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Carolina Ferreira UROLOGIA ESCROTO AGUDO -A dor escrotal aguda pode ser causada por torção testicular, torção do apêndice testicular ou epididimite. O grande desafio é a dificuldade de diferenciar esses diagnósticos, uma vez que os achados ñ são exuberantes e o dano espermatogênico secundário à torção de testículo inicia c/ 6 horas de evolução. -Define-se como quadro doloroso súbito c/ de volume da bolsa testicular, geralmente unilateral, c/ edema e rubor, podendo ser acompanhado por manifestações gerais como febre, sudorese, náuseas e vômitos. -Torção testicular: corresponde à torção do cordão espermático sobre o testículo, interrompendo seu aporte sanguíneo, o que pode levar à necrose. -Torção do apêndice testicular: corresponde à torção dos restos embrionários da regressão dos ductos de Muller e Wolff. -Epididimite: é o processo inflamatório ou infeccioso do epidídimo, que pode também afetar o testículo (orquite/orquiepididimite). -Etiologia: a conduta terapêutica a ser instituída depende do diagnóstico etiológico correto. Várias doenças podem se apresentar sob esse diagnóstico sindrômico. -Epidemiologia: a torção testicular é responsável por 50-60% dos casos de escroto agudo em adolescentes e por 25-30% de todos os casos pediátricos. A torção do apêndice testicular é + comum entre 7 e 10 anos, e a distribuição é a mesma entre os 2 lados. A epididimite é causa de 20% dos casos em adolescentes e menos de 1% em meninos pré-púberes. -Quadro clínico: nos casos de torção testicular, o paciente apresenta-se c/ dor súbita, sendo que a indicação do local pode ser precisa. Ñ há relatos de sintomas urinários ou corrimento uretral. Quando ocorre a torção do apêndice testicular, usualmente a dor também é súbita, mas o paciente localiza a dor em apenas um ponto específico do testículo, que normalmente é no seu ápice. Ñ se acompanha de náuseas ou vômitos. Já nos pacientes c/ epididimite, o início da dor geralmente é insidioso. Nos adolescentes sexualmente ativos, usualmente há uma infecção sexualmente transmissível associada. Nesses casos, são comuns o corrimento uretral e sintomas urinários. Quando não há infecção associada, o diagnóstico fica prejudicado. Não costuma apresentar-se com náuseas ou vômitos. -Exame físico: evidencia-se o testículo elevado em relação ao contralateral, e ausência do reflexo cremastérico. O paciente geralmente encontra-se desconfortável e sem posição de repouso, podendo apresentar vômitos. Nos pacientes c/ torção do apêndice testicular no exame físico, encontramos esse ponto de dor localizado e, na transiluminação, evidencia-se uma “mancha azulada”, que corresponde ao apêndice testicular torcido.O exame físico do paciente c/ epididimite, no estágio inicial, evidencia uma massa e macia posterior ao testículo. C/ a evolução, torna-se + difícil diferenciar o epidídimo do testículo, ficando, assim, muito semelhante à apresentação da torção testicular. -Exames de imagem: um exame comum de urina geralmente é normal no paciente c/ torção testicular, assim como no paciente c/ torção do apêndice testicular; já no paciente c/ epididimite c/ causa infecciosa, pode haver numerosos leucócitos. Nesses casos, um cultural também pode auxiliar. É muito importante esclarecer o fluxo testicular p/ se diferenciar entre torção testicular e epididimite. Existem dois exames capazes de aferir o fluxo testicular: a ecografia testicular c/ Doppler a cores e a cintilografia testicular. Quando a realização dos exames retardar a cirurgia, ultrapassando o prazo de risco de lesão testicular, eles ñ devem ser realizados. Durante a ecografia testicular c/ Doppler a cores, podem ser diferenciados os 2 tipos de torção. -Diagnóstico: preciso e rápido deve ser realizado p/ que o procedimento terapêutico permita preservar o órgão. -Diagnóstico diferencial: é feito a partir de orquite aguda, orquiepididimite aguda, torção do cordão espermático, torção dos apêndices testiculares, hérnia inguinoescrotal encarcerada, hidrocele e tumor testicular, apesar de esses 2 últimos ñ se classificarem como urgências. -Tratamento: quando houver o diagnóstico de torção testicular, pode-se realizar uma manobra de distorção manual antes da cirurgia p/ alívio dos sintomas, mesmo assim a cirurgia está indicada. Essa manobra consiste em rotar o testículo no sentido medial p/ lateral, quantas vezes forem necessárias p/ o alívio dos sintomas. Em casos de dúvidas sobre a causa da dor testicular, a exploração testicular está indicada, c/ o intuito de preservar o testículo. A exploração testicular é realizada por incisão na rafe escrotal, c/ abordagem inicial do lado torcido, realizando-se a destorção e aquecendo-se o testículo c/ compressas mornas. Se, após 30 minutos, o testículo ñ se recuperar, deve Carolina Ferreira UROLOGIA ser realizada a orquiectomia. Quando há recuperação, deve-se fixar esse testículo c/ fio ñ absorvível. Independentemente disso, é necessária a fixação do testículo contralateral. Nos casos de torção do apêndice testicular, em geral o uso de analgésicos e anti-inflamatórios, e algumas vezes de antibiótico, é suficiente. Em casos + avançados, a exploração testicular pode ser indicada p/ diferenciar da torção testicular. Em pacientes c/ epididimite, também o uso de analgésicos e anti-inflamatórios é suficiente. Nos adolescentes sexualmente ativos ou quando há diagnóstico etiológico, é indicado tratar a causa específica. Um suspensório escrotal pode ajudar no alívio dos sintomas. Epididimite, orquite orquiepididimite aguda : -A epididimite aguda é a causa + comum, no adulto, de escroto agudo, sendo sua etiologia possivelmente viral, bacteriana e idiopática. Comumente, seu quadro clínico é de início insidioso, uni e, + raramente, bilateral, com sinais flogísticos, de volume do conteúdo da bolsa testicular, sendo o epidídimo doloroso e espesso. Frequentemente, após 24 horas, existe participação do testículo, causando o que se denomina orquiepididimite. -A inflamação aguda do testículo: isolada, é pouco frequente, sendo a orquite pós-parotidite (caxumba), de etiologia viral, a mais habitual. Atinge os adultos jovens em até 30% dos casos. Comumente, os sintomas aparecem de maneira insidiosa, 7 dias após a parotidite, unilateral em cerca de 70%. A evolução é autolimitada, podendo levar a atrofia testicular em cerca de 50% e, quando atinge os testículos bilaterais, a esterilidade (10%). -A orquiepididimite aguda é o processo inflamatório + comum da bolsa testicular, podendo ser evolução da epididimite, e é comumente de etiologia bacteriana, sendo, em pacientes c/ menos de 40 anos, Chlamydia e Neisseria gonorrhoeae as bactérias + comuns e, acima de 40 anos, as Gram negativas, sendo a via de contaminação + comum a retrógrada (uretra prostática). -Diagnóstico: é feito pela história clínica, pelo exame físico e pelos exames laboratoriais e de imagem, como hemograma, urinálise + cultura e US c/ Doppler -Diagnóstico diferencial: torção de cordão espermático e hérnia encarcerada. -Tratamento: recomendam-se medidas gerais, que visem à melhora dos sintomas, como repouso relativo, gelo, suspensão escrotal, analgésicos, anti-inflamatórios e antibióticos adequados (ciprofloxacino por 10 a 14 dias), direcionadas ao diagnóstico etiológico específico. Convém lembrar que a melhora pode ser lenta, mesmo c/ tratamento adequado, e que o restabelecimento completo pode levar até 1 mês. -Complicações: abscesso escrotal e infarto testicular; consequentemente, ocorre infertilidade em níveis de 42%, quando bilateral, e 23%, quando unilateral. Orquiepididimite aguda (aspecto de bolsa testicular) Orquiepididimite aguda (aspecto detestículo e epidídimo) Torção de cordão espermático: -Em um quadro de escroto agudo, deve ser levantada a hipótese de torção de cordão espermático, até que se prove o contrário, principalmente em crianças e adolescentes. -Tipos de torções: 1. Extravaginais: ocorrem em testículos ñ descidos, exclusivas no período intrauterino ou em recém-nascidos, quando as fixações da túnica vaginal e do gubernáculo ao músculo dartos são frouxas. Correspondem a 10% de todas as torções; 2. Intravaginais: ocorrem em qualquer idade, c/ pico de incidência na puberdade, por uma anomalia de fixação do testículo, que permite que ele e o epidídimo flutuem livremente dentro da túnica vaginal, tal qual um “badalo de sino”. São defeitos anatômicos congênitos. Correspondem a cerca de 88 a 90% dos casos Carolina Ferreira UROLOGIA Escroto agudo: torção em adolescente, c/ de volume de bolsa testicular à direita Torção de cordão espermático -Quadro clínico: a dor é de início súbito, de grande intensidade, e pode estar acompanhada de náuseas e vômitos, sem relação c/ traumas e exercícios físicos. O sintoma predominante é a dor, em + de 90% dos casos, de início abrupto e intenso, referida ao longo do cordão espermático e/ou no baixo abdome, podendo ser acompanhada de náuseas e vômitos. Em RN, o quadro consiste em de volume do testículo, c/ bom estado geral -Exame fisico:o epidídimo pode mostrar-se anteriorizado, porém, caso esteja em sua posição normal, ñ afasta a hipótese de torção, pois pode estar torcido 360 °. Outro sinal que chama a atenção ao exame físico é a elevação do testículo na bolsa (redux testis), em cerca de 1 terço dos pacientes. Edema, eritema, dor à palpação e endurecimento são achados comuns, que podem confundir o diagnóstico. P/ diferenciar torção de cordão de orquiepididimite, 2 sinais são importantes a serem analisados: o sinal de Angell (paciente em pé e testículo contralateral horizontalizado) e o sinal de Prehn (piora ou manutenção da dor c/ a elevação do testículo na torção testicular e melhora da dor na orquiepididimite – sinal positivo). -Diagnóstico: deve ser feito de maneira precisa e rápida, p/ um tratamento cirúrgico na tentativa de salvar o testículo, pois o tempo de isquemia pode alterar a viabilidade deste. A torção pode ser de 90 a 180 °, acreditando-se que, quanto > o nº de torção, pior o prognóstico. O tempo de isquemia e comprometimento testicular é de 80% de viabilidade nas primeiras 5 horas e 20% de viabilidade após 10 horas. Alterações no leucograma e febre são raras. -Exames de imagem: o exame que fecha o diagnóstico da torção do testículo é a US do escroto c/ Doppler colorido, ela aponta a anatomia do cordão e o fluxo sanguíneo, que, nos casos de torção, está reduzido ou ausente. A cintilografia escrotal c/ o tecnécio-99m demonstra, também c/ precisão, a irrigação dos testículos, porém demanda + tempo e ñ está disponível na maioria dos serviços de urgência. O diagnóstico por imagem indicado, que não deve atrasar o tratamento cirúrgico, é a US de bolsa testicular com Doppler, que demonstra a ausência de vascularização. US c/ Doppler de torção de cordão c/ ausência de vascularização à esquerda -Tratamento: o objetivo é a revascularização do testículo pelo destorcimento do cordão espermático. Como cerca de 2 terços das torções ocorrem de lateral p/ medial, a tentativa de destorcer manualmente pode ser feita de maneira inversa, sempre visando manter a vitalidade do testículo. A correção cirúrgica está indicada mesmo quando, manualmente, consegue-se destorcê-lo, e é feita sempre a orquipexia bilateral, pois o defeito anatômico que permitiu a torção de um lado, em geral, existe bilateralmente. A orquiectomia pode ser realizada em caso de comprometimento da vitalidade do(s) testículo(s). Torção testicular(apêndice testiculares): -A torção testicular é uma emergência urológica resultante da torção do testículo no cordão espermático, causando uma constrição no suprimento vascular e isquemia tempo dependente e/ou necrose do tecido testicular Carolina Ferreira UROLOGIA -Os apêndices testiculares são estruturas remanescentes do desenvolvimento embriológico. A extremidade cranial do ducto mülleriano persiste como appendix testis. -São 4 os apêndices testiculares: appendix testis (apêndice testicular), appendix epididymis (apêndice epididimário), paradidimys (paradídimo – órgão de Giraldès) e vasa berrans (ducto aberrante – órgão de Haller), sendo o appendix testis o + comumente encontrado e torcido. -Epidemiologia: tem uma distribuição bimodal, sendo que a torção extravaginal afeta neonatos no período perinatal, e a torção intravaginal afeta homens de qualquer idade, mas ocorre c/ + frequência em adolescentes. Geralmente ñ é uma doença que afeta os idosos -Etiologia:a deformidade em badalo de sino é o defeito anatômico + comum associado ao desenvolvimento da torção testicular intravaginal. Outras etiologias incluem trauma. A etiologia exata da torção extravaginal é desconhecida e ñ se identifica um defeito anatômico -Fisiopatologia: normalmente, o testículo passa pelo canal inguinal coberto por uma camada de peritônio. Essa camada, a túnica vaginal, prende-se naturalmente à parede posterior, na parte inferior e na região superior do testículo. Se as 2 fixações da túnica vaginal ocorrerem na parte superior do testículo, a deformidade se desenvolverá em badalo de sino, o que a probabilidade de torção porque o testículo se move livremente dentro da túnica. Quando ocorre a torção, o tempo p/ destorção determinará a extensão da viabilidade testicular. A morte das células germinativas testiculares ocorre secundariamente ao suprimento de oxigênio reduzido, depleção da energia celular e formação de um metabólito tóxico. Os mecanismos p/ lesão por reperfusão/isquemia que pode afetar os 2 testículos foram sugeridos, incluindo mecanismos inflamatórios e/ou formação de radicais livres de oxigênio. Nº de rotações, que pode variar de 180° a 720°,e a duração da isquemia determinam o grau de viabilidade do tecido. Se o tratamento for iniciado até 4 a 6 horas após o início dos sintomas, os testículos provavelmente permanecerão viáveis. Se os testículos continuarem torcidos por + de 10 a 12 horas, provavelmente haverá isquemia e dano irreversível ao testículo. Após 12 horas, muito provavelmente terá ocorrido necrose. -Classificação: • Torção intravaginal: é o tipo + comum de torção testicular. Ela ocorre por causa de uma fixação anormalmente alta da túnica vaginal ao cordão espermático, que permite a rotação do testículo dentro da bolsa. Durante o desenvolvimento anatômico normal, o testículo passa pelo canal inguinal coberto por uma camada de peritônio. Essa camada, a túnica vaginal, prende-se à parede escrotal posterior, na parte inferior posterior do testículo e na região testicular superior. Se as 2 fixações da túnica vaginal ocorrerem na parte superior do testículo, se formará a deformidade em badalo de sino, o que a probabilidade de torção porque o testículo se move livremente dentro da túnica. • Torção extravaginal: é uma entidade rara. Ela ocorre durante o período perinatal quando o testículo desce e gira em torno do cordão espermático antes de fixar-se à parede escrotal posterior. • Mesórquio longo: o mesórquio é uma faixa densa de tecido conjuntivo que fixa os dúctulos eferentes do epidídimo à parede posterolateral dos testículos. Quando alongado, pode permitir que os testículos se torçam, e o epidídimo permaneça fixo -Diagnóstico: se dá pela clínica de dor, que pode ser de leve a forte intensidade, também de instalação súbita, comumente no polo superior do testículo, acompanhadaou ñ de edema e hiperemia da bolsa. A US é o exame indicado, e, feito o diagnóstico, o tratamento pode ser conservador, c/ analgésicos e anti-inflamatórios. -Prevenção primária: pacientes c/ uma história de criptorquidia devem ser encaminhados p/ correção. Um paciente c/ episódios de dor testicular intermitente que remite espontaneamente pode ter torção intermitente, que está associada a torção testicular subsequente e, por isso, esses pacientes devem ser encaminhados p/ uma avaliação urológica em tempo adequado. -Rastreamento: o exame de todos os neonatos do sexo masculino deve incluir um exame testicular p/ excluir criptorquidia e qualquer outra anormalidade da genitália, como a entidade rara de torção extravaginal. Em caso de criptorquidia, o lactente corre alto risco de apresentar torção. Dor abdominal regular ou inguinal de início súbito pode indicar a presença de torção, exigindo avaliação e intervenção urológica de urgência. -Prevenção secundária: durante a exploração, o testículo contralateral é fixo na parede posterior p/ evitar a torção testicular bilateral assíncrona. A torção recorrente pode desenvolver-se muitos anos depois em pacientes c/ uma Carolina Ferreira UROLOGIA história prévia de fixação testicular, independentemente do uso de suturas absorvíveis ou ñ absorvíveis.É importante um nível elevado de suspeita p/ esses pacientes p/ evitar o dano testicular