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REVISÃO DE ECONOMIA MONETARIA
1. A moeda: conceito, importância e funções
1.1 O sistema de escambo (trocas diretas)
É sabido que desde os primórdios da humanidade, nos primeiros agrupamentos
humanos, que foram designados de nômades, estes teriam sobrevivido das seguintes
atividades econômicas: caça, pesca, colheita de produtos silvestres. Tais grupos não
conheciam a moeda, e quando recorriam às atividades de troca, realizavam trocas diretas
em espécie, denominadas escambo.
Por muitos séculos e até hoje encontramos esta forma rudimentar de comércio,
entre povos de economia primitiva, em regiões cujo acesso é muito difícil, pois há escassez
de meio circulante, e ainda hoje, observa-se que algumas pessoas efetuam permuta de
objetos sem a preocupação de sua equivalência de valor.
As mercadorias utilizadas para escambo geralmente se apresentam em estado
natural, variando conforme as condições de meio ambiente e as atividades desenvolvidas
pelo grupo, correspondendo a necessidades fundamentais de seus membros. A troca é dita
direta, quando a transação é realizada sem o auxílio de um instrumento intermediário de
troca. Apesar de muito utilizada no início da civilização até os dias atuais, a economia das
trocas, ou seja, o escambo possui custos envolvendo pessoas, serviços e objetos, tais como:
(i) necessidade de dupla coincidência – a necessidade de que ambos os negociadores
desejem o que cada um deseje oferecer a um preço acordado por ambos; e, (ii) para cada
bem transacionado, deve ser estabelecido um preço em termos de outro bem.
A primeira revolução agrícola – traduziu-se na fixação de certos grupos humanos
em determinadas áreas, como os deltas dos rios Nilo, Tigre, Eufrates. Pratica-se a
agricultura organizada e a domesticação de animais. O nomadismo vai, gradualmente
cedendo lugar a uma forma de vida mais sedentária, o que aumenta a complexidade das
relações sociais. A produção se diversifica.
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Manifesta-se uma pequena especialização e divisão social do trabalho: guerreiros,
agricultores, pastores, artesão, sacerdotes. Os meios de se obter benefícios da especialização
são as trocas, nas quais cada indivíduo troca o seu produto diretamente com outro
indivíduo.
O abandono do sistema de escambo (trocas diretas) e a criação da moeda
Quando a divisão do trabalho se tornou mais complexa, aumentou o número de bens e
serviços exigidos para satisfação das necessidades humanas estimuladas pelo caráter
sedentário da vida; a dupla coincidência dos desejos de modo que fica mais difícil e
dispendiosa em termos de tempo e recursos, logo, as trocas, que antes eram acessórias nos
agrupamentos primitivos, torna-se agora fundamental para o desenvolvimento e para a
sobrevivência do grupo.
Um importante problema num sistema de escambo (ou de trocas diretas) é que
qualquer indivíduo que deseja realizar uma troca deve encontrar outro indivíduo com os
bens que deseja vender. Para permitir o desenvolvimento das trocas, o escambo foi sendo
substituído por processos indiretos de pagamento. Inicialmente, determinados produtos,
que eram recebidos em pagamentos referentes às transações econômicas configura a
origem da moeda.
Determinados produtos irão desempenhar a função de intermediários de trocas,
mesmo que eles não tenham valor de uso ou não sejam desejados pelos que os recebam,
mas são amplamente aceitos por todos os membros do grupo para a finalidade de
intermediar trocas. As trocas agora passam a ser indiretas, isto é, utiliza-se um
intermediário – a moeda.
As operações de compra e venda de mercadorias são agora intermediadas por
produtos que possuem aceitação geral e atual como moeda. De agora em diante, o valor de
todos os bens passa a ser medido em relação aos produtos-padrão.
Desde o seu estágio mais primitivo, a moeda é usada para intermediar processos
rudimentares de troca, pode ser conceituada como um bem econômico qualquer que
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desempenha as funções básicas de intermediária de trocas, que serve como medida de valor
e que tem aceitação geral.
1.2 Conceito, funções e formas assumidas pela moeda
A moeda como conhecemos hoje representa o conjunto de meios de pagamento é
uma instituição que responde a uma necessidade social decorrente da divisão do trabalho.
Consiste na totalidade dos ativos financeiros (papel moeda, depósitos bancários, cheques de
viagens) possuídos pelo público que pode ser utilizada a qualquer momento para
liquidação de qualquer compromisso futuro ou à vista.
Moeda é o conjunto de ativos da economia usados regularmente pelos agentes
econômicos para comprar bens e serviços uns dos outros. Sendo assim, a moeda inclui
apenas os poucos tipos de ativos que são regularmente aceitos por vendedores e
compradores em suas transações. O que diferencia a moeda dos outros ativos da economia
é a sua liquidez, ou seja, a facilidade que esse ativo tem de ser trocado por outros bens e
serviços. Por exemplo, é deveras complicado trocar televisores de 60 polegadas por sacos de
arroz ou por imóveis residenciais. Já a moeda, seja a moeda bancária ou o papel-moeda,
pode ser trocado facilmente por qualquer um dos dois.
A moeda possui três funções que a distinguem dos outros tipos de ativos da
economia:
(1) Função de instrumento ou meio de troca. - A principal função da moeda é a de
ser meio de pagamento. Logo, a moeda é um ativo que pode ser usado na troca de bens e
serviços e em operações de compra ou venda. No entanto, para ser meio de pagamento é
fundamental que a moeda seja amplamente aceita e que toda a sociedade tenha confiança
nela. A utilização da moeda como uma intermediária de trocas possibilita a sensível
redução do tempo empregado em transações, reduzindo sensivelmente os custos de
transação. A moeda como meio de troca torna desnecessária que exista uma dupla
coincidência de necessidades nas trocas e promove a eficiência, reduzindo o tempo gasto no
intercâmbio dos bens.
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(2) Função de unidade de conta. – função, a moeda é tida como o denominador
comum nos quais todos os bens e serviços são medidos. Ela possibilita, portanto, que os
valores de todos os bens ou serviços na economia sejam expressos em moeda nacional. A
moeda usada com unidade de conta reduz os custos de transação numa economia
reduzindo o número de preços que se necessita considerar numa troca.
Os benefícios desta função crescem à medida em que a economia se torna mais
complexa. A introdução de uma unidade de conta na qual são expressas e comparadas os
valores de diferentes bens e serviços é importante para a eficiência econômica, pois isto
reduz o número de cálculos requeridos para se alcançar a valoração dos bens quando estes
crescem. Esta função é a de evitar cálculos desnecessários, adotando uma determinada
linguagem na qual se possa expressar o valor dos bens e serviços.
(3) Função de reserva de valor. - Quando as pessoas recebem moeda em troca de
bens ou serviços, não há a necessidade imediata de gastá-la, pois a moeda pode manter o
seu valor, isto é, pode ser usada como reserva de valor. A moeda é uma reserva por
excelência do poder de compra, devido a sua liquidez e pelos graus de incerteza quanto as
possibilidades futuras de conversão das outras formas de ativo (títulos, ações, terra, obras
de arte, joias, carros, bônus,etc).
1.3 Formas assumidas pela Moeda - A moeda pode assumir três tipos de formas na
sociedade:
1. Moedas metálicas - Estas constituem pequena parcela dos meios de pagamento na
economia e visam facilitar as operações de pequeno valor. São emitidas pelo Banco Central.
2. Papel-moeda em poder do público (PMPP) - Esta representa parcela significativa da
quantidadede dinheiro em poder do público, e também são emitidas pelo Banco Central. O
papel moeda e as moedas metálicas em poder do público são denominados moedas
manuais.
3. Moeda escritural ou bancária (DVbc) - é representada pelos depósitos à vista nos bancos
comerciais (depósitos em conta corrente).
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1.4 Meios de Pagamento: Conceito e Composição
A moeda, assim como qualquer outro bem ou serviço tem seu preço e quantidade
determinados pela oferta e demanda. A oferta de moeda constitui-se nos recursos
financeiros colocados à disposição do público pelas autoridades monetárias e pelos bancos
comerciais para atender às necessidades da sociedade.
O público – aí incluídos os indivíduos e as empresas – possui, de uma forma geral,
diversos ativos ou haveres – isto é, coisas que têm valor econômico e que constituem seu
patrimônio, podendo ser citados entre estes os imóveis, fazendas, carros, depósitos de
poupança, aplicações financeiras em bancos, títulos do governo, depósitos à vista nos
bancos comerciais, papel-moeda em espécie em seu poder, ações e outros tantos.
Cada ativo deste possui um grau diferente de liquidez – medido este pela capacidade
de o ativo se transformar em moeda ou em dinheiro propriamente dito. Assim, quanto mais
fácil for transformar um ativo em dinheiro, maior se diria que é o seu grau de liquidez.
A oferta de moeda também é chamada de meios de pagamento. Os meios de pagamento
(MP) no sistema econômico são dados pela soma da moeda manual com a moeda escritural,
ou seja: MP = PMPP + DVbc.
Quando nos referimos à moeda como o ativo mais líquido na economia, queremos
enfatizar com isso, sua capacidade e disponibilidade de ser prontamente aceita para ser
usada nas mais diversas transações econômicas. Aos meios de pagamento conceituados
como moeda de liquidez imediata na literatura econômica chamamos de M ou ativos
monetários: M1 = MP = PMPP + DVbc.
Dessa forma, os meios de pagamento no conceito de M1 - correspondem à soma de
duas formas da moeda: moeda em poder do público mais os depósitos à vista nos bancos
comerciais.
É possível também conceituarmos outros ativos ou haveres não monetários de alta
liquidez (embora não tão imediata) que rendem juros denominados de quase-moedas, tais
como: M1 = papel moeda em poder do público + depósitos à vista
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M2 = M1 + depósitos especiais remunerados + depósitos de poupança+ títulos
emitidos por instituições depositárias.
M3 = M2 + quotas de fundos de renda fixa + operações compromissadas (Selic)
M4 = M3 + títulos públicos de alta liquidez.
1.5 Quais são os instrumentos que servem como moeda, isto é, que desempenham as
funções da moeda na economia Brasileira?
Os meios de pagamentos são aqueles vários ativos em poder dos agentes públicos e
privados que podem ser utilizados para o pagamento de compromissos (dívidas) assumidas
e/ou para pagamentos à vista. Os meios de pagamento, em conceito restrito (M1), envolve o
papel-moeda em poder do público (moeda manual) e os depósitos à vista (moeda escritural)
nos bancos comerciais.
O Banco Central emite o papel-moeda (PME) legal de curso forçado. Uma parte
desse papel-moeda emitido pelo Banco Central é retida pelos bancos comerciais na forma
de encaixes ou reservas bancárias. O restante se torna papel moeda em poder do público
não bancário (PMPP).
Os Bancos Comerciais são os agentes responsáveis/autorizados a receber depósitos à
vista. Ao conjunto de instituições responsáveis pela criação de M1 denomina-se Sistema
Monetário ou Bancário e é constituído, no Brasil, pelo Banco Central e pelos Bancos
Comerciais.
Os demais ativos financeiros, M2, M3, M4, são considerados ativos não monetários
assim como as instituições que os emitem são chamadas instituições não bancárias. Essas
definições são, em certo sentido, bastante arbitrárias uma vez que muitos dos ativos não-
monetários são utilizados e aceitos como meios de pagamentos.
Por exemplo, em algumas transações o governo aceita títulos públicos em poder do
comprador como meio de pagamento. Outro exemplo: títulos privados, como depósitos a
prazo, são altamente líquidos, isto é, podem ser convertidos em M1 instantaneamente sem
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perda de valor (ainda que o aplicador possa perder o rendimento a que tinha direito).
A questão da definição do que é meio de pagamento está relacionada com as regras de
conversão dos vários ativos em moeda do governo (isto é, moeda aceita pelo governo no
pagamento de tributos) e a moeda dos bancos comerciais (os depósitos à vista).
As regras de conversão dos meios de pagamentos em M1 estão, por seu turno,
relacionadas ao grau de organização dos mercados e a regras de conversão dos demais
agregados monetários estabelecidas pelo governo para sua moeda. Por exemplo, os
próprios depósitos à vista são considerados moeda porque o Estado garante que os mesmos
sejam plenamente conversíveis na moeda do Estado.
1.6 O Sistema Monetário
O sistema financeiro nacional é constituído de dois grupos de instituições: o
chamado sistema monetário e o sistema não monetário. O sistema-monetário é constituído
pelas instituições financeiras que criam moeda, ou seja, é constituído de apenas o Banco
Central – que emite moeda – e dos bancos comerciais – que recebem depósitos à vista.
Já o sistema não-monetário é constituído de todas as demais instituições financeiras
(as que não criam meios de pagamento), aí compreendidos os bancos de investimento, os
bancos de desenvolvimento, as sociedades de crédito, financiamento e investimento
(financeiras), o sistema brasileiro de poupança e empréstimo (cadernetas de poupança), as
distribuidoras, as corretoras e tantas outras.
Os bancos comerciais são agentes especiais dentro do sistema porque seus passivos
(depósitos à vista) são reconhecidos pelo estado como plenamente conversíveis em moeda
do estado (meio de pagamentos aceitos na liquidação de tributos). Por isso mesmo, essas
instituições recebem regulação específica do Banco Central. Assim, os bancos comerciais
são obrigados a manterem uma reserva compulsória que é estabelecida e recolhida pelo
Banco Central e que serve para mostrar a solvabilidade dos bancos comerciais na forma de
moeda do estado.
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Entretanto, os próprios bancos comerciais têm interesse em manter a estabilidade
de seus balanços de forma que eles mesmos mantêm uma reserva voluntária em seus ativos.
Dessa forma, se em um determinado dia um banco recebe mais saques do que depósitos, o
banco poderá fazer os pagamentos sem ter de recorrer ao mercado ou ao Banco Central.
Os bancos comerciais agentes no sistema monetário autorizados a receberem
depósitos à vista, e por esta razão, são importantes fontes de criação de moeda. As pessoas
preferem manejar a moeda escritural, isto é, moeda bancária comparativamente ao uso da
moeda manual, para a liquidação de suas transações. As razões que explicam essa
preferência são, em síntese, as seguintes:
a) Os depósitos bancários à vista são mais seguros e oferecem maiores garantias aos
seus detentores. Comparativamente com a moeda manual, são menos passíveis
de perdas e roubo.
b) O manejo de cheques, para efetuar pagamentos, é mais fácil, principalmente
quando se trata de transações de grande vulto.
c) A manutenção de saldos monetários nos bancos comerciais facilita a obtenção de
empréstimos, quer por parte das empresas (para o financiamento do processo de
produção), quer por parte das unidades familiares (para o financiamento do consumo de
bens e serviços, em antecipação a rendimentos que estas esperam auferir no futuro).
d) Os pagamentos por intermédio de cheques permitem o melhor controle e amelhor contabilização das despesas, ao mesmo tempo em que podem servir de
comprovante para determinadas finalidades legais, especialmente quando nominais e
cruzados.
e) A concessão de aberturas automáticas e limitadas de crédito, superiores aos
saldos existentes, de que são exemplos os cheques especiais, levam os agentes econômicos a
se utilizarem, de forma generalizada, dos bancos comerciais como depositários de suas
reservas monetárias.
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1.7 Conceitos de base monetária e multiplicador dos meios de pagamento
O Banco Central- a principal autoridade monetária de um país - influencia a oferta
de moeda, mas não é o único no sistema econômico, pois, tanto os bancos comerciais quanto
os indivíduos podem afetar também, a oferta de moeda. Qual a relação entre oferta de
moeda e base monetária?
O banco comercial capta recursos diretamente do público - os depósitos - e faz
empréstimos a partir desses recursos. Para evitar prejuízos aos depositantes, o governo
obriga os bancos a manterem reservas: uma percentagem (fração) determinada dos
depósitos à vista fica retida no BACEN. Os bancos também detêm uma parcela de seus
recursos denominada de reservas voluntárias no banco, para sua própria segurança.
O papel–moeda emitido (PME) pelo Banco Central menos o caixa do Banco Central
(CBC) é igual ao montante de papel-moeda em circulação (PMC), ou meio circulante.
Dessa forma, PME menos CBC = PMC.
Os bancos comerciais retêm parte do PMC, para fazer seu caixa. Assim, o PMC
menos o encaixe (reserva) total dos bancos comerciais (Et) é igual ao PMPP (papel - moeda
em poder do público).
As Reservas Bancárias: Ets são constituídas pelos depósitos compulsórios dos
bancos comerciais e outras instituições incluídas no conceito convencional de meios de
pagamento junto ao Banco Central, DBCAM, mais o papel-moeda em caixa dos bancos
comerciais, PMBC, Et = DBCAM + PMBC.
Logo, PMC menos Et = PMPP. Portanto, o papel-moeda emitido é igual caixa do
BACEN mais reservas bancárias mais papel-moeda em poder do público, ou PME = CBC
+ Et + PMPP.
A base monetária é chamada de emissão primária de moeda e constitui-se na
principal variável de política monetária do governo cuja soma compreende dois
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componentes: o papel-moeda em poder do público (PMPP) com o total de reservas (ou
encaixes) dos bancos comerciais (Et), ou, B = PMPP+ Et = PMC.
A base monetária é, portanto, igual ao total da moeda colocada em circulação pelo
Banco Central. Se o PMPP = MP menos DVbc.
Então, a base monetária pode ser redefinida da seguinte forma: base monetária(B) é
igual aos meios de pagamento – MP - menos os depósitos à vista nos bancos comerciais -
DVbc mais as reservas dos bancos comerciais – Et, ou B = MP - DVbc + Et.
Deve-se destacar que o Banco Central tem controle da base monetária, pois ele pode
expandir (ou contrair) a mesma ao decidir aumentar (ou reduzir) o seu estoque de ativos
ou pode ainda reduzir (ou aumentar) o seu passivo não monetário.
1.8 Criação e Destruição de Base e de Meios de Pagamento
Deve-se entender a criação ou destruição de moeda como a mesma coisa que a
criação ou destruição de meios de pagamentos. Sabendo que este último é constituído por
todos os ativos de liquidez imediata possuídos pelo setor não bancário da economia,
conclui-se que a criação ou destruição de moeda envolve uma transação entre o setor
bancário e setor não bancário da economia.
Diariamente, o público - isto é, os indivíduos e as empresas, realiza operações com o
setor bancário comercial, operações estas traduzidas em depósitos, saques, pagamentos
diversos (luz, telefone), tomada ou quitação de empréstimos, etc. Dependendo da natureza
dessas operações, o total de ativos monetários da economia – isto é, os meios de pagamento
(M1) – poderá se reduzir ou aumentar.
Se o resultado for um aumento dos meios de pagamento, tem-se aí uma criação de
moeda; se ocorrer uma redução dos meios de pagamento, tem-se uma destruição de moeda.
Então, o que se tem de verificar, após a operação bancária, é se o total de meios de
pagamento se alterou para mais ou para menos.
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Para um melhor entendimento da explicação a seguir, é interessante que você
conheça dois conceitos novos: primeiro, o conceito de haver monetário; segundo, o de haver
não-monetário. Haver ou ativo monetário corresponde a um dos componentes dos meios de
pagamento (M1), ou seja, ou é o papel-moeda em poder do público ou é o depósito à vista.
Já haver não-monetário é todo ativo possuído pelo público que não seja meio de pagamento
(M1), como, por exemplo, ações, promissórias, títulos do governo, carro, lote, imóveis, etc.
Isto posto, exemplificamos agora o que se entende por criação e a destruição de
moeda. Ocorrerá criação de moeda quando ocorrer uma troca entre um ativo não
monetário (de liquidez não imediata) do setor não bancário por um ativo monetário do
setor bancário. Ocorrerá destruição de moeda se a troca for entre um entre um ativo
monetário do setor não bancário por um ativo não monetário do setor bancário.
Exemplos:
a. um indivíduo efetua um depósito a vista em um banco comercial em moeda
corrente ou cheque: não há criação ou destruição de moeda pois nos depósitos a vista será
compensado pelo decréscimo no PMPP.
b. desconto de duplicata cria meios de pagamentos: troca de um haver não
monetário por moeda.
c. depósito nas cadernetas de poupança: reduzem o M1 (aumenta o passivo não
monetário das instituições financeiras).
Portanto:
(i) há criação ou destruição de base sempre que houver uma operação ativa do
Banco Central não compensada por uma operação de passivo não monetário;
(ii) há criação de meios de pagamento sempre que o setor bancário adquirir algum
haver não monetário do setor não bancário da economia com M1;
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(iii) Meios de pagamentos são destruídos quando vendem ao público quaisquer
haveres não monetários em troca do recebimento de moeda.
Fica claro que para haver criação de meios de pagamento é necessário haver
transações entre o setor não bancário com o setor bancário.
Vale repetir que a criação ou destruição de moeda só ocorre se, da operação entre o
público e o banco, resultar uma alteração do total de meios de pagamento do público. Isto
significa dizer que, se um indivíduo paga sua conta de luz com um cheque de sua conta
corrente não haverá nem criação nem destruição de moeda, pois a queda de seus depósitos
à vista é compensada pelo aumento dos depósitos da companhia de eletricidade – que
também é público.
Da mesma forma, se um correntista vai ao banco e saca de sua conta corrente, com
um cheque seu, nada ocorre, de vez que ele trocou um ativo monetário (depósito à vista)
por outro (dinheiro em espécie). Mas, claro, se ele saca de sua conta de poupança, há
criação de meios de pagamento, pois os depósitos de poupança são considerados haveres
não monetários.
1.9 Multiplicador Bancário ou Monetário
De uma forma simplificada, o processo se dá da seguinte maneira: as autoridades
monetárias injetam dinheiro no sistema econômico, ou seja, há um aumento dos meios de
pagamento. Por exemplo: vamos supor que o BACEN compra títulos da dívida de um
agente no valor de 200 mil reais. O agente econômico deposita este dinheiro em um banco
comercial. Por simplicidade, consideraremos que o agente deposita todo o dinheiro no
banco comercial. O banco comercial não mantém a totalidade do depósito em caixa, mas
empresta este dinheiro a outro agente. No final, a moeda criada pelos bancos comerciais
será dada pelo depósito inicial no sistema bancário multiplicado por uma constante, que se
chama Multiplicador dos Meios de Pagamento.Como os bancos mantêm um volume de reservas muito inferior ao volume de
depósitos à vista, segue-se que eles criam “meios de pagamento”. O multiplicador
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monetário mostra qual será o acréscimo no volume de meios de pagamento decorrente de
um determinado acréscimo no volume de base monetária.
PMPP/M1 = c = Expressa o comportamento do público em relação ao papel moeda
que deseja manter;
DVBC/M1 = d = Expressa o quanto o público tem de depósitos nos bancos;
r = RdM1= Expressa o quanto os bancos manterão de reservas como proporção dos
depósitos;
Podemos escrever a Base Monetária, agora, como segue:
B = PMPP + Reservas bancárias = cM1 + RdM1,
E Sabemos que c = 1 – d
Assim temos: B = (1 - d)M1 + RdM1 = M1 – d(1 – R)M1
Ou M1/B = 1/ 1 - d( 1 – R)
Exemplo 1: Mostraremos a seguir através de uma situação hipotética o conceito de
multiplicador monetário em termos práticos. Primeiro, faremos algumas suposições:
(1) A emissão primária da moeda pelo BACEN seja R$ 100.000, sendo essa quantidade de
moeda entregue ao público;
(2) As pessoas depositarão todo o dinheiro nos bancos comerciais para movimentá-lo
através de cheques (moeda em poder do público é nula);
(3) Os bancos precisam manter em reservas técnicas, compulsórias e voluntárias 40% dos
depósitos; e
(4) Os bancos irão reter apenas o necessário para cobrir as reservas e emprestarão os
recursos remanescentes.
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Afinal, quanto deve ter sido o montante de dinheiro criado pelo sistema bancário na
economia? O aumento da oferta de moeda na economia deve ser igual ao valor
acrescentado inicial dividido pelas reservas dos bancos. Logo, o aumento da Oferta
Monetária = R$ 60.000/R$ 0,40 = R$150.000
2. A Teoria Quantitativa da Moeda
Os assuntos a serem abordados nesta unidade referem-se às temáticas: Breve
Histórico de um Longo Debate: A Controvérsia Bulhonista: 1797-1821; A Controvérsia
Continua: 1821 em diante e A Teoria Quantitativa da Moeda: a herdeira da posição
Bulhonista.
2.1 A Teoria Quantitativa da Moeda de Fisher à teoria da demanda por moeda de
Friedman
A Teoria Quantitativa da Moeda estabelece que o estoque de moeda, “M”, é o
principal determinante do nível geral de preços, “P”. Os economistas clássicos/neoclássicos
chegaram a esta conclusão, a partir da hipótese de que o produto real a preços constantes
de qualquer economia depende exclusivamente de variáveis reais (fatores de produção e
função de produção agregada) e que a velocidade de circulação da moeda varia de forma
lenta e previsível a longo prazo (dependendo de fatores como o grau de desenvolvimento do
setor bancário, frequência de pagamentos e recebimentos, rapidez de transporte e
comunicações), podendo ser considerada uma constante no curto prazo.
A conclusão de que o produto real a preços constantes depende somente de fatores
reais é obtida a partir da hipótese de flexibilidade de preços, tanto no mercado de bens e
serviços quanto no mercado de trabalho, tornando-se conhecida na literatura como
“equilíbrio clássico de pleno emprego” (Ackley 1978, cap. VI). Em meados do século XVIII,
David Hume em seu ensaio Of Money, de 1752, foi o primeiro pensador a analisar de modo
mais rigoroso a relação entre variáveis monetárias e variáveis reais.
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A primeira versão da Teoria Quantitativa da Moeda apareceu na literatura
econômica como Equação Quantitativa na forma de transações, sendo formulada por
Simon Newcomb, em 1885 (Spiegel, 1992, p. 617) mas foi Irving Fisher, em 1911, em The
Purchasing Power of Money, quem popularizou esta teoria.
A TQM desenvolve a Equação Quantitativa cujo objetivo é mostrar a identidade
existente entre o total de pagamentos em moeda e o total de bens e serviços transacionados.
Note-se que, em cada ato de compra e venda de um bem ou serviço qualquer, os
pagamentos em moeda e o valor monetário dos bens e serviços trocados são iguais. Logo, o
total de moeda paga nas transações é igual ao valor monetário total dos bens e serviços
comprados. Antes de descrever esta teoria vejamos alguns eventos históricos que
influenciaram a teoria supracitada.
2.2 A Demanda de Moeda
A moeda é formada por uma série de ativos financeiros (incluindo dinheiro, saldos
bancários, cheques de viagem e outros instrumentos) com características especiais, que os
distinguem dos outros tipos de direitos financeiros. Quando uma pessoa vai ao cinema,
compra legumes ou um carro, nunca vai tentar fazer a compra com títulos ou ações, mas
com algum tipo de dinheiro. Esta característica - a de ser um meio de troca aceitável - um
motivo importante pelo qual a moeda é um meio de troca tão útil é que, de acordo com a
lei, ninguém pode recusar-se a receber um pagamento em dinheiro. Na realidade, a moeda
exerce três papéis fundamentais.
1. Em primeiro lugar, é um meio de troca, isto é, as pessoas estão dispostas a
aceitá-la em troca de bens e serviços e, portanto, não há necessidade de haver
coincidência mútua de desejos para que uma transação ocorra.
2. Em segundo lugar, serve como unidade de conta, e como tal os preços são
cotados em unidades monetárias e não em relação a outros bens e serviços.
Nestes dois papéis a moeda facilita o processo de troca.
3. Em terceiro lugar, a moeda é uma reserva de valor e, neste papel, é igual aos
demais ativos financeiros. Quando as pessoas recebem dinheiro em troca de bens
e serviços, não precisam gastá-lo imediatamente, porque ele mantém seu valor
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(exceto em períodos de inflação, quando deixa de ser usado como reserva de
valor).
2.3 A Teoria Quantitativa da Moeda
A abordagem clássica é baseada na teoria quantitativa da moeda, teoria que afirma
que a quantidade de moeda nominal determina o nível da renda nominal. A ideia de que a
quantidade de moeda em circulação afeta o nível geral de preços é bastante antiga em
análise econômica, e encontra um marco histórico notável na controvérsia entre Jean
Bodin e Mallestroit sobre as causas da inflação na França de 1570. Durante cerca de três
séculos, a teoria quantitativa foi aceita como lei de proporcionalidade entre a quantidade
de moeda em circulação e o nível geral de preços. As versões mais refinadas datam do final
do século XIX e princípio do XX, devendo-se, principalmente, a Marshall, Wicksell e
Fisher. (Simonsen & Cysne, p.319)
2.3.1 A Equação de Fisher e a Velocidade de Transações da Moeda
Uma primeira expressão da teoria quantitativa da moeda foi a chamada de
"equação de Fisher", em homenagem a Irving Fisher (1867 - 1947), seu principal
proponente. Ela é: MV = PT
onde: M = moeda;
T = todas as transações realizadas com moeda;
P = preço médio de todos os itens incluídos em T;
V = velocidade de transações e representa o número de vezes que uma unidade
monetária se torna receita para alguém, ainda que não se torne renda.
Assim, (T) não abrange apenas os itens incluídos no PIB, mas também os produtos
intermediários, compras de artigos de 2a. mão e serviços de fatores. Chega até a incluir
transações financeiras, como, por exemplo, transferências de fundos de uma conta de
depósito à vista para um fundo do mercado monetário. As dificuldades de manuseio
operacional desta versão da teoria quantitativa da moeda levou Fisher e outros economistas
clássicos, como Marshall e Pigou, a evoluírem para o conceito da equação de trocas e da
velocidade-renda da moeda.
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2.3.2 A Equação de Trocas e a Velocidade-Renda da Moeda
Suponha que você queira relacionar a renda nominal (PY) à quantidade de moeda
(M). A maneira mais simples seria dizer que elas são a mesma coisa e escrever: M = PY.
Isto é simples, masestá errado. As notas de dinheiro ou os depósitos em conta corrente não
se limitam a comprar um determinado bem ou serviço e depois morrerem. Em vez disso,
quem os recebe torna a gastá-los, de modo que se tornam renda uma segunda vez, e assim
por diante.
O que precisa ser feito é mudar o absurdo M = PY para MV = PY, mediante o
acréscimo de um termo, V, para indicar a velocidade-renda da moeda. Esse termo mede o
número de vezes que uma unidade de moeda se torna renda para alguém num determinado
período. V mede não o número de vezes que um dólar ou real é gasto, mas o número de
vezes que ele se torna renda durante o ano. Por definição, portanto, a velocidade de
circulação é a renda nominal agregada dividida pela quantidade de moeda e representa o
“giro” da moeda, ou seja, o número de vezes por período que uma unidade monetária é
gasta para adquirir o total de bens e serviços produzidos na economia. (Hillbrecht, 1999)
MV = PY Equação de trocas (identidade representativa da TQM)
V = PY / M Velocidade-renda da moeda
A Hipótese da Velocidade Constante
Segundo Irving Fisher, são fatores tecnológicos e institucionais que determinam a
velocidade de circulação da moeda. Quanto menos moeda for demandada, maior será a
velocidade-renda da moeda. Se, por exemplo, os indivíduos usam cartões de crédito para
fazer compras, eles precisam manter menos moeda para efetuar determinado volume de
transações e, portanto, a velocidade-renda é maior do quando dinheiro ou cheques são
utilizados (que se constituem em moeda). Fisher considerou que esses fatores tecnológicos e
institucionais mudam lentamente ao longo do tempo, de maneira que a velocidade de
circulação da moeda poderia ser considerada constante no curto prazo. (Hillbrecht, 1999)
Uma vez considerada a velocidade (V) constante, a equação quantitativa (MV=PY)
pode ser considerada uma teoria do PNB nominal, que diz que a renda nominal (PY) é
determinada por movimentos da oferta de moeda (M). Em outras palavras, uma variação
na quantidade de moeda (M) deve provocar uma mudança proporcional no PIB nominal
18
(PY). Isto é, a quantidade de moeda determina o valor em unidades monetárias do produto
da economia.
Fisher, como os economistas clássicos de sua época, acreditava que preços e salários
eram perfeitamente flexíveis, de maneira que o produto real (Y), sob condições normais,
estaria em seu nível de pleno emprego e poderia também ser considerado como constante
no curto prazo. Portanto, pela teoria quantitativa, como V e Y são considerados constantes,
todos os movimentos do nível de preços são determinados por mudanças proporcionais na
quantidade de moeda. (Hillbrecht, 1999)
2.4 A Equação e a Abordagem de Cambridge
A hipótese central da teoria quantitativa é uma concepção dicotômica dos mercados.
Como aplicação duradoura de patrimônio, a moeda se considera absolutamente
indesejável, por não render juros. Mas os agentes econômicos precisam de uma reserva
transitória de valor, pois os seus pagamentos e recebimentos não se sincronizam nas
mesmas datas. E, como instrumento de compensação dessas defasagens entre recebimentos
e pagamentos, considera-se a moeda absolutamente insubstituível. Dentro dessa concepção,
a equação de Cambridge postulava que a procura de moeda era proporcional ao produto
nominal (PY). (Simonsen & Cysne, p.319).
A equação de Cambridge é uma formulação alternativa à equação quantitativa MV
= PY, em homenagem à Universidade de Cambridge, onde foi desenvolvida por Alfred
Marshall e A. C. Pigou. Ela é: Md = kPY. Onde k era denominada constante marshalliana.
Supondo-se equilíbrio entre oferta (M) e demanda no mercado monetário, M = Md, o
produto nominal ficaria determinado pela oferta de moeda, M, de acordo com a equação:
M = kPY.
Note-se que, em qualquer das equações anteriores, M ou Md representa um estoque
(unidades monetárias), e PY um fluxo (unidades monetárias por unidade de tempo).
Como MV = PY e M = k.PY, então: k = 1 / V. Isto é, se as pessoas mantiverem a
renda de um mês em moeda, de modo que k = 1/12, então, em média, um dólar ou real de
moeda entra na renda de alguém doze vezes ao ano. Quando usamos a equação
quantitativa estamos supondo que a oferta de saldos monetários reais seja igual à demanda
de saldos monetários reais, e esta, proporcional à renda.
19
2.5 A Demanda Individual de Moeda
A falta de sincronização entre recebimentos e pagamentos, aliada à
imprevisibilidade de certas despesas, são os dois motivos essenciais que, segundo os
economistas clássicos, conduzem à retenção de moeda pelos indivíduos.
2.5.1 Os Determinantes da Demanda Individual
Quais os fatores que explicam a maior ou menor proporção de moeda retida pelo
público em relação a um dado nível de renda? Em outras palavras: que fatores
determinam a maior ou menor magnitude da proporção k? Em síntese, admite-se que os
principais fatores sejam: 1. a forma como os indivíduos e as empresas distribuem, no
tempo, as suas despesas; 2. os intervalos entre os pagamentos e os recebimentos, dados por
hábitos e práticas econômicas que tendem a se institucionalizar; 3. as facilidades bancárias
para a concessão de crédito; 4. a eficiência do sistema de compensação e dos processos de
comunicação, que dificultam os sistemas de débito e de crédito de ordens de pagamento,
ampliando as margens de ociosidade da moeda escritural; 5. a maior ou menor integração
vertical do sistema econômico, à medida que influencia o número de transações
intermediárias, reduzindo-as ou ampliando-as, e, assim, exigindo maiores ou menores
saldos monetários disponíveis; 6. a existência ou não de substitutos próximos da moeda,
geralmente denominados quase-moeda, pelo seu elevado grau de liquidez e por se
constituírem em reservatórios rentáveis de poder aquisitivo; 7. o nível em que se encontra a
taxa real de juros, aqui considerada como o custo de oportunidade de retenção de moeda;
8. a taxa de inflação, à medida que provoca a diminuição da riqueza retida sob forma
monetária.
Como a quase totalidade desses fatores é determinada institucionalmente e, a curto
prazo e sob clima não inflacionário, se mantém inalterada, os economistas clássicos
consideravam a proporção "k" como uma constante. Isto é, com algumas qualificações, eles
consideravam irrelevantes as variações de “k” a curto prazo. (Lopes & Rossetti, p. 49-50)
Particularmente, os economistas de Cambridge consideraram que a moeda tem
duas propriedades importantes, que levam os indivíduos a demandá-la. Em primeiro lugar,
a moeda serve como meio de trocas, que os indivíduos usam para efetuar transações. Esta
parte da demanda por moeda é proporcional à renda nominal. Em segundo lugar, a moeda
20
também pode servir como estoque de riqueza, ou seja, quanto maior fosse a riqueza dos
indivíduos, maior seria o seu estoque de ativos, entre estes a moeda.
Na medida em que a riqueza dos indivíduos é proporcional à renda, a demanda por
moeda por este motivo também seria proporcional à renda. M = f(Y).
De acordo com os economistas clássicos, a demanda por moeda é uma função da
renda dos indivíduos (ou famílias). Entretanto, embora eles considerassem frequentemente
que o coeficiente de proporcionalidade k fosse constante no curto prazo, ele poderia
experimentar mudanças decorrentes das decisões dos indivíduos. Por exemplo, como a
moeda poderia ser demandada como estoque de riqueza, essa decisão dependeria dos
retornos esperados dos outros ativos que compõem o estoque de riqueza. Se esses retornos
subissem em relação ao da moeda, os indivíduos demandariam menos moeda por esse
motivo. Dessa maneira, k se reduziria e avelocidade de circulação da moeda aumentaria.
Portanto, a abordagem de Cambridge difere da teoria quantitativa estrita da moeda
pelo fato de que a taxa de juros (por meio do retorno esperado sobre os ativos que compõem a
riqueza dos indivíduos) pode afetar a velocidade de circulação da moeda, enquanto na teoria
quantitativa a demanda por moeda não guarda nenhuma relação com a taxa de juros.
(Hillbrecht, 1999)
2.6 A Versão Keynesiana da Demanda de Moeda (A Teoria da Preferência pela Liquidez)
Na versão Keynesiana, contrariando a versão clássica, a moeda deixou de ser vista
apenas como um instrumento de intermediação de trocas, que não afetava
significativamente outras variáveis econômicas, como a taxa de juros e o volume global de
emprego. Enfocando-a também como uma reserva de valor, mantida não apenas para fins
transacionais, mas também para atender a oportunidades de especulação, Keynes deixou
de ver a moeda como componente neutro.
Em sua versão, uma significativa parcela da demanda de moeda é afetada pelas
expectativas sobre o comportamento da taxa de juros, ao mesmo tempo em que o nível do
emprego e, consequentemente, outras variáveis do setor real da economia, experimentam a
influência de variações situadas no setor monetário. Ademais, Keynes incorporou na sua
versão da demanda de moeda a incerteza acerca das variações futuras na taxa de juros,
21
assinalando ser esta "a única explicação inteligível que justifica a conservação de recursos
líquidos para fins de especulação". (Lopes & Rossetti, p. 54)
2.6.1 Os Motivos da Demanda de Moeda em Keynes
A Teoria da Preferência pela Liquidez, de John Maynard Keynes, surgiu em 1936,
em seu famoso livro A Teoria Geral do Emprego, Juros e Moeda. Keynes rompeu com a
teoria clássica ao considerar explicitamente que a demanda por moeda depende da taxa de
juros. Segundo Keynes, há três motivos para a procura de moeda: as transações, a
precaução e a especulação.
1. Motivo Transação - Esse motivo foi desdobrado em dois. Keynes denominou-os
motivos-renda e giro de negócios. Quanto à renda, trata-se da necessidade de
conservar recursos líquidos para garantir a transição entre os recebimentos e os
desembolsos; a força deste motivo para induzir os agentes econômicos à decisão
de reter ativos monetários depende, segundo Keynes, principalmente do
montante da renda regularmente recebida e da duração normal do intervalo
entre o seu recebimento e os gastos. Quanto ao giro de negócios, incluiu-se sob
este motivo a moeda retida pelas empresas para garantir os pagamentos que se
efetuam no intervalo entre as compras de insumos e remunerações dos fatores e
as entradas de caixa resultantes da realização das vendas; a força deste motivo
para induzir as empresas a manter maiores ou menores saldos líquidos em caixa
depende, segundo Keynes, sobretudo do montante da produção corrente (e,
portanto da renda corrente) e do número de mãos através das quais ela passa.
(Lopes & Rossetti, p. 55). A procura de moeda para transações era identificada
pelos economistas clássicos: o estoque necessário para compensar as defasagens
entre recebimentos e pagamentos. Até aí, Keynes só inventou uma denominação.
2. Motivo Precaução - Enquanto o motivo transação se refere ao atendimento de
despesas ordinárias e certas, o motivo precaução decorre da necessidade de se
fazer frente a despesas extraordinárias e incertas. Há, assim, motivos que levam
os agentes a se precaverem quanto às contingências inesperadas. A força deste
segundo motivo depende, em grande parte, ainda segundo a versão de Keynes,
22
do custo e da segurança dos métodos para obter moeda em caso de necessidades
imprevistas. No Brasil, atualmente, a concessão de limites para movimentação de
contas correntes, em aberto nos bancos comerciais, franqueada aos detentores de
“cheques especiais”, tende a reduzir a demanda de moeda por precaução a níveis
próximos de zero. (Lopes & Rossetti, p. 56) Na boa linha clássica, Keynes
admitiu que não apenas a procura de moeda por transações, mas também a por
precaução, fossem proporcionais à renda nominal, na forma marshalliana kPY,
sendo k uma constante.
3. Motivo Especulação - Enquanto os dois motivos anteriores são comuns aos
clássicos e a Keynes, o motivo especulação é especificamente Keynesiano. Quanto
a este terceiro motivo, Keynes procura mostrar que, ao contrário do que
pensavam os clássicos, não é irracional manter ativos monetários para satisfazer
a oportunidades especulativas, desde que os agentes econômicos tenham razões
para acreditar em mudanças a seu favor no preço dos títulos e, portanto, na taxa
de juros. A expectativa sobre mudanças futuras na taxa de juros situa-se, assim,
atrás do motivo especulação. Sob uma expectativa generalizada de alta na taxa
de juros ou de uma queda equivalente no preço dos títulos, no futuro, a retenção
de saldos monetários para fins especulativos tende a se elevar; caso contrário, a
retenção de moeda devida a esse motivo tende a diminuir. (Lopes & Rossetti, p.
56)
A linha de raciocínio seguida por Keynes está fundamentada nessa relação simples
entre os preços de mercado dos títulos de renda fixa e as correspondentes taxas de juros
auferidas por seus detentores. Admitindo que os agentes econômicos manteriam seus
excedentes de renda em relação as suas necessidades de consumo (isto é, poupanças) sob a
forma de ativos monetários ou de títulos adquiridos no mercado financeiro, Keynes
observou que, quando os preços dos títulos estavam altos e as taxas de juros baixas, os
agentes econômicos revelavam, de uma forma geral, forte propensão a manter aqueles
excedentes sob a forma de ativos monetários, na expectativa de que os preços caíssem e
ensejassem, se adquiridos quando então se encontrassem em queda, maiores ganhos
23
especulativos. Inversamente, estando baixos os preços dos títulos e altas as taxas de juros, a
manutenção de saldos monetários para fins especulativos tendia a se reduzir, dada a
preferência que então se estabelecia por aplicações em títulos, na expectativa de que seus
preços se elevassem, ensejando maiores ganhos especulativos, se vendidos quando então se
encontrassem em alta.
Relações entre preços de mercado e taxas de juros de um título de renda fixa
preço de mercado do título ($)
valor nominal = $ 100.000
rendimento fixo mensal ($)
3% a.m. s/o valor nominal
Taxa de juros ( i )
%
100.000 3.000 3.00
105.000 3.000 2.85
110.000 3.000 2.73
120.000 expansão 3.000 2.50 redução
100.000 3.000 3.00
95.000 3.000 3.15
86.000 3.000 3.53
82.000 redução 3.000 3.66 expansão
(Lopes & Rossetti, p.59-60)
2.7 O Modelo Baumol-Tobin de Demanda por Moeda
A teoria mais famosa de demanda por moeda, chamada de abordagem do estoque, é
baseada nos trabalhos isolados realizados por William Baumol e James Tobin em meados
dos anos cinquenta (W. Baumol, "The Transactions Demanda for Cash: An Inventory
Approach", QJE/1952, e J.Tobin, The Interest-Elasticity of the Transactions Demand
for Cash, RES/1956). Atualmente é conhecida como modelo de Baumol-Tobin. Ambos
observaram que as pessoas mantém estoques de dinheiro da mesma forma que as empresas
mantém estoques de mercadorias.
Num certo momento, a família tem uma parte do seu patrimônio em forma de
moeda para poder fazer compras. Se mantiver grande parte do seu patrimônio em forma
de moeda, sempre terá dinheiro para realizar transações; se for uma pequena parte, vai
precisar obter dinheiro, por exemplo, vendendo títulos, sempre que quiser fazer uma
24
compra. Em geral, vai haver um custo, como,por exemplo, uma taxa de corretagem, cada
vez que vender um ativo remunerado para obter o dinheiro necessário para as compras.
Portanto, a família precisa fazer uma escolha. Se ficar com muita riqueza em forma
de moeda em seu poder, perde os juros que ganharia se mantivesse os títulos. Ao mesmo
tempo, reduz o custo de transação de converter os títulos em dinheiro cada vez que quiser
comprar alguma coisa.
Este problema é semelhante ao da empresa que precisa definir o nível de estoques.
Com um estoque grande, sempre terá insumos para produzir ou vender. Mas manter
estoques tem um custo, pois eles não rendem juros e envolvem despesas de armazenagem e
seguro. Portanto, a empresa deve analisar se é mais conveniente manter estoques maiores e
arcar com os custos (tanto os de oportunidade quanto os diretos) ou reduzí-los. A seguir
vamos ver como Baumol e Tobin formalizaram esta ideia.
Os arranjos institucionais no mercado financeiro também afetam significativamente
a procura de moeda. Keynes só conseguiu engordar a procura especulativa supondo que os
títulos de curto prazo pouco circulassem no mercado. Uma oferta abundante de títulos de
prazo curto, reduzindo o risco de oscilação de suas cotações, deve reduzir a procura de
moeda a tal ponto que pode, inclusive, afetar a procura por transações. Vejamos o
diagrama de encaixes triangulares: (Simonsen & Cysne, p.343)
Y
M/2
M
moeda
M/2
moeda
M títulos
M/2
M moeda
tempo
25
Trabalha-se, agora, com a suposição de preços constantes (PY = Y). Implicitamente,
ao construirmos as curvas de procura de moeda, admitimos que indivíduos e empresas não
tivessem como aplicar dinheiro em títulos de prazo inferior a um mês. Contudo, nos
mercados monetários modernos, há operadores de mercado aberto que oferecem a seus
clientes operações por qualquer prazo, a partir de um dia. Não é preciso, no caso, muita
imaginação para dividir o mês em n partes iguais dividindo por n o estoque médio de
moeda.
A figura anterior mostra esta composição para um indivíduo que guarda em moeda
Y/3 e aplica no mercado aberto Y/3 por 10 dias e Y/3 por 20 dias. Com isso, o seu encaixe
médio ao longo do mês se reduz de M = Y/2 para M = Y/6. (Obs: Y/3 + Y/3 + Y/3 = 3Y/3 =
Y).
Genericamente, se decompusermos o triângulo de encaixes mensais em n
subtriângulos, o encaixe médio se reduz de M = Y/2 para M = Y/2n, à custa de (n - 1)
operações de mercado aberto. Até que ponto vale à pena expandir n? Deve-se admitir que
cada operação de mercado aberto envolva um custo fixo real b, independente do volume
transacionado (os custos variáveis se supõem deduzidos da taxa de juros).
Em geral, o saldo médio de dinheiro (M/2) é a metade da quantidade de moeda
transferida das aplicações de mercado aberto para a conta corrente em cada transferência
(M). Alternativamente, a quantia transferida para a conta corrente é o dobro do saldo
médio nesta conta. O número total de transferências é o total de consumo planejado para o
mês, Y, dividido pelo valor de cada transferência (valor de cada transferência = M). O
custo total das transferências é b vezes Y/M.
bY/M custo total das transferências. Mas o indivíduo, ao manter um saldo médio,
M/2, em sua conta corrente, incorre em um custo de oportunidade no mês, que é
simplesmente i.M/2.
O indivíduo quer escolher seu saldo médio (M/2) de forma a minimizar o total dos
dois custos. Algebricamente, quer achar M/2 que minimize o custo total:
CT = bY / M + i.M/2
Este problema de minimização é resolvido da seguinte forma:
бCT/бM = - bY/M2 + i/2 bY/M2 = i/2 M2 = 2bY/i
26
Portanto, o valor do saldo médio em conta corrente, M/2, que minimiza o custo total
é: Md/P = M/2P = (2bY/4i)1/2 = (bY/2i)1/2
onde: b custo fixo real de cada operação de mercado aberto
Y total do consumo planejado para o mês
i taxa de juros (nominal) dos títulos (custo de oportunidade de retenção de
moeda)
Md/P = M/2P saldo médio em conta corrente (demanda por saldos reais)
Isto significa que: um aumento de juros reduz a demanda por moeda;
um aumento de renda aumenta a demanda por moeda; e
um aumento do custo de corretagem aumenta a demanda por moeda.
Este último modelo é devido a Baumol e destaca a influência da renda real, da taxa
de juros e dos custos de transação na procura de moeda. Ele deve ser considerado
complementar ao de Tobin (de onde a identificação Tobin-Baumol na teoria monetária
moderna).
Podemos ver na equação Md/P = 1/2(2bY/i)
1/2
que, se o nível de preços duplicar
mas todas as outras variáveis (I, Y,b) permanecerem constantes, a demanda por M também
vai dobrar. Em geral, podemos concluir que uma alteração do nível de preços afeta na
mesma proporção o valor da quantia que se deseja ter em poder, mas a demanda real por
moeda continua inalterada. O modelo também capta efeitos importantes da renda, taxa de
juros e do custo fixo b sobre a demanda de moeda. Como fica claro a partir da equação
Md/P = 1/2(2bY/i)
1/2
, um aumento da renda real Y aumenta o valor que se deseja manter.
Em outras palavras, o aumento da renda faz com que uma família aumente suas despesas
e, para suportar o volume maior de transações, ela aumenta o valor médio de dinheiro que
mantém em seu poder. Podemos indicar o efeito quantitativo exato de um aumento de
renda. Imagine, por exemplo, uma família de sorte cuja renda real aumenta 10% e,
portanto, seu nível de Y passa a 1,10Y. Usando a expressão Md/P = (2bY/i)
1/2
, podemos
ver que a demanda aumenta aproximadamente 5% (mais precisamente, aumenta em 4,88).
Em termos técnicos, dizemos que a elasticidade da renda real da demanda por moeda é ½,
ou seja, um aumento de por cento na renda real causará um aumento de /2 no valor que
se deseja manter em moeda. Isto tem uma consequência importante.
27
Como a variação percentual do dinheiro é menor que a variação percentual na
renda, um aumento da renda real leva a uma queda na proporção entre dinheiro e renda.
Em outras palavras, as famílias economizam o valor que vão manter em seu poder quando
a renda real aumenta. Usando um conceito econômico familiar, há uma economia de escala
na manutenção da moeda.
Um aumento na taxa de juros precipita um declínio na demanda por moeda. Este
resultado é fácil de explicar intuitivamente: a taxa de juros maior eleva o custo de
oportunidade de manter o dinheiro, e isso faz com que as famílias reduzam o valor mantido
em seu poder. Novamente, a equação Md/P = (2bY/i)
1/2
nos dá a relação exata entre Md/P
e i. Um aumento de 10% na taxa de juros gera uma redução da demanda por moeda de
cerca de 5%. Portanto, a elasticidade dos juros da demanda por moeda é de -(1/2).
Finalmente, podemos analisar o efeito sobre a demanda por moeda de um aumento
no custo fixo da retirada da conta de poupança. É fácil ver que, quando este custo aumenta,
a família vai querer ir com menos frequência ao banco e, portanto, o valor de cada retirada
será maior, assim como o valor médio de dinheiro mantido num determinado período. A
expressão Md/P = (2bY/i)
1/2
indica que a elasticidade da demanda por moedacom relação
ao custo fixo b é (1/2). Em resumo, podemos dizer que a demanda por moeda é
simplesmente uma função f da taxa de juros nominal e do nível de renda, como vemos na
equação seguinte: Md/P = f(i,Y). (Sachs, Larrain, p.265)
2.8 A Abordagem de Friedman
A versão da demanda de moeda de Milton Friedman - que afinal acabou por se
constituir numa espécie de ressurgimento, em bases teóricas mais sofisticadas, da
tradicional abordagem quantitativa de Cambridge - foi desenvolvida no final da década de
50. (Lopes & Rossetti, p.83) (1956 - The Quantity Theory of Money: A Restatement -
University of Chicago Press, em Studies in the Quantity Theory of Money e The demand for
money: Some theoretical and empirical results, publicado em 1959).
Em certo nível, os monetaristas se distinguem dos outros economistas destacando a
existência de uma função estável de demanda por moeda. Em outras palavras, eles
afirmam que (M/P)
D
é função de algumas variáveis identificáveis, e sugerem que uma
28
implicação da estabilidade da demanda por moeda é que a melhor forma de estabilizar a
economia é estabilizar a taxa de crescimento da oferta monetária em um nível baixo.
A crença na estabilidade da demanda por moeda funciona, a grosso modo, da
seguinte forma: supondo que o produto seja determinado por fatores externos (pelas
decisões microeconômicas de oferta das famílias e das empresas), de modo que Y seja dado,
a definição da velocidade implica que: P = MV/Y
Se V for relativamente estável, e Y é exógeno, a equação conclui que as alterações de
M se traduzem em alterações no nível de preços. Portanto, os monetaristas afirmam que as
variações de M são a chave para controlar o nível de preços, pelo menos quando as
alterações são consideradas num intervalo de alguns anos. Afirmam que é preciso permitir
que a moeda aumente numa taxa anual constante (a assim denominada regra de x por
cento, que permite que a moeda aumente numa determinada taxa anual x), para dar
origem a uma taxa constante de aumento nos preços ao ano. Controlar a inflação passa a
ser simplesmente uma questão de controlar M. Os não-monetaristas discordam deste ponto
de vista com vários argumentos.
Em primeiro lugar, afirmam que V não é uma constante, de modo que um
crescimento constante de M não leva necessariamente a um aumento constante (ou
estabilidade) de P, mesmo a médio prazo. Não só V é função de i e Q, como também é
suscetível aos choques por alterações tecnológicas e de regulamentação.
Em segundo lugar, no curto prazo, a variação de M provavelmente também vai
afetar Y além de P (um ponto reconhecido por muitos monetaristas). Para os não-
monetaristas, o provável efeito de mudanças em M sobre Y tem duas implicações.
Primeiro, a tentativa de implantar uma política monetarista de crescimento monetário
estável pode envolver uma alteração em relação às regras monetárias anteriores e provocar
uma alteração indesejável em Y. Segundo, a regra do crescimento monetário fixo significa
uma política monetária ativa para ajudar a estabilizar Y no curto prazo.
A maioria dos monetaristas rejeita a noção de que a política monetária deve ser
usada para a estabilização a curto prazo. Apesar de, geralmente, reconhecerem que a
moeda afeta o produto real no curto prazo, afirmam que as relações entre moeda e produto
são “longas e variáveis”, e que na realidade não são confiáveis para o propósito de
estabilização a curto prazo. Portanto, argumentam que a política monetária deve visar o
29
médio prazo e, neste caso, sugerem que um crescimento estável e baixo da moeda vai gerar
uma taxa estável e baixa de inflação. (Sachs & Larrain, p.276).
De certa forma, Friedman tenta restaurar o prestígio da teoria quantitativa após as
intensas contestações de Keynes e pós-keynesianos. É verdade que isso obrigou o autor a
desenvolver uma teoria quantitativa de tal forma modificada que, segundo os críticos mais
céticos, pouco tem em comum com as versões dos neoclássicos.
Contudo, o modelo de Friedman, se é analiticamente muito mais sofisticado do que a
equação M = kPY, restabelece a primazia da política monetária como instrumento de
combate à inflação e de ação anticíclica. Tentando resumir a contribuição desse autor,
iniciaremos pela sua abordagem dos motivos determinantes da demanda por moeda, para,
em seguida, apresentarmos os resultados de suas pesquisas neste sentido, relativas à
economia americana entre 1870 e 1954.
O primeiro ponto a ser destacado é que, em sua nova versão, a equação MV = PY
(ou M = kPY, com k = 1/V) não pretende explicar a evolução da renda nominal, da renda
real, ou do nível de preços. Trata-se de uma equação de demanda por moeda, devendo ser
interpretada da forma: Md = kPY, ou seja, com a quantidade de moeda demandada como
variável endógena.
A oferta de moeda pode ser exógena, mas a demanda é endógena. Friedman derivou
a sua função de demanda de moeda fazendo-a resultar da agregação de duas demandas
distintas: a das unidades familiares e a das empresas. Iniciemos estudando separadamente
os motivos determinantes da demanda por moeda dos indivíduos (famílias) e das empresas.
2.8.1 A Demanda de Moeda pelas Famílias (indivíduos)
Para explicar porque as pessoas demandam moeda, Milton Friedman usou a teoria
da demanda por ativos. Ele considerou que, por ser a moeda um ativo, a demanda por
moeda deve ser influenciada pelos mesmos motivos que determinam a demanda por ativos.
A teoria da demanda por ativos diz que os principais determinantes da demanda por ativos
são a riqueza total dos indivíduos e o retorno relativo esperado dos ativos. (Hillbrecht,
1999) Na visão Friedmaniana a moeda representa, para os indivíduos, uma das cinco
formas alternativas de alocação de riqueza. As outras possibilidades seriam títulos com
rendimento nominal constante, títulos com rendimento real constante (indexados), bens
30
físicos e capital humano. Desta forma, segundo Friedman, a demanda de moeda pelas
famílias é função das seguintes variáveis:
a – Renda permanente, que representa a riqueza total das pessoas, decorrente da
soma das riquezas humana e não humana (Yp).
b - Proporção da riqueza humana sobre a de natureza não humana (material) (w).
c - Custo de oportunidade de retenção de ativos monetários, dado pelos retornos de
títulos de renda variável e fixa, bem como pela taxa esperada de inflação (i, r, P*).
d - Outros fatores econômicos e não econômicos, de natureza institucional,
decorrentes do processo de desenvolvimento histórico das economias nacionais, ou
meramente conjunturais, que interferem momentaneamente nas preferências das famílias e
das empresas quanto às diferentes formas de retenção de ativos ( ). (Lopes & Rossetti, p.
83)
Numa análise equivalente à determinação da demanda por bens e serviços da teoria
do consumidor, os indivíduos escolheriam a quantidade de moeda a reter pela maximização
de uma função de utilidade, cujos argumentos deveriam incluir as cinco diferentes formas
de alocação de riqueza. Como, numa mudança de composição de portfólio, uma unidade
monetária alocada de determinada forma se troca sempre por uma mesma unidade
monetária alocada de maneira alternativa, o que determinará a composição de ativos será o
fluxo de rendimentos esperados associados a cada possibilidade de alocação de riqueza.
Outros fatores determinantes serão, obviamente, os gostos dos indivíduos e, numa analogia
à restrição orçamentária da teoria do consumidor, o total da riqueza.
Após algumas ressalvas e simplificações, chega-se à seguinte função de demanda por
encaixes nominais por parte dos indivíduos:
Md = f (P, i, r, P*,w, PYp, ) onde:P = nível de preços
i = taxa de juros nominal (ou seja, dos títulos de renda nominal constante)
r = taxa de juros real (ou seja, dos títulos de renda real constante)
P* = taxa de inflação esperada
w = relação entre a riqueza aplicada sob a forma de capital não-humano e a riqueza
alocada sob a forma de capital humano, ou, segundo Friedman, equivalentemente, a
31
relação entre os rendimentos associados ao capital não-humano e aqueles associados ao
capital humano.
Yp = renda real permanente, utilizada como "proxy" para a riqueza real (riqueza
total). PYp representa a renda nominal permanente.
= variável relacionada aos gostos e preferências dos indivíduos.
Se supusermos que a multiplicação de P e PYp por um determinada constante “c”
implica numa multiplicação de Md pela mesma constante (ou seja, homogeneidade de
primeiro grau da função Md anterior em relação ao nível de preços P e à renda nominal
PYp), temos, tomando c= 1/P:
Md --- = f (i, r, P*,w, Yp, )
P
onde agora Md/P representa a demanda por encaixes reais (ou seja, medidos em
termos do seu poder de aquisição de bens e serviços) desejados. Considera-se, assim, que as
pessoas demandam moeda por seu poder de compra, ou seja, elas demandam encaixes
reais. Passa-se agora a examinar cada uma das variáveis:
a) Riqueza Total (Yp)
Riqueza total: Riqueza humana (capital humano)
Riqueza não humana: Moeda
Títulos de renda variável
Títulos de renda fixa
Bens físicos: Imóveis
Outros ativos materiais
Além das formas conhecidas de riqueza material, a riqueza total é também
constituída pela riqueza humana, conceituada como o valor atual das rendas futuras
geradas pelo capital humano. A ideia de riqueza total das famílias equivale ao máximo do
montante em moeda que suas riquezas possam ser transformadas, adicionado do valor
atual dos rendimentos futuros proporcionados pela aplicação da riqueza humana no
processo produtivo.
32
Como a determinação do valor da riqueza total envolve sérias dificuldades
operacionais, Friedman sugere a adoção do conceito de renda permanente, dada pela
média ponderada das rendas correntes e passadas das unidades detentoras de riqueza,
como aproximação válida do conceito de riqueza total.
Deste modo: Lf = f(Yp).
b) Proporção da Riqueza Humana sobre a Não Humana (w)
Segundo Friedman, apresentando a riqueza humana menor grau de liquidez que as
demais formas de riqueza não humana, quanto maior for a proporção da primeira em
relação ao total da segunda, tanto maior será a necessidade de retenção de moeda. A
capacidade futura de trabalho é institucionalmente vista como garantia inferior à que
resulta de outras formas convencionais e imediatas de riqueza acumulada. Assim:
Lf = f( w ) onde w = proporção riqueza humana/riq.não humana
sendo que: &Lf/& w > 0
c) Custo de Oportunidade de Retenção de Moeda (i, r, P*)
Ao decidir reter saldos monetários, as unidades familiares incorrem em custos de
oportunidade representados pela taxa de retorno (r) que os ativos de renda variável (ações)
podem render e pela taxa de juros (i) que pode ser auferida com a aplicação em títulos de
renda fixa. Além disso, se a taxa esperada de inflação (P*) for positiva, a retenção de ativos
monetários importará no custo adicional resultante da perda do seu poder real de compra.
Se estes custos se elevarem, a demanda de outras formas de ativo aumentará e a de moeda
declinará. Em outras palavras:
Lf = f(r,i,P*) e: &Lf/&r < 0
&Lf/&i < 0
&Lf/&P* < 0
d) Outros Fatores ( )
- estrutura de distribuição de renda;
- regimes de mercado prevalecentes na oferta de bens e serviços e de fatores de
produção;
- graus de incerteza quanto ao futuro;
- expectativas quanto à ocorrência de anormalidades, como guerras e crises
econômicas agudas;
33
- grau de estabilidade político-institucional;
- variáveis localizadas no âmbito da psicologia social;
- estrutura de valores sociais e éticos predominantes.
Assim: Lf = f( )
Em sua abordagem, Friedman admite, dadas as dificuldades de precisão dos efeitos
dos fatores assinalados sobre a demanda de moeda, que a variável ( ) é constante,
notadamente a curto prazo. Neste caso: &Lf/& = 0
Em conclusão, reunindo novamente em uma só função todas as variáveis
focalizadas, a demanda de moeda pelas famílias (indivíduos), segundo a versão de
Friedman, é dada por: Md = Lf = f(P, PYp, w,r,i,P*, )
ou então, conforme já visto: Md----- = f(i, r, P*, w, Yp, ) = Lf
P
Onde Md/P representa a demanda das famílias por encaixes reais (ou seja, medidos
em termos do seu poder de aquisição de bens e serviços) desejados.
Friedman não tenta argumentar que a velocidade-renda apresente um valor
constante no curto prazo. De fato, pelo que vimos até aqui, variações nas taxas de juros
implicariam em alterações no valor de V. Nem mesmo aos clássicos ele atribui tal tese,
citando como contra-exemplo uma passagem de Pigou que relaciona a velocidade-renda da
moeda à taxa de juros. Sua posição básica consiste em defender a estabilidade da função V
(i, P*, w, Yp, u).
Matematicamente, isto equivale a se admitir que a velocidade-renda (e,
consequentemente, a demanda por moeda em termos reais) possa ser razoavelmente
explicada tomando-se como base as variáveis explicitadas nesta função.
A valer a teoria friedmaniana, incluindo a hipótese de estabilidade da função V(i,
P*, w, Yp, u) e a controlabilidade da oferta monetária, a atividade econômica seria
extremamente sensível a flutuações da política monetária - flutuações estas que se
transmitiriam à renda permanente, provocando oscilações de muito maior amplitude na
renda corrente. O resultado é semelhante ao da teoria clássica, mas com muito maior força
de propagação. E a política monetária voltaria a ser o determinante básico do nível de
atividade e dos preços.
34
Nesta linha, os friedmanianos criticam veementemente a política monetária
espasmódica aplicada em muitos países, que alterna períodos de relaxamento expansionista
com fases de contração monetária. A sua recomendação para uma política de pleno
emprego sem inflação é a manutenção de uma taxa de expansão dos meios de pagamento
conhecida e metodicamente constante, de acordo com o crescimento do produto real e a
elasticidade-renda da procura por moeda.
2.8.2 A Oferta de Moeda
A forma pela qual a oferta de moeda é determinada na maioria das economias
experimentou uma alteração fundamental no século XX. Nas suas primeiras décadas a
moeda sem lastro não era usada de forma geral, mas sim o ouro e a moeda com lastro em
ouro. O papel-moeda, quando em uso, podia ser convertido naquele metal precioso por um
preço fixo. Nesse sistema monetário, as variações na oferta de moeda eram determinadas,
principalmente, pela produção do metal precioso (do ouro, em particular)
1
. Por outro lado,
no sistema de curso forçado, a oferta de moeda é determinada, principalmente, pela
política governamental. A diferença é crucial.
A maioria das nações tem uma instituição oficial normalmente chamada banco
central, que possui autoridade legal para imprimir dinheiro. Nos Estados Unidos, o banco
central é o Sistema Federal de Reserva; na Inglaterra, o Banco da Inglaterra; na União
Europeia, o Banco Central Europeu; no Japão, o Banco do Japão e, no Brasil, o Banco
Central do Brasil. Contudo,há vários países que não têm bancos centrais ou, quando
existem, não têm autoridade para imprimir a moeda nacional. Por exemplo, na Libéria e
no Equador o dólar é a moeda e o meio de troca oficial (no Panamá, o dólar também é
usado como moeda corrente, ao lado do dinheiro local, que existe apenas na forma de
moedas de pequeno valor).
Como regra geral, o banco central de cada país, ao buscar determinar a oferta de
moeda, usa o agregado composto pelo papel moeda e moedas metálicas em poder do
público não-bancário, mais as reservas que os bancos comerciais mantém junto a si e no
banco central (este agregado é denominado de M0, ou base monetária). Como o banco
central é a única autoridade que pode imprimir (ou autorizar que se imprima) uma nota de
1
Outro metal precioso, a prata, deixou de ser usado como metal monetário no final do século XIX.
35
dinheiro ou cunhar uma moeda, ele determina a oferta dessas notas e moedas na economia
(que são mantidas como dinheiro pelo público ou como reservas bancárias). Lembra-se,
entretanto, que esta não é a única categoria de moeda, nem mesmo uma categoria que
considere a medição da moeda em poder do público (pois M0 inclui reservas bancárias). Há
categorias mais amplas - M1, M2, M3 etc. Em geral, a quantidade desses Ms maiores em
circulação é determinada pela quantidade de moeda em circulação produzida pelo banco
central, pelas regulamentações relativas ao sistema bancário (geralmente determinadas
pelo banco central, com destaque para as reservas compulsórias dos bancos comerciais
junto a si) e pelos instrumentos financeiros que as pessoas escolhem para suas carteiras de
investimento (Sachs; Larrain, p.283).
Existe a hipótese de que a moeda legal é um elemento institucional subordinado ao
controle das autoridades monetárias. Sob esta hipótese, a moeda é vista como uma variável
exógena, o que torna o seu controle possível e restrito às autoridades monetárias, as quais
administram a oferta de moeda e a taxa de juros como instrumentos de política monetária.
Para alguns teóricos da economia monetária (os pós-keynesianos, por exemplo), a oferta de
moeda não se subordina, estritamente, a controles centrais, mas sim é largamente
influenciada pelo sistema financeiro, sendo gerada pela expansão do crédito ou pelo
racionamento deste, com efeitos importantes, transformando-se assim, em grande medida,
em variável endógena
2
.
3. Os Meios de Pagamento e outros Agregados Monetários
O Sistema Financeiro Monetário (ou, equivalentemente, o Sistema Financeiro
Bancário) representa a parte do sistema financeiro responsável pela geração de meios de
pagamento. O que incluir precisamente nesses ativos disponíveis, eis uma questão que
suscita algumas controvérsias e que não pode ser resolvida sem certa margem de
arbitrariedade.
A definição mais usual considera meios de pagamento numa economia moderna o
papel-moeda em poder do público (que é igual ao saldo do papel-moeda emitido menos os
2
Como muitas questões em economia, a questão entre endogenia e exogenia da oferta de moeda (meios de
pagamento) encontra uma solução de equilíbrio, em cada sistema monetário, entre a atuação do banco central e as
operações de crédito das demais instituições financeiras bancárias.
36
encaixes em moeda corrente dos bancos, inclusive do Banco Central) mais os depósitos à
vista do público na rede bancária. Estes meios podem ser utilizados a qualquer momento
para a remuneração de fatores da produção empregados, para o pagamento de bens ou
serviços adquiridos ou ainda para saldar dívidas contraídas no passado.
No caso do Brasil, o primeiro passo na criação de papel-moeda é que a Casa da
Moeda, órgão da Secretaria do Tesouro Nacional, produza as notas e moedas de dinheiro.
Ela depois as transfere para o Banco Central, que paga por elas creditando o seu valor na
conta que o Tesouro Nacional tem no Bacen (eximindo-se este, assim, do recebimento de
receitas de senhoriagem). Depois, quando um banco precisa de dinheiro, ele chama o Banco
Central, que lhe remete o dinheiro e debita a sua conta de reserva.
O banco põe então esse dinheiro em circulação, dando-o em pagamento a seus
clientes. A essa altura, quando o dinheiro passa para a mão do público não-bancário, ele se
torna parte do meio circulante. Estes são os ativos que preenchem os atributos essenciais de
rendimento zero, de custo de manutenção e estocagem negligenciáveis e de máxima liquidez.
Portanto, os meios de pagamento, são dados por:
papel-moeda emitido (inclusive moedas metálicas) menos: moeda em caixa forte do
Bacen igual a: saldo do papel-moeda em circulação
menos:caixa em moeda corrente dos bancos comerciais
igual a: Moeda Manual (Mm) ou saldo de Papel-Moeda em Poder do Público (PMPP)
3
mais: Moeda Escritural (ou bancária): depósitos à vista nos bancos comerciais
(Dv) igual a: Meios de Pagamento
Em resumo, os meios de pagamento se compõem do papel-moeda em poder do
público e da moeda escritural. Por essa definição, a criação de meios de pagamento só pode
ser realizada: a) pelo Banco Central, que tem o poder legal de emitir papel-moeda; b) pelos
bancos comerciais (e outras instituições bancárias), que têm depósitos à vista.
Os saldos de cartões de crédito não são incluídos, porque cartões de crédito são uma
forma de diferir o pagamento. Quando se paga com cartão de crédito e financia-se a
compra realizada em mais de um pagamento, está-se recebendo um crédito, uma dívida
que será paga no tempo, em cheque ou dinheiro.
3
Equivalente ao termo em inglês currency e ao termo em português dinheiro.
37
Assim, para indicar o total da oferta de meios de pagamento (oferta monetária), M1,
pode ser empregada a seguinte expressão: M1 = Mm + Dv, onde Mm = moeda manual (ou
saldo de PMPP) e Dv = depósitos a vista nos bancos (ou moeda escritural).
A observação desse conceito convencional de moeda leva à constatação que ele
privilegia a função da moeda como intermediária de trocas. No entanto, se a definição de
oferta monetária considerar, além da função de intermediação de trocas, a de reserva de
valor, o conceito convencional exclui totalmente um significativo grupo de ativos
financeiros que, pelo seu alto grau de liquidez, são considerados como quase-moeda: as
letras e demais obrigações do Tesouro Nacional e do Banco Central, os depósitos a prazo
fixo, as cadernetas de poupança, as letras imobiliárias e outros ativos financeiros de
emissão sistema de intermediação financeira. A partir de argumentos dessa ordem é que se
desenvolveram outros conceitos mais abrangentes de moeda.
A definição de outros conceitos mais amplos de agregados monetários tem gerado
controvérsias, uma vez que o sistema financeiro cria instrumentos de alta liquidez,
tornando-se cada vez mais difícil distinguir a moeda transacional da poupança. Dessa
forma, procura-se classificar os meios de pagamento em ordem decrescente de liquidez, de
tal maneira que se incluam todos os haveres financeiros em poder do público e que sejam
disponíveis contabilmente no contexto do Sistema Financeiro Nacional.
O principal critério para definir moeda é a facilidade com a qual um ativo pode ser
usado para transações e, em especial, sua liquidez, que é a capacidade de converter
rapidamente um ativo em dinheiro sem que haja perda de valor. O dinheiro (moedas
metálicas e papel-moeda do banco central) é o mais líquido dos ativos.
A moeda em circulação, que é o PMPP, mais as reservas em dinheiro mantidas pelos
bancos junto a si, somadascom as reservas em dinheiro que os bancos mantém no Banco
Central, é chamada de high-powered money (Mh) ou, ainda, por base monetária (ou Mo).
Esta é uma variável-chave, como veremos adiante, pois pode ser diretamente controlada
pelo Banco Central
4
. Os depósitos a vista em bancos são o ativo mais líquido depois do
dinheiro, pois é possível fazer retiradas das contas “a vista”, sem demora ou qualquer
penalidade (Sachs, Larrain, p.250).
4
Isto porque o Banco Central é a única instituição monetária a criar a moeda legal e porque o Banco Central pode
alterar as regras de recolhimento compulsório de reservas dos bancos para o Bacen.
38
O conceito de oferta monetária correspondente aos meios de pagamento, já visto,
que inclui apenas a moeda manual e a moeda escritural, é denominado de M1. Outros
conceitos, denominados M2 e M3, abrangem outros ativos financeiros. No Brasil, o Banco
Central adota ainda o conceito M4. Em síntese, estes conceitos são os seguintes:
Conceito M1: Trata-se dos meios de pagamento (moeda manual e moeda escritural).
É composto pelo papel-moeda e moedas metálicas em poder do público (moeda manual) e
pelos depósitos à vista do público nos bancos comerciais e caixas econômicas (moeda
escritural).
Conceito M2: (M1) mais depósitos de poupança e títulos privados em poder do
público.
Conceito M3: (M2) mais quotas de fundos de renda fixa e operações
compromissadas/Selic.
Conceito M4: (M3) mais os títulos federais em poder do público/Selic e títulos
estaduais e municipais em poder do público.
A Base Monetária (Mo ou Mh) - Denominação dada ao conjunto de moeda em
circulação no país, mais os depósitos à vista (reservas) dos bancos comerciais junto ao
banco central. A atuação sobre a base monetária, visando estimular sua expansão ou
provocar sua contração, desempenha papel importante em qualquer política de combate à
inflação (Sandroni, p.25).
3.1 A Criação de Moeda pelos Bancos Comerciais
Normalmente registra-se uma alta participação da moeda escritural na composição
dos meios de pagamento, em relação à moeda manual. As razões para o uso de moeda
escritural, que os agentes econômicos preferem à moeda manual, são os seguintes:
1. os depósitos bancários à vista são mais seguros;
2. o manejo de cheques e, hoje, cartões de débito e de crédito, para efetuar
pagamentos, é fácil, em especial quando se trata de transações de grande vulto
(apesar do avanço da moeda digital);
3. a manutenção de saldos médios nos bancos comerciais facilita a obtenção de
empréstimos;
39
4. os pagamentos mediante cheques nominais e cartões permitem controle e
contabilização das despesas, bem como podem também servir de comprovante;
O uso generalizado da moeda escritural está na origem do processo multiplicador
dos meios de pagamento. Isto porque a moeda de alto poder de expansão (high-powered
money), injetada no sistema econômico por decisão das autoridades monetárias, tende a se
transformar em depósitos bancários, por força das razões assinaladas, enquanto uma
substancial parcela de tais depósitos acaba por se transformar em empréstimos concedidos
pelos bancos, que tendem a retornar ao sistema bancário, sob a forma de novos depósitos.
Este processo tende a se renovar infinitamente, dado que os bancos comerciais não mantêm
em caixa a totalidade dos depósitos captados, mas apenas uma parcela deles, pois atuam
com reservas fracionárias (Lopes & Rossetti, p.109).
3.1.1 Sistema Bancário com Cobertura Integral e com Reservas Fracionárias
Em uma economia hipotética, os bancos aceitam depósitos à vista, mas não fazem
empréstimos. Os depósitos que os bancos receberam, mas não emprestaram, são chamados
de reservas. Parte das reservas é guardada no cofre dos bancos disseminados pelo país, mas
a maior parte fica guardada num Banco Central. Nesta economia hipotética, todos os
depósitos são mantidos como reservas: os bancos aceitam os depósitos, guardam a moeda
como reserva e assim a deixam, até que os depositantes façam uma retirada ou passem um
cheque. O sistema é dito de cobertura integral. Se os bancos mantém reservas de 100% de
seus depósitos à vista, o sistema bancário não influi sobre a oferta de moeda.
Imagine-se agora que os bancos comecem a usar parte de seus depósitos para
conceder empréstimos a famílias que estão comprando casa própria ou para empresas que
estão investindo, por exemplo, em instalações e equipamentos. Para os bancos isto significa
que podem cobrar juros sobre os empréstimos. Os bancos precisam manter algumas
reservas para atender às retiradas de seus correntistas sempre que estes o desejarem. Mas,
na medida que o montante de novos depósitos for aproximadamente igual ao montante das
retiradas, o banco não precisa manter em caixa todos os depósitos recebidos. Desta forma,
os banqueiros são incentivados a conceder empréstimos. Quando o fazem, tem-se um
sistema bancário com reservas fracionárias, no qual os bancos mantém como reserva uma
40
parte de seus depósitos. Desta forma, em um sistema bancário com reservas fracionárias, os
bancos criam moeda, a denominada moeda escritural.
3.2 A Determinação do Estoque Monetário
Começando a partir da equação seguinte, passamos a desenvolver os detalhes do
processo pelo qual o estoque monetário é determinado.
M = Mm + D onde: M = oferta monetária (ignorando distinção entre M1 e
M2)
Mm = moeda manual
D = depósitos (ignorando se a vista, a prazo ou de poupança)
Devemos resumir o comportamento do público, dos bancos e do Bacen no processo
de oferta monetária através de três variáveis:
5. a proporção moeda manual / depósitos (md);
6. a proporção de reservas / depósitos (rc); e
7. o estoque de base monetária (B ou Mo ou Mh).
a) A Razão Moeda Manual-Depósitos (md)
A razão moeda manual-depósitos é determinada pelo comportamento do público,
que decide em que proporção quer deter moeda e depósitos. A razão moeda-depósitos é
determinada primordialmente pelos hábitos de pagamento do público. A razão moeda-
depósitos aumenta quando a proporção de consumo em relação ao PNB aumenta.
b) A Razão Reservas-Depósitos (re)
As reservas bancárias se constituem de notas e moedas detidas pelos bancos e de
depósitos que os bancos detêm no Bacen. Os bancos devem manter reservas na forma de
notas e moedas, porque são obrigados a prover moeda em espécie aos seus clientes, quando
estes quiserem. Os bancos também mantém contas no Bacen, principalmente para efetuar
pagamentos entre eles mesmos, bem como podem usar seus depósitos no Bacen para obter
dinheiro. A razão reserva-depósitos é determinada, portanto, por dois conjuntos de
considerações:
41
8. o sistema bancário está sujeito à regulamentação do Bacen, na forma de
requerimentos mínimos de reservas, que variam conforme o tipo de depósito e o
tamanho do banco;
9. os bancos podem querer deter reservas em excesso, isto é, acima do nível mínimo
de reservas requerido pelo Bacen, por razões de precaução.
Se um banco não pode suprir as demandas por dinheiro ou por pagamentos a outros
bancos, ele tem que pegar emprestado do Bacen ou de outros bancos que tenham reservas a
mais. A taxa de redesconto é a taxa de juros cobrada pelo Bacen de bancos que emprestam
dele para enfrentar uma necessidade temporária de reservas, enquanto que a taxa do CDI
é a taxa de juros cobrada pelos bancos para empréstimos interbancários.
Existe também um custo para um banco deter reservas, pois estas não recebem
juros. Detendo reservas menores, um banco está apto a investir em ativos remunerados por
juros e aumentar seus lucros. Quantomais reservas o banco detêm, menos ele incorrerá em
custos de empréstimos. Porém, quanto mais reservas ele detiver, mais juros ele perde.
Pode-se, portanto, escrever a razão reservas-depósitos, "re", como função da taxa
de juros de mercado ( i ), da taxa de redesconto (iD), da proporção de reservas obrigatórias
(rR), e de "", que indica as características de incerteza das entradas e saídas de depósitos
dos bancos:
re = f(i, iD, rR, ) onde:
re = razão reservas-depósitos
iD = taxa de redesconto
rR = reservas requeridas (compulsórias)
= incerteza na movimentação de depósitos
re/i < 0 re/iD > 0re/rR > 0 re/ > 0
c) A Base Monetária (M0)
A base monetária é constituída de moeda manual (PMPP) e de reservas dos bancos
comerciais (encaixe dos bancos e depósitos voluntários e compulsórios destes no Bacen). O
Bacen pode controlar a oferta de base monetária. A demanda total pela base monetária
vem do público, que quer usá-la como moeda, e dos bancos, que precisam dela na forma de
42
reservas. Pelo fato de o público ter uma proporção preferencial de moeda em relação aos
depósitos e pelo fato de os bancos terem uma razão esperada de reservas em relação aos
depósitos, pode-se calcular o estoque monetário total que pode ser sustentado por qualquer
dado nível de base monetária.
Assim, a base monetária (B) é a soma do papel-moeda em poder do público (PMPP)
com o total de reservas dos bancos comerciais (Et). A base monetária é, então, igual ao total
de moeda colocada em circulação pelo Banco Central (PMC). É, por vezes, chamada de
estatística Mo (M zero). Então:
B = PMPP + Et = PMC
É importante lembrar que:
PMC = PME - CBC onde CBC = caixa do Banco Central;
PME = papel-moeda Emitido;
PMC = papel-moeda em circulação.
PMC – Et = PMPP onde Et = Encaixes (reservas) totais dos bancos.
Os bancos comerciais mantém reservas (ou realizam encaixes) para poderem honrar
seus compromissos com o público e, consequentemente, gerar confiança na
conversibilidade dos seus depósitos. Os bancos realizam dois tipos de encaixes. Aqueles que
são impostos externamente, ou encaixes compulsórios; e aqueles que são decididos
internamente, ou encaixes de negócios.
As reservas compulsórias (Ec) são determinadas pelas autoridades monetárias, que
estabelecem um percentual dos depósitos à vista a ser recolhido ao Banco Central na forma
de moeda. Historicamente, essa obrigação tem sido exigida por regulamentação das
autoridades monetárias, objetivando mostrar ao público que os bancos são capazes de
saldar seus compromissos com os clientes e, assim, evitar pânicos e corridas contra os
mesmos. As reservas de negócios (En) são decididas pelos próprios bancos para que possam
operar diariamente. Então, as reservas totais (Et) dos bancos são representadas pela
seguinte adição:
Et = Ec + En onde Ec = Encaixes (reservas) compulsórios;
En = Encaixes (reservas) de negócios (voluntários).
43
Quando os bancos encontram-se em dificuldades, por exemplo, quando a razão
(reservas de negócios)/(depósitos à vista) está muito baixa, podem pedir auxílio ao Banco
Central. Genericamente, tem-se chamado tal auxílio de operação de redesconto. Contudo, é
necessário distinguir uma operação propriamente dita de redesconto de uma operação de
concessão de crédito. O redesconto ocorre quando o Banco Central compra títulos de um
banco, mediante uma taxa de redesconto.
O processo alternativo é, simplesmente, um empréstimo direto do Banco Central ao
banco que se encontra em dificuldade. A função do Banco Central conhecida como
emprestador de última instância é exercida através dessas operações.
3.3 A Base Monetária, o Estoque Monetário e o Multiplicador Monetário
Formulação específica, usada pelo Banco Central do Brasil para o Multiplicador
Monetário
C = PMPP/M1 PMPP = C.M1
D = Dv/M1 Dv = D.M1
R1 = Cx/Dv Cx = R1.Dv
R2 = RB/Dv RB = R2.Dv
C + D = 1
Mh = B = PMPP + Cx + RB
M1 = PMPP + Dv M1 = k.B k = M1/B
M1/B = (PMPP + Dv)/(PMPP + Cx + RB) = (C.M1 + D.M1)/(C.M1 + R1.Dv + R2.Dv)
Dividindo o numerador e o denominador do termo da direita por M1, obtém-se:
M1/B = (C.M1/M1 + D.M1/M1)/(C.M1/M1 + R1.Dv/M1 + R2.Dv/M1)
M1/B = (C + D)/(C + R1.D + R2.D)
M1/B = 1/(C + D(R1 + R2)) = k M1 = 1/(C + D(R1 + R2)) . B = k.B
Onde:
44
k = 1/(C + D(R1 + R2)) = multiplicador monetário
C = Preferência do público por papel-moeda
PMPP = Papel-moeda em poder do público
M1 = Meios de pagamento
D = Preferência do público por depósitos à vista
Dv = Depósitos à vista
R1 = Taxa de encaixe em moeda corrente
Cx = Encaixe em moeda corrente
R2 = Taxa de reservas bancárias
RB = Reservas bancárias
B = Base monetária
3.4 As Instituições Monetárias e as Variações na Oferta de Moeda
O modo básico pelo qual os bancos centrais alteram a quantidade de moeda em
circulação na economia (meios de pagamento) é a compra de ativos - títulos do tesouro, por
exemplo - do público e a venda de ativos para o público. Para compreender melhor esse
processo de criação e de destruição de meios de pagamento, passa-se a estudar as contas do
sistema monetário, isto é, dos bancos comerciais e do Banco Central.
3.4.1 Contas do Sistema Monetário: Bancos Comerciais
O balancete consolidado dos bancos comerciais pode ser observado na tabela 1.1.
Por uma questão metodológica, os itens do passivo foram subdivididos em dois grupos: a)
os recursos monetários, que correspondem aos depósitos à vista (que são meios de
pagamento criados pelos bancos comerciais); e b) os recursos não-monetários,
correspondentes aos demais itens do passivo.
45
Tabela 1.1 Balancete Consolidado Sintético dos Bancos Comerciais
Ativo
Passivo
- Encaixes Recursos Monetários
- Em moeda corrente - Depósitos à vista
- Em depósitos nas Aut.Monetárias
– Voluntários Recursos Não-Monetários
– Compulsórios - Depósitos a prazo
- Empréstimos ao setor privado - Redescontos e outros
empréstimos do Bacen
- Títulos públicos e particulares - Saldo líquido das demais
contas
Contas do Sistema Monetário: Banco Central
As funções típicas de Banco Central são:
i) a de banco emissor de papel-moeda;
ii) a de banqueiro do Tesouro Nacional;
iii) a de banqueiro dos bancos comerciais;
iv) a de depositário das reservas internacionais do país;
v) a de emprestador de última instância.
Estas funções se refletem nas Contas Consolidadas da Autoridade Monetária da
seguinte maneira, sendo que por conveniência metodológica e para simplificação, as contas
do passivo da AM estão classificadas em recursos monetários (Base Monetária) e Recursos
Não Monetários.
46
Tabela 1.2 Balancete Consolidado Sintético da Autoridade Monetária
Ativo Passivo
- Reservas internacionais Base Monetária
- Empréstimos ao Tesouro nacional - Papel-moeda em poder do
público
- Títulos públicos federais - Encaixe dos bancos comerciais
- Emprést. aos governos estad. munic. - Em moeda corrente
Autarquias e outras entidades
públicas
- Em depósitos nas Autor.
Monetárias
- Aplicações especiais/diversas – Voluntários
- Redescontos e outros empr. aos B.
Com.
– Compulsórios
Recursos Não-Monetários
- Depósitos do Tesouro
Nacional
- Empréstimos externos
- Recursos Especiais/Diversos
Contas Consolidadas do Sistema Monetário
Consolidemos agora os balancetes sintéticos do Banco Central e dos bancos
comerciaisapresentados nas duas tabelas 1.1 e 1.2. Isso equivale a uma soma algébrica de
balancetes. A primeira tarefa deve ser a de eliminar as contas internas do sistema, que
aparecem no ativo dos bancos comerciais e no passivo das Autoridades Monetárias, e vice-
versa. Estas são as Contas de Redesconto e de Encaixe dos Bancos Comerciais.
Feita esta eliminação, resulta o balancete consolidado apresentado na Tabela 1.3,
que mostra uma tautologia de grande utilidade no estudo do processo de criação e
destruíção de meios de pagamento: o seu volume é igual ao saldo de aplicações do sistema
bancário comercial e da Autoridade Monetária junto ao restante da economia, menos o
volume de recursos não-monetários recebidos pelo referido sistema.
47
Tabela 1.3 Balancete Consolidado do Sistema Monetário
Ativo Passivo
Aplicações dos Bancos Comerciais Meios de Pagamento
- Empréstimo ao setor privado - Papel-moeda em poder do público
- Títulos públicos e particulares - Depósitos à vista nos Bancos
Comerciais
Aplicações do Banco Central Recursos Não-Monetários dos Bcos
Com.
- Reservas internacionais - Depósitos a prazo
- Empréstimos ao Tesouro
Nacional
- Saldo líquido das demais contas
- Títulos públicos federais Recursos Não-Monetários do Bco
Central
- Empréstimos aos governos
estad., mun.,
- Depósitos do Tesouro Nacional
Autarquias e outras entidades
públicas
- Empréstimos externos
- Aplicações especiais/diversas - Recursos especiais/diversas
3.4.2 A Criação e Destruição de Base Monetária e Meios de Pagamento
Os balancetes apresentados nos permitem concluir que qualquer variação () na
Base Monetária ou nos Meios de Pagamento deve apresentar como contrapartida uma
variação das operações ativas ou do passivo não-monetário do Banco Central (no caso da
Base) ou do sistema bancário como um todo (no caso dos meios de pagamento). Assim
denotando por BC e SB, respectivamente, a Autoridade Monetária e o conjunto composto
por esta última mais os bancos comerciais, pode-se escrever:
Base Monetária = Operações ativas BC - Passivo não-monetário BC
Meios de Pagamento = Operações ativas SB - Passivo não-monetário SB
48
Em suma, haverá criação de meios de pagamento sempre que o setor bancário (SB)
adquirir algum haver não-monetário do setor não-bancário da economia (SNB), pagando
em moeda manual ou escritural. Isto é o que se chama de "monetização", pelos bancos, de
haveres não-monetários do público. Assim, os bancos criam meios de pagamento:
10. quando descontam (compram) títulos do público;
11. quando adquirem do público, pagando em moeda, quaisquer bens ou
serviços;
12. quando adquirem cambiais de exportadores (compra de divisas em troca de
moeda nacional);
13. quando emprestam para o público não bancário, etc.
Reciprocamente, os bancos destroem meios de pagamento quando vendem ao
público quaisquer haveres não monetários em troca do recebimento de moeda. Assim, há
destruição de meios de pagamento:
14. quando o público resgata um empréstimo previamente contraído no sistema
bancário;
15. quando o público deposita dinheiro a prazo nos bancos;
16. quando os bancos vendem ao público, mediante recebimento em moeda,
quaisquer títulos, bens ou serviços;
17. quando os bancos vendem cambiais aos exportadores (vendem divisas
estrangeiras em troca de moeda nacional) etc.
Assim, para expandir o volume de meios de pagamento, a Autoridade Monetária
dispõe dos seguintes instrumentos:
18. expandir os redescontos aos bancos comerciais;
19. comprar títulos da dívida pública em poder do público (operação de "open
market");
20. aumentar as reservas cambiais;
21. reduzir a relação encaixe/depósitos nos bancos comerciais, diminuindo as
exigências de recolhimentos compulsórios à sua ordem.
Naturalmente, as medidas inversas provocam a contração dos meios de pagamento.
49
3.5 As Operações do Banco Central e a Base Monetária
Conforme visto, os três tipos de operações mais comuns usados pelas autoridades
monetárias para alterar o estoque da base monetária são as que se seguem.
3.5.1Operações de Open Market
As transações dos bancos centrais de compra e venda de títulos no mercado aberto
são conhecidas como operações de open market. A compra de instrumentos financeiros
pelo banco central, no seu papel de autoridade monetária, resulta num aumento da base
monetária em poder do público. O banco central compra os ativos com moeda, que então é
colocada em circulação. Por outro lado, uma venda de títulos feita pelos bancos gera uma
redução na base monetária.
3.5.2 A Janela de Redesconto
Outra forma pela qual o banco central pode influir na oferta monetária são os
empréstimos aos bancos. A taxa de juros utilizada é a taxa de redesconto. Os bancos
privados usam essa opção de crédito para dois propósitos diferentes: (1) ajustar as suas
reservas de dinheiro para o caso de ficarem abaixo do nível desejado ou exigido pelo banco
central; e (2) para obter fundos que o banco possa emprestar aos clientes, se as condições
de mercado forem favoráveis para isso.
3.5.3 Operações de Câmbio
O banco central também influi na oferta monetária quando compra e vende ativos
em moeda externa. No caso mais simples, o banco central compra ou vende moeda
estrangeira em troca de moeda nacional. Em outros casos, o banco central compra ou
vende um ativo remunerado em moeda estrangeira, normalmente um título do tesouro de
outra nação. Assim como nas operações de open market, essas transações têm efeito direto
sobre a quantidade de moeda em circulação na economia (Sachs & Larrain, p.294).
3.5.4 O Controle do Banco Central sobre a Oferta Monetária
O banco central pode influir na oferta monetária de várias maneiras, como antes
visto, mas não pode controlá-la totalmente. O banco central tem um controle
razoavelmente efetivo sobre o estoque da base monetária por meio das operações de open
market, podendo esterilizar as alterações em Mh (ou Mo) decorrentes de outras fontes,
50
como empréstimos na janela de redesconto e nas operações de câmbio. A autoridade
monetária tem menos controle sobre o multiplicador que sobre a base monetária. O banco
central determina as reservas exigidas e a taxa de redesconto, e ambas influenciam o nível
de reservas bancárias (note que a taxa de redesconto é a única variável diretamente
controlada pelo banco central que afeta tanto a base monetária quanto o multiplicador
monetário); no entanto, não pode determinar a razão reservas/depósitos e tem menos
controle ainda sobre a proporção entre moeda em circulação e depósitos.
3.5.5 A Polêmica sobre a Autonomia do Banco Central
Com o fim do padrão-ouro e tendo os bancos centrais a responsabilidade pela
regulação da quantidade de moeda em circulação e pelo controle da inflação em um
contexto de moeda de curso forçado, surgiu a polêmica sobre a independência (ou
autonomia) ou subordinação destas instituições em relação a seus governos.
A Defesa da Independência
Os que apoiam a independência alegam que a política monetária, e, com isso, o valor
da moeda, é um tema demasiado importante e complexo para ser deixado ao jogo das
forças políticas. De acordo com esse ponto de vista, o processo político é míope. Por estar
excessivamente preocupado com a próxima eleição, ele exagera a importância de benefícios
de curto prazo e não está disposto a tomar as duras e impopulares decisões - como a de
tolerar mais desemprego a curto prazo - necessárias a que se obtenham os benefícios de
longo prazo de um nível de preços estável.
Associada a esta questão há o perigo do ciclo econômico político. Emessência, trata-
se de uma situação na qual, antes de uma eleição, o presidente induz o banco central a
adotar uma política expansionista que baixe as taxas de juros e reduza o desemprego.
Então, após as eleições, o banco central reduz as pressões inflacionárias resultantes daquela
política, tornando-se mais restritivo. As taxas de juros e o desemprego, então, aumentam.
Mas a eleição já foi ganha.
51
Além do mais, é quase certo que os políticos, se puderem, utilizarão o banco central
para financiar maiores despesas do governo, sem aumentar os impostos. Por conseguinte,
seria necessário um banco central independente, afastado das pressões políticas, para
garantir a justiça para aqueles que perdem com a inflação. Além disso, mesmo que o desejo
dos políticos por uma certa política monetária reflita a vontade do público, não é óbvio que
o Banco Central tenha que realizá-lo.
Especificamente, o público sofre do que se chama síndrome do problema número
um. Durante uma recessão, tudo o que parece ter importância é reduzir a taxa de
desemprego, enquanto durante uma expansão inflacionária, a redução da taxa de inflação é
tudo o que importa. Mas uma política demasiado expansionista para combater o
desemprego acaba resultando numa inflação exagerada, assim como uma política restritiva
que reduza a taxa de inflação também aumenta temporariamente o desemprego. Por isso, o
público pode muito bem preferir que o banco central dedique menos atenção a suas
preferências por uma política temporária.
Os defensores da tese da independência do Banco Central (IBC) reconhecem que
são os pilares teóricos da economia novo-clássica que sustentam a sua proposição.
Goodhart (Charles Goodhart e Alex Cukierman são responsáveis pelos trabalhos mais
importantes entre os defensores da IBC) reconhece que a curva de Phillips de longo prazo
vertical compõe os fundamentos teóricos da proposta de independência.
Cukierman considera que políticas monetárias discricionárias ativas podem
somente temporariamente reduzir a taxa de desemprego (colocando-a abaixo da taxa
natural de desemprego). O custo da melhoria temporária de variáveis reais é, contudo, a
inflação. Segundo os novos clássicos, o resultado final de qualquer política monetária ativa
é sempre nulo: a economia retorna à posição original de equilíbrio onde vigora a taxa
natural de desemprego. Logo, o melhor resultado sustentável que as autoridades podem
alcançar através da política monetária é a estabilidade de preços.
Em suma, independência do Banco Central tem um claro significado para os seus
proponentes: plena liberdade de ação para as autoridades monetárias com o objetivo único
52
de combater a inflação. A proposição da IBC apóia-se também nas discussões estabelecidas
em torno do trinômio credibilidade-reputação-delegação.
3.5.6 O Trinômio Credibilidade-Reputação-Delegação
Os gestores de política econômica podem, eventualmente, avaliar que resultados
imediatos e passageiros sobre o nível de produto são mais valiosos do que a credibilidade
nas regras de política monetária. Motivados, por exemplo, por interesses eleitorais, podem
flexibilizar a política monetária com ações discricionárias expansionistas, implementando
uma política monetária dinamicamente inconsistente e, assim, perdem reputação perante
os agentes privados.
O termo reputação deve ser entendido como a quantidade de graus de confiança dos
agentes nos dirigentes do Banco Central, a qual é medida em relação ao seu
comportamento pregresso. A tese da IBC objetiva delegar a política monetária a um agente
que mantenha a sua reputação, a credibilidade nas regras monetárias e, portanto,
mantenha a inflação em patamar aceitável e reduza a variabilidade do produto. Os mais
interessantes trabalhos que sugerem formas de delegação da política monetária para conter
o viés inflacionário são de K. Rogoff e de C. Walsh.
Segundo Rogoff, se a política monetária for delegada a um agente cujas preferências
sejam mais avessas à inflação do que as preferências da sociedade, seria possível sustentar
uma taxa de variação do nível de preços mais baixa do aquela que ocorreria se o presidente
do Banco Central tivesse as mesmas preferências sociais. Em suma, Rogoff sugere um
presidente do Banco Central conservador em relação às preferências sociais.
Walsh sugere que seja estabelecido um contrato entre o Banco Central e o governo.
Esse contrato deve impor custos (perda do cargo) ao presidente do Banco Central e a sua
diretoria quando a inflação ultrapassar o nível considerado ótimo pelo governo ou pelo
parlamento. Nesta abordagem, o Banco Central tem que ser independente, para que seus
dirigentes possam, sem restrições, tentar atingir seu objetivo: a taxa de inflação ótima
(meta de inflação) e, consequentemente, a manutenção dos seus empregos, salários e
imagem profissional.
53
O modelo de Walsh tem sido considerado mais adequado pelos adeptos da tese da
IBC, em relação ao de Rogoff, pois, sob as condições desse último modelo, todo candidato
ao cargo de presidente do Banco Central tende a se mostrar mais antiinflacionista do que
realmente pode ser, pois isto é um pré-requisito para a manutenção das suas chances
eleitorais (para presidente do bacen). E, após eleito, pode decepcionar o colégio eleitoral
que o conduziu ao cargo revelando suas verdadeiras preferências, ou seja, conduzindo a
política monetária de forma flexível, isto é, quebrando a credibilidade nas regras
monetárias. Já o modelo de Walsh estabelece uma meta de inflação que deve ser perseguida
pelos gestores da política monetária e, ao mesmo tempo, estabelece uma punição a estes,
caso a meta não seja alcançada.
3.5.7 As Metas Inflacionárias
As metas inflacionárias surgiram no modelo de Walsh de Banco Central
independente. O regime de metas inflacionárias propõe uma meta de crescimento para
algum índice de inflação, que é anunciada no início de um determinado período. A meta é
estabelecida pelo governo e/ou parlamento e deve ser perseguida pelo Banco Central.
A política monetária passa a ter um único objetivo, alcançar a meta inflacionária
determinada. Assim, os dirigentes do Banco Central não devem se preocupar com o
desempenho de outras variáveis macroeconômicas. Por exemplo, o desemprego e o produto
de uma economia somente se tornariam objeto de análise se estivessem dificultando a
realização da meta de inflação, que é o alvo exclusivo do Banco Central.
O Ataque à Independência
Aqueles que criticam negativamente a independência do banco central rejeitam
esses argumentos. Eles acreditam que é fundamentalmente antidemocrático dizer que não
se deve confiar em autoridades eleitas no julgamento da política monetária.
Não há dúvida de que uma política monetária envolve decisões difíceis, que
precisam de uma visão de longo prazo, mas o mesmo acontece com a política externa ou
com a política de defesa nacional. Além do mais, o público responsabiliza o presidente pelas
54
condições econômicas que resultem de todas as políticas seguidas durante o seu governo.
Por isso, ele deveria exercer o controle da política monetária, uma das mais importantes
dessas políticas.
Finalmente, as políticas monetária e fiscal deveriam ser integradas, e uma
integração adequada não pode ser obtida, segundo os opositores da independência do
banco central, meramente por um processo de consultas informais.
4.Teoria Política Monetária (um resumo): Keynes (Pos keynesianos) Keynesiana (velhos
keynesianos e horizontalistas e novos keynesianos)
4.1 Keynes e keynesiana
Keynes explicitou dois canais principais de influência de fatores monetários sobre a
produção e o emprego:por um lado, afeta-se a capacidade dos bancos comerciais de
proverem recursos de curto termo para as firmas financiarem suas necessidades de capital
circulante {working capital), o que afeta diretamente a implementação de decisões de
produzir, em função da relação direta, de natureza técnica, postulada entre nível de
produção e capital circulante; por outro, a disponibilidade de recursos líquidos afeta as
decisões de investimento através da influência sobre a taxa de juros utilizada para o
desconto de rendas futuras, determinante da formação do preço de demanda dos ativos de
capital.
Em linhas gerais, as diferentes teorias monetárias podem ser divididas em dois
grandes grupos: keynesianas e monetaristas. As teorias keynesianas são (ou pretendem ser)
herdeiras do pensamento do inglês John Maynard Keynes e têm, como traço mais geral, a
crença no potencial da política monetária em afetar varáveis reais. Por sua vez, as
formulações teóricas monetaristas partem da visão de que há uma relação direta entre a
oferta de moeda e o nível de preços, não sendo, por tanto, a política monetária capaz de
afetar de modo duradouro as variáveis reais.
A divisão das teorias em keynesianas e monetaristas não significa, contudo, que, em
cada grupo, as teorias sejam extremamente similares. Na verdade, no interior destes dois
55
grupos, há uma diversidade de formulações, de modo que é possível identificar alguns
subgrupos relevantes. Do ponto de vista das teorias keynesianas, a principal vertente é a
chamada Síntese Neoclássica.
Quando Keynes lançou a sua Teoria Geral em 1936, alguns jovens economistas
começaram um trabalho de formalização das principais propostas deste livro e de
enquadramento das ideias de Keynes no arcabouço da teoria neoclássica, a qual constituía
o mainstream das ciências econômicas na década de 1930. O termo síntese neoclássica
resulta exatamente desta esforço de sintetizar as ideias de Keynes com a teoria neoclássica.
A política monetária no modelo da síntese neoclássica age através das taxas de juros,
de modo que uma política expansionista faz os juros caírem. Lawrence Klein em The
Keynesian Revolution, o problema é que a função investimento é inelástica à taxa de juros,
ou seja, o investimento reage muito pouco às variações na taxa de juros. Desta forma,
políticas monetárias expansionionistas têm efeitos quase nulos no aumento da produção e
do emprego (Klein, 1949: 88).
Conforme explica Os velhos-keynesianos consideram que o modelo IS-LM é o
instrumental capaz de descrever os fenômenos essenciais da economia. A curva IS é o
conjunto de pontos de equilíbrio no mercado de bens (demanda igual ao produto)
representado no plano renda e taxa de juros (i).
A curva LM é o conjunto de pontos de equilíbrio no mercado monetário (demanda
por moeda igual à oferta) representado no mesmo plano. A interseção das duas curvas é o
ponto em que a economia está em equilíbrio no mercado monetário e no mercado de bens.
A curva IS é, para os velhos-keynesianos, basicamente vertical. Logo, a política
monetária torna-se quase que impotente para alterar a renda. Em verdade, não é
recompensador fazer uma expansão monetária, que provavelmente será custosa, já que
precisa reduzir drasticamente a taxa de juros para obter apenas reduzidos aumentos da
variável renda. Resta, então, aos adeptos da síntese neoclássica, como instrumento de
intervenção macroeconômica, a política fiscal.
56
Uma versão especial do receituário velho-keynesiano de política econômica emerge
quando associada à função demanda por bens de investimento com baixa elasticidade-juros
vislumbrando-se uma função demanda por moeda com elevadíssima elasticidade-juros.
Dessa forma, a IS seria basicamente vertical e a LM, quase horizontal. Essa versão especial
tornou-se conhecida como a armadilha da liquidez. Nessa situação, o público transforma
todo o aumento de oferta monetária em encaixes inativos. Assim, somente uma política
fiscal expansionista poderia afetar consideravelmente a renda. Uma política monetária
expansionista produziria efeitos nulos sobre as variáveis reais.
4.2 A teoria da política monetária monetarista
No seu discurso de posse presidencial na American Economic Review, Friedman
(1968), atacando as políticas keynesianas das décadas de 50 e 60, seleciona duas limitações
para a política monetária. Segundo o autor, a política monetária só poderá determinar as
taxas de juros e a taxa de desemprego em períodos bastante limitados.
Friedman critica a suposição de que um aumento na quantidade de moeda possa
afetar a taxa de juros. Diz que essa suposição parte de uma função de preferência pela
liquidez negativamente inclinada, onde as pessoas seriam induzidas a guardar uma maior
quantidade de moeda, ao serem diminuídas as taxas de juros.
Mas adverte que a taxa mais rápida de crescimento monetário estimulará o
dispêndio, a renda crescente elevará a preferência pela liquidez e a procura por
empréstimos, devendo, também, elevarem-se os preços — o que reduzirá a verdadeira
quantidade de moeda.
Esses efeitos, segundo Friedman, inverteriam a pressão decrescente inicial sobre as
taxas de juros de uma maneira bastante imediata — estipulada por ele em menos de um
ano. Um outro efeito, no entanto, faria com que uma taxa mais alta de expansão monetária
produzisse um nível mais alto e não mais baixo de taxas de juros. À medida que o
crescimento monetário produza preços em ascensão e que o público venha a esperar que os
preços continuem a subir, os emprestadores exigirão taxas de juros mais elevadas.
57
Desta feita, Friedman argumenta que, se a autoridade monetária desejasse
assegurar taxas de juros mais baixas, teria que fazê-lo por uma política monetária que,
inicialmente, ao reduzir o crescimento da oferta de moeda, aumentasse a própria taxa de
juros. A segunda limitação relaciona-se à concepção de Friedman sobre a Curva de
Phillips.
A análise, até então aceita, da Curva de Phillips teria a falha de não distinguir a
dinâmica dos salários nominais em relação à dos salários reais. Friedman argumenta que
existe uma taxa natural de desemprego definida por características e traços institucionais
do mercado de trabalho, tais como legislação e atuação de sindicatos.
Essa taxa de desemprego traduz um nível de longo prazo de desocupação do fator
trabalho, no qual está inserido o desemprego voluntário. Embora seja uma taxa de
desemprego de caráter estrutural, não se trata de uma constante. Mudanças nas legislações
trabalhistas e na produtividade do trabalho modificam o nível da taxa natural de
desemprego. Para Friedman, a política econômica não conseguiria reduzir a taxa corrente
de desemprego para baixo da taxa natural.
Uma elevação do estoque de moeda em circulação resultante de uma decisão do
Banco Central significa geralmente um excesso de moeda em relação à demanda. Os
agentes expandirão seus gastos, o que implica um maior volume de despesas na economia,
isto é, uma maior demanda agregada. Como a oferta agregada se expande de forma mais
lenta do que a demanda, a disputa pelos bens e serviços disponíveis ocasiona a uma
elevação no nível geral de preços.
Os trabalhadores têm uma expectativa para a inflação futura determinada pela
inflação vivida no passado. Trata-se de uma hipótese sobre a formação de expectativas dos
agentes sobre a evolução das variáveis econômicas em geral e da inflação em particular.
Nesse caso, a hipótese é de que os agentes constroem suas expectativas para a variação
futura de uma variável a partir do comportamento passado dessa variável, não se levando
em conta nenhuma outra informação, tais como a evolução corrente da variávelou os
58
efeitos de política econômica sobre essa variável. Essa hipótese refere-se a expectativas
adaptativas.
Como os trabalhadores não percebem o aumento do estoque de moeda nem preveem
a elevação da taxa de inflação, supõem que maiores salários monetários significam também
maior poder de compra, ou seja, maiores salários reais. Diante disso, os trabalhadores
consideram que o incremento no salário real compensa a insatisfação de trabalhar e
resolvem aceitar as ofertas de trabalho feitas pelos empresários.
Consequentemente, uma elevação da inflação aumenta o nível de emprego, levando
a taxa corrente de desemprego a ficar menor do que a taxa natural. Contudo, os
trabalhadores sofreram uma ilusão monetária. Aceitaram as ofertas de trabalho, pois
acreditaram que salários monetários mais elevados resultariam em maior poder de
compra. Não perceberam que a elevação da inflação acabará por neutralizar os salários
monetários maiores e que o salário real não aumentará.
Porém, quando forem transformar seus salários monetários em bens e serviços,
perceberão seu erro e imediatamente entenderão que a insatisfação do trabalho é
novamente superior à satisfação do salário real, o que resultará na revisão de sua decisão
de trabalhar. A taxa de desemprego corrente volta a subir e passa a ser igual à taxa natural
de desemprego.
Conclusão: a política monetária expansionista não consegue diminuir
permanentemente a taxa de desemprego corrente, deixando-a abaixo da taxa natural. Se o
Banco Central mantiver a política monetária expansionista, apenas conseguirá reduções
momentâneas da taxa de desemprego ao mesmo tempo em que estará criando, nos agentes,
expectativas inflacionárias cada vez maiores.
Para Friedman, os agentes formam expectativas de inflação segundo sua vivência
passada. Assim sendo, uma política monetária expansionista não apenas fracassaria em
reduzir o desemprego, mas também resultaria em pressões inflacionárias crescentes.
Como a autoridade monetária não teria controle sobre variáveis reais como a taxa de juros
real e a taxa de desemprego, ao menos de forma duradoura, melhor seria, segundo a
59
prescrição friedmaniana, que a autoridade monetária se concentrasse no controle do nível
de preços.
Para evitar que a moeda se transformasse numa fonte de distúrbio econômico,
propunha-se a adoção de uma meta anunciada de crescimento do agregado monetário que
melhor se adequasse a uma função de demanda por moeda estável. Essa taxa, que
produziria uma quantidade ótima de moeda no sistema, deveria acompanhar o crescimento
do produto real e a elasticidade-renda da demanda por moeda.
4.3 A teoria da política monetária novo clássica
A corrente novo-clássica está baseada em muitas hipóteses monetaristas.
O que diferencia basicamente as ideias de Lucas das de Friedman é que o primeiro acredita
que se os agentes são maximizadores, então, maximizam também a utilização das
informações que recebem. Isto implica que não formam expectativas olhando unicamente
para trás (backward-looking), mas também olham para a frente (forward-looking). As
expectativas não são adaptativas, mas são do tipo que ficou conhecida como racionais. É
por isso que muitos chamam a escola novo-clássica de escola das expectativas racionais.
Ao se afirmar que as expectativas são racionais, supõe-se que todo e qualquer agente
possui o mesmo modo de entender a economia e que tal modo corresponde à verdadeira
forma de operação da economia. Assim, um aumento da oferta de moeda anunciado pelo
governo representa apenas uma mensagem de que preços e salários irão se elevar, então, a
única reação dos agentes deve ser se antecipar elevando os preços e salários da economia.
Nada mais que isto ocorre. Em outras palavras, uma política monetária expansionista será
ineficaz para alterar variáveis reais, por exemplo, o nível de emprego e de produto.
A taxa corrente de desemprego somente não coincidirá com a taxa natural quando
os governantes implementarem uma política monetária de surpresa porque, dessa forma,
haverá decepção das expectativas de variação do estoque monetário e, consequentemente,
de variação do nível de preços.
60
Portanto, qualquer conjunto de decisões individuais que possa afastar a economia
da taxa natural é necessariamente fruto de erros expectacionais. No modelo novo-clássico,
os agentes privados erram porque são surpreendidos. A surpresa é sempre fruto da
introdução de novas variáveis no mundo real ou da alteração inesperada da magnitude de
variáveis já existentes.
Muitos adeptos da economia novo-clássica se dedicaram nos últimos anos à
elaboração de propostas de organização do Banco Central e de condução da política
monetária capazes de reduzir os estímulos à implementação de políticas de surpresa
monetária. As mais importantes propostas são a criação de bancos centrais independentes e
a utilização de metas de inflação como objetivo da política monetária.
A independência de um Banco Central não significa tão-somente autonomia para
realizar políticas monetárias sem a interferência do governo central. Significa, acima de
tudo, independência para perseguir o objetivo da estabilidade de preços, mesmo que esta
busca represente sacrificar outros objetivos que podem ser mais importantes para as
autoridades políticas. Os proponentes da tese da IBC têm argumentado que um Banco
Central independente deve assumir a tarefa estatutária única de guardião da estabilidade
do poder de compra da moeda.
5 O banco central e a operacionalidade da política monetária
Nessa aula discutiremos as principais funções do Banco Central, a política
monetária e sua operacionalidade, seus objetivos e instrumentos na economia.
5.1 O papel do Banco Central – BACEN
A oferta e a demanda de moeda resultam de uma interação complexa de uma série
de fatores. Um deles é a demanda das instituições e indivíduos por crédito, outro é a
resposta do sistema bancário comercial a tal demanda.
A instituição governamental responsável pela produção do papel moeda é a Casa da
Moeda e a instituição responsável pela autorização de sua emissão é o Banco Central
61
(BACEN) do país cujo objetivo principal consiste em regular a moeda e o crédito, em níveis
compatíveis com o crescimento do produto (manter a liquidez do sistema econômico) no
país. O BACEN tem outras funções além dessa, de uma forma ou de outra relacionada ao
seu papel de garantir a estabilidade da economia do ponto de vista monetário.
Além do BACEN, há outros setores que interagem através da moeda na economia,
por exemplo, o Setor Bancário. Este tem a possibilidade de criar ou destruir moeda. É
permitido aos bancos comerciais manterem depósitos do público e emprestar uma quantia
superior a suas reservas monetárias, isto é, podem emprestar parte de suas obrigações, os
chamados depósitos à vista.
Os bancos oferecem dinheiro por meio de empréstimos e cobram juros. Todavia, a
taxa de juros cobrada depende da oferta e de demanda por crédito e da política monetária.
Já o Setor Não Bancário consiste nas unidades familiares, empresas, o Governo e sistema
financeiro não monetário (BNDES, Banco de Investimento).
O sistema financeiro de um país compreende os mercados, os intermediários, as
empresas de serviços e outras instituições usadas para possibilitar decisões financeiras às
famílias, empresas e governos. As instituições financeiras são empresas cujo negócio
principal é proporcionar produtos e serviços financeiros. (Bancos, companhias de seguros,
companhias de investimentos. Seus produtos incluem: contas correntes, empréstimos
comerciais, hipotecas, fundos mútuos e amplo leque de contratos de seguros).5.2 Principais funções do BACEN
Para exercer tais funções o governo dispõe de instrumentos para controlar a oferta
de moeda na economia, vale dizer, do que se convenciona chamar de política monetária.
São quatro as funções do BACEN:
(1) Ser o Banco emissor de moeda (controlar a oferta de moeda);
62
(2) Ser o Banco dos bancos (os bancos depositam seus fundos e transferem entre eles
através da câmara de compensação de cheques; ademais, o BACEN empresta aos bancos
(redesconto bancário);
(3) Ser o Banco do governo (canal que o Governo tem para impor sua política
monetária; recebe fundos do Governo e emite títulos – obrigações - para venda ao público);
(4) Ser o Banco depositário das reservas internacionais do país.
A política monetária trata de controlar a quantidade de moeda que circula na
economia, da determinação da taxa básica de juros (SELIC). Dessa maneira, essa política
atua sobre a base monetária com o objetivo estabilizar a economia, isto é, manter o valor
da moeda e eliminar a inflação.
5.3 Operacionalidade da Política Monetária: objetivos e instrumentos
O modo mais adequado em termos didáticos – para compreender a
operacionalidade da política monetária consiste em apresentá-la de acordo com a seguinte
estrutura analítica: objetivos, metas e instrumentos, pois isto permite uma visualização
mais clara do seu funcionamento.
Em boa medida, tanto os objetivos finais da política como a escolha das variáveis
operacionais a serem privilegiadas estão relacionadas ao quadro referencial teórico
adotado. Em termos gerais, os objetivos ou metas finais da política monetária são:
estabilização de preços, um nível de atividade econômica elevado, uma baixa taxa de
desemprego e maior estabilidade do sistema financeiro.
As metas intermediárias estão entre as metas finais de política e as ações do Banco
Central através de seus instrumentos de política. São consideradas metas intermediárias:
(i) a taxa de juros de longo prazo;
(ii) e, os agregados monetários. A ideia central do uso destas metas é de que é através delas
– impactando nos custos e disponibilidade de crédito ou diretamente no nível dos gastos dos
63
agentes – que as autoridades monetárias procuram alcançar os objetivos finais da política,
já que estes últimos não podem ser afetados diretamente pela política monetária.
Já as metas operacionais referem-se àquelas variáveis que são resultado direto da
operacionalização de um instrumento de política monetária, sendo fortemente associadas
às metas intermediárias e aos instrumentos de política. São dois os tipos de metas
operacionais: (i) determinação da taxa de juros básica de curto prazo; (ii) controle das
reservas agregadas.
A Regra de Taylor tem sido usada como uma espécie de função de reação do Banco
Central na determinação da taxa de juros de curto prazo. Serve, assim, como um guia
operacional que o Banco Central pode seguir no processo decisório de política monetária.
Essa regra relaciona o movimento da taxa de juros fundamentalmente a desvios da inflação
presente ou esperada em relação à meta inflacionária estabelecida pela autoridade
econômica e também ao chamado hiato do produto, ou seja, o desvio do produto efetivo de
um país com relação ao produto potencial.
Os instrumentos de política monetária são os métodos e meios usados na
operacionalização desta política que afetam diretamente as variáveis operacionais, com
vistas a atingir as metas intermediárias. Os instrumentos clássicos de política monetária
são três: recolhimento compulsório, redesconto de liquidez e operações de mercado aberto.
Os Depósitos Compulsórios - os Depósitos Compulsórios referem-se a um percentual
incidente sobre os depósitos captados pelos bancos comerciais, que deve ser colocado a
disposição do Banco Central. Tais depósitos podem ser efetuados em espécie (reservas
bancárias) ou em títulos elegíveis pelo Banco Central. A alteração das taxas de
recolhimento compulsório determina a expansão ou a retração da atividade econômica.
A principal função deste instrumento de política monetária é estabilizar a demanda
por reservas bancárias, de modo a facilitar a ação do Banco Central na fixação da taxa de
juros. O formato do compulsório no Brasil foi desenhado para dar suporte ao
gerenciamento diário de reservas por parte do Banco Central, seja por permitir uma
alguma flexibilidade na gerência de caixa das instituições financeiras, seja porque esta
64
forma de recolhimento, sendo defasada e com base na média das posições diárias de
depósito durante o período de movimentação, facilita o gerenciamento de liquidez tanto dos
bancos como do Banco Central, ajudando, desta forma, na estabilização da taxa de juros
do mercado de reservas bancárias.
A Política de Redesconto – As operações de redesconto ou de assistência financeira
de liquidez são empréstimos, na forma de crédito em reservas bancárias, concedidos pelo
Banco Central aos bancos, voltadas normalmente para atender necessidades episódicas de
reservas por parte das instituições bancárias.
Neste sentido, as operações de assistência financeira à liquidez são usadas
indiretamente como apoio no controle da liquidez, com vistas à maior estabilidade da taxa
de juros no mercado monetário. As operações de redesconto atuam de forma apenas
auxiliar no gerenciamento de reservas feito pelo Banco Central, isto é, que colocada à
disposição dos bancos uma linha de assistência de liquidez – com taxas normalmente acima
da taxa de juros básica (Selic) – que ajude a solucionar eventuais problemas individuais de
caixa ao final do dia ou ao final do período de manutenção do recolhimento compulsório,
evitando a existência de saques a descoberto na conta de reservas bancárias.
Operação de Mercado Aberto - São as vendas de títulos públicos pelo Banco
Central, para remover os fundos ou as reservas que podem ser emprestados pelos bancos
comerciais ou comuns. Estas operações funcionam como instrumento ágil de política
monetária para melhorar o fluxo monetário da economia e influenciar os níveis das taxas
de juros no curto prazo. Se a intenção do governo é aumentar os meios de pagamento, ele
resgata os títulos públicos, injetando dinheiro na economia. Por outro lado, se o objetivo do
governo for reduzir os meios de pagamento, ele coloca novos títulos da dívida para
“enxugar” a quantidade de moeda em circulação na economia.
Este instrumento é recomendado tanto para a realização da gerência de liquidez,
como para a sinalização da taxa de juros básica. Em particular, tem sido considerado como
o mais indicado e eficaz para a realização do gerenciamento de liquidez de que dispõe o
Banco Central, pois atua diretamente sobre as reservas bancárias. Por isso, a tendência
65
internacional revela o uso cada vez mais intenso desse instrumento, como forma de evitar a
volatilidade na taxa de juros de curto prazo.
5.4 A Operacionalidade da política Monetária e formação da taxa de juros
O mercado de reservas bancárias é o mercado através do qual os bancos realizam
suas operações financeiras. Cada vez que um agente não financeiro faz um depósito em
moeda ou compra um título emitido pelo banco vai haver um impacto na conta de reservas
bancárias da instituição. Essa conta é a conta-corrente que os bancos mantêm no Banco
Central para fins de execução de suas operações com o restante do sistema econômico e
entre si.
Na ocorrência cotidiana de perdas e ganhos de saldos de reservas bancárias entre as
instituições financeiras, surgem excessos e deficiências quanto à exigibilidade do Banco
Central; os bancos acabam trocando reservas entre si pelo prazo de um dia, com lastro em
títulospúblicos federais. Como o sistema bancário como um todo não é capaz de criar ou
destruir reservas bancárias, resta ao Banco Central, como única instituição com poder de
criar ou destruir primariamente moeda, exercer o controle de liquidez.
De modo a promover o ajuste adequado da liquidez do sistema bancário para
atender seus propósitos de política, o Banco Central cotidianamente faz previsões quanto
ao saldo consolidado de reservas do sistema bancário. A intenção da autoridade é garantir
a taxa de juros definida pelas suas decisões de política sem, contudo, elevar sobremaneira o
grau de fragilidade do sistema bancário, o que poria em risco todo o sistema financeiro.
O controle da liquidez pelo lado da oferta pode se dar por dois tipos de operações, ambas
no âmbito do mercado aberto: operações compromissadas ou leilões informais, por um
lado, e leilões formais, de outro. As operações compromissadas são o instrumento mais
utilizado pelo Banco Central para fazer o ajuste fino da liquidez. Nessas operações, o Banco
Central negocia moeda com os bancos (como doador ou tomador), com a garantia
representada pela caução de títulos públicos federais.
Nos leilões informais, o Banco Central opera apenas com instituições credenciadas
(dealers). Estes leilões são comunicados através de contatos telefônicos. Quando o objeto de
66
negociação no leilão informal são títulos federais, estas operações são ditas definitivas. Este
também é o caso dos leilões formais de títulos. Os leilões formais estão abertos a todas às
instituições participantes do SELIC e são comunicados através de portaria do Tesouro
Nacional.
A formação da taxa de juros de curto prazo vai depender das inferências do Banco
Central quanto às condições no mercado de reservas, bem como quanto a suas metas
intermediárias e finais. Assim, o Banco Central decide, com base em uma série de critérios,
muitos dos quais explicitados nos relatórios dos comitês de política monetária, qual a taxa
de juros adequada para a operação da economia.
A partir daí, vai procurar “fazer” essa taxa no mercado bancário, criando um
“consenso” a respeito da taxa de juros que deve prevalecer. Isto é feito com base na
combinação dos instrumentos de política que tem a seu dispor. O recolhimento
compulsório é utilizado para moldar parcialmente a demanda por reservas e o mercado
aberto é a arena para os ajustes de oferta. No dia a dia, a autoridade ajusta a oferta à
demanda de modo a produzir uma trajetória suave – com baixa volatilidade – na taxa de
juros compatível com as metas anunciadas. Isto é feito basicamente através de operações
compromissadas e leilões informais de títulos e dinheiro. Os leilões formais são utilizados
para configurar o nível normal de liquidez no mercado monetário.
5.5 Mecanismos de transmissão da política monetária
Ao contrário da política fiscal, a política monetária envolve instrumentos que não
causam impacto diretamente nas decisões do público. Por isso, para discutir a eficácia da
política monetária é necessário determinar como as decisões da autoridade monetária se
traduzem em estímulos efetivos para famílias e empresas. É preciso determinar-se quais
são os elos que conectam os instrumentos à disposição do banco central e os fatores que
afinal influenciam a decisão do público. Estes são os mecanismos, ou canais, de transmissão
da política monetária.
Um elemento de grande importância nesse quadro é a curva de rendimentos. Esta
curva relaciona as maturidades de contratos às taxas de juros anualizadas pagas por cada
67
um. Embora a curva de rendimentos seja uma construção puramente descritiva, ela tende
a exibir padrões estáveis de relação entre as diversas taxas de juros, apoiando a hipótese de
que fatores sistemáticos estejam em operação na determinação desses padrões. Dentre esses
possíveis elementos sistemáticos destacam-se as diferenças de risco e os modos de formação
de expectativas.
Se existe um padrão de relacionamento entre as diversas taxas de juros, é possível
identificar um primeiro mecanismos de transmissão da política monetária. O banco central
fixa a taxa de curtíssimo prazo e esta, através de deslocamentos da curva de rendimentos,
determina o valor das taxas restantes, inclusive aquelas que influenciam o comportamento
de investidores e consumidores.
Em países que não têm um mercado de capitais suficientemente desenvolvido para
construir uma curva de rendimentos, o canal mais provável de transmissão da política
monetária é o de crédito. Por este canal, a autoridade monetária fixa o preço das reservas.
Os bancos acrescentam um mark up (chamado de spread) sobre esse custo para formar as
taxas de juros sobre empréstimos. As altas ou baixas dessas taxas levam consumidores e
investidores a se comportar como esperado pela autoridade monetária.
Com a abertura financeira da maioria das economias nos últimos 20 a 25 anos,
outro canal de transmissão se abriu para aqueles países que adotam o câmbio flutuante.
Nessas economias, elevações da taxa de juros induzem movimentos de entrada de capitais
que valorizam a moeda doméstica e barateiam importações de bens e serviços. Reduções da
taxa de juros obtém o efeito inverso.
No caso do Brasil atual, não operam o canal de ativos, por causa do reduzido
horizonte da curva de rendimentos. Também opera com reduzida eficácia o canal do
crédito, dada a atrofia do crédito ao setor privado no país. Opera, por outro lado, com
grande força o canal da taxa de câmbio. Além disso, as taxas de curtíssimo prazo situam-se
em patamares tão elevados que provavelmente acabam por afetar diretamente decisões de
consumo e investimento que em outras condições seriam insensíveis a variações dessas
taxas.
68
6 Relações, Mercados e Sistemas Financeiros
6.1 Relações Financeiras
Relações financeiras são estabelecidas sempre que um agente econômico é capaz de
transferir o comando sobre recursos financeiros para terceiros, contra o reconhecimento de
uma obrigação (e de seu serviço) por parte do beneficiário. Uma relação financeira
característica corresponde a uma operação de crédito. Esta relação se estabelece quando
um agente empresta recursos a outro, por um prazo determinado e é remunerado por isto
através do pagamento de juros. Outro conceito relevantes sobre relações financeiras
corresponde ao que se chama de intermediação e desintermediação financeiras.
Relações financeiras intermediadas são aquelas em que uma instituição financeira
interpõe suas próprias obrigações no processo de canalização de recursos do emprestador
último ao tomador último. Tipicamente, bancos operam captando depósitos, isto é,
assumindo obrigações junto aos depositantes, usando os recursos assim obtidos para
comprar ativos sob a forma da dívida dos tomadores. A remuneração do banco nessas
operações é conhecida por spread.
Em contraste, relações desintermediadas são aquelas em que o emprestador último
retém consigo diretamente obrigações do tomador final, como, por exemplo, na colocação
de commercial papers junto a fundos de mercado monetário, ou de bônus emitidos por
empresas ou governos junto a fundos de investimento. Nesse tipo de relação financeira, o
papel da instituição financeira é diverso do anterior, limitando-se à promoção da colocação
de papéis, isto é, à corretagem de valores (que corresponde à remuneração da instituição
pelos serviços prestados). Mercados de capitais referem-se, assim, a operações
desintermediadas (Cardim de Carvalho et allii, p.242).Mercados Financeiros
Mercados financeiros englobam todas as transações que são feitas com obrigações
(títulos ou contratos) emitidas por agentes deficitários ou por intermediáriosfinanceiros
que busquem canalizar recursos para eles. Esses mercados são regulados por instituições e
práticas de funcionamento que são, em parte, fixados pelos próprios participantes nessas
transações, e, em parte, por instituições do estado.
69
Essas práticas e instituições, por sua vez, não são as mesmas em todos os segmentos
do sistema financeiro. Mercados específicos tomam a forma que for necessária para a
viabilização das transações, dependendo das classes de ativos negociadas em cada um.
Ativos diferenciam-se pelos riscos que envolvem, pelo perfil de retornos que oferecem, pela
complexidade das disposições que regulam o cumprimento das obrigações e pelas garantias
que cercam este cumprimento. Podemos reconhecer essas diferenças de vários modos,
conforme segue.
a) Mercados de Crédito e de Títulos
No mercado de crédito, as transações são feitas de forma individualizada,
identificando-se as duas partes que realizam o empréstimo, porque os contratos tendem a
ser desenhados de modo a satisfazer as demandas específicas dos tomadores e dos
emprestadores, em termos de taxas de juros, prazos, garantias e outras disposições
relevantes para as partes. O mercado de crédito se desdobra em dois segmentos, o de
crédito de longo prazo e o de crédito de curto prazo.
Nos mercados de títulos as transações obedecem a regras mais genéricas,
desprezando-se as idiossincrasias de cada parte interessada. Pode-se identificar o mercado
de papéis de curta duração, com, por exemplo, até três meses de maturidade (denominado
de mercado monetário). A característica mais relevante para essa caracterização é que
papéis de curta duração não estão sujeitos ao risco de capital. Os papéis de maturidade
mais longa, sujeitos, portanto, aos riscos de capital, são transacionados no mercado de
capitais, que, por sua vez, se desdobra nos mercados de dívidas (que negocia títulos de
dívidas, como bônus, notas, debêntures etc.) e de ações (títulos de propriedade, emitidos
por empresas sociedades anônimas).
b) Mercados Primário e Secundário
O mercado primário é aquele em que se realiza a primeira aquisiçäo de um ativo
financeiro, assim que emitido. É nesse mercado que efetivamente se transferem fundos de
agentes superavitários para agentes deficitários, no financiamento das atividades
produtivas e do consumo.
70
O mercado secundário é aquele em que são renegociados ativos financeiros já
existentes e primariamente adquiridos quando de sua emissão, transferindo-se assim, de
um proprietário para o outro. Este mercado não exerce, precipuamente, a função de
aumentar o estoque de ativos financeiros e, consequentemente, o fluxo agregado de
financiamentos. Sua finalidade principal é a de aumentar a liquidez do estoque de ativos
financeiros da economia, tornando mais atraente sua aquisição primária.
c) Mercados Públicos e Privados
Mercados públicos são aqueles cujas condições de operação permitem a qualquer
participante usufruir, em princípio, das mesmas vantagens que qualquer outro
participante. Os termos dos contratos são conhecidos e acessíveis a todos. Exemplo destes
mercados são os pregões em bolsa de valores. Já os mercados privados não são acessíveis a
todos os participantes. Nestes, as transações são feitas em condições que são acordadas de
forma bilateral. Exemplo destes mercados são as operações de balcão.
d) Mercados Monetário e de Capitais
Outra classificação usual dos mercados em que atuam as instituições financeiras é a
segmentação de suas atividades em dois estamentos: o mercado monetário e o mercado de
capitais. Este responsável pelas relações financeiras essencialmente ligadas à emissão e
negociação de títulos de propriedade (ações) e por títulos de dívida de médio e longo
prazos, enquanto que o mercado monetário engloba as atividades monetárias, creditícias e
cambiais essencialmente ligadas à captação de recursos e à emissão e negociação de
contratos e de títulos de dívidas de curto prazo.
e) Mercados Monetário, de Crédito, de Capitais e Cambial
Pode-se ver que os segmentos de mercado em que atuam os intermediários
financeiros apresentam mais de um critério de diferenciação. Uma segmentação mais usual
classifica os intermediários financeiros, a partir de suas finalidades essenciais, como
integrantes dos mercados monetário, de crédito, de capitais e cambial.
71
No mercado monetário realizam-se operações de curto e de curtíssimo prazos. É por
meio deste mercado que os agentes econômicos e os próprios intermediários financeiros
suprem suas necessidades momentâneas de caixa. A liquidez deste segmento de mercado é
regulada por operações abertas, realizadas pelas autoridades monetárias, via colocação,
recompra e resgate de títulos da dívida pública de curto prazo.
O mercado de crédito atende aos agentes econômicos quanto as suas necessidades de
crédito de curto, médio e longo prazos. São, principalmente, atendidas solicitações de
crédito para financiamento da aquisição de bens duráveis e moradias pelos consumidores,
ao lado de capital de giro e investimentos das empresas. A maior parte do suprimento desse
tipo de crédito é feita por intermediários financeiros bancários. Em complemento, podem
ocorrer suprimentos via intermediários não-bancários.
O mercado de capitais atende aos agentes econômicos produtivos quanto as suas
necessidades de financiamentos de médio e, sobretudo, de longo prazos, a maior parte dos
quais suprida por intermediários financeiros não bancários. As operações que se realizam
nas bolsas de valores (particularmente ações) são parte integrante desse mercado, além do
lançamento de debêntures e de outros títulos de dívida por parte das empresas
organizadas, principalmente, sob a forma de sociedades anônimas.
No mercado cambial realizam-se operações de compra e venda de moedas
estrangeiras conversíveis, além de operações de financiamento envolvendo a troca de
moedas e de ativos financeiros estrangeiros por moeda e ativos financeiros nacionais e vice-
versa.
6.2 Intermediários Bancários e Não-Bancários
No que tange às instituições que atuam nos diversos segmentos do mercado
financeiro, cabe esclarecer a diferença entre intermediários bancários e não-bancários. Os
intermediários financeiros bancários são os que operam com ativos monetários. Os não-
bancários são os que operam com ativos financeiros não-monetários.
72
Os ativos monetários são o papel-moeda e os depósitos (essencialmente os depósitos
à vista em bancos comerciais, mas, hoje em dia, também são assim considerados os
depósitos a prazo e os depósitos de poupança, ampliando-se, assim, o conceito de
instituições financeiras bancárias). Os ativos financeiros não-monetários são constituídos
por diferentes tipos de títulos que dão sustentação às operações que se realizam nos
mercados de crédito e de capitais.
Assim, os bancos comerciais, ou outros intermediários que desempenham funções
típicas de bancos comerciais, são os chamados intermediários financeiros bancários ou
monetários. As demais instituições que operam no sistema financeiro são geralmente
consideradas não bancárias, essencialmente em virtude do fato de não emitirem ou criarem
ativos incorporados ao conceito tradicional de meios de pagamento (ainda que, conforme
visto, bancos de investimento e de desenvolvimento são considerados bancos por aceitarem
depósitos a prazo).
O que são ativos financeiros? Ativo financeiro é assim chamado, pois tem um valor
de troca. Uma série de objetos (tangíveis ou não) se enquadra nesta definição. Exemplo:
Ações, Moedas, CDB, mercadorias, títulos públicos ou privados, imóveis, ações, veículos,
etc.
Os mercados de ativos sãotodos interligados. Agentes com excesso de demanda de
ativos tangíveis, normalmente financiam sua demanda através de ativos financeiros
intangíveis. Exemplos: Empresa em expansão emite ações ou toma empréstimo; As pessoas
emitem dívida (financiamento) para comprarem um imóvel ou veículo. Este contrato por
sua vez, pode inclusive ser negociado no mercado financeiro através de uma Cessão de
Créditos.
O repasse dos recursos de poupadores/investidores às empresas pode ser feito de
duas formas:
Dívida: Os investidores compram títulos emitidos pelas empresas que precisam de
dinheiro. Esses títulos dão aos investidores o direito de receber a quantia emprestada, mais
73
juros previamente determinados. Os títulos são chamados de títulos de dívidas e esse
mercado é conhecido como o mercado de renda fixa.
Ações: Também aqui os investidores compram títulos emitidos por empresas. Mas
os títulos não garantem remuneração fixa aos investidores. A remuneração dos títulos são
os dividendos – parte do lucro que uma empresa de capital aberto distribui entre seus
acionistas. Os investidores tornam-se sócios da empresa. Esses títulos são chamados ações e
o mercado é conhecido como mercado de renda variável.
Os detentores de ações são sócios da empresa e, como tal, correm o risco de sucesso
ou fracasso das estratégias adotadas pela mesma. Se o investidor mudar de opinião quanto
à capacidade da empresa em conseguir lucro no mercado, pode comprar ou vender os
papéis. Essa negociação é feita nas bolsas de valores, um mercado livre e aberto. O
funcionamento desse mercado é regulado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM),
cujo objetivo é garantir transparência nos negócios realizados em bolsa e das informações
fornecidas pelas empresas.
Para agilizar e facilitar as negociações no mercado acionário, as bolsas de valores,
como a Bovespa, atribuem códigos aos ativos negociados. No caso da bolsa brasileira, os
ativos negociados apresentam um sufixo de quatro letras, que se refere ao nome da
empresa (por exemplo, PETR para Petrobrás), seguidos por um ou dois algarismos.
PETR 4 NÚMERO CORRESPONDENTE AO TIPO DA AÇÃO
QUATRO LETRAS= NOME DA EMPRESA PETR= PETROBRAS S/A
As companhias que têm ações negociadas nas bolsas são chamadas companhias
"listadas". Para ter ações em bolsas, uma companhia deve ser aberta ou pública, o que não
significa que pertença ao governo, e sim que o público em geral detém suas ações. A
companhia deve, ainda, atender aos requisitos estabelecidos pela Lei das S.A. (Lei nº 6.404,
de 15 de dezembro de 1976) e pelas instruções da CVM, além de obedecer a uma série de
normas e regras estabelecidas pelas próprias bolsas.
74
No passado, o Brasil chegou a ter nove bolsas de valores, mas atualmente a
BM&FBOVESPA é a principal. A BM&FBOVESPA foi criada em maio de 2008 com a
integração entre Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) e Bolsa de Valores de São Paulo
(BOVESPA), tornando-se a maior bolsa da América Latina, a segunda das Américas e a
terceira maior do mundo. Nela são negociados títulos e valores mobiliários, tais como:
ações de companhias abertas, títulos privados de renda fixa, derivativos agropecuários
(commodities), derivativos financeiros, entre outros valores mobiliários.
O Índice Bovespa é uma carteira das ações mais negociadas no mercado à vista da
Bolsa de Valores de São Paulo. Entram na carteira do Ibovespa as ações que, nos últimos
dozes meses, apresentaram os maiores índices de negociabilidade (participação percentual
de uma ação no total negociado pela Bovespa em reais). O peso de cada ação na carteira é
diretamente proporcional a sua negociabilidade. O Índice Bovespa é o mais importante
indicador do desempenho médio das cotações do mercado de ações brasileiro.
É importante fazermos distinção de dois tipos de “intermediação financeira”:
a) Intermediação Financeira Direta
Agentes Superavitários: depositam ou aplicam seus recursos em uma “Instituição
Financeira”. Exemplos: Depósitos à Vista (contas-correntes), Depósitos a Prazo (CDB –
Certificado de Depósito Bancário, RDB – Recibo de Depósito Bancário, Letra de Câmbio,..)
e Poupança.
Agentes Deficitários: tomam estes recursos na forma de “Operações de Crédito”.
Exemplos: Empréstimos em Conta (sem destinação específica), Financiamentos, Títulos
Descontados (Duplicatas, Cheques, Notas Promissórias,..) e Leasing, entre outros.
b) Intermediação Financeira Indireta
Agentes Superavitários: adquirem como um investimento “Títulos de Crédito
Mobiliários” (ex.: Ações e Debêntures), via Bolsa de Valores (Bolsa de Valores de São
Paulo - Bovespa) e Mercado de Balcão (Organizado e Não Organizado).
75
Agentes Deficitários: tomam estes recursos na forma de títulos de crédito, inclusive
abrindo a possibilidade de participação de novos acionistas no seu “Capital Social”.
Mercado de Crédito
É onde se realizam operações de crédito do tipo: (entre outras)
a) empréstimos (não têm destinação específica dos recursos); Crédito
pessoal, cheque especial, crédito rotativo para capital de giro,. (possuem
destinações específicas para os recursos cedidos);
b) Financiamento de consumo de bens duráveis, rurais e agroindustriais,
financiamento de câmbio de exportações e importações, financiamentos
imobiliários,....
c) descontos de títulos de crédito Duplicatas, notas promissórias, cheque pré-
datados,...
d) Leasing - Aluguel de bens de consumo durável, imóveis, entre operações.
Para a formalização dessas operações, a fim de se evitar uma maior
inadimplência ou perda futura da operação de crédito, são exigidas
inúmeras garantias pessoais e reais (aval, fiança, penhor, alienação
fiduciária, caução, hipoteca,..) dos clientes pessoas físicas e/ou jurídicas,
conforme o caso.
Atualmente, as Autoridades Monetárias têm regras rígidas para concessão,
acompanhamento, atualizações e provisões pra créditos de liquidação duvidosa
(provisões de até 100%).
Quais são as diferenças entre debêntures e CDBs? CDBs (Certificado de
Depósito Bancário) são títulos emitidos pelos bancos comerciais e de investimentos, que
pagam taxas de juros em determinado vencimento para seus compradores.
76
O dinheiro captado nos CDBs é usado para as operações de crédito do banco. Já as
debêntures são títulos de renda fixa emitido por sociedade anônima para tomar
empréstimos no mercado. Seu lançamento pode ser público ou particular.
Qual a diferença entre ações, debêntures e notas promissórias? As ações são
pertencentes ao mercado de renda variável. Ao comprar ações de uma empresa, o
investidor se torna sócio dela, dividindo os riscos do negócio.
Já as debêntures e as notas promissórias fazem parte do mercado de renda fixa.
Quem investe em debêntures ou em notas promissórias se torna credor da empresa e terá
de volta os recursos emprestados, nos prazos, condições e garantias pré-determinados no
ato da emissão do título. Neste caso, deve-se analisar o risco de crédito da emissão.
6.3 Bancos comerciais
Os bancos comerciais são instituições financeiras privadas ou públicas que têm
como objetivo principal proporcionar suprimento de recursos necessários para financiar, a
curto e a médio prazos, o comércio, a indústria, as empresas prestadoras de serviços, as
pessoas físicas e terceiros em geral. A captação de depósitos à vista, livremente
movimentáveis, é atividade típica do banco comercial, o qual pode também captar
depósitos a prazo. Deve ser constituído sob a forma de sociedade anônima e na sua
denominação social deve constar a expressão "Banco" (Resolução CMN 2.099, de 1994).
6.3.1 O que é o SPREAD BANCÁRIO
É a diferença entre o que o bancoteria de custo de oportunidade do dinheiro (o que
faria com ele sem risco), e a taxa cobrada de juros.
Exemplo: A taxa na qual o banco pode remunerar seu capital, sem considerar
impostos, sem risco seria a taxa Selic (atualmente 11,25%).
Se o banco empresta a 31,25% a você, ele está com um spread de 20%, ou seja,
31,25% menos 11,25%. Com esse spread ele paga os custos bancários funcionamento de
agência, pessoal, etc.), paga também a possível inadimplência, além de outros custos
77
agregados, como impostos (o IOF, por exemplo). O que sobra é o lucro, que é legítimo.
Outras variáveis ainda entram neste cálculo, como o compulsório.
6.3.2 Bancos de investimento
Os bancos de investimento são instituições financeiras privadas especializadas em
operações de participação societária de caráter temporário, de financiamento da atividade
produtiva para suprimento de capital fixo e de giro e de administração de recursos de
terceiros. Devem ser constituídos sob a forma de sociedade anônima e adotar,
obrigatoriamente, em sua denominação social, a expressão "Banco de Investimento". Não
possuem contas correntes e captam recursos via depósitos a prazo, repasses de recursos
externos, internos e venda de cotas de fundos de investimento por eles administrados. As
principais operações ativas são financiamento de capital de giro e capital fixo, subscrição
ou aquisição de títulos e valores mobiliários, depósitos interfinanceiros e repasses de
empréstimos externos (Resolução CMN 2.624, de 1999).
7 Teoria Neoclássica da firma bancaria
Modelos de gerenciamento de reservas: procuram estabelecer a alocação ótima
entre o ativo líquido (reservas) e o ativo lucrativo (empréstimos), dada a quantidade de
depósitos, tomando-se os custos operacionais do lado do ativo como implícitos. O volume de
depósitos pode se alterar ao longo do tempo devido às retiradas feitas pelos depositantes,
risco que o banco pode estimar de forma probabilística. O volume de reservas, por sua vez,
é determinado pela igualdade entre o custo marginal de reter reservas (custo de
oportunidade) e o benefício marginal (redução do custo de ajustamento) de assim proceder.
Tais modelos, buscam, assim, soluções de otimização na divisão de recursos entre
empréstimos, que proporcionam retornos, e reservas, que devem ser retidas devido ao risco
de iliquidez.
A solução de otimização é determinada pela condição ra = p∫f(X) dx, onde ra é o
rendimento de um ativo, p é o custo de obtenção de fundos adicionais relacionados a uma
78
eventual deficiência de reservas, e X são as retiradas bancárias líquidas, com a
probabilidade estabelecida pela função densidade f(X).
A premissa básica da visão convencional é que o banco é uma firma maximizadora
de lucro neutra ao risco. Um dos resultados destes modelos é que os bancos funcionam
como intermediários neutros na transferência de recursos reais na economia. Deste modo,
eles não criam poder de compra novo, o que significa que seu comportamento pouco afeta a
determinação das condições de financiamento da economia e, portanto, as variáveis reais
da economia, como produto e emprego.
A demanda por ativos líquidos, mas pouco rentáveis, se justifica, no contexto da
teoria neoclássica, pelo fato de que o volume total de depósitos a vista é uma variável
aleatória de tal forma que o banco está sujeito ao risco de ocorrência de uma redução
súbita e inesperada do volume dos depósitos em consideração. Embora o banco possa
sempre recorrer ao mercado interbancário ou ao redesconto do banco central para obter a
liquidez necessária para atender os saques de seus correntistas, tais operações envolvem
necessariamente um custo para o banco, seja na forma de juros pagos sobre os
empréstimos junto aos demais bancos ou ao banco central ou ainda a perda de reputação
ou de prestígio junto aos seus clientes (cf. Tobin, 1998, p.182).
Nesse contexto, o banco estará disposto a manter ativos pouco rentáveis em carteira
como precaução contra a possibilidade de ter que recorrer ao mercado interbancário ou ao
redesconto do banco central.
8. Teoria da firma bancária - uma perspectiva pós-keynesiana
Na perspectiva pós-keynesiana, bancos são vistos como entidades que, mais do que
meros intermediadores passivos de recursos, são capazes de criar crédito
independentemente da existência de depósitos prévios, através da criação ativa da moeda
bancária.
O comportamento dos bancos – como uma firma que possui expectativas e
motivações próprias - têm um papel essencial na determinação das condições de
79
financiamento em uma economia capitalista, ao estabelecer o volume e as condições sob os
quais o crédito é ofertado, pois deles depende a criação de poder de compra novo
necessário à aquisição de ativos de capital que proporciona a independência da acumulação
de capital em relação à poupança prévia.
Keynes, em seu Treatise on Money, já havia destacado que as taxas de
reservas bancárias, uma vez fixadas por lei ou por força de hábito, tendem a ser mantidas
pelos bancos numa proporção estável ao longo do tempo, pois a manutenção de uma taxa
mais elevada poderia significar abrir mão de possibilidades de lucro, enquanto uma taxa
menor poderia resultar em problemas de liquidez. Na abordagem pós-keynesiana a firma
bancária é um agente que tem expectativas e está em um contexto de futuro incerto, e por
este motivo tem preferência pela liquidez. A incerteza que a firma bancária enfrenta é a
incerteza não-probabilística, isto é, aquela em que não existe qualquer possibilidade de
cálculo probabilístico para sua determinação. Em razão disso a firma bancária baseará a
escolha de seus ativos de acordo com suas expectativas sobre o futuro.
Como qualquer firma capitalista, bancos têm como principal objetivo a obtenção de
lucro na forma monetária. Para tanto, tomam suas decisões de portfólio orientadas pela
perspectiva por maiores lucros, levando em conta sua preferência pela liquidez e suas
avaliações sobre a riqueza financeira, em condições de incerteza que caracteriza uma
economia monetária da produção.
Deste modo, os bancos enfrentam a escolha básica entre satisfazer os compromissos
de empréstimo ou preservar a flexibilidade para maximizar a liquidez do seu ativo em um
ambiente adverso. A concessão de crédito pelo banco depende fundamentalmente de suas
expectativas quanto à viabilidade dos empréstimos, ou seja, da capacidade do tomador
auferir receitas futuras para cumprir seus compromissos financeiros.
A volatilidade dessas avaliações feitas pelos bancos, além de sua preferência pela
liquidez, ocasiona flutuações na oferta de crédito e, consequentemente, no nível de
investimento, produto e emprego na economia: “este ativismo do banqueiro afeta não
80
apenas o volume e distribuição do financiamento, mas também o comportamento cíclico
dos preços, da renda e do emprego” (Minsky, 1986: 226).
A firma bancária procura ativamente ajustar seu portfólio de modo a explorar as
oportunidades de lucro existentes. Contrariamente à abordagem neoclássica, suas
estratégias e desempenho têm impacto significativo sobre o comportamento da economia.
9. O Sistema de Bretton Woods
Na parte final da Segunda Guerra Mundial, os EUA e a Grã-Bretanha tomaram a
iniciativa de criar um conjunto de instituições econômicas para lidar com os problemas que
se previam para o período de pós-guerra e para evitar uma repetição das perturbações
monetárias e comerciais dos vinte anos anteriores (Mayer, Duesenberry, Aliber, p.591).
O Presidente Franklin Roosevelt decidiu convocar uma conferência, que ocorreu em
julho de 1944, em Bretton Woods, com representantes de 45 países,inclusive o Brasil, já
reunidos sob o espírito das Nações Unidas, com o objetivo de discutir os problemas
monetários de caráter internacional, que necessariamente deveriam se apresentar de forma
aguda ao terminar a Segunda Guerra Mundial. O Secretário do Tesouro dos EUA, Sr.
Morgenthau, entrou em contato com o Governo da Inglaterra, que designou John Maynard
Keynes, então já Lord Keynes, para colaborar, junto com especialistas norte-americanos,
na formulação do planejamento de instituição ou instituições que deveriam dirigir e
resolver os problemas monetários do pós-guerra.
Lord Keynes elaborou um projeto geral de uma única organização, que devia servir
de banco central dos bancos centrais dos países membros da organização e que se
encarregaria de efetuar operações de crédito de curto e de longo prazo. O Dr. Harry White,
distinguido conselheiro do Tesouro norte-americano, apresentou um projeto que diferia
consideravelmente do de Keynes. O Tesouro dos Estados Unidos considerou que o plano de
Keynes, por inovador e por sua grande amplitude, dificilmente seria ratificado pelo
Senado, e o próprio Keynes pensava, pelas mesmas razões, que seu plano encontraria séria
oposição no Parlamento britânico.
Na discussão entre os especialistas ingleses e norte-americanos chegou-se à
formulação de um plano misto. Em lugar de uma única instituição, propuseram-se criar
81
duas: um banco mundial, para fazer empréstimos a longo prazo aos países que formavam
parte da organização das nações unidas, e um fundo monetário para resolver desajustes
transitórios dos países membros, que teria como seus principais alvos evitar a guerra
financeira entre diversos países por meio de desvalorizações monetárias, para ganhar
vantagens no comércio exterior, e prestar assistência aos bancos centrais que se
encontravam em dificuldades temporárias.
O Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD) ou Banco
Mundial, como é mais conhecido hoje, foi criado para financiar a recuperação da Europa
Ocidental no pós-guerra. Assim que esta tarefa terminou, em fins da década de 40, o banco
se concentrou em vários tipos de empréstimos e assistência técnica aos países em
desenvolvimento.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) foi criado para melhorar a estabilidade
nos pagamentos internacionais, tanto oferecendo regras para as alterações da paridade
cambial e para os controles de câmbio nos pagamentos internacionais, como administrando
um conjunto de moedas nacionais, as quais os países poderiam tomar emprestado, para
financiar seus déficits de pagamentos. Cada país membro do FMI era obrigado a declarar
uma paridade para sua moeda, em termos de ouro ou em termos de dólar americano.
Sendo assim, o FMI é a corporificação institucional do sistema monetário de Bretton
Woods.
O Banco Mundial e o FMI são conhecidos como instituições de Bretton Woods
porque os tratados de criação de ambos foram assinados neste balneário de New
Hampshire, EUA. Chegou-se também a propor em Bretton Woods a criação da
International Trade Organization (ITO), que proporcionaria um arcabouço para a
redução de tarifas e para a celebração de acordos, a fim de limitar as variações nos preços
das matérias-primas básicas e para a coordenação de políticas nacionais de combate ao
truste. Embora a ITO jamais tenha chegado a existir, o primeiro artigo de sua carta levou
ao General Agreement on Tariffs and Trade (GATT), que foi a instituição predominante,
desde o fim da Segunda Guerra, até 1994, na promoção de redução de tarifas e outras
barreiras ao comércio. Em 1994, ao final da denominada Rodada Uruguai, os países
membros do GATT acordaram em criar a Organização Mundial de Comércio (OMC).
82
Finalmente, formulou-se em Bretton Woods uma terceira instituição, qual seja, um
sistema monetário internacional baseado no padrão ouro-dólar, isto é, a moeda norte-
americana passou, após o fim da Segunda Guerra Mundial, a ter uma paridade fixa com o
ouro (35 dólares por onça de ouro) e a ser conversível em ouro a esta paridade, enquanto as
demais moedas dos países filiados ao FMI passaram a ter uma paridade fixa com o dólar
5
.
Este sistema perdurou até 1971/72, quando os Estados Unidos, primeiro, desvalorizaram o
dólar em relação ao ouro (1971) e, depois, abandonaram oficialmente o padrão câmbio-
ouro e a conversibilidade do dólar em ouro numa taxa fixa (1972). Desde então, o valor da
moeda norte-americana tem flutuado livremente em relação ao ouro e a outras moedas nos
mercados internacionais de câmbio. O dólar experimentou uma forte desvalorização desde
então, na medida em que, no final do século XX, uma onça-troy de ouro, cujo peso é de
31,0917g, estava valendo US$282,55.
Acrescenta-se, ainda, que, terminada a Segunda Guerra Mundial, houve o Plano
Marshall, que versava sobre empréstimos e doações para a reconstrução da Europa. Entre
1947/51, a ajuda dos EUA à Europa foi de US$17 bilhões, correspondente a 2,5% do PIB
americano da época, ou o equivalente, na segunda metade dos anos 1990, quando
comemorou 50 anos, a US$ 100 bilhões.
Enquanto a taxa de inflação americana estava baixa, o Sistema de Bretton Woods
funcionou. O colapso do sistema iniciou-se em 1971, quando o presidente dos Estados
Unidos suspendeu a paridade dólar/ouro. Em agosto de 1971, o Tesouro americano
suspendeu formalmente as vendas de ouro a instituições oficiais estrangeiras. O governo
americano também adotou uma sobretaxa de 10% às tarifas para os produtos importados
tributáveis e adotou um conjunto de tetos para preços e salários, a fim de impedir mais
aumentos do nível de preços americano. No início de 1972, no contexto do Acordo
Smithsoniano
6
, o preço do ouro em dólares foi aumentado para US$ 38 e a sobretaxa das
5
Bancor. Nome proposto por Keynes na Conferência de Bretton Woods, para uma moeda internacional inteiramente
destinada a ajustar desequilíbrios dos balanços de pagamentos, embora permanecendo cada país com seu sistema
monetário particular. A proposta não foi aceita por pressão dos delegados norte-americanos, que pretendiam
transformar o dólar no padrão internacionalmente aceito, com as vantagens inerentes a essa adoção (Sandroni,
2005).
6
Acordo Smithsoniano. Acordo estabelecido pelo Grupo dos Dez, em dezembro de 1971, para adotar taxas de
câmbio flutuantes. A conferência foi convocada para resolver o problema do colapso das taxas fixas de câmbio
(adjustable peg), que existiam desde a Conferência de Bretton-Woods, em 1944, e, indiretamente, pela decisão dos
Estados Unidos de abandonar o padrão câmbio-ouro. A conferência levou a um acordo em 1972, com a Comunidade
Econômica Européia, para limitar os movimentos monetários e cambiais numa faixa estreita de flutuação na CEE,
83
tarifas foi retirada. Como os déficits no balanço de pagamentos americano continuassem,
aumentou a especulação contra o dólar. Devido à incapacidade das autoridades monetárias
nacionais em adotar políticas que tornassem viável o novo sistema de taxas de câmbio fixas,
as taxas flutuantes tornaram-se mais uma vez inevitáveis, como nos anos imediatamente
seguintes à Primeira Guerra Mundial.
9.1 O Sistema Financeiro Internacional
O contraste mais visível entre os sistemas financeiros nacionais e o internacional é a
ausência neste último de instituições reguladoras dotadas de poderes abrangentes de
regulação e uniformização estrutural. Apesar da existência de instituições influentes, como
o BIS (Bank for International Settlements) e o FMI (Fundo Monetário Internacional), as
restrições regulatórias existentes na esfera internacional decorrem seja da aceitaçãovoluntária de regras, em geral prudenciais, pelos agentes privados participantes do sistema,
seja dos relativamente poucos limites e normas que são decididos por consenso entre as
nações.
A relação entre o sistema financeiro internacional e os sistemas nacionais depende
diretamente do grau de abertura destes últimos, seja em relação à operação em território
nacional de instituições financeiras estrangeiras, seja em termos da existência ou não de
controles de capital.
Os bancos comerciais e os bancos de investimento são as principais instituições
operadoras privadas do sistema financeiro internacional. O banco comercial é o principal
agente financeiro envolvido na atividade de intermediação, como captador de depósitos,
especialmente a termo, que são emprestados aos tomadores, seja por sua responsabilidade,
seja através do empréstimo sindicalizado, isto é, feito por um grupo (sindicato) de
instituições. A principal característica desse tipo de operação é a aceitação, pelo banco, do
risco de crédito inerente ao empréstimo e do risco de liquidez dos seus ativos em geral.
O banco de investimento é o intermediário representativo nas operações de
securitização, que tipicamente organiza o processo de colocação no mercado de papéis
emitidos pelos tomadores, subscrevendo-os ou não, e fornecendo-lhes ou não facilidades de
chamada snake (serpente), fixando as taxas de câmbio à moeda mais forte da Comunidade, o marco alemão
(Sandroni, 2005).
84
reforço de crédito e liquidez (credit enhancement). Neste caso, a instituição financeira
sujeita-se aos riscos de mercado e de liquidez, transferindo o risco de crédito ao aplicador
final. Os mercados de derivativos desenvolveram-se, fundamentalmente, para reduzir ou
socializar aqueles dois tipos de risco.
Observação: Os riscos corridos por um banco comercial são, principalmente, o risco
de crédito e o risco de liquidez. O risco de crédito refere-se à probabilidade de calote por
parte dos tomadores de crédito. O risco de liquidez é medido pela perda esperada na venda
de ativos sob pressão. O risco principal a que um banco de investimento está sujeito é o
risco de mercado. Esse risco consiste na probabilidade de que o banco tenha superestimado
as possibilidades futuras de absorção pelo mercado dos papéis retidos em carteira.
Os mercados de títulos se dividem em dois segmentos: os instrumentos de mercado
monetário (títulos de curto prazo) e o mercado de bônus (bonds) e notas (notes), títulos
respectivamente de longo e de médio prazos (Cardim de Carvalho et allii, p.314).
9.2 As Tendências Internacionais do Sistema Financeiro
Dentre as profundas transformações e inovações pelas quais atravessou o sistema
financeiro internacional nos últimos anos, em especial desde a segunda metade dos anos
1980, cabe destacar as seguintes: a securitização, os mercados de derivativos, a emergência
dos investidores institucionais, a tendência à generalização do banco múltiplo (ou
universal) e a desregulação e liberalização financeiras.
9.2.1 Securitização
Securitização refere-se à transformação de obrigações financeiras geradas
anteriormente em processos de oferta de crédito em papéis colocáveis diretamente no
mercado. O crescimento do processo de securitização, a partir da substituição do crédito
bancário pela emissão de títulos negociáveis de renda fixa (bônus ou securities) por
empresas, tem, portanto, como contrapeso, o movimento de desintermediação financeira.
O custo de operação de crédito bancário compreende as elevadas despesas
necessárias para a construção de um cadastro, isto é, uma coleção de informações sobre
85
cada tomador potencial, de capacitação de avaliadores dos riscos que cada um desses
tomadores representa, e da criação de mecanismos de monitoramento do desempenho
desses tomadores após o crédito ser concedido.
Operações de mercado de capitais, isto é, de colocação direta de papéis (títulos de
propriedade, como ações, ou de dívida, como bônus, debêntures, commercial papers etc.)
evitariam esses custos. Além disso, no caso da operação de mercados de capitais,
economiza-se o risco do intermediário, pois, numa operação de crédito, o intermediário
corre riscos de inadimplência do tomador e pelo eventual descasamento entre passivos
imitidos em favor dos aplicadores e os ativos representados por direitos contra os
tomadores. Estes riscos são cobrados pelos intermediários de seus clientes. A colocação
direta de papéis no mercado elimina os riscos do intermediário.
A securitização corresponde a dois tipos diferentes de processos financeiros, quais
sejam: a) securitização primária; e b) securitização secundária. A securitização primária
corresponde ao apelo crescente à colocação direta de papéis de tomadores junto ao público
não-financeiro, em substituição ao crédito bancário anteriormente utilizado. Já a
securitização secundária refere-se ao processo de transformação experimentado pelos
próprios intermediários financeiros, que buscam se adaptar às novas tendências do
mercado. Neste caso, o que é securitizado são os ativos dos bancos, representados por
empréstimos originalmente realizados aos tomadores finais. Este processo, criado
principalmente para resolver a crise do sistema de financiamento da construção norte-
americano, permite aos bancos repassar para os aplicadores finais tanto o risco de crédito
(probabilidade de calote), quanto o risco de juros (probabilidade de que elevações de juros
reduzam o valor dos ativos mais do que o dos passivos) envolvidos na concessão de
empréstimos, e também reduzem os custos de monitoração dos tomadores.
9.2.2 Derivativos
Esta transformação corresponde à proliferação dos produtos derivativos - swaps,
opções, mercados futuros - como forma de transferência e transformação de riscos de
câmbio e juros, principalmente. Derivativos são ativos cujo valor é derivado de outros.
A importância de seu papel repousa, em primeiro lugar, pela sua capacidade de
decomposição de riscos, os derivativos têm servido para que os diversos aspectos que
86
caracterizam uma dada transação possam ser negociados separadamente, permitindo a
cada parceiro aceitar apenas aqueles riscos que lhe atraem, transferindo o restante para
outros (isto é, fazendo hedge contra esses outros riscos, o que nada mais é que a compra de
contratos que lhe garantam uma compensação contra contingências específicas). Em
segundo lugar, porque derivativos podem cumprir as mesmas funções que mercados
secundários para um dado papel, à medida que asseguram a possibilidade de revenda do
título em condições adversas determinadas.
9.2.3 Emergência de Investidores Institucionais
Referem-se ao papel crescente dos investidores institucionais, principalmente fundos
de pensão, fundos de investimento e seguradoras, como fonte de funding para operações de
longo prazo. Investidores institucionais compreendem um conjunto relativamente
heterogêneo de iniciativas que têm como traço comum o de constituírem pools de recursos
para aplicação financeira. Assim, fundos de pensão, um de seus principais segmentos, são
produto da organização de poupadores de um determinado grupo, que reúnem seus
recursos para potencializar suas possibilidades de aplicação financeira, com vistas à
obtenção de um fluxo de renda em um futuro, em média, relativamente distante. Fundos de
Investimento, em tese, são criados por grupos de pessoas que têm como meta aplicar sua
poupança em um mercado determinado, como o monetário ou o mercado de ações ou de
títulosde renda fixa, ou um misto de todos eles.
Companhias de seguro reúnem os prêmios pagos por seus segurados para realizar
investimentos que permitam o pagamento de compensação, em caso de uma contingência
adversa pré-especificada.
9.3 Tendência aos Bancos Múltiplos (ou Bancos Universais)
Corresponde à generalização do banco universal (múltiplo), com os bancos
comerciais atuando de forma crescente em atividades de investimento, tais como
underwriting de títulos, prestação de garantias e de serviços de montagem de engenharias
financeiras complexas. Como resultado das transformações já apresentadas, tornam-se
rapidamente obsoletas as formas de organização segmentadas que não sejam resultado de
uma escolha estratégica privada. Os bancos americanos, já desde a década de 1980, vinham
87
pressionando o Congresso no sentido de permitir a diversificação de atividades,
notadamente a possibilidade de operação simultânea como bancos comerciais e bancos de
investimento, revogando-se a Lei Glass/Steagal, o que finalmente ocorreu em fins de 1999.
9.3.1 Desregulamentação e Liberalização Financeira
A integração crescente da economia mundial, em contraposição ao isolacionismo e
ao protecionismo que floresceram nas primeiras décadas do século XX, tem sido um
objetivo explícito da comunidade de países capitalistas desde o final da Segunda Guerra
Mundial. Essa integração, contudo, até recentemente, foi entendida em sentido mais
restrito, abrangendo basicamente as operações de comércio internacional.
O forte movimento de expansão de empresas multinacionais, especialmente as
industriais, a partir da década de 1950, mostrou aspectos mais complexos da questão da
integração, notadamente aqueles referentes às limitações do conceito de soberania nacional.
Superados em grande parte esses problemas, mas não inteiramente, pela generalização do
fenômeno do investimento direto estrangeiro, colocou-se, particularmente a partir dos anos
1980, uma nova dimensão da questão da integração da economia mundial, com a
emergência do conceito de globalização.
Ao contrário dos movimentos anteriores de internacionalização e integração
econômica através da liberalização dos fluxos comerciais e de capitais de risco, a
globalização implica uma redução sensivelmente maior da soberania nacional. Isto porque,
enquanto a internacionalização anteriormente praticada limitava-se a abrir as economias
nacionais à penetração de capitais estrangeiros, a globalização implica um movimento
adicional, de redução das diferenças de natureza legal e institucional entre aquelas
economias. Globalização implica equalização de condições de operação e, com isso, a
tendência à unificação dos mercados.
Em nenhum outro setor da atividade econômica, o processo de globalização avançou
tanto quanto no setor financeiro. A tendência de globalização financeira corresponde a um
processo de redução das barreiras entre os mercados financeiros domésticos e as atividades
dos centros financeiros internacionais. Em consequência, houve uma crescente penetração
e participação das instituições financeiras transnacionais nos diversos países do mundo.
88
9.3.2 Outras Tendências Financeiras Internacionais
A formação de parcerias entre bancos estrangeiros e bancos nacionais, visando
soluções criativas na disputa estratégica entre a ênfase ao negócio principal e a
necessidade de satisfazer a exigências mais complexas dos clientes (“full-line
strategy versus focus strategy”);
O papel fundamental das instituições financeiras no futuro será coletar e processar
informações para seus clientes, e não mais atuar apenas como intermediadoras de
recursos financeiros. Neste sentido, as instituições financeiras “desembrulharão e
re-empacotarão” seus serviços quantas vezes forem necessárias, de modo a
flexibilizar a construção de portfólios que atendam às necessidades específicas de
cada cliente;
9.3.3 Os Mercados Financeiros Internacionais e as crises bancárias
7
Desde que o sistema de Brettons Woods de taxas fixas de câmbio foi abandonado no
início dos anos 1970, o setor bancário parece ter saltado de um drama para outro, inclusive
a crise da dívida latino-americana, o fiasco de US$ 150 bilhões do sistema americano de
poupança e empréstimo (S&L) e um excesso de empréstimos relacionados a imóveis, que
forçou governos escandinavos a socorrer porções de seus sistemas bancários.
8
Além de tudo isso, ocorreram alguns problemas individuais muito sérios, como o
colapso do Barings Bank da Grã-Bretanha em fevereiro de 1995, depois que um corretor
abriu um rombo de US$ 1,4 bilhão em seu balancete, as perdas do Crédit Lyonnais, banco
estatal francês, de US$ 4,2 bilhões em 1992-94, ou ainda as perdas do Banco do Brasil, de
7
As crises bancárias e eventos de quebras em mercados financeiros especulativos têm sido recorrentes em diversos
momentos da história. Um dos primeiros episódios registrados ocorreu com a febre das tulipas, processo
especulativo que se desenvolveu na Holanda no século XVII (1634 a 1637), envolvendo a comercialização de
opções de compra e venda de tulipas (assim como a comercialização de bulbos de tulipa). À medida que se
transacionavam as opções, mas não as próprias tulipas, os preços daquelas acabaram se descolando do valor das
tulipas e a crise resultante ocasionou enormes perdas para os produtores e investidores nesse mercado (Sandroni,
2005).
8
Antes dessa época, seria impossível não registrar a terça-feira negra (black Tuesday), dia 29/10/1929, data da
grande quebra da Bolsa de Valores de Nova York, quando o volume de transações dobrou e o Dow Jones caiu, no
início do pregão, de 252 para 238 e, no encerramento, para 212 (queda de 23% em dois dias) (Sandroni, 2005).
Depois dessa época, verificou-se a segunda feira negra (black Monday), dia 19 de outubro de 1987, quando o Dow
Jones caiu 508 pontos na Bolsa de Nova York (queda de 22,6% em um único dia), provocando um início de pânico,
na medida em que os aplicadores acreditavam que estava se iniciando uma crise semelhante à de 1929, fato que, na
realidade, não aconteceu (idem, ibidem).
89
R$ 7 bilhões (valor equivalente em US$) no primeiro semestre de 1996, associadas com a
taxa de inadimplência do Banco, que atingiu 18,7% das suas operações de crédito. Em
março de 1996, o governo italiano anunciou um plano de ajuda de emergência ao Banco di
Napoli, depois que a instituição perdeu US$ 2 bilhões em 1995.
Até 1990, o Japão tinha a imagem de ser imune a dores de cabeça bancárias, mas,
desde então, seu sistema - que incluía muitos dos maiores bancos do mundo - também
transpareceu seus problemas. No fim de março/96, os 21 maiores bancos daquele país
anunciaram US$ 86 bilhões de provisões contra suas dívidas de pagamento duvidoso.
Muitas delas são herança da bolha econômica do país, que arrebentou no início dos anos
90
9
.
O que levou tantos bancos a entrar em crise num espaço relativamente tão curto de
tempo? Parte da resposta é que, desde meados até o final dos anos 1980, as taxas de juro
das economias que depois sofreram crises bancárias permaneceram relativamente baixas,
enquanto suas economias se tornavam vigorosas. Ao mesmo tempo, a desregulamentação
eliminou normas que haviam anteriormente limitado a competição no setor bancário. O
resultado, sob o impulso do crédito, foi uma explosão nos preços dos imóveis e ações, o que
encorajou os banqueiros a emprestar a todos os que se apresentaram. Quando a taxa de
juros cresceu bruscamente em 1989, perfurando a bolha, numerosos tomadores de recursos
começaram a atrasar os pagamentos, e bancos de muitos países submergiram rapidamentesob dívidas de pagamento duvidoso.
O risco sistêmico surge se a falência do primeiro banco levar depositantes que têm
dúvidas a respeito da solidez financeira de outros bancos a correr para eles também. Isso
também pode ter um efeito devastador sobre a economia real. Enquanto lutam para se
manter à tona, os bancos pedem o pagamento de seus empréstimos pendentes e se recusam
a fazer novos, criando uma escassez de crédito que pode agravar um declínio econômico.
Foi precisamente isso que aconteceu nos anos 30. Entre 1930 e 1933, cerca de 9 mil bancos
americanos caíram como pinos de boliche; em 1931, na Europa, o colapso do Kreditanstalt,
maior banco da Áustria, também levou a uma série de outras falências. Elas tornaram
9
A década de 1980 esteve associada a uma explosão da bolsa de valores no Japão: o índice Nikkei, que consiste em
indicador dos preços das ações japonesas, subiu de 7 mil pontos em 1980 para 35 mil pontos no final de 1989.
Então, no período de dois anos, o índice caiu abruptamente (diminuiu para 16 mil no final de 1992 e permaneceu
baixo pelo restante da década de 1990 e início do século XXI.
90
“Grande” a Depressão. Não admira que os governos estejam ansiosos para garantir que
essa história não se repita.
Para enfrentar o risco sistêmico, os governos desenvolveram uma abordagem tripla.
A primeira via é estabelecer um emprestador de última instância, geralmente o banco
central de um país, que fornecerá a liquidez durante a crise financeira, seja a bancos
individuais, seja ao sistema como um todo.
A segunda via é oferecer garantia de depósito, principalmente depósitos pequenos,
seja no total ou em parte, de forma a reduzir a probabilidade de uma corrida, caso os
clientes suspeitem que o banco está em dificuldades. O problema com uma rede de garantia
é que os bancos são tentados a assumir grandes riscos, sabendo que os contribuintes
arcarão com a conta se falirem. Isto cria um dilema chamado de “risco moral” para os
governos, pois, sem uma rede, as falências de bancos podem devastar uma economia; com
ela, o número de bancos que assumem riscos excessivos pode aumentar. Para resolver o
dilema, os governos confiam no terceiro aspecto de sua estratégia: regulamentação e
fiscalização.
Como outra forma de autodefesa, os bancos também desenvolveram seus próprios
sistemas sofisticados de administração de risco, tanto nos negócios de empréstimos quanto
na compra e na venda de valores mobiliários.
Ao mesmo tempo, os bancos continuaram a se diversificar para além de seus
negócios corriqueiros de empréstimos. Isso faz sentido porque o papel deles como
intermediários está sendo solapado pelos mercados de ações, que colocam emprestadores e
tomadores em contato direto. É por isso que muitas instituições norte-americanas e
japonesas instalaram áreas de underwriting e negociação de ativos em subsidiárias
legalmente distintas, conseguindo desta forma contornar parcialmente as restrições legais
que separam os bancos comerciais dos bancos de investimentos em ambos os países. Na
Europa, onde há longo tempo os bancos atuam em ambos os campos, a compra e venda de
valores mobiliários está ficando maior. Outra forma de diversificação, a bancassurance -
ligações entre bancos e companhias de seguros - continua a todo vapor.
Coeficientes maiores de capital, sistemas de administração de riscos e diversificação
são fatores que estão criando um sistema bancário mais ajustado.
91
9.4 O Mercado de Títulos
Títulos são emitidos por governos ou por empresas. Quando emitidos pelo governo
ou por agências governamentais, recebem o nome de títulos públicos; quando emitidos por
empresas são chamados de títulos privados.
Nos principais mercados financeiros internacionais, os títulos são classificados de
acordo com seu risco de inadimplência por empresas privadas, destacando-se a standard
and Poor’s Corporation (S&P) e a Moody’s Investors Service. A classificação dos títulos feita
pela Moody’s varia de Aaa para títulos praticamente sem risco de inadimplência, como os
emitidos pelo governo norte-americano, até C, para títulos com alto risco de inadimplência.
Uma classificação baixa em geral implica que o título deve pagar uma taxa de juros mais
elevada, pois, em caso contrário, os investidores não o comprarão. A diferença entre a taxa
de juros paga por um título e a taxa de juros paga pelo título com melhor classificação é
chamada de prêmio de risco associado ao título.
10
Os títulos que prometem um único pagamento no vencimento são chamados de
títulos com desconto (ou discount bonds ou ainda títulos com deságio). O pagamento único
recebe o nome de valor de face do título.
Os títulos que prometem pagamentos múltiplos antes do vencimento e um
pagamento no vencimento são chamados de títulos com cupom. Os pagamentos efetuados
antes do vencimento são chamados de pagamentos de cupom. O pagamento final é
chamado de valor de face do título. A razão entre os pagamentos de cupom e o valor de
face denomina-se taxa de cupom. O rendimento anual é a razão entre o pagamento de
cupom e o preço do título. Por exemplo, um título com pagamentos de cupom de $ 5 ao ano,
um valor de face de $ 100 e um preço de $ 80 tem uma taxa de cupom de 5% e um
rendimento anual de 5/80 = 0,0625 = 6,25%.
Do ponto de vista econômico, nem a taxa de cupom, nem o rendimento atual
constituem medidas interessantes. A medida correta da taxa de juros de um título é seu
rendimento até o vencimento, ou, simplesmente, rendimento. Pode-se pensar neste como a
10
O Risco Brasil, comumente veiculado em jornais e revistas especializadas, mede o prêmio de risco, em que o
título nacional é comparado a outro emitido pelo Tesouro dos Estados Unidos (considerado pelo mercado como o de
melhor classificação). Dividindo o Risco Brasil por 100, obtém-se o seu efeito sobre a taxa de juros em termos
percentuais.
92
taxa de juros média paga pelo título ao longo de sua vida (a vida de um título é quanto
tempo resta até seu vencimento).
11
O vencimento dos títulos públicos dos Estados Unidos varia de alguns dias a 30
anos. Os títulos com vencimento de até um ano a partir da emissão são chamados de letras
do Tesouro (ou T-bills). São títulos com desconto, pois efetuam apenas um pagamento no
vencimento. Os títulos com vencimento de um a dez anos a partir da emissão recebem o
nome de notas do Tesouro (Treasury Notes). Os títulos com vencimento de dez anos ou mais
a partir da emissão recebem o nome de bônus do Tesouro (Treasury Bonds). As notas e os
bônus do Tesouro são títulos com cupom.
10. O Sistema Financeiro Nacional
Sistemas financeiros são definidos pelo conjunto de mercados financeiros existentes
numa dada economia, pelas instituições financeiras participantes e suas inter-relações e
pelas regras de participação e intervenção do poder público nesta atividade. Uma
conceituação mais abrangente de sistema financeiro poderia ser a de um conjunto de
instituições dedicado ao trabalho de propiciar condições satisfatórias para a manutenção
de um fluxo de recursos entre poupadores e investidores.
O mercado financeiro, onde se processam essas transações, permite que um agente
econômico (um indivíduo ou uma empresa, por exemplo), sem perspectivas de aplicação em
algum empreendimento próprio, da poupança que é capaz de gerar (denominado agente
econômico superavitário), seja colocado em contato com outro, cujas perspectivas de
investimento superem as respectivas disponibilidades de poupança (denominado agente
econômico deficitário).
Para que possamos entenderpor que sistemas financeiros são organizados de forma
tão diferenciada nos diversos países, as qualidades e limitações de cada tipo de sistema
11
Os títulos diferem em duas dimensões básicas: a) risco de inadimplência, que é o risco de que o emissor do título
não pague o montante total prometido pelo título; b) vencimento, que é o intervalo de tempo em que o título promete
pagar seu dentor. Um título que prometa pagar $ 1.000 daqui a seis meses tem vencimento de seis meses; um título
que prometa pagar $ 100 ao ano durante os próximos 20 anos e um pagamento final de $ 1.000 ao fim desses 20
anos tem um vencimento de 20 anos. Títulos com diferentes vencimentos têm, cada um, um preço e uma taxa de
juros associada denominada rendimento até o vencimento (Yield to Maturity). Rendimentos de títulos com
vencimento curto, em geral de um ano ou menos, são chamados de taxas de juros de curto prazo. Rendimentos de
títulos com vencimento mais longo são chamados de taxas de juros de longo prazo. A relação entre rendimento e
vencimento de um título é chamada de curva de rendimento, ou estrutura a termo de taxas de juros (onde termo =
vencimento).
93
financeiro, e sua evolução, é preciso conhecer as razões materiais que levaram à criação de
cada tipo de sistema, mas também, e principalmente, sua história e a da sociedade em que
se insere.
10.1 A Evolução do Sistema Financeiro Nacional (SFN) até 1964/65
10.1.1 Do Império aos Primeiros Anos da República
O surgimento da intermediação financeira no Brasil coincide com o término do
período colonial, no decurso do qual prevaleceram ideias e procedimentos de política
econômica mercantilista, que bloqueavam quaisquer iniciativas que promovessem o
desenvolvimento da colônia, conforme os interesses da Coroa portuguesa. As grandes
companhias de comércio dominavam o cenário econômico do Brasil colonial, exercendo
grande influência, não só na distribuição como no próprio financiamento da produção
interna.
Com a transferência da família real para o Brasil, em 1808, criaram-se as pré-
condições necessárias para o surgimento da intermediação financeira no país, mediante a
constituição de bancos comerciais. Com a abertura dos portos, com a celebração de novos
acordos comerciais e com a articulação de relações econômicas e financeiras com a Europa,
as colônias africanas e asiáticas e diversos países sul-americanos, tornou-se necessária a
implantação de um mercado financeiro capaz de dar assistência às atividades de
importação e exportação.
Estabelecidas estas pré-condições, foi então criada, em outubro de 1808, a primeira
instituição financeira do país, o Banco do Brasil, cujas operações seriam iniciadas só um
ano depois, em 1809, devido, principalmente, às dificuldades de subscrição do capital
mínimo requerido para o início de suas atividades. As operações permitidas abrangiam,
privilegiadamente, o desconto de letras de câmbio, o depósito de metais preciosos, papel-
moeda e diamantes, a emissão de notas bancárias, a captação de depósitos a prazo, o
monopólio da venda de diamantes, pau-brasil e marfim e o direito exclusivo das operações
financeiras do governo.
Devido ao fraco desempenho da economia de exportação no início do Império e
ainda ao fato do Banco do Brasil converter-se em fornecedor de recursos não lastreados
94
para o governo, a continuidade de suas operações tornou-se insustentável com a volta de
Dom João VI a Portugal em 1821. Esse monarca teria recambiado para Portugal boa parte
do lastro metálico depositado no banco, com o que se enfraqueceu a já abalada confiança
nessa primeira instituição financeira no país. Oito anos depois, em 1829, após insustentável
período crítico, seria autorizada a liquidação do primeiro Banco do Brasil, cujas operações
se encerraram definitivamente em 1835, a despeito das muitas tentativas empreendidas
para evitar sua extinção.
Em vez de cumprir funções básicas de intermediação para o crescimento das
atividades produtivas internas, este banco converteu-se em fornecedor de recursos para
pagar as despesas governamentais, basicamente decorrentes das compensações devidas a
Portugal em função do reconhecimento da independência do Brasil, das despesas militares
com a guerra no sul do país (anexação da Província Cisplatina) e dos gastos com a criação
de um exército e de uma marinha de guerra (Lopes & Rossetti, p.308).
Em 1833, foi aprovada a criação de um segundo Banco do Brasil. Mas, em virtude
dos traumas decorrentes do insucesso da experiência pioneira, não se conseguiu a
subscrição do capital mínimo exigido para sua instalação.
Em 1836 foi estabelecido o primeiro banco comercial privado do país, o Banco do
Ceará, que, entretanto, encerrou suas atividades em 1839, basicamente em função da
concessão de créditos a longo prazo, sem que houvesse captações de recursos também
resgatáveis a longo prazo.
Havia, entretanto, condições para que se implantassem no país atividades de
intermediação financeira, sobretudo se ligadas ao setor cafeeiro e aos projetos
financeiramente viáveis no setor de infraestrutura econômica. Assim, em 1838, um grupo
privado criou e estabeleceu o Banco Comercial do Rio de Janeiro. A solidez e o crescimento
dessa instituição ensejaram o surgimento, em outras praças, de outras instituições
congêneres, como o Banco da Bahia (1845), o Banco do Maranhão (1847) e o Banco de
Pernambuco (1851).
Também em 1851 foi constituído o terceiro Banco do Brasil (o segundo a funcionar
com este nome), por iniciativa do Barão de Mauá. Dois anos depois, em 1853, verificar-se-ia
no país a primeira experiência de fuso bancária: os Bancos Comerciais do Rio de Janeiro e
do Brasil fundiam-se com o objetivo de criar um novo estabelecimento, sob a denominação
95
de Banco do Brasil (o quarto estabelecimento sob esta denominação e o terceiro a funcionar
efetivamente). Surgiram, na mesma época, novas casas bancárias, também com autorização
para emissão de notas bancárias, como o Banco Comercial e Agrícola e o Banco Rural e
Hipotecário (ambos no Rio de Janeiro), o Banco da Província do Rio Grande do Sul e o
Banco Comercial do Pará.
A partir do início da década de 1860, as atividades de intermediação financeira no
país seriam ampliadas, com a chegada dos primeiros bancos estrangeiros. Os dois
primeiros (ambos em 1863) foram o London & Brazilian Bank e o The Brazilian and
Portuguese Bank. À mesma época (1866), capitalistas alemães fundaram o Deutsche
Brasilianische Bank, cujas atividades foram encerradas em 1875, após acirrada
concorrência com os bancos ingleses que operavam no país.
No final do Império, a libertação dos escravos (1888) alterou substancialmente a
ordem econômica e financeira do país. A liberdade concedida a 800.000 escravos aniquilou
fortunas rurais, motivou perdas de 40% a 50% das colheitas, provocou a escassez e a
inflação e motivou um primeiro surto de industrialização. Ainda no Império, para atender
às pressões por maior volume de crédito, em virtude da expansão da massa salarial e das
necessidades de financiamento dos novos empreendimentos, o poder emissor, que se
encontrava a cargo do Tesouro, foi estendido aos bancos.
Este clima econômico e financeiro prosseguiu nos primeiros anos do governo
republicano. Embora a criação de meios de pagamento tenha sido redisciplinada, a
expansão imoderada de crédito não foi interrompida. No entanto, em seguida a um curto
período de crescimento acelerado, não tardaram a aparecer focos de especulação. Houve o
encilhamento (1889/91)
12
, período caracterizado pela galopante expansão dos meios de
pagamento, pela excitação das atividadesde intermediação financeira e por decorrente
surto inflacionário.
12
Encilhamento. Política financeira de estímulo à indústria, adotada por Rui Barbosa quando ministro da Fazenda
(novembro de 1889 a janeiro de 1991), após a proclamação da República. Baseava-se no incremento do meio
circulante com a criação de bancos emissores (tendo como lastro não libras-ouro, mas títulos da dívida pública),
cujos empréstimos teriam de ser aplicados apenas no financiamento de novas empresas industriais (e não na
agricultura). Com créditos, garantias oficiais e um ambiente psicológico favorável, a Bolsa de Valores do Rio de
Janeiro entrou em intensa atividade e a política do ministro foi popularmente identificada com o encilhamento dos
cavalos logo antes da largada na pista dos hipódromos, quando a atividade dos apostadores se torna frenética
(Sandroni, 2005).
96
Após o Encilhamento, o país foi conduzido a uma fase de contra-reforma (1892-
1906), caracterizada, nos três primeiros anos, por um esforço de estabilização e, nos dois
anos subsequentes, por breve relaxamento da austeridade implantada e, finalmente, já
então na virada do século, por generalizada recessão.
Os esforços de estabilização pós-encilhamento levaram o sistema bancário do país,
inclusive o Banco do Brasil, a enfrentar dificuldades operacionais. Resultaram daí novas
fusões bancárias, envolvendo o próprio Banco do Brasil, que em 1892 se incorporou ao
Banco da República dos Estados Unidos do Brasil, resultando no Banco da República do
Brasil. Verificaram-se outras fusões e incorporações, notadamente nos cinco primeiros
anos do século, quando, então, não resistindo à recessão econômica do período, muitas
casas bancárias foram liquidadas. O próprio Banco da República do Brasil (o quarto a
funcionar) foi também liquidado em 1905.
A partir de 1906, ao final da crise financeira do início do século, a intermediação
financeira no país voltou gradativamente à normalidade. Nesse ano foram reativadas as
operações do Banco do Brasil, o quinto a funcionar sob esta denominação (Lopes &
Rossetti, p.310).
10.2 O Período das Guerras e da Depressão
O período que se estende de 1914 a 1945 apresentou considerável importância no
quadro da intermediação financeira no Brasil. Entre os principais, são destacados os
seguintes: expansão do sistema de intermediação financeira de curto e médio prazos no
país; disciplinamento, integração e ampliação do nível de segurança da intermediação
financeira no país, mediante a criação da Inspetoria Geral dos Bancos (1920),
posteriormente substituída pela Caixa de Mobilização e Fiscalização Bancária (1942), a
instalação da Câmara de Compensação (1921) e a implantação da Carteira de Redescontos
do Banco do Brasil (1921); elaboração de projetos com vista à criação de instituições
especializadas no financiamento de longo prazo. Mas a vigência da Lei da Usura, de 1933,
que estabelecia um teto máximo de 12% ao ano para a taxa nominal de juros, teria
retardado o surgimento espontâneo de intermediários financeiros bancários ou não
bancários dispostos a operar a longos prazos em um contexto de inflação crescente (a
criação do Banespa, em São Paulo, e do Banrisul (então BERGS), no Rio Grande do Sul,
97
ocorreu nessa época); início de estudos e esforços convergentes para a criação de um Banco
Central no país.
A captação de recursos e os empréstimos concedidos pelos bancos comerciais
elevaram-se de forma consistente durante todo o período, não obstante a interrupção (não
muito acentuada) nos anos da Grande Depressão.
10.3 Do Pós-Guerra às Reformas de 1964-65
O período que se estende de 1945 a 1964 é geralmente considerado como de
transição entre a estrutura ainda simples de intermediação financeira que se firmou ao
longo da primeira metade do século e a complexa estrutura montada a partir das reformas
institucionais de 1964-65. Nesses vinte anos de transição, em paralelo às mudanças que se
observaram em toda a estrutura da economia do país, o sistema financeiro nacional foi
objeto de marcantes transformações.
As principais foram: a consolidação e penetração no espaço geográfico da rede de
intermediação financeira de curto e médio prazos, com a expansão do número de agências
bancárias nas diferentes regiões do país; a implantação de órgão normativo, de assessoria e
de fiscalização do sistema financeiro, como primeiro passo para a criação de um banco
central no país, a Superintendência da Moeda e do Crédito - SUMOC; a criação de uma
instituição de fomento, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico - BNDE, para a
centralização e a canalização de recursos de longo prazo, inicialmente destinados à
implantação de infraestrutura no país; a criação de instituições financeiras de apoio a
regiões carentes, como o Banco do Nordeste do Brasil - BNB, o Banco de Crédito da
Amazônia e, já no final do período, o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul -
BRDE; desenvolvimento espontâneo de companhias de crédito, financiamento e
investimento, para a captação e aplicação de recursos em prazos compatíveis com a
crescente demanda de crédito para o consumo de bens duráveis e bens de capital, em
decorrência da implantação de novos setores industriais no país, produtores desses bens
(Lopes; Rossetti, p.315).
98
10.4 Arrecadação de Tributos e Pagamento de Benefícios
Até a década de 60, quase todo o relacionamento entre população e órgãos públicos
era feito diretamente entre as partes. Cada entidade mantinha a própria estrutura para
arrecadação de impostos e taxas de serviços, ou para o pagamento de benefícios. Assim, na
maioria dos municípios, eram mantidas as Coletorias Federais e Estaduais. As empresas de
serviços públicos (luz, água, gás e telefone), por sua vez, mantinham órgãos específicos para
a arrecadação das taxas que lhes eram devidas. Por outro lado, os bancos constituíam-se
em pequenas redes de agências, voltadas basicamente para os serviços de depósitos e
descontos.
As funções de caixa e empréstimo a clientes eram os objetivos únicos da empresa
bancária. Com o desenvolvimento da sociedade brasileira, a crescente complexidade das
relações econômicas e o aumento na execução de serviços públicos e na concessão de
benefícios, os sistemas de arrecadação próprios passaram a consumir recursos crescentes.
Por outro lado, para os bancos, o desenvolvimento da economia possibilitou a disseminação
de sua rede de agências por todo o território nacional, para atender à crescente necessidade
de transferência de ativos financeiros entre as entidades econômicas. Estruturados para
processar com rapidez as transferências de numerário, os bancos passaram a substituir as
coletorias e postos de recebimento de taxas de serviços públicos e pagamentos de benefícios,
servindo de intermediários entre os órgãos públicos e o contribuinte.
10.4 As Reformas de 1964-65 e a Evolução Posterior do SFN
A próxima fase da evolução da intermediação financeira no país inicia-se no biênio 1964-
65, com quatro leis, que introduziram profundas alterações na estrutura do sistema
financeiro nacional:
1. Lei n. 4.357, de 1964 (Lei da Correção Monetária), que instituiu normas para a
indexação de débitos fiscais, criou títulos públicos federais com cláusula de correção
monetária (ORTN), destinados a antecipar receitas, cobrir déficit público e
promover investimentos. Esta foi a solução buscada para o problema da limitação
da taxa de juros em 12% ao ano, imposta pela Lei da Usura, ao lado da persistência
de inflação anual acima desse patamar, o que limitava a capacidade do poder
99
públicofinanciar-se mediante a emissão de títulos próprios, restando-lhe apenas a
emissão primária de moeda.
2. Lei n. 4.380, de 21.08.64 (Lei do Plano Nacional da Habitação), que instituiu a
correção monetária nos contratos imobiliários, criou o Banco Nacional da
Habitação - BNH e institucionalizou o Sistema Financeiro da Habitação, criou as
Sociedades de Crédito Imobiliário e as Letras Imobiliárias. O BNH tornou-se o
órgão gestor do Sistema Brasileiro de Habitação (também denominado Sistema
Brasileiro de Poupança e Empréstimo-SBPE), destinado a fomentar a construção de
casas populares e obras de saneamento e infraestrutura urbana, com moeda própria
(UPC-Unidade Padrão de Capital) e seus próprios instrumentos de captação de
recursos: Letras Hipotecárias, Letras Imobiliárias e Cadernetas de Poupança.
Posteriormente, a esses recursos foram adicionados os do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço-FGTS. Esta lei buscou incentivar a criação de empregos na
construção civil, como solução para o emprego de mão-de-obra não qualificada, no
cenário econômico de recessão que caracterizou os anos 1960.
3. Lei n. 4.595, de 31.12.64 (Lei da Reforma do Sistema Financeiro Nacional), que
dispôs sobre a política e as instituições monetárias, bancárias e creditícias, criou o
Conselho Monetário Nacional-CMN e o Banco Central do Brasil e foi a base da
reforma bancária, reestruturando o sistema financeiro nacional, mediante o
estabelecimento de normas operacionais, rotinas de funcionamento e procedimentos
de qualificação aos quais as entidades do sistema deveriam se subordinar, bem como
definiu as características e as áreas específicas de atuação das instituições
financeiras. Esta lei reordenou os órgãos de aconselhamento e de gestão da política
monetária, do crédito e das finanças públicas, até então concentrados no Ministério
da Fazenda, na Superintendência da Moeda e do Crédito-SUMOC e no Banco do
Brasil, estrutura esta que não mais suportava os crescentes encargos e
responsabilidades da condução da política econômica.
4. Lei n. 4.728, de 14.07.65 (Lei do Mercado de Capitais), que disciplinou e reformou o
mercado de capitais, bem como estabeleceu medidas para seu desenvolvimento.
Estabeleceu normas e regulamentos básicos para a estruturação de um sistema de
investimentos destinado a apoiar o desenvolvimento nacional e atender à crescente
100
demanda por crédito. O problema de popularização do investimento estava contido
na nítida preferência dos investidores por imóveis de renda e de reserva de valor.
Ao governo interessava a evolução dos níveis de poupança internos e o seu
direcionamento para investimentos produtivos.
A partir desses institutos legais, o sistema financeiro brasileiro passou a contar com
maior e mais diversificado número de intermediários financeiros não bancários, com áreas
específicas e bem determinadas de atuação. Ao mesmo tempo, foi significativamente
ampliada a pauta de ativos financeiros, abrindo-se novo leque de opções para captação e
aplicação de poupanças e criando-se, assim, condições mais efetivas para a ativação do
processo de intermediação.
As reformas bancária e do mercado de capitais foram inspiradas no sistema norte-
americano de organização do sistema financeiro, voltando-se para a especialização das
instituições
13
. Apesar desta opção, em virtude de condicionamentos econômicos e, em
especial, da necessidade de buscar economia de escala e melhor racionalização do sistema,
os bancos comerciais passaram a assumir o papel de líderes de grandes conglomerados, no
âmbito do qual atuavam coordenadamente diversas instituições especializadas nas
diferentes modalidades financeiras que, embora com grande número de pequenos bancos
regionais, passaram a deter o maior volume de negócios de intermediação financeira e
prestação de serviços.
Nos anos subsequentes foram instituídas outras leis importantes para o
reordenamento institucional do Sistema Financeiro Nacional, quais sejam:
Lei n. 6385, de 1976 (Lei da CVM), que criou a Comissão de Valores Mobiliários-
CVM, transferindo do Banco Central a responsabilidade pela regulamentação e
fiscalização das atividades relacionadas ao mercado de valores mobiliários (ações,
debêntures etc.). Esta lei deu solução à falta de uma entidade que absorvesse a
regulação e fiscalização do mercado de capitais, especialmente no que se referia às
sociedades de capital aberto.
13
Ato Bancário de 1933 (Banking Act of 1933). Reforma da legislação bancária efetuada pelo Congresso dos
Estados Unidos, para reduzir a instabilidade financeira do sistema bancário norte-americano durante a grande
depressão dos anos 1930. O ato deu controle efetido da política monetária à Junta de Governadores da Reserva
Federal, criando o Comitê Federal de Open Market e o Federal Deposit Insurance Corporation. Os itens 16,20,21 e
32 do Ato, separando os bancos comerciais dos bancos de investimento, são mais conhecidos como Glass-Steagall
Act.
101
Lei n. 6.404, de 1976 (Lei das Sociedades Anônimas), que estabeleceu regras quanto
às características, forma de constituição, composição acionária, estrutura de
demonstrações financeiras, obrigações societárias, direitos e obrigações de acionistas
e órgãos estatutários e legais. Esta lei veio ao encontro da necessidade de atualização
da legislação sobre as sociedades anônimas brasileiras, especialmente quanto aos
aspectos de composição acionária, negociação de valores mobiliários (ações,
debêntures etc.) e modernização do fluxo de informação.
Lei n. 10.303, de 2001 (Nova Lei das S.A.), Decreto 3.995 e MP 8 (estes de 2002), que
consolidam os dispositivos da Lei da CVM e da Lei das S.A., melhorando a proteção
aos minoritários e dando força à ação da CVM como órgão regulador e fiscalizador
do mercado de capitais, incluindo os fundos de investimento e os mercados de
derivativos. A questão associada a esta legislação é que o mercado de capitais cada
vez mais perdia espaço para o exterior pela ausência de proteção ao acionista
minoritário e insegurança quanto às aplicações financeiras.
O elenco de normas e a disciplina operacional são impostos ao sistema por meio de
resoluções, circulares, instruções e atos declaratórios, direta ou indiretamente decorrentes
de decisões do CMN. O conjunto destes atos normativos compõe o MNI - Manual de
Normas e Instruções do Banco Central do Brasil.
A estrutura do SFN emergente da reforma de 1964/65 foi a seguinte:
Sistema Financeiro Nacional: Autoridades Monetárias
Autoridades de Apoio
Instituições Financeiras
Autoridades Monetárias: Conselho Monetário Nacional: Comissões Consultivas
Banco Central do Brasil
Autoridades de Apoio: Comissäo de Valores Mobiliários
Banco do Brasil S/A
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
Instituições Financeiras: Bancos Comerciais Públicos e Privados
102
Bancos Estaduais de Desenvolvimento
Bancos Regionais de Desenvolvimento
Banco Nacional da Habitação (BNH)
Caixa Econômica Federal (CEF)
Caixas Econômicas Estaduais
Sociedades de Crédito Imobiliário
Associações de Poupança e Empréstimo
Cooperativas HabitacionaisSoc. de Créd. Financ. e Investimento
Bancos de Investimento
Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC)
Cooperativas de Crédito
Bolsas de Valores
Corretoras de Títulos e Valores Mobiliários
Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários
Seguradoras
Outras Instituições
Na cúpula do subsistema normativo encontra-se, desde então, o Conselho Monetário
Nacional. Abaixo, encontram-se o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores
Mobiliários (criada pela Lei n. 6.385, de 07.12.76). Esses órgãos normativos regulam,
controlam e fiscalizam as instituições de intermediação, disciplinando todas as modalidades
de operações de crédito, ativas e passivas, assim como a emissão e distribuição de valores
mobiliários.
Cabe ainda assinalar que se estabeleceram relações estreitas entre o subsistema
normativo e os agentes especiais do subsistema de intermediação, porque a regulação e o
controle do subsistema de intermediação não se realizam apenas por meio das normas
legais expedidas pelas autoridades monetárias, mas também "pela oferta seletiva de
crédito, levada a efeito pelo Banco do Brasil e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social" (Barbosa, op.cit. Lopes e Rossetti).
103
As demais instituições de intermediação, bancárias, não bancárias e auxiliares,
passaram a operar em segmentos específicos dos mercados monetário, de crédito, de
capitais e cambial, subordinando-se às normas emanadas dos órgãos superiores.
Atualmente, a estrutura institucional do Sistema Financeiro Nacional está composta
na forma apresentada a seguir, conforme o site do Banco Central do Brasil na internet.
Órgãos Normativos
Conselho Monetário Nacional - CMN
Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP
Conselho de Gestão de Previdência Complementar – CGPC
Entidades Supervisoras
Banco Central do Brasil – Bacen e Comissão de Valores Mobiliários – CVM
(vinculados ao CMN)
Superintendência de Seguros Privados – Susep e IRB – Brasil Resseguros
(vinculados ao CNSP)
Secretaria de Previdência Complementar – SPC (vinculada ao CGPC)
Operadores (Supervisionados pelo Bacen)
Instituições Financeiras Captadoras de Depósitos à Vista
Bancos Múltiplos (inclusive o Banco do Brasil)
Bancos Comerciais
Caixa Econômica Federal
Cooperativas de Crédito (e Bancos Cooperativos)
Demais Instituições Financeiras
Agências de Fomento
Associações de Poupança e Empréstimo
Bancos de Desenvolvimento
Bancos de Investimento
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)
104
Companhias Hipotecárias
Cooperativas Centrais de Crédito
Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento
Sociedades de Crédito Imobiliário
Sociedades de Crédito ao Microempreendedor
Outros Intermediários Financeiros e Administradores de Recursos de Terceiros
Administradores de Consórcio
Sociedades de Arrendamento Mercantil
Sociedades Corretoras de Câmbio
Sociedades Corretoras de Títulos e Valores Mobiliários
Sociedades de Crédito Imobiliário
Sociedades Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários
Operadores (Supervisionados pela CVM)
Bolsas de Mercadorias e de Futuros
Bolsas de Valores
Operadores (Supervisionados pela Susep e IRB)
Sociedades Seguradoras
Sociedades de Capítalização
Entidades Abertas de Previdência Complementar
Operadores (Supervisionados pela SPC)
Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Fundos de Pensão)
Sistemas de Liquidação e Custódia
Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC
Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos – CETIP
Caixas de Liquidação e Custódia
No que tange às instituições financeiras, a Lei da Reforma Bancária (4.595/64), art.
17, caracteriza-as da seguinte forma: “Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos
da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas e privadas, que tenham como atividade
principal ou acessória a coleta, a intermediação ou a aplicação de recursos financeiros
105
próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de
propriedade de terceiros”.
Em complemento, no seu parágrafo único, estabelece: “Para os efeitos desta Lei e da
legislação em vigor, equiparam-se às instituições financeiras as pessoas físicas que exerçam
qualquer das atividades referidas neste artigo, de forma permanente ou eventual”.
Os Órgãos Normativos do SFN
O Conselho Monetário Nacional
Como órgão normativo, por excelência, não lhe cabem funções executivas, sendo o
responsável pela fixação das diretrizes da política monetária, creditícia e cambial do País.
Pelo envolvimento destas políticas no cenário econômico nacional, o CMN acaba
transformando-se num conselho de política econômica.
Ao longo da sua existência, o CMN teve diferentes constituições de membros, de
acordo com as exigências políticas e econômicas de cada momento, desde quatro membros,
no governo Costa e Silva, até 15 membros, no governo Sarney. A Medida Provisória no.
542, de 30.06.94, que editou o Plano Real, simplificou a composição do CMN,
caracterizando seu perfil monetário, que passou a ser integrado pelos seguintes membros:
5. Ministro da Fazenda (Presidente),
6. Ministro de Planejamento, Orçamento e Gestão,
7. Presidente do Banco Central.
O CMN é a entidade superior do sistema financeiro, sendo sua competência:
adaptar o volume dos meios de pagamento às reais necessidades da economia
nacional e ao seu processo de desenvolvimento;
regular o valor interno da moeda, prevenindo ou corrigindo os surtos
inflacionários ou deflacionários de origem interna ou externa;
regular o valor externo da moeda e o equilíbrio do balanço de pagamentos do
país;
106
orientar a aplicação dos recursos das instituições financeiras públicas ou
privadas, de forma a garantir condições favoráveis ao desenvolvimento
equilibrado da economia nacional;
propiciar o aperfeiçoamento das instituições e dos instrumentos financeiros,
de forma a tornar mais eficiente o sistema de pagamento e mobilização de
recursos;
zelar pela liquidez e pela solvência das instituições financeiras;
coordenar as políticas monetária, creditícia, orçamentária, fiscal e da dívida pública
interna e externa; e estabelecer a meta de inflação.
O Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP)
É o órgão responsável por fixar as diretrizes e normas da política de seguros
privados. É composto pelo Ministro da Fazenda (Presidente), representante do Ministério
da Justiça, representante do Ministério da Previdência Social, Superintendente da
Superintendência de Seguros Privados, representante do Banco Central do Brasil e
representante da Comissão de Valores Mobiliários. Dentre as funções do CNSP estão:
regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos agentes
que exercem atividades subordinadas ao Sistema Nacional de Seguros
Privados, inclusive aplicar penalidades;
fixar itens gerais dos contratos de seguro, previdência privada aberta,
capitalização e resseguro;
prescrever os critérios de constituição das Sociedades Seguradoras, de
Capitalização, Entidades de Previdência Privada Aberta e Resseguradores,
com fixação dos limites legais e técnicos das respectivas operações e
disciplinar a corretagem de seguros e a profissão de corretor.
O Conselho de Gestão de Previdência Complementar (CGPC)
É um órgão colegiadoque integra a estrutura do Ministério da Previdência Social e
cuja competência é regular, normatizar e coordenar as atividades das Entidades Fechadas
de Previdência Complementar (fundos de pensão). Também cabe ao CGPC julgar, em
107
última instância, os recursos interpostos contra as decisões da Secretaria de Previdência
Complementar.
As Entidades Supervisoras do SFN
O Banco Central do Brasil
A Superintendência da Moeda e do Crédito, através da Lei n. 4.595, de 31.12.64, foi
transformada em autarquia federal, tendo sede e fôro na Capital da República, sob a
denominação de Banco Central do Brasil. Além da sua sede em Brasília, o BC (ou Bacen)
possui representações regionais em Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Porto
Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo. O Bacen pode ser considerado como:
banco dos bancos;
- depósitos compulsórios;
- redescontos de liquidez;
gestor do Sistema Financeiro Nacional;
- normas, autorizações, fiscalização, intervenção;
executor da política monetária;
- determinação da taxa Selic;
- controle dos meios de pagamento (liquidez do mercado);
- orçamento monetário, instrumentos de política monetária;
banco emissor de moeda;
- emissão do meio circulante;
- saneamento do meio circulante;
banqueiro do governo;
- financiamento ao Tesouro Nacional (via compra e venda de títulos públicos);
- administração da dívida pública interna e externa;
- gestor e fiel depositário das reservas internacionais do país;
- representante, junto às instituições financeiras internacionais, do Sistema
Financeiro Nacional;
centralizador do fluxo cambial;
- normas, autorizações, registros, fiscalização, intervenção.
108
Em resumo, é por meio do BC que o estado intervém diretamente no sistema
financeiro e, indiretamente, na economia.
Para poder atuar como autoridade monetária plena, o Banco Central exigiu cerca
de 25 anos de aprimoramento. As dificuldades residiam no fato de, até a sua criação, as
funções de banco central estarem sendo exercidas pela Superintendência da Moeda e do
Crédito, pelo Banco do Brasil e pelo Tesouro Nacional.
A Sumoc tinha a finalidade de exercer o controle monetário, a fiscalização dos
bancos comerciais e a orientação da política cambial. O Banco do Brasil era o executor das
normas estabelecidas pela Sumoc e exercia as funções de Banco do Governo Federal,
controlador das operações de comércio exterior, recebedor dos depósitos compulsórios e
voluntários dos bancos comerciais e, ainda, Banco de crédito agrícola, comercial e
industrial. O Tesouro Nacional era o órgão emissor de papel-moeda.
Assim, o Banco Central do Brasil era o banco emissor, mas realizava as emissões em
função das necessidades do Banco do Brasil. Era também o banco dos bancos, mas não
detinha com exclusividade os depósitos das instituições financeiras. Era agente financeiro
do Governo, pois fora encarregado de administrar a dívida pública federal, mas não era o
caixa do Tesouro Nacional, tendo em vista que esta função era atribuída ao Banco do
Brasil. Também era o órgão formulador e executor da política de crédito, mas não tinha o
pleno controle do crédito, porque outros organismos governamentais tinham idêntico
poder.
Operacionalmente, os recursos do Banco Central eram acessados automaticamente
pelo Banco do Brasil, através da “Conta Movimento”, para expansão do crédito e para o
custeio do Governo. Até 1988, as funções de autoridade monetária exercidas pelo Banco do
Brasil foram progressivamente transferidas ao Banco Central, e as atividades de
administração da dívida pública federal, que vinham sendo exercidas pelo Banco Central,
foram transferidas ao Tesouro Nacional.
A Comissão de Valores Mobiliários
A Comissão de Valores Mobiliários-CVM foi criada pela Lei 6.385, em 07/12/1976, e
ficou conhecida como a Lei da CVM, pois, até aquela data, faltava uma entidade que
109
absorvesse a regulação e a fiscalização do mercado de capitais, especialmente no que se
referia às sociedades de capital aberto.
A CVM fixou-se, portanto, como um órgão normativo do sistema financeiro,
especificamente voltado para o desenvolvimento, a disciplina e a fiscalização do mercado de
valores mobiliários não emitidos pelo sistema financeiro e pelo Tesouro Nacional -
basicamente, o mercado de ações e debêntures, cupões desses títulos e bônus de subscrição.
É uma entidade auxiliar, autônoma e descentralizada, mas vinculada, como autarquia, ao
Governo Federal.
A Lei 10.303, mais popularmente conhecida como a Nova Lei das S.A., editada em
30/01/2001 consolidou e alterou os dispositivos da Lei 6.404, de 15/12/1976, Lei das
Sociedades Anônimas, da Lei da CVM e das pequenas modificações em ambas
introduzidas, anteriormente, pela Lei 9.457, de 15/05/1997.
Os poderes fiscalizatório e disciplinador da CVM foram ampliados para incluir as
Bolsas de Mercadorias e Futuros, as entidades do mercado de balcão organizado e as
entidades de compensação e liquidação de operações com valores mobiliários que, da
mesma forma que a Bolsa de Valores, funcionam como órgãos auxiliares da Comissão de
Valores Mobiliários.
Elas operam com autonomia administrativa, financeira e patrimonial e
responsabilidade de fiscalização direta de seus respectivos membros e das operações com
valores mobiliários que nelas realizadas, mas, sempre, sob a supervisão da CVM.
Sob a disciplina e a fiscalização da CVM foram consolidadas as seguintes
atividades:
emissão e distribuição de valores mobiliários no mercado;
negociação e intermediação no mercado de valores mobiliários;
negociação e intermediação no mercado de derivativos;
organização, funcionamento e operações das Bolsas de Valores;
organização, funcionamento e operações das Bolsas de Mercadorias e Futuros;
auditoria das companhias abertas;
serviços de consultor e analista de valores mobiliários.
110
Redefiniram-se os valores mobiliários sujeitos ao regime da nova Lei, como sendo:
ações, debêntures e bônus de subscrição;
cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento de
valores mobiliários;
certificados de depósito de valores mobiliários;
cédulas de debêntures;
cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de
investimento em quaisquer ativos;
notas comerciais;
contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam
valores mobiliários;
outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e,
quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de
investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de
remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos
advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.
Foram textualmente excluídos do regime da nova Lei:
os títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal;
os títulos cambiais de responsabilidade de instituição financeira, exceto as
debêntures.
Em resumo, sob a ótica da Bovespa e da SOMA (Sociedade Operadora do Mercado
de Ativos), a CVM tem por objetivos fundamentais: a) estimular a aplicação de poupança
no mercado acionário; b) assegurar o funcionamento eficiente e regular das bolsas de
valores e de outras instituições auxiliares que operam nesse mercado; c) proteger os
titulares de valores mobiliários (notadamente os pequenos e minoritários) contra emissões
irregulares e outros tipos de atos ilegais, que manipulem preços de valores mobiliários nos
mercados primário e secundário de ações; d) fiscalização da emissão, do registro, da111
distribuição e da negociação de títulos emitidos pelas sociedades anônimas de capital
aberto.
A Superintendência de Seguros Privados (Susep)
É autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda, responsável pelo controle e
fiscalização do mercado de seguro, previdência aberta e capitalização. Dentre suas
atribuições estão:
fiscalizar a constituição, organização, funcionamento e operação das
sociedades seguradoras, de capitalização, entidades de previdência privada
aberta e resseguradores, na qualidade de executora da política traçada pelo
CNSP;
atuar no sentido de proteger a captação de poupança popular que se efetua
através das operações de seguro, previdência privada aberta, de
capitalização e resseguro;
zelar pela liquidez e solvência das sociedades que integram o mercado;
disciplinar e acompanhar os investimentos daquelas entidades, em especial os
efetuados em bens garantidores de provisões técnicas;
cumprir e fazer cumprir as deliberações do CNSP e exercer as atividades por
este lhe delegadas;
prover os serviços de secretaria executiva do CNSP.
O Instituto de Resseguros do Brasil (IRB)
É sociedade de economia mista, com controle acionário da União, jurisdicionada ao
Ministério da Fazenda, que conta com o objetivo de regular o cosseguro, o resseguro e a
retrocessão, além de promover o desenvolvimento das operações de seguros no país.
A Secretaria de Previdência Complementar (SPC)
É um órgão do Ministério da Previdência Social, responsável por fiscalizar as
atividades das entidades fechadas de previdência complementar (fundos de pensão). A SPC
se relaciona com os órgãos normativos do sistema financeiro na observação das exigências
legais de aplicação das reservas técnicas, fundos especiais e provisões que as entidades sob
112
sua jurisdição são obrigadas a constituir e que tem diretrizes estabelecidas pelo Conselho
Monetário Nacional. À SPC compete:
propor as diretrizes básicas para o Sistema de Previdência Complementar;
harmonizar as atividades das entidades fechadas de previdência privada com
as políticas de desenvolvimento social e econômico-financeira do Governo;
fiscalizar, supervisionar, coordenar, orientar e controlar as atividades
relacionadas com a previdência complementar fechada;
analisar e aprovar os pedidos de autorização para constituição,
funcionamento, fusão, incorporação, grupamento, transferência de controle
das entidades fechadas de previdência complementar, bem como examinar e
aprovar os estatutos das referidas entidades, os regulamentos dos planos de
benefícios e suas alterações;
examinar e aprovar os convênios de adesão celebrados por patrocinadores e
por instituidores, em como autorizar a retirada de patrocínio e decretar a
administração especial em planos de benefícios operados pelas entidades
fechadas de previdência complementar, bem como propor ao Ministro a
decretação de intervenção ou liquidação das referidas entidades.
Alguns Operadores do SFN
Os Bancos Múltiplos
Após as reformas do início dos anos 1960, a mais significativa mudança introduzida
no Sistema Financeiro Nacional foi a instituição dos Bancos Múltiplos, pela Resolução n.
1.524, de 21.09.1988, do Banco Central do Brasil. Por esta resolução, foi facultado aos
bancos comerciais, bancos de desenvolvimento, bancos de investimento, sociedades de
crédito imobiliário e sociedades de crédito, financiamento e investimento a organização
opcional em uma única instituição financeira, através de processos de fusão, incorporação,
cisão e transformação - ou ainda por constituição direta. Os bancos múltiplos passaram a
operar em todos os segmentos do sistema de intermediação financeira, mediante as
seguintes carteiras especiais, sem vinculação entre as fontes de recursos captados e as suas
aplicações:
113
carteira comercial;
carteira de desenvolvimento (no caso de bancos múltiplos públicos);
carteira de investimentos (no caso de bancos múltiplos privados);
carteira de crédito imobiliário;
carteira de crédito, financiamento e investimento;
carteira de arrendamento mercantil.
O Banco do Brasil
O Banco do Brasil (BB) teve uma função típica de autoridade monetária até janeiro
de 1986, quando, por decisão do CMN, foi suprimida a conta movimento, que colocava o BB
na posição privilegiada de banco co-responsável pela emissão de moeda, via ajustamento
das contas das autoridades monetárias e do Tesouro Nacional.
No período do pós-guerra até as reformas de 1964-65, a despeito da criação da
SUMOC, o Banco do Brasil continuou exercendo funções executivas de autoridade
monetária, atuando como banco dos bancos, agente financeiro do governo, depositário e
administrador das reservas internacionais do país e emprestador de última instância do
sistema financeiro.
Após as reformas de 1964-65, o Banco do Brasil perdeu a maior parte das
atribuições típicas de um banco central, como a Carteira de Redescontos, a Caixa de
Mobilização Bancária, a concessão de créditos ao Tesouro Nacional. Com a reforma de
1986, e as consequentes redefinições de papéis do Bacen e do Banco do Brasil, este passou a
operar sob padrões bem próximos de um banco comercial qualquer. Hoje, o BB é um
conglomerado financeiro de ponta, que, aos poucos, se ajustou à estrutura de um banco
múltiplo tradicional, embora ainda opere, em muitos casos, como agente financeiro do
Governo Federal. É o principal executor da política oficial de crédito rural. Conserva,
ainda, funções que não são próprias de um banco comercial comum, mas típicas do
parceiro principal do governo federal na prestação de serviços bancários, como:
administrar a Câmara de Compensação de cheques e outros papéis;
efetuar os pagamentos e suprimentos necessários à execução do Orçamento
Geral da União;
114
a aquisição e o financiamento dos estoques de produção exportável;
agenciamento dos pagamentos e recebimentos fora do país;
a execução da política de preços mínimos dos produtos agropastoris;
a execução do serviço da dívida pública consolidada;
a realização, por conta própria, de operações de compra e venda de moeda
estrangeira e, por conta do BC, nas condições estabelecidas pelo CMN;
o recebimento, a crédito do Tesouro Nacional, das importâncias provenientes
da arrecadação de tributos ou rendas federais; e,
como principal executor dos serviços bancários de interesse do Governo
Federal, inclusive suas autarquias, receber em depósito, com exclusividade,
as disponibilidades de quaisquer entidades federais, compreendendo as
repartições de todos os ministérios civis e militares, instituições de
previdência e outras autarquias, comissões, departamentos, entidades em
regime especial de administração e quaisquer pessoas físicas ou jurídicas
responsáveis por adiantamentos.
Os Bancos Comerciais
Os bancos comerciais se dedicam à captação e aplicação de recursos financeiros em
operações de curto e médio prazos, normalmente de até um ano, bem como prestam
serviços de pagamentos e recebimentos ao público em geral, a partir de uma estrutura
descentralizada que é proporcionada por sua capacidade de abrir agências bancárias. No
Brasil, atualmente, os bancos comerciais geralmente estão integrados em uma estrutura de
banco múltiplo, a partir da qual exercem, total ou parcialmente, uma diversificada gama
de operações monetárias e financeiras.
Para atender aos seus objetivos, os bancos comerciais podem: a) descontar títulos;
b) realizar operações de abertura de crédito simples ou em conta corrente (contas
garantidas); c) realizar operações especiais, inclusive de créditorural, de câmbio e
comércio internacional; d) captar depósitos à vista e a prazo e recursos nas instituições
oficiais, para repasse aos clientes; e) obter recursos externos para repasse; e f) efetuar a
prestação de serviços, inclusive mediante convênio com outras instituições.
115
É importante frisar que a captação de depósitos à vista, que nada mais são do que as
contas correntes livremente movimentáveis, é a atividade básica dos bancos comerciais,
configurando-os como instituições financeiras monetárias. Tal captação de recursos, junto
com a captação via CDB e RDB, cobrança de títulos e arrecadação de tributos e tarifas
públicas, permite aos bancos repassar tais recursos aos seus clientes, em especial às
empresas, sob a forma de empréstimos que vão girar a atividade produtiva (estoques,
salários etc.).
A Caixa Econômica Federal
14
As caixas econômicas são instituições de cunho eminentemente social, concedendo
empréstimos e financiamentos a programas e projetos de assistência social, saúde,
educação, trabalho, transportes urbanos e esporte, sendo seu único representante, hoje, a
Caixa Econômica Federal, resultado da unificação, pelo Decreto-Lei 759, de 12/08/1969,
das 23 Caixas Econômicas Federais até então existentes.
Suas origens confundem-se com as dos primeiros bancos comerciais. Estes, pela
falta de interesse em captar pequenos valores e pelos altos riscos dos empreendimentos em
que se envolviam, afastavam os pequenos depositantes. Assim, surgida da iniciativa
particular, a primeira caixa econômica que se constituiu no país (Rio de Janeiro) remonta a
1831, que não obteve êxito. Em 1860, o Governo Imperial criou outra instituição do gênero,
que começou a operar em 1861 (que corresponde hoje à Caixa Econômica Federal do Rio
de Janeiro). Em 1955, o Parlamento rejeitou projeto de lei para autorizar a caixa a
conceder financiamentos para a casa própria, permanecendo suas operações limitadas ao
atendimento de necessidades populares de curto prazo. Atendendo a essa faixa de crédito, a
caixa federal abriu agências em todos os Estados da União.
Ao mesmo tempo, devido a sua reduzida flexibilidade operacional, ensejou o
aparecimento de caixas estaduais, inicialmente em São Paulo, Minas, Rio Grande do Sul,
Santa Catarina e Goiás. Mas só a partir de 1964, com a instituição do mecanismo da
14
Caixa Econômica Federal. Instituição financeira, sob forma de empresa pública, vinculada ao Ministério da
Fazenda. Foi fundada em 1860 e sua atual constituição foi estabelecida em 1969 e alterada em 1973. A empresa é
produto da unificação das 22 antigas Caixas Econômicas Federais, autônomas, distribuídas pelos Estados e Distrito
Federal, substituídas por agências (Sandroni, 2005).
116
correção monetária, com a criação das cadernetas de poupança e com a integração das
caixas econômicas no SFH e no SBPE, é que as atividades dessas instituições foram
dinamizadas. Hoje encontram-se todas extintas, exceto a CEF.
A CEF é uma instituição financeira responsável pela operacionalização das políticas
do Governo Federal para habitação popular e saneamento básico, caracterizando-se cada
vez mais como o banco de apoio ao trabalhador de baixa renda.
À CEF é permitido atuar nas áreas de atividades relativas a bancos comerciais,
sociedades de crédito imobiliário e de saneamento e infraestrutura urbana, além de
prestação de serviços de natureza social, delegada pelo Governo Federal.
Suas principais atividades estão relacionadas com a captação de recursos em
cadernetas de poupança, em depósitos judiciais e a prazo, e sua aplicação em empréstimos
vinculados, preferencialmente à habitação. Os recursos obtidos junto ao Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço-FGTS são direcionados, quase na sua totalidade, para as
áreas de saneamento e infraestrutura urbana.
A CEF exerce a administração de loterias, de fundos e de programas, entre os quais
destacavam-se o FGTS, o Fundo de Compensação de Variações Salariais-FCVS, o
Programa de Integração Social-PIS, o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social-FAS e o
Fundo de Desenvolvimento Social-FDS.
Os Bancos Cooperativos
O Banco Central, através da Resolução 2.193, de 31/08/1995, autorizou a
constituição de bancos comerciais na forma de sociedades anônimas de capital fechado,
com participação exclusiva de cooperativas de crédito singulares, exceto as do tipo Luzzati
(as que admitem a participação de não-cooperados) e centrais de cooperativas, bem como
de federações e confederações de cooperativas de crédito, com atuação restrita à Unidade
da Federação de sua sede, cujo Patrimônio de Referência-PR deverá estar enquadrado nas
regras do Acordo de Basiléia. Não podem participar no capital social de instituições
financeiras autorizadas a funcionar pelo BC, nem realizar operações de swap por conta de
terceiros.
117
O Banco Central deu autorização para que as cooperativas de crédito abrissem seus
próprios bancos comerciais, podendo fazer tudo o que qualquer outro banco comercial faz:
ter talão de cheques, emitir cartão de crédito, fazer a compensação de documentos e,
principalmente, passar a administrar a carteira de crédito antes sob responsabilidade das
cooperativas.
Através da Resolução 2.788, de 30/11/2000, o BC renovou as regras para a
constituição de bancos cooperativos, cuja atuação deve observar no cálculo do patrimônio
líquido exigido os mesmos fatores e parâmetros estabelecidos pela regulamentação em
vigor para os bancos comerciais e múltiplos.
As Cooperativas de Crédito
A Lei 5.764, de 16/12/1971, definiu a Política Nacional de Cooperativismo como
sendo a atividade decorrente das iniciativas ligadas ao sistema cooperativo, originárias de
setor público ou privado, isoladas ou coordenadas entre si, desde que reconhecido o seu
interesse público, e instituiu o regime jurídico das sociedades cooperativas. Na lei ficou
estabelecido que celebram o contrato de sociedade cooperativa as pessoas que,
reciprocamente, se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma
atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro, e classificou as sociedades
cooperativas como:
singulares, as constituídas pelo número mínimo de 20 (vinte) pessoas
físicas, sendo excepcionalmente permitida a admissão de pessoas jurídicas
que tenham por objeto as mesmas ou correlatas atividades econômicas das
pessoas físicas ou, ainda, aquelas sem fins lucrativos;
centrais de cooperativas ou federações de cooperativas, as constituídas de, no
mínimo, 3 (três) singulares, podendo, excepcionalmente, admitir associados
individuais.
Quanto aos tipos de operações a que estão autorizadas, as cooperativas de crédito
podem:
na ponta da captação: a) captar depósitos, somente de associados, sem
emissão de certificado; b) obter empréstimos ou repasses de instituições
financeiras nacionais ou estrangeiras; c) receber recursos oriundos de fundos
118
oficiais e recursos, em caráter eventual, isentos de remuneração, ou a taxas
favorecidas, de qualquer entidade, na forma de doações, empréstimos ou
repasses;
na ponta de empréstimos: a) conceder créditos e prestar garantias, inclusive
em operações realizadas ao amparo da regulamentação do crédito rural, em
favor de produtores rurais, somente a associados; b) aplicar recursos no
mercado financeiro, inclusive em depósitos à vista e a prazo, com ou sem a
emissão de certificado, observadas eventuais restrições legais e
regulamentares específicas de cada aplicação;
na ponta de serviços: a) prestar serviços de cobrança, de custódia, de
recebimentos e pagamentospor conta de terceiros, sob convênio com
instituições públicas e privadas; b) prestar serviços de correspondente no
país, nos termos da regulamentação em vigor.
Bancos de Investimento
As bases para a criação de bancos de investimento no Brasil foram estabelecidas
pela Lei n. 4.728/65, que disciplinou o mercado de capitais, fixou diretrizes para seu
desenvolvimento, instituiu as condições de acesso a esse mercado e estruturou o sistema de
distribuição de títulos ou valores mobiliários. Criados para canalizar recursos de médio e
longo prazo para o suprimento de capital fixo ou de giro das empresas privadas, os bancos
de investimento operam em um segmento bem específico do sistema de intermediação
financeira, viabilizando operações diferenciadas, quanto aos prazos e montantes, das
praticadas pelos bancos comerciais.
Em síntese, são as seguintes as operações ativas que podem ser praticadas pelos BIs:
a) empréstimos, a prazo mínimo de um ano, para financiamento de capital fixo; b)
empréstimos, a prazo mínimo de um ano, para financiamento de capital de giro; c)
aquisição de ações, obrigações e quaisquer outros títulos e valores mobiliários, para
investimento ou revenda no mercado de capitais (operações de underwriting); d) repasses
de empréstimos obtidos no exterior; e) prestação de garantia em empréstimos no país ou
provenientes do exterior; f) gestão de fundos de investimentos.
119
Para atender a esse conjunto de operações, os bancos de investimentos podem
captar recursos no país e no exterior. A captação interna é feita mediante depósitos a prazo
fixo. Além disso, esses bancos repassam recursos de instituições oficiais do país,
notadamente do BNDES. Contam ainda com recursos decorrentes da colocação, no
mercado de capitais, de títulos e debêntures, assim como de venda de quotas de fundos de
investimento por eles administrados.
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
O BNDES é a instituição responsável pela política de investimentos de longo prazo
do Governo Federal. É a principal instituição financeira de fomento do país e tem como
objetivos: a) impulsionar o desenvolvimento econômico e social do país; b) fortalecer o
setor empresarial nacional; c) atenuar os desequilíbrios regionais, criando novos polos de
produção; d) promover o desenvolvimento integrado das atividades agrícolas, industriais e
de serviços; e) promover o crescimento e a diversificação das exportações.
Para a consecução desses objetivos, conta com um conjunto de fundos e programas
especiais de fomento. Foi também da responsabilidade do BNDES, durante os governos
Collor, Itamar e FHC, o encargo de gerir todo o processo de privatização das empresas
estatais.
Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento
As sociedades de crédito, financiamento e investimento surgiram espontaneamente
no país, nos primeiros anos do pós-guerra, para atender à demanda de crédito a prazos
médio e longo, gerada pela implantação de novos setores industriais, produtores de bens de
capital e de bens duráveis de consumo. Atualmente, as sociedades de crédito, financiamento
e investimento estão, em sua maioria, integradas em bancos múltiplos.
Bancos de Desenvolvimento
Os bancos estaduais de desenvolvimento, ainda existentes, são instituições
financeiras controladas pelos governos estaduais e destinadas ao fornecimento de crédito
de médio e longo prazo às empresas localizadas nos respectivos estados. Normalmente
operam como órgãos financeiros repassadores de recursos do BNDES.
120
Agências de Fomento
A Resolução nº 2.828, de 30/03/2001, do Banco Central, estabeleceu as regras atuais
que dispõem sobre a constituição e o funcionamento das agências de fomento. A expressão
“Agência de Fomento”, acrescida da indicação da unidade da federação que a controla,
deve constar, obrigatoriamente, da denominação social dessas sociedades.
As agências de fomento somente podem praticar operações de repasse de recursos
captados no país e no exterior, originários de: a) fundos constitucionais; b) orçamentos
federal, estaduais e municipais; c) organismos e instituições financeiras nacionais e
internacionais de desenvolvimento.
Às agências de fomento são facultadas: a) a realização de operações de
financiamento de capitais fixo e de giro associados a projetos na unidade da federação onde
tenham sede; b) a prestação de garantias, na forma da regulamentação em vigor; c) a
prestação de serviços de consultoria e de agente financeiro; d) a prestação de
administrador de fundos de desenvolvimento, observado o disposto no artigo 35 da Lei
Complementar 101, de 04/05/2000.
Às agências de fomento são vedados: a) o acesso a linhas de assistência financeira e
de redesconto do Banco Central; b) o acesso à conta Reservas Bancárias no Banco Central;
c) a captação de recursos junto ao público, inclusive o de recursos externos; d) a
contratação de depósitos interfinanceiros – DI – na qualidade de depositante ou
depositária; e) a participação societária, direta ou indireta, no país ou no exterior, em
outras instituições financeiras e em outras empresas coligadas ou controladas, direta ou
indiretamente, pela unidade da federação que detenha seu controle.
As agência de fomento devem observar limites mínimos de capital realizado e
patrimônio de referência – PR – de R$4 milhões e o seu patrimônio líquido exigido – PLE –
deve seguir as regras do Acordo de Basiléia com um fator de alavancagem de recursos
equivalente a 3,3 vezes o PLE.
O Plano Real e o Ajuste do Sistema Financeiro Nacional
121
Desde o início do Plano Real, em julho de 1994, sabia-se que o novo ambiente de
estabilização macroeconômica não seria condizente com a dimensão que o sistema bancário
havia alcançado, fruto de vários anos de inflação alta e desequilíbrios macroeconômicos.
Esses anos levaram à constituição de instituições financeiras que, para se beneficiar das
receitas inflacionárias (float), faziam uso de um grande número de agências para captação
de depósitos e aplicações, com custos elevados. A grosso modo, pode-se dividir em três
fases, que se sobrepõem, em parte, as mudanças que ocorreriam no sistema financeiro
desde o início do Plano Real.
A primeira destas fases caracteriza-se pela diminuição do número de bancos na
economia brasileira em decorrência de liquidação, incorporação, fusão e transferência de
controle acionário de várias instituições bancárias, em conjunto com as modificações
adotadas pelo Banco Central referentes à legislação e à supervisão bancárias.
A segunda fase do processo de ajuste do Sistema Financeiro Nacional foi
caracterizada pela entrada de bancos estrangeiros e pelos ajustes dos sistemas financeiros
público e privado, mediante, respectivamente, o Proer (Programa de Estímulo à
Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional) e o Proes (Programa
de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária).
Por fim, a terceira e última fase refletiu uma profunda modificação no modelo
operacional seguido pelos bancos antes do Plano Real. A receita inflacionária foi
substituída pelo crescimento da receita proveniente da intermediação e pela receita de
serviços, via cobrança de tarifas.
Assim, desde o início do Plano Real, os bancos perderam uma importante fonte de
receita, representada pelas transferências inflacionárias: o float, que era propiciado: (i)
pela perda de valor dos depósitos a vista e/ou (ii) pela correção dos depósitos bancários em
valores abaixo da inflação.
122
Tabela sobre Receita Inflacionária
A
no
Receita
Inflacionária / PIB
Receita Inflacionária /Valor da Produção das
Instituições Bancárias
1
990
4,0 35,7
1
991
3,9 41,3
1
992
4,0 41,9
1
993
4,2 35,3
1
994
2,0 20,4
Fonte: Barros e Almeida Jr., p.5.
Uma das formas encontradas pelo sistema bancário para compensar a perda da
receita inflacionária, antes de fechar agências e efetuar os ajustes que se faziam necessários
no modelo operacional, foi expandir as operações de crédito, lastreadas pelo crescimento
abrupto dos depósitos bancários trazidos com o Plano Real. Os depósitos à vista, por
exemplo, cresceram 165,4% nos seis primeiros meses do Plano Real, e os depósitos a prazo
cresceram quase 40% no mesmo período.
Antecipando-se ao possível crescimento das operações de créditos que decorreria do
quadro de estabilidade macroeconômica, o Banco Central elevou, no início do Plano Real,
as alíquotas de recolhimento compulsório dos depósitos bancários. O recolhimento
compulsório sobre depósitos à vista passou de 48% para 100%, sobre os depósitos de
poupança passou de 10% para 30%, e foi instituído um recolhimento de 30% sobre o saldo
de depósitos a prazo. Apesar disso, os empréstimos totais do sistema financeiro para o setor
privado, segundo dados do Banco Central, mostraram crescimento de 58,7% durante o
primeiro ano de vigência do Plano.
Apesar do crescimento das operações de crédito compensarem, em parte, a perda do
float, esse crescimento ocorreu sem os devidos cuidados quanto à capacidade de pagamento
dos novos e antigos devedores. Assim, a “solução” de expandir rapidamente o crédito como
123
forma de compensar a perda do float ocasionou novos problemas. O resultado desse
processo foi um crescimento dos empréstimos de liquidação duvidosa. A diminuição no
ritmo de crescimento da economia brasileira, no segundo trimestre de 1995, e o aumento da
taxa de juros doméstica confirmaram o aumento substancial nos créditos em atraso e em
liquidação no sistema financeiro. O passo seguinte foi a necessidade do Proer e do Proes,
antes já referidos.