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1 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA Aterosclerose • Base das doenças coronarianas, cerebrais e vasculares periféricas. • Provoca morbidade e mortalidade mais do que qualquer outra doença. • Doença arterial coronariana constitui importante manifestação da aterosclerose. A probabilidade de aterosclerose é determinada pela combinação de: • fatores de risco adquiridos (níveis de colesterol, tabagismo, hipertensão), • hereditários (mutações nos genes dos receptores de lipoproteína de baixa densidade LDL) e • associados a sexo e à idade. Esses fatores, atuando em conjunto causam lesões da túnica íntima que fazem protusão na luz dos vasos – ateromas, placas ateromatosas ou ateroscleróticas. Placa ateromatosa: • lesão elevada • cerne mole e grumoso de lipídios (colesterol e ésteres de colesterol) • recoberta por capa fibrosa Importante: • As placas ateroscleróticas podem sofrer ruptura, levando à trombose vascular obstrutiva. • As placas ateroscleróticas podem aumentar a distância de difusão da luz até a média, levando à lesão isquêmica e ao enfraquecimento da parede do vaso – pode resultar em aneurisma. EPIDEMIOLOGIA: A redução da mortalidade por doenças infecciosas e a adoção do estilo de vida ocidental levaram a um aumento na prevalência da doença cardíaca isquêmica nos países de baixa renda. FATORES DE RISCO: • Fatores constitucionais – menos controláveis. • Fatores adquiridos ou relacionados com comportamentos específicos – são acessíveis à intervenção. Normalmente, esses fatores de risco apresentam efeitos mais do que aditivos, porém o tratamento (mesmo quando abaixo do ideal) pode reduzir parte do risco. Fatores de risco constitucionais: • Genética: a predisposição familiar bem estabelecida à aterosclerose e à doença cardíaca isquêmica é habitualmente poligênica. • Idade: o desenvolvimento da placa aterosclerótica é um processo progressivo que se manifesta clinicamente na meia-idade ou em uma idade mais avançada. Com o envelhecimento, há uma tendência à proliferação de clones hematopoéticos e essa hematopoese clonal está associada a um aumento da mortalidade cardiovascular. • Gênero: mulheres na pré-menopausa são relativamente protegidas contra a aterosclerose. Por isso, o IAM e outras complicações da aterosclerose são incomuns em mulheres na pré- menopausa, a não ser que tenham predisposição ao DM, à hiperlipidemia ou à hipertensão grave. Entretanto, depois da menopausa, a incidência de doenças relacionadas com a aterosclerose aumenta. Importante: a terapia com estrogênio na pós-menopausa aumenta o risco cardiovascular. Fatores de risco modificáveis: • Hiperlipidemia e hipercolesterolemia: a hipercolesterolemia é suficiente para iniciar o desenvolvimento de uma lesão. O principal componente do colesterol sérico associado a um aumento de risco é o colesterol LDL (“colesterol ruim”). A LDL é o complexo de lipídio-colesterol- proteína que libera colesterol nos tecidos periféricos; em contrapartida, a lipoproteína de alta densidade (HDL) é o complexo que mobiliza 2 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA colesterol da periferia (incluindo ateromas) e o transporta até o fígado para catabolismo e excreção biliar. A presença de níveis mais altos de HDL (“colesterol bom”) correlaciona-se com uma redução do risco. Reduzir os níveis de LDL é interessante, mas elevar exclusivamente os níveis de HDL não é efetivo. Ácidos graxos ômega-3 são benéficos. Gorduras insaturadas trans são adversas. As estatinas são uma classe de fármacos que reduzem os níveis circulantes de colesterol ao inibir a hidroximetilglutaril coenzima A (HMG CoA) redutase, a enzima limitadora de velocidade na biossíntese hepática de colesterol. As estatinas também tem efeitos não intencionais sobre a redução da inflamação. • Hipertensão: pode aumentar o risco de doença cardíaca isquêmica. Constitui a causa mais comum de hipertrofia ventricular esquerda – também um marcador substituto de risco cardiovascular. • Tabagismo: duplica a taxa de mortalidade por doença cardíaca isquêmica. O abandono do tabagismo reduz de modo substancial esse risco. • Diabetes melito: induz hipercolesterolemia e aumenta o risco de aterosclerose. A incidência de IAM é 2x mais alta em pacientes diabéticos. Existe também um aumento no risco de acidente vascular encefálico e um aumento de 100 vezes no risco de gangrena dos membros inferiores induzida pela aterosclerose. Fatores de risco adicionais: Até 20% de todos os eventos cardiovasculares ocorrem na ausência de fatores de risco importantes (p. ex., hipertensão, hiperlipidemia, tabagismo ou diabetes melito). Com efeito, mais de 75% dos eventos cardiovasculares em mulheres anteriormente saudáveis ocorrem com níveis de colesterol LDL abaixo de 160 mg/dℓ (níveis geralmente considerados indicadores de baixo risco). Evidentemente, existe a contribuição de outros fatores. Entre os fatores comprovados ou suspeitos, destacam-se os seguintes: • Inflamação: observada em todos os estágios da aterogênese e está ligada à formação da placa aterosclerótica e sua ruptura. Diversos marcadores circulantes da inflamação exibem uma correlação com a doença cardíaca isquêmica, e a proteína C reativa (PCR) surgiu como um dos mais estáveis e mais simples de medir. A PCR é um reagente de fase aguda sintetizado principalmente pelo fígado. Embora a PCR não pareça ter nenhuma relação causal com o desenvolvimento da aterosclerose ou suas sequelas, já está bem estabelecido que a PCR plasmática constitui um forte marcador de risco independente para o infarto do miocárdio, o acidente vascular encefálico, a doença arterial periférica e a morte súbita cardíaca, até mesmo entre indivíduos aparentemente saudáveis. Por conseguinte, os níveis de PCR são agora incorporados nos algoritmos de estratificação de risco. Curiosamente, os níveis de PCR também estão normalmente reduzidos em associação a outras medidas de redução de risco, incluindo abandono do tabagismo, perda de peso, exercício e administração de estatinas. • Hiper-homocistemia: Os níveis séricos de homocisteína apresentam uma correlação com a aterosclerose coronariana, a doença vascular periférica, o acidente vascular encefálico e a trombose venosa. A homocistinúria, devido a erros inatos raros do metabolismo, resulta em níveis circulantes elevados de homocisteína (> 100 μmol/ℓ) e está associada a doença vascular prematura. • Síndrome metabólica: associada a obesidade central, caracteriza-se por resistência à insulina, hipertensão, dislipidemia (níveis elevados de LDL e valores diminuídos de HDL), hipercoagulabilidade e estado pró-inflamatório. A dislipidemia, a hiperglicemia e a hipertensão constituem fatores de risco cardíaco, enquanto os estados de hipercoagulabilidade sistêmica e pró- inflamatório podem contribuir para a disfunção endotelial e/ou trombose. • Lipoproteína a: forma alterada de LDL que contém a porção de apoliproteína B-100 da LDL ligada à apoliproteína A (apo A). Os níveis de Lp(a) estão associados a um risco de doenças coronariana e cerebrovascular, independentemente dos níveis de colesterol total ou LDL. • Fatores que afetam a hemostasia: Diversos marcadores da função hemostática e/ou fibrinolítica (p. ex., nível elevado do inibidor do ativador do plasminogênio 1) são potentes preditores de risco para eventos ateroscleróticos importantes, incluindo infarto do miocárdio e acidente vascular encefálico. Os fatores derivados das plaquetas, bem como a trombina – por meio de efeitos tanto pró-coagulantes quanto pró- inflamatórios –, são cada vez mais reconhecidos como importantes fatores que contribuem para a patologia vascular local. • Outros fatores: sedentarismo, estilo de vida estressante e competitivo (personalidade tipo A), obesidade. PATOGÊNESE: Hipótese de resposta à lesão– considera a aterosclerose uma resposta inflamatória crônica e reparadora da parede arterial à lesão endotelial. A progressão da lesão ocorre por meio da interação de lipoproteínas modificadas, macrófagos e linfócitos T com CE e CML da parede arterial. A aterosclerose progride de acordo com esta sequência: • Lesão e disfunção endoteliais, causando (entre outros problemas) aumento da permeabilidade vascular, adesão dos leucócitos e trombose 3 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA • Acúmulo de lipoproteínas (principalmente LDL e suas formas oxidadas) na parede do vaso • Adesão dos monócitos ao endotélio, seguida de migração na túnica íntima e transformação em macrófagos e células espumosas • Adesão plaquetária • Liberação de fatores das plaquetas ativadas, macrófagos e células da parede vascular, induzindo o recrutamento de CML a partir da média ou de precursores circulantes • Proliferação de CML, produção da MEC e recrutamento de células T • Acúmulo de lipídios tanto extracelular quanto no interior de células (macrófagos e CML) • Calcificação da MEC e restos necróticos tardiamente na patogênese. Lesão endotelial: Pilar da hipótese da resposta à lesão. As lesões iniciais surgem em locais de endotélio morfologicamente intacto, que demonstram características de disfunção endotelial – aumento da permeabilidade, aumento da adesão dos leucócitos e alteração da expressão gênica. As causas da disfunção das CEs incluem: • Toxinas da fumaça do cigarro • Homocisteína • Produção de citocinas inflamatórias As 3 causas mais importantes de disfunção endotelial são: • Distúrbios hemodinâmicos • Hipercolesterolemia • Inflamação Distúrbios hemodinâmicos: Turbulência hemodinâmica: as placas tendem a se localizar nos óstios de saída dos vasos, nos pontos de ramificação e ao longo da parede posterior da parte abdominal da aorta – onde há padrões de fluxo desordenado e não laminar. O fluxo laminar não turbulento aumenta a produção de fatores de transcrição e, em particular, do fator tipo Krüppel (KLF2), que ativam genes ateroprotetores e desativam a transcrição de genes inflamatórios. O fluxo turbulento não laminar desencadeia transcrições genéticas que torna os sítios propensos à aterosclerose. Obs: efeitos ateroprotetores das estatinas ocorrem por meio da suprarregulação do KLF2. Hipercolesterolemia: Os lipídios são transportados na corrente sanguínea em sua forma ligada a apoproteínas específicas – complexos de lipoproteínas. As dislipoproteinemias são anormalidades das lipoproteínas que podem estar presentes na população geral. Incluem: • Aumento dos níveis de colesterol LDL • Diminuição dos níveis de colesterol HDL • Aumento dos níveis de Lp(a) anormal. Essas anormalidades podem resultar de mutações em apoproteínas ou receptores de lipoproteínas ou podem se originar de outros distúrbios subjacentes que afetam os níveis circulantes de lipídios, como síndrome nefrótica, alcoolismo, hipotireoidismo ou 4 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA DM. Todas essas anormalidades estão associadas a um aumento no risco de aterosclerose. • Lipídios dominantes nas placas ateromatosa são o colesterol e os ésteres de colesterol. • Defeitos genéticos na captação e no metabolismo das lipoproteínas estão associados à aterosclerose acelerada. • Análises epidemiológicas demonstram correlação entre a gravidade da aterosclerose e os níveis de colesterol plasmático total ou LDL. • Redução do colesterol sérico diminui a velocidade de progressão da aterosclerose, produz regressão de algumas placas e reduz o risco de eventos cardiovasculares. Os mecanismos pelos quais a hiperlipidemia contribui para a aterogênese incluem os seguintes: • Comprometimento da função das CEs – a hiperlipidemia aumenta a produção local de espécies reativas de oxigênio que causam dano à membrana e às mitocôndrias, e aceleram a decomposição do NO, reduzindo sua atividade vasodilatadora. • LDLs modificadas – na hiperlipidemia crônica, as lipoproteínas acumulam-se dentro da íntima e sofrem modificação (oxidação ou agregação). Quando modificadas, são acumuladas por macrófagos, e por serem modificadas, não podem ser degradadas por completo, então a ingestão crônica leva à formação de macrófagos preenchidos de lipídios (células espumosas). As lipoproteínas modificadas não apenas são tóxicas para as CEs, as CMLs e os macrófagos como também a sua ligação e captação estimulam a liberação de fatores de crescimento, citocinas e quimiocinas, que criam um círculo inflamatório vicioso de recrutamento e ativação dos monócitos. As lesões iniciais que contêm macrófagos repletos de lipídios são denominadas estrias gordurosas. Inflamação: A inflamação crônica contribui para o início e a progressão das lesões ateroscleróticas. A inflamação pode ser desencadeada pelo acúmulo de cristais de colesterol e ácidos graxos livres nos macrófagos e outras células. As células detectam a presença de materiais anormais por meio de receptores imunes inatos citosólicos – a ativação do inflamassomo leva à produção da IL-1 que recruta e ativa células mononucleares (macrófagos e linfócitos T). A ativação de células mononucleares leva à produção local de citocinas e quimiocinas, que recrutam e ativam mais células inflamatórias. Os macrófagos ativados produzem espécies reativas de oxigênio, que intensificam a oxidação das LDL e elaboram fatores de crescimento que estimulam a proliferação de CML. Os linfócitos T ativados nas lesões da íntima em crescimento elaboram citocinas inflamatórias (p. ex., interferona-γ ), que, por sua vez, podem ativar os macrófagos, bem como as CEs e as CMLs. Por conseguinte, muitas das lesões da aterosclerose são atribuídas à reação inflamatória crônica na parede dos vasos. Infecção: Embora evidências circunstanciais tenham sido apresentadas, estabelecendo uma ligação da aterosclerose com herpes-vírus, citomegalovírus e Chlamydophila pneumoniae, a infecção não desempenha nenhum papel etiológico estabelecido. Proliferação do músculo liso e síntese de matriz: A proliferação de CML na íntima e a deposição de MEC convertem a estria gordurosa em um ateroma maduro e contribuem para o crescimento progressivo das lesões ateroscleróticas. Vários fatores de crescimento estão implicados na proliferação de CML e na síntese da MEC, incluindo o fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), liberado por plaquetas aderentes ao local, bem como macrófagos, CE e CML; fator de crescimento do fibroblasto e fator de crescimento transformador α. Esses fatores também estimulam as CMLs a sintetizar a MEC (notavelmente o colágeno), o que estabiliza as placas ateroscleróticas. Em contrapartida, as células inflamatórias ativadas nos ateromas podem aumentar a degradação de componentes da MEC, resultando em placas instáveis. Visão geral: Existem várias vias patogênicas na aterogênese – natureza multifatorial. Destaque: aterosclerose como uma resposta inflamatória crônica. Tentativa de reparo vascular – estimulada por uma variedade de agressões, incluindo lesão das CE, oxidação e acúmulo de lipídios e inflamação. Os ateromas são lesões dinâmicas, que consistem em: • CE disfuncionais • CML em proliferação 5 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA • Linfócitos T e macrófagos misturados Todos os quatro tipos de células são capazes deliberar mediadores capazes de influenciar a aterogênese. Assim, nos estágios iniciais, as placas na íntima são constituídas por apenas alguns agregados de CML, macrófagos e células espumosas; a morte dessas células libera lipídios e restos necróticos. Com a progressão, o ateroma é modificado pela MEC sintetizada pelas CMLs; o tecido conjuntivo é particularmente proeminente na face da íntima, formando uma capa fibrosa. Normalmente, as lesões conservam um cernede células preenchidas de lipídios e restos lipídicos, que podem sofrer calcificação. Embora a placa na íntima possa inicialmente causar remodelagem da média e expansão para fora, a placa aterosclerótica em crescimento – com graus variáveis de calcificação, dependendo da natureza da matriz circundante – finalmente invade a luz do vaso e compromete o fluxo sanguíneo. A placa também pode comprimir a túnica média subjacente, levando à sua degeneração, ou pode erodir ou sofrer ruptura, expondo fatores trombogênicos que resultam na formação de trombo e oclusão vascular aguda. Figura 11.12 Sequência de interações celulares na aterosclerose. A hiperlipidemia, a hiperglicemia, a hipertensão e outras influências causam disfunção endotelial. Isso resulta em adesão das plaquetas e dos monócitos, com liberação subsequente de citocinas e fatores de crescimento, levando à migração e proliferação das células musculares lisas. As células espumosas presentes nas placas ateromatosas originam-se de macrófagos e células musculares lisas que acumularam lipídios modificados (p. ex., lipoproteínas de baixa densidade [LDL] oxidadas e agregadas), por meio de proteínas de depuração e relacionadas ao receptor de LDL. O lipídio extracelular provém da insudação a partir da luz do vaso, particularmente na presença de hipercolesterolemia, bem como das células espumosas em degeneração. O acúmulo de colesterol na placa reflete um desequilíbrio entre o influxo e o efluxo; a lipoproteína de alta densidade (HDL) provavelmente ajuda a eliminar o colesterol desses acúmulos. Em resposta às citocinas e quimiocinas elaboradas, as células musculares lisas migram para a íntima, proliferam e produzem matriz extracelular, incluindo colágeno e proteoglicanos. IL- 1, interleucina-1; MCP-1, proteína quimioatrativa dos monócitos 1. MORFOLOGIA: Estrias gordurosas: • Compostas por macrófagos espumosos repletos de lipídios. • Surgem como pequenas máculas amarelas e planas, que finalmente podem coalescer, formando estrias alongadas de 1 cm ou mais de comprimento. • As lesões não são elevadas e não provocam qualquer distúrbio no fluxo. • Podem evoluir e formar placas, mas nem todas se transformam em lesões avançadas. • As aortas de lactentes podem exibir estrias gordurosas, e essas lesões estão presentes em praticamente todos os adolescentes, mesmo naqueles sem fatores de risco conhecidos. • Evolução temporal: as estrias gordurosas coronarianas começam a se formar na adolescência, nos mesmos locais anatômicos onde tendem a desenvolver placas. Placa aterosclerótica: Os processos fundamentais na aterosclerose consistem em espessamento da túnica íntima e acúmulo de lipídios. • As placas ateromatosas são castanho amareladas e são elevadas acima da parede circundante do vaso. • Qualquer trombo superposto às placas ulceradas exibe uma coloração marrom-avermelhada. • As placas variam quanto a seu tamanho e podem coalescer, formando massas maiores. As lesões ateroscleróticas: • São focais e raramente circunferenciais. 6 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA • Acometem apenas parte de qualquer parede arterial – em corte transversal aparecem excêntricas. • As paredes vasculares têm exposição uniforme a fatores como toxinas de fumaça do cigarro, níveis elevados de LDL, hiperglicemia. • O caráter focal das lesões é atribuível às variações da hemodinâmica vascular. • Os distúrbios locais do fluxo, como o fluxo não laminar (turbulência) nos pontos de ramificação, fazem com que certas porções da parede do vaso sejam mais suscetíveis à formação de placa. • Embora sejam inicialmente focais e de distribuição esparsa, as lesões ateroscleróticas tendem a aumentar com o passar do tempo e tornam se mais numerosas e de distribuição mais ampla. Além disso, em qualquer vaso, é frequente a coexistência de lesões em vários estágios. Por ordem descendente, os vasos mais extensamente acometidos são: • Porção inferior da parte abdominal da aorta e artérias ilíacas • Artérias coronárias • Artérias poplíteas • Artérias carótidas internas • Vasos do polígono de Willis Os vasos dos membros superiores são, em geral, relativamente poupados, assim como as artérias mesentéricas e renais, exceto em seus óstios. Embora a maioria dos indivíduos tenha tendência a apresentar um grau consistente de carga aterosclerótica na vasculatura afetada, a gravidade da doença em uma distribuição arterial não prevê necessariamente a gravidade em outra. As placas ateroscleróticas apresentam 3 componentes principais: • Células, incluindo número variável de CML, macrófagos e linfócitos • MEC, incluindo colágeno, fibras elásticas e proteoglicanos • Lipídios intracelulares e extracelulares • Calcificações nas placas de estágio mais tardio Esses componentes ocorrem em proporções e configurações variáveis em diferentes lesões. Normalmente, há uma capa fibrosa superficial composta de CML e de colágeno relativamente denso. Abaixo e ao lado dessa capa (o “ombro”) existe uma área mais celular que contém macrófagos, linfócitos T e CML. Abaixo da capa fibrosa, encontra-se um cerne necrótico contendo lipídios (colesterol e ésteres de colesterol), restos de células mortas, células espumosas (macrófagos e CML repletos de lipídios), fibrina, trombo em graus variáveis de organização e outras proteínas plasmáticas. O colesterol frequentemente está presente como agregados cristalinos que são eliminados durante o processamento de rotina do tecido, deixando fendas vazias. A periferia das lesões exibe neovascularização. A maioria dos ateromas contém lipídios em quantidade abundante, porém algumas placas (“placas fibrosas”) são compostas quase exclusivamente por CML e tecido fibroso, que pode ser densamente calcificado. Em geral, as placas continuam mudando e aumentam de modo progressivo, em consequência da morte e degeneração das células, síntese e degradação (remodelamento) da MEC, organização de qualquer trombo superposto e calcificação secundária dos fosfolipídios ou restos necróticos. As placas ateroscleróticas são suscetíveis a alterações patológicas clinicamente importantes. A espessura e o conteúdo de MEC da capa fibrosa sobrejacente têm impacto na estabilidade ou na fragilidade da placa e na sua tendência a sofrer alterações secundárias: • Ruptura, ulceração ou erosão: expõem a corrente sanguínea a substâncias altamente trombogênicas e levam à trombose, que pode causar oclusão parcial ou completa da luz do vaso. Se o pct sobreviver, o trombo pode se organizar e ser incorporado na placa em crescimento. • Hemorragia dentro de uma placa: A ruptura da capa fibrosa sobrejacente ou dos vasos de paredes finas nas áreas de neovascularização pode causar hemorragia dentro da placa; um hematoma contido pode expandir a placa e induzir a sua ruptura. • Ateroembolismo: a ruptura da placa pode liberar restos ateroscleróticos na corrente sanguínea, produzindo microêmbolos. • Formação de aneurisma: A pressão induzida pela aterosclerose ou a atrofia isquêmica da túnica média subjacente, com perda do tecido elástico, causam fraqueza e ruptura potencial. 7 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA CONSEQUÊNCIAS DA DOENÇA ATEROSCLERÓTICA: • Infarto do miocárdio (ataque cardíaco) • Infarto cerebral (AVE) • Aneurismas da aorta • Doença vascular periférica (gangrena das pernas) As grandes artérias elásticas (p. ex., aorta, artérias carótida e ilíaca) e as artérias musculares de grande e de médio calibres (p. ex., artérias coronárias e poplíteas) representam os principais alvos da aterosclerose. A doença aterosclerótica sintomática acomete, com mais frequência, as artérias que suprem o coração, o encéfalo, os rins e os membros inferiores. História natural, principais características morfológicas e principais eventos patogênicos:Características das lesões ateroscleróticas que normalmente são responsáveis pelas manifestações clínico-patológicas: Estenose aterosclerótica: • Nas pequenas artérias, as placas ateroscleróticas podem provocar oclusão gradual da luz do vaso, comprometendo o fluxo sanguíneo e causando lesão isquêmica. • Nos estágios iniciais da estenose, o remodelamento da túnica média do vaso tende a preservar o tamanho da luz. Entretanto, o grau de remodelamento tem limites, e, por fim, o ateroma em expansão invade a luz a ponto de comprometer o fluxo sanguíneo. • A estenose crítica refere-se ao estágio em que a oclusão é grave o suficiente para causar isquemia tecidual. • Na circulação coronariana isso ocorre quando a oclusão produz redução de 70 a 75% na área de corte transversal da luz. Com esse grau de estenose, pode ocorrer dor torácica com esforço (angina estável). • Embora a ruptura aguda da placa seja a consequência mais perigosa, a aterosclerose também provoca efeitos adversos por meio da diminuição crônica da perfusão arterial. • A oclusão mesentérica e a isquemia intestinal, a morte súbita cardíaca, a doença cardíaca isquêmica crônica, a encefalopatia isquêmica e a claudicação intermitente (perfusão diminuída dos membros) representam consequências das estenoses com limitação do fluxo. • Os efeitos da oclusão vascular dependem, em última análise, do suprimento arterial e da demanda metabólica do tecido afetado. • Se a estenose ocorrer lentamente, os vasos menores adjacentes podem compensar em parte pelo aumento e criação de circulação colateral para perfundir o órgão. Alteração aguda da placa: Normalmente, a erosão ou a ruptura da placa é seguida imediatamente de trombose vascular parcial ou completa, resultando em infarto agudo do tecido (IAM ou AVE). As alterações da placa são classificadas em 3 categorias gerais: • Ruptura/fissura - com exposição dos constituintes da placa altamente trombogênicos, que ativam a coagulação e induzem trombose. Esta, com frequência, é totalmente oclusiva • Erosão/ulceração - com exposição da membrana basal subendotelial trombogênica ao sangue, induzindo, com menos frequência, trombose totalmente oclusiva • Hemorragia no ateroma – com expansão de seu volume Sabe-se agora que as placas responsáveis pelo infarto do miocárdio e por outras síndromes coronarianas agudas são, com frequência, assintomáticas antes de sofrer uma súbita alteração normalmente imprevisível. Assim, os estudos clínicos e patológicos mostram que, na maioria dos casos, as placas que sofrem ruptura abrupta e causam oclusão coronariana anteriormente só apresentavam estenose leve a moderada e não crítica da luz. Por conseguinte, um grande número de adultos assintomáticos pode estar correndo o risco de um evento coronariano catastrófico. Embora exames de imagem estejam sendo desenvolvidos para a identificação antecipada dessas lesões, é evidente que os exames angiográficos 8 Laís Flauzino | ANATOMIA PATOLÓGICA | 7°P MEDICINA padrões são lamentavelmente inadequados para visualizá-las até depois do evento. As placas sofrem ruptura quando são incapazes de suportar o estresse mecânico gerado pelas forças de cisalhamento vascular. Os eventos que desencadeiam alterações abruptas nas placas e trombose subsequente são complexos e incluem tanto fatores intrínsecos (p. ex., estrutura e composição da placa) quanto elementos extrínsecos (p. ex., pressão arterial, reatividade plaquetária e espasmo vascular). A capa fibrosa sofre remodelamento contínuo, que pode estabilizar a placa ou, pelo contrário, torná-la mais suscetível à ruptura. O colágeno é o principal componente estrutural da capa fibrosa, responsável pela sua resistência e estabilidade mecânicas; o equilíbrio entre a síntese e a degradação do colágeno afeta a integridade da capa. Por conseguinte, as placas com capas fibrosas finas e células inflamatórias ativas sobre um cerne necrótico têm mais tendência a sofrer ruptura e são designadas como “placas vulneráveis”. O colágeno na placa aterosclerótica é produzido principalmente pelas CMLs, de modo que a perda dessas células resulta em uma capa menos resistente. Além disso, a renovação do colágeno é controlada por metaloproteinases (MMPs), enzimas elaboradas, em grande parte, pelos macrófagos e CMLs dentro da placa ateromatosa. Por outro lado, os inibidores teciduais das metaloproteinases (TIMP, tissue inhibitors of metalloproteinases), que são produzidos por CEs, CMLs e macrófagos, modulam a atividade das MMPs. Em geral, a inflamação da placa resulta em aumento efetivo da degradação do colágeno e redução de sua síntese, desestabilizando, assim, a integridade mecânica da capa fibrosa. A inflamação induzida pelos depósitos de colesterol pode contribuir para a desestabilização da placa. Por outro lado, as estatinas podem ter um efeito terapêutico benéfico não apenas ao reduzir os níveis circulantes de colesterol, mas também ao estabilizar as placas por meio de uma redução de sua inflamação. As influências extrínsecas às placas também contribuem para alterações agudas da placa. A estimulação adrenérgica pode aumentar a pressão arterial sistêmica ou pode induzir vasoconstrição local, aumentando, assim, os estresses físicos sobre determinada placa. Com efeito, a estimulação adrenérgica associada ao despertar e levantar-se, pode causar picos de pressão arterial (seguidos de aumento da reatividade plaquetária), que foram causalmente ligados à periodicidade circadiana pronunciada para o início do infarto agudo do miocárdio (cujo pico ocorre entre 6 horas da manhã e meio-dia). O intenso estresse emocional também pode contribuir para a ruptura da placa; isso é ilustrado de maneira mais dramática pelo aumento da incidência de morte súbita associada a desastres naturais ou outros desastres, como terremotos e o ataque ao World Trade Center em 11 de setembro de 2001. É também importante observar que nem todas as rupturas de placas resultam em tromboses oclusivas com consequências catastróficas. Com efeito, a ruptura da placa e a agregação plaquetária superficial e trombose que se seguem constituem, provavelmente, complicações comuns, repetitivas e, com frequência, clinicamente silenciosas do ateroma. O reparo dessas rupturas subclínicas das placas – e a organização dos trombos sobrejacentes – constitui um importante mecanismo no crescimento das lesões ateroscleróticas. A trombose parcial ou total associada à ruptura de uma placa constitui um fator central nas síndromes coronarianas agudas. Em sua forma mais grave, o trombo leva à oclusão total do vaso afetado. Por outro lado, em outras síndromes coronarianas, a obstrução luminal pelo trombo é incompleta e pode até mesmo aumentar e diminuir com o passar do tempo. O trombo mural em uma artéria coronária também pode embolizar. Com frequência, pequenos fragmentos embólicos de trombo podem ser encontrados na circulação intramiocárdica distal ou em associação a microinfartos em pacientes com aterosclerose que sofrem morte súbita. A trombina e outros fatores associados à trombose são potentes ativadores das CMLs e, por conseguinte, podem contribuir para o crescimento das lesões ateroscleróticas. A vasoconstrição compromete o tamanho da luz e, ao aumentar as forças mecânicas locais, pode potencializar a ruptura da placa. A vasoconstrição nos locais de ateroma pode ser estimulada por (1) agonistas adrenérgicos circulantes, (2) conteúdo das plaquetas liberado localmente, (3) disfunção das CE, com comprometimento da secreção de fatores de relaxamento derivados do endotélio (NO) relativos a fatores de contração (endotelina), e (4) mediadores liberados das células inflamatórias perivasculares. Kumar, V., Abbas, A. K., & Aster, J. C. (2023). Robbins & Cotran Patologia: Bases Patológicas das Doenças (10th ed.). Grupo GEN. https://integrada.minhabiblioteca.com.br/books/9788595159167https://integrada.minhabiblioteca.com.br/books/9788595159167