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IBET – INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS Módulo: Tributo e Segurança Jurídica Seminário V: Segurança Jurídica e Processo: Recursos, Ação Rescisória e Coisa Julgada Aluna: Muryelle Reguengo Leite e Silva 1. Tomando o conceito fixado por Paulo de Barros Carvalho acerca do princípio da segurança jurídica: “dirigido à implantação de um valor específico, qual seja o de coordenar o fluxo das interações inter-humanas, no sentido de propagar no seio da comunidade social o sentimento de previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da regulação da conduta.” Pergunta-se: a) Que é segurança jurídica? Qual sua relevância? R: A segurança jurídica é um princípio constitucional que exige uma maior previsibilidade e estabilidade nas relações humanas. Para Paulo de Barros trata-se de um sobreprincípio que traz estabilidade e equilíbrio paras relações jurídicas. A CRFB/88 dispôs que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”, o que garante que uma nova lei não prejudique situações já consolidadas sob a vigência de uma lei anterior. Assim, este princípio é de extrema relevância no ordenamento jurídico, pois tem por objetivo inserir a estabilidade, confiabilidade, previsibilidade, dentre outros e influenciará os demais na busca da segurança, estabilidade, confiabilidade, previsibilidade jurídica, garantindo a proteção da confiança depositada pela sociedade no direito como um todo. b) Indicar limites objetivos previstos no direito positivo que resguardam o valor da segurança jurídica. Indique dispositivos da Constituição Federal de 1988 e do Código Tributário Nacional que confirmem sua resposta. R: Cabe mencionar os princípios da igualdade (art. 5º da CRFB/88), legalidade, legalidade estrita (art. 150, I do CTN), universalidade da jurisdição (art. 5º, XXXV da CRFB/88), vedação do emprego do tributo com efeitos confiscatórios (art. 97 do CTN), irretroatividade (art. 106 do CTN) e anterioridade (art. 150 do CTN), e também os princípios que garantem o direito à ampla defesa e ao devido processo legal (art. 5º, LV da CRFB/88). c) Como poderia ser resguardada a segurança jurídica no contexto social em hipóteses como a de mudança de orientação de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, como se deu no caso do direito à manutenção do crédito de ICMS na hipótese de saída de mercadorias com redução de base de cálculo (sobre essa questão ver RE 161.031/MG e 174.478/SP – Anexos I e II)? R: A segurança jurídica traz um questionamento acerca das consequências de eventuais modificações jurisprudenciais em matéria tributária, considerando que as alterações de entendimento e posicionamento jurisprudencial integram a essência da ordem jurisdicional. O RE 161.031 tratou da situação das empresas que praticavam operações com mercadorias usadas, sendo tributadas pelo ICMS com base de cálculo reduzida, de acordo com legislação do Estado de Minas Gerais. Com base no previsto no Regulamento do ICMS, essas empresas estornavam proporcionalmente o crédito de ICMS relativo às suas operações com base de cálculo reduzida. Inicialmente, foi decidido pela Suprema Corte que mesmo nos casos de redução na base de cálculo do ICMS, o princípio da não-cumulatividade poderia ser violado, já que não se poderia falar em creditamento quando houvesse a redução da base de cálculo. No caso em tela, ficou definido que não se tratava de isenção parcial, porém de incidência reduzida. Contudo, cerca de uma década após o julgamento daquele RE, novamente o STF analisou o tema no RE 174.478/05. Já nesse período o STF passou a adotar o entendimento de que a redução da base de cálculo do ICMS era uma hipótese de isenção fiscal parcial, sendo possível, portanto, o aproveitamento do crédito pelo contribuinte. A mudança jurisprudencial, não pode pôr em risco a segurança jurídica, uma vez que os atos-fatos ocorridos no passado devem ser protegidos. Assim, os efeitos da decisão proferida devem ser modulados de sorte a garantir a segurança jurídicas nas relações jurídico-tributárias estabelecidas. d) As prescrições do CPC/15 voltadas à estabilização da jurisprudência vêm ao encontro da realização da segurança jurídica (vide arts. 9º, 10, 926, 535, §§ 5º, 6º, 7º e 8º 927 ambos do CPC/15)? R: O CPC/15 aduziu acerca da vinculação e a obrigatoriedade dos precedentes. O amplo acesso à proteção judicial dado pelo constituinte de 1988 e a necessidade de racionalizar o sistema determina que as cortes de justiça respeitem as decisões vinculantes de cortes superiores e a sua própria jurisprudência. Uma aderência aos precedentes dos tribunais superiores permite a permanência de um sistema jurídico sadio e coerente. A preocupação fundamental deve residir na segurança jurídica que o sistema judicial deve assegurar aos cidadãos. É necessário resguardar a previsibilidade sobre o entendimento do judiciário na manifestação de um litígio, sem haver um enrijecimento diante das mudanças sociais. Logo, o reconhecimento de novos direitos não pode fragilizar os direitos já conquistados sob o fundamento de uma ampla liberdade jurídica e criatividade judicial. A segurança jurídica se constitui num princípio que deve ser preservado. 2. Qual o conteúdo e alcance do termo “precedente” utilizado pelo CPC/15? Jurisprudência e precedente são termos sinônimos dentro do sistema jurídico brasileiro? Os precedentes são normas jurídicas? Se sim, de que tipo? O verbo “observar”, veiculado pelo art. 927 do CPC/15, significa que os julgadores estão vinculados aos precedentes judiciais? Esta obrigação pode ser reputada instrumento hábil para garantia da segurança jurídica? (Vide arts. 926, 927, 988, IV do CPC/15). R: No Código Processual Civil de 2015 o termo “precedente” é utilizado para indicar, de forma ampla, pronunciamentos judiciais que, já quando são emitidos, desponta o reconhecido efeito de servir como base, vincular, em maior ou menor grau, decisões judiciais subsequentes, que servem sobre casos em que se ponha a mesma questão jurídica. O “precedente” é qualquer decisão em julgamento que serve como fundamento para outro julgamento posterior. A jurisprudência, por sua vez, resulta de um agrupamento de decisões judiciais, aplicações e interpretações das leis na mesma orientação sobre determinada matéria emitida pelos tribunais. O legislador ao utilizar o verbo “observar” no artigo 927, aduziu a necessidade do julgador obrigatoriamente estudar o precedente invocado e a partir desta análise promover ou não sua aplicação, considerando que pode realizar os atos de distinção e superação do precedente. Por fim, cabe destacar que os novos dispositivos do CPC/15 vieram justamente para garantir a realização da segurança jurídica. 3. Uma lei tributária municipal é considerada inconstitucional por uma associação que possui representação em âmbito estadual. Quais seriam os caminhos para a discussão da questão com efeitos erga omnes sem que seja necessária a discussão individual por cada contribuinte? Analise as opções seguintes motivando as razões do cabimento ou não e, no último caso, o foro de ajuizamento: a) Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI: R: A CRFB/88, em seu art. 125, dispôs sobre a possibilidade do controle de constitucionalidade das leis ou atos normativos municipais em face da Constituição Estadual. Por sua vez, o art. 102 da CR/1988, disciplina o controle de constitucionalidade das leis federais ou atos normativos federais ou estaduais, se privando do controle concentrado das leis ou atos normativos municipais diante da Constituição Federal. O direito municipal apenas será verificado pelo STF quando for objeto de controle difuso ou por meio de ação de descumprimento de preceito fundamental. Desta forma, de acordo com a previsão legal e entendimento jurisprudencial, não é cabível o ingresso de ação direta de inconstitucionalidade contra lei municipal, tendo em vista que não há previsão expressa na Constituição. Este mesmo entendimento é aplicado com a ação direta de constitucionalidade. Logo, não é possível que uma lei municipaltenha sua constitucionalidade por meio de ADI ou ADC perante ao STF. b) Mandado de Segurança Coletivo: R: O Mandado de Segurança Coletivo objetiva assegurar direito que pertence a uma coletividade ou categoria representada por Partido Político, Organização Sindical ou Entidade de Classe, bem como Associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, na forma da Constituição Federal (art. 5º, LXX, “a” e “b” da CRFB/88). Não obstante, esta ferramenta, conforme Súmula 266 do STF, não é aplicável contra lei em tese. c) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental: R: A ADPF visa proteger os preceitos fundamentais. Nasce, então, a questão em torno da definição de preceito fundamental. A questão deve ser solucionada a partir de uma compreensão de valores, uma vez que, inicialmente, toda norma constitucional é fundamental. Entretanto, os preceitos fundamentais são aqueles que estão ligados diretamente aos valores supremos do Estado e da Sociedade. Preceito fundamental não significa o mesmo que princípio fundamental. Trata-se de conceito mais amplo, abrangendo todas as prescrições que dão sentido básico à ordem constitucional. Desta forma, é possível conceituar preceito fundamental como toda norma constitucional (norma princípio ou norma regra) que é utilizada como fundamento básico para a conformação e preservação da ordem política e jurídica do Estado. Assim, caso o questionamento da lei municipal fosse em razão de descumprimento de preceito fundamental, esta ação seria cabível. d) Ação popular: R: Ação popular é o meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos ilegais e lesivos do patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiros públicos. A ação popular é uma forma de exercício da soberania popular, permitem ao povo, de forma direta, exercer a função fiscalizatória do Poder Público. A ação popular deve ser utilizada para atos lesivos em concreto, não sendo o instrumento apropriado para o controle abstrato da legislação. e) Ação Civil Pública: R: A ação civil pública é um instrumento processual de ordem constitucional destinado à defesa de interesses difusos e coletivos. O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a legitimidade da utilização da ação civil pública como instrumento idôneo de fiscalização incidental de constitucionalidade, pela via difusa, de quaisquer leis ou atos do Poder Público, mesmo quando contestados em face da Constituição da República, desde que, nesse processo coletivo, a controvérsia constitucional, longe de identificar-se como objeto único da demanda, qualifique-se como simples questão prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal. f) Ação de rito comum: R: Nas ações de rito comum, a inconstitucionalidade de lei municipal só poderá ser suscitada de forma incidental, pela via difusa. 4. Pode o Supremo Tribunal Federal, ao julgar Recurso Extraordinário que trate de matéria tributária modular os efeitos de decisão proferida em sede de controle difuso de constitucionalidade de forma a lhe dar efeitos ex nunc, proibindo com efeitos erga omnes a repetição do indébito tributário dos valores recolhidos até a data do julgamento? Quais os limites previstos em nosso ordenamento para a modulação de efeitos em controle de constitucionalidade em matéria tributária? Pode haver modulação de efeitos por meio da edição de Súmula Vinculante? (Vide o RE 556.664-1, na parte afeta à modulação de efeitos – ementa e parte final da discussão em Plenário – e a Súmula Vinculante n. 8) R: A declaração de inconstitucionalidade de norma tributária terá os efeitos prospectivos aplicado apenas se justificado naquelas hipóteses excepcionais em que haverá situação irreparável ao patrimônio público, avaliada depois de considerada todas as possibilidades, controlando se a irresponsabilidade legislativa e vedando sua utilização para impedir a restituição de tributos. Além disso, cabe ressaltar que preferencialmente, o instituto de modulação de efeitos deve ser utilizado especialmente para resguardar os direitos fundamentais dos contribuintes, devido estes terem maior carga axiológica em relação aos interesses arrecadatórios. Logo, é esperado que o STF ao aplicar a modulação de efeitos fundamente sua decisão baseado nos preceitos constitucionais. Quando o assunto é matéria tributária, há preocupação com a governabilidade não se sobreponha aos mandamentos constitucionais. 5. A empresa Xpto propôs ação de repetição de indébito tributário em face da União, obtendo decisão, transitada em julgado junto ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, reconhecendo a inconstitucionalidade da lei instituidora do tributo pago e condenando a União na restituição. Iniciada a fase de cumprimento de sentença contra a União sobreveio decisão de mérito do STF, em Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), julgando a mesma lei constitucional (isto significa que a referida Adin foi julgada improcedente e que o controle de constitucionalidade exercido foi o concentrado). Pergunta-se: a) É necessário o ajuizamento de ação rescisória pela União objetivando a desconstituição da coisa julgada para não ter que cumprir a sentença que a condenou à restituição do tributo? Se afirmativa sua resposta, indicar o fundamento legal contido no CPC/15 que respalde sua conclusão. Se negativa sua resposta, justifique-a indicando a solução processual que a União deve adotar, bem como o dispositivo do CPC/15 que respalde sua conclusão. (vide Anexo III) R: Será necessário ajuizamento de ação rescisória para fins de desconstituir a coisa julgada, substituindo a decisão rescindenda por outra. As matérias que podem ser arguidas em sede de ação rescisória foram transportadas do art. 485 do CPC/73 e adaptadas no CPC/15 em seu art. 966, também tratando especificamente dos temas passiveis de constar em ação rescisória. Assim, a referida hipótese não se abarca naquelas previstas no CPC, por serem taxativas. b) Tendo havido modificação posterior da jurisprudência do STF, em sentido oposto ao da coisa julgada e por meio de controle difuso de constitucionalidade, em recurso extraordinário em que houve o reconhecimento da repercussão geral da matéria, a conclusão a que você chegou na resposta “a” mudaria? Justifique. R: Considerando a segurança jurídica, os efeitos de tal modificação, o estabelecimento de nova disciplina concreta da situação jurídica da parte interessada, ainda que possível, estará sempre subordinado à existência de um novo pronunciamento jurisdicional, desde que comprovada a alteração do estado de fato ou de direito cuja ocorrência possa legitimar, diante desse novo quadro, o ajuizamento de outra ação e o reconhecimento, por sentença, de um novo “status” jurídico daí decorrente. 6. Um contribuinte recolheu determinado tributo a partir de uma base de cálculo prevista em lei. A instrução normativa regulamentadora (IN n. 01/02) esclareceu que, na base de cálculo, não deveria ser considerado o valor do transporte pago a terceiro (frete). Um ano depois, a IN n. 03/03 esclareceu que o frete pago a terceiro integraria a base de cálculo do tributo em questão. Nesse contexto, o contribuinte consultou você questionando a necessidade de complementação do recolhimento durante a vigência da IN n. 01/02. O que você responderia? Analise os arts. 100, 103 e 146 do CTN na resposta. R: Nos termos da redação do art. 146 do CTN: Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução. Diante do exposto, entende-se que será devido somente a partir da IN03/03. Retroatividade benéfica, retroage somente se beneficiar o contribuinte. Entendimento contrário violaria a segurançajurídica por meio de um aumento da base de cálculo de tributo para fatos pretéritos. 7. Analisando o ordenamento jurídico como um todo, isto é, as normas de direito material (constitucional e tributário) e processual civil, texto constitucional e infralegal, indique mecanismos cuja função no sistema é dar efetividade à segurança jurídica, justificando sua resposta com motivos e indicação do dispositivo normativo. Para auxiliá-lo(a), segue um exemplo: formação da coisa julgada num processo, mecanismo processual que impede a rediscussão da mesma questão em outro processo – art. 5º, XXXVI da Constituição Federal/1988, art. 502 do CPC/2015. R: As normas jurídicas devem tender a dar efetividade às garantias constitucionais gerando previsibilidade ao jurisdicionado. A boa-fé objetiva reflete naturalmente a relevância do princípio da preservação da dignidade humana erigido à fundamento da República Federativa do Brasil, nos termos do texto constitucional vigente. Um mecanismo cuja função no sistema é dar efetividade à segurança jurídica, foi introduzido pelo Código de Processo Civil de 2015 e é chamado de "microssistema de solução de casos repetitivos". Dentro desse microssistema estão as figuras do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR (artigos 133 e seguintes) e o Incidente de Assunção de Competência (artigo 947), que demonstram a força da concepção verticalizadora de jurisdição adotada por este diploma legal.