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1 A Universalização do Registro de Nascimento Civil no Brasil: uma Proposta de Virtualização e Integração de Sistemas. Autoria: Tiago da Costa, Vitor Hugo Klein Junior, Julio da Silva Dias, Carlos Roberto De Rolt RESUMO Este artigo está inserido no esforço de modernização dos serviços de Registro Público para a universalização dos registros de nascimento formais através da proposta da integração entre os sistemas de Registro de Nascimento Público do Brasil, através da criação da declaração de nascimento eletrônica (e-DN), que permitirá a formação de uma base de dados conjunta entre os principais órgãos de registro do país, fornecendo uma importante fonte de informação segura e relevante para a formulação de estudos demográficos, planejamento e implementação de políticas públicas, acesso e monitoramento do exercício da cidadania, entre outros aspectos. O presente documento procura descrever a importância do Registro de Nascimento formal, bem como dos respectivos levantamentos estatísticos dele provenientes, além de focalizar a questão do sub-registro de nascimento, que é considerado o principal fator limitador para a utilização desses dados de maneira efetiva para as finalidades acima citadas. 1. INTRODUÇÃO Os levantamentos estatísticos constituem um importante instrumento no acompanhamento da evolução populacional no País, proporcionando, além de estudos demográficos, subsídios para a implementação de políticas públicas e o monitoramento do exercício da cidadania (IBGE, 2006). Neste sentido, desde 1974, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publica anualmente um relatório denominado Estatísticas do Registro Civil, que fornece um elenco de informações relativas aos fatos vitais, casamentos, separações judiciais e divórcios ocorridos no País. Os resultados apresentados refletem a totalidade dos assentos de nascidos vivos, casamentos, óbitos e óbitos fetais informados pelos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais, e de separações e divórcios declarados pelas Varas de Família, Foros ou Varas Cíveis (IBGE, 2006). O uso das Estatísticas do Registro Civil do IBGE pelos estudiosos vem se ampliando, sobretudo nos períodos intercensitários, quando as estatísticas vitais tornam-se imprescindíveis para o acompanhamento da evolução demográfica no Brasil. No que diz respeito especificamente às informações dos Registros de Nascimentos provenientes deste levantamento estatístico, a relevância deste relatório é percebida na possibilidade da produção de indicadores, tais como: taxas brutas de natalidade e taxas de fecundidade, que além de fornecer importantes dados para estudos demográficos, podem constituir elementos de referência para o planejamento de políticas públicas específicas, nos diversos níveis espaciais (IBGE, 2006). Entretanto, embora o aspecto mais visível dessas informações seja identificado na elaboração das estatísticas vitais, a importância do registro civil de nascimento tem sido ressaltada, nos últimos anos, em função da crescente conscientização e organização da sociedade na esfera dos chamados direitos civis e humanos. O registro de nascimento, realizado nos Cartórios, significa a oficialização da existência do indivíduo, de sua identificação e da sua relação com o Estado, condições fundamentais ao exercício da cidadania (CRESPO; BASTOS; CAVALCANTI, 2004). Contudo, o problema do sub-registro de nascimentos e de óbitos ainda é um fator limitador para os cálculos diretos dos indicadores demográficos, principalmente, naqueles 2 estados e regiões, social e economicamente menos desenvolvidos, onde a parcela da população residente em pequenas cidades e áreas rurais é ainda significativa (IBGE, 2006). O sub-registro de nascimento é um indicador que resulta da razão entre o número de nascidos vivos informados pelos Cartórios ao IBGE, em relação ao número de nascimentos estimados pelo IBGE, na população residente em determinado espaço geográfico em um ano considerado. Em geral, este indicador é usado para analisar variações geográficas e temporais dos dados coletados pelo Registro Civil, com o propósito de avaliar a sua consistência, indicar regiões com sub-registro expressivo, subsidiar o aperfeiçoamento de estimativas obtidas por métodos demográficos indiretos e orientar políticas de ampliação do registro de nascimento (IBGE, 2006). O último índice de sub-registro apurado, divulgado nas estatísticas de Registro Civil do IBGE para o ano de 2006, apresentou o índice de 12,7% para o país. Entretanto, o fenômeno do sub-registro de nascimentos se distribui de maneira diferenciada pelo território brasileiro, sendo os maiores percentuais observados nas Unidades da Federação das Regiões Norte e Nordeste, áreas também com taxas de fecundidade mais elevadas, e os percentuais menores nos estados da Região Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e no Distrito Federal (IBGE, 2006). Dessa forma a existência do sub-registro de nascimentos e óbitos tem sido o principal fator de impedimento para o uso das informações destes relatórios estatísticos para o cálculo direto de indicadores demográficos e no planejamento de políticas públicas, especialmente as da área de saúde (IBGE, 2006). Como resposta a essa demanda social, foi divulgado recentemente o Decreto Presidencial 6.289/07 que institui o Plano Social de Registro Civil de Nascimento e Documentação Básica. Este Plano tem como principais objetivos a erradicação do sub- registro de nascimento e implantação de uma estrutura que garanta a efetividade do direito ao registro civil de nascimento; e a garantia da sustentabilidade dos baixos índices de sub- registros alcançados e expansão do acesso à documentação civil básica, com prioridade para o CPF (Cadastro de Pessoa Física), RG (Registro Geral de Identidade) e CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social). Esta proposta apresenta um direcionamento claro no sentido do aperfeiçoamento do sistema brasileiro de Registro Civil através da criação do Sistema Nacional de Registro Civil (SIRC) e do Banco de Dados Nacional de pessoas registradas, com aprimoramento do fluxo de informações entre os cartórios e o poder público. Este Plano prevê também pontos como: a interligação de cartórios de registro civil de nascimento em postos avançados de documentação; a padronização do Registro Civil de Nascimento e da Certidão de Nascimento com a codificação de cartórios; a inclusão da Declaração de Nascidos Vivos (DN) nos registros; a criação de um padrão de certidão com matrícula única; e o encaminhamento de proposta de revisão da Lei 6.015/73, que dispõe sobre os Registros Públicos, ao Legislativo Federal. Considerando a importância dessa temática para o país, e a possibilidade de aplicação de um estudo exploratório, em que, além de revisão teórica sobre o assunto, verifica-se a coerência com a realidade prática, este artigo tem como objetivo o desenvolvimento de uma proposta de integração tecnológica entre os atuais sistemas de nascidos vivos (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos do Ministério da Saúde – SINASC – e a Certidão de Nascimento em Cartório de Registro Civil), através da criação da declaração de nascimento eletrônica - e-DN. Esta é uma extensão da proposta de Crespo, Bastos e Cavalcanti (2004, p. 3) que defende a compatibilização e integração entre os sistemas de estatística vitais do SINASC (Ministério da Saúde) e das Estatísticas do Registro Civil (IBGE). 3 Esta interligação tecnológica entre estes sistemas, a partir da criação da e-DN, que é a Declaração de Nascimento Eletrônica, e permitirá a integração entre os sistemas do Ministério da Saúde (SINASC), Cartórios de Registro Civil e o IBGE (Estatísticas do Registro Civil), possibilitando a modernização tecnológica destes processos, sua desburocratização e ganho em eficiência, e a criação de uma proposta efetiva, alinhada às diretrizes do Plano Social de Registro Civilde Nascimento e Documentação Básica do governo federal. Para facilitar a apresentação dos seus principais argumentos e a defesa da sua proposta principal, este artigo foi dividido em quatro partes. Na primeira é realizado um breve relato da atual sistemática do Registro de Nascimento e o desafio da erradicação do Sub-registro de Nascimento. A segunda parte apresenta a arquitetura básica da CRSEC, que é uma aplicação tecnológica em desenvolvimento para integração as informações registradas em cartório com sua ampla rede de usuários. Na terceira parte é defendida a proposta principal deste artigo: a criação da Declaração de Nascimento Eletrônica (E-DN) e interligação entre os SINASC e a CRSEC. Finalmente, na última parte são apresentadas as considerações conclusivas que finalizam este documento. 2. O ATUAL FUNCIONAMENTO DO REGISTRO DE NASCIMENTO E A METODOLOGIA DE CÁLCULO DO SUB-REGISTRO Neste tópico será descrito o atual funcionamento do sistema de registro de nascimentos e respectiva metodologia de avaliação do sub-registro realizado pelo IBGE. Para a descrição abordaremos dois órgãos, a saber: a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) do Ministério da Saúde e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, os quais se utilizam de informações do registro de nascimento em momentos distintos e para fins diversos. O Ministério da Saúde realiza um levantamento de dados utilizando o Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), que tem por objetivo, coletar dados sobre os nascimentos informados em todo o território nacional e o fornecimento de dados sobre natalidade para todas as instâncias do sistema de saúde. A descrição aqui realizada está baseada no levantamento de informações do Manual de Procedimentos do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos de 2001. O SINASC foi originado a partir da Portaria nº 649/GM/MS, de 04 de julho de 1989, que cria o Grupo de Estatísticas Vitais (GEVIMS), para assessorar o Ministério da Saúde, quanto aos seguintes tópicos: a) mortalidade e natalidade; b) avaliação da situação de saúde e de programas básicos de saúde; c) promoção da utilização de estatísticas vitais em instância federal, regional e local; d) planejamento e avaliação em saúde. Junto com o sistema informatizado, foi criado em 1990 o documento-padrão de registro, que é denominado Declaração de Nascido Vivo (DN). O documento padrão de registro possui três vias de distintas cores: branca, amarela e rosa; e é composta por sete blocos, contendo 41 variáveis. Os sete blocos de informações coletadas na DN contém as seguintes: I - Cartório, com cinco variáveis; II - Local da Ocorrência, com sete variáveis; III - Mãe, com 12 variáveis; IV - Gestação e Parto, com quatro variáveis; V - Recém-Nascido, com seis variáveis; VI - Identificação, com duas variáveis; VII - Responsável pelo preenchimento, com cinco variáveis; 4 Este documento é impresso em três vias numeradas. O fluxo de distribuição do documento é feito pelo nível federal para o estadual, e do estadual para o municipal, até os estabelecimentos de saúde e cartórios, conforme pode ser visto na figura 1. Figura 1: Fluxo da distribuição Declaração Nascidos Vivos. Fonte: Manual do SINASC, 2001 A informação tem um tratamento diferenciado conforme o tipo de parto, que pode ser hospitalar ou domiciliar. No parto hospitalar, que é considerado o nascimento em qualquer estabelecimento de saúde, o estabelecimento é responsável pelo preenchimento da DN, que é encaminhada para locais distintos conforme suas três vias. A Primeira Via (cor branca) permanece no estabelecimento de saúde até ser coletada, por busca ativa, pelos órgãos estaduais ou municipais responsáveis pelo sistema; a Segunda Via (cor amarela) – cartório: fica com a família até ser levada ao cartório do registro civil para o competente registro do nascimento, conforme determina a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que após o registro reterá esta via para seus procedimentos legais; e a Terceira Via (cor rosa) – unidade de saúde: será arquivada no estabelecimento de saúde onde ocorreu o parto, em princípio no prontuário do recém-nascido. O procedimento do Cartório, portanto, é exigir que o declarante apresente a via amarela (segunda via) da Declaração de Nascido Vivo que será emitida pelo hospital, conforme pode ser visto na figura 2. Ressalte-se aqui que esta é uma regra instituída pela Lei Federal n. 8.069, de 13 de julho de 1990, válida para todo o território nacional (BORTOLI, 2002). No caso dos partos domiciliares, estes ocorrem em domicílios e são realizados por parteiras leigas. O preenchimento da Declaração de Nascido Vivo (DN), segundo consta nos procedimentos do SINASC, deve ser feito nos estabelecimentos de saúde ou em cartórios de registro civil. Crespo, Bastos e Cavalcanti (2004) salientam que o SINASC possui estatísticas bastante confiáveis num expressivo número de unidades da federação, entretanto quando se apresentam demandas para níveis geográficos menores, as quais se tornaram bastante comum na última década, observam-se ainda algumas fragilidades. Estas fragilidades decorrem da desigual distribuição dos serviços de saúde no território, que estão concentrados em áreas específicas, em sua maioria, urbanas e metropolitanas. Isto leva populações de diferentes municípios a buscar atendimento à saúde em outras cidades. “Nesses casos elas se declaram residentes do município, embora não o sejam, sobrestimando ou subestimando os dados de 5 nascimentos de municípios de uma mesma região” (CRESPO; BASTOS; CAVALCANTI, 2004). Figura 2 - Processo de emissão de Certidão de Nascimento Tradicional Fonte: BORTOLI, 2002 O fluxo de retorno da informação começa no nível municipal e segue para o federal. As DNs são coletadas pelas secretarias municipais e processadas por esta no sistema, que consolida a base Estadual. O estado por sua vez envia os dados ao sistema federal, onde é consolidado os dados gerais na Base Nacional de Dados sobre Nascimentos. Quando o município não possui acesso ao sistema, este repassa as DNs às secretarias estaduais, as quais se encarregam de consolidar as bases estaduais e enviar a instância federal. O estado possui um prazo estabelecido para o envio dos dados que é o seguinte: I - Primeiro trimestre: até 10 de abril; II - Segundo trimestre: até 10 de julho; III - Terceiro trimestre: até 10 de outubro; e IV - Quatro trimestre: até 10 de janeiro do ano seguinte. Como podemos observar os dados não são providos de forma única e centralizados, podendo haver uma descontinuidade na provisão dos mesmos, visto que este é alimentado em tempos diferentes pelas diversas instâncias do processo. Ao examinarmos o processo que ocorre dentro dos cartórios, vemos que este estabelecimento é responsável pelo assentamento efetivo dos dados contidos na DN, e que podem ocorrer de duas maneiras distintas. Uma delas é quando o registro civil é efetuado a partir da declaração (DN via amarela) levada ao cartório pelo pai ou responsável, a qual o cartório retém e se utiliza dos dados para a certidão de nascimento. Outra maneira é quando o parto domiciliar, podendo o preenchimento da DN ser realizado no próprio cartório de registro civil, com a presença de duas testemunhas, subsidiando assim a certidão de nascimento. As informações contidas no cartório serão utilizadas pelo IBGE, e irão servir de base para o cálculo do índice de sub-registro. Conforme já dito anteriormente, outro órgão responsável pelo levantamento de estatísticas, que servem para subsidiar as políticas públicas, é o IBGE. Este órgão publica anualmente o relatório Estatísticas do Registro Civil, contendo informações diversas relativas ao nascimento, casamento, óbito e separação, e entre estas o índice de sub-registro de nascimentos. Segundo o relatório de 2006: “a necessidadede implantação ou de ampliação de políticas públicas focalizadas em parcelas específicas da população, com recortes socioeconômicos, culturais e 6 etários diferenciados, tornou-se outro fator que ressaltou a importância do registro de nascimento e lhe conferiu maior visibilidade no conjunto de documentação civil básica dos cidadãos. O indivíduo sem o registro de nascimento está impedido de ter acesso a diversos benefícios concedidos pelas administrações federal, estadual ou municipal”. (IBGE, 2006) Ao longo da última década, diversas iniciativas têm sido promovidas com a intenção de ampliar a cobertura da população registrada em Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais e, mais especificamente, dos nascimentos ocorridos e registrados no ano. Dentre estas ações estão uma lei que determina a gratuidade da primeira via do registro civil de pessoa física, a compensação de déficits dos serviços cartorários, campanhas nacionais do registro civil, gratificações para unidades hospitalares que incentivem a mãe a registrar os filhos antes da alta hospitalar, a instalação de postos dos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais nas maternidades, e outras. Na parte metodológica do cálculo do índice de sub-registro, o IBGE determina os percentuais de sub-registro que resultam da razão entre o número de nascidos vivos informados pelos Cartórios ao IBGE, em relação ao número de nascimentos estimados pelo IBGE, na população residente em determinado espaço geográfico, em um ano considerado. O levantamento é realizado através de captação dos dados nos cartórios de forma individualizada, em períodos programados. Nos cartórios informatizados, há a possibilidade de se realizar esse levantamento eletronicamente, entretanto, quando não há informatização, esses dados são levantados manualmente. Dessa forma, parte do problema no Registro Civil de Nascimento, vai além da necessidade de sensibilização da população e mobilização de agentes e organizações para essa finalidade. De acordo com Silveira (2005), novas formas de interoperabilidade precisam ser alcançadas, e um dos objetivos mais difíceis de alcançar em um desenvolvimento de sistemas de informação cooperativos é a coerência dos conjuntos de dados, geralmente distribuídos. Por isso, esta questão carece de uma análise aprofundada de fatores estruturais e tecnológicos, os quais podem tornar possível a compatibilização e integração de iniciativas e sistemas existentes na área do Registro Civil, de modo a atenuar as limitações que um país de proporções continentais e população numerosa apresenta na gestão de processos padronizados, formais e essenciais para o bem estar de sua sociedade. Esta convergência por sua vez é uma proposta que pode ser facilitada com o uso de novas tecnologias da informação baseadas em serviços eletrônicos e digitais, com o desenvolvimento de aplicações específicas por meio da Central Registral de Serviços Eletrônicos Compartilhados (CRSEC), proposta que será abordada com maior profundidade na próxima seção deste artigo. 3. A CENTRAL REGISTRAL DE SERVIÇOS ELETRÔNICOS COMPARTILHADOS Considerando os diversos aspectos que apontam para as vantagens provenientes da inserção digital da sociedade como um todo, em termos de ganhos de eficiência, redução de diversos custos e oferecimento de serviços adequados aos novos avanços da economia digital, é notório que grande parte dos serviços de Registro Público do Brasil ainda apresenta procedimentos burocratizados e ineficientes para seus usuários. Dessa forma, o governo federal brasileiro tem atuado, através de diversas frentes, no desenvolvimento de novas propostas de gestão de processos, novos padrões e requisitos tecnológicos, bem como na abertura de linhas de financiamento para o aperfeiçoamento destes serviços por atores capacitados para essa finalidade. Especialmente a partir a criação da Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP- Brasil), através da MP 2200/02 e da Lei 11.419/06, foram abertos caminhos para o 7 desenvolvimento de novas tecnologias digitais baseadas no fluxo e guarda de documentos eletrônicos, o que por sua vez possibilitou o desenvolvimento de aplicações digitais reconhecidas juridicamente, para os serviços de Registro Público. Neste sentido, estas iniciativas demonstram que os serviços de Registro Público tendem a se pautar por um novo paradigma tecnológico, que não se concentra em apenas prover equipamentos de sistemas de informação ou a interligação deles em rede, mas sim em uma profunda reavaliação dos atuais processos, alterando-os, se necessário, a fim de prepará- los para a aplicação de modernas tecnologias de informação e comunicação, levando sempre em consideração as demandas sociais. Entendido assim, o processo de modernização dos serviços de Registro Públicos ganha maior efetividade, na medida em que pode servir de condutor do desenvolvimento de todo uma infra-estrutura de soluções, o que por sua vez possibilitará a criação de novos serviços em uma plataforma de desenvolvimento integrada. Neste sentido, a Central Registral de Serviços Eletrônicos Compartilhados – CRSEC é uma iniciativa das entidades representativas dos cartórios extrajudiciais de registro (IRIB/ARISP/ARPEN/CDT)i em parceria com a Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (CAMARA E-NET), o Laboratório de Tecnologias de Gestão (LabGES) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), e o Laboratório de Segurança em Computação (LABSEC) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), cujo objetivo principal é, por meio da complementaridade de competências entre diversas organizações e atores, desenvolver um modelo integrado de gestão de serviços de Registro Público com uso intenso de tecnologias de informação e gestão. Esta proposta visa, portanto, tornar possível a criação de novas aplicações tecnológicas e técnicas de gestão alinhadas às demandas da sociedade brasileira para a área de Registros Públicos. Dentro dessa perspectiva, apresenta-se aqui o a proposta conceitual que vem sendo adotado como o direcionador estratégico para o desenvolvimento das novas aplicações da CRSEC, sendo utilizada como uma alternativa para a modernização da gestão de processos e serviços de Registro Público no Brasil. A dinâmica estrutural de desenvolvimento das aplicações da CRSEC pode ser visualizada na figura 3. Figura 3 – Modelo de Gestão da Modernização dos Serviços de Registro Público do Brasil Fonte: Elaborado pelos autores O referencial teórico dessa proposta tomou como base o conceito de Organização Virtual, que tem sido predominantemente entendido na literatura como uma rede temporária 8 de organizações independentes, ligadas pela tecnologia da informação, e que em sua forma mais pura se ligam a outras para formar uma cooperação, contribuindo apenas com o que considerar sua competência central (BYRNE, 1993). Diante disso, as organizações virtuais são apresentadas como sendo uma versão eletrônica das organizações tradicionais (OPREA, 2003) que buscam, através de uma rede com outras organizações, aproveitar novas oportunidades de atuação. O Gestor Virtual é o representante legítimo dos participantes da Plataforma Virtual que possui a responsabilidade de gerenciar o esforço de modernização e a manutenção dos serviços compartilhados (FRANKE, 2002). As cooperações são a essência do modelo. Por isso, os desafios da modernização contrastados com a velocidade em que são necessárias obrigam o Gestor Virtual a buscar competências externas, principalmente no que se refere à infra-estrutura e tecnologias. O desenvolvimento de qualquer aplicativo ou serviço a ser utilizado pela CRSEC deve utilizar tecnologias existentes e comprovadamente estáveis. O estabelecimento de um grupo de Empresas Virtuais deve fortalecer a iniciativa, sendo que cada uma das organizações apresentaria competências específicas. A complementaridadedestas competências deve ser utilizada para o desenvolvimento de tecnologias de uso comum. Nesse sentido, os atores atuam de maneira independente, mas estão reunidos em uma plataforma representada pelos mecanismos de integração, identidade comum e objetivos de modernização. Segundo este entendimento, uma das principais estratégias da CRSEC é o desenvolvimento de alianças com redes de especialistas externos que dominam elementos e competências essenciais a serem agregadas aos processos realizados nos cartórios, para que estes se modernizem e ofereçam um novo conjunto de serviços, aproximando a oferta da demanda reprimida existente. A legitimidade da CRSEC é baseada principalmente em capacidade de gestão da rede, que envolve a criação e manutenção da sua plataforma e a formação de cooperação com comunidades de especialistas externos, corregedorias estaduais e com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), criando organizações em rede que possibilitem o desenvolvimento de serviços modernos e ajustados à realidade. O CNJ atua em sintonia com o Gestor do esforço de modernização e com as corregedorias estaduais, representantes do Poder Judiciário, para reduzir as assimetrias normativas, tornando possível o trabalho de gestão da rede de organizações e contribuindo para uma maior padronização dos processos de negócio. Conforme pode ser visto na figura 3, a modernização proposta pela CRSEC depende de modelos e técnicas de gestão adequadas e de um conjunto de aplicações estruturais e serviços. Tal infra-estrutura vem sendo construída dentro dos padrões da ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas do Brasil) e do e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico), através de uma cooperação entre os institutos representativos dos cartórios em parceria com instituições de pesquisa, que desenvolvem projetos e estudos em áreas correlacionadas, fornecedores de infra-estrutura e desenvolvedores de sistemas. Para agilizar a formação da infra-estrutura necessária, diversas alianças e convênios foram formados com atores públicos e privados. Dessa forma o sucesso desta iniciativa pode ser atribuído a existência de um planejamento adequado, utilizando pesquisas desenvolvidas em centros de pesquisa, de reconhecida capacidade. As bases lançadas desta forma facilitam o desenvolvimento e implementação da Central. Um aspecto importante a ser considerado é que para participar desta plataforma, os diversos atores envolvidos precisam desenvolver requisitos de virtualização de processos. Isso significa que, conforme esse grau de virtualização, a integração dos usuários da CRSEC é automatizada em maior ou menor escala. Ou seja, cada participante integra-se ao modelo 9 conforme as suas necessidades e capacidade de investimento, com base em um plano de integração que levará de uma situação atual à aquela pretendida para o alcance da modernização projetada. A redução de custos operacionais e a velocidade com que os serviços poderão ser prestados oferecem uma pequena amostra das vantagens e possibilidades da CRSEC. A tendência é que o aumento da confiabilidade na prestação destes novos serviços faça com que os seus usuários os utilizem em escala crescente. Dessa forma, entende-se que a CRSEC pode ser uma alternativa para os desafios de ampliação da cobertura de registros civis em todo país, e de sua modernização e adequação tecnológica, na medida em que pode abrigar e fornecer uma base de dados integrada das informações de Registro do país, bem como integrá-las tecnologicamente aos demais sistemas de Registro Civil adotados por órgãos governamentais, possibilitando o acesso a uma ampla rede de informações em tempo reduzido e a atualização e armazenamento desses dados baseados em padrões tecnológicos avançados na área da gestão da informação. Esta proposta será estudada com mais propriedade na próxima seção. 4. MODELO DE INTEGRAÇÃO ENTRE SISTEMAS DE REGISTRO CIVIL DE NASCIMENTO (SINASC/CRSEC) A virtualização de processos de negócio em serviços públicos já é uma realidade em algumas áreas importantes do Brasil. Alguns exemplos que podem ser destacados são: a Receita Federal, através da expansão da entrega de declarações de renda via internet; o Poder Judiciário, com a realização e acompanhamento de processos judiciais via internet; e o processo eleitoral brasileiro, com a realização da votação via urna eletrônica em todo país. Tal realidade provém de uma demanda social por agilidade e transparência nos atos de gestão pública. Da mesma forma, a proposta da criação da CRSEC vai ao encontro dos anseios de uma sociedade em busca de resolução de problemas, alinhando tecnologia ao exercício da cidadania. Dentro desta perspectiva, o CRSEC subsidiaria uma série de informações, que são consideradas essenciais na formulação de políticas públicas e no planejamento de ações do governo. Entre estas está a possibilidade da criação de sistemas e processos eletrônicos de registro civil, assim como uma integração e convergência entre diversas bases de dados de órgãos do poder público. No caso específico deste artigo, a proposta é de integração e convergência dos sistemas SINASC, IBGE, e a CRSEC, que partiria de uma concepção mais ampla de modernização dos cartórios de Registros Civis, em consonância com o Plano Social de Registro Civil de Nascimento, instituído pelo Decreto Presidencial 6.289/07. A partir do modelo hoje existente, onde o nascimento de pessoas é registrado primeiramente na declaração de nascido vivo (DN), para posteriormente ser registrado no cartório civil, elabora-se um modelo idealizado a partir da elaboração eletrônica do documento DN, com disponibilização simultânea dos dados para o SINASC e CRSEC. Essa ação minimizaria lapsos temporais que hoje acontecem com o sistema manual e disperso de coleta das DNs, além de centralizar e compatibilizar consultas formuladas por outros sistemas. O fluxo seguiria da seguinte forma: 1 – O nascimento ocorre no Hospital (veremos que outros casos podem ocorrer também) e é gerada uma declaração eletrônica de nascimento (e- DN) pelo estabelecimento, o qual possuirá um protocolo automático, sendo este o que o pai ou responsável deve apresentar no cartório para o registro civil. Aqui o estabelecimento onde ocorre o nascimento não mais preenche manualmente o documento, mas sim através de um sistema, dispensando o trabalho de coleta e lançamento das antigas DNs; 2 – Num segundo 10 momento, de posse do protocolo, os pais ou responsáveis vão ao cartório de registro civil, que já possui acesso ao sistema e-DN, via CRSEC, com toda informação correspondente na declaração, bastando conferir a identidade do pai ou responsável autenticando o protocolo e expedindo a certidão de nascimento; 3 – ao efetuar o registro civil, expedindo a certidão de nascimento, o cartório alimenta o banco de dados CRSEC, que espelha as informações para o Datasus/Sinasc, confrontando e indexando os registros efetuados com as DNs existentes. Esses dados, provenientes do CRSEC e Datasus/Sinasc, também são replicados para o IBGE, que os utiliza para a elaboração das estatísticas do registro civil. Podemos observar o modelo na figura 4. Figura 4 – Modelo de Integração Sinasc/CRSEC Fonte: Elaborado pelos autores Com relação aos locais, onde não há acesso a um sistema, a e-DN pode ser gerada através de agentes responsáveis por coletar essas informações e alimentar o sistema via locais habilitados para tal registro. As possibilidades geradas com tal integração servem para sistematizar vários tipos de informações relevantes para a elaboração de políticas públicas, com acesso rápido e centralizado de dados. Tal convergência subsidia tanto o IBGE em suas coletas, assim como o SINASC. Assim, o ganho de velocidade de acesso às informações é inegável no modelo proposto. Além deste, melhora-se o controle e confiabilidade(CRESPO; BASTOS; CAVALCANTI, 2004) na emissão de declarações e certidões de nascimento, pois se restringe a responsabilidade de inserções de dados e melhora-se o acesso aos mesmos dando maior transparência. Ademais, a virtualização e integração dos sistemas podem gerar possibilidades de informações ainda não imaginadas, pois os cruzamentos de dados que são viabilizados pelo modelo são inúmeros. 11 5. CONCLUSÃO A proposta de integração dos sistemas Sinasc/CRSEC, faz parte de um conjunto de medidas necessárias para modernização do registro civil no Brasil. Necessária para a elaboração de políticas públicas, em especial da área da saúde e demográfica, o modelo de e- DN viabilizado pelo CRSEC propõe redução na defasagem de resultados existentes hoje (CRESPO; BASTOS; CAVALCANTI, 2004). Esta proposta possui maior capacidade de controle de dados, e subsidia a elaboração de dados estatísticos pertinentes na elaboração de políticas públicas. Torna-se pertinente também, na medida em que o desenvolvimento de uma metodologia de gestão moderna e ágil possibilita expandir o acesso à documentação civil básica, como forma de garantir o exercício da cidadania. O registro civil de nascimento e o seu conteúdo informacional, dentro de uma proposta de integração de sistemas visam cobrir as interfaces sugeridas por Crespo; Bastos e Cavalcanti (2004), que são: direitos humanos, demografia e saúde, justiça, segurança pública, e desenvolvimento social Além disto, o governo federal, com seu Plano Social de Registro Civil de Nascimento e Documentação Básica (Decreto Presidencial 6.289/07), pretende erradicar o sub-registro de nascimento e implantar de uma estrutura que garanta a efetividade do direito ao registro civil de nascimento. Entretanto salientamos que a proposta apresentada idealiza um modelo de gestão, através da criação de um documento digital (e-DN), fazendo-se necessário dar continuidade às pesquisas vislumbrem soluções tecnológicas que coloquem em prática o modelo apresentado. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. [on line] Disponível em: . Acesso em 04 mar. 2008. ________. 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