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Prévia do material em texto

Robert A. Dahl
Urn Prefacio a
Teoria Dernocratica
Traduftio:
Ruy Jungmann
R ET r,~L,~' n ':)0
~£11?CJf.-
Jorge Zahar Editor
Rio de Janeiro
Titulo original:
A Preface to DemocraJic Thtory
7 Nota Preliminar
9 Introdu~ao
1
13 A Democracia Madisoniana
2
A Democracia Populista
3
A Democracia Poliarquica
4
19ualdade, Diversidade e Intensidade
5
o Hfbrido Americano
Tradu~o autorizada da primcira ed.i~o norte~americana
publicada em 1956 per University of Chicago,
de Chicago, Dlinai" EUA
ropyright e 1956, The Univenity of o,ieago
All rights reserved.
ropyright e 1989 da edi~o em lingua portugue,.:
Jorge Zahar Editor Ltda.
rua Mexico 31 sobreloja
20031 Rio delanoiro, RJ
Todos os dircitos reservados.
A reprodu~o nio-autorizada ciesla publica~o, no todo
au em pane, constitui viola~o do copyright. (Lei 5.988)
Lista das ilustra~6es
1. Tres possfveis estados da opiniao publica
a respeilo da alternaliva Y
2. Consenso forle com preferencias fortes
3. Consenso forle com preferencias fracas
4. Desacordo moderado: simetrico
5. Desacordo moderado: assimetrico
6. Preferencias dos eleilores do pleilo presidencial de 1952
7. Preferencias dos eleilores do pleilo presidencial de 1952
8. Dcsacordo serio: simetrico
9. Desacordo serio: assimeLrico
10. VOlOSpopulares e cadeiras conquistadas na Camara
11. VOlOSpopulares e cadeiras conquistadas no Senado
58
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97
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100
101
143
144
Ao apresentar Um Pre/acio a Teoria Democratica, de aUloria do professor
Robert Dahl, julga a Walgreen Foundation estar acrescentando mais um
importante trabalho ao numero crescente de obras sobre as ideias basic as a
respeito da democracia. A Funda~ao, alias, ja patrocinou estudos sobre
democracia, do ponto de vista do fil6sofo e do moralista. No campo da
lcoria polftica, porem, numerosos te6ricos tem submetido a testes
empfricos as ideias democraticas. Por isso mesmo, acolhe com grande
satisfa~ao 0 trabalho do professor Dahl, como representativo da linha
cmpfrica de indaga~ao. Sua contribui~ao ao campo da teoria sera sem
duvida bem recebida pclos cientistas socia is, quaisquer que sejam as
escolas a que se filiem.
JEROME G. KERWIN,
Presidente do Conselho
Charles R. Walgreen Foundation for the
Study of American Institutions
Introduc;ao
Dei a estes ensaios 0 tftulo Urn Prefacio a Teoria Dernocratica porque, na
sua maioria, formulam quest6es que precisariam ser solucionadas por uma
teoria satisfat6ria de polftica democnitica. Nao tern a intenc;ao de sugerir
tadas as quest6es que necessitariam de soluc;ao, ou mesmo as mais impor-
tantes, mas apenas algumas que julguei interessantes e que, alimento esta
esperanc;a, sejam importantes.
E estranho, talvez, que ap6s tantos seculos de especulac;ao polftica, a
teoria de democracia continue a ser - se estou certo nesta minha suposi-
c;ao basica - sumamente insatisfat6ria, seja ela considerada de carater es-
senciiumente etico ou basicamente como uma tentativa de descrever 0
mundo real.
Desde 0 comec;o, uma das dificuldades que temos que enfrentar e que
nao ha uma teoria·democratica, ou de democracia - mas vanas. Sugere
este fato que melhor farfamos em estudar algumas teorias representativas
de democracia a fim de descobrir que tipos de problemas colocam; tal' 0
procedimcnto que adotamos nestes ensaios, embora nenhum esforc;o tenha
sido fcito para estudar todas ou a maioria das teorias tradicionais.
o fato de haver tantos e ta~ diferentes enfoques da teoria de demo-
cracia constitui em parte, embora nao totalmente, resultado da existencia
de tantos possfveis fmgulos de estudo de qualquer teoria social. No estudo
da democracia, uma boa argumentac;ao poderia ser formulada para quase
tadas essas possibilidades. Seria realmente assustadora uma lista das ma-
neiras alternativas atraves das quais poderfamos tentar formular uma teoria
sobre dcmocracia. Menciono algumas apenas para indicar a espantosa faixa
de possibilidades:
1. Poderiamos tentar elaborar uma teoria de maximizac;ao que conside-
rasse algum estado de coisas (tal como a igualdade polftica) como urn
valor, ou meta, e perguntar: Que condi~6es sao necessarias para atingir
a maxima concretiza~ao dessa meta? au, altemativamente, po-
deriamos tentar construir uma teoria descritiva, uma que na verdade
diria alguma coisa como: Temos aqui urn conjunto de organiza~Oes
sociais que possuem em comum esta ou aquela caracteristica. Que
condi~Oes sao necessarias para que existam organiza~Oes sociais como
estas?
2. Se escolhessemos uma teoria de maximiza~ao, poderiamos tentar for-
mular uma que fosse essencialmente etica no sentido em que procu-
rasse justificar, explicar ou tomar racionais os valores ou metas que
quereriamos que fossem maximizadas. au, quem sabe, construir uma
que fosse eticamente neutra no sentido em que metas ou valores sao
tornados como dados, pelo menos para as finalidades da teoria.
3. Se resolvessemos arquitetar uma teoria eticament.e neutra, poderiamos
nos inclinar por uma axiomatica ou outra que perguntasse algo como:
Que precondi~Oes 16gicas posso deduzir da descri~ao da pr6pria meta?
au talvez preferissemos uma teoria empirica, que indagasse: Obser-
vando 0 mundo real, em algum sentido, 0 que posso considerar como
condi~oes necessarias (no mundo real) para a maximiza~ao da meta
postulada?
4. Poderiamos nos satisfazer com uma teoria nao-operacional ou exigir
que fosse tomada operacional. (Operacional no sentido em que as de-
fini((Qes principais na teoria especificam urn conjunto de observa((Oes
sobre 0 mundo real, urn conjunto de opera~Qes a serem realizadas com
base nas observa((Qes, ou ambas as coisas.)
5. Poderiamos aceitar como valida uma teoria que nao requeresse qual-
quer medi((ao ou exigir que alguns dos fenomenos fossem mensu-
raveis. (por medi((ao ent.endo, no minimo, 0 estabelecimento de uma
ordem entre os fenomenos, de modo que se possa dizer que A e maior,
igual ou menor do que B, oUalguma rela((ilo 16gica equivalente.)
6. Poderiamos, fmalmente, construir uma teoria que estabelecesse apenas
requisitos constitucionais basicos ou t.entar edificar outra que incluisse
tarnbem as necessarias condi~Qes sociais e psicol6gicas.
Tomara que ninguem se assuste e abandone a leitura por causa desse
conjunto enorme de altemativas, porque nao e minha int.en((ilo sujeitar 0
lei tor a uma critica de cada uma deIas. Em vez disso, proponho-me a tomar
alguns poucos tipos representativos de teoria de democracia, comC((afldo
com uma que e muito conhecida dos americanos: a teoria madisoniana. N.->
exame desses tipos, estudarei tambem algumas das vantagens e defici-
encias das principais altemativas mencionadas acima. . "
Nao me proponho a definir rigorosamente 0 termo "?emOCracla.,
porquanto cada urn dos capftulos e, ate certo po?to, u~ ensalO ~m defim-
((ao _ embora todos sejam, segundo espero, m.Ulto.mals d~ que lSSO.Mas,
no minimo, parece-me, a-leona de democracla dlZ res~lto a processos
atraves dos quais cidadaos comuns exercem urn grau relallvamente alto de
controle sobre lideres~ 'Temos af uma defini((ao minima, .que pod~ ser
facilmente transposta para uma grande varied~de de ~nuncIado~ millS ou
menos equivalentes, caso 0 leitor nao goste do upo parucular de lmguagem
que resolvi usar. • .
Coloquei em notas de rodape ou em apendlces ~e~os ?etalhes que
acho de interesse e que julgo importantes, mas que prejUdlCanam 0 de.se~-
volvimenlO do argumento no caso de leitor int.eressado no~ pont?s, ~nncl-
pais. Na elucida((ao do argumento, a fim d~ me satisfaze.r, jUlguel ut!l usar
nota~ao algebrica. Uma vez que alguns ICltores podem. julgar tambem es-
clarecedor esse procedimento, incluf parte desse mat~nal nas nota~ d~ ro-
dape e nos apendices. Tal como nos casos das dem31s notas e .aJ?Cndlces,
elas, tambem, podem ser ignoradas pelo leitor, sem grandes prejUiZOSpara
a compreensao do argumenlO principal. . . _ ,
Desejo, na oportunidade, manifestar minha. smcera ~ra~ldao a Charles
R. Walgreen Foundation for the Study of Amencan Insutuuo.n~ po~ ter me
convidado a transformar em capftulos estes trabalhos,ongman~en~e
apresentados como Palestras Walgreen. Desejo tambem ~egistrar aqUi ~l-
nha dfvida com C.E. Lindblom, que naa s6 leu 0 manuscnto em sua versao
preliminar, mas brindou-me com numerosas criticas detalha~ e su-
gestOes, todas as quais muito proveitosas para mirn e q~e, na malo~ par~,
aceitei, a parte umas poucas que rejeitei ~om gran~e nsco para mun. Fl-
nalmente, desejo consignar meus agradeclmentos a sra. Suzanne Ke~an
que, com competencia e pacicncia inesgotavel, encarregou-se da daulo-
grafia das numerosas versOes do manuscrito.
A democracia, ouvimos dizer freqiientemente, repousa sabre concessoes
mutuas. A teoria da democracia, no en tanto, tambem esm cheia dessas
concess5es - concilia<;oes de princfpios que colidem uns com os outros e
sao antagonicos entre si. 0 que e uma virtude na vida social, porem, nao 0 e
necessariamente na teoria social.
[0 que vou chamar de teoria "madisoniana" de democracia constitui
urn esfof«o para se chegar a uma acomoda<;ao entre 0 poder das maiorias e
o das minorias, entre a igualdade politic a de tadas os cidadaos adultos, por
urn lado, e 0 desejo de lhes limitar a soberania, pelo outro. Como sistema
politico, a transigencia mutua, exceto em urn interludio importante, provou
ser duradoura. E 0 que e mais, parece que os americanos 0 apreciam. Como
teoria politica, contudo, a concessao mutua cobre delicadamente de papel
certo numero de rachaduras, sem as esconder inteiramente. Nao e por acaso
que a preocupa<;ao com os acertos e erros do govemo da maioria tern sido
uma constante no pensamento politico americano desde 1789. Isto porque
se a maioria dos americanos parece ter aceito a legitimidade do sistema
politico maclisoniano, nunca desapareceu inteiramente a critica acs seus
fundamentos 16gicos, bastante debeis. 'E como conseqiiencia disso, sem
duvida, as teses madisonianas rem que ser constantemente reiteradas ou
mesmo, como no caso de Calhoun, ampliadas.
, Indm:ir~a a erro atribuir diretamente ao pr6prio James Madison todas
as proPOSI,~~S que se seguem. Isto porque, embora Madison tenha formu-
I~do a ma~on~ dos elementos basicos da teoria, antes e durante a Conven-
~a<:ConstltucIOnal e ~ais tarde em alguns dos "Federalist Papers", sua re-
la~ao. com as proPOSI~5eSa seguir discutidas deve ser ressalvada de tres
manelfas.
Em primeiro lugar, a despeito de dissensOes de varios tipos, grande
~arte do que ele fo~ulou o~ ,deixou implicito era amplamente compar-
tiI~ado por outros hderes POlttlCOSde sua epoca Madison, contudo, pos-
s~la 0 ~o do~ ,- duplam~nte raro entre os Iideres politicos _ de expo-
sl~ao lucida, loglca e organlzada de seu argumento te6rico. Talvez em ne-
nh~m o~tro trabalh? politico de autor americano haja uma pe~a de teoria
mals soltd~ente 10~lca, quase matematica, do que no The Federalist, nO
10, de Madison. Dat ser tanto conveniente como intelectualmente com-
IX;n,sadorvO,ltara Mad!~on a fim de descobrirmos os fundamemos l6gicos
basICOS do sistema polttlCOamericano.
, Segundo, nem, ~esmo Madison enunciou sempre suas suposi~Oes no
tocante a fat~, defml~ao ou valor. Em conseqiiencia, juiguei necessario
fomecer ocasIOnalment~ 0 que ,me'parecem ser essas suposi~Oes basicas.
Trata-se de uma empreltada am~cada e, como defesa, posso apenas dizer
que, em todos os casos, procurel tomar sua posi~ao ta~ organizada e coe-
, rente quanto possfvel, e nao debilit<i-Ia. Em suma, cito Madison nos casos
em qU,eele me parece tomar sua argumenta~ao a mais l6gica, coerente e
exp~lclta, embora, em tod?S os ,demais casos, eu tente f~rmular uma pro-
posI~ao que me parece, maIS l6glca, coerente e explfcita. E elJllJm estilo de
argumento que ~stou mteressado e nilo em uma n~producao perfeita das
palavras de Madison.
• T~iceiro, e urn pouco injusto considera-lo como te6rico politico. Ele
escrevla e falava para sua epoca, nao para 0 futuro.l MerguIhado ate as
orelhas na polftica, acon~l~ava, procurava convencer, abrandava a palavra
aspera, apoucava esta dlflculdade ou exagerava aqueIa, participava de
debates, acesas ~on~oversias, polemicas e manobras ardilosas. Foi urn
grande home~, I?tehgente, probo, bem-sucedido. E construiu bem. Des-
montat:-l~e as ,td6as e eX~ina-las ~a, por pe~a e sem duvida alguma urn
, po~co mJusto. Como admlfador de MadIson, 0 homem eo estadista, eu dei-
xana, contente, que Madison, 0 te6rico, descansasse em paz - nao fosse 0
fato de ter ele ~o profundamente modelado, e modelar ainda hoje, 0
pensarnento amencano sobre democracia.
A proposi~ao fundamental da teoria madisoniana e parcialmente
implfcita e ate certo ponto explfcita, a saber:
Esta proposi~ao, por seu lado, pressupOe pelo menos duas defini~Oes
implfcitas:
o "controle externo" no caso do indivfduo consiste na
aplica~ao de recompensas e penalidades ou na expectativa
de que serao aplicadas por alguma outra fonte que nilo ele
mesmo.l
Tres comentarios precisam ser feitos sobre a defini~ao de tirania pro-
posta aqui. Em primeiro lugar, nao e a mesma que a defini~ao explfcita de
tirania que Madison del no The Federalist" nO47, ond~ ele ~ecl~~ ~ue "a
acumula~ao de todos os poderes, legislatIvo, executIvo e Judlclarlo nas
mesmas maos, seja de urn, de alguns ou de m 'tos, pode corretame~t~ ser
julgada como a pr6pria defini~ao de, tirania". ~arece.-me ~e a deflnt~ao
explfcita de Madison deriva da Defint~ao 2, mediante mser~ao de uma pre-
missa empfrica, isto e, a acumula~ao de lodos os poderes nas mesmas maos
levaria a grave priva~ao de direitos naturais e daf a tirani~. ,Afigura-se, ra-
zeavel, por conseguinte, reconstruir 0 seu argumento exphctto no segumte
raciocfnio madisoniano: I
A acumula~ao de todos os poderes, legislativo, executivo e
judiciario nas mesmas maos implica a elimina~ao dos con-
troles externos (generaliza~ao empirica).
A elimina~ao dos con troles externos gera tirania (deri-
vado da,Hipatese 1).
Por conseguinte, a acumula~ao de todos os poderes nas
mesmas maos implica tirania.
Hip6tese 1: Na ausencia ,de ,c~ntroles. externos, qualquer dado indivfduo,
ou grupo de mdlvIduos, tIranizara os demais.
Da forma como est<i,a defini~ao explfcita de Madison e desnecessaria-
mente arbitraria e argumentativa, e uma vez que pode ser derivada de uma
defini~ao que nao s6 e altamente compatfvel com todo 0 teor do pensa-
men to dele, mas, como veremos dentro em pouco, util a 16gica de seu argu-
mento, proponho que fiquemos com a Defini~ao 2. , .
~ Segundo, os direitos naturais nao sao c1aramente especlflcados. Entre
os contemporaneos de Madison, com? tambem en~e, s~us p'rede~~~so~es,
nilo havia absolutamente acordo perfelto sobre que dlrettos sao dlreltos
naturais". 0 acordo, que porventura havia, situava-se em urn alto nfvel,d,e
abstra~ao e deixava amplas oportunidades de desacordo em casos especlfl-
cos.3 Con forme veremos adiante, a falta de uma definj~ao acordada e acelta
de direitos naturais constitui uma das principais dificuldades da teoria
madisoniana.
... Terceiro, usei a expressao "grave priva~ao" a fim de encobrir uma am-
blguldade n~ pc~samento de Madison ~ de seus contemporaneos. Ate que
ponto p.o~e~lam Ir os. gov~mos na hmJta~ao dos direitos naturais sem se
tom~ u~aIllcos? AqUl, millS ~ma vez, nem Madison nem qualquer outro
~a.dlson~ano, tanto quanto SCI,propuseram criterios inteiramente satisfa-
t~nos. Nao obstantc, :vr.adlson sem duv.id~ concordava com seus con tempo-
~aneos e~ que, ,~o m~Illmo, qualquer 1Jmlta~ao dos direitos naturais sem 0
consentlf~e~to do I~teressa~o.era u~a priva~ao suficientemente grave
para constItUlr Urania. A amblguldade e ta~ profunda, porem, que duvido
que qualquer outro fraseado possa remenda-Ia.
Com? corolarios da Hip6tese 1, duas hip6teses adicionais precisam ser
estabelecldas:
!'Ia. ~usenc!a ?e .controles extemos, uma minoria de
mdlVlduos tlraIllzara uma maioria de individuos
~a a~sencia de con troles extemos, uma maioria de individuos
trramzara uma minoria de individuos.
'. Ou, como disse .mais sucintamente Hamilton: "Deem todo 0 poder aos
mu~to~ : eles op~mlrao os poucos. Deem todo 0 poder aos poucos e elesopnmrrao os mUltos."s
4
Passemos agora a pro va da Hip6tese 1 e, dai, tambem das Hip6teses 3
e .
•• EVident~mente, a Hip6tese 1 e uma proposi~ao empirica. Sua validade por
consegU1~te,. s6 pode ser submetida a teste pela experiencia. Os met~dos
que o. propno M~dison usou para comprovar a hip6tese parecem repre-
sentau~os d~ estIlo de pensamento americano amplamante aceito que
neste livro., e denominado de "madisoniano". Seu primeiro metodo d~
p~o~a.conslste ~~ enumerar exemplos hist6ricos colhidos, por exemplo, na
hlstona ~ Grecl~ e de .Roma.6 0 segundo e 0 de derivar a hip6tese de
certos aXlOmas pSlcol6~lCOSde grande aceita~o nos seus dias - e talvez
mes~o agora. Esses axlOmas, de caratel hobbesiano, sac mais ou menos do
segum«: teor: Os homens sac instrumentos de seus desejos. Se dada a
opoltumdade, leva-Ios-ao ate a saciedade. Urn deles e 0 desejo de exercer
pod~r sobre out~os individuos, porquanto 0 poder nao s6 e diretamente
gratificante em. Sl, mas possui tambem grande valor instrumental, uma vez
~ue grande vanedade de satisfa~5es dele dependem. 0 teor desses axiomas
e retratado em observar;~s feitas em convenr;5es estaduais e na federal
tanto por pessoas que apolavam quanto combatiam a Constitui~ao:
Lenoir, nos debates na Carolina do Norte: "Temos que levar em conta a
deprava~ao da natureza humana, a sede predominante de poder que se
esconde no peito de todos os homens, as tenta~5es a que govemantes .P,O-
dem ser submetidos, e a confianr;a ilimitada depositada neles por esse SIS-
tema."?
. Franklin, na Conven~ao Federal: "Ha duas paix5es que exercem pro-
funda influencia sobre os assuntos humanos. Sao elas a ambi~ao e a ava-
reza; 0 amor pelo dinheiro e 0 amor pelo poder.''ll
Hamilton, na Convenr;ao Federal: "Os homens amam 0 poder.''9
Mason, na Conven~ao Federal: "Tendo em vista a natureza do homem,
podemos ter certeza de que aqueles que possuem poder nas maos ... sempre
.I " "10e quando puderem, ... aumenta- O-aO.
Se a Hip6tese 1 e aceita como confirmad.1 por esses dois metodos (ou por
outros), enta~ as Hip6teses 3 e 4, que sao apenas derivadas dela, sac tam-
bem validas. 'Nao obstante, aparentemente, a Hip6tese 4 desempenha urn
papel especiaf no pensamento ~adi~oniano.l1 " . "
Nem na Conven~ao ConsutuclOnal nem nos Federalist Papers de-
monstrou ele grande preocupa~ao com os perigos atinentes a tirania da mi-
noria; em compara~ao, 0 perigo de tirania da maioria parecia the despertar
grandes temores. Os "Federalist Papers", por exemplo, nao revelam qual-
quer profunda desconfian~a do ramo executivo, que era considerado ~r
seus autores (erroneamente, como se viu) como 0 ponto forte para a ml-
noria da riqueza, do status e do poder. n Em contraste, urn tema basico para
Madison e a amea~ de parte do legislativo, supostamente 0 baluarte da
maioria. Assim: "E contra a ativa ambi~ao deste departamento que 0 povo
deva mobilizar todo 0 seu ressentimento e esgotar todas as suas precau-
~oes~'~~e_se da Defini~ao 2, como tambem da pr6pria defini~ao explfcita
de tirania dada por Madison, que a tirania legislativa, ou da maioria, nao e
menos ~tiranica do que a tirania do executivo, ou da minoria. Sao ambas por
igual indesejaveis. Assim: "Os fundadores de nossa rcpublica: .. aparente-
mente nunca se lembraram do perigo das usurpa~5es do leglslauvo que,
reunindo todo 0 poder nas mesmas maos, tera que gerar a mesma tirania
que seria amear;ada por usurpar;oes do executivo."14 Madison refor£ou sua
posi~ao invocando Jefferson, que no seu Notes on Virgi~ia, dissera' "C~nto
e setenta e tres despotas seriam com certeza tao opresslvos como urn UIll-
co ... e urn despotismo eletivo nao seria aquilo pelo que lutamos."lS
• Maiorias e minorias, portamo, sac pesadas na mesma balan~a. Isto
porque 0 leste objelivo da nao-tirania nao e 0 tamanho do grupo gover-
name, mas se ele, qualquer que for seu tamanho, impae priva~6es severas
aos "direilos nalurais" dos cidadaos.
, vavelmente deduzido implicitamente de u~ ,p?stu-
porem, 0 aXlOmaera pro . da de uma premissa empmca, da
lado etico mais fundamen,tal, com a aJ~ devem ser respeitados (axioma); .
seguinte maneira: 9 ~s dlrelto~::t~~~tirania (derivado da Defini~ao 2);
2) 0 respeilo aos drreltos na~_ sana embora nao suficiente, para a
3) uma republica e ~ma condl~~~ neces ED' _ 0 axioma madisaniano.
nao-tirania (generaliza~ao empmca). Q. , ."'~s Cossem largamente aceitas,
d rimeiras proposl~lA- , d
Embora as uas p 'd 0 Hamilton negavam a valIda e' 'to conhecl os, com , ,
alguns federalis~ mm e a demonstrava uma clara embo~ rrrea-
da terceira. H~llton, que na ~ d'sse na verdade que uma repubhca po_
listica preferencla ~la monm:qu;a~~s seguramente nao necessaria, para a
deria ser uma condi~o p?s~lve , , 's para esta ele teria inclufdo a mo-
diroes posslvel, l' 'nao-tirania. Entre as con Y stabilidade do sistema po lUCO
narquia constitucionaI. Por sorte para a, e rtica 0 desafio de Hamilton
' infelizmente para a teona po I, '
~:~::~i~O ~~mo uma monumental irrelevancla.
Ale agora, as ProPOSl~oeS no sistema madisoniano sao definidoras ou
empiricas, Com a aceita~ao de mais uma defini~ao, torna-se possivel agora
estabelecer as metas a usar na orienta~ao da o~ao entre sistemas politicos
possiveis, ~
~ 0 que se imp6e nesta altura e uma defini~ao de "democracia". Note-
se, porem, que nos dias de Madison 0 termo "democracia" era menos co-
mum do que nos nossos·IAte certo ponto, ele se vinculava ao igualitarismo
radical; era tambem amoiguo porquanto muitos autores 0 definiram de ma-
neira a significar 0 que hoje chamarfamos de democracia "direta", iSlOe,
~ democracia nao-representativa. '0 termo "republica" era usado com maior
freqiiencia para se referir ao que nos nos sentiriamos mais inclinados a
denominar de democracia "representativa".16 Nao fara mal, portanto, acei-
tar 0 termo "republica" como 0 usava Madison, que ele defmiu da seguinte
maneira:
I t ria etica 0 restante do sistema m~diso-
Ap6s esta breve excur~o pe a ef,t' s d~fini~6es e inferencias den vadas
niano consiste em enunclados pro e lCO, dado 0 axioma madisoniano, a
do que foi dito ate enta~. Isto porq,ue
t
, . Que condir6es sao necessanas
f agora no segum e. y ,
questao trans o~~-se d uma republica nao-tiramca?
para que seja atmglda a meta e , A '
, ' I s duas condi~6es para a eXlstenclaHip6tese 5: Sao necessanas pe 0 m,e~o,
de uma,rep,ublica~~o=tl~l~~:umula~ao de todos os pod~res,
Pnmelra co ,I9
ao
" d' 'ano nas mesmas maos, seJa de
legislativo, executlVO e JU lCl e hereditaria autonomeada ou
de alguns ou de multos, e s ,urn, , da 19
eletiva, deve ser e; .•~ ,'As facyoes devem ser controladas de
Segunda con 19M
, , de forma contraria aos' que nao possam agrr
~e~::: demais cida~aos ou aos interesses permanentes e
comuns da comunidade.
DEFINIC;:ii.o 3: Vma republica e urn governo que: a) deriva todos os seus
poderes direta ou indiretamente do grande corpo do pavo e
b) e administrado por pessoas que exercem seus cargos
enquanto assim agradar ao povo, por urn periodo limitado
ou enquanto tiverem born comportamento.17
E possivel enunciar agora a meta etica fundamental do sistema mad i-
soniano e que, por questao de conveniencia, podemos chamar de axioma
madisoniano:
f A meta a ser atingida, pelo men os nos Estados Vnidos, e a republica
nao-tiranica.
Essa meta foi aceita como urn postulado. Vma vez que nao foi seria-
mente questionada na Conven~ao Constitucional ou em qualquer outro
foro, nem seriamente pasta em duvida neste pais desde aquela epoca, ela
permaneceu na maior parte como sendo urn axioma nao-examinado.18 Dai
nao podermos afirmar inequivocamente quais os fundarnentos l6gicos que
passam existir par tras desse postulado. 'Para Madison e para muitos outros,
rimeira condi~ao e urn requisito fundamental
Na tentativa de ~o~ar qu~ a ~ A icas 0 sistema madisoniano torna-se ta~
de todas as repubhcas nao-wan , mo fazer justi~a ao argumento,
ambfguo que e diffcil saber exatamente co
Logo no inicio, deparamos duas possibilidades altemativas. A primei-
ra ja rejeitamos linhas atras,como sendo basicamente trivial. Isto porque,
se aceitamos a defini9ao explicita de Madison de tirania e se postulamos
que ela deve ser evitada, enta~ a primeira condi9ao e necessaria apenas por
defini9ao: 1) A tirania significa a acumula9ao de todos os poderes, etc.
(defini9ao); 2) a tirania e indesejavel (axioma); 3) Por conseguinte, a acu-
mula9ao de todos os poderes, etc., e indesejavel. Contudo, solucionar 0
problema por defini9ao deixa em aberto muitas e importantes questoes.
Dando urn exemplo, se perguntarmos "Por que a tirania, da forma como ele
a define, e indesejavel?", 0 sistema madisoniano explicito nao fomece res-
posta. Isto porque certamente a "acumula9ao de todos os poderes, legisla-
tivo, executivo e judiciario nas mesmas maos" nao e 6bvia ou intuitiva-
mente desejavel. A indesejabilidade de tal estado de coisas deve, enta~, de-
rivar de certas conseqiiencias previstas. Quais serno essas conseqiiencias?
A fim de manter intacto 0 sistema madisoniano, tomei a liberdade de espe-
cificar quais devem ser essas conseqiiencias, isto e, a "priva9ao grave de
direitos naturais". 21
Outra possibilidade, por conseguinte, consiste em aceitar a defini9ao
implicita de Madison de que tirania e toda grave priva~ao de direitos na-
turais, e formular a hip6tese empirica de que a acumula~o de todos os po-
deres, etc., eliminara os con troles extemos (Hip6tese 2) e dai gerara tirania
(segundo a Hip6tese 1e a Defini~ao 2).
Contudo, se tentarmos agora salvar 0 sistema madisoniano da condi-
~ao de argumento trivial mediante acrescimo dessas hip6teses e defini9Qes
implicitas, enfrentaremos urn dilema. Isto porque, se por "poderes" enten-
demos autoridade constitucionalmente estabelecida, enta~ a Primeira Con-
di9ao e demonstravelmente falsa, porque nao e evidentemente necessaria a
tadas as republicas nao-ticinicas, como revelara prontamente urn exame de
sistemas democraticos parlamentares, mas certamente nao-tirfu1icos, como
o da Gra-Bretanha. Suponhamos, enta~, que por "poderes" queremos des-
crever urna rel~ao mais realista, tal como a capacidade de A de agir de ma-
neira a controlar as rea~oes de B. Neste caso, toma-se claro que "0 legis-
lativo, 0 executivo e 0 judiciario" de maneira alguma abrangem todas as
rela~oes de poder ou processos de controle em uma sociedade. Os proces-
sos eleitorais, por exemplo, tomam possivel que certos individuos con-
trolem outros; certamente contribuem para que liderados controlem lideres.
Dai, nao e 6bvio que a mera acumula~ao de poderes legislativo, executivo
e judiciario deva for90samente levar it tirania, no sentido de grave priv~ao
de direitos. As elei9Qes populares (e os partidos que disputam entre si) po-
dem ser suficientes para impedir essas usurpa~Qes de direitos Msicos. Isto
e, 0 argumento de Madison parece requerer agora a prova de, pelo menos,
uma hip6tese adicional, a saber:
Elel'roe-s populares freqiien.tes n.ao criarao controles extemos
Hip6tese 6: y
suficientes para impedir a urania.
• I que se esta ultima hip6tese e falsa, e elei9.Qes pop~lares _fre-
sto por f . ntes para impedlr a urania, entao 0
qiientes criam con~oles extemos su lC~~de de se manter os poderes legis-
to de Madison sobre a neceSSI d Iargumen . .' ., . arados constitucionalmente, ou e qua -
lativo, executlvo. e jUdlClarl~ s~p d' a tirania e tarnbCm patentemente
quer outra manelra, a hm e lmpe if ,
falso.. '. 0 ex licito tenta, na verdade, provar a vali-
Ora, 0 s~st~ma madlsom~ v lickde da Hipotese 2, isto e, que a acumu-
dade dessa hlpotese supond~ a . ~ ( 0 executivo e judiciario nas mesmas
la9ao de t~dos os .po.ctere_s,egis a I:I~S extemos. Se aceitamos esta hip6-
maos im?hca ~iepol!~~~a~a~0~~~~n~adeqUa9ao de elei90es ~pul~es, t~~
tese, enta~ a. ' d rovado a Hipotese 6 pela acelta9ao da 1-
que ser verdadelra. Mas, ten 0r . olta e provar a Hipotese 2 su-
p6tese 2, nao podemos ~gora azer mela-V
pondo a validade.da ~lpot~;e ~a sermos exatos tenta de fato provar que 0
The Federal~st, n 49, P rocesso eleitoral ~ inadequado para impedir
controle proporclOnado pelo p .' d' .ario se acumulem nas
pod legislativo execuUVOe jU ICI ,
que todos os eres,. d t' umento cabem duas observa90es. Em
mesmas maos. A respelto es e arg. _ seJ'a valida ela nao pode provar a
. . 1 ar mesmo que a proposl9ao , 1 .'
pnmelro ug , . . C ndi ao exceto pela rota definidora bana , rejel-
necessldade da Pnmelfa 0 9 ' defini ao nao se segue que a acumu-
tada acima. Isto porque, exc~to. ~o~' 0 ex~cu~ivo e judiciario" leve a tira-
la9ao de "todos os poderes, egis a '~cifiCOSem apoio a propos,1930 no The
nia. Em segundo, os argumentos eSPtentemente infundados ou claramente
F d /" t nQ 49 parecem-me pa . . de era IS., _ ' .) los freqiientes ao povo indicarlam e-
in~oncluslvos. Sao eles. ~ ~u~:~itariam a venera9ao necessaria it esta-
f~I~OSno govemo e, porii~~fd~de ublica seria perigosamente abalada p~r
blhdade; 2) que a tranq . _ p ulares' 3) que sendo poucos em nu-
evocar excessivamente as PalX~S POdo 'udi~iario s6 poderiam ser con:w.-
meros, os membros do execut~o ekto:ado 0 judiciario estaria distante
cidos de uma pequena ~arte. 0 e I. me~a e impopularidade. Em con-
demais e 0 executiVO sen~ obJeto d~ c~ entre 0 vo e tern com ele Iiga-
traste, os membros do l~glsdlauDvo,VI~~ta pelo po&r seria desigual e nela 0
roes de parentesco e amlza e. at a
y . od S23
legislativo engoliria os dem_alsp ~re. f mada a validade da Primeira
Receio, assim, que nao esteja con if
Condi9ao. .d d d ssa condi9ao para uma republica nao-
. :'~ao obs~~e, a n~essld: f~ d~ credo politico americano. Dela Madi-
tifamca constltul urn arugo deduziram a necessidade de toda
son e seus sucessores que 0 ultrapassaram s constitucionais: eleitorados
a complicada rede de con troles e contrapeso
separados para eleger 0 Pre id
veto presidencial; um Con sre~~te, .os senad.ores e os deputados; 0 poder de
nomeac;6es, confirmac;ao d~ senadblc~eral, 0 controle prcSldencial sobre
passar dos anos surgiram ai d ores, e, em parte, 0 fedcralismo. Com 0
politico e eles t~m sido raci;na~i~~~os Controles e conlrapesos no sistema
mentos: a revisao judicial os partid os co~ .0 emprego dos mesmos argu-
~C;6es no Senado, a "cortesia" os po Wcos descentralizados, as obs-
mlssao e, na verdade, quase toru:enato~lal., 0 poder ?OS presldenles de co-
tem conlribuir com um conlr I s as tecfllcas. ~rganlzaclonais que prome-
identificaveis de lideres pOlftic~s~ extcrno adlclOnal de quaisqucr grupos
t Passemos agora a Segund Cd' -
la1 forma que nao consi :m ~n Ic;ao:As f~cC;6esdevem .se~conlroladas de
cidadaos ou aos interess;s pe~uar contran~ente aos dIreHos dos demais
De que modo pode ser at"n a.~enles e conJuntos da comunidade.
$ssa pergunla, Madison form~l~~ ~~sse estad.o d~ ~oisas? Ao responder a
Juntos de ProposiC;Oespolfticas' . dos maIS IUCIdose compactos con-
hoje muito conhecido argument~:% aPfe~en~?o ~r u~ ame~icano:_~
apenas expor 0 esboC;omais simples pose, e1dera1St, n 10. AqUl tenlarei
Obviamente . SIve e seu argumenlo.
, torna-se necessana desde 0 infcio uma definic;ao:
-., DEFINI<;:AO 4· Vma fac a '" ,
. a um C;.o.e cerl~ 11U~erode cidadaos, seja equivalente
al a ~aIona ou mmona do todo, unidos e motivados por
ri;u~;1:r~i~o codmumde p.aix~o, o~ de interesses, contra-
os ?S demaIs CIdadaos ou aos interesses
permanentes e conJuntos da comunidade". 2.S
Dada essa definic;ao e facil d ' .
facc;ao gerara tirania na ~usencia d~~on~f' a VIsta da Hip6tese 1, que a
va-s~ que e necessaria a Segunda C d~n_0 es extemos. Desse modo, pro-
LDe ue' on Ic;ao.
Madison
qarg=~~'c~r;:;~i~~~er contro1adas. as facc;Oesl Em resumo,
aa!ac.c;~o sa9 semeadas na n!ture n~~rhe econ?"!Ia qu.e astiu~~ lat~
d~ opmIao, que se baseiam ria f~bil'd ~m~m,tern ongem nas diferenc;as
dIferentes Iideres e nas dife en 1 a ~ . a razao humana, no apego a
que sao por seu lado resultadoc;~n~dom~~~ e usufruto de propriedades,
dades dos homens" Se as pe a verSI e que se observa nas facul-
das fac{'Oes s6 pod'e . ssoas n 0 podem ser tomadas iguais as causas
y nam ser controladas I d' . 'soluC;~~~sta obviameme vedada a pe a estrUlc;aOda hberdade -
nao-trramca. Dai segue-se que elas ~oo~ que lutem por uma republica
nac;ao de suas causas. Dessa maneira M di em ser contro~adas pela elimi-
, a son prova a vahdade da
Hip6tese 7: Se queremos que as facc;Oes sejam controladas, e evitada a
tirania, isto tera que ser conseguido pelo controle dos efeitos
por elas produzidos.
Poderao os efeitos ser controlados de modo a se evitar a tirania? Po-
derao, afrrma Madison, contanto que se fac;am presentes duas outras
condic;Oes:
Hip6tese 8: Se uma facc;ao consiste em menos que a maioria, ela pode ser
controlada mediante aplicac;ao do "princfpio republicano" de
votac;ao em um corpo legislativo, isto e, a maioria pode, pelo
voto, vencer a minoria.
IIip6tese 9: 0 desenvolvimento da facc;ao da maioria pode ser limitado se
o eleitorado for numeroso, variado em composic;ao e diversi-
ficado em interesses.
A validade da Hip6tese 8 deve ter parec~'d evidente por si mesma a
Madison, uma vez que sequer tentou prova-la ao obstante, constitui ela
uma suposic;ao de importfulcia crucial para sistema madisoniano. Isto
porque, se puder ser demonstrado que a aplicac;ao do "principio republica-
no" nao impedira em lodos os casos que graves privac;ocs sejam impostas a
maioria pela minoria, 0 sistema nao gerara uma republica nao-tiranica.
Voltaremos a este ponto mais adiante.
lA Hip6tese 9 e provada por um argumento que contem cert<fnumero
de enu~ extremamente duvidosos e alguns que, se verdadeiros, colo-
cariam questoes serias quanta a va IcJaae de outras hip6teses basicas do sis-
tema. Argumenta Madison que s6 ha duas maneiras possfveis de controlar
os efeitos produzidos por uma facC;aode maioria. Em primeiro lugar, deve
ser impedida a existencia da mesma paixao ou imeresses na maioria, na
mesma ocasiao. Mas como neste caso nenhuma facc;ao de maioria existiria,
Madison parece ter invertido seu argumento anterior, de que nao poderiam
ser controladas as causas das facc;Oes.Em segundo lugar, mesmo que exis-
tis~c uma facc;ao de maioria, seus membros deveriam ser tornados inca-
pazes de agir juntos efetivamente]
Ambas as maneiras de controlar os efeitos, argumenta Madison, sao
proporcionadas P.9r uma grande republica. Segue-se um conjunto extre-
mamente duvido~e provavelmeme falso ~eproposic;Oes com a intenc;ao
de demonstrar que a representac;ao numa grande republica dara origem a
"melhores" politicos e reduzira a probabilidade de sucesso "das anes vi-
ciosas atraves das quais as eleic;Oes sao freqiientemente realizadas". Logo
depois, Madison enuncia uma proposic;ao final e de excepcional impor-
tfulcia: 'Amplie-sea esfera e obtem-se maior variedade de panidos e inte-
resses e-alma-se menos provlivel que uma maioria do todo tenha um mo-
livo comum par a USurparas direilos d d 0 0
comum exisle sera m<>;sdOf' 01 as emaIs cldadaos au se tal 0
f ' Ul I ICI que el ,mOllvoraseemos a que disse M dO ... a alue em unissono" 26 Ma Ison: . as para-
• Hip6tese 100 Na med 0da
o 0 I em que a e1eilorado e n 0
slficado em interesses e u~eraso, varlado e diver-
maioria e, se existir ~ mmenosprav,avel que exista fac9ao de
unidade. ,enos provavel que atue como uma
Num~rosos te6ricos politicos antes de Madison deram grande enfasc
ao papel da doutrinayao social au formayao dos costumes na criayao de
atitudes, habitos e mesmo de tipos de personalidade necessarios a um d&do
lipo de sistema polilico. Maquiavel, que de maneira geral nao foi urn
observador tolerante do comportamento humano, evidentemente acreditava
que a controle fundamental da lirania nao se encontrava tanto em urn con-
junto de formulas legais sabre a dislribuiyao especifica de certos can troles
- isto e, uma constituiyao formal - como numa rede de habitos e alitudes
inculcados na sociedade. Certamente essa opiniao e mais compalivel com
as conceitos modemos de comportamento do que a implfcita no sistema
madisoniano. Um cientista social modemo inclinar-se-ia a supor que a tipo
predominante de relacionamento familiar, por exemplo, seria pelo menos
urn determinante tao importante do comportamenlo politico como urn sis-
tema constitucionalmente prescrito de controles govemamentais. A estru-
tura da familia, as sistemas de cren9as, as mitos, as herois, as tipos leg i-
timos de comportamento nos grupos primanos, as tipos de personalidade
predominantes au modais, estes e outros fatores semelhantes seriam de im-
portAncia crucial para determinar as rea90es provaveis de lideres e lidera-
dos e, dai, a probabilidade de tirania au nao-tirania. Embora mal tenham
comeyado as estudos cientificos nessa area, e claro que alguns tipos de per-
sonalidade au de predisposiy0es apresentarn muilO maior probabilidade
que qutros de engendrar atitudes favoraveis au contrarias em relayao a
lideres autoritarios. Nos Estados Unidos, essas predisposiyQes podem estar
relacionadas com fatores tais como classe, educa9ao e grupo etario.28
Em outras palavras, a prova ora exislente sugere que as "controles
intemos" - consciencia (superego), atitudes e predisposiyQes basicas -
sao cruciais para determinar se qualquer dado individuo procurara tiranizar
seus semelhantes; que esses controles intemos variam de urn individuo pa-
ra outro, de urn grupo para outro, e de urn momenta para outro; e que a
probabilidade de a tirania implantar-se em uma sociedade e uma funyao da
extensao em que as van as tipos de rea90eS intemalizadas se encontram
presentes entre seus membros.
Contudo, farfamos com que Madison e seus atuais seguidores pare-
cessemiliJjoas se supusessemos que eles desconheciam esses e outros falos
analogos Muito antes dos estudos modemos sabre tipos de personalidade
autori ' a e democratico,'Jefferson, por exemplo, insistia na importAncia
de urn meio predominantemente rural para criar as lipos de comportamenlo
necessarios ao funcionamento de uma democracia. (Aulores pre-revolu-
cionarias insisliram na virtude moral dos cidadaos c6mo condiyao neces-
saria ao govemo republicano. A virtude entre as cidadaos, acreditavam, por
seu lado requeria "a religiao exortativa, a educayao solida, a govemo ho-
nesto e uma economia simples."29 No seu argumento explfcito, contudo,
Madison parece ter ignorado au minimizado 0 que deve ler sido uma supo-
~
VIll
Na t~~tativa de conferir significado a Pro 0 0
c~~d 0 exami;lar-lhe a validade Passe Imelra Condl~ao, ja se lomou ne-
v ~ ~de de algumas das do· 0 , mos agora a uma curta anal 0
defmlyQes no estilo mad· e~aIs hlp?teses e da utilidade de al Ise da
ate enta~ adotando Isomano dellberadamente formalizado gqum~ das
A· . ue Vlmos
~ pnmeira hip6tese cabe lembrar e . 0 '0
argumento madisoniano e foi formul cia dmaIs I~pllclta do que explfcita no
cJ A _ a segumte forma:
Hip6tese 1: Na ausencia de Controles exte A '"' - , ('
DEFINJr' - . au ~po de individuos, tiranizZ;~s, q:;alquoer dado individuo,
.,..AO 1. 0 controle extemo" a os emals.
siste na aplicayao de ' no caso de qualquer individuo con-
o recompensas e penal°dad 'pectatlva de que serao ap!" da I es au na ex-
que nao 0 proprio individu Ica s par alguma outra Fonteo.
Inter alia, a primeira hip6tese im lica. -.-
1. Que 0 controle sabre as demais ~ed. . I ~
um objetivo altamente vali 0 ,Iante processos govemamentais e
. dO oso, ISto e acred°La2.) Ja Ireta au indiretamente compe d I -se que esse controle se-
/ 2. Que e impossivel medi<>nt dnsa or para aqueles que a exercem•••••e e uca9ao 0 .
atraves da consciencia autodom' 0 ~u. tremamento social criar
favoraveis a tirania en~e lideres ;:;:?o sUfIclen~ para inibir impulso;
ponto de dizee "Sabe-se 10t~COS.MadIson, na verdade vaie 0 f· 0 que a consclencia ' 0 ' a
msu IClente nos individuos 0 1 darn - a umco layo restante _
co pode ISOa ente· em gra dse . esperar dela."ZI ,n es numeros, pou-
3. Q~e a faIxa de identifica9ao empatica d 0 0
lrelta demais para poder eli 0 . e urn mdlviduo com outro e es-
mmar as Jrnpulsos para a tirania.
si~ao comum na sua epoc"~qUi sem d' .
tos do argumento, defronl:~os ~ma ~t;-da,com? ~m mUitos outros pon-
de debatee controversia. (Madison ti:a ~ao slmplJfl~a~a demais para fins
do que satisfazer a I6gica de criticos ass~ntos mcus ~mportantes a tratar
VIsta disso, poderemos tentar sal umdseculo e meIQ mais tarde.) Em
. var uma as suas h" .
slcas vazando-a em termos de probabilidade: Ipoteses Implicitas ba-
Hip6tese I: A probabilidade de que qual uer dad . "
tiranize as demais na auscncG d a mdlvlduo, au grupo,
cientemente alta de modo q e contr?Ies. extemos, e sufi-
Iongo '" ue para a lJrama ser evitada no
d Jrazo a maqumana constitucionalmente estabeIec'd
e qu quer govemo teni que e al I a,t -' temos sabre todos as ~eus servido:~~~er guns can troles ex-
- -/; Isto .e, parece razoavel sugerir ue m .
possam freqiientemente inibir impuIso; am esmo que can troles mtemos
nos casas de todos os individuos q p a lJrama, talvez nao 0 fa~am
de tiranizar. Dai, caso se ueira u~ prov.aveImen~e, es~ao em condi~6cs
eXlemos sao necessarios. E
q
esses ~oe ~ :lfa~la seJa eVltada, os COntroIes
Constitui~ao. noes evem ser estabelecidos pela
Antes de aceitarmos a razoabilidade da ulti
nemos alguns tipos de controles ext m~ senten~a, contudo, exami-
tamen to. Suponhamos que a cond ~mo.s usauos para dominar a compor-
conscientes ou inconscientp.s de u seJa produto de nossas expectativas
'~ocialmente modificados 3O~Q lJ~ccomdpensase penalidades por impulsos
di· . L ue pas e controle exte A
'- os ma somanos como inibidores da tirania? mas tern em mente
A simples demarca~ao . . .
<Y varios departamentos (~i~ ~~rg~:m,ho d?~ hmltes constitucionais dos
quelas usurparoe- s que Ievam) , a e SufIClente para nos defender da-
- y a concentra - . A •
poderes do govemo nas mesmas ma- 31 ~ao t1fanlca de todos os
A q d' os.ue expe lente, entao deveremo
tica a necessaria divisao'de pod s recorrer a fim de manter na pra-
forma estatuida na COnStitUirao~rAen~eos vanos departamentos, da
c . I y. umca resposta possi I 'omo se JUga que lodas essas dis . _ ve e que,
defeilo deve ser corrigido co tr~Sld~oesextemas sac insuficientes 0
. ns um o-se de tal man . ,
mlema do govemo que suas varia . . elra a estrulura
suas rela~Oes muluas ser a meio d s partes conslIlwntes possam, por
Iugar. ' e manter cada outra em seu devido
- A grande salvaguarda contra a .:oncentra~ao gradual dos varios
poderes no mesmo departamenlo consisle em dar aqueles que as actmi·
nistram os meios conSlilucionais e as mati vas pessoais necessarios
para resistir a usurpa~ao dos demais .. A ambi~ao deve ser usada para
contrariar a ambi~iio. 0 interesse do homem deve ser ligado aos
direitos constilucionais dos locais.32
Ora, quanta mais analisamos esses trechos, mais eles parecem se clis-
solver diante de nossos olhos l.omo urn gato Cheshire. * Par que sera a se-
para~ao de poderes necessaria para impedir a tirania? Porque fomece urn
controle extemo aos impulsos tiranicos dos servidores publicos. Par que
fomece esse controle? Porque garante que as ambi~6es de inclividuos em
urn departamento seraocontrariadas por aqueles em outros. Par que essas
ambi~6es contrarias sac efetivas? Presumivelmente porque indivfduos em
urn departamento podem invocar a amea~a de recompensas e penalidades
contra individuos liranicos em outro. Quais, enmo, sao essas recompensas e
penalidades?
Neste ponto chegamos ao amago da quesmo. Presumivelmente, elas
nao sac coisas lais como perda de status, respeito, prestigio e amizade - a
menos que se argumente que a mero fato da prescri~ao constitucional em si
confere legitimidade ou ilegitimidade a certas a~6es; que servidores que
praliquem atos ilegitimos sofrerao perda de status, respeito, prestfgio e
amizade; e que essas penalidades sac suficientes para impedir a tirapia.
Mas esle certamente nao e 0 argumento madisoniano. Tampouco podem as
recompensas e penalidades depender de dinheiro, umavez que a Constitui-
~ao foi elaborada para restringir esse meio de controle, com receio de que 0
legislativo se tomasse poderoso demais.
Envolverao as recompensas e penalidades a amea~a de coer~ao ffsica?
Nesta categoria poderiam incluir-se 0 impeachment, a condena~ao e 0 em-
prego de for~as armadas. Neste caso, porem, a republica estaria sempre a
beira da violencia e da guerra civil. Isto porque se a coer~ao ffsica e 0 obs-
taculo principal a tirania, e se a tirania e 0 perigo fundamental que 0 argu-
mento sup6e que seja, enmo a amea~a de coer~ao ffsica e, por conseguinte,
de violencia, jamais podera estar muito distante da opera~ao da polftica.
Alem do mais, se 0 principal obstaculo e a amea~ de coer~ao ffsica, por
que os Ifderes de uma maioria se absteriam de tiranizar uma minoria - no
minimo se a maioria fosse julgada fisicamente mais poderosa do que a
minoria? Adotando uma visao mais modema da maneira como 0 controle
coercitivo e distribuido, por que uma minoria que exercesse controle dos
instrumentos de violencia e coer~ao se absteria de tiranizar uma maioria?
o fato e que, em algumas na~6es, minorias poderosas nao se refrearam
eo resultado foi a tirania. Ainda assim, contiveram-se em outras na~6es. E
se minorias poderosas ou Ifderes ditatoriais, com apoio de massa, evitaram
Ou nao. implantar a tirania, evidente _
~ ausen~la de paderes conStitucion~:~~~~~~ te~ela~ao com a presen~a
. m.em Jogo nessa situa~ao, mas nao se os. umerosas variaveis en-
~lOnal dos poderes seja uma delas ])Odeprovar que a separa~ao cons-
o est.110madisoniano de ar urn .
solu~ao s~tisfat6ria as quest6es fund~~~~p~r conseguinte, nao proporciona
temen~e, tmha em mente urn conceito b' .talS9ue ~oloca. Madison, eViden-
entre hderes. Mas de varias man' aslco, IStOe, 0 de controle recfproco
l. Nao demonstra e ach e~as 0 argumento e inadequado'
, 0 que nao pode s d .
con~ole recfproco entre lfderes f .er usa 0 p~a demonslrar, que 0
quelra separa~ao de oder ' suoICI~nte para Impedir a tirania re-
na Constitui~ao ameJcanaes, constItUClOnalmente estabelecida c~mo2 0 .. ,
. u a Importilncia do preceito con' .
~xag~~adaOU0 argumento inte :~~uclOnal com~ controle externo e
~~PhCIt.as.no conceito de freio ~ con:~l as realIdades psicol6gicas
. sas as mferencias tiradas de . 0 e ao comportamento. E sao
m~o.rreta para as Proposi~Oes s06~:~~~er dos ,dois tipos de premissa
dUISItOSde uma democracia nao-tiranica POrtamento polftico ou os re-
3. ~gumento madisoniano exagera a i' • .
ranIa, de. freios especificados a servid:;Po~c.la, na preven~ao da ti-
lros servldores igualmente espec'f d es publIC?S, Operados por ou-
controles mutuos sociais ineren~sl~~ os, e sUbestm~a a importilncia de
Sem esses Controles, e duvidoso que ~od~sas Soc~edades pluralistas.
lragovernamental Operem realm os relOSa servldores na esfera in
e discutivel que todos os contrente ~ara impedir a tirania. Com eles-
mad~s?niano, da forma como o;~:smtragovernamentais do sistem;
cessanos para prevenir a tirania. m nos Estados Vnidos, sejam ne-
X
Na .discussao precedente, dei como certo " . ."
s?nf~o e urn termo com significa~ao clariu~ tIrama. no sistema madi-
slve. emonstrar que a Hip6tese 1 ind f.' upondo IStO, tornou-se pas-
£' que mdagar ' uz a alsas concJusOe T
tI da ' porem, se 0 conceito de "tira . ". ,. s. emos agora
un mental para a base 16 ica rua Imph~Ito. nesse sistema, e
encfrra ~g~m significado ope~acio~l estnItura constItuclonal americana,
~ tIranla, vale recordar foi definida .
qu. quer grave priva~ao de ~m dir 't :tJa com? significando toda e
fm;~o e nece~S<iria.Realmente, a ~~~an~~ tir J~~hq~ei'porque essa de-
se evanta 0 SIstema madisoniano s6 ~m~ maJona, contra a qual
atue atraves dos processo ul' pode slgmficar que uma t;~_'. . s reg ares de 1 . - . ....aJtla que
~aI?na pode, apesar disso, agir de m ~ el~oes? legIsla~ao e governo de
dlfeltos naturais anelfa a pnvar uma minon'a d. ese~
Desejo evitar aqui uma discussao do conceito de "direito natural" e de
sua utilidade em teoria polftica, uma vez que isto implicaria uma digressao
muito grande por urn assunto extenso e quase ilimitado. Nao obstante, se
tenho razao em pensar que por "tirania" Madison queria incluir "tadas as
priva~oes graves de urn direitonatural", enta~ nao podemos realmente a-
quilatar a utilidade dessa defini~ao sem examinar esse conceito. Acho,
porem, que podemos nos extricar desse dilema da seguinte maneira:
Nao precisamos resolver a questao de decidir se indivfduos tern direi-
tos naturais ou, em caso afirmativo, quais SaDeles. Tudo 0 que precisamos
saber e se alguma coisa aproximadamente equivalente a defini~ao de tira-
nia que propus (a unica alternativa aparentemente nos levaria a uma defesa
basicamente trivial da decisiva Primeira Condi~ao de Madison) conslitui
urn conceito util em seu sistema. Se isto nao ocorre, enta~ a ideia de tirania,
que e naturalmente fundamental ao argumento de Madison, teni que per-
manecer em urn estado altamenle insalisfal6rio.
E evidente por si mesmo que a defini~ao de tirania seria inteiramente
vazia, a menos que os direitos naturais pudessem ser, de alguma forma,
definidos. Pode-se demonstrar, acho, que temos que especificar urn pro-
cesso mediante 0 qual direitos naturais especfficos possam ser definidos no
contexto de alguma sociedade polftica. Especificar esse processo, porem,
cria alguns dilemas para os madisonianos.
Se urn direito natural fosse definido, de maneira muito absurda, como
significando 0 direito de cada indivfduo de fazer aquilo que deseja, tadas as
formas de governo teriam que ser tiranicas. Isto porque Lodos os governos
pelo menos impedem que alguns indivfduos fa~am 0 que querem. Neste
sentido, por exemplo, todos os governos tiranizam os criminosos, sejam
eles definidos pelo nQsso governo ou pelo governo da URSS. Vma repu-
~lica nao-tiranica, portanto, seria impossfve!. Em vista disso, tal sig-
nificado de tirania deve ser abandonado.
Segue-se que a tirania teni que ser definida como significando que pe-
nalidades severas SaDinfligidas a apenas alguns tipos de comportarnento.
De que modo devem ser especificados, na pnitica, esses tipos de compor-
tamento cuja restri~ao e tiranica? Vma das possibilidades seria restringir
apenas os tipos de comportarnento que Lodos os indivfduos (ou todos os
adultos) na comunidade consideram indesejaveis. Mas isto exigiria unani-
midade para os atos governamentais e, por isso mesmo, tornaria imposslvel
o governo. De acordo com esta regra, por exemplo, se urn assassino ne-
gasse que 0 assassinato e indesejavel, a comunidade nao poderia punir esse
crime. A regra de unanimidade do Conselho de Seguran~a das Na~oes Vni-
das .seria a regra de todas as republicas. Evidentemente, 0 sistema madi-
somano nao exige tal coisa.
A situa~ao polftica tfpica e aquela em que indivfduos em urn grupo ou
na sociedade discordam sobre a desejabilidade de castigar ou premiar
certos .lipo~ de comporlamento. Normas de __
para dmmlr a disputa. Mas quando indivi gove~o sao enta~ empregadas
ser empregada para delerminar se . ~uos dlscordam, que regra deve
liranica ou nao? Uma das pOSSI'b'I'dadPum~ao.de algum alo especifico seria
d 'd I I a es conslsle e ..ecl a. No capilulo 2 examinare' I m permlllr que a maioria
prec~ilo. Conludo, um'a vez que e~s~~~nsados problem~ gerados por esse
Madison quis impedir e ale'm d . gr o~raclonal e exatamente 0 que
. . , 0 mals lomana se 'd
~anla da maioria, lemos que rejeil<i-Ia A ,. m ~e~~ 00 conceilo de
tao, e que algum grupo esnecificad d unlca posslblhdade reSlanle, en-
maioria, mas nao necessan'am' ente 0 a comumdade, nao definido como
d " sempre em opo . - I
e d~ldlr. Mas se a Hip61ese I e correta sl~ao a e a, tenha 0 poder
que dlspusessem de tal poder usa-I _. ' lodos. os ~pos da comunidade
Dai, na pnilica, ninguem leria 0 ;d~~:~a .1I~anlzaroutros individuos.
tambem essa defini~ao de tiran;" ecldlr tal questao. E por isso
. I ••• aparentemente nao '" .
operacIOn~ no ContexlO do processo decisori ' . JiOSSUIsIgnIfIcado
segue-se amda que se lirnnia nao possui s· .~ ~hlICO. ~, naluralmente,
o lem a tirania da maioria. Igru Ica 0 operaCIOnal, tampouco
~ Para que nao se diga que r . . . d fi .
subsliluindo-a deliberadament~jeIleI a e Im~ao que Madison da de tirania,
las, ~ que, portanto, assim fazenckra ou::
s
que c0n.duz a ~onseqiiencias to-
moh-la, que se me permita dIZ'er ' pe. h conslrui uma flc~ao a fim de de-
l em mm a defesa' em . .
pe as raz~ ja exposlaS a propria defini ao d '. p~merro lugar, que
que a defmI~ao que prop us esl<i im r .~ e Ma<!-isone banal; segundo,
nenh~ma defini~ao allernativa com~~~~tm seu sls,tt:ma; e, lerceiro, que
~u SISlema como urn lodo pode s e necessana ao argumento de
Implicadas na defmi~ao que SUg;rYundo penso, escapar das dificuldades
XI
Se passamos ao conceito ex ,. d t
cobrimos que ele enfrenta as mesmas ~.~c f:Iadro sto-.QOrMadison, des-
de tirania. Mal valeria a pena exam' I ICU ~s que 0 conceilO irnpJicito
fo~se 0 fato de que ideias desse leor~~~ ~onc~I~o expIicil~, contudo, nao
tallvas de defender a ideia de lim'ta Oe mp~lcI~S em mUllaS OUlrasten-
"maiorias" 34 0 le'to 1 b I ~ S conslIlucIOnalmenle prescrilaS >.~
" . I r em ra-se decerto da Defi . ~
certo numero de cidadaos seJ'a e . al ml~ao 4: Uma fac~ao e
lod' , qUlv ente a uma '. .
0, umdos e motivados por algum . I maIon~ ou mmoria do
resses, contr~o aos direilos dos de~~;~i:~omum de p~xao, ou de inle-
nentes e COnjunlos da comunidad" aos ou aos mleresses perma-
A dificuldade enfrentada PO: e~ d . _ U,
conlrada com a de "lirania" De sa efim~ao e semelhante a que e en-
. que modo podemos usar esse conceilo? Po-
I
demos interprel<i-Io como significando que fac~ao e qualquer grupo de ci-
dadaos dispostos a usurpar os direitos nalurais dos demais. Uma vez que tal
a~o e tiriinica (por defini~ao, mesmo que esta seja espinhosa), as fac~oes
devem ser obviamente restringidas para que possa existir uma republica
nao-tiranica. Uma republica que evita a tirania lem que evitar a lirania.
A definir,:ao, porem, deixaria de ser redundante se pudesse nos ajudar
de alguma maneira a dislinguir enlre "certo numero de cidadaos" que cons-
tiluem uma "fac~ao" e qualquer outro numero de cidadaos. A menos que
possamos estabelecer tal distin~ao, seriam sem sentido as proposi~6es sub-
seqiientes importantes que dela dependem. Possuem as fac~6es, pergunlO
eu, caracleristicas reconheciveis?
E evidente que ficaremos impotentes enquanlo nao soubermos quais
sao "os direilos dos demais cidadaos" e "os inleresses permanentes e con-
junlos da comunidade". Dianle de tal dificuldade, poder-se-ia sugerir urn
enfoque diferenle. Em vez de pedir as caraclerislicas definidoras de uma
fac~ao, poderiamos tentar irnaginar algum processo polflico alraves do qual
elas poderiam ser idenlificadas a medida que surgissem as silua~6es. Ad-
milo que iS10nao era 0 que Madison tinha em mente, mas talvez seja ulil
seguir por esse caminho, uma vez que ele mesmo nos deixou sem urn guia.
Ora, se lodos sempre concordassem sobLe que a~Qes especificas eram
"conlranas aos direilOs dos demais cidadaos ou aos inleresses permanentes
e conjuntos da comunidade", a fac~ao poderia ser idenlificada por unani-
midade. Ambos os crilerios, porem, sao por demais ambfguos e e suma-
mente improvavel a oblen~ao de unanimidade. Quase lodas as a~6es gover-
namentais privam alguns indivfduos de direitos legais antes possufdos, e
quase lodos os grupos politicos pleileiam do go verno medidas que privem
alguns individuos de certos direilos legais vigenles. Daf, direilos devem ser
inlerpretados como significando direilos nalurais, mas, como demonstra-
mos, nao ha consenso sobre que tipos de comportamenlo esliio incJufdos
nos direilos nalurais, especialmente em casos concrelOS. Quanlo aos "inle-
resses permanentes e conjunlos da comunidade", tanlO quanlo sei nenhum
grupo polflico jamais admitiu Ihes ser hostiJ.
Mas se a unanimidade nao e obrigaloria, enta~ a1gg menos que eJa de-
ve ser suficiente. Se, contudo, a maioria puder decidir 0 CLueconstitui uma
fac~ao e invocar a maquinaria apropriada contra ela, enta~, na pratica, a
maioria nunca seria uma fac~ao. Na pratica, por exemplo, uma maioria
legislativa poderia ter permissao para determinar que politicas SaD"con Ira-
rias aos direitos dos demaiscidadaos ou aos interesses permanentes e con-
juntos da comunidade". E poderia enta~ simplesmente, mediante voto, re-
pelir a polftica proposta. Mas e altamente improvavel que uma maioria fa-
voravel a uma dada polftica jamais CfiCguea conclusao de que sua propria
polftica e facciosa e por isso a repila no voto. Na verdade, tal a~ao seria in-
leiramenle inconcebfvel no contexto madisoniano de comportamenlo polf-
tico e dificilmente seria aceitavel em Cl!!alqueroutro. Dai, se as faq:5es de
maioria sao consideradas autenticos perigos, como insistiram Madison e
seus seguidores contemporaneos, enmo a determina9ao do significado de
fac9ao pela propria maioria tomaria 0 conceito imitil no arcabou90 mad i-
soniano.
Se a determina9ao por unanimidade e por voto majoritario sac exclui-
das, segue-se que a unica altemativa restante e a determina9ao por decisao
de alguma minoria. Mas 0 argumento precedente contra a entrega desse po-
der a uma maioria certamente se aplica a qualquer minoria. Se a Hip6tese I
e correta, enmo devemos esperar que qualquer minoria que disponha desse
poder 0 empregue em interesse proprio, na melhor das hip6teses, e, na pior,
que tiranize todas as demais minorias e mesmo qualquer maioria.
Nao faz parte de meu objetivo analisar todos os aspectos detalhados da tese
madisoniana. Nao obstante, mais urn ponto importante justifica a analise.
A protC9ao contra as fac95es e, por conseguinte, contra a tirania, cabe
lembrar, requer duas condi9Qes:
• Hipolese 8: Se uma fac9ao consiste em menos que uma maioria, ela pode
ser controlada pela aplica9ao do "principio republicano" de
.I vota9aO no corpo legislativo, isto e, a maioria pode, pelo
voto, vencer a minoria.
Hipolese 9: 0 desenvolvimento de uma fac9ao de maioria pode ser con-
tido se 0 eleitorado e numeroso, variado e possui interesses
diversificados.
Vma vez que, como vimos, nenhum significado especifico foi atribui-
do aos termos "faC95es" e "tirania", nas duas hip6teses acima eles tampou-
co 0 possuem, isto e, nao Ita meio concebivel atraves do qual possa ser sub-
metida a teste sua validade. Permanecem, por eonseguinte, como meras as-
ser9Qes incomprovaveis.
Mas despacM-Ios dessa maneira impiedosa deixaria, sem duvida, os
leitores mo insatisfeitos como me sinto. Isto porque nao podemos nos furtar
a impressao de que essas proposi9QeS sao, pelo menos, dignas de exame, se
puderem, de algwna maneira, ser vazadas de forma a superar as deficien-
• cias de seus termos principais.' Que meia-sola podemos aplicar a esses con-
ceitos a fim de testar as Hip6teses 8 e 9, na medida em que possam ser ab-
solutamente submetidas a prova?
• Talvez as dificuldades possam ser evitadas da seguinte maneira: va-
mos, em primeiro lugar, supor que as priva9Qes de liberdade sejam mini-
mizadas. Definamos em seguida a "liberdade" ?e urn individuo como a
oportunidade de atingir seus objetivos ~e~. restn9Qes extemas. ~opomos
agora a regra seguinte: 0 processo declsono govema~~n~l. se~ ~~trutu-
rado de tal maneira que todos os ~pos de taman~o slgmftcauvo tera?
oportunidade de vetar amea9as de pnva9ao de sua hberdade. Dessa manel-
ra, nao e provavel que seja limitada a liberdade de qualquer grupo, exceto
por desconhecimento, perfidia, etc.
Esta formula9ao implica varias dificuldades, uma das matS Impor-
tantes das quais e que provavelmente pouquissimas pessoas considerariam
razoavel conceder 0 poder de veto a todos os grupos de ~anho. si~ni-
fieativo. A maioria das pessoas, por exemplo, nao 0 concedena a cnmmo-
sos mesmo que estes constituissem urn grupo muito numeroso. Se exce-
9oe's tern que ser feitas, isto ca~ria obrig.atoria~~nte a ~Iguns indiv~rluos.
E neste caso voltariamos ao labmnto de dllemas Ja exammados nas dISCUS-
soes precedentes sobre tirania e fac9ao.
Vamos supor, contudo, que este problema poderia ser de alguma ma-
neira solucionado e tornado compativel com os principios madisonianos e
que algumas, mas nao todas, as minorias pudessem ter poder de veto efe-
tivo. (Confonne veremos no capitulo 5, algo semelhante aparentemente
acontece no sistema politico americano.) Podemos agora submeter a teste a
validade da Hipotese 8. Segundo ela, uma minoria disposta a impor severas
priva90es a algwna maioria poderi~ ser. simple~m~nte ~en.ci~a pel~ voto no
eorpo legislativo. Dai, nenhuma mmona podena Jamros hmltar a hberdade
da maioria mediante a9ao govemamental'
Se deixamos de lade as dificuldades da costumeira passividade poli-
tiea da maioria no tocante a quest5es, no estagio de formula9ao de politic a,
enmo a Hipotese 8 e valida, con tanto que seja estreitamente interpretada.
Por estreitamente interpretada, quero dizer que a hip6tese deve especificar
que a maioria precisa ser maior do que a minoria por apenas urn, pessoa.
Se uma maioria qualificada e necessaria para aprovar legisla9ar:- isto e,
uma maioria maior do que a minoria por mais do que urn, como nos casos
em que sac necessanas maiorias de dois ter90s ou tres quartos - nllio
pode-se facilmente demonstrar que a Hipotese 8 trara amea9as a maioria
apenas se elas decorrerem de proposta a9ao govemamentaJlIsto porque, se
mais do que uma simples maioria e necessaria para promulgar uma poli-
tica, enmo uma minoria de tarnanho apropriado pode vetar qualquer poli-
tica que eombatalSe a liberdade de alguma malOria ja e limitada, de ma-
neira que so a a9i'io govemamental positiva e que elimina a priva9ao, e se
uma minoria com poder de veto combate as medidas propostas para au-
mentar a liberdade da maioria, enmo, ao exercer seu poder de veto, uma
minoria pode manter as priva9Qes de liberdade de uma maioria e dai tira-
niza-Ia.35
I
Assim, uma maioria pode julgar que a trabalho infantil, os baixos sala-
rios, as mas condil;oes de habital;ao, a falta de sindicatos eficazes e de pre-
videncia social e a reforma de cortil;os representam graves prival;Oes de sua
liberdade. Neste caso, as prival;oes imediatas seriam infligidas por indivi-
duos privados e nao por servidores publicos. Por conseguinte, se a al;ao go-
vemamental e uma condil;ao necessaria para eliminar 0 trabalho infantil, as
baixos salarios, as mas condil;oes de habital;ao, para criar sindicatos efi-
cazes, instituir a previdencia social e prover moradias decentes ese, alem
disso, uma minoria composta, digamos, de empregadores (au servidores
publicos simpaticos ou responsaveis perante os empregadores) puder vetar
todas as medidas do govemo destinadas a eliminar essas prival;Oes impos-
tas por particulares, entao a Hip6tese 8 e falsa. Isto porque, neste caso, 0
"principio republicano" nao seria suficiente para proteger a maioria contra
as prival;Oes impostas par uma minoria. y
A Hip6tese 9 assegura que as efeitos produzidos por uma faq:ao de maio-
ria podem ser controlados se a eleitorado for numeroso, variado e possuir
interesses diversificados. Neste caso, mais uma vez, a falta de urn signifi-
cado precise da palavra facl;ao constitui obsraculo a comproval;ao do prog-
n6stico. Contudo, se analisarmos os argumentos que a proprio Madison
utilizou a fim de provar a validade dessa hip6tese, toma-se claro que ela
deve ser interpretada como significando que a eficacia de qualquer que seja
a maioria e severamentelimitada se a eleitorado for numeroso, variado e de
interesses diversificado~ Se a maioria e faccionaria ou nao, pouco importa
para a aplical;ao das restril;Oes decorrentes da existencia de urn eleitorado
numeroso, variado e de interesses diversificados. Alem do mais, tanto
quanto sei, nenhum madisoniano modemo demonstrou que as restril;Oes a
eficacia das maiorias impostas pelas realidades de uma sociedade pluralista
sirvam apenas para limitar as "mas" maiorias e nao as "boas". E confesso
que nao vejo maneira como uma proposil;ao ta~ engenhosa assirn poderia
ser satisfatoriamente provada.36
>- Por tudo quanto foi dito, 0 efeito liquido da Hip6tese 9 parece ser 0
seguinte: uma vez que e provllvel que as maiorias sejam insraveis e transi-
t6rias em uma sociedade grande e pluralista, e provllvel tambem que sejam
politicamente ineficazes.E aqui se situa a prot~ao fundamental contra a
explora~o das minorias por elas. Esta conclusao, claro, dificilmente e
compativel com a preocupayao com a tirania da maioria, que constitui a
caracteristica do estilo de pensamento madisoniano.
A falta de significado especifico de term os como "tirania da maioria" e
"facl;ao", juntamente com a importfulcia fundamental desses conceitos no
estilo de pensamento madisoniano, levou a uma teoria politica sumamente
tortuosa, mais explicavel em termos geneticos do que 16gicos. Genetica-
mente, a ideologia madisoniana serviu como racionalizal;ao conveniente a
todas as minorias que, temendo possiveis prival;Oes por iniciativa de
alguma maioria, exigem urn sistema politico que Ihes de oportunidade de
vetar tais politicas.37
r Ao tempo da elaboral;ao da Constituil;ao, 0 estilo madisoniano de ar-
gumentayao proporcionou uma ideologia satisfat6ria, con vincente e prote-
tora as minorias de riqueza, status e poder, que sentiam profunda des-
confianya e temor de seus acerbos inimigos - os artesaos e agricultores,
de riqueza, status e poder inferiores, que elas julgavam constituir a "maio-
ria popular". Atualmente, contudo, afigura-se provavel que, por razOeS his-
toricamente explicaveis, urn numero preponderante de american os politi-
camente ativos se considerem membros, pelo men os durante parte do tem-
po, de uma ou mais minorias - minorias, demais disso, cujos objetivos
poderiam ser ameayados se a autoridade constitucionalmente estabelecida
das maiorias fosse legalmente ilimitada. Por isso mesmo, a des ito de
suas falhas em 16gica, defini~o e utilidade cientifica, a ideologia madiso-
niana provave mente contmuara a ser a mais geran-tle mais fundas raizes
de todos os estilos de pensamento que se poderia denominar corretamente
.de "americanos". Sena tofoaqueTe que pen sasse que 0 exame de sua falta
de 16gica the reduziria significativameme a aceital;ao. As ideologias ser:-'
vem a uma grande variedade de necessidades, psicol6gicas, socioecono-
micas, politicas, propagandisticas - que transcendem a necessidade de
coerencia cientifica reclamada pelos pedantes.
Nada obstante, como ciencia politica, se nao como ideologia, 0 siste-
ma madisoniano ~ claramcnte inadequado. Em retrospecto, as deficiencias
16gicas e empiricas do pensamento de seu autor parecem ter decorrido em
grande parte de sua incapacidade de conciliar dois objetivos diferentes. Por
urn lado, Madison aceitava na maior parte a ideia de que todos os cidadaos
adultos de uma republica deveriam ter direitos iguais garantidos, incluindo
a de determinar a direl;ao geral da politica publica. Neste sentido, 0 go-
verno da maioria e 0 "principia republicano". Pelo outro, ele desejava eri-
grr urn sistema politico que assegurasse as liberdades de certas minorias
cujas vantagens de status, poder e riqueza, acreditava ele, nao seriam pro-
vavelmeme toleradas para sempre por uma maioria nao-restringida por lia-
mes constitucionais. Dai, as maiorias precisavam ser constitucionalmente
controladas. 0 madisonianismo, tanto no passado como atualmente, cons-
titui uma acomoda~ao entre essas duas metas conflitantes. Acho que de-
monstrei que os term os explfcito e implfcito da acomoda~ao nao resistem a
uma analise cuidadosa. E talvez fosse tolo esperar isso.
.Na busca de uma teoria de democracia que se sustente sob exame,
duas altemativas se sugerem por si mesmas, ambas concentradas na conse-
cu~ao de uma das duas metas basicas ta~ perigosamente aliadas pela aco-
moda~ao madisoniana. Uma possibilidade seria a de concentrar-se no argu-
mento sobre a preocupa~ao de Madison de que a maioria impediria a mi-
noria - ou uma minoria particularmente valiosa - de obter aquilo que
tern 0 "direito" de obter, seja isso propriedades, status, poder ou a opor-
tunidade de salvar a humanidade. Seguindo essa linha de raciocinio, postu-
larfamos que as metas de algum dado conjunto de individuos sac ineren-
temente corretas ou boas e que 0 processo decis6rio deveria assegurar a
maximiza~ao dessas metas. Ironicamente, a preocupa~ao com os perigos
gerados pelas maiorias foi compartilhada·nao s6 pelas elites aristocraticas
mas tambem por aventureiros politicos, fanaticos e totalitarios de todos os
matizes, de modo que este estilo de pensamento assume urn sem-numero
de formas e encontra defensores ta~ diferentes como Platao e Lenin. Se
levarmos urn dos aspectos do argumento de Madison ate seu limite l6gico,
portanto, podemos facilmente coloca-Io no campo dos gran des te6ricos an-
tidemocraticos. Mas desde que ele evitou levar suas premissas aos limites
ultimos, seria desleal, tolo e sem proveito esticar-lhe 0 argumento ate essas
I?njuras. Alem do mais, 0 que quer que possamos pensar sobre a desejabi-
hdade de urn ou de outro dos sistemas politicos propostos por esses te6-
ricos, acho que, a menos que queiramos eliminar algumas distin~6es muito
uteis entre sistemas politicos, nao poderemos considera-los, concentrados
como estao na meta de evitar 0 controle da maioria, como democraticos.
Segundo penso, Madison foi ate onde era possivel, ainda permanecendo
sob 0 palio da democracia. Por esse motivo, nao me proponho a explorar 0
desenvolvimento altemativo de seu argumento.
A outra altemativa consiste em estabelecer a igualdade polftica como
urn fim a ser maximizado, isto e, postular que os objetivos de todos os
cidadaos adultos de uma republica devem ser considerados de igual valor
na determina~ao das politicas publicas. Se tal fosse nosso objetivo, que
condi~6es basic as deveriam existir para a tomada de decisOes pelo go-
verno? Esta e a altemativa que nos ocupara a partir de agora.
Sumario do argumento madisoniano
1. As defini~6es basicas:
o "controle extemo", no caso do individuo, consiste na
aplica~ao de recompensas ou penalidades, ou na expec-
tativa de que serao aplicadas por alguma fonte que nao ele
mesmo.
A "tirania" e toda grave priva~ao de urn direito natural.
Uma republica e urn govemo que: a) deriva todos os seus
poderes direta ou indiretamente do grande corpo do povo e
b) e administrado por pessoas que exercem seus cargos
enquanto assim agradar ao povo, por urn perfodo limitado
e enquanto tiverel11born comportamento.
Uma fac~ao e "certo numero de cidadaos, seja equivalente
a uma maioria ou minoria do todo, unidos e motivados por
algum impulso comum de paixao, ou de interesses, con-
trario aos direitos dos demais cicladaos ou aos interesses
permanentes e conjuntos da comunidade".
DEFINIC;:AO 2:
DEFINIC;:AO 3:
II. 0 axioma basico: 0 objetivo que deve ser colimado, pelo menos nos
Estados Unidos, e uma republica nao-tiranica.
III. 0 argumento:
Hip6tese 1: Na ausencia de con troles extemos, qualquer dado individuo,
ou gropo de individuos, tiranizara os demais.
Hip6tese 2: A acumula~ao de todos os poderes, legislativo, executive e
judiciario, nas mesmas maos implica a elimina~ao dos con-
troles extemos.
Hip6tese 3: Na ausencia de controles extemos, uma minoria de indivi-
duos tiranizara uma maioria de indivfduos.
Hip6tese 4: Na auscncia de con troles extemos, uma maioria de individuos
tiranizara uma minoria de individuos.
Hip6tese 5: Sao necessarias pelo menos duas condi~6es para a existencia
de uma republica nao-ticinica:
Primeira condil;do: A acumula~ao de todos os poderes,
legislativo, executivo e judiciario, nas mesmas maos, seja de
urn, de alguns ou de muitos, e se hereditaria, autonomeada ou
elctiva, deve ser evitada.
Segunda condil;do: As fac~6es devem ser controladas de
tal maneira que nao possam agir de forma contraria aos
direitos dos demais cidadaos ou aos interesses permanentes e
comuns da comunidade.
Hip6tese 6: Elei96es populares freqiientes nao criarao con troles extemos
suficientes para impedir a tirania.
Hip6tese 7: Se queremos que as fac90es sejam controladas, e evitada a
tirania, isto ten} que ser conseguido pelo controle dos efeitos
por ela produzidos.
Hip6tese 8: Se uma fac9ao consiste em menos que a maioria, ela pode ser
controlada mediante aplica9ao do "principio republicano" de
vota9ao em urncorpo legislativo, isto e, a maioria pode, pelo
voto, vencer a minoria.
Hip6tese 9: 0 desenvolvimento de fac90es de maioria pode ser limitado
se 0 eleitorado for numeroso, variado em composi9ao e diver-
sificado em interesses.
Hip6tese 10: Na medida em que 0 eleitorado e numeroso, variado e diver-
sificado em interesses, e menos provavel que exista fac9ao de
maioria e, se existir, e menos provavel que atue como uma
unidade.
16gica em sua posi~ao.
12. Aparentemente, coube a Hamilton redigir os documentos relevantes, .de nOs ~7-77.
Dadas suas ideias poHticas, seria de esperar que ele minimizasse os pengos da tLTama
por esse ramo do govemo. Alem' do mais, nao devemos nunca esquecer que os
"Federalist Papers" enfeixam trabalhos polemicos e propagandlsticos, refletindo pontos
de vista altarnente partidarios.
13. The Federalist, nO48, p. 323.
14. Ibid., p. 322 (grifos do autor).
15. Ibid., p. 324.
16. Sobre essa questao, contudo, vcr 0 comentario de Elisha P. Douglas, Rebels and
Democrats (Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1955), p. viii.
17. The Federalist, nO49. "E essencial para tal govemo que ele derive do grande corpo da
sociedade, nao de uma propor~ao minuscula ou de uma c1asse por ele favorecida ... E
suficiente para tal govemo que as pessoas que 0 administram sejam indicad~s direta o~
indiretamente pelo povo; e que cumpram seus mandatos pelos prazos especiflcados ...
18. Cf. Louis Hartz, "The Whig Tradition in America and Europe", American Political
Science Review, XLVI (dezembro de 1952), 989-1()()2.
19. The Federalist, nO47, p. 313.
20. The Federalist, nO 10, pp. 57 e segs. .
21. Embora a defmi~o nao seja expHcita nos trabalhos de Madison, tanto quanto nos fOi
posslvel descobrir, cia e deixada c1aramente impHcita. Por exemplo, ele argumenta em
numerosos trechos que "em um govemo justo e !lvre ... os dlreltos de propnedade & de
pessoas devem ser eficazmente protegidos". Mas se houvesse sufnigio universal, e' se_a
maioria dos cidadaos carecesse de propriedades, entao, os dlrelt?s destas ~Ivez nao
fossem protegidos. Dal 0 govemo devia ser estruturado de manelra a 1D1pedlr que os
direitos de propriedade fossem irlfringidos pela malOna (padover, op. cll., pp. 37-38).
De outra maneira 0 govemo nao seria "justo & livre". Simplesmente, tomel "Justo &
livre" equivalent~ It "nao-tirania" e "tirania" igual a "nao-justo & livre", isto e, It
priva~o dos direitos naturais. Se 0 conceito de "tirania da maioria" de Madison tern
qualquer outro posslvel significado alem deste, nao me fOl posslvel descobn-Io.
22. Embora a autoria deste trabalho tenha sido de certa feita contestada, esta agora provado
que Madison, e nao Hamilton, foi seu autor. (Irving Brant, James Madison, Vol. lll:
Father of the Constitution, 1787-1800 [Nova York: Bobbs-Merrill Co., 19501, p. 184).
23. Madison adiciona tarnbem urn argumento que e mais comum entre os antidemocratas,
isto e, que problemas levados as elei¢es populares nao seriam decididos de acordo
"com os verdadeiros meritos da questao", mas em base partidaria. Ao contrario dos tres
prirneiros, que me parecem visivelmente falsos, este ultimo simplesmentl7 nao tl7m
sentido - pelo menos nao sem uma indaga~o filos6fica e emplnca mUlto
consideravel, que nao foi tentada por Madison. Cf. The Federalist, nO49, pp. 327-32.
24. Isto represcnta urn refmamcnto de ideias de Madison, ja expostas na Conven~o e
antes. Cf., por exemplo, Elliot's Debates, V, 242-43.
25. The Federalist, nO 10, p. 54.
26. The Federalist, nO 10, p. 61. Cf. tambem 0 ultimo panigrafo de The Federalist, nO51,
pp. 339 e segs.
Elliot's Debates, V, 162.
Morris Janowitz e Dwaine Marvick, "Authoritarianism and Political Behavior", Public
Opinion Quarterly, XVII (verno de 1953), 185; e tambem T.W. Adomo et. al., The
Authoritarum Personality (Nova York: Harper & Bros., 1950). Agrade~ a meu
eolega, professor Robert Lane, por me ter chamado a atcn~ao para 0 fato de que, se a
c1asse socioeconomica for mantida constante, os demais correlatos nao parecem ser
estatisticamente significantes. Cf. seu "Political Personality and Electoral Choice",
American Political Science Review, XLIX (mar~o de 1955), 173-90.
Rossiter, op. cit., pp. 429-32. .
Note-se que, quando vazada em termos psicol6gicos, a distin~ao entre con troles mter-
nos e extemos do comportamento toma-se algo vaga. Mesmo na parte de controle
I. A Hip6tese I e a Defmi~ao I sao parafrases, embora me pare~am razoavelmente pre-
cisas, de numerosas referencias encontradas nos trabalhos de Madison. Minha lin-
guagem talvez seja mais modema, mas as ideias sao, acho, as mesmas expressadas poT
Madison, como, por exemplo, em "Observations", de abril de 1787, no The Complet
Madison, His Basic Writings, Saul K. Padover, org. (Nova York: Harper & Bros.,
1953), pp. 27-29. Cf. tarnbem sua carta a Jefferson, 24 de outubro de 1787, pp. 40-43.
2 The Federalist, Edward Mead Earle, org. ("The Modem Library", Nova York: Random
House, s.d.), p. 313. Para outra analise da obra de Madison, vcr Mark Ashin, "The
Argument of Madison's 'Federalist' nO 10", College English, XV (outubro de 1953),
37-45.
3. Clinton Rossiter sumariou 0 estado do acordo sobre direitos naturais It epoca da
Revolu~ao no SeedJime of the Republic (Nova York: Harcourt, Brace & Co., 1953),
cap. XIII.
4. Ibid., p. 383. Rossiter descreve 0 consenso sobre este ponto.
5. The Debates in the Several State Convention on the Adoption of the Federal
ConstiJution as RecOfTlm£nded by the General Convention at Philadelphia, in 1787,
together wiJh the Journal of Federal Convention, etc., Jonathan Elliot, org. (21 ed.,
FiladeIfia, Lippincott, 1941), V, 203. Doravante mencionado como Elliot's Debates.
6. Por exemplo, as observa~Oes feitas por Madison na Conven~ao, ibid., p. 162.
7. Ibid., IV, 204.
8. Ibid, V, 145.
9. Ibid, V, 200.
10. Ibid., V. 294.
II. Por exemplo, ver Padover, op. ciJ., pp. 28, 37-38, 41, 45-47. Mas ver tarnbem 0
"comentario" de Madison em 1833, ibid, p. 49. Em anos posteriores, Madison parece
ter sentido urna admira~ muito mais afetuosa pelo prindpio da maioria. Tal como a
maioria dos americanos, ele aparentemcnte nunca julgou haver a menor contradi~o
intemo pela consciencia. 0 sinal que provoca a expectativa de sentimentos de culpa
dolorosos ou "urn ataque de consciencia" pode muito hem ser urn objeto. ou a~ao.
extemo. Alem do mais. mesmo quando as recompensas e penalidades sao manipuladas
por uma fonte extema a um dado indivfduo, como, por exemplo. no caso de renda ou
respeito. 0 que control a e a expectativa interior ou sensa~o concreta de prazer ou
priva~ao. Aqui. mais urna vez, a teoria madisoniana. ao que tudo indica. nao pode ser
satisfatoriamente convertida cm ciencia politica modema sem uma cirurgia tao extensa
que 0 resultado nao seria coerente com 0 estilo de pensamento que rOlulamos de
umadisonianou
.
The Federalist, nO 48, pp. 326.
The Federalist, nO 31. pp. 335-37.
Em Alice no Pais das Marayilhas. de Lewis Carroll, urn gato somdente que gradual-
mente desaparece ate que s6 fica 0 somso. (N. do T.)
31. Poder-se-ia dizer que cada pessoa decide por si mesma. ap6s consultar seu pr6prio
sistema de valores. se urn dado ate foi ou nao tiranico. Mas isto e meramente uma
norma para comportamento individual e nao proporciona uma regra para urna decisao
coletiva.
As aspas refletem minha convic~ao de que, no sentido habitual. as maiorias raramente.
se e que alguma vez. govemam em qualquer paIS ou organiza~ao social em qualquer
epoca. Assim. 0 temor do govemo da maioria, hem como sua defesa. baseia-se em urna
interpreta~ao errooea das probabilidades permitidas pela realidade polftica. Para uma
discussao deste ponto. ver cap. 5.
.Embora, aparentemente, Madison nunca tenha isolado com clareza esta situa~ao, acho
que ele a compreendia e supunha 0 significado mais limitado da Hip6tese 8. Assim. em
1830. ele se opOs a doutrina da anula~o. se ela significava que "a decisao do estado
deve ser presurnida vilida e que derroga a lei dos Estados Unidos. a menos que
derrogada per tres quartosdos estados". Isto porque, argumentou ele. "instituir urn
preceito positivo e permanente dando tal poder a tal minoria. sobre tal maioria,
invalidaria 0 primeiro prindpio do govemo livre ...•. (Padaver, op. cil., pp. 157-58) Os
conceitos de "veto de minoria" e de "maiorias coincidemcs" nao sao, rigorosamente
falando. de cria~ao de Madison. Esta ideia, ligada ao nome de John C. Calhoun, parece
ainda assim ter-se tornado urn elemento fundamental Jla ideologia amcricana e e
freqiientemente defendida em linguagem basicamente madisoniana.
Cf. capItulo 4.
A clara defesa que Calhoun faz da escravocracia sulista com a doutrina de malorias
coincidentes parece-nos senslvel a todas as fraquc/<ls do sistema madisoniano, ao qual
e paralela em numerosos aspectos. Mas nao me proponho aqui tratar especificamente
da variante especial que Calhoun elaborou com fundamento em Madison. Cf. seu
Disquisition on GovernmenJ, R.K. CraIJe, arg. (Nova York: Peter Smith, 1943), esp.
pp.28-38.
A Democracia Populista1
Referiu-se Madison as decis6es da rnaioria como "0 principio republi-
cano". Isto, con forme demonstramos, era uma das partes de sua grande
acornoda9ao. Perpassando por toda a hist6ria das teorias de democracia
encontramos sua equipara9ao a igualdade polftica, a soberania popular e ao
govemo das maiorias. Temos, por exemplo, no Polftica, de Arist6teles:
A dernocracia mais pura' e aquela assim chamada principalmente par
causa da igualdade que nela prevalece: pois e isto 0 que a lei nesse
estado determina; que os pobres nao fiquem em maior sujei9ao do que
os ricos; nem que 0 poder supremo caiba a urn ou a outro, mas que
ambos 0 compartilhem. Isto porque se liberdade e igualdade, como
alguns sup6ern, sao encontradas principal mente na dernocracia, isto
deve ocorrer por estarem todos os departarnemos do govemo
igualmente abertos a todos; mas como 0 povo esta em maioria, e 0 que
vota e lei, segue-se que tal estado deve ser uma dernocracia.
Porque quando quaisquer numeros de homens formaram, por consen-
timento de todos, uma cornunidade, com essa a9ao transformaram essa
cornunidade em urn tinico corpo, com 0 poder de agir como corpo
unico,o que ocorre apenas pela vontade e determina9ao cia maioria.
Tendo a maioria... de homens que se uniram para formar uma
sociedade, todo 0 poder da comunidade nela investido, pode emprega-
10para, em ocasioes oportunas, elaborar leis para si ... (Locke, Second
Treatise. on Civil Government).
Ha apenas uma lei que, por sua pr6pria natureza, necessita de con-
sentimento unanime. Esta e 0 contrato social ...
A parte esse contrato primitivo, 0 voto da maioria obriga mOt"al-
mente a todos os demais ...
PressupOe isto, na verdade, que todas as qualidades da vontade ge-
ral residam na maioria; quando elas deixam de faze-lo, qualquer que
seja 0 partido que urn homem possa tomar, nao e mais possivel a
lil)erdade (Rousseau, 0 Contrato Social).
o primeiro principio do republicanismo e que a lex-majoris partis e a
lei basica de todas as sociedades de individuos de iguais direitos;
considerar a vontade da sociedade expressa pela maioria de urn unico
voto, tao sagrado como se unanime, e a primeira de todas as lir;oes em
importiincia ... (Jefferson, Carta ao barao yon Humboldt, 1817).
A unanimidade e impossivel; 0 govemo de uma minoria, como arranjo
permanente, e inteiramente inadmissivel; de modo que, rejeitando-se 0
principio da maioria, a anarquia ou 0 despotismo sob alguma forma
sao tudo 0 que resta (Lincoln, Primeiro Discurso de Posse, 4 de marr;o
de 1861).
A pr6pria essencia do govemo democratico consiste na soberania ab-
sol uta da maioria; isto porque nada ha nos estados democraticos que a
ela possa resistir (De Tocqueville, Da Democracia na America).
Esses preceitos, ou descrir;oes, do funcionamento de govemos demo-
craticos colidem frontalmente com a visao madisoniana. Na pratka, con-
tudo, a tentativa de equiparar democracia ao poder ilimitado de maiorias
tern sido em geral acompanhado da tentativa de incluir na definir;ao algum
conceito de restrir;oes as mesmas. Locke deixou 0 argumento suficiente-
mente ambiguo para ser consideraoo como defensor tanto do govemo ma-
joritario ilimitado como do limitado. Jefferson, <lfinal de contas, era urn
"madisoniano" e apoiava 0 sistema constitucional construido durante sua
ausencia. Em 1861, Lincoln julgou util insistir no direito divino das maio-
rias como altemativa tanto a sucessao como as maiorias "coincidentes" de
Calhoun, mas nao questionou basicamente 0 sistema constitucional madi-
soniano, que procurava preservar. Ao referir-se a soberania absoluta da
maioria, De Tocqueville aludia aos Estados Unidos; 0 pr6prio lar do madi-
. . mol As palavras citadas acima constituem a frase inicial do capi-
sontants . . . U'd S
twO intitulado "0 Poder Ilimitado da MalOna nos Estados m os e uas
conseqiiencias". . _. , .
Uma analise das vanas formular;oes dessa~ POSI~oeSI?compau.vels su-
e duas conclusoes. Em primeiro lugar, a afrrmar;ao de soberanla ,abso-f~~da maioria" ou de "direitos de minor~a a?solutos" e~frenta urn numero
imenso de objer;oes e, por isso mesmo, Ide.ol~gos serviram a um~ g~n~e
'edade de fins sustentando ambas as poSlr;oes ao prer;o da coerencla 10-
van I f - t'. Nos Estados Unidos, e quase incrivel a resu tante con usao em ma e-
glca. . ~. 16' , ereria de 16gica. A longa persistencia das mcoerenClas giCas, porem, su.g
tisfal'ao de alguma necessidade social profunda. Nos Estados Umdos,
a~ Y fl'isto talvez seja a minimizar;ao de con ItOSgraves. .,
Segundo, tanto quanto sei, ninguem j~ais defen~e~, e mnguem salvo
seus inimigos jamais definiu, a democracI~ como sl~Ificando. que uma
maioria quereria ou deveria fazer tudo aqUll? qu~ s~n~sse deseJo de rea-
lizar. Todos os defensores da democracia c~J~ .existencI~ conher;o e. to~s
as definir;oes generosas dela feita incluem a IdeI~ de restnr;oes as malOnas.
Um ponto fundamental, pore~, e se ~ssas restn~oes sao ou devem ser: 1)
fundamentalmente restrir;oes mtemahzadas no SIstema de co.mportame?to
individual, tal como a consciencia e outros ~rodutos da d?~tnn~r;ao social;
2) fundamentalmente con troles sociais reclprocos de v~os upos; ~~ 3)
fundamentalmente controles constitucionais. Entre os SIstemas pohtlc~s
aos quais e habitualmente aplicado 0 termo "democracia" no. m~ndo OCI-
dental, ha uma diferenr;a importante entre os que confiam pnncIpa~ente
nos dois primeiros con troles e aqueles que, como os Estados Umdos,
empregam tamt>em os de natureza constitucional.
Nas paginas que se seguem, tentarei expor urn ~gumento do q~al - para
usar a frase de De Tocqueville - e as vezes de~vada a '"sober~ma abs?luta
da maioria". Em seguida, procederei a respectlva anA!Ise. ~mda maiS do
que no caso do argumento madisoniano, a f:aTe!~aqUl consiste .em tomar
explicitas certas suposir;oes e cadeias de raCIOCffiIOque sao hab~~ua~ente
deixadas irnplicitas ou tangenciais. E isto ocorre com tanta fr~uen;Ia ~ue
nao atribuirei 0 argurnento absolutamente a qualque~ dado te6nco. DaI,.o
que se segue pode ser considerado como urna manerra.- e, ar~mentana
eu, uma maneira deixada irnplicita com muita freqiiencIa em teonas de de-
mocracia _ de derivar a proposir;ao de que maiorias devem exercer so-
berania ilimitada
DEFINI<;:AO ): Uma organizarrao e democf<itica se, e apenas se, os pro-
cessos para se chegar a formularrao da polftica publica sao
compativeis com a condirrao de soberania popular e a
condirrao de igualdade polftica.
DEFINI<;:AO 2: A condirrao de soberania popular e satisfeita se, e apenas
se, acontece que quaisquer que sejam as oprr6es de polftica
identificadas, a alternativa escolhida e posta em pratica
como polftica publica e a que contou com a preferencia da
maioria de seus membros.
DEFINI<;:AO 3: A condirrao de igualdade politica e satisfeita se, e apenas
se, 0 controle sobre as decis6es do governo e comparti-
lhado de tal maneira que, quaisquer que sejam as alterna-
tivas de politic a identificadas, na escolha daquela a ser fei-
ta cumprir como politica publica, a preferencia de cadamembro e atribuido urn valor igual.
ProposiC;iio 1: A unica regra compativel com 0 pro-
cesso decisorio em uma democracia pluralista e 0 prin-
cipio da maioria.3
DEFINI<;:AO 4: A REGRA: 0 princfpio do governo da maioria preceitua que,
na escolha entre alternativas, a preferida pelo maior nume-
ro e escolhida. Isto e, dadas duas ou mais alternativas x, y,
etc., para que x seja a politica do governo e condirrao ne-
cessaria e suficiente que 0 nUmero dos que a preferem a
qualquer outra alternativa seja maior do que 0 numero que
prefere qualquer outra altemativa a ela.
Proposic;iio 2: A democracia populista e desejavel, pelo
menos para as decis6es governamentais, como apelo final
quando os demais processos estabelecidos foram esgo-
tados, e entre cidadaos adultos (a condirrao da "ultima pa-
lavra").
A Regra, como chamarei a Definirrao 4 por questao de conveniencia,
pode ser considerada como uma norma que realmente governa 0 compor-
tamento de individuos em urn dado sistema quando sao tomadas decis6es
governamentais. Nao precisamos decidir se e ou nao tamrem uma regra ou
preceito constitucional. Tudo 0 que precisamo~ especificat e que, quais-
quer que possam ser os preceitos constitucionais, eles nao devem gerar urn
comportamento incompativel com a Regra. De identica maneira, nao ne-
cessitamos decidir se os individuos concordam com ela ou, se concordam,
que proporrrao deles 0 faz. Mais uma vez, tudo 0 que precisamos especi-
ficar e que, qualquer que seja 0 estado de acordo, ele nao pode enr ndrar
comportamento incompativel com a Regra. Assirn, 0 que se afirrna na Pro-
posirrao 1 e que, para que sejam satisfeitas as condirr6es de soberania po_
pular e igualdade politic a, os individuos que participam do sistema_politico
devem comportar-se de acordo com a Regra. Colocando a .questao dessa
maneira, acho que evitamos certo nume~o deyroblemas dehcados que, de
outra forma, nos impediriam de tratar Imedlatamente dos pontos funda-
mentais do argumento.
As objerr6es a esse enfoque de democracia podem, urn tanto ar~itr~ia-
mente, ser englobadas em tres grupos, dependendo de serem elas tecmcas,
eticas ou empiricas. . .
Entre as tecnicas, discutiremos quatro delas. Em pnmeuo lugar, ,0 ~-
gumenlo aparentemente supoe que cada individuo de falo te.m preferenCl.a
por uma unica alternativa. Na verdade, con~ud?, pode-se obJetar que mUl-
tos cidadaos podem ser, e geralmenle sao, mdlfcrentes ao resultado. ?:ta,
no entanto, nao e uma objerrao de peso, uma vez que, dad as as ~uposlrroes
da Proposirrao 1, 0 cidadao indiferente ~e ser correta~en~e l~norad? e
levados em conta apenas aqueles que manlfestaf? p~eferen:l~. ISlO e, a
Proposirrao aplica-se a individuos que tern preferenclas e. nao ~queles que
nao as possuem. Em conseqiiencia, 0 fato de nu~~rosos mdlvlduos ser~m
indiferentes quanto as alternativas nao afeta a ~oglca do argumemo: a flm
de satisfazer a Regra e suficiente conhecer ~ n~mero d?s 9ue prefere~ ca-
da alternaliva, uma vez que somar as preferenclas dos mdlferentes eVlden-
temente nao influenciaria 0 resultado.5 . . •. . .
Uma segunda e correta objer;ao tecmca e que 0 pr~ncl~lO da ~alOna
nao fornece solurrao para os casos em que cada.~lernatJva ~ ~r:fenda (ou
votada) por igual numero de cidadaos. Uma analise da Deflmrrao .4 revela
que assim e. Poder-se-ia sugerir .q~~, e~ t<>?osesses casos, uma mterpre-
tarrao correta da Proposirrao 1 eXlgma a mdiferenrra g~vernatnental ou ~
impasse. Certamente nenhuma outra.solurrao e compatIvel co~ a ~egra. "
Nao obstante, e facil ser induzldo a erro pela palavra I~dlferente,
uma vez que, psicologicamente falando, os membros.da .comumdade e, por
conseguinte, a comunidade, podem ser tUd.omenos mdlferentes. Se 0 Im-
passe ocorre na escolha entre duas altematlvas que sao ar~orosamente de-
fendidas por seus respectivos partidarios, disto pode mUlto. bem ~esultar
violencia e guerra civil. Historicamente, es~ talvez tenha sldo a sltuarrao
que realmente se configurou nos Estados Umdos nos anos 1850-60, quando
urn numero substancial de individuos com preferencias na questao da
escravidao tornou-se polarizado em tomo d~ ~uas altem~ti.v~ mut~amente
exclusivas: extensao vs. exclusao da escravldao nos temLOnos. 0 Impasse
C
t0!"ll.ou-seintoleravel e s6 foi rompido pela elei~ao de Lincoln e a GuerraIvI1.
ma :f, em. tod?s os casos em qu~ cidadaos se dividem em grupos aproxi-
da d ente Igmus, ~da urn prefenndo sua pr6pria altemativa, e a rejei~ao
. outra, a valores ~s como paz social, absten~ao da violencia, coesao na-
Clonal, etc., toma-se .trnpossfvel uma solu~ao compativel com a Regra. Isto
porque nes!e c~o 0 Impasse - a unica condi~ao forrnalmente compativel
- nao sera. acelto e U?1lado ten.tar~ ~mpor suas preferencias ao outro por
todos os melOs a seu dlspor. 0 pnnclplo da maioria em conseqiiencia teria
que ser posto de lado. '.
A ?r~, P?de-se ?izer que a obj~ao fundamenta-se em urn caso de ocor-
rencia ill? ~mprovavel que a tom a insignificante.7 Nao obstante a obje~ao
su?e~e v.anas conclusOes. importantes. Para come~ar, a Regra p~essupOe a
eXlstenCta de c,erm: c~ndi~Oes empfricas (como, por exemplo, alto consen-
~o no tocan~e_a propna Regra) que nao foram especificadas. Na ausencia
essas condl~oes, a Regra nao se aplica. E se acredimssemos que as condi-
~oes nao estava:n suficientemente presentes para tomar a Regra aplicavel
nos Estados Umdos, por ~xemplo, enta~ seria de todo coerente argurnentar
que as me~s ~e soberanla popular e igualdade polftica, embora rigorosa-
me?te posslvels nos Estados Unidos, poderiam chegar a uma aproxima~ao
mu~to. grande gra~as a alguma outra altemativa que nao 0 principio da
malOna.
b Alem do ~a~s,. no mundo real, e mesmo em urn sistema constitucional
~ea,.do no pnnclplO ~ ~aioria (como na Fran~), 0 impasse ou a violen-
~la nao requerem a eXlstencia de dois grupos de tamanho perfeitamente19ual.
Fin~n:ente, se 0 impasse e a unica solu~ao compativel com a Regra
nas. condl~oes dadas, su~ere-se pelo ~e?os a possibilidade de que, quanto
m~IS~~ grupo ~e ~proxImar de uma dIvlsao igual, menos va lido se toma 0
pr~nc~p~oda m~or~a. Constilui urna inferencia necessaria da defini~ao do
pnncIpIo ~a r,n~lona que, mesmo que ela exceda a minoria por urn Unico
voto, 0 pnncIplO ainda assim se aplica. Nao obstante, sua aplica~ao num
caso extremo como esse em q~e 0 grupo e grande e a diferen~a muito pe_
q~~na, pode nos parecer, na plOr das hip6teses, como urn absurdo doutri-
nano e, na ,"?elho~,como uma mera questao de conveniencia.
A tercelfa obJe~ao a Regra tern origem na precedente. Como acabamos
d~ demo,ns.trar, nos casos de divisao igual de preferencias entre os cida-
daos, a umca solu~ao compatfvel com a Regra e 0 impasse no govemo
Mas em alguns dess~s caso,s.ate mesmo essa solu~ao e contradit6ria em si:
Suponhamos que x e a polItlca em vigor e que y e uma altemativa reque-
~endo ayao. govemamental, como, por exemplo, x e uma polftica de nao-
mterf:rencla pe!o govemo federal em casos de linchamento eye uma le-
glsla~ao determmando que 0 govemo intervenha. Se for adotada a solu9ao
do impasse, nenhuma a9ao govemamental e empreendida, mas se isto ~ao
for feito, enta~, na realidade, x e a politica do govemo. Dessa maneIra,
preceituando 0 impasse e?1 casos de igual ~iv~sao de preferencias (V?t?~),
estamos de fato mtroduzmdo uma tendencIosIdade no processo decIsono
em favor de todos os indivfduos que preferem polfticas que requerem
ina9ao govemamental e contra todos os que prefere?1 polfticas no sentido
da a9ao. Ainda assim, se nao seguida a solu9ao do Impasse, os resultados
seriam igualmente arbitrarios. Por isso, nesses casos, a solu9ao do impasse
e contradit6ria em si e nao se pode demonstrar que qualquer resultado seja
compativel com a Proposi9ao 1 e com a Regra.
Mais uma vez, a principal conclusao pratica e que, quanto mais um
grupo se aproxima de uma divisao igual, mais qualquer regra parece ser
uma mera questao de conveniencia, dados os valores subjacentes a Pro-
posi~ao 1.
A terceira obje9ao pode ser generalizada para abranger todos os casosem que as preferencias (vOlOS)sao distribufdas entre grupos iguais.8 Em
todos esses casos, nao s6 a Regra nao se aplica, como nao pode ser aduzida
qualquer regra satisfat6ria compativel com as condi90es de soberania po-
pular e igualdade polflica.9
A quarta obje~ao e que mesmo que exista uma maioria, no sentido de
mais legisladores e cidadaos preferirem uma altemativa a outra, talvez seja
impossivel descobrir urn metodo de vota9ao que satisfa9a a Regra e ao
mesl"lWtempo atenda a certos requisitos praticos. Seria tedioso demonstrar
as dificuldades dos varios metodos de vota9ao, especialmente porque eles
ja foram exaustivamente examinados por varios autores.lO Seja suficiente
dizer que, em todas as ocasiOes em que ha mais de duas altemativas em
jogo, todos os metodos seguintes de vota9ao podem dar origem a uma
escolha coletiva que viole as preferencias da maioria:11 0 metoda de YOlO
unico, pelo qual cada eleitor lan9a um voto indicando a Unica e mais prefe-
rida op~ao; 0 metodo anterior seguido pela sel~ao final entre as o~oes
mais votadas; 0 metodo de dupla vota~ao, pelo qual cada eleitor tern duas
altemativas, e e escolhida aquela que recebe 0 maior nllinero de votos; 0
metodo de Borda, mediante 0 qual cada eleitor tern direito a tres votos, dois
sendo dados a uma altemativa e urn a outra.
o requisito essencial de um sistema de vota9ao que satisfa9a IiRegra e
que os eleitores, sejam eles cidadaos, legisladores ou membros de comis-
sao, tenham oportunidade de votar em altemativas dispostas duas a duas
em uma serie de pares suficientemente completa para que a altemativa pre-
ferida pela maioria, se houver, seja necessariamente a escolhida. Em alguns
casos, isto requer que urn voto seja dado para cada par de altemativasP
o requisito de que uma vota9ao seja feita por cada par de altemativas
identificadas, se numa elei9ao ou na escolha entre m~oes em urn corpo
legislativo ou comissao, s6 raramente ou nunca e seguido no funcionamen-
to ,das org~niz~~6cs de,n:ocraticas. Os requisitos tecnicos para se aperfei-
~oar_a aphca~ao arJtI~eLJCada Regra implicariam altos custos em tempo,
paCIe.ncla, comprcc~~ao e acordo que talvez superem de muito quaisquer
IdenlIflCados beneflclos no mundo real. Nao obstante, exceto no caso da
representa~ao, ~roporcional, e apenas justo ruzer que a aplica~ao pratica de
regras necessarlas ~ara apli~ar 0 princfpio da maioria e urn assunto que nao
tern Jnt~ressado mUlto aos clentistas polfticos e outros tecnicos neste ultimo
melO sec,ulo. Talvez urn estudo mais acurado do assunto revele alguns me-
todos prdlIcos para atender a quarta obj~ao.
vazado em linguagem mais precisa, a 16giea dos direitos naturais aparente-
mente requer uma visao transcendental, na qual eles sao "naturais" porque
Deus direta ou indiretamente quer que existam. E Deus os quer como di-
reitos que os homens tenham permissao (mas nlio necessariamente) de seus
semelhantes para exercer em sociedade. E facil compreender que tal ar-
gumento envolve inevitavelmente grande variedade de suposiyoes que sao,
no minimo, dificeis e, na pior hip6tese, impossiveis de provar para satis-
fayao de todos os que tenham inclinayQes positivistas ou ceptieas.
A dificuldade de se derivar uma prova mais ou menos inatacavel da
desejabilidade da igualdade politiea e soberania popular diretamente de
uma etica transcendental sugere a possibilidade de se recorrer a provas de
carater eonveniente. Estas pelo menos adiam 0 problema de uma justi-
fica~ao final, embora, claro, nao 0 eliminem para aqueles que acreditam na
necessidade da mesma.
Dando urn exemplo, se como resultado de doutrinayao social sentir-
mos inquietayao em situayoes de desigualdade politica e se a democracia
populista alivia essa inquietayao e nlio cria outras de gravidade igual ou
maior, e se preferimos serenidade a inquietaylio, seria racional preferi-Ia a
democraeia madisoniana (ou, claro, a rutadura ou a qualquer outro sistema
hierarquico). Uma vez que esse tipo de hedonismo parece, mesmo em nos-
sa cultura, earecer de autoridade psicol6gica ou da aceitabilidade de uma
etica transcendental, 0 argumento seria insatisfat6rio para numerosos indi-
viduos. E eertamente nlio adiaria por muilo tempo a questao etica basica.
Poderiamos tentar tambem demonstrar que, em urn dado tempo e lu-
gar, por razoes hist6rieas e culturais, nenhuma regra etiea que nao a cor-
porificada na soberania popular e igualdade polftica conferiria legitimidade
as decisoes polftieas. E se fosse possivel demonstrar que essa legitimidade
era necessaria a uma grande variedade de metas, tal como a estabilidade, a
democracia populista seria, necessariamente conveniente. Mas se, como vi-~
mos supondo, a democracia madisoniana e a tese predominante nos Esta-
dos Unidos, 0 argumento dificilmente se aplicaria a este pais. 0 maximo
que se poderia demonstrar e que os americanos foram doutrinados para
acreditar tanto na democracia madisoniana como na populista; que nunca
conciliaram inteiramente as duas; e que essa incapacidade priva as deeisoes
govemamentais de grande parcela de legitimidade. Seria dificil demons-
trar, contudo, que uma mudanya completa para a democracia populista au-
mentaria por esse motivo a legitimidade das decisoes do govemo.13
Urn terceiro argumento conveniente poderia basear-se em uma ampla
estralegia para consccuc;ao de uma grande variedade de metas do indivi-
duo. Deriva-se ele do progn6stico de que, pelo menos para 0 individuo ou
para os grupos que ele ap6ia, a probabilidade de maximizar grande varie-
dade de metas altamente apreciadas e maior na democracia populista do
que em qualquer uma de suas alternativas. lsto pressupoe, claro, algum
A fim de Ievar, em co~ta algumas das obj~5es eticas a teoria populista,
v~o; comp~a-Ia rapldamente com. 0 argumento madisoniano. A pro-
pos.lc;aoessencml ?O argumento descnto neste capitulo e que, dadas a sobe-
ranla P?pular e ~ ~gualdade polftica como Unicas metas, deve ser condic;ao
n~essarla e SU~lclcntea polftica publica que cia se con forme as preferen-
Clas do mawr nume~o de cldadaos (eleilores ou legisladorcs). Contra isto, 0
ru:g~mento madlsoOlan~ afirma, como inferencia etica de suas suposi~5es
baslCas, que a conformldade com as preferencias do maior numero de ci-
dadaos deve s~r uma condic;ao necessaria, mas nao suficiente, a polftica do
govemo. Isto ~, 0 fato de uma dada polftica ser preferida pcla maioria a to-
das as altemallvas conhecidas nao implica que ela seja efetivamente ado-
tada pelo g.ovemo, IStOporque con troles intemos impostos a maioria po_
dem Impedlr a altemativa de ser promulgada.
Bern, sobre que fundamentos poderiamos defender a desejabilidade da
Regra ,~m contras~e com.? p~o~sic;lio madisoniana? Na verdade, a per-
g~nta e. Po: que sao deseja.ve.ls a Igualdade polftica e a soberania popular?
Sltua-se alem de meus objetlvos neste trabalho empreender uma analise
detalhada ?ess~ quest5es ~ticas, que por seu lado exigem alguma teoria
sobre a ~~1Jdac;aode proPOSIc;oeSdesse tipo. Isto porque 0 exame de teorias
democratIcas aitemallvas logo se transformaria em urn elemento subordi-
nado .em uma c~~tica ge~al de tearias eticas alternativas. Nao obstante,
~ena ser desejavel dehnear 0 esboyo geral que assumiria, talvez essa
cntIca. '
Histori~amente, a justifieati.va da igua~dade polftica e da soberania po_
pular .tem sido em geral deduzlda da aceltac;ao dos rureitos naturais. As
SUPO,Sly~Sque tornaram a idCia de direitos naturais intelectualmente de-
fe~save~s tenderam a dissolver-se nos tempos modemos. A menos que elas
sejam slmplesmente uma maneira indireta de argumento, que poderia ser
, ~empo e, lu~ar, como os Estados Unidos em 1956, e tambem alguns dados,
Impressloms~~ ou nao, que serviriam de base a uma estimativa aproxima-
da de p~obabih~des. Neste caso, 0 compromisso do individuo com a de-
. moc~acla populista e, do ponto de vista 16gico, inteiramente provis6rio e
contmgente a produr;;~? de certos resultados (ou da probabilidade de que
el~s .~orram). ~a. prauca real, contudo, urn sistema via vel de democraciaeXlgma, sem dU~lda, extensa doutrinar;;ao e habitua~ao social.14 Dai, em-
b?r.a 0 compro,mlsso pudesse ser intelectualmente considerado como provi-
sor~o, no que ~te~essa ao comportamento precisaria ser, e provavelmente
ser~a para ~ malOna das pessoas, altamente est<ivel e fortemente ancorado
no ~nconsClente. Na verdade, enta~, seria provis6rio no sentido da 16gica e
mUlto mais rigido no do comportamento.
Mas prossigamos no exame do terceiro argumento, reformulando nos-
sa qu~stao da se~inte maneira: Em primeiro lugar, suponhamos que a Pro-
pOSlr;;aoI prop?r~lona uma regra com alguma probabilidade positiva de ser
usada em declsoe~ govemamentais nos Estados Unidos, digamos. Su-
ponhamos em segUida que nosso unico criterio para escolher uma ou outra
rcgra e 0 efei~ pro~a~el da mesma sobre nossas metas ou sobre a de algum
outro grupo IdenufIcavel. De que modo podemos decidir racionalmente
que u~a r~~~a que n:aximize a soberania popular e a igualdade politica e
prefenvel.a so~ran.la popular Jimitada" expressa em regras apropriadas a
dem?Cra~la madlsomana? A resposta obviamente requer urn volume muito
conSlderavel ,de progn6sticos sobre as conseqiiencias de cada uma delas.
Not.e-:e, po~em, que as rel~r;;~s estabelecidas pelas Defini~OeS 1-3 e Pro-
posl~ao I sac puramente 10giCas e nao nos permitem fazer absolutamente
q~~quer profecia. Isto e, nada mais fizemos do que elaborar urn sistema
10giCOque, por mais satisfat6ria seja sua simetria, nada nos diz sobre 0
mundo reaL Ainda assim, nao podemos sensatamente decidir se preferimos
a ,der:nocracla populista a madisoniana sem estimar as conseqiiencias pro-
vavelS de cada alternativa, se aplicada em urn dado tempo a algum dado
gru~ no ~~ndo real. Em conseqiiencia, ternos que nos voltar para a obser-
var;;aoempmca em busca de resposta. Mas passar a ela implica alterar todo
o problema, de u".l de estabelecimento de rela~6es puramente 16gicas para
outro de estabeleclmento tambem de rela~Oes empiricas. Voltaremos a este
ponto na se~o V.
.. Para sermos e~atos, 0 fil6sofo dira que nao podemos provar a deseja-
~llIdade da PrOpo~lr;;ao1 basean.do-nos inteiramente em proposir;;Oesempi-
ncas - e q~e malS cedo ou mms tarde faremos algumas suposi~oes eticas
fun?amentaIs. Nao obstante, nao levaremos adiante a analise da etica final
da 19ualdade politic a e da soberania popular. Em vez disso voltaremos a
algumas quest6es anteriores. '
Mesmo supondo que e valido 0 enfoque sugerido pelo ultimo argumento,
uma das obje~Oes a democracia populista e que ela ignora as diferen~as em
intensidade de preferencias. Na linguagem da economia, ela rejeita as com-
para~Oes interpessoais de utilidades. Suponhamos que nos seja posslvel
medir ou, pelo menos, graduar as intensidades das preferencias. Suponha-
mos ainda que x e apenas ligeiramente preferido a y por uma maioria e que
ye fortemente preferido a x por uma minoria. A defini~ao de igualdade po-
litica nao leva em conta esse fato e a Regra 0 ignora.iDai, nesse caso, mes-
mo que a maioria exceda a minoria por apenas urn, a democracia populista,
conforme vimos, exigiria apesar disso que a o~ao da maioria fosse a poli-
tica publica. E talvez 0 receio de que, ocasionalmente, uma meta altamente
apreciada seja postergada por uma maioria modesta que leva ate os ameri-
canos mais ardentemente democratas a preferir com tanta freqiiencia a dc-
mocracia madisoniana a populista - pelo menos no caso dosEstados Unidos.
A fim de enfrentar esse problema, teremos que passar brcvemente a
Proposi~ao 2, que ate agora ignoramos. Esta, a condi~ao da "ultima pala-
vra", sustenta que "a democracia populista e desejavel, pelo menos no to-
cante a decisOes do govemo, pelo menos como solu~ao final quando todos
os demais processos preceituados foram esgotados e pelo menos entre ci-
dadaos adultos". 0 argumento que justifica essa condi~ao desenrola-se da
maneira seguinte: embora as regras da democracia populista possam ser
estendidas a numerosos tipos de organiza~ao, 0 govemo e a mais impor-
tante de tadas elas. A condi~ao, por conseguinte, visa a assegurar que a de-
mocracia populista aplica-se pelo menos ao govemo. 0 govemo e crucial
porque dispOe de con troles relativamente poderosos. Em uma grande va-
riedade de sjtua~oes, em urn choque entre con troles govemamentais e
outros, os primeiros serao provavelmente mais decisivos do que os segun-
dos. Para sermos exatos, a eficacia dos con troles govemamentais tern li-
mites. Seria facil Ihes exagerar a for~a comparativa mas a hist6ria politica
Constitui urn registro de lutas violentas, e nao raro sanguinarias, a fim de
Controlar os controles que denominados de govemamentais. E razoavel
S.uporque, em uma grande variedade de situa~Oes de formula~ao de po li-
t~ca"quem quer que controle ~ decisOes govemamentais tera urn poder
slgmficativamente maior sobre ela do que individuos que nao se encontram
nes~ condi~Oes. Por isso mesmo, 0 argumento em prol da democracia po-
pulista e, pelo menos inicialmente, em favor dela no govemo.
A frase "democracia populista no govemo", porem, pode induzir a
erro. "Govemo" incIui numerosos tipos de processos sociais; os depar-
-
~ ~ '0- ..,
tamentos san hierarquicos, alguns deles operam dentro de urn sistema de
pr~os e e comum a barganha entre lideres hierarquicos. A exigcncia de
democracia populista nao implica tambCm a elimina~ao de tados esses pro-
cessos altemativos de controle no go verno. Da mesma forma que 0 go-
verno e urn sistema crucial de controles na sociedade, san de igual im-
portiincia nele os processos que permitem uma voz mais ou menos final ou
decisiva na politica. Por isso mesmo, 0 argumento em favor da democracia
populista aplica-se a esses processos decisivos no govemo, onde a "ultima
palavra" tern que ser dita.
A restri~ao da "ultima palavra" a adultos e defendida por uma grande'
variedade de razoes. Embora a idade limite mais baixa seja motivo de al-
gumas controversias, 0 princfpio basico desperta Ilio pouca contesta~ao que
me dispenso de passar em revista os argumentos que 0 justificam.
Voltemos agora a quest.ao das intensidades. Mesmo aqueles que jul-
gam a Regra razoavel, nos casos em que acrcdita que e mais ou menos a
mesma a intensidade do desejo entre os membras da minoria e maioria,
consideram-na intoleravel no casu do tipo citado acima, em que x e apenas
ligeiramente preferido por uma escassa maioria eye fortemente preferido
por uma minoria igualmente pequena. Com efeito, pravavelmente ninguem
defenderia a aplica~ao da Regra em todas as situa~6es. A verdadeira ques-
Ilio e se 0 indivfduo a defende: a) para 0 governo, b) como apclo final, c)
entre adultos, isto e, se a quer mesmo na condi~ao de "palavra final".
Suponhamos que alguem negue a validade da Regra, mesmo sob a
condi~ao de ultima palavra, alegando que ela nao reflete aprapriadamente
as intensidades dos desejos. Nega-Ia implica dizer que ou nenhuma regra e
valida, 0 que seria de pouca utilidade no mundo real, ou que uma regra
contraria e valida. A regra contraria teria que afirmar que, em alguns casos
em que 0 de~ejo da minoria por y e mais intenso do que 0 desejo da maioria
por x, a polftica govemamental deve adotar a preferencia da minoria e nao
da maioria (a Regra Ressalvada da Minoria).
A fim de tomar essa regra aplicavel, haveria necessidade de especi-
ficar urn metodo para decidir quando urn casu particular se enquadra nesta
categoria. Suponhamos que se permita que a maioria decida. A primeira
vista, isto pareceria sem sentido e, na verdade, logicamente contraditorio,
mas, na verdade, isto acontece freqiientemente nos pafses democraticos,
seja funcionando de acordo com regras madisonianas ou com algo como 0
princfpio do governo de maioria. Ha uma grande variedade de raz6es por
que uma maioria que inicialmente demonstra apenas uma ligeira preferen-
cia por uma polftica pode finalmente aceder as exigencias de uma minoria
fortemente atuante. A intensidade dos desejos de outras pessoas, e os pro-
vaveis atos polfticos resultantes de diferentes graus de intensidade, figurarn
entreos fatores que numerosos indivfduos, e certamente muitos Ifderes
politicos, poderao levar em conta ao decidir sobre suas proprias prefe-
rencias em polfticas.
Mas suponhamos que esse tipo de solu~ao, inte~ame~te compa~fvel
com a Regra, e julgado inadequado, uma vez que a declsaO fmal cabe amda
a maioria. Neste caso, a Regra Ressalvada da Minoria deve ser toma.da
operacionaI, especificando-se uma dada minoria em que se pode c?nfIar
que invocara seu poder nos casos, mas apenas n~ste.s caS?S, em que a ~nten-
sidade da preferencia de uma minoria por y era slgmficatlvam~nte malOr do
que a intensidade da preferencia de uma maio~a ~r .x. Infehzmente: con-
forme veremos no capftulo 4, no mundo real e difIcil estruturar de.htx:r~-
damente uma organiza~ao oficial apropriada a esta condi~ao. Rels-fIlo-
sofos nao sao faceis de encontrar.
A obj~ao etica final e que acredilO valida a teoria da democracia,P0pulista
e que ela postula apenas duas metas a serem maximizadas - a 19ual,dade
polftica e a sobcrania popular. Mas ninguem, exceto talvez ~m fa~allco,
desejaria maximizar duas metas as expensas de todas as demals. ~a~, qual-
quer etica polftica que estabele~a regras apropna~s apenas ao atlOglmento
de uma ou duas metas e inadequada para a malona de nos.
Isto porque para quase todos nos - e isto pode ser ~specialmente ver-
dadeiro em pafses que conseguiram manter democra~las durante longos
perfodos de tempo - sao excessivos os custos de Vlsar a uma .ou .duas
melaS as custas de todas as demais. Na maior parte, somos margmahstas.
De modo geral, expe(imentamos utilidade marginal ~ecrescente qua~to
mais atingimos uma meta ou, na linguagem da ~slcOlogl~ modema, 0 ~t~n-
gimento da meta reduz 0 valor motivador do eSllmulo. A 19ualdade pohtlca
e a \oberania popular nao sao metas absolutas. Temos que nos perguntar 0
quanto de lazer, privacidade, consenso, estabilidade, renda, segur~n~a, pro-
gresso, status e provavelmente muitos outros objetivos estamoS,~lspo~tos a
renunciar em troca de urn aumento adicional de igualdade pohllca. E fato
observavel que quase ninguem considera a igualdade polftica. e .a soberania
popular como valendo 0 sacriffcio ilimitado desses outros o?Jetlvos. .
Cabe perguntar: a democracia popular imp6e custos, dlgamos, nos ~-
pos de objetivos mencionados acima? Esta e uma quesllio a qual a teona
nao oferece resposta. Mas certamente uma tcoria que nao m?IC~ ~s.custos
provaveis contra os quais terfamos que medir os ganhos provavels e mcom-
pleta demais para nos ajudar muito no mundo real.
Esta ulti~a obse~a9ao lembra urn ponto mencionado antes: a teoria da
de~ocra,cl~ popuhsta nao e urn ~i~tema empirico. Consiste apenas em re-
la90es loglcas entre postulados etlcos. Nada nos diz sobre 0 mundo real
Baseando-nos nela nao podemos preyer qUalquer tipo que seja de compor~
tamento.
. E este. e urn ponto de suprema importfuJcia. .na avalia9ao da signifid'm-
~Ia.~ ~eona: lsto p?rque, conf?rme ~a .vimos, em certo numcro de questoes
e difIclI ou Impossl.vel para nos, de.cldlf que regra preferirfamos seguir ate
que tenhamos prevlsto a~ prova~els conseqiiencias do emprego da Regra
n? mund~ real. ~as aqUl a teona da democracia populista em nada nos
~Juda. Nao nos. diz como devemos nos aproximar da sobcrania popular e
Igualdade polftlca ou ~axim~a-Ia no mundo concreto. Declara simples-
m~n~e.que a ~onsecu.9ao perfelta dessas condi9oes, supondo-as atingfveis,
~xlgma de nos a apltca9ao da Regra. Mas esta raramente e, se realmente
l~tOac~ntece alguma vez, a forma que assume urn problema no mundo do
dla-a:dia, e acho que nunca acontece na polftica.
E grande a varieda?e,?e fatos empiric os que precisamos conhecer, ou
sobre el.es formar uma Idela, antes de podermos decidir racionalmente so-
b~e os tl~S de regras polfticas que queremos seguir no mundo real. Alem
dISSO,a StlUa9~0concre~ pode muito bem variar de urn momento a outro e
de uma organlza9ao SOCIala outra. Dessa maneira, mesmo que nossas me-
tas (valores~ pe:manCIYames~veis, urn conjunto de regras que maximize a
sua concreuza9ao em uma stlua9ao pode ser inteiramente inaplicavel em
~utra. Certa?1e~te nao ha razao a priori para supor que a democracia popu-
ltsta maxl.mlzarla n~ssas metas (ou as metas dos demais) em todas as cul-
~uras, socleda?~s e epocas. Por isso mesmo, ainda que acreditemos que a
Igualda~e polttlca e a soberania popular sac metas desejaveis (entre ou-
tras), e~ldentemente a questiio relevante precisa ser colocada mais ou me-
nos. ~SIf!1: ~~ propos.tas especificas (como, por exemplo, a elimina9ao da
revlsao JUdICI~, parudos politicos unificados, mudan9as na dura9ao de
mandatos, ou Implan~9ao do sistema parlamentar, etc.) se adotados, diga-
mos, nos Estados U.mdos, nos aproximariam mais dessas duas metas do
que as sugestoes ex~stentes ou outras alternativas, sem impor ao mesmo
tempo custos exce~slvos e outros valores? A fim de responder a urna per-
gu~ta como es~, ~Acla:o qu~.temos que sair da teoria da democracia po_
pulista e passar a clencla polttlca empirica.
~o capitulo 3, examinaremos algumas das mais importantes rela90es
empmcas qu~ aparentemente existem nos sistemas polfticos denominados
de de'!1ocraucos (pelo menos no Ocidente). No restante deste ca 't I
tratar d trA b' -, . pI U 0,. el e es 0 ~e9oes a teona da democracia populista que colocam
Importantes questoes empiricas.
Em primeiro lugar, a teoria nao indica que individuos ou grupos de-
vem ser incluidos no sistema polftico ao qual a igualdade polftica, a sobe-
rania popular e a Regra devem aplicar-se. Sem duvida, alguns de seus de-
fensores gostariam de ver todos os seres humanos vivendo em tal sistema,
mas, tanto quanto sei, nenhum te6rico polftico jamais propugnou urn sis-
tema unico e mundial desse tipo de democracia. Historicamente, a demo-
cracia moderna e 0 nacionalismo desenvolveram-se aproximadamente na
mesma epoca e os modernos te6ricos da materia tern em geral, implfcita ou
explicitamente, propos to 0 sistema para a na9ao-Estado. Alguns, como
Rousseau, aparentemente 0 consideraram apropriado a grupos pequenos,
mais ou menos do tamanho de urn cantiio; Jefferson evidentemente consi-
derava a igualdade polftica e a soberania popular mais praticaveis ao nivel
estadual do que no do governo federal, esfera esta em que ele, na pratica,
aceitava 0 sistema madisoniano. Resta, contudo, a questao: deve urn con-
junto de indivfduos ser inclufdo de preferencia a outro? Tanto quanto sei,
nenhum te6rico democrata nos fomeceu qualquer resposta sistematica a
esta questiio.
Poder-se-ia dizer que as fronteiras apropriadas incluiriam apenas os
individuos que concordassem com a Regra. Mas isto certamente tomaria 0
sistema impraticavel no mundo real. Uma vez que fronteiras geogrMicas
seriam provavelmente necessanas como assunto pratico, seria provavel que
qualquer area geogrMica significativa inclufsse apenas indivfduos que con-
cordam com a Regra. Se, por esse motivo, se insistisse em que as fronteiras
deveriam incluir grupos nos quais a maioria concorda com a Regra, verifi-
car-se-ia que esta norma nao nos daria absolutamente qualquer principio
operacionalmente util. De que modo uma decisao desse tipo seria alcan9a-
da no mundo real? Sup<;mhamos que a area conhecida como Greater Wys-
teria tenha uma maioria de adultos que concorda com a Regra, mas que a
minoria que se opOe a ela na zona de Greater Wysteria conhecida como
South Wysteria seja suficientemente numerosa para formar uma maioria
nessa zona. Nosso principio experimental nos diria para tra9ar as fronteiras
em tome de Greater Wysteria e excluir South Wysteria, isto e, seria uma
inStTu9aocontradit6ria em si mesma.
Os limites de inclusao e exclusao de unidades govemamentais geo-
grMicas constituem, no mundo real, alguns dos fenomenos polfticos mais
rigidos. Nao precisamos recorrer as experiencias de na90es-Estado em
busca de prova nesse sentido. Basta que nos lembremos das dificuldades
que quase sempre irnpedem a aceita9ao de propostas de consolida9ao ur-
bana. Em grande parte, todos temos que aceitar as fronteiras de nossomundo polftico tais como foram tra9adas pela tradi9ao e os fatos hist6ricos.
E s6 raramente sac elas acessfveis a mudan9a racional.
Mas mesmo que fossem, no caso de indivfduo que subscrevesse nu-
merosos valores, e nilo apenas os dois corporificados na igualdade polftica
e na soberania popular, a norma mais racional a seguir seria aproxima-
d~mente a segumte: escolher uma sociedade polftica que contivesse incli-
vlduos ~uJos obJell.vos fossem suficientemente parecidos com os seus para
. proporclOnar a ~aIS alla probablhdade de que pudessem maximizar todos
os seus p~mclpaIs valo:es. Vma vez que a igualdade polftica e a soberania
popular ~~o apenas dOiS valores, seria inteiramente racional que 0 indivi-
du~ sacnflCasse algum ou ~guns para assegurar a realiza9ao dos demais.
~al, ele podena JUIg~ r~clOnal escolher fronteiras que incluissem indi-
vlduos, talvez uma malOna deles, que fossem favoraveis a democracia ma-
dlsomana ou mesmo a algum outro sistema polilico allemalivo. Por isso
mesmo, 0 Acordo de Conneclicut nao constitui necessariamente uma
acomoda9ao t,o.la,mesmo para os americanos que atribuem alto valor a
Igualdade pohuca e por ISSOmesmo sao contrarios a igual repreSenla9aO
eSladual no Sena~o. ISlOporque pode ser de longe a melhor barganha glo-
bal que u.m amencano pode obter no mundo real, isto e, todas as altema-
tlvas reahsLas senam menos satisfat6rias.
Nao disc.UlOaqui. se este e ou nao 0 caso. 0 importanle e que a teoria
da dem~r~cta popuhsla nao proporciona quaisquer criterios satisfat6rios
p!":a decl.dlr quem d~v~ ~er i?cluido no sistema. A elabora9ao desses cri-
teno~ .sausfatonos eXlgma cUldadosa alen9ao a urn grande numero de fatos
e.mpmcos que nao es~o especificados no sistema e, realmenle, nao pode-
nam, ser sem converte-Io de urn sistema de 16gica pura em uma teoria
empmca.
u~ s~gundo problema empirico foi colocado por Gaelano Mosca, cuja
0~Je9ao podemos parafrasear da seguinle maneira: Todas as sociedades
cnam uma classe dominante. 0 controle popular geral (e cerlamenle 0
govemo da maioria) e impossive!. Nao obslante, a exte~sao em qu~ a
cla~s~ dommante e sensivel aos desejos populares e aos resullados das
elet9oes. depende ate ce~ ponto do sistema constitucional, da ideologia
p:edommante e da doutnna9aO social. Doutrinas e preceitos constitucionais
dlspo~do sobre soberania popular e govemo da maioria sao os que exercem
os maIS fraco~ d~ too_osos controles sobre os govemantes. Isto porque, uma
vez qu~ a maIona nao govema em nenhum caso, as doutrinas e preceitos
desse tIpo na verdade conferem poder ilimilado a minoria govemante a
qual, natur.alm~n~e, alega representar a maioria. Por isso mesmo, em p~te
algu~a ayrama e.maIs p~ovavel do. que numa sociedade em que 0 sistema
~On~tItUClOnale.a t~eologla predommante legitimam 0 poder constitucional
thmtlado da malOna.
A objCl;ao de Mosca, cabe notar, dificilmente pode dar algum consolo
aos cnticos maclisonianos da democracia populisla. E acontece isto porque
a objCl;ao repousa na suposi9aO explicila de que toda a ideia de tirania da
maioria e absurda; a maioria jamais govema e, portanto, nao pode jamais
tiranizar; s6 as minorias govemam e, conseqUentemente, a tirania e sempre
exercida pelas minorias.
Neste capitulo, nao tentarei chegar a uma conclusao sobre se e valida
ou nao a objCl;ao de Mosca.ls 0 imporLante e que ela coloca uma serie de
quest6es empiricas para as quais a tcoria da democracia populisla nao pro-
porciona resposla.
o terceiro problema empirico tern dado origem a grande confusao inte-
lectual, em grande parte por causa de ambigUidades lingUisticas. 0 pro-
blema surge da objCl;30 de que, sob urn sistema de soberania popular,
igualdade politica e govemo da maioria, uma maioria pode muito bem
tomar meclidas que destruam 0 sistema e, por isso, talvez seja necessario al-
gum metoda de veto de minoria para impedir que isso ocorra. Nos ESlados
Vnidos, uma grande variedade de elementos no sislema constitucional pro-
porciona urn veto de minoria, incluindo 0 Supremo Tribunal, a composi9aO
do Senado, 0 sistema de comiss6es do Congresso, a obstru9aO e, as vezes,
talvez, a presidencia.16
Tomemos x* como algum requisito fundamenlal a igualdade politica e
a soberania popular, digamos, certo grau de liberdade de expressao. Supo-
nhamos l\ue y e uma altemativa que a reduziria a urn ponto em que a
soberania popular seria impossivel, e inevit<'ivel a oligarquia.l1 Poder-se-ia
argumentar que urn veto de minoria e necessario para impedir a implan-
la930 de y e, com ela, a destrui930 nao apenas da democracia populisla em
si mas de qualquer aproxima9ao real da me sma.
o problema e agravado neste ponto pela necessidade de levar em conla
o periodo temporal no qual se espera que as preferencias populares sejam
transformadas em politica publica. Nenhum defensor da democracia popu-
lisla, lanto quanto sei, exigiu jamais a transforma9ao instantanea das pre-
ferencias da maioria em politica publica, isto e, sup6e-se que uma defasa-
gem temporal exisla entre 0 primeiro aparecimento da preferencia da mai-
oria e a a9ao govemamental que a implcmenla. Propugnadores da demo-
cracia sup6em em geral que a escolha da maioria deve ser uma coisa pon-
derada, pensada; a escolha racional exige que 0 individuo conhe9a seus
pr6prios valores, possua conhecimento tecnico das altemativas e saiba
quais as prov3veis conseqUencias de cada uma delas. Esse conhecimento,
sustenta~se tradicionalmente, requer tempo para debate, discussllo, tomada
de depolmentos e outros eXpedientes que consomem tempo.
? Ate qu~ ponto urn retardamento, ou demora, e compativel com a Re-
gra. ,A teona da dem~racia populista nao fomece resposta; e urn sistema
es~ttco e nao constrUI~o em uma sequencia temporal. Se urn mes e com-
patlvel, por que n~~ dOIS?Por que nao urn ano, dois, dez? Dizer que a de-
mo!a ,de,v~ser suftc,lentemente longa para que se fa~a uma escolha racional
s~na muttl porque IStOe urn conselho de perfei~ao ou, se nao isso, opera-
CIO?al~ente nao, tern sentido. Nao ?bstan~e, u,ma resposta como essa sugere
van os ttpos de sltua~ao e uma teona preclsana explica-Ias.
Surge uma d~l~ quando ,a opiniao em favor de y declina ininter-
ruptame~te~ de malona para mmona; outra quando a opiniao e transit6ria
-, a, malona em favor de y tern curta dura~ao; e uma terceira quando a
opmlao favoravel a Y aumenta sem cessar no tempo. A figura a seguir re-
presenta essas tres possibilidades (Fig. I).
Contudo, se a opiniao a favor de y' esta crescendo no longo prazo,
todas as solu~OeS conduzem it oligarquia. Operar sob a democracia popu-
lista levarn it oligarquia, porquanto, de acordo com nossas suposi~Oes, y e
uma o~ao de facto pela oligarquia. Altemativamente, 0 veto da minoria
redundara tambem em oligarquia.20
Cabe diz,er, contudo, que enquanto 0 primeiro caso podera resultar em
oligarquia em todas as decisOes govemamentais, no segundo caso as con-
di~Oes para a mesma talvez se restrinjam ao caso particular. Certamente ha
uma diferen~a irnportante entre essas duas situa~Oes, embora nenhuma de-
las seja de democracia populista.
Ate agora neste argumento, vimos trabalhando sem fatos. Contudo,
nao podemos analisar a obj~ao aqui postulada ate que tenhamos tentado
prognosticar a probabilidade dos eventos que se diz que 0 veto da minoria
evitaria. Alem do mais, quereriamos saber se uma minoria seria capaz de
exercer seu veto em tais casos, e nao simplesmente usar seus poderes para
estabelecer a oligarquia em todas as situa~Oes em que esteja sel)do con-
testado 0 statu quo. Esses progn6sticos nao podem ser derivados analitica-
mente. Requerem estudo empirico de uma dada cultura, ocasiao e lugar,
Os americanos inclinam-se a pensar que 0 Supremo Tribunal e 0 deus
ex machina que regularmente salva a democracia de si mesma. Esta opi-
niao e dificil de sustentar em vista de decisOes concretas do Supremo. Ele
se desincumbe de algumas fun~Oes indispensaveis atraves da revisao judi-
cial, mas impedir que minorias nacionais destruam requisitos fundamentais
da democracia politica naoe uma delas. Presumo aqui que "os requisitos
fundamentais da igualdade polftica e soberania popular" sac 0 direito ao
voto, it liberdade de expressllo, de assembleia e de imprensa. Em toda a sua
hist6ria, em 77 ocasiOes, 0 Supremo Tribunal considerou inconstitucionais
leis do Congresso. Nelas, apenas 12 podem ser corretamente caracterizadas
como envolvendo liberdades civis nao-economicas. Entre essas 12, seis en-
volveram medidas do Congresso para defender e ampliar os direitos dos
negros. Em todos os seis casos, 0 Supremo Tribunal vetou essas tentativas
de conceder aos escravos emancipados aproximadamente os mesmos di-
reitos desfrutados pelos cidadaos brancos. Entre os 12 casos, apenas quatro
- todos tratando de direitos de negros - podem ser razoavelmcnte inter-
pretados como envolvendo um ou mais dos requisitos fundamentais referi-
dos acima. Em apenas quatro casos em toda a hist6ria do Supremo Tribu-
nal, nos casos de legisla~ao a respeito dos requisitos fundamentais que foi
considerada inconstitucional, as decisOes impediram 0 Congresso nilo de
destruir direitos basicos, mas de ampWi-los. Assim, nilo ha urn unico caso
na hist6ria desta na~ao em que 0 Supremo Tribunal tenha repelido le-
gisla~ao de ambito nacional destinada a reduzir, e nilo a expandir, os re-
quisitos fundamentais de igualdade e soberania popular.21
Neste exemplo, como em todos os demais em que ha necessidade de
informa~OeS factuais, a teoria da democracia populista nilo nos proporciona
>-
g
zwowa:
§?
Lt 50
~
w
~
Zwoa:w
CL
TEMPO
Fig. 1 - Tres possiveis estados de opiniao publica a respeito da alternativa Y
, Ora, se ~ ?pinia? favora~el a y (a politic a que resultaria em oligarquia)
esta ;m dech~IO ou ~ passagerra, entao 0 veto de minoria exercido em favor
de ~ geral ~~lgarqUIano ~urto p~o, mas nao necessariamente em periodo
mals longo. Mas se, apos a devlda reflexao, a maioria conclui que se en-
ganou e realm,ente prefere x* a y, entao, como resullado do veto da minoria,
ela P?d~ c~nttnu~ a operar sob 0 sistema de veto, 0 que certamente nao
constIlUI oligarqUIa.19
conhecimentos sobre 0 mundo real. Posso preferir a igualdade a desigual-
dade social e a soberania popular a oligarquia, da mesma maneira que pos-
so querer uma sociedade sem assassinatos a outra em que viva "em etemo
medo e perigo de morte violenta". Mas ate que tenha feito urn grande con-
junto de previsoes sobre fatos no mundo real, minhas preferencias nao me
dao meios de decidir 0 que devo fazer, se e que devo, para reduzir 0 nu-
mero de mortes violentas na sociedade. Nem me confere meios para fazer
op~6es racionais entre arranjos politicos altemativos, alguns dos quais po_
dcm produzir urn impacto sobre a igualdade polftica e a soberania popular.
Significa iSLO,enl.<"io,que podemos lavar as maos no que tange a igual-
dade politica? Sera ela uma meta estupida porque grande parte da teoria
polftica e, quando devidamente analisada, inaplicavel ao mundo real?
Evidcntemente, nao e este 0 caso.
Se a solu~ao madisoniana nao satisfaz, nao precisamos ser recondu-
zidos em descspero a urn corpo axiomatico de teona que e, em ultima ins-
tImcia, quase inutil como urn guia para a a~ao. Isto porque nada M inerente
ao conceito de igualdade polftica que 0 tome destituido de sentido no mun-
do real.
A Pro va da Proposir;iio 1
Que 0 principio do governo da maioria (Proposi~o 1) ja esta contido na
defini~ao da democracia populista (Defini~oes 1-3) parece-me intuitiva-
mente 6bvio. E e apenas correndo 0 risco de fazer uma demonstra~ao basi-
camente trivial das rela~6cs l6gicas envolvidas que submeto a prova se-
guinte.
Continuando com 0 sistema de nota~ao algebrica das notas de rodape,
vimos ja que a Defini~ao da Regra (Defini~ao 4) pode ser forrnulada da se-
guinte maneira:
Vejamos agora qual a nossa tarefa: ternos que interpretar de alguma
maneira as condi~oes de soberania popular e igualdade polftica de modo
que sejam compativeis entre si. A Defini~ao 2 nos diz que a condi~ao da
soberania popular e satisfeita se:
Mas de que maneira decidiremos que altemativa e "preferida" ou
"mais preferida" pelos membros? Que regra deveremos seguir para dar
significado operacional a expressao (x P c y) ou ao conceito "altemativa
mais preferida pelos membros"? Poderemos, por exemplo, levar em conta
diferentes intensidades de preferencias? No capitulo 4 veremos que surge
urn numero imenso de dificuldades em qualquer tentativa para estudar
intensidades. Entrementes, e claro que a interpreta~ao que derrnos a (1)
deve ser coerente com a condi~ao de igualdade polftica, ou enta~ nao po-
deremos satisfazer as duas condi~6es. Parece ser compatfvel e, na verdade,
necessaria a condi~ao de igualdade polftica que as preferencias devam de
alguma maneira ser manifestadas individualmente pel os cida?aos~ de modo
que a elas sejam atribufdos valores e possam ser contadas. Hlstoncamente,
o ato de votar tern sido aceito como indicador apropriado de preferencias
individuais. Mas se a vota~ao, ou alguma outra a~ao individual, saD aceitas
como manifesta~ao de preferencia, de que modo devem ser contados os
votos? Aqui a condi~ao de igualdade politica evidentemente requer que ig-
noremos intensidades porque a prcferencia de cada membro e atribufdo urn
valor igual. Isto e, teremos de contar os votos de tal maneira que:
onde V' representa 0 voto de urn indivfduo, V" 0 de outro, etc. Mas, a fim
de seguir esta regra, as propriedades comuns dos numeros reais devem ser
invocadas, de modo que a condi~ao seguinte seja satisfeita pelo processo
de contagem:
ISLOe, para ser compativel com a Defini~ao 3, 0 "mais prcferido" deve ser
compativel com (2) e (5). Daf:
Sabine analisou as origens e caracteristicas da tradi~ao democnitica que enfatiza a
"Iiberdade" e a que destaca a "igualdade". A teoria madisoniana constitui urn exemplo
da primeira e a teoria populista e a essencia da segunda. Ver seu "The Two Democratic
Traditions", The Philosophical Review, LXI (outubro de 1952), 451. Quanto ao
expediente de usar nota~ao algebrica nas notas e apendice deste capitulo, e por muitas
introvisc5es sobre 0 argumento, manifesto minha divida para com as sugestc5es
encontradas em Kenneth Arrow, Social Choice and Individual Values (Nova York:
John Wiley & Sons, 1951).
Uma prova desta proposi~ao sera encontrada no Apendice a este capitulo.
Se designarmos pelo sfmbolo NI "0 numero de cidadaos que sao indiferentes ao
resultado de uma ~ao entre duas altemativas", e se chamarmos as altemativas de "x"
e "y", podemos escrever 0 "numero de cidadiios indiferentes entre as altemativas x e y"
simplesmente como NI(x,y). De identica maneira, podemos escrever NP(x,y) signifi-
cando "0 n6mero de cidadaos que preferem x a y". Ora, por defini~ao, NI = NI(x,y) =
NI(y,x).
Por conseguinte,
Definir;Qo de maioria
Vale notar que se (7) e mantida em todas as situayOes, entRo uma simples
maioria seria suficiente para estabelecer a polftica do govemo, isto e,
N+.1 P ( )
2 x,y
N-}TP (y,x) --fX P g Y.
A fim de corresponder a reaJidade, uma simples maioria pode ser defi-
nida de maneira diferente, dependendo de se 0 numero total de cidadaos
(votos) e impar ou par. Parece, pois, conveniente definir "maioria" como
significando:
(as sfmbolos conectivos -) e H serao usados como significando "implica" e "A
implica B e reciprocamente", respectivamente. Podem ser tambem interpretados como
"A e uma condi~o suficiente para B" e "A e uma condi~ao suficiente e necessaria para
B", respectivamente.)
Supondo que a indiferen~a nao reflete simplesmente ignorancia das altemativas e de
suas conseqi.iencias. No mundo real, a indiferen~ poHtica (apatia) e na verdade
inversamente proporcional a educa~o e a varios outros fndices de posse de
conhecimentos.
Simbolicamente, a Regra pode ser formulada da seguinte maneira:
NI2 + } ou maior em todos os casos onde N e par.
(N +})/2 ou maior em todos os casos onde N e fmpar.
I. 0 termo "democracia populista" me foi sugerido por Edward Shils ern urn trabalho
intitulado "Populism and the Rule of Law", apresentado a Universityof Chicago Law
School Conference on Jurisprudence and Politics, abril de 1954.
2. a trabalho de Wolodymyr Starosolskyz, Das Majoritiitprinzip (Viena e Leipzig, 1916),
constituiu uma das poucas tentativas de analise sistematica dos conceitos implicados no
prindpio do govemo da maioria. Representando 0 estilo grandioso da sociologia alema
da epoca, ele faz uso intenso de duvidoso material antropol6gico, e nao e dos mais
uteis. Talvez a formula~o isolada mais sucinta do argumento do govemo da maioria
seja 0 de Henry Steele Commager no Majority Rule and Minority Rights (Nova York:
Oxford University Press, 1943). A analise mais exaustiva cabe a Wilmoore Kendall no
JOM Locke and the Doctrine of Majority Rule (Urbana, 1941); cf. tambem 0 debate
entre ele e Herbert McOosky publicado no The Journal of Politics, XI (novembro de
1949),637-54, e xn (janeiro de 1950),694-713. Sou grato a ele e a Austin Ranney pela
generosidade de me permitirem examinar 0 manuscrito dos primeiros quatro capftulos
de seu pr6xirno livro, Democracy and the American Party System, que tambem expOe a
teoria coricemente ao govemo de maiorias. Francis W. Coker criticou a tese Kendall-
Ranney no "Some Present-Day Critics of Liberalism", American Political Scieru:e
Review, XLVII (mar~ de 1953), 1-27. Alguns dos elementos do modelo populista e
algumas fraquezas do modelo madisoniano foram comentados em meu trabalho
"Majority Rule and Civil Rights", apresentado na reuniao anual da American Political
Science Association em 1948. Dependi muito tambem dos capftulos relevantes de urn
livro escrito em co-autoria por Charles E. Lindblom e este autor, Politics, Economics
and Welfare (Nova York: Harper & Bros., 1953). Com sua habitual lucidez, George H.
onde x Pg y significa 'x e preferido pelo govemo a y " ou 'x e nao y e escolhido como
poJ[tica do govemo". Mas, obviamente, se NP(x,y) = NP(y,x), entiio a Regra nao
fomece instru~c5es para uma solu~o. Mas de fato nos diz que nenhuma solu~ao deve
levar em conta x como a poIitica escolhida e tambem que nenhuma solu~ao deve fazer
o mesmo por y, isto e, a poJ[tica do govemo deve ser indiferente entre x e y. au,
simbolicamente:
Segundo sei, ninguem realizou ate hoje uma investiga~ao da ocorrencia de empate na
vota~ao em grupos de varios tamanhos. Esta tarefa seria gigantesca e nao me proponho
a faze-Ia. Se supusermos que todas as possiveis combina~c5es de preferencias entre duas
altemativas sao igualmente provaveis, por exemplo, que entre 10 individuos ocorrem
divisc5es como lOa favor e 0 contra, 0 a favor e 10 contra, 5 a favor e 5 contra, que sao
igualmente provaveis, entiio a probabilidade de uma divisao de 50-50 sobre qualquer
dada questao seria de apenas I/(N+ I), onde N e 0 numero de votos lan~dos. Mas uma
divisao 50-50 e possfvel apenas se N for par. Se supusermos uma igual probabilidade
de que N seja par ou fmpar, entiio a probabilidade de uma divisao 50-50 de modo geral
seria 1/2(N+ I). Essas suposi~c5es sao arbitrarias. No Congresso Americano ou na
Camara dos Deputados esperariamos que as divisc5es se fizessem em tomo de 50-50 e
perto da unanimidade.
Este aspccto da terceira obje~ao, e tambem da quarta, foi retirado do trabalho de E.!.
Nansen, "Methods of Election", Transactions and Proceedings of (he Royal Society of
Victoria, XIX (1883), 197-240. Kenneth Arrow chamou a aten~ao para a importancia
da obje~ao no seu Social Choice and Individual Values (Nova York: John Wiley &
Sons, 1951), p. 3.
Suponhamos tres altem~tivas, x, y e z, e 0 corpo de cidadaos dividido em tres grupos
Iguals da scgumte manelra:
Suponhamos, por exemplo, que ha tres indivfduos ou grupos, A, B e C, e tres
altemativas, x, y e z, e que as preferencias sejam as seguintes:
A prefere x aye y a z.
B prefere y a z e z a x.
C prefere z aye y ax.o Grupo A prcfere x a y, y a z, e x a z.
o Grupo B prefere y a z, z a x, e y ax.
o Grupo C prefere z a x, x a y, e z a y. Ora, se cada gropo vota de acordo com sua preferencia, no par (x,y) a altemativa y sera
preferida por 2-1; se y formar par com x, y sera favorecido de 2-1 mais uma vez.
Evidentemente, yea altemativa mais preferida por uma maioria. Oaf a escolha de y
estara de acordo com as preferencias de uma maioria de 2-1.
Mas suponhamos agora que 0 Grupo C nao vota em cada par de acordo com suas
preferencias reais, mas, sim, para manipular 0 resultado fmal em seu favor. Dessa
maneira, no par (x,y), em bora 0 Grupo C realmente prefira y a x, suponhamos que vota
em x, que vence neste par por 2-1. Ordinariamente, uma vez que x e y foram delTOlados
na vota~o e x emergiu com uma maioria de 2(3, a vota~o acabaria. Ainda assim,
neste Caso, urna maioria de 2(3 prefere realmente a altemativa derrotada, y, a vence-
dora, z. Por conseguinte, a menos que 0 corpo polftico tenha oponunidade de votar no
par (y,z), a altemativa que e selecionada, por urna maioria de 2/3, representara na
verdade uma escolha que urna maioria de 2(3 rejeitaria se tivesse oportunidade de votar
no par (y,z). Oaf, neste caso, a Regra nlio e atendida, a menos que uma vota~lio seja
feita sobre coda par de altemativas.
Mais urna vel., a transitividade leva a conclusOes irracionais, conforme acabado
de demonstrar, e deve ser rejeitada no mundo real. Cf. a discusslio em Arrow, op. cit.,
pp. 80-81, n. 8; Ouncan Black, "The Decisions of a Committee Using a Special
Majority", Econometrics, XVI (julho de 1948),245-61; e "On the Rationale of Group
Decision-making", Journal of Political Economy, LVI (fevereiro de 1948),23-34.
Legitimidade e empregada aqui nlio em sentido etico, mas psicol6gico, isto e, cren~a na
cor~lio da decislio ou do processo decis6rio.
Cf. cap. 3.
Cf. cap. 5, pp. 125 e segs.
Uma vez que pane do problema e puramente verbal, perrnitam-me usar mais uma vez
urn sistema de nota~Oes algebricas simples para sumariar as etapas no argumento. As
condi~Oes de soberania popular e igualdade polftica, vale lembrar, slio satisfeitas
apenas se
Uma vez 9ue 0 Grupo A e 0_ Grupo B preferem y a z, e uma vez que juntos com pre-
endem dOts ter~s dos cldadlios, poder-se-la pensar que y deveria ser a escolha. Nao
obstante, 0 Grupo A e 0 Grupo C preferem x aye daf poder pcnsar-se que x deva scr a
escolha •. 0 Gfl;lpo B e 0 Grupo C, porem, preferem z a x. Oessa maneira, cada alter-
nallva e prefenda por uma combina~lio de grupos, e ainda outra combina~lio de grupos
prefere. em todos os caso~ outra altemativa. Oaf nlio ser possfvel nenhuma solu~ao
compatlvel com as condl~oes de soberanla popular e igualdade polftica. Uma vez que
Arrow, op. ell., sUpOe a "transitividade da escolha coletiva" como crileno de a~lio
SOCial raclonal, vale notar que sob qua~e todas as teorias de polftica democratica, e
certamente sob a dlscutlda aqut, 0 requlSlto de transitividade seria irracional em muitos
tlpaS de escolhas coletivas. Por "transitividade" entendemos, com base na analogia das
deslgualdades. em matematica, que se urn indivfduo prefere x aye y a z, ele tern que
preferu tambem x a z - pelo menos, se ele quiser componar-se racionalmente. Mas
qualque~ que seJa ~ caso com escolhas individuais - e mesmo aqui 0 requisito e algo
tendencloso .-:-. eVldentcmente levana a resultados irracionais em uma democracia
eXlgir transltlvldade em escolhas coletivas. Por excmplo, entre 101 individuos,
suponhamos que
I indivfduo prefere x a y, e y a z,
50 mdividuos preferem z a x, e x a y,
50 indivfduos preferem ya z, e z a x.
Neste caso, 51 preferem x a y, e 51 preferem y a z. Se supomos transitividade em
escolha coletlva, seguir-se-ia que uma maioria de pelo menos 51 prefere x a z, tambem.
Mas, na verdade, 100 indivfduos preferem z a x. E 0 requisito de transitividade pro-
duzma 0 resultado an6malo de que as preferencias do t1nico excentrico seriam transfor-
madas em politica pUblica a despe~to do faro de 100 indivfduos preferirem a politica
oposta. Arrow d_emonstr~ que se ha malS de d~as altemativas, qualquer metodo para
tomada de decisoes SOCialSque garanta a translllvidade nas decisOes tera que ser neces-
sana~ente dltado por uma .unica pes~oaou imposto contra as preferencias de todos os
m~~vlduos ,~p. 5~-59). A uruca ~stn~o suposta. as escolhas individuais e que sejam:
I) hgadas ,.IStOe, nenhwn mdlvlduo pode prefenr x aye ao mesmo tempo preferir y a
x, ou ser mdiIerente entre x e y; e 2) "transitivas" no sentido indicado acima. Contudo,
d.adas certas restn~Oes ulteriores as possiveis orqena~Oes de escolhas individuais (elas
tem que ser em curva campanular), 0 metodo de govemo da maioria resultara em
declsOes que slio transitivas e, ao mesmo tempo~ nem impostas nem ditatoriais (pp. 75-
80). E~te argwne~to brilha?temente desenvolvldo e surpreendente, infelizmente, tern
sldo ate agora mteuamente Ignorado pclos cientistas polfticos.
ESIJt:clalmente por Nansen, op. cit., que 0 leitor deve consultar em busca de critica
tecmca do me.ta<!0de voto unico, 0 voto com segundo tumo, 0 voto duplo, 0 metodo de
Bor~a e a propna sugestlio de Nansen. Cf. tambem Alfred de Grazia, "Mathematical
DenvatlOn of an Election System", Isis, Vol. XLIV (junho de 1953) para wna tradu~o
e comen~rio do "Memoir on Elections by Ballot", de Borda, publicado em 1781.
A vota~o por rcpresenta~lio proporcional, naturalmente, nlio soluciona nenhwn dos
problemas aqul colocados, pois simplesmente os empurra e a outros para a al~da do
leglslauvo.
A fim de simplificar a discusslio que se segue, suponhamos que 0 sfmbolo ma
represente 0 conjunto de todos os eleitores maior que N12, e mi 0 conjunto de todos os
eleitores menor que N12. (pelas raz6es ja discutidas, evitaremos situa~s em que a
maioria e indefinida, isto e, em que NP(x,y) = NP(y,x). Ora, (I) pode ser escrita
simplesmente como
E imponante distinguir (3) da situa~lio muito diIerente que chamarei de condi~tio de
oligarquia. EJa e definida da seguinte maneira:
Veto de minoria e oligarquia niio siio identicos, porquanto niio e verdadeiro que em
todos os casos, sob a condi~iio de veto da minoria, sua preferencia se tome a polftica do
govcmo. Ap contnirio, em alguns casos, a preferencia da minoria toma-se a politica
apenas se coincide com a preferencia da maioria, isto e, (3) pode ser tambem escrita
aSSlm:
Ora, a objc~iio que vimos examinando afirma que urn veto da minoria a a~6es da maio-
ria pode as vezes impcdir que 0 govemo demowitico descambe para a pura oligarquia,
conforme definido por (4). Ha, contudo, dificuldades serias neste argumento.
Em primci ro lugar, embera seja vcrdade que a condi~iio da oligarquia niio e identica a
condi~iio de veto de minoria, em todas as situa~6es em que esta, com seu veto, prefere a
politica em vigor e a maioria prefere uma altemativa a ela, a diferen~a entre oligarquia
e veto de minoria desaparece. Suponhamos que x* representa a polftica em vigor. Neste
caso, aplicando (3) A Democracia Poliarquica.
Mas se a minona com poder de veto de fato prefere x*, que e a politica em vigor, e
pode vetar y, que C uma altemativa a ela, entiio
Uma vez que (7) e idcntica a (4), nessas circunstiincias a condi~o de veto da minoria e
identica a de oligarquia.
17. Pode-se, corretamente, forrnular a seguinte pergunta: Na opiniiio de quem ocorreriio
essas consequencias? Aqui reencontramos algumas das dificuldades intelectuais do
sistema madisoniano discutido acima.
18. Isto e, n0 curto praw:
o exame das teorias madisoniana e populista sugere pelo menos dois
possiveis metodos que se poderia empregar para construir uma teoria de
democracia. 0 primeiro, 0 metodo de maxirniza~ao, consiste em especi-
ficar urn conjunto de metas a serem maximizadas. Poder-se-ia entiio definir
democracia em termos dos processos govemamentais especfficos neces-
sarios para maximiza-las ou algumas delas. As duas teorias que vimos ana-
lisando sao basicamente desse tipo: a madisoniana postula uma republica
nao-tirfmica como objetivo a ser maximizado; a teoria populista indica a
soberania popular e a iguald,ade polftica. A segunda m~eira - caberia
talvez chama-la de metodo descritivo - implica conSlderar como uma
unica classe de fenomenos todas essas na~6es-Estado e organiza~6es so-
ciais que sao geralmente classificadas como democnhicas pelos cientistas
politicos e em analisar os membros dessa classe com 0 objetivo de desco-
brir, em primeiro lugar, as caracteristicas distintivas que tern em comum e,
em segundo, as condi~Oes necessanas e suficientes as organiza~Oes sociais
que as possuem.
Estes metodos, contudo, nao sao mutuamente incompatfveis. E vere-
mos que, se com~armos empregando 0 primeiro, logo depois tomar-se-a
necessario algo parecido com 0 segundo, tarnbem.
que e idcntica a (4), ou oligarquia.
19. No senti do em que (3) e (5) na nota 16 niio siio cquivalentes a (4).
20. A situa~iio a longo praw e a da Proposi~iio (7) na nota 16, que e oligarquia.
21. Cf. Library of Congress, Provisions of Federal Law Held Unconstitutional by the
Supreme Court of the United States, Washington, 1936.0 t1nico caso adicional desde
essa epoca envolvcndo legisla~iio votada no Congresso foi 0 do processo judicial
United Siaies v. Lovell, 328 U.S. 303 (1936). Sobre 0 argumento apresentado acima,
ver especialmcnte Commager, op. cit., p. 55. John D. Frank chega a mesma conclusiio,
embera fa~a uma tabuJa~iio algo diferente dos casos. Descobriu 19 casos que diziam
respeito a libcrdades civis. Desles, oito eram "perifericos"; entre os II casos restantes,
oito limitavam a liberdade e tres a promoviam. Os oito foram decis6es envolvendo
direitos de negros. Frank, contudo, infere desses fatos que 0 Supremo devia intervir
mais positivamente na legisla~iio envolvendo liberdades civis, uma inferencia niio
implicada no argumento deste capitulo. Ver "Review and Basic Liberties", em
Supreme Court and Supreme Law, Edmund N. Cahn, org. (Bloomington: Indiana
University Press, 1954).
Descobrimos no capitulo 2 que as metas da democracia po~lista, e a
Regra simples r1elas deduzida, nao nos fomecem nada parecido comJuma
teoria completa e acabada. Urn de seus defeitos basicos e que nao contribui
com nada mais que umalredefini~aQ fQrlIlaI de uma regra processual ne-
cessaria ao atingimento perfeito ou ideal da igualdade politic a e da sobe-
rantapopular. Mas porque constitui apenas urn exercfcio em tome de uma
regrasllpostamente indiscutfvel, a teoria nada nos diz sobre 0 mundo real.
Nao obstante, vamos colocar agora a questao decisiva em uma forma ligei-
ramente diferente: Quais sac as condi~oes necessarias e suficientes para
maximizar a democracia no mundo real? Demonstrarei que as palavras "no
mundo real" alteram fundamentalmente 0 problema.
Comecemos, no entanto, com urn meticuloso interesse pela precisao
do significado. Em primeiro lugar, 0 que queremos dizer com "democracia
maximizadora"? Evidentemente, aqui como na teoria populista, ten,os que
proceder considerando a democracia como urn estado de coisas que consti-
tui urn limite e que todos os atos que dele se aproximem serao atos maximi-
zadores. Mas de que modo descrever 0 estado de coisas que constitui 0
limite?
o modele da democracia populista sugere tres possiveis caracteristicas
que poderiam ser operacionalmente significativas: 1) Em todas as ocasiOes
em que se julgue existirem o~Oes de politica, a altemativa selecionada e
feita cumprir como politic a publica (: a mais preferida pelos membros; 2)
em todos os casos em que se considera que ha o~Oes de polftica, no pro-
cesso de sel~ao da altemativa que sera feita cumprir como polftica pu-
blica, a prefcrencia de cada membro e atribuido urn valor igual; 3) a Regra:
na escolha de altemativas, a preferida pelo maior numero e a escolhida.
A fim de tomar operacional a primeira dessas caracte~sticas, ou igno-
ramos 0 problema de intensidades diferentes de preferencia entre indivi-
duos ou nos atolamos num pantano tao profundo de obstaculos a observa-
~ao e a compara~ao que seria quase impossivel dizer se, de fato, a caracte-
ristica existe. Voltarei a este problema no capitulo seguinte. Mas se ignora-
mos as intensidades, enta~ na verdade adotamos a segunda caracteristica
como nosso criterio: que a preferencia de cada membro e atribuido igualvalor. Pareceria a primeira vista que a questao da preferencia de cada mem-
bro de uma organiza~ao receber ou nao igual valor seria mais ou menos
suscetivel de observa~ao. De igual maneira, a terceira caracteristica, a Re-
gra, seria observavel. Mas, uma vez que ela e dedutivel das duas primeiras
caracteristicas, nao seria suficiente apenas examinar a organiza~o social a
fim de descobrir a medida em que a Regra e ou nao seguida? Isto e, temos
na Regra uma defmi~ao adequada do limite de democracia? Suponhamos
que observamos que a maioria prefere x aye que 0 primeiro e selecionado
como polftica publica. Ainda assirn, poderia acontecer que entre a maioria
esteja urn ditador; se ele estivesse na minoria enta~ y e que seria 0 esco-
lhido. A condi~ao de igualdade polftica evidentemente requer "intercam-
biabilidade", isto e, 0 intercfunbio de igual numero de individuos de urn la-
do para 0 outro MO afetaria 0 resultado da decisao. Mas como podemos sa-
ber se essa intercambiabilidade ocorre? Evidentemente, nenhuma decisao
isolada nos fomece informa~Oes suficientes, pois, na melhor das hip6teses,
ela s6 pode revelar que a Regra nao esta sendo seguida e que a igualdade
politica, portanto, nao existiu durante essa decisao. S6 podemos inferir a
intercambiabilidade examinando urn grande numero de casos. Mas 0 que
podemos rea1mente observar mesmo em urn grande numero de decisOes?
Suponhamos observar que quando A esta com a maioria, a escolha
desta e transformada na polftica da organiza~ao, e que quando esta na mi-
noria, a o~ao desta se toma a polftica. Claro e que a intercambiabilidade
esta sendo violada. Mas 0 que observamos nada mais foi do que a extensao
em que a Regra esta sendo empregada em mais de urn caso. Ate agora,
enta~, 0 conceito de "igualdade polftica" nao sugere outro conjunto de
observa~Oes do que as necessarias para determinar se a Regra esta sendo ou
nao seguida.
Suponhamos agora que A esta sempre com a maioria e que a o~ao
desta e sempre feita cumprir como politica. Ainda assim, suspeitamos que
seA estivesse com uma minoria, a op~ao desta seria a estatuida. Que obser-
va~Oes teremos agora a fazer a fim de verificar se nosso palpite e ou nao
correto? Aqui chegamos a uma importante conclusao: se aceitamos qual-
quer a~o especifica, como 0 resultado de uma vota~ao, como indice satis-
fat6rio de preferencia, enta~ nenhum teste operacional existe para deter-
minar a igualdade polftica que nao aqueles necessarios para determinar se a
Regra esta sendo seguida ou nao. Isto e, dada a manifesta~ao de prefe-
rencias como adequada, 0 unico teste operacional para a igualdade polftica
e a extensao em que a Regra e seguida em certo ntimero de casos. Dai,
supondo a validade das preferencias manifestadas, nao podemos nunca
falar corretamente de uma dec'isao particular como "democratica", mas
apenas de urna serie de decisOes. (podemos, claro, corretamente dizer que
uma dada decisao nao foi democr<itica.) Por tudo isso, nossa questao deci-
siva pass a a ser: Que eventos temos que observar no mundo real a fim de
determinar a medida em que a Regra e empregada numa organiza~ao?
Infelizmente, a frase "dada a manifesta~ao de preferencias" encerra
algumas serias dificuldades. Que tipos de atividade aceitaremos como
indices de preferencia? Em urn extremo, poderiamos confiar em algum ate
publico de escolha, como a vota~ao ou uma declara~ao publica.l No outro,
a~aves de exame profundo e cuidadoso, poderiamos buscar prova psicol6-
glca. Se 0 primeiro e freqiientemente ingenuo, 0 segundo e impossivel em
uma escala suficiente. Na pratica, a maioria adota urn meio-termo e pro-
Cura suas pistas no ambiente predominante em que a preferencia particular
~ ~anifestada. Em urn ambiente aceitamos 0 ate publico da vota~ao como
Indlce adequado, ainda que imperfeito; em outro, rejeitamo-lo inteira-
mente.
Por conseguinte, e de imporillncia crucial especificar 0 eslligio parti-
cular no processo de tomada de decisao no qual nos propomos a aceitar a
expressao da preferencia como dada. E inteiramente coerente dizer que, em
urn eslligio, a Regra e empregada e dai que a esse nivel a decisao e "demo-
cnitica" por defini~ao e, ao mesmo tempo, declarar que, em outro eslligio,
ela nao 0 e e que a decisao neste eslligio nao 0 e. No mundo real da poliLica
publica nos Estados Unidos, 0 unico eslligio ao qual se chega absoluta-
mente a uma boa aproxima~ao da Regra parece ocorrer durante a contagem
de votos nas elei~oes e nos corpos Iegislativos. No eslligio pre-vota~ao, nu-
merosas influencias, incIuindo as de riqueza superior e controle de recursos
organizacionais, exageram ta~ absurdamente 0 poder de alguns em compa-
ra~ao com 0 de muitos, que os processos sociais que culminam na vota~ao
poderiam ser chamados corrctamente de altamente nao-igualitfu"ios e anti-
democniticos, embora menos do que em uma ditadura.2 Desta maneira, e
possivel na teoria democnitica uma especie de regressao finita a diferentes
eslligios do processo de tomada de decisoes. Mas enquanto estivermos
absolutamente certos do eslligio que estamos descrevendo, algumas das
ambigiiidades comuns poderao ser evitadas.
o efeito de nosso argumento ate agora consistiu em dividir em duas a
questao principal: 1) Que atos consideraremos suficientes para constituir
uma manifesta~ao de preferencias individuais em urn dado eslligio do pro-
cesso decis6rio? 2) Considerando-os como manifesta~ao de preferencias,
que eventos temos que observar a fim de determinar a extensao em que a
Regra e empregada na organiza~ao que estamos examinando? Estamos ain-
da procurando, vale a pena lembrar, urn conjunto de condi~oes limitadoras
das quais queremos nos aproximar.
No minimo, dois eslligios precisam ser distinguidos: 0 eleitoral3 e 0
entre elei~oes. 0 eslligio eleitoral, por seu lado, consiste em pelo menos
tres periodos que e util distinguir: 0 periodo de vota~ao, 0 anterior a ela e 0
posterior. (Seria possivel definir a dura~ao desses perfodos mais precisa-
mente em casos particulares, mas nada indica que uma defini~ao geral seria
muito util. Dai, no que se segue, a dura~ao de cada urn deles nao e especi-
ficada.)
Durante 0 perfodo de vota~ao precisarfamos observar em que medida
vigoram pelo menos tres condi~oes:
1. Todos os membros da organiza~ao praticam atos que supomos consti-
tuirem uma manifesta~ao de preferencia entre as altemativas apresen-
tadas, isto e, votam.
2. Na tabula~ao dessas manifesta~oes (votos) e identico 0 peso atribuido
a o~o de cada individuo.
3. A alternativa que con segue 0 maior numero de votos e declarada a op-
~ao vencedora.
E evidente por si mesma a ligar;:aoentre as tres condir;:oes e a Regra. Se
o ato de manifestar preferencias e tornado como dado, enta~ essas condi-
~oes parecem ser necessanas e suficientes para a operar;:ao da Regra duran-
te 0 perfodo de vota~ao.4 Mas tambem e evidente por si mesmo que ate
agora demos como provada a primeira de nossas questoes, incorrendo em
peti~ao de principio. Urn plebiscito totalitario poderia satisfazer - e
realmente na pnitica tern freqiientemente satisfeito - essas tres condir;:oes
ainda melhor do que uma eleir;:aonacional ou decisao legislativa em paises
que a maioria dos cientistas politicos ocidentais considerariam democni-
ticos. 0 ponto crucial do problema eslli em nossa primeira questao, que jul-
gamos constituir urna manifestar;:ao da preferencia individual. Nao se pode-
ria dizer, sem falsear a verdade, que 0 campones que lanr;:aseu voto pela
ditadura eslli expressando suas preferencias entre as altemativas apresen-
tadas, con forme as ve? Isto porque, quem sabe, as altemativas que percebe
sao votar na ditadura ou fazer urna viagem para a Siberia. Isto e, em certo
sentido, todas as decisoes humanas podem ser consideradas como uma op-
~ao consciente ou inconsciente da altemativa preferida entre as que sac
percebidas pelo individuo. De identica maneira, as maquinas poliLicas
urbanas mais corruptas neste Pais freqiientemente satisfazem a esses requi-
sitos, mesmo quando seus cabos eleitorais nao enchem asumas com votos
faIsos, ou manipulam os resultados, porque comparecem com urn numero
suficiente de individuos inesciupulosos oferecendo uma altemativa sim-
ples: alguns d6lares se voce votar em nossa chapa e nada se votar na outra.
Em sentido grosseiro, a essencia de toda polftica competitiva consiste
no subomo do eleitorado pelos politicos. De que modo distinguir entao 0
voto de urn campones sovietico, ou de urn vagabundo subomado, do voto
do fazendeiro que ap6ia urn candidato comprometido a manter altos pr~os
minimos dos produtos agrfcolas, do empresario que vota em urn pro-
pugnador de baixos impostos para as empresas, ou do consumidor que vota
em candidatos que sac contrarios ao imposto de circular;:ao de merca-
d~ri.as? Suponho que desejamos excIuir manifestar;:oes de preferencia do
p~meiro tipo, mas incIuir as do segundo. Isto porque, se nao excIuimoso
pnmeiro, qualquer distinr;:ao entre sistemas totalitfu"ios e democraticos e
tol~. Mas se excIuimos 0 segundo, certamente nenhum exemplo do que
~a.ls se aproxime de democracia pode ser encontrado em parte alguma. E
diflcilmente podemos nos dar ao luxo de excIuir a rar;:ahumana da politic a
democratica.
Temos aqui urn problema que exige distin<;:6es sutis, mas que, tanto
quanto sei, nao e muito estudado na literatura especializada. A distin<;:ao
que buscamos evidentemente nao sera encontrada na magnitude das re:
compensas ou priva<;:6esresultantes da escolha. 0 ganho do vagabundo e
pequeno sem duvida e em compara<;:aocom 0 ganho do acio~i~ta da. grande
empresa chega a ser microscopico. Se tomamos como cnteno slmples-
mente a magnitude das possiveis priva<;:6espor se fazer uma op<;:aoern')-
nea,5 enta~, para sermos exatos, uma das altemativas percebidas pelo cam-
pones russo talvez seja mais do que a came eo espirito humanos poss~
suportar; mas, em compara<;:ao,0 eleitor ocidental que per~ebe as al~em~tl-
vas entre candidatos como sendo guerra nuclear ou paz fna nao esta mUlto
longe da tribula<;:aoem que vive 0 campones russo.
o que refugamos quando se trata de aceitar 0 voto do cidadao s?vie-
tico como uma manifesta<;:ao de preferencia e que ele nao tern permlssao
para escolher entre todas as altemativas ~ue nos, c~mo obser~ador~s ~x-
temos, consideramos como, em certo sentldo, potencIal mente dlsporuvels a
ele. Se ele enfrenta as seguintes altemativas: voto x pela chapa dominante
ou voto y contra ela, sua preferencia por x em compara<;:ao com y e ta~ au-
tentica como a que se encontraria em qualquer elei<;:ao,em qualquer parte
do mundo. Mas se ele pudesse ordenar as altemativas para incluir z, ou 0
voto contra a chapa dominante sem que se siga urn castigo previsivel, enta~
e mais provavel que aceitemos 0 resultado de sua escolha entre esse con-
junto de altemativas, mesmo que esse conjunto, de nosso ~onto de vista,
esteja longe de perfeito. Podemos agora esperar que ele preflra z a x ou a y,
mas, se ele teimosamente prefere x a z, nao temos mais raz6es solidas para
rejeitar os resultados do plebiscito, se no restante ele se conforma as tres
condi<;:6eSestabelecidas acima.
o que fizemos, en tao , foi formular uma quarta condi<;:ao !imitadora,
que deve existir no perfodo pre-eleitoral quando se faz a apresenta<;:ao das
altemativas que serao escolhidas no perfodo de vota<;:ao.
4. Qualquer membro que percebe urn conjunto de altemativas, pelo ~e-
nos urna das quais considera preferfvel a qualquer uma das altematlvas
na ocasiao apresentadas, pede inseri-Ia(s) entre as apresentadas a
vota<;:ao.
Mesmo assim, nos so problema nilo fica inteiramente solucionado. Su-
ponhamos que sabemos que urn gropo de eleitores prefere x aye y a z. A,
parem, que prefere y a z e z a x, possui monop6lio ~e in~orma~6eS e
convence os demais eleitores de que x nilo e uma altematIva disporuvel ou
aplicavel. Daf, ninguem prop6e x e os eleitores escolhem y. Todas as no~-
sas quatro condi<;:6es foram atendidas, mas a maioria de nos MO acei~a
urn perfodo pre-eleitoral dominado por esse tipo de controle monopohsta
daS informa<;:6es.Por conseguinte, temos que estabelecer uma quinta con-
di~ao que opere no perfodo pre-eleitoral.
5. Todos os individuos devem possuir informa<;:6eS identicas sobre as
altemativas.
Talvez tres observa<;:oes precisem ser feitas aqui. Se ficamos desa-
lentados com 0 carater utopico dos dois ultimos requisitos, vale notar que
estamos buscando condi<;:6esque possam ser usadas como limites contra os
quais os sucessos no mundo real possam ser realmente medidos. Alem do
mais, mesmo que a quinta condi<;:iloexistisse plenamente, os eleitores.
poderiam escolher uma altemativa que teriam rejeitado se possuissem mais
informa<;:6eS,isto e, a quinta condi<;:ilocertamente nilo constitui garantia de
raciona!idade gera!. Na melhor das hip6teses, permite-nos ~izer que a es-
colha nao foi manipulada por con troles sobre as informa<;:6espor qualquer
individuo isolado ou grupo. Finalmente, temos que reconhecer que a quarta
e quinta condi<;:6esnao sao ta~ facilmente observaveis como as tres primei-
ras. Na pnltica, 0 observador seria fOf«ado a aceitar alguns indices gros-
seiros da existencia destas duas ultimas condi<;:6ese, nessa medida, 0 con-
junto de condi<;:6es limites que tencionavamos propor como observavei"
devem, elas mesmas, ser interpretadas por ainda outros fenomenos nae-
especificados suscetiveis de observa<;:ilo.
A primeira vista, poder-se-ia pensar que essas cinco condi<;:6essilo su-
ficientes para garantir a opera<;:iloda Regra, mas, pelo menos em principio,
seria possivel a urn regime permitir que essas condi<;:6es existissem no
perfodo pre-eleitoral e de vota<;:aoe depois simplesmente ignorar os resul-
tados. Em conseqiiencia, temos que postular pelo menos mais duas con-
di<;:6espara 0 periodo p6s-eleitoral, ambas as quais sao suficientemente ob-
vias para'dispensar discussao:
6. As altemativas (lfderes ou polfticas) que tiveram 0 maior numero de
votos substituem quaisquer altemativas (lideres ou polfticas) que re-
ceberam urn numero menor.
7. As ordens dos servidores publicos eleitos sao executadas.
Este, enta~, constitui nosso conjunto de condi<;:6es!imites mais ou me-
nos observaveis que, quando presentes no estcigio da elei<;:ao,serao consi-
deradas como evidencia de opera<;:aomaxima da Regra, que por seu lade e
considerada como principal evidencia para 0 maximo atingimento da igual-
dade polftica e da soberania popular. Mas 0 que dizer do estcigio entre as
elei<;:6es?Se nosso argumento ate agora e correto, a maximiza<;:ao da igual-
dade polftica e da soberania popular no periodo entre elei<;:6esrequereria 0
seguinte:
'8.1 Ou que todas as decisoes tomadas entre as elei~5es sejam subordi-
nadas ou execut6rias das tomadas durante a fase da elei~ao, isto e, as
elei~5es saD em certo sentido controladoras;
8.2 Ou que novas decis5es tomadas durante 0 periodo entre eIei~5es sejam
determinadas pelas sete condi~oes precedentes, operando, contudo,
sob circunstfmcias institucionais muito diferentes;
membros politicamente ativos constituam amiude uma propor~ao ainda
menor do total.s
Em nenhuma organiza~ao de meu conhecimento prevalece a quarta
condi~ao. Talvez se obtenha uma aproxima~ao mais estreita del a nos gm-
.pas muito pequenos. Certamenle em tados os gr~de~ gr~~s so~re os
ql1ais dispomos de dados, 0 con.tro!e ,sobre as comumca~oes e ~o. deSl?U~-
mente distribufdo que alguns mdlvlduos exercem mUlto mats mfluenCla
sobre a designa~ao de altemativas programadas para vota~ao do que ou-
tros. Nao sei como quantificar esse controle, mas, se isso fosse possfvel,
acho que nao seria exagero dizer que 0 Sf. Henry Luce exerce mil ou dez
mil vezes mais controle sobre as altemativas apresentadas a debate e de-
cisao experimental em uma elei~ao nacional do que eu. Embora se confi-
gure aqui urn problema assustador que, tanto quanto sei, jamais foi adequa-
damente analisado, constitui uma hip6tese preliminar razmivel dizer que 0
numero de indivfduos ql.le exercem controle importante sobre as altema-
tivas apresentadas e, na maioria das organiza~5es, apenasuma fra~ao mi-
nuscula da filia~ao total das mesmas. Isto parece acontecer no caso mesmo
das organiza~oes mais democniticas se a filia~ao as mesmas for numerosa.
Grande parte das mesmas observa~5es aplica-se a quinta condi~ao. 0
hiato de informa~oes entre as elites polfticas e os membros ativos - para
nada dizer dos inativos - e sem duvida alguma sempre considenivel. Em
tempos recentes, a brecha foi ainda mais alargada nos govemos nacionais
pelas crescentes complexidades tecnol6gicas e pela nipida dissemina~ao
dos regulamentos de seguran~a. Como sabem todos os estudiosos da buro-
cracia, a setima condi~ao e uma fonte de graves dificuldades. Contudo, a
extensao em que essa condi~ao e atendida afigura-se ser a mais enigmatica
de todas para medir objetivamente.
Se as elei~oes, como os mercados, fossem contfnuas, nenhuma neces-
sidade haveria da oitava condi~ao. Mas, claro, elas sao apenas peri6dicas.
Sugere-se as vezes que pressoes entre elei~5es sobre os processos de deci-
sao sao uma especie de elei~ao, mas isto e, na melhor das hip6teses, apenas
uma metafora falaciosa. Se as eIei~5es, com sua refinada maquinaria,
legisla~ao eleitoral e oportunidades garantidas pelo judiciario, nao maxi-
mizam realmente a igualdade polflica e a soberania popular pel as raz5es
que acabamos de mencionar (bem como por muitas outras), enta~ nao acho
que se possa argumentar com seriedade que os processos atuantes entre
elei~Oes maximizem essas metas mesmo em grau aproximado.
Uma vez que as organiza~oes talvez nunca ou apenas raramente atin-
gem 0 limite estabelecido par eSSaSoito condi~oes, e necessario interpretar
cada uma del as como extremidade de urn continuum ou escala com a qual
qUalquer uma das entidades possa ser medida. Infelizmente, nao M no pre-
senle maneira conhecida de atribuir pesos significativos as oito condi~oes.
Contudo, mesmo sem eles, se as oito escalas pudessem ser metrificadas,9
Acho que podemos afirmar dogrriaticamente que nenhuma organiza~ao
humana - e por certo nenhuma que contenha mais do que urn punha,do de
pessoas - provavelmente satisfaz ou satisfaci essas oito condi~5es. E bem
verdade que a segunda, a terceira e a sexta saD muito bem atendidas em
algumas organiza~5es, embora, nos Estados Unidos, pniticas corruptas as
vezes anulem ate mesmo estas. Das outras, apenas dificilmenle as organi-
za~5es se aproximam.
Quanto a primeira, evidentemente M nas organiza~oes humanas gran-
des varia~5es no que tange a participa~ao em decisoes polfticas -
varia~5es que nos Estados Unidos parecem estar funcionalmente relacio-
nadas com variaveis tais como grau de interesse ou envolvimento, capaci-
dades, acesso, status socioecon6mico, educa~ao, residencia, grupo ewio,
identifica~5es etnicas e religiosas e algumas caracterfsticas de personalida-
de pouco conhecidas. Como e bem sabido, em media, nas elei~5es nacio-
nais, cerca de metade de todos os adultos nos Estados Unidos comparecem;
apenas urn quarto, parem, faz algo mais do que votar, tal como escrever aos
seus deputados, contribuir financeiramente para a campanha eu tentar
convencer outros a adotarem-Ihe as ideias polfticas.6 Nas elei~5es de 1952,
apenas 11% em uma pesquisa de ambito nacional ajudaram financeiramen-
te os partidos, compareceram a comfcios, ou trabalharam por urn dos par-
tidos ou candidatos; apenas 27% conversaram com outras pessoas tentandO
convence-Ias do motivo por que deviam votar I'm urn dos partidos ou
candidatos.7 As elites polfticas ativas, por conseguinte, atuam nao raro den-
tro de limites vagos e amplos, ainda que, as vezes, estreitos e bem defini-
dos, estabelecidos por suas expectativas quanto as rea~5es do grupo de
cidadaos politicamente ativos que comparecem as umas. Outras organiza-
~oes, como os sindicatos, que nos seus estatutos preceituam a igualdade
polftica, operam mais ou menos da mesma mane ira, embora suas elites e
, seria possivel e talvez util estabelecer algumas classes arbilnirias, mas nao
destituidas de significa~ao, entre as quais a por~ao superior poderia ser
chamada de "poliarquia".IO
E mais do que evidente, contudo, que 0 que acabamos de descrever
nao passa de urn programa, pois nada de semelhante foi tentado, segundo
pensamos. Simplesmente alinho aqui, por conseguinte, as seguintes obser-
va~6cs: as organiza~6es realmente diferem muito na medida em que se
aproximam dos limites estabelecidos por essas oito condi~6es. Alem disso,
as "poliarquias" incluem grande variedade de organiza~6es que os cien-
tistas politicos ocidentais normal mente chamariam de democnlticas, inclu-
'indo certos aspectos dos govemos de na~6es-Estado como os Estapos Uni-
dos, Gra-Bretanha, os Dominios (com exce~ao possivelmente da Africa do
SuI), os paises escandinavos, Mexico, ltilia e Fran~a; estados e provincias,
como os estados deste pais e as provincias do Canada; numerosas cidades
grandes e pequenas; alguns sindicatos; urn born numero de associa~6es
como as Associa~6es de Pais e Professores, diret6rios da Liga das Mu-
lheres Eleitoras e alguns grupos religiosos; e algumas sociedades primiti-
vas. E grande, portanto, 0 numero de poliarquias. (0 numero de poliarquias
igualit:irias e, tudo indica, relativamente pequeno, ou talvez nenhuma delas
exista.) 0 numero de poliarquias pode muito bem superar uma centena e
provavelmente mais de urn milheiro. Entre este numero, porem, apenas urn
punhado minusculo foi exaustivamente estudado por cientistas politicos, e
estas foram as mais diffceis de todas, constituidas dos govemos de estados
e, em alguns casos, de unidades govemamentais menores (municfpios, con-
dados, etc.).
Alguns crft,iGOSinsistirao logo em que as diferen~as entre tiPos parti-
culares de pOliarquias, como,jJ9r exemplo, entre na~6es-Estado e sindi-
catos, saD ta~ grandes que provavelmente nenhuma utilidade havera em
inclui-las na mesma classe. Nao acho que tenhamos evidencia suficiente
para essa conclusaQ. De qualquer modo, dado urn numero ta~ grande de
casos a estudar, em princfpio seria possivel responder a pergunta seguinte:
Quais saD as condi~6es necessarias e suficientes para que existam poliar-
quias?
Vemos, destarte, que 0 primeiro metoda de formula~ao de uma teoria
de democracia, 0 metodo de maximiz(\\:ao descrito no capitulo 1, funda-se
aqui com 0 que chamei de metoda descritivo. Come~amos procurando
identificar as condir;oes que seriam necessanas e suficientes no mundo real
a fim de maximizar, tanto quanto fosse possivel, a soberania popular e a
igualdade polftica. Descobrimos que podiamos solucionar esta questao me-
dindo a extel!sao em que a Regra era adotada numa organiza~ao. Mas, a
fim de medir essa extensao, tivemos que estabelecer oito condi~oes mais
ou menos observaveis. Interpretarnos essas condi~oes como limites, que
vimos que nao saD atingidos no mundo real e que sao provavelmenteina-
tingiveis, e em seguida os reinterpretamos como extremidades de oito
continua ou escalas que, sugerimos, poderiam ser usadas nas medir;oes.
Agora, nossa questao precisa ser refraseada da seguinte maneira: Quais as
condir;oes necessArias e suficientes no mundo real para a existencia dessas
oito condir;oes em, pelo menos, 0 grau minima que concordamos em
denominar de poliarquia? A fim de solucionar essa questao, seria necessa-
rio classificar e estudar urn numero consideravel de organizar;oes do mun-
do real. Fechamos, assim, 0 cfrculo entre os metodos de maximizar;ao e 0
descritivo.
Executar rigorosamente esse programa e tarefa muito alem dos objetivos
destes ensaios e, com toda a possibilidade, fora do escopo da ciencia polf-
tica nos dias atuais. Nao obstante, podemos formular algumas hip6teses
para as quais existem evidencias em numero consideravel.
Para comer;ar, cada uma das oito condi~6es pode ser formulada como
uma regra ou, caso prefira 0 leitor, como uma norma. Da primeira con-
dir;ao, por exemplo, podemos derivar uma norma no senti do em que cada
membro deve ter oportunidade de manifestar suas preferencias. Parece urn
truismo que, se todos os membros de uma organiza~ao rejeitam a norma
preceituandoas oito condir;6es, enta~ as condir;6es nao existem; ou, alter-
nativamerite, a extensao em que a poliarquia existe deve relacionar-se com
a medida em que as normas saD aceitas como desejaveis. Se estamos dis-
pastos a supor que a extensao do acordo (consenso) sobre as oito normas
basicas e mensunlvel, podemos formular as hip6teses seguintes, que tern
sido comuns na literatura da ciencia politica:
1. Todas as condir;oes da poliarquia aumentarn com a extensao do acordo
(ou consenso) sobre a norma aplicavel.
2. A poliarquia e uma funr;ao do consenso sobre as oito normas, perma-
necendo iguais outras condir;oesY ,
Infelizmente para a simplicidade das hip6teses, 0 consenso possui pelo
menos tres dimensoes: 0 numero de individuos que concordam, a intensi-
dade ou profundidade de suas convicr;6es e a extensao em que a atividade
visivel conforma-se a essas convicr;oes. Nao obstante, parece valer a pena
expar explicitarnente 0 que, a primeira vista, parece trivial, se nao mera
questao de definir;ao, porque constitui urn fato curioso e PQssivelmente im-
Flortante que, a despeito da respeitabilidade sagrada das hip6teses entre os
cientistas sociais, tanto quanta sei nenhum deles reuniu os clados empiricos
necessarios ate mesmo para uma confirma~ao preliminar de sua valida de.
Temos de fato alguns bons volumes de evidencia muito indireta no sentido
de que 0 acordo sobre as oito normas e menor, digamos, na Alemanha do
que na Inglaterra, mas parece-me altamente arbitrario deixar nossas hip6-
teses cruciais em tal estado de abandono.
A extensao do acordo, por outro lado, deve ser funcionalmente de-
pendente cia medicla em que os varios processos de treinamento social sao
empregados, por conta das normas, pela familia, escolas, igrejas, clubes,
literatura, jomais, e assim por diante. Ora, se Fosse possivel medir a exten-
sao em que esses processos sao usad05, nossas hipOteses poderiam ser for-
muladas cia seguinte maneira:
3. A extensao do acordo (consenso) sobre cada uma das oito normas au-
menta com 0 grau do treinamento social sobre sua observancia.
4. 0 consenso, por conseguinte, e uma fun~ao do treinamento social total
em todas as normas.
5. A poliarquia e uma fun~ao do treinamento social em toclas as
normas.12
Como anteriormente, a varia vel "treinamento" e altamente complexa.
No minimo, precisariamos distinguir entre treinamento favoravel ou refor-
~ador, compativel (ou neutro) e negalivo. E razoavel supor que esses tres
tipos de treinamento operam nos casos dos membros da maioria, se nao de
todas as organiza~Oes poliarquicas, e talvez dos membros de numerosas or-
ganiza~oes hierarquicas, tambCm. Mas parece que e muito pouco 0 conhe-
cimento seguro sobre essa queslao.13
Em principio, nao precisamos encerrar com 0 treinamento a cadeia de
relacionamentos. Por que, caberia perguntar, algumas organiza~oes sociais
empenham-se em promover extenso treinamento nessas normas e outras s6
o fazem muito pouco, quando nao absolutamente? A resposta aparente-
mente se perde nas complexidades dos acidentes hist6ricos, embora uma
util hipOtese subsidiaria sugira-se por si mesma, isto e, que a extensao em
que 0 treinamento e proporcionado nessas normas nao e independente cia
extensao do acordo existente sobre as o~oes entre altemativas de poli-
tica.14 E razoavel supor que, quanto menos acordo sobre o~oes de politica,
mais dificil sera para qualquer organiza~ao treinar seus membros nas oito
normas. Isto porque embora a opera~ao das normas possa conferir bene-
ficios a alguns membros, implicaria tamMm severas restriyoes a outros. Se
os resultados forem penosos para nUmeros relativamente grandes, enlaO e
razoavel supor que os que sofrem com a aplica~ao clas regras se oporao a
elas e dai resistirao ao treinamento nelas. Por conseguinte:
6. 0 treinamento socia! nas oito normas aumenta com a extensao do
consenso ou acordo sobre as op\;oes entre altemativas de politica.
7. Vma ou mais clas condi~6es cia poliarquia aumentam com 0 consenso
sobre altemativas de politica.
A hipOtese 6 sugere, demais disso, que 0 oposto cia Hip6tese 4 tamMm
e valido. Seria de esperar que a extensao em que 0 treinamento social nas
normas ocorre e em si dependente do volume de acordo ja existente sobre
elas. Quanto mais desacordo, mais provavel e que alguns dos meios de
treinamento social - a familia e a escola, principalmente - eduquem 0
individuo em norm as conflitantes. A relayao entre treinamento social e
consenso e, portanto, urn. exemplo perfeito do problema do ovo e cia ga-
linha. Dai:
8. A extensao do treinamento social em uma das oito norrrias aumenta
tambem com a extensao do acordo sobre ela.
A rela~ao que provoca ocasional confusao e a existente entre poliar-
quia e diversidade social. Freqiientemente ouvimos ctizer que "democracia
exige diversidade de opinioes". Certamente e verdade que a diversidade de
opini6es constitui urn fato da socieclade hum ana. Em nenhuma sociedade
conhecicla todos os membros concorclam sobre todas as politicas durante
tocto tempo, e isto toma necessario que todas as organiza~oes sociais pos-
suam algum meio, por mais primitivo que seja, de solucionar conflitos
sobre metas. Poder-se-ia mesmo sustentar a proposi~ao de que, uma vez
que conflitos sobre metas sao inevitaveis em organiza~oes, as poliarquias
sao necessarias para maximizar 0 bem-estar humano - se este termo pu-
desse ser convenientemente definido. Na opiniao de muitas pessoas, a di-
versidade, ate algum ponto mal definido, inclui outros valores - esteticos,
emocionais e intelectuais. Talvez seja tambem verdade, como alegou Mill,
q.uealguma ctiversidade de opiniao seja condi~ao necessaria ao calculo ra-
Clonal de politicas altemativ3s. Mas toclas essas proposi~6es sao inteira-
mente diferentes da asser~ao de que diversidade de opiniao, ou conflito
sobre metas, constitui uma concti~ao necessaria a poliarquia.15 Se nosso
'argumento ate agora e correto, nao pode ser inteiramente verdadeiro que a
poliarquia requer desacordo sobre a validade das oito normas basicas ou
sobre determinadas polfticas publicas. De qualquer maneira, a rela~ao nao
e simples.
Nos Estados Unidos, glorificamos certa inevitabilidade historica como
virtude. (Minha esperan~a e que isto continue.) Ainda assim, nao se deve
permitir que a glorifica~ao da diversidade nos confunda sobre relaciona-
mentos sociais importantes. Nao hi}enta~ coisa alguma em nossa opiniao
tradicional? 0 que dizer da freqlientemente repetida hipotese de Madison
no Tbe Federalist, nQ 10?
Estenda-se a esfera e abrange-se uma maior variedade de partidos e
interesses; tornamos menos provavel que uma maioria do todo tenha
motivo comum para usurpar os direitos de outros cidadaos ou, se esse
motivo comum existe, sera mais diffcil para todos os que dele compar-
tilham descobrir sua propria for~a e agir em unfssono.
A fim de enfrentar essa questao da rela~ao, se alguma, entre diversi-
dade e democracia, imp6e-se distinguir com todo 0 cuidado entre duas ca-
tegorias muito diferentes - ou, como prefiro chama-Ias - continua.
a) 0 primeiro e 0 continuum do acordo ao desacordo sobre metas.
Aqui temos ainda que distinguir entre acordo sobre metas polftica e nao-
polftica. A primeira e qualquer objelivo que indivfduos procurem promover
ou inibir por meio de a~ao governamental.16 Nas Hipoteses 1 a 5 distingui-
mos, na realidade, entre dois tipos de metas polfticas: as corporificadas nas
oito normas basicas e as metas da polftica. 0 argumento ate agora e que a
poliarquia exige urn acordo relativamente alto sobre ambos os tipos de
metas polfticas.
b) 0 segundo e 0 continuum da autonomia ao controle. Urn grupo e
aut6nomo na medida em que suas polfticas nao sac controladas por indivf-
duos externos a ele.
o argumento de Madison na verdade declara que urn nfvel relativa-
mente alto de autonomia de grupo, combinado com urn grau tambem rei a-
tivamente alto de desacordo sobre metas, servira como importante limita-
~ao a capacidade de qualquer maioria putativa de controlar a politica do
governo. MaS se estamos interessados,como neste ensaio, nas condi~6es
em que a existencia da Regra pode ser maximizada, nao achamos das me-
Ihores essa solu~ao. Por isso, precisamos reconstruir 0 argumento de Ma-
dison e embora ele fizesse esse trabalho com uma elegancia, for~a de con-
vencirnento e precisao que estao alem de nossos poderes, nao achamos que
ele teria discordado desta analise.
Imaginemos dois gropos de indivfduos. 0 Grupo A prefere a polftica x
aye 0 outro prefere a y a x. Ora, lembrando-nos de que a autonomia social
completa de urn grupo e (por defini~ao) identica a completa ausencia de
controle por quaisquer indivfduos ou gropos externos, se 0 Grupo A e 0
Grupo B sao inteiramente aut6nomos com rela~ao urn ao outro em todas as
politicas, enta~ nenhuma rela~ao govern amen tal existe entre eles e por isso
nao podem ser membros da mesma poliarquia. Dadas essas condi~6es
extremas, nenhuma questao polftica surgira por causa do desacordo entre
eles.17 Reciprocamente, se lodos os membros dos Grupos A e B nao sac
aut6nomos na questao das o~6es, incluindo x e y, enta~, em principio, a
poliarquia e possfvel entre eles,_ isto e, a Regra pode ser aplicada para
resolver a questao de x ou y. A parte outras quest6es que podem ser
imaginadas, se nao ha autonomia e se 0 desacordo sobre x eye muito forte
-- como, por exemplo, numa questao como a escravatura, que penetra no
proprio amago da estrutura social e da ideologia - enta~, conforme
sugerido em conexao com a Hip6tese 4,0 acordo sobre e 0 treinamento nas
oito normas basic as necessarias a poliarquia serno provavelmente muito re-
duzidos, talvez drasticamente. Isto e, 0 desacordo acrescido de nao-aulo-
nomia solapa a poliarquia.
Se, contudo, os dois gropos sao aut6nomos entre si, pelo menos no to-
cante a escolha entre x e y, enta~ a decisao nao e mais de natureza polflica,
para a qual os mecanismos da poliarquia teriam de ser empregados. Torna-
se, como a toleriincia religiosa, uma questao nao-polftica, e diferenles op-
~6es podem ser compativeis com urn alto grau de acordo e treinamento so-
bre e nas oito normas basicas necessarias a poliarquia. Em vista disso, for-
mulamos a seguinte hip6tese:
Alem de certo ponto, quanto mais forte 0 desacordo sobre polflicas
dentro de uma organiza~ao social, e maior a propor~ao de indivfduos
envolvidos no desacordo, maior 0 volume de autonomia social reque-
rido para que a poliarquia exista em qualquer dado nfvel.
Ora, a extensao do acordo nao pode ser de todo considerada indepen-
dentemente da extensao da atividade polflica na organiza~ao. A medida em
que algumas das condi~6es necessarias a poliarquia - 1,4 e 5 - sao sa-
tisfeitas e tambem a medida da atividade polflica de seus membros, isto e, a
extensao em que eles votam em elei~6es gerais e primarias, participam de
campanhas e busearn e disseminam informa~6es e propaganda. Em vista
disso, por defini~ao:
9. A poliarquia e uma fun~ao da atividade polflica de seus membros.1S
MuilO se sabe agora sobre as variaveis as quais esta ligada a alividade
p?lflica. Na verdade, na proxima decada deve surgir urn conjunto bem pre-
CiSOde proposi~6es sobre essas rela~6es. Atualmente, sabemos que a alivi-
· dade politica, pelo menos nos Estados Vnidos, esta positivamente associ a-
da em grau importante com variaveis como renda, status socioecon6mico e
educa~ao e que tambem se relaciona de formas complexas com sistemas de
cren~as, expectativas e estruturas de personalidade. Sabemos agora que os
membros das massas ignorantes e destituidas de propriedades que Madison
e seus colegas tanto temiam sac muito menos ativos politicamente do que
os educados e abastados. Devido a sua propensao para a passividade poli-
tica, os pobres e ignorantes se privam de seus direitos politicos.19 Desde
que tern tambem menos aces so do que os ricos aos recursos organizacio-
nais, financeiros e propagandisticos, e nao menos as decisoes executivas,
qualquer coisa como controle igual sobre a politica publica e triplamente
vedada aos membros das classes sem propriedades de que falava Madison.
E sao excluidas por sua inatividade relativamente maior, pelo aces so relati-
vamente limitado aos recursos e pelo sistema elegantemente montado de
con troles govemamentais que ele defendeu.
raro publicamente manifestadas por numerosos cientistas politicos, de So-
crates ate 0 presente. Nao obstante, talvez seja util separar este enfoque, se
apenas em grau, do madisoniano e do populista.
A solu~ao conciliatoria de Madison entre 0 poder das maiorias e 0 das
minorias repousou em grande parte, embora nao de todo, na existencia de
freios constitucionais a a~ao da maioria. Em contraposi~ao ao madisoni-
anismo, a teoria da poliarquia focaliza-se principal mente nao em requisitos
constitucionais previos, mas nas condi~oes preliminares a uma ordem de-
mocrMica. A diferen~ e de grau: Madison, como vimos, nao era indiferen-
te as necessarias condi~oes sociais para sua republica nao-tiranica. Mas
certamente nao sera injusto dizer que sua maior preocupa~ao era com os
controles constitucionais prescritos e nao com os con troles sociais ope-
rantes, com os controles constitucionais reciprocos e nao com os con troles
sociais mutuos. Afinal de contas, a Conven~ao Constitucional tinha que
elaborar uma Constitui~ao e nao projetar uma sociedade. Os convencionais
aceitaram a natureza humana e a estrutura social principalmc)';te como se
apresentavam, e seu trabalho, como 0 interpretavam, consistia em redigir a
Constitui~ao mais harmoniosa possivel com a natureza humana e a estru-
tura social, e com a meta de uma republica que respeitasse os direitos na-
turais, particularmente os dos bem-nascidos e dos poucos.
Nao obstante, acho que a inclina~ao dada ao pensamento americano
pela Conven~ao Constitucional e a apoteose subseqiiente de seu produto
impediram 0 estudo realistico e precise dos requisitos de democracia. :E
importante lembrar que, ate a queda do Fort Sumter, a disputa entre Norte e
SuI era vazada, com algumas poucas exc~oes importantes, quase inteira-
mente na linguagem do direito constituciona1. A tragedia da decisao no
caso Dred Scott nao foi tanto seu resultado como 0 estado de espfrito que
pressagiava.
Vma vez que somos educados para acreditar na necessidade de contro-
les constitucionais recfprocos, pouca fe depositamos nos seus correspon-
dentes sociais. Admiramos a eficacia da separa~ao constitucional de pu-
deres no freio as maiorias e minorias, mas freqiientemente ignoramos a im-
porlimcia das restriryoes impostas pela dimensao social no particular. Ainda
assim, se a teoria da poliarquia e aproximadamente valida, segue-se que, na
ausencia de certas condiryoes sociais previas, nenhum arranjo constitu-
cional pode criar uma republica nao-tiranica. A historia de numerosos Es-
tados latino-americanos constitui, acho eu, evidencia suficiente. Recipro-
camente, urn aumento na extensao em que esta presente uma das precon-
di~oes sociais talvez seja muito mais importante no fortalecimento da de-
mocracia que qualquer dada elabora~ao constitucional. Estejamos preo-
cupados com uma tirania da maioria ou da minoria, a teoria da poliarquia
Sugere que as primeiras e cruciais variaveis para as quais os cientistas poli-
ticos devem dirigir sua aten~ao sac sociais e nao constitucionais .
•••
Estas, enta~, sac algumas das rela~oes que nos, cientistas politicos, precisa-
mos examinar com a ajuda de nossos colegas das demais cicncias sociais.
Dificilmente se poderia negar que elas sac apenas algumas das rela~oes
cruciais. Vma relaryao, por exemplo, mesmo que complexa, indubitavel-
mente existe entre a extensao da igualdade politica possivel em uma socie-
dade e a distribui~ao da renda, riqueza, status e controle sobre os recursos
organizacionais. Alem do mais, e cada vez mais provavel que existam
algumas rcla~oes entre a extensao da poliarquia e as estruturas de persona-
lidade dos membros da organizaryao. Referimo-nos neste instante aos tipos
de personalidade autoritario e democratico, mesmo que nosso conheci-
mento desses tipos hipoteticos e da suadistribui~ao concreta em socieda-
des diferentes ainda seja muito fragmentario. E ainda muito cedo para di-
zer, pensamos, que foi provada urna alta correlaryao entre a poliarquia e a
presenrya ou ausencia relativas de tipos particulares de personalidade. Mas,
decerto, a eficacia do treinamento social nas normas basicas, mencionado
acima, tern que depender parcialmente das inclinary6es mais profundas do
indivfduo.
Vma vez que a preocuparyao com as precondi~oes sociais de diferentes
ordens politicas e ta~antiga como a especularyao politica, nenhuma alega-
~ao de novidade podemos fazer para as hip6teses bosquejadas neste capi-
tulo. Expus apenas, ocasionalmente com mais rigor cientffico que 0 costu-
meiro, urn conjunto de proposi~oes insinuadas, sugeridas, inferidas e nao
Verificamos que a teoria populista delineada no ultimo capitulo e for-
mal e axiomMica, mas que carece de informa~oes sobre 0 mundo real. Di-
zer que a consecu~ao perfeita da igualdade polftica e da soberania popular
e, por defini<;ao de term os, compativel apenas com 0 principio de maioria
nao implica enunciar uma proposi<;ao inteiramente inutil, mas tarnpouco e
muito util. Pois 0 que queremos desesperadamente saber (se nos preocu-
pam os com a igualdade polftica) e 0 que podemos fazer para maximiza-Ia
em alguma situa<;ao real, dadas as condi<;oes existentes.
Se queremos voltar a aten<;ao para 0 caos do mundo real sem nos per-
dermos inteiramente em fatos destitufdos de scntido ou de empirismo ba-
nal, precisamos de uma teoria que nos ajude a ordenar 0 conjunto incrfvel e
enigmatico dos eventos. A teoria da poliarquia, uma ordena~ao inadequa-
da, incompleta e primitiva do repositorio comum de conhecimentos sobre
democracia, e formulada na convic<;ao de que, em alguma dimensao entre
o caos e a tautologia, podcmos, no futuro, construir uma teoria satisfatoria
sobre a igualdade polftica.
Durante 0 per/odo p6s-vota~iio:
6. As altemativas (lfderes ou polfticas) com 0 maior numero de votos
. vencem todas as demais (lfderes ou politicas) contempladas com me-
nos.
7. As ordens dos servidores eleitos sac executadas.
Durante 0 estagio entre vota~6es:
8.1 Todas as decis0es tomadas entre elei<;0es sac subordinadas ou execu-
torias aquelas tomadas durante 0 perfodo de elei<;ao, isto e, as elei<;0es
sao, em certo sentido, controladoras;
8.2 au as novas decis0es, tomadas durante 0 periodo entre elei<;0es, sac
pautadas pelas sete condi<;oes precedentes, operando, no entanto, sob
circunstfu1cias institucionais muito diferentes;
8.3 au ambas as coisas.
B. A medi~iio da poliarquia
A fim de chegarmos a urn conjunto de escalas com as quais possamos
medir quantitativamente a poliarquia, todas essas condi<;0es podem ser
consideradas como indican do certos atos cuja freqilencia pode, em prin-
cipio, ser determinada. Se podem se-Io, podemos converter as condi<;0es ou
em declara<;Oes sobre freqilencias passadas, digamos, ao longo de uma
escala de 0 a 100, ou sobre futuras freqilencias esperadas'llsto e, proba-
bilidades ordenadas ao longo de uma escala de 0 a 1. '
Assim, a primeira condi<;ao pode ser convertida no enunciado de que a
poliarquia e uma fun<;aoda variavel seguinte: A fra<;aoda filia<;ao total que
realiza (ou, altemativamente, a probabilidade de que qualquer numero
aleatoriamente selecionado realize) 0 ate que supomos constituir uma ma-
nifesla\:ao de preferencia entre altemativas apresentadas. (Esta fra<;aopode
ser designada como Pr) Acontece, contudo, que a primeira condi<;ao
presta-se muito a este tratarnento, pois existem dados excelentes na maioria
das organiza~0es sobre a extensao da participa<;ao na vota<;ao, 0 ate que, de
maneira geral, sem duvida, seria usado como indice de preferencia. Infe-
lizmente, porem, a medida que descemos na lista, surgem numerosas difi-
culdades. Nos casos de algumas condi<;6es, nossos conhecimentos nao es-
tao, como no caso das elei<;6es, ja em forma quantitativa nem e provavel
que isso venha a acontecer. Nao temos tabelas de freqilencia, por exemplo,
no tocante a Condi<;ao 7, e e claro que haveria problemas enormes na ten-
tativa de determinar essas freqilencias. Nestes casos, as freqilencias, ou
probabilidades, poderiam ser estabelecidas pelo observador de uma ma-
neira intuitiva e bastante arbitraria. Alem do mais, algumas das condi~oes
A. As caracterfsticas definidoras da poliarquia
A poliarquia e frouxamenle definida como urn sistema politico em que as
condi<;oes seguintes existem em nivel relativamente alto:
Durante 0 perfodo de votar;ao:
1. Todos os membros da organiza<;ao praticam atos que supomos consti-
tuir uma manifesta<;ao de preferencias entre altemativas apresentadas,
isto e, votando.
2. Na tabula<;ao dessas manifesta<;oes (votos), e identico 0 peso atribuido
a escolha de cada individuo.
3. A altemativa com 0 maior numero de votos e declarada vencedora.
Durante 0 per/odo entre votar;6es:
4. Cada membro que considera urn conjunto de alternativas, pelo menos
uma das quais acha preferivel a qualquer das altemativas apresentadas,
pode inserir sua(s) altemativa(s) preferida(s) entre as apresentadas a
vota~ao.
5. Todos os individuos possuem informa<;0es identicas sobre as altema-
tivas.
sao complexas e nao fariam sentido se seu ordenarnento ignorasse essas
complexidades. No caso da CondilYao 2, por exemplo, quererfarnos levar
ern conta mais do que a freqiiencia corn que, ou a probabilidade de que,
alguns votos ou votantes teriam uma ponderalYao maior que outros. AI~
rccentemente na Gra-Bretanha, cerca de 375.000 pessoas dispunharn de urn
voto extra (ou porque possufarn urn diploma universitario ou porque
possufam negocios ern zonas eleitorais diferentes da de sua residencia).
Daf, a CondilYao 2 era certamente violada ern tadas as eleilYoes. Mas era
uma violalYao relativarnente pequena se considerarmos a magnitude do
eleitorado, uma vez que, ern 1945, esses votos extras representararn apenas
1,2% de todo 0 eleitorado. 0 que isto sugere, contudo, e que quereriamos
que uma medilYao da CondilYao 2 levasse ern conta tanto a proporlYao de
votos como de votantes ponderados excessivamente e os pesos relativos.
Talvez fosse possivel elaborar uma escala para levar ern conta esses
fatores, embora valha notar que entre uma meia duzia mais ou menos que,
inicialmente, me pareceram promissoras, todas se revelaram defeituosas de
uma ou outra maneira. A melhor poderia ser alguma coisa mais ou menos
assim:
variavel independente quando todos os demais fatores sao fixos. Supo-
nharnos, dai, que i signifique essa relalYao.
1) P 1iC1 quando PIe uma das caracteristicas definidoras da poliarquia
e C1 e 0 consenso sabre a norma relevante.
P2 i C2
2) PI i(C1• C2• •••• Cs' X), onde X significa todas as demais
precondilYQesdas quais depende a poliarquia.
3) C1ixl• onde Sl eo treinarnento social nessa norma.
c2is2
,f Iw -wilNi
1= 1
P2 = 1 - -------
4) ci(SI,S2<"'<SsX)
5)P1iSI.etc.
6) SiCa, onde Ca e 0 consenso sobre altemativas de politica.
7) piCa
8) Sji(Ca. Cl)onde W e 0 peso do voto, N e 0 numero de cidadaos ou eleitores que
depositam esse voto particular, eWe a media do voto ponderado. Esta
formula proporcionaria valores que se aproximariarn de 0 a medida que
aumentassem os desvios e seria igual a 1 no caso ern que tados os cictadaos
tivessem votos de igual peso. No caso britanico mencionado acima, 0
resultado seria de mais ou menos 0,98.
As CondilYQes4 e 5 sao talvez ainda mais dificeis, porque embora seja
muito facil detectar a presenlYa ou ausencia bruta dessas condilYQes,
surgiriarn numerosos problemas para ordenar os diferentes estados de
coisas possiveis e, na verdade, provaveis, ao longo do continuum. Dispensa
dizer que impor uma escala media a tal ordenalYao seria ainda mais dificil
- se nao, na verdade, absurdo.
e
Si(Ca. CI' C2 ••••• Cs)
9) PiCA. X), onde A e a atividade politica.
10) Pi(Ca. C1_S' S. A. X)
C. Sumario de jun(;oes mpotericas relacionando a poliarquia com suas
precondi(;oes
A forma especifica das func;:oesseguintes nao e conhecida, exceto que
se supoe quea variavel dependente seja uma funlYaopositiva e crescente da
1. Poliarquias sao definidas como: organizalYQes ern que todas as oito
condilYQessao representadas numa escala ern valores iguais ou maiores
que 0,5.
1.1 As poliarquias igualitarias sao definidas como: poliarquias em que
todas as oito condi~oes sao representadas numa escala em valores
iguais ou maiores do que 0,75.
1.2 Poliarquias nao-igualit<irias sao definidas como todas as demais.
2. As hierarquias sao definidas como: organiza~oes em que todas as oito
condiyoes sao representadas em uma escala em valor de menos de 0,5.
2.1 As oligarquias sao definidas como: hierarquias nas quais algumas
condi~oes sao reduzidas a escala em valores iguais ou maiores que
0,25.
2.2 Ditaduras sao definidas como: hierarquias nas quais nenhuma
condi~ao e reduzida a escala em valor igual a 0,25.
3. Corpos politicos mistos sao definidos como: 0 residuo, isto e, organi-
za~6es em que pelo menos uma condi~ao e reduzida a escala em valor
maior que au igual a 0,5 e pelo menos uma em urn valor de menos que
0,5.
E. Nota sobre a relar;iio entre acordo e atividade polftica
Tanto quanto sei, poucos conhecimentos seguros existem sobre a rela-
~ao entre acordo e atividade polftica e, por conseguinte, sobre as rela~oes
entre as variaveis das hip6teses 2), 7) e 10) acima. Francis Wilson argu-
mentou, na verdade, que a atividade politica tende a relacionar-se inversa-
mente com 0 acordo sobre alternativas de politica.20 Simbolicamente:
ll)AI-Ca
De onde se seguiria, se nossa hip6tese 9) for correta, que
12) PI-Ca
Mas, evidentemente, 7) e 12) nao podem ser verdadeiras, uma vez que a
poliarquia nao pode aumentar e diminuir com a extensao do consenso
sobre a faixa total.
V.O. Key, segundo penso, demonstrou que a hip6tese de Wilson nao e
apoiada pela evidencia empirica de que hoje dispomos e que, de fato, a re-
cfproca poderia ser mantida com tanta ou melhor razao. Por isso, nao pode-
mos razoavelmente argumentar que 0 consenso e menor na Nova Zelandia,
onde 90% da popula~ao adulta freqiientemente votam em elei~Oes na-
cionais, do que nos Estados Unidos, onde votarn de 50-60%.
Nao obstante, nao e absurdo supor que, em uma dada na~ao ou outra
organiza~ao social, ocorra com 0 tempo uma associa~ao discemivel entre a
extensao da atividade politica e a do desacordo sobre altemativas de politi-
ca. Numa situayao hipotetica em que apenas duas alternativas sao perce-
bidas, 0 caso mais simples seria mais ou menos 0 seguinte:
Claro que a linha reta e arbitraria. Enquanto a inclinayao da curva for
sempre positiva, cada aumento no consenso ou na atividade politica deve
estar associado a aumento na poliarquia. Ora, e razoavel supor que nos
casos em que 0 consenso e muito baixo, isto e, nos casos em que ha pouco
acordo sobre qualquer alternativa e, daf, grande dificuldade em se escolher
uma delas, a apatia pode ser 0 resultado. De identica maneira, e razoavel
supor que, nos casos em que e muito alto 0 consenso, numerosos indivi-
duos sentirao pouca necessidade de votar OU de outra maneira influenciar
as decisOes politicas. Se estas suposi~Oes sao corretas, seria de esperar que,
ate certo ponto, a atividade aumentasse com 0 aumento do acordo e dai em
diante declinasse como no diagrama seguinte.
De A a B nenhum problema surge. De B a C, contudo, a atividade polf-
tica decresce a medida que aumenta 0 acordo sobre a polftica. Mas a ati-
vidade politica decrescente significaria que os valores de PI' P4 e Pj decli-
nariam, isto e, a poliarquia diminuiria. Ainda assim, de acordo com a hip6-
tese 7), a poliarquia tenderia a aumentar.
Se tivessemos dados suficientes, a contradi~ao poderia provavelmente
ser resolvida. Em primeiro lugar, poderfamos, nesse caso, especificar a
area dentro da qual se aplicam as varias fun~Oes. Em segundo lugar, pode-
rfamos introduzir 0 fator tempo, que e ignorado na hip6tese, mas tern in-
o
o 100
MAIOR PERCENTAGEM DE ACORDO EM UMA ALTERNATIVA ISOLADA
«
>
f=«
w
f- B
Zw
:2«
0
f=:::J
0D..
:2w
CJ« A Cf-
Z
W
0a:wD..
o
o 100
MAlaR PERCENTAGEM DE ACORDO EM UMA ALTERNATIVA ISOLADA
dubitavelmente importfu1cia crucial. Assim, urn aumento ou diminui~ao do
acordo talvez apenas lentamente surja com 0 aumento ou diminui~ao do
treinamento social, ao passu que talvez apare~a muito mais rapidamente na
atividade polftica. Finalmente, poderfamos determinar se as rela~Oes sao
reversiveis. Nao precisam see. Urn aumento do acordo talvez nao reduza a
atividade polftica em urn volume ta~ grande como uma diminui~ao equiva-
lente no acordo a aumentaria. Dai, sao imensos os problemas do conheci-
mento empirico e, com toda a possibilidade, inteiramente insoluveis, ex-
ceto de uma forma muito imprecisa.
As mesmas dificuldades aplicam-se a rela~ao entre poliarquia, ativi-
dade politica e consenso sobre normas basicas. Mas aqui podemos deparar
urn problema adicional, pois a evidencia corrente sugere que, nos Estados
Unidos, quanto mais baixa a c1asse socioecon6mica do individuo, mais au-
torit<irias suas predisposi~Oes e menos ativo politicamente ele provavel-
mente sera. Dessa maneira, se urn aumento da atividade politica traz os in-
dividuos de mente autoritaria para a arena politica, 0 consenso sobre as
normas basicas entre os politicamente ativos deve estar declinando. Na me-
dida em que 0 consenso declinar, cabe esperar a vista da hip6tese 1) que,
ap6s algum retardo, decline tambem a poliarquia.
A luz de tudo isto, nao podemos supor que urn aumento da atividade
politica esteja sempre associado ao aumento da poliarquia, conforme indi-
cado pela hip6tese 9). A rela~ao e evidentemente muito complexa e neces-
sita de muito mais pesquisas cuidadosas e elabora~ao de teorias.
1. Mais exatamente, na utilizac;:ao da votac;:ao e de pesquisas de opiniao geralmente con-
fiamos mais nas declarac;:6es publicadas dos individuos que compilam os resultados.
2. E concebivel que a reciproca possa existir, isto e, uma ditadura que rejeitou a Regra n,o
estJigio de eleic;:ao, mas organizou a sociedade de modo que as fases de pre-votac;:ao do
processo de tomada de decis6es fossem altamente democniticas. Mas desconhec;:o a
existencia de tal sociedade. Interpretes simpatizantes do comunismo sovietico sugerem
as vezes que tal relac;:aoexiste na URSS, embora a evidencia esmagadora parec;:asugerir
que a estrutura social e 0 processo decis6rio na poHtica sejam extremamente nao-
igualitJirios. Algurna coisa nesse sentido, porem, parece saturar 0 curioso retrato que os
Webb trac;:amda URSS no Soviet Communism: A New Civilization?
3. Eleic;:aoe usada aqui em sentido amplo. Aplicar a analise ao funcionamento intemo de
uma organizac;:ao que e em si constituida atraves de eleic;:6es, como urn corpo
legislativo, consideraria 0 voto sabre medidas como "a fase eleitoral".
4. A Condic;:ao I tern que ser interpretada com cuidado, uma vez que a palavra "ato" da
margem a ambigiiidade. Suponhamos que os membros de uma organizac;:ao tern que
escolher entre as altemativas x e y; todos os membros preferem uma ou outra, e 0 indice
dos que preferem x aos que preferem yea/b. Neste caso, enquanto os que realmenle
votam 0 fizerem de acordo com esse indice, a magnitude do voto nao e rigorosamente
importante. Tudo 0 que e necessario para a aplicac;:ao da Regra e que os eleitores sejam
plenamente representativos de todos os mernbros. Realmente, em uma escolha entre
apenas duas altemativas, a Regra seria satisfeita ainda mais facilmente, pois requereria
apenas que se a/b > I, enta~ a /bJ > I, e se a/b < I, entao a/bJ < I, onde aJ eo numero
de eleitores que preferem x e hJ 0 numero dos que preferem y. Contudo, em termos de
fatos observaveis, atraves de que "ato" conhecemos 0 indice a/b, se nao por votac;:ao ou
algurn processo equivalente? De modo que se estamos interessados em fatos obser-
vliveis, e nao exigimos a Condic;:ao I para 0 processo de votac;:ao ern si, enta~ temos que
exigi-lo para algum ate anterior que "supomos constituir urna expressao de prcferencia
entre as altemativas postuladas" e da qual 0 resultadoda pr6pria eleic;:ao depende
parcialmente.
5. Poderao alguns sugerir que 0 teste seja baseado na qualidade da escolha, publica vs.
privada ou social vs. egoista. A analise, porem, demonstraria ou que essa distinc;:ao nao
faz sentido ou que sao poucos, se e que existern, os casos da primeira altemativa, isto e,
se nao sem sentido, a distinc;:ao seria irrelevante para 0 nosso problema.
6. Por exemplo, ver Julian L. Woodward e Elmo Roper, "Political Activity of American
Citizens", American Political Science Review, dezembro de 1950.
7. Angus Campbell, Gerald Gurin e Warren E. Miller, The Voter Decides (Evanston:
Row, Peterson & Co, 1954), p. 30. Tabela 3.1.
8. S.M. Lipset, "The Political Process in Trade Unions: A Theoretical Statement", em
Freedom and Control in Modern Society, M. Berger, T. Abel e C.H. Page, orgs. (Nova
York: D. Van Nostrand Co., Inc., 1954). Joseph Goldstein, The Government of British
Trade Unions: A Study of Apathy and the Democratic Process in the Transport and
General Workers Union (Londres: Allen & Unwin, 1952). Bernard Barger,
"Participation and Mass Apathy in Associations", Studies in Leadership, A.W.
Goudner, org. (Nova York: Harper & Bros., 1950).
9. Esta questiio e discutida rapidamente no Apendice B deste capitulo.
10. 0 Apendice D a este capitulo sugere urn possivel esquema de classifica~iio. . .
II. 0 Apendice E a este capItulo coloca algumas quest6es sobre 0 tratamento da poharqUia
como valor positivo e que aurnenta com 0 consenso e a atividade polftica.
12. Para urn "Sumario de fun~6es hipoteticas relacionando a poliarquia com suas precon-
di~6es", ver 0 Apendice C a este capItulo.
13. Sem duvida alguma, 0 trabalho pioneiro neste particular e A Republica, de Platiio. Nos
tempos modemos, a tentativa mais ambiciosa de analisar este problema parece ter sido
a inspirada por Charles Merriam, incluindo seu proprio The Making of Citizens
(Chicago: University of Chicago Press, 1931). Cf. tambem Elizabeth A. Weber, The
Duk-Duks, Primitive and Historic Types ofCitizenship(Chicago: University of Chicago
Press, 1929).
14. Uma analise altamente interessante, factual, e especulativa do consenso sobre
problemas controversos, como os encontrados na cidade de Elmira, Nova York, consta
do trabalho de B.R. Berelson, Paul F. Lazarsfeld e William N. McPhee, Voting
(Chicago: University of Chicago Press, 1954), cap. IX. Na verdade, todo esse volume e
relevante para 0 estudo em pi rico da poliarquia.
15. A proposi~iio e valida, claro, no sentido trivial seguinte: a sociedade humana e neces-
saria para a poliarquia. Uma caracteristica fundamental das sociedades humanas e 0
conflito sobre objetivos. Ergo ...
16. Niio quero farer uma regressiio interminavel de defini~6es. Nestes ensaios, 0 signi-
ficado de "govemo" pode ser aceito como mais ou menos claro intuitivamente au a
defini~ao seguinte pode ser usada, a despeito de suas limita0es: govemo e 0 grupo de
indivlduos que disp6e de monop6lio suficiente de controle para farer curnprir a solu~ao
pacifica de litigios.
Nas condi~6es expostas, mesmo a guerra e eliminada.
No tocante a uma complexidade importante nesta fun~iio hipotetica, ver 0 Apendice E
deste capitulo, "Uma nota sobre a rela~iio entre acordo e atividade politica". .
Cf. especialmcnte B.R. Berelson, P.F. Lazarsfeld e W.N. McPhee, op. Clt.; S.M. Llpset
et al., "The Psychology of Voting: An Analysis of Political Behavior", Handbook of
Social Psychology (Cambridge: Addison-Wesley, 1954).
"The Inactive Electorate and Social Revolution", Southwestern Political Science
Quarterly, XVI, No.4 (1936), citado em V.O. Key, Politics and Pressure Groups (31
ed., Nova York: Thomas Y. Crowell, 1952), p. 58.
Igualdade, Diversidade e Intensidade
17.
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Nao hayed por acaso uma soluc;:aoclara e nilida para 0 problema com que
lutou Madison e para 0 qual propos uma conciliac;:ao? Sera posslvel cons-
truir urn sistema para se chegar a decisoes que sejam compativeis com a
igualdade polflica e, simultaneamente, defenda os direitos das minorias? A
soluc;:aode Madison, conforme vimos, esta inc;:adade suposic;:oes e argu-
mentos que nao resistem a crilica. No que resolvemos chamar de teoria
populista - parlindo das premissas de soberania popular e de igualdade
politica - deduzimos com rigorosa 16gica que a unica regra processual
compativel com essas duas metas e 0 principio da maioria. Transformando
o "mais preferido" no equivalente ao "preferido pela maioria" ladeamos
deliberadamente urn problema crucial: 0 que acontecera se a minoria pre-
ferir sua alternativa muito mais ardentemente do que a maioria prefere a
alternativa contrana? Fara ainda sentido 0 principio da maioria?
Coloca-se aqui 0 problema da intensidade. Con forme podemos enten-
der facilmente, intensidade e quase uma moderna versao psicol6gica dos
_direitos naturais. Da mesma forma que Madison acreditava que 0 governo
deve ser construido de modo a impedir que maiorias usurpem os direitos
naturais das minorias, urn Madison moderno poderia argumentar que ele
deveria ser planejado para impedir uma maioria relativamente ap<itica de
~nfiar sua polilica pela goela de uma minoria de convicc;:6es relativamente
Intensas.
seriam desejaveis, mas, se pudessem ser formuladas, evidentemente solu-
cionariam urn problema que, de uma maneira ou de outra, perturba mui13s
vezes os te6ricos da democracia, particularmente nos Es13dos Unidos. A
inova~ao modema da ideia de Calhoun, de "maiorias coincidentes", cons-
titui 13lvez urn esfor~o para provar a necessidade de tais regras e a maneira
como elas poderiam ser elaboradas.
A segunda razao por que a compara~ao de intensidades de preferencias
e importante decorre do desejo de preyer a es13bilidade de urn sistema de-
mocratico e, quem sabe, mesmo elaborar regras que a garan13m. Como
ilustra~ao, suponhamos uma situa~ao bipolar simples em que os cidadaos
tern que escolher ou rejeitar alguma altemativa. Vamos presumir ainda que
fizemos urn cuidadoso inquerito de opiniao dos cidadaos, a fim de deter-
minar, ap6s excIuir os indiferentes e indecisos, as propor~6es dos que SaD
contra e a favor da polftica. Cada urn desses grandes grupos e, por seu tur-
no, subdividido entre os que sao fortemente, moderadamente ou ligeira-
mente a favor ou contra. Podemos imaginar agora seis diferentes tipos de
distribui~ao.
Primeiro, as opini6es podem ser preponderantemente a favor (ou con-
tra) a polftica, com 0 maior numero sentindo forte preferencia, como na
Figura 2. Ou pode ser predominantemente a favor (ou contra) a altemativa,
com 0 maior numero apenas ligeiramente a favor (ou contra), como na
Figura 3. Terceiro, as opini6es podem ser mais ou menos igualmente divi-
didas a favor e contra, mas com os numeros preponderantes preferindo ape-
nas ligeiramente sua altemativa, como nas Figuras 4 e 5.
Ora, na organiza~ao social poliarquica que utiliza a Regra durante 0
processo de escolha da politica, nenhuma dessas distribui~6es ocasiona
problemas serios. Na medida em que es13mos interessados em inten-
sidades, a aplica~ao da Regra nao e eticamente repugnante3 nem e provavel
que acarrete instabilidade.
Embora os dados sejam, na verdade, muito fragmentcirios, constitui
uma hip6tese razoavel dizer que a opiniao sobre grandes quest6es nas poli-
ar~uias esmveis tende a variar entre esses quatro grupos. Assim, em respos-
13a pergun13 "Voce acha que faria mui13 diferen~a para 0 pais se dcmo-
cra13s ou republicanos ganhassem a elei~ao ... ou que nao faria muita dife-
ren~a qualquer que fosse 0 lado vencedor?", numa amostra nacional de
pessoas entrevistadas nas semanas anteriores a elei~ao de 1952, cerca de
apenas urn quinto julgou que faria mui13 diferen~a, ao passo que quase urn
ter~o pen sou que nao teria a menor importancia. As respos13S estiio distri-
bUid~s mais ou menos como em nossa distribui~ao hipotetica na Figura 5.
Isto e, a elei~ao de 1952 foi evidentemente urn caso de desacordo mode-
rado, assimetrico (ver Fig. 6). Nessa pesquisa, como em muitas outras, con-
tUdo, 0 fraseadoda pergun13 faz uma grande diferen~a. Por isso mesma,
quando foi fei13a pergun13 "Voce diria que se importa pessoalmente muito
Infelizmente nao e facH definir intensidade. Como defini~ao preliminar,
poderfamos dizer ue e 0 rau em ue oilli!ividuo_ uer ou"prefere alguma
altemativa.! Se, contudo, queremos nos restringir aquilo que podemos
o rvar, 0 que concordaremos em en tender quando dizemos que A prefere
x a y? Se A e Jones, x "a companhia das louras" e y "a companhia das
morenas", temos que entender que, quando Jones tern oportunidade de es-
colher, escolhe louras e nao morenas. Ou, no minimo, alguma parte de seu
comportamento observado - neste caso, talvez, 0 que 0 proprio Jones nos
diz - permite-nos preyer que ele escolhera louras e nao morenas.
Note-se que nao podemos dizer 0 quanto ele prefere louras a morenas.
o proprio Jones nao precisa saber 0 quanto prefere umas as outras. Ainda
assim,o fato basico de que nao podemos medir a intensidade de suas prefe-
rencias cria alguns problemas interessantes e, na verdade, serios para a
teoria democmtica. Isto porque, se nao podemos medir 0 quanto Jones pre-
fere louras a morenas, ou 0 quanto Smith prefere 0 inverso, 0 que podemos
possivelmente entender quando dizemos que 0 primeiro prefere as louras e
o segundo as morenas? Surpreendente como possa parecer, no caso geral
(se nao neste caso especffico), a questiio e altamente incomoda.2 Pois de
que maneira poderemos jamais saber que alguma minoria prefere mais
intensamente sua altemativa do que acontece com a maioria? Sera acaso
destituida de sentido a antitese entre a minoria intensa e a maioria apcitica?
Poder-se-ia argumentar que, mesmo que a antitese nao fosse destituida
de sentido, seria irrelevante. Ainda assim, ha duas raz6es pelas quais seria
impor13nte estimar intensidades - porque poderiamos querer saber se um~
altemativa e apenas Iigeiramente preferida por uma maioria e intensamente
rejeitada por alguma minoria.
A primeira razao e de carater essencialmente etico e nem todos con-
cordarao com sua importfmcia. Suponhamos que A prefefe x a y, B prefere
y a x e a escolha de uma excIui a outra. A maioria de nos ~ostaria de .sa~r
se A prefere mais x a y do que B prefere y a x. Sendo JgUaISas demms Clf-
cunstancias, muitos de nos quereriam que A tivesse sua altemativa como
vencedora, se sua preferencia fosse muito mais intensn. Claro, freqiiente-
mente, as demais circunstancias nao sao as mesmas e neste caso 13lvez
queiramos ignorar as intensidades. Mas se 0 resultado e, a parte isso, uma
questiio indiferente, pareceria justo estabelecer a regra que 0 individuo com
preferencia mais intensa deveria ganhar. .
Se esta em jogo uma decisao coletiva, envolvendo vota~ao, sena pos-
sivel elaborar regras no sentido em que uma maioria apatica, preferindo
apenas Iigeiramente uma altemativa, nao deveria predominar sobre uma'
minoria que prefira forte mente outra? Nao tentarei provar que essas regras
com 0 partido que ganhar a elei~ao presidencial neste outono, ou pouco lhe
importa que partido ven~a?", muda a distribui~ao (ver Fig. 7). U~ pouco
mais de urn quarto disse que "se importava mUlto" e apenas urn OItavOde-
clarou que "nao se importava absolutamente". Contudo, os ~oderados. q~e
"se importavam urn pouco" (39%), juntamente com os rel.auvament~ l~di-
ferentes que nao se importavam muito ou em absoluto, ronda consutUlam
mais de dois ter~os do total. Parece provavel que a primeira pergunta for-
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A - FORTEMENTE
B - MODERADAMENTE
C - LEVEMENTE
ABC
-AFAVOR-
Fig. 2 - Consenso forte com prefe.rencias fortes
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A - FORTEMENTE
B - MODERADAMENTE
C - LEVEMENTE
neceria uma base mais segura para preyer possivel descontentamento ap6s
a elei~ao do que a segunda, mas como, em ambos os casos, a propor~ao nos
extremos aumentou, deveriamos esperar que a aceita~ao tranqiiila do resul-
tado da elei~ao se tomaria cada vez menos provcivel.
Isto e, vamos supor que cada lade vem a considerar a vit6ria do outro
como uma amea~a seria a alguns valores altamente estimados. Na decada
anterior a Guerra Civil americana a Iota sobre 0 destino a ser dado as terras
30
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A - FORTEMENTE
B - MODERADAMENTE
C - LEVEMENTE
ABC
-A FAVOR-
A - FORTEMENTE
B - MODERADAMENTE
C - LEVEMENTE
ABC
-AFAVOR--
Fig. 5 - Desacordo moderado: assimetrico
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E5 10a...
A - MUITA
B - ALGUMA, POUCA
C - NENHUMA
ABC C B A
PREFEREM EISENHOWER PREFEREM STEVENSON
Fonte: Angus Campbell, Gerald Gurin e Warren E. Miller, The Voter Decides, p. 38,
Tabela 3.9. A resposta "Depende" nao passou de 1 por cento em cada categoria.
"Nao sabe ou nao tem certeza" variou de 4 a 11 por cento. Ambas estao ausentes
na figura 6.
Fig. 6 - Prefer~ncias dos eleitores no pleito presidencial de 1952. Respostas a
pergunta "Voce acha que seria muito diferente para 0 pais se ganhassem as
elei~oes os Democratas ou os Republicanos ... ou nenhum dos do is faria
diferen~a?
do Oeste tomou-se cada vez mais intensa. Conquanto no com~o dessa de-
cada aziaga solur,:5es conciliat6rias ainda fossem possiveis, ao seu termino
nenhuma acomoda~ao aceit<:ivelp6de ser encontrada. Isto porque tomara-
se cada vez mais claro para os lideres sulistas que, se a escravidao fosse
proibida nos territ6rios, e essas enorrnes areas se incorporassem a Uniao
como estados livres, estes, com 0 passar do tempo, controlariam a politica
publica e alterariam a pr6pria Constituir,:ao. Para serrnos exatos, mais tarde,
muitos autores concluiriam que a instituir,:ao da escravatura teria sido anti-
economica nos territ6rios do Oeste e, por conseguinte, nao poderia ter
sobrevivido neles ou taIvez mesmo no Sui. Mas 0 relevante aqui e que nu·
merosas pessoas no Norte evidentemente acreditaram que se a escravatura
fosse perrnitida nos territ6rios isto alteraria 0 equilibrio politico contra os
estados Iivres e, em ultima analise, frustraria a pressao crescente por terras
isentas de escravidao. Dessa maneira, qualquer eleir,:ao interpretada como
uma nitida vit6ria de urn lado era certarnente tao intoleravel para 0 outrO
que ele recusaria aceitar-Ihe 0 resultado. Achamos que, em 1860, ocorreu
A - MUlTO
8- UM POUCO
C- NAOMUITO
D-NADA~
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DeB A
PREFEREM STEVENSON
Font:: Campbell et aI, op. cit. As respostas tabuladas como "Depende" e "Nao sabe
au nao tem certeza" nao chegaram a 5 por cento nas tres categorias e fica ram
ausentes da flgura 7.
Fig. 7 -, P.r~ferencias dos eleitores no pleito presidenciaf de 1952. "Voce diria
que a vJt?r1a de.um o~ de outro partido nesta elei~ao tem significado pessoal
para voce, ou nao Ihe Importa muito qual deles veneer?"
uma eleir,:a? assim. Nao significa isto que numerosos eleitores consideras-
scm preemmente essa questao quando foram as umas, pois e inteiramente
possl~el que e~a tenha si~o decidida principalmente com base em outras
qucstoes ~u~ nao a e~c~avldao e as terras livr.es. Nao obstante, ela precipi-
tou uma se~lCde declsoes, cada uma das qualS evidentemente excluiu cer-
tas al~matJvas. Por volta da primavera de 1861, elas estavam rapidamente
reduzmdo-se a urn pequen~ ~umero, todas as quais eram intoleraveis para
urn, dos ~ados. A Guerra CIvIl talvez nao tenha sido inevit<:ivel. Mas uma
poh~qUla est<:ivelincluindo 0 Norte e 0 SuI havia se tornado aitamente im-
provavel.
A resistencia a apIica~ao da regra da maioria pode assumir varias
f?rm~, dependend? do tamanho relativo da minoria derrotada e da maioria
VItonosa, su~ I~allzar,:ao geografica, seu acesso aos recursos, seus siste-
mas ~e convlcr,:oes e a nat~eza. das questoes que as separam. A Rebeliao
d~ Uisque, por exemplo, nao fOi uma revolur,:ao, mas apenas uma resisten-
cIa aos coletores de Impostos. Outra possibilidade e urn coup d' erat como
aconteceu na Espanha com Franco, na Checo-Eslovaquia com os comunis-
~? OUna Franr,:a com Louis Napoleon. A secessao e uma terceira possi-
blhda~e. ~odemos mesmo inc,l~ir a aceitar,:ao aparente e a rejeir,:ao secreta
da Icgttlmldadeda ordem polItlca como quarta possibilidade. De qualquer
pectos do si~tema politic? americano que modificam a opera~ao direta da
regra da malOna sao de Importancia fundamental na solu~ao de silua~6es
deste tIpo.
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A - FORTEMENTE
B - MODERADAMENTE
C - LEVEMENTE A - FORTEMENTE
B - MODERADAMENTE
C - LEVEMENTE
ABC
-AFAVOR--
Fig. 8 - Desacordo serio: simetrico
modo, nos easos em que urn lade e numeroso e considcra a vit6ria do outro
como grande amea~a a valores altarnente apreciados, e razoavel esperar
difieuldades serias na conlinua~ao de urn regime poliarquico.
Este easo e sugerido na Figura 8. Quando alguma coisa que se apro-
xima dessa distribui~ao persiste, nao e provavel que nenhuma maquinaria
constitueional garanta a apliea~ao da rcgra. A sua rejei~ao pode surgir sob
a recusa em aceitar 0 imperio da lei, a revolu~ao, a secessao, a retirada da
legitimidade antes conferida ao govemo poliarquico, ou outros meios. E
podemos ter certeza do seguinte: 0 sistema de con troles recfprocos da
Constitui~ao madisoniana nao impediu uma das mais sanguinolentas guer-
ras civis da hist6ria do homem ocidental. Nenhum dos numerosos remedios
constitucionais sugeridos na epoea revelou-se aceimvel e mesmo em re-
trospecto e impossivel descobrir uma solu~ao puramente eonstitucional
para 0 que era urn eonflito social profundamente enraizado.
Por eonseguinte, embora as primeiras quatro distribui~oes nao eriem
problemas especiais para as poliarquias, podemos dizer que a da Figura 8
situa-se alem de sua capacidade de as solucionar. Ela, portanto, pode ser
ignorada tarnbem na discussao que se segue. Nao obstante, e utiI escla-
recer, com base na distribui~ao da Figura 8, urn tipo de desacordo muito di-
ferenle, iSlOe, 0 caso em que uma grande minoria sente forte preferencia
por uma de duas altemativas e a maioria contraria exibe apenas ligeira pr~-
ferencia pela outra (ver Fig. 9). Se ha algum easo que podena ser consl-
derado 0 anaIogo modemo do conceito implicito de tirania de Madison,
acho que e este. Na verdade, sustenta-se frequentemente que os varios as-
C B A
-CONTRA-
Fig. 9 - Desacordo serio: assimetrico
Sug~rimos acirna duas razoes por que seria util ao desenvolvimento de urna
teona de de~ocrac!a se pudessemos supor a existencia de alguma maneira
de comparar mtensldades de preferencia. Mas existe acaso tal meio?
Se por "intensidade" entendemos,as sensa~oes de outra pessoa, entlio
estamos, derrotados desde 0 eom~o. E 6bvio que nao podemos nunea ob-
servar dueta.mente as sensa~oes de outro individuo. 0 que quer que experi-
m~ntemos dlreu:mente ou observemos por introspec~ao sera sempre nossas
propnas s~nsa~oes. De nenhuma manelra eoneebivel, portanto, podemos
observar duetamente e comparar a intensidade das prefereneias sentidas
por outr?S individuos. Mais do que isso: uma vez que nunea podemos ob-
servar dlretamente as sensa~oes dos demais, tampoueo podemos trata-las
como variaveis observaveis com as quais, dado urn numero sufieiente de
casos, poderiamos e0n:.el~eionar mudan~as em expressao facial, palavras,
POslura ou mesmo a qUlmlea do corpo. Podemos eorrelacionar estas com as
~aIavras que nosso sujeito usa a respeito de suas sensa~oes, mas estas em si
e~m~ sempre nos escaparao. Podemos e de falo poslulamos que os de-
~als lem sensa~oes, mas nao podemos observa-las diretamenle. Neste sen-
tI?O,de medir intensidades de sentimentos ou sensa~6es, eareee de senlido
dlZer que A prefere x a y mais do que B prefere y ax.
Ainda assim, quase todos continuamos a dizer isso e a acreditar que
faz sentido. Discutiremos se Ellen realmente quer mais seu vestido do que
Peter quer seu "Transformer" ou Eric sua bicicleta e nem por urn momento
duvidaremos que a discussao faz sentido. Continuamos a acreditar que nao
s6 podemos formar palpites inteligentes mas tambem palpitar inteligente-
mente sobre essas coisas. Acho que 0 funago do significado e encontrado
na suposi~ao de que as uniformidades que observamos nos seres humanos
podem ser transportadas, em parte, para as nao-observaveis, como senti-
mentos e sensa~6es. Supor que a sensa~ao e aut6noma e nao seguramente
ligada a comportamento visfvel parece mais arbitrario e menos sensato do
que 0 postulado alternativo. Em certo sentido, estamos negando que todos
os indivfduos sejam excepcionais, unicos, e, por conseguinte, incognosci-
veis. Estamos presumindo que ha uniformidades. Pretendemos ainda que
algumas uniformidades no comportamento aparente sac aproximadamente
associadas com outras nos estados interiores, embora logo cheguemos a
conclusao de que uma vida inteira sera insuficiente para examinar todas as
sutis rela~6es entre 0 comportamento observavel e a vida interior que pos-
tlliamos nos demais.
Entre todos os tipos de comportamento aparente que observamos, es-
colhemos alguns como possfveis criterios de mensura~ao. Mas ainda quan-
do aplicamos cada urn deles com 0 maior cuidado, no fim nao podemos
ainda escapar do fato que nao sabemos se esses criterios realmente medem
a intensidade das sensa~6es, Contudo, uma vez que temos que fazer algu-
ma coisa, n6s os usamos como palpites ou postulados. Em seguida, tenta-
mos reduzir uma situa~ao de escolha a esses criterios considerados como
postulados. Se grandes discrepfmcias surgem em nossos criterios, con-
clufmos que as intensidades diferem.4
Suponhamos que urn grupo de cidadaos em uma cidade quer mais es-
colas, mesmo que isso signifique impostos prediais mais altos para si mes-
mos, e outro os quer baixos, mesmo que isto signifique escolas congestio-
nadas. Os membros de ambos os gropos, suponhamos, acham que tern uma
possibilidade de 50-50 de vit6ria em uma reuniao dos eleitores do munici-
pio se nao fizerem nada antes do encontro. Vamos presumir ainda que os
propugnadores de mais escolas sacrificam tempo, energia, lazer e conve-
niencias para tomar sua plataforma conhecida. Os discursos e as maneiras
se caracterizam por tensao, frustra~ao, irrita~ao, raiva, ansiedade. Os parti-
darios dos impostos mais baixos, contudo, estao tranqiiilos e mesmo apa-
tieos e se ouviu quando disseram privadamente que 0 aumento dos im-
postos nao vai lhes causar dificuldades, mas que acham que devem pro-
testar, quando nao para evitar que 0 pessoal da Associa~ao de Pais e Pro-
fessores domine a cidade. Acho que quase todos n6s concluiriamos que,
embora certo numero de explica~Oes alternativas se apresentem (tal como a
possibilidade de que os defensores das escolas gostem realmente de agitar
e organ~zar movime,ntos), nao seria absurdo dizer que 0 grupo da APP pre-
fere ,millS escolas a Impostos baixos do que seus adversarios preferem bai-
xos Impostos a escolas.
De nossa discussao ate agora achamos que vwas conclusoes se
sugerem:
~ maioria parece acreditar que podemos fazer compara~Oes de inten-
sldades.
Fazemos i,sso postu!ando certos tipos de comportamento aparente
como ~edldas aproxlmadas das intensidades.
Mas naoyodemos f~zer m~s do que postular. Nao podemos nunca ob-
ser~ar _dlfetamente mtensldades sentidas de vontade ou preferencia.
Dal, nao podemos nunca saber 0 que 0 comportamento visivel que
usamos como criterio realmente mede, a menos que me~a outros tipos
de comportarnento visivel.
Mesmo nas melhores ,c~r~unstfmcias, em que uma grande variedade de
nos~os p~stulados ~ntenos ~arecem revelar diferen~as aproximadas
e~ ~ntensldade senllda, exp1Jcar;Oesalternativas sao geralmente plau-
SlvelS.
Nao _ob~tante, a "intensidade" pode ser definida simplesmente com
referenCla a alg~ma ~ear;ao observavel, como a declara~ao do que a
pessoa sente, a dlSpOSlr;aode renunciar ao lazer ete
S: ,a int~nsid~de e restringida a rea~Oes obse~ave;s, enta~, em prin-
CIP~O,a mtenSldade de A pode ser com parada com a de B.
Se IStOe ou nao e uma solur;ao satisfat6ria do problema da intensidade
contudo, dependera do tipo de decisao que formos chamados a tomar. '
, ~ que dizer, enta~~ a res~eito de nossos dois problemas? Quanto ao
~nme~ro, 0 pr,ob~ema ellco, eVldentemente 0 tipo de intensidadeem jogo e
sentIda. Dill, ~lgorosamente falando, nao podemos elaborar metodo ne-
n m para medlf ou comparar intensidades diferentes nesse sentido S6 se
~on~ordarm?s, em ,considerar algum comportamento observavel' como
~ulVaiente a mtensldade ,sentida, pod~rem~s absolutamente com~ar a tra-
do problema. Mas mUltas pessoas mdubltavelmente julgarao que neste
caso, a solu~ao do problema com que com~amos realmente nos esc~pou e
q~e 0 emp~ego do comportamento visivel apenas da como verdadeiro 0 que
amda preclsa ser provado (peti~ao de principio).
r Nosso segu?do problema, 0 da estabilidade, e de tipo diferente. Isto
: que ,e~tamos mteressados em saber como pessoas se "sentem" no siste-
!'OlitIco apenas para podermos preyer como possivelmente agirao Se
e~dessemos preve~ como elas provavelmente agiriam, com base em ob~er-
r;6es de outros tIpos de comportamento visivel, enta~ nao precisariamos
nos preocupar com a situar;:ao, se realmente sabemos como elas se sentem.
Em princfpio, enta~, 0 problema parece capaz de solur;:ao,5embora valha a
pena deixar registrado aqui que a ciencia social ainda nao tratou dele de
maneira satisfat6ria. A questiio de como a estabilidade varia em um sistema
democnitico com as diferentes distribuir;:6cS de prcferencias e intensidades
e uma questao quase virgem de estudo, salvo talvez em uma forma alta-
mente especulativa.
r;:oes,pelo me~os de m~neira aproximada?6 Uma vez que, para comer;:ar, e a
Regra da teona popuhsta que cria 0 problema, caberia talvez pensar que
uma solu~ao poderia ser encontrada numa especie de posir;:ao neomadi-
SOnIan~. A: pergunta "De que modo podemos impedir que uma maioria
q,uas.e I~dlferente Imponha suas preferencias a uma minoria com prefe-
renCIaSmtensas?", a teoria neomadisoniana poderia ser formulada mais ou
menos nestes term os:
Em primeiro lugar, atraves de regras constitucionais estabelecidas, su-
plc~entadas por pniticas e procedimentos organizacionais em fases cru-
c~als do processo decis6rio - nos partidos politicos, eleir;:oes, atividade le-
glsl.aLIvae recurso ao judiciano, por exemplo - de maneira que uma mi-
nona mfluente, em qualquer uma dessas fases, possa vetar a altemativa
prefenda pela maioria.
Segundo, atraves de um sistema social de interesses tao diversificados
que seja improvavel 0 aparecimento de grave desacordo assimetrico.
.Examinemos rapidamente estas condir;:oes. Quanto a primeira, que ga-
ran~Ia fomece ela de que a quinta condir;:ao seria atendida - que 0 veto
sera usado apenas em casos de grave desacordo assimetrico?
Seria estimulante elaborar conjuntos altemativos de procedimentos em
um esforr;:o para descobrir se algum deles diferenciaria 0 caso de desacordo
assimetrico grave de todos os demais. Vamos, porem, contentar-nos com a
questao mais modesta de saber se 0 conjunto de procedimentos constitucio-
nais e politicos usados na tomada de decisoes no govemo nacional dos Es-
tados Unidos realmente se aplica para identificar esse caso. A unica manei-
ra de solucionar essa questao formidavel - se, na verdade, pudermos ab-
solutamente soluciona-la - consiste em fazer um breve exame de algumas
das disposir;:oes basicas e de seus beneficiarios. Voltaremos a este proble-
ma na ser;:aoV.
A s,eg~nda proposir;:ao t.em sido defendida de tres maneiras. A primei-
r~, a p.ropna defesa de MadIson, parece implicar que, dada uma suficiente
dlversldad~ d~ interesses e uma area geogrillica suficientemente ampla, ne-
nhuma maIOna pode ser organizada e tomada efetiva em decisoes nacio-
nai~. Se isto fosse verdadeiro, porem, nao seriam necessarias regras e pro-
cedlmentos adicionais: os con troles sociais recfprocos seriam 0 bastante,
sem acrescentar outros de natureza constitucional. A segunda linha de
def~sa, porem, desenvolve-se no sentido de que, embora um sistema social
d.e mteresses diversificados tome muito diffcil organizar maiorias per-
Slst.entes, n~o as tom~ de fato impossiveis. Por conseguinte, uma garantia
mals f?rte e ~roporcIOnada contra a tirania da maioria se con troles pro-
cess~a~s. suficlentes forem acrescentados, de modo que qualquer maioria
p.r?VIsona se esfacelara contra sucessivas barreiras constitucionais e po-
1I1IC~.~qui, mais uma vez, temos que perguntar se essas barreiras cons-
lItucIOnaIS separam dos demais 0 caso de grave desacordo assimetrico ou
Suponhamos agora que:
1. Podemos, de algum modo, determinar intensidades visiveis, isto e, de-
rivar uma esp6cie de "escala de intensidade" com base em com porta-
mento visivel que nos permitira preyer certos tipos de futura atividade
politica que influencia a estabilidade do sistema democnitico.
2. Existe um caso de "grave desacordo assim6trico"; isto e, uma maioria
prefere ligeiramente uma altemativa e uma minoria prefere fortemente
outra mutuamente exclusiva.
3. Desejamos elaborar um conjunto de regras ou procedimentos que fa-
cilitem a escolha entre as altemativas.
4. As regras devem levar em conta nao s6 os numeros de individuos -
como na regra pura da maioria - mas tambem a intensidade de suas
preferencias.
5. As regras devem aplicar-se de modo a permitir 0 veto da minoria a
maioria apenas nos casos em que uma maioria relativamente apatica
poderia, por operar;:ao da regra pura da maioria, vencer uma minoria de
desejos relativamente mais intensos. Isto e, a regra deve ser elaborada
de maneira a distinguir 0 caso de "grave desacordo assimetrico" das
demais distribuir;:oes e permitir apenas neste caso 0 veto da minoria.
Uma palavra a respeito desta ultima condir;:ao. Se uma decisao tomada
por uma mai\)fia relativamente indiferente contra as preferencias re.l~tiva-
mente fortes de uma minoria for considerada perigosa para a establhdade
(ou eticamente indesejavel), enta~ teremos que considerar tambem ~omo
perigosa (ou eticamente indesejavel) qualquer decisao em que, 1) a mmona
consegue 0 que quer bloqueando a maioria e 2) 0 numero de pessoas na
maioria com fortes preferencias e igual ou maior do que 0 numero delas na
minoria com preferencias igualmente fortes.
Sem necessidade de estabelecer um conjunto de condir;:oes ut6picas, e
possivel elaborar um conjunto de valores que atendam a essas especifica-
se elas beneficiam arbitrariamente algumas minorias as expensas de outras
ou de possiveis maiorias. S6 podemos chegar a uma conclusao a este res-
peito examinando os arranjos particulares e seus respectivos beneficiarios.
A terceira defesa, popular alias entre os cientistas politicos amenca-
nos,.recorre a hip6tese de filiac;:oescoincidentes e simultfuleas. Se a maiaria
dos individuos na sociedade se identifica com mais de urn grupo, enta~ h:i
alguma probabilidade positiva de que qualquer maioria contenha indivi-
duos que fazem causa comum, para certos fins, com a minaria ameac;:ada.
Membros da minoria ameac;:ada que preferem fortemente sua altemativa
tomarao seus sentimentos conhecidos desses membros da maioria provi-
s6ria que tambem, em algum nivel psicol6gico, se identificam com a mino-
ria. Alguns desses simpatizantes retirarao seu apoio a altemativa da mai-
oria e esta desmoronara.
Embora, tanto quanto sei, nada senao a evidencia mais fragment<iria
exista para esta hip6tese engenhosa, ela e altamente plausivel e tenho espe-
ranc;:ade que antes que se tome urn axioma incontestavel da ciencia politica
americana seja pelo menos examinada com algum rigor empirico. Para
nossas finalidades, e importante notar que se a hip6tese e verdadeira, enta~
em todos os casos a' que se aplica nem regras nem procedimentos adicio-
nais sao necessarios. Se, contudo, houver casos de desacordo assimetrico
grave aos quais nao se aplique, sera correto perguntar se 0 conjunto par-
ticular de regras e procedimentos que constituem a politica americana pro-
porciona uma soluc;:ao.Passemos agora a esta questao.
ele podia indignar-se com 0 poder de minorias quando pensava no grande
estado da Virginia no mesmo pe que Delaware no Senado, desde que suas
finas distinc;:6es eram, no fundo, arbitrarias, tomou-se inevit<ivel que seu
argumento geral, com a passagem do tempo, adicionasseestatura a tadas as
defesas contra a regra ilimitada da maioria que era incluida e embutida na
Constituic;:ao. ,
A revisao judicial tern sua extrema importfulcia nas dificuldades de
alterar a Constituic;:ao por emenda forma!. Como e bem sabido, urn terc;:o
mais urn dos membros votantes de qualquer das casas do Congresso pode
impedir a passagem de uma emenda. E, se ela ultrapassa esta barreira, urn
quarto mais urn dos estados podem veta-Ia. Em consequencia, se 0 Supre-
mo Tribunal veta legislac;:ao apoiada mesmo que par maioria substancial do
eleitorado, nao se segue absolutamente dai que a maioria deSapOnk'lda po-
de, enta~, emendar a Constituic;:ao. Reciprocamente, se ela permitisse e-
mendas faceis por iniciativa de maiorias, desapareceria tambem a maioria
das vantagens da revisao judicial preconizada por seus defensores. Por isso
mesmo nlio podemos considerar a revisao como independente do pader de
apresentar emendas.
Embora raramente possamos ter certeza de que a maioria do eleitorado
e realmente favoravel a uma dada politica controversa, no caso da legisla-
c;:aosobre trabalho infantil, a indicac;:ao de que a maioria queria uma le-
gislac;:aode ambito nacional era ta~ convincente como a que provavelmente
poderfamos querer. Em 1916, urn Congresso dominado pelos democratas
aprovou a primeira lei de trabalho infantil na hist6ria da nac;:aopor urn voto
de 337-46 na Camara e 51-12 no Senado. Dois anos depois, 0 Supremo
Tribunal declarou inconstitucional a lei por uma votac;:aode 5-4. Dentro de
oito meses, urn Congresso recem-eleito com maioria republicana aprovou
nova lei de trabalho infantil por 312-11 votos na Camara e 50-12 no
Senado.7 Tres anos depois, 0 Supremo Tribunal, mais uma vez, declarou-a
inconstitucional por uma votac;:ao de 8-1. Em vista disso, uma emenda a
Constituic;:ao foi apresentada ao Congresso. Em 1924, ela passou na Ca-
mara por uma votac;:aode 297-69 e no Senado de 61-23. Apos algumas re-
jeic;:oesiniciais e de algumas regressoes subsequentes, doze anos depois os
legislativos de 24 estados, com mais de 50% da populac;:ao dos Estados
Unidos, aprovaram a emenda. Em 1938,28 estados, com 55,6% da popu-
lac;:ao,referendaram-na.8 Nesse ano, 0 Congresso votou a Lei de Praticas
Trabalhistas Justas, que incluia disposic;:6es proibindo 0 trabalho infanti!.
Em 1942,0 Supremo Tribunal sustentou-Ihe a validade. Dessa maneira,
empregando todos os testes que podemos provavelrnente usar, parece cor-
reto dizer que, durante mais de 20 anos, a maioria legislativa manifestou-se
favoravel a uma legislac;:ao sobre 0 trabalho infantil e, conquanto a infe-
rencia seja mais duvidosa, e prov:ivel tambem que a maioria do eleitorado
pensasse da mesma maneira. Ainda assim, por que uma minoria de
Entre as claras disposic;:oes constitucionais com que concardam os ameri-
canos, tres se sugerem por si mesmas como possiveis soluc;:aes de nos so
problema. A primeira e a revisao judicial da legislac;:ao, combinada com 0
veto da minoria a emendas constitucionais. A segunda toma a forma da
estrutura do Senado. A terceira consiste em certas relac;:oes entre 0 Presi-
dente, as duas casas do COllgresso e 0 eleitorado. Neste capitulo, examina-
remos apenas as duas primeiras. .
Vale observar aqui que todas as tres disposic;:aes sao em geral defendi-
das por urn estilo de argumento ta~ fundamentalmente madisoniano que, ao
longo de todos estes ensaios, denominei-as comv tais. Nilo obstante, na
convenc;:ao 0 pr6prio Madison combateu fortemente a igual representac;:ao
dos estados no Senado, mesmo que finalmente aquiescesse como unica
soluc;:aoconciliat6ria possivel; e suas sugest6es para revisao constitucional
previam urn conselho de revisao que poderia ser derrotado por voto sim-
ples de maioria do Congresso. Ainda assim, ha certa justic;:aem chamar de
madisoniano lodo 0 sistema de I!mitac;:oesconstitucionais. Isto porque se
legislativos nacionais e, provavelmente, uma minoria do eleiLOrado, tinham
o apoio de decis0es do Supremo Tribunal, puderam vetar efetivamenle
legisla~ao sobre 0 trabalho infanti!.
o poder de velo do Supremo Tribunal a legisla~ao aprovada pelo Con-
gresso proporcionara por acaso uma solw;ao ao nosso problema de de-
fender uma minoria de preferencias inlensas de uma maioria apalica?9
Cabe dizer, de infcio, que os defensores do Supremo nao estabelecem essa
distin~ao. MuilO ao contrario, na opiniao do Supremo e de seus defensores,
e precisamenle contra a inlensa maioria legisladora que os direilos das mi-
norias devem ser defendidos. Joseph Choale enunciou uma conce~ao co-
mum do correlO papel do Supremo quando, duranle seu ataque ao imposlo
de renda em 1895, afirmou:
... Se e verdade, como disse meu culLo amigo em sua perora~ao, que as
paix5es do povo foram despertadas por eSle assunto, se e verdade que
urn poderoso exercito de 60 milh5es de cidadaos ficara provavelmente
irritado com esta decisao, mais vital ainda e para 0 bem-estar fUluro
deste pais que este Tribunal, mais uma vez, resoluta e corajosamente,
declare, como fez Marshall, que tern 0 poder de derrogar uma lei do
Congresso que viole a Constilui~ao, e que nao hesitara em fazer valer
esse poder, nao importa quais possam ser as amea~adoras conseqiien-
cias da ira popular ou populista.10
Nao obstanle, sera razoavel dizer que 0 processo de revisao judicial de
legisla'Yao de ambito nacional tern de fato assegurado prole'Yao eficaz a
minorias com intensas preferencias contra as usurpa'Yoes de maiorias apa-
lieas e, ao mesmo tempo, nao impedido maiorias de preferencias relativa-
mente intensas de realizarem seus objetivos? Se fosse assim, 0 Supremo
conslituiria uma excelente solu'Yao do problema do grave desacordo assi-
metrico.
Ora, e claro que nao ha como resolver essa queslao a menos que
possamos, em primeiro lugar, estabelecer uma distin'Yao entre maioria apa-
tica e fortemente inleressada. Mas de que modo podemos fazer isso? Em
primeiro lugar, de que maneira podemos ter certeza do que conslilui a pre-
ferencia da maioria? Ale bem pouco tempo nao tinhamos pesquisas de
opiniao - ou pelo men os nao de carater cientifico. Na ausencia de pes-
quisas de opiniao cientfficas no perfodo pre-eleitoral, 0 voto popular depo-
sitado em elei'Yoes nacionais pouco indica, urna vez que as quest5es abor-
dadas nas campanhas san sempre tao complexas que apenas atraves das
mais absurdas inferencias poderfamos relacionar a percentagem de vows
diretamente para Presidente com, digamos, uma ~a especffica de legis-
la'Yao.llSe mesmo hoje - com as tecnicas refinadas de consulta da opiniiiO
publica que temos - nao podemos absolutamente ter certeza da impor-
Umcia relativa das vanas quest5es, candidatos e habitos de vota'Yao na
elei'Yao imediatamente precedente, 0 quanto mais isto teria se aplicado a
elei'Y0es realizadas h3 uma gera'Yao ou h3 urn seculo?
Acredito, por isso mesmo, que no presente s6 em raros casos podemos
falar com alguma seguran'Ya sobre preferencias de maioria em elei'Y0es
nacionais das decadas anteriores. Geralmente tudo 0 que podemos dizer
corretamente e que determinada legisla'Yao foi aprovada ou derrotada em
cada C~sa por um~ dada percentagem de votos e promulgada ou vetada pe_
l? Pres.ldente. Por ISSOmesmo, no que se segue, falaremos apenas da maio-
fla leglsladora no sentido muilO resLrito que acabamos de indicar isto e
um3 maioria de membros votantes de ambas as Casas, mais a aqui;scenci~
presidencial.
. Se e dif~cil determinar as preferencias da maioria em uma p~a espe-
cfflca de leglsla'Yao, mais diffcil ainda e apurar se a hipoletica maioria foi
relalivamente inlensa em suas preferencias ou apalica. Talvez 0 unico teste
dis!JOnf~el seja a extensao e'!1 que foram feitos esfor'Yospara reapresentar a
leglsla'Yao, emendar a COnStItUl'Yao,alterar a jurisdi'Yao do Supremo Tribu-
nal, nomear jufzes manobraveis para 0 Supremo ou de qualquer outra ma-
neira ~onseguir urn novo resultado. Neste sentido limitado apenas, pode-
mos dlZer corretamente que as maiorias legisladoras favoraveis ao imposto
de renda ou contra 0 trabalho infantilprovavelmente nao foram apaticas.
No mesmo sentido restrito caberia falar de uma minoria legisladora,
sem saber sempre se expressa apenas preferencias de minoria entre 0 elei-
torado, e tentar verificar a intensidade de suas preferencias pelas atividades
e persistencia que desenvolve.
E mais do que claro, lamento dizer, que quando nos restringimos ape-
nas a inferencias seguras, nao podemos falar com muita confian'Ya de nosso
problema. Esta e, na realidade, talvez a conclusao mais importante a que
podemos chegar. Isto porque, se estamos a procura de urn conjunto de pro-
cedimentos que prolejam minorias de fortes preferencias contra maiorias
apaticas, se urn desses possfveis conjuntos e defendido por apelo a expe-
ricncia passada, e se esta e mostrada como inaplicavel porque nao podemos
Inlerprelli-Ia com seguranc;:a, enLao somas forc;:adosa considerar as lentati-
vas de defende-Ios como, principalmente, preconceitos arbitrarios.
Nao obstante, talvez seja ulil verificar que conclusoes provis6rias po-
demos tirar de nossa expericncia hist6rica com a Supremo Tribunal. Ao
longo de toda a sua hisl6ria, a Supremo considerou legisla'Yao aprovada
pelo Congresso como inconstitucional em 77 casosY Em quase urn ter'Y0
desses casas, os objetivos da legisla'Yao foram subseqiientemente atingidos
par outros meios; em urn quinto dos casos, a a'Yaosubseqiiente ocorreu em
quatro anos ou menos.13 Em pclo menos quatro casas, foram precisos mais
de 20 anos. 0 caso mais extrema de veto judicial e a da legisla'Yao sobre
lrabalho infantil, quando transcorreu urn intervalo de 26 anos entre a a'Yao
da primeira maioria legisladora e a aqui~scencia final do Supremo. A legis-
la~ao nacional sobre indeniza~6es a estivadores e a trabalhadores de portos
em geral precisou de 25 anos e de tres leis diferentes. uma por um Con-
gresso democrata em 1917, outra por um republicano em 1922 e a tercelra
por outro Congresso com maioria republicana em 1927. A ques~o do Im-
posto de renda s6 foi resolvida depois de 19 anos, duas leis dlferentes e
uma emenda a Constitui~ao.14
Nos restantes dois ter~os dos casos em que os objetivos nao foram
posteriormente alcan~ados por outros meios, um numero considefllvel en-
volveu legisla~ao de natureza temporfuia e grande numero implicou aspec-
tos essencialmente banais ou secundfuios de legisla~ao. Nao ha, acho, caso
conhecido em que uma maioria legis ladora persistente nao tenha, mais ce-
do ou mais tarde, conseguido 0 que queria.
As grandes vantagens da maioria legisladora persistente estiio na ve-
Ihice e na morte. 0 Supremo Tribunal perdura; os ministros sao simples
mortais. Na hist6ria do Supremo, em media, um novo ministro e nomeado
a cada 23 meses. Em vista disso, a maioria legisladora tem possibilidade
razoavel de nomear dois novos membros em urn mandato presidencial e
quatro membros em dois mandatos. Mais de 30% de tados os ministros ser-
viram durante oito anos ou menos. A media e de 15 anos (ver Tabela 1).
Vma vez que 0 Presidente eo Senado examinam cuidadosamente as op!-
nioes dos indicados, e uma vez que eles sao geralmente membros do parh-
do dominante ou simpaticos ao seu programa, nao e de surpreender qu~,
mais cedo ou mais tarde, "0 Supremo Tribunal siga os resultados da elel-
~ao".150 surpreendente e que, em alguns casos, seja Laolongo 0 intervalo.
TABELA 1
Periodo de Exercicio no Cargo de
Ministros do Supremo Tribunal
Percentagem
AcwnuIada
1-4
5-8
9-12
13-16
17-20
21·24
25-28
29-32
33-36
9,2
21,8
14,9
14,9
8,1
11,5
9,2
5,8
....1.Q
100,0
9,2
31,0
45,9
60,8
68,9
80,4
89,6
95,4
100,0
Voltando ao problema com que iniciamos nossa indaga~ao, a que
conclusoes podemos razoavelmente chegar? Acho que a evidencia indica 0
seguinte:
I. Em cerca de dois ter~os dos casos em que 0 Supremo Tribunal consi-
derou inconstitucionallegisla~ao federal, podemos inferir que a maio-
ria legisladora nao sentia fortes preferencias. De qualquer modo, nao
realizou esfor~os subsequentes para atingir de outras maneiras os fins
da legisla~ao.
2. Mesmo nestes casos, contudo, nao temos maneira de saber se a mino-
ria protegida pelo Supremo sentia em algum senti do preferencias mais
intensas, a menos estejamos dispostos a dizer que, por defini~ao, levar
o caso aos tribunais constitui indica~ao suficiente de intensidade rela-
tiva de preferencias.
3. Em todos os casos restantes, ou cerca de um ter~o do total, os efeitos
do veto foram eliminados por outros meios - em um caso, por guerra
civil.
4. Em alguns desses casos, incluindo 0 do imposto de renda, do trabalho .
infantil, de indeniza~ao a trabalhadores, da regulamentalYao de horas
de trabalho e salarios para as mulheres e outros, porem, 0 Supremo
Tribunal retardou eficientemente uma maioria legisladora, aparen-
temente motivada por fortes preferencias, por ate um quarto de seculo.
Em vista disso, nao podemos concluir que um sistema de revisao judi-
cial com restrilYoes a emendas constitucionais seja um processo que efeti-
vamente impe~a que preferencias de minorias relativamente intensas em
seus desejos sejam vencidas por maiorias relativamente apaticas, sem que
ao mesmo tempo restrinja tambem maiorias relativamente intensas em suas
prefercncias - isto e, ele nao atende ao nosso quinto requisito. Nao po-
demos, enLaO, voltarmo-nos para 0 Supremo Tribunal em busca de uma
solulYao.
Provavelmente ninguem argumentou com maior poder de conviclYaocontra
a desejabilidade de representa~ao igual dos estados no Senado do que
James Madison na ConvenlYao constitucional. Ele disse praticamente tudo
o que poderia ser dito sobre a contradilYao fundamental entre 0 "princfpio
republicano" e a representa~ao igual nao de indivfduos mas de entidades
geograficas. No fim, aceitou a representa~ao igual como so]ulYaoconcilia-
t6ria necessaria para obter a adesao dos pequenos estados ao novo slst?ma
federal. E considerou a acomoda~ao como uma questiio nao de pnnClpIO,
mas de conveniencia desesperada. Com 0 transcorrer dos anos, a acomoda-
lYaode convenicncia foi convertida em princfpio e se utilizou a pr6pria teo-
ria politica de Madison para justifica-Io. A representar;ao igual no Senado,
argumenta-se, constitui urn expediente para proteger as minorias contra
maiorias tiranicas. No contexto destes ensaios, poderemos acaso interpretar
isso como significando que a representar;ao igual no Senado fornece uma
solur;ao ao nosso problema de grave desacordo assimetrico, quando uma
minoria de prefercncias relativamente fortes enfrenta uma minoria rela-
tivamente indiferente?16
Como no caso da revisao judicial, a tentativa de responder a essa per-
gunta na base da prova enfrenta obstliculos formidaveis. Torna-se logo cla-
ro que nao se aplicam mais os critcrios que usamos para estabelecer a dis-
tinr;ao entre intensidade de sentimentos e indiferenr;a relativa, e nao estou
absolutamente certo de que quaisquer outros possam ser descobertos. Ate
mesmo 0 trabalho de identificar situar;6es em que 0 Senado protege uma
minoria (presumivelmente contra politicas apoiadas pelo Presideme ou par
maioria de votos da Camara) torna-se muito dificil. Em vista disso, a unica
conclusao a que podemos chegar com certeza e que, quaisquer que possam
ser os fatos do caso, a tentativa de defender 0 Senado, como urn mecanis-
mo para resolver 0 problema da intensidade de preferencias, forr;osamente
tera que repousar sobre argumentos altamente duvidosos e incapazes,
mesmo na melhor das hipoteses, de despertar ate 0 acordo mais provisOrio.
Talvez a unica maneira de ir adiante seja examinando, tanto quanto
isto seja possivel, os tipos de minorias que saD em algum sentido "super-re-
presentadas" no Senado, a fim de descobrir, se pudermos, se igual repre-
sentar;ao de fato funciona para solucionar, ou pelo menos aliviar, 0 pro-
blema do desacordo assimetrico grave. Tres observar;oes, porem, precisam
ser feitas logo. Em primeiro lugar, 0 argumento em favor da igual repre-
sentar;ao dos estados no Senado parece repousar freqiientemente em uma
falsa equar;ao psicologica, na qual os pequenos estados saDequiparados a
"pequenos interesses" e pequenos interesses a pessoas "pequenas" e iner-
meso Nossos desejos humanitlirios de proteger pessoas relativamente iner-
mes de agressao de individuos mais poderosos saD dessa maneira invo-
cados em favor dos pequenos estados. Mas estados consistem em pessoas e
sao os interesses delas que nos interessam. 0 que queremos saber, portanto,
c que tipos de pessoas sao beneficiadas ou prejudicadas por igual repre-
sentar;ao no Senado.
Suponho que nao desejamos endossar 0 principio de que tados os pe-
quenos grupos de interesses devem ter pader de veto sobre a palitica. Isto
porque, neste caso, jamais poderiamos especificar qualquer situar;ao que
nao Fosse de unanimidade, na qual a maioria legisladora teria condir;oes
para agir. Dessa maneira, tornariamos impossivel nao so a aplicar;ao do
"principio republicano" mas do proprio governo. Os primeiros a exercer 0
poder de veto poderiam ser os quadrilheiros, os assassinos, os ladr6es -
em suma, a popular;ao de criminosos. Quanto a nos restantes, nao ficarfa-
mos muito longe: capitalislaS, trabalhadores brar;ais, agricultores, mesmo
professores universitlirios, os exploradores e os explorados, os sociais e os
anti-sociais, os donos de empresas que tiram 0 couro dos empregados, os
pelegos sindicais, os que fogem a convocar;ao para e servir;o militar, os
sonegadores de impostos e milhares de outros grupos que vetariam tambem
a politica publica. Antes de muito tempo, nao terfamos. mais "nem arIes,
nem letras, nem sociedade e, pior que tudo, viveriamos todos em medo per-
petuo e perigo de morte violenta, e a vida do homem seria solitliria, pobre,
vii, brutal e curta".
Em segundo lugar, temos que evitar tambem a falacia de supor que, se
o Senado representa ou super-representa algumas minorias situadas em
certas areas geograficas dos Estados Unidos, ele necessariamente 0 faz no
tocante a todas as localizadas nessas areas. Isto e manifestamente falso. Ha
minorias dentro de minorias. 0 grupo regional dominante pode ser repre-
sentado no Senado enquanto a minoria regional subordinada nao 0 e. Dai,
urn veto do Senado pode simplesmente preservar ou ampliar 0 controle do
grupo regional dominante sobre a minoria subordinada. Os negros do Sui,
os b6ias-frias do Oeste, os migrantes clandestinos do Sudoeste, nao saD
evidentemente minorias que se beneficiem com igual representar;ao no Se-
nado. E e born lcmbrar que mesmo em uma situar;ao de plena igualdade
politica, uma minoria regional protegida par representar;ao igual de unida-
des geogrlificas em urn corpo legislativo seria maioria na sua propria area e
que as minorias derrotadas nessa regiao nao seriam protegidas pela igual
representar;ao. Realmente, se a minoria na regiao consistisse em individuos
com preferencias semelhantes as da maioria em todo 0 elcitorado, a repre-
sentar;ao igual de areas geograficas, paradoxalmente, privaria essa minoria
regional de proter;ao em todos os casos em que ar;ao positiva do governo
Fosse necessaria para impedfr que a maioria regional a tiranizasse.
Em terceiro lugar, a representar;ao igual de unidades geograficas su-
per-representa algumas mirrorias concentradas em areas esparsas, mas sub-
representa as concentradas em areas densamente povoadas. Alcm do mais,
na medida em que nao e geograficamente concentrada, a minoria nao re-
cebe proter;ao per se da representar;ao estadual igual. Em uma sociedade
em que todas as minorias fossem distribuidas em iguais proporr;6es entre
os eleitores de todos os estados, nenhuma del as receberia qualquer prote-
r;ao per se da representar;ao estadual igual. Por que, enta~, esse carinho
todo especial por minorias concentradas geograficamente em areas espar-
sas? Embora uma resposla historica perfeitamente aceitlivel possa ser en-
contrada, nao e uma resposta que se possa facilmente tornar racional como
solur;ao de nosso problema de desacordo assimetrico grave.
Se estamos interessados simplesmente na medida em que 0 eleitorado,
e nao toda a popular;ao, e representado, enta~ talvez seja mclhor classificar
os estados por numero de eleitores.17 Na Tabela 2 (p. 114), todos os estados
igualdade, diversidade e intensidade 115
TABELA 2 (cont.)
Eleitorado Percentagem Percentagem Indice de
Estadual* do Eleitorado Cumulativa vantagem**
Total
16. Alabama 342 0,59 6,51 3,5
17. Arkansas 361 0,63 7,14 3,3
18. Rhode Island 407 0,71 7,85 2,9
19. Louisiana 416 0,72 8,57 2,9
20. Virginia 447 0,78 9,35 2,7
21. Georgia 547 0,95 10,30 2,2
22. Nebraska 566 0,98 11,28 2,1
23. Colorado 606 1,06 12,34 2,0
24. Oregon 666 1,16 13,50 1,8
25. Tennessee 700 1,22 14,72 1,7
26. Florida 739 1,28 16,00 1,6
27. Kansas 824 1,43 17,43 1,46
28. Maryland 841 1,46 18,89 1,43
29. West Virginia 874 1,52 20,41 1,37
30. Oklahoma 933 1,63 22,04 1,28
31. Kentucky 951 1,66 23,70 1,26
32. Washington 1016 1,77 25,47 1,18
33. Connecticut 1093 1,90 27,37 1,1
34. North Carolina 1122 1,95 29,32 1,08
35. Iowa 1143 1,99 31,31 1,05
36. Minnesota 1388 2,41 33,72 0,86
37. Wisconsin 1568 2,73 36,45 0,76
38. Texas 1719 2,99 39,44 0,70
39. Missouri 1861 3,24 42,68 0,64
40. Indiana 1935 3,37 46,15 0,62
41. Massachusetts 2289 3,98 50,03 0,52
42. New Jersey 2315 4,03 54,06 0,52
43. Michigan 2772 4,82 58,88 0,43
44. Ohio 3382 5,88 64,76 0,36
45. Dlinois 4352 7,57 72,33 0,28
46. Pennsylvania 4507 7,84 80,17 0,27
47. California 4563 7,93 88,10 0,26
48. New York 6910 12,01 100,11 *** 0,17
Total 57.559
Media 1.199
, sao orden ados de acordo com 0 mimero de votos depositados a favor de
candidalos a Camara dos Representanles dos Estados Unidos na eleil;30 de
1952, Por ela se ve que os oilO maiores estados, com 54% dos eleitores,
lem 0 mesmo numero de votos no Senado que os OilOmenores, com menos
de 3% dos eleilorcs. Uma maioria de votos no Senado pode ser obtida por
senadores que representam menos de 15% dos eleitores. Dessa maneira,
uma politica preferida pelos representantes de 85% dos eleilores pode ser
vetada pelos representanles de apenas 15%. Nevada lem quase 15 vezes
mais represental;30 do que lcria se a represental;30 fosse rigorosamenle
proporcional ao numero de eleilores. Nova York disp5e de apenas urn sex-
to da represental;ao que leria se todos os eleilores fossem igualmenle repre-
sentados. Dessa maneira, urn -yolo tipico depositado em Nevada tern 85
vezes tanto peso quanto 0 vOlOlfpico de Nova York, permanecendo iguais
outras condil;oes. Trinta e cinco estados estao super-representadosl8 e treze
sub-representados. Vinle e tres estados tern mais de duas vezes sua repre-
sental;30 proporcional e cada urn dos oilO maiores tern metade ou menos da
metade.
Mas basta do tamanho da discrepancia. Que grupos poderiam ser
beneficiados ou prejudicados pela represental;30 igual? Na Tabela 3 (p.
116) ha tres grupos que, seria correto dizer, nao figuram entre as forl;as
dominanles em seus estados e que nao foram protegidos - na verdade
foram prejudicados - pela represental;30 estadual igual. Na Tabela 3.1 (p.
116), porem, ha grupos cujos inleresses podem ter side promovidos pela
super-represental;30. Na Tabela 3.2 p. 116), Lemos outro conjunto de gru-
pos cujos interesses talvez tenham sido prejudicados por sub-represen-
tal;ao.
Eleitorado Percentagem Percentagem Indice de
Estadual* do Eleitorado Cumulativa vanlagem**
Total
I. Nevada 81 0,14 0,14 14,8
2. Wyoming 127 0,22 0,36 9,4
3. Vermont 153 0,27 0,63 7,8
4. Delaware 170 0,30 0,93 7,0
5. North Dakota 231 0,40 1,33 5,2
6. New Mexico 233 0,41 1,74 5,1
7. Maine 234 0,41 2,15 5,1
8. Mississippi 240 0,42 2,57 5,0
9. Arizona 248 0,43 3,00 4,8
10. Montana 256 0,45 3,45 4,7
11. New Hampshire 258 0,45 3,90 4,6
12. Idaho 264 0,46 4,36 4,5
13. South Carolina 284 0,49 4,85 4,2
14. South Dakota 287 0,50 5,35 4,2
15. Utah 326 0,57 5,92 3,7
* Votos para deputados federais, 1952. Fonte: Statistics of the Presidential and
Congressional Election of November 4, 1952 (Washington, D.C.: U.S. Government Printing
Office, 1953).
** Indice de vanta em = representayao efetiva
g representac;:aoproporcional
media do eleitorado estadual
eleitoradoestadual
= 1-/ eleitorado estadual
48 eleitorado total
1.199.000
eleitorado estadual
Se a representa~o efetiva = representa~ao proporciona1, entiio 0 indice de vantagem = I.
*** 0 total e rnais de 100% pelo arredondamento.
(1) (2) (3) (4) (5) (6)
N°de Percentagem Percenlagem Vanlagem Grupo Percenlagem
ESlados de ESlados do Tolal de Relaliva** do Grupo nesses
Eleitores* ESlados***
9+D.C. 18,8 7,8 2,4 Negros 50,0
11 22,8 13,2 1,7 Meeiros 68,0
8 16,7 12,5 1,3 Trabalh. 33,0
migrantest
1. As unicas minorias protegidas por igual representac;ao estadual, como
tais, sac minorias geogrMicas concentradas em areas esparsas.
2. Algumas minorias nelas, porem, sac deixadas sem protec;ao. Na ver-
dade, representames do grupo dominante podem efetivamente usar sua
super-representac;ao no Senado para impedir ac;ao destinada a proteger
os desprotegidos.
3. Minorias em arcas dcnsamente povoadas sac sub-represenLadas em urn
sistema de igual rcpreSCnLac;aOestadual.
4. E impossivel dClcrminar as inlcnsidadcs de prcfercncias relativas des-
ses varios grupos, mas parccc inevit<ivcl a conclusao de que os bene-
ficios e desvantagens sac distribuidos de modo inleiramente aleat6rio
e nao se pode dcmonstrar que dcrivcm de algum principio geral.
* Votos depositados para a Camara dos Representantes dos Estados Unidos, 1952.
*".~Co!. (3)
*** Fonte: Censo de 1950: Biocstatfstica e censo agricola.
t as que trabalharam mais de 150 dias fora das fazendas.
Nao quero sugerir que 0 Acordo de Connecticut deva ser desfeito, mas
afirmo que e uma grande estupidez romanccar uma barganha necessaria,
transformando-a em urn nobre principio de poHtica democnltica.N°de Percenlagem Percenlagem Vanlagem Grupo Percenlagem
ESlados de ESlados do Tolal de Relaliva do Grupo nesses
Eleilores ESlados
8 16,7 9,2 1,8 Agricultores 35,4
7 14,6 6,2 2,4 Tosquiadores 57,6
6 12,5 5,0 2,5 Cotonicultores 67,0
4 8,3 1,9 4,4 Mineiros (prata) 84,4 A que conclusao, entiio, podemos chegar sobre 0 roblcma da intensidade?
_Primeirop:or mais que acreditemos que a inlensidade sentida de prefe-
3Jlcias ellill fato, nao podemos diretamente observar e medir diferenc;as de
,jensa~6es entre pessoas, 'Por isso mesmo, nao podcmos ler esperanc;a de
estabelecer quaisquer regras politicas que tratcm desse problema, embora
elas1?ossam ser eticamente desejaveis.
~UDdQ na medida em que pudermos nos contentar em definir inten-
sidade em termos de atividades que possamos observar, em principio deve
serpossivel comparar as intensidades relativas de preferencias entre indivi-
':duos diferentes.
Ierce.iro..-dadas vanas possiveis distribuic;6es de inlensidades diferen-
tes,.entre uma minoria e uma maioria, vanas delas aparentemente nao criam
problemas importantes para a teoria da democracia. Para pelo menos uma
distribuic;ao, nenhuma soluc;ao democnltica parece possive!. Urn caso final,
Parem, de fato coloca algumas quest6es interessantes, iSIOe, qualquer si-
tuac;ao em que uma minoria relativamente intensa prefere uma altemativa
combatida por uma maioria relativamente apatica.
~ar.tQ., embora tenha side ocasionalmente sugerido que 0 sistema
constitucional americano foi peculiarmente construido para lidar com este
N°de Percenlagem Percenlagem Vanlagem Grupo Percenlagem do
ESlados de ESlados do Tolal de Relaliva Grupo nesses
Eleilores ESlados
-.
12 25,0 51,0 0,49 Assalariados 53,7
2 4,2 9,4 0,45 Mineiros (carviio) 58,8
Ora, 0 interessante a respeito dessas tabelas e que os grupos beneficia-
dos e prejudicados pela igual representac;ao parecem inteiramenle arbitra-
rios. Seria dificil argumentar que ou os direitos naturais ou as intensidades
relalivas de preferencias requerem sub-representac;ao de negros, meeiros,
trabalhadores migranles, assalariados e mineiros e a super-representac;ao de
fazendeiros e produtores de la, algodao e prata,
caso, nem a revisao judicial nem a igual representa~ao dos estados no Se-
nado fomece uma solu~ao.
Finalmeme, a anaJise sugere convincentemente, embora nao prove,
que nenhuma solu~ao do problema da intensidade de preferencias atraves
de normas constitucionais ou processuais e possive!.
% Favoravel em
Estados que aprovam
(y)
% Necessaria em
Estados que se opoem
(x)
50m
50,1
51,0
52,0
53,0
66,0
66,66
49,97
49,7
47,0
44,0
41,0
2,0
oA. A~ maiorias e 0 processo de apresenta,iio d.f.emendas
Releva notar que a a resentaeao.- de emendas por alguma propor~ao das
unidades geogrMicas de urn pafs, como, por exemplo, os estados, nem
profbe uma mera maioria do eleitorado de propor emendas a Constitui~ao
nem assegura que ela sera suficiente para tanto. A fim de demonstrar isso,
vamos supor que: a) os legislativos de todos os estados estlio perfeitamente
sincronizados com as preferencias de uma maioria do eleitorado de cad a
urn, b) a populayao e igualmente distribuida entre os estados, c) os legis-
lat.ivos de tres quartos dos estados devem aprovar a emenda para que ela
seJa adotada e d) tres quartos dos legislativos estaduais aprovam a emenda
e urn quarto desaprova. Neste caso, uma f6rmula pode ser facilmente cons-
truida, demonstrando todas as situa~oes em que uma maioria do eleitorado
nacional e ou nao favoravel a emenda. Vamos supor que x e a percentagem
do eleitorado favoravel a emend a em cada urn dos tres quartos de estados
cujos legislativos a aprovaram, e y a percentagem do eleitorado favonivel a
emenda no restante quarto de estados cujos legislativos sac contrarios a
emenda. Sob a suposiyao a) acima, x deve ser sempre maior e y menor que
50. Neste caso, para que uma maioria de todo 0 eleitorado fosse favoravel a
emenda seria necessario que:
Assim se uma maioria~mples, digamos 51% do eleitorado de36 estados
sac favorav~is a uma emenda, de acordo com nossas suposiyoes, ela serA
aprovada. AI.n~ ~Slm, essa aprovayao e coereme com a possibilidade de
que uma m.'ll?~la sImples de todo 0 eleitorado nacional ap6ie a emenda e
com ~ J?OSslblhdade d~ que u~a maioria de todo 0 eleilorado nacional seja
contrarlO a ela. Isto e, se maIS de 47% dos eleitorados dos restantes 12
estados apoiarem a emenda, enllio a maioria do eleitorado nacional a ap6ia.
Mas se menos de 47% dos eleitorados dos 12 estados restantes ap6iam a
emenda, e~llio ela sera aprovada, mesmo que apenas uma minoria do elei-
lorado naclOnal a ap6ie. (As percentagens podem ser consideradas como
percentagens do eleilorado em cad a urn dos estados como medias aril-
meticas ou como percentagens do eleitorado total nos ~stados a favor e nos
estados contra, respectivamente.)
O.!1?esmo argumento pode ser usado para demonstrar que mesmo que
o requ~slto !osse ~b~ndonado p~a uma maioria simples dos estados (n12 +
1), a sltuayao sena 19ualmente mdeterminada, isto e, a emenda poderia ser
aprovada com apoio da maioria, ou com menos que ela, ou nao ser apro-
vada mesmo que contasse com apoio da maioria.
. Se elim.inarmos. nos~a suposi~ao altamente artificial de populayao
l~ual ou eleltorados IgUaIS em cada urn dos estados, a situa~ao toma-se
aInda ~a!s erratica. Por exemplo, dados os resultados de maioria simples
na.se~el.YOeSde 1952 em 36 estados com 31,3% do eleitorado poderiam, em
pnnclplO, emendar a Conslitui~ao. Desta maneira uma emenda constitu-
cional precisaria ter 0 apoio de apenas 16% do el~itorado total. Por outro
lado, os 63% do eleitorado concentrados em 11 estados nem emendariam a
Constitui~.ao. nem poderiam opor urn velo a emenda proposta.° obJellvo de tudo iSlO nao e demonstrar que esses fatos realmente
ncorreram ou que provavelmente ocorrerao, mas simplesmente que urn me-
~ de apresentayao de emendas baseado em aprova~ao de unidades geo-
graflcas nao leva por si mesmo a qualquer resposta clara se uma maioria
pode ou nao emendar a Constituiyao.
Dai, se y e igual ou menor que esse valor, a emenda sera aprovada mesmo
que a favor dela haja apenas uma minoria do eleitorado nacional.
A Tabela 4 sugere alguns dos possiveis valores:
premo Tribunal nao parece ter side contnmo a uma maioria legislativa seja
quando retirou seja quando restituiu os direitos dos negros.
Pode-seargumentar que os seis casos que trataram de legislatyao am-
pliando e protegendo os d.ireitos dos negros no periodo que se seguiu a
Guerra Civil devem ser citados como 0 exemplo nota vel de frustratyao de
uma maioria legisladora persistente as maos do Supremo Tribunal. E
impossivel, porem, demonstrar que havia uma maioria congressional a
frustrar. Toda essa legislatyao foi aprovada durante os dois mandatos presi-
denciais de Grant, quando os democratas sulistas estavam ainda excluidos
do Congresso e os rcpublicanos radicais constitufam uma fortya poderosa.
A primeira das decisoes do Supremo ocorreu em 1876 e todas as demais
aconteceram depois: duas em 1883 e uma cada em 1887, 1903 e 1906. Que
a eleityao de 1876 constituiu 0 ponto crucial na "estrada para a reuniao" e
fato ha muito reconhecido pel os historiadores. A partir daquele ano, 0
poder do SuI branco no Congresso foi virtual mente restaurado. A barganha
que levou a solutyao, e a natureza da pr6pria solutyao, foram recentemente
estudadas em detalhe por C. Vann Woodward no Reunion and Reaction:
The Compromise of 1877 and the End of Reconstruction (Boston: LillIe,
Brown & Co., 1951).0 ana de 1876, enta~, assinala 0 ponto aproximado
em que as fortyas dominantes do Partido Republicano chegaram a urn
acordo com as fortyas dominantes no SuI e concordaram em tolerar, se nao
realmente apoiar, a restauratyao da supremacia branca. A ultima petya de
legislatyao a proteger os direitos dos negros sulistas foi aprovada por urn
Congresso sem chance de se reeleger, em fevereiro de 1875, e promulgada
pelo Presidente no dia 1Q de martyo. Tres dias depois, expirou 0 mandato da
Casa dominada pelos republican os. S6 15 anos depois recuperaram eles 0
controle efetivo da Casa. A liderantya republicana meramente aquiesceu a
supremacia branca. Os lideres do Partido Democrata exigiram que ela fosse
reconhecida. No perfodo de 1875 a 1897, em todos menos quatro anos, os
democratas controlaram pelo menos urn dos ramos do legislativo. Em qua-
tro das cinco eleityoes presidenciais realizadas de 1876 a 1892,0 candidato
democrata conseguiu mais votos populares do que 0 republicano, embora
s6 duas vezes fosse eleito urn democrata. A decisao de 1877, por conse-
guinte, tomou-se uma parte eSLavelde uma penca de acomodatyQes basicas
das quais os politicos americanos sempre dependeram. S6 depois da II
Guerra Mundial e que 0 ajuste foi rompido (se e que foi). Nessa ocasiao,
como e bem conhecido, democratas sulistas utilizaram a tecnica de obstru-
tyaono Senado para vetar as tentativas do que poderia ter equivalido a uma
maioria legislativa de votar legislatyao destinada a proteger os direitos de
cidadaos negros e outros. Diante desse veto por obstrutyao, foi 0 pr6prio
Supremo Tribunal que, em sua hist6rica decisao de 1954, trouxe de volta
os direitos dos negros para a Constituityao. Assim, paradoxalmente, 0 Su-
--C. Uma nota sobre.!} comparac;iio de intensidades de preferencia
Suponhamos que existe urn continuum de intensidades experlmen
ffiveis, de tal modo que elas possam ser ordenadas de menores a maiores:
Por conseguinte, se a intensidade da preferencia do individuo A esta em x,
ela e menos intensa do que a do individuo Bern y.
Mas uma vez que nao podemos observar a intensidade, de que modo
podemos saber que 0 individuo A esta em x e 0 Bern y? Construamos uma
~ala..-consistindo, por exemplo, em respostas a questao: "Yoce_sente forte
interesse por este objetivo? Moderado? Indiferente?"
moderado . 1_ forte. -+ escala
y' z'
Se esta escala puder ser ligada a outro conjunto de fatos ou eventos de
maneira que a ordem relativa de urn ponto (ou de uma faixa) na escala
indique inequivocamente a ordem rclativa de urn ponto (ou de uma faixa)
no conjunto de fatos, entao a escala "mede" 0 conjunto de fatos:
X" y" z"
Suponhamos que descobrimos empiricamcnte que nossa escala nos
permite preyer algum outro conjunto de fatos ordenados, como, por exem-
plo,o volume relativo de lazer renunciado por urn indivfduo para atingir 0
objetivo. Isto e, se 0 individuo A esta em x' na escala, ele estaci em x" no
continuum de "lazer renunciado"; e se B estiver em y', ele estara tambem
emy":
Varios passos SaDagora possfveis:
Embora nao possamos observar intensidades experimentadas,
podemos concordar em ir adiante como se elas fossem medidas por
esta escala (ou outras):
jntensidade experimentada
(nao observavel)
Mas note-se que, embora a escala e 0 conjunto de eventos sejam am-
bos observaveis e relacionados par observa~ao, nao temos observa-
~6es para relacionar nossa e,scala, ou 0 conjunto de fatos observaveis,
com a intensidade experimentada. Meramente concordamos em que:
a) intensidade experimcntada existe e b) nossa escala a mede. Estreita-
mente interprctado, tudo 0 que fizemos, na verdade, foi tratar a inten-
sidade experimentada como urn constructo consistente do resultado de
urn conjunto de medi~6es de alguns itens observaveis.
Em vista disso, podemos concordar ern..ahandonar.o constructo "inten-
sidade experimentada", isto e, para nossos objetivos, abandonamos ;s--
suposi~6es a) e b). Tratamos enta~ nossa escaluomo simplesmente
urn previsor de urn co!:1.iuntoobservavel de eventos: se 0 indivfduo A
esta em x', ele tambem estara em x" ou ha alguma probabilidade co-
nhecida, P, de que estara em x"). Poderemos, se quisermos, chama-Ia
de escala de "intensidade", contanto que nao vejamos nada mais no
r6tulo do que urn conjunto de medidas.
Se nosso interesse e etico e estamos preocupados com intensidades ex-
perimentadas, enta~ 2 e insatisfat6rio, mas todas as solu~6es, acho, 0
serao tambem. Se nosso interesse e empirico, como, par exemplo, se
estamos interessados em preyer a estabilidade de uma organiza~ao so-
cial, enta~ 2 pode ser satisfat6rio, contanto que possamos descobrir
uma escala para 0 conjunto de eventos que desejamos preyer.
I. 0 leitor compreendera certamente que: querer urna altemativa inc1ui nao aceitar outra.
Isto e, nao querer ser for~ado a aceilar a a1temativa x implica querer a altemativa "nao-
x". Na discussao que se segue, "querer" e "preferir" sao usados como intercambiaveis.
2. Note-se que estamos exc1uindo aqui duas outras quest6es de menor relevancia para a
leoria da democracia: •
1) Se A e B preferem x e y, A prefere x a y mais do que B?
2) Se A prefere x aye B prefere p a q, A prefere mais x a y do que B prefere p a q?
Urn momento de reflexao moslrara, penso eu, por que essas quest6es nao tern grande
impomncia para a teoria de democracia.
3. No sentido limitado do problema aqui eSludado. Isto e, nestes casos a maioria, quan~o
existe, contem pelo menos tantos individuos que sao fortemente a favor ou contra a
poHtica como a minoria.
4. Para urn enunciado mais fonnal, consultar 0 Apendice C a este capitulo. Em alguns
aspectos, meu argumento corre paralelo ao de I.D.M. Little, A Critique of Welfare
Economics (Oxford: Oxford University Press, 1950). Nao obstante, compare as pp. 57.-
59 com meu argumento acima e 0 contido no Ap€ndice C.
5. Cf. S.A. Stouflcr et al., Measurement and Prediction, Vol. IV de Studies in Social
Psychology in World War IJ (princeton: Princeton University Press, 1950), caps. II, m,
VI, VII, Vm.
6. 0 econ'omista, interessado como esta em "maximizar" comportamento, come\Alria pro-
vavelmente de fonna contraria, isto e, passaria logo a descrever a realiza~ao perfeita e
em seguida, talvez, aceilaria alguma grosseira aproxima~ao. Mas, como sugeriu
Herbert Simon, urn conceito mais util de escolha racional pode ser descoberto no
conceito de "resultado satisfatorio", distinlO do resultado maximo, ou otimo. Cf. seu "A
Behavioral Model of Rational Choice", Quarterly Journal of Economics, LlX
(fevereiro de 1955), pp. 99-118, esp. 108 e segs.
7. No Senado, foi votada a emenda sobre trabalho infantil ao projeto de or~amento de
1919. A vota~ao no tocante a todo 0 or\Almento foi de 41-22. Na Camara, a vota~ao foi
sobre todo 0 projeto, nao se fazendo vota~ao separada sobre a emenda.
8. Cf. Apendice A a este capitulo para urn comentario sobre a importiinciado processo de
apresenta~ao de emendas como indicador da existencia de uma maioria.
9. No que se segue, exc1ui deliberadamente a questao do veto judicial a q~quer
legisla~ao. Isto envolve urn conjunto muito diferente de quest6es e urn exame dos"an~s
do Tribunal, que poderia fevar a urn conjunto diferente de conc1us6es.
10. Citado em Carl Brent Swisher, American Constitutional Development (2' ed, Roston:
Houghton Mifflin Co., 1954), p. 448.
II. Este argumento e ainda mais desenvolvido no capitulo 5, pp. 125 e segs. Poder-se-ia
dizer que estudos cuidadosos das elei~6es, empregando dados do censo e outros. e utili-
zando lecnicas estatisticas boas, se nao refinadas, poderiam contribuir muito para nos
dar uma reconstru~o bastante segura de alguns detenninantes decisivos de elei~6cs
passadas. Alguns estudos dessa natureza estao sendo realizados no Bureau of Applied
Social Research, Columbia University. Duvido que a maioria das explica~6cs histo-
ricas padronizadas de vitorias e derrotas eleitorais resi sl.a a este tipo de indaga~ao,
12. Estados Unidos, Library of Congress, Legislative Reference Service, Provisions of
Federal Law Held Unconstitutional by the Supreme Court (Washington. 1936), p. 95.
Desde essa compila~ao, a unica decisao judicial adicional quc se conhcce e 0 processo
United States v. Lovell, 328 U.S. 303 (1946).
13. Meus cilculos neste particular divergem urn pouco dos que constam das pp. 135-36 do
documento da Biblioteca do Congresso citado na nota 12. Contudo, muitos dos casos
que 0 autor daquele documento inc1ui sob outros titulos deviam, na verdade, ser
considerados como exemplos em que 0 objetivo original foi atingido. Assim,
conquanto seja tecnicamente correto dizer que "nao houve a~o legislativa como
rea~o a decisao" apos 0 caso Dred Scoll v. Sandford, seria falso dizer que os efeitos
dessa decisao nao foram posteriorrnente anulados.
prefacio a teoria democr:itica
14. Para uma dlscussao dos casos de dire'
15. Cf. Earl Latham, "The Supreme COUl~OSC~VIS,ver Apendlce B a este capitulo77~I(maio de. 1954), 207; Cortez A.~.n E~; Su~:me People", Journal oj PolitIcs,
9-1937 (MmneapolIs: University of M' g, P Judges of the Supreme Court
nomea~6es malS controvertidas. Urn resolutmnesota ,ress~ 1938), cap. n, ana1Jsa a;
proteger direitos de mmonas, encontra-s 0 ataque a revisao judicial, como melo de
Majority R~le and Minority RIghts (Nova \~~k~rabalho de Henry Steele Commager,
Cahill, Jud'CUlI LegIslation (Nova York' Ron~~~ord UmveTSIty Press, 1943). Fred
:sfor~s mtelectuals que tentaram reconcillar f ress, 1952), analisa os pnnclpals
e urn corpo leglslativo com a teona de _0 at? patente de que 0 Supremo Tnbunal
16. Estou supondo que, c~mo no caso daque na? 0 e. Cf. especlalmente 0 cap. Ill.
dls~oSI~6es corn fundamenro em dlreltos :~lsa~ JUd;clal, a tentativa de defender as
capltuJo I. a urals en renta as diflculdades mdlcadas no
17. As claSSlflca~6es s· .... .
18. Significand . enam slgmflcattvamente diferentes
o malS representa~ao do qu d' .representados. e 0 esta 0 tena se os eleitores fossem igualmente
o Hibrida Americana
Tal como urn dente que d6i, 0 problema da tirania da maioria, postulado
por Madison, tern nos perturb ado atraves de todos estes ensaios. Conforme
descobrimos desde 0 inicio, nao e simples nem mesmo definir-Ihe os ter-
mos satisfatoriamente. Se, por algum tempo, pareceu que urn exame da
'~nsidade':': das preferencias poderia fomecer-nos a soluc;ao, a verdade e
que ao fim de nosso estudo do assunto nao chegamos a uma soluc;ao clara.
Nao obstante, com base no que foi dito antes, sete ro osi ocs impor-
tantes e pertinentes para esta questao podem, acho, ser elaboradas. Se e as
S[O urn tanto especulativas', sao nao s6 meramente compativeis com tudo 0
que foi argumentado ate agora, mas, em grau importante, estao tambem
implicitas no argumento.
_Aprimeira dessas proposic;oes diz respeito a assuntos de politic a que a
maioria raramente decide.
Analisando a democracia JXlliarquica, achamos necessario estabelecer
sete condic;oes necessarias separadas para a consecuc;ao da Regra durante 0
periodo eleitoral, isto e, descrevemos sete continua contra os quais poderia
ser medido 0 atingimento relativo da Regra durante 0 perfodo em causa.
Essa enfase nas condic;6es reinantes no perfodo e importante, JXlisacho que
nenhum dos fatos ocorridos no entendimento, no ultimo seculo e meio, do
funcionamento das sociedades dcmocr::iticas, e certamente nenhurrl dos fa-
tos recentes na ciencia poHtica empirica, devem ser interpretados como
reduzindo 0 papel fundamental das elei~6es na maximiza~ao da igualdade
polftica e a soberania popular. Embora esteja na moda em alguns cfrculos
sugerir que tudo 0 que se acreditava sobre polftica democr::itica antes da I
Guerra Mundial e, talvez, II Guerra Mundial era absurdo, estou inclinado a
pensar que os democratas radicais que, ao contnirio de Madison, insistem
na importimcia do processo eleitoral em toda a grande estrategia da demo-
cracia, estao basicamcnte certos. Para sermos exatos, se os requisitos fun-
darnentais da poliarquia nao existem, enta~ 0 processo eleitoral nao pode
aliviar, evitar ou substituir 0 govemo hienirquico. Mas se essas conoi~6es
fundamentais de fato existem, a elei~ao e a tecnica decisiva para garantir
que os Hderes do govcmo serao relativarncnte responsaveis perante os !ide-
rados. Outras tecnicas depend em para ter eficacia principalmente da
realiza~ao de elei~6es e de condi~6es sociais fundarnentais.
Posto isto, e importante notar 0 quae pouco uma elei~ao nacional nos
diz sobre as preferencias das maiorias. Rigorosarnente falando, tudo 0 que
uma elei~ao revela sac as primeiras prefcrcncias de alguns cidadaos entre
os candidatos que se apresentam aos cargos. Vejamos agora 0 que ela nao
faz.
Deixemos de lado 0 fato de que, por causa da existencia da maquinaria
eleitoral, 0 resultado pode ser realmente contrario as preferencias manifes-
tadas par uma pluralidade de eleitores. Em tres elei~6es nos Estados Uni-
dos, par exemplo, 0 candidato preferido pela maioria dos eleitores nao foi
eleito Presidente. Ponharnos de lade tambem 0 fato de que quando mais de
dois candidatos disputarn urn cargo, 0 vencedor pode ter uma pluralidade
mas nao urna maioria dos votos. E e geralmente impossivel dizer qual seria
o resultado se houvesse uma elei~ao em segundo tumo com os dois candi-
datos mais votados. Assim, em nove elei~6es presidenciais americanas, os
candidatos vencedores tiveram uma pluralidade mas nao maioria dos votos
populares. Daf, em mais de doze casos, ou mais de urn ter~o das elei~6eS
presidenciais desde os dias de Jackson, I 0 candidato vencedor nao foi a pri-
meira escolha da maioria dos eleitores.
Muito mais importante e 0 fato de que, mesmo quando urn candidato
constitui evidentemente a primeira escolha da maioria dos eleitores, nao
podemos ter certeza em uma elei~ao nacional que ele foi tambem a pri-
meira escolha da maioria dos adultos ou de eleitores no gozo de seus di-
reitos? Embora 0 caso americano seja extremo, em todas as na~oes-Estado
onde nao existe 0 voto compulsorio a proposi~ao basica se sustenta. Em
qualquer elei~ao quase nunca estarnos em condi~6es de saber com certeza
qual teria sido 0 resultado se alguns ou todos os nao-eleitores votassem.
Temos uma leve razao para supor que 0 resultado teria side 0 mesmo. Em
uma elei~ao apertada, urn pequeno aumento no ultimo minuto na propor~ao
o favoraveis a urn dos lados pode mudar 0
dos eleitores trrados daqueles. . t arece ter acontecido nas duas
osa pareclda com IS 0 P d '
resultado. Alguma COl de 1948.3 Alem disso, urn dos la os e
ultimas semanas d.a ca~p~nha la absten ao do que 0 outro. Dando urn
freqiientemente malS preJudlcad~ ~ same~te relacionada com a renda,
exetnplo, quando a absten~ao e mV~m uma apertada divisao de opinioes
educa~ao e outrOS fatores ~orr~latos, m maior probabilidade sera 0 derro-
o candidato dos pobre~ e mc.u t~s cOreferencia de todos os adultos ou elei-
tado, mes~o queoele seJa a pnme~~~o dos educados e abastado~. Na~Iei-
tores quallficavels do que 0 can de 20% dos que quenam Elsen-
~ao presidencial de 1952, parece que cerc~ °am Stevenson e tambem nao
hower nao votaran:" .c~ntra 29~o .~ueaPper~~a a diferen~a nas propor~6es
taram 4 Numa diVlsao de opmlao 'vo· 0 0 • 15
dos nao-votantes tena sldo crucla. fossem indiferentes aos res~lta?os, en-
Ora se todos os nao-votantes 'tulo 2 suas preferenclas, ou a, gumento no capI, . 0 d
ta~, de acordo co~ nossO oar d s na determina~ao do que a malona os
falta delas, podenam soer19onoraa nao e verdade que todos os nao-votan-
adultos preferia. Mas, mfehzmente, ostra nacional realizada em 1952, por
tes sejam indiferentes. Em uma adn:' que tinham muito interesse no
450 pessoas que lsseram 0 ,.
exemplo, entre 0 _ °d ncial 76 (ou 17%) eVldentcmente nao
partido que ganhou a elel~.a~ pr~~l e de Stevenson que "se interessavam
votaram. Entre os correhglOnanOS mUlOtomaior (28%) deixou de
1 d ma percentagem 0 hmuito" pelo resu ta 0, u 0 0 ,0 altamente motivados de Elsen ower
votar do que entre os correhglOnanOS
(10%).6 0 _ im orrnncia de elei~6es como indica~ao
Finalmente, na av~,ha~a? ~~em~ar que muitos eleitores nao perce~m
de primeiras escolhas, e precIs andidatos A e Bo Para mUltaS
o a onrao entre os c "realmente que eXlste urn . YY por urn dos candidatos ou naO
as as unicas altematlVaS sao votar
pesso , 7 0 0
votar absolutamente. , r inar todas essas dificuldades, am~a sena
Mesmo que pudessemos e 1m, tar uma maioria de primerras es-
t podemos mterpre 0 1verdade que rararnen e 1 0 - Cloonalcomo sendo 0 eqUlva ente
d°dat em uma e el~ao na , 0 'focolhas entre can I oOS0 lhas no tocante a uma pohtlca especl lca.
a uma maioria de pnmelras esco m urn candidato embora se mos-
Algumas pessoas e~id~ntemente v~~ i~Odas questoes em jogo. Outras
trem inteiramente mdifere~tes a , . pe elas em algumas quest6es. Na a-
dOd to que e contrano a ." dapoiarn urn can 1 a 0 da 290h dos que tomaram uma pOSl~aO e-
mostra de 1952 ja m~nclOna artle : sar disso votaram em Eisenhow~r.
mocratica sobre a Le~ ~aft~~ d~ u:candidato as vezes diver gem mUlto
Alem disso, os correhglonarlOs toes cruciais. Em uma amostra entre
em suas preferenci~s no tocante a1~5e~ cerca de 64% pensavarn que os Es-
os que apoiararn ~lse~hower em emai; em seu envolvimento em problemas
tados Unidos haVlam ldo longe d 0 d te 27% achavam que nao, e uns
d aproxlma amende outras partes do mun 0, 0
, 9% declararam-se indecisos.8 Dessa maneira, toma-se passivel que uma
esmagadora maioria eleja urn candidato cujas principais polfticas sac as
primeiras escolhas apenas de uma minoria. .
1maginemos, por exemplo, que os eleitores tern que escolher entre dOlS
candidalos que discordam sobre tres politicas, como na forma mostrada na
Tabela 5. Suponhamos agora que cada uma dessas minorias constitui urn
grupo distinto, de modo que as tres representam 75% dos eleilores. Vamos
presumir ainda que a primeira minoria cons.idera a polflica exlema ~omo a
questao crucial e cIassifica suas opr;:oes aSSlm: u, x, z, w, y, v. 1sto,~' esses
eleilores preferem 0 candidalo A porque ele Ihes oferece uma pohLIca ex-
lema que aprovam, embora sejam contrarios a sua polflica agricola e fi~~al.
Suponhamos ainda que a segunda minoria de ele~lores consldera a ~ohtlca
agricola como crucial e classifica suas prefercnc13s na ordem segumte: w,
z, v, u, y, x. 1Slo e, esses eleitores preferem 0 canclidato A porque ele Ihes
oferece uma politica agricola que aprovam, mesmo que desaprove~ sua
postura em politica extema e polftica fiscal. Aplicando 0 mesmo LI~Ode
raciocfnio a terceira minoria, podemos facilmente perceber que 0 candidalo
A poderia conquistar 75% dos vOlOS,mesmo que cada uma de suas polfti-
cas Fosse desaprovada por 75% dos eleitores. Este e urn exemplo nao de
govemo de maioria ou mesmo de minoria, mas de govemo de minorias.
Candidalo A Apoiado por Candidalo B Apoiado por
prefere a prefere a
allernativa allernaliva
Politica extema u 25% dos v 75% dos
eleitores eleitores
Politic a agricola w 25% dos x 75% dos
eleitores eJeitores
Politica fiscal
I
y 25% dos z
'-
75% dos
eleitores eleitores
Alem do mais, na medida em que os eleitores preferem urn candidato
por causa de suas polfticas, freqiienlemente 0 apoio representa aprova~ao
ou desaprova~ao de uma politica ja em vigor, mesmo que pouco ou nada
possa ser feito para mudar-Ihe as conseqiiencias. Sem duvida nenhum_a,
muitas pessoas votaram contra Stevenson em 1952 porque Truman nao
detivera os comunistas chineses em 1947.90 voto foi mais urn castigo por
atos passados do que uma escolha de polftica futura. Lideres politicos re-
conhecem esse aspecto das elei~oes e freqiientemente procuram evitar uma
decisao ate que a elei~ao passe, de modo que possam agir relativamente
livres dos compromissos de campanha. Assim, paradoxalmenle, a elei~ao
pode realmente mais impedir do que facilitar a escolha de polfticas pelo
eleitorado.
Ora 0 eSludante desatenlo das democracias modemas pode apressada-
mente c~ncIuir que as deficiencias nas eleir;:Oesa que aludi sao caracteris-
ticas apenas dos Estados Unidos, mas, excetuadas a<;peculiaridades que
concordei em par de lado, considerando-as em princfpio remediaveis, 0
que eu disse aplica-se com igual for~a, acredito, a polftica de qualqu~r
grande nar;:ao-Estado. Embora cientistas poli~cos par~~ as vez~s ac~edl-
tar que muitas das virtudes e alguns dos .defeltos da pohtlca ame~cana."l;ao
encontrados no sistema parlamentar mgles, que funclOna com dOlSpartldos
altamente unificados e disciplinados, sinto-me incIinado a pcnsar que eIei-
~Oes sob esse sistema sao, .no mfnimo, ain~ menos c~n~aladoras do que as
nossas.lO 0 unico ponto lmportante a sallentar aqm e que em nenhuma
grande na~ao-Estado as eleir;:Oespodem nos dizer muito sobre as prefe-
rencias das maiorias e minorias, alem dos fatos crus de que entre os que fo-
ram as umas uma maioria, pluralidade ou minoria indicou suas primeiras
opr;:Oespor algum candidato ou grupo de candi?atos. 0 que sac .as primei-
ras opr;:Oesdessa maioria eleitoral, alem da manlfestada por candldatos par-
ticulares, e quase impossivel dizer com muita confian~a,. ,
o que e verdade a respeito de eIei~Oes deve ser amda maJs verdadelro
no perfodo entre elas. Nosso modele poliarqmco tentou explicar esse perfo-
do atraves de sua oitava condir;:ao:
8.1 Ou Ladas as decisoes tomadas entre as elei~oes sac subordinadas au
execut6rias as tomadas durante a fase de elei~ao;
8.2 Ou as novas decisoes tomadas durante 0 perfodo entre eleir;:oes sao de-
tertninadas pelas sete condir;:oes precedentes, operando, conludo, sob
circunstfmcias instituciOllais muito diferentes;
8.3 Ou ambas as coisas.
o leitor pode ter pensado na ocasiao que esta era uma trisle maneira de
ladear urn problema formidavel. Eu mesmo pensei isso, mas nao podemos
dizer ludo na mesma ocasiao.
Acabamos de demonstrar que a condir;:ao 8.1 e, na pratica, apenas me-
diocremente satisfeita. A liga~ao entre elei~oes e op~6es de polftica nao c
debil. Mas se elas raramente revelam as preferencias de uma maioria em
ques16es de polflica, nao ha preferencia de maioria a qual decisoes entre ~s
eleir;:Oespassam ser subordinadas ou execut6rias. A outra possivel, condi-
r;:ao(8.2) enfrenta dificuldades igualmente grandes, porquanto a maJor p~-
te da politica entre as eleir;:oes parece ~er determi~ada pela a~ao d:ml:
narias relativamente pequenas mas relatlvamente aLIvas. Acho que nao ha
caso em loda a hisl6ria da polftica americana em que a atividade entre
eleic;oes fosse qualquer coisa parecida com 0 nivel que atinge em uma elei-
c;ao comum. Se examinarmos com cuidado qualquer decisao de polftica,
mesmo muito importante, descobriremos sempre, acho, que apenas uma
minuscula pI;Oporc;aodo eleitorado exerceu ativamente sua influencia sobre
os polfticos Em uma area tao critica como a polftica externa, e conclusiva
a evidencia de que ano ap6s ana a maioria esmagadora dos cidadaos ame-
ricanos manifesta sua preferencia, se isto acontece, por nenhum outro meio
que nao indo as urnas e depositandourn voto. Em uma pesquisa recente
sobre atitudes no tocante a organizac;oes mundiais, as percentagens de va-
rios grupos de opiniao que comunicaram que haviam feito alguma coisa
para disseminar seus pontos de vista, tais como ingressando em organi-
zac;oes, empenhando-se em atividade politica ou mesmo discutindo suas
icteias com amigos, foram as seguintes:11
exceto da maneira mais trivial. A despeito desta limitac;ao, 0 processo
eleitoral e urn dos dois metodos fundamentais de controle social que, fun-
cionando juntos, tornam lideres governamentais tao responsaveis perante
liderados que a distinc;ao entre democracia e ditadura ainda faz sentido. 0
outro metodo e a competic;ao politica continua entre individuos, partidos,
ou ambos. Eleic;oes e competic;ao politica nao significam governo de maio-
rias em qualquer maneira significativa, mas aumentam imensamente 0 ta-
manho, numero e variedade das minorias, cujas prefercncias tern que ser
levadas em conta pelos lideres quando fazem opc;oes de politica. Sinto-me
inclinado a pensar que e nesta caracteristica das eleic;oes - nao 0 governo
de uma minoria, mas de minorias - que ternos que procurar algumas das
diferenc;as fundamentais entre ditaduras e democracias.
Entre "isolacionistas": 87%
Entre os favoraveis as Nac;oes Unidas, como sao: 84%
Entre os que querem uma OrganizaC;ao das Nac;oes Unidas mais forte: 80%
Entre os que ap6iam algum tipo de alianc;a entre as democracias: 84%
Mas ha outra caracteristica das eleic;oes que e importante para nosso
estudo. Se a maioria raramente decide em questoes de politica espccffica,
nao obstante, as que sac escolhidas em urn processo de "dccisao de mi-
norias" situam-se provavelmente durante a maior parte do tempo dentro
dos limites de consenso estabelecidos pelos valores importantes de mem-
bros po!iticamente ativos d~ sociedade, entre os quais os elcitores consti-
tuem urn grupo importante. Esta, entao, e a nossa terceira proposiC;ao e,
neste sentido, a m~ioria (pel?, me~os jlos poJiticamen~e. ativos! quase se~-
pre "decide" no sIstema polIarqUlcoj! Isto porque polItIcos sUjettos a elet-
c;oes tern que atuar dentro dos !imites estabelccidos por seus pr6prios valo-
res, como membros doutrinados da sociedade, e por suas expectativas so-
bre que polfticas podem adotar e ainda serem reeleitos.
Em certo sentido, 0 que habitualmente descrevemos como "politic a"
democrMica e meramente a casca, a manifestac;ao superficial, representan-
do conflitos superficiais. Anterior a politica, por baixo dela, envolvendo-a,
restringindo-a, condicionando-a, esta 0 consenso subjacente sobre politic a
que, em geral, existe na sociedade entre a parte predominante dos membros
politicamente ativos. Sem esse consenso nenhum sistema democrutico
sobreviveria muito tempo as irritac;oes interminaveis e frustrac;oes de elei-
c;oes e competic;ao entre partidos. Com ele, as disputas sobre altemativas de
politica sac sempre sobre urn conjunto de alternativas que ja [oram joei-
radas e reduzidas aquelas que cabem dentro da ampla area do acordo bu-
sico.
Que ninguem conclua que esses acordos basicos sac triviais: h3 urn
seculo nos Estados Unidos, urn dos assuntos do debate polftico era se a
Nao estou sugerindo que as eleic;oes e a atividade entre elas sac sem
imporulOcia para a determinac;ao da polftica.12 Muito ao contrario, sac
processos cruciais para assegurar que os Ifderes polfticos se mostrem urn
pouco sensiveis as preferencias de alguns cidadaos comuns. Mas nem as
eleic;oes nem as atividades entre elas dao muita garantia de que as decisoes
se conformarao as preferencias de uma maioria de adultos ou de eleltores.
Dai nao podermos corretamente descrever as operac;oes concretas das
sociedades democnlticas em termos dos contrastes entre maiorias e mino-
rias. Podemos apenas distinguir gropos de varios tipos de tarnanho, todos
procurando de varias maneiras promover seus objetivos, geralmente as
expensas, pelo menos em parte, dos demais.13
Demonstramos que as eleic;oes sac meios cruciais para controlar lideres e
tarnMm inteiramente ineficazes como indicadores das preferencias da
maiori Estas palavras nao encerram realmente uma contradiC;ao. Boa par-
te da teoria tradicional de democracia leva-nos a esperar mais de eleic;oes
nacionais do que elas possivelmente podem dar. Alimentamos a esperanc;a
de que elas revelem a "vontade" ou as preferencias de uma maioria no to-
cante a urn grupo de problemas. Isto e algo que elas raramente fazem,
escraviza~ao de seres humanos era ou nao dcsejavel. Hoje a quesLL10nao
admite mais debate.
por outro, ela provavelmente nao sera encontrada em form as constitucio-
nais. Sera descoberta, se isso acontecer, em fatores extraconstitucionais.
Tomemos 0 problema da intensidade das preferencias, por exemplo. Nosso
curto exame das normas constitucionais para proteger de priva~ao urn
grupo de preferencias relativamente intensas por urn grupo mais numeroso
mas relativamente apatico em nada resultou. Ainda assim, pode muito bem
haver formas de prote~ao situadas alem do formato constitucional. Sem
tentar chegar a uma conclusao se intensidades de preferencias relativas po-
dem ser realmente medidas, podemos dizer que, se isto for absolutamente
possivel, algum tipo de comportamento visivcl tera que ser aceito como in-
dicador. Se aceitarmos como tal a propria declara~ao do individuo sobre
como se sente, enta~ a importante hip6tese seguinte parece valida:
Se as maiorias nas democracias quase sempre govemam no significado
amplo do termo, raramente 0 fazem em term os madisonianos, porquanlo
vimos gue polfLicas especificas tendem a ser produtos de "governo de mi-
norias". No sentido em que Madison se preocupava c;om0 problema, enta~,
o govemo da maioria e principal mente urn milo)Isto nos leva a nossa
quarla proposi~ao: Se 0 govemo da maioria e na maior parte urn mito,
enta~ a sua tirania, na maior parte, tarnbem 0 e. Isto porque se uma maioria
nao pode govemar, ela tampouco pode ser tiriinica.
o problema no mundo real nao e se a maioria, e muito menos "a"
maioria, atuara de forma tiriinica, atraves de processos democraLicos para
impor sua vontade a uma (ou a) minoria. Em vez disso, a questao mais im-
portante e a medida em que varias minorias na sociedade frustram as am-
bi~oes de outra com aquiescencia passiva ou indiferen~a de uma maioria de
adultos ou eleitores.
o fato de algumas minorias frustrarem e, nesse scnLido, Liranizarem os
demais e inerente numa sociedade onde pessoas discordam, isto e, na
sociedade humana. Mas se a frustra~ao e inerente a ela, nao 0 e a diladura.
Contudo, se ha algO a ser dito pelos processos que efetivamente distingucm
ou difercnciam democracia (ou poliarquia) de ditadura, ele nao sera desco-
berto na nilida distin~ao entre govemo pela maioria e govcrno por uma
minoria. A distin~ao aproxima-se muito mais de ser entre govemo por uma
minoria e govemo por minorias. Em compara~ao com os process os poli-
ticos das ditaduras, as caracteristicas da poliarquia aumentarn muito 0 mi-
mero, tamanho e diversidade de minorias, cujas prcfcrcncias influenciarao
o resultado das decisoes govemamentais. Alcm do mais, essas caracte-
rfsticas evidentemente exercem influencia rcciproca sobre certo mimcro de
aspcclos importantes da politica: os tipos de lideres recrutados, os tipos le-
gftimos e ilegftimos de atividade politic a, a faixa de op~oes e tipos de po-
Ifticas abertas aos Ifderes, os processos sociais para dissemina~ao de infor-
ma~oes e de comunica~ao - na verdade, sobre todo 0 ethos da sociedade.
Sao neSles e em outros efeitos, mais do que na soberania da maioria, que
encontramos os valores do processo democratico.
A aLividade polftica e, em uma medida importante, fun~ao da inten-
sidade relativa de preferencias.14
Ora, parece tambem claro que 0 prova'lel resultado de uma decisao de poli-
tica e, em parte, fun~ao do volume relativo de aLividade polftica empreen-
dida a favor ou contra as alternativas. Daf:
Sendo iguais todas as demais condi~oes, 0 resultado de uma decisao
poliLica sera determinadopela inlensidade relativa das preferencias
entre os membros de urn grupo.
o corpo principal das prot~6es, contudo, sera encontrado nas precondi-
~oes e caracterfsticas da poliarquia. Quanto mais plenamente existirem os
requisitos fundamenlais da poliarquia, menos provavel sera que qualquer
dada minoria tenha suas liberdades mais apreciadas reduzidas por a~ao go-
vemamental. A extensao do consenso sobre as normas poliarquicas, 0 trei-
namento social nelas, a concordiincia geral sobre altemativas de polflica e a
atividade polftica na medida em que estas e outras condi~6es ~stiverem
presentes, determinarao a viabilidade da propria poliarquia e darao prote-
~ao as minorias. Parece-me esmagadora a prova de que nas vanas poliar-
quias do mundo modemo a extensao em que minorias sao maltratadas pela
a~ao govemamental depcnde quase inteiramente de fatores nao-consti-
tucionais. Na verdade, se cles nao sac inteiramente irrelevantes, sua impor-
tiincia e banal em compara~ao com os nao-constitucionais.
Nossa quinta proposi~ao e que na medida em que ha alguma prot~ao geral
na sociedade humana contra a priva~ao por urn grupo da liberdade desejada
Qual e, enta~, a importancia dos fatores constitucionais?
Ate agora, cvitei uma definic;ao dc "constitucianal". Como sabem tad os os
cientistas politicos, e realmente dificil especificar rigorosamente 0 signifi-
cado de "constitucional". E provavel que comecemos com uma defini~ao e
terminemos com urn Weltanschauung. Embora nao deposite muita confian-
~a na utilidade de minha defini~ao, par "constitucional" proponho identifi-
car os determinantes de decisoes do governo (deixo estes termos indefi-
nidos) consistindo em norm as prescritas que influenciam a distribui~ao, os
tipos e metodos legftimos de comrole entre servidores publicos. As regras
ou normas podem ser baixadas por grande variedade de autoridades aceitas
como legftimas pel os servidores publicos: a Constitui~ao escrita, se hou-
ver, decisoes de urn tribunal aceiLocomo autoridade em interpreta~ao cons-
Litucional, comentarios respeitados e coisas assim. Por fatores nao-consti-
tucionais, por conseguinte, entendo todos os demais determinantes das de-
cisoes do governo.
Neste sentido, todas as poliarquias modernas parecem possuir consti-
tui~oes ta~ notavelmente semelhantes que 0 elenco de variaveis constitu-
cionais e ainda mais limitado do qw;poderfamos pensar a primeira vista.
Sao duas as causas dessa semelhan~a. Em primeiro lugar, as caracterfsticas
e condi~6es basicas da poliarquia impoem uma Iimita~ao definida aos tipos
constitucionais a disposi~ao de qualquer grande sociedade desse tipo. Em
..segundo lugar, dadas essas caracterfsticas e requisitos, a eficiencia decor-
rente da divisao do trabalho impoe mais uma e altamente impartante limi-
ta~ao. Ha necessidade de urn corpo mais ou menos representativo para le-
gitimar decis6es basicas atraves de algum processo de assentimento - por
mais riLualizado que seja. A menos que 0 processo seja inteiramente ritual,
porem, ha necessidade nos legislativos pdo menos de lideres, de comissoes
e de organiza~oes partidarias. E tambem de burocracias constitufdas rle
especialistas permanentes a fim de formular alternativas e assegurar 0 ma-
ximo proveito do estonteante numero de decis6es que 0 governo moderno
for~osamente tern que tomar. Essas burocracias precisam ser altamente es-
pecializadas entre si, uma vez que realizam tarefas altamente diferenciadas:
competem e colidem entre si e com outros grupos oficiais no sistema. Os
servidores burocraticos devem, entre outras coisas, tomar decis6es que in-
f1uenciam diretamente atos de indivfduos particulares. Daf uma burocracia
especializada ser necessaria para julgar apela~6es decorrentes dessas
decis6es preliminares. Outra de suas tarefas e adjudicar conflitos entre
indivfduos, ambas as tarefas as vezes combinadas na mesma burocracia es-
pecializada, isto e, 0 judiciario. Decisoes burocraticas, judiciais e legisla-
tivas precisam ser de alguma maneira coordenadas, e par isso e necessario
urn grupo espccializado de coordenadores. Uma vez que a tarefa de coar-
dena~ao e com tanta freqUencia de importiincia crucial, envolvendo deci-
s6es basicas entre alternativas de polftica, ela exige lideres de grande status
e poder que possam competir com sucesso na epoca de elei~oes. 0 pro-
cesso eleitoral em si requer espcciaIiza~ao adicional; indivfduos dedicados
principalmente a tarefa de ganhar elei~6es dirigem organiza~6es partidarias
de ambito nacional.
Com 0 passar do tempo, todos esses multiplos grupos especializados
transformam-se em direitos adquiridos, dependendo os lideres e liderados
da permanencia, da renda, do prestfgio e da legitimidade,. de suas organiza-
~6es. Tornam-se parte da urdidura e trama da sociedade. Neste sentido, to-
dos os sistemas poliarquicos se caracterizam pela separa~ao de poderes:
possuem legislativo, executivo, burocracia administrativa e judiciario,
Cada urn dos quais, por seu tumo, divide-se e subdivide-se. Neste sentido,
tambem, todos eles saD urn sistema de controles recfprocos, numerosos
grupos de servidores competindo e se chocando entre si.
Dados esses Iimites a faixa de variaveis constitucionais, qual a impor-
tfulcia das normas constitucionais no funcionamento da poJitica democra-
tica? Ate agora demonstramos que elas nao saD cruciais, nem fatores inde-
pendentes na manuten~ao da democracia. Ao contrario, elas pr6prias pare-
cern ser fun~6es de fatores nao-constitucionais subjacentes. Demonstramos
tambem que as normas constitucionais nao SaD importantes como garan-
tidoras do govemo por maiorias ou de isen~ao de tirania por parte delas.
Nossa sexta proposi~ao vem a ser a seguinte: os preceitos constitucio-
nais saD principalmente importantes porque contribuem para determinar a
que grupos particulares devem caber as vantagens ou desvantagens das lu-
tas poJiticas. Em nenhuma- sociedade as pessoas entram em igualdade de
condi~oes na luta politica. 0 efeito das normas constitucionais e 0 de pre-
servar, adicionar ou subtrair das vantagens e desvantagens com que elas
iniciam a disputa. Daf, por mais triviais as_realiza~oes dos preceitos cons-
titucionais quando medidos pelas ~pira~6es ilimitadas do pensamento
democratico tradicional, eles saD cruciais para 0 status e poder de grupos
particulares que ganham 'ou perdem com sua aplica~ao. Por essa razao,
entre outras, os preceitos tern sido amiude causa de luta violenta e mesmo
fratricida.
Considerado desta perspectiva, podemos ver 0 sistema politico americano a
luz de suas caracterfsticas especiais. Aqui chegamos a setima e ultima
proposi~ao sobre 0 problema da tirania da maioria. Urn fio condutar central
do desenvolvimento constitucional americano tern sido a evolu~ao de urn
sistema politico no qual todos os grupos ativos e Iegftimos da popula~ao
podem se fazer ouvir em algum esragio crucial do processo de tomada de
decis6es. No restante deste capftulo, desenharemos em largas pinceladas 0
dcsenvolvimcnto e caniLer deste sistema, ao qual chamarei de processo po-
lfLicoamericano "normal".
Nao obstante, antes de passar a maneira como se desenvolveu esse
sistema, talvez seja prudente especificar 0 que queremos dizer por "ativo e
legftim?" . .r0r tudo 0 que foi dito antes, e claro que os membros politica-
mente mauvos de uma organizac;;ao poliarquica nao podem influenciar di-
rctamente 0 resultad~ de decisoes.15 Portanto, se urn grupo e inativo, seja
IS~Ooc~slOnado por livre opc;;ao,violencia, intimidac;;ao ou cominac;;oes da
lei, 0 sistema necessarlamente nao the foroece urn ponto de controle em
parte alguma do processo. Por "legftimos" entendo aqueles cujas aLividades
sao aceitas como ccrtas e corretas por uma parcela preponderante dos ati-
vo~. No Sui, ate recentem~nte, os negros nao constitufam urn grupo ativo.
EVldentemente, os comumstas nao saD agora urn grupo lcgftimo. Em com-
parac;;aocom 0 que espcrarfamos do sistema normal, os negros foram relati-
vamente impotentes no passado, exatamente como saD hoje os comunistas.
Urn grupoexclufdo da arena polftica normal por proibic;;oes contra ati-
vidades normais pode, apesar disso, ganhar freqiientemente acesso. Pode
conseguir isso: 1) participando ou ameac;;ando participar de atividade polf-
tica "anormal" - violencia, por exemplo; 2) ameac;;ando impor privac;;oesa
grup?s. que ja fu?cion~m na arena de sua legitimidade, ou adquirindo
legltl.ml.dade e, dill, motlvando' grupos in a aceitar grupos out. A ampliac;;ao
do dlfeilo de votac;;ao no perfodo da Revoluc;;ao Americana ate Jackson
constitui urn exemplo dos tres metodos. A protec;;aoatrasada do direito le-
gal de votar concedido aos negros, pelo Supremo Tribunal, constitui urn
exemplo do terceiro metodo. Contudo, a medida que os negros se tomam
uma parte maior do eleilOrado ativo e legftimo, as oportunidades normais
do sistema tomam-se acessfveis a eles e protec;;aoulterior do direito de voto
dependera mais e mais do emprego de pontos de controle no sistema nor-
mal. A plena assimilac;;ao dos negros no sistema ja ocorreu em numerosos
estados nortistas e parece que agora se espalha lentamente pelo SuI.
o sistema "~ormal" desenvolveu-se atraves de varios esmgios. Ex-
cetuados Connecucut e Rhode Island, que mantiveram suas cartas coloniais
relAtivamente democciticas, todos os, estados elaboraram novas Cons-
~it?iC;;oesentre, 1.176 e 1781. Certo numero de fatores - entre os quais as
Idelas democraucas eram apenas urn deles - modelaram essas Constitui-
c;;oes.Em urn aspecto, contudo, tenderam a semelhanc;;a: "nos termos da
maioria das Constituic;;oes revolucionanas, 0 legislativo era realmente oni-
potente e 0 executivo correspondentemente fraco."16 Em oito estados 0
legislativo escolhia urn conselho, que por seu lado escolhia urn preside~te
entre seus membr~s ..Exceto em tres. estados, 0 executivo era eleito para 0
mandato de urn umco ano; em ~els estados sulistas ele nao podia ser
reelelto e de modo geral n~o podlam os titulares do executivo prorrogar,
suspender os trabalhos ou dissolver 0 legislativo. 0 poder de nomeac;;aoca-
bia na maior parte ao legislativo; com excec;;aode do is estados, 0 executivo
nao tinha poder de veto a legislac;;ao; em todos os estados, havia urn con-
selho executivo para fiscaliza-Io e, em dez, este conselho era eleito pelo le-
gislativo.
Devido a supremacia do legislativo, essas constituiC;;oesestaduais fo-
ram as vezes consideradas como triunfos da democracia populistaP Mas
isto esm muito longe da verdade. Porque a falha do sistema residia no fato
de os pr6prios legislativos serem muitas vezes bem pouco representativos.
Em. muitos estados, a supremacia do legislativo significava nao tanto 0 do-
mfnio do povo como 0 controle sobre a polftica por elites relativamente pe-
quenas de status e riqueza que podiam controlar urn ou os do is ramos do le-
gislativo. Quer isto dizer que as regras eram viciadas em favor de alguns
grupos e contra outros. Em termos gerais, eram manipuladas em favor dos
velhos centros de populac;;aona costa e contra os novos colonos que se esta-
beleciam nas zonas ocidentais dos estados e tambem dos ricos contra os
pobres.
Assim, em Massachussells, a Constituic;;ao revolucionana estabeleceu
o controle dos interesses comerciais sobre a polftica estadual em detri-
menlO do poder dos fazendeiros; atraves de rigorosa qualificac;;ao de posse
de bens para servidores e eleitores, os ricos obtiveram poder as custas dos
grupos de classe media e dos pobres; 0 Senado, no qual a representac;;ao
dependia de impostos pagos, era urn baluarte dos abastados; ate mesmo a
camara baixa era viciada em favor das cidades comerciais do Leste. 0
legislativo e os tribunais, como seria de se esperar, funcionavam a favor
dos credores e contra os devedores. Os criterios de dfvida e propriedade,
porem, foram longe demais: explodiu a rebeliao; Daniel Shays durante
curto espac;;o de tempo tomou-se her6i dos endividados e para sempre 0
sfmbolo dos perigos da tirania da rnassa para os bem-nascidos e os poucos.
Finalmente, a repressao implacavel foi seguida por uma debil reforma. Mas
permaneceu imumvel 0 equilibrio basico de beneffcios e prejufzos im-
postos pela Constituic;;ao.18
Do primeiro ao ultimo, os participantes da Convenc;;ao Constitucional
reunida em Filadelfia eram realistas. Quando cometeram cincadas nao foi
por falta de realismo, mas de conhecimentos. Como realistas, entendiam
sobre a Constituic;;ao que estavam elaborando 0 seguinte: que os preceitos
constitucionais teriam inevitavelmente que beneficiar alguns grupos e pe-
nalizar outros; que os preceitos seriam por conseguinte altamente pole-
micos e sujeitos a violento conflito; que deviam ser aplicados dentro dos
limites estabelecidos pelo predominante equiHbrio de forc;;associais; que
elas, por seu tumo, trariam conseqiiencias para 0 equilibrio social; e que,
para durar, a Constituic;;ao exigiria 0 assentimento de mais do que os 55
ilustres cavalheiros reunidos em Filadelfia, mas, por sorte, muito menos
que de toda a populac;;ao adulta.
AS homens da Conven9ao formaram talvez uma assembleia tao bri-
lhante como jamais tenha havldo alguma para elaborar uma Constitui9ao
duradoura para uma grande na9ao. Constituiu apenas uma indica9ao das
deploraveis limita90es dos conhecimentos humanos que, realistas e talcn-
tosos como tenham sido, muitas de suas suposi90es basicas tenham resul-
tado falsas, e a Constitui9ao que criaram sobreviveu nao por causa de suas
previsoes, mas a despeito delas.
A teoria madisoniana proporcionou uma brilhante e duradoura defcsa
- sentimos a tenta9ao de dizer racionaliza9ao - dos preceitos acordados
pelos convencionais. Ja vimos em que aspectos 0 enfoque madisoniano e
deficiente. Mais importante para nossas atuais finalidades, porem, e a ex-
tensao em que os membros dessa historica assembleia desconheciam 0 que
estavam realizando. Pensavam cles que a Camara de Representantes, po-
pular, seria dinamica, populista, igualimria, niveladora e, por conseguinte,
urn centro de poder perigoso que precisava de restri9OCs, e tarnbem que 0
Presidente representaria os bem-nascidos e os poucos e que utilizaria seu
poder de veto contra as minorias populares alojadas na Camara. Enga-
naram-se porque acabou por se descobrir que 0 centro dinamico de poder
era a presidencia e, apos Jackson, 0 Presidente p6de reivindicar, e frequen-
temente reivindicou, ser 0 unico representante da maioria nacional em todo
o sistema constitucional. Entrementes, a Camara de Representantcs dificil-
mente mostrou ser 0 instrumento das maiorias apaixonadas que os homens
da Conven9ao ta~ desespcradamen~e temiam. Hoje a rela9ao que imagina-
ram foi, de modo geral, invertida. E 0 Presidente 0 formulador da politica,
o originador de legisla9ao, 0 porta-voz autonomeado da maioria nacional,
ao passe que 0 poder do Congresso se reduz cada vez mais ao veto - urn
veto exercido, quase sempre, em nome de grupos cujos privil6gios sac
amea9ados pela politica presidencial.
Se os horn ens da Conven9ao previram ou nao a revisao judicial e
questao que provavelmente nunca sera resolvida, mas nao ha uma unica
palavra nos anais da assembl6ia ou nos "Federalist Papers" que sugira te-
rem eles antevisto 0 papel fundamental que 0 Supremo Tribunal assumiria
ocasionalmente como formulador de politica e legislador independente.
Nao prognosticaram claramente, se e que absolutamente 0 fizeram, a gran-
de fun9ao organizadora que os partidos politicos desempenhariam e as ma-
neiras como esses instrumentos transformariam as disposi90es constitu-
cionais formais. A representa9ao igual dos estados no Senado, que tanto
contribuiu para descentralizar os partidos, 0 executivo e, na verdade, todo 0
processo de formula9ao de politica, nao constituiu questao de altos princf-
pios constitucionais, mas uma barganha necessaria e combatida por muitas
das melhores mentes presentes a Conven9ao, incluindo 0 proprio Madison.
Acirna de tudo, porem, os homens da Conven9ao interpretaram mal a
dinamica de sua pr6pria sociedade. Nao conseguiram preyer corretarnente
o equilfbrio de poder social que prevaleceriamesmo ao te~po em que
ainda viviam. Nao compreenderam realmente que, em uma socledade rural
carente de institui90es feudais e que possuia uma fronteira aberta e em ex-
pansao, a democracia radical quase certarnente se tomaria a opiniao domi-
nante e convencional, quase inevitavelmente prevaleceria na politica e qua-
se indubitavelmente seria conservadora no tocante a propriedade.
A despeito de suas falsas esperan9as, contudo, as institui90CS que seu
trabalho contribuiu para criar sobreviveram na maior parte. Tres razoes
podem explicar este futo. Em primeiro lugar, por ~ma grande variedade de
motivos, a apoteose da Constitui9ao come90u mUlto cedo e em urn tempo
espantosamente curto a controversia sobre 0 arcabou90 cons~itucional ba-
sico foi praticamente eliminada. Ate mesmo 0 debate conslituclOnal que
precedeu a Guerra Civil tratou ostensivamente da questao das !nten90es
reais da Conven9ao. Em segundo, talvez em nenhuma outra socledade as
condi90es da poliarquia estiveram ta~ plenamente presentes como nos Es-
tados Unidos no periodo ante-bellum (salvo, natural mente, no tocante aos
negros). Supor que este pais continuou democratico por ~au~a da. Cons~-
tui9ao parece-me uma inversao obvia da rela9ao que havla. E mu.Ito mal~
plauslvel supor que a Constitui9ao per~aneceu porq_u~n~ssa socle~adc_ c
essencialmente democratica. Se as condl9oes necessanas a polIarqula nao
tivessem existido, teria sobrevivido qualquer Constitui9ao deslinada a
limitar 0 poder de lideres. Talvez uma grande variedade ~e form~ c~nsti-
tucionais pudessem ter side facilmente adaptadas,ao mutavel ~u~lfbno ~e
poder social. Vale enfatizar mais uma vez que 0 sistema constiluclOnal nao
funcionou quando final mente tratou da questao da escravatura, uma ques-
ta~ que, tcmporariamente, solapou as principais condi90es fundamentais da
poliarquia. . , ,
Em terceiro lugar, a Constilui9ao sobrevlveu apenas porque fOi fre-
qiienlemente adaptada para ajustar-se ao bal.an90 de po~er s,?cial em mu-
ta9ao. Medida pela sociedade 9ue. se. segulU, a Co_n~tltuI9ao lIl;agmada
pelos homens da Conven9ao distrlbUlU seus beneflc~os ~ preJUlzos aos
grupos errados. Por sorte, quando se verifico~ que era Ilu.sono ?eqUllfbno
social de poderes que previra, 0 sistema conSlitUClonal fOi modlflcado para
conferir beneficios e alocar prejuizos mais em consonancia com 0 balan90
que enta~ prevalecia.
Vemos estes fatos de maneira notavelmente clara tanto nas fases de
desenvolvimento jacksoniana quanto congressional. Tivessem as constitui-
90eS estaduais do perfodo revolucionario confe~do. ma~s bcneffci~s aos
pequenos fazendeiros e artesaos e menos ao ~ome~clO ~ as pop~la9oe~ da
costa, e pelo menos possivel que, quando a dissemma9ao quase mevltavel
do sufragio universal para os homens adultos desse maI~ controle aos
representantes dos pequenos fazendeiros e artesaos, ~les t~nam adotado 0
sistema constitucional nacional de uma maneua mUlto dlferente daquela
modar,;ao foi mantida, por conseguinte, por urn sistema de formular,;ao de
polftica altamente descentralizado e que funcionou basicamente atraves de
barganhas. 0 conlTole cfetivo dos partidos polfticos foi descentralizado pa-
ra os estados e as maquinas pollticas municipais; 0 conlTole do Congresso
descentralizou-se sob a forma de comissoes; e 0 executivo foi ta~ descen-
tralizado que 0 Presidcnte se tornou pouco mais que urn membro da dire-
toria de uma companhia controladora de outras (holding company).
o subsequente crcscimento de organizar,;oes burocnlticas sob 0 contro-
Ie nominal do Prcsidcnte, ou do Presidente e do Congresso juntos, foi em
grande parte modclado pelo legado do governo congressional e os habitos e
pontos de vista politicos a que deu origem. No contexto de partidos bar-
ganhadores descentralizados e de urn legislativo barganhador tambtm des-
centralizado, era talvez inevitavcl que, a despeito da ar,;ao poderosa de
numerosos Presidentes e dos anclos algo utopicos de muitos rcformadores
administrativos, a imensa maquina que cresceu para administrar os assun-
tos do Estado de bem-estar social americano se tornasse uma burocracia
barganhadora descentralizada. Isto e apenas outra maneira de dizer que a
burocracia tornou-se parte do que antes chamei de processo polftico ameri-
cano "normal".
que, de fato, selecionaram. Acidentes historic os ajudaram tamocm a afastar
a democracia rural da supremacia legislativa. Em urn governo partidano
altamente unificado liderado pelo Presidente, Jefferson inventara urn
expediente que poderia ter justamente permitido que 0 mito da supremacia
legislativa sobrevivesse lado a lado com uma vigorosa lideranr,;a executiva.
o sistema de Jefferson, porem, requeria 0 controle pelos IIderes, reunidos
no Congresso, das nomear,;oes e polftica e lideranr,;a desse grupo pelo Presi-
dente. Apos Jefferson, a assembleia de Ifderes parece ter escapado gradual-
mente da lideranr,;a presidencial. Por volta de 1824, as forr,;asque apoiavam
Jackson nao puderam utilizar 0 sistema e a sua eleir,;ao em 1828 marcou 0
fim do sistema jeffersoniano.
Mais do que isso, a presidencia de Jackson assinalou 0 fim real neste
pais da identificar,;ao cJassica de govemo democnitico com supremacia
legislativa. Os democratas radicais haviam temido 0 poder executivo. Os
interesses conservadores nos estados eram favoraveis a supremacia legis-
lativa porque podiam conlTolar as assembleias. Seus porta-vozes na Con-
venr,;ao Constitucional, por seu lado, temeram urn legislativo nacional que
nao podiam ter certeza de controlar e procuraram como defesa propria urn
executivo com poderes de veto. Trabalhando de maos dadas com 0 colcgio
de Ifderes do Congresso, Jefferson superou a barreira entre executivo e
legislativo. Jackson, porem, construiu urn novo padrao de relar,;oes, urn no-
vo sistema constitucional e, desde seus dias, esse sistema tern prevalecido
na maior parte, e nao mais 0 jeffersoniano, 0 madisoniano ou 0 revolucio-
nario. 0 sistemajacksoniano pode ser interpretado como afirmando que:19
1. Grupos nao efetivamente representados no legislativo e no judiciano
podem se-Io, e plenamente, pelo executivo.
2. 0 processo eleitoral confere pelo menos tanta legitimidade a represen-
tatividade do executivo quanto a do legislativo.
3. 0 Presidente tern talvez maior reivindicar,;ao a representar a maioria
nacional.
E 0 crescimento do terceiro principio que, acredito, separa 0 perfodo
pos-Jackson daquele que 0 precedeu, porquanto a ideia de que 0 executivo
eleito poderia ser 0 autentico representante da maioria teve uma impor-
tfulcia revolucionaria.
No periodo post-bellum 0 Congresso consolidou sua posir,;ao. Ou
melhor, seria mais exato dizer que grupos socia is altamente poderosos,
ativos e ambiciosos, possuidores de crescente riqueza e status, consolida-
ram-se atraves do Congresso. Mas 0 poder dos novos interesses comerciais
e industriais nao foi absolutamente ilimitado; os dois partidos polfticos
eram inevitavelmente uma mix6rdia de delicadas acomodar,;oes· e como
mostrou 0 destino que tiveram os republicanos radicais, era imp~ssivel al-
guma coisa como uma polftica nacional abrangente e coordenada. A aco-
Defini 0 processo politico americano "normal" como aquele em que ha alta
probabilidade de que urn grupo ativo e legitimo da popular,;ao possa se
fazer efetivamente ouvido em algum esillgio crucial do processo de tomada
de decisoes. Ser "ouvido" abrange ampla faixa de atividades e nao e minha
intenr,;ao definir rigorosamente a palavra. Evidentemente, nao significa que
todos os grupos exercem igual controle sobre 0 resultado.
a olftica americana, como alias em todas as sociedades, 0 controle
soore decis6es e desigualmente distribuido. Nem individuos nem grupos
SaG:£9liticamente iguais. Quando digo que urn grupo e ouvido "efetiva-
mente" en tendo mais do que 0 simples fato de fater barulho; entendo que
urn ou mais servidores estao nao so prontos para escutar 0 barulho mas
esperam sofrer de alguma maneira dolorosa se nao aplacarem 0 grupo, seus
lideres, ou seus membros mais vociferantes. A fim desatisfazer 0 grupo, 0
Ifder responsavel pode tomar uma ou mais de uma grande variedade de
medidas: pressao em prol de polfticas substantivas, nomear,;oes, suborno,
respeito, manifestar,;ao das emor,;oes apropriadas ou a combinar,;ao certa de
barulhos reciprocos.
Assim, a tomada de decisoes pelo govemo nao constitui uma marcha
_majestosa de gran des maiorias unidas a respeito de certos assuntos de po-
populosos com grande numero de votos cleitora~s; a e.stados que sejam
Tnaiglnais entre os partidos, isto e, estados de dOls partldos; aos es~a?os-
"chaves", isto e, os marginais e densamente povoados; a grupos declSlv~S
em estados decisivos - clnicos, religiosos, ocupacionais; a grupos relatl-
vamenle grandes de ambilO nacional; e a areas urbanas e industriais densa-
menle povoadas. Um exame cuidadoso desses requisilOS.demonstr~~, acho
eu, que eles sao diferenles e freqUentemenle tem obJeuvos contrarlOs aos
grupos que predominam no Congresso.
y
80
x
. 40 45 50 55 60
PERCENTAGEM DEMOcRATICA DE VOTOS DO PARTIDO MAJORITARIO
PARA CANDIDATOS A CAMARA
Fig. 10 - Votos populares e cadeiras conquistadas no Congresso: Os
Democratas na Camara dos Representantes, 1928·54
lflica. E 0 apaziguamento permanente de grupos relalivrunenle pequenos.
Mesmo que esses grupos se somem em uma maioria numcrica na epOC;)de
e1ei~ao, em geral nao e ulil imerpretar essa maioria como mais do que uma -
expressao arilmclica. ISlOporque numa medida que leria agradado imensa- ~
menle a Madison, a maioria numerica e incapaz de emprecnder qualquer
a~ao coordenada. Os varios componenles dela C que dispoem de meios de~
a~ao.
Uma vez que tudo isto c assunto conhecido, permiLa-me 0 leitor suma-
riar breve e dogmaticamente i!!guns aspectos bem sabidos dos preceiLOs
conSlilucionais: os grupos que cles beneficiam, aqueles que prejudicam, e 0
resultado li<;jIIjdQ"\...Quandoanalisamos 0 Congresso, descobrimos ue cer-
tOS grupos sao super-represenlados, no sentido em que possuem mais rc-
presentanles (ou mais represenlantes em lugares decisivos) e, por conse-
guinle, mais comrole sobre 0 resulLado de decisoes do Congresso do que
teriam se os preceilos tivessem sido elaborados para maximizar igualdade
Jlolftica formal.f A representat;:ao igual no Senado levou a super-
represenLa~ao de estados menos densamente povoados. Na ptatica, iSlOsig-
nifica que fazendeiros e cerlOSoutros grupos - interesses de mineradores
de metais, por exemplo - sao super-representados. Os legislarivos eSla-
duais super-representam areas agricolas e de pequenas cidades c dill nao
redistribuem as cadeiras na Camara de Represemanles de acordo com as
mudan~as na composi~ao da popular;ao. A aplica~ao do principio de anti-
guidade e 0 poder dos presidcntes de comissao lem levado os e\eilores em
eSLadosde um unico partido ou de partido unico modificado a serem sign i-
ficativamente super-representados. Dc acordo com uma estimativa recente,
h3 22 desses eSl.c.1.dos.2!Geograficamente, eles incluem 0 solido Sui, os
estados de fronteira, a zona norte da Nova Inglaterra, quatro esrados do
Meio-Oeste, 0 Oregon e a Pensilvania. Entre eSles, apenas'a Pensilvania e
allamente urbanizada e industrializada. Devido a aplica~ao do sislema de
um unico membro por distrilo na Camara, em media uma mudan~a lfquida
de 1% do eleitorado de um partido para 0 outro resulta em um ganho
Ifquido de cerca de 2,5% de cadeiras da Camara para 0 par lido beneficiado.
E por causa da aplica~ao do sistema de dois membros por distrito no
Senado uma mudan~a de 1% resultara em urn ganho Ifquido para 0 parlido
beneficiado de cerca de 3% das cadeiras no Senado-I'oL conseguinte,
quando grandes grupos heterogeneos, como os agricultores, mudam seu
apoio a partidos, os efeitos legislativos serao provavelmenle muito
exagerados. (Cf. Figs. 10 ell, pp.143 e 144).
Todos esses polfticos e servidores interessados na eleir;ao ou reelei~ao
de urn Presidente e, dill, nos caprichos do colegio eleitoral, lem necessaria-
mente que ser sensiveis a urn conjunto algo diferenciado de grupos. Repe-
tindo, 0 quadro geral e ta~ conhecido que basta enumerar alguns pontos.
De modo zeral, as politicos- presidenciais precisam ser sensiveis a estados
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As burocracias SaD muito mais complexas. Em graus variaveis, elas
precisam ser sensfveis aos polfticos presidenciais e congressionais. Mas
eSl~s sao em si urn grupo muito estreito e especializado. No Congresso,
tlplcamente, trata-se dos presidentes das Comissaes On;;amentfuias da Ca-
mara e do Senado, das subcomissaes relevantes, e das comissaes substan-
tivas importantes. Entre os polfticos presidenciais, os administradores de-
vem em geral ser responsaveis ao Departamento de Or9amento, aos
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30 40 50 60 70
PERCENTAGEM DEMOCRATICA DE VOTOS DO PARTIDO MAJORITARIO
PARA CANDIDATOS AO SENADO
Fig. 11 - Volos populares e cadeiras conquisladas no Congresso: Os
Democralas no Senado, 1928.52.
secretlirios de departamento (ministros) e, natural mente, ao proprio Pre·
sidente. E tern que ser sensfveis tambem as suas proprias clientelas especia·
lizadas. A mais efetiva entre estas sera obviamente uma como ados fazen·
deiros, que e tambem bem representada no Congresso e mesmo no execu-
tivo. As vezes, burocracia e clienlela se misturam tanto que nao se pode
determinar quem e responsavel perante quem!
Este e 0 sistema normal. Nao tentei nestas paginas concluir se e urn sistema
desejavel de govemo, nem 0 farei agora. Isto porque a avalia9aO de seus
meritos e defeitos exigiria uma discussao penetrante e longa que se situaria
alem do escopo destes ensaios.
Mas 0 seguinte pode ser dito a . tema~ se nao e 0 proprio
auge da realiza9aO humana, urn modelo para 0 resto do mundo copiar ou
ffiOCfificarpor sua propria conta e risco, como nossos apologistas naciona-
listas e politicamente analfabetos ta~ cansativamente insistem em dizer,
tampouco, acho eu, e urn sistema ta~ obviamente defeituoso como alguns
de seus crfticos sugerem.
Para scrmos exatos, reformadores dotados de urn fino senso de ordem
antipatizam com ele. Observadores estrangeiros, mesmo simpaticos, fieam
amiude at6nitos e confusos com ele. Numerosos american os se mostram
desalentados com seus paradoxos. Na verdade, alguns que examinam atenl
tamente nosso proeesso polftico podem, as vezes, sentir profunda frustra-
9aOe irado ressentimento com urn sistema que, supcrfieialmente, ta~ pou<;Q.;
te1l\de ordem e tanto de caos.
Isto porque e urn sist m aCen1lladamente descentralizado As deci-
saes ao tomadas por barganhas interminaveis. Talvez em nenhum outrQ
sistema polftico nacional no mundo a barganha seja urn componente ta~
basieo do proeesso polftic<j. Numa era em que as eficicneias da hierarquia
foram enfatizadas em todos os conlinentes, sem duvida nenhuma 0 sistema
polftico americano normal constitui como que uma anomalia, e nao, as
vezes, urn anacroHisrno. Isto porque, como meio para ehegar a decisOes
altamente integradas, eoerentes, em algumas areas importantes - polftica
extcrna, por exemplo - ele parece freqlientemente funcionar de maneira
fragil, beirando 0 colapso total.
Ainda assim, nao devemos ser apressados demais em nossa avalia9ao,
isto porque, nos casos em que seus defeitos sobressaem, suas virtudes fi-
cam ocultas ao olho demasiado rapido. Por sorteL 0 sistema normal tern as
virtudcs de seus vfcios. 'Com todos os seus defeitos, ele ainda assim pro-
Eisenhower teria precis ado apenas do apoio de mais de 41,2% dos nao-e1eitores. Estas
estimativas baseiam-se em dados constantes de tabelas em The Political Almanac of
1952 (Nova York: Forbes & Sons, 1952), p. 22; Statistics of the Presidential and
Congressional Elections of Nov. 4, 1952 (Washington: Government Printing Office,
1953), p. 52; e v.a. Key, A Primer of Statistics for Political Scien!ists (NovaYork:
'Thomas Y. Crowell & Co., 1953), p. 197.
6. Minhas estimativas baseiam-se nos dados da Tabela 3.8. Campbell et al .• op. cit .• p. 37.
7. Na eleiyao de 1948. em uma amostra de eleitores, 73% disseram que nunca pensaram
em vOlar em outro candidato durante qualquer tempo da campanha. Na eleiyao de
1952. em outra amostra. 0 numero foi de 78%, ibid., p. 23. Tabela 2.7. Isto sugere 0
limite superior. Os dados nao indicam quantos consideraram nao votar como alter-
nativa a votar em seus candidatos.
8. Minhas estimativas baseiam-se na Tabela 8.1, ibid.
9. 71 % daqueles que achavam que "era culpa de nos so govemo que a China se tivesse
tornado comunista" apoiavam Eisenhower, ibid.
10. A Gra-Bretanha fomece uma interessante confirmayao do fato que maiorias eleitorais
raramente dcterminam politicas especfficas. 0 sistema politico britanico tern poucas
das barreiras constitucionais e politicas ao govemo da maioria. caracteristieas do
sistema americano. Nao obstante. e relativamente raro que 0 partido no poder tenha
sido a primeira prefereneia da maioria dos cleitores - muito men os de todo 0
eleitorado - na eleiyao anterior. Desde 1923. houve nove eleiyOes. Apenas duas delas
indicaram uma maioria de primeiras preferencias pelo govemo que se seguiu. Mas ate
as duas exceyOes sao politicamente aberranles. Na eleiyao de 1931, os candidatos que
endossavam a coa1isao nacional de Ramsay MacDonald ganharam por uma maioria de
votos, tendo sido 0 Partido Trabalhista duramente atingido pcla retirada de MacDonald.
Em 1935. os candidalos do Partido Conservador tiveram apcnas 47,7% dos votos, mas
os candidatos que endossavam 0 govemo nacional ganharam por 54,7%. Em nenhuma
ocasiao des de 1945 qualquer govemo foi a primeira prefercncia da maioria dos
e1eitores. Realmente. em 1945, 10.4 milh6cs de pessoas em condiyOes de votar nao 0
fizeram ou votaram em cand.idatos que nao os trabalhistas e conservadores.
comparados com os 9,6 milhoes que votaram nos candidatos conservadores e os 12
milhOes nos traba1histas. Em 1950. este grupo chegou a 8,2 milhOes, comparados com
12.1 milhOes de eleitores conservadores e 13,2 milhoes de trabalhistas. Cf. The
Constitutional Year Book, 1938 (Londres: Harrison. 1938), Vol. LII; D.E. Butler, The
Electoral System in Britain, 1918-1951 (Oxford: Clarendon Press, 1953), p. 173; John
Bonham, The Middle Class Vote (Londres: Faber & Faber. 1955), p. 120.
11. Elmo Roper. "American Altitudes on World Organization", Public Opinion Quarterly.
XVII (invemo de 1953-54), pp. 405-20.
12. A este respeito. a analise de outra forma excelente que Joseph A. Schumpeter faz da
dernocracia no seu Capitalism, Socialism and Democracy (2i cd.: Nova York: Harper
& Bros., 1947). parece-me algo dcfeituosa. ..,
13. Arthur F. Bentley, The Process of Government (Chicago: UnlveTSlty of Chicago Press.
1908); David Truman. The Governmental Process (Nova York: A.A. Knopf, Inc.,
1951); Earl Latham, The Groups Basis of Politics: a Study in Basing Poin! Legislation
(Ithaca: Cornell University. 1952).
14. Por exemplo, como se poderia esperar, a atividade de votar decai rapidamente daqueles
que estavam "muito interessados" em acompanhar uma campanha para aqueles que
"nao estavam muito interessados", ou daqueles que "estao muito interessados no
resultado da eleiyao" para os que "nao estao absolutamente interessados· .•.<:ampbell e,t
al., op. cil. Tabclas 3.6 e 3.8, pp. 35-37. Por outro lado. avahada por optmao quanto ~
importiincia do resultado para 0 pais. uma diferenya interessante e nao-exph~da e
revelada pela amostra. Entre os correligionllrios de Eisenhower votou. urn numero
consideravelmente maior dos que achavam que 0 resultado fazla grande diferenya para
o pars do que aqueles que julgavam que 0 resultado nao faria diferen~. Entre os
correligionanos de Stevenson. as diferenyas nao foram estalislicamente s,gniflcantes.
porciona aha probabilidade de que todos os grupos ativos e legitimos se fa-
rao ouvir efetivamente em algum estagio do processo de tomada de
dCCisocs E isto nao c uma vantagem banal em urn sistema politico.
-E-rambcm nao e estatico. 0 sistema americano evoluiu. e por isso so-
brevive. Evoluiu e sobreviveu passando da aristocracia para a democracia-
df massa, atravessando a escravidao. a guerracivil, a diffciI reconcilia~ao
entre Norte e Sui, a repressao dos negros e sua emancipa~ao vacilante; duas
grandes guerras de ambilO mundial, mobiliza~ao. a~6es militares em todos
os quadrantes do mundo e volta a uma paz instavel; passou por numerosos
period os de instabilidade ccon6mica e uma depressao prolongada. com de-
semprego em massa, "fcrias" agricolas. march as de veteranos, gas lacri-
mogcneo e mesmo balas; dois periodos de cinismo no pas-guerra. excessos
demag6gicos, usurpa~ao de liberdades trawcionais. e tentcantes, desa-
jeitadas, nao raro selvagens tentativas de enfrentar os problemas da sub-
versao. medo e tensao civil.
Provavelmente este estranho hfbrido. 0 sistema politico americano.
nao serve para exportar. Mas enquanto as condiyOes sociais fundamentais
da democracia estiverem substancialmente intactas neste pais, parece que 0
sistema sera rclativamente eficiente para refor~ar 0 acordo, encorajar a mo-
dera~ao e manter a paz social em urn povo inquieto e exagerado. que faz
com que funcione uma sociedade gigantesca, poderosa, diversificada e
incrivelmente complcxa.
Nao C, portanto, uma contribui~ao mesquinha. a que os americanos
deram as artes do governo - e aqucle ramo que entre todas as artes da
polftica e a mais diffcil: a arte do governo democratico.
1. Antes de Jackson, os eleitores presidenciais eram em geral escolhidos pelos legislalivos
estaduais. Por conseguinte, e dificil estimar 0 numero de clcitores que apoiavam urn
dado candidato. As compilayiics de votos populares em eleiyOes presidenciais
comeyaram em geral nas eleiy6cs de 1828.
2. Nao obstante, pesquisas modemas de opiniao por amoslragem sao hoje uteis neste
particular.
3. Ver The Pre-Election Polls of 1948 (Nova York: Social Science Research Council.
1949); Angus Campbell e R.L. Kahn. The People Elect a President (Ann Arbor:
Institute for Social Research, 1952); Angus Campbell, Gerald Gurin e Warren E.
Miller, The Voter Decides (Evanston: Row, Peterson & Co .• 1954).
4. Campbell et al., op. cit., p. 31, Tabela 3.2.
5. Pode-se facilmente demonstrar que para que 0 candidato vencedor seja a primeira
opyao de uma maioria de eleitores em condiyOes de votar. ele deve ser tambem a
primeira opyao de uma percentagem de nao-eleitores maior que (X-2W)12Z. onde X e 0
numero de eleilores em condiyOcs de votar. W e 0 numero de votos obtidos pelo
candidato vencedor e Z e 0 numero de nao-eleitores. Por cxemplo, em 1948. Truman
foi a primeira opyao de uma maioria de todos os eleitores em condiyoes de votar apenas
se foi tamocm a primeira de mais de 50,7% dos nao-eleitores; em 1952. por oulro lado,
· Na verdade, na amostra votou uma percentagem ligeiramente menor dos que pensavam
que 0 resultado teria muita importancia para 0 pais do que os que pensavam que nlio
seria importante.
15. Duas aparentes exce¢es a isto slio as seguintes: I) Se membros ativos inc1uem entre
seus objetivos a proteyao ou progresso de membros inativos; 2) se no presente,
membros ativos esperam que membros atualmente inativos se tomem ativos no futuro.
Esses dois casos slio importantes no mundo real. 0 primeiro, contudo, pode ser
corretamente considerado urn caso de influencia indireta, e nlio direta, sobre 0 resul-
tado. 0 segundo meramente requer que, em principio, a dimenslio temporal seja de al-
guma forma especificada. Este assunto, porem, tomar-se-ia complexo demais para uma
exposi~lio e talvez seja preferivel que permanep como esta nossa proposi~lio, em bora
excessivamente simplificada.
16. H.G. Webster, "A Comparative Study of the State Constitutions of the American
Revolution", American Academy of Political and Social Science, Annals, Vol. IX
(1897).
17. Cf.1. Allen Smith, The Spirit of American Government (Nova York: Macmillan Co.,
1911), caps.II e IX.
18. Cf. Oscar e Mary Flug Handlin, Commonwealth: A Study of the Role of Government in
the American Economy: Massachussells, 1774-1861 (Nova York: New York
University Press, 1947), pp. 26-27, 41, 44, 45, 49-52 e Apendice ll, p. 267. Em
numerosos aspectos, a Constituiyao de Massachussetts era atipica, isto e, 0 govemador
dispunha de poder absoluto de veto. "Embora elaborada por uma conven~lio eleita de
sufnigio masculino, foi nlio s6 uma das mais aristocniticas do periodo revolucionario,
mas que tambem assegurou mais 0 governo pelas classes superiores do que a
Constitui~lio de 1778, rejeitada pelo mesmo eleitorado". Elisha P. Douglas, Rebels and
Democrats: The Struggle for Equal Political Rights and Majority Rule during the
American Revolution (Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1955), p. 211.
Na Carolina do Sul, como seria de esperar, a Constitui~lio fortaleceu 0 litoral contra 0
interior. 1bid., pp. 43-44. Cf. tambem Fletcher M. Green, Constitutional Development
in the South Atlantic States, 1776-1860 (Chapel Hill: University of North Carolina
Press, 1930). Em uma disserta~ao de doutoramento inedita, Norman Stamps demonstra
que a Constitui~lio de Connecticut, que era a velha carta de funda~lio colonial, era
altamente democratica em aparencia e fora habilmente elaborada para permitir rigoroso
controle por uma oligarquia fechada. Norman Stamps, "Political Parties in
Connecticut, 1789-1819" (disserta~lio de Ph.D. inedita, Yale University, 1950). Na
Pensilvania, 0 mode1o foi excepcional. 0 sufragio universal era virtualmente fato
consumado por volta de 1790, quarenta anos antes que se tomasse geral nos Estados
Unidos. Evidentemente, por causa disto, 0 equilibrio permaneceu mais ou menos quase
favoravel ao agricultor comum e ao arteslio do que nos outros estados, mesmo depois
de ter sido substituida a Constitui~lio adotada sob 0 impeto da democracia radical
durante a Revolu~lio em 1789. Douglas, op. cit., caps. Xll-XIV; e Louis Hertz,
Economic Policy and Democratic Thought: Pennsylvania, 1776-1860 (Cambridge:
Harvard University Press, 1948), pp. 23 e segs. Em anos recentes, a ascenslio " gueda
dessas constitui~6es estaduais deixou de atrair a aten~lio dos cientistas politicos. E uma
pena. Elas slio lima mina de informa0es para 0 estudo das institui~6es politicas, e seu
declinio nunca foi satisfatoriamente explicado. Contudo, para conhecer urn aspecto da
mudan~a, vale consultar Leslie Lipson, The American Governor: From Figurehead to
Leader (Chicago: University of Chicago Press, 1939).
19. Por exemplo, ver W.E. Binkley, President and Congress (Nova York: A.A. Knopf,
lnc., 1947), caps. IV e V.
20.• "Formal" porque se as regras destinadas a maximizar a igualdade politica formal real-
mente fazem ou nlio mais do que as regras alUais e uma dura questlio empirica que
desejo evitar.
21. Austin Ramney e Willmoore Kendall, "The American Party System", American
Political Science Review, XLVm (junho de 1954), p. 477.
Indice Analitico e Onomastico
Adorno, T.W., 39n.28
acordo, 79-80
Acordo de Connecticut, 56, 117
Africa do Sui, 76
Alemanha, 78
anula~lio, 4On.35
argumento madisoniano, 36; Apendice,
37-8
Arist61eles, 41
Arrow, K., 63n.2, n.8, 65n.12
Ashin, M., 38n.2
atividade politica, 82, 88-89
autonomia, 80-81
axioma de Madison, 18
Barber, B., 91n.8
Bentley, A.F., 147n.13
Berelson, B.R., 92n.14, 92n.19
Binkley, W.E., 148n.19
Black, D., 65n.12
b6ias-frias, 113
Bonham, J., 147n.129
Borda, 47, 64n.lO
Brant, I., 39n.22
burocracia, 141, 144
Butler, D.E., 147n.10
Cahill, F., 124n.l5
Calhoun, J.c., 40n.35, n.37, 95
Camara dos Representantes, 142
Campbell, A., 91n.7, 98, 99, 146n.3,
147n.14
Canada, 76
Checo-Eslovaquia, 99
Choate, 1., 108
Coker, FW., 62n.2
Commager, H.S., 62n.2, 66n.2I, 124n.15
competi~lio politica, 131
comunistas, 99, 136
Congresso, 57, 59, 106
consciencia, 25, 43
Conselho de Seguran~ das Na¢es Unidas,
29
consenso, 77, 78,96,131
Constitui~lio, 35,83, 100, 107, 109, 134,
137, 139; controle constitucional, 43;
ver tambem Conven~lio Constitucional
controle extemo, 15,21,22,24,27
controles sociais, 43
Convenyao ConstilUcional, 17, 18,83,107,
111,137-38
cotonicultores, 116
"decislio de minorias", 131
de Grazia, A., 64n.IO
democracia poliarquica, 67-91; definiyao
de, 84; medi~lio da, 85-88
democracia populista, 41-62
desacordo, 79-80, 96, 100, 101
de Tocqueville, 42
direito dos negros, 59, 120
direitos iguais, 35-36
direitos naturais, IS, 19,29,31,48-49
ditadura, 131
diversidade, 79

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