.	Por	outro	lado,	se	se	deixasse
seduzir	pelo	apelo	da	professora,	mordendo	a	isca	do	“atendimento	de	caso”,
nunca	mais	sairia	das	demandas	de	quem	nem	sempre	sabe	como	lidar	com	o
que	lhe	parece	“o	aluno-problema”.
Sem	saber	o	que	fazer,	a	orientadora	levou	o	“problema”,	agora	problema	seu,
para	ser	discutido	na	reunião	de	coordenação	de	orientação	educacional,	em	que
todas	as	orientadoras	se	reuniam	quinzenalmente	para	trocar	experiências,
aprendendo	umas	com	as	outras	e	todas	com	a	coordenadora,	responsável	pelo
processo	de	educação	continuada	do	grupo	de	orientadoras	educacionais	do
município	do	Rio	de	Janeiro.
Da	reunião	saiu,	não	só	com	uma	ideia,	mas	com	a	certeza	de	que	aquelas
reuniões	eram,	como	afirmara	sua	colega,	um	momento	de	renovação	de
esperanças	e	confiança...	assim	como	uma	bola,	que	se	enche	de	gás	nas	reuniões
e	que	vai	se	esvaziando	durante	os	15	dias	de	solicitações	e	desgastes	na	escola.
A	ideia	que	levou	consigo	foi	sugerida	por	uma	de	suas	colegas	orientadoras	que,
lembrando-se	de	sua	experiência	com	arte,	dera-lhe	a	ideia	de	criar	um	Núcleo
de	Arte,	estratégia	para,	sem	deixar	de	atender	à	solicitação	da	professora
ansiosa,	não	cair	na	armadilha	do	“atendimento	de	caso”.
Ao	chegar	à	escola,	procurou	a	diretora	e	lhe	solicitou	um	espaço	para	criar	o
Núcleo	de	Arte,	onde	“atenderia	as	crianças	encaminhadas	pelas	professoras”.
Com	a	aquiescência	da	diretora,	começou	a	listar	o	material	indispensável	para
iniciar	as	atividades.	Procurou	também	parcerias	para	o	trabalho,	conseguindo
adesão	imediata	da	supervisora,	da	bibliotecária	e	da	professora	de	arte.
E	puseram-se	a	trabalhar.
Com	José,	vieram	outras	crianças.	E	começou	o	Núcleo	de	Arte	da	escola	a
funcionar,	o	que	veio	a	provocar	significativas	mudanças	pedagógicas,	objetivo
maior	de	Marta.	Aliás,	ela	escrevera	em	seu	diário	de	campo	no	dia	em	que	a
diretora	concordara	com	sua	ideia:
O	que	importa,	de	fato,	não	é	“resolver	o	caso	encaminhado	pela	professora”,
mas	criar	na	escola	um	clima	de	coconstrução,	ou	melhor,	de	reorientação
curricular.	Este	é	o	objetivo	maior	de	meu	trabalho	–	atuar	junto	com	a
supervisão,	no	sentido	de	provocar	a	discussão	coletiva	da	prática	pedagógica,
contribuindo	assim	para	a	melhoria	da	qualidade	do	trabalho	desenvolvido	na
escola.
É	destas	mudanças	que	me	ponho	a	falar,	já	que	estou	certa	de	que	elas	nos	darão
pistas	em	relação	às	possibilidades	de	uma	ação	pedagógica	conjunta,	supervisão
e	orientação	educacional,	na	escola.
O	Núcleo	de	Arte
As	crianças	chegavam	ao	Núcleo	de	Arte	após	o	término	do	horário	das	aulas,
para	as	do	primeiro	turno,	e	antes	do	início	das	aulas,	para	o	grupo	do	segundo
turno.	Vinham	cheias	de	alegria	e	encontravam	a	orientadora,	a	supervisora,	a
bibliotecária	e	a	professora	de	arte,	igualmente	cheias	de	entusiasmo	pela	nova
atividade,	que	começou	a	despertar	a	curiosidade	de	todos	na	escola.
A	diretora	forneceu	o	material	tradicionalmente	considerado	“material	de	arte”,
como	lápis,	pincéis,	tintas,	tesouras,	cola,	papel	etc.	A	supervisora	e	a
orientadora	mobilizaram	os	professores	e	os	alunos	para	que	trouxessem
“material	de	sucata”,	a	se	transformar	em	material	de	criação.	Chamaram
também	os	pais	para	uma	reunião,	em	que	explicaram	o	tipo	de	trabalho	que
realizariam,	solicitando	sua	colaboração.	Pediam	tudo	o	que	não	tivesse	uso,	pois
o	aparentemente	inútil	tornar-se-ia	utilíssimo,	redefinido	que	seria	no	Núcleo	de
Arte.	Foram	aparecendo	caixas	de	ovos,	copos	de	iogurte,	jornais	velhos,	caixas
de	papelão,	restos	de	pano,	de	lã,	de	linha,	de	algodão,	lâmpadas	queimadas,
pilhas	velhas,	roupas	velhas,	sapatos	velhos,	chapéus	velhos,	e	tanta,	tanta	coisa,
que	pela	variedade	desafiava	a	imaginação	das	professoras	e	das	crianças	para	o
seu	reaproveitamento.
Além	do	material	trazido	pelas	crianças	e	pelas	professoras,	acrescido	aos
materiais	comprados	pela	diretora,	foi	realizada	uma	excursão	pelo	quarteirão
em	que	estava	localizada	a	escola.
Desse	passeio,	foram	trazidas	novas	contribuições:	cachos	de	madeira	oferecidos
pelo	marceneiro	da	esquina,	pedaços	de	metal	oferecidos	pelo	mecânico	da
oficina	de	automóveis	da	outra	esquina,	copos	e	sacos	de	papel	do	botequim,
folhas	secas	encontradas	na	calçada.	Esses	materiais,	e	outros	que	foram	sendo
anexados	posteriormente,	constituíram-se	no	acervo	do	Núcleo	de	Arte.
O	sucesso	da	excursão	fez	com	que	vez	por	outra	o	grupo	excursionasse	pelos
arredores	da	escola,	não	apenas	em	busca	de	novos	materiais	para	o	Núcleo	de
Arte,	mas	também,	em	busca	de	“inspiração”.	E,	o	que	é	mais	importante:
algumas	professoras,	estimuladas	pelo	resultado	da	excursão	do	grupo	do	Núcleo
de	Arte,	tiveram	coragem	de	ousar	sair	da	sala	de	aula	e	ganhar	o	espaço	da	rua,
transformando-o	em	espaço	pedagógico.	As	descobertas	feitas	pelas	turmas	na
rua	transformavam-se	em	conteúdos	pedagógicos,	enriquecendo	os
conhecimentos	formais,	a	que	em	geral	as	professoras	estão	submetidas.
Abriam-se	as	portas	da	escola,	ampliava-se	o	universo	cultural	de	professoras	e
alunos,	enriquecia-se	o	currículo.	Recuperava-se	o	elo	perdido	escola-vida.	Os
ensinamentos	sem	sentido	tornavam-se	aprendizagens	significativas	na	unidade
dialética	teoria	e	prática.
As	atividades	do	Núcleo	de	Arte	passavam	por	desenho,	pintura,	recorte,
colagem,	esculturas,	teatro	de	máscaras,	de	fantoches,	música,	e	tudo	aquilo	que
surgisse	como	possibilidade	de	criação/recriação.	Do	já-conhecido	de	alguns,
abriam-se	para	o	desconhecido	de	todos,	o	que	só	era	possível	pelo	clima	de
confiança	e	de	desejo	comum	que	se	instalara	no	grupo.
Inicialmente	constituído	de	“crianças-problema”	encaminhadas	por	professoras,
o	grupo	foi	se	diversificando,	rompendo	com	o	estigma	da	“doença	a	ser
curada”,	tornando-se	apenas	um	espaço	prazeroso,	em	que	as	crianças	vinham
criar	coletivamente,	independentemente	dos	“problemas”	que	pudessem	ter,	ou
que	se	acreditava	que	tivessem.
O	resultado	do	trabalho	desenvolvido	no	Núcleo	de	Arte	começou	a	ser	levado
para	as	reuniões	pedagógicas	promovidas	pela	supervisora	e	pela	orientadora.	As
professoras	que	inicialmente	se	mostravam	curiosas	apenas	em	saber	sobre	seus
alunos	foram	se	interessando	pelo	trabalho	de	arte	e	suas	possibilidades
pedagógicas.
Desdobramentos	do	trabalho	no	Núcleo	de	Arte
Por	solicitação	das	professoras,	começaram	a	ser	discutidas	as	potencialidades
de	um	trabalho	de	arte,	seus	fundamentos	teóricos,	metodologias	mais
adequadas,	técnicas	de	fácil	uso,	uso	de	diferentes	técnicas	com	possibilidades
diversas.	A	arte	como	linguagem	expressiva	e	comunicativa.	A	arte	como
enriquecimento	à	aprendizagem	da	linguagem	escrita.	A	arte	como	fonte	de
prazer.	A	arte	como	recurso	pedagógico.	A	arte	como	conhecimento.
À	medida	que	as	professoras	percebiam	mudanças	em	seus	alunos,	iam	se
interessando	mais	e	mais	por	um	trabalho	que	até	um	certo	momento	parecia
meio	misterioso,	ou	sem	sentido,	quem	sabe?
A	frequênciaàs	reuniões	pedagógicas	ampliou-se.	As	perguntas	mudavam	de
qualidade.	De	um	ingênuo	“O	que	é	que	vocês	descobriram	dele?”	ou	“Você	não
acha	que	precisa	chamar	a	mãe	para	levar	esta	menina	a	uma	psicóloga?”,
avançavam	para	“Como	eu	poderia	fazer	na	minha	sala	de	aula	para	que	as
crianças	se	tornassem	mais	interessadas?”	ou	“O	que	posso	fazer	para	tornar	a
minha	prática	pedagógica	mais	criativa?”,	chegando	a:	“Será	que	vocês	me
ajudariam	a	fazer	um	trabalho	mais	criativo?”
O	primeiro	pedido	de	auxílio	veio	de	uma	professora	da	1ª	série	e	de	uma
professora	da	4ª	série.	A	supervisora	foi	em	auxílio	da	professora	da	1ª	série	e	a
orientadora	pôs-se	à	disposição	da	professora	da	4ª	série.
A	supervisora	ajudou	a	professora-alfabetizadora	a	replanejar	seu	trabalho,
incorporando	a	literatura	e	o	desenho,	a	pintura	e	a	modelagem,	o	recorte	e	a
colagem,	a	música	e	o	teatro	como	linguagens	em	si,	e	como	conteúdos	de
alfabetização,	enriquecendo	o	processo	de	aprendizagem	da	linguagem	escrita.
Acompanhava	a	professora	diariamente,	observava	as	crianças	em	interação	e
em	situações	de	interlocução	e	de	coconstrução,	intervinha,	participava,	sugeria.
Ao	final	de	cada	aula,	discutiam	o	realizado	e	planejavam	o	próximo	passo	com
base	nos	resultados.	Os	progressos	observados	nas	crianças	encorajavam	a
professora	a	ousar	mais.	O	suporte	da	supervisora	dava-lhe	mais	segurança.
Tratava-se,	afinal,	de	uma	experiência	compartilhada.
A	professora	começou	a	registrar	seu	trabalho,	e	seus	registros	eram	discutidos
nas	reuniões	pedagógicas,	o	que	foi	provocando	uma	saudável	emulação	entre	as
professoras-alfabetizadoras.	Da	tradicional	cartilha,	as	professoras	iam	se
valendo	de	livros	de	literatura	infantil,	de	revistas,	de	histórias	em	quadrinhos,
de	jornais	e	revistas.	Instituiu-se	a	troca	de	correspondência,	e	Freinet	foi
introduzido	às	professoras	que,	entusiasmadas,	passaram	a	discuti-lo	em	suas
reuniões	quinzenais.	De	Freinet	partiram	para	Paulo	Freire.	E	as	reuniões,	de
simples	trocas	de	experiências,	tornaram-se	um	grupo	de	estudo.	Novos	autores
iam	sendo	introduzidos	à	medida	que	se	tornavam	oportunos	para	o	momento	e
para	os	desafios	enfrentados	pelo	grupo.	A	teoria	passava	a	ter	sentido	para	o
grupo,	algumas	vezes	por	cumprir	uma	função	explicativa,	outras	vezes	por	se
tornar	aplicativa.
A	qualidade	das	aulas	mudou,	a	qualidade	das	produções	das	crianças	mudou,	a
qualidade	da	alfabetização	mudou.	E	neste	processo	de	mudanças,	mudava
também	a	professora.	A	cada	resultado	avaliado,	aumentava	sua	autoconfiança,
e,	por	consequência,	aumentava	também	sua	coragem	de	ousar.	Tornar-se
criativa	exige	coragem	e	segurança.
As	produções	das	crianças	eram	trazidas	à	luz	da	teoria	nas	reuniões	quinzenais.
A	cada	novo	desafio	(não	compreender	o	processo	de	apropriação	da	linguagem
escrita	pelas	crianças	tornou-se	um	desafio),	a	supervisora	apresentava	novos
aportes	teóricos	que	pudessem	dar	conta	da	situação	que	desafiava	os
conhecimentos	pedagógicos	das	professoras-alfabetizadoras.
O	grupo	ia	construindo	sua	competência	docente	coletiva	e	um	forte
compromisso	comum	com	seus	alunos.
O	mesmo	se	deu	com	a	professora	da	4ª	série,	a	professora	de	José.	Tendo
procurado	a	orientadora	educacional	para	“resolver	o	problema	de	José”,	foi
descobrindo	novas	possibilidades	de	atuação,	não	apenas	com	José,	mas	com	sua
turma	toda.
À	medida	que	a	orientadora	lhe	trazia	os	resultados	de	seu	trabalho	com	José,
seja	as	atividades	de	arte,	seja	as	entrevistas	realizadas	com	José	e	com	sua	avó,
a	realidade	vivencial	do	menino	lhe	ia	sendo	revelada,	o	que,	até	então,	era-lhe
desconhecido.
O	mundo	da	miséria,	até	então	conhecido	apenas	através	de	notícias	de	jornal,	de
filmes	ou	de	romances	realistas,	ia	invadindo	o	universo	protegido	da	moça	de
classe	média,	tornada	professora.
José	era	órfão	de	pai	e	mãe,	e	vivia	com	a	avó	materna,	velha	e	pobre.	Moravam
os	dois	num	cortiço,	onde	ocupavam	um	quarto,	compartilhando	o	banheiro	e	a
cozinha	com	os	demais	inquilinos,	tão	pobres	quanto	os	dois.	Sobreviviam	da
venda	de	doces	que	a	avó	fazia	durante	o	dia	e	que	José	vendia	à	noite.	É
evidente	que,	enquanto	não	vendesse	todos	os	doces,	José	não	voltava	para	casa.
Isto	o	obrigava	a	ficar	perambulando	pelas	ruas	até	muito	tarde,	tendo	por
companhia	bêbados,	prostitutas	e	meninos	que	vagavam	pelas	ruas	como	ele
próprio.
No	entanto,	apesar	de	voltar	frequentemente	de	madrugada,	não	deixava	de	ir	à
escola	na	manhã	seguinte.	Chegava	atrasado,	sim,	mas	chegava.	Às	vezes
adormecia	enquanto	a	professora	dava	aula,	mas	lá	estava.
Era	evidente	o	valor	que	José	dava	à	escola.	Talvez	sua	presença	insistente	se
devesse	à	sua	expectativa	de	melhorar	de	vida	por	meio	do	que	pudesse	aprender
na	escola.	Afinal,	a	ideologia	da	ascensão	social,	via	educação,	é	fortemente
internalizada	pela	população.	Ou	talvez	fosse	à	escola	apenas	para	merendar,
quem	sabe,	a	sua	única	refeição,	ou	pelo	menos	como	uma	possibilidade	de
economizar	o	pouco	de	que	dispunham,	ele	e	sua	avó.	Seja	qual	for	a	verdadeira
razão	para	a	presença	diária	de	José	na	escola,	este	era	um	dado	definitivo	para	a
orientadora.	E	foi	com	este	dado	que	ela	procurou	reverter	a	idiossincrasia	da
professora.
O	processo	de	mudança	da	professora	foi	lento	e	cheio	de	contradições.	É	como
afirma	Agnes	Heller	em	relação	aos	preconceitos:	demanda	muito	tempo	para
que	desenvolvamos	uma	atitude	crítica	em	relação	aos	esquemas	recebidos,	e,
frequentemente,	não	se	chega	à	libertação	dos	preconceitos.	A	professora,	como
já	afirmei,	jovem	de	classe	média	urbana,	protegida	contra	os	“incômodos	da
miséria”,	trazendo	consigo	representações	rígidas	do	“bom	aluno”,	como	poderia
se	abrir	para	compreender	a	situação	de	José,	que	fugia	aos	padrões	de
normalidade	por	ela	internalizados?
Para	Joana,	aquele	menino	era	desinteressado,	pois	quem	está	interessado	é
assíduo,	pontual,	atento.	José	chegava	atrasado	à	escola,	não	trazia	os	deveres	de
casa	feitos,	chegando	algumas	vezes	a	adormecer	em	plena	aula	–	“evidências	de
desrespeito	e	desinteresse”.	Desinteresse,	desrespeito,	ou	o	genérico	“problema”,
o	fato	é	que	alguma	coisa	o	menino	tinha,	que	só	um	especialista	deveria	poder
diagnosticar.	Compreender	a	situação	de	José	e	os	seus	motivos	exigiria	de	Joana
abrir-se	de	seu	universo	cultural	fechado	e	preconceituoso.	O	caminho	mais	fácil
era,	portanto,	o	de	encaminhar	o	“problema”	para	a	orientadora	educacional.
Foram	necessários	tempo	e	evidências	empíricas,	além	do	respaldo	teórico,	para
que	a	professora	pudesse	lentamente	ir	se	abrindo	para	outras	visões	de	mundo,
diferentes	das	que	lhe	haviam	ensinado	em	sua	história	vivencial	e	profissional.
Isto	porque,	além	dos	preconceitos	de	classe	média,	ela	carregava	a	visão
estereotipada	aprendida	em	seu	curso	de	formação	de	professora,	em	que	haviam
lhe	ensinado	que	tudo	o	que	foge	a	uma	pseudonormalidade	é	anormalidade,	e
precisa	ser	tratado.	José	não	era	igual	ao	modelo	de	aluno	que	aprendera	no
Instituto	de	Educação.	Como	aceitá-lo	em	sua	diferença,	se	para	ela	o	mundo	era
homogêneo,	sem	lugar	para	as	diferenças?	Antes	de	preocupar-se	com	sua
aprendizagem,	era	preciso	que	a	orientadora	tratasse	de	sua	“doença”,	para
então,	e	só	então,	ela	poder	atuar	como	professora.	Daí	tê-lo	encaminhado	para	o
SOE	(Serviço	de	Orientação	Educacional),	onde	a	especialista	competente	o
atenderia,	preparando-o	para	o	mundo	harmonioso	da	normalidade,	sua	sala	de
aula,	onde,	caminhando	juntos	pelos	mesmos	caminhos,	todos	devem	aprender.
Consciente	da	situação	a	ser	enfrentada,	a	orientadora	usou	toda	sua
sensibilidade	para	ir	trazendo	a	realidade	vivencial	de	José,	com	cuidado	para
não	desqualificar	a	professora,	ao	mostrar	uma	outra	verdade	que,	obviamente,
punha	por	terra	a	verdade	acreditada	por	Joana.	Trouxe,	por	exemplo,	dados	da
situação	familiar	e	econômica	de	José:	como	vivia,	de	que	vivia,	com	quem
vivia,	onde	vivia.	Trouxe	trabalhos	realizados	por	José,	desenhos,	pinturas	e
colagens,	em	que	ficavam	claras	a	importância	que	para	ele	tinha	a	escola,	e	a
condição	miserável	em	queele	vivia.	Trouxe	situações	dramatizadas	pelo
menino,	em	que	ficava	evidente	sua	experiência	de	menino	de	rua,	solto	por	ruas
e	praças,	exposto	ao	perigo	e	preso	à	responsabilidade	de	garantir	o	sustento	de
sua	pequena	família.	Em	todas	as	situações,	José	revelava	criatividade,
responsabilidade	e	empenho	em	levar	os	compromissos	assumidos	a	termo.	Aos
poucos	ia	se	revelando	um	outro	José,	até	então	desconhecido	de	Joana.
Mas	José	não	se	limitava	a	se	mostrar	em	suas	produções;	ele	abria	as	portas	de
um	mundo	ignorado	pela	professora,	que	a	obrigava	a	pensar	e	a	fazia	sofrer,	às
vezes,	e	a	se	defender,	outras	vezes.	O	impacto	das	descobertas	foi	provocando
mudanças	em	Joana,	até	que	um	dia	ela	irrompeu	pelo	SOE,	dizendo:	“Agora
quem	precisa	de	atendimento	sou	eu!”
De	uma	longa	e	penosa	conversa	surgiram	o	desejo	de	mudar	a	prática
pedagógica	e	o	pedido	de	auxílio.
Daí	em	diante,	Marta	passou	a	frequentar	a	sala	de	aula	de	Joana,	e	juntas
iniciaram	um	trabalho	com	as	crianças,	entre	as	quais	se	encontrava	José.
Começaram	com	o	Flicts,	de	Ziraldo.	O	livro	possibilitou	um	rico	projeto,	que	se
estendeu	por	um	mês.	Fizeram	leituras	pictóricas,	criaram	textos	individuais	e
coletivos,	dramatizaram,	criaram	músicas	com	vozes	e	instrumentos,	realizaram
experiências	com	cores,	pesquisas	sobre	bandeiras	e	sobre	países,	compararam
línguas	diferentes	(português,	francês,	inglês)	e	escritas	diferentes	(a	escrita
árabe,	a	chinesa,	a	nossa),	estudaram	povos	e	culturas	diferentes.	Por	caminhos
diferentes,	estudavam	matemática,	história,	geografia,	ciências,	estudos	sociais,
arte	e	língua	portuguesa.	Mas	a	grande	diferença	podia	ser	percebida	nas
expressões	de	prazer	das	crianças	e	da	professora.	Professora	e	alunos
descobriam	o	grande	prazer	de	conhecer	e	de	criar.
Assim	como	a	supervisora	fizera	com	a	professora	da	1ª	série,	a	orientadora	foi,
pouco	a	pouco,	deixando	a	professora	a	sós	com	seus	alunos.	Ambas	pretendiam
que	as	professoras	fossem	conquistando	maior	autonomia,	na	medida	em	que	se
percebessem	capazes	de	atuar	mais	criativamente.	Deixar	as	professoras	a	sós
com	seus	alunos	não	significava	abandoná-las,	mas	lhes	abrir	espaços	de	ação
mais	independente,	embora	se	mostrassem	sempre	disponíveis	para	a	troca,	a
discussão	e	o	suporte	teórico	e	afetivo.
A	escola	vai	mudando
Das	primeiras	mudanças,	ainda	em	nível	individual	–	uma	professora,
alfabetizadora	e	uma	professora	de	4ª	série	–,	foram	se	dando	mudanças	mais
amplas,	mais	abrangentes,	mais	no	nível	coletivo	da	escola.	Este	era	o	objetivo
comum	da	supervisora	e	da	orientadora.
Mudanças	coletivas	só	podem	se	dar	no	coletivo.	E	o	espaço	do	coletivo	na
escola	são	as	reuniões	pedagógicas,	que	já	aconteciam	por	iniciativa	da
supervisora	e	bem	antes	da	chegada	da	orientadora.
As	reuniões	pedagógicas	aconteciam	quinzenalmente,	e	delas	participavam
professores	do	ensino	fundamental,	nem	todos,	mas	um	número	razoável.	É	mais
fácil	conseguir	a	participação	das	professoras	de	1ª	a	4ª	série.	Sua	dedicação	é
exclusiva	a	uma	turma.	Mesmo	quando	trabalham	em	outra	escola,	ficam	na
mesma	escola	durante	o	turno	completo	e	todos	os	dias.	Só	têm	a
responsabilidade	de	uma	turma	em	cada	escola	e	sentem	esta	turma	como	“sua
turma”.	Enquanto	isto,	os	professores	de	5ª	a	8ª	séries	vivem	correndo	de	uma
escola	para	outra,	e	nessa	corrida	sobra	pouco	tempo	para	reuniões,	quando	não
falta	tempo	para	planejar	e	até	para	conhecer	cada	aluno.	São	verdadeiros
mascates	pedagógicos,	correndo	de	uma	escola	para	outra,	com	sua	pastinha
pedagógica.
Em	matéria	de	reunião	só	o	Conselho	de	Classe,	e,	assim	mesmo,	dependendo	do
dia	e	do	horário.
E	seria	possível	exigir	tanto	de	quem,	para	sobreviver,	tem	de	correr	contra	o
tempo,	pois	se	não	correr,	o	salário	corre	mais	rápido	do	que	o	tempo,	e	acaba
antes	de	chegar	o	final	do	mês?
Quando	faço	a	crítica	ao	aviltamento	salarial	dos	professores	e	às	condições	de
vida	e	de	trabalho	a	que	foram	condenados,	não	estou	fazendo	a	apologia	do
“pro	que	ganho	faço	muito”,	mas	estou	querendo	dizer	que	não	é	possível	escola
de	qualidade	com	professores	mal	pagos.	Estou,	na	verdade,	querendo	dizer	que
o	professor	mascate	foi	produzido	socialmente,	como	parte	do	quadro	de
destruição	da	escola	pública.	E	que	ele	é	tão	vítima	quanto	os	seus	alunos.
Esses	professores	poucas	vezes	compareciam	às	reuniões	pedagógicas,	embora
dessem	uma	contribuição	interessante	quando	estavam	presentes.	Eram	mais
politizados	e	traziam	questões	mais	ligadas	ao	contexto	social	e	econômico	e	às
condições	de	trabalho	a	que	estavam	submetidos	os	profissionais	da	educação.
Eram	mais	reivindicativos	e	denunciavam	uma	certa	postura	assistencialista
entre	algumas	das	professoras	primárias.	Reclamavam	muito	da	falta	de	base	de
seus	alunos,	colocando	a	culpa	nas	professoras	das	séries	iniciais,	que	não	teriam
ensinado	o	que	seria	indispensável	para	que	as	crianças	pudessem	entender	os
conteúdos	específicos	de	suas	disciplinas,	para	que	tivessem	desenvolvido
hábitos	de	estudo,	para	que	tivessem	adquirido	a	capacidade	de	estudar	com
autonomia.
À	medida	que	as	reuniões	foram	ganhando	sentido	para	o	grupo	de	professores,	a
frequência	foi	aumentando.	Comentários	de	corredor,	de	sala	de	professores,	de
entrada	e	de	saída	de	turno,	de	encontros	casuais	iam	fazendo	a	“propaganda”
das	reuniões	pedagógicas	e	do	trabalho	da	supervisora	e	da	orientadora
educacional.	A	diretora,	até	então	ausente	das	reuniões,	passou	a	frequentá-las.
Com	a	presença	da	diretora	nas	reuniões	pedagógicas,	o	processo	decisório	foi	se
tornando	um	pouco	mais	democrático,	saindo	do	gabinete	e	das	mãos	exclusivas
da	diretora	para	a	decisão	compartilhada.
Reavaliando	a	avaliação
Com	o	aprofundamento	das	discussões	nas	reuniões	pedagógicas,	o	grupo
chegou	ao	ponto	nodal	da	escola:	o	sistema	de	avaliação.
A	avaliação	sempre	se	dera	por	meio	de	provas,	testes,	exercícios,	e,	algumas
vezes,	de	observações	dos	professores,	cujos	resultados	eram	quantificados,	e
transformados	em	notas.	Os	Conselhos	de	Classe	eram	os	momentos	de
apresentação	dos	resultados	e,	no	máximo,	de	confronto	das	diferentes
avaliações	realizadas	pelos	professores.	Eram	momentos	decisivos,	pois	ali	se
definia	quem	seria	aprovado	e	quem	seria	reprovado.	Alguns	professores,	mais
conscientes,	trocavam	informações	sobre	os	alunos,	discutiam	os	progressos	de
cada	aluno,	e,	ao	final,	decidiam	coletivamente.	Outros,	menos	comprometidos,
ou	mais	pressionados	pelo	exíguo	tempo	de	que	dispunham	em	sua	luta	pela
sobrevivência,	limitavam-se	a	entregar	para	a	supervisora	as	listas	de	suas
turmas	com	as	notas	relacionadas,	sem	dar	à	supervisora	qualquer	espaço	de
interferência	no	sentido	de	que	as	crianças	e	os	adolescentes	pudessem	ser
avaliados	mais	globalmente.
Jamais	se	discutira	as	consequências	sociais	da	reprovação,	e,	muito	menos,	a
subjetividade	presente	na	avaliação,	por	mais	objetivo	que	alguém	se	pretenda.
O	Conselho	de	Classe	era	apenas	o	momento	em	que	os	professores	se	reuniam,
sob	a	coordenação	da	supervisora,	para	“trocar	figurinhas”.	Todos	chegavam
com	muita	pressa	para	acabar	de	uma	vez	o	que	lhes	parecia	uma	perda	de
tempo.	Aliás,	para	entregar	e	confrontar	notas,	tirando	as	médias,	“a	supervisora
pode	fazer	sozinha”,	como	afirmavam	alguns.
Até	aquele	momento,	naquela	escola,	a	avaliação	era	direcionada	apenas	pelas
perguntas:	Quem	avaliar?	O	que	avaliar?	Como	avaliar?
Quem	avaliar?	Diriam	os	professores:	“É	óbvio	que	os	alunos.”
O	que	avaliar?	Responderiam	os	mesmos	professores:	“É	claro	que	o	que	os
alunos	aprenderam	do	que	ensinamos.”
Como	avaliar?	A	esta	pergunta,	diferentes	professores	responderiam	de	forma
diferente...	mas	não	tanto:
A	minha	avaliação	é	justa	porque	é	objetiva.	Eu	faço	uma	prova	no	final	do	mês,
onde	fica	claro	quais	os	melhores,	quais	os	médios,	e	quais	os	candidatos	à
reprovação.
Eu	faço	a	cada	semana	um	exercício	para	a	turma	toda,	e	vou	fazendo	a
avaliação	cumulativa.	Assim	eu	tenho	mais	dados	sobre	o	aproveitamento	de
cada	aluno.
Com	a	minha	experiência	eu	já	posso	dizer,	no	primeiro	diade	aula,	quem	vai
passar	e	quem	vai	ficar.	No	olho,	minha	amiga.
Eu	vou	avaliando	cada	exercício,	e	vou	anotando.	No	final	do	mês,	está	pronta	a
avaliação.	Não	perco	tempo.
Como	afirmei	acima:	diferente...	mas	não	tanto.	Pois	todos	colocavam	no	aluno	a
responsabilidade	absoluta	por	seu	fracasso.	Todos	avaliavam	apenas	o
desempenho	cognitivo	dos	alunos,	quantificando-o.	Todos	centravam-se	nos
alunos	e	no	resultado	(chamado	produto,	não	por	acaso),	desconsiderando	o
processo	global	vivido	pelo	grupo	de	alunos,	e	de	cada	aluno	individualmente,	e,
sobretudo,	descontextualizando	o	desempenho	de	desiguais,	como	se	iguais
fossem.	Finalmente,	todos	se	“esqueciam”	de	que	a	aprendizagem	constitui-se
em	unidade	dialética	com	o	ensino.
Neste	enfoque,	aos	professores	caberia	apenas	ensinar.	Os	alunos	que
mostrassem	ter	aprendido	o	que	havia	sido	ensinado	pelo	professor	eram
aprovados;	os	que	não	tivessem	aprendido	eram	reprovados.	Ou	melhor,	os	que
mostravam	saber	aquilo	que	o	professor	considerava	importante	saber	do	que
havia	ensinado	eram	aprovados.	Aqueles	que	não	respondiam	“corretamente”	às
perguntas	feitas	pelo	professor	na	prova	eram	reprovados.
A	avaliação	quantificava,	rotulava,	discriminava,	aprovava	ou	reprovava,
excluía.	Tudo	isso	com	a	capa	da	neutralidade,	da	objetividade,	da	justiça.
Com	o	envolvimento	nas	reuniões	pedagógicas,	os	professores	foram	tomando
consciência	do	que	efetivamente	acontecia	quando	avaliavam;	o	que	estava
subjacente	à	avaliação,	e	as	consequências	sociais	do	processo	avaliativo.
A	discussão	política	da	avaliação	ia	provocando	tomadas	de	consciência	em
alguns	e	resistências	em	outros,	mas,	sem	dúvida,	sofrimento	em	todos,	pois	as
descobertas	sobre	o	que	vinha	sendo	feito	com	as	crianças	das	classes	populares
provocavam	muito	sofrimento,	sobretudo	naqueles	que	tinham	uma	participação
política	em	partidos	progressistas	e	no	sindicato	de	professores,	e	que	percebiam
a	contradição	entre	o	discurso	político	genérico	e	a	prática	pedagógica	concreta.
Porém,	ajudados	uns	pelos	outros,	o	grupo	continuava,	e	crescia.	Ao	avançar,
colocava-se	outras	questões.	O	grupo	começou	a	discutir	avaliação,
perguntando-se:
•	A	quem	cabe	avaliar?
•	Quem	deve	ser	avaliado?	E	por	quê?
•	Qual	a	finalidade	da	avaliação?
•	Quando	se	deve	avaliar?
•	O	que	é	avaliar?
•	Como	avaliar?
A	lógica	da	avaliação	ia	mudando	à	medida	que	mudava	a	postura	dos
profissionais	da	escola.
Um	novo	projeto	pedagógico	ia	sendo	gestado.	Mudanças	substantivas	se
davam.
A	supervisora	e	a	orientadora,	que	haviam	provocado	a	discussão,	municiavam	o
grupo	com	textos	de	suporte	às	mudanças.	O	grupo	foi	discutindo	os
pressupostos	teóricos	da	avaliação	tradicional;	onde,	como,	e	por	que	surge	a
avaliação	na	história	da	escola;	o	papel	controlador	e	homegeneizador	que
cumpre;	a	prática	avaliativa	como	prática	social;	as	versões	tecnicistas	de
avaliação	que	privilegiam	o	problema	das	técnicas	aplicadas;	o	discurso
pseudocientífico	que	reduz	homens	e	mulheres	a	“condutas	observáveis”;	a
arbitrariedade	de	temas	e	questões	privilegiados	pelos	professores	nas	provas;	os
métodos	que	desvinculam	os	fenômenos	psicológicos	da	totalidade	social	e
humana	em	que	se	dão.	O	grupo	ia	compreendendo	com	Angel	Barriga	que	“o
problema	da	avaliação	não	poderá	ser	visto	e	analisado	com	outro	enfoque
enquanto	se	mantiver	o	mesmo	paradigma	epistemológico	para	sua	análise”.
Para	mudar	a	avaliação	escolar,	seria	necessária	uma	ruptura	epistemológica,
com	a	construção	de	um	novo	paradigma	epistemológico,	fundamentado	em
concepções	de	aprendizagem,	de	escola	e	de	sociedade,	de	homem,	de	mulher	e
de	criança,	diferentes	das	concepções	hegemônicas.
Esta	parecia	uma	tarefa	hercúlea.	Como	construir	um	novo	paradigma
avaliativo?	O	grupo	entrou	em	crise.	E	a	orientadora	trouxe	Gramsci,	para	ajudar
a	compreender	o	que	acontecia	com	os	profissionais	da	escola.
A	crise	se	instala	quando,	ao	lado	do	arcaico	o	novo	se	coloca	e	busca	seu	espaço
para	se	expressar.	O	amálgama	do	que	é	válido	no	arcaico	(e	deve	ser
conservado)	com	o	que	é	viável	no	novo	(e	deve	ser	estimulado)	é	o	cimento	da
construção	do	futuro.
O	fragmento	de	Gramsci	foi	discutido	e	rediscutido.	Voltava	sempre	que	o	grupo
se	perdia	na	crise.	Do	fragmento	foram	para	o	texto.	E	Gramsci	tornou-se
“íntimo”	do	grupo,	explicando	a	sociedade,	a	escola,	a	prática	política	e
pedagógica.
Aliás,	o	grupo	lia	avidamente	os	textos	que	eram	traduzidos	pela	supervisora	e
pela	orientadora.	As	leituras	passaram	a	ter	sentido,	pois	contribuíam	para	a
compreensão	dos	impasses	que	o	grupo	vivia,	e	forneciam	subsídios	para	que
fossem	encontradas	soluções	para	os	problemas.	As	discussões	teóricas	eram
confrontadas	com	o	material	empírico	trazido	pelos	professores,	resultado	de
suas	práticas.
Além	das	discussões	teóricas,	o	grupo	vivia	experiências	ligadas	à	avaliação.
Exemplo	disso	foi	a	proposta	da	supervisora	de	que	o	grupo	de	professores,	por
área	e	individualmente,	elaborasse	uma	prova	sobre	determinado	item	do
programa.	Ao	final	do	exercício,	constataram	que	cada	professor	havia
privilegiado	um	ponto	de	vista	diferente	do	que	seus	colegas	haviam	feito,
embora	se	tratasse	do	mesmo	item	do	programa.	Se	os	professores	davam
valores	diferentes	ao	mesmo	item	do	programa,	como	afirmar	que	tal	ou	qual
aluno	não	havia	aprendido	“o	mais	importante”?
Outra	experiência,	desta	vez	proposta	pela	orientadora	educacional,	foi	que	os
professores	avaliassem	um	colega	quanto	a	cabelos,	pele,	altura,	gordura,	olhos,
boca,	coisas	“tão	objetivas”	e	aparentes,	as	quais,	no	entanto,	ao	final,	todos
perceberam,	entre	divertidos	e	surpreendidos,	que	cada	um	avaliara
diferentemente.	Perceberam	a	falácia	da	objetividade	e	da	neutralidade.
Esse	exercício	foi	complementado	por	outro,	em	que	a	orientadora	apresentava
fotografias	de	crianças,	jovens,	adultos	e	velhos,	de	diferentes	gêneros,	de
diferentes	origens	étnicas	e	raciais,	de	diferentes	classes	sociais,	e	pedia	que
avaliassem.	Foi	ficando	evidente	para	o	grupo	quanto	de	subjetividade	e	de
preconceitos	carrega	a	prática	avaliativa.	A	experiência	vivenciada	permitiu	aos
professores	recordarem	quantas	vezes	“antipatizaram”	com	algum	aluno,	sem
qualquer	razão	aparente.	A	orientadora	ia	ajudando	o	grupo	“a	se	lembrar”,
evitando	que	se	fixassem	na	culpa,	o	que	só	traria	sofrimento.	Para	isso,	lançou
mão	das	mesmas	técnicas	que	utilizava	com	as	crianças	no	Núcleo	de	Arte,	pois,
consciente	do	potencial	integrador	da	arte,	dele	se	valia.
As	experiências	vivenciadas	pelo	grupo	de	professores	eram	em	seguida
discutidas	e	confrontadas	com	a	teoria.	Com	isso,	a	discussão	sobre	avaliação	ia
sendo	aprofundada,	provocando	mudanças	nas	práticas	avaliativas,	que	sempre
voltavam	para	as	reuniões,	onde	eram	socializadas	entre	os	professores.	O	grupo
partia	de	sua	própria	prática	avaliativa,	buscava	a	teoria	explicativa	às	situações
trazidas,	e	retornava	à	prática	avaliativa	em	seu	cotidiano.
As	mudanças	foram	acontecendo,	e,	como	eram	sempre	compartilhadas,	o	autor
sentia-se	estimulado	a	ousar	cada	vez	mais.	Alguns	foram	além	de	suas	pernas	e
“quebraram	a	cara”,	tendo	de	voltar	atrás.	Outros	eram	menos	afoitos,	indo	mais
devagar.	Muitos	limitavam-se	a	acompanhar	cuidadosamente	o	movimento	de
mudança	que	se	instalara.	As	diferenças	de	ritmo	e	de	possibilidades	eram
respeitadas,	o	que	cumpria	um	papel	pedagógico,	pois	ensinava	aos	professores
que	as	crianças	e	os	jovens	também	são	sempre	diferentes	uns	dos	outros,	e	que
devem	ser	respeitados	em	suas	diferenças.
Começaram	por	instituir	a	auto	e	a	heteroavaliação.	Como	os	alunos	não
estavam	preparados	para	esta	mudança,	em	algumas	turmas	houve	excessos,
provocando	o	ressentimento	das	professoras.	Em	outras	turmas	deu	certo,	talvez
por	mais	maturidade	dos	alunos,	ou	por	mais	segurança	da	professora.	A
aprendizagem	era	de	todos,	portanto	todos	sentiam-se	inseguros.	Mas,	como	o
caminhante	faz	o	seu	caminho,	o	grupo	foi	construindo	o	caminho	novo,	e	nesse
processo	de	construção	do	novo,	construía-se,	individual	e	coletivamente.
Outrasmudanças	foram	se	dando	gradativamente.	O	grupo	aprendia	o	que	o
povo	sabe	quando	diz	que	“a	pressa	é	inimiga	da	perfeição”.
As	avaliações	foram	se	tornando	mais	globais,	mais	qualitativas,	de	sazonais
tornavam-se	contínuas,	de	limitadas	à	avaliação	única	da	professora	abriam-se
para	uma	avaliação	interdisciplinar,	de	punitivas	tornavam-se	diagnósticas,
contribuindo	para	a	reformulação	do	planejado.	Se	os	alunos	estão	tendo
sucesso,	“estamos	no	bom	caminho”.	Se	alguns	não	estão	avançando	“é	preciso
repensar	conteúdos,	metodologias,	relações”.	Afinal,	a	vítima	não	pode	ser
responsabilizada	por	um	fracasso,	que	foi	sendo	compreendido	como	uma
produção	social,	cujas	consequências	sociais	são	lamentáveis.
E	assim	o	grupo	crescia	e	a	qualidade	do	trabalho	pedagógico	ganhava	corpo.
A	avaliação	foi	se	tornando	um	instrumento	valioso	de	conhecimento	e	de
interpretação	da	realidade.	As	crianças	e	os	adolescentes	começavam	a	aparecer
em	sua	complexidade.	As	práticas	docentes	adquiriam	uma	qualidade	antes
desconhecida.	O	processo	educativo	começava	a	ser	avaliado,	e	para	isso	era
necessário	que	os	alunos	participassem,	e	que	os	pais	fossem	ouvidos.	O
currículo	começava	a	ser	reconstruído.	Apareciam	sinais	de	um	projeto	político-
pedagógico-orgânico.
Perguntas	nunca	antes	formuladas	começavam	a	surgir:
•	Por	que	os	alunos	da	turma	X,	que	no	ano	passado	se	saíram	tão	bem	em
matemática,	neste	ano	estão,	em	sua	maioria,	apresentando	resultados
medíocres?
•	Por	que	o	José,	que	trabalha	durante	a	noite,	não	é	transferido	para	o	segundo
turno?
•	Por	que	os	alunos	da	turma	Y	estão	tão	bem	em	estudos	sociais	e	tão	mal	em
língua	portuguesa?
•	Por	que	a	turma	X	vai	tão	bem	com	o	professor	Paulo,	e	a	turma	Y	vai	tão	mal
com	o	mesmo	professor?
Perguntas	novas	a	partir	do	surgimento	de	novas	preocupações.	Necessidade	de
ouvir	outros	profissionais,	como	a	merendeira,	o	porteiro,	a	servente.
Necessidade	de	ouvir	os	pais.	Necessidade	de	conhecer	mais	sobre	a	vida	dos
alunos:	como	vivem,	convivem	e	sobrevivem,	de	onde	vieram	suas	famílias,	qual
sua	história	familiar,	de	grupo	sociocultural,	de	classe	social,	que	experiências
vivem	fora	da	escola,	o	que	sabem,	como	falam	de	seu	saber,	o	que	desejam
saber,	o	que	precisam	saber.	Perguntas	que	demandam	ouvir	os	alunos	e	seu
mundo,	deixando-os	falar.
Para	isso	foi	preciso	que	a	orientadora	educacional	saísse	da	escola,	abrindo	um
novo	tipo	de	diálogo	com	o	universo	cultural	ao	qual	o	aluno	pertence.	Para
muitas	das	perguntas,	as	respostas	estavam	fora	da	escola,	e	a	orientadora
educacional	foi	investigar	o	mundo	até	então	desconhecido	da	instituição.	Os
dados	levantados	por	meio	de	visitas,	entrevistas	e	questionários	voltavam	à
escola,	eram	trazidos	para	as	reuniões	pedagógicas	e	incorporados	ao	currículo.
Uma	nova	relação	da	escola	com	a	família
As	mudanças	que	começaram	a	se	dar	na	escola	provocaram	reações,	algumas
favoráveis	e	outras	desfavoráveis,	da	parte	dos	pais.
Alguns	pais	vinham	reclamar	que	“a	professora	não	está	mais	corrigindo	o
caderno	de	meu	filho”,	outros	vinham	aplaudir	“uma	forma	nova	de	ensinar,	que
minha	filha	está	gostando	muito”.
A	supervisora	e	a	orientadora	concluíram	que	estava	na	hora	de	chamar	os	pais
para	uma	reunião	pedagógica.	Assim	fizeram,	convencidas	da	necessidade	de
dar-lhes	satisfações	do	trabalho	que	estava	sendo	realizado	na	escola,	embora
cheias	de	medo	de	sua	reação.	Sabiam	da	importância	de	se	criar	uma
cumplicidade	entre	a	escola	e	a	família,	já	que	havia	um	objetivo	comum	a
ambas:	que	todas	as	crianças	tivessem	sucesso	em	seu	processo	de	aquisição	do
conhecimento	socializado	pela	escola.
No	dia	marcado,	após	convite	enviado	por	meio	dos	alunos	a	seus	pais,	a
supervisora,	a	orientadora,	a	diretora	e	alguns	professores	esperavam
pontualmente	à	hora	aprazada.	O	clima	era	tenso,	pois	todos	sabiam	da
importância	desse	encontro.
Os	pais	foram	chegando	e	sendo	convidados	a	ocupar	as	cadeiras	do	auditório.
Após	15	minutos	de	tolerância,	a	diretora	abriu	a	reunião,	dando-lhes	as	boas-
vindas	e	dizendo-lhes	da	importância	de	tê-los	na	escola	para	discutir	o	projeto
pedagógico	do	estabelecimento,	e	para	lhes	dar	conta	do	que	estava	sendo
realizado	com	seus	filhos.	Passou	em	seguida	a	palavra	à	supervisora,	que
discorreu	sobre	o	que	estava	sendo	feito,	por	que	estava	sendo	feito,	e	como
estava	sendo	feito.	Falou,	na	verdade,	sobre	a	reorientação	curricular	que
acontecia	na	escola.	Ao	finalizar,	passou	a	palavra	à	orientadora,	para	que	ela
falasse	sobre	o	núcleo	de	arte	e	suas	finalidades.	Foram	mostrados	trabalhos	de
crianças,	colocados	em	exposição	nas	paredes	e	comentados	pela	orientadora	e
pela	professora	de	arte.	Em	seguida,	a	supervisora	retomou	a	palavra,	a	fim	de
explicar	como	as	atividades	de	arte	se	incorporavam	ao	currículo,	enriquecendo-
o.	Falaram	ainda	algumas	das	professoras	sobre	o	trabalho	em	desenvolvimento
com	suas	turmas,	os	resultados	já	atingidos	e	os	resultados	pretendidos	a	médio	e
longo	prazos.	Terminadas	as	apresentações,	a	diretora	abriu	a	palavra	aos	pais,
que,	no	início	timidamente,	foram	pouco	a	pouco	ganhando	confiança	para
perguntar,	concordar	e	discordar,	assumindo	seu	direito	de	participar	da	vida
escolar	de	seus	filhos.
A	reunião	durou	duas	horas,	o	que	para	um	primeira	reunião	era	gratificante.	Ao
final,	alguns	pais	avaliaram	como	muito	positivo	o	encontro,	pedindo	que	aquele
tipo	de	reunião	acontecesse	com	mais	frequência.	Antes	de	fechar	a	reunião,
foram	levantados	o	melhor	horário	e	o	melhor	dia	da	semana	para	a	realização	de
reuniões	de	pais,	ficando	determinados	a	data	e	o	horário	do	encontro	seguinte.
Ficou	clara	a	dificuldade	de	realização	de	reuniões	em	horário	de	trabalho	dos
pais.	O	melhor	horário	seria,	portanto,	à	noite,	ou,	o	que	era	mais	conveniente,
aos	sábados,	dia	em	que	os	pais	estavam	mais	disponíveis.	Só	ouvindo	os	pais	é
possível	saber	de	suas	dificuldades	em	vir	à	escola	em	horários	incompatíveis
com	a	vida	de	um	trabalhador,	e	compreendendo	suas	razões,	romper	com	a
visão	preconceituosa	e	recorrente	entre	os	professores	de	que	“pai	não	quer
nada”,	ou	que	“só	vem	à	reunião	de	pais	quem	não	precisa”.
Esta	foi	a	primeira	de	uma	série	de	reuniões	que,	de	pedagógicas,	foram
entrando	por	questões	administrativas,	o	que	anunciava	uma	direção	colegiada,
objetivo	crescente	de	todos.
Nesse	meio	tempo,	a	orientadora	educacional,	auxiliada	pela	assistente	social	do
Distrito	de	Educação,	fazia	as	visitas	às	famílias	dos	alunos,	ouvindo	sobre	o	que
era	seu	objetivo	precípuo,	frequentemente	ouvindo	muito	mais	do	que
pretendera,	e	algumas	vezes	se	surpreendendo	com	a	reação	à	sua	visita,	com	um
embaraçador	“nunca	alguém	da	escola	veio	na	nossa	casa”.
Junto	com	o	cafezinho	com	biscoito	e	o	“não	repara	que	é	casa	de	pobre”,	a
conversa	ia	revelando	o	mundo	objetivo	e	subjetivo	dos	alunos,	que	voltava	à
escola	para	enriquecer	a	avaliação	e	reorientar	o	currículo.
Abre-se	a	relação	entre	a	escola	e	a	comunidade
Após	o	primeiro	encontro	informal	com	a	comunidade,	que	se	deu	com	a
excursão	realizada	com	as	crianças	pela	orientadora	educacional,	foi	avaliada	a
pertinência	de	um	contato	mais	frequente	com	a	comunidade	circundante.	O
bairro	caracteriza-se	sobretudo	por	serviços:	pequenas	lojas,	oficinas,
laboratórios,	escritórios,	bancos,	restaurantes,	botequins,	além	de	algumas	casas
de	saúde,	cinemas	e	empresas	estatais.	Parecia,	à	equipe	envolvida	no	trabalho
coletivo,	que	era	preciso	mobilizar	aquela	comunidade	para	sua	responsabilidade
social	com	a	educação	das	crianças	e	dos	adolescentes	da	escola.
Esta	era	uma	responsabilidade	histórica	da	orientação	educacional.	Cabia
portanto	à	orientadora	atuar.	E	assim	foi	feito.
Inicialmente	foram	realizadas	algumas	visitas	a	pequenos	comerciantes,	bancos	e
empresários	locais.	Alguns	se	mostravam	receptivos,	outros	fechavam	qualquer
possibilidade	de	diálogo.	Após	as	primeiras	visitas,	foi	fixada	uma	data	para	a
primeira	reunião	escola-comunidade,	sendo	elaborados	os	convites	pela
professora	de	arte,	e	em	seguida	enviados	a	cada	destinatário.Na	data	marcada,	lá	estavam	a	diretora	e	a	orientadora	educacional,	tensas
porque	inseguras,	aguardando	que	os	convidados	chegassem,	“se	é	que	viriam”,
cada	uma	dizia	para	si	mesma,	sem	coragem	de	admitir	para	a	outra	o	seu	receio.
Vieram	poucos,	mas	vieram	alguns.	E	os	que	vieram,	eram	movidos	pelo	desejo
de	colaborar	com	a	escola.	A	parceria	que	se	instalou	foi	bastante	proveitosa	para
a	escola,	embora	tenha	sido	sempre	problemática.	Quem	trabalha	com	resultados
tem	dificuldade	de	compreender	o	ritmo	da	escola	e,	sobretudo,	os	nem	sempre
visíveis	resultados	imediatos.	De	qualquer	modo,	representou	uma	rica
aprendizagem,	tanto	para	a	escola	quanto	para	os	empresários.
Da	primeira	reunião	saíram	algumas	iniciativas	conjuntas,	senão	pela
generosidade	ou	pelo	compromisso	social	de	todos,	pelo	menos,	pela	competição
que	se	instalou	entre	os	participantes	da	reunião.	Houve,	por	exemplo,	um
concurso	de	cartazes,	promovido	por	um	banco;	a	festa	junina	teve	a	colaboração
de	algumas	empresas,	por	meio	de	prendas;	foi	oferecido	um	ônibus	para	levar
os	alunos	e	algumas	professoras	a	uma	exposição	de	pintura;	um	supermercado
criou	oportunidades	de	trabalho	de	meio	expediente	para	meninos	que	faziam
biscates,	ou	que,	como	José,	“se	viravam”	pelas	ruas;	o	Banco	do	Brasil	também
ofereceu	oportunidades	de	estágio	remunerado.
A	escola	começava	a	ser	percebida	como	um	espaço	educativo	da	comunidade.
A	comunidade	começava	a	se	perceber	como	corresposável	pelo	que	acontecia
na	escolha.
A	ação	supervisora	e	a	ação	orientadora
O	que	aconteceu	nesta	escola	poderia	acontecer	sem	a	participação	da
supervisora	e	da	orientadora?
Alguns	diriam	que	qualquer	professor	poderia	fazer	tudo	o	que	as	duas
profissionais,	chamadas	pejorativamente	de	“especialistas”,	realizaram.	Eu	tenho
dúvidas.
Ainda	que	qualquer	professor	pudesse	realizar	o	trabalho	que	as	duas
profissionais	desenvolveram	naquela	escola,	as	funções	supervisora	e
orientadora	estavam	fortemente	presentes,	e	não	me	parece	que	qualquer
professor	pudesse	desempenhá-las.
Em	primeiro	lugar,	porque	há	conhecimentos	específicos	que	tornam	mais
eficiente	e	eficaz	uma	prática.	As	ações	da	supervisora	e	da	orientadora
produziram	resultados,	entre	outras	razões,	porque	ambas	tinham	uma	formação
específica.	O	mesmo	acontece	com	qualquer	especialista	de	qualquer	área	de
conhecimento.	Embora	qualquer	brasileiro	conheça	a	língua	portuguesa,	quem
está	capacitado	a	ensiná-la	na	escola	é	o	professor	de	língua	portuguesa.	Ainda
que	os	diferentes	professores	das	diferentes	áreas	do	conhecimento	ensinem	o
uso	da	língua	portuguesa	em	matemática,	história,	geografia,	estudos	sociais,
ciências,	arte	ou	educação	física,	quem	efetivamente	ensina	a	língua	portuguesa,
com	suas	convenções	e	particularidades,	é	o	professor	especialista	em	língua
portuguesa.	Os	demais	ensinam,	embora	frequentemente	sem	saber	que	o	fazem,
a	língua	em	uso.	Qualquer	pessoa	que	tenha	passado	pela	escola	tem
conhecimentos	de	história,	geografia,	matemática,	ciências	naturais	e	sociais,	no
entanto	quem	pode	ensinar	estas	disciplinas	é	o	especialista	de	cada	uma	das
áreas.	Os	conhecimentos	específicos	só	o	especialista	domina,	e	é	ele,	portanto,
quem	pode	desempenhar	mais	competentemente	a	função	de	professor	da	área.
Isso	porque,	com	a	ampliação	e	o	aprofundamento	dos	conhecimentos
específicos	a	cada	área,	foi	se	tornando	impossível	a	alguém	dominar	todos	os
conhecimentos	de	todas	as	áreas.	O	homem	renascentista	só	foi	possível	até	a
Renascença.	Daí	para	os	nossos	dias	limitamo-nos	a	admirar	Leonardo	da	Vinci,
sabendo	que	a	omnilateralidade	é	uma	das	nossas	utopias,	cada	vez	mais	difícil
de	realizar	numa	sociedade	de	especializações	e	especialistas.
A	supervisora,	como	qualquer	profissional,	em	seu	curso	de	formação	e	em	sua
prática,	prepara-se	para	atuar	como	especialista,	no	caso,	como	coordenadora	do
processo	curricular,	seja	em	sua	formulação,	execução,	avaliação	e	reorientação.
Prepara-se	também	para	atuar	com	o	grupo	de	professores	no	sentido	da
construção	de	uma	competência	docente	coletiva.	E	é	instrumentalizada	para
coordenar	o	processo	de	construção	coletiva	do	projeto	político-pedagógico	da
escola.
É	ela,	em	suma,	a	especialista	em	currículo,	ou	no	jargão	dos	especialistas,	a
“curriculeira”.
Por	que	deslocar	um	professor	para	desempenhar	a	função	supervisora	para	a
qual	não	foi	preparado,	deixando	de	se	dedicar	àquilo	para	que	foi	formado?
Assim	também	no	que	se	refere	à	função	orientadora.	Em	seu	curso	de	formação
e	em	sua	prática,	a	orientadora	foi	se	fazendo	especialista.	Ela	foi	preparada	para
atuar	com	as	famílias	e	a	comunidade,	fazendo	a	articulação	escola-família-
comunidade-sociedade.	É	ela	quem	irá	trazer	dados	indispensáveis	para	a
construção	de	um	currículo	que	responda	às	características,	às	possibilidades,	às
necessidades	e	aos	desejos	dos	alunos.	É	ela	quem	procurará	estabelecer	uma
sintonia	entre	o	trabalho	escolar	e	o	mundo	do	trabalho	que	acontece	fora	da
escola.	É	ela	quem	influirá	para	que	o	trabalho	seja	o	fio	condutor	da	prática
pedagógica,	como	princípio	educativo.	É	ela,	portanto,	quem	contribuirá	para	a
recuperação	da	unidade	teoria-prática,	escola-vida.
Enquanto	o	supervisor	mobiliza	os	professores	para	a	construção	do	currículo	e
para	a	discussão	da	prática	pedagógica,	o	orientador	traz	a	realidade
socioeconômico-cultural	dos	alunos,	em	seus	aspectos	objetivos	e	subjetivos,
para	o	currículo.
É	claro	que	a	escola	pode	funcionar	sem	supervisores	e	orienta-dores,	mas,	fora
de	dúvida,	estes	profissionais	podem	contribuir	para	a	melhoria	do	trabalho
desenvolvido	na	escola.
E	José?
E	José,	herói	de	nossa	pequena	história?
Bem,	José,	embora	personagem	central	de	nossa	história,	foi	o	pré-texto,	pois	o
texto	mesmo	foi	o	rico	processo	de	reorientação	curricular	iniciado	na	escola
pela	ação	conjunta	da	supervisora	e	da	orientadora	educacional.
Nossa	história	conquista	espaços	mais	amplos
Tendo	sido	convidada	a	participar	de	um	Encontro	de	Supervisores,	Orientadores
e	Diretores	de	escolas	da	rede	municipal	de	Caxias,	município	do	estado	do	Rio
de	Janeiro,	fui	surpreendida	com	um	jogral	criado	por	parte	do	grupo	de
orientadores.	Emocionada,	ao	final	lhes	solicitei	uma	cópia,	e,	sem	consultá-los,
transcrevo	a	sua	criação,	pelo	que	ela	revela	de	compromisso	e	de	capacidade	de
luta	de	um	grupo	que	acredita	ter	uma	contribuição	a	dar	na	construção	de	uma
escola	de	qualidade	para	a	classe	trabalhadora,	historicamente	desqualificada	e
alijada	da	escola	que	se	afirma	“democrática”.
Para	não	ser	injusta,	coloco	apenas	o	nome	da	organizadora,	Teresa	Sarmento,	já
que	não	seria	capaz	de	recuperar	os	nomes	de	todos	os	participantes.	Fica	a
minha	homenagem	a	este	grupo	de	batalhadores,	que	numa	quente	manhã	de
dezembro,	encontrou-se	para	me	ouvir	e	para	apresentar	a	sua	síntese	do	que
deve	e	pode	ser	a	orientação	educacional.
Daqui	para	baixo,	a	autoria	é	do	grupo	de	orientadores	da	rede	municipal	de
Duque	de	Caxias.
O	jogral	da	orientação	educacional
(A	relatora)	A	orientação	educacional,	compromissada	com	um	ensino
democrático	e	com	um	ensino	de	qualidade,	busca	uma	ação	mais	abrangente,
saindo	da	visão	psicologizante	e	ideologizada,	para	tentar	compreender	e
interferir	no	processo	pedagógico.
(Todos)	Os	orientadores	educacionais	buscam	uma	ação	mais	abrangente,
atuando	por	meio	dos	professores,	de	todos	os	professores,	de	modo	a	atingir
indiretamente	a	todos	os	alunos.
(Relatora)	A	orientação	educacional,	como	parceira	de	todos	os	segmentos
progressistas,	desvelou	o	discurso	ideológico	que	propunha	a	escolha	de
ocupações	profissionais,	de	acordo	com	as	aptidões,	para	ampliar	a	discussão	das
relações	entre	a	escola	e	o	mundo	do	trabalho,	para	a	comunidade	escolar.
(Todos)	Pensar	criticamente	a	sociedade,	repensando	a	função	do	trabalho	e	da
escola,	influindo	na	formação	do	aluno	crítico,	trabalhador	e	cidadão.	
(Relatora)	A	organização	do	trabalho	e	as	relações	de	trabalho	deverão	ser
debatidas	nas	escolas	com	alunos,	pais	e	professores,	passando	a	fazer	parte
integrantedo	currículo.	Quando	se	afirma	que	não	se	pode	trabalhar	dessa	ou
daquela	maneira	porque	não	deixam,	ou	porque	alguém	impôs	que	fosse	de	outra
forma,	estamos	diante	de	uma	relação	autoritária.
(Todos)	Relação	autoritária?
Sim,	porque	se	de	um	lado	há	alguém	dificultando,	por	outro	lado	há	alguém
aceitando	a	dificuldade	ou	a	imposição.	
(PG1)	Por	comodismo?
(PG2)	Por	omissão?	
(Relatora)	Não	adianta;	o	fato	concreto	é	que	se	estamos	aceitando	levar	adiante
uma	proposta	de	trabalho,	um	projeto	em	que	se	acredita,	isso	significa	lutar,
enfrentar	oposições	e	barreiras.
(PG3)	Como	pode	ser	colocado	o	conceito	de	trabalho	na	escola?
(Relatora)	O	trabalho	deve	ser	colocado	não	só	como	uma	realização	dos
homens,	mas,	também,	como	uma	forma	de	exploração	deste	homem.
(Todos)	E	o	orientador	educacional	como	trabalhador?
Pausa
(Relatora)	É	necessário	que	o	orientador	educacional	compreenda	o	que	é	a
escola	hoje	e	qual	a	sua	função	neste	contexto,	para	que	ele	possa	influir	para	a
sua	transformação.
(Todos)	Ser	competente	é	condição	para	quem	deseja	transformar	a	sociedade.
Pausa
(Relatora)	No	entanto,	isto	não	basta.	É	necessário	aliar	a	competência	técnica	ao
compromisso	político.	Daí	a	importância	do	envolvimento	dos	orientadores
educacionais	nas	questões	relativas	à	sua	categoria.
(Todos)	Participando	da	Associação	de	Classe.
(PG1)	Participando,	em	todos	os	níveis,	das	reivindicações	do	magistério.
(PG2)	Participando,	no	que	lhe	é	específico	e	no	seu	local	de	trabalho,	para	que
todos	tenham	acesso	ao	conhecimento,	ou	seja,	trabalhando	para	a
democratização	do	ensino.
Pausa
(Relatora)	Participando	das	reivindicações	que	hoje	se	colocam,	através	dos
movimentos	sociais:	associações	de	bairro,	comunidades	de	base	e	tantos	outros.
(Todos)	Trabalhando	por	uma	sociedade	mais	justa.
(PG3)	Por	que,	afinal,	tudo	isto?
Pausa
(Relatora)	Porque	se	o	seu	compromisso	é	com	a	transformação	da	sociedade,	é
preciso	um	posicionamento	como	profissionais	e	como	cidadãos.
Se	o	orientador	educacional	opta	por	influir	na	mudança	da	sociedade,	toda	a
direção	de	suas	ações	se	dará	no	sentido	desta	opção.	Ou	seja,	a	direção	de	seu
trabalho	será	a	preparação	do	futuro	cidadão	crítico	e	participativo.
(Todos)	Como	atuar?
(Relatora)	Atuando	em	três	frentes.
(PG1)	A	primeira	é	a	questão	do	trabalho	no	currículo,	parte	integrante	da	vida
de	todos	na	escola.
(PG2)	A	segunda	seria	a	garantia	de	que	todos	tenham	acesso	ao	conhecimento
veiculado	pela	escola.
(Todos)	De	que	maneira	podemos	agir?
Pausa
(Relatora)	Repensando,	junto	com	professores,	pais,	supervisores,	diretores	e
demais	funcionários	envolvidos	na	escola,	os	conteúdos	transmitidos.
(Todos)	Repensar	o	que	é	avaliação	e	como	se	processa.
(PG3)	É	avaliando	o	processo	ensino/aprendizagem,	ou	avaliando	uma	parte	do
processo	–	o	aluno?
(PG1)	São	identificadas	as	falhas	para	se	avaliar	o	trabalho	pedagógico,	ou	se
distribuem	apenas	conceitos?
(Todos)	A	terceira	frente	de	atuação	diz	respeito	à	articulação	entre	as	diferentes
disciplinas	e	o	trabalho.
Pausa
(Relatora)	Para	isso	é	necessário	que	a	vida	do	aluno	seja	o	ponto	de	partida	do
planejamento	global	da	escola;	que	este	envolva	toda	a	comunidade	escolar	–
professores,	alunos,	pais	e	funcionários	–	para	que,	com	base	neste	planejamento
global,	possam	ser	planejadas	as	ações	específicas	de	cada	disciplina.
(Todos)	Entendemos	que	só	assim	os	conteúdos	transmitidos	terão	sentido	para
nossos	alunos	e	possibilitarão	que	eles	compreendam	a	realidade	e	possam	nela
influir.
(PG1)	Acreditamos	ser	este,	talvez,	o	caminho	para	a	aquisição	do	conhecimento
crítico,	que	contribuirá	para	que	os	alunos	atuem	no	sentido	da	transformação
social.
(Relatora)	Mas	são	muitos	os	obstáculos	e	os	desafios	a	serem	enfrentados	na
educação	fundamental.
(PG1)	Baixa	produtividade.
(PG2)	Nível	insatisfatório	de	qualidade	de	ensino.
(PG3)	Prática	de	avaliação	de	desempenho	escolar	inadequada.	
(PG1)	Pouca	criatividade	do	sistema	para	atender	a	grupos	em	situação
específica.
(PG2)	Metodologias	e	processos	inadequados	para	o	trabalho	com	grupos	em
situação	de	risco.	
(PG3)	Inexistência	de	políticas	e	de	comprometimento	mais	amplo	com	as
questões	do	magistério.
(PG1)	Dispersão	na	alocação	de	recursos	destinados	a	investimentos	para
desenvolver	e	aperfeiçoar	o	sistema.	
(PG2)	Enfraquecimento	da	escola	como	instituição-chave	no	processo	ensino-
aprendizagem.
(PG3)	Descontinuidade	das	políticas	educacionais.
(PG1)	Baixa	sustentação	social	de	projetos	pedagógicos	inovadores	e	de
métodos	mais	eficientes	de	administração	educacional.	
(Todos)	O	sistema	educacional	vem	mostrando	incapacidade	de	associar	o
acesso	e	a	permanência,	com	qualidade	e	equidade,	para	uma	clientela	afetada
por	profundas	desigualdades	sociais.
(Relatora)	Para	o	sucesso	escolar	não	basta	oferecer	vagas	em	número	suficiente.
É	preciso	estabelecer	metas	que	possam	deixar	a	escola	mais	atuante	quanto	à
permanência,	com	bom	aproveitamento	dos	alunos	que	a	frequentam.
(Todos)	Vontade	política	para	enfrentar	os	problemas.
Pausa
(PG2)	Política	salarial	e	plano	de	carreira.
(Todos)	Vontade	política	para	enfrentar	os	problemas.
(PG3)	Valorização	profissional.
(Todos)	Vontade	política	para	enfrentar	os	problemas.
(PG1)	Eliminação	das	desigualdades	educacionais.
(Todos)	Vontade	política	para	enfrentar	os	problemas.
Pausa
(Relatora)	Os	orientadores	educacionais	têm	de	estar	comprometidos	de	forma
efetiva	com	a	construção	do	projeto	pedagógico	da	escola,	explicitando	seu
compromisso	político	com	a	classe	trabalhadora,	empenhados	em	promover	a
real	democratização	da	escola	pública,	em	busca	da	qualidade	de	ensino,	que
concretize	a	cidadania,	favorecendo	a	inserção	do	aluno	no	mundo	do	trabalho	e
na	complexa	sociedade	onde	terá	de	conviver	e	que	deverá	transformar.
Pausa
(Todos)	Para	tanto	a	proposta	de	trabalho	da	orientação	educacional	é	por	uma
escola	pública	de	qualidade,	que	articule	trabalho	e	educação.
(Relatora)	Portanto,	o	referencial	teórico-metodológico,	que	embasa	a	prática	do
orientador	educacional	na	escola,	não	poderá	prescindir	de	uma	atualização
continuada,	para	que	ele	possa	estar	preparado	para	exercer	o	seu	papel.
Fechamento	do	jogral
(Relatora)	Lá	vem	o	OE.
(PG1)	Sempre	com	disposição.
(Todos)	Trabalhar,	trabalhar.
(Relatora)	Cadê	o	OE?
(PG2)	Refletindo	sobre	educação.
(Todos)	Integrar,	integrar.
(Relatora)	Lá	vem	o	OE.
(PG3)	Sempre	com	reivindicações.
(Todos)	Lutar,	lutar.
(Relatora)	Cadê	o	OE?
(PG1)	Procurando	soluções.
(Todos)	Atuar,	atuar.
(Relatora)	Lá	vem	o	OE.
(PG2)	Com	a	bandeira	da	transformação.
(Todos)	Transformar,	transformar.
(Relatora)	Cadê	o	OE?
(PG3)	Nos	polos,	junto	com	a	divisão.
(Todos)	Integrar,	integrar.
(Relatora)	Lá	vem	o	OE.
(PG1)	Acreditando	na	educação.
(Todos)	Acreditar,	acreditar.
(Relatora)	Cadê	o	OE?
(PG2)	Junto	ao	Sepe	e	ao	povão.
(Todos)	Melhorar,	melhorar.
(Relatora)	Lá	vem	o	OE.
(Todos)	Dando	adeus	à	omissão.
Assim	falaram	os	orientadores	de	Duque	de	Caxias,	no	dia	15	de	dezembro	de
1994.
Quero	agora	dar	a	palavra	aos	supervisores,	já	que	o	fiz	com	os	orientadores
educacionais.	Dou	a	palavra	a	uma	supervisora	que,	assim	como	o	grupo	de
orientadores	de	Caxias,	tomou	a	palavra,	e	falou	em	seu	nome	e	em	nome	de	sua
categoria.
No	decorrer	do	ano	letivo	de	1994	trabalhei	com	as	supervisoras	e	as
orientadoras	educacionais	ligadas	à	Secretaria	Municipal	de	Educação	do
município	de	Angra	dos	Reis.
A	cada	15	dias	nos	encontrávamos	para	discutir	a	escola,	e	na	escola,	as	práticas
supervisora	e	orientadora.
Quando	aceitei	escrever	um	capítulo	para	o	livro	organizado	por	Mary	Rangel	e
Celestino	Alves	da	Silva	Junior	levei	meu	texto	para	ser	discutido	pelo	“meu
grupo	de	Angra”.	Na	semana	seguinte,	uma	das	supervisoras	trouxe	um	texto
escrito	por	ela,	que,	ainda	segundo	ela,	teria	sido	o	resultado	da	leitura	que	fizera
do	meu	texto.	Meu	texto	teria	provocado	nela	“um	mergulho	em	minha	história
de	professora	e	de	supervisora”.
Transcrevo	o	texto	de	Ritade	Cássia	da	Cunha	Salomão	Barroso,	supervisora	da
rede	pública	de	Angra	dos	Reis,	que	muito	contribuiu	para	que	pudéssemos
construir	algum	conhecimento	sobre	as	possibilidades	da	orientação	e	da
supervisão	na	escola,	quando	ambas	estão	comprometidas	com	a	construção
coletiva	de	um	projeto	político-pedagógico	orgânico	na	escola,	sintonizado	com
um	projeto	emancipatório	de	sociedade.
Com	a	palavra,	portanto,	Rita,	que	fala	melhor	do	que	eu,	em	nome	dos
supervisores	deste	país.
Supervisor	–	Agente	de	mudança	ou	mudança	para	ser	Agente
No	ano	de	1979	eu	acabara	de	sair	do	curso	de	formação	de	professores	com	um
diploma,	muitos	amigos	e	um	monte	de	ideias	que	aos	poucos	iam	se
transformando	em	ideais.
Lembro-me	bem	da	Escola	Municipal	Santos	Dumont,	na	Japuíba,	onde	em
1980	eu	iniciava	minha	trajetória	no	magistério.	
Nos	primeiros	meses	a	vontade	era	de	sair	correndo,	mas,	aos	poucos,	o	desafio
me	levava	a	encarar	com	garra	a	função	de	professora-alfabetizadora	na	antiga
1sn1	(Primeira	série	nível	1),	o	que	hoje	considero	um	grande	equívoco,	mas	que
na	época	parecia	uma	alternativa	interessante.
Nesse	mesmo	tempo,	eu	iniciara	o	curso	na	faculdade	de	Pedagogia,	nas
habilitações	de	magistério	e	de	supervisão.	O	curso	era	em	Campo	Grande,	o	que
exigia	de	nós,	professoras-estudantes,	um	grande	esforço,	pois	nos	deslocávamos
duas	horas	para	ir	e	duas	horas	para	voltar,	conseguindo	retornar	a	nossos	lares	já
de	madrugada.	Isto,	quando	o	ônibus	que	compramos	não	se	dava	ao	luxo	de
quebrar.
Durante	os	quatro	anos	de	faculdade,	tive	um	professor	que	marcou	muito	minha
atuação	futura	como	supervisora,	já	em	1983,	na	Secretaria	Municipal	de
Educação	(onde	comecei	como	estagiária).
Este	professor	colocava-nos	sempre	que	a	ação	supervisora	era	uma	ação	de
parceria,	comunhão	e	troca.	
Naquela	época,	Angra	dos	Reis	era	considerada	Área	de	Segurança	Nacional,	e
nossas	ações	eram	limitadas	e	ousadas	ao	mesmo	tempo.	Limitadas	porque
convivíamos	com	uma	situação	de	ditadura	militar	que	nos	incomodava
sobremaneira,	e	ousadas	porque	fazíamos	coisas	das	quais	nos	orgulhávamos
muito.	Exemplo	disso	foi	o	Iepem	–	Encontro	de	Professores	das	Escolas
Municipais.	Numa	ocasião	em	que	era	proibido	falar,	nós	ousávamos	fazer	o
primeiro	encontro,	para	que	nossos	colegas	começassem	a	repensar	sua	prática
educativa,	e,	melhor	do	que	isto,	começassem	a	avaliar	nossa	própria	prática,	o
que	para	nós	era	muito	importante	e	corajoso.
Conquistamos	espaços,	começamos	a	buscar	intercâmbio	com	outras
instituições,	como	a	UFF	–	Universidade	Federal	Fluminense	–,	que	desde
aquela	época	é	nossa	grande	aliada	e	companheira.	Vide	Manhães,	companheiro
de	lutas	desde	aquele	tempo...
O	trabalho	era	para	nós	uma	grande	emoção,	e,	por	incrível	que	possa	parecer,
nossa	autonomia	era	bastante	grande,	possibilitando-nos	descobrir	muitas	coisas
por	nós	mesmas.	Errávamos,	acertávamos,	mas	éramos	unidos,	coesos,	enfim,
éramos	uma	equipe.	O	secretário	e	a	diretora	do	Departamento	de	Educação	à
época,	apesar	de	representarem	figuras	austeras,	eram	profissionais	altamente
comprometidos	com	a	educação,	e	dispensavam	um	respeito	muito	grande	à
equipe	com	a	qual	trabalhavam,	valorizando-nos	como	pessoas	e	como
profissionais,	o	que	nos	propiciava	sinceridade	em	nossas	críticas	e	ações.
O	tempo	passou,	a	luta	continuou,	e	de	1985	a	1993	minha	trajetória	profissional
foi	um	pouco	conturbada,	dividida	entre	o	município	e	o	estado,	entre	a
supervisão	e	a	direção	de	departamento,	entre	ser	inspetora	escolar	e	elemento
do	promunicípio,	gerente	educacional	do	Núcleo	de	Educação	e	Cultura	e
professora	de	psicologia	do	Centro	de	Formação	de	Professores.
Retornei	à	Secretaria	Municipal	de	Educação	em	janeiro	de	1993,	numa	situação
muito	conflituosa	para	mim,	pois	a	ligação	com	a	Secretaria	era	forte,	as	“feridas
do	saber”	ainda	estavam	muito	vivas	em	mim,	e	o	“novo”	representava	uma
resistência	que,	por	muitos	motivos,	eu	tinha	e	da	qual	não	sabia	como	me	livrar.
O	reencontro	com	a	equipe
Apesar	do	conflito,	a	alegria	de	rever	antigos	colegas	que	ainda	estavam	ali
dava-me	um	novo	ânimo.	E	comecei	a	pensar:	Por	que	não?	Afinal,	ser
profissional	é	isto...
Ser	profissional	é	transpor	barreiras	e	conseguir	repensar	sempre	o	que	se	faz.	
Comecei	atuando	como	inspetora,	função	na	qual	procurei	sempre	tirar,	do
administrativo,	dados	da	pesquisa,	para	que	pudesse	atuar	no	campo	pedagógico.
Este	era	um	momento	difícil	para	nós,	pois	todos	os	orientadores	e	supervisores
haviam	sido	deslocados	para	as	escolas,	com	o	apelido	de	“orientadores
pedagógicos”,	ou	OP,	“apelido	do	apelido”.	Com	a	nova	denominação,	vinha	a
nova	orientação	de	que	deveríamos	realizar	o	mesmo	trabalho,	sem	que,	em
nenhum	momento,	nos	tivessem	dito	o	que	pretendiam	que	efetivamente
fizéssemos.	
Perdíamos	a	identidade,	pois	já	não	seríamos	um	grupo	de	supervisores	e
orientadores	que	tentavam	se	articular	a	partir	de	nossas	diferenças,	e
passávamos	a	ser	cobrados	de	algo	que	não	nos	tinha	sido	explicitado,	e	para	o
que	não	havíamos	sido	preparados	ou	consultados	(não	vai	aqui	nenhuma	crítica
a	esse	ou	àquele	colega,	mas	à	situação	em	si,	com	a	qual	deparávamos).
Ação	orientadora	e	supervisora	–	Como	podem	se	articular?
Acho	que	o	grande	passo	inicial	é	a	gente	querer	estar	junto,	não	só	com	aquele
colega	da	escola,	mas	com	todos	os	colegas	da	Rede.	A	ação	supervisora	e
orientadora	se	dá	a	partir	do	momento	em	que	partimos	para	um	conhecimento
maior	do	que	temos,	do	que	pretendemos	fazer	com	o	que	temos	e,	sobretudo,
por	que	fazemos.
A	partir	daí,	a	construção	é	feita	com	a	base,	ou	seja,	você	conhece	para	adaptar,
adapta	para	possibilitar	e	possibilita	para	alcançar.	Cria-se	naturalmente	uma
cadeia	de	contribuições	e	recursos	que	possibilitam	uma	ação	integrada,	não	só
de	orientadores	e	supervisores,	mas	de	pais,	alunos,	pessoal	administrativo,
pessoal	de	apoio,	comunidade,	Secretaria	Municipal	de	Educação.	Esta	cadeia,
quando	se	instala,	mobiliza	todos,	na	direção	do	professor	que	ensina	e	do	aluno
que	aprende.
Como	e	o	que	dificulta
Os	antigos	tinham	um	ditado	que	dizia:	O	que	começa	errado	acaba	errado.	
Está	aí	o	grande	segredo!	
A	maneira	como	passamos	nossa	proposta	ou	iniciamos	nossa	discussão	é	ponto
fundamental	no	caminho	a	ser	trilhado	posteriormente.	
A	resistência	se	dá	no	momento	em	que	alguém	chega	dizendo	que	tudo	o	que
você	fez	está	errado,	arcaico	etc.	
Reporto-me	ao	texto	de	Regina	e	encontro	a	prática	levando	à	teoria	através	do
conhecimento	espontâneo.	É	uma	teoria	com	sentido.	Penso	que	a	teoria	pura,
apenas	para	reflexão,	é	cansativa	e	não	dá	conta	da	capacidade	de	compreensão	e
ampliação	do	trabalho	que	está	sendo	realizado	aqui	e	agora.	Daí	eu	ter	feito,	em
nosso	segundo	encontro	com	Regina,	a	colocação	de	que	o	professor	sabe	que
precisa	mudar,	mas	que	ele	precisa	primeiro	mudar	sua	prática,	para	encontrar
uma	nova	teoria,	simultaneamente.	Não	sendo	assim,	ele	fica	como	está,	pois	é
mais	seguro.	Ninguém	muda	se	não	tiver	chão.
Conclusão
Poderia	enumerar	algumas	condições	para	que	a	ação	educacional	(gostaria	de
assim	denominá-la)	pudesse	se	dar	com	qualidade	e	parceria.
1.	Respeitar	a	história	do	profissional,	seja	ela	qual	for.
2.	Antes	de	achar	que	seu	projeto	é	o	melhor	do	mundo,	lembre-se	que	os	outros
pensam,	e	pensam	pensar	certo.
3.	A	escola	não	é	uma	instituição	isolada,	portanto	devemos	compartilhar	nossas
experiências	com	outras	escolas	das	diversas	redes	de	ensino.
4.	Não	devemos	julgar	os	profissionais	apenas	pelas	universidades	ou	faculdades
que	cursaram,	ou	pela	biblioteca	pessoal	que	possuem.
5.	Nem	sempre	aquilo	que	se	ouve	ou	vê	é	realmente	o	que	é.
6.	É	preciso	que	sejam	criados	em	Angra	dos	Reis,	ou	facilitado	aos
profissionais	de	Angra,	o	acesso	a	cursos	de	especialização,	de	extensão,	de
mestrado	e	de	doutorado.
Sendo	assim,	o	que	se	entende	por	ação	educativa	é	uma	ação	de	valorização	de
todos	os	profissionais	e	de	todos	os	alunos.	Nós	pregamos	isso	o	tempo	todo,	em
nossa	ação	com	os	professores,	para	que	seja	colocadoem	prática	com	os	alunos.
No	entanto,	não	somos	capazes	de	fazê-lo	com	nossos	companheiros	ao	lado.
Há	15	anos	venho	tentando	contribuir	para	a	construção	de	uma	escola	pública
de	qualidade.	Muitos	profissionais,	com	os	quais	convivi,	foram	muito
importantes	para	a	seriedade	com	que	conduzo	hoje	minha	vida	profissional.	O
tradicional	e	o	moderno	são	tempos	fundamentais,	para	que	encontremos	nosso
equilíbrio.
A	“mudança”	que	necessitamos	brota	de	nosso	dia	a	dia,	de	nossa	capacidade	e
sensibilidade	para	ver	aquilo	que	pode	parecer	óbvio	para	outros.
Já	presenciei	cenas	de	risos	e	de	expressão	de	falsos	valores,	que	me
entristeceram	profundamente.	Profissionais	que	se	encantam	com	meras
palavras,	e	riem	de	sua	própria	ação	na	História.
Triste	“saber”!!!
Triste	“sentir”!!!
Eu	me	orgulho	muito	de	tudo	o	que	fiz	até	hoje,	seja	como	professora,	como
supervisora	ou	como	inspetora.	Foram	e	são	valores	que	me	levaram	e	levam	a
estar	aqui	e	agora	com	vocês,	sem	o	menor	medo	e	com	toda	a	humildade,	e
poder	dizer:	Estarei	sempre	pronta	a	recomeçar	e	a	ser	um	agente	de	mudança.
Esta	é	a	minha	contribuição	para,	mais	uma	vez,	repensarmos	a	supervisão	e,
quem	sabe,	podermos	contribuir	para	a	melhoria	do	trabalho	pedagógico	e
educativo	na	escola	pública	brasileira.
NOTAS
[1]	“Supervisão	escolar	–	Da	ação	exercida	à	ação	repensada:	Uma	experiência
na	Rede	Municipal	de	Ensino	(RME)	de	Porto	Alegre,	RS”.	A	tese	transformou-
se	num	livro	editado	pela	Edipucrs	em	março	de	1995,	intitulado	Supervisão
escolar:	Da	ação	exercida	à	ação	repensada	.
[2]	Conselho	Administrativo	e	Pedagógico	(CAP):	órgão	consultivo	e	normativo
da	escola,	presta	assessoramento	ao	diretor	em	assuntos	administrativos	e
pedagógicos,	sendo	constituído	por	diretor,	vice-diretor,	supervisor,	orientador
educacional	e	representante	do	corpo	docente.
[3]	Agentes	educacionais	compreendidos	como	profissionais	e	trabalhadores	de
educação.
[4]	Regente	de	classe	é	o	professor	unidocente	ou	o	titular	de	uma	disciplina
específica.
[5]	Apoiado	em	acordos	gerais	estabelecidos	entre	o	Brasil	e	os	Estados	Unidos,
o	Ministério	de	Educação	e	Cultura	solicitou,	em	11/4/1956,	assistência	técnica	à
Missão	Norte-Americana	de	Cooperação	Técnica	no	Brasil	(Usom-B)	para	a
criação	de	um	centro	experimental	de	programa	piloto	de	educação	elementar
em	Belo	Horizonte.	Em	22/6/1956	foi	autorizado	o	planejamento	do	programa	e
assinado	acordo	com	a	universidade	de	Indiana	para	realização	de	cursos	para
brasileiros	que	viriam	a	atuar	naquele	programa.	Em	15/1/1957,	o	Diário	Oficial
publicou	portaria	do	ministro	da	Educação	e	Cultura	Clóvis	Salgado,	atribuindo
ao	Inep	(Instituto	Nacional	de	Estudos	e	Pesquisas	Educacionais)	a	execução	do
programa;	foram	nomeados	seus	codiretores	Thomas	A.	Hart	(responsável	pela
Divisão	de	Educação	da	Usom)	e	Abgart	Renault	(secretário	de	Estado	da
Educação	e	Cultura	de	Minas	Gerais).	Como	diretores	técnicos	responsáveis	pela
administração	do	centro	piloto	no	Instituto	de	Educação,	assumiram	o	recém-
nomeado	diretor	do	Instituto	de	Educação,	Mário	Casasanta,	e	Charles	M.	Long,
da	Usom.	O	Pabaee	iniciou	suas	atividades	em	julho	de	1957.	Em	maio	de	1964,
cessou	a	participação	americana	direta	na	administração,	mas	as	atividades	se
mantiveram;	então	o	Pabaee	passou	a	ser	dirigido	por	Lyra	Paixão.	Em	6/5/1965,
o	Pabaee	transformou-se	na	Divisão	de	Aperfeiçoamento	(DAP)	do	Centro
Regional	de	Pesquisas	Educacionais	João	Pinheiro.
[6]	Sobre	a	Escola	de	Aperfeiçoamento,	consultar	Peixoto	(1983)	e	Prates
(1989).
[7]	Para	realizar	esta	pesquisa,	as	autoras	contaram	com	o	apoio	do	CNPq,	do
Inep,	da	Fapemig	e	da	UFMG.	Parte	do	trabalho	de	pesquisa	foi	realizada	como
atividade	das	autoras	na	qualidade	de	docentes	da	Faculdade	de	Educação	da
UFMG.	Atualmente	Léa	Pinheiro	Paixão	é	professora	da	UFF,	e	Edil
Vasconcellos	de	Paiva,	da	Uerj.
[8]	No	acordo	celebrado	em	22/6/1956,	os	objetivos	foram	assim	enunciados:	“1.
Formar	quadros	de	instrutores	de	professores	de	Ensino	Normal	para	diversas
Escolas	Normais	mais	importantes	do	Brasil.	2.	Elaborar,	publicar	e	adquirir
textos	didáticos	tanto	para	as	Escolas	Normais	como	para	as	Elementares.	3.
Enviar	aos	Estados	Unidos,	pelo	período	de	um	ano,	na	qualidade	de	bolsistas,
cinco	grupos	de	instrutores	de	professores	de	ensino	normal	e	elementar
recrutados	em	regiões	representativas	do	Brasil	que	ao	regressarem	serão
contratados	pelas	respectivas	escolas	normais	para	integrarem	os	quadros	de
instrutores	de	professores	pelo	período	de	2	anos.”
[9]	No	decorrer	da	implantação	do	Pabaee,	o	diretor	do	Instituto	de	Educação	foi
se	tornando	figura	secundária	na	administração.	As	decisões,	parece,	eram
tomadas	pelos	americanos,	em	contatos	com	Renault.	A	direção	do	Programa	se
fazia,	formalmente,	em	dois	níveis.	Havia	dois	codiretores	e	dois	diretores
administrativos.	Ao	se	implantar	o	Programa,	Hart	e	Renault	eram	os	codiretores
e	assumiram	a	direção	administrativa	Casasanta	e	Schwab.	Mais	tarde	foram
nomeados	codiretores	norte-americanos	Charles	H.	Long,	Philip	K.	Schwab,
Maurice	Norton	e	Crayton	T.	Jackson.	Abgar	Renault	manteve	a	codireção
brasileira	do	Programa	em	todo	o	período.	Na	direção	administrativa,	Casasanta
foi,	depois,	substituído	pelos	diretores	do	instituto	de	Educação,	que	o
sucederam	no	cargo:	Manuel	Casasanta	e	José	Mesquista	de	Carvalho.
[10]	Não	podemos	esquecer	que	o	mito	grego	concebe	as	musas,	de	quem	a
poesia	receberia	um	lampejo	inspirador,	como	filhas	de	Zeus	e	de	Mnemósine,	a
deusa	da	memória,	que	representaria	uma	guardiã	contra	o	esquecimento.
[11]	Já	em	1988,	Jurandir	F.	Costa	vem	usando	essa	expressão	para	analisar	“o
descrédito	das	leis	e	o	ataque	ideológico	à	ideia	do	sujeito	moral	ideal”	(1994,	p.
40),	referenciando-se	em	estudos	de	Sloterdijk.
[12]	“Balançamos	em	movimentos	pendulares	entre	duas	esferas	de	valor:	uma
indignada	e	furiosa,	outra	generosa	e	condescendente,	e	acreditamos	com	isso
salvar	a	própria	pele.”	(Castello	1994,	p.	14).
[13]	A	exceção	mais	clara	se	inscreve	nas	administrações	do	PT	que,	pela
própria	ideologia	partidária,	confere	um	tratamento	especial	à	educação	e	à
saúde.
[14]	Pesquisa	recente	feita	pelo	sindicato	de	professores	de	Santa	Catarina
mostrou	que	um	terço	dos	professores	deseja	mudar	de	profissão	(	Veja	,
24/5/1995).
[15]	Quantos	jograis	e	jogralesas,	adivinhos	e	adivinhas	foram	condenados	pela
memória	e	pelo	prazer	que	exibiam,	que	eram	entendidos	como	perigosas
parcerias	com	o	diabo.
[16]	Antes	de	Nóvoa	1992,	histórias	de	vida	de	professores	foram	estudadas
como	método	para	entender	o	magistério	e	a	educação	de	docentes	por	autores
como:	Ozouf	1967;	Muel	1977;	Huberman	1987;	Casey	1992;	Stephen	e
Goodson	1992	.
[17]	Dando	a	palavra	a	Bourdieu	(1988,	p.	51)	vamos	ouvi-lo	enfatizando	que:
“Os	campos	sociais	[...]	só	podem	funcionar	na	medida	em	que	haja	agentes	que
invistam	neles,	nos	mais	diferentes	sentidos	do	termo	investimento,	e	que	lhes
destinem	seus	recursos	e	persigam	seus	objetivos,	contribuindo,	assim,	por	seu
próprio	antagonismo,	para	conservar-lhes	a	estrutura,	ou,	sob	certas	condições,
para	transformá-los”.
[18]	A	“Primera	Convención	Americana	de	Maestros:	Primarios,	secundarios	y
universitarios”,	realizada	em	Buenos	Aires	em	1928,	já	recomendou	“às
entidades	do	magistério	uma	vinculação	efetiva	com	as	organizações	de
trabalhadores	para	secundar	ativamente	a	obra	de	melhoramento	cultural	do
proletariado	americano...”	Rama,	German	1963.
[19]	Em	trabalho	anterior	(Linhares	1993)	trabalhamos	as	raízes	populares	da
escola	e	da	universidade	no	Uruguai	e	suas	íntimas	relações	com	a	construção	da
identidade	nacional	e	a	luta	dos	trabalhadores.	A	autonomia	universitária,	que
implicou	a	participação	de	estudantes	e	egressos	nas	decisões	universitárias,	foi
conquistada	em	1908.
[20]	O	presente	trabalho	é	resultado	de	pesquisas	desenvolvidas	entre	UFRGS	e
PUCRS,	de	1990	a	1993,	com	base	no	tema	“Construindo	um	processo
avaliativo	pela	via	da	ação	comunicativa,	crítica	e	emancipatória	e	suas
possibilidades	no	cursode	formação	de	especialistas	em	educação”,	por	meio	de
equipe	composta	por	Maria	Helena	Klein	(UFRGS),	Tereza	H.	Lovatel	(UFRGS)
e	Marilu	Fontoura	de	Medeiros	(PUCRS/UFRGS).
[21]	Pesquisas	desenvolvidas	com	referencial	equivalente,	embora	com	equipes
diferenciadas:	uma	delas	trata	da	relação	trabalho	da	universidade	e	1º	grau	de
ensino	(PUCRS	e	UFRGS)	e	outra,	de	paradigmas	ideológicos	e	consciência
moral	presentes	na	educação	ambiental	(PUCRS	e	UFRGS).
[22]	Excertos	de	uma	das	pesquisas	–	a	da	construção	de	uma	proposta	de
avaliação	–	é	objeto	deste	relato	e	reflexão.
[23]	O	discurso,	na	perspectiva	habermasiana,	representa	a	possibilidade	de	uso
de	atos	de	fala	voltados	para	o	entendimento	e	fundados	na	argumentação
intersubjetivamente	estabelecida.	Nele,	fatos,	vivências	e	normas	são
tematizados	em	suas	pretensões	de	verdade;	ou	seja,	implicam	o	uso	de	atos
ilocucionários,	diferentemente	dos	atos	instrumentais	e	estratégicos
(perlocucionários),	que	visam	ao	êxito	e	ao	domínio.	O	discurso	estabelece	a
condição	para	a	tematização	de	verdades	consideradas	ilegítimas.
[24]	As	questões	tematizadas	ao	longo	do	processo	avaliativo	contemplaram
temas	que	envolviam	a	organização	das	disciplinas,	a	estrutura	administrativa,	a
dimensão	político-pedagógica,	entre	outros,	como	parte	da	estrutura	curricular,
buscando	desvelar	os	reais	nexos	entre	teoria	e	prática.
SOBRE	OS	AUTORES
Antonia	da	Silva	Medina	é	doutora	em	Educação	pela	Pontifícia
Universidade	Católica	do	Rio	Grande	do	Sul,	onde	atuou	nos	cursos	de
mestrado	e	doutorado.
Celestino	Alves	da	Silva	Junior	(org.)	é	livre-docente	e	professor	da
graduação	e	dos	cursos	de	mestrado	e	doutorado	em	Educação	da
Universidade	Estadual	Paulista.
Célia	Frazão	Linhares	é	doutora	e	livre-docente	em	Educação	e	realizou	seu
pós-doutorado	em	Políticas	Educacionais	e	Avanços	Tecnológicos	na
Universidad	Complutense	de	Madrid	e	na	Universisy	of	London.	É
professora	titular	de	Política	Educacional	da	Universidade	Federal
Fluminense,	participando	da	graduação	e	dos	cursos	de	mestrado	e
doutorado	em	Educação.
Edil	V.	de	Paiva	é	doutora	em	Educação	pela	Universidade	de	Pittsbrugh	e
professora	da	Faculdade	de	Educação	da	Universidade	do	Estado	do	Rio	de
Janeiro,	atuando	na	graduação	e	no	mestrado.
Léa	Pinheiro	Paixão	é	doutora	em	Ciências	da	Educação	pela	Universidade
Paris	V	e	professora	titular	de	Sociologia	da	Educação	da	Universidade
Federal	Fluminense,	onde	atua	na	graduação	e	nos	cursos	de	mestrado	e
doutorado	em	Educação.
Marileusa	Moreira	Fernandes	é	mestre	em	Educação	pela	Universidade	de
São	Paulo	e,	além	de	supervisora,	desenvolve	trabalhos	de	planejamento	e
coordenação	na	Secretaria	Estadual	de	Educação	de	São	Paulo.
Marilu	Fontoura	de	Medeiros	é	doutora	em	Ciências	Humanas	pela
Universidade	Federal	do	Rio	Grande	do	Sul,	onde	é	professora	titular.
Integra	também	os	cursos	de	mestrado	e	doutorado	em	Educação	da
Pontifícia	Universidade	Católica	do	Rio	Grande	do	Sul.
Mary	Rangel	(org.)	é	doutora	em	Educação	Brasileira	pela	UFRJ.	É
professora	titular	de	didática	da	UFF,	atuando	na	graduação	e	nos	cursos	de
mestrado	e	doutorado	em	Educação.	É	também	professora	titular	da	área
de	ensino-aprendizagem	da	Universidade	do	Estado	do	Rio	de	Janeiro,	com
atividades	na	graduação	e	no	curso	de	mestrado	em	Educação.
Regina	Leite	Garcia	é	doutora	em	Educação	Brasileira	pela	UFRJ	e
realizou	seu	pós-doutorado	nas	Universidades	de	Londres	e	de	Wisconsin-
Madison.	É	professora	titular	em	alfabetização	da	UFF,	onde	atua	na
graduação,	na	pós-graduação	latu	sensu	em	Alfabetização,	como
coordenadora,	e	nos	cursos	de	mestrado	e	doutorado	em	Educação.
OUTROS	LIVROS	DOS	AUTORES
MÉTODOS	DE	ENSINO	PARA	A	APRENDIZAGEM	E	A	DINAMIZAÇÃO
DAS	AULAS	–	E-BOOK
Mary	Rangel
SUPERVISÃO	E	GESTÃO	NA	ESCOLA:	CONCEITOS	E	PRÁTICAS	DE
MEDIAÇÃO	–	E-BOOK
Mary	Rangel	(org.)
SUPERVISÃO	PEDAGÓGICA:	PRINCÍPIOS	E	PRÁTICAS	-	EBOOK
Mary	Rangel	(org.)
http://www.papirus.com.br/livros_detalhe.aspx?chave_livro=4185
http://www.papirus.com.br/livros_detalhe.aspx?chave_livro=4134
http://www.papirus.com.br/livros_detalhe.aspx?chave_livro=4382
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Capa:	Fernando	Cornacchia
Foto	de	capa:	Rennato	Testa
Copidesque:	Lúcia	Helena	Lahoz	Morelli
Revisão:	Antônio	Carlos	R.	da	Silva	Jr.	e	Cristiane	Rufeisen	Scanavini
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Coordenação:	Ana	Carolina	Freitas
Produção:	DPG	Editora	e	Papirus	Editora
Revisão:	Roberta	Munhoz	Alecrim
Exceto	no	caso	de	citações,	a	grafia	deste	livro	está	atualizada	segundo	o	Acordo
Ortográfico	da	Língua	Portuguesa	adotado	no	Brasil	a	partir	de	2009.
Proibida	a	reprodução	total	ou	parcial	da	obra	de	acordo	com	a	lei	9.610/98.
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	Cover Page
	Nove olhares sobre a supervisão
	SUMÁRIO
	APRESENTAÇÃO
	1. SUPERVISOR ESCOLAR: PARCEIRO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DO PROFESSOR
	2. O PABAEE E A SUPERVISÃO ESCOLAR
	3. O DIREITO AO SABER COM SABOR. SUPERVISÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA ESCOLA PÚBLICA
	4. ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA PÚBLICA: O PEDAGÓGICO E O ADMINISTRATIVO NA AÇÃO SUPERVISORA
	5. A OPÇÃO DA SUPERVISÃO DIANTE DA AMBIVALÊNCIA
	6. PARADIGMA DE AVALIAÇÃO EMANCIPATÓRIA E A AÇÃO SUPERVISORA: CIDADANIA E ESPAÇO PÚBLICO[20]
	7. CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL DO SUPERVISOR, COMO ESPECIALISTA EM EDUCAÇÃO, NA AMÉRICA LATINA
	8. JOSÉ – DE DIA ALUNO DA ESCOLA, DE NOITE MENINO DE RUA
	NOTAS
	SOBRE OS AUTORES
	OUTROS LIVROS DOS AUTORES
	REDES SOCIAIS
	CRÉDITOS

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