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UNIDADE II TÓPICOS INTEGRADORES III LETRAS - PORTUGUÊS 2 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, do Grupo Ser Educacional. Edição, revisão e diagramação: Equipe de Desenvolvimento de Material Didático EaD. ___________________________________________________________________________ Cavalcanti, Roberta. Tópicos Integradores III Letras - Português: Unidade 2. Recife: Grupo Ser Educacional, 2019. ___________________________________________________________________________ Grupo Ser Educacional Rua Treze de Maio, 254 - Santo Amaro CEP: 50100-160, Recife - PE PABX: (81) 3413-4611 3 Sumário SEmÂNTiCA: CoNCEiTuANDo .................................................................................. 6 SiGNo: BrEVE rEViSÃo DE CoNCEiToS ................................................................. 7 ENuNCiAÇÃo E ArGumENTAÇÃo ........................................................................... 9 Argumentação e Enunciação ..................................................................................................... 9 SiGNiFiCAÇÃo E CoNTEXTo ...................................................................................... 13 4 TÓPiCoS iNTEGrADorES iii – LETrAS PorTuGuÊS uNiDADE ii PArA iNíCio DE CoNVErSA Olá, prezado (a) estudante, como vai? Bem-vindo (a) a segunda unidade da disciplina de Tópicos Integradores III Letras - Português. Nesta disciplina trabalharemos com guias de estudo, um material elaborado de forma dinâmica e interativa com a finalidade de tornar seu estudo mais prático e facilitar a sua compreensão sobre o assunto. Como a disciplina não possui livro texto, o guia de estudo é o material base da nossa disciplina e é através dele que você terá todas as orientações sobre Tópicos Integradores III. Por ser um material dinâmico, o guia de estudo conta com vários tópicos que têm função de separar e organizar o conteúdo trabalhado de forma mais prática e interativa, facilitando, desta forma, seu aprendizado. Perceba, meu (minha) caro (a), que este material é elaborado com todo cuidado para que você, aluno (a), tenha acesso a um conteúdo de qualidade. Apesar de ser o material base da disciplina, ele não é o único. Os livros textos das disciplinas escolhidas são leituras obrigatórias, de preferência em conjunto com este guia de estudo. O conhecimento, meu caro, é construído de diversas formas e, para que você possa absorver o conteúdo da melhor maneira possível, é essencial ler também os materiais de apoio, como os textos sugeridos ao longo deste material, os conteúdos indicados pelos professores executores no Dicas de Vídeo e Dicas de Leitura, as dicas de conteúdo publicadas pela tutoria on-line, além da participação nos fóruns e debates no ambiente virtual. Para qualquer dúvida, o (a) seu (a) tutor (a) está a sua disposição para melhor compreensão do assunto trabalhado. Seja bem-vindo (a) e aproveite este material porque ele é feito especialmente para você! 5 oriENTAÇõES DA DiSCiPLiNA Estimado (a) aluno (a), na unidade passada, estudamos e revisamos alguns conteúdos abordados na disciplina de Fonética e Fonologia do Português. Iniciamos com as considerações sobre as noções de Fonética e Fonologia, assunto escolhido da unidade I do livro. Em seguida, vimos a classificação dos fonemas: vogal, consoante, semivogal, assunto da unidade II. Depois foi o momento de vermos os conceitos de alofone, variação, neutralização e arquifonema, referente à unidade III e, por fim, o conteúdo da unidade IV, as relações dos estudos de Fonética e Fonologia com o ensino da Língua Portuguesa. Agora, nesta segunda unidade, vamos nos debruçar sobre a disciplina de Semântica do Português. A semântica é a parte da língua que se dedica ao estudo dos sentidos e significados. Para iniciarmos, vamos primeiro, estudar o conceito de semântica, para depois vermos o signo: breve revisão de conceitos e suas considerações de acordo com Saussure. Caminhando, relembraremos a enunciação, a argumentação e a polifonia e, por fim, a significação e contexto. Na unidade III, iremos nos voltar para a Linguística Aplicada ao Ensino do Português. Desta disciplina, escolhemos os seguintes temas: Definição de Linguística Aplicada, Prática de Ensino e avaliação de leitura, Prática de Ensino e avaliação de escrita e Letramento como prática social. Para finalizar Tópicos Integradores III, será o momento da unidade IV, onde vamos relembrar como elaborar um plano de aula, elemento de integração destas disciplinas. Ao longo do curso você já deve ter elaborado alguns para outras disciplinas, sobretudo a de Estágio. Pois bem, nesta, você irá colocar em prática, mais uma vez, o que aprendeu sobre elaboração de planos de aulas como elemento integrador dos conteúdos estudados em Tópicos Integradores III. Bem, esta é nossa disciplina de Tópicos Integradores III. Espero que nossa caminhada ao longo dessas 4 unidades seja feita em conjunto, de forma bastante produtiva e que possamos construir um produto final de qualidade. É isto, bom estudo e vamos lá! 6 SEmÂNTiCA: CoNCEiTuANDo O estudo da semântica surgiu no início do século XIX quando o filólogo francês Michel Bréal, considerado como um dos fundadores da semântica moderna, lançou o seu “Essai de sémantique” ou “Ensaio sobre a semântica”, cujo livro o autor divide em 3 partes: ü a primeira, onde ele aborda questões sobre fonética e fonologia; ü a segunda, que trata questões especificamente sobre semântica, como a polissemia, a metáfora, restrição de sentido, etc.; ü a terceira e última parte, onde consta a área da sintaxe, Tenha acesso ao assunto nas páginas 2 e 3 do artigo “O que é semântica” do Professor da USP (Universidade de São Paulo) Ataliba de Castilho, disponível neste LINK: O filólogo francês Bréal, estabeleceu os princípios da chamada semântica diacrônica, cuja finalidade era estudar a mudança de sentido numa linha temporal, ou seja, analisava as transformações de sentido e significado que uma palavra sofreu ao longo dos anos. LEiTurA ComPLEmENTAr Para que você se aprofunde mais sobre Michel Bréal, indico um artigo muito interessante intitulado de “A semântica de Michel Bréal: uma abordagem baseada no uso”, da Doutora em Filologia e Língua Portuguesa, Márcia Seide, que você pode encontrar publicado nos Cadernos do IL, disponível na web, através do LINK. Quero chamar a sua atenção, meu (minha) caro (a), para o fato de que os estudos a respeito da semântica ganharam força em decorrência de uma necessidade de se estudar o sentido das palavras e frases, tendo em vista que o significado é o elemento central e determinante na atividade linguística. Esse é um dos motivos da semântica não ser chamada de ciência, uma vez que a ciência trata de investigações definidas e do aperfeiçoamento de métodos de análise que geralmente envolve certezas, enquanto que a semântica lida com investigações movediças, seu campo de estudo e análise abarca elementos que não possibilitam certezas, uma vez que o significado é relativo. A grande mudança dos estudos semânticos se deu com a influência do nosso amigo, já citado, Ferdinand de Saussure, e suas dicotomias. A partir do surgimento da teoria do linguista suíço, a semântica nunca mais parou de ser estudada. Conceituando a semântica, ela estuda, de forma sincrônica e diacrônica, a significação como parte dos sistemas linguísticos, ou seja, estuda o componente do sentido das palavras e da interpretação das sentenças e dos enunciados. Desta forma, ela investiga os sentidos expressos nas línguas naturais, debruçando-se sobre os seus processos de construção e sobre os produtos que deles resultaram. Resumindo, querido (a) aluno (a), a semântica é o estudo do significado,também conhecida como teoria da significação. https://docplayer.com.br/8920020-O-que-e-a-semantica.html https://seer.ufrgs.br/cadernosdoil/article/view/28197/18803 7 Bom, já que você estudou o panorama histórico da semântica, agora vamos nos debruçar sobre as semânticas. É isso mesmo, meu (minha) caro (a)! Como o campo de análise dos significados é vasto e extenso, surgiu uma necessidade de dividir os estudos e, a partir disto, passou a existir os vários tipos de semântica, como você pode ver nas páginas 17 a 19 do seu livro texto, dentre elas: ü Geral - Cujo foco de estudo é a unicidade do sentido. Pode-se dizer que essa é “semântica mãe”, a que estuda o sentido de forma única e geral; ü Lexical - Também conhecida por sintagmática, aborda o sentido das palavras, onde estes são defini- dos levando em consideração a relação que as palavras possuem umas com as outras, possibilitando diversas significações; ü Gramatical - Cujo campo de estudo é o significado das construções. Esta semântica estuda a forma- ção dos traços adquiridos, ou seja, palavras que foram derivadas de outras e que carregam consigo traços semânticos de outras palavras; ü Discursiva - Também conhecida como pragmática, que trata das significações geradas entre o locu- tor e o signo linguístico. A semântica discursiva aborda as significações que são geradas no espaço existente entre o sujeito, ou interlocutor, e o signo linguístico; ou seja, as significações dadas ao signo não estão contidas nas construções gramaticais e sim na relação entre a palavra e o interlocutor; ü Cognitiva - Apresenta como campo a criação dos sentidos. Esta semântica trata o sentido como fruto da interação entre o sujeito (eu, você, sua mãe, sua namorada ou namorado, etc.) e o seu conhecimen- to de mundo, o contexto no qual ele está inserido. A semântica cognitiva recorre a outras áreas afins para fundamentar sua teoria, como, por exemplo, a psicologia e a psicolinguística; Para ler mais sobre o assunto, sugiro o artigo intitulado “Semântica Cognitiva”, de autoria de Paula Lenz e publicado no livro “Semântica, Semânticas”, organização de Celso Ferrarezi Junior e Renato Basso, que você pode encontrar disponível na biblioteca on-line; ü Gerativa - Estabelece modelos de invariância de sentido. Também conhecida como generativa e elaborada pelo linguista Noam Chomsky, apresenta uma teoria semântica que visa estabelecer uma lista dos conceitos possíveis, numa tentativa de estabelecer uma matriz semântica universal; ü Diacrônica - Como já vimos, estuda a mudança de sentidos. Como vimos anteriormente, a semânti- ca diacrônica é a que estuda as alterações de sentidos nas palavras no decorrer do tempo, dos anos. SiGNo: BrEVE rEViSÃo DE CoNCEiToS Antes de nos debruçarmos sobre o signo linguístico, vamos falar um pouco sobre Saussure? Saussure foi um linguista e filósofo suíço, que nasceu/ viveu durante o século XIX e faleceu no início do século XX. Seu livro de maior importância é o Curso de Linguística Geral, ou popularmente conhecido como CLG, lançado em 1916, 3 anos após a sua morte, por dois de seus alunos: Charles Bally e Albert Sechehaye. Saussure foi, e ainda é considerado, o pai da linguística moderna e seus estudos tiveram muita influência em outras áreas, como, por exemplo, na literatura. 8 Agora, vamos relembrar uma teoria base para a linguística estruturalista e que todo e qualquer estudante de Letras sabe na ponta da língua. Trata-se da Teoria do Signo Linguístico que defende que o signo é constituído por uma junção entre um significante e um significado. O que seria isso? Vou explicar melhor para você. O significante é uma imagem acústica do som produzido pelo falante, ou seja, quando alguém fala casa, seu cérebro automaticamente te remete à imagem daquele ambiente com quartos, sala, cozinha, banheiro, área de serviço, etc. Após seu cérebro te remeter a esta imagem, ele cria um conceito de casa, seja esse conceito, um lar, uma estrutura arquitetônica, uma moradia, etc. Este conceito, formado pelo cérebro, é chamado de significado. SIGNIFICANTE: C-A-S-A (Imagem acústica formada pelo cérebro. Você pode referenciar aquele desenho de uma casa que fazemos quando criança). SIGNIFICADO: 1. Nome comum a todas as construções destinadas a moradia; 2. Moradia, residência, vivenda; 3. Estabelecimento, firma comercial; 4. Família, lar. Esses são os quatro primeiros conceitos sobre o verbete casa informados no dicionário Michaelis, disponível na web através do LINK: Figura 1. Fonte: Livro texto Linguística I, pg. 48. Desta forma, o signo linguístico é formado pela união, indissociável, de um significante e um significado, em outras palavras, de uma imagem acústica com um conceito. Outra característica do signo é a linearidade, ou seja, cada som, cada fonema, é produzido um por vez. Primeiro você reproduz o /k/, depois o /a/, em seguida o /z/ e, por fim, o /a/, formando, assim, um significante linear. Arbitrariedade Em sua teoria, Saussure afirma a arbitrariedade do signo linguístico, ou seja, o fato de que a relação entre o significante e o significado não possuem relações fonéticas exatas. Para isso, vou te dar um exemplo, a palavra /casa/ não possui relação significado – objeto, sendo assim, se quando a construção de moradia foi nomeada de casa, tivesse sido nomeada de orla, hoje moraríamos em orlas, isso tudo porque a escolha desses 4 fonemas não possui relação com o objeto em si. Em contraponto, Saussure relata uma série de palavras as quais ele nomeia de semiarbitrárias, ou seja, palavras cujo significante possuem uma relação, como é o caso das onomatopeias que são tentativas de reproduzir sons da natureza. https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/casa/ 9 Linearidade Outra característica do signo linguístico, de acordo com Saussure, no CLG (Curso de Linguística Geral), é a linearidade do mesmo. O que isso quer dizer, querido (a) aluno (a)? Quer dizer que, ao reproduzirmos um signo, não falamos todos os fonemas ao mesmo tempo e sim um por vez, formando uma linha, permitindo que o significante seja assim, linear, como afirma Saussure “O significante, sendo de natureza auditiva, desenvolve-se no tempo, unicamente, e tem as características que toma do tempo: a) representa uma extensão, e b) essa extensão é mensurável numa só dimensão: é uma linha” (pg. 84). ENuNCiAÇÃo E ArGumENTAÇÃo Prezado (a) estudante, neste tópico iremos tratar destes dois elementos tão significantes para o estudo dos significados, a enunciação e a argumentação. Mas, antes de nos aprofundarmos sobre a enunciação e a argumentação, quero relembrar a dicotomia saussuriana: língua x fala. De acordo com o linguista suíço, Ferdinand de Saussure, em seu Curso de Linguística Geral, a língua possuía um caráter científico, fazendo surgir dicotomias essenciais para a perspectiva do estudo da linguagem, sendo elas: ü Língua x Fala ü Sincronia x Diacronia ü Significante x Significado ü Relações associativas x Relações sintagmáticas Saussure acreditava que a língua era uma construção coletiva, um produto social, um sistema de valores onde os elementos se opõem uns aos outros na mente de cada falante, sem sofrer variação de acordo com o sujeito, tornando-se assim, algo homogêneo. Pela língua apresentar estas características, ela se torna objeto dos estudos linguísticos, material de pesquisa científica. Quanto à fala, Saussure defendia que era um ato individual, que está sujeita à influência do meio externo, moldada de acordo com o falante e, portanto, heterogênea. Argumentação e Enunciação A argumentação é o objeto de investigação da semântica argumentativa e define-se como “uma forma particular de estruturação da linguagem, desenvolvida, sobretudo, na intenção entre interlocutores, que se presta, grosso modo, a explicar uma situação, defender uma tese ou justificar uma ação” (KOCH, 2011 apud DIENSTBACH, 2017). A Teoria da Argumentação na língua (ANL), elaborada porOswald Ducrot e Jean-Claude Anscombre, coloca a argumentação como fator essencial para a apreensão do sentido do enunciado, uma vez que 10 este sentido está inscrito na língua. Para os autores, “a linguagem coloca a subjetividade do eu na interpretação, ou seja, o locutor expressa seu ponto de vista no discurso, por isso não é mais possível aceitar o caráter objetivo da linguagem. Dessa forma, a argumentação é uma subjetividade inevitável e das relações subjetivas e intersubjetivas depreende-se uma concepção enunciativa de linguagem”, conforme Cristina Rörig, disponível no LINK. Da ANL, Ducrot elabora, junto com Marion Carel, a Teoria dos Blocos Semânticos (TBS), uma teoria da argumentação essencialmente linguística que busca descrever o sentido dos enunciados pela língua, sem recorrer às estratégias extralinguísticas, como faz a argumentação retórica, como podemos ver no trecho abaixo: Diferentemente da argumentação retórica, a argumentação linguística de que ele e Carel se ocupam, considera a persuasão unicamente pela palavra, pelo discurso. Por essa perspectiva, o que Ducrot chama de argumentação linguística, ou abreviadamente, argumentação, são segmentos de discurso constituídos pelo encadeamento de duas proposições, A (argumento) e C (conclusão), ligadas implícita ou explicitamente por conectores como portanto (donc) e no entanto (pourtant). Mas Ducrot refuta a interpretação de A (argumento), justificando C (conclusão), embora entenda que essa interpretação faça parte dos conhecimentos metalinguísticos dos falantes e constitua um nível incontestável da compreensão dos encadeamentos em portanto ou em no entanto. A ideia de base da teoria criada por ele e Anscombre, e desenvolvida por Carel, é que nesses encadeamentos, o sentido do argumento A contém em si a indicação, ou a instrução, de que ele deve ser completado pela conclusão C. Em outras palavras, a teoria postula que em um encadeamento como Tu diriges depressa demais (A), tu corres o risco de sofrer acidente (C)2, o sentido de C já está no segmento A: dirigir depressa demais significa velocidade perigosa. E, nesse sentido, a explicitação do conector é meramente ilustrativa. A prova disso é que para acessar o sentido constituído pelos dois segmentos não se precisa do conector (GOMES, 2016, p. 66). Agora que estudamos sobre a argumentação, vamos à enunciação e começamos buscando o significado de enunciação no nosso amigo dicionário, encontramos a seguinte definição: “1 Ato ou efeito de enunciar (-se); 2. Expressão oral ou por escrito; 3. LÓG Aquilo que é suscetível de ser verdadeiro ou falso; juízo expresso por palavras; tese; 4. LING Utilização da língua pelo falante ao produzir um enunciado em determinado contexto.” Se atentarmos ao item 4, o significado para a linguística, vemos que a enunciação diz respeito ao evento de uso da língua em um determinado contexto e, indo além do que o dicionário nos diz, acrescentamos que ela se faz por meio de 1 agente: o enunciador, resultando em um produto, fruto desta enunciação, o enunciado. Para Émile Beneviste, a enunciação diz respeito ao ato de dizer em que o sujeito se apropria da língua para uma manifestação individual, trata-se do ponto de mediação entre a língua e a fala, ou langue e parole, uma das dicotomias saussuriana. http://www.pucrs.br/edipucrs/IVmostra/IV_MOSTRA_PDF/Letras/72179-CRISTINA_RORIG.pdf 11 Ao tratar de enunciação, é primordial falarmos de subjetividade, de acordo com o linguista francês Émile Beneviste, tendo em vista que esse tende a indicar os agentes envolvidos em um enunciado, como podemos ver na citação de Fontana e Oliveira (2016, p. 128), disponível através do LINK. A subjetividade assim quando observada, nos modos que a língua no acontecimento da enunciação oferece para apresentar a relação com o falante, é tomada como efeito da exterioridade constitutiva, pela inscrição necessária daquele que fala numa posição-sujeito no interdiscurso, o que faz com que estar em uma língua implique em “habitar” espaços políticos de tomada da palavra, movimentados pelas relações ideológicas de divisão do real, que Guimarães denomina espaços de enunciação, e caracteriza como espaços políticos de funcionamento de línguas, “que se dividem, se misturam, desfazem, transformam por uma disputa incessante. São espaços “habitados” por falantes, ou seja, por sujeitos divididos por seus direitos ao dizer e aos modos de dizer. [...]” (GUIMARÃES, 2002, p. 18). A subjetividade pode ser identificada ao longo da enunciação através dos dêiticos, elementos que indicam lugar, tempo ou participante de uma situação enunciativa. Para que você entenda melhor, vou exemplificar, se eu falo a seguinte frase “Eu comprei um livro ontem na estante virtual”, podemos identificar o sujeito Eu falando para um Tu, o tempo passado (ontem) e o um espaço determinado, um lugar (site estante virtual). Entendido? Para explorar mais este conteúdo, trago abaixo um trecho presente no livro texto Linguística Avançada, disponível para vocês na biblioteca virtual da Editora SAGAH: O objeto da teoria da enunciação é o enunciado: o que é dito em mais de uma situação enunciativa. Assim, o enunciado é remetido à enunciação para que ela, servindo de contexto situacional, auxilie na compreensão do sentido do que está sendo dito. O que é dito só tem sentindo se as categorias linguísticas sejam tomadas em relação à determinada situação enunciativa. Pronomes, numerais, advérbios, só têm sentido se tiverem relação com as categorias enunciativas. As marcas enunciativas, os dêiticos, são: Eu/Tu; o Aqui e o Agora (EGO-HIC-NUNC, termos do latim usados por Beneviste para indicar as categorias iniciativas, pois o linguista percebeu que essas categorias estavam presentes na maioria das línguas naturais: sujeito, espaço e tempo). Um enunciado, portanto, só pode ser interpretado em relação a um Eu que fala para um Tu; em um tempo dado: o agora; e em um espaço determinado: o aqui (NOBLE, 2017, p. 57). Ainda no nosso estudo sobre a enunciação, vimos a visão do linguista francês Émile Beneviste, mas também a do linguista francês Oswald Ducrot, analisando a enunciação de uma maneira diferente. Para Ducrot, a enunciação permite que uma frase se realize de forma concreta e transforma-se em enunciado, podendo conter um ou vários sujeitos que seriam a sua origem. O francês também defende a distinção destes sujeitos em dois tipos de personagens: os enunciadores, sujeito falante e ser empírico, e os locutores, ser do discurso, como você pode ver no artigo Argumentação linguística, enunciação e polifonia, de autoria de Neiva Gomes, disponível no seguinte endereço da web: LINK. http://www.revistas.usp.br/linhadagua/article/view/120001/120196 http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/21557/14338 12 Leia um trecho do artigo: Em relação à noção de locutor, ele distingue ainda “o locutor enquanto tal” (por abreviação L), do locutor enquanto ser do mundo. L é o responsável pela enunciação e é considerado unicamente por essa propriedade (1987, p. 188). Ele denomina como enunciadores os seres que se expressam através da enunciação, sem que para isso lhes sejam atribuídas palavras precisas. Enunciadores são pontos de vista, posições expressas pela enunciação. O estudo linguístico da origem desses diferentes pontos de vista constitui a Teoria Argumentativa da Polifonia. O conceito de polifonia diz respeito aos desdobramentos da significação que um determinado enunciado pode conter, ou seja, um enunciado pode ser considerado polifônico quando as intenções do enunciador são insinuadas, como quando as figuras de linguagem ironia e metáfora são utilizadas. A polifonia nos permite identificar as várias vozes simultâneas dentro do texto, indicadas por determinados elementos como a utilização do discurso indireto livre, a intertextualidade, os operadores argumentativos e os marcadores de pressuposição, como podemos observar na charge abaixo,onde podemos pressupor que Fogaça já foi prefeito, tendo em vista que deseja ser “de novo”. Figura 2. Fonte: LINK. LEiTurA ComPLEmENTAr Para maior aprofundamento sobre a polifonia, de acordo com a ótima de Ducrot, oriento a leitura do artigo de autoria de Neiva Gomes, publicado na Revista Eletrônica Letras de Hoje, da PUCRS, disponível no seguinte LINK. http://3.bp.blogspot.com/-uHMAawpgdwU/UKq1gWizuRI/AAAAAAAAAFg/xGEAQZOs-WE/s1600/subentendido.jpg http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/21557/14338 13 SiGNiFiCAÇÃo E CoNTEXTo Para a linguística moderna, língua e fala são dois elementos distintos que se complementam. A língua apresenta estruturas intrínsecas que não sofrerão variação, uma vez que ela é um conjunto de convenções necessárias adotadas pela organização social. O que isto quer dizer? Quer dizer que, independente de quem a fale, a língua não sofrerá alteração, enquanto que a fala sofre influência direta do sujeito falante e/ou do ouvinte, ou seja, dependendo de quem seja nosso interlocutor, a nossa fala sofrerá variação. Para que você entenda melhor, que tal um exercício bem simples? Quero que você vasculhe a sua memória e me responda: Você fala com a sua mãe do mesmo jeito que fala com a sua namorada ou namorado? E com os seus amigos, você conversa com eles igual conversa com seu (sua) chefe? E no bar? Você fala no bar da mesma forma que fala na faculdade quando está apresentando algum trabalho? E quanto às crianças... você conversa com elas do mesmo jeito que conversa com um adulto e/ou um idoso? Tenho certeza que a sua resposta será um não. E você sabe por quê? Porque a língua é como uma roupa, nós a usamos de acordo com a situação, ocasião e com quem estamos nos comunicando. Por exemplo, você ao conversar com um estrangeiro que esteja aprendendo português, irá utilizar palavras mais simples e de mais fácil compreensão para que o entendimento entre ambos seja feito com sucesso. Porém, se estiver apresentando um trabalho na faculdade irá usar uma linguagem mais rebuscada e culta. As mudanças de significado num verbete da língua podem se dar por diversas causas, diversos contextos, entre eles: ü Causas Linguísticas Essa modificação se dá através da transferência de sentido que a palavra sofre ao decorrer dos anos, como é o caso do exemplo que já mencionamos durante as unidades passadas, acerca do pronome de tratamento “vossa mercê” que era empregado para se referir ao rei, mas foi sofrendo modificações fonéticas e evoluindo linguisticamente, virando vosmecê, vossuncê, mecê, vacê até chegar ao nosso pronome você e, em alguns casos, especialmente na fala caipira, ocê, e cê, na fala jovial; ü Causas Históricas As causas de mudança de significado históricas ocorrem semelhantes às linguísticas, só que partem de fora (sociedade) para dentro (língua). A palavra átomo é um excelente exemplo, uma vez que era composta pelo prefixo de negação ‘a’ e por tomo, que significa parte, e definia algo indivisível, porém pesquisas científicas já mostram que o átomo é sim divisível. 14 ü Causas Sociais O contexto histórico-social é de suma importância no que diz respeito ao sentido das palavras. Vamos exemplificar... Durante o ano de 2013 houve muitos protestos no país que foram iniciados com o aumento das passagens em São Paulo e que se estendeu contra a corrupção instaurada no Brasil. Junto com esses protestos, um grupo de resistência e luta, intitulados Black Blocks, ganhou força e algumas manchetes de jornal. Com isso, os termos vandalismo e vândalos foram bastante pronunciados e disseminados, mas a origem do termo vem dos vândalos, povos guerreiros que invadiram e saquearam Roma. Hoje, especialmente no Brasil, este termo é designado para definir pessoas que brigam nas ruas e destroem patrimônio, principalmente o público. ü Causas Psicológicas As causas psicológicas estão ligadas ao tabu, que aproveitamos e explicamos aqui para você. Os tabus linguísticos são aqueles termos que não são pronunciados por receio quanto a sua carga semântica, palavras que lhe foram atribuídos significados pejorativos e que acabaram referenciando coisas difíceis de discutir. Os tabus podem ser próprios, que diz respeito a proibição de certas palavras, que possuem um poder “sobrenatural ou mágico”; ou impróprios, cuja proibição está ligada a termos grosseiros ou imorais, como você pode ver na página 365 do artigo “Aspectos semântico-lexicais dos tabus linguísticos em atlas linguísticos estaduais”, da Professora da Universidade Estadual de Santa Cruz, Laura de Almeida, disponível on-line no LINK. Como consequência dessa mudança semântica, as palavras ganham um sentido pejorativo e um ameliorativo. Você deve estar se perguntando o que vem a ser isso, não é verdade? Calma, querido (a) aluno (a) que iremos te explicar! Sentido pejorativo é quando uma palavra ganha um significado negativo e este se sobressai, tornando desconhecido, muitas vezes o sentido real, como é o caso da palavra “paraiba”, por exemplo, usada para definir qualquer nordestino que migra para as regiões sul e sudeste à procura de emprego. Ao contrário do pejorativo, o sentido ameliorativo minimiza o teor negativo que a palavra possui. Um bom exemplo é a palavra “monstro” que surgiu para definir animais estranhos, em seguida passou a ser o vilão de histórias infantis e agora lhe foi atribuído um sentido bom, similar ao da palavra mestre. Na frase “Niemeyer era um monstro da arquitetura”, a palavra assume um sentido bom, de expert no assunto. https://www.revistas.usp.br/tradterm/article/download/36768/39490/ 15 PALAVrAS FiNAiS Do ProFESSor Prezado (a) estudante, chegamos ao final de mais uma unidade da nossa disciplina de Tópicos Integradores III, que visa integrar conteúdos estudados em outras 3 disciplinas escolhidas: Fonética e Fonologia do Português, Semântica do Português e Linguística Aplicada ao Ensino do Português. Nesta segunda unidade, revisamos os conteúdos estudados em semântica. Iniciamos com a conceituação da semântica, área que estuda, de forma sincrônica e diacrônica, a significação como parte dos sistemas linguísticos, ou seja, estuda o componente do sentido das palavras e da interpretação das sentenças e dos enunciados. Em seguida, fomos ao signo linguístico e seus conceitos. De acordo com o suíço Ferdinand de Saussure, o signo linguístico é a união indissociável de um significante, imagem acústica, e significado, conceito. Dentro dos estudos do signo, vimos também as características do signo, como a arbitrariedade e a linearidade. Caminhando com a unidade 2, revimos também, a argumentação e a enunciação, de acordo com as teorias de Ducrot e Beneviste. Iniciamos ainda com a revisão de Saussure sobre suas dicotomias Língua x Fala, Sincronia x Diacronia, Significante X Significado e Relações associativas x Relações sintagmáticas. Depois vimos a argumentação, objeto de investigação da semântica argumentativa; a enunciação que, de acordo com Beneviste, trata-se do ponto de mediação entre a língua e a fala; e a polifonia, as várias vozes simultâneas dentro do texto, os desdobramentos da significação que um determinado enunciado pode conter. Por fim, estudamos a significação e o contexto e as causas que uma palavra muda de significado, como as linguísticas, transferência de sentidos de acordo com os anos; históricas, onde a mudança de significado acontece semelhante às linguísticas, só que parte de fora (sociedade) para dentro (língua); sociais, onde o meio social interfere diretamente nas alterações de significados; e psicológicas, que estão ligadas ao tabu linguístico. Bem, meu (minha) caro (a), espero que nossa caminhada relembrando conteúdos estudados na disciplina de semântica tenha sido bastante prazerosa e que você possa ter compreendido, até agora, o que preza a nossa disciplina, a integração de conteúdos. Bom estudo e nos encontramos na unidade 3! 16 rEFErÊNCiAS BiBLioGráFiCAS ALMEIDA, Laura de.Aspectos semântico-lexicais dos tabus linguísticos em atlas linguísticos estaduais. Revista da USP. São Paulo: USP, 2011. Disponível em: http:// www.revistas.usp.br/tradterm/article/view/36768. Acesso em 19 de jun de 2019. CASTILHO, Ataliba T. de. O que é semântica? Disponível em: https://docplayer.com. br/8920020-O-que-e-a-semantica.html. Acesso em 20 de jun de 2019. GOMES, Neiva Maria Tebaldi. Argumentação Linguística, enunciação e polifonia. Revista Letras de Hoje. Porto Alegre: PUCRS, 2016. Disponível em: http:// revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/21557/14338. Acesso em 20 de jun de 2019. RÖRIG, Cristina; BARBISAN, Leci Borges. A enunciação na teoria da argumentação na língua. III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação. Porto Alegre: PUCRS, 2008. Disponível em: http://www.pucrs.br/edipucrs/IVmostra/IV_MOSTRA_PDF/Letras/72179- CRISTINA_RORIG.pdf. Acesso em: 19 de jun de 219. SEIDE, Márcia Sipavicius. A semântica de Michel Bréal: uma abordagem baseada no uso. Cadernos do IL. Porto Alegre: UFRGS, 2012. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/ cadernosdoil/article/view/28197/18803. Acesso em: 18 de jun de 2019. ZOPPI-FONTANA, Mónica; OLIVEIRA, Sheila Elias de. Tá serto! Só que não... Argumentação, enunciação, interdiscurso. Revista Linha DÁgua. São Paulo: USP, 2016. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/linhadagua/article/view/120001/120196. Acesso em 20 de jun de 2019. http://www.revistas.usp.br/tradterm/article/view/36768 http://www.revistas.usp.br/tradterm/article/view/36768 https://docplayer.com.br/8920020-O-que-e-a-semantica.html https://docplayer.com.br/8920020-O-que-e-a-semantica.html http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/21557/14338 http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/21557/14338 http://www.pucrs.br/edipucrs/IVmostra/IV_MOSTRA_PDF/Letras/72179-CRISTINA_RORIG.pdf http://www.pucrs.br/edipucrs/IVmostra/IV_MOSTRA_PDF/Letras/72179-CRISTINA_RORIG.pdf https://seer.ufrgs.br/cadernosdoil/article/view/28197/18803 https://seer.ufrgs.br/cadernosdoil/article/view/28197/18803 http://www.revistas.usp.br/linhadagua/article/view/120001/120196 _Hlk11870141 _Hlk11871261 _Hlk11871139 _Hlk11871352 _GoBack SEMÂNTICA: CONCEITUANDO SIGNO: BREVE REVISÃO DE CONCEITOS ENUNCIAÇÃO E ARGUMENTAÇÃO Argumentação e Enunciação SIGNIFICAÇÃO E CONTEXTO