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CINESIOLOGIA E BIOMECÂNICA Larissa Barbosa de Paula E d u ca çã o C IN E S IO L O G IA E B IO M E C Â N IC A La ris sa B ar b os a d e P au la Curitiba 2020 Cinesiologia e Biomecânica Larissa Barbosa de Paula Ficha Catalográfica elaborada pela Editora Fael. P324c Paula, Larissa Barbosa de Cinesiologia e biomecânica / Larissa Barbosa de Paula. – Curitiba: Fael, 2020. 270 p. il. ISBN 978-65-86557-10-7 1. Cinesiologia 2. Mecânica humana I. Título CDD 612.76 Direitos desta edição reservados à Fael. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael. FAEL Direção Acadêmica Fabio Heinzen Fonseca Coordenação Editorial Angela Krainski Dallabona Revisão Editora Coletânea Projeto Gráfico Sandro Niemicz Imagem da Capa Shutterstock.com/kentoh Arte-Final Evelyn Caroline Betim Araujo Sumário Carta ao Aluno | 5 1. Planos e eixo | 7 2. Avaliação qualitativa do movimento humano | 27 3. Avaliação quantitativa do movimento humano | 45 4. Cinemática | 67 5. Cinética | 91 6. Aspectos biomecânicos do tecido ósseo e das articulações | 107 7. Aspectos biomecânicos dos segmentos corporais | 131 8. Cinesiologia e biomecânica aplicada aos esportes I | 167 9. Cinesiologia e biomecânica aplicada aos esportes II | 191 10. Cinesiologia e biomecânica aplicada aos esportes III | 231 Gabarito | 259 Referências | 269 Prezado(a) aluno(a), A partir de agora, você dará início ao estudo da cinesiolo- gia e da maneira como ela descreve os movimentos que reali- zamos em nossas atividades cotidianas e na prática de exercí- cios físicos. Você já reparou na força que voluntariamente temos que fazer para a execução desses movimentos e/ou nas forças externas que sofremos enquanto os realizamos? O entendimento da cinesiologia e da biomecânica permitirá que você responda a questões sobre quais os músculos e articulações envolvidos em cada movimento e aplique os conhecimentos adquiridos em vivências relacionadas a sua formação profissional, tais como o aprimoramento do desempenho e do rendimento em atividades desportivas e o aperfeiçoamento na forma como os movimentos são executados com o intuito de adequá-los a técnicas mais efi- cientes, além de prevenir e reabilitar lesões. Carta ao Aluno – 6 – Cinesiologia e Biomecânica Para que você assimile todo o conteúdo que será apresentado e adquira a competência de compreender os princípios fundamentais da mecânica do movimento humano e sua aplicação nos esportes, é necessário que você se dedique ao máximo lendo esse livro didático, acessando links de pesquisa sugeridos por seu professor e buscando aprender ainda mais por meio de outras fontes de conhecimento. No decorrer dos três primeiros capítulos, conheceremos os planos e eixos que delimitam o corpo humano e que definem os movimentos permitidos em cada um deles, bem como avaliaremos qualitativa e quan- titativamente o movimento humano. No quarto e quinto capítulos, com- preenderemos a cinemática e a cinética do movimento humano. No sexto e sétimo capítulos, abordaremos os aspectos biomecânicos do tecido ósseo e dos sistemas musculoesquelético e articular, bem como dos segmen- tos corporais. Por fim, nos três últimos capítulos, adentraremos o mundo esportivo para analisar a cinesiologia envolvida em esportes individuais e coletivos. Ao final dessa obra, você será capaz de compreender melhor como as forças mecânicas atuam e influenciam nas estruturas biológicas durante os movimentos. Vamos lá? 1 Planos e eixos O estudo da anatomia humana é fundamental para o bom exercício profissional na área da saúde. A fim de evitar que a posição das estruturas anatômicas seja descrita de maneira diversa pelos diferentes autores, uma posição padrão do corpo (anatômica) foi criada para que os anatomistas façam suas con- siderações. O indivíduo deve estar nesta posição: ereta e em pé, Cinesiologia e Biomecânica – 8 – com a face voltada para frente, olhar voltado para o horizonte, membros superiores estendidos e juntos ao tronco, palmas das mãos voltadas para frente, membros inferiores estendidos e com as pontas dos pés voltadas para frente (Figura 1.1). No caso de um cadáver, mesmo que ele esteja sobre a mesa com o dorso nela encostado (decúbito dorsal), com o ventre nela encostado (decúbito ventral) ou de lado (decúbito lateral), as descrições anatômicas serão sempre realizadas considerando-se o indivíduo na posição anatô- mica. O conhecimento dos planos e eixos anatômicos é de fundamental importância para a compreensão dos movimentos. Sendo assim, o propó- sito neste capítulo é esclarecer quais são esses planos e eixos, bem como os tipos de movimentos relacionados a eles. 1.1 Planos de delimitação O corpo humano pode ser imaginariamente delimitado por planos tangenciais à sua superfície, formando um paralelepípedo no qual o corpo se insere (Figura 1.1). Esses planos podem ser: a) Planos frontais – um plano vertical tangente ao ventre (plano ventral ou anterior) e outro tangente ao dorso (plano dorsal ou posterior). A terminologia atual tem dado preferência aos ter- mos anterior e posterior e evitado a utilização dos termos ventral e dorsal, respectivamente. b) Planos laterais – um plano vertical tangente ao lado direito do corpo (plano lateral direito) e outro tangente ao lado esquerdo (plano lateral esquerdo). c) Planos horizontais – um plano tangente à cabeça (plano cranial ou superior) e outro tangente à planta dos pés (plano podálico ou inferior). Ainda, se fizermos referência ao tronco isolado, este estará limi- tado inferiormente por um plano horizontal tangente ao vértice do osso cóccix (análogo à cauda de outros animais), portanto, será denominado plano caudal. – 9 – Planos e eixos Figura 1.1 – Planos de delimitação do corpo humano a) Plano Sagital/ Eixo Latero Lateral b) Plano Frontal/ Eixo Antero Posterior c) Plano Transversal/ Eixo Longitudinal Fonte: Shutterstock.com/Blamb Os movimentos corporais comuns e aqueles com designações espe- cíficas que ocorrem nas articulações são frequentemente descritos como sendo realizados principalmente no plano frontal, sagital ou transverso. Pedalar e marchar, por exemplo, são movimentos no plano sagital; enquanto algumas articulações dos movimentos de polichinelos, saltos e chutes laterais no futebol são realizadas no plano frontal. Já a rotação executada por um mergulhador ou a pirueta de uma ginasta/bailarina são exemplos de movimento corporal total no plano transverso. 1.1.1 Planos de secção Além dos planos de delimitação, podemos também descrever planos de secção (Figura 1.2): Cinesiologia e Biomecânica – 10 – a) plano frontal ou coronal, em azul na figura – divide o corpo humano em metades anterior e posterior. Qualquer secção reali- zada em planos paralelos ao frontal é denominada secção fron- tal; os planos de secção também são denominados frontais. b) plano sagital mediano, em amarelo na figura – divide o corpo humano em metades direita e esquerda. Qualquer secção rea- lizada em planos paralelos ao mediano é denominada secção sagital; os planos de secção também são denominados sagitais. c) plano horizontal ou transverso, em vermelho na figura – divide o corpo humano em metades superior (cranial) e inferior (podálico ou caudal). Qualquer secção realizada em planos paralelos ao horizontal é denominada secção transversal; os planos de sec- ção também são denominados transversais. Figura 1.2 – Planos de secção do corpo humano Fonte: Shutterstock.com/ Arisa_J – 11 – Planos e eixos 1.2 Eixos anatômicos Quando um segmento do corpo se movimenta, ele gira ao redor de um eixo de rotação que passa pela articulação à qual está ligado. Os eixos referem-se a linhas imaginárias perpendiculares a um dos três planos de movimento. Sendo assim, o eixo anteroposterior constitui uma linha ima- ginária que se projeta perpendicularmente ao plano frontal; o eixo látero- -lateral ou eixo látero-medial (no caso dosmembros) constitui uma linha imaginária projetando-se perpendicularmente ao plano sagital mediano; e o eixo craniocaudal (eixo longitudinal) forma uma linha imaginária proje- tando-se perpendicularmente ao plano transverso (Figura 1.3). Figura 1.3 – Eixos do corpo humano Fonte: CC BY 2.0 1.2.1 Termos direcionais Quando estudamos a forma dos órgãos, descrevemos faces, mar- gens, extremidades ou ângulos, que são designados conforme os planos Cinesiologia e Biomecânica – 12 – correspondentes para os quais estão voltados. Um rim, por exemplo, pos- sui duas margens dispostas a partir do plano mediano: uma voltada para o plano mediano e mais próxima deste (margem medial) e outra voltada para a lateral do corpo, portanto, mais distante do plano mediano (margem lateral). Outro exemplo é a comparação da posição de dois ligamentos do joelho: ligamento colateral medial, mais próximo do plano mediano, e ligamento colateral lateral, mais distante do plano mediano. A Figura 1.4 representa um corte transversal a nível torácico e diversas estruturas anatômicas nele presentes, em posições distintas. Figura 1.4 – Termos de posição de direção de estruturas anatômicas Fonte: Dangelo e Fattini (2011, p. 12). Com base na análise da figura anterior, podemos determinar que: a) a linha xy corresponde ao plano mediano, portanto, as estruturas situadas neste plano (a, b e c) são denominadas medianas. b) em relação às estruturas d, e e f, esta última se situa mais próxima do plano mediano, portanto, é denominada medial; enquanto que as estruturas d (mais distante do plano mediano) e e (localizada no meio das outras duas) são denominadas, respectivamente, lateral e intermédia. c) em relação às estruturas g, h e i, esta última se situa mais próxima do plano anterior, portanto, é denominada anterior; enquanto as estruturas g e h são denominadas posteriores, por se situarem – 13 – Planos e eixos mais próximas do plano posterior. Ainda, a estrutura h é deno- minada média, por se situar entre as estruturas g e i. d) os números 1 e 2 representam, respectivamente, as faces externa (voltada para a pele e os músculos do tórax) e interna (voltada para a cavidade do tórax) de uma costela. Ainda, nos membros utilizam-se termos especiais como proximal (mais próxima da raiz do membro) e distal (mais distante da raiz do mem- bro): a mão, por exemplo, é distal em relação ao antebraço; o qual também é distal em relação ao braço, mas proximal em relação à mão. Figura 1.5 – Termos de direção para o corpo humano a) b) Posterior Anterior c) d) Inferior Superior Lateral LateralMedial Fonte: Shutterstock.com/Lole Cinesiologia e Biomecânica – 14 – 1.3 Formas de movimento 1.3.1 Movimento linear A maioria dos nossos movimentos é composta por um movimento geral, ou seja, uma combinação dos componentes dos movimentos linear e angular. O movimento linear constitui um movimento uniforme, de mesma distância, na mesma direção e com a mesma velocidade (ao mesmo tempo); também é denominado movimento de translação. Um exemplo clássico de movimento linear é um passageiro dormindo durante uma viagem de ônibus: enquanto dorme, o passageiro é transladado por meio do ar. Por outro lado, ao acordar e erguer o braço para alcançar uma revista, o passageiro modifica a posição do membro em relação ao corpo e a translação deixa de acontecer. Ainda, o movimento linear pode ser considerado como o movimento ao longo de uma linha, que, sendo reta, caracteriza o movimento retilíneo e, sendo curva, caracteriza o movimento curvilíneo. A Figura 1.6 demonstra um dos movimentos retilíneos realizados por uma ginasta. Figura 1.6 – Movimento retilíneo Fonte: Shutterstock.com/ Master1305 1.3.2 Movimento angular O movimento ao redor de um ponto fixo imaginário, denominado eixo de rotação, constitui o movimento angular (movimento rotacional); o eixo de rotação é orientado perpendicularmente ao plano da rotação. Nesse – 15 – Planos e eixos tipo de movimento, todos os segmentos se movem no mesmo ângulo, na mesma direção e ao mesmo tempo, porém, não na mesma distância. A Figura 1.7 demonstra o movimento de rotação realizado por uma ginasta em que todo o corpo roda, com o eixo de rotação passando perpendicular- mente ao plano, ou seja, pelo centro da barra. O mesmo acontece quando um atleta de saltos ornamentais executa uma cambalhota no ar, rodando todo o seu corpo ao redor de um eixo de rotação, se movimentando junta- mente com o corpo. Quase todos os movimentos voluntários envolvem a rotação de uma parte do corpo ao redor de um eixo de rotação, passando pelo centro da articulação à qual essa parte está unida. Durante um movi- mento angular, partes do corpo em movimento deslocam-se constante- mente em relação às demais partes corpóreas, aumentando ou diminuindo o ângulo da articulação produzido pelos ossos que se articulam. Figura 1.7 – Movimento rotacional Fonte: Shutterstock.com/ Victoria VIAR PRO 1.3.3 Movimento generalizado Como vimos, a maioria dos movimentos é composta por um movi- mento generalizado; uma combinação dos movimentos linear e angular. Um ciclista, por exemplo, realiza um movimento de translação na parte superior do corpo como resultado do movimento de rotação de suas per- nas. Ainda, se considerarmos a ação de uma das pernas do ciclista, especi- ficamente, teremos a presença de três movimentos de rotação simultâneos: (a) rotação da coxa em torno do eixo do quadril, o qual está em translação; (b) rotação da perna em torno do eixo do joelho; e (c) rotação do pé em torno da articulação do calcanhar. Cinesiologia e Biomecânica – 16 – Figura 1.8 – Movimento generalizado (translação + rotação) Fonte: Shutterstock.com/ Master1305 1.3.4 Movimentos osteocinemáticos As articulações se movem em diversas direções diferentes, por meio de planos articulares e em torno de eixos articulares. Esse tipo de movi- mento é denominado osteocinemático; ele analisa a correlação do movi- mento dos ossos em torno de um eixo articular. Por outro lado, a cor- relação do movimento da superfície articular é denominado movimento artrocinemático. 1.3.4.1 Movimentos no plano frontal Os principais movimentos realizados no plano frontal são: abdução (movimento que afasta um segmento corporal da linha média do corpo), adução (movimento que aproxima um segmento da linha média), rotação lateral do tronco (flexão lateral direita ou esquerda), elevação e depressão da cintura escapular (nas direções superior e inferior, respectivamente), eversão e inversão da região plantar (rotação externa e interna da região plantar, respectivamente), desvio radial e desvio ulnar (rotação da mão, ao nível do punho, na direção do rádio e da ulna, respectivamente) e pro- nação e supinação (rotação na articulação subtalar). A pronação é uma combinação de abdução, eversão e dorsiflexão, e a supinação é uma com- binação de adução, inversão e flexão plantar. – 17 – Planos e eixos Figura 1.9 – Movimentos no plano frontal: abdução e adução Abdução Adução Fonte: Will Amaro Figura 1.10 – Movimentos no plano frontal: flexão lateral direita e esquerda Fonte: Hall (2000, p. 29). Cinesiologia e Biomecânica – 18 – Figura 1.11 – Movimentos no plano frontal: elevação e depressão Fonte: Hall (2000, p. 29). Figura 1.12 – Movimentos no plano frontal: desvios radial e ulnar Desvio radialDesvio ulnar Fo nt e: ad ap ta do de Sh ut te rs to ck .c om / A ut ta po n W on gt ak ea w Figura 1.13 – Movimentos no plano frontal: eversão e inversão Eversão Inversão b) a) Fo nt e: S hu tte rs to ck .co m /A lil a M ed ic al M ed ia – 19 – Planos e eixos 1.3.4.2 Movimentos no plano sagital Os principais movi- mentos realizados no plano sagital são: flexão (movi- mento rotacional, dirigido anteriormente, da cabeça, tronco, braço, antebraço, mão e quadril, além de, posterior- mente, da extremidade infe- rior), extensão (movimento que restabelece um segmento à posiçãoanatômica após uma flexão), hiperextensão (movimento rotacional além da posição anatômica, em direção oposta à flexão), dorsiflexão (movimento que aproxima o dorso do pé da parte inferior da perna) e flexão plan- tar (movimento oposto à dorsiflexão, como o rea- lizado pelas bailarinas para ficarem na ponta). 1.3.4.3 Movimentos no plano transverso Os movimentos no plano transversal se dão ao redor de um eixo longitudinal; sendo rotação esquerda e rotação direita os movimen- tos realizados pela cabeça, pescoço e tronco. Já a rotação dos membros superiores e inferiores é Extensão Flexão Figura 1.14 – Movimentos no plano sagital: flexão, extensão Extensão Flexão Fonte: Will Amaro Flexão plantar Dorsi�exão Fi gu ra 1 .1 5 – M ov im en to s no p la no s ag ita l: do rs ifl ex ão e fl ex ão pl an ta r Fonte: Shutterstock.com/Dn Br Cinesiologia e Biomecânica – 20 – denominada rotação medial, quando em direção ao mediano do corpo, e rotação lateral, quando em direção à lateral do corpo e afastando-se do mediano. Para o antebraço são utilizados termos específi- cos: supinação, para a rotação externa, e pronação, para a rotação interna. Repare que, na posição anatômica, o antebraço se encontra em posição de supinação. Rotação interna Rotação externa Figura 1.16 – Movimentos no plano transversal: rotação medial (interta) e lateral (externa) Rotação medial Rotação lateral Fonte: Will Amaro Figura 1.17 – Movimentos no plano transversal: supinação e pronação Úmero Ulna Rádio Palma Posterior a) PRONOTAÇÃO b) SUPINAÇÃO Palma Anterior Fonte: Shutterstock.com/VectorMine – 21 – Planos e eixos Figura 1.18 – Movimentos articulares Legenda: (a) adução de ombro e quadril; (b) abdução de ombro e quadril; (c) rotação da coluna vertebral; (d) flexão lateral da coluna; (e) flexão da coluna; (f) hiperextensão da coluna; (g) flexão de ombro e quadril e extensão de cotovelo e punho; (h) hiperextensão de ombro e quadril e flexão plantar de tornozelo direito. Fonte: Van de Graaff (2003b, p. 211). Figura 1.19 – Principais articulações e seus respectivos movimentos Articulação Tipo Movimentos Maioria das articula- ções do crânio Fibrosas (suturas) Imóveis Temporamandibular Sinovial (gínglimos; plana) Elevação, abaixamento, protra- ção, retração. Atlantoccipital Sinovial (condilar ou elipsóidea) Flexão, extensão, circundação. Cinesiologia e Biomecânica – 22 – Articulação Tipo Movimentos Atlantoaxial Sinovial (trocóidea) Rotação Intervertebral Corpos vertebrais Cartilagínea (sínfise) Limitado Processos Articulares Sinovial (plana) Flexão, extensão, rotação limi-tada. Sacroilíaca Cartilagínea (plana) Limitado; pode se fundir em adultos. Costovertebral Sinovial (plana) Limitado, durante a respiração. Estemocostal Sinovial (plana) Limitado, durante a respiração. Estemoclavicular Sinovial (plana) Limitado, quando se encolhe os ombros. Esternal Cartilagínea (sínfise) Limitado, durante a respiração. Acromioclavicular Sinovial (plana) Protração, retração; elevação, abaixamento. Glenoumeral (ombro) Sinovial (esferóidea) Flexão, extensão; adução, abdução; rotação; circundação. Cotovelo Sinovial (gínglimo) Flexão, extensão. Radiulnar proximal Sinovial (trocóidea) Rotação Radiulnar distal Fibrosa (sindesmose) Limitado, lado a lado. Radiocarpal (punho) Sinovial (condilar ou elipsóidea) Flexão, extensão; adução; abdução, circundação. Intercarpal Sinovial (plana) Limitado Carpometacarpal Dedos Sinovial (condilar ou elipsóidea) Flexão, extensão; adução; abdução. Polegar Sinovial (selar) Flexão, extensão; adução; abdução. Metacarpofalângica Sinovial (condilar ou elipsóidea) Flexão, extensão; adução; abdução. Interfalângicas Sinovial (selar) Flexão, extensão. Sínfise púbica Cartilagínea (sínfise) Limitado – 23 – Planos e eixos Articulação Tipo Movimentos Quadril Sinovial (esferóidea) Flexão, extensão; adução; abdução, rotação; circundação. Joelho (tibiofemoral) Sinovial (gínglimo) Flexão, extensão; ligeira rota-ção quando flexionada. Tibiofibular proximal Sinovial (plana) Limitado Tibiofibular distal Fibrosa (sindesmose) Limitado Talocrural (tornozelo) Sinovial (gínglimo) Dorxiflexão, flexão plantar; pequena circundação; inver- são, eversão. Intertarsal Sinovial (plana) Inversão, eversão. Tarsometatarsal Sinovial (plana) Flexão, extensão; adução; abdução. Fonte: Van de Graaff (2003b, p. 225). 1.3.4.4 Outros movimentos Como vimos, os movimentos de abdução e adução correspondem ao plano frontal conforme demonstrado na Figura 1.20, entretanto, quando o braço ou a coxa formam um ângulo de 90° de fle- xão, o movimento dessas partes do corpo no plano transverso, da posição anterior para a posição lateral, é denominado de abdução horizontal ou extensão horizontal. Por outro lado, o movi- mento da posição lateral para a posição anterior é denominado adução horizontal ou flexão hori- zontal. Ainda, há outro tipo bastante comum Abdução Adução Figura 1.20 – Movimentos do ombro no plano frontal Fonte: Will Amaro Cinesiologia e Biomecânica – 24 – de movimento: a circundução, um caso especial de deslocamento geral envolvendo quatro movimentos articulares combinados: (1) flexão, (2) extensão, (3) abdução e (4) adução. Figura 1.21 – Movimento de circundução Fonte: adapatado de Shutterstock.com O movimento linear ao longo de um plano paralelo ao chão e para frente, afastando-se do plano frontal, é denominado protração (protrusão), enquanto o movimento contrário, para trás e aproximando-se do plano fron- tal, é denominado retração (retrusão). Exemplos de protração e retração são os movimentos da escápula para frente e para trás (protração e retração do cíngulo do membro superior) e a protrusão e retrusão da mandíbula. – 25 – Planos e eixos Figura 1.22 – Movimento de protração e retração da escápula Protração Retração Clavícula Ombro Úmero Escápula Fonte: Will Amaro Saiba mais BRITO, A. J. C.; HIGINO, N. Planos e eixos e nomenclatura dos movi- mentos humanos. Disponível em: <https://go.aws/2v0oH8J>. Acesso em: 1 fev. 2020. Síntese O corpo humano pode ser imaginariamente delimitado pelos pla- nos ventral ou anterior, dorsal ou posterior, lateral (direito e esquerdo), cranial ou superior e caudal/podálico ou inferior. Quanto às secções, o corpo humano pode ser seccionado pelos planos: frontal (secção frontal), sagital mediano (secção sagital) e transverso (secção transversal). A maio- ria dos movimentos realizados pelo corpo humano é composta por uma combinação dos componentes dos movimentos (a) linear, que constitui um movimento uniforme e de mesma distância, na mesma direção e com a mesma velocidade, podendo ser retilíneo ou curvilíneo, e (b) angular, Cinesiologia e Biomecânica – 26 – que constitui um movimento ao redor de um ponto fixo imaginário, deno- minado eixo de rotação. Os principais movimentos articulares são: fle- xão, extensão, hiperextensão, dorsiflexão e flexão plantar, realizados no plano sagital; abdução, adução, flexão lateral, elevação, depressão, inver- são, eversão, desvio radial e desvio ulnar, realizados no plano frontal; e rotação medial, rotação lateral, pronação, supinação, abdução horizontal e adução horizontal, realizados no plano transverso. A circundução combina os movimentos de flexão, extensão, abdução e adução, resultando em uma trajetória cônica. O movimento linear ao longo de um plano paralelo ao chão e para frente é denominado protração ou protrusão; o movimento contrário, para trás, é denominado retração ou retrusão. Atividades 1. Preencha as lacunas a seguir, baseando-se nos termos de posição de direção. a) O osso esterno é __________ em relação ao coração. b) O osso occipital está localizado na parte __________ do crânio. c) O tórax é __________ em relação ao quadril. d) O rádio é __________ à ulna. e) A tíbia está localizada __________ na perna. 2. Em que posição se encontra uma pessoa deitada em uma cama,olhando para o teto? 3. Qual é o tipo de movimento realizado por uma bola de futebol americano passando entre as traves e qual é o tipo de movimento realizado pela perna do jogador que chutou a bola? 4. Qual é o tipo de movimento articular realizado no plano frontal por um aluno que, sentado em uma carteira, pega sua borracha que caiu no chão? 2 Avaliação qualitativa do movimento humano A análise qualitativa do movimento humano corresponde a uma avaliação do movimento sem mensuração, ou seja, sem a utilização de números. Essa análise requer tanto o conhecimento das características desejadas do movimento quanto a capacidade de observar e analisar se um determinado desempenho incorpora essas características. Para tanto, a metodologia mais utilizada é a observação visual, que deve ser planejada e conduzida por um analista conhecedor da biomecânica do movimento e por meio da qual técnicos, professores e médicos emitem suas opiniões e recomendações (HALL, 2000). Sem o conhecimento dos fundamentos de biomecânica mais relevantes, os analistas podem se deparar com uma certa Cinesiologia e Biomecânica – 28 – dificuldade na identificação dos fatores que contribuem ou dificultam o desempenho e, consequentemente, interpretar as observações de maneira incorreta. Portanto, para uma análise efetiva da habilidade motora, devem ser capazes de identificar a causa de um erro técnico, contrariamente a um sintoma do erro, ou uma característica do desempenho (HALL, 2000). Nesse sentido, a experiência pessoal conta bastante, uma vez que um indivíduo que realiza eficientemente uma habilidade encontra-se mais bem preparado para a análise qualitativa dessa habilidade em relação a um indivíduo menos familiarizado. Existem duas fontes de informação para o diagnóstico de uma habilidade motora: a técnica ou cinemática exibida pelo executante e o resultado do desempenho (HALL, 2000). 2.1 Análise qualitativa versus análise quantitativa A análise de um movimento pode passar de qualitativa a quantitativa em um conjunto contínuo de variáveis (Figura 2.1). Por exemplo, a aná- lise de um saque em uma partida de voleibol pode ir desde as opiniões dos comentaristas de televisão até a velocidade da bola, medida por um radar. A análise quantitativa baseia-se na medida do desempenho, que, caso possa ser expresso em números, resultará em uma análise baseada em dados quantificados. Embora subjetiva, a análise qualitativa não é menos válida ou fidedigna que a quantitativa, pois, para ser mais eficaz, requer planejamento, etapas sistematizadas e multidisciplinaridade das informa- ções. Uma análise quantitativa não é de todo fidedigna, uma vez que nela sempre existe um pouco de subjetividade (onde colocar a fita para come- çar a medir ou onde se deve tomar a medida das dobras cutâneas, por exemplo); já a análise qualitativa constitui um processo interdisciplinar. Figura 2.1 – Conjunto de variáveis na análise do movimento humano durante uma corrida Fonte: Elaborado pelo autor. – 29 – Avaliação qualitativa do movimento humano 2.1.1 Planejamento de análises qualitativas Mesmo uma análise qualitativa simples pode fornecer informações insuficientes ou errôneas, portanto, é recomendado um planejamento da análise, cujo nível aumenta conforme a complexidade da habilidade e/ou o nível do detalhe anatômico desejado. A primeira etapa deve ser a iden- tificação da questão ou das questões a serem respondidas, normalmente já formuladas pelos analistas e que constituem o objetivo original para a observação: por exemplo, o que pode estar causando a dor no punho de uma datilografista? A marcha do paciente submetido a uma cirurgia no joelho já está estabilizada? Em seguida, deve-se determinar a(s) perspectiva(s) visual(is) ótima(s) a partir da(s) qual(is) o movimento deverá ser analisado. Caso os movimen- tos mais importantes sejam realizados em um único plano, uma única pers- pectiva visual pode ser suficiente, por exemplo, a análise de um indivíduo pedalando, na qual uma vista lateral ou uma vista posterior são suficientes. Em contrapartida, caso os movimentos mais importantes sejam realizados em mais de um plano, como o chute de um atleta de artes marciais, mais de uma perspectiva poderá ser necessária, por exemplo, uma vista lateral, uma vista posterior e uma vista superior. Outro aspecto importante a ser determinado é a distância visual do analista em relação ao realizador do movimento, devendo ser mais próxima e por trás das pernas no caso da análise de um paciente cami- nhando na esteira, na qual se deseja observar a pronação e a supinação subtalares, ou mais distante e em uma posição mais elevada no caso da análise de jogadores de voleibol, que se deslocam em condições que se modificam rapidamente. A quantidade de testes ou de execuções do movimento que deve- rão ser observados também constitui fator importante em uma análise qualitativa. Normalmente, quanto maior a inconstância na cinemática (descrição dos aspectos do movimento) do realizador do movimento, maior é o número de observações a serem feitas, já que não é sen- sato basear uma análise na observação de um único desempenho, como no caso da observação de uma criança que acabou de aprender a cor- rer, portanto, dificilmente demonstrará duas passadas semelhantes (de Cinesiologia e Biomecânica – 30 – modo diferente da corrida de um atleta profissional, cuja cinemática dos movimentos realizados desvia-se ligeiramente durante as várias passa- das) (HALL, 2000). Os trajes utilizados pelos executantes do movimento também influen- ciam na sua análise qualitativa, uma vez que roupas mais folgadas podem dificultar a observação de alguns movimentos sutis, os quais seriam per- ceptíveis se os trajes utilizados fossem mínimos (por exemplo, um homem vestindo apenas uma bermuda e tênis, uma mulher vestindo apenas um “top de ginástica”, bermuda e tênis). Além disso, uma iluminação ade- quada e um fundo liso, de cor contrastante, também auxiliam na visibili- dade do movimento observado (HALL, 2000). Uma câmera de vídeo auxilia na identificação de movimentos exe- cutados com rapidez, os quais podem passar desapercebidos pelos olhos humanos, incapazes de decompor eventos que ocorrem em menos de cerca de um quarto de segundo. Entretanto, essa alternativa deve ser utilizada com a ciência de que as técnicas e os movimentos realizados pelos exe- cutantes podem ser modificados inconscientemente ou por distração em relação à presença da câmera, resultando em mudanças no desempenho (redução em indivíduos pouco qualificados e aprimoramento em indiví- duos mais qualificados) (HALL, 2000). Ainda, os analistas de cinesiologia devem ser conscientes de que as características do executor do movimento, tais como idade, sexo, antropometria, níveis de desenvolvimento e traços físicos ou de per- sonalidade, podem afetar cada execução de uma habilidade motora e impactar no desempenho. Outras formas não visuais de observação também podem ser úteis durante uma análise qualitativa; como a infor- mação auditiva, que pode fornecer indícios sobre a maneira pela qual um movimento foi executado (o contato correto de um taco de golfe com a bola, por exemplo, produz um som nitidamente diferente do som produzido quando o taco “acerta” na parte mais superior ou mais inferior da bola). Técnicos, professores e médicos frequentemente par- ticipam de um processo contínuo, que consiste em formular a aná- lise, coletar observações adicionais e elaborar uma análise atualizada (Figura 2.2) (HALL, 2000). – 31 – Avaliação qualitativa do movimento humano Figura 2.2 – Processo de uma análise qualitativa Fonte: Elaborado pelo autor. 2.2 Modelos de análise qualitativa baseados na observação Os modelos de análise baseados na observação têm sido o principal alvo das pesquisas nos últimos anos e concentram-se na capacidade de o analista observar os aspectos mais difíceis da habilidade do realizador do movimento, a sequência ou as fases dosmovimentos a serem obser- vados e os possíveis erros a serem cometidos, bem como dicas de que maneira corrigi-los. Cinesiologia e Biomecânica – 32 – 2.2.1 Modelo de Gangstead e Beveridge Proposto em 1984, consiste em um modelo de observação focado na atenção do analista aos aspectos temporais (fases de preparação, ação e seguimento do movimento) e espaciais do movimento (peso corporal do executor, ponto central do movimento, braços, pernas, movimento do tronco, movimento da cabeça e parâmetros de impacto e relaxamento). É útil aos analistas que possuem dificuldades em dirigir sua atenção a dife- rentes segmentos do movimento ao mesmo tempo. Figura 2.3 – Modelo de Gangstead e Beveridge Componentes do corpo Fase temporal Preparação Ação Seguimento Ponto central do movimento Peso do corpo Ação do tronco Ação da cabeça Ação da perna Ação do braço Impacto/soltura Fonte: Elaborado pelo autor. 2.2.2 Modelo de Hoffman Modelo proposto em 1983, é focado na diferença entre a reação observada e a imagem mental da reação correta, devendo resultar em um diagnóstico (extensão da discrepância e possível causa) e na prescrição da solução, caso haja discrepância entre as duas. Para tanto, o analista deve obter uma nítida imagem mental de um bom desempenho, bem como metas/objetivos bem definidos para o movimento. As diferenças entre o que foi observado e o que era esperado para o movimento podem ocorrer em virtude da falta de capacidade crítica, da deficiência na habilidade ou de um problema psicossocial. – 33 – Avaliação qualitativa do movimento humano 2.2.3 Modelo de Dunham Proposto em 1986 e atualizado em 1994, consiste em um modelo focado na importância da obtenção de uma impressão geral da qualidade do movimento, antes da observação de componentes específicos, dife- rindo dos modelos tradicionais que, primeiramente, focam as formações temporais e espaciais. O analista é orientado a obter uma visão geral de como a habilidade é realizada, baseando-se na premissa de que o global é mais importante que a soma de suas partes. Sendo assim, deve-se analisar a habilidade pelos meios temporais e espaciais caso o movimento não tenha uma boa qualidade. Esse modelo propõe a utilização de folhas de tarefa para a análise qualitativa do movimento. 2.2.4 Modelo de Brown Proposto em 1982, é um modelo composto por 19 técnicas de avalia- ção visual desenvolvidas para a formação de técnicos, organizadas em cinco áreas: (1) ponto de observação, (2) simplificação do movimento, (3) equilí- brio e estabilidade, (4) relações do movimento e (5) amplitude do movimento. Sendo assim, a observação e a análise qualitativa são feitas com base nessas técnicas, as quais partem do genérico ao específico: primeiramente leva-se em consideração o ponto de observação, seguido dos menores segmentos do movimento e, por fim, as partes mais complexas e rápidas do movimento. 2.2.5 Modelo de Hudson Esse modelo foi proposto em 1985 e é baseado em uma abordagem denominada Sistema de Observação/Objetivo para Estudo e Compreen- são do Movimento (SOOECM), na qual o movimento é classificado con- forme seu objetivo (manutenção do equilíbrio ou esforço máximo). Para tanto, o objetivo deve estar associado a algumas dimensões observáveis do movimento, baseando-se na seleção das variáveis importantes, que devem identificar os níveis da habilidade possíveis de serem observados qualitativamente e trabalhados pelo executor do movimento. A Figura 2.4 demonstra exemplos do princípio de direção de força do modelo de Hud- son, cujos objetivos das habilidades estão ligados às variáveis observáveis para a análise do desempenho. Cinesiologia e Biomecânica – 34 – Figura 2.4 – Modelo de análise qualitativa SOOECM Fonte: Elaborado pelo autor. No início dos anos 1950, Hudson ampliou a ideia de como analistas novatos e experientes observam as variáveis em habilidades motoras a eles pouco familiares e identificou dez conceitos fundamentais de cinesio- logia. Eles consistem nas variáveis que o profissional pode avaliar e sobre as quais pode fornecer uma resposta, objetivando melhora no desempenho (Figura 2.5). Esses conceitos tornaram-se recursos técnicos para auxiliar os atletas no aprimoramento de seus movimentos, estimulando a discus- são sobre as variáveis biomecânicas passíveis de observação. Figura 2.5 – Os dez conceitos fundamentais de cinesiologia de Hudson Fonte: Elaborado pelo autor. – 35 – Avaliação qualitativa do movimento humano 2.3 Modelos abrangentes de análise qualitativa Com o passar dos anos, novos modelos de análise qualitativa foram sendo criados, capazes de proporcionar uma visão global de todas as tarefas envolvidas na análise do movimento. Nos modelos propostos por pedagogos do esporte, a observação sistemática constitui o método prefe- rido para a avaliação do ensino; é uma maneira de classificar o comporta- mento de alunos e professores com o objetivo de coletar dados sobre estes últimos e suas técnicas de ensino. Entretanto, a análise qualitativa é uma habilidade profissional focada no aluno e não no processo de ensino e/ ou treinamento, constituindo uma observação da qualidade do movimento humano visando à intervenção mais adequada ao aperfeiçoamento do desempenho do aluno (KNUDSON; MORRISON, 2001). 2.3.1 Modelo de Arend e Higgins Proposto em 1976, consiste em um modelo que considera se uma aná- lise está direcionada para a habilidade ou para o desempenho. A análise é pensada como uma avaliação da aprendizagem ou da forma como o movi- mento sofre alterações ao longo do tempo e a análise do desempenho como uma avaliação da execução de um movimento. Esse modelo foi desenvol- vido para ser aplicado em análises subjetivas, anatômicas ou quantitativas, dividindo a análise qualitativa em três partes: (a) pré-observação, subdi- vidida em três níveis conforme os fatores influenciadores do movimento e nos quais cada nível fornece informações mais específicas a respeito do movimento; (b) observação e (c) pós-observação. O terceiro nível da etapa de pré-observação identifica com precisão os fatores biomecânicos, táticos e morfológicos envolvidos no movimento (KNUDSON; MORRISON, 2001). 2.3.2 Modelo de Hay e Reid Modelo proposto em 1988 e baseado na utilização do método mecâ- nico, o qual utiliza modelos biomecânicos para análise sistemática dos fatores, visando à verificação da possibilidade de aprimoramento do desempenho. Primeiramente, são identificados os fatores menos relevan- tes de cada trajetória, sendo desconsiderados os fatores não passíveis de mudança pelo executor do movimento e determinados, pelo observador, os fatores passíveis de melhora (KNUDSON; MORRISON, 2001). Cinesiologia e Biomecânica – 36 – 2.3.3 Modelo de McPherson Proposto em 1990, consiste em um modelo baseado em quatro eta- pas: (a) pré-observação, (b) observação, (c) diagnóstico e (d) correção. Enfatiza a importância dos princípios mecânicos e sua relação com as características críticas e detalha os planos de observação e diagnóstico de erros. A Figura 2.6 demonstra o modelo de McPherson, utilizado como base para o desenvolvimento do modelo de Philipp e Wilkerson (KNUD- SON; MORRISON, 2001). Figura 2.6 – Modelo abrangente de McPherson Fonte: Elaborado pelo autor. 2.3.4 Modelo de Roberton e Halverson Esse modelo foi proposto em 1984 e consiste em uma síntese de vários modelos desenvolvimentistas de componentes dos padrões de movimento (HALVERSON, 1983; ROBERTON, 1983; WILLIAMS, 1980 apud KNUDSON; MORRISON, 2001) nos quais os níveis de desen- volvimento são classificados em seis componentes. Baseado no desen- volvimento do lançamento por cima do ombro no beisebol, esse modelo propõe a avaliação, primeiramente, da ação do tronco por meio da análise – 37 – Avaliação qualitativa do movimento humano qualitativa do movimento de lançar e bater; e que as principais alterações nos outros componentes do movimento são determinadas pelas alterações no uso do tronco. Com base no modelode Roberton e Halverson, Rose et al. propuseram, em 1990, um modelo de componentes para análise do saque no tênis, assim como Messick, em 1990, cujo estudo baseou-se no desenvolvimento motor do saque no tênis considerando-se os seis compo- nentes (KNUDSON; MORRISON, 2001). 2.3.5 Modelo de Wickstrom Proposto em 1983, consiste em um modelo baseado na análise qua- litativa por meio da observação de sequências de desenvolvimento motor do corpo todo; também utilizando o lançamento por cima do ombro. O desenvolvimento desse tipo de movimento em crianças de 2 a 7 anos geralmente apresenta-se em quatro etapas: (I) envolvimento da flexão e da extensão do cotovelo sem alteração da posição dos pés, em plano sagital; (II) envolvimento de flexão e extensão sem alteração da posição dos pés, em plano mais oblíquo e horizontal e com certa rotação do tronco em plano transversal; (III) movimentos preparatórios dos braços, geralmente direto para trás, e movimentação de um passo com a perna do mesmo lado do braço que será utilizado, limitando o potencial de rotação do tronco; e (IV) movimento descendente do braço para trás, seguido de rotação do tronco, adução horizontal da parte superior do braço e extensão do coto- velo, envolvendo um passo para frente com a perna do lado oposto do braço que será utilizado. Esses tipos de modelo fornecem informações essenciais sobre as sequências e alterações apresentadas durante a apren- dizagem de habilidades motoras. É importante que os analistas possuam consciência dos níveis de desenvolvimento das habilidades estudadas (KNUDSON; MORRISON, 2001). Figura 2.7 – Estágios II e IV do modelo de Wickstrom Cinesiologia e Biomecânica – 38 – Fonte: Knudson e Morrison (2001, p. 26). 2.3.6 Modelo abrangente e integrado Tanto os modelos de análise qualitativa baseados na observação quanto os modelos abrangentes possuem alguns pontos em comum que podem ser utilizados por quase todas as profissões que envolvem a aná- lise qualitativa do movimento humano. Analistas experientes conhecem muito bem os movimentos e seus executantes, utilizando esse conheci- mento para planejamento da observação do desempenho e avaliando os pontos fortes e fracos, diagnosticando as etapas necessárias para o apri- moramento e realizando a(s) intervenção(ões) adequada(s). A Figura 2.8 demonstra o modelo abrangente e integrado de análise qualitativa, bem como alguns dos pontos impor- tantes de cada etapa (prepara- ção, observação, avaliação/diag- nóstico e inter- venção), que devem ser con- siderados igual- mente impor- tantes, uma vez que a falha em algum deles compromete a eficácia de toda a análise qualitativa. Figura 2.8 – Modelo abrangente e integrado de análise qualitativa Fonte: Elaborado pelo autor. – 39 – Avaliação qualitativa do movimento humano Como podemos observar, o modelo abrangente e integrado é circu- lar, enfatizando que a aprendizagem e o aprimoramento são contínuos. Além disso, é possível a passagem da etapa de intervenção para a etapa de observação, proporcionando ao analista a possibilidade de fornecer um feedback ao executante e, logo em seguida, iniciar outra observação para continuar a análise. Sendo assim, a intervenção pode ser adiada a fim de se obter um maior número de informações por intermédio de novas observações. A análise qualitativa constitui uma habilidade que deveria estar inclusa no currículo acadêmico dos profissionais de cinesiologia, assim como o modelo integrado deveria fazer parte do processo de ensino dessa área. Na análise qualitativa, a validade possui dois níveis: (a) validade lógica, baseada no consenso obtido com base na literatura e na opinião dos especialistas no movimento em questão; (b) validade referenciada a um critério, baseada na verificação da avaliação e do diagnóstico qualita- tivo de algum ponto crítico do desempenho. Normalmente, os modelos de análise qualitativa concedem validade lógica aos componentes utilizados na análise; poucos estudos utilizam-se da validade referenciada a um cri- tério e, aqueles que a utilizam, sugerem uma provável validade da análise qualitativa em cinesiologia. Alguns modelos baseados na observação para avaliação das exigên- cias físicas de diversos movimentos são desenvolvidos por engenheiros da área de fatores ergonômicos; os quais estudam o projeto ideal de infra- estruturas, instrumentos e movimentos. Estudos ergonômicos demons- tram uma avaliação visual de ângulos estáticos e segmentados do corpo humano em observações de postura com precisão de 3 a 5 graus; em com- paração, a observação visual (por vídeos) do ângulo estático do ombro por analistas não treinados demonstra índices médios de erro em torno de 9 graus. Uma explicação para essa diferença é a tendência desses analistas de superestimar o ângulo real em ângulos de ombro baixos e subestimar o ângulo real em ângulos de ombro médios e altos. O método mais básico utilizado pela biomecânica para analisar o movimento humano é a cinemetria, análise pela filmagem. Esse método é de grande valor como feedback para alunos ou atletas; podendo-se utilizar apenas uma câmera (a de um celular, por exemplo) ou diversas câmeras, Cinesiologia e Biomecânica – 40 – posicionadas para gravação de todos os ângulos do movimento. Quando se trata de análise dos segmentos e articulações, é comum a realização de marca- ções em pontos anatômicos espe- cíficos do executante do movi- mento (Figura 2.9); em seguida, as coordenadas dos pontos de cada imagem do movimento são digitalizadas e os dados são armazenados para cálculo de ângulos articulares, deslocamen- tos das marcas, velocidades line- ares e angulares, etc. Outro método utilizado, com o objetivo de medir o valor da força externa no contato, é a dina- mometria. Nesse método, uma plataforma de força emite um sinal elétrico proporcional à força aplicada pelo executante (Figura 2.10) e algumas plataformas são capazes de medir as forças, os momentos e o deslocamento do centro de pressão em torno dos eixos x, y e z. Esse método é valioso para análise da sobrecarga nas articulações e mensuração das forças necessárias para a produ- ção dos movimentos. A antropometria é um método que possibilita o cálculo do comprimento, da massa, do centro de gravidade dos segmentos e do centro de gravidade do corpo Figura 2.9 – Marcações em cinemetria Fonte: adaptado de Shutterstock.com/Sergey Nivens Figura 2.10 – Plataforma de força em dinamometria Fonte: Shutterstock.com/Artem Oleshko – 41 – Avaliação qualitativa do movimento humano no geral, com base no peso e na altura do indivíduo, considerando-se o centro de gravidade (CG) o ponto no qual é concentrado o efeito da gra- vidade sobre a massa do segmento ou massa total do indivíduo. Dentre os diversos modelos teóricos existentes, destacam-se o modelo de radioisó- topos e o modelo de Dempster (Figura 2.11). Quando uma análise biome- cânica mais complexa é realizada, a escolha do modelo utilizado deve ser minuciosa, uma vez que os percentuais variam de modelo para modelo – havendo, também, modelos antropométricos específicos para crianças e idosos. Figura 2.11 – Modelo de radioisótopos e modelo de Dempster Fonte: adaptado com Shutterstock.com/ Lina_Lisichka Por fim, a eletromiografia (EMG) é o método baseado na análise da função do músculo por meio do registro do sinal elétrico muscular, obtido Cinesiologia e Biomecânica – 42 – por eletrodos de superfície ou de agulha. Por se tratar de um método indo- lor e não invasivo, a EMG de superfície é a mais utilizada para a análise dos movimentos do esporte em geral. Nas membranas das fibras muscu- lares, os potenciais de ação resultantes da despolarização e subsequente repolarização fornecem o sinal elétrico captado pela EMG, isto é, o sinal elétrico reflete as características de recrutamento e disparo das unidades motoras no interior do músculo em análise. Saiba mais AMADIO, A. C.; SERRÃO, J. C. Contextualização da biomecânica paraa investigação do movimento: fundamentos, métodos e aplicações para análise da técnica esportiva. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, v. 21, p. 61-85, 2007. Disponível em: <http://www.revistas.usp. br/rbefe/article/view/16665>. Acesso em: 7 fev. 2020. Síntese A análise qualitativa do movimento humano corresponde a uma avalia- ção do movimento sem mensuração, ou seja, sem a utilização de números. A metodologia mais utilizada é a observação visual. Os modelos de análise baseados na observação concentram-se na capacidade de o analista obser- var os aspectos mais difíceis da habilidade do executor do movimento, a sequência ou as fases dos movimentos a serem observados e os possíveis erros a serem cometidos, bem como as formas de corrigi-los. Com o passar dos anos, novos modelos foram criados, proporcionando uma visão global de todas as tarefas envolvidas na análise do movimento. Nesses modelos, a observação sistemática constitui o método preferido para a avaliação do ensino, classificando o comportamento de alunos e professores, com o objetivo de coletar dados sobre estes e suas técnicas de ensino. Ambos os modelos baseados na observação e abrangentes possuem alguns pontos em comum, úteis para quase todas as profissões envolvendo a análise qualita- tiva do movimento humano: preparação, observação, avaliação/diagnóstico e intervenção, que devem ser considerados igualmente importantes, já que a falha em algum deles compromete a eficácia de toda a análise. – 43 – Avaliação qualitativa do movimento humano Atividades 1. Cite sucintamente as diferenças entre análise qualitativa e aná- lise quantitativa do movimento. 2. Quais são os dez conceitos fundamentais de cinesiologia de Hudson? 3. Explique sucintamente o que são modelos abrangentes de aná- lise qualitativa. 4. “Proposto em 1990, consiste em um modelo baseado em qua- tro etapas: (a) pré-observação, (b) observação, (c) diagnóstico e (d) correção. Enfatiza a importância dos princípios mecânicos e sua relação com as características críticas e detalha os planos de observação e diagnóstico de erros”. O texto refere-se a qual modelo de análise qualitativa? 3 Avaliação quantitativa do movimento humano Como vimos no capítulo 2, a análise quantitativa baseia-se na medida do desempenho, o qual, caso possa ser expresso em números, resultará em uma análise baseada em dados coletados durante a execução do movimento. Dessa forma, os movimentos podem ser analisados com maior precisão e comparados aritme- ticamente com desempenhos anteriores ou subsequentes. A prin- cipal vantagem desse tipo de análise é a obtenção de uma repre- sentação completa, objetiva e precisa do movimento. Para tanto, os dados são coletados por meio de acelerôme- tros (que medem diretamente as acelerações dos segmentos cor- porais) ou, mais comumente, sistemas de vídeo de alta veloci- dade ou de captura optoelétrica, os quais registram as posições dos segmentos corporais com base no tempo e cujas câmeras são calibradas utilizando-se um quadro de referência, que converte as coordenadas da câmera em um conjunto de coordenadas de Cinesiologia e Biomecânica – 46 – marcadores reais conhecidos. Nos sistemas de vídeo de alta velocidade, os dados são obtidos por digitalização da fita de vídeo. Já nos sistemas de captura optoelétrica, um sensor de câmera varre sinais provenientes de diodos emissores de radiação infravermelha, fixados ao corpo, ou a unidade de captura do vídeo atua como fonte e gravador da radiação infra- vermelha refletida de marcadores retrorreflexivos; a localização dos mar- cadores posteriormente é introduzida em um computador, eliminando a digitalização. A determinação de um sistema de referência espacial é imprescindí- vel para qualquer análise. O sistema de coordenadas cartesianas (bi- ou tridimensional), também conhecido como sistema de referência retangu- lar, é bastante utilizado. O sistema bidimensional é utilizado para movi- mentos planares, ou seja, deslocamentos para cima ou para baixo (altura), para a direita ou para a esquerda (largura). O mais conhecido consiste em dois eixos imaginários (x, y) perpendiculares um ao outro, de forma que um deles (x) é posicionado horizontalmente e o outro (y), verticalmente. Assim, um par ordenado de números determina qualquer ponto com refe- rência aos eixos, sendo sempre designado pela ordem horizontal (valor de x), seguido pela ordem vertical (valor de y); a intersecção ou origem dos eixos é designada como (0,0). Para movimentos mais complexos (por exemplo, flexão e abdução da coxa durante projeção para frente e lateralmente para fora), o sistema utilizado é o tridimensional, por haver a necessidade de três tipos de infor- mação para se localizar precisamente as partes do corpo ou de qualquer ponto importante, acrescentando aos componentes bidimensionais (altura/ largura) o conceito de profundidade (medial e lateral). Nesse sistema, estão presentes três eixos: horizontal (x), vertical (y) e médio-lateral (z), também perpendiculares uns aos outros. 3.1 Indicadores dinâmicos do movimento humano Durante a realização de nossas atividades diárias, nosso corpo gera forças e resiste a elas, como no caso da força da gravidade e do atrito enquanto caminhamos. Quando praticamos esportes temos, ainda, que aplicar forças sobre bolas, raquetes, tacos ou bastões e absorver as forças – 47 – Avaliação quantitativa do movimento humano oriundas dos impactos com esses objetos, com o solo e/ou com os cole- gas de equipe e adversários. Para melhor compreensão dos efeitos dessas forças, devemos conhecer brevemente os conceitos de massa, inércia, centro de gravidade, peso, peso específico, pressão, volume e densidade (HALL, 2000). A massa é a quantidade de matéria que compõe um corpo; ela é repre- sentada pelo símbolo m e sua unidade no sistema internacional (SI) é o quilograma (kg). Inércia é o conceito que define a resistência de um corpo à ação ou à mudança, tendendo a manter-se em seu estado atual de movi- mento, parado ou movimentando-se com velocidade constante (como é o caso, por exemplo, de uma patinadora que continua deslizando sobre o gelo, em linha reta e velocidade constante). A quantidade de inércia que um corpo possui é diretamente proporcional à sua massa, sendo a tendên- cia de manter o estado atual de movimento maior quanto mais maciço for o corpo (HALL, 2000). O ponto ao redor do qual o peso e a massa de um corpo equilibram- -se, igualmente, em todas as direções, é denominado centro de gravidade (CG). Seu deslocamento, nas análises de um movimento, é um índice do movimento corporal total. No corpo humano adulto, o CG está localizado aproximadamente e um pouco antes do nível da segunda vértebra sacral (S2) (HALL, 2000). Já a quantidade de força gravitacional exercida sobre um corpo refere- -se ao peso; constituindo-se a multiplicação da massa (m) pela aceleração da gravidade (ag). Assim sendo, o peso de um corpo aumenta proporcio- nalmente ao aumento de sua massa e o fator dessa proporção relaciona- -se à aceleração da gravidade, igual à -9,81 m/s². O peso específico diz respeito ao peso por unidade de volume e é proporcional à densidade, uma vez que o peso é proporcional à massa (HALL, 2000). A pressão constitui a força distribuída por uma determinada área, por exemplo, o peso corporal de um indivíduo apoiado sobre o sapato, dividido pela área superficial entre a sola e o chão. Isso explica a dor causada, nas mulheres, pelo uso de salto alto: a menor quantidade de área superficial na ponta de um sapato de salto resulta em uma quanti- dade muito maior de pressão exercida. A quantidade de espaço que um Cinesiologia e Biomecânica – 48 – corpo ocupa é definida como volume. Uma unidade de volume constitui uma unidade de comprimento ao cubo (largura × altura × profundidade). Unidades de massa divididas por unidades de volume constituem a den- sidade (HALL, 2000). 3.1.1 Leis de movimento Todos os tipos de movimentopodem ser explicados por leis desen- volvidas por Isaac Newton: lei da inércia, lei da aceleração e lei da ação e reação. Como visto anteriormente, a lei da inércia é a tendência de um corpo permanecer em seu estado atual (repouso ou movimento); sendo necessária a aplicação de uma força extra para superá-la e fazer com que o corpo se movimente, mude de direção ou pare. A segunda lei refere-se a qualquer variação na velocidade de um corpo (aceleração), proporcional à força a ele aplicada; a mudança de direção também é dependente da força aplicada a um corpo em movimento e a aceleração é inversamente propor- cional à massa do corpo. A terceira lei de Newton, por sua vez, define que para cada ação existe uma reação correspondente, de igual intensidade e sentido contrário (LIPPERT, 2018). 3.1.2 Força Forças são grandezas vetoriais, portanto, apresentam uma magnitude (intensidade) e uma direção. São representadas graficamente por setas que correspondem ao comprimento e à direção adequados, ou seja, quanto maior a força representada, mais comprida será a seta. Conforme os efei- tos produzidos, as forças podem ser: a) Lineares – atuam ao longo da mesma linha, seja no mesmo sen- tido ou em sentidos opostos. b) Paralelas – atuam no mesmo plano, no mesmo sentido ou em sentidos opostos. c) Concorrentes – atuam em diferentes direções, gerando uma força resultante de posição intermediária. d) Binário de forças – atuam em diferentes direções, gerando um movimento de rotação. – 49 – Avaliação quantitativa do movimento humano Figura 3.1 – Forças lineares: mesmo sentido (A) e sentidos opostos (B) Fonte: Shuttertock.com/ Body Stock/ Anana_go Figura 3.2 – Forças paralelas Fo nt e: L ip pe rt (2 01 8, p . 1 00 ). Cinesiologia e Biomecânica – 50 – Figura 3.3 – Forças concorrentes Fonte: Lippert (2018, p. 99). Figura 3.4 – Força resultante de forças concorrentes Fonte: Lippert (2018, p. 100). – 51 – Avaliação quantitativa do movimento humano 3.1.3 Torque Torque ou momento força é o efeito rotatório criado por uma força excêntrica; é definido pelo produto da força pela dis- tância perpendicular, da linha de ação da força até o eixo de rotação. Nos músculos, a distân- cia perpendicular entre a linha de tração do músculo e o centro da articulação (eixo de rotação) é denominada braço de torque ou braço de momento (Figura 3.6); o torque máximo ocorre quando o ângulo de tração é igual a 90°. Em resumo, o braço de momento será maior quanto maior for a força angular (tor- que) do músculo (LIPPERT, 2018). Figura 3.6 – Braço de momento do bíceps braquial Fonte: Lippert (2018, p. 102). Figura 3.5 – Binário de forças Fonte: Lippert (2018, p. 101). Cinesiologia e Biomecânica – 52 – Quando o ângulo da articulação se aproxima de 0° (braço quase total- mente estendido), o braço de momento diminui e a força constitui uma força estabilizadora que aproxima os dois ossos. Por outro lado, quando o ângulo da articulação se aproxima de 180° (braço quase totalmente fle- xionado), o braço de momento também diminui, porém, a força de deslo- camento (afastamento de um osso do outro) aumenta. No ponto de torque máximo, ou seja, quando o ângulo da articulação se encontra na metade de sua amplitude máxima (90°), o braço de momento é máximo e a efici- ência de movimentar ou rodar a articulação também é máxima. A Figura 3.7 demonstra os três casos que acabamos de descrever (LIPPERT, 2018). Figura 3.7 – Efeitos do ângulo da articulação sobre o braço de momento e a força de deslocamento Le ge nd a: ( A ) ân gu lo d a ar tic ul aç ão ig ua l a 9 0° ; ( B ) ân gu lo d a ar tic ul aç ão pr óx im o de 0 °; (C ) â ng ul o da a rti cu la çã o pr óx im o de 1 80 °. Fo nt e: L ip pe rt (2 01 8, p . 1 02 ). – 53 – Avaliação quantitativa do movimento humano 3.2 Indicadores cinemáticos do movimento humano Biomecânicos do esporte comumente analisam quantitativamente os ele- mentos cinemáticos (tempo, distância, posição, ângulo, velocidade e aceleração) do desempenho de um atleta ou os fatores biomecânicos possíveis de limitar esse desempenho. Uma descrição correta e precisa do movimento humano deve ser realizada utilizando-se os termos posição, velocidade e aceleração. A posi- ção de um corpo ou objeto relaciona-se à sua localização no espaço, em relação a um valor de base ou a um eixo. Quando tais corpos ou objetos sofrem uma mudança de posição, essa condição implica a ocorrência de um movimento, detectado comparando-se a posição desses elementos em um certo instante e a posição em outro instante (HAMILL; KNUTZEN, 2008; ENOKA, 2000). 3.2.1 Distância e deslocamento A distância é uma grandeza escalar que se refere à medida da trajetória de um movimento, por exemplo, para um piloto de kart que completa meia volta em uma pista de 500 m, a distância percorrida é igual à metade da pista; ou seja, 250 m. Por outro lado, o deslocamento percorrido pelo piloto constitui uma linha reta traçada da posição inicial (partida) à posição final (chegada), con- forme mostrado na Figura 3.8 (HAMILL; KNUTZEN, 2008; ENOKA, 2000). Figura 3.8 – Representação gráfica de distância e deslocamento em uma pista de kart Chegada Partida D eslocam ento D istância Fonte: adaptado de Shutterstock.com/dmitriylo. Cinesiologia e Biomecânica – 54 – Se uma volta completa for realizada, a distância percorrida pelo piloto será igual a 500 m, enquanto o deslocamento será igual a 0, já que as posições inicial e final serão as mesmas. Por se tratar de uma grandeza vetorial, diferentemente da distância, o deslocamento inclui, além do comprimento da linha reta entre as duas posições, a direção na qual se dá o deslocamento. Essa direção pode ser definida utilizando-se os termos direita, esquerda, para cima, para baixo, positivo (para cima ou para a direita) e negativo (para baixo ou para a esquerda) (HAMILL; KNUTZEN, 2008; ENOKA, 2000). 3.2.2 Rapidez e velocidade A rapidez constitui uma quantidade escalar, definida como a dis- tância percorrida dividida pelo tempo gasto para percorrê-la, enquanto a velocidade, uma grandeza vetorial, constitui o deslocamento percorrido durante certo período de tempo; ambas incluem magnitude e direção do movimento (HAMILL; KNUTZEN, 2008; ENOKA, 2000). Imagine um atleta de triátlon que, durante a prova de natação, cruza um lago de 1,5 km em 45 minutos. Nesse caso, sabemos que seu deslocamento foi de 1,5 km, porém, não sabemos qual foi a distância (trajetória) percorrida por ele, portanto, não podemos calculá-la. Em relação à sua velocidade, sabemos que: . Sendo assim, a velocidade do atleta durante a prova de natação será: . 3.2.3 Aceleração A aceleração é uma quantidade vetorial que representa a mudança na velocidade em relação ao tempo, podendo ser expressa pela equação: , em que Δv = v2 – v1 e Δt = t2 – t1. Mesmo se a velocidade de um corpo ou objeto estiver sendo mantida constante, mudanças de direções representam uma mudança na aceleração (HAMILL; KNUTZEN, 2008; ENOKA, 2000). Como exemplo, vamos imaginar um skatista cuja veloci- dade em uma pista de skate passe de 5 m/s para 7 m/s em dois segundos. – 55 – Avaliação quantitativa do movimento humano A aceleração do skatista será: . Entretanto, a aceleração também pode constituir um valor nega- tivo; como no caso de uma bola de basquete levando 0,015 segun- dos para cair no chão após entrar pela cesta: por influência da força da gravidade, a bola adquire velocidade e passa de -0,5 m/s para -0,7 m/s e, por último, para -1,0 m/s. A aceleração da bola será: . No exemplo que acabamos de ver, a aceleração é negativa por estar ocorrendo em uma direção negativa (para baixo). Com base nisso, podemos concluir que quando a aceleração for negativa, a velocidade poderá estar tanto aumentando em uma direção negativa quanto diminuindo em uma direção positiva. Por outro lado, quando a aceleração for positiva, avelocidade poderá estar tanto aumentando em uma direção positiva quanto diminuindo em uma direção negativa. Por fim, se a aceleração for igual a 0 m/s², a velocidade será constante, ou seja, v1 e v2 possuirão valores iguais (HAMILL; KNUTZEN, 2008; ENOKA, 2000). 3.2.4 Ângulo Considerando-se que os movimentos humanos ocorrem por meio da rotação de um segmento corporal em volta de outro, é prática bas- tante comum a análise da relação entre dois ângulos durante um movi- mento. Com base nessa análise, um diagrama de ângulo × ângulo é criado, contendo um ângulo relativo (ângulo entre dois segmentos corporais adjacentes) em função do ângulo absoluto do segmento corporal, relativo a um ponto de referência externo (Figura 3.9). Esse tipo de diagrama pode ser válido na análise da efetividade de uma prótese em restabelecer a marcha na caminhada de um paciente com amputação de um dos membros inferiores, comparado a um indiví- duo não amputado durante uma corrida (HAMILL; KNUTZEN, 2008; ENOKA, 2000). Cinesiologia e Biomecânica – 56 – Figura 3.9 – Diagrama ângulo (joelho) × ângulo (coxa esquerda) de um corredor Fonte: Enoka (2000, p. 16). 3.3 Análise do movimento 3.3.1 Diagrama de corpo livre A avaliação do movimento humano envolve muitas variáveis que influenciam na execução do movimento. Uma maneira de simplificar a complexidade de uma análise específica é utilizar um diagrama de corpo livre; que constitui um desenho simplificado das forças externas que estão influenciando um corpo ou partes dele, indicadas por setas (vetores). Os diagramas de corpo livre demonstram somente as forças externas que agem sobre o sistema, mas não as forças interiores dele. Na Figura 3.10c, estão representadas forças externas agindo sobre um corredor, com as setas indicando os respectivos comprimento e direção de cada força: força de reação do solo (Fs), peso do atleta (Fp) e resistência do ar (Fa). Note que – 57 – Avaliação quantitativa do movimento humano não são demonstradas forças internas do sistema, como as forças muscu- lares sobre a articulação do joelho, por exemplo. Figura 3.10 – Diagrama de corpo livre de um corredor Fonte: Enoka (2000, p. 38). Caso a determinação da atividade muscular seja desejada, as forças inter- nas, musculares, devem ser incluídas em um diagrama de corpo livre que envolva o corte através da articulação; identificando a força responsável pelo contato entre os ossos (força de reação articular) e a força muscular resultante (força muscular líquida). Na Figura 3.11, estão representadas, além da força de reação do solo (Fs) e peso do atleta (Fp), a força de reação articular (Fa) e a força muscular resultante (Fm), sendo J a articulação do joelho. As duas componentes horizon- tais da força de reação do solo (Fs) Figura 3.11 – Diagrama de corpo livre incluindo atividade muscular Fonte: Enoka (2000, p. 38). Cinesiologia e Biomecânica – 58 – resultam na força de atrito (Fat); uma força bastante útil na locomoção, servindo como base para a progressão horizontal do centro de gravidade (CG) e correspondendo à aceleração do CG do corpo inteiro no plano hori- zontal (direções para frente, para trás e de um lado para o outro). Como vimos, a força de reação articular (Fa) refere-se a forças musculares, de ligamentos e de contato entre os ossos exercidas sobre a articulação, mas não representa a força interóssea absoluta. Geralmente, a Fa é estimada supondo-se que seja a força restante após determinação de todas as outras forças constantes no diagrama de corpo livre. Já a força muscular (Fm) é unidirecional, visto que o músculo é capaz apenas de exercer uma força de tração (puxar), mas não uma força de compressão (empurrar) direta – indi- retamente exercendo uma força compressiva interóssea, quando a força de tração é transmitida ao longo de um segmento. Quando incluída em um diagrama de corpo livre, a Fm deve estar especificada quanto ao grupo muscular em que está atuando (flexores ou extensores) e representada por um vetor com direção voltada para trás, atravessando a articulação. 3.3.2 Análise segmentar Método desenvolvido com o objetivo de localizar o CG durante os movimentos, envolvendo o cálculo estimado da massa e da localização do CG de cada segmento do corpo humano, seguido da determinação da loca- lização do CG do corpo todo. Com base em estudos desenvolvidos com cadáveres, foram determinadas equações de regressão para a estimativa do peso dos segmentos corporais e a respectiva localização de seus CGs. Tabela 3.1 – Equações de regressão para estimativa do peso dos segmentos corporais e respectivas localizações do centro de gravidade Segmento Peso (N) Localização CG (%) Cabeça 0,032 PC + 18,70 66,3 Tronco 0,532 PC – 6,93 52,2 Braço 0,022 PC + 4,76 50,7 Antebraço 0,013 PC + 2,41 41,7 Mão 0,005 PC + 0,75 51,5 Coxa 0,127 PC – 14,82 39,8 – 59 – Avaliação quantitativa do movimento humano Segmento Peso (N) Localização CG (%) Perna 0,044 PC – 1,75 41,3 Pé 0,009 PC + 2,48 40,0 Fonte: Enoka (2000, p. 42). Além das equações de regressão e localização do CG, os estudos com cadáveres também determinaram os valores dos momentos de inércia para os segmentos, que correspondem ao equivalente angular da inércia (massa) e referem-se à medida de resistência que um corpo ou objeto ofe- rece para mudar seu movimento em torno dos três principais eixos de rotação: transversal (de um lado para outro), anteroposterior (de frente para trás) e longitudinal (rotação). É possível observar que o momento de inércia diminui conforme a massa do segmento desloca-se para perto do eixo de rotação. Tabela 3.2 – Momentos de inércia dos segmentos corporais Segmento Transversal Anteroposterior Longitudinal Cabeça 0,0164 0,0171 0,0201 Tronco 1,0876 1,6194 0,3785 Braço 0,0133 0,0133 0,0022 Antebraço 0,0065 0,0067 0,0009 Mão 0,0008 0,0006 0,0002 Coxa 0,1157 0,1137 0,0224 Perna 0,0392 0,0391 0,0029 Pé 0,0030 0,0034 0,0007 Fonte: Enoka (2000, p. 43). Complementando os estudos com cadáveres, pesquisadores desen- volveram modelos matemáticos nos quais os segmentos do corpo humano são representados por elementos geométricos (cilindros, cones e esferas) e cuja principal vantagem é a exigência de apenas algumas medidas antro- pométricas simples, como comprimento e circunferência dos segmentos, para tornar o modelo individualizado e localizar precisamente o CG e o Cinesiologia e Biomecânica – 60 – momento de inércia para cada segmento. Um dos modelos mais utilizados é o desenvolvido por Hatze (1980), que divide o corpo em 17 segmentos e exige 242 medidas antropométricas para individualização. Nesse modelo, os sexos masculino e feminino são diferenciados, as crianças são passíveis de serem analisadas e é possível adequá-lo a mudanças morfológicas, tais como as causadas por obesidade e gravidez. Figura 3.12 – Modelo de Hatze Fonte: Enoka (2000, p. 44). 3.3.3 Força × massa × aceleração Quando analisamos a aceleração de um movimento, esta pode ser igual ou diferente de zero, estática ou dinâmica, respectivamente. A acele- ração estática constitui um caso especial da segunda lei de Newton, porque um módulo de aceleração igual a zero implica um corpo ou objeto parado ou deslocando-se com velocidade constante; estando o sistema em equilí- brio e o somatório das forças igual a zero, independentemente da direção. – 61 – Avaliação quantitativa do movimento humano Por outro lado, na aceleração dinâmica não há equilíbrio das forças. Uma vez que o movimento humano frequentemente envolve o movimento de mais de um segmento, a cinemática nos pontos anatômicos é determinada pelo acúmulo do movimento de todos os segmentos envolvidos. Tais inte- rações cinemáticas entre segmentos ocorrem pelas interações dinâmicas entre eles, isto é, existem forças interativas entre os segmentos do corpo durante o movimento humano. Sendo assim, o estudo da dinâmica inter- segmentar analisa as interações dependentes do movimento entre os seg- mentos (ENOKA,2000). 3.3.4 Impulso × momento A abordagem impulso-momento analisa os choques envolvidos em muitos movimentos, nos quais o corpo humano choca-se, direta ou indi- retamente, com o solo ou com um objeto. O momento linear (G) de um corpo ou objeto que se desloca é uma grandeza vetorial, com direção igual à direção da velocidade do corpo, e definida como a multiplicação da massa desse corpo por sua velocidade, com unidade de medida igual a kg ∙ m/s. Conforme a lei da aceleração de Newton ( ), o momento é alterado quando uma força age sobre o sistema; e sendo tal força aplicada durante intervalos de tempo e não instantaneamente, podemos considerar o efeito dessa força um impulso. Em resumo, a aplicação de um impulso resulta em alteração no momento de um sistema (ENOKA, 2000). Quando a análise envolve os torques que agem sobre um sistema, essa análise refere-se a um movimento angular. Portanto, o momento angular (H) de um corpo ou objeto é a multiplicação do momento de inér- cia pela velocidade angular, com unidade de medida igual a kg ∙ m²/s. Em ambos os casos (movimento linear e movimento angular), se não houver alteração no momento, o momento do sistema permanece constante, cons- tituindo o princípio da conservação do momento (ENOKA, 2000). 3.3.5 Trabalho × energia O trabalho (U) executado sobre um corpo ou objeto refere-se ao seu deslocamento a certa distância como resultado de uma força, constituindo uma grandeza escalar, obtida por meio da multiplicação do deslocamento Cinesiologia e Biomecânica – 62 – sofrido pela componente de força agindo na direção desse deslocamento. Graficamente, o trabalho pode ser representado como a área sob a curva de força × deslocamento. Como a execução de um trabalho exige gasto de energia, o trabalho (resposta) realizado por um corpo ou objeto é igual à alteração na energia (entrada) do sistema (ENOKA, 2000). Caso haja transferência de energia do sistema para o meio ambiente, o trabalho será realizado pelo sistema; caso haja transferência de energia no sentido oposto, o trabalho será realizado pelo meio ambiente sobre o sistema. Por exemplo: um indivíduo elevando uma barra com os flexores do cotovelo está encurtando os músculos (contração concêntrica) e exe- cutando um trabalho sobre a barra, ou seja, está executando um trabalho positivo. De modo contrário, um indivíduo abaixando uma barra com os flexores do cotovelo está alongando os músculos (contração excêntrica) e a barra está executando um trabalho sobre os músculos, ou seja, um trabalho negativo. Com esse exemplo, podemos perceber que a energia necessária para a realização de um trabalho positivo é muito maior que a necessária para a execução de uma quantidade igual de trabalho nega- tivo (ENOKA, 2000). Figura 3.13 – Trabalho positivo, negativo e nulo Em se tratando dos movimentos humanos, as formas significativas de energia incluem: energia potencial por causa de gravidade (Ep,g), energia cinética de translação linear (Ec,t), energia cinética de rotação (Ec,r), ener- gia potencial em razão de distensão (Ep,d), energia dissipada em calor (Eh) – 63 – Avaliação quantitativa do movimento humano e energia metabólica liberada (Em). Ainda, quando o trabalho é executado sobre um corpo ou objeto para contrabalancear o efeito de outra força, esse corpo ou objeto possui o que chamamos de energia potencial. Os movimentos humanos envolvem dois tipos de energia potencial: energia gravitacional (Ep,g), que ocorre em virtude da localização de um corpo ou objeto em campo gravitacional acima da linha de base; e energia elástica ou energia de distensão (Ep,d), que acontece por causa da distensão de um corpo, objeto ou tecido (músculos, por exemplo) para além de seu compri- mento de repouso (ENOKA, 2000). 3.3.6 Potência A quantidade de trabalho, por unidade de tempo, que um mús- culo pode produzir é denominada produção de potência, definida como a multiplicação da força pela velocidade; constitui a variável que limita a execução do movimento. A duração que uma atividade pode ter é inversamente proporcional às necessidades de potência dessa atividade, ou seja, potência constitui a taxa de utilização de energia (ENOKA, 2000). Tabela 3.3 – Principais unidades de medida utilizadas em biomecânica Medida Unidade Unidade internacional (SI) Massa Quilograma Kg Peso específico Peso por unidade de volume N/m³ Pressão Pascal Pa Força Newton N Torque Newton-metro Nm Distância Metro m Velocidade Metro por segundo m/s Aceleração Metro por segundo ao quadrado m/² Ângulo Grau º Cinesiologia e Biomecânica – 64 – Medida Unidade Unidade internacional (SI) Trabalho Joule J Energia Joule J Potência Joule por segundo J/s ou W (Watt) Fonte: elaborada pela autora. Síntese A análise quantitativa baseia-se na medida do desempenho; a prin- cipal vantagem desse tipo de análise é a obtenção de uma representação completa, objetiva e precisa do movimento. Todos os tipos de movimento podem ser explicados pelas leis desenvolvidas por Isaac Newton: lei da inércia, lei da aceleração e lei da ação e reação. Forças são grandezas vetoriais, portanto, apresentam uma magnitude (intensidade) e uma dire- ção, representadas graficamente por setas que correspondem ao compri- mento e à direção adequados. Torque ou momento força é o efeito rotató- rio criado por uma força excêntrica; é definido pelo produto da força pela distância perpendicular, da linha de ação da força até o eixo de rotação. A distância é uma grandeza escalar que se refere à medida da trajetória de um movimento; enquanto o deslocamento constitui uma linha reta traçada da posição inicial (partida) à posição final (chegada). A rapidez consti- tui uma quantidade escalar, definida como a distância percorrida dividida pelo tempo gasto para percorrê-la, enquanto a velocidade, uma grandeza vetorial, constitui o deslocamento percorrido durante um certo período de tempo; ambas incluem magnitude e direção do movimento. A aceleração é uma quantidade vetorial que representa a mudança na velocidade em rela- ção ao tempo e, por fim, potência ou produção de potência é a quantidade de trabalho, por unidade de tempo, que um músculo pode produzir. Atividades 1. Explique sucintamente as três leis do movimento desenvolvidas por Isaac Newton. – 65 – Avaliação quantitativa do movimento humano 2. Qual é a diferença entre distância e deslocamento? 3. Qual é a finalidade de um diagrama de corpo livre? 4. Coloque, em ordem crescente de dificuldade de serem medidas, as seguintes forças: força de reação articular, peso do segmento, força de reação do solo e força muscular. 4 Cinemática A cinemática é a divisão da Biomecânica que estuda a geo- metria, a forma ou o padrão de um movimento em relação ao tempo, sendo a cinemática linear voltada ao estudo desses aspec- tos na translação ou movimento linear, e a cinemática angular, à rotação ou movimento angular. O estudo da cinemática é útil mediante uma nova habilidade motora aprendida, quando ocorre uma modificação progressiva da cinemática do movimento, e mediante a reabilitação de uma articulação lesionada, quando se objetiva o retorno gradual da cinemática normal dessa articula- ção (HALL, 2000). Qualitativamente, a cinemática de um chute pode ser des- crita por meio das principais ações articulares: flexão do quadril, extensão do joelho e, possivelmente, flexão plantar do tornozelo. Mais detalhadamente, a análise qualitativa envolveria a sequên- cia precisa realizada pelo jogador e o momento mais adequado das movimentações dos segmentos corporais. Quantitativa- mente, a cinemática do chute seria correspondente à amplitude de movimento das articulações envolvidas e/ou o desempenho do atleta no chute; normalmente utilizando-se cinematografia ou videografia de alta velocidade (HALL, 2000). Cinesiologia e Biomecânica – 68 – 4.1 Movimento osteocinemático e artrocinemático O movimento osteocinemático é composto pelos movimentos de fle- xão, extensão, abdução,adução e rotação, vistos no capítulo 1. Podemos classificá-lo como ativo ou passivo, sendo o movimento osteocinemático ativo aquele no qual a amplitude ocorre quando os músculos são contra- ídos para deslocamento das articulações ao longo de sua amplitude. Por exemplo: ao movimentarmos nossas articulações durante o dia. Por outro lado, o movimento osteocinemático passivo é aquele no qual a articulação é passivamente movimentada ao longo de sua amplitude Por exemplo: quando um profissional de Educação Física ou Fisioterapeuta mobilizam uma articulação de um paciente ao longo de sua amplitude de movimento, objetivando a manutenção ou recuperação da amplitude de movimento (LIPPERT, 2018). Quando o objetivo da mobilização de uma articulação é determinar a resistência que um profissional de saúde sente aplicando uma discreta pressão ao término da amplitude passiva de movimento do paciente, chamamos de sensação final de uma articulação. A sensação final foi descrita pela primeira vez por James Cyriax e pode ser normal (quando há plena amplitude passiva de movimento em uma articulação e este movimento é limitado pela(s) estrutura(s) anatômica(s) esperada(s) para essa articulação) ou anormal (quando há presença de dor, defesa muscu- lar, edema ou anatomia anormal interrompendo a movimentação articu- lar) (LIPPERT, 2018). A sensação final normal pode, ainda, ser subdividida em macia (quando a massa muscular sofre compressão), firme (quando há uma tensão nos ligamentos, na cápsula e/ou nos músculos ao redor) e dura (abrupta e rigidamente limitada). Em alguns casos, a sensação macia pode ser chamada de aproximação de tecidos moles, quando, por exem- plo, a flexão do cotovelo é interrompida devido à aproximação do braço e do antebraço, especialmente em indivíduos extremamente obesos ou com músculos bem desenvolvidos (Figura 4.1). A sensação firme pode ser observada como uma parada brusca do movimento que, mediante uma pressão aumentada, acaba “cedendo um pouco”, como é o caso das – 69 – Cinemática rotações medial e lateral do ombro, extensão do quadril e dorsiflexão do tornozelo. Na sensação dura, observa-se um movimento articular passivo abrupta e rigidamente limitado, que não “cede” ainda que mediante uma pressão aumentada, como no caso de, ao final da amplitude de movi- mento, um osso entrar em contato com outro, o que denominamos sensa- ção final óssea (LIPPERT, 2018). Figura 4.1 – Limitação da flexão do cotovelo pela aproximação de tecidos moles (braço e antebraço), caracterizando uma sensação final macia (1) 1 2 3 olécrano Extensão Flexão ativa e passiva cápsula músc �ex. Fonte: Adaptado de Shutterstock.com/Boogie Man Se a sensação final normal ocorrer na articulação errada ou no ponto errado da amplitude de movimento, ela pode ser considerada uma sen- sação final anormal. Por exemplo: na flexão do cotovelo, vimos que a aproximação de tecidos moles é uma sensação final normal; por outro lado, uma sensação final capsular firme é anormal porque trata-se de uma sensação final normal para a rotação lateral do ombro (LIPPERT, 2018). Sensações finais anormais apresentam dor, defesa muscular, edema ou anatomia anormal, e são acompanhadas de interrupção do movimento articular; podendo ser descritas como infiltração, contra- tura muscular, sensação vazia e bloqueio elástico. A infiltração nor- malmente está presente em condições agudas relacionadas ao edema de Cinesiologia e Biomecânica – 70 – tecidos moles, como entorses de tornozelo ou sinovites. Na presença de uma lesão aguda, a resposta protetora observada é a contratura muscular, uma defesa muscular reflexa durante o movimento. Quando o movimento provoca uma dor significativa no paciente, impedindo que o profissional de saúde movimente a articulação além do ponto dolorido, temos um caso de sensação final vazia e, neste caso, não é possível saber se há limitação de movimento além do ponto doloroso ou que estrutura está ocasionando a limitação. Por fim, na presença de um movimento de rebote ao final da amplitude de movimento é considerado um bloqueio elástico, geralmente presente quando há um distúrbio interno de uma articulação, como uma ruptura de cartilagem (LIPPERT, 2018). 4.1.1 Movimento artrocinemático O movimento artrocinemático descreve o que acontece nas superfí- cies articulares de uma articulação durante o movimento osteocinemático, sendo também denominado movimento da superfície articular. Durante os movimentos ativo e passivo são descritos dois respectivos tipos de movi- mentos artrocinemáticos acessórios: movimentos componentes e jogo arti- cular; os quais não se encontram sob controle voluntário, mas são impres- cindíveis para que os movimentos funcionais normais ocorram. Como exemplo, temos a cabeça do úmero deslizando inferiormente para fazer com que o ombro flexione plenamente. Esse movimento componente não pode ser realizado de forma independente, necessitando acompanhar o movimento osteocinemático para a realização do movimento articular normal. Quando uma força externa cria um movimento passivo em uma articulação, o movimento artrocinemático realizado entre as superfícies articulares é denominado jogo articular. Os movimentos artrocinemáticos resultantes do movimento compo- nente ou do jogo articular podem ser classificados em rolamento, desliza- mento e rotação; sendo que a maioria dos movimentos articulares envolve a combinação desses três tipos de movimento. Temos um rolamento quando o movimento de uma superfície articular sobre outra gera novos pontos de contato em cada uma das superfícies, como no caso de uma bola rolando no chão (Figura 4.2). – 71 – Cinemática Figura 4.2 – Movimento de rolamento de uma bola sobre o chão, gerando novos pontos de contato em ambas as superfícies Fonte: Elaborado pelo autor. Havendo apenas um ponto de contato em uma das superfícies e novos pontos de contato sendo gerados na outra superfície, temos um desliza- mento, como a lâmina do patim de uma patinadora (um ponto) deslizando no gelo (diversos pontos), conforme demonstrado na Figura 4.3. Por último, a rotação se caracteriza pelo movimento giratório da superfície articular móvel sobre uma superfície fixa, não havendo novos pontos de contato, pois o mesmo ponto de contato em cada superfície permanece em contato durante todo o movimento (por exemplo: um pião girando perfeita e ver- ticalmente em uma mesa – Figura 4.4). No corpo humano, podemos utili- zar como exemplos de rotação o úmero girando na cavidade glenoidal da escápula durante as rotações medial e lateral do ombro (LIPPERT, 2018). Figura 4.3 – Movimento de deslizamento de um bloco (um ponto) sobre o chão, gerando muitos pontos novos de contato em apenas uma das superfícies (chão) Fonte: Elaborado pelo autor. Cinesiologia e Biomecânica – 72 – Figura 4.4 – Movimento de rotação, no qual é gerado um mesmo ponto de contato em cada superfície Fonte: Elaborado pelo autor com elementos de Shutterstock.com/ Normalmente, o deslizamento é acompanhado por rolamento durante o movimento articular normal; sendo que esses dois movimentos inte- ragem para manter as superfícies articulares alinhadas, utilizando todas as superfícies articulares disponíveis e produzindo plena amplitude de movimento em determinado ponto, sem que uma superfície “escape” dos limites da outra superfície antes da completa finalização do movimento articular. Um exemplo dessa interação entre deslizamento e rolamento é a articulação do joelho ao nos levantarmos de uma cadeira (Figura 4.5): os côndilos convexos do fêmur começam a rolar anteriormente sobre os côn- – 73 – Cinemática dilos côncavos da tíbia, os quais, por apresentarem muito menor super- fície articular e devido à grande amplitude possível de flexão e extensão do joelho, permitiriam que o fêmur rolasse para fora, não fosse o desliza- mento posteriormente e simultaneamente dos côndilos do fêmur sobre a tíbia (LIPPERT, 2018). Figura 4.5 – Movimento de deslizamentoacompanhado por rolamento na articulação do joelho Fêmur Fêmur Fêmur Tíbia Tíbia Deslizamento Rolamento + Vista lateral Rolamento apenas Côndilos do fêmur Fonte: Elaborado pelo autor. O formato de uma superfície articular determina como o movimento é realizado; ou seja, como diferenças no formato das extremidades ósseas exigem que as superfícies articulares se movam especificamente durante o movimento articular. Essa propriedade, denominada regra convexo-côn- cava, determina a relação entre a osteocinemática e a artrocinemática para determinado movimento; sendo descrita como uma superfície articular côncava que desliza sobre uma superfície convexa fixa, na mesma direção da extremidade distal do osso em movimento (Figura 4.6). Por outro lado, se a superfície articular deslizante for convexa, o deslizamento se dará sobre uma superfície côncava fixa na direção oposta à extremidade distal do osso em movimento (Figura 4.7). Cinesiologia e Biomecânica – 74 – Figura 4.6 – Regra convexo-côncava: superfície côncava deslizando na mesma direção (posteriormente) da extremidade distal do segmento ósseo em movimento Falange proximalOsso metacarpal Superfície côncava deslizando posteriormente Segmento ósseo movendo-se posteriormente através do plano axil (extensão) Fonte: Elaborado pelo autor. Figura 4.7 – Regra convexo-côncava: superfície convexa deslizando na direção oposta (para baixo) da extremidade distal do segmento ósseo em movimento (para cima) Segmento do corpo movendo-se para cima através do plano frontal (abdução) Superfície convexa deslizando para baixo Fonte: Elaborado pelo autor. – 75 – Cinemática A congruência articular descreve de que maneira se encaixam as superfícies de uma articulação, sendo a articulação congruente quando as superfícies apresentam contato máximo uma com a outra, firmemente com- primidas e difíceis de serem separadas. Em um extremo da amplitude de movimento, como o joelho totalmente estendido, um deslocamento manual da patela é possível de ser realizado; já na posição de joelho totalmente flexionado, esse deslocamento não é possível. Dizemos, então, que a posi- ção trancada da articulação do joelho é a flexão. A possibilidade de ocor- rência de uma lesão na posição não trancada (joelho totalmente estendido) devido à aplicação de uma força lateral é maior que a possibilidade de lesão na posição trancada (joelho totalmente ou semiflexionado). Sendo assim, a posição não trancada, também denominada posição de repouso, corres- ponde à máxima incongruência das superfícies articulares, na qual, partes da cápsula articular e dos ligamentos estão relaxadas, permitindo o rolamento, o deslizamento e a rotação necessários ao movimento articular normal. Nes- sas posições de repouso, podemos evidenciar certo jogo articular, isto é, um movimento passivo de uma superfície sobre a outra (LIPPERT, 2018). 4.1.2 Mobilização da articulação A técnica pela qual aplica-se uma força externa à articulação, propo- sitalmente objetivando a geração de um movimento oscilatório passivo ou estiramento sustentado entre as superfícies articulares, é denominada mobilização da articulação. Essa técnica pode ser utilizada na restauração da mobilidade articular ou para alívio de dores provenientes de estruturas articulares. A restauração da mobilidade também pode se dar pela técnica de manipulação, ou seja, mobilização da articulação em alta velocidade ao longo de baixa amplitude, calculada e minimamente além do ponto final do jogo articular (LIPPERT, 2018). Três tipos de forças são aplicados na realização de uma mobilização articular: tração, compressão e cisalhamento. Forças de tração resultam no afastamento articular (Figura 4.8), distanciando as faces articulares, como ao carregarmos uma mala pesada e provocarmos distração (afas- tamento) nas articulações do ombro, cotovelo e punho. Ao contrário das forças de tração, as forças de compressão resultam na aproximação da articulação (Figura 4.9) pela diminuição da distância entre as superfícies Cinesiologia e Biomecânica – 76 – articulares, como acontece quando realizamos flexões de braço no chão, aproximando as superfícies envolvidas nas articulações do ombro, coto- velo e punho. Já os deslizamentos, nos quais as superfícies articulares se movimentam paralelamente (Figura 4.10), são resultado das forças de cisalhamento (LIPPERT, 2018). Figura 4.8 – Força de tração (distração), afastando as superfícies articulares Fonte: Elaborado pelo autor. Figura 4.9 – Força de compressão, aproximando as superfícies articulares Fonte: Elaborado pelo autor. Figura 4.10 – Força de cisalhamento, resultando em movimentação paralela das superfícies articulares Fonte: Elaborado pelo autor. – 77 – Cinemática Outras duas forças – de inclinação e torção – constituem forças combinadas, sendo a inclinação gerada quando é aplicada uma força não vertical, resultando em compressão na superfície côncava, e distração na convexa (Figura 4.11), e torção quando são aplicadas forças rotatórias, resultando em deslocamento angular. Forças de tração, deslizamento, inclinação e torção são comumente utilizadas na restauração da mobili- dade articular. Na condição de forças de compressão, auxiliam na esta- bilização da articulação (LIPPERT, 2018; HAMILL; KNUTZEN, 2008). Figura 4.11 – Força de inclinação, resultando em tração (afastamento) de um lado e compressão (aproximação) de outro Força de compressão Força de tração Fonte: Elaborado pelo autor. 4.2 Cinemática linear do movimento humano Como vimos no capítulo 3, os indicadores cinemáticos do movimento linear constituem a distância e o deslocamento, a rapidez, a velocidade e a aceleração. Frequentemente, torna-se interessante mensurar a velocidade ou a aceleração instantânea (em um momento específico do movimento) ou a velocidade ou a rapidez média de todo o movimento. A velocidade média é calculada como o deslocamento final dividido pelo tempo total, já a aceleração média é calculada pela diferença entre as velocidades final e inicial dividida pelo tempo. A escolha do intervalo de tempo a ser levado em consideração interfere na análise do desempenho de um atleta. Por exemplo: alguns atletas de corrida conseguem manter ritmos de recorde mundial na primeira metade ou nos três quartos da prova, mas mostram- Cinesiologia e Biomecânica – 78 – -se lentos na quarta parte da prova, devido à fadiga. Quanto mais longo o trajeto, maior a quantidade de informações potencialmente perdidas ou ocultadas, caso seja analisado apenas o tempo final ou a velocidade média do atleta (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Vejamos agora a cinemática do deslocamento de um corpo ou objeto no ar, considerados projéteis, sujeitos somente às forças gravitacionais e à resistência do ar. Os deslocamentos podem ser horizontais (por exemplo: nos arremessos de peso ou dardo) ou verticais (por exemplo: nos saltadores de altura e com vara). Sendo assim, o deslocamento horizontal refere-se à distância percorrida pelo projétil, ao passo que o deslocamento vertical se refere à máxima altura alcançada por ele. O principal interferente no des- locamento vertical, mas não no horizontal, é a gravidade, responsável pela aceleração dos corpos em direção à superfície da Terra, constante e imutável independentemente do peso, tamanho ou formato do projétil. Já o principal interferente no deslocamento horizontal de um projétil é a resistência do ar, bastante variável (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Quadro 4.1 – Fatores interferentes no movimento de um projétil, ignorando-se a resistência do ar Variável Interferências Tempo de voo no ar Velocidade vertical inicial e altura relativa de projeção Deslocamento horizontal Velocidade horizontal e altura relativa de projeção Deslocamento vertical Velocidade vertical inicial e altura relativa de projeção Trajetória Velocidade inicial, ângulo de projeção e altura relativa de projeção Fonte: Hall (2000. p. 248). Os interferentesda trajetória do projétil, por sua vez, são o ângulo, a velocidade e a altura relativa da projeção, úteis na determinação da melhor maneira de projetar um corpo ou objeto, bem como na previsão da melhor maneira de apanhá-los ou rebatê-los. O ângulo de projeção, juntamente com a resistência do ar, determina a forma da trajetória do projétil. Na – 79 – Cinemática ausência de resistência do ar, temos três possíveis formas de trajetória (Figura 4.12), conforme o ângulo de projeção: perfeitamente vertical, caso o ângulo de projeção também seja perfeitamente vertical; parabó- lica, caso o ângulo de projeção seja oblíquo (entre 0º e 90º) e horizontal, caso o ângulo de projeção seja perfeitamente horizontal (ângulo nulo, 0º). O ângulo de projeção é especialmente importante na prática do basquete, uma vez que ângulos de entrada mais íngremes para o interior da cesta resultam em margens de erro bem maiores que ângulos de entrada mais rasos (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Figura 4.12 – Possíveis trajetórias de um projétil conforme o ângulo de projeção Trajetória horizontal Trajetória oblíqua Trajetória vertical Fonte: Elaborado pelo autor com elementos de Shutterstock.com/ednal/Bokita Quando o ângulo de projeção e demais fatores interferentes são constantes, as mudanças na velocidade de projeção influenciam o com- primento ou o tamanho da trajetória. Por exemplo: quando uma bola é arremessada verticalmente para cima, sua velocidade inicial determinará Cinesiologia e Biomecânica – 80 – a altura do ápice de sua trajetória. Por outro lado, quando uma bola é arremessada com um ângulo oblíquo, a velocidade de projeção determi- nará tanto a altura, quanto o comprimento horizontal da trajetória. Nesse contexto, a incorporação de saltos verticais em uma dança, por exemplo, deve ser muito bem planejada: caso o ritmo da música exija que os saltos sejam executados em um terço de segundo, a altura dos saltos será restrita a aproximadamente 12 cm (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Outro fator interferente importante na trajetória é a altura de proje- ção relativa, correspondente à diferença na altura de projeção do projétil (altura inicial) e a altura na qual ele aterrissa ou para (altura final). Por exemplo: uma bola lançada de uma altura de 2,0 metros acima do solo terá uma altura de projeção relativa igual a 2,0 metros, visto que a altura de projeção é 2,0 metros maior que a altura do chão onde aterrissou (Figura 4.13) (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Figura 4.13 – Altura relativa de projeção para três alturas iniciais de projeção Altura relativa de projeção = 1,5m Altura relativa de projeção = 2m Altura relativa de projeção = 0m 3m 1,5m 2m Fonte: Elaborado pelo autor com elementos de Shutterstock.com/ednal/Aleksandr Sulga – 81 – Cinemática Condições ótimas de projeção envolvem a maximização da veloci- dade de projeção e da altura de liberação, já que uma maior altura de projeção relativa possibilita voos mais prolongados e, consequentemente, maior deslocamento horizontal. Nesse sentido, o fator mais variante é o ângulo ótimo de projeção: para uma altura de projeção relativa igual a zero, o ângulo ótimo de projeção, para a produção de um deslocamento horizontal máximo é igual a 45º. O ângulo ótimo de projeção é inversa- mente proporcional à altura de projeção relativa, isto é, à medida que a altura de projeção relativa aumenta, o ângulo ótimo de projeção diminui e vice-versa. Entretanto, quando pensamos no corpo humano como um projétil, como no caso de uma prova de salto em distância, nem sempre é simples aplicar o ângulo ótimo de projeção (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Considerando-se que, na execução desse tipo de salto, a altura de impulsão e de aterrissagem são iguais, o ângulo ótimo de projeção (impul- são) teoricamente é 45º, porém, isso implica em uma redução de cerca de 50% na velocidade horizontal que o saltador pode alcançar em condições habituais. Os ângulos de impulsão de atletas profissionais de salto em dis- tância variam, aproximadamente, de 18º a 27º, portanto os atletas obterão sucesso em seus saltos se conseguirem maximizar a velocidade horizontal ao ser iniciada a impulsão (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). A velocidade inicial de um projétil engloba a rapidez inicial (mag- nitude) e o ângulo de projeção (direção), sendo que, quando decom- posta, o componente horizontal apresenta rapidez ou magnitude em dire- ção horizontal, e o componente vertical apresenta rapidez ou magnitude em direção vertical. As magnitudes dos componentes são quantificadas supondo-se que, se somadas por composição vetorial, o vetor da velo- cidade resultante será igual ao vetor original da velocidade inicial, em magnitude e direção. Ainda, admitindo-se que o componente horizon- tal da velocidade do projétil é constante em toda a trajetória e que o componente vertical modifica-se constantemente devido à influência da gravidade: uma vez que a velocidade horizontal do projétil é constante, sua aceleração horizontal será igual à constante de 0, portanto sua acele- ração vertical será igual à constante -9,81 m/s² (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Cinesiologia e Biomecânica – 82 – 4.3 Cinemática angular do movimento humano A maioria dos movimentos humanos voluntários envolve a rotação de um ou mais segmentos corporais ao redor das junções nas quais se arti- culam. Um analista de Biomecânica qualificado consegue extrair muitas informações sobre os níveis relativos de desenvolvimento e de perícia do executor de um movimento, por meio de cuidadosa observação da cine- mática angular. A análise cinemática quantitativa pode ser realizada por meio da projeção de imagens filmadas do corpo e filmes do movimento humano sobre uma folha, marcando-se os centros articulares por pontos, os quais, conectados por linhas, representam os eixos longitudinais dos segmentos corporais (Figura 4.14). Desta forma, os ângulos presentes nas articulações, bem como as orientações angulares dos segmentos, podem ser avaliados com o auxílio de softwares que constroem representações esquemáticas do corpo (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Figura 4.14 – Representação esquemática do corpo humano, construída com base na imagem filmada Fonte: Elaborado pelo autor. – 83 – Cinemática 4.3.1 Ângulo relativo versus ângulo absoluto O ângulo relativo de uma articulação compreende o ângulo de um segmento corporal em relação a outro segmento que se articula na arti- culação, sendo a amplitude de movimento articular igual ao ângulo arti- cular relativo. O ângulo relativo no joelho, por exemplo, corresponde ao ângulo formado entre o eixo longitudinal da coxa e o eixo longitudinal da perna. Para a mensuração dos ângulos relativos, levando-se em conta a posição anatômica com todos os ângulos articulares sendo iguais a 0º, mede-se a direção do movimento articular. Por exemplo: considerando-se o braço estendido e elevado a 30º no plano sagital, ele estará em 30º de flexão ao nível do ombro. Por outro lado, o ângulo absoluto corresponde ao ângulo de inclinação de um segmento corporal, mensurado em relação a uma linha de referência absoluta, horizontal ou vertical (Figura 4.15) (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Figura 4.15 – Ângulos absolutos de segmentos corporais, em relação à linha de referência horizontal Fonte: Elaborado pelo autor. Cinesiologia e Biomecânica – 84 – Na mensuração direta dos ângulos relativos, profissionais de saúde costumam utilizar goniômetros, um tipo de transferidor com dois braços longos articulados, no qual um dos braços é fixado de maneira a ser esten- dido a partir do transferidor em posição 0º, e o outro braço, estendido a partir do centro do transferidor, livremente para rodar (Figura 4.16). O centro do transferidor é então alinhado ao centro da articula- ção e os dois braços alinhados sobre os eixos longitudinais dos segmentos envolvidos na articulação. A leitura do ângulo é realizada na inter- seçãodo braço para rodar livremente com a régua do transferidor; sendo a exatidão da leitura dependente da pre- cisão do posicionamento do goniômetro. Recomenda-se, anteriormente ao alinhamento do goniômetro, a marcação de pontos na pele para identificação da localização do centro de rotação e dos eixos longitudinais (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Além do goniômetro, o eletrogoniômetro (elgon) também pode ser utilizado para quantificar os ângulos corporais, sendo esse instrumento um goniômetro com um potenciômetro elétrico no vértice, que capta as altera- ções na corrente elétrica emitida pelo elgon, resultantes das proporcionais alterações no ângulo relativo. Ainda, instrumentos denominados inclinôme- tros identificam, com base gravitacional, o ângulo absoluto de orientação de um segmento, porém com validade e fidedignidade controversas, uma vez que o posicionamento preciso dos inclinômetros é crítico para a exatidão das leituras obtidas (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). 4.3.2 Indicadores cinemáticos do movimento angular 4.3.2.1 Distância e deslocamento angulares Distância angular é a medida da soma de todas as alterações angulares sofridas por um corpo ou objeto, como um pêndulo oscilando para frente Figura 4.16 – Goniômetro para mensuração de ângulos articulares Fonte: Shutterstock.com/ESB Professional – 85 – Cinemática e para trás a partir de um ponto de apoio: ele está rodando ao redor de um eixo que passa através de seu ponto de apoio, perpendicular ao plano de movimento. Se oscilar através 60º para frente, o pêndulo terá balançado uma distância angular de 60º, em seguida, balançando para trás mais 60º a partir de sua posição original, terá balançado uma distância angular total de 120º. No corpo humano, se o ângulo na articulação do cotovelo se mover de 90º para 160º durante a realização de uma flexão para o exercí- cio de rosca do antebraço, terá percorrido uma distância angular de 160º – 90º = 70º. Em seguida, retornando-se o cotovelo na posição original de 90º durante a realização de uma extensão, ele terá percorrido uma distân- cia de mais 70º, resultando em uma distância angular total de 140º. Ainda, considerando-se a realização de 10 exercícios de rosca do antebraço, a distância angular transcrita no cotovelo será de 1400º (HAMILL; KNUT- ZEN, 2008; HALL, 2000). O deslocamento angular, assim como o deslocamento linear, corres- ponde à diferença nas posições inicial e final de um corpo ou objeto em movimento. Por exemplo: a fase de sustentação inicial de uma passada na corrida que provoca a alteração do ângulo no joelho da perna de apoio de 5º para 12º resultará em um deslocamento angular de 12º (final) subtraído 5º (inicial) = 7º. Por outro lado, retornando-se à articulação na posição inicial de 5º, pela extensão do joelho, o deslocamento angular será igual a zero (posição final igual à inicial) (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Figura 4.17 – Distância angular (soma das alterações angulares – A) e deslocamento angular (ângulo entre as posições inicial e final - B) de um pêndulo A Deslocamento angular Distânca angular B Fonte: Elaborado pelo autor. Cinesiologia e Biomecânica – 86 – Igualmente ao deslocamento linear, o deslocamento angular é uma grandeza descrita pela magnitude e pela direção, desta forma, uma vez que a rotação é observada de uma perspectiva lateral, a direção do deslo- camento angular pode ser determinada como horária (negativa) ou anti- -horária (positiva). Tratando-se do corpo humano, sugere-se a descrição utilizando-se uma terminologia articular: flexão, abdução etc. A unidade de medida grau é a mais utilizada para a determinação da distância e do deslocamento angulares, mas comumente utiliza-se também o radiano, definido como o tamanho do ângulo subtendido no centro de um círculo por um arco de comprimento igual ao raio do círculo (Figura 4.18) e equi- valente a 57,3º (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Figura 4.18 – Medida de 1 radiano Raio Raio 1 radiano (57.3º) Raio Fonte: Elaborado pelo autor. Ainda é possível a utilização da revolução, uma unidade de medida mais ocasional, que transcreve um arco igual a um círculo, aplicada, por exemplo, nos saltos com mergulho e em algumas modalidades de ginás- tica. A figura 4.19 demonstra a relação entre essas três unidades de medida (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). – 87 – Cinemática Figura 4.19 – Correspondência entre grau, radiano e revolução 90 grau ∏/2 radianos ¼ de revolução 180 grau ∏ radianos ½ revolução 270 grau 3∏/2 radianos ¾ de revolução 360 grau 2∏ radianos 1 revolução Fonte: Elaborado pelo autor. 4.3.2.2 Rapidez e velocidade angulares A rapidez angular é descrita como a distância angular percorrida dividida pelo intervalo de tempo em que durou o movimento, obtida pela fórmula: ou . Já a velocidade angular é descrita como a alteração na posição angular ou o deslocamento angular realizado durante determinado período de tempo, obtida pela fórmula: ou . Ainda, visto que a velocidade angular é baseada no deslocamento angular, a direção (horária/negativa ou anti-horária/positiva) deve ser incluída, referente ao momento em que ocorreu o deslocamento angular no qual se baseia. As unidades de medida correspondentes são graus por segundo (º/s), radianos por segundo (rad/s), revoluções por segundo (rev/s) e revoluções por minuto (rpm) (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). 4.3.2.3 Aceleração angular Consiste no ritmo de mudança na velocidade angular ou a mudança na velocidade angular ocorrida durante certo tempo, obtida pela fórmula: Aceleração Mudança velocidade Tempo = . ou . Assim como a Cinesiologia e Biomecânica – 88 – aceleração linear, a aceleração angular deve ser descrita como positiva, negativa ou nula (igual a zero), sendo que, quando nula, a velocidade angu- lar é constante. A aceleração angular positiva corresponde a uma velocidade angular cada vez maior na direção positiva ou uma velocidade angular cada vez menor na direção negativa. Da mesma forma, uma aceleração angu- lar negativa corresponde a uma velocidade angular decrescente na direção positiva ou uma velocidade angular crescente na direção negativa. As uni- dades de medida definidas para essa grandeza são graus por segundo ao quadrado (º/s²), radianos por segundo ao quadrado (rad/s²) e revoluções por segundo ao quadrado (rev/s²) (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). A representação das quantidades angulares por setas curvas não é muito prática, fazendo com que essas quanti- dades sejam represen- tadas por vetores retos, por meio da utilização da regra da mão direita: quando os dedos da mão direita apontam para a direção de um movi- mento angular, o vetor utilizado é perpendicu- lar ao plano de rotação na direção apontada pelo polegar estendido (Figura 4.20). A partir de então, a magnitude da quantidade pode ser definida pela proporção com o comprimento do vetor. Por fim, assim como para movimen- tos lineares, a rapidez, a velocidade e a acelera- Figura 4.20 – Representação da regra da mão direita para orientação do vetor de movimento angular Fonte: Elaborado pelo autor com elementos de Shutterstock.com/ katarinka/ Aleksandr Sulga/ kotss – 89 – Cinemática ção angulares podem ser instantâneas ou médias, conforme a duração do período definido. Particularmente, a velocidade angular instantânea é mais interessante que a velocidade angular média. Por exemplo: a velocidade instantânea de um bastão de beisebol no momento do contato com a bola é mais interessante que a velocidade média do balanceio, pois a instantânea é diretamente responsável pela velocidade resultante da bola (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Síntese A cinemática é a divisão da Biomecânica que estuda a geometria, a forma ou o padrão de um movimento em relação ao tempo, sendo a cine- mática linear voltada ao estudo desses aspectos na translação ou movimento linear, e a cinemática angular, à rotação ou movimento angular. Omovimento osteocinemático é composto pelos movimentos de flexão, extensão, abdução, adução e rotação e podemos classificá-lo como ativo ou passivo. O movi- mento artrocinemático descreve o que acontece nas superfícies articulares de uma articulação durante o movimento osteocinemático. Durante os movi- mentos ativo e passivo são descritos dois respectivos tipos de movimentos artrocinemáticos acessórios: movimentos componentes e jogo articular. Os movimentos artrocinemáticos resultantes do movimento componente ou do jogo articular podem ser classificados em rolamento, deslizamento e rotação. A técnica pela qual aplica-se uma força externa à articulação, propositalmente objetivando a geração de um movimento oscilatório passivo ou estiramento sustentado entre as superfícies articulares, é denominada mobilização da arti- culação, sendo que três tipos de forças são aplicados na realização de uma mobilização articular: tração, compressão e cisalhamento. A análise cinemá- tica quantitativa pode ser realizada por meio da projeção de imagens filmadas do corpo e filmes do movimento humano sobre uma folha, marcando-se os centros articulares por pontos, os quais, conectados por linhas, representam os eixos longitudinais dos segmentos corporais. Atividades 1. A flexão e a extensão do ombro são consideradas como movimen- tos osteocinemáticos ou artrocinemáticos? E a distração do ombro? Cinesiologia e Biomecânica – 90 – 2. Uma moeda verticalmente segurada pela borda, lentamente girando até o outro lado da mesa, realiza que tipo de movimento artrocinemático? E essa mesma moeda, totalmente sobre a mesa, deslocando-se através desta após um “peteleco”? 3. Qual é a posição trancada da articulação temporomandibular (ATM) – quando os dentes estão totalmente cerrados ou quando a boca está ligeiramente aberta? 4. Considere um pêndulo balançando, primeiramente oscilando através de um arco de 45º. Em seguida, ele balança para trás mais 50º a partir de sua posição original. Qual é a distância angular total do pêndulo? Qual é o seu deslocamento angular, considerando-se seu retorno à posição inicial? 5 Cinética 5.1 Cinética linear do movimento humano A cinética constitui o ramo da biomecânica que estuda as causas dos movimentos, tratando de forças que agem sobre um sistema. Vimos, no capítulo 3, que todos os tipos de movimento podem ser explicados por meio das três leis do físico e matemá- tico Isaac Newton: a) a lei da inércia descreve a tendência de um corpo permanecer em seu estado atual (repouso ou movimento), sendo necessária a aplicação de uma força extra para superá-la e fazer com que o corpo se movimente, mude de direção ou pare; b) a lei da aceleração se refere a qualquer variação na veloci- dade de um corpo proporcional à força a ele aplicada, sendo a mudança de direção também dependente da força aplicada e a aceleração inversamente proporcional à massa do corpo e c) a lei da ação e reação, que define que para cada ação existe uma reação correspondente, de igual intensidade e sentido contrário. Cinesiologia e Biomecânica – 92 – Pensando na terceira lei de Newton, um cavalo que puxa uma carroça e exerce, sobre ela, uma força que a faz se mover para a frente (ação), recebe de volta uma força da carroça, de igual magnitude e direção oposta (reação). Nessas condições, a soma vetorial das forças de ação e de reação é zero. Então, de que maneira o cavalo consegue gerar um movimento para a frente? Por meio de outra força presente sobre a carroça: o atrito – uma força que age sobre a área de contato entre duas superfícies, na dire- ção oposta à força do movimento atual ou iminente, medida em unidades de força (N). Vejamos outro exemplo: Figura 5.1 – Magnitude necessária para que uma força supere a força de atrito Nehuma força horizontal aplicada Sem atrito Sem movimento Pequena força aplicada Pequena força de atrito Fa = Fe Sem movimento Maior força aplicada Atrito estático máximo Fa = Fm Sem movimento, porém o movimento é iminente p R p R Fe Fa p R Fm Fa Maior força aplicada Fa > Fc Está havendo movimento p R Fc Fa Fonte: Elaborado pelo autor. – 93 – Cinética Na primeira situação, as únicas forças presentes são o peso da caixa (ação) e a força exercida de volta pela mesa (reação), o que faz com que a caixa permaneça imóvel. Na segunda situação, podemos observar uma força horizontal (Fa) que atua sobre a caixa; porém ainda é pequena para movê-la, visto que sua magnitude é igual à pequena força de atrito (Fe) atuando, em direção oposta, na área de contato entre a caixa e a mesa. Na terceira situação, a magnitude da força Fa foi aumentada; mas ainda não o suficiente para mover a caixa. Entretanto, a força de atrito Fe alcançou sua magnitude máxima, recebendo a denominação de atrito estático máximo (Fm). Aumentando-se ainda mais a força Fa, o atrito máximo Fm pode ser superado e a caixa, movida, como demonstrado na quarta situação. Sobre a caixa em movimento atua outro tipo de atrito oponente, diferentemente do atrito estático, por apresentar uma magnitude constante, menor que a magnitude do atrito Fm e independente da quantidade de força aplicada ou da velocidade do atrito Fm: o atrito cinético (Fc). A magnitude do atrito estático máximo e do atrito cinético é deter- minada por dois fatores: a) coeficiente de atrito, designado pela letra mu (µ) e b) força de reação normal (R), perpendicular; representada pela fórmula: . O coeficiente de atrito indica a facilidade de desli- zamento de um corpo/objeto ou a quantidade de interação mecânica ou molecular entre duas superfícies em contato, sendo influenciado pela irregularidade e pela dureza relativas dessas superfícies e pelo tipo de interação molecular entre elas. Por exemplo, entre dois blocos envoltos por uma lixa áspera há maior coeficiente de atrito que entre um patim e uma pista de gelo lisa. Ainda, o coeficiente de atrito difere entre os mate- riais (o coeficiente de atrito entre o patim e a pista de gelo não é mesmo para a interação do patim com o concreto ou a madeira) e seu valor difere em relação ao estado atual do corpo ou objeto: um valor de coeficiente de atrito estático (µe), presente em corpos imóveis, e um valor de coeficiente de atrito cinético (µc), presente em corpos em movimento (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). A força de reação normal (R) constitui a soma vetorial de todas as for- ças ou componentes de força que agem perpendicularmente às superfícies de contato. Sobre a caixa em cima da mesa, a única força vertical agindo é o peso da caixa e, portanto, R será igual ao peso em magnitude. Em um Cinesiologia e Biomecânica – 94 – trator dirigido por um motorista pesando 100 Kg, a força de reação normal R será igual ao peso do trator somado ao peso do motorista. Intencional- mente, podemos alterar a magnitude de R ao aumentar ou reduzir a quan- tidade de atrito presente; a qual também pode ser modificada alterando-se o coeficiente de atrito entre as superfícies (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Entretanto, ao contrário do que você possa estar imaginando, uma maior superfície de atrito não gera mais atrito. Isso mesmo! Os únicos interferentes do atrito são o coeficiente de atrito (µ) e a força de reação normal (R). Por outro lado, no atrito de rolamento, além de µ e R, o raio da curvatura do corpo ou objeto que rola influencia na magnitude do atrito. Em bicicletas, por exemplo, o atrito de rolamento é inver- samente proporcional ao diâmetro da roda: quanto maior a largura do pneu, menor o atrito de rolamento e vice-versa. A magnitude do atrito de rolamento, entre um objeto que rola e uma superfície plana, é cem a mil vezes menor que entre superfícies de deslizamento. Quando uma camada de líquido se interpõe entre duas superfícies de contato, a quantidade de atrito presente tanto em situações de deslizamento quanto de rolamento é drasticamente reduzida. É o que acontece, por exemplo, com carros que “rodam” na pista ao passarempor uma mancha de óleo ou com as articulações diartrodiais do corpo humano, nas quais a presença de líquido sinovial reduz o atrito entre as superfícies articulares, o que con- sequentemente reduz o seu desgaste mecânico (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). 5.1.1 Impacto O impacto constitui a colisão de dois corpos ou objetos, em que ambos exercem forças relativamente grandes um sobre o outro, durante um período extremamente pequeno de tempo. O comportamento dos cor- pos envolvidos após o impacto depende do momento coletivo e da natu- reza do impacto. Assim, um impacto perfeitamente elástico é aquele no qual as velocidades relativas dos dois corpos após o impacto são iguais às velocidades relativas antes do impacto; como, por exemplo, o impacto de uma bola de futebol americano colidindo com o chão, no qual a velocidade da bola diminui pouco durante o impacto. Por outro lado, um impacto per- – 95 – Cinética feitamente plástico é aquele no qual ao menos um dos corpos se deforma e não recupera sua forma original, não havendo separação entre os corpos; como, por exemplo, o impacto de uma massinha de modelar colidindo com uma superfície dura (HALL, 2000). O coeficiente de restituição é um número adimensional, entre 0 e 1, que define a elasticidade relativa de um impacto; quanto mais próximo de 1, mais elástico é o impacto e, por consequência, quanto mais pró- ximo de 0, mais plástico. Newton também foi o responsável por descrever o fator de proporcionalidade entre as velocidades relativas de dois cor- pos antes e após um impacto, determinado pelo coeficiente de restitui- ção: � � � � e v v u u 1 2 1 2 , em que e é o coeficiente de restituição, v1 e v2 são as velocidades relativas dos corpos imediatamente após o impacto, e u1 e u2 são as velocidades relativas imediatamente antes do impacto. Figura 5.2 – Diferença nas velocidades relativas de duas bolas, antes e após um impacto Velocidades das bolas antes do impacto Velocidades das bolas após o impacto u2u1 v2 v1 - v2 = -e (u1 - u2) v1 Fonte: Elaborado pelo autor. A lei do impacto de Newton pode ser simplificada quando a situação envolve um corpo em movimento e outro estacionado, uma vez que a velo- Cinesiologia e Biomecânica – 96 – cidade do corpo estacionário permanece zero. Nesse caso, o coeficiente de restituição é descrito por meio da fórmula: , em que hb é a altura alcançada pela bola em seu rebote e hd é a altura da qual a bola caiu. Ainda, o aumento do coeficiente de restituição pode ser influenciado dire- tamente pela velocidade do impacto e pela temperatura (HALL, 2000). 5.2 Cinética angular do movimento humano Ao considerar a segunda lei de Newton, que afirma que quanto maior é a massa de um corpo, maior é sua resistência à aceleração linear, pode- mos concluir que massa é a característica inercial dos corpos no movimento linear. Em relação à resistência à aceleração angular, o mesmo conceito é válido: quanto maior a massa, maior a resistência à aceleração angular. Entretanto, outro fator é responsável pela facilidade ou dificuldade relativa de se iniciar ou interromper um movimento angular: a distribuição da massa pelo eixo de rotação. Quanto mais próxima a massa do eixo de rotação, mais fácil se torna brandir o objeto; e quanto mais longe do eixo de rotação, mais difícil se torna iniciar ou interromper um movimento angular. Dessa forma, podemos concluir que ambas massa e distribuição da massa com relação ao eixo de rotação são características inerciais dos corpos no movimento angu- lar; sendo descritas como momento de inércia, representado pela fórmula: , na qual m é a soma dos momentos de inércia de todas as partículas de massa contidas no objeto e r é o seu raio de rotação. Figura 5.3 – Momento de inércia Eixo m d d d d m m m Fonte: Elaborado pelo autor. – 97 – Cinética Para a determinação do momento de inércia dos segmentos corporais e do corpo como um todo em diferentes posições são utilizados procedi- mentos experimentais ou modelos matemáticos para obtenção de valores aproximados, visto que o corpo humano é formado por segmentos de for- mas irregulares e distribuições homogêneas da massa. Os valores aproxi- mados foram definidos por meio de mensurações médias realizadas em cadáveres, obtenção da aceleração de um membro oscilante, emprego de métodos fotogramétricos e aplicação de modelagem matemática. Assim, o momento de inércia para um corpo de massa conhecida pode ser cal- culado por meio da fórmula: , em que m é a massa corporal total e k é o raio de giro (distância do eixo de rotação até um ponto em que, teoricamente, a massa pode ser concentrada sem alterar as características inerciais do corpo em rotação – sendo esse ponto diferente do centro de gravidade do segmento). O momento de inércia de um segmento que roda ao redor de seu próprio eixo lon- gitudinal difere bastante do seu momento de inér- cia quando em flexão, extensão, abdução ou adu- ção, pois a dis- tribuição de sua massa e, conse- quentemente, seu momento de inér- cia, diferem muito em relação ao eixo de rotação (Figura 5.4). Quando o corpo inteiro roda livremente, sem Pronação/supinação Flexão/extensão Eixo de rotação Eixo de rotação k k Figura 5.4 – Diferença no raio de giro (k) para diferentes tipos de movimento Fonte: Elaborado pelo autor. Cinesiologia e Biomecânica – 98 – apoio, seu deslocamento se dá ao redor dos três eixos principais: trans- versal (de um lado para outro), anteroposterior (de frente para trás) e longitudinal (rotação), todos eles passando pelo centro de gravidade do corpo; e o momento de inércia relacionado a um dos eixos é denomi- nado momento de inércia principal. A Figura 5.5 mostra as quantidades estimadas dos principais momentos de inércia para o corpo humano, em diversas posições. Figura 5.5 – Estimativas quantitativas dos principais momentos de inércia corporais (1) Frontal (2) 12,0 - 15,0 (1) Transversal (2) 10,5 - 13,0 (1) Transversal (2) 4,0 - 5,0 (1) Longitudinal (2) 1,0 - 1,2 (1) Longitudinal (2) 2,0 - 2,5 Fonte: Shutterstock.com/ Babkina Svetlana O avançar da idade acarreta mudanças nas proporções das massas, dos comprimentos dos segmentos corporais e dos raios de giro, o que interfere em todos os momentos de inércia dos segmentos, os quais, por sua vez, interferem na resistência à rotação angular e na qualidade do desempenho em alguns esportes, como a ginástica. É por esse motivo que, frequentemente, vemos ginastas adolescentes de nível mundial perdendo a popularidade antes dos 20 anos, devido à diminuição em seus desempe- nhos como resultado de proporções corporais alteradas com o crescimento (HALL, 2000). Assim como temos o momento linear (G, visto no capítulo 3), que corresponde ao produto da massa pela velocidade linear, temos o momento angular (H), que corresponde ao produto do momento de inércia pela velocidade angular. Os fatores que interferem na magni- tude do momento angular são a massa do corpo (m), a distribuição dessa massa em relação ao eixo de rotação (k) e a velocidade angular do corpo (ω), sem a qual não há momento angular. O momento angular – 99 – Cinética aumenta proporcionalmente ao aumento da massa ou da velocidade angular; e sendo o momento angular proporcional ao quadrado do raio de giro, a distribuição de massa em relação ao eixo de rotação é o maior interferente de H (kg∙m²/s). Ainda, da mesma maneira que para o momento de inércia, o momento angular do corpo humano corres- ponde à soma dos momentos angulares dos segmentos corporais indi- viduais (HALL, 2000). O momento angular será conservado sempre que a gravidade for a única força externa em atuação, ou seja, o momento angular de um sis- tema se mantém constante na ausência de torques externos. Porém, é pos- sível a transferência, pelo menos em parte, da velocidade angular de um eixo principal de orientação para outro. Na presença de torques externos, a quantidade de momento angular é previsivelmente modificada,sendo o momento angular influenciado tanto pela magnitude e direção dos torques externos quanto pelo período durante o qual cada torque atua. Havendo um impulso angular sobre o sistema, o resultado será uma mudança no momento angular total desse sistema. Dessa forma, o momento angular necessário para rotações do corpo humano como um todo, em manobras no ar, provém principalmente do impulso angular criado pela força de reação da superfície de apoio durante a impulsão (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Por fim, os corpos em movimento de rotação ao redor de um eixo fixo estão sujeitos, também, a uma força linear: a força centrípeta (Fc), impede que o corpo em rotação saia de sua trajetória circular enquanto a rotação ocorre ao redor de um eixo fixo, sendo a direção de uma força cen- trípeta sempre voltada para o centro de rotação, conhecida como força que procura o centro – produzindo o componente radial da aceleração de um corpo que percorre uma trajetória curvilínea. A magnitude de uma força centrípeta em termos de velocidade linear tangencial do corpo em rota- ção é descrita pela fórmula: . Podemos observar, por meio da fórmula, que a velocidade de rotação é o maior interferente na magnitude da força centrípeta, visto que Fc é proporcional ao quadrado da velocidade angular (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Cinesiologia e Biomecânica – 100 – 5.3 Mecânica do equilíbrio Vimos em nossos estudos que torque ou momento força é o efeito rotatório, em um corpo ou objeto, gerado por uma força a ele aplicada; e que ambos magnitude de uma força e comprimento de seu braço de momento influenciam, igualmente, na quantidade de torque gerado. As magnitudes de dois ou mais torques agindo sobre um determinado eixo de rotação podem ser somadas por meio das regras da composição vetorial. No corpo humano, quando uma tensão é gerada por um músculo que cruza uma articulação, esse músculo produz uma força que exerce tração sobre o osso no qual se insere, gerando um torque na articulação que ele cruza (HALL, 2000). A maior parte dos movimentos humanos envolve a produção conco- mitante de tensão nos grupos musculares agonistas e antagonistas, sendo que a tensão nos antagonistas é responsável por controlar a velocidade do movimento e aperfeiçoar a estabilidade da articulação na qual o movi- mento ocorre. Quando o torque e o movimento articular estão presentes na mesma direção, o torque é denominado concêntrico; contrariamente, o torque é excêntrico quando está presente na direção oposta ao movimento articular. Outro fator interferente nos torques articulares, durante a realiza- ção de um exercício, é a velocidade do movimento (HALL, 2000). 5.3.1 Alavancas Os músculos desenvolvem tensão, tracionando os ossos para sus- tentação ou deslocamento da resistência gerada pelo peso dos segmentos corporais e, possivelmente, pelo peso de uma carga acrescentada. Quando isso acontece, músculos e ossos funcionam como alavancas, definidas como hastes rígidas que giram ao redor de um eixo. Sendo assim, o osso atua como a haste rígida, a articulação constitui o eixo e os músculos apli- cam força. Quando a força aplicada e a resistência localizam-se em lados opostos do eixo, temos uma alavanca de primeira classe, como no caso da ação simultânea de músculos agonistas e antagonistas em lados opos- tos de um eixo articular, de gangorras, tesouras, alicates e pés de cabra (Figura 5.6 A). Quando a força aplicada e a resistência localizam-se no mesmo lado do eixo, com a resistência mais próxima do eixo, temos uma – 101 – Cinética alavanca de segunda classe, como no caso de carrinhos de mão, chaves de roda e quebra-nozes (Figura 5.6 B). Por último, quando a força aplicada e a resistência localizam-se do mesmo lado do eixo, porém com a força mais próxima do eixo, temos uma alavanca de terceira classe; como no caso de remos para canoagem, pás e a maioria dos sistemas de alavanca mús- culo-osso do corpo humano (Figura 5.6 C) (LIPPERT, 2018; HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Figura 5.6 – Exemplos de alavancas de primeira, segunda e terceira classe A R F F C B A R F A RF A F R A F R A A R F RA F R A F A R F F Equilíbrio Velocidade e amplitude de movimento Amplitude de movimento Força Força Fonte: Shutterstock.com/ Eduard Radu/ Fouad A. Saad/ udaix/ Ildar Galeev Sempre que o braço de momento da força aplicada for maior que o da resistência, a magnitude da força aplicada necessária para o deslocamento de determinada resistência será menor que a magnitude dessa resistência; por outro lado, sempre que o braço de momento da resistência for mais longo que o da força, a resistência possivelmente será deslocada através de uma distância relativamente grande. Denominamos vantagem mecâ- nica (VM) a eficiência de uma alavanca em movimentar uma resistência, Cinesiologia e Biomecânica – 102 – constituindo a relação entre o braço de momento da força e o braço de momento da resistência: . Ainda, sempre que o braço de momento da força for mais longo que o braço de momento da resistência, a relação da vantagem mecânica será reduzida para um valor maior que a unidade, e a magnitude da força aplicada necessária para des- locar a resistência será menor que a magnitude da resistência (LIPPERT, 2018; HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Como citado anteriormente, a maioria das alavancas músculo-osso é de terceira classe; sendo assim, apresenta uma vantagem mecânica inferior a 1,0. A eficácia mecânica das alavancas músculo-osso também é influen- ciada pelo ângulo com que um músculo exerce tração sobre um osso. A força da tensão muscular decompõe-se em dois componentes de força: um perpendicular ao osso imóvel e outro paralelo ao osso. Na medida em que ângulo articular e vantagem mecânica se alteram, o comprimento do músculo também é alterado e essas alterações interferem na quantidade de tensão que um músculo consegue gerar (LIPPERT, 2018; HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). 5.3.2 Equilíbrio estático e dinâmico Equilíbrio constitui o estado caracterizado por forças e torques balan- ceados, e sempre que um corpo fica completamente imóvel, encontra-se em equilíbrio estático. Para que isso aconteça, três condições devem se fazer presentes: I. a soma de todas as forças ou componentes de força verticais agindo sobre o corpo deve ser igual a 0; II. a soma de todas as forças ou componentes de força horizon- tais agindo sobre o corpo deve ser igual a 0; III. a soma de todos os torques deve ser igual a 0. Com todas as forças atuantes resultando em forças inerciais iguais dirigidas em sentidos opostos, os corpos em movimento encontram-se em equilíbrio dinâmico (princípio de D’Alembert). Um exemplo desse prin- – 103 – Cinética cípio é a alteração na força vertical ao utilizarmos um elevador: à medida em que o elevador acelera para cima, uma força de inércia na direção oposta é gerada e o peso do corpo, se medido dentro do elevador, aumenta. Ao contrário, quando o elevador acelera para baixo, uma força inercial voltada para cima é criada, reduzindo o peso corporal. Na verdade, o peso corporal permanece constante. O que acontece é uma modificação, pela força de inércia vertical, da magnitude da força de reação medida na balança (LIPPERT, 2018; HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Podemos definir mecanicamente a estabilidade como a resistência a ambas as acelerações linear e angular ou, de forma simplificada, como a resistência em romper o equilíbrio. A capacidade de um indivíduo em controlar a estabilidade constitui o equilíbrio. Vários fatores mecânicos interferem na estabilidade de um corpo: a) massa – quanto maior for a massa, maior será a força neces- sária para a produção de determinada aceleração, como por exemplo em um jogo de futebol americano, em que a maior massa corporal dos jogadores da linha ofensiva ajuda a manter suas posições estáveis mesmo com a força neles aplicada pela linha defensiva. b) quantidade de atrito –quanto maior a quantidade de atrito entre um objeto e a(s) superfície(s) em contato, maior a força necessária para iniciar e manter o movimento, como por exem- plo na patinação sobre o gelo, na qual o mínimo atrito existente entre o patim e a pista permite uma rápida quebra da estabilidade para o início de uma corrida. c) tamanho da base de sustentação – correspondente à área cir- cundada pelas bordas externas do corpo em contato com a(s) superfície(s) de apoio; quanto maior for a base de apoio, menor será a probabilidade da ocorrência de criação de um torque que tende a produzir o movimento angular do corpo, rompendo a estabilidade, criado quando a linha de ação do peso de um corpo (dirigida a partir do centro de gravidade) se desloca para fora da base de apoio (LIPPERT, 2018; HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). Cinesiologia e Biomecânica – 104 – A estabilidade também pode ser afetada pela altura do centro de gra- vidade (CG) em relação à base de apoio: quanto mais alto for o posi- cionamento do CG, maior será o torque potencialmente destrutivo criado quando o corpo sofrer um deslocamento angular. Por exemplo, em um terremoto, a movimentação do solo ocasiona a oscilação horizontal de um edifício e, quanto mais alto for o edifício (CG mais elevado), maior será a movimentação horizontal sofrida em comparação a um edifício contendo um andar, pois a movimentação horizontal aumenta a cada andar suces- sivo (LIPPERT, 2018; HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). 5.3.3 Resumo dos princípios da estabilidade mecânica Quando os demais fatores interferentes são mantidos constantes, a capacidade de um corpo manter o equilíbrio é aumentada por: I. maior massa corporal; II. maior atrito entre o corpo e a(s) superfície(s) de contato; III. aumento do tamanho da base de apoio na direção da linha de ação de uma força externa; IV. posicionamento horizontal do CG próximo à borda da base de apoio sobre a força externa atuante; V. posicionamento vertical do CG o mais baixo possível. Geralmente, os princípios de estabilidade são verdadeiros; entretanto, sua aplicação ao corpo humano será válida somente mediante o reconheci- mento de que outros fatores neuromusculares são igualmente importantes. Mudanças na posição dos pés, por exemplo, afetam duas medidas do equi- líbrio na postura ereta: a localização da linha de gravidade e a inclinação postural. O ângulo da posição do pé durante a postura normal não modi- fica o equilíbrio, mas um metatarso extremamente valgo implica em maior inclinação do corpo. Em condições normais, o tamanho da base de apoio constitui determinante primário da estabilidade, embora outros fatores também possam limitar o controle do equilíbrio (HAMILL; KNUTZEN, 2008; HALL, 2000). – 105 – Cinética Síntese A cinética linear constitui o estudo das forças associadas ao movi- mento linear. O atrito refere-se à força produzida na área entre duas super- fícies em contato, quando existe movimento ou tendência ao movimento de uma superfície em relação à outra. As magnitudes do atrito estático máximo e do atrito cinético são definidas pelo coeficiente de atrito (µ) entre as duas superfícies e pela força de reação normal (R), mantendo-as juntas, sendo que a direção da força de atrito opõe-se sempre à direção do movimento ou à tendência ao movimento. Momento linear é o produto da massa de um corpo ou objeto por sua velocidade, enquanto a resistência de um corpo ou objeto à aceleração linear é proporcional à sua massa. A resistência à aceleração angular (momento de inércia) relaciona-se tanto à massa quanto à distribuição dessa massa pelo eixo de rotação. Assim como o momento linear, o momento angular é o produto do momento de inércia pela velocidade angular. Na ausência de torques externos, o momento angular mantém-se conservado. Movimentos rotatórios são cau- sados pelo torque, e a rotação dos segmentos corporais ocorre na direção do torque articular resultante. A maioria das articulações atua como ala- vancas de terceira classe, estruturadas de maneira a aumentar a ampli- tude de movimento e sua rapidez; mas exigindo do músculo uma força de maior magnitude em relação àquela da resistência a ser superada. Um corpo imóvel encontra-se em equilíbrio estático, enquanto um corpo em movimento encontra-se em equilíbrio dinâmico quando são levados em conta os fatores inerciais. Atividades 1. Defina atrito, atrito estático máximo e atrito cinético. 2. Qual é a força de reação normal (R) de um trator pesando 500 toneladas, dirigido por um motorista pesando 100 Kg? (1 tone- lada = 1000 Kg). 3. Classifique os objetos a seguir em relação aos seus respectivos tipos de alavanca: tesoura, pá, gangorra, alicate, chave de roda, remo e pé de cabra. Cinesiologia e Biomecânica – 106 – 4. Cite as três condições para que um corpo fique completamente imóvel, em equilíbrio estático.