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2014 Ecologia, BiodivErsidadE E ÁrEas ProtEgidas Profª. Iraci Alves Profª. Cláudia Sabrine Brandt Profª. Edna Maria Alves Copyright © UNIASSELVI 2014 Elaboração: Profª. Iraci Alves Profª. Cláudia Sabrine Brandt Profª. Edna Maria Alves Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 301.3108 A474e Alves, Iraci Ecologia, biodiversidade e áreas protegidas / Iraci Alves, Cláudia Sabrine Brandt, Edna Maria Alves. Indaial : Uniasselvi, 2014. 240 p. : il ISBN 978-85-7830-856-8 1. Ecologia I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. Impresso por: III ApresentAção Prezado(a) acadêmico(a)! Considerando o compromisso do Grupo UNIASSELVI em garantir a qualidade do material disponibilizado para auxiliar no seu processo de aprendizagem é sempre um desafio desenvolver um material de estudo que possa contribuir efetivamente para a formação de um profissional que seja capaz de ir além do saber, mas saber fazer, produto do conhecimento compartilhado e internalizado. Neste sentido, este caderno busca fornecer subsídios para suas atividades de construção do conhecimento através da apresentação de temas relevantes à disciplina Ecologia. O processo de construção se deu no sentido de estimular o aprendizado do conteúdo apresentado em um material eficiente. O conteúdo é rico em informações, entretanto não temos a pretensão de esgotar a discussão do tema e por isto foi necessário delimitar a abordagem. São apresentadas 3 unidades, subdivididas em tópicos cujo objetivo principal é estimular seu interesse e curiosidade no estudo da disciplina. Sugerimos algumas vezes outras fontes de informações que serão úteis para a consolidação do seu conhecimento. A Unidade 1 do caderno apresenta no Tópico 1, definições que possibilitam a compreensão dos conceitos básicos de Ecologia. No tópico 2 são relacionados os fatores que influenciam o ambiente físico. O Tópico 3 trata da correlação entre clima e biomas e o Tópico 4 busca identificar a correlação entre meio físico e a disponibilidade de recursos naturais. A Unidade 2 apresenta conteúdo que busca facilitar o conhecimento da dinâmica da estrutura das populações naturais, identificando as diferentes formas de interação ocorrentes entre os organismos. No tópico 3 são apresentados conteúdos que possibilitam a compreensão dos padrões e processos existentes nas comunidades e para finalizar a unidade, no Tópico 4 são apresentadas as relações de fluxo de energia e matéria que regem a dinâmica dos ecossistemas. Finalmente, a Unidade 3 aborda as aplicações da ecologia, onde são tratados temas atuais como a Ecologia da Conservação, a Ecologia Humana e fechando o caderno o Tópico Desenvolvimento Sustentável. Lembre-se que a UNIASSELVI coloca a sua disposição tutores e demais colaboradores que podem contribuir neste modelo de Educação a Distância. IV Sucesso em sua caminhada! Profa. Cláudia Sabrine Brandt Profa. Edna Maria Alves Profa. Iraci Alves Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! UNI V Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos! UNI VI VII sumário UNIDADE 1 - VIDA E AMBIENTE FÍSICO ..................................................................................... 1 TÓPICO 1 - ECOLOGIA BÁSICA ....................................................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 HISTÓRIA DA ECOLOGIA ............................................................................................................... 4 3 OS ORGANISMOS E O MEIO FÍSICO – CONCEITOS .............................................................. 6 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 11 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 13 TÓPICO 2 - AMBIENTE FÍSICO ......................................................................................................... 15 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 15 2 POTENCIAL BIÓTICO ....................................................................................................................... 15 3 FATORES LIMITANTES FÍSICOS .................................................................................................... 17 4 MAGNIFICAÇÃO BIOLÓGICA DAS SUBSTÂNCIASTÓXICAS ............................................ 20 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 23 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 25 TÓPICO 3 - BIOMAS .............................................................................................................................. 27 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 27 2 O QUE SÃO BIOMAS? ........................................................................................................................ 27 3 AS CONDIÇÕES QUE DETERMINAM A DISTRIBUIÇÃO DOS BIOMAS E A ADAPTAÇÃO DOS SERES VIVOS AOS PRINCIPAIS BIOMAS MUNDIAIS E BRASILEIROS ......................................................................................................................................... 27 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 51 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................35 Bioma florestas decíduas temperadas As florestas decíduas temperadas originalmente cobriam a América do Norte, no leste dos Estados Unidos e sul do Canadá, parte da Europa Ocidental e no leste da Ásia, e Hemisfério sul (Nova Zelândia e sul do Chile). O reflexo desse grau de isolamento é a diversidade na composição de suas espécies. As chuvas são abundantes e bem distribuídas o ano todo (75 a 150 cm3), e temperaturas moderadas formando um padrão sazonal distinto (-30ºC e 30ºC). Nas latitudes mais baixas (Florida e Nova Zelândia), os invernos são amenos (pouca geada e seca), com árvores latifoliadas perenifólias, cuja estação de crescimento dura cerca de 180 dias. Já ao norte (latitudes altas) das Florestas de Maine e meio oeste superior dos Estados Unidos, as estações são fortemente marcadas, o inverno é curto, com seis meses de baixas temperaturas e muita neve, com uma estação de crescimento vegetativo que dura aproximadamente 130 dias. Há predomínio de árvores decíduas, cujas folhas caem no outono, tornando- se dormentes após grande transferência do seu conteúdo mineral para o seu corpo lenhoso. No outono, à medida que a temperatura cai, as folhas da vegetação de médio e grande porte, e arbustos ficam avermelhadas ou amareladas e caem. Por isso, muitos autores denominam estas florestas de temperada caducifólia (folhas envelhecem e caem) havendo um grande contraste entre o verão e o inverno, onde no inverno a vegetação das florestas perdem completamente suas folhas. Na primavera, as temperaturas vão aumentando gradativamente, assim como, as chuvas. Nas camadas de estratificação entre as árvores decíduas dominantes e as ervas e arbustos, que são bem desenvolvidas, a floração e o crescimento destes dois tipos de vegetação se completam antes do início da primavera, que é quando as árvores dominantes completam a sua cobertura com folhas. O solo é abundante em material orgânico, como também a biota do solo (decomposição folhas e frutos). Com exceção das partes mais secas e quentes do bioma da floresta sazonal temperada, principalmente onde os solos são arenosos e pobres em material orgânico, tendem a se desenvolver florestas acículas, dominadas por pinheiros, predominantemente na América do Norte (planícies costeiras do Atlântico e dos estados do Golfo dos USA) e no oeste e sudeste dos Estados Unidos onde os incêndios são frequentes e a maioria das espécies está adaptada/resistência aos danos do fogo. A vegetação variada é formada por belotas e castanheiras (produzem frutas com polpa e nozes), carvalhos-vermelhos (espécie longeva), bordo (colonizadores de clareiras), faia etc. A fauna também apresenta uma grande diversidade, como insetos sazonais, de ciclos de vida curtos (comedores de folhas), aves migratórias (joão-de-barro e várias espécies de pica-paus, característico de estágios florestais maduros, entre outros), que retornam na primavera, veados, ursos, esquilo-cinza, raposa-cinza e dourada, lince e peru selvagem. (ODUM; BARRETT, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003) (Figura 15). Segundo Odum e Barrett (2008), entre os principais tipos de floresta decídua madura da América do Norte está a floresta de faia-bordo, floresta de bordo-tília, 36 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO floresta de carvalho-nogueira, floresta de carvalho-castanheira das montanhas Apalaches (atualmente apenas uma, devido à destruição por doenças de fungos), floresta mesofítica mista do platô dos Apalaches e floresta edáfica de pinheiros da planície costeira do sudeste. FIGURA 15 – (a) FLORESTA TEMPERADA ÚMIDA EM WASHINGTON (b) FLORESTA TEMPERADA DA CHINA FONTE: Disponível em: (a) . (b) . Acesso em: 11 mar. 2013. Bioma florestas pluviais tropicais As florestas pluviais tropicais se estendem em três regiões dos trópicos. A primeira constitui a floresta pluvial americana, que se localiza nas bacias do Amazonas e do Orinoco da América do Sul, com áreas adicionais na América Central e ao longo da costa atlântica do Brasil. A segunda, encontra-se na África Ocidental (bacia do Congo), e a terceira, cobre parte do Sudeste da Ásia (Índia, Malásia, Tailândia) e parte da Austrália. O clima é sempre quente com temperaturas geralmente altas (21ºC e 32ºC), grande precipitação, pelo menos 2000 mm anuais, e não abaixo de 100 mm em qualquer mês e grande umidade relativa do ar (transpiração dos vegetais). Esta floresta pluvial é extremamente estratificada, cujas árvores formam cinco camadas, que se distinguem em árvores emergentes ocasionais entre 50 e 60 metros de altura (acima camada dossel), geralmente decíduas, mesmo em floresta pluvial perene; as árvores da camada do dossel, formando um tapete contínuo de 25 a 35m de altura; o estrato de árvores mais baixas de 15 a 24 m de altura, tornando-se mais denso quando aparecem clareiras da quebra do dossel; os arbustos e árvores jovens, que se encontram em sombra profunda; e as camadas de herbáceas formadas por ervas e gramíneas altas, entre elas as lianas lenhosas (cipós) e as epífitas (orquídeas, samambaias, bromélias). A luminosidade é alta (incidência de radiação solar), principalmente na copa das árvores (temperaturas mais altas), que filtram a radiação solar (fotossíntese), permanecendo mais escuro nos estratos inferiores, aumentando a umidade e com menor temperatura, comparado aos estratos superiores. A produtividade TÓPICO 3 | BIOMAS 37 fotossintética pode ser superior a 1.000 g de carbono fixado por metro quadrado ao ano, devido à alta radiação solar e chuvas regulares e abundantes. Neste bioma encontra-se a maior biodiversidade de espécies, comparado aos outros biomas encontrados no planeta terra. Por isso, a preocupação na comunidade científica, da necessidade da preservação de grandes áreas de floresta tropical como recurso genético. Estima-se que mais de 50% das espécies animais e vegetais do planeta se encontrem em florestas tropicais. A rápida degradação da matéria orgânica (alta temperatura e umidade), que acelera a decomposição da serapilheira sobre o solo, é rapidamente absorvida pelas raízes das árvores, tornando o solo geralmente pobre e vulnerável à perturbação. A fauna é rica em biodiversidade, com milhares de espécies de insetos, muitas espécies de aves, onças, primatas, capivaras, antas, tartarugas, cobras, jacarés, peixes, anfíbios etc. E por fim, nas áreas montanhosas dos trópicos encontramos a floresta pluvial montana (terras baixas), que vai ficando progressivamente menos alta com a elevação da altitude, aumentando a biomassa das epífitas, se direcionando para uma floresta de neblina anã e ao longo da margem e leitos dos rios denominada de floresta de galeria ou às vezes de mata ciliar. (ODUM; BARRETT, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003) (Figura 16 a; b). FIGURA 16 – (a) FLORESTAS TROPICAIS ÚMIDAS, ILUSTRADA PELA VEGETAÇÃO AO LONGO DO RIO SEGAMA, NO BORNÉO, (b) FLORESTAS TROPICAIS MUNDIAIS FONTE: Disponível em: (a) . (b) . Acesso em: 11 mar. 2013. Bioma campos (pradarias ou estepes) temperados As grandes áreas de pradarias temperadas se estendem desde o interior da América do Norte e da Eurásia, ao Sul da América do Sul (pampas argentinos) e da Austrália. Nestes locais, ocorre uma baixa umidade do ar, com precipitações que ficam entre as que ocorrem nos desertos 250 a 750 mm/ano (regiões temperadas), e nas áreas de florestas, que passam dos 1000 mm/anuais (regiões subtropicais). 38 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO Segundo Odum e Barret (2008), existem três tipos de pradarias, determinados pelo volume de precipitação, na América do Norte e dividido entre zonas que vão do Leste-Oeste, que são: “pradaria alta, típico das regiões bem úmidas, com gramíneas de 2 a 3m de altura e raízes bem profundas (grandes capins-vassoura Andropogon gerardii, branqueja Panicum virgatum, capim-do-banhado Sorghastrum nutans, entre outros),a pradaria mista, com grande diversidade florística de 1 a 2 metros de altura (pequenos capins-vassoura Andropogon ecoparius, capim-agulha Stipa spartea, capim-mourão Sporobolus heterolepis, grama-de-ponta Agropyron smithii, capim- de-junho Koeleria cristata e capim-arroz Oryzopsis hymenoides), presente em solos muito férteis e por fim a pradaria baixa, com gramíneas de pequeno porte de 0,1 a 0,5m de altura (capim-de-búfalo Buchloe dactyloides, grama-azul Bouteloua gracilis, outras gramas Bouteloua spp., capim-do-campo Poa spp., cevada Bromus spp.), além de pouca diversidade de espécies”. As temperaturas variam desde 38ºC (verão) a 0ºC (inverno). A vegetação é herbácea fechada adaptada a pouca disponibilidade de água no solo, mas é fértil em matéria orgânica, pela decomposição, típico de clima temperado. Estes campos também são conhecidos por “veldt” (África do sul), “estepe” (Ásia), “pradarias” (América do Norte) e “pampa” (América do sul). A flora, como citado anteriormente não necessitam de grande quantidade de água para se desenvolverem, mas necessitam do fogo, através das queimadas naturais, para a renovação do substrato das gramíneas, bem como ao ciclo de vida das gramíneas típicas das pradarias. Mas quando mal conduzida através de queimadas criminosas, atividade agropecuária desordenada, florestamentos para a produção de celulose (monocultura) podem causar enormes perdas ambientais, como a desertificação. A flora é composta por diversas espécies de gramíneas, já citadas anteriormente, como também por herbáceas e alguns arbustos, e árvores típicas de clima quente e seco. Nas pradarias, a fauna é composta por cabras muito usadas em áreas de pastagens (criação de gado). E pelos animais nativos como os ratos do campo, espécies de cabras, bois, raposas, bisões, pequenos antílopes, búfalos, lebres, cães-da-pradaria, entre outros. (ODUM; BARRETT, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003; PLANETABIO, 2013). (Figura 17 a; b). FIGURA 17 – (a) ESTEPE NORTE AMERICANO E (b) PAMPAS SULINOS, BRASIL FONTE: Disponível em: . Acesso em: 11 mar. 2013. TÓPICO 3 | BIOMAS 39 Bioma campos tropicais do tipo savanas ou cerrados A maior área se encontra na África, as “savanas africanas”, parte da Austrália, e na América do Sul, “o cerrado brasileiro” e os “pampas argentinos”. As savanas são campos com árvores esparsas, que se espalham nos trópicos secos, limitando o crescimento da vegetação, cujos climas tropicais frequentemente apresentam uma ou duas estações de secas prolongadas. Os incêndios e as migrações dos pastejadores são importantes para a manutenção das características deste bioma e quando o fogo for de forma controlada neste habitat de savana, a floresta seca começa a se desenvolver. As precipitações sazonais, nos locais mais quentes chegam à média de 1000 a 1500 mm/ano (pouca umidade), que é maior no verão e geralmente seco no inverno, restringindo a diversidade de espécies animais e vegetais na savana. Assim, as estações são reguladas pelas precipitações e não pela temperatura, como nos campos de clima temperado. As temperaturas variam de acordo com a latitude: no cerrado brasileiro varia entre 10ºC (inverno) e 38ºC (verão), na savana africana, as médias anuais ficam acima de 20ºC. No Brasil chove principalmente entre outubro e março. Devido à forte sazonalidade, com abundância de sementes e insetos, as savanas podem suportar grandes populações de aves migratórias, mas poucas espécies encontram recursos para o ano inteiro. A flora é composta por espécies de gramíneas, herbáceas, arbustos ou árvores de pequeno porte como: barbatimão, jacarandá entre outros; e acácias na savana africana, com raízes de mais de 10 metros (absorção água do lençol freático). A fauna na savana africana é composta por elefantes, rinocerontes, antílopes, guepardos, hienas, leões, zebras, girafas, leopardos; no cerrado brasileiro encontra-se: emas, lobo-guará, tamanduá, onça, suçuarana, veado-campeiro, porcos selvagens (queixada e caititus), tatu etc. (ODUM; BARRETT, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003) (Figura 18). FIGURA 18 – SAVANAS AFRICANAS FONTE: Disponível em: (a) . (b) . Acesso em: 11 mar. 2013. 40 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO Bioma de bosque ou campos de vegetação mediterrânea O clima mediterrâneo encontra-se principalmente no sul da Europa Ocidental, com pequenos trechos ao sul da Califórnia (Hemisfério Norte), no Chile Central (região do Cabo da África do Sul) e sudoeste da Austrália (Hemisfério Sul). O clima é ameno, caracterizado por temperaturas de inverno moderado (0ºC) e chuvas moderadas, mais intensas no inverno e outono (500 e 1000 mm/ano), e o verão é quente e seco, com uma grande amplitude térmica: durante o dia (próximo 30ºC), caindo bruscamente à noite. Cujo clima proporciona uma vegetação arbustiva, espessa, perene (1-3m altura), com raízes profundas e folhas pequenas e duráveis (vegetação esclerofilosa – folha dura), como maquis (vegetação mais densa e fechada) e o gaguirres (arbustos de pequeno porte e esparsos), com predomínio de arbustos/plantas xerófitas (adaptação à perda excessiva água por transpiração), cutícula espessa e tronco com casca grossa (carvalho, cactáceas, alecrim, oliveiras, loureiro, alfazema etc.). A maioria dos vegetais apresentam sementes resistentes ao fogo, que renascem após o fogo. Os animais mais frequentes são: insetos, javalis, veados, coelhos, répteis e muitas espécies de aves migratórias. (ODUM; BARRETT, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003) (Figura 19). FIGURA 19 – FLORESTA DO MEDITERRÂNEO – COIMBRA PORTUGAL FONTE: Disponível em: . Acesso em: 11 mar. 2013. Bioma deserto O termo deserto refere-se às áreas secas, que quase não recebem chuva, dependendo da zona climática em que se localizam, apresentam suas características típicas. Os desertos subtropicais das Américas desenvolvem-se em latitudes de 20º a 30º norte e sul do Equador, com alta pressão atmosférica, chuvas esparsas (menos de 250 mm/ano) e estações de crescimento vegetal longo, que com a presença das chuvas de verão, muitas plantas herbáceas, como os arbustos creotoso (Larrea tridentata) são dominantes, suculentos cactos (Carnegiea gigantea) e pequenas árvores como a mesquita e o palo verde (Parkinsonia) e as sementes dormentes crescem rapidamente e se reproduzem antes que o solo seque novamente. As TÓPICO 3 | BIOMAS 41 plantas dos desertos subtropicais não resistem aos invernos gelados. Devido à baixa precipitação, o solo é raso (aridossolos), com ausência de matéria orgânica e de pH neutro, formação de muitos lençóis freáticos nas camadas inferiores, e há muitos depósitos de sal. No deserto de clima continental, com baixa precipitação e invernos frios, como nos desertos do Great Basin, encontra-se a sálvia (Artemisia) como vegetação dominante. Os principais desertos se encontram na África (Saara e Kalahari), Emirados Árabes, Argentina, Bolívia, Tibete, Chile (Atacama), China, México, Austrália e Estados Unidos. Existe uma grande amplitude térmica: no deserto do Atacama (Chile), durante o dia a temperatura chega aos 40ºC, caindo à noite para 0ºC e no deserto do Saara (maior deserto do mundo), já chegou a 57ºC durante o dia e pode cair a 0ºC à noite. Segundo estudos, aparentemente, os únicos lugares, em que quase não ocorre precipitação ou nenhuma chuva, localizam-se no centro do Saara e no norte do Chile. A flora é composta por plantas xerófitas, folhas pequenas ou transformadas em espinhos, folhas com cutícula espessa, poucos estômatos ou contidos em criptas. As raízes são longas, para poderem absorver água nos lençóis freáticos, com predomínio de cactáceas. A fauna é composta por animais adaptados a pouca água. A maioria apresenta hábitos noturnos (evitar excesso de transpiração), como os roedores, insetos, escorpiões, cobras, lacraias e lagartos.Os camelos e dromedários conseguem atravessar grandes áreas do deserto africano e do Oriente Médio sem beber água, porque seus tecidos toleram um grau de desidratação que seria fatal para a maioria dos animais. (ODUM; BARRETT, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003) (Figura 20 a; b). FIGURA 20 – (a) DESERTO DO WHITE SANDS, NOVO MÉXICO; (b) DESERTO DO SAARA, ÁFRICA FONTE: Disponível em: (a) , (b) . Acesso em: 11 mar. 2013. Os camelos não armazenam água em suas corcovas, isto é um mito. São nas corcovas em que os camelos acumulam a maioria da sua gordura, podendo sobreviver por muitos dias sem se alimentar no deserto, que é imprescindível, devido à escassez de alimento. DICAS 42 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO Principais biomas terrestres brasileiros Bioma é a relação entre a flora e a fauna, cuja diversidade depende desde aspectos fitogeográficos a aspectos abióticos (água, luz, minerais no solo e ventos) encontrados nos grandes domínios da natureza brasileira. Os principais biomas brasileiros são: Floresta Amazônica, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampa e o Pantanal. (AB`SABER, 2006) (Figura 21 a; b). FIGURA 21 – (a): DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DOS PRINCIPAIS BIOMAS BRASILEIROS FONTE: Banco de dados IBAMA – SIGPNRH (SRH/MMA). Disponível em: . Acesso em: 8 maio 2013. FIGURA 21 – (b): DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DOS PRINCIPAIS BIOMAS BRASILEIROS FONTE: Disponível em: . Acesso em: 8 maio 2013. TÓPICO 3 | BIOMAS 43 FIGURA 22 – LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DOS BIOMAS BRASILEIROS, E SEU PERCENTUAL DE OCUPAÇÃO NO TERRITÓRIO BRASILEIRO FONTE: IBGE, 2004. Disponível em: . Acesso em: 25 mar. 2013. Floresta Amazônica Segundo o IBGE, (2004) a Floresta Amazônica é o maior bioma brasileiro, abrangendo uma área de 4.196.943 km2 (Figura 23). Esse bioma fica localizado na região Norte (Amazonas, Pará, Roraima, Rondônia, Acre, Amapá, Maranhão, Tocantins e Mato Grosso). A floresta é úmida e quente (20ºC e 41ºC) quase o ano todo, com alto índice pluviométrico de até 6000 mm/ano. O solo é pobre em nutrientes (rápida decomposição do material orgânico) devido à alta temperatura e umidade, mas logo absorvido pelas raízes das árvores, com pouca penetração no subsolo. A paisagem é formada por árvores altas que ficam em terra firme (mais 60m), por matas de várzeas (periodicamente inundadas), por matas de igapó (áreas baixas, permanentemente inundadas), cuja vegetação deste bioma é formada por folhas latifoliadas (grande área foliar), pluriestratificada (árvores com tamanhos diferentes). (AB´SABER, 2006; PLANETABIO, 2013). 44 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO A flora predominante da Floresta Amazônica é a Floresta Ombrófila Densa (41,67%), deste total cerca de 12,47% foram alterados pela ação do homem, sendo que 2,97% se encontram em recuperação em forma de vegetação secundária e 9,50% do total da área da floresta ombrófila densa são usados na agricultura e pecuária. (PROBIO – MMA, 2004). A Amazônia é a maior floresta tropical e a com maior biodiversidade biológica do mundo. Neste bioma encontra-se um grande número de espécies de angiospermas (plantas com flores), em que se destacam: a castanheira, o cacau, o palmito, o cupuaçu, o coco-de-açaí, o guaraná e a seringueira (onde se extrai o látex na fabricação da borracha). Assim como também plantas medicinais, como o curare (potente anestésico), quinino (combate a malária), e o mogno e a cerejeira, na extração da madeira, para a construção civil e de móveis residenciais. Além disso, representa um dos biomas mais ricos em biodiversidade de número de espécies animais do mundo. (AB´SABER, 2006; PLANETABIO, 2013) (Figura 23). FIGURA 23 – CARACTERIZAÇÃO DA FAUNA E FLORA DA MAIOR FLORESTA TROPICAL DO MUNDO E A MAIOR EM BIODIVERSIDADE, FLORESTA AMAZÔNICA BRASILEIRA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 25 mar. 2013. Cerrado O cerrado abrange uma área estimada de 2.036.448 km2, segundo o IBGE (2004) (Figura 24). De acordo com PROBIO-MMA (2004), sua área é recoberta por 60,42% de vegetação nativa, em suas diversas fitofisionomias. Deste percentual, a área florestada abrange 36,73% do bioma do cerrado e a área não florestada recobre 23,68%. O restante refere-se à área antrópica (38,98%), onde as pastagens cultivadas (26,45%) são predominantes do bioma, onde 0,6% do território é coberto por águas superficiais. Do total do cerrado, a região fitoecológica predominante é a de Savana Arborizada (20,42%), seguido da Savana Parque (15,81%). (PROBIO- MMA, 2004). TÓPICO 3 | BIOMAS 45 As folhas apresentam cutícula grossa, com muitos estômatos que, ficam abertos inclusive no calor. A vegetação é composta por árvores e arbustos de pequeno porte, com características xeromórficas, apresentando raízes profundas (seca), troncos tortuosos (escleromorfismo), súber grosso e folhas espessas com pelos, devido ao tipo de solo, que é rico em alumínio e ferro, e pobre em outros nutrientes, podendo haver no subsolo reservatórios de água (abaixo de 2m profundidade). Podemos encontrar a vegetação de cerrado, nas regiões de Goiás, Bahia, Piauí, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Tocantins, Minas Gerais, São Paulo e Distrito Federal. É no cerrado que nascem as três maiores bacias da América do Sul (Amazônica/Tocantins, São Francisco e Prata), resultando num grande e potente aquífero e biodiversidade. O clima é tropical quente subúmido, com temperatura média anual entre 22ºC e 27ºC, com pouco vento. Os períodos chuvosos e de seca são bem definidos, sendo os meses de setembro e maio, os períodos de chuvas mais concentrados, acarretando em um inverno seco, com clima tropical sazonal, cuja vegetação pode sofrer com o fogo espontâneo (fenômeno natural), renovando a vegetação local. A principal vegetação deste bioma é o araçá, murici, gabiroba, pau-terra, indaiá (palmeira de caule subterrâneo), capim-flecha e o buriti (palmeira) encontrada a margem dos rios do cerrado. A fauna também é rica em espécies como a ema (maior ave das Américas), gavião-carcará, siriema, urubu-rei, socó, tucano, periquito, lobo-guará, onça-pintada, anta (maior mamífero terrestre das Américas), tamanduá, tatu, raposa, veado-campeiro, várias espécies de primatas (macacos), além de muitos insetos entre outros. (AB´SABER, 2006; PLANETABIO, 2013) (Figura 24). FIGURA 24 – CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA DE CERRADO COM SUA VEGETAÇÃO PREDOMINANTE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 25 mar. 2013. Caatinga A caatinga é o único bioma exclusivamente brasileiro, com uma área de 518.635 km2. (IBGE, 2004) (Figura 25). Incluindo a esta estimativa, as fitofisionomias de caatinga, estão a savana estépica com (35,9%), cerrado e mata atlântica com (8,43%), as áreas de tensão ecológica, que são os ecótonos com (18%). É o principal bioma do Nordeste ocupando totalmente o Ceará, Bahia, Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Piauí, Alagoas, Sergipe, Maranhão e 2% na região de Minas Gerais. (PROBIO-MMA, 2004). 46 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO O índice pluviométrico fica entre 250 e 1000 mm/ano e a temperatura média entre 27ºC e 29ºC, tratando-se de um clima semiárido. O solo é arenoso, rochoso e alcalino (onde a grande evaporação acelera processo da salinização do solo), ocorrendo acúmulo de água no subsolo (lençol freático). O bioma se diversifica entre os brejos de altitude (próximo regiões serranas), são áreas com grande fertilidade do solo. Ex.: Vale do São Francisco, com projetos de irrigação artificial, para o cultivo de frutas (uva, manga, melão e outros). A vegetação é formada por árvores e arbustos tortuosos, com adaptações morfofisiológicas: plantas xerófitas, caducifólia (folhas caem na época da seca), com folhas reduzidas ou transformadasem espinhos (cactáceas), raízes profundas (para atingirem o lençol freático). Quando chove, as folhas ficam esverdeadas e com muitas flores atraindo uma vasta fauna. Ações do homem, como o desmatamento e as queimadas já alteraram mais do que a metade os ecossistemas deste tipo de bioma. A fauna é constituída por animais como a cascavel, a jiboia, o gavião-carcará, a gralha, a cutia, o gambá, o preá, o veado-campeiro, o tatupeba, a ararinha-azul (praticamente extinta), entre outros. (AB´SABER, 2006; PLANETABIO, 2013) (Figura 25). FIGURA 25 – CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA DE CAATINGA COM SUA VEGETAÇÃO PREDOMINANTE Mata Atlântica Segundo o mapeamento realizado pelo IBGE, (2004), a cobertura vegetal da Mata Atlântica é de 1.110.182 km2 (Figura 26). A cobertura vegetal nativa total na época da colonização era cerca de 15%, agora restam apenas 7% da cobertura original. Deste restante encontram-se 26,97% da cobertura vegetal nativa e 21,80% são constituídos por diferentes fisionomias florestais. As florestas ombrófilas densas, com 9,10% são o principal componente florestal do bioma, seguindo-se as florestas estacionais semideciduais, com 5,18%, depois as florestas ombrófilas abertas (com palmeiras), hoje praticamente extintas (0,25%) e as Savanas Gramíneo-lenhosas (cerrado), são as mais representativas no bioma (3,43%). (PROBIO-MMA, 2004). A Mata Atlântica também é uma floresta tropical pluvial, que apresenta muitas das características da Floresta Amazônica. O que as distingue provavelmente seja a topografia do terreno onde se localizam. A Floresta Amazônica ocupa planícies FONTE: Disponível em: . Acesso em: 25 mar. 2013. TÓPICO 3 | BIOMAS 47 e planaltos no interior do Brasil, enquanto a Mata Atlântica ocorre na região costeira, em planícies e montanhas como a serra do mar e a serra da Mantiqueira (estende-se ao longo de todo o litoral brasileiro, do Rio Grande do Norte até o Rio Grande do Sul). Ao norte o clima é tropical úmido e ao sul ele é subtropical úmido. Existe uma grande cadeia de montanhas por toda a costa litorânea, que varia entre 500 a 800m acima do nível do mar (norte), ao sul, em torno de 900m na região da Serra do Mar e São Paulo. Devido ao calor e alta umidade ocorre uma aceleração da decomposição, não ficando muitos nutrientes no solo, porque já são absorvidos pelas raízes das plantas. A vegetação é similar à Floresta Amazônica, com folhas e caules pendentes, para facilitar o escoamento da água. Com a maior biodiversidade de animais e vegetais entre os biomas brasileiros. Mesmo com a redução e fragmentação da Mata Atlântica nas últimas décadas, a mesma possui uma grande importância social e ambiental. Pois regula o fluxo dos mananciais hídricos, influencia o clima e protege escarpas e encostas das serras. Nelas nascem diversos rios que abastecem cidades e metrópoles. Entre as plantas que se destacam neste tipo de bioma são o pau-brasil, jacarandá, palmito, jambo, jambolão, paineira, figueira, caviúna, jatobá e embaúba. Além da fauna que é muito rica, em que aproximadamente 40% do total de mamíferos, aves e répteis existentes são endêmicas (próprias deste local). Entre as espécies ameaças de extinção estão o cachorro-vinagre, a onça-pintada, a jaguatirica, o mono-carvoeiro, o bugio o sagui, o guaxinim, o mico-leão-dourado, o jacu, o macuco, a jacutinga, o tiê-sangue, o mutum, o sanhaço, a araponga, entre outros (AB´SABER, 2006; PLANETABIO, 2013) (Figura 26). Na classificação de biomas realizada pelo IBGE (2004), a mata de araucárias faz parte do bioma Mata Atlântica, que em outras classificações é considerado um bioma à parte. FIGURA 26 – CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA DE MATA ATLÂNTICA COM SUA VEGETAÇÃO PREDOMINANTE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 25 mar. 2013. NOTA 48 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO Pantanal O Pantanal brasileiro cobre uma área aproximada de 150.355 km2 (IBGE, 2004) (Figura 23). O bioma Pantanal ainda é bem conservado, segundo IBGE, (2004), apresentando 86,77% da cobertura vegetal nativa e 11,54% de áreas antrópicas. As fitofisionomias florestais, como a Floresta Estacional Semidecidual e a Floresta Estacional Decidual respondem por 5,07% da área do bioma, enquanto as fitofisionomias não florestais como as Savanas (Cerrado), a Savana Estépica (Charcos), Áreas de Tensão Ecológica ou Contatos Florísticos (Ecótonos e Encraves) e Formações Pioneiras respondem por 81,70% da área do Pantanal. A Savana (Cerrado) predomina em 52,60% do bioma, seguida por contatos florísticos, que ocorrem em 17,60% da área. Com relação à área antrópica, nota-se que a agricultura é inexpressiva no bioma (0,26%), dando lugar à pecuária extensiva em pastagens plantadas, que equivalem a 10,92% da área do bioma e ocupam 94,68% da área antrópica. (PROBIO-MMA, 2004). O Pantanal abrange os estados de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, estendendo-se pela Bolívia e pelo Paraguai. A média do índice pluviométrico fica entre 1000 e 1400 mm/ano. A temperatura média no verão é de 32ºC, e no inverno é de 21ºC. Durante o ano existe o período das cheias (outubro a abril), vazante (abril a maio), de seca (maio a setembro) e de enchente (novembro e dezembro). Na época de seca, o leito dos rios normaliza, deixando um solo mais fértil. Já na época de cheias, o rio Paraguai transborda, e os animais migram para as regiões mais altas. A vegetação é muito heterogênea, devido à alternância de cheias e secas anuais e uma grande biodiversidade biológica. No caso das aves estima-se que esse bioma reúna a maior concentração do continente, onde se evidenciam as garças, patos- selvagens e jaburus ou tuiuiús (ave símbolo do pantanal). Além de um grande número de peixes (dourado, piranha, traíra, pacu e pintado), répteis (jacarés, predados pelos coureiros) e espécies de mamíferos (cervo-do-pantanal, ariranha, porco-espinho). A criação de gado bovino teve seu início no final do século XIX e vem a ser a principal atividade econômica da região. (AB´SABER, 2006; PLANETABIO, 2013) (Figura 27). FIGURA 27 – CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA PANTANAL COM SUA VEGETAÇÃO E POPULAÇÃO DE AVES PREDOMINANTE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 25 mar. 2013. TÓPICO 3 | BIOMAS 49 Pampa ou Campo Sulino O bioma Pampa, também chamado de campos sulinos, abrange os campos da metade sul e das Missões do Rio Grande do Sul, cobrindo uma área estimada de 176.496 km2 (IBGE, 2004). (Figura 28). O bioma Pampa apresenta três formações vegetais: a Campestre, Florestal e área de Transição (Ecótono). Do total, 41,32% da área do bioma Pampa apresenta cobertura vegetal nativa e os demais 58,68% encontram-se modificados por uso antrópico. (PROBIO-MMA, 2004). Com quatro estações bem definidas, no verão pode chegar a 35ºC e no inverno as temperaturas podem ficar negativas, com geadas e até neve em algumas localidades. O clima é subtropical, com precipitações em média 1200 mm anuais. As áreas são planas, e com um solo bem fértil, propício para a criação de gado, pelas grandes áreas de pastagens, que vem sendo a atividade econômica da região. Alguns autores consideram que existem duas unidades de pampas: os campos acima da serra (gramíneas e araucárias), que abrange parte do território gaúcho e paranaense, e os campos subtropicais (gramíneas, manchas floresta estacional, com espécies da Mata Atlântica e alguns cordões de floresta de galeria), que abrange o território gaúcho e se estende à Argentina e Uruguai. A vegetação predominante: gramíneas e leguminosas. Além do gado, existem os animais silvestres típicos da região: lobo-guará, veado campeiro, curruíra-do-campo, ema, ratão do banhado, capivara, quero-quero, peixes, aves etc. (AB´SABER, 2006; PLANETABIO, 2013) (Figura 28). FIGURA 28 – CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA PAMPA OU CAMPOS SULINOS COM SUA VEGETAÇÃO PREDOMINANTE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 25 mar. 2013. A grandediversidade de ecossistemas interagindo na biosfera é dividida em três grandes biociclos: Epinociclo ou ciclo terrestre (a região superficial e subterrânea), Talassociclo ou biociclo das águas salgadas – marinho (fundo dos mares: sistema litorâneo e abissal) e Limnociclo ou biociclo das águas doces ou continentais (todos os ecossistemas dulcícolas, inclusive uma poça de água). IMPORTANTE 50 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO Acesse estes sites, vídeos e documentários que irão complementar seus estudos: Mapa de biomas do Brasil e o mapa de vegetação do Brasil. Disponível em: . Produzidos pelo IBGE. Acesso em: 12 fev. 2013. Mapa interativo dos biomas brasileiros. Disponível em: . Produzido pelo WWF/Brasil. Acesso em: 12 fev. 2013. Rede ambiental: educando para a vida. Aplicativo desenvolvido como ferramenta de apoio em educação ambiental. Possui informações e imagens sobre os biomas brasileiros, atividades virtuais, fichas de atividades práticas, filmes e uma biblioteca com temas da área de educação. Disponível em: . Acesso em: 12 fev. 2013. Vídeo: - Planeta Terra – a terra como você nunca viu. Produção: BBC/Discovery Channel. Duração: 48 min. “Uma visão geral da distribuição dos biomas e dos mais importantes ecossistemas da Terra justificando suas ocorrências em determinadas regiões do planeta”. Episódio 1 – De polo a polo Episódio 2 – Montanhas Episódio 3 – Água doce Episódio 4 – Cavernas Episódio 5 – Desertos Episódio 6 – Regiões polares Episódio 7 – Grandes planícies Episódio 8 – Selvas Episódio 9 – Mares rasos Blue Planet: uma aventura fantástica pelos oceanos do mundo. Episódio 1 – Planeta Azul. Ano: 2001. Produção: BBC. Duração: 50 min. A biblioteca do Amazonas (FERRIS, T. O céu da mente: a inteligência humana num contexto cósmico. Rio de Janeiro: Campus, 1993. p. 135-140). FONTE: A Teoria de Gaia (NUNES NETO, N. F.; LIMA-TAVARES, M.; EL-HANI, C.N.). Teoria Gaia: de ideia pseudocientífica a teoria respeitável. Revista Com-Ciência, SBPC/Labjor, Campinas, n. 111, ago. 2005. Disponível em: . Acesso em: 12 mar. 2013. DICAS TÓPICO 3 | BIOMAS 51 LEITURA COMPLEMENTAR O CERRADO NÃO É UM BIOMA Marco Antônio Batalha Nosso planeta apresenta um padrão complexo de climas, os quais, por sua vez, têm um papel importante na criação dos padrões complexos de vegetação e tipos de comunidades que nele encontramos. Os ecólogos dividem esses padrões de grande escala em unidades denominadas biomas, as mais amplas comunidades bióticas reconhecidas em nível geográfico, definidos como subdivisões biológicas que refletem as características funcionais e fisionômicas da vegetação (OXFORD, 2004). A distribuição dos biomas na superfície terrestre relaciona-se principalmente com os climas e, dentre os seus elementos, mais diretamente com a temperatura e a precipitação, seja a quantidade de chuva, seja a sua distribuição ao longo do ano (Walter 1986). Ao empregar uma abordagem fisionômica da vegetação, Raunkiaer (1934) mostrou ser possível definir e caracterizar unidades ecológicas, inicialmente referidas como formações vegetais, por serem baseadas exclusivamente em critérios botânicos, em que a aparência da vegetação e as formas de vida predominantes são uniformes. Essa forma das plantas foi reconhecida como o modo mais eficaz de definir os biomas em relação a qualquer outro sistema de classificação taxonômico ou evolutivo. O conceito de bioma é similar ao de formação vegetal, mas leva em conta a associação da vegetação com a fauna e com os microrganismos (BOX & FUJIAWARA 2005). Assim, um bioma corresponde, grosso modo, a uma formação vegetal, porém inclui não só as plantas, mas também os demais organismos (MAAREL, 2005). Cada bioma tem uma fisionomia característica, compreendendo altura e hábito de crescimento dos principais táxons, tamanho, forma e textura das folhas, proporção de plantas sempre verdes e decíduas, diversidade de espécies e outros fatores que impõem fisionomia e arquitetura características para amplas extensões da cobertura vegetal (TALLIS 1991). UM ERRO ENRAIZADO O cerrado é considerado um dos pontos quentes (hot spots) para a conservação da biodiversidade no mundo (MYERS et al. 2000). Mas que cerrado? O cerrado enquanto domínio fitogeográfico? O cerrado enquanto bioma? O cerrado enquanto tipo vegetacional? O cerrado enquanto fisionomia? Como podemos ver, é importante definirmos corretamente um termo, porque pode haver implicações práticas e imediatas. Dois conceitos importantes para serem definidos acuradamente são os de “cerrado” e de “bioma”. Da maneira como vem sendo usado no Brasil, o conceito de bioma adquiriu erroneamente uma conotação florística. Usado dessa maneira errônea por biólogos, não por acaso passou a ser usado equivocadamente por um público mais amplo, como agências governamentais e organizações não governamentais. Hoje em dia, esse erro está enraizado. Coutinho (2006) chamou a atenção para esse problema e teve a oportunidade de resolvê-lo, mas sua argumentação em alguns pontos é contraditória. Embora apresente as premissas corretamente, Coutinho (2006) chama o cerrado ora de um único bioma 52 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO (por exemplo, “O bioma Cerrado merece aqui uma discussão um pouco mais longa.”, p. 19), ora de um complexo de biomas (por exemplo, “[...] pode-se dizer que o Cerrado não é um bioma único, mas um complexo de biomas.”, p. 19). Como argumentarei, esse segundo ponto de vista é o correto e, portanto, o cerrado não é um único bioma – como vem sendo rotineiramente tratado –, mas um complexo de biomas. A ciência gera jargões, e essa terminologia especializada é necessária para expressarmos ideias novas e complexas de forma clara e sucinta (PETERS, 1991). Cada parte de uma teoria começa como um conceito, e conceitos fracos são difíceis de serem erradicados (PETERS, 1991). Na ausência de uma definição clara, diferentes usuários do termo podem desenvolver definições independentes e até inconsistentes, fazendo, ao longo do tempo, com que o conceito traga consigo tantos significados que acaba se transformando em um “não conceito” (HURLBERT, 1971). Quando a linguagem é desvalorizada ou usada erroneamente, também o são aqueles que a usam (ORR, 1999). Uma vez que a linguagem é a única moeda onde quer que se persiga a verdade, não deve haver prioridade maior para a comunidade científica do que defender a clareza e a integridade de seus conceitos (ORR, 1999). O criticismo científico encoraja a operacionalização de conceitos, identificando as capacidades, funções e limitações atuais de conceitos existentes (PETERS, 1991). Sendo assim, dada a importância de definirmos termos claramente e dada a importância dos conceitos de cerrado e de bioma, pretendo discuti-los e sugerir um uso acurado deles. O CONCEITO DE BIOMA Uma excelente revisão do conceito de bioma foi feita por Coutinho (2006). Relembro algumas das definições apresentadas nesse trabalho de Coutinho (2006) para tornar minha argumentação clara. Clapham Jr. (1973, p. 14) disse que “[...] a distribuição dos biomas é controlada em última instância por fatores ambientais abióticos – especialmente o clima – e um dado bioma pode ser formado em várias diferentes partes do mundo.” Dajoz (1973, p. 280) escreveu que “[...] o bioma é um agrupamento de fisionomia homogênea e independente da composição florística.” Crawley (1989, p. 27) disse que “[...] os grandes biomas do mundo mostram um grau de convergência notável, apesar das amplas diferenças na afinidade taxonômica das suas floras.” Cox & Moore (1993, p. 8) também enfatizaram que o conceito de bioma é biogeográfico e não taxonômico, e que “[...] embora as savanas tropicais do Brasil,Quênia, Índia e Tailândia compreendam espécies diferentes de plantas e animais, elas têm muito em comum em termos de suas arquiteturas, crescimentos e produtividades estacionais, formas de vida de animais e plantas e as maneiras pelas quais têm sido usadas pela população humana.” No próprio conceito de Walter (1986), adotado por Coutinho (2006), está claro que um mesmo tipo de bioma pode aparecer em áreas distintas geograficamente. Além disso, em um dicionário de Biologia (OXFORD, 1996, p. 72), encontramos a seguinte definição de bioma: “Uma comunidade ou complexo de comunidades ecológicas que se estende por uma ampla área geográfica caracterizada por um tipo dominante de vegetação. Os organismos de um bioma TÓPICO 3 | BIOMAS 53 estão adaptados às condições climáticas associadas à região. Não há fronteiras bem definidas entre biomas adjacentes, que se fundem gradualmente uns com os outros. Exemplos de biomas são tundra, floresta pluvial tropical, taiga, chaparral, campos (temperados e tropicais) e deserto”. Em um dicionário de Ecologia (OXFORD 2004, p. 56), encontramos uma definição semelhante: “Uma subdivisão biológica que reflete o caráter fisionômico e ecológico da vegetação. Biomas são as maiores comunidades bióticas e geográficas que são convenientes de serem reconhecidas. Eles correspondem, grosso modo, às regiões climáticas, ainda que outros controles ambientais sejam algumas vezes importantes. Eles são equivalentes ao conceito de principais formações vegetais na Ecologia Vegetal, mas são definidos em termos de todos os organismos vivos e de suas interações com o meio (e não apenas com o tipo de vegetação dominante). Tipicamente, biomas distintos são reconhecidos para todas as principais regiões climáticas no mundo, enfatizando as adaptações dos organismos aos seus ambientes, e.g., bioma das florestas tropicais pluviais, bioma dos desertos, bioma das tundras”. Sendo assim, dos diversos conceitos de bioma apresentados, podemos ressaltar alguns pontos que são comuns e se sobressaem: 1) o conceito de bioma é fisionômico, isto é, leva-se em conta a aparência geral da vegetação, resultante do predomínio de certas formas de vida; 2) o conceito de bioma é funcional, isto é, levam-se em conta aspectos como os ritmos de crescimento e reprodução; 3) o conceito de bioma não é florístico, isto é, a afinidade taxonômica das espécies que aparecem em várias unidades de um mesmo bioma é irrelevante; 4) o conceito de bioma é delimitado pela vegetação, mas engloba além dela, toda a demais biota; e 5) o conceito de bioma é aplicável à Terra como um todo e não a esta ou àquela região. O CONCEITO DE CERRADO Há dois principais sistemas usados para classificar a vegetação, um baseado em descritores funcionais e fisionômicos e outro baseado em relações florísticas (JOLY et al. 1999). Das definições de bioma apresentadas acima, inferimos que só há sentido em se usar esse conceito quando a classificação da vegetação é funcional-fisionômica. Nesse caso, por coerência, devem-se usar termos aplicáveis à vegetação mundial. Há termos usados na classificação da vegetação brasileira que são carregados floristicamente, isto é, quando nos referimos, por exemplo, ao “cerrado”, “à “caatinga” ou ao “pampa”, estamos nos remetendo a certas espécies vegetais características. Coutinho (2006) afirma corretamente que, dentro dos domínios fitogeográficos, encontramos vários biomas. Dessa forma, o “domínio amazônico não é, portanto, um bioma único”, mas sim “um mosaico de biomas” (COUTINHO 2006, p. 18). O problema aparece quando o autor discute o cerrado. Em um primeiro momento, citando um trabalho anterior (COUTINHO, 2006, p. 19), ele diz que o cerrado seria “[...] um complexo de biomas, distribuídos em mosaico.” Concordo com essa visão. Justamente por sua variação fisionômica, indo do campo limpo (bioma dos campos tropicais), passando pelas fisionomias intermediárias (bioma das savanas) e chegando ao cerradão (bioma das florestas estacionais), o cerrado 54 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO FIGURA 29 – CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA CERRADO COM SUA VEGETAÇÃO PREDOMINANTE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 6 maio 2013. Coutinho (2006, p. 19) até sugere essa posição escrevendo que “[...] caso se queira ser absolutamente fiel ao conceito de bioma adotado pelos diversos autores mencionados adrede, pode-se dizer que o cerrado não é um bioma único, mas um complexo de biomas.” Entretanto, contrariamente à sua argumentação anterior, Coutinho (2006) alega que todas as savanas do mundo tem essa complexidade fisionômica e, ainda assim, são consideradas um único bioma pela grande maioria dos autores e que, portanto, ao se considerar o cerrado como um bioma de savana, não se foge ao conceito da maioria dos autores internacionais. Esse erro se enraizou, com o oxímoro “bioma cerrado” se tornando onipresente, aparecendo quase como um substantivo composto, só faltando o hífen para tal. Para sermos coerentes com toda a literatura internacional e usarmos o conceito de bioma acuradamente, devemos considerar o cerrado sensu lato como formado por três biomas: o campo tropical, a savana e a floresta estacional. Campos tropicais são formações tropicais em que o estrato herbáceo é contínuo, com pequenos arbustos em baixas densidades (Woodward, 2008). Se seguirmos a classificação fisionômica de Coutinho (1978), incluímos no bioma de campo tropical o campo limpo. Já as savanas são formações tropicais em que o estrato herbáceo é quase contínuo, interrompido apenas por arbustos e árvores em densidades variáveis, e em que os principais padrões de crescimento estão associados às estações úmidas e secas alternantes (BOURLIÈRE & HADLEY, 1983). No bioma de savana, portanto, incluímos o campo sujo, o campo cerrado e o cerrado sensu stricto. Florestas estacionais são formações em que predominam árvores de maior porte, cujas copas formam um dossel e cujos principais padrões de crescimento também estão associados às estações úmidas e secas alternantes (WOODWARD; 2008). No bioma de floresta estacional, incluímos, pois, o cerradão. Como há uma unidade florística entre as diversas fisionomias do cerrado (COUTINHO, 1978), devemos considerá-lo um único tipo vegetacional, já que as afinidades taxonômicas são levadas em conta nesse caso. sensu lato não pode ser considerado um único bioma, mas sim um complexo de biomas, mais especificamente três (Figura 29). TÓPICO 3 | BIOMAS 55 Cabe ainda ressaltar que, dentro de um domínio fitogeográfico, isto é, uma área do espaço geográfico, com dimensões subcontinentais, em que predominam características morfoclimáticas semelhantes e certo tipo de vegetação, há vários tipos vegetacionais. Assim, dentro do domínio do Cerrado, além do cerrado como tipo vegetacional dominante, há outros tipos vegetacionais, como a floresta ripícola, o campo rupícola, a floresta estacional semidecídua, a floresta estacional decídua, o campo úmido, entre outros. Cada um desses tipos vegetacionais tem sua flora característica e daí a razão de distingui-los. No caso do cerrado em particular, dada a sua grande variação fisionômica, encontramos não um, mas sim três biomas. Isso tem implicações práticas e imediatas para a conservação. Por exemplo, recentemente aprovou-se no estado de São Paulo (2009) uma lei que visa a proteger o cerrado, mas que não contempla as suas fisionomias abertas. Dessa forma, todo um bioma que compõe o cerrado, o bioma de campo tropical, não está contemplado pela lei. Assim, podemos usar a palavra “cerrado” em três sentidos: 1) Cerrado, com a inicial maiúscula, quando estivermos nos referindo ao domínio fitogeográfico do Cerrado, incluindo não só o cerrado sensu lato, mas também os outros tipos vegetacionais que ali se encontram; 2) cerrado sensu lato ou simplesmente cerrado, quando estivermos nos referindo ao cerrado enquanto tipo vegetacional, isto é, do campo limpo ao cerradão – aqui há um complexode biomas, bioma dos campos tropicais, das savanas e das florestas estacionais; e 3) cerrado sensu stricto, quando estivermos nos referindo a uma das fisionomias savânicas do cerrado sensu lato. É importante usarmos tais termos de forma precisa e acurada para que definamos aquilo que pretendemos estudar e para que conservemos esse complexo de biomas, com toda a biodiversidade que compõe o cerrado. FONTE: Publicado em: Batalha, M. A. O cerrado não é um bioma. Biota Neotropical, v. 11, n. 1. 2011. Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2013. 56 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você pode concluir que: • Biomas são as maiores formações ecológicas ou os tipos de ecossistemas facilmente reconhecidos, em suas diferenças geográficas e biológicas proporcionando uma extraordinária diversidade de vida em nosso planeta. • Os diferentes biomas são influenciados pela temperatura e pluviosidade (clima, latitude), e estes sobre a vida nos campos, florestas, desertos, praias e montanhas, que são os principais ambientes onde se desenvolvem os biomas. • Os principais biomas terrestres mundiais são: • Tundra: típico das regiões de clima frio, Ex.: musgos, liquens, gramíneas e árvores anãs. • Taiga: também de clima frio, mas mais ameno comparado à tundra, com maior presença de água no estado líquido. A vegetação é persistente, com pouca formação da copa, que é em forma de cone, aumentando a absorção dos raios luminosos fracos, proporcionando a fotossíntese em todos os estratos vegetais, o ano todo (ramos não fazem sombra). • Deserto: clima seco e grandes amplitudes térmicas durante o dia, desenvolvendo uma vegetação pouco desenvolvida e pouco variada. Somente animais adaptados conseguem se desenvolver. • Floresta decídua temperada: floresta de árvores com folhas caducas (folhas envelhecem e caem), típico deste clima (verão quente, chuvoso e úmido), comum nos EUA e América Central. • Savana: são as pradarias, das regiões tropicais, presença de poucas árvores espalhadas e pastagem para muitos herbívoros, comparado ao cerrado. • Floresta equatorial: grande variedade de espécies de árvores de grande porte. • Floresta tropical úmida: o mais exuberante, pela sua grande biodiversidade, Ex.: floresta amazônica e mata atlântica. • Floresta de coníferas (gimnospermas), característico de regiões frias e montanhosas. • Floresta de mangues: transição entre o biociclo marinho e dulcícola (fonte de alimento e local reprodutivo, muitos animais marinhos). 57 • Principais biomas brasileiros: • Floresta Amazônica: alta pluviosidade, temperatura constante, devido à latitude, vegetação latifoliada (folhas área foliar grande), solo pobre, mas elevado material orgânico e alta biodiversidade de espécies animais e vegetais. • Floresta Atlântica: alta umidade, temperatura constante, devido à maritimidade. Folhas latifoliadas, árvores com epífitas e maior densidade no nível arbustivo. • Floresta de Araucária ou “taiga brasileira”: coníferas com três níveis de estratificação, em cujo andar arbustivo se encontram as samambaias. • Cerrado: grande amplitude térmica, vegetação com folhas coriáceas, troncos retorcidos, casca espessa, árvores esparsas e regime de queimadas. • Caatinga: baixa pluviosidade, vegetação xeromórfica, ex.: cactáceas (caule acumula água), folhas coriáceas ou transformadas em espinhos. • Manguezais ou “berço do mar”: latitude não interfere nos fatores edáficos, ou seja, do solo; solo argiloso e salino, raízes pneumatóforos, árvores com longas raízes (rizóforas), semente germina no fruto (viviparidade). • Pantanal: na época das chuvas, alta pluviosidade, lençóis freáticos rasos (umidade), alta biodiversidade. 58 AUTOATIVIDADE 1 A partir das características comuns em animais, cite um exemplo de animal portador de cada característica, e em qual bioma esse animal pode ser encontrado. a) Pelagem abundante: b) Hábitos migratórios: c) Necessidade de hibernação: 2 Identifique a que se referem os seguintes itens: a) Bioma com extrema escassez de água e que não está representado no Brasil. b) Elemento abundante no solo do cerrado e que dificulta o desenvolvimento da vegetação. c) Bioma que se estende por todo o Brasil central. d) Bioma apresentado apenas o estrato herbáceo, presente no sul do Brasil, usado na pecuária. e) Tipo de clima que caracteriza a caatinga brasileira. 59 TÓPICO 4 MEIO FÍSICO E A DISPONIBILIDADE DE RECURSOS UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Neste tópico veremos a interação entre as condições locais (características físicas e químicas do ambiente), como a temperatura, a umidade, a pressão osmótica e o pH de um ambiente e seus recursos essenciais disponíveis, que são consumidos pelos organismos durante o seu crescimento e reprodução, como a radiação solar, o dióxido de carbono, a água e os nutrientes minerais para a vida. Assim como, a resposta dos organismos a estas condições e recursos encontrados, nos ambientes habitáveis. 2 CONDIÇÕES AMBIENTAIS As condições ambientais que podem ser “extremas”, “adversas”, “propicias” e “estressantes” determinam a distribuição e o comportamento de organismos. Ex.: calor do meio dia num deserto, locais gelados da Antártica, intensidade de chuvas na floresta tropical. Essas condições (temperatura, umidade relativa e outros) induzem respostas fisiológicas em organismos que determinam se o ambiente é propício ou não. Ex.: para os pinguins o clima da Antártica é extremo, porém, o clima da floresta pluvial tropical seria severo, mas propício para as araras; como um lago seria severo para um cacto, mas propicio para um aguapé. Os efeitos destas condições podem apresentar três respostas básicas denominadas por “curvas de resposta”, que são: a) Curva de efeitos da temperatura e pH: onde as condições extremas são letais, mas entre estes dois extremos existe um continuum de condições favoráveis para a sobrevivência, podendo crescer ativamente dentro de uma faixa mais restrita e se reproduzir numa faixa ainda mais estreita. b) Curva de efeitos de veneno: com letalidade apenas em concentrações altas, que em condições zero ou baixas, o organismo não é afetado, havendo um limiar acima do qual o desempenho decresce rapidamente: primeiramente a reprodução, depois o crescimento, por fim a sobrevivência. c) Curva de efeito da exigência de condições de concentração (necessita de recursos com concentrações baixas, pois as altas se tornam tóxicas): Ex.: cloreto de 60 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO cobre e sódio são recursos essenciais para o crescimento, quando em quantidade- traço (traços de concentração), pois altas concentrações se tornam tóxicos. As condições ambientais atuam primeiramente para regular os processos fisiológicos. Desta maneira, muitas condições funcionam como estímulos para o crescimento, desenvolvimento e a preparação do organismo para as condições que estão por vir. Ex.: o “relógio biológico” (interno) percebe sinais externos, como a diminuição do fotoperíodo (incidência solar em decorrência do inverno ou chuvas), onde ursos, gatos e outros mamíferos desenvolvem uma pele espessa; ou fotoperíodo amplo (verão ou estiagem), em que muitos insetos entram em dormência (diapausa). Assim como, na aproximação da estação mais quente (primavera) os animais entram em atividade reprodutiva, proporcionando a migração de aves e nos vegetais ocorre o início do florescimento. Nas interações entre organismos, eles respondem a cada condição em seu meio, mas os efeitos das condições podem ser fortemente determinados pelas respostas de outros organismos da comunidade. Ex.: o fator temperatura não age apenas sobre um organismo, mas sobre os seus competidores (suas presas, seus parasitas, etc.), que podem não tolerar uma determinada condição ambiental. (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Tanto os animais apresentam sensibilidade em relação à luz (fototatismo, em que se orientam para ela, ou se afastam dela), comoos vegetais (fototropismo). Desta forma, ambos apresentam fotoperiodismo, ou seja, são capazes de reagir à duração da luminosidade diária a que estão sendo submetidos (fotoperíodo). Ex.: as diferentes épocas de floração de muitas plantas se devem as diferentes reações ao fotoperíodo das plantas com flor. Os animais reagem de forma diferente ao fotoperíodo, sendo mais ativos nas temperaturas ótimas e menos ativos quando as temperaturas se afastam do ótimo, permitindo-os a sobreviver. Ex.: lagartixas reduzem suas atividades vitais, ficando num estado de vida latente (não têm facilidade em realizar grandes deslocamentos); as andorinhas, com grande facilidade para deslocamento, migram, isto é, partem determinadas épocas do ano para regiões com temperatura favorável. Mas existem animais que apresentam características próprias de adaptação às diferentes temperaturas. Ex.: animais que vivem em regiões muito frias desenvolvem uma pelagem longa e uma camada de gordura sob a pele. (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). 3 RECURSOS VEGETAIS Os recursos são componentes bióticos ou abióticos do ambiente, que pode ser consumido por organismos, ao longo do seu crescimento e manutenção, tornando-se menos disponíveis para outros organismos. Ex.: quando uma folha de uma planta absorve a radiação solar, ela priva deste recurso às outras folhas ou plantas que estiverem abaixo dela (estratos vegetais); ou quando uma larva se alimenta de uma folha, sobra menos material foliar para as outras. Portanto, TÓPICO 4 | MEIO FÍSICO E A DISPONIBILIDADE DE RECURSOS 61 “os recursos são críticos para a sobrevivência, crescimento e reprodução, além de uma fonte potencial de conflito e competição entre organismos”. (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). As plantas podem evitar ou tolerar a escassez de água. Processos bioquímicos especializados podem aumentar a taxa fotossintética a ser alcançada por unidade de água perdida em plantas C4 e CAM (em oposição às plantas C3). (RICKLEFS, 2003). As plantas, quando realizam a fotossíntese, obtêm energia e materiais (matéria inorgânica), para o seu crescimento e reprodução. Os recursos ambientais consumidos pela planta são radiação solar, dióxido de carbono, água e nutrientes minerais (água, fósforo, cálcio, nitrogênio, potássio etc.); as bactérias quimiossintetizantes (organismos quimiossintéticos) obtêm energia e materiais da oxidação do metano, íons amônio, ácido sulfídrico ou ferro ferroso; assim como, os demais organismos obtêm seus recursos de corpos de outros organismos. Consequentemente, o que foi consumido nestes três casos, não estará mais disponível para outro consumidor (competição). (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Radiação solar, água, minerais e dióxido de carbono são recursos críticos para as plantas verdes. Estes recursos quando disponíveis em abundância são excelentes para as plantas, mas quando em escassez, pode ser desfavorável para o crescimento e reprodução dos vegetais. A forma da curva que relaciona a taxa de fotossíntese à intensidade de radiação varia bastante entre as espécies. A radiação que atinge uma planta está sempre mudando e as folhas somam as diversas exposições de suas várias folhas. (RICKLEFS, 2003). ATENCAO ATENCAO 62 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 4 ANIMAIS E SEUS RECURSOS As plantas verdes (autótrofas), depois da fotossíntese, reúnem a radiação solar, íons e moléculas simples em moléculas complexas (carboidratos, gorduras e proteínas) em células, tecidos, órgãos e nos organismos. Estas estruturas são depósitos de recursos alimentares para todos os outros organismos heterótrofos (decompositores, predadores, herbívoros e parasitas). Estes consumidores utilizam estes depósitos através da metabolização, em que parte é secretada e outra é reagrupada em seus organismos podendo ser consumidos, decompostos e reconstituídos em uma cadeia de eventos, em que cada consumidor pode se tornar um recurso para algum outro consumidor. (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Segundo Townsend, Begon e Harper (2006), os heterótrofos podem ser agrupados em: decompositores: que se alimentam de vegetais e animais mortos; parasitas: que se alimentam de um ou muito poucos animais e vegetais hospedeiros vivos (geralmente não os matam, pelo menos não imediatamente); predadores: ao longo de sua vida, é típico que matem suas presas para delas se alimentarem. Quando se pensa em predador-presa, o que vem à mente é um animal matando e se alimentando de outro animal. Mas esta relação de interações entre o consumidor e seu recurso abrange um rol muito mais amplo, do que aparenta. Ex.: um papagaio se alimentando de sementes (mata o embrião dentro da semente), fungos que se alimentam de uma plântula e a matam, baleias que se alimentam de Krill, plantas carnívoras que se alimentam de insetos (como forma de reposição de nutrientes não encontrados no solo). Como se pode ver, em cada um dos casos, todos são predadores matam o seu recurso alimentar e o consomem totalmente ou em parte. Quando se fala em consumidores não se refere apenas aos seres heterótrofos carnívoros, mas os herbívoros e os autótrofos também, que para sobreviverem necessitam de um nível trófico anterior ao seu, para completarem o seu ciclo de vida. Além disso, os consumidores animais, quanto à dieta, podem ser classificados como especialistas ou generalistas. Quando os indivíduos de espécies individuais tiverem vida longa são provavelmente generalistas (espécies polifágicas), mesmo que muitas vezes tenham preferências claras e uma ordem de prioridades para escolher quando existem alternativas disponíveis, pois não dependem apenas da disponibilidade de um recurso alimentar. Ex.: herbívoros e carnívoros. Já os especialistas (monófagos) apresentam um tempo de vida curto, onde o organismo é esforçado a viver de partes do recurso ou de gastar tempo e energia na procura deste recurso entre outros recursos (que é um dos custos da especialização). Ex.: as abelhas se alimentando do néctar de uma determinada planta em floração (período curto), depois da floração desta espécie, ela terá que procurar outras espécies para se alimentar durante o verão. No caso do besouro da framboesa, uma única espécie (a planta framboesa) pode fornecer muitos recursos alimentares ao mesmo tempo, tornando-se menos dispendioso ao consumidor (besouro) na procura do seu recurso. Como exemplo, o besouro põem seus ovos na framboesa e as larvas, após a eclosão, consomem somente as flores desta espécie. Dentro do fruto, completa o seu desenvolvimento, TÓPICO 4 | MEIO FÍSICO E A DISPONIBILIDADE DE RECURSOS 63 ficando inativa na fase de pupa, até a próxima estação de florescência da framboesa. Dentre 10-11 meses, a larva fica ativa e se alimenta da medula do caule, fechando o ciclo de vida num único recurso (a framboesa). As várias partes de uma planta (seres autótrofos) têm composições muito diferentes e, assim, fornecem recursos completamente diferentes aos heterótrofos (consumidores). A diversidade de organismos heterótrofos se deve a diversificação de peças bucais e tratos digestivos que evoluíram para o consumo, no caso dos consumidores. E para fazer um uso melhor do material vegetal, muitos herbívoros estabelecem uma associação mutualística com bactérias e protozoários celulolíticos em seu canal alimentar. (RICKLEFS, 2003). DICAS DE LIVROS, VÍDEOS E SITES LOVELOCK, J. Gaia: cura para um planeta doente. São Paulo: Cutrix, 2006. PURVES, W. K.; SADAVA, D.; ORIANS, G. H.; HELLER, H. C. Vida: a ciência da biologia. Evolução, diversidade e ecologia - Vol. II. Porto Alegre: Artmed, 2005. RAVEN, P. H.; EVERT, R. F.; EICHHORN, S. E. Biologia Vegetal. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. SCHELP, D. A vingança de Gaia. Veja São Paulo, nº 1979, out. 2006. Disponível em: . Vídeos: O segredo da vida na Terra. Ano: 1993. Duração: 40min. Direção: Adrian Warren. Produção: Christopher Parsons. Mudanças ambientaisGlobais. Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos, INPE. Disponível em: . Vídeo-animação sobre mudanças globais devido às causas antropogênicas. Efeito Estufa. Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos, INPE. Disponível em: . Vídeo-animação sobre efeito estufa, suas características naturais e causas antropogênicas. Avatar. Ano: 2009. Duração: 162 min. Direção: James Cameron. Produção: 20th Century Fox. Embora se trate de um filme de ficção, as preocupações ecológicas e as ideias científicas são evidentes em quase todo o enredo, principalmente a teoria de Gaia. ATENCAO UNI 64 Neste tópico, você pode concluir que: • As condições são características físicas e químicas do ambiente (temperatura e umidade), que podem ser alteradas, mas não consumidas. Mas os recursos são consumidos por organismos, durante o seu crescimento e reprodução. • As condições ambientais que determinam a distribuição e o comportamento de organismos podem ser “extremas”, “adversas”, “propicias” e “estressantes”. • Os efeitos destas condições podem apresentar três respostas básicas denominadas “curvas de resposta”, que são: curva de efeitos da temperatura e pH; curva de efeitos de veneno; curva de efeito da exigência de condições de concentração. • As condições ambientais atuam primeiramente para regular os processos fisiológicos, e muitas condições funcionam como estímulos para o crescimento, desenvolvimento e a preparação do organismo para condições que estão por vir (hibernação, diapausa entre outras). • A aproximação da estação mais quente (primavera), animais entram em atividade reprodutiva, nos vegetais ocorre o início do florescimento, como também, a migração de aves. • Nas interações entre organismos, os efeitos das condições podem ser fortemente determinados pelas respostas de outros organismos da comunidade. Ex.: fator temperatura não age apenas sobre um organismo, mas sobre os seus competidores (suas presas, seus parasitos etc.), que não possa tolerar uma condição ambiental. • Os recursos são componentes bióticos ou abióticos do ambiente, que pode ser consumido por organismos, ao longo do seu crescimento e manutenção, tornando-se menos disponíveis para outros organismos. • As plantas, quando realizam a fotossíntese, obtêm energia e materiais (matéria inorgânica), para o seu crescimento e reprodução. Os recursos ambientais consumidos pela planta, não estarão mais disponíveis para outro consumidor (competição). • Os organismos autótrofos sintetizam os carboidratos, gorduras e proteínas, em células, tecidos, órgãos e nos organismos. Que são depósitos formados em recursos alimentares para todos os outros organismos heterótrofos (decompositores, predadores, herbívoros e parasitas). Os consumidores podem se tornar um recurso para algum outro consumidor. RESUMO DO TÓPICO 4 65 • Na relação predador-presa, o predador mata seu recurso alimentar e o consome todo ou em parte. • Os consumidores animais quanto à dieta podem ser classificados como especialistas ou generalistas. • Indivíduos de espécies individuais com vida longa são provavelmente generalistas (espécies polifágicas), pois não podem depender apenas da disponibilidade de um recurso alimentar. • Os especialistas (monófago) apresentam um tempo de vida curto, em que, uma única espécie pode fornecer muitos recursos alimentares. 66 AUTOATIVIDADE 1 Diferencie condições ambientais de recursos ambientais. 2 Para que servem as condições ambientais aos organismos? 3 Cite recursos vegetais e animais. Assista ao vídeo de resolução da questão 1 67 ATIVIDADE DE LABORATÓRIO E DIDÁTICO-PEDAGÓGICO DE BIOLOGIA Para esta prática devem-se coletar previamente as amostras de água a serem analisadas. 1 INTRODUÇÃO A água para consumo humano, denominada potável, é aquela cujos parâmetros microbiológicos, físicos, químicos e radioativos atendam aos padrões legais de potabilidade e que não ofereçam riscos à saúde. Adicionalmente os parâmetros da água presente em outros meios devem atender aos padrões de qualidade adequados para seu uso. (MERTEN, 2002). Por exemplo, a água de um rio pode apresentar riscos para a saúde humana se for bebida e mesmo assim ser considerada de boa qualidade para manter a vida dos seres aquáticos. Portanto, uma das formas de conhecer a qualidade de uma água é estabelecer, analisar e medir parâmetros de qualidade. Os principais parâmetros que serão vistos na prática são: cloro livre; ferro; nitrogênio amoniacal; pH; transparência; cor; cloretos; dureza total; oxigênio dissolvido; alcalinidade; coliformes a 45º C e salmonela: É importante destacar que o conteúdo desta prática se relaciona com outras disciplinas e áreas afins: química geral, química analítica, saneamento ambiental, microbiologia, geologia, recursos hídricos entre outras. UNI UNI ANÁLISE DOS PARÂMETROS FÍSICO-QUÍMICOS E MICROBIOLÓGICOS DA ÁGUA 68 FIGURA 30 – INDICADORES DE ANÁLISE DE ÁGUA FONTE: As autoras Tenha uma excelente prática! 2 OBJETIVOS • Conhecer os principais parâmetros de análise de água. • Analisar águas de diferentes fontes e comparar os parâmetros analisados para cada tipo; • Interpretar os resultados obtidos inferindo sobre possíveis sequências de acontecimentos (natural e/ou antrópica) que geraram o valor obtido para os parâmetros. • Identificar impactos ambientais futuros possíveis de ser gerados por águas que apresenta os parâmetros encontrados. 3 MATERIAIS • 500 mL de água de lago ou rio coletada em um frasco estéril ou em uma garrafa plástica de água mineral. • 500 mL de água potável da torneira coletada um frasco estéril ou em uma garrafa plástica de água mineral. • 1 kit de análise de água, Kit-Potabilidade. 69 4 PROCEDIMENTO • Analisar os parâmetros de acordo com as instruções contidas no kit de análise. • Medir os parâmetros necessários tendo em consideração o método e comentários expressos no quadro 1. • Observar as instruções de manipulação, segurança e manutenção dos produtos, reagentes e componentes conforme o estabelecido no kit de análise de água. A manipulação incorreta e imprudente do kit de análise pode conduzir a resultados errôneos e contaminação dos produtos utilizados na análise! QUADRO 1 – MÉTODOS DE MEDIÇÃO DOS PARÂMETROS DO KIT DE ANÁLISE DE ÁGUA. KIT – POTABILIDADE FONTE: Alfakit (2012) Lembre-se de gerir adequadamente o tempo para que seja possível determinar todos os parâmetros no período estabelecido para a realização das análises. Divida as tarefas, pois várias análises podem ser realizadas simultaneamente. UNI UNI 70 5 INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS Depois da realização desta prática preencha a tabela de resultados, conforme o modelo estabelecido no quadro a seguir: QUADRO 2 – RESULTADOS: VALORES DOS PARÂMETROS OBTIDOS EM CADA AMOSTRA FONTE: As autoras Ao finalizar a prática, o acadêmico deve adquirir a competência de fazer um diagnóstico crítico dos resultados obtidos combinando os seguintes fatores: • Conhecimentos prévios dos acadêmicos. • O conteúdo teórico abordado na introdução. • Consultando bibliografia adicional sempre que necessário. • Padrões vigentes de potabilidade na legislação brasileira (Anexo I). Os acadêmicos devem discutir em equipe os resultados obtidos de forma a ser possível preencher duas tabelas de interpretação e conclusões, conforme o modelo no quadro a seguir: 71 QUADRO 3 – TABELA DE INTERPRETAÇÃO E CONCLUSÕES FONTE: As autoras Na coluna “justificativa do valor encontrado”, a equipe deve justificar a sequência de acontecimentos que ocorreu para que a amostra apresente o valor encontrado. Na coluna “consequências para o meio natural”, a equipe deve identificar se o valor encontrado pode ser considerado uma contaminação e seus possíveis impactos ao meio ambiente de forma geral. Na coluna “consequências para a saúde humana”, o acadêmico deve identificar se o valorencontrado para o parâmetro pode ser prejudicial se a água é consumida pelo ser humano ou não. UNI 72 ANEXO I Padrões de potabilidade legais conforme a legislação vigente: QUADRO 4 – PARÂMETROS DE POTABILIDADE FONTE: As autoras 73 UNIDADE 2 ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade você será capaz de: • conhecer a dinâmica estrutural das populações naturais; • identificar as diferentes formas de interação ocorrentes entre os organismos; • compreender os padrões e processos existentes nas comunidades; • entender as relações de fluxo de energia e matéria que regem a dinâmica dos ecossistemas. A Unidade 2 está dividida em quatro tópicos, cujas atividades, no final de cada um deles, reforçarão o seu aprendizado. TÓPICO 1 – ORGANISMOS E POPULAÇÕES TÓPICO 2 – INTERAÇÕES ECOLÓGICAS TÓPICO 3 – ECOLOGIA DE COMUNIDADES TÓPICO 4 – ECOSSISTEMAS Assista ao vídeo desta unidade. 74 75 TÓPICO 1 ORGANISMOS E POPULAÇÕES UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Na unidade anterior vimos alguns fatores que influenciam a vida dos organismos ou indivíduos. Porém, a definição de organismo, em um primeiro olhar, não é tão simples quanto parece. Se pensarmos em animais, de uma forma geral, é fácil identificar onde termina um organismo e começa outro, principalmente se estivermos observando um bando de andorinhas ou de macacos. Agora, porém, pensemos em uma esponja. Como definimos o que é um organismo? Se considerarmos o reino Fungi, esta definição se torna ainda mais complexa. Afinal, vemos somente o corpo de frutificação destes seres e um único organismo pode produzir mais de um corpo de frutificação ao mesmo tempo (Figura a seguir). FIGURA 31 – CORPOS DE FRUTIFICAÇÃO DE REPRESENTANTES DO REINO FUNGI. NÃO É POSSÍVEL AFIRMAR QUE CADA CORPO DE FRUTIFICAÇÃO REPRESENTA UM ORGANISMO DA ESPÉCIE FONTE: As autoras Por isso, é de suma importância que nestes estudos haja uma descrição detalhada dos elementos utilizados para definir um organismo. Alguns questionamentos podem surgir em sua mente: por que é importante ter uma definição clara de organismo? E ainda, qual é o objetivo de estudá-lo? É imprescindível ter um conceito claro de organismo para poder efetuar qualquer pesquisa envolvendo uma determinada população, como por exemplo, UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 76 para realizar o controle populacional de uma espécie exótica que se tornou invasora ou “praga”, ou ainda no acompanhamento de uma espécie considerada ameaçada de extinção. Falando em população, vamos relembrar esse conceito? Uma população pode ser definida como o conjunto de organismos ou indivíduos de uma mesma espécie que vive em um determinado local, em um determinado espaço de tempo. Assim, o conjunto de aves da espécie aracuã (Ortalis guttata) que habita um determinado fragmento florestal é considerado uma população, da mesma forma que o total de organismos do palmiteiro (Euterpe edulis) encontrados neste mesmo fragmento. Poderíamos citar os mais diversos exemplos, como um cardume de sardinhas (Sardina sp.) que vivem juntas em uma determinada área do Oceano Atlântico, ou ainda uma colônia de bactérias que habitam o nosso trato intestinal. Mas o nosso intuito é que você compreenda os termos básicos a qualquer estudo focando as relações ecológicas existentes em nosso planeta. Um fator muito importante e que sempre deve ser considerado é que a definição de população pode variar de acordo com o objetivo do estudo ou com a definição de população dada pelo pesquisador. Vamos a um exemplo: Anteriormente consideramos como uma população o conjunto de aracuãs que habita um determinado fragmento florestal. Porém, se o objetivo do estudo for estudar as aracuãs de uma determinada cidade e se assim o desejar, o pesquisador pode considerar o conjunto destas aves como uma população. Ainda, o conjunto de aracuãs existentes no estado de Santa Catarina também pode ser considerado uma população se o objetivo for compará-las com as aracuãs de outros estados. Por isso, definir os limites de uma população e deixá-los sempre claros é indispensável! Vamos agora entender um pouco mais sobre a história de vida dos organismos, parâmetro esse que define as estratégias utilizadas para realizar as mais diferentes atividades, tais como o seu crescimento e reprodução. Essas estratégias influenciam na estrutura e dinâmica populacional e, consequentemente, no comportamento de cada espécie. ATENCAO TÓPICO 1 | ORGANISMOS E POPULAÇÕES 77 2 HISTÓRIAS DE VIDA DOS ORGANISMOS O estudo dos organismos vai muito além de saber identificá-los. Se quisermos entender as forças que interferem na sua abundância em uma população precisamos conhecer as fases da sua vida onde estas forças são mais significativas (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006) para, se for o caso, intervir sobre estes quesitos. Estas informações são obtidas através da história de vida dos organismos. É o que veremos a seguir. Desde o momento do nascimento até a sua morte, um organismo passa por diversas fases de vida onde sempre precisa equilibrar algumas questões primordiais: o seu crescimento e a sua reprodução. A forma como um organismo gerencia estas questões em cada idade é que governa a evolução da sua história de vida (RICKLEFS, 2010). Mas o que significa a expressão história de vida? De forma simplificada a história de vida de um organismo, como o próprio nome sugere, compreende desde o seu nascimento, o período pré-reprodutivo, o período reprodutivo, o período pós-reprodutivo até a sua morte (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). De acordo com Ricklefs (2010), alguns componentes destacam-se na história de vida de um organismo. São eles: a) a idade de maturidade ou primeira maturação; b) a parição ou número de eventos reprodutivos; c) a fecundidade ou número de descendentes produzidos por evento; e d) a longevidade. A forma como os organismos lidam com os componentes acima citados varia amplamente, de forma que as suas histórias de vida também são bastante distintas. De forma geral, a maioria dos problemas de alocação de recursos que moldam as histórias de vida dos organismos pode ser resumida em três questionamentos: 1) quando começar a reproduzir? 2) quão frequentemente reproduzir? 3) quantos filhotes gerar em cada evento reprodutivo? (RICKLEFS, 2010). Um dos fatores que influencia estes questionamentos é o tempo de vida. Geralmente organismos com tempo de vida longa começam a reproduzir mais tardiamente em relação àqueles cujo tempo de vida é curto. Em relação a este quesito, são denominados anuais os organismos cujo ciclo de vida não ultrapassa um ano, enquanto que os organismos cujo ciclo de vida vai além deste período de tempo são denominados perenes (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Grande parte das plantas utilizadas na agricultura, tal como arroz, milho, feijão, entre outros, são exemplos de organismos anuais. Por outro lado, vegetais florestais e animais vertebrados de grande porte comumente vivem durante vários anos, e são exemplos de organismos perenes. UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 78 Alguns organismos, independentemente de possuírem ciclo de vida anual ou perene, apresentam apenas um evento reprodutivo ao longo da vida, sendo denominados organismos semélparos (semel “uma vez” e pario “dar a luz”). A semelparidade é comum em plantas anuais, mas é rara entre animais e plantas de vida longa (perenes) (RICKLEFS, 2010). Todavia, pode-se citar o caso do salmão do pacífico, da cigarra periódica, dos bambus e do agave (Figura a seguir). FIGURA 32 – INFLORESCÊNCIA DE UM ORGANISMO DE AGAVE UTILIZADO PARA ORNAMENTAÇÃO EM INDAIAL, SANTA CATARINA, EM PERÍODO FÉRTIL FONTE: As autoras Outros organismos reproduzem-se continuamente ao longo da vida, sendo denominados organismos iteróparos (do latim itero “repetir”). A espécie humana é um bom exemplo de espécie iterópara.56 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 58 TÓPICO 4 - MEIO FÍSICO E A DISPONIBILIDADE DE RECURSOS ....................................... 59 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 59 2 CONDIÇÕES AMBIENTAIS ............................................................................................................. 59 3 RECURSOS VEGETAIS ...................................................................................................................... 60 4 ANIMAIS E SEUS RECURSOS ......................................................................................................... 62 RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 64 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 66 ATIVIDADE DE LABORATÓRIO E DIDÁTICO-PEDAGÓGICO DE BIOLOGIA ............... 67 UNIDADE 2 - ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS ........ 73 TÓPICO 1 - ORGANISMOS E POPULAÇÕES ................................................................................. 75 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 75 2 HISTÓRIAS DE VIDA DOS ORGANISMOS ..................................................................... 77 3 MONITORANDO A MORTALIDADE, A NATALIDADE E A DISPERSÃO DOS ORGANISMOS DE UMA POPULAÇÃO .......................................................................................... 80 VIII 3.1 TABELAS DE VIDA E CURVAS DE SOBREVIVÊNCIA ........................................................... 80 3.2 DISPERSÃO E MIGRAÇÃO........................................................................................................... 83 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 85 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 86 TÓPICO 2 - INTERAÇÕES ECOLÓGICAS ....................................................................................... 87 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 87 2 INTERAÇÕES INTRAESPECÍFICAS ............................................................................................... 87 2.1 SOCIEDADE ..................................................................................................................................... 88 3 INTERAÇÕES INTERESPECÍFICAS ............................................................................................... 89 3.1 PREDAÇÃO ...................................................................................................................................... 90 3.2 HERBIVORIA ................................................................................................................................... 91 3.3 PARASITISMO ................................................................................................................................. 92 3.4 AMENSALISMO .............................................................................................................................. 93 3.5 COMENSALISMO ........................................................................................................................... 94 3.6 PROTOCOOPERAÇÃO .................................................................................................................. 95 3.7 MUTUALISMO ................................................................................................................................ 96 4 A COMPETIÇÃO .................................................................................................................................. 98 4.1 RECURSOS ECOLÓGICOS ............................................................................................................ 98 4.2 RECURSOS LIMITANTES .............................................................................................................. 99 4.3 TIPOS DE COMPETIÇÃO .............................................................................................................. 99 4.3.1 Competição intraespecífica .................................................................................................... 100 4.3.2 Competição interespecífica .................................................................................................... 102 5 A EVOLUÇÃO DAS INTERAÇÕES ENTRE AS ESPÉCIES ........................................................ 103 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 107 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 109 TÓPICO 3 - ECOLOGIA DE COMUNIDADES ............................................................................... 111 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 111 2 CADEIAS ALIMENTARES ................................................................................................................. 113 3 SUCESSÃO ECOLÓGICA ................................................................................................................. 114 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 118 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 125 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 126 TÓPICO 4 - ECOSSISTEMAS ............................................................................................................... 127 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 127 2 ENERGIA NOS ECOSSISTEMAS .................................................................................................... 127 3 CICLOS BIOGEOQUÍMICOS ........................................................................................................... 130 3.1 CICLAGEM DO NITROGÊNIO .................................................................................................... 131 3.2 CICLAGEM DO FÓSFORO ............................................................................................................ 133 3.3 CICLAGEM DO ENXOFRE ........................................................................................................... 134 3.4 CICLAGEM DO CARBONO .......................................................................................................... 135 3.5 CICLO HIDROLÓGICO ................................................................................................................. 137 4 CLASSIFICAÇÃO DOS ECOSSISTEMAS ..................................................................................... 138 RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 140 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 141 UNIDADE 3 - GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ...................................................Grande parte dos animais e plantas de vida longa também apresenta este padrão de reprodução. Com relação ao tempo de vida e número de eventos reprodutivos, uma inúmera quantidade de organismos apresenta história de vida que se encaixa entre os dois extremos apresentados, variando distintamente para cada um desses atributos. Porém entre os organismos que se enquadram na ponta lenta desse extremo podem-se citar os albatrozes. Essas aves possuem grande longevidade e atingem a maturidade sexual tardiamente (cerca de 5-6 anos para as espécies menores e 11 anos para os grandes albatrozes). Apenas um ovo é produzido por temporada podendo haver intervalos entre as posturas de dois ou mais anos (NEVES et al., 2006). Outros exemplos de extremo lento são os elefantes, as tartarugas-marinhas e as árvores de carvalho. No extremo rápido temos as ervas em geral e as moscas-da-fruta. TÓPICO 1 | ORGANISMOS E POPULAÇÕES 79 Foram justamente as características da história de vida das moscas-da-fruta que permitiram que esta espécie fosse amplamente utilizada em experimentos genéticos! Desta forma, pode-se observar que existe certo balanço ou escolha entre alocar energia para o crescimento ou reprodução. Como citam Townsend, Begon e Harper (2006), especialmente quanto à reprodução, a iniciação dessa etapa pode gerar um alto custo para o crescimento, podendo inclusive encerrar a vida do organismo. Em algumas situações, no entanto, isso pode ser interessante, pois espécies que conseguem se multiplicar rapidamente, produzindo um elevado número de descendentes em um curto período de tempo, obtêm maior sucesso em ambientes efêmeros. Isso permite que estas espécies colonizem novos hábitats rapidamente, tal como áreas perturbadas. Costuma-se denominar de oportunistas as espécies que apresentam esse tipo de padrão de vida. Elas ainda podem ser denominadas de r-estrategistas. No outro extremo, algumas espécies são mais eficientes em sobreviver em hábitats onde há intensa competição pelos recursos limitados. Nesses casos, os organismos investem mais em crescimento, ao invés de reprodução, ou na competição uns com os outros. Essas espécies são denominadas de k-estrategistas por passar a maior parte de suas vidas crescendo contra os limites dos recursos ambientais (veja no Tópico 2 onde se discute a competição intraespecífica). Aqui vale uma ressalva: apesar de os ecólogos sempre buscarem encontrar padrões nos fenômenos e processos que estudam, é preciso considerar que estamos lidando com seres vivos diversificados, cujas características foram e continuam a ser moldadas pela evolução e pelas condições do ambiente onde vivem. Portanto, não há dois ou mais grupos isolados de padrões diferenciados com relação às histórias de vida dos organismos. Ao contrário, o que se pode verificar na natureza é uma continuidade de valores para as diferentes características que moldam as histórias de vida, cujos extremos são ocupados por organismos com histórias de vida ditas lentas e aqueles que apresentam uma história de vida considerada rápida. Os extremos lento-rápidos das histórias de vida dos organismos podem ser assim distinguidos (Tabela a seguir): UNI UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 80 TABELA 1 – AGRUPAMENTO DE VALORES EXTREMOS PARA OS ATRIBUTOS (CARACTERÍSTICAS) QUE COMPÕEM A HISTÓRIA DE VIDA DE UM ORGANISMO FONTE: Ricklefs (2010, p. 120-121) 3 MONITORANDO A MORTALIDADE, A NATALIDADE E A DISPERSÃO DOS ORGANISMOS DE UMA POPULAÇÃO Na seção anterior comentamos sobre a importância de conhecermos a fundo a história de vida dos organismos para que seja possível conhecer alguns aspectos das populações naturais. Não podemos, no entanto, determinar a taxa de natalidade, mortalidade e sobrevivência de uma população estudando os organismos separadamente. Esses são alguns exemplos das diversas propriedades únicas das populações e que, portanto, somente fazem sentido no âmbito populacional (ODUM; BARRET, 2011). Conhecer estes processos é de suma importância uma vez que são eles os responsáveis pela modificação do tamanho de uma população (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Você pode questionar a importância de estudar estas questões. Um exemplo prático da sua utilidade é em atividades de manejo. Como elaborar uma estratégia eficaz se não se conhece a estrutura e dinâmica da população? Será necessário intervir severamente ou simples ações são suficientes? E ainda, em qual fase da vida é necessário focar as intervenções? Essas e outras questões podem ser acessadas através de dados populacionais como os que veremos a seguir. 3.1 TABELAS DE VIDA E CURVAS DE SOBREVIVÊNCIA Uma forma de acompanhar as taxas de natalidade de uma população é através da construção de uma tabela de vida. O tipo de tabela de vida varia de acordo com a forma de monitoramento da população. Assim, é possível elaborar uma tabela de vida de coorte ou dinâmica ou uma tabela de vida estática. O termo coorte, utilizado na tabela de vida de coorte ou dinâmica, define os organismos que nasceram em um mesmo determinado período de tempo. Desta forma, nesse tipo de tabela é registrada a sobrevivência desses organismos que nasceram em uma mesma época até o último morrer (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Esse método é geralmente aplicado para plantas e animais sésseis, nos quais os indivíduos marcados podem ser continuamente rastreados ao longo de suas vidas (RICKLEFS, 2010). TÓPICO 1 | ORGANISMOS E POPULAÇÕES 81 A tabela de vida estática, por sua vez, pode ser definida como uma foto instantânea da população, pois acompanha a população em um dado espaço de tempo descrevendo os números de sobreviventes de diferentes idades na população (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). A seguir apresentamos um gráfico para que você entenda a diferença de estratégia existente entre a construção das tabelas de vida. Não vamos aqui demonstrar ou ensinar a calcular as tabelas de vida, mas é importante você saber da sua existência e da sua utilidade em estudos populacionais. De fato, as tabelas de vida fornecem informações detalhadas sobre organismos específicos, como por exemplo, em qual fase houve uma maior número de mortes. Porém, os ecólogos buscam encontrar padrões entre as mais diversas espécies de forma que a transferência dos dados de sobrevivência calculados nas tabelas de vida para um gráfico pode ser mais reveladora (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). GRÁFICO 1 – DEMONSTRAÇÃO GRÁFICA DA FORMA DE ACOMPANHAMENTO DOS ORGANISMOS DE UMA POPULAÇÃO ATRAVÉS DA CONSTRUÇÃO DE TABELAS DE VIDA Obs.: Nas tabelas de vida de coorte todos os organismos que nasceram no tempo t0 são acompanhados até que o último tenha morrido. Já na tabela estática, todos os organismos existentes no período t1 são monitorados. FONTE: Adaptado de: Ricklefs (2010) UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 82 Ao se transpor os dados de tabelas de vida de coorte ou dinâmica podem ser observadas três formas de curva de sobrevivência: CURVA DO TIPO I: na curva de sobrevivência do Tipo I, a taxa de mortalidade de indivíduos na população é baixa nos estágios jovens, se concentrando nas idades mais avançadas (DAJOZ, 2005), como pode ser visto nos gráficos a seguir. Um exemplo típico deste tipo de curva é o apresentado pelas populações humanas, assim como pelas demais populações de mamíferos. Os insetos sociais e as moscas- da-fruta também tendem a apresentar esse padrão (DAJOZ, 2005). GRÁFICO 2 – CURVA DE SOBREVIVÊNCIA E TAXA DE MORTALIDADE EM CURVAS DO TIPO I FONTE: Adaptado de Townsend, Begon e Harper (2006) CURVA DO TIPO II: nas populações que apresentam este tipo de curva de sobrevivência, a taxa de mortalidade é relativamente constante ao longo do tempo de vida do organismo (Gráfico 3). Esse é o caso da hidra de água doce, de diversos passeriformes, de coelhos, cervos, entre outros (DAJOZ, 2005, p. 140; ODUM; BARRET, 2008). GRÁFICO 3 – CURVA DE SOBREVIVÊNCIA E TAXADE MORTALIDADE EM CURVAS DO TIPO II FONTE: Adaptado de: Townsend, Begon e Harper (2006) CURVA DO TIPO III: nas populações que apresentam este tipo de curva de sobrevivências, a taxa de mortalidade é elevada nos estágios iniciais, diminuindo posteriormente (Gráfico 4). Esse é o tipo mais comum de curva apresentado pelas populações naturais e é frequente nos animais invertebrados, plantas, muitos peixes e anfíbios (DAJOZ, 2005; RICKLEFS, 2010). TÓPICO 1 | ORGANISMOS E POPULAÇÕES 83 GRÁFICO 4 – CURVA DE SOBREVIVÊNCIA E TAXA DE MORTALIDADE EM CURVAS DO TIPO III FONTE: Townsend, Begon e Harper (2006, p. 202) Os três tipos de curva de sobrevivência apresentados são úteis generalizações, mas é preciso destacar que na prática a forma da curva está muitas vezes relacionada com a densidade da população podendo, portanto, variar ao longo do tempo (ODUM; BARRET, 2011; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). 3.2 DISPERSÃO E MIGRAÇÃO Dificilmente um organismo permanece ao longo da sua vida no mesmo local onde foi gerado. Isso é uma realidade não somente com os animais, mas também para os outros seres, como microrganismos e vegetais. De acordo com as características de cada espécie em relação a sua capacidade de locomoção, diversas estratégias podem ser observadas. Os vegetais, por exemplo, incapazes de se locomoverem por si próprios, desenvolveram diferentes maneiras para dispersarem suas sementes. Assim, algumas plantas têm as suas sementes dispersas pelo vento (ex. dente-de-leão), num fenômeno denominado anemocoria. Outras oferecem frutos carnosos atraentes aos seus agentes dispersores animais (zoocoria) como aves e morcegos; ou pela água (hidrocoria), entre diversas outras. Desta forma, suas sementes chegam a locais distantes da planta-mãe permitindo que a população se distribua de uma forma que jamais seria possível sem estes agentes. Os animais por sua vez, se deslocam à procura de recurso e abrigo, mesmo que esse deslocamento signifique mover-se somente 1 cm em uma folha, ou se mover de um hemisfério a outro (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Os efeitos dos movimentos dispersores são variados. Em alguns casos eles agregam os organismos da população, em outros eles permitem que fiquem espalhados. De forma geral, podem-se encontrar três padrões espaciais: ao acaso, regular e agregado (Figura a seguir). UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 84 FIGURA 33 - PADRÕES GERAIS DE DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL QUE PODEM SER EXIBIDOS PELOS ORGANISMOS EM SEUS HABITATS FONTE: Adapatado de: Townsend, Begon e Harper (2006) Conhecer o padrão de distribuição dos organismos de uma população é muito importante para censos populacionais. Isso decorre do fato que dificilmente é possível realizar a contagem de todos os organismos habitantes em um determinado local e da densidade populacional. Portanto, usualmente costuma-se utilizar amostras. Sem conhecer a distribuição da população, corre-se o risco de selecionar amostras em áreas que superestimem ou subestimem a realidade da população, inferindo e prejudicando possíveis ações de controle de pragas e ou de conservação da espécie. Você deve ter percebido que apesar do subtítulo indicar que falaríamos da dispersão e da migração dos organismos, até o momento utilizamos apenas a expressão dispersão. Isso indica que dispersão e migração são sinônimas? De forma alguma. Enquanto a dispersão se refere ao movimento de afastamento dos organismos, a migração constitui em um movimento direcional em massa pelo qual os indivíduos se dirigem de um local a outro (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). A migração ocorre geralmente de locais com baixa disponibilidade de recursos para áreas mais produtivas. O movimento de migração é mais frequente em ambientes temperados, onde as estações do ano mudam bruscamente o clima local. Assim, muitas espécies de aves, por exemplo, durante o inverno migram do hemisfério norte para o hemisfério sul e vice-e-versa. 85 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você pode concluir que: • Definir um organismo não é tão fácil como em um primeiro momento parece, demonstrando que os conceitos ecológicos não devem ser generalizados e necessitam de claras regras de delimitação. • A partir do estudo dos organismos pode-se acessar a sua história de vida permitindo medidas de intervenção, quando necessário for. • A história de vida de um organismo compreende todas as fases da sua vida, mas de forma resumida pode ser dividida em nascimento, período pré-reprodutivo, reprodutivo, período pós-reprodutivo e morte. • Em suma, os fatores que influenciam a história de vida de um organismo são a idade da maturação, o número de eventos reprodutivos, o número de descendentes gerados a cada reprodução, e a o tempo de vida. • Algumas espécies possuem ciclo de vida curto, com duração de até um ano. Estas espécies são denominadas de espécies anuais. Outras espécies vivem por mais tempo, sendo chamadas de espécies perenes. • Durante a sua vida uma espécie pode reproduzir uma única vez (espécies semélparas) ou apresentar vários eventos reprodutivos (espécies iteróparas). • Para acessar a história de vida dos organismos, os ecólogos utilizam como estratégia a construção de tabelas de vida. A tabela de vida de coorte o ou dinâmica é confeccionada através do acompanhamento de uma geração de organismos da população, desde o nascimento do primeiro indivíduo até a morte do último da “leva”. Já a tabela de vida estática utiliza como estratégia acompanhar todos os organismos presentes na população em um determinado período de tempo fixo. • Através dos dados adquiridos em uma tabela de vida de coorte ou dinâmica, é possível elaborar a curva de sobrevivência ao longo da vida para uma dada população. • Há três padrões de curva de vida entre as populações naturais, sendo elas denominadas de Curva do Tipo I, Curva do Tipo II e Curva do Tipo III. • Os organismos se dispersam de seus progenitores formando três padrões básicos de distribuição: ao acaso, regular e agregado. 86 AUTOATIVIDADE 1 Os organismos variam amplamente em suas histórias de vida, possuindo diferentes estratégias em relação ao crescimento e reprodução. A este respeito analise as sentenças e classifique V para as afirmativas verdadeiras e F para as falsas: ( ) São denominadas espécies semélparas aquelas que apresentam apenas um evento reprodutivo ao longo da sua vida. ( ) As espécies vegetais utilizadas na agricultura em sua maioria são consideradas perenes por apresentarem ciclos de vida inferiores a um ano. ( ) Toda espécie com ciclo de vida curto apresenta apenas um evento reprodutivo, enquanto que todas as espécies de vida longa reproduzem várias vezes ao longo de sua vida. ( ) O início da vida reprodutiva de um indivíduo tem grande influência sobre a sua história de vida. Agora, assinale a alternativa CORRETA: ( ) V – F – F – V. ( ) V – V – F – V. ( ) F – F – F – V. ( ) V – V – F – F. 2 Um pesquisador foi contratado para monitorar uma população de uma ave ameaçada de extinção e sobre a qual pouco se sabe. Quais atributos desta população o pesquisador deve acessar de maneira a poder monitorar de forma correta esta população? Por quê? 3 Quando se deseja conhecer as histórias de vida dos organismos de uma população, é possível realizar dois tipos de abordagem, cada qual dará origem a um tipo de tabela de vida. Quais são estes tipos de tabela e o que cada uma delas aborda? 4 Apesar de muitas vezes serem tratados como sinônimos, a dispersão e migração são eventos distintos. Qual é a principal diferença existente entre estes dois fenômenos? Dê um exemplo de cada. Assista ao vídeo de resolução da questão 4 87 TÓPICO 2 INTERAÇÕES ECOLÓGICAS UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Independente da espécie que consideremos, o fato é que nenhum organismo consegue viver sem interagir com outros seres, sejam eles da mesma espécie ou de espécies distintas. Nesse contexto, abordaremos a partir de agora as diferentesformas de relações ocorrentes entre os organismos vivos. O motivo que leva um organismo a se relacionar com os demais são os mais distintos, variando desde a busca de proteção até a garantia de alimentação. Ainda, esta interação pode se dar entre organismos da mesma espécie, a chamada interação intraespecífica, ou ocorrer entre organismos de espécies diferentes, o que é denominado interação interespecífica. Primeiramente focaremos nas interações intraespecíficas, dando posterior ênfase às interações interespecíficas. Como pode ocorrer tanto intra como interespecificamente, a competição será tratada em separado ao final do tópico. 2 INTERAÇÕES INTRAESPECÍFICAS Um organismo se relaciona com outros organismos da sua espécie por diversas razões, seja devido à disputa por alimento, necessidade de abrigo ou busca por um parceiro, seja para maximizar os esforços para sobrevivência do grupo ou sucesso reprodutivo. A esse tipo de interação que ocorre entre organismos da mesma espécie dá-se o nome de interação intraespecífica. São várias as formas de ocorrência desse tipo interação, sendo relacionadas a seguir as interações sociais, um tipo especial de comportamento que envolve membros de uma mesma população (RICKLEFS, 2010). As interações envolvendo organismos de uma mesma espécie equilibram de forma delicada as tendências de conflito de cooperação e competição, altruísmo e egoísmo, ocorrendo em quase todas as espécies. Como destaca Ricklefs (2010), mesmo as bactérias e os protistas podem sentir a presença de outros da mesma espécie e reagir de formas amigáveis ou agressivas através do lançamento de secreções químicas. Da mesma forma, as plantas podem se comunicar através de compostos químicos para sinalizar danos por herbívoros. UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 88 O comportamento social inclui desde situações de cooperação ao antagonismo, de forma que a seguir será explorado o tipo de interação intraespecífico mais “famoso” e comentado em livros didáticos de Ciências e Biologia: a sociedade. 2.1 SOCIEDADE Uma sociedade pode ser definida como um agrupamento permanente, onde os organismos não estão ligados fisicamente e apresentam divisão de atividades entre os membros, agindo de forma cooperativa. Há vários graus de sociabilidade no mundo animal, cujo grau máximo é denominado de eussociabilidade (RICKLEFS, 2010), que será tratada neste Caderno de Estudos. Para que uma interação seja denominada de eussociabilidade (eu em latim significa verdadeiro), as seguintes características devem ser verificadas: 1 Diversos adultos vivendo juntos em um grupo. 2 Gerações sobrepostas (pais e filhos) vivendo em um mesmo grupo. 3 Cooperação na construção de ninhos e no cuidado dos ovos. 4 Dominância reprodutiva por um ou poucos organismos, havendo castas estéreis. Poucas espécies animais apresentam tal grau de organização, de forma que a eussociabilidade está restrita às térmitas (cupins), formigas, abelhas e vespas. A seguir, relataremos um pouco sobre a organização social destes animais, utilizando como base o descrito por Ricklefs (2010). As sociedades sociais são dominadas por uma ou poucas fêmeas ovopositoras, denominadas rainhas. Nas colônias de formigas, abelhas e vespas (figura 34), as rainhas acasalam somente uma vez durante a sua vida, armazenando uma quantidade de esperma suficiente para produzir filhotes por um período de 10 a 15 anos! As sociedades das abelhas são organizadas da seguinte forma: os filhotes de uma rainha são divididos entre uma casta estéril trabalhadora, todas geneticamente fêmeas, e outra casta reprodutiva, produzida sazonalmente, formada por machos e fêmeas. O destino de um organismo entre estas duas opções depende da qualidade da nutrição recebida enquanto era larva em desenvolvimento. Processo semelhante ocorre entre as formigas e vespas. Diferentemente, nas térmitas, as colônias são dirigidas por um casal reprodutivamente ativo (rei e rainha) que produzem todos os demais organismos da colônia através da reprodução sexuada. Estes trabalhadores são divididos em ambos os sexos que não são capazes de amadurecer reprodutivamente até que o rei ou a rainha morra. TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 89 FIGURA 34 – VESPA RAÍNHA E OPERÁRIA Obs.: À esquerda, exemplo de vespa rainha e vespa operária. Na foto à direita, ao centro da imagem uma térmita rainha com seu abdômen cheio de ovos. FONTE: Disponível em: . (vespas); . (térmitas). Acesso em: 28 maio 2013. Em livros didáticos de Ciências e Biologia é citada a interação intraespecífica colônia, cuja definição dada é de um agrupamento de organismos de uma determinada espécie que são interdependentes uns dos outros para a sua sobrevivência, mas onde, diferentemente das sociedades, não há uma divisão de atividades claramente definida. Como exemplos são comumente citadas as colônias de esponjas e de bactérias. Todavia, é necessário ter cautela com esse termo. Em livros e artigos respeitados na área de ecologia não é feita esta distinção entre sociedade e colônia, sendo inclusive denominado de colônia o ambiente físico ocupado pelas espécies sociais. Ainda, pode-se encontrar o termo colônia para definir um grupo de aves, morcegos e diversos outros seres que vivem em grupos. 3 INTERAÇÕES INTERESPECÍFICAS Assim como é inevitável que organismos da mesma espécie interajam, o mesmo pode ser dito em relação aos organismos de espécies diferentes. Ora, todo ser vivo necessariamente precisa se alimentar, de forma que uma espécie acaba por ser consumidora ou recurso alimentar para outra espécie. Porém, não é apenas devido à alimentação que organismos de espécies diferentes interagem ao longo da vida. Nesta seção, comentaremos os tipos mais comuns de interações interespecíficas existentes no mundo natural. De forma geral, as interações interespecíficas podem 1) beneficiar ambas as espécies envolvidas, 2) beneficiar uma das espécies sendo indiferente à outra espécie em questão, e 3) beneficiar uma das espécies em detrimento da outra espécie integrante na relação. Nos livros didáticos de Ciências e Biologia tais situações são divididas entre as interações harmônicas e desarmônicas. UNI UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 90 A seguir apresentamos uma tabela com o resumo das interações e suas consequências para as espécies nelas envolvidas (Tabela a seguir). TABELA 2 – TIPOS DE INTERAÇÃO INTERESPECÍFICA FONTE: Adaptado de: Dajoz (2005) Apesar de termos nos baseado na nomenclatura utilizada por DAJOZ (2005) para definir as interações interespecíficas, é necessário ter em mente que estas denominações mudam conforme os livros-referência de Ecologia e, consequentemente, entre os livros didáticos de Ciências e Biologia. De fato, como comentam Quesado e Rios (2011), há ambiguidade e diferentes formas de definir as mesmas interações. Isso evidencia que a ciência não é uma verdade absoluta e acabada, sendo mutável e sujeita a interpretações diferenciadas de acordo com os contextos históricos e culturais. Essa questão será melhor evidenciada quando falarmos nas relações de protocooperação e mutualismo. Vamos então agora discutir os principais tipos de interações interespecíficas citados em livros-texto de Ecologia e nos livros didáticos de Ciências e Biologia. 3.1 PREDAÇÃO Os predadores capturam os indivíduos e os consomem, retirando-os da população e ganhando nutrição para sustentar a própria reprodução (RICKLEFS, 2010). Os exemplos são os mais diversos e conhecidos por todos nós (Figura 35). Afinal, quem nunca assistiu a um documentário sobre a vida silvestre que demonstrasse esse tipo de relação? Um aspecto que precisa ser considerado é que nós humanos somos, sem sombra de dúvida, os maiores e mais eficazes predadores existentes. E não somente quando realizamos atividades de caça, mas tambémquando consumimos carne em nossas refeições. UNI TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 91 FIGURA 35 – ORGANISMO DE ANU-BRANCO GuiraGuira PREDANDO UM RÉPTIL NÃO IDENTIFICADO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2013. 3.2 HERBIVORIA A herbivoria envolve um organismo que utiliza uma espécie de planta como recurso alimentar. Nos livros-referência de Ecologia a interação herbivoria é classificada juntamente com a predação, com o parasitismo ou com ambos, podendo, muitas vezes, confundir o leitor menos avisado. O fato é que dependendo do caso, os herbívoros se comportam como predadores e em outras situações, como parasitas (RICKLEFS, 2010). Mas o que diferencia essa classificação entre os herbívoros? De forma simplificada, a herbivoria pode ser considerada predação quando o herbívoro remove a planta inteira. Por outro lado, quando apenas parte dos tecidos vegetais são retirados, esta interação pode ser considerada parasitismo. Neste contexto, quando colhemos um pé de alface em nosso quintal, ou derrubamos um palmiteiro para nosso consumo, podemos ser considerados predadores desta planta. O mesmo acontece com um veado, capivara, ou outro animal qualquer que consuma uma planta por inteiro (figura 36). FIGURA 36 – INDIVÍDUO DE CAPIVARA SE ALIMENTANDO EM UM TÍPICO CASO DE HERBIVORIA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2013. UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 92 Por outro lado, se retirarmos apenas uma parte do tecido vegetal para, por exemplo, extrair o látex de uma árvore, ou quando uma lagarta consome parte das folhas de um arbusto, esta interação pode ser considerada um parasitismo. 3.3 PARASITISMO É denominada de parasitismo a relação em que um organismo nomeado parasita vive intimamente associado com um organismo de outra espécie, que é considerado seu hospedeiro (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Geralmente, o parasita retira os recursos necessários do seu hospedeiro de forma a prejudicá-lo sem, porém, matá-lo. Pelo menos a princípio. Isso porque não é interessante para um parasita eliminar a sua fonte de recurso quando não tem a capacidade de se locomover e sobreviver sem ela (Figura 37). FIGURA 37 – ORGANISMOS DE SABIÁ-DE-COLEIRA Turdus Albicollis PARASITADO. EM DESTAQUE, CARRAPATO PRÓXIMO AO OLHO DO ANIMAL FONTE: As autoras Se os parasitas “roubam” recursos de seus hospedeiros, por outro lado esses não permitem que os parasitas tenham uma vida fácil e frequentemente desenvolvem diversos mecanismos para reconhecer os invasores e os destruir. Além disso, os parasitas devem se dispersar através de um ambiente hostil para se deslocar de um hospedeiro para outro (RICKEFS, 2010), o que não é nem de longe uma tarefa fácil. TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 93 FIGURA 38 – A) ORGANISMO DE LAGARTA PARASITADA; B) ECLOSÃO DO PARASITOIDE FONTE: Disponível em: A) e B) . Acesso em: 28 maio 2013. De acordo com o local em que um parasita se aloja, ele pode ser denominado de diferentes formas. Assim, considera-se um endoparasita o organismo que se instala na parte interna do organismo hospedeiro, enquanto que o organismo que se aloja na parte externa é denominado de ectoparasita. Exemplos clássicos de ectoparasitas de animais são o carrapato, o piolho e a pulga, mas podem-se citar também os ácaros, os fungos e as bactérias. Já entre as plantas, a cochonilha é bastante comum, mas há diversas outras espécies que apresentam esse comportamento. Entre os endoparasitas, podemos citar as Taenia solium e T. saginata (conhecidas como solitárias) que podem parasitar o trato intestinal humano. Apesar de não ser uma regra, muitas vezes os parasitas podem ocasionar sintomas de doença em seu hospedeiro. Quando isso ocorre, o parasita é denominado de patógeno (RICKLEFS, 2010). Em outros casos, algumas espécies de moscas e vespas capturam um organismo e nele depositam seus ovos que quando eclodirem se alimentarão dos tecidos dos hospedeiros vivos, sendo chamados de parasitoides. Apesar de nesse caso o hospedeiro acabar morrendo, antes de isso acontecer, as larvas já terão completado o seu ciclo e entrado em estágio de pupa. Assim, estas espécies primeiramente se comportam como parasitas, respeitando os órgãos vitais de seus hospedeiros e posteriormente como predadores, devorando-os e os matando (DAJOZ, 2005) (Figura 38 “a” e “b”). 3.4 AMENSALISMO O amensalismo, também conhecido como antagonismo ou antibiose, é a interação em que uma espécie é eliminada por outra através do lançamento de uma substância tóxica (DAJOZ, 2005). Quando este tipo de associação ocorre nas plantas, ela recebe o nome de alelopatia. A espécie de pinheiro Pinus eliotti UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 94 FIGURA 39 – À ESQUERDA, EVENTO MARÉ-VERMELHA CAUSADA PELA ESPÉCIE DE PERIDIANO DO GÊNERO Gonyaulax. À DIREITA, SUB-BOSQUE DE UMA PLANTAÇÃO DE Pinus Elliottii FONTE: Disponível em: A) . B) . Acesso em: 28 maio 2013. 3.5 COMENSALISMO São denominadas de espécies comensais aquelas que utilizam outras espécies como suporte ou abrigo. Esse é o caso, por exemplo, de liquens e musgos que se desenvolvem sobre troncos de árvores e de plantas trepadeiras como a hera e a videira que, embora tenham raízes, utilizam o tronco das árvores como suporte para que suas folhas atinjam o dossel florestal (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Outro exemplo são as plantas epífitas, que são erroneamente denominadas parasitas e muitas vezes retiradas por pessoas que acreditam que estas plantas possam prejudicar ou mesmo levar a árvore-suporte à morte (Figura 40, letra “b”). Na verdade essas espécies apenas emitem suas raízes nos ramos das árvores sem, no entanto, retirar qualquer recurso delas. São consideradas plantas epífitas as orquídeas, bromélias, pteridófitas, entre outras. No ambiente aquático o comensalismo também é comum. De acordo com Odum e Barret (2011) praticamente todas as galerias de vermes, moluscos e esponjas contém diversos organismos que as utilizam como abrigo sem, no entanto, prejudicar o hospedeiro. é um exemplo de planta que lança substâncias tóxicas ao seu redor inibindo o crescimento de outras espécies. O amensalismo é comum em ambientes aquáticos, e explica o fenômeno das águas vermelhas que consiste no lançamento de substâncias tóxicas na água pelos organismos de Peridianos (Gonyaulax), que é capaz de eliminar grande parte da fauna atingida (Figura 39). TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 95 FIGURA 40 – A) OS ORGANISMOS DE RÊMORA ACOMPANHAM TUBARÕES SE ALIMENTANDO DO RESTO ALIMENTAR CONSUMIDO POR ELES. B) PLANTAS EPÍFITAS UTILIZAM OUTROS VEGETAIS APENAS PARA SE FIXAR FONTE: Disponível em: A) e B) as autoras. Apesar de o comensalismo ser muito menos estudado do que o mutualismo e o parasitismo, esta interação permite que surjam modos de vida completamente especializados e fascinantes e sua contribuição para a diversidade de comunidades pode ser bastante expressiva (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). 3.6 PROTOCOOPERAÇÃO Vários organismos comensais não são hospedeiros específicos, mas alguns aparentemente são encontrados associados a apenas uma espécie de hospedeiro. Esse seria, segundo Odum e Barret (2011), o passo mais curto para o desenvolvimento da relação de protocooperação. Mas o que vem a ser a protocooperação? A protocooperação pode ser definida como uma interação em que ambos os organismos envolvidos se beneficiam, mas não dependem da associação para a sua sobrevivência. Os casos de protocooperação são os mais diversos, de forma que citaremos apenas alguns. Um exemplo bastante conhecidoé a interação ocorrente entre o caranguejo-eremita e as anêmonas, que se fixam na concha utilizada pelo caramujo. Enquanto o caramujo proporciona locomoção, às anêmonas, que são sésseis, oferecem proteção ao caramujo através de substâncias urticantes presentes em seus tentáculos. Muitas aves também participam de interações protocooperativas com outros organismos. Inclusive, o nome carrapateiro dado ao gavião Milvago chimachima se UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 96 deve ao seu hábito de pousar sobre o dorso de bovinos e equinos, retirando destes os ectoparasitas para a sua alimentação (Figura 41). O carrapateiro não utiliza os carrapatos como única fonte de alimento, assim como os bovinos e equinos não dependem do carrapateiro para a sua sobrevivência. Porém, ambos se beneficiam desta associação, em um típico caso de protocooperação. FIGURA 41 – ORGANISMO JOVEM DE Milvago Chimachima SOB O CRÂNIO DE UM BOVINO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 11 abr. 2013. 3.7 MUTUALISMO É considerado mutualismo a associação entre espécies em que ambas podem viver independentemente, mas cuja associação permite que determinada ação ou atividade ocorra. Essa interação assume diversas formas, mas geralmente os organismos envolvidos suprem recursos complementares ou serviços (RICKLEFS, 2010, p. 257). Um exemplo bastante ilustrativo é o mutualismo ocorrente entre algumas espécies de formigas e o gênero de plantas Cecropia (embaúbas). O “caule” das embaúbas é oco e as formigas costumam utilizá-lo como abrigo. Em contrapartida, as formigas atacam qualquer intruso (tal como lagartas e outros insetos) que por ventura tentem se utilizar da embaúba como recurso alimentar. Entre outros casos de mutualismo, pode-se citar a dispersão de sementes por aves, morcegos e outros organismos, que se alimentam do arilo nutritivo produzido pelas plantas e acabam por levar as suas sementes para longe da planta- mãe ao defecarem. Situação semelhante ocorre entre as plantas e espécies de TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 97 animais nectarívoros. Enquanto a planta oferece o néctar como recurso nutritivo para o animal, este acaba por transportar o pólen da flor. O termo simbiose é utilizado muitas vezes para definir o tipo de associação mutualística obrigatória e indissociável (DAJOZ, 2005; RICKLEFS, 2010). Todavia, esse termo não é consenso entre os grandes ecólogos. Pode ser considerado um caso de simbiose a associação entre os fungos micorrízicos e as raízes de algumas plantas (Figura 42). Se por um lado o fungo facilita a nutrição da planta, que sem a presença do fungo se desenvolve mal ou nem chega a se desenvolver, por outro o fungo micorrízico não sobrevive sem esta interação (DAJOZ, 2005). FIGURA 42 – ORGANISMO DE FUNGO MICORRÍZICO DA ESPÉCIE Rhizophagus Clarus EM ASSOCIAÇÃO COM AS RAÍZES DE PLANTA DA ESPÉCIE SORGO SORGHUM BICOLOR FONTE: As autoras Outros exemplos de simbiose ocorrem entre as bactérias fixadoras de nitrogênio do gênero Rhizobium e as plantas da família Fabaceae (conhecidas também como leguminosas); entre fungos e algas, formando o líquen; entre o cupim ou térmita e os protozoários ou bactérias que habitam o seu intestino digerindo a celulose; entre vários outros exemplos. Muitas relações mutualísticas evoluíram de relações hospedeiro-parasitas e talvez o contrário (RICKLEFS, 2010). Em plantas, tão notáveis quanto à diversidade de parasitas, são as populações de fungos mutualísticos que vivem fortemente integrados aos seus tecidos (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 98 Os termos protocooperação, mutualismo e simbiose podem causar certa confusão. De forma geral, essas interações possuem o mesmo princípio variando somente o grau de dependência existente entre os organismos envolvidos, que aumenta da protocooperação em direção à simbiose. Todavia, os livros-texto de Ecologia e os livros didáticos de Ciências e Biologia variam muito em relação a essas definições. Essas e outras dúbias interpretações de termos ecológicos (como o de colônia nas interações intraespecíficas) demonstra a necessidade de unificação da classificação das interações ecológicas, afim de não mais suscitar em confusões não só para os pesquisadores, mas também por parte dos leigos (QUESADO; RIOS, 2011). 4 A COMPETIÇÃO A competição pode ser definida como qualquer uso ou defesa de um recurso por um organismo que reduza a sua disponibilidade para outros organismos (RICKLEFS, 2010). Mas o que pode ser considerado um recurso? 4.1 RECURSOS ECOLÓGICOS A água pode ser entendida como um recurso porque a sua utilização por um organismo prontamente diminuirá a quantidade a ser consumida por outros organismos. Por outro lado, a temperatura local não pode ser assim considerada já que ela está disponível a todos e sua intensidade não varia de acordo com o uso (RICKLEFS, 2010). Os recursos utilizados pelos organismos podem ser divididos em dois grupos: recursos renováveis e recursos não renováveis. São considerados recursos renováveis aqueles que uma vez utilizados por um organismo não estarão mais disponíveis até que esse organismo o libere ou cesse o seu uso. Um exemplo de recurso não renovável é o espaço. Sabe aquela máxima da física “Dois corpos não ocupam o mesmo lugar”? Ela se aplica e explica o porquê o recurso espaço é considerado não renovável. Enquanto um organismo utilizar um determinado local para nidificar, ou para se fixar (no caso de organismos sésseis), essa área não estará mais disponível. Por outro lado, recurso renovável é aquele que pode ser constantemente renovado, tal como o número de presas, detritos, água, entre outros. O uso destes recursos por um organismo diminui prontamente a sua disponibilidade, mas com o passar do tempo, estes recursos voltam a ter os seus níveis aumentados e a ficar disponíveis tanto para o organismo que já o utilizava como para os demais organismos. UNI TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 99 4.2 RECURSOS LIMITANTES Porém, não são todos os recursos utilizados pelos organismos que limitam as populações que os consomem. É nesse contexto que surge a Lei do mínimo de Liebig que defende a ideia de que cada população cresce até que o suprimento de algum recurso, denominado recurso limitante, não satisfaça mais as necessidades da população (RICKLEFS, 2010). Por exemplo, considerando novamente o espaço, imaginemos uma colônia de aves marinhas que utilizam uma ilha para nidificar. Enquanto houver espaço, novos organismos poderão realizar as suas posturas e produzir ovos e filhotes que ao amadurecerem, também nidificarão no local. No entanto, à medida que o espaço for se tornando escasso, as investidas reprodutivas também diminuirão por não haver mais local adequado para realizar tal atividade. Essa Lei, no entanto, não pode ser aplicada a todos os recursos já que pressupõe que um recurso tem influência independente na população de consumidores, ou seja, só ele regula o tamanho da população, o que muitas vezes não ocorre. Na verdade o que muitas vezes acontece é que dois ou mais recursos, juntos, regulam o tamanho de uma população, sendo denominados de recursos sinergéticos. 4.3 TIPOS DE COMPETIÇÃO Se os recursos podem ser considerados de forma distinta, o mesmo pode ser feito em relação à competição. Assim, a competição pode acontecer de forma direta (competição direta ou por interferência) ou indiretamente (competição indireta ou por exploração). Vamos entender como ocorre cada um desses tipos de competição? A competição por interferência ocorre quando um organismo apresenta comportamento agressivo com seus competidores ou se utiliza de substâncias tóxicas que são secretadas no meio (DAJOZ, 2005). Um caso bastante comum e elucidativo ocorre com os beija-flores (colibris) que utilizam bebedouros colocados como atrativos para aves nectarívoras em diversas residências.Um colibri que utiliza deste recurso prontamente expulsará qualquer outro organismo que venha a se aproximar do bebedouro, impedindo a sua alimentação. Esse é um legítimo caso de competição por interferência. Agora imagine uma situação em que uma população de determinada espécie de morcego e outra população de uma espécie de ave utilizem os frutos de uma árvore em particular como o seu principal recurso alimentar. Apesar de eles apresentarem essa sobreposição de uso pelo recurso fruto, eles têm comportamento distinto, um se alimentando durante o dia (ave) e outro à noite (morcego). Ora, então eles não competem, certo? Errado. Esse é um exemplo claro de competição por exploração, pois apesar de eles não se enfrentarem diretamente pelo uso do recurso, a sua utilização ou exploração, diminui a oferta para o outro consumidor. UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 100 Vamos a mais um exemplo de competição por exploração. Imagine uma reserva extrativista em que a população humana local utiliza os frutos do palmiteiro Euterpe edulis para produzir suco para venda. Ainda, considere que nesse mesmo local há uma população de aves que utiliza como principal recurso alimentar esses mesmos frutos. O uso do recurso fruto por cada uma das espécies acarretará na diminuição da sua disponibilidade para a outra espécie consumidora, de forma que essas se tornam competidoras por exploração. Esse foi apenas um caso hipotético, mas devemos lembrar que em diversas situações agimos como competidores de outras espécies e por geralmente sermos mais eficazes em utilizar os recursos que desejamos, acabamos contribuindo para o declínio das populações de muitas espécies. No sul do Brasil isso é nítido com relação ao uso do pinhão produzido pela araucária (Araucaria angustifolia). Devido ao alto índice de extração desta semente para consumo humano, muitas espécies de Psittacidae (papagaios, araras, periquitos) estão perdendo o seu principal recurso alimentar. Segundo Dajoz (2005), quando a competição ocorre de forma amena, geralmente ela ocorre por intermédio da exploração. Por outro lado, em casos de competição forte, esta geralmente se dá por intermédio da interferência. 4.3.1 Competição intraespecífica Os organismos de uma espécie obviamente apresentam os mesmos nichos ecológicos de forma que dependendo da disponibilidade dos recursos necessários à sua sobrevivência, os organismos de uma população podem competir entre si. Isso geralmente leva à redução das taxas de entrada por indivíduo e, desse modo, à diminuição das taxas de crescimento ou desenvolvimento individual e possivelmente a decréscimos nas reservas ou ao aumento de risco de predação (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Como destacam Townsend; Begon e Harper (2006) a competição intraespecífica geralmente é unilateral. Vamos a um exemplo. Muitas sementes do palmiteiro Euterpe edulis caem da planta-mãe se estabelecendo sob e no entorno de sua copa. Assim, é comum encontrarmos diversas plântulas recém-nascidas nestas condições (Figura a seguir). No entanto, ao longo do crescimento das plântulas é nítido verificar que alguns organismos começam a se desenvolver mais rapidamente em relação aos demais e que esta diferença vai se acentuando com o tempo. O que ocorre é que o tamanho de cada plântula acaba por refletir a sua “força”, isto é, a capacidade de obter os recursos de forma que o faz de maneira mais eficaz do que as plântulas menores que acabam por sucumbir. UNI TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 101 FIGURA 43 – INDIVÍDUOS JOVENS DE Euterpe Edulis ADENSADOS SOBRE A PLANTA-MÃE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 29 mai 2013. No caso dos animais, um exemplo que muitas vezes chega a chocar algumas pessoas, é a competição que ocorre entre filhotes de algumas espécies de aves, em uma interação denominada fratricídio. Nestas espécies, geralmente, os pais têm a capacidade de alimentar apenas um filhote, mas geralmente realizam a postura de um ovo reserva para os casos em que o filhote seja predado. Esse segundo ovo geralmente é menor e eclode mais tardiamente. Por ter nascido primeiro, a ave eclodida do primeiro ovo é mais robusta em relação ao seu irmão mais novo e consegue obter alimento de forma mais eficaz, impedindo inclusive que o outro se alimente. Com o passar do tempo, o filhote menor vai definhando até ser lançado para fora do ninho e morrer de inanição. Como exemplificado acima, a competição intraespecífica ocorre de diferentes formas e por diversos fatores, entre os quais o comportamento territorial da espécie, a manutenção de hierarquia, e a alimentação (RICKLEFS, 2010). Quanto mais densa for a população, mais fortes serão os efeitos da competição, de forma que esta interação regula o crescimento populacional de um modo dependente da densidade (DAJOZ, 2005). Assim, à medida que os recursos vão sendo consumidos e diminuídos, os consumidores limitam o seu próprio crescimento populacional. É denominado de efeito dependente da densidade todo aquele que reduz a capacidade individual de natalidade e aumenta a chance de mortalidade (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). No caso da competição, esta pode atuar de forma diferenciada sobre a natalidade e mortalidade, originando diferentes UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 102 situações. Em alguns casos, ambas as taxas são controladas pela densidade da população, gerando gráficos conforme visto na figura 44 (no alto, à esquerda). Em outros casos, apenas a taxa de mortalidade (Figura44, no alto à direita) ou a taxa de natalidade (Figura 44, embaixo à esquerda) se modifica de acordo com o aumento da densidade. De acordo com Townsend; Begon; Harper (2006), a situação demonstrada no último gráfico é a mais comum em populações naturais, onde as taxas de natalidade e mortalidade flutuam entre determinadas faixas de possibilidades. Independente da forma como as taxas são alteradas, o que pode ser verificado é que em algum momento estas taxas se igualam, o que significa que o tamanho populacional permanecerá constante. Essa densidade constante é denominada de capacidade de suporte e é representada pela letra K, conforme pode ser verificado nos gráficos apresentados. FIGURA 44 – TAXAS DE NATALIDADE E MORTALIDADE DEPENDENTES DA DENSIDADE QUE LEVAM À REGULAÇÃO DO TAMANHO POPULACIONAL FONTE: Adaptado de: Townsend; Begon; Harper (2006) 4.3.2 Competição interespecífica É denominada de competição interespecífica a interação em que os organismos de uma espécie sofrem redução na fecundidade, sobrevivência ou crescimento como resultado da exploração de recursos ou interferência de TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 103 organismos de outra espécie (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Esse tipo de interação pode resultar em um ajuste do equilíbrio entre duas espécies ou, caso ocorra de maneira muito severa, pode fazer com que a população de uma espécie substitua outra, force a outra a ocupar outro lugar, ou, ainda, faça com que utilize outro alimento (BEGON; BARRET, 2011). De acordo com Ricklefs (2010), diversos estudos foram feitos na busca de determinar os efeitos de uma espécie sobre o crescimento da população de outra. Nestes experimentos, duas espécies foram primeiramente cultivadas separadamente, sob condições e níveis de recurso controlados, para determinar suas capacidades de suporte na ausência de competição com outra espécie. Posteriormente, as duas espécies foram cultivadas juntas sob as mesmas condições para determinar o efeito de cada uma sobre outra. A diferença entre o crescimento populacional de uma espécie na presença e na ausência de outra espécie foi utilizada como medida de intensidade da competição entre elas. Diversas formas de vida foram testadas, variando desde protistas, até animais (ratos, moscas-da-fruta, entre outros) e plantas anuais. Em todas as interaçõesestabelecidas os resultados foram semelhantes: quando os organismos das populações foram cultivados isoladamente, cresceram rapidamente até os limites impostos pelo suprimento alimentar. Porém, quando criadas juntas, apenas uma população persistiu. Destes resultados surgiu o princípio da exclusão competitiva. De acordo com este princípio, os organismos com parentesco muito próximo ou com hábitos e/ou morfologias muito semelhantes, não ocorrem no mesmo local e, se isto ocorrer, utilizarão diferentes recursos ou serão ativos em momentos distintos (BEGON; BARRET, 2011). Em outras palavras, não terão o mesmo nicho ecológico (veja o conceito mais à frente). 5 A EVOLUÇÃO DAS INTERAÇÕES ENTRE AS ESPÉCIES As interações interespecíficas são importantes agentes evolutivos, sendo responsáveis pelo surgimento de diversas estratégias entre as espécies envolvidas. Assim, para evitar a predação, parasitismo ou herbivoria, certas espécies desenvolveram diversos mecanismos de defesa. Algumas espécies comestíveis ou palatáveis desenvolveram colorações e formas semelhantes ao local onde vivem de forma a se tornarem menos perceptíveis aos seus consumidores. Os exemplos de camuflagem são os mais variados, podendo-se citar as mariposas cuja coloração se confunde com a coloração de troncos de árvore, os bichos-pau que se assemelham a galhos de árvores, os gafanhotos que possuem a forma e a cor de uma folha, os anfíbios cuja cor e forma do dorso imitam a serapilheira de uma floresta, entre muitos outros (Figura 45). UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 104 FIGURA 45 – ORGANISMO DE Megascops sp. CAMUFLADO EM UMA ABERTURA DE TRONCO DE ÁRVORE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2013. Outros animais apresentam uma estratégia diferenciada e produzem ou acumulam de vegetais substâncias químicas e anunciam esse fato através de padrões de cores chamativas (RICKLEFS, 2010). Assim, diversas espécies apresentam coloração que misturam as cores amarelo, laranja e vermelho advertindo os seus predadores de que seu sabor não é nada bom. A este mecanismo dá-se o nome de coloração de advertência ou aposematismo e é apresentado por diversas espécies de borboleta (tanto em sua fase como lagarta quanto quando adulta) (Figura 46), serpentes (ex.: cobra-coral), alguns anfíbios, entre diversos outros animais. Se apresentar coloração de advertência já é algo curioso, imagine diferentes espécies impalatáveis ou não comestíveis que possuem padrão de coloração similar para sinalizar tal fato. Isso de fato existe e é denominado de mimetismo mülleriano, em homenagem ao seu descobridor Fritz Muller. Os predadores aprendem a evitar esses mímicos de maneira mais eficaz porque uma experiência ruim com uma das espécies que apresenta este padrão de coloração será suficiente para proteger todas as demais que também o compartilham (RICKLEFS, 2010). TÓPICO 2 | INTERAÇÕES ECOLÓGICAS 105 FIGURA 46 – COLORAÇÃO DE ADVERTÊNCIA APRESENTADA POR UMA LAGARTA DE ESPÉCIE NÃO IDENTIFICADA FONTE: As autoras Em regiões tropicais, por exemplo, diversas espécies de borboletas impalatáveis apresentam um padrão de faixas “tigradas” laranjas e pretas, ou ainda uma mistura das cores preta, laranja e amarela (Figura 47). FIGURA 47 – ESPÉCIES DE BORBOLETA DO GÊNERO Heliconius QUE POSSUEM PADRÕES DE COLORAÇÃO SEMELHANTES, UM EXEMPLO DE MIMETISMO MÜLLERIANO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2013. UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 106 FIGURA 48 – A SEMELHANÇA ENTRE OS ORGANISMOS DE FALSA CORAL (À ESQUERDA) E DE CORAL VERDADEIRA É UM CASO DE MIMETISMO BATESIANO As plantas, por sua vez, possuem um número mais restrito de opções de defesa em relação às que os animais possuem. Geralmente a defesa ocorre através da produção de substâncias químicas nocivas, que podem ser divididas em dois tipos: substâncias tóxicas (ou qualitativas), que são venenosas mesmo em pequenas quantidades; e substâncias quantitativas, como o tanino, que tornam impalatáveis os tecidos da planta (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Outro tipo de mecanismo interessante é o chamado mimetismo batesiano (descoberto por Henry Bates). Através dele, espécies comestíveis ou palatáveis imitam o padrão de coloração de espécies impalatáveis evitando, assim, a sua predação (Figura 48). FONTE: Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2013. 107 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você pode concluir que: • Um organismo se envolve com outros organismos ao longo da vida através de diferentes relações ecológicas. Quando a interação ocorre entre organismos da mesma espécie ela recebe o nome de interação intraespecífica. • A interação intraespecífica mais comumente citada é a sociedade ou eussociedade, onde os organismos envolvidos desempenham atividades diferenciadas. • As interações interespecíficas ocorrem entre membros de espécies distintas e podem beneficiar ambos os envolvidos, beneficiar uma espécie e ser indiferente à outra, ou ainda ser benéfica a uma espécie e prejudicial ao outro organismo participante da interação. • É denominada de predação a interação onde os organismos de uma espécie capturam organismos de outra espécie e os consomem, retirando-os da população. • A herbivoria ocorre com um organismo que utiliza vegetais como recurso alimentar. Dependendo da situação a herbivoria comporta-se como predação ou como um evento de parasitismo. • Na interação de parasitismo, um organismo denominado parasita vive intimamente associação a outro organismo, de uma espécie distinta, que é denominado de hospedeiro. Apesar de utilizar o hospedeiro como recurso alimentar, o parasita não mata o seu hospedeiro. Algumas particularidades apresentadas pelos parasitas dão origem às expressões patógeno e parasitoide. • É denominada de antagonismo a interação em que o organismo de uma espécie se utiliza de substâncias tóxicas para eliminar ou “espantar” organismos de outra espécie que lhe sejam concorrentes. • O comensalismo é a interação em que o organismo de uma espécie utiliza um organismo de outra espécie como fonte de abrigo ou suporte. • A protocooperação pode ser definida como uma interação em que ambos os organismos envolvidos se beneficiam, mas não dependem da associação para a sua sobrevivência. • É considerado mutualismo a interação em que duas espécies podem viver independentemente, mas dependem uma da outra para que uma determinada situação benéfica a ambas ocorra. 108 • A competição pode ocorrer entre organismos da mesma espécie, sendo denominada de competição intraespecífica, ou entre espécies diferentes – competição interespecífica. • Os organismos competem por recursos limitantes no ambiente onde vivem. • A competição pode ocorrer por embate direto, sendo chamada de competição por interferência. Por outro lado, as espécies podem competir através da exploração do mesmo recurso em momentos distintos. • As diversas interações ecológicas ocorrentes entre os organismos acarretaram o desenvolvimento de algumas estratégias por parte das espécies consideradas recurso alimentar. Entre essas estratégias pode-se citar a camuflagem, a coloração de advertência, o mimetismo batesiano e mülleriano, e o desenvolvimento de substâncias tóxicas. 109 AUTOATIVIDADE 1 As interações ecológicas podem ser divididas em interações intraespecíficas e interespecíficas. Qual é a principal diferença entre estes dois tipos de interação? 2 As interações interespecíficas podem beneficiar ambos os envolvidos na associação, ser benéfica a um organismo e prejudicial ao outro, ou ainda ser indiferente a um dos integrantes. Com relação às interações interespecíficas, associe os itens através do código a seguir:I- Herbivoria. II- Comensalismo. III- Competição. IV- Alelopatia. ( ) Esta interação envolve o uso de recursos limitados no ambiente. ( ) Dependendo da situação esta interação pode ser considerada como um evento de predação ou parasitismo. ( ) É um exemplo a interação entre esponjas e peixes que utilizam o seu interior como moradia. ( ) Constitui no uso de substâncias tóxicas para inibir o crescimento de outro organismo. Agora assinale a alternativa com a sequência CORRETA: a) ( ) III – I – II – IV. b) ( ) I – III – II – IV. b) ( ) III – I – IV – II. d) ( ) I – III – VI – II. 3 A competição entre os organismos pode ocorrer diretamente ou indiretamente. Explique de que forma estas interações ocorrem. Assista ao vídeo de resolução da questão 3 110 111 TÓPICO 3 ECOLOGIA DE COMUNIDADES UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO É denominada uma comunidade o conjunto de organismos de diferentes espécies que vivem em um determinado local e que estão conectados uns com os outros por suas relações de alimentação e outras interações. Muitas destas interações já foram vistas no tópico passado e algumas outras também serão vistas neste tópico. Compreender como as comunidades variam de lugar para lugar é o primeiro passo para compreender os processos que influenciam a estrutura e o funcionamento dos sistemas ecológicos, e determinam as abundâncias relativas das espécies (RICKLEFS, 2010). Todavia, para compreendermos os processos que ocorrem nas comunidades naturais é necessário que alguns conceitos ecológicos estejam bem claros em nossa mente, de forma a evitar confusões e interpretações equivocadas. Alguns termos são mais utilizados, outros menos, mas independente da frequência e intensidade de seu uso, a sua correta interpretação é indispensável. Afinal, o que significa o termo habitat e qual é a diferença entre esse conceito e nicho ecológico? Considera-se habitat o local onde um organismo vive, ou seja, o espaço físico que este organismo ocupa. O nicho ecológico, por sua vez, não inclui apenas essa característica, mas também o total de necessidades e condições necessárias à sua sobrevivência. Em outras palavras, o nicho ecológico abarca as especificidades do organismo quanto à temperatura do ambiente, pH, solo, umidade, entre outras diversas características (ODUM, 2010). Dessa forma, se construíssemos um gráfico com todas as características necessárias à sobrevivência de um organismo, utilizando cada eixo desse gráfico (x, y, z,...) como uma necessidade, teríamos como resultado uma representação gráfica n-dimensional (Figura 49). 112 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS FIGURA 49 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO NICHO ECOLÓGICO DE UMA ESPÉCIE CONSIDERANDO TRÊS DIMENSÕES DE CONDIÇÕES NECESSÁRIAS À SUA SOBREVIVÊNCIA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 9 abr. 2013. O conceito de nicho ecológico é bastante abstrato e um pouco difícil de compreender em um primeiro momento. Mas isso não deve ser um empecilho para que ensinemos aos alunos de ensino fundamental e médio o conceito correto desse termo. Conceituações ultrapassadas como profissão da espécie devem ser evitadas, visto que dão uma visão antropocêntrica ao mundo natural e simplificam em demasia o conjunto de exigências dos organismos. Quando o assunto é o nicho ecológico dos organismos, as dimensões mais quantificadas são a largura do nicho e a sobreposição de nichos entre vizinhos. Grupos de espécies com papeis ecológicos e de dimensões de nicho comparáveis são denominados de guildas (ODUM, 2010). Todavia, duas ou mais espécies que tenham exatamente o mesmo nicho ecológico não sobrevivem no mesmo local, devido às fortes consequências da competição pelos recursos. Se a situação acima não é possível, o fato é que as espécies disputam com outras em diversos dos seus “eixos” de necessidades vitais. Assim sendo, dificilmente uma espécie consegue aproveitar totalmente o intervalo de condições dentro das quais a espécie poderia sobreviver, o que é denominado de nicho fundamental. Além de competidores, patógenos e predadores também impedem esse aproveitamento máximo. Desta forma, as espécies acabam por utilizar um intervalo menor de condições – o chamado nicho percebido (RICKLEFS, 2010) (Figura 50). UNI TÓPICO 3 | ECOLOGIA DE COMUNIDADES 113 FIGURA 50 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO NICHO ECOLÓGICO FUNDAMENTAL DE UMA ESPÉCIE CONSIDERANDO DUAS DIMENSÕES DE CONDIÇÕES NECESSÁRIAS À SUA SOBREVIVÊNCIA E DO NICHO REALMENTE UTILIZADO – O NICHO PERCEBIDO FONTE: As autoras 2 CADEIAS ALIMENTARES As diferentes formas de vida existentes em uma comunidade estão interligadas por relações tróficas, isto é, pela transferência de energia e nutrientes através de cadeias alimentares formadas por diferentes níveis tróficos. Cada cadeia inicia com um organismo dito produtor (primeiro nível trófico), que recebe esse nome por ser capaz de “produzir” uma forma de energia assimilável pelos demais organismos participantes da cadeia – os consumidores. São organismos produtores as plantas, as algas verdes e azuis, e algumas bactérias fotossintetizantes. Ao absorverem a energia luminosa esses seres a transformam em energia química por intermédio da fotossíntese. Por este motivo, os produtores são também intitulados de seres autotróficos. Os consumidores, também denominados heterótrofos, não são capazes de realizar tal transformação necessitando, portanto, se alimentar de outro ser vivo para obter energia necessária às suas atividades. De acordo com os seus hábitos alimentares, os consumidores podem ser chamados de herbívoros, carnívoros ou detritívoros. De acordo com a posição que ocupam na cadeia alimentar, os carnívoros recebem uma especificação. Assim, os carnívoros que se alimentam de herbívoros são chamados de carnívoros primários e fazer parte do segundo nível trófico. Por sua vez, o organismo que se alimenta deste carnívoro primário recebe a nomenclatura de carnívoro secundário (terceiro nível trófico), e assim por diante. UNI 114 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS O último nível trófico é ocupado pelos organismos decompositores, ou seja, que se alimentam de organismos mortos e seus subprodutos, provenientes de todos os níveis tróficos anteriores. Os decompositores possuem uma grande importância ecológica, possibilitando que a matéria volte a se tornar disponível no ambiente. Esse papel é feito por várias espécies de fungos e as bactérias. Agora que já identificamos os níveis tróficos que constituem uma cadeia alimentar, vamos agora compreender como estas cadeias são representadas? Vejamos o exemplo a seguir: Portanto, costuma-se colocar as espécies envolvidas na cadeia em ordem do fluxo de energia, utilizando uma seta para indicar a direção em que a energia flui. Atentemos para o fato de as cadeias alimentares não ocorrem de forma isolada na natureza, mas sim em uma rede de conexões. Pela forma que assume ao ser representado, essa interconexão é denominada de teia alimentar, conforme demonstrado (figura 51). FIGURA 51 – REPRESENTAÇÃO DE UMA TEIA ALIMENTAR FONTE: As autoras 3 SUCESSÃO ECOLÓGICA É denominada sucessão ecológica a sequência de mudanças nos processos da comunidade, tal como estrutura e funcionamento, ao longo do tempo (MIRANDA, 2009; ODUM, 2010). O processo de sucessão pode levar meses, dezenas de anos ou ainda centenas de milhares de anos dependendo das comunidades e locais envolvidos (NUNES; CAVASSAN, 2011). TÓPICO 3 | ECOLOGIA DE COMUNIDADES 115 A sucessão ecológica pode ocorrer em um local nunca antes habitado por qualquer forma de vida, tal como sobre sedimentos resultantes de atividades vulcânicas. A esse fenômeno dá-se o nome de sucessão ecológica primária. Por outro lado, quando a sucessão acontece sob um substrato anteriormente ocupado ela é denominada sucessão ecológica secundária. A sucessão secundáriapode ocorrer posteriormente a diferentes eventos naturais, tal como, incêndios, tufões, tsunamis, abertura de clareiras devido à queda de árvores, entre outros; ou ainda em áreas perturbadas devido às atividades antrópicas (agricultura, pecuária, etc.). Independente das particularidades dos eventos de sucessão, o fato é que para que este processo ocorra é necessário ter havido uma perturbação ou distúrbio ecológico no local. Diversos estudos têm focado esta questão, gerando a teoria do distúrbio intermediário. De acordo com os seus defensores, distúrbios de baixa ou alta intensidade não contribuem para a diversidade de uma comunidade, pois ou não são suficientes para gerar a sucessão ecológica ou ainda, no outro extremo, dizimam a comunidade impedindo a ocorrência desse fenômeno. De forma geral, a sequência básica da vegetação em processos de sucessão ecológica em um ambiente florestal é a seguinte (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006): Outra forma de classificar a sequência da vegetação em uma sucessão ecológica é demonstrada na figura a seguir. Note que apesar da nomenclatura mudar, a sequência em relação às características das espécies envolvidas continua a mesma. UNI 116 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS FIGURA 52 – REPRESENTAÇÃO DE SUCESSÃO ECOLÓGICA EM UMA FLORESTA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 9 abr. 2013. Para compreendermos melhor a sucessão ecológica, vamos considerar uma área que era inicialmente florestal, foi desmatada e transformada em campo, e que atualmente está abandonada. As espécies colonizadoras (primeiras espécies a chegar ao local) e pioneiras podem se estabelecer rapidamente nesse hábitat alterado, seja por dispersão rápida para o local ou a partir de propágulos que já estejam presentes. As plantas de início de sucessão tem um estilo de vida “fugaz” e a sua continuidade depende da dispersão para outros locais perturbados. Isso acontece porque essas espécies não conseguem competir com espécies tardias, de forma que precisam crescer e consumir rapidamente os recursos disponíveis. São características de espécies pioneiras taxas fotossintéticas e de crescimento altas (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Já as plantas de níveis sucessionais tardios podem germinar na sombra e conseguem continuar a crescer sob intensidades luminosas baixas. Apesar de esse crescimento ocorrer de forma lenta, ele é mais rápido do que o desenvolvimento de plantas de níveis sucessionais anteriores (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). As árvores de estágios posteriores de sucessão ecológica podem ser agrupadas em grupos distintos, sendo denominadas iniciais e tardias. As árvores de estágio sucessionais iniciais comumente possuem folhagem em várias camadas e as folhas se estendem sob o dossel até onde forem capazes de capturar luz suficiente para realizarem a fotossíntese. Já as espécies tardias apresentam uma única camada densa de folhas e são mais eficazes no dossel adensado da sucessão tardia (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Mas essas não são as únicas diferenças entre estas plantas. A seguir segue um resumo destas características (tabela 3). TÓPICO 3 | ECOLOGIA DE COMUNIDADES 117 TABELA 3 – CARACTERÍSTICAS GERAIS DE PLANTAS SUCESSIONAIS INICIAIS E TARDIAS FONTE: Ricklefs (2010) Nunes e Cavassan (2011) destacam que os livros didáticos de Ciências e Biologia desconsideram a participação dos animais e micro-organismos no processo de sucessão ecológica. No entanto, sem os animais muitas comunidades não conseguiriam se manter de forma eficiente, uma vez que são eles os responsáveis pela dispersão de alguns tipos de sementes. Já em relação aos micro-organismos, esses são os principais decompositores da serapilheira, disponibilizando os nutrientes aos vegetais. Comumente costuma-se afirmar que após as espécies sucessionais tardias terem se estabelecido, o processo cessa e a comunidade atinge o seu clímax, tornando-se imutável. No entanto, a noção de clímax tem sido muito criticada e para ser válida, sua definição deve assumir um caráter dinâmico. Como ressalta Dajoz (2005), uma floresta que chegou ao estágio clímax não é um sistema estável e imutável. Ao contrário, é um conjunto heterogêneo de parcelas de vegetação em diferentes estágios de sucessão, causados por perturbações, tais como vento, fogo, queda de uma árvore etc. É essa heterogeneidade do clímax que explica a elevada biodiversidade existente nos ambientes naturais. Quando uma área perturbada pelas atividades antrópicas é abandonada, a sucessão de espécies pode ocorrer naturalmente caso exista uma fonte de propágulos vegetais próximo ao local. Porém, há algumas situações em que o entorno não permite que os propágulos alcancem a área a ser regenerada e/ou o banco de sementes no solo está inviabilizado sendo necessária a intervenção humana. UNI 118 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS As concepções históricas de sucessão ecológica e os livros didáticos Patrícia da Silva Nunes Osmar Cavassan 1 INTRODUÇÃO De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), o estudo da dinâmica ambiental compreende os conhecimentos de vários campos científicos, sendo, portanto, um conteúdo interdisciplinar. Nesse contexto, insere- se o conceito de sucessão ecológica. Por meio do estudo desse conceito é possível compreender a dimensão espaço-temporal do estabelecimento de comunidades e relacionar diversidade e estabilidade (equilíbrio dinâmico), fornecendo elementos para avaliar as possibilidades de absorção de impactos pela comunidade. Além disso, esse conceito envolve toda dinâmica que ocorre em um ecossistema, incluindo as interações entre os componentes bióticos (ex.: competição, entrada de sementes) e abióticos (ex.: solo, umidade), ciclos biogeoquímicos, fatores como tempo e espaço dentro de um gradiente evolutivo, enfim a evolução de espécies levando em consideração todos os fatores que a influenciam. Apesar da importância de tais conhecimentos, eles não são comumente abordados no contexto da Educação Básica quando o conceito de sucessão ecológica é discutido. A explicação incompleta (ou parcial) de um conceito biológico, que não leva em consideração pontos que sejam importantes para uma construção significativa, pode comprometer o seu entendimento. Publicações didáticas devem associar a capacidade de apresentar os conceitos da maneira o mais completa possível. Poderiam, por exemplo, (re)construir o modo pelo qual, os conceitos são definidos e modificados pelos pesquisadores, garantindo uma noção de ciência que vem sendo construída concomitantemente com a história humana. Quando se trata do conceito de sucessão ecológica, uma forma de apresentá-lo de maneira mais ampla, talvez, fosse a de possibilitar que os alunos pudessem associar esse processo com outros conceitos biológicos, tais como, estratégias de reprodução das plantas e restauração ecológica. É importante frisar que essas inserções devem considerar a recontextualização didática daquele conhecimento científico (MARANDINO, 2004). No entanto, limitações como as de ordem técnica ou editorial dos livros didáticos podem comprometer essa apresentação, além de questões concernentes à transposição dos saberes. A identificação das abordagens do conceito de sucessão ecológica em livros didáticos da Educação Básica pode ser uma forma de colaboração a diferentes estratégias didáticas utilizadas no ensino de Ecologia. Foi objetivo deste trabalho, portanto, analisar o conceito de sucessão ecológica em livros didáticos de Biologia, sendo alguns da década de 1970 e outros dos anos 2000, visando identificar a evolução do modo de apresentação desse conteúdo. LEITURA COMPLEMENTAR TÓPICO 3 | ECOLOGIA DE COMUNIDADES 119 2 LIVROS DIDÁTICOS Segundo Patrícia Gomes Pinheiro da Silva e Osmar Cavassan, o livro didático é ainda um dos principais ou o único instrumento de ensinoutilizado pelos professores no âmbito escolar brasileiro (SILVA; CAVASSAN, 2005, p. 1). De acordo com Simão Dias Vasconcelos e Emanuel Souto os livros de ciências possuem várias funções, como o estímulo à análise de fenômenos e formulação de conclusões, além de auxiliarem na formação de cidadãos (VASCONCELOS; SOUTO, 2003). Assim, devem promover reflexões sobre a realidade, além de “estimularem a capacidade investigativa do aluno para que ele assuma a condição de agente na construção do seu conhecimento” (Ibid., 2003, p. 94). Luzia Marta Bellini argumenta que a transposição das ciências para os livros didáticos é realizada mediante modelos inconsistentes e com vocabulário reducionista, não permitindo novas aberturas para a compreensão de fenômenos, tais como os evolutivos (BELLINI, 2006). No que se refere ao conceito de sucessão ecológica, Julia Ibarra Murillo e María José Gil Quílez (2009) explanam que para se compreender o significado desse conceito, os alunos devem conhecer outros, tais como população, ecossistema e as relações entre os seres vivos e o hábitat. Em se tratando dos conteúdos e esquemas ilustrativos de sucessão ecológica contidos nos livros didáticos, evidencia-se que muitas vezes eles se apresentam como abordagens reduzidas, nas quais um único modelo sucessional é utilizado em detrimento de outros possíveis. Ressalta-se que poderiam ser utilizados, além dos modelos de sucessão ecológica iniciados em uma rocha nua, modelos de sucessão em um costão rochoso. Esse último colocaria em evidência um tipo de processo sucessional, cujos animais estruturam a comunidade, o que poderia proporcionar uma visão mais ampla do fenômeno aos alunos. É importante lembrar que a utilização de imagens e esquemas em sala de aula deve ser planejada corretamente, pois, uma vez que estes permanecem na memória visual com clareza, frequentemente, substituem o texto que é esquecido. Podemos conjeturar que, com o passar dos anos, algumas imagens permanecerão na memória dos alunos e, a partir dessas, eles tentarão reconstituir o conhecimento original (FREITAS; BRUZZO, 1999). 3 A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE SUCESSÃO ECOLÓGICA A visão sobre o processo de sucessão ecológica vem sofrendo sucessivas mudanças desde que o ecólogo Henry Chandler Cowles (1869-1936), em artigo intitulado “The Ecological Relations of the Vegetation on the Sand Dunes of Lake Michigan” (1899), reconstruiu com profundidade a evolução temporal das associações de plantas das dunas da região de Chicago (EUA). 120 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS Por sua vez, o botânico Frederic Edward Clements (1874-1945), diferentemente de Cowles, estudou as florestas de coníferas e pradarias ocidentais dos Estados Unidos, ambientes mais estáveis que as dunas do Lago Michigan (KINGSLAND, 1991). Frederic Edward Clements, em seu livro Plant Succession: An analysis of the development of Vegetation, publicado em 1916, definiu o processo sucessional como: “Uma sequência de comunidades vegetais marcada pela mudança desde as menores até as maiores formas de vida.” (CLEMENTS, 1916, p. 6). Clements caracterizava a comunidade como um superorganismo e a sucessão ecológica como um processo determinista e organizado, similar ao desenvolvimento de um organismo, culminando no clímax, assim caracterizado: “Determina a população do começo ao fim, a direção do desenvolvimento, o número e tipo de fases, as reações dos estágios sucessivos etc.” (CLEMENTS, 1916, p. 5). Alguns ecólogos não concordavam com as ideias defendidas por Clements, como foi o caso de Henry Allan Gleason (1882-1975), que defendeu, em artigo de 1926 intitulado “The Individualistic Concept of the Plant Association”, a teoria de que o processo sucessional seria muito menos determinista do que o proposto por Clements, no qual as espécies surgiriam independentemente umas das outras, sendo discutível a ideia de um clímax final previsível e imutável. Como aponta Fernando Mayer Pelicice, para Gleason “a sucessão reflete somente ‘mudança’, sem que isso implique fim algum” (PELICICE, 2010, p. 69). Mesmo com críticas em relação às suas teorias, Frederic Edward Clements não as abandonou. Apesar de entender a importância das populações animais no processo sucessional, conclusão que pode ter sido influenciada por Victor Ernest Shelford (1877-1968), ecologista animal e ex-aluno de Henry Chandler Cowles, Clements continuou a pensar na comunidade principalmente por suas formações vegetais (KINGSLAND, 1991). Acredita-se hoje, que embora os vegetais forneçam a base das cadeias alimentares, há casos em que os animais interferem na estrutura da comunidade. Predadores de sementes podem desacelerar a sucessão em campos abandonados, ou ainda, pastadores podem modificar a estrutura vegetal da comunidade (BEGON, TOWNSEND; HARPER, 2007). Ainda, de acordo com Michael Begon, Colin R. Townsend e John L. Harper, o fato de a sucessão ecológica ser um assunto essencialmente botânico é facilmente explicado, de acordo com os seguintes argumentos. As plantas geralmente fornecem a maior parte da biomassa e estrutura física das comunidades, além disso, elas não se escondem ou fogem, facilitando a construção de lista de espécies, [...] e detecção de mudanças. (BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2007, p. 487). Embora existissem pontos importantes a serem analisados acerca da teoria de Clements, como o da analogia entre o desenvolvimento da comunidade e o desenvolvimento dos organismos. Muitos autores, talvez, sem fazer muitos questionamentos devido à força das teorias clementsianas, seguiram a sua tradição para definirem o processo sucessional (PELICICE, 2010). Eugene Pleasants Odum (1913-2002), por exemplo, definiu a sucessão ecológica como o desenvolvimento do ecossistema, envolvendo mudanças na estrutura de espécies TÓPICO 3 | ECOLOGIA DE COMUNIDADES 121 da comunidade ao longo do tempo (ODUM, 1988). A sucessão ecológica seria um processo razoavelmente direcional e previsível, resultante da modificação do ambiente físico pela comunidade, embora o ambiente físico determine os limites de desenvolvimento dela, culminando em um ecossistema estabilizado, ou seja, o clímax (ODUM, 1969). Desde a gênese dessas teorias, várias outras foram surgindo na tentativa de compreender o fenômeno sucessional. O pensamento gleasoniano, próximo do aceito na atualidade (BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2007), só foi retomado na década de 1950. Até então, a vertente determinista clementsiana sobrepujava as demais (PELICICE, 2010). 4 METODOLOGIA DA PESQUISA Esta pesquisa seguiu uma abordagem qualitativa, tendo sido realizada por meio de uma análise documental. Efetuou-se uma análise comparativa, baseada no método de análise de conteúdos de Laurence Bardin (1977), entre livros didáticos recentes e antigos, para investigarmos a transformação do tratamento do conceito de sucessão ecológica ao longo dos anos no conhecimento escolar de ciências. Optamos por dois livros didáticos da década de 1970, contidos na série Biological Science Curriculum Study (BSCS), devido à sua importância no ensino de Ciências no Brasil naquela época, e sete livros atuais de Biologia, utilizados por alunos de escolas públicas. Para a análise da abordagem do conceito de sucessão ecológica nos livros didáticos, optou-se por alguns aspectos relevantes para o entendimento do processo como um todo, tais como: comunidade clímax, a participação de animais e micro-organismos, ação antrópica, as variáveis tempo e espaço, estrangeirismos, a definição do conceito e sua reconstrução histórica. Em decorrência do conceito de clímax ser ainda controverso e de difícil compreensão, deu-se maior ênfase a ele. Assim, optou-se por uma apresentação em forma de tabela (tabela 1), onde o conceito de clímax contido nos livros analisados serão reproduzidos na íntegra e, posteriormente, discutidos em alguns subtítulos. Neste trabalho, procurou-se considerar, além dos textos, os esquemas143 TÓPICO 1 - BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO ................................................................................. 145 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 145 IX 2 COMPREENDENDO OS PROCESSOS ........................................................................................... 145 3 BIODIVERSIDADE .............................................................................................................................. 146 4 ESTIMATIVA DA BIODIVERSIDADE ........................................................................................... 147 5 AMEAÇAS À BIODIVERSIDADE.................................................................................................... 148 5.1 EXTINÇÃO E SUAS CAUSAS ....................................................................................................... 149 5.2 PERDA E FRAGMENTAÇÃO DE HABITATS ............................................................................ 150 6 CONSERVAÇÃO .................................................................................................................................. 151 6.1 O ESTABELECIMENTO DE NOVAS POPULAÇÕES ............................................................... 153 6.2 CONSERVAÇÃO IN SITU E EX SITU .......................................................................................... 153 6.2.1 Zoológicos ................................................................................................................................ 154 6.2.2 Aquários ................................................................................................................................... 154 6.2.3 Jardins botânicos ..................................................................................................................... 154 6.2.4 Bancos de sementes ................................................................................................................ 154 7 O VALOR ECONÔMICO DA BIODIVERSIDADE ...................................................................... 155 7.1 OS CUSTOS AMBIENTAIS ............................................................................................................ 157 8 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL......................................................................................... 158 8.1 ASPECTOS TEÓRICOS SOBRE DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADE............... 158 8.2 DIMENSÕES DA SUSTENTABILIDADE .................................................................................... 159 8.3 CRESCIMENTO OU DESENVOLVIMENTO? ............................................................................ 161 8.4 A ABORDAGEM DA SUSTENTABILIDADE NO CONTEXTO INTERNACIONAL ........... 162 8.5 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL ............................................................... 163 9 A AGRICULTURA E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ............................................. 164 9.1 A AGRICULTURA MODERNA .................................................................................................... 165 9.2 AGRICULTURA TRADICIONAL ................................................................................................. 166 9.3 AGRICULTURA SUSTENTÁVEL ................................................................................................. 166 9.4 AGRICULTURA FAMILIAR .......................................................................................................... 170 9.5 POLÍTICAS PÚBLICAS .................................................................................................................. 171 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 172 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 175 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 176 TÓPICO 2 - CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS ............................................................ 177 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 177 2 DEFININDO CONCEITOS ................................................................................................................ 178 3 ESTABELECIMENTO DE ÁREAS PROTEGIDAS ........................................................................ 180 3.1 ÁREAS DE PROTEÇÃO PERMANENTE – APP ........................................................................ 181 3.2 RESERVA LEGAL – RL ................................................................................................................... 186 4 AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO SEGUNDO O SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO – SNUC (Lei nº 9.985/00) ................................................ 187 4.1 UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL ............................................. 188 4.1.1 Estação Ecológica (Esec) ........................................................................................................ 189 4.1.2 Reserva Biológica (Rebio) ..................................................................................................... 190 4.1.3 Parque Nacional (Parna) ....................................................................................................... 190 4.1.4 Monumento Natural (Mona) ................................................................................................ 192 4.1.5 Refúgio da Vida Silvestre (Revis) ........................................................................................ 192 4.2 UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL .................................................. 193 4.2.1 Área de Proteção Ambiental (APA) ..................................................................................... 193 4.2.2 Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) .................................................................. 194 4.2.3 Floresta Nacional (Flona) ...................................................................................................... 194 4.2.4 Reserva Extrativista (Resex) ................................................................................................. 195 4.2.5 Reserva de Fauna ................................................................................................................... 196 4.2.6 Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) .............................................................. 197 X 4.2.7 Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) ........................................................... 197 5 CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI Nº 9.985/00 ............................................................................... 199 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 200 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 201 TÓPICO 3 - CRIAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO E GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO............................................................................................................................... 203 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 203 2 ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELO SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO .................................................................................................................................. 203 3 A CRIAÇÃO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO ............................................................e figuras apresentados nesses livros, utilizando-se dos mesmos aspectos relevantes relatados anteriormente. 5 RESULTADOS Para fins de organização do trabalho, os livros analisados no quadro a seguir, encontram-se listados numericamente de 1 a 9. Suas referências situam-se ao final deste artigo. 122 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Após essas análises, percebeu-se que, mesmo depois de inúmeros debates na esfera acadêmica, muitos autores de livros didáticos adotam principalmente uma visão clementsiana do processo, desconsiderando a dinamicidade do fenômeno e a variedade de interações que são necessárias para que esse evento ocorra. Seria importante que os livros didáticos contemplassem uma visão mais recente do processo, considerando também a teoria de Henry Allan Gleason. Enfatiza-se que não se defende aqui, que absolutamente todos os conhecimentos Livro Conceito de Clímax 1 Em muitos lugares, a sucessão continua até que se devolva uma comunidade de floresta apesar de, para isso, serem necessárias várias centenas de anos. A comunidade de floresta, uma vez formada, pode persistir por dezenas de milhares de anos, mantendo-se em equilíbrio dinâmico, constituindo então uma comunidade clímax (p. 96). 2 Dissemos que o resultado final do processo de sucessão é uma comunidade madura, na qual as populações podem se reproduzir em lugar de serem substituídas por outras (p. 373). 3 Considera-se que uma comunidade chegou ao clímax quando ela se apresenta estável, em equilíbrio com o ambiente. A comunidade clímax, então, constitui a etapa final de uma sucessão ecológica (p. 239). 4 A comunidade, formada pelo conjunto de populações que habita a região, torna-se estável, sendo chamada de comunidade clímax (p. 52). 5 O máximo de homeostase é atingido quando a sucessão atinge o clímax, um estado de estabilidade compatível com as condições da região. Essa comunidade estável, denominada comunidade clímax, constitui o final da sucessão ecológica (p. 363). 6 As diversas comunidades se sucedem, até que se atinja um estágio de relativa estabilidade e equilíbrio, denominado comunidade clímax que se instala de forma permanente. [...] Quando a comunidade atinge a maturidade e se torna estável, ela é chamada de comunidade clímax, e apresenta grande diversidade de espécies e de nichos ecológicos (p. 358-359). 7 Podem ocorrer mudanças nas comunidades, ao longo do tempo, que, em princípio, em ambientes constantes, acabam por levar ao estabelecimento de uma comunidade estável, autorregulada, que não sofre alterações significativas em sua estrutura (p. 566). 8 Nessa fase, a comunidade, que conta com grande número de espécies, entra em equilíbrio com o ambiente, permanecendo relativamente estável (p. 21). 9 Uma comunidade pode se desenvolver gradualmente até atingir a maturidade, isto é, um equilíbrio relativo com as condições ambientais. [...] estabelece-se uma comunidade clímax, que fica em equilíbrio com o solo e o clima da região, sem ser substituída por outra. [...] A comunidade clímax formada depende do tipo de solo e do clima da região (p. 495-496). TÓPICO 3 | ECOLOGIA DE COMUNIDADES 123 de “ponta” produzidos pela academia sejam transpostos para a Educação Básica, apenas como uma acumulação ilimitada de saberes. Ao contrário, visa-se que os conteúdos ensinados aos alunos sejam aqueles que façam a diferença para a vida dos ecossistemas naturais. Vale lembrar, que os livros didáticos além de trazerem versões muito desatualizadas sobre o conceito estudado, ainda as tratam como verdades absolutas. Ao invés disso, se fizessem uma reconstrução histórica, mostrando aos alunos, por exemplo, as concordâncias e as controvérsias da comunidade científica, eles poderiam compreender como os conceitos científicos vão se transformando ao longo do tempo. Contribuiriam, também, para desmitificar a ideia de ciência infalível e povoada de gênios enclausurados, que chegam às suas conclusões mediante insights. Outras questões a serem consideradas são as variáveis tempo e espaço, as quais são tratadas como secundárias; porém, constituem importantes para o entendimento do processo. Destarte, os livros didáticos deveriam apresentá-las em suas muitas nuances, relacionando-as. Afinal, o processo de sucessão pode levar meses, no caso da decomposição da serapilheira, anos, para a ocupação de uma clareira no meio de uma mata, dezenas de anos em um campo abandonado, ou centenas de milhares de anos para a formação de uma complexa floresta equatorial. Percebeu-se também que um fator significante desconsiderado nos livros didáticos recentes é a participação dos animais e micro-organismos no processo sucessional, fato que pode ser historicamente entendido, pois os estudos a respeito da sucessão ecológica se iniciaram com botânicos, em sua maioria. Outro fator que nos faz entender a primazia dada aos vegetais no processo é que os mesmos constituem-se como produtores nas cadeias alimentares. Assim, na ausência deles, é praticamente impossível a presença dos animais. Também podemos pensar que a ênfase dada a esses seres vivos nesse processo deve-se ao fato de os vegetais contribuírem com a maior parte da biomassa de uma comunidade, o que é considerável. No entanto, mesmo com a inegável importância dos vegetais, não se pode deixar de ressaltar a importância dos animais e micro-organismos no processo. Sem os primeiros, muitas comunidades não conseguiriam manter-se eficientemente, pela ausência da dispersão de alguns tipos de sementes, que só é realizada por alguns animais. Igualmente, os micro-organismos possuem grande importância, pois são os principais responsáveis pela decomposição da serapilheira, o que dinamiza a disponibilidade de nutrientes para os vegetais. Além disso, quando tratamos da sucessão ecológica em uma infusão, por exemplo, esses seres vivos são os protagonistas. Quando o assunto é clímax, notou-se uma gama de confusões conceituais. Em muitos livros didáticos esses conceitos são simplificados, chegando-se a afirmar que o único clímax possível é o florestal. Assim, faz-se necessário que os livros didáticos contemplem exemplos diversificados de comunidades, a fim de que os alunos não prefiram alguns ambientes, em detrimento de outros, possibilitando um entendimento mais complexo da importância de todos os ecossistemas naturais, sejam eles dominados por árvores ou não. 124 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS Dessa maneira, infere-se a necessidade de os livros didáticos tratarem de forma mais completa o conceito de sucessão ecológica, interligando os diversos conceitos contidos nele, permitindo aos alunos entendê-los como interdependentes, o que condiria com a visão integrada que o ensino de Ecologia requer. FONTE: NUNES, P. S.; CAVASSAN, O. As concepções históricas de sucessão ecológica e os livros didáticos. Filosofia e História da Biologia, v. 6, n. 1, p. 87-104, 2011. Acesse o link: e saiba quais foram os livros considerados, bem como, leia o artigo na íntegra. UNI 125 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você pode concluir que: • O termo comunidade pode ser denominado como o conjunto de organismos de diferentes espécies que vivem em um determinado local e que estão conectados uns com os outros por suas relações de alimentação e outras interações. • O local onde os organismos vivem é denominado de habitat, enquanto que o conjunto de necessidades e condições necessárias à sua sobrevivência é denominado nicho ecológico. • O nicho fundamental é o intervalo de condições em que uma espécie pode sobreviver. No entanto, raramente os organismos conseguem utilizar este intervalo reduzindo-o a intervalos menores, conhecidos como nichos percebidos. • As populações estão interligadas através de relações tróficas para obtenção de energia, o que chamamos de cadeiaalimentar. • As cadeias alimentares não ocorrem isoladamente, mas sim estão interconectadas em teias alimentares. • A riqueza e estrutura de espécies variam ao longo do tempo em uma comunidade em um processo de sucessão ecológica. Esta sucessão pode ser denominada primária ou secundária, dependendo das condições em que ela ocorre. • As plantas envolvidas no processo de sucessão ecológica variam em várias de suas características de acordo com a fase da sucessão em que elas participam. 126 AUTOATIVIDADE 1 Muitos dos processos e fenômenos ecológicos podem ser representados através de gráficos e imagens, porém isso não é possível com relação ao nicho real de uma espécie. Explique o motivo dessa impossibilidade. 2 A regeneração de uma área anteriormente utilizada para mineração é um exemplo de sucessão ecológica primária ou secundária? Explique. 3 Explique de que forma ocorre a substituição de espécies em uma área perturbada. Assista ao vídeo de resolução da questão 1 127 TÓPICO 4 ECOSSISTEMAS UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Um ecossistema ou sistema ecológico pode ser definido como uma unidade onde os organismos existentes interagem entre e si e com o meio físico, gerando um fluxo constante de matéria e energia. Portanto, neste tópico falaremos um pouco sobre os aspectos que regem o fluxo de matéria e energia em um ecossistema, e os tipos de ecossistemas que existem na biosfera. Ainda, discutiremos a diferença entre os termos ecossistema e bioma, constantemente confundidos. Vamos lá? 2 ENERGIA NOS ECOSSISTEMAS “As populações de comunidades são sistemas transformadores de energia”. Esta foi a conclusão chegada pelo pesquisador Alfred Lotka ao estudar as relações existentes nesses níveis de organização ecológica (apud RICKLEFS, 2010). Essa conversão de energia acontece de várias formas e se inicia através das plantas que, para realizar a fotossíntese, precisam transformar energia luminosa em energia química. A transformação continua, pois os organismos herbívoros necessitam converter a energia contida nos compostos de carbono das plantas e em outros seres autótrofos de forma a utilizá-la em seu próprio metabolismo, atividade, crescimento e reprodução. Da mesma forma, isto acontece com os animais carnívoros que se alimentam dos herbívoros e assim sucessivamente ao longo de toda a cadeia alimentar (RICKLEFS, 2010). Para entender essa relação de conversão de energia em uma cadeia alimentar, é necessário partir dos princípios termodinâmicos que governam toda e qualquer transformação e energia. 128 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS O comportamento da energia pode ser descrito por duas leis. A primeira lei da termodinâmica, ou lei da conservação da energia, estabelece que a energia pode ser transformada de uma forma para outra, mas jamais criada ou destruída. A segunda lei da termodinâmica, ou lei da entropia, por sua vez, institui que nenhum processo de transformação de energia ocorre espontaneamente, a não ser que ocorra de uma forma mais concentrada para outra mais dispersa. Ainda, nenhuma transformação de energia espontânea em energia potencial é 100% eficiente, pois parte da energia será dispersa sob a forma de energia térmica não disponível (ODUM; BARRET, 2011). Assim, a Terra pode ser considerada uma gigantesca máquina termodinâmica, na qual a circulação dos ventos e correntes oceânicas e a evaporação da água são dirigidas pela energia do Sol. Essa energia é também assimilada pelas plantas e alimenta a maioria dos sistemas biológicos (RICKLEFS, 2010). A essa transferência de energia nos processos biológicos, como nas cadeias alimentares, dá-se o nome de fluxo de energia (Figura 53), uma vez que as conversões são “unidirecionais”, em contrastes com o comportamento cíclico da matéria (o que veremos mais adiante nos ciclos biogeoquímicos) (ODUM; BARRET, 2011). A cadeia alimentar pela qual uma energia passa possui diversas conexões entre organismos de níveis tróficos (alimentares) diferentes, ou seja, entre plantas, herbívoros e carnívoros. FIGURA 53 – MODELO DE FLUXO DE ENERGIA ATRAVÉS DOS ECOSSISTEMAS FONTE: Ricklefs (2010) UNI TÓPICO 4 | ECOSSISTEMAS 129 Essa energia diminui de acordo com o avanço de um nível trófico para outro. Isso acontece porque as plantas conseguem transformar somente parte da energia do Sol em energia para o seu sustento. Os herbívoros, por sua vez, terão que utilizar a energia presente nos compostos de carbono nos vegetais, transformando-a. Porém, parte desta energia já terá sido utilizada pelas plantas em seu metabolismo, não estando, portanto, disponível na biomassa. O mesmo acontecerá a um carnívoro ao consumir um animal herbívoro, pois este já terá utilizado parte da energia adquirida das plantas em suas atividades e metabolismo. Resumindo, a fonte primária de energia provém das plantas a partir da fotossíntese. Após essa transformação básica da energia, ela passa a ser transferida de um nível trófico para outro diminuindo conforme o nível trófico aumenta. Estima-se que algo em torno de 10% da energia constante em um nível trófico torna-se disponível para o outro nível trófico. Essas inter-relações podem ser esquematizadas na forma de uma pirâmide de energia, que recebe este nome pela forma que a representação assume (figura 54). FIGURA 54 – PIRÂMIDE DE ENERGIA ENTRE OS NÍVEIS TRÓFICOS EXISTENTES EM UM ECOSSISTEMA. A LARGURA DE CADA BARRA REPRESENTA A QUANTIDADE DE ENERGIA DAQUELE NÍVEL TRÓFICO FONTE: As autoras Muitos estudos das eficiências ecológicas levaram à generalização de que 10% de energia são passados de um nível trófico para o seguinte. Porém, essa não é uma lei fixa, porque diversos fatores influentes podem aumentar ou diminuir este percentual (RICKLEFS, 2010). A luz do Sol é a fonte de energia para a maioria dos seres vivos. Sua disponibilidade ocorre a partir da sua transformação em energia química, via fotossíntese, pelas plantas, algas e algumas bactérias. Esse processo de assimilação de energia é denominado de produtividade primária, e os seres que a realizam são chamados de produtores primários dos ecossistemas. A energia total assimilada pela fotossíntese recebe o nome de produtividade primária bruta. Porém, como já dito anteriormente, as plantas e os outros organismos fotossintéticos utilizam parte da energia para realizar as suas necessidades metabólicas através da respiração. Assim, somente parte da energia total assimilada é incorporada à sua biomassa e se torna disponível para os consumidores. Essa é a produtividade primária líquida (RICKLEFS, 2010) (Figura 55). UNI 130 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS FIGURA 55 – DEMONSTRAÇÃO DOS PRODUTOS DA FOTOSSÍNTESE: PRODUÇÃO PRIMÁRIA BRUTA E PRODUÇÃO PRIMÁRIA LÍQUIDA FONTE: Ricklefs (2010) A produtividade primária líquida global não está distribuída uniformemente pela Terra. Os oceanos abertos são pouco produtivos, enquanto que banhados e pântanos, estuários, bancos de algas e recifes, florestas tropicais e terras cultivadas estão entre os sistemas com elevada produtividade (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Diversos fatores influenciam a produção primária de um ambiente, sendo em comunidades terrestre a radiação solar, o dióxido de carbono, água e nutrientes do solo são os recursos necessários. Já em comunidades aquáticas, os fatores que mais frequentemente limitam a produtividade primária são a disponibilidade de nutrientes (particularmente nitrato e fosfato) e a intensidade da radiação solar que penetra na coluna d’água (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). 3 CICLOS BIOGEOQUÍMICOS Os elementos e compostos químicos são vitais para as atividades dos seres vivos, mas ao contrário da energia que se dissipa em forma de calor, os elementos químicos permanecem na biosfera, sendo continuamente ciclados entre os organismos e os ambientes físicos. Uma vez assimiladas pelas plantas em formas inorgânicas e convertidas em biomassa pelas plantas,essa matéria se “locomove” ao longo da cadeia alimentar. Por fim, esta matéria retorna às formas inorgânicas pelo processo de decomposição. TÓPICO 4 | ECOSSISTEMAS 131 Dos elementos que ocorrem na natureza, cerca de 30 a 40 são exigidos pelos organismos, sendo denominados de elementos essenciais. Alguns elementos são necessários em grandes quantidades, tal como o carbono, o hidrogênio, o oxigênio e o nitrogênio. Por outro lado, outros são necessários em pequenas (ou mesmo minúsculas) quantidades (ODUM; BARRET, 2011). Todos os elementos essenciais apresentam ciclos biogeoquímicos definidos e conhecê-los é importante tanto em atividades que envolvem a agricultura, como em medidas de conservação da qualidade ambiental. Nesse contexto, comentaremos a seguir os ciclos biogeoquímicos de alguns dos elementos necessários à vida na Terra. 3.1 CICLAGEM DO NITROGÊNIO O ciclo do nitrogênio é o mais complexo de todos os ciclos biogeoquímicos, pois envolve diversas fases e agentes biológicos ao longo do percurso (figura 56). FIGURA 56 – ETAPAS DA CICLAGEM DO NITROGÊNIO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2013. A fase atmosférica é considerada como predominante no ciclo, onde o nitrogênio está disponível sob a sua forma molecular (N2). Essa forma de nitrogênio se dissolve até certo ponto na água, mas não está disponível nas rochas (RICLKEFS, 2010). 132 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS Apesar de descargas elétricas converterem alguma quantidade de nitrogênio molecular em formas que as plantas podem assimilar (NO3), a maior parte entra nas vias biológicas do ciclo através da assimilação por parte de certos micro-organismos em um processo denominado fixação de nitrogênio (RICLKEFS, 2010). O resultado desta ação é a transformação do nitrogênio molecular (N2) em amônio (NH4). Conforme comentam Odum e Barret (2011), até meados da década de 1950, pensava-se que a capacidade de fixar nitrogênio atmosférico era limitada a poucos tipos de micro-organismos, citados a seguir: • Bactérias de vida livre: Azobacter (aeróbica) e Clostridium (anaeróbica). • Bactérias de nódulos simbióticos em leguminosas (família Fabaceae): Rhizobium. • Cianobactérias: Anabaena, Nostoc e vários outros gêneros. Hoje se sabe que outros organismos também são capazes de fazer tal processo, mas os acima citados ainda são os mais conhecidos e comentados. Os fixadores de nitrogênio trabalham com mais intensidade quando o suprimento de nitrogênio no seu ambiente é baixo. Assim, adicionar fertilizante nitrogenado à plantação de leguminosas inibe a biofixação (ODUM; BARRET, 2011). Ainda, o enriquecimento por nitrogênio vem reduzindo a biodiversidade e aumentando o número de pragas e doenças no mundo, além de afetar de maneira adversa a saúde humana. Todavia, esta não é única fonte de nitrogênio utilizada pelas plantas, visto que os organismos heterotróficos também disponibilizam nitrogênio no solo. Isso ocorre quando esses organismos degradam as proteínas por meio de enzimas e excretam o nitrogênio excedente sob a forma de ureia, ácido úrico ou amônio (ODUM; BARRET, 2011). A partir deste momento, micro-organismos decompositores passam a utilizar esses produtos para adquirir energia para o seu sustento, oxidando o amônio para nitrito e o nitrito para nitrato. Os agentes desse processo são descritos por Dajoz (2005) e reproduzidos a seguir: • a amonificação é feita por micro-organismos como Microcorus, transformando o nitrogênio aminado de proteínas em amônio; • a nitrificação que transforma o amônio em nitrito é feito por Nitrosomonas; • por fim, a nitração, que transforma o nitrito em nitrato, é feita por Nitrobacter. As plantas são capazes de utilizar as três formas de nitrogênio disponível (amônio, nitrito e nitrato) como fontes básicas. No entanto, por exigir menor gasto energético, a maioria das plantas utilizará preferencialmente o amônio quando esse estiver disponível (ODUM; BARRET, 2011). UNI TÓPICO 4 | ECOSSISTEMAS 133 Uma parte do nitrogênio dos nitratos retorna ao estado gasoso na atmosfera através da ação de bactérias de desnitrificação. Outra parte considerável é lixiviada pelas águas de escoamento e chega até o mar, onde o nitrogênio é consumido pelo fitoplâncton. A partir de então, o nitrogênio entra nas cadeias alimentares podendo chegar até as aves piscívoras, que reconduzem o nitrogênio ao meio terrestre por meio do guano (DAJOZ, 2005). Antes de encerrarmos os comentários acerca do ciclo do nitrogênio, é importante destacar que a produção e uso excessivos de fertilizantes além de ser maléfica aos ecossistemas naturais, reduzindo a biodiversidade e facilitando a propagação de pragas, também pode se tornar prejudicial aos humanos. Isso ocorre porque o excesso de componentes nitrogenados na água de abastecimento, na comida, e no ar põe a saúde humana em perigo (ODUM; BARRET, 2011). 3.2 CICLAGEM DO FÓSFORO O fósforo é um grande constituinte dos ácidos nucleicos, das membranas celulares, dos sistemas de transferência de energia, dos ossos e dos dentes (RICKLEFS, 2010). Ainda, acredita-se que ele limita a produção das plantas em muitos habitats aquáticos. Seu principal reservatório são as rochas que cedem aos poucos seus fosfatos aos ecossistemas (figura 57). No ambiente terrestre, a concentração de fósforo assimilável costuma ser baixa, agindo como fator limitante. Uma grande parte dos fosfatos penetra no mar, onde pode ficar imobilizada nos sedimentos profundos. Quando não houver corrente ascendente que permita a subida das águas à superfície, novamente o fósforo agirá como fator limitante (DAJOZ, 2005). FIGURA 57 – ETAPAS DA CICLAGEM DO FÓSFORO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2013. 134 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 3.3 CICLAGEM DO ENXOFRE Segundo Townsend, Begon e Harper (2006), três processos biogeoquímicos naturais liberam enxofre para a atmosfera: formação de aerossóis através de borrifos do mar, respiração anaeróbica por bactérias redutoras de sulfato, e a atividade vulcânica (Figura 58). As sulfobactérias liberam compostos de enxofre reduzidos de turfeiras submersas e pântanos bem como de comunidades marinhas associadas com planícies de maré. Um fluxo inverso, a partir da atmosfera, envolve a oxidação de compostos de enxofre a sulfato, que retorna a terra como precipitação úmida e precipitação seca. O intemperismo de rochas fornece aproximadamente a metade do enxofre que escoa da terra para os corpos hídricos. O restante deriva de fontes atmosféricas. Em seu trajeto até o oceano, parte do enxofre disponível é absorvida pelas plantas, participa de cadeias alimentares e, através de processos de decomposição, torna- se novamente disponível para as plantas. No entanto, há uma perda contínua de enxofre para os sedimentos oceânicos (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Atualmente, uma grande quantidade de enxofre encontra-se em circulação devido às atividades humanas, em especial através da combustão de carvão e de petróleo. A chuva ácida é a manifestação mais clara dessa realidade (DAJOZ, 2005). FIGURA 58 – ETAPAS DA CICLAGEM DO ENXOFRE FONTE: Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2013. TÓPICO 4 | ECOSSISTEMAS 135 3.4 CICLAGEM DO CARBONO A fotossíntese e a respiração são os dois processos opostos que governam o ciclo do carbono, que é essencialmente gasoso e tem como veículo principal do fluxo entre atmosfera, hidrosfera e a biota, o dióxido de carbono (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Segundo Ricklefs (2010), três classes de processos fazem o carbono ciclar através dos ecossistemas: 1) as reações assimilativas e desassimilativas, principalmente na fotossíntese e respiração; 2) as trocas de dióxido de carbono entre a atmosfera e o oceano; e 3) a precipitação de sedimentosde carbonato nos oceanos. As plantas terrestres utilizam o dióxido de carbono atmosférico como a sua fonte de carbono para a fotossíntese, enquanto as plantas aquáticas o fazem através de carbonatos dissolvidos. Os dois subciclos (terrestre e oceânico) estão interligados por trocas de dióxido de carbono entre a atmosfera e o oceano (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). O carbono encontra seu caminho para águas internas e oceanos como bicarbonato resultante do intemperismo de rochas ricas em cálcio, como o calcário. A respiração por plantas, animais e micro-organismos libera o carbono de volta aos compartimentos originais (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006) (Figura 59). 136 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS FIGURA 59 – ETAPAS DA CICLAGEM DO CARBONO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2013. Todos os ecossistemas terrestres possuem a característica comum de conseguir emitir ou sequestrar carbono atmosférico. Essa função vem ganhando destaque nas últimas décadas devido ao avanço do conhecimento sobre as mudanças climáticas globais resultantes das atividades antrópicas, principalmente a emissão elevada de dióxido de carbono (ADUAN; VILELA; KLINK, 2003). No Brasil, as principais fontes de dióxido de carbono e outros gases do efeito estufa para a atmosfera são as mudanças no uso da terra, a agricultura e a pecuária (CARVALHO et al., 2010). De acordo com Odum e Barret (2011), antes da Revolução Industrial, a concentração de dióxido de carbono na atmosfera era da ordem de 280 ppm (partes por milhão). Porém, nos últimos 150 anos essa concentração aumentou para 370 ppm, levando os cientistas a se preocuparem com o efeito estufa. As principais estratégias para tentar mitigar esse fenômeno consistem na menor utilização de combustíveis fósseis, redução das taxas de desmatamento e de queima de material vegetal, uso adequado do solo e, por fim, estratégias de maximização do sequestro de carbono no solo e na vegetação (CARVALHO et al., 2010). TÓPICO 4 | ECOSSISTEMAS 137 3.5 CICLO HIDROLÓGICO O ciclo da água nos ecossistemas é moldado pelos processos de evaporação, precipitação e transpiração (RICKLEFS, 2010) (Figura 60). O movimento se inicia através da evaporação da água dos oceanos para a atmosfera e, posteriormente, pela precipitação de volta à superfície terrestre. Parte da água precipitada pode então, infiltrar e escoar nos continentes e, eventualmente retornar aos oceanos. Ainda, parte da água da chuva volta à atmosfera através da evaporação e transpiração da vegetação (ODUM; BARRET, 2011). FIGURA 60 – ETAPAS DA CICLAGEM DA ÁGUA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2013. A evaporação e a precipitação estão intimamente relacionadas, pois a atmosfera possui uma capacidade limitada de reter o vapor de água. Qualquer aumento na evaporação cria um excesso de vapor na atmosfera e causa um equivalente aumento na precipitação. De um modo simplificado, é a evaporação quem determina a velocidade com que a água se move na biosfera (RICKLEFS, 2010). Odum e Barret (2011) enfatizam dois aspectos do ciclo da água: 138 UNIDADE 2 | ORGANISMOS, POPULAÇÕES, COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS 1 Uma parte considerável das chuvas que sustentam os ambientes terrestres provém da água do mar, podendo representar em alguns locais até 90% da água precipitada. 2 As atividades humanas muitas vezes aumentam o índice pluviométrico, seja através da pavimentação das ruas, abrindo e represando rios, compactação do solo ou desmatamento. Assim, há uma drástica redução da recarga das águas subterrâneas – aquíferos. De acordo com Townsend, Begon e Harper (2006), ainda que o ciclo hidrológico ocorresse na ausência de seres vivos, é inegável a influência da vegetação terrestre sobre os fluxos que nele ocorrem. De fato a vegetação pode interceptar a água das chuvas impedindo que chegue até os corpos hídricos e ocasionando o seu retorno à atmosfera de duas formas: 1) retendo parte da água na folhagem, onde pode posteriormente evaporar; 2) absorvendo a água do solo participando posteriormente do processo de transpiração. 4 CLASSIFICAÇÃO DOS ECOSSISTEMAS Existem várias formas de se classificar um ecossistema, contudo suas definições não são muito aceitas pelos ecólogos. Todavia, em várias situações tal sistematização pode se mostrar útil (ODUM; BARRET, 2011). Assim sendo, os ecossistemas podem ser classificados tanto estruturalmente como funcionalmente. Quando apenas a vegetação e as principais características físicas estruturais servem de base para a classificação, têm-se os chamados biomas (ODUM; BARRET, 2011). Por diversas vezes os termos ecossistema e bioma são confundidos. Porém, como ressalta Coutinho (2006): “Não se deve supor erroneamente que bioma e ecossistema sejam sinônimos. Para a fisionomia, elemento de fundamental importância na classificação dos biomas, a fauna tem pouco ou nenhum significado. O mesmo não ocorre quando nos referimos a um ecossistema”. O termo bioma não é utilizado para ambientes aquáticos ou marinhos por não possuir elementos florísticos característicos que os possam classificar. UNI UNI TÓPICO 4 | ECOSSISTEMAS 139 Outra forma de classificar os ecossistemas é com relação à quantidade e qualidade da energia. De acordo com Odum e Barret (2011), a energia fornece uma excelente base para uma classificação funcional, uma vez que é um importante “denominador comum” para os ecossistemas, inclusive os criados e/ou gerenciados pelo homem. Considerando o exposto, pode-se identificar 21 tipos principais de ecossistemas, considerando nesta soma os locais onde os humanos se estabeleceram (Tabela 4). TABELA 4 – PRINCIPAIS TIPOS DE ECOSSISTEMA EXISTENTES NO PLANETA FONTE: Odum e Barret (2011) 140 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você pode concluir que: • O ecossistema é a unidade onde os organismos existentes interagem entre si e com o meio físico, gerando um fluxo de matéria e energia. • A energia flui entre os organismos de forma unidirecional, havendo perda de parte dela ao longo da cadeia alimentar. • Estima-se que cerca de 10% da energia constante na biomassa de um organismo seja aproveitada pelo seu consumidor. O restante é perdido sob a forma de calor devido às atividades metabólicas. • O processo de assimilação de energia luminosa pelas plantas e sua transformação em energia química através da fotossíntese é denominada de produtividade primária. • A produtividade primária pode ser dividida em produtividade primária bruta, que é o total de energia assimilado pela planta, e produtividade líquida, que é o que é incorporado à sua biomassa. • Os seres necessitam de diversos elementos e compostos químicos para a sua sobrevivência e a sua obtenção contínua é possível devido à existência dos ciclos biogeoquímicos. • No ciclo de nitrogênio é um dos ciclos mais complexos e envolve micro- organismos capazes de fixar o nitrogênio no solo e de outros organismos capazes de transformar esse nitrogênio em formas que possam ser utilizadas pelos vegetais. • O principal reservatório de fósforo são as rochas, sendo que grande parte deste elemento penetra no mar e fica imobilizada nos sedimentos profundos. • Três processos biogeoquímicos naturais liberam enxofre para a atmosfera: formação de aerossóis através de borrifos do mar, respiração anaeróbica por bactérias redutora de sulfato, e a atividade vulcânica. • O ciclo do carbono é governado por dois processos opostos: a respiração e a fotossíntese. • De forma geral, o ciclo da água é moldado pelos processos de evaporação, precipitação e transpiração. • Os termos ecossistema e bioma não são sinônimos, pois este último não considera os fluxos de matéria e energia, mas sim somente a fitofisionomia. • Pode-se identificar 21 principais tipos de ecossistemas no mundo, incluindo os locais onde os humanosse estabeleceram. 141 AUTOATIVIDADE 1 A produtividade primária de um vegetal pode ser dividida em produtividade primária bruta e produtividade primária líquida. Diferencie estes conceitos. 2 Por que é dito que apenas 10% da energia absorvida por um organismo é repassada para o seu consumidor? 3 Os ecossistemas são “regidos” pelos fluxos constantes de matéria e energia necessários à sobrevivência dos organismos. Sobre a ciclagem de matéria nos ecossistemas, associe os itens através do código a seguir: I- Ciclo do Nitrogênio. II- Ciclo do Carbono. III- Ciclo da Água. IV- Ciclo do Enxofre. ( ) A atividade vulcânica é uma das fontes naturais da sua liberação na atmosfera. ( ) A fotossíntese e a respiração são os principais agentes deste ciclo. ( ) A vegetação tem grande influência sobre o regime deste ciclo. ( ) É o ciclo mais complexo entre os principais elementos necessários aos seres vivos. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) IV – II – III – I. b) ( ) IV – I – III – II. c) ( ) I – II – III – IV. d) ( ) I – III – II – IV. 142 143 UNIDADE 3 GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade você será capaz de: • definir o conhecimento e a importância das unidades de conservação para a biodiversidade; • reconhecer e diferenciar as categorias das unidades de conservação; • compreender os princípios e diretrizes que regem a gestão em unidades de conservação e em áreas protegidas em geral. Esta unidade está dividida em quatro tópicos e em cada um deles você encon- trará atividades que o(a) ajudarão a aplicar os conhecimentos apresentados. TÓPICO 1 – BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO TÓPICO 2 – CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS TÓPICO 3 – CRIAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO E GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO TÓPICO 4 – GESTÃO TERRITORIAL PARA A CONSERVAÇÃO Assista ao vídeo desta unidade. 144 145 TÓPICO 1 BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Prezado(a) acadêmico(a)! Para começarmos, neste tópico teremos a oportunidade de discutir os aspectos relacionados à Biologia da Conservação. Serão abordados estudos relacionados à conservação da fauna e flora. Discutiremos também aspectos relativos ao planejamento ambiental e políticas públicas para a conservação, que no Brasil envolvem, principalmente, a criação e gestão de unidades de conservação. 2 COMPREENDENDO OS PROCESSOS Ao longo das unidades anteriores acompanhamos o desenvolvimento de conceitos que possibilitam o entendimento de fenômenos naturais. Um conhecimento que nos permite agora compreender as relações entre os seres vivos e destes com o ambiente. Vimos “como se estrutura e como funciona o conjunto de seres vivos em um gradiente heterogêneo de ambiente”, procurando a explicação para a complexa rede de interdependência (ALHO, 1992). Percebemos que os níveis de organização dos seres vivos na natureza tornam evidentes importantes relações. Assim, os organismos, o primeiro nível de organização, são as diversas formas de vida que apresentam estrutura e função únicas que definem a espécie e cuja adaptação ou organização em um determinado tempo ou espaço define uma população. Quando avançamos para uma análise mais complexa, verificamos que há interações de organismos e populações com o sistema natural, os fatores abióticos. Todas essas interações em um dado espaço geográfico determinam os ecossistemas (ODUM; BARRET, 2008). Passamos a compreender então o ambiente natural, sua organização e as leis que definem a manutenção da vida e como se estabelece o equilíbrio das relações no ambiente. Neste contexto, o homem é o ser vivo que apresenta uma grande capacidade de intervir nessas relações, através da alteração do ambiente e a extração de recursos naturais. Muitas vezes, a taxa de extração desses recursos pode ser muito superior à capacidade de recuperação do ambiente, e é exatamente nesse momento que este mesmo homem precisa intervir para viabilizar o restabelecimento do equilíbrio, sob pena de comprometer a disponibilidade de recursos e, em uma situação extrema, sua própria existência (PINTO-COELHO, 2000). UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 146 Quais são os processos, técnicas ou comportamentos e atitudes que podem nos levar à correta utilização dos recursos naturais que nos permitam manter o desenvolvimento e ao mesmo tempo garantir a manutenção desses recursos para as gerações futuras? 3 BIODIVERSIDADE Quando falamos em conservação, faz-se necessário entendermos por que e o que é necessário conservar. Precisamos conhecer os elementos que compõem as comunidades ou os ecossistemas. Uma das características que determinam a viabilidade da conservação é exatamente a biodiversidade. A biodiversidade está relacionada ao ramo da ecologia de comunidades e inclui todas as espécies encontradas na Terra. O texto elaborado pelo Fundo Mundial para a Natureza (1989, p. 52) estabelece o termo diversidade biológica como sendo “a riqueza da vida na Terra, os milhões de plantas, animais e micro- organismos, os genes que eles contêm e os intricados ecossistemas que eles ajudam a construir no meio ambiente”. Deste conceito conseguimos perceber que a biodiversidade considera o número de espécies existentes, mas contempla muito mais do que isso. Ela abrange a variação genética existente entre organismos e populações, e ainda pode ser abordada em nível de comunidade e ecossistema. Recapitulando o conceito de espécie, consideramos bem ilustrativa a definição apresentada por Primack e Rodrigues (2001, p. 27). Estes autores indicam que uma espécie pode ser definida de dois modos: Primeiro, uma espécie pode ser definida como um grupo de indivíduos que é morfologicamente, fisiologicamente ou bioquimicamente distinta de outros grupos em algumas características (definição morfológica de espécie). Mais e mais, as diferenças nas sequências de DNA estão sendo usadas para distinguir espécies que parecem quase idênticas, como é o caso das bactérias. Segundo, uma espécie pode ser distinguida como um grupo de indivíduos que pode potencialmente procriar entre si, mas não procria com indivíduos de outros grupos (definição biológica de espécie). Lembre-se: “Para compreender os processos é necessário ter consolidado os conceitos, pois eles são a base para o desenvolvimento de técnicas e práticas ambientais”. (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). Então, se necessário, volte às unidades anteriores e reveja os conceitos. UNI IMPORTANTE TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 147 4 ESTIMATIVA DA BIODIVERSIDADE Aproximadamente 1,4 milhão de espécies já foram identificadas e descritas pelos pesquisadores. Sua distribuição nos diversos grupos de seres vivos é apresentada na tabela a seguir. TABELA 5 – ESTIMATIVA DO NÚMERO DE ESPÉCIES IDENTIFICADAS E DESCRITAS POR PESQUISADORES Insetos Plantas Fungos Protistas Algas Bactérias e formas similares Vírus Outros 751.000 248.500 69.000 30.800 26.900 4.800 1.000 281.000 FONTE: Adaptado de: Primack e Rodrigues (2001) Embora pareça elevado, este número ainda pode chegar a cinco milhões(!), porque grande quantidade de insetos e bactérias ainda não foi devidamente identificada pelos pesquisadores e biólogos. Ouvimos falar com frequência que o Brasil é um dos países que apresenta a maior diversidade biológica do planeta. Mas por que isso acontece? O Brasil é um dos países com maior biodiversidade do planeta, devido ao fato de que quase um terço das florestas tropicais remanescentes do mundo está em seu território, e elas são reconhecidas como um dos mais importantes repositórios da diversidade biológica global (MMA, 2006). Soma-se a isso a ocorrência endêmica de milhares de espécies biológicas em uma variedade de ecossistemas. São denominadas de endêmicas as espécies cuja ocorrência natural se dá em uma área específica. As áreas de ocorrência de espécies endêmicas são importantes para a conservação das espécies. Vejamos o exemplo de um levantamentoefetuado no Parque Nacional da Serra da Canastra, localizado nos municípios de São Roque de Minas, Sacramento e Delfinópolis, sudoeste de Minas Gerais, abrangendo uma área de 71.525 ha e com altitudes variando entre 800 e 1.496 metros. Os tipos de vegetação da área são as florestas mesófilas de encosta, capões, cerradão, cerrado, campo cerrado, campo limpo e campo rupestre. O levantamento florístico efetuado na região catalogou 101 famílias, das quais 73 foram identificadas, totalizando 768 espécies. Este estudo identificou a ocorrência de 45 espécies endêmicas, incluindo várias espécies novas, pertencentes a 11 famílias. Foi possível ainda delimitar e descrever 17 áreas de endemismo e, como resultado prático desse estudo, essas áreas foram propostas como zonas de preservação permanente. FONTE: ROMERO, Rosana; NAKAJIMA, Jimi Naoki. Revista Brasileira de Botânica, São Paulo, v. 22, n. 2 (suplemento), p. 259-265, out. 1999. Disponível em: . Acesso em: 13 maio 2013. NOTA UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 148 Dados do Ministério do Meio Ambiente estimam que cerca de 20% do número de espécies conhecidas pela ciência podem estar abrigadas em território brasileiro. De fato, a flora brasileira apresenta entre 50 e 56 mil espécies de plantas superiores. Quanto à fauna brasileira, você pode observar, na tabela a seguir, que os números também são expressivos. TABELA 6 – ESTIMATIVA DO NÚMERO DE ESPÉCIES IDENTIFICADAS NA FAUNA BRASILEIRA Anfíbios Répteis Mamíferos Aves Peixes de água doce 517 468 524 1.622 3.000 FONTE: Ministério do Meio Ambiente, Relatório nacional sobre a biodiversidade (1998) Conhecendo esses números, conseguimos imaginar o mundo sob a ameaça de extinção de espécies e perda de material genético? Apesar dos números serem impressionantes, a extinção é uma ocorrência bem mais frequente do que gostaríamos de pensar. 5 AMEAÇAS À BIODIVERSIDADE Estamos constantemente ouvindo falar sobre espécies ameaçadas ou em extinção. Este é um tema sempre atual. Relacionaremos, neste item, as ameaças mais relevantes, discutindo sobre as causas de sua ocorrência e que medidas podem ser tomadas no sentido da conservação. O texto a seguir é bastante ilustrativo quanto às consequências da extinção de espécies. Pesquisadores afirmam que o custo da perda de espécies é incalculável e a ciência tem indicado que todos os esforços devem ser direcionados para evitá- la. As técnicas de recuperação, em geral, têm custos elevados. Assim sendo, as melhores ações serão sempre no sentido de conservação das espécies. Um meio ambiente bem preservado tem grande valor econômico, estético e social. Mantê-lo significa preservar todos os seus componentes em boas condições: ecossistemas, comunidades e espécies. O aspecto mais sério do perigo ambiental é a extinção das espécies. As comunidades podem ser degradadas e confinadas a um espaço limitado, mas na medida em que as espécies originais sobrevivam, ainda será possível reconstruir as comunidades. Da mesma forma, a variação genética das espécies será reduzida se o tamanho da população for diminuído, mas estas podem ainda recuperar o potencial de sua variação genética através da mutação, seleção natural e recombinação. Entretanto, uma vez que a espécie é extinta, a informação genética única contida em seu DNA e a combinação especial de caracteres que ela possui estarão perdidas para sempre. Uma vez que uma espécie tenha sido extinta, sua população não pode ser recuperada, a comunidade que ela habitava torna-se empobrecida e seu valor potencial para os seres humanos jamais poderá se realizar. (PRIMACK; RODRIGUES, 2001, p. 28). TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 149 5.1 EXTINÇÃO E SUAS CAUSAS Ao acompanharmos os eventos da história, percebemos que existiram momentos nos quais a própria natureza se encarregou de controlar a população de determinadas espécies. Exemplificando, a teoria da extinção dos dinossauros sobre a Terra indica, entre outras coisas, que após este evento, determinadas espécies vegetais e animais se multiplicaram e passaram a predominar na paisagem natural. Como já estudamos nos capítulos anteriores, os ecossistemas tendem a alcançar o equilíbrio na utilização de energia e espaço físico onde as populações estabelecem uma teia de relações interdependentes (ODUM; BARRET, 2011). As relações interespecíficas (competição, predação, sucessão) são ocorrências naturais. Entretanto, em determinadas situações, podem determinar a extinção de espécies. Estas relações, os processos ecológicos e a utilização dos recursos determinam a predominância de populações ou espécies. É importante lembrarmos ainda de como a utilização da energia solar, a eficiência na fotossíntese e demais ciclos biogeoquímicos podem interferir na biodiversidade e conservação. Mais uma vez nos reportamos a informações de capítulos anteriores. Aproveite para verificar o seu conhecimento sobre os ciclos biogeoquímicos e fluxo de energia! Entre as espécies, o ser humano aparece como o maior agente de transformações do ambiente natural. Vejamos o que Primack e Rodrigues (2001, p. 29) afirmam a respeito: A lista de transformações de sistemas naturais que estão diretamente relacionadas às atividades humanas é longa. Inúmeras espécies diminuíram rapidamente, algumas até o ponto de extinção, em consequência da caça predatória, destruição do habitat e a ação de novos predadores e competidores. As causas dos declínios de espécies nos ambientes, tanto marinhos quanto terrestres, estão associadas a atividades humanas. Os impactos diretos são principalmente a destruição e a exploração de habitats, e, de forma indireta, a poluição, a introdução de espécies e a disseminação de doenças também têm ocasionado impactos significativos (HERO e RIDGWAY, 2006). IMPORTANTE UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 150 5.2 PERDA E FRAGMENTAÇÃO DE HABITATS A perda de habitat devido ao desmatamento é a principal origem da alteração de habitat promovida pelo homem. Em geral, acontece para fins de pecuária, extração da madeira, exploração agrícola, exploração mineral ou para ocupação urbana. Considerando os mecanismos naturais de recuperação dos ecossistemas, este fenômeno não seria tão grave se ocorresse em um ritmo que permitisse a sua regeneração. Entretanto, os interesses econômicos se sobrepõem e o resultado já é bastante conhecido. Historicamente, a destruição de habitats foi mais intensa nas regiões costeiras do Sul e do Sudeste brasileiro, onde se encontra o bioma Mata Atlântica. Como consequência, temos a atual situação que já foi discutida na primeira unidade do nosso caderno. De fato, na América do Sul, as perdas populacionais mais intensas têm sido verificadas nesse bioma (HERO e RIDGWAY, 2006). No entanto, não é somente nesse bioma que a perda de habitat é um problema. O Cerrado também tem sido seriamente comprometido devido ao desmatamento. Hoje restam cerca de 20% da vegetação original. Mesmo a Amazônia, região onde as florestas eram relativamente pouco perturbadas, está sob ameaça (HERO e RIDGWAY, 2006). Além da perda de habitat, a sua fragmentação também constitui em uma ameaça à biodiversidade brasileira. As mudanças biológicas associadas a esses dois processos favorecem espécies adaptadas a paisagens alteradas, de forma que a maioria das espécies florestais está declinando e sendo substituída por um número menor de espécies que resistem em habitats alterados. A esse fenômeno dá-se o nome de homogeneização biótica (HERO e RIDGWAY, 2006). Pode-se dizer que os principais efeitos ecológicos da fragmentação são o aumento do efeito de borda e o isolamento do habitat (ROCHA et al., 2006). O aumento do efeito de borda deve-se a uma maior quantidade de borda por área de habitat e a uma diminuição da distância entre o centro de cada fragmento e a sua borda (PRIMACK e RODRIGUES, 2001). A problemática das bordas consiste no fatode que nesse micro-habitat as condições são distintas daquelas encontradas no interior da floresta. Sendo assim, o aumento da área da borda provoca alterações no ambiente, aumentando os níveis de iluminação, de temperatura e de vento, bem como a diminuição da umidade, podendo assim alterar a composição das espécies e, mesmo, levar muitas espécies à extinção local ou ecológica (ROCHA et al., 2006). Antes de definirmos os termos extinção global, extinção local e extinção ecológica, é necessário ressaltar que a redução e o isolamento dos habitats não ocasionam imediatamente o risco de extinção. Esse processo ocorre de forma gradativa, através da redução no tamanho e do isolamento das populações (ROCHA et al., 2006). TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 151 Voltando agora as nossas atenções às diferentes definições de extinção, percebemos que a extinção em nível global ocorre quando o último indivíduo de uma espécie morre. Já a extinção local refere-se ao caso em que o último indivíduo de uma população morre, o que não significa que a espécie tenha se extinguido, já que outras populações podem ocorrer em outras áreas. Por fim, a extinção ecológica ocorre quando a população de uma espécie em um determinado local é tão pequena que o seu papel desempenhado dentro do ecossistema se torna negligenciável (ROCHA et al., 2006). 6 CONSERVAÇÃO Antes de começarmos a tratar de questões envolvendo a conservação, precisamos conceituar corretamente o termo, já que esse é utilizado, muitas vezes, como sinônimo de preservação. Segundo Santos (2011), o termo ‘conservação’ deve ser utilizado quando se visa resguardar algo de dano, evitando a sua deterioração, o prejuízo. Assim, a conservação permite que haja a intervenção humana – até explorando alguns recursos naturais. Quando ela é percebida em relação ao meio ambiente, tem a conotação de proteção dos recursos naturais, utilizando-os racionalmente. Já o termo ‘preservação’ visa garantir a integridade de alguma coisa. Tal termo é usado ao se referir à proteção integral, como forma de manter sua intocabilidade. Ao se levar em conta o meio ambiente, usa-se da preservação para evitar perda de biodiversidade constante nesse locus. Sendo assim, “a conservação incorpora melhorias ao meio ambiente, retardando sua degradação; e a preservação é uma ação direcionada à proteção integral das condições naturais dos recursos ambientais existentes” (SANTOS, 2011, p. 144). Vimos até aqui os processos que ameaçam a diversidade biológica. Precisamos então discutir métodos e técnicas que promovam a utilização dos recursos naturais de forma racional e que permitam a sua conservação. A argumentação apresentada por Primack e Rodrigues (2001, p. 31) esclarece sobre tal necessidade. A desaceleração do crescimento da população humana é parte da solução para a crise da diversidade biológica. Além disso, as atividades industriais em larga escala, o corte da madeira e a agricultura, na busca de altos lucros em curto prazo, têm efeitos destrutivos e desnecessários para o ambiente natural. Esforços para reduzir o alto consumo de recursos naturais nos países ricos e industrializados e para eliminar a pobreza em países em desenvolvimento são também parte importante da proteção da diversidade biológica. No que diz respeito ao crescimento populacional, as estimativas não são otimistas, conforme podemos verificar na figura a seguir. UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 152 FIGURA 61 – ESTIMATIVA PARA A POPULAÇÃO MUNDIAL FONTE: United Nations (2004). Disponível em: . Acesso em: 24 mar. 2013. O gráfico mostra uma tendência de que a população dobre de tamanho até o ano de 2100. As transformações advindas deste crescimento são e serão percebidas na organização do espaço urbano e rural. As dificuldades na conservação dos recursos naturais frente às necessidades humanas destacam-se no cenário político. Entretanto, a evolução da ecologia enquanto ciência tem possibilitado uma redefinição do desenho dos padrões de desenvolvimento e conservação. Novas abordagens das questões ambientais têm permitido o estabelecimento de regras de convívio e gerenciamento de conflitos de interesses. Neste sentido, Gipps (1991), citado por Primack e Rodrigues (2001, p. 35), afirma que: Ao invés de apenas observar passivamente as espécies em perigo caminharem para a extinção, muitos biológos de conservação começaram a desenvolver abordagens para salvar essas espécies. Aguns métodos novos e interessantes estão sendo desenvolvidos para estabelecer novas populações silvestres e semissilvestres de espécies raras e ameaçadas e para aumentar o tamanho das populações existentes. TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 153 Ou seja, a ciência tem ocupado o espaço na solução dos problemas relacionados ao ambiente, tomando nova forma. 6.1 O ESTABELECIMENTO DE NOVAS POPULAÇÕES Para tratar do estabelecimento de novas populações, visando a sua recuperação e conservação, devemos, inicialmente, levantar alguns aspectos técnicos que possibilitem o diagnóstico da situação. É preciso avaliar a variabilidade genética da população remanescente. É esta variabilidade que permitirá, ou não, que as populações se adaptem a um ambiente transformado ou em transformação e está diretamente relacionada ao número de indivíduos. Em pequenas populações a variabilidade tende a ser menor e, consequentemente, as variações genéticas são limitadas, reduzindo as chances de sucesso e exigindo técnicas mais eficientes (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Outro aspecto é a disponibilidade de informações sobre estas populações, os ambientes nos quais estão distribuídas, as interações bióticas, sua morfologia e fisiologia. Em muitos casos é necessário levantar informações de monitoramento a médio e longo prazos. O estabelecimento propriamente dito de novas populações pode ocorrer por um programa de reintrodução, de acréscimo ou de introdução, considerando ainda o comportamento social dos animais, da população de plantas, da disponibilidade de recursos abióticos, da influência do clima, da topografia etc. (ODUM; BARRET, 2011). 6.2 CONSERVAÇÃO IN SITU E EX SITU Sob o aspecto da biologia será sempre indicado que as estratégias de conservação de populações sejam aplicadas in situ – nas áreas de origem, em seu ambiente natural. Entretanto, sob o ponto de vista prático, nem sempre isto é possível. Alternativamente, quando a conservação in situ não é tecnicamente viável, podem ser aplicadas as estratégias de conservação ex situ, através do uso de espaços delimitados, como os zoológicos, aquários, jardins botânicos e bancos de sementes (BEZERRA; MUNHOZ, 2000). UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 154 6.2.1 Zoológicos O principal objetivo destes espaços é estabelecer populações, em cativeiros, de animais raros ou ameaçados. Infelizmente, o número reduzido de indivíduos de uma determinada espécie pode inviabilizar um projeto de conservação. O esforço é no sentido de desenvolver tecnologias que aumentem as possibilidades de reprodução e disponibilizar informações sobre o adequado manejo e tratamento de espécies silvestres. 6.2.2 Aquários Os aquários públicos atuam de forma similar aos zoológicos, entretanto apresentam um alto custo de manutenção. 6.2.3 Jardins botânicos No Brasil, o primeiro jardim botânico a ser instalado foi o Jardim Botânico do Rio de Janeiro. A finalidade, na época de sua criação, foi a de possibilitar a aclimatação de espécies exóticas trazidas do Oriente. Atualmente é o maior depositário da flora nacional. No mundo, os jardins botânicos estão se especializando e há centros de conservação e reprodução em tipos específicos de plantas. Estes espaços contribuem para a conservação e representam fontes de informação sobre a distribuição geográfica e exigências nutricionais, de clima e solo de plantas. 6.2.4 Bancos de sementes Os bancos de sementes representam umaestratégia na conservação de espécies vegetais. As sementes podem ser armazenadas em condições de baixas temperaturas e permanecerem viáveis por um período de tempo. No momento adequado são colocadas para germinar. Neste caso, percebemos que não é necessária a disponibilidade de grandes espaços e apresentam um menor custo. Entretanto, se ocorrerem problemas na manutenção dos sistemas ou equipamentos, toda a coleção pode ser comprometida. TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 155 7 O VALOR ECONÔMICO DA BIODIVERSIDADE Consideramos importante a abordagem de aspectos referentes ao valor econômico da biodiversidade, tema amplamente discutido nos dias atuais. O uso de conceitos e vocabulários vinculados à economia é cada vez mais comum pelos biólogos da conservação, de forma a convencer o governo, banqueiros e empresários da necessidade de proteger a biodiversidade. Isto será possível desde que estes atores encontrem uma justificativa econômica para fazê- lo (RICKLEFS, 2003). Apresentamos a seguir o texto elaborado por Arruda (2001) que resume de modo eficiente e interessante aquilo que é essencial conhecermos sobre o valor econômico da biodiversidade. FONTE: Disponível em: . Acesso em: 6 jun. 2013. A Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB reconhece que a biodiversidade possui valores econômicos, sociais e ambientais. Logo no primeiro parágrafo do texto esse reconhecimento é explicitado: ‘Consciente do valor intrínseco da diversidade biológica e dos valores ecológico, social, econômico, científico, educacional, cultural, recreativo e estético da diversidade biológica e seus componentes’. A seguir, o artigo 1º define os objetivos da Convenção como sendo a ‘conservação da biodiversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos’. Complementando, o artigo 11 destaca a necessidade de utilizar instrumentos econômicos na gestão da conservação da biodiversidade, afirmando que: ‘cada parte contratante deve, na medida do possível e conforme o caso, adotar medidas econômica e socialmente racionais que sirvam de incentivo à conservação e utilização sustentável de componentes da diversidade biológica’. Assim, a CDB busca demonstrar, como estratégia de proteção à biodiversidade, que a conservação e o uso sustentável da biodiversidade têm valor econômico e que a utilização de critérios econômicos é relevante na sua implementação, ou seja, apregoa ser imprescindível o reconhecimento do valor econômico da biodiversidade por aqueles que participam de sua gestão. Hoje, a maioria das decisões de políticas públicas se baseia em considerações econômicas. O conhecimento do montante dos valores econômicos associados à conservação, à preservação e ao uso sustentável da biodiversidade é a forma contemporânea de garantir que a variável ambiental tenha peso efetivo nas tomadas de decisões em políticas públicas. Neste contexto, a Economia Ambiental, fundamentada na Teoria Econômica Neoclássica, incorpora hoje métodos e técnicas de valoração que buscam integrar as dimensões ecológicas, econômicas e sociais, de forma que capture os valores econômicos associados à conservação e à preservação da diversidade biológica. O objetivo é tirar as formulações neoclássicas do nível teórico de abstração e enfrentar o desafio de medir as variáveis indispensáveis à implantação e à instrumentalização de políticas públicas. UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 156 O conceito de valor econômico, desenvolvido pela economia ambiental, é útil para identificarmos os diversos valores associados aos recursos ambientais. Vejamos o quadro a seguir: QUADRO 5 – VALORES ASSOCIADOS AOS RECURSOS AMBIENTAIS VALORES DE USO DIRETO (VUD) São aqueles derivados do uso direto da biodiversidade, como atividades de recreação, lazer, colheita de recursos naturais, caça, pesca, educação. VALORES DE USO INDIRETO (VUI) Abrangem as funções ecológicas da biodiversidade, como proteção de bacias hidrográficas, preservação de habitat para espécies migratórias, estabilização climática, sequestro de carbono. Exemplo: Polinização. VALORES DE OPÇÃO (VO) Derivam da opção de usar o recurso no futuro. Os usos futuros podem ser diretos ou indiretos, ou seja, podem incluir o valor futuro da informação derivada do recurso em questão. Exemplo: Controle biológico. VALORES DE NÃO USO (VNU) São aqueles que as pessoas atribuem ao recurso ambiental, sem que esteja ligado a algum de seus usos. Exemplo: Valores de herança e de existência. FONTE: Adaptado de: Arruda (2001) Ao utilizarmos as informações do quadro anterior em um diagrama, teremos a estrutura da figura a seguir: TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 157 FIGURA 62 – ESTRUTURA DO CONCEITO VALOR ECONÔMICO DA BIODIVERSIDADE FONTE: Adaptado de: Arruda (2001) 7.1 OS CUSTOS AMBIENTAIS Para entendermos um pouco melhor a importância de avaliarmos os custos ambientais, separamos o texto a seguir. Prejuízos causados por ciclones tropicais mais frequentes, perda de terra em consequência de um aumento do nível do mar e danos aos recursos pesqueiros, à agricultura e ao fornecimento de água poderiam custar mais de US$ 300 bilhões por ano. Em termos globais, os maiores prejuízos seriam na área da energia. A indústria hídrica mundial enfrentará um custo adicional de US$ 47 bilhões por ano em 2050. A indústria agrícola e a silvicultura podem perder até US$ 42 bilhões em todo o mundo em consequência de secas, enchentes e incêndios se os níveis de dióxido de carbono alcançarem o dobro das suas concentrações pré- industriais. Programas de defesa contra inundações para proteger moradias, fábricas e usinas de energia do aumento do nível do mar e de tempestades repentinas podem custar US$ 1 bilhão por ano. A perda de ecossistemas, incluindo manguezais, recifes de corais e lagunas costeiras, pode chegar a mais de US$ 70 bilhões em 2050. FONTE: IBAMA: integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento: 1972-2002. Perspectivas do Meio Ambiente Mundial GEO-3. Disponível em: . Acesso em: 23 mar. 2013. UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 158 8 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A ecologia enquanto ciência é muito dinâmica e tem, frequentemente, provocado a reflexão sobre o comportamento humano frente ao ambiente e a utilização de recursos naturais, como temos afirmado repetidamente ao longo desta unidade. Seguiremos agora para um tema bastante atual: a sustentabilidade. Tudo aquilo que é sustentável pode ser mantido em condições de equilíbrio: os negócios, as atividades industriais, as empresas e até mesmo as residências precisam ser sustentáveis. A compreensão dos processos como um todo possibilita- nos efetuar as ligações entre as diversas abordagens e, portanto, perceber que estes eventos não ocorrem isoladamente e são interdependentes. 8.1 ASPECTOS TEÓRICOS SOBRE DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADE A ciência tem alertado sobre as consequências do uso inadequado dos recursos ambientais. Neste contexto, muitas são as linhas de pensamento sobre o que realmente importa ao desenvolvimento. A crise ambiental que vivemos, produto do desenvolvimento, tem levado ao debate sobre as dimensões dos problemas ambientais. Convivemos com a contaminação de recursos naturais e alterações climáticas significativas. Surge, então, uma proposta alternativa para o modelo de desenvolvimento: “o desenvolvimento sustentável”. A definição da World Commission on Environment and Development (Comissão Mundial de Ambiente e Desenvolvimento), criada em 1987, afirma que o desenvolvimento será sustentável se atender às necessidades das gerações presentes sem comprometer as futuras gerações. Entretanto, não esclarece quais são os limites dessas “necessidades”, gerando uma relativa fragilidade ao conceito. Sabemos que o desenvolvimento,no modelo atual, está vinculado à criação incessante de necessidades que em geral refletem um consumo deliberado. Este consumo deve nos levar à reflexão sobre o que é realmente necessário, que é a raiz do debate sobre o tipo de desenvolvimento que se pretende estabelecer. Assim, o termo sustentável refere-se a um sistema que apresenta estabilidade, equilíbrio e a sua manutenção é estabelecida por um consumo compatível com a capacidade produtiva do próprio sistema. As questões ambientais ocupam um lugar de destaque nas discussões econômicas e sociais e esperamos, de fato, uma mudança na condução dos negócios das políticas públicas e sociais. Portanto, trata-se de um modelo onde a comunidade envolvida deve participar ativamente através de programas dos governos municipais, estaduais e federais. E, neste sentido, são necessárias políticas públicas cujo modelo de desenvolvimento esteja sob uma perspectiva da sustentabilidade. TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 159 Reflita sobre as expressões “fatores limitantes” e “capacidade de suporte do meio ambiente”. O que isto tem a ver com o desenvolvimento? UNI 8.2 DIMENSÕES DA SUSTENTABILIDADE O desenvolvimento sustentável envolve múltiplas dimensões que objetivam a gestão sustentada dos recursos naturais. No quadro a seguir são apresentadas as cinco dimensões do desenvolvimento sustentável (IBAMA, 2003): • a dimensão social; • a dimensão econômica; • a dimensão ambiental (ecológica); • a dimensão geográfica; e • a dimensão cultural. QUADRO 6 – DIMENSÕES DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DIMENSÃO C OMP O N E N T E S O B J E T I V O S Sustentabilidade Social Criação de postos de trabalho que permitam a obtenção de renda individual adequada (à melhor condição de vida; à maior qualificação profissional). Produção de bens dirigida prioritariamente às necessidades básicas sociais. R e d u ç ã o d a s desigualdades sociais. Sustentabilidade Econômica Fluxo permanente de investimentos públicos e privados (os últimos com especial destaque para o cooperativismo). Manejo eficiente dos recursos. Absorção, pela empresa, dos custos ambientais. Endogeneização (contar com as próprias potencialidades de cada localidade). Aumento da produção e da riqueza social, sem dependência externa. UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 160 Sustentabilidade Ecológica Produzir respeitando os ciclos ecológicos dos ecossistemas. Prudência no uso de recursos naturais não renováveis. Prioridade à produção de biomassa e à industrialização de insumos naturais renováveis. Redução da intensidade energética e aumento da conservação de energia. Tecnologias e processos produtivos de baixo índice de resíduos. Cuidados ambientais. Melhoria da qualidade do ambiente e preservação das fontes de recursos naturais para as próximas gerações. Sustentabilidade Espacial/ Geográfica Desconcentração espacial (de atividades e de população). Democratização do poder global, nacional, local e regional. Relação cidade/campo equilibrada. Soluções adaptadas a cada ecossistema. E v i t a r e x c e s s o d e aglomerações. Sustentabilidade Cultural Respeito à formação cultural e organização social comunitária. Evitar conflitos culturais com potencial regressivo. FONTE: IBAMA, 2003. Disponível em: . Acesso em: 23 mar. 2013. O detalhamento do quadro anterior nos permite observar que a dimensão ecológica do desenvolvimento determina os próprios limites do crescimento. Exemplificando: os resíduos gerados pelo processo de crescimento deveriam ser absorvidos pelo próprio sistema respeitando o fluxo de matéria e energia, contudo tais resíduos são produzidos em escalas superiores à capacidade da biosfera. Podemos concluir que o desenvolvimento é um processo inter-relacionado e, portanto, não pode ser considerado como o objetivo-fim, uma vez que a manutenção da sustentabilidade só é possível quando observadas as questões econômicas, sociais e ambientais, conjuntamente (PHILIPPI, 2005). Quanto à dimensão social, não se pode conceber que processos produtivos que gerem uma elevada concentração de renda, liberem grandes quantidades de elementos contaminantes ao meio ambiente e ainda promovam a exclusão social, segregação espacial, pobreza e condições precárias de habitabilidade, sejam consideradas propulsores de desenvolvimento. Assim, é necessária a valorização de características locais nos processos de desenvolvimento, evitando a globalização nociva que incorre em uniformização/ TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 161 homogeneização cultural, legitimando um desenvolvimento com a força local, gerada pelo “capital social”. O envolvimento da sociedade faz-se essencial. A participação na definição de prioridades e necessidades, em planos de desenvolvimento que harmonizem o crescimento econômico e o desenvolvimento social, em todas as suas dimensões. O desenvolvimento sustentável ocorre somente quando são observados os elementos que o compõem e de forma harmônica. Essas relações estão ilustradas na figura a seguir. Observe que para o efetivo desenvolvimento se fazem necessários o planejamento ambiental, a definição do padrão de consumo, os programas de administração e destinação dos resíduos sólidos que estão diretamente relacionados a questões populacionais e à saúde pública. Para completar o fluxo são necessárias políticas públicas eficientes que definam claramente as ações e regras. FIGURA 63 – O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL FONTE: Adaptado de: Philippi Jr. (2005, p. 804) 8.3 CRESCIMENTO OU DESENVOLVIMENTO? Em todas as discussões podemos perceber que as questões ambientais estão atreladas ao “desenvolvimento” e que este é frequentemente definido pelo “crescimento econômico”, dando forma ao equívoco conceitual. Vejamos o que afirma Sachs (1996, apud GOMES, 2010, p. 9) sobre esta questão: O fato é que geramos padrões de crescimento que se traduzem pela incorporação predatória de recursos naturais no fluxo de renda, o que significa descapitalizar a natureza, falando em uma linguagem de economês. E porque ao mesmo tempo ainda geramos poluições, ou seja, tudo se passa como se o sistema de produção atual fosse um sistema de produção de riqueza que se acompanha da reprodução ampliada da pobreza e da exclusão social no nível da sociedade e pela degradação ambiental. Chamar isso de desenvolvimento é muito difícil. De qualquer UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 162 QUADRO 7 – MARCOS DA DISCUSSÃO AMBIENTAL maneira, o que está certo é que crescimento econômico não é sinônimo de desenvolvimento, que não é pela aceleração do crescimento econômico dentro do padrão passado que vamos resolver os problemas... Portanto, a questão é como passar a um outro paradigma de desenvolvimento? Sachs (1996) continua questionando sobre a eficiência econômica contemplada do ponto de vista macrossocial, porque para o microempresarial pode haver situações de alta rentabilidade, mas que se traduz em impor custos sociais e ecológicos, e assim ele conclui que o que pode parecer muito eficiente no patamar micro, pode ser considerado como socialmente ineficiente. 8.4 A ABORDAGEM DA SUSTENTABILIDADE NO CONTEXTO INTERNACIONAL Os eventos ocorridos nos últimos 20 anos, reunindo nações para discutir os efeitos da ação humana no meio ambiente; relatórios das Nações Unidas divulgando as mudanças ocorridas no planeta; a discussão ampla sobre o aquecimento global, sobre a escassez da água, e a crescente necessidade de busca de energias alternativas, são consequências de uma mudança de pensamento em relação à manutenção de condições mínimas necessárias à sobrevivência humana no planeta. A partir de 1950 surgem as primeiras preocupações com o meio ambiente. Entre as décadas de 50 e 60 o desenvolvimento da agricultura e suas consequências sobre os ecossistemas trouxeram o debate do tema de forma maisacirrada. O entendimento da questão sob um ponto de vista mais completo é apresentado em 1976, com o programa de assentamentos humanos e qualidade ambiental em habitação. A Comissão Mundial sobre Ambiente e Desenvolvimento da ONU, em 1983, levanta a bandeira da defesa do ambiente. A Carta da Terra, produzida durante a Rio 92, desenvolve tratados internacionais sobre como viabilizar a desenvolvimento sustentável. Estes eventos estão relacionados no quadro a seguir. ANO EVENTO MARCO 1972 Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano em Estocolmo. Os limites do crescimento – Criação do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas – UMEP. 1982 Sessão especial do UNEP em Nairóbi. 10 anos após a Conferência de Estocolmo. 1985 Viena. Acordo de Proteção da Camada de Ozônio. TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 163 1987 Relatório Brundtland – "O Nosso Futuro Comum" – Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – WCED. A publicação do relatório Brundtland desencadeou um processo de debate, que levou as Nações Unidas a convocar a "Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD)", no Rio de Janeiro, para junho de 1992. 1992 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – Rio de Janeiro. RIO-92. Plano de ação sobre temas econômicos, sociais e culturais de proteção ao meio ambiente – Agenda 21 e assinado por 150 países. 2002 Declaração de Johanesburgo – Rio +10 Foram assumidos desafios associados ao desenvolvimento sustentável, à promoção dos direitos das mulheres, metas para a erradicação da pobreza, a alteração de padrões de consumo e de produção e a proteção dos recursos naturais. 2012 Rio +20. FONTE: Adaptado de: NOBRE M.; AMAZONAS, M. de C. (Orgs.), 2002 8.5 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL Considerando a ideia central do desenvolvimento sustentável, o Brasil apresenta uma legislação ambiental avançada, se a compararmos com a de muitos outros países. Os conceitos e critérios para o desenvolvimento sustentável, definidos pela Agenda 21, estão presentes em grande parte dos planos de desenvolvimento estratégicos. A legislação ambiental regulamenta as atividades que afetam diretamente as espécies e os ecossistemas. O objetivo é limitar a extração de recursos, a exemplo da caça, pesca ou produtos vegetais (Lei de proteção à fauna, Lei n° 5.197/1967, e Código Florestal, Lei n° 12.651/2012). A implantação do Estatuto das Cidades representa um grande avanço na determinação do tipo de desenvolvimento que se pretende para as cidades brasileiras. O Ministério do Meio Ambiente sinaliza em seus diversos programas a determinação do governo em direcionar, acompanhar e fiscalizar questões ambientais. UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 164 A inclusão de políticas ambientais pode ser observada nos mais diversos setores. A aplicação de recursos federais para a execução de obras públicas, por exemplo, está condicionada ao atendimento de exigências quanto à manutenção do equilíbrio entre o desenvolvimento e o ambiente, conforme padrões estabelecidos na Agenda 21, e legislações pertinentes. Os programas para financiamento do saneamento urbano, programas de habitação popular e até mesmo para agricultura familiar apresentam exigências ambientais a serem cumpridas. Tais exigências são estabelecidas também na liberação de recursos para educação e saúde. Quando analisamos a concepção dos programas destinados ao desenvolvimento do país (ministérios), verificamos que são abordadas as questões do desenvolvimento social e econômico em harmonia com o meio ambiente. Além disto, as necessidades das comunidades locais quanto aos aspectos de saúde, educação, geração de emprego e renda, saneamento básico, também são incluídas nesses projetos. Infelizmente, a força da intervenção político-partidária na liberação destes recursos resulta em muitas irregularidades que são frequentemente divulgadas através da imprensa nacional. Quando a gestão participativa ocorre apenas para cumprir as formalidades legais, deixamos de exercer nossa cidadania, e muitas vezes isto acontece por indiferença ou descrenças nos processos. 9 A AGRICULTURA E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Na agricultura, o conceito de sustentabilidade é a base para a criação de políticas e práticas que levem a um desenvolvimento rural igualitário e seguro ao meio ambiente. A sustentabilidade é dependente da biodiversidade e, neste sentido, na construção de um novo modelo de produção agrícola que não esteja assentado na uniformidade das espécies, populações e ecossistemas (GLIESSMANN, 2001). O desenvolvimento de uma agricultura sustentável é um processo participativo de construção coletiva e democrática. É dinâmico e envolve perspectivas sociais, políticas, econômicas e ecológicas. Esta mudança passa pela interrupção de um processo de produção com intensa utilização de insumos, mecanização agrícola e um “pacote tecnológico” não comprometido com a preservação de recursos naturais e seus efeitos socioculturais (MARCATTO, 2007). TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 165 9.1 A AGRICULTURA MODERNA O modelo de desenvolvimento da agricultura moderna é comprovadamente simplificador sob o aspecto da ecologia. A base econômica é a monocultura, e este modelo tem sido responsável por desequilíbrios ambientais e esgotamento de recursos naturais. Suas consequências vão além e resultam no empobrecimento de pequenos agricultores que foram excluídos do processo de crescimento econômico (CAPORAL; COSTABEBER, 2004). A chamada modernização da agricultura mundial foi baseada nos princípios da intensificação e especialização, e tem como eixos a monocultura e a produção de alimentos. Destacam-se os períodos (MARCATTO, 2007): • 1ª Revolução Agrícola Contemporânea, nos séculos XVIII e XIX, cujo princípio básico foi a intensificação do uso da terra. • 2ª Revolução Agrícola Contemporânea, no final do século XIX e início do século XX – este período caracterizou-se também por profundas modificações na agricultura e um novo padrão de desenvolvimento e sistemas ainda mais intensivos de produção e utilização de recursos externos, passando a depender de máquinas e insumos agrícolas produzidos pela indústria etc. • A “Revolução Verde” caracterizou-se pela adoção de um “pacote tecnológico” envolvendo mecanização agrícola, irrigação, variedades geneticamente modificadas e insumos agrícolas (pesticidas/agrotóxicos), muito exigentes em capital, poupadoras de mão de obra, e altamente dependentes de recursos externos à propriedade. Considerando que 85% das propriedades rurais brasileiras apresentam áreas menores que 100 ha, e grande parte ocupada pela agricultura familiar, com características de produção muito diferentes daquelas exigidas pelas tecnologias da Revolução Verde, a decisão do governo brasileiro em adotar o “pacote tecnológico” aumentou as diferenças sociais no campo e trouxe ainda consequências ambientais, tais como a erosão de solos, contaminação da água por agrotóxicos e adubos químicos, aumento no número de pragas e doenças, destruição de hábitats naturais, erosão genética e aumento da instabilidade econômica e social nas comunidades de agricultores familiares (GLIESSMANN, 2001). UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 166 9.2 AGRICULTURA TRADICIONAL Os sistemas agrícolas tradicionais, aqueles instalados em pequenas propriedades e que não foram tão fortemente influenciados pelo modelo da moderna agricultura, revelam um sistema de produção menos agressivo ao meio ambiente. Uma maior biodiversidade é a característica marcante nos sistemas tradicionais. Apresentam atividades agroflorestais, rotação de culturas, culturas intercalares, a fruticultura e criação de animais. Todas essas atividades reunidas fortalecem a ideia de uma agricultura multifuncional. Manejar sistemas agrícolas do ponto de vista da conservação da biodiversidade, assim como de uma produção204 4 ELABORAÇÃO DO PLANO DE MANEJO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO ..... 206 5 AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DO MANEJO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO .... 212 5.1 MÉTODO RAPPAM (RAPID ASSESSMENT AND PRIORIZATION FOR PROTECTED AREAS MANAGEMENT) OU METODOLOGIA DE AVALIAÇÃO RÁPIDA E PRIORIZAÇÃO DO MANEJO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ................................... 213 5.2 O ESTABELECIMENTO DO CONSELHO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO ...... 215 6 O USO PÚBLICO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ........................................................... 217 7 ACORDOS DE GESTÃO .................................................................................................................... 219 8 CONCESSÃO DE FLORESTAS PÚBLICAS ................................................................................... 219 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 221 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 222 TÓPICO 4 - GESTÃO TERRITORIAL PARA A CONSERVAÇÃO .............................................. 223 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 223 2 CORREDORES ECOLÓGICOS ......................................................................................................... 223 3 MOSAICOS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ..................................................................... 224 4 RESERVAS DA BIOSFERA ................................................................................................................ 226 RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 228 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 229 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 231 1 UNIDADE 1 VIDA E AMBIENTE FÍSICO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS Esta unidade tem por objetivos: • definir e compreender conceitos básicos de ecologia; • relacionar fatores que influenciam o ambiente físico; • identificar correlação entre clima e biomas; • identificar correlação entre meio físico e disponibilidade de recursos. A Unidade 1 está dividida em quatro tópicos, cujas atividades, no final de cada um deles, reforçarão o seu aprendizado. TÓPICO 1 – ECOLOGIA BÁSICA TÓPICO 2 – AMBIENTE FÍSICO TÓPICO 3 – BIOMAS TÓPICO 4 – MEIO FÍSICO E A DISPONIBILIDADE DE RECURSOS Assista ao vídeo desta unidade. 2 3 • Phillipson (1969): “o estudo das inter-relações, entre o vivo e o seu ambiente físico, e com todos os outros organismos que vivem nesse ambiente”; • Odum (1977): o “estudo da estruturação e funcionalidade da natureza”; • Dajoz (1978): a “ciência que estuda as condições em que os seres vivos existem e suas interações, com o seu meio”; • Pianka (1983): o “estudo das relações entre os seres vivos os fatores físicos e biológicos, que os atingem, ou são afetados por eles, direta ou indiretamente”; TÓPICO 1 UNIDADE 1 ECOLOGIA BÁSICA 1 INTRODUÇÃO Caro(a) acadêmico(a)! Você, provavelmente, já deve ter ouvido falar em ecologia e já deve ter uma noção sobre o tema. O significado da palavra ecologia originou do grego oikos (casa) e logos (estudo), e têm como significado literal “estudo da casa”. Ecologia é a ciência que estuda a relação entre os seres vivos e os demais componentes do ambiente, ou seja, o estudo do ambiente, com seus fatores físicos, químicos e biológicos que afetam os organismos. A ecologia também pode ser definida, segundo os autores a seguir: FONTE: Adaptado de: . Acesso em: 31 maio 2013. • Lopes e Rosso (2005): a “Ecologia é uma área da biologia que se preocupa em estudar as relações entre os seres vivos e entre eles e o meio ambiente em que vivem.” Pelo fato da ecologia procurar explicar fenômenos ambientais complexos, apoia-se em outras ciências como a Química, Física, Climatologia, Geografia, Economia, Oceanografia, Geologia, Antropologia, Sociologia, Psicologia, e outros ramos da Biologia como Botânica, Fisiologia, Zoologia, etc. A Ecologia como ciência é muito recente comparada à Física e à Química, consideradas ciências mais precisas. O seu entendimento quanto à estrutura e funcionamento dos ecossistemas necessita de comprovação e investigação frente às várias hipóteses, o que demanda ainda muitos estudos. Um exemplo desta problemática é a “teoria da seleção natural”, descrita inicialmente por Charles UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 4 Darwin (1809-1882) e Alfred Wallace (1823-1913) e amplamente difundida através da obra “A origem das espécies pela seleção natural”, escrita por Darwin em 1859 (PIANKA, 1983). 2 HISTÓRIA DA ECOLOGIA Apesar de o pesquisador alemão Ernst Haeckel (Figura a seguir) ter sido o primeiro a empregar a palavra ecologia, no ano de 1866, outros pesquisadores contribuíram no desenvolvimento desta ciência. FIGURA 1 – BIÓLOGO ALEMÃO ERNST HAECKEL, PRIMEIRO CIENTISTA A EMPREGAR O TERMO ECOLOGIA, NO ANO DE 1866 FONTE: Disponível em: . Acesso em: 3 mar. 2013. Essa contribuição ocorreu através de estudos das cadeias alimentares e regulação de populações por Anton Van Leeuwenhoek e sobre a produtividade biológica com Richard Bradley, no século XVIII e XIX. Ainda, Charles Darwin em 1859 já considerava as inter-relações dos organismos, mesmo não tendo conhecimento mais profundo sobre a questão ecológica desta ciência. Já na segunda metade do século XIX, estudando a função comparada entre animais e vegetais, Forbes (1887) dividiu a ecologia em Ecologia Animal e Ecologia Vegetal. Möbius (1877), por sua vez, abordou os ambientes aquáticos marinhos, originando a ecologia dos oceanos. Para melhor explicar a função e a estrutura dos ecossistemas, a ecologia contou com o surgimento da Termodinâmica, da Estatística e da Cibernética possibilitando o surgimento da Ecologia Humana. Através da observação do papel do homem no meio por Odum (1959) e sob a ênfase da subsistência e da evolução http://www.crv.educacao.mg.gov.br TÓPICO 1 | ECOLOGIA BÁSICA 5 das populações humanas no meio, por König (1967) e Wallner (1972), foi possível considerar a relação dependente entre meio ambiente e o homem (socioeconomia e antropoecologia). Além disso, os estudos ecológicos foram subdivididos sob os seguintes enfoques: indivíduo e ambiente (autoecologia); população e ambiente (demoecologia); comunidade e ambiente (sinecologia). Mas foi no século XX, que a ecologia foi reconhecida como um campo distinto da biologia e como ciência, através de uma teoria unificada baseada em estudos que produziram os conceitos: comunidades bióticas por F. E. Clements e V. E. Shelford, e cadeia alimentar e ciclagem de matéria por R. Linderman e G. E. Hutchinson (ODUM, 1988). Atualmente, é frequente a confusão entre os termos Ecologia Humana e Ecologia e Meio Ambiente pelo fato do termo ecologia ser referido também como o estudo dos problemas ambientais causados pelas sociedades humanas, que na verdade abrange apenas o homem. Porém, é denominado Ecologia Humana o estudo focando o homem como um organismo, uma espécie animal e suas relações com o meio. Por outro lado, a questão ambiental, em nível global, vem tomando maior destaque desde o final da década de 60 e 70, devido às crescentes alterações ambientais causadas pela sociedade moderna. Nesse contexto é possível verificar que meio ambiente não é sinônimo de ecologia, mas uma área de ação dentro da ecologia que integra problemas ambientais. O manejo de ecossistemas sesustentável, pode incrementar a capacidade de uso múltiplo da agricultura, provendo benefícios tais como o aumento da produção, a estabilidade do sistema, um eficiente manejo de pragas e doenças e conservação do solo (LIMA; WILKINSON, 2002). Atualmente, a combinação de atividades agrícolas e não agrícolas representa a possibilidade de complementação de renda de famílias rurais. Conhecemos também propriedades que são utilizadas para o turismo rural. Somando-se a atividade de turismo encontramos uma diversidade de produtos regionais cuja comercialização proporciona um maior rendimento total da propriedade. Este processo é conhecido por pluriatividade e pode ser aplicado de forma criativa no desenvolvimento rural sustentável. 9.3 AGRICULTURA SUSTENTÁVEL Na agricultura o conceito de sustentabilidade é a base para a criação de políticas e práticas que levem a um desenvolvimento rural igualitário e seguro ao meio ambiente. Pode abrigar diferentes concepções políticas e propostas de desenvolvimento. A “Agricultura Sustentável pode ser definida como uma agricultura ecologicamente equilibrada, economicamente viável, socialmente justa, humana e adaptativa”. (REIJNTJES et al., 1992 apud MARCATTO, 2007, p. 6). Neste sentido, a sustentabilidade depende da diversidade cultural e biológica e implica a construção de um novo modelo de produção que não se assente na uniformidade cultural e biológica. O processo de desenvolvimento de uma agricultura mais sustentável exige a participação de um grande número de atores envolvidos em um processo de aprendizado constante. Um processo de construção coletiva e democrática, com a participação ativa de agricultores, pesquisadores, professores, extensionistas, políticos e consumidores, por exemplo. TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 167 Certamente não há um “pacote” a ser aplicado, pois a realidade é dinâmica para permitir a existência de uma receita para a sustentabilidade. Existem tecnologias de baixo custo e baixo uso de insumos que são promissoras e provavelmente serão importantes no processo de desenvolvimento da agricultura sustentável. As tecnologias da agricultura sustentável devem ser específicas para cada sistema e cujas alternativas sejam geradas pelas partes envolvidas e alicerçadas nas condições e potencialidades locais. Portanto, o desenvolvimento de uma agricultura sustentável deve ser visto como um processo complexo e dinâmico e que envolva as perspectivas sociais, políticas, econômicas, culturais e ecológicas. • AGROECOLOGIA A agroecologia apresenta princípios aplicáveis aos sistemas agrícolas que asseguram a sustentabilidade econômica, ecológica, social, cultural, política e ética e como resultado promove transformações significativas para o desenvolvimento rural sustentável. Apresentamos a seguir alguns conceitos sobre a agroecologia elaborados por pesquisadores reconhecidos internacionalmente. É a ciência ou a disciplina científica que apresenta uma série de princípios, conceitos e metodologias para estudar, analisar, dirigir, desenhar e avaliar agroecossistemas, com o propósito de permitir a implantação e o desenvolvimento de estilos de agricultura com maiores níveis de sustentabilidade. A agroecologia proporciona então as bases científicas para apoiar o processo de transição para uma agricultura “sustentável” nas suas diversas manifestações e/ou denominações. FONTE: Disponível em: . Acesso em: 27 mar. 2013. Agroecologia caracteriza-se pela desconstrução das formas de produção que causam degradação social e ecológica e da sua construção ou reconstrução, dentro do paradigma da sustentabilidade: Portanto, a Agroecologia nos traz a ideia e a expectativa de uma nova agricultura, capaz de fazer bem aos homens e ao meio ambiente como um todo, afastando-nos da orientação dominante de uma agricultura intensiva em capital, energia e recursos naturais não renováveis, agressiva ao meio ambiente, excludente do ponto de vista social e causadora de dependência econômica. (GLIESSMANN, 2001, p. 142). Segundo Caporal e Costabeber (2004, p. 13): UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 168 FIGURA 64 – CICLO CONSTRUTIVO DA AGROECOLOGIA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 23 mar. 2013. A Agroecologia tem sido reafirmada como uma ciência ou disciplina científica, ou seja, um campo de conhecimento de caráter multidisciplinar que apresenta uma série de princípios, conceitos e metodologias que nos permitem estudar, analisar, dirigir, desenhar e avaliar agroecossistemas. Os agroecossistemas são considerados como unidades fundamentais para o estudo e planejamento das intervenções humanas em prol do desenvolvimento rural sustentável. Nestas unidades geográficas e socioculturais é que ocorrem os ciclos minerais, as transformações energéticas, os processos biológicos e as relações socioeconômicas, constituindo o lócus onde se pode buscar uma análise sistêmica e holística do conjunto destas relações e transformações. Em essência, o Enfoque Agroecológico corresponde à aplicação de conceitos e princípios da Ecologia, da Agronomia, da Sociologia, da Antropologia, da Ciência da Comunicação, da Economia Ecológica e de tantas outras áreas do conhecimento, no redesenho e no manejo de agroecossistemas que queremos que sejam mais sustentáveis através do tempo. A figura a seguir apresenta o ciclo construtivo da agroecologia. Este ciclo refere-se à evolução do processo produtivo envolvendo as dimensões da sustentabilidade, onde podemos observar a conservação dos recursos naturais, o envolvimento social e político e o efetivo desenvolvimento. TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 169 O processo de transição para uma produção agroecológica pode ser gradual e gerar transformação das bases produtivas da agricultura. Vimos que apresenta característica multidisciplinar e, por outro lado, recebe influências do saber popular como fonte de estudo para o conhecimento científico. Outras possibilidades de adoção de processos intermediários com redução dos impactos negativos sobre o meio ambiente são possíveis. Mesmo em áreas destinadas ao monocultivo pode haver a adoção de práticas que reduzam os impactos ambientais negativos da uniformização. Uma agricultura de base ecológica simplificada pode ajudar na redução desses impactos e mesmo na participação em mercados de nicho, onde a substituição de agroquímicos e fertilizantes sintéticos é suficiente (EMBRAPA, 2006). • EMBRAPA – UM MARCO REFERENCIAL EM AGROECOLOGIA A Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – é o principal agente de disseminação de tecnologias para o campo no Brasil. Em seu documento Marco Referencial em Agroecologia, a empresa apresenta informações importantes com o objetivo de consolidar a institucionalização do conceito de agroecologia, visando cumprir sua missão de viabilizar soluções para o desenvolvimento sustentável no espaço rural. Os conceitos apresentados foram inspirados no próprio funcionamento dos ecossistemas naturais, no manejo tradicional e indígena dos agroecossistemas e no conhecimento científico. Neste documento são apresentados dados da agricultura no Brasil que nos levam à reflexão sobre o modelo produtivo até então adotado pelo país. Aproximadamente 37% dos produtos exportados são oriundos da agropecuária. Apesar da importante geração de divisas e equilíbrio da balança comercial, o aumento das exportações tem sido acompanhado de impactos sobre os ecossistemas e populações rurais. A redução das áreas naturais dos Campos Sulinos, da Mata Atlântica e Cerrados e, mais recentemente, a entrada da fronteira agrícola na Amazônia Legal são exemplos dos riscos inerentes deste setor e da necessidade urgente de se estabelecer novas abordagens desta realidade. Neste sentido, a agroecologiase propõe a desenhar e manejar agroecossistemas sustentáveis e construir estratégias de desenvolvimento rural sustentável englobando as dimensões ecológicas, sociais, culturais e econômicas. Pode-se afirmar ainda que a agroecologia serve à sociedade como um todo, às gerações atuais e futuras, aos atores do mundo rural e urbano. (EMBRAPA, 2006). Produzir, comercializar e consumir alimentos são atividades com profundo conteúdo ético e político que dizem respeito não apenas aos agricultores, mas a todos. É uma questão para toda a sociedade, com sérias implicações para as gerações futuras. UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 170 Ao encontro desse conceito, a Embrapa pretende trabalhar passos da Transição Agroecológica em todos os setores produtivos, tendo como público preferencial para a Agroecologia os agricultores familiares, os assentados da reforma agrária, as populações tradicionais, as comunidades indígenas e as comunidades afrodescendentes, além dos consumidores rurais e urbanos. 9.4 AGRICULTURA FAMILIAR A inclusão do tema agricultura familiar neste tópico se deve ao fato de que esta é uma atividade essencial ao desenvolvimento sustentável no ambiente rural e até mesmo urbano, nos chamados “cinturões verdes” das grandes cidades. Em geral, são pequenos agricultores que conseguem desenvolver sistemas complexos com adaptações locais, sustentabilidade e satisfação de necessidades, sem depender obrigatoriamente de mecanização ou tecnologias modernas. Esta sustentabilidade é explicada por apresentar características que lhes são peculiares: são pequenas áreas, com alta diversidade, uso de recursos locais e menor dependência de insumos externos. Podem apresentar elevados rendimentos, considerando a produtividade total, onde há reciclagem de materiais e nutrientes em processos ecológicos naturais e apresentam um cultivo diversificado e alta variabilidade genética (LIMA; WILKINSON, 2002). A agricultura familiar, por suas características produtivas, apresenta melhores possibilidades para a adoção de sistemas de produção com bases ecológicas. As exigências alimentares e econômicas das famílias resultam no cultivo de um número maior de espécies numa mesma área e incluem ainda a criação de animais. Convém esclarecer que existem casos de maiores desequilíbrios em menores propriedades. Entretanto, esta questão parece estar relacionada com a falta de acesso à terra, empobrecimento de pequenos agricultores, falta de acesso ao crédito e assistência técnica. Dessa forma, o conjunto de instrumentos de política pública, que envolve desde a reforma agrária até o crédito, a extensão rural e a educação do campo, é essencial para garantir que os agricultores familiares ampliem suas potencialidades na realização de suas funções de preservação ambiental. Muitas pessoas das grandes cidades estão resgatando hábitos de vida mais saudáveis e isso inclui o uso de alimentos sem agrotóxicos, produzidos de forma artesanal e matéria-prima com menor processamento industrial. Isto representa a criação de um nicho de mercado. Apesar das dificuldades no campo, a agricultura familiar é uma das maiores geradoras de trabalho no meio rural, pois também promove melhoria social no campo, além de ter a vocação de produzir e consumir o que faz. Assim, a agricultura TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 171 familiar é responsável pela busca de um novo paradigma de desenvolvimento que é um componente cultural do modo de vida rural. 9.5 POLÍTICAS PÚBLICAS As atuais políticas públicas de desenvolvimento territorial sustentável estão baseadas em princípios estabelecidos por recomendações internacionais, entre elas as metas para o novo milênio da ECO-92 representadas pelas orientações da Agenda 21 e que têm por objetivo a redução da pobreza, combater a exclusão social e diminuir as desigualdades sociais e regionais (BEZERRA; MUNHOZ, 2000). As iniciativas visam o desenvolvimento rural sustentável e passam pela reforma agrária, formação de profissionais, assistência técnica e o Plano Nacional de transição agroecológica. No Ministério do Desenvolvimento da Agricultura, a Secretaria para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar estabelece diretrizes para o fortalecimento da agricultura familiar. A liberação de crédito, através do PRONAF, foi fator determinante para que a agricultura familiar representasse, em 2003, 10,1% do PIB, segundo dados do FIPE. Contraditoriamente, o maior volume de recursos do crédito agrícola é aplicado em monoculturas que representam a produção de grãos responsáveis pelo equilíbrio da balança comercial. O agronegócio ainda é o objetivo-fim das políticas públicas, apesar da existência de programas específicos para o desenvolvimento sustentável. Estão previstos também o apoio técnico e financeiro para implantação, ampliação, modernização e racionalização da infraestrutura necessária ao fortalecimento da agricultura familiar, mediante a realização de obras públicas. O programa de Zoneamento Ecológico-Econômico – ZEE tem sido uma proposta do governo brasileiro para subsidiar as decisões de planejamento social, econômico e ambiental do desenvolvimento e do uso do território nacional em bases sustentáveis (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO, 2012). UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 172 AGROECOLOGIA: A DINÂMICA PRODUTIVA DA AGRICULTURA SUSTENTÁVEL Miguel Altieri O pesquisador Miguel Altieri é um estudioso renomado do tema agricultura multifuncional. A leitura a seguir oferece informações complementares e também conclusivas sobre o desenvolvimento sustentável no meio rural. Você terá a oportunidade de verificar que existem estratégias de controle de populações que podem ser aplicadas no manejo da produção agrícola e poderá relacionar seus conhecimentos de ecologia com as possibilidades de aplicações práticas na agricultura. Em seus trabalhos, Altieri apresenta uma definição para a agricultura multifuncional como sendo aquela que, além da produção de alimentos e fibras, produz uma quantidade de bens públicos para a sociedade, incluindo a segurança alimentar, o equilíbrio ecológico, a redução de efeitos ambientais negativos, preservação da terra, funções econômicas múltiplas, função social e valores culturais. Segundo o autor, os sistemas tradicionais de produção multifuncional são responsáveis por cerca de 20% da produção de alimentos do mundo. Ele apresenta exemplos na América Latina de áreas cultivadas por indígenas cujas características de produção têm apresentado rendimentos sustentáveis. São agroecossistemas que asseguram fontes diversas de alimentos, produção estável, riscos mínimos e uso eficiente dos recursos da terra. Estes enfoques representam estratégias de uso múltiplo que incrementam a multifuncionalidade da agricultura. Estas interações positivas são encontradas também na América Central. A preservação de bosques representa manutenção de espécies importantes para o comércio e ainda constituem barreira natural para os cultivos atuando contra a disseminação de doenças e pragas. Manejar paisagens agrícolas do ponto de vista de conservação da biodiversidade, assim como também da produção sustentável, pode incrementar a capacidade de uso múltiplo da agricultura, provendo assim vários benefícios de forma simultânea: • Aumento da produtividade agrícola. • Melhor manejo de pragas e doenças. • Conservação e aumento da fertilidade do solo. Por outro lado, agrega valor econômico aos produtos, reduz riscos às comunidades, aumenta a eficiência do uso dos recursos locais, reduz a pressão LEITURA COMPLEMENTAR TÓPICO 1 | BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO 173 da agricultura sobre áreas frágeis, diminui a dependência de insumos externos e aumenta o valor nutritivo da produção. Em agroecossistemas simplificados, a ocorrência de pragas é mais evidente. A redução da diversidade cria instabilidade e surgem problemas com insetos e pragas, vinculados à expansão de monoculturas.Onde a vegetação nativa é mantida ao redor de áreas cultivadas e em associação com outras culturas, o manejo de pragas e o controle populacional de insetos são obtidos pela manutenção ou aumento da biodiversidade. Nestes casos verificam-se o controle biológico, a presença de plantas hospedeiras e especialmente inimigos naturais. No Chile, algumas experiências foram relevantes. Foram utilizadas práticas de conservação de solo para controlar a erosão e restaurar a fertilidade de solos degradados. Técnicas de plantio em linhas de contorno, respeitando a declividade do terreno, o uso de um sistema adequado de drenagem, métodos orgânicos de fertilização e culturas intercalares com leguminosas fixadoras de nitrogênio e adubação verde. Estas práticas levaram a um aumento em até três vezes da produção de grãos por hectare. Este aumento de produção provocou mudanças econômicas e sociais na comunidade local. No Brasil existem algumas iniciativas agroecológicas. A Epagri, junto com agricultores de Santa Catarina, implantou tecnologias para conservação do solo e microbacias com a utilização de adubação verde e barreiras físicas. Estão utilizando mais de 60 espécies de plantas para cobertura do solo. Como resultado, os solos já apresentam coloração mais escura, mais úmidos e maior atividade biológica. Este trabalho evidencia a importância da manutenção da cobertura do solo para prevenir a erosão e com custo reduzido, no caso, apenas compra de sementes. No cerrado, onde a soja é monocultura dominante, os problemas associados ao manejo inadequado do solo se fazem mais evidentes. A adoção da rotação de cultura milho-soja tem aumentado os rendimentos, diminuído a erosão do solo e os problemas de pragas típicos que afetam o monocultivo da soja. Sistemas integrados de produção em Cuba, junto à Associação Cubana de Agricultura Orgânica (ACAO), tiveram o papel de promover módulos de produção alternativa, mediante o uso integrado de práticas e tecnologias de manejo agrícola. Cada componente de cultivo reforça biologicamente os outros componentes. Reflorestamentos, rotação de culturas, culturas intercaladas, adubação verde são práticas que estão conduzindo a um aumento de produção e biodiversidade e, ainda, melhorias na qualidade do solo, especialmente o conteúdo de matéria orgânica. A agroecologia estimulou várias organizações não governamentais e outras instituições na busca de estratégias agrícolas de gestão de recursos para melhorar a produtividade de pequenas propriedades. Há vários exemplos de produtores rurais adotando projetos de desenvolvimento que incorporam o conhecimento UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 174 moderno e a ciência agrícola tradicional com a implantação de sistemas como policultivos, sistemas agroflorestais, culturas consorciadas etc. O CET – Centro de Educação e Tecnologia no Chile tem um programa de desenvolvimento destinado a atender aos pequenos agricultores, ajudando a alcançarem a autossuficiência alimentar durante o ano todo e a reconstruir a capacidade produtiva de suas pequenas fazendas. O enfoque é incluir a rotação espacial e sequencial de culturas, forragens, verduras, árvores frutíferas e florestais e ainda a criação de pequenos animais domésticos. Os componentes são escolhidos conforme as contribuições nutritivas dos cultivos, sua adaptação, as condições climáticas locais, hábitos e consumo e também oportunidade de mercado. Outra contribuição importante foi conseguir recuperar e manter a diversidade genética de tipos silvestres de batatas. As pesquisas conduzidas na América Latina sugerem que os sistemas de produção em pequena escala são sustentavelmente produtivos, biologicamente regenerativos e energeticamente eficientes e tendem a melhorar a qualidade, participação e a ser socialmente justos. São práticas que provocam degradação mínima dos solos e mantêm a diversidade genética. Manejam um sistema de uso múltiplo natural, obtendo variedade de produtos. Esta dimensão multifuncional é traduzida em produção, benefícios ambientais econômicos e socioculturais, o que ressalta o papel da agricultura familiar como ponta de lança em uma estratégia de desenvolvimento rural sustentável. A ideia é destacar o valor da agricultura tradicional para a conservação da agrobiodiversidade, já que este modo de apropriação da natureza melhora a multifuncionalidade da agricultura. O desafio está em elevar a produtividade em sistemas agroecológicos, fazer uma transição com bases científicas, ter disponível uma rede de referências, profissionais capacitados e um programa adequado para as especificidades locais. FONTE: Adaptado de ALTIERI, Miguel. Agroecologia: a dinâmica produtiva da agricultura sustentável. 4. ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004. 175 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, vimos que: • A biologia da conservação é uma ciência indispensável quando se visa conservar a biodiversidade mundial. • A biodiversidade ou diversidade biológica é muito mais do que simplesmente o número de espécies existentes. Ela envolve ainda a diversidade genética e ecológica. • As principais ameaças à biodiversidade são resultado das atividades humanas, sendo que se pode destacar a perda de habitat como um dos mais severos impactos. • A conservação e a preservação são diferentes estratégias utilizadas na busca pela manutenção da biodiversidade mundial. • A conservação pode ser feita basicamente de duas formas: no próprio ambiente natural da espécie (conservação in situ) ou, quando isso não é possível, em outros lugares que buscam reproduzir o ambiente natural (conservação ex situ). • Atualmente tem-se utilizado da estratégia da valoração econômica da biodiversidade para tentar sensibilizar a humanidade da sua importância. • Frente a todo o panorama conhecido, busca-se atualmente a modificação de pensamento e atitudes frente ao meio ambiente, visando ao desenvolvimento sustentável. 176 AUTOATIVIDADE 1 Atualmente, a ciência ecologia tem se preocupado com outras questões além de conhecer os padrões e processos ecológicos naturais. Isso se deve à verificação de que talvez não dê tempo de conhecê-los antes que o ser humano degrade o nosso planeta ao ponto deles deixarem de acontecer. Essa área de estudo é conhecida como biologia da conservação. Dentro dessa área temos os conceitos de preservação e conservação. Busque um exemplo para cada um deles. 2 Conforme vimos ao longo do tópico, a conservação da biodiversidade pode ser realizada através dos métodos in situ e ex situ. Qual é a diferença entre esses dois métodos? 3 Cada vez mais se tem buscado estabelecer uma forma de desenvolvimento da sociedade que degrade o menos possível a biodiversidade mundial. A essa busca dá-se o nome de desenvolvimento sustentável. O que é necessário para se alcançar esse modelo de desenvolvimento? Assista ao vídeo de resolução da questão 2 177 TÓPICO 2 CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Vimos até aqui a importância da biodiversidade para a manutenção dos padrões e processos ecológicos naturais; as pressões cada vez mais intensas que têm extinguido ou colocado sob risco de extinção muitas espécies; e os esforços que têm sido feitos para avaliar a verdadeira riqueza de espécies existentes em nosso planeta e a mais eficaz e rápida forma de frear/impedir o ritmo atual de avanço dos ambientes urbanos sobre os ambientes naturais. Infelizmente, a proteção real e formal da biodiversidade só foi conseguida até o momento para cerca de 5% da Terra. Isso ocorre em grande parte porque a biodiversidade tende a se concentrar em terras férteis de planície, onde as pessoas relutam em destinar ao uso de outras espécies (TERBORGH et al., 2002). A obrigação moral de dividir o planeta com as outras formas de vida tem sido reconhecida por no mínimo 80% dos governos do mundo através da criação de áreas protegidas legalmente constituídas, em grande parte onde a presença humana não é permitida.Entre os motivos está o fato de que estudos têm demonstrado que os seres humanos, mesmo em pequeno número, são incompatíveis com a persistência de mega-herbívoros e carnívoros de topo de cadeia, dois grupos de animais que estão entre os mais cruciais para a manutenção do funcionamento normal dos ecossistemas. Quando essas espécies estão ausentes, a extinção em cascata ocorre, resultando na aceleração de extinções e em colapso do ecossistema, conduzindo-o para um estado mais simples e empobrecido. De fato, em muitos países os parques e outras áreas protegidas são tudo o que sobrou dos habitats naturais e da fauna nativa (TERBORGH et al., 2002). Assim, Terborgh et al. (2002) comentam que os esforços para conservar a biodiversidade enfrentam dois desafios principais que consistem em destinar mais áreas para a proteção da biodiversidade; e proteger adequadamente as terras dedicadas à conservação da biodiversidade de um conjunto de forças destrutivas, algumas ilegais, mas muitas legais. Sendo assim, nosso intuito a partir de agora é discorrer sobre as diferentes formas que têm sido propostas para conservar a biodiversidade utilizando como aliado o arcabouço jurídico. Discutiremos, portanto, as diferentes terminologias utilizadas, as diferentes categorias propostas e as formas como a relação entre o 178 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO homem e os outros seres vivos são entendidas pelos defensores dessas diferentes alternativas. Vamos lá? 2 DEFININDO CONCEITOS Antes de iniciarmos a nossa discussão propriamente dita, precisamos elucidar e diferenciar três conceitos que são amplamente utilizados como sinônimo, mas que possuem significados distintos: os espaços territoriais especialmente protegidos; as áreas protegidas; e as unidades de conservação. O termo espaços territoriais especialmente protegidos é citado na Constituição Federal de 1988, onde, ao longo da sua redação, consta que é dever da União “definir espaços territoriais a serem especialmente prote gidos, de alteração e supressão permitidas somente por meio de lei” (PEREIRA e SCARDUA, 2008, p. 15). Pereira e Scardua (2008, p. 17), utilizando diversos autores que tratam sobre essa temática, chegam ao conceito de que os espaços territoriais especialmente protegidos são “espaços, públicos ou privados, criados pelo poder público e que conferem proteção especial ao meio ambiente, tomado este em sua acepção mais ampla, de modo a incluir o aspecto cultural do meio ambiente”. Utilizando esse conceito, podem ser considerados nesse contexto: 1) as unidades de conservação; 2) as áreas destinadas às comunidades tradi cionais, quais sejam, as terras indígenas e os territórios quilombolas; 3) as áreas tombadas; 4) os monumentos arqueológicos e pré-históricos; 5) as áreas especiais e locais de interesse turístico, destinados à prática do ecoturismo; 6) as reservas da biosfera; 7) os corredores ecológicos; 8) as zonas de amortecimento; 9) os espaços protegidos constitucionalmente como patrimônio nacional, a Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, a Zona Costeira e o Pantanal Mato-grossense; 10) as áreas de proteção especial, destinadas à gestão ambiental urbana; 11) os jardins botânicos; 12) os hortos florestais; 13) os jardins zoológicos; 14) as terras devolutas e arrecadadas, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais; 15) as áreas de preservação permanente e as reservas legais, previstas no Código Florestal; e, por fim, 16) os megaespaços ambientais, protegidos também pelas seguintes normas internacionais: a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, o Tratado da Bacia do Prata, o Tratado de Cooperação Amazônica, a Convenção Relativa a Zonas Úmidas de Importância Internacional e a Convenção Relativa à Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural (PEREIRA, 2006 apud PEREIRA e SCARDUA, 2008). Já a expressão áreas protegidas é citada no artigo 2º da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), significando “uma área definida geograficamente que é destinada, ou regulamentada, e adminis trada para alcançar objetivos específicos de conservação”. Ainda, nessa mesma convenção fica definido que, apesar da finalidade de conservação para as áreas protegidas, não é necessário que elas tenham sido criadas com esse intuito para serem tratadas como tal. TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 179 Como exemplo, podem ser citadas as áreas de preservação permanente (APP) e as reservas legais (RL) (PEREIRA e SCARDUA, 2008). Seguindo o discutido durante a CDB, o Ministério do Meio Ambiente, em 2006, elaborou o Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas (PNAP), definindo que os seguintes espaços territoriais especial mente protegidos deveriam integrar as áreas protegidas, em cumprimento à CDB: áreas terrestres e marinhas do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (veja conceito a seguir), as terras indígenas, os territórios quilombolas, as áreas de preservação permanente e as reservas legais, essas duas últimas possuindo a função estratégica de conectividade entre fragmentos naturais e as próprias áreas protegidas (BRASIL, 2006 apud PEREIRA e SCARDUA, 2008). Por fim, são consideradas unidades de conservação as áreas constantes no Sistema Nacional de Unidades de Conservação, a Lei do SNUC, criada em 2000. Segundo essa legislação, uma unidade de conservação é o espaço territorial e seus recursos ambien tais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo poder público com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (BRASIL, 2000). Para tentar elucidar melhor o descrito acima, vejamos a representação esquemática de Espaços Territoriais Especialmente Protegidos (ETEP), Áreas Protegidas (AP) e Unidades de Conservação (UC). FIGURA 65 – ÁREAS PROTEGIDAS FONTE: Adaptado de: Pereira e Scardua (2008) 180 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Dessa forma, poderíamos dizer que os espaços territoriais especialmente protegidos são todas as áreas criadas pelo poder público e que conferem proteção especial ao meio ambiente, mesmo aquelas não protegidas por lei específica. Já as áreas protegidas englobam aquelas em que há uma legislação que regulamenta o seu uso e, por fim, as unidades de conservação são aquelas contidas na lei do SNUC. Sendo assim, toda unidade de conservação é considerada uma área protegida, mas nem toda área protegida é uma unidade de conservação. O mesmo se aplica relação às áreas protegidas e os espaços territoriais especialmente protegidos. Toda área protegida é considerada um espaço territorial especialmente protegido, mas nem todo o espaço territorial especialmente protegido é uma área protegida. Apesar da diferenciação dada aqui em nosso caderno, o uso dos conceitos discutidos ainda é bastante confuso. Alguns autores ignoram a existência do termo espaços territoriais especialmente protegidos e diferenciam apenas as áreas protegidas e as unidades de conservação. Outros utilizam o termo área protegida como sinônimo de unidade de conservação. O uso correto da nomenclatura está em constante debate no campo do direito ambiental e não apresenta sinais de logo acabar. Aqui apresentamos essa diferenciação para que você perceba e preste atenção sempre que esses termos forem utilizados na literatura, pois dois trabalhos podem utilizar um mesmo termo para se referir a diferentes conceitos. 3 ESTABELECIMENTO DE ÁREAS PROTEGIDAS Para efeitos desse caderno consideraremos como áreas protegidas as reservas da Biosfera, as áreas de preservação permanente (APP), as reservas legais (RL), as unidades de conservação (UC), os corredores ecológicos e os mosaicos de unidades de conservação. No entanto, como as unidades de conservação, as reservas da biosfera e os corredores ecológicos estão previstos em uma legislação à parte (Lei nº 9.985/2000), os discutiremosem um próximo momento, focando primeiramente as áreas de preservação permanente (APP) e as reservas legais (RL). Ao falarmos sobre essas duas categorias de áreas protegidas é indispensável lançar um olhar sobre o novo Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012), visto que a partir da sua publicação houve mudança de conceitos e de abrangência. Assim, no decorrer de nossas explicações faremos menção constante a essa lei. NOTA TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 181 3.1 ÁREAS DE PROTEÇÃO PERMANENTE – APP As áreas de preservação permanente são originalmente áreas naturais intocáveis, com rígidos limites de exploração, onde não é permitida a exploração econômica direta. No entanto, os órgãos ambientais podem autorizar o uso e até o desmatamento de área de preservação permanente rural ou urbana, desde que comprovem as hipóteses de utilidade pública, interesse social do empreendimento ou baixo impacto ambiental. De acordo com o Código Florestal vigente (Lei nº 12.651/12), é considerada área de proteção permanente a área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. (Art. 2º) Especificamente, para as áreas a serem protegidas sob essa categoria de proteção e que se encontram às margens dos cursos d’água, as conhecidas matas ciliares, o Código Florestal determina o seguinte: Áreas de Proteção Permanente em cursos d'água Rios com menos de 10 m 30 m Rios entre 10 m e 50 m 50 m Rios entre 50 m e 200 m 100 m Rios entre 200 m e 600 m 200 m Rios com 600 m ou mais 500 m Nascentes e olhos d'água raio de 500 m Lagos e lagoas naturais em zona urbana 30 m Lagos e lagoas naturais em zona rural 100 m, exceto para corpos d´água com até 20 ha, cujas faixas serão de 50 m Reservatórios artificiais Faixa definida na licença do empreendimento, exceto em casos que não decorram de barramento ou represamento Manguezais Protegidos em toda a sua extensão Restingas Protegidas 182 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Entre as mudanças introduzidas pelo Código atual, com relação a esse tipo particular de APP, está a de que, embora tenham sido mantidas as mesmas distâncias do Código revogado (Lei 4.771/1965), ele inicia a medida a partir da calha regular (isto é, o canal por onde correm regularmente as águas do curso d'água durante o ano) dos rios e não mais a partir do leito maior (a largura do rio ao considerar o seu nível mais alto, isto é, o nível alcançado por ocasião da cheia sazonal). Isto significou uma efetiva redução dos limites das APPs às margens de cursos d'água, uma vez que a nova medida ignora as épocas de cheias dos rios. Dado que o regime fluvial varia ao longo do ano, a calha será menor nos meses secos que nos meses chuvosos (SITE OECO, 2013). Perceba na figura a seguir o infográfico demonstrando a diferença entre a área a ser preservada de acordo com o Código Florestal vetado e o novo Código Florestal. FIGURA 66 – INFOGRÁFICO FONTE: Site Jornal do Campus. Disponível em: . Acesso em: 20 set. 2014. Ainda segundo o Código Florestal atual (2012), no seu art. 4º, são áreas de preservação permanente: V - as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive; VIII - as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 183 IX - no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d'água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação; X - as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação; XI - em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado. Além das áreas descritas acima, ainda podem ser consideradas nesta categoria, quando assim declaradas de interesse social por ato do chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras formas de vegetação destinadas à contenção da erosão do solo e mitigação dos riscos de enchentes e deslizamentos de terra e de rocha; à proteção a restingas ou veredas; à proteção de várzeas; ao abrigo de exemplares da fauna ou da flora ameaçados de extinção; proteção de sítios de excepcional beleza ou de valor científico, cultural ou histórico; formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias; assegurar condições de bem- estar público; auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares; proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional (art. 6º) (SITE OECO, 2013). Segundo o novo Código, é permitida a supressão de vegetação em APPs nos casos em que a área for declarada de utilidade pública, de interesse social ou ainda de baixo impacto ambiental. Já em propriedades familiares é permitida a cultura temporária e sazonal em terra de vazante, desde que não haja novos desmatamentos. Por fim, a recomposição das propriedades consolidadas só é obrigatória em caso de áreas alagadas, inclusive em pequenas propriedades (SITE OECO, 2013). É denominada de propriedade consolidada aquela ocupada com atividades agrossilvopastoris anteriores a 22 de julho de 2008 (Lei nº 12.651/12). A recomposição das propriedades consolidadas não se dará de acordo com a largura do rio, mas sim com o tamanho da propriedade, e deve ser feita da seguinte forma: NOTA 184 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO QUADRO 8 – RECUPERAÇÃO DA APP RECUPERAÇÃO OBRIGATÓRIA DA APP Área do imóvel rural (em módulos fiscais) APP independente da largura do curso d’água APP Nascentes APP Lagos e lagoas naturais APP Veredas Limite de recomposição (% de APP nos imóveis rurais) ≥ 1 5 m 5 m 5 m 30 m 10% 1 ≥ 2 8 m 8 m 8 m 30 m 10% 2 ≥ 4 15 m 15 m 15 m 30 m 20% > 4 de 20 a 100 m 30 m 30 m 50 m Não há limites FONTE: O autor Faixa de APP a ser recuperada de acordo com o tamanho da propriedade. FIGURA 67 – RECUPERAÇÃO DA APP FONTE: Blog Gasparim Sat. Disponível em: . Acesso em: 20 set. 2014. Você deve ter notado que o tamanho das propriedades está indicado em módulos fiscais. Essa medida foi instituída pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e foi determinada como parâmetro para definir a área de uma propriedade (LANDAU et al., 2012). TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 185 O módulo fiscal é uma unidade de medida de terras calculada em hectares. O número de hectares que compõe um módulo fiscal varia entre os municípios do Brasil e leva em consideração a produtividade da terra. Assim, ele representa a área mínima necessária para as propriedades rurais poderem ser consideradas economicamente viáveis. (LANDAU et al., 2012). NOTA O tamanho dos módulos fiscais dos municípios brasileiros varia entre 5 e 110 hectares, sendo que a seguir apresentamos o tamanho dos módulos fiscais nos municípios onde há polos da UNIASSELVI estabelecidos. TABELA 7 – TAMANHO DO MÓDULO FISCAL Município Tamanho do Módulo Fiscal (ha) Município Tamanho do Módulo Fiscal (ha) Manaus 10 Capão da Canoa 18 Alagoinhas 30 Erval Seco 20 Feira de Santana 30 Passo Fundo 16 Itabuna 20 Porto Alegre 5 Jacobina 60 São Paulo das Missões 20Paulo Afonso 70 Balneário Camboriú 12 Salvador 5 Blumenau 12 Teixeira de Freitas 35 Brusque 12 Serra 12 Capivari de Baixo 14 Porangatu 60 Criciúma 14 Posse 70 Florianópolis 7 São Luís 15 Guaramirim 12 Campo Grande 35 Herval d'Oeste 20 Maracaju 40 Imbituba 16 Colíder 90 Indaial 12 Belém 5 Itapiranga 20 Cametá 70 Ituporanga 18 Marabá 70 Joinville 12 Curitiba 5 Lages 20 Maringá 14 Palhoça 12 Ji-Paraná 60 Rio do Sul 18 Rolim de Moura 60 Xaxim 20 Bento Gonçalves 12 Mairinque 12 Camaquã 16 FONTE: Adaptado de: Landau et al. (2012) 186 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Você pode consultar o tamanho dos módulos fiscais dos demais municípios brasileiros acessando o trabalho de Landau et al. (2012), intitulado Variação Geográfica do Tamanho dos Módulos Fiscais no Brasil, disponível em: . NOTA 3.2 RESERVA LEGAL – RL Segundo consta no novo Código Florestal, é considerada uma reserva legal a área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa. Essa extensão de terra a qual deve ser obrigatoriamente protegida dentro da propriedade rural é distinta entre a Amazônia Legal e os outros biomas. Na área da Amazônia Legal, ou seja, no Acre, Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá, Mato Grosso, norte do Tocantins e Goiás e no oeste do Maranhão, a área de Reserva Legal deve abranger 80% do total em caso de floresta, 35% em áreas de Cerrado e 20% nos Campos Gerais. Nos demais biomas, a regra é de que a Reserva Legal abranja 20% da área (BRANDT, 2013). No entanto, como o novo Código respeita as legislações vigentes no período de ocupação das propriedades, as áreas de Reserva Legal desmatadas em conformidade com a lei da época do desmatamento não precisam ser reflorestadas em nenhuma região do Brasil (BRANDT, 2013). Já para as propriedades que não respeitaram essa lei, a recuperação dependerá do seu tamanho. Assim, em propriedades com até quatro módulos fiscais (consideradas propriedades pequenas), será considerada como Reserva Legal a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, independente da sua quantidade, sendo que não é permitido que novas áreas sejam desmatadas enquanto houver menos área florestal do que o percentual de Reserva Legal exigido pela lei. Por outro lado, em propriedades superiores a quatro módulos fiscais (propriedades grandes) em que foi desmatado mais do que era permitido, é preciso recompor, regenerar ou compensar a área de Reserva Legal obrigatória para a região (Lei nº 12.651/12). Quando for necessária a recomposição da área, será aceito o plantio associado entre espécies nativas e exóticas frutíferas, para uso social, em até 50% do total. O restante deve ser abandonado, deixando que ocorra a regeneração http://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/77505/1/doc-146.pdf TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 187 natural. É também possível compensar a área de Reserva Legal em outras propriedades, desde que dentro do mesmo bioma. É importante lembrar que cabe a todo proprietário rural o registro no órgão ambiental competente (estadual ou municipal) por meio de inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR, sendo que as especificidades para o registro vão depender da legislação de cada Estado. Uma vez realizado o registro, fica proibida a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão ou de desmembramento, com exceção das hipóteses previstas na Lei (art. 18) (SITE OECO, 2013). De maneira geral, é proibida a extração de recursos naturais, o corte raso, a alteração do uso do solo e a exploração nessas áreas, mas é permitida a exploração comercial, desde que as condições do solo e a integridade da biodiversidade local sejam preservadas e tenha sido autorizada pelo órgão ambiental via Plano de Manejo ou em casos de sistemas agroflorestais e ecoturismo (SITE OECO, 2013). 4 AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO SEGUNDO O SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO – SNUC (Lei nº 9.985/00) Desde a criação do Parque Nacional de Itatiaia, em 1937, a instituição de unidades de conservação das mais diversas categorias tem sido a mais importante estratégia de conservação da biodiversidade no Brasil. (ROCHA et al., 2010). Para conhecer um pouco mais sobre o histórico de criação de áreas protegidas e unidades de conservação no Brasil, sugerimos o acesso ao artigo de autoria de Rodrigo Medeiros, intitulado Evolução das tipologias e categorias de áreas protegidas no Brasil. Segue a referência completa: MEDEIROS, R. Evolução das tipologias e categorias de áreas protegidas no Brasil. Ambiente & Sociedade, v. IX, n. 1, p. 41-64. 2006. NOTA 188 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO A instituição do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) ocasionou um intenso debate entre os ambientalistas brasileiros. Duas correntes enfrentaram-se: a dos preservacionistas, que defendiam, entre outros pontos, a proibição da presença humana nas áreas, e a dos socioambientalistas, para quem a administração das áreas protegidas teria melhor êxito se elas suportassem atividades humanas e tivessem as populações primitivas ou tradicionais como as suas aliadas (ROCHA et al., 2010). O texto final da Lei do SNUC refletiu, em parte, essa divisão existente no ambientalismo brasileiro, o que pode ser percebido pelas duas grandes tipologias de unidades estabelecidas: as unidades de conservação de proteção integral e as unidades de conservação de uso sustentável. A diferença essencial entre essas duas categorias de unidades de conservação está na permissão para utilizar os recursos naturais presentes nas áreas de forma direta. Esse tipo de atividade é permitido em unidades de conservação de uso sustentável, mas é proibida em unidades de conservação de proteção integral. Isso se dá em parte pelos objetivos propostos para cada um desses dois grupos de unidades, os quais são compostos por diferentes categorias de unidades de conservação. O fato é que de um dos países que mais tardiamente desenvolveu instrumentos legais que criassem as condições necessárias ao estabelecimento de áreas protegidas territorialmente demarcadas, em período relativamente curto o SNUC permitiu em um curto espaço de tempo criar várias possibilidades de proteção, de maneira extremamente original em alguns casos (MEDEIROS, 2006). Vamos a partir de agora, então, discutir sobre esses dois tipos principais de unidades de conservação. Começaremos pelas unidades de conservação integral e, em sequência, focaremos as unidades de conservação de uso sustentável. 4.1 UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL O objetivo principal das unidades de Conservação de Proteção Integral é a preservação da natureza, sendo, portanto, permitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, salvo quando previsto na própria lei que as cria (Lei nº 9.985/00). Para buscar atender a esse objetivo estão arroladas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação cinco categorias de unidades de proteção integral, cada qual com algumas particularidades. São elas: Estação Ecológica; Reserva Biológica; Parque Nacional; Monumento Natural; e Refúgio da Vida Silvestre. TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 189 4.1.1 Estação Ecológica (Esec) Essa categoria de unidade de conservação tem como seus objetivos a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas. Assim, a visitação pública é proibida (com exceção aos casos em que a finalidade seja educacional, devendo-se então consultar o Plano de Manejo da unidade ou ainda o regulamento específico) e a posse e o domínio das terras devem ser públicos, havendo a desapropriação dasáreas particulares localizadas no seu interior. Mesmo que as pesquisas científicas sejam um dos objetivos dessa unidade, as mesmas devem ser precedidas de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade, a qual determinará as condições e restrições necessárias. Com relação ao outro objetivo dessas unidades – a preservação da natureza, somente são permitidas alterações nos ecossistemas locais nos casos de: a) restauração de ecossistemas alterados; b) manejo de espécies com a finalidade de reservar a diversidade biológica; c) coleta de componentes com finalidades científicas; d) pesquisa científica que ocasione impacto superior àquele empregado pela simples observação ou pela coleta controlada de componentes dos ecossistemas, em uma área não superior a 3% da extensão total da unidade, ou até o limite de 1500 ha. De acordo com Leuzinger (2004), as oito primeiras estações ecológicas foram oficialmente instituídas em 1981, sendo, até o final daquela década, criadas 22 unidades. Na década de 90, apenas a Estação Ecológica de Tamoios foi instituída. Já entre 2001 e janeiro de 2007, outras nove estações foram estabelecidas. Atualmente, há no Brasil 32 estações ecológicas criadas: quatro no bioma Mata Atlântica, cinco no bioma Cerrado, quatro na Caatinga, dez na Floresta Amazônica, uma no Pantanal e ainda oito estações ecológicas no bioma marinho costeiro. Para mais informações sobre essas áreas, acesse o site do ICMBio (). 190 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 4.1.2 Reserva Biológica (Rebio) Segundo a Lei nº 9.985/00, as unidades de conservação dessa categoria têm como objetivo: a preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos naturais (Art.10). Outras características dessas unidades de conservação são a sua posse e domínio público, a proibição da visita pública (exceto a educacional, sob consulta) e a ocorrência de pesquisa científica somente após a autorização prévia do responsável pela administração da unidade. Diante do exposto, muitas pessoas têm dificuldade de diferenciar os objetivos de uma Estação Ecológica e de uma Reserva Biológica, até mesmo porque não há nenhuma diferença substancial entre elas. No entanto, o regime de proteção das reservas biológicas é mais restritivo do que nas estações ecológicas, visto que nessas últimas sequer a pesquisa científica que cause alterações ecossistêmicas poderá ser realizada (LEUZINGER, 2004). A primeira reserva biológica, Poço das Antas, foi criada em 1974, no Rio de Janeiro. Atualmente, o Brasil conta com 30 reservas biológicas, que estão assim distribuídas: 15 unidades no bioma Mata Atlântica; nove na Amazônia; quatro no bioma marinho costeiro; uma no Cerrado; e também uma na Caatinga (SITE ICMBio, 2008). 4.1.3 Parque Nacional (Parna) Essa é a categoria de unidade de conservação mais antiga a ser utilizada no Brasil. Uma questão interessante em relação aos parques é que a origem dessa palavra vem de “parc”, em francês, e inglês arcaicos, que significava “uma área cercada de solo, ocupada por animais de caça, protegidos por ordem ou por concessão do rei”. Sendo assim, originalmente, o objetivo dos parques era garantir a oferta de animais para que a realeza pudesse manter as suas atividades de caça. O termo contemporâneo de parque nacional, o qual inclui a proteção da biodiversidade, só foi descrito em 1932 (TERBORGH et al., 2002). Para o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o Parque Nacional tem como objetivo básico “a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica” (Lei nº 9.985/00, Art. 11). No entanto, diferentemente das TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 191 duas categorias anteriormente vistas, o parque nacional permite a realização de pesquisas científicas, assim como o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de ecoturismo. Assim, a possibilidade de visitação é o seu diferencial. Conforme comenta Leuzinger (2004), apesar de um parque nacional não precisar ter sua área totalmente aberta ao público, ao menos parte dela deverá sê-lo, sob pena de transformar o parque em categoria de manejo semelhante à estação ecológica ou à reserva biológica. Desta forma, manter parques fechados (exceto provisoriamente) contraria a sua lei de criação. No entanto, vale ressaltar que “a visitação pública sempre estará sujeita às normas e restrições estabelecidas no plano de manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração, e àquelas previstas no regulamento” (Lei 9.985/00, Art. 11, § 2º). Outras características relacionadas aos parques nacionais são a posse e domínio públicos das áreas e a necessidade de autorização prévia para realizar pesquisa científica. Os três primeiros parques nacionais brasileiros foram criados entre 1937 e 1939, refletindo o princípio da preocupação mundial para a necessidade de delimitação de espaços naturais legalmente protegidos. Foram eles: Parque Nacional do Itatiaia, Parque Nacional da Serra dos Órgãos e Parque Nacional do Iguaçu (SANTOS, 2011). Atualmente há 72 parques nacionais em solo brasileiro. A maior parte está situada no bioma Mata Atlântica (23 parques), sendo a Amazônia o segundo bioma com mais áreas protegidas sob essa categoria de unidades de conservação, possuindo 18 parques. O Cerrado e a Caatinga possuem 14 e 7 parques nacionais, respectivamente, sendo que o Pantanal possui apenas um. Por fim, o bioma marinho costeiro conta com nove parques nacionais (SITE ICMBio, 2008). Grande parte dos parques nacionais foi criada com graves pendências fundiárias, que se acumularam e mesmo se agravaram ao longo dos anos. Como resultado, grandes prejuízos vêm sendo causados à política conservacionista, ao erário e ao patrimônio público. (ROCHA et al., 2010). 192 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 4.1.4 Monumento Natural (Mona) A criação de um monumento natural tem como objetivo básico “preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica” (Lei nº 9.985/00, Art. 12). Como exemplo, pode-se citar uma montanha específica, formações esculturais naturais, uma cachoeira. Apenas o monumento deve obter proteção especial, não o restante da área (LEUZINGER, 2004). Dada a essa característica, diferentemente das unidades vistas até agora, um monumento natural pode abrigar áreas particulares, desde que não haja incompatibilidade entre os objetivos da unidade e aqueles dos proprietários. Quando tal situação é relatada, deve-se haver a desapropriação. Com relação à visitação pública, assim como nas categorias anteriores, essa “está sujeita às condições e restrições estabelecidas no Plano de Manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração e àquelas previstas em regulamento”. (Art. 12, § 12). Há apenas três monumentos naturais estabelecidos em nível federal: um em ambiente Marinho Costeiro, um na Mata Atlântica e outro na Caatinga (SITE ICMBio, 2008). 4.1.5 Refúgio da Vida Silvestre (Revis) O estabelecimento de um Refúgio da Vida Silvestre, segundo consta no SNUC, “tem como objetivo proteger os ambientes naturais onde se asseguram condições para a existência ou reprodução de espécies ou comunidades da flora local e da fauna residente ou migratória”. (Lei 9.985/00, art. 13). Como cita Leuzinger (2004), esse é o caso de uma praia específica onde ocorra a desova de tartarugas, ou local utilizado por aves migratórias para pouso ou reprodução. Assim como os monumentos naturais, os refúgios da vida silvestre são pouco extensos, de forma que podem possuir domínioprivado, seguindo o mesmo princípio dos monumentos: havendo incompatibilidade de objetivos, a área deverá ser desapropriada. A visitação pública e a pesquisa científica são permitidas desde que previstas no Plano de Manejo e que haja autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade. Com relação à quantidade de Refúgios da Vida Silvestre existentes no Brasil, atualmente há sete: dois no bioma Marinho Costeiro, quatro no bioma Mata Atlântica e um no bioma Cerrado. TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 193 4.2 UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL Agora que já falamos sobre as unidades de conservação de proteção integral, vamos voltar o nosso olhar para as unidades de conservação de uso sustentável, cujo objetivo é “compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais”. (Lei nº 9.985/00, Art. 7º, § 2º). Em outras palavras, esse grupo de unidades de conservação permite o uso direto dos recursos da unidade, o que, no entanto, como deixa claro Leuzinger (2004), não significa a sua utilização sem controle, desregrada, mas sim o seu uso respeitando a capacidade de suporte do ecossistema e os mecanismos de renovação dos recursos bióticos. Esse grupo de unidades de conservação é representado por sete modalidades de unidades: a Área de Proteção Ambiental; Área de Relevante Interesse Ecológico; Floresta Nacional; Reserva Extrativista; Reserva de Fauna; Reserva de Desenvolvimento Sustentável; e Reserva Particular do Patrimônio Natural. 4.2.1 Área de Proteção Ambiental (APA) A Área de Proteção Ambiental, segundo consta na Lei 9.985/00, é: uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais (Art. 15). O território de uma Área de Preservação Ambiental pode ser constituído por terras públicas ou privadas, sendo que nesse último caso podem ser estabelecidas normas e restrições para o uso da propriedade desde que sejam respeitados os limites constitucionais. (Lei nº 9.985, Art. 15, § 2º). Com relação à visitação pública e a realização científica, estas estão previstas, mas as condições para a sua realização são estabelecidas pelo órgão gestor da unidade em caso de áreas de domínio público, ou pelo proprietário no caso de áreas sob propriedade privada. Leuzinger (2004) destaca que as áreas de preservação ambiental vêm sofrendo inúmeras críticas. Alguns defendem que essas áreas não são áreas de conservação propriamente ditas, mas sim formas de disciplinar o uso do solo. Outros citam a sua baixa efetividade, uma vez que muitas áreas de proteção ambiental estão localizadas em lugares antropizados e, consequentemente, degradados, sem que seja realizado um zoneamento que permita a proteção de parcelas dos ecossistemas. 194 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Todavia, de acordo com a autora (LEUZINGER, 2004), a baixa efetividade de parte das áreas de proteção ambiental não traduz a sua inutilidade, pois caso sejam elaborados planos de manejo adequados e haja fiscalização efetiva, esses espaços ambientais são muito úteis à proteção do meio ambiente, e apresentam baixíssimo custo para o Estado. Atualmente há 33 áreas de preservação ambiental no Brasil, que estão assim distribuídas: 12 unidades no bioma Marinho Costeiro; 10 no Cerrado; cinco na Mata Atlântica; três na Caatinga; duas na Amazônia; e uma no bioma Pampa (SITE ICMBio, 2008). 4.2.2 Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) A Área de Relevante Interesse Ecológico, ao contrário da Área de Proteção Ambiental, possui geralmente pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, que possua características naturais extraordinárias ou, ainda, que abrigue representantes raros da biota regional (Lei nº 9.985/00, Art. 16). Essas características fazem com que essa modalidade seja considerada como uma versão menor das Áreas de Proteção Ambiental (LEUZINGER, 2004). Os objetivos de uma Área de Relevante Interesse Ecológico também são semelhantes aos de uma Área de Proteção Ambiental e consistem em “(...) manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação da natureza”. (Lei nº 9.985/00, Art. 16). Por fim, a possibilidade de visitação e de pesquisa científica, assim como as restrições para uso da área, seguem a mesma lógica de uma Área de Preservação Ambiental (LEUZINGER, 2004). Segundo o site do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio, 2008), há 18 ARIEs federais criadas no Brasil. Destas, sete estão localizadas no bioma Mata Atlântica; três no bioma Marinho Costeiro, na Caatinga e na Amazônia; e uma no Cerrado e no bioma Pampa. 4.2.3 Floresta Nacional (Flona) A Floresta Nacional é constituída de áreas florestais onde haja predomínio de espécies nativas e tem como objetivo básico o uso sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica com foco no desenvolvimento de métodos de exploração sustentável das florestas nativas (Lei nº 9.985/00, Art. 17). Assim, a realização de pesquisa não é só permitida como incentivada, devendo, no entanto, TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 195 ser autorizada previamente pelo órgão responsável pela administração da unidade. A visitação pública também é possível e está condicionada às normas do órgão gestor da unidade. Ao contrário das duas categorias de unidades de conservação de uso sustentável vistas, a área de uma floresta nacional necessariamente deve ser de posse e domínio público, havendo a desapropriação de possíveis propriedades particulares existentes em seus limites. Outra particularidade dessa categoria de unidade de conservação é a possibilidade de permanência de populações tradicionais que habitavam a área no momento da sua criação. Segue trecho de um artigo publicado por Leuzinger (2004, p. 12) que demonstra a contradição existente no estabelecimento dessa categoria de unidade de conservação: Deveriam as florestas nacionais ser criadas [...] para o desenvolvimento de métodos que permitam aos povos da floresta o uso sustentável dos recursos naturais, em que haja menor impacto possível, com um grau de aproveitamento econômico que lhes garanta uma boa qualidade de vida. Mas, apesar do comando legal, as florestas nacionais vêm sendo instituídas como florestas de produção, com o objetivo de concessão a particulares de sua exploração comercial para extração de recursos madeireiros e não madeireiros, sem a preocupação com o desenvolvimento tecnológico a ser repassado às populações tradicionais [...]. Há 65 Florestas Nacionais espalhadas pelo país. Destas, a maior parte se encontra na Amazônia (32 unidades), seguida pela Mata Atlântica, que possui 21 Florestas Nacionais. Na sequência estão representadas a Caatinga e o Cerrado, com seis unidades cada (SITE ICMBio, 2008). 4.2.4 Reserva Extrativista (Resex) O Sistema Nacional de Unidades de Conservação define uma Reserva Extrativista como consta na Lei 9.985 art. 18: Área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade (BRASIL, 2000). Apesar de o uso ser concedido a essas populações extrativistas, a posse e o domínio de uma Reserva Extrativista devem ser públicos, havendo a desapropriação de propriedades particulares que porventura existam em seu perímetro. A questão 196 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃOda visitação e da pesquisa científica são semelhantes ao definido para Florestas Nacionais (vide seção anterior). Duas questões importantes com relação a uma reserva extrativista dizem respeito à exploração da biota local. Segundo consta na lei 9.985, “são proibidas a exploração de recursos minerais e a caça amadorística ou profissional” (Art. 18, § 6º), e “a exploração comercial de recursos madeireiros só será admitida em bases sustentáveis e em situações especiais e complementares às demais atividades desenvolvidas [...]” (Art. 18, § 7º). (BRASIL, 2000). Sendo assim, essa categoria de unidade de conservação visa a conciliar a proteção ambiental e a sobrevivência física e cultural de populações extrativistas tradicionais, como, por exemplo, castanheiros, seringueiros, pescadores artesanais, babaçueiros etc. Tal conciliação é baseada na ideia de que essas populações, por dependerem diretamente da existência de um ambiente natural preservado, em geral utilizam os recursos florestais necessários à prática da atividade extrativista de forma sustentável (LEUZINGER, 2010). Até o momento há 63 Reservas Extrativistas no Brasil, 35 delas no bioma Amazônia, 21 no bioma Marinho Costeiro, cinco no Cerrado e duas na Mata Atlântica. 4.2.5 Reserva de Fauna A reserva de fauna “é uma área natural com populações animais e espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas para estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos” (Lei nº 9.985/00, Art. 19). Assim como é previsto para a maior parte das unidades de conservação, a posse e o domínio dessa categoria de unidade são públicos, devendo haver a desapropriação de propriedades particulares, e a visitação pública pode ser permitida. Da mesma forma como determinado para a Reserva Extrativista, a caça amadorística ou profissional é proibida. Ainda, a comercialização dos produtos e subprodutos resultantes das pesquisas deve obedecer ao disposto nas leis sobre a fauna (Lei 9.985/00, Art. 19, § 3 e 4). Até o momento não há nenhuma Reserva de Fauna estabelecida no Brasil. TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 197 4.2.6 Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) A Reserva de Desenvolvimento Sustentável é, segundo a Lei nº 9.985/00: Uma área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica. (Art. 20). Como se pode perceber, a sua definição é bastante semelhante àquela dada à Reserva Extrativista, no enquanto esta, teoricamente, abriga apenas grupos que vivem de atividade extrativista, a reserva de desenvolvimento sustentável alberga populações tradicionais de um modo geral, que também dependem da utilização dos recursos ambientais para sua subsistência e manutenção de sua cultura (LEUZINGER, 2004). Outra questão importante em relação a essa categoria de unidade de conservação é o fato de que a posse e o domínio da área devem ser públicos, mas diferentemente do que é previsto para a Reserva Extrativista, “(...) as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser, quando necessário (grifo nosso), desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei” (Art. 20, § 2). Tanto a visitação quanto a pesquisa científica nessa unidade são incentivadas, considerando sempre a prévia autorização do órgão responsável pela gestão da unidade. No entanto, fica claro que deve ser considerado o equilíbrio dinâmico entre o tamanho da população e a conservação, e que a exploração de componentes do ecossistema natural para o uso sustentável e a substituição da cobertura vegetal nativa por aquela cultivável pode ser feita, mas está sujeita ao plano de manejo da área. Há apenas duas Reservas de Desenvolvimento Sustentável no Brasil, uma na Amazônia e outra na Mata Atlântica (SITE ICMBio, 2008). 4.2.7 Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) A Reserva Particular do Patrimônio Natural difere das demais categorias de unidades de conservação principalmente por ser de posse e domínio particular. Pode-se dizer que essa unidade encontra-se erroneamente no grupo de unidades de uso sustentável, já que na prática o seu uso é restrito (BACCA, 2002). De acordo com o que está estabelecido na Lei nº 9.985/00, “A Reserva Particular do Patrimônio Natural é uma área privada gravada com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica”. (Art. 21). As únicas atividades permitidas nessas áreas são a pesquisa científica e a visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais. 198 UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Para que um determinado local seja instituído como uma RPPN, deve ser assinado pelo proprietário, perante o órgão ambiental, um termo de compromisso. Havendo a existência de interesse público, essa área será averbada à margem da inscrição do Registro Público de Imóveis (Lei nº 9.985/00, Art. 21, § 1º). Em outras palavras, uma Reserva Particular do Patrimônio Natural é criada a partir da vontade do proprietário que assume o compromisso de conservar a natureza e proteger a área em caráter perpétuo sem, no entanto, perder a titularidade da terra. Á área transformada em RPPN torna-se isenta do Imposto Territorial Rural (ITR) e o proprietário pode solicitar auxílio do poder público para elaborar um plano de manejo, proteção e gestão da área (SCHÄFFER e PROCHNOW, 2002). Como essa categoria de unidade de conservação difere das demais, por ser particular e partir de iniciativa do próprio proprietário, os dados referentes a essa unidade são compilados em separado. Até o momento há 646 RPPN criadas, distribuídas em 27 estados. O Estado que possui o maior número de RPPN é a Bahia, com 103 unidades. No outro extremo, o Acre possui até o momento uma unidade. Com relação à área protegida sob essa categoria, tem-se um total de 511.439 ha, sendo que o Mato Grosso se destaca nesse quesito, possuindo 172980.67 há, protegidos sob essa categoria (SITE ICMBio, 2008). Uma questão importante sobre a Reserva Particular do Patrimônio Natural é que a sua criação pode também ser feita por organizações empresariais. De acordo com a publicação feita pelo “Programa de Incentivo às Reservas Particulares do Patrimônio Natural da Mata Atlântica” (2010), a criação de uma RPPN permite que a empresa direcione de maneira eficaz os seus investimentos em ações ambientais efetivas, além de se constituir em uma forma de marketing ecológico. Ainda, representa uma nova oportunidade de negócios para as empresas, no quadro do movimento internacional, para conter as mudanças climáticas provocadas pelo aquecimento global. Apesar de termos tratado as categorias de unidades de conservação em nível federal, é importante destacarmos que a Lei nº 9.985/00 torna possível integrar ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação aquelas unidades criadas em nível estadual e municipal. NOTA TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS 199 5 CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI Nº 9.985/00 O Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (2000), em ocasião da publicação de um documento a respeito da então recente Lei nº 9.985/00, explanou sobre os diversos benefícios que essa lei trouxe em direção da proteção ambiental. Como esse conselho destacou, além de estabelecer o primeiro Sistema Nacional de Unidades de Conservação, essa lei possibilitou: - a exigência de elaboração de Planos de Manejo (ver tópico a seguir) para todas as unidades no prazo de cinco anos; - a busca de parceria com as populações locais durante o processo de estabelecimento de uma unidade de conservação; - o reconhecimento da existência de populações tradicionais em algumas unidades, o respeito aos seus direitos e a busca em torná-las aliadas para a conservação da natureza;- a exigência de conselhos (consultivo ou deliberativo) para a gestão das unidades de conservação, envolvendo vários setores da sociedade (ver tópico a seguir); - a reafirmação sobre a necessidade de publicação em forma de lei e com compensação ambiental e financeira caso haja a necessidade de diminuir área em uma unidade de conservação; - a inserção do princípio usuário-pagador, assegurando o pagamento de servidão de passagem e de serviços de água e de energia elétrica; - o reconhecimento das Reservas da Biosfera, dos corredores e dos mosaicos ecológicos e das zonas de amortecimento no entorno das unidades como figuras que permitem uma maior inserção dessas no contexto regional (ver tópico a seguir); - a colaboração para uma gestão mais integrada e participativa, entre outros. Como pontos fracos, no entanto, pode-se dizer que ao consolidar, mesmo que não intencionalmente, as Unidades de Conservação como tipologia dotada de maior visibilidade e expressão, e dotá-las de instrumentos mais concretos de gestão, outras tipologias, como as Áreas de Preservação Permanente, as Reservas Legais, entre outras, continuaram relegadas aos mesmos problemas históricos de gestão, não dispondo de instrumentos de integração e articulação com as ações previstas para as Unidades de Conservação (MEDEIROS, 2006). 200 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, vimos que: • Apesar de serem considerados sinônimos, é importante conseguirmos diferenciar os conceitos de espaços territoriais especialmente protegidos, áreas protegidas e unidades de conservação. • No Brasil, a principal estratégia utilizada é o estabelecimento de unidades de conservação. • As Áreas de Proteção Permanente são regiões protegidas por lei e que segundo o novo Código Florestal obtiveram algumas modificações quanto aos seus limites. • As reservas legais são porções de terra que o proprietário rural deve obrigatoriamente respeitar. • As unidades de conservação brasileiras estão divididas em duas tipologias principais: as unidades de conservação de proteção integral e as unidades de conservação de uso sustentável. • Dentro de cada tipologia de unidades de conservação há diferentes categorias de unidades, cada qual com um objetivo específico. 201 AUTOATIVIDADE 1 Vimos ao longo desse tópico que há um Sistema Nacional de Unidade de Conservação implementado no Brasil desde o ano de 2000. Nele há duas tipologias principais de unidades. Conceitue-as e dê dois exemplos para cada uma delas. 2 Qual é a principal diferença entre as Reservas Particulares do Patrimônio Natural das demais categorias de unidade e quais os benefícios obtidos a quem as cria? Assista ao vídeo de resolução da questão 2 202 203 TÓPICO 3 CRIAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO E GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO No tópico anterior focamos a definição das diferentes áreas protegidas existentes em nosso país, dando maior ênfase aos grupos de unidades de conservação e suas categorias. No entanto, é preciso que destaquemos que a lei não se resume à determinação dessas categorias. Seguindo essa linha de raciocínio, discutiremos mais as questões que tornam possível colocar em prática o que está estabelecido em lei, sendo que voltaremos a citá-la sempre que necessário. 2 ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELO SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Antes de mais nada, vamos conhecer os órgãos responsáveis pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação. São eles: 1) Órgão consultivo e deliberativo: Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), que tem como atribuições acompanhar a implementação do Sistema. 2) Órgão central: é o Ministério do Meio Ambiente (MMA) o responsável por coordenar o Sistema. 3) Órgãos executores: o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, os órgãos estaduais e municipais é que possuem a função de implementar o SNUC, subsidiar as propostas de criação, bem como administrar as unidades de conservação federais, estaduais e municipais, respectivas esferas de atuação. UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 204 Originalmente a Lei nº 9.985/00 estabeleceu que o órgão executor em nível federal seria o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, o IBAMA. O IBAMA foi criado em 1989 como forma de unificar a resolução de questões ambientais que até então eram repartidas por quatro entidades distintas: a Secretaria do Meio Ambiente – Sema, a Superintendência da Borracha – Sudhevea, a Superintendência da Pesca – Sudepe, e o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF. O IBAMA então passou a ser o gerenciador da questão ambiental, responsável por formular, coordenar, executar e fazer executar a Política Nacional do Meio Ambiente e da preservação, conservação e uso racional, fiscalização, controle e fomento dos recursos naturais renováveis. No entanto, em 2007 foi publicada a Medida Provisória n° 366, que atribuiu a gestão das unidades de conservação federais de proteção integral e de uso sustentável ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio. Dessa forma, podemos dizer que, atualmente, tudo o que tenha por finalidade executar ações da política nacional de unidades de conservação da natureza, referente às atribuições federais relativas à proposição, implantação, gestão, proteção, fiscalização e monitoramento das unidades de conservação instituídas pela União, é de responsabilidade do ICMBio. O restante das questões ambientais que não contemplem esse grupo de áreas protegidas é regido pelo IBAMA. FONTE: Ramos (2012). 3 A CRIAÇÃO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO Consta na Lei nº 9.985 que uma unidade de conservação é criada por ato do poder público e que a mesma deve ser precedida de estudos técnicos (Art. 22, § 2º). Esses estudos geralmente consistem em levantamentos e relatórios com foco no meio natural (físico e biótico), socioeconômico, cultural e fundiário, os quais podem ser executados tanto pelo poder público, por meio de seus órgãos executores e corpo técnico próprio, quanto por meio de consultorias contratadas. É importante que os estudos sejam complementados por levantamentos e vistorias em campo que permitam o detalhamento de informações, como, por exemplo, a existência de populações tradicionais na área; a ocorrência de impactos humanos; a forma como são feitos o uso e a ocupação do solo, entre outras questões. Ao final dessas etapas dá-se a elaboração de uma proposta preliminar de limites e de categoria da Unidade de Conservação a ser apresentada e discutida junto à sociedade (SITE ICMBio, 2008). Segue-se então a consulta pública, também prevista na Lei nº 9.985/00 (Art. 22, § 2º). Essa atividade consiste em reuniões abertas à sociedade, precedidas de amplo processo de divulgação, nas quais a proposta deve ser apresentada de forma clara e acessível, possibilitando aos cidadãos e instituições locais que NOTA TÓPICO 3 | CRIAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO E GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 205 manifestem sua posição e considerações sobre a proposta. Dessa forma é garantida a participação do máximo de atores sociais locais, permitindo que todos contribuam com sua opinião. Após essa etapa, é elaborada a proposta final a ser enviada ao Ministério do Meio Ambiente (SITE ICMBio, 2008). Ao Ministério do Meio Ambiente – MMA cabe a tarefa de realizar as análises técnicas e jurídicas complementares, bem como consultas a outros órgãos da estrutura do Poder Executivo que possam ter interesses na área proposta para a criação da unidade. Seguidas todas estas etapas, a proposta é então encaminhada ao Presidente da República, acompanhada de todos os documentos que integram o processo de criação da UC. Após a assinatura do Presidente da República e publicação no Diário Oficial da União do respectivo decreto que a cria, assinado, está criada a unidade de conservação (SITE ICMBio, 2008). O Brasil, por abrigar a maior biodiversidade do mundo, tem uma responsabilidade muito grande nesta área.fundamenta em teorias ecológicas consistentes, baseadas em leis ambientais que visam a um equilíbrio entre as comunidades animais e vegetais, fontes de produtos úteis ao homem (conservação) e de conhecimento científico (conservação e preservação) para uso das próximas gerações, bem como, o desenvolvimento sustentável, trabalhando as necessidades presentes sem prejudicar as futuras. Por fim, a abordagem mais polêmica dada por esta parte da ecologia e o jogo existente entre os interesses econômicos e as ações políticas (ODUM; BARRET, 2008 apud SANTO; FERRARI, 2012). Cibernética é uma tentativa de compreender a comunicação e o controle de máquinas, seres vivos e grupos sociais através de analogias com as máquinas eletrônicas. FONTE: Disponível em: . Acesso em: 6 fev. 2013. NOTA UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 6 Os três principais ramos/áreas de estudo da ecologia foram determinados pelo botânico Carl Schroter no início do século XX, que são: Autoecologia: estuda as espécies (animal ou vegetal) a partir de suas relações com o meio ambiente, ou seja, como reagem separadamente a determinados fatores ambientais (clima, vegetação, relevo etc.). É um ramo científico clássico e atualmente seguido por poucos cientistas. Sinecologia: conhecida por ecologia comunitária é voltada ao estudo das comunidades de seres vivos. Foca a distribuição das populações e suas relações ecológicas, demografia, deslocamento e quantidades. Ainda, examina as cadeias alimentares, as sucessões ecológicas e inter-relações entre predadores e presas. Demoecologia: também conhecida por dinâmica das populações ou ecologia das populações. Realiza o estudo de cada população separadamente. FONTE: Disponível em: . Acesso em: 18 mar. 2013. Atualmente novos ramos da ecologia estão surgindo como: a dinâmica de populações, ecologia humana, ecologia social, ecologia comportamental, ecologia matemática, entre outras. Dezenas de livros, jornais, periódicos, congressos e simpósios especializados em ecologia são lançados todos os anos, em todos os países do mundo. A abordagem política da ecologia tem crescido muito, principalmente porque esta ciência é a que possibilita o entendimento das transformações causadas pelo homem no ambiente, e das suas consequências para a humanidade. O congresso mundial de meio ambiente, a ECO-92 e a AGENDA 21 são exemplos de transformações políticas impulsionadas pela ecologia e pelas ciências ambientais. FONTE: Disponível em: . Acesso em: 18 mar. 2013. 3 OS ORGANISMOS E O MEIO FÍSICO – CONCEITOS Vamos agora relembrar alguns conceitos básicos de ecologia. Os fatores abióticos (a= sem; bio= vida) são todos os elementos não vivos de um ambiente, tais como a luz solar, solo, ar, água e temperatura. Por outro lado, os fatores bióticos são todos os elementos vivos de um ambiente, ou seja, todos os seres vivos, tanto os aquáticos como os seres terrestres (Figura 2). Os seres vivos podem ser organizados em diferentes níveis de organização ecológica: célula – tecido – órgão – sistema de órgãos – organismo – população – ATENCAO ATENCAO TÓPICO 1 | ECOLOGIA BÁSICA 7 comunidade – ecossistema – paisagem – bioma – ecosfera (Figura 3), interagindo entre eles nos seus processos ou funções. Portanto, qualquer estado de organização da vida somente é mantido através de um fluxo de energia contínuo, pois passa por uma série de níveis diferentes de organização (ODUM; BARRET, 2008). FIGURA 2 – OS FATORES BIÓTICOS E ABIÓTICOS DO ECOSSISTEMA SERRA DA MALCATA, A 1075 METROS DE ALTITUDE – PORTUGAL FONTE: Disponível em: . Acesso em: 3 mar. 2013. UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 8 Conceitos Ecológicos Espécie: é o conjunto de indivíduos semelhantes estruturalmente, funcionalmente e bioquimicamente que se reproduzem naturalmente, originando descendentes férteis. Apresenta uma propagação genética própria em resposta às pressões do ambiente ao longo da evolução. Assim, todos os organismos de Homo sapiens pertencem a uma mesma espécie, assim como ocorre, por exemplo, com organismos de Araucaria angustifolia (pinheiro-do-paraná). FIGURA 3 – AS ESCALAS HIERÁRQUICAS DENTRO DE NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO ECOLÓGICOS NOS SEUS PROCESSOS E FUNÇÕES FONTE: Disponível em: . Acesso em: 3 mar. 2013. Organismo: é a unidade (indivíduo) fundamental da ecologia. É qualquer corpo vivo (unicelular ou pluricelular), ou seja, é um ser vivo individual (veja com maiores detalhes a Unidade 2). População: é o conjunto de indivíduos da mesma espécie que vivem em uma mesma área em um determinado período, e abrange a taxa de natalidade, a taxa de mortalidade, a proporção de sexos, a distribuição de idades, a emigração e imigração etc. Ex.: indivíduos de aracuã (Ortalis guttata) vivendo em um fragmento florestal; cardume de uma espécie de peixe, entre outros (mais detalhes serão dados na Unidade 2). Comunidade: é o conjunto de populações de várias espécies que sofrem interferência uma das outras, e que habitam um determinado espaço (região) em um determinado tempo TÓPICO 1 | ECOLOGIA BÁSICA 9 (período). Ex.: o conjunto de seres vivos que habitam um rio ou lago, ou ainda uma área florestal, entre outros. Ecossistema ou sistema ecológico: “Um sistema ecológico ou ecossistema é qualquer unidade que inclui todos os organismos (comunidade biótica), em uma dada área, interagindo com o meio físico de modo que um fluxo de energia leve a estruturas bióticas claramente definidas e à ciclagem de materiais entre componentes vivos e não vivos”. (ODUM; BARRET, 2008). Ex.: cavidade bucal; floresta Amazônica. FONTE: Adaptado de: . Acesso em: 1 jun. 2013 Habitat: é o lugar preciso onde uma espécie vive, isto é, o seu “endereço” dentro do ecossistema que determina o comportamento de sobrevivência e reprodutivo da comunidade (local de abrigo, alimentação e reprodução). Ex.: o habitat de uma solitária Taenia solium é o intestino de outro animal; o solo é o habitat de minhocas. Biótopo: é a área física na qual determinada comunidade vive. Ex.: o habitat das piranhas é a água doce e o biótopo Rio Amazonas é o local onde vivem todos os seres vivos desse rio, inclusive as piranhas. Nicho ecológico: o nicho ecológico pode ser definido como o total de necessidades e condições necessárias à sobrevivência de um organismo. É um espaço n-dimensional, no sentido de que há uma infinidade de propriedades envolvidas (ODUM, 1988). Ecótono: é a região de transição entre duas ou mais comunidades/ ecossistemas. Nesta área de transição (ecótono) encontramos grande número de espécies, e consequentemente, grande número de nichos ecológicos. Ex.: floresta e campo, ambiente marinho e dulcícola, matas de cocais que consistem na transição entre o bioma amazônico e a caatinga. Biosfera: é o conjunto de todos os ecossistemas da Terra, ou seja, de todas as formas de vida que inclui a litosfera, a hidrosfera e a atmosfera. Nesta faixa se encontram os gases oxigênio e nitrogênio, importantes para a vida. (ODUM, 1988). O termo “biosfera” foi introduzido em 1875, pelo geólogo austríaco Eduard Suess. Entre 1920 e 1930 iniciou a aplicar o termo biosfera para designar “a parte do planeta ocupada pelos seres vivos. O conjunto de todas as partes do planeta Terra onde existe ou pode existir vida. Os seus limites vão desde as mais altas montanhas até as profundezas das fossas abissais marinhas”. Existem autores que consideram a Terra um verdadeiro ser. NOTA UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 10 Complemente seus conhecimentos, leia também: fatores abióticos e bióticos: . .E por ser um dos países signatários da Convenção da Diversidade Biológica, assumiu o compromisso de destinar, sob a forma de Unidades de Conservação, 30% do bioma Amazônia e 10% dos demais biomas (Pampa, Pantanal, Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica e os ecossistemas Marinhos e Costeiros), sendo computadas para isso também as UCs estaduais, municipais e particulares (SITE ICMBio, 2008). De uma forma resumida, podemos então elencar as seguintes etapas a serem cumpridas para proceder-se à criação de uma unidade de conservação: 1) Interesse de criação de uma unidade de conservação por parte do poder público ou da sociedade civil. 2) Elaboração de estudos (levantamentos e relatórios) com foco no meio natural (físico e biótico), socioeconômico, cultural e fundiário que demonstrem a melhor localização, dimensão, limites e categoria para a unidade de conservação e posterior confirmação em campo. 3) Elaboração de proposta e realização de consulta pública. 4) Envio da proposta final ao Ministério do Meio Ambiente para consulta a outros órgãos da estrutura do Poder Executivo que possam ter interesse na área proposta para a criação da unidade. Assinatura do Presidente da República e publicação no Diário Oficial da União do respectivo decreto de criação. NOTA UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 206 Para o caso das Reservas Particulares do Patrimônio Natural, onde o interesse parte do próprio proprietário, os passos diferem de certo modo. O ICMBio publicou um roteiro para a criação dessa categoria de unidade de conservação. Segue a referência completa desse documento: ICMBio. Roteiro para criação de RPPN federal. Reserva Particular do Patrimônio Natural. Brasília: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. 2011. 92 p. Conforme relata Ramos (2012), várias unidades de conservação acabam tendo os seus processos de criação paralisados por oposição dentro do próprio governo. O Ministério de Minas e Energia, por exemplo, opõe-se à criação de novas áreas nas regiões onde prevê a possibilidade de futura exploração de potencial hidrelétrico. Com isso, muitas vezes instaura-se um impasse que impede o estabelecimento de novas unidades de conservação. Essa pressão ocorre mesmo onde uma unidade de conservação já existe. A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão que planeja a produção de energia, por exemplo, já fez com que o MMA e o Instituto Chico Mendes tivessem que conceder autorizações para que estudos fossem realizados em pelo menos duas unidades de proteção integral amazônicas. E isso que a criação é apenas o ponto de partida para a consolidação dessas áreas (BADIALLI e PARANAGUÁ, 2012). 4 ELABORAÇÃO DO PLANO DE MANEJO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO A necessidade das unidades de conservação possuírem planos de manejo está prevista na Lei nº 9.985/00, assim como a sua elaboração no prazo de até cinco anos após a data de criação da unidade. O objetivo desse documento é levar a Unidade de Conservação a cumprir com os objetivos estabelecidos na sua criação, definir objetivos específicos de manejo, orientando a gestão da Unidade de Conservação e promover o manejo da Unidade de Conservação, orientado pelo conhecimento disponível e/ou gerado. No entanto, muitas unidades de conservação não possuem plano de manejo e algumas chegam a permanecer mais de uma década sem nenhum documento que planeje o seu uso (BENSUSAN, 2006). Afinal, o que é um plano de manejo? Segundo consta na Lei nº 9.985/00, o plano de manejo é: um documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da terra e o manejo NOTA TÓPICO 3 | CRIAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO E GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 207 dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade (Art. 2º, inciso XVII). Os planos de manejo de unidades de conservação de categorias distintas devem também apresentar as suas particularidades (BENSUSAN, 2006). Tanto é que o IBAMA elaborou “Roteiro Metodológico de Planejamento – Parque Nacional, Reserva Biológica, Estação Ecológica” (IBAMA, 2002), o “Roteiro Metodológico para Gestão de Áreas de Proteção Ambiental” (IBAMA, 1999), o “Roteiro Metodológico para Elaboração do Plano de Manejo das Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável Federais” (IBAMA/ DISAM, 2006), o “Roteiro metodológico para elaboração de plano de manejo para Reservas Particulares do Patrimônio Natural” (FERREIRA et al., 2004) e o “Roteiro metodológico para elaboração de plano de manejo para Florestas Nacionais” (ICMBio, 2008), esse último baseado no documento de mesmo nome publicado em 2003 (IBAMA, 2003). O passo mais importante na elaboração dos planos de manejo é a organização do planejamento, onde se adequam as atividades e o conteúdo do processo de planejamento (CASES, 2012). Considerando essas premissas, Cases (2012) identifica um caminho a seguir na elaboração de planos de manejo que consiste em sete etapas. São elas: Etapa 1ª: Organização do planejamento Etapa 2ª: Diagnóstico da unidade de conservação Etapa 3ª: Análise e avaliação estratégica da informação Etapa 4ª: Planejamento estratégico Etapa 5ª: Planejamento tático Etapa 6ª: Conclusão do documento Etapa 7ª: Aprovação do plano Etapa 1ª: Organização do planejamento O objetivo dessa etapa é organizar todo o processo de planejamento a ser desenvolvido para produzir o plano de manejo da unidade de conservação. Dessa forma, todo o processo de planejamento é definido e detalhado nesta etapa: a equipe de planejamento; os colaboradores e os consultores que fornecerão informações básicas para o planejamento nas diferentes etapas; como vai ser a participação e o envolvimento dos diferentes setores da sociedade; quais são as informações necessárias para o manejo da unidade; quais dessas informações devem ser coletadas para a elaboração do plano de manejo; como vão ser coletadas; e como vai ser organizada toda informação. Adicionalmente, a área de abrangência do plano de manejo deve ser estabelecida nesse momento. (CASES, 2012). Cases (2012) recomenda que a equipe de planejamento seja composta por cinco a oito pessoas, comandada por um coordenador (que pode ser contratado, voluntário ou ainda o próprio chefe da unidade), o gestor ou chefe da unidade (caso ele não seja o coordenador), um representante do setor de planejamento UNIDADE 3 | GESTÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 208 do órgão gestor da unidade de conservação, um especialista em sistemas de informação geográfica e algum especialista em um tema que se destaque na unidade de conservação (por exemplo, turismólogo, no caso de vocação turística; engenheiro florestal, no caso de floresta nacional; sociólogo, no caso de presença de populações tradicionais; oceanógrafo, no caso de UC marinha ou costeira etc.). É interessante ainda que um representante do conselho da unidade participe da equipe de planejamento. É importante que a equipe de planejamento seja a mesma do início ao fim da elaboração do plano de manejo e que em cada fase haja a participação de profissionais específicos (como pesquisadores durante os diagnósticos, moderadores de oficinas de planejamento participativo, consultores para a redação do plano etc.) (CASES, 2012). Essa etapa deve encerrar-se com uma oficina de organização do planejamento que conte com a participação da equipe de planejamento e outros atores que conheçam a unidade de conservação. Através dessa atividade será possível identificar e mapear, de forma preliminar, as pressões e ameaças à unidade, destacar, de forma preliminar, os desafios para a gestão da UC, definir as lacunas de informação, selecionar as áreas temáticas que serão pesquisadas e as consultorias necessárias e elaborar a matriz de organização do planejamento (CASES, 2012). Etapa 2ª: Diagnóstico da unidade de conservação Essa etapa consiste em caracterizar a situação. DICAS http://www.rbma.org.br/ http://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/77505/1/doc-146.pdf 11 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você pode concluir que: • O termo ecologia foi empregado pela primeira vez, em 1866, pelo zoólogo alemão Ernst Haeckel. • Ecologia é a ciência que estuda a relação entre os seres vivos e os componentes do meio ambiente que afetam os organismos. • A ecologia se relaciona com outras ciências para explicar fenômenos ambientais que ocorrem nos ecossistemas, como: Química, Física, Climatologia, Geografia, Economia, Oceanografia, Geologia, Antropologia, Sociologia, Psicologia; e outros ramos da Biologia: Botânica, Fisiologia, Zoologia etc. • Depois do primeiro emprego da palavra ecologia, em 1869, com o alemão Ernst Haeckel, outros pesquisadores contribuíram no desenvolvimento desta ciência. • Forbes (1887) subdividiu a ecologia em Ecologia Animal e Ecologia Vegetal, na segunda metade do século XIX. • Möbius (1877) abordou a ecologia dos oceanos. • A termodinâmica, a estatística e a cibernética contribuíram para melhor explicar a função e estrutura dos ecossistemas. • A Ecologia Humana foi criada através da observação do papel do homem no meio, por Odum (1959) e sob a ênfase da subsistência e da evolução das populações humanas no meio, por König (1967) e Wallner (1972), designado de relação dependente (socioeconomia e antropoecologia). • No século XX, a ecologia foi reconhecida como um campo distinto da biologia e como ciência. • Espécie é o conjunto de indivíduos semelhantes que se intercruzam, originando descendentes férteis. • Organismo é um ser vivo. A unidade fundamental da ecologia. Cada organismo é limitado por uma membrana (unicelulares) ou outra cobertura, no qual ocorre uma troca de energia e matéria com seu meio. • População é o conjunto de indivíduos da mesma espécie que vivem numa mesma área em um determinado período. • Comunidade é o conjunto de populações de várias espécies que habitam um 12 determinado espaço em um determinado tempo. • Ecossistema ou sistema ecológico é o conjunto dos fatores abióticos e bióticos que interagem. • Habitat é o endereço de uma espécie dentro do ecossistema. • Biótopo é a área física na qual determinada comunidade vive. • Nicho ecológico é o conjunto de condições e recursos necessários à sobrevivência de um organismo. • Ecótono é a região de transição entre duas comunidades ou entre dois ecossistemas. • Biosfera é o conjunto de todos os ecossistemas da Terra, os seres vivos e o ambiente em que vivem (habitat). 13 AUTOATIVIDADE 1 Qual o conceito biológico da palavra Ecologia e discorra sobre a importância deste estudo para os seres vivos em geral. 2 Assinale as alternativas incorretas e torne-as corretas: a) Espécies são indivíduos morfologicamente diferentes, capazes de se reproduzirem e gerarem descendentes férteis. b) População: indivíduos da mesma espécie presentes em áreas diferentes. c) Comunidade: indivíduos de iguais espécies presentes em uma área. d) Ecossistema: relação que ocorre entre a comunidade e os fatores abióticos. e) Biosfera: maior ecossistema da Terra, parte não viva do planeta. f) Habitat: papel “profissão” que o indivíduo desempenha na natureza. 14 15 TÓPICO 2 AMBIENTE FÍSICO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Depois do contexto introdutório da ecologia, o que ela é? Qual é a sua função? E do que consiste? Podemos entender que no mundo natural encontramos componentes vivos e o não vivos onde um depende do outro. Em outras palavras, a vida depende do mundo físico e os seres vivos afetam o meio físico. Neste Tópico veremos a influência do meio físico sobre a vida, ou seja, sobre os organismos e consequentemente sobre o seu grupo. O conjunto de todos os fatores físicos exerce influência sobre o crescimento, atividades, características e a distribuição de comunidades, em diferentes locais (regiões), determinando a diversidade de ambientes (RICKLEFS, 2003). 2 POTENCIAL BIÓTICO Em condições hipotéticas ideais, em que não houvesse mortalidade e nenhuma restrição à sobrevivência de uma população biológica, seu crescimento seria infinito, atingindo rapidamente um número elevadíssimo de indivíduos. Vamos pensar na reprodução de um casal de coelhos, que aos seis meses estão maduros sexualmente, e a cada dois meses se procriam gerando em média sete filhotes. Ao completar dois anos estes já somariam 3158 descendentes, e ao final de alguns anos somariam milhões de indivíduos, cuja capacidade de crescimento se denomina potencial biótico. A representação gráfica deste crescimento hipotético é representada por uma curva exponencial em forma de J (Figura 4). No entanto, em ecossistemas naturais não se observa tal potencial biótico. Observam-se populações relativamente estáveis na sua densidade, devido à resistência do meio, observando-se então o crescimento real. Isso ocorre porque todas as populações estão expostas a uma grande variedade e quantidade de fatores ambientais (bióticos e abióticos), que limitam o seu crescimento, cujo conjunto de fatores ambientais limitantes denomina-se resistência do meio. Esta resistência pode ocorrer devido à indisponibilidade de alimento, água, espaço, condições climáticas adversas e pelas relações com outras espécies, principalmente a predação e a competição (Figura 5) (RICKLEFS, 2003). UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 16 FIGURA 4 – GRÁFICO DE CRESCIMENTO REAL DE UMA POPULAÇÃO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 16 abr. 2013. FIGURA 5 – FATORES AMBIENTAIS QUE INFLUENCIAM O CRESCIMENTO REAL DE UMA POPULAÇÃO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 16 fev. 2013. De modo geral uma população cresce em um ambiente favorável real obedecendo aos seguintes critérios: • Primeiramente o crescimento populacional é baixo, pelo baixo número de indivíduos. • Ocorre um aumento exponencial, à medida que o número de indivíduos vai aumentando. TÓPICO 2 | AMBIENTE FÍSICO 17 • Sua densidade também aumenta, elevando a resistência do meio, diminuindo o crescimento populacional. • É atingido um equilíbrio na taxa de natalidade e mortalidade (estabilização da densidade populacional), permanecendo constante. Graficamente esse crescimento tem forma sigmoide, em forma de S, caracterizando o limite máximo de indivíduos suportado pelo ambiente (capacidade de suporte do meio ou carga biótica máxima). (Figura 4) (RICKLEFS, 2003). 3 FATORES LIMITANTES FÍSICOS Agora veremos os principais fatores abióticos que formam os diferentes ecossistemas distribuídos no planeta e a sua influência sobre o sucesso de um organismo, de um grupo de organismos, ou de uma comunidade biótica. Bem como, os fatores limitantes (qualquer condição que se aproxime ou exceda os limites de tolerância), ou seja, que se aproxime das necessidades mínimas de sucesso, em condições de estabilidade de uma comunidade (ODUM; BARRETT, 2008). Os fatores climáticos (luz, temperatura, umidade e pluviosidade) caracterizam o clima de uma região, e os fatores edáficos, como a composição química e a estrutura do solo, classificam os diferentes fatores abióticos. Esses fatores nada mais são do que as condições ambientais, ou seja, as características físicas e químicas do ambiente e não são consumidas nem esgotadas durante as atividades dos organismos, criando assim o Macroclima ou Clima Regional e o Microclima particular a que um organismo vivo está sendo submetido (ODUM; BARRETT, 2008). Segundo Odum e Barrett (2008), os principais fatores limitantes físicos (fatores abióticos) de um ecossistema natural são: A luz, energia indispensável ao desenvolvimento das plantas, através do processo da fotossíntese, que capta a energia luminosa, tendo como fonte o sol. Com exceção das espécies cavernícolas (que vivem em cavernas)e das espécies abissais (que vivem em grandes profundezas), todos os seres vivos necessitam de luz solar. A luz também influencia a distribuição dos seres vivos e suas características morfológicas (fenótipo). Desta forma, os seres vivos, cada um na sua espécie, conseguem sobreviver entre um limite de temperatura, denominado por limite térmico ou Lei do Mínimo de Liebig. E para que suas atividades vitais possam ser desenvolvidas ao máximo, deverão se encontrar, na faixa da temperatura ótima. A água é outro fator indispensável para a sobrevivência dos organismos e das comunidades. Sua importância se dá tanto nas atividades celulares e fisiológicas dos seres vivos (transpiração e condução das seivas), como também, no ponto de vista ecológico, já que, nos ambientes terrestres e aquáticos, a salinidade pode variar muito causando a perda de água dos organismos por osmose. Por isso, UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 18 a chuva, a umidade, a evaporação e a disponibilidade superficial de água são os principais fatores abióticos de um ecossistema. Os gases atmosféricos, como o oxigênio e o gás carbônico, também são essenciais para a vida no planeta Terra (fotossíntese e respiração), em ambientes terrestres e aquáticos, assim como a concentração de íons de hidrogênio, que estão diretamente relacionados ao pH da água (habitat de muitos organismos). E por fim, o vento e as enchentes também são considerados fatores limitantes aos seres vivos, porque o meio atmosférico e hidrosférico não são estáveis. Por isso, são fatores que contribuem para o aumento ou diminuição da produção no nível de espécies em nível de ecossistema. Não se pode esquecer a disponibilidade de nutrientes (macronutrientes e micronutrientes) também essenciais à vida dos animais e vegetais, por serem elementos e compostos necessários ao funcionamento das atividades vitais dos organismos vivos. Além dos fatores abióticos, temos os fatores bióticos que limitam o crescimento e reprodução de organismos e comunidades (parasitismo, competição e predação). Segundo Ricklefs (2003), o pesquisador russo Georgyi F. Gause, em seus experimentos, demonstrou através da produção de duas populações de protozoários (Paramecium aurelia e Paramecium caudatum), que duas populações não podem coexistir por muito tempo no mesmo habitat, especialmente quando ocorre a sobreposição de nichos de duas ou mais espécies, denominado por Princípio de Gause ou Princípio da Exclusão Competitiva. Assim, após certo período, uma das populações poderá apresentar um crescimento gradual enquanto outra poderá declinar (Figura 6). Além disso, o aumento da densidade populacional também poderá levar à diminuição da natalidade e assim, o aumento da mortalidade proporcionando flutuações populacionais, bem como o estresse ambiental (secas, erupções vulcânicas etc.). Os indivíduos sobreviventes é que transmitirão esse potencial genético às futuras populações. Entre as fontes de estresse ambiental encontramos: as físicas (condições extremas de calor, umidade, luz, radiações em geral) descritas anteriormente, a poeira e outros poluentes, que serão descritos na Unidade 3, que tratam da influência do homem sobre o meio ambiente e este (ambiente físico) sobre os organismos vivos, e as biológicas (predadores, parasitas – inclusive patógenos), além da deficiência ou excesso de nutrientes específicos. Na Figura 7 podemos ver um exemplo de adaptação de indivíduos às mudanças ambientais e ao estresse, estudada pela Fisiologia Ambiental. TÓPICO 2 | AMBIENTE FÍSICO 19 FIGURA 6 – CRESCIMENTO DAS POPULAÇÕES DE DUAS ESPÉCIES DE PARAMÉCIO, OBTIDAS POR GAUSE, CULTIVADAS NO MESMO RECIPIENTE, MOSTRANDO A EXTINÇÃO DO PARAMECIUM CAUDATUM PELA FORTE COMPETIÇÃO COM O PARAMECIUM AURELIA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 16 fev. 2013. Linha superior representa P. aurelia e a linha inferior representa P. caudatum. FIGURA 7 – O ESTRESSE AMBIENTAL COMO LIMITANTE, OCASIONANDO FLUTUAÇÕES POPULACIONAIS FONTE: Disponível em: . Acesso em: 16 fev. 2013. Por fim, um organismo ou grupo apresenta uma taxa mínima ou máxima de tolerância à deficiência ou ao excesso de um fator ambiental, que pode limitar seu desenvolvimento e reprodução, chamado de Lei da Tolerância de Shelford (Figura UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 20 FIGURA 8 – AMPLITUDE ECOLÓGICA DE UM ORGANISMO OU POPULAÇÃO, COM O LIMITE MÁXIMO PARA UM FATOR E LIMITE MÍNIMO PARA OUTRO FATOR – LEI DA TOLERÂNCIA DE SHELFORD FONTE: Disponível em: . Acesso em: 16 fev. 2013. FIGURA 9 – UM EXEMPLO DE AMPLITUDE DE TOLERÂNCIA DE UMA POPULAÇÃO, COM O LIMITE INFERIOR E LIMITE SUPERIOR DE TOLERÂNCIA TÉRMICA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 18 fev. 2013. 8). A este espectro (mínimo e máximo) de tolerância denomina-se Amplitude Ecológica, que poderá ser larga ou estreita, para cada um dos fatores ecológicos. Ex.: disponibilidade de alimento (fator limitante dependente da densidade) e frio (fator limitante independente da densidade). Quanto mais um organismo ou grupo estiverem próximos deste limite, maior será o estresse ambiental (tendo que usar todos os seus artifícios) para sua sobrevivência, e quando um organismo ou grupo volta ao seu nível normal, esta capacidade recebe o nome de Resiliência. 4 MAGNIFICAÇÃO BIOLÓGICA DAS SUBSTÂNCIASTÓXICAS Magnificação biológica ou trófica é a concentração acumulativa de algumas substâncias através da distribuição de energia, via cadeia alimentar, pelo TÓPICO 2 | AMBIENTE FÍSICO 21 comportamento de certos radionuclídeos persistentes (césio-127, estrôncio-90, plutônio-239 e o fósforo radioativos etc.), pesticidas (a base de hidrocarbonetos clorados), metais pesados encontrados em tintas, agrotóxicos, indústrias têxteis etc. ((cádmio (Cd), chumbo (Pb), zinco (Zn), mercúrio (Hg), cobre (Cu) entre outros), benzopireno (hidrocarboneto liberado combustão, ação cancerígena), entre outros. Radionuclídeos são substâncias radioativas usadas no diagnóstico e tratamento de problemas de saúde, a serviço da medicina nuclear em hospitais, clínicas e laboratórios, fiscalizados pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Os radionuclídeos são usados no mundo desde 1940 e no Brasil iniciou-se em 1955, cuja denominação genérica dos exames da medicina nuclear denomina-se cintilografia, fundamental para o diagnóstico e tratamento de inúmeras doenças, em fase bastante precoce. Além disso, o avanço tecnológico tem permitido o uso de radionuclídeos que emitem radiações que ficam menos tempo no organismo e não lhe causam danos. Um exemplo desse avanço se observa na radiação cósmica de um voo Rio-São Paulo que é mínima e ainda superior, a comparada aos exames administrados atualmente na medicina nuclear. FONTE: Disponível em: . Acesso em: 20 de mar. de 2013. Por não serem biodegradáveis, permanecem nos ecossistemas e entram na cadeia alimentar, passando aos diferentes níveis tróficos (produtores aos consumidores). Como apenas 10% da matéria e energia são efetivamente absorvidos pelo nível trófico imediatamente superior, estes necessitam consumir uma biomassa 10 vezes maior do que a sua própria (veja unidade 2). Por isso, a passagem de matéria e energia a partir dos produtores e destes aos consumidores é sempre numa concentração acumulativa e crescente. Dessa forma, uma maior acumulação destas substâncias ocorre nos organismos que se encontram no topo da cadeia alimentar, incluindo o homem. Como exemplo pode-se citar o DDT (dimetil-difenil-tricloroetano) ou mesmo o BHC (benzeno-hexaclorito), criado após a resistência de algumas espécies ao DDT. Estes inseticidas (combatem piolhos, moscas, mosquitos e pragas da lavoura no mundo todo), são biocidas originalmente usados para matarinsetos, mas que interferem diretamente sobre peixes, aves e outros consumidores. As aves são extremamente vulneráveis, a estes biocidas, pois estes interferem na formação da casca do ovo fazendo com que se quebrem antes do término de seu desenvolvimento. Deste modo, pequenas concentrações podem não ser letais para alguns indivíduos, mas para a população (diminuição do número populacional). Esses e outros pesticidas e agrotóxicos, embora proibidos, ainda continuam sendo industrializados e comercializados, pondo em risco a saúde do homem, de outros animais e do ambiente. (PEAKALL, 1967; HICKEY; ANDERSON, 1968 apud ODUM; BARRETT, 2008). NOTA UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO 22 Segundo pesquisas, metais pesados encontrados no lodo de esgotos industriais, em área urbana ou bacias hidrográficas, podem ser magnificados biologicamente através da cadeia alimentar. Estudos mostraram que minhocas do gênero Lumbricus, detritívoras, acumularam 30 vezes mais cádmio do que níveis encontrados no solo; 60 vezes mais do que encontrado nas plantas Poa, e mais de 100 vezes acima dos níveis encontrados em rins de arganaz-do-prado (Microtus), durante o décimo ano de aplicação de lodo de esgoto, no local do experimento (veja maiores detalhes deste experimento em CARSON, 1962; LEVINE et al., 1989; e BREWER et al., 1994). Os autores citados anteriormente propõem que estes animais são indicadores entre os detritívoros e monitores dos efeitos do lodo ao longo do tempo, principalmente durante a sucessão secundária desta paisagem (ODUM; BARRET, 2008). 23 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você pode concluir que: • No ambiente natural, os fatores ambientais podem limitar indivíduos e populações, influenciando o crescimento, atividades, características e a distribuição de comunidades, para diferentes locais (regiões), determinando a diversidade de ambientes. • Potencial biótico é a capacidade de sobrevivência de uma população biológica em condições hipotéticas ideais, sem nenhuma restrição de sobrevivência (crescimento infinito). O que em ecossistemas naturais não se observa. Observam-se populações relativamente estáveis na sua densidade, devido à resistência do meio (indisponibilidade de alimento, água, espaço, condições climáticas adversas e pelas relações com outras espécies, principalmente a predação e a competição), observando-se então o crescimento real. • Fatores limitantes: são quaisquer condições que se aproxime ou exceda os limites de tolerância (se aproxime das necessidades mínimas de sucesso), em condições de estabilidade de uma comunidade. • Os fatores abióticos se subdividem em: fatores climáticos (luz, temperatura, umidade e pluviosidade) e os fatores edáficos (composição química e a estrutura do solo); criando o Macroclima ou Clima Regional e o Microclima, particular a que um organismo vivo está sendo submetido. • Os principais fatores limitantes físicos (fatores abióticos) de um ecossistema natural são: • Luz, energia indispensável ao desenvolvimento das plantas, através do processo da fotossíntese, que capta a energia luminosa, tendo como fonte o sol. • Temperatura, cada espécie de seres vivos consegue sobreviver entre um limite de temperatura, denominado, limite térmico ou Lei do Mínimo de Liebig, para o desenvolvimento de suas atividades vitais. • Água, indispensável para a sobrevivência dos organismos e das comunidades (atividades celulares e fisiológicas dos seres vivos – transpiração e condução das seivas). • Os gases atmosféricos como o oxigênio e o gás carbônico são essenciais para a vida no planeta terra (fotossíntese e respiração), em ambientes terrestres e aquáticos. E a concentração de íons de hidrogênio, diretamente relacionados ao pH da água. 24 • Disponibilidade de nutrientes (macronutrientes e micronutrientes) também é essencial à vida dos animais e vegetais (elementos e compostos necessários ao funcionamento das atividades vitais dos organismos vivos). • Vento e enchente, também são fatores limitantes dos seres vivos, contribuem para o aumento ou diminuição da produção de ecossistemas, no nível de espécies. • Os fatores bióticos limitam o crescimento e reprodução de organismos e comunidades (parasitismo, competição e predação). • O Princípio de Gause se refere a duas populações que não podem coexistir por muito tempo em um mesmo lugar, principalmente quando ocorre a sobreposição de nichos de duas ou mais espécies. • Flutuação populacional ocorre com o aumento da densidade populacional, levando à diminuição da natalidade e ao aumento da mortalidade. • Estresse ambiental natural se refere a secas, erupções vulcânicas etc. • As fontes de estresse ambiental: físicas (condições extremas de calor, umidade, luz, radiações em geral) e biológicas (predadores, parasitas – inclusive patógenos), deficiência ou excesso de nutrientes específicos. • A Lei da Tolerância se refere a um organismo ou grupo que apresentam uma taxa mínima ou máxima de tolerância, para os fatores ecológicos. • Amplitude ecológica é um termo que se refere ao espectro mínimo e máximo de tolerância. • Resiliência é a capacidade de um organismo ou grupo voltar ao nível normal, após terem passado por um estresse ambiental. • Magnificação biológica consiste na acumulação de substâncias nocivas, via cadeia alimentar. 25 AUTOATIVIDADE 1 O que você entende por fator ecológico? 2 Em que condições um fator ecológico desempenha o papel de fator limitante? 3 O que diz o enunciado da Lei de tolerância? 4 Quando uma população está em resiliência? 5 O potencial biótico é observado em ecossistemas naturais? Justifique. 6 Diferencie organismos euritérmicos de estenotérmicos. Assista ao vídeo de resolução da questão 5 Assista ao vídeo de resolução da questão 2 26 27 TÓPICO 3 BIOMAS UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Como vimos no tópico anterior, a ecologia estuda a relação e a influência dos componentes do meio ambiente com os seres vivos. Assim, o meio ambiente inclui os elementos do clima, do solo, da água, de organismos, de uma população ou de uma comunidade. Neste tópico veremos as caracterizações dos biomas terrestres brasileiros e mundiais. Vamos lá! 2 O QUE SÃO BIOMAS? Biomas são grandes comunidades de plantas e animais dos ecossistemas de terra firme sob a influência da latitude e altitude. Os biomas podem ser “um grande biossistema regional ou subcontinental caracterizado por um tipo principal de vegetação ou outro aspecto identificador da paisagem” (ODUM, 1985). 3 AS CONDIÇÕES QUE DETERMINAM A DISTRIBUIÇÃO DOS BIOMAS E A ADAPTAÇÃO DOS SERES VIVOS AOS PRINCIPAIS BIOMAS MUNDIAIS E BRASILEIROS A influência do clima e latitude determinam os diferentes tipos de biomas terrestres. Os principais ambientes onde se desenvolvem os biomas são os campos, florestas, desertos, praias e montanhas. Entre as florestas pode-se destacar a floresta tropical úmida, a floresta temperada, a floresta de mangues e a floresta de coníferas. Entre os variados campos, a campina, a pradaria, a savana, o pampa, a tundra, a estepe, o cerrado, a taiga etc. A caatinga, que é característica entre o campo e o deserto; e, por fim, os desertos como o do Saara, do Gobi e o do Arizona, todos com características diferenciadas (Figuras 10 (a), (b), (c) e 11) (ODUM;BARRET, 2008). 28 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO O crescimento das plantas está diretamente relacionado com o clima, formando os grandes tipos vegetais. Os grandes tipos de vegetação podem ser usados para classificar ecossistemas em categorias chamadas biomas. Fatores como o solo, a sazonalidade climática, os incêndios e a paisagem influenciam adicionalmente o caráter dos biomas. As abordagens usadas para a classificação de biomas são: a abordagem de zona climática de Walter, que classifica as regiões com base no clima, dentro das quais o tipo característico de vegetação normalmente se desenvolve, e a abordagem simplificada de vegetação de Whittaker(1975), que classifica as regiões. Adicionalmente a vegetação geralmente reflete o clima local (RICKLEFS, 2003). As distribuições geográficas de plantas nas escalas continentais são determinadas principalmente pelo clima e latitude, enquanto as distribuições locais dentro das regiões podem variar de acordo com a topografia e com os tipos solos (RICKLEFS, 2003). O clima afeta profundamente a evolução das plantas e dos animais, que se tornam especializados para condições particulares do ambiente físico. Consequentemente cada região apresenta suas características vegetais que diferem na forma de crescimento, na morfologia foliar e na sazonalidade da folhagem (RICKLEFS, 2003). ATENCAO IMPORTANTE TÓPICO 3 | BIOMAS 29 FIGURA 10 – (a): EFEITO DA ALTITUDE E LATITUDE SOBRE A DISTRIBUIÇÃO DOS PRINCIPAIS BIOMAS DO MUNDO FONTE: Disponível em: . Acesso em: 6 mar. 2013. FIGURA 10 – (b) BIOMAS FONTE: Disponível em: . Acesso em: 6 mar. 2013. 30 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO FIGURA 10 - (c) BIOMAS FONTE: Disponível em: Acesso em: 6 mar. 2013. FIGURA 11 – OS PADRÕES DE WHITTAKER (1975) DAS FORMAÇÕES VEGETAIS NO MUNDO, BASEADOS NA RELAÇÃO DAS MÉDIAS ANUAIS DE PRECIPITAÇÃO (cm3) COM AS MÉDIAS ANUAIS DE TEMPERATURA (ₒC). FONTE: Disponível em: . Acesso em: 25 fev. 2013. TÓPICO 3 | BIOMAS 31 Os principais biomas terrestres mundiais As zonas de biomas climáticos estão amplamente divididas de acordo com as suas latitudes norte e sul do Equador em zonas tropicais, temperadas, boreais e polares. Dentro destas zonas latitudinais, o nível anual de precipitação e sua sazonalidade distinguem ainda mais os biomas. Dentro das zonas climáticas temperadas, os grandes biomas são as florestas sazonais, florestas úmidas e campos/desertos. Nas latitudes mais baixas dentro das zonas temperadas estão os bosques e arbustos de clima mediterrâneo. Os desertos subtropicais se situam entre as zonas climáticas tropicais e temperadas. Em latitudes maiores, encontram-se as florestas boreais, normalmente consistindo em árvores de acículas com folhagens persistentes e baixas taxas de crescimento sobre solos ácidos e pobres em nutrientes, e a tundra, um bioma sem árvores que se desenvolveu nos solos permanentemente congelados ou permafrost. As zonas climáticas tropicais são fornadas por florestas pluviais perenes e florestas sazonais que vão desde florestas parcial e completamente decíduas até florestas de espinhos em climas mais secos, e, às vezes, savana, um campo com árvores esparsas que é mantido pelas pressões do fogo e da pastagem (RICKLEFS, 2003) (Figuras 12 a e b). FIGURA 12 – (a): LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DOS PRINCIPAIS BIOMAS TERRESTRES MUNDIAIS FONTE: Disponível em: . Acesso em: 6 mar. 2013. 32 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO FIGURA 12 – (b): TIPOS DE VEGETAÇÃO E LOCALIZAÇÃO FONTE: AUDESIRK; AUDESIRK, 1996. Disponível em: . Acesso em: 6 mar. 2013. Classificação dos biomas a seguir relacionados, segundo Whittaker (1975), e as zonas climáticas do mundo de acordo com o curso anual da temperatura e da precipitação, segundo Heinrich Walter (1986). Bioma Tundra – Ártica e Alpina (acima das altitudes de limitação de árvores em montanhas altas, mesmo nos trópicos). É um bioma terrestre importante da América do Norte, encontrado nos países escandinavos, Sibéria, Canadá e Alasca. Essa zona climática polar fica localizada entre 60º e 80º de latitude norte, nas proximidades do Circulo Polar Ártico, apresentam uma temperatura média anual abaixo de -5ºC. O ar seco e a escassez de chuvas e muita neve formam um típico deserto polar. As estações climáticas se resumem em inverno e verão. No inverno, as temperaturas ficam entre -28ºC e -34ºC, com período de luminosidade curto e noites longas. Grandes camadas de gelo recobrem o solo. O verão, por sua vez, dura cerca de três meses, com temperatura máxima não ultrapassando os 10ºC. As noites são ausentes ou curtas, fazendo com que http://www.crv.educacao.mg.gov.br TÓPICO 3 | BIOMAS 33 o período de luminosidade seja longo. Durante o degelo ocorre a formação de pântanos/grandes brejos e várias lagoas, porque as águas superficiais não conseguem penetrar no subsolo, que fica permanentemente congelado denominado permafrost. Consequentemente a vegetação é perene e baixa, sem árvores, composta por gramíneas, ciperáceas (ervas), musgos e líquens, o solo apresenta baixa taxa de decomposição. Em relação à fauna, no solo existem poucos invertebrados pequenos e populações de herbívoros como os lemingues (pequenos roedores), ratos e lebres árticas. Entre os carnívoros há linces, aves predadoras migratórias como, as corujas, gaivotas e ptármigas (aves do tamanho de um pombo), e mamíferos, como as doninhas, ursos-polares, lobos, raposas entre outros. (ODUM; BARRET, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003) (Figura 13). FIGURA 13 – TUNDRA ÁRTICA – AMÉRICA DO NORTE FONTE: Disponível em: (a) (b) . Acesso em: 11 mar. 2013. Nas regiões de “Tundras”, as aves e os mamíferos possuem várias adaptações evitando a perda do calor corporal através da diminuição das extremidades corporais, como orelhas, caudas e patas. Além disso, apresentam espessa plumagem e pelagem (TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006). Bioma floresta boreal ou taiga ou biomas de floresta de coníferas do norte A floresta boreal se estende a 50ºN na América do Norte e cerca de 60ºN na Europa e Ásia com extensões que vão desde as montanhas até os trópicos. O clima é parecido ao da tundra, com temperatura anual média abaixo dos 5ºC e NOTA 34 UNIDADE 1 | VIDA E AMBIENTE FÍSICO precipitação entre 400 e 1.000mm. Devido a essa alta precipitação os solos são úmidos durante a maior parte da estação de crescimento da vegetação. As temperaturas no inverno (durante a metade do ano) podem chegar a -60ºC, havendo um curto período de luminosidade. O congelamento do solo dificulta a absorção de água pelas raízes, ocorrendo a seca fisiológica (árvores desfolhadas). Isso fez com que a vegetação se adaptasse a estas baixas temperaturas (tolerância) assim como às estações de crescimento (verão) que não duram mais de 100 dias, período de luminosidade maior e cuja temperatura pode chegar aos 20ºC. Durante o verão a paisagem vai mudando com o derretimento do gelo, formando-se pântanos e vários lagos, que permitem que a vida se torne abundante nesta estação, apesar da diversidade de espécies ser baixa. A flora é composta por cedros, abetos perenes do gênero Picea, pinheiros do gênero Abies e Pinus, bem como por laricas decíduas coníferas do gênero Larix, de 10-20m de altura, com folhas aciculadas (em forma de agulha) e grossa cutícula (evitar excesso transpiração). As florestas de coníferas estão entre as regiões de grande produção de madeira do mundo (ODUM; BARRETT, 2008). Os troncos apresentam um espesso súber (cortiça) para o isolamento térmico e proteção dos tecidos internos. A densa sombra que se estende o ano todo proporciona pouco desenvolvimento de camadas de arbustos e de ervas e, devido ao congelamento do solo, a decomposição da serapilheira de acículas (produz ácidos orgânicos) é lenta, acumulando-se na superfície do solo, formando solos ácidos, podzolizados e de baixa fertilidade. A fauna de solo é composta por populações razoáveis de invertebrados, além de vertebrados herbívoros como o alce, lebre-da-pata-branca (dependem das angiospermas), esquilos, pintassilgos, pardais e muitas outras aves migratórias (sementes de coníferas), ursos, lobos, raposas (ODUM; BARRETT, 2008; TOWNSEND; BEGON; HARPER, 2006; RICKLEFS, 2003) (Figura 14). FIGURA 14 – FLORESTA DE CONÍFERAS NA FRANÇA FONTE: Disponível em: . Acesso em: 11 mar. 2013. TÓPICO 3 | BIOMAS