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Indaial – 2021 Microbiologia aMbiental Prof.a Louise Cristine Franzoi 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2021 Elaboração: Prof.a Louise Cristine Franzoi Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: F837m Franzoi, Louise Cristine Microbiologia ambiental. / Louise Cristine Franzoi. – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 257 p.; il. ISBN 978-65-5663-477-7 ISBN Digital 978-65-5663-478-4 1. Microbiologia. – Brasil. 2. Meio ambiente. – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 576 apresentação Bem-vindos aos nossos estudos referentes à disciplina de Microbiologia Ambiental! Nossa maravilhosa viagem por esta área tão interessante se dá, primeiramente, no aprofundamento da unidade básica da vida: a célula. Desse modo, por meio dos conhecimentos da Biologia Celular, é possível estudar/pesquisar os seres comumente conhecidos por “micróbios”. Veremos a importância desses seres diminutos na manutenção da nossa saúde e na ocorrência de doenças, a exemplo das patologias de veiculação hídrica. Podemos aferir, então, que a Microbiologia Ambiental se constitui no campo de interação entre as ciências ambientais e o estudo dos microrganismos (MO) e as interações com o solo, a água e o ar, além da identificação de MO, considerados indicadores ambientais ligados à questão da poluição, temática contemplada na Unidade 2. Nesse sentido, por meio das metodologias de análises disponíveis, é possível estudar a qualidade desses diferentes ambientes, objetivando o estabelecimento de protocolos e de políticas públicas que visem à qualidade ambiental adequada para a espécie humana e para o ecossistema. Não paramos por aí! A partir desses conhecimentos, é possível delinear estratégias de intervenção que minimizem os impactos ambientais negativos decorrentes das ações antrópicas nos ambientes. Podemos citar, como exemplo, os sistemas de tratamento de efluentes líquidos domésticos e industriais. Essas técnicas empregam os processos biológicos utilizados pelos MO, na remoção da matéria orgânica, além de outros compostos, para que esses materiais tratados possam ser dispostos nos corpos hídricos em consonância com os padrões estabelecidos pela legislação. Esse é o foco da nossa Unidade 3, que também abordará aspectos relativos à biorremediação e à importância na limpeza/descontaminação de solos e de águas contaminados. . Na Unidade 3, trataremos a respeito dos principais instrumentos da legislação ambiental brasileira ligados à microbiologia da água, do solo e do ar, com destaque para os padrões de potabilidade e balneabilidade dos recursos hídricos. Afinal, esses dispositivos legais e o cumprimento contribuem para a conservação dos recursos naturais e para uma gestão ambiental pública e privada, que promova a sustentabilidade ambiental. Bons estudos! Prof.a Louise Cristine Franzoi Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi- dades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra- mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida- de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun- to em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen- tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE suMário UNIDADE 1 — NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA .......................................................................... 1 TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA ..................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3 2 MICROBIOLOGIA: DEFINIÇÕES E ÁREAS DE ESTUDO ....................................................... 3 3 EVOLUÇÃO DA MICROBIOLOGIA ............................................................................................. 8 4 MICRORGANISMOS: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E PRINCIPAIS GRUPOS ......... 11 5 MICROSCÓPIO: TIPOS E FINALIDADES ................................................................................. 16 5.1 MICROSCÓPIO ............................................................................................................................ 16 5.2 O MICROSCÓPIO ELETRÔNICO ............................................................................................. 19 6 BIOLOGIA CELULAR: UMA VISITA GUIADA ........................................................................ 22 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 24 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 27 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 28 TÓPICO 2 — MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA ......................................................... 29 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 29 2 MICROBIOLOGIA AMBIENTAL: CONCEITOS ....................................................................... 29 2.1 A MICROBIOTA HUMANA ....................................................................................................... 31 2.2 MICRORGANISMOS CAUSADORES DE DOENÇAS NA ESPÉCIE HUMANA ............. 34 3 MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS ............................................ 42 3.1 AS BACTÉRIAS ............................................................................................................................. 42 3.1.1 Bactérias gram-positivas e gram-negativas...................................................................... 47 3.1.2 A parede celular das arqueobactérias (arqueas) ............................................................. 50 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 53 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 56 AUTOATIVIDADE ..............................................................................................................................57 TÓPICO 3 — REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO................. 59 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 59 2 REPRODUÇÃO CELULAR BACTERIANA ................................................................................. 59 2.1 OUTROS TIPOS DE REPRODUÇÃO BACTERIANA ............................................................ 63 3 FATORES QUE INTERFEREM NO CRESCIMENTO MICROBIANO .................................. 68 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 78 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 79 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 81 UNIDADE 2 — MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS .................. 87 TÓPICO 1 — MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO .....89 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 89 2 MEIOS DE CULTURA MICROBIANA ......................................................................................... 89 3 EQUIPAMENTOS ESSENCIAIS À ROTINA DE UM LABORATÓRIO DE MICROBIOLOGIA............................................................................................................................ 93 4 TÉCNICAS DE SEMEADURA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO DE POPULAÇÕES MICROBIANAS .................................................................................................... 99 4.1 CONTAGEM EM PLACAS ....................................................................................................... 102 4.2 TÉCNICA DE TUBOS MÚLTIPLOS (NMP) ........................................................................... 106 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 114 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 115 TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA .............................................................................. 117 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 117 2 A QUESTÃO DO SANEAMENTO BÁSICO ............................................................................. 117 2.1 FLORAÇÕES DE ESPÉCIES DE CIANOBACTÉRIAS E CONSEQUÊNCIAS .................. 123 2.2 DOENÇAS CAUSADAS POR VÍRUS ..................................................................................... 125 2.3 DOENÇAS CAUSADAS POR BACTÉRIAS ........................................................................... 127 2.4 DOENÇAS CAUSADAS POR FUNGOS ................................................................................. 129 2.5 DOENÇAS CAUSADAS POR PROTOZOÁRIOS .................................................................. 131 2.6 DOENÇAS CAUSADAS POR HELMINTOS ......................................................................... 132 3 ANÁLISE MICROBIOLÓGICA DA ÁGUA .............................................................................. 133 3.1 TÉCNICA DE TUBOS MÚLTIPLOS ........................................................................................ 134 3.2 TÉCNICA COLILERT® ...................................................................................................................................................................................................136 3.3 CONTAGEM DE BACTÉRIAS HETEROTRÓFICAS ............................................................ 139 3.4 DENSIDADE DE CIANOBACTÉRIAS .................................................................................... 141 3.5 AVALIAÇÃO DE CRYPTOSPORIDIUM E DE GYARDIA ................................................... 144 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 149 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 153 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 155 TÓPICO 3 — MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR ........................ 157 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 157 2 MICROBIOLOGIA DO SOLO ..................................................................................................... 157 2.1 COMPOSIÇÃO DA MICROBIOTA EXISTENTE NO SOLO ............................................... 157 2.2 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DO SOLO ..................................... 162 3 MICROBIOLOGIA DO AR ........................................................................................................... 167 3.1 AVALIAÇÃO MICROBIOLÓGICA DO AR ............................................................................ 169 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 171 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 174 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 175 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 176 UNIDADE 3 — TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL .............. 183 TÓPICO 1 — TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS .................................................... 185 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 185 2 PARÂMETROS ENVOLVIDOS NO TRATAMENTO BIOLÓGICO DE EFLUENTES DOMÉSTICOS......................................................................................................... 187 3 MICRORGANISMOS ENVOLVIDOS NO TRATAMENTO BIOLÓGICO DE EFLUENTES LÍQUIDOS ................................................................................................................ 190 4 LODOS ATIVADOS ........................................................................................................................ 195 4.1 PROCESSOS ANAERÓBIOS ..................................................................................................... 197 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 206 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 208 TÓPICO 2 — BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS ..............211 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 211 2 CONCEITOS DE BIORREMEDIAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO ............................................... 211 3 MICRORGANISMOS EMPREGADOS NO PROCESSO DE BIORREMEDIAÇÃO ........ 216 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 229 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 230 TÓPICO 3 — LEGISLAÇÃO AMBIENTAL APLICADA ............................................................ 231 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................231 2 LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA DA ÁGUA.............................................. 231 3 LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA DO SOLO .............................................. 242 4 LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA DO AR .................................................... 244 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 246 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 249 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 250 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 253 1 UNIDADE 1 — NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • estudar os principais conceitos da microbiologia e as diferentes áreas de estudo; • observar que todos os organismos (com exceção dos vírus), são formados por uma ou mais células, sendo, a célula, a unidade básica da vida; • verificar a aplicação da microbiologia ambiental à saúde e ao bem-estar antrópicos dentro do contexto ambiental; • analisar a importância dos microrganismos à saúde humana, além da capacidade de alguns de causarem doenças aos seres humanos; • identificar os mecanismos de reprodução bacteriana e os fatores que influenciam no crescimento das bactérias e de outros microrganismos. Esta unidade será dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA TÓPICO 2 – MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA TÓPICO 3 – REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 3 TÓPICO 1 — UNIDADE 1 INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 1 INTRODUÇÃO Iniciamos nossos estudos definindo o termo microbiologia e as diferentes áreas dessa ciência tão fascinante, porém, entendemos que a microbiologia é uma ciência que apresenta relação com outras áreas, a exemplo da biologia celular, pois se debruça sobre o conhecimento desta para estudar os seres comumente denominados de “micróbios”. De forma que possamos adentrar nos estudos referentes à disciplina de Microbiologia Ambiental, é necessário definir alguns conceitos essenciais a partir do espectro da teoria celular e dos desdobramentos. 2 MICROBIOLOGIA: DEFINIÇÕES E ÁREAS DE ESTUDO Ao esmiuçarmos o termo microbiologia, temos a seguinte caracterização: mikros = pequeno; bios = vida; logos = estudo. A partir desse foco, podemos conhecer alguns conceitos trazidos por autores da área. Vamos lá?! O termo microbiologia é empregado para definir a ciência que estuda os microrganismos, um grande e diverso grupo de organismos microscópicos que podem ser encontrados em células únicas ou em agrupamentos celulares. É uma ciência dedicada à “forma, à estrutura, à reprodução, à fisiologia, ao metabolismo e à identificação dos microrganismos. Assim, a microbiologia envolve o estudo de organismos procariotos (bactérias, archaeas) e eucariotos inferiores (algas, protozoários)” (VIEIRA; FERNANDES, 2012, p. 11). Área da ciência que se ocupa em estudar os microrganismos e as atividades, pois preocupa-se com a forma, a estrutura, a reprodução, a fisiologia, o metabolismo e a identificação dos seres microscópicos. Inclui o estudo da distribuição natural, relações recíprocas e com os outros seres vivos, efeitos benéficos e prejudiciais sobre os homens e as alterações físicas e químicas provocadas no meio ambiente (PARUSSOLO, 2020, p. 3). UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 4 Interessante, não é mesmo?! A partir desses conceitos, podemos evidenciar que, em grande parte, a microbiologia trata dos organismos microscópicos unicelulares. Nas assim chamadas formas superiores de vida (por exemplo, a espécie humana, homo sapiens), os organismos são compostos de inúmeras células (pluricelulares), que compõem tecidos altamente especializados e órgãos destinados a exercer funções específicas. Nos indivíduos unicelulares, como o próprio nome já diz, todos os processos vitais são realizados em uma única célula (unicelular). Independentemente da complexidade de um organismo, a célula é, na realidade, a unidade básica da vida (BOSSOLOAN, 2002). Cabe destacar que, no campo de estudo da microbiologia, estão incluídos, também, vírus, seres microscópicos de natureza acelular. Observe a seguir e note a diferença entre organismos unicelulares e pluricelulares: FIGURA 1 – SERES UNICELULARES E PLURICELULARES FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=8czePpvEgBU>. Acesso em: 29 jun. 2020. TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 5 Você já se perguntou: o que é uma célula? Pois bem, a célula se constitui como unidade básica fundamental dos seres vivos. É uma entidade/estrutura separada das outras células por uma membrana (e, certas vezes, por uma parede celular), contendo uma diversidade de substâncias químicas e estruturas subcelulares no interior (MADIGAN et al., 2010). Observe o exemplo esquemático de uma célula: ATENCAO MODELO ESQUEMÁTICO DE UMA CÉLULA FONTE: Adaptada de Carvalho (2020) Sejam os organismos unicelulares ou pluricelulares, podemos apontar que existe um nível organizacional entre os elementos que integram esses seres. UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 6 FIGURA 2 – ORGANIZAÇÃO BIOLÓGICA - EXEMPLO DA ESPÉCIE HUMANA FONTE: <https://querobolsa.com.br/enem/biologia/niveis-de-organizacao-dos-seres-vivos>. Acesso em: 29 maio 2020. É importante destacar que o estudo da microbiologia pode ser dividido em microbiologias básica e aplicada. TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 7 QUADRO 1 – ÁREAS DA MICROBIOLOGIA ÁREA FOCOS DE ESTUDO EXEMPLOS MICROBIOLOGIA BÁSICA Natureza e propriedades dos microrganismos Morfologia, fisiologia, bioquímica etc. Características fisiológicas Nutrição e condições de crescimento e de reprodução. Atividades bioquímicas Obtenção de energia pelos microrganismos. Características genéticas Hereditariedade e variabilidade das características. Características ecológicas Microrganismos no ambiente e a relação com outros organismos. Potencial patogênico Capacidade de ocasionar doenças dos microrganismos. Classificação Relação taxonômica entre os grupos de microrganismos. MICROBIOLOGIA APLICADA FOCOS DE ESTUDO EXEMPLOS Microbiologia Industrial Emprego dos microrganismos para síntese de substâncias químicas. Antibióticos, enzimas, biometalurgia (explora as atividades químicas de bactérias para extrair minerais, como cobre e ferro). Microbiologia Ambiental Utilização dos microrganismos como agentes. Biodegradação e limpeza ambiental, controle de pragas etc. Microbiologia Médica Estudo dos microrganismos causadores de doenças e da prevenção e controle. Estudo do vírus Sars-CoV-2 (novo coronavírus). Microbiologia dos Alimentos Relacionada às doenças transmitidas por alimentos, controle de qualidade e produção de alimentos. Queijos, bebidas (vinhos, cervejas), pães etc. FONTE: Adaptado de Bossolan (2002) e Vieira e Fernandes (2012) Obviamente que, neste livro didático, focaremos nossas atenções nos estudos referentes à Microbiologia Ambiental e aos desdobramentos, porém, é fundamental que tenhamos ciência da infinidade de áreas e de aplicações da microbiologia em diferentes segmentos da ciência e do cotidiano. UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 8 3 EVOLUÇÃO DA MICROBIOLOGIA A microbiologia passou por inúmeros avanços ao longo dos anos, mas um marco fundamental paraque essa ciência tomasse os rumos atuais se deu quando da invenção do primeiro microscópio, em 1674, pelo alemão Antony Van Leeuwenhoek. O cientista empregou o pequeno instrumento para observar pequenos seres, em amostras de solo, água, saliva e fezes, denominando de “animálculos” (DIAS, 2020). FIGURA 3 – O PRIMEIRO MICROSCÓPIO E O INVENTOR FONTE: <https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi- d=S1676-24442009000200001>. Acesso em: 24 jun. 2020. No mesmo ano, Leeuwenhoek redigiu várias cartas à sociedade real inglesa, descrevendo os seres que ele observava por meio do pequeno microscópio. Essas cartas possibilitaram o início da microbiologia em si, pois foram os documentos de divulgação científica da época que fizeram com que a sociedade fosse informada acerca da existências de seres microscópicos (DIAS, 2020). Posteriormente, o microscópio primitivo de Leeuwenhoek foi aprimorado por Robert Hooke (1635-1703), ganhando mais uma lente e a possibilidade de ampliação de imagem ainda maior. Por consequência, as primeiras observações de Hooke e os estudos de Leeuwenhoek levaram à descoberta das células. A descoberta do microscópio e a constatação da existência dos microrganismos fizeram com que a comunidade científica da época questionasse a respeito da origem dos seres, o que levou ao surgimento das teorias da abiogênese (geração espontânea) e da biogênese (CARVALHO, 2020). TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 9 Vamos conhecer os conceitos de abiogênese e de biogênese? A teoria da biogênese (defendida por alguns cientistas), inclusive, Leuwenhoek, atestava que as “sementes” das criaturas microscópicas estão sempre presentes no ar, de onde ganham acesso aos materiais e ali crescem, desde que as condições sejam adequadas ao desenvolvimento. A essa forma de multiplicação dos microrganismos, chamou- se biogênese. Outros cientistas acreditavam que os microrganismos se formavam espontaneamente, a partir da matéria orgânica em decomposição ou da putrefação. Essa forma de multiplicação se chamou de abiogênese, que ficou conhecida como teoria da geração espontânea (CARVALHO, 2020). NOTA As ideias da abiogênese, ou teoria da geração, foram perdendo espaço a partir de demonstrações científicas, como a do médico italiano Francesco Redi (1626-1697). Demonstrou que as larvas encontradas na carne em putrefação eram larvas de ovos de insetos, e não um produto da geração espontânea. No experimento, Redi colocou um pedaço de carne em uma jarra coberta com gaze. Atraídas pelo odor da carne, as moscas depositaram ovos sobre a cobertura, e, destes, emergiram as larvas. Com isso, demonstrou que a vida se origina de outra preexistente, refutando a teoria da abiogênese (CARVALHO, 2010). FIGURA 4 – EXPERIMENTO DE FRANCESCO REDI FONTE: <http://digitalizandoabiologia.weebly.com/a-origem-da-vida.html>. Acesso em: 24 jun. 2020. UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 10 A controvérsia teve fim quando, finalmente, o químico francês Louis Pasteur (1822-1895) realizou um experimento, que também se tornaria famoso na história da biologia. Este preparou um frasco com colo longo, estreito, em pescoço de cisne. Colocou diversas infusões em balões de vidro, em contato com o ar. Em seguida, alongou os pescoços dos balões na chama, de modo que fizessem várias curvas. Ferveu os líquidos (caldo de carne) até que o vapor saísse livremente das extremidades estreitas dos balões. Como resultado, verificou que, após o arrefecimento (refrigeração) dos líquidos, estes permaneciam inalterados em odor e em sabor. No entanto, não se apresentavam contaminados por microrganismos (NÓBREGA; BOSSOLAN, 2017). FIGURA 5 – EXPERIMENTO DE LOUIS PASTEUR FONTE: <https://sites.google.com/site/biologiaparaoensinomedio/experimentos>. Acesso em: 24 jun. 2020. Legenda: note que o ar podia circular livremente por meio dos frascos abertos. Contudo, nenhum microrganismo surgiu na solução. A poeira e os microrganismos se depositavam na área sinuosa, em forma de V do tubo e, portanto, não atingiam o caldo. TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 11 Você já ouviu falar do processo de pasteurização? Pois bem, Pasteur descobriu que, aquecendo o vinho a uma temperatura de 56oC, os organismos que alteravam o gosto do vinho eram eliminados. Esse processo ficou conhecido como pasteurização, e, ainda hoje, é amplamente empregado na indústria de alimentos, especialmente, como processo de conservação do leite (NÓBREGA; BOSSOLAN, 2017). NOTA O experimento de Pasteur demonstrou, finalmente, que a teoria de geração espontânea estava equivocada. Podemos evidenciar, então, que a ciência é construída a partir do trabalho de inúmeros cientistas em diferentes áreas, e que o conhecimento científico está sob constante evolução. É fascinante, não é mesmo?! Passemos, agora, ao estudo dos microrganismos em si. Sigamos em frente! 4 MICRORGANISMOS: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E PRINCIPAIS GRUPOS Agora que estudamos as áreas de estudo da microbiologia e algumas das suas particularidades, vamos nos aprofundar a respeito dos microrganismos em si. Vamos lá?! Invisíveis a olho nu, comumente conhecidos como “micróbios”, os microrganismos são seres fascinantes, pois, além de hóspedes do nosso organismo, estão presentes em todos os lugares e são parte fundamental à manutenção da vida no planeta Terra. Seres de tamanhos microscópicos variados (vírus 1nm, bactérias 1µm e fungos 100µm de diâmetro). Contudo, alguns, em determinadas fases de crescimento, atingem tamanho macroscópicos, a exemplo dos fungos, conhecidos como cogumelos, que chegam a formar um falso tecido (NASCIMENTO, 2020). Para melhor compreender nosso objeto de estudo, entenderemos algumas das unidades de medida utilizadas no estudo da biologia em geral. Acompanhe: UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 12 QUADRO 2 – UNIDADES DE MEDIDA UNIDADE EQUIVALÊNCIA MICROSCÓPIO Milímetro (mm) 0,001 metro (m) Visível a olho nu Micrômetro (µm) 0,001 milímetro Microscópio óptico Nanômetro (nm) 0,001 µm Microscópio eletrônico Angströn (Å) 0,1 nm Microscópio eletrônico FONTE: <https://theamazingbiology.weebly.com/vestibular/archives/05-2013>. Acesso em: 29 jun. 2020. Para ter uma noção mais clara dessas dimensões, é importante que observe as figuras a seguir: FIGURA 6 – ESCALADA DE TAMANHO DOS ORGANISMOS FONTE: <https://www.indagacao.com.br/2019/03/puc-rs-responda-questao-com-base-na-escala- logaritimica-que-mostra-os-tamanhos-das-estruturas-e-organismos.html>. Acesso em: 29 jun. 2020. Legenda: A = vírus; B = bactéria; C = célula eucariótica. TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 13 FIGURA 7 - TAMANHOS E FORMAS RELATIVOS DOS ORGANISMOS FONTE: <https://pt.slideshare.net/filho92/001-intoducao>. Acesso em: 29 jun. 2020. Realmente, a diversidade da vida em formas e tamanhos é impressionante, mas não paramos por aí. Surgiu um termo essencial ao andamento dos nossos estudos: célula eucariótica. Para compreendê-lo, é preciso compará-lo com outro tipo celular existente, a célula procariótica. Esses dois tipos de células se diferenciam em algumas características. As células procarióticas contam com uma estrutura relativamente simples. Nela, o nucleoide (consiste em DNA bacteriano) não é delimitado por uma membrana (carioteca), e se encontra disperso no citoplasma, ou seja, elas não apresentam núcleo organizado ou verdadeiro. Nelas, a maior parte da célula é formada por água, proteínas, íons e demais moléculas. Geralmente, medem de 1 a 2 µm. Podemos citar, como exemplo, as bactérias e as cianobactérias (LODISH et al., 2014). As células eucarióticas apresentam núcleo delimitado (organizado) por membrana (a carioteca), armazenado o material genético (DNA). Além disso, esse tipo celular conta com muitos compartimentos delimitados por membrana, ou organelas. Comumente, essas células apresentam o tamanho entre 10 e100 µm de diâmetro. São formadas por células eucarióticas, todos representantes dos reinos vegetal e animal, algas, além dos fungos (ex.: leveduras, bolores) e do protozoário, seres exclusivamente unicelulares. Citam-se, como exemplo, os protozoários, as algas, os fungos, os animais e os vegetais (LODISH et al., 2014). UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 14 Qual é a característica definidora das células eucariótica e procariótica? ATENCAO FIGURA 8 – CÉLULAS EUCARIÓTICA E PROCARIÓTICA FONTE: <http://wesleibio.blogspot.com/2016/12/celulas-eucariontes-e-procariontes.html>. Acesso em: 29 maio 2020. Legenda: A – célula procariótica; B – célula eucariótica. As células eucarióticas apresentam maior complexidade em estruturas (organelas) quando comparadas às procarióticas, além da diferença de tamanho existente. Note que um fibroblasto humano (célula que compõe o tecido conjuntivo) conta com, aproximadamente, 15 µm de diâmetro, com volume e peso secos de algumas milhares de vezes maiores em comparação a Escherichia coli, uma bactéria intestinal comum (LODISH et al., 2014). As células animais e vegetais apresentam diferenças e similaridades? Na verdade, a célula eucariótica vegetal é, em grande parte, semelhante à célula eucariótica animal. Contudo, a primeira conta com uma parede celular que circunda a membrana plasmática, e duas organelas adicionais: os plastídios (o cloroplasto é o tipo mais conhecido) e o vacúolo, que conferem característica particular à célula vegetal (BIOLOGIA CELULAR, 2011). TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 15 FIGURA 9 – CÉLULAS ANIMAL E VEGETAL - MODELOS ESQUEMÁTICOS FONTE: <https://dicasdeciencias.com/2013/03/28/diferencas-entre-as-celulas-animal-e-vegetal/>; <https://blog-mundo-biologia.blogspot.com/2016/01/estruturas-da-celula-vegetal.html>. Acesso em: 28 maio 2020. Legenda: A – Célula animal; B – Célula vegetal. A seguir, será possível evidenciar as características dos principais grupos de microrganismos, cujos conceitos que estudamos até o momento podem ser observados. QUADRO 3 – CARACTERÍSTICAS DOS PRINCIPAIS GRUPOS DE MICRORGANISMOS Microrganismos Características A. Vírus Acelulares, menores e mais simples, em estrutura quando comparados às bactérias; em geral, apresentam apenas um tipo de ácido nucléico (DNA ou RNA), protegido por uma capa proteica. Podem se multiplicar apenas dentro das células vivas, porém, poucos vírus de DNA, como o citomegalovírus e o vírus da hepatite B, podem iniciar a síntese de moléculas de RNA enquanto ainda estão se formando, de modo que a partícula viral contenha os dois tipos de ácidos nucléicos (DNA e RNA). B. Bactérias Procariontes, divididas em dois grupos: Eubactérias e Arqueobactérias. Eubactérias Apresentam diversas formas (esférica, bastonete e espirilo). Aparecem isoladas ou em formas de colônias. Variam de 0,2 – 5,0 µm. São unicelulares e algumas apresentam flagelos. Arqueobactérias (Arqueias) São semelhantes às eubactérias, mas contam com diferenças importantes quanto à composição química Habitam ambientes extremos, como os de altas concentrações salinas, os de acidez e os de temperatura. C. Protozoários Eucariontes, unicelulares, não apresentam parede celular rígida, não contêm clorofila. Alimentam-se por ingestão. Alguns se movem por meio de flagelos ou de cílios, e são amplamente distribuídos na natureza. D. Fungos Eucariontes, com parede celular rígida. Uni ou pluricelulares, não apresentam clorofila. Alimentam-se por absorção. São conhecidos como bolores, leveduras e cogumelos. UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 16 Bolores Fungos multicelulares e produzem estruturas filamentosas (hifas e micélios). Leveduras Fungos unicelulares e apresentam formas variadas (esférica à ovoide; elipsoide a filamentosos). E. Algas Eucariontes apresentam clorofila (realizam fotossíntese) e podem ser uni ou pluricelulares. Contam com parede celular rígida e crescem em diversos ambientes, mas a maioria é aquática. FONTE: Vieria e Fernandes (2012, p. 17) 5 MICROSCÓPIO: TIPOS E FINALIDADES Como já vimos anteriormente, o aprimoramento do microscópio e das técnicas de utilização de corantes para visualizar as estruturas internas celulares possibilitou, aos biólogos da época, examinarem micróbios e finas fatias (pedaços) de tecidos de plantas e de animais (NÓBREGA; BOSSOLAN, 2017). Vimos a importância do microscópio enquanto instrumento fundamental para a rotina laboratorial, o que torna possível a observação de estruturas não visíveis a olho nu. Dependendo do princípio no qual a ampliação é baseada, os microscópios podem ser (VIEIRA; FERNANDES, 2012): • Ópticos: utilizam dois sistemas de lentes, ocular e objetiva, por meio das quais a imagem ampliada é obtida. • Eletrônicos: utilizam um feixe de elétrons para gerar a imagem ampliada. Empregados para observar células procarióticas e eucarióticas, detalhes celulares e vírus. 5.1 MICROSCÓPIO Apesar da grande variabilidade externa dos microscópios, os componentes fundamentais são similares. O microscópio de luz é composto pelas partes mecânica e óptica (BRANCALHÃO; CAVÉQUIA, 2020). TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 17 FIGURA 10 – MICROSCÓPIO ÓPTICO FONTE: <http://projetos.unioeste.br/projetos/microscopio/index.php?option=com_ phocagallery&view=category&id=76&Itemid=140>. Acesso em: 18 maio 2020. Cada um dos números da figura representa uma das partes de um microscópio óptico, conforme os autores Vieira e Fernandes (2012) e Brancalhão e Cavéquia (2020): • Componentes mecânicos: 1- Pé: sustenta o microscópio, conferindo estabilidade ao equipamento. 2- Braço ou coluna: haste vertical ou inclinável fixada à base. Sustenta o tubo do microscópio e se articula com a base. 3- Canhão ou tubo: suporte cilíndrico da ocular. Permite a troca e a fixação das objetivas. 4- Revólver ou porta-objetiva: local onde são fixadas as lentes (oculares e objetivas). 5- Platina: mesa em miniatura que contém um orifício central destinado à passagem de luz. Local onde se deposita a lâmina (com a preparação a ser observada). 6- Parafuso macrométrico ou dos grandes deslocamentos: botão giratório que possibilita movimentos amplos da platina em direção às objetivas (e vice- versa). É útil na focalização inicial. 7- Parafuso micrométrico ou de focagem lenta: botão giratório que possibilita movimentos mais delicados da platina. Útil no ajuste final de focalização da lâmina, para focagens mais precisas. 8- Parafuso condensador: localizado na porção inferior da coluna, é destinado a baixar e a levantar o condensador. UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 18 • Componentes ópticos – sistema de iluminação: 9- Fonte de luz: localizada na base do microscópio, fornece os raios luminosos. 10- Condensador: conjunto de lentes situado abaixo da platina que distribui, regularmente, no campo visual do microscópio, a luz refletida pelo espelho ou diretamente da fonte luminosa. 11- Filtros: fabricados com filtro colorido, destinam-se a absorver parte do espectro da radiação luminosa. • Componentes ópticos – sistema de observação: 12- Lentes oculares: aumentam a imagem recebida da objetiva. 13- Lentes objetivas: situadas próximas ao objeto, criam imagens real e invertida. Estas podem oferecer aumentos de 10x, 20x, 40x, 100x. Existem as lentes objetivas a seco (entre a lâmina e a objetiva, existe o ar) e as objetivas de imersão, assim, coloca-se um tipo de óleo (óleo de imersão) nesse meio, cujo objetivo é evitar a dispersão dos raios luminosos, além de possibilitar a entrada de grande quantidade de luz na objetiva. As objetivas de 100x são sempre de imersão. A objetiva de imersão, que fornece grande aumento, é muito empregada nos laboratórios de microbiologia. Dessa forma, é preciso óleo de imersão para assegurar um trajeto do raio luminosoopticamente homogêneo entre a lâmina e a lente objetiva. Depois do uso, deve-se limpar as superfícies ópticas com papel absorvente, com um pouco de xilol, pois restos de óleo podem danificar o sistema óptico do microscópio. NOTA Vamos conhecer o funcionamento do microscópio óptico (MO)? Para saber mais, acesse https://www.youtube.com/watch?v=yLVh0HIdeSs. DICAS A título de curiosidade, conforme a espécie de material que deseja ser observada na amostra, os microscópios apresentam as seguintes tipologias: TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 19 QUADRO 4 – COMPARATIVO ENTRE DIFERENTES TIPOS DE MICROSCÓPIOS FONTE: Vieira e Fernandes (2012, p. 20) Legenda: microscópios ópticos: campo claro; campo escuro; fluorescência; contraste de fase. 5.2 O MICROSCÓPIO ELETRÔNICO O advento do microscópio eletrônico (ME) possibilitou a observação direta de aspectos ultraestruturais das células até então desconhecidos. Por meio dessas novas observações, a compreensão a respeito da organização dos tecidos vegetais e animais foi enormemente ampliada, e muitas das nossas ideias a respeito da construção e da função celulares foram radicalmente modificadas (GALLETI, 2003). A utilidade do ME é enorme e oferece uma comprovação fotográfica de organismos e características subcelulares. Os objetos de estudo da ME são os mais diversificados: estudo ultraestrutural de células vegetais e animais, fungos, bactérias, vírus, artrópodes, peças automotivas, papéis, exames de balística etc., ao passo que, na microscopia óptica, é utilizado um feixe de luz para visualizar as estruturas (MICROSCOPIA ELETRÔNICA, 2012). UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 20 Na microscopia eletrônica, é empregado um feixe de elétrons, que sofre refração através de lentes eletrônicos. O ME produz aumentos úteis de 200.000 a 400.000X, apresentando um poder de resolução 100 vezes maior quando comparado ao microscópio óptico (GALLETI, 2003). FIGURA 11 – BACTÉRIA ESCHERICHIA COLI VISTA NOS MICROSCÓPIOS ÓTICO E ELETRÔNICO FONTE: <https://slideplayer.com.br/slide/364653/>. Acesso em: 28 maio 2020. Legenda: à esquerda – observação a partir do MO (com coloração específica); à direita – observação a partir do ME. Você sabia que existem dois tipos básicos de microscópios eletrônicos? Vamos conhecê-los? ATENCAO Um deles é o ME de Transmissão (MET). O feixe de elétrons atravessa a célula (ou a organização molecular do vírus) e forma a imagem em uma tela fluorescente, o que fornece detalhes de moléculas, organelas e estruturas intracelulares. A capacidade de resolução é de até 300 mil vezes (GALETTI, 2003; PLATAFORMA DE MICROSCOPIA ELETRÔNICA, 2020). TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 21 FIGURA 12 – MICROSCÓPIO ELETRÔNICO DE TRANSMISSÃO FONTE: <http://1.bp.blogspot.com/-BvrJc4FmSrE/UIa27tgr4OI/AAAAAAAAAC8/ rnWSWUnBHDA/s1600/5.jpg>; <http://www.fiocruz.br/ioc/cgi/cgilua.exe/sys/start. htm?infoid=2514&sid=32&tpl=printerview>. Acesso em: 29 maio 2020. Legenda: A – Microscópio Eletrônico de Transmissão (MET); B – Células do vírus Zika (esferas escuras). Com relação ao ME de Varredura (MEV), a geração de imagem é realizada com os elétrons que varrem a superfície (topografia) das estruturas biológicas. Dessa forma, o instrumento oferece uma imagem da superfície, com noções de profundidade e de tridimensionalidade, com limite de resolução de 0,3 nm. Contudo, fornece pouca (ou nenhuma) informação da estrutura interna. O poder separador não se iguala ao do microscópio de transmissão, embora sejam adequadas muitas finalidades (GALETTI, 2003; PLATAFORMA DE MICROSCOPIA ELETRÔNICA, 2020). UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 22 FIGURA 13 – MICROSCÓPIO ELETRÔNICO DE VARREDURA FONTE: <http://ca.iq.usp.br/novo/paginas_view.php?idPagina=16>; <encurtador.com.br/xOX25>. Acesso em: 29 maio 2020. Legenda: A – MEV; B – Bactérias que formam a placa sobre os dentes. Cabe destacar que o emprego de determinado instrumento, seja MO, MET ou MEV, depende do objetivo do estudo (ou levantamento) a ser realizado, pois este deve indicar que equipamento deve ser utilizado de forma que os resultados esperados sejam atingidos. Vamos conhecer algumas imagens da microscopia eletrônica? Por meio do atlas virtual, você poderá observar diversas células e estruturas celulares. Ficou curioso (a)? Acesse o link e aprenda mais: http://www.drjastrow.de/WAI/EM/EMAtlas.html. Você também pode acessar a biblioteca de imagens de células: http://cellimagelibrary.org/home. DICAS 6 BIOLOGIA CELULAR: UMA VISITA GUIADA É hora de colocar em prática os conhecimentos adquiridos no Tópico 1. Vamos lá?! De forma a tornar o nosso estudo mais interativo e dinâmico, existe um recurso disponível de forma online. É possível navegar pelo maravilhoso mundo da biologia celular, ciência básica do estudo da microbiologia. Primeiramente, é necessário que você acesse http://www.celuladidatica. ufpr.br/celulas-virtuais.php. TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 23 A página é intitulada de “Células Virtuais”. Clique no link, “célula 3D interativa”. Vamos, então, navegar e explorar a nossa célula virtual. Ao longo do caminho, surgem alguns termos novos, de organelas celulares sob as quais não nos aprofundamos neste tópico, mas não se assuste: o intuito desta atividade é possibilitar que você se familiarize com as novas terminologias e reforce os conteúdos já adquiridos. Visualize a figura a seguir e conheça o início do nosso passeio virtual pela célula: FIGURA 14 – TELA INCIAL - CÉLULA 3D FONTE: <http://3d.cl3ver.com/0MKDN>. Acesso em: 29 maio 2020. Na parte superior da tela, é possível clicar nas diferentes estruturas apresentadas, além de obter uma visualização e uma descrição do modelo esquemático apresentado. A partir deste link, é possível conhecer as estruturas: mitocôndria, centríolos, peroxissomo, Complexo de Golgi, membrana plasmática, vesículas, núcleo, citoesqueleto, lisossomos, ribossomos e retículo endoplasmático. Fascinante, não é mesmo?! A partir dos conteúdos já trabalhados neste tópico e da nossa visita guiada pelo interior celular, partimos para os estudos referentes ao Tópico 2. Vamos lá?! Sigamos em frente! UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 24 LEITURA COMPLEMENTAR Colocando a “mão na massa”. Acadêmico, para fixar os conteúdos deste tópico, propomos o seguinte desafio: “esquematizando e modelando células com imagens microscópicas reais”. Para tal atividade, você precisará de: • Imagens de células (a seguir) ou de qualquer outra fonte. • Papel transparente (manteiga, acetato ou transparência de retroprojetor, plástico ou celofane). • Caneta de retroprojetor. • Lápis de cor. • Materiais recicláveis diversos (tampas de garrafas pet, caixas de remédios vazias etc.). • Miçangas diversas ou bolas de amido (bolas de sagu/pérolas de tapioca). • Massa plástica (massa de modelar). Trata-se de criar o seu próprio modelo esquemático de uma célula a partir das informações obtidas neste tópico ou de outras fontes (confiáveis) a serem consultadas. Procedimento: coloque uma folha transparente ou translúcida sobre uma das imagens obtidas por você. Lembre-se de tentar circular, em cores diferenciadas, todas as estruturas que conseguir identificar. CÉLULA E DESENHO/MODELO ESQUEMÁTICO FONTE: <http://www.fiocruz.br/ioc/media/comciencia_03.pdf>. Acesso em: 29 maio 2020. Legenda: A – Imagem de uma célula (parte superior) e modelo esquemático construído. B – Diferentes modelos esquemáticos elaborados. TÓPICO 1 —INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA 25 Empregando uma das figuras disponíveis, você pode tentar recobrir cada elemento presente na imagem com massa de modelar da mesma forma e da mesma cor. Assim, você terá um modelo esquemático desenhado e outro elaborado a partir da massa de modelar e/ou outros materiais.É indicado utilizar a folha transparente como suporte (molde), de forma a não sujar a imagem de fundo com a massa. Figuras de células sugeridas para a realização da atividade: CÉLULAS ANIMAIS (HEPATÓCITO) - VISTA SOB MET FONTE: <http://www.fiocruz.br/ioc/media/comciencia_03.pdf>. Acesso em: 29 maio 2020. BACTÉRIAS VISTAS SOB MET FONTE: <http://www.fiocruz.br/ioc/media/comciencia_03.pdf>. Acesso em: 29 maio 2020. UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 26 CÉLULAS DE ELODEA VISTAS SOB MO FONTE: <https://www.nikonsmallworld.com/galleries/2008-photomicrography-competition/ chloroplasts-in-the-leaf-cells-of-elodea-canadensis-canadian-waterweed>. Acesso em: 29 maio 2020. Legenda: Células de Elodea canadensis (espécie de planta aquática). FONTE: COM CIÊNCIA NA ESCOLA - LBC/IOC/FIOCRUZ. Esquematizando e modelando células com imagens microscópicas reais. 2020. Disponível em: http://www.fiocruz.br/ioc/ media/comciencia_03.pdf. Acesso em: 3 maio 2020. 27 Neste tópico, você aprendeu que: • A microbiologia é a ciência que se dedica ao estudo dos microrganismos, um grande e diversificado conjunto de organismos microscópicos que pode ser encontrado em células únicas ou em agrupamentos celulares. Divide-se em microbiologia básica (ex.: atividades bioquímicas dos microrganismos) e microbiologia aplicada (ex.: microbiologia ambiental – biodegradação). • A célula é a unidade básica da vida e todos os seres vivos são constituídos por células. Esses organismos podem ser unicelulares (ex.: protozoários) e pluricelulares (ex.: plantas, animais etc.). • É importante salientar que, no campo de estudo da microbiologia, estão incluídos, também, os vírus, seres microscópicos de natureza acelular. • Com a invenção do primeiro microscópio, pelo alemão Antony Van Leeuwenhoek, no século XVII, a microbiologia tomou os rumos atuais, visto que o equipamento possibilitou observar pequenos organismos, denominados de “animálculos”. • Em virtude do advento do microscópio, por meio da observação dos “pequenos seres”, a comunidade científica da época indagou a respeito da origem desses organismos, o que levou ao surgimento das teorias da abiogênese (geração espontânea) e da biogênese (um ser vivo surge a partir de outro ser preexistente). • Existem dois tipos celulares básicos: as células procarióticas (ex.: protozoários) e as células eucarióticas (ex.: células que formam o organismo de plantas e de animais). As células eucarióticas animais se diferenciam das células eucarióticas vegetais, pois estas últimas aprestam as seguintes estruturas: parede celular, plastídios e vacúolos. • Para o estudo da microbiologia, é importante conhecer a escala de tamanho dos organismos em geral em relação aos seres microscópicos e algumas unidades de medida básicas: milímetro (mm), micrômetro (µm), nanômetro (nm) e angströn (Å). • As características dos principais grupos de microrganismos são vírus, bactérias (eubactérias e arqueobactérias), protozoários, fungos (bolores e leveduras) e algas. • Existem dois tipos de microscópio, o óptico e o eletrônico. Além disso, dois tipos de ME: microscópio eletrônico de transmissão (MET) e microscópio eletrônico de varredura (MEV). A utilização de um ou de mais equipamentos depende do objetivo do estudo/pesquisa que se pretende efetuar. RESUMO DO TÓPICO 1 28 1 Através deste tópico, identificamos a importância do conhecimento das características básicas da célula para o estudo da microbiologia. Dessa forma, a célula apresentada no nosso passeio virtual é: a) ( ) Eucariótica. b) ( ) Procariótica. c) ( ) Probiótica. d) ( ) Viral. 2 A invenção do microscópio foi um marco fundamental, que inaugurou uma nova perspectiva ao estudo da célula em si. Atento a esse fato, um meticuloso cientista desejava visualizar as organelas celulares da bactéria E. coli. Para tal pesquisa, foi necessária a utilização do equipamento: a) ( ) Microscópio óptico de fluorescência. b) ( ) Microscópio eletrônico de transmissão. c) ( ) Microscópio eletrônico de varredura. d) ( ) Microscópio óptico de campo claro. 3 A importância de saber diferenciar os tipos de células e as particularidades é primordial quando se aborda o estudo da célula. Dessa forma, visualize atentamente as figuras a seguir: AUTOATIVIDADE A B PAREDE CELULAR CITOPLASMA NÚCLEO FONTE: <https://www.thinglink.com/scene/1177118794502373377>; <https://carlosmout. files.wordpress.com/2017/01/celula-animal.jpg>. Acesso em: 29 maio 2020. As letras A e B indicam, respectivamente: a) ( ) Célula vegetal e célula animal. b) ( ) Célula vegetal e célula bacteriana. c) ( ) Célula animal e partícula viral. d) ( ) Célula de pele e célula vegetal. 29 TÓPICO 2 — UNIDADE 1 MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 1 INTRODUÇÃO Olá, acadêmico! Chegamos aos nossos estudos referentes ao Tópico 2. Primeiramente, traremos alguns conceitos atribuídos à microbiologia ambiental e às subáreas correspondentes. Em seguida, trataremos da importância dos microrganismos no organismo humano, no que se refere aos MO que habitam, além daqueles causadores de inúmeras doenças na espécie humana. Posteriormente, abordaremos a classificação dos MO quanto à morfologia, apresentando alguns exemplos existentes na tão vasta biodiversidade dos seres microscópicos. Finalmente, veremos um tipo de classificação corriqueiramente utilizado nos laboratórios de microbiologia. Com base na composição da parede celular, divide as bactérias em gram-positivas e gram-negativas. Bons estudos! 2 MICROBIOLOGIA AMBIENTAL: CONCEITOS Nesta etapa dos estudos, você já se questionou: mas onde a Microbiologia Ambiental (MA), que, inclusive, nomeia este livro didático, encaixa-se no tão vasto campo de estudo da microbiologia? Para entender a fundo tal campo de estudo, é necessário conhecer alguns conceitos da Microbiologia Ambiental. Vamos lá?! De acordo com a Sociedade Brasileira de Microbiologia (SBM), a Microbiologia Ambiental é definida enquanto uma área da ciência que se dedica ao estudo da fisiologia, genética, interações e funções dos microrganismos no ambiente, e faz uso desse conhecimento com o objetivo maior de manter a qualidade ambiental, além de contribuir para o desenvolvimento sustentável da sociedade moderna (SBM, 2020, s.p.). 30 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Outra definição é apresentada por Dalzoto e Pimentel (2020, s.p.), que conceituam a Microbiologia Ambiental enquanto área dedicada ao “estudo dos microrganismos e das atividades no ambiente para o entendimento do papel na manutenção da biosfera e do uso potencial na remediação de locais que tenham sido modificados”. Nicolau (2014, p. 4) aponta que a “Microbiologia Ambiental é, geralmente, definida como o estudo dos efeitos dos microrganismos aplicados ao ambiente, às atividades humanas, saúde e bem-estar”. Por fim, a Microbiologia Ambiental é a: interface entre as ciências ambientais e a ecologia microbiana. Estuda os microrganismos e as funções na condução de processos nos sistemas naturais, e prioriza os efeitos provocados pela presença e pela atividade desses no meio ambiente. Com os avanços da biologia molecular, aumentou-se a habilidade de detectar, além de identificar microrganismos e atividades no ambiente (MICROBIOLOGIA AMBIENTAL, 2020, s.p.). Por meio desses conceitos, podemos evidenciar que a Microbiologia Ambiental integra parte do cenário científico mundial, como uma área de estudos fundamental e inserida em diversos temas de grande importância, como biorremediação, biocatálise, biocombustíveis, controle biológico, fertilizantes etc. FIGURA 15 – ÁREAS DE ESTUDO DA MICROBIOLOGIA AMBIENTAL FONTE: <https://kasvi.com.br/microbiologia-ambiental-saude-humana-plantas-animais/>. Acesso em: 24 maio 2020. TÓPICO 2 —MICRORGANISMOSE A IMPORTÂNCIA 31 Podemos notar que a MA compreende diversas subáreas de elevada importância, todas com o objetivo de manter a qualidade do meio ambiente, além de contribuir para o desenvolvimento sustentável da sociedade. 2.1 A MICROBIOTA HUMANA Já verificamos o conceito de microrganismo e os grupos principais, mas qual a importância desses seres microscópicos? Bem, os microrganismos constituem a maior massa de matéria viva do planeta Terra. Estes efetuam processos químicos necessários a outros organismos. Caso não existissem, outras formas de vida não teriam surgido no planeta e não se manteriam (RICOBELO, 2020). O início dos estudos da microbiologia, aliado a doenças e à preocupação com questões de saúde, contribuiu para que a primeira ideia ligada a esses seres (micróbio, germe, bactéria) fosse, exclusivamente, a de agente causador de doenças. Dessa forma, a presença desses diminutos organismos no corpo deve ser constantemente lembrada (NÓBREGA; BOSSOLAN, 2017). No organismo humano, encontra-se grande quantidade de microrganismos, os quais se distribuem em diferentes órgãos e tecidos, podendo-se encontrar dez vezes mais células microbianas do que células humanas (GONÇALVES, 2014 apud CHAVASCO et al., 2017). FIGURA 16 – MICRORGANISMOS PRESENTES NO CORPO HUMANO FONTE: <http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2011/03/bacterias-sao-fundamentais-para-o- equilibrio-do-corpo-explica-medico.html>. Acesso em: 24 maio 2020. 32 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Cabe destacar que a distribuição dos microrganismos depende de inúmeros fatores, a exemplo de: umidade, acidez, temperatura e disponibilidade de nutrientes. Esses microrganismos influenciam o sistema imunológico, a resistência aos patógenos e o aproveitamento dos alimentos (GONÇALVES, 2004 apud CHAVASCO et al., 2017). O primeiro contato do organismo humano com os microrganismos ocorre logo no início da vida. Ao longo dos anos, somos progressivamente expostos a diferentes quantidades, espécies e gêneros de MO. Dessa forma, como as impressões digitais, não existem microbiomas idênticos entre si, isso porque, além da herança genética, nossa microbiota é moldada por fatores externos. Fatores, como dieta, estilo de vida, variáveis ambientais e comportamentais, interferem diretamente na estrutura, diversidade e estabilidade da população de microrganismos residente no corpo (CHONG; BLOOMFIELD; O’SULLIVAN, 2018; CONLON; AR, 2014 apud BIOMA 4ME, 2020). “Essas particularidades passam pela melhoria do saneamento básico, urbanização, uso excessivo de antibióticos, menor exposição a infeções na infância, vacinação, sedentarismo etc.” (BERNSTEIN; SHANAHAN, 2008 apud CHAVASCO et al., 2017, p. 6). Como já mencionado, sabe-se que muitos microrganismos podem ocasionar doenças graves. Entretanto, existem aqueles que apresentam grande importância à saúde humana. É o caso das bactérias, que integram a microflora intestinal. Você sabe a origem do termo “flora intestinal”? Pois bem, o termo “flora” se refere aos vegetais. Já os microrganismos (MO) pertencem aos grupos protista e das bactérias, por exemplo. Essa nomenclatura é devida ao fato de os MO terem sido classificados entre as planas na taxonomia do sueco Carl von Linné (1707-1778), conhecido, também, como Lineu. Inclusive, data, do século XVIII, a contribuição de Lineu ao desenvolvimento de um sistema de classificação dos seres vivos, que atingiu uma aplicação universal e estabeleceu grande parte dos grupos de animais e plantas aceitos até a atualidade (ARAÚJO; BOSSOLAN, 2006). ATENCAO Para termos uma ideia da questão em números, no intestino de um adulto saudável, podem ser encontradas mais de 1014 células bacterianas, distribuídas em um elevado número de espécies diferentes (possivelmente, existem mais de 1.000 espécies bacterianas distintas no trato intestinal). A maioria dessas espécies está agrupada nos gêneros Bifidobacterium, Clostridium, Eubacterium, Peptococcus, Ruminococcus e Peptostreptococcus (OLIVEIRA; CARDOSO, 2020). TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 33 FIGURA 17 – A COMPOSIÇÃO DA MICROBIOTA INTESTINAL FONTE: <https://www.biocodexmicrobiotainstitute.com/pt-pt/intestinal>. Acesso em: 24 maio 2020. Em um laboratório, é possível criar animais livres de germes, os chamados “germ-free”, sem nenhum contato com microrganismos, inclusive, no trato digestivo. Ao se estabelecer uma comparação destes com outros “normais”, chegou-se à conclusão de que as bactérias intestinais não são necessárias à sobrevivência do hospedeiro. Entretanto, diversas diferenças foram observadas nesses grupos, dentre elas, em animais livres de germes, foi possível evidenciar, conforme Oliveira e Cardoso (2020): • Anatomia do intestino: animais livres de germe têm o ceco (porção inicial do intestino grosso) distendido, com uma mucosa mais fina e com renovação celular mais lenta. • Diferença na química do intestino grosso: os animais livres de germes não têm muitas enzimas bacterianas, além de não metabolizarem os ácidos biliares. • Diferença no sistema imune: a presença de microflora influencia na função dos macrófagos (tipo de célula do sistema imune), na fagocitose (englobamento de partículas sólidas pela célula), na produção de citocinas e na morte intracelular. A questão da microflora intestinal é um importante e complexo exemplo da importância dos microrganismos para a sobrevivência, estando intimamente ligada a uma vida saudável. 34 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Citocinas são moléculas produzidas em resposta a microrganismos e a outros antígenos, que medeiam e regulam reações imunológicas e inflamatórias. Já o antígeno é o nome atribuído a qualquer substância que pode ser especificamente ligada a uma molécula de anticorpo (proteínas que efetuam o reconhecimento de um antígeno). NOTA 2.2 MICRORGANISMOS CAUSADORES DE DOENÇAS NA ESPÉCIE HUMANA Acadêmico, com certeza, você já ouviu falar ou já vivenciou algum caso de intoxicação ou infecção alimentar após a ocorrência de algum evento ou reunião social (casamentos, festas de aniversário), não é mesmo?! Primeiramente, é importante diferenciar os termos infecção e intoxicação alimentar. Vamos conhecê-los?! A infecção alimentar é ocasionada por meio da ingestão de alimentos contendo células viáveis de microrganismos patogênicos. Já a intoxicação alimentar é causada pela ingestão de alimentos que contêm toxinas microbianas formadas (TEIXEIRA, 2020). NOTA Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças transmitidas por alimentos (DTA) são aquelas causadas pela ingestão de alimentos e/ou água contaminados. Mais especificamente, são doenças de natureza infecciosa geradas por ou através do consumo de alimentos ou água contaminados por agentes biológicos, químicos e físicos (FIGUEIREDO et al., 2007 apud TEIXEIRA, 2020; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020). Cabe salientar que, considera-se um surto de DTA, “quando duas ou mais pessoas apresentam doença ou sintomas semelhantes após ingerirem alimentos e/ ou água da mesma origem, normalmente, em um mesmo local. Para doenças de alta gravidade, como botulismo e cólera, apenas um caso já é considerado surto” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020, s.p.). TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 35 As DTA são causadas por grupos de organismos, como bactérias, bolores, leveduras, protozoários e vírus. Alimentos de procedência animal ou vegetal, frescos e processados (a água está inclusa), ao serem contaminados por patógenos e ingeridos, os MO, que geram doenças, invadem os fluídos ou os tecidos do indivíduo infectado, ocasionando doenças ou perturbações fisiológicas, a exemplo de vômitos, febre, diarreia e dores abdominais (TEIXEIRA, 2020). Quais os MO principais, responsáveis pelas DTA? QUADRO 5 – DTA ALIMENTARES E AGENTES CAUSADORES AGENTE CAUSADOR PRINCIPAIS SINTOMASALIMENTOS MAIS SUSCETÍVEIS À CONTAMINAÇÃO Salmonella Diarreias, febre, dores abdominais e vômitos, em média, doze a trinta e seis horas Carnes bovinas, aves, suínos, ovos, leite e vegetais crus. Shigella Febre até uma disenteria e convulsões em criança com menos de quatro anos Ostras, camarão e leite. Yersinia Diarreia, febre e dor abdominal Leite cru e pasteurizado, carnes, língua suína e produtos de laticínios. Escherichia: espécie predominante Escherichia coli habita, normalmente, no intestino humano e de alguns animais. A EPEC é um importante microrganismo causador de gastroenterite em crianças. Está associada à capacidade de adesão às microvilosidades do intestino, além da destruição, provocando diarreia, vômitos, febre baixa Principal causa de diarreia bacteriana infantil, nos países em desenvolvimento ou em áreas de saneamento precário. Staphylococcus aureus Vômitos intensos, diarreia, dor abdominal, febre e cefaleia Resulta da contaminação do alimento por um portador humano, pois a manipulação é uma importante forma de contaminação ou transferência de microrganismos de um alimento para outro. Está ligada às condições higiênico-sanitárias dos próprios manipuladores. Bacillus cereus Náuseas e vômitos no prazo de até seis horas após a ingestão do alimento contaminado, ou quadros clínicos do tipo diarreico Produtos alimentares frescos (ex.: hortaliças e derivados de animais). Além disso, alimentos devem ser refrigerados após cozidos, pois esporos de B. cereus podem sobreviver à fervura, germinando e se multiplicando rapidamente em temperatura-ambiente. 36 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Rotavírus Doenças diarreicas agudas, atingindo humanos e várias espécies de mamíferos e aves Os rotavírus são eliminados em grande quantidade nas fezes. São transmitidos pela via fecal-oral, através de água, alimentos e objetos contaminados, por pessoa a pessoa e, provavelmente, secreções respiratórias, mecanismos que permitem a disseminação elevada da doença. Norovírus: principais agentes virais entéricos. Diarreia, vômitos e cólica estomacal Somente ocorre em seres humanos e é encontrada no mundo inteiro. É fácil de disseminar e muito comum devido à fácil transmissão. São encontrados nas fezes ou vômito de pessoas infectadas. Podem passar para os alimentos, água ou superfícies pelo contato das mãos da pessoa infectada que não realizar o procedimento de lavagem das mãos adequadamente lavadas após a utilização do banheiro. FONTE: Adaptado de Informes Técnicos Institucionais (2004), Fiocruz (2011), Teixeira (2020) e Ministério da Saúde (2020) Legenda: EPEC (cepa – “tipo” de E.coli causadora de doença): E.coli enteropatogênica clássica; Colite aguda: inflamação do intestino grosso; Cefaleia: dor de cabeça. Vamos visualizar alguns desses MO? FIGURA 18 – ESPÉCIES DE MO CAUSADORAS DE DOENÇAS OBSERVADAS AO MICROSCÓPIO FONTE: <https://www.luciacangussu.bio.br/atlas/salmonella-spp/>; <http://www.laminas-lieder.com. br/bacterias-jogo-basico-25-laminas-preparadas-para-microscopio-mg3000/staphylococcus-aureus- organismo-do-pus/>; <https://www.stepwards.com/?page_id=16585>. Acesso em: 6 set. 2020. Legenda: A – Salmonella enteritidis (uma espécie de Salmonella) vista sob ME; Demais imagens vistas sob microscópio ótico; B – Shiguella sp; C – Staphylococcus aureus; D - Bacillus cereus. TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 37 Ao observarmos, podemos notar um ponto importante, intimamente ligado ao foco da nossa disciplina: as doenças de veiculação hídrica e a importância da existência de saneamento básico de qualidade. Outro aspecto que merece destaque é a relevância de lavar corretamente as mãos para que se evite a disseminação de doenças. Em termos financeiros, segundo dados da OPA Brasil, os alimentos não seguros também geram dificuldades no desenvolvimento de muitas economias de baixa e de média renda, geradas perdas de 95 bilhões de dólares (US$) em produtividade associada à doença, incapacidade e morte prematura sofrida pelas (os) trabalhadoras (es) (OPAS BRASIL, 2019). Para as Américas, é estimado que 77 milhões de pessoas sofram um episódio de DTA a cada ano, metade desse montante composto por crianças com menos de cinco anos de idade. As informações disponíveis indicam que as doenças transmitidas por alimentos geram de US$ 700 mil a 19 milhões em custos anuais de saúde nos países do Caribe e mais de US$ 77 milhões nos Estados Unidos (OPAS BRASIL, 2019). No Brasil, a vigilância epidemiológica das DTA (VE-DTA) monitora os surtos de DTA e os casos das doenças definidas em legislação específica. De acordo com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), são notificados, em média, por ano, 700 surtos de DTA, com envolvimento de 13 mil doentes e 10 óbitos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020, s.p.). Acadêmico, utilizamos esse exemplo das DTA para demonstrar que as áreas da microbiologia ambiental se complementam, além de apontarem a importância do consumo de água e de alimentos de qualidade, para a saúde e o bem-estar humanos, além dos prejuízos financeiros em decorrência das DTA e de outras enfermidades. Na Unidade 2, aprofundar-nos-emos nos estudos referentes à microbiologia da água e implicações. Sigamos em frente. ESTUDOS FU TUROS Nesta etapa, você já deve ter percebido que as bactérias não são exatamente iguais, pois apresentam, dentre outros aspectos, características morfológicas diferenciadas. Lembre-se: as bactérias são seres unicelulares, procariontes, não apresentam organelas membranosas e podem ser encontradas vivendo de forma isolada ou vivendo sob a forma de colônias. Então, podemos evidenciar que, 38 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA embora existam milhares de espécies de bactérias, estas podem ser agrupadas em três tipos de morfologia geral: cocos, bacilos e formas espiraladas (CARVALHO, 2010; VIEIRA; FERNANDES, 2012). Vamos conhecer um pouco mais de cada uma dessas morfologias? • Cocos: células, em geral, arredondadas, mas podem apresentar forma ovoide ou achatada em um dos lados quando estão aderidas a outras células. Quando os cocos se dividem para se reproduzir, podem continuar unidos uns aos outros, o que os classifica em: QUADRO 6 – CLASSIFICAÇÃO DOS COCOS ARRANJO DEFINIÇÃO EXEMPLO Diplococos Permanecem em pares após a divisão. Neisseria gonorrhoeae FONTE: <https://microbenotes.com/habitat-and- morphology-of-neisseria-gonorrhoeae/>. Acesso em: 6 maio 2020. Tétrades Dividem-se em dois planos e permanecem em grupamentos de quatro cocos. Deinococcus radiodurans FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=f_ o2iSXIi3I>. Acesso em: 6 maio 2020. Sarcina Agrupamentos de oito cocos em forma cúbica. Sarcina sp. FONTE: <https://www.sciencedirect.com/science/ article/pii/S2214330014200897>. Acesso em: 6 out. 2020. TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 39 Estreptococos Sofrem divisão e permanecem ligados após esta. Streptococcus thermophilus FONTE: <https://microbewiki.kenyon.edu/index.php/ Streptococcus_thermophilus>. Acesso em: 6 out. 2020. Estafilococos Dividem-se em múltiplos planos e formam cachos. Essa conformação lembra os cachos de uva. Staphylococcus aureus FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/ Staphylococcus_aureus>. Acesso em: 6 maio 2020. FONTE: Adaptado de Carvalho (2010) e Vieira e Fernandes (2012) • Bacilos (bastonetes): células de formato cilíndrico ou em formato de bastão. Existem diferenças consideráveis em comprimento e largura entre as diversas espécies de bacilos existentes. Existem alguns bacilos com porções terminais quadradas, outras arredondadas e, ainda, outras afiladas ou pontiagudas. QUADRO 7 – TIPOS DE BACILOS (BASTONETES) ARRANJO EXEMPLO Bacilo único Mycobacterium tuberculosis FONTE: <https://www.terra.com.br/noticias/tuberculose-e-doenca-infecciosa-mais-mortal-do-mundo-diz-oms,9782305c502acf51e70c43b0f200 0512h88lom3e.html>. Acesso em: 4 maio 2020. 40 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Diplobacilos Bacillus subtilis FONTE: <https://annarenatav3.wordpress.com/2011/04/04/bacteria-gram- positiva-e-gram-negativa/>. Acesso em: 4 out. 2020. Estreptobacilos Streptobacillus moniliformis FONTE: <https://link.springer.com/article/10.4056/sigs.48727>. Acesso em: 4 out. 2020. Cocobacilo Chlamydia trachomatis FONTE: <https://link.springer.com/article/10.4056/sigs.48727>. Acesso em: 4 out. 2020. FONTE: Adaptado de Carvalho (2010), Vieira e Fernandes (2012) e Barbosa, Gomes e Torres (2018) • Formas espiraladas: caracterizadas por células em espiral ou helicoidal. TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 41 QUADRO 8 – TIPOS DE FORMAS ESPIRALADAS ARRANJO DEFINIÇÃO EXEMPLO Espirilos Apresentam corpo celular rígido e se locomovem com o auxílio de flagelos externos. Aquaspirillum itersonii FONTE: <https://quizlet.com/133442468/microbiology- 17-unknowns-dee-flash-cards/>. Acesso em: 4 out. 2020. Espiroquetas Flexíveis e realizam a locomoção por meio de contrações do citoplasma, podendo realizar várias voltas ao redor do próprio eixo. Treponema pallidum FONTE: <https://aia1317.fandom.com/pt-br/wiki/ Treponema_pallidum_e_s%C3%ADfilis>. Acesso em: 4 out. 2020. Vibrio Unidade celular que tem semelhança com uma vírgula. Vibrio Cholerae FONTE: <https://microbeonline.com/vibrio-cholerae- laboratory-diagnosis-confirmation/>. Acesso em: 4 out. 2020. FONTE: Adaptado de Carvalho (2010), Vieira e Fernandes (2012) e Barbosa, Gomes e Torres (2018) 42 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 3 MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS É possível verificar que a MA não apresenta limites bem definidos a respeito de quais grupos de microrganismos podem ser de grande interesse quando se trata da área ambiental. Contudo, existe um consenso, nesse campo da microbiologia, acerca da necessidade de compreender as comunidades e as interações entre microrganismos, além do modo como as populações microbianas podem ser compreendidas no equilíbrio sistêmico (ROCHA, 2020). Neste tópico, realizaremos um estudo mais aprofundado dos domínios Bacteria (bactérias) e Archea (arqueobactérias), dentre os quais estão importantes grupos de microrganismos associados a ciclos biogeoquímicos e processos ambientais de interesses antrópicos (ROCHA, 2020). 3.1 AS BACTÉRIAS As bactérias possuem grande capacidade adaptativa a diversos habitat que, com o potencial metabólico diversificado, conferem, a esse grupo, uma importância ímpar para a microbiologia ambiental (ROCHA, 2020). Você já ouviu falar do termo habitat? Trata-se da área de ocorrência de um organismo, dentro de um certo limite físico, um espaço definido. A dimensão de um habitat pode ser variável e depende do organismo analisado. Para a bactéria E.coli, o habitat pode ser o trato gastrointestinal de humanos, por exemplo. Já o habitat de um peixe pode ser uma área de um rio (ECOLOGIA BÁSICA, 2020). ATENCAO Uma estrutura presente nas células bacterianas fundamental aos nossos estudos é a parede celular. Esta confere proteção e suporte celular. Também é responsável por reduzir o estresse mecânico da célula em condições ambientais desfavoráveis, o que garante a manutenção da estrutura e do volume celular (WOESE; KANDLER; WHEELIS, 1990 apud ROCHA, 2020). Composta, dentre outras substâncias, por um complexo macromolecular, conhecido como mucocomplexo (também chamado de peptidoglicano, mureína, mucopeptídio ou glicopeptídio) (NOGUEIRA; MIGUEL, 2020). Graças à parede celular, as bactérias estão aptas a viver em ambientes com a concentração de solutos extremamente inferior do que as do citoplasma, sem sofrer lise (rompimento). Esse envoltório rígido confere resistência e limita o aumento do volume ocasionado pela entrada de água, o que impede o rompimento da membrana plasmática (BARBOSA; GOMES; TORRES, 2018). TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 43 Para termos uma noção da resistência da parece celular, esta é capaz de resistir à pressão de até 100 atm (CZONKA, 1989 apud ROCHA, 2020), o que equivale a 76000 mmgH! Incrível, não é mesmo?! A título de comparação, um mergulhador, sem qualquer tipo de auxílio, consegue atingir a profundidade de até 30 m, com a pressão total do ar de 4 atm (3040 mmgH). NOTA Cabe salientar que nem todas as bactérias possuem parede celular. Podemos citar, como exemplo, aquelas pertencentes ao gênero Mycoplasma, cujas algumas espécies são parasitas. Considerados os menores microrganismos de vida livre capazes de autorreplicação, essas bactérias têm predileção por membranas serosas ou mucosas (RAZIN, 2006; CLAYDE, 1986 apud RIZZO et al., 2011). Podemos citar a espécie M. pneumoniae, que coloniza o aparelho respiratório humano, causando pneumonia, afetando, especialmente, pessoas com idades entre os 8 e os 30 anos de idade (MICOPLASMAS, 2005). FIGURA 19 – MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE MYCOPLASMA PNEUMONIE FONTE: <https://www.cdc.gov/pneumonia/atypical/mycoplasma/hcp/disease-specifics.html>. Acesso em: 9 maio 2020. 44 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA A ausência de parede celular confere, ao gênero Mycoplasma, imunidade à antibióticos (por exemplo, a penicilina), cujo mecanismo de ação está relacionado à inibição da síntese da parede celular (BÉBÉAR; PEREYRE; PEUCHANT, 2011). ATENCAO Sob a ótica da microbiologia ambiental, a parede celular tem importância fundamental na formação de biofilmes. Estes são agregados altamente organizados e unidos por uma matriz polimérica. Em um estudo realizado pelos autores Bucher et al. (2015), ao pesquisarem a formação do biofilme pela bactéria Bacillus subtilis (uma bactéria do solo), puderam verificar que a inibição da síntese de compostos da parede celular (peptideoglicanos, por exemplo) ocasiona obstáculo na formação do biofilme e fixação do agregado celular em uma superfície. A partir desses resultados, os cientistas chegaram à conclusão de que a parede celular do microrganismo gram-positivo está intimamente envolvida no desenvolvimento e na sustentação de biofilmes do meio ambiente (BUCHNER et al., 2015 apud ROCHA, 2020). O biofilme microbiano é definido enquanto uma associação de células microbianas (uma ou mais espécies), fixas a superfícies, bióticas ou abióticas, recoberta por uma complexa matriz extracelular de substâncias poliméricas (polímeros naturais de elevado peso molecular secretados por microrganismos no ambiente). Os biofilmes representam mais de 90% dos contaminantes presentes em sistemas aquosos, industriais, clínicos e ambientais. NOTA TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 45 FIGURA 20 – ETAPAS DA FORMAÇÃO DE UM BIOFILME TÍPICO FONTE: Stoodley et al. (2002) apud Oliveira e Cardoso (2020) Legenda: Células plactônicas – células livres; EPS - matriz de polímeros extracelulares. Essa matriz age como uma barreira física, impedindo que sanitizantes cheguem aos sítios de ação, como a membrana de bactérias gram-positivas (ESPER, 2011). Conforme a composição da parede celular, as bactérias podem ser classificadas em dois grandes grupos: gram-positivas e gram-negativas. Essa diferenciação é importante, pois possibilita diferenciar microrganismos a partir de uma técnica de coloração simples, pautada em diferenças estruturais, que apresentam, como resultado, comportamentos distintos frente a um processo de coloração (ROCHA, 2020). Dessa forma, podemos aferir a diferenciação entre bactérias gram-positivas e gram-negativas, pois a coloração de Gram se configura na metodologia mais importante e mais empregada na atualidade, cuja finalidade é a classificação de microrganismos com base nas características tintoriais, tamanho, forma e arranjo celular. 46 UNIDADE 1 —NOÇÕESDE MICROBIOLOGIA FIGURA 21 – CLASSIFICAÇÃO BACTERIANA QUANTO À PRESENÇA/AUSÊNCIA E COMPOSIÇÃO DA PAREDE CELULAR FONTE: <https://www.ufjf.br/microbiologia/files/2013/05/Morfologia-Citologia-e-Fisiologia- Bacteriana-ENF.pdf>. Acesso em: 9 maio 2020. Até a segunda metade do século XIX, quando as bactérias começaram a ser propostas como causadoras de doenças humanas, observavam-se as bactérias apenas no tocante à forma. Contudo, em 1884 (séc. XIX), um médico dinamarquês, Hans Christian Gram, idealizou uma técnica de coloração que ficou conhecida como “coloração de Gram” (MOREIRA; CARVALHO; FROTA, 2015). NOTA HANS CHRISTIAM GRAM FONTE: <http://micro-ifrj.blogspot.com/2019/05/a-biografia-de-hans-christian-gram.html>. Acesso em: 9 maio 2020. TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 47 Assim, existe um método de coloração comumente empregado nos laboratórios de microbiologia para diferenciar bactérias quanto à composição química da parede celular. A seguir, estudaremos as características particulares desses dois tipos de bactérias (gram-positivas e gram-negativas). Sigamos em frente! 3.1.1 Bactérias gram-positivas e gram-negativas A parede celular das bactérias gram-positivas se caracteriza por uma espessa camada de peptidoglicano (30-100 nm), também conhecido como mureína ou mucopeptídeo, o que compensa a ausência de uma membrana externa, presente apenas nas bactérias gram-negativas. Nestas últimas, a camada de peptidoglicano é muito delgada (“fina”), mas com estrutura da parede celular bem mais complexa do ponto de vista químico (MOREIRA; CARVALHO; FROTA, 2015; ROCHA, 2020). Observe dois desenhos esquemáticos comparativos. Note a diferença de espessura na camada de peptideoglicano: FIGURA 22 – BACTÉRIAS GRAM-POSITIVA E GRAM-NEGATIVA FONTE: <https://pt.khanacademy.org/science/biology/bacteria-archaea/prokaryote-structure/a/ prokaryote-structure>. Acesso em: 9 maio 2020. As bactérias gram-positivas contam com uma parede com várias camadas de peptideoglicano (mureína), composta por subunidades alternadas de N-acetilglicosamina (NAG) e N-acetilmurâmico (NAM). Essas moléculas são ligadas, de forma cruzada, por tetrapeptídeos conferindo rigidez à parede. Encontra-se, ainda, na parede, o ácido teicoico, constituído por um carboidrato fosfato e um álcool (glicerol ou ribitol). A maioria dos cocos de importância clínica (Staphylococcus, Streptococcus, Micrococcus, Enterococcus) é gram-positiva, exceto Neisseria, Bordetella etc. (NASCIMENTO, 2020). 48 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Além da composição, a parede celular de bactérias gram-positivas conta com proteínas de superfície, que são importantes para se assegurar a adesão de microrganismos em superfícies, passo essencial na colonização de ambientes e na formação de biofilmes (CUCARELLA et al., 2001; CORRIGAN et al., 2007 apud ROCHA, 2020). Conforme já mencionado, a parede celular das bactérias gram-negativas é mais complexa do que a parede das gram-positivas, pois apresenta uma membrana externa cobrindo uma camada fina de peptideoglicano. Essa membrana externa é constituída por fosfolipídeos, proteínas e lipopolissacarídeos (LPSs) (BOSSOLAN, 2002). A membrana externa bacteriana das gram-negativas apresenta lipopolissacarídeos (LPS), fosfolipídeos e proteínas, além de ser uma estrutura resistente e, em termos relativos, uma estrutura permeável. A principal finalidade está ligada à ancoragem em superfícies de crescimento do biofilme ou adesão em células animais por bactérias causadoras de doenças (ROCHA, 2020). Observe a representação esquemática detalhada da parede celular de bactérias gram-negativas. FIGURA 23 – PAREDE CELULAR DE BACTÉRIAS GRAM-POSITIVA E GRAM-NEGATIVA FONTE: <https://blog.jaleko.com.br/como-e-feito-o-metodo-de-gram/>. Acesso em: 9 maio 2020. Acadêmico, não se assuste com os nomes das estruturas/compostos citados ao longo do texto. Quando estes forem importantes ao entendimento dos conteúdos desta disciplina, contarão com definições e exemplos que facilitarão o entendimento. ATENCAO TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 49 Qual o segredo da Coloração de Gram? Primeiramente, observe o método propriamente dito a seguir: FIGURA 24 – COLORAÇÃO DE GRAM FONTE: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4269646/mod_resource/content/1/ Pr%C3%A1tica%204.pdf>. Acesso em: 9 maio 2020. Observe a coloração das bactérias gram-positivas e gram-negativas ao fim do procedimento de coloração de Gram. FIGURA 25 – BACTÉRIAS GRAM-POSITIVAS E GRAM-NEGATIVAS FONTE: <http://www.biomedicinaemacao.com.br/2015/08/coloracao-de-gram-microbiologia- dia1.html>. Acesso em: 9 set. 2020. Legenda: Gram-negativas: coram-se de vermelho (ou rosa); Gram-positivas: coram-se de azul (ou roxo). 50 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA O princípio ou fundamento da técnica de Gram se baseia, obviamente, na diferença da composição química da parede celular das bactérias e na ação do álcool sobre a parede. A diferença na coloração depende da criação de uma barreira de permeabilidade na bactéria gram-positiva, que acontece após o tratamento com álcool, sendo que este desidrata a densa camada de peptideoglicano na bactéria gram-positiva. Isso faz com que sejam criados pequenos poros que aprisionam o complexo cristal violeta-iodo no interior celular. Já o tratamento com álcool na gram-negativa gera um aumento da permeabilidade em virtude da extração de lipídios da membrana externa (MOREIRA; CARVALHO; FROTA, 2015). Outra teoria complementar se trata da lipossolubilidade dos constituintes da parede celular bacteriana. As bactérias gram-negativas, por possuírem, na composição, grandes lipídeos (formando a membrana externa), estes são solubilizados quando expostos ao solvente orgânico, deixando extravasar todo o corante que, ocasionalmente, tenha adentrado na célula bacteriana. As gram- positivas, por não apresentarem lipídeos na composição, não sofrem essa ação. Além disso, a solubilização dos lipídios, pertencentes à membrana externa, facilita, ainda, mais o extravasamento do corante (das gram-negativas), tornando- as incolor. Assim, para a evidenciação das bactérias gram-negativas, após a etapa da diferenciação, utiliza-se um contracorante para facilitar a visualização (MOREIRA; CARVALHO; FROTA, 2015). 3.1.2 A parede celular das arqueobactérias (arqueas) As células de arqueobactérias também podem ser diferenciais pelo processo de coloração de Gram, porém, as células gram-positivas e gram-negativas contam com características peculiares. Arqueas Gram-positivas apresentam parede celular composta por pseudopeptideoglicanos, ao passo que as Gram-negativas não possuem parece celular ou membrana externa. No lugar dessas estruturas, as arqueobactérias Gram-negativas possuem uma camada, denominada de camada S, de grande espessura e ancorada aos lipídeos da membrana plasmática (ROCHA, 2020; NOGUEIRA; MIGUEL, 2020). As Gram-positivas também apresentam a camada S, mas esta conta com espessura inferior, quando comparada às arqueas Gram-positivas, e ligada à camada de pseudomureína. A camada S é fundamental na adesão dos microrganismos em superfícies e entre indivíduos de uma colônia. Além disso, é essencial na estabilidade dos biofilmes, fornecendo proteção e transporte de metabólitos às células que formam a comunidade de microrganismos (ROCHA, 2020). TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 51 FIGURA 26 – CAMADAS S EM ARQUEOBACTÉRIAS FONTE: Adaptada de Sleytr et al. (2014) apud Rocha (2020) Outra característica interessante diz respeito aos lipídeos (mais precisamente, os fosfolipídeos) presentes nas membranas de algumas espécies de arqueobactérias, cuja composição química é diferente quando comparada às bactérias de uma forma geral. Isso confere rigidez à estrutura da membrana plasmática,característica vantajosa para microrganismos que se encontram expostos a ambientes muito ácidos ou básicos (ROCHA, 2020). Podemos citar, como exemplo, a arqueobactéria Ferroplasma acidiphilum, encontrada em resíduos e em efluentes de mineração. Em virtude da estrutura celular diferenciada, essa espécie apresenta as capacidades de sobreviver e de se multiplicar em um ambiente com pH de 0 a 2 e com altas concentrações de ferro e metais pesados (FERRER et al., 2007 apud ROCHA, 2020). FIGURA 27 – FERROPLASMA ACIDIPHILUM FONTE: <https://microbewiki.kenyon.edu/index.php/Ferroplasma>. Acesso em: 9 maio 2020. 52 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Acadêmico, nesta etapa dos estudos, foi possível conhecer a importância da aplicação da técnica de Coloração de Gram nos estudos bacteriológicos, pois essa é uma das mais importantes metodologias empregadas em laboratórios de microbiologia, sendo (quase sempre) a etapa inicial para a caracterização de amostras de bactérias. Dessa forma, nossa leitura complementar é destinada a essa técnica. TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 53 LEITURA COMPLEMENTAR CONHECENDO A TÉCNICA DA COLORAÇÃO DE GRAM 1 – Primeiramente, é necessário que se efetue a preparação do esfregaço celular. Para tal atividade, deve-se realizar o seguinte procedimento: Limpar uma lâmina de vidro (passar algodão embebido em álcool). Quando se tratar de uma cultura em meio líquido, com uma alça de inoculação (alça bacteriológica), tomar uma pequena porção da cultura, observando as precauções de assepsia, e colocá-la sobre a lâmina, espalhando-a para formar um esfregaço fino e uniforme. Quando a cultura for em meio sólido, colocar uma gota de água destilada sobre a lâmina e, com uma alça de inoculação, colher uma pequena quantidade de crescimento bacteriano da superfície do ágar, além de suspendê- la na gota de água destilada, espalhando suficientemente para obter um esfregaço fino. Deixar a lâmina secar à temperatura-ambiente. Fixar na chama do Bico de Bunsem, cortando a chama por 3x. FONTE: <http://portal.virtual.ufpb.br/biologia/pdf/roteiro_AP_BIOLOGIA_DE_MICROORGANISMOS.pdf>. Acesso em: 9 maio 2020. PREPARAÇÃO DO ESFREGAÇO FONTE: <encurtador.com.br/ckpyS>. Acesso em: 9 maio 2020. 54 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA 2 – Iniciando o procedimento de coloração propriamente dito: FONTE: <paginapessoal.utfpr.edu.br›at_download›. Acesso em: 9 maio 2020. TÓPICO 2 —MICRORGANISMOS E A IMPORTÂNCIA 55 3 – Em resumo, o procedimento de Coloração de Gram pode ser explicado da seguinte forma: Soluções em ordem de aplicação Reação do aspecto das bactérias gram-positivas Reação do aspecto das bactérias Gram-negativas Cristal violeta Coradas em violeta Coradas em violeta Solução de Iugol Formação do complexo CVI no interior da célula, que permanece violeta Formação do complexo CVI no interior da célula, que permanece violeta Álcool-acetona Desidratação da parede celular, diminuição da porosidade e da permeabilidade; o complexo CVI não pode sair da célula, que permanece violeta Extração dos lipídeos da parede celular, aumento da porosidade; o complexo CVI é removido da célula Fucsina ou safranina A célula não é afetada, permanece violeta A célula adquire o corante, tornando-se vermelha FONTE: <http://docente.ifsc.edu.br/melissa.kayser/MaterialDidatico/Microbiologia/2.%20Colo- ra%C3%A7%C3%A3o%20GRAM.pdf>. Acesso em: 9 maio 2020. Legenda: CVI – complexo cristal violeta-iodo. 56 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • A Microbiologia Ambiental (MA) é uma ciência que se ocupa em estudar os efeitos dos microrganismos aplicados ao ambiente, às atividades humanas, saúde e bem-estar. A MA engloba uma série de subáreas, a exemplo da microbiologia do solo, da água, da qualidade do ar etc. • No organismo humano, encontra-se grande quantidade de microrganismos, os quais se distribuem em diferentes órgãos e tecidos, podendo-se encontrar dez vezes mais células microbianas do que células humanas. • Variáveis, como, dieta, estilo de vida, fatores ambientais e comportamentais interferem diretamente na estrutura, diversidade e estabilidade da população de microrganismos residente no corpo. • A questão da microflora intestinal é um importante e complexo exemplo da importância dos microrganismos para a nossa sobrevivência, estando intimamente ligada a uma vida saudável. • Existem os MO, causadores de doenças, a exemplo das doenças transmitidas por alimentos (DTA), que podem causar sintomas. Dentre eles, os mais comuns são náuseas, vômitos, dores abdominais, diarreia, falta de apetite e febre. • Hábitos de higiene adequados e existência de saneamento básico de qualidade são mecanismos eficazes de prevenção das DTA e das outras patologias. • Conforme a morfologia, as bactérias podem ser agrupadas em cocos, bacilos e formas espiraladas. • A parede celular bacteriana permite que, por meio de coloração específica (Coloração de Gram), sejam classificadas em gram-positivas e gram-negativas. Além disso, a estrutura tem papel fundamental na formação de biofilmes. • Existem bactérias que não apresentam parede celular. Podemos citar, como exemplo, aquelas pertencentes ao gênero Mycoplasma. • A estrutura celular diferenciada das archeobactérias permite, a estas, a colonização de ambientes inóspitos, a exemplo dos resíduos e dos efluentes de mineração, meio com pH extremamente ácido. 57 1 Na rotina de um laboratório de Microbiologia Ambiental, foi realizado o procedimento de Coloração de Gram a partir de uma colônia de bactérias obtida de um tubo de ensaio. Posteriormente, os técnicos, ao visualizarem a lâmina no microscópio óptico, verificaram as seguintes características: agregados de bactérias que lembram um formato de “cacho de uva”, na cor violeta (roxa). Esse resultado levou os técnicos a concluírem se tratarem de: a) ( ) Sarcinas – Gram-positivos. b) ( ) Estafilococos - Gram-positivos. c) ( ) Estafilococos - Gram-negativos. d) ( ) Tétadres – Gram-negativos. 2 Considere que após uma análise de rotina, onde observou-se através de um microscópio um agregado de bactérias gram positivas com morfologia de estafilococos, os técnicos foram à literatura da área pesquisar o motivo pelo qual as evidências foram obtidas. Dessa forma, encontraram que a coloração roxa obtida ocorreu em virtude da seguinte característica: a) ( ) Presença de membrana plasmática dupla. b) ( ) Ausência de parede celular. c) ( ) Parede de peptideoglicano mais delgada. d) ( ) Parede de peptideoglicano mais espessa. 3 A técnica de Coloração de Gram é uma das metodologias empregadas, em virtude da composição da parede celular bacteriana. Entretanto, outros métodos são empregados para coloração de estruturas microbianas específicas. Efetue uma pesquisa e disserte acerca de um desses métodos. AUTOATIVIDADE 58 59 TÓPICO 3 — UNIDADE 1 REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 1 INTRODUÇÃO Você já deve ter ouvido falar de que as bactérias se multiplicam em ritmo acelerado, quando comparadas a outros organismos (por exemplo, uma planta). Pois bem, neste tópico, aprofundaremos o interessante mecanismo de reprodução bacteriana (fissão binária), além de outras maneiras com que esses seres minúsculos transmitem a informação genética. Estudaremos que existem variáveis (temperatura e pH, por exemplo) que influenciam diretamente no crescimento das bactérias, além de outros MO, em geral. Além disso, poderemos evidenciar que existem faixas de crescimento ótimo observadas para os MO, conforme as características físico-químicas do meio em que vivem ou são cultivados. Ficou curioso? Sigamos em frente e bons estudos! 2 REPRODUÇÃO CELULAR BACTERIANA Para que seja dada continuidade à espécie, todas as células (procarióticas e eucarióticas) necessitamefetuar o processo denominado de divisão celular. Nas bactérias, em geral, a reaprodução se dá por fissão binária ou cissiparidade. Nesse processo, ocorre a replicação do cromossomo, e uma célula individual (célula-mãe) se divide em duas. Em seguida, acontece a divisão do cromossomo bacteriano, além do desenvolvimento da parede celular transversal (VIEIRA; FERNANDES, 2012; ROCHA, 2020). 60 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA FIGURA 28 – REPRODUÇÃO CELULAR BACTERIANA FONTE: <https://brainly.com.br/tarefa/17367698>. Acesso em: 9 maio 2020. O tempo de reprodução (tempo de geração), período necessário para duplicar uma célula bacteriana, geralmente, é de cerca de 20 minutos a uma hora. Entretanto, existem espécies com tempos de geração superiores. Um exemplo que podemos citar é a espécie Rhizobium japonicum, MO fixador de nitrogênio em plantas leguminosas. O tempo de geração varia entre seis a oito horas (ROCHA, 2020; TODAR, 2005). QUADRO 9 – TEMPOS DE GERAÇÃO DE ALGUMAS ESPÉCIES BACTERIANAS Espécie de bactéria Tempo de geração em minutos Escherichia coli 17 Bacillus megaterium 25 Staphylococcus aureus 27-30 Lactobacillus acidophilus 66-87 Rhizobium japonicum 344-461 Mycobacterium tuberculosis 792-932 Treponema pallidum 1980 FONTE: O autor TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 61 Como foi possível medir o tempo de geração das espécies? De que maneira podemos estudar esses MO em laboratório? Veremos, no decorrer deste tópico, as condições necessárias à realização desses procedimentos! Para termos uma ideia da velocidade do crescimento de uma bactéria típica, indicamos que você assista https://www.youtube.com/ watch?v=KIpcCyuypzg;https://www.youtube.com/watch?v=4grQSLmWXQk. Fascinante, não é mesmo?! DICAS As bactérias se reproduzem via progressão geométrica (n2). Desse modo, a expressão é representada em logaritmo (log) do número de microrganismo pelo tempo gasto para a multiplicação, isto é, crescimento exponencial, por haver uma célula originando 2, que, por sua vez, originam 4, e assim sucessivamente (CARVALHO, 2010). Nesse contexto, o tempo de geração coincide com o tempo necessário para que a colônia duplique de tamanho (ROCHA, 2020). O aumento é dependente de fatores relacionados ao meio em que o microrganismo se encontra. Podemos citar, como exemplo, a fonte de carbono utilizada, a disponibilidade de nutrientes e de vitaminas, além de fatores abióticos, como temperatura, umidade, pH, pressão etc. (ISCHII et al., 2010 apud ROCHA, 2020). Para a microbiologia, o termo crescimento é referido a um aumento do número de células, e não ao aumento das dimensões celulares (VIEIRA; FERNANDES, 2012). NOTA Cabe salientar a observação de que o comportamento da divisão bacterina em cultivo (laboratorial) difere daquele que os MO apresentam no habitat natural. Isso ocorre pois as bactérias possuem crescimento exponencial apenas quando as condições do meio são favoráveis, ou quando as necessidades dos MO são inteiramente atendidas. Nem sempre isso ocorre no habitat natural (ROCHA, 2020). Em contrapartida, em meios de cultura, o crescimento bacteriano segue quatro fases de desenvolvimento bem definidas: 62 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA • Fase lag: caracterizada pela adaptação da célula do MO ao novo meio, seja por meio da inoculação ou da contaminação (CARVALHO, 2010). Nesta fase, as células estão ativas metabolicamente, sintetizando moléculas essenciais (RNA, enzimas). Não estão em processo de divisão celular, mas podem aumentar de tamanho, preparando o maquinário celular para a divisão posterior (ROCHA, 2020). • Fase log: fase na qual ocorre rápida divisão celular, na qual as bactérias crescem com progressão geométrica. Trata-se de uma reta cuja inclinação depende da velocidade de divisão das bactérias (VIEIRA; FERNANDES, 2012). Nesta etapa, portanto, ocorrem a duplicação do material genético e o processo de fissão binária (ROCHA, 2020). • Fase estacionária: as células não se reproduzem indefinidamente, quando em um meio de cultura limitado, pois os nutrientes se esgotam em algum momento. Nesta etapa, entra-se na fase estacionária, quando há carência de nutrientes. O número de mortes se iguala ao número de células produzidas, o que gera o status de equilíbrio da população microbiana (VIEIRA; FERNANDES, 2012; ROCHA, 2020). • Fase de morte ou declínio: as bactérias passam a morrer a uma taxa mais rápida quando comparadas à população de novas células. A partir da observação a seguir, será possível evidenciar as fases do crescimento bacteriano. GRÁFICO 1 – CURVA DE CRESCIMENTO BACTERIANO EM MEIO DE CULTURA CONTROLADO FONTE: <https://microimunoliga.blogspot.com/2016/09/curva-de-crescimento.html>. Acesso em: 6 out. 2020. TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 63 Cabe destacar que são poucos os MO capazes de crescer em cultivo. De fato, mais de 90% dos MO presentes em uma amostra ambiental (ex.: de solo) não são cultiváveis, devendo ser estudados com o emprego de outras técnicas analíticas (ROCHA, 2020), que estudaremos na Unidade 2. NOTA 2.1 OUTROS TIPOS DE REPRODUÇÃO BACTERIANA A fissão binária não é a única maneira pela qual as bactérias se reproduzem. Podem ocorrer, também, a esporulação e o brotamento. Na esporulação, formas dormentes de células bacterinas são fabricadas por determinadas espécies em caso de escassez de nutrientes. Os esporos contam com uma fase latente (de repouso) celular. Essa conformação os torna extremamente resistes a agentes químicos e físicos adversos, o que denota uma estratégia de sobrevivência. O endósporo resiste até o momento em que as condições ambientais melhorem. Muitos deles, inclusive, resistem à água fervente. Podem resistir à radiação. Todas as bactérias dos gêneros Bacillus, Clostridium produzem esporos (VIEIRA; FERNANDES, 2012), além do gênero Desulfotomaculum. 64 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA FIGURA 29 – ESPORULAÇÃO BACTERIANA FONTE: Adaptada de Tortora (2011) Já em condições adequadas, o esporo germina e origina a célula vegetativa, voltando ao metabolismo normal (NASCIMENTO, 2020). TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 65 FIGURA 30 – ESPORO E CÉLULA VEGETATIVA FONTE: <https://abccam.com.br/wp-content/uploads/2017/08/APRESENTA%C3%87%C3%83O- DO-BIOLOGO-ALYSSON-LIRA-ANGELIM-PROBI%C3%93TICOS.pdf>. Acesso em: 6 maio 2020. As Bactérias Redutoras de Sulfato (BRS) são consideradas o principal grupo de microrganismos envolvidos na formação de biofilmes e de biocorrosão de oleodutos, causando inúmeros prejuízos econômicos relacionados à atividade metabólica na indústria petroquímica. Desse modo, têm sido alvo de inúmeras pesquisas destinadas à mitigação dos malefícios. Um exemplo a ser citado é a bactéria Desulfotomaculum nigrificans (LEÃO, 2009). NOTA Entretanto, mesmo não havendo reprodução sexuada em bactérias, pode haver troca de material genético entre estas, por meio dos processos de transformação, conjugação e transdução (VIEIRA; FERNANDES, 2012). • Transformação: descoberta de forma experimental, trata-se da absorção e da posterior incorporação de fragmentos de DNA dispersos no meio, originários da lise celular (maioria dos casos), ou da secreção realizada por bactérias ainda vivas. Existindo compatibilidade entre as linhagens participantes, o fragmento de DNA originário da célula (célula doadora) passa a integrar o material genético 66 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA da célula receptora, cujo material é transmitido aos descentes da etapa de duplicação bacteriana. O processo de transformação tem sido útil na realização do mapeamento de genes de bactérias competentes (capazes de efetuar a incorporação), como a Bacillus subtilis, que também efetua, de forma eficiente, a captação do DNA por meio da transdução, por exemplo(SANTOS, 2014). FIGURA 31 – TRANSFORMAÇÃO BACTERIANA FONTE: Adaptada de Santos (2014) A bactéria Bacillus subtilis é uma habitante natural do solo, capaz de sintetizar antibióticos, enzimas e fitohormônios, que conferem benefícios para as plantas. Essa espécie microbiana é descrita como rizobactéria promotora de crescimento de plantas (RPCP) (ARAUJO, 2008). NOTA • Transdução: ocorre quando moléculas de DNA são transferidas de uma bactéria a outra, empregando os vírus, como vetores (bacteriófagos). Quando o vetor entra em uma célula bacteriana, o DNA viral se mistura com uma parte do DNA bacteriano, de forma que o vírus passa a carregar esse fragmento do DNA. Caso o vírus infecte uma segunda bactéria, o DNA da primeira pode se misturar ao DNA da segunda. Essa nova informação genética é, então, replicada a cada nova divisão. O processo de engenharia genética ou tecnologia do DNA recombinante também possibilita a recombinação genética nesses organismos (VIEIRA; FERNANDES, 2012; SANTOS, 2014). TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 67 FIGURA 32 – TRANSDUÇÃO BACTERIANA FONTE: Adaptada de Santos (2014) • Conjugação: em uma mesma espécie bacteriana, existem linhagens distintas, que diferem, de forma significativa, umas das outras. Essas alterações são devidas à elevada taxa de mutação do genoma bacteriano e do mecanismo de conjugação (ROCHA, 2020). Duas células bacterianas geneticamente diferentes trocam DNA através do pelo sexual, o chamado pilus bacteriano (VIEIRA; FERNANDES, 2012). Trata-se, então, de um processo de transferência direta e horizontal de genes, através de uma ponte citoplasmática temporária (ponte de conjugação). Essa ponte, criada pelas fímbrias de uma bactéria doadora (“macho”) para uma receptora (“fêmea”), permite a troca de material genético (SANTOS, 2014). Geralmente, a informação genética transferida confere algum benefício evolutivo à célula que a recebeu. A conjugação pode proporcionar resistência bacteriana aos antibióticos e a compostos tóxicos no meio. FIGURA 33 – CONJUGAÇÃO BACTERIANA FONTE: Adaptada de Santos (2014) e <https://ib.bioninja.com.au/standard-level/topic-3- genetics/32-chromosomes/prokaryotic-genetics.html>. Acesso em: 6 maio 2020. Legenda: à esquerda, modelo esquemático do processo de conjugação; à direita, encontra- se uma micrografia de um pilus bacteriano. 68 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA Diversos autores consideram a conjugação bacteriana uma forma de reprodução sexuada. Contudo, deve-se ter cautela com essa denominação. Embora a conjugação possa promover recombinação, que outros seres conseguem por meio da reprodução sexuada, a conjugação bacteriana não gera novos organismos (SANTOS, 2014). NOTA O processo de conjugação é empregado em aplicações biotecnológicas, dado o fato de muitas células bacterianas serem capazes de transferir genes às células eucarióticas (fungos, plantas, mamíferos), o que torna essa ferramenta um poderoso recurso da engenharia genética (ROCHA, 2020). Uma das aplicações que trata desse procedimento diz respeito à utilização da bactéria Agrobacterium tumefaciens, para introdução da construção genética de interesse no organismo-alvo, que pode ser uma planta, por exemplo, conferindo resistência a pragas que assolam as plantações. Atualmente, mais de 90% dos organismos geneticamente modificados (OGM) comerciais liberados utilizam Agrobacterium como método de transformação (EMBRAPA, 2015). 3 FATORES QUE INTERFEREM NO CRESCIMENTO MICROBIANO Conforme estudamos, a disponibilidade de nutrientes é a principal variável que limita o crescimento bacteriano, porém, outras variáveis são consideradas limitantes ao crescimento das bactérias: temperatura, pH, pressão osmótica (fatores/variáveis físicos), nutrição e disponibilidade de O2 (oxigênio), que compõem os principais fatores químicos (VIEIRA; FERNANDES, 2012; CAMARGO, 2019). Na sequência, aprofundaremos cada um desses fatores. • Temperatura: certas bactérias crescem melhor em temperaturas baixas, outras, em temperaturas intermediárias, e, outras, em temperaturas elevadas. Destaca-se que a temperatura ótima de crescimento se trata daquela em que o MO cresce de forma mais rápida. Quando as temperaturas são favoráveis ao crescimento, o número de divisões celulares por hora (taxa de crescimento) dobra para cada aumento de temperatura de 10°C. Desse modo, existem três faixas de temperatura que devemos conhecer: mínima, ótima e máxima. Nesta última, as enzimas sofrem danificação em virtude do calor, prejudicando o crescimento bacteriano (VIEIRA; FERNANDES, 2012). TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 69 FIGURA 34 – TEMPERATURAS MÍNIMA, MÁXIMA E ÓTIMA ASSOCIADAS AO CRESCIMENTO MICROBIANO FONTE: Adaptada de Madigan et al. (2010) Legenda: os valores reais podem sofrer variação significativa, conforme o MO analisado. Conforme a temperatura de crescimento, podemos diferenciar três grupos distintos de MO, de acordo com Camargo (2019): • Microrganismos psicrófilos (crescem em baixas temperaturas): apresentam a temperatura de multiplicação entre 0°C e 20°C, com ótimo entre 10°C e 15°C. São encontrados nas profundezas de oceanos e de regiões polares (algas clorofíceas e diatomáceas). • Microrganismos mesófilos: apresentam temperatura ótima de crescimento entre 25 - 45°C. A maioria das bactérias cresce nessa condição. • Microrganismos termófilos: possuem temperatura ótima de crescimento entre 45 - 80°C. Encontrados em fontes termais, camadas superiores de solos que sofrem intensa radiação solar, esterco e silo em fermentação. • Microrganismos hipertermófilos: capazes de sobreviver em temperaturas muito elevadas, superiores a 80°C. São encontrados em fontes termais, como as do Parque Yellowstone. Principalmente, membros de Archaea. 70 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA GRÁFICO 2 – CRESCIMENTO MICROBIANO EM DIFERENTES FAIXAS DE TEMPERATURA FONTE: Adaptado de Madigan et al. (2010) Legenda: a temperatura ótima para cada tipo de MO é apresentada no gráfico. Silo é o termo utilizado para definir o local construído onde são armazenados os produtos agrícolas (ex.: soja, arroz). NOTA • pH (potencial hidrogeniônico): com base na tolerância ao pH, os MO podem ser classificados em neutrófilos acidófilos e alcalífilos. Geralmente, o pH ótimo é estabelecido para cada espécie, porém, a maioria das espécies bacterianas não cresce nos meios com pH acima ou inferior ao pH ótimo (VIEIRA; FERNANDES, 2012). TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 71 FIGURA 35 – FAIXAS DE PH ÓTIMO E EXEMPLOS DE MO FONTE: Adaptada de Madigan et al. (2010) • Disponibilidade de O2: de acordo com a respiração, as bactérias podem ser classificadas em aeróbias estritas ou obrigatórias (necessitam de O2 para crescer), anaeróbias estritas ou obrigatórias (só crescem na ausência de O2), microaerofílicas ou microarófilas (precisam de O2, mas em pressão inferior à atmosférica) e anaeróbias facultativas ou aerotolerantes (crescem na presença ou ausência de O2. 72 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA FIG U R A 3 6 – E FE IT O D O O 2 SO B R E O C R E SC IM E N T O B A C T E R IA N O FO N T E : A d ap tad a d e M ad ig an e t al. (2 0 10 ) TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 73 FI G U R A 3 7 – R E LA Ç Õ E S D O S M O C O M O O 2 FO N T E : < h tt p :/ /b io lo g ia .if sc .u sp .b r/ b io 4 /a u la /a u la 0 6 .p d f> . A c e ss o e m : 6 m ai o 2 0 2 0 . Le ge nd a: a s le tr as e nt re p ar ên te se s in di ca m o s ta tu s fil og en ét ic o (B . B ac té ria ; A . A rc he a) . S ão c on he ci do s re pr es en ta nt es d e ca da d om ín io d os pr oc ar io to s e m to da s a s c at eg or ia s. A m ai oria d os e uc ar io to s é a er ób ia o br ig at ór ia . S ão li st ad os h ab ita ts tí pi co s d e ca da e xe m pl o de o rg an is m o, em bo ra o ut ro s po de ri am s er li st ad os . 74 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA • Pressão osmótica: os MO apresentam necessidades específicas de NaCl (cloreto de sódio) ao crescimento ótimo. As bactérias, muitas vezes, apresentam a capacidade de viver em meios hipotônicos (meios em que a concentração de solutos é menor do que a própria concentração de solutos). Quando as bactérias são transferidas para meios de concentração de soluto mais elevada do que a do soluto interno, estas sofrem o fenômeno conhecido por plasmólise (perda de água). Certas bactérias conseguem tolerar concentrações de sal da ordem dos 10% e são chamadas de halófilas facultativas, e crescem em meios com concentrações de sal de 15 a 20% e se chamam halófilas extremas (MICROBIOLOGY, 2020). Desse modo, quanto a essa característica (pressão osmótica), esses MO podem ser classificados em: não halófitos; halotolerantes, halófitos ou halófitos extremos. Os microrganismos retiram, da água, a maioria dos nutrientes solúveis (conteúdo celular 80 – 90% de água). A água presente no interior da célula pode ser removida por elevações na pressão osmótica. Lembrando que a correta pressão osmótica presente no meio de cultura é fundamental para a sobrevivência celular. GRÁFICO 3 – CLASSIFICAÇÃO DOS MO QUANTO À PRESSÃO OSMÓTICA FONTE: Adaptado de Madigan et al. (2010) Legenda: O gráfico ilustra o efeito da concentração do íon sódio no crescimento de microrganismos com diferentes tolerâncias ou necessidades de sal. TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 75 Afinal, o que é pressão osmótica? Trata-se da pressão originada pela diferença das concentrações de soluto dentro e fora de uma célula, assim, a água passa para a solução mais concentrada no interior da célula, levando moléculas pequenas de nutrientes. Esse influxo de água garante que a célula se mantenha túrgida (inchada), ao passo que a ausência de água cause a perda da turgidez e a célula fica desidratada (ATKINS; JONES, 2012). FIGURA 38 – PRESSÃO OSMÓTICA E CÉLULA BACTERIANA FONTE: <https://slideplayer.com/slide/7469943/>. Acesso em: 9 maio 2020. Legenda: Plasma membrane: membrana plasmática; cell wall: parede celular; cytoplasm: citoplasma. Figura à esquerda: denota uma célula normal em solução isotônica. Sob essas condições, a concentração de soluto na célula é equivalente à concentração de soluto de 0,85% de NaCl. Já na figura da direita, ocorreu o fenômeno chamado de plasmólise celular. No caso, a concentração de NaCl é maior no meio circundante quando comparada ao interior celular. Consequentemente, a água tende a deixar a célula e o crescimento celular é inibido. • Fatores nutricionais: os MO podem ser agrupados em classes fisiológicas, conforme a maneira com que obtém fontes de energia e carbono para a realização dos processos vitais (VIEIRA; FERNANDES, 2012). Estes podem ser classificados em (MACHADO, 2020): ◦ Autotróficos: empregam composto inorgânico como fonte de carbono. Ex.: CO2. ◦ Heterotróficos: utilizam composto orgânico como fonte de carbono. Ex.: carboidratos. ◦ Fototróficos: utilizam luz como fonte de energia. ◦ Quimiotróficos: utilizam compostos químicos (orgânicos ou inorgânicos) como fonte de energia. 76 UNIDADE 1 —NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA FIGURA 39 – DIVERSIDADE METABÓLICA ENTRE OS MO FONTE: <https://www.ufjf.br/microbiologia/files/2013/10/Fisiologia-e-crescimento-bacteriano- BIO-e-BAC.pdf>. Acesso em: 9 maio 2020. Acadêmico, neste tópico, estudamos as formas de reprodução bacteriana, as fases do crescimento microbiano, além dos diversos fatores que interferem no crescimento. Inúmeros conceitos estão implicados nesses estudos. Portanto, sempre que apresentar dúvidas, acesse os canais de comunicação já conhecidos: protocolo, Ferramenta Mensagem e WhatsApp da UNIASSELVI. ATENCAO TÓPICO 3 —REPRODUÇÃO E FATORES DE CRESCIMENTO MICROBIANO 77 A descoberta nas fontes termais de Yellowstone, nos EUA, que se tornou chave para os testes da covid-19 "Definitivamente vivo" Thomas Brock anotou essas palavras há mais de 50 anos, em um dos cadernos que levava nas investigações de campo em Yellowstone, nos Estados Unidos. Era a década de 1960 e o cientista americano se referia a um dos organismos incomuns que acabara de encontrar em uma das fontes termais do parque. Foi em um desses mananciais que Brock descobriu uma bactéria adaptada à vida em altas temperaturas, que ele chamou de Thermus aquaticus. A bactéria, hoje conhecida pelos especialistas, acabaria revolucionando a biotecnologia e tornando possíveis os testes PCR, as provas mais confiáveis usadas em todo o mundo para diagnosticar a covid-19, causada pelo novo coronavírus. O trabalho pioneiro de Brock acabou vinculado à pandemia do novo coronavírus, por meio de uma sequência de episódios na história da ciência. Brock, hoje, com 90 anos, sente-se orgulhoso ao pensar que a descoberta está ajudando a diagnosticar casos de covid-19 e auxiliando no combate ao novo coronavírus. "Eu sempre vi a minha descoberta como um bom modelo para estudar a biologia molecular da vida em altas temperaturas", contou Brock, que é professor emérito de Microbiologia na Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos. Apesar de sempre considerar que o modelo tivesse importância para a ciência, o estudioso confessa que nunca pensou que a descoberta fosse, um dia, ter um impacto tão importante. "Não imaginava isso nem em um milhão de anos", revela por telefone à BBC News Mundo (o serviço em espanhol da BBC), da sua casa em Wisconsin, nos EUA Leia mais em MARTINS, A. A descoberta nas fontes termais de Yellowstone, nos EUA, que se tornou chave para os testes da covid-19. 2020. Disponível em: https://www. bbc.com/portuguese/brasil-52539425. Acesso em: 6 maio 2020. DICAS Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. CHAMADA 78 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • Em geral, a reprodução das bactérias ocorre por fissão binária, também chamada de cissiparidade. Ocorre a replicação do cromossomo e uma célula individual (célula-mãe) se divide em duas. A reprodução bacteriana também pode ocorrer via esporulação ou brotamento. • As bactérias se reproduzem por progressão geométrica e, em laboratório, o crescimento bacteriano segue quatro fases de desenvolvimento bem definidas: fase lag; fase log; fase estacionária; e fase de morte ou declínio. • Mesmo não ocorrendo reprodução sexuada em bactérias, podo haver troca de material genético entre estas, por meio dos processos de transformação, conjugação e transdução. • O mecanismo de conjugação é utilizado em aplicações biotecnológicas, dado o fato de muitas células bacterianas serem capazes de transferir genes às células eucarióticas (fungos, plantas, mamíferos), o que torna essa ferramenta um poderoso recurso da engenharia genética. • Existem diversos fatores que inferem no crescimento microbiano. Estudamos os principais: temperatura, pH, pressão osmótica (fatores/variáveis físicos), nutrição e disponibilidade de O2 (oxigênio), que compõem os principais fatores químicos. • De acordo com a temperatura de crescimento, os MO podem ser classificados em: psicrófilos, mesófilos, termófilos ou hipertermófilos. • Já conforme a tolerância ao pH, podem ser agrupados em neutrófilos, acidófilos ou alcalinos. • Em virtude da dependência (maior/menor/ausência) de O2, as bactérias podem ser classificadas em: aeróbias estritas ou obrigatórias, anaeróbias estritas ou obrigatórias, microaerofílicasou microarófilas, e anaeróbias facultativas ou aerotolerantes. • Quanto à característica de pressão osmótica, os MO podem ser classificados em não halófitos, halotolerantes, halófitos ou halófitos extremos. • Finalmente, verificamos que, conforme a forma com que os MO obtêm as fontes de energia e carbono para realização dos processos vitais, estes podem ser agrupados nas seguintes categorias: autotróficos, heterotróficos, fototróficos ou quimiotróficos. 79 1 Acerca da reprodução das bactérias, leia atentamente a charge a seguir: AUTOATIVIDADE FONTE: <https://brainly.com.br/tarefa/26117382>. Acesso em: 6 maio 2020. A charge em questão corresponde ao mecanismo de: a) ( ) Fissão binária ou cissiparidade. b) ( ) Reprodução sexuada. c) ( ) Esporulação. d) ( ) Brotamento. 2 Ao conduzir os experimentos em laboratório, um pesquisador, ao evidenciar o crescimento bacteriano, confeccionou o seguinte gráfico: 80 As fases, retratadas pelos números 1, 2, 3 e 4 correspondem, respectivamente: a) ( ) Fase estacionária, fase log, fase intercelular e fase de repouso. b) ( ) Fase lag, fase log, fase estacionária e fase de morte celular. c) ( ) Fase log, fase lag, fase estacionária e fase de morte celular. d) ( ) Fase estacionária, fase lag, fase de declínio e fase de morte celular. 3 A bactéria Thermus aquaticus é uma espécie capaz de suportar temperaturas elevadas, tendo com temperatura ótima para o crescimento o valor em torno de 72 °C, sendo assim, ela é uma de várias bactérias ________________. Essa bactéria é a fonte da enzima chamada de TAQ polimerase, uma enzima que resiste a altas temperaturas sem perder sua forma e uma das mais importantes enzimas na biologia molecular, devido à utilização na reação em cadeia da polimerase (PCR), técnica de amplificação de DNA (MARTINS, 2020). FONTE: MARTINS, A. A descoberta nas fontes termais de Yellowstone, nos EUA, que se tornou chave para os testes da covid-19. 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/por- tuguese/brasil-52539425. Acesso em: 6 maio 2020. Assinale a alternativa que preenche corretamente a lacuna: a) ( ) Mesófilas. b) ( ) Acidófilas. c) ( ) Termófilas. d) ( ) Psicrófilas. FONTE: <https://www.qconcursos.com/questoes-de-concursos/questoes/9da3cc0e-a0>. Acesso em: 6 maio 2020. 81 REFERÊNCIAS ARAUJO, F. F. Inoculação de sementes com Bacillus subtilis, formulado com farinha de ostras e desenvolvimento de milho, soja e algodão. Ciênc. Agrotec., v. 32, n. 2, p. 456-462, 2008. ARAÚJO, A. P. U.; BOSSOLAN, N. R. G. 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Acesso em: 29 maio 2020. 86 87 UNIDADE 2 — MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • estudar os principais tipos de meios de cultura existentes ao estudo da microbiologia; • conhecer os equipamentos essenciais à garantia da biossegurança e à confiabilidade das análises microbiológicas; • identificar os métodos de semeadura e de quantificação de microrganismos rotineiramente utilizados em laboratório; • aplicar os conhecimentos adquiridos no Tópico 1, no preparo de um meio de cultura caseiro, de forma a evidenciar o estudo dos MO na prática; • verificar a importância do saneamento básico no controle da disseminação de doenças de transmissão hídrica; • conhecer as principais doenças de veiculação hídrica transmitidas por vírus, bactérias, fungos, protozoários e helmintos; • evidenciar as causas das florações de espécies de cianobactérias e consequências; • analisar as metodologias de análise microbiológica da água aplicadas ao estudo de coliformes totais, termotolerantes e E. coli; análise da densidade de cianobactérias, presença/ausência e quantificação de Giardia e Cryptosporidium em amostras de água; • abordar aspectos da microbiologia do ar e da microbiologia do solo no estudo de bioindicadores da qualidade ambiental. Esta unidade será dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – MEIOS DE CULTURA MICROBIA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO TÓPICO 2 – MICROBIOLOGIA DA ÁGUA TÓPICO 3 – MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 88 Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 89 UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO TÓPICO 1 — MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO Na Unidade 1, estudamos conteúdos fundamentais à compreensão da microbiologia ambiental, a exemplo da definição de célula, da importância dos MO para a espécie humana, da morfologia microbiana e das tipologias, além dos principais fatores que interferem no crescimento microbiano. Sempre que necessário, revisite o texto da Unidade 1 de forma a relembrar esses assuntos. Neste tópico, estudaremos as tipologias de meios de cultivo existentes e as aplicações, além dos principais equipamentos necessários às análises rotineiras de um laboratório de microbiologia. Finalmente, veremos duas ferramentas/ métodos de contagem microbiana e de que maneira são utilizadas. Seguimos em frente. Bons estudos! 2 MEIOS DE CULTURA MICROBIANA Os microrganismos, como os demais seres vivos, apresentam a necessidade de nutrientes adequados, além de características ambientais (físico-químicas) favoráveis. No laboratório, essas condições são providas pelo meio de cultura (meio de cultivo) e por meio das condições de incubação. O meio de cultivo apresenta nutrientes, salinidade e pH adequados para cada MO específico, em concentrações propícias ao crescimento, possibilitado condições ideais de aeração, umidade e temperatura de incubação em período de tempo necessário (CEBALHOS; DINIZ, 2017). De modo a quantificar determinado MO de uma amostra, é preciso selecionar este para a obtenção de uma cultura pura. Contudo, nas matrizes ambientais (ex.: rio ou lagoa), os MO compõem agregados de comunidades mistas ou biofilmes. Aos procedimentos de seleção e de obtenção de uma cultura pura a partir de uma cultura mista, dá-se o nome de isolamento. Esse processoé possível através da semeadura da amostra em meios de cultura específicos (CEBALHOS; DINIZ, 2017). UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 90 De acordo com Cebalhos e Diniz (2017) e Vieira e Fernandes (2012), os meios de cultura podem ser classificados em: • Meios líquidos: neles, os nutrientes se encontram dissolvidos em solução aquosa. Nesse meio, o crescimento bacteriano modifica o aspecto, e o meio sofre turvação, mudança da cor e produção de gás, por exemplo. Particularmente, as bactérias crescem dispersas no volume do meio, na superfície, e, nas proximidades desta, aeróbios, mais próximo do fundo, caso o metabolismo seja anaeróbio. Caso sejam facultativas, crescem em todo o meio. • Meios semissólidos: além da composição (nutrientes), estes contam com uma pequena porcentagem de ágar, polissacarídeo oriundo de algas marinhas. Comumente empregados em tubos de ensaio e, por meio desse tipo de cultura, é possível observar a motilidade bacteriana. Também são utilizados para conservação de culturas bacterianas puras para utilização posterior. • Meios sólidos: contam com uma porcentagem de ágar entre 1,5 e 2%. Esses meios possibilitam que as bactérias inoculadas fiquem aprisionadas no ágar e formem colônias visíveis a olho nu. Tomemos, como exemplo, que uma única célula de E. coli se multiplica a cada 30 minutos em condições ótimas de crescimento, ou seja, em 24 horas, uma colônia apresentaria 248 bactérias (283 trilhões de bactérias). O ágar (ágar-águar), componente dos meios de cultura sólidos, é obtido de algas vermelhas da classe Rodophyta, comumente chamadas de “algas agarófilas ou agarófitas”. Esse composto apresenta a propriedade de se manter em estado líquido acima de 45°C, e, sólido, a temperaturas inferiores. A denominação ágar-ágar advém do idioma malaio e significa gelatina, repetida duas vezes pela tradição nas culturas da Polinésia para dar ênfase à palavra, que significa “pura gelatina”, com tradução, “gelatina-gelatina” ou “pura gelatina” (CEBALHOS; DINIZ, 2017). NOTA TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 91 FIGURA 1 – TIPOS DE MEIOS DE CULTURA QUANTO AO ESTADO FÍSICO FONTE: <https://slideplayer.com/slide/5871849/>. Acesso em: 24 out. 2020. Conforme a composição química, os meios de cultura podem ser classificados em: • Meios de cultura naturais: essa denominação é empregada aos meios de cultura de origens vegetal (frutas, rodelas de batata), animal (ovos) ou de industrialização simples (pão). A utilização remonta aos primórdios das técnicas de microbiologia. Fungos e bolores, por exemplo, foram observados em frutas e no pão. Esses meios possibilitam o crescimento de MO decompositores heterótrofos de diferentes grupos (ex.: bolores, leveduras, bactérias). Apresentam, como desvantagem, a inespecificidade, aspecto que facilita a contaminação das culturas (CEBALHOS; DINIZ, 2017). • Meios de cultura artificiais: apresentam compostos químicos definidos ou não, e, em geral, são chamados de meios complexos (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Outra classificação importante ao estudo desta disciplina se trata da diferenciação dos meios de cultura, segundo a fórmula química (função): • Meios não seletivos: conhecidos por meios de cultura simples, permitem o crescimento de numerosas bactérias, que apresentam a capacidade de se desenvolver com esses nutrientes e em condições de temperatura e pH determinadas (CEBALHOS; DINIZ, 2017). • Meios seletivos: substâncias que incluem ou excluem algum ingrediente que favorece o crescimento de um MO determinado. Inibem o crescimento de alguns MO, mas permitem o crescimento de outros. São todos os meios empregados na confirmação bioquímica das bactérias (CEBALHOS; DINIZ, 2017; NUTRIÇÃO MEIOS DE CULTURA, 2017). • Meios de enriquecimento: apresentam compostos específicos para um determinado MO ou grupo de MO, o qual favorece o desenvolvimento seletivo sobre o restante da biota microbiana. Esses meios permitem o crescimento de microrganismos exigentes, de crescimento lento, mas não inibem o crescimento de outros. Têm a propriedade de estimular o crescimento de determinados microrganismos (CEBALHOS; DINIZ, 2017; CLASSIFICAÇÃO DE MEIOS DE CULTIVO, 2020). UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 92 Cabe destacar que a maioria dos meios de cultura seletivos facilita o procedimento de identificação de bactérias ou grupo de bactérias que se desenvolvem e ocasionam modificação na cor, em decorrência da alteração do pH e, ocasionalmente, pela produção de gás, em consequência do metabolismo das bactérias. Também são indicadores específicos de um meio de cultura a precipitação de componentes do meio e as atividades proteolítica (do grego, proteo = proteína, lise = quebra, separação) e lipolítica (“quebra”/degradação do lipídeo), a exemplo da digestão do ágar (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Para que seja efetuada uma análise microbiológica (ex.: de uma amostra de água), os meios de cultura são adquiridos prontos e desidratados, cujo preparo deve ser realizado conforme as instruções dos fabricantes. Em sua maioria, contam com uma composição química definida, a saber: extrato de carne, leveduras, peptonas, sais e um indicador de pH, que sofre modificação de cor para condições ácidas alcalinas. Outros apresentam substâncias tamponadas, que evitam mudanças bruscas de pH (CEBALHOS; DINIZ, 2017). As peptonas são compostos derivados da hidrólise de proteínas de origem animal ou vegetal, que servem como fonte de nitrogênio orgânico para o cultivo de uma variedade de bactérias e de fungos (PROBAC, 2020). NOTA No caso dos meios de cultura líquidos, estes são distribuídos em tubos de ensaio e cobertos com tampa de metal ou acrílico. Não é indicado que os tubos sejam cobertos com tampões de algodão. De modo a detectar a produção de gás, é colocado, no interior do tubo, um pequeno tubo de ensaio invertido, chamado de Tubo de Durham. Este é esterilizado em conjunto para, depois, ser utilizado nas futuras análises microbiológicas. É importante salientar que, nos meios líquidos, é a turbidez do líquido que denota o crescimento microbiano. São comumente empregados em técnicas de quantificação de bactérias, especialmente, para coliformes (Técnica de Tubos Múltiplos), na rotina dos laboratórios das estações de tratamento de água, por exemplo (CEBALHOS; DINIZ, 2017). TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 93 FIGURA 2 – TUBOS DE ENSAIO CONTENDO MEIOS DE CULTURA LÍQUIDOS: CALDO LACTO- SADO (AMARELO) E VERDE BRILHANTE BÍLIS 2% (VERDE) DESTINADOS À QUANTIFICAÇÃO DE COLIFORMES TOTAIS EM AMOSTRAS DE ÁGUA FONTE: <https://www.hexis.com.br/produto/caldo-lauril-sulfato-triptose-nmp-concentrado-pct-15un>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: Observe os pequenos tubos de ensaio (Tubo de Durham) no interior dos tubos de ensaio com tampa. Esses pequenos tubos coletam o gás produzido na fermentação da lactose nos dois meios de cultura (formação de bolha no tubo de Durham). Curiosidade: a bílis 2%, incluída no meio Verde Brilhante Bílis, seleciona as bactérias intestinais que são adaptadas à bílis secretada pela vesícula biliar (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Já os meios de cultivo com ágar são preparados e esterilizados em balões de vidro para, posteriormente, serem distribuídos em placas de Petri estéreis, com solidificação em temperatura-ambiente. Em seguida, são estocados na geladeira (dentro de caixas plásticas bem vedadas, de forma a evitar o ressecamento) (CEBALHOS; DINIZ, 2017). 3 EQUIPAMENTOS ESSENCIAIS À ROTINA DE UM LABORATÓRIO DE MICROBIOLOGIA A semeadura no meio de cultura sólido (ou líquido), assim como todo o trabalho no laboratório de microbiologia, deve ser realizada sob condições de assepsia perto do Bico de Bunsen ou na câmara de fluxo laminar (CEBALHOS; DINIZ, 2017). UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 94 FIGURA 3 – CÂMARA DE FLUXO LAMINAR E BICO DE BUNSEN FONTE: <https://www.tradeindia.com/fp3163844/Laminar-Airflow-Chamber.html>;<https:// www.medical-supply.ie/2019/04/03/is-it-safe-to-use-a-bunsen-burner-in-a-biological-safety- cabinet-bsc/>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: A figura da esquerda denota uma câmara de fluxo laminar. A figura da direita demonstra a utilização do Bico de Bunsen em um procedimento microbiológico. Acadêmico, você já deve ter notado que existem equipamentos comumente utilizados na rotina dos trabalhos em um laboratório de microbiologia ambiental ou de outras áreas de estudo da microbiologia. Entretanto, certos equipamentos são primordiais para o bom andamento e para a garantia de qualidade das análises a serem realizadas: câmara de fluxo, Bico de Bunsen, autoclave, estufa microbiológica e incubadora de banho de água (banho-maria). Qual a importância destes para as análises microbiológicas? Também conhecida como cabine de segurança biológica, a câmara de fluxo laminar se trata do principal equipamento de contenção física para agentes infecciosos. Protege o material e o profissional na manipulação de materiais biológicos altamente infectantes, substâncias tóxicas e cultura de células (ANVISA, 2013). O Bico de Bunsen é um equipamento aquecedor a gás com chama, cuja temperatura pode variar, conforme a regulagem. É suprido com gás liquefeito de petróleo (GLP) e proporciona uma chama que possibilita a realização da manipulação das análises microbianas. Por questões de segurança e de bom andamento das análises microbiológicas, deve-se verificar, com frequência, se não há vazamentos de gás nas conexões (RESENDE, 2014). TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 95 FIGURA 4 – PRINCÍPIOS DE FUNCIONAMENTO DO BICO DE BUNSEN FONTE: <https://www.splabor.com.br/blog/uso-correto-do-bico-de-bunsen/como-utilizar- corretamente-um-bico-de-bunsen//>. Acesso em: 24 out. 2020. Robert Wilhelm Eberhard von Bunsen (1811-1899) foi um químico alemão que, dentre outros feitos, inventou o Bico de Bunsen (queimador de gás com elevado poder calorífico), utilizado até os dias de hoje rotineiramente em laboratórios (microbiologia, química etc.) (QUI FÁCIL, 2020). NOTA FIGURA 5 – ROBERT WILHELM EBERHARD VON BUNSEN FONTE: <https://www.quifacil.com.br/robert-wilhelm-eberhard-von-bunsen>. Acesso em: 24 out. 2020. UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 96 A autoclave é um utensílio laboratorial indispensável à rotina de um laboratório de microbiologia. Trata-se de um equipamento cujo objetivo é a esterilização pelo calor úmido (vapor d’água sob pressão). Geralmente, é empregado para esterilizar águas de diluições, meios de cultura que suportem elevadas temperaturas (115-120°C), além de materiais contaminados que são descartados. Esse utensílio pode ser do tipo horizontal ou vertical, apresentando os seguintes componentes: caldeira cilíndrica hermeticamente fechada por uma tampa de bronze ou cobre, dotada de manômetro, válvula de escape de ar e de segurança. No interior, existe uma cesta metálica (móvel), na qual são colocados todos os materiais a serem esterilizados (RESENDE, 2014). FIGURA 6 – ESQUEMA GERAL DE UMA AUTOCLAVE VERTICAL FONTE: <https://www.researchgate.net/figure/figura-56-diagrama-e-asPeto-geral-de-uma- autoClave-vertiCal_fig2_259296839>; <https://www.marcamedica.com.br/autoclave-vertical- 30l-prismatec>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: A – Esquema geral de uma autoclave. B – Imagem de uma autoclave vertical. Você pode se perguntar: o que é esterilização? Bem, a esterilização é o processo pelo qual os microrganismos são mortos a tal ponto que não seja mais possível detectá-los no meio de cultura padrão, no qual, previamente, tinham proliferado. Usualmente, considera-se um artigo (recipiente com meio de cultivo, por exemplo) estéril quando a probabilidade de sobrevivência dos microrganismos é menor do que 1:1.000.000 (BRUCH; BRUCH apud BUSTAMANTE, 2020). TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 97 Portanto, é essencial, em um laboratório de microbiologia, demonstrar o controle e a eficiência da esterilização. Para tal procedimento, são efetuados monitoramentos mecânicos (controle e registro do tempo, temperatura e pressão durante a esterilização), e utilizados indicadores físicos ou biológicos. Como indicador físico, é muito utilizada a fita indicadora de esterilização (RESENDE, 2014). FIGURA 7 – FITA INDICADORA DE ESTERILIZAÇÃO FONTE: <https://www.marcamedica.com.br/autoclave-vertical-30l-prismatec>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: A – Fita indicadora de esterilização. B – Fita indicadora de esterilização antes e após o procedimento de autoclavagem. A tinta indicativa apresenta um substrato que reage a uma determinada temperatura, mudando a tonalidade. A única função é diferenciar um produto que passou pelo processo ou não de esterilização via autoclave. Contudo, não podemos confundir o processo de esterilização com o procedimento de desinfecção. O segundo é definido como o processo que elimina todos os microrganismos ou objetos inanimados patológicos, com exceção dos endósporos bacterianos, ao contrário da esterilização, que apresenta a capacidade para a eliminação das estruturas (KALIL; COSTA, 1994). A estufa microbiológica é um tipo específico de estufa que apresenta, além de uma porta metálica, uma porta de vidro. Conta com um sistema de aquecimento controlado por uma resistência elétrica. O aquecimento é controlado por meio de um termostato, com o acompanhamento da temperatura através de um termômetro analógico ou digital. Destaca-se que a temperatura não deve sofrer uma variação superior a ±0,5°C. Esse dispositivo é empregado para auxiliar no crescimento e na reprodução microbianos, pois fornece a temperatura adequada para cada espécie microbiana (RESENDE, 2014). UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 98 FIGURA 8 – ESTUFA MICROBIOLÓGICA FONTE: <https://www.marcamedica.com.br/autoclave-vertical-30l-prismatec>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: Através do link https://www.youtube.com/watch?v=d_AxNiRIuBg, pode-se evidenciar o funcionamento de uma estufa com alguns recipientes para o cultivo de microrganismos. Outro equipamento importante é chamado de incubadora de banho de água (banho-maria). É um dispositivo indispensável para realizações dos ensaios de coliformes termotolerantes (44,5°C ± 0,2°C). Este é dotado de um termômetro, termostato e tampa para o controle da temperatura do banho (RESENDE, 2014). FIGURA 9 – DIFERENTES TIPOS DE INCUBADORA DE BANHO DE ÁGUA (BANHO-MARIA) FONTE: <https://www.medicalexpo.com/prod/nueve/product-69565-608361.html>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: Através do link https://www.youtube.com/watch?v=76vNvN2bi-c, pode- se visualizar o funcionamento de uma incubadora de banho de água, com alguns recipientes para o cultivo de microrganismos. TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 99 Acadêmico, realmente, o trabalho em um laboratório de microbiologia é meticuloso, pois exige uma série de equipamentos e de cuidados fundamentais às avaliações microbiológicas. Agora, partiremos para o estudo de técnicas de semeadura e dos métodos de quantificação de populações microbianas. Vamos lá?! 4 TÉCNICAS DE SEMEADURA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO DE POPULAÇÕES MICROBIANAS É importante frisar que a escolha da técnica para o cultivo de microrganismos em condições laboratoriais pode variar conforme o tipo de meio de cultura e a finalidade do cultivo. Entretanto, algumas regras básicas devem ser seguidas nas inoculações (VIEIRA; FERNANDES, 2012): • A agulha e a alça bacteriológica devem ser esterilizadas por flambagem antes e após qualquer cultivo. Deve-se tomar cuidado para esfriá-las antes da coleta. • Os recipientes devem sempre ser abertos próximos à chama do Bico de Bunsen. • Deve-se evitar, ao máximo, que as tampas dos tubos e as placas fiquem abertas sobre a bancada durante o cultivo. FIGURA 10 – TIPO DE TÉCNICA DE SEMEADURA BACTERIANA - CUIDADOS DE ASSEPSIAFONTE: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4547451/mod_resource/ content/1/Pr%C3%A1ticas%201%2C%202%20e%203%20-%20Isolamento%2C%20 purifica%C3%A7%C3%A3o%20e%20Gram.pdf>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: Preparo de estoque de microrganismos em tubo inclinado a partir de colônias isoladas por estrias de esgotamento. a) Esterilização da alça por flambagem; b) Coleta de colônia isolada; c) Inóculo por estrias no tubo inclinado. A semeadura pode ser efetuada por meio de estrias até o esgotamento, de forma a serem obtidas colônias isoladas, com o emprego de alças, que podem ser de platina ou de níquel-cromo. Também existem as alças bacteriológicas descartáveis, confeccionadas com material plástico (polipropileno). É possível UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 100 efetuar, também, a inoculação em meio sólido por espalhamento na superfície, que consiste em colocar uma alíquota (parte) da amostra na superfície do meio sólido, preservando-se a esterilidade com a distribuição através da alça bacteriológica ou da alça de Drigalsky (de vidro ou de plástico) (CEBALHOS; DINIZ, 2017). FIGURA 11 – ALÇA BACTERIOLÓGICA E ALÇA DE DRIGALSKY FONTE: <https://www.biosave.com.br/includes/pdf/copan_portuguese.pdf>; <https:// en.wikipedia.org/wiki/Cell_spreader>. Acesso em: 24 out. 2020. Legenda: A – Alça de níquel-cromo e alça de plástico descartável. B –Tipos de alças de Drigalsky. Poderemos evidenciar, a seguir, diferentes tipos de semeadura em tubos de ensaio e em placas de Petri. TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 101 FIGURA 12 – TIPOS DE SEMEADURA EM TUBOS E EM PLACAS FONTE: <https://slideplayer.com.br/slide/3769438/>. Acesso em: 29 out. 2020. Note que, dependendo do objetivo da avaliação microbiológica, podem ser empregadas diferentes técnicas de semeadura, pois estas apresentam objetivos distintos. A técnica de semeadura em meio líquido é destinada à observação da respiração das bactérias. Ao se realizar a semeadura em meio semissólido, objetiva- se observar a motilidade bacteriana. No que tange à metodologia de semeadura em meio sólido inclinado, tem, por finalidade, a obtenção de uma concentração de massa bacteriana. Podemos observar, também, a técnica de semeadura por esgotamento em meio sólido (placa de Petri), que se destina a obter (isolar) cultura puras a partir de amostras que apresentem microbiota mista, sendo isso útil para o estudo da morfologia de colônia microbiológica (VIEIRA; FERNANDES, 2012). Existe a técnica de semeadura denominada de pour-plate, também chamada de semeadura em profundidade, cujo objetivo da técnica é obter colônias isoladas (qualitativo) ou realizar contagem de colônias em placas (quantitativo). Nessa técnica, deve-se tomar cuidado para não adicionar o meio em temperatura elevada sobre o inóculo, pois isso pode matar as bactérias (VIEIRA; FERNANDES, 2012). Ok, já estudamos as diferentes formas de semeadura utilizadas em microbiologia, entretanto, de que modo é realizada a quantificação microbiológica? No caso das bactérias, existem dois métodos básicos para a enumeração de números viáveis de bactérias, a saber: a contagem de colônias em meios sólidos (ou “Unidades Formadoras de Colônia”, UFC, do inglês, Colony Forming Units, CFU) e a técnica do número mais provável, ou técnica NMP (do inglês, Most Probable Number, MPN) (NICOLAU, 2014). UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 102 4.1 CONTAGEM EM PLACAS Na contagem das UFC, é necessário que as amostras sejam diluídas para que seja possível quantificar/enumerar o número de bactérias por meio da técnica de diluição em série. Nessa técnica, 1 ml (mililitro) é diluído pela adição de 9 ml de uma solução esterilizada (água, tampão-fosfato, solução salina etc.), o que gera uma diluição de 1:10 (v/v) ou 10-1 da amostra original (a amostra original é diluída para 1/10) (NICOLAU, 2014). De forma similar, são preparadas diluições em série 1:100 (10-2), 1:1000 (10- 3), 1:10.000 (10-4), 1:100.000 (10-5), e assim por diante. Finalmente, uma alíquota de 0,1 ml de cada diluição é retirada e plaqueada no meio sólido adequado. Os meios são incubados nas condições adequadas ao crescimento das bactérias em análise. O número de colônias que cresce em cada meio possibilita que seja calculada a concentração de bactérias presente na amostra original, multiplicando pelo fator de diluição (NICOLAU, 2014). FIGURA 13 – TÉCNICA DE DILUIÇÃO SERIADA E ESPALHAMENTO DE SUPERFÍCIE Descartar a pipeta Descartar a pipeta Descartar a pipeta Descartar a pipeta FONTE: Adaptada de Guerra (2016) TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 103 Posteriormente ao período de incubação, são escolhidas as placas de Petri com, aproximadamente, 30 a 300 UFC (ou entre 25 e 250 UFC). Em seguida, é efetuada a contagem do número de colônias com o auxílio de um contador de colônias (CEBALHOS; DINIZ, 2017; GUERRA, 2016). Para cada nível de diluição, existe uma quantidade de amostra presente no meio, por grama ou mililitro. Observemos o exposto a seguir: QUADRO 1 – QUANTIDADE DE AMOSTRA EM CADA NÍVEL DE DILUIÇÃO POR MILILITRO Nível da diluição Quantidade de amostra por mililitro (g ou mL) 10-1 0,1 10-2 0,01 10-3 0,001 10-4 0,0001 10-5 0,00001 FONTE: Guerra (2016, p. 4) Partiremos, então, para o cálculo das UFC, por meio de exemplos práticos. No caso da inoculação em superfície (spread plate), adota-se a seguinte metodologia para o cálculo das UFC. Utilizaremos o exemplo da figura anterior, demonstrado pela autora Guerra (2016): UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 104 Observação: No exemplo, a autora utiliza o cálculo demonstrando de que forma se expressa o resultado, quando da análise efetuada para a microbiologia de alimentos (UFC/g). Contudo, para a análise de amostras de água (por exemplo), a unidade a ser utilizada é UFC/mL (de amostra). Com relação à técnica de espalhamento em profundidade (pour plate), observe a figura a seguir, que demonstrará o procedimento de diluição. TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 105 FIGURA 14 – TÉCNICA DE DILUIÇÃO SERIADA E ESPALHAMENTO EM PROFUNDIDADE FONTE: Adaptada de Guerra (2016) Agora, conheceremos o cálculo das UFC/mL de amostra, conforme o exemplo elaborado por Guerra (2016): Descartar a pipeta Descartar a pipeta Descartar a pipeta Descartar a pipeta UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 106 4.2 TÉCNICA DE TUBOS MÚLTIPLOS (NMP) Trata-se de um método estatístico de contagem microbiana. A unidade de expressão do resultado é número mais provável de unidade formadora de colônia por grama ou mililitro (NMP/g ou mL). Existem tabelas específicas para a análise microbiológica de água, que expressam o resultado como NMP/100 mL (GUERRA, 2016). Para tal procedimento, diluições decimais da amostra são inoculadas em séries de tubos que apresentam meio líquido seletivo. Os tubos são positivos quando apresentam crescimento e/ou produção de gás de fermentação (VIEIRA; FERNANDES, 2012). TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 107 FIGURA 15 – TÉCNICA DE DILUIÇÃO DE TUBOS MÚLTIPLOS (NMP) FONTE: Adaptada de Oliveira et al. (2020) Legenda: Neste exemplo (pesquisa realizada para enumeração de coliformes termotolerantes em amostras de água pluvial), a técnica de tubos múltiplos foi utilizada, em um primeiro momento, referindo-se à etapa presuntiva do referido estudo. O número de tubos positivos e negativos de cada diluição é usado para determinar o número de microrganismos mais provável (NMP) presente na amostra da amostra original (não diluída), por meio da utilização de tabelas estatísticas de valores de NMP (APHA, 1998 apud NICOLAU, 2014). Cabe salientar que os estudos envolvendo o NMP são compostos por três etapas (VIEIRA; FERNANDES, 2012): • Teste presuntivo: possibilita estimar, preliminarmente, a densidadedo grupo bacteriano baseada no enriquecimento em meio minimamente restritivo. Os resultados do teste não podem ser usados sem confirmação posterior. • Teste confirmativo: trata-se da fase do NMP. Os tubos considerados positivos, no teste anterior, são inoculados em tubos de meio mais seletivo e inibidor. As reações positivas são lidas e a densidade calculada com a ajuda da tabela NMP. Esta etapa será demonstrada a seguir. • Teste completo: esta etapa é empregada somente na determinação do número de coliformes totais. Os tubos positivos do teste anterior são submetidos a testes adicionais para isolamento e identificação dos microrganismos. Devido à morosidade do teste, normalmente, não é utilizado. UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 108 FIGURA 16 – TÉCNICA DE DILUIÇÃO DE TUBOS MÚLTIPLOS (NMP) FONTE: Adaptada de Oliveira et al. (2020) Legenda: Etapa confirmativa da enumeração de coliformes termotolerantes das amostras de água pluvial. A ocorrência de crescimento e a ausência de crescimento são marcadas +/-, respetivamente, na base da detecção de crescimento, por exemplo, por turbidimetria, produção de gás e desaparecimento de substrato. O número de tubos positivos e negativos de cada diluição é empregado para determinar o número de microrganismos mais provável que se encontrava na amostra original (não diluída), através do uso de tabelas estatísticas de valores de NMP (APHA, 1998 apud NICOLAU, 2014). Estudaremos um outro exemplo, mais esmiuçado, acerca do cálculo do NMP. TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 109 FIGURA 17 – TÉCNICA DE TUBOS MÚLTIPLOS FONTE: Adaptada de Guerra (2016) Após o período de incubação, procede-se com a seguinte análise dos resultados obtidos (GUERRA, 2016): UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 110 Então, com base no exemplo apresentado, a contagem de tubos positivos (2-1-0) corresponde ao resultado de 15 NMP/g ou mL. Observaremos esse resultado na própria tabela do NMP. TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 111 TABELA 1 – TABELA DE NMP FONTE: Adaptada de FDA (2020) Legenda: MPN = NMP; Confidence range: intervalo de confiança. Observe que, a partir dos resultados obtidos, e por meio da observação da tabela, chegou-se ao resultado para o exemplo estudado = 15 NMP/g ou mL. Neste tópico, vimos as diferentes classificações dos meios de cultura, conforme o estado físico e a finalidade do estudo (investigação a ser realizada), além dos equipamentos básicos essenciais às análises microbiológicas. Vimos, também, duas metodologias de isolamento, quantificação e identificação de populações microbianas. No próximo tópico, estudaremos a aplicação desses conhecimentos ao estudo da microbiologia da água. Vamos lá?! Bons estudos! UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 112 Vamos preparar nosso próprio meio de cultura e utilizá-lo em uma atividade prática? Mãos à obra! ATIVIDADE PRÁTICA 1: Preparo de meio de cultura caseiro Material necessário: um copo de vidro, 100 mL de água filtrada, duas colheres de café de ágar-ágar (encontrado em lojas de produtos naturais), duas colheres de café de açúcar, uma colher bem rasa de amido de milho, vela, potinhos transparentes ou placas de petri, papel-alumínio, filme de PVC. Procedimento: a) Preparo do meio de cultura sólido: 1- Colocar 100 mL de água filtrada no copo e deixar em banho-maria por cerca de cinco minutos. 2- Juntar o ágar-ágar, o açúcar e o amido de milho. Utilizar uma colher para mexer e para ajudar a diluir o ágar-ágar. 3- Retirar do banho-maria após 10 minutos e tampar o copo com filme de PVC e papel- alumínio. b) Esterilização do material em panela de pressão (baseado em SILVA, 2009): 1- Em uma panela de pressão de tamanho médio, colocar, no fundo, bolas amassadas de papel-alumínio, procurando deixá-las niveladas (planas) e encher com água até mais ou menos a metade da altura do papel-alumínio. 2- Colocar os potes, as placas de Petri (tampas separadas), o meio de cultura no copo e o que mais precisar ser esterilizado, envoltos em papel-alumínio, tomando cuidado para não deixar derramar o meio de cultura durante o processo. É recomendável que os potes ou as placas de petri não sejam vedados e sejam apenas embalados, pois esses materiais podem se quebrar com a pressão dentro da panela. 3- Tampar bem a panela (deve estar bem vedada), tirar o pino da tampa, ligar o fogo e aguardar sair vapor. 4- Assim que começar a sair o vapor, colocar o pino na tampa (com cuidado para não se queimar); aguardar 15 minutos. 5- Após 15 minutos, desligar o fogo e aguardar cerca de três horas para abrir a panela de pressão (é preciso esperar esfriar). c) Distribuição do meio de cultura nos recipientes: 1- Retirar o meio da panela de pressão, colocar em banho-maria (o meio, assim que esfria, se solidifica) ainda tampado e aguardar cerca de 10 minutos, até que o meio fique líquido. 2- Acender uma vela e dispor os potes e as placas estéreis, ainda embalados, próximos à chama. 3- Tirar o meio do banho-maria e distribuir nas placas e nos potes estéreis, tomando cuidado para não contaminar o meio e os recipientes. 4- Tampar as placas e os potes, de modo que estes permitam uma visualização clara do meio de cultura. Guarde-os de cabeça para baixo, assim que o meio de cultura solidificar. DICAS TÓPICO 1 —MEIOS DE CULTURA MICROBIANA E MÉTODOS DE QUANTIFICAÇÃO 113 No primeiro recipiente, você ou um colega deverá encostar o dedo no meio de cultura sem lavar as mãos antes. No segundo, outro colega deverá encostar o dedo após lavar as mãos com sabonete líquido comum. No terceiro, um terceiro colega deverá encostar o dedo no meio após lavar as mãos com sabonete líquido, contendo ingrediente antibacteriano. No quarto e último potinho, um quarto colega, que utilizou sabonete líquido comum e passou álcool 70% em gel nas mãos, deverá encostar o dedo no meio de cultura. Os potinhos devem ser numerados e identificados, vedados com filme de PVC e deixados à temperatura-ambiente. FIGURA 1 – MATERIAL PARA PREPARAÇÃO DO MEIO DE CULTURA CASEIRO UTILIZADO PARA CRESCIMENTO DE MICRORGANISMOS NAS PRÁTICAS “MÃOS LIMPAS?” E “E ISSO FUNCIONA?” ATIVIDADE PRÁTICA 2: Crescimento de microrganismos em cultivo Nesta atividade, foram utilizadas, para o crescimento de microrganismos, placas de Petri e potinhos, contendo o mesmo meio de cultura da prática anterior, também previamente esterilizados. Foram necessários outros materiais, como cotonete, pedaços de papel-filtro e agentes de limpeza, como desinfetante, álcool e antisséptico bucal. O objetivo desta prática é o de analisar a eficiência de diferentes produtos utilizados para limpeza e assepsia. Nesta prática, você fará a inoculação do meio de cultura com cotonetes em esfregaços de diferentes superfícies. Em toda superfície do meio na placa de Petri, esfregar o cotonete com sujeira do chão. A placa deve ser em quatro partes (com caneta para vidro), devendo ser adicionados pedaços de papel-filtro embebidos em diferentes concentrações de desinfetante, diluído em água. Na primeira parte, deverá ser adicionado o desinfetante puro; na segunda, desinfetante na concentração 50%; na terceira parte, desinfetante na concentração de 33%; e, na quarta, desinfetante na concentração de 25%. Nos potinhos, devem ser adicionados papéis de filtro, contendo álcool 70% e antisséptico bucal, inoculados, respectivamente, com um cotonete esfregado embaixo das unhas e outro cotonete nos dentes. Para essas duas atividades práticas, é necessário deixar uma placa de petri e um potinho com meio de cultura esterilizado à temperatura-ambiente, como controle. O meio de cultura aqui descrito pode ser substituído por gelatina comum (CASSANTI et al., 2007; GENTILE, 2005), embora o ágar-ágar utilizado nesse meio seja um potente agente solidificante e não se liquefaz em temperatura-ambiente. Leia mais em: http://www.decb.uerj.br/arquivos/monografias/Andr%C3%A9a%20Fonseca%20Ferreira%20-%20PPII%20-%20A%20import%C3%A2ncia%20da%20microbiolo.pdf. 114 Neste tópico, você aprendeu que: • Conforme o estado físico, os meios de cultura podem ser classificados em sólidos, semissólidos e líquidos. A escolha por um ou mais tipos destes se processa em virtude do tipo de MO e do objetivo de avaliação microbiológica. • De acordo com a composição, os meios de cultura podem ser classificados em naturais (cuja utilização remonta aos primórdios da microbiologia) e artificiais (com composição química definida). Estes últimos são adquiridos comercialmente, por meio de empresas especializadas. • Outra classificação dos meios de cultura é a diferenciação destes segundo a fórmula química/função, sendo divididos em seletivos, não seletivos e de enriquecimento. • Equipamentos, autoclave, Bico de Bunsen, câmara de fluxo e estufa bacteriológica são fundamentais à rotina de um laboratório de microbiologia, pois proporcionam biossegurança necessária aos procedimentos laboratoriais. • Existem diferentes tipos de técnicas de semeadura microbiológica: semeadura em meio sólido; em meio semissólido; em meio sólido inclinado; e em meio sólido (placa de Petri). • Há duas metodologias rotineiramente empregadas na contagem de MO: “Unidades Formadoras De Colónia”, UFC, ou do inglês Colony Forming Units, (CFU) e Técnica do Número mais Provável, ou técnica NMP, do inglês Most Probable Number (MPN). RESUMO DO TÓPICO 1 115 1 (IFAP - Adaptado) Existem diversos meios de cultura que podem ser empregados para diversos tipos de análise microbiológica. Um desses meios de cultura é o ágar chocolate. Pesquise sobre este meio de cultura e assinale a alternativa correta. a) ( ) Apenas uma espécie de bactéria cresce nesse meio de cultura. b) ( ) É um meio de cultura que facilita o crescimento de vários tipos de microrganismos. c) ( ) Pode-se adicionar sangue de cavalo, de coelho, ou de boi à composição desse meio de cultura. d) ( ) Apesar de receber o nome chocolate, esse meio de cultura apresenta uma coloração verde. 2 Existem alguns métodos diferentes utilizados na contagem de microrganismos, e tais métodos ajudam na avaliação do crescimento microbiano. Acerca destes métodos de contagem, analise as alternativas a seguir e assinale a opção CORRETA: a) ( ) A contagem em placas é um método utilizado para determinar a quantidade de células vivas e mortas. b) ( ) A contagem de microrganismos por plaqueamento somente pode ser utilizada para amostras com elevada concentração microbiana. c) ( ) A técnica de determinação do número mais provável é realizada por meio da colocação de uma amostra em uma lâmina especial, com um poço com dimensão conhecida, a qual é levada ao microscópio para contagem celular. d) ( ) A técnica de determinação do NMP é uma técnica estatística útil na contagem de microrganismos que possuem uma determinada característica metabólica. 3 Ao realizar uma análise de amostra de água de uma lagoa para análise microbiológica (coliformes termotolerantes), a partir de três diluições realizadas, você encontrou o seguinte resultado: AUTOATIVIDADE 10-1 10-2 10-3 2 0 2 Por meio da análise da tabela do NMP (elencada neste tópico), qual o resultado (NMP) obtido? 4 Ao realizar uma análise de amostra de água de uma lagoa para análise microbiológica (coliformes termotolerantes), houve a necessidade de realizar a contagem de bactérias em placa, sendo encontrada uma média de 86 colônias, para a diluição 10-1. Para tal resultado, calcule o valor de UFC/mL. 116 117 UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA A microbiologia das águas se refere à investigação de todo MO que apresenta habitat em águas (doces ou salgadas), ou que utiliza água em algum momento do ciclo de vida. É elevada a diversidade de grupos e de espécies de MO em corpos hídricos, em virtude da alta capacidade de suporte ao crescimento microbiano que o meio possui (ROCHA, 2020). Todo MO apresenta uma demanda conhecida como atividade de água, um indicativo da quantidade mínima do recurso necessária ao desenvolvimento. Para a maior parcela das bactérias e das leveduras, esse valor é alto. Assim, ambientes com elevada disponibilidade hídrica são favoráveis ao desenvolvimento (ROCHA, 2020). Neste tópico, estudaremos a importância do saneamento básico na prevenção da ocorrência de doenças de transmissão hídrica, além das patologias decorrentes da ineficiência ou da não existência deste, causadas por bactérias, vírus, cianobactérias, fungos protozoários e helmintos. Finalmente, abordaremos metodologias para a identificação e a contagem dos MO nos corpos hídricos. 2 A QUESTÃO DO SANEAMENTO BÁSICO Inúmeros MO são encontrados, naturalmente, em corpos d’água, a exemplo de muitas espécies de bactérias, arqueas, algas e protozoários. Em virtude da diferença de concentração salina, a população de MO, em mares e em oceanos, deve divergir daquela encontrada em corpos hídricos de água doce, apesar de algumas espécies poderem tolerar as variações, adequando a sobrevivência nos dois ambientes. Podemos citar, como exemplos desses MO, os gêneros Pseudomonas e Vibrio. Já outros MO não são naturalmente encontrados nesses ambientes, e são transportados para rios e para demais ambientes hídricos, por esgotos ou por águas superficiais, geralmente, com elevado potencial de causa de patologias à espécie humana e a outros animais (ROCHA, 2020). É importante atentarmos ao fato de que a constante e intensa intervenção antrópica nos ambientes alterou a qualidade do ar, das águas e do solo, com descargas poluidoras que geraram profundas modificações na distribuição de 118 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS diversas espécies de organismos (TUNDISI, 2011 apud CEBALHOS; DINIZ, 2017). Têm destaque os vetores de doenças infecciosas que deixaram os habitats naturais agredidos na busca de locais adequados para a adaptação e, por consequência, desenvolvimento e reprodução (ROCHA, 2020). O saneamento básico apresenta um papel essencial no controle e na disseminação dessas doenças no ambiente, reduzindo os riscos de transmissão. Inúmeros estudos têm demonstrado as correlações entre a falta de saneamento (o que inclui acesso à água potável e esgotamento sanitário) e o aumento das taxas de morbidade e de mortalidade por doenças infeciosas, especialmente, a diarreia infantil (PRADO; MIAGOSTOVICH, 2014). Fezes humanas e resíduos sólidos contaminados são os principais veículos de transmissão de doenças infecciosas propagadas pela água e as principais causas de mortalidade em crianças com idade inferior a dois anos. A pobreza e a desnutrição, ainda presentes no século XXI, favorecem a transmissão de MO patogênicos (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Cabe salientar que as fezes humanas e dos animais de sangue quente con têm componentes inorgânicos e microrganismos comensais que formam parte da biota normal, mas se o indivíduo está infec tado, existirão, também, microrganismos patogênicos (CEBALHOS; DINIZ, 2017). TABELA 2 – COMPOSIÇÃO QUÍMICA FONTE: A autora Legenda: note as elevadas concentrações de fósforo e de nitrogênio nas fezes e na urina humanas. TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 119 Nos indivíduos infectados, existem MO patogênicos. Os esgotos municipais, que agregam esgotos domésticos de bairros populosos, contêm elevada diversidade de microrganismos patogênicos, em geral, uma mistura de vírus, bactérias, protozoários e helmintos (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Nos dias atuais, mais de um bilhão de pessoas no planeta não conta com acesso a banheiro. Obviamente, a situação afeta, especialmente, as nações com menos recursos e em desenvolvimento. Como consequência da falta de saneamento, cerca de um milhão de mortes é contabilizada anualmente no mundo, oriunda de doenças ligadas ao contato direto com fezes humanas e/ou esgoto a céu aberto. Conforme dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), 88% das mortes por diarreiasresultantes desse contato são geradas por saneamento inadequado. Desses óbitos, 84% são de crianças. Esses dados demonstram que a falta de recursos básicos prejudica a saúde dos cidadãos (TRATA BRASIL, 2020). Ao tratarmos do Brasil, nosso país não é diferente, visto que a porcentagem da população com acesso à rede de água e à coleta de esgoto é de 83,6% e 53,15%, respectivamente. O volume de esgoto tratado no país está próximo aos 46%. Como resultado da problemática, diversos setores do Brasil são seriamente afetados pelos baixos índices de saneamento básico, a exemplo do trabalho, turismo, preservação/conservação ambiental, educação e, especialmente, a saúde (TRATA BRASIL, 2020). Vamos conhecer o SNIS? O SNIS se constitui no maior e mais importante sistema de informações do setor de saneamento do Brasil, apoiando-se em um banco de dados que contém informações de caráteres institucional, administrativo, operacional, gerencial, econômico-financeiro, contábil e de qualidade, sobre a prestação de serviços de água, de esgotos e de manejo de resíduos sólidos urbanos. Acesse o link a seguir e saiba mais: http://app4.mdr.gov.br/serieHistorica/. DICAS Em uma pesquisa realizada pelo Instituto Trata Brasil, denominada de “Benefícios Sociais da Expansão do Saneamento Brasileiro”, evidencia que, em 20 anos, caso o país consiga universalizar o serviço de saneamento básico, o Sistema Único de Saúde (SUS) pode economizar até R$ 6 bilhões com custos por internações em virtude de doenças de veiculação hídrica (TRATA BRASIL, 2020). 120 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Acesse o levantamento Benefícios Sociais da Expansão do Saneamento Brasileiro e se aprofunde nessa temática: http://www.tratabrasil.org.br/images/estudos/itb/ beneficios/Relat%C3%B3rio-Benef%C3%ADcios-do-saneamento-no-Brasil-04-12-2018.pdf. DICAS A partir dessas informações, podemos notar a importância do saneamento básico à saúde da população, questão intimamente ligada aos aspectos econômicos. Inclusive, um dos objetivos do desenvolvimento sustentável (Agenda 2030) trata justamente desse aspecto, sendo intitulado de Água Potável e Saneamento. TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 121 FI G U R A 1 8 – O B JE T IV O S D O D E SE N V O LV IM E N T O S U ST E N TÁ V E L FO N T E : < h tt p s: // b ra si l.u n .o rg /p t- b r/ sd g s/ 6 > . A c e ss o e m : 4 m ai o 2 0 2 0 . 122 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Esse objetivo (Objetivo 6) apresenta, como finalidade, garantir a disponibilidade e a gestão sustentável da água potável e do saneamento para todos. Outros objetivos estão ligados a essa meta, a saber: 6.1 Até 2030, alcançar o acesso universal e equitativo à água potável e segura para todos. 6.2 Até 2030, alcançar o acesso a saneamento e à higiene adequados e equitativos para todos, e acabar com a defecação a céu aberto, com especial atenção para as necessidades das mulheres e meninas e daqueles em situação de vulnerabilidade. 6.3 Até 2030, melhorar a qualidade da água, reduzindo a poluição, eliminando despejo e minimizando a liberação de produtos químicos e materiais perigosos, reduzindo, à metade, a proporção de águas residuais não tratadas e aumentando, substancialmente, a reciclagem e a reutilização segura globalmente. 6.4 Até 2030, aumentar, substancialmente, a eficiência do uso da água em todos os setores, além de assegurar retiradas sustentáveis e o abastecimento de água doce para enfrentar a escassez de água, reduzindo, substancialmente, o número de pessoas que sofre com a escassez de água. 6.5 Até 2030, implementar a gestão integrada dos recursos hídricos em todos os níveis, inclusive, via cooperação transfronteiriça, conforme apropriado. 6.6 Até 2020, proteger e restaurar ecossistemas relacionados com a água, incluindo montanhas, florestas, zonas úmidas, rios, aquíferos e lagos. 6.a Até 2030, ampliar a cooperação internacional e o apoio à capacitação para os países em desenvolvimento em atividades e programas relacionados à água e saneamento, incluindo a coleta de água, a dessalinização, a eficiência no uso da água, o tratamento de efluentes, a reciclagem e as tecnologias de reuso. 6.b Apoiar e fortalecer a participação das comunidades locais, para melhorar a gestão da água e do saneamento. Leia mais em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/6. DICAS Já estudamos a importância do saneamento básico na prevenção da ocorrência de patologias de veiculação hídrica e do esforço mundial para que todos tenham acesso ao serviço. Agora, estudaremos as doenças de veiculação hídrica em si. Seguimos em frente! TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 123 2.1 FLORAÇÕES DE ESPÉCIES DE CIANOBACTÉRIAS E CONSEQUÊNCIAS As cianobactérias são microrganismos com características procariontes (similares às bactérias), capazes de realizar a fotossíntese oxigênica (bactérias que realizam a fotossíntese com liberação de O2). De modo geral, as cianobactérias se apresentam enquanto colônias filamentosas móveis, chamadas de hormogônicas, de coloração azul esverdeada (ROCHA, 2020). FIGURA 19 – COLÔNIAS FILAMENTOSAS DE CIANOBACTÉRIAS FONTE: <https://www.luciacangussu.bio.br/artigo/cianobacterias-contam-ate-dez/>. Acesso em: 4 maio 2020. Benéficos aos processos ambientais, esses organismos estão associados ao ciclo do carbono e do nitrogênio e são, inclusive, o principal grupo de organismos responsável pela fixação do nitrogênio molecular na Terra, com destaque para o gênero Trichodesmium. Florações extensas das cianobactérias podem ser prejudiciais aos animais e, inclusive, à espécie humana, especialmente, quando ocorrem em reservatórios e em rios de abastecimento humano. Essa problemática se deve ao fato de que as cianobactérias são responsáveis pela produção de cianotoxinas, que podem apresentar ação neural ou hepática, gerando danos severos aos demais organismos (CARMICHAEL, 1992 apud ROCHA, 2020). A presença de florações de cianobactérias em sistemas de abastecimento de água é um problema preocupante, visto que as etapas convencionais de tratamento não conseguem remover as cianotoxinas. Essa questão se torna ainda mais grave dados os resultados de estudos científicos recentes que indicam que a ingestão dessas toxinas aumenta o risco do desenvolvimento de doenças, a exemplo da esclerose lateral amiotrófica, em virtude da ação neurotóxica (CALLER et al., 2009; BANACK et al., 2005 apud ROCHA, 2020). 124 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Cerca de 40 espécies de cianobactérias produzem substâncias tóxicas (cianotoxinas), que são liberadas, especialmente, quando as células dos organismos envelhecem e se rompem espontaneamente, ou quando produtos químicos, como algicidas, são adicionados à água, para o controle (CANGUSSU, 2020). A crescente eutrofização dos ambientes aquáticos tem sido produzida por ação antrópica, o que vem ocasionando um enriquecimento artificial desses ecossistemas, especialmente, fósforo e nitrogênio, gerando um aumento de eventos de eutrofização nos ambientes. A eutrofização é definida como o aumento da concentração de nutrientes, especialmente, nitrogênio e fósforo, nos ecossistemas aquáticos. Esta pode ser de ordem natural (processo lento, porém, contínuo) ou artificial (provocada pela espécie humana) (ESTEVES, 1998). NOTA A eutrofização artificial é de origem humana e consequência do emprego extenso de fertilizantes na agricultura, contaminando rios, lagos e mananciais. Também resulta da descarga de águas residuárias (esgotos) industriais e domésticas sem nenhum tratamento, em virtude da elevada taxa de urbanização e da falta de saneamento básico, conforme já mencionado no início deste tópico. Esse enriquecimento artificial gera modificações na qualidade da água, como diminuição do oxigênio dissolvido, aumento dos custos de tratamento de água para consumo, morte extensiva de peixes, decréscimo na diversidadede espécies da comunidade fitoplanctônica e aumento da incidência de florações de microalgas, especialmente, de cianobactérias. Em florações ocorridas em águas continentais, as cianobactérias estão entre os organismos mais presentes nesse tipo de fenômeno. As florações, geralmente, apresentam consequências visíveis e danosas aos organismos e ao meio ambiente. Alteram o equilíbrio dos ecossistemas aquáticos, criam um biofilme superficial de cor verde, alterando a transparência da água e levando à desoxigenação de lagos e de rios. Também liberam compostos com gosto e odor desagradáveis, afetam a potabilidade da água para consumo humano e, até mesmo, em áreas de recreação, comprometendo a qualidade dos recursos hídricos. TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 125 FIGURA 20 – FLORAÇÃO DE CIANOBACTÉRIAS EM UM CORPO HÍDRICO FONTE: <https://conhecimentocientifico.r7.com/cianobacterias/>. Acesso em: 4 maio 2020. 2.2 DOENÇAS CAUSADAS POR VÍRUS Conforme já estudamos, as fezes contaminadas com microrganismos patogêni cos e os esgotos domésticos que as transportam são veículos de transmissão desses microrganismos, e, se despejados no ambiente sem tratamento adequado, favorecem a disse minação. As doenças infecciosas podem ser provocadas por vírus, bactérias, protozoários e helmintos patogênicos (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Os vírus entéricos ou de disseminação entérica são, constantemente, objeto de estudos ambientais, e pertencem a diversas famílias e gêneros, estando associados a inúmeras doenças infecciosas. A terminologia “vírus entéricos” representa todos os grupos virais que residem no trato gastrointestinal humano e que, após a transmissão fecal-oral, podem gerar infecções em indivíduos susceptíveis. Esses “organismos” são altamente resistentes a condições ambientais desfavoráveis. Os norovírus (NoV) constituem os principais agentes virais entéricos responsáveis pelos surtos de gastroenterite de veiculação hídrica no mundo, seguidos pelos adenovírus (AdV), echovírus e vírus da hepatite A (HAV) (SINCLAIR; JONES; GERBA, 2009 apud PRADO; MIAGOSTOVICH, 2014). O rotavírus do grupo A (RV-A), considerado o principal responsável pela gastroenterite infantil aguda, também tem sido relacionado a diversos surtos de gastroenterite de veiculação hídrica (MACHADO, 2012; BOSCH, 2008 apud PRADO; MIAGOSTOVICH, 2014). 126 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS A seguir, será possível evidenciar as doenças geradas por vírus presentes nos ecossistemas aquáticos e as doenças associadas. QUADRO 2 – DOENÇAS OCASIONADAS POR VÍRUS PATOGÊNICOS Gênero Nome popular Doenças associadas Enterovirus Poliovírus (PV) Paralisia, meningite, febre Coxsackievírus A Meningite, febre, doença respiratória, doença das mãos, pés e boca Coxsackievírus B Miocardites, anomalias do coração, diabetes Echovírus Meningite, febre, doença respiratória, gastroenterite Hepatovirus Vírus da hepatite A (HAV) Hepatite Rotavirus Rotavírus (RV) Gastroenterite Norovirus Norovírus humano (HuNoV) Gastroenterite Hepevirus Vírus da hepatite E (HEV) Hepatite Mamastrovirus Astrovírus humano (HAsTV) Gastroenterite Mastadenovirus Adenovírus humano (HAdV) Gastroenterite, doença respiratória, conjuntivite Polyomavirus Poliomavírus humano (JCPyV) Leucoencefalopatia multifocal progressiva, doenças do trato urinário Alphatorquevirus Torque teno vírus (TTV) Desconhecida/Hepatite Kobuvirus Klasse vírus Gastroenterite FONTE: Adaptado de Bosch et al. (2008) apud Prado e Miagostovich (2014) Legenda: Leucoencefalopatia: doença que gera demielinização progressiva do sistema nervoso central, déficits neurológicos multifocais (ex.: complicações na visão, audição e fala) e morte, geralmente, em 9 meses (MANUAL MSD, 2020). A detecção de vírus em amostras ambientais é um desafio, especialmente, em virtude da grande variedade e da complexidade de amostras. Ademais, exige uma etapa prévia de concentração de amostras destinadas à redução do volume, além do posterior emprego em análises moleculares (PRADO; MIAGOSTOVICH, 2014). Cabe salientar que os vírus não têm sido integrados como padrões de monitoramento para mensurar a qualidade sanitária de efluentes produzidos por ETEs (Estações de Tratamento de Efluentes). É o caso das resoluções do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) 357/2005 e 430/2011. Esse fator gera a carência de medidas mais específicas, objetivando o controle da disseminação viral em corpos d’água (PRADO; MIAGOSTOVICH, 2014). TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 127 2.3 DOENÇAS CAUSADAS POR BACTÉRIAS Dentre as espécies de bactérias que se apresentam como agentes causadores de doenças de veiculação hídrica, têm destaque aquelas pertencentes à família Enterobacteriaceae (ROCHA, 2020). QUADRO 3 – DOENÇAS DE VEICULAÇÃO HÍDRICA CAUSADAS POR BACTÉRIAS Bactéria Doença associada Salmonella enterica (subespécie enterica) Febre tifoide e salmonelose S. typhi Febre tifoide S. paratyphi Febre paratifoide Escherichia coli Gastroenterite Shigella dysenteriae Shigelose Vibrio cholerae Cólera Outros vibriões Campylobacter jejuni Disenteria Yersínia enterocolítica Diarreias e septicemias Leptospira icterohaemorrhagiae Leptospirose FONTE: Rocha (2020) e Feachem et al. (1983) apud Cebalhos e Diniz (2017) Legenda: Febre tifoide: apresenta, enquanto sintomas característicos: febre prolongada; alterações intestinais, que vão da constipação à diarreia com sangue; cefaleia (dor de cabeça); falta de apetite; mal-estar; prostração; aumento do fígado e do baço; distensão; e dores abdominais, náuseas e vômitos. A febre paratifoide possui sintomatologia similar (DRAUZIO, 2012). Shigelose: infecção aguda do intestino. Os sintomas incluem febre, náuseas, vômitos e diarreia (MANUAL MSD, 2020). Acadêmico, não se assuste com a quantidade de nomes científicos dos organismos mencionados. Estes são importantes para que você tenha noção das patologias de veiculação hídrica e do papel do saneamento básico na prevenção dessas e de outras doenças relacionadas. ATENCAO Conforme já mencionado, a presença de MO causadores de doenças em ambientes aquáticos, em geral, deve-se à contaminação dos ambientes com material fecal, devido ao fato de que a maior parte desses organismos coloniza o trato gastrointestinal de seres humanos e de outros animais. Dessa forma, muitas espécies podem ser empregadas como indicadores de qualidade da 128 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS água, a exemplo da bactéria Escherichia coli (ROCHA, 2020; CEBALHOS; DINIZ, 2017). Essa bactéria integra o grupo conhecido como coliformes, formado por bactérias associadas a processos de decomposição, com fermentação da lactose e consequente produção de ácidos orgânicos e gás carbônico (ROCHA, 2020). O grupo dos coliformes totais (CT) abrange bactérias Gram-negativas, que fermentam a lactose a 35oC, com produção de ácido e de gás. Esse grande grupo apresenta um subgrupo denominado, inicialmente, de coliformes fecais (atualmente, é chamado de coliformes termotolerantes). Cabe apontar que a bactéria E. coli é a única espécie que confirma a contaminação fecal (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Assim, a seguir, poderemos evidenciar os três grupos de coliformes, atualmente, em utilização: coliformes totais (CT), coli formes termotolerantes (anteriormente, chamados de coliformes fecais – CF) e E. coli. FIGURA 21 – COLIFORMES TOTAIS (GRANDE GRUPO DE MO) QUE INCLUEM COLIFORMES TERMOTOLERANTES E E. COLI FONTE: Adaptada de Cebalhos e Diniz (2017) A subdivisão do grupo coliformes, os coliformes termotolerantes, possui a capacidade de reprodução em temperatura acima de 40°C. Os organismos estão associados às fezes de animais endotérmicos (ex.: espécie humana). Esse grupo está incluso no grupo dos coliformes totais (CT), bactérias Gram-negativas que fermentam a lactose a 35°C, com produção de ácido e de gás (ROCHA, 2020). As bactérias do gênero Enterococcus também pertencem ao grupo. Contudo, a maior presençaé de E. coli em amostras de águas contaminadas, quando comparadas aos demais coliformes termotolerantes, ligadas a técnicas simples e disseminadas para a detecção. Assim, há a escolha da espécie como uma bioindicadora adequada de contaminação de corpos d’água (ROCHA, 2020), mas o que é uma espécie/organismo bioindicador? Como o próprio nome diz, esses organismos recebem a denominação de bioindicadores, pois apresentam a capacidade de inferir sobre a qualidade ambiental, são de fácil percepção e dão respostas pontuais, de acordo com a presença ou a ausência em uma determinada área ou local (CALLISTO; GONÇALVES-JÚNIOR; MORENO, 2005). A terminologia bioindicador é uma denominação genérica TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 129 utilizada para diversos organismos vivos, que possuem essas características, podendo ser encontrados em diversos ambientes ao redor do mundo, e nos mais diversos tipos de hábitats (CONTI, 2008 apud FERNANDES; SOUZA, 2018). Os coliformes termotolerantes que estudamos são exemplos de bioindicadores. 2.4 DOENÇAS CAUSADAS POR FUNGOS Os fungos passaram a receber mais atenção como contaminantes de água potável nas últimas décadas, pois infecções de origem fúngica têm se tornado cada vez mais comuns. Espécies potencialmente patogênicas, alergênicas e toxigênicas são isoladas de água, às vezes, em altas concentrações (YAMAGUCHI et al., 2007; HAGESKAL, 2009; NUNZIO; YAMAGUCHI, 2010 apud OTTONI et al., 2014). Bactérias filamentosas dos gêneros Thiothrix, Beggiatoa e Sphaerotillus são abundantes nas regiões de rios e de represas, onde são descarregados os esgotos domésticos, assim como em pântanos, onde há abundante matéria orgânica em decom posição. Essas bactérias, com leveduras e fungos do gênero Geotrichum spp, por exemplo, e com cianobactérias filamentosas dos gêneros Oscllatoria e Phormidium, formam os denominados fungos dos esgotos (MARA, 1974 apud CEBALHOS; DINIZ, 2017). Visualizam-se como tufos de fios esbranquiçados sobre um fundo aquático marrom-preto com filamentos ver des e escuros. Dessa forma, a presença dessas bactérias e desses fungos em quantidades excessivas, no ambiente, é um indi cador da entrada dos esgotos e de qualquer outro tipo de resíduo rico em matéria orgânica (MARA, 1974; BITTON, 2005 apud CEBALHOS; DINIZ, 2017). Há relatos de transmissão por águas recreacionais e por águas recreacionais de leveduras, como Cândida albicans e diversos fungos filamentosos. A detec ção desses MO confere importantes informações complementares acerca do grau de contaminação das águas. Entretanto, torna-se difícil o isolamento em monitoramentos de qualidade da água de monitoramento de rotina (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Uma grande diversidade de espécies de fungos foi isolada a partir da água potável, como fungos potencialmente patogênicos, alergênicos e espécies toxigênicas. Por exemplo, Aspergillus fumigatus foi recuperado a partir de 49% das torneiras investigadas no Hospital Universitário Rikshospitalet, em Oslo (capital da Noruega), em uma pesquisa efetuada por Warris e colaboradores (2001) (SILVA, 2014). A. fumigatus se constitui como um dos mais importantes fungos patogênicos que causam infecções em pacientes imunocomprometidos (ex.: portadores de HIV) em hospitais. Devido à frequência crescente de pacientes imunodeprimidos, os hospitais estão enfrentando um grande desafio a respeito das infecções fúngicas oportunistas (DENNING, 2006 apud SILVA, 2014). Os 130 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS resultados indicam que águas de hospitais podem conter uma grande diversidade de fungos, incluindo os potencialmente patógenos (SILVA, 2014). Suspeita-se que os fungos presentes na água podem se tornar aerossóis para o ar, quando a água passa por instalações (ex.: torneiras) e, desse modo, introduzida em indivíduos gravemente imunocomprometidos com alto risco de infecções fúngicas (ANAISSIE et al., 2002b; WARRIS et al., 2001 apud SILVA, 2012). A espécie de fungo ocasiona uma série de doenças, como a aspergilose pulmonar invasiva. Esta é, agora, considerada como uma das principais causas de morte em doentes imunocomprometidos (KOUSHA; TADI; SOUBANI, 2011; MONTEIRO et al., 2012). Como sintomas, os pacientes apresentam febre e infiltrados pulmonares, acompanhados de dor torácica e hemoptise (eliminação de sangue do trato respiratório pela tosse). FIGURA 22 – A. FUMIGATUS E ASPERGILOSE PULMONAR INVASIVA FONTE: <https://www.researchgate.net/figure/Figura-4-Microscopia-de-cultivo-de-Aspergillus- -fumigatus-Gentileza-de-TM-Agustin_fig1_297753784>; <https://www.jornaldepneumologia. com.br/detalhe_artigo.asp?id=629>. Acesso em: 3 maio 2020. Legenda: A – Microscopia de cultivo de A. fumicatus. B – Tomografia computadorizada de pulmão de paciente acometido por aspergilose pulmonar invasiva. As setas indicam nódulos irregulares, uma das características da doença. Podemos notar que, futuramente, o monitoramento dos sistemas de abastecimento de água para a ocorrência de fungos pode ser necessário, especialmente, em sistemas de água de hospitais. Demais pesquisas são fundamentais no que diz respeito ao estabelecimento de métodos precisos de investigação e aos efeitos do tratamento da água em relação aos fungos. TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 131 2.5 DOENÇAS CAUSADAS POR PROTOZOÁRIOS Os MO Cryptosporidium e Giardia são protozoários parasitas de transmissão hídrica que infectam uma ampla variedade de hospedeiros vertebrados, inclusive, humanos (XIAU; FAYER, 2008 apud FREGONESI et al., 2012). A cryptosporidiose e a giardíase se caracterizam por causar, nos indivíduos acometidos, quadros de diarreia de diversa severidade, causando sérias morbidades nos hospedeiros, principalmente, em indivíduos imunocomprometidos (LOBO et al., 2009 apud FREGONESI et al., 2012). FIGURA 23 – CRYPTOSPORIDIUM E GIARDIA FONTE: <http://www.bccdc.ca/health-info/diseases-conditions/cryptosporidium>. Acesso em: 3 maio 2020. Legenda: A – Espécie de Cryptosporidium (Cryptosporidium parvum) em vermelho (esferas arredondadas). B – Espécie Giardia lamblia, causadora da giardíase. A forma de transmissão de ambos os parasitas ocorre pela via fecal-oral, através do contato direto com as fezes de pessoas infectadas ou por contato indireto por ingestão de água ou de alimentos contaminados (XIAU; FAYER, 2008 apud FREGONESI et al., 2012). A análise de protozoários na água gera uma série de desafios científicos e tecnológicos, dado que os métodos reconhecidos internacionalmente são de alta especificidade tecnológica. Nota-se que a inserção desse tipo de metodologia na rotina de laboratórios certificadores da potabilidade da água ainda é incipiente no Brasil. As legislações pertinentes à temática vêm apresentando avanços recentes, com a inclusão da recomendação para o monitoramento de Cryptosporidium e de Giardia em associação com outros microrganismos indicadores (FREGONESI et al., 2012). 132 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 2.6 DOENÇAS CAUSADAS POR HELMINTOS O termo helminto advém da palavra grega Helmis, que significa “vermes”. Os helmintos compõem um grupo numeroso de animais que compreende espécies de vida livre e parasitárias. Esses organismos constituem um grave problema de saúde pública em diversas regiões do mundo. A sua presença, na maioria dos casos, está associada ao baixo desenvolvimento econômico, à falta de saneamento básico e à falta de higiene (MUÑHOZ; FERNANDES, 2020). Conforme a região analisada e a população, no Brasil, a frequência de infecção por enteroparasitas sofre variação. Na literatura científica, existem inúmeros artigos de estudos epidemiológicos na população do município em diversos estados do país. A seguir, será possível verificar algumas das doenças ocasionadas por helmintos frequentes em fezes humanas que passam uma parte do ciclo de vida no ambiente aquático (CEBALHOS; DINIZ, 2017). QUADRO 4 – DOAENÇAS OCASIONADAS POR HELMINTOS HelmintoTransmissão Doença associada Schistosoma mansoni Homem e animais-caramujo aquático-homem Esquistossomose Schistosoma haematobium Homem-caramujo aquático-homem Esquistossomose Schistosoma japonicum Homem-caramujo aquático-homem Esquistossomose Fasciola hepática Ovelha-caramujo aquático-homem Fasciolase Clonorchis sinensis Homem ou animal-caramujo aquático-peixe-homem Clonorchíase FONTE: Feachem et al. (1983) apud Cebalhos e Diniz (2017) A esquistossomose é endêmica em vasta extensão do território nacional, considerada um grave problema de saúde pública no Brasil porque acomete milhões de pessoas, provocando um número expressivo de formas graves e óbitos. Comumente, é adquirida por meio da pele e de mucosas em consequência do contato humano com águas contendo formas infectantes do S. mansoni. A transmissão da doença depende da presença do homem infectado, excretando ovos do helminto pelas fezes, e dos caramujos aquáticos, que atuam como hospedeiros intermediários, liberando larvas infectantes do verme nas coleções hídricas utilizadas pelos humanos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 133 FIGURA 24 – S. MANSONI E ESQUISTOSSOMOSE FONTE: <http://www.ufrgs.br/para-site/siteantigo/Imagensatlas/Animalia/Schistosoma%20mansoni. htm>; <http://www.ccs.saude.gov.br/portinari/experimento02.php>. Acesso em: 3 maio 2020. Legenda: A – Espécime (fêmea) de S. mansoni. B – Criança acometida por esquistossomose com sintoma típico (aumento do volume do abdômen – barriga d’água). A redução da morbimortalidade da esquistossomose requer a detecção precoce e o tratamento de todos os portadores, evitando que a ação patogênica acumulativa dos ovos do S. mansoni gere alterações nos órgãos afetados, especialmente, no fígado, o que gera a hipertensão portal (aumento anormal da pressão sanguínea na veia porta) e outras formas graves da doença. A detecção e o tratamento dos portadores objetivam, também, reduzir a expansão geográfica da esquistossomose (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). O controle duradouro e sustentável da esquistossomose depende da implementação de políticas públicas que melhorem as condições de vida das populações. Para isso, os gestores municipais do Sistema Único de Saúde (SUS), responsáveis pela execução das ações de vigilância e pelo controle da esquistossomose, devem buscar, em articulação com outros setores governamentais, a melhoria de vida das populações, por meio de ações/iniciativas de educação e de intervenção no meio ambiente (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). 3 ANÁLISE MICROBIOLÓGICA DA ÁGUA Agora que já evidenciamos a importância de medidas adequadas de saneamento básico na promoção da qualidade de vida da população e das diversas patologias decorrentes da falta/ineficiência de ações, estudaremos os principais tipos de análises empregados para a verificação da qualidade de corpos hídricos no diagnóstico, na promoção e na manutenção dos serviços ecossistêmicos dos ambientes. Bons estudos e vamos em frente! 134 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS 3.1 TÉCNICA DE TUBOS MÚLTIPLOS Conhecemos os fundamentos da técnica de tubos múltiplos neste tópico, mas, de que forma, esses conhecimentos são aplicados em uma análise rotineira dos MO? Primeiramente, é necessário definir os volumes de amostra e diluições a serem realizadas. Conforme Cebalhos e Diniz (2017), para água potável, podem ser utilizados cinco tubos para 10 mL, cinco tubos para 1 mL e cinco tubos para 0,1 mL. Mesmo não atingindo o volume recomendado de 100 mL, isso pode ser útil para algum dado que não faça parte da rotina de controle sistemático da qualidade da água. Para a água não potável, pode-se usar, sem restrições, o teste de tubos múltiplos de 15 tubos, ou seja, cinco tubos para cada volume e diluições de 1; 0,1 (10-1); 0,001 (10-2), 0,001 (10-3 mL); e assim por diante. Já sabemos que a técnica está dividida nos ensaios presuntivo, confirmativo e fase completa. Para conhecer os meios de cultivo e as particularidades que envolvem as análises, observaremos o exposto a seguir. QUADRO 5 – ETAPAS DA TÉCNICA DE TUBOS MÚLTIPLOS PARA O GRUPO COLIFORMES Meio de cultura Utilização Temperatura e período de incubação Especificações Caldo Lauryl Triptose (CLT) Isolamento presuntivo (fase presuntiva) de coliformes 35 ±0.5 °C ou 37±0.5 °C 24h a 48h As alíquotas da água a serem quan tificadas, ou as diluições, são inoculadas em tubos de ensaio com meio de cultura. Tubos positivos com turbidez e gás contêm presunti- vamente coliformes totais). Aqueles tubos que são negativos, após as 24 horas, ficam mais 24 horas na estufa. Caldo Verde Brilhante Bílis 2% (CVBLB) Confirmação de coliformes totais (fase confirmativa) 35 ±0.5 °C ou 37±0.5 °C 24h a 48h Dos tubos positivos da etapa presuntiva anterior, repica-se, com alça bacteriológica estéril, a cultura do CLT para o caldo CVBLB, destinado à confirmação da presença de coliformes totais. Caldo EC Confirmação de bactérias termotolerantes - A partir de tubos positivos da fase presuntiva, efetua-se, de modo simultâneo, uma ou duas alças bacteriológi cas para tubos contendo o meio caldo EC (específico para coliformes termotolerantes) e para o CVBLB 2% (para investigação de coliformes totais). Os tubos inoculados com EC devem ser incubados a 44,5 °C, durante 24 horas, de pre ferência em banho-maria, com recirculação de água, para garantir que todos os tubos recebam a mesma temperatura. FONTE: Adaptado de Cebalhos e Diniz (2017) TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 135 Legenda: É importante lembrar que o aspecto da formação de bolhas de gás nos tubos de Durham é uma característica fundamental em todas as fases da técnica de tubos múltiplos. Por meio dos resultados para coliformes totais e termotolerantes, procede-se à consulta da tabela para o cálculo do NMP. Para diferenciar, de modo seguro e rápido, o E. coli a partir dos tubos positivos de EC, usa-se o meio cromogênico EC-MUG. Esse meio é empregado para a confirmação de E. coli pela produção de fluorescência quando se ilumina com luz UV (λ 366 nm). Para identificar a presença de E. coli, deve-se trans ferir uma ou duas alças da cultura positiva nos tubos do teste confirmativo Verde Brilhante Bílis para o meio EC-MUG, além de incubar em banho-maria a 44,5 ± 0,2°C por 24 ± 2 horas, man tendo o nível da água ou a temperatura homogênea na estufa. Observar os tubos e aqueles em que, houve crescimento (tur bidez), submetê-los à luz UV (λ 366 nm). A presença do brilho azul fluorescente é uma resposta positiva para E. coli (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Os resultados também são expressos em NMP/100 mL, utilizando-se a tabela de NMP. FIGURA 25 – RESULTADO POSITIVO E NEGATIVO PARA O TESTE COM EC-MUG FONTE: <http://universe84a.com/mug-test/>. Acesso em: 4 out. 2020. Legenda: Presence of blue fluorescence (presença de fluorescência); Lack of blu fluorescence (ausência de fluorescência azul). MUG test (teste MUG) – Positivo (esquerda) e negativo (direita). 136 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS E. coli é o único coliforme que produz a enzima ß-glu curonidase, que permite metabolizar parte da molécula MUG e produzir fluorescência. MUG é a sigla do composto 4-metilumbeliferil-β-D-glucoronídeo, molécula sintética e marcada com a substância luminescente no fragmento 4-metilumbeliferil. A enzima ß-glucuronidase cliva o MUG em dois componentes: 4-metilumbeliferil e o ß-d-glucorini deo. Esse último composto é assimilado e metabolizado pela E. coli enquanto o primeiro fica livre no meio e expressa a marca de bioluminescência ao ser iluminado com UV (λ 366) (CEBALHOS; DINIZ, 2017). DICAS 3.2 TÉCNICA COLILERT® O Colilert® é empregado na detecção e na enumeração de coliformes totais, e E. coli em amostras de água, por meio da hidrólise enzimática (quebra de moléculas por meio de enzimas) de substratos específicos, como ONPG e MUG. O substrato cromogênico ONPG (Orto-nitrofenil-β-D-galactopiranosídeo)é específico para a enzima constitutiva GAL (beta-galactosidade) presente nos coliformes. Já o substrato MUG é empregado, especificamente, para E.coli. (BUCKALEW et al., 2006; LOPEZ-ROLDAN et al., 2013 apud OLIVEIRA, 2013). Acadêmico, os nomes das enzimas e dos substratos mencionados são importantes para o mecanismo do teste em si. Entretanto, não há necessidade de memorizá-los. É importante que você compreenda a finalidade do teste na obtenção de resultados de forma mais ágil. IMPORTANTE Colilert® se trata de um kit desenvolvido pela empresa IDEXX, de utilização fácil e prática, especialmente, quando da análise de numerosas amostras diariamente. Essa realidade ocorre, por exemplo, em companhias de água e de esgoto que devem monitorar a qualidade da água fornecida em diversos pontos da rede distribuidora (CEBALHOS; DINIZ, 2017). O kit conta com sacos de plástico estéreis com tiossulfato de sódio, que se destina à eliminação do cloro residual presente na água potável. Além disso, apresenta a marca para coletar 100 mL de amostra ou frascos de coleta estéril, também, com a marca de 100 mL. O meio de cultivo em pó é fornecido pelas cartelas plásticas e já vem esterilizado. A cartela possui ampolas plásticas individuais de fácil abertura, com a quantidade de meio estéril adequada para ser adicionada diretamente a 100 mL de amostra de água (CEBALHOS; DINIZ, 2017). TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 137 FIGURA 26 – PRODUTOS COLILERT® FONTE: <https://twitter.com/hashtag/colilert>. Acesso em: 4 out. 2020. Legenda: À esquerda – Cartelas COLILERT®; à direita – tubos com meio de cultivo para teste de presença/ausência. Quando a amostra possui elevada contaminação microbiana, são elaboradas diluições seriadas com água destilada estéril adicionada do meio de cultivo em frascos estéreis, com capacidade superior a 100 mL (ex.: frascos de 200 mL). Assim, são preparadas as diluições seriadas da mostra, sendo inoculadas, seguindo as orientações para NMP, ou seja, em 90 mL de água destilada estéril com meio de cultivo, são adicionados 10 mL de amostra de água que se pretende investigar. Desse modo, obtém-se a primeira diluição decimal (10/100 = 10-1) (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Posteriormente à agitação da primeira diluição, retiram-se 10 mL e estes são adicionados em outro recipiente com 90 ML de água destilada estéril com meio de cultivo, agitando-se novamente. Temos, então, a diluição (10/100 = 10-2). O procedimento deve ser repetido até a última diluição desejada para o estudo/ monitoramento. Cada uma dessas diluições é inoculada em uma cartela diferente, de modo a se obterem resultados com células positivas e negativas (CEBALHOS; DINIZ, 2017). De forma a se proceder com a execução do teste, o meio de cultura é dissolvido diretamente na amostra. Os resultados podem ser obtidos em até 18 horas ou menos, dada a determinação simultânea da presença-ausência (P/A) de coliformes totais e de E. coli, altamente importante na situação de calamidade pública ou na necessidade de análises rápidas da qualidade microbiológica da 138 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS água. O teste qualitativo pode ser empregado em análises de águas potáveis, pois devem apresentar, sempre, resultado negativo. Já o teste quantitativo (cartela) pode ser utilizado em avaliações da eficiência das estações de tratamento de água, da qualidade bacteriológica da água produzida na saída do tratamento e da água distribuída pela rede. QUADRO 6 – ANÁLISES QUALITATIVA E QUANTITATIVA DO TESTE COLILERT® Análise Quantitativa Princípio do teste Temperatura e período de incubação Especificações São utilizadas cartelas espe cíficas com depressões ou cavidades denominadas células. Estas são preenchidas com 100 mL da amos tra (ou de suas soluções) , sendo adicionado, previamente, o meio de cultura. Essas células representam repetições de um mesmo inóculo, ou seja, da mesma diluição da amostra. Desse modo, trata-se da aplicação do mesmo método estatístico da Técnica de Tubos Múltiplos, denominada de Técnica do NMP. 37°C 18 - 24 horas. Primeiramente, é observado se ocorreu mudança da cor do meio para amarela intensa em alguma célula, indicativo de resultado positivo para coliformes totais positivos. Em seguida, observa-se a mesma cartela sob UV (366 nm). A presença de fluorescência azul confirma E. coli. Análise Quantitativa Princípio do teste Temperatura e período de incubação Especificações Adicionar o meio de cultura ao frasco, contendo a amostra. Adição do meio de cultura em 100 mL da amostra de água. 35°C 24 h Leitura dos resultados: Incolor: negativo; Amarelo: coliformes totais; Amarelo/azul fluorescente: E. coli. FONTE: Adaptado de Cebalhos e Diniz (2017) Ambas as técnicas que estudamos (Técnica De Tubos Múltiplos e Colilert®) apresentam vantagens e desvantagens. Vamos conhecê-las?! TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 139 QUADRO 7 – VANTAGENS E DESVANTAGENS DAS TÉCNICAS: TUBOS MÚLTIPLOS E COLILERT® Técnicas de Tubos Múltiplos Vantagens Desvantagens Esta técnica tem a vantagem de analisar tanto amostras límpidas como turvas. Método laborioso, pois necessita de grandes quantidades de vidrarias e meio de culturas, sendo necessários repiques e longo tempo de incubação chegando a 96 horas Colilert® Vantagens Desvantagens Maior precisão. Simples manuseio. Rápida execução. Não requer trabalho de preparo de meios de cultura; Tempo de resposta mais ágil, já que a determinação simultânea de coliformes (totais) e E. coli é efetuada após incubação das amostras a 35o C por 24 horas, não havendo necessidade de ensaios confirmativos Necessidade do uso de uma seladora para lacrar a cartela antes da incubação. Maior preço do método Colilert® elevando o custo da análise, em especial, do aparelho selador. FONTE: Adaptado de Fundação Nacional de Saúde (2013), IFSC EDU (2020) e Fernandes e Gois (2015) 3.3 CONTAGEM DE BACTÉRIAS HETEROTRÓFICAS A realização da contagem de bactérias heterotróficas, definidas, genericamente, como MO, que necessitam de carbono orgânico como fonte de nutrientes, provê informações a respeito da qualidade bacteriológica da água de modo amplo. Inclusive, a técnica empregada para quantificar os MO heterótrofos na água objetiva atender às instruções do Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater, publicação da American Public Health Association (APHA), American Water Works Association (AWWA) e Water Environment Federation (BRASIL, 2011). São em órgãos ambientais e de saúde norte-americanos. Com a determinação da densidade total de bactérias hete rotróficas ou CPP, seja em águas brutas ou para consumo humano, é possível que sejam verificadas as condições higiênicas da fonte e das águas tratadas, de modo a se avaliar a eficiência das diversas etapas de tratamento, além de registrar as condições higiênicas ao longo da rede de distribuição (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Estudos confirmaram a associação existente entre a frequência de detecção de coliformes e a densidade de bactérias totais, entretanto, somente até níveis de contagem de 500 UFC/mL. Quando a população de bactérias ultrapassa as 1000 UFC/mL, a frequência de detecção de coliformes decresce. Cabe salientar que todas as portarias do Ministério da Saúde que tratam da qualidade de água admitem a presença de, no máximo, 500 UFC/mL de água tratada (CEBALHOS; DINIZ, 2020). 140 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS O meio Plate Count Agar (PCA) é, também, chamado de Ágar Extrato Glicose Triptona. Esse meio pode ser utilizado no método “pour-plate”, e está disponível comercialmente na forma desidratada (STANDARD METHODS, 2018). NOTA Em seguida, espalha-se a amostra, movimentando o bastão (embebido em álcool a 96° e flambado) em círculos de dentro para fora da placa. Para cada análise, faz-se um branco, incubando uma placa sem amostra e um controle negativo. Incubam-seas placas invertidas em estufa a 35 ± 0,5°C por 48 horas. Após o tempo de incubação, conta-se o número de colônias presentes nas placas e se procede com o cálculo de UFC/mL da amostra. A ausência de crescimento na placa de branco valida as análises. Agora que já conhecemos os princípios compreendidos na análise da contagem de bactérias heterotróficas, estudaremos a metodologia para a verificação, conforme APHA (2012) apud Glowacki e Crippa (2018). O método empregado para análise se trata do spread plate, acerca do qual estudamos no Tópico 1. Contudo, é importante relembrar que a técnica se constitui no espalhamento uniforme da solução em placa com meio de cultivo apropriado. Para tal procedimento, a amostra deve ser analisada à temperatura- ambiente. Separar duas placas de Petri contendo ágar padrão para contagem a cada diluição. Na diluição, realiza-se a homogeneização da amostra 25 vezes por inversão e, nas proximidades do Bico de Bunsen, pipeta-se 1 mL para um tubo estéril, contendo 9 mL de água autoclavada. Em seguida, é homogeneizado o tubo em vórtex (agitador de tubo de ensaio), continuando a diluição seriada até atingir a solução desejada. Para a inoculação, deve-se aproximar do Bico de Bunsen, além de pipetar 100 uL (microlitros = 0,1 mL) da amostra no centro de cada placa. Geralmente, utiliza-se, como meio de cultura, o Plate Count Agar (PCA). TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 141 FIGURA 27 – PROCEDIMENTO DE CONTAGEM DE COLÔNIAS EM CONTADOR DE COLÔNIA FONTE: <https://microambiental.com.br/analises-de-agua/bacterias-heterotroficas-e-a- qualidade-da-agua/>. Acesso em: 6 out. 2020. 3.4 DENSIDADE DE CIANOBACTÉRIAS Conforme evidenciamos anteriormente, as cianobactérias representam um perigo adicional à qualidade da água pela capacidade potencial de numerosas espécies de produzirem cianotoxinas, que se bioacumulam nas células de protozoários, crustáceos, animais e espécie humana, sofrendo biomagnificação ao longo das cadeias e das teias alimentares (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Você sabe o significado dos termos bioacumulação e biomagnificação? Bioacumulação é o termo geral que descreve um processo pelo qual substâncias (ou compostos químicos) são absorvidas pelos organismos. O processo pode ocorrer de forma direta, quando as substâncias são assimiladas a partir do meio ambiente (solo, sedimento, água), ou de forma indireta, pela ingestão de alimentos quem contêm as substâncias. Esses processos, frequentemente, ocorrem de forma simultânea, em especial, em ambientes aquáticos. Já a biomagnificação (ou magnificação trófica) é um fenômeno que ocorre quando há acúmulo progressivo de substâncias de um nível trófico para outro ao longo da teia alimentar. Assim, os predadores do topo têm grandes concentrações das substâncias do que as presas (MONTONE, 2020). ATENCAO 142 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS No Brasil, a Portaria n° 2914/2011, do Ministério da Saúde, legisla a respeito de cianobactérias e de cianotoxinas nos mananciais (fontes de água que podem ser empregadas para o abastecimento público), e preconiza a frequência amostral em detrimento da densidade das células e do monitoramento das concentrações de cianotoxinas no manancial, ao longo do tratamento, na saída da ETA (Estação de Tratamento de Água) e na entrada das clínicas de hemodiálises (BRASIL, 2011). A análise de cianobactérias pode ser realizada sob o enfoque qualitativo ou quantitativo. Para a análise qualitativa, a amostra deve ser coletada, diretamente, com o auxílio de um recipiente de boca larga, garrafa de profundidade, ou concentrada com rede de plâncton. A amostra deve ser acondicionada em um recipiente de polietileno denso (150-300 mL), preservada em formol, de forma que a concentração final corresponda a 2%-4% do volume total (BRASIL, 2016). Em laboratório, é efetuada a análise, a partir das observações em microscópio óptico, dos aspectos morfológicos das cianobactérias e dos táxons identificados, de acordo com a bibliografia pertinente para o grupo em questão. Os organismos foram identificados através de chaves de identificação específicas. FIGURA 28 – REDE COLETORA DE PLÂNCTON FONTE: <https://www.didaticasp.com.br/rede-de-fitoplancton-20-micras>; <https://www.resear- chgate.net/figure/Figura-98-Rede-coletora-de-plancton-e-seus-componentes_fig6_216014721>. Acesso em: 6 out. 2020. Legenda: A – Rede coletora de plâncton. B – Rede coletora de plâncton e de componentes. No caso da análise quantitativa, tal amostra deve ser coletada, diretamente, com o auxílio de um recipiente de boca larga na superfície e com garrafa para as profundidades (para mananciais de abastecimento, no ponto de captação). O acondicionamento deve ser em recipiente de vidro ou de plástico do “tipo âmbar” (150-300 mL), fixado com lugol acético (1%). Pode ser empregado, também, um recipiente de plástico denso, envolvido com papel-alumínio ou madeira, desde que evite a incidência de luz. Quanto ao transporte, caso mantido sob refrigeração, o lugol conserva melhor as características de preservação (BRASIL, 2016). TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 143 Em laboratório, é empregado o método de sedimentação em Câmara de Utermöhl, realizada uma subamostragem de volumes de 10, 5 ou de 2 mL. A câmara deve permanecer em local plano para fornecer distribuição homogênea, e em ambiente úmido, para evitar a evaporação durante o tempo de sedimentação. Nesse caso, é necessária a utilização de um microscópio invertido para a contagem (RAMOS; LIRA; LIRA, 2015). A contagem é realizada em campos por transecto, considerando o número de células de cada táxon, quando possível, ou o número de organismos, sendo este, posteriormente, convertido em um número de células a partir da média de células da população de cada táxon, previamente estabelecida. Os resultados são apresentados em células por mL de amostra (RAMOS; LIRA; LIRA, 2015). FIGURA 29 – REPRESENTAÇÃO DO PROCEDIMENTO DE SEDIMENTAÇÃO DE AMOSTRAS EM CÂMARA DE UTERMÖHL FONTE: <http://www.funasa.gov.br/site/wp-content/uploads/2013/05/Giulliari.pdf>. Acesso em: 6 out. 2020. 144 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Após a contagem de células, é efetuado um cálculo com base no procedimento a seguir: A conversão em células por mL (cél./mL ou cél.mL-1) foi desenvolvida a partir do cálculo do Fator (F), obtido pela fórmula a seguir: F = A/a/v: F = fator de conversão do número de células ou organismos contados por mL; A = área do fundo da cubeta; a = área contada (corresponde à área do campo objetiva x número de campos contados); v = volume de sedimentação (RAMOS; LIRA; LIRA, 2015, p. 3). Por exemplo, considerando, durante uma análise quantitativa, foram contadas 500 células de cianobactérias na amostra, em uma cubeta de volume de 10 mL, com uma objetiva (no microscópio) de aumento de 40X, analisado o total de 20 campos da objetiva (considerar A = 4,9 cm2 e área do campo da objetiva = 0,002 cm2). Organizando os dados: No caso, a contagem de cianobactérias está abaixo de 20.000 células/ ml. Caso estivesse acima desse valor, a Portaria n° 2.914/2011, do Ministério da Saúde, estabeleceria que fosse realizada a análise de cianotoxinas na água do manancial, no ponto de captação, com frequência semanal (BRASIL, 2011). 3.5 AVALIAÇÃO DE CRYPTOSPORIDIUM E DE GYARDIA DADO VALOR Área de Fundo (A) 4,9 cm2 Área de Campo da Objetiva 40X 0,002 cm2 Número de Campos Analisados 20 Área Contada (a) 0,04 cm2 Obs.: Este valor é obtido pela multiplicação da área de campo da objetiva pelo número de campos analisados. Volume Sedimentado (v) 10 mL Número de Células Contadas (ncélulas) 500 células CÁLCULOS Fator F Densidade CONCLUSÃO Há 6125 células de cianobactérias a cada 1 mL de amostra. TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 145 FIGURA 30 – OOCISTOS DE CRYPTOSPORIDIUM SP. E CISTOS DE GIARDIA LAMBLIA B FONTE: <encurtador.com.br/crtvE>; <encurtador.com.br/ijkAD>. Acesso em: 6 out.2020. Legenda: A – Oocistos de Cryptosporidium sp. B – Cistos de Giardia lamblia. Uma das principais características biológicas dos protozoários Cryptosporidium e Giardia é a acentuada resistência dos oocistos e dos cistos à desinfecção por cloro, cloramina e outros desinfectantes químicos empregados nos processos de tratamento da água (QUINTERO-BETANCOURT; ROSE, 2004 apud FRANCO; BRANCO; LEAL, 2012). Essa questão, aliada ao aspecto da exigência da legislação nacional a respeito do levantamento e da quantificação dos MO para laboratórios certificadores da potabilidade de água, torna os estudos importantes na verificação da qualidade d’água para consumo humano. Não há uma metodologia universalmente aceita para a avaliação de Cryptosporidium e de Giardia. Em 1997, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (USEPA) desen volveu o método1622 para análise de protozoários em águas. Foi aprimorado em 2005 e denominado de método 1623. A verificação de protozoários na água gera uma série de desa fios técnico- científicos, dado que as metodologias reconhecidas internacionalmente são de alta especificidade. A inserção desse tipo de metodologia na rotina de laborató- rios certificadores da potabilidade da água ainda é incipiente no país. Contudo, a legislação vigente (exige que sejam quantificados oocistos de Cryptosporidium e cistos de Giardia em associação com E. coli ou coliformes termotolerantes quando a média geo métrica anual desses últimos, nos pontos de captação, seja superior a 1.000 E.coli.100mL-1 (FRANCO; BRANCO; LEAL, 2012). Quando a média aritmética da concentração de Cryptosporidium spp. for maior ou igual a 3,0. L-1, nos pontos de captação de água, a turbidez do efluente filtrado por filtração rápida deverá ser menor ou igual a 9,3 uT (unidade de turbidez). Alternativamente, deve-se utilizar desinfecção, que, comprovadamente, alcance a mesma eficiência na remoção de oocistos (CEBALHOS; DINIZ, 2017). 146 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS QUADRO 8 – MÉTODO 1623 PARA ANÁLISE DE CRYPTOSPORIDIUM E DE GIARDIA Volume da amostra Tipo de filtro Eluição Centrifugação/ Concentração Purificação Visualização Água bruta: 10 litros. Água tratada: até 1000 litros. Cápsulas de filtração; porosidade absoluta de 1,2 µm (micrômetros). Adição de 600 mL de solução PBST 1% (2 x). A uma velocidade de 1.050 x g (força g), sendo, o volume final, reconstituído a 10 mL. Separação Imunomagnética (IMS). Reação direta de imunofluorescência, teste confirmatório da morfologia com DAPI* e microscopia de interferência diferencial. FONTE: Adaptado de Connel et al. (2000) apud Franco, Branco e Leal (2012) DAPI = 4’,6’,diamidino-2-fenilindol. Legenda: Solução PBST: solução-tampão salina-fosfato com Tween-20. É uma solução- tampão comumente utilizada na bioquímica. Shaker: espécie de “agitador” de laboratório. O método apresenta as etapas: filtração, eluição (espécie de diluição), concentração, purificação, separação imunomagnética, detecção, quantifi cação, coloração – DAPI e imunofluorescência. A separação imunomagnética (IMS) consiste na separação dos oocistos da matéria orgânica da água com uso de uma barra magné tica, a qual provê melhor e mais purificação da amostra. O método mostrou acurácia na concentração, identificação e quantificação dos oocistos e dos cistos de protozoários (McCUIN; CLANCY, 2002 apud CEBALHOS; DINIZ, 2017). TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 147 FIGURA 31 – DIAGRAMA DO MÉTODO 1623 DA USEPA/IMS FONTE: <http://www.smarh.eng.ufmg.br/defesas/649M.PDF>. Acesso em: 9 maio 2020. 1- Coleta da amostra: 10L água bruta em galão de polietileno previamente homogenezado com solução PBST 1% 2a- Filtração em bomba peristáltica 4L/s: módulo de filtro em espuma FILTA-MAX) 2b- Retenção do material particulado nos discos de espuma 3a- Expansão dos discos de espuma para promover o desprendimento do material retido3b- Eluição das amostras em Stomacher. Adição de de 600 mL de solução PBST (2x)e agitação durante 5 min. (cada vez) 4a- Transferência da amostra eluída para os tubos de centrífuga 5a- Separação Imunomagnetica. Ressuspensão do pellet com uso do vortex, transferência da amostra para o tubo de lado chato e posterior adição do reagente imunoenzimático Sistema Dynal/Biobeads4b- Concentração das amostras: 15 min centrifugação a 15000 e 2700rpm 4c- Obtenção do pellet final (0,2-0,4 mL) 5d- Etapa de dissociação térmica a 80°C durante 10 min. Nessa etapa o conjugado - Biobeads-(oo) cistos - se desprende 5c- Tubo de lado chato colocado numa parede imantada e com a rotação manual de 90° durante 2 min é promovido o arraste do conjugado - Biobeads-(oo) cistos - para a parede do tubo. Após isso, o sobrenadante é descartado 5b- Rotação a 18rpm durante 1 hora para promoção da reação imunoezimática (os anticorpos presentes no kit Biobeads vão reagir com os antígenos contidos na amostra- oocistos de Cryptosporidiume cistos de Gardia) 5e- Amostra transferida para um tudo eppendorf e novamente colocada em uma parede imantada, dessa vez somente os Biobeads serão arrastados durante rotação manual de 360° por 1 minuto, deixando, assim os (oo) cistos livres na amostra 6a- Amostra com os (oo) cistos transferida para os poços das lâminas juntamente com os reagentes do kit Merifluor que correspondem à etapa de Microscopia por Epifluorescência 6b- Após coloração dos (oo) cistos, a lâmina é selada e levada ao microscópio óptico para quantificação 148 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Legenda: (2a e 2b) – filtração; (3a e 3b) – eluição; (4a e 4b) – concentração; (5a, 5b, 5c, 5d e 5e) – separação Imunomagnética; (6a e 6b) – detecção e quantificação. Todo o procedimento de verificação da presença e da quantificação desses MO em amostras de água é meticuloso, exigindo uma equipe técnica de laboratório altamente especializada. A seguir, você poderá acessar um resumo esquemático de todo o procedimento de análise fundamentado no método 1623: https://www.scielo.br/pdf/esa/ v22n1/1809-4457-esa-S1413_41522016143529.pdf. Conheça, também, o mecanismo de funcionamento da microscopia de interferências diferencial em https://www.youtube.com/ watch?v=Oipc5BgkrRc. A partir dos seis minutos e 14 segundos, é fornecida a explicação do mecanismo. DICAS Após a análise em microscópio (microscopia de interferência diferencial), o cálculo do número médio de cistos e de oocistos por litro (L) é realizado, de acordo com a equação descrita por Breternitz (2018): Sendo: F = fração do pellet purificado por IMS; R = fração de amostra analisada no microscópio; V = volume de amostra filtrada (L). Os resultados são expressos em número de cistos de Giardia e de oocistos de Cryptosporidium/L. Apesar das restrições e das discussões acerca do método 1623, é uma ferramenta adequada para a detecção de protozoários em amostras de água. Para a implementação, é necessária uma boa experiência dos analistas, além de consideráveis investimentos financeiros (FRANCO; BRANCO; LEAL, 2012). Já tivemos contato com algumas metodologias utilizadas para a análise microbiológica da água. Na Unidade 3, estudaremos a questão da microbiologia aplicada aos processos de tratamento de efluentes e nos aprofundaremos na legislação inerente à microbiologia ambiental. Seguimos em frente! TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 149 LEITURA COMPLEMENTAR DESAFIOS NO COMBATE À GIARDÍASE Pesquisa identifica, em humanos, tipo de giárdia, até então associada a animais. Especialistas alertam para a importância do saneamento e do tratamento adequado Um estudo realizado por pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), com 89 crianças menores de quatro anos, frequentadoras de uma creche em uma comunidade carioca, identificou que 44 delas, quase 50% do total, estavam infectadas pelo parasito intestinal Giardia lamblia. Esse protozoáriopode prejudicar o desenvolvimento das crianças e levar à desnutrição infantil, nos casos mais graves. Os cientistas do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisas Médicas do IOC, que conduziram a investigação, realizaram a caracterização molecular dos patógenos. Verificaram que 29 crianças apresentaram infecção por parasitos giárdia do genótipo A, o mais comum em casos humanos no Rio de Janeiro, e 15 revelaram presença do genótipo E, que foi considerado, por muito tempo, o causador de infecções unicamente em animais de produção, como cavalos, bois e porcos. Publicado na revista científica ‘The Journal of Infectious Diseases’, o estudo teve colaboração da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e foi apoiado pelo programa Brasil sem Miséria. ALIANDO DIFERENTES MÉTODOS DE ANÁLISE, O ESTUDO CONTRIBUI PARA CONFIRMAR O POTENCIAL DE INFECÇÃO HUMANA POR PARASITOS GIÁRDIA DO GENÓTIPO E 150 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS De acordo com os especialistas, devido à falta de saneamento básico na comunidade, uma alta taxa da parasitose intestinal já era esperada, porém, é a primeira vez que a infecção humana pelo genótipo E é identificada em um número significativo de pacientes. “Com poucas ocorrências relatadas na literatura científica, que já havia registrado casos isolados, ainda existia dúvida acerca do potencial de infecção do genótipo E em humanos. O percentual expressivo de casos, nesse trabalho, foi uma surpresa, e contribui para confirmar essa hipótese”, afirma Maria Fantinatti, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Medicina Tropical do IOC e primeira autora do artigo. Coordenadora do trabalho, a pesquisadora Alda Maria Da-Cruz, chefe do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisas Médicas do IOC, diz que o achado levanta diversas questões, especialmente, relativas ao ciclo de transmissão da giárdia, já que outros animais, além de gatos e de cães, podem atuar como fontes de contaminação, aumentando a possibilidade de infecção. “É possível que o genótipo E esteja se disseminando em humanos a partir do contato com as fezes de outras pessoas infectadas. No entanto, também é preciso considerar a possibilidade de que as fezes de animais tenham um papel importante na disseminação da doença”, pondera a pesquisadora. IMPORTÂNCIA DO SANEAMENTO Amostras da água que abastece a creche foram analisadas na pesquisa, e 35 dos 36 educadores também passaram por exames de fezes. Considerando que não foi detectada contaminação, e que todos os funcionários apresentaram resultado negativo para enteroparasitos, os pesquisadores avaliam que as crianças possam ter adquirido a giardíase na comunidade onde moram. No local, a coleta de esgoto e a água tratada não chegam a todas as casas. Nessas condições, os cistos de giárdia, que são liberados nas fezes dos pacientes e de animais infectados, podem contaminar as fontes de abastecimento de água, facilitando a disseminação do protozoário. Além de permanecerem viáveis no ambiente por meses, os cistos do parasito são resistentes ao cloro. “A infecção acontece quando as pessoas ingerem os cistos da giárdia. Uma vez que o tratamento da água se torna difícil em determinadas localidades e o uso de cloro não é suficiente para eliminar o parasito, o consumo de água contaminada constitui uma importante via de transmissão. O contato com superfícies contaminadas e o hábito comum entre as crianças em idade pré-escolar, de colocar as mãos e os objetos na boca, também podem favorecer a propagação do agravo”, explica Fantinatti. “Geralmente, as crianças de menor idade são as mais afetadas, pois a imunidade ainda se encontra pouco estimulada, impedindo o controle da infecção”, acrescenta. TÓPICO 2 — MICROBIOLOGIA DA ÁGUA 151 ASSIM COMO O DIAGNÓSTICO E O TRATAMENTO, O SANEAMENTO É APONTADO, POR ALDA MARIA DA-CRUZ E MARIA FANTINATTI, COMO FUNDAMENTAL PARA INTERROMPER O CICLO DE TRANSMISSÃO DA GIARDÍASE Em muitos casos, a infecção é assintomática. Quando ocorrem sintomas, as manifestações mais frequentes são diarreia e dor abdominal, comuns em diversas enfermidades. Já nos casos de infecções graves, o quadro pode evoluir para desnutrição infantil, com impacto direto no desenvolvimento das crianças. O diagnóstico é feito através do exame parasitológico de fezes, com a detecção dos cistos de giárdia nas amostras. Segundo Alda, esse é um dos desafios no enfrentamento do agravo. Se o exame não for solicitado, os pacientes assintomáticos podem ficar sem tratamento. Outra questão é a conscientização do uso indiscriminado de vermífugos, que não possuem ação contra giárdia. “Existe a impressão de que as parasitoses intestinais são uma questão já resolvida no Brasil ou que não afetam os centros urbanos, mas elas permanecem como um importante problema de saúde pública”, ressalta a médica, especialista em doenças infecciosas e parasitárias, lembrando que, além do tratamento, o saneamento é fundamental para prevenir a reinfecção. OS GENÓTIPOS A classificação dos diferentes genótipos de giárdia é feita a partir da análise de regiões específicas do DNA do parasito. Dentre as oito variedades, apenas A e B são tradicionalmente conhecidas por infectar seres humanos e alguns animais, incluindo cães e gatos. Os demais genótipos são encontrados, unicamente, em determinados hospedeiros: C e D em cães domésticos e selvagens, F em gatos, G em ratos e camundongos, e H em focas. Com relação ao genótipo E, os achados recentes 152 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS em diferentes espécies, incluindo coelhos e primatas, além de seres humanos, apontam para a hipótese de que os avanços nas técnicas de genotipagem estejam permitindo a identificação de um fenômeno que ocorria despercebidamente no passado. Por outro lado, segundo as especialistas, é preciso, também, considerar a possibilidade de adaptação da variedade de giárdia. “Uma vez que o contato com fezes de animais, como cavalos, bois e porcos, ocorre mais frequentemente, é possível que os parasitos do genótipo E tenham se adaptado, tornando-se capazes de infectar os pacientes e outros hospedeiros”, comenta Alda. PRÓXIMOS PASSOS Os cientistas planejam avaliar quais as vias mais comuns de transmissão e a disseminação de giárdia do genótipo E. As análises devem incluir amostras de fezes de animais, solo, água e alimentos produzidos e consumidos na comunidade estudada. O trabalho também deve ser expandido para outros bairros do Rio. Reportagem: Maíra Menezes Edição: Cristiane Albuquerque e Vinícius Ferreira 02/01/2017 FONTE: <http://www.fiocruz.br/ioc/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=2699&sid=32&tpl=printerview>. Acesso em: 9 maio 2020. 153 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • Diversos MO não são naturalmente encontrados nos ambientes aquáticos e são transportados para rios e para demais ambientes hídricos por esgotos ou por águas superficiais, geralmente, com elevado potencial de causar patologias à espécie humana e a outros animais. • O saneamento básico possui um papel essencial no controle e na disseminação dessas doenças no ambiente, reduzindo os riscos de transmissão. • Fezes humanas e resíduos sólidos contaminados são os principais veículos de transmissão de doenças infecciosas propagadas pela água e as principais causas de mortalidade em crianças com idade inferior a dois anos. • Ao tratarmos do Brasil, nosso país não é diferente, visto que a porcentagem da população com acesso à rede de água e à coleta de esgoto é de 83,6% e de 53,15%, respectivamente. • Florações extensas das cianobactérias podem ser prejudiciais aos animais e, inclusive, à espécie humana, especialmente, quando ocorrem em reservatórios e em rios de abastecimento humano. • A eutrofização artificial é de origem humana e consequência do emprego extenso de fertilizantes na agricultura, contaminando rios, lagos e mananciais. É gerada da descarga de águas residuárias (esgotos) industriais e domésticas semnenhum tratamento, em virtude da elevada taxa de urbanização e da falta de saneamento básico. • Os “vírus entéricos” têm essa denominação pois esta representa todos os grupos virais que residem no trato gastrointestinal humano e que, após a transmissão fecal-oral, podem gerar infecções em indivíduos susceptíveis. • Muitas espécies de bactérias podem ser empregadas como indicadores de qualidade da água, a exemplo da bactéria Escherichia coli. Essa espécie integra o grupo conhecido como coliformes, formado por bactérias associadas a processos de decomposição, com fermentação da lactose e consequente produção de ácidos orgânicos e de gás carbônico. • Existem organismos que recebem a denominação de bioindicadores, pois apresentam a capacidade de inferir sobre a qualidade ambiental. São de fácil percepção e dão respostas pontuais, de acordo com a presença ou a ausência em uma determinada área ou local. 154 • A espécie A. fumigatus é um dos mais importantes fungos patogênicos que causam infecções em pacientes imunocomprometidos (ex.: portadores de HIV) em hospitais. Devido à frequência crescente de pacientes imunodeprimidos, os hospitais estão enfrentando um grande desafio em respeito a infecções fúngicas oportunistas. • A cryptosporidiose e giardíase se caracterizam por causar, nos indivíduos acometidos, quadros de diarreia de diversa severidade, causando sérias morbidades nos hospedeiros, principalmente, em indivíduos imunocomprometidos. • A esquistossomose é endêmica em vasta extensão do território nacional, considerada um grave problema de saúde pública no Brasil porque acomete milhões de pessoas, provocando um número expressivo de formas graves e óbitos. • Para se diferenciar, de modo seguro e rápido, E. coli a partir dos tubos positivos de EC, usa-se o meio cromogênico EC-MUG. Esse meio é empregado para a confirmação de E. coli pela produção de fluorescência quando se ilumina com luz UV (λ 366 nm). • O método Colilert® se trata de um kit desenvolvido pela empresa IDEXX, de utilização fácil e prática, especialmente, quando da análise de numerosas amostras diariamente. • A realização da contagem de bactérias heterotróficas, definidas, genericamente, como MO, que necessitam de carbono orgânico como fonte de nutrientes, provê informações a respeito da qualidade bacteriológica da água de modo amplo. • Não há uma metodologia universalmente aceita para a avaliação de Cryptosporidium e de Giardia. Em 1997, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (USEPA) desen volveu o método1622 para a análise de protozoários em águas. Foi aprimorado em 2005 e denominado de método 1623. 155 1 (IFAP - Adaptado) Existem diversos meios de cultura que podem ser empregados para diversos tipos de análise microbiológica. Um desses meios de cultura é o ágar chocolate. Pesquise sobre este meio de cultura e assinale a alternativa correta. a) ( ) Apenas uma espécie de bactéria cresce nesse meio de cultura. b) ( ) É um meio de cultura que facilita o crescimento de vários tipos de microrganismos. c) (X) Pode-se adicionar sangue de cavalo, de coelho, ou de boi à composição desse meio de cultura. d) ( ) Apesar de receber o nome chocolate, esse meio de cultura apresenta uma coloração verde. 2 Quando se realiza uma análise de água, devem ser avaliados diversos parâmetros, além dos estudos microbiológicos. Além disso, conforme o objetivo do estudo, inúmeras variáveis são estudadas (pH, temperatura, turbidez etc.). Comumente, costuma-se empregar os chamados índices de qualidade da água, que fornecem um resultado da condição de determinado corpo hídrico. Muito utilizado no Brasil, o IQA (Índice de Qualidade da Água) é um desses indicadores qualitativos. Dessa forma, quais os parâmetros/variáveis considerados para o cálculo do índice? 3 Em um manancial da cidade “X”, foi detectada, em 2019, uma média geométrica anual maior ou igual a 2500 Escherichia coli/100mL. A partir desse resultado, qual o procedimento a ser realizado, conforme a Portaria no 2.914/2011, do Ministério da Saúde? a) ( ) Monitoramento de cistos de Giardia spp e oocistos de Cryptosporidium spp. b) ( ) Monitoramento das espécies de macroinvertebrados bentônicos. c) ( ) Levantamento das espécies de macrófitas aquáticas do local. d) ( ) Análise genética dos peixes encontrados no manancial. AUTOATIVIDADE 156 157 UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO TÓPICO 3 — MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR Na primeira parte deste tópico, estudaremos os principais grupos de MO existentes no solo e a importância destes enquanto bioindicadores de qualidade do ambiente. Na sequência, veremos algumas metodologias utilizadas em análises microbiológicas do solo e finalidades. Posteriormente, evidenciaremos a importância do estudo da microbiologia do ar, especialmente, em ambientes internos, além de conhecer metodologias empregadas no estudo de MO presentes no ar. Bons estudos! 2 MICROBIOLOGIA DO SOLO O solo é considerado um dos mais importantes reservatórios de biodiversidade do planeta terra, em virtude da enorme variedade de organismos vivos que habitam esse ambiente. Os organismos do solo são classificados em microrganismos (bactérias, fungos, algas e protozoários) e macrorganismos (fauna do solo), do qual fazem parte, por exemplo, nematoides, minhocas e cupins. Esses dois grupos de organismos, em especial, os microrganismos, são responsáveis pela realização de processos essenciais à manutenção da vida na Terra (BIOLOGIA DO SOLO, 2020). 2.1 COMPOSIÇÃO DA MICROBIOTA EXISTENTE NO SOLO Fungos, bactérias e minhocas (Filo Annelida) são os grupos que possuem grande biomassa. Em relação à biomassa, os organismos do solo podem ultrapassar mais de 10 toneladas por hectare, quantidade que equivale ou, até maior, do que as melhores produções agrícolas (MOREIRA; MOREIRA, 2006). 158 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS TABELA 3 – TAMANHO, DENSIDADE E BIOMASSA DOS PRINCIPAIS GRUPOS DE ORGANISMOS DO SOLO POR M2 FONTE: Adaptada de Metting-Jr. (1992) e Decaens et al. (1994) apud Moreira e Moreira (2006) Legenda: *Baseado na largura do corpo; **Ordem de grandeza; ***Inclui actinomicetos e cianobactérias. A diversidade biológica é definida enquanto variabilidade existente entre os organismos vivos. Usualmente, é atribuída à diversidade de espécies. Contudo, pode ser mensurada em diversos níveis taxonômicos (família, gênero, espécie etc.) ou, ainda, em relação a determinadas características genéticas ou fenotípicas (morfológicas, bioquímicas, fisiológicas). A diversidade funcional de MO do solo é elevada, ocorrendo, até mesmo, entre espécies do mesmo gênero (MOREIRA; MOREIRA, 2006). A maioria das bactérias presentes no solo é aeróbia e heterotrófica, ou seja, necessita do O2 para o crescimento e de uma fonte de carbono orgânico para a nutrição. No solo, existem, também, as bactérias, que conseguem viver na presença e/ou na ausência de O2 (p.ex.: Pseudomonas aeruginosa). Além dessas, existem aquelas que crescem somente na ausência de O2, como as bactérias do gênero Clostridium (BIOLOGIA DO SOLO, 2020). Esses MO exercem uma importante função na decomposição da matéria orgânica, na ciclagem de nutrientes, na fixação biológica de nitrogênio e no desenvolvimento de patologias. Além disso, também são bioindicadoras da qualidade do solo (DIONÍSIO et al., 2016). Conforme demonstrado, a população estimada de bactérias no solo é de 1014 organismos por grama de solo. Outros autores apontam um valor de 108 a 109. Contudo, esse número pode variar, conforme a metodologia utilizada para a contagem (MOREIRA; MOREIRA, 2006). TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 159 As bactérias que apresentam importância agrícola (que fixam nitrogênio atmosférico) podem ser reunidas em três categorias (DIONÍSIO et al., 2016): • Simbiontes (nodulam leguminosas): Rhizobium e Bradyrhizobium. • Associativas (vivem endofiticamente ou na rizosfera de gramíneas):Azospirillum, Herbaspirillum e Gluconobacter. • De vida livre: Beijerinkia, Derxia e Azotomonas. Bactérias endofíticas são MO que habitam o interior da planta sem causar danos aparentes ao hospedeiro e exercem vários efeitos benéficos, como a supressão de doenças e a promoção do crescimento das plantas. A simbiose é restrita às leguminosas e se caracteriza pela formação de estruturas especializadas nas raízes, chamadas de nódulos, nos quais ocorre o processo de fixação biológica de nitrogênio (EMBRAPA, 2020). NOTA Entretanto, os gêneros de grande ocorrência no solo são: Pseudomonas, Artrhobacter, Achromobacter, Flavobacterium, Xanthomonas e Micrococcus (EWEIS et al., 1999 apud DIONÍSIO et al., 2016). Com relação aos fungos, estima-se que somente 5% desses organismos existentes nos solos tenham sido descritos. Muito progresso tem sido feito em relação à catalogação de fungos superiores, que formam sistemas de reprodução macroscópicos (cogumelos). Já os micorrízicos, que formam relações mutualistas com plantas, foram pouco estudados. Os fungos micorrízicos arbusculares são comuns em todo o mundo, porém, apenas as espécies associadas a plantas de interesse agrícola foram estudadas de maneira adequada. Já os fungos ectomicorrízicos apresentam um grau de especificidade superior aos arbusculares (BIODIVERSIDADE DOS SOLOS, 1998). Os fungos apresentam importância fundamental nos diversos ambientes, estando entre os principais responsáveis pela ciclagem de nutrientes, sobretudo, nos ecossistemas florestais. O solo é considerado um dos principais “habitats” para esses organismos, e os filamentosos e as leveduras representam os maiores contribuintes da biomassa microbiana do solo, constituindo um grupo de indivíduos organotróficos responsáveis, primariamente, pela decomposição de compostos orgânicos (HYDE 1997 apud MAIA et al., 2020). Os organismos são encontrados no solo, em comunidades, variando de 10 a 1000 microrganismos por grama de solo, assim como são predominantes em 26 solos ácidos, nos quais sofrem menor competição, porém, o valor ótimo de pH varia, conforme a espécie (BRANDÃO, 1992 apud COSTA, 2015). 160 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS O aporte de matéria orgânica pode ser considerado um dos principais elementos para a manutenção da comunidade de fungos no solo, no que tange à formação dos macroagregados, visto que esses microrganismos produzem substâncias diretamente envolvidas na estabilização dos agregados, e agem diretamente pelo entrelaçamento de hifas nas partículas do solo (MILLER; JASTROW, 1990 apud COSTA, 2015). FIGURA 32 – AGREGAÇÃO DO SOLO FONTE: <https://tinyurl.com/y3lpee29>. Acesso em: 4 maio 2020. HIFA DE FUNGO SILTE ARGILA AREIA ACTINOMICETO MATÉRIA ORGÂNICA BACTÉRIA Legenda: Durante o processo de agregação, as partículas minerais do solo (silte e areia fina) são cobertas com resíduos decompostos de plantas ou de animais e outros materiais orgânicos. As hifas de fungos micorrízicos arbusculares (FMA) também possuem importância na formação de agregados no solo. De acordo com Garret (1963) apud Costa (2015), os fungos do solo podem ser agrupados na seguinte classificação ecológica: TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 161 QUADRO 9 – FUNGOS EXISTENTES NO SOLO Gênero ou Divisão (Filo) ou Ordem Classificação ecológica Definição Bloteus, Amanita, Telephora, Pisolithus, Rhizoctonia, Glomuse, Gigaspora Micorrízicos Micorriza: associação simbiótica mutualística entre raízes de plantas e de fungos do solo. Armillara, Fomes e Ophiobolus Parasitas Parasitismo: relação desarmônica, na qual ocorrem prejuízos de diversos níveis ao hospedeiro, podendo chegar à morte. Phytium, Rhizoctonia e Fusarium Saprófitas Alimentam-se de matéria orgânica no processo de decomposição. Zigomicetos e Deuteromicetos Saprófitas obrigatórios Fungos que vivem, exclusivamente, em matéria orgânica morta, podendo parasitar organismos vivos. Trichoderma e Penicillium Celulolíticos Capazes de degradar celulose. Basidiomicetos Lignolíticos Digerem madeira e outros materiais lenhosos. Pilobolus, Ascodesmus, Sordaria e Coprinus Coprófilos Adaptados a viver e a se alimentar de excrementos de herbívoros. Ordens Zoophagales (Oomicetos) e Moniliales (Deuteromicetos) Predatórios Capturam e parasitam amebas e nematoides. FONTE: A autora Legenda: Os nomes dos gêneros de fungos estão diferenciados em itálico. Cabe salientar que os fungos, com as bactérias heterotróficas, são os principais decompositores da biosfera, degradando os produtos orgânicos e reciclando carbono, nitrogênio e outros compostos do solo e do ar. Muitos fungos são economicamente importantes para o homem, como destruidores de alimentos estocados e outros materiais orgânicos (LEITE, 2008 apud MEIRA, 2009). Os fungos, com as bactérias, são MO fundamentais na degradação de resíduos sólidos urbanos (RSU). Em compostos de RSU, têm sido encontrados fungos do gênero Aspergillus, inclusive, da espécie A. fumigatus, que é responsável por infecções graves em seres humanos e em animais. Como os fungos são microrganismos formadores de esporos, a presença, ao longo do processo de degradação de RSU em aterros, sugere que possam permanecer, por muito tempo, no ambiente do aterro, mesmo após a estabilização do material orgânico (ALCÂNTARA, 2007 apud MEIRA, 2009). Faz-se necessário o estudo da ação dos fungos na massa de resíduos, visto que esses MO são os primeiros degradadores a surgir no processo de biodegradação. São eles que devem “preparar o terreno”, de forma que os outros 162 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS MO possam atuar. Isso graças ao poderoso arsenal enzimático, que torna os fungos capazes de degradar macromoléculas, ou seja, de transformar produtos complexos em produtos menos complexos ou mais fáceis de assimilação (ALMEIDA, 2015). Em aterros de RSU, as bactérias sempre apresentaram destaque, o que gerou pouca literatura disponível, sobretudo, na identificação de fungos. A identificação de organismos fúngicos pode gerar dados científicos diversos, inclusive, auxiliando no melhoramento de processos metabólicos. Apesar da crescente descoberta no que se refere à identificação de fungos e ao papel ou nicho ecológico, existe uma grande lacuna no conhecimento, sobretudo, na eficiência desses organismos em RSU (ALMEIDA, 2015). Na sequência, veremos algumas metodologias destinadas ao estudo de fungos (microscópicos) e bactérias presentes no solo. 2.2 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DO SOLO Quando falamos da qualidade do solo, é necessário o entendimento de que esta está relacionada a reações biológicas e bioquímicas catalisadas pelos MO. Essas reações são responsáveis pela decomposição de resíduos de plantas, animais, urbanos e industriais, pela ciclagem biogeoquímica (incluindo a fixação de N2), pela formação de agregados do solo e pela taxa de decomposição de materiais orgânicos (ELSAS, 1997 apud SILVERIA; FREITAS, 2007). Por isso, em virtude das características, os MO do solo são considerados indicadores sensíveis na avaliação do impacto humano sobre os processos biológicos do solo (DICK, 1994; DORAN; PARKINSON, 1994; TURCO et al., 1994 apud SILVEIRA; FREITAS, 2007). O emprego de métodos microbiológicos para indicar a qualidade do solo vem sendo pesquisado, pois os MO mantêm uma íntima relação com as propriedades químicas e físicas do solo, e porque são responsáveis por inúmeros processos biológicos e bioquímicos, sendo sensíveis às alterações de origens naturais e antropogênicas que ocorrem no solo (SILVERIA; FREITAS, 2007). Os parâmetros microbianos sensíveis às variações provocadas no solo pelos elementos poluidores são divididos em três grupos (BROOKES, 1995; OBBARD, 2001 apud FORTES NETO; FERNANDES; JANEL, 2007): TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 163 • Aquele que mede a atividade microbiana global. • Aquele quedetermina o tamanho da população de um organismo ou da comunidade de um grupo funcional. • Aquele que correlaciona a atividade com a comunidade microbiana predominante no solo. Um dos métodos microbiológicos mais empregados em avaliações de impacto ambiental sobre a microbiota do solo é a quantificação da biomassa microbiana do solo. É considerada um agente de transformação, pelo qual passam todos os materiais orgânicos adicionados ao solo, e um reservatório de nutrientes, sendo, o estudo, de grande importância em sistemas de manejo do solo, uma vez que influi na dinâmica dos nutrientes e na fertilidade do solo (BROOKES, 1995 apud FORTES NETO; FERNANDES; JANEL, 2007). QUADRO 10 – MÉTODOS DE DETERMINAÇÃO DE BIOMASSA MICROBIANA DO SOLO Método Especificações Microscopia direta Pode prover informações úteis da natureza e da composição da microbiota do solo. Na microscopia direta, as biomassas de bactérias e fungos devem ser analisadas separadamente. Clorofórmio-fumigação- incubação (CFI) Possibilita a obtenção de resultados referentes à taxa de respiração do solo e, ao mesmo tempo, de estimar a biomassa microbiana pela diferença de emissão de CO2 entre amostras de solo não fumigadas e fumigadas. Clorofórmio-fumigação- extração (CFE) Mais indicado em virtude de que, o carbono, proveniente da comunidade microbiana morta, é determinado por extração química. FONTE: Jenkinson e Powlson (1976) e Brookes e McGrath (1984) apud Fortes Neto, Fernandes e Janel (2007) e Silva (2014) Legenda: Os métodos CFI e CFE são baseados na esterilização parcial (fumigação) das amostras de solo com clorofórmio. 164 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS FIGURA 33 – MÉTODOS DE CFI E CFC FONTE: Adaptada de Silva (2014) Legenda: A – Método CFI. B – Método CFE. Os valores de carbono de biomassa microbiana, obtidos pelos métodos descritos, são expressos em mgC-1 solo (mgC = miligrama de carbono). Outro método, que, inclusive, complementa as análises de CFI e de CFE, trata-se da respirometria. Pelo fato de não ser possível mensurar as taxas de respiração no interior das células, são empregadas as medidas de volume de oxigênio consumido ou de CO2 produzido (BERNARDES; SOARES, 2005). É uma metodologia que determina a quantidade de carbono liberado na forma de CO2, resultante da decomposição da matéria orgânica pela comunidade microbiana quimiorganotrófica aeróbia do solo. Possibilita que seja quantificado o carbono que está sendo degradado no solo, além de verificar se as condições climáticas, o manejo do solo e a presença de elementos poluentes estão ou não comprometendo a atividade microbiana durante a decomposição e a mineralização do carbono no solo (FORTES NETO; FERNANDES; JANEL, 2007). A liberação de CO2 é um método que, quando realizado em condições controladas de umidade (40-50% da capacidade de campo) e de temperatura (15-25oC), provê resultados confiáveis acerca da poluição do solo (JENKINSON; POWLSON, 1976 apud FORTES NETO; FERNANDES; JANEL, 2007). Do mesmo modo que outras atividades metabólicas, a respiração depende do estado fisiológico das células e é influenciada por diferentes fatores, como umidade, temperatura e disponibilidade de nutrientes no solo. O ensaio de respirometria apresenta, como finalidade principal, estimar o período de tempo necessário à estabilização de um resíduo orgânico inserido no solo, além de obter as taxas de aplicação mais convenientes e de detectar uma possível toxicidade aos MO do solo em virtude da presença de determinados elementos no resíduo (NUVOLARI, 1996 apud COSTA, 2009). Uma das técnicas de respirometria que tem se destacado se trata da liberação de CO2 através da captura da substância por composto alcalino (geralmente, hidróxido de potássio – KOH ou hidróxido de sódio – NaOH), com a posterior precipitação na forma de TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 165 carbonato de bário (BaCO3), por meio da adição de solução saturada de cloreto de bário (BACl2). A NaOH excedente é, então, titulada com ácido clorídrico (HCl), possibilitando o cálculo da produção de gás carbônico (MARIANI, 2005 apud COSTA, 2009). Observe, a seguir, um respirômetro, para mensurar a produção de CO2 em solo. FIGURA 34 – FOTOGRAFIA DE UM RESPIRÔMETRO DE BARTHA FONTE: Adaptada de Costa (2009) A respirometria, enquanto metodologia fundamentada em respostas biológicas aos componentes das águas residuárias ou resíduos sólidos a determinadas condições do ambiente, pode ser utilizada no projeto, no controle operacional e na modelagem de unidades de tratamento (BERNARDES; SOARES, 2005). No caso da decomposição de resíduos orgânicos, uma alta taxa de respiração pode ser interpretada como uma característica desejável, ao se considerar que a decomposição dos resíduos orgânicos deve disponibilizar nutrientes para as plantas (p. ex.: no caso da compostagem) (JUNIOR; MENDES, 2007). Os resultados do teste de respirometria são expressos em E CO2 (%), em função de determinado tempo de estudo. 166 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Com relação à microscopia direta, uma diluição da amostra do solo é espalhada em camada fina sobre uma lâmina de vidro. Posteriormente à fixação e à coloração do esfregaço, os MO podem ser contados pelo exame microscópico. Como o princípio básico da metodologia é efetuar uma estimativa da biomassa microbiana por meio do biovolume dos MO, existe a necessidade da estimativa da densidade específica, além do conteúdo de umidade dos microrganismos, para a conversão de biovolume à biomassa (ALEXANDER, 1977; GRISI; GRAY, 1985; DE-POLLI; GUERRA, 1999 apud CARDOSO, 2004). Embora o método possa ser empregado para estimar a população microbiana total, técnicas de colorações especiais são necessárias para discriminar microrganismos vivos de mortos, pois, muitas vezes, é difícil distinguir partículas microscópicas do solo de células microbianas (CASIDA, 1976; GRISI; GRAY, 1985; SCHEU; PARKINSON, 1994 apud CARDOSO, 2004). Na microscopia direta, os MO podem ser corados por várias formas e observados por diferentes técnicas ópticas. Quando são solos bem drenados, o método é comumente utilizado como padrão, sendo, a expectativa geral, de que todos os demais métodos apresentem boa correlação (SEGANFREDO, 1999 apud CARDOSO, 2004). A microscopia direta é muito utilizada para fungos micorrízicos arbusculares (FMA). Aspectos ligados ao tamanho do esporo, forma, coloração, ornamentação, número de paredes internas e externas e reação ao reagente de Melzer podem ser utilizados na identificação de tipos morfológicos presentes no solo. Além disso, é um método simples, rápido e econômico, e envolve equipamentos simples, como o microscópio óptico ou o estereomicroscópio (SILVEIRA; FREITAS, 2007). Uma importante aplicação desse tipo de estudo se trata da avaliação da sensibilidade da diversidade de FMA em indicar a reabilitação de solos minerados (SILVEIRA; FREITAS, 2007). FIGURA 35 – ESTRUTURAS DE FMA FONTE: <https://www.agrolink.com.br/fertilizantes/nutricao-via-raizes---absorcao- radicular_361459.html>. Acesso em: 6 maio 2020. Legenda: Esquema que demonstra as estruturas dos FMA (hifas, vesículas e arbúsculos). TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 167 3 MICROBIOLOGIA DO AR A qualidade do ar interno se tornou uma importante preocupação de saúde pública, em virtude de a maioria das pessoas passarem mais de 90% do tempo em ambientes fechados (casas, escritórios e escolas). O ar, em ambientes internos, pode ser poluído por inúmeros compostos, dentre estes, os MO (bactérias e fungos) compõem o grupo mais importante. É estimado que um terço das reclamações da qualidade do ar interno (do inglês, indoor air quality – IAQ) se deve à contaminação microbiológica (POPE et al., 1993 apud NARUKA; GAUR, 2013). A exposição a esses contaminantes microbiológicos pode causar alergias e doenças respiratórias. Inclusive, diversaspesquisas relataram a presença dos contaminantes em diferentes ambientes internos, como hospitais (DOUWES et al., 2003 apud NARUKA; GAUR, 2013). Ambientes aclimatados artificialmente apresentam uma infinidade de componentes químicos (substâncias tóxicas, carcinogênicas, radioativas) e biológicos (microrganismos patogênicos) emitidos por diversas fontes, e que, dependendo das condições físicas (umidade do ar, temperatura do ar, ventilação inadequada) do ambiente, podem interagir entre si (LEE, 2006 apud MORAIS et al., 2010). O ar dos ambientes internos pode ser mais poluente do que o ar exterior (LEE, 2006 apud MORAIS et al., 2020). O fenômeno de recirculação de ar é responsável pelo aumento de microrganismos na ordem de 1.000 a 100.000 vezes em relação ao ar externo. Ademais, a limpeza inadequada dos filtros e dutos de ar refrigerado possibilita o desenvolvimento de partículas microbianas, incluindo fungos, vírus, ácaros, bactérias, que podem levar os ocupantes de ambientes climatizados a contraírem doenças respiratórias, infecciosas ou alérgicas (CARTAXO et al., 2007 apud MORAIS et al., 2020). Certos MO causam reações alérgicas, cujos sintomas incluem espirros, olhos lacrimejantes, tosse, deficiência respiratória, letargia, febre e problemas digestivos, além de serem causadores de pneumonia, rinite e asma. De forma geral, as principais doenças associadas a poluentes biológicos são o Mal dos Legionários (ou legionelose, pois tem, como agente, a bactéria gram-negativa do gênero Legionella); a febre do umidificador (doença que se desenvolve a partir de exposições a toxinas de microrganismos, especialmente, daqueles que crescem nos sistemas de ventilação dos edifícios); asma brônquica (espasmos associados à inalação de aerossol biológico); pneumonite alérgica ou alveolite extrínseca; e pneumonia (infecção pulmonar associada a bactérias, como Streptococcus pneumoniae, Mycoplasma pneumoniae, Staphylococcus aureus, Legionella eHaemophilus influenzae, vírus e alguns tipos de fungos). A carência de uma política preventiva nos programas de manutenção nos sistemas de refrigeração e ventilação pode ser fator determinante para a ocorrência de poluentes biológicos (microrganismos patogênicos), os quais podem constituir uma ameaça à saúde dos ocupantes (COSTA et al., 2006 apud MORAIS et al., 2020). 168 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Você já ouviu falar dos bioaerossóis? Um aerossol se trata de uma dispersão coloidal de um sólido ou líquido em um gás, ou seja, um gás que apresenta uma suspensão de matérias sólidas ou líquidas sob a forma de partículas muito finas (COUTO, 2020). Portanto, os bioaerossóis podem ser definidos como componentes microbiológicos presentes (suspensos) no ar atmosférico. ATENCAO FIGURA 36 – FONTES DE BIOAEROSSÓIS EM AMBIENTES INTERNOS FONTE: Adaptada de Prussin II, Marr e Marr (2015) Legenda: as fontes de bioaerossóis microbianos em ambientes internos podem incluir: humanos, outros animais, plantas, sistemas de encanamento, ressuspensão de poeira assentada e ar exterior. Os pontos verdes e vermelhos representam MO, que podem ser benéficos ou prejudiciais à saúde humana, respectivamente (PRUSSIN II; MARR; MARR, 2015). A partir dessas informações, podemos notar que a avaliação microbiológica da qualidade do ar é um critério importante que deve ser considerado quando os ambientes internos de trabalho (escolas, hospitais) são projetados para promover um ambiente seguro. TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 169 3.1 AVALIAÇÃO MICROBIOLÓGICA DO AR No Brasil, de acordo com a Consulta Pública no 109, de 2003, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o indicador biológico de qualidade de ar ambiental interior é a contagem total de bactérias e de fungos, que não deve ultrapassar os níveis relacionados a seguir: QUADRO 11 – PARÂMETROS DE QUALIDADE BIOLÓGICA DO AR Variáveis e Componentes Nível 0 Nível 1 Nível 2 Nível 3 Partículas biológicas totais no ar ambiental ≤ 750 ufc/m3 = 500 ufc/m3 = 200 ufc/m3 = 50 ufc/m3 FONTE: A autora Os nomes dos gêneros de fungos estão diferenciados em itálico. Legenda: Os níveis de risco são relativos a: nível 0: área onde o risco não excede aquele encontrado em ambientes de usos público e coletivo; nível 1 = área onde não foi constatado o risco de eventos adversos relacionados à qualidade do ar, porém, algumas autoridades, organizações ou investigadores sugerem que o risco deva ser considerado; nível 2: área onde existem fortes evidências de risco de ocorrência de eventos adversos relacionados à qualidade do ar de ocupantes ou de pacientes que utilizam produtos manipulados nas áreas, baseadas em estudos experimentais, clínicos ou epidemiológicos bem delineados; nível 3: área onde existem fortes evidências de alto risco de eventos adversos de ocupantes ou de pacientes que utilizam produtos manipulados, baseados em estudos experimentais, clínicos ou epidemiológicos bem delineados (BRASIL, 2003). Para que se efetue a determinação do número de amostras a serem efetuadas, deve-se observar a área construída do edifício. Além disso, indica-se que as amostras sejam coletadas a 1,5 metro de distância do chão. QUADRO 12 – DETERMINAÇÃO DO NÚMERO DE AMOSTRAS EM FUNÇÃO DA ÁREA CONSTRUÍDA DO EDIFÍCIO Área construída No mínimo de amostras a serem coletadas Até 1.000 1 1.000 a 2.000 3 2.000 a 3.000 5 3.000 a 5.000 8 5.000 a 10.000 10 10.000 a 15.000 15 15.000 a 20.000 18 20.000 a 30.000 21 Acima de 30.000 25 FONTE: Adaptado de Brasil (2003) 170 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS Ainda, segundo a Resolução n° 9, o tempo mínimo de incubação para fungos é de sete dias, com temperatura de 25°C. Para bactérias, é de, no mínimo, dois dias, com temperatura de 37°C23 (BRASIL, 2003). Acadêmico, a partir do estudo da microbiologia da água, do solo e do ar, nota-se que o Brasil necessita de avanços, especialmente, no estudo dessas duas últimas áreas da microbiologia. Contudo, as informações já nos fornecem um escopo necessário aos assuntos que serão abordados na Unidade 3. Verificaremos questões inerentes ao tratamento de efluentes, além de nos aprofundarmos nas questões relativas à legislação ambiental aplicada ao estudo da microbiologia. Sigamos em frente e bons estudos! TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 171 LEITURA COMPLEMENTAR PRESENÇA COMPROVADA DO CORONAVÍRUS NO AR REFORÇA NECESSIDADE DA BOA VENTILAÇÃO DE AMBIENTES Testes realizados no Hospital das Clínicas identificaram o vírus em microgotículas expelidas pelas pessoas e que podem ficar durante horas suspensas no ar Uma pesquisa realizada no Hospital das Clínicas (HC), da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), comprova a presença do coronavírus em suspensão no ar. O vírus foi identificado em microgotículas que as pessoas expelem quando conversam ou expiram e podem ficar suspensas no ar durante horas, havendo possibilidade de transmissão da doença. Os resultados do estudo reforçam a necessidade de manter uma ventilação adequada em ambientes fechados, para diminuir o risco de contaminação pelo vírus. A pesquisa utilizou a tecnologia de monitoramento da qualidade do ar SPIRI, desenvolvida pela Omni-electronica, startup residente na incubadora do Centro de Inovação, Ciência e Tecnologia (Cietec), instituição ligada à USP e ao Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). De acordo com o engenheiro Arthur Aikawa, CEO da Omni-electronica, o projeto teve início em abril, com apoio do programa VedacitLabs. “A pesquisa buscou evidenciar a presença do vírus suspenso no ar, relacionando-a com indicadores de qualidade do ar interior (QAI) da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava). Alinhada com órgãos internacionais, reforça a importância de manter ventilação adequada em ambientes fechados, como forma de mitigar o risco de contaminação”, afirma. “A tecnologia SPIRItem a capacidade de monitorar, em tempo real, a QAI, além de permitir a gestão da qualidade do ar desses locais”. As análises foram realizadas no HC durante dois meses. “Os estudos começaram em junho, depois de um período de aprovação interna do HC, viabilização dos equipamentos para amostragem do ar e alinhamento com laboratórios para verificação das amostras”, conta Aikawa. “O monitoramento com sensores tem a capacidade de indicar o risco de contaminação por meio de bioaerossóis, em tempo real, para todos os ocupantes de ambientes internos. Já o procedimento de detecção da presença do vírus envolve coleta de amostra e análise laboratorial para atestar a contaminação ou não de um ambiente”. VÍRUS NO AR Ao todo, já foram realizadas mais de 20 amostras coletadas ao longo de, ao menos, 150 horas de estudo de campo. “A equipe de pesquisadores capturou o vírus SARS-CoV-2 suspenso no ar em ambiente hospitalar. Além disso, com 172 UNIDADE 2 —MICROBIOLOGIA APLICADA A PROCESSOS AMBIENTAIS o auxílio da Tecnologia SPIRI, pôde demonstrar que, mesmo em hospitais, a renovação adequada do ar tem capacidade para mitigar o risco de contaminação”, explica o engenheiro. “Ou seja, garantir a ventilação adequada pode ser a maior arma na luta contra o coronavírus”. As amostras estão associadas a dados em tempo real da QAI, como concentração de dióxido de carbono (CO2), um indicador da eficácia da ventilação em ambientes internos. “Dessa forma, fica validada a hipótese de que o vírus é transmissível não somente por grandes gotículas durante tosse ou espirro, mas, também, por microgotículas que as pessoas expelem quando conversam ou expiram”, destaca Aikawa. “Essas partículas, chamadas de bioaerossóis, são tão leves que podem ficar suspensas no ar durante horas se o ambiente não tiver ventilação suficiente”. EQUIPE DE PESQUISADORES CAPTUROU O VÍRUS SARS-COV-2 SUSPENSO NO AR EM AMBIENTE HOSPITALAR; COM O AUXÍLIO DA TECNOLOGIA SPIRI, FOI DEMONSTRADO QUE, MESMO EM HOSPITAIS, A RENOVAÇÃO ADEQUADA DO AR TEM CAPACIDADE PARA MITIGAR O RISCO DE CONTAMINAÇÃO PELO CORONAVÍRUS As amostras colhidas e analisadas em laboratório podem identificar a presença ou não do SARS-CoV-2 com emissão de laudo técnico, por meio de dispositivos de sensoriamento em tempo real instalados nos ambientes internos. “Os indicadores de risco de contaminação, entre outras informações, são visualizados na plataforma AMI-Hub e auxiliam o responsável pelo edifício na manutenção da QAI”, afirma o engenheiro. “Os dados também podem ser informados aos ocupantes, como forma de tranquilizá-los a respeito da permanência no local. Alarmes e relatórios de conformidade podem ser configurados”. Um artigo científico da pesquisa está em processo de publicação e deve ser concluído ainda neste mês de agosto. O estudo foi realizado pelos pesquisadores Arthur Aikawa, Matheus Manini, John Esquiagola, Paulo Henrique Peitl Gregório, Alessandro Mariani e Renato Astorino Filho. Para realizar o trabalho, a Omni- TÓPICO 3 —MICROBIOLOGIA DO SOLO E MICROBIOLOGIA DO AR 173 Electronica teve o apoio do Instituto Central do Hospital das Clínicas (ICHC), da FMUSP, da incubadora de empresas do Cietec, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), por meio do Programa de Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), e do VedacitLabs. FONTE: <https://jornal.usp.br/ciencias/presenca-do-coronavirus-no-ar-reforca-necessidade-da- boa-ventilacao-de-ambientes/>. Acesso em: 4 maio 2020. Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. CHAMADA 174 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • Fungos, bactérias e minhocas (Filo Annelida) são os grupos que possuem grande biomassa. Com relação à biomassa, os organismos do solo podem ultrapassar mais de 10 toneladas por hectare, quantidade que equivale, ou até é maior do que as melhores produções agrícolas. • A maioria das bactérias presentes no solo é aeróbia e heterotrófica, ou seja, necessitam do O2 para o crescimento e de uma fonte de carbono orgânico para a nutrição. • Os fungos apresentam importância fundamental nos diversos ambientes, estando entre os principais responsáveis pela ciclagem de nutrientes, sobretudo, nos ecossistemas florestais. • Com bactérias heterotróficas, os fungos são os principais decompositores da biosfera, degradando os produtos orgânicos e reciclando carbono, nitrogênio e outros compostos do solo e do ar. • Ao se abordar a questão da qualidade do solo, é importante a compreensão de que esta está relacionada às reações biológicas e bioquímicas catalisadas pelos MO. Essas reações são responsáveis pela decomposição de resíduos de plantas, animais, urbanos e industriais, pela ciclagem biogeoquímica (incluindo a fixação de N2), pela formação de agregados do solo e pela taxa de decomposição de materiais orgânicos. • Um dos métodos microbiológicos mais empregados em avaliações de impacto ambiental da microbiota do solo é a quantificação da biomassa microbiana. • O ar dos ambientes internos pode ser mais poluente do que o ar exterior (LEE, 2006 apud MORAIS et al., 2020). O fenômeno de recirculação de ar é responsável pelo aumento de MO na ordem de 1.000 a 100.000 vezes em relação ao ar externo. • Certos MO presentes no ar causam reações alérgicas, cujos sintomas incluem espirros, olhos lacrimejantes, tosse, deficiência respiratória, letargia, febre e problemas digestivos, além de serem causadores de pneumonia, rinite e asma. • No Brasil, de acordo com a Consulta Pública no 109, de 2003, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o indicador biológico de qualidade de ar ambiental interior é a contagem total de bactérias e de fungos, que não deve ultrapassar valores estipulados pela norma. 175 1 Em um levantamento da qualidade do ar de uma sala de espera de hospital, foi encontrada uma quantidade de partículas biológicas totais que classificou esta sala como nível 2, de acordo com os parâmetros apresentados na Consulta Pública nº 109, de 2003, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Dessa forma, o número de UFC de fungos e de bactérias permitido para esse local é de: a) ( ) 450 ufc/m3. b) ( ) 200 ufc/m3. c) ( ) ≤ 750 ufc/m3. d) ( ) 500 ufc/m3. 2 No inverno é comum observar um aumento significativo de casos relacionados aos vírus Influenza (gripe) e Rhinovírus (resfriado) devido a alguns fatores como a diminuição da imunidade, o aumento da umidade ambiente e o ato de frequentar ambientes aglomerados, quentes e com falta de circulação de ar. Em certa situação, num escritório de 100m2, um colaborador com resfriado espirrou e, com isso, liberou, no ambiente interno: a) ( ) Bioaerossóis. b) ( ) Aerossóis químicos. c) ( ) Aerossóis físico-químicos. d) ( ) Partículas inorgânicas. 3 Em um experimento de deposição de resíduos de mineração em uma mina de extração de ferro, foi necessário analisar os impactos sobre a biologia do solo da região. Para tal análise, foi empregado o método de: a) ( ) Verificação da microbiota presente na água. b) ( ) Análise de parâmetros físicos do solo. c) ( ) Quantificação da biomassa microbiana do solo. d) ( ) Medição da temperatura do local. 4 Para a análise do processo de decomposição dos resíduos, é fundamental que seja mensurado o mecanismo de atividade dos fungos no local. Explique a razão da importância desse levantamento. AUTOATIVIDADE 176 REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. V. A. Identificação de fungos filamentosos presentes em um biorreator de resíduos sólidos urbanos. 2015. Disponível em: http://dspace.sti.ufcg.edu.br:8080/xmlui/bitstream/handle/riufcg/4030/ M%C3%81RBARA%20VILAR%20DE%20ARA%C3%9AJO%20 ALMEIDA%20-%20DISSERTA%C3%87%C3%83O%20PPGECA%202015. pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 6 maio 2020. ANVISA. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA.Microbiologia clínica para o controle de infecção relacionada à assistência à saúde. Brasília: Anvisa, 2013. 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Acesso em: 29 maio 2020. 183 UNIDADE 3 — TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • diferenciar os conceitos dos termos “esgoto”, efluentes domésticos e efluentes industriais; • estudar aspectos inerentes à microbiologia envolvida no tratamento de efluentes líquidos; • conhecer alguns dos principais parâmetros ligados à questão da digestão microbiológica dos efluentes líquidos; • identificar os microrganismos envolvidos no tratamento de efluentes líquidos; • entender a importância dos flocos biológicos para o processo de lodos ativados; • verificar a diferença entre processos de tratamento aeróbios e anaeróbios sob o ponto de vista microbiológico; • compreender o conceito de biorremediação e a aplicabilidade dessa técnica; • identificar os principais microrganismosenvolvidos no processo de biorremediação; • analisar os principais instrumentos legais ligados à microbiologia da água, do solo e do ar. Esta unidade será dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS TÓPICO 2 – BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS TÓPICO 3 – LEGISLAÇÃO AMBIENTAL APLICADA 184 Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 185 UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO TÓPICO 1 — TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS Ao iniciarmos a Unidade 3, é importante conceituar o termo “efluente”, comumente chamado de “esgoto”. O esgoto pode se tratar da água oriunda do banho, da limpeza de roupas ou da descarga. Apesar do “esgoto” residencial ser o tipo mais comum, não é o único. Também pode ser gerado em estabelecimentos comerciais, órgãos públicos e indústrias (ELETROREDE, 2018). Observe que a palavra “esgoto” não é inicorreta. Contudo, quando tratamos de estudos científicos, devemos ter conhecimento da terminologia adequada relacionada à área que desejamos nos aprofundar. Efluente é todo resíduo líquido ou gasoso, proveniente das diversas atividades humanas, que é lançado no meio ambiente. Resulta de atividades industriais, agrícolas ou dos esgotos domésticos urbanos. Desse modo, águas residuárias, ou, no caso, efluentes, podem ser entendidas como águas resultantes do contato e/ou da utilização humana para os diversos fins (VON SPERLING, 1989 apud PUTTI et al., 2015). Então, sabemos, agora, que o termo mais adequado a ser utilizado nos nossos estudos se trata de efluentes ou águas residuárias. NOTA Existe diferença entre efluentes domésticos e industriais? Os efluentes líquidos industriais são originários das águas empregadas na área de utilidades e/ou processos industriais. As características dependem da natureza da indústria (metalúrgica, têxtil, alimentícia etc.), das matérias- primas processadas, das etapas de transformação utilizadas no processo, da incorporação de substâncias indesejáveis à água (ex.: detergentes, solventes, pigmentos, óleos etc.), do porte da indústria e do modelo de gestão utilizado (CAMMAROTA, 2011). UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 186 Um efluente doméstico se trata de toda água residuária gerada pelas atividades e necessidades humanas em uma residência e que fluem através da rede de esgoto. Podem, igualmente, ser lançadas diretamente no ambiente ou redirecionadas para estações de tratamento. A Norma Brasileira NBR 9648/1986 define o esgoto doméstico como despejo líquido resultante do uso da água para higiene e necessidades fisiológicas humanas. Já o esgoto sanitário é definido como o despejo líquido constituído dos esgotos doméstico e industrial, água de infiltração e contribuição pluvial parasitária (ABNT, 1986 apud LOPES, 2015). Cabe destacar que esgoto sanitário ou doméstico é aquele oriundo de residências, estabelecimentos comerciais, instituições ou quaisquer edificações que dispõem de instalações de banheiros, lavanderias e cozinhas. Compõe-se, essencialmente, da água de banho, excretas (fezes e urina), papel higiênico, restos de comida, sabão, detergentes e águas de lavagem (INSTITUTO TRATA BRASIL, 2012). Contribuição pluvial parasitária é a parcela do deflúvio superficial inevitavelmente absorvida pela rede de esgoto sanitário. Deflúvio superficial significa escoamento superficial. NOTA Existem diferenças importantes entre os efluentes domésticos e industriais. Podemos aferir, então, que existe uma classificação que diferencia os tipos de efluentes (“esgotos”) existentes, a saber (INSTITUTO TRATA BRASIL, 2012): • Efluentes domésticos: oriundos, principalmente, de residências, estabelecimentos comerciais, instituições ou qualquer edificação que dispõe de instalações de banheiros, lavanderias e cozinhas. Compõem-se, essencialmente, da água de banho, excretas, papel higiênico, restos de comida, sabão, detergentes e águas de lavagem. • Efluentes industriais: compreendem os resíduos orgânicos, de indústria de alimentos, matadouros etc.; águas residuárias agressivas, procedentes de indústrias de metais etc.; águas residuárias procedentes de indústrias de cerâmica, água de refrigeração etc. • Águas pluviais: águas originárias das chuvas. • Água de infiltração: águas do subsolo que se introduzem na rede. Agora que já conhecemos esses conceitos principais e os tipos de efluentes, passaremos ao estudo dos microrganismos envolvidos no tratamento de efluentes líquidos. Vamos lá?! TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 187 2 PARÂMETROS ENVOLVIDOS NO TRATAMENTO BIOLÓGICO DE EFLUENTES DOMÉSTICOS Antes de iniciarmos os estudos referentes aos parâmetros propriamente ditos, é essencial que conheçamos a composição do esgoto doméstico. QUADRO 1 – COMPOSIÇÃO DO ESGOTO DOMÉSTICO Componente Porcentagem/concentração Proteínas 40%-60% Carboidratos 25%-50% Gorduras e óleos 10% Ureia (NH3-N) 25-50 mg/L P total 8-15 mg/L Traços de compostos orgânicos (pesticidas, surfactantes, fenóis e outros poluentes). FONTE: Adaptado de Metcalf e Eddy (1991) apud Araujo (2021) Legenda: P = fósforo. Então, podemos aferir que o tratamento de esgotos tem a finalidade de remover a matéria orgânica (reduzir a DBO), o material em suspensão, além da remoção de patógenos e de nutrientes (N e P – nitrogênio e fósforo) (ARAUJO, 2021). Dentro desse contexto, os processos de tratamento de esgotos sanitários são classificados, usualmente, em função do grau de redução dos sólidos em suspensão e da demanda bioquímica de oxigênio – DBO, originária da eficiência de uma ou de mais unidades de tratamento (JORDÃO; PESSÔA, 2011 apud DIELLE, 2014). Essa classificação subdivide todo o tratamento dos efluentes sanitários em: tratamento preliminar, tratamento primário, tratamento secundário e tratamento terciário. UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 188 FIGURA 1 – ETAPAS DO TRATAMENTO DE ESGOTOS FONTE: Adaptada de Dielle (2014) Os tratamentos de efluentes mais utilizados mundialmente são os biológicos, que apresentam, como elemento principal, os microrganismos, realizando a remoção da matéria orgânica e de outros compostos. Para tal ação, diversas tipologias são empregadas, dentre elas, a mais utilizada, mundialmente, é a de lodos ativados (MOREIRA, 2018). O tratamento biológico se caracteriza como método mais eficiente de remoção da matéria orgânica dos efluentes líquidos. O próprio efluente apresenta grande diversidade de bactérias e de protozoários para compor as culturas microbiais mistas que processam os poluentes orgânicos. A utilização desse processo necessita do controle da vazão, da recirculação dos microrganismos decantados, do fornecimento de oxigênio e de outros fatores. Os fatores que mais afetam o crescimento das culturas são a temperatura, a disponibilidade de nutrientes, o fornecimento de oxigênio, o pH, a presença de elementos tóxicos e a insolação (SAEE, 2006). Na presença de oxigênio livre (dissolvido), são as bactérias aeróbias que promovem a decomposição. Na ausência do oxigênio, a decomposição se dá pela ação das bactérias anaeróbias. A decomposição aeróbia se diferencia da anaeróbia pelo tempo de processamento e pelos produtos resultantes. Em condições naturais, a decomposição aeróbia necessita de três vezes menos tempo do que a anaeróbia, resultando gás carbônico, água, nitratos e sulfatos, substâncias inofensivas e úteis à vida vegetal. O resultado dadecomposição anaeróbia é a geração de gases, como sulfídrico, metano, nitrogênio, amoníaco e outros, geralmente, gases bem pouco cheirosos (SAEE, 2006). A decomposição do esgoto é um processo que demanda vários dias, iniciando-se com uma contagem elevada de DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio), que vai decrescendo e atinge o valor mínimo ao se completar a estabilização. A determinação da DBO é importante para indicar o teor de matéria orgânica biodegradável, definir o grau de poluição que o “esgoto” pode causar ou a quantidade de oxigênio necessária para submeter o esgoto a um tratamento aeróbio (SAEE, 2006). TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 189 Além da DBO, outros parâmetros importantes a serem mensurados se tratam da medição do carbono orgânico (Carbono Orgânico Total – COT) e da Demanda Química de Oxigênio – DQO (VON SPERLING, 2014 apud MOREIRA, 2018). QUADRO 2 – DETERMINAÇÃO DO NÚMERO DE AMOSTRAS EM FUNÇÃO DA ÁREA CONSTRU- ÍDA DO EDIFÍCIO Parâmetro Definição DBO – Demanda Bioquímica de Oxigênio Quantidade de oxigênio dissolvido necessário para estabilizar a matéria orgânica biodegradável. Para padronizar os testes, convencionou-se realizar a análise no 5° dia a uma temperatura de 20°C (DBO5 20) (VON SPERLING, 2014). Como o processo é demorado, cerca de 20 dias até a estabilização total da matéria orgânica, determinou-se que a análise, no 20° dia, seria considerada a DBO última (DBOu). DQO – Demanda Química de Oxigênio Quantidade de oxigênio dissolvido necessário para oxidação química da matéria orgânica, obtida através de um forte oxidante em meio ácido. O teste tem a duração de duas a três horas para ser realizado, porém, oxida as frações biodegradável e inerte, dando um indicativo superestimado do consumo de oxigênio no tratamento biológico dos esgotos (VON SPERLING, 2014). COT – Carbono Orgânico Total Medido diretamente por meio de instrumentos que aferem o carbono liberado na forma de CO2. Para que somente o carbono orgânico seja lido, é importante que todo carbono inorgânico seja eliminado antes da análise ou que seja feita uma correção nos cálculos. O processo de determinação da matéria orgânica por COT é utilizado em estudos que exigem uma análise mais aprofundada, devido aos custos mais elevados da técnica (VON SPERLING, 2014). FONTE: Adaptado de Moreira (2018) A relação DQO/DBO pode ser empregada como indicativo da biodegradabilidade dos despejos, o que propicia auxílio na escolha do tratamento a ser empregado (VON SPERLING, 2014 apud MOREIRA, 2018). QUADRO 3 – RELAÇÃO DQO/DBO 5 20 Relação DQO/ DBO5 20 baixa < 2,5 (fração biodegradável elevada) Relação DQO/ DBO5 20 intermediária 2,5 < DQO/DBO5 20 < 4 Relação DQO/ DBO5 20 elevada > 4 (fração inerte elevada) FONTE: Adaptado de Von Sperling (2016) No caso de uma relação DQO/DBO baixa, a fração biodegradável é elevada, o que indica a utilização de tratamento biológico, ao passo que quando da relação DQO/DBO elevada, a fração inerte, ou seja, não biodegradável, é alta, não em termos de poluição do corpo hídrico receptor. Para os efluentes UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 190 domésticos brutos, a relação DQO/DBO se encaixa na faixa de 1,7 a 2,4. Ao fim do tratamento biológico, o efluente final apresenta valores de DQO/DBO5 superiores a 3. Quanto maior esse valor, maior a eficiência do tratamento (QUÍMICA DAS ÁGUAS, 2021). É importante salientar que processos (aeróbios ou anaeróbios), isolados ou combinados, representam a fase biológica do tratamento de esgoto, denominada de etapa secundária. O tratamento primário consiste, basicamente, na sedimentação do esgoto para remoção de resíduos sólidos. O efluente do tratamento secundário ainda pode conter íons de fosfato e de nitrato, que são removidos, quimicamente, na terceira etapa. O efluente final de um processo adequado de tratamento de esgoto possui concentração baixa de matéria orgânica e de nutrientes, podendo ser lançado em rios, lagos e oceanos sem causar impactos significativos ao meio ambiente (HAGLER, 2005). 3 MICRORGANISMOS ENVOLVIDOS NO TRATAMENTO BIOLÓGICO DE EFLUENTES LÍQUIDOS A coleta e o tratamento de esgoto integram os serviços de saneamento, cuja importância verificamos ao longo das Unidades 1 e 2. A finalidade da coleta é transportar os efluentes domésticos para longe das residências. Já a finalidade do tratamento é diminuir a carga poluidora para que retorne à natureza sem causar impactos ambientais significativos ao meio ambiente. Ao chegarem na estação de tratamento de esgoto (ETE), os efluentes domésticos passam por diversos processos que reduzem a alta concentração de compostos orgânicos e de outros nutrientes e elementos que os tornam prejudiciais ao meio ambiente. Dentro desse contexto, os microrganismos desempenham um papel preponderante em sistemas de tratamento biológico de esgoto, sendo os responsáveis pela estabilização da matéria orgânica e remoção de nutrientes, a fim de gerar um efluente com características que permitam o lançamento em corpo d’água, de acordo com os limites previstos pela legislação em vigor (CAMPOS; PIVELI; BUENO, 2012). Os organismos presentes nos efluentes domésticos variam de acordo com o processo de tratamento. Em tratamentos aeróbios, a presença de bactérias e de protozoários é expressiva, contando com a presença de micrometazoários em menor escala (METCALF; EDDY, 2003 apud MOREIRA, 2018). Esta questão pode ser observada na figura a seguir, que representará a predominância dos principais microrganismos presentes no tratamento aeróbio. Por meio dela, poderemos notar que, na entrada da matéria orgânica, no reator, a presença de bactérias é baixa, e podem ser encontradas amebas, devido à grande disponibilidade de matéria orgânica. O número de bactérias cresce TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 191 exponencialmente e, com isso, os protozoários flagelados aumentam, devido à abundância de alimento. Com a posterior queda de matéria orgânica no sistema, o número de bactérias atinge o ápice e a presença de protozoários ciliados de vida livre dá um indicativo de menor carga orgânica. Quando há existência de pouca matéria orgânica, a presença de bactérias diminui pela predação de ciliados fixos (encontrados em sistemas estáveis) e rotíferos e pela competição do pouco alimento (VON SPERLING, 2011 apud MOREIRA, 2018). GRÁFICO 1 – PREDOMINÂNCIA DE MICRORGANISMOS NO TRATAMENTO AERÓBIO DE EFLUENTES FONTE: Adaptada de Von Sperling (1995) apud Barboza (2021) Conforme Richard (1989) apud Campos, Piveli e Bueno (2012), é muito comum, em análises microscópicas de uma amostra de lodo biológico proveniente do tanque de aeração de um sistema de tratamento biológico aeróbio, a identificação, além da quantificação de protozoários. Segundo o mesmo autor, protozoários estão sempre presentes no lodo biológico em uma faixa populacional que pode variar de 10 a 100.000 organismos/mL. Os protozoários se alimentam em uma razão de 500 bactérias/hora, contribuindo, de forma importante, para a clarificação do efluente. Esse aspecto, aliado à facilidade de identificação microscópica e à sensibilidade a mudanças ambientais, faz com que seja uma ferramenta de avaliação de funcionamento e de eficiência do sistema. UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 192 Podemos compreender que os protozoários ciliados são essenciais para a produção de um efluente de boa qualidade. A atividade predatória desses organismos sobre o crescimento disperso bacteriano é responsável pela clarificação e pela redução do número de coliformes durante o processo de lodo ativado (CURDS,1973). Assim, a seguir, estarão relacionadas fotomicrografias de protozoários ciliados encontrados em um sistema de tratamento combinado UASB – lodo ativado. FIGURA 2 – FOTOMICROGRAFIAS DE PROTOZOÁRIOS CILIADOS FONTE: Adaptada de Von Sperling (1995) apud Barboza (2021) Legenda: bacterívoros sésseis (a-f); ciliados rastejantes (g-h); espécie Vorticella spp. (a-c) e após coloração específica (d); colônia de indivíduos da espécie Epistylis plicatilis (e); colônia de indivíduos da espécie Carchesium polypinum (f); Chilodonella uncinata (g); Drepanomonas revolula (h); Barras de escala = 20 µm (micrômetros). No caso das Archaeas (Arqueias), conforme Fredriksson (2012) apud Moreira (2018), ainda existe pouca informação a respeito das comunidades de Acrhaeas em lodos ativados. Embora estas estejam presentes, parecem ser de menor importância para a remoção de nitrogênio e de carbono, quando comparadas às bactérias. Entretanto, é possível que as Arqueias apresentem outras funções, como uma relação de simbiose com bactérias e, se presentes em lodos ativados, as metanogênicas podem contribuir para a estrutura do floco biológico, que estudaremos na sequência. Não podemos nos esquecer das bactérias, dos microrganismos mais importantes no tratamento de efluentes líquidos, responsáveis diretamente pela degradação da matéria orgânica. As bactérias heterotróficas apresentam função- chave no tratamento biológico, sendo responsáveis pela degradação da matéria TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 193 orgânica, desempenham, também, a função de se aglomerar em estruturas, como flocos, biofilmes e grânulos. Estes últimos podem ocorrer de forma dispersa, ou seja, a biomassa cresce no meio líquido sem nenhuma estrutura de sustentação (flocos), ou de forma aderida, ou seja, a biomassa cresce aderida a um meio suporte artificial, natural, ou a própria biomassa aglomerada (grânulos), originando um biofilme (VON SPERLING, 2011 apud MOREIRA, 2018). FIGURA 3 – FLOCO BIOLÓGICO FONTE: <https://slideplayer.com.br/slide/5615769/>. Acesso em: 24 jan. 2021. Legenda: A – estrutura de um floco biológico típico. B – fotomicrografia de um floco biológico. Nos lodos ativados típicos, o crescimento da biomassa ocorre de forma dispersa, dando origem aos flocos. Essas estruturas possuem a finalidade essencial na eficiência do processo de tratamento, apresentando uma estrutura heterogênea composta de material orgânico adsorvido, células vivas e mortas, material inerte dos esgotos etc. (VON SPERLING, 2011 apud MOREIRA, 2018). A aeração tem influência sobre o tamanho dos flocos, o que gera a separação do líquido através da sedimentação, possibilitando que o efluente saia clarificado ao fim do processo de tratamento. Os flocos são constituídos não somente de bactérias, mas, também, de protozoários, fungos, nematoides. Essa diversidade microbiana proporciona uma característica de biofilme a partir da qual exoenzimas hidrolisam o material particulado antes da metabolização pelas bactérias e, dentro do floco, ocorre um gradiente de nutrientes e de oxigênio disponível. A formação desses flocos ocorre com a presença de bactérias filamentosas que exercem a função de matriz estrutural, permitindo a aderência das bactérias formadoras de flocos e de outros microrganismos (VON SPERLING, 2011 apud MOREIRA, 2018). UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 194 Exoenzimas são enzimas extracelulares que degradam moléculas orgânicas complexas em moléculas simples assimiláveis pelo microrganismo. A reação de hidrólise enzimática se trata daquela em que uma enzima “quebra” uma molécula em outros compostos menores com o emprego de água. Daí o termo hidrólise, do grego, hidro-, água, e -lysis, separação. NOTA A respeito da hidrólise, esta apresenta duas importantes funções no tratamento biológico. Uma delas se trata do fato de que muitas estações recebem apenas substratos complexos. No caso, a hidrólise é primordial na promoção de substratos solúveis à biomassa, pois somente substâncias solúveis podem ser absorvidas e degradadas pelas bactérias. Já a segunda finalidade está no fato de que, em qualquer unidade de tratamento biológico, ocorre morte bacteriana, e a hidrólise possibilita a solubilização e a degradação dos componentes celulares (ELIOSOV; ARGAMAN, 1995 apud PUC-RIO, 2021). Para o sucesso da operação de uma estação, utilizando o processo de flocos, é necessário equilíbrio entre as bactérias filamentosas e as formadoras de flocos para obter boas sedimentabilidade e adensibilidade do lodo. Caso exista predominância das bactérias formadoras de floco, obtém-se um floco pouco rígido, pequeno, fraco, e, a essa condição, é dado o nome de “pin-point floc”. Já na ocorrência de predominância por parte das bactérias filamentosas, os filamentos se projetam para fora do floco, impedindo que ocorra aderência entre eles, ocupando um volume maior, condição conhecida como “sludge bulking”. FIGURA 4 – EXEMPLOS DE BACTÉRIAS FILAMENTOSAS E FORMADORAS DE FLOCOS FONTE: <https://www.researchgate.net/figure/Excessive-growth-of-a-Microthrix-parvicella-b- Nostocoida-limicola-II-with-no_fig4_8015120>; <https://www.ecologycenter.us/wastewater- treatment-2/info-gyb.html>. Acesso em: 24 jan. 2021. TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 195 Legenda: A – fotomicrografia da bactéria filamentosa Nostocoida limicola II. B – fotomicrografia de um floco formado pela bactéria da espécie Zoogloea ramigera. A seguir, poderemos evidenciar os diferentes tipos de flocos que podem se formar em um processo de tratamento de efluentes. FIGURA 5 – INFLUÊNCIA DE ORGANISMOS FILAMENTOSOS NA ESTRUTURA DO FLOCO FONTE: <https://www.semanticscholar.org/paper/Activated-Sludge-and-Aerobic-Biofilm- Reactors-Sperling/2b5225eab436034d8340a8b6de97074ca573a172>. Acesso em: 24 jan. 2021. Legenda: Da esquerda para a direita, podemos notar a estrutura de um floco ideal; ao centro, o chamado pint-point floc; à direita, o sludge bulking Estudaremos os principais processos de tratamento biológico sob o enfoque da microbiologia ambiental. Seguimos em frente! 4 LODOS ATIVADOS O sistema de tratamento de esgotos por meio de ativados foi concebido no Reino Unido, por Ardern e Lockett, em 1914. A primeira versão do sistema era por tanques que operavam com ciclos de enchimento e esvaziamento, similares aos reatores de batelada sequenciais atuais. Posteriormente, foi concebida a versão de fluxo contínuo, mais utilizada atualmente (VON SPERLING, 2016). O sistema é vastamente utilizado mundialmente para o tratamento de despejos domésticos e industriais, em situações em que é necessária uma elevada qualidade do efluente, além de reduzidos requisitos de área disponível. Contudo, o sistema de lodos ativados inclui um índice de mecanização superior ao de outros sistemas de tratamento, gerando uma operação mais sofisticada e grandes consumos de energia elétrica (VON SPERLING, 2016). Assim, a seguir, será possível observar um esquema das unidades da etapa biológica dos lodos ativados. UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 196 FIGURA 6 – TRATAMENTO AERÓBIO POR LODO ATIVADO FONTE: Adaptada de Von Sperling (2007) Legenda: tanque de aeração (reator); tanque de decantação (decantador secundário). Vamos observar algumas das características morfológicas e microbiológicas do lodo ativado? Acesse o link e confira: https://www.youtube.com/watch?v=HXf-5aVS36g. DICAS Conforme já estudamos, o sistema de lodos ativados se fundamenta em promover o desenvolvimento de uma cultura microbiológica na forma de flocos (lodos ativados) em um tanque de aeração, que é alimentada pela carga orgânica contida no efluentea tratar (SILVEIRA, 2010). No reator, ocorrem as reações bioquímicas de remoção da matéria orgânica e, em determinadas condições, da matéria nitrogenada. A biomassa se utiliza do substrato presente no esgoto bruto para se desenvolver. No decantador secundário, ocorre a sedimentação dos sólidos (biomassa), permitindo que o efluente final saia clarificado. Os sólidos sedimentados, no fundo do decantador secundário, são recirculados para o reator, aumentando a concentração de biomassa, o que é responsável pela elevada eficiência do sistema. A biomassa consegue ser facilmente separada no decantador secundário, devido à propriedade de flocular. Isso se deve ao fato de as bactérias possuírem uma matriz gelatinosa, que permite a aglutinação das bactérias e de outros microrganismos, como protozoários (VON SPERLING, 2016). TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 197 Outro aspecto relevante é o tempo de retenção dos sólidos, aspecto denominado de idade do lodo. É essa a maior permanência dos sólidos no sistema que garante a elevada eficiência dos sistemas de lodos ativados. Isso se deve ao fato de que a biomassa conta com tempo suficiente para metabolizar praticamente toda a matéria orgânica dos esgotos (VON SPERLING, 2016). 4.1 PROCESSOS ANAERÓBIOS A digestão anaeróbia é uma das melhores alternativas para o tratamento de subprodutos altamente poluidores, como resíduos sólidos, efluentes da agroindústria, esgoto sanitário doméstico e dejetos de animais. A produção de metano e de efluente estabilizado é muito importante na digestão anaeróbia e pode ser utilizada como combustível e biofertilizante (CHERNICHARO, 2007; GERARDI, 2003; METCALF; EDDY, 2003; SPEECE, 1996; VEERESH et al., 2005 apud BRUNO; OLIVEIRA, 2008). O processo anaeróbio, nas últimas décadas, contou com significativos avanços do conhecimento dos fundamentos, principalmente, na microbiologia e na concepção dos reatores. Para o tratamento de efluentes industriais com alto teor de matéria orgânica, têm sido aplicados os reatores biológicos anaeróbios, em virtude das vantagens técnicas e econômicas, e um dos principais é o reator anaeróbio de fluxo ascendente com manta de lodo (UASB). No tratamento anaeróbio, ocorre elevada remoção de material orgânico suspenso e solúvel, inclusive, substâncias tóxicas, como os fenóis, porém, a remoção de nutrientes é baixa (CHERNICHARO, 2007; GERARDI, 2003; METCALF; EDDY, 2003; SPEECE, 1996; VEERESH et al., 2005 apud BRUNO; OLIVEIRA, 2008). A digestão anaeróbica pode ser considerada um processo no qual vários grupos de microrganismos trabalham em sinergia na conversão da matéria orgânica complexa em produtos finais, como metano, dióxido de carbono, sulfeto de hidrogênio, água e amônia (CHERNICHARO, 2007 apud VIANA; SILVA; SILVA-NETO, 2017). Os ciliados participam do processo de três formas: (1) consumindo bactérias e contribuindo para o controle e a renovação populacional, (2) abrigando, dentro das próprias células, bactérias metanogênicas imprescindíveis ao tratamento; e (3) consumindo matéria orgânica dissolvida. Além disso, os ciliados excretam compostos que podem aumentar a atividade bacteriana nesses sistemas (NISBET, 1984 apud MADONI, 2011 apud VIANA; SILVA; SILVA-NETO, 2017). UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 198 FIGURA 7 – ETAPAS DA DIGESTÃO ANAERÓBIA FONTE: <https://www.guiadaengenharia.com/reatores-uasb/>. Acesso em: 9 fev. 2021. Legenda: H2CO2: ácido metanoico (fórmico); CH4: metano; CO2: dióxido de carbono. A respeito das bactérias presentes no processo de digestão anaeróbia, de acordo com Chernicharo (1997), Von Sperling (1996) e McCarty (1964) apud Hamerski (2012), são divididas em três importantes grupos com comportamentos fisiológicos diferenciados. Estas consomem oxigênio a partir dos sais inorgânicos, produzindo a forma reduzida dos elementos iniciais, além da produção de CH4 e de CO2. Todo o processo de digestão anaeróbia pode ser simplificado em um mecanismo de duas fases. Na primeira, ocorre a formação de ácidos (acidogênese), por meio da fermentação ácida e da oxidação anaeróbia. Já na segunda fase, há a formação do metano, através da metanogênese (CHERNICHARO, 1997 apud HAMERSKI, 2012). TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 199 FIGURA 8 – PRINCIPAIS BACTÉRIAS ENVOLVIDAS NO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA FONTE: Von Sperling (1996), McCarty (1964) e Chernicharo (1997) apud Hamerski (2012) O tratamento de esgotos por reatores UASB é reconhecido como um dos métodos que causam menos danos ao ambiente (NAIR; AHAMMED, 2013 apud VIANA; SILVA; SILVA-NETO, 2017), e é indicado para a utilização em países em desenvolvimento, tendo em vista o baixo custo operacional e a baixa geração de resíduos desse tipo de reator. O UASB é um reator anaeróbio de manta de lodo, caracterizado por conter câmara de digestão, separador trifásico, zona de sedimentação e zona de acumulação de gás (JORDÃO; PESSÔA, 2011; VON SPERLING, 2005). FIGURA 9 – ESQUEMA DE UM REATOR UASB FONTE: <http://h2oengenharia.com.br/pt/uasb/>. Acesso em: 9 fev. 2021. Legenda: Reator UASB – Upflow Anaerobic Sludge Blanket. Trata-se de um reator anaeróbio de fluxo ascendente de alta eficiência. UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 200 Ademais, os reatores do tipo UASB empregam biomassa suspensa ou aderida, denominada de manta de lodo, para a degradação da matéria orgânica presente no esgoto afluente. O esgoto entra no reator pela parte inferior e segue um fluxo ascendente até ser retirado, na parte superior, pelas calhas de coleta de esgoto tratado. As bactérias presentes na biomassa dos reatores UASB formam flocos de boa sedimentabilidade. Assim, com o passar do tempo, parte da biomassa se deposita no fundo do reator formando uma camada denominada de leito de lodo. Nessa camada, encontra-se a porção já inativa da biomassa, caracterizando o lodo dos reatores UASB como um lodo estabilizado (DIELLE, 2014). Seguindo o fluxo ascendente, após percorrer a manta de lodo, o efluente passa por um sistema de separação trifásica no interior dos reatores UASB. O separador trifásico apresenta vertedouros que, ao entrarem em contato com o efluente, possibilitam a sedimentação das partículas sólidas que retornam para a parte inferior do reator. As bolhas de gás, geradas na reação de decomposição anaeróbia da matéria orgânica, passam por um canal de coleta no centro do reator e são removidas na parte superior. Dessa forma, somente a porção líquida do esgoto sai através das calhas, conferindo, ao efluente dos reatores UASB, a característica de efluente clarificado (DIELLE, 2014). Agora, vamos assistir a uma animação que demonstra o funcionamento de um reator do tipo UASB. Acesse o link e confira: https://www.youtube.com/watch?v=xa5WwUS8-fM. DICAS Acadêmico, agora que conhecemos as diferenças existentes entre os tratamentos aeróbios e anaeróbios de efluentes líquidos, estudaremos as vantagens e as desvantagens desses dois processos.• TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 201 QUADRO 4 – VANTAGENS E DESVANTAGENS DOS PROCESSOS AERÓBIOS E ANAERÓBIOS Processos Vantagens Desvantagens Aeróbios • Elevados níveis de eficiência na remoção da DBO5 (de até 98%). • Riscos reduzidos de emissões de odor. • Maior capacidade de absorver substâncias de menor biodegradabilidade e mesmo compostos que poderiam ser tóxicos. • Sistemas providos de aeração natural (ex.: lagoas) necessitam de grandes áreas para a instalação, o que pode dificultar ou inviabilizar o uso em determinadas regiões. • Sistemas aeróbios mecanizados tambémnecessitam de áreas consideráveis e apresentam valores de investimento em instalação e operação elevados em função da necessidade de equipamentos tecnologicamente superiores, além do consumo de energia elétrica com os sistemas de aeração forçada. • Maior geração de lodo. • O lodo produzido não é tão digerido quanto o lodo produzido por reatores UASB, por exemplo. Dessa forma, quanto maior a quantidade de lodo gerado, mais constante é a rotina de descarte, o que, com o consumo de energia elétrica para aeração, eleva os custos operacionais desses sistemas. Anaeróbios • Baixa produção de sólidos (cerca de 10 vezes inferior quando comparada a processos aeróbios). • Baixo consumo energético, o que reduz o custo operacional. • Baixa demanda de área. • Produção de metano, um gás combustível que pode ser empregado na produção de energia. • Possibilidade de preservação da biomassa. • Tolerância de elevadas cargas orgânicas. • Aplicabilidade em pequenas e em grandes escalas. • Baixo consumo de nutrientes. • Bactérias suscetíveis à inibição por alguns compostos. • Lenta partida do processo na ausência de inóculo. • Necessidade de pós-tratamento. • Geração de efluente com aspecto desagradável. • Remoção de N (nitrogênio), P e patógenos é insatisfatória. FONTE: Adaptado de Chernicharo (1997) apud Wetlands (2019) UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 202 Membranas de tratamento de água e seus processos Filtrando contaminantes, mesmo em escala nanométrica, as membranas são um pilar dos tratamentos de água e efluentes NOTA DOIS PROCESSOS DE MEMBRANA, ULTRAFILTRAÇÃO E OSMOSE REVERSA, SÃO USADOS PARA TRATAR O RIO COM LIMO NAS INSTALAÇÕES DE CENTRAL PUERTO, EM BUENOS AIRES, ARGENTINA No tratamento da água, as membranas são barreiras que permitem a passagem da água, mas impedem a passagem de substâncias indesejadas. Ao trabalhar de maneira muito semelhante às paredes celulares dos nossos corpos, as membranas técnicas filtram sais, impurezas, vírus e outras partículas de água. Um processo de membrana é qualquer método que se baseia em uma barreira de membrana para filtrar ou remover partículas da água. O fluido passa através da membrana, devido à diferença de pressão entre um lado da membrana e o outro. Os contaminantes permanecem de um lado. Embora muitos tipos de meios de filtração sejam usados para tratamento de água, como argila, limo e areia, uma das propriedades que distingue as membranas é a capacidade de separar substâncias menores de um líquido, como sais e íons. As membranas foram aplicadas, pela primeira vez, nos processos de tratamento de água na década de 1960, mas somente na década seguinte foram cada vez mais usadas para dessalinização. Agora, a lista de processos de membrana usados no tratamento de água foi expandida para incluir o seguinte: • Osmose Direta. • Osmose Reversa. • Microfiltração. • Ultrafiltração. • Nanofiltração. TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 203 Diferentes processos requerem diferentes tipos de membrana, em termos gerais, funcionando como uma peneira ou separando a água das impurezas em nível molecular. As membranas são feitas de camadas à base de polímeros, cerâmicas e outros materiais. Estão sendo feitas pesquisas acerca dos materiais poliméricos em bloco, óxido de alumínio, grafeno e outros nanomateriais, como nanotubos de carbono. As membranas têm diferentes graus de permeabilidade: • membranas de microfiltração (têm o maior tamanho de poro): de 0,1 a 10 mícrons. • membranas de UF: de 0,1 a 0,01 mícrons. • membranas de nanofiltração: de 0,01 a 0,035 mícrons. • membranas de osmose reversa (efetivamente não porosas): de 0,0001 a 1 mícron. Tipos e Configurações de Membrana As membranas são, geralmente, classificadas como isotrópicas ou anisotrópicas. As membranas isotrópicas mostram uma composição e estrutura física uniformes no corte transversal, enquanto as membranas anisotrópicas não são uniformes no corte transversal. Elas são, geralmente, formadas por camadas estruturadas e materiais diferentes. Os tipos de membranas de uso geral incluem tubulares, fibras ocas e lâminas planas. Esses tipos são aplicados em diferentes configurações, como membranas de lâminas planas, usadas na Solução Compacta Inteligente NIROBOX ™, ou enroladas em espiral, como aquelas usadas no Reator de Biofilme de Membrana Aerada (MABR), como as Plantas de Tratamento de Efluentes Compactos Inteligentes Aspiral ™, ambas da Fluence. As propriedades ideais das configurações de membrana de tratamento de água são: • Realmente compacto. • Baixa resistência ao fluxo tangencial. • Distribuição uniforme de velocidade sem regiões mortas. • Alta turbulência no lado retido para minimizar incrustações e ajudar na transferência de massa. • Fáceis manutenção e limpeza. • Baixo custo unitário. David C. Sammon explica as capacidades das membranas no artigo Processos de Membrana: Em geral, os processos de membrana oferecem a possibilidade de separar a água de vários tipos de solutos e separá-los pelo tamanho ou porque alguns são ionizados e outros não. Além desses casos, nos quais é alcançado um alto grau de separação, há muitos em que a composição do material dissolvido é alterada. Um exemplo é a osmose reversa, com o permeado com um teor de sal consideravelmente reduzido. Osmose direta e reversa Na purificação da água, as membranas são utilizadas na osmose e na osmose reversa, além de outros processos. A osmose direta, ou simplesmente osmose, é um processo físico no qual um solvente se move através de uma membrana semipermeável. É mais conhecido como o processo que as células usam para transportar água. A água está presente nos dois lados da membrana, com diferentes níveis de minerais dissolvidos nos dois lados. UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL 204 A água com a maior concentração de solutos é diluída naturalmente. Jean- Antoine Nollet, cientista e clérigo francês, observou, pela primeira vez, a osmose, em 1748, e cunhou o termo com base nas palavras gregas endosmose e exosmose. A osmose reversa (RO), pelo contrário, depende da pressão para forçar a água através de uma membrana, separando a água das impurezas. Uma pesquisa de 2018, realizada por profissionais da indústria, acerca da eficácia das tecnologias de reuso de água, colocou a RO entre as mais bem classificadas. Embora a RO seja frequentemente usada para a dessalinização, também é usada para o tratamento de efluentes e reuso de água. Ainda, para a remoção de vestígios de fosfatos, cálcio, metais pesados e outras substâncias. Microfiltração e ultrafiltração Nas tecnologias de membrana baseadas em partículas de bloqueio, incluindo microfiltração e ultrafiltração, o tamanho dos poros é importante, pois determina o tamanho das partículas e microrganismos que podem atravessar a barreira. As membranas de poros pequenos, utilizadas na ultrafiltração, bloqueiam proteínas, ácidos graxos, macromoléculas, bactérias, protozoários, vírus e sólidos em suspensão. Desafios do processo de membrana A eficácia do tratamento da membrana, geralmente, depende das condições. Por exemplo, para que as tecnologias de osmose reversa funcionem eficientemente, a manutenção da membrana deve ser impecável ou ela pode ficar suja com incrustações ou biofilmes, um problema eterno. Impurezas podem reduzir a eficácia e aumentar o consumo de energia. Muita pesquisa é dedicada ao design de membranas para resistir a incrustações, através de revestimentos especializados e de outros tratamentos, como a alteração da carga do material da membrana. Em meados da década de 2010, pesquisadores, em Israel, desenvolveram um importante processo sem produtos químicos para evitar impurezas na membrana no processo de dessalinização de RO. O processo evita a incrustação da membrana, reduz os custos químicos e torna a dessalinizaçãomais ecológica. O pré-tratamento, com um filtro de bio-floculação rápida granular (RBF) em duas etapas, um bio-floculador de primeira etapa (BF) e um filtro de leito de mídia misto (MBF), evita que agentes sujos cheguem à membrana. Tudo isso fez com que o processo fosse muito mais rentável, o que gerou um crescimento global exclusivo da tecnologia. Aproveitamento das Propriedades dos Biofilmes As membranas usadas no tratamento e no reuso de efluentes também são vulneráveis à incrustação de biofilme. A formação de biofilmes, nas membranas de filtração, e a obstrução resultante dos poros (incrustações biológicas), são problemas difíceis enfrentados pelas operações. Em algumas aplicações, a desinfecção de membranas a 85°C é usada para manutenção sem produtos químicos. No entanto, em um reator de biofilme de membrana aerada (MABR), o biofilme é, realmente, usado para fazer o trabalho pesado no processo de tratamento. As membranas usadas no MABR, um tratamento biológico, são semipermeáveis em escala molecular, para auxiliar na aeração sem bolhas, o que permite o crescimento robusto de microrganismos úteis. TÓPICO 1 —TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS 205 A membrana aerada em espiral vertical é permanentemente limpa com bolhas do fundo, o que evita o entupimento, devido ao crescimento excessivo de biofilme. Tratamentos Combinados Os processos de membrana são frequentemente combinados com outros processos para fornecer soluções abrangentes de tratamento de água. Por exemplo, a instalação da Central Puerto, Buenos Aires, Argentina, precisava tratar a água do rio antes de ser utilizada em equipamentos industriais. A ultrafiltração foi usada em combinação com osmose reversa para criar a água desmineralizada para a caldeira de alta pressão da planta. O processo de ultrafiltração ajudou em problemas de incrustação de membranas. O tratamento da água de minas é outro exemplo de processo combinado. Normalmente, os efluentes das operações de mineração são extremamente altos no total de sólidos em suspensão e coloides. A ultrafiltração pode remover essas partículas para prepará-las para o tratamento com osmose reversa. Em alguns casos, a água passa por osmose reversa duas vezes para atingir as especificações finais e alcançar um tratamento completo da água. FONTE: https://tratamentodeagua.com.br/membranas-tratamento-agua-processos/. Acesso em: 6 fev. 2021. 206 Neste tópico, você aprendeu que: • Efluente é todo resíduo líquido ou gasoso que, proveniente das diversas atividades humanas, é lançado no meio ambiente. Resulta de atividades industriais, agrícolas ou dos esgotos domésticos urbanos. • Os efluentes líquidos industriais são originários das águas empregadas na área de utilidades e/ou processos industriais. As características dependem da natureza da indústria (metalúrgica, têxtil, alimentícia etc.), das matérias- primas processadas, das etapas de transformação utilizadas no processo, da incorporação de substâncias indesejáveis à água (ex.: detergentes, solventes, pigmentos, óleos etc.), do porte da indústria e do modelo de gestão utilizado. • Um efluente doméstico se trata de toda água residuária gerada pelas atividades e necessidades humanas em uma residência e que flui através da rede de esgoto. • Existe uma classificação que diferencia os tipos de efluentes (“esgotos”) existentes: efluentes domésticos, efluentes industriais, águas pluviais e águas de infiltração. • O tratamento de esgotos tem a finalidade de remover a matéria orgânica (reduzir a DBO), o material em suspensão, além da remoção de patógenos e de nutrientes (N e P – nitrogênio e fósforo). • Os tratamentos de efluentes mais utilizados mundialmente são os biológicos, que apresentam, como elemento principal, os microrganismos, realizando a remoção da matéria orgânica e de outros compostos. • O tratamento biológico é o método mais eficiente de remoção da matéria orgânica dos efluentes líquidos. O próprio efluente apresenta grande diversidade de bactérias e de protozoários para compor as culturas microbiais mistas que processam os poluentes orgânicos. • Além da DBO, outros parâmetros importantes a serem mensurados são a medição do carbono orgânico (Carbono Orgânico Total – COT) e a Demanda Química de Oxigênio. • A relação DQO/DBO pode ser empregada como indicativo da biodegradabilidade dos despejos, o que propicia auxílio na escolha do tratamento a ser empregado. • Os MO desempenham um papel preponderante em sistemas de tratamento biológico de esgoto, sendo os responsáveis pela estabilização da matéria orgânica e pela remoção de nutrientes. RESUMO DO TÓPICO 1 207 • Os protozoários ciliados são essenciais para a produção de um efluente de boa qualidade. A atividade predatória desses organismos sobre o crescimento disperso bacteriano é responsável pela clarificação e pela redução do número de coliformes durante o processo de lodo ativado. • As bactérias heterotróficas apresentam função-chave no tratamento biológico, sendo responsáveis pela degradação da matéria orgânica. Ainda, aglomeram- se em estruturas, como flocos, biofilmes e grânulos. • Nos lodos ativados típicos, o crescimento da biomassa ocorre de forma dispersa, dando origem aos flocos. Para o sucesso da operação de uma estação, utilizando o processo de flocos, é necessário um equilíbrio entre as bactérias filamentosas e as formadoras de flocos. • Os flocos são constituídos não somente de bactérias, mas, também, de protozoários, fungos e nematoides. Essa diversidade microbiana proporciona uma característica de biofilme. • O sistema de lodos ativados se fundamenta em promover o desenvolvimento de uma cultura microbiológica na forma de flocos (lodos ativados) em um tanque de aeração, que é alimentada pela carga orgânica contida no efluente a tratar. • Para o tratamento de efluentes industriais com alto teor de matéria orgânica, têm sido aplicados os reatores biológicos anaeróbios, em virtude das vantagens técnicas e econômicas, e um dos principais é o reator anaeróbio de fluxo ascendente com manta de lodo (UASB). • A digestão anaeróbica pode ser considerada um processo no qual vários grupos de microrganismos trabalham em sinergia na conversão da matéria orgânica complexa em produtos finais, como metano, dióxido de carbono, sulfeto de hidrogênio, água e amônia. • Os reatores do tipo UASB empregam biomassa suspensa ou aderida, denominada de manta de lodo, para a degradação da matéria orgânica presente no esgoto afluente. • As bactérias presentes na biomassa dos reatores UASB formam flocos de boa sedimentabilidade. Assim, com o passar do tempo, parte da biomassa se deposita no fundo do reator, formando uma camada denominada de leito de lodo. • Existem vantagens e desvantagens no emprego de processos aeróbios e anaeróbios no tratamento de efluentes líquidos. 208 1 A avaliação dos parâmetros DBO e DQO é comumente utilizada na determinação do grau de poluição das águas e dos efluentes líquidos. A respeito dos parâmetros DQO, DBO5 e COT, utilizados no controle do tratamento de efluentes, é CORRETO afirmar: a) ( ) A DBO5 se refere à quantidade de oxigênio dissolvido necessária para que a matéria orgânica contida no efluente seja reduzida a 5% do valor original. b) ( ) A relação DQO/DBO5 fornece indicações da biodegradabilidade do efluente e do tipo de processo a ser utilizado no tratamento. c) ( ) Uma relação DQO/DBO baixa sinaliza que a porção biodegradável é baixa, o que indica a utilização de tratamento químico. d) ( ) A análise de COT requer a necessidade de eliminação de 50% do carbono inorgânico da amostra. 2 No que diz respeito ao reator do tipo UASB − reator anaeróbio de fluxo ascendenteem manto de lodo, analise as sentenças que seguem: I- O reator UASB é uma tecnologia de tratamento biológico de esgotos fundamentada na decomposição aeróbia facultativa da matéria orgânica. Apresenta uma coluna de escoamento ascendente, composta por uma zona de digestão aeróbia, uma zona de sedimentação, e o dispositivo separador de fases gás-sólido-líquido. II- O esgoto adentra no reator e, após ser distribuído pelo fundo, segue uma trajetória ascendente, desde a parte mais baixa até encontrar a manta de lodo, ocorrendo a mistura, a biodegradação e a digestão anaeróbia da matéria orgânica, tendo, como subproduto, a geração de gases metano, carbônico e sulfídrico. III- Ainda em escoamento ascendente, e através de passagens definidas pela estrutura dos dispositivos de coleta de gases e de sedimentação, o esgoto alcança a zona de sedimentação. IV- A manutenção de um leito de sólidos em suspensão constitui a manta de lodo, e, em função do fluxo contínuo e ascendente de esgotos, ocorre a decomposição do substrato orgânico pela ação de organismos anaeróbios. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. b) ( ) As sentenças I, II, e III estão corretas. c) ( ) As sentenças I, III, e IV estão corretas. d) ( ) As sentenças I, II, III e IV estão corretas. AUTOATIVIDADE 209 3 O tratamento do esgoto, por meio de um processo denominado de “lodo ativado”, é baseado na capacidade natural de depuração ou “purificação” da água com elevados níveis de matéria orgânica, por meio da atividade de microrganismos e micrometazoários (animais microscópicos). À medida que os microrganismos modificam as características físicas e químicas da água, determinados grupos funcionais vão se tornando mais abundantes. Ao mesmo tempo, as relações tróficas entre os organismos também determinam mudanças na composição e na abundância da microfauna (fauna de organismos microscópicos). O acompanhamento dessas mudanças permite avaliar a eficiência de cada etapa do processo de depuração da água. Dentre os organismos atuantes nesse processo, podemos destacar quatro grupos funcionais: I. Protozoários Ciliados e Flagelados: se alimentam da matéria orgânica dissolvida na água. II. Protozoários Ciliados Bacterívoros: se alimentam de bactérias heterotróficas. III. Bactérias Heterotróficas: se alimentam da matéria orgânica dissolvida na água. IV. Anelídeos e Rotíferos: se alimentam dos protozoários. A partir do enunciado, responda à seguinte questão: Qual (ou quais) dos quatro grupos funcionais poderiam ser encontrados com maior abundância na fase ini- cial (esgoto bruto) do processo de depuração da água? 210 211 UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO TÓPICO 2 — BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS Acadêmico, neste tópico, abordaremos a biorremediação. Com certeza, você já deve ter ouvido falar a respeito dos meios de comunicação em geral, especialmente, nos estudos/casos de contaminação de águas por petróleo e da utilização de microrganismos para a remoção, não é mesmo?! Então, vamos lá... Qual é o conceito de biorremediação? 2 CONCEITOS DE BIORREMEDIAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO Biorremediação é definida como o processo no qual organismos vivos, normalmente, plantas, microrganismos ou enzimas, são empregados, tecnologicamente, para remover (remediar) ou reduzir poluentes no ambiente (GAYLARD; BELLINASO; MANFIO, 2005 apud PEREIRA; FREITAS, 2012). O processo metabólico que tem se mostrado mais apto em biodegradar moléculas xenobióticas (moléculas estranhas ao ambiente natural) recalcitrantes (moléculas de difícil degradação) nos processos de biorremediação é o microbiano, uma vez que os microrganismos desempenham a tarefa de reciclar a maior parte das moléculas da biosfera, participando dos principais ciclos biogeoquímicos e representando, portanto, o suporte de manutenção da vida na Terra (GAYLARD; BELLINASO; MANFIO, 2005 apud PEREIRA; FREITAS, 2012). Outro conceito é apresentado por Yakubu (2007), que define a biorremediação como um processo biotecnológico no qual se utiliza o metabolismo de microrganismos para a eliminação rápida de poluentes, com a finalidade de diminuir a concentração a níveis aceitáveis, transformando-os em compostos de baixa toxicidade. Conceito similar é trazido pela Agência de Proteção Ambiental Americana (EPA), cuja biorremediação é definida como o uso de microrganismos para limpar/descontaminar solos e águas subterrâneas contaminadas. Assim, a biorremediação estimula o crescimento de certos microrganismos que utilizam os contaminantes como fonte de alimento e de energia. Contaminantes tratados, empregando-se a biorremediação, incluem óleo e outros derivados de petróleo, solventes e pesticidas (EPA, 2012). 212 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL FIGURA 10 – ESQUEMA SIMPLIFICADO DA AÇÃO DE MICRORGANISMOS EM PROCESSOS DE BIORREMEDIAÇÃO FONTE: <https://www.researchgate.net/figure/Figura-2-Esquema-simplifi-cado-da-acao-de- microorganismos-em-processos-de-biorremediacao_fig1_260766257>. Acesso em: 9 fev. 2021. A biorremediação pode ser classificada em in-situ e ex-situ (off-site). Conforme o nome já menciona, a primeira se caracteriza por ser um tratamento realizado no próprio local de contaminação. Já a segunda, por ser realizada fora de onde ocorreu a contaminação, é um tratamento que requer a escavação e a remoção do solo contaminado para outro local (ANDRADE; AUGUSTO; JARDIM, 2010). São exemplos de biorremediação in-situ: atenuação natural, bioaumentação, bioestimulação, fitoremediação e landfarming. Como exemplos de ex-situ, citam-se a compostagem e os biorreatores. Cabe salientar que a biorremediação ex-situ, ou off-site, normalmente, apresenta aumento dos custos do tratamento, pois envolve, além dos custos relacionados com o tratamento propriamente dito, custos com o desenvolvimento da área que deve receber o solo, remoção do solo, transporte e disposição final do solo tratado, além de outras exigências, como o treinamento de um grande número de pessoas. Ainda, essa prática apresenta a desvantagem de que a remoção do solo deve ser realizada com todos os cuidados para que não ocorra a propagação da contaminação para meios, a princípio, não afetados, necessitando da realização prévia de uma análise de risco por diferentes vias de contaminação, um incremento dos custos do tratamento, como aérea, aquática etc. (ANDRADE et al., 2010 apud ALVES, 2014). TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 213 Quanto ao tipo de metabolismo, a biorremediação pode ser classificada de aeróbia, anaeróbia e cometabólica. Na biorremediação aeróbia, há reações microbianas que exigem oxigênio para acontecerem. No caso, a bactéria emprega um substrato carbônico como doador de elétrons, e oxigênio, como aceptor. Já na biorremediação anaeróbia, ocorrem reações na ausência de oxigênio, abrangendo muitos processos, incluindo fermentação, metanogênese, decloração redutiva e condições de redução de sulfato e de nitrato. FIGURA 11 – BIORREMEDIAÇÃO - AERÓBIA E ANAERÓBIA FONTE: <https://www.researchgate.net/figure/Illustrating-the-difference-between-aerobic-and- anaerobic-bioremediation_fig2_336446238>. Acesso em: 6 fev. 2021. A decloração redutiva utiliza processos químicos e biológicos para acelerar a redução de compostos organoclorados (compostos orgânicos que contêm cloro na composição química). São substâncias largamente empregadas na fabricação de pesticidas. NOTA 214 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL Dependendo do contaminante, um subconjunto dessas atividades pode ser cultivado.No metabolismo anaeróbio, nitrato, sulfato, CO2, materiais oxidados ou componentes orgânicos podem substituir o oxigênio como aceptor de elétrons (EPA, 2021). FIGURA 12 – REAÇÃO QUÍMICA DE CORROSÃO DO ALUMÍNIO (AL) EM SOLUÇÃO AQUOSA DE ÁCIDO CLORÍDRICO (HCL) FONTE: <https://brasilescola.uol.com.br/quimica/conceito-exemplos-agente-redutor-agente- oxidante.htm>. Acesso em: 9 fev. 2021. Legenda: Observe como o Al transferiu elétrons, isso significa que ocasionou a redução dos cátions H+ (aq). Essa é a razão pela qual é denominado de agende redutor. Já o cátion H+ (aq) retirou os elétrons do alumínio, causando a oxidação do metal, portanto, atua como um agente oxidante. Outra classe de biorremediação é a biorremediação cometabólica. Os MO não obtêm energia a partir da degradação de carbono ou contaminante. Esse tipo de biorremediação pode ser aeróbio ou anaeróbio. No primeiro, o contaminante é oxidado por uma enzima ou cofator produzido durante o metabolismo microbiano ou outro componente que contenha oxigênio. Já no segundo, o contaminante é reduzido por enzima ou cofator produzido durante o metabolismo microbiano ou outro componente no ambiente desprovido de oxigênio. Nesses casos, a biodegradação do contaminante não provê energia ou crescimento para o MO mediador da reação (EPA, 2000 apud EPA, 2021). É importante destacar que a abordagem de biorremediação mais adequada (aeróbia, anaeróbia ou cometabólica) depende do tipo do contaminante e das condições presentes no local (ex.: temperatura, pH, concentração do contaminante etc.) (EPA, 2021). Assim, a seguir, estarão dispostos alguns exemplos da biodegradabilidade de certos contaminantes e as condições preferenciais (aeróbias ou anaeróbicas) de degradação. TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 215 QUADRO 5 – BIODEGRADABILIDADDE DO CONTAMINANTE E CONDIÇÕES PREFERENCIAIS DE DEGRADAÇÃO Contaminante Degradabilidade microbiana Condições preferenciais Hidrocarbonetos de óleo mineral Alta Baixa Hidrocarbonetos de óleo mineral de cadeia curta x Aeróbica Hidrocarbonetos de óleo mineral de cadeia longa/ ramificada x Aeróbica Cicloalcanos x Aeróbica Pesticidas g-Hexaclorocicloexano (Lindano) – inseticida sólido x Anaeróbio/aeróbico Atrazinas (herbicidas) x Aeróbica Dioxinas PCDD/F (dioxinas+furanos) x Anaeróbica Componentes inorgânicos Amônio x Anaeróbio/aeróbio Nitrato x Anaeróbica Sulfato x Anaeróbica FONTE: Adaptado de EPA (2021) A biorremediação é considerada o aprimoramento dos processos de biodegradação. Nesse contexto, os principais agentes dessa aceleração são (MORAIS FILHO; CORIOLANO, 2016; VICENTE, 2020): • Bioestímulo (bioestimulação): acréscimo de nutrientes. Trata-se de criar condições para o aumento de populações autóctones degradadoras do poluente. • Bioaumento (bioaumentação): introdução de microrganismos degradadores do poluente. Nesse caso, existem três tipos de técnicas que podem ser empregados: utilização de MO autócnones: isolamento e seleção de microrganismos a partir de amostras do próprio-ambiente a ser tratado; utilização de MO alóctones: seleção de microrganismos a partir de amostras de coleções de cultura ou de outro ambiente; OGMS: introdução de organismos geneticamente modificados. • Biorremediação intrínseca: atenuação natural/monitorada. Está baseada no monitoramento da capacidade de biodegradação dos microrganismos nativos de degradarem o contaminante, sem que haja o acréscimo de nutrientes ou qualquer adequação do ambiente. Dessa forma, os microrganismos, no local, passam a utilizar o contaminante como fonte de carbono (energia) para reduzir, com o tempo, os níveis de concentração. 216 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL A partir do exposto, podemos notar, acadêmico, que a biorremediação é uma tecnologia de grande complexidade, e a implementação ocorre em fases que abarcam um estudo do ambiente, do tipo de contaminante e dos riscos envolvidos. FIGURA 13 – ESQUEMA GERAL DAS ETAPAS PARA A DEFINIÇÃO E A IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROCESSO DE BIORREMEDIAÇÃO FONTE: <https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/85/85134/tde-15052017-160603/ publico/2017ConicelliBiossorcao.pdf>. Acesso em: 9 fev. 2021. A seguir, conheceremos alguns dos principais MO utilizados no processo de biorremediação. Sigamos em frente! 3 MICRORGANISMOS EMPREGADOS NO PROCESSO DE BIORREMEDIAÇÃO No caso específico da utilização de microrganismos, estes podem ser de ocorrência natural (nativos) ou cultivados, sendo que bactérias, fungos filamentosos e leveduras são os mais utilizados, porém, as bactérias são os principais microrganismos que atuam na biorremediação de contaminantes (GAYLARDE et al., 2005; CASTELO-GRANDE et al., 2007; ROCHA et al., 2009; ANDRADE et al., 2010 apud BRAUN et al., 2019). TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 217 A eficiência de um microrganismo ou outro no processo de biorremediação é dependente, em muitos casos, da estrutura da molécula e da presença de enzimas hábeis em degradar o produto, as quais apresentam especificidade para a maioria dos substratos (MEYER, 1978 apud PEREIRA; FREITAS, 2012). É, por meio desse mecanismo, que a biorremediação é efetivada. Os fungos apresentam diversas características que os tornam organismos interessantes para a aplicação em sistemas de biorremediação. Esses organismos possuem a capacidade de crescer sob condições de estresse ambiental, que podem gerar limitação do crescimento de bactérias, além do próprio modo de crescimento induzido quimiostaticamente, em direção à fonte de carbono orgânico, através do alongamento e da ramificação das hifas, que possibilitam a colonização de grandes áreas. Outra característica importante é o sistema de biodegradação fúngico, efetuado por enzimas extracelulares. Assim, o contato superficial com o contaminante é otimizado, aumentando a biodisponibilidade e, por consequência, a biodegradação (CHANDER; ARORA; BATH, 2004 apud PEREIRA; FREITAS, 2012). Os fungos são capazes de transformar e de mineralizar contaminantes ambientais, como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, corantes azo, herbicidas e outros compostos tóxicos, através da ação das enzimas extracelulares (SOARES, 2012). Muitos fungos, incluindo as espécies Aspergillus niger, Aspergillus terreus, Cladosporium oxysporum, Mucor thermohyalospora, Fusarium ventricosum, Phanerochaete chrysosporium e Trichoderma harzianum têm sido testados pela habilidade em degradar o composto endosulfan (BHALERAO; PURANIK, 2007 apud GUPTA et al., 2020), um tipo de inseticida e acaricida. León-Santiesteban et al. (2016) apud Gupta et al. (2020) reportaram que um tipo de fungo Rhizopus oryzae CDBB-H-1877 apresenta o potencial de biossorção da substância pentaclorofenol (desinfetante, fungicida, bactericida etc.), por meio da metilação e da descloração. Estudos demonstraram, também, que poucos fungos zigomicetos e Aspergillus spp. apresentam as capacidades de descolorir e de desintoxicar efluentes de indústrias têxteis. Biossorção é um processo que emprega materiais biológicos, como adsorventes. Esse método tem sido largamente estudado por diversos pesquisadores enquanto técnica alternativa aos métodos convencionais para remoção de metais pesados de efluentes líquidos. NOTA 218 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL FIGURA 14 – DIAGRAMA SIMPLIFICADO DAS INTERAÇÕES FÚNGICAS COM HIDROCARBONETOS DE PETRÓLEO E METAIS TÓXICOS FONTE: <https://link.springer.com/article/10.1007/s00253-020-10854-y>. Acesso em: 6 fev. 2021. Legenda: com a biomineralização, os microrganismos (neste caso, os fungos) excretam substâncias que provocam a precipitaçãodos metais sob uma forma insolúvel, reduzindo a mobilidade no solo. Algumas espécies de fungos, como Penicillium chrysogenum, Scedosporium apiospermum, Penicillium digitatum e Fusarium solani são, também, conhecidas pela capacidade de degradação de bifenilos policlorados (conhecidos como PCBs). Esses fungos demonstram o envolvimento de enzimas não lignolíticas na degradação dos PCBs (TIGINI et al., 2009 apud GUPTA et al., 2020). Pesquisas apontam a levedura Saccharomyces cerevisiae com potencial de remover vários tipos de corantes têxteis diazo (AKSU, 2003 apud TOLLER, 2019). A biomassa de S. cerevisiae também foi empregada como adsorvente na remoção de chumbo (Pb2+) (FERREIRA et al., 2007 apud TOLLER, 2019), além de possuir capacidade de bioacumular diversos metais, como prata, cádmio, cobalto, cobre, urânio, zinco e tório (LEMOS et al., 2008 apud TOLLER, 2019). Os PCBs (do inglês, polychlorinated biphenyls), ou por ascarel, são misturas de até 209 compostos clorados, que variam de nome, de acordo com a posição relativa dos átomos de cloro na estrutura. Essas substâncias integram o grupo genericamente denominado de dioxina e foram sintetizadas, inicialmente, por volta de 1800, na Alemanha, porém, a produção industrial teve início a partir de 1922. NOTA TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 219 Na literatura, há, também, vasta documentação da utilização de bactérias em processos de biorremediação. Bactérias do gênero Curpiadivus sp. por exemplo, possuem grande importância na biorremediação de metais tóxicos de solos, pois, além de apresentarem diversos mecanismos de resistência a essas substâncias, especialmente, ao metal cobre, podendo sobreviver em ambientes com elevadas concentrações, são compostos por facilitadores de difusão, aumentando a capacidade de retenção dos metais (GAD; WHITE, 1989; VANDAMME; COENYE, 2004 apud BRAUN, 2019). Surgiram bons resultados na degradação da gasolina comercial por bactérias das espécies Pseudomonas putida e Pseudomonas aeruginosa. Outros gêneros bacterianos têm sido descritos como potenciais degradadores de petróleo de ambientes contaminados, como Acidovorans, Acinetobacter, Agrobacterium, Alcaligenes, Aeromonas, Arthrobacter, Beijemickia, Burkholderia, Bacillus, Comomonas, Corynebacterium, Cycloclasticus, Flavobacterium, Gordonia, Microbacterium, Moraxella, Mycobacterium, Micrococcus, Neptunomonas, Nocardia, Paracoccus, Pasteurella, Polaromonas, Pseudomonas, Ralstonia, Rhodococcus, Sphingomonas, Stenotrophomonas, Streptomyces e Vibrio (CRAPEZ et al., 2002; JACQUES et al., 2007; MANDRI; LIN, 2007 apud TONINI; REZENDE; GRATIVO, 2010 apud PEREIRA; FREITAS, 2012). Pesquisas têm sido conduzidas com a bactéria Alcanivorax borkumensis, como potencial MO degradador de hidrocarbonetos, substâncias presentes no petróleo. Trata-se de um organismo aeróbio com a capacidade de empregar alcanos como fonte de carbono. Os resultados são promissores e oferecem a esperança de uma técnica eficaz e ecológica para fazer descontaminações em caso de derramamento de óleo (CICLO VIVO, 2018). FIGURA 15 – FOTOMICROGRAFIA DA BACTÉRIA ALCANIVORAX BORKUMENSIS FONTE: <https://throughthesandglass.typepad.com/through_the_sandglass/2010/06/ alcanivorax-borkumensis---oil-eating-bacteria-where-are-you.html>. Acesso em: 6 fev. 2021. 220 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL Acadêmico, assista ao vídeo que explica a ação dos microrganismos na descontaminação de ambientes que sofreram derramamento de petróleo: https://www. youtube.com/watch?v=a_HWlFzgQiM&feature=emb_logo. DICAS Obviamente, existem vantagens, mas, também, limitações da técnica de biorremediação: QUADRO 6 – VANTAGENS E LIMITAÇÕES DA TÉCNICA DE BIORREMEDIAÇÃO Vantagens Limitações • Capacidade de microrganismos biodegradarem substâncias nocivas em vez de transferir o contaminante de um meio a outro. • Baixo custo, quando comparado a outras técnicas de remediação. • Elevada diversidade de ação, permitindo a incorporação dessa técnica a uma variedade de agentes contaminantes e poluentes. • Capacidade de degradar substâncias perigosas em vez de apenas transferir o contaminante de um meio para outro. • Produtos utilizados não apresentam risco ao meio ambiente e não são tóxicos. • Uso em áreas de proteção ambiental. • Pode ser usado com outras tecnologias de tratamento. • Necessidade de um melhor entendimento em relação à ação microbiológica sobre os resíduos a serem biorremediados. • Método em evolução no Brasil. • Necessidade de acompanhamento durante o processo. • Muitas moléculas não são biodegradáveis. • Substâncias tóxicas, ao microrganismo, inviabilizam o tratamento. • Requisitos e eficiência de remoção podem variar, consideravelmente, de um local para outro. • Há um risco para a acumulação de produtos tóxicos da biodegradação. FONTE: Adaptado de Lacerda, Navoni e Amaral (2019) Enzimas formam tesoura molecular que destrói PET Redação do Site Inovação Tecnológica - 16/04/2019 Enzimas que comem PET Em 2016, um grupo de pesquisadores japoneses descobriu uma bactéria que cresce no PET (polietileno tereftalato), no material das garrafas de refrigerante, e se alimenta, parcialmente, do polímero tão difícil de degradar. NOTA TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 221 Descobriram que a bactéria Ideonella sakaiensis possui duas enzimas especiais, PETase e MHETase. A PETase decompõe o plástico em blocos de construção de PET menores, principalmente, o MHET, e a MHETase divide esse MHET em dois blocos precursores básicos do PET, o ácido tereftálico e o etilenoglicol. Ambos os componentes são muito valiosos para sintetizar um PET novo sem a adição de petróleo, para um ciclo de produção e recuperação sustentável e fechado. PETase e MHETase Para desfrutar de todo o potencial dessa dupla, é necessário desvendar a estrutura tridimensional das duas enzimas, permitindo a construção de versões sintéticas otimizadas, que não atendam apenas às necessidades das bactérias, mas à necessidade de lidar com imensos volumes de lixo. Em abril de 2018, a estrutura da PETase foi, finalmente, resolvida, de forma independente por vários grupos de pesquisa. Agora, Gottfried Palm e colegas da Universidade Greifswald, na Alemanha, desvendaram a estrutura da MHETase. "A MHETase é, consideravelmente, maior do que a PETase, e ainda mais complexa. Uma única molécula de MHETase consiste em 600 aminoácidos, ou cerca de 4.000 átomos. A MHETase tem uma superfície que é, aproximadamente, duas vezes maior do que a superfície da PETase e tem, portanto, um potencial consideravelmente maior de otimização para a decomposição do PET," disse o professor Gert Weber. Decifrar a estrutura permitiu que os pesquisadores vissem exatamente onde a molécula MHET, produzida pela PETase, liga-se à MHETase, onde é quebrada em dois componentes formadores. Foi possível produzir uma variante MHETase com atividade otimizada, a fim de utilizá-la, com a PETase, para uma reciclagem sustentável do PET. Os resultados foram tão promissores que a equipe chamou o composto de "tesoura molecular para cortar PET". ESTRUTURA DA MHETASE 222 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL Ciclo biotecnológico Foi um primeiro passo, mas otimizações adicionais serão necessárias porque nem a PETase e nem a MHETase são, particularmente, eficientes do ponto de vista de uma reciclagem em escala industrial. A equipe planeja complementar esses estudos de otimização com trabalhos das estruturas biológicas, a fim de desenvolver, sistematicamente, enzimas de digestão de plástico para aplicações ambientais. Produzir esses tipos de enzimas em ciclos biotecnológicos fechados, por exemplo, pode ser uma maneira de quebrar os plásticos PET e outros polímerosnos blocos básicos. Essa também seria a chave para uma solução de longo prazo para a reciclagem dos resíduos plásticos: A produção de plástico seria um ciclo fechado e não mais dependente do petróleo. FONTE: https://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=enzimas- tesoura-molecular-destroi-pet&id=010125190416#.YB8JtOhKjIV. Acesso em: 6 fev. 2021. Acadêmico, estudamos o papel dos fungos e das bactérias no processo de biorremediação, além de conhecermos as vantagens e as limitações da técnica. Verificamos, também, a grande potencialidade da biorremediação, pois esta otimiza reações que já ocorrem no ambiente natural. Partimos, então, para a leitura complementar, que apresentará outros casos práticos/avanços obtidos na área. Bons estudos! Microrganismos são alternativa sustentável para recuperação de áreas contaminadas O avanço da microbiologia tem estimulado o uso de fungos e bactérias no tratamento de poluentes – a chamada biorremediação Luanne Caires A discussão dos combustíveis está em alta no Brasil. Em maio, caminhoneiros de todo o país iniciaram uma paralisação motivada, principalmente, pelo aumento do preço do diesel, o que afetou o abastecimento de produtos e causou prejuízos para alguns setores, mas os impactos dos combustíveis vão muito além dos aspectos econômicos. Eles geram um custo ambiental elevado: segundo o último relatório da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), há 5.942 áreas com algum grau de contaminação no estado, sendo 72% delas em decorrência da atividade de postos de combustíveis. A recuperação dessas áreas conta com aliados muito importantes, mas pouco lembrados: os microrganismos. NOTA TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 223 Bactérias dos gêneros Bacillus, Pseudomonas, Rhodobacter e Achromobacter são exemplos de microrganismos capazes de degradar petróleo e derivados por um processo conhecido como biorremediação. Além das bactérias, fungos e plantas, também são utilizados para remover ou degradar contaminantes ambientais. A contaminação por petróleo, metais pesados, agrotóxicos, esgoto e outros resíduos também pode ser revertida com a aplicação dessa técnica versátil e, muitas vezes, mais barata e ecologicamente sustentável do que as técnicas tradicionais. MICRORGANISMOS QUE ESTÃO NATURALMENTE NO AMBIENTE SÃO ELEMENTOS IMPORTANTES NA DEGRADAÇÃO DO PETRÓLEO, TRANSFORMANDO-O EM GÁS CARBÔNICO E ÁGUA FONTE: Fisheries and Oceans, Canadá Comparada a outros métodos físicos e químicos, a biorremediação se destaca por otimizar processos que já ocorrem naturalmente. Os microrganismos presentes nas áreas contaminadas são resistentes às condições alteradas pelos poluentes, e muitas das espécies têm mecanismos para transformar ou incorporar o contaminante. Elen Aquino, pesquisadora da Unifesp e do Centro de Pesquisa em Meio Ambiente da USP (Cepema), explica que, por essa razão, a busca por organismos biorremediadores é realizada em locais com contaminação comprovada, pois, nessas áreas, o conjunto de bactérias (microbiota) já está adaptado ao contaminante de interesse. “Amostras do ambiente contaminado são coletadas, e os microrganismos são selecionados e criados em laboratório, etapa que pode variar de dias a meses, dependendo da toxicidade do poluente e da biodiversidade contida na amostra ambiental. Depois, os microrganismos passam para um reator industrial, para aumento de escala e geração de um produto biotecnológico, etapa, geralmente, realizada por empresas da área de saneamento”, diz Aquino. Escolha da melhor técnica Depois que os microrganismos com potencial são encontrados, a aplicação da biorremediação se dá de duas formas. A primeira delas é baseada no princípio da bioestimulação, utilizando microrganismos do próprio local contaminado e estimulando a atividade com a adição de nutrientes, oxigênio e outros compostos. 224 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL Em locais nos quais os microrganismos nativos são insuficientes para a degradação do contaminante, pode haver a aplicação de microrganismos externos, gerando uma atividade mais eficiente. Essa técnica é conhecida como bioaumentação e tem risco ambiental reduzido, pois os microrganismos adicionados ao local precisam ser específicos para biodegradar o contaminante, e atuam sem interferência nos processos naturais típicos da área. A escolha da melhor técnica depende das características dos próprios poluentes e das condições ambientais da área contaminada, como temperatura, acidez ou alcalinidade e concentração de nutrientes. Segundo Aquino, “áreas contaminadas com compostos orgânicos são as que apresentam melhores resultados, porque o próprio contaminante serve de fonte de alimento para os microrganismos, e pode ser completamente degradado a gás carbônico, água e sais minerais. Os compostos mais difíceis de se degradar são os orgânicos clorados [como muitos pesticidas], por serem altamente tóxicos, e os compostos inorgânicos, como os metais pesados. A mistura de substâncias também pode inibir a biodegradação de alguns contaminantes da amostra”. Quando a eficiência da biorremediação é baixa, são utilizados procedimentos complementares. Juliana Freitas, pesquisadora do Laboratório Multidisciplinar em Mineralogia, Águas e Solos (Lamas – Unifesp), diz que não existe solução única para todos os problemas, e explica que, nos casos em que as condições naturais não são propícias para a biorremediação, geralmente, utiliza-se uma combinação dessa técnica com métodos físicos e químicos, como remoção, oxidação química e extração de vapores. “Às vezes, já há condições naturais propícias para a biodegradação, e, às vezes, não. Então, você precisa fazer alterações para que ela seja viável, combinar as técnicas para ter um resultado mais interessante”, afirma. Independentemente da técnica escolhida, algumas etapas são essenciais ao processo. A professora Aquino complementa com o passo a passo: primeiro, o local contaminado deve ser devidamente avaliado para que se escolha a melhor tecnologia de remediação naquele caso; depois, o produto biotecnológico deve ser liberado pelo órgão de controle ambiental competente, com testes de eficiência e de toxicidade para o ser humano e para outros organismos do meio ambiente. Petróleo, solventes e metais como principais alvos No Brasil, a principal contaminação de áreas ocorre por resíduos de postos de combustíveis, seguidos por metais e solventes halogenados (aqueles com cloro, flúor, bromo e iodo, muito utilizados em indústrias). Ao menos, essa é a realidade para os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, únicos estados brasileiros com informações sistematizadas de áreas contaminadas. O padrão é semelhante ao de outros lugares do mundo: na Europa, os metais pesados e óleos minerais contribuem com 60% da contaminação de solos e 53% da contaminação de águas subterrâneas; já nos Estados Unidos, os produtos de petróleo, solventes e metais também são os poluentes mais comuns. Exemplos bem-sucedidos do uso de microrganismos no combate a esses poluentes são antigos. No caso dos postos de combustíveis, métodos físicos e químicos ainda predominam, mas a biorremediação de petróleo foi essencial em contaminações em escalas maiores. Em 1989, um petroleiro norte-americano da Exxon Valdez se chocou contra um recife no Alasca e ocasionou o vazamento de 42 mil toneladas de petróleo no oceano, um dos mais graves vazamentos de óleo da história. Com a dificuldade de remoção física do TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 225 poluente, a petrolífera adotou a técnica de biorremediação e utilizou cerca de 48 toneladas de fertilizantes, distribuídos em diferentes pontos da costa, para aumentar a população natural de bactérias capazes de degradar o petróleo. Os resultados foram positivos. Em três anos, a área contaminadafoi reduzida para quase 1% da extensão original, e a população bacteriana retornou aos níveis considerados normais antes do acidente. Em 2010, as bactérias também foram responsáveis por grande parte da degradação de óleo no Golfo do México, após a explosão da plataforma de perfuração Deepwater Horizon, que operava para a petrolífera British Petroleu (BP). O acidente derramou milhões de litros de petróleo no mar e atingiu mais de dois mil quilômetros de costa. Na mineração, a biorremediação tem sido mais voltada para o uso das plantas como transformadoras ou acumuladoras dos contaminantes, porém, pesquisas mostraram a utilidade dos microrganismos como remediadores, com várias espécies de bactérias e fungos capazes de degradar cobre, chumbo, urânio e outros metais. As próprias mineradoras estão interessadas no desenvolvimento de técnicas que utilizam os microrganismos. É o caso da Vale, que, em 2015, estabeleceu uma parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) para pesquisar microbiota capaz de degradar o creosoto, substância utilizada antigamente, pela empresa, para conservação de madeira em ferrovias. Parcerias poderiam ser úteis no caso do desastre ambiental causado pelo rompimento da barragem de Fundão, no município de Mariana (MG), há dois anos e meio. No entanto, o uso da biorremediação não consta nos planos de remediação propostos pela Samarco após o acidente. Campos e plantações Apesar de ser menos registrada nos levantamentos de áreas contaminadas, a poluição decorrente de práticas agrícolas também tem preocupado os especialistas. No campo, por exemplo, com o uso de pesticidas. Segundo Jackson Marcondes, professor do Departamento de Biologia Aplicada à Agropecuária da Unesp, a agricultura sempre se depara com novas formas de antigos problemas. “Até há pouco tempo, as plantas transgênicas eram vistas como uma forma importante de reduzir os pesticidas, mas, hoje, as plantas que foram lançadas há algumas décadas não são mais resistentes às pragas, porque os insetos já evoluíram. Buscam-se novas ferramentas de transgenia e novos inseticidas para combater esses insetos, mas se a indústria lança novos pesticidas tóxicos, que oferecem risco ao ambiente, ela tem que trabalhar paralelamente em métodos para controlar a disseminação, e a biorremediação é uma boa medida”, afirma Marcondes. Outro problema apontado pelo pesquisador é o excesso de matéria orgânica nos plantios, como é o caso do reaproveitamento da vinhaça das indústrias sucroalcooleiras nas lavouras de cana-de-açúcar. A vinhaça é o resíduo que sobra após a destilação do caldo de cana fermentado para a obtenção de etanol e, para cada litro de etanol produzido, são gerados cerca de 13 litros de vinhaça. Como a vinhaça é rica em nutrientes, algumas usinas aplicam esse produto de volta na área de cultivo, como forma de aumentar a produtividade e de reduzir o uso de fertilizantes químicos. Contudo, é preciso cuidado. O poder poluidor da vinhaça é cerca de cem vezes maior do que o do esgoto doméstico, pois contém muita matéria orgânica, baixo pH, é muito corrosiva e sai dos destiladores a altas temperaturas (de 85 a 90°C). Com isso, os impactos negativos podem ser grandes no solo, rios, nascentes e lençóis freáticos, pois o escoamento de água carrega a vinhaça. Uma solução é o uso de microrganismos. “No tratamento de subprodutos da indústria sucroalcooleira, como a própria vinhaça, você pode ter microrganismos que atuem como 226 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL biotransformadores dessa matéria que, de maneira geral, é tóxica in natura para a própria lavoura. Os microrganismos transformam [a vinhaça] em uma forma mais aproveitável, em termos de nutrientes, com papel mais efetivo na produção e no crescimento das plantas”, complementa Marcondes. Alternativa sustentável, mas ainda pouco utilizada O investimento em processos de biorremediação cresceu muito nos últimos 30 anos em decorrência da crescente preocupação ambiental e das vantagens associadas à degradação de contaminantes por microrganismos. Segundo levantamento realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o número de patentes registradas na área de biorremediação saltou de 3, em 1982, para 529, em 2014. Os principais países responsáveis por esse aumento são Estados Unidos, China e Japão, especialmente, devido a esforços de empresas. As universidades e os órgãos governamentais aparecem em segundo plano, indicando que a iniciativa privada domina a pesquisa e a aplicação da biorremediação. Esse crescimento no uso da técnica se reflete em movimentação financeira: de acordo com pesquisa realizada pela organização Transparency Market Research, o mercado global de tecnologias e serviços de biorremediação foi avaliado em US$ 32 bilhões em 2016, e deve atingir os US$ 65 bilhões até 2025. ORIGEM DAS PATENTES EM BIORREMEDIAÇÃO FONTE: Carmo e colaboradores (2015) Apesar do crescimento do setor, a aplicação de técnicas de biorremediação ainda não é muito difundida entre as empresas que atuam no ramo de recuperação de áreas contaminadas no Brasil. Em São Paulo, das mais de 5 mil áreas contaminadas, apenas 70 passaram por algum processo de biorremediação, o que corresponde a menos de 2%. Nos Estados Unidos, essa porcentagem é de 13% para tratamento no local (in situ) e de 11% para tratamento fora da localidade (ex situ), considerando as áreas remediadas pelo Superfund, principal programa federal de remediação. Não é só em número de áreas contaminadas que a aplicação da biorremediação é limitada no Brasil. De acordo com levantamento do Instituto de Pesquisas Tecnológicas da USP (IPT), apenas 52% das empresas que atuam na cadeia produtiva de gerenciamento de áreas contaminadas (GAC) utilizam essas técnicas. Para as empresas, a principal dificuldade envolvida no processo é o longo tempo de operação da biorremediação em comparação com tecnologias físicas e químicas tradicionais. TÓPICO 2 —BIORREMEDIAÇÃO: FUNDAMENTOS E EXEMPLOS PRÁTICOS 227 O longo tempo do processo reduz o retorno financeiro da empresa e dificulta que se deem respostas rápidas aos envolvidos, como clientes, comunidade, poder público e imprensa. Essa pressão é maior quando a contaminação coloca em risco a população ou causa danos irreversíveis ao ecossistema. A estimulação do uso da biorremediação pode ser favorecida com o desenvolvimento de pesquisas que acelerem o processo. Como em outras áreas do conhecimento, a maior parte da pesquisa no país é feita nas universidades, e não nas empresas. Por essa razão, aproximar os meios acadêmico e empresarial é importante para a difusão de novas tecnologias. Em fevereiro desse ano, o governo regulamentou a nova Lei de Inovação, que pode ajudar na aproximação de órgãos públicos, universidades e iniciativa privada. No entanto, para Aquino, ainda há um longo caminho. “A parceria público- privada ainda é tímida, principalmente, pela falta de conhecimento dos mecanismos de transferência de tecnologia. O Brasil ainda não possui uma ‘cultura’ de transferência de tecnologia e as instituições científicas e tecnológicas (ICTs) apresentam dificuldades diversas para a estruturação dos núcleos de inovação. Nesse sentido, a autoavaliação institucional e a criação de um planejamento estratégico das ICTs despontam como um importante ponto de partida para a elaboração de uma política institucional de inovação, gestão de propriedade intelectual e, consequentemente, implementação de um núcleo de inovação tecnológica”, afirma a pesquisadora. Organizar e difundir informação é essencial Além de promover a integração entre empresas e centros de pesquisa e tecnologia, organizar as informações das áreas contaminadas e técnicas de remediação é essencial. No Brasil, o Banco de Dados Nacional sobre Áreas Contaminadas foi instituído por lei, em 2009, e deveria disponibilizar informações das áreas contaminadasde todos os estados brasileiros. Entretanto, apenas três têm essas informações disponíveis: São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Nos outros estados a situação é preocupante porque o sistema de gerenciamento de áreas contaminadas é incipiente, mesmo com a industrialização aumentando rapidamente. Juliana Freitas destaca que parte do problema é a baixa quantidade de pessoas treinadas para o trabalho com áreas contaminadas. “Há uma situação muito desigual entre os estados. Existe uma legislação federal para o acompanhamento de áreas contaminadas e a tendência é que isso se torne mais comum nos outros estados nos próximos anos, mas ainda é um esforço grande ter um órgão ambiental com pessoas capacitadas para trabalharem com áreas contaminadas. Boa parte dos órgãos ambientais sofre com o baixo número de profissionais com capacitação para conduzir investigações nesse setor, analisar os resultados e fazer uma análise um pouco mais completa. Então, o desenvolvimento das técnicas acaba acontecendo mais entre as empresas de consultoria. O órgão ambiental acaba ficando mais na parte de controle e fiscalização das empresas”, afirma Freitas. A divulgação sistematizada de informações facilita o conhecimento da sociedade e das empresas acerca do tamanho do problema e do potencial do uso de microrganismos como solução. “Hoje, temos uma série de recursos que podem ser explorados biotecnologicamente, mas falta difusão do conhecimento, investimentos público e privado na aplicação efetiva desses recursos, investimento em pesquisa. Por meio do conhecimento, as pessoas que atuam nessa área, realmente, podem vislumbrar a biorremediação como algo que traga um benefício não só ecológico, mas de sustentabilidade econômica. Esse processo leva tempo, depende de dinheiro e, obviamente, de difusão do conhecimento para o grande público”, diz Marcondes. 228 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL Para Freitas, as perspectivas são otimistas. Segundo ela, o uso da biorremediação tem crescido, principalmente, devido aos avanços nas técnicas de microbiologia: “embora a aplicação das técnicas de biorremediação tenha uma defasagem em relação ao desenvolvimento de técnicas de sequenciamento genético e outras possibilidades biotecnológicas, as aplicações ajudam, cada vez mais, na recuperação das áreas contaminadas”, afirma a pesquisadora do Lamas. Luanne Caires é formada em Biologia (USP). Cursa mestrado em Ecologia (USP) e é aluna de especialização em Jornalismo Científico (Labjor/Unicamp). FONTE: ahttps://www.comciencia.br/microrganismos-sao-alternativa-sustentavel-para- recuperacao-de-areas-contaminadas/. Acesso em: 6 fev. 2020. 229 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • Biorremediação se trata da técnica pela qual organismos vivos, normalmente, plantas, microrganismos ou enzimas, são empregados, tecnologicamente, para remover (remediar) ou reduzir poluentes no ambiente. • A biorremediação pode ser classificada em in-situ e ex-situ (off-site). A primeira se caracteriza por ser um tratamento realizado no próprio local da contaminação. Já a segunda, por ser realizada fora do local no qual ocorreu a contaminação, é um tratamento que requer a escavação e a remoção do solo contaminado para outro local. • Quanto ao tipo de metabolismo, a biorremediação pode ser classificada aeróbia, anaeróbia e cometabólica. • A biorremediação aeróbia envolve reações microbianas que exigem oxigênio para acontecer. • No caso da biorremediação anaeróbia, ocorrem reações na ausência de oxigênio, abrangendo muitos processos, incluindo fermentação, metanogênese, decloração redutiva e condições de redução de sulfato e de nitrato. • Existe a biorremediação cometabólica, os MO não obtêm energia a partir da degradação de carbono ou contaminante. • A técnica de biorremediação mais adequada (aeróbia, anaeróbia ou cometabólica) depende do tipo do contaminante, e das condições presentes no local. • Os principais agentes da aceleração da biorremediação são: bioestímulo (bioestimulação), bioaumento (bioaumentação) e biorremediação intrínseca. • Na biorremediação, que emprega MO, estes podem ser de ocorrência natural (nativos) ou cultivados, sendo que bactérias, fungos filamentosos e leveduras são os mais utilizados. • Os fungos apresentam as capacidades de transformar e de mineralizar contaminantes ambientais, como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, corantes azo, herbicidas e outros compostos tóxicos através da ação das enzimas extracelulares. • As bactérias apresentam grande aplicabilidade em processos de biorremediação, sendo capazes, inclusive, de degradar plástico, petróleo e outras substâncias. 230 1 No processo de biorremediação, diversas condições devem ser observadas para a implementação. Muito estudo é necessário para que a técnica mais adequada seja empregada. A respeito dessas condições/fatores, leia, com atenção, as sentenças a seguir: I- Biodegradabilidade do contaminante. II- Tipo de metabolismo microbiano. III- Natureza do contaminante. IV- Condições do local no qual o poluente é encontrado não interferem no processo. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I, II, III e IV estão corretas. b) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas. c) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas. d) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas. 2 A biorremediação é um processo essencial na remoção e/ou redução dos contaminantes presentes no ambiente, mas, assim como diversas técnicas utilizadas na resolução desse tipo de problema, ela apresenta vantagens e limitações. Cite três vantagens e três limitações da biorremediação. 3 A biorremediação é um processo de recuperação de áreas contaminadas pelo qual os resíduos orgânicos são biologicamente degradados, sob condições controladas. Quanto a esse tema, identifique as afirmativas a seguir como verdadeiras (V) ou falsas (F): ( ) Os resíduos orgânicos devem ser biologicamente degradados até um estado inócuo, ou até níveis abaixo da concentração estabelecida pelas autoridades reguladoras. ( ) As técnicas permitem o tratamento dos resíduos nos locais contaminados ou em outros locais, quando há a escavação e a remoção das áreas contaminadas do local original. ( ) Quanto à origem dos microrganismos, estes podem ser produzidos por bioestimulação, isolados de outras áreas, com origem laboratorial, levados para o local contaminado, ou por bioadição dos próprios microrganismos degradadores presentes na comunidade local. ( ) Pode-se utilizar bactérias, fungos ou plantas para degradar substâncias perigosas para a saúde humana ou para o ambiente. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA, de cima para baixo: a) ( ) V – V – F – V. b) ( ) V – F – F – V. c) ( ) F – F – V – F. d) ( ) F – V – F – F. e) ( ) F – F – V – V. AUTOATIVIDADE 231 UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO TÓPICO 3 — LEGISLAÇÃO AMBIENTAL APLICADA Este tópico é dedicado ao estudo dos principais instrumentos legais relacionados à qualidade da água, do solo e do ar, sob o enfoque da microbiologia ambiental. Vamos conhecê-los?! 2 LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA DA ÁGUA Quando se discute a respeito da análise da água, sistemas de monitoramento qualitativos e quantitati vos desta abrangem a avaliação de variáveis microbiológicas e sanitárias (bactérias coliformes totais e termotolerantes, Escherichia coli e enterococos etc.) e se consti tuem técnicas essenciais para as políticas públicas e as ações de gestão (CEBALHOS; DINIZ, 2017). Podemos citar a classificação dos cor pos de água em classes, conforme a qualidade das águas e a definição dos usos e dos tipos de tratamen to a serem aplicados nessas águas para a potabilização. Abordaremos, mais especificamente, a ResoluçãoCONAMA No 357/2005 (BRASIL, 2005), que “dispõe sobre a classificação dos corpos de água e for nece diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências”; a Resolução CONAMA N° 274/2000 (BRASIL, 2000), que “define os critérios de bal neabilidade em águas brasileiras”; e a Portaria N° 2914/2011 (BRASIL, 2011), do Ministério da Saúde, que “dispõe sobre os procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade” (CEBALHOS; DINIZ, 2017). A respeito da Resolução CONAMA No 357/2005, esta estabelece as classes da qualidade da água a partir dos usos, a saber: Art. 4° As águas doces são classificadas em: I- classe especial: águas destinadas: a) ao abastecimento para consumo humano, com desinfecção; b) à preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas; e, c) à preservação dos ambientes aquáticos em unidades de conservação de proteção integral. 232 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL II- classe 1: águas que podem ser destinadas: a) ao abastecimento para consumo humano, após tratamento simplificado; b) à proteção das comunidades aquáticas; c) à recreação de contato primário, como natação, esqui aquático e mergulho, conforme Resolução CONAMA n° 274, de 2000; d) à irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película; e e) à proteção das comunidades aquáticas em Terras Indígenas. III- classe 2: águas que podem ser destinadas: a) ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional; b) à proteção das comunidades aquáticas; c) à recreação de contato primário, como natação, esqui aquático e mergulho, conforme Resolução CONAMA n° 274, de 2000; d) à irrigação de hortaliças, plantas frutíferas e de parques, jardins, campos de esporte e lazer, com os quais o público possa vir a ter contato direto; e e) à aquicultura e à atividade de pesca. IV- classe 3: águas que podem ser destinadas: a) ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional ou avançado; b) à irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras; c) à pesca amadora; d) à recreação de contato secundário; e e) à dessedentação de animais. V- classe 4: águas que podem ser destinadas: a) à navegação; e b) à harmonia paisagística. No que tange à questão do limite de organismos indicadores de contaminação de corpos da água, para as águas doces de Classe 1, é estabelecido: g) coliformes termotolerantes: para o uso de recreação de contato primário, deverão ser obedecidos padrões de qualidade de balneabilidade, previstos na Resolução CONAMA n° 274, de 2000. Para os demais usos, não deverá ser excedido um limite de 200 coliformes termotolerantes por 100 mililitros em 80% ou mais, de, pelo menos, 6 (seis) amostras, coletadas durante o período de um ano, com frequência bimestral. A E. Coli poderá ser determinada em substituição aos parâmetros coliformes termotolerantes, de acordo com limites estabelecidos pelo órgão ambiental competente. TÓPICO 3 — LEGISLAÇÃO AMBIENTAL APLICADA 233 Já para as águas doces de Classe 2, devem ser cumpridas as exigências: Art. 15°. Aplicam-se, às águas doces de classe 2, condições e padrões da classe 1 previstos no artigo anterior, com exceção do seguinte: II- coliformes termotolerantes: para uso de recreação de contato primário, deverá ser seguida a Resolução CONAMA n° 274, de 2000. Para os demais usos, não deverá ser excedido um limite de 1.000 coliformes termotolerantes por 100 mililitros em 80% ou mais de, pelo menos, 6 (seis) amostras coletadas durante o período de um ano, com frequência bimestral. A E. coli poderá ser determinada em substituição ao parâmetro coliformes termotolerantes, de acordo com limites estabelecidos pelo órgão ambiental competente. Lembre-se, acadêmico, de que estudamos a questão da contagem de coliformes termotolerantes na Unidade 2 (Tópico 1 - Meios de cultura microbiana e métodos de quantificação). Caso seja necessário, retome os estudos desse conteúdo. ATENCAO Para as águas doces de Classe 3, os critérios microbiológicos devem seguir: g) coliformes termotolerantes: para o uso de recreação de contato secundário, não deverá ser excedido um limite de 2500 coliformes termotolerantes por 100 mililitros em 80% ou mais de, pelo menos, 6 (seis) amostras, coletadas durante o período de um ano, com frequência bimestral. Para dessedentação de animais criados confinados, não deverá ser excedido o limite de 1000 coliformes termotolerantes por 100 mililitros em 80% ou mais de, pelo menos, 6 (seis) amostras, coletadas durante o período de um ano, com frequência bimestral. Para os demais usos, não deverá ser excedido um limite de 4000 coliformes termotolerantes por 100 mililitros em 80% ou mais de, pelo menos, 6 (seis) amostras coletadas durante o período de um ano, com periodicidade bimestral. A E. Coli poderá ser determinada em substituição ao parâmetro coliformes termotolerantes, de acordo com limites estabelecidos pelo órgão ambiental competente. h) cianobactérias para dessedentação de animais: os valores de densidade de cianobactérias não deverão exceder 50.000 cel/ml, ou 5mm3/L. É importante destacar que, conforme a referida resolução, as águas de contatos primário e secundário são definidas da seguinte forma: XXX- recreação de contato primário: contato direto e prolongado com a água (como natação, mergulho, esqui-aquático), na qual a possibilidade de o banhista ingerir água é elevada; 234 UNIDADE 3 —TRATAMENTO DE EFLUENTES, BIORREMEDIAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA À MICROBIOLOGIA AMBIENTAL XXXI- recreação de contato secundário: refere-se àquela associada a atividades em que o contato com a água é esporádico ou acidental e a possibilidade de ingerir água é pequena, como na pesca e na navegação (como iatismo). Para as águas doces de classe 4, de acordo com o Art. 17°: As águas doces de classe 4 observarão as seguintes condições e padrões: I- materiais flutuantes, inclusive, espumas não naturais: virtualmente ausentes; II- odor e aspecto: não objetáveis; III- óleos e graxas: toleram-se iridescências; IV- substâncias facilmente sedimentáveis que contribuam para o assoreamento de canais de navegação: virtualmente ausentes; V- fenóis totais (substâncias que reagem com 4 - aminoantipirina) até 1,0 mg/L de C6H5OH; VI – OD superior a 2,0 mg/L O2 em qualquer amostra; e VII - pH: 6,0 a 9,0. No caso das águas salinas (águas com salinidade igual ou superior a 30 ‰), sendo o caso da água do mar, os seguintes padrões microbiológicos são estabelecidos: g) coliformes termolerantes: para o uso de recreação de contato primário, deverá ser seguida a Resolução CONAMA n° 274, de 2000. Para o cultivo de moluscos bivalves destinados à alimentação humana, a média geométrica da densidade de coliformes termotolerantes de, um mínimo, de 15 amostras coletadas no mesmo local, não deverá exceder 43 por 100 mililitros, e o percentil 90% não deverá ultrapassar 88 coliformes termolerantes por 100 mililitros. Esses índices deverão ser mantidos em monitoramento anual com um mínimo de cinco amostras. Para os demais usos, não deverá ser excedido um limite de 1.000 coliformes termolerantes por 100 mililitros em 80% ou mais de, pelo menos, 6 (seis) amostras coletadas durante o período de um ano, com periodicidade bimestral. A E. Coli poderá ser determinada em substituição ao parâmetro coliformes termotolerantes, de acordo com limites estabelecidos pelo órgão ambiental competente.