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DIREITO EMPRESARIAL 1 DIREITO EMPRESARIAL Graduação 111 DIREITO EMPRESARIAL U N ID A D E 5 CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO Nesta unidade, analisaremos duas matérias de suma importância para o Direito Empresarial, com aplicabilidade prática até mesmo para aqueles que não exercem atividade econômica, pois ambas são utilizadas no dia-a-dia do cidadão comum. Estudaremos, primeiramente, os contratos empresariais cuja principal característica é a presença de empresário como uma das partes contratantes, não importando ser contratante ou contratado. Nesta primeira parte, aprenderemos quais os principais contratos empresariais existentes, a quem se aplicam e quais as regras essenciais para sua validação jurídica. De outro lado, abordaremos os títulos de créditos e documentos existentes para facilitar o registro de relações de crédito entre pessoas. À primeira vista, tal tema aparenta ser algo desconhecido dos alunos, mas ao citar dois exemplos de títulos de crédito, a matéria torna-se familiar: cheque e nota promissória. Conheceremos neste tópico os títulos de créditos mais utilizados, suas normas e, ainda, os direitos e deveres do credor e do devedor. A razão de se unir estas duas matérias em uma única unidade decorre do fato de serem ambas as matérias ligadas à forma de se documentar relações de crédito, além disso, não podemos deixar de citar a íntima relação existente entre tais temas, visto que para ter maior segurança nas relações jurídicas é comum que se utilizem em uma mesma negociação ambos os institutos jurídicos. Para melhor compreender, em caso de empréstimos bancários (contrato empresarial), é comum se vincular título de crédito, geralmente, nota promissória. Portanto, muita atenção nos capítulos abaixo, vez que lhe serão úteis tanto em sua vida profissional como pessoal. Bom estudo! OBJETIVOS DA UNIDADE • Apresentar ao estudante as principais modalidades de contratos em- presariais e títulos de créditos utilizados no cotidiano do empresariado bem como da população em geral. • Desenvolver no aluno potencial para converter o aprendizado em ações práticas, fornecendo-lhe conhecimento para analisar e criar os docu- mentos estudados, permitindo maior segurança jurídica em negócios que firmar em seu próprio interesse, seja pessoal ou profissional. 112 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO • Conscientizar o leitor acerca da importância surgida a partir da assi- natura de qualquer dos documentos estudados, atribuindo-lhe a in- cumbência de orientar as pessoas com as quais convivem no que tan- ge ao preenchimento e às conseqüências da assinatura desses títu- los. PLANO DA UNIDADE • Compra e venda mercantil. • Contratos bancários. • Outros contratos empresariais. • Títulos de crédito – Letra de Câmbio, Nota Promissória, Cheque e Duplicata. CONTRATOS EMPRESARIAIS A materialização das negociações firmadas no meio empresarial é feita através de contratos que se denominam empresariais ou mercantis. A validade destes contratos é condicionada à existência de um empresário como sendo umas das partes. Sabe-se que todos os contratos possuem contratante e contratado e, ao menos um deles, terá que ser sociedade empresária ou empresário individual. Passemos, então, à análise das espécies de contratos empresariais. COMPRA E VENDA MERCANTIL Esta modalidade contratual tem por finalidade regulamentar a circulação de mercadorias, sendo que as partes envolvidas, COMPRADOR e VENDEDOR, estabelecerão cláusulas relativas à quantidade e qualidade dos produtos, preço e condições de pagamento, além, claro, das cláusulas habituais de todo e qualquer contrato. O Contrato de Compra e Venda Mercantil é essencial no exercício da atividade atacadista e na relação comercial que mantém com seus clientes, supermercados, mercearias, bares e restaurantes. Dentre as regras previstas em lei, importante demonstrar as obrigações de cada parte, a começar pelo vendedor. A primeira, claro, refere-se à transferência das mercadorias adquiridas pelo comprador. Se omisso o contrato acerca do local da entrega dos produtos, deverá o vendedor se responsabilizar e enviar os produtos. A forma de entrega poderá ser via postal (correios) ou ainda através de veículo próprio ou terceirizado. O risco do transporte (extravio, roubo, furto, acidente, etc.) será do vendedor, salvo se houver cláusula contratual em sentido contrário ou se o transporte ficar a cargo do comprador. 113 DIREITO EMPRESARIAL Deixando de entregar a mercadoria ou o fazendo fora do prazo, poderá o vendedor ser processado por perdas e danos pelo comprador. Outra obrigação do vendedor se refere a sua responsabilização por vícios, que são defeitos que impedem o produto de funcionar corretamente ou no todo. O vício pode ser manifesto, quando facilmente visualizado ou oculto, quando é descoberto através da realização de teste na mercadoria. Segundo a legislação, o comprador deverá informar da existência de vício manifesto no prazo de 30 dias e do oculto, em 180 dias, ambos a contar da entrega do bem. Interessante que, uma vez identificados os vícios, às partes restam duas alternativas: rescindir o contrato ou reduzir proporcionalmente o preço. Estas duas hipóteses estão previstas na lei que trata do assunto, mas como se sabe, em caso de defeito na mercadoria entregue, geralmente, o vendedor faz sua substituição, resolvendo a questão; no entanto, esta possibilidade se trata de costume comercial, não previsto em lei. Por fim, deve ainda a vendedora responder pelos efeitos da evicção, ou seja, quando, após realizada a venda, se descobre que o bem não pertencia ao vendedor, isto é, sua propriedade estava sendo discutida. Nestes casos, o verdadeiro proprietário da mercadoria acaba a retomando e restará ao comprador ajuizar Ação de Indenização contra o vendedor que lhe prometeu a venda de bens cuja propriedade era questionável. Na outra ponta da relação contratual, atribui-se ao comprador a obrigação de pagar o preço no prazo, forma e valor combinados. Para alguns estudiosos do direito, é ainda seu dever averiguar se a mercadoria possui algum vício. Entretanto, não nos parece se tratar de obrigação, mas sim de precaução tal análise, pois não a realizando o contrato não sofrerá qualquer alteração. CONTRATOS BANCÁRIOS Consideram-se contratos bancários próprios (ou típicos) as negociações em que um dos contratantes seja necessariamente uma instituição financeira, não importando se contratante ou contratada. A outra parte pode ser qualquer pessoa, física ou jurídica. Por instituição financeira se deve entender a pessoa jurídica de direito público ou privado, autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil e em sendo estrangeira, deverá obter autorização especial concedida pelo Presidente da República. O objeto contratual é a captação, intermediação ou aplicação de recursos financeiros, seja em moeda nacional ou estrangeira. Feita esta introdução, iniciemos o estudo dos contratos bancários típicos. 1º. Depósito bancário. À primeira vista, muitos desconhecem esta modalidade, no entanto, sabendo-se tratar do que chamamos popularmente de Conta Corrente fica fácil compreendê-lo. 114 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO Por este contrato, o DEPOSITANTE (cliente) entrega valores monetários ao banco que deverá restituí-lo no momento desejado. Atualmente, como é sabido, o depositante (correntista) possui cartão para sacar quantia de sua conta sempre que tiver interesse, mas, a depender do valor, o saque somente poderá ser feito no caixa. Os bancos possuem critérios próprios quanto ao saque de valores significativos, sendo que, geralmente, retiradas superiores à R$100.000,00 (cem mil reais) dependem de aviso prévio a ser feito pelo correntista. Para o encerramento deste contrato que é feito por prazo indeterminado, basta solicitação (verbal ou escrita) feita pelo depositante e devolução de cartões e cheques relativos à conta corrente. Perguntainteressante: se o correntista emitiu cheque e no mesmo dia for ao banco encerrar a conta, sem que o mesmo tenha sido apresentado, obterá êxito? Sim. O banco não pode impedi-lo. Deve informá-lo da existência de cheque ainda não apresentado. Com o fechamento da conta, obviamente o cheque não será compensado e regressará ao credor com a informação de “conta encerrada”. Caberá ao credor ajuizar ação de execução para receber a quantia e se conseguir provar que o propósito do emitente do cheque ao encerrar a conta era não pagar o credor, processá-lo também por crime de estelionato, o famoso artigo 171 do Código Penal. 2º. Mútuo bancário. Por este contrato, o banco (mutuante) empresta certa quantia de dinheiro ao mutuário (cliente), que deverá restituí-la com acréscimos remuneratórios (juros) previamente combinados. Esta espécie é bem conhecida dos brasileiros pelo nome de EMPRÉSTIMO. O início do contrato se dá com a entrega do dinheiro ao mutuário e seu término é especificado em cláusula contratual. Questão controversa se refere aos juros cobrados. A primeira regra a se explicar é que NÃO há limite de sua cobrança estabelecida em lei, competindo ao Conselho Monetário Nacional determiná-lo, porém este Conselho adotou como regra a “lei da oferta-procura”, ou seja, o banco não sofre qualquer restrição quanto ao valor cobrado. Segundo o Conselho, à medida que os mutuários pesquisarem diversos bancos, conseguirão forçar a redução dos juros. Na prática, o que assistimos dista — e muito — desta pretensão. Outra rega se refere à espécie de mutuário. Se pessoa física, atualmente, há julgados dizendo que se trata de consumidor (unidade IV) e por este motivo deve se fazer aplicação de juros legais de 1% por mês. Para “fugir” desta situação, os bancos passaram a inserir no contrato, além dos juros, a famosa taxa de risco com percentuais elevados, já que não há para esta limitação. O mutuário possui três principais obrigações: a) pagar o valor emprestado, no prazo combinado; b) pagar juros, encargos, taxa de risco, comissões, correção monetária e outras taxas estabelecidas; c) proceder às amortizações contratadas. 115 DIREITO EMPRESARIAL Por fim, o mutuário não poderá quitar o contrato de forma antecipada requerendo redução dos juros, pois o banco faz seu cálculo de ganho nas parcelas e prazo estabelecidos. Em se tratando de consumidor (pessoa física) e sendo omisso o contrato, poderá, nesta hipótese, o mutuário quitar antecipadamente com redução proporcional de juros. Mútuo bancário – subespécies FINANCIAMENTO: este contrato é decorrente do empréstimo (mútuo bancário). A principal característica que o torna peculiar é que a quantia de dinheiro emprestada ao financiado deve ser utilizada na aquisição de bem predeterminado, como ocorre com o financiamento da casa própria (imóvel escolhido pelo cliente), o financiamento agrícola (aquisição de insumos, sementes, etc.), ficando o próprio bem como garantia da quitação. Ademais, segue todas as regras aplicáveis ao mútuo bancário. ABERTURA DE CRÉDITO: trata-se aqui do tradicional Cheque Especial (pessoa física) ou Conta Garantida (pessoa jurídica). Esta espécie contratual tem sua existência dependente de outro contrato bancário: o depósito bancário (Conta Corrente, anteriormente estudado). O banco empresta certa quantia ao cliente quando emitir cheque sem provisão de fundos, de forma que o credor receberá o valor normalmente. Por ser espécie de mútuo bancário não há limite na cobrança de juros, razão pela qual observamos hoje em dia, acréscimos remuneratórios de 10%, em média. Portanto, o mútuo bancário além de ser contrato próprio, possui ainda as duas subespécies acima. 3º. Aplicação financeira Popularmente conhecido como “Fundos de Investimento”, este contrato tem como partes o DEPOSITANTE que autoriza o banco (DEPOSITÁRIO) a empregar, no todo ou em parte, o dinheiro mantido em conta de depósito em certo investimento. Compete à instituição financeira remunerar o Depositante de forma a lhe garantir retribuição superior à caderneta de poupança, o que, nos dias atuais, é tarefa bastante simples. Por se tratar de contrato de investimento do risco, o Depositante deve ser orientado que poderá ter perdas no investimento, sendo que só se pode responsabilizar o banco se comprovada má administração da quantia, ilegalidade no investimento e descumprimento do contrato. 4º. Desconto bancário Através desta modalidade contratual, o DESCONTADOR (instituição financeira) antecipa ao cliente (DESCONTÁRIO) o valor do crédito vencido ou não, que este titulariza perante terceiros e o recebe em cessão. Para os que não conhecem este contrato, veja o exemplo. O cliente, Sr. Aristóteles é credor de nota promissória que vencerá em cinco meses, emitida por Sr. Sócrates, no valor de R$5.000,00. Ocorre que Aristóteles necessita do dinheiro com urgência e para recebê-lo firmará com o banco contrato de desconto, ou seja, o cliente “vende” a nota promissória para o banco. Claro 116 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO que as instituições financeiras, antes de realizar tal contrato, averiguam a situação patrimonial do emitente do título e também do Descontário. Por esse serviço, o banco cobra encargos contratuais e juros, livremente estabelecidos entre as partes. A esta altura, muitos leitores devem estar associando este contrato ao contrato de Factoring, mas há entre eles uma grande diferença. Ao descontar o título, no nosso exemplo, a nota promissória, no dia do vencimento, o Banco tentará receber do emitente o valor nele contido e, em caso de não-pagamento, o Banco poderá processar tanto o emitente do título (Sócrates) como o próprio Descontário (Aristóteles). Quer dizer, ao efetuar contrato de desconto bancário, o cliente poderá ter que pagar ao descontador o valor integral do título acrescido de juros, correção monetária, custas processuais e honorários de sucumbência! Já no contrato de Factoring este risco não existe, razão pela qual muitos o preferem, ainda que suas taxas sejam mais altas que as do desconto. 5º. Crédito documentário Neste contrato, o banco (EMISSOR) faz papel de intermediário. Seu cliente, chamado de ORDENANTE, lhe solicita que pague determinado beneficiário de crédito, advindo de relação comercial mantida entre o ordenante e o beneficiário, que deverá procurar o banco para receber o montante mediante a apresentação de documentos previamente estabelecidos. Por esta prestação de serviços, o banco cobra juros e encargos contratuais. Popularmente este contrato recebe o nome de Carta de Crédito e tem grande utilidade em negociações internacionais. Veja a ilustração: certa empresa brasileira importa maquinário fabricado na Alemanha. Para efetuar o pagamento, procura banco existente em ambos os países e firma Contrato de Crédito Documentário, através do qual o banco receberá o dinheiro aqui no Brasil e remunerará a credora, lá na Alemanha, após apresentar os documentos exigidos em contrato de compra e venda, tais como, comprovante de embarque, de quitação fiscal, entre outros. 6º. Vendor Por esta modalidade contratual, o banco financiará as aquisições realizadas por clientes de seu próprio cliente. Quando cito este conceito em sala, a expressão dos alunos é de que não entenderam nada! Mas é simples compreender através de exemplo. Certa atacadista faz venda de R$20.000,00 para seu cliente, que não dispõe desta quantia, mas precisa das mercadorias por está se aproximando período de boas vendas. Para não perder o cliente (nem a venda), a atacadista procura um banco e com ele firma o contrato chamado Vendor, ou seja, o banco pagará os R$20.000,00 para a atacadista e financiará a mesma quantia para o cliente da atacadista. Veja que o banco ganha duas vezes, através de um único contrato. 117 DIREITO EMPRESARIAL Em Uberlândia-MG, onde estão instaladas as maiores atacadistas do Brasil, uma delas constituiu o próprio banco para tal fim e, com isso, passou avender e faturar mais, pois as vendas aumentaram e o banco ganha com a prestação de serviços, com a cobrança de juros e encargos contratuais. Observe que este contrato depende de outros contratos: a) banco X cliente: depósito bancário, pois o cliente terá que possuir conta corrente no banco para ter acesso ao pagamento; b) banco X terceiro (cliente do cliente): mútuo bancário (empréstimo). Estes são os contratos bancários típicos, ou também chamados de próprios, em virtude de sua realização somente ser autorizada à instituições financeiras. OUTROS CONTRATOS EMPRESARIAIS 1º. Arrendamento mercantil (leasing) A palavra arrendamento pode ser entendida como aluguel. Chamam-se Arrendador e Arrendatário as partes do contrato, cujo objeto é o arrendamento de bem comprado pelo arrendador, segundo critérios definidos pelo arrendatário, com opção de compra do bem OU sua devolução ao término do contrato. A legislação criou duas espécies: 1. Leasing financeiro: inexistência de valor residual (VR) expressivo ou seja, o valor das prestações considera o custo do bem + investimento esperado pelo arrendador; 2. Leasing econômico: o total das prestações a serem pagas pelo arrendatário é inferior a 75% do valor do bem. Em cada modalidade há prazo determinado para o contrato, sendo que no Leasing financeiro deverá durar no mínimo de 2 anos para bens cuja vida útil seja de até 5 anos e mínimo de 3 anos, para acima de 5 anos; já no Leasing operacional o prazo mínimo é de 90 dias. Ao término do contrato, terá o arrendatário que escolher entre uma das três opções: 1. compra do bem; 2. prorrogação do contrato; 3. devolução do bem. Possui o arrendador as seguintes obrigações: 1. adquirir o bem de outrem para transferir a posse ao arrendatário; 2. dever de receber o bem de volta ou vendê-lo pelo preço ajustado; 3. dever de prorrogar o contrato. 118 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO Por sua vez, cabe ao arrendatário: 1. pagar as prestações combinadas; 2. zelar pela conservação do bem; 3. devolvê-lo, caso não opte pelo compra. Este contrato se extingue pelo decurso do prazo, por vontade das partes ou falência de qualquer delas. Bem, em breves linhas, estes são os principais contratos empresariais utilizados com maior freqüência. Esta unidade, diferentemente das demais, possui duas partes distintas como especificado em seu início. Terminado o estudo dos contratos mercantis, passaremos a abordagem dos títulos de créditos. TÍTULOS DE CRÉDITO Nesta segunda parte da presente unidade, compete-nos conhecer a legislação aplicável aos títulos de crédito, matéria de extrema importância no cotidiano do brasileiro e que, em diversos casos, em virtude principalmente do DESCONHECIMENTO do assunto e da MÁ-FE dos devedores, acabam por gerar processos judiciais, avolumando o Poder Judiciário com questões que poderiam ser facilmente evitadas. O nosso propósito principal não é apenas ensinar a você o conteúdo programado, mas lhe orientar no sentido de aplicar o aprendizado às situações vivenciadas a cada dia. No caso dos títulos de créditos, reiteramos esta afirmação, pois são documentos utilizados por praticamente toda a sociedade brasileira. E uma simples pergunta deixa evidente o nosso despreparo acerca do tema: quando você recebe um cheque como forma de pagamento, quantos dias tem para depositá-lo em sua conta? Devo salientar que leciono esta matéria há mais de sete anos e sempre que inicio o estudo do cheque, faço esta pergunta e até hoje nenhum aluno a respondeu corretamente. Destaque-se que muitos alunos são bancários... Portanto, mãos à obra! Leia atentamente cada parágrafo a seguir e encontrará esta e tantas outras respostas que o tornarão apto a evitar discussões e polêmicas quando da aplicabilidade dos títulos de crédito. Comecemos por entender o termo TÍTULO DE CRÉDITO. A palavra título pode ser compreendida por documento, base em que se consta a síntese de algo que fora negociado; enquanto crédito se refere tanto ao valor que alguém possui em virtude de negócio jurídico realizado bem como confiança. Assim, temos que título de crédito, de forma fácil de ser compreendida, nada mais é que documento representativo da vontade de duas ou mais pessoas, demonstrando confiança mútua, para formalizar a existência de relação de crédito mantida entre si. No Brasil, atualmente em uso, podemos citar como títulos de crédito a nota promissória, o cheque, a duplicata e, menos usual, a letra de câmbio. 119 DIREITO EMPRESARIAL A legislação aplicável aos títulos de créditos está contida na Lei Uniforme (Decreto 57.663/66) e nas leis que criaram cada título e serão citadas no estudo individualizado. Todos estes documentos possuem — obrigatoriamente — três características que os distinguem dos demais documentos. 1ª. Relações Creditícias: em títulos de créditos somente se podem documentar situações decorrentes de relação de crédito-débito. Nada além disso! Quer-se dizer que, em qualquer título de crédito, não se fazem constar obrigações, como, por exemplo, a entrega de certo bem em tal dia ou a realização de prestação de serviços. Estes dois casos devem ser documentados através de CONTRATOS, não de títulos de créditos. É possível se fazer um contrato de prestação de serviços e a ele se associar um título de crédito. 2ª. Executibilidade: por determinação da legislação vigente, os títulos de crédito são títulos executivos extrajudiciais, significando que para o credor receber o crédito contido neste documento, o processo que utilizará será mais RÁPIDO e EFICAZ. Ao apresentar cheque ao banco e este retornando por qualquer motivo (falta de provisão, sustação, conta encerrada, etc.) o credor ajuizará Ação de Execução. Nesta espécie de processo judicial, NÃO se discute a razão da devolução do cheque ou o motivo de sua emissão; analisa-se apenas o valor, vencimento e se cita o devedor para pagar. Contudo, se a dívida fosse decorrente de contrato, por exemplo, o credor se utilizaria de Ação de Cobrança, permitindo ao devedor apresentar defesa, alegar não cumprimento do contrato para, somente após analisado o fato, em caso de vitória, o credor receber seu crédito, executando a sentença dada no processo. No caso dos títulos de crédito, executa-se o PRÓPRIO título. 3ª. Negociabilidade: por esta característica, os títulos de crédito, ao longo da história, ganharam lugar de destaque entre os documentos com validade jurídica. A razão é simples: o pagamento é facilitado com a utilização de títulos de crédito. Se Fernando deve para Danilo, que deve para Alexandre, basta Danilo repassar cheque ao seu credor para satisfazer a relação de débito e crédito envolvendo três pessoas, ou seja, com um único documento, duas dívidas foram sanadas! Identificados os três aspectos distintivos dos títulos de créditos, passemos à análise dos seus PRINCÍPIOS. Atenção: compreendendo os três princípios a seguir, o leitor possuirá elementos para responder às principais dúvidas acerca do tema. 120 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO Pelo Principio da cartularidade se impede o uso indevido do título, tornando legítimo reivindicar crédito apenas ao PORTADOR do documento original, comprovando a posse legítima do documento. Imagine que Danilo aceitou nota promissória como forma de documentar o crédito que passou a possuir ao vender certo bem a Fernando, com data de vencimento em 20 de maio de 2008. Por precaução, Danilo fez cópia (xerox) e a autenticou em cartório (para se autenticar, o documento original deve ser levado ao cartório). Suponha que, ao chegar o dia do vencimento, Danilo não encontre o título de crédito original e procure Fernando — o devedor —, portando a cópia autenticada. Fernando, que adquiriu o bem de Danilo e conhece a dívida e o dia do pagamento, deverá pagar a dívida ou poderá se negar, exigindo a apresentação da nota promissória original? Segundo o citado princípio, o devedor somente deve pagarao credor que portar o título de crédito original, sendo inválida cópia autenticada. Aparentemente, tal princípio se mostra incoerente, mas fora criado exatamente para proteger tanto o credor como o devedor. Usando ainda o exemplo anterior, caso Fernando pague Danilo e fique com a cópia autenticada como prova de quitação, pode ocorrer de, horas mais tarde, ser procurado por Alexandre, que se apresenta, portanto a nota promissória devidamente endossada (transferida) por Danilo! E pior: se Fernando não pagar Alexandre, este poderá processá-lo, pois é portador legítimo do título original! Fernando será obrigado, pelo Poder Judiciário, a pagar Alexandre. O vilão da estória se chama Danilo, que entregou a nota promissória a Alexandre, quitando sua dívida e enganou Fernando dizendo que havia perdido o título original. Fernando poderá processá-lo por estelionato e entrar com Ação de Regresso contra Danilo para ressarcir o prejuízo que teve com o processo movido por Alexandre. Portanto, aprenda: se você é devedor de título de crédito, ao ser procurado pelo credor, exija a apresentação do documento original! Quitada a dívida, o próximo passo é destruí-lo (rasgar, triturar, queimar). Caso o credor não apresente o original, exija boletim de ocorrência relatando o motivo da ausência do original, declaração de próprio punho do credor, assumindo não ter transferido ou entregue o título à outra pessoa, além de fazê-lo assinar recibo. No entanto, saliente-se que estas providências não impedem que surja credor com o documento original exigindo o pagamento, apenas facilitam ação de cobrança e provas para incriminar o golpista, afinal há uma máxima no direito: quem paga mal, paga duas vezes! Outro princípio, chamado de Literalidade condiciona a validade do título de crédito aos dados nele contidos, ou seja, somente podem ser exigidos os dados lançados no documento, como, por exemplo, valores, datas, pessoas que se obrigam, etc. Para facilitar: se certa pessoa deve R$5.000,00 à outra e pede para constar na nota promissória a quantia de R$ 3.000,00 alegando que a inserção do valor real lhe trará problemas tributários, e que outra pessoa seja avalista do título, em caso de inadimplência, ainda que haja testemunha no momento do feitio do documento, em ação de execução, somente se poderá cobrar R$3.000,00, ou seja, o valor LITERALMENTE contido 121 DIREITO EMPRESARIAL e, ainda, serão processados o devedor e o avalista, já que a assinatura de ambos está presente no documento. Por último, há o denominado Princípio da autonomia cuja característica principal é a desvinculação do cumprimento da obrigação primária em relação ao título de crédito. Entenda-se: todo título de crédito surge em decorrência de relação de crédito existente entre as partes (obrigação primária), como, por exemplo, compra e venda, prestação de serviços, etc. Para documentar o crédito destas operações, as pessoas se utilizam dos títulos de crédito, em virtude das características que possuem (início do capítulo). Dessa forma e segundo o princípio anteriormente narrado, chegando o dia do vencimento, o título de crédito deve ser executado INDEPENDENTEMENTE do cumprimento da obrigação que o gerou. Veja este exemplo: a sociedade empresária “Universitarius Bar Ltda” contratou prestadora de serviços para divulgar, através de outdoor, os preços promocionais de seus produtos. A propaganda deveria ser realizada nas duas primeiras semanas de retorno às aulas, via de outdoors próximos a faculdades e universidades. A Universitarius Bar Ltda pagaria pela prestação de serviços (obrigação primária) a quantia de R$3.000,00 (três mil reais), sendo R$ 1.000,00 (mil reais ) à vista e o restante, através de duas notas promissórias, com 30 e 60 dias, no valor de R$1.000,00 cada. Ocorre que a empresa de propaganda (credora) não cumpriu sua obrigação, não preparando nenhum outdoor no prazo combinado. Vencida a primeira promissória (30 dias), mesmo sem a entrega de qualquer outdoor, a empresa procura a Universitarius Bar Ltda para receber o valor nela existente e esta se nega a efetuar o pagamento, sendo surpreendida dias depois, com a negativação de seu nome em Cartório de Protestos. Aqueles que trabalham ou são proprietários de empreendimentos comerciais sabem as principais conseqüências desta negativação, sendo uma delas, a perda da credibilidade ante seus fornecedores. E foi exatamente o que ocorreu e o bar não conseguiu mais comprar a prazo, perdendo o capital de giro. Vencida a segunda promissória, foi novamente protestada e, em seguida, processada pela empresa de propaganda. Pergunta-se: a credora terá direito a receber o valor contido nas duas notas promissórias, mesmo sem cumprir sua obrigação? Terá!! Absurdo?? Não! Primeiro pelo fato de que o princípio da autonomia separa o pagamento do débito do cumprimento da obrigação. Isto lhe fará pensar que o princípio está incorreto; entretanto, tal regra foi criada para proteger terceiros de boa-fé, ou seja, supondo que a prestadora de serviços de propaganda tivesse transferido as notas promissórias, através de endosso (vide a seguir), a qualquer pessoa que sequer tinha conhecimento do contrato realizado, não poderia este terceiro ser prejudicado. Em segundo lugar, por haver “remédio” jurídico para o caso, como, por exemplo, Ação Cautelar de Sustação de Protestos, que devidamente instruída, fará cessar os efeitos do protesto, “limpando” o nome do devedor. Portanto, ao assinar qualquer título de crédito, você terá que pagá-lo mesmo que o serviço não seja prestado ou o produto não lhe for entregue ou vier com defeito. 122 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO O exemplo narrado decorre de fato real, com alteração do nome do devedor para Universitarius Bar Ltda (nome fictício). Este deveria ter ajuizado ação para obrigar o credor a cumprir seu dever, além de lhe exigir perdas e danos pela não veiculação da propaganda no momento adequado. Classificação dos títulos de créditos. Antes de se adentrar ao estudo de cada título de crédito, necessário se faz distingui-los quanto aos critérios de classificação. A primeira diferença está na quantidade de participantes que dão origem ao título de crédito, dividindo-os em PROMESSA DE PAGAMENTO ou ORDEM DE PAGAMENTO. Na promessa de pagamento, como o próprio nome diz, certa pessoa promete pagar à outra determinada quantia em dia específico. Basta a presença de dois participantes para a validação do documento: devedor e credor. Dos títulos que serão estudados, apenas a nota promissória se enquadra nesta classificação. Já na ordem de pagamento são necessários três intervenientes. Você está acostumado a ouvir que cheque é ordem de pagamento à vista. Pergunta: quantos intervenientes (participantes) há no cheque? Dois: emitente e credor? Não. Há TRÊS partes: Emitente que dá ordem ao sacado (banco) para pagar o credor. Neste critério, se enquadram, além do cheque, a duplicata e a letra de câmbio. Outro critério distingue os títulos de crédito em AO PORTADOR, NOMINATIVO À ORDEM e NOMINATIVO NÃO À ORDEM. O primeiro permite que o título seja transferido através da simples entrega, já que não especifica quem é o credor. Usando o cheque como exemplo, ocorre quando não preenchemos a terceira linha do cheque, ou seja, quem o possuir de boa-fé será seu credor. Já os nominativos à ordem, lança-se o nome do credor, podendo ser transferido através do endosso. No cheque, chamamos de cheque nominal. Finalmente, por nominativos não à ordem, além de se especificar o nome do credor, risca-se a expressão “ou à sua ordem” existente no título. Nos cheques está escrita ao término da terceira linha. Existem outras classificações dos títulos de créditos que não serão abordadas, pois importam aos estudantes de direito. Feita esta análise, vejamos as regras aplicáveis a todos os títulos. I – ENDOSSO: permite a transferência de título nominativo à ordem, ou seja, em que consta o nome do credor. A pessoa queendossa necessariamente é o credor original do título e se denomina endossante, enquanto aquele que recebe, chama-se endossatário, passando a ser o novo credor. se eu, professor Gustavo, emito cheque nominal, constando você como credor, poderá transferi-lo através do endosso, bastando sua simples assinatura no verso (atrás) do cheque. Agora vem a novidade: ao fazer isto, você se tornou CO-DEVEDOR, ou seja, ao “passar” o cheque para terceiro, caso não seja compensado, o terceiro poderá lhe processar e nem precisa processar o emitente! Sua simples assinatura no verso poderá lhe custar caro... IMPORTANTE 123 DIREITO EMPRESARIAL Esta assinatura no verso é chamada de ENDOSSO EM BRANCO, pois o endossante não identifica credor. Desta forma, com o endosso em branco, o título se torna ao portador. Por sua vez, o ENDOSSO EM PRETO se identifica o endossante. Há três formas de se lançar o endosso: a) simples assinatura no verso do título de crédito: endosso em branco; b) simples assinatura no verso ou no anverso (frente), acrescida das expressões “por endosso” ou “pague-se”: endosso em branco; c) simples assinatura no verso ou no anverso (frente), acrescida das expressões “por endosso” ou “pague-se” mais o nome do endossário: endosso em preto. Ante o exposto, não se esqueça: o endosso transfere o crédito e torna o endossante co-devedor do título de crédito! II – AVAL: visa garantir o pagamento do título de crédito. Para trazer maior segurança ao documento, o devedor indica alguém que possua patrimônio para ser avalista, que se torna tão devedor quanto o seu avalizado. Há duas espécies: a) aval em branco: não identifica o avalizado; b) aval em preto - identifica o avalizado. O avalista poderá prestar o aval através de qualquer das seguintes formas: a) simples assinatura no anverso (frente): aval em branco; b) simples assinatura no anverso ou verso, acrescida da expressão “por aval”: aval em branco; c) simples assinatura no anverso ou verso acrescida da expressão “por aval” mais o nome do avalizado: aval em preto. Pode ocorrer de que haja mais de um avalista para o mesmo avalizado, situação que se denomina aval simultâneo; além disso, há a hipótese de se trazer um avalista para outro avalista, chamado aval sucessivo. Passemos, então, à análise de cada título. I - Letra de câmbio A letra de câmbio é uma ordem de pagamento, à vista ou a prazo, cuja criação se dá através de um ato chamado saque. Por se tratar de ordem de pagamento, deve haver, no mínimo, três participantes para se constituir o título. Sua utilização decorre de duas ou mais relações jurídicas e, por assim ser, com apenas um documento, se regulariza o crédito de duas pessoas. Veja: • Danilo (credor) vende uma bicicleta a Fernando (devedor). • Fernando (agora credor) vende um computador a Dolores (deve- dora). 124 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO Supondo que o valor dos bens e o dia do pagamento sejam os mesmos, há uma forma simples de resolver a questão. Ao invés de Dolores pagar Fernando e posteriormente este pagar Danilo, basta Fernando ORDENAR Dolores a pagar Danilo diretamente. Considerando as informações acima e tomando por valor a quantia de R$5.000,00, o dia do vencimento 30 de maio de 2008 e data da criação do título (saque) 29 de março de 2008, poderíamos elaborar a seguinte letra de câmbio, cujo formato se assemelha à nota promissória, porém possui, por costume e modismo, formato quadrado: Eis a letra de câmbio! Preenchida com os dados citados e que após ser assinada pelo devedor principal (Fernando) será entregue ao credor final (Danilo). Para melhor compreender, lembre-se que a pessoa que irá assinar (sacar) a letra de câmbio chama-se Fernando (1) e está ordenando (2) Dolores (3) a pagar Danilo (4). Agora, reflita: quem ficará com a letra até o dia do vencimento? Lembre-se da estória que originou o título: • Danilo (credor) vende uma bicicleta a Fernando (devedor). • Fernando (agora credor) vende um computador a Dolores (deve- dora). Portará o documento o credor final, a pessoa que somente possui crédito, qual seja, Danilo, vez que Fernando é devedor e credor e Dolores é somente devedora. Segundo esta legislação, estas três partes intervenientes possuem denominações específicas, a saber: a) sacador: pessoa que faz o saque, criando a letra de câmbio, dando a ordem de pagamento. É quem assina o documento. Em nosso exemplo, Fernando Rodrigues é o sacador; b) sacado: representa a parte a quem a ordem é dada, ou seja, é quem deve efetuar o pagamento, ou seja, na letra anterior, Dolores; c) tomador (ou beneficiário): a pessoa que receberá o pagamento e que portará o título. 125 DIREITO EMPRESARIAL A validação da letra de câmbio depende da existência dos seguintes requisitos: a) a expressão “letra de câmbio” no corpo do texto; b) ordem incondicional de pagar quantia certa: ao preencher a letra de câmbio, não se pode condicionar o pagamento a qualquer evento. Por exemplo: “... pagará a quantia de cinco mil reais caso o Corínthians retorne à Série “A” do campeonato brasileiro. Ainda que não reste dúvida que o Timão retornará à primeira divisão, não se pode trazer tal condição para o pagamento da letra; c) o nome de quem deve pagar (sacado); d) o nome da pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga (tomador); e) a assinatura de quem emite a letra de câmbio (sacador); f) data e lugar de emissão (ou saque) da letra de câmbio. Atualmente, a letra de câmbio é pouco utilizada se comparada com o cheque, a duplicata e a promissória e há razão para isso. O tomador terá muito trabalho para receber seu crédito. Em nosso exemplo, Danilo está com a letra em mãos, mas antes do dia do vencimento, deverá procurar a sacada, Dolores, para obter seu consentimento. Este ato é chamado de aceite e ocorre com a assinatura da devedora principal na frente do título (ou em seu verso, acompanhada da expressão “por aceite”). A questão é que o aceite é FACULTATIVO, ou seja, se Dolores não quiser pagar, simplesmente não assina a letra. Neste caso, Danilo terá que procurar Fernando, que passará a ser devedor principal. Se houvesse aceite, Dolores seria devedora principal e Fernando, co-devedor. Assim, de toda forma, Danilo terá que procurar Dolores para obter o aceite (ou a recusa) e posteriormente se deslocar, no dia do vencimento, até o devedor principal. Trabalhoso, não?! Nota promissória A mesma legislação (Decreto n. 2.044 de 31/12/1908) que definiu a letra de câmbio tratou de criar a nota promissória cuja característica principal é a presença de, no mínimo, dois intervenientes: o devedor, que promete pagar quantia certa em momento determinado e o credor, que portará o título até o dia do vencimento, oportunidade que procurará o emitente para cumprir sua promessa. Tal qual na letra de câmbio o credor é chamado de tomador ou beneficiário, diferindo o devedor que neste título se chama subscritor. Vê-se, portanto, que este documento é bem mais simples que a letra de câmbio, até mesmo pelo fato de regulamentar, inicialmente, apenas uma negociação. Para visualizar a nota promissória, vamos utilizar o mesmo exemplo da letra de câmbio: • Danilo (credor) vende uma bicicleta a Fernando (devedor). • Fernando (agora credor) vende um computador a Dolores (deve- dora). 126 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO A documentação das dívidas acima poderá ser feita em duas notas promissórias, tendo Dolores como subscritora (devedora) e Fernando como credor e na outra, Fernando sendo o devedor e Danilo, o tomador. O Decreto nº. 2.044 ao criar ambos os títulos permitiu aos interessados adequarem suas negociações, concretizando-as em documento que melhor se adapte à sua realidade, ou seja, no caso acima, se Danilo, Fernando e Dolores se conheçam ou haja entre eles mútua confiança, as duas dívidas podem ser lançadas em um único título, qual seja, letra de câmbio, porém, não havendo uma ou as duas questões citadas, melhorcada qual firmar seu próprio documento, utilizando-se da nota promissória. Todavia, posso lhes afirmar que há possibilidade de se elaborar uma única nota promissória para solucionar as duas relações jurídicas e, considerando ser este título mais fácil de se elaborar e não havendo necessidade de aceite, torna-se mais prático fazê-lo. Quando digo isso em sala, alguns alunos dizem que basta ter a nota promissória Dolores como emitente (devedora) e Danilo como credor. De fato, não está errado, mas poderá trazer problemas a Fernando, pois, se necesssário for, terá dificuldades em comprovar que quitou sua dívida com Danilo, que fora paga por Dolores, com quem Fernando possuía crédito. Nesta nota promissória o nome de Fernando não aparece em lugar algum. Veja, a seguir, a melhor forma de constituí-la: Observe o verbo pagar. Na letra de câmbio, utiliza-se PAGARÁ por ser ORDEM de pagamento, enquanto na nota promissória, PAGAREI, em virtude de ser PROMESSA de pagamento. Da forma elaborada, falta regulamentar o crédito de Danilo, pois somente consta que Dolores pagará Fernando. Para resolver, basta que Fernando assine no verso do título, endossando-o a Danilo e com apenas uma nota promissória se resolve as duas obrigações. Finalmente, importante esclarecer que, tal qual a letra de câmbio, a nota promissória pode ser elaborada em folha de caderno ou em computador e posteriormente impressa, ou seja, não há a obrigação de se utilizar as feitas por tipografias, vendidas em papelarias e livrarias, desde que em seu conteúdo estejam presentes os seguintes requisitos: 127 DIREITO EMPRESARIAL a) a expressão “nota promissória” no corpo do texto; b) promessa incondicional de pagar quantia determinada; c) nome da pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga (credor - tomador); d) indicação da data de emissão da nota promissória; e) assinatura do emitente (subscritor - devedor). O leitor atento deve ter percebido que a DATA DO VENCIMENTO não consta como requisito obrigatório em ambos os títulos estudados. Realmente a legislação o trata como facultativo, sendo que na sua ausência o título é pagável à vista. Cheque Adotado no Brasil através da Lei 7.357, de 02 de setembro de 1985, conquistou a preferência dos usuários, principalmente pela facilidade de se receber o crédito. Tanto a letra de câmbio como a nota promissória obrigam o credor a se deslocar até o devedor, portando o título para receber o crédito. No caso do cheque, como se sabe, basta depositá-lo na agência bancária ou em caixa eletrônico (e torcer para ter saldo!) e pronto. O conceito de cheque é bem conhecido: ordem de pagamento à vista. Isto quer dizer que há três participantes e sua utilização deve ser para pagamentos à vista. Veremos adiante que o cheque PRÉ-DATADO não é previsto em lei, passando a ser aceito pelos tribunais como um costume, sendo interpretado, basicamente, como um contrato e não título de crédito. Denomina-se EMITENTE o devedor do cheque; SACADO quem efetua o pagamento (banco) e TOMADOR o seu credor. A ordem de pagamento é dada pelo emitente para o sacado, que remunerará o tomador em caso de existência de saldo positivo na conta do emitente ou, não o havendo, utilizando-se seu limite especial, caso existente. Sua validação decorre dos seguintes requisitos: a) a palavra cheque no corpo do texto; b) ordem incondicional de pagar a quantia determinada; c) nome do banco (sacado); d) data e lugar do saque; e) assinatura do emitente; f) nome do credor, para cheques com valor superior a R$100,00 (cem reais). 128 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO Nesse modelo, os elementos obrigatórios podem ser facilmente observados, lembrando que a formatação de todos os cheques, independentemente do banco, é exatamente a mesma. Depois de emitido, o cheque deve ser apresentado ao banco no prazo máximo de trinta dias se da mesma praça ou sessenta, se de praça diferente. Considera-se mesma PRAÇA quando o lugar da emissão é o mesmo da agência bancária. No cheque anterior, a agência é de Barretos-SP, assim, se o titular emiti-lo nesta cidade, será da mesma praça, agora, se estiver em viagem, digamos à Niterói, no Rio de Janeiro, será de praça diferente. Desta forma, ao receber pagamento em cheque, saiba, a partir deste momento, que você tem 30 ou 60 dias no máximo para depositá-lo em sua conta. Caso não o faça neste prazo, o banco compensará normalmente o cheque, porém, supondo que, dentro do prazo de 30 (mesma praça), houvesse saldo na conta do emitente e, ao depositar fora do prazo, o banco utilize-se do limite especial, cobrando juros do emitente, este poderá requerer em juízo o ressarcimento destes juros e todas as conseqüências advindas. Ainda sobre prazo, deve ser ressaltado que os bancos pagam cheque até seis meses a contar do término do prazo de apresentação, a que damos o nome de prescrição. Outro ponto que merece abordagem se refere à SUSTAÇÃO, ou seja, a contra-ordem feita pelo emitente ao banco. Segundo a legislação, pode- se sustar sempre que houver desapossamento indevido, ou seja, o emitente não mais possui certa(s) folha(s) do talonário, como, por exemplo, em caso de extravio, furto, roubo, entre outras. Foi-lhes dito que o cheque é ordem de pagamento à vista e, portanto, sua emissão com data futura não é prevista em lei, vez que para pagamentos futuros deve ser utilizado, preferencialmente, a nota promissória. Entretanto, o brasileiro adotou a prática de pré-datar o cheque, ou seja, emiti-lo hoje, mas solicitar ao credor que somente o deposite em data futura. À esta “modalidade” chamamos cheque pré-datado, mas, no mundo jurídico, é corretamente denominado cheque PÓS-DATADO, já que a apresentação ao banco ocorrerá em data futura (pós). A importância do seu estudo consiste basicamente no momento da compensação a ser feita pelo banco. Supondo o preenchimento de cheque com data de 10"04"08 e pós-datado para 20"07"08, caso seja apresentado ao banco em qualquer data anterior à 20"07"08 haverá o procedimento normal de compensação, pois para o banco esta modalidade não existe. O depósito antecipado do cheque pelo credor não acarreta nenhuma conseqüência para o banco pagador; no entanto, havendo prejuízo para o emitente, este poderá processar o credor pelos danos causados. No caso acima, o emitente reservará quantia para compensar o cheque em meados do dia 20"07"08 e, portanto, pode ser que a compensação antes de tal dia poderá trazer-lhe descontrole financeiro, como, por exemplo, falta de crédito para pagamento de contas com débito automático. 129 DIREITO EMPRESARIAL Os tribunais têm entendido que a apresentação antecipada de cheque pós-datado é como o descumprimento de contrato, pois emitente e tomador negociaram o dia para depósito do cheque. Ultimando o estudo do cheque, passemos a conhecer as suas modalidades, previstas em lei. a) CRUZADO: basta se fazer duas linhas paralelas no cheque, como no exemplo abaixo. Sua finalidade é impedir o saque no caixa, já que deverá ser depositado em conta bancária. Da forma como está abaixo é chamado de cruzamento em branco. Se entre as linhas se constar o nome de certo banco, é tratado como cruzamento em preto e somente poderá ser depositado em conta bancária do banco especificado. As seguradoras, geralmente, preenchem entre as linhas o nome do beneficiário do seguro. Esta hipótese é PROIBIDA por lei, porém, como não traz prejuízo a ninguém e traz segurança para a seguradora, esta prática tem sido constantemente adotada. b) ADMINISTRATIVO: nesta hipótese o emitente é o banco, de tal forma a dar total segurança ao credor. Cheques de valores consideráveis, utilizados em grandes negociações, pagamentos de acionistas, etc., geralmente são emitidos neste formato. c) VISADO: neste caso o banco reserva na conta do emitente o valor contido no cheque durante o prazo da apresentação. Assim, em sendo cheque da mesma praça, possuindo o emitente saldo em sua conta de R$10.000,00 e emitindocheque visado no valor de R$6.000,00, durante trinta dias, o emitente terá à sua disposição R$4.000,00. Para o credor, ao apresentar o cheque dentro do prazo não correrá risco algum, pois certamente a quantia estará à sua disposição. Bem, o estudo do cheque sob a ótica jurídica é bem mais complexo, sendo apresentado aos leitores deste material as noções básicas da emissão, prazo de apresentação e modalidades. Aos interessados em aprofundar o conhecimento, sugerimos a leitura da bibliografia indicada. Duplicata O ponto marcante da duplicata, criada pela Lei 5.474, de 18/07/1968, é que sua emissão somente pode ocorrer em dois casos específicos: contrato de compra e venda mercantil com prazo não inferior a 30 (trinta) dias, contado da data da entrega ou despacho das mercadorias ou contrato de 130 UNIDADE 5 - CONTRATOS EMPRESARIAIS E TÍTULOS DE CRÉDITO prestação de serviços. Dessa forma, a realização de negócios entre particulares não poderá ser documentada através deste título de crédito. Juntamente à duplicata, emite-se a fatura, documento que especifica as mercadorias vendidas ou o serviço prestado e seus valores. Para cada fatura emitida deverá haver documento fiscal correspondente, ou seja, a nota fiscal. Por esse motivo, para facilitar e até mesmo reduzir custos, os empresários se utilizam da “nota fiscal-fatura”, documento único que reúne dados comerciais e fiscais da venda ou prestação de serviços. Tal qual o cheque e a letra de câmbio, a duplicata é ordem de pagamento, envolvendo, portanto, três intervenientes, a saber: a) SACADOR: a pessoa que vende a mercadoria ou presta o serviço, que emitirá a fatura. b) SACADO: adquirente do produto ou tomador do serviço que escolheu este título como forma de documentar seu débito e que o pagará no prazo e forma estabelecidos. É quem cumpre a ordem de pagamento. c) TOMADOR: o credor do contrato. Aqui surge a característica peculiar da duplicata, pois o tomador é o sacador! Imagine contrato de compra e venda mercantil realizado entre atacadista (vendedor) e mercearia (comprador). A duplicata será emitida pelo sacador (atacadista), enviada à mercearia, juntamente com a nota-fiscal-fatura, para que esta pague no dia previsto pela aquisição das mercadorias que lhe foram entregues. O credor da venda é a atacadista, emitente e credora ao mesmo tempo. A eficácia da duplicata está condicionada aos seguintes requisitos: a) a denominação “duplicata” no corpo de seu texto, a data de sua emissão e o número de ordem; b) o número da fatura; c) a data do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista; d) o nome e domicílio do vendedor”prestador de serviço (sacador) e do comprador “tomador do serviço (sacado); e) a importância a pagar, em algarismos e por extenso; f) o lugar do pagamento; g) a cláusula à ordem; h) a declaração da concordância a ser assinada pelo sacado; i) a assinatura do emitente. O requisito “h” nada mais é que o aceite, concordância do devedor com o conteúdo do título de crédito, já estudado na letra de câmbio, com uma grande diferença: na duplicata, o aceite é obrigatório, podendo haver a recusa nas três hipóteses a seguir: a) avaria ou não recebimento de mercadorias; b) vícios na quantidade ou qualidade das mercadorias; c) divergência entre preços e prazos combinados. 131 DIREITO EMPRESARIAL Não ocorrendo nenhuma destas hipóteses, o comprador deverá pagar a duplicata no prazo e forma combinados. É HORA DE SE AVALIAR! Lembre-se de realizar as atividades desta unidade de estudo, presentes no caderno de exercício! Elas irão ajudá-lo a fixar o conteúdo, além de proporcionar sua autonomia no processo de ensino-aprendizagem. Caso prefira, redija as respostas no caderno e depois as envie através do nosso ambiente virtual de aprendizagem (AVA) ou pelo correio (em formulário próprio). Interaja conosco! Nesta unidade, abordamos dois assuntos extremamente importantes para o Direito Empresarial, vez que ligados à formalização das negociações mantidas por empresários entre si e com terceiros. De um lado, foram-lhe apresentados os principais contratos utilizados pelo empresário em seu cotidiano e de outro, conhecemos o significado dos títulos de crédito, as regras de sua validade e a maneira correta de preenchê- los. Resta-nos, portanto, caminharmos para o fim da disciplina Direito Empresarial, estudando o “fim” das sociedades empresárias em situação ruinosa, de crise econômica, financeira e patrimonial.