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ECONOMIA BRASILEIRA 
AULA 2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Walcir Soares da Silva Junior 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Da Era Vargas ao Milagre 
No contexto da Grande Depressão de 1929, o Brasil se deparou com uma 
conjuntura desafiadora, que exigia respostas criativas e transformações 
estruturais. Além dos efeitos devastadores da crise mundial, o país se 
confrontava com a crise de superprodução do café, seu principal produto de 
exportação, e com uma série de entraves que limitavam o avanço de sua 
indústria incipiente. Diante desses obstáculos, a economia brasileira se viu 
compelida a buscar soluções internas para enfrentar as dificuldades. 
A política de substituição de importações emergiu como estratégia 
fundamental, impulsionando o surgimento de uma indústria leve voltada para 
atender às demandas do mercado interno. No entanto, o Brasil ainda enfrentava 
desafios consideráveis relacionados à infraestrutura precária, o que dificultava a 
consolidação de uma indústria mais avançada e diversificada. Além disso, os 
esforços governamentais para proteger a cafeicultura e estimular a economia 
agrícola conduziram o país a uma crescente dependência do endividamento 
externo, exacerbada pela desvalorização da moeda e pela queda dos preços 
internacionais do café. Essa conjuntura complexa criou um ambiente propício 
para profundas transformações. 
Nesse contexto desafiador, o Brasil se viu confrontado com a necessidade 
premente de reestruturar sua economia e buscar alternativas para superar os 
obstáculos impostos pela crise. A busca por maior autonomia econômica e 
diversificação produtiva tornou-se uma prioridade urgente, impulsionando 
mudanças significativas nos rumos da economia brasileira. No presente capítulo, 
nosso objetivo é explorar essas transformações e analisar seus 
desdobramentos, investigando como o Brasil enfrentou os desafios do período e 
estabeleceu as bases para o desenvolvimento econômico e industrial que 
moldariam as décadas seguintes. 
Ao compreender o panorama histórico e as estratégias adotadas para 
enfrentar a crise, seremos capazes de reconhecer os principais marcos e 
impasses que moldaram a economia brasileira. Mais do que uma mera descrição 
de eventos, nossa análise busca identificar as motivações, as escolhas políticas 
e os impactos socioeconômicos dessas transformações. Dessa forma, 
poderemos compreender as raízes do desenvolvimento industrial posterior e 
 
 
3 
refletir sobre as lições aprendidas, buscando alternativas para um futuro de maior 
resiliência, inclusão e prosperidade para o Brasil e sua população. 
TEMA 1 – A ERA VARGAS (1930-1945) 
Segundo Silveira Filho (2000), a indústria nacional cresceu, de 1933 a 
1939, 11,3%, em comparação com 1,7% de crescimento da agricultura, 
demonstrando a importância crescente da indústria na economia brasileira, 
ainda que as bases fundamentais para o desenvolvimento desta não fossem 
ainda muito sólidas. O país carecia de bens de capital e de uma indústria de 
base que permitisse a substituição de importações de bens de consumo duráveis 
e intermediários. 
De acordo com Fritsch (1990), o fim da Primeira República marca o início 
de uma importante transição. A economia primário-exportadora baseada no café, 
com um regime cambial e comercial relativamente livre, dá lugar a uma economia 
voltada “para dentro”, com severos controles sobre as transações externas. 
Getúlio Vargas, junto aos membros da Revolução de 1930, acusavam os 
feitos da Proclamação da República de 1889 como frutos de um movimento que 
excluiu a participação do povo brasileiro, por ter sido uma ação puramente militar 
com raízes fincadas em influências estrangeiras e que sugeria uma nova era 
nacionalista com ênfase nos direitos trabalhistas e fomento à industrialização. 
Essa primeira etapa, de 1930 a 1934, ficou conhecida como Governo Provisório 
(vide Quadro 1). 
Quadro 1 - Lista de presidentes da república de 1930 a 1946 
Período Presidente Denominação 
1930 
Junta Governativa 
Provisória Segunda República 
1930 a 1937 Getúlio Vargas 
1937 a 1945 Getúlio Vargas Terceira República 
(Estado Novo) 1945 a 1946 José Linhares 
Fonte: Silva Junior, 2023. 
Com a promulgação de uma nova Constituição em 1934 e a eleição de 
Getúlio Vargas, instaurou-se efetivamente uma ideologia nacionalista baseada 
na preocupação com a ameaça comunista. O período entre 1934 e 1937 ficou 
 
 
4 
conhecido como Governo Constitucional. Posteriormente, com apoio dos 
militares e popular, acontece o Estado Novo, de 1937 a 1945, período conhecido 
como a Terceira República. Segundo Abreu (1990, p. 90): 
A implantação do Estado Novo em novembro de 1937 correspondeu 
ao amadurecimento de tendências já detectáveis em alguns casos até 
mesmo antes de 1930. Assim, dada a inexistência de estruturas 
partidárias nacionais e a desestruturação política das forças que 
haviam viabilizado 1930, consolidou-se a reversão da descentralização 
republicana, fortalecendo-se o poder central, sendo criadas agências 
governamentais com objetivos reguladores na área econômica. 
Silveira Filho (2000) traduz essa mudança de postura do Estado em 
Getúlio Vargas: o Estado passa de regulador da economia para produtor. Os 
lucros da indústria leve não seriam capazes de alavancar uma indústria de base 
gigantesca. Caberia ao Estado essa mobilização de recursos sem precedentes 
no país, para assentar os alicerces da industrialização. Ainda que não tenha 
conseguido realizar todos os investimentos necessários, Getúlio Vargas, nos 
seus quinze anos de ditadura, conseguiu estabelecer um planejamento de 
desenvolvimento nunca adotado no Brasil. 
É interessante perceber que, já nesta época, havia o debate em torno da 
intervenção do Estado, que este deveria ser o propulsor do desenvolvimento e o 
foco na economia agrícola era acalorado. Personalidades como Roberto 
Simonsen1 (defensor do desenvolvimento industrial a partir da intervenção do 
Estado) e Eugênio Gudin2 (defensor liberal da vocação agrícola brasileira) 
encabeçavam esse debate. 
Silveira Filho (2000, p. 21) argumenta que essa postura intervencionista 
do Estado estava longe de ser imparcial: 
O intervencionismo declarado não surgiu nem por obra do acaso, nem 
por racionalização de desejo. Surgiu para apoiar a acumulação geral 
capitalista e saltar obstáculos intransponíveis. Por isso se confirma o 
caráter burguês do Estado, na prática, embora advogue, através das 
mais diversas literaturas, sua imparcialidade, um Estado acima das 
classes, para promover o bem comum, na teoria. Enquanto houvesse 
crescimento e emprego para todos, este Estado burguês seria 
aplaudido e enaltecido como promotor desse bem comum. 
Segundo Abreu (1990), a decisão de construção da primeira usina 
siderúrgica em 1940 marcou uma mudança importante no modus operandi do 
Estado. Controles cambiais e de importações, legislação social e planos de 
 
1 Roberto Simonsen (1889-1948). 
2 Eugênio Gudin (1886-1986). 
 
 
5 
desenvolvimento entre Brasil e Estados Unidos foram muito relevantes neste 
período. Com a Segunda Guerra Mundial, a luta dos brasileiros em terras 
estrangeiras contra governos autoritários despertou movimentos internos contra 
a ditadura de Vargas. Mesmo o apoio estadunidense começa a dar lugar a 
preocupações com a “falta de democracia”. É nesse contexto que Getúlio Vargas 
renuncia, em 1945. 
TEMA 2 – A REPÚBLICA POPULISTA 
Após a Segunda Guerra Mundial, uma nova forma institucional se 
desenhava na política brasileira: a obtenção do poder pela presença de um líder 
carismático populista, forma institucional que irá se manifestar por diversas 
vezes em diferentes períodos da história econômica brasileira. Com o apoio de 
Getúlio Vargas, Gaspar Dutra venceu as eleições de 1946 e promulgou uma 
nova Constituição, a quinta do país. 
O principal projeto desse período e, também, o seu principal fracasso, foi 
o PlanoSalte, com o objetivo de estimular o desenvolvimento de setores da 
Saúde, Alimentação, Transporte e Energia no Brasil. O Brasil enfrentava déficits 
desafiadores nessas áreas, e a falta de infraestrutura acabava por ser um dos 
gargalos no desenvolvimento da indústria, já cheia de outros gargalos em termos 
dos vultosos investimentos necessários. 
No entanto, a pressão inflacionária e a procura por uma estratégia de 
combate à inflação se traduziram em políticas que penalizavam muito mais os 
trabalhadores – por meio da desvalorização do salário-mínimo. Além disso, a 
postura mais liberal do Governo Dutra em relação ao governo anterior e as 
dificuldades de financiamento levaram ao fracasso e posterior abandono do 
plano a partir de 1951. 
Segundo Vianna (1990a, p. 122): 
O final do Governo Dutra pode ser caracterizado, portanto, no setor 
interno, pela retomada do crescimento, do processo inflacionário e pela 
recorrência do desequilíbrio financeiro do setor público e, no setor 
externo, pelas expectativas favoráveis decorrentes da elevação dos 
preços do café e da mudança de atitude do governo norte-americano 
em relação ao financiamento dos programas de desenvolvimento do 
Brasil. 
O segundo Governo de Getúlio Vargas, eleito agora pelo voto direto para 
o mandato de 1951 a 1954, é apresentado por Vianna (1990b) como uma 
“estratégia bem definida de desenvolvimento econômico”. O projeto de governo 
 
 
6 
consistia em dividir o governo em duas fases, a primeira sendo a estabilização 
da economia – política monetária restritiva para combater a inflação – e a 
segunda dos empreendimentos e realizações. 
Segundo Silveira Filho (2000), fundado em 1952, o Banco Nacional de 
Desenvolvimento (BNDE) poderia financiar o arrojado planejamento de longo 
prazo, já que os bancos comerciais estavam ocupados, financiando os 
fazendeiros. A disposição americana em colaborar com o desenvolvimento 
brasileiro, de acordo com Vianna (1990b), materializou-se na Comissão Mista 
Brasil-Estados Unidos, em 1951, que propunha a facilitação no financiamento 
dos projetos de infraestrutura necessários ao desenvolvimento brasileiro. 
No entanto, uma grave crise cambial em conjunto com a piora nas 
relações internacionais com os Estados Unidos, com a mudança de governo 
(vitória do Partido Republicano e do general Eisenhower nas eleições de 1952), 
fizeram com que o projeto do governo não pudesse ser levado a cabo. Segundo 
Vianna (1990b, p. 132), “o governo norte-americano alegou necessidade de 
conter gastos e negou a existência de compromisso no sentido de fazê-lo até um 
determinado limite”. 
Neste período, além da criação do BNDE, a criação da Petrobrás e o 
controle dos lucros enviados ao exterior pelas multinacionais se tornam feitos 
importantes do novo governo. No entanto, as dificuldades apresentadas 
anteriormente, somadas às crises na produção de energia elétrica e o 
descontentamento por parte dos trabalhadores – ocasionando uma grande greve 
de mais de 300 mil operários – e da classe média, enfraqueceram o governo 
politicamente. 
Getúlio Vargas ficou isolado politicamente e sem o apoio das massas e 
dos setores empresariais. Uma “tomada de posição majoritária em defesa da 
democracia”, segundo Vianna (1990, p. 150), “converteu o que seria uma 
antecipação de 1964 numa administração provisória de gestores de negócios”. 
O período entre o final do governo Getúlio Vargas e o início do governo 
de Juscelino Kubitschek é conhecido como o interregno Café Filho, entre 1954 
e 1955. Segundo Pinho Neto (1990), de 1945 até 1964 a política não apresentou 
descontinuidade. O período pode ser caracterizado pela permanência do poder 
do chamado “pacto populista”, representado pela aliança PSD-PTB, não sem 
tentativas agressivas da oposição de retirar esses partidos do poder. 
Segundo Pinho Neto (1990, p. 165): 
 
 
7 
[...] [essa aliança] excluía importantes setores das classes dominantes, 
representados partidariamente pela UDN3. De uma certa forma, a 
história política do chamado “intermezzo democrático” é a história da 
luta conspiratória desses setores pelo poder. Com Café Filho, tais 
setores eram governo E todo o transcurso de seu mandato seria 
marcado por sucessivas tentativas de ser impedida a volta do “pacto 
populista” ao poder. No quadro político do pós-guerra, o Governo Café 
Filho pode ser considerado um efêmero triunfo do “golpismo” udenista. 
Mais do que um ensaio, tratava-se de um anúncio de 1964. 
Contrariando a máxima marxista, a história apresentar-se-ia 
originalmente como farsa para anos mais tarde repetir-se como a 
verdadeira tragédia. 
TEMA 3 – O PLANO DE METAS DE JK (1956-1961) 
Dentre as medidas reguladoras mais importantes no plano de 
desenvolvimento industrial brasileiro, a Instrução n. 70 da Superintendência da 
Moeda e do Crédito (Sumoc), a autoridade monetária da época, foi um marco na 
industrialização brasileira. Isso porque as medidas retiravam do Estado a 
pressão pelos investimentos produtivos, criando vantagens para o capital 
nacional. Dentre essas vantagens, estavam o encarecimento de mercadorias 
importadas e taxas de câmbio subsidiadas e diferenciadas para importar bens 
de capital e matérias-primas necessárias ao desenvolvimento da indústria 
(Silveira Filho, 2000). 
Estando o capital estatal voltado aos investimentos em infraestrutura e o 
capital nacional em bens de tecnologia mais simples para o mercado interno, 
faltava o espaço para o capital estrangeiro a ser alocado na produção de alta 
tecnologia e bens sofisticados. No entanto, a escassez de capital na América 
Latina era um problema a ser resolvido e era essa umas das principais questões 
do presidente que governou de 1956 a 1961, Juscelino Kubitschek, o famoso JK 
(vide Quadro 2). 
Quadro 2 - Lista de presidentes da república de 1946 a 1964 
Período Presidente Denominação 
1946 a 1951 Eurico Gaspar Dutra 
Quarta República 
República Populista 
1951 a 1954 Getúlio Vargas 
1954 a 1955 Café Filho 
1955 Carlos Luz 
1955 a 1956 Nereu Ramos 
 
3 União Democrática Nacional 
 
 
8 
1956 a 1961 Juscelino Kubitschek 
1961 Jânio Quadros 
1961 Ranieri Mazzilli 
1961 a 1964 João Goulart 
Fonte: Silva Junior, 2023. 
Segundo Orenstein e Sochaczewski (1990, p. 171), o governo JK tinha 
como principal característica o nacional-desenvolvimentismo, ou seja, 
“compromisso do setor público com uma explícita política de desenvolvimento”. 
O plano de ação dos diagnósticos e projeções da economia brasileira feitos 
desde o final da Segunda Guerra se materializaram na forma do Plano de Metas, 
com o famoso slogan de 50 anos em 5. 
[O Plano de Metas] constituiu o mais completo e coerente conjunto de 
investimentos até então planejados na economia brasileira. Por isto 
mesmo, o Plano foi implementado com sucesso alcançando-se a 
maioria das metas estabelecidas tanto para o setor público como para 
o setor privado. A economia cresceu a taxas aceleradas, com razoável 
estabilidade de preços e em um ambiente político aberto e 
democrático. Foi o último período em que estas três características 
estiveram presentes na economia brasileira. (Orenstein; 
Sochaczewski, 1990, p. 171) 
Para tanto, a entrada do capital estrangeiro seria de grande importância. 
Assim, facilitou a Instrução n. 113 da Sumoc, concedendo vantagens e até 
mesmo desprestigiando o capital nacional. O Plano tirava do papel metas 
ambiciosas na produção siderúrgica, refino do petróleo, geração de energia, 
construção de estradas e outros relativamente menores como alimentação e 
educação (Silveira Filho, 2000). E claro, seu maior símbolo histórico, a 
construção e mudança de capital do Brasil para Brasília. 
Do sucesso na consecução dos planos, o outro lado seria iminente: 
déficits cada vez maiores, aumento da carga tributária e emissões de papel 
moeda para tentar reduzir o peso das contas públicas. É deste período as 
principais causas de diversos problemas que assombrariamo Brasil anos 
depois: a dívida pública explosiva e a inflação. Segundo Silveira Filho (2000, p. 
35), foi o preço cobrado “para transformar um país agrário-exportador numa 
potência industrializada”. Além disso, a dependência do Brasil ao capital 
estrangeiro se tornaria permanente, colocando, muitas vezes, os interesses 
destes em detrimento dos interesses nacionais. 
 
 
9 
As escolhas do governo JK eram claras: ao invés de focar em medidas 
restritivas para estabilização da economia, optou-se pela continuidade do 
governo desenvolvimentista sem controle monetário, segundo a visão 
estruturalista de que “economias subdesenvolvidas só poderiam se industrializar 
com algum nível de inflação que deveria ser administrada, ao invés de se buscar 
preços controlados com estagnação” (Orenstein; Sochaczewski, 1990, p. 194). 
As tentativas de estabilização tomaram a forma de diversos “Planos de 
Contenção” da despesa orçamentária que tomaram ainda mais forma durante o 
governo Jânio Quadros em 1961, um governo conservador eleito pelas elites 
para trazer a estabilidade. No entanto, o ajuste foi radical, reduzindo e muitas 
vezes parando os investimentos, com foco nas exportações primárias. Era o 
abandono da política desenvolvimentista e o surgimento de uma nova, mais 
pragmática e preocupada com o fechamento das contas públicas, sem o arrojo 
de investidor adotado durante o governo JK. Com apenas seis meses de 
governo, Jânio Quadros renunciou. 
Após o governo intermediário de Ranieri Mazzilli, assume o presidente 
João Goulart, que governou de 1961 a 1964. Com a crise político-econômica 
deixada pelo seu antecessor, Jango opta pela solução nacionalista: restringir o 
capital estrangeiro, recuperar o salário-mínimo e controlar preços. De acordo 
com Silveira Filho (2000, p. 52), “solicita um plano desenvolvimentista aos 
economistas da esquerda moderada, o Plano Trienal. Contudo, após resultados 
desalentadores, Jango abandona esta formulação”. 
Da tentativa fracassada de “[...] ao mesmo tempo, tentar controlar o 
grande capital e contentar os trabalhadores”, com sugestão de mudanças 
radicais como a reforma agrária, Jango perdeu o controle da sua política. “A 
população ficou assustada, diante da organização de trabalhadores politizados, 
a ferretear reivindicações, mobilizantes das forças armadas aos civis, da cidade 
e do campo. [...] Nesse jogo de forças, venceu a primeira via, coroada com o 
Golpe de 64” (Silveira Filho, 2000, p. 52). 
TEMA 4 – DITADURA MILITAR E O MILAGRE ECONÔMICO 
Os primeiros governos a partir do Golpe de 64 significaram, do ponto de 
vista econômico, a conciliação com o capital estrangeiro com as relações até 
então intrincadas com os Estados Unidos. Ainda que cada governo no período 
tivesse suas próprias características, foram 21 anos em que a presidência da 
 
 
10 
república ficou cargo dos militares no Brasil (vide Quadro 3). O plano na vez era 
o Plano de Ação Econômica do Governo (Paeg), com objetivo de acelerar o 
crescimento econômico sem esquecer o combate à inflação. O que se seguiu 
foram políticas que acabavam em arrocho salarial, supressão de sindicatos. 
Quadro 3 - Lista de presidentes da república de 1964 a 1985 
Período Presidente Denominação 
1964 Ranieri Mazzilli 
Ditadura Militar 
1964-1967 Humberto Castelo Branco 
1967-1969 Artur da Costa e Silva 
1969 Junta militar de 1969 
1969-1974 Emílio Garrastazu Médici 
1974-1979 Ernesto Geisel 
1979-1985 João Figueiredo 
Fonte: Silva Junior, 2023. 
Com o alinhamento do governo com o setor externo, retornaram os 
empréstimos e financiamentos. Os investimentos diretos quase triplicaram. A 
capacidade ociosa trazida pela recessão de 1963 a 1965 levou a um crescimento 
gradual com pouca pressão sobre os preços. A ortodoxia monetarista criou a 
correção monetária para correção de preços e impostos, exceto para os salários, 
sempre abaixo da inflação. Era a almejada moderação, com “inflação 
amenizada, salários contidos e crescimento do PIB em fogo branco” (Silveira 
Filho, 2000, p. 55). 
O Paeg forjou as condições, sem que seus elaboradores pudessem 
esperar, para um crescimento econômico nunca visto: de 1968 a 1973 o PIB 
crescia a uma média anual de 11,2%. Era o período que ficou conhecido como 
“Milagre Econômico”. Como bem definiu Silveira Filho (2000, p. 56): 
Na aferição do PIB per capita, a produção de bens e serviços crescia 
de 5,9 a 39,56 vezes acima da população nesses anos delirantes. [...] 
os números de expansão do emprego vociferavam um crescimento de 
4,3% anual, na média do período. E a formação bruta de capital fixo, a 
base do investimento propulsor da economia, atingiu 21% do PIB na 
média de 1971 a 1973, dentre as maiores de toda a história. 
É deste período a reformulação institucional do sistema financeiro, que 
por meio da Lei 4.595 criou o Banco Central do Brasil, e a Lei 4.380, que criou o 
Sistema Financeiro da Habitação. O cenário era de crédito internacional, e o 
 
 
11 
aumento do endividamento, segundo Silveira Filho (2000, p. 63), “dotou o país 
de uma capacidade industrial formidável, entre as dez maiores do mundo, 
gerando emprego e renda”. É deste período também o Plano Nacional de 
Desenvolvimento (PND), implantado entre 1972 e 1974 com o objetivo de colocar 
o Brasil entre as nações desenvolvidas no espaço de uma geração. O plano 
seguia as mesmas pautas desenvolvimentistas de estímulos estatais à 
industrialização e ao consumo. 
A distribuição da renda sofreu uma significativa deterioração de 1960 a 
1972. Segundo Lago (1990), o índice de Gini aumentou de 0,497 em 1960 para 
0,622 em 1972. A concentração da renda no estrato dos 5% mais ricos passou 
de 28,3% em 1960 para 39,8% em 1972. No caso dos 1% mais ricos, passou de 
11,9% em 1960 para 19,1% em 1972. Em contraste, os 50% mais pobres, que 
recebiam 17,4% da renda em 1960, passaram a auferir 11,3% em 1972. 
A teoria de crescer o bolo para depois dividir não funcionou para o Brasil 
e trouxe consequências desastrosas em termos de desigualdade até os dias 
atuais, tal qual as consequências do período colonial e da escravatura. Os 
benefícios do crescimento assombroso do “milagre econômico” não foram 
distribuídos de forma equitativa, principalmente por conta das políticas de 
estabilização adotadas pelo governo e, mais uma vez, quem pagou a conta foi a 
parcela mais pobre da população. 
TEMA 5 – O FIM DO MILAGRE 
O primeiro sintoma de que o milagre estava em vias de acabar foi a 
denominada Crise do Petróleo, derivada da decisão da Organização dos Países 
Produtores de Petróleo (Opep) de aumentar subitamente os preços do produto. 
Segundo Silveira Filho (2000), os preços partiram de 1,90 dólares o preço do 
barril em 1972, para $ 2,50 em 1973, $ 10,41 em 1974, $ 13,03 em 1978, $ 29,75 
em 1979 e $ 35,69 em 1980. 
No Brasil, a pressão sobre os preços acelerou a inflação e desestimulou 
os investimentos que estavam a todo vapor na esteira do “Milagre Econômico”. 
O Brasil esteve em vias de decidir se absorveria a crise ou seguiria em frente a 
todo vapor, optando pela segunda opção. Uma nova estratégia de 
desenvolvimento se fez necessária e a solução adotada foi seguir em frente com 
mais endividamento externo, de modo a não estancar o crescimento econômico: 
era o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND). 
 
 
12 
O II PND foi considerado um segundo Plano de Metas: “um bloco de 
investimentos na metalurgia, petroquímica, matérias-primas básicas e bens de 
capital para substituir, de uma vez por todas, essas importações básicas” 
(Silveira Filho, 2000, p. 73). São deste período os investimentos públicos na 
Eletrobrás, Petrobrás, Siderbrás, Embratel, Itaipu e outros. Era a tentativa de 
continuar o período do “Milagre Econômico”. 
E, de fato, a estratégia funcionou. De 1974 a 1979 a economia cresceu 
7% ao ano, com investimento em Formação Bruta de Capital Fixo na casa dos 
23% em relação aoPIB (Silveira Filho, 2000). No entanto, a submissão do capital 
nacional ao capital estrangeiro começou a se tornar preocupante, gerando um 
capitalismo atrasado, que comprava sua tecnologia pronta ao invés de 
desenvolvê-la, por meio de uma poupança externa barata e abundante, muitas 
vezes com juros reais negativos, até meados de 1982. 
O esgotamento dessa estratégia se deu com a alta das taxas de juros no 
início dos anos 1980, levando os países em desenvolvimento, especialmente os 
da América Latina, a um endividamento externo sem precedentes. Segundo 
Silveira Filho (2000), a dívida externa brasileira, que em 1981 estava em 73 
bilhões de dólares, alcançou 123 bilhões em 1990. A fonte do crédito barato 
secara e levava a economia para o caminho da estagnação. Era o início da 
década perdida. 
NA PRÁTICA 
1. O processo de "se voltar para dentro" da economia brasileira durante o 
início da Era Vargas teve um significado profundo. O que essa estratégia 
representou para o Brasil? Como o país buscou enfrentar os desafios 
decorrentes da crise internacional e da crise de superprodução do café? 
Quais foram as principais medidas adotadas para promover o 
desenvolvimento da indústria nacional e fortalecer o mercado interno? 
2. Durante os anos conhecidos como República Populista (1946-1964), o 
conflito entre estabilização econômica e promoção do crescimento esteve 
presente de forma intensa. Como essa tensão foi conciliada durante esse 
período? Quais foram as principais políticas econômicas adotadas para 
equilibrar esses objetivos aparentemente contraditórios? Quais foram os 
impactos dessas políticas na economia brasileira e na vida da população? 
 
 
 
13 
3. O Plano de Metas foi uma estratégia fundamental para o desenvolvimento 
da economia brasileira em um determinado período. Quais foram as 
principais forças e fraquezas desse plano? Como ele foi implementado e 
quais foram os resultados alcançados? Como o Plano de Metas contribuiu 
para a modernização da indústria brasileira e para a transformação do 
país em diferentes setores? 
4. Durante o período do "Milagre Econômico", caracterizado por altas taxas 
de crescimento econômico, houve um conflito distributivo entre esse 
crescimento e o aumento das desigualdades no Brasil. Quais foram as 
causas desse conflito? Como as políticas adotadas durante o "Milagre 
Econômico" afetaram a distribuição de renda e a estrutura social do país? 
Quais foram as consequências desse período para as desigualdades e a 
sustentabilidade do crescimento econômico no longo prazo? 
FINALIZANDO 
Durante o período de 1930 a 1980, o Brasil passou por uma série de 
transformações profundas, que o levaram de um país agrário-exportador e de 
economia fragilizada a se tornar a 8ª maior economia do mundo. A transição de 
uma população majoritariamente rural para uma população predominantemente 
urbana refletiu a rápida industrialização do país, que se tornou capaz de produzir 
uma ampla variedade de bens. No entanto, as expectativas de se tornar uma 
potência econômica em poucas décadas não se concretizaram, resultando em 
um cenário de endividamento, desigualdade e estagnação. 
Os planos de desenvolvimento adotados ao longo dos últimos 50 anos 
foram responsáveis por impulsionar a industrialização e o crescimento 
econômico do Brasil. No entanto, essas estratégias não conseguiram traduzir 
essa riqueza em um desenvolvimento econômico pleno e equitativo. Mesmo sem 
as circunstâncias históricas adversas - como a crise do petróleo e as altas taxas 
de juros - é improvável que o resultado desse meio século fosse 
significativamente diferente para a parcela mais vulnerável da população. O país 
experimentou crescimento, mas permaneceu nas mãos de elites com interesses 
questionáveis, sendo que, ironicamente, muitas dessas elites opressoras já nem 
eram mais brasileiras. 
Essa contradição entre crescimento econômico e desigualdade social 
evidencia uma realidade em que os frutos do desenvolvimento não foram 
 
 
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distribuídos de forma justa e inclusiva. O Brasil enfrentou desafios estruturais 
que impediram a construção de uma sociedade mais igualitária, em que todos 
os cidadãos pudessem desfrutar dos benefícios do progresso econômico. A 
concentração de poder econômico e a falta de políticas efetivas para combater 
as desigualdades perpetuaram um ciclo de exclusão social. 
Para compreender o presente e construir um futuro mais promissor, é 
essencial refletir sobre essa trajetória histórica. O capítulo explorou as mudanças 
e os obstáculos enfrentados pelo Brasil ao longo dessas décadas, permitindo-
nos identificar os fatores que contribuíram para a persistência da desigualdade 
e do subdesenvolvimento. Ao compreender esses aspectos, podemos buscar 
alternativas e soluções que promovam um desenvolvimento econômico mais 
inclusivo, sustentável e equitativo, transformando o Brasil em um país que 
verdadeiramente beneficie todos os seus cidadãos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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REFERÊNCIAS 
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