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Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Sociais Aplicadas/Programa de Pós- Graduação em Educação Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais – Abordagens Históricas, Educativas e Literárias As mudanças na educação do RN nos idos de 1950 e 1960: a prática de Lia Campos Daniela Fonsêca Vieira Orientadora: Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais NATAL – RN 2005 2 Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Sociais Aplicadas/Programa de Pós-Graduação em Educação Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais – Abordagens Históricas, Educativas e Literárias As mudanças da educação do RN nos idos de 1950 e 1960: a prática de Lia Campos Daniela Fonsêca Vieira Orientadora: Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais NATAL – RN 2005 3 Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção de título de Mestre em Educação, à Banca Examinadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob a orientação da Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais. 4 As mudanças da educação do RN nos idos de 1950 e 1960: a prática de Lia Campos Dissertação defendida em ____/____/____ Mestranda: Daniela Fonsêca Vieira Banca Examinadora: ______________________________________________________ Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais – Orientadora/ UFRN. ______________________________________________________ Profª Drª Maria Inês Sucupira Stamatto/UFRN – (Titular) ______________________________________________________ Prof Dr Charliton José dos Santos Machado/UFPB – (Titular) ______________________________________________________ Profª Drª Maria Lúcia da Silva Nunes/FUNDESCOLA/MEC-PB – (Suplente) 5 Agradecimentos A Deus, fonte inesgotável de força, luz e sabedoria em todos os dias da minha vida. À professora e orientadora Maria Arisnete Câmara de Morais que muito me ensina através de seus recados. Ao Instituto Histórico e Geográfico e Arquivo Público do Rio Grande do Norte pela disponibilidade do material pesquisado. Aos meus queridos pais, José Vieira e Cícera, minha eterna gratidão pelo que tenho e o que sou. Ao meu irmão, Augusto César, que pela sua irreverência não me deixava desanimar. A Luiz José de Sant’Anna Neto, amor que me encoraja na perspectiva de um futuro. À amiga de todas as horas Amélia Cristina, em especial, pela divisão de angústias passageiras e momentos de alegria. Ao amigo Manoel Pereira da Rocha Neto, pelos esclarecimentos prestados e disponibilidade. Ao amigo Marcos Antônio Silva, pela amizade, compreensão e flexibilidade. Aos que fazem o Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos do RN, onde trabalho e aprendo, a cada dia, a importância da vida. Aos integrantes da Base de Pesquisa Gênero e Práticas Culturais pelo companheirismo. 6 [...] sinto-me cada vez mais ligada, afetivamente, à vida desse Estado, onde tive a oportunidade de prestar a minha modesta contribuição na sua área educacional, contando com a colaboração de educadores devotados, que muito contribuíram, para a conquista das metas programadas (Lia Campos, 1975). 7 Dedico este trabalho à memória da professora Lia Campos. 8 RESUMO O presente estudo investiga e analisa a participação da professora Lia Campos, durante as décadas de 1950 e 1960, na organização educacional norte-riograndense. A escolha do período justifica-se por ser esse o tempo em que essa professora gaúcha permanece nas terras potiguares, trabalhando em prol da educação. Na busca de dados que me informassem acerca de suas ações, percorro acervos como Arquivo Público do Rio Grande do Norte, Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e Centro de Estudos Supletivos Professora Lia Campos, na tarefa de garimpar fotografias e relatos orais de amigos e colegas de trabalho, jornais da época, leis e decretos. Alicerçado no ensino primário, o trabalho de Lia Campos ressalta a relevância da formação docente para esse nível de ensino e o modo como os que nele trabalham podem conduzir suas concepções e fazeres da prática diária. Dessa forma, constato que a referida professora promove, nesse Estado, uma série de atividades como: levantamento e sistematização da rede escolar; organização dos quadros administrativos das escolas; capacitações e cursos de aperfeiçoamento para professores leigos, bem como implantação da Lei da Educação nº 2.171/1957. Através dessa análise, mostro como essa professora deixou impressa a sua marca na historiografia do Rio Grande do Norte por meio das suas ações, sendo por isso lembrada pelos que acompanharam sua experiência em terras norte-riograndenses. Palavras-chave: Educação. Professora. Lia Campos. Rio Grande do Norte 9 ABSTRACT The present study investigates and analyzes the participation of the teacher Lia Campos, during the 50’s and 60’s years, in the norte-riograndense educational organization. The choice of the period is justified because was at this the time what this teacher remained in the potiguar lands, working in favor of the education. In the search of data that informed me concerning her actions, I cover quantities as the Public Archive of the Great River of the North, Historical Institute and Geographic of the Rio Grande do Norte and the Center of Supplementary Studies Teacher Lia Campos, in the task to obtain photographs and verbal stories of friends and fellow workers, periodicals of the time, laws and decrees. Based on the primary education, the work of Lia Campos shows the relevance of the teaching formation for this level of education and the way as the ones that in it work can lead their conceptions and daily practical tasks. This way, I evidence that the cited teacher promotes, in this State, a series of activities as: survey and systematization of the school net; organization of the administrative stuff of the schools; qualifications and courses of improving for lay professors, as well as implantation of the Law of the Education nº 2.171/1957. Through this analysis I show as this teacher left printed her mark in the Rio Grande do Norte historiography by means of her actions, being therefore remembered for that they had followed her experience in norte- riograndense lands. Key-words: Education. Teacher. Lia Campos. Rio Grande do Norte 10 SUMÁRIO 1. Traços de uma trajetória 12 2. Procedimentos metodológicos 23 3. Lia Campos 32 4. O Rio Grande do Norte no plano político-educacional 42 5. A prática de Lia Campos 78 6. Algumas considerações 94 Referências 99 11 Traços de uma trajetória 12 1 – Traços de uma trajetória ste estudo investiga e analisa a participação da professora Lia Campos, entre as décadas de 1950 e 1960, na educação norte- riograndense quando sistematizou as bases da Secretaria de Educação. Tal interesse desponta da minha trajetória no curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no qual ingressei no ano de 1999. Meus primeiros passos na Universidade são tomados por expectativas, entusiasmos, desejos e receios. O universo que ora se descortinava na minha presença evidenciava-se como um espaço instigador de responsabilidades solitárias e de buscas incessantes por respostas a questões que a cada aula surgiam. E Durante as aulas da disciplina Fundamentos Histórico-Filosóficos da Educação, primeira disciplina com a qual tive contato, comecei a conhecer os alicerces da História da Educação em vários lugares do mundo e que ficaram de legado para a educação no Brasil. Seguindo o caminho proposto pelo currículo do curso, em 2000, matriculei-me na disciplina História da Educação, a grande responsável pelo despertar de uma curiosidade a respeito de como se constituiu a educação no Brasil e de que maneira os processos do passado se refletem no contexto da educação atual. Essa disciplina apresentou-me também o movimento pela educaçãoa serviço da democracia, a Escola Nova, que reuniu personalidades engajadas no propósito de colocar a educação em defesa da cidadania – uma proposta que parece pertencer, aos menos avisados, tão somente a situação educacional contemporânea. Os integrantes desse movimento, José Augusto, 13 no Rio Grande do Norte; Sampaio Dória, em São Paulo; Lourenço Filho, no Ceará; Anísio Teixeira, na Bahia; Fernando de Azevedo, no Distrito Federal, entre outros, partiam da suposição de que a educação brasileira, tradicionalmente, dirigia-se a determinados segmentos da sociedade ou visava exclusivamente à formação profissional. Com o ensejo de sobrelevar essa realidade, conceberam reformas educacionais abrangentes, objetivando tanto os diversos níveis de ensino, como os procedimentos didáticos (PINTO, 1986). As discussões sobre a Escola Nova, aliadas às informações apresentadas sobre o que acontecia em âmbito local, no contexto social e educacional, moveram-me a estudar, a deter-me ainda mais sobre a história da Educação no Brasil. No entanto, só o ambiente de sala de aula não era o bastante. Nesse mesmo ano, procurei integrar-me a uma Base de Pesquisa que trabalhasse com o tema. Foi quando conheci a Base de Pesquisa Gênero e Práticas Culturais: abordagens históricas, educativas e literárias coordenada pela professora Maria Arisnete Câmara de Morais. A referida Base de Pesquisa está vinculada ao Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Política e Cultura – NEPEPC – sendo composta por professores pesquisadores, estudantes de Pós-Graduação em Educação e de iniciação científica das mais diversas áreas de estudo como Letras, Pedagogia, História, Jornalismo e Ciências Sociais. Conduzida pela minha curiosidade e pela vontade de aprender, tornei- me aluna de Iniciação Científica, participando do Projeto Integrado História dos Impressos e a Formação das Leitoras, aprovado pelo CNPq, que pretende com os estudos das relações sociais de gênero, com suas diferenças e semelhanças compreender historicamente o papel da mulher na sociedade, 14 para melhor entender a interação homem e mulher, segundo valores e interdependências historicamente constituídos (MORAIS, 2000-2004, p. 10). A Base de Pesquisa objetiva, assim, contribuir para a história da educação no Brasil, e em especial, no Rio Grande do Norte, através do Projeto Integrado que se firma no seguinte tripé: 1 – história dos impressos e a formação das leitoras; história do livro e das edições, sua circulação, maneiras de ler, indicações de leitura para mulher; história das disciplinas escolares, 2 – representações da mulher no romance; a visão que os escritores têm da mulher; como as mulheres vêem as representações das suas imagens?, 3 – participação de mulheres na construção de uma sociedade letrada brasileira, especialmente a norte-riograndense; prática de professoras, literatas ou participantes ativas na sociedade que associavam seus nomes ao esforço de educar gerações. Detendo-me no terceiro ponto deste tripé e através dos encontros semanais realizados no seminário Gênero, Educação e Literatura, oferecido aos alunos de Pós-Graduação em Educação, pude perceber que as mãos que escreveram essa história não eram apenas masculinas e que as mulheres tiveram uma participação efetiva na tarefa de executar e transformar o ensino, bem como formar gerações. A partir dessas discussões, conheci autores, como Roger Chartier, Michelle Perrot, Georges Duby, Jane Soares de Almeida, entre tantos outros, que tratam de aspectos históricos, culturais e de gênero, os quais fundamentam teórica e metodologicamente o estudo atual. Roger Chartier (1990), em sua obra A história cultural: entre práticas e representações, mostra a emergência de novos objetos no âmbito do fazer histórico, repercutindo na entrada do historiador em novos territórios e, ainda, 15 desvia a atenção para a história dos homens e das mulheres comuns, na intenção de compreender suas práticas culturais e as relações que estes estabelecem com o mundo. Da mesma maneira, Perrot (1998) no livro Os excluídos da história: operários, mulheres e prisioneiros, evidencia que aqueles que por muito tempo estiveram à margem da história podem ser analisados como objeto de pesquisa. A autora demonstra como as mulheres, na sociedade ocidental do século XIX, vão obtendo conquistas de oportunidades no espaço público. A leitura do livro A história continua (1993) de Duby mostra e analisa os caminhos trilhados por esse pesquisador, tratando de questões referentes às fontes, metodologia de pesquisa e o exercício solitário da escrita do trabalho historiográfico. Nessa descoberta bibliográfica encontrei-me com Almeida em sua obra Mulher e educação: a paixão pelo possível (1998). Este livro traça o percurso profissional feito pelas mulheres desde os fins do século XIX, quando estas ingressavam no mercado de trabalho como professoras primárias, fazendo de seus desejos, coragem e esforço o primeiro passo pra adentrar em um território imperado pelo poder masculino. Merecem destaque, também, as pesquisas desenvolvidas pelos componentes da Base de Pesquisa que auxiliam na reconstituição da participação feminina na esfera pública, quer na literatura, no magistério ou em quaisquer tipos de movimentação cultural ou social. Exemplos a serem citados são as pesquisa de Morais (2001), Isabel Gondim: educação enquanto prática de vida, e de Pinheiro (1998), Sinhazinha Wanderley: o cotidiano do Assu em prosa e verso. 16 Morais (2001) analisa a produção textual e a prática educativa de Isabel Urbana de Albuquerque Gondim. Esta mestra dedicou sua longa vida às letras, à educação e à história. Foi também pioneira em quase tudo que se propôs a fazer: escrever e publicar livros dedicados à educação e a primeira mulher a tornar-se sócia efetiva do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, em 29 de julho de 1928, “única mulher admitida em seu grêmio, por força de seus grandes merecimentos” (2001, p. 14). A Tese de Pinheiro (1998) aponta para uma professora que detinha práticas modernas. Sinhazinha Wanderley aboliu o castigo corporal e fez uso da música e do teatro como forma de representar o conteúdo por ela ministrado nas aulas. Essa professora ainda contribuiu para o meio artístico-cultural, ao compor hinos cívicos e religiosos; escrevendo artigos e poemas, colaborando com os jornais e revistas. Através dessas leituras percebi que as professoras são agentes sociais que têm uma responsabilidade direta nos processos educativos. São elas que propagam, discutem, indagam e corporificam todas as significativas teorias e concepções sociais acerca da educação institucional. Por isso, a importância da análise histórica de professoras se faz cada vez mais necessária em pesquisas e estudos. Continuando nesse percurso participei de eventos locais e regionais nos quais tive a oportunidade de expor o que vinha produzindo, o resultado dos estudos realizados enquanto aluna de iniciação científica. O primeiro evento do qual participei foi o XI Congresso de Iniciação Científica da UFRN, em 2000, juntamente com Hiltnar Silva Muniz, onde apresentei o trabalho O desafio da reconstrução de uma época, que mostrava 17 a tarefa de ir e vir aos arquivos em busca das fontes que fornecem informações acerca do trabalho a ser realizado. Em 2001, na cidade de São Luís/MA, ao participar do XV Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e Nordeste – EPENN, apresentei um trabalho que mostra como me constituí leitora, o que me levou por esse percurso, que contribuições essas leituras me proporcionaram quanto à formação pessoal e sócio-cultural e que obras se destacaram nesse caminho que até hoje percorro. Posteriormente, com a organização desse texto mais aprofundado, ele é publicado, com o título Minha vida de leitora, no livro Carrossel deleituras: ensaios de vida (2003, p. 95-98), organizado pela professora Maria Arisnete Câmara de Morais. Com a sistematização desses estudos, tive a oportunidade de publicar um artigo no periódico DaVinci: um suplemento de textos acadêmicos do jornal Diário de Natal (2002), cujo título é Estudos de Gênero: uma construção social, histórica e cultural, produzido juntamente com a também aluna bolsista, Amélia Cristina Reis e Silva. Tal artigo divulga parte da produção realizada na Base de Pesquisa, bem como mostra o referencial teórico que norteia os trabalhos nela concluídos. Esse constante movimento de estudos, discussões e pesquisas me fez perceber, entre tantas outras coisas, que a literatura também exerce o papel de fonte para as pesquisas históricas em educação e em outras áreas do conhecimento. Ainda, não cabe ao pesquisador fazer o papel de juiz da história, mas reconstituí-lo como lhe for possível, analisando os seus aspectos culturais, econômicos, educativos, étnicos e outros. E o mais importante é que, quando se trabalha com história, não se deve levar em consideração apenas a 18 história dos grandes homens e seus feitos, mas reconstituir os fatos, mostrando a história dos excluídos, das minorias (BURKE, 1992). Simultaneamente, prossegui desenvolvendo minhas atividades, ora assistindo a aulas e apresentações de teses e dissertações, ora estudando a bibliografia recomendada ou visitando os arquivos da cidade. Segundo Nunes (1990), nessa trajetória de visitas, vivenciamos os dois lados da busca: o angustiante e o encorajador. Angustiante, pois muitas vezes, diante dos percalços impostos por essa tarefa, pensamos em desistir, em buscar outro rumo. Encorajador, porque, na medida em que os documentos se mostram, e que aparecem diante de nossos olhos, percebemos o quanto ainda existe para ser descoberto, transpondo, dessa forma, todos os obstáculos impostos. O contato com os arquivos mostrava, a todo o tempo, como se configurava o Rio Grande do Norte e, mais especificamente, Natal: o que acontecia no plano social, político, econômico e educacional. A partir dessas atividades, tem início uma série de questionamentos: se as mulheres tinham sua participação na construção das sociedades, como se dava a sua educação? Como esse processo acontecia no Rio Grande do Norte? Enveredando pelo caminho que esses questionamentos me apontavam, iniciei a pesquisa que resultou no meu trabalho monográfico concluído no período letivo de 2002. Intitulado A educação da mulher na década de 1930: a Escola Normal de Natal. Essa pesquisa teve como objetivo reconstituir uma parcela da história da educação feminina em Natal, na década de 1930, abordando a sua organização curricular, o seu conteúdo de formação, a duração do curso, os métodos e a avaliação utilizados. A pesquisa revelou o 19 cotidiano da Escola Normal de Natal, sua organização enquanto instituição de ensino, como eram formadas as futuras professoras; o regimento interno da Escola e a relação que este tinha com os processos educativos vigentes na época e com a dinâmica política do Brasil do período. Seguindo os vestígios da década em estudo, 1930, no Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, deparei-me várias vezes nos jornais A República e Tribuna do Norte com o nome da professora Lia Campos (1928- 1979), pela qual me interessei. A convite do então governador, Dinarte Mariz, e do Secretário de Educação, Tarcísio de Vasconcelos Maia, Lia Campos veio ao Rio Grande do Norte coordenar cursos de aperfeiçoamento para professores, participando da sistematização da Secretaria de Educação e Cultura do Estado. Nesse período, Lia Campos fazia parte da equipe de Orientadores da Educação Primária do Centro de Pesquisas e Orientações Educacionais (CPOE) da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul. Compreendendo que pesquisas sobre mulheres representam um estudo relevante para a percepção histórica das práticas femininas e educacionais no Rio Grande do Norte, em especial, decidi que a atuação dessa professora seria por mim explorada numa oportunidade futura. Com a finalidade de pesquisar sobre essa professora, ingressei no Programa de Pós-Graduação em Educação, na condição de aluna mestranda. O objetivo deste novo estudo consiste em investigar e analisar a contribuição da professora Lia Campos na organização educacional norte-rio- grandense no período que compreende os anos de 1957 e 1964. Busquei, através das suas iniciativas, reconstituir parcela da sua relação com a 20 educação, mostrando de que forma ela protagonizou todas as mudanças educacionais. A escolha do período de 1957 e 1964 se deve ao fato de ter sido esse o tempo que Lia Campos trabalhou em prol da educação, inserida em um contexto que não era tão favorável ao deslocamento geográfico feminino para trabalhar em outros lugares que não o seu de origem. A exemplo dela, só tenho conhecimento da professora norte-riograndense, Francisca Nolasco Fernandes, mais precisamente Dona Chicuta, sua contemporânea e colega de trabalho que, “em 1930 foi designada pelo Diretor do Departamento de Educação, Dr. Francisco Ivo Cavalcanti, para atender ao convite do governo de Pernambuco para a implantação de uma reforma de ensino no seu estado” (MORAIS, 2002, p. 06). Em contato com a equipe técnica que compõe o Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora Lia Campos, situado no bairro de Dix Sept Rosado, e nas referências que os jornais ofereciam, obtive informações de que a professora promoveu, nesse Estado, uma série de atividades como: levantamento da rede escolar e organização dos quadros administrativos das escolas. Foi ainda membro do Conselho Estadual de Educação; coordenou o Programa de Treinamento de Professores Leigos1, foi diretora do Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE) e presidiu a comissão que realizou o I Curso Escolar do Rio Grande do Norte. Lia Campos, situada no seu tempo e como entusiasta da educação, percebeu toda a tendência de descentralização dos serviços educacionais pela qual passavam Estados e Municípios no contexto da criação e aprovação da 1 Professores leigos, na época em estudo, eram aqueles que não tinham formação pela Escola Normal. 21 Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº 4.024, em 20 de dezembro de 1961. Em tal conjuntura, ela pôs em prática as modificações sugeridas por essa legislação, em consonância com a Lei nº 2.171, de 6 de dezembro de 1957, que organizava e fixava as bases da Educação Elementar e da Formação do Magistério Primário do Rio Grande do Norte. Pretendo submeter a prática dessa professora a apreciação pública para reconstruir parte da sua história e da historiografia da educação do Estado do Rio Grande do Norte, a qual foi perpassada, por quase uma década pelas ações desta professora. 22 Procedimentos metodológicos 23 2 – Procedimentos metodológicos ara investigar e analisar a participação da professora Lia Campos, entre as décadas de 1950 e 1960, na educação norte- riograndense, busquei respaldo nos conceitos utilizados pela História Cultural, por se tratar de uma abordagem que abre espaço para novas perspectivas da pesquisa histórica, ampliando o campo do historiador, os objetos de análise e os tipos de fonte. P Desta forma, a realização da pesquisa histórica possibilita a análise da multiplicidade de grupos sociais, sujeitos históricos e minorias. Nessa mesma perspectiva, Pinheiro (1997, p. 288) afirma que: Neste enfoque, a história tem sua atenção voltada para as práticas culturais e experiências sociais trazendo, por exemplo, alunos, professores, famílias, costumes e outros para o cenário histórico. Os indivíduos são situados no centro da história sócio- cultural, sendo dada uma atenção privilegiada às vivências e recordações. Assim, torna-se possível a reconstituição do cenário social e historiográficode grupos sociais, de instituições e de atores desse processo. Dessa forma, as atividades humanas e os sujeitos comuns são considerados objetos de análise histórica. Morais (1996, p. 03) afirma: Entende-se que os eventos, ou tudo que se refira à atividade humana são considerados objetos de análise histórica. Portanto, pequenos gestos, os sentimentos, os valores, a mulher, a infância, a morte, a loucura, o corpo, a festa, a fotografia, a pintura, a maneira de ler, escrever, por exemplos, 24 são práticas culturais que não estão perdidas para a história. Esses objetos de análise são tão importantes no estudo histórico quanto os tradicionalmente analisados, como por exemplo, a luta de classes, as grandes revoluções, os grandes homens, os modos de produção. Dessa forma, pesquisas fundamentadas nesses conceitos vêm contribuindo para a ampliação de novas áreas de estudo e novos objetos. Galvão (1996, p. 20) afirma que, “de fato, objetos nunca pensados passam a ser vistos como ‘historicizáveis’”. Exemplos desses objetos são estudos historiográficos de práticas de leitura e escrita, de instituições educativas, de histórias de vida de professoras, do cotidiano escolar. Seguindo o mesmo pensamento, Nóvoa (1995, p. 19) enfatiza que o estudo historiográfico da educação deve abranger a análise de práticas de vidas de professores. Segundo o autor, tais estudos podem “produzir um outro tipo de conhecimento, mais próximo das realidades educativas e do cotidiano dos professores”. Esse modo de fazer história mostrou-me a possibilidade de construir a análise do meu objeto de estudo, esclarecendo o meu ensejo de registrar, por meio da contribuição de Lia Campos, as configurações de uma sociedade, chamando a atenção para a condição feminina e sua participação na educação. Pretendi trazer à tona o nome dessa professora e sua contribuição, o que possibilitou reconstituir a participação feminina na historiografia da educação norte-riograndense e suas ações enquanto sujeito histórico do processo educacional e social. Como iniciar a pesquisa histórica? O primeiro passo foi fazer uma revisão bibliográfica que me levasse a compreender melhor o universo 25 diversificado das fontes. Nessa tarefa, dois autores se mostraram de grande valia na minha compreensão: Peter Burke e Ana Maria de Oliveira Galvão. Burke (1992, p. 13, 14) mostra que a história tradicional se fundamenta nos documentos oficiais do governo e por ele arquivados. Porém, seguindo a tendência da história cultural, faz-se necessário o entrecruzamento das fontes oficiais com os diversos tipos de fonte que tal abordagem apresenta. Segundo o autor, é relevante a análise das diversas informações que chegam às mãos do pesquisador. Os registros em geral expressam o ponto de vista oficial. Para construir as atitudes dos hereges e dos rebeldes, tais registros necessitam ser suplementados por outros tipos de fontes. De qualquer modo, os historiadores estão mais preocupados que seus antecessores com uma maior variedade de atividades humanas, devem examinar uma maior variedade de evidências. De acordo com Galvão (1996, p. 102), o crescente interesse pela investigação da vida cotidiana leva, necessariamente, à busca de novos tipos de fontes, capazes de revelar aspectos das sociedades passadas pouco explorados nos documentos oficiais escritos. Assim, a fotografia, a pintura, a literatura, a correspondência, os móveis e objetos utilizados e os depoimentos orais ganham tanta importância quanto os documentos oficiais. 26 Buscando agregar diversas fontes que informassem acerca do meu objeto, percorri os arquivos de Natal, como o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, o Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora Lia Campos e o Arquivo Público do Rio Grande do Norte. No Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora Lia Campos, através do seu diretor Klebson Roberto Saraiva Peixoto, tive acesso a algumas informações que mostraram pistas sobre o trabalho desenvolvido por essa professora, como o levantamento da rede escolar do Estado, a implementação da Lei 2.171/1957, bem como as capacitações destinadas aos professores leigos do Rio Grande do Norte. No Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e no Arquivo Público priorizei o levantamento de materiais que tratam da educação do período, bem como da sociedade em questão, como: jornais A República e Tribuna do Norte, das décadas de 1950 e 1960, reformas de ensino, registros da Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte. A investigação nos jornais possibilitou-me o encontro de indícios sobre a atuação de Lia Campos. Através de uma leitura focada nesses registros que me proporcionaram a descoberta do início e o desenvolvimento dos trabalhos dessa professora na educação norte-riograndense, prossegui na compilação de dados relevantes para a minha pesquisa. No Arquivo Público deparei-me com uma realidade que é angustiante para todo pesquisador: fontes em estado precário de conservação, páginas rasgadas, recortadas e rabiscadas, além da mudança de local da instituição, o 27 que o fez permanecer por muito tempo com o seu acervo indisponível para visita e consulta. Nunes (1990, p. 38) fala da difícil tarefa de situar informações nos arquivos. Todos nós que nos dedicamos à pesquisa histórica já passamos pela angustiante experiência de não encontrá-los pelo descuido intencional, sistemático e criminoso com que os acervos da História e da memória da Cultura e da Educação brasileiras vêm sendo dilapidados em nosso país. No entanto, paradoxalmente, poucos de nós viveram outra angústia: a de vasculhar os arquivos existentes, organizados e disponíveis. Seja por desconhecimento, impaciência, preguiça, desinteresse, descuido ou até falta de oportunidade, muitos pequenos grandes tesouros permanecem escondidos numa vasta gama de documentação. Essa documentação mal cuidada me levou a adotar apenas o Instituto Histórico e Geográfico como único lugar de fácil acesso aos jornais da época em estudo. Lá encontrei o livro Perfil da República no Rio Grande do Norte (1889-2003), de João Batista Machado. O livro faz uma síntese das ações de todos os governantes que administraram o estado no período de 1889 a 2003. A partir desta obra, percebi como estava configurado o período em questão. Dois governadores chamaram-me atenção: Dinarte de Medeiros Mariz2 e Aluísio Alves3, pois foi durante essas administrações que Lia Campos exerceu a sua função na Secretaria de Educação. 2 Dinarte Mariz governou o Estado do Rio Grande do Norte de 1956 a 1960. Criou a Universidade do Rio Grande do Norte, depois federalizada, bem como os Institutos de Educação de Caicó e Mossoró, hoje denominados Centro Educacional José Augusto e Centro de Educacional Jerônimo Rosado (LIMA, 2001). 3 Aluízio Alves governou o Estado do Rio Grande do Norte entre os anos de 1961 a 1966. Construiu mil salas de aula, o Instituto Winston Churchill e o Instituto de Educação Presidente 28 Contei, ainda, com o apoio de Zilda Lopes do Rêgo4, contemporânea na Secretaria de Educação e amiga pessoal de Lia Campos e de sua família, que me concedeu, por várias vezes, entrevistas que enriquecem a produção deste trabalho. Por meio dessas interlocuções, cheguei aos nomes das senhoras Nanci Gomes dos Santos5 e Anilda Menezes6, as quais entrevistei. Ambas fizeram parte do quadro técnico da Secretaria de Educação. Estabeleci contato também com representantes da família Campos, nas pessoas de Léa Campos Lage, irmã gêmea de Lia Campos, bem como de sua sobrinha, Nara Campos Lage. Esse contato ocorreu por telefone, uma vez que a distância geográfica que separa Natal/RN e Porto Alegre/RS e a disponibilidade de tempo impediram-me de interagir com elas pessoalmente. Mesmo assim, informações e registros, como fotografias, notas e matérias de jornais,falas e homenagens a ela concedidas chegaram-me às mãos. Além dessas pessoas, tive contato, na ocasião de uma apresentação de trabalho no I Encontro Regional da Associação Nacional de História (ANPUH), evento que ocorreu na UFRN, com a professora e diretora do Núcleo de Arte e Cultura (NAC), Sônia Maria de Oliveira Othon. Na ocasião, a professora assistia às apresentações de trabalhos no Grupo de Trabalho História e Educação. E qual foi a minha surpresa quando, ao final da minha apresentação, intitulada A participação de Lia Campos no cenário educacional Kennedy, promoveu o treinamento de quatro mil professores leigos e deu início à aplicação do método Paulo Freire de alfabetização (ALVES, 2001). 4 Zilda Lopes do Rêgo é professora aposentada, foi Secretária de Educação na administração do Monsenhor Walfredo Gurgel (1966-1971) e membro do Conselho de Cultura do Rio Grande do Norte. 5 Professora aposentada do Departamento de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 6 Anilda Menezes integrou a equipe do CEPE e participou diretamente das ações educacionais postas em prática por Lia Campos. 29 do RN (1957-1964), a professora Sônia disse que fora vizinha de Lia Campos no período em que esta residiu em Natal. Surgiu, então, mais uma colaboradora para a minha empreitada. No entanto, a pesquisa apontou-me a necessidade de selecionar os entrevistados. Devido a questões de prazo de conclusão e delimitação das informações necessárias à construção do trabalho, não fortaleci o contato com a professora Sônia. Objetivando perceber como se trabalha com relatos orais, busquei contribuições em Thompson (1998). Na percepção do autor, as entrevistas orais, quando bem conduzidas, se transformam em um instrumento eficiente para diminuir a distância entre os informantes e o pesquisador e, por conseqüência, o acesso aos documentos privados, como é o caso das fotografias e correspondências. Lopes e Galvão (2001, p. 90), por sua vez, chamam atenção para a importância do cruzamento das fontes orais com outros tipos de registros. A consulta a outras fontes serve, ainda, para melhor formular as próprias questões das entrevistas e melhor compreender suas respostas. Por outro lado, os depoimentos não podem ser tomados como mera ilustração para reafirmar aquilo que já se tem como verdade, construída principalmente a partir de fontes consideradas mais confiáveis. Na verdade, as entrevistas, no caso de muitas pesquisas em que os testemunhos escritos são raros e esparsos, possibilitam a visualização de rostos e a escuta de vozes de parcelas da população muitas vezes consideradas de maneira homogênea e que, embora expressem uma época, um pertencimento social, de gênero, de etnia, de origem (rural ou urbana), são compostas de indivíduos singulares. 30 Por serem muito extensos, muitas vezes os relatos escapam do que se objetiva para o momento. Sendo assim, tomei o cuidado de selecionar as informações que fossem de mais relevância para a composição dessa pesquisa. Do cruzamento de informações colhidas, procurei reconstituir o percurso feito por Lia Campos, tecendo parte da sua biografia e estabelecendo relações com o contexto social no qual estava inserida, pois no campo da historiografia não se compreende um sujeito histórico desvinculado de uma configuração social; muito menos que este se apresente de maneira estática. Investigar e analisar a participação de Lia Campos na organização educacional do Rio Grande do Norte, entre as décadas de 1950 e 1960, torna- se uma pesquisa tão relevante quanto qualquer outro objeto histórico. Segundo Cambi (1999), ao partirmos para uma análise da historiografia da educação não podemos deixar de relacionar as diversas subdivisões da História da Educação, como a história dos docentes, dos métodos, das regras e das relações sociais. O estabelecimento de relações entre essas ramificações permite ainda configurar a participação da mulher na História da Educação do Rio Grande do Norte e colocá-las no centro do processo educacional desse Estado, auxiliando no entendimento da sua contribuição no espaço público e suas ações enquanto sujeito histórico, datado e situado, do processo educativo e social. 31 Lia Campos 32 3 – Lia Campos ia Campos nasceu em Encruzilhada do Sul, no estado do Rio Grande do Sul, no dia 13 de maio de 1928. Filha de Albertino Campos, Exator Estadual – atual Auditor de Finanças Públicas – e de Carlota Nunes Campos, era a quinta filha do casal, juntamente com sua irmã gêmea Léa, e mais seis irmãos, por ordem: Ruth, Evaldo, Jaime, Hélio, Renan e Dila. L A professora Lia Campos fez seus primeiros estudos em sua cidade natal. Em 1935, concluiu o Curso Primário no Grupo Escolar Borges de Medeiros e, em 1939, diplomou-se como aluna mestra7 pela Escola Normal Olavo Bilac, em Santa Maria/RS. 7 Segundo Louro (1997), aluna-mestre é aquela normalista que se dedica ao magistério primário. O ensino era dividido em dois cursos: primário (com trabalhos de agulhas e prendas e princípios de música); e o curso secundário, dividido em dois anos (1º português, ortografia, francês, aritmética, até proposições, música e piano e 2º português, francês, noções gerais de geografia, história sagrada e do Brasil, piano e canto). 33 Figura 1: Foto da formatura de Lia Campos na Escola Normal (1939) Fonte: Acervo pessoal da família Campos Aprovada em Concurso Público, iniciou suas atividades profissionais em 1941, no Grupo Escolar José do Patrocínio, sendo nesse mesmo ano removida para o Grupo Escolar Miguel Couto, na cidade de Barra do Ribeiro/RS, onde permaneceu até o início do ano letivo de 1943. Sempre inquieta no que dizia respeito aos temas educacionais, Lia Campos iniciou como bolsista, em 1949, um Curso de Especialização em Administração e Supervisão no Instituto de Educação General Flores da Cunha, no seu estado natal. Após a conclusão dessa especialização, foi convidada a participar da equipe de Orientadores da Educação Primária do Centro de Pesquisas e Orientações Educacionais (CPOE) da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul. 34 Sua vida sempre dedicada à educação e à cultura a fez migrar – trabalhar – para várias instituições de ensino e participar de diversos cursos de especialização e aperfeiçoamento. Por isso, nas palavras de sua sobrinha e afilhada Nara Campos Lage, “não hesitou em abdicar de constituir sua própria família para fazer o que realmente a impulsionava, a educação” (2004, p. 02). Entretanto, mesmo dedicada à educação a professora Lia tinha sua atenção também voltada para a família. Em especial, aos seus treze sobrinhos, aos quais incentivou a estudar e buscar satisfação profissional. Nara Campos Lage (2004, p. 01), fala a seu respeito: Até hoje agradeço a ela por ter despertado em mim o amor pela leitura. A coleção O Mundo da Criança8, que tenho até hoje, foi um dos primeiros presentes que recebi dela. Lembro com muito carinho sua voz doce contando histórias que me faziam viajar no mundo da imaginação. Outro legado seu foi o gosto pela correspondência, pois mesmo antes de ser alfabetizada, já recebia suas cartas que eram lidas por minha mãe; mais tarde eu mesma passei a respondê-las. Mesmo tendo a educação como alicerce da sua vida, Lia Campos não se descuidava da aparência e de cultivar amizades. Seus familiares e amigos que fez por Natal e pelo Estado confirmam este seu lado vaidoso, mas sem extravagância. Vaidosa e elegante, adorava comprar muitas roupas, sapatos e bolsas; sua presença era sempre anunciada por perfumes suaves, mas marcantes e inesquecíveis. Adorava viajar e tinha 8 Lançada na década de 1950 pela Companhia Editora Nacional, a coleção O Mundo da Criança reúne contos populares de diversos países. Tem por objetivo estimular a iniciação à leitura através de fábulas muito populares em várias regiões do mundo: A Galinha Ruiva (Inglaterra),O Leão e o Rato (Grécia), O Menino e a Baleia (Japão) e Por Que o Sol e a Lua Vivem no Céu (África). Ao final de cada capítulo existe um almanaque que trata a respeito dos locais dos contos. Atualmente, tal coleção pode ser encontrada em formato multimídia. (http://www.ibep-nacional.com.br/mundo/default.asp). 35 muitos amigos, a grande maioria ligados à cultura e educação (Nara Campos Lage, 2004, p. 02). Zilda Lopes do Rêgo também fala a esse respeito: Ela se trajava muito bem, luxuosa, perfumada. Ela encantava quando chegava. Pessoa extraordinária, tinha um papo muito bom... Era muito religiosa. Ela era religiosa, a gente ia muito à missa. Gostava muito de cinema, lia muito. Quando ela desistiu, não veio mais... Porque ela foi convidada e não veio mais. Eu tive que fazer toda a embalagem da bagagem dela. Foi uma bagagem imensa... A professora permaneceu nos quadros da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul até 1957. Nesse mesmo ano, passou a coordenar Cursos de Aperfeiçoamento para Professores do Ensino Primário, por indicação do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) /Ministério de Educação e Cultura (MEC), no Estado do Rio Grande do Norte. O jornal A República de 10 de janeiro de 1957 registra a instalação deste curso e a aguardada presença da professora vinda do Rio Grande do Sul para coordená-lo: Ontem, às 8 horas, no Instituto de Educação, foi solenemente instalado o Curso de Férias para professores primários do RN, iniciativa que virá, sem dúvida, ampliar os conhecimentos didáticos dos componentes do nosso magistério primário. (...) Para coordenar o Curso de Férias, está sendo esperada hoje, a professora Lia Campos, do INEP, quando serão intensificadas as aulas as quais se prolongarão por um mês. Lia Campos, que inicialmente veio a nossa terra para coordenar o curso de um mês, permaneceu por quase uma década. Mais precisamente sete anos. Tendo assim, a oportunidade de aplicar toda a sua experiência profissional. 36 De acordo com entrevista concedida ao jornal Tribuna do Norte de 21 de outubro de 1979, a professora Maria Alexandrino Sampaio9, uma de suas auxiliares, comenta que: Lia Campos, com sua atuação inconfundível, despertou em todo o magistério um grande entusiasmo de lutar e crescer na profissão. Ela conclamava o professor a fazer da escola o centro da comunidade e nela se projetar pela obra educativa. Foi dessa maneira que Lia Campos imprimiu seu nome na História da Educação do Rio Grande do Norte, trabalhando até 1964, quando a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul reclamou a sua volta ao seu torrão natal. Restou à Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte consentir com o seu regresso. Em reconhecimento ao trabalho por ela desempenhado o Governador Tarcísio de Vasconcelos Maia, no ano de 1975, concedeu a Lia Campos e a outras nove personalidades, a medalha do Mérito Alberto Maranhão10, a mais alta comenda potiguar destinada às pessoas que tenham se destacado nos campos da cultura e educação. 9 Maria Alexandrino Sampaio concluiu o Ginásio Normal e tornou-se professora primária. Coordenou o Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário (PAMP) do Rio Grande do Norte, durante a administração do governador Dinarte de Medeiros Mariz, órgão responsável pelo sistema de distribuição de bolsas de estudo para os componentes da Secretaria de Educação e Cultura deste Estado. Foi proprietária de uma escola privada de ensino primário que recebera o nome Escola de Ensino Primário Maria Alexandrino Sampaio, a mesma situava- se no Centro de Natal, na rua Felipe Camarão. (NANCI GOMES DOS SANTOS). 10 Alberto Frederico de Albuquerque Maranhão nasceu em Macaíba, no dia 02 de outubro de 1872. Foi promotor público em Macaíba, elegeu-se governador do Rio Grande do Norte pela primeira vez em 1899. Em 1908, retorna ao Governo do Estado, função na qual permanece até 1913. Foi responsável pela construção do Teatro Carlos Gomes (atual Teatro Alberto Maranhão), criou o Conservatório de Música, o Hospital Juvino Barreto (hoje Hospital Universitário Onofre Lopes), implantou a luz e o bonde elétricos em Natal. (http://www.cabugi.globo.com/rnonline/personalidades.html). 37 Figura 2: Foto de Lia Campos recebendo a Medalha Alberto Maranhão das mãos de Tarcísio Maia (1975) Fonte: Acervo pessoal da família Campos Na ocasião, em nome dos agraciados, o professor Edgar Barbosa11 agradeceu com um discurso: Movido pela simpatia de todo governante civilizado por aqueles que aplicam seu esforço longe do gosto e da cobiça de consagrações, Vossa Excelência distingue nesta hora educadores, professores, cientistas, destacados pelo seu devotamento ao progresso cultural do Rio Grande do Norte. Assim fazendo, Vossa Excelência honra a memória de Alberto Maranhão e legitima ainda mais os superiores objetivos de um prêmio dante do qual nos curvamos com emoção e orgulho (A REPÚBLICA, 18/12 de 1975). 11 Edgar Barbosa, nascido em Ceará-Mirim, em 1909, formou-se em Direito em Recife, em 1932. Trabalhou em alguns jornais, como: A República, O Debate, A Ordem. Fundou a Faculdade de Filosofia e foi seu primeiro diretor. Foi também autor de alguns livros: História de uma Campanha (1936), Três Ensaios (Recife, 1960), Imagens do Tempo (Natal, 1966). Faleceu em Natal em 1976. (HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE, [199_?]). 38 A professora Lia Campos partiu desse mundo no dia 15 de outubro, por coincidência, no dia do Professor. Em 1979, aos 51 anos, na cidade de Porto Alegre/RS, morreu vitimada por um câncer. O jornal Tribuna do Norte de 21 de outubro de 1979 noticia o seu falecimento com o seguinte título na reportagem de página inteira: Morte de Lia Campos encerra fase importante da história da educação do RGN. Ainda, enaltece suas características físicas e sua personalidade: Nem alta nem baixa, cabelos castanhos, olhos claros, traços finos. Uma figura elegante e que poderia ter sido comum, mas o sangue gaúcho que lhe corria nas veias, deixava aflorar uma firmeza de espírito e uma sensibilidade que muitas vezes surpreendia. No ano seguinte à sua morte foi criado o Centro de Estudos Supletivos Professora Lia Campos12, voltado para o ensino de 2º Grau, através do Decreto nº 7.851 de 26 de fevereiro de 1980, estabelecendo que o Centro se submeteria às normas da legislação em vigor, no tocante às disposições pedagógico-administrativas, tendo também um regimento interno. 12 A escola atualmente exibe em sua fachada o nome Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora Lia Campos. 39 Figura 3: Foto da fachada do Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora Lia Campos (2005) Fonte: Daniela Fonsêca Vieira Na solenidade se fizeram presentes seus irmãos, Evaldo Campos, Léa Campos Lage e Ruth Campos Magalhães, sendo esta última também professora. Seu irmão, Evaldo Campos, na ocasião proferiu um discurso no qual lembra o apreço e desvelado carinho que Lia Campos nutria pelos norte- riograndenses. Ela sempre se referia aos seus colegas e amigos do Rio Grande do Norte com entusiasmo e orgulho. Nos serões da família, quando havia a participação de amigos menos identificados com as causas que faziam de Lia a grande promotora deste Estado, alguns a interrogavam, confusos, se ela era potiguar ou gaúcha, já que, como Sul Riograndense, muitas vezes parecia Riograndense do Norte, tal o carinho e o amor que caracterizavam as recordações de sua passagem por aqui (CAMPOS, 1980). 40 Na mesma solenidade de homenagem póstuma a Lia Campos, o então Secretário de Educação Arnaldo Arsênio de Azevedo13 lembrou o trabalho da professora, exaltando a sua dedicação e amor ao magistério. Para ele, nada mais justo do que “o seu nome no frontispício de uma escola, é o mínimo que se pode fazer em reconhecimento pelo seu trabalho a favor do nosso sistema de ensino” (TRIBUNA DO NORTE, 25/03 de 1980). É com a finalidade de mostrar quem foi esta professoraque pretendi evidenciar o modo como Lia Campos atuou no cenário educacional enquanto esteve trabalhando no nosso Estado, observando e analisando de que forma ela pôs em prática o que se pretendia para a educação no período de 1950 a 1960 e de que forma essas mudanças, principalmente a Reforma do Ensino, repercutiram no território norte-riograndense. 13 Professor, formado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, foi diretor da então Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte (ETFERN), no período de 26/03/1974 à 25/05/1979. Hoje, seu nome encontra-se gravado em uma escola estadual localizada no município de Parnamirim/RN. (http://www.cabugi.globo.com/rnonline/personalidades.html). 41 O Rio Grande do Norte no plano político-educacional 42 4 – O Rio Grande do Norte no plano político-educacional s décadas de 1950 e 1960 foram marcadas por grandes agitações nos âmbitos político, econômico e educacional no cenário brasileiro. Até o ano de 1964, o Brasil vivenciou o populismo, movimento político nascido nos idos de 1930, que tinha como característica a política de controle das camadas populares quando o governo adotou medidas para agradá-las em troca de seu apoio. A No início da década de 1950, Getúlio Vargas conseguiu eleger-se presidente da República, tomando posse em 31 de janeiro de 1951. Era o seu segundo mandato como presidente, mas o primeiro obtido com o voto popular direto. Devendo o mandato estender-se até 31 de janeiro de 1956, o mesmo foi interrompido drasticamente pelo seu suicídio, ocorrido em 24 de agosto de 1954. Nos dezessete meses seguintes à morte de Getúlio Vargas, três presidentes ocuparam o poder: João Café Filho14 (de 25/08/1954 até 14 João Café Filho, nasceu em Natal, em 1899. Estudou na Academia de Ciências Jurídicas e Comerciais do Recife, mas não chegou a concluir o curso. Apesar de não ter conquistado qualquer diploma, foi advogado e jornalista. Como líder sindical, fundou e presidiu o primeiro Sindicato dos Trabalhadores do RN. Foi eleito deputado federal constituinte em 1934. Em 1950, concorreu a uma vaga na Câmara dos Deputados e à vice-Presidência (em separado da eleição para presidente). Vitorioso, optou pelo cargo de vice-presidente ao lado de Getúlio Vargas. Assumiu a presidência com o suicídio do presidente e governou por pouco mais de um ano, quando licenciou-se para tratamento de saúde e pelo golpe militar chefiado por seu ministro da Guerra, o general Lott. Permaneceu na vida pública até 1960, quando foi nomeado ministro do Tribunal de Contas da Guanabara. Publicou suas memórias no livro Do Sindicato ao Catete. Café Filho faleceu no Rio de Janeiro, em 20 de fevereiro de 1970, aos 73 anos de idade. (http://www.cabugi.com/rnonline/resultadopersonalidades.asp?codigo_personladade). 43 08/11/1955); Carlos Coimbra da Luz (de 08 até 11/11/1955) e Nereu de Oliveira Ramos (de 11/11/1955 até 31/01/1956). O nacionalismo e trabalhismo difundidos por Getúlio Vargas prometiam o desenvolvimento do capitalismo no país e, como conseqüência, uma situação de bem-estar social. Deveriam, ainda, fazer do Estado o maior responsável pela distribuição de educação para as classes populares. Na tentativa de efetivar essa tese, o governo Vargas procurou elevar as despesas públicas com o ensino. Porém, houve um descompasso na distribuição de recursos para os níveis primário e superior. Segundo Ribeiro (2000), o ensino superior foi mais contemplado que o ensino primário. Os problemas da educação pública continuavam claros, as matrículas no ensino primário não sofreram grandes alterações, e a alfabetização nesse período cresceu apenas 1, 79%. A autora afirma, ainda, que a exclusão permaneceu como entrave principal do sistema escolar. No terceiro ano da administração de Getúlio Vargas, 17% dos alunos matriculados no primário conseguiram atingir o quarto ano do curso e apenas 3% alcançaram o último ano. Essa situação não sofreu modificações significativas, continuando, pois, a persistir no curto período de tempo em que o potiguar, João Café Filho, assumiu a Presidência do Brasil. De acordo com o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Rio Grande do Norte apresentava, na década de 1950, um índice de 179.228 pessoas alfabetizadas e 365.314 analfabetos, não apresentando um cenário tão divergente do que se observava no plano nacional. Já na década de 1960, o Censo Demográfico registrou que a população alfabetizada em terras potiguares era da ordem de 364.976 44 pessoas, enquanto que 586.688 pessoas não dominavam o conhecimento da escrita e da leitura. Esses números confirmam, portanto, a desigualdade na distribuição de vagas por nível de ensino, que também ocorria de maneira desequilibrada no Rio Grande do Norte. Em 31 de janeiro de 1956, Juscelino Kubitschek de Oliveira assumiu a presidência do país, juntamente com o vice-presidente João Goulart. O então presidente estabeleceu um plano ambicioso de realizações – Plano de Metas, prometendo cinqüenta anos de progresso em cinco de governo. O governo foi perpassado por medidas político-econômicas de grande repercussão interna, como a concessão de facilidades para as multinacionais montadoras de automóveis se firmarem no Brasil. Tais empresas, aos poucos, passaram a substituir autopeças importadas por peças fornecidas pela indústria nacional, que foi se desenvolvendo. Como precisavam de energia elétrica, o governo construiu hidrelétricas para suprir essa necessidade. Foi o caso de Furnas e Três Marias. Criou a Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) e fundou Brasília, a nova capital do país. Em relação à educação, o Programa de Metas de Juscelino Kubitschek vinculava o ensino às necessidades de institucionalização de uma educação para o desenvolvimento. Isto é, o incentivo ao ensino técnico-profissionalizante. O ideário da educação sugeria que tanto o nível médio quanto o básico deveriam estar vinculados a educação para o trabalho (RIBEIRO, 2000). Em decorrência dessa preocupação desenvolvimentista, houve uma ênfase na escola formadora de mão-de-obra técnica, em nível médio, enquanto as universidades destinavam-se a formar os filhos da elite intelectual. Por sua 45 vez, os conhecimentos básicos da leitura e da escrita não chegavam à metade da população. No mesmo período, o Rio Grande do Norte vivenciava um momento de atenção aos problemas educacionais. No ano de 1955, Dinarte de Medeiros Mariz elegeu-se governador do Estado, tomando posse no dia 31 de janeiro de 1956. Enquanto exerceu o seu mandato, deu ênfase especial à educação. Nas suas falas afirmava que um país só é de fato independente através da educação do seu povo. Só acredito em independência econômica do Brasil com base na educação do povo. [...] Uma nação só se realiza democraticamente quando atinge um grau de legalidade e esta só pode ser criada em um povo educado, o cidadão. O povo educado sabe cuidar da sua saúde e da sua economia (MARIZ, apud LIMA, 2001a, p. 69, 70). Na sua administração, no ano de 1958, o Estado assistiu a criação da Universidade do Rio Grande do Norte (URN), posteriormente federalizada, além da criação dos Institutos de Educação de Caicó e de Mossoró, atualmente denominados Centro Educacional José Augusto e Centro Educacional Jerônimo Rosado, respectivamente. Na ocasião da criação da URN, Dinarte Mariz lê a seguinte mensagem: Ao enviar a exame e deliberação desta Augusta Assembléia o projeto de lei da criação da Universidade do Rio Grande do Norte, o faço com legítimo orgulho de norte-rio-grandense, certo de que esta iniciativa, elevando-nos no julgamento de nossa posteridade, será a semente fecunda da floração de conceitos mais humanos e mais liberais, para a felicidade do estado e o bem da pátria (MARIZ, apud LIMA, 2001a, p. 207). 46 Segundo a professora Zilda Lopes do Rêgo,foi na administração de Dinarte Mariz que “o Rio Grande do Norte presenciou uma revolução no ensino”. Isto, porque anteriormente ao seu mandato, o que existia era o Departamento de Educação, órgão que foi extinto ainda no governo Silvio Pedroza (1951-1956) quando foi criada a Secretaria de Educação. No entanto, a mesma só iniciou suas atividades na administração seguinte. Com o titular da pasta da Educação, Tarcísio de Vasconcelos Maia15, iniciaram-se as estruturações das bases de funcionamento desse novo órgão. Teve início a importação de técnicos de outros Estados do Brasil, pois havia uma carência de recursos humanos devidamente capacitados no Rio Grande do Norte para integrar essa nova estrutura. Para tanto, o Secretário de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte, Tarcísio de Vasconcelos Maia, juntamente com o governador, Dinarte de Medeiros Mariz solicitaram o apoio do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) nessa empreitada. De acordo com Nunes (2000), cabia ao INEP, segundo o Decreto-Lei nº 580, organizar a documentação relativa à história e ao estado atual das doutrinas e técnicas pedagógicas; manter intercâmbio com instituições do Brasil e de outros países; prestar assistência técnica aos serviços estaduais, municipais e privados de educação, ministrando-lhes esclarecimentos e soluções acerca de problemas pedagógicos. Esse Instituto tornou-se uma 15 Tarcísio de Vasconcelos Maia nasceu na cidade Catolé do Rocha, na Paraíba, em 1917. Clínico e pediatra, atuou na cidade Mossoró, onde iniciou sua carreira política. Foi Secretário de Educação na administração do governador Dinarte de Medeiros Mariz (1955-1960), sendo eleito deputado federal logo em seguida. Relator da Lei de Diretrizes e Bases, também teve destaque como presidente do extinto IPASE, Instituto de Previdência dos Servidores Públicos, e conselheiro da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste, SUDENE. Em 1975 foi eleito governador do Rio Grande do Norte, juntamente com o vice-governador Genibaldo Barros. Falece em 10 de abril de 1998, no Rio de Janeiro, aos 81 anos. (http://www.assecom.rn.gov.br/pg_noticias.asp?NOI_id=673). 47 referência para a questão educacional no país. À época, o seu diretor-geral era o professor Lourenço Filho. Em 1944 o órgão lançou a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP), periódico direcionado à publicação dos escritos sobre educação, produzidos por ele, sendo utilizados até hoje por pesquisadores e estudiosos da área. Em meio às mudanças trazidas pela década de 1950, o professor Anísio Teixeira assumiu em 1952, a direção do Instituto, enfatizando o trabalho de pesquisa, que tinha por objetivo, estabelecer centros de pesquisa como forma de alicerçar em bases científicas a reconstrução educacional do país. Seu pensamento foi concretizado com a criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), sediado no Rio de Janeiro e desmembrado nos Centros Regionais, situados nas cidades de Recife, Salvador, Belo Horizonte, São Paulo e Porto Alegre. Segundo Nunes (2000), os Centros Regionais estavam articulados às universidades locais, e ofereciam, através dos resultados das pesquisas, subsídios para um planejamento educacional que eram realizados, em alguns dos seus aspectos, por meio de convênio entre o INEP e as secretarias de educação estaduais. Tais convênios possibilitaram a aquisição de equipamentos para escolas primárias, construção de centros de aperfeiçoamento docente e cursos voltados para o objetivo de formar um profissional atualizado e competente, intencionando, em última instância, contribuir para estimular a ampliação da escolaridade nas escolas públicas e minimizar, quando possível, suas deficiências. 48 Anísio Teixeira, simultaneamente a criação do Centro Brasileiro de Pesquisa Educacional, empreendeu a luta pela escola primária e pelo controle da formação docente. Sua meta era a emancipação do povo brasileiro pela valorização da cultura popular, assim como pela sua transformação em meio de construção da sua autonomia. Ele criticava as reformas educacionais anteriores, como as dos Ministros Francisco Campos e Gustavo Capanema, por serem, na sua essência, burocráticas e centralizadoras. Através de cinco decretos, o ministro Francisco Campos procurou estruturar o sistema de ensino nacional. A Reforma Francisco Campos consistia então em criar o Conselho Nacional de Educação (Decreto nº 19850/1931); organizar o ensino superior do país adotando o regime universitário (Decreto nº 19851/1931); organizar a Universidade do Rio de Janeiro (Decerto nº 19852/1931); e o ensino secundário (Decreto nº 19890/1931); bem como, organizar o ensino comercial e regulamentar a profissão de contador, além de consolidar as disposições sobre o ensino secundário (Decreto nº 21241/1931). Entretanto, o ensino primário, o ensino normal e os demais ramos do ensino técnico não foram incluídos nesta reforma. Ainda quanto à Reforma, esta separou totalmente o ensino comercial do secundário e equiparou as escolas estaduais e particulares ao Colégio Pedro II, situado no Rio de Janeiro, mediante determinações a serem cumpridas e monitoradas pelo sistema de inspeção federal (GONÇALVES, 1990). As reformas empreendidas por Gustavo Capanema, por sua vez, ficaram conhecidas como Leis Orgânicas do Ensino, responsáveis por ampliar o caráter nacional da legislação educacional iniciado por Francisco Campos. As Leis 49 Orgânicas são compostas por oito Decretos-Lei que versam sobre a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI, a Lei Orgânica do Ensino Industrial (Decreto nº 4073/1942); Lei Orgânica do Ensino Secundário (Decreto nº 4224/1942); Lei Orgânica do Ensino Comercial (Decreto nº 6141/1943); Lei Orgânica do Ensino Primário (Decreto nº 8529/1946); Lei Orgânica do Ensino Normal (Decreto nº 8530/1946); criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC (Decretos 8621 e 8622/1946) e Lei Orgânica do Ensino Agrícola (Decreto nº 9613/1946). Essas leis mantinham o alto grau de seletividade que se observa na reforma anterior, bem como aprofundou a elitização do ensino, uma vez que entre os ramos técnico e entre este e o ensino secundário não havia nenhuma possibilidade de passagem. O pensamento educacional norteador destes decretos acentuava a tradição do ensino secundário acadêmico, propedêutico e aristocrático (GONÇALVES, 1990). Para Anísio Teixeira, essas reformas foram impressas pelo antiquado ato educativo, que consistia no funcionamento da escola primária por meio de métodos obsoletos de memorização e improvisação do fazer dos professores, enquanto que a escola secundária transformava-se em um trampolim para a mudança de classe social. Nesse quadro sobremodo desqualificado da educação, o magistério nacional tornou-se o problema máximo, a saber, pela proporção de mestres desprovidos de preparo pedagógico, tanto na escola primária quanto na escola média” (TEIXEIRA, 1968, p. 22). Dessa maneira, atendendo à solicitação do Governador Dinarte Mariz e, ainda, cumprindo uma das funções do órgão que dirigia, Anísio Teixeira enviou 50 ao Rio Grande do Norte, em janeiro de 1957, a professora Lia Campos, com o intuito de coordenar um curso de aperfeiçoamento oferecido aos professores primários do Estado. Inicialmente convidada para ministrar um primeiro curso de aperfeiçoamento para professores leigos durante o mês de janeiro de 1957, Lia Campos veio a Natal e permaneceu aqui por aproximadamente um mês. Nesse mês, ela fez uma sondagem da situação da educação do Estado através do contato com professores. Assim, a professora objetivou, no I Curso de Aperfeiçoamento para Professores do Rio Grande do Norte, juntamente com as professoras Maria do Carmo Vieira e Lucilda Jordão, ambas representantes da Secretaria de Educação de Pernambuco, a ampliação dosconhecimentos didáticos dos componentes do magistério primário norte-riograndense. O Secretário de Educação, percebendo o entusiasmo dos professores capacitados e a necessidade dessa capacitação para o sistema de ensino estadual, decidiu organizar um segundo curso, no segundo semestre do mesmo ano, para atender aos professores da região oeste do Estado, sendo escolhida a cidade de Mossoró como sede. Assim, Lia Campos retornou ao Rio Grande do Norte, em julho de 1957, para ministrar mais um curso de aperfeiçoamento, preocupando-se, principalmente, com as atividades básicas do currículo da escola primária. A respeito de como ocorreram esses cursos e quais os procedimentos utilizados, qual a metodologia adotada, enfim, como estavam organizados e se o objetivo principal foi atingido, não obtive a resposta desejada. Em conversa com Zilda Lopes do Rêgo, fui informada que a entrevistada não estava em Natal nesse período, ficando então essa lacuna. 51 Pela inadequada manipulação dos documentos que informam sobre o passado, não tive acesso aos planos dos cursos realizados pela Secretaria de Educação. Nas visitas aos arquivos, encontrei apenas um Relatório de Atividades realizadas pelo CEPE, compreendendo o período de maio de 1962 a julho de 1963. O documento contém informações acerca das ações daquele órgão técnico, abordando aspectos da estrutura do CEPE; o número de matrículas nas oficinas oferecidas pela Secretaria; objetivos de cursos; duração e currículo dos mesmos; municípios que participariam das capacitações; distribuição de provas e material didático. Como exemplo, há o registro da oferta de vagas da Oficina de Artes Industriais para a cidade de Caicó que, com uma oferta de 150 vagas para os interessados, que logo foi preenchida completamente por 150 candidatos, que freqüentaram o curso até o final. A matrícula para o mesmo curso em Natal e em Mossoró, respectivamente, totalizou o número de 162 e 129 alunos, perfazendo um total de 324 escolas envolvidas no projeto. Enfim, o documento exibe todas as iniciativas de capacitar os professores potiguares no período informado. Os registros dão conta do envolvimento de um expressivo número de municípios norte-riograndenses participantes das atividades, como, por exemplo: Natal, Mossoró, Caicó, Tangará, Currais Novos, Campo Redondo, Serra Caiada, Barcelona, São Tomé, dentre os 87 municípios percorridos. Este aspecto revela a preocupação dos professores em repensar seus saberes e seus fazeres docentes na escola primária. Nesse período, Lia Campos deixou registrada, em uma entrevista ao jornal A Republica de 01 de fevereiro de 1957, a sua concepção a respeito de 52 como desenvolveria essas capacitações. Em seu depoimento, mostrou o compromisso em difundir os preceitos de renovação das práticas educacionais e métodos de ensino pensados por Anísio Teixeira. O método moderno de ensino adota, visando a formação em cada espírito, a unidade social, o trabalho conjunto, o sentido de equipe, para cuja média comparecem todos de uma classe ou de uma turma. Se vivemos em um meio democrático e em uma sociedade, achamos de muita importância o trabalho por equipe, o que favorecerá o desenvolvimento desses princípios, promovendo um crescimento individual e conseqüentemente social. Assim, a professora permaneceu no Rio Grande do Norte durante o período deste curso, retornando ao Rio Grande do Sul logo em seguida a sua conclusão. A professora Lia Campos havia plantando semente de trabalho fértil no Rio Grande do Norte. Tanto, que retornou ao seu Estado de origem, mas só por cinco meses, pois foi convidada pelo governador Dinarte Mariz para retornar às terras potiguares, e assumir a direção do Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE). Esse órgão da Secretaria de Educação tinha como objetivo a organização de toda a matriz curricular dos cursos, assim como a indicação do material didático e das atividades que deveriam ser seguidos pelos professores. Ela organizou uma equipe da qual faziam parte Zilda Lopes do Rêgo, Maria Anilda Menezes, Maria Alexandrina Sampaio, Concessa Cunha de Figueiredo e Maria de Lourdes Alves e que, juntas, desenvolveram atividades voltadas para a educação no Rio Grande do Norte. Desempenhando suas funções nesse setor, Lia Campos permaneceu durante 7 anos em Natal, de 1957 a 1964. 53 Figura 4: Foto de Anilda Menezes e Lia Campos [196_?] Fonte: Acervo particular de Anilda Menezes Em 1958 veio a autorização para que a professora Lia Campos permanecesse no Estado por tempo indeterminado e recebeu carta branca do governo do Estado para processar no sistema de ensino as modificações necessárias ao processo educativo. A criação de um órgão técnico na Secretaria de Educação foi logo a sua primeira meta de trabalho e, assim, nasceu o Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (TRIBUNA DO NORTE, 21/10 DE 1979, p. 04). Iniciou-se, então, uma Reforma de Ensino, no governo Dinarte Mariz (1956-1960), aprovada na forma da Lei de nº 2.171, datada de 06 de dezembro de 1957. Essa lei tinha por finalidade organizar e fixar as bases da Educação Elementar e da Formação do Magistério Primário do Estado. Considerada uma Lei avançada e em consonância com os ideais de democracia vigentes na época, determinava que a educação contribuísse para o desenvolvimento integral do educando. Assim era dever do Estado: 54 a) ministrar sempre que possível, Educação integral, considerando o aluno não só em função da estrutura escolar, como também do lar e de toda a vida social, tendo em vista os ideais e as tendências democráticas da sociedade moderna; b) contribuir para a difusão da cultura por meio de serviços apropriados às necessidades da população, desempenhando, sempre que possível, a função do Centro de Cultura da Comunidade; c) observar em cada um dos seus níveis, os métodos mais eficazes de organização, administração, currículo e cursos, procurando sempre adaptá-los às condições locais e aproveitar as experiências bem sucedidas no estado e em todo o Brasil; d) prover os serviços especializados que, gradualmente, venham permitir aos indivíduos suprir as deficiências inatas, bem como as do lar e da herança social. (RIO GRANDE DO NORTE, 1957, p. 01, Cap. I, Art. 1º). O ideário educacional da época trazia uma concepção de democracia e mudança social centrada na criança. Aspirava a incorporação de toda a população infantil na escola que se renovava, oferecendo ao aluno situações em que este, a partir da observação e da experimentação, elaborasse seu próprio saber. Segundo Vidal (2000, p. 498), uma nova dinâmica impulsionava as relações escolares. O aluno assumia soberanamente o centro dos processos de aquisição do conhecimento escolar: aprendizagem em lugar de ensino. A psicologia experimental dava suporte à cientificidade da pedagogia e produzia no discurso da escolarização de massas populares o efeito da individuação da criança: o recurso aos testes e à constituição das classes homogêneas pretendia assegurar a centralidade da criança no processo educativo e garantir o respeito à sua individualidade em uma escola estruturada para o ensino de um número crescente de alunos. A fundamentação e os nortes que essa mudança assumia estavam postos na infância. Surgia a importância na função social da educação e de seu caráter democrático, entendida, segundo Nunes (2000, p. 27), como o 55 processo pelo qual os indivíduos desenvolvem interesse pessoal pelas relações sociais, na sua direção e na formação de hábitos que permitam mudanças sem que estas ocasionem desordens sociais. Isto, porque Anísio Teixeira e os renovadores defendiam a regionalização do ensino; a adaptação da educação à cultura local, assim como a descentralização do sistema educacional até o nível municipal. Assim, se cada região apresenta sua peculiaridade cultural, a descentralização do ensino permitiaà comunidade tomar em suas mãos o controle do sistema escolar e participar das decisões educativas. Dessa forma, Anísio Teixeira (1999) concebia a escola como um espaço real no qual a criança das camadas populares pudesse ter a experiência de uma vida melhor. Ou seja, com acesso a revistas, livros, estudo, recreação, saúde, professores bem preparados, ciência, arte. Ideário educacional construído a partir da sua crítica do privilégio das elites. Nessa perspectiva, as transformações educacionais do Estado ocorreram. Lia Campos percorreu parte do interior do Estado. Nas cidades de Natal, Mossoró, Caicó, Angicos, Pau dos Ferros, onde foram instaladas as primeiras Inspetorias Regionais de Ensino. Segundo a professora Nanci Gomes dos Santos, era provável também que tenha existido uma unidade na cidade de Santa Cruz. As Inspetorias de Ensino tinham, como função principal, a responsabilidade de intermediar o contato entre o CEPE e as escolas existentes no Estado. Eram responsáveis ainda pela distribuição de material para as escolas, bem como de inspecionar o cumprimento da realização das tarefas. 56 Ainda nesse período, Lia Campos realizou o levantamento da rede escolar através da contagem de escolas existentes no Estado e da distribuição de funcionários das mesmas, assim como o número de matrículas, bem como a organização dos quadros administrativos das escolas e coordenando a Elaboração de Programas Educacionais. Era necessário realizar uma organização da estrutura educacional, a fim de que as práticas pedagógicas consonantes com esse ideário rendessem bons resultados. As escolas, seus diretores e equipes de apoio pedagógico teriam que acompanhar esse processo. Segundo Zilda Lopes do Rêgo, Lia Campos e os técnicos da Secretaria fizeram um levantamento junto às escolas, a fim de sistematizar o funcionamento destas, tanto no aspecto administrativo quanto de pessoal, bem como proporcionar atualização dos diretores e supervisores. De acordo com a entrevistada: Uma escola tinha três turnos, então ela precisava de um certo número de merendeiras, de porteiro, de zelador. Para os diretores foi oferecido um curso de administração e supervisão escolar. Outra grande preocupação foram as semanas pedagógicas. Segundo o Relatório das Atividades do CEPE, para a realização deste trabalho, a Secretaria de Educação contou com a participação de nove pessoas do seu quadro, tendo sido recrutadas três pessoas do próprio CEPE e seis do Departamento de Educação. A equipe designada para esta tarefa percorreu seis regiões do Rio Grande do Norte: Zona Agreste e Litoral, Zona Centro-Oeste, Zona do Seridó, Zona da Chapada do Apodi e Zona Serrana. O trabalho de levantamento da realidade escolar durou cerca de quinze dias e visava a coleta de informações sobre a situação educacional do Estado, 57 condições dos prédios e necessidade de construções, levantamento de pessoal e matrícula, necessidade de equipamento e material didático (RIO GRANDE DO NORTE, 1963b, p. 03) A Lei 2.171/1957 instituiu diretrizes para o Magistério de Educação Elementar e sua formação. Suas determinações estabeleciam de quem era a responsabilidade pela formação dos professores; o ajustamento dos resultados dos estudos por eles empreendidos; as orientações a serem seguidas durante a formação; quem poderia exercer o magistério no Rio Grande do Norte e quais os critérios de escolha dos diretores dos Grupos Escolares, entre outras disposições. Para exercer o magistério seria necessário que o candidato fosse brasileiro, maior de 18 anos, apresentasse boas condições de saúde física e mental e tivesse formação conveniente em cursos de formação pedagógica. Em caso de professores não diplomados, a Reforma do Ensino fixava no capítulo II, Artigo 15º: § 1 – Na falta de professores diplomados, o Magistério será exercido por elementos locais, para o que será exigido exame de habilitação. § 2 – Aos docentes não diplomados serão proporcionados cursos de treinamento em serviço, e formação de emergência, que os habilitem às funções do magistério. Seguiram-se semanas pedagógicas nos municípios de Macaíba, Santa Cruz, Currais Novos, Acari, Jardim do Seridó, Alexandria, Pau dos Ferros, Mossoró, Areia Branca, Angicos, Caraúbas, Ceará-Mirim, São José de Mipibu, Nova Cruz e Pedro Velho (TRIBUNA DO NORTE, 21/10 DE 1979, p. 04), a fim de preparar os professores para melhor exercerem suas funções docentes. 58 Planejavam-se, também, cursos para diretores de escolas da capital e do interior, de onde o professor saiu mais atento à significação social da escola e capaz de ajudar na solução dos problemas da vida. Coube, então, a professora Lia Campos, também, a função de estruturar a equipe técnica da Secretaria de Educação. Ela e sua equipe ficariam responsáveis por multiplicar as ações pensadas pelo CEPE nos municípios do interior do Estado nas questões referentes à educação primária. O jornal Tribuna do Norte em 21 de outubro de 1979, noticiava a respeito da prática pedagógica de Lia Campos, afirmando que Ela se arrojou com dedicação e muito preparo pedagógico ao que se propôs, enfrentando todas as dificuldades advindas da situação financeira do estado, procurando situar o CEPE na sua verdadeira posição de órgão técnico. Planejou um programa de atividades com valor educativo, de modo que contribuísse para o desenvolvimento do educando e melhoria do preparo do professor. Pelos parâmetros legais o Capítulo II, Artigo 13º da Lei 2.171/1957 estabelecia que a formação do professor primário era de: competência do Estado, cabendo, ao órgão competente da Secretaria de Educação realizar o estudo contínuo da situação elementar e do próprio processo de formação do professor, afim de que este se adapte sempre a novas circunstâncias e a novas necessidades. A preocupação do governador Dinarte Mariz consistia em organizar e aumentar a rede escolar, desde a estrutura física até a formação de pessoal capacitado, mesmo que para que isso fosse necessária a saída dos professores para se atualizarem fora do seu estado. Lima (2001a, p. 49) relata em seu livro Solidão, Solidões, uma biografia de Dinarte Mariz, a afirmação do 59 governador a respeito da formação continuada dos docentes da rede estadual através de cursos realizados fora do Rio Grande do Norte. Disse-me que estimulava a saída de professores para estudar nos grandes centros, e que fariam o inverso dele, ou seja, voltariam para ensinar aqui o que aprenderam fora. ‘Tudo o que eu sei aprendi aqui dentro. E fui ensinar lá fora’. Dinarte integrou delegação do Senado à Conferência da União Interparlamentar realizadas na Dinamarca, Alemanha, Suíça, Israel, China e Itália. Para preparar a equipe técnica, como previa a Lei 2.171/1957, foi necessário que essas professoras se ausentassem do Estado, a fim de cursar uma especialização nas diversas áreas da educação. Para isso, o então Secretário de Educação, Tarcísio de Vasconcelos Maia, conseguiu bolsas de estudos junto ao INEP, levando os professores para Estados como São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Araújo (2000) afirma que Nos termos dos Acordos, a Secretaria de Educação e Cultura do Estado do Rio Grande do Norte (SEC-RN), por um lado, comissionava com bolsa de estudo, concedida pelo INEP, a ida dos professores formados em escolas normais, para cursos de longa, média e curta duração nos seus Centros de Pesquisa, destinados a especializá-los em pesquisa educacional, administração, supervisão, orientação educacional e ensino pré- primário, entre outras especializações. A intenção era incentivar investigações científicas sobre a realidade educacional brasileira, lançando, então, as bases da ciência da educação. Nesta perspectiva, os centros de pesquisa significavam um passo relevante para o processo de renovação educacional desencadeado ainda nos anos de 1930.60 De acordo com Cunha (2004, p. 117) Para renovar a educação, era preciso, antes de tudo, olhar os fatos escolares por intermédio da ciência, o que possibilitaria planejar racionalmente as ações político-administrativas voltadas à superação dos entraves nessa área. O Estado não só mandava seus professores se especializarem fora como também recebia professores e/ou especialistas em metodologia do ensino da linguagem, ciências, matemática, história e outra matérias, além de artes industriais, recreação e audiovisual, para ministrar cursos, ateliês e oficinas práticas. Esses cursos eram oferecidos de maneira intensiva, nas férias escolares, aos professores dessas disciplinas nos cursos normais do estado, seguindo as proposições da pedagogia escolanovista. Na concepção educativa de Anísio Teixeira, defensor dos preceitos escolanovistas de democracia e educação para a democracia, o cerne das reformas educacionais consistia no preparo dos professores e dos quadros técnicos, devendo atribuir cientificidade ao trabalho pedagógico do professor e da escola. Esse caráter descentralizador e regionalizante da escola primária era tido como princípio comum pela sua equivalência cultural. Anísio Teixeira (1999, p. 168), afirmava ainda que É um problema profissional, a ser resolvido pelos educadores e professores brasileiros, em um ambiente de liberdade e responsabilidade, de experimentação e verificação, de flexibilidade e descentralização, para que se crie a escola brasileira, diversificada pelas regiões, ajustadas às condições locais, viva, flexível, elástica, com a só unidade de se sentir brasileira na variedade e pluralidade de suas formas. 61 A reconstrução da educação brasileira suscita um problema que apresentava solução gradual e progressiva. Tal impasse consistia em uma questão de adaptação profissional que conclamava os professores a experimentar, ensaiar, verificar e progredir na escola brasileira. Para tanto, a Lei 2.171/1957 fixava a formação docente considerando os parâmetros regional e de experimentação de novas diretrizes. A formação do professor será realizada em escolas de 1º e 2º ciclos e obedecerá às seguintes diretrizes: a) adaptação às peculiaridades regionais, quer sociais quer econômicas do estado; b) regime escolar que permita modalidades diversas de plano, estrutura e processo a serem ensaiados, experimentalmente e, gradualmente, pelos Centros de Formação de Magistério do Estado; c) o ano letivo de 200 dias, divididos em períodos iguais e independentes; d) planos gerais de estudos, elaborados pelo Centro de Estudos e Pesquisas, da Secretaria de Educação, para as diversas modalidades de formação do Magistério Primário e preparo de Administradores escolares, supervisores de Ensino Primário, orientadores educacionais e professores especializados para o ensino primário; e) a duração dos cursos não será inferior a cinco anos, o primeiro ciclo e a 3 o segundo ciclo; f) a admissão ao Curso Normal de 2º ciclo será feita mediante conclusão do curso Normal de 1º ciclo, ou do curso Ginasial ou ainda de outros a este oficialmente equivalentes (RIO GRANDE DO NORTE, 1957, p. 06, Cap. II, Art. 14º) Concluídos, portanto, os cursos de especialização, era papel dos professores, administradores, especialistas e técnicos que freqüentaram os cursos de aperfeiçoamento nos Centros de Pesquisa, assumir as novas cadeiras professorais no Instituto de Educação de Natal. Eles também, tinham a função de transmitir gradativamente o conhecimento geral e específico recebido – tomado pelos preceitos de como ensinar, como organizar e como 62 transmitir – para os professores primários de Natal e cidades do interior do Estado, com exceção dos professores leigos. Ainda na administração de Dinarte Mariz, no ano de 1959, foram construídos seis Grupos Escolares distribuídos no interior do Estado, através de convênios entre o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) e Governo do Estado. Essas obras foram levadas a efeito nos municípios de Currais Novos, Afonso Bezerra, José da Penha, São Miguel, Luiz Gomes, Canguaretama e Alexandria. O jornal A República, 07 de fevereiro de 1960, enaltece esses feitos, mostrando o empenho de Anísio Teixeira, através do INEP: O Rio Grande do Norte pode louvar-se, nos dias de hoje, de ser um dos Estados da Federação que vem recebendo maior atenção por parte do Dr. Anísio Teixeira, Diretor do INEP. Dele recebe o Governo do Estado todo o apoio necessário ao programa de reorganização do sistema pedagógico, cuja estrutura foi completamente reformada no sentido de adaptar-se as exigências da Nova Escola. No começo da década de 1960, com o professor Grimaldi Ribeiro à frente da Secretaria de Educação e Cultura, a rede de ensino estadual sofreu um aumento na sua estrutura física. Esse secretário mantinha constantes contatos com autoridades educacionais do país, a fim de sustentar a planificação elaborada para as questões educativas do Rio Grande do Norte. Primeiros passos dados na direção de uma estruturação educacional do Estado, encontrava-se a Secretaria composta de tais órgãos: Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE), responsável pelo apoio pedagógico às escolas da rede; Inspetorias de Ensino, órgão que intermediava o contato entre as escolas e o CEPE; o Serviço Cooperativo da Educação do 63 Rio Grande do Norte (SECERN), setor responsável por administrar os recursos financeiros e o Setor de Ensino Médio e de Planejamento. Contava também com o Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário (PAMP), que assistia pedagogicamente os professores leigos. No âmbito da administração municipal, o prefeito Djalma Maranhão (1956-1959 e 1960-1964) também demonstrava uma preocupação com a realidade educacional de Natal. Tomou para si o reclamo popular de combater o analfabetismo. Definindo a educação e a cultura como meta número um do governo, no seu primeiro mandato introduziu o programa municipal de ensino, por meio das escolinhas de alfabetização e do Ginásio Municipal de Natal. No entanto, a situação da educação municipal não apresentava um crescimento expressivo, pois a quantidade de escolas públicas diminuíra com o passar dos anos. Os onze grupos escolares que funcionavam em Natal na década de 1940 foram reduzidos a dez unidades no ano de 1961. Entre os Grupos Escolares que funcionavam na cidade do Natal podemos citar alguns: Augusto Severo, criado em 1908, na Ribeira; Padre Miguelinho, criado em 1913, no Alecrim; Isabel Gondim, criado em 1934, nas Rocas; Alberto Torres, criado em 1934, em Petrópolis; João Tibúrcio, criado em 1934, no Alecrim; e Áurea Barros, criado em 1946, no Tirol (CASCUDO, 1999). Outros Grupos Escolares do mesmo período que não foram citados por Cascudo são: Mascarenhas Homem, Grupo Escolar Clementino Câmara, Grupo Escolar Professora Stela Gonçalves, Grupo Escolar Rêgulo Tinôco e Grupo Escolar Nestor Lima. Já as escolinhas mantidas pela prefeitura regrediram de 120 em 1958 para 86 em 1960. Segundo Moacyr de Góes (1991) as escolinhas se 64 destinavam ao ensino de ler, escrever e contar, foram criadas durante a primeira administração do prefeito Djalma Maranhão entre os anos de 1956 e 1959. O jornal A República de 16 de março de 1957 registra o funcionamento dessas Escolinhas, localizando-as por bairros: Já se encontram em pleno funcionamento as escolas Djalma Maranhão (Rua Jundiaí), Rocas (Sede do Rio Grande F. C.), Quintas (Sede dos Imperadores do Samba e Amplificadora São José), Bairro da Conceição (Amplificadora Cruzeiro do Sul e Sede do Irapuan F. C.), no bairro de Nova Descoberta e no Alecrim (Sede da União dos Servidores Públicos do Rio Grande do Norte). Enquanto isso, Natal contava com uma população de 154.276 habitantes, de acordo com censo de 1960, e tinha mais de trinta mil analfabetos, entre adultos e crianças, sem escolas (GERMANO,1982). A esse respeito o jornal A República de 10 de junho de 1950 traz uma nota tratando do tema com o título O problema da educação, que mostra bem a radiografia do ensino nessa década. Quanto maior é o povo, mais dilatado deve ser o seu índice de educação. A cultura é sem dúvida, o ponto culminante da evolução social, moral, política, espiritual e econômica do cidadão. Alguém há que a supõe desvirtuadora dos hábitos e dos costumes, e que acarreta com sérios prejuízos para o povo, especialmente nesta fase de metamorfose artística que vem sofrendo com o advento do existencialismo. Todavia, a educação é o grande fator, o caminho mais curto por onde podemos contornar e atingir o nosso grau de perfeição, educando os brasileiros para que nos livremos da assombrosa porcentagem de analfabetos que se multiplica por todo o país. Os livros didáticos todos os anos são mudados, as matrículas e mensalidades são aumentadas e a aprendizagem decresce, por falta de meios financeiros dos pais de família para cumprirem as suas obrigações com o sustento dos filhos nas escolas. 65 Os educandários mantidos pelo Governo estão superlotados e quem quer aprender a ler tem que se subordinar a imposição das escolas particulares, que usam e abusam do direito de estipularem a tabela de preços a seu talente. Diz-se comumente que, no Brasil, aprende a ler quem é rico. E se precisamos da cooperação do pobre, porque o deixarmos sem instrução? Deste modo, não é possível o país livrar-se da porcentagem de analfabetos. E é por esta razão que, apesar do eficiente e patriótico combate dos governos contra o analfabetismo, com a abertura de escolas rurais, grupos escolares, escola de alfabetização de adultos e outros educandários gratuitos, ainda perdura, em nosso, como em outros estados da Federação, um clamoroso coeficiente de ignorantes. Diante de todos esses problemas, o titular da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Saúde de Natal, Moacyr de Góes, foi incumbido da missão de coordenar e desenvolver um vasto movimento de organização educacional e cultural. Nasceu a Campanha De Pé no Chão Também se Aprende e Ler, lançada em 23 de fevereiro de 1961, tendo o bairro das Rocas como área- piloto. Figura 5: Acampamento da Campanha de Pé no Chão no bairro das Rocas (1961) Fonte: Diário de Natal - Educação de Jovens e Adultos, 2005. O primeiro Grupo de Trabalho a comandar a Campanha foi presidido pelo prefeito, Djalma Maranhão, na Secretaria de Educação e Cultura do 66 Município. Os primeiros professores convidados a participar do grupo foram: Moacyr de Góes16, Omar Pimenta17, Severino Fernandes de Oliveira18, Herly Parente19, entre outros nomes da educação local. Um grupo considerado de vanguarda e que iria se engajar na batalha contra o analfabetismo; todos sob a supervisão da professora Lia Campos que, na opinião de Moacyr de Góes (2000, p. 98, 99), era “figura do mais alto gabarito nos círculos educacionais do País”. Ainda, segundo o mesmo autor: O curso foi orientado pela Diretoria do Ensino Municipal e contou com a participação de professores da Secretaria de Educação, Ginásio Municipal e de técnicos do Centro de Pesquisas Educacionais. Essa campanha visava a alfabetização de crianças e adultos que precisavam aprender a ler e escrever e prosseguir nos estudos – a única forma de elevar-se socialmente e não viverem na marginalidade. Para que a campanha ocorresse, a escola seria a responsável pela promoção de professores, carteiras, material escolar e merenda. Isso feito, deu-se o crescimento da campanha, que passou por diversas fases: escolinhas municipais, funcionando em salas doadas por particulares; acampamentos escolares; escolas com chão de barro batido e teto feito de palha de coqueiro. Para os adultos que se recusavam a estudar nos acampamentos, o ensino se 16 Moacyr de Góes foi Secretário Municipal de Educação de Natal na administração do Prefeito Djalma Maranhão (1960-1964) quando coordenou a campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler. Foi professor do Ateneu e fundador das disciplinas de História da América e de História Econômica das Faculdades de Filosofia e Ciências Econômicas da UFRN. Preso político em 1964, esteve destituído de cargos e funções oficiais até a anistia em 1979. Secretário Municipal de Educação do Rio de Janeiro no período de 1987-1988, voltando à Secretaria Municipal de Educação de Natal na administração da Prefeita Wilma Maria de Faria, em 1989. (EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS, 2005). 17 Omar Fernandes Pimenta era nesse período Diretor do Ensino do município de Natal. 18 Severino Fernandes de Oliveira, professor, desempenhava nessa época a função de Diretor do Ginásio Municipal. 19 Joaquim Herly Parente foi Supervisor Administrativo do Centro de Formação de Professores da Campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler. (GÓES, 1991). 67 dava na sua própria casa. (HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE, 12. [199_?]). Figura 6: Imagem de divulgação da Campanha De Pé no Chão (1961) Fonte: Diário de Natal - Educação de Jovens e Adultos, 2005 Não havia somente, por parte da Campanha, a preocupação em alfabetizar e sim de também analisar a realidade educacional e cultural da cidade, através de uma vasta pesquisa e questionamentos, divididos em planos que seriam entregues a especialistas em cada assunto. Foi programado então o I Seminário de Estudos dos Problemas da Educação e Cultura do Município de Natal, que contou com a presença de vários intelectuais da cidade. Entre os dias 03 e 08 de abril de 1961, o Seminário contou com a participação da professora Lia Campos, responsável por abordar o tema A Reforma do Ensino Primário do Rio Grande do Norte. De acordo com Góes (1991), o Seminário foi centrado na realidade local, e a fala da referida professora subdividiu-se em: 1- causas da reforma; 2- pontos fundamentais; 3- aspectos da reforma; 4- classes regulares e de 68 recuperação; 5- atividades desenvolvidas pelo Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais da Secretaria de Educação do Estado a fim de preparar pessoal docente para a experiência da reforma do ensino primário; 6- revisão dos programas de ensino primário do Estado. Mudança de governo. Aluízio Alves assumiu a administração do Estado (1961-1966). Apesar de ser adversário político do governador anterior, Aluízio Alves manteve a professora Lia Campos na sua função. O novo governador elegeu a educação como uma das prioridades do seu mandato e deu continuidade ao processo de organização e desenvolvimento do Sistema Educacional do Estado, na forma como previa a Lei 2.171/1957. Aluízio Alves lançou, então, o plano Fazer em três anos o que não se fez em três séculos. Esse plano tinha como objetivo mudar o cenário norte-rio-grandense, cuja realidade, revelava uma região subdesenvolvida e sem o preparo para construir o desenvolvimento industrial. Nesse contexto foram criados órgãos de prestação de serviços, como a Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte (COSERN) e a Companhia Telefônica do Rio Grande do Norte (TELERN). Para implementar esses e outros projetos, Aluízio Alves contou com um estreito relacionamento com o governo norte-americano, denominado Aliança Para o Progresso, que consistia em conseguir empréstimos para realizar as metas de seu programa de governo (LIMA, 2001b). Os recursos eram destinados a projetos em diversas áreas, como: agricultura, construção de casas populares (Cidade da Esperança, bairro situado na zona oeste de Natal), pecuária, abastecimento de água, saúde e educação (GERMANO, 1982). Para administrar os recursos recebidos, foi criado e estruturado, o Serviço 69 Cooperativo de Educação do Rio Grande do Norte (SECERN), cujo diretor executivo era o Secretário de Educação, o jornalista Calazans Fernandes. Figura 7: Aluízio Alves, ao centro e de pé, reunido com membros da Secretaria de Educação [196_?] Fonte: Acervo particularde Anilda Menezes Para atender a demanda crescente de alunos e ampliar o número de prédios escolares, a meta do governo era alfabetizar 100 mil pessoas acima da idade escolar primária, ou seja, aquelas que tivessem idade acima de treze anos. Segundo a Lei 2.171/1957, no seu Artigo 3º, a educação elementar abrange quatro categorias de cursos relacionados a faixa etária: a) pré-primária, para crianças de menos de sete anos; b) primária, com duração de quatro anos, destinada a crianças de sete a onze anos; c) complementar, com duração de dois anos, destinada a crianças de onze a treze anos; d) supletiva, para adolescentes e adultos. O governador Aluízio Alves pretendia, ainda, a extensão da escolaridade a todas as crianças do Estado e, para tanto, seria necessária a construção de 1.000 salas de aula. Tomou as seguintes medidas: recuperação de prédios antigos; construção de novos edifícios e funcionamento de cursos de 1º grau 70 nos prédios dos Grupos Escolares. Para o 2º grau, foram construídos três prédios os quais funcionam, até hoje: o Instituto Padre Miguelinho, o Instituto de Educação Presidente Kennedy e o Centro Educacional Winston Churchill. Para educar um grande número de pessoas em um curto espaço de tempo foi lançado, em Angicos-RN, o método do professor Paulo Freire20 de alfabetização de adultos em 40 horas. Segundo o pensamento de Paulo Freire (2005), a educação devia fundamentar seu método no diálogo, no qual professor e aluno aprendem juntos. Seria necessário acabar com a escola autoritária e dar lugar a uma escola democrática, que desse voz e vez aos educandos e que preparasse o homem para o mundo. Assim, o povo deixa de ser objeto para ser sujeito. A isso, Paulo Freire chamava de consciência cívica. Nesse sentido, formula duas concepções de educação assim denominadas: educação bancária e educação problematizadora. A educação bancária consiste no ato de depositar, transferir e transmitir valores e conhecimentos aos educandos. Nesta visão bancária, os homens são vistos como seres em adaptação, ajustamento. Isto é, quanto mais se realizam depósitos tanto menos se desenvolverá a consciência crítica, fator que os impediria de inserir-se como sujeitos no mundo, tendo a capacidade de transformá-lo. Assim, o saber é uma doação dos que julgam saber mais aos que nada sabem. 20 Paulo Reglus Freire nasceu em Recife/PE, em 1921. Trabalhou no Serviço Social da Indústria (SESI) e no Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife. Foi professor da disciplina História e Filosofia da Educação naquela universidade. Trabalhou na Universidade de Havard e Consultor Especial das Igrejas (Genebra). Exilado político no Chile desenvolveu trabalhos em programas de educação de adultos no Instituto Chileno para Reforma Agrária. Escreveu muitas obras, entre elas: Educação: prática da liberdade (1967), Pedagogia do oprimido (1968), Pedagogia da esperança (1992) e A sombra desta mangueira (1995). Falece no dia 2 de maio de 1997, na cidade de São Paulo, vítima de infarto agudo. (http://www.paulofreire.org.br/pfreire.htm). 71 No contra-fluxo da concepção anterior Freire (1987) aponta a educação problematizadora. Nesta concepção, o conhecimento é um processo que se realiza mediante o contato do homem com o mundo vivenciado. Desse modo, o saber não se apresenta de forma estática, mas de maneira dinâmica e em constante transformação. Estabelece-se, então, uma relação dialógica entre os homens, na qual o diálogo pressupõe troca sempre mediatizada pelo mundo. Portanto, o saber aqui constituído percebe a necessidade de transformar o mundo, pois apenas assim os homens se percebem como sujeitos históricos. De autoria do professor pernambucano, o método partia da pesquisa do universo popular e temático do grupo a ser alfabetizado para selecionar situações que servissem de instrumento não só para o aprendizado da escrita e da leitura, mas também da discussão da realidade, relacionando o processo educativo ao meio social do aluno. Através dessa pesquisa, o educador identificava as palavras geradoras. Sem o uso de cartilhas, o monitor coletava o universo vocabular que correspondia a situações sociológicas existenciais do grupo. Partindo de uma palavra que fizesse parte do conhecimento de mundo do indivíduo, por exemplo, tijolo, o professor apresentava ao grupo a imagem de uma construção na qual se destaca o objeto e a palavra tijolo. Progressivamente, as sílabas desta palavra eram usadas para a construção de outras. De acordo com o Relatório do Plano de Aplicação do SECERN, os objetivos da Campanha de Alfabetização não se restringiam apenas a ensinar a ler e escrever. O programa previa também: 1. dar ao adulto o domínio das habilidades fundamentais em linguagem, leitura e aritmética; 72 2. promover o renascimento ou a criação de ideais e padrões elevados de vida; 3. formar no homem a convicção da sua responsabilidade (e da responsabilidade do Estado) em dar educação aos seus filhos; 4. habilitá-lo ao exercício da cidadania, como eleitor, como membro de uma nação livre e como participante ativo do regime democrático; 5. promover a elevação do seu nível de vida em casa, do ponto de vista da higiene, do conforto e da alimentação; 6. habilitá-lo a administração equilibrada dos seus recursos financeiros e da direção da sua própria vida; 7. despertar nele a noção de que ele, sua mulher, seus filhos, têm direito a uma vida melhor. (RIO GRANDE DO NORTE, 1963a, p. 27). Para que estes objetivos fossem atingidos, a Secretaria de Educação convocou voluntários para colocar em prática tal campanha. A Experiência de Angicos, prática que ficou mais conhecida na campanha, contou com a participação de estudantes universitários e ginasianos que se dispuseram voluntariamente a testar o novo método de alfabetização de adultos. A repercussão da campanha de alfabetização passou por duas vertentes: a primeira, que tinha como objetivo a ativação da população no seu próprio processo histórico, onde o homem agiria com e na sua realidade, podendo se tornar politizada e conscientizada; e uma outra que a conotaria como subversiva. O método de alfabetização em larga escala desagradava tanto aos partidários da UDN21 e do PSD22 quanto aos comunistas, pois ele ensinava não apenas a ler e a escrever, mas também a admirar a democracia. 21 Na conjuntura final do Estado Novo foram criados os principais partidos políticos brasileiros atuantes entre as décadas de 1940 e 1960. A União Democrática Nacional (UDN) foi fundada no dia 7 de abril de 1945. Reuniu diversas correntes que nos anos anteriores haviam se colocado contra a ditadura do Estado Novo. Foram representantes da sua fundação: Otávio Mangabeira, Júlio Prestes, Artur Bernardes, José Américo de Almeida, Juarez Távora, Juraci Magalhães e Flores da Cunha, entre outros. (http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos37- 45/ev_fim_ppn.htm). 22 O Partido Social Democrático (PSD) foi fundado no dia 17 de julho de 1945 sob o comando dos interventores estaduais nomeados por Getúlio Vargas durante o Estado Novo, entre os 73 De acordo com Paiva (1980), esse método de alfabetização também apresentava uma outra conotação, pois o mesmo vinculava-se ao nacionalismo-desenvolvimentismo. Isso porque o programa de alfabetização fora financiado com recursos da Aliança Para o Progresso, e ainda, a USAID (Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional), e mais precisamente os Estados Unidos, entendiam que a região nordeste do Brasil era um problema de segurança internacional. A campanha de alfabetização serviria, ainda, para garantir o eleitorado do líder populista, Aluízio Alves, fortalecendo, portanto, suas bases eleitorais. O lançamento do método oferecia vantagens para o governo do Estado e para a agência financiadora por alfabetizar em poucas horas, sendo utilizado em larga escala e com baixo custo e,ainda, pela posição cristã do seu criador e pelas tensões surgidas entre Paulo Freire e os comunistas durante a campanha de Miguel Arrais, na disputa do governo de Pernambuco, o que resultava em confiança contra as suspeitas de subversividade do método. No entanto, no transcurso do ano de 1963, “a imprensa inicia uma série de denúncias a respeito do método e da USAID como sendo um ‘programa intensivo de comunização do Nordeste’” (PAIVA, 1980, p. 25). Por este motivo foi retirado o apoio financeiro da USAID, alegando, como razão oficial, a inadequação dos procedimentos didáticos. Na verdade, o método era encarado como uma fábrica de revoluções. Mas, para Paiva (1980, p. 135), Paulo Freire se mostrava contraditório e favorável ao projeto nacionalista-desenvolvimentista. De acordo com a autora, no final de década de 1950, mais precisamente em 1959, Freire sabia quais se destacaram Benedito Valadares, Ernani do Amaral Peixoto, Nereu Ramos e Agamenon Magalhães. (http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos37-45/ev_fim_ppn.htm). 74 claramente onde deveria chegar à participação popular na vida política, de forma que essa participação não oferecesse risco a estabilidade e a harmonia da vida político-social. Desse modo, o professor desejaria “a conscientização para facilitar a mudança, a modernização, dentro dos limites do modo de produção vigente.” Todavia, quando isto aconteceu, Paulo Freire e seu método já estavam difundidos pelo país. O presidente João Goulart compareceu ao encerramento da Campanha em Angicos e juntamente com o Ministro da Educação, Paulo de Tarso, convidou Freire a realizar uma experiência em Brasília. Nesse contexto, Lia Campos e sua equipe prosseguiam na tarefa de capacitar os professores leigos dos municípios do Rio Grande do Norte. Essa demanda de professores se devia ao fato de só existir no Estado as Escolas Normais de Natal e Mossoró. Essas capacitações eram divididas em três etapas que compreendiam o período das férias escolares. Segundo a professora Nanci Gomes dos Santos, foram formados centros de treinamentos de professores leigos, vinculados às Inspetorias, de acordo com o número de professores que necessitassem de atualização. Os professores se deslocavam da sua cidade e partiam para os locais que sediavam os centros de treinamento para participarem das etapas dos cursos. Nos meses de janeiro e fevereiro, acontecia a primeira etapa. Já no período do recesso escolar de junho, ocorria a segunda etapa e, por fim, em dezembro concluía-se a terceira e última etapa. Os docentes também recebiam um auxílio financeiro, em forma de bolsa de estudo, para custear sua formação e permaneciam nesses locais em regime de internato, recebendo, inclusive, alimentação. O conteúdo dos cursos eram 75 divididos em disciplinas de formação geral e em disciplinas de formação pedagógica. Esses cursos eram atrelados ao INEP/MEC, e supervisionados aqui no estado pelo Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário (PAMP), coordenado pela professora Maria Alexandrino Sampaio. Em parágrafo único a Lei 2.171/1957 afirma que: Quanto à execução e ao ajustamento dos resultados desse estudo contínuo, caberá aos Centros Educacionais de formação do magistério, localizados em determinada região, assumir as responsabilidades, procedendo, automaticamente, de acordo com as diretrizes fixadas em regulamento (RIO GRANDE DO NORTE, 1957, p. 05, Cap. II). Segundo Germano (1982), a partir do quarto trimestre de 1963 a remessa de recursos para a educação foi suspensa, sendo liberada apenas depois de instaurado o golpe militar de 1964. O autor afirma também que o SECERN, órgão executor do programa, passou a sofrer uma série de intervenções quanto a ação administrativa por parte do governador e de outras instâncias da administração estadual. Tal fato motivou a saída do então Secretário de Educação, Calazans Fernandes. Dessa maneira, por trás das interferências e restrições administrativas impostas a Secretaria de Educação, escondia- se, na verdade, uma divergência política entre facções do governo, do que resultou uma crise, na qual a facção mais “conservadora” conseguiu expurgar a facção “modernizadora e progressista” (p. 60 e 61). Ainda segundo Germano (1982, p. 61), o jornal A Ordem de 14 de dezembro de 1963 veicula uma reportagem sobre o mesmo episódio. 76 [...] o governador Aluízio Alves subscreveu e divulgou no Diário Oficial ‘um despacho em que declara dever o secretário de Educação submeter à sua aprovação todas as decisões relacionadas com a educação, inclusive despesas e nomeação de professores’. No ano de 1964, no advento da Ditadura Militar, o prefeito Djalma Maranhão foi deposto, preso e deportado para a ilha de Fernando de Noronha. Posteriormente, foi exilado no Uruguai, permanecendo lá até morrer, sozinho, no dia 30 de julho de 1971. O governador Aluízio Alves concluiu seu mandato em 1966, conseguindo fazer seu sucessor, o Monsenhor Walfredo Gurgel, que governou o Estado de 1966 a 1971. Ainda no ano de 1964, a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul solicitou a volta de Lia Campos. Portanto, é até 1964 que pretendo analisar as questões educacionais das quais Lia Campos participou, seja na esfera estadual ou municipal da educação. 77 A prática de Lia Campos 78 5 – A prática de Lia Campos a experiência vivenciada na Campanha De Pé No Chão Também se Aprende a Ler, como supervisora do 1º Curso Intensivo para o Magistério Primário (1961), Lia Campos pôs em prática os objetivos e critérios do programa do curso. O Curso Intensivo para o Magistério Municipal, segundo Góes (2000, p. 168), tinha como objetivo, N verificar o nível de preparo das professoras, a fim de realizar o treinamento baseado nas deficiências do domínio dos conteúdos das matérias do primário e no conhecimento dos princípios da técnica pedagógica. Seu critério básico para funcionamento era que as participantes fossem professoras efetivamente integradas ao ensino municipal. Isto, porque havia urgência em reduzir o índice de analfabetismo que existia no município de Natal, cujo indicador apontava para mais de trinta mil analfabetos. O passo inicial consistia em planejar um curso de férias para as professoras primárias da capital e arredores e candidatos ao ingresso no Magistério Primário Municipal. Lia Campos pretendia elaborar e pôr em andamento um programa de formação docente que mantivesse as práticas pedagógicas em consonância com a vida de uma escola que estava se modificando. Neste curso seriam matriculadas as professoras que já integravam o quadro, havendo margem de vagas para matrícula de novos componentes a serem aproveitados progressivamente, à medida que se estendesse a rede escolar municipal, a exemplo de outros cursos oferecidos pela Secretaria de 79 Educação do Estado. Com o intuito de capacitar professores leigos, este também acontecia no período das férias escolares, tendo uma duração de um mês e meio. Era importante proporcionar às professoras a noção dos objetivos visados na realização do curso, levando-as a uma formação continuada de forma específica para o trabalho que desempenhavam, bem como revisar os conhecimentos que possuíam sobre as principais matérias do curso primário. Assim, elas compreenderiam as finalidades da escola primária municipal e estabeleceriam critérios para a organização das classes e do material didático mínimo necessário a ser utilizado nas aulas. O curso seria desenvolvido através de aulas, palestras, debates, apresentação do material didático e jogos a serem confeccionados pelas professoras e, ainda, contaria com aplicação de questionários para levantamento de problemas existentes no decorrer do curso. Ao final, as professoras seriam submetidas a uma avaliação na forma de prova ou trabalho. As candidatas, cujos exames apresentassem resultados insuficientes,continuariam a capacitação, reservando-se um dia na semana para que, no período de quatro horas, pudessem assistir às aulas de preparação das matérias em que apresentassem baixo rendimento. O programa do curso fixava as matérias e os limites de conteúdos a serem vencidos. As disciplinas trabalhadas com as professoras eram: Língua Portuguesa, Matemática, Conhecimentos Gerais – que compreendia História e Geografia, e ainda, Ciências Físicas e Naturais. As aulas de Língua Portuguesa se dividiam em seis pontos básicos: redação de cartas, telegramas e recibos; ofícios; relatórios; ditado; leitura 80 (leitura silenciosa com interpretação escrita, leitura oral, considerando altura da voz, expressão e pronúncia e interpretação oral, destacando as idéias principais e secundárias do texto lido); gramática com exercícios escritos e orais, com destaque para os seguintes assuntos: categoria gramatical, elementos principais de uma sentença, conjugação de verbos regulares, irregulares, auxiliares e defectivos, emprego da crase, sinônimos, antônimos e homônimos e acentuação gráfica. Esta deveria obedecer ao vocabulário vigente a partir de 1943 (GÓES, 2000, p. 169). Em relação às aulas de Matemática, estas se dividiam em cinco pontos que contemplavam: operações com números inteiros e decimais; cálculo mental; multiplicação e divisão de inteiros e decimais por 10, 100 e 1.000; frações, nas suas operações, redutíveis e irredutíveis, redução de fração ao mesmo denominador e, por fim, sistema métrico, envolvendo operações, área, reduções, perímetro e metro cúbico. As demais disciplinas do curso também estavam divididas por assunto, ressaltando que a elaboração desse currículo se deu com o objetivo de, pelo menos, amenizar as deficiências das professoras em relação aos conteúdos ministrados no ensino primário. As orientações oferecidas durante a realização deste curso consistiam em nortear as professoras nos seus fazeres em sala de aula. Na área da Linguagem, seriam trabalhados os seguintes aspectos: como iniciar a leitura; a leitura nas diferentes séries; ditado; cópia; composição e escrita. A orientação metodológica para o ensino da Matemática compreendia os seguintes pontos: como iniciar o ensino da matemática; fatos fundamentais – a tabuada; aprendizagem das operações fundamentais; frações e problemas. 81 A equipe supervisora esperava que ao término do curso as professoras estivessem preparadas para trabalhar os conteúdos em sala de aula de uma forma integral, de modo que pudessem realizar os seus fazeres pedagógicos relacionado-os com as necessidades dos alunos, enquanto sujeitos de uma sociedade dinâmica e que se pretendia democrática. Figura 8: Diploma de participação na Campanha de pé no Chão [196_?] Fonte: Acervo particular da família Campos No ano de 1962, o CEPE contava com apenas treze funcionários, em sua maioria, professores primários recrutados nos Grupos Escolares do Estado, que eram cedidos para este órgão. As atividades desenvolvidas em maio desse mesmo ano estavam voltadas para o setor de Artes Industriais, com o planejamento dos trabalhos para o funcionamento de oficinas em Natal, Caicó e Mossoró. Essas cidades 82 foram escolhidas como sede, por serem pólos das regiões a que pertenciam, apresentando também a possibilidade da vinda de pessoas dos municípios vizinhos para participar das aulas. Em parceria com a Secretaria de Educação e Cultura, foram concluídas as obras das oficinas de Artes Industriais de Natal e equipadas as de Caicó e Mossoró. Em Natal, contou com uma matrícula geral de 240 alunos, sendo que deste total de alunos inscritos apenas 162 participaram efetivamente. Na cidade de Mossoró o início ocorreu em setembro, com a matrícula de 129 alunos; seguindo-se por Caicó, em novembro do mesmo ano, com uma matrícula efetiva de 150 alunos. Essa oficinas tinham como objetivo levar os alunos a desenvolverem habilidades técnicas nos trabalhos com cerâmica, cestaria, couro, madeira, cartonagem, fantoche tapeçaria, encadernação e desenho. Através desses novos conhecimentos adquiridos, os aprendizes poderiam assegurar uma forma de se inserir no mercado de trabalho. Para isso, segundo o Relatório, foi montada uma exposição de Artes Industriais, em Natal, mais precisamente na Lagoa Manoel Felipe. No evento, estiveram presentes os alunos de 324 escolas das regiões atendidas pela iniciativa. Segundo a Lei 2.171/1957, no seu Artigo 1º, a educação elementar, posto que acentuadamente geral e comum, procurará, sempre que possível constituir uma iniciação ao trabalho, assumindo o aspecto rural ou urbano neste seu caráter de escola pré-vocacional. Posteriormente às oficinas de Artes Industriais o CEPE organizou, nos meses de junho e julho, um curso de Recreação, cujo objetivo consistia em preparar recreadores para as escolas primárias da capital, Caicó e Mossoró, 83 tendo um total de 41 professores participantes. Para os educadores advindos do interior foi assegurada uma bolsa no valor de dez mil cruzeiros para custear as despesas. Com a duração de um mês esse curso tinha seu programa formado pela seguinte estrutura curricular: Psicologia, Jogos, Linguagem, Fundamentos da Recreação, Danças, Músicas (bandinhas), e Atividades Dramáticas (teatro fantoches, teatro sombra e atividades artísticas). De acordo com o pensamento educacional que perpassava a época, as escolas tinham que renovar suas práticas educacionais e métodos de ensino. Isto requeria do professor uma formação mais ampla, que não fosse restrita apenas às disciplinas do currículo comum, introduzindo no currículo de formação de seus educadores novos conhecimentos advindos de disciplinas, como Psicologia, Recreação, entre outras que foram integradas aos cursos oferecidos, pois, não haveria uma renovação no ato educativo se também não fosse renovada a maneira como seriam formados os educadores. No segundo semestre do mesmo ano, a professora Lia Campos estabeleceu, como meta pedagógica, difundir novos processos de ensino para os professores leigos do interior do Estado, tendo sido realizado o curso na cidade de São José de Mipibu no período de 1 a 7 de julho, beneficiando 126 professores dos seguintes municípios: São José de Mipibu, Nísia Floresta, Monte Alegre, Januário Cicco (atual Boa Saúde), Goianinha, Arês, Parnamirim e Vera Cruz. Esse curso estava direcionado aos professores da rede estadual que vinham de diversas instituições de ensino, não existindo, portanto, escolas especificamente selecionadas para enviar docentes para formação. 84 O curso tinha uma duração de oito horas diárias, com o intuito de contemplar o currículo que era composto pelos conteúdos de: Administração, Língua Pátria, Aritmética, Estudos Sociais, Estudos Naturais, Clube Agrícola, Artes Industriais e Religião. Os conteúdos dessas disciplinas serviriam tanto para o aprofundamento do conhecimento dos professores quanto para serem ministrados, de acordo com o nível da turma, nas escolas em que eles lecionavam, sendo necessário a adaptação dos assuntos às séries atendidas. Isto, porque ficou constatado que os professores, pela própria dinâmica da educação, necessitavam estar sempre se atualizando em relação a tais disciplinas. Sendo, dessa forma, necessária uma capacitação para construir e reconstruir os saberes em estudo. Como forma de verificar o rendimento da aprendizagem desses conteúdos nas escolas primárias, no segundo trimestre de 1962, o Centro elaborou e distribuiu provas objetivas. Para aplicação das mesmas foram realizadas reuniões com os diretores de Grupos Escolares do Estado (os documentos encontrados não especificam quais foram esses Grupos Escolares) com o objetivo de orientar sobre a aplicação das referidas provas. As provas foram distribuídas para aplicação da 1ª a 5ª séries primárias num total de 28.802 provas distribuídasem todo o Estado (RIO GRANDE DO NORTE, 1963b, p. 04). A execução desse procedimento não atendia a nenhuma norma específica. O intuito principal consistia em verificar o andamento das atividades escolares, o que vinha sendo realizado e como os alunos estavam se apropriando dos conteúdos ministrados. De acordo com a professora Nanci Gomes dos Santos, 85 O CEPE era responsável por irradiar, era o efeito multiplicador do que se fazia dentro da Secretaria de Educação em termos pedagógicos para as escolas. Por exemplo, apostilas... Qual era a função do CEPE? Através daqueles técnicos elaborar apostilas de Ciências, de Língua Portuguesa, de Matemática... O material didático e as provas eram elaboradas pelo CEPE e distribuídas já prontinhas, o pacotinho pronto era entregue nas escolas através dos órgãos intermediários que eram as Inspetorias de Ensino. Obtidas as informações e mapas do exame fez-se a avaliação do rendimento escolar, com os seguintes resultados: 1. Escolas que aplicaram provas 94 2. Matrícula geral 29.141 3. Matrícula efetiva 25.093 4. Comparecimento ao exame (número de alunos) 21.057 5. Considerados suficientes ou aprovados (número de alunos) 15.451 6.Considerados insuficientes ou que não lograram promoção à serie seguinte (número de alunos) 9.642 7. Percentagem de promoção 61,61% (RIO GRANDE DO NORTE, 1963b). Fica evidente na análise dos resultados obtidos que o trabalho empreendido pela Secretaria de Educação, apesar do muito que percorreu, ainda estava apenas no início. Muitas ações ainda estavam por fazer para que as benesses de uma formação continuada para professores se irradiassem pelo Estado e pudessem transformar professores e alunos em indivíduos mais ativos e participativos na escola e na sociedade. Aluno e professores como sujeitos de seus próprios atos de criar e recriar o mundo, conforme análise de Paulo Freire. De acordo com o Relatório das Atividades do CEPE desse período, a justificativa para que somente 94 escolas participassem da avaliação era a de que as provas não chegaram a atingir os 106 Grupos Escolares do Estado, porque alguns deles ainda não aceitaram ou não se prepararam para este tipo 86 de trabalho, em virtude de falta de professores ou ainda, embora contém com dedicados regentes, estes são leigos. Também a carência de recursos financeiros e a falta de supervisores impediram a remoção dos fatores citados. Para dar continuidade ao processo de formação dos professores leigos, a professora Lia Campos viabilizou, em parceria com o Ministério da Educação e Cultura (MEC), a especialização do pessoal que compunha os quadros técnicos da Secretaria de Educação, a exemplo de professoras como: Dione Moreira, Vilma Tinoco, Iracema Coutinho, Francisca Ivaíta23. Através de uma seleção, alguns professores se deslocaram para outras cidades do país, de acordo com a área de interesse e necessidades de trabalho. A Lei 2.171/1957 assegura esse direito aos professores, quando expressa no Artigo 19º que a rede de escolas de formação de professores do Estado compreende: Instituto de Educação de Natal, com caráter experimental em seus Cursos de Pesquisas, destinados à melhoria do ensino normal do Estado, mantendo, na medida de suas possibilidades, Cursos de Especialização e Aperfeiçoamento, para o que poderá procurar a cooperação de técnicos nacionais ou estrangeiros. 23 Todas as professoras citadas fizeram parte da Secretaria de Educação no período citado, e após a conclusão dos cursos de aperfeiçoamento, foram encaminhadas para as Inspetorias de Ensino. 87 CURSO LOCAL 1962 1963 Artes Industriais Guanabara 4 __ Artes Industriais São Paulo 1 17 Artes Industriais Salvador 2 __ Especialista em Educação São Paulo 1 1 Pesquisador em Educação São Paulo __ 2 Recursos Áudio-Visuais São Paulo __ 8 Metodologia da Matemática Belo Horizonte 1 3 Aperfeiçoamento em Currículo e Supervisão Belo Horizonte 1 1 Ciências Naturais Belo Horizonte __ 5 Língua Pátria Belo Horizonte __ 4 Estudos Sociais Belo Horizonte 1 5 Arte Infantil Guanabara 1 __ Jardim de Infância Guanabara 2 __ Regência de Classe Guanabara 2 __ Supervisor educacional de Ensino Primário Guanabara __ 11 TOTAL DE BOLSAS NOS ANOS DE 1962 E 1963 73 (RIO GRANDE DO NORTE, 1963b). Estavam previstas, ainda, a concessão de 63 bolsas de estudo para o segundo semestre de 1963, ficando a professora Lia Campos aguardando somente a autorização do MEC. Nanci Gomes do Santos, selecionada para estudar em Belo Horizonte, relata como ocorria o processo: Antes de 1963 eu comecei a ensinar. Naquele tempo não tinha Universidade, tinha a Fundação José Augusto. Aí eu fiz vestibular para fazer História.Quando eu estava acomodada, aparece Lia Campos nas escolas escolhendo professores. Ela olhou para mim e disse: _ Tu não queres fazer um curso em Belo Horizonte? _ Eu disse: -não, não quero não porque eu estou terminando o meu curso, vou fazer licenciatura. _ E ela disse: -ah, mas preenches o formulário, só para arriscar, não tem problema. Eu preenchi o formulário e com menos de uma semana chegou a resposta. Não tinha entrevista, era só preencher o formulário e saber uma língua estrangeira. A Inspetoria da qual a professora Nanci Gomes fazia parte tinha sua sede aqui em Natal e inspecionava, segundo ela, aproximadamente 34 municípios; entre eles: Macaíba, Parnamirim, São José de Mipibu, Ares, 88 Goianinha, Monte Alegre, Nísia Florestan entre outros. Esse órgão tinha como função básica multiplicar, para os municípios por ela assistidos, as deliberações educacionais sugeridas pelo CEPE, como por exemplo: a divisão dos conteúdos a serem trabalhados pelas escolas, as atividades propostas, bem como as provas. Ao concluírem os Cursos de Especialização os professores seriam absorvidos pelos seguintes setores e instituições da educação estadual: SECERN, CEPE, Oficinas de Artes Industriais, Inspetorias de Ensino, Escolas Normais de 2º ciclo, Escola de Aplicação de Natal e Caicó e Jardim de Infância Modelo. A professora Nanci Gomes relata o seu processo de volta ao Estado, quando assumiu uma função na Inspetoria de Ensino de Natal: Quando eu voltei, junto com mais dez pessoas, depois de seis meses, eu não fui mais para a escola. Eu tinha concluído o curso de Jardim de Infância e ocupei um cargo em uma Inspetoria de Ensino. As outras pessoas ficaram distribuídas nos órgão da Secretaria de Educação. Em relação ao material didático utilizado pelas escolas, este era remetido pelo MEC e distribuído nos municípios do Rio Grande do Norte através da ação das Inspetorias de Ensino de cada região do Estado e pelo SECERN. Esse material era composto pelas cartilhas Upa cavalinho24 e Sarita25 e seus amiguinhos, lápis, cadernos, coleções e Atlas. As coleções de Atlas 24 A cartilha Upa Cavalinho! é de autoria de Lourenço Filho e tem ilustrações de Oswaldo Storni. Sua primeira edição data de 1957, cuja tiragem foi de 1.000.000 de exemplares. (http://www.ufrgs.br/faced/extensao/memoria/cartilhas_imagens/upa_2.htm). 25 A cartilha Sarita e seus amiguinhos tem como autoras Cecy Cordeiro Thofehrn e Jandira Cárdias Szechir. No ano de 1961 estava na sua 69ª edição. (http://www.ufrgs.br/faced/extensao/memoria/cartilhas_imagens/sarita_4.htm). 89 denominadas A biblioteca da professora foram distribuídas apenas com as regentes de classes diplomadas. As Escolas Normais de 2º ciclo26 e os Ginásios Normais também foram incluídos na distribuição de material27. Figura 9: Cartilha Sarita e seus Figura 10: Cartilha Upa, Cavalinho! Amiginhos Fonte: Faculdade de Educação Fonte: Faculdade de Educação da UFRGS da UFRGS Alguns critérios foram adotados para distribuição do material didático. A professora Lia Campos levou em consideração, ao remetê-los às escolas, os seguintes aspectos: número de matrícula das escolas; priorização das Escolas Públicas do Estado, seguidas pelas Escolas Municipais da capital e pelasEscolas Municipais do Interior. Quanto à distribuição dos livros, cartilhas e Atlas, esta era de responsabilidade do SECERN, setor responsável por administrar os recursos financeiros e o Setor de Ensino Médio e de Planejamento, dirigido pelo próprio 26 Por Escola Normal de 2º ciclo entende-se aquela que ministrava curso de formação de professores primários em três anos.(LOURO, 1997). 27 Não encontrei o material citado, o que me impossibilitou de realizar uma análise do mesmo. Segundo alguns funcionários do Arquivo Público do Rio Grande do Norte, o material da Secretaria de Educação e Cultura da década de 1950 e parte dos documentos da década de 1960 foram incinerados por uma funcionária da Secretaria de Educação. 90 Secretário, que considerou como critério de recebimento a necessidade das escolas em utilizar esse material. Para tanto, foi realizado um levantamento para comprovação desse dado. A culminância do trabalho de capacitação de professores, realizado pela professora Lia Campos se deu com a abertura do Curso de Orientação Pedagógica. Este tinha por objetivo levar novas técnicas de ensino aos professores e realizar uma experiência com classes de 1º ano primário, tendo em vista diminuir a repetência. A nova forma de abordar os conteúdos desse nível deveria considerar as experiências da criança, pois se pensava que desse modo a aquisição do conhecimento se tornaria algo significativo. Razão que levaria o educando a deter-se na apreensão dos conteúdos trabalhados.A esse respeito, a Lei da Educação Estadual de 1958 no seu Artigo 1º fixa que se faz necessário aos serviços de educação e cultura do Rio Grande do Norte: Ministrar sempre que possível, educação integral, considerando o aluno não só em função da estrutura escolar, como também do lar e de toda a vida social, tendo em vista os ideais e as tendências democráticas da sociedade moderna. Realizado na capital deste Estado, o curso atendeu a professores dos Grupos Escolares e das Escolas Reunidas e Isoladas da Capital. O período de aulas se estendeu por dois semestres, sendo o primeiro realizado entre os dias 20 de abril e 20 de junho de 1963, e o segundo, compreendendo os dias 20 de julho a 31 de dezembro do mesmo ano. As aulas ocorriam sempre aos sábados, no horário da manhã, divididas em quatro períodos de 40 minutos cada um. As disciplinas ministradas foram: Linguagem na Escola Primária, Matemática na escola Primária, Estudos Sociais e Ciências Naturais. 91 As aulas que aconteceram no 1º semestre foram divididas em três postos de funcionamento sob a coordenação de técnicas da Secretaria de Educação. Tais postos agrupavam um determinado número de professores, ficando assim organizados: 1º posto: Escola de Aplicação – professores de 2ª e 3ª séries primárias. Coordenadora: Ana Djanira van der Linden. 2º posto: Colégio Marista e posteriormente Associação de Professores – professores de 1ª série. Coordenadora: Maria da Costa Oliveira. 3º posto: Instituto Padre Miguelinho – professores de 4ª e 5ª séries. Coordenadora: Maria Anilda de Menezes. Finalizando as atividades do CEPE no ano de 1963, foram enviados aos Grupos Escolares e Escolas Reunidas do Estado, três planos de estudo para serem desenvolvidos por estas unidades de ensino. Tais planos abordavam os seguintes assuntos: Dia das Mães, Festas Juninas e Plano de Eletrificação do Estado. O tema Eletrificação do Estado surgiu em decorrência de que 1963 foi o ano em que o governador Aluízio Alves criou, através da Lei 2.721/1961 a Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte – COSERN, trazendo energia elétrica de Paulo Afonso/BA para o Rio Grande do Norte. Tal feito acarretou o desenvolvimento industrial do Estado e, mais tarde, o crescimento do setor agroindustrial, tendo em vista que no ano de 1960 apenas 14% da população se beneficiava dos serviços elétricos, passando, em 1965, para 39% da população com acesso a luz elétrica. 92 Lia Campos, sempre atenta à realidade local buscou integrar os conteúdos escolares com os acontecimentos do Estado que lhe acolheu e que foi acolhido por ela. Desse modo, esta professora foi traçando o seu percurso na educação em Natal e no Rio Grande do Norte, seja coordenando cursos, percorrendo municípios do interior do Estado ou empreendendo reformas educacionais. Enfim, a professora Lia Campos imprimiu uma marca na historiografia do Rio Grande do Norte através de suas ações educativas, sendo por isso lembrada pelos que foram expectadores e companheiros da sua experiência em terras potiguares, e ainda pelos que não a conheceram, mas que ouviram falar da sua prática como diretora do CEPE. Foto 11: Lia Campos, a terceira da esquerda para a direita, com professoras da Secretaria de Educação [196_?] Fonte: Acervo particular de Anilda Menezes 93 Algumas considerações 94 6 – Algumas considerações Foto 12: Lia Campos momentos antes de uma reunião com a equipe do CEPE [196_?] Fonte: Acervo particular da família Campos Busquei no decorrer desta pesquisa analisar a atuação da professora Lia Campos nas questões educacionais desta capital e deste estado, nas décadas de 1950 e 1960. Na tarefa de garimpar os arquivos, procurei dados acerca da referida professora, da cidade de Natal e dos fatos 95 ocorridos no Rio Grande do Norte, da organização educacional e de que forma essa professora desempenhou suas funções. À medida que encontrava indícios dos passos percorridos por Lia Campos, eu visualizava um universo de acontecimentos entrelaçados: educação, política. E para que esse cenário se mostrasse mais claro era preciso que eu o ajustasse na minha visão do período, de modo que nele houvesse resquícios de vida em atividade. Dessa maneira, consegui estabelecer conexões entre como se pensava a educação, à época, e de que forma esse ideário seria concretizado. Atividade. Penso ser esta a palavra que mais expressa a atuação dessa professora, uma vez que ao chegar neste Estado empreendeu visitas aos mais distantes rincões potiguares em busca de promover uma melhoria no funcionamento das instituições de ensino que permitiriam um vislumbrar de um futuro. Tomando conhecimento do seu desempenho, transportei-me, por vezes, para o período em estudo. Percorri algumas estradas de barro batido, empoeiradas, circundadas por vegetações secas. Pude ver também o entusiasmo da população de municípios como Santa Cruz, Caicó, Mossoró, Macaíba, Currais Novos, Pau dos Ferros, entre outras por ela visitadas. Em um espaço social que buscava transformações e modernizações, em consonância com os acontecimentos nacionais, a educação não poderia ficar relegada a um plano posterior. Surgiu então a necessidade de criar uma universidade, diminuir os índices de analfabetismo, capacitar e formar docentes comprometidos com o ato de educar e todas as implicações que este traz. 96 Para realizar tais ações, o governo do Estado estabeleceu convênio com INEP. O Rio Grande do Norte, a partir daí, procurou manter intercâmbio com diversos Estados da Federação, a fim de garantir o bom andamento das ações multiplicadoras de conhecimento para professores leigos. Ainda, através de um ordenamento legal, a Lei 2.171/1957 fixa as bases da educação elementar e da formação do Magistério Primário. Com isso, imprimiu na educação do Estado a consideração pelo aluno de forma integral, não apenas em função da estrutura escolar, mas também em relação a sua vida doméstica e social. O governo do Estado, através da força de vontade da professora Lia Campos que, a exemplo de Anísio Teixeira – o escolanovista – procurou organizar uma escola condizente com o mundo que o aluno conhecia, respeitando suas necessidades e dando acesso a livros, recreação, saúde e professores melhor preparados. Ao longo dos anos da década de 1960, o poder público também almejou uma educação sistematizada, de abrangênciae de qualidade. Deu continuidade aos cursos de férias para professores leigos; objetivou ampliar o conhecimento dos mesmos de acordo com os preceitos escolanovistas, fiscalizando o cumprimento das ações determinadas pela Secretaria de Educação e pelo CEPE, ampliou a rede escolar, lançou uma campanha de alfabetização de adultos, da qual obteve bons resultados. Inserida nesse contexto como participante ativa das mudanças educativas, Lia Campos deixou marcada na historiografia norte-rio-grandense e na memória dos que com ela conviveram, enquanto professora e coordenadora de um órgão técnico da Secretaria de Educação, as suas ações de disseminação de ideais e concretização dos mesmos. Fica claro, em sua 97 prática, aspectos que se mostram tão atuais hoje, quanto eram para o tempo passado. Alicerçado no ensino primário, o trabalho de Lia Campos ressalta a relevância da formação docente para tal nível de ensino e o modo como os que nele trabalham podem conduzir suas concepções e fazeres da prática diária. Como jovem professora iniciante na carreira do magistério e nos escritos da historiografia da educação, percebo que o “passado é inacabado, no sentido de que o futuro o utiliza de inúmeras maneiras. Daí a possibilidade, e para nós exigência, de que cada geração reescreva a ou as histórias daqueles que a antecederam” (NUNES, 1990, p. 38). 98 Referências 99 Referências Entrevistas RÊGO, Zilda Lopes do. Entrevista concedida a Daniela Fonsêca Vieira. Natal/RN; julho de 2004 e agosto de 2005. SANTOS, Nanci Gomes dos. Entrevista concedida a Daniela Fonsêca Vieira. Natal/RN; março e junho de 2005. Livros e Revistas ALMEIDA, Jane Soares de (Org.). estudos sobre a profissão docente. Araraquara: FCL/Laboratório Editorial/UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica Editora, 2001. (Séries Temas em Educação Escolar). ____. Mulher e educação: a paixão pelo possível. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998. (Prismas). ALVES, Aluízio. O que eu não esqueci: reminiscências políticas. Rio de Janeiro: Léo Christiano Editorial, 2001. ARAÚJO, Marta Maria de. A pesquisa educacional como dimensão formativa do educador científico: o legado de Anísio Teixeira (1952-1964). 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