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FACULDADE ÚNICA DE IPATINGA FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO II SUMÁRIO Unidade 1: Conceitos básicos em fisiologia do exercício .............................................................. Unidade 2: Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais ........................... Unidade 3: Exercícios para gestantes .......................................................................................... Unidade 4: Exercício e estresse térmico. ..................................................................................... Unidade 5: Efeitos da utilização de Recursos ergogênicos no desempenho. .............................. Unidade 6: Efeitos fisiológicos agudos e crônicos do exercício físico............................................ INTRODUÇÃO Assumir a postura de um profissional que se apresente como mediador do conhecimento é compreender a diversidade e as complexidades que surgem na individualidade de cada educando diante de suas necessidades e potencialidades. Estudar em EaD não é uma tarefa tão fácil como muitos pensam, os desafios são constantes. Vale ressaltar que esta modalidade também permite muitas vantagens na aquisição de um curso superior, como a possibilidade da interatividade entre colegas, tutores e técnicos administrativos que auxiliam na construção da aprendizagem dentro do conforto de sua casa. O Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) disponibiliza uma gama de recursos, tecnologias da comunicação e ferramentas de apoio à aprendizagem que permitem a interação acima, entre elas estão: fóruns, chats, videoconferências, simulações e exercícios on-line. Não poderíamos esquecer que muitas pessoas gostam de ler e estudar o material de maneira física, fazendo suas anotações, grifos e dialogando com os autores a partir de comentários ou apresentando dúvidas para serem sanadas pelo tutor ou para serem compartilhada com os colegas. Buscando mais uma alternativa para apoiar os(as) alunos(as) em seus estudos, esta coletânea foi elaborada com o objetivo de facilitar a impressão de todos os capítulos de livros que estão disponibilizados no Ambiente Virtual de Aprendizado (AVA) para quem deseja estudar no material físico sem precisar imprimir os arquivos separados por unidades. Desta forma, o aluno poderá ter acesso a todos os textos que serão fundamentais para as atividades da disciplina em um só material. Bom trabalho e aproveite cada instante da oportunidade de construir conhecimento, pois este é um pilar fundamental para sua formação. Um abraço, Equipe Pedagógica FISIOLOGIA APLICADA À FISIOTERAPIA Marília Rossato Marques Conceitos básicos em fisiologia do exercício Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar as adaptações que ocorrem no organismo quando há realização de atividade física ou exercício. � Reconhecer as principais rotas metabólicas e como elas funcionam durante o exercício físico. � Relacionar os principais tipos de exercícios físicos com as rotas me- tabólicas predominantes. Introdução O nosso organismo necessita continuamente de energia, seja para realizar uma atividade física ou apenas se manter em repouso e desempenhar as funções biológicas básicas. Ao realizar um exercício físico, o corpo ativa mecanismos, a fim de produzir mais energia, em contrapartida, também pode apresentar gastos energéticos durante esse processo. É indispensável que o fisioterapeuta compreenda os efeitos dos diferentes exercícios físicos no organismo e quais são os principais me- canismos metabólicos envolvidos na realização desses exercícios. Esse conhecimento será diretamente utilizado para que a intervenção fisio- terapêutica seja planejada e definida. Dessa forma, neste capítulo, você irá estudar os conceitos básicos da fisiologia do exercício. Adaptações do organismo ao exercício físico Quando você realiza um exercício físico, é necessário que diversos sistemas do seu organismo sejam ativados de forma integrada. O conjunto de mudanças que acontecem envolve modificações no metabolismo e na homeostase cor- poral, a fim de proporcionar adaptações ao exercício realizado. Ao iniciar um movimento, receptores sensoriais presentes nos seus músculos e articulações (mecanorreceptores e proprioceptores) são ativados, enviando informações para o seu encéfalo, mais especificamente para o córtex motor. Por meio de vias descendentes do córtex motor, centros de controle no bulbo são estimulados e adaptações no organismo são iniciadas (SILVERTHORN, 2010). No sangue, por exemplo, as concentrações de hormônios, como o glu- cagon, cortisol, catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) e hormônio do crescimento, são alteradas. Essas modificações são indispensáveis para que o organismo obtenha energia para a realização do exercício físico. O glucagon, o cortisol e as catecolaminas, por exemplo, atuam mobilizando o glicogênio do fígado para a corrente sanguínea, aumentando os níveis plasmáticos de glicose, o principal substrato energético dos músculos para a execução de um exercício. O cortisol, as catecolaminas e o hormônio do crescimento ainda atuam na conversão de triacilgliceróis em glicerol e ácidos graxos. De forma associada, a secreção de insulina é diminuída durante o exercício físico, favo- recendo a baixa captação de glicose pelas demais células corporais e poupando a glicose no sangue para que possa ser utilizada pelos músculos esqueléticos na conversão em energia (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). No sistema respiratório, as respostas acontecem em decorrência ao estímulo proveniente do centro de controle respiratório, que é retroalimentado pelas informações sensoriais. A frequência e a amplitude da respiração aumentam, resultando na hiperventilação (hiperpneia do exercício). Durante e após o exercício físico, é observado um aumento no consumo de oxigênio para suprir a necessidade de oxigênio para o metabolismo aeróbio. Ao cessar o exercício, o consumo de oxigênio pós-exercício está relacionado à necessidade de usar o oxigênio para metabolizar o lactato, restaurar a concentração de FCr (fosfato de creatina) e ATP (adenosina trifosfato), bem como restabelecer a ligação entre a mioglobina e o oxigênio (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). De forma semelhante, o centro de controle cardiovascular, localizado no bulbo, estimula o sistema cardiovascular e, portanto, mais sangue é ejetado a cada contração cardíaca (volume sistólico). A frequência cardíaca ainda é aumentada, promovendo um aumento do débito cardíaco. O fluxo sanguíneo periférico também é modificado e os músculos recrutados durante o exercício Conceitos básicos em fisiologia do exercício2 recebem um maior aporte sanguíneo, enquanto outros tecidos não diretamente exercitados têm as suas arteríolas em vasoconstrição. Além disso, ocorre um aumento na pressão sanguínea (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). Grande parte da energia produzida durante o exercício físico é liberada sob a forma de calor, o que aumenta a temperatura corporal. Em consequência, dois mecanismos termorregulatórios são ativados: a sudorese e o aumento do fluxo sanguíneo cutâneo. Porém, ao mesmo tempo em que a temperatura corporal é diminuída pelo resfriamento gerado pela evaporação do suor, a sudorese leva à perda de líquidos, podendo causar desidratação. Em resposta à desidratação, há a ativação do processo de conservação de água nos rins associada à percepção de sede. O aumento do fluxo sanguíneo cutâneo também pode interferir na homeostase do organismo, pelo fato de diminuir a resistência periférica e desviar o fluxo sanguíneo dos músculos. Se a pressão venosa central tiver uma redução significativa por esse processo de termorregulação, o fluxo sanguíneo é normalizado para que ofluxo sanguíneo perfunda normalmente o sistema nervoso central (SNC) (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). Toda a ação integrada do metabolismo corporal e dos mecanismos de manutenção de homeostase diante do exercício físico permite que o organismo mantenha a sua estabilidade. Essa habilidade permite que o organismo evite ser submetido a alterações bruscas que criem risco ao seu funcionamento (Figura 1). Rotas metabólicas Para que o nosso organismo realize as suas funções, é necessário que seja pro- duzida energia. Essa energia química pode ser obtida pela quebra da molécula de ATP, o que faz com que um dos três grupos fosfato seja removido dessa molécula. Devido a essa importante função, o ATP é conhecido como a moeda energética dos seres vivos, a qual permite que exista energia para ser utilizada durante processos químicos, mecânicos (como a contração da musculatura), elétricos (como a propagação de um estímulo nervoso pelo sistema nervoso), entre outros (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). Para iniciar um exercício, é necessário ter energia para que ocorra contração da musculatura esquelética e que essa energia seja obtida por vias metabólicas. Inicialmente, a energia é proveniente da quebra de moléculas de ATP existentes nas fibras musculares. No entanto, pouco ATP existe nas fibras musculares, permitindo sustentar apenas um ou dois segundos de contração muscular 3Conceitos básicos em fisiologia do exercício Fi gu ra 1 . M od ifi ca çã o da d is tr ib ui çã o do fl ux o sa ng uí ne o du ra nt e a re al iz aç ão d e um e xe rc íc io fí sic o vi go ro so . Fo nt e: S ilv er th or n (2 01 0, p . 8 20 ). D ÉB IT O C AR D ÍA CO E M R EP O U SO 5 ,8 L /m in D ÉB IT O C AR D ÍA CO D U RA N TE O E XE RC ÍC IO V IG O RO SO O U IN TE N SO 2 5, 6 L/ m in En cé fa lo En cé fa lo 13 % 3% 4% 4% 19 % 24 % 9% 10 % 21 % D éb ito c ar dí ac o = 5 ,8 L /m in D éb ito c ar dí ac o = 2 5, 6 L/ m in Ri m Ri m Tr at o G I Tr at o G I Pe le Pe le O ut ro s t ec id os O ut ro s t ec id os M ús cu lo s es qu el ét ic os M ús cu lo s es qu el ét ic os 1% 1% 2, 5% 0, 5% 88 % Conceitos básicos em fisiologia do exercício4 intensa, por isso, existem diferentes rotas metabólicas que proporcionam essa energia para a realização do exercício físico: a via anaeróbia alática, a via anaeróbia lática e a via aeróbia. As principais diferenças entre essas vias são a velocidade com que ocorrem, a necessidade ou não de o oxigênio participar da reação e a produção ou não de lactato (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004; TORRES; MARZZOCO, 2007). Para dar continuidade ao exercício, ocorre a via anaeróbia alática que necessita da participação da molécula de FCr presente na fibra muscular. Porém, esta também é uma via rápida e, se o exercício necessitar ser mais longo, outras vias deverão ser ativadas para a obtenção do ATP. Conforme a disponibilidade de oxigênio, a via poderá ser a via anaeróbia lática, em caso de ausência de oxigênio, ou via aeróbia (fosforilação oxidativa), na presença de oxigênio. Essas vias ocorrem a partir de substratos provenientes de nutrientes, principalmente a glicose, que pode ser obtida não apenas pela ingestão de glicose livre, mas também em forma de amido, sacarose e lactose. Parte dos substratos que serão utilizados pelas vias metabólicas anaeróbia lática e aeróbia está localizado nas fibras musculares, enquanto a outra parte é direcionada pela corrente sanguínea de outras estruturas do corpo, como o fígado e o tecido adiposo, chegando até a musculatura esquelética (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004; TORRES; MARZZOCO, 2007). As diferentes fibras musculares que existem na musculatura esquelética apresentam características diferenciadas e, por isso, têm a capacidade de obter energia preferencialmente por uma via ou outra. As fibras tipo I, por exemplo, são denominadas fibras lentas oxidativas. Essas fibras são altamente vascularizadas e ricas em mitocôndrias e mioglobina, tendo a capacidade de produzir ATP pela oxidação aeróbia. Por outro lado, as fibras tipo II, também conhecidas como fibras rápidas, têm poucas mitocôndrias e mioglobina, bem como poucas enzimas do metabolismo aeróbio e resistência à fadiga. Além disso, essas fibras tipo II têm maior capacidade de realizar a contração mus- cular com grande velocidade por meio da via da glicólise anaeróbia, a qual utiliza a glicose e o glicogênio como substratos para obter energia (TORRES; MARZZOCO, 2007). A distribuição dos tipos de fibras musculares pela musculatura esquelética é variada e determinada pelo modo de utilização dessa musculatura. Além disso, o exercício físico é um importante estímulo para a transformação mus- cular, podendo converter um tipo de fibra em outro. A musculatura de atletas maratonistas que correm longas distâncias, por exemplo, tem predominância de fibras lentas do tipo I, enquanto os corredores de curta distância têm maior quantidade de fibras rápidas do tipo II (TORRES; MARZZOCO, 2007). 5Conceitos básicos em fisiologia do exercício Via anaeróbia alática (ATP-CP) Essa rota metabólica envolve o sistema fosfagênico, pois utiliza o FCr em sua via e, por isso, pode também receber o nome de via ATP-CP (CP do inglês creatine phosphate). Essa via é nomeada como anaeróbia alática por não precisar de oxigênio e não produzir lactato. O FCr existe em pequena quantidade nas fibras musculares, sendo produ- zido nos períodos de repouso, por isso se torna uma via bastante limitada ao sustentar apenas 15 segundos de exercício físico. Ao mesmo tempo, também é uma via que permite um exercício físico de alta intensidade e rápido, pois as suas reações ocorrem rapidamente, liberando energia para o exercício (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). Tal via ocorre pela conversão da adenosina difosfato (ADP), proveniente da quebra do ATP que existia nas fibras musculares, para ATP por ação do FCr. Isso acontece pela quebra da molécula de FCr pela ação da enzima creatina quinase, liberando um fosfato que irá se ligar à molécula de ADP, formando uma molécula de ATP. O rendimento final dessa via é a produção de uma molécula de ATP para cada molécula de FCr (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). Via anaeróbia lática (glicólise) Nessa via, a glicose é utilizada para produzir energia. A conversão da glicose até a molécula de piruvato rende pouco ATP, quando comparado à via aeróbia, no entanto, trata-se de um processo utilizado por diversas células do nosso corpo, além das fibras musculares, como, por exemplo, as hemácias, as células na medula renal, os espermatozoides, etc. (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). É uma rota que não necessita de oxigênio, mas produz lactato. A partir de uma molécula de glicose, ocorre o processo de glicólise, ou seja, a separação dessa molécula que dará origem a dois piruvatos. Durante esse processo, ocorre uma grande liberação de hidrogênio, o que poderia deixar a célula ácida. Para evitar essa acidez, o transportador de elétron, nomeado como nicotina adenina dinucleotídeo (NAD), liga-se ao hidrogênio, formando o composto NADH. Na sequência, o NADH se liga ao piruvato, formando a molécula de lactato (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). Conceitos básicos em fisiologia do exercício6 Diferentemente do que muitos afirmam de maneira incorreta, essa reação não produz ácido lático seguido de acidose pelo aumento da quantidade de prótons e lactato no plasma. A molécula formada é o lactato e, nesse processo, ocorre o consumo de prótons e não a sua produção. Os prótons produzidos nessa via são provenientes da intensa hidrólise de ATP. A produção do ATP por essa via é 2,5 vezes mais rápida do que a via aeróbia, porém, são produzidas apenas 2 moléculas de ATP para cada molécula de glicose (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). Via aeróbia(oxidativo) A via aeróbia também utiliza a glicose para produzir energia, no entanto, rende muito mais ATP do que a via anaeróbica lática. Ela se diferencia das vias anteriores por ocorrer a fosforilação oxidativa ao utilizar oxigênio du- rante o processo de produção de energia. Nessa rota, além da glicose, pode ser utilizado como substrato energético o glicogênio, os ácidos graxos ou os aminoácidos (SILVERTHORN, 2010). Quando a célula tem adequada quantidade de oxigênio para o metabolismo aeróbio, as moléculas de piruvato são deslocadas para o interior das mitocôn- drias das células. Ao chegar à matriz mitocondrial, as moléculas de piruvato são quebradas em acetil e associadas à coenzima, formando o acetilcoenzima-A (AcetilCoA). A partir desse momento, é dado início ao chamado ciclo do ácido cítrico, também conhecido como ciclo de Krebs por ter sido descrito por Hans A. Krebs. Esse ciclo produz uma rota circular que produz ATP, elétrons de alta energia e dióxido de carbono dentro da mitocôndria celular (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). No ciclo do ácido cítrico, a unidade de AcetilCoA com seus dois carbonos se combina com uma molécula de oxaloacetato que tem quatro carbonos, resultando em uma molécula de citrato com seis carbonos. Essa molécula passa por diversas outras reações até retornar ao estado de oxaloacetato com quatro carbonos. A energia produzida durante essa rota ou é capturada como elétrons pelos transportadores NAD (nicotinamida adenina dinucleotídeo) e dinucleotídeo de flavina e adenina (FAD) ou é usada em ligações fosfato de ATP ou, ainda, é liberada em forma de calor (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). 7Conceitos básicos em fisiologia do exercício O rendimento final da via aeróbia, apesar de ser mais lenta, é a produção entre 30 e 32 moléculas de ATP para cada molécula de glicose (Quadro 1) (SILVERTHORN, 2010; TORRES; MARZZOCO, 2007). Fonte: Adaptado de Silverthorn (2010) e Torres e Marzzoco (2007). Via anaeróbia alática Via anaeróbia lática Via aeróbia Uso de O2 Não Não Sim Produção de lactato Não Sim Não Quantidade de ATP produzida 1 ATP a partir de cada molécula de fosfato de creatina 2 ATP para cada molécula de glicose 30 a 32 ATP para cada molécula de glicose Quadro 1. Comparativo das vias anaeróbias e via aeróbia e seus processos metabólicos Vendo a Figura 2, é possível saber mais sobre a contribuição energética das principais rotas metabólicas desencadeadas pelo exercício físico. ATP-CP Glicólise Oxidativo Duração do ExercícioC on tr ib ui çã o En er gé tic a 100 50 0 0 1 2 3 4 5 Figura 2. Gráfico representativo da contribuição energética anaeróbia e aeróbia conforme a duração do exercício físico. Fonte: Adaptada de McCallum (2017). Conceitos básicos em fisiologia do exercício8 Diferentes exercícios e suas principais rotas metabólicas Se você participar de uma corrida de 10 km ou de 100 m, todas as rotas me- tabólicas terão a sua parcela de contribuição, porém, a porcentagem de uso de cada via produtora de energia será diferente. O que determina a proporção de contribuição de cada via para o fornecimento de energia à musculatura esquelética para a execução de determinados exercícios físicos é a intensidade e a duração do exercício (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). Exercícios físicos que exigem grande intensidade, como corridas de curta distância, levantamento de peso, saltos ou mergulhos, utilizam rotas metabó- licas mais rápidas e dependentes da degradação anaeróbia de substratos, já que não existe oxigênio suficiente para que ocorra o metabolismo aeróbio. Ao iniciar um movimento, é utilizado o ATP presente na musculatura esquelética, permitindo a ativação da via anaeróbia alática. No entanto, os músculos têm pequena quantidade de ATP disponível, além de pouco FCr. Isso permite que o exercício intenso tenha durabilidade máxima de 15 segundos (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). Se houver a necessidade de continuidade no exercício físico, a muscula- tura necessitará de energia derivada de outras fontes energéticas, como os nutrientes armazenados e mobilizados do fígado ou do tecido adiposo, os quais são transportados até os músculos esqueléticos pela corrente sanguínea. Os carboidratos e as gorduras são os principais substratos para a produção de energia (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). As atividades com duração um pouco maior, mas que ainda necessitam de muita força, em geral, recrutam a via anaeróbia lática. Isso acontece porque a reserva muscular de oxigênio é pequena, aumentando gradual e proporcio- nalmente a demanda muscular de ATP, por isso, uma alternativa imediata é a degradação anaeróbia de glicose. É o caso de exercícios intensos com duração de 1 ou 2 minutos, como as corridas de 200 e 400 metros, bem como os es- portes que apresentam corridas intermitentes, como o basquete ou o futebol. Nessa via, existe a necessidade de glicose, molécula obtida principalmente dos carboidratos (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). 9Conceitos básicos em fisiologia do exercício Por fim, os exercícios de longa duração permitem uma maior adaptação do organismo. Conforme o sistema respiratório e o sistema circulatório são ativados e possibilitam um maior suprimento de oxigênio, aumenta-se a con- tribuição da via aeróbia para o fornecimento de energia e cresce também o fornecimento de ácidos graxos para a musculatura, que, aos poucos, assume grande importância no metabolismo energético devido ao decréscimo da reserva de glicogênio pela continuidade do exercício físico (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). Dessa forma, exercícios como uma longa maratona exigem o fornecimento de energia por um tempo muito maior, necessitando da ativação da via aeróbia. Nessa via, a produção de ATP é mais lenta, porém, enquanto na via anaeróbia lática existe uma produção de duas moléculas de ATP para cada molécula de glicose, na rota aeróbia são produzidos entre 30 e 32 moléculas de ATP para cada molécula de glicose. Essa grande quantidade de ATP produzida pela via aeróbia é indispensável para a manutenção dos exercícios de longa duração (SILVERTHORN, 2010; HEYWARD, 2004). Veja na Figura 3 o ciclo do ácido cítrico (também conhecido como ciclo de Krebs), perceba que o processo inicia com a AcetilCoA. Nessa rota circular, são produzidos ATP, elétrons de alta energia e dióxido de carbono. Via anaeróbia Misto de duas vias Via aeróbia Intensidade do exercício Figura 3. Imagem representativa da relação das rotas metabólicas e dos tipos de exercícios físicos. Fonte: Adaptada de Riddell et al. (2017). Conceitos básicos em fisiologia do exercício10 Você já imaginou o porquê de alguns atletas como Usain Bolt conseguirem adquirir performances motoras incríveis? A fisiologia pode explicar. Acesse o link a seguir e veja a notícia que explica algumas características físicas desse atleta. https://goo.gl/o9NG7T HEYWARD, V. H. Avaliação física e prescrição de exercício: técnicas avançadas. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2004. MCCALLUM, S. Muscle fatigue, muscle recovery and how this knowledge applies to rock climbers. Duluth Journal of Undergraduate Biology, v. 4, p. 12-18, 2017. RIDDELL, M. C. et al. Exercise management in type 1 diabetes: a consensus statement. The Lancet Diabetes & endocrinology, v. 5, n. 5, p. 377-390, 2017. SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. TORRES, B. B.; MARZZOCO, A. Bioquímica básica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. 11Conceitos básicos em fisiologia do exercício Leituras recomendadas GUYTON, A. C.; HALL, J. E.; GUYTON, A. C. Tratado de fisiologia médica. Rio de Janeiro: Elsevier Brasil, 2006. HUIJSMANS, R. J. et al. The clinical utility of the GOLD classification of COPD disease severity in pulmonary rehabilitation. Respiratory Medicine, v. 102, n. 1, p. 162-171, 2008. SWANWICK, E.; MATTHEWS, M. Energy systems: a new look at aerobic metabolism in stressfulexercise. MOJ Sports Medicine, v. 2, n. 1, p. 39, 2018. Conceitos básicos em fisiologia do exercício12 Conteúdo: ESTUDO DO MOVIMENTO III: FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO Gustavo Leite Camargos Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:  Reconhecer a fisiologia do exercício como ferramenta de auxílio na prescrição e montagem do programa de exercícios.  Apresentar os efeitos fisiológicos de base para interpretação das ne- cessidades do exercício físico.  Discutir as condutas iniciais para o atendimento e prescrição do exercício. Introdução Para aqueles que trabalham com a prescrição de exercício físico, o co- nhecimento em fisiologia do exercício é altamente necessário, pois é extremante importante conhecer a ampla gama de respostas ao exercício, incluindo aquelas que ocorrem no âmbito de uma determinada classe de doenças, bem como entre as diferentes condições especiais. Neste capítulo, você conhecerá a importância do conhecimento em fisiologia do exercício na prescrição e aplicação de programas de exercício físico com ênfase em grupos especiais. Assim, ampliará seu conhecimento sobre as principais modificações fisiológicas ocorridas nas condições especiais apresentadas, compreendendo o possível papel do exercício no seu tratamento. Além disso, conhecerá as principais condutas para o atendimento às respectivas populações especiais, com destaque para suas individualidades e aspectos mais importantes. A fisiologia na prescrição e montagem de programas de exercícios O conhecimento em fi siologia do exercício é essencial para compreender quais são as demandas impostas ao organismo, dependendo dos tipos e métodos de treinamento utilizados, e quais poderão ser as respostas e adaptações provo- cadas (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). A aptidão física é um estado de funcionamento corporal caracterizado pela capacidade do indivíduo em tolerar o estresse do exercício. Como diferentes tipos de exercícios envolvem diferentes capacidades para serem realizados, a aptidão física abrange um conjunto de componentes, como força, potência e resistência musculares, a resistência cardiorrespiratória, a fl exibilidade, a composição corporal e a agilidade. E para promover melhorias nesses componentes da aptidão física, é importante conhecer antes de mais nada quais são as variáveis relevantes e as relações de estímulos necessários para promover as modifi cações (POWERS; HOWLEY, 2017; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Apenas assim é possível estabelecer um diagnóstico correto das necessidades do indivíduo (EHRMAN et al., 2017). Quando trabalhamos com grupos especiais, esses conhecimentos se tornam ainda mais urgentes, pois estamos lidando com indivíduos que apresentam algum problema de saúde ou alguma condição de caráter irreversível que pode interferir diretamente na prática esportiva, ou que exigem cuidados específicos para participarem de algum programa de exercício físico. Nesse contexto, podem ser incluídos idosos e indivíduos com alguma condição cardiovascular ou alteração metabólica como diabetes, obesidade e câncer (ROBERGS; ROBERTS, 2002; ACSM, 2018). Para cada uma das condições citadas, se torna importante compreender as principais modificações fisiológicas associadas e como o exercício físico deve ser prescrito, ou seja, quais são as principais diretrizes de prescrição e as principais variáveis fisiológicas de controle e avaliação. Assim, é necessário compreender, por exemplo, as principais modificações vasculares e neuromus- culares no indivíduo idoso, a fim de promover uma prescrição adequada, que permita adaptações específicas e melhora nas variáveis necessárias (POWERS; HOWLEY, 2017; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Além disso, o conhecimento das variáveis fisiológicas e de como elas se comportam nas condições especiais permite o controle adequado da intensi- dade do exercício. Em cardiopatas e hipertensos que usam betabloqueadores, por exemplo, o exercício irá promover competição pela ligação de adrenalina e noradrenalina nos receptores beta-adrenérgicos cardíacos, o que reduz a Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais2 frequência cardíaca (FC) e o vigor da contração miocárdica durante o esforço físico. Assim, ter esse conhecimento é importante ao prescrever exercícios e interpretar os resultados dos testes de esforço de indivíduos que tomam esse tipo de medicamento, dentre outros (EHRMAN et al., 2017; ACSM, 2018). Um fisiologista do exercício capacitado deve possuir ampla gama de co- nhecimentos nas seguintes áreas: anatomia, fisiologia, química, biologia e psicologia, além, é claro, do conhecimento sobre prescrição de exercício físico. Os fisiologistas do exercício avaliam, planejam ou implementam programas de condicionamento que incluem exercícios físicos destinados a melhorar a função cardiorrespiratória, a composição corporal, a força e a resistência muscular e a flexibilidade (EHRMAN et al., 2017). Sendo assim, é possível afirmar que conhecimentos em fisiologia do exer- cício para prescrição de programas permitem promover melhores resultados, com base em análises de dados e levantamentos da condição de cada indivíduo. Conhecer todas as respostas fisiológicas durante a realização de diferentes modalidades e intensidades de exercícios permitirá ao profissional ser mais assertivo na sua prescrição e, principalmente, prestar um trabalho de maior qualidade, segurança e eficiência para seu aluno, cliente ou paciente, com atenção especial aos indivíduos que possuem alguma condição especial ou alguma doença diagnosticada (EHRMAN et al., 2017; POWERS; HOWLEY, 2017; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Efeitos fisiológicos para interpretação das necessidades de exercício físico Como já destacado, os grupos especiais englobam um conjunto de indivíduos que apresentam alguma condição especial. A fi m de promover uma melhor organização e entendimento dessas condições, serão apresentadas as principais alterações fi siológicas para as seguintes condições, nessa ordem: crianças e adolescentes; envelhecimento; gestantes; diabetes melito; obesidade; doenças cardiovasculares; doenças pulmonares; câncer; doenças neurodegenerativas; transtornos mentais comuns. Crianças e adolescentes As crianças e adolescentes são fi siologicamente adaptáveis tanto aos treinamen- tos aeróbicos quanto aos de força muscular (resistência). Para essa população, o exercício físico contribui na redução dos fatores de risco cardiometabólicos, 3Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais auxiliando no controle do peso corporal, no aumento da força óssea e no bem-estar psicossocial. Além disso, a atividade física (AF) e a aptidão física parecem estar associadas positivamente ao melhor desempenho escolar e cognitivo (ACSM, 2018). Crianças apresentam menor eficiência ventilatória quando comparadas aos adultos, além de possuírem menor amplitude e maior frequência de passadas. Além disso, apresentam menores valores de capacidade aeróbica absoluta (l/ min) e menor capacidade de gerar potência muscular. As crianças pré-púberes, quando comparadas às crianças púberes e aos adultos, possuem capacidade limitada para aumentar a massa muscular, principalmente devido aos níveis mais baixos de andrógenos (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Envelhecimento A partir dos 35–40 anos de idade, a tendência é que nossa capacidade fun- cional comece a declinar, com a deterioração variando em qualquer idade, porém sofrendo infl uências genéticas, sexuais e de estilo de vida de cada um. Nosso pico de força muscular geralmente é alcançado entre os 20 e 40 anos, quando, então, a força concêntrica da maioria dos grupos musculares começa a declinar (MCARDLE; KATCH; KATCH TCH, 2018). A perda de força sofre infl uência direta do nível mais baixo de AF em indivíduos idosos; no entanto, a perda acelerada que ocorreentre os 60 e 80 anos de idade decorre da própria perda de massa muscular, inerente ao envelhecimento, chamada de sarcopenia (POWERS; HOWLEY, 2017). Observa-se ainda que o ritmo de perda de força é maior nos membros inferiores do que nos membros superiores, o que se torna uma preocupação por elevar o risco de quedas (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). No entanto, o treinamento de força é capaz de promover alterações positivas, aumentando a força muscular nos idosos de forma muito similar ao que ocorre em indivíduos mais jovens (POWERS; HOWLEY, 2017). De fato, cargas equivalentes a 80% de uma repetição máxima (1–RM) são capazes de promover tanto o aumento de massa quanto de força muscular (Figura 1), indicando que os idosos apre- sentam impressionante plasticidade nas características fisiológicas, estruturais e relacionadas com o desempenho, mesmos que as capacidades de responder aos sinais de crescimento muscular diminuíam com a idade (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais4 Figura 1. Plasticidade na resposta fisiológica de resistência em dutos mais velhos: (a) corte transversal da coxa de idoso de 92 anos antes e (b) depois de 112 semanas de treinamento de força. Houve aumento de 44% na área magra de corte transversal. Fonte: Adaptada de McArdle, Katch e Katch (2018). A potência aeróbica máxima (VO2máx) declina com o passar dos anos, em aproximadamente 1% ao ano (0,4–0,5 ml/kg) sendo influenciada por reduções no nível de AF e aumento no percentual de gordura corporal. A manutenção de programas de treinamento é útil para promover menores perdas no VO2máx e maior cinética do consumo de O2 de forma semelhante para indivíduos jovens, sendo necessário um tempo maior para ocorrer o efeito do treinamento (POWERS; HOWLEY, 2017). Durante o envelhecimento, ainda se observam outras alterações cardiovasculares, como o declínio da FC e do volume sistólico, devido à diminuição do efluxo simpático ao coração, menor débito cardíaco e redução na complacência das grandes artérias, com consequente elevação da pressão arterial (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Gestantes A gestação é marcada por modifi cações fi siológicas e anatômicas progressi- vas. O organismo da grávida está constantemente tentando adequar as suas demandas às necessidades do feto em desenvolvimento. Para isso, vários mecanismos tentam manter um ambiente fi siologicamente estável. As principais adaptações cardiovasculares e metabólicas à gestação incluem um aumento do volume sanguíneo em torno de 40–50%, ligeiro aumento do consumo do O2, aumento do gasto energético para exercícios com sustentação de peso, 5Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais maiores valores para frequência cardíaca e aumento do débito cardíaco durante os dois primeiros trimestres, com sua redução no terceiro trimestre, gerando maior risco de hipotensão. Dessa forma, a implementação de um programa de exercício físico deve levar em consideração essas modifi cações (POWERS; HOWLEY, 2017). De fato, gestantes sem contraindicações são orientadas a se exercitar ao longo da gravidez, pois, além dos benefícios do exercício para essa população, existe uma preocupação com os riscos a curto e a longo prazos associados ao comportamento sedentário. Alguns dos benefícios incluem (ACSM, 2018):  prevenção no ganho excessivo de peso durante a gestação;  prevenção de desenvolvimento de diabetes melito gestacional;  redução do risco de desenvolvimento de pré-eclâmpsia;  redução dos sintomas de lombalgia;  risco reduzido de incontinência urinária;  prevenção e/ou melhora de sintomas da depressão;  manutenção da aptidão física;  prevenção de retenção de peso no pós-parto. Atualmente, diversas evidências apontam para o benefício da prática de exercício físico durante a gestação; no entanto, ainda existem barreiras que precisam ser quebradas, tal como o temor de profissionais da saúde com o risco de complicações na gestação devido ao exercício físico. Isso é lamentável, pois já é comprovado que a AF praticada de forma regular está associada positivamente com a prevenção de várias condições e melhora da qualidade de vida da gestante. Portanto, deve-se enfatizar a divulgação dessas informações para o grupo de profissionais que atuam junto a essa população, para que tenham real conhecimento sobre os riscos e benefícios da AF durante a gestação (POWERS; HOWLEY, 2017). Diabetes melito Diabetes melito é um termo que abrange um grupo de doenças metabólicas caracterizadas pela difi culdade de se produzir insulina sufi ciente ou de utilizá-la de forma adequada, resultando em hiperglicemia. A insulina é um hormônio Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais6 produzido pelas células beta do pâncreas, e é extremamente necessária para que os músculos, tecido adiposo e o fígado, consigam utilizar glicose. Os tipos que mais acometem os indivíduos são o diabetes melito tipo 1 (DM1) (5 a 15% dos casos) e o diabetes metilo tipo 2 (DM2) (90 a 95% dos casos) (EHRMAN et al., 2017). O DM1 é uma condição ocasionada principalmente pela destruição autoimune das células beta do pâncreas, embora, em alguns casos, seja idiopático. Pela ausência quase absoluta de insulina, o portador de DM1 tem grande tendência a desenvolver cetoacidose diabética por acúmulo de cetonas (corpos cetônicos) devido a maior metabolismo de ácidos graxos. Dessa forma, é prescrito insulina via injeções regulares (insulinodepen- dentes). A cetoacidose diabética pode ocorrer principalmente se estiverem descompensados e/ou quando a insulina encontra-se muito baixa ou o seu uso não está correto. Os sintomas associados a essa condição incluem dor abdominal, náusea, vômito, hálito com odor adocicado ou de fruta e respiração acelerada ou profunda (taquipneico) (EHRMAN et al., 2017; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). O DM2 acomete principalmente indivíduos acima de 40 anos; no entanto, atualmente observa-se um aumento da sua incidência em adolescentes. Essa condição é complexa e multifatorial, manifestando-se geralmente com resis- tência à insulina (RI) nos tecidos periféricos e/ou secreção diminuída de tal hormônio (EHRMAN et al., 2017). Dessa forma, o organismo é incapaz de utilizar a insulina de modo adequado, sobretudo nos músculos esqueléticos, gerando uma sobrecarga do pâncreas, que aumenta a produção desse hormô- nio. Uma vez que o pâncreas não consegue mais elevar essa produção para compensar a RI, haverá a elevação da glicemia sanguínea (hiperglicemia) (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Os fatores que influenciam o risco de desenvolver o DM2 são genéticos, a obesidade, principalmente central (circunferência de cintura maior que 102 cm nos homens e 89 cm nas mulheres), a idade, o sedentarismo e a presença de hipertensão; além disso, a dislipidemia parece contribuir com a sua fisio- patologia. De fato, 80% dos indivíduos com DM2 tem excesso de peso ou são obesos (EHRMAN et al., 2017). Indivíduos que apresentam obesidade central e RI frequentemente evoluem para uma condição de pré-diabetes, marcada por hiperglicemia em resposta a dietas carboidratadas (intolerância à glicose) e/ou glicemia plasmática em jejum elevada (intolerância à glicose em jejum) (Quadro 1). Esses indivíduos 7Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais apresentam risco elevado de desenvolver DM, uma vez que a capacidade de secreção das células beta tende a diminuir com o tempo (ACSM, 2018). O exercício físico é capaz de promover o aumento da sensibilidade à insulina e melhora no transporte de glicose para as células musculares, por sinalização celular via AMPK (POWERS; HOWLEY, 2017). Fonte: Adaptado de ACSM, (2018). Normal Pré-diabetes DM HbA1c < 5,7% HbA1c = 5,7 a 6,4% HbA1c > 6,4% GPJ < 100 mg.dl-1 GPJ = 100 a 125 mg.dl-1 GPJ > 125 mg.dl-1 GP de 2h < 140 mg.dl-1 GP de 2h = 140 a 199 mg.dl-1 GP de 2h > 199 mg.dl-1 HbA1c: hemoglobina glicada;GPJ: glicose plasmática de jejum; GP: glicose plasmática. Quadro 1. Critérios diagnósticos para pré-diabetes e DM Obesidade O sobrepeso e a obesidade são defi nidos com base na avaliação do índice de massa corporal (IMC), correspondendo a 25–29,9 kg.m-2 e a 30 kg.m-2 ou mais, respectivamente. Para todas as idades e etnias, ambas condições estão associadas a um aumento no risco de diversas condições crônicas como doenças cardiovasculares, DM, alguns tipos de cânceres e até alterações musculoes- queléticas (EHRMAN et al., 2017; POWERS; HOWLEY, 2017; ACSM, 2018). Embora o IMC seja utilizado para avaliar a obesidade, é necessária a rea- lização de outras avaliações para corroborar o real estado do indivíduo, pois esse dado isolado não leva em consideração sua proporção de massa gorda e massa magra (Figura 2) (EHRMAN et al., 2017). Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais8 Figura 2. Comparação entre dois homens com mesma estatura e mesmo peso corporal, mas com diferenças nas outras variáveis antropométricas. Fonte: Adaptada de Ehrman et al. (2017). O sobrepeso e a obesidade resultam de um balanço calórico positivo a longo prazo, associado ao consumo e ao gasto energético (CE e GE, respectivamente); portanto, entende-se que a redução do peso exige uma elevação do GE e uma diminuição do CE a médio e longo prazos (ACSM, 2018). O GE envolve a taxa metabólica basal (TMB), a termogênese dos alimentos e a prática de exercício/ AF. A primeira corresponde à velocidade do gasto energético mensurado em condições padronizadas, e representa um gasto entre 60 a 75% do total de um indivíduo sedentário, sendo maior em indivíduos mais jovens e, após os 20 anos, diminui cerca de 2 a 3% por década em mulheres e homens, respectivamente. Além disso, o aumento do percentual de gordura corporal e dietas restritivas prolongadas contribuem para redução da TMB. A termogênese dos alimentos corresponde a cerca de 10 a 15% do GE total, não sendo, portanto, um preditor de obesidade quando se avalia o GE. Por fim, a AF e o exercício representam um gasto de até 40% do GE diário. De fato, estudos mostram uma associação inversa entre AF e o peso corporal, havendo melhor distribuição de peso em pessoas fisicamente ativas (POWERS; HOWLEY, 2017). 9Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais Atualmente, admite-se que uma inflamação sistêmica crônica subclínica está associada a uma gama de doenças crônicas como a hipertensão, car- diopatias e acidente vascular encefálico, alguns tipos de câncer, condições respiratórias, DM2 e síndrome metabólica. Essa inflamação é caracterizada por aumento na concentração de citocinas inflamatórias como o TNFα, interleucina 6 (IL–6), interleucina 1β (IL–1β) e proteína C reativa (PCR). A quantidade excessiva de tecido adiposo parece promover o aumento na concentração de alguma dessas citocinas, o que poderia justificar o elo entre a obesidade e as variadas doenças crônicas (POWERS; HOWLEY, 2017). Em condições normais, células chamadas adipócitos sintetizam e armazenam lipídeos, além de liberar hormônios anti-inflamatórios como a adiponectina. No entanto, essas mesmas células possuem a capacidade de secretar citocinas inflamatórias. De fato, o aumento dos adipócitos, principalmente viscerais, promove maior secreção de IL–6, concomitantemente à redução de adiponectina. Além disso, macrófagos começam a se infiltrar no tecido adiposo aumentado, contribuindo para uma inflamação local, onde passam a secretar TNFα. O tecido adiposo passa então a liberar ácidos graxos livres (AGL), juntamente com a IL–6 e o TNFα no fígado, que, em seguida, cairão na circulação geral. Esses fatores inflamatórios estimulam o fígado a secretar a PCR, e esta é usada como marcador inflamatório (POWERS; HOWLEY, 2017). Doenças cardiovasculares Os principais fatores de risco associados ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares (DCV) são sobrepeso e obesidade, comportamento seden- tário e componente genético (EHRMAN et al., 2017). As DCVs mais comuns englobam a insufi ciência cardíaca (IC) e hipertensão arterial sistêmica (HAS) (EHRMAN et al., 2017; POWERS E HOWLEY, 2017; ACSM, 2018; MCAR- DLE; KATCH; KATCH, 2018). Pacientes que sofrem de IC apresentam uma incapacidade cardíaca em acompanhar as demandas metabólica dos órgãos e tecidos. Essa condição está associada principalmente ao ventrículo esquerdo (VE), podendo ser causada por falhas na função sistólica ou diastólica (EHRMAN et al., 2017). Cerca de 60% dos casos de IC estão associados a doença cardíaca isquêmica (DCI), ou seja, aterosclerose coronariana, gerando infarto do miocárdio (IM), Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais10 além de consumo crônico de álcool, hipertensão a longo prazo, disfunções das válvulas cardíacas, infecções virais e/ou outros fatores desconhecidos (EHRMAN et al., 2017). Essa condição gera várias adaptações fisiológicas e mudanças compen- satórias associadas à disfunção do VE. De forma resumida, podem ocorrer reduções da fração de ejeção, aumento da massa do VE, com volume diastólicos e sistólicos finais elevados (insuficiência sistólica) ou diminuídos (insuficiência diastólica), edemas ou retenção de líquido tanto pelo aumento da pressão dias- tólica quanto pela ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona (RAA) e ainda um desequilíbrio do sistema nervoso autônomo, podendo promover inibição da atividade parassimpática e aumento da atividade simpática, que promove maior resistência periférica, além da diminuição da secreção de óxido nítrico (NO) e aumento de endoteliana–1 (EHRMAN et al., 2017). O treina- mento físico é amplamente reconhecido como um complemento extremamente importante na terapêutica para o atendimento de indivíduos com IC crônica e estável, promovendo melhoras no VO2pico , na função hemodinâmica central, na regulação do sistema nervoso autônomo, na função vascular periférica e no aumento da capacidade oxidativa do músculo esquelético dos membros e da musculatura respiratória (ACSM, 2018). A HAS é considerada, atualmente, a doença cardiovascular mais comum, afetando milhões de pessoas pelo mundo. Segundo as diretrizes internacionais, a HAS é diagnosticada quando o indivíduo apresenta pressão arterial sistólica (PAS) em repouso maior que 139mmHg e/ou pressão arterial diastólica (PAD) superior a 89mmHg, confirmadas por no mínimo duas medições em pelo menos dois dias separados, ou pela ingestão de algum medicamento anti-hipertensivo (EHRMAN et al., 2017; ACSM, 2018). Os fatores patogênicos que contribuem para a HAS estão associados a aumento do débito cardíaco, da resistência periférica total (RPT) ou de ambos, sendo mais comumente associada ao aumento da RPT (EHRMAN et al., 2017). A manutenção de valores pressóricos elevados causa lesão no endotélio vascular, contribuindo para o processo de aterosclerose, elevando a RPT. Dessa forma, ocorre aumento da pós-carga cardíaca, o que contribui para remodelação hipertrófica do VE, que, como já descrito, é uma das principais causas de IC. Doenças pulmonares As alterações pulmonares podem ser subdivididas em condições obstrutivas, em que há difi culdade do fl uxo de ar pulmonar, ou restritivas, em que há redução das dimensões pulmonares (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). 11Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) envolve um conjunto de doenças do trato respiratório que geram obstrução ao fluxo de ar, sendo as mais comuns o enfisema e a bronquite crônica, que se manifestam mais frequen- temente em indivíduos tabagistas crônicos; seus sintomas incluem dispneia, hipercapnia, tosse persistente e cianose. Atualmente a asma não é considerada uma DPOC; no entanto, suas condições ventilatórias se assemelham a uma, e, por isso, será discutida juntamente com as DPOCs (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). O enfisema é caracterizado por um aumento permanente e anormaldos bronquíolos e alvéolos, devido à destruição do parênquima pulmonar sem a presença de fibrose. Os indivíduos enfisematosos costumam apresentar uma baixa capacidade física e sensação de dispneia extrema mediante esforços físi- cos. Já a bronquite se manifesta como uma inflamação que, quando prolongada, pode levar a bronquite crônica. Essa inflamação pode ser desencadeada por agentes irritantes como a fumaça do cigarro. As membranas mucosas tendem a se dilatar, o que eleva a produção de muco, obstruindo as veias respiratórias e gerando a tosse crônica típica desses pacientes. Assim como no enfisema, esses indivíduos apresentam capacidade funcional reduzida, podendo apresentar fadiga mesmo em esforços mais leves (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Estudos tem demonstrado que, além das alterações pulmonares, a DPOC contribui para a disfunção da musculatura esquelética, o que poderia, por sua vez, contribuir para a intolerância aos exercícios nesses indivíduos. Biopsias de músculos de pacientes com DPOC demonstraram uma menor proporção de fibras do tipo 1 (oxidativas), o que poderia ser justificado pela hipoxemia crônica (baixa concentração de O2 no sangue) (MCARDLE; KATCH; KA- TCH, 2018). Por sua vez, a asma é uma condição que acomete vários indivíduos ao redor do mundo, caracterizada por uma inflamação e hipersensibilidade das vias aéreas inferiores, gerando broncoconstrição. É uma condição crônica que gera episódios recorrentes de falta de ar, sibilo, dor no peito e tosse, estando associada a uma ampla variação de obstruções, frequentemente reversíveis. Assim, observa-se sintomas característicos da DPOC (EHRMAN et al., 2017; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Algumas metanálises sugerem que o exercício pode ser benéfico, demonstrando melhora na quantidade de dias sem sintomas de asma, na capacidade aeróbica, na taxa de trabalho máxima, na tolerância ao exercício e na ventilação-minuto pulmonar (POWERS; HO- WLEY, 2017; ACSM, 2018). Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais12 Uma atenção especial deve ser dada ao indivíduo com asma, pois os sintomas podem ser provocados ou piorados pelo exercício, uma condição associada à broncoconstrição induzida pelo exercício (BIE), chamada de asma induzida pelo exercício (AIE). Uma forma de minimizar essa condição é evitar a realização de exercícios em ambientes frios e secos, bem como com alto nível de poluição (ACSM, 2018). Por fim, as doenças pulmonares restritivas (DPR) se caracterizam por uma redução na mobilidade do tórax, pois os tecidos pulmonares ficam enrijeci- dos, opondo-se à expansão torácica. Essa resistência aumentada exige maior realização de força da musculatura inspiratória para manter uma ventilação adequada. Dessa forma, o custo energético da ventilação se eleva, podendo corresponder a até cerca de 50% da demanda total de O2 durante a AF. Das condições de DPR, a que mais parece se beneficiar pela prática de exercício físico é a doença pulmonar intersticial (fibrose pulmonar) (MCARDLE; KA- TCH; KATCH, 2018). Câncer O câncer engloba um grupo de doenças caracterizadas por um crescimento descontrolado de células anormais. Dentre as consequências mais sérias para o sobrevivente do câncer, podemos destacar a perda de massa corporal e o seu estado funcional, incluindo difi culdade na deambulação, fadiga séria, perda de endurance cardiovascular e força muscular, afetando suas atividades diárias. Dessa forma, a realização de exercícios e atividades físicas para os pacientes durante e após as diferentes modalidades de tratamento pode auxiliar na retomada de seu cotidiano, além de parecer prevenir recaídas (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). De fato, existe uma associação inversa entre a prática de exercício físico regular após o diagnóstico e a recidiva do câncer, além da mortalidade específi ca da doença e geral. Além disso, o exercício parece ter um papel preventivo ao desenvolvimento de certos tipos de câncer, como o de mama, de próstata e o colorretal (EHRMAN et al., 2017). Os tratamentos do câncer acabam por desenvolver manifestações clínicas como sensação de dispneia, com redução da capacidade pulmonar, fraqueza muscular, incontinência urinária, diarreia, náuseas, vômitos, aterosclerose prematura, miocardiopatias, disfunção sexual, anorexia, anemia, perda de massa muscular, osteoporose, cefaleia, alterações da pressão arterial, dentre 13Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais outras (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). A reabilitação para câncer com AF auxilia na recuperação e na retomada do estilo de vida normal, com maior independência e capacidade funcional, mitigando a sensação de fadiga e aumentando a força muscular e o endurance cardiovascular (ACSM, 2018; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Evidências atuais demonstram que a AF está fortemente associada a um menor risco de desenvolvimento de câncer de cólon, com uma associação um pouco mais fraca para o câncer de mama e de endométrio e ainda limitada para cânceres de próstata, estômago, pâncreas, ovários e pulmão. Estima-se uma média de redução nos riscos entre 20 a 30%, e acredita-se que esses efeitos protetivos estejam associados a múltiplos fatores, como a redução da adiposidade central, mudanças nos biomarcadores e na resistência a insulina, aprimoramento da função imune e menores níveis de inflamação (KRUK; CZERNIAK, 2013). Doenças neurodegenerativas As duas condições neurodegenerativas mais comuns são a doença de Pa- rkinson (DP) e doença de Alzheimer (DA), que afetam principalmente indivíduos idosos. A DP confi gura-se como um transtorno neurológico crônico e progressivo marcado por sintomas que consistem em tremores em repouso, bradicinesia (redução da velocidade da amplitude do movimento), rigidez, instabilidade postural e anormalidade na marcha. A sua causa ainda é desconhecida; no entanto, parece haver infl uências genéticas e do meio ambiente. Além disso, o processo de envelhecimento, respostas autoimunes e a disfunção mitocondrial dos neurônios também parecem contribuir com a doença. O exercício físico representa um tratamento complementar no auxílio ao paciente com DP. De fato, a prática regular de exercícios parece retardar as sequelas secundárias que podem afetar os sistemas musculoes- quelético e cardiorrespiratório, além de melhorar a performance da marcha, a qualidade de vida e a capacidade aeróbica do paciente (ACSM, 2018). Um estudo conduzido por Zigmond e Smeyne (2014) propôs a hipótese de que o exercício físico apresenta um papel neuroprotetor em indivíduos com DP, mas sua comprovação ainda exige mais estudos. Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais14 A DA também é uma doença crônica que apresenta um declínio progressivo na capacidade funcional, gerando perda gradual da autonomia do indivíduo. É considerada a principal causa de demência nos idosos. Geralmente, co- meça com sintomas leves, marcados pela piora da memória, principalmente para eventos recentes, além de dificuldades de raciocínio e de julgamento e problemas de orientação no tempo e no espaço. Na sua evolução, o indivíduo passa a ter dificuldade de aprender coisas novas e lembrar de informações pouco utilizadas, passando a esquecer de coisas importantes e a apresentar comprometimento da linguagem. Estudos tem demonstrado que o nível de AF é um fator modificável de risco que pode atenuar o declínio cognitivo nas fases progressivas da DA. Além disso, a prática de exercícios revela-se uma estratégia importante para melhorar as capacidades neuromotoras e as funções cognitivas, contribuindo para a melhora da capacidade funcional e outras complicações da DA (FORLENZA et al., 2012). Transtornos mentais comuns São considerados transtornos mentais comuns (TMC) as alterações do hu- mor que, em questões epidemiológicas, atingem grande parte da população. Abrangem a depressão, a ansiedade e os transtornos somáticos, condições que têm sido incluídas entreos maiores problemas do século XXI, estando relacionadas com a correria do dia a dia, pressões cotidianas, questões fi nan- ceiras e familiares, bem como o trabalho (VIEIRA, 2015). Estudos demonstram que o nível de AF está positivamente associado com a boa saúde mental quando esta é avaliada pelo bom humor, bem-estar geral e sintomas relativamente esporádicos de ansiedade e depressão. Entre outros aspectos, o exercício físico regular parece modular a liberação de alguns neu- rotransmissores como a serotonina, demonstrando ser positivo para pacientes com depressão. A manutenção de um programa de exercícios para indivíduos propensos a distúrbios psicológicos parece promover alegria, motivação e sociabilização (VIEIRA, 2015). Distúrbios do sono são uma característica marcante das condições de TMC, e muitos medicamentos utilizados no tratamento de TMC parecem influenciar no sono (EHRMAN et al., 2017). Um estudo realizado por Singh et al. (2005) demonstrou que 8 semanas de treinamento de força promoveram melhora em sintomas depressivos e na qualidade do sono em relação ao grupo de controle, além de revelar que o treinamento de força de alta intensidade foi mais significativo que o treinamento de baixa intensidade. 15Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais Condutas iniciais para prescrição de exercícios O Colégio Americano de Medicina do Esporte propõe que todos os indivíduos antes de iniciarem um programa de exercícios físicos devem passar por uma triagem pré-participação (ACSM, 2018). Nessa etapa, deve ser avaliado seu histórico médico de forma minuciosa, incluindo informações anteriores e atuais a respeito de sua condição. Além disso, devem ser avaliadas as variá- veis associadas à aptidão física relacionada à saúde (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Devido às peculiaridades das condições aqui discutidas, apresentaremos a seguir as principais orientações e condutas para cada uma no que tange a prescrição de exercícios. No link a seguir, você poderá acompanhar um vídeo de apresentação do instrumento proposto pelo Colégio Americano de Medicina do Esporte (ACSM) para a realização da triagem pré-participação em exercícios. https://qrgo.page.link/6cpdJ Crianças e adolescentes Crianças e adolescentes saudáveis podem iniciar um programa de exercícios sem a necessidade de realização de teste de esforço; no entanto, se apre- sentarem condições como asma, diabetes, obesidade ou alguma condição cardiovascular, o teste de esforço pode ser solicitado. Em geral, podem ainda ser realizados testes de saúde e aptidão, como, por exemplo, a bateria de testes do FitnessGram, que avalia os seguintes componentes: composição corporal (IMC, dobras cutâneas ou impedância bioelétrica) aptidão cardiorrespiratória; e aptidão muscular e fl exibilidade (ACSM, 2018). Geralmente, as diretrizes de treinamento de força para adultos podem ser aplicadas a esta população, respeitando-se as características inerentes a cada idade (ACSM, 2018). A maneira como crianças e adolescentes respondem ao exercício pode ser diferente de como o adulto responderia, e suas adaptações ao treinamento estão associadas, até certo ponto, ao crescimento e maturação (EHRMAN et al., 2017). Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais16 Envelhecimento As recomendações para programas de treinamento físico voltados para idosos são similares àquelas para pessoas mais jovens, com a necessidade de realização de um exame clínico e de triagem de fatores de risco, já que idosos apresen- tam maior probabilidade de terem DCV e outras comorbidades. Devem ser investigados os padrões de AF habituais, seu nível de capacidade funcional e os sintomas induzidos pelo exercício (dor no peito, dispneia, palpitações, tonturas ou claudicações). Caso o idoso apresente histórico desses sintomas ou infarto do miocárdio, revascularização periférica, presença de DM e/ou outros distúrbios, ele deverá ser colocado em uma categoria de maior risco. Devido às possíveis condições que essa população pode apresentar, é importante identifi car os medicamentos utilizados, pois podem infl uenciar no desempenho e na segurança do exercício físico. Exemplo disso são os fármacos psicoativos (como os ansiolíticos), que podem aumentar o risco de quedas (ACSM, 2018; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Deve ser realizado um exame físico focado na PA e na auscultação cardíaca e pulmonar, além de avaliações físicas que incluem medidas antropométricas para composição corporal, avaliação postural e avaliação funcional. Um teste simples de caminhada por um corredor pode revelar alterações na marcha. Geralmente, idosos que não apresentam alterações da PA e nenhuma outra DCV podem iniciar um programa de exercício de intensidade baixa ou moderada (de 3 a 6 METs; 40–60% do VO2máx estimado) sem a necessidade de um teste de esforço (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). No caso de idosos com riscos maiores ou que desejam realizar exercícios mais intensos, é recomendado a realização de um teste de esforço, incluindo capacidade cardiorrespiratória, força e flexibilidade. Se apresentarem histórico de queda, é importante a avaliação do equilíbrio. Alguns dos testes de desempenhos mais utilizados são o Senior Fitness Test, Short Physical Performance Battery, Velocidade de Marcha Usual, Teste de Caminhada de 6 min e Teste de Desempenho Físico de Escala Contínua (ACSM, 2018). Gestantes A avaliação médica da gestante para prática de exercícios físicos pode incluir a aplicação do PARmed-X para gestação, que é um instrumento que avalia o seu estado de prontidão para AF (ACSM, 2018). Os testes de esforço máximo não devem ser realizados, a menos que seja uma necessidade médica e desde 17Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais que a grávida não apresente qualquer contraindicação para a realização de exercícios físicos (POWERS; HOWLEY, 2017; ACSM, 2018). De maneira geral, as seguintes recomendações devem ser observadas junto a gestantes (POWERS; HOWLEY, 2017):  se forem previamente sedentárias e desejam iniciar a prática de exercício físico, devem preferir atividades de baixo risco, como caminhada, natação, hidroginástica, etc.;  se já praticam atividade física e desejam continuar, é recomendado atividades de médio risco, como ginástica aeróbica, musculação e esportes com raquetes;  atividades que apresentam grandes possibilidades de trauma, como esportes coletivos e ginástica de alto impacto, devem ser evitados. Diabetes melito O exercício físico regular em indivíduos com DM2 resulta em melhorias na tolerância à glicose, na sensibilidade à insulina e na diminuição da hemoglo- bina glicada (HbA1c). Além disso, existem outros benefícios para indivíduos com DM1, DM2 ou pré-diabéticos, que incluem melhoria nos fatores de risco associados a doenças cardiovasculares, bem como no bem-estar geral. A prática de exercícios 150 minutos/semana está associada à diminuição da morbimor- talidade em todas as populações, incluindo aquelas com DM (EHRMAN et al., 2017). A prescrição de exercícios físicos para indivíduos com DM1 deve ter como preocupação a possibilidade de hiperglicemia e cetose, que podem resultar em coma diabético (ACSM, 2018). Os sintomas comuns associados à hiperglicemia são fadiga, poliúria, fraqueza, sede e hálito cetônico. É recomendado avaliar a concentração de cetonas se a glicemia do paciente estiver superior a 250 mg.dl-1. Indivíduos que apresentem uma glicemia maior que 299 mg.dl -1, se estiverem se sentindo bem e não apresentarem corpos cetônicos nos testes de sangue e urina, podem praticar exercícios de intensidade moderada, abstendo-se de exercícios de intensidade vigorosa. Caso apresentem corpos cetônicos, o exercício deve ser adiado (Figura 3) (LAMOUNIER et al., 2015; EHRMAN et al., 2017). Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais18 Figura 3. Exercício físico e hiperglicemia. Fonte: Adaptada de Lamounier et al.(2015). Porém, outra preocupação é a possibilidade de ocorrência de hipoglicemia (glicose sanguínea inferior a 60–70 mg.dl -1) ocasionada pelo excesso de insulina ou agente hipoglicemiante oral, ingestão inadequada de carboidratos, jejuns prolongados e prática de exercícios excessivos ou mal planejados, sendo os principais sintomas tremores, fraqueza, sudorese anormal, ansiedade, formi- gamento na boca e nos dedos e fome, podendo evoluir para dor de cabeça, distúrbios visuais, confusão mental e até coma. A hipoglicemia pode ocorrer tanto durante o exercício quanto várias horas após o término da sessão. Em indivíduos com DM1, uma glicemia inferior a 70 mg.dl -1 é uma contraindica- ção relativa para início de exercícios aeróbicos agudos. Dessa forma, quem faz uso de insulina deve monitorar a sua glicemia antes, durante e após o exercício. A maioria desses indivíduos pode precisar consumir entre 15 e 45 g de carboidratos (incluindo glicose, sacarose ou lactose) antes da prática de exercícios se sua glicemia estiver abaixo de 100 mg.dl -1, dependendo da intensidade e da duração do exercício (EHRMAN et al., 2017; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). Já os indivíduos com DM2 tendem a não apresentar as mesmas flutuações na glicemia durante os exercícios. Nesse caso, se sua glicemia estiver elevada por duas ou três horas após uma refeição (pós-prandial), eles provavelmente sofrerão queda no nível de glicose sanguínea durante o exercício aeróbico, uma vez que os níveis endógenos de insulina estarão altos (ACSM, 2018). Nessa situação, é preciso ter cuidado, pois pode haver um aumento na micção de forma exagerada, o que poderia levar a uma desidratação e uma diminuição da atividade mental, podendo resultar em coma. Essa condição é chamada de síndrome hiperosmolar não cetótica, e ocorre quando a glicemia é intensa e prolongada. Nesse caso, o exercício é contraindicado (EHRMAN et al., 2017). 19Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais Obesidade Embora a obesidade seja, aparentemente, uma condição médica óbvia, é necessária uma avaliação completa para determinar sua real condição. Para isso, é preciso realizar uma avaliação da massa corporal, da estatura, das cir- cunferências de cintura, quadril e pescoço (recentemente sendo demonstrado como fator de risco para DM e DCV), gordura corporal, problemas musculo- esqueléticos e/ou ortopédicos, além de outras medidas para identifi cação de possíveis comorbidades, como HAS e DM (ACSM, 2018). Um teste de esforço não é indicado para indivíduos com sobrepeso ou obesos antes do início de um programa de exercícios de intensidade leve à moderada (2–6 METs). Porém, caso seja realizado, principalmente para os indivíduos obesos, é recomendado a utilização de bicicletas ergométricas que permitam com que o indivíduo possa ficar sentado (ACSM, 2018). Apesar disso, um estudo conduzido por McCullough et al. (2006) com indivíduos obesos que possuíam indicação para cirurgia bariátrica (IMC > 45 km.m-2), demonstrou que apenas um não pode realizar o protocolo de caminhada testado. Além disso, recomenda-se a realização de teste de força, para orientar na elaboração de um programa de força, e a avaliação da flexibilidade, para identificar articulações com amplitude limitada (EHRMAN et al., 2017). Doenças cardiovasculares Antes de iniciar um programa de AF, é necessário realizar uma triagem de saúde que deve incluir anamnese, exame físico, avaliações laboratoriais e testes fi siológicos pertinentes. O histórico médico deve estar atualizado, sendo importante seu acompanhamento ao longo do programa de treinamento (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). O ACSM (2018) propõe a utilização do algoritmo de triagem de pré-participação, um instrumento desenvolvido para identifi car participantes com risco de complicações cardiovasculares durante ou imediatamente após exercícios. Para indivíduos com sinais/sintomas ou alguma DCV diagnosticada, é reco- mendada a avaliação dos níveis plasmáticos de colesterol e triglicerídeos, além da glicemia de jejum. Além disso, deve ser realizado, com base na avaliação médica, eletrocardiograma de 12 derivações em repouso, angiografia coronária, ecocardiograma, radiografia de tórax (em caso de suspeita ou presença de IC), perfil bioquímico e hemograma completo (EHRMAN et al., 2017). O teste de esforço limitado por sintomas é seguro junto a pacientes com IC, e, quando associados à medição indireta de gases inspirados, fornece Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais20 informações úteis sobre respostas eletrocardiográficas e hemodinâmicas ao exercício (ACSM, 2018). Já para indivíduos hipertensos, controlados e assintomáticos, o teste de esforço não é uma indicação; porém, pode ser útil para avaliar a resposta da PA ao exercício. Indivíduos com HAS podem apresentar respostas exa- geradas da PA durante a AF, mesmo se ela estiver controlada em repouso (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2018). A utilização de medicamentos pelos praticantes sempre deve ser levada em consideração, como é o caso dos be- tabloqueadores, que podem reduzir a capacidade submáxima e máxima do exercício. Medicamentos anti-hipertensivos e vasodilatadores podem levar a reduções excessivas e súbitas da PA pós-exercício, justificando uma volta à calma de forma gradual e prolongada, com monitorização da PA e da FC até que retornem aos níveis de repouso. Independentemente dessa resposta, indivíduos que sofrem de HAS tendem a apresentar hipotensão pós-exercício, principalmente aeróbico, e devem ser conscientizados sobre isso (EHRMAN et al., 2017; ACSM, 2018). Doenças pulmonares Antes de iniciarem um programa de exercício físico, os pacientes que apre- sentam doenças pulmonares devem ser orientados a realizar testes de esforço, pois eles fornecem medidas objetivas da capacidade de exercício, mecanismos de intolerância ao exercício, prognóstico, progressão da doença e resposta ao tratamento. Em indivíduos cuja doença é leve ou moderada, os sintomas podem surgir apenas quando o sistema respiratório é demandado, como du- rante o exercício. Já nas condições graves, a sua capacidade está tão reduzida que até a atividade simples se torna um desafi o para o sistema respiratório (EHRMAN et al., 2017). Durante os testes, devem ser realizados a monitorização da PA, a atividade elétrica cardíaca (eletrocardiograma), a saturação de O2 arterial e a medição da dispneia. Já existem aparelhos validados para a medição da PA durante exercícios. Além disso, um oxímetro de pulso, também validado, pode ser utilizado. Para avaliação da dispneia, podem ser utilizadas escalas subjetivas (como a escala de Borg CR-10 modificada para dispneia) (EHRMAN et al., 2017; ACSM, 2018). Para indivíduos com DPOC, é preciso tomar um cuidado especial com seu risco de desenvolver hipertensão pulmonar, tanto durante os testes quanto durante os exercícios. É recomendada cautela ao realizar exercícios de membros superiores, pois o aumento da pressão adicional nos músculos assessórios da 21Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais respiração pode dificultar ainda mais a ventilação nesses indivíduos, aumen- tando sua dispneia. Para os pacientes que sofrem de asma, deve-se acompanhar a utilização do medicamento broncodilatador inalatório de curta duração (como albuterol, bitolterol e pirbuterol), que pode ser indicado para evitar BIE (ACSM, 2018). Além disso, uma dessaturação de oxi-hemoglobina inferior a 80% pode ser utilizada como forma de término tanto do teste quanto do exercício. Se houver exacerbações da asma, o paciente não deve se exercitar até que os sintomas e a função respiratória tenham melhorado. Também deve ser evitada a realização de exercícios em ambientes frios ou com poluentes, sob risco de desenvolvimento de broncoconstrição (EHRMAN et al., 2017). Câncer Ainda são poucas as pesquisas que demonstram a prescrição adequada de exercícios para indivíduos com câncer, bemcomo o momento mais adequado para iniciar o programa em relação às fases do tratamento. Por conta disso, as recomendações para a reabilitação oncológica, em geral, incluem exercícios que são limitados por sintomas. Devem ser avaliados o estado nutricional, possíveis problemas metabólicos, além de sinais agudos ou sintomas que são específi cos de um tipo de câncer e que poderiam impedir a participação no exercício (uma mulher que realizou mastectomia recente, por exemplo, pode estar limitada a realizar exercícios de membros superiores). Também deve ser realizada uma avaliação funcional que permita identifi car possíveis instabilidades na marcha associadas à quimioterapia ou ao envolvimento do sistema nervoso, alterações na cicatrização, imunossupressão e sangramentos. Além disso, alguns sintomas agudos podem exigir mudanças no planejamento, como náusea, vômito, fadiga e fraqueza. Isso requer uma reavaliação constante durante o programa de treinamento (EHRMAN et al., 2017). Os procedimentos utilizados para os testes de esforço são os mesmos adotados para indivíduos sadios, com a ressalva de que tais pacientes devem receber uma atenção especial em termos de suas sensações de fadiga. Não é recomendado que se exercitem ao máximo, e algumas informações podem sugerir uma contraindicação para a realização de exercícios (EHRMAN et al., 2017):  Hemoglobina < 10 g.dl-1  Células brancas (leucócitos) < 3.000/ml  Neutrófilos < 0,5.109.ml-1  Plaquetas < 50.109.ml-1 Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais22  Febre > 38°C (100,4° F)  Marcha instável (ataxia)  Caquexia ou perda de > 35% do peso pré-comorbidade  Dispneia limitante com esforços físicos  Dor óssea  Náusea severa  Metástase esquelética extensa Doenças neurodegenerativas Como estas condições afetam principalmente os idosos e apresentam re- percussões signifi cativas nas suas capacidades funcionais, é recomendada a realização de testes de aptidão física específi cos para idosos, que incluam avaliações de equilíbrio, marcha, mobilidade geral, amplitude de movimento articular, fl exibilidade e força e resistência musculares (ACSM, 2018). Como se tratam de condições degenerativas progressivas, pode haver dis- função do sistema nervoso autônomo, o que talvez acarrete em anormalidades na pressão arterial. Dessa forma, deve-se ter cuidado na prescrição e deve ser realizado monitoramento constante das variáveis hemodinâmicas. Além disso, esses indivíduos podem apresentar com maior frequência hipotensão ortostática, sendo recomendado, portanto, a realização de exercícios com a maior segurança possível, evitando-se a mudança de posição rápida e constante (FORLENZA et al., 2012; ACSM, 2018). Transtornos mentais comuns As orientações para indivíduos com TMC são as mesmas, respeitando-se sua idade, sexo e/ou alguma comorbidade que apresentem. No entanto, deve-se dar uma atenção especial ao seu estado motivacional e à sua percepção de esforço, pois eles tendem apresentar menor tolerância à fadiga. Portanto, o profi ssional deve criar estratégias que promovam a maior adesão destes indivíduos ao programa de treinamento, preferencialmente promovendo a prática de exercícios mais prazerosos para cada um. É importante também que os profi ssionais conheçam os sintomas específi cos da condição apresentada. Sendo assim, todo um processo de pré-participação deve ser realizado junto a estes indivíduos (VIEIRA, 2015; EHRMAN et al., 2017). Com base no que foi exposto, podemos perceber a importância dos co- nhecimentos em fisiologia aplicada à prescrição de exercícios, principalmente associados às populações especiais. Foi possível identificar os principais 23Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais cuidados, necessidades e restrições que devem ser levados em conta durante a prescrição e orientação do treinamento. São procedimentos a serem segui- dos para a análise das principais condições associadas aos indivíduos, que permitem nortear com segurança a atuação do profissional de educação física e outros profissionais que atuem na área do exercício físico. A fisiologia do exercício é uma área em constante crescimento, e hoje existe um ramo dessa disciplina, chamado fisiologia do exercício clínico, que amplia o entendimento das principais doenças crônicas e o papel do exercício físico no seu tratamento. ACSM. Diretrizes do ACSM para os testes de esforço e sua prescrição. 10. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. EHRMAN, J. K. et al. Fisiologia do exercício clínico. 3. ed. São Paulo: Phorte, 2017. FORLENZA, O. et al. Doença de Alzheimer: uma perspectiva do tratamento multiprofis- sional. Rio de Janeiro: Atheneu, 2012. KRUK, J.; CZERNIAK, U. Physical activity and its relation to cancer risk: updating the evidence. Asian Pacific Journal of Cancer Prevention, v. 14, n. 7, p. 3.993–4.003, 2013. LAMOUNIER, D. et al. (ed.). Atividade física e diabetes: a prática segura de atividades desportivas. Posicionamento Oficial SBD no. 04/2015. São Paulo: SBD, 2015. Disponível em: https://www.diabetes.org.br/profissionais/images/2017/posicionamento-4.pdf. Acesso em: 1 ago. 2019. MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. MCCULLOUGH, P. A. et al. Cardiorespiratory fitness and short-term complication after bariatric surgery. Chest, v. 130, n. 2, p. 517–525, 2006. POWERS, S. K.; HOWLEY, E. T. Fisiologia do exercício: teoria e aplicação ao condiciona- mento e ao desempenho. 9. ed. Barueri: Manole 2017. SINGH, N. et al. A randomized controlled trial of high versus low intensity weight training versus general practitioner care for clinical depression in older adults. Journal of Geron- tology: Series A, Biological Sciences and Medical Sciences, v.60, n. 6, p. 768–776, 2005. VIEIRA, A. 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Porto Alegre: Artmed, 2013. 25Fundamentos da fisiologia do exercício para populações especiais EXERCÍCIO FÍSICO PARA POPULAÇÕES ESPECIAIS Alexandre Machado Lehnen Exercícios para gestantes Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:  Enumerar os cuidados quedevem ser adotados para a prática de exercícios físicos, com atenção especial aos três primeiros meses de gestação.  Aplicar programas de treinamento específicos para fortalecimento do core: músculos do quadril, lombar e pelve.  Desenvolver estratégias de treinamento para atendimento e otimiza- ção do treinamento aplicado a diferentes perfis de gestante: sedentária e atleta. Introdução Gravidez não é doença, mas requer cuidados especiais. Esta frase traduz o tema que será abordado neste capítulo. De fato, a gestação não implica doença ou condição patológica alguma. Contudo, as gestantes são clas- sificadas como “população especial” perante os programas de exercícios físicos, por exigirem cuidados extras àqueles normalmente aplicados na população em geral. Não são todas as modalidades, volumes, inten- sidades e/ou posições de exercícios que as gestantes podem executar. O entendimento dos principais cuidados, especialmente no primeiro trimestre de gestação, pode determinar o sucesso de um programa de exercício físico. Além disso, o fortalecimento do assoalho pélvico e lombar, entre outros objetivos, tanto para gestantes sedentárias quanto para aquelas habituadas a treinos, deve ser executado com segurança. Assim, neste capítulo você conhecerá os cuidados que devem ser adotados para a prática de exercícios físicos, com atenção especial aos três primeiros meses de gestação. Também aprenderá a aplicar programas de treinamento específicos para fortalecimento do core: músculos do quadril, lombar e pelve. Por fim, ficará a par das dife- rentes estratégias de treinamento para perfis distintos de gestantes: sedentárias e atletas. Cuidados para a prática de exercícios físicos em gestantes É importante respeitar as alterações no corpo da mulher frente à gestação, principalmente quando o assunto é a prática de atividade física e/ou exer- cício físico. Ainda circulam por aí mitos de que o exercício físico pode ser prejudicial tanto para a mãe quanto para o bebê. Assim, é fundamental entender as alterações que a gestação proporciona e confrontá-las com os possíveis mitos. As modifi cações ocorrem em todos os planos: físico, emo- cional, psicológico etc. Todas as alterações manifestadas nos 9 meses (ou aproximadamente 40 semanas) de gestação servem para preparar a mulher para o nascimento do fi lho. Primeiramente, o aumento do hormônio gonadotrofina coriônica (HCG, na sigla em inglês) e da progesterona tem a função de inibir a musculatura lisa para evitar contrações e movimentos indesejáveis neste período (LEVENO, 2014; CARVALHO, 2016). Contudo, o sistema gastrointestinal possui musculatura lisa ao seu redor, que também é afetada. Assim, a digestão torna-se mais lenta, elevando a probabilidade de acidez e azias no estômago. Com a motilidade mais lenta, aumentam as chances de constipações, e os enjoos e regurgitações são comuns em 70–80% das gestantes (GOMES, 2012). A tendência é que esse quadro, iniciado principalmente pelo HCG, perca intensidade no início do segundo trimestre. Em paralelo, o corpo da gestante apresenta metabolismo mais acelerado, com objetivo de desenvolver o embrião ou feto. Essa aceleração leva a um maior esgotamento geral, exigindo mais horas de sono. No segundo trimestre de gravidez, outra mudança latente é a maior frequência de micção. Isto ocorre porque durante a gestação a mulher aumenta sua volemia (quantidade de sangue total no corpo) entre 40-50%, e a maior parte deste aumento se dá na forma de volume plasmático (SOUZA; BATISTA FILHO; FERREIRA, 2002). Com isso, os rins trabalham mais para que todo o sangue seja filtrado, produzindo maior quantidade de urina. Além disso, o crescimento do feto no útero pressiona fisicamente a bexiga, reduzindo sua capacidade de armazenamento. Os seios Exercícios para gestantes2 ficam maiores, preparando-se para a produção de leite e maior circulação sanguínea. Em paralelo a isso, as aréolas tornam-se bem mais sensíveis, o que pode trazer desconforto para as mulheres, principalmente durante um exercício físico em que haja atrito pelo movimento corporal. Por definição, o embrião, produto da união do gameta masculino e do gameta femi- nino, ocupa os primeiros estágios de desenvolvimento gestacional, estendendo-se até a 8ª semana (período embrionário). A partir da 8ª semana, começa o período de desenvolvimento do feto, já implantado no útero, o que exige maior mobilização de nutrientes, oxigenação etc. para este local. Embora estes aspectos físicos sejam importantes, são os aspectos emo- cionais que requerem maiores cuidados. Há mulheres, especialmente na primeira gestão, que transitam do riso ao choro com extrema facilidade. Essas alterações de humor e sensibilidade à flor da pele são causadas pela variação hormonal do primeiro trimestre, bem como pelas incertezas que surgem pela nova situação. Embora o quadro geral possa parecer preocupante em relação às alterações no corpo da mulher, muitas respostas corporais são benéficas e podem ser potencializadas pela prática regular de atividade física e/ou exercício físico. Você sabe qual é a diferença entre atividade física e exercício físico? Atividade física é todo movimento corporal realizado pela musculatura esquelética que requer gasto calórico acima do repouso. Exercício físico, por sua vez, é uma atividade física com o objetivo específico de aumentar a aptidão física relacionada à saúde e/ou desempenho esportivo. Assim, por atividade física, entenda “movimentar-se mais”, e por exercício físico, entenda “[...] praticar atividade física programada e com objetivo definido sobre a aptidão física” (GUEDES; GUEDES, 1995, documento on-line). 3Exercícios para gestantes Em relação à prática de exercícios físicos, se na população geral a pre- valência de sedentarismo fica entre 40–50% (BRASIL, 2015), para as gestantes a prevalência é ainda maior. Em uma coorte de 118 gestantes, a maioria mostrou um baixo nível de atividade física durante o período gestacional. Além disso, 100% da amostra apresentaram comportamento sedentário na 32ª semana de gestação (NASCIMENTO et al., 2014). Em outro trabalho, foram avaliadas 305 gestantes, verificando-se que 80% apresentaram um padrão de leve atividade física ou sedentarismo. A di- retriz do American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG COMMITTEE OBSTETRIC PRACTICE, 2002) recomenda a prática de atividade física na gestação, o que é reconhecidamente seguro para todas as gestantes saudáveis. Inúmeros benefícios podem ser elencados tanto para a mãe quanto para o feto pela prática de atividade física. Os benefícios maternos são:  manutenção do gasto energético, associado à capacidade cardiorrespiratória;  controle do peso corporal para esta condição;  prevenção/tratamento do diabetes gestacional;  prevenção/tratamento da pré-eclampsia;  menor estresse cardiovascular;  ajuda no trabalho de parto;  melhora da recuperação pós-parto;  melhora da postura para esta condição;  prevenção de dores na região lombo-sacra;  melhorados aspectos psicológicos e emocionais (humor, autoimagem, ansiedade etc.). Para o feto, os benefícios estão associados a menor risco de complicações no parto e menor prematuridade.No entanto, por se tratar de uma população que requer um cuidado adicional, foram elaboradas certas contraindicações absolutas (aquelas que são indiscutíveis e não exigem avaliação) e relativas (aquelas que são vistas “caso a caso” e que podem ser avaliadas mediante pontos de cortes para cada contraindicação) para a prática de exercícios (Quadro 1). Embora essas contraindicações possam se impor em qualquer período da gestação, o primeiro trimestre é o mais preocupante, porque o desenvolvimento do bebê ainda é muito dependente das condições ma- ternas, incluindo nutrição, nível de oxigenação (fluxo sanguíneo) e grau de imunidade. Exercícios para gestantes4 Fonte: Adaptado de Nascimento et al. (2014). Absolutas Relativas Doença cardíaca Anemia(hemoglobina inferior a 10 mg/dL) Doença pulmonar restritiva Arritmia cardíaca Incompetência istmocervical Bronquite Gestação múltipla (após 30 semanas) Diabetes não controlado Sangramento durante a gestação Hipertensão arterial crônica, epilepsia ou doença da tireoide Placenta prévia Obesidade extrema, desnutrição ou desordem alimentar Trabalho de parto prematuro Restrição de crescimento fetal Ruptura prematura de membrana Fumante em excesso Pré-eclampsia ou qualquer hiperten- são arterial não controlada Estilo de vida sedentário Quadro 1. Contraindicações absolutas e relativas na prática de exercícios físicos para gestantes A prescrição adequada de exercício físico passa, obrigatoriamente, por uma bateria de avaliações, incluindo as avaliações físicas. Para a população gestante, devem ser observadas algumas orientações especiais nesse caso:  Não deve ser prescrito exercício máximo, mesmo que seja para avaliação.  É recomendada a presença ou supervisão de um médico.  Para avaliação do consumo máximo de oxigênio (VO2máx), pode ser realizado um teste submáximo (até 80% FCmáx predita pela idade, ou 65–70% FC de reserva).  Gestantes sedentárias devem ser avaliadas pelo médico antes da rea- lização dos testes físicos. A resposta fisiológica durante os testes, sejam eles para determinação de VO2máx ou de força, é similar à da população em geral, porém com mais in- tensidade. Assim, a frequência cardíaca responderá de forma mais acentuada e, em consequência, o mesmo ocorrerá com o débito cardíaco e a pressão arterial. A ventilação será maior em profundidade e frequência para garantir o aporte 5Exercícios para gestantes de ar necessário em resposta ao exercício físico. Este cenário provoca exaustão mais precocemente em mulheres gestantes, se comparadas às não gestantes. Outros cuidados gerais são importantes para a prática de exercício físico, tais como:  evitar esportes de contato físico;  evitar exercícios isométricos e posições supinadas após o primeiro trimestre, especialmente devido à obstrução venosa;  evitar a manobra de Valsalva, prática comum nos exercícios de muita força; e  evitar, sob todos os aspectos, o estresse térmico, ou seja, manter a gestante hidratada e praticar o exercício físico em ambiente ameno. Mesmo com estas precauções, é importante que o profissional de educação física reconheça os principais sinais para interromper o exercício físico:  todo e qualquer sangramento vaginal;  dispneia durante e/ou imediatamente após exercício físico;  tonturas, dor de cabeça ou dor no peito;  dor muscular excessiva ou inchaços repentinos;  diminuição do movimento fetal;  perda de líquido amniótico. A adoção de um estilo de vida mais saudável deve fazer parte da vida de todos. Na condição de gestantes, essa prática deveria ser ainda mais incisiva. A falta de conhecimento dessa condição, partindo da fisiológica da gestante até os sinais de alerta, é uma realidade que deve ser revista. As diretrizes apresentadas, embasadas na ciência, garantem os benefícios e a segurança da prática regular de exercícios físicos. Uma grande parte destes exercícios deve objetivar o fortalecimento do core, como você verá a seguir. Programas de treinamento específicos para fortalecimento do core O conceito de “core” vem do signifi cado da palavra em inglês (núcleo, cerne, centro, âmago etc.), ou seja, uma região central que é responsável por grande parte do equilíbrio (realinhamento central) e postura do corpo. São músculos profundos da região abdominal, lombar e pélvica, cujo objetivo é manter a Exercícios para gestantes6 estabilidade dessa região proporcionando melhor equilíbrio e postura (EVAN- GELISTA, 2015). Pessoas com core enfraquecido têm maior chance de desvios posturais e lesões, principalmente hérnia de disco. Assim, o fortalecimento do core para as gestantes é de grande valia. Para que seja possível determinar um treinamento específico da região, é importante conhecer os músculos envolvidos no core. Ao todo são 29 músculos, sendo os principais deles apresentados no Quadro 2, acompanhados das respectivas ações. Além dos músculos elencados no Quadro 2, os glúteos têm fundamental importância para o core, pois realizam diversas ações sobre os quadris. Para complementar, temos ainda os músculos do assoalho pélvico: quando contraídos, elevam os órgãos pélvicos e mantêm a continência urinária e fecal; quando rela- xados, permitem o esvaziamento intestinal e vesical. São músculos com ação de grande distensão para permitir e auxiliar no trabalho de parto. Evidências indicam que cerca de 10% das mulheres sofrem lesão na musculatura do assoalho pélvico durante o parto. Assim, o trabalho de fortalecimento prévio é fundamental. Ação geral Ação específica Reto abdominal: a contração aumenta a pressão intra-abdominal para a respiração, regurgitação, defe- cação, micção e trabalho de parto. Multífidos: estabilização e extensão da coluna vertebral, rotação e flexão lateral. Oblíquo externo: rotação do tórax, flexão do tronco e aumento da pressão intra-abdominal. Psoas maior: a flexão da coxa e a contra- ção unilateral inclinam a coluna lombar e a contração bilateral eleva o tronco, saindo da posição supina. Oblíquo interno (porção anterior): similar ao oblíquo externo; contudo, rota o tronco para o mesmo lado da contração. Transverso do abdômen: aumenta a pressão intra-abdominal e estabiliza a coluna lombar. Iliocostais: inclinam a cabeça lateralmente, estendem a cabeça e parte da coluna vertebral. Quadrado lombar: inclinação lateral do tronco e depressão da 12ª costela. Oblíquo interno (porção posterior): similar ao oblíquo externo; contudo, rota o tronco para o mesmo lado da contração. Quadro 2. Principais músculos para o fortalecimento do core (Continua) 7Exercícios para gestantes O fortalecimento do core, baseado na musculatura envolvida, pode ser feito por diversas modalidades, tais como: exercícios de força com o peso corporal, utilização de bolas grandes, faixas elásticas, BOSU (meia lua de borracha em que a pessoa fica em cima), exercícios com métodos Pilates ou ioga, entre outros. Os exercícios podem ser feitos em sequência ou “circui- tado”, de acordo com a necessidade. Você deve priorizar a utilização do peso corporal da praticante e faixas elásticas, em vez de pesos guiados (aparelhos de musculação). Evite tensões elevadas e fique atento aos exercícios isométricos intensos que coloquem a gestante em risco quanto à posição de execução. Para exercitar especificamente o assoalho pélvico, a gestante pode realizar contrações sustentadas durante 5 a 10 segundos ou contrações rápidas (contrair e relaxar) em diferentes posturas. Uma orientação segura é realizar diariamente 2 séries de 8 a 10 contrações. Após os exercícios para fortalecimento do core, utilize técnicas de alonga- mento muscular leve, que já foram evidenciadas para a diminuição das queixas de dor pélvica posterior e de dor lombar durante a gestação. Cabe ressaltar que durante a gestação ocorre um aumento dos níveis dos hormônios relaxina e progesterona; assim, devem-se evitar alongamentos extremos. (Continuação) Fonte: Adaptado de Evangelista (2015). Ação geral Ação específica Longuíssimo: extensão da coluna vertebral e flexão lateral. Diafragma: as bases dos pulmões estão apoiadas no diafragma; quando da sua con- tração, aumenta a área do pulmão e diminui a pressão intrapulmonar e, por diferença de pressão em relação ao ambiente, o ar entra nos pulmões (inspiração). Quando do seu relaxamento, a musculatura expiratória comprime o pulmão, elevando a pressão intrapulmonar, e o ar é expirado. Além deste processo, o diafragma é importante para o espirro, a tosse, a defecação e no trabalho de parto. Quadro 2. Principais músculos para o fortalecimento do core Exercícios para gestantes8 Seguem alguns exemplos de exercícios para o fortalecimento do core que podem ser executados pelas gestantes,sempre observando os critérios e sinais de alerta. Os movimentos devem ser realizados em baixa velocidade e com estabilização da cintura pélvica para melhor resultado. As gestantes jamais devem realizar a manobra de Valsalva (segurar a respiração) durante os exer- cícios. A partir dos exemplos recomendados, pode-se criar variações com o BOSU ou faixas elásticas para aumentar a dificuldade (somente para aquelas gestantes que já praticavam exercícios físicos e que tenham condicionamento e experiência motora) (EVANGELISTA, 2015).  Prancha reta ou com os joelhos apoiados: 2 a 3 séries; contrações sus- tentadas de 10 a 15 segundos; descansar por 20 a 30 segundos.  Elevação do quadril (ponte): em decúbito dorsal, pés apoiados ao chão e com os joelhos dobrados, realizar a elevação do centro gravitacional e sustentar na posição elevada (2 a 3 séries; contrações sustentadas de 10 a 15 segundos, sem manobra de Valsalva; descansar por 20 a 30 segundos). Uma alternativa é apoiar os pés em uma bola grande.  Agachamentos podem ser feitos preferencialmente sem peso adicional (somente o peso corporal). Executar 2 a 3 séries de 10 repetições e inter- valos de 45 segundos a 1 minuto. Uma alternativa para o agachamento é a utilização da bola grande na parede, com ângulo próximo a 90º na articulação do joelho e do quadril.  Abdominal sobre a bola grande é ótimo e seguro; basta ter cuidado para não estender demasiadamente a coluna vertebral na bola para não sobrecarregar a região abdominal. Movimentos em decúbito ventral não são recomendados em hipótese alguma.  Elevação das pernas com a bola grande presa nos joelhos ou nos pés, sempre em decúbito dorsal. Elevar as pernas (articulação do quadril) e ao mesmo tempo pressionar a bola (adutores). No link a seguir, você encontra exemplos de exercícios com método Pilates para reforçar o core. É necessário ajustar os exercícios de acordo com a individualidade biológica das gestantes, levando-se em consideração a experiência prévia, possíveis dores e desconfortos etc. https://qrgo.page.link/dmBmL 9Exercícios para gestantes Além do fortalecimento do core, a prática de exercícios aeróbicos também tem sua relevância. Contudo, é preciso separar as gestantes com experiência prévia (atletas profissionais e/ou amadoras) daquelas que não praticavam exercícios e, por recomendação médica, querem praticá-los durante a gra- videz. A seguir, você verá pontos de otimização do treinamento físico que devem ser observados para as diferentes populações: gestantes sedentárias e gestantes atletas. Estratégias de treinamento para diferentes perfis de gestantes: sedentárias e atletas A recomendação de prática regular de exercício físico na condição de gestante está muito bem consolidada, e há consenso sobre o tema (ARTAL; O’TOOLE; WHITE, 2003; BARAKAT; LUCIA; RUIZ, 2009; ROBLEDO-COLONIA, 2012). No entanto, quando a gestante já é uma atleta profi ssional ou mesmo uma atleta amadora muito bem condicionada, qual seria a recomendação neste caso? Ela pode competir em esportes que não sejam de contato? Dois exemplos são emblemáticos e ajudam a embasar essa discussão. Em 2017, a fi nal do Aberto da Austrália de tênis foi vencida por Serena Willians. Nada fora do comum, não fosse o fato dela estar na 8ª semana de gestação. O se- gundo caso foi um pouco mais intenso: a corredora americana Alysia Montano participou de uma prova de 800 m entre o 7º e 8º mês de gestação! Ficou na última colocação, mas participou de uma prova ofi cial de 800 m. Estes fatos não devem ser levados como regra na sustentação de “fazer exercícios físicos na gestação é amplamente recomendado”. Existem limites na gravidez que devem ser respeitados. É verdade que a regra básica determina que a mulher deve seguir a sua rotina pré-gestação, ou seja, praticar os exercícios de acordo com o que o corpo estava acostumado antes da gravidez. Porém, é necessário ajustar a prática de exercícios à nova realidade, tal como: reduzir os impactos, diminuir a intensidade e grandes volumes, evitar determinadas posições, fi car em alerta contra choques térmicos e ricos de quedas, entre outros. Na Figura 1, podem ser observadas duas realidades, ambas de com- petição: Alysia Montano em uma prova ofi cial de 800 m e uma segunda, aparentemente em uma prática mais leve, sem a preocupação e a carga do profi ssionalismo. Qual é a sua opinião quanto à conduta de um profi ssional de educação física frente a estes dois panoramas? Exercícios para gestantes10 Figura 1. “Competição” no período gestacional. Fonte: UOL Esporte (2014, documento on-line); Halfpoint/Shutterstock.com. Tradicionalmente, a rotina recomendada de exercícios e esporte para grávidas costuma abranger acima de tudo hidroginástica, ioga e Pilates. Existem várias outras modalidades que precisam ser encorajadas, de acordo com o histórico da gestante e sua experiência prévia. Contudo, não é porque a ioga é aparentemente mais calma que não possa trazer prejuízo à gestante. O cerne da questão ultrapassa a modalidade e recai sobre a intensidade, volume, posições e condições ambientais. A prescrição de exercícios aeróbicos deve preferencialmente partir de ca- minhadas e/ou corridas leves, de acordo com o condicionamento prévio da gestante (NASCIMENTO et al., 2014). Outras opções incluem a bicicleta e modalidades aquáticas (deep running ou water bike). A intensidade dos exercí- cios de característica aeróbica pode ser controlada pela frequência cardíaca e/ ou escala subjetiva de Borg. Neste sentido, a intensidade relativa para FCmáx predita pela idade fica entre 60 e 80%. Outra opção é controlar a intensidade pela frequência cardíaca de reserva com intervalo entre 45 e 65% da FCreserva. Na escala de Borg, esta intensidade encontra-se entre 12 e 14 (para a escala de 6 a 20 pontos). A Sociedade Canadense de Ginecologistas e Obstetras (WOLFE; DAVIES, 2003) generalizou estas zonas de treinamento da seguinte forma:  idade inferior a 20 anos —140 a 155 bpm;  entre 20 e 29 anos —135 a 150 bpm;  entre 30 e 39 anos —130 a 145 bpm;  mulheres com mais 40 anos —125 a 140 bpm. Para as mulheres atletas, esta intensidade pode ser reavaliada de acordo com a condição física da gestante. Contudo, não é aconselhável ultrapassar o liminar anaeróbico. 11Exercícios para gestantes Para utilizar a fórmula de Karvonen (frequência cardíaca de reserva) deve-se conhecer (ACSM, 2018):  FCmáxima: por se tratar de gestante, não é aconselhável a realização de um teste de esforço para a FCmáxima real. Uma alternativa é a utilizar “220 – idade”.  FCrepouso: menor frequência cardíaca em 15 minutos de repouso absoluto (decúbito dorsal), sem pernas ou braços cruzados.  FCtreino = [ (FCmáxima – FCrepouso) × %intensidade ] + FCrepouso. Quanto à frequência semanal e tempo da sessão, para mulheres sedentárias pode-se iniciar um programa de exercícios com 3 vezes por semana de 15–20 minutos e progredir até 5 vezes por semana de 30 minutos, paulatinamente (meta: 150 minutos por semana de exercícios leves à moderados). Em mulheres atletas, treinos de 4 a 5 vezes por semana em sessões de 30–45 minutos já garantem benefícios maternos e fetais. Embora a prática de exercícios regulares seja encorajada durante todo período gestacional, o 2º trimestre é o mais apropriado e seguro. Isso porque no 1º trimestre a formação fetal deixa a gestante mais propensa a elevação da frequência cardíaca em maior magnitude, indisposição (enjoos e regurgita- ções), desequilíbrio hormonal, entre outros. No 2º trimestre, estas alterações tendem a se estabilizar, e os aspectos corporal, emocional e psicológico da mulher já estão em maior harmonia. Ademais, o desenvolvimento do feto já não é tão delicado em comparação ao 1º trimestre. No 3º trimestre, os cuidados recaem sobre o peso corporal agindo sobre a lombar, cintura pélvica, espaço interno dos órgãos etc. Assim, os exercícios, especialmente com deslocamentos corporais, devem ser aplicadoscom parcimônia frente a esta realidade. Resumidamente, a maior diferença entre a prática de exercícios físicos por mulheres atletas e mulheres sedentárias é que em gestantes atletas pode-se continuar realizando os mesmos exercícios que antes, devido à sua memória muscular, mas ajustando alguns parâmetros, como a intensidade, tempo da sessão, posições e condições ambientais. Já para as gestantes sedentárias, a prática deve ser incentivada com progressões mais amenas e sem agressões extras, como impactos ou sobrecargas na coluna vertebral. A prática regular de exercícios físicos é o meio mais saudável e com menor custo para a população geral, incluindo as gestantes. Exercícios para gestantes12 Patrícia tem 30 anos e experiência mediana na prática de exercícios (realiza somente exercícios aeróbicos 2 vezes por semana, por 60 minutos). No 1º trimestre de gestação, os exercícios aeróbicos que ela já praticava foram reduzidos para 30–45 minutos por sessão com intensidade moderada. Ela também incorporou um fortalecimento muscular com aulas de Pilates. Atualmente está na 20ª semana de gestação, e por se mostrar muito bem-disposta, ela quer evoluir e pediu para fazer uma aula experimental de HIIT (high intensity interval training) na academia, modalidade ministrada por você. Nesse caso, qual seria a sua conduta? Reflita sobre o caso e discuta com os seus colegas. ACOG COMMITTEE OBSTETRIC PRACTICE. ACOG Committee opinion. Number 267, January 2002: exercise during pregnancy and the postpartum period. Obstetrics & Gynecology, v. 99, n. 1, p. 171–173, 2002. ACSM. Diretrizes do ACSM para os testes de esforço e sua prescrição. 10. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. ARTAL, R.; O'TOOLE, M.; WHITE, S. Guidelines of the American College of Obstetricians and Gynecologists for exercise during pregnancy and the postpartum period. British Journal of Sports Medicine, v. 37, n. 1, p. 6–12, 2003. Disponível em: https://www.ncbi. nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1724598/. Acesso em: 15 jul. 2019. BARAKAT, R.; LUCIA, A.; RUIZ, J. R. Resistance exercise training during pregnancy and newborn's birth size: a randomized controlled trial. International Journal of Obesity, v. 33, n. 9, p. 1.048–1.057, 2009. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pub- med/19636320. Acesso em: 15 jul. 2019. BRASIL. Diagnóstico nacional do esporte (Diesporte). Brasília: Ministério do Esporte, 2015. 1 ví- deo (2 min). Disponível em: http://www.esporte.gov.br/diesporte/. Acesso em: 15 jul. 2019. CARVALHO, C. S. C. Fitoterapia na gravidez: segurança e eficácia de produtos à base de plantas no alívio de sintomas e desconfortos associados à gravidez. 2016. Dis- sertação (Mestrado em Ciências Farmacêuticas) — Faculdade de Farmácia, Univer- sidade de Coimbra, Coimbra, 2016. Disponível em: https://estudogeral.sib.uc.pt/ bitstream/10316/47852/1/M_Claudia%20Carvalho.pdf. Acesso em: 15 jul. 2019. EVANGELISTA, A. L. Treinamento funcional e core training. 2. ed. São Paulo: Phorte, 2015. GOMES, R. C. Enjoos e vômitos na gravidez. Portal Educação, 2012. Disponível em: https:// www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/enfermagem/enjoos-e-vomitos-na- -gravidez/14012. Acesso em: 15 jul. 2019. 13Exercícios para gestantes GUEDES, D. P.; GUEDES, J. E. R. P. Atividade física, aptidão física e saúde. Revista Brasileira de Atividade Física & Saúde, v. 1, n. 1, p. 18–35, 1995. Disponível em: http://rbafs.org.br/ RBAFS/article/view/451. Acesso em: 15 jul. 2019. LEVENO, K. J. Manual de obstetrícia de Williams: complicações na gestação. 23. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. NASCIMENTO, S. L. et al. Recomendações para a prática de exercício físico na gravidez: uma revisão crítica da literatura. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v. 36, n. 9, p. 423–431, 2014. ROBLEDO-COLONIA, A. F. et al. Aerobic exercise training during pregnancy reduces depressive symptoms in nulliparous women: a randomised trial. Journal of Physiothe- rapy, v. 58, n. 1, p. 9–15, 2012. 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Essa assimetria na influência dos vôos transoceânicos deve-se ao fato de que o ritmo circa- diano natural na direção oeste supera as 24 horas e, na direção leste, diminui. Como em algumas ocasiões a alteração no fuso horário está acompanhada de alteração no clima, na temperatura e na alimentação, recomenda-se que, no caso de competi- ções fundamentais (como olimpíadas e campeonatos mun- diais), os esportistas com possibilidade de medalha partam, junto com seus treinadores e equipe médica, 2 a 3 semanas antes do evento, a fim de garantir uma adaptação completa. A defasagem de horário é também conhecida como jet- lag, expressão inglesa que se refere ao desequilíbrio que acompanha as viagens de avião através das diferentes zonas de fusos horários no mundo. Isto é, voando transversal- mente sobre o globo terrestre no sentido leste-oeste ou vice- versa. Possíveis recomendações: � Quando se voa na direção oeste: o dia fica maior, assim, o mais provável é que haja interesse em man- ter-se acordado, o que é o melhor para a adaptação. É importante uma dieta rica em proteínas (carne, peixe, ovos, derivados do leite), o que ajuda a man- ter-se desperto. � Quando se voa na direção leste: o dia se torna mais curto, de forma que é melhor descansar no avião. Para dormir, é conveniente uma dieta rica em car- boidratos (massa, arroz, frutas, vegetais, etc.). De maneira geral: � Antes e durante o vôo, pensar positivamente em rela- ção ao próprio vôo e a futura permanência. � Beber em abundância água mineral ou sucos para evitar a perda de líquidos que ocorre nos vôos. Não é conveniente ingerir bebidas alcoólicas, nem bebi- das com cafeína (café, chá, bebidas à base de cola). � Durante as escalas nos terminais de aeroporto, apro- veitar para andar e realizar alongamentos. � No local de destino: estabelecer um cronograma aco- plado ao novo horário, sendo muito rigoroso com os horários de treinamento, de alimentação e de des- canso. Evitar comer ou dormir fora de horário. O primeiro treinamento deve ser uma sessão curta com caráter aeróbio (corrida contínua, não mais de 30 min), realizando aquecimento e resfriamento apro- priados. As reações do esportistaao calor: adaptação Sabemos que aproximadamente 75% da energia produzida durante um treinamento intenso ou uma competição é li- berada para o meio externo sob a forma de calor. O meio mais ativo dessa liberação de calor é a exalação durante a ventilação e a difusão de líquidos através da pele. Produto disso, se a temperatura ótima do ar para a atividade vital do ser humano oscila entre 18 e 22oC, a atividade física intensa requer uma diminuição na temperatura ótima. Por exemplo, para uma atividade física que requeira uma fre- qüência cardíaca de 140 bpm, a temperatura ideal seria entre 16 e 17oC e, para 170 a 180 bpm, a realização ótima de trabalho seria a uma temperatura de 13 a 14oC. O aumento da temperatura externa acima de um nível relativamente suportável elimina a diferença útil, do ponto de vista fisiológico, entre a temperatura interna do corpo e a externa, o que dificulta seriamente a liberação de calor e gera uma ameaça por meio do superaquecimento do corpo. A evaporação do suor da superfície do corpo torna-se mais difícil quando ocorre aumento na umidade. Com a pressão dos vapores de água do ar ambiente superior a 40 mm rrtst, a evaporação do suor é quase nula. Por isso, o esportista suporta melhor uma temperatura do ar muito alta quando a umidade não é significativa em relação a uma temperatura relativamente baixa mas com grande umidade. O aumento da temperatura e da umidade do ar em rela- ção ao nível de bem-estar (Tabela 19.5) está relacionado com uma diminuição importante do nível de consumo de oxigênio com o qual o ser humano mantém a temperatura corporal constante. O treinamento ou a competição em temperaturas muito elevadas sem que haja aumento da temperatura do corpo exige uma forte diminuição da inten- sidade da atividade, o que produz uma diminuição do VO2máx em aproximadamente 33% e uma marcada dimi- nuição do rendimento esportivo, de forma mais notória nas modalidades de tempo prolongado. A partir dos 37oC de temperatura seca ou dos 29oC de temperatura úmida, o esportista apresenta sérias dificulda- des fisiológicas, e a manutenção da atividade física prolon- gada provoca uma diminuição no rendimento e, em tempe- raturas extremamente elevadas, como observado na Tabela 19.5, pode colocar em perigo a saúde do atleta. Essas si- tuações influenciam negativamente os sistemas circulató- rio e respiratório, alteram a formação do suor e a transpi- ração, assim como o balanço salino e hídrico. Por exemplo, o fluxo de sangue e o VO2 não são diferenciados do nível alcançado no início do trabalho em condições normais e em condições de calor, porém são diferenciados em qualida- de, já que com o calor há aumento da circulação da pele (cutânea) até 20% do fluxo cardíaco (cerca de quatro vezes 527MEDICINA DO ESPORTE mais que em condições normais). Esse aumento em direção à rede capilar cutânea é necessário para impedir um supera- quecimento do corpo. Uma das conseqüências mais negativas da desidratação é a diminuição do volume do plasma sangüíneo. Durante a desidratação, como conseqüência do trabalho prolongado em altas temperaturas secas e/ou úmidas, perde-se aproxi- madamente 4% do peso corporal, e o volume do plasma diminui em 16 a 18%. Também há diminuição do volume sangüíneo circulante e do volume sistólico, observando-se uma hemoconcentração com um aumento do hematócrito e da viscosidade do sangue, aumentando a carga de traba- lho que o coração pode suportar e diminuindo a sua produ- tividade. Isso leva a uma diminuição da circulação nos mús- culos que estão sendo utilizados devido ao aumento da por- centagem do fluxo cardíaco dirigido aos vasos cutâneos para intensificar a perda de calor, diminuindo o volume de sangue circulante. Isso leva a um acúmulo de lactato e, por conseguinte, diminui o ritmo de trabalho. Uma conse- qüência da desidratação é, inclusive, a diminuição do volu- me de líquido intercelular e intracelular. Nas células com baixo conteúdo de água e com um equilíbrio alterado de eletrólitos, a atividade normal altera-se. Esse desvio do flu- xo sangüíneo em direção à pele também afeta o suprimento para o fígado, para os rins e para o intestino. Essa situação crítica de insuficiência coronariana aumenta a freqüência cardíaca, a qual é insuficiente. Se isso persistir por um tem- po prolongado, em condições de competição, pode provo- car no esportista um choque térmico e colocar sua vida em perigo. Pode ser típico da maratona. O treinamento e a competição do esportista com altas temperaturas e umidade ambiental provocam, pouco a pou- co, o desenvolvimento de reações de adaptação, fazendo com que a atividade do organismo seja mais efetiva e o rendimento aumente. As pessoas que vivem em países quentes caracterizam- se por um limiar menor de perda de calor, não só por adap- tação, mas também por um aumento de 0,2oC na tempera- tura corporal e, inclusive, um acentuado aumento na quan- tidade de glândulas sudoríparas por cada cm2 de superfície corporal em comparação com as pessoas que vivem em paí- ses de temperaturas moderadas. Tem-se observado que pessoas de climas moderados e de olhos negros e castanhos adaptam-se, de forma geral, mais facilmente. Pessoas de olhos claros, em algumas oca- siões, são acometidas no período de aclimatação com irri- tabilidade, insônia, hipertensão arterial, etc. Quando os atletas devem deslocar-se de países frios para competir em países quentes, é necessário organizar uma aclimatação prévia, entre 7 e 14 dias, com sessões diárias de 2 ou 3 horas, inicialmente com baixa intensidade. Se não for possível treinar nessas condições, é preciso utilizar uma roupa que bloqueie a liberação de calor e limite a eva- poração do suor, com a finalidade de ir criando mecanismos de adaptação. Os esportistas jovens suportam menos o calor do que os adultos, já que se aclimatam mais lentamente a um clima quente. De maneira geral, são dadas algumas recomendações para a adaptação ao calor: � Quando nos deslocamos em direção a um país com temperaturas e/ou umidade elevada, a adaptação an- tes da competição deve ser, no mínimo, de 7 a 14 dias. � É preciso, no início, diminuir a duração e a intensida- de e aumentar progressivamente as cargas. Realizar mais de uma sessão diária de treinamento. Não pas- sar de 2 a 3 horas de treinamento nos primeiros dias. � Os esportistas devem estar bem-hidratados antes de treinar e de competir. É preciso repor as necessida- des hidreletrolíticas mediante bebidas isotônicas e, em algumas ocasiões, somente água, durante o treinamento e a competição, em uma proporção de 150 a 200 mL a cada 20 a 30 minutos. � Essas condições críticas de temperatura fazem o or- ganismo consumir de 2 a 2,5 vezes mais do que em condições normais, devido à grande quantidade de água absorvida. � A alimentação deve ser balanceada e com poucas calorias no início da adaptação. � Utilizar roupas leves, as quais devem ter apenas uma camada de tecido para permitir a evaporação da água e abrir o máximo possível a superfície da pele. � Ainda devemos ser mais cuidadosos com crianças e adolescentes, já que sua adaptação é mais lenta, es- pecialmente as crianças. � Lembrar que a resposta é individual e que alguns se recuperam mais rapidamente. � A adaptação do esportista ao calor seco não é garan- tia de adaptação ao calor úmido. � A adaptação ao trabalho de baixa intensidade (25% do VO2máx ou um pouco mais) em condições de calor não garante a adaptação a um trabalho de maior intensidade nas mesmas condições. Tabela 19.5 Condições de temperatura e rendimento Temperatura Temperatura Classificação seca (oC) úmida (oC) Agradável 27 22 Quente 37 29 Muito quente 40 32,5 TREINAMENTO EM MÉDIA ALTITUDE E OUTRAS SITUAÇÕES ESPECIAIS DO MEIO AMBIENTE528 � Em algumas ocasiões, as alterações de adaptação nas modalidades esportivas de tempo prolongado, como é o caso de algumas modalidades de resistência em clima quente, são bastante complexas e necessitam de 3 a 4 semanas. � Os esportistas de países mais quentes e úmidos adap- tam-se melhor ao treinamentoe à competição nessas condições. � O aumento da temperatura retal do corpo é um índi- ce que informa sobre a ação da carga no organismo do esportista, e há uma elevação considerável dessa temperatura quando estamos realizando trabalho em condições de alta temperatura. Tem sido proposta como um indicador para classificar a intensidade de trabalho, segundo os registros da temperatura, em: leve até 38,1oC; difícil de 38,1 até 39,4ºC; ex- tremamente difícil (crítica) em mais de 39,4°C. Tem- se demonstrado, em um seguimento de esportistas, durante um trabalho intenso e durante a recupe- ração, a relação desse indicador (temperatura retal) com a freqüência cardíaca, com o fluxo sangüíneo e com a ventilação pulmonar. As reações do esportista ao frio: adaptação A adaptação aguda e crônica do esportista ao frio é muito menos complexa. Não obstante, para os esportistas de paí- ses quentes, é mais lenta e um pouco arriscada para a saúde, observando-se o aumento da incidência de lesões esporti- vas. As reações de adaptação aguda do organismo a certas temperaturas estão condicionadas pela necessidade de de- fesa do corpo ante a perda de calor. O aumento da capacidade de isolamento por meio de vasoconstrição cutânea é fundamental. Isso provoca uma diminuição da temperatura cutânea, pela qual é produzida uma diferença de temperatura entre a superfície do corpo e o meio ambiente. A vasoconstrição mais importante é produzida nas ex- tremidades, especialmente nos dedos das mãos e dos pés. A circulação entre os dedos das mãos e dos pés pode dimi- nuir cerca de cem vezes, enquanto os tecidos das partes distais das extremidades podem diminuir até a temperatura do meio ambiente. Por isso, a capacidade de isolamento da pele pode aumentar 5 ou 6 vezes. É importante conservar o calor do corpo em temperatu- ras baixas. Para que isso seja garantido, deve-se: � Utilizar roupas adequadas. Utilizar roupa e calçado esportivos durante o treinamento e a competição, para garantir a manutenção de uma temperatura ótima e proteger as áreas do corpo que podem ser mais afetadas. Por exemplo, utilizar luvas nos dedos das mãos e, se possível, durante a prática do esporte, como pode ocorrer no futebol, atletismo de fundo, etc. É fundamental evitar doenças respiratórias, as- sim como lesões do esporte, incluindo fraturas devi- das a quedas após nevar. � Dieta balanceada, com um maior aporte de calorias do que o habitual em esportistas que não tenham dificuldades com sobrepeso, com um pequeno au- mento das proteínas e dos lipídeos a fim de garantir um maior aporte calórico e enfrentar os gastos extras devidos ao frio. � Realizar um ótimo aquecimento para garantir o au- mento e a manutenção do calor corporal por meio do aumento do metabolismo, evitando também fu- turas lesões. O não-cumprimento dessas medidas conduz à diminui- ção da temperatura corporal abaixo do normal, devido ao resfriamento, o que diminui o VO2máx, o fluxo cardíaco, a capacidade de trabalho e a recuperação. Também decrescem significativamente os índices de força e velocidade, cujo nível está diretamente relacionado com a temperatura mus- cular. A capacidade de resistência também diminui. A adap- tação crônica ao frio diminui a vasoconstrição cutânea, in- tensificando a circulação sangüínea periférica e diminuindo menos a temperatura cutânea e muscular. Aumenta a coor- denação dos esportistas, assim como a força-velocidade, a mobilidade articular e a resistência. A adaptação deve durar entre 7 e 14 dias, lembrando que as crianças se adaptam mais lentamente do que os adultos. Influência das condições climáticas sobre o rendimento esportivo As condições climáticas também influenciam o treinamen- to, a competição e a preparação do esportista para o desen- volvimento da competição. A informação sobre o tempo real permite aumentar a qualidade da preparação do es- portista e a realização das competições, assim como permite resolver melhor os problemas envolvendo o treinamento e a competição. Para organizar o treinamento e a competição, convém conhecer a previsão do tempo em curto prazo (segurança de 80 a 90%), em médio prazo (70 a 75%) e em longo prazo (60 a 65%). Quando o tempo é agradável e quente, pode-se reduzir a duração do aquecimento e diminuir um pouco a sua in- tensidade. Quando, por exemplo, sopra um vento forte, deve-se corrigir a técnica e a tática da atividade competitiva em esportes que dependem do tempo, como vela, remo, canoagem, esqui, ciclismo, triatlo, futebol e vôlei de praia. 529MEDICINA DO ESPORTE As temperaturas baixas podem modificar os programas das sessões de treinamento e alterar os programas das com- petições; por exemplo, quando chove forte são adiadas as corridas do ciclismo em pista aberta, beisebol, etc. Influência das condições de poluição ambiental sobre o rendimento esportivo Existem muitos compostos químicos que, isoladamente ou em combinação com outros compostos, produzem efeitos danosos sobre a saúde, afetando principalmente o sistema respiratório por meio da diminuição ou alteração de sua função. Essas substâncias tóxicas terão uma maior ou menor repercussão no rendimento físico do esportista que compete ou treina sob condições atmosféricas adversas, dependendo de diferentes fatores, como a concentração do produto químico no meio e a combinação com outros produtos químicos, ocasionando uma soma por adição de efeitos tóxicos; o nível de ventilação do esportista; o estado prévio da árvore brônquica do atleta; o estado de saúde e a forma física do esportista; a combinação com outros fatores atmosféricos (altitude, temperatura, umidade, etc.). Os agentes contaminantes são classificados em primá- rios e secundários. Os secundários são muito mais prejudi- ciais. Formam-se por meio de reações químicas de precurso- res naturais ou emitidos por fontes artificiais; estes incluem o ozônio (O3), o HNO3, o H2SO4, o peroxiacetil nitrato e uma grande quantidade de compostos inorgânicos que pode existir em forma gasosa ou de partículas. A principal fonte dos agentes de poluição, tanto primários quanto se- cundários, é a combinação de produtos derivados do pe- tróleo pelos meios de transporte nas cidades e nas áreas industriais. É preocupante que esportistas treinem em áreas onde existe contaminação ambiental, correndo por grandes ave- nidas em que a contaminação ambiental é elevada devido aos produtos da combustão dos meios de transporte, ou tenham parte de seu circuito de treinamento em zonas in- dustriais. Drobnic (1996) propõe uma série de recomendações para o esporte em um meio ambiente com contaminação ambiental, que citaremos a seguir: Organizadores do evento: � Estudar os locais onde se vai competir. � Avaliar os locais de treinamento. � Estabelecer um horário compatível com os horários de menor contaminação. � Estabelecer medidas oportunas para limitar a poluição durante a atividade física (indústrias, transportes). Equipe esportiva (técnicos do esporte, equipe médica e esportistas): � Colaborar, oportunamente, na avaliação da organiza- ção do evento. � Prever a chegada para ao menos três dias antes do evento. � Pode ser útil manter um tratamento com uma fór- mula antioxidante via oral. � Usar uma medicação preventiva da tosse induzida pelo esforço após exercício em indivíduos sensíveis, como o Nedocromil, o qual produz efeitos benéficos nessas situações e não é um produto proibido. � Avaliar a presença de outros possíveis contaminantes e, conseqüentemente, fazer profilaxia da bronco- constrição em indivíduos hiper-reativos, sejam ou não asmáticos. Devem ser utilizados medicamentos simpaticomiméticos que não se encontrem na lista de substâncias proibidas pelo COI. � Se a área estiver muito contaminada, deve-se avaliar seriamente a possibilidade de não competir, sobretu- do atletas de esportes de moderada e alta intensida- de e duração, como ciclismo, provas de fundo no atletismo, marcha, triatlo, e, fundamentalmente, es- portistas com maior sensibilidade. Asma e hiper-reatividade brônquica nos esportistas derendimento A presença de asma no esportista deve ser avaliada com certa cautela e deve-se estar preparado para atendê-la e preveni-la durante as competições. Em condições de conta- minação ambiental, esses esportistas são mais suscetíveis. Em condições ambientais normais, a porcentagem de espor- tistas asmáticos é similar à da população em geral, oscilando entre 5 e 10%; porém, nos atletas, existe uma hiper-rea- tividade brônquica superior à da população em geral. O motivo ainda não está claro, mas suspeita-se de que a hi- perventilação durante períodos longos, desde idades muito jovens, em muitos casos, provoca o envio de certas subs- tâncias irritantes e/ou hipersensibilizantes em maior quan- tidade e intensidade. Além do efeito do exercício, há o próprio efeito do ar frio e seco sobre a mucosa brônquica. Devemos lembrar que um atleta de maratona ventila, em duas horas e meia, o mesmo volume que ventilaria em 5 ou 6 dias levando uma vida sedentária. Como hiper-reatividade brônquica entende-se um esta- do de maior sensibilidade dos brônquios ante um determi- nado estímulo físico (exercício) ou químico (substâncias provocadoras), resultando em uma diminuição da capaci- dade brônquica. O esportista hiper-reativo pode jamais apresentar uma crise, porém, em condições de gripe ou durante um clima muito frio ou seco, pode apresentar sinto- mas leves de “sufoco”, tosse ou sensação de aperto no peito TREINAMENTO EM MÉDIA ALTITUDE E OUTRAS SITUAÇÕES ESPECIAIS DO MEIO AMBIENTE530 e sibilos. A diferença em relação à asma é que esta é uma doença crônica, caracterizada pela presença de dispnéia e revertida com a ajuda de um broncodilatador. A população esportista que sofre de asma ou de hiper- reatividade brônquica é mais sensível à contaminação am- biental. Lembrar de utilizar os medicamentos estabelecidos pelo COI. Não devemos esquecer que atletas fumantes apresentam um risco maior, já que sofrem com maior intensidade os efeitos da contaminação ambiental. Substâncias químicas tóxicas próprias do esporte � Altos níveis de monóxido de carbono estão relaciona- dos com a patinação sobre o gelo, juntamente com outro gás, o NO2. São convertidos em irritantes do sistema respiratório dos esportistas. Seus efeitos são parecidos aos efeitos do tabagismo. � O cloro, o qual é utilizado na esterilização dos depósi- tos de água e nas piscinas, é um poderoso irritante do sistema respiratório. Os nadadores, ao estarem expostos desde idades muito precoces, podem apre- sentar obstruções repentinas das vias aéreas com hi- per-reatividade brônquica. REFERÊNCIAS ALVIRA, R. et al. Análisis de la patología de las alturas, adaptación cardiorrespiratoria y su relación con radicales libres y especies acti- vas de oxígeno. Consideraciones Bioquímicas y Fisiológicas. Apuntes, v. 27, p.103-125, 1990. CÓRDOBA, A. et al. Aspectos básicos de biomedicina. Soria: Universidad Internacional Alfonso VIII, 1995. ETIENNE, J.L. Medicine et sports de Montagne. Paris: Acal, 1987. KARIKOSK, O. Altitude: problems. Athlete and Coach, n. 21, p. 25-27, 1983. MANNO, R. Fundamentos del entrenamiento deportivo. Barcelona: Paidotribo, 1991. NAVARRO, F. 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SUPLEMENTOS NUTRICIONAIS E ESPORTE DE COMPETIÇÃO DE ALTO NÍVEL436 conseqüente eliminação pelas fezes. A Tabela 15.7 apresenta os primeiros sinais e sintomas de de- ficiência do ferro, e a Figura 15.11 mostra a rela- ção do ferro em seus depósitos de reserva e fun- cional e sua relação com a anemia do esportista. � Considerando as características do atleta e sua mo- dalidade esportiva, idade e sexo, deve-se orientá-lo ao consumo da dieta apresentada anteriormente. As carnes vermelhas, as vísceras, a gema do ovo, os le- gumes secos, o cacau, os mariscos e a salsa são ali- mentos ricos em ferro. Às vezes, é necessário utilizar suplementos com a combinação de ferro ferroso e ácido fólico, assim como complexo de vitamina B, principalmente a B12. Embora seja caro, o controle sérico é importante. Às vezes, os controles de exames de Hb e Fe de rotina podem mascarar o estado de carência dos depósitos (ferritina). Nos atletas de elite, o controle da ferritina deve ser acompa- nhado sempre. AJUDA ERGOGÊNICA E ESPORTE DE ALTO NÍVEL A ajuda ergogênica constitui qualquer intervenção realizada sobre o esportista cujo objetivo seja melhorar o rendimento. O auxílio pode ser um suporte mecânico, a utilização de substâncias farmacológicas, a adoção de medidas psicoló- gicas (biofeedback, hipnose e placebos) e fisiológicas (aque- cimento, massagens, autotransfusão, etc.) e orientação nu- tricional (supercompensação de carboidratos, suplemen- tação de aminoácidos, bicarbonato de sódio, ginseng, pró- polis, etc.). No esporte de alto nível é necessário utilizar suplemen- tos nutricionais como ajuda ergogênica devido às exigên- cias do nível competitivo, existindo cada vez mais compe- tições de elite, com maiores prêmios e menos tempo para a recuperação biológica e psicológica. Assim, pode-se apli- car a ajuda ergogênica para atletas que tenham assimilado bons hábitos alimentares. A ajuda ergogênica é um suple- mento à quantidade e à qualidade calórica. Ergogenia é uma palavra de origem grega que, em rela- ção ao esporte, significa economia na utilização, no controle e na eficiência da energia. Não se deve confundir ajuda ergogênica com ingestão de substâncias proibidas (doping) e/ou com administração de transfusões sangüíneas ou ma- nipulações químicas. É um dever de todos lutar contra o doping, por isso é importante educar os atletas desde seu início para evitar esse hábito prejudicial. Todos os treina- dores, dirigentes de federações, médicos e profissionais do esporte, em seus respectivos comitês olímpicos nacionais, federações esportivas e instituições estatais do esporte, de- vem informar sobre substâncias que contenham doping e que anualmente aparecem publicadas nas listas oficiais emitidas pelo COI. Objetivos da ajuda ergogênica por meio de suplementos nutricionais Colaborar para manter o equilíbrio endócrino-metabólico com predomínio anabólico e evitar a depleção de substratos importantes. � Poupador de glicogênio. Produtos: glutamina, tri- glicerídeos de cadeia média e carnitina, que, por seus efeitos, também pode contribuir para a diminuição do peso. � Poupador de glicogênio, melhora a reserva de ami- noácidos e colabora no desenvolvimento da força. Produtos: ornitina, arginina e lisina (aminoácidos essenciais) e aminoácidos ramificados. � Recuperador cardiovascular, colabora no desenvol- vimento da força. Produto: inosina. � Desenvolvimento da força. Produtos: creatina, con- centrados protéicos, como o superamino, que se utili- za para aumento de peso à custa do peso magro. � Reguladores do metabolismo, aporte de agentes an- tioxidantes, imunomoduladores, aporte de ferro. Produtos: vitaminas e minerais. � Reposição hidromineral. Bebidas istônicas que apor- tam a necessidade de água, minerais e carboidratos, necessários para o treinamento e para a competi- ção. Produtos: Gatorade, Isostar, Flectomin, etc. Caracterização dealguns produtos ergogênicos � Glutamina: é um aminoácido não-essencial regula- dor da síntese hepática do glicogênio, poupador de glicogênio muscular e dos aminoácidos essenciais em nível muscular e precursor dos aminoácidos es- senciais valina, leucina e isoleucina. A ingestão ade- quada garante um sistema protetor das proteínas que participam na construção muscular. Aporte ime- diato de energia. Dosagem: 2 a 4 cápsulas de 400 Tabela 15.7 Conseqüências da deficiência de ferro Perda de apetite Apatia Fadiga Palpitações ao exercício Inflamação da língua e do estômago Diminuição da produção de hemoglobina 437MEDICINA DO ESPORTE mg, 15 a 20 minutos antes do treinamento principal do dia. Deve ser ingerida sempre depois das refeições para evitar a competição com outros aminoácidos existentes nos alimentos. � Triglicerídeos de cadeia média: poupador de glico- gênio e de proteínas. Utilidade principal em provas de fundo, principalmente em maratonas e em triatlo. De 1 a 3 colheres, duas vezes ao dia, dependendo do peso corporal. Apresentação: 1.000 mL. � Inosina: recuperador cardiovascular, contribui para o desenvolvimento da força. Melhora a síntese de ATP, já que é um elo natural na cadeia bioquímica da produção de ATP. É um nucleotídeo da purina, componente natural que se encontra nos tecidos do organismo, principalmente no coração e no músculo esquelético. Melhora a potência aeróbia e a anae- róbia. Dosagem: 1 a 3 cápsulas de 500 mg no almo- ço e jantar. Tomar dois dias e descansar um, já que pode elevar o ácido úrico. Atualmente está entrando em desuso. � Arginina, ornitina e lisina: são aminoácidos que, em sua forma livre, colaboram com o treinamento de for- ça, contribuindo para eliminar os radicais de amônia. Retardam a produção de lactato e poupam glicogênio. Acredita-se que atuem indiretamente sobre o hormô- nio do crescimento. Dosagem: 1 a 3 comprimidos uma hora antes de deitar, já que nesse horário têm maior efeito. Cada um dos aminoácidos contém 500 mg. � L-Carnitina: poupador de glicogênio. Ativa especifi- camente o metabolismo dos lipídeos, ajudando a re- duzir a gordura corporal por metabolizá-la, favore- cendo a obtenção de energia. Colabora indiretamen- te na melhora da capacidade aeróbia pela utilização dos lipídeos como fonte energética. É usada tam- bém para diminuir o peso em esportistas ou pesso- as com sobrepeso. Dosagem: 1 a 3 comprimidos di- ários de 1.000 mg nas refeições ou meia hora antes do treinamento. � Creatina: é um metabólito rico em energia que se encontra no músculo. Colabora na elevação da capa- cidade anaeróbia aláctica, melhorando o desenvol- vimento da força, a explosão e a velocidade. Melhora a potência e a recuperação do músculo. Dosagem: o Plus Creatine deve ser administrado nos primeiros cinco dias na razão de 200 mg/kg em quatro doses acompanhadas de suco de frutas com açúcar, após o café da manhã, o almoço e o jantar e 15 minutos antes do treinamento principal. A partir da segunda semana, diminui-se a dosagem para 50 mg/kg, em dose única 15 a 20 minutos antes do treinamento principal. Próximo à competição, em modalidades esportivas individuais ou em campeonatos de tem- poradas extensas, não se deve administrar esse pro- duto, ou deve-se reduzi-lo ao máximo, uma vez que os esportistas podem perder elasticidade em seu aparelho musculoesquelético, o que pode ocorrer so- bretudo em atletas extremamente musculosos, favo- recendo as rupturas de miofibrilas. Em atletas com pouco desenvolvimento muscular não se deve utili- zar esse produto. � Aminoácidos ramificados (AAR ou BCaa): compos- tos pela L-Leucina (200 mg), pela L-Valina (200 mg) e pela L-Isoleucina (100 mg). Têm uma atividade essencial para o desenvolvimento da massa muscu- lar e contribuem para melhorar a resistência, o ren- dimento físico e a regeneração das fibras musculares. Possuem um efeito anabólico natural. Indiretamen- te, são poupadores de glicogênio. Apresentação em cápsulas de 500 mg. Dosagem: 6 a 9 cápsulas ao dia em três doses diárias, entre as refeições e antes do treinamento. � Superamino 2000: é uma fórmula de aminoácidos obtida mediante processamento de alto valor biológi- co. É um produto composto 100% por lactoalbumina e albumina de ovo digerida por enzimas. É usado para aumentar o peso à custa do peso magro. Seu aporte de gordura é praticamente nulo. Dosagem: nove comprimidos diários divididos em três doses; cada comprimido contém 2.000 mg de aminoácidos. Existem similares desse produto no mercado, em diferentes apresentações. � Suplementos vitamínicos e minerais: encontram-se vários nas casas comerciais. Aportam as necessida- des extras dos micronutrientes exigidos no esporte de alta competição para obter uma nutrição balan- ceada. Como sabemos, os micronutrientes intervêm em diferentes processos endócrino-metabólicos, in- cluindo a obtenção de energia. Também possuem ações antioxidantes e imunomoduladoras. Depen- dendo da apresentação, deve-se tomar 1 ou 2 compri- midos ao dia, em diferentes etapas, durante a tem- porada. � Bebidas isotônicas: aportam hidratação e minerais. São uma pequena fonte energética necessária para responder às necessidades hidrominerais durante treinamentos ou competições, devendo-se repor lí- quidos entre 150 e 200 mL a cada 15 a 20 minutos. Existem diferentes marcas, como Gatorade, Isostar, Flectomin, etc. Observamos na Tabela 15.8 algumas características de diferentes bebidas isotônicas. NUTRIÇÃO. SUPLEMENTOS NUTRICIONAIS E ESPORTE DE COMPETIÇÃO DE ALTO NÍVEL438 Tabela 15.8 Características de algumas bebidas comerciais utilizadas no esporte Bebida Osmolaridade Conteúdo g/L HC Na+ (mEq/L) K+ (mEq/L) Cl- (mEq/L) Isostar 296 73 24 4 12 Gatorade 349 62 23 3 14 Lucozado Sport 280 69 23 4 1 Prips Energy 260 75 13 2 7 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES RELACIONADAS AOS SUPLEMENTOS NUTRICIONAIS � Devemos levar em conta em sua dosagem: a super- fície corporal do atleta, seu peso atual e o peso dese- jado, com um adequado desenvolvimento muscular, estado de saúde, objetivos a desenvolver nos micro- ciclos, capacidades funcionais motoras da modalida- de esportiva, características individuais do atleta, etapa do treinamento e sistema competitivo. � A ajuda ergogênica em nenhum momento substitui uma nutrição balanceada. Antes da ajuda ergogêni- ca, devemos promover bons hábitos de alimentação e hidratação dos esportistas, assim como uma ade- quada carga de treinamento e recuperação. � É muito importante selecionar adequadamente o produto e a etapa em que será administrado, cor- respondendo sempre a um objetivo bem-definido. Produtos indevidamente utilizados podem entorpe- cer as capacidades morfofuncionais a desenvolver. � O êxito não reside na ajuda ergogênica, uma vez que ela é parte da estratégia de recuperação biológica do atleta. � É obrigação do médico e do treinador zelar pelo uso correto dos suplementos nutricionais, evitando a au- tomedicação e os efeitos prejudiciais que pode oca- sionar. O trabalho educativo é especialmente impor- tante. � Existem produtos naturais, como o mel, a espirulina, entre outros, que são utilizados como suplementos nutricionais. O mel no aporte de carboidratos de qua- lidade, com a finalidade de poupar glicogênio, e no aporte de aminoácidos, vitaminas e sais minerais; a espirulina, no aporte de minerais e de aminoácidos. � Pesquisas recentes de diferentes suplementos nu- tricionais em laboratórios de doping credenciados de- monstraram: – Alguns suplementos declaram possuir certos componentes que não possuem, ou que possu- em em quantidades diferentes das mencionadas, ou, ainda, não mencionam em seus rótulos com- ponentes que foram detectados. – Cientificamente se comprovou que muitos bene- fícios anunciados na maioria dos suplementos nutricionais são falsos. – A demonstração mais perigosa desses estudos é a de entre os componentes substâncias que são detectadas e que de forma direta ou indireta são substâncias proibidas. As que se encontram com maior freqüência são os agentes anabolizantes, hormôniosou pró-hormônios que produzem efei- tos anabolizantes, entre outras. Com relação a isso, a Comissão Médica do COI indi- cou ao Instituto Antidoping de Colônia, Alemanha, a realização um amplo estudo, que se realizou de outu- bro de 2000 a novembro de 2001, em que se demons- trou a falta de seriedade de algumas empresas de suplementos nutricionais, as quais atentavam contra a saúde de seus clientes e a ética esportiva e médica. O estudo realizou-se com empresas de 13 países de- senvolvidos, 12 da Europa e os Estados Unidos, sen- do analisados 634 diferentes suplementos nutricio- nais, todos declarados livres de agentes anabolizan- tes e de pró-hormônios que pudessem possuir efeitos anabolizantes. O estudo demonstrou que 94 suple- mentos nutricionais foram positivos por conter hor- mônios não-listados. Nesses casos, esses suplemen- tos foram positivos no controle de doping por pos- suirem agentes anabolizantes. Desse estudo, 14,8% foram positivos o que deve servir de alerta, confir- mando a grave situação que permeia suplementos nutricionais. O trabalho realizado pelo Instituto de Colônia tem o título: “Analysis of Non-Hormonal Nutritional Su- plements for Anabolic-Androgenic Steroides. An In- ternational Study”. Pode ser encontrado no site do Comitê Olímpico Internacional: www.olympics.org, em que se deve buscar a Comissão Médica do COI. A falta de informação em relação aos suplementos nutricionais pode afetar outras substâncias ou méto- http://www.olympics.org/ 439MEDICINA DO ESPORTE dos proibidos, como estimulantes e diuréticos, muito utilizados para diminuir o peso corporal. Se este foi o resultado encontrado ao avaliar-se em- presas de países desenvolvidos, é muito provável que a situação de países menos desenvolvidos seja mais grave. � A Agência Mundial Antidoping, WADA, informa ao Movimento Desportivo Olímpico e a todos os prati- cantes de exercícios físicos que o uso de suplemen- tos nutricionais não é necessário para a performance e recuperação do atleta, ressaltando que o verdadeiro êxito do rendimento esportivo e da longevidade do atleta encontra-se no sucesso de um planejamento e controle do treinamento cientificamente funda- mentados e personalizados, necessitando-se de uma ótima relação entre as cargas de treinamento e com- petições aplicadas, uma boa recuperação e ótima nu- trição. DOPING E ESPORTE Com o objetivo de melhorar o rendimento esportivo, alguns treinadores, atletas e, lamentavelmente, certos médicos e investigadores do esporte recorrem a fármacos e/ou méto- dos para conseguir tal objetivo, tentando justificar que o preço não é demasiado elevado para atingir o objetivo de vencer. Além dos problemas éticos, por tentar obter uma vantagem adicional sobre seus adversários, tal prática põe a saúde do atleta em risco. O doping não é novo, embora nos últimos tempos a pro- fissionalização e a comercialização excessivas do esporte, repleto de competições de alto nível e poucas possibilidades de recuperação, associadas ao aparecimento de fármacos novos (alguns deles obtidos por técnicas recombinantes, que dificultam ou impossibilitam sua detecção na análise da urina), possam sugerir que tais meios têm sofrido um considerável aumento. No entanto, deve-se levar em con- ta que a detecção de um maior número de positivos tem exercido um papel importante no controle e na regulamen- tação mais rigorosa a que em épocas anteriores. A Agência Mundial Antidoping com a elaboração de seu código ético, em união ao Comitê Olímpico Internacional, da mesma forma que as diferentes federações esportivas internacionais, exerce um papel importante na atualização das substâncias e dos métodos considerados doping, tentando, com isso, assegurar o jogo limpo e a segurança dos esportistas. Os fármacos proibidos são um arsenal terapêutico reduzido. Portanto, o atleta que, por motivos clínicos, necessite de um tratamento, dispõe de alternativas válidas que garantem seu direito a um tratamento apro- priado. De forma breve, apresentaremos a classificação atual da Agência Mundial Antidoping (WADA - AMA) e do Comitê Olímpico Internacional para 2004, relacionada às substân- cias e aos métodos proibidos. Substâncias proibidas S1. Estimulantes S2. Narcóticos S3. Canabinóides S4. Agentes anabolizantes S5. Hormônios peptídicos S6. Beta-2-agonistas S7. Agentes com atividades antiestrogênica S8. Agentes mascarantes S9. Glicorticosteróides Métodos proibidos M1. Aumento do transporte do oxigênio M2. Manipulação farmacológica, química e física M3. Dopagem genética Substâncias proibidas para determinada disciplina esportiva Sustâncias como álcool, diuréticos e beta-bloqueadores encontram-se registradas como substâncias proibidas para determinadas disciplinas esportivas. A nova classificação de dopagem é discutida no Capítulo 22. Cada vez mais as federações esportivas internacionais exigem o cumprimento do regulamento oficial do COI – WADA que relaciona a lista das substâncias proibidas (doping). A recente criação da Agência Internacional Antidoping fortaleceu essa posição em nível mundial. Os controles sangüíneos incorporados contribuirão de forma definitiva para a detecção de substâncias não-detec- tadas na urina. ESPORTE DE ALTO RISCO E NUTRIÇÃO MARGINAL: EFEITOS FISIOPATOLÓGICOS DA RESTRIÇÃO CALÓRICA E DIMINUIÇÃO DE PESO E DO PERCENTUAL DE GORDURA CORPORAL A perda da gordura corporal abaixo dos valores normais mínimos do percentual de gordura corporal (5% nos ho- mens e 10 a 12% nas mulheres), a longo prazo, não melhora o rendimento esportivo. Ocorre primeiro um estancamen- to nos resultados e, posteriormente, uma redução, o que NUTRIÇÃO. SUPLEMENTOS NUTRICIONAIS E ESPORTE DE COMPETIÇÃO DE ALTO NÍVEL440 se acentua quando a situação ocorre por meses ou tempo- radas, ainda que seja de forma flutuante (ver Capítulo 13). A Tabela 15.9 mostra um grupo de modalidades esporti- vas nas quais isso pode ocorrer se os atletas possuírem di- ficuldades com sua composição corporal. Observamos dois grupos com diferentes características metodológicas com- petitivas, ambos com um possível problema de peso. Mecanismos desencadeantes de fadiga por deficiência de reserva energética Ao diminuir a reserva de gordura corporal do organismo esgotam-se também as reservas do glicogênio e, assim, ini- ciam-se mecanismos catabólicos no organismo do atleta, que se caracterizam por: � Depleção de substratos (triglicerídeos e glicogênio), acúmulo de metabólitos, alterações hidreletrolíticas, alteração na captação de aminoácidos ramificados e alteração de enzimas cinases. � A depleção do glicogênio e dos triglicerídeos armaze- nados exerce um papel muito importante nas altera- ções endócrino-metabólicas. Depleção de carboidratos endógenos: efeitos Alteração na função dos aminoácidos, importante mudança na relação aminoácidos intramusculares e plasmáticos, uti- lização dos aminoácidos ramificados e aumento rápido dos produtos finais protéicos. Tudo isso leva à limitação do ren- dimento esportivo. A ação crônica desse quadro produz desequilíbrio hor- monal, favorecendo dos processos catabólicos. Nos Capítulos 17 e 20 trataremos de diferentes estados fisiopatológicos que ocorrem no esporte de alto rendimento, como a tríade da atleta, problemas de depressão imuno- lógica e fadiga crônica, em que a perda exagerada de peso e uma diminuição excessiva do percentual da gordura cor- poral, com nutrição deficiente e maus mecanismos de re- cuperação biológica, incluindo má relação carga de treina- mento e/ou competição com recuperação insuficiente, são causas multifatoriais desses quadros negativos para a per- formance esportiva e o futuro dos atletas. Tudo isso está relacionado à depleção de carboidratos endógena. CUIDADOS NOS PROGRAMAS DE PERDA OU AUMENTO DE PESO Na hora de definir os programas de perda ou aumento de peso dos atletas, deve-se levar em consideração importantes aspectos que caracterizam a qualidade desse programa: � Conhecer o estado de saúde do atleta, já que a causa do problema de baixo peso ou sobrepeso geralmenteestá associada a hábitos de alimentação incorretos. Devem ser descartadas alterações endócrino-meta- bólicas, parasitismo, entre outras. � Caracterizar o esportista do ponto de vista morfo- funcional. Conhecer a superfície corporal, o gasto energético da modalidade, tanto nas sessões de trei- namento como na competição e no resto de sua ati- vidade diária. � Começar o programa desde o início da etapa prepara- tória e, inclusive, se for necessário, iniciá-lo entre 4 e 8 semanas antes que seus demais companheiros de modalidade para poder criar uma base ideal, do ponto de vista morfofuncional, combinando a nu- trição e o treinamento necessário. � Conhecer o gasto energético diário do atleta, incluin- do o do treinamento. � As modificações que forem necessárias na ingestão calórica e no treinamento não podem afetar a saúde do atleta. � A combinação do programa de nutrição (incluída a ajuda ergogênica) com o treinamento não deve produzir aumento ou perda de peso maior de 1 kg por semana. � Obter o peso corporal e a distribuição de sua com- posição corporal ideal pelo menos uma semana an- tes da competição. � Estabilizar o peso corporal do atleta de maneira que responda à estratégia competitiva, sem afetar o esta- do de saúde, o rendimento e a longevidade atlética. � Para competir ou treinar com menos de 5% de gordu- ra corporal nos homens e de 12% nas mulheres, de- vemos ter permissão do médico especialista. Procu- rar evitar essa situação para qualquer modalidade, idade e sexo. � Os atletas que estão acima de seu peso ideal devem reduzi-lo gradualmente, na razão de não mais que 1 kg/semana, para preservar seu peso magro (massa livre de gordura). Isso deve ser alcançado mediante Tabela 15.9 Esportes de alto risco em nutrição marginal Critérios Modalidades esportivas Peso baixo Ginástica esportiva e artística, < % Gordura patinação artística, balé, aeróbica, nado Aparência corporal sincronizado, salto de trampolim, salto de esqui, hípica (jóquei) Competição vs Judô, boxe, luta, taekwondo, remo categoria de peso (categorias leves), halterofilismo, fisiculturismo 47MEDICINA DO ESPORTE Tais modificações estão relacionadas aos seguintes prin- cípios: � Individualidade (incluindo herança genética) � Especificidade do treinamento (com predomínio aeróbio, anaeróbio ou misto) � Relação entre volume e intensidade � Progressão da carga � Manutenção (a perda é reversível) AJUSTES CARDIOVASCULARES AO ESFORÇO A realização de qualquer exercício físico pressupõe o estabe- lecimento de uma situação de sobrecarga para o sistema cardiovascular. A atividade física traduz-se na existência de um aumento de substâncias nutritivas e no aumento do aporte de oxigênio necessário para os músculos ativos. Secundariamente, aumentam também os níveis de anidri- do carbônico e de metabólitos, os quais precisam ser eli- minados. Para responder a isso, é necessária uma série de ajustes no sistema cardiovascular e em sua inter-relação com os diferentes órgãos e sistemas do corpo. Freqüência cardíaca O controle da freqüência cardíaca (FC) durante o repouso e o exercício é um bom indicador do nível de intensidade em que o coração está trabalhando e é uma informação importante do estado de saúde de uma pessoa. O músculo cardíaco responderá diretamente à necessidade de oxigênio e de fluxo sangüíneo do organismo em diferentes momen- tos da vida, tanto para realizar um exercício de determinado nível de intensidade como durante períodos de doença ou de necessidade externa, em que o organismo responde en- viando fluxo sangüíneo aos músculos e/ou órgãos que ne- cessitem do aporte de sangue e de O2. A freqüência cardíaca é parte importante de diferentes variáveis fisiológicas. Por exemplo, junto ao volume sistólico forma o débito cardíaco. A freqüência cardíaca é também parte do duplo produto. Existe uma correlação linear entre o aumento do consumo máximo de O2 (VO2máx) durante o exercício e o aumento da freqüência cardíaca. Nesse caso, com respeito ao per- centual da FC máxima. A seguir, abordaremos a importân- cia do controle da freqüência cardíaca. Freqüência cardíaca de repouso Considerações importantes: � A freqüência cardíaca de repouso (FCR) é de 60 a 80 batimentos por minuto (bpm) em média. Em in- divíduos sedentários e de meia-idade, ela pode supe- rar 100 bpm. Esportistas em forma e de modalidades de resistência podem apresentar entre 28 e 40 bpm, pelo aumento do volume sistólico, a partir de uma hipertrofia ventricular esquerda de caráter fisiológico. � A FC normalmente diminui com a idade, tanto em repouso como durante exercícios submáximos e má- ximos (principalmente neste último, em conseqüên- cia do processo biológico do envelhecimento). � Fatores como aumento de temperatura e altitude aumentam a FC de repouso. � Antes do exercício, a FC costuma aumentar acima dos valores normais, o que se denomina resposta antecipatória. Devido a isso, as verificações de FC de repouso prévias ao exercício devem ser desconsi- deradas. A verdadeira FC de repouso deve ser verifi- cada nas primeiras horas da manhã, quando a pessoa levanta. � Se quando estivermos deitados nossa FC de repou- so for de 50 bpm, quando estivermos sentados au- mentará para 55 bpm e, quando estivermos de pé, para 60 bpm. A FC de repouso aumenta porque, quando nosso corpo passa de uma posição, deitado, para outra, de pé, o volume sistólico cai imediata- mente. Isso se deve sobretudo ao efeito da gravidade, que faz com que o sangue se acumule nas pernas, reduzindo o volume de sangue que retorna para o coração. Isso, ao mesmo tempo, produz um aumento da FC de repouso, para manter o débito cardíaco de repouso. � Por fim, determinadas doenças e medicamentos po- dem aumentar ou diminuir a FC de repouso. Freqüência cardíaca durante o exercício Algumas considerações que devemos lembrar: � Quando se inicia um exercício, a FC aumenta propor- cionalmente à sua intensidade (de acordo com a ca- pacidade física atual). � Existe uma correlação direta entre a intensidade da FCmáx e o VO2máx durante o exercício, embora pró- ximo do VO2máx se perca a linearidade. � A freqüência cardíaca máxima é muito importante para o planejamento do treinamento e seu controle, assim como para determinados testes de laboratório e de campo, tanto para esportistas como para a po- pulação em geral. � Segundo a fórmula da OMS-Karvonen, a FCmáx é 220 – idade (fórmula aplicada pela Organização Mundial de Saúde [OMS]). No entanto, isso é uma estimativa, e os valores individuais variam conside- ravelmente em relação a esses valores médios. Por exemplo, em uma pessoa com 40 anos de idade, a FCmáx seria estimada em 180 bpm. No entanto, se- INTRODUÇÃO À FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO48 gundo estudos realizados, dentre pessoas de 40 anos, 68% apresentam uma FCmáx entre 168 e 192 bpm e 95% entre 156 e 204 bpm. O próprio Karvonen possui outra fórmula para avaliar o VO2máx ou a FC de reserva: FCmáx – FCR. Ambas as fórmulas são importantes para conhecer o potencial cardiovascular, mas as duas possuem margem de erro. A partir des- ses resultados planeja-se o pulso de treinamento. � A fórmula da OMS é a mais utilizada na população (FCmáx = 220 – idade). � Perde-se 1 bpm por ano de vida. � Quando o ritmo de esforço se mantém constante, em níveis submáximos de exercício, a FC aumenta muito rapidamente, até estabilizar-se. O ponto de estabilização é conhecido como estável da FC e é o ritmo ideal do coração para satisfazer as exigências circulatórias a esse ritmo específico de esforço. Para cada incremento posterior de intensidade, a FC al- cançará um novo valor dentro de um ou dois minu- tos. Apesar disso, quanto mais intenso é o exercício, mais se demora para alcançar o estado estável. � Nesse princípio de cargas crescentes, utiliza-se um teste de laboratório para o diagnóstico da capacidade funcional. � Após seis meses de treinamento moderado a mode- rado-intenso, a FC durante o exercício submáximo costuma diminuir cerca de 20 a 40 bpm. A FC sub- máxima de uma pessoa reduz-se proporcionalmenteà quantidade de treinamento realizado. � O período de recuperação da FC diminui aumentan- do-se o treinamento de resistência; é uma variável considerada para avaliar o progresso do treinamento. � Wilmore e Costill (2000) referem que quando se pas- sa da posição de pé, em relativo repouso, a caminhar, a FC pode aumentar de 60 para 90 bpm aproximada- mente. Fazendo jogging (trote) a um ritmo modera- do de 140 bpm, pode-se chegar a 180 bpm ou mais se passamos a correr a uma grande velocidade. O débito cardíaco (DC) aumentará por duas causas: maior volume sistólico e maior FC durante o exercí- cio, em virtude da demanda de fluxo sangüíneo e O2 dos músculos que estão trabalhando. � Vários fatores afetam a FC durante o repouso e du- rante o exercício, como temperatura, umidade, horá- rio do exercício, modificação de posição, ingestão de alimentos, etc. O uso de determinados medica- mentos pode alterar a FC durante a prática de exercí- cios; por exemplo, os beta-bloqueadores diminuem a FC. Situações parecidas também ocorrem durante o repouso (ver Tabelas 2.2 e 2.3). � Fatores como as modificações de posição durante o exercício (posição ortostática – como ocorre durante Tabela 2.2 Variações na resposta da FC a uma velocidade de 14 km/h na esteira ergométrica com alterações ambientais Freqüência cardíaca Fatores ambientais Repouso Exercício Temperatura com 50% de umidade 21oC 60 165 35oC 70 170 Umidade com 21oC 50% umidade 60 165 90% umidade 65 175 Nível de ruído (21oC e 0% de umidade) Baixo 60 165 Alto 70 165 Ingestão de comida (21oC e 50% de umidade) Uma pequena refeição 3 horas antes do exercício 60 165 Uma grande refeição 3 horas antes do exercício 70 175 Fonte: Wilmore e Costill, 2000. a corrida –, ou sentado – como ocorre no ciclismo e durante a natação) afetam a freqüência cardíaca em uma intensidade similar de trabalho (ver Tabela 2.7). Como podemos determinar a freqüência cardíaca máxima prevista de uma pessoa e o pulso de treinamento? Tanto no esporte de rendimento como nos programas de saúde direcionados à população utilizamos diferentes fór- mulas, como as seguintes: � FCmáx = 220 – idade (OMS-Karvonen) � FCmáx de reserva ou VO2máx = FCmáx – FC de repouso (Karvonen) � FCmáx = 208 – (0,7 × idade) (fórmula da Universi- dade do Colorado, EUA) A aplicação dessas fórmulas é abordada em outros ca- pítulos, principalmente nos Capítulos 4 e 13. De posse dessa informação, o médico com conhecimen- tos de fisiologia do exercício, o professor de educação física ou o técnico do esporte, entre outros profissionais da área, podem planejar de forma simples em que faixa do percen- tual de intensidade da FCmáx devem treinar seu atleta, cliente ou paciente para obter os resultados esperados, criando um nível inferior e outro superior de intensidade, controlado, nesse caso, pelos bpm, o que constitui, então, a banda ou faixa de pulso de treinamento. 49MEDICINA DO ESPORTE Em casos de doença, trabalha-se a partir da freqüência de trabalho submáximo, e a fórmula que se utiliza para obtê-la é: FC submáxima= FC máxima × 0,85 Em cardiologia e em medicina do esporte, utilizam-se as fórmulas de Vivacqua e Spagna para a reserva cronotró- pica (RC) e o déficit cronotrópico (DF). RC = FCmáx – FC de repouso (também conhecida como FCmáx de reserva ou percentual de VO2máx, utilizado por Karnoven) FCmáx prevista – FCmáx alcançada DC = ________________________________ FCmáx prevista Débito cardíaco: a capacidade funcional do sistema cardiovascular O débito cardíaco é o primeiro indicador da capacidade fun- cional da circulação para satisfazer as demandas da ativi- dade física. Os dois fatores que determinam a capacidade do débito cardíaco são a freqüência cardíaca e o volume sistólico (VS). A relação é: DC = FC × VS Dispõe-se de vários métodos, invasivos (como o método de Fick) e não-invasivos (como o método de reinalação), para medir o débito cardíaco. Cada um tem suas vantagens e desvantagens, sobretudo quando utilizados durante a prá- tica de exercícios. A fórmula do método de Fick é esta: VO2máx × 100 = mL/minDC = __________________________ Diferença a-vO2 Em condições de repouso, o organismo dispõe de aproxi- madamente 250 mL de VO2máx, os quais são utilizados durante um minuto em repouso para responder ao gasto energético, e a diferença arteriovenosa durante esse tem- po é de 5 mL de O2 por 100 mL de sangue. Assim, confor- me a fórmula de Fick, teríamos um DC de 5.000 mL/min de sangue, ou seja, de 5 L/min. Débito cardíaco em condições de repouso e durante o exercício O DC aumenta proporcionalmente à intensidade do exer- cício, desde 5 L em condições de repouso a um máximo de 20 a 25 L/min em homens jovens e que realizam atividade física; em esportistas de elite o DC é maior, sendo mais evidente nos esportistas de resistência, que podem ter entre 35 e 40 L/min de sangue de DC. Essas diferenças devem-se inteiramente ao grande volume sistólico de indivíduos trei- nados, já que o exercício físico contínuo de características aeróbias produz hipertrofia fisiológica do ventrículo esquer- do, com aumento do volume sistólico, gerando um bati- mento mais forte. Em conseqüência disso, aqueles que realizam exercícios aeróbios possuem um DC de repouso mais econômico, com menor FC do que pessoas sedentárias, uma vez que seu VS é maior (de 70 a 71 mL em indivíduos sedentários e de aproximadamente 100 mL em indivíduos treinados). Os valores médios do DC em condições de repouso são resumi- dos a seguir: � Repouso – Débito cardíaco = freqüência cardíaca × volume sistólico – Indivíduos sedentários: 4.970 mL/min = 70 bpm × 71 mL/batimento – Indivíduos treinados: 5.000 mL/min = 50 bpm × 100 mL/batimento Durante o exercício máximo, a diferença não é só de economia, mas também de quantidade e qualidade do DC. Ao possuir um VS maior, a pessoa treinada tem um DC maior diante de um esforço máximo. Em homens sedentá- Tabela 2.3 Variações, durante o dia, da FC de um mesmo indivíduo em repouso e durante o exercício Horas do dia. Freqüência cardíaca (bpm) Condição 2 h 6 h 10 h 14 h 18 h 22 h Repouso 65 69 73 74 72 69 Exercício leve 100 103 109 109 105 104 Exercício moderado 130 131 138 139 135 134 Exercício intenso 179 179 183 184 181 181 Recuperação, 3 min 118 122 129 128 128 125 Fonte: Reilly e Brooks, in Wilmore e Costill, 2000. INTRODUÇÃO À FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO50 rios, o VS médio fica entre 103 e 113 mL de sangue por batimento, enquanto em pessoas treinadas pode ser entre 150 e 210 mL/batimento. Como exemplo, consideremos duas pessoas que realizam um esforço máximo de 195 bpm: � Esforço máximo – Débito cardíaco = freqüência cardíaca × volume sistólico – Indivíduos sedentários: 21.450 mL/min = 195 bpm × 110 mL/batimento – Indivíduos treinados: 34.950 mL/min = 195 bpm × 179 mL/batimento Devemos salientar que a eficiência do trabalho é muito diferente entre os exemplos que podemos apresentar, já que o que é um esforço máximo para um sedentário (por exemplo, correr 2 km em 13 minutos e 30 segundos) pode ser um esforço submáximo ou moderado (correr esses 2 km em 12 minutos e 45 segundos) para uma pessoa que realiza atividade física aeróbia de forma sistemática e pode ser um esforço leve para um esportista de alto rendimento (que percorra 2 km em 11 minutos e 20 segundos). Os mecanismos de recuperação da FC, do VS e, por conseguin- te, do DC são mais rápidos em indivíduos treinados. Durante exercícios realizados em pé, o volume sistólico aumenta durante a transição do repouso ao exercício leve, com valores máximos que chegam a 45% do VO2máx. De- pois desse ponto, o débito cardíaco intensifica-se conforme aumenta a freqüência cardíaca. Os aumentos no volume sistólico em exercícios realizados em pé devem-se geral- mente a um esvaziamento sistólico mais completo, em lu- gar de um maior enchimento dos ventrículos durante a diástole. A ejeção sistólica aumenta por meio dos hormô- nios simpáticos. O treinamento de fundo melhora a força miocárdica, que também contribui consideravelmentepara a potência do batimento durante a sístole. A freqüência cardíaca e o consumo de O2 estão relacio- nados de maneira linear, tanto em indivíduos treinados como em não-treinados, durante a maior parte do exercício. Com o treinamento de resistência, essa relação desloca-se significativamente para a direita, devido à melhora no vo- lume sistólico cardíaco. Por conseguinte, a freqüência car- díaca reduz-se consideravelmente, em nível de trabalho submáximo, nos indivíduos treinados em exercícios de re- sistência aeróbia. Na Tabela 2.4, observa-se o comportamento do volume sistólico em condições de repouso e durante o exercício em pessoas sedentárias, em pessoas ativas que treinam para melhorar o condicionamento cardiorrespiratório e em es- portistas de alto rendimento de modalidades de resistência. Vê-se que o volume sistólico de repouso das pessoas ativas que treinam o condicionamento aeróbio ou cardiorrespi- ratório e o dos esportistas de resistência é praticamente igual ou superior ao volume sistólico dos sedentários du- rante o exercício. Se a pessoa tiver uma maior atividade de resistência aeróbia, terá um maior volume sistólico de re- pouso e durante o exercício. Após um treinamento de resistência cardiorrespiratória, o volume sistólico aumenta em repouso, assim como ao realizar exercícios de nível submáximo ou máximo de in- tensidade. Durante o treinamento aeróbio, ocorre um au- mento do volume diastólico final, causado principalmente pelo aumento do volume plasmático. O ventrículo esquerdo é a câmara do coração mais modi- ficada em resposta ao treinamento de resistência. As di- mensões internas do ventrículo esquerdo aumentam sobre- tudo como resposta a um aumento no enchimento ventri- cular. Durante o treinamento de resistência cardiorrespi- ratória, a espessura da parede ventricular esquerda também aumenta, intensificando o potencial de força das contrações do ventrículo esquerdo. A lei de Frank Starling descreve que o fator principal no controle e no desenvolvimento do volume sistólico é o grau de estiramento dos ventrículos. Quando os ventrículos se estiram mais, eles se contraem com mais força. Por exem- plo, se um grande volume de sangue entra na câmara quan- do os ventrículos se enchem durante a diástole, as paredes dos ventrículos se distenderão mais do que quando entra um volume menor de sangue. Com o objetivo de expulsar essa quantidade maior de sangue, os ventrículos devem reagir ao estiramento, contraindo-se com mais força. O trabalho sistemático de treinamento de resistência aeróbia ou de condicionamento cardiorrespiratório produz uma hipertrofia cardíaca esquerda com predomínio do ven- trículo esquerdo, o que garante um coração mais forte e eficiente em condições de repouso e durante o exercício submáximo e máximo. O volume ou débito sistólico previsto pode ser calculado (Ellestad) por meio da seguinte fórmula indireta: � Volume sistólico previsto em homens: VSp = 112 – (0,363 × idade) mL/min � Volume sistólico previsto em mulheres: VSp = 74 – (0,172 × idade) mL/min Tabela 2.4 Volumes sistólicos típicos para diferentes esta- dos de treinamento VS em VS Indivíduos repouso (mL) máximo (mL) Sedentários 55-75 80-110 Ativos 80-90 130-150 Esportistas de resistência 100-120 160-220 ou >220 51MEDICINA DO ESPORTE O volume sistólico avaliado durante um teste de esforço é obtido, para ambos os sexos: 1.000 × DC VS = _________ = mL/bpm FCmáx Distribuição do débito cardíaco O sangue que flui para os diferentes tecidos do organismo é geralmente proporcional à atividade metabólica realizada em estado de repouso ou em atividade física. Problemas de saúde podem alterar o fluxo sangüíneo, em condições de repouso, para diferentes órgãos. O exercício físico mo- difica o volume de fluxo sangüíneo no organismo, deslo- cando uma quantidade significativa de sangue para os mús- culos que trabalham. O fluxo sangüíneo de 5 L, em condições de repouso, distri- bui-se em proporções aproximadas às ilustradas na Tabela 2.5. Cerca de um quinto do débito cardíaco dirige-se ao tecido muscular, ao passo que a maior parte do sangue irriga o baço, o fígado, o intestino, o trato gastrintestinal e o cérebro. O fluxo sangüíneo durante o exercício possui uma distri- buição diferente, dependendo de o exercício ser leve, mo- derado, intenso ou máximo (Tabela 2.6). Embora a irrigação sangüínea durante a atividade física varie consideravel- mente segundo o tipo de exercício, sua intensidade e du- ração, o nível de condicionamento físico, o estado de saúde e a idade do indivíduo e as condições ambientais, a maior parte do débito cardíaco desvia-se para os músculos ativos. Em repouso, em torno de 4 a 7 mL de sangue são fornecidos a cada minuto para cada 100 g de músculo. Esse débito aumenta constantemente; com esforço máximo, o fluxo sangüíneo muscular pode ser tão alto quanto 50 a 75 mL por 100 g de tecido. Isso representa em torno de 85% do débito cardíaco total. Na Tabela 2.6, observamos as diferen- ças marcadas no fornecimento de sangue aos vários órgãos e o percentual que representam do débito cardíaco total nos diversos níveis de intensidade do exercício. Observamos como órgãos importantes, como o coração, aumentam gradualmente a quantidade de fluxo sangüíneo que necessitam e, ao mesmo tempo, mantêm constante o percentual (4%) durante os diferentes níveis de intensida- de de exercício. Mesmo durante o repouso, podem aumen- tar de 4 a 5 vezes de condições de repouso ao exercício vigoroso. Já o cérebro aumenta apenas 50 mL de condições de repouso ao exercício leve, mantendo-se constante nos exercícios moderados e máximos. O débito cardíaco, ou volume cardíaco por minuto, pode ser previsto pelas seguintes fórmulas indiretas de Hossack: � DC previsto (homens) = 26,5 – (0,17 × idade) L/min � DC previsto (mulheres) = 15 – (0,071 × idade) L/min O débito cardíaco durante um teste de esforço cardior- respiratório é avaliado de forma indireta por meio da se- guinte fórmula de Hossack e colaboradores: � DC previsto (homens) = (VO2máx/kg × peso kg × 0,0046) + 5,31 = L/min � DC previsto (mulheres) = (VO2máx/kg × peso kg × 0,00407) + 4,72 = L/min � DC cardiopatas = (VO2máx/kg × peso kg × 0,0046) + 3,10 = L/min O débito cardíaco informa quanto sangue abandona o coração a cada minuto, enquanto a diferença arteriovenosa de oxigênio (dif a-vO2) indica quanto oxigênio é extraído do sangue pelos tecidos. O produto desses dois fatores indi- ca o ritmo de consumo de oxigênio (VO2), expresso na se- guinte fórmula: VO2 = VS × FC × dif a-vO2 Tabela 2.5 Distribuição relativa do débito cardíaco em condições de repouso Órgão Porcentagem Volume por minuto (mL) Hepático-esplênico 27 1.350 Rins 22 1.100 Músculos 20 1.000 Cérebro 14 700 Pele 6 300 Coração 4 200 Outros 7 350 Total 100 5.000 Tabela 2.6 Distribuição do débito cardíaco durante exercícios leves, moderados e vigorosos Fluxo sangüíneo do exercício (mL/min e porcentagem) Órgão-tecido Leve Moderado Intenso Esplâncnico 1.100 (12%) 600 (3%) 300 (1%) Renal 900 (10%) 600 (3%) 250 (1%) Cerebral 750 (8%) 750 (4%) 750 (3%) Coronário 350 (4%) 750 (4%) 1.000 (4%) Muscular 4.500 (47%) 12.500 (71%) 22.000 (88%) Epitelial 1.500 (15%) 1.900 (12%) 600 (2%) Outros 400 (4%) 400 (3%) 100 (1%) Total 9.500 mL/min 17.500 mL/min 25.000 mL/min INTRODUÇÃO À FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO52 Existe uma relação direta entre o exercício e o aumento do DC, porque este assegura o aumento de O2 durante o exercício. Na Tabela 2.7, observam-se, durante a prática de exercí- cios intensos, as alterações na FC, no VS e no DC de uma pessoa ativa, saudável e com bons indicadores de condicio- namento cardiorrespiratório (não-esportista de rendimen- to). Tais alterações dependem da posição anatômica e do percentual de músculos usados na corrida, no ciclismo e na natação. Fluxo sangüíneo e exercício O fluxo sangüíneo aumenta durante o esforço, principal- mente pelo exercício que desenvolve o condicionamento cardiorrespiratório, com um aumento do volume sistólico e do débitocardíaco. Esse aumento é devido a três fatores: � Maior capilarização � Maior abertura dos capilares existentes � Redistribuição mais efetiva do sangue Nas Tabelas 2.5 e 2.6, podem-se observar a distribuição e a redistribuição do fluxo sangüíneo durante repouso e durante exercícios de intensidades leve, moderada e intensa. Pressão arterial e exercício A pressão sistólica (PAS) aumenta em proporção ao consu- mo de O2, ao débito cardíaco e à progressão do exercício, enquanto a pressão diastólica (PAD) permanece relativa- mente igual ou aumenta apenas levemente. Com a mes- ma carga relativa de trabalho, as pressões sistólicas são maiores quando o trabalho se realiza mais com os braços do que com as pernas, devido à menor massa muscular e à menor vascularização que existe nos membros superiores. Em pacientes hipertensos ou com predisposição, o estí- mulo do exercício escalonado, com o objetivo de levar à freqüência cardíaca máxima durante um teste de esforço, pode produzir uma resposta hipertensiva tanto sistólica como diastólica, como ilustra a Tabela 2.8. Em pessoas treinadas em exercícios aeróbios com a fina- lidade de prevenir doenças ou recuperar a saúde, e sobretu- do em esportistas de competição, principalmente nas mo- dalidades de resistência, durante exercícios de grande in- tensidade, aumenta consideravelmente a pressão arterial diferencial, elevando a sistólica e diminuindo a diastólica e produzindo uma diminuição da resistência periférica geral com o propósito de levar um maior fluxo sangüíneo e de O2 aos tecidos que trabalham (em especial aos músculos) de uma forma econômica e efetiva. Durante o exercício isométrico (estático), com pesos e com máquinas hidráulicas, as pressões sistólica e diastólica aumentam o estado hipertensivo, o que constitui um risco para o indivíduo hipertenso ou com outra doença cardio- vascular. Como se sabe, a hipertensão arterial sistêmica (HAS) impõe uma carga crônica sobre a função cardíaca. O treina- mento aeróbio (caminhada, trote, natação, ciclismo, etc.) regular, de forma individualizada e conservadora para cada paciente, produz melhora da hipertensão arterial, tanto em condições de repouso como no exercício submáximo. De- vemos ser cuidadosos com os estágios graves e muito graves da HAS; apenas com acompanhamento médico a prática de exercícios físicos é indicada para esses indivíduos. Pacientes com hipertensão arterial leve podem realizar, sem exageros, exercícios de força, de caráter isotônico ou dinâmico (ver Capítulo 4), sempre sob prescrição médica e com pressão arterial normal. Devem-se observar as seguintes considerações: � Antes de mais nada, deve-se recordar que a pressão sistólica de repouso oscila entre 135 e 100 mmHg e que a diastólica ou mínima, entre 85 e 60 mmHg. Podem-se observar valores tensionais normais, prin- cipalmente no sexo feminino, entre 100 e 90 mmHg de sistólica e 60 mmHg de diastólica. Uma pressão normal típica é de 120/80 ou 110/70 mmHg, o que assegura uma pressão diferencial de 40 mmHg.Tabela 2.7 Modificações na FC, no VS e no DC Tipo de FC VS DC exercício Condição (bpm) (mL/bat) (L/min) Corrida Repouso 60 70 4,2 Exercício máximo 190 130 24,7 Ciclismo Repouso 60 70 4,2 Exercício máximo 185 120 22,2 Natação Repouso* 55 95 5,2 Exercício máximo 170 135 22,0 *Medição realizada em posição supina. Adaptada de Wilmore, 2000. Tabela 2.8 Resposta hipertensiva ao esforço durante o teste ergométrico funcional (Instituto de Cardiologia de Cuba) Resposta hipertensiva Sistólica Diastólica Leve 190-210 110-119 Moderada 220-249 120-129 Grave ≥ 250 ≥ 130 53MEDICINA DO ESPORTE � A pressão (ou tensão) arterial sistólica aumenta, du- rante o exercício, proporcionalmente ao consumo de O2 e ao débito cardíaco, que aumenta durante o exercício progressivo. A pressão diastólica permane- ce relativamente igual, aumenta levemente ou dimi- nui, dependendo do grau de atividade da pessoa, do estado de saúde e do tipo de exercício realizado. � Em esportistas submetidos a esforços máximos, po- de-se obter 200 a 250 mmHg de PAS. Relataram-se 240 a 250 mmHg em esportistas de alto nível e sau- dáveis. � A atividade física sistemática melhora a qualidade da resposta da PAS e da PAD durante o exercício, elevando a pressão arterial diferencial. � Durante um exercício máximo progressivo, podemos encontrar em esportistas, sobretudo de modalidades de resistência, valores de 250 mmHg na sistólica e de 30 ou menos na diastólica, garantindo uma pres- são arterial diferencial grande, para obter a eficiência do aumento do débito cardíaco com um maior fluxo de sangue e de oxigenação para os músculos. � Indivíduos sedentários e/ou com hipertensão arterial não respondem de forma fisiológica ao exercício ae- róbio, com dificuldades na pressão arterial diastólica, que geralmente aumenta, diminuindo a pressão arte- rial diferencial, que torna o trabalho menos econômico. � Na hipertensão arterial leve ou moderada, a ativi- dade física aeróbia sistemática diminui, em condi- ções de repouso, uma média de 11 mmHg da PAS e de 8 mm da PAD, reduzindo, assim, a pressão média (ver Capítulo 6). � Um aumento de 15 mm na pressão arterial diastólica durante o exercício é considerado uma resposta anor- mal ao exercício, sobretudo em pessoas “aparente- mente saudáveis”. � A resposta ao trabalho de halterofilismo de grande intensidade e volume pode chegar até o valor pato- lógico de PAS de 480 e de PAD 350 mm (480/350 mmHg), segundo refere Wilmore (2000), em pessoas hipertensas e que praticam halterofilismo ou fisicul- turismo de forma intensa e perigosa. � O treinamento de força isotônico bem-realizado não gera problemas de saúde em pessoas saudáveis. É um método importante de exercícios para melhorar de forma notável o condicionamento musculoesque- lético e também colabora com o condicionamento cardiorrespiratório (ver Capítulos 4 e 6). � Veja no Capítulo 6 a classificação da pressão arterial e da hipertensão arterial segundo a Organização Mundial de Saúde. � A pressão diferencial é obtida subtraindo-se a pres- são arterial diastólica da pressão arterial sistólica; por exemplo: se a PA de repouso for 120/80 mmHg, a pressão diferencial será 40; para uma PA de 220/30 durante o exercício de um atleta de esporte de resis- tência, em um teste de esforço máximo progressivo, a tensão ou pressão diferencial será de 190 mmHg. � A pressão ou tensão arterial média (PAM ou TAM; ver Capítulo 6) é obtida por meio da seguinte fórmula: PAS + (2 × PAD) PAM = _______________ 3 � Vivacqua e Spagna (Lamb, 1985) propuseram uma avaliação de parâmetros da pressão arterial com res- peito à pressão arterial durante repouso (basal) e esforço, relacionada aos equivalentes metabólicos de tarefa (METs) alcançados durante o esforço, que se expressam em mmHg/MET. Essa avaliação é usada principalmente em cardiologia, mas também em me- dicina do esporte. As fórmulas são as seguintes: – Variação da pressão arterial sistólica (VAR PAS): PAS máxima – PAS repouso VAR PAS = _________________________ METs – Variação da pressão arterial diastólica (VAR PAD): PAD máxima – PAD repouso VAR PAD = _________________________ METs Lembrar que 1 MET equivale ao consumo metabólico de uma pessoa sentada e em condições de repouso (1 MET= 3,5 mL O2/kg/min). Para garantir que uma pessoa possa caminhar a um passo normal, necessita-se de 5 METs (17,5 mL de O2/kg/min). Esse tema é abordado nos Capítulos 4 e 6. Duplo produto O consumo de O2 pelo miocárdio e o fluxo miocárdico de sangue são diretamente proporcionais ao produto da fre- qüência cardíaca e da pressão arterial sistólica, o que é defi- nido como duplo produto (DP). DP = FC × PAS O DP é uma estimativa do trabalho do miocárdio e do VO2máx. Em cardiologia, utiliza-se o duplo produto para avaliar o risco cardiovascular ao esforço físico, tanto por aumento da FC quanto da PAS. O DP é utilizado para análise comparativa em um mes- mo indivíduo, para avaliar a ação terapêutica de um medi- camento e sua utilização ou não e para a prescriçãode exer- cícios físicos e de procedimentos clínicos de cardiologia, como a evolução da revascularização miocárdica. INTRODUÇÃO À FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO54 Durante exercícios contínuos, a FC e a PAS aumentam paralelamente com a intensidade do esfoço, como ocorre nos testes máximos de ergonomia funcional. Nos esportistas, sobretudo das modalidades de resis- tência, e em pessoas ativas e saudáveis que realizam exercí- cio de forma sistemática para melhorar o condicionamento cardiorrespiratório, o duplo produto diminui em condições de repouso. O DP é utilizado pelos cardiologistas e pelos médicos do esporte. Segundo Ellestad, obtemos o duplo produto (mmHg/ bpm) por meio das seguintes fórmulas: DPmáx previsto = 360 – (0,54 × idade) × 100 DPmáx avaliado = PAS × FCmáx A partir da obtenção do DP, podemos saber de forma indireta o VO2máx do miocárdio (Hellesterns et al., in Lamb, 1985), que se expressa em unidade de mL × 100 g de ventrículo esquerdo, e o déficit funcional do ventrículo esquerdo (DFVE), que se expressa em porcentagem; ambos são muito utilizados em cardiologia, mediante as seguintes fórmulas: VO2máx do miocárdio = (DP × 0,0014) – 6,3 mL 100 × DPmáx previsto – DPmáx alcançado DFVE = _____________________________________ DPmáx previsto Utilização de oxigênio pelo miocárdio Em repouso, cerca de 80% do oxigênio que flui pelas artérias coronárias é extraído pelo miocárdio. Essa extração de alto nível significa que as demandas elevadas de O2 para o mio- cárdio, durante o exercício, só podem ser atendidas com um aumento proporcional da irrigação sangüínea corona- riana. Durante esforço intenso, a quantidade de fluxo san- güíneo coronariano aumenta cinco vezes para atender a demanda de O2 acima do nível de repouso. Como o miocárdio é um tecido essencialmente aeróbio, deve ter uma provisão contínua de O2. O impedimento do fluxo sangüíneo coronariano causa dor anginosa e pode provocar um dano irreversível ao músculo cardíaco, como no infarto do miocárdio. Os principais substratos que geram energia no miocár- dio são a glicose, os ácidos graxos e o ácido láctico. O per- centual de utilização desses substratos dependerá da inten- sidade e da duração do exercício. Algumas considerações sobre variações hematológicas no exercício Durante a atividade física, ocorrem alterações hematoló- gicas, dependendo do tipo de exercício, da duração, da in- tensidade, da temperatura ambiental, do grau de treina- mento, do nível de hidratação, da postura, etc. Tais altera- ções podem modificar esses parâmetros. O treinamento bem-planejado permite modificações ne- cessárias nas variações hematológicas, tanto com fins de alto rendimento como nos programas de saúde dirigidos à população. Essas modificações são menos bruscas pela adaptação ao exercício, como se verá a seguir. Hemoconcentração e hemodiluição A hemoconcentração refere-se ao aumento progressivo dos componentes intravasculares devido à perda contínua de líquido plasmático da corrente sangüínea. A hemodiluição é o contrário, o conteúdo vascular aumenta graças a um ganho resultante de líquido proveniente do espaço inters- ticial. Os elementos figurados e os solutos diluem-se. O trânsito de líquidos pelos tecidos depende do equilí- brio entre pressões hidrostáticas e coloidosmóticas capilares e teciduais. Assim, a tendência à hemodiluição ou à he- moconcentração depende de vários fatores específicos: � Quanto maior a temperatura ambiental maior será a tendência à hemoconcentração, devido, logica- mente, à eliminação de suor. � Gravidade e duração: a magnitude da hemoconcen- tração costuma ser propocional ao exercício intenso e prolongado. Durante trabalho intenso e curto, tam- bém a observamos. � A postura de execução pode condicionar a resposta. Um exercício em posição ortostática facilita a hemo- concentração, porque predomina a filtração no leito capilar da parte inferior do corpo. � O estado de hidratação pode influir qualitativa e quantitativamente nas respostas do volume intra- vascular ao exercício. Comprovou-se que reposições líquidas durante o esforço podem atenuar a hemo- concentração gerada no treinamento e na compe- tição. Capacidade de transporte de oxigênio pelo sangue É um fator determinante da capacidade física e tem como base a concentração de hemoglobinas (Hb), o número de hemácias circulantes e a eficácia de suas funções. O exer- cício físico gera aumentos na concentração de hemoglobi- na, no hematócrito e na contagem de eritrócitos no sangue periférico, por: � Desidratação. � Catecolaminas, que provocam contrações de reserva- tórios sangüíneos como o baço ou o fígado, capazes de liberar certa quantidade de eritrócitos para a cir- culação. Capa As reações do esportista ao calor: adaptação As reações do esportista ao frio: adaptação Influência das condições climáticas sobre o rendimento esportivo Influência das condições de poluição ambiental sobre o rendimento esportivo Asma e hiper-reatividade brônquica nos esportistas de rendimento Substâncias químicas tóxicas próprias do esporte Capa Ajuda ergogênica e esporte de alto nível Objetivos da ajuda ergogênica por meio de suplementos nutricionais Caracterização de alguns produtos ergogênicos Algumas considerações relacionadas aos suplementos nutricionais Doping e esporte Substâncias proibidas Métodos proibidos Substâncias proibidas para determinada disciplina esportiva Esporte de alto risco e nutrição marginal: efeitos fisiopatológicos da restrição calórica e diminuição de peso e do percentual de gordura corporal Capa Ajustes cardiovasculares ao esforço Frequência cardíaca Frequência cardíaca de repouso Frequência cardíaca durante o exercício Débito cardíaco: a capacidade funcional do sistema cardiovascular Débito cardíaco em condições de repouso e durante o exercício Distribuição do débito cardíaco Fluxo sanguíneo e exercício Pressão arterial e exercício Duplo produto Utilização de oxigênio pelo miocárdio