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1 Thiago M. Zago medUnicamp XLVI Neoplasias As neoplasias são definidas como proliferações celulares ou neoformações teciduais de causa não totalmente estabelecida, de crescimento autônomo e ilimitado. Câncer é o termo comum para todos os tumores malignos. Todos os tumores benignos e malignos apresentam dois componentes básicos: 1- Células neoplásicas em proliferação que constituem seu parênquima; 2- Estroma de sustentação formado por tecido conjuntivo e vasos sanguíneos. Tumores benignos em geral são designados com a inclusão do sufixo oma na célula de origem. É importante destacar que toda a população de células dentro de um tumor surge de uma célula isolada que sofreu uma alteração genética. Dessa forma, os tumores são clonais. Adenoma é o termo aplicado a um tumor epitelial benigno que forma padrões glandulares assim como tumores derivados de glândulas, mas não necessariamente reproduzindo os padrões glandulares. Papilomas são tumores epiteliais benignos que produzem projeções digitiformes ou projeções verrucosas visíveis micro ou macroscopicamente a partir de superfícies epiteliais. Já um pólipo é uma projeção de um tumor benigno macroscopicamente visível acima de uma superfície mucosa que se projeta, por exemplo, na luz gástrica. O termo pólipo é preferivelmente restrito a tumores benignos. Os pólipos malignos são mais bem designados como cânceres polipóides. As principais características dos tumores benignos são: 1- Tamanho variável; 2- Limite da lesão bem definido; 3- Presença de cápsula; 4- Crescimento expansivo e limitado; 5- Ausência de necrose; 6- Ausência de hemorragia; 7- Baixa taxa de crescimento; 8- Maior grau de diferenciação; 9- Baixa densidade celular; 10- Atipia celular rara; 11- Atipia de micose rara; 12- DNA diplóide; 13- Efeitos locais e sistêmicos inexpressivos; 14- Recidiva pouco freqüente; 15- Ausência de metástases. Tumores malignos os tumores malignos que surgem no tecido mesenquimal são chamados de sarcomas porque apresentam pouco estroma conjuntivo e são carnosos. Os tumores epiteliais malignos originados a partir de células epiteliais, derivadas de qualquer uma das três camadas germinativas, são chamados de carcinomas. Um carcinoma com um padrão glandular de crescimento é chamado de adenocarcinoma, e um tumor que produza células escamosas identificáveis surgindo em qualquer 2 Thiago M. Zago medUnicamp XLVI epitélio do corpo é chamado de carcinoma de células escamosas. No entanto, um câncer pode ser formado por células indiferenciadas cujo tecido de origem é desconhecido, e deve ser designado apenas como um tumor maligno pouco diferenciado ou indiferenciado. A grande maioria dos tumores é formada por células provenientes de um único folheto germinativo. Entretanto, há um grupo de tumores chamados de teratomas que representam mais de um único folheto germinativo, em geral os três (ectoderma, mesoderma e endoderma). Eles surgem a partir de células totipotentes e, portanto são encontrados principalmente nas gônadas. Um padrão comum é visto no teratoma cístico do ovário (cisto dermóide), que se caracteriza por um tumor cístico revestido por pele com cabelo, glândulas sebáceas e estruturas dentárias. As principais características dos tumores malignos são: 1- Tamanho variável; 2- Limite da lesão impreciso; 3- Cápsula geralmente ausente; 4- Crescimento infiltrativo; 5- Presença de necrose; 6- Presença de hemorragia; 7- Alta taxa de crescimento; 8- Grau de diferenciação variável; 9- Alta densidade celular; 10- Atipia celular freqüente; 11- Presença de mitose atípica; 12- DNA aneuplóide; 13- Importantes efeitos locais e sistêmicos; 14- Presença de recidiva; 15- Presença de metástase. A história natural dos tumores malignos pode ser resumida da seguinte maneira: Alteração maligna na célula-alvo, esse processo é chamado de transformação. Crescimento das células transformadas Invasão local Metástases à distância Diferenciação e anaplasia. A diferenciação se refere à extensão com que as células neoplásicas lembram células normais comparáveis tanto morfologicamente como funcionalmente. Já a falta de diferenciação é chamada de anaplasia. Em geral, os tumores benignos são bem diferenciados. Já os tumores malignos variam desde bem diferenciados até indiferenciados. Os tumores malignos compostos por células indiferenciadas são chamados de tumores anaplásicos. A falta de diferenciação (anaplasia) é um ponto fundamental da transformação maligna. Há muitas evidências de que as células tumorais não 3 Thiago M. Zago medUnicamp XLVI possuem como origem uma célula diferenciada que sofre um processo de desdiferenciação, mas sim uma célula-tronco presente em tecidos especializados. Dessa forma, o câncer bem diferenciado evolui a partir da maturação ou especialização de células indiferenciadas à medida que proliferam, ao passo que o tumor maligno indiferenciado deriva da proliferação sem maturação completa das células transformadas. A anaplasia é marcada pelas seguintes alterações morfológicas: 1- Pleomorfismo variação de tamanho e forma das células e seus núcleos; 2- Morfologia nuclear anormal o DNA se apresenta em abundância com uma coloração hipercromática (escura). Os núcleos são desproporcionalmente grandes e normalmente possuem nucléolo grande e evidente; 3- Mitoses os tumores indiferenciados geralmente apresentam grande número de mitoses. No entanto, a presença de mitoses não indica necessariamente que um tumor é maligno ou que o tecido é neoplásico. Mais importante como característica morfológica de neoplasia maligna são as mitoses atípicas, bizarras, produzindo às vezes fusos tripolares, quadripolares ou multipolares; 4- Perda da polaridade a orientação de células anaplásicas está acentuadamente alterada. Dessa forma, camadas ou grandes massas de células tumorais crescem de maneira anárquica e desorganizada; Outra alteração morfológica que pode ocorrer é a formação de células tumorais gigantes. Na célula gigante cancerosa, os núcleos são hipercromáticos e grandes em relação à célula. Apesar das células em crescimento precisarem de um aporte sanguíneo, o estroma vascular frequentemente é escasso. Dessa forma, em diversos tumores grandes há uma área de necrose isquêmica. O diagnóstico morfológico de malignidade dos tumores bem diferenciados pode às vezes ser bem difícil. O termo displasia se refere a um crescimento desordenado. A displasia é caracterizada por diversas alterações, entre as quais estão: 1- Perda na uniformidade das células individuais e na sua orientação arquitetural; 2- Pleomorfismo; 3- Núcleos anormalmente grandes; 4- Mitoses em locais anormais. Por exemplo, no epitélio estratificado escamoso displásico as mitoses não estão restritas às camadas basais e podem aparecer em todos os níveis e até mesmo nas superfícies celulares. Quando as alterações displásicas são acentuadas e envolvem toda a espessura do epitélio, mas a lesão permanece confinada ao tecido normal, ou seja, não há invasão da membrana basal, essas lesões são consideradas um tumor pré-invasivo, denominado carcinoma in situ. A partir do momento em que as células tumorais se movem além dos limites normais, o tumor é chamado de invasivo. É importante destacar que uma displasia não evolui necessariamente para um tumor maligno. É importante que se diagnostique a displasia, uma vez que um diagnóstico precoce leva à cura em 100% dos casos. Em geral, quanto mais rápido for o crescimento do tumor, e quão mais anaplásico, menor é a probabilidade de haver uma atividade funcional especializada. As células nos tumores benignossão quase sempre bem diferenciadas e lembram suas células normais de origem. 4 Thiago M. Zago medUnicamp XLVI Taxas de crescimento. Quando um tumor sólido é clinicamente detectável, ele já completou uma porção importante do seu ciclo vital. Este é um grande impedimento no tratamento do câncer e enfatiza a necessidade do desenvolvimento de marcadores para diagnóstico visando detectar cânceres precoces. A taxa de crescimento de um tumor é determinada por três fatores: 1- Tempo de duplicação das células tumorais; 2- Fração das células tumorais que se encontra em divisão celular (fração de crescimento) a fração de crescimento das células do tumor tem um efeito profundo na sua suscetibilidade à quimioterapia do câncer, uma vez que a maioria dos agentes antineoplásicos atua sobre as células no ciclo. Dessa forma, um tumor de crescimento lento é refratário a um tratamento que mata as células em divisão. Uma estratégia empregada no tratamento dos tumores com fração de crescimento lenta é, primeiro, levar todas as células de G0 para o ciclo celular. Isto pode ser obtido com a redução do volume do tumor com cirurgia ou radioterapia. Em geral, a taxa de crescimento dos tumores se correlaciona com seu nível de diferenciação, e assim a maioria dos tumores malignos cresce mais rapidamente do que as lesões benignas; 3- Taxa com que as células são eliminadas e perdidas na lesão crescente. Pode-se concluir então que o crescimento progressivo dos tumores e a taxa com que crescem são determinados por um excesso de produção celular em relação à perda celular. O crescimento de um tumor não está comumente associado a um encurtamento do tempo do ciclo celular. Em geral, quando um tumor já é clinicamente detectável a maioria das células não se encontra em divisão celular. Invasão local. Quase todos os tumores benignos crescem como massas expansivas coesas que permanecem localizadas em seu sítio de origem e não têm capacidade de se infiltrar, invadir ou metastizar para locais distantes, como os tumores malignos. Considerando que crescem e se expandem lentamente, estas massas em geral desenvolvem uma borda de tecido conjuntivo condensado, às vezes chamada de cápsula fibrosa/ pseudocápsula, que as separa do tecido do hospedeiro. Esta cápsula deriva principalmente do estroma do tecido hospedeiro à medida que as células parenquimatosas atrofiam sob a pressão do tumor em expansão. Tal encapsulamento não impede o crescimento do tumor, mas mantém o tumor benigno como uma massa circunscrita, facilmente palpável e facilmente removível cirurgicamente O crescimento dos tumores malignos é acompanhado por infiltração, invasão e destruição progressivas do tecido adjacente. Em geral, os tumores malignos são mal demarcados a partir do tecido normal adjacente e não apresentam um plano de clivagem bem definido. Tumores malignos de crescimento lento podem, no entanto, desenvolver uma cápsula fibrosa aparentemente abrangente e podem se apoiar ao longo de uma ampla frente nas estruturas adjacentes normais. A maioria dos tumores malignos é invasiva e tal capacidade de invasão torna difícil sua ressecção cirúrgica, e mesmo se o tumor parece bem circunscrito, é necessário remover uma margem considerável de tecidos normais adjacentes ao tumor infiltrante. Juntamente com o desenvolvimento de metástases, a invasividade é a característica mais segura que distingue os tumores malignos dos benignos. Os tumores epiteliais in situ mostram as características citológicas de malignidade sem invasão da membrana basal. Podem ser considerados uma etapa anterior a um câncer invasivo; com o tempo a maioria penetra na membrana basal e invade o estroma subepitelial. 5 Thiago M. Zago medUnicamp XLVI Metástases. As metástases são implantes tumorais separados do tumor primário. A metástase caracteriza de modo inequívoco um tumor como sendo maligno porque os tumores benignos não metastatizam. A invasividade dos tumores possibilita sua penetração nos vasos sanguíneos, linfáticos e cavidades corporais, criando a oportunidade para disseminação. Com poucas exceções, todos os cânceres podem metastatizar. Os fatores seguintes determinam uma maior probabilidade de que um tumor vai metastatizar ou já metastatizou: 1- Maior agressividade; 2- Crescimento rápido; 3- Tumor primário com tamanho considerável. A disseminação metastática reduz fortemente a possibilidade de cura do câncer. A disseminação do câncer pode se dar pelas seguintes vias: 1- Disseminação hematogênica típica dos sarcomas, mas também é vista nos carcinomas. As artérias, com suas paredes mais espessas, são mais difíceis de penetrar do que as veias. Com a invasão venosa, as células tumorais seguem o fluxo venoso de drenagem do local do tumor. É compreensível que o fígado e os pulmões estejam, com frequência, envolvidos secundariamente na disseminação hematogênica, uma vez que a área de drenagem porta flui para o fígado, e todo o sangue da cava flui para os pulmões; 2- Disseminação linfática é a via mais comum para a disseminação inicial dos carcinomas, mas também pode ser usada por sarcomas. Os tumores não contêm vasos linfáticos funcionais, mas os vasos linfáticos localizados nas margens tumorais são aparentemente suficientes para a disseminação linfática de células tumorais. O padrão de comprometimento dos linfonodos segue as vias naturais de drenagem linfática. O crescimento dos linfonodos que ocorre frequentemente pode ser causado por: a. Disseminação e crescimento das células tumorais; b. Hiperplasia reativa. 3- Implante das cavidades e superfícies corporais pode ocorrer sempre que uma neoplasia maligna penetrar em um “campo aberto” natural, como na cavidade peritoneal. É importante destacar que as células tumorais são capazes de permanecer restritas à superfície das vísceras abdominais revestidas sem nelas penetrar.