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TÓPICO 3
AS FUNÇÕES DA LITERATURA
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
Assim como a arte pode ter um conceito mais comum, que está ligado 
ao belo, à apreciação, essa é, também, uma das definições mais recorrentes de 
literatura, sendo que, nesse viés, a literatura não teria outro compromisso além 
do estético. Essa é a primeira função da literatura, a estética. Seria assim a 
contemplação do belo. 
No entanto, a literatura também pode ser pragmática; atende a anseios 
ideológicos de determinados grupos; atua como forma de protesto à política e 
à sociedade; informa, de maneira particular, ativando sentimentos e sensações; 
funciona como catarse, de forma a purificar o espírito do autor e do leitor.
São essas as funções da literatura e, de acordo com o descrito acima, são 
nomeadas como: função cognitiva, político-social, pragmática, catártica e lúdica. 
Veremos com mais detalhes cada uma delas a seguir.
2 IDENTIFICAÇÃO DAS FUNÇÕES DA LITERATURA
Assim como outras formas de arte, a literatura tem o intuito de mobilizar 
sentimentos e sensações através da palavra, não se trata apenas de usá-la como 
meio de comunicação, embora também o faça. Enquanto outros textos têm uma 
finalidade talvez mais objetiva, a arte literária permite transpor o mundo do nosso 
cotidiano sem dele se perder, permitindo-se à subjetividade dos textos de caráter 
conotativo, ou seja, que adquirem uma interpretação polissêmica. 
Apesar disso, a literatura está ligada à sociedade que representa, afinal, 
os escritores são cidadãos de um meio social específico. Dessa forma, é comum 
ouvirmos que o artista recria a realidade, tornando-a mais interessante e, por 
vezes, mágica ou mística. 
O que vamos observar a seguir é que a literatura não tem uma finalidade 
específica, porém não é ingênua, nem vaga, não acontece simplesmente ao acaso, 
ela exerce várias funções em relação ao público leitor que vai desde a contemplação 
da beleza à emotividade e à mobilização política e social. 
UNIDADE 1 | LITERATURA: QUE ARTE É ESSA?
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NOTA
Conotativo: que tem sentido figurado, diferente daquele dicionarizado, quando 
uma palavra ou expressão adquire novos sentidos. 
Polissêmica: que pode ter diferentes sentidos conforme o contexto e os sujeitos envolvidos 
(nesse caso, escritor/leitor/sociedade).
2.1 FUNÇÃO ESTÉTICA
Podemos afirmar que esta talvez seja a mais representativa das funções 
da literatura, visto que se encontra mesmo no cerne daquilo que a maioria dos 
conceitos aponta sobre o que vem a ser arte e literatura. Como identificamos 
neste material, ao falar sobre a literatura e seus conceitos, ela tem o sentido de 
fenômeno estético e produção artística. É o fazer estético, criativo, que difere o 
texto literário do científico, jornalístico etc. 
Não é apenas o tema que toca o leitor, mas principalmente a maneira 
como ele é retratado, a maneira como ele interpela o seu público, os sentimentos 
e emoções que desperta. Não se trata apenas de dizer, mas principalmente a 
maneira como é dito. 
A capacidade de apreciar o belo, o bonito e as sensações que sentimos em 
contato com a obra literária se relacionam ao emprego adequado da metrificação, 
do ritmo, da rima, das figuras de linguagem, da articulação de personagens, 
estruturação do enredo etc. 
Olavo Bilac, poeta brasileiro que muito se esmerou em utilizar técnicas 
perfeitas na produção de sua literatura, expressa seu ideal de escritor no poema 
Profissão de fé, comparando o trabalho do poeta à produção de uma joia. 
Invejo o ourives quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor.
Por isso, corre, por servir-me,
Sobre o papel
A pena como em prata firme
Corre o cinzel.
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase: e, enfim,
TÓPICO 3 | AS FUNÇÕES DA LITERATURA
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No verso de ouro engasta a rima
Como um rubi.
Quero que a estrofe cristalina
Dobrada ao jeito
Do ourives saia da oficina
Sem defeito:
Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por te servir, Deusa serena,
Serena Forma!
Nota-se a preocupação estética tanto pelas palavras do poeta quanto pela 
apresentação das rimas e da estrutura do poema em questão. 
Vinícius de Moraes escreveu sonetos, sempre se preocupando com as 
características formais. O soneto, por natureza, deve sempre ser composto por 
duas estrofes de quatro versos (quartetos) e duas estrofes de três versos (tercetos), 
se não for assim, não será um soneto. 
Além disso, o escritor traz a seus poemas melodia, rima e métrica perfeita. 
O que nos leva a compreender: existe uma preocupação com a forma, prevista pela 
função estética. Você pode notar que aqui fazemos a escanção de cada verso do poema 
(divisão em sílabas poéticas), de maneira que se observa mesmo uma preocupação 
matemática do poeta ao fazer cada verso com o mesmo número de sílabas. 
Soneto de Fidelidade
De/ tu/do ao/ meu/ a/mor/ se/rei/ a/ten/to
An/tes/ e /com/ tal /ze/lo, e/ sem/pre, e/ tan/to 
 Que/ mes/mo em/ fa/ce/ do/ mai/or/ en/can/to 
 De/le /se en/can/te /mais/ meu/ pen/sa/men/to
Que/ro/ vi/vê/-lo em/ ca/da/ vão/ mo/men/to 
 E em/ seu/ lou/vor/ hei/ de es/pa/lhar/ meu/ can/to 
 E/ rir/ meu/ ri/so e/ de/rra/mar/ meu/ pran/to 
 Ao/ seu/ pe/sar/ ou/ seu/ con/ten/ta/men/to
E as/sim/ quan/do/ mais/ tar/de/ me/ pro/cu/re 
 Quem/ sa/be a/ mor/te, an/gús/tia/ de/ quem/ vi/ve 
 Quem/ sa/be a/ so/li/dão/, fim/ de/ quem/ a/ma
Eu/ pos/sa/ me/ di/zer/ do a/mor (que/ ti/ve): 
 Que/ não/ se/ja i/mor/tal,/ pos/to /que é/ cha/ma 
 Mas/ que/ se/ja in/fi/ni/to en/quan/to/ du/re
 
Vinícius de Moraes
UNIDADE 1 | LITERATURA: QUE ARTE É ESSA?
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Veja que as rimas são as mesmas em cada verso das duas primeiras estrofes 
e se intercalam na penúltima e última estrofe. Quanto à métrica, temos um soneto 
decassílabo, ou seja, todos os versos têm dez sílabas poéticas, que não são contadas 
como na divisão de sílabas de palavras para outros fins. As sílabas poéticas fazem-se 
de acordo com a sonoridade, de maneira que, por vezes, a sílaba final de uma palavra 
aglutina-se à inicial de outra, geralmente isso acontece quando há encontro de vogais. 
Isso pode parecer um pouco complexo agora, mas não se preocupe, as 
regras de metrificação serão estudadas na segunda unidade deste material. Nesse 
momento, as trouxemos com o intuito de exemplificar o seu uso como uma das 
regras estruturais com vistas à estética literária.
Apesar de a preocupação estética estar no cerne da produção literária, os 
textos podem ter funções práticas, como informar e fazer perceber o conhecimento. 
É o que veremos a seguir ao tratar da função cognitiva.
2.2 FUNÇÃO COGNITIVA
Entende-se por função cognitiva aquela em que o escritor descreve a 
percepção do conhecimento de maneira particular, a forma pessoal como visualiza 
o mundo ao seu redor é o espaço em que razão e emoção se fundem. 
Leia o poema a seguir e observe que, além das características do gênero 
poesia, como o ritmo e sonoridade, a informação transmitida faz parte do 
cotidiano, porém o texto literário está impregnado da emoção, da percepção 
pessoal de uma dada realidade. O poema informa uma realidade a partir do 
ponto de vista do eu lírico. 
O bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa, 
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão, 
Não era um gato, 
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem. 
Manuel Bandeira
Analisemos agora uma reportagem que trata do mesmo tema:
TÓPICO 3 | AS FUNÇÕES DA LITERATURA
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Homem cata comida no lixo perto de local de reunião da Rio+20
Ele contou que recolhe restos de carne crua para alimentar a família. 
Sem trabalho, ele mora nas ruas do Rio de Janeiro há oito anos.
Um homem foi visto catando comida no lixo em frente ao prédio onde 
ocorria uma reunião sobre segurança alimentar da Rio+20. O flagrante foi 
feito bem em frente ao Centro de Convenções Sul América, a Cidade Nova, no 
Centro do Rio de Janeiro, durante uma reportagem para o Globo Rural, nesta 
sexta-feira (22).Como mostrou o RJTV, Luciano da Silva, de 26 anos, contou que há oito 
anos mora nas ruas e depende dos restos de comida para sobreviver. O que ele 
cata no lixo serve de alimento para toda a família. Como não trabalha, ele diz 
que costuma pegar no lixo pedaços de carne crua e de comida pronta.
O flagrante foi feito no dia em que o documento final da Rio+20 foi 
divulgado. Entre os temas tratados está justamente a erradicação da pobreza.
FONTE: HOMEM CATA COMIDA NO LIXO PERTO DE LOCAL DE REUNIÃO DA RIO+20. Rio de 
Janeiro, 22 jun. 2012. Disponível em: <http://g1.globo.com/natureza/rio20/noticia/2012/06/
homem-cata-comida-no-lixo-perto-de-local-de-reuniao-da-rio20.html>. Acesso em: 23 abr. 2017.
Nesse último texto, o tema é bastante semelhante ao do poema de Manuel 
Bandeira, porém é escrito de maneira impessoal, tem caráter comunicativo e não 
explora aspectos emotivos. Poderíamos ainda dizer, segundo algumas definições 
de literatura, que essa característica de sobriedade e imparcialidade diante da 
informação categoriza esse segundo texto como não literário. 
Tanto o poema quanto a reportagem têm caráter informativo, porém 
o primeiro imprime uma marca pessoal e podemos até dizer que, além disso, 
caminha para uma crítica social. Este aspecto, aliás, é trabalhado pela função 
político-social ou engajada, sobre a qual trataremos a seguir. 
2.3 FUNÇÃO POLÍTICO-SOCIAL OU ENGAJADA
Compreende-se como aquela que trata de problemáticas características de 
determinado contexto espaçotemporal. Conforme Paviani (2003, p. 85), “a arte em 
sua suprema determinação é um passado. No momento atual cabe antecedência 
à reflexão”. Ou seja, nessa perspectiva, a arte como função social deve prevalecer 
à perspectiva de existência da arte pela arte. Segundo ele, Hegel afirmava que 
“A ciência da arte é muito mais necessária em nossa época do que em outras nas 
quais a arte chegava por si mesma a obter inteira satisfação” (PAVIANI, 2003, p. 
85). Contemporaneamente, a arte e a literatura adquirem o espaço de discussão 
político-social, retrata as carências da sociedade atual.
http://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/cidade/rio-de-janeiro.html
UNIDADE 1 | LITERATURA: QUE ARTE É ESSA?
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O poema O bicho, que usamos para tratar da função cognitiva, ao mesmo 
tempo que explicita uma realidade de maneira pessoal, traz uma crítica social a 
respeito das desigualdades sociais, de forma que, além da função cognitiva, traz 
também a função de literatura engajada. Um autor brasileiro de bastante destaque 
nesse aspecto é Ferreira Gullar, definido por Costa (2017, p. 58) como escritor que 
tem “autenticidade temática pelo engajamento político-social; na verdade, um 
letal ‘punhal de fina lâmina’ quando ativista verbal, o que lhe garante lugar de 
destaque na poesia brasileira”. 
Leia o poema a seguir e observe nele a função de que estamos falando.
Não há vagas
O preço do feijão 
não cabe no poema. O preço 
do arroz 
não cabe no poema. 
Não cabem no poema o gás 
a luz
o telefone 
a sonegação 
do leite 
da carne 
do açúcar 
do pão 
O funcionário público 
não cabe no poema 
com seu salário de fome 
sua vida fechada 
em arquivos. 
Como não cabe no poema 
o operário 
que esmerila seu dia de aço 
e carvão 
nas oficinas escuras 
– porque o poema, senhores, 
está fechado: 
“não há vagas” 
Só cabe no poema 
o homem sem estômago 
a mulher de nuvens 
a fruta sem preço 
O poema, senhores, 
não fede 
nem cheira.
 Ferreira Gullar
TÓPICO 3 | AS FUNÇÕES DA LITERATURA
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IMPORTANT
E
As obras costumam ter direitos autorais até 70 anos após a morte de seu autor. 
Ferreira Gullar faleceu em 2016. Porém, segundo Ana Beatriz Nunes Barbosa 
(2017), “há usos que são permitidos, MESMO NO CASO DE OBRA PROTEGIDA. Seriam estes 
casos os das chamadas limitações ao direito autoral:
 [...]
• A citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens 
de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a 
atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra.
• A reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer 
natureza ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não 
seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra 
reproduzida nem cause prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores. 
Observação da autora deste material: Esse critério também é utilizado em outras obras que 
constam neste estudo, onde poemas são citadas na íntegra para fins de entendimento e 
análise, mas não obras completas dos autores. É muito importante saber distinguir o que 
é a utilização necessária para fins de estudo do simples plágio (cópia, sem o resguardo da 
autoria). Este último constitui crime.
Publicado em 1963, o poema acima retrata problemas sociais e econômicos 
do país que, por ironia, continuam muitíssimo atuais, como o custo de vida, 
o desemprego, a falta de espaço e importância para a poesia, como o autor 
demonstra através da metalinguagem do poema referindo-se a ele mesmo. Afinal, 
nesse contexto, o poema “não fede nem cheira”. Podemos compreender a palavra 
poema como a beleza da vida e, num contexto social em que falta às pessoas o 
básico para sua subsistência e o seu tempo é ocupado com a mera sobrevivência, 
não há espaço para interpretar o belo ou se ocupar da arte. 
Outros autores, como Castro Alves, já apresentavam uma poesia engajada 
em Navio Negreiro, por exemplo. Veja o trecho a seguir:
E ri-se a orquestra irônica, estridente... 
E da ronda fantástica a serpente 
Faz doudas espirais ... 
Se o velho arqueja, se no chão resvala, 
Ouvem-se gritos... o chicote estala. 
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia, 
A multidão faminta cambaleia, 
E chora e dança ali! 
Um de raiva delira, outro enlouquece, 
Outro, que martírios embrutece, 
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra, 
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UNIDADE 1 | LITERATURA: QUE ARTE É ESSA?
E após fitando o céu que se desdobra, 
Tão puro sobre o mar, 
Diz do fumo entre os densos nevoeiros: 
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros! 
Fazei-os mais dançar!..."
Castro Alves, também conhecido como o poeta dos escravos, retrata nesse 
poema a dor dos negros durante as viagens marítimas, e vai brincando entre essa 
dor (chora, de raiva delira, enlouquece) e elementos “lúdicos” (como a dança, a 
risada, a canção...). Uma combinação sarcástica e cruel, retratando uma realidade 
em que alguns seres humanos são torturados e têm suas vidas anuladas em prol 
do conforto alheio. Da maneira como está configurado, faz uma crítica feroz a 
essa realidade e esse jogo entre a dor e o riso que nos mostra a loucura de tal 
situação. O mesmo poema foi musicado por Caetano Veloso e Maria Bethânia e 
enaltece, além do problema representado pela poesia, toda a sua rima e melodia. 
Vale a pena conferir.
Ao falar a respeito de literatura engajada, é nítido que o conceito de arte 
como expressão do belo não se desfaz da função estética, mas agrega nova função 
relacionada à crítica, ou seja, a literatura adquire caráter prático. Sobre isso, vamos 
tratar ao abordar a função pragmática da literatura.
2.4 FUNÇÃO PRAGMÁTICA
Também conhecida como utilitária, passa pelo viés de uma literatura que 
busca outro fim além da estética, busca um fim não artístico, não sendo valorizada 
por si mesma apenas, mas pela sua finalidade. Analisa-se aqui a capacidade que 
a arte tem de pregar uma ideologia. Observamos isso desde o período romântico, 
em que a obra Iracema, de José de Alencar, tem um pano de fundo histórico, a 
começar pelo próprio título, que é um anagrama da palavra América. O romance 
conta ao mesmo tempo a história de amor entre Iracema e o europeu Martim. 
Dessa união nasce Moacir, que, filho de índia e europeu, representa a formação 
da identidade nacional. Outros aspectos, como a valorização da natureza e 
celebração das características brasileiras, elementostípicos do período romântico, 
são ideologias inculcadas pela obra. Esta representa ainda a chegada do branco 
como a quebra de harmonia existente nas comunidades indígenas, representada 
pelos conflitos causados pela presença de Martim. 
 No modernismo observamos também algumas ideologias trazidas pela 
arte. Prega-se a ideologia de uma cultura nova, a ruptura com o que é estrangeiro 
para dar espaço a elementos nacionais, à valorização da cultura brasileira. Essa 
ruptura, porém, não se dá completamente. 
TÓPICO 3 | AS FUNÇÕES DA LITERATURA
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Passamos a descrever o nacional, mas após “devorar” os conceitos 
europeus, especialmente das artes de vanguarda, daí o conceito de antropofagismo. 
“Devora-se o outro”, deglute-se, “vomita-se”, restando dele apenas a forma, mas 
trazendo a valorização dos temas nacionais, ideologia pregada pela arte. Marcou 
esse período a frase de Oswald de Andrade: “Tupi or not tupi, that is the question”. 
Cultivar ou não o nacional. Porém, a brincadeira de substituir o tupi pelo verbo 
to be (ser) joga justamente com essa questão de construir uma ideologia nacional, 
mas sobre uma concepção artística europeia. 
Trouxemos aqui apenas exemplos de quando essa função lúdica ocorre, 
porém acontece em quaisquer textos ou obras de arte que busquem inculcar no 
público determinada ideologia. 
Retomando o termo “vomitar”, compreendemos que esse ato equivale a 
uma “limpeza do organismo”, uma forma de pôr para fora o que está a incomodar. 
Em sentido semelhante surge a função catártica da literatura, que se refere não 
a detritos humanos, mas à expurgação (purificação) de sentimentos e emoções 
através da literatura. 
2.5 FUNÇÃO CATÁRTICA
Conforme o Dicionário Priberam (2017), a palavra catarse foi utilizada por 
Aristóteles como a purificação sentida pelos espectadores durante e após uma 
representação dramática. Também apresenta os sentidos de libertação de emoção 
ou sentimento que sofreu repressão. 
Quando a literatura provoca esses efeitos, ela estará exercendo a função 
catártica. Alguns escritores sentem a catarse durante a escrita, bem como o leitor 
ou espectador de uma determinada obra escrita ou cinematográfica pode ter esse 
sentimento de catarse/purificação emocional, sentindo alívio de suas tensões e 
frustrações, identificando-se com determinado personagem e suas ações. 
Giacon (s.d., p. 6) observa que “nas peças teatrais e no cinema essa função 
atinge seu grau máximo pelo uso de visão e audição, contudo nos textos literários 
é necessário que o escritor faça o leitor percorrer um caminho tortuoso até o 
conflito para atingir o máximo do grau catártico de uma obra”.
Um conto, por exemplo, de maneira geral é composto pela apresentação 
do enredo, conflito, busca pela solução desse conflito, clímax e desfecho. O clímax 
é o ponto alto do conto, momento de maior tensão, quando ficamos numa grande 
expectativa para saber o desfecho. Se compararmos a uma telenovela, esse seria 
justamente o ponto em que acaba o capítulo e tem-se de esperar pelo próximo 
capítulo, no dia seguinte. O desfecho é quando o conflito se resolve, “a justiça é 
feita”. O clímax é o momento de maior tensão para a personagem e também para 
o espectador ou leitor, já no desfecho ocorre o alívio, a descarga de toda tensão. 
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UNIDADE 1 | LITERATURA: QUE ARTE É ESSA?
A Cartomante, de Machado de Assis, conta a história do casal Vilela e 
Rita e seu amigo, Camilo. Rita e Camilo são amantes e este receia que Vilela tenha 
descoberto o caso porque o chamou à sua casa para uma conversa. O caminho de 
Camilo até a residência do casal é de extrema tensão, o leitor acompanha o drama 
psicológico do personagem durante todo o percurso. O clímax se dá no momento 
em que Vilela recebe Camilo e o leva até uma sala, onde se dá o desfecho da situação. 
O clímax cria o ápice de tensão, que é liberada com o desfecho trágico do conto.
A função catártica também pode ser identificada quando o autor 
descarrega no texto os sentimentos guardados, talvez em busca de alívio. É o que 
se pode perceber em Versos Íntimos, de Augusto dos Anjos. 
Versos Íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável 
Enterro de sua última quimera. 
Somente a Ingratidão – esta pantera – 
Foi tua companheira inseparável! 
Acostuma-te à lama que te espera! 
O homem, que, nesta terra miserável, 
Mora, entre feras, sente inevitável 
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro! 
O beijo, amigo, é a véspera do escarro, 
A mão que afaga é a mesma que apedreja. 
Se alguém causa inda pena a tua chaga, 
Apedreja essa mão vil que te afaga, 
Escarra nessa boca que te beija!
Augusto dos Anjos
NOTA
quimera = esperança
Escarro = Matéria viscosa expelida pela boca depois dos esforços da expectoração. 
Chaga = pancada ou ferida
Afaga = acaricia
Escarra = O ato de expelir pela boca matéria viscosa.
TÓPICO 3 | AS FUNÇÕES DA LITERATURA
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É possível interpretar que no poema o autor coloca todo o seu rancor, 
sua decepção e descrença em relação ao mundo e às pessoas e, possivelmente, o 
desejo de uma contrapartida, como forma de vingança representada pelos dois 
últimos versos. A função catártica aparece de forma bastante nítida no poema. 
 Assim como a literatura provoca no leitor momentos onde há certo 
“descarrego de emoções”, exercendo seu caráter catártico, pode também ter 
uma função lúdica, quando se apresenta como uma forma de jogo, de prazer e 
entretenimento, como ocorre com a função lúdica. 
2.6 FUNÇÃO LÚDICA
Conforme Giacon (s.d.), o autor escreve por prazer, seja como forma de 
trabalho, seja como forma de passatempo. Há uma ligação entre escritor e leitor, 
visto que o segundo também encontra o prazer na fruição da leitura, ou seja, 
ainda que a interação de ambos com o texto não aconteça simultaneamente, 
ocorre entre eles um pacto.
Essa função da literatura fica bastante explícita em alguns textos de 
Machado de Assis, quando este estabelece um diálogo aberto com seu leitor, 
chamando-o à reflexão sobre o texto. Temos a seguir um excerto de Memórias 
Póstumas de Brás Cubas, que exemplifica bem o caso. 
Era fixa a minha ideia, fixa como... Não me ocorre nada que seja assaz fixo 
nesse mundo: talvez a lua, talvez as pirâmides do Egito, talvez a finada 
dieta germânica. Veja o leitor a comparação que melhor lhe quadrar, 
veja e não esteja aí a torcer-me o nariz, só porque ainda não chegamos à 
parte narrativa destas memórias. Lá iremos. Creio que prefere a anedota à 
reflexão, como os outros leitores, seus confrades, e acho que faz muito bem.
NOTA
O exemplar do livro utilizado para a citação acima está em e-book Kindle e, por 
esse motivo, não possui data de publicação e numeração de páginas.
Este é um exemplo nítido de autor que literalmente dialoga com o leitor 
como se ele estivesse à sua frente, supondo o que pensa e prevendo suas reações. 
Em outros textos, Machado convida seu leitor a ser um leitor ruminante, ou seja, 
rumina suas leituras, reflete a respeito delas. 
As funções da literatura que abordamos são as mais recorrentes nos 
materiais de Teoria literária, no entanto, alguns autores podem trazer também 
outras funções ou, ainda, diferentes nomenclaturas.
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RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:
• A literatura exerce distintas funções. Retomamos a seguir cada uma delas de 
forma breve.
o Função estética: é a responsável pelo mais recorrente dos conceitos de arte, 
que é a representação do belo, daquilo que é digno de contemplação, está 
ligada aos aspectos formais considerados ideais a cada gênero.
o Função cognitiva: descreve o conhecimento de forma particular, fundindo 
razão e emoção. Tem caráter informativo, mas apresenta uma visão particular 
sobre um fato ou situação, apelando para a emotividade.
o Função político-social ou engajada: preocupa-se com as problemáticas 
políticas e sociais, assumindo uma posição crítica e, por vezes, até militante. 
o Função pragmática: compreende que a literatura não é apenas produto da 
estética,mas deve ser utilitária. Vai além da arte e, por vezes, pode servir a 
ideologias específicas.
o Função catártica: tem a capacidade de provocar no autor e no leitor a libertação 
de sentimentos ou emoções reprimidas, causando um efeito de purificação.
o Função lúdica: Geralmente é representada por textos em que há um 
diálogo explícito entre escritor e leitor. O prazer do autor no ato da escrita 
é visível ao leitor.
31
1 A literatura é conhecida como a arte da palavra e, como tal, funciona como 
instrumento de comunicação e interação social. Há uma concepção de 
que o papel primordial da literatura é estético, porém observamos que ela 
vai além da mera contemplação e assume outras funções, como o lazer e 
o entretenimento, informação, reflexão, conhecimento, cultura, ou ainda, 
traz questionamentos políticos e denúncia de fatos sociais. 
Com base nesse contexto, relacione as colunas de forma a indicar as 
características adequadas a cada função da literatura.
I- Função estética
II- Função cognitiva
III- Função político-social ou engajada
IV- Função pragmática
V- Função catártica
VI- Função lúdica
( ) Comumente é representada por textos em que há um diálogo explícito 
entre escritor e leitor. São textos em que o prazer do autor no ato da 
escrita é perceptível.
( ) Provoca no leitor o sentimento de libertação de uma emoção ou 
sentimento reprimido, causando a purificação, alívio das tensões.
( ) A literatura, de acordo com essa função, tem um caráter utilitário. 
Deve ir além da arte e, por vezes, pode mesmo trabalhar a favor de 
determinadas ideologias. 
( ) Trata de problemáticas de determinado contexto social, ou seja, traz 
uma discussão sobre fatos políticos e sociais. 
( ) Descreve o conhecimento de forma particular, pessoal, fundindo razão 
e emoção, ou seja, tem caráter informativo, mas apresenta uma visão 
emotiva e particular. 
( ) Está no fundamento daquilo que se considera arte e tem o sentido de 
fenômeno do belo e da produção artística. 
As características de cada função da linguagem são apontadas 
corretamente na seguinte ordem:
a) ( ) VI, V, IV, III, II, I
b) ( ) V, VI, IV, III, II, I
c) ( ) I, II, III, IV, V, VI
d) ( ) VI, I, V, II, IV, III
AUTOATIVIDADE
32
2 Leia os poemas seguir e responda qual função da literatura está mais 
presente em cada um deles.
POEMA 1
Psicologia de um vencido 
 
Eu, filho do carbono e do amoníaco, 
Monstro de escuridão e rutilância, 
Sofro, desde a epigênese da infância, 
A influência má dos signos do zodíaco. 
 
Profundissimamente hipocondríaco, 
Este ambiente me causa repugnância... 
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia 
Que se escapa da boca de um cardíaco. 
 
Já o verme — este operário das ruínas — 
Que o sangue podre das carnificinas 
Come, e à vida em geral declara guerra, 
 
Anda a espreitar meus olhos para roê-los, 
E há-de deixar-me apenas os cabelos, 
Na frialdade inorgânica da terra!
Augusto dos Anjos
a) ( ) Função estética
b) ( ) Função Cognitiva
c) ( ) Função Político-social ou Engajada
d) ( ) Função Pragmática
e) ( ) Função Catártica
f) ( ) Função Lúdica
POEMA 2
Quando o português chegou 
Debaixo duma bruta chuva 
Vestiu o índio 
Que pena! 
Fosse uma manhã de sol 
O índio tinha despido 
O português.
Oswald de Andrade
33
a) ( ) Função estética
b) ( ) Função Cognitiva
c) ( ) Função Político-social ou Engajada
d) ( ) Função Pragmática
e) ( ) Função Catártica
f) ( ) Função Lúdica
POEMA 3
“Sete quedas por mim passaram, 
e todas sete se esvaíram. 
Cessa o estrondo das cachoeiras, e com ele 
a memória dos índios, pulverizada, 
já não desperta o mínimo arrepio. 
Aos mortos espanhóis, aos mortos bandeirantes, 
aos apagados fogos 
de Ciudad Real de Guaira vão juntar-se 
os sete fantasmas das águas assassinadas 
por mão do homem, dono do planeta”.
Carlos Drummond de Andrade
a) ( ) Função estética
b) ( ) Função Cognitiva
c) ( ) Função Político-social ou Engajada
d) ( ) Função Pragmática
e) ( ) Função Catártica
f) ( ) Função Lúdica

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