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O Roteiro na Narrativa Hipermidiática A origem do roteiro para hipermídia A hipermídia, e o roteiro para hipermidia ambos nasceram da soma dos desenvolvimentos tecnológicos e estéticos na área da comunicação, no momento em que acontece um aproveitamento de meios comunicativos para a desconstrução da hierarquização no mundo da arte, e o desenvolvimento do conceito de comunidade toma lugar, promovendo o coletivo artístico entre colaboradores e aproximando o espectador, que deixa de ser apenas receptor para se tornar participante ativo dentro da comunidade artística, contribuindo e reagindo à arte. Esta nova maneira de interagir e participar é,de maneira rústica, o fundamento da hipermídia, cujo conceito é utilizado até hoje para denominar também uma região no cenário cultural onde se manifestam vários trabalhos que se utilizam das novas mídias decorrentes - os meios digitais com mais de uma mídia (telecomunicação, informática etc). A comunicação a partir da escrita desenvolveu-se com o tempo, chegando ao ponto atual onde é possível a realização de obras em hipermídia. Em certos aspectos, retornou à sua origem de roteiros não lineares, nascidos segundo a história a aproximadamente 1600 anos a.C nas primeiras civilizações, e a partir daí, pode ser dividida em quatro períodos históricos: a escrita das ideias, a escrita sintática, a escrita das palavras e a escrita dos sons. O link para a hipermídia O conceito de link é um dos mais importantes na hipermídia. Sendo uma das ferramenta mais exploradas para tal, é o mecanismo que promove a inter-relação entre conteúdos e usuários em um ambiente hipermidiatico, e é através dele que se torna possível a não-linearidade entre documentos e conteúdos apresentados, potencializando sua leitura e navegação. Na leitura de uma hipermídia, cada conteúdo é lido individualmente pelo usuário, e pode ser vinculado a qualquer outro conteúdo.Este vínculo é dado pelo deslocamento do olhar e pela atenção da audição - ou o audiovisual. Para James Thomas1, especialista de roteiro para produções audiovisuais “todo roteiro descreve uma trajetória demarcada por links”. Logo, podemos entender por link não só a organização das sentenças e da pontuação de um documento, mas os intervalos, frases, diálogos ou parágrafos que sustentam o sentido proposto pelos conteúdos inter-relacionados entre si. No roteiro de hipermídia, o link é o elemento chave na estrutura hipertextual, mas é importante lembrar que não existe apenas um só tipo de link. O link é o responsável pela leitura e compreensão de um dado, e também cria sentidos para além dos conteúdos. O que liga cada conteúdo é o que constitui a hipermídia, ou sua estrutura. Conceito de interatividade na hipermídia Entendemos por interatividade o recurso de troca de comunicação e de conhecimento entre duas ou mais partes, que abrange diferentes níveis de envolvimento e mobilização no espectador/usuário a partir de seu desejo e de sua necessidade de interferir e se relacionar com uma obra e seu conteúdo. Interatividade é o resultado da soma comunicação + escolha. Para a roteirização de uma efetiva interatividade em hipermídia, é preciso definir conteúdos consistentes, sem os quais não se justificaria a necessidade de abrir uma nova janela ou tela. Dessa maneira, a interatividade é também o resultado da busca e necessidade em organizar e interligar conteúdos consistentes em relação à proposta geral da obra durante o desenvolvimento do roteiro de hipermídia. Na obra de Brenda Laurel2, a “interatividade contínua” é definida por três variáveis: ● Frequência - com qual frequência há interação; ● Alcance - quantas escolhas estão disponíveis; ● Significância - o quanto as escolhas afetam os conteúdos. 2 Brenda Laurel, Computer as a Theater (6º ed. Reading, Addison-Wesley, 1998), pp. 20-21 1 James Thomas, encScript for Actors, Directors, and Designers (3ª ed. Boston: Focal, 1992), pp 116-117. Para Laurel, para ser considerado muito interativo, o roteiro deve permitir fazer algo que realmente interesse ao usuário a qualquer momento, e pode ser qualquer coisa próxima da realidade, uma vez que compreendida e considerada a importância da expectativa de controle que este usuário apresenta referente à interface (como por exemplo, em um game). Para interatividade, transparência também é um conceito importante, pois ressalta a prioridade da ação em atividades humano-computador, e a transforma em uma atividade cognitiva. Nesta forma de interpretação da interatividade, o computador (plataforma física) torna-se apenas uma ferramenta durante a interação, permitindo ao usuário a imersão sem que ele perceba a existência de uma interface, que se torna invisível entre ele a obra na qual esta participando. Um exemplo para este tipo de interação ocorre no cinema, quando normalmente não percebemos todos os aparatos envolvidos em uma projeção cinematográfica, como a tela, as caixas de som, o projetor etc. Outros conceitos sobre interatividade em hipermídia A ambiência é o complexo que organiza os sistemas ambientais (físicos, estéticos e psicológicos) oferecidos ao usuário dentro do ambiente hipermidiático. A ambientação é o conceito responsável pela imersão no ambiente criado, dada pela repetição de elementos do cenário ou de sonoridade nas telas (audiovisual), que não devem se restringir ao seu próprio espaço, tomando uma perspectiva tridimensional, ou até mesmo bidimensional para complementar um dos componentes característicos da realidade virtual, juntamente com a interatividade e intensidade da informação. Todos estes itens ampliam o conceito de interatividade para o roteiro de hipermídia, que é um de seus objetivos finais. A interatividade define o link, que por sua vez, define o roteiro de navegação não-linear em ambientes hipermidiáticos interativos. O link é o que irá gerenciar a interatividade quando esta for o resultado da disponibilidade de um conteúdo de acesso pelo usuário, visto que ele é o que determina os conteúdos e o modo pelo qual estes são disponibilizados pelo roteirista na interface. Logo, o link define a interatividade e o caráter da hipermídia. Não-linearidade no roteiro hipermidiático “A nova mídia determina uma audiência segmentada, diferenciada que, embora maciça em termos de números, já não tem mais uma audiência de massa em termos de simultaneidade e uniformidade da mensagem recebida. A nova mídia não é mais mídia de massa no sentido tradicional do envio de um número limitado de mensagens e uma audiência homogênea de massa. Devido à multiplicação de mensagens e fontes, a própria audiência torna-se mais seletiva. A audiência tende a escolher suas mensagens, assim aprofundando sua segmentação” (CASTELLS, 2000, p.34) A grande diferença entre o acesso, ou a experiência com o uso de uma hipermídia ou hipertexto e um livro físico, é a não-linearidade: a possibilidade de acesso preciso e aleatório à informações específicas dentre uma vasta gama de outras informações que estão disponíveis e compõem o conjunto de conteúdo total da obra, sem perder a continuidade. A possibilidade de escolha de qual caminho narrativo percorrer passa a ser responsabilidade do leitor, e não mais do autor estritamente, ainda que este decida qual o conteúdo que estará disponível para navegação. O usuário da obra de hipermídia percorre a narrativa através de diversas opções de caminhos definidos pelo autor através de links entre seus conteúdos, resultando assim na possibilidade de diversas leituras diferentes de uma mesma obra, todas estas válidas. O roteirista por sua vez, preocupa-se em manter um controle do deslocamento do usuário sobre as unidades narrativas através de um mapeamento do conteúdo disponibilizado, evitando que este se desoriente, e tem o desafio de planejar um fluxo comunicacional: todos os fluxos que possibilitem que toda a interação autoral se concretize pela obra e pela interação com o usuário. É importante que na obra hipermidiática, TODOS os conteúdospossuam links com outros conteúdos para que possam ser acessados, caso contrário tornam-se supérfulos e podem interferir na experiência de navegação ou até mesmo comprometer o entendimento da narrativa e gerar uma reação negativa à expectativa do usuário. Porém quanto mais unidirecional e linear os links trabalharem a navegação entre os conteúdos, mais limitada é a interatividade da obra e a imersão do usuário. A Análise do Roteiro Hipermidiático Os parâmetros que definem a produção de um roteiro para hipermídia são derivados de modelos trabalhados para outras linguagens que também aderem à elementos hipermídiaticos e audiovisuais em seus produtos finais, como o cinema e os games, por exemplo. Tendo isso em vista, é possível inclusive, nesta fase inicial da construção de um roteiro, atentar para um desenvolvimento mais elaborado do modelo trabalhado, afim de explorar todas os possíveis recursos que podem estar presente no projeto. Quanto mais detalhista e bem elaborado o roteiro, mais ele contém todas as informações sobre ocorrências comunicacionais claramente previstas, descritas e visualizadas. Aqui, o desenvolvimento teórico sobre hipermídia que o roteirista tem conhecimento é exatamente o que vai auxiliá-lo a dizer o que, com o quê, como e quais os mecanismos que são utilizados para realizar a interação descrita no roteiro. Também é de suma importância caminhar sempre de encontro ao conceito de desenvolvimento centrado no humano, que é a peça chave em um projeto de interação. A construção do roteiro hipermidiático começa muito antes de sua estruturação, com o estudo de seu usuário e de suas necessidades. A ideia é que o link, juntamente com o conteúdo, é o estruturador da roteirização em ambiente hipermidiático desde que seja acessível e compreensível para o usuário. Uma referência para o roteirista de hipermídia se encontra na experiência de criar um ambiente em hipervídeo, onde é possível o desenvolvimento de três formas de link: ● Temporal: Quando o link funciona com tempos determinados ● Espacial: Definem a interface como molduras dentro do vídeo, mudanças no cursor e playback de um preview do áudio do vídeo de destino ● Textual Interpretativo: Permite ao usuário interferir diretamente no texto apresentado simultaneamente ao vídeo. “A hipermídia se preocupa em trazer o maior número de informações no menor tempo e com a maior clareza possível, onde o roteirista, o editor e o autor devem considerar a efemeridade da permanência de um usuário e o volume de informações à sua disposição em um produto hipermidiático.” (GOSCIOLA, 2003, p. 210) A realização de uma obra de hipermídia trabalha um mesmo conteúdo em todos os canais - ou meios de comunicação -, que participam da unicidade da obra, como o de acompanhamento e ilustrações de um texto. O processo comunicacional da hipermídia é previsto, planejado e roteirizado pelo roteirista através do dimensionamento e disposição dos conteúdos e dos links, porém ele não pode prever plenamente a navegação escolhida pelo usuário, nem seu resultado de leitura, e no máximo, estabelece o que e de que maneira estará disponível para este usuário. O Desenvolvimento do Roteiro de Hipermídia A princípio, o roteirista tem como função o trabalho técnico de definir o que será feito: o projeto de bancos de textos, sons e imagens, a sua adequação ao fluxograma, a definição da necessidade de gráficos, o esboço e a diagramação das telas, o projeto de áudio, a edição de vídeos, as transições entre as telas etc. O roteiro de hipermídia pode prever as seguintes características audiologovisuais das sequências de telas ou cenas: ● Planificação: determina o tamanho e a localização das imagens, sons e textos na tela; ● Movimentação: define o movimento da câmera e o movimento das imagens, sons e textos; ● Transição: determina algumas maneiras de realizar a passagem de uma tela para outra, ou acessar funções adicionais. O link, identificado como elemento vivamente presente na obra hipermidiática, é determinado por três características comunicaionais: ● Comportamento: tipos de links definidos por sua ação em relação ao conteúdo, pela forma como comunica a presença de outro conteúdo; ● Estruturação: links que definem para o conteúdo em qual localização e em qual movimento do seu desenvolvimento se faz a sua apresentação ao usuário; ● Repetição: o quanto e como os links se repetem, constituindo um certo ritmo construindo a unicidade e tornando a obra hipermidiática harmoniosa.