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1 INVESTIGAÇÃO E PERÍCIA CRIMINAL: FRAUDES CONTÁBEIS UNIDADE 1, SESSÃO 1 CONHECENDO A DISCIPLINA Olá, estudante! Seja bem-vindo ao nosso encontro! A contabilidade é um instrumento essencial na análise e avaliação das situações que envolvem as operações financeiras dentro das instituições. Diante disso, faremos uma viagem em busca de diversos conhecimentos que nos permitam compreender as principais contribuições da contabilidade para a investigação e execução da perícia criminal. Como a contabilidade é uma ciência que interpreta, registra e estuda os fenômenos e fatos que ocorrem na empresa ao longo do tempo, esse saber possibilita que usuários com acesso a tais informações verifiquem as mudanças e situações que afetaram o patrimônio, objeto da contabilidade. Por meio do patrimônio, é possível identificar as mutações ocorridas e avaliar a evolução da empresa com o passar dos anos, visto que os registros realizados na contabilidade viabilizarão a análise dos recursos obtidos, das despesas realizadas e dos investimentos efetuados, afinal a contabilidade tem como objetivo fornecer informações e controlar o patrimonial. A partir dos relatórios financeiros, faz-se a análise da empresa, de modo que é possível verificar se há fraudes. Tais documentos darão subsídios para a elaboração de pareceres a respeito de fatos relevantes ocorridos na corporação. Com o avanço tecnológico, a contabilidade deu um grande salto no que diz respeito à obtenção de informações mais precisas e de maneira mais rápida, pois as ferramentas que hoje existem permitem ao contador gerar relatórios com mais agilidade. Além disso, as adequações ocorridas nas normas contábeis para que os registros contábeis não estejam resumidos a uma necessidade interna, contemplando apenas o nosso País, foram fundamentais para o avanço das empresas no mercado globalizado. Diante da globalização, tornou-se necessário adequar as normais contábeis, para que atendessem, também, às normas internacionais, conhecidas como International Financial Reporting Standards (IFRS), além de oportunizar aos clientes a efetuação de diversas operações financeiras e comerciais por meio de processos dinâmicos. Frente à evolução dos negócios, à abertura de diferentes maneiras de executar aplicações financeiras e à atuação das empresas no mercado, também houve a necessidade de desenvolver mecanismos de proteção ao Sistema Financeiro Nacional (SFN) e ao Sistema Tributário Nacional. Os entes públicos criaram e continuam aprimorando diversas obrigações acessórias para fornecer informações relativas a operações das organizações. 2 Trata-se de declarações impostas, as quais devem ser encaminhadas a cada órgão vinculado às operações em um determinado período. Muitas dessas obrigações são mensais e outras, anuais. Mediante esses dados, os entes públicos conseguem fazer cruzamentos de informações entre as pessoas físicas e jurídicas, bem como de pessoas jurídicas para pessoas jurídicas. O contador tem um papel fundamental no desenvolvimento da empresa. Tendo consciência de sua responsabilidade civil e criminal, esse profissional deve assegurar que os registros da corporação, realizados ao longo de cada período, apresentem a veracidade dos fatos, a partir dos documentos que darão o suporte necessário à evolução patrimonial da instituição e à análise de prática de crimes financeiros e contra a ordem tributária. No decorrer desta etapa de aprendizagem, você compreenderá como a contabilidade pode atuar no deslinde dos crimes financeiros e contra a ordem tributária. Além disso, será possível entender mais detalhes sobre o papel do contador, verificando suas respectivas responsabilidades. Você também será capaz de identificar a importância dos relatórios contábeis e do Sistema Financeiro Nacional (SFN) no dia a dia do indivíduo, da sociedade e do País. Para o fechamento desta unidade de estudos, você conhecerá os tipos de crimes efetuados contra o SFN e a ordem tributária, como também a responsabilidade civil e penal do contador. Vamos fazer esta viagem rumo ao conhecimento? A CIÊNCIA CONTÁBIL Olá, estudante! Você já percebeu que os meios de comunicação divulgam muitas ocorrências relacionadas a crimes financeiros, as quais demandam a ação de diversos agentes para a apuração dos casos? Exemplo de uma das operações ocorridas no Brasil foi a Black Flag, da Polícia Federal. Os fiscais da Receita Federal, após a análise de movimentações financeiras suspeitas, identificaram inúmeras fraudes em empresas que ensejaram crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. Com o objetivo de instrumentalizá-lo acerca do papel da contabilidade e do contador no combate aos crimes financeiros e contra a ordem tributária, alguns conteúdos importantes serão desenvolvidos neste material, para proporcionar o seu avanço profissional. A nossa proposta de viagem rumo ao conhecimento está dividida em seções, nas quais abordaremos os seguintes conteúdos: Seção 1.1: O que é a contabilidade e o seu objetivo; Objeto de estudo da contabilidade; Relatório financeiro para fins gerais; O contador e suas responsabilidades. Seção 1.2: Conceito e tipos de instituições financeiras; O que é o Sistema Financeiro Nacional; Estrutura do Sistema Financeiro Nacional; O que é a ordem tributária. Seção 1.3: O que são os crimes e os tipos de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e a ordem tributária; Legislação vigente; Responsabilidade penal e delação premiada nos crimes contra o SFN. 3 Querido estudante, vamos embarcar nesta jornada de aprendizagem? O seu espaço no mercado de trabalho depende única e exclusivamente de você. Somente você poderá mudar sua vida e alcançar os seus objetivos. Vamos iniciar fazendo uma reflexão sobre a operação Black Flag. Para isso, você terá acesso a um breve resumo sobre a referida operação, para que possa compreender como começa a apuração dos crimes financeiros. Lembra que comentei sobre as obrigações acessórias? Os fiscais da Receita Federal, de posse das informações prestadas ao ente público pelas pessoas físicas e jurídicas, identificaram indícios de crimes. As pessoas envolvidas no caso criaram empresas para assumir a propriedade de bens, de forma que pudessem se livrar de possíveis ações fiscais. No entanto, essas mesmas pessoas mantinham um padrão de vida muito alto. Compravam carros de luxo, imóveis e lanchas cujo valor era bem elevado, o que chamou a atenção da fiscalização. De posse das informações, declarações e relatórios financeiros das empresas, foi possível identificar que se tratava de uma organização criminosa. E o início de todo esse processo de investigação se deu em face de um contrato realizado com uma agência de fomento econômico estatal em São Paulo. Vários policiais federais e servidores da Receita Federal atuaram nesta investigação. Parte dos valores financiava o esporte automobilístico (BENTES, 2021). Neste momento, pensando na operação mencionada, reflita sobre a seguinte questão: como a ciência contábil pode contribuir para o deslinde de diversas operações relacionadas a crimes financeiros? Para contribuir com a sua reflexão, sugiro uma breve leitura acerta do objeto de estudo da contabilidade, dos relatórios financeiros e da responsabilidade do contador. Elabore possíveis respostas para o questionamento feito anteriormente e continue a sua trajetória de estudos. Ao final desta unidade de aprendizagem, proponho que você descreva o seu novo entendimento sobre a pergunta realizada e faça uma comparação. Destaque o que você conseguiu somar à sua aprendizagem. Então responda: valeu a pena? PRATICAR PARA APRENDER Agora que você há conhece os propósitos de nossa disciplina, nossa ideia é apresentar aspectos do conteúdo que envolvam a contabilidade, o profissional da contabilidade e suas responsabilidades como instrumento de colaboração contra crimes aoSistema Financeiro Nacional e à ordem tributária. Você sabia que o contador é um grande agente de transformação para prevenção e combate aos crimes financeiros? É possível que você já tenha ouvido essa afirmação em diversos meios de comunicação que informam sobre crimes financeiros no Brasil, não é mesmo? Como exemplo de operação de combate a ações criminosas, podemos citar a Black Flag, que revelou um esquema de fraudes. Em decorrência dos crimes financeiros ocorridos no Brasil, foi instituída a Lei nº 9.613/1998, que trata dos esquemas de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores, bem como da prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos. Essa mesma legislação também promoveu a criação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Para contextualizar sua aprendizagem de forma mais adequada, imagine que você atue como contador na empresa ABC Construções Ltda. No ano de 20X1, os sócios disponibilizaram, em 4 dezembro, o fluxo de caixa, o balanço patrimonial, a demonstração de mutação do patrimônio líquido e demais relatórios financeiros referentes ao período de janeiro a novembro. O sócio André informa a contabilidade sobre a aquisição de um iate no valor de R$ 1.200.000,00 à vista, realizada em março de 20X1. Também foi verificado um pagamento a fornecedor em espécie, no valor de R$ 200.000,00, em agosto, para o suprimento de material a ser aplicado no serviço ganho na licitação do Governo do Estado da Bahia. Sabe-se que a atividade-fim da empresa é de construção civil. No relatório do ano de 20X0, o patrimônio da empresa estava registrado em R$ 500.000,00; possuía em caixa o valor de R$ 50.000,00 e na conta do banco, o valor de R$ 100.000,00. Nos documentos entregues referentes a 20X1, os registros de recebimentos não ultrapassaram o valor de R$ 300.000,00. Considerando a Resolução do CFC nº 1530, de 22 de setembro de 2017, que trata dos procedimentos a serem efetuados por profissionais de contabilidade ao verificarem indícios de crimes financeiros, analise e justifique os processos que devem ser realizados pelo contador com relação às operações ocorridas no período de 20X1 da empresa ABC Construções Ltda., contemplando os seguintes aspectos: Avaliar a análise de riscos nas operações realizadas. Analisar se a situação apresentada requer comunicação ao Coaf, justificando a decisão. Para saber mais detalhes sobre a Resolução do CFC nº 1.530/2017, faça a leitura desse documento acessando seu respectivo link disponível nas Referências desta seção de estudos. Com dedicação e muita leitura, você conseguirá promover uma associação entre o contexto da situação-problema apresentada e as responsabilidade e ações do contador no cenário em questão. Quer ser um profissional diferenciado no mercado? Então, siga em frente, leia bastante e busque compreender os temas propostos! CONCEITO-CHAVE Vamos imergir no conteúdo desta etapa de aprendizagem? A contabilidade é considerada uma ciência que estuda, interpreta, registra os fatos ocorridos em um determinado período e demonstra, a partir dos registros, o patrimônio construído ao longo do tempo, que é o objeto da contabilidade. Mas afinal, o que é patrimônio? O patrimônio é o conjunto de bens, direitos e obrigações. O que podemos compreender sobre cada um desses elementos? No momento em que eu preciso efetuar uma compra pessoal, é necessário ter recurso financeiro, seja dinheiro em caixa ou em conta corrente. A essa disponibilidade na contabilidade, damos o nome de bens. As mercadorias que são postas à venda também estão nesse componente, assim como as aplicações financeiras, veículos, móveis, imóveis, direitos autorias, entre outros elementos. Vale ressaltar que os bens têm relação com as necessidades humanas, sejam elas materiais ou imateriais. Entendemos, portanto, que os bens são coisas que atenderão às necessidades das pessoas ou até mesmo das empresas. Mas e quanto aos direitos e às obrigações, o que podermos compreender sobre esses dois componentes? 5 EXEMPLIFICANDO A empresa ABC Construções Ltda realizou a venda de um serviço para a construção de dez casas populares. No contrato assinado com o Governo do Estado da Bahia, consta como valor dos serviços a quantia de R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais). No decorrer da obra, foram realizadas medições para serem comparadas com o cronograma apresentado no momento da contratação, como também para que os pagamentos fossem feitos na conclusão de cada uma das etapas acordadas, conforme estabelecido no contrato entre as partes. Na finalização de cada uma das fases da obra, foi emitida a nota fiscal para que o Estado efetuasse o pagamento dos serviços. No que se refere à conclusão dos estágios da obra, como acordado em contrato, a empresa, ao concluir as etapas, emitiu uma nota fiscal para o Governo do Estado e gerou uma obrigação de pagamento, de modo que a empresa que realizou o serviço tem o direito de receber o valor acordado em contrato. Quando há uma relação entre as pessoas, isto é, de um lado existe o direito a receber e do outro, a obrigação de pagar, no contexto da contabilidade, esse direito a receber pertence ao componente “direitos”, e o compromisso de pagar pela entrega dos serviços pertence ao componente “obrigações”. Figura 1.1 | Representação do patrimônio Fonte: elaborada pela autora. O objetivo da contabilidade é controlar esse patrimônio e fornecer informações. Quando ocorrem situações de ocultação de bens, direitos e valores, a empresa está praticando um crime financeiro de “lavagem” de dinheiro. Nesse caso, o contador tem a obrigação de informar o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre tal pendência. Vamos analisar, a seguir, algumas situações que vivemos no cotidiano para entender de forma mais efetiva o que é a contabilidade. Sabemos que devemos ter o controle de todas as nossas ações, não é verdade? Não podermos comprar tudo o que vemos pela frente ou tudo o que desejamos em um só momento. É preciso planejar, controlar os nossos desejos e vontades, não é mesmo? Figura 1.2 | Equilíbrio financeiro Fonte: Pixabay. Em uma empresa, o controle do patrimônio também se faz necessário. Devem-se registrar todas as operações com seus respectivos documentos, administrar os gastos para que não haja um endividamento, ou seja, planejar para gerir o negócio de maneira mais adequada. Controlar o patrimônio, prezando por uma boa gestão dos recursos, permite à empresa manter-se competitiva no mercado e crescer financeiramente. 6 ASSIMILE Por meio do artigo indicado para leitura a seguir, você poderá identificar os tipos de contas que são registradas em bens, direitos e obrigações, ou seja, que constituem o objeto da contabilidade: o patrimônio. Para acessar o material, consulte o link disponível nas Referências desta seção. PRATES, W. R. O que é patrimônio na contabilidade? Bens, direitos e obrigações! Ciência e Negócios, 2 fev. 2018. Note que em todas as situações analisadas até este momento, a ação humana foi a principal motivadora dos fatos ocorridos no decorrer do tempo e, consequentemente, gerou resultados, fossem eles positivos ou negativos. A contabilidade tem duas funções extremamente importantes: a administrativa, que cuida do controle patrimonial; e a econômica, que a cada mês, trimestre ou ano, depois de todos os registros das operações realizadas pela empresa, apura o resultado, que poderá ser lucro ou prejuízo. O lucro é um bom sinalizador, porém o prejuízo é sinal de que algo está errado e deve ser checado e avaliado. REFLITA Considerando que estamos no meio de nossa jornada de aprendizagem e diante do que analisamos até o momento, reflita sobre o que vem a ser a contabilidade. Para isso, disponho, a seguir, algumas palavras-chaves que podem contribuircom a sua avaliação: Ciência; Fatos; Patrimônio; Informações; Controle. Agora que você aprofundou seus conhecimentos sobre patrimônio, vamos retomar a análise da operação Black Flag, deflagrada pela Polícia Federal. As empresas foram criadas para que não houvesse suspeitas sobre as operações executadas pelos envolvidos, porém estes se esqueceram de um pequeno detalhe: existem profissionais capacitados que fazem a análise patrimonial das empresas e conseguem perceber quando existem operações alheias ao negócio ou até mesmo movimentações de grande monta de dinheiro circulando. Por meio da contabilidade, é possível interpretar todos os fenômenos que ocorrem na corporação e afetam o patrimônio da empresa. Com os registros de todos os fatos, pode-se analisar integralmente a movimentação e a variação do patrimônio. É possível gerar relatórios que darão suporte para avaliar a empresa e analisar a situação em um determinado momento. É a partir dos registros dos fatos contábeis realizados envolvendo todas as operações que ocorreram na empresa que são produzidos relatórios capazes de contribuir para a tomada de decisões. Você pode estar pensando: não constam apenas números nesses relatórios? Aparentemente sim, porém os números indicam muitas informações, como: se a empresa está com um bom capital de giro, se está com endividamento alto, se os sócios tiveram uma boa rentabilidade nos negócios, entre outros dados. É importante saber fazer a leitura dos relatórios. Por isso, é imprescindível que todas as operações sejam registradas e estejam de acordo com as normas contábeis, a fim de que seja possível garantir o melhor controle do patrimônio. 7 EXEMPLIFICANDO A empresa ABC Construções Ltda resolve pedir empréstimo a um banco, a fim de dar andamento às obras. Um dos documentos que o banco solicitará é o balanço patrimonial, por meio do qual o banco terá condições de avaliar a evolução patrimonial da empresa. Consegue perceber como é importante fazer os registros de toda a movimentação da organização? Com base nessa demonstração contábil, é possível fazer uma comparação entre os dois últimos anos e avaliar a capacidade financeira que a empresa tem de assumir o empréstimo. Quando analisamos a contabilidade e nos deparamos com um caso concreto, é possível perceber a importância dessa atividade para o deslinde dos crimes, não é mesmo? Depois desta trajetória inicial, você conseguiu chegar a uma conclusão sobre a relação da contabilidade com a operação Black Flag? Se a sua resposta foi sim, significa que estamos no caminho certo e que podemos seguir em frente. Caso ainda tenha alguma dificuldade, retorne ao início e faça uma nova leitura, para agregar valor à sua aprendizagem. Nas operações realizadas pela empresa, em transações com instituições financeiras e em contratos de serviços prestados, geram-se documentos que devem ser registrados pela contabilidade. A partir desses registros, são produzidos os relatórios, na intenção de que os usuários da contabilidade tenham conhecimento sobre as transações efetuadas pela corporação, a origem dos recursos obtidos e as aplicações executadas pelos gestores. Os relatórios financeiros obedecem a uma estrutura conceitual. Como estabelece a NBC TG Estrutura Conceitual, de novembro de 2019, esses documentos contribuem para a transparência das informações, reforçam a prestação de contas e estimulam a eficiência econômica, o que auxilia os investidores na identificação de oportunidades e riscos em todo o mundo. De acordo com a NBC TG Estrutura Conceitual, o objetivo do relatório financeiro para fins gerais é fornecer informações relevantes para a tomada de decisões referente à oferta de recursos à entidade, como: compra, venda ou manutenção de patrimônio e dívida; tomada de decisão em relação a concessão ou liquidação de empréstimos e até mesmo outras formas de créditos; exercício do direito de voto ou de outra forma influência sobre os atos da administração que estejam relacionados aos recursos econômicos da entidade. Com base nos relatórios gerados pela contabilidade, como fluxo de caixa, balanço patrimonial, demonstração da mutação patrimonial e outras demonstrações contábeis, é possível identificar situações que podem dar indícios de fraudes e crimes. Quando há ocultação ou alguma dissimulação da origem, movimentação ou propriedade de bens e direitos, caracteriza-se o crime e, por se tratar de um crime, há infração penal. Quando existe uma tentativa de disfarçar a origem dos recursos obtidos, configura-se o crime de lavagem de dinheiro. Vamos a um exemplo comum de fraude: a abertura de empresas utilizando os dados de pessoas honestas, conhecidas como “laranjas”. Trata-se de empresas de fachada, utilizadas por fraudadores para cometer crimes financeiros. Em decorrência de diversos crimes financeiros ocorridos no Brasil, como o investigado pela operação Black Flag, institui-se a Lei nº 9.613/1998, que trata dos crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos. Essa mesma legislação também promoveu a criação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Tal operação, apresentada no início de nossa jornada de estudos, envolvia crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e casos de lavagem de dinheiro. 8 Vamos, agora, retomar nossa análise sobre a operação Black Flag! No caso em questão, o papel da Receita Federal foi fundamental na avaliação das movimentações suspeitas, o que se tornou possível em virtude do trabalho de fiscalização. Durante a operação, verificaram-se indícios no processo de fraude pública. Muitas empresas foram criadas para assumir a propriedade de bens e livrar-se de ações fiscais. A obtenção de contratos junto à Caixa Econômica Federal e a uma agência de fomento paulista no valor de milhões configuraram uma fraude, a qual foi detectada a partir dos relatórios financeiros analisados por profissionais especializados. As demonstrações contábeis, como balanço patrimonial, demonstração de resultado do período, demonstração da mutação patrimonial, notas explicativas, entre outros documentos, são relatórios emitidos por meio da contabilidade, os quais fornecem informações sobre ativos, passivos, patrimônio líquido, receitas e despesas das empresas. Tais dados permitem aos usuários da contabilidade avaliar o fluxo de caixa líquido, a gestão de recursos econômicos da entidade, entre outros elementos. Os profissionais especializados souberam utilizar tais relatórios como fonte de contribuição ao deslinde do crime na operação Black Flag. Os criminosos envolvidos respondem por crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e a ordem tributária e lavagem de dinheiro. Na Polícia Federal, existem profissionais especialmente qualificados na área de contabilidade que desenvolvem as atividades de análise, pois, para atuar como perito criminal, deve-se ser um profissional concursado, como estudaremos na Seção 1.2. Então, caro estudante, para que seja possível executar todos os procedimentos de registros e análises contábeis, é preciso contar profissionais especializados, capazes de atestar a veracidade das informações. Para que todo o processo funcione da forma correta, devem-se seguir as normas contábeis e as legislações pertinentes a cada atividade da empresa. É por causa disso que você está buscando se especializar, para se tornar uma peça-chave no mundo dos negócios. Ao avançar nesta jornada de aprendizagem, você perceberá quantas informações são importantes para obter sucesso em sua carreira. Um bom perito deve se aprofundar nas legislações e conhecer bem o conteúdo do qual se propõe a fazer perícia. O contador atua em diversas áreas: perícia, contábil, departamento pessoal, tributária, auditoria, consultoria, acadêmica. Como o foco desta disciplina está direcionado à investigaçãoe à perícia criminal, vamos tratar da responsabilidade do perito. De acordo com a Norma do Perito – NBC PP (R1) (BRASIL, 2020), esse profissional tem responsabilidade civil e criminal. No que se refere à parte civil, o perito pode sofrer multas, indenização e tornar-se inabilitado ao exercício da profissão. Quanto à responsabilidade penal, se o profissional descumprir as normas legais, poderá sofrer penas de multa e reclusão. No desenvolvimento do trabalho pericial, o perito tem a obrigação de ser ético e respeitar os princípios do direito. O profissional que não tem consciência de sua responsabilidade e não atende às exigências estabelecidas à sua profissão também pode sofrer penalidade ética, que é avaliada junto ao conselho de classe. Quando o perito é nomeado, deve exercer sua atividade com imparcialidade, dando tratamento igual a ambas as partes envolvidas no processo. A Lei nº 12.030/2009 dispõe sobre as perícias oficiais. As atividades exercidas pelo perito criminal são consideradas perícias oficiais. E a perícia criminal federal é exercida por quem? Para a realização de uma perícia criminal, o profissional deve ser concursado para atuar na Polícia Federal. Nesse caso, é imprescindível ter conhecimento técnico e científico; técnico porque o perito deve ser capaz de encontrar provas suficientes e contundentes para comprovar os crimes; e científico porque sua principal função é analisar vestígios que possam elucidar os crimes. O órgão 9 central de perícia oficial de natureza criminal é o Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal. Quem quiser trabalhar como perito criminal deve fazer concurso público para ingressar na Polícia Federal. Então, a nossa viagem está sendo proveitosa? Para que a jornada se torne ainda mais fascinante, vamos nos imaginar numa situação-problema, a fim de que possamos compreender bem tudo o que estamos adquirindo de conhecimento? Vamos lá! REFERÊNCIAS ADILSON CARVALHO. Olá, pessoal! Conforme combinado, eis o terceiro de três vídeos contendo o Curso Prático de Perícia Contábil-Financeira de Natureza Criminal [...]. [S. l.], 14 ago. 2021. Instagram: @peritocarvalho. Disponível em: https://bit.ly/3qw9o16. Acesso em: 24 abr. 2022. BENTES, V. PF combate crimes financeiros e lavagem de dinheiro que somam R$ 2,5 bilhões. CNN Brasil, 11 maio 2021. Disponível em: https://bit.ly/3d9SNNl. Acesso em: 20 abr. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade, NBC PP nº 1 (R1), de 19 de março de 2020. Dá nova redação à NBC PP 01, que dispõe sobre perito contábil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 27 mar. 2020. Disponível em: https://bit.ly/3B7J16y. Acesso em: 24 abr. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Resolução nº 1.530, de 22 de setembro de 2017. Dispõe sobre os procedimentos a serem observados pelos profissionais e organizações contábeis para cumprimento das obrigações previstas na Lei nº 9.613/1998 e alterações posteriores. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 28 set. 2017. Disponível em: https://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/Res_1530.pdf. Acesso em: 24 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998. Dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - Coaf, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 4 mar. 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm. Acesso em: 24 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 12.030, de 17 de setembro de 2009. Dispõe sobre as perícias oficiais e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 18 set. 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12030.htm. Acesso em: 24 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 1 jul. 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm. Acesso em: 24 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 14.133, de 1 de abril de 2021. Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Diário 10 Oficial da União, Brasília, DF: 1 abr. 2021. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm. Acesso em: 24 abr. 2022. PRATES, W. R. O que é patrimônio na contabilidade? Bens, direitos e obrigações! Ciência e Negócios, 2 fev. 2018. Disponível em: https://cienciaenegocios.com/o-que-e-patrimonio-na-contabilidade- bens-direitos-e-obrigacoes/. Acesso em: 25 abr. 2022. SEM MEDO DE ERRAR Vamos analisar a situação problema da empresa ABC Construções Ltda apresentada nesta seção? Dividiremos em partes os fatos ocorridos no contexto descrito: primeiro, vamos identificar informações relevantes acerca das operações realizadas na operação; em seguida, avaliaremos se a situação enseja possibilidade de crime; por fim, vamos promover a relação entre a responsabilidade do contador e as operações efetuadas pelos sócios, de acordo com o ocorrido. Informações relevantes: a empresa registrou, no final de 20X0, um patrimônio de R$ 500.000,00; em seu caixa, possuía R$ 50.000,00 e, no banco, registrava o valor de R$ 100.000,00. No ano de 20X1, as receitas da corporação não ultrapassaram o valor de R$ 300.000,00. Diante das evidências, pode-se verificar que, de acordo com os registros do patrimônio e das receitas de 20X1, a compra do iate é incompatível com a situação patrimonial da empresa. Sendo assim, conforme prevê o art. 5º da Resolução do CFC nº 1.530/2017, tal operação merece especial atenção, visto que não é resultante da atividade do ramo de negócio, além de demonstrar incompatibilidade com o patrimônio e com a capacidade financeira da corporação. Como aprendemos, a contabilidade avaliará essa evolução patrimonial e registrará em seus relatórios informações relevantes, que demonstrem as movimentações ocorridas. Outro ponto importante e que chama a atenção é o pagamento feito a um fornecedor, em apenas um mês, no valor de R$ 200.000,00, em espécie. Tal operação deve ser comunicada ao Coaf por ter sido efetuada com um valor acima de R$ 50.000,00. Conforme estabelece o art. 9º da Resolução nº 1.530/2017, a declaração correspondente à referida ocorrência deve ser feita num prazo de 24 horas, a contar do momento em que o responsável pela comunicação conclui que a operação deve ser comunicada, abstendo-se de dar ciência aos clientes de tal ato. Vale ressaltar que o contador da empresa não realiza a investigação, mas tem o dever de informar o Coaf sobre as situações identificadas no prazo legal para o órgão fiscalizador. Diante do contexto apresentado, é possível constatar a responsabilidade do perito no processo de investigação dos crimes contra o SFN e a ordem tributária. No caso descrito, a empresa vem sendo utilizada para a obtenção de ativos não relacionados à atividade-fim. Percebe-se que os valores constantes nas contas patrimoniais são incompatíveis com a aquisição de um bem como o iate, cujo valor é expressivo. Entende-se que houve omissão de operações referentes à entrada, burlando, assim, o pagamento de tributos sobre a referida omissão. As informações podem ensejar crime contra o Sistema Financeiro Nacional, de modo que o caso precisa ser investigado. AVANÇANDO NA PRÁTICA SUPERFATURAMENTO EM LICITAÇÕES A empresa ABC Construções Ltda. participou do processo de licitação para a construção de dez casas populares para o Governo do Estado. No objeto do contrato, a construção das casas tem 11 como referência imóveis de 41,5 m² pré-fabricados, com fornecimento de material e mão de obra. Alguns dos materiais que constamna proposta para fornecimento do material são: papeleira em metal cromado, vaso sanitário sifonado com caixa de louça branca acoplada, saboneteira de parede em metal cromado. A obra foi entregue no prazo estipulado e o valor acordado pelos serviços foi pago. As pessoas beneficiadas pelo programa receberam as casas, mas constatou-se que a dimensão dos imóveis era de 40 m², o que deu origem a uma denúncia junto ao Tribunal de Contas do Estado, que apurou as irregularidades. Confirmou-se que as casas realmente tinham a metragem de 40m². Além disso, percebeu-se que as papeleiras, saboneteiras e vasos sanitários fornecidos não correspondiam ao material estipulado no contrato da licitação. Com base nas informações prestadas e nas legislações pertinentes ao problema, desenvolva as seguintes atividades: Como perito, identifique as irregularidades encontradas no processo. Avalie se houve superfaturamento ou sobrepreço. Acrescente informações relevantes que possam ser observadas de acordo com o art. 31 da Lei nº 1.303/2016. 12 UNIDADE 1, SESSÃO 2: INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS PRATICAR PARA APRENDER Olá! Como é bom estar com você novamente! Fico feliz com a sua escolha, afinal você entendeu como o conhecimento poder transformar pessoas, e a sua decisão, neste momento, demonstra um desejo de melhorar a cada dia, para se tornar um profissional altamente qualificado. Vamos dar prosseguimento à nossa jornada de aprendizagem? Fizemos uma pequena parada para respirar um pouco e analisar o que foi estudado até aqui. Agora é o momento de retomar a viagem e adquirir novos saberes relacionados à nossa disciplina. Vamos lá? Para facilitar a compreensão dos conteúdos a serem apresentados, convido você a participar de um desafio. Nele, você deverá pesquisar os diferentes tipos de instituições financeiras e, de acordo com as características que serão descritas no decorrer desta etapa de estudos, sinalizar qual modelo de instituição está sendo abordado. Por fim, você precisará analisar a situação e, em seguida, emitir um parecer justificando a sua avaliação. Para o desenvolvimento dessa atividade, considere o seguinte contexto: André Fernando Fausto está reformando a sua casa e, por meio de uma instituição, realizou um contrato de empréstimo no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A instituição financeira intermediou a transação financeira entre André e Maurício Velask, cobrando o valor de R$ 25,00 (valor de taxa fictícia). Considerando a situação apresentada e as informações sobre a transação, a qual tipo de instituição financeira o caso se refere? Justifique. CONCEITO-CHAVE Nesta seção, trataremos de alguns conceitos importantes para que você possa desenvolver os conteúdos que serão propostos posteriormente, na Seção 1.3. Preparado? Primeiro, vamos definir o que pode ser compreendido como sistema. Para isso, observe a Figura 1.3, a seguir: Figura 1.3 | Sistema 13 Fonte: Pixabay. Perceba que há vários pontos interligados. Para a constituição de um sistema, torna-se necessária a integração entre vários pontos, formando, portanto, um conjunto. Observe, ainda, que há uma organização entre tais pontos. Logo, é possível concluir que o sistema é o conjunto de algo interligado de modo organizado. Diante disso, o Sistema Financeiro Nacional (SFN) pode ser entendido como um conjunto de instituições financeiras interligadas, no qual, de um lado, estão os credores, e de outro, os tomadores de recursos. No entanto, para que haja uma harmonização, existem regras estabelecidas, por meio das quais o sistema funciona de forma ágil e ordenada. Nesse conjunto, existem as instituições que fiscalizam, regulam e executam operações financeiras, movimentam a moeda e efetuam as operações de créditos. Veja na Figura 1.4, a seguir, a estrutura do Sistema Financeiro Nacional: Figura 1.4 | Sistema Financeiro Nacional 14 Fonte: elaborada pela autora. No Sistema Financeiro Nacional, há o órgão normatizador, o supervisor e os operadores. O Banco do Brasil, por exemplo, é um executor de operações financeiras. Trata-se de um operador do sistema financeiro porque os bancos oferecem serviços financeiros aos seus correntistas, mas, para realizar as operações financeiras, é preciso seguir regras que são estabelecidas pelo órgão normatizador. Como é possível visualizar na Figura 1.6, no Brasil, o órgão regulador é o Conselho Monetário Nacional (CMN), que estabelece as regras e normas acerca de como devem funcionar os executores. Tal órgão foi criado para que o País tivesse um progresso econômico e social. Sua finalidade, segundo a Lei nº 4.595, de 1964, é “formular a política da moeda e do crédito” (BRASIL, 1964, [s. p.]). Mas de que maneira o CMN desempenha esse papel? O CMN trabalha de forma orientativa, com zelo, promovendo o aperfeiçoamento das instituições financeiras e coordenando as políticas internas e externas, sejam elas monetárias, creditícias, orçamentárias, fiscais ou da dívida pública. Além disso, orienta a aplicação dos recursos das instituições financeiras, zela pela liquidez e solvência dos operadores financeiros. Você já ouviu notícias a respeito da limitação das taxas de juros, por exemplo? O CMN assegura as melhores taxas para aqueles que realizam investimentos indispensáveis às atividades agropecuárias. ASSIMILE O Conselho Monetário Nacional tem um papel fundamental na política da moeda e do crédito, pois tem foco direcionado ao progresso econômico e social do País. Caso você queira saber mais sobre a criação do Conselho Monetário Nacional, faça a leitura da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964. Para acessar o material, consulte o link disponível nas Referências desta seção. BRASIL. Ministério da Economia. Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964. Estabelece sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias, Cria o Conselho 15 Monetário Nacional e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 31 dez. 1964. O que são as instituições financeiras? Toda pessoa jurídica, seja ela pública ou privada, que tenha como principal atividade a aplicação ou intermediação de recursos financeiros próprios ou pertencentes a terceiros, na forma de moeda nacional ou estrangeira, é considerada uma instituição financeira. Para que possa funcionar, toda instituição financeira depende de uma autorização prévia do Banco Central do Brasil, caso se trate de uma empresa brasileira. Se for uma instituição estrangeira, estará sujeita ao decreto do Poder Executivo. O Banco Central do Brasil (BCB) atua como supervisor no Sistema Financeiro Nacional (SFN). Nesse contexto, é o BCB quem garante a estabilidade do poder de compra da moeda, além de zelar por um sistema competitivo, sólido e eficiente e de estimular o bem- estar econômico da sociedade. São tipos de instituições do Sistema Financeiro Nacional: os bancos e caixas econômicas, cooperativas de créditos, administradoras de consórcios, corretoras e distribuidoras, bolsa de valores, bolsas de mercados futuros, corretores de câmbio, instituições de pagamento, fintechs. Figura 1.5 | Banco do Brasil Fonte: Global Pics. O Banco do Brasil, por exemplo, é um agente financeiro sob a supervisão do CMN. Nesse cenário, tal instituição funciona como um instrumento executor de política creditícia e financeira do Governo Federal, possuindo as atribuições de ser um agente pagador e recebedor fora do País, executar o serviço da dívida pública consolidada, entre outras elencadas na Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) atua como agente do Governo nas operações de reaparelhamento e estímulo da economia nacional. Um exemplo de atividade exercida por essa instituição é o recebimento do depósito de entidades governamentais ou autarquias, de sociedades de economia mistanas quais o 16 Governo tem maioria das ações, entre outras. As instituições públicas fazem parte da política de crédito do Governo Federal e são consideradas órgãos auxiliares, cujo principal representante é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). As instituições públicas estão sujeitas às regras do Conselho Monetário Nacional (CMN), de forma que suas atividades dependem da aprovação desse órgão. Já as instituições financeiras privadas, excetuando- se as cooperativas de crédito, podem ter a participação de capital social em ações preferenciais. Para que instituições financeiras privadas participem de outras sociedades, a não ser as de investimento, deverão obter a autorização do BCB e, obrigatoriamente, precisarão emitir balanço duas vezes ao ano: primeiro em 30 de junho e depois em 31 de dezembro de cada ano. Perceba, caro estudante, que para funcionar da maneira adequada, as instituições financeiras devem seguir as regras impostas pelos órgãos reguladores e precisam obter a autorização do Banco Central do Brasil para desempenhar atividades financeiras. REFLITA Uma empresa cuja atividade é a comercialização de alimentos aceita a compra de mercadorias com cartão-alimentação. Muitos de seus clientes compram utilizando esse tipo de recurso. Certo dia, um dos consumidores estava passando por um período de complicações financeiras e questionou o proprietário sobre a possibilidade de trocar o valor do cartão por dinheiro. Ou seja, o cliente não levaria nenhum produto do mercado. O proprietário aceitou a proposta, na condição de que, para efetuar a troca de saldo por dinheiro, seriam descontados 10% do valor disponível no cartão. Desde esse episódio, sempre que alguém solicitava o mesmo tipo de transação, o dono do mercado fazia a retenção de 10% do valor disponível no cartão e entregava o dinheiro ao cliente já com o referido desconto. Estudamos, até este momento, sobre o Sistema Financeiro Nacional, mas também é importante aprofundar seus conhecimentos sobre a ordem tributária, afinal, na terceira fase de nossa jornada de aprendizagem, vamos analisar crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e a ordem tributária. Quando tratamos da ordem tributária, é importante destacar dois pontos: o conceito de tributos; e o crédito e a obrigação tributária. Pagamos muitos tributos no Brasil, e muitas pessoas, por perceber as deficiências nos serviços prestados pelo Governo, como nos setores de saúde, educação e segurança, resolvem burlar as regras para não pagar taxas. Mas o que é tributo? O tributo é um valor que deve ser pago obrigatoriamente, ou seja, não há opção de escolha. Deve ser pago em dinheiro ou cheque; não há como quitar o valor devido do tributo com outros bens. Não se deve confundir tributo com penalidade, por isso não se constitui sanção por ato ilícito. Para qualquer tributo cobrado, precisa haver uma lei que determine tal cobrança, bem como o fato gerador, que deverá incidir sobre a apuração dos valores a serem recolhidos. A autoridade administrativa é que realiza a cobrança, pois trata-se de uma atividade administrativa vinculada. O tributo é uma receita computada para o Governo, constituindo-se, portanto, como uma receita pública. Vamos analisar juntos? Se o tributo enseja pagamento aos cofres públicos, então quem são as pessoas envolvidas nessa relação? No direito tributário, chamamos de sujeito ativo e sujeito passivo. O sujeito ativo é a pessoa jurídica de direito público que poderá exigir o tributo de acordo com a sua competência. 17 EXEMPLIFICANDO Tipos de sujeitos e obrigações durante a tributação Empresas que têm funcionários são obrigadas a reter e recolher o imposto de renda dos seus colaboradores que se encontram na faixa de tributação. Quem carrega a competência de exigir tal tributo da empresa é a Receita Federal. Portanto, caso a organização não realize o repasse do tributo, poderá sofrer penalizações pelo descumprimento legal. Nesse caso, o sujeito ativo é a Receita Federal. O sujeito passivo é a pessoa que deve pagar o tributo. No exemplo adotado aqui, a empresa é o sujeito passivo da relação, pois tem obrigação de recolher o tributo. É dessa relação entre os sujeitos que nasce o crédito tributário. Ou seja, sendo o tributo algo impositivo, sobre o qual não há poder de escolha, o sujeito ativo impõe ao sujeito passivo o pagamento, que é considerado uma obrigação principal. Existe, também, a obrigação acessória, que pode ser transformada em principal. Omissão de nota fiscal O mercado LAC vendeu dez sacos de pano de chão. O cliente efetuou o pagamento, porém não exigiu nota fiscal. A empresa, por sua vez, não emitiu a nota fiscal em questão ao final do dia, já que não foi solicitada pelo consumidor. A emissão da nota fiscal é considerada uma obrigação acessória. O que ocorre nesse caso? A empresa, por não ter emitido a nota fiscal, não recolherá o tributo devido da operação sobre a venda. Caso haja uma fiscalização por parte do Estado, a não emissão da nota ensejará o pagamento de multa, transformando-se, por consequência, em uma obrigação principal: a de pagar a multa. E o que podemos dizer sobre a obrigação tributária? Faça, agora, uma breve recapitulação sobre os saberes que acabamos de apreender nesta etapa de aprendizagem. Fizemos menção a sujeito ativo, sujeito passivo, crédito tributário. Há alguma relação entre esses conceitos? REFLITA Para que possa existir o sujeito ativo, é necessário haver o sujeito passivo. É por conta dessa relação que existe o crédito tributário. Sendo assim, pode-se concluir que a obrigação tributária é a relação existente entre o sujeito passivo e o sujeito ativo? A ordem tributária equivale ao Sistema Tributário Nacional, no qual se encontram estabelecidos os conjuntos de regras impostas ao sujeito ativo e ao sujeito passivo, assim como as atribuições das competências de cada ente público: as limitações da competência tributária, ou seja, quem pode instituir ou majorar tributos, quem poderá cobrar determinados tributos, os tipos de impostos e sua base de cálculo, quem é o sujeito passivo de cada tributo. Além disso, a ordem tributária apresenta diretrizes relacionadas às distribuições das receitas tributárias, entre outros aspectos. A falta de cumprimento às regras estabelecidas na legislação que trata do Sistema Tributário Nacional poderá ensejar crimes contra a ordem tributária, os quais estão tipificados na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, a qual analisaremos de forma mais detalhada na próxima seção de estudos. Não se transfere o delito cometido por uma pessoa a outrem; o caráter é pessoal. Nesta seção de estudos, você teve acesso a novos tipos de saberes e conceitos importantes relacionados à nossa disciplina. Agora, para incentivar a compreensão efetiva dos assuntos que serão apresentados na próxima etapa de aprendizagem, convido você a confeccionar um mapa mental acerca dos temas abordados na Seção 1.2. Para desenvolver 18 essa tarefa, você pode explorar a plataforma on-line GoConqr, que dá instruções sobre como construir mapas mentais. Para conhecer essa ferramenta, consulte o respectivo link de acesso disponível nas Referências desta seção. CONECTE informações com mapas mentais. GoConqr, 1 abr. 2015. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Define os crimes contra o sistema financeiro nacional, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 18 jun. 1986. Disponível em: https://bit.ly/3DdKo6p. Acesso em: 6 maio 2022. BRASIL. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 28 dez. 1990. Disponível em: https://bit.ly/3L5XNze. Acesso em: 6 maio 2022. BRASIL. Ministério da Economia. Lei nº 4.595,de 31 de dezembro de 1964. Estabelece sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias, Cria o Conselho Monetário Nacional e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 31 dez. 1964. Disponível em: https://bit.ly/2LHtO0P. Acesso em: 6 maio 2022. CONECTE informações com mapas mentais. GoConqr, 1 abr. 2015. Disponível em: https://bit.ly/3L4YY1M. Acesso em: 6 maio 2022.Silva SEM MEDO DE ERRAR Estamos chegando ao final de mais uma seção de estudos e, para concluir esta etapa da nossa jornada de aprendizagem, vamos retomar a situação-problema apresentada no início deste material. Aprendemos que existem diversas instituições financeiras, as quais carregam características próprias. Observe que, no contexto descrito na situação-problema, a operação realizada foi um empréstimo no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Até esse ponto da análise, seria pertinente a hipótese de que a instituição em questão fosse um banco ou uma fintech, porém existe um detalhe importante que contribui para sanar a dúvida. Trata-se de uma instituição que intermediou a operação entre duas pessoas – André e Maurício Velask – e cobrou uma taxa por essa atividade. Fintechs são empresas que trabalham intermediando negócios de empréstimos, sob autorização do Banco Central, e podem cobrar taxas pelo serviço prestado. Conforme prevê o Banco Central do Brasil, tais empresas contribuem com a diminuição da burocracia no acesso ao crédito, de modo que as operações se tornam mais rápidas e céleres. No entanto, existe um limite de empréstimo por operação, que é de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Figura 1.6 | Fintech http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7492.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8137.htm http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%204.595-1964?OpenDocument http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4595.htm https://www.goconqr.com/pt-BR/mapas-mentais/ 19 Fonte: iStock. No caso apresentado, a operação foi realizada entre pessoas físicas. Logo, a instituição financeira atuou apenas como a intermediadora do contrato entre André (tomador de crédito) e Maurício (credor). Nesse tipo de operação, o investidor disponibiliza o capital, a fintech o conecta com quem precisa do empréstimo e, na outra ponta, encontra-se o cliente que solicita o crédito. Como pudemos notar, o diferencial nesse procedimento é justamente o processo de intermediação da operação entre pessoas, conhecido como sociedade de empréstimo entre pessoas (SEP), que disponibiliza créditos dentro do limite estabelecido para essa transação, que é de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). E por que a instituição descrita na situação-problema não pode ser caracterizada como banco? Apesar de também ter a função de intermediar o dinheiro, o banco guarda a quantia daqueles que concedem o empréstimo. No caso apresentado, a instituição apenas intermediou a operação, a qual foi realizada entre pessoas. AVANÇANDO NA PRÁTICA IRREGULARIDADE NA OPERAÇÃO FINANCEIRA Carlota Viviane e sua irmã são ricas e emprestaram dinheiro a várias pessoas. Ocorre que essas operações de empréstimos financeiros não foram informadas na declaração do imposto de renda. Agora, as irmãs estão com sérios problemas, pois seu patrimônio cresceu e é necessário explicar a origem do dinheiro. Considerando os conceitos estudados sobre as instituições financeiras, analise a situação das irmãs e identifique qual deveria ser o procedimento adotado para que elas pudessem realizar as operações de empréstimo sem que houvesse problemas futuros para justificar o crescimento patrimonial. 20 UNIDADE 1, SESSÃO 3: CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A ORDEM TRIBUTÁRIA Silva PRATICAR PARA APRENDER Olá, estudante! Que bom seguirmos juntos nesta caminhada! O conhecimento que você já possui será um grande diferencial no mercado de trabalho. Fizemos a nossa segunda parada e agora prosseguiremos nesta jornada de aquisição de novos saberes. Vamos lá? Nesta seção de estudos, você terá a oportunidade de apreender mais detalhes sobre os crimes financeiros, mas, antes de continuar, faça uma reflexão acerca de sua aprendizagem até aqui. Relacione, em uma checklist, os conteúdos estudados e, em poucas palavras, descreva tudo o que aprendeu até este momento. Caso ainda tenha ficado com dúvidas sobre algum tema, retorne aos conteúdos anteriores e assista novamente aos vídeos. Isso será muito importante para que você compreenda os assuntos a serem apresentados nesta etapa de estudos. Então, vamos seguir em frente? Proponho a você mais um desafio. Desta vez, você deverá analisar a situação-problema apresentada, justificar e descrever o seu parecer, apresentando uma resposta com embasamento legal para o contexto descrito. Preparado? Para o desenvolvimento dessa atividade, considere o seguinte contexto: Faustino César é o executivo de uma grande empresa de cosméticos. Seu sobrinho trabalha na bolsa de valores. Faustino tem interesse na compra de ações de sua concorrente, com o objetivo de ter o controle acionário de, no mínimo, 50% das ações. Faustino efetuou a compra de American Depositary Receipts (ADRs), oito meses antes que a oferta pública de aquisição de ações (OPA) fosse de conhecimento público. As informações privilegiadas concedidas pelo seu sobrinho deram-lhe uma grande vantagem financeira, de aproximadamente U$ 300 mil (trezentos mil dólares), pois houve uma oferta no valor de R$ 28,00 por ação, e o preço foi superior a 20% da cotação das ações no momento do fechamento do pregão anterior. Agora é com você! Sua capacidade de análise sobre operações de insider trading (quando um operador consegue vantagens a partir de informações privilegiadas) dará a você a condição de desenvolver um raciocínio sobre como funcionam as operações financeiras. Vamos, então, seguir nesta jornada de aprendizagem? CONCEITO-CHAVE Preparado para encerrar esta unidade de aprendizagem com chave de ouro? Vamos, agora, compreender o que são crimes financeiros e contra a ordem tributária. Como aprendemos na Seção 1.2, o Sistema Financeiro Nacional é formado por um conjunto de entidades que promovem a intermediação financeira, o qual é bastante complexo. Os entes que compõem esse sistema promovem o equilíbrio das finanças de um País. Quando existem condutas ilícitas que transgridam a lei, há um impacto muito grande para o sistema financeiro, pois operações realizadas de forma irregular afetam não somente os investidores, como também a credibilidade da corporação, causando prejuízos econômicos. Como exemplo de uma situação ocorrida no mercado financeiro que teve alto impacto no 21 setor financeiro, gerando desequilíbrio para o País, foi a queda na bolsa de valores de Nova York em decorrência da queda do índice Dow Jones, que estava relacionado à concessão de empréstimos de alto risco. Os créditos, como CDS e CDO, vinham sendo transferidos de modo desenfreado, e ainda havia outras situações resultantes desse colapso. O fato repercutiu mundialmente no mercado financeiro e muitos bancos entraram em situação de insolvência. Operações como as citadas anteriormente, efetuadas de maneira inadequada, com muitas falhas, em desacordo com a legislação pertinente ao mercado financeiro e utilizando-se de fraudes para a obtenção de financiamentos junto às instituições financeiras são consideradas como crimes financeiros. Antes de verificarmos os tipos de crimes financeiros, vamos relembrar o que estudamos na Seção 1.2 no que diz respeito à instituição financeira segundo a Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Todas as empresas que são constituídas com a atividade de administração de seguro, consórcio, capitalização, que atuem com câmbio ou recursos de terceiros ou qualquer pessoa natural que exerça uma tarefa elencada na referida Lei (ou seja, pessoasque executem como atividade principal a aplicação ou intermediação de recurso financeiros próprios ou pertencentes a terceiros) são instituições financeiras. Agora, veremos quais são os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, com base na Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Figura 1.7 | Tipos de crimes financeiros 22 Fonte: elaborada pela autora. Vamos aprofundar nosso entendimento sobre alguns desses crimes? Vejamos: Art. 2º – São crimes materiais: imprimir, fabricar, reproduzir. Nas modalidades “distribuir e divulgar”, constituem-se os crimes formais. Qualquer que seja a emissão pública de valores mobiliários, somente poderá ser distribuída obtendo-se registro prévio na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Art. 4º – A consumação e a tentativa se dão em atos de comando que envolvam deliberações com atuação de comando. Abrange algum tipo de decisão com grau de definitividade. Sujeito ativo: diretores, gerentes, interventor, liquidante, síndico. As penas são cominadas de acordo com a culpa nos atos praticados. Sujeito passivo: o Estado e, secundariamente, os correntistas que podem ter sido lesados, os investidores e a instituição financeira. Parágrafo único – Exemplos de ações que ensejam a gestão temerária: realizar operações em que ocorram grandes perdas, de especulação e arriscadas; contratar crédito sem que haja garantias prescritas em lei; gerar despesas que suplantam resultados operacionais da instituição financeira; pagar juros exorbitantes, adquirir recursos para o prolongamento 23 de uma liquidação forçada. Art. 6º – A sonegação e a prestação de informação falsa são formas encontradas pelo agente de induzir e manter em erro sócio, investidor ou repartição pública competente. Sujeito ativo: administrador da instituição financeira, controlador, contador ou auditor no exercício de sua função. Sujeito passivo: sócios e investidores lesados e, de forma secundária, o Estado. A consumação ocorre quando se consegue enganar a vítima, induzindo-a a erro. Art. 8º – É uma extorsão financeira efetuada quando são exigidos juros e comissões que estão em desacordo com a Lei. Art. 9º – Inserir declaração falsa em documentos comprobatórios de investimento em títulos ou valores mobiliários. Art. 10 – Inserção ou omissão de informações das demonstrações contábeis de instituições financeiras ou de qualquer instituição que seja integrante do sistema de distribuição de títulos de valores mobiliários. Art. 12 – Quando o ex-administrador não apresenta para o interventor, liquidante ou síndico as informações ou declarações de sua responsabilidade nos prazos que a Lei estabelece. Art. 13 – Quando o interventor, síndico ou liquidante se apropria de bens em proveito próprio ou alheio. Art. 15 – Quando o interventor, liquidante ou síndico (administrador judicial), no exercício de sua função, faz declarações que estão fora da realidade. Art. 16 – Operar atividades inerentes a instituições financeiras sem permissão e autorização. Art. 17 – Uma empresa toma empréstimo utilizando o nome de terceiros em linha direta ou indireta, por exemplo. Quando se tem distribuição de lucros de forma disfarçada. Sujeito ativo: controlador ou administrador de instituições financeiras, diretores, gerente. Sujeito passivo: Estado, instituição financeira, investidores, acionistas. Art. 18 – Instituições financeiras não podem divulgar as operações ou serviços realizados para os seus correntistas, empresas ou investidores, visto que a exposição das informações pode causar danos a esses agentes. O patrimônio deve ser protegido. Art. 20 – Obtêm-se recursos para determinadas finalidades e tais recursos são desviados. Art. 22 – Quando se promove a saída de dinheiro ou divisa para o exterior sem autorização. Omitir depósitos não declarados à repartição federal. Operações de câmbio que não são autorizadas. Art. 23 – O funcionário público omite, pratica ou retarda um ato necessário ao regular o funcionamento do Sistema Financeiro Nacional contra o que consta em lei. 24 Como é possível perceber, são diversos os tipos de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional previstos na Lei nº 7.492/1986, também conhecida como Lei do Colarinho Branco. A titularidade da ação penal será promovida pelo Ministério Público Federal, perante a Justiça Federal. No entanto, caso haja inércia do Ministério Público Federal, é permitido, por lei, que a pessoa física ou jurídica apresente ao procurador-geral da República a denúncia quando se sentir ofendido. Quando o crime praticado estiver sujeito à fiscalização e à disciplina da Comissão de Valores Mobiliários e do Banco Central do Brasil, será admitida a assistência da CVM. No caso de o Bacen, a CVM, o interventor, o síndico ou o liquidante não comunicar a ocorrência de crime previsto na Lei, as autarquias sofrerão penalidades administrativas e às pessoas será imputada a contravenção penal. E quem são os responsáveis penais? O controlador, os diretores e gerentes de instituições financeiras, dentre os quais estes dois últimos são considerados administradores. A responsabilidade é subjetiva, ou seja, depende da existência de um sujeito. Está presente o nexo de causalidade, que é um dos pressupostos desse sujeito relacionado com o ato ilícito; ou quando há, no resultado, o interesse e a intenção de agir, que é o dolo; ou quando quem causou o dano não teve o propósito de provocá-lo, que é a culpa. O crime está associado à conduta do sujeito. ASSIMILE Cultivar uma compreensão mais adequada sobre as transações no mercado financeiro dará a você uma visão mais ampla quanto aos crimes financeiros, e é importante que saiba como funcionam determinadas operações. Caso você queira conhecer mais detalhes sobre a oferta pública de aquisição (OPA), faça a leitura do artigo a seguir. OFERTA pública de aquisição – OPA. Portal do Investidor, 6 abr. 2019. É fundamental entender corretamente o papel do controlador e do administrador nas empresas, para que seja possível definir as responsabilidades desses profissionais diante de casos de crimes financeiros. Para aprofundar seus conhecimentos sobre esse assunto, faça a leitura da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, especialmente dos arts. 116 e 117, que versam sobre o papel do controlador. BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 17 dez. 1976. Já com relação ao trabalho desempenhado pelo gerente, é interessante que você consulte os arts. 1.172 a 1.176 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 11 jan. 2002. Para acessar os materiais indicados, consulte os respectivos links de acesso disponíveis nas Referências desta seção. Diante de tudo o que foi abordado até o momento, é possível afirmar que os autores dos crimes praticados poderão ser presos? Justifique a sua resposta refletindo sobre a decisão do Superior Tribunal de Justiça e observando o art. 312, do Código de Processo Civil. 25 REFLITA Decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) Para que você consiga responder ao questionamento realizado sobre a prisão dos autores em crimes financeiros, tome como fundamentação teórica o habeas corpus indicado para leitura a seguir. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 40.818 - RJ. Prisão preventiva. Crime contra o sistema financeiro. Lavagem de dinheiro. Quadrilha. Operação “Farol da Colina”. Magnitude da lesão. Autoria e indícios demonstrados. Pretensão de revogação. Requisitos da custódia atendidos. Proteção da ordem pública e econômica e da instrução. Relator: Ministro José Arnaldo da Fonseca. DJ, 17 mar. 2005. Lex: jurisprudência do STJ e Tribunais RegionaisFederais, Brasília, 11 abr. 2005, p. 350. Também é interessante que você faça a leitura da Lei nº 8.137/1990 e liste outros tipos de crimes contra a ordem tributária, associando-os a fatos ocorridos no dia a dia que comprovem os crimes cometidos. BRASIL. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 28 dez. 1990. Para acessar os materiais indicados, consulte os respectivos links de acesso disponíveis nas Referências desta seção. Para cada um dos crimes abordados nesta seção, há uma pena relativa aos atos praticados. Contudo a Lei nº 7.492, de 1986, também prevê, em seu art. 25, § 2º, a hipótese de confissão espontânea, que poderá reduzir a pena, caso o coautor ou partícipe revele à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa do crime. EXEMPLIFICANDO Casos de delação premiada no Brasil O doleiro Alberto Youssef assinou, em setembro de 2014, um acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal em troca de redução da pena de prisão, o qual foi homologado três meses depois, em dezembro de 2014. A possibilidade da delação ocorreu em virtude da colaboração de Youssef para a força-tarefa da Operação Lava Jato. Conheça mais detalhes do caso fazendo a leitura do artigo indicado a seguir, cujo link de acesso está disponível nas Referências desta seção. BARBOSA, G. Jurisprudência sobre delação premiada. 3MIND, 3 fev. 2021. Agora que você já aprofundou seus conhecimentos sobre a delação premiada, é possível conceituá-la como um instituto no qual, por meio de um contrato, o criminoso se beneficia da pena imputada em decorrência do crime causado contra o Sistema Nacional Tributário e a ordem tributária. Até aqui, garantimos novos saberes sobre os crimes financeiros. Vamos, então, conhecer os crimes contra a ordem tributária? De acordo com a Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, são definidos como crimes contra a ordem tributária aqueles praticados por particulares e funcionários públicos na intenção de prejudicar a economia e as relações de consumo. Vejamos alguns deles. 26 Figura 1.8 | Exemplos de crimes contra a ordem tributária Fonte: elaborada pela autora. Os crimes contra a ordem tributária constituem-se a partir das atitudes que um indivíduo pratica. Vejamos alguns exemplos: quando um comerciante vende mercadoria e não emite nota fiscal referente à saída dos produtos, configura-se um crime previsto na Lei nº 8.137/1990: “V – negar, ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativo a venda de mercadoria ou prestação de serviço” (BRASIL, 1990, [s. p.]). Outro exemplo pode ser observado quando um indivíduo que tem várias fontes pagadoras, pois realiza serviços para diferentes empresas, deixa de informar a Receita Federal sobre seus rendimentos, quando é obrigado a declarar o imposto de renda. Esta foi a última seção de estudos desta unidade de aprendizagem. A intenção foi aperfeiçoar os seus conhecimentos compartilhando conceitos, exemplos e casos práticos relacionados aos assuntos estudados, a fim de promover uma melhor compreensão dos temas propostos. Espero que você tenha curtido bastante a nossa viagem e que ela tenha agregado novos saberes à sua atuação no mercado de trabalho. Agradeço a sua participação. Prossiga com sua trajetória de aprendizagem, desta vez com uma nova equipe. Até a próxima! 27 REFERÊNCIAS BARBOSA, G. Jurisprudência sobre delação premiada. 3MIND, 3 fev. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3Bsshar. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Comissão de Valores Mobiliários. Instrução CVM nº 361, de 5 de março de 2002. Dispõe sobre o procedimento aplicável às ofertas públicas de aquisição de ações de companhia aberta, o registro das ofertas públicas de aquisição de ações para cancelamento de registro de companhia aberta, por aumento de participação de acionista controlador, por alienação de controle de companhia aberta, para aquisição de controle de companhia aberta quando envolver permuta por valores mobiliários, e de permuta por valores mobiliários, revoga a Instrução CVM nº 229, de 16 de janeiro de 1995, a Instrução CVM nº 299, de 9 de fevereiro de 1999 e a Instrução CVM nº 345, de 4 de setembro de 2000, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 7 mar. 2002. Disponível em: https://bit.ly/3xipTSi. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941. Lei das Contravenções Penais. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro: 3 out. 1941. Disponível em: https://bit.ly/3qxBbyi. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro: 13 out. 1941. Disponível em: https://bit.ly/3TUuKTc. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976. Dispõe sobre o mercado de valores mobiliários e cria a Comissão de Valores Mobiliários. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 9 dez. 1976. Disponível em: https://bit.ly/2HCC00v. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 17 dez. 1976. Disponível em: https://bit.ly/3d9WwKP. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Define os crimes contra o sistema financeiro nacional, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 18 jun. 1986. Disponível em: https://bit.ly/3RCTSMD. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 28 dez. 1990. Disponível em: https://bit.ly/3d0Hp6I. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998. Dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - Coaf, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 4 mar. 1998. Disponível em: https://bit.ly/3U0HlnQ. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 11 jan. 2002. Disponível em: https://bit.ly/3eJKx7q. Acesso em: 10 maio 2022. BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 17 mar. 2015. Disponível em: https://bit.ly/3qvHimw. Acessado em: 10 maio 2022. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 40.818 - RJ. Prisão preventiva. Crime contra o sistema financeiro. Lavagem de dinheiro. Quadrilha. Operação “Farol da Colina”. Magnitude da lesão. Autoria e indícios demonstrados. Pretensão de revogação. Requisitos da custódia atendidos. Proteção da ordem pública e econômica e da instrução. Relator: Ministro José Arnaldo da Fonseca. DJ, 17 mar. https://www.3mind.com.br/blog/jurisprudencia-sobre-delacao-premiada/#:~:text=O%20doleiro%20Alberto%20Youssef%20assinou,envolvidas%20no%20esc%C3%A2ndalo%20da%20Petrobras https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/instrucoes/inst361.html http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3688.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6385.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404compilada.htm http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%205.172-1966?OpenDocument http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7492.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8137.htm#:~:text=V%20%2D%20negar%20ou%20deixar%20de,cinco)%20anos%2C%20e%20multa http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htmhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm https://conteudo.colaboraread.com.br/202202/EAD/INVESTIGACAO_E_PERICIA_CRIMINAL_FRAUDES_CONTABEIS/LIVRO_DIGITAL/npf_u1s3.html#http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm 28 2005. Lex: jurisprudência do STJ e Tribunais Regionais Federais, Brasília, 11 abr. 2005, p. 350. Disponível em: https://bit.ly/3B7YHXn. Acesso em: 10 maio 2022. OFERTA pública de aquisição – OPA. Portal do Investidor, 6 abr. 2019. Disponível em: https://bit.ly/3d5OuTj. Acesso em: 10 maio 2022. SOUSA, I. Conheça as principais crises econômicas mundiais. TC School, 22 nov. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3xiqm70. Acesso em: 10 maio 2022.Zoraide dos Santos Silva SEM MEDO DE ERRAR Vamos, juntos, analisar a situação-problema apresentada no início desta seção de estudos? O uso inadequado de informações relevantes e confidenciais obtidas de forma privilegiada nas negociações de valores mobiliários, como fundos de investimentos, ações preferencias e ordinárias, está previsto na Lei nº 6.385/76, especificamente no art. 27-D. Tais informações têm a finalidade de propiciar vantagem indevida, para si ou para outrem, dando origem a um processo mais conhecido como insider trading. No caso em análise, Faustino César tirou proveito das informações fornecidas por seu sobrinho, que trabalha na bolsa de valores, e recebeu privilégios acerca das ações que dariam a ele o controle acionário de sua concorrente. Empresas lançam ações para venda e emitem um certificado conhecido com ADR, o qual é emitido no exterior, a partir de uma instituição depositária. Tal operação é negociada em países diferentes, fora do estabelecimento da empresa que a efetuou. Faustino realizou compras de American Depositary Receipts (ADRs), ou seja, de certificados americanos, antes mesmo que as ações fossem ofertadas publicamente em um processo conhecido como OPA. Empresas que têm o interesse de adquirir uma determinada quantidade de ações, com prazos e preços predeterminados, participam dessa oferta. A intenção é que os acionistas possam fornecer suas ações em igualdade de direitos, bem como que as ações sejam adquiridas pelos interessados, com o propósito de mudar a estrutura da corporação. Tendo em vista que Faustino tinha o interesse de alterar a configuração da empresa, ele adquiriu a OPA voluntária, para aquisição de controle, também prevista na Lei nº 6.404/1976, art. 257. As OPAs estão relacionadas na Instrução CVM nº 361, de 5 de março de 2002. De acordo com a Lei, a CVM poderá expedir normas sobre OPAs de aquisição de controle. Nesse caso, Faustino praticou um crime financeiro ao adquirir ADRs antes mesmo que esses certificados fossem a conhecimento público. Tal fato concedeu a Faustino uma vantagem no valor da ação. De acordo com a Lei nº 6.385/76, art 27-D, a “pena é de reclusão, de 1 a 5 anos de multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência ado crime” (BRASIL, 1976, [s. p.]). AVANÇANDO NA PRÁTICA BENS NÃO DECLARADOS CONFIGURAM CRIME OU NÃO? https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=1701301&num_registro=200401852334&data=20050411&tipo=5&formato=PDF https://www.investidor.gov.br/menu/Menu_Investidor/ofertas/opas.html https://tc.com.br/blog/educacao-financeira/crise-economica 29 Ana Malta trabalhou durante muitos anos como gestora em grades empresas. No decorrer de sua vida, conseguiu construir um patrimônio de aproximadamente R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). Compõem seu patrimônio cinco tipos de aplicações financeiras, dois veículos, um sítio, a casa onde ela mora e uma casa de praia. No ano de 2022, você foi contratado para fazer a declaração de imposto de renda de Ana Malta. Para iniciar o processo de preenchimento, você precisou fazer uma entrevista com ela, no intuito de saber o que deveria declarar. Você solicitou a Ana, inclusive, a última declaração emitida, com o objetivo de informar os últimos dados enviados à Receita Federal. Durante a entrevista, você foi informado sobre a casa de praia comprada no ano de 2000, no valor de R$ 200.000,000 (duzentos mil reais), mas percebeu que tal informação não constava na declaração do ano anterior. Você conversou com Ana Malta sobre a falha na informação desse bem, e ela afirmou que nunca havia declarado a casa, já que o imóvel equivalia ao valor de R$ 200.000,00. Você, como contador contratado por Ana para o ano de 2022, deve analisar os seguintes aspectos: a. Com base nos estudos realizados nesta etapa de aprendizagem, é possível confirmar se Ana Malta cometeu algum crime? Caso algum crime seja constatado, ela estará submetida a alguma pena? b. Qual orientação deve ser dada a Ana Malta a respeito dessa situação? c. Justifique as suas respostas. 30 UNIDADE 2, SESSÃO 1: PERÍCIA CONTÁBIL CONVITE AO ESTUDO Caro estudante, na Unidade 2, continuaremos nosso estudo sobre investigação e perícia criminal por meio do entendimento dos procedimentos relacionados à utilização e à aplicação da perícia contábil no contexto de investigação de crimes financeiros cometidos pelas organizações ou ocorridos dentro delas, a partir de seus colaboradores. Nosso objetivo, nesta etapa de aprendizagem, é fazer com que você conheça os conceitos, procedimentos de investigação e normas referentes ao compliance e aplicados às perícias empresariais, para que, a partir desses saberes, seja possível realizar a análise e resolução de problemas de relacionamento interpessoal, gestão de conflitos, planejamento e organização. Para tanto, na Seção 2.1, vamos aprender o que é e como ocorrem os trabalhos de perícia contábil dentro de uma organização, verificando os conceitos e características relacionados a essa atividade, sua utilização por parte das organizações, bem como seu papel no contexto dos crimes corporativos. Também entenderemos com quais procedimentos de investigação o perito pode contar para a elucidação dos fatos que motivam a realização da perícia, denominados como “objeto da perícia”. Ao fim da Seção 2.1, você saberá identificar a estrutura do sistema financeiro nacional e seu papel na normatização, regulação e fiscalização das atividades dos agentes públicos e privados existentes em nossa economia. Na Seção 2.2, discutiremos sobre os elementos presentes em um ambiente de governança corporativa, a partir do entendimento desse conceito. Nesse contexto, estudaremos sobre o processo de prestação de contas ao qual os agentes de uma organização que utilizam governança corporativa estão sujeitos, bem como as principais concepções e aplicações relacionadas ao disclosure (divulgação) das informações financeiras de uma organização. Por fim, ainda nessa etapa de estudos, abordaremos outro importante conceito relacionado à governança corporativa, o qual contribui para a sustentabilidade da relação entre as partes interessadas no âmbito organizacional: a equidade. Para finalizar, na Seção 2.3 desta unidade, trataremos do compliance nas organizações, buscando entender mais detalhes sobre esse conceito, sua importância no contexto empresarial e quais práticas contribuem para minimizar a probabilidade de ocorrência de crimes e fraudes corporativas. Além disso, vamos descobrir a importância da prática do compliance na perícia contábil criminal. Ao final dos estudos desta unidade, você deverá ser capaz de compreender e aplicar os conceitos, procedimentos de investigação e normas referentes ao compliance e que são utilizados na realização das perícias empresariais. Você também se tornará apto a elaborar um mapa conceitual sobre compliance e investigação em fraude empresarial. PRATICAR PARA APRENDER Caro estudante, depois de conhecermos a importância da contabilidade para as organizações, vamos, agora, explorar um elemento específico da contabilidade,conhecido como perícia contábil, o qual é utilizado para verificar a ocorrência de crimes contra o patrimônio das instituições, sejam elas públicas ou privadas. Vale lembrar que o patrimônio das organizações é o principal objeto de estudo da 31 contabilidade. Ou seja, a contabilidade tem como missão fundamental estudar o patrimônio das organizações e demonstrar a sua evolução ao longo dos anos. Para ilustrar como os conhecimentos que serão apresentados podem ser aplicados na prática, imagine a seguinte situação hipotética: você foi contratado recentemente por uma empresa, a pedido do departamento jurídico, para atuar como perito assistente, visto que a instituição está sendo investigada pela Polícia Federal, sob a acusação do crime de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Como essa matéria envolve elementos financeiros e patrimoniais, o juiz responsável pelo caso nomeou um perito contábil para analisar os documentos e demonstrativos contábeis originados da operação. Para que seja possível orientar a produção da peça de defesa, uma de suas funções é verificar (a partir dos procedimentos de perícia) toda a documentação apreendida pela operação policial e orientar a defesa na produção de quesitos a serem apresentados ao juízo. Sua tarefa é apresentar, aos representantes do departamento jurídico da empresa, todos os tipos de procedimentos que um perito contábil pode utilizar e explicar o que tais mecanismos significam, a fim de que você, juntamente com o departamento jurídico, possa construir quesitos que ajudem a organização a provar que não há ilicitudes em seus elementos patrimoniais. CONCEITO-CHAVE Cotidianamente, vemos nos noticiários diversas operações da Polícia Federal, das polícias civis estaduais ou de outros agentes públicos que, por vezes, investigam e detêm pessoas acusadas de crimes referentes a prejuízos ao patrimônio das instituições, como lavagem de dinheiro, apropriação indébita, desvios financeiros em empresas ou prefeituras, entre outros. É nesse contexto que se insere a perícia contábil, um saber aprendido nas ciências contábeis e que posteriormente será aplicado por profissionais denominados peritos, na intenção de apurar eventuais incongruências existentes no patrimônio de uma organização, a partir de delitos cometidos. A palavra “perito”, aplicado aos profissionais que realizam as perícias, têm sua origem etimológica no termo em latim peritia, cujo significado se traduz como conhecimento, sendo o conhecimento aquele que fora obtido pela experiência. Cabe lembrar que a atividade de perícia aplica-se a diversos profissionais, como médicos, engenheiros, agrônomos, entre outros, os quais tomam o conhecimento e a experiência obtidos no exercício de sua atividade profissional como base para a formulação de uma opinião sobre determinado fato a ser verificado. A perícia contábil é entendida como aquela que é exercida por indivíduos formados em ciências contábeis, devidamente habilitados para o exercício da profissão, os quais, a partir dos conhecimentos e experiências obtidos, tornam-se aptos para verificar e opinar sobre fatos referentes ao patrimônio das entidades. Verificação e opinião são considerados elementos fundamentais para que a realização de um trabalho pericial seja motivada. Tal motivação, que enseja a verificação de um determinado fato contábil, será provocada ou requerida por algum elemento interessado na opinião do perito sobre um determinado fato contábil, de modo que esse profissional, a partir da emissão de seu ponto de vista, poderá auxiliar as pessoas envolvidas quanto ao esclarecimento do que ocorreu no evento para o qual a perícia foi demandada. A realização da perícia contábil pode acontecer por meio das figuras do perito oficial, do perito do juízo e do perito assistente. O perito oficial, de acordo com a NBC PP 01 32 (BRASIL, 2020a), é o contador investido na função por lei e pertencente a um órgão especial do Estado. Como exemplos, temos os peritos contábeis, que exercem a atividade na Polícia Federal e na Polícia Civil. Já o perito do juízo, segundo Crepaldi (2019), é nomeado pelo juiz, árbitro, autoridade pública ou privada para exercício da perícia contábil. É o profissional designado para subsidiar a solução do litígio ou, simplesmente, constatar um fato. Já o perito assistente, também denominado como assistente técnico, é o profissional contratado e indicado pela parte no litígio (BRASIL, 2020a; BRASIL, 2020b), o qual, como orienta Crepaldi (2019), acompanhará os procedimentos, bem como os trâmites processuais, e elaborará um parecer técnico contábil acerca da matéria objeto do litígio. O perito assistente poderá, ainda, manter contato com o perito assim que a sua contratação for formalizada, colocando-se à disposição para cooperar com o desenvolvimento do trabalho pericial (BRASIL, 2020b). Sá (2019) afirma que a perícia contábil surge da necessidade de se conhecer a opinião de um especialista em contabilidade sobre uma realidade patrimonial. Tal opinião pode ser dada sobre um determinado fato em qualquer tempo, em qualquer espaço, qualitativa e quantitativamente, em causas e efeitos. ASSIMILE Perícia contábil é a verificação de fatos ligados ao patrimônio individualizado, com o objetivo de oferecer opinião mediante uma questão proposta. Para a formulação desse parecer, realizam-se exames, vistorias, indagações, investigações, avaliações, arbitramentos; em resumo, todo e qualquer procedimento necessário à opinião (SÁ, 2019). É importante destacar que, para que se possa realizar a perícia, é necessário que haja um objeto determinado, a ser requerido por pessoa competente, o qual será submetido às devidas análises para que seja possível produzir as opiniões sobre o objeto periciado. Quando se menciona a pessoa competente, tal distinção se torna indispensável para a classificação do tipo de perícia contábil a ser realizada pelo perito. Nesse sentido, as perícias podem ser classificadas como: judicial, extrajudicial ou arbitral, a depender do ambiente em que será efetuada. Como o próprio nome indica, a perícia judicial é aquela que acontece no ambiente judiciário, isto é, nos tribunais, sendo que, nesse caso, a perícia contábil pode ser demandada pelo juiz ou a pedido das partes (e aceita pelo juiz), para elucidação do objeto a ser trabalhado pela perícia (SÁ, 2019). Já a perícia extrajudicial (ou voluntária) é aquela que ocorre fora da esfera judicial e arbitral, sendo inquirida por meio de um livre acordo entre as partes envolvidas para a verificação do objeto a ser periciado (MÜLLER, 2017). Por fim, a perícia arbitral é aquela que se realiza nas cortes de arbitragem, ambientes específicos para a solução de conflitos e que surgiram com a instauração da Lei nº 9.307, de 1996. Sendo assim, a perícia desenvolvida é aquela exercida sob o controle da Lei da Arbitragem. As perícias arbitrais são demandadas pelo árbitro ou pelas partes e apresentam-se como uma opção mais rápida e menos burocrática, quando comparada ao ambiente judicial. A normatização brasileira para a contabilidade, a partir da NBC TP 01 (R1) (Norma Técnica de Perícia Contábil), considera, ainda, a existência da perícia estatal. Esse tipo de perícia é demandado e executado sob controle de um órgão do Estado, em suas diversas esferas (municipal, estadual e federal). É muito comum que a perícia estatal seja efetuada 33 quando tais órgãos, por exemplo, exigem a opinião do perito sobre um determinado objeto a ser verificado nas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). EXEMPLIFICANDO Com a existência de litígio relacionado a fatos financeiros de uma empresa ou mesmo de indícios de crimes de ordem financeira, elementos como o juiz, árbitro ou as partes envolvidas no evento sob análise podem solicitar o trabalho de um perito contábil ou de um perito contábil assistente, paraque estes possam, com base em suas expertises e na fundamentação obtida a partir da utilização de ferramentas de investigação, apresentar subsídios que contribuam para a justa solução do litígio em questão. ASSIMILE A perícia contábil pode ser requerida sempre que houver fatos capazes de motivar o trabalho de um profissional habilitado, cuja opinião sobre o objeto da perícia poderá ser levada em consideração para o esclarecimento da demanda. Nesse sentido, temos: Perícia judicial: ocorre no ambiente dos tribunais, ou seja, no domínio judiciário. Perícia extrajudicial (voluntária): pode ser requerida por particulares, normalmente no âmbito das entidades, ou seja, fora dos ambientes judicial e arbitral. Perícia arbitral: acontece no âmbito das cortes de arbitragem, instituto aprovado pela Lei de Arbitragem, com a finalidade de desburocratizar e agilizar a solução de litígios. Perícia estatal: realiza-se nos ambientes de Estado, como órgãos das esferas municipais, estadual e federal. No contexto da apuração de fatos criminais, isto é, de fatos que sejam contrários à legislação vigente, a perícia contábil pode ser utilizada para apurar eventuais irregularidades legais cometidas por pessoas físicas ou jurídicas no âmbito público ou privado. Logo, pode-se tornar objeto de perícia, por exemplo, o enriquecimento ilícito de pessoas físicas, no âmbito público ou privado, com ou sem foro privilegiado. Além disso, as movimentações bancárias efetuadas por esses indivíduos, bem como quaisquer evoluções patrimoniais atípicas, também podem ser alvo de perícia. No que tange às entidades, comumente classificadas com pessoas jurídicas, a perícia pode verificar se um determinado elemento patrimonial ou o que é considerado patrimônio dessas instituições corresponde à realidade. Como exemplo, podemos citar a existência de recursos financeiros nas disponibilidades da organização, como o caixa e as contas bancárias da empresa. Outro grande foco da atuação de perícia contábil encontra-se na esfera pública, quando, a partir da instauração de processos específicos, verifica-se a licitude da aplicação de recursos públicos por meio de transferências orçamentárias aprovadas pela respectiva Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), na intenção de investigar a existência física de um determinado bem adquirido pelo serviço público ou, ainda, de identificar a correta aplicação da lei no exercício do cargo/mandato de um agente público. Para conseguir realizar seus trabalhos, o perito contábil, a partir da análise do objeto a ser periciado, conta com uma gama de possíveis procedimentos a serem utilizados durante o processo de investigação e apuração dos fatos. Tais mecanismos de perícia contábil têm 34 como objetivo fundamentar as conclusões que serão levadas ao laudo pericial contábil (se emitido pelo perito do juízo) ou ao parecer pericial contábil (se emitido pelo perito assistente). Dessa forma, consideraremos como investigação todos os procedimentos que podem ser utilizados pelo perito contábil, de forma total ou parcial (considerando a natureza e a complexidade dos elementos em análise). De acordo com Crepaldi (2019), os procedimentos técnico-científicos adotados para fundamentar as conclusões que serão abordadas no laudo pericial contábil ou no parecer técnico-contábil são: exame, vistoria, indagação, investigação, arbitramento, mensuração, avaliação e certificação (BRASIL, 2020b). O Quadro 2.1, a seguir, apresenta o conceito e a definição relacionados a cada um desses procedimentos. Quadro 2.1 | Procedimentos técnico-científicos de investigação utilizados pela perícia contábil Conceito Definição Exame É a análise de livros, registros das transações e documentos. Vistoria É a diligência que objetiva a verificação e a constatação de situação, coisa ou fato, de forma circunstancial. Indagação É a busca de informações mediante entrevista com conhecedores do objeto ou fato relacionado à perícia. Investigação É a pesquisa que busca trazer ao laudo pericial contábil ou parecer pericial contábil o que está oculto por quaisquer circunstâncias. Arbitramento É a determinação de valores ou a solução de controvérsia por critério técnico. Mensuração É o ato de qualificação e quantificação física de coisas, bens, direitos e obrigações. Avaliação É o ato de estabelecer o valor de coisas, bens, direitos, obrigações, despesas e receitas. Certificação É o ato de atestar a informação trazida ao laudo pericial contábil pelo perito contador, conferindo-lhe caráter de autenticidade pela fé pública atribuída a esse profissional. Testabilidade É a verificação dos elementos probantes juntados aos autos e o confronto com as premissas estabelecidas. Fonte: Brasil (2020b). ASSIMILE Laudo pericial contábil: laudo pericial é uma peça tecnológica que contém opiniões do perito do juízo, como pronunciamento sobre as questões que lhe são formuladas e que requerem seu parecer (CREPALDI, 2019). Parecer técnico-contábil: é uma peça escrita na qual o perito assistente técnico deve visualizar, de forma abrangente, o conteúdo da perícia e particularizar os aspectos e as minudências que envolvam a demanda (CREPALDI, 2019). É comum que o perito contábil precise desenvolver seus trabalhos observando aspectos relacionados a movimentações financeiras realizadas pelos diversos agentes mencionados anteriormente. Tais movimentações, por vezes, são executadas de forma intencional, com 35 o objetivo de lesar indivíduos, organizações e até mesmo o erário. No mercado de capitais, por exemplo, a grande volatilidade e o alto risco, que são características desse mercado, induzem participantes mal-intencionados a criarem condições que levem os demais integrantes ao erro, com o propósito de auferir ganhos por meio dessas decisões. Por esse motivo, o Estado, a partir de seu representante máximo, deve buscar organizar o sistema financeiro, para que este controle as ações dos agentes econômicos e minimize a probabilidade do surgimento de crises capazes de afetar a economia de um país. EXEMPLIFICANDO Vários são os exemplos de crimes, cometidos por indivíduos e organizações, que resultaram em profundos impactos sobre a economia de um país. Com o advento da globalização, tais crises, que antes estavam restritas à região de sua ocorrência, passaram a gerar efeitos significativos em nível internacional, como aconteceu na crise de 2008, por exemplo. Tal evento teve como principal causa a desvalorização acentuada dos derivativos, isto é, de contratos que derivam a maior parte de seu valor de um ativo subjacente (café, ouro, etc.), taxa de referência (taxas de juros) ou índice (ações). Para coibir novas ocorrências de crimes contra a economia, os países procuram regulamentar e fiscalizar o mercado. De acordo com Abreu e Silva (2016), é nesse contexto que o sistema financeiro se apresenta como um conjunto de órgãos que regulamenta, fiscaliza e executa as operações necessárias à circulação da moeda e do crédito na economia. Para realizar as funções de regulamentação, fiscalização e execução, o sistema financeiro nacional é estruturado em três pilares. O primeiro relaciona-se aos mercados de moeda, crédito, capitais e câmbio, que podem ser denominados, de forma concisa, como mercado financeiro. O segundo pilar refere-se ao mercado de previdência complementar aberta, capitalização e seguros. Por fim, o terceiro pilar diz respeito ao mercado de previdência complementar fechada. A sistematização desses três pilares é apresentada na Figura 2.1, a seguir: Figura 2.1 | Estrutura do sistema financeiro nacional Fonte: Abreu e Silva (2016). 36 Enquanto estrutura normativa, o mercado de moeda, crédito, capitais e câmbio é normatizado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN); o mercado de seguros, previdência complementar aberta, capitalização e seguros, peloConselho Nacional de Seguros Privados (CNSP); e, por fim, o Mercado de Previdência Complementar Fechada é normatizado a partir das deliberações do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC). A partir da ordem de normatização, apresenta-se a estrutura de regulação do SFN, sistema que, conforme descrevem Abreu e Silva (2016), além da supervisão, também executa a função normativa – sempre de acordo com as diretrizes traçadas por cada um dos conselhos mencionados anteriormente. Regulando o mercado financeiro nos segmentos de moeda, câmbio e crédito, temos o Banco Central do Brasil (Bacen). Já no setor de mercado de capitais, temos como órgãos reguladores a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Bacen. Para regular o mercado de seguro, previdência aberta, capitalização e resseguro, tem-se a Superintendência de Seguros Privados (Susep). Para finalizar, o mercado de previdência fechada (fundo de pensão) tem como órgão regulador a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). REFLITA Em um cenário no qual vemos o fluxo de informações econômicas e financeiras ampliar sua velocidade em função da melhoria da tecnologia, de novos instrumentos financeiros e das transações cada vez mais constantes entre os países, qual seria o padrão ideal para a estruturação de um sistema financeiro nacional mais eficiente? Um modelo mais nacionalista, um modelo internacional padronizado ou um modelo misto? Por enquanto, são esses os assuntos que ajudarão você na resolução da missão apresentada no início desta seção de estudos. Verifique se a sua sugestão de intervenção está de acordo com o método indicado na proposta de resolução da situação-problema. Vou reencontrar você daqui a pouco, com mais temas e contextos. Até breve! REFERÊNCIAS ABREU, E.; SILVA, L. Sistema financeiro nacional. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2016. Disponível em: https://bit.ly/3eI7dow. Acesso em: 21 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996. Dispõe sobre a arbitragem. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 23 set. 1996. Disponível em: https://bit.ly/3QyVMg3. Acesso em: 21 abr. 2022 BRASIL. Norma Brasileira de Contabilidade, NBC PP Nº 1 (R1), de 19 de março de 2020. Dá nova redação à NBC PP 01, que dispõe sobre perito contábil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 27 março 2020a. Disponível em: https://bit.ly/3RE3qHe. Acesso em: 7 maio 2022. BRASIL. Norma Brasileira de Contabilidade, NBC TP Nº 1 (R1), de 19 de março de 2020. Dá nova redação à NBC TP 01, que dispõe sobre perícia contábil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 27 março 2020b. Disponível em: https://bit.ly/3L7aOsm. Acesso em: 7 maio 2022. CREPALDI, S. A. Manual de perícia contábil. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3Qz3BlN. Acesso em: 22 abr. 2022. MÜLLER, A. N.; TIMI, S. R. R.; HEIMOSKI, V. T. M. Perícia contábil. São Paulo: Saraiva, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530974657/ http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9307.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%209.307%2C%20DE%2023,Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20arbitragem.&text=Art.,relativos%20a%20direitos%20patrimoniais%20dispon%C3%ADveis https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/norma-brasileira-de-contabilidade-nbc-pp-n-1-r1-de-19-de-marco-de-2020-250058222 https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/norma-brasileira-de-contabilidade-nbc-tp-n-1-r1-de-19-de-marco-de-2020-250058048 https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788571440227/ 37 https://bit.ly/3TYHhFg. Acesso em: 22 abr. 2022. PERÍCIA contábil: fiscalização. Conselho Regional de Contabilidade do Estado de São Paulo, 27 fev. 2015. Disponível em: https://bit.ly/3QJ9rBu. Acesso em: 22 abr. 2022. SÁ, A. L. de. Perícia contábil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3L46ha5. Acesso em: 20 abr. 2022. SEM MEDO DE ERRAR Olá novamente, estudante! Você conseguiu perceber como a perícia contábil pode ajudá- lo na resolução de problemas relacionados a crimes cometidos contra as organizações, sejam elas públicas ou privadas? De acordo com a NBC TP 01 (BRASIL, 2020b) e Crepaldi (2019), os procedimentos técnico-científicos aplicados à atividade de perícia contábil têm a intenção de fundamentar as conclusões que serão abordadas no laudo pericial contábil ou no parecer pericial contábil. Tais mecanismos podem ser empregados em sua integralidade ou parcialmente, de acordo com a natureza e a complexidade da matéria, a determinação de valores ou a solução de controvérsia. Os procedimentos técnico-científicos periciais estão elencados no Quadro 2.2, a seguir: Quadro 2.2 | Conceito, definição e exemplos de procedimentos técnico-científicos periciais utilizados para investigação Conceito Definição Exemplo Exame É a análise de livros, registros das transações e documentos. O perito realiza exame ao analisar a conciliação bancária com o livro Diário. Vistoria É a diligência que objetiva a verificação e a constatação de situação, coisa ou fato, de forma circunstancial. Exemplo: o perito faz uma vistoria in loco dos meios de controle utilizados pela empresa para a guarda do estoque. Indagação É a busca de informações mediante entrevista com conhecedores do objeto ou fato relacionado à perícia. A realização de entrevista com os funcionários da controladoria da empresa periciada, a fim de apurar evidências para o laudo pericial. Investigação É a pesquisa que busca trazer ao laudo pericial contábil ou parecer pericial contábil o que está oculto por quaisquer circunstâncias. O perito realiza investigação da vida particular dos envolvidos no objeto da perícia, descobrindo, por exemplo, que o fornecedor de material de uso e consumo para a empresa tem um forte vínculo de amizade com o responsável pelo setor de aquisição. Arbitramento É a determinação de valores ou a solução de controvérsia por critério técnico. Há o arbitramento de valores ao se estimar a quantidade de combustível utilizada pelos veículos de determinada empresa. Mensuração É o ato de qualificação e quantificação física de coisas, bens, direitos e obrigações. Contagem física do estoque, medidas de áreas, avaliação de componentes patrimoniais, etc. https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547219888/ https://crcsp.org.br/portal/fiscalizacao/pericia.htm https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788597022124/ 38 Conceito Definição Exemplo Avaliação É o ato de estabelecer o valor de coisas, bens, direitos, obrigações, despesas e receitas. Avaliação do imobilizado da empresa, considerando as recomendações da legislação vigente. Certificação É o ato de atestar a informação trazida ao laudo pericial contábil pelo perito contador, conferindo-lhe caráter de autenticidade pela fé pública atribuída a esse profissional. O contador apresenta uma importação não contabilizada que foi certificada pelo despachante aduaneiro. Testabilidade É a verificação dos elementos probantes juntados aos autos e o confronto com as premissas estabelecidas. Testar se um documento (planilha, relatórios) apresentado pelas partes tem os seus valores devidamente calculados ou mesmo se um determinado sistema está registrando as informações de forma correta. Fonte: Brasil (2020b), Crepaldi (2019) e Sá (2020). AVANÇANDO NA PRÁTICA POSSIBILIDADES DE TRABALHO PARA O PROFISSIONAL PERITO CONTADOR João terminou recentemente a faculdade de Ciências Contábeis. Durante o curso, os professores afirmavam que profissionais de contabilidade vinham ganhando bastante destaque no processo de fornecimento de informações para as empresas, principalmente em decorrência da adequação que as organizações precisaram efetuar por conta da adoção das normas internacionais de contabilidade. Lembrando-se dessa possibilidade, João percebeu que poderia atuar como perito na esfera judiciale realizou os procedimentos de cadastro no sistema judiciário estadual e federal onde atua. Em pouco tempo, João foi nomeado como perito do juiz em uma causa na qual uma determinada empresa contesta os valores de uma multa aplicada pela Receita Federal por causa do não recolhimento de valores de impostos incidentes sobre o lucro. De que modo, ou seja, com qual objetivo João deverá realizar os trabalhos, entendendo que as funções a serem desempenhadas por ele referem-se à atividade de perito do juízo? 39 UNIDADE 2, SESSÃO 2: GOVERNANÇA CORPORATIVA PRATICAR PARA APRENDER Após sofrer uma condenação pelos crimes de desvio financeiro e evasão de divisas, a empresa XYZ S.A. ganhou destaque na mídia, mas de modo muito negativo, aparecendo em noticiários de televisão, portais de notícias e tornando-se um dos assuntos mais comentados nas redes sociais por várias semanas. Todo esse escândalo fez com que o valor das ações despencasse no mercado de capitais, no qual a empresa tinha ações em oferta. Como forma de conquistar novamente a confiança do mercado e tentar aumentar o valor de suas ações, a empresa emitiu um comunicado, informando ao mercado e às partes interessadas que implementaria práticas de governança corporativa para coibir a ocorrência de futuras ações criminosas. Tal procedimento era exigido pelos acionistas e foi repassado aos integrantes do conselho de administração, uma vez que a governança corporativa estabelece regras e procedimentos que visam atender às expectativas dos acionistas e do mercado, minimizando a probabilidade de ocorrência de atos considerados criminosos e que prejudiquem o patrimônio da organização. Para efetuar essa implementação, a empresa NPTO, na qual você, estudante, atua como consultor, foi contratada para a aplicação de boas práticas de governança corporativa como cultura organizacional e de procedimentos a serem desenvolvidos pelos colaboradores da empresa XYZ S.A. Nesse sentido, você, enquanto consultor contratado, deverá orientar os gestores quanto ao modelo de governança corporativa a ser instaurado, disponibilizando-lhes mecanismos que permitam uma gestão organizacional eficiente, a fim de minimizar possíveis conflitos de interesses. Para atender à demanda da empresa XYZ S.A., é necessário que você apresente aos membros do conselho de administração da empresa os seguintes pontos: • Conceitos sobre governança corporativa. • O que é a prestação de contas (accountability) em governança corporativa. • Os principais conceitos e aplicações relacionados ao processo de transparência (disclosure) das informações contábeis-financeiras. • Os principais conceitos e a definição de equidade em governança corporativa. Pronto? Então, vamos em frente! CONCEITO-CHAVE A adoção da governança corporativa como modelo para otimização de boas práticas organizacionais não se aplica apenas às organizações de capital aberto (ainda que estas sejam as que mais utilizem tal modelo de gestão), mas é cabível a toda e qualquer empresa que procure se consolidar internamente para, consequentemente, fortalecer seu modelo de gestão externamente, adquirindo benefícios como excelência, inovação e diferenciação. Governança corporativa pode ser definida, segundo Oliveira (2015), como o conjunto de 40 práticas administrativas que potencializa o desempenho das empresas ao proteger, de maneira equitativa, todas as partes interessadas. Como partes interessadas, entende-se qualquer usuário interno (acionistas, diretores, etc.) ou externo (governo, bancos, etc.) que possua (ou venha a possuir, no futuro) algum tipo de relação com a empresa. As práticas administrativas são interpretadas como uma coleção de formas de atuação e de procedimentos ou processos estabelecidos – formal ou informalmente – prestigiados por uma amplitude representativa de empresas (OLIVEIRA, 2015). Pode-se, então, entender que a adoção da governança corporativa representa, sob o ponto de vista das práticas administrativas, uma mudança na cultura organizacional da empresa, de modo que essa instituição consiga aprimorar e inserir em suas práticas administrativas habituais elementos já consagrados, pelo fato de terem sido utilizados e concedido vantagens a certas organizações em comparação a outras empresas que não implementaram tais práticas. ASSIMILE Governança corporativa é um instrumento de sintonia entre a empresa e o mercado, não apenas com os acionistas atuais e potenciais – controladores e minoritários –, mas também com outros diversos públicos envolvidos (clientes, fornecedores, comunidade, governos) (OLIVEIRA, 2015). Todos esses valores são trabalhados para “amarrar” elementos que fazem parte da rotina empresarial, mas que, por vezes, não se comunicam entre si, o que pode motivar a existência de incongruências informacionais e, como consequência, a ocorrência de crimes capazes de afetar o patrimônio da empresa, uma vez que tais elementos podem estar associados a interesses específicos e apresentar divergências entre si. Desse contexto, surgem as práticas de governança corporativa para intermediar essas relações e buscar uma relação equilibrada entre os elementos. Como exemplo, podemos citar a busca por equilíbrio, quando, de um lado, temos a governança corporativa ajudando a empresa a trabalhar como guardiã dos interesses das partes envolvidas, mas estas, por vezes, possuem interesses conflitantes. As partes envolvidas podem ser resumidas em dois agentes: os shareholders e os stakeholders. Shareholders são os agentes que possuem ações da organização e apresentam um interesse maior no recebimento de dividendos e em ganhos de capital ao longo do tempo. Ou seja, estão preocupados com os benefícios que a empresa gera para eles. Por outro lado, os stakeholders, segundo Rossetti e Andrade (2014), direcionam sua atenção à gestão estratégica da empresa, ou seja, a demandas que sejam conciliáveis com a perenidade da instituição. EXEMPLIFICANDO Percebe-se que shareholders e stakeholders possuem visões diferentes da proposta de distribuição da riqueza de uma empresa. Enquanto os shareholders concentram seus esforços na distribuição dessa riqueza para atender ao interesse dos acionistas, os stakeholders têm a preocupação de que essa riqueza financie a continuidade e a sustentabilidade da organização. Tal divergência gera um conflito de interesses, também conhecido como conflito de agência, sobre o qual a governança corporativa deverá intervir para minimizar possíveis discórdias. Outro fator com o qual a governança corporativa pode auxiliar as empresas é a definição da estrutura de poder, pois apresenta, para a organização, uma descrição clara dos papéis 41 de cada um de seus agentes internos, ou seja, delimita o papel de atores (agentes), como os proprietários da instituição, do conselho de administração, diretores e outros profissionais relevantes. O compartilhamento de riscos também é um aspecto fundamental, uma vez que decisões de alto impacto são compartilhadas entre os agentes. Desse modo, as deliberações não ficam concentradas em uma única pessoa, o que poderia ser prejudicial, visto que as resoluções seriam desenvolvidas de acordo com interesses específicos, contrariando os objetivos da empresa. Além disso, a governança corporativa cria uma cultura empresarial orientada ao planejamento estratégico da organização no processo de formulação, homologação e controle de técnicas, em uma visão de longo, médio e curto prazo. Aprendemos, até agora, que a governança corporativa contribui para a estruturação dos pilares relacionados ao direito das partes interessadas (stakeholders e shareholders), bem como para o processo de organização da ordem de poder da empresa. Outra contribuição que a governança corporativa apresenta para as instituições se dá na configuração do sistema de relações entre os agentes, orientandocomo esses colaboradores, tanto internos quanto externos, devem se comportar. REFLITA Muito se fala sobre a corrupção por parte de agentes públicos, políticos, entre outros envolvidos, mas, para que a corrupção ocorra, é necessário que o agente corruptor e o agente corrupto estejam de acordo com a prática criminosa. Logo, percebe-se que a governança corporativa, a partir da orientação do comportamento e da relação de seus agentes com usuários internos e externos, ajuda a proteger a ordenação empresarial, uma vez que tal conduta ilícita seria atribuída ao agente interno (um diretor, por exemplo), e não à empresa, pelo fato de o agente não obedecer às orientações da empresa nem ao trato comportamental com agentes públicos. O que você pensa sobre o tema? Por fim, para que todas as estruturas discutidas anteriormente não sejam articuladas em um ambiente informal e não entrem em desuso, a governança corporativa relaciona-se com um sistema normativo que concede um aspecto formal aos elementos de conduta ética a serem seguidos pelos agentes de uma empresa nas suas relações internas e externas, trazendo responsabilidade corporativa para os assuntos tratados pela organização. ASSIMILE A governança corporativa consiste no conjunto de regras, procedimentos, atitudes e instituições que condicionam a ação dos administradores no sentido de atender aos interesses dos financiadores e das partes interessadas na empresa (stakeholders), especialmente os acionistas (shareholders). Práticas de governança, juntamente com as leis e a atuação dos tribunais e dos legisladores, têm o propósito de evitar que uma parte seja expropriada por outra (SILVA, 2016). Percebe-se que a governança corporativa surge em um ambiente onde se apresentam agentes com diferentes interesses a serem satisfeitos. A partir das práticas de governança, o conflito entre tais interesses (agência) é minimizado. Jensen e Meckling (1976, [s. p.]) definem um relacionamento de agência como um contrato “onde uma ou mais pessoas – o principal – engajam outra pessoa – o agente – para desempenhar alguma tarefa em seu favor, envolvendo a delegação de autoridade para tomada de decisão pelo agente”. Considerando essa definição e as afirmações de Silva (2016), se ambas as partes agem 42 tendo em vista a maximização das suas utilidades pessoais, existe uma boa razão para acreditar que o agente nem sempre atuará com o propósito de atender ao melhor interesse do principal, o que implicará o conflito entre os agentes ou o conflito de agência. Diante disso, a governança corporativa surge com valores que ajudam a diminuir tal divergência. EXEMPLIFICANDO Os conflitos dentro das empresas, quando ocasionados pela separação entre propriedade e gestão, são conhecidos como conflitos de agência (LARRATE, 2013). Dentre os principais elementos que, segundo Williamson (1988), podem motivar tais conflitos, estão: • Investimentos não lucrativos que evitaram a distribuição de dividendos. • Utilização de recursos da empresa com objetivos pessoais. • Exposição da empresa a riscos elevados. • Elevada remuneração dos gestores. Os princípios básicos que norteiam a governança corporativa foram definidos e amplamente divulgados por causa de escândalos corporativos e crimes financeiros cometidos por organizações dos Estados Unidos, dentre os quais podemos citar as fraudes contábeis praticadas pelas empresas Enron e WorldCom. Os crimes cometidos por essas corporações causaram prejuízos incalculáveis não somente a investidores dos Estados Unidos, mas também a investidores e fundos de investimentos internacionais que tinham, na época, investimentos no mercado de capitais estadunidense. Por causa desses crimes, o governo dos Estados Unidos editou a Lei Sarbanes-Oxley (SOx), idealizada pelos congressistas norte-americanos Paul Sarbanes e Michael Oxley. De acordo com Oliveira (2015), a Lei SOx nasceu em resposta ao fato de que a economia americana estava muito contaminada e com pouca credibilidade em virtude dessa sequência de fraudes bilionárias. A edição da Lei SOx foi necessária para que se pudesse resgatar a confiança da comunidade de investidores e manter a liquidez e a atratividade dos sistemas financeiro e empresarial do país (OLIVEIRA, 2015). Nesse cenário, a Lei SOx, bem como organismos internacionais, como a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), estabeleceram o que conhecemos hoje como princípios básicos de governança corporativa. Rossetti e Andrade (2014) indicam que a governança corporativa se estrutura como um sistema baseado em valores como equidade (fairness), transparência (disclosure), prestação de contas (accountability) e conformidade (compliance). Para Larrate (2013), o primeiro princípio – o da equidade (fairness) – caracteriza-se pelo tratamento justo de todos os sócios e demais partes interessadas. Nesse caso, atitudes ou políticas discriminatórias, sob qualquer pretexto, são totalmente inaceitáveis em nível organizacional. Rossetti e Andrade (2014) complementam essa ideia ressaltando que a equidade se dá pelo respeito aos direitos dos minoritários, de modo que estes tenham participação equânime quando comparados aos majoritários, tanto no aumento da riqueza corporativa quanto nos resultados das operações e na presença ativa em assembleias gerais. Desse modo, percebe-se que a governança corporativa, a partir do princípio da equidade, preocupou-se com os pequenos acionistas, procurando disponibilizar todas as informações básicas para proporcionar uma ambiente de igualdade e equidade entre todos os acionistas da empresa, quer fossem grandes, médios ou pequenos (OLIVEIRA, 2015). 43 REFLITA Você certamente já ouviu falar sobre o termo “informação privilegiada”, um tipo de crime financeiro observado quando um determinado agente, como um investidor, tem acesso a informações importantes que podem alterar o valor da ação de uma empresa, como acontece com a Petrobras ao trocar de presidente ou anunciar o aumento ou a redução dos combustíveis. Normalmente, a informação privilegiada faz com que o valor da ação suba ou caia, uma vez que é utilizada de forma não justa. De que maneira a equidade pode contribuir para minimizar a ocorrência dos efeitos produzidos pela informação privilegiada? O princípio da transparência (disclosure) indica que toda informação que possa influenciar decisões de investimentos deve ser divulgada, de forma imediata e simultânea, a todos os interessados (LARRATE, 2013). Quando se tem uma boa comunicação, ou seja, quando há transparência no processo informacional, constitui-se um clima de confiança, tanto de maneira interna quanto externa, nas relações com terceiros (SILVA, 2016). As organizações, a partir da aplicação desse princípio, apresentam uma maior transparência das informações, especialmente as de alta relevância para o mercado, que impactam os negócios e envolvem resultados, oportunidades e riscos, fazendo com que todas as partes interessadas conheçam os eventos objetos da divulgação. O princípio de governança corporativa referente à prestação de contas (accountability) prevê que agentes de governança devem prestar contas de sua atuação (LARRATE, 2013). São considerados como agentes de governança, para fins de aplicação desse princípio, os sócios, administradores (como conselheiros de administração e executivos/gestores), conselheiros fiscais e auditores. Nesse princípio, os agentes de governança assumem integralmente as consequências de seus atos e omissões. Ou seja, os agentes da governança devem prestar contas a quem os elegeu, além de responder integralmente pelos atos praticados no exercício de seus mandatos (ROSSETTI; ANDRADE, 2014). Cabe ressaltar que, ainda de acordo com Rossetti e Andrade (2014), a prestação responsável de contas precisaestar fundamentada nas melhores práticas contábeis e de auditoria. REFLITA É possível concluir que a aplicação dos princípios de governança traz resultados positivos para empresas do setor privado, uma vez que o foco da governança, nesse domínio, está direcionado à postura dos dirigentes Diante disso, como a aplicação da governança corporativa poderia ser percebida no setor público? Será que teríamos como reflexo os mesmos resultados observados no setor privado? A governança é aplicável no setor público ou se restringe a empresas da esfera privada? Resta, ainda, o princípio relacionado à responsabilidade corporativa (compliance). Dedicaremos a próxima seção de estudos especialmente a uma discussão sobre esse tema, mas podemos adiantar que tal princípio abrange um amplo conjunto de compromissos, os quais podem ser segregados em três dimensões: econômico-financeira, social e ambiental (ROSSETTI; ANDRADE, 2014). Larrate (2013) salienta que, com base na responsabilidade corporativa, os agentes de governança devem zelar pela sustentabilidade das organizações, incorporando considerações de ordem social e ambiental na definição dos negócios e operações. Por 44 fim, Gonzalez (2012) indica que tal princípio também prevê a adoção, por parte das empresas, de um código de conduta ética direcionado a seus principais executivos. ASSIMILE A governança corporativa é regida por princípios básicos que lhe permitem ser implementada em sua plenitude. São eles: transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa. Vejamos, a seguir, um breve resumo sobre cada um desses princípios: • Transparência (disclosure): ressalta que uma perfeita comunicação entre os agentes proporciona um clima de confiança. • Equidade (fairness): tratamento justo e sem distinção em relação às partes envolvidas, principalmente quando se trata dos colaboradores, fornecedores, entre outros agentes. • Prestação de contas (accountability): os gestores e demais agentes da governança deverão prestar contas aos que lhes elegeram, respondendo integralmente pelos atos e fatos de sua responsabilidade. • Responsabilidade corporativa (compliance): condução dos negócios com o objetivo de perpetuar a existência da companhia. Como pudemos perceber ao longo desta seção de estudos, a governança corporativa é o meio mais eficiente de fazer com que uma companhia conquiste a confiança das partes interessadas, fato que concede à empresa a possibilidade de valorização ou obtenção de investimentos, principalmente se a corporação possuir ações em negociações no mercado de capitais (Bolsa de Valores). A necessidade de aplicação da governança corporativa veio como uma resposta às lacunas encontradas entre a legislação e o comportamento de agentes envolvidos em decisões organizacionais, o que dava margem para a ocorrência de fraudes e crimes que lesavam nações. Frente a esses comportamentos criminosos e em decorrência das mudanças expressivas ocorridas no cenário econômico e corporativo, houve a necessidade de implantar um modelo de gestão mais eficiente e transparente nas companhias. Em resumo, quando administrada de acordo com as boas práticas de governança corporativa, uma empresa diminui o risco de surgimento de escândalos, por conta da proteção oferecida aos investidores, garantindo, em virtude dessa segurança, maiores retornos sobre o investimento. Vejo você na próxima seção! REFERÊNCIAS A CRISE de 2008 e seus impactos na sociedade dos EUA | Nerdologia. [S. l.]: Nerdologia, 21 set. 2021. 1 vídeo (10min20s). Disponível em: Link. Acesso em: 25 abr. 2021. CASO Enron resumido - maior fraude da história (contabilidade/auditoria/governança/SOx). [S. l.]: GCoelho, 21 jun. 2021. 1 vídeo (13min50s). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=5MpNETAVLUM. Acesso em: 25 abr. 2022. GONZALEZ, R. S. Governança corporativa: o poder de transformação das empresas. São Paulo: Trevisan, 2012. Disponível https://youtu.be/0Kq_20Oww1w https://www.youtube.com/watch?v=5MpNETAVLUM 45 em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788599519424/. Acesso em: 24 abr. 2022. GOVERNANÇA corporativa. Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, 1 maio 2019. Disponível em: https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca- corporativa. Acesso em: 10 maio 2022. JENSEN, M.; MECKLING, W. Theory of the firm: managerial behavior, agency costs and ownership structure. Journal of Financial Economics, v. 3, n. 4, p. 305-360, out. 1976. LARRATE, M. Governança corporativa e remuneração dos gestores. São Paulo: Atlas, 2013. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788522477005/. Acesso em: 24 abr. 2022. OLIVEIRA, D. P. R. D. Governança corporativa na prática: integrando acionistas, conselho de administração e diretoria executiva na geração de resultados. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788522494569/. Acesso em: 23 abr. 2022. ROSSETTI, J. P.; ANDRADE, A. Governança corporativa: fundamentos, desenvolvimento e tendências. 7. ed. São Paulo: Grupo GEN, 2014. 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Inicialmente, você poderia informar aos profissionais da empresa XYZ que a governança corporativa possui uma relação de sustentabilidade responsável da organização, a qual está vinculada a processos, costumes, políticas, leis e instituições. Nesse contexto, busca- se uma relação equilibrada e justa entre todos esses elementos, com o objetivo de valorizar a imagem da empresa frente ao mercado, contribuindo com a possibilidade de atração de investidores e mitigando a ocorrência de eventos criminosos, isto é, de fatos contrários ao ordenamento legal vigente. Para que a governança corporativa possa ser aplicada, a instituição deverá adotar, em sua cultura organizacional, alguns princípios básicos que servem como pilares para a estruturação das boas práticas de governança no ambiente empresarial. Como você pôde verificar ao longo desta etapa de aprendizagem, os princípios básicos que regem a governança corporativa são: transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa. https://integrada/ https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca-corporativa https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca-corporativa https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788522477005/ https://integrada/ https://integrada/ 46 A transparência pode ser traduzida como a disponibilização de informações, não se restringindo ao desempenho econômico-financeiro, mas contemplando, também, os demais fatores que norteiam a ação gerencial e que condizem com a preservação e a otimização do valor da organização. A equidade relaciona-se ao tratamento justo e isonômico de todos os sócios e demais partes interessadas, considerando seus direitos, deveres, necessidades, interesses e expectativas. A prestação de contas refere-se à cobrança dos agentes de governança acerca de sua atuação.Tal princípio deve ser atendido de modo claro, conciso, compreensível e tempestivo, cabendo aos agentes de governança assumir integralmente as consequências de seus atos e omissões, desempenhando seus papéis com diligência e responsabilidade. Por fim, a responsabilidade corporativa trata do zelo na viabilidade econômico-financeira das organizações e da redução das externalidades negativas de seus negócios e operações, aumentando as positivas e levando em consideração, no seu modelo de negócios, os diversos capitais (financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social, ambiental, reputacional) no curto, médio e longo prazos. No Brasil, todos esses princípios são orientados de acordo com o que delibera o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Você pode saber mais sobre o assunto fazendo a leitura do artigo indicado a seguir, intitulado Governança corporativa, publicado no site do IBGC. GOVERNANÇA corporativa. Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, 1 maio 2019. Para acessar o material, consulte o link disponível nas Referências desta seção. Bom trabalho! AVANÇANDO NA PRÁTICA CONFLITO DE INTERESSES EM UMA EMPRESA FORNECEDORA DE VACINAS Uma determinada empresa de produtos farmacêuticos decidiu, em seu planejamento estratégico, realizar a abertura de capital. Para isso, contratou uma companhia especializada em auditorias internas, para que preparasse o prospecto de apresentação ao mercado. Durante os trabalhos, a empresa contratada percebeu que certo procedimento de compra de materiais não estava de acordo com as boas práticas de governança, visto que, nesse processo, o profissional responsável pela aquisição de matéria-prima estava comprando com fornecedores que ofereciam um preço maior do que os concorrentes. Ao investigar as motivações na intenção de apurar as responsabilidades sobre o fato identificado, descobriu-se que o profissional incumbido das compras estava recebendo presentes da instituição fornecedora, como pacotes de viagens para resorts, além de favorecimento para familiares. Uma das principais atribuições da governança corporativa é assegurar que a empresa não se exponha a riscos desnecessários. Para minimizar os riscos, é possível, por exemplo, utilizar sistemas de informações que possibilitem a medição e o acompanhamento da probabilidade de ocorrência de riscos versus efeitos negativos (caso o risco ocorra), buscando prevenir impactos financeiros prejudiciais e a ocorrência de crimes contra os 47 sistemas financeiro e civil. Depois da análise, foi possível perceber que o profissional responsável pela compra dos insumos necessários à fabricação de medicamentos colocou seus interesses e objetivos pessoais à frente dos interesses da companhia, o que não pode ocorrer, já que essa conduta representa um risco para a sustentabilidade organizacional pelo fato de comprometer a imagem, reputação e credibilidade da empresa, você concorda? Diante dessa situação, o que deve ser feito? 48 UNIDADE 2, SESSÃO 3: COMPLIANCE NAS ORGANIZAÇÕES PRATICAR PARA APRENDER Caro estudante, seja bem-vindo à última seção da Unidade 2. Nesta etapa de aprendizagem, vamos tomar como objeto central de estudos o compliance. Para isso, estudaremos, juntos, o conceito de compliance, entendendo como aplicá-lo no contexto empresarial, as principais práticas relacionadas a esse mecanismo e, por fim, sua importância para a perícia contábil criminal. Como você pôde perceber, os temas se conectam e se completam para que seja possível compreender quais são os benefícios que as práticas de compliance trazem às empresas, principalmente com relação à redução das probabilidades de riscos de ocorrências de práticas criminosas por parte dos agentes de governança. Por meio da breve introdução feita na seção de estudos anterior e do aprofundamento a ser apresentado nesta fase de aprendizagem, você perceberá que o compliance está inserido nas recomendações de boas práticas que a governança corporativa propõe às corporações. Como você deve se lembrar, os princípios de governança corporativa são sugeridos para que as empresas apresentem maior valor de mercado e conquistem a confiabilidade de possíveis interessados. Já aprendemos que a governança corporativa está apoiada nos princípios de transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa (compliance), sendo este último o tema central de estudos nesta seção. Para que você possa aprimorar o conhecimento sobre tais conceitos, reflita sobre a situação-problema, relacionada a uma empresa familiar. Uma empresa familiar obteve muito êxito e cresceu de forma significativa nos últimos anos. Essa evolução foi tão exponencial que exigiu da organização uma reorganização de sua estrutura. Novos procedimentos e departamentos foram desenvolvidos para atender à realidade inédita da companhia, pois era comum que ocorressem falhas procedimentais constantes nesses setores. A empresa, nessa nova fase, vislumbra, em seu planejamento estratégico, uma abertura de capital para os próximos anos, de modo que possa ter ações negociadas na Bolsa de Valores. Para atender a esse planejamento, a empresa estruturará, já para o próximo exercício, um departamento responsável pela implementação da governança corporativa. Uma das tarefas desse novo setor será preparar o desenvolvimento de estratégias para a minimização de riscos, apresentando as principais medidas a serem adotadas por toda a organização. Entretanto, apesar de o planejamento estratégico indicar que essas ações serão realizadas, ainda não há um consenso entre sócios, marido, esposa e dois filhos sobre a real necessidade de práticas de governança corporativa na empresa, pois, na visão do marido e da esposa, tais atividades custariam caro e representariam algo redundante, visto que, para eles, a corporação já funcionava muito bem sem as novas medidas. Diante disso, tente responder aos seguintes questionamentos: • Como você poderia convencer os sócios da importância da instalação de práticas de governança corporativa na empresa? • Será que tais medidas realmente são ineficientes e custosas para a companhia? • Como as novas ações ajudariam a corporação a ter uma maior valorização em seu processo de abertura de capital? 49 Vamos lá? Bons estudos! CONCEITO-CHAVE Olá! Tudo bem? Vamos fazer um pequeno resumo da aula anterior? Na Seção 2.2, aprendemos que o conceito de governança corporativa se refere a um conjunto de boas práticas cujo principal objetivo é orientar o relacionamento comportamental interno e externo das empresas, sejam elas públicas ou privadas, de capital aberto ou fechado, na intenção de que atuem de forma ética, com a finalidade de trazer sustentabilidade e minimizar externalidades negativas. Tal comportamento interno e externo diz respeito à maneira de lidar com as partes interessadas, isto é, com as pessoas físicas e jurídicas que, de alguma forma, possuem algum tipo de interesse ou relacionamento com a organização e são capazes de gerar impactos tanto positivos quanto negativos sobre o valor da empresa. Já sabemos, também, que a governança corporativa pretende criar uma identidade corporativa para as empresas, as quais buscarão adequar os princípios de governança aos seus elementos organizacionais. Por isso, entendemos que os princípios de transparência (disclosure), equidade (equity), prestação de contas (accountability) e responsabilidade corporativa (compliance) são os pilares pelos quais uma corporação pode identificar e absorver as práticas de governança em sua estrutura organizacional. Discutimos sobre os três primeiros princípios de forma mais detalhada na seção de estudos anterior. Agora, daremos destaque ao princípio da responsabilidade corporativa, ou compliance. Tais práticas, especialmente o compliance, devem ser coerentes com a estruturasocietária, uma vez que a sua adoção resulta na criação de um ambiente de segurança jurídica e na confiança indispensável para uma boa tomada de decisão (CARVALHO et al., 2021). Muito além de representar uma tentativa de cumprir o interesse dos acionistas ou de atender a regulamentos legais, a prática do compliance parte de um compromisso efetivo da liderança organizacional, devendo estar alinhado com a estratégia da empresa. Como aprendemos anteriormente, os princípios de governança corporativa tiveram fundamental importância em diversos momentos da economia dos Estados Unidos, mas principalmente no início deste século, por conta das fraudes contábeis e crimes financeiros ocorridos no país. De igual modo, as práticas são recomendadas às empresas brasileiras para evitar o surgimento de atos criminosos contra o sistema financeiro nacional. REFLITA A efetuação de atos lesivos ao sistema financeiro nacional leva à produção de legislações em âmbito federal, além de recomendações desenvolvidas por órgãos de controle, como a Controladoria Geral da União (CGU) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), e por órgãos auxiliares, como o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Podemos citar alguns exemplos de legislações formuladas que servem ao propósito de orientar as práticas empresariais, a fim de dirimir a existência de crimes de natureza contábil-financeira-econômica. Alguns deles estão listados a seguir: BRASIL. Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 50 Brasília, DF: 2 ago. 2013. BRASIL. Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015. Regulamenta a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 19 mar. 2015. BRASIL. Controladoria-Geral da União. Programa de integridade: diretrizes para empresas privadas. Brasília, DF: CGU, 2015. CADE. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Guia para programas de compliance: orientações sobre estruturação e benefícios da adoção dos programas de compliance concorrencial. Brasília, DF: Cade, 2016. IAA. Instituto dos Auditores Internos do Brasil. Declaração de posicionamento do IIA: as três linhas de defesa no gerenciamento eficaz de riscos e controles. São Paulo: IIA Brasil, 2013. IBGC. Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Código das melhores práticas de governança corporativa. 5. ed. São Paulo: IBGC, 2015. Agora, faça a seguinte reflexão: Por que, mesmo com essa diversidade de dispositivos que recomendam padrões comportamentais éticos e o cumprimento às leis, além da existência de órgãos reguladores e fiscalizadores, ainda ocorrem tantos crimes contra o sistema financeiro, bem como práticas lesivas à imagem e ao valor de mercado das organizações? Como destacam Carvalho et al. (2021, p. 49), o compliance “integra um sistema complexo e organizado de procedimentos de controle de riscos e preservação de valores intangíveis”. Por essa razão, podemos traduzir o termo compliance como a concordância com aquilo que é ordenado, o que, no contexto empresarial, se enquadra na correta observação dos elementos que disciplinam a atividade legal e ética da organização frente às partes interessadas, como leis, decretos, etc. Entretanto, o compliance, no âmbito da governança corporativa, não trata de uma obediência impositiva aos regramentos apresentados nas legislações, mas sim do dever que as empresas têm de promover uma cultura que estimule, em todos os membros da organização, a ética e o exercício do objeto social em conformidade com a lei (ASSI, 2018; VERÍSSIMO, 2017). Por isso, podemos dizer que a governança corporativa e os programas de compliance estão intimamente relacionados, visto que implementar e manter essa cultura em uma empresa impacta o modo como as companhias são geridas e como as decisões de gestão são tomadas (CARVALHO et al., 2021). Para que possa ter uma aplicabilidade no domínio empresarial, o compliance precisa contar com uma área específica, como a auditoria interna, que, por meio de investimentos feitos pela alta administração, contará com uma estrutura formal capaz de desenvolver instrumentos de controle internos. Tais áreas contarão com o apoio de profissionais dos setores de contabilidade, jurídico, financeiro, além de outras esquipes em nível tático, para que, após a definição dos instrumentos de governança, torne-se possível a aplicação de treinamentos, a aquisição de instrumentos de tecnologia, entre outros recursos que viabilizem o acompanhamento 51 de irregularidades. A adoção dessas medidas é de extrema importância para a organização, pois a falta de tais dispositivos pode provocar a ausência de instrumentos internos anticorrupção, como manuais de orientação e conduta, além de políticas internas para o relacionamento entre a empresa e suas partes interessadas. Essa deficiência de materiais dá margem para a existência de conflitos de comportamento no quadro funcional, uma vez que o compliance tem em seu bojo o alicerce fundamental para nortear as boas práticas ligadas à responsabilidade ambiental e social, dentro e fora da organização (CARVALHO et al., 2021). ASSIMILE Os agentes de governança devem zelar pela viabilidade econômico-financeira das organizações a partir de práticas que pretendam reduzir externalidades negativas e aumentar as positivas (LANDRISCINA, 2020). O compliance, em nível empresarial, pode ser traduzido como o entendimento da responsabilidade corporativa dos agentes de governança. Tal responsabilidade se reflete na adoção, implementação, revisão e controle de políticas internas anticrimes e anticorrupção, medidas que devem ser utilizadas sem desconsiderar as demais recomendações de governança corporativa. Para que o compliance seja aplicado, ou seja, para que seja possível implementar um sistema ou programa de compliance nas empresas, sugere-se a realização de algumas práticas alinhadas aos elementos organizacionais das corporações, como missão, visão, objetivos e planejamento estratégico. Na instauração das atividades de compliance, é preciso verificar, também, o tamanho da empresa, se esta é de capital aberto ou fechado, entre outras informações, já que a adoção dessas medidas gera custos para a companhia. Dessa forma, entende-se que não é pertinente exigir que empresas de pequeno ou médio porte tenham estruturas complexas de prevenção de delitos, como fazem as organizações de grande porte (VERÍSSIMO, 2017). Ou seja, as medidas de prevenção de externalidades negativas e de otimização de práticas positivas devem ser mensuradas e adequadas ao porte e aos riscos apresentados pela realidade da empresa. Logo, para empresas de pequeno porte, o ideal é implementar práticas mais simples, e, para companhias de grande porte, medidas mais complexas (VERÍSSIMO, 2017). Outro ponto a ser considerado é que as práticas de compliance, quando associadas aos demais princípios de governança corporativa, devem estar alinhadas aos princípios e valores da empresa. Isso fará com que as medidas implementadas reflitam as políticas, procedimentos e normas internas da companhia, bem como as leis e os dispositivos regulatórios aos quais a organização está submetida em nível externo (IBGC, 2015). Durante a implementação de um programa de compliance, devemos considerar que tal procedimento trará conformidade para as atividades da empresa, de modo que os agentes de governança da corporação passarão a atuar com responsabilidade corporativa e, com isso, minimizarão os riscosde ocorrência de eventos que possam provocar perda de valor à companhia. Esse entendimento atende à recomendação do IBGC (2015), a qual destaca que os agentes de governança têm a responsabilidade de assegurar que toda a organização esteja em conformidade com suas diretrizes, de maneira que a efetividade desse processo constitui o programa de compliance. Tal incumbência diz respeito ao acompanhamento das ações realizadas pelos diversos agentes presentes na esfera empresarial, com o objetivo de verificar se as atividades desempenhadas por esses profissionais estão em harmonia com práticas que agreguem um valor positivo para a organização. Nesse sentido, uma das principais recomendações para que se obtenha êxito na 52 implantação do compliance é alinhar as práticas sugeridas com a alta gestão empresarial, na intenção de obter apoio desse setor. No conselho de administração de uma empresa de capital aberto, por exemplo, a partir do suporte do topo da cadeia de comando da corporação, as demais áreas ficarão mais receptivas à implementação e ao cumprimento das medidas. Ou seja, é importante que haja articulação e apoio de todos os setores da empresa, desde a alta gestão até os níveis médios e operacionais (MENDES; CARVALHO, 2017). Além do apoio da alta administração, outra ação indicada para o processo de instauração do compliance é o desenvolvimento de práticas relacionadas a gerenciamento de riscos, controles internos e adoção de sistemas de conformidades (IBGC, 2015). O gerenciamento de riscos, de acordo com Veríssimo (2017), perpassa por três pontos da estruturação: formulação de um plano de compliance; implementação do programa de compliance; e, por fim, consolidação e aperfeiçoamento do programa de compliance. Nesse mesmo contexto, Viol (2021) define que os elementos de compliance capazes de evitar a execução de atividades contrárias à legislação vigente passam pelas etapas de: 1. Formulação do plano de integridade (compliance). 2. Implementação dos instrumentos e mecanismos de integridade. 3. Formação de uma cultura de integridade. O Quadro 2.3, a seguir, resume o sistema de aplicação desses estágios. Quadro 2.3 | Aplicação da gestão de riscos para programa de compliance Etapa Etapa Atividades Formulação Identificar Definir Estruturar • Análise de riscos e valoração dos riscos. • Definição de medidas de prevenção, detecção, comunicação e dos valores da empresa. • Criação de uma estrutura de compliance. Implementação Informar Incentivar Organizar • Comunicação e detalhamento das especificações de compliance. • Promoção da observância do compliance. • Medidas organizacionais para a criação de processos de compliance. Consolidação e aperfeiçoamento Reagir Sancionar Aperfeiçoar • Estabelecimento de um processo para apuração de violações ao programa de compliance. • Instauração dos critérios para sanção das violações ao programa de compliance. • Avaliação continuada e aperfeiçoamento do programa. Fonte: adaptado de Veríssimo (2017) e Viol (2021). 53 Viol (2021, p. 83) reforça, ainda, que a aplicação desse programa “é formada por diversos elementos, os quais podem diferir de organização para organização”. A partir dessas etapas, a empresa pode elaborar uma matriz de gestão de riscos, considerando, por exemplo, fatores capazes de afetá-la, os quais podem ter origem no ambiente interno (endógeno) ou externo (exógeno) da corporação (IBGC, 2007). Tais fatores de risco podem ser classificados em: macroeconômicos, ambientais, sociais, tecnológicos e legais, quando originados do ambiente externo. Já quando surgem no ambiente interno, são categorizados em: financeiros, ambientais, sociais, tecnológicos e conformidade. Por fim, os riscos podem ter impacto sobre o compliance empresarial nos níveis estratégico, operacional ou financeiro. Cada risco identificado recebe uma nota, de acordo com o nível de gravidade que representa para a empresa. Os graus de riscos podem variar de 1 a 5, sendo que, no grau 1, o risco é classificado como muito baixo; no grau 2, como risco baixo; no grau 3, como risco moderado; no grau 4, como risco alto; e, no grau 5, como risco muito alto. Os graus de riscos são calculados com base na frequência com que determinado evento ocorre e nos efeitos que causará, caso realmente aconteça. EXEMPLIFICANDO Suponha que uma determinada empresa estivesse desenvolvendo o processo de mapeamento e gestão de riscos para fins de implementação de um programa de compliance e tenha verificado que um dos riscos refere-se ao assédio por parte de agentes externos, que oferecem vantagens financeiras em troca da formalização de contratos. Nesse caso, o risco identificado tem sua origem em um fator externo (exógeno), pelo fato de ser algo motivado por um agente externo, e pode ser classificado como de tipo legal, em virtude dos contratos envolvidos, os quais afetam a parte financeira e operacional da organização. A depender da frequência com que ocorrem as tratativas com agentes e do impacto que gerarão na empresa, caso aconteçam, os riscos podem receber, na escala de gravidade, notas de 1 a 5. A partir dessas métricas, é possível elaborar uma matriz de risco, cujo modelo pode ser verificado no Quadro 2.4, a seguir: Quadro 2.4 | Modelo de matriz de risco Descri ção do evento Orige m Tipo Área Probabil idade de ocorrênc ia Impa cto Grau de risco (probabil idade versus impacto) Ação a ser realizada Responsabi lidade Versão Descr ever o evento cujo risco está sendo mapea do. Endóg ena ou exóge na. Exógeno: macroecon ômico, ambiental, social, tecnológico e legal. Endógeno: financeiro, ambiental, Estraté gica, operaci onal ou finance ira. Peso 1 – Probabil idade muito baixa. Peso 2 – Probabil idade baixa. Peso 3 – Peso 1 – Impa cto muit o baix o. Peso 2 – 1 a 2 – risco muito baixo. 3 a 6 – risco moderad o. 8 a 12 – risco Risco baixo – Estratégi a: aceitar. Risco moderad o – Estratégi a: Descrever o responsáve l pelo evento. Descre ver qual a versão do docum ento. 54 social, tecnológico e conformida de. Probabil idade média. Peso 4 – Probabil idade alta. Peso 5 – Probabil idade muito alta. Impa cto baix o. Peso 3 – Impa cto médi o. Peso 4 – Impa cto alto. Peso 5 – Impa cto muit o alto. alto. 15 a 25 – risco muito alto. reduzir ou comparti lhar. Risco elevado e extremo – Estratégi a: evitar. Fonte: adaptado de IBGC (2007). A adoção desses procedimentos para a consolidação de um programa de compliance, além de trazer inúmeros benefícios a uma organização, uma vez que esta mitigará os riscos envolvidos nas operações e criará uma cultura pautada em valores éticos, também produz efeitos positivos por propiciar uma formalização mais efetiva dos procedimentos executados pelos funcionários da empresa. Tal formalização contribui para que haja um registro histórico das operações, o que permite o rastreamento e a identificação de atividades ilícitas realizadas no âmbito da corporação. Ou seja, conforme orientam Mendes e Carvalho (2017, p.142), “documentar, para além de garantir confiança e segurança, ajuda a preservar a memória institucional, o que efetivamente pode vir a auxiliar na gestão das atividades e resultar em ganhos de eficiência”. Os registros das operações a partir da documentação das atividades estabelecida pelo programa de compliance também pode resguardar a companhia, caso ocorram investigações por parte das autoridades públicas, como os poderes de polícia, o Ministério Público ou mesmo órgãos judiciários. O processo investigatório poderá contar com o apoio de um perito contábil, o qual estará apto paraatuar tanto pela acusação (perito de carreira das polícias federal e civil) quanto por parte do investigado (perito assistente ou assistente técnico) ou, ainda, quando for nomeado pelo juiz ou árbitro (perito do juízo), como aprendemos na Seção 2.1 desta unidade de aprendizagem. Dentre vários procedimentos técnico-científicos, o perito contábil, em seu processo de trabalho, poderá realizar a análise dos documentos da empresa, para contribuir com a elucidação dos fatos em investigação ou julgamento. Podem-se verificar documentos internos, como as movimentações em registros contábeis e financeiros da organização, além dos relatórios obrigatórios por lei, como o balanço patrimonial. A atuação do perito contábil, com base nos procedimentos técnico-científicos utilizados em seu processo de trabalho, também ajudará a evidenciar a responsabilidade objetiva e subjetiva relacionada ao crime em investigação ou julgamento, fazendo com que haja a 55 condição de responsabilizar os agentes envolvidos na prática criminosa. Assim, é possível proteger a instituição e o seu valor de mercado dentro dos limites da lei. A responsabilização objetiva se manifesta quando a empresa é responsabilizada pelos atos praticados por seus representantes e fornecedores (NEVES, 2018). Já a responsabilização subjetiva é observada quando há a responsabilização de dirigentes e administradores, a partir da evidência de que estes agiram com culpa ou dolo, na intenção de causar danos tanto à organização quanto aos demais envolvidos, como a Administração Pública (CARVALHO et al., 2021). Ou seja, a partir dos elementos encontrados pelo perito na apuração e investigação dos fatos delituosos praticados, as regras de compliance estabelecidas pela empresa podem ajudar o perito contábil a identificar os responsáveis pelas ações criminosas e a verificar se estas foram praticadas a mando da organização (responsabilidade objetiva) ou por um funcionário da corporação que negligenciou as regras estabelecidas pela governança corporativa em benefício próprio, especialmente no que diz respeito a diretrizes relativas ao compliance. Nesse último caso, não se pode atribuir a responsabilidade dos fatos à empresa, o que caracteriza uma responsabilidade subjetiva. Percebe-se no contexto da governança, sobretudo no compliance, que os controles internos, realizados com o apoio de departamentos como a auditoria interna, constituem um importante processo cuja adoção e prática devem ocorrer em todos os níveis da companhia, ou seja, desde a alta administração, perpassando pelos diretores e gerentes e consolidando-se nos funcionários de nível operacional. A integração do compliance com os demais princípios de governança corporativa tem como efeito positivo a promoção de atividades que auxiliam a empresa quanto à realização de seus objetivos específicos, definidos no planejamento estratégico da companhia, o qual, por sua vez, está alinhado com a missão, visão e valores da corporação. REFERÊNCIAS ASSI, M. Compliance: como implementar. São Paulo: Trevisan, 2018. Disponível em: https://bit.ly/3BwJnF1. Acesso em: 14 maio 2022. BRASIL. Controladoria-Geral da União. Programa de integridade: diretrizes para empresas privadas. Brasília, DF: CGU, 2015. Disponível em: https://bit.ly/3d0NKPz. Acesso em: 19 maio 2022. BRASIL. Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015. Regulamenta a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 19 mar. 2015. Disponível em: https://bit.ly/2B3KDzW. Acesso em: 26 maio 2022. BRASIL. Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 2 ago. 2013. Disponível em: https://bit.ly/3RYg2sq. Acesso em: 26 maio 2022. CADE. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Guia para programas de compliance: orientações sobre estruturação e benefícios da adoção dos programas de compliance concorrencial. Brasília, DF: Cade, 2016. Disponível em: https://bit.ly/3d5Uz25. Acesso em: 6 maio 2017. CARVALHO, A. C. et al. Manual de compliance. Rio de Janeiro: Forense, 2021. https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595450356/ https://www.gov.br/cgu/pt-br/centrais-de-%20conteudo/publicacoes/integridade/arquivos/programa-de-integridade-diretrizes-para-empresas-privadas.pdf http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/decreto/d8420.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm https://cdn.cade.gov.br/Portal/centrais-de-conteudo/publicacoes/guias-do-cade/guia-compliance-versao-oficial.pdf 56 Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559640898/. Acesso em: 14 maio 2022. IAA. Instituto dos Auditores Internos do Brasil. Declaração de posicionamento do IIA: as três linhas de defesa no gerenciamento eficaz de riscos e controles. São Paulo: IIA Brasil, 2013. 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Conheça os quatro princípios da governança corporativa. Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, 27 jan. 2020. Disponível em: https://www.ibgc.org.br/blog/principios-de-governanca-corporativa. Acesso em: 25 maio 2022. MENDES, F. S.; CARVALHO, V. M. de. Compliance: concorrência e combate à corrupção. São Paulo: Trevisan, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595450073/. Acesso em: 20 maio 2022. NEVES, E. C. Compliance empresarial: o tom da liderança: estrutura e benefícios do programa. São Paulo: Trevisan, 2018. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595450332/. Acesso em: 21 maio 2022. VERÍSSIMO, C. Compliance: incentivo à adoção de medidas anticorrupção. São Paulo: Saraiva, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547224011/. Acesso em: 14 maio 2022. VIOL, D. M. Programas de integridade e combate à corrupção: aspectos teóricos e empíricos da multiplicação do compliance anticorrupção no Brasil. São Paulo: Grupo Almedina (Portugal), 2021. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786556273815/. Acesso em: 20 maio 2022. SEM MEDO DE ERRAR Olá, estudante! Para que possamos resolver a situação-problema apresentada no início desta seção, em que os sócios de uma empresa (que pretende abrir o seu capital) não veem tanta utilidade e valor na adoção de práticas de compliance, dentro do contexto da https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdfhttps://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4656825/mod_resource/content/1/3.pdf https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547224011/ https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786556273815/ 57 governança corporativa, você poderá explicar aos sócios como a antiga estrutura organizacional pode expor a corporação a riscos financeiros e operacionais. Para isso, utilize pontos importantes identificados durante a análise de evolução da empresa. A corporação em questão apresenta o seguinte expediente organizacional: A gestão ainda é realizada de forma amadora e operacionalmente distante. Ou seja, não há interligação entre as atividades estratégicas, táticas e operacionais, o que resulta em decisões confusas e práticas que contradizem o que já se fazia historicamente na empresa. Outro problema identificado e que deverá ser resolvido a partir do compliance é a ausência de conhecimento técnico por parte dos sócios. Esse fato compromete a governança corporativa de forma bastante contundente e deverá ser resolvido com a implementação de um conselho de administração e a contratação de profissionais que apresentem expertise nos negócios praticados pela empresa. Como a corporação tem foco direcionado à expansão de suas atividades, utilizando como fontes de investimentos os bons resultados obtidos no passado e a possibilidade de abertura de capital na bolsa de valores, uma forma de conquistar a confiança do mercado, especialmente de futuros investidores, é por meio da adoção de uma estrutura empresarial mais profissional e com interligação entre as áreas, a qual se torna viável com a implementação de medidas de compliance. Como aprendemos ao longo desta seção de estudos, a temática da governança corporativa, sobretudo com relação ao compliance, vai além do cumprimento de regras, associando- se, também, à preservação de valores éticos e de sustentabilidade, o que permite a perpetuação do negócio e o atendimento aos interesses dos stakeholders (CARVALHO et al., 2021). Assim, com a adoção do compliance, as empresas evidenciam tanto no âmbito interno, a partir de práticas estruturadas de trabalho e com o apoio das áreas de todos os níveis empresariais, quanto em nível externo, por meio da demonstração empresarial de valores éticos, sociais e ambientais, que o cumprimento das práticas de compliance pode gerar benefícios às empresas e às partes interessadas. AVANÇANDO NA PRÁTICA COMPLIANCE, CONFORMIDADE E RISCOS Um grupo empresarial do ramo farmacêutico que possui ações em negociação na bolsa de valores passou a ter sua atenção voltada à manutenção de uma atividade empresarial pautada na ética, na responsabilidade social e na adequação à lei, uma vez que, durante a realização de uma operação da Polícia Federal, diversos diretores de uma companhia farmacêutica concorrente foram presos preventivamente por causa de delitos de ordem financeira, como lavagem de dinheiro e prática de caixa dois, para pagamento de propina a políticos e membros do Ministério da Saúde. Diante disso, o conselho de administração pediu ao departamento responsável pelo compliance da corporação que fizesse uma revisão dos riscos inerentes à atividade empresarial e que preparasse uma comunicação para todas as áreas da companhia, a fim de que os colaboradores dessem atenção não somente às práticas de compliance, mas também aos riscos inerentes às ações de cada departamento, visto que, caso a empresa também fosse alvo de uma operação policial, além de sofrer prejuízos financeiros, a imagem da organização e a confiança das partes interessadas seriam imensamente prejudicadas. Nesse sentido, qual a importância do 58 processo de revisão dos riscos e da posterior divulgação das normas de compliance para os diferentes setores da companhia? 59 UNIDADE 3, SESSÃO 1: REGISTROS CONTÁBEIS CONVITE AO ESTUDO A sociedade vem demonstrando uma crescente preocupação com a falta de valores éticos por parte das pessoas físicas e jurídicas, o que é resultado de um sistema econômico- financeiro baseado numa relação em que a busca pelo lucro leva aos mais diversos comportamentos antiéticos no ambiente profissional e empresarial. Forjar demonstrações contábeis para “melhorar” o desempenho financeiro e econômico de uma entidade, seja com a intenção de aumentar os ganhos dos investidores, impressionar acionistas ou beneficiar o mercado financeiro com bons resultados, aparece entre os maiores procedimentos antiéticos já relatados a partir da análise de grandes escândalos de fraudes financeiras, como o da Enron Corporation, que no ano de 2001 escondeu em seu balanço bilhões de dólares em dívidas. Uma forma de acabar com essas práticas antiéticas e minimizar seus impactos nocivos é por meio da atuação do profissional contábil, o qual deve ter um domínio cada vez maior sobre um conjunto de conhecimentos e técnicas que expressam a linguagem do negócio, além de exercer suas funções com ética e de acordo com as instruções normativas. Vale ressaltar, também, que o papel do contador é de extrema utilidade para o meio empresarial e vem passando por transformações numa crescente adaptação aos novos tempos, o que faz com que as habilidades desse profissional sejam testadas a todo momento. Conhecer e dominar os registros contábeis e entender como se elabora uma demonstração contábil em conformidade com as normas internacionais são aspectos tão necessários ao contador quanto seguir as normativas emanadas pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), dentre as quais se destaca o próprio Código de Ética Profissional do Contador (CEPC). PRATICAR PARA APRENDER A sociedade vem demonstrando uma crescente preocupação com a falta de valores éticos por parte das pessoas físicas e jurídicas, o que é resultado de um sistema econômico- financeiro baseado numa relação em que a busca pelo lucro leva aos mais diversos comportamentos antiéticos no ambiente profissional e empresarial. Forjar demonstrações contábeis para “melhorar” o desempenho financeiro e econômico de uma entidade, seja com a intenção de aumentar os ganhos dos investidores, impressionar acionistas ou beneficiar o mercado financeiro com bons resultados, aparece entre os maiores procedimentos antiéticos já relatados a partir da análise de grandes escândalos de fraudes financeiras, como o da Enron Corporation, que no ano de 2001 escondeu em seu balanço bilhões de dólares em dívidas. Uma forma de acabar com essas práticas antiéticas e minimizar seus impactos nocivos é por meio da atuação do profissional contábil, o qual deve ter um domínio cada vez maior sobre um conjunto de conhecimentos e técnicas que expressam a linguagem do negócio, além de exercer suas funções com ética e de acordo com as instruções normativas. Vale ressaltar, também, que o papel do contador é de extrema utilidade para o meio empresarial e vem passando por transformações numa crescente adaptação aos novos 60 tempos, o que faz com que as habilidades desse profissional sejam testadas a todo momento. Conhecer e dominar os registros contábeis e entender como se elabora uma demonstração contábil em conformidade com as normas internacionais são aspectos tão necessários ao contador quanto seguir as normativas emanadas pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), dentre as quais se destaca o próprio Código de Ética Profissional do Contador (CEPC). CONCEITO-CHAVE A finalidade principal da contabilidade é a de fornecer informações para que seus diversos usuários tomem suas respectivas decisões. Quanto mais detalhes forem apresentados em suas demonstrações, mais decisões assertivas poderão ser tomadas. De acordo com o Pronunciamento Técnico CPC 00, que está em sua segunda revisão, as informações concedidas precisam ser úteis e relevantes, ou seja, devem ser capazes de fazer a diferença nas decisões tomadas, além de retratar, de formafiel, em palavras e números, todas as movimentações financeiras da empresa que representam. É interessante lembrar que para que todo esse processo seja possível, os fenômenos financeiros empresariais devem ser escriturados de forma neutra, completa, isenta de erros, compreensível e no tempo certo. Mas o que é mesmo a escrituração e como ela é feita? Escrituração é o registro contábil de todos os atos e fatos administrativos e contábeis que acontecem dentro de uma empresa, tomando como base: as notas fiscais emitidas e recebidas das vendas de produtos e mercadorias e dos serviços prestados ou contratados; os contratos assinados com clientes, fornecedores e funcionários; os recibos emitidos e recebidos dos prestadores de serviços avulsos; os boletos que representam os pagamentos de obrigações e os recebimentos dos clientes; os cheques emitidos ou recebidos; os extratos bancários das diversas movimentações financeiras da empresa, inclusive dos seus investimentos; a folha de pagamento com as informações referentes aos valores a pagar aos seus funcionários; as guias dos tributos pagos aos governos federal, estadual e municipal (inclusive encargos trabalhistas); etc. Ufa! É muito papel que precisa ser analisado, checado, processado e transformado em informação útil. E, ao menor descuido, corre-se o risco de que a informação seja processada de maneira equivocada. Além disso, em alguns momentos o documento não é tão esclarecedor em relação ao que representa, e a empresa tem que correr atrás de mais informações. Essa escrituração sempre foi apresentada em papel, fazendo uso do livro diário: primeiro escriturado à mão e depois de modo informatizado. Mais recentemente, para fins de atendimento ao Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), algumas corporações passaram a ser obrigadas a apresentar a escrituração digitalmente. REFLITA Você consegue perceber que a fraude contábil pode ser iniciada neste momento? É possível que aconteça a omissão de registros contábeis, na qual alguns documentos são suprimidos ou inexistentes, como a venda efetuada sem o respaldo da nota fiscal; a utilização de documentos “frios”, recibos comprados que não representam absolutamente nada; os equívocos na aplicação das normas contábeis, como a contabilização em contas erradas, com valores incorretos; tributos calculados em desacordo com a legislação 61 tributária e fiscal; etc. Basta um errinho por parte do profissional contábil para iniciar o problema. A escrituração é a base das demonstrações contábeis, que deverão ser analisadas antes da tomada de decisão. De acordo com a Lei nº 6.404/76 e as alterações posteriores (Lei das Sociedades Anônimas), juntamente com a Instrução Normativa 59/86 da CMV, os seguintes documentos podem ser considerados como demonstrações obrigatórias para as S/As: Balanço Patrimonial (BP), Demonstração do Resultado do Exercício (DRE), Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL), Demonstração do Fluxo de Caixa (DFC), Demonstração do Valor Adicionado (DVA), Demonstração de Resultado Abrangente (DRA) e Notas Explicativas (NE), que devem estar em consonância com os padrões internacionais. Vamos ver o que cada uma das demonstrações evidencia? Balanço Patrimonial: é uma demonstração estática e sintética que exprime a situação financeira da empresa em determinada data. Seus fenômenos devem ser classificados e agrupados para facilitar o conhecimento do panorama financeiro da organização (liquidez, endividamento, capital de giro, necessidade de capital de giro, etc.). O balanço é como uma foto (estático) porque por meio dele não é possível observar a evolução dos fatos ao longo do ano, mas apenas o saldo final de um período. Esse relatório evidencia, também, o patrimônio de uma entidade tanto sob o aspecto quantitativo como qualitativo. Demonstração do Resultado do Exercício: é um relatório econômico-financeiro que mostra o resultado do exercício da empresa (lucro ou prejuízo), ou o seu desempenho, de forma dinâmica e vertical. Nesse documento são demonstradas as receitas que a corporação realizou (ganhas ou auferidas) e as despesas incorridas, respeitando sempre o princípio da competência, ou seja, independentemente dos recebimentos ou pagamentos. É importante ressaltar que a performance apresentada pela empresa serve como base para o acionista analisar o retorno do seu investimento. Tal informação se transforma num suporte para que ele adquira mais ações da companhia ou venda as que já possui. Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido: seu objetivo é apontar as movimentações que ocorrem no Patrimônio Líquido (PL) durante o exercício, principalmente identificando como se deu a formação de todas as reservas, e não apenas das originadas dos lucros. Por ser uma demonstração bem completa, serve de apoio para a gestão administrativa, econômica e financeira de uma empresa. Apesar de parecer uma demonstração simples e pequena, trata-se de uma importante ferramenta no combate à fraude. Demonstração do Fluxo de Caixa: evidencia as modificações que ocorrem no saldo da conta caixa e equivalentes de caixa num determinado período a partir dos fluxos de recebimentos e pagamentos que acontecem, auxiliando no planejamento financeiro. Vale destacar que equivalentes de caixa representam as aplicações financeiras de liquidez imediata, com vencimento de curtíssimo prazo (até três meses), mantidas na empresa para cumprir os compromissos imediatos. As atividades que são destacadas nessa demonstração são: Fluxo das Atividades Operacionais (FAO), que deriva das atividades geradoras de receitas da entidade; Fluxo das Atividades de Investimento (FAI), que deriva de aquisições e venda de ativos e outros investimentos; Fluxo das Atividades de Financiamento (FAF), que deriva das alterações no tamanho e na composição do PL e 62 dos empréstimos da entidade. Demonstração do Valor Adicionado: identifica o quanto de riqueza a empresa produziu (adicionou de valor) e de que forma ela foi distribuída entre os empregados, o governo, os acionistas, os financiadores de capital, além da quantia retida na corporação. Desse modo é possível mensurar a eficácia daquele negócio, entender como a companhia colabora com a sociedade de uma maneira geral, e, principalmente, verificar como seus recursos são divididos. Demonstração do Resultado Abrangente: o objetivo desta demonstração é evidenciar pontos não reconhecidos na DRE, que são os resultados abrangentes. São exemplos de resultados abrangentes os ajustes de reavaliação patrimonial, as variações da reserva de reavaliação, os ganhos e perdas atuariais em planos de pensão, os ganhos e perdas derivados da conversão de demonstrações de operação no exterior, entre outros fatores. Esse relatório deixa explícito para os investidores o que é patrimônio da empresa e o que é patrimônio dos sócios, constituindo-se como uma importante ferramenta de análise gerencial, pois atualiza o capital próprio dos sócios a partir daquelas receitas e despesas incorridas, porém de realizações incertas. Notas Explicativas: têm a finalidade de facilitar algumas interpretações que aparecem nas outras DC, na intenção de esclarecer alguns elementos, como: critérios utilizados pela empresa, composição de saldos de determinadas contas, métodos de depreciação, critérios de avaliação dos estoques, mecanismos de apuração de perdas estimadas e provisões, etc. As NE integram as DC e estão relacionadas a qualquer uma delas, evidenciando e dimensionando a qualidade e a quantidade das informações apresentadas, dando ênfase para as áreas que as empresas consideram mais importantes e relevantes. LEMBRE-SE Cada demonstração tem um objetivo, uma finalidade e atende a um grupo específico de usuários, de acordo com o interesse individual. Após o levantamento das DC, e antes da tomada de decisãopor parte dos usuários, os auditores entram em cena: eles são os grandes responsáveis por analisar todas as DC, verificando a exatidão e fidedignidade dos dados apresentados, além da qualidade das demonstrações, é claro. A partir da aplicação de técnicas e procedimentos específicos, a auditoria busca, também, realizar testes nos demonstrativos contábeis à procura de possíveis erros e fraudes. A história da auditoria no Brasil se inicia na colonização, diante da necessidade de um controle mais rígido nas finanças de um país recém-descoberto e que produzia, principalmente, para a exportação. Nessa época, o auditor ou ouvidor tinha a função de ser o elo entre o governo e a população. Na década de 1950 começaram a surgir os primeiros institutos de auditores no país, mas foi somente a partir da Lei nº 4.728/65 que ficou estabelecida a obrigatoriedade da prática da auditoria no Brasil. Atualmente a auditoria é uma profissão regulamentada e normatizada pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), o qual determina que o exercício da auditoria contábil, seja esta interna ou externa, é privativo dos bacharéis registrados no Conselho Regional de Contabilidade (CRC). O fato é que a auditoria exerce um papel fundamental quando o assunto é fraude contábil. Para Sá e Hoog (2005, p. 23), “conhecer como se praticam as fraudes é questão fundamental para um profissional de auditoria”. De acordo com a Norma Brasileira de 63 Contabilidade Técnica de Auditoria (NBC TA) 200 (R1), para que o auditor emita a sua opinião sobre o trabalho realizado, deve-se ter a razoável segurança de que as DC estejam livres de distorções relevantes, seja por erro ou fraude. Além disso, caso o auditor observe que os fatos contábeis não foram registrados adequadamente, seus procedimentos técnicos serão mais profundos e extensos, com o exame integral dos registros e controles patrimoniais e a aplicação dos testes de detalhes, os quais são divididos em: Inspeção: é a contagem física, exame de um ativo ou o exame de registros e documentos em forma de papel, eletrônicos ou disponibilizados em outras mídias, com o intuito de comprovar a fidedignidade e a autenticidade dos registros principais. Observação: é a constatação visual de erros, problemas ou deficiências e envolve os conhecimentos e a experiência profissional do auditor. Trata-se de um teste útil em todas as fases do exame, de modo que não pode ser omitido pelo profissional. Circularização ou investigação: é a obtenção de informações com terceiros sobre bens, direitos a receber e obrigações a pagar, inclusive causas judiciais. A solicitação pode ser feita por escrito, por meio eletrônico ou por outra mídia, e sua confirmação ou não indica se os registros contábeis estão corretos ou incorretos. Recálculos: é a técnica mais utilizada. Mesmo que os cálculos já tenham sido conferidos pelos funcionários das empresas, é importante que sejam revistos. Reexecução: neste caso, o auditor reexecuta procedimentos já executados pelas empresas. Indagações: são capazes de revelar erros e suas respostas podem ser obtidas de maneira formal ou informal (oral). Caso as indagações tenham que ser feitas à alta administração, é aconselhável que sejam mais formais. No entanto, o auditor não é o responsável pela prevenção de erros e fraudes: a administração da empresa, por intermédio de um sistema de controle interno, é que deve se responsabilizar por isso. Diferentemente da auditoria, a perícia contábil entra em cena quando existe a necessidade de uma investigação mais aprofundada em apenas uma parte das DC, seja por suspeita de fraude, sonegação fiscal, apropriações indébitas, problemas de corrupção, evasão de divisas, etc. Uma vez que o objetivo da perícia contábil é buscar e apresentar a verdade sobre os fatos analisados, esse conjunto de procedimentos técnicos, ao longo do tempo, passou a ser um importante instrumento contra a corrupção, auxiliando no combate aos crimes contábeis. O perito contador pode atuar tanto na esfera judicial, cooperando com os juízes em suas tomadas de decisão, quanto na esfera extrajudicial, levando informações úteis aos vários envolvidos no processo investigatório. A perícia contábil também conta com alguns procedimentos técnicos durante o seu trabalho. São eles: Exame: é o processo de análise de toda a documentação, inclusive de livros, pertinentes ao caso. Trata-se do procedimento mais importante na execução de uma perícia contábil, uma vez que documentos são a principal matéria-prima. 64 Vistoria: é a verificação física que constata um fato ou uma situação. Nesse caso, o perito deve ir ao local para observar de perto o que realmente está acontecendo. Indagação: entrevista que o perito pode realizar durante o seu trabalho, em busca de esclarecimentos mais abrangentes. As entrevistas são feitas com as pessoas envolvidas no caso ou com aquelas que conhecem melhor todos os fatos. Investigação: é o processo de buscar fatos que estão ocultos ou que não foram apresentados, seja por erro ou fraude. Vale ressaltar que erro é o ato não intencional, como um esquecimento, por exemplo. A fraude já demanda uma intenção. Nesse último caso, as informações podem ter sido excluídas de propósito, com a finalidade de dificultar o trabalho pericial, por exemplo. Arbitramento: o termo arbitrar significa “propor meios”, ou seja, apresentar soluções ou valores por intermédio de critério técnico-científico. Mensuração: mensurar significa “medir”, via de regra, aquilo que pode ser medido. Nesse contexto, o perito utiliza as suas técnicas para apresentar quantificações e qualificações de todos os componentes patrimoniais. Avaliação: neste procedimento o perito estabelece o valor das coisas, bem como dos elementos patrimoniais. Certificação: técnica em que o perito atesta toda e qualquer informação que foi utilizada na elaboração do seu relatório. O perito tem fé pública, que é a autenticação da verdade. Testabilidade: este último procedimento foi incorporado à NBC TP 01 na sua primeira revisão, em 2015, e representa a verificação de todos os elementos probantes (provas) em confronto com os métodos aplicados no trabalho, trazendo uma maior confiabilidade técnica à análise. Dessa forma, podemos observar que a auditoria e a perícia são igualmente importantes para a sociedade como um todo, principalmente quando o assunto discutido é a inibição de fraudes. Contudo, cada uma dessas ações tem o seu papel, em conformidade com os objetivos propostos. Enquanto a perícia busca elucidar os fatos e trazer a verdade à tona, a auditoria trabalha mais com a revisão, principalmente das DC, indicando diretrizes para o cumprimento de normas ou sugerindo melhorias nos controles internos. ASSIMILE O exercício do perito é bastante abrangente e, por vezes, pode ser confundido com a tarefa do auditor. Devemos sempre nos lembrar de que a perícia analisa 100% de todo o material que for apresentado e não trabalha com amostragem, como a auditoria. Somente dessa maneira a verdade poderá ser exibida, sem suposições ou achismos. E por falar em controle interno (já repetimos muito essas duas palavrinhas, não é mesmo?), o que é esse mecanismo e como pode auxiliar no controle dos erros e no combate a fraudes? Toda empresa tem riscos, isto é, situações que podem ocorrer, seja por um evento em particular ou por uma série de acontecimentos, e que afetam os objetivos e metas 65 estabelecidos. Gerenciar esses riscos e aumentar a probabilidade de sucesso faz parte da área de “controles internos”. Na verdade, controles internos são ações ou medidas que a empresa desenvolve para gerenciar seus riscos, como: a implantação de políticas internas, a incorporação de novos procedimentos ou de novas atividades/mecanismos desenvolvidas justamente para assegurar a prevençãocontra eventos indesejáveis ou a detecção e correção desses fatos. Nesse sentido, os controles podem ter natureza preventiva, detectiva, corretiva ou diretiva e nada mais são do que métodos de fiscalização instaurados dentro de uma corporação, com o intuito de combater os fatores de riscos. EXEMPLIFICANDO São exemplos de fatores de riscos com os quais as empresas devem se preocupar: Fatores econômicos: mercado financeiro, competição, desemprego, fusões e aquisições, etc. Meio ambiente: emissão de poluentes, desastres naturais, etc. Políticos: legislação, órgãos reguladores, etc. Sociais: privacidade, terrorismo, vandalismo, etc. Tecnológicos: comércio eletrônico, dados externos, crimes cibernéticos, integridade dos dados, manutenção, etc. Infraestrutura: disponibilidade e acesso aos ativos da empresa, etc. Pessoal: capacidade dos funcionários, fraudes, saúde e segurança, etc. Processos: desenho, execução, capacidade, etc. Dependendo da estratégia de riscos que adote, a empresa pode até aceitá-los, conforme o seu grau de tolerância, ou tentar transferi-los, com a contratação de um seguro, por exemplo, mas sua principal intenção deve ser controlá-los e reduzi-los ao máximo. Vamos mais uma vez dirigir nossa atenção aos controles internos e aos métodos de fiscalização de uma empresa para entender um pouco mais sobre um assunto muito instigante, mas direcionado ao nosso tema principal: as fraudes! De acordo com a probabilidade de detecção de uma fraude, o processo de investigação sempre será iniciado a partir da alegação de um ato desonesto. Essa alegação pode ser detectada por meio de uma denúncia, de uma revisão gerencial, de uma auditoria interna, de uma identificação acidental, de uma reconciliação contábil ou de uma auditoria externa. Devemos nos lembrar de que cada alegação tem as suas particularidades, e a empresa deve definir seus processos investigativos levando em consideração tais aspectos específicos. Além disso, à medida que a investigação avança, novos procedimentos são incorporados ou ajustados. As investigações obedecem aos seguintes passos: 1. Análise da alegação da fraude e identificação de quem conduzirá a investigação (comitê de compliance, por exemplo). 2. Planejamento e organização da investigação, com a apresentação dos fatos que serão investigados, bem como dos períodos e prazos para a conclusão do trabalho. 3. Coleta de informações e evidências relevantes, além da preservação dos documentos necessários para a condução da investigação. 4. Revisão dos documentos, uma vez que a investigação pode contar com um número expressivo de documentos analisados. 66 5. Condução de entrevistas, não necessariamente com pessoas envolvidas na alegação de fraude, mas também com indivíduos que talvez tenham informações relevantes, as quais possam ser aproveitadas. 6. Análise financeira, que, caso realmente seja necessária, deverá ser profunda e exaustiva, a fim de evitar especulações e generalizações. 7. Reporte dos resultados e das recomendações, no qual o relatório da investigação será apresentado e as recomendações, identificadas. Isso evita que o problema se torne recorrente. 8. Remediação e acompanhamento, quando a empresa tomará medidas para sanar o problema em questão e impedir que o fato aconteça novamente. Esse processo deverá ser revisado sempre que novas informações forem aparecendo. Além disso, a cada problema, um novo processo precisará ser aberto e investigado. DICA Que tal aprofundar seus conhecimentos sobre o maior escândalo financeiro da história do mundo: o caso Enron? Para isso, faça a leitura do texto indicado a seguir, cujo link de acesso está disponível nas Referências desta seção. SOLÉ, A. Dez anos de Enron: importância e deficiências. Governança Já, 16 ago. 2011. E aqui finalizamos esta seção de estudos! Os temas que acabamos de analisar são muito interessantes, pois enquanto houver relações humanas e interpessoais, conflitos continuarão existindo. É da natureza humana! E isso nos remete a todos os problemas empresariais que acometem as entidades no mundo inteiro, bem como seus funcionários, clientes, fornecedores, parceiros, etc. A fraude pode começar com a sonegação de uma simples informação, só para que o colega não tenha uma vantagem competitiva. Mas, com o passar do tempo, o problema pode se tornar muito mais sério. REFERÊNCIAS BRASIL. Comissão de Valores Mobiliários. Instrução CVM nº 59, de 22 de dezembro de 1986. Dispõe sobre a obrigatoriedade de elaboração e publicação da demonstração das mutações do patrimônio líquido pelas companhias abertas. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 30 dez. 1986. Disponível em: https://bit.ly/3xfuNPR. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade – NBC PG 01, de 7 de fevereiro de 2019. Aprova a NBC PG 01 – Código de Ética Profissional do Contador. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 14 fev. 2019. Disponível em: https://bit.ly/3U4Cty0. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade – NBC TA 200 (R1): objetivos gerais do auditor independente e a condução da auditoria em conformidade com normas de auditoria. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 5 set. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3By7HXl. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade – NBC TP 01 (R1): perícia contábil, de 27 de fevereiro de 2015. Dá nova redação à NBC TP 01 – Perícia Contábil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 19 mar. 2015. Disponível em: https://bit.ly/2kXUT4l. Acesso em: 18 mar. https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/instrucoes/inst059.html https://www2.cfc.org.br/sisweb/sre/detalhes_sre.aspx?%20Codigo=2019/NBCPG01&arquivo=NBCPG01.doc https://www2.cfc.org.br/sisweb/sre/detalhes_sre.aspx?Codigo=2016/NBCTA200(R1) http://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/NBCTP01.pdf 67 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Resolução CFC nº 803, de 10 de outubro de 1996. Aprova o Código de Ética Profissional do Contabilista – CEPC. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 20 nov. 1996. Disponível em: https://bit.ly/3RUriWR. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965. Disciplina o mercado de capitais e estabelece medidas para o seu desenvolvimento. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 16 jul. 1965. Disponível em: https://bit.ly/3eAByFj. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 17 dez. 1976. Disponível em: https://bit.ly/2UqQCGG. Acesso em: 18 mar. 2022. CPC. Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Pronunciamento técnico CPC 00 (R2): estrutura conceitual para relatório financeiro. Brasília, DF: CPC, 2019. Disponível em: https://bit.ly/2x9wlvM. Acesso em: 18 mar. 2022. SÁ. A. L. de; HOOG, W. A. Z. Corrupção, fraude e contabilidade. Curitiba: Juruá, 2005. SOLÉ, A. Dez anos de Enron: importância e deficiências. Governança Já, 16 ago. 2011. Disponível em: https://bit.ly/3d3GbaC. Acesso em: 18 mar. 2022. SEM MEDO DE ERRAR O tipo de impasse descrito na situação-problema apresenta no início desta etapa de aprendizagem, isto é, ter que alterar registros contábeis para atender a algum cliente insatisfeito, é mais comum do que parece à primeira vista. Para resolver o caso, é importante lembrar que o seu gestor aceitou fazer a alteração, já que se trata de um cliente responsável por quase 10% do faturamento mensal do escritório em que você trabalha. Com medo de perder o cliente e ter que demitir alguns funcionários posteriormente por problemas financeiros, ele pede que você modifique as DC. Mas você se sente confortável com esse pedido? O tipo de fraude associado ao contexto do caso se parece muito com outro que costumamos encontrar nos meios empresariais:forjar um contracheque (holerite) para aumentar as chances de se conseguir um empréstimo bancário ou um financiamento. Você já viu isso acontecer? Em 7 de fevereiro de 2019, o CFC aprovou a alteração do Código de Ética Profissional do Contador (CEPC) com a publicação da NBC PG 01. O CEPC tem como objetivo fixar a conduta do contador em relação ao exercício de sua atividade e a demais aspectos que se relacionem ao seu trabalho, aos seus colegas e à classe contábil como um todo. Logo no início dos escritos dessa norma, especificamente no item 4, encontramos algumas informações sobre os deveres do contador, dentre os quais se destaca o de “(a) exercer a sua profissão com zelo, diligência, honestidade e capacidade técnica” (BRASIL, 2019, p. 1). Sem querer entrar no mérito do que é ser honesto ou não, o fato é que o profissional, durante o seu trabalho, deve respeitar as Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC) e a legislação vigente. Mais adiante, no item 5, encontramos algumas vedações, dentre elas a de “(g) concorrer [...] para a realização de ato contrário à legislação ou destinado a fraudá-la” (BRASIL, 2019, p. 1). A transgressão ao CEPC constitui infração ética, pela qual será aplicada uma das seguintes penalidades: (a) advertência reservada; (b) censura reservada; ou (c) censura pública. Dependendo da gravidade, o profissional de contabilidade pode até ficar https://www2.cfc.org.br/sisweb/sre/detalhes_sre.aspx?codigo=1996/000803 https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=LEI&numero=4728&ano=1965&ato=bbcITWq1UeZRVT68b http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80 https://governancaja.com.br/dez-anos-de-enron-importancia-e-deficiencias/ 68 impedido de realizar o seu trabalho. Essas informações, por si só, já são motivos suficientes para que recusemos a incumbência recebida em nosso trabalho? Espero que sim. E para quem ainda quer saber como ficarão os funcionários do escritório: não há como deduzir o que acontecerá caso o cliente decida mesmo desfazer a parceria, tampouco se o escritório realmente ficará numa situação tão delicada financeiramente a ponto de ter que demitir alguns de seus colaboradores. Talvez com uma boa conversa e uma breve explicação sobre o que é ter independência profissional o próprio cliente compreenda que fraude, seja qual for sua gravidade, ainda é fraude. Além disso, um problema ainda mais sério poderá ocorrer caso as alterações sejam feitas não por você, mas por outro funcionário que “veste a camisa” da empresa sem pensar nas consequências: a fraude correrá o risco de ser descoberta, seja por uma denúncia ou pelo próprio órgão que fez a licitação da qual a corporação participou. Se isso acontecer, todos serão punidos criminalmente: seu gestor, o funcionário e o proprietário da empresa. E o escritório, como ficará nessa situação? Portanto, todo cuidado é pouco quando o assunto se refere à contabilidade. AVANÇANDO NA PRÁTICA APLICAÇÃO DE PROCEDIMENTOS TÉCNICOS NUMA PERÍCIA CONTÁBIL Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você seja um perito contador e tenha sido contratado por um colégio particular que oferece as modalidades de ensino fundamental e médio para realizar uma perícia contábil extrajudicial. Em sua primeira reunião, a equipe do colégio relatou que assumiu a administração da instituição há pouco tempo e tinha muitas dúvidas sobre as demonstrações contábeis que foram apresentadas pelo antigo contador naquele ano. A principal delas se referia ao valor do prejuízo acumulado que aparecia no BP, no valor de R$ 1.000.000,00, sendo que o faturamento da empresa girava em torno de R$ 100.000,00/mês. Você concordou em realizar o trabalho, mas, antes de mais nada, precisa identificar qual procedimento técnico pericial adotará (descreva se utilizará mais de um) e, principalmente, quais documentos deverá examinar para efetuar a perícia. 69 UNIDADE 3, SESSÃO 2: FRAUDES CONTÁBEIS PRATICAR PARA APRENDER Todo profissional, contador ou não, poderá se deparar em algum momento de sua carreira com dilemas éticos que exigirão dele alguma decisão imediata. Essa escolha, dependendo da maneira como tais problemas forem conduzidos, possivelmente terá impactos positivos ou negativos no seu futuro profissional. Os dilemas podem ter início na forma de um assédio, por exemplo, como uma perseguição inconveniente para que um determinado profissional faça algo contra a sua vontade, passe por um processo de corrupção, com finalidade de interesse próprio, submeta-se ao uso de informações confidenciais e até mesmo a uma apropriação indevida. Além disso, um contador pode agir de modo ilegal para manter um cliente em sua carteira e continuar recebendo os seus honorários de forma regular. Um empresário, por sua vez, pode omitir receitas para se manter num enquadramento tributário mais favorável, ou “esconder” alguma atividade desenvolvida pela empresa para pagar menos impostos, ou até mesmo utilizar sócios que não são realmente sócios, mas que são mais “adequados” ao âmbito empresarial. Para isso, acaba contratando um profissional contábil que “feche os olhos” e “não faça muitas perguntas”. Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você esteja legalizando uma empresa e o seu cliente diz que o capital social da nova sociedade será “fictício”, uma vez que ele não tem o dinheiro necessário para integralizar o capital agora. Você, então, sugere que ele diminua o valor do capital social até alcançar uma quantia mais adequada às suas condições financeiras, mas o cliente alega que precisa de um capital social bem alto para que seu gerente bancário lhe conceda um empréstimo. Além disso, afirma que sem esse empréstimo ele não conseguirá comprar as máquinas tão necessárias ao seu negócio, ou seja, o empreendimento estará fadado ao fracasso. Observe que dilemas éticos e fraudes contábeis caminham juntos e merecem ser analisados com bastante cuidado. Então, vamos lá! Reflita sobre o caso com carinho e tome a sua decisão. CONCEITO-CHAVE Fraude é qualquer ato intencional que tenha o propósito de conseguir vantagem sobre algo que a pessoa não tenha direito. A fraude pode se dar por uma ação ou por uma omissão deliberada, e a sua intenção (o dolo) é o que a distingue de um erro. Todos nós estamos sujeitos a fraudes dentro de uma empresa, as quais podem ser cometidas por empregados, por terceiros (fornecedores, clientes, prestadores de serviços) ou por empregados e terceiros em conluio. As fraudes que os funcionários de uma companhia cometem em detrimento da organização são chamadas de fraudes ocupacionais e podem ser classificadas em: 1. Corrupção: podemos citar como exemplos os conflitos de interesses público e privado; o recebimento de propinas ou de gratificações ilegais; a falsa cotação em licitação para favorecer outra empresa, etc. 2. Apropriação indébita de ativos: o furto de dinheiro (caixa, bancos); o roubo de produtos/mercadorias estocadas; o roubo de itens do ativo imobilizado; a criação de fornecedores fictícios para gerar uma saída de recursos financeiros da empresa; a fraude na folha de pagamento, que também gera uma saída de dinheiro da 70 empresa; a fraude com reembolso de despesas, em que o gasto foi menor do que a quantia apresentada em documentos; e, de forma mais recente, passamos a conviver com o roubo de dados. 3. Falsificação de informações: a falsificação de dados num documento; a omissão no detalhamento de alguns dados; os lançamentos sem documentos que os suportem; o gerenciamento de resultados feitos com dados fictícios, etc. Podemos dizer que os crimes virtuais sempre existiram, mas, com o aumento dos cibernegócios, acabaram se intensificando dentro das empresas. ASSIMILE De acordo com a KPMG (2021), as iniciativas virtuais mais utilizadas pelofraudador são as seguintes: • Acesso indevido de sistemas, em 50% das fraudes. • Criação de informações falsas, em 48% das ações. • Compartilhamento de login ou senhas, em 39% dos delitos. • Invasão de sistemas, realizada em 11% dos casos. Ainda segundo uma pesquisa realizada pela KPMG (2021, p. 8), 43% das pessoas cometem fraude por estar em relacionamentos atípicos com outros indivíduos, promovendo acordos que favorecem a todos; 36% por adotar um estilo de vida incompatível com os seus ganhos; e 25% por estar em situação de dificuldades financeiras. REFLITA De acordo com a KPMG (2021), o perfil do fraudador (em geral) tem as seguintes características: • 73% têm entre 26 e 45 anos de idade. • 68% agem em conluio com outro indivíduo. • 80% são homens, 20%, mulheres. • 45% trabalham na empresa vítima por um período de um a quatro anos, e 34%, por mais de seis anos. Mas o que exatamente são fraudes e como identificá-las no contexto contábil? Antes de iniciar esse assunto, precisamos discutir sobre os motivos pelos quais um profissional contábil aceita participar de processos fraudulentos. É importante, também, entendermos que se assim o faz, é porque encontra anuência entre outros profissionais da sua rede de relacionamentos, como empresários, funcionários de órgãos públicos e/ou outras pessoas que concordam com tais práticas. Funcionários de alguns órgãos públicos podem concordar em não fiscalizar uma empresa em troca de favores e/ou comissões, autorizar o funcionamento de uma organização em local não tão próprio e até mesmo “passar por cima” de erros contábeis e fiscais. ASSIMILE A lei anticorrupção de 2013 prevê uma série de punições para empresas que infringirem os princípios contábeis brasileiros. Algumas das penalidades são: 71 • Multa de até 20% no valor de faturamento da empresa. • Devolução do valor obtido com a fraude. • Suspensão das atividades da empresa. • Fechamento da empresa. • Proibição de receber incentivos fiscais, doações ou empréstimos de órgãos públicos. Dentro da esfera contábil, podemos encontrar inúmeros tipos de fraudes. Algumas são facilmente identificadas, outras nem tanto. Forjar demonstrações contábeis para “melhorar” o desempenho financeiro e econômico de uma entidade, seja para aumentar os ganhos dos investidores, impressionar acionistas ou beneficiar o mercado financeiro com bons resultados, aparece entre as ocorrências de fraudes já relatadas a partir da análise de grandes escândalos. Mas algumas fraudes são tão simples, que passam despercebidas no dia a dia profissional. Vejamos, a seguir, algumas delas! MANIPULAÇÃO, FALSIFICAÇÃO OU ALTERAÇÃO DE REGISTROS OU DOCUMENTOS, DE MODO A MODIFICAR OS REGISTROS DE ATIVOS, PASSIVOS E RESULTADOS A função de um documento, seja ele público ou particular, é garantir que uma informação se torne eterna, além de servir como meio de prova em caso de necessidade. Independentemente do seu formato, adulterar ou falsificar um ofício, seja por supressão, troca de determinadas informações, criação ou inserção de declaração contrária à verdadeira, além de constituir uma fraude, também é considerado um crime, com pena de reclusão para os envolvidos. No âmbito da contabilidade podemos encontrar diversas manipulações, por exemplo: alterar procurações com o intuito de mudar datas e mascarar a validade do documento; inserir informações falsas sobre o perfil empresarial em contratos sociais de constituição de empresas; omitir dados de funcionários em folha de pagamento; inserir quantidades e valores em notas fiscais que não correspondam à mercadoria vendida; transmitir e assinar SPED contábil e fiscal contendo informações inverídicas; emitir Decore com valores que não condizem com a realidade; fazer declaração falsa sobre o faturamento da empresa; emitir recibo de pró-labore diferente do real; entre muitas outras adulterações. FURTO OU APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE ATIVOS Trata-se de uma fraude que abrange desde sócios que não seguem o princípio da entidade, retirando numerários do caixa e equivalentes de caixa sob o pretexto de que a empresa pertence a eles e, por isso, podem fazer o que quiser, até funcionários que, seguindo o exemplo de seus dirigentes e encontrando facilidade nos controles internos, subtraem dinheiro e mercadorias em estoque ou itens do imobilizado, etc. Normalmente em conluio, funcionários de diversos departamentos podem se juntar (para que o processo de apropriação indébita passe despercebido) e, ao final, dividir entre todos os envolvidos os bens subtraídos da companhia. 72 SUPRESSÃO OU OMISSÃO DE TRANSAÇÕES NOS REGISTROS CONTÁBEIS Neste tipo de fraude podemos encontrar distorções deliberadas, omissões de fatos ou divulgações de demonstrações financeiras com a intenção de provocar engano a seus usuários, especialmente os investidores e credores, mudando as informações relevantes nos relatórios financeiros da organização. Os métodos mais comuns envolvem a ocultação de passivos e de despesas, a sonegação da emissão de uma nota fiscal, ou seja, a venda de produtos, mercadorias ou serviços sem nota fiscal, fato que provocará, também, a redução no lucro tributável. Dentro do patrimônio líquido encontraremos valores irreais na integralização (formação) do capital social sem um lastro efetivo, o que prejudicará credores e terceiros. REGISTRO DE TRANSAÇÕES SEM COMPROVAÇÃO O caso mais comum é a utilização, pela empresa, de notas fiscais e/ou outros documentos não verídicos (frios) para justificar um lucro tributável menor (reduzindo a base de cálculo para apuração do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) ou para justificar saldos de caixa diferentes do real. Podemos citar como exemplos a contabilização de despesas que não se realizaram ou que até se realizaram, mas não pela empresa, e, por isso, não têm validade para a contabilidade da entidade; a contabilização de movimentações financeiras sem extratos bancários; a compra de imobilizado sem a apresentação das notas fiscais; o lançamento de empréstimos e/ou parcelamentos sem os contratos de formalização, etc. APLICAÇÃO DE PRÁTICAS CONTÁBEIS INDEVIDAS Práticas contábeis são aquelas adotadas por uma empresa na elaboração e apresentação das demonstrações contábeis, baseadas nas normas contábeis brasileiras e internacionais, nos procedimentos técnicos adotados e nas convenções. Seja por desconhecimento ou por ação deliberada, utilizar práticas contábeis de forma equivocada, com a intenção de modificar o resultado e o patrimônio da empresa, em proveito próprio ou de terceiros, constitui uma fraude contábil. Nesse contexto, podemos dizer que a conduta da ética se inicia na faculdade, a partir da disciplina Ética profissional. A partir de então, o exercício da integridade do contador deverá ser diário, tendo sempre como base o Código de Ética Profissional do Contabilista (CEPC), que precisará ser utilizado durante toda a carreira do profissional, já que será responsável por informar a verdadeira situação financeira das empresas. Dentre alguns deveres, podemos destacar dois principais: a. Exercer a profissão com zelo, diligência, honestidade e capacidade técnica, observando as Normas Brasileiras de Contabilidade e a legislação vigente, resguardando o interesse público, bem como os interesses de seus clientes ou empregadores, sem prejuízo da dignidade e independência profissionais. b. Comunicar, desde cedo, ao cliente ou ao empregador, em documento reservado, eventual circunstância adversa que possa gerar riscos e ameaças ou influir sobre a decisão daqueles que são usuários dos relatórios e serviços contábeis como um todo.2 73 EXEMPLIFICANDO O CEPC fixa a norma de conduta do contador, quando no exercício da sua atividade e nos assuntos relacionados à profissão e à classe, e está divididoem: 1. Deveres, vedações e permissibilidades. 2. Valor e publicidade dos serviços profissionais. 3. Deveres em relação aos colegas e à classe. 4. Penalidades. Analisando a seção 4 do CEPC, podemos identificar três tipos de penalidades que incidem sobre as transgressões do contador, segundo a gravidade do ato praticado: a. Advertência reservada. b. Censura reservada. c. Censura pública. O CEPC considera alguns atenuantes na aplicação dessas penalidades, como: “I – ação desenvolvida em defesa de prerrogativa profissional; II – ausência de punição ética anterior; III – prestação de relevantes serviços à Contabilidade” (BRASIL, 2019, p. 5). Por outro lado, o documento menciona os fatos considerados agravantes, como: “I – ação cometida que resulte em ato que denigra publicamente a imagem do Profissional da Contabilidade; II – punição ética anterior transitada em julgado” (BRASIL, 2019, p. 5). Em 2017 o CFC aprovou a Resolução nº 1.525/2017, que dispõe sobre a punição aos profissionais de contabilidade envolvidos em irregularidades, como fraudes e escândalos de corrupção, a qual estabelece que “a punibilidade dos autuados pelos Conselhos de Contabilidade prescreve em cinco anos, contados da data de verificação do fato respectivo” (BRASIL, 2017, [s. p.]). Isso significa que o prazo de cinco anos só passará a ser contado a partir do momento em que o Sistema CFC/CRCs receber a denúncia ou comunicação oficial de órgãos da Justiça sobre o caso. Antes, o prazo de prescrição se encerrava em cinco anos contados da data de ocorrência do fato. Vários outros dispositivos legais estabelecem regras e punições sobre as fraudes contábeis, as quais devem ser do conhecimento do contador. Vejamos, a seguir, alguns deles. CÓDIGO CIVIL – LEI Nº 10.406/2002 A responsabilidade contratual e civil do contabilista, por atos culposos ou dolosos, foi instituída de forma clara no Código Civil em vigor. De acordo com o parágrafo único do art. 1.177 desse dispositivo legal civil, “no exercício de suas funções, os prepostos são pessoalmente responsáveis, perante os preponentes, pelos atos culposos; e perante terceiros, solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos” (BRASIL, 2002, [s. p.]). Em outras palavras, são atos culposos: a imprudência, negligência ou imperícia. Não há má-fé. O resultado é diferente do esperado, prejudicando terceiros. O contador (preposto) responde perante o cliente (preponente), e este, perante terceiros. São atos dolosos aqueles praticados propositalmente, esperando-se um resultado. O contador (preposto) responde juntamente com o seu cliente (preponente) perante terceiros – isto é, Justiça e outras entidades. 74 CÓDIGO PENAL – DECRETO-LEI Nº 2.848/1940 O contador, em caso de dolo, pode responder a partir dos seguintes artigos: Art. 168 – Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção. Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa. Aumento de pena § 1º – A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa: III – em razão de ofício, emprego ou profissão. Art. 168-A – Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional. Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa. § 1 – Nas mesmas penas incorre quem deixar de: I – Recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público. II – Recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços. III - Pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social. Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa. Art. 172 – Emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado. Pena – detenção, de dois a quatro anos, e multa. Parágrafo único – Nas mesmas penas incorrerá aquele que falsificar ou adulterar a escrituração do Livro de Registro de Duplicatas Art. 298 – Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro. Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa. Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular. Art. 304 – Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302. Pena – a cominada à falsificação ou à alteração. Art. 305 – Destruir, suprimir ou ocultar, em benefício próprio ou de outrem, ou em prejuízo alheio, documento público ou particular verdadeiro, de que não podia dispor. Pena – reclusão de dois a seis anos, e multa, se o documento é público, e, reclusão de um a cinco anos, e multa, se o documento é particular. Art. 342 – Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral. Pena – reclusão, de dois a quatro anos, e multa. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – LEI Nº 8.078/1990 Art. 14 – O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à 75 prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Art. 66 – Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou emitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços. Pena – Detenção de três meses a um ano, e multa. CRIMES FALIMENTARES – LEI Nº 11.101/2005 Art. 168 – Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem. Pena – Reclusão de três a seis anos, e multa. § 1º – A pena aumenta-se de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se o agente: I – Elabora escrituração contábil ou balanço com dados inexatos. II – Omite, na escrituração contábil ou no balanço, lançamento que deles deveria constar, ou altera escrituração ou balanço verdadeiros. III – Destrói, apaga ou corrompe dados contábeis ou negociais armazenados em computador ou sistema informatizado. IV – Simula a composição do capital social. V – Destrói, oculta ou inutiliza, total ou parcialmente, os documentos de escrituração contábil obrigatórios. § 2º – A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até metade se o devedor manteve ou movimentou recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação. § 3º – Nas mesmas penas incidem os contadores, técnicos contábeis, auditores e outros profissionais que, de qualquer modo, concorrerem para as condutas criminosas descritas neste artigo, na medida de sua culpabilidade. CRIMES TRIBUTÁRIOS – LEI Nº 8.137/1990 Art. 1 – Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I – Omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias. II – Fraudar a fiscalização tributária,inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal. III – Falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável. IV – Elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato. V – Negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa. Art. 2 – Constitui crime da mesma natureza: I – Fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo. II – Deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria 76 recolher aos cofres públicos. III – Exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal. IV – Deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento. V – Utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública. Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL – LEI Nº 7.492/86 Art. 10 – Fazer inserir elemento falso ou omitir elemento exigido pela legislação, em demonstrativos contábeis de instituição financeira, seguradora ou instituição integrante do sistema de distribuição de títulos de valores mobiliários. Pena – Reclusão, de um a cinco anos, e multa. Art. 11 – Manter ou movimentar recurso ou valor paralelamente à contabilidade exigida pela legislação. Pena – Reclusão, de um a cinco anos, e multa. Art. 18 – Violar sigilo de operação ou de serviço prestado por instituição financeira ou integrante do sistema de distribuição de títulos mobiliários de que tenha conhecimento, em razão de ofício. Pena – Reclusão, de um a quatro anos, e multa. Antes de finalizar esta seção de estudos, é importante que você reflita sobre empresas que nunca enviam os documentos solicitados, inclusive os extratos bancários, achando que isso não fará muita diferença no resultado do Balanço Patrimonial (BP) e da Demonstração do Resultado do Exercício (DRE). REFERÊNCIAS BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 3.741/2000, de 8 novembro de 2000. Altera e revoga dispositivos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, define e estende às sociedades de grande porte disposições relativas à elaboração e publicação de demonstrações contábeis e dispõe sobre os requisitos de qualificação de entidades de estudo e divulgação de princípios, normas e padrões de contabilidade e auditoria como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2000. Disponível em: https://bit.ly/3xjTo63. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade – NBC PG 01, de 7 de fevereiro de 2019. Aprova a NBC PG 01 – Código de Ética Profissional do Contador. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 14 fev. 2019. Disponível em: https://bit.ly/3DifF8i. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Resolução CFC nº 1.055, de 7 de outubro de 2005. Cria o COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS – (CPC), e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 24 out. 2005. Disponível em: https://bit.ly/3SdjTlV. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Resolução CFC nº 1.525, de 9 de junho de 2017. Altera o caput do art. 38 da Resolução CFC nº 1.309/2010. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 16 jun. https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=20141 https://www2.cfc.org.br/sisweb/sre/detalhes_sre.aspx?Codigo=2019/NBCPG01&arquivo=NBCPG01.doc https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=101916 77 2017. Disponível em: https://bit.ly/3QuNshm. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro: 31 dez. 1940. Disponível em: https://bit.ly/3By9PhN. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 17 dez. 1976. Disponível em: https://bit.ly/2UqQCGG. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Define os crimes contra o sistema financeiro nacional, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 18 jun. 1986. Disponível em: https://bit.ly/3B62g0o. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 12 set. 1990. Disponível em: https://bit.ly/3Bvpxdu. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 28 dez. 1990. Disponível em: https://bit.ly/3d7QjiI. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 11 jan. 2002. Disponível em: https://bit.ly/3S09hGR. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial e extrajudicial do empresário e da sociedade empresária. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 9 fev. 2005. Disponível em: https://bit.ly/3d1BYV3. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Altera e revoga dispositivos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, e estende às sociedades de grande porte disposições relativas à elaboração e divulgação de demonstrações financeiras. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 28 dez. 2007. Disponível em: https://bit.ly/3U086ZM. Acesso em: 18 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009. Altera a legislação tributária federal relativa ao parcelamento ordinário de débitos tributários; concede remissão nos casos em que especifica; institui regime tributário de transição, alterando o Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, as Leis nos 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.213, de 24 de julho de 1991, 8.218, de 29 de agosto de 1991, 9.249, de 26 de dezembro de 1995, 9.430, de 27 de dezembro de 1996, 9.469, de 10 de julho de 1997, 9.532, de 10 de dezembro de 1997, 10.426, de 24 de abril de 2002, 10.480, de 2 de julho de 2002, 10.522, de 19 de julho de 2002, 10.887, de 18 de junho de 2004, e 6.404, de 15 de dezembro de 1976, o Decreto- Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977, e as Leis nos 8.981, de 20 de janeiro de 1995, 10.925, de 23 de julho de 2004, 10.637, de 30 de dezembro de 2002, 10.833, de 29 de dezembro de 2003, 11.116, de 18 de maio de 2005, 11.732, de 30 de junho de 2008, 10.260, de 12 de julho de 2001, 9.873, de 23 de novembro de 1999, 11.171, de 2 de setembro de 2005, 11.345, de 14 de setembro de 2006; prorroga a vigência da Lei nº 8.989, de 24 de fevereiro de 1995; revoga dispositivos das Leis nos 8.383, de 30 de dezembro de 1991, e 8.620, de 5 de janeiro de 1993, do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, das Leis nos 10.190, de 14 de fevereiro de 2001, 9.718, de 27 de novembro de 1998, e 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.964, de 10 de abril de 2000, e, a partir da instalação do ConselhoAdministrativo de Recursos Fiscais, os Decretos nos 83.304, de 28 de março de 1979, e 89.892, de 2 de julho de 1984, e o art. 112 da Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005; e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 28 maio 2009. Disponível em: https://bit.ly/2JKanqx. Acesso em: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=344957 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7492.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8137.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11941.htm 78 18 mar. 2022. BRASIL. Medida Provisória nº 449, de 3 de dezembro de 2008. Altera a legislação tributária federal relativa ao parcelamento ordinário de débitos tributários, concede remissão nos casos em que especifica, institui regime tributário de transição, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 4 dez. 2008. Disponível em: https://bit.ly/3eEWivJ. Acesso em: 18 mar. 2022. CPC. Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Página inicial, [s. d.]. Disponível em: https://bit.ly/3d1C7YB. Acesso em: 27 mar. 2022. KPMG. Perfil do fraudador no Brasil. São Paulo: KPMG Consultoria Ltda., 2021. Disponível em: https://bit.ly/3Qun732. Acesso em: 27 mar. 2022.Silva Paes SEM MEDO DE ERRAR Na situação-problema proposta no início desta etapa de aprendizagem, você assumiu a tarefa de legalizar uma empresa, mas o seu cliente lhe diz que o valor do capital social da nova sociedade será “fictício”, uma vez que ele não tem o dinheiro necessário para integralizar o capital agora. Apesar de todos os argumentos apresentados por você, seu cliente não quer diminuir o valor, pois precisa de um empréstimo bancário e só o conseguirá se demonstrar um capital social bem “alto”. Primeiro, precisamos esclarecer o que é capital social e quais são as suas finalidades dentro das empresas. O capital social deve ser entendido como o valor que os sócios destinam para a sociedade, a fim de que esta possa realizar o seu objeto social e tudo aquilo que está estabelecido em seu contrato social. É divido em quotas/ações, que são consideradas bens móveis para os efeitos legais, devendo constar nas declarações de imposto de renda (IRPF) dos sócios. Por ser formado pela contribuição em dinheiro ou bens (desde que possam ser avaliados), além de propiciar o desenvolvimento do objeto social, o capital social é uma importante ferramenta de proteção para os credores da empresa, pois garante as obrigações assumidas. Para que uma corporação reduza o seu capital social inicial, deverá provar, fazendo uso de certidões negativas, que não tem nenhum débito fiscal ou tributário, confirmando a importância dessa conta nas demonstrações contábeis. Integralizar um capital social sem o seu devido lastro financeiro (que determina a capacidade financeira da empresa) fará com que o valor só exista no contrato (de direito), mas não realmente (de fato) no caixa da empresa, de modo que a instituição perderá credibilidade no mercado, colocando-se em risco com a redução de concessão de crédito ou a inviabilidade no fornecimento de produtos e mercadorias. Além disso, de acordo com o art. 299 do Código Penal, fazer declaração falsa em documento particular pode levar os seus autores a uma pena de reclusão de um a três anos, além de multa. E o contador? Ele pode ser exatamente o agente que faz a inserção da informação falsa no contrato social ou, no mínimo, é aquele que faz uso dos documentos falsos (art. 304) ou que conhece a verdade dos fatos e se cala (art. 342). AVANÇANDO NA PRÁTICA http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/mpv/449.htm http://www.cpc.org.br/CPC https://d335luupugsy2.cloudfront.net/cms/files/69324/1638906654perfil-fraudador-brasil.pdf 79 PERÍCIA CONTÁBIL FINANCEIRA NUMA EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS Para contextualizar sua aprendizagem, vamos supor que você, agora, esteja realizando a perícia contábil financeira de uma empresa prestadora de serviços. Ao perguntar sobre o valor do faturamento mensal, você ouve do proprietário que a quantia condiz exatamente com as notas fiscais emitidas, as quais, por sua vez, se referem a todos os serviços prestados pela organização. Independentemente da informação recebida, e tendo ciência da responsabilidade do trabalho que está executando, você resolve investigar mais a fundo e pede outros documentos para a empresa. Nesse contexto, como você pretende checar se a informação recebida é mesmo verdadeira e quais tipos de documentos devem ser solicitados ao proprietário? 80 UNIDADE 3, SESSÃO 3: PERÍCIA CONTÁBIL CRIMINAL PERÍCIA CONTÁBIL CRIMINAL PRATICAR PARA APRENDER A prova pericial é sempre indicada diante da necessidade de se constatar a existência de fatos que dependem do conhecimento de pessoas habilitadas profissionalmente. O agente responsável por executá-la, além de possuir conhecimento técnico específico, precisa ter domínio sobre a matéria objeto da prova, o que facilitará muito a realização de seu trabalho. Quanto aos aspectos éticos, além de ilibada idoneidade moral, o profissional precisa e deve ser imparcial, isto é, necessita desenvolver e oferecer um trabalho pericial sem ser tendencioso, mostrando-se livre de influências ou pressões de pessoas interessadas no resultado da demanda. Logo, não pode ter medo de contrariar interesses, devendo expor o seu trabalho de forma clara e objetiva. Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você tenha sido contratado para efetuar uma perícia contábil na qual seu cliente, o sócio da empresa Bela Vita Ltda., precisa de uma defesa técnica referente a uma “Ação Penal sobre Crimes da Lei de Licitações”, que envolve um pregão eletrônico do qual participou. Em uma investigação conduzida pela Controladoria Geral da União (CGU), no âmbito dos processos licitatórios, foi identificado que seu cliente burlou a competitividade do pregão, elevando arbitrariamente seus preços de vendas após ganhar a licitação, causando prejuízo ao erário. A empresa Bela Vita alega que não superfaturou seus preços e que entregou os produtos exatamente pelo mesmo valor contratado. Além disso, a organização afirma ter sofrido prejuízos com o fornecimento em questão, que comprometeu seu lucro anual. Não parece ser tão difícil provar quem detém a verdade nessa história, não é mesmo? Basta fazer uma investigação minuciosa para que os fatos apurados apareçam. O problema é o seguinte: como realizar essa investigação? O que é preciso analisar para conseguir apurar os fatos? Então, vamos lá! Com base em seus conhecimentos contábeis, descreva o que realmente deve ser feito. CONCEITO-CHAVE A perícia criminal utiliza técnicas ligadas à ciência forense e atua nas infrações penais, para as quais o Estado assume a defesa do cidadão em nome da sociedade. Essas infrações têm como objetivo final a obtenção de lucro. A legislação que regulamenta as perícias oficiais de natureza criminal é a Lei nº 12.030, de 17 de setembro de 2009, a qual exige “concurso público, com formação acadêmica específica, para o provimento do cargo de perito oficial” (BRASIL, 2009, [s. p.]). Numa perícia contábil criminal só existe a figura do perito contador oficial (peritos concursados por órgãos de segurança e institutos de criminalística, em âmbito estadual, e pelos peritos criminais federais), cujo trabalho deve ser requerido pelo juiz, por uma autoridade policial ou pelo membro do Ministério Público. Nos crimes de natureza criminal contábil, incluem-se diversasatividades ilegais, como as mencionadas a seguir. 81 1. Sonegação fiscal: constitui crime de sonegação fiscal prestar declaração falsa ou omitir informação com a intenção de eximir-se do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei; inserir elementos inexatos ou omitir rendimentos em documentos ou livros exigidos por lei com o intuito de exonerar- se do pagamento de tributos; alterar faturas e quaisquer documentos com o propósito de fraudar a Fazenda Pública; fornecer ou emitir documentos graciosos ou alterar despesas com o objetivo de obter dedução de tributos devidos; exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte, qualquer porcentagem sobre a parcela dedutível. O crime previsto é de reclusão, de seis meses a dois anos, e multa de duas a cinco vezes o valor do tributo. 2. Crimes em licitações: em 2021, o Código Penal passou a apresentar um novo capítulo chamado Crimes em licitações e contratos administrativos. Tal crime consiste em fazer contratação direta de forma ilegal; frustrar ou fraudar o processo licitatório; patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração Pública, dando causa à instauração de licitação ou à celebração de contrato cuja invalidação vier a ser decretada pelo Poder Judiciário; modificar ou fazer pagamento irregular em contratos administrativos; impedir, perturbar ou fraudar a realização de ato de processo licitatório; violar sigilo em licitação; afastar ou tentar afastar licitante por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; fraude em licitação ou contrato; contratação inidônea; impedir ou dificultar a inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais; omitir, modificar ou entregar dados incorretos ou dissonantes com a realidade. Dependendo do crime, as penas podem ser de reclusão, detenção e multa. 3. Estelionato: consiste em obter, para si ou para outra pessoa, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. Outras condutas também são consideradas como estelionato, conforme estipula o art. 171 do Código Penal, como: dispor de coisas alheias como se fossem próprias; alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria; defraudação de penhor; fraude na entrega de coisa; fraude para recebimento de indenização ou seguro; e fraude no pagamento por meio de cheque. A característica principal do estelionato é a fraude. O crime previsto é de reclusão, de um a cinco anos, e multa. 4. Falsidade ideológica: é a omissão, em documento público ou particular, de declaração que dele deva constar, ou nele inserir ou fazer declaração falsa ou diversa da que deveria estar escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fatos juridicamente relevantes. O crime previsto é de reclusão, de um a cinco anos, e multa. 5. Lavagem de dinheiro: a expressão vem do inglês money laundering, que dá a ideia de que o dinheiro precisa ser “lavado”. É uma prática que remete à época de Al Capone, que teria comprado uma lavanderia para justificar a origem do seu dinheiro (que vinha de delitos penais nos EUA). Após a assinatura do Tratado Internacional de Viena, em 1998, o Brasil sancionou a Lei nº 9.613/1998 e tal delito passou a ser criminalizado no território brasileiro. O crime consiste na ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. O crime previsto é de reclusão, de três a dez anos, e multa. 6. Corrupções: ativa – quando uma pessoa particular oferece vantagens indevidas a funcionário público para que este pratique, omita ou retarde algum ato. A pena 82 para esse tipo de crime é de reclusão, de um a oito anos, e multa. Passiva – consiste na solicitação, no recebimento ou na aceitação de vantagem indevida, para si ou para outra pessoa, em razão de função pública. A pena prevista é de reclusão, de dois a doze anos, e multa. 7. Peculato: acontece quando um funcionário público se apropria ou desvia um bem sobre o qual tem domínio em razão da sua função. É um delito previsto no art. 312 do Código Penal, sendo considerado um crime funcional. A pena prevista para esse crime é de reclusão, de dois a doze anos, e multa. ASSIMILE Existem dois tipos de fraudadores: o acidental e o predador O fraudador acidental sucumbe à pressão. Desenvolve um ou mais esquemas de fraudes e, em algum momento, comete o ato. Esse indivíduo é considerado uma boa pessoa e cumpridor da lei, de modo que, em circunstâncias normais, nunca consideraria a hipótese de roubar, violar a lei ou prejudicar os outros. O fraudador predador já cometeu algum ato ilegal anteriormente e costuma procurar organizações nas quais possa iniciar esquemas quase imediatamente após sua contratação. Fraudadores acidentais, se não forem barrados de antemão, poderão mudar seu comportamento até que se tornem fraudadores predadores. De acordo com o item 2 da Norma Brasileira de Contabilidade Técnica Pericial (NBC TP) 01, a perícia se realiza a partir da aplicação de um “conjunto de procedimentos técnico-científicos destinados a levar à instância decisória elementos de prova necessários a subsidiar a justa solução do litígio ou constatação de fato [...]” (BRASIL, 2015, p. 2). Ainda de acordo com a NBC TP 01, antes mesmo de o perito iniciar as diligências, pesquisas, cálculos e respostas aos quesitos, esse profissional deve se planejar, estabelecendo uma metodologia de trabalho, identificando todos os procedimentos periciais que serão aplicados e montando um cronograma do processo como um todo. Durante a execução do trabalho, o perito deve se ater ao objeto da demanda e determinar, com base em seu critério técnico profissional, o universo que será analisado e investigado. Além disso, é importante que esse profissional tenha um conhecimento multidisciplinar, já que estará incumbido de servir como auxiliar da justiça, esclarecendo pontos específicos distantes do conhecimento jurídico do magistrado. Dominar a ciência grafoscópica (estudo da escrita manuscrita, no sentido de definir sua veracidade ou identificar o seu autor) e a ciência documentoscópica (estudo dos documentos, no sentido de apontar sua veracidade), por exemplo, é fundamental para a busca da verdade na esfera criminal. REFLITA Importante! O laudo pericial é um relatório emitido pelo perito judicial quando nomeado pela Justiça. Por sua vez, parecer pericial é um relatório emitido pelo perito extrajudicial quando contratado pelas partes de um litígio ou, de forma particular, por qualquer pessoa física ou jurídica que precise tomar decisões. Ambos devem apresentar a mesma estrutura, seguindo as orientações do Código de Processo Civil (CPC) e da Norma Brasileira de Contabilidade Técnica Pericial 01 – NBC TP 01 (R1). Os detalhes que mostram a diferença entre esses documentos é a nomenclatura 83 (título) do relatório e o fato de que no parecer não há número de processo, nome das partes nem informações sobre o juizado que está “mediando” o litígio. Além disso, normalmente o parecer pericial não conta com quesitos que precisam ser respondidos pelo perito, mas baseia sua investigação a partir do objeto da perícia, ou seja, daquilo que os contratantes desejam elucidar. No contexto criminal, a realização de uma perícia segue os mesmos procedimentos técnicos constantes da NBC TP 01 (R1), iniciando-se sempre com uma investigação em busca de provas ou evidências probatórias. A prova, num sentido amplo, é todo meio suscetível de demonstrar a verdade sobre um argumento mediante o qual, por meio lícito, busca-se o convencimento do juiz, para que este tome a sua decisão. O objeto da prova são os fatos, mais precisamente aquelespertinentes ao processo e que suscitam o interesse das partes em demonstrá-los. Numa investigação, podemos encontrar quatro tipos de evidências probatórias: tincidunt lorem, non pulvinar turpis. Aliquam pretium, metus et lobortis suscipit, tellus nunc tempus arcu, sit amet hendrerit mi dolor et enim. • Evidência testemunhal: evidência colhida de pessoas que, direta ou indiretamente, tenham relação com a situação investigada. É a afirmação oral, compreendendo as produzidas por testemunhas, declarações da vítima e do réu. • Evidência documental: evidência colhida de documentos, sistemas de computadores e outros dados escritos ou impressos. É a afirmação escrita ou gravada. • Evidência material: consiste em qualquer materialidade que sirva de prova ao fato probando. É a atestação emanada da coisa: o corpo de delito, os exames periciais, os instrumentos do crime, etc. Inclui segurança, furto de ativos, violação de marcas e patentes e outras evidências tangíveis. • Evidência física ou presencial: evidência decorrente do exame físico de estoques e bens patrimoniais quando realizado por intermédio da observação do próprio investigador. O processo de coleta de provas é feito em cinco etapas: • Identificação da prova: é a busca dos elementos que serão expostos no parecer ou laudo pericial. • Averiguação efetiva: representa a busca material da prova necessária, segundo o planejamento efetuado anteriormente. • Apresentação da prova: quando o investigador analisa as provas obtidas, buscando uma explicação por parte dos responsáveis pela entidade. • Admissão da prova: é o consenso, entre o investigador e o investigado, com relação às provas encontradas. • Apreensão e avaliação da prova: quando o investigador considera as provas relevantes para emitir sua opinião em relação a pessoas, assuntos ou áreas examinadas. Na elaboração do parecer pericial contábil criminal, deverão ser levados em consideração os mesmos critérios utilizados na produção do laudo pericial contábil. De acordo com a NBC TP 01, “os peritos devem registrar, de forma abrangente, o conteúdo da perícia e particularizar os aspectos e as minudências que envolvam o seu 84 objeto e as buscas de elementos de prova necessários para a conclusão do seu trabalho” (BRASIL, 2015, p. 7). Além disso, ao final, devem constar as suas conclusões, sempre indicando como as alcançou. A linguagem utilizada no relatório precisa ser simples e com coerência lógica. O perito não deve ultrapassar os limites da sua designação nem emitir opiniões pessoais. Para desempenhar tal atividade, esse profissional e os assistentes técnicos das partes podem ouvir testemunhas e obter informações a partir de solicitações feitas a terceiros ou repartições públicas, preenchendo seu relatório com planilhas, mapas, plantas, desenhos, fotografias ou outros elementos necessários ao esclarecimento do objeto da perícia. A norma prevê, ainda, que a estrutura do relatório (tanto do laudo pericial como do parecer pericial) deve conter, no mínimo, os seguintes itens: • Identificação do processo e das partes. • Síntese do objeto da perícia. • Resumo dos autos. • Metodologia adotada para os trabalhos periciais e esclarecimentos. • Relato das diligências realizadas. • Transcrição dos quesitos e suas respectivas respostas para o laudo pericial contábil. • Transcrição dos quesitos e suas respectivas respostas para o parecer técnico contábil, onde houver divergência das respostas formuladas pelo perito do juízo. • Conclusão. • Termo de encerramento, constando a relação de anexos e apêndices. • Assinatura do perito: deve constar sua categoria profissional de contador, seu número de registro no Conselho Regional de Contabilidade, comprovado mediante Certidão de Regularidade Profissional (CRP), e sua função (se laudo, perito do juízo; e, se parecer, perito-assistente da parte). É permitida a utilização da certificação digital, em consonância com a legislação vigente e as normas estabelecidas pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil). O art. 473 do Código de Processo Civil (CPC) de 2015 também estabelece uma estrutura para a apresentação do laudo pericial, que deverá conter: I – a exposição do objeto da perícia; II – a análise técnica ou científica realizada pelo perito; III – a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou; IV – resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público. (BRASIL, 2015, [s. p.]). No caso do parecer pericial, é comum que os peritos extrajudiciais também utilizem o modelo do CPC. Vejamos, a seguir, um exemplo de parecer pericial criminal que segue as orientações do Código de Processo Civil de 2015, complementado com as orientações da NBC TP 01 (R1). 85 EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA (NÚMERO) VARA (ÓRGÃO JULGADOR – FEDERAL, CIVIL, ETC.) DA COMARCA DE (NOME DA CIDADE) – (SIGLA DO ESTADO) Processo: (colocar o número do processo, caso haja). Ação: (colocar o nome da ação que consta no processo, caso haja). Autor: (colocar o nome do autor ou autores, caso haja). Réu: (colocar o nome do réu ou réus, caso haja). 1 EXPOSIÇÃO DO OBJETO DA PERÍCIA (ART. 473, I, DA LEI Nº 13.105/2015) 1.1 SÍNTESE Neste campo o perito identifica os principais fatos (resumo) que culminaram na sua contratação ou nomeação. 1.2 RESUMO HISTÓRICO Nesta seção o perito faz um levantamento detalhado, de preferência em tópicos (para facilitar a leitura posteriormente), identificando datas e números de páginas do processo (caso haja) e esclarecendo os pontos mais importantes do caso, como: inicial com os pedidos do autor; contestação do réu; decisão ou sentença judicial; nomeação do perito; proposta de honorários apresentada, etc. 2 METODOLOGIA (ART. 473, III, DA LEI Nº 13.105/2015) É neste tópico que o perito precisa descrever a metodologia adotada no desenvolvimento do seu trabalho e os critérios técnicos que utilizou durante a investigação, além de toda a legislação aplicada em cada caso. Deve, ainda, explicar como se organizou e a forma de divisão do seu trabalho. Normalmente o perito inicia este parágrafo da seguinte forma: “A metodologia aplicada na elaboração deste Parecer Técnico Contábil observou as Normas Profissionais de Perícia Contábil – NBC TP 01 (R1) e NBC PP 01 (R1) –, bem como, no que aplicável, a Lei nº 13.105/2015 – Novo Código de Processo Civil, em especial seu art. 473.”. 3 DILIGÊNCIAS REALIZADAS Todas as diligências realizadas deverão ser identificadas neste campo, onde o perito determina o que foi pedido e para quem, além de apresentar os resultados encontrados, sejam eles positivos ou negativos, como a recusa no atendimento da solicitação. É 86 importante que todos saibam que o trabalho foi realizado de acordo com as normas, mesmo que a falta de algum documento prejudique o andamento da investigação. 4 ANÁLISE TÉCNICA (ART. 473, II, DA LEI Nº 13.105/2015) Este é o momento em que o perito discorre sobre os seus achados, detalhando fatos, legislação e questões que foram analisadas. Devem-se apresentar cálculos, entrevistas, etc., fundamentando todo o material coletado e descrito nesta seção do documento. É a parte mais importante do seu relatório e, portanto, merece especial atenção. É preciso mencionar os anexos e/ou apêndices apresentados sempre que forem avaliados, para facilitar a interpretação das informações. Exemplo: “Durante a análise das AGO e AGE (Anexos 7 a 12), este(a) perito(a) elaborou os seguintes quadros resumos, com o intuito de identificar os pontos mais relevantes.”. Se houver quesitos, é neste campo que eles serão inseridos e respondidos. Além disso, é importante separá-los de acordo com quem fez a pergunta. QUESITOS DO MAGISTRADONão foram apresentados quesitos pelo MM. Juiz. QUESITOS DO AUTOR O autor formulou quesitos (fl. 164). 5 CONCLUSÃO Neste tópico o perito relata os principais achados a partir da análise técnica do seu trabalho. Quantificar, sempre que for possível, auxilia na tomada de decisão por parte dos interessados. É na conclusão que o perito faz esclarecimentos sobre fatos encontrados no decorrer de sua investigação e que não constaram na quesitação. Vale ressaltar que o perito não conclui o processo, e sim o seu trabalho. Muitos peritos confundem o termo “conclusão” e acabam definindo, de maneira antecipada, quem é culpado ou inocente. 6 ENCERRAMENTO É aqui que o perito finaliza o seu relatório, identificando quantas folhas foram produzidas e, no caso de utilização de anexos e/ou elaboração de apêndices, quantos arquivos adicionais foram gerados. Vejamos, a seguir, um exemplo de encerramento: “Nada mais havendo a expor, dá-se por finalizado o presente trabalho, que se apresenta em xx folhas impressas por processamento de dados só no anverso do papel, numeradas de 1 a xx no rodapé. Além disso, existem mais xx (xx) Apêndices e mais xx (xx) Anexos, que são parte integrante do presente Parecer Pericial Contábil, todos rubricados e assinados.”. 87 7 APÊNDICES Nesta parte, é preciso relacionar todos os apêndices produzidos, os quais devem ser identificados com número e nome. 8 ANEXOS Nesta seção, é necessário relacionar todos os anexos produzidos, também identificados com número e nome. EXEMPLIFICANDO Anexos são documentos que o perito obteve por intermédio de diligências e que foram utilizados como elementos de prova, servindo de base para a sua argumentação. Apêndices são documentos que foram elaborados pelo perito, como planilhas, termos de diligências, etc., e que também serviram de base para a sua argumentação. Antes de finalizar esta seção de estudos, é importante que você reflita sobre a importância do contador durante a atividade pericial, uma vez que o seu trabalho deve ser conduzido pela incansável busca da verdade. REFERÊNCIAS BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade – NBC PP 01 (R1): perito contábil, de 19 de marco de 2015. Dá nova redação à NBC PP 01, que dispõe sobre perito contábil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 27 mar. 2020. Disponível em: https://bit.ly/3B8uho3. Acesso em: 9 abr. 2022. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade – NBC TP 01 (R1): perícia contábil, de 27 de fevereiro de 2015. Dá nova redação à NBC TP 01 – Perícia Contábil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 19 mar. 2015. Disponível em: https://bit.ly/2kXUT4l. Acesso em: 7 abr. 2022. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro: 31 dez. 1940. Disponível em: https://bit.ly/3d4noft. Acesso em: 7 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965. Define o crime de sonegação fiscal e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 19 jul. 1965. Disponível em: https://bit.ly/3d4I4UB. Acesso em: 7 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Define os crimes contra o sistema financeiro nacional, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 18 jun. 1986. Disponível em: https://bit.ly/3DebhqD. Acesso em: 7 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998. Dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 4 mar. 1998. https://www2.cfc.org.br/sisweb/sre/detalhes_sre.aspx?Codigo=2020/NBCPP01(R1)&arquivo=NBCPP01(R1).doc http://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/NBCTP01.pdf http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l4729.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7492.htm 88 Disponível em: https://bit.ly/3U4G9zO. Acesso em: 7 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 12.030, de 17 de setembro de 2009. Dispõe sobre as perícias oficiais e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 18 set. 2009. Disponível em: https://bit.ly/3Dhu5oV. Acesso em: 7 abr. 2022. BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 17 mar. 2015. Disponível em: https://bit.ly/3eMbreY. Acesso em: 9 abr. 2022.da Silva Paes SEM MEDO DE ERRAR Então, pensou bem sobre a história do seu cliente, apresentada no início desta etapa de aprendizagem? Ele alega que foi injustamente envolvido em uma “Ação Penal sobre Crimes da Lei de Licitações”, já que não superfaturou os seus preços, entregando seus produtos pelo mesmo valor contratado. Afirma, inclusive, que teve prejuízos contábeis durante esse contrato. Como devemos iniciar essa investigação? O que é preciso analisar para conseguir apurar os fatos? Você deve seguir cinco passos: O primeiro é analisar a estrutura de formação de preço que a empresa Bela Vita Ltda. apresentou ao participar do pregão eletrônico. Nessa estrutura, identificamos todos os custos envolvidos, como: impostos e taxas de vendas, custo da mercadoria vendida, outros custos/despesas e, consequentemente, o preço de venda e o possível lucro apurado. O segundo é proceder à análise das informações extraídas do edital e da ata do pregão eletrônico, quando poderemos constatar se o valor ofertado pela empresa Bela Vita Ltda. atendeu aos parâmetros do edital, como o critério do menor preço global. O terceiro é analisar todas as notas fiscais emitidas pela empresa antes, durante e depois do contrato, para detectar se houve alteração nos preços praticados. O quarto passo demanda um pouco mais de cuidado. Com todas as notas fiscais de compras de vendas em mãos, é de suma importância checar se os livros fiscais da empresa Bela Vita Ltda. foram devidamente escriturados e seus valores, levados à tributação. Os livros diários também deverão ser averiguados para identificar se as mesmas notas fiscais foram contabilizadas de modo correto. Caso se opte por analisar outros custos e despesas, também será necessário conferir se estão suportados por documentos legais e se foram contabilizados. Na quinta etapa buscamos as demonstrações contábeis da Bela Vita e, com elas em mãos, conseguiremos saber qual foi o resultado apresentado ao longo dos anos e se, durante o contrato, realmente houve um prejuízo apurado. Vale destacar a importância de observar se a empresa não fornece suas mercadorias para apenas um órgão. De posse de todas essas informações e depois de planilhar os dados, iniciamos o processo de comparação à procura de respostas. Comparar os valores orçados com os executados é a melhor forma de saber o que aconteceu durante o período questionado. Todo esse procedimento não parece tão difícil depois que fazemos uma checklist, não é mesmo? Mas não se esqueça: quando mencionamos “notas fiscais”, um alerta deve ser ligado. A legislação do ICMS é muito complexa e pode conter “detalhes extras” de acordo com o Estado analisado. Substituição tributária, diferencial de alíquota e venda para entrega futura são termos comumente ligados a esse assunto. É por isso que o perito, além de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12030.htm https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm 89 especialista, também deve ter larga experiência profissional, pois dessa maneira o trabalho fica menos complexo. AVANÇANDO NA PRÁTICA NOMEAÇÃO EM PERÍCIA JUDICIAL Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você tenha sido nomeado por um juiz para efetuar uma perícia contábil judicial. Aoanalisar o processo para o qual foi nomeado, você observa que não tem tanta experiência com o tipo de problema discutido no caso, apesar de conhecer o assunto pelo fato de já tê-lo estudado na faculdade. Você sabe que o tema em questão não é tão complexo assim e que, com uma boa leitura, será possível realizar um ótimo trabalho. Além disso, um de seus colegas de profissão diz que gostaria muito de colaborar na perícia e incentiva você a aceitar o encargo, afirmando que, juntos, vocês serão capazes de concluir o processo sem ter problemas. É assim que aprendemos, não é mesmo? Na prática! A pergunta é bem simples: você aceitaria tal atribuição, mesmo sem ter experiência no assunto discutido? 90 UNIDADE 4, SESSÃO 1: PERÍCIA CINTÁBIL E ELUCIDAÇÃO DE CRIMES CONVITE AO ESTUDO Entre 5% a 10% do faturamento das empresas são desviados anualmente e, mesmo quando os controles para riscos de fraudes são efetivos, contando com a detecção a partir de denúncias anônimas, por exemplo, os fraudadores ainda conseguem burlá-los ou negligenciá-los. As fraudes são extremamente prejudiciais a toda a sociedade e vêm sendo consideradas um problema global crônico. Além de trazer consequências financeiras e econômicas desastrosas, também geram danos reputacionais irreversíveis às corporações envolvidas, já que, como consequência, tais organizações precisam fazer investimentos financeiros para a recuperação de seus dados. Nesse contexto, a principal tarefa do perito contador é comunicar a existência de qualquer fraude durante a execução do seu trabalho. Esse profissional atua em todas as questões que envolvem fatos patrimoniais e, ao fazer uso da investigação contábil, pode agregar ao inquérito policial aspectos patrimoniais e financeiros relacionados à criminalidade. A perícia contábil criminal pode ser utilizada, ainda, como medida de combate a casos de lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, crimes em licitações e fraudes no mercado financeiro, como o suborno de agentes públicos, a chantagem, as propagandas enganosas e abusivas, os desvios de capital, as falências fraudulentas, etc. Logo, é uma área repleta de informações e muito proveitosa para quem deseja buscar respostas direcionadas a grandes problemas empresariais. PRATICAR PARA APRENDER Diante do panorama atual, marcado por grandes escândalos de corrupção e de lavagem de dinheiro envolvendo empresas privadas e órgãos públicos, tornou-se necessária a adoção de medidas mais enérgicas que auxiliem na detecção de fraudes, municiando os órgãos julgadores com a geração de provas. Dessa forma, podem-se reduzir os diversos impactos negativos que afetam a democracia e o desenvolvimento econômico de toda a sociedade. Além disso, os custos envolvidos num processo de investigação acabam minimizando ainda mais os investimentos em saúde, segurança, educação, etc. Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você tenha sido contratado para realizar uma perícia contábil criminal relacionada à seguinte situação: uma companhia apresentou, para um órgão regulador, documentos que continham a revisão de seus dados financeiros do ano de 2020, assim como ajustes nos resultados de 2021 previamente anunciados, visto que a corporação registrou em seus livros contábeis, de forma irregular, o valor de R$ 6,4 bilhões em receitas. O valor lançado originalmente como vendas de equipamentos foi posteriormente reclassificado como receita de aluguel. A operação provocou uma distorção do real desempenho dos negócios. Você foi contratado para identificar o(s) potencial(ais) tipo(s) de fraude(s) cometida(s) pela empresa e deverá propor análises financeiras/contábeis capazes de auxiliar na detecção de irregularidades e valores envolvidos. Tais análises poderão agilizar a 91 detecção de dolo e dos potenciais agentes causadores do evento fraudulento. Então, vamos lá! Reflita sobre o caso! CONCEITO-CHAVE A finalidade da perícia contábil é trazer à tona possíveis irregularidades ou manipulações contábeis provenientes de pessoas que utilizam meios fraudulentos, como ardis, artifícios, mentira e engano, na intenção de obter algum proveito ilícito. A partir dos seus procedimentos técnicos, a perícia investiga as mais variadas mudanças patrimoniais e presta esclarecimentos sobre a origem e aplicação dos recursos de pessoas físicas e jurídicas, produzindo provas que serão utilizadas para elucidar diversos questionamentos, como o que aconteceu, como aconteceu e quem é o responsável pelo ocorrido. Com o aumento dos casos de corrupção, a perícia contábil vem sendo cada vez mais utilizada na tentativa de restaurar a confiança dos diversos usuários da informação contábil, já tão abalada por tantos escândalos envolvendo grandes empresas. Dentro de uma perícia, as provas são os elementos centrais, já que sem elas não poderá haver uma tomada de decisão. São as provas que materializam um fato conflituoso, subsidiando a sentença judicial ou extrajudicial. Na área penal, elas são ainda mais requisitadas por causa da gravidade do conflito: ouvir testemunhas, fazer perguntas ou interrogatórios, analisar documentos, efetuar buscas e apreensões estão entre as provas mais utilizadas num litígio. Além disso, a prova pericial também é muito exigida quando o fato conflituoso necessita de um especialista no assunto em discussão. Em sua pesquisa, Paes (2019, p. 103) identificou que “a sentença proferida pelos magistrados se baseia em 100% do que foi apresentado pelo perito contador em seu trabalho, para cinco dos seis juízes entrevistados”, fato que mostra o grau de relevância desse tipo de prova nos meios judiciais. Para alguns juízes entrevistados durante esse mesmo estudo, a prova pericial é tão importante que serve de embasamento para a fundamentação da sua sentença. REFLITA A pesquisa de Paes (2019) também detectou o que os magistrados procuram num laudo pericial: que ele seja mais claro, mais conclusivo, tenha mais objetividade e seja esclarecedor. Além disso, para cinco dos seis juízes entrevistados, os laudos periciais contábeis atendem às suas necessidades na tomada de decisão, demonstrando que, se o perito tem conhecimento técnico e habilidade para se expressar, pode ajudar o juiz a definir sua resolução, mesmo que este não tenha nenhum conhecimento técnico-contábil. A perícia criminal contábil é de suma importância para a elucidação de vários crimes, especialmente aqueles que atacam o sistema financeiro ou a ordem econômica e tributária. Tais crimes, na maioria das vezes, estão relacionados a aspectos contábeis, envolvendo uma grande quantidade de dinheiro público que precisa ser ressarcido ao erário. O perito contador é o detentor do conhecimento sobre a realidade patrimonial não somente quanto a aspectos qualitativos e quantitativos, mas principalmente em relação às suas causas e efeitos. No contexto criminal, a perícia contábil costuma ser realizada antes da fase processual, sendo obrigatória quando os crimes deixam vestígios nas demonstrações contábeis. Nesse caso, o perito deve ser capaz de identificar todas as atividades ilícitas ocorridas, como: 92 desvios e corrupção, contabilidade paralela, simulação de renda, simulação de operações comerciais, empréstimos fictícios, origem e destino de valores financeiros, remessa de dinheiro para os paraísos fiscais, contratos fraudulentos, notas fiscais frias, declarações falsas, etc. Confrontando as informações apresentadas e analisando os documentos que as geraram (extratos bancários, relatórios de aplicações financeiras, obrigações acessórias apresentadas pela contabilidade aos órgãos públicos, contratos diversos, notas fiscais, processos licitatórios, livros contábeis, etc.), a perícia se torna um importante instrumento de justiça, garantindo o esclarecimento de todos os fatos e a punição dos envolvidos. A perícia criminalcontábil, nos âmbitos estaduais, é executada pelas polícias civis dos Estados e Distrito Federal. No domínio nacional, tal atividade é articulada pelo Instituto Nacional de Criminalística do Departamento de Polícia Federal. Após a identificação da origem do crime e do órgão responsável pela demanda, os peritos iniciam o processo de investigação, com a definição dos procedimentos investigativos de acordo com os aspectos específicos da averiguação. À medida que a apuração avança e novos elementos são descobertos, alguns ajustes passam a ser feitos nos procedimentos. As investigações incluem os seguintes métodos: 1. Entrevistas: com o objetivo de checar as informações já coletadas e buscar novos dados, as entrevistas são realizadas com os possíveis envolvidos ou conhecedores dos fatos. Para a realização de uma boa entrevista, é importante compreender, com antecedência, todos os detalhes sobre a situação alegada, tornando-se apto para responder às seguintes perguntas: Como aconteceu? Onde aconteceu? Quem viu? Com quem estava? Quanto tempo durou? A escolha dos entrevistados dependerá do fato recebido. Basicamente, qualquer pessoa que possa contribuir com informações relevantes pode ser entrevistada, como gestores, colegas do denunciado ou denunciante, profissionais que atuam na mesma área em que os fatos ocorreram, etc. As entrevistas podem ser: exploratórias (ajudam a obter uma visão inicial sobre o objeto da investigação, auxiliando na compreensão de todo o contexto); investigativas (buscam mais detalhes sobre o contexto e novos elementos); e de confronto (uma conversa com o denunciado ou fraudador, com evidências do fato investigado). É importante que haja um roteiro a ser seguido e que o ambiente esteja preparado, com a presença de, pelo menos, dois entrevistadores. Além disso, a interlocução poderá ocorrer de forma presencial ou virtual, via telefone ou videoconferência. Para finalizar, recomenda-se que o perito tome notas dos principais pontos discutidos, não minta ou prometa algo que não possa cumprir, não dê conselhos ou advertências morais e não faça perguntas tendenciosas ou que não tenham relação com o caso. 2. Background investigation (BKG): é a verificação de antecedentes ou o processo de coleta, análise e consolidação das informações apresentadas a partir de registros eletrônicos ou por consulta in loco. Essas informações também podem ser obtidas em locais públicos, como por meio dos registros das mídias. O BKG Check integrado à investigação pode trazer dados relevantes sobre as fraquezas operacionais da empresa e identificar possíveis não conformidades com políticas empresariais ou governamentais, bem como conflitos de interesse. Vale destacar, ainda, que esse método promove a análise da movimentação patrimonial. O processo se dá a partir do cruzamento dos dados encontrados em bases públicas 93 gratuitas ou pagas e pesquisa de mídia. A inspeção pode ser simples, quando há apenas uma análise financeira, societária e criminal do público-alvo, ou complexa, caso também sejam investigados os registros em órgãos específicos, como Anvisa ou Ibama, ou a situação do contrato de registro da empresa, feito na Junta Comercial de cada Estado, ou até mesmo o histórico de processos civis, criminais e trabalhistas. Além disso, investiga-se a existência de algum pedido de falência ou recuperação judicial. EXEMPLIFICANDO Algumas certidões negativas, dependendo do Estado, podem ser solicitadas de forma on- line e gratuita, como: certidão de improbidade administrativa e inelegibilidade, certidão da Justiça Federal, certidão do Procon, etc. Outras podem ser pagas, como as certidões dos cartórios de distribuição. Em casos mais específicos, outros mecanismos de coleta podem ser necessários, como o uso do Certificado Digital para identificar pendências tributárias no âmbito federal (Receita Federal do Brasil e INSS). A investigação patrimonial se dá por meio de consultas a registros públicos, com o objetivo de identificar bens móveis, imóveis ou semoventes (animais). As principais pesquisas realizadas relacionam-se a: certidões públicas das juntas comerciais estaduais, certidões públicas dos cartórios de registro de imóveis, certidões públicas dos cartórios de registro de títulos e documentos, documentos públicos da Agência Nacional de Aviação Comercial (Anac), documentos públicos do Departamento Nacional de Trânsito, entre outros ofícios. 3. Data analytics: transformar dados digitais mantendo a integridade das informações é a principal preocupação da tecnologia forense e das técnicas de analytics. A definição das técnicas aplicadas dependerá do formato dos dados que serão manuseados. Nesse sentido, podemos encontrar dois grandes grupos: dados estruturados, aqueles que possuem um padrão fixo e constante, como arquivos em XML ou um sistema integrado ERP; e dados não estruturados, aqueles que não possuem um formato ou organização definidos, como e-mails, planilhas, vídeos ou áudios, etc. Quando se identifica uma informação (dados) que pode ser útil, é preciso entender onde ela está, quem pode acessá-la e como está protegida. Não se deve mantê-la por mais tempo do que o requerido inicialmente, a menos que surjam outras demandas de análise. Depois de obter o acesso aos dados, estes precisam ser isolados e protegidos, para que não sejam alterados ou destruídos. Durante a coleta das informações, deve-se utilizar uma metodologia apropriada, sempre respeitando a cadeia de custódia e verificando a sua integridade, a legibilidade, o backup e a validação do hash, a fim de confirmar que os dados não foram modificados durante a manipulação do perito. ASSIMILE O art. 158-A do Código Penal estabelece que a cadeia de custódia “é o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio 94 coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte” (BRASIL, 1941, [s. p.]). 4. Revisão dos documentos eletrônicos: a revisão dos documentos coletados a partir de dados não estruturados dá um pouco mais de trabalho, por causa da quantidade de informações que chegam de forma dispersa e aleatória. Existem técnicas que são aplicadas com a finalidade de reduzir o volume de material e organizar os documentos de forma mais adequada. Já a revisão dos documentos coletados por meio de dados estruturados, apesar de mais extensa, acaba produzindo informações mais precisas. A análise se inicia com base nos dados dos usuários de um determinado sistema, identificando suas restrições e limitações. Depois, o próprio sistema é avaliado, na intenção de saber se ele permite que o usuário visualize todos os registros, se há alguma limitação tecnológica e se existem filtros que o usuário não consegue ver. Isso é importante, porque os relatórios emitidos podem conter inconsistências em função de algumas restrições do próprio sistema. O código-fonte (linguagem de programação) também é analisado, para verificar se existem erros gerados por intermédio de novas implantações ou se a integração com outros sistemas acontece de forma adequada. Para concluir o processo, investiga-se a forma como os dados são armazenados, ou seja, se existem backups disponíveis, quem possui acesso ao banco de dados, etc., finalizando com os testes de integridade, os quais buscam respostas, por exemplo, para os seguintes questionamentos: O valor movimentado nos lançamentos contábeis é o mesmo apontado no balanço? Os valores registrados nos pagamentos são diferentes dos que constam nos extratos bancários? Os valores movimentados entre diferentes sistemas apresentam disparidades? Existem justificativas para valores divergentes dentro de um fluxo? 5. Análises financeiras e contábeis: revisando as informações financeiras e contábeis relacionadasàs alegações da suposta fraude, podem-se identificar os impactos financeiros, os possíveis envolvidos e até mesmo falhas nos controles internos. O fluxo normal dos processos empresariais envolve três fases, e podemos encontrar fraudes em cada uma delas. A primeira fase é a operacional. Nessa etapa, há o fechamento dos contratos, a compra de imobilizados e de equipamentos de produção, a aquisição do estoque para a produção, etc. Dentro desse contexto, podemos encontrar as fraudes operacionais. A segunda fase é a dos registros contábeis. Durante esse estágio, temos os processos financeiros e gerenciais (sistemas), os registros financeiros contábeis (razão contábil), a elaboração do balancete de verificação e o fechamento dos demonstrativos contábeis. Nesse caso, é possível observar fraudes contábeis. A terceira fase é a das demonstrações contábeis e financeiras, na qual temos a elaboração das demonstrações contábeis e das notas explicativas, a assinatura da carta de representação e a emissão das demonstrações financeiras. Nesse contexto, podemos encontrar as fraudes em demonstrações contábeis e financeiras. Como se dá o esquema de fraude nas demonstrações contábeis e financeiras? Na conta clientes, podem-se encontrar receitas fictícias, diferenças temporais e avaliação indevida dos ativos. Nas contas estoques e imobilizados, é possível detectar diferenças temporais e avaliação indevida dos ativos. Nas contas fornecedores e empréstimos, podem-se encontrar omissões de 95 passivo. Nas contas de receitas, é possível identificar receitas fictícias e diferenças temporais. Nas contas de despesas, podem-se encontrar diferenças temporais, avaliação indevida e omissão de despesas. As análises contábeis comumente realizadas estão elencadas no Quadro 4.1, a seguir: Quadro 4.1 | Exemplos de análise e descrição de testes Exemplos de análises Descrição do teste Contas divergentes Pagamentos realizados para diferentes contas bancárias de um mesmo fornecedor. Mesma conta bancária Pagamentos realizados para contas bancárias iguais de diferentes fornecedores. Fornecedores não cadastrados Pagamentos realizados a fornecedores não incluídos no cadastro de fornecedores. Mesma referência de Nota Fiscal no mesmo ano Pagamentos a fornecedores cujo campo de referência indique uma mesma NF ou conste em branco. Mesma data de lançamento/pagamento Pagamentos realizados a um mesmo fornecedor na mesma data. Fornecedores cadastrados com o mesmo registro de endereço na base Pagamentos realizados a fornecedores registrados no cadastro com o mesmo endereço. Contas raramente utilizadas Pagamentos contabilizados em contas contábeis pouco utilizadas ou com natureza divergente do serviço. Lançamentos manuais Lançamentos manuais e/ou contas com muitos lançamentos manuais. Usuários (sistemas e logs de alteração) Lançamentos e/ou alterações realizadas por usuários envolvidos nas alegações. Lançamentos sem descrição Lançamentos sem descrição ou com descrição divergente da natureza da conta. Fonte: EY Forensics Academy (2022a). 6. Reporte dos resultados: nesse procedimento, o perito prepara o seu laudo pericial, com a descrição minuciosa da dinâmica dos fatos que foram examinados e os critérios adotados para responder aos quesitos formulados pelo juiz, seguindo os itens exigidos pelo Novo Código de Processo Civil. Antes de finalizar esta seção de estudos, devemos observar que o trabalho contábil é bastante complexo, exaustivo e normalmente passível de erros. O que estamos debatendo, nesse contexto, é que, em determinadas ocasiões, erros comuns acabam se transformando em fraudes. Identificá-los e diferenciá-los faz toda a diferença dentro de uma perícia contábil. Imputar um dolo injustamente pode acabar com a carreira de um profissional. Ao mesmo tempo, ignorar uma fraude significará a perpetuação dos problemas, com a certeza da impunidade. 96 REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 13 out. 1941. Disponível em: https://bit.ly/3L84Mrs. Acesso em: 27 mar. 2022. EY FORENSICS ACADEMY. Investigações forenses: aula 8. Rio de Janeiro: UERJ, 2022a. EY FORENSICS ACADEMY. Investigações forenses: aula 9. Rio de Janeiro: UERJ, 2022b. EY FORENSICS ACADEMY. Investigações forenses: aula 10. Rio de Janeiro: UERJ, 2022c. LARA, W.; GAZZONI, M. Justiça condena 7 ex-executivos do banco Panamericano. G1, 8 fev. 2018. Disponível em: http://glo.bo/3U3MMSX. Acesso em: 19 abr. 2022. PAES, A. L. da S. Os desafios na formação do perito contador do estado do Rio de Janeiro: da graduação à inserção no mercado de trabalho. 2019. 166 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Contábeis) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Administração e Finanças, Rio de Janeiro. Disponível em: https://bit.ly/3xhbK7O. Acesso em: 27 mar. 2022.Silva Paes SEM MEDO DE ERRAR Vamos retomar o caso hipotético que você está periciando? A companhia analisada apresentou divergências nas contas de receitas: o valor foi lançado originalmente como vendas de equipamentos, mas, posteriormente, foi alterado para receita de aluguel, causando distorção do real desempenho dos negócios. FRAUDES COMETIDAS Possíveis receitas fictícias, que normalmente ocorrem por meio do registro de vendas de produtos e/ou serviços que não aconteceram. Nesse caso, os serviços podem até ter sido realizados, porém, já que foram registrados como vendas de equipamentos e depois alterados para receita de aluguel, há um gap que precisa ser analisado. Além disso, referem-se a transações significativas, fora do curso usual dos negócios da empresa, o que já liga o sinal de alerta ou a red flag. Possíveis divergências no ativo imobilizado, uma vez que as receitas foram geradas, num primeiro momento, como venda de imobilizado. Diante disso, deve-se buscar a evidência física da existência ou inexistência de tais ativos. ANÁLISES FINANCEIRAS/CONTÁBEIS QUE PODERIAM AUXILIAR NA DETECÇÃO DAS IRREGULARIDADES E DE VALORES ENVOLVIDOS Iniciamos nossa investigação por meio da análise das evidências da receita, como: ordens de serviços, contratos, comprovantes de recebimento e a respectiva alocação em centro de custo. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm https://g1.globo.com/economia/noticia/justica-condena-7-ex-executivos-do-banco-panamericano.ghtml https://www.bdtd.uerj.br:8443/bitstream/1/8050/1/dissertacao_Aurea_Lopes_da_Silva_Paes.pdf 97 Posteriormente, avaliamos a receita versus os controles gerenciais de mensuração dos serviços prestados, verificando o aging list de contas a receber, ou seja, como foi a composição do fluxo de caixa em termos de pagamentos e recebimentos. Como toda receita deve ter um custo correspondente, analisar os documentos que geraram as despesas diretamente relacionadas às receitas auxiliará na identificação do que realmente ocorreu na empresa. Por último, investigamos as evidências da existência ou inexistência do ativo imobilizado da companhia, examinando laudos de avaliação e inventários, documentos que comprovem suas aquisições (como pedidos de compras, notas fiscais e comprovantes) e possíveis notas fiscais de alienações e baixas. Vale destacar que outras análises poderão ser necessárias no curso da investigação, uma vez que nunca temos ciência do que encontraremos em nosso trabalho, ok? AVANÇANDO NA PRÁTICA PROBLEMAS DE SENHA NO AMBIENTE CORPORATIVO Para contextualizar seu processo de aprendizagem, suponha que você trabalhe no departamento contábil de uma grande empresa da área médica. Seu colega de trabalho, que entrou na corporação na mesma época que você e é muito querido, atrasou a entrega dos relatórios contábeis/financeiros por conta de problemas particulares e, para completar, depois de várias tentativas deacesso ao sistema, acabou sendo bloqueado. Ele, agora, além de atrasado, também não consegue trabalhar, pois o TI só liberará uma nova senha no dia seguinte. Na iminência de uma demissão, ele, então, tem a brilhante ideia de trabalhar, somente naquele dia, com a sua senha. Para tanto, seu colega gentilmente pede seus dados de acesso, e você tem que tomar uma importante decisão: compartilhar a sua senha e permitir que seu companheiro de trabalho faça mudanças no sistema como se fosse você ou recusar a ideia, deixando que ele lide com as consequências de seus problemas pessoais. Faça a sua escolha e justifique-a com base em seu aprendizado. 98 UNIDADE 4, SESSÃO 2: PERÍCIA DOCUMENTAL PRATICAR PARA APRENDER As fraudes ocupacionais relacionam-se a corrupção, apropriação indébita de ativos e falsificação de informações. Dentro do contexto “falsificação”, as evidências documentais são consideradas como afirmações escritas ou gravadas de fatos ocorridos ou não, uma vez que podem envolver a omissão, manipulação, adulteração, exclusão, etc. de alguns dados em documentos ou, ainda, lançamentos contábeis gerados sem o devido suporte documental. Hoje, com o avanço dos cibernegócios e a transformação dos dados em arquivos digitais, fraudes documentais virtuais passaram a fazer cada vez mais parte do âmbito empresarial, dificultando progressivamente o processo de investigação, o que leva peritos a integrarem processos tecnológicos forenses e técnicas de analytics para manter a integridade das informações colhidas. Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você faça parte de uma equipe que investiga uma denúncia anônima recebida pela empresa MN Corporação, a qual alega que um funcionário da corporação teria alterado o código de barras de boletos emitidos pelos fornecedores, vinculando os valores a receber a contas bancárias de empresas relacionadas a ele. Após o pagamento do boleto adulterado, o profissional teria realizado o pagamento ao fornecedor de direito, gerando dois pagamentos no mesmo valor para cada boleto. E, para que o esquema não fosse identificado, ele contabilizava os dois pagamentos contra as contas a pagar da empresa MN Corporação. No seu ponto de vista, quais documentos devem ser analisados para evidenciar cada um dos elementos das alegações apresentadas anteriormente? E com qual objetivo ou justificativa devem ser examinados? Então, vamos lá? Reflita sobre os seus conhecimentos contábeis e indique o que realmente precisa ser feito. CONCEITO-CHAVE Documento é qualquer base de conhecimento que se possa utilizar para consulta ou prova, pois é a reprodução de um fato ou pensamento, independentemente da forma como é apresentado: em papel, em arquivo, em vídeo, etc. Num primeiro momento, deve-se analisar a autenticidade do documento, que vem da garantia da originalidade do seu conteúdo. Verifica-se a sua procedência e identifica-se a possibilidade de que seja modificado, desvinculado ou reutilizado em outro local. Em seguida, é preciso analisar a sua consistência, ou seja, se há suporte material ou algum fato que o tenha gerado. Ele não pode ser alvo de adulteração ou cancelamento e, caso isso aconteça, tais eventos devem ser detectados. Dentro da perícia, a análise documental é utilizada para garantir a autenticidade da informação nos meios judiciais e/ou extrajudiciais e impedir que as fraudes aconteçam. É um procedimento que usa técnicas capazes de identificar, de forma segura, se houve adulterações em textos e constatar, até mesmo, se houve coação no momento da escrita. Atualmente, o documento não é apresentado apenas por meio de papel. Temos observado, cada vez mais, a exibição das informações por meio eletrônico, em função da rapidez no trânsito de dados, trazendo aos meios empresariais a redução de espaços físicos e a diminuição dos custos operacionais. No entanto, essa alteração de suporte também deve satisfazer o mesmo grau de segurança 99 dos documentos em papel. A partir da aplicação de recursos técnicos, também é necessário assegurar a consistência e a procedência da informação. REFLITA A tecnologia e os estudos sobre as análises documentais têm avançado muito, mas os falsificadores também vêm se aperfeiçoando. Diante disso, cabe ao perito manter-se capacitado, a fim de estar sempre um passo à frente dos fraudadores e, assim, tentar inibir e minimizar todos os estragos. A perícia documental se inicia a partir da identificação do formato em que os dados são apresentados: em papel ou de modo digital. Começaremos descrevendo o processo a partir do documento digital, que pode ser exibido de forma estruturada (arquivos em XML, sistema integrado ERP, etc.) ou de forma não estruturada (e-mails, planilhas, vídeos ou áudios, etc.). Depois de identificar o documento e a forma pela qual é exposto, o próximo passo é a sua preservação, com o isolamento e a proteção da informação. A coleta acontece respeitando a cadeia de custódia e a verificação da integridade da informação, para assegurar que os dados não se alterem durante a manipulação do perito. Nesse momento, são utilizadas técnicas de analytics para que se respeite a extração dos dados, a preservação dos metadados e a recuperação do que foi deletado. LEMBRE-SE Analytics são análises e raciocínios sistemáticos aplicados a diversos negócios ou departamentos, gerados para uma tomada de decisão. É um conceito entendido como um ramo do Business Intelligence (BI). O planejamento de uma perícia documental digital deve considerar os seguintes passos: 1. Entendimento do caso e definição do escopo do trabalho: início do planejamento do trabalho pericial. 2. Mapeamento de dados e sistemas: entendendo se eles são estruturados ou não estruturados. 3. Planejamento da coleta: definindo qual tecnologia e quais técnicas devem ser aplicadas durante uma investigação. 4. Preservação e recebimento de custódia: identificando quem disponibilizou os dados e como as evidências foram manuseadas. 5. Documentação: identificando as características das evidências coletadas e os dados do servidor de dados. 6. Imagem forense: identificando as características da imagem gerada (data, horário, servidor, forma de acesso) e os softwares utilizados. 7. Validação da coleta: verificando a integridade e a legibilidade da informação. 8. Devolução da custódia: mantendo-a na análise apenas pelo tempo necessário. Durante a revisão dos documentos e a partir de dados não estruturados, deve-se ter especial atenção ao tentar reduzir a quantidade de informações coletadas, que chegam de formas dispersas, para que evidências importantes não passem despercebidas. O processo também deve envolver a organização dos documentos, a revisão (que deve seguir um protocolo predefinido) e o acompanhamento da revisão, com a aplicação de técnicas de verificação de qualidade. 100 Por meio dos dados estruturados, devem-se analisar todas as camadas dos sistemas que a companhia utiliza, com a aplicação de testes de integridade, documentais, sistêmicos e de hipóteses. Os testes de integridade têm como propósito identificar se existem diferenças com relação aos valores movimentados entre todos os sistemas e se há justificativas plausíveis para possíveis divergências. Dentro dos sistemas, é preciso verificar se existem políticas de conciliação entre os módulos ou sistemas adotados pela empresa e se os controles externos indicam os mesmos valores encontrados nos sistemas. Nos testes documentais, torna-se necessário checar se as quantidades de registros são iguais às quantidades coletadas e se os totais vistos nas telas são os mesmos vistos nos arquivos coletados. Por último, devem-se desenvolver os testes de hipóteses, que buscam anomalias e padrões na qualidade dos dados, a partir da aplicação de técnicas estatísticas. A perícia documental, ou documentoscopia, costumaser utilizada tomando como base documentos em papel e envolve: • A análise de assinaturas, documentos e textos, fazendo o reconhecimento por meio da comparação das escritas (grafoscopia). • A identificação de modificações feitas em documentos, como substituições, emendas, raspagens, rasuras, entre outros tipos de alterações. • A comprovação de que o documento foi escrito por meio de coação, a partir de modificações na escrita causadas por efeitos de coação, doenças e até mesmo uso de drogas. • A recuperação de documentos danificados que estejam molhados, raspados e até mesmo queimados, identificando textos cobertos por líquidos corretores ou tintas. • A identificação de fraudes a partir da verificação de assinaturas, analisando se houve substituição de folhas encadernadas, se a escrita foi feita com tinta invisível, etc. ASSIMILE Grafoscopia, também conhecida como grafotecnia, é uma parte da documentoscopia que tem como objetivo estudar a escrita, verificando sua autenticidade e autoria a partir de características gráficas utilizadas na elaboração de um documento. O fato é que, independentemente da forma como a informação se apresenta, seja em papel ou via digital, sempre que existe algum indício de fraude, o processo de investigação deve passar, obrigatoriamente, pela análise documental. Vejamos, a seguir, alguns exemplos de esquemas de fraudes e os testes recomendados para cada um deles, de acordo com a EY Forensics Academy (2022). Receitas fictícias: ocorrem por meio do registro de vendas de produtos ou serviços que não aconteceram. Envolvem frequentemente o registro de clientes falsos, mas também podem ser oriundas do registro de receitas falsas (de transações que nunca existiram) atribuídas a clientes verdadeiros. Testes recomendados: a. A perícia deverá buscar as evidências da receita, analisando ordens de vendas, contratos assinados entre as partes, comprovantes de recebimentos e a locação em centros de custos. b. A perícia deverá analisar as contas a receber, na tentativa de conciliar as receitas com os clientes para identificar inconsistências. 101 c. A perícia deverá analisar as receitas versus controles gerenciais da empresa, investigando a mensuração dos serviços prestados e/ou do custo da mercadoria/produto vendido para também identificar inconsistências. d. A perícia deverá analisar os estoques da empresa, analisando os inventários, os controles de estoques, etc., buscando confrontar com as receitas apresentadas. O que normalmente chama a atenção do perito: • Uma quantidade de contas a receber vencidas descomunalmente grande. • Transações significativas, fora do curso usual de negócios, e com partes relacionadas ou entidades que não sejam auditadas. • Contas a receber pendentes de clientes difíceis ou impossíveis de se identificar. • Volume de vendas significativo para entidades cujos sócios/objeto social sejam desconhecidos. • Alto volume de cancelamentos. Diferenças temporais: trata-se do deslocamento de receitas ou despesas ao longo do tempo, de modo a manipular o resultado. Envolve o income smoothing ou o “gerenciamento dos resultados”. Testes recomendados: a. A perícia deverá fazer análises temporais das receitas versus fluxos de caixa, para identificar possíveis inconsistências. b. A perícia deverá analisar os controles gerenciais, com o objetivo de acompanhar a evolução das receitas e das despesas. c. A perícia deverá analisar os documentos que suportaram os registros contábeis, como os contratos firmados entre as partes (que determinavam as condições comerciais), as notas fiscais, os comprovantes de pagamentos e os boletins de medição. O que normalmente chama a atenção do perito: • Crescimento rápido ou não usual da lucratividade. • Geração negativa de fluxo de caixa operacional associada a reportes de crescimento em receita. • Transações significativas, fora do curso usual de negócios, e próximas do final do período, levando a questionamentos sobre sua essência. • Crescimento não usual da margem bruta. Avaliação indevida de ativos: ocorre por meio da manipulação dos valores de ativos, normalmente com o objetivo de inflar ativos do balanço ou melhorar indicadores financeiros. Testes recomendados: a. O perito deverá analisar as contas a receber, fazendo a circularização de clientes (com o envio de solicitação de informações sobre os valores em aberto), recalculando as Perdas Estimadas para Crédito de Liquidação Duvidosas (PECLD) e aplicando os testes de liquidação. b. O perito deverá analisar os estoques, buscando recalcular as perdas de itens obsoletos, e analisar os documentos que comprovam a aquisição dos estoques. 102 c. O perito deverá analisar todo o imobilizado da empresa, identificando os laudos de avaliação e o inventário físico dos ativos imobilizados, além de verificar documentos que comprovam a aquisição desses bens, como os pedidos de compras, as notas fiscais e os comprovantes de pagamentos. O que normalmente chama a atenção do perito: • Superavaliação das contas a receber por estimativa inadequada da PECLD. • Quantidade de contas a receber vencidas de forma descomunal. • Vendas para clientes com restrições e/ou inaptos. • Avaliação inadequada do custo dos estoques. • Inexistência física dos estoques. • Inexistência física de ativos imobilizados. • Depreciação acumulada subavaliada por erro de cálculo. • Inadequação de balanceamento de saldo decorrente da classificação de curto e longo prazo. Omissão de passivos e despesas: meio de melhorar o resultado de uma demonstração financeira. Normalmente, é a fraude mais difícil de se detectar, pois, como são dados omitidos, costuma não deixar traços. Testes recomendados: a. O perito deverá comparar a variação do fluxo de caixa, considerando tendências de receitas e despesas. b. O perito deverá analisar a variação da margem dos prazos médios de pagamentos (Days Payable Outstanding – DPO) das obrigações. c. O perito deverá revisar todas as transações ocorridas após o período final das demonstrações financeiras. d. O perito deverá analisar todos os documentos que comprovam as despesas e as obrigações da empresa, como notas fiscais e comprovantes de pagamentos. O que normalmente chama a atenção do perito: • Geração negativa e recorrente de fluxo de caixa operacional, mesmo reportando crescimento em receita. • Ativos, passivos, receitas ou despesas baseados em estimativas que envolvam julgamento subjetivo ou premissas difíceis de se embasar. • Participação/preocupação excessiva da administração não financeira nas decisões contábeis (princípios e estimativas). • Crescimento incomum na margem bruta ou excessivo em relação a parâmetros da indústria. • Diminuição incomum do número de DPO em comparação aos concorrentes. Divulgações indevidas: princípios contábeis requerem que sejam divulgadas todas as informações relevantes ao negócio de uma organização, o que é suscetível a subjetividade e manipulação. Testes recomendados: a. O perito deverá analisar todas as atas de reuniões ocorridas após a data de encerramento do exercício até a data de publicação das demonstrações contábeis. 103 b. O perito deverá observar os eventos subsequentes, como os pagamentos e os recebimentos emitidos entre as datas do encerramento do exercício e da publicação das demonstrações. c. O perito deverá analisar a carta da administração aos auditores e a declaração de anticorrupção. d. O perito deverá analisar todos os contratos mútuos e os documentos que suportam as transações entre partes relacionadas. O que normalmente chama a atenção do perito: • Administração dominada por uma pessoa ou grupo pequeno, sem que haja controles que compensem esse fato. • Supervisão inefetiva do comitê de auditoria. • Políticas de integridade ineficazes ou sem a devida execução. • Transações complexas pós-fechamentodo exercício. • Transações significativas com partes relacionadas fora do curso usual de negócios. • Incidência de contas bancárias, filiais e movimentação em paraísos fiscais. • Estrutura organizacional complexa, envolvendo entidades incomuns aos negócios. EXEMPLIFICANDO A companhia brasileira Via Varejo, proprietária de empresas como Ponto Frio, Casas Bahia, etc., encontrou evidências de fraudes contábeis em suas demonstrações financeiras referentes ao 4º trimestre de 2019, o que resultou em um impacto de R$ 1,19 bilhão nas despesas do resultado e na consequente diminuição do seu lucro. Do montante total, R$ 1 bilhão se referia a provisões para contingências de processos trabalhistas e R$ 76 milhões, à baixa/depreciação de ativos fixos fora da competência. O esquema de fraude utilizado pela empresa se referiu a “diferenças temporais”. Caso você queira saber mais detalhes sobre o assunto, faça a leitura do texto indicado a seguir. Para acessar o material, consulte o link disponível nas Referências desta seção. CONCLUSÃO da investigação independente. Via Varejo S.A., São Caetano do Sul, 25 mar. 2020. O perito, ao elaborar o seu relatório (parecer pericial contábil), deverá adotar os mesmos critérios utilizados na formulação de um laudo pericial contábil, mantendo a estrutura indicada na NBC TP 01 (BRASIL, 2015). Sua linguagem, durante a descrição dos fatos analisados, deverá ser simples, clara e objetiva, não se esquecendo de que o objetivo principal do trabalho é elucidar inconsistências contábeis. REFERÊNCIAS BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Norma Brasileira de Contabilidade: NBC TP 01 (R1) Perícia Contábil. Brasília, DF: Conselho Federal de Contabilidade, 2015. Disponível em: https://bit.ly/2kXUT4l. Acesso em: 7 abr. 2022. CONCLUSÃO da investigação independente. Via Varejo S.A., São Caetano do Sul, 25 mar. 2020. Disponível em: https://tinyurl.com/2ptcdhrp. Acesso em: 1 maio 2022. http://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/NBCTP01.pdf https://s3.amazonaws.com/mz-filemanager/ce9bff9f-fb19-49b9-9588-c4c6b7052c9c/5e9e4e99-290f-401e-a323-d12f6d646506_Via%20Varejo_Fato%20Relevante%20Investigacao.pdf 104 DOCUMENTOSCOPIA e grafotecnia. Associação Portuguesa de Ciências Forenses, [s. d.]. Disponível em: https://bit.ly/3L55hCB. Acesso em: 1 maio 2022. EY FORENSICS ACADEMY. Investigações forenses: aula 10. Rio de Janeiro: UERJ, 2022. SCATOLINI, L. Quase 8 milhões de brasileiros foram vítimas de fraudes no último ano. Agência Brasil, 22 nov. 2018. Disponível em: https://bit.ly/3RVm3Gr. Acesso em: 1 maio 2022. FOCO NO MERCADO DE TRABALHO SEM MEDO DE ERRAR Vamos retomar o caso hipotético que sua equipe está investigando? Um funcionário da empresa MN Corporação está supostamente alterando o código de barras de boletos emitidos pelos fornecedores. Além disso, ele ainda gera, possivelmente, dois pagamentos para cada boleto adulterado, de modo que um valor vai para a conta do fornecedor e o outro, para a conta de empresas relacionadas ao funcionário. Com base nos fatos, sua equipe precisa analisar diversos documentos para evidenciar cada uma das alegações, começando com: 1. Análise das obrigações, como verificação das notas fiscais recebidas dos fornecedores, dos boletos emitidos pelos fornecedores, dos comprovantes dos pagamentos efetuados pela empresa. Tal análise tem como objetivo identificar se há evidências documentais dos pagamentos em duplicidade, além de promover o acompanhamento da movimentação financeira de cada fornecedor ao longo do tempo e do volume de compras por fornecedor. 2. Análise dos controles financeiros da empresa, como fluxo de caixa, movimentação bancária, etc. Esse processo tem a intenção de confrontar os controles financeiros com as informações contábeis e identificar possíveis divergências com os pagamentos efetuados pela corporação. 3. Circularização bancária: tal procedimento tem como objetivo identificar se as informações bancárias estão em consonância com a contabilidade e detectar possíveis divergências. 4. Circularização de fornecedores: busca identificar o montante das compras efetuadas pela empresa e detectar possíveis inconsistências com a contabilidade. 5. Análise do sistema operacional utilizado pela empresa no seu processo de contabilização: tem a intenção de identificar as transações efetuadas e o(s) autor(es) envolvidos em cada transação. AVANÇANDO NA PRÁTICA POTENCIAIS TIPOS DE FRAUDES CONTÁBEIS Para contextualizar a sua aprendizagem, suponha que você seja funcionário(a) de uma empresa de grande porte do ramo de gás e energia, a qual está envolvida num suposto caso de fraude contábil. De acordo com a denúncia de um funcionário do alto escalão, a http://apcforenses.org/?page_id=30 https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2018-11/quase-8-milhoes-de-brasileiros-foram-vitimas-de-fraudes-no-ultimo-ano 105 companhia teria contabilizado, num determinado ano, uma receita de US$ 12,4 bilhões por vendas ocorridas durante os três anos anteriores, sem ter havido entrega de mercadoria. Os valores relacionados a essas vendas, porém, nunca foram recebidos e a empresa não contabilizou quaisquer tipos de perdas em decorrência do não recebimento de tais valores. Alega-se que os registros estavam associados a clientes inexistentes. Uma vez que o processo de investigação iniciará em dez dias, seu chefe pediu que você identificasse os potenciais tipos de fraudes cometidas pela empresa, para que ele prepare um relatório preliminar. 106 UNIDADE 4, SESSÃO 3: PERÍCIA EMPRESARIAL PRATICAR PARA APRENDER Agora que já conhecemos todo o processo de fraude contábil, suas características e formas de atuação do auditor e do perito, vamos entender mais detalhes sobre a perícia empresarial? Nesta seção de estudos, trabalharemos com as perícias empresariais, compreendendo o que são e como podem ajudar os empresários. Então, nesse contexto, suponha que você tenha sido contratado como assistente técnico da empresa InterAmericana Ltda. para elaborar alguns quesitos sobre um processo judicial em que a corporação está envolvida. Ocorre que a empresa InterAmericana celebrou um contrato para a prestação de serviços elétricos à organização TeleAtendimento S.A. em 20 de dezembro de 2017, no valor total de R$ 10.400.000,00 e vigência de 01/01/2018 a 31/12/2021. As empresas optaram pela renovação automática do contrato, caso não haja manifestação expressa de alguma das partes. Em setembro de 2020, a empresa TeleAtendimento optou por rescindir a relação comercial sem pagamento de qualquer multa contratual, ainda que prevista em contrato, alegando potenciais irregularidades na execução do contrato, impetrando uma ação judicial contra a corporação InterAmericana, com pedido de indenização. Sabe-se que a empresa InterAmericana está localizada na cidade de São Paulo e vinha executando os serviços na cidade do Rio de Janeiro, onde precisou admitir 497 funcionários para o desenvolvimento do trabalho contratado. Além disso, ao longo dos anos, a empresa TeleAtendimento repassou mais e mais trabalho para a InterAmericana, de modo que esta deixou de prestar serviços para outros clientes, tornando-se “quase exclusiva” da TeleAtendimento. Como assistente técnico, você deverá elaborar alguns quesitos que serão respondidos pelo perito judicial nomeado nesse processo. Seu trabalho é formular questões que busquem elucidar algumas divergências do litígio e, o mais importante, tentar identificar o valor da perda ocorrida. A quantidade de quesitos depende muito da demanda que precisa ser analisada. É importante ressaltar que o assunto envolve a apuração dos fatos e a mensuração da perda. Então, vamos lá? CONCEITO-CHAVE Primeiramente, é importante salientar, mais uma vez, que a contabilidade é uma área que auxilia na tomada de decisão em diversas esferas: não somente em processospenais e criminais (como já estudamos anteriormente), mas também no deslinde de questões de cartões de crédito, capitação de juros, etc., em processos cíveis de operações com cheque especial, em procedimentos administrativos oriundos do Ministério Público ou quando a matéria discutida for de natureza trabalhista. A perícia contábil também é utilizada em assuntos que versam sobre avaliação de sociedades e apuração de haveres, em processos de falências e recuperação de empresas, no âmbito tributário, sobre matéria patrimonial, em contratos de financiamento e em erros na contabilidade das organizações. Estudos demonstram, ainda, sua aplicação na contabilidade ambiental, em ações no sistema financeiro de habitação, em revisão de contratos, em assuntos sobre a 107 desoneração da folha de pagamento, assim como nas ações de lucros cessantes, de apropriação indébita previdenciária, nos processos de recuperação judicial, em perícias atuariais e em varas de família, nas quais é possível observar o contador auxiliando os juízes em decisões sobre pensão alimentícia quando o réu possui uma empresa. Além disso, o trabalho pericial não se restringe à esfera judicial, uma vez que o contador pode atuar como perito assistente em demandas extrajudiciais e arbitrais – também extrajudiciais segundo classificação do CFC. Mais recentemente, alguns estudos apontaram a semelhança entre a contabilidade forense e a perícia contábil. Logo, trata-se de uma área bastante rica e complexa, exigindo do perito contador capacitações constantes, em busca de aperfeiçoamento. PERÍCIA EMPRESARIAL De acordo com o conceito econômico do Código Civil, empresa é o exercício, realizado pelo empresário, de atividade econômica organizada para a produção de bens e serviços para o mercado. Independentemente de sua forma jurídica, isto é, seja uma associação, uma fundação, uma organização religiosa, um partido político ou sociedades simples e empresárias (empresa limitada – unipessoal ou não –, sociedade anônima, cooperativa, etc.), o fato é que, a partir da globalização e, consequentemente, do aumento da competitividade, mais e mais empresas vêm precisando repensar seus modelos de negócios, em busca de inovações e da otimização de qualidade e resultados, sejam eles financeiros ou não. Novas oportunidades estão surgindo a todo momento e, com elas, novas formas de realizar negócios, com a utilização de recursos tecnológicos modernos e ferramentas inovadoras de relacionamento com os clientes, fornecedores, funcionários, acionistas e comunidade. Diante desse ambiente cada vez mais competitivo, as empresas precisam efetuar mudanças estruturais profundas, na tentativa de trazer uma maior flexibilização e agilidade ao desenvolvimento de novos produtos e serviços, buscando reconfigurar totalmente os seus modelos de negócios, sob pena de não sobreviverem. Vejamos, então, alguns desafios do mundo corporativo e a consequente ajuda que a perícia contábil concede frente a isso. Disputas contratuais: normalmente envolvem a violação ou a inobservância de cláusulas contratuais, o que frequentemente, por falta de consenso, pode levar a disputas extrajudiciais ou judiciais. Na área cível, podemos encontrar problemas relacionados a contratos de empréstimos ou de financiamentos envolvendo taxas de juros não cumpridas, por exemplo, o que conduz os consumidores à justiça, tendo os bancos e outras instituições financeiras como réus. Essas ações podem ter como objeto a revisão contratual, quando o perito é levado a aplicar as cláusulas relacionadas ao contrato com o propósito de identificar se a taxa de juros empregada é realmente aquela contratada. Como consequência, valores de parcelas mensais poderão ser ajustadas e o próprio banco poderá ser responsabilizado por praticar o anatocismo. ASSIMILE Anatocismo é o termo jurídico que define a cobrança de juros sobre juros, que normalmente está associada à prática de mercado de aplicação de juros compostos em obrigações contraídas a prazo, oriundos de contratos firmados com instituições 108 financeiras. É importante esclarecer que a aplicação de juros compostos é uma prática lícita. O ilícito é a cobrança de juros sobre o montante de juros não pagos no mês anterior, o que caracteriza o anatocismo, este, sim, considerado uma prática ilegal. Apuração de haveres: os termos fusão, incorporação e cisão são operações de natureza jurídica pelas quais as sociedades são modificadas formalmente, conforme a regulamentação dada pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Por conta dessas reorganizações societárias, tornou-se fundamental o conhecimento de metodologias que permitam avaliar o valor de uma empresa. Além disso, em casos de dissolução de sociedade, na saída de um ou mais sócios, ou apenas como um indicador estratégico para avaliar os intangíveis (marca, capital intelectual, etc.), é importante conhecer os conceitos e as técnicas para se avaliar uma empresa, ou seja, deve-se ter domínio sobre o processo de apuração de haveres. Fusão: é a operação pela qual duas ou mais sociedades se unem para formar uma sociedade nova, que lhes sucederá em todos os direitos e obrigações (art. 228 da Lei nº 6.404/76). Incorporação: é a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhe sucede em todos os direitos e obrigações (art. 227 da Lei nº 6.404/76). Cisão: é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, e dividindo-se o seu capital, se a versão for parcial (art. 229 da Lei nº 6.404/76). Em reunião ou assembleia dos sócios de cada sociedade, após a deliberação das respectivas modificações e da aprovação do projeto do ato constitutivo das novas sociedades, bem como dos planos de distribuição do capital social, serão nomeados os peritos para a avaliação do patrimônio das sociedades. Caberá à CVM estabelecer normas especiais de avaliação e contabilização aplicáveis a operações que envolvam companhia aberta. Existem diferentes métodos para mensurar o valor de uma empresa (valuation), porém nenhum é capaz de representar o valor exato, uma vez que são utilizados, como base, hipóteses comportamentais do ambiente em que a corporação está inserida, sempre resultando em um valor aproximado. VOCABULÁRIO Valuation é um termo em inglês para Avaliação de Empresas, que representa um conjunto de técnicas usadas para determinar o valor justo de uma empresa ou unidade de negócios, bem como o seu potencial retorno. Cada processo avaliativo possui características próprias, sendo que a qualidade dos dados e informações apresentados será fundamental para a compreensão do fato em si e do objetivo da avaliação. As metodologias mais utilizadas são: Método da avaliação patrimonial: possibilita três tipos de mensuração: método de avaliação patrimonial contábil (baseado nas informações contidas no balanço patrimonial), método de avaliação patrimonial de mercado (a partir da valoração dos ativos e passivos da empresa a valores de realização no mercado) e método de liquidação, abordagem adotada quando o comprador está interessado apenas nas instalações físicas e itens do capital de giro (e não na sua capacidade de gerar fluxos de caixa no futuro). 109 Método pelo valor de bolsa: utilizado quando a empresa possui ações negociadas em bolsa de valores. O valor de mercado total da corporação pode ser obtido pela multiplicação da quantidade de ações em circulação versus o seu valor de mercado. Método dos múltiplos: método que estima o valor de uma empresa por meio da aplicação de um fator de referência baseado em organizações que atuam no mesmo segmento e que já foram avaliadas, ou seja, apoia-se na forma como seus paressão precificados no mercado. Método do fluxo de caixa descontado: abordagem bem mais complexa, é o principal método aplicado ao valuation, pois avalia o valor de mercado de uma empresa a partir das expectativas de geração de caixa no futuro, descontadas por uma taxa de atratividade e o risco associado ao investimento. É muito utilizado por bancos de investimentos, consultorias e empresários que querem calcular o valor de uma corporação, seja para fins internos, de análise de investimentos, ou para fusões e aquisições. Obrigações contratuais: um contrato é um negócio jurídico que só tem validade se for celebrado com o consentimento de pessoas capazes, em conformidade com a ordem legal, com objeto lícito e possível de ser determinado, e obedecer à forma prescrita pela lei. Ou seja, a forma não pode ser proibida por qualquer legislação. Sempre que o descumprimento contratual resultar em perdas ou danos para uma das partes, a outra parte (a que ocasionou o dano, seja por ação ou omissão, por culpa ou dolo) deverá reparar o prejuízo ocasionado, que abrange os danos emergentes e os lucros cessantes. Alguns contratos costumam prever cláusulas limitando as responsabilidades em caso de danos; outros inserem cláusulas classificando tais danos como diretos, indiretos, eventuais, consequenciais, etc. O fato é que definir o valor do dano, mensurando todos os riscos e possíveis prejuízos em caso de sinistro, acaba se tornando difícil em razão da subjetividade envolvida no processo, gerando interpretações diversas. Invariavelmente, os problemas se encerram nos meios judiciais, em que a prova pericial terá suma importância no momento da decisão, justamente porque conseguirá apurar a extensão do dano ocorrido e determinar a responsabilidade civil pelo não cumprimento das cláusulas contratuais. EXEMPLIFICANDO Dano emergente: é o prejuízo sofrido diretamente pelo fato ocorrido (dano direto), cuja indenização deve abranger tudo aquilo que o lesado tenha perdido, ou seja, o valor financeiro da redução patrimonial. Exemplo: a quebra de um contrato pode gerar, imediatamente, a perda de uma receita esperada para uma empresa. Dano consequencial: é o dano indireto, ou seja, o prejuízo ocorrido como consequência do dano direto sofrido. Exemplo: após a perda de uma receita esperada, uma empresa pode ter que arcar com mais perdas, caso tenha que demitir seus funcionários em função da quebra do contrato. Lucros cessantes: quando uma empresa sofre algum evento danoso provocado por um imprevisto, decorrente de culpa, negligência, imperícia ou omissão de terceiros, ela deverá estimar o montante de resultados econômicos que foram perdidos. No exemplo da quebra de um contrato, com danos emergentes e consequenciais, o lucro cessante seria o valor estimado do que a empresa lesada deveria ter lucrado, caso o contrato fosse cumprido integralmente. 110 Se já é difícil apurar um dano consequencial, mensurar o valor do lucro cessante pode exigir, a partir de um fundamento seguro de um dia típico de trabalho, análises objetivas por parte do perito, uma vez que ele não pode abranger ganhos imaginários mediante especulação ou alavancagens, para que não haja um enriquecimento indevido. O cálculo normalmente é feito a partir de uma projeção simulada quanto ao futuro daquela empresa. Análise tributária: a legislação tributária nacional é bastante abrangente e envolve a obrigação principal (o recolhimento do tributo) e a obrigação acessória (as informações sobre o recolhimento que precisam ser fornecidas aos órgãos fiscalizadores), podendo deixar algumas empresas de “cabelos em pé”. Além disso, são considerados tributos: os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria e as contribuições especiais. Podemos encontrá-los nas esferas municipal, estadual e federal e, em cada uma delas, há legislações específicas que precisam ser seguidas. Como se não bastasse, tais legislações passam por mudanças constantes, fazendo com que as empresas (e os empresários) se sintam bastante inseguros sobre como proceder para fugir das multas e autuações e, o mais importante, como usar essas legislações a seu favor. Diante de tantas deliberações do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), julgando, decidindo e criando jurisprudências, o trabalho do perito, dentro do âmbito extrajudicial, acaba sendo o de oferecer serviços de cálculos e recálculos, de modo que as empresas entendam tais mudanças e usufruam dos seus benefícios. No âmbito judicial, o perito auxilia advogados em ações ajuizadas, fornecendo planilhas que façam valer todos os direitos empresariais. REFLITA Em 2018, o STF firmou o entendimento de que o ICMS não pode compor a base de cálculo do PIS e da Cofins, uma vez que representa uma receita do Estado, e não um faturamento da empresa. Desse modo, o valor do ICMS destacado na nota fiscal para simples registro contábil, não deve ser incluído na base de cálculo PIS/Cofins. A mesma interpretação vem sendo discutida quanto à exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Liquidação de sentença: é o procedimento de cálculo do valor líquido de uma sentença quando já há uma decisão tomada, mas ainda sem fixação do montante devido. Geralmente, uma sentença já é líquida e estabelece limites em extensão da obrigação que deverá ser paga, mas, em alguns momentos, isso não acontece, principalmente em função da complexidade de se mensurar tal valor ou até mesmo o valor condenatório. Nesses casos, poderemos encontrar duas fases de discussão: a primeira é a de instrução, também chamada de fase de conhecimento de causa, na qual a discussão tem o objetivo de verificar se há ou não a procedência do mérito; e a segunda fase é a de liquidação, em que, após uma decisão favorável, discute-se o valor da prestação pecuniária que o condenado deverá pagar. O interessante é que poderá haver duas perícias, uma para cada momento. O novo Código de Processo Civil estabelece duas modalidades de liquidação de sentença: a liquidação por arbitramento (quando o juiz determina, por sentença, a necessidade de liquidação) e a liquidação pelo procedimento comum (quando ainda há a necessidade de alegar ou provar fatos novos). Dentro do âmbito empresarial, a liquidação de sentença pode estar atrelada a processos trabalhistas, a processos cíveis, a processos tributários, etc. Como já foi esclarecido, o perito, ao elaborar o seu relatório (parecer pericial contábil), deverá adotar os mesmos 111 critérios utilizados na elaboração de um laudo pericial contábil, preservando a mesma estrutura já mencionada em seções de estudo anteriores. Além disso, esse profissional também não pode se esquecer de manter uma linguagem simples, clara e objetiva, afinal o principal objetivo de seu trabalho é o de elucidar inconsistências contábeis, e nem todos os envolvidos dominam essa técnica. Vale destacar, ainda, que, em caso de cálculos, as planilhas devem envolver, da forma mais simples possível, o montante total final a ser cumprido. Finalizamos, assim, a última etapa de aprendizagem da importante disciplina Investigação e Perícia Criminal: Fraudes Contábeis. Espero que você tenha aproveitado cada ensinamento compartilhado e que possa usufruir e aproveitar todas as informações presentes neste material em seu dia a dia de trabalho. Boa sorte! REFERÊNCIAS BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 17 dez. 1976. Disponível em: https://bit.ly/2UqQCGG. Acesso em: 13 maio 2022. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: 11 jan. 2002. Disponível em: https://bit.ly/3L8LYZ9. Acesso em: 13 maio 2022. EXAME de suficiência. Conselho Federal de Contabilidade, 11 mar. 2022. Disponível em: https://bit.ly/3QGrU1k.Acesso em: 13 maio 2022. SEM MEDO DE ERRAR E então, conseguiu elaborar seus quesitos? Estamos diante de um fato bastante comum nas relações empresariais. A quebra do contrato (antes do seu encerramento) tornou a empresa InterAmericana insolvente, uma vez que ela dependia, quase exclusivamente, daquele serviço para sobreviver. Além disso, a corporação estava prestando serviços fora da sua sede e tinha em seu ambiente laboral 497 funcionários que ficaram sem trabalho. Você, como assistente técnico dessa empresa, precisou elaborar quesitos que deverão ser respondidos pelo perito judicial nomeado no processo judicial, tentando identificar as divergências envolvidas na relação contratual e o valor da perda ocorrida. Para começar, você deve identificar o que dispõem as cláusulas contratuais sobre quebra de contrato, motivos que ensejam a quebra de contrato e os valores de indenização, em caso de quebra de contrato. Observe, a seguir, um exemplo de quesito: 1. Pode o Ilustre Perito esclarecer o que estabelece o contrato de prestação de serviços no que se refere à quebra de contrato, como motivos que ensejam a rescisão antecipada e os valores das multas envolvidas? Num segundo momento, será necessário verificar se realmente houve potenciais irregularidades na execução do contrato, conforme alega a empresa TeleAtendimento. Exemplos de quesitos: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm#:~:text=LEI%20N%20o%2010.406%2C%20DE%2010%20DE%20JANEIRO%20DE%202002&text=Institui%20o%20C%C3%B3digo%20Civil.&text=Art.,e%20deveres%20na%20ordem%20civil https://cfc.org.br/category/exame-de-suficiencia-anteriores/ 112 2. Pode o Ilustre Perito identificar se há evidências de irregularidades na execução do contrato? Em caso positivo, quais foram as irregularidades apuradas e em que período elas ocorreram? 3. Caso tenha sido apurada irregularidade, pode o Ilustre Perito identificar o montante avaliado? 4. Caso tenha sido apurada irregularidade, pode o Ilustre Perito identificar quem foram os indivíduos envolvidos? E, para finalizar, você deve identificar quais foram os danos e o consequente valor da perda envolvidos na quebra do contrato. Exemplos de quesitos: 5. Pode o Ilustre Perito apurar o valor do faturamento mensal somado aos tributos envolvidos, por conta dos serviços prestados à TeleAtendimento, após análise dos livros obrigatórios, escrituração mercantil e documentos da InterAmericana? 6. Pode o Ilustre Perito apurar o valor das penalidades/descontos aplicados pela TeleAtendimento e por ela não pagos? 7. Pode o Ilustre Perito apurar o valor dos custos de mão de obra direta, indireta, horas extras, encargos sociais e benefícios suportados pela InterAmericana por conta dos serviços prestados à TeleAtendimento? 8. Pode o Ilustre Perito apurar o valor dos custos com equipamentos/veículos, gastos diversos no canteiro de obras, despesas com fornecedores, subcontratações, encargos financeiros e custos administrativos e operacionais por conta dos serviços prestados à TeleAtendimento? 9. Pode o Ilustre Perito identificar o valor dos lucros cessantes ocasionados pela quebra contratual antes da sua finalização? 10. Pode o Ilustre Perito identificar o montante final do prejuízo ocasionado à empresa InterAmericana depois de apurados todos os valores elencados nos quesitos anteriores? Claro que esses são apenas exemplos de quesitos. Os assistentes técnicos são livres para elaborar quantos quesitos acharem necessários, atentando-se para o fato de que devem elucidar todos os questionamentos envolvidos no processo. Além disso, bons quesitos geram boas respostas e, automaticamente, boas reflexões por parte do juiz, que decidirá a demanda. AVANÇANDO NA PRÁTICA APURAÇÃO DE HAVERES Ainda no contexto empresarial, suponha que você trabalhe em uma empresa cuja composição societária esteja distribuída da seguinte maneira: • Sócio 1: 23%. • Sócio 2: 12%. • Sócio 3: 25%. • Sócio 4: 40%. 113 Em fevereiro de 2022, os sócios 1, 3 e 4 resolveram excluir da sociedade o sócio 2 (a título de esclarecimento, a exclusão de sócio é perfeitamente possível, desde que o contrato social apresente uma cláusula que permita tal fato). Em função disso, a sociedade solicitou ao contador que apurasse um balanço patrimonial especial, a fim de demonstrar ao sócio 2 a sua participação nos haveres. Após o pedido, o contador informou que o patrimônio líquido da empresa estava constituído do seguinte modo: • Capital social: 220.000,00. • Reservas de lucros: 50.000,00. • Prejuízos acumulados: 70.000,00. • Lucro apurado em fevereiro de 2022: 80.500,00. Com essas informações em mãos, você ficou encarregado(a) de conferir o valor que o sócio 2 deverá receber após a apuração dos haveres. Então, que tal desenvolver um cálculo bem simples para elucidar essa questão?