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Unidade I ESTUDOS DISCIPLINARES A Teoria de Pierre Bourdieu e as Classes Sociais Profa. Aline Chiaramonte Sociólogo francês, ocupou a cadeira de Sociologia no Collège de France a partir de 1981. Teoria: estruturalismo construtivista/ construtivismo estruturalista. Sociologia crítica e reflexiva. Principais conceitos: campo, habitus, illusio, capitais, violência simbólica, doxa, estratégias, interesse. Extensa variedade de objetos e temas de estudo: educação, arte, ciência, literatura, economia, oposição masculino- feminino, jornalismo, linguística, política, Estado. Pierre Bourdieu (1930-2002) Pierre Bourdieu (1930-2002) Principais obras: Trabalhos dedicados à análise da sociedade argelina: “Sociologia da Argélia” (1958), “Trabalho e trabalhadores na Argélia” (1963), “O desenraizamento: a crise da agricultura tradicional na Argélia” (1964). Práticas culturais e excelência escolar: “Os herdeiros: os estudantes e a cultura” (1964), “Uma arte média: ensaio sobre os usos sociais da fotografia” (1965), “O amor pela arte: os museus europeus e seu público” (1966), “A profissão de sociólogo” (1968). Domínios diversificados, educação, produção e consumo de bens culturais: “A reprodução” (1970), “Esboço de uma teoria da prática” (1972), “A distinção: crítica social do julgamento” (1979), “O senso prático” (1980). Pierre Bourdieu (1930-2002) “Questões de sociologia” (1980), “A economia das trocas linguísticas” (1982), “A ontologia política de Martin Heidegger” (1988). Obras dedicadas ao ensino: “Homo academicus” (1984), “A nobreza de Estado” (1989). Arte e literatura: “As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário” (1987). Política: “A miséria do mundo” (1993), “Sobre a televisão” (1996), “Contra-fogos” (1998). Oposição masculino-feminino: “A dominação masculina” (1998). Questões de “teoria” ou de filosofia: “Razões práticas” (1994), “Meditações pascalianas” (1997). Pensamento relacional A realidade deve ser apreendida relacionalmente. Só é possível analisar um agente e/ou um grupo social observando-o(s) em relação a outro(s) agente(s) e/ou grupo(s) social(is). Os agentes buscam transformar as pequenas diferenças em signos distintivos. Estão em permanente luta por poder, engendrando estratégias para se distinguirem em relação a seus concorrentes mais próximos. A vida cotidiana é feita de uma infinidade de interações que são localizadas no tempo e no espaço. Para compreender uma interação, é necessário conhecer o mais precisamente possível as circunstâncias e o lugar onde ela foi produzida. Circunstâncias: não somente as circunstâncias imediatas, mas também o contexto histórico. Lugar: não somente o lugar físico onde se desenrola a interação, mas também a situação no espaço social. Quais as determinações que todas as interações devem ao espaço social no qual são produzidas? Interações e espaço social Espaço social e distâncias sociais Um espaço social é um sistema de posições sociais que se definem umas em relação às outras. O “valor” de uma dada posição só é possível de ser medido pela distância que a separa de outras posições, inferiores ou superiores. O espaço social é um sistema de diferenças. Na vida social, toda prática individual ou coletiva é orientada por valores socialmente estabelecidos (reconhecidos no momento). As práticas dos agentes são orientadas por valores percebidos como formando pares de oposição. Esses dão valores positivos ou negativos às coisas e às práticas. Espaço social e diferenças sociais Em um dado espaço social, o sistema de posições sociais impõe aos agentes o respeito às distâncias sociais estabelecidas. Instituições cuja função é codificar as distâncias sociais e/ou fazer com que elas sejam respeitadas. Toda modificação dessas distâncias pode levar, ao mesmo tempo, a mudanças na ordem social. Interatividade Identifique a alternativa correta: a) Para Bourdieu, é possível compreender um grupo social sem analisá-lo em relação a outros grupos. b) Na teoria de Bourdieu, os indivíduos não possuem agência. c) Bourdieu entende que não é importante observar as circunstâncias e o lugar das interações sociais. d) O espaço social no qual ocorre uma dada interação a determina. e) As práticas sociais não são orientadas por valores. Resposta Identifique a alternativa correta: a) Para Bourdieu, é possível compreender um grupo social sem analisá-lo em relação a outros grupos. b) Na teoria de Bourdieu, os indivíduos não possuem agência. c) Bourdieu entende que não é importante observar as circunstâncias e o lugar das interações sociais. d) O espaço social no qual ocorre uma dada interação a determina. e) As práticas sociais não são orientadas por valores. Estabilidade nos espaços sociais Em um dado espaço social, as distâncias sociais são respeitadas ou transgredidas? Historicamente, o que se observa é uma certa inércia dos sistemas de posições sociais. Os agentes, pelo fato de serem socializados nesses espaços, conformam-se aos constrangimentos impostos. Os agentes têm espontaneamente um respeito pelas distâncias. Nenhum sistema social pode funcionar sem um certo conformismo por parte dos agentes. Consenso. Inconsciente social. Reprodução da ordem social. Estruturação dos espaços sociais Diante dos inúmeros fatores que contribuem para provocar uma interação, nem todos têm a mesma força causal. Nem os fatores pontuais, ínfimos, nem os gerais, universais. Fatores específicos, ligados à lógica de funcionamento. Especificidades dos espaços: fatores explicativos próprios. Para analisar corretamente as condutas sociais deve-se reconstituir o espaço social específico no qual elas se desenrolam. A lógica interna do espaço é a chave explicativa das interações nesse espaço. Para marcar a característica específica das determinações que, em um dado espaço, produz uma certa gama de interações, Bourdieu utiliza a noção de campo. Características objetivas dos campos Campo: sistema específico de relações objetivas, que podem ser de aliança e/ou de conflito, de concorrência e/ou de cooperação, entre posições diferenciadas, socialmente definidas e instituídas, independentes da existência física dos agentes que as ocupam. A sociedade nos é anterior e existirá bem depois de nós – características posicionais, não propriedades posicionais. Contra a ideologia de carismática: competência adquirida, não “dom”. Características objetivas dos campos Apreender a especificidade de um campo: alternativa à oposição clássica entre as análises macrossociológica e microssociológica. Analisar os fatos sociais como determinados pelas estruturas objetivas externas e como produtos de investimentos subjetivos dos agentes. Mostrar como as estruturas e os agentes condicionam-se, implicam-se, provocam-se reciprocamente, em uma incessante dialética da interioridade e da exterioridade. Capital Se toda interação ocorre em um campo específico, sendo comandada pela posição ocupada pelo agente no sistema de relações objetivas, como é possível ascender às posições no campo? É possível mudar de posição? O sistema pode se modificar? Como, em quais condições? Compreender a especificidade do campo: qual jogo é jogado? Quais são as regras? O que está em jogo? Bens colocados em jogo. Algumas categorias de recursos: 1) De natureza econômica – capital econômico. 2) De natureza cultural – capital cultural. 3) Rede de relações mobilizáveis – capital social. Capital Possuir um ou mais desses recursos é a condiçãode entrada no jogo (direito de entrada). Nos campos, os agentes lutam para que os recursos (capitais) detidos por eles recebam maior valor, adotam estratégias para valorizá-los. As espécies de capitais relacionam-se estreitamente na realidade social, convertendo-se, em certas condições, umas nas outras. Uma propriedade não é necessariamente um capital. Ela se torna capital quando há um mercado criado por uma demanda social que fixa seu preço. Este, por sua vez, é estabelecido em função das relações de forças objetivas estabelecidas entre os agentes do campo. Capital e dominação Uma espécie de capital pode, em um dado momento, em um dado campo, ser preponderante em relação às demais. O capital acumulado em um campo é distribuído desigualmente entre os agentes segundo a posição ocupada no campo. Na realidade, observa-se uma estrutura de repartição do capital específico mais ou menos dispersa (ou concentrada) segundo a história do campo e segundo as evoluções das lutas pela apropriação do capital. As relações de dominação instauram-se em um campo pelo fato de que há distribuição desigual de capital. As relações de dominação repousam, assim, nas relações de força que sustentam as interações sociais. Interatividade Identifique a alternativa correta: a) Os agentes são dotados de recursos sociais que permitem localizá-los nos espaços em que esses recursos são válidos. b) Não é preciso conhecer a história de um campo social para dizer qual recurso é válido no momento da análise. c) A posição ocupada por um agente deixará de existir quando ele não estiver mais presente. d) O capital econômico não pode, em nenhuma hipótese, ser convertido em capital cultural. e) Analisar a especificidade de um campo é fazer microssociologia. Resposta Identifique a alternativa correta: a) Os agentes são dotados de recursos sociais que permitem localizá-los nos espaços em que esses recursos são válidos. b) Não é preciso conhecer a história de um campo social para dizer qual recurso é válido no momento da análise. c) A posição ocupada por um agente deixará de existir quando ele não estiver mais presente. d) O capital econômico não pode, em nenhuma hipótese, ser convertido em capital cultural. e) Analisar a especificidade de um campo é fazer microssociologia. Estabilidade e transformação nos campos Por que as relações de dominação constitutivas da ordem social são toleradas por aqueles que estão submetidos à dominação econômica, social e cultural? As estruturas sociais apresentam uma forte inércia. Mudança: importância das lutas dentro dos campos. O potencial de subversão está inscrito na lógica da dominação. Luta entre dominantes e dominados como causa essencial das transformações em um campo. As classes sociais Existem critérios precisos segundo os quais os agentes se repartem em diferentes níveis. Esses critérios são variados: idade, sexo, etnia, língua, cor, formação, ganhos, lugar de residência, religião, diplomas, opinião política etc. Eles podem servir para reunir ou dividir os agentes em grupos homogêneos. Um indivíduo pertence a muitos grupos de uma só vez. Os pertencimentos são diferentes entre um indivíduo e outro. Os grupos se sobrepõem e há inúmeras intersecções parciais. As classes sociais Há uma particularidade fundamental que pesa sobre todas as outras: a oposição entre “ricos” e “pobres” (economicamente). De todos os princípios de classificação que desempenharam historicamente um papel na diferenciação entre grupos, nenhum outro teve tanto poder de discriminação e abrangência. A concepção objetivista Repartição dos capitais como dado objetivo, visível a olho nu e evidenciado pela estatística. Visão objetivista/ substancialista das classes sociais: representa as classes sociais como conjuntos homogêneos, resultado mecânico da repartição automática dos agentes nos diferentes estágios da estrutura social em função dos critérios objetivos. Sociologia marxista: classifica os agentes segundo critérios econômicos (relação dos agentes com os meios de produção). Não é preciso levar em conta a consciência dos agentes: ela é “falsa”. Críticas à concepção objetivista A concepção objetivista não considera a consciência que os agentes podem ter da própria identidade ou a percepção que eles têm dos outros. É a partir da percepção que têm de sua situação concreta que os agentes se mobilizam, agem em um sentido ou em outro. Decepção para a sociologia objetivista: as classes “no papel” estão longe de se mobilizarem e engendrarem lutas como na realidade. Interatividade Assinale a alternativa incorreta: a) A sociologia objetivista não considera a consciência dos agentes, reputa-a “falsa”. b) O critério econômico impõe-se sobre outros princípios de diferenciação social. c) A mudança social não é consequência das lutas entre dominantes e dominados. d) A sociologia marxista considera as classes como um dado objetivo. e) As classes “no papel” são diferentes das classes na realidade. Resposta Assinale a alternativa incorreta: a) A sociologia objetivista não considera a consciência dos agentes, reputa-a “falsa”. b) O critério econômico impõe-se sobre outros princípios de diferenciação social. c) A mudança social não é consequência das lutas entre dominantes e dominados. d) A sociologia marxista considera as classes como um dado objetivo. e) As classes “no papel” são diferentes das classes na realidade. A concepção subjetivista Dá importância a tudo o que os indivíduos pensam, percebem, experimentam, pelo fato de que eles são seres conscientes, dotados de uma subjetividade independente de qualquer determinação. O que importa para a classificação social é a percepção que os agentes têm deles mesmos e dos outros. Classe como estrato: níveis sobrepostos que se distinguem ao longo de um continuum social. Os agentes podem passar de um estrato a outro. O que move os agentes a ascenderem é a “ambição”, a “vontade”, o “dinamismo”. Críticas à concepção subjetivista As desigualdades e as relações de dominação são consideradas expressões da justiça transcendente. Considera as oposições sociais como competições saudáveis entre os indivíduos. Essas competições permitem selecionar os melhores dentro de um jogo considerado democrático. Objetivismo x subjetivismo Objetivismo: tende a perder de vista que as relações sociais são relações de sentido. Subjetivismo: tende a esquecer que as relações sociais são também relações de força. Objetivismo: mede as forças objetivas externas que pesam sobre os agentes; os fatores econômicos que são o fundamento material dos diferentes estilos de vida que distinguem os grupos uns dos outros por seus gostos, suas maneiras, suas opiniões. Subjetivismo: descrição das diferenças sociais tais como elas são percebidas e vividas pelos agentes. Diferenças de significado entre as diferentes práticas e consumos constitutivos dos estilos de vida. Diferentes fatores sociais Os fatores econômicos não determinam sozinhos a constituição dos grupos sociais. Há sempre vários princípios determinantes, os quais interagem uns com os outros. Análise sociológica: apreender uma causalidade estrutural: uma rede de variáveis que estão em interação umas com as outras, de modo que por meio de cada uma delas se pode sentir o poder das outras sobre a prática em análise. Sobredeterminação inevitável de toda prática. Sobredeterminação da prática A sobredeterminação inevitável de toda prática nãoimplica que todas as variáveis intervenham de modo igual. Alguma(s) tem(têm), em uma dada situação, uma eficácia particular. Promove a reunião e a mobilização dos agentes de modo mais provável e mais durável. Sobredeterminação da prática Não é cair no objetivismo afirmar que essas variáveis são objetivas. As variáveis não têm efeito automático: elas tendem a ser geradoras de um possível processo de mobilização. Toda probabilidade só pode ser verificada estatisticamente, quantitativamente e em um longo período de tempo. Em qual medida e em qual sentido é possível afirmar que os fatores econômicos desempenham um papel preponderante na classificação dos agentes? Em grande escala, em um longo período de tempo, as solidariedades engendradas pelos efeitos dos fatores econômicos se mostraram mais frequentes e mais estáveis que outras. Interatividade Assinale a alternativa correta: a) Para a sociologia subjetivista, as práticas dos agentes são determinadas por fatores econômicos. b) Para a sociologia subjetivista, as classes são estratos. c) Para a sociologia subjetivista, a competição entre os agentes não é justa. d) Os fatores econômicos estão na origem da diferenciação entre todos os grupos sociais. e) Todas as variáveis devem ser consideradas como tendo o mesmo peso na determinação das práticas. Resposta Assinale a alternativa correta: a) Para a sociologia subjetivista, as práticas dos agentes são determinadas por fatores econômicos. b) Para a sociologia subjetivista, as classes são estratos. c) Para a sociologia subjetivista, a competição entre os agentes não é justa. d) Os fatores econômicos estão na origem da diferenciação entre todos os grupos sociais. e) Todas as variáveis devem ser consideradas como tendo o mesmo peso na determinação das práticas. ATÉ A PRÓXIMA!