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TEMA 02 – CONTESTAÇÃO – PARTE II Aula 01 – Contestação – parte II A contestação parece ser uma peça processual simples, porém, existe uma série de aspectos formais e procedimentais eu acabam tornando-a um texto complexo para o profissional que possui uma boa qualificação. Já se observou que a contestação é a defesa do réu/demandado, e isso sempre deve estar muito claro na mente do operador jurídico, porque deve estar também clara a limitação da matéria que pode ser alegada em sede de contestação. Na contestação, apenas se podem alegar matérias defensivas, que representem uma resistência do réu/demandado diante da pretensão do autor/demandante. Não obstante, na contestação não se pode realizar pedidos, apenas requerimentos. Em casos excepcionais, como no procedimento dos juizados especiais ou nas ações possessórias, é admitido um pedido contraposto na contestação. Em outros casos, quando o réu quer contra-atacar a parte autora sob os mesmos fatos alegados em sede inicial, deve recorre à reconvenção, que será matéria de estudo mais adiante. Deve-se recordar, neste sentido, os ensinamentos da doutrina, que explicam que, da mesma forma que o autor tem o direito de apresentar uma causa perante o judiciário, o réu também tem o direito de defender-se: Da mesma forma como garante a todos o direito de ação, isto é, o direito de demandar perante o Poder Judiciário (art. 5o, XXXIV e XXXV, CF), a Constituição Federal também garante aos demandados o direito a ampla defesa (art. 5o, inciso LV, CF); em outras palavras, o direito de resistir à pretensão do autor, podendo esta resistência tomar várias formas no processo civil, tais como: contestação, reconvenção, exceções, impugnações e embargos. (ARAÚJO JUNIOR, 2020, p. 11). Deve-se ressaltar também que o réu/demandado não é obrigado a responder ao litígio judicial. Contudo, se não o fizer, estará sujeito a sofrer os efeitos da revelia, e reputar-se-ão verdadeiras as alegações da parte autora. (ARAÚJO JUNIOR, 2020). Apenas a parte ré/demandada é legítima para se defender, então, apenas essa parte pode arguir uma série de questões processuais que devem ser cautelosamente analisadas. Nesse sentido, se deve prosseguir com as questões de ordem práticas iniciadas na última aula do bloco anterior. A primeira questão a ser abordada é a seguinte: Qual a diferença entre exceções e objeções? No processo civil existem dois termos técnicos importantes: exceções e objeções. Compreender tais termos técnicos pode se mostrar útil para a prática profissional da advocacia. Ambas, exceções e objeções, são matérias que podem ser alegadas pela parte ré/demandada em sede de contestação. São, portanto, outras formas de classificar defesas processuais e materiais (mérito). Para a doutrina, as exceções não são defesas diante dos pedidos do autor. As exceções implicam questões de ordem processual e são, portanto, arguidas em sede de preliminar de contestação. Exceção, em sentido amplo (lato sensu) pode ser matéria arguida por ambas as partes em um processo. Porém, neste momento, deve-se ressaltar o sentido estrito (stricto sensu) de exceção, que se referem às matérias específicas de alegação da parte demandada/ré na contestação. Existem duas classes principais de exceções: a) Processuais; b) Materiais (de mérito). As exceções processuais são matéria de defesa preliminar e, em sua grande maioria, podem ser arguidas de ofício pelo magistrado. Deve-se relembrar que o reconhecimento de ofício pelo magistrado se caracteriza pela apreciação de uma matéria sem que ela tenha sido provocada por uma das partes. Em razão do princípio da inércia processual, entende-se que um tema não pode ser analisado pelo magistrado se não for arguido por uma das partes. Contudo, existem matérias de ordem pública que não apenas podem, mas devem ser reconhecidos de ofício pelo juiz. O reconhecimento de ofício ocorre quando uma questão de ordem de preliminar processual ou preliminar de mérito são analisadas pelo poder judiciário, mesmo que nenhuma das partes a tenha alegado. Portanto, observando-se o rol do artigo 337 do CPC/2015, existem treze matérias processuais que podem ser arguidas em sede de preliminar processual. Contudo, destas treze, apenas duas não se tratam de exceções. As exceções podem ser reconhecidas de ofício pelo magistrado e, no rol do artigo 337 do CPC/2015, a incompetência relativa e o compromisso arbitral não podem ser reconhecidos de ofício pelo magistrado. Portanto, são as duas únicas hipóteses de preliminares processuais que não são exceções. Já as exceções materiais (também conhecidas como exceções de mérito ou exceções substanciais), são vinculadas à arguição de matéria de mérito em sede de contestação. As exceções são arguidas em sede preliminar de mérito, e as mais comuns são a prescrição e a decadência. As exceções de matéria de mérito não apenas podem, mas devem ser reconhecidas de ofício pelo magistrado. Diferentemente das exceções processuais, que podem levar a resolução do caso sem julgamento de mérito, as exceções materiais resolvem o processo com resolução de mérito, tamanha é sua incidência sobre o direito material pleiteado. Entende-se que a prescrição e a decadência são questões de ordem pública e, assim como as exceções processuais, esta é a justificativa para que o magistrado atue de ofício no seu reconhecimento. Lembre-se que A prescrição e a decadência devem ser alegadas dentro da defesa de mérito, pois, caso acolhida uma delas, o processo será extinto nos termos do art. 487, II, do CPC. Contudo, antes de adentrar na defesa de mérito propriamente dita. ( p. 129). Observe-se também a redação do artigo 487, em especial, ao seu inciso II do CPC/2015, que dispõe que o processo será extinto com resolução de mérito se o magistrado “decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição” (BRASIL, 2015, s.p.). Contudo, mesmo que uma matéria de defesa processual ou de mérito possa ser reconhecida de ofício, isso não significa que ela não deva ser alegada pela parte ré/demandada. A boa técnica profissional indica que, por mais que a matéria possa ser reconhecida de ofício, ela deve ser interposta pelo procurador da parte demandada. Isso demonstra a técnica qualificada do profissional e também demonstra domínio do processo civil. Ainda, isso auxilia o próprio magistrado, que, muitas vezes, pode não estar a par de todas as informações sobre o litígio, o que pode prejudicar sua análise sobre a prescrição e a decadência. Portanto, mesmo que as exceções e objeções possam ser reconhecidas de ofício pelo magistrado julgador da causa, o procurador jurídico representante da parte ré/demandada deve argui-las em sede de contestação. É indispensável ressaltar que a prescrição e a decadência são matérias que podem ser arguidas em sede de defesa, mesmo que apresentadas de forma intempestiva. Isso significa que essas preliminares de mérito, por se tratarem de matéria de ordem pública, podem ser reconhecidas como parte da defesa do réu, mesmo que a contestação já tenha sito apresentada. Se o procurador da parte já tiver peticionado a contestação e, posteriormente, perceber a incidência da prescrição e decadência, poderá realizar uma petição simples informando o magistrado sobre tais preliminares de mérito. Mas isso só se aplica a esses casos específicos de matéria de mérito de ordem pública (prescrição e decadência). Nos demais casos, se a matéria não for arguida na contestação e não for de ordem pública, não poderá ser alegada em outro momento processual. Esses são, portanto, os aspectos principais de diferenças e semelhanças entre exceções e objeções na defesa do réu. Para melhorar o aprendizado sobre elas, observe-se o quadro síntese a seguir: Quadro síntese sobre as diferenças entre exceções e objeções na defesa do réu: Após esses esclarecimentos, é possível avançar para a próxima questão prática para o exercício da advocacia contenciosa. Essa questão é a seguinte: Qual a diferença entre preliminar e prejudicial? Como já destacado várias vezes neste estudo, as preliminares são defesas processuais, que indicam defeitos na formalidade do procedimento jurisdicional e que, se não sanadas, podem implicar na extinção do processo sem a resolução do mérito da demanda. São matérias arguidas em sede de preliminar de contestação e encontram-se elencadas no artigo 337 do CPC/2015. Observe-se o quadro síntese a seguir sobre a relação entre as preliminares arguidas em uma contestação e os requerimentos que delas devem se originar: Quadro síntese sobre as alegações preliminares e os requerimentos e delas resultam: Fonte: BARROSO, Darlan; LETTIÈRE, Juliana Francisca. Prática no processo civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 125-126. Quanto as preliminares, portanto, não restam dúvidas de que se referem às matérias que podem ser alegadas em tema de defesa processual, antes do ingresso no mérito da demanda. Por outro lado, restam as dúvidas quanto as prejudiciais. Se, por um lado, as preliminares são temas que podem ser arguidos em sede de defesa preliminar de contestação e se referem aos defeitos processuais da causa, por outro lado, as prejudiciais são questões essenciais ao mérito da demanda, que prejudicam a análise do direito. Nas prejudiciais não se está mais mencionando as preliminares processuais ou as preliminares de mérito (prescrição e decadência). As prejudiciais são questões que tangenciam o mérito da causa e representam um defeito para o seu julgamento. Para melhor compreensão do assunto, observe-se o seguinte exemplo: determinado negócio jurídico é levado a questionamento em juízo. O autor da demanda faz o pleito em ação judicial, exigindo o pagamento pela obrigação derivada do negócio jurídico. Por outro lado, a parte ré, exige o desfazimento do negócio jurídico, baseada em uma das hipóteses de vício no negócio jurídico. Verificada a nulidade do negócio jurídico pelo magistrado julgador da demanda, o mérito da demanda estará prejudicado, pois todos os direitos que derivam de tal negócio são considerados automaticamente nulos. Neste sentido, pode-se dizer que as prejudiciais são as questões que surgem diante do magistrado que impedem o julgamento do caso com base no direito pleiteado pela parte autora, ou seja, prejudicam o mérito da demanda. Elas solucionam o processo com resolução de mérito, porém, não sobre os mesmos fundamentos elencados pela parte autora da demanda. Assim, um exemplo de prejudicial são as hipóteses de nulidades dos negócios jurídicos. Deve-se ressaltar, portanto, que ambas as preliminares e prejudiciais são matérias de ordem da defesa do réu, que devem ser arguidas em sede de contestação. Todavia, a principal diferença entre elas é que as preliminares acarretam a extinção do processo sem resolução de mérito, enquanto que as prejudiciais resolvem o mérito do processo. Sobre o assunto, observe-se o quadro síntese a seguir: Quadro síntese sobre as principais diferenças entre preliminares e prejudiciais: Outro ponto muito importante a ser ressaltado é que as preliminares não podem ser objeto de processo autônomo. Essa informação parece ser óbvia, tendo em vista que se está tratando das defesas processuais, e isso significa que são as matérias que podem ser arguidas mediante provocação. Não há sentido em alegar preliminares em processo autônomo. Contudo, essa questão não é tão clara para quem obtêm profundo conhecimento da prática processual cível. Existem situações em que as prejudiciais podem ser alegadas em processo autônomo. Imagine-se, por exemplo, a questão da nulidade do negócio jurídico que é utilizada como base para uma ação judicial de rescisão contratual, enquanto que há outro processo de execução da obrigação firmada em tal negócio jurídico. Nestes casos, por força do artigo 313 inciso V, alínea a do CPC/2015, o processo estará suspenso enquanto pender julgamento sobre a ação que versa sobre a prejudicial de sua matéria: Art. 313. Suspende-se o processo: (...) V - quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente. (BRASIL, 2015, s.p.). Portanto, outra diferença substancial entre as preliminares e as prejudiciais é que as preliminares só podem ser alegadas em contestação, não podem ser objeto de processo autônomo. Não se pode, por exemplo, ingressar com uma ação específica para reconhecimento da incompetência absoluta do juízo (matéria de preliminar processual). Isso deve ser um tema alegado na peça da contestação. Por outro lado, as prejudiciais podem ser objeto de ação autônoma. Assim, pode-se ingressar com uma ação de declaração de nulidade contratual, mesmo que se esteja na pendência de julgamento de ação que resulte das obrigações contraídas pelo contrato. Aula 02 – Contestação – parte II Nas aulas anteriores o enfoque recaiu sobre algumas questões de ordem prática para o exercício da advocacia contenciosa. Isso não significa que os demais temas aqui estudados não possuem aplicabilidade prática. Todos os conhecimentos adquiridos neste módulo são importantes porque lançam as bases teóricas necessárias para que o profissional jurídico desempenhe suas atividades práticas de forma coerente e qualificada. Um desses conhecimentos teóricos importantes para uma defesa do réu/demandado eficaz é sobre os princípios que regem a contestação. Esse será o tema desta aula. Em específico, abordam-se os princípios da: eventualidade, eficácia preclusiva da coisa julgada, dedutível e ônus da impugnação específica. Antes de adentrar no estudo específico de cada um desses princípios, deve-se ressaltar que: Os princípios não são regras jurídicas. Isso significa que os princípios não são específicos e certos como são as regras do direito. Eles são como mandamentos de otimização, isto é, nortes a serem seguidos para potencializar a intepretação sobre determinadas regras jurídicas. Tanto os princípios quanto as regras jurídicas podem estar contidos em normas jurídicas, isto é, no texto de algum diploma legal. Para melhor observação das características e diferenças entre regras e princípios, observe-se o quadro síntese a que dispõe sobre os critérios de diferenciação entre ambos: Características distintivas entre regras e princípios: Fonte: LYRA, Diane. Diferença Entre Princípios E Regras - Direito Constitucional. Disponível em: https://www.passeidireto.com/arquivo/91359326/diferenca-entre-principios-e- regras-direito-constitucional Acesso em 15 nov. 2022. Portanto, muitos dos princípios estudados possuem uma base legal. Porém, essa base legal deixa o princípio implícito ao texto normativo e isso advém da sua própria natureza flexível. Com base nessas informações iniciais, é possível partir para o estudo o primeiro princípio da contestação: o princípio da eventualidade. 1. Pelo princípio da eventualidade: Por este princípio, compreende-se que o réu/demandado deve apresentar toda matéria de sua defesa na contestação, sob pena de preclusão. Tal princípio é extraído da redação do artigo 336 do CPC/2015: “Art. 336. Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir. (BRASIL, 2015, s.p. Grifo nosso). A regra, portanto, é de que seuma matéria de direito não for devidamente alegada na defesa processual da contestação, estará preclusa e reputar-se-ão verdadeiras as alegações da parte autora/demandante. Nesse sentido, deve-se lembrar que: A preclusão é a perda do direito de manifestação no processo. Difere, portanto, da prescrição, que é a perda da capacidade de reivindicar o direito em juízo devido ao decurso do tempo. Na preclusão, perde-se o direito de se manifestar sobre algo, porque não houve manifestação no momento processual oportuno. A preclusão pode ser: temporal, lógica, consumativa ou punitiva. A preclusão temporal é a mais comum, pois ocorre quando transcorre o prazo preclusivo de uma matéria que não foi alegada no momento processual oportuno. A prescrição lógica, por outro lado, é aquela que decorre da incompatibilidade dos atos processuais praticados. A prescrição consumativa é consequência da realização (consumação) do próprio ato processual, o que indica que, uma vez realizado, o ato processual não pode ser apresentado uma segunda vez. E, por fim, a preclusão punitiva é aquela que decorre de uma sanção legal diante de ato processual ilícito. Assim, se o ato processual não for lícito, será desconsiderado e estar-se-á preclusa sua nova apresentação. Contudo, como basicamente todas as regras e princípio do direito, o princípio da eventualidade também admite exceções. Isso significa que existem alguns casos específicos em que mesmo que a matéria não tenha sido alegada no momento processual oportuno, ela não será objeto de preclusão e, portanto, poderá ser alegada em outro momento processual. Na defesa do réu, significa mais especificadamente que alguns temas podem não ser alegados na contestação e, ainda assim, serem passíveis de alegações futuras, porque não sofreram os efeitos da preclusão. Os primeiros temas de contestação que não sofrem os efeitos da preclusão são aqueles elencados no artigo 493 do CPC/2015: Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão. Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir. (BRASIL, 2015, s.p.). Logo, tal dispositivo legal afirma que os fatos supervenientes podem ser alegados fora dos momentos processuais oportunos, justamente, porque não existiam à época da realização do ato processual. Da mesma forma, os fatos supervenientes podem ser reconhecidos de ofício pelo magistrado julgador da causa, porém, neste caso, ele deverá cientificar ambas as partes do fato e permitir o direito de resposta de ambas sobre o ocorrido. Portanto, a primeira hipótese de exceção ao princípio da eventualidade são os fatos supervenientes. A segunda hipótese já foi abordada neste estudo, e se trata das objeções. Matérias de preliminares de mérito (prescrição e decadência) podem ser reconhecidas a qualquer tempo, bem como em qualquer grau de jurisdição, de ofício pelo magistrado ou não. 2. Princípio da eficácia preclusiva da coisa julgada O princípio da eventualidade produz efeitos, dentre os quais, se ressalta a produção de um novo princípio: a eficácia preclusiva da coisa julgada. Tal princípio aduz que as alegações apresentadas em um determinado processo do qual já há uma sentença transitada em julgado, não podem ser utilizadas como fundamentos para a propositura de uma nova ação. Isso advém da vedação de que uma mesma matéria seja analisada duas vezes pelo poder judiciária, ao mesmo tempo em que garante a produção dos efeitos característicos da coisa julgada. Nesse sentido, destaque-se que: Coisa julgada significa advém da sentença judicial que já teve esgotada seu prazo recursal, não cabendo assim, reanálise sua pelo poder judiciário. Ela se encontra descrita no artigo 502 do CPC/2015: “Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso” (BRASIL, 2015, s.p.). Portanto, a coisa julgada não pode mais ser objeto de nova ação, bem objeto de recurso. Existem dois tipos de coisa julgada: Coisa julgada material: é aquela que surge de uma sentença que proferiu julgamento de mérito. Há, neste sentido, a resolução do processo com apreciação do mérito (do direito material) da demanda. Coisa julgada formal: é aquela que decorre de um julgamento sem análise do mérito da demanda. É comum nos casos em que há acolhimento de defeito processual que gera o julgamento da demanda sem resolução de mérito. Nesse sentido, tendo em vista que a coisa julgada impede que a demanda seja novamente analisada pelo poder judiciário, é possível também argumentar que a ela possui uma eficácia preclusiva, uma vez que, os argumentos que não foram arguidos no momento processual oportuno, isto é, no decorrer do processo, não poderão ser apresentados após o trânsito em julgado da demanda. Evidente que isso não significa que inexistem exceções a essa regra. O fato superveniente, a prescrição e a decadência podem ser arguidas a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, bem como, podem ser objeto de processo autônomo a fim de revisar a decisão anteriormente proferida. 3. Princípio do dedutível: Tanto o princípio da eficácia preclusiva da coisa julgada, quando o princípio do dedutível, são ramificações do próprio princípio da eventualidade, e isso significa que ambos possuem relação com a ideia de que precluem as matérias de direito que não foram alegadas no momento oportuno, tanto da defesa, quanto da autoria da demanda judicial. O princípio do dedutível encontra-se subentendido na redação do artigo 508 do CPC/2015: Art. 508. Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se- ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido. (BRASIL, 2015, s.p.). Portanto, tal princípio explica que, transitada em julgado a ação, as alegações que existiam a época do processamento que não foram arguidas pelas partes no momento oportuno, serão consideradas deduzidas, isto é, repelidas pelas próprias partes e, portanto, não poderão mais ser objeto de ações futuras. Há, nesse sentido, mais uma vez a incidência da preclusão sobre os fatos e argumentos que poderiam ter sido ressaltados no momento processual oportuno. Deve-se reiterar que a preclusão vale tanto para alegações de fato, quanto para alegações de direito. 4. Princípio da Impugnação Específica: Destacando-se das ramificações do princípio da eventualidade, que incorre na consequência jurídica da preclusão, existe o princípio da impugnação específica. Para compreender este princípio, antes de estuda-lo, deve-se realizar o seguinte questionamento: É possível cumulação de defesa na contestação? Muito se discute sobre a cumulação de pedidos em uma petição inicial, porém, é raro verificar questionamentos sobre a cumulação de defesas em uma contestação. Assim como é possível a cumulação de pedidos em sede inicial, a cumulação de defesas na contestação é sim possível. Existem duas formas de as defesas se cumularem: a) Cumulação própria: ocorre quando a contestação apresenta diversas linhas defensivas e requere o acolhimento de todas elas pelo magistrado. Em um exemplo de ação de dano moral e material, uma defesa cumulativa pode ser reconhecida se houver a resistência contra ambos os pedidos da parte autora, isto é, quando a parte ré argumenta ser indevido tanto o dano moral, quanto o material. b) Cumulação eventual: ocorre quanto a contestação apresenta mais de uma linha defensiva e prevê, no caso de desconsideração da tese defensivaanterior por parte do magistrado, uma ou mais teses supervenientes para serem acolhidas. Um exemplo disso é uma ação de dano material na qual a parte ré alega tanto a prescrição quanto a inexistência do fato que gerou o dano material. Assim, se acolhida a prescrição pelo magistrado, haverá a resolução do conflito com resolução de mérito e sem ser analisado o argumento posterior sobre a inexistência do fato causador do dano material. Se o magistrado, por outro lado, não reconhecer a prescrição, poderá analisar a segunda tese defensiva, que impugna a materialidade do fato gerador do dano material. Com base nessas explicações, é possível analisar o princípio da impugnação específica, que dispõe que, na contestação, o réu deve impugnar especificadamente todos os fatos e argumentos apresentados pelo autor, sendo vedada, portanto, a negativa geral. Não significa, entretanto, que uma negativa geral não possa ser apresentada, mas significa que ela não possui quaisquer efeitos, sendo que, se apresentada, o réu se sujeitará aos efeitos da revelia. A contestação deve ser, portanto, específica, apresentando todos os fatos e argumentos que apresentam uma resistência a todas as alegações do autor. Se um fato ou argumento não for impugnado, será reputado verdadeiro, e o réu não poderá mais dele se defender (a preclusão é um efeito da revelia). Isso por força do artigo 344 do CPC/2015: “Art. 344. Se o réu não contestar a ação, será considerado revel e presumir- se-ão verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo autor” (BRASIL, 2015, s.p.). Contudo, existem também exceções a este princípio. O defensor público, por exemplo, assim como o defensor dativo que não têm contato com o cliente, podem contestador por negativa geral dos fatos. Por outro lado, nos demais casos isto não se admite, incluindo, em causas em que a Fazenda Pública ou o Ministério Público fazem parte. Ainda, existem questões que, mesmo se não alegadas em sede defensiva, não gerarão a revelia. Nos casos de direitos indisponíveis, interesse de incapaz, ou de petição não acompanhada de documento fundamental que a lei exige para a veracidade da ação, mesmo que a defesa não alegue determinada tese defensiva, não haverá a incidência dos efeitos da revelia. Aula 03 – Contestação – parte II Analisados alguns dos principais princípios que regem a contestação, é possível avançar no estudo de questões mais técnicas sobre a defesa do réu. Nesta terceira aula do segundo bloco de tema das defesas da parte ré em um processo cível, abordam-se temas relativos às hipóteses de indeferimento da contestação e também sobre a explicação e consequências do acolhimento ou não das defesas preliminares processuais. Primeiramente, é importante definir que, no caminho processual, a contestação pode seguir diferentes rumos, dependo dos argumentos nela constantes. Nesse sentido, observe-se a síntese a seguir: Possibilidades processuais após apresentação da contestação (processo cível) Observe-se que, em caso de apresentação de contestação com vício, o magistrado indicará um prazo hábil para o seu saneamento. Se sanável, o procedimento seguirá com a apreciação da matéria de contestação pelo julgador. Se o vício não for sanado, a contestação será desmembrada do processo, isto é, não será juntada. Ela não terá, portanto, existência no mundo jurídico e isso acarreta ao réu todas as consequências jurídicas como se nunca tivesse apresentação sua resposta. Isso significa que, no caso de a contestação não ter seus vícios sanados, a parte demandada incorrerá nas penas da preclusão e da revelia, isto é, não poderá mais alegar matérias defensivas e reputar-se-ão verdadeiras as alegações do demandante. Existem, portanto, três grandes hipóteses de indeferimento da contestação: a) Intempestividade; b) Incapacidade processual; c) Irregularidade da representação quando não sanada no momento oportuno. Sobre o significado de cada uma dessas hipóteses, observe-se o quadro a seguir: Hipóteses de indeferimento da contestação Uma questão muito importante se der recordada, neste ponto do estudo, é relativa aos prazos para apresentação da contestação, que já foram objeto de estudo neste módulo. Via de regra, a contestação pode ser apresentada no prazo hábil de 15 dias úteis, excluindo-se o primeiro e incluindo-se o último dia nesta contagem. Contudo, o termo inicial da contagem é motivo de controvérsia tendo em vista os inúmeros caminhos processuais que a petição inicial pode tomar. Neste sentido, recorda-se a redação do artigo 335 do CPC/2015: Art. 335. O réu poderá oferecer contestação, por petição, no prazo de 15 (quinze) dias, cujo termo inicial será a data: I - da audiência de conciliação ou de mediação, ou da última sessão de conciliação, quando qualquer parte não comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição; II - do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação ou de mediação apresentado pelo réu, quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4º, inciso I ; III - prevista no art. 231 , de acordo com o modo como foi feita a citação, nos demais casos. § 1º No caso de litisconsórcio passivo, ocorrendo a hipótese do art. 334, § 6º , o termo inicial previsto no inciso II será, para cada um dos réus, a data de apresentação de seu respectivo pedido de cancelamento da audiência. § 2º Quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4º, inciso II , havendo litisconsórcio passivo e o autor desistir da ação em relação a réu ainda não citado, o prazo para resposta correrá da data de intimação da decisão que homologar a desistência. (BRASIL, 2015, s.p.). Neste contexto, é importante observar a seguinte imagem para melhor compreender a contagem dos prazos processuais da contestação no direito civil, tendo em vista que é matéria de confusão entre os iniciantes na carreira jurídica. Imagine-se que o termo inicial da contagem do prazo da contestação seja a realização da audiência de mediação e conciliação que restou inexitosa. Tal audiência se realizou no dia 07 de outubro de 2022, uma sexta- feira. Tendo em vista a redação do inciso I do artigo 355 do CPC, a contagem do prazo processual para apresentação da contestação seguirá o seguinte: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art334%C2%A74i https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art231 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art334%C2%A76 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art334%C2%A76 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art334%C2%A74ii Imagem 7: Exemplo para visualização da contagem do prazo processual de contestação (15 dias): Seguindo o exemplo, na imagem, o dia 7 de outubro, em amarelo, representa o dia da realização da audiência de mediação ou conciliação que restou inexitosa. Portanto, é o termo inicial para a contagem do prazo. O prazo processual da contestação é contato em dias úteis, portanto, finais de semana e feriados são excluídos da contagem. Da mesma forma, exclui-se o dia do início do prazo, isto é, o dia do termo inicial, e inclui-se o último dia (décimo quinto dia a partir do início da contagem do prazo). Portanto, o prazo inicia na segunda-feira, dia 10 de outubro, pois é o primeiro dia útil subsequente ao dia do termo inicial. O término do prazo é 31 de outubro, pois é o décimo quinto dia a partir do início da contagem do prazo. No exemplo, se a contestação for apresentada no dia primeiro de novembro, já será considerada intempestiva, isto é, apresentada fora do tempo hábil e, portanto, não será computada ao processo. Assim, a primeira hipótese de indeferimento da contestação, neste contexto, é a sua apresentação intempestiva,isto é, sua apresentação fora do prazo hábil, nos termos do artigo 335 do CPC/2015. Se intempestiva, a contestação será desmembrada do processo e o réu/demandado será considerado revel, inclusive, incorrendo sob as penas da preclusão, ou seja, não poderá mais alegar matérias defensivas que deixou de alegar no momento oportuno. Contudo, deve-se recordar que as exceções e objeções que são matérias de ordem pública e que podem ser reconhecidas de ofício pelo magistrado, podem ser apresentadas como tese defensiva a qualquer tempo, independentemente da tempestividade da apresentação da contestação. Assim, mesmo que o procurador jurídico não cumpra o prazo de apresentação da contestação, ainda poderá exercer a defesa de seu cliente, limitando-se a arguir as matérias preliminares processuais e de mérito que podem ser reconhecidas de ofício pelo julgador. São essas matérias: inexistência ou nulidade da citação; incompetência absoluta incorreção do valor da causa; inépcia da petição inicial; perempção; litispendência; coisa julgada; conexão; incapacidade da parte, defeito de representação ou falta de autorização; ausência de legitimidade ou de interesse processual; falta de caução ou de outra prestação que a lei exige como preliminar; indevida concessão do benefício de gratuidade de justiça; prescrição; decadência; Fato Superveniente; Demais hipóteses admitidas em lei. Nesse sentido, deve-se também observar a redação do artigo 342 do CPC/2015, que dispõe sobre as possíveis alegações de defesa que podem ser matéria arguida de forma intempestiva: Art. 342. Depois da contestação, só é lícito ao réu deduzir novas alegações quando: I - relativas a direito ou a fato superveniente; II - competir ao juiz conhecer delas de ofício; III - por expressa autorização legal, puderem ser formuladas em qualquer tempo e grau de jurisdição. (BRASIL, 2015, s.p.). Da mesma forma, o artigo 493 do CPC/2015 traduz importantes informações para o estudo da apresentação de defesas intempestivas: Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão. Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir. (BRASIL, 2015, s.p.). É fundamental frisar, neste sentido, que tais dispositivos legais não se aplicam apenas às defesas no processo civil, mas também as próprias alegações do autor. Isso significa que eles se aplicam a ambas as partes conflitantes. Neste estudo, a ênfase que se exprime é nas defesas, pois é a temática do atual módulo abordado. A primeira hipótese, portanto, de indeferimento da petição inicial é a sua intempestividade. A consequência jurídica desse indeferimento sãos os efeitos da preclusão e da revelia, excetuadas as hipóteses legais que não sofrem esses efeitos. Sobre as duas outras hipóteses de indeferimento, isto é, a incapacidade processual e a irregularidade da representação, deve-se ressaltar que ambas são questões que podem ser arguidas como matéria de defesa preliminar, se atingirem a parte autora. Por outro lado, se atingem a parte ré, podem acarretar o indeferimento da contestação e, consequentemente, a incursão nos efeitos da preclusão e da revelia. A incapacidade processual tem relação com a capacidade que o indivíduo tem de ser parte do processo, não no sentido de sua capacidade civil (maioridade, saúde mental), mas sim de sua capacidade de se envolver na lide por conta de seu interesse. Apenas podem litigar em um processo as partes que possuem relação com o direito pleiteado em juízo. Se, por ventura, houver uma petição inicial em juízo, e uma parte totalmente estranha à lide resolver se manifestar, sem possuir quaisquer interesses sobre o direito ou o bem objeto da ação, será imediatamente afastada do processo pelo magistrado. Não obstante, pode ser comum a apresentação de contestações de forma equivocada, em processos cuja parte não possui, de fato, interesse. Se a falta de interesse processual for percebida, a contestação será indeferida. Já a questão da irregularidade da representação, se não sanada, é mais complexa. Diz respeito à capacidade postulatória da parte. A capacidade postulatória só pode ser exercida por profissional competente, advogado com registro no conselho da Ordem dos Advogados do Brasil. Imagine-se, nesse sentido, que a parte contesta uma ação sendo representada por bacharel em direito sem o devido registro na ordem dos advogados. Na ausência de tal registro, o bacharel não é advogado e, portanto, não possui capacidade postulatória. Afastando as questões éticas da discussão sobre esse assunto, no caso em tela prejudicou-se o direito de resposta do réu, uma vez que se constatou irregularidade na contestação. Muitas vezes essas irregularidades acontecem por alguma eventualidade, ou até mesmo por má-fé, no sentido de que a parte do processo não possui culpa sobre isso. É por esse motivo que, em caso de ausência de irregularidade na representação, a contestação não é imediatamente indeferida. O magistrado concede um prazo razoável para a correção do vício de representação. Se o vício for sanado, o procedimento continua. Se o vício não for sanado, não há alternativas senão indeferir a contestação. Estas são, portanto, as hipóteses de indeferimento da contestação. Analisadas estas hipóteses, pode-se seguir no estudo, promovendo um olhar minucioso sobre as hipóteses do artigo 337 do CPC/2015, isto é, sobre as defesas processuais preliminares. Nesse sentido, a primeira questão a ser observada diz respeito ao seu inciso I, que refere que é matéria de defesa processual a inexistência ou nulidade da citação. Aqui é importante uma diferença. Existem duas formas de uma citação ser considerada inexistente: a material e a jurídica. A citação é inexistente quando não é, de fato, realizada. Imagine-se, nessa hipótese, um oficial de justiça que vai até a residência do réu para citá-lo, mas não o encontra. O processo não pode continuar sem a cientificação do réu, porque ele deve ser devidamente citado. Assim, os procedimentos previstos em ei seguem, até que haja a devida citação legal do réu. A citação é considerada, por outro lado, inexistente de forma jurídica se viola alguma norma legal que determine sua validade. Um exemplo é a citação que de fato se realiza, porém, é entregue por profissional não habilitado. Ou ainda, uma citação por edital que não segue os procedimentos previstos em lei. Nestes casos, a citação é inexistente não porque, de fato, não se realizou, mas sim porque não seguiu os procedimentos que asseguram sua validade no mundo jurídico. O que é importante mencionar nessa questão de nulidade ou inexistência da citação é que ela é uma matéria preliminar que, se arguida, não leva à direta resolução da lide. Ela se trata de uma preliminar dilatória, pois, se acolhida, o magistrado irá definir um prazo hábil para saná-la. Se acolhida a preliminar, os prazos de contestação serão igualmente alterados. Isso nos termos do artigo 239 do CPC/2015: Art. 239. Para a validade do processo é indispensável a citação do réu ou do executado, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido. § 1º O comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação ou de embargos à execução. (BRASIL, 2015, s.p.). Assim, não há de se falar em intempestividade da contestação que foi apresentada diante da nulidade ou inexistência da citação. Mesmo que intempestiva, se a contestaçãofor apresentada sob essa matéria de defesa processual, e for acolhida pelo juízo, abre-se novo prazo para apresentação da defesa. Aula 04 – Contestação – parte II Nesta última aula sobre o tema da contestação serão analisados os pormenores dos incisos do artigo 337 do CPC/2015, que trata das defesas processuais. Na última aula, abordou-se as defesas processuais do inciso I do artigo 337 do CPC/2015, isto é, os vícios processuais relacionados à nulidade ou inexistência da citação. Agora, é possível partir para a análise do inciso II do artigo supracitado, que trata da incompetência absoluta ou relativa como matéria de defesa preliminar processual. Para compreender a incompetência, antes é necessário entender aspectos relacionados à competência. No direito, competência do juízo tem relação com os limites da jurisdição de determinada comarca ou juízo. É, portanto, o alcance do poder de dizer o direito que o magistrado possui. Logo, dizer que um juízo é incompetente significa assumir que o magistrado não possui jurisdição sobre a causa e, portanto, não tem poderes para dizer o direito sobre o caso. Existem dois graus de incompetência: a absoluta e a relativa. a) Incompetência absoluta: é a competência que não pode ser atribuída a outro magistrado, em razão da matéria de ordem pública. Se um processo vier a ser julgado em foro absolutamente incompetente, a decisão proferida será nula. A incompetência absoluta é definida em razão da matéria (civil, penal, federal, trabalhista, etc.) e em razão das prerrogativas de função (julgamento de magistrados, governadores ou presidentes). b) Incompetência relativa: por outro lado, a incompetência relativa não leva em questão a ordem pública. Trata-se de uma incompetência que decorre do interesse privado das partes e, portanto, assim como foi convencionada, pode se convencionar que a incompetência relativa seja desconsiderada. Como exemplo, pode-se citar os casos de litígio sobre contratos que elegem determinado foro para a resolução de controvérsias sobre si. Mesmo que seja proposta ação em foro incompetente, essa incompetência é relativa e, se não oposta pela defesa, é considerada sanada e o processo pode seguir o julgamento no foro que a ação foi, de fato, proposta. Assim, a incompetência relativa decorre da vontade das partes. Dentre as principais dúvidas que possam surgir, neste sentido, pode- se destacar a seguinte: Se alegada incompetência relativa ou absoluta pela defesa, em qual foro pode ser oposta a contestação? à primeira vista, a resposta a este questionamento pode parecer óbvia, no sentido de que a contestação será oposta no mesmo foro da propositura da ação. Contudo, o artigo 340 do CPC/2015 traduz uma hipótese distinta. Refere o dispositivo legal: Art. 340. Havendo alegação de incompetência relativa ou absoluta, a contestação poderá ser protocolada no foro de domicílio do réu, fato que será imediatamente comunicado ao juiz da causa, preferencialmente por meio eletrônico. (BRASIL, 2015, s.p.). Neste sentido, se a defesa perceber a incidência de incompetência relativa ou absoluta e decidir alegá-la em sede de preliminar de contestação, poderá apresentar a defesa completa no foro da residência do réu/demandado. Após, caberá ao juízo comunicar o ocorrido ao foro que a ação foi proposta. Contudo, a incompetência absoluta, diferentemente da relativa, pode ser arguida a qualquer tempo, pois é matéria de ordem pública e que pode ser reconhecida de ofício pelo magistrado. A incompetência relativa, se não arguida no momento processual adequado (preliminar de contestação), preclui. Nesta senda, é importante também ser mencionado que o julgamento sobre a incompetência, seja ela relativa ou absoluta, ocorre no foro no qual foi apresentada a contestação. O julgamento da incompetência ocorre nos mesmos autos do processo de origem, porém, é um procedimento apartado. No caso de reconhecimento da incompetência, os autos são remetidos imediatamente ao juízo elencado como competente. Analisados os aspectos mais importantes sobre a incompetência, é possível partir para um exame do inciso III do artigo 337 do CPC/2015, que trata sobre a incorreção do valor da causa. O que é importante ser mencionado, neste aspecto, é que pelo CPC antigo, de 1973, a incorreção do valor da causa não era matéria de contestação, sendo necessária uma petição simples ao magistrado indicando tal vício processual. A partir do CPC/2015, a incorreção do valor da causa deve ser arguida em sede de preliminar de contestação. Se, por ventura, a incorreção do valor da causa não for arguida neste momento processual, haverá preclusão. Isso, nos termos do artigo 293 do CPC/2015: “Art. 293. O réu poderá impugnar, em preliminar da contestação, o valor atribuído à causa pelo autor, sob pena de preclusão, e o juiz decidirá a respeito, impondo, se for o caso, a complementação das custas” (BRASIL, 2015, s.p.). Por isso a incorreção do valor da causa é matéria de atenção pelo profissional jurídico, para que não se confunda e se incorra a erro de utilizar o procedimento do antigo Código de Processo Civil. Ainda, é importante mencionar que, da decisão que negue a incorreção no valor da causa como preliminar de contestação, não cabe agravo de instrumento. Isso poderá ser tema de preliminar de apelação. Prosseguindo com as defesas processuais do artigo 337 do CPC/2015, tem-se o inciso IV, que trata sobre a inépcia da petição inicial. Nesse sentido, a defesa deve observar atentamente os artigos 319 a 321 (dos requisitos da inicial), 322 a 329 do (dos pedidos da petição inicial), 330 e 331 (do indeferimento da inicial), ambos do CPC/2015. Em resumo, as hipóteses de inépcia da petição inicial são as seguintes: a) Falta de pedido ou causa de pedir b) Pedido indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se admite o pedido genérico; I c) Narração dos fatos que não decorrer logicamente a conclusão; d) Pedidos incompatíveis entre si. Nos casos em que for reconhecida a inépcia da inicial, haverá extinção do processo sem resolução de mérito, porque, via de regra, uma petição inepta não pode ser corrigida. Na sequência, o inciso V do artigo 337 do CPC/2015 trata sobre a perempção. A perempção é uma sanção estatal e significa que o Estado não irá mais julgar determinada demanda. Isso ocorre porque a parte ingressou três vezes com uma ação judicial, sob os mesmos fatos e fundamentos, e desistiu do prosseguimento com a ação A perempção não se confunde com outros institutos, como prescrição ou decadência. Para vislumbrar tais diferenças, observe-se o quadro a seguir: Quadro síntese sobre as diferenças entre prescrição, decadência e perempção: A perempção encontra-se normatizada no artigo 486, § 3º do CPC/2015: Art. 486. O pronunciamento judicial que não resolve o mérito não obsta a que a parte proponha de novo a ação. (...) § 3º Se o autor der causa, por 3 (três) vezes, a sentença fundada em abandono da causa, não poderá propor nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa o seu direito. (BRASIL, 2015, s.p.). Após a indicação da perempção como matéria de defesa processual, o legislador elencou, no inciso VI do artigo 337 do CPC/2015 a litispendência. A litispendência ocorre quando há duas ações ajuizadas, com as mesmas partes e as mesmas causas de pedir. Assim a litispendência se caracteriza por se tratar de dois processos simultâneos sobre o mesmo assunto. Nesse sentido, é importante mencionar que, para a litispendência se caracterizar, devem estar presentes os requisitos dos seguintes parágrafos do artigo 337 do CPC/2015, que definem objetivamente o que se considera litispendência: § 1º Verifica-sea litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada. § 2º Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. § 3º Há litispendência quando se repete ação que está em curso. (BRASIL, 2015, s.p.). Na verificação de litispendência, a ação proposta posteriormente será extinta sem resolução de mérito, pois deverá ser aguardada a resolução da primeira ação proposta. O inciso VII do artigo 337 do CPC/2015, por sua vez, trata da coisa julgada. A coisa julgada já foi objeto de estudo e, portanto, não cabe ser mencionada novamente. O que deve ser ressaltado é que, de acordo com a lei (artigo 337 CPC/2015), “§ 4º Há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado” (BRASIL, 2015, s.p.). existem a coisa julgada processual e a coisa julgada material. Para fins da defesa do réu/demandado, atenta-se para a coisa julgada material. A coisa julgada processual ocorre quando há uma matéria processual que sofre os efeitos da preclusão e, portanto, não pode mais ser objeto de alegações. Já a coisa julgada material se refere ao mérito da questão, é definida pelo trânsito em julgado da sentença. Nesse sentido, havendo a percepção da coisa julgada, o processo será imediatamente extinto sem resolução de mérito, pois já há uma resposta jurisdicional sobre a causa. Em seguida, o inciso VIII, artigo 337 do CPC/2015 dispõe sobre a conexão. Contudo, a interpretação desse inciso se estende para abarcar também a continência. Assim, tanto conexão quanto continência são matérias de defesa processual preliminar. Segundo a doutrina, A diferença entre a conexão e a continência reside no fato de que, enquanto na conexão as causas veiculam segmentos diversos de uma mesma relação jurídica de direito material, na continência a causa contida veicula apenas uma parte da relação jurídica de direito material veiculada na causa continente. (OLIVEIRA NETO, 2018, s.p.). Assim, na conexão há duas ou mais ações que possuem um vínculo entre si que representa a necessidade de que, para uma ação ser julgada, necessariamente uma ação anterior deverá ter sua sentença provida. Por outro lado, a continência ocorre quando há o ajuizamento de uma ação que está contida em uma ação maior já ajuizada. Consequentemente, a ação contida não pode ser julgada sem que antes se tenha uma decisão sobre a ação contingente. Para melhor compreender a diferença entre conexão e continência observe-se a figura a seguir: Figura 8: diferença entre conexão e continência: Portanto, tanto a conexão quanto a continência são matérias que podem ser alegadas em sede de preliminar de contestação, como vício processual. Se reconhecidas essas matérias pelo juízo, o processo será extinto sem resolução de mérito. Dando seguimento às questões de ordem processual que podem ser alegadas como preliminar da defesa, tem-se o inciso IX do artigo 337 do CPC/2015, que trata da capacidade processual e do defeito na representação. A capacidade processual também já foi objeto de análise neste estudo. Ela se refere à capacidade que a pessoa possui em ser parte do processo, e isso inclui questões formais como a maioridade e saúde mental. O mais comum é que a incapacidade processual advenha do fato da parte ser menor de idade sem representação legal. Nestes casos, o Réu pede a V. Exa. que se digne a suspender o processo, nos termos do art. 76 do Código de Processo Civil, marcando ao Autor prazo para sanar o defeito, sob pena de nulidade do processo e sua consequente extinção sem resolução do mérito, tudo como dispõe o art. 485, IV, combinado com o § 1o, I do art. 76, ambos da Lei Processual em vigor. (BARROSO; LATIÉRRE, 2019, p. 135). Da mesma forma que a capacidade processual, o defeito na representação também já foi objeto de estudo neste módulo. Ele é o vício sanável sobre a representação jurídica, isto é, vinculado à pessoa do procurador. Nestes casos, o magistrado pode definir um prazo razoável para sanar o vício processual. Se o vício for sanado, o procedimento seguirá normalmente. Se não sanado, haverá extinção do processo sem resolução de mérito. Lembre-se que a incapacidade processual como causa de indeferimento da petição inicial é semelhante, porém, não possui o mesmo sentido da incapacidade processual como matéria de alegação processual. Isso porque, nos termos do artigo 337 do CPC/2015, a interpretação desse instituto legal pode ser mais restritiva, uma vez que o próprio artigo faz menção a ausência de legitimidade e falta de interesse processual como matéria de preliminar de defesa. A ausência de interesse processual significa que uma parte não pode ingressar com uma demanda judicial ou se defender de uma demanda judicial. A ausência de interesse processual é definida pelo fato de o autor não possuir relações com o objeto ou o direito pleiteado. Por outro lado, a ilegitimidade de parte significa que o objeto ou o direito pleiteado não é de titularidade da pessoa que ingressa ou se defende da ação. Uma pessoa só pode propor ação judicial em virtude de um interesse do qual é titular estar sendo violado. Assim, comprovada da incapacidade da parte ou a falta de interesse processual, se o vício processual não for sanado, haverá extinção do processo sem resolução de mérito. E, por fim, as três últimas questões que podem ser matéria da defesa preliminar são as seguintes: convenção de arbitragem (inciso X), falta de caução ou prestação que a lei exija (inciso XII) e indevida concessão do benefício da gratuidade da justiça (inciso XIII), todas elencadas no artigo 337 do CPC/2015. O próprio texto legal é explicativo nestas questões. O compromisso arbitral é normalmente uma cláusula contratual, e pode ser arguido como preliminar dilatória, pois o processo deverá ser remetido ao árbitro estipulado pelas partes, e não para o judiciário. Já a falta de caução ou prestação exigida por lei pode ser exemplificada pela falta do recolhimento das custas processuais. E, no caso do indevido benefício da gratuidade da justiça, a defesa deve alegar e provar seu cabimento indevido. Assim, os aspectos principais sobre as defesas processuais preliminares estão esgotados. Pode-se partir para o próximo tema deste módulo, isto é, uma nova modalidade de defesa do réu: a reconvenção.