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Psicologia Social Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Dra. Gisele de Lima Fernandes Ribeiro Profa. Ma. Nirley Dragonetti Revisão Textual: Profa. Dra. Selma Aparecida Cesarin O que é Psicologia Social • A psicologia e suas abordagens • Psicologia e outras ciências • Psicologia Social • Sociologia e psicologia: influências na psicologia social • Influência da Sociologia • Influência da Psicologia • A nova Psicologia Social · O que difere a Psicologia Social da Psicologia?; · Como a Psicologia se relaciona com as Ciências Sociais?; · Quais as influências da Psicologia Social? OBJETIVO DE APRENDIZADO Seja bem-vindo(a) às nossas discussões sobre Psicologia Social ! Saiba que esta Disciplina tem como propósito de estudar da Psicologia em seus aspectos gerais, bem como da Psicologia Social, além de compreender as relações entre as áreas de conhecimento relacionadas às ciências sociais na contemporaneidade e seus desafios, oferecendo-lhe contato com as discussões mais recentesdessaárea;alémdelheproporcionarmomentosdeleitu ra – textual e audiovisual – e reflexãosobreostemasqueserãoaquidiscutidos,co ntribuindo com sua formação continuada e trajetória profissional. Esta Disciplina está organizada em quatro unidades, cujo eixo principal será, ou seja,que dê conta de apresentar o conceito de Psicologia Social, as etapas do desenvolvimento humano e o entendimento do ser humano nos ambientes sociais, para que se possa entender a Psicologia Social na contemporaneidade, é o que você encontrará nas próximas unidades. ORIENTAÇÕES O que é Psicologia Social UNIDADE O que é Psicologia Social Contextualização “Ó Professora: Vou contar a história da psicologia social do ‘meu jeito’ Lucas Roberto Pedrão Paulino Marillicia Witzier Antunes Ribeiro Palmieri Venho por meio de este ensaio contar a rapsódia História da Psicologia Social, sob a perspectiva da minha ideologia. Mas espera aí: sob a perspectiva da minha ideologia? (...) Cada ser humano portador de uma (...) uma estrutura que, no decorrer de sua existência aqui na Terra, é modificada de acordo com suas experiências – muito lindo toda essa citação, não é? Palavras bonitas, mas falta objetividade. Há muitas ideologias que circulam na sociedade, sabia? Na verdade, elas não são uma criação somente minha. É sério! Vamos, acompanhe-me numa viagem ao interior de mim, leia meus pensamentos ‘digitados’: Eu não tinha parado para pensar que desde que nasci e depois com o passar do tempo eu não aprendi coisa alguma sozinho, sempre aprendi com a mamãe, depois com mamãe e papai, depois com mamãe, papai, vovô, vovó, tios, tias, primos, primas, colegas da escola, namorada, enfim aprendi muitas coisas com muita gente. Foi aí que acabei descobrindo ‘... que a sociedade (os outros) é cheia de regras: eu devia pensar antes de agir, pensar para resolver problemas, pois ‘pensar’ era ser inteligente’ (Lane, 2002, p.14) . Pensar! Eis a chave para não correr um sério risco: o de estar sendo dominado pelos ‘outros’ e, pior, de estar permitindo a dominação ‘dos outros’ em mim. ‘Para! Para tudo! Calma lá ...’ Será que passei muito tempo pensando que era ser humano, mas não passava de um papagaio? Será que passei muito tempo como um autômato só reproduzindo normas e regras sociais sem ao menos reconhecer que o meu agir e o meu pensar estavam desconectados? Sei lá!... Só sei que levou um tempo para passar de papagaio e autônomo, para alguém capaz de pensar, agir e sentir de acordo com a minha consciência, buscando construir a minha identidade.” O texto do quadro é parte do artigo “A história da Psicologia Social contada da perspectiva do aluno que não fez ‘a tarefa de sempre’”. Com uma narrativa bem humorada, o artigo, na íntegra, aborda conteúdos teóricos e históricos da Psicologia Social. Lucas Roberto Pedrão Paulino, o tal aluno que decide contar a história da Psicologia Social do seu jeito, proporciona, por meio de sua reflexão, a possibilidade de analisar como o que somos é resultado da Sociedade em que vivemos. Neste contexto, esta Unidade procura apresentar uma breve história da Psicologia Social, destacando como diferentes abordagens teóricas influenciam uma Ciência e, especialmente, como diferentes formas de compreensão de um mesmo fenômeno podem afetar a análise que dele fazemos. 6 7 A psicologia e suas abordagens A busca pela compreensão do ser humano é bastante remota. Podemos afirmar que entre os registros mais antigos das indagações do homem para compreender o comportamento humano, bem como suas relações com o ambiente que o cerca, estão aqueles que se referem ao pensamento socrático, no século IV antes da Era Cristã. Pensadores gregos como Sócrates, Platão e Aristó- teles já buscavam compreender questões relacionadas à imortalidade da alma e ao conhecimento nela con- tido, sendo assim considerados pensadores primitivos da Psicologia. Sócrates, primeiro filósofo que se ocupou em es- tudar o comportamento humano, atribuiu ao homem a razão, distinguindo-o dos demais seres da natureza. Discípulo de Sócrates, Platão também se ocupou da busca por compreender o ser humano, especialmente questões relacionadas à distinção corpo e alma, pos- tulando que a alma inteligente e imortal estaria presa ao corpo mortal. Fig. 01 – Sócrates Fonte: wikimedia/commons Já Aristóteles, o discípulo de Platão, avançou em seus estudos, buscando respostas às questões relacionadas não só à razão, mas também à percepção e às sensações, entre outras. Fig. 02 – Wilhelm Fonte: wikimedia/commons A história da Psicologia mais contemporânea, também destaca importantes pensadores. Entre eles, um dos estudiosos que merece destaque é o médico, psicólogo e filósofo Wilhelm Wundt (1832-1920). Entre as grandes contribuições de Wundt, está a criação do primeiro laboratório de Psicologia Experi- mental na Universidade de Leipzig, na Alemanha, no ano de 1879. A inauguração do primeiro Laborató- rio de Psicologia Experimental contribuiu por trazer à psicologia status de Ciência, conferindo à Wundt importante destaque. 7 UNIDADE O que é Psicologia Social Fig. 03 – Universidade de Leipzig Fonte: wikimedia/commons Sucessivo à criação do laboratório de Psicologia Experimental, a Universidade de Leipzig, oficializa, em meados da década seguinte, 1880, a criação de um Instituto de Psicologia Experimental, Instituto este que se tornou referência internacional na formação de psicólogos. E, à medida que a Psicologia passava a contar com Metodologia Científica própria e estudos em laboratórios, esta se afastava da Filosofia que havia marcado o início de sua história, passando a adquirir status de Ciência (BOCK, FURTADO & TEIXERA, 2008). “Seu status de ciência é obtido à medida que se ‘liberta’ da Filosofia, que marcou sua história até aqui, e atrai novos estudiosos e pesquisadores” (BOCK, FURTADO & TEIXERA, 2008, p. 41). No entanto, é importante considerar que, ainda que o Laboratório de Leipzig marque o surgimento da Psicologia Científica, a constituição de uma Psicologia Científica não pôs fim à Psicologia Filosófica. Ou seja, a despeito de a inauguração do Laboratório de Psicologia na Universidade de Leipzig ser um importante marco de constituição da Psicologia Científica, é certo considerar que os experimentos ali desenvolvidos não representavam todo o debate da Psicologia da época, mas sim parte dele. Se por um lado as preocupações dos pesquisadores do Instituto de Psicologia da Universidade de Leipzig, muitos deles doutorandos orientados por Wundt, era a compreensão, por meio de experimentos, de fenômenos relacionados às sensações, percepções, associações e memória; por outro lado, investigações de uma Psicologia de caráter menos experimental eram desenvolvidas por outros pensadores, em outros centros de pesquisa. Importante! Entre os objetivos a que se propôs Wundt, estava a criação de uma Psicologia Social? Para Wundt fenômenos coletivos não poderiam ser reduzidos àconsciência individual, mas sim à coletividade. Você Sabia? 8 9 A diversidade metodológica existente no passado é ainda hoje uma forte marca da Psicologia. Esta ciência tem se aventurado por diferentes formas do saber. A Psicologia atual é constituída tanto por abordagens que tendem mais ao caráter científico, como também por abordagens que tendem ao caráter mais filosófico. Ou seja, as abordagens teóricas que vigoram na Psicologia na atualidade são oriundas das diferentes formas de compreensão e de produção do conhecimento acerca do ser humano que eram desenvolvidas nos séculos passados. Psicologia Cientí�ca Psicologia Filosó�ca ≠ Fig. 04 Fonte: Adaptado de istock/getty images Entre tais abordagens podemos citar, por exemplo, a Análise do Comportamento ou a Comportamental Cognitiva, oriundas de movimentos behavioristas ligados aos laboratórios experimentais; ou, ainda, abordagens junguiana e lacaniana, que tiveram origem na Psicanálise, abordagem desenvolvida por Sigmund Freud e de caráter mais filosófico. Psicologia e outras ciências A Psicologia, como vimos, apresenta abordagens e metodologias de estudo distintas, conforme suas linhas de pensamento. Bock, Furtado e Teixeira afirmam, e entendo que não sem razão, que “provavelmente, a Psicologia jamais terá um único paradigma confiável que possa ser adotado por todos, sem questionamento”, visto que, “as diferentes formas de pensar a Psicologia representam a própria riqueza do ser humano e suas capacidades múltiplas de pensar sobre si mesmo” (2008, p. 21). “[...] as diferentes formas de pensar a Psicologia representam a própria riqueza do ser humano e sua capacidade múltiplas de pensar sobre si mesmo” (BOCK, FURTADO & TEIXERA, 2008, p. 21). No entanto, saiba que essa multiplicidade de abordagens teóricas não é exclusiva da Psicologia; tal multiplicidade ocorre, também, com as chamadas Ciências Humanas Sociais, que, tal como a Psicologia, apresentam diferentes e, porque não dizer, divergentes abordagens teóricas. 9 UNIDADE O que é Psicologia Social Além de compartilhar a multiplicidade de abordagens com as demais Ciências Humanas E Sociais, a Psicologia, ao longo de seu desenvolvimento, tem demonstrado também aplicabilidade de seu conhecimento em diversas outras áreas do saber e tem, por outro lado, buscado também a contribuição dessas outras áreas para seu próprio desenvolvimento. Entre essas diversas áreas do saber estão, por exemplo, a Sociologia, a Antropologia e as Ciências Políticas, entre outras. Bock, Furtado e Teixeira (2008) comentam que diante da complexidade da sociedade em que vivemos, a interdisciplinaridade do saber torna-se essencial para a compreensão do ser humano. A união dessas diversas formas de saber pode enriquecer umas as outras. “Operários”, 1933, de Tarsila do Amaral. Disponível em: https://goo.gl/PmGuHGEx pl or A importância da união da Psicologia com outras áreas do saber, ou seja, da interdisciplinaridade, está na possibilidade de cada uma contribuir com seus conhecimentos sobre o ser humano (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 2008). Psicologia Social Da relação com as Ciências Sociais surge um ramo da Psicologia cujo foco de estudos está na compreensão da relação do homem com a Sociedade, além das expectativas e reações provenientes de tal relação. Tal ramo da Psicologia é denominado Psicologia Social. Rodrigues, Assmar e Jablonski definem a Psicologia Social como “O estudo científico da influência recíproca entre as pessoas (interação social) e do processo cognitivo gerado por esta interação (pensamento social)” (2009, p.13). Ou seja, a Psicologia Social busca compreender, por meio de uma metodologia científica, como se dão as relações sociais e como estas relações afetam os indivíduos, gerando novas ações e reações. A Psicologia Social é a área da Psicologia que busca estudar a interação social e procura estudar cientificamente a influência recíproca entre as pessoas (interação social) e o processo cognitivo gerado por esta interação (pensamento social)” (RODRIGUES, ASSMAR & JABLONSKI, 2009, p.13). Ex pl or Mas, se a Psicologia, de forma geral, sofre influência de uma multiplicidade de abordagens, com a Psicologia Social não há diferença. Esse ramo da Psicologia que busca compreender a interação social e o pensamento social também recebe influência de distintas abordagens, ou, mais especificamente, de distintas Ciências. 10 11 O estudo dessas relações que os indivíduos mantém entre si, influenciando-se mutuamente, resulta em uma “pluralidade e multiplicidade de abordagens teóricas” (FERREIRA, 2010, p.51), que por um lado favorece a produção de conhecimento, mas de outro dificulta a delimitação do objeto de estudo desta Ciência. Sociologia e psicologia: infl uências na psicologia social Robbins (2005) é contundente ao definir a Psicologia Social como uma mistura de conceitos da Psicologia e da Sociologia. Bock, Furtado e Teixeira (2008) reiteram tal definição, confirmando a influência das duas ciências na constituição da Psicologia Social, mas ampliam a discussão ao introduzir a noção de antagonismo dessas duas ciências na forma como influenciaram a Psicologia Social. Desse modo, é correto afirmar que a Psicologia Social se desenvolve acolhendo quer a visão sociológica, quer a visão psicológica: ainda que se mostrem antagônicas. Enquanto a Sociologia defende que o comportamento dos indivíduos é determinado pela sociedade; a visão da Psicologia sustenta que o individuo autodetermina seu comportamento a partir da percepção que tem da Sociedade na qual está inserido. Importante! Sociologia: é Comportamento dos indivíduos determinado pela sociedade. Psicologia: é Comportamento dos indivíduos é autodeterminado a partir da percepção que tem da Sociedade na qual está inserido. Importante! Infl uência da Sociologia No que se refere à visão da Sociologia, temos a chamada Teoria dos Papéis Sociais, que embasa tal visão. Na concepção da Teoria dos Papéis Sociais, o indivíduo se comporta de acordo com as normas e valores sociais, desempenhando, ao longo da vida, diferentes papéis que lhes são estabelecidos. Pense em uma situação, um jovem que pertence a um determinado grupo social. Por exemplo: o grupo pode ser de colegas da escola, do trabalho, da igreja que frequenta, do bairro, enfim, qualquer grupo social. Pertencer a este grupo é importante para esse jovem? Se sim, ele seguirá as normas desse grupo, ainda que não concorde com elas, pois buscará manter- se coeso e pertencente ao grupo. Por outro lado, se não for importante para ele pertencer ao grupo, ele tenderá a não obedecer as normas. 11 UNIDADE O que é Psicologia Social De acordo com a Teoria dos Papéis Sociais, desempenhamos diversos papéis ao longo da vida e nos diversos grupos sociais aos quais pertencemos; podemos ser filho, pai, profissional, cônjuge, vizinho e tantos outros personagens na Sociedade na qual estamos inseridos. Em cada grupo, desempenhamos um determinado papel, adaptando-nos às diferentes situações sociais. Vamos a mais um exemplo? Pensemos em um determinado homem, a quem chamaremos de José. José é bastante competente e bem sucedido profissionalmente – papel profissional; mostra-se bastante apegado à família, dedicado, responsável e amoroso com os filhos – papel pai, além de ser bom companheiro para com a esposa – papel cônjuge. Contudo, José tem se mostrado relapso com os pais, a quem pouco visita. Delega aos irmãos os cuidados e o acompanhamento dos pais, não se envolvendo nesta tarefa – papel filho. José é também pouco participativo nos debates e na tomada de decisão do condomínio no qual reside ou em questões políticas – papel condômino e papel de cidadão. Fig. 05 Fonte: iStock/Getty Images José, de acordo com o que lemos, tem desempenhado vários papéis. Muitos outros papéis José pode desempenhar em sua vida, assim como nós desempenhamos vários papéis em nossas vidas também. No exemplo, vemos queJosé se dedica mais a alguns de seus papéis e menos a outros. De acordo com a visão sociológica, podemos justificar suas escolhas acerca de a quais papéis se dedicará mais ou menos e qual valorização que ele dá em pertencer ou não a determinados grupos. Quanto maior for a valorização por pertencer a um grupo, mais seguiremos suas normas e suas regras, tornando-nos mais coeso com esse grupo. 12 13 Ainda sobre o exemplo de José, podemos afirmar que os comportamentos apresentados por ele certamente receberão elogios, mas também críticas por parte dos diferentes grupos sociais e tais opiniões poderão influenciar a maneira como ele continuará se comportando. Esses elogios e críticas representarão o que se chama de pressão social ou controle social. O quanto este controle social influenciará o comportamento de José nos mostrará quanto há de controle social sobre suas ações, sobre seu comportamento. Sobre a pressão social, Durkheim (1858-1917), um dos principais estudiosos da Sociologia e da Psicologia Social, afirma que quando o homem não se submete a tais regras sociais sofre uma penalidade por não fazê-lo. Nas palavras do teórico: “Se não me submeto às convenções do mundo (...) os costumes observados em meu País (...) o riso que provoco, o afastamento em relação a mim produzem, embora de maneira mais atenuada, os mesmos efeitos que uma pena propriamente dita” (2007, p.3). Assim, o fato de sermos seres sociais nos molda à forma como nos relacionamos com o mundo que nos cerca. Não estamos alheios a isso! “A construção do ser social, feita em boa parte pela Educação, é a assimilação pelo indivíduo de uma série de normas e princípios – sejam morais, religiosos, éticos ou de comportamento – que balizam a conduta do indivíduo num grupo. O homem, mais do que formador da sociedade, é um produto dela” (Émile Durkheim). Ex pl or Em contrapartida às influências sociológicas temos as influências da Psicologia. Infl uência da Psicologia A compreensão dos diferentes papéis que o indivíduo desempenha na sociedade também é comum à visão psicológica do indivíduo. No entanto, para a Psicologia, as pressões sociais só influenciarão o indivíduo caso ele às perceba. Se não houver percepção pelo indivíduo da pressão social, ela não influenciará seu comportamento. Se, por um lado, a compreensão das normas e dos papéis grupais são fundamentais para a compreensão da visão sociológica; conceitos como percepção, formação de atitudes e processo de socialização tornam-se essenciais para a compreensão da visão psicológica acerca de como se comporta o homem na Sociedade. Para a Psicologia, o homem se comportará de acordo com a forma como percebe a si mesmo e percebe a situação que o cerca. 13 UNIDADE O que é Psicologia Social Robbins define a percepção como “O processo pelo qual os indivíduos orga- nizam e interpretam suas impressões sensoriais com a finalidade de dar sentido ao ambiente” (2005, p.104). Ou, mais especificamente, a forma como os indi- víduos organizarão e interpretarão os diversos estímulos aos quais se submetem receberá influência direta do repertório que ele possui. As crenças, valores e conhecimento de uma determinada pessoa influenciará a forma como ela julgará um determinado acontecimento. Vamos a um exemplo diferente? Você já deve ter reparado que, diante de um acidente de trânsito, algumas pessoas se ocupam em ajudar a socorrer as vítimas, auxiliando profissionais que trabalham no socorro; como também há pessoas que apenas observam; há os que passam pela situação sem se ater ao que está ocorrendo; como também há aqueles que aproveitam para registrar o momento com uma self e divulgar nas redes sociais, evidenciando que presenciaram o ocorrido: isso para pensarmos em apenas algumas das possíveis formas de reagir a uma mesma ocorrência. Não estamos aqui para julgar qual ação é melhor ou qual é pior, mas apenas para ilustrar como diferentes pessoas diante de uma mesma ocorrência (acidente) organizam e interpretam a situação (percebem) e, consequentemente, reagem a ela. Essas diferentes formas de agir e de reagir serão influenciadas, como já dito, pelo repertório que cada pessoa possui. Ou seja, o que tais pessoas vivenciaram, o que aprenderam na vida e com a vida, quais são seus grupos sociais e como reagem a eles, em qual cultura essas pessoas estão inseridas, e assim por diante. Em síntese, a visão psicológica considera que o comportamento dos indivíduos é autodeterminado a partir da percepção que tem da Sociedade na qual está inserido. O comportamento sofre, sim, influência social, mas não é predeterminado, mas sim dependerá de quem esse indivíduo é e de como ele reagirá nas diversas situações. “O mundo importante para o comportamento é o mundo na forma em que é percebido” (ROBBINS, 2005, p. 104). Para usar as palavras de Ferreira a “pluralidade e multiplicidade de abordagens teóricas” (2010, p.51) acerca da Psicologia Social não se encerram aqui. Há ainda uma visão que se opõe quer às influencias sociológicas, quer às influencias psicológicas, inaugurando o que se chama a Nova Psicologia Social. 14 15 A nova Psicologia Social Nos anos 1970, conforme afirmam Bock, Furtado e Teixeira (2008), há uma crítica às visões da Psicologia Social que vigoravam até então, isto é, aquela influenciada quer pela visão sociológica, quer pela visão psicológica. A Psicologia Social aqui procura aprofundar o conhecimento da natureza social do fenômeno psíquico, passando a estudar o psiquismo humano, entendendo que a construção do mundo interno do ser humano se dá a partir das relações sociais vividas por ele. O que chamamos de subjetividade humana, na qual “o mundo objetivo passa a ser visto não como fator de influência para o desenvolvimento da subjetividade, mas como fator constitutivo” (BOOK, FURTADO & TEIXEIRA, 2001, p. 141). Os pesquisadores mais contemporâneos, entre eles Pichon-Riviére, defendem que o indivíduo é constituído quer pelas influências externas, quer pelas influências internas. Fig. 06 – Pichon-Riviére Fonte: kennedy.edu.ar “Desde as primeiras experiências, as necessidades do sujeito se transformam, e, em consequência, o próprio sujeito se transforma” (GAYOTTO, 1992, p.64). Ou ainda, nas palavras de Bock, Furtado e Teixeira “[...]o indivíduo age sobre o mundo, transformando-o, e, ao fazer isso, transforma a sim mesmo” (2008, p. 184). A Nova Psicologia Social irá aprofundar-se em estudos inerentes aos conceitos básicos de atividade, de consciência e de identidade. Estas são características da essência do ser humano, que demonstram e expressam a manifestação humana. Segundo Bock, Furtado e Teixeira (2001), é pela atividade que o homem se apropria do mundo em que vive. A atividade que oferece condições para a transição do que está do lado externo dele para seu interior. Por exemplo: um bebê se apropria do mundo explorando o ambiente, engatinhando e manuseando os objetos e brinquedos. É nesse movimento de exploração que o homem constrói a base do conhecimento e do pensamento. Na consciência humana, temos a forma como o homem se relaciona com o mundo externo (objeto). Ela é o resultado das relações sociais que os homens estabelecem. 15 UNIDADE O que é Psicologia Social O homem é capaz de entender o mundo por meio de imagens, símbolos e de estabelecer relações entre os objetos desse mundo. Essas relações podem estar no trabalho, na vida social e na linguagem. Esta última, podemos entender como as expressões da consciência. Assim, quando alguém diz alguma coisa ou algum tema, ele está se reportando ao mundo real e expressa sua consciência por meio de representações sociais. “A representação social é a denominação dada ao conjunto de ideias que articula os significados sociais” (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 2001, p.144). Ainda segundo o autor, a representação social também pode ser definida pelo sentido construído de forma coletiva atribuída ao objeto, com o sentido pessoal. Podemosconsiderar aqui os valores, as crenças e as imagens que os seres humanos constroem ao logo de suas vidas, em decorrência da vivência em Sociedade. Outro ponto importante para essa nova Psicologia Social é o conceito de identidade. Ela é o conceito dado às representações e sentimentos que o homem desenvolve a respeito de si próprio, a partir do universo de suas experiências. Ou seja, “A síntese pessoal sobre o si-mesmo, incluindo dados pessoais (cor, sexo, idade), biografia (trajetória pessoal), atributos que os outros lhe conferem, permitindo uma representação a respeito de si” (BOCK,FURTADO & TEIXEIRA, 2001, p.145). Ao pensarmos em como as inovações tecnológicas tem influenciado as pessoas nos grandes centros urbanos, desencadeando no ser humano a necessidade de rever regras sociais, criando, por exemplo, a netiqueta ou, ainda, criar normas jurídicas que controlem os possíveis crimes digitais, uso exacerbado da tecnologia tem feito com que as relações do ser humano com seus pares e com a Sociedade de forma geral seja modificada. Netiqueta: Neologismo que se refere a um conjunto de normas e de boas maneiras que devem ser adotadas pelos usuários da internet.Ex pl or Todavia, sabemos que, a despeito da evolução da tecnologia ocorrida no Brasil nos últimos anos, há muitas regiões do país ainda sem acesso a essas modernidades. E, em tais regiões, nas quais o avanço tecnológico ainda não chegou, certamente as relações sociais e culturais, bem como o contato com o ambiente, são muito distintas daquelas que ocorrem nas regiões com mais recursos tecnológicos. Por isso é relevante compreender que a Psicologia Social busca compreender o ser humano como um ser social, inserido em um grupo social e em um ambiente social, isto é, um ambiente humanizado. Esse ser humano afetará seu grupo social e o ambiente no qual vive, mas também será por eles afetado. Entre vários possíveis exemplos de como o ser humano interfere no modo como seu grupo age e seu ambiente social está o livro A Terceira Onda, de Alvin Toffler – fica o convite para a leitura completa da obra. 16 17 Toffler (1980) faz vários apontamentos acerca das modificações vividas pela sociedade ao longo dos tempos. Entre os apontamentos, Toffler destaca as mudanças ocorridas na família, que passa de uma estrutura estendida na Era Agrícola, vista como uma unidade econômica e formada por todos os parentes de um mesmo clã, para uma estrutura mais enxuta na Era Industrial, denominada família nuclear e formada apenas por pai, mãe e filhos, até chegar à Era Tecnológica, na qual ó conceito de família é novamente modificado dando lugar às famílias formadas por apenas um dos pais, casais sem filhos e pessoas solteiras que vivem sozinhas, entre outras. É certo que a depender do grupo social, a visão de família hoje, para muitos, ainda seja a mesma descrita na primeira onda e família seja representada por todos os parentes. A verdade é que não há certo ou errado, mas isso só evidencia como o grupo social, o ambiente social influencia o ser humano e, este, influencia os demais. E você, consegue pensar em outras questões em nossa sociedade que sofrem infl uencia direta de fatores sociais? Bom, fi ca o convite à refl exão. Ex pl or Enfim, a Psicologia Social, esse ramo da Ciência denominada Psicologia, sofre diferentes influências que regerão a forma como tal ramo procurará compreender e explicar a relação do homem com o mundo que o cerca. 17 UNIDADE O que é Psicologia Social Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Durkheim – Sociologia RODRIGUES, A. (Org.) e FERNANDES, F. (Coord.). Durkheim – Sociologia. 9.ed.11. imp. São Paulo: Ática, 2008; Vídeos A Psicologia Social e o Social na Psicologia A história da Psicologia Social no Brasil e seus ícones podem ser conhecidos em: https://youtu.be/PeOqV1zvXkE Leitura A história da psicologia social contada da perspectiva do aluno que não fez a “tarefa de sempre” A história da psicologia social contada da perspectiva do aluno que não fez “a tarefa de sempre”. Autores Lucas Roberto Pedrão Paulino e Marilicia Witzler Antunes Ribeiro Palmieri. https://goo.gl/24dNoe Psicologia Social e Serviço Social: uma relação interdisciplinar na direção da produção de conhecimento Para aprofundar o assunto sobre a interdisciplinaridade, recomendamos o artigo disponível em: https://goo.gl/xZvPCx 18 19 Referências BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi. Psicologias: uma introdução ao estudo de Psicologia. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. ________. Psicologias: uma introdução ao estudo de Psicologia. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2001. ________. Psicologia Fácil. São Paulo: Saraiva,2011. DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. Tradução de Paulo Neves. Revisão de tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2007. FERREIRA, Maria Cristina. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 26 n. especial, p. 51-64, 2010. GAYOTTO, Maria Leonor Cunha. Socialização segundo Pichon-Rivière. In: ________. et. al. Creches: desafios e contradições da criação coletiva da criança pequena. São Paulo: Ícone, 1992. LANE, Silvia Tatiana Maurer. A dialética da subjetividade versus objetividade. In: Odair Furtado e Fernando L. González Rey (Ed.). Por uma epistemologia da subjetividade: Um debate entre a teoria sócio-histórica e a teoria das representações sociais. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002, p. 11-7. ________. O que é Psicologia Social. 22 ed. São Paulo: Brasiliense, 2001. PAULINO, L. R. P.; PALMIERI, M. W. A. R. A história da psicologia social contada da perspectiva do aluno que não fez “a tarefa de sempre”. Athenea Digital,n.17, p.163-178, mar. 2010. ROBBINS, Stephen P. Comportamento Organizacional. Tradução técnica de Reynaldo Marcondes. 11.ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005. RODRIGUES, Aroldo; ASSMAR, Eveline Maria Leal; JABLONSKI, Bernardo. Psicologia Social. 27.ed. Petrópolis: Vozes, 2009. TOFFLER, Alvin. A terceira onda. 16.ed. Rio de Janeiro: Record, 1980. 19