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Biomecânica das articulações: joelho Apresentação Nesta Unidade de Aprendizagem você vai ver informações sobre o complexo do joelho, as principais estruturas que compõem este complexo e questões biomecânicas ligadas ao desalinhamento patelar. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar a estrutura mecânica que compõe a articulação tibiofemoral.• Distinguir as funções dos meniscos, ligamentos e cápsula articular do joelho.• Definir as principais funções da patela e alterações promovidas por alinhamentos anormais desta estrutura. • Infográfico Neste infográfico são resumidos os aspectos biomecânicos do complexo do joelho. Conteúdo do livro Para que seja possível dar mais atenção a aspectos importantes sobre o complexo do joelho, acompanhe os trechos do livro-base Estrutura e Função do Sistema Musculoesquelético, de James Watkins. Para tanto, leia os textos a partir dos seguintes subtítulos: Meniscos do joelho, Cápsula do joelho, Ligamentos do joelho e Causas de alinhamento anormal. Boa leitura. Sobre o Autor James Watkins, PhD, leciona anatomia funcional e biomecânica na Scottish School of Sports Studies, na University of Strathclyde, em Glasgow, Escócia, onde trabalhou como chefe de departamento de 1989 a 1994. Suas publicações contabilizam mais de 70 trabalhos em revis- tas acadêmicas e quatro livros. É membro do conselho consultivo do Journal of Sports Sciences e do conselho editorial do European Journal of Physical Education e do British Journal of Physical Education. Perten- ceu ao conselho da seção de Biomecânica da British Association of Sport and Exercise Sciences de 1993 a 1996. Seu PhD em biomecânica foi conferido pela University of Leeds, Inglaterra, em 1975. Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 W336e Watkins, James. Estrutura e função do sistema musculoesquelético [recurso eletrônico] / James Watkins ; tradução: Jacques Vissoky ; revisão técnica: Aylton José Figueira Júnior. – Porto Alegre : Artmed, 2014. Editado também como livro impresso em 2001. ISBN 978-85-8271-141-5 1. Anatomia – Músculos. 2. Articulação. 3. Biomecânica. I. Título. CDU 611.73 206 JAMES WATKINS Meniscos do Joelho Em qualquer posição articular, a área de contato entre as superfícies arti- culares dos côndilos femoral e tibial é relativamente pequena (ver Figura 7.9). Entretanto, a área efetiva de contato está normalmente aumentada em três a quatro vezes pela presença de dois meniscos em formato de C, um medial e um lateral, que formam cunhas entre as superfícies articula- res periféricas incongruentes dos côndilos femoral e tibial (Figura 7.10). Os cornos (ou extremidades) dos meniscos estão inseridos nas áreas intercondilares do platô tibial. O corno anterior do menisco lateral está inserido no aspecto posterior e lateral da área intercondilar anterior (Fi- gura 7.11a). O corno posterior do menisco lateral está inserido no aspecto anterior e lateral da área intercondilar posterior. O corno anterior do menisco medial está inserido no aspecto anterior da área intercondilar posterior. O corno posterior do menisco medial está inserido no aspecto anterior da área intercondilar posterior. Os dois meniscos estão unidos anteriormente por um ligamento transverso (Figura 7.11b). A periferia de cada menisco está inserida na parede inter- Figura 7.11. Os meniscos e os ligamentos cruzados; aspecto superior do platô tibial direito, mostrando a localização de (a) inserções dos meniscos e ligamentos cruzados e o contorno da cápsula articular; (b) os meniscos e os ligamentos cruzados. Ligamento cruzado posterior Menisco lateral Ligamento transverso Ligamento cruzado posterior Cápsula articular Menisco lateral Ligamento cruzado anterior Menisco medial b a Ligamento cruzado anterior Menisco medial Figura 7.10. Meniscos do joelho; (a) seção sagi- tal; (b) seção coronal. ba ESTRUTURA E FUNÇÃO DO SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO 207 na da cápsula articular. Entretanto, as superfícies articulares dos meniscos estão livres; elas estão em contato com as superfícies articulares dos côndilos femoral e tibial, mas livres para deslizar sobre elas. A capacidade meniscal de deslizar nas superfícies articulares é essencial para a função articular normal. Os meniscos têm quatro funções principais: 1. Manter a congruência entre as superfícies articulares em todas as posições da articula- ção. Durante o movimento articular, os meniscos deformam-se em resposta à curvatura mutante dos côndilos femorais e, assim, mantêm a congruência entre as superfícies articulares em todas as posições da articulação. O aumento na congruência dado pelos meniscos resulta em estabi- lidade articular aumentada e também minimiza o estresse de compressão sobre as cartilagens articulares. 2. Prover absorção contra choques na articulação. Os meniscos deformam-se sob pres- são, auxiliando na absorção do choque de forças de impacto sobre a articulação. 3. Manter uma circulação de fluido sinovial entre as cartilagens articulares. A estrutura da cartilagem articular é similar à de uma esponja, com uma densa rede de minúsculos poros interconectados. Durante o movimento articular, a força de reação articular comprime as carti- lagens articulares, “espirrando” o fluido sinovial para fora da cartilagem. Durante períodos de relaxamento, quando a força de reação articular é reduzida, a viscoelasticidade restaura a car- tilagem a seu tamanho e formato normais, e o líquido sinovial flui para dentro da cartilagem. Mesmo em articulações que normalmente não têm meniscos ou discos articulares, as su- perfícies articulares não são perfeitamente congruentes. Conseqüentemente, em qualquer po- sição articular, algumas partes das superfícies articulares estão sob maior carga de compressão do que outras. Ademais, as partes das superfícies articulares sob a maior carga de compressão modificam conforme as mudanças na posição articular. Dessa forma, o movimento articular cria uma circulação de fluido sinovial através das cartilagens articulares; isso permite que as células cartilaginosas recebam nutrientes e livrem-se dos produtos excretados. Os meniscos do joelho ajudam a manter a circulação do fluido sinovial através das cartilagens articulares dos côndilos tibial e femoral. 4. Ajudar a produzir o movimento normal entre as superfícies articulares. A flexão do joelho a partir da extensão completa envolve duas principais fases: rolagem somente, seguida por rolagem e deslizamento simultâneos (Kapandji, 1970; Norkin e Levangie, 1992). As duas fases são revertidas quando a articulação é estendida. Para o côndilo medial, a fase de somente rolagem corresponde aproximadamente aos primeiros 15° de flexão, enquanto para o côndilo lateral a fase de somente rolagem corresponde aproximadamente aos primeiros 20° de flexão. Conseqüentemente, o côndilo lateral rola mais que o côndilo medial, resultando na rotação interna da perna em aproximadamente 20° durante a fase de somente rolagem. Essa fase, no começo da flexão do joelho, que corresponde à amplitude normal de flexão e de extensão no caminhar comum, é algumas vezes referida como destravamento do joelho. O movimento re- verso, a rotação externa da perna durante a fase de somente rolagem na extensão do joelho, é algumas vezes referido como travamento do joelho ou mecanismo de torção. A fase de somente rolagem no começo da flexão do joelho é seguida por uma fase na qual ocorrem simultaneamente a rolagem e o deslizamento, com o último tornando-se mais impor- tante com o progredir da flexão. A amplitude total de flexão e de extensão do joelho está nor- malmente em torno de 160°. A capacidade de deformar-se dos meniscos é essencial para a manutenção do padrão normal de rolagem e de deslizamento entre as superfícies articulares. Por sua vez, o padrão normal de rolagem e de deslizamento é essencial para a manutenção da congruência normal, para a absorção de choques e para a circulação do fluido sinovial atravésda cartilagem articular. Os côndilos femorais são convexos e os côndilos tibiais relativamente achatados. En- tretanto, sua área efetiva de contato está normalmente aumentada de três a quatro vezes pelos meniscos medial e lateral, que têm quatro funções: • Manter a congruência entre as superfícies articulares em todas as posições da articulação. • Prover absorção contra choques na articulação. 208 JAMES WATKINS • Manter uma circulação de fluido sinovial através das cartilagens articulares. • Ajudar a produzir o movimento normal entre as superfícies articulares. As lesões meniscais são bastante comuns, principalmente em atividades como dança (moder- na e balê) e esportes como futebol, basquete, beisebol, luta livre e esqui (Baker et al., 1985; Silver e Campbell, 1985). A incidência de lesões no menisco medial é aproximadamente quatro vezes mais alta do que no menisco lateral. Em comparação com o menisco lateral, o movimento do menisco medial é bastante restringido por sua firme inserção ao ligamento medial via cápsula articular e pela distância entre suas inserções no planalto tibial. Essa amplitude de movimento restringida é tida como responsável pela incidência aumentada de lesões no menisco medial. Quaisquer movimentos anormais do joelho podem resultar em lesão nos meniscos, mas isso ocorre com mais freqüência em torções, ou seja, em rotação axial excessiva da perna. Existem dois tipos de lesão meniscal: 1. ruptura das inserções dos meniscos no planalto tibial e na cápsula articular; 2. esmagamento dos meniscos entre os côndilos femoral e tibial, o que produz rupturas circulares (em alça de balde) e radiais. Essas lesões estão ilustradas na Figura 7.12. Um menisco ou parte dele pode também se tornar aprisionado na incisura intercondilar, o que freqüentemente resulta em bloqueio do joelho – o indivíduo é incapaz de estendê-lo por completo. O único suprimento sangüíneo para os meniscos é pela membrana sinovial na periferia. Ademais, os meniscos estão habi- tualmente sob considerável pressão, especialmente durante o apoio do peso, o que pode manter afastadas as partes rompidas de um menisco lesionado. Conseqüentemente, o re- paro de um menisco lesionado tende a ser lento e pode não ocorrer. Por essa razão, é prática médica normal remover um menisco gravemente avariado. Entretanto, as recentes técnicas cirúrgicas e uma maior consciência da importância dos meniscos para a função do joelho têm direcionado, sempre que possível, a uma remoção parcial em vez da meniscectomia total (Yates e Jackson, 1984; Silver e Campbell, 1985). Figura 7.12. Tipos de rupturas meniscais no joelho. Ruptura radial no menisco medial Ruptura do ligamento transverso Rupturas circulares no menisco lateral Rupturas mistas no menisco medial Ruptura no menisco lateral perto da inserção anterior Cápsula do Joelho As articulações tibiofemoral e patelofemoral dividem uma cápsula articular comum com um formato complicado. A cápsula está inserida acima no fêmur, abaixo na tíbia, e anteriormente na patela (Figura 7.13). Para acomodar os extremos da flexão e da extensão completas, a parte anterior da cápsula é dobrada para cima durante a extensão, e a parte posterior é dobrada para baixo durante a flexão. Durante a flexão do joelho, a parte anterior da cápsula articular retifica- ESTRUTURA E FUNÇÃO DO SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO 209 se e empurra fluido sinovial para trás, onde se coleta em uma bursa (bolsa) formada pela parte posterior frouxa da cápsula. Essa bolsa, presente apenas durante a flexão do joelho, é chamada de bolsa do gastrocnêmio, uma vez que fica entre o aspecto posterior do joelho e o músculo gastrocnêmio. Uma bursa é um saco achatado de membrana sinovial, contendo fluido sinovial. As bursas minimizam a fricção entre estruturas que deslizam entre si durante o movimento normal (ver Capítulo 8). Durante a extensão do joelho, a parte posterior da cápsula articular estira-se – a bursa do gastrocnêmio torna-se gradualmente menor, desaparecendo em extensão total. Quando isso ocorre, o fluido sinovial na bursa do gastrocnêmio é empurrado para frente, onde se coleciona em uma bolsa formada pela parte anterior e frouxa da cápsula. Essa bolsa, presente apenas durante a extensão do joelho, é chamada de bursa suprapatelar. A bursa suprapatelar interpõe- se entre o tendão do quadríceps e o aspecto anterior do fêmur, logo proximal à superfície patelar. A bursa suprapatelar está separada do fêmur por um coxim de gordura conhecido como coxim gorduroso suprapatelar. Entre o espaço limitado pelos dois terços superiores do aspecto posterior do ligamento patelar, pela área intercondilar anterior da tíbia e pelo aspecto anterior e inferior da superfície articular dos côndilos, há um coxim gorduroso conhecido como coxim infrapatelar. Possui um formato grosseiramente triangular em um corte sagital, e está suspenso superiormente a partir de uma banda fibroadiposa conhecida como dobra infrapatelar. A do- bra infrapatelar está inserida anteriormente ao pólo inferior da patela e posteriormente à bor- da anterior da incisura intercondilar (Figura 7.13). O coxim gorduroso infrapatelar está inseri- do anteriormente ao aspecto posterior do ligamento patelar e estende-se a ambos os lados do ligamento patelar. O coxim infrapatelar também estende ramos estreitos a meio caminho em cada lado da patela; os ramos são referidos como dobras alares (alar = referente a asa). O coxim gorduroso infrapatelar protege o ligamento patelar e a parte inferior da patela durante os mo- vimentos do joelho. Figura 7.13. Secção sagital através do complexo do joelho mostrando o formato da cápsula em extensão. Dobra infrapatelar Patela Bursa suprapatelar Coxim gorduroso infrapatelar Bursa infrapatelar Ligamento patelar Bursa pré-patelar Coxim de gordura suprapatelar Tendão do quadríceps Músculo gastrocnêmio 210 JAMES WATKINS Ligamentos do Joelho Quatro ligamentos extracapsulares sustentam a articulação tibiofemoral. O ligamento lateral (também referido como ligamento colateral lateral ou ligamento colateral fibular) insere-se superiormente no epicôndilo lateral do fêmur e inferiormente na cabeça da fíbula (Figura 7.14a). O ligamento medial (também referido como ligamento colateral medial ou ligamento colateral tibial) insere-se superiormente no epicôndilo medial do fêmur e inferiormente no aspecto medial da tíbia, abaixo do côndilo tibial (Figura 7.14b). As fibras posteriores do ligamento medial misturam-se com a cápsula articular ao nível do menisco medial, assim, o ligamento medial não é completamente extracapsular. O arranjo dos ligamentos medial e lateral e a curvatura dos côndilos femorais é tal que ambos os ligamentos estão relativamente frouxos quando o joelho é flexionado, mas tornam-se progressivamente mais retesados com o estender do joelho. Em uma articulação normal, os ligamentos estão completamente retesados quando a articula- ção estiver totalmente estendida. Nessa posição articular, ambos os ligamentos ajudam a pre- venira a hiperextensão e a rotação lateral da tíbia em relação ao fêmur. Além disso, os ligamen- tos medial e lateral ajudam a prevenir, respectivamente, a abdução e a adução (ver Figuras 5.23 e 5.24). Com o joelho completamente estendido, a amplitude de abdução e de adução é normal- mente zero. Uma vez que os ligamentos medial e lateral estão relativamente frouxos quando o joelho está fletido, pode ocorrer uma certa quantidade de rotação axial, abdução e adução da perna quando o joelho estiver flexionado em uma posição sem carga. Por exemplo, ao sentar em uma mesa com a perna pendendo livremente, as amplitudes de rotação interna e externa estão normalmente em torno de 30° e 40°, respectivamente (Norkin e Levangie, 1992). Entre- tanto, as amplitudes de abdução e de adução são normalmente muito pequenas, aproximada- mente de 2° e 5°. As lesões aos ligamentos lateral e, principalmente, medial são comuns em esportes (Reider, 1996). A causa clássica da lesão do ligamento medial é um golpe ao aspecto lateraldo joelho Figura 7.14. Ligamentos do joelho (mostrando joelho esquerdo); (a) aspecto lateral; (b) aspecto medial. ba Ligamento cruzado anterior Ligamento cruzado posterior Ligamento lateral Ligamento medial Ligamento cruzado posterior 214 JAMES WATKINS mento anormal da patela sobre os lados lateral e medial da articulação patelofemoral, respecti- vamente (Figura 7.17, b e c). Os alinhamentos lateral e medial da patela estiram a cápsula articular e os retináculos, e também aumentam a força de compressão sobre as superfícies articulares por causa de uma diminuição na área de contato entre elas. Se prolongado, o alinhamento anormal pode resultar em dor ao redor e sob a patela. A dor pode ser exacerbada por exercícios envolvendo a flexão e a extensão do joelho durante o apoio, como corrida, saltos e subir ou descer escadas. A dor pode também ocorrer quando se fica sentado por longos períodos com o joelho flexionado, como em um carro ou no teatro (Callaghan e Oldham, 1996). Em adultos mais velhos, a condi- ção freqüentemente associada com lesão à cartilagem articular da patela e, assim, pode estar associada com condromalácia patelar (condro = cartilagem, malácia = amolecimento) (Casscells, 1982). Entretanto, em crianças e adultos jovens, a condição habitualmente ocorre sem qualquer lesão óbvia à cartilagem articular; para esses casos usa-se o termo geral síndrome de dor patelofemoral (ou um termo similar, como síndrome de compressão patelofemoral, síndrome de mal-alinhamento patelofemoral, ou patelalgia) (Galea e Albers, 1994; Percy e Strother, 1985). A dor é tida como sendo causada por estiramento das estruturas de sustentação fibrosa (cápsula articular e retináculos) e membrana sinovial associada a compressão no osso subcondral. Dife- rentemente da cartilagem articular, as estruturas de sustentação fibrosa, a membrana sinovial e o osso subcondral têm um rico suprimento de receptores da dor. Uma alta incidência de síndrome de dor patelofemoral e, em um menor grau, de condromalácia patelar é comum entre dançarinos de teatro (Reid, 1987; Winslow e Yoder, 1995) e participantes de esportes como corridas de longa distância (Clement et al., 1981; Ferretti, Papandrea e Conteduca, 1990), e em treinamento via jogging (Kujala et al., 1986). A síndrome de dor patelofemoral também é co- mum na população não-atlética (McConnell 1986). As pressões exercidas sobre a patela pelo tendão do quadríceps, pelo ligamento patelar e pelos retináculos normalmente mantêm a congruência máxima e o alinhamento nor- mal da articulação patelofemoral. Qualquer mudança no padrão normal dessas pres- sões pode resultar em alinhamento anormal. Se prolongado, o alinhamento anormal pode resultar em síndrome de dor patelofemoral. Causas de Alinhamento Anormal Existem quatro principais causas de alinhamento anormal que freqüentemente interagem en- tre si: anormalidades esqueléticas, desequilíbrio de forças no quadríceps, desequilíbrio de for- ças nas estruturas de sustentação fibrosa e movimentos compensatórios do joelho em resposta a movimentos anormais do pé. Figura 7.17. Alinhamento da patela (mostrada a perna direita); (a) alinhamento normal; (b) alinhamen- to lateral; (c) alinhamento medial. cba Síndrome de dor patelofemo- ral: dor persistente ao redor da patela, freqüentemente associa- da com alinhamento anormal, que é tida como sendo causada por estiramento das estruturas fibrosas de sustentação (cápsu- la articular e retináculos), mem- brana sinovial associada e pres- são de compressão no osso subcondral. ESTRUTURA E FUNÇÃO DO SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO 215 Anormalidades esqueléticas. Uma variedade de anormalidades esqueléticas pode contribuir para o alinhamento anormal; incluem o tamanho do ângulo Q, genu varo e valgo, patela alta e patela baixa e o tamanho da borda lateral da superfície patelar. • O ângulo Q. A posição da tuberosidade tibial afeta a linha de arrasto do quadríceps e, por conseguinte, o alinhamento da patela. A posição normal da tuberosidade tibial é tal que, na posição anatômica, o ligamento patelar corre para baixo e levemente lateral (Figura 7.18a). Entretanto, se a tuberosidade estiver localizada mais lateralmente que o normal, existe uma tendência para um alinhamento lateral. Similarmente, se estiver localizada mais medialmente que o normal, existe uma tendência para alinhamento medial. A orientação do ligamento patelar em relação ao tendão do quadríceps pode ser avaliada pela medida do ângulo Q – o ângulo entre a linha unindo a espinha ilíaca ântero-superior e o centro da patela e a linha unindo o centro da patela e o ponto médio da tuberosidade tibial (Figura 7.18b). Em homens, o ângulo Q é de aproximada- mente 14°. Em mulheres, aproximadamente 17°, por causa do relativo aumento da largura dos quadris em comparação aos homens (Aglietti, Insall e Cerulli, 1983). Os aumentos e as diminuições do ângulo Q, com relação a esses valores normais, estão associados com uma incidência aumentada de síndrome de dor patelofemoral (Huberti e Hayes, 1984). • Genu varo e genu valgo. O genu varo (pernas arqueadas) e o genu valgo (joelhos cola- dos) podem levar a um alinhamento anormal da patela. Quando essas condições de- senvolvem-se durante a infância, são habitualmente o resultado do modelamento nor- mal em resposta aos padrões anormais de pressão impostas sobre os joelhos pelo efei- to combinado das forças musculares e do peso corporal (ver Capítulo 11). As adapta- ções esqueléticas do genu varo e do genu valgo garantem a transmissão normal de pressões através do joelho; os joelhos são funcionalmente normais, embora possam Figura 7.18. O ângulo Q; (a) aspecto anterior do joelho direito, mostrando o alinhamento do tendão do quadríceps e o ligamento patelar; (b) o ângulo Q. ba Ângulo Q 216 JAMES WATKINS parecer anormalmente alinhados. É apenas provável que as articulações tornem-se funcionalmente anormais quando o equilíbrio entre o peso corporal e as forças mus- culares mudar. Isso se aplica a todos os indivíduos, mas aqueles com genu varo e genu valgo são mais prováveis de desenvolver joelhos funcionalmente anormais como re- sultado de alterações no equilíbrio entre as forças musculares e o peso corporal do que aqueles com joelhos normalmente alinhados. Com o avanço da idade, é provável que com a fraqueza muscular aumente o grau de varo de um indivíduo com genu varo, assim como aumente o grau de valgo em alguém com genu valgo. Quando isso acontece, as articulações tornam-se incongruentes, o que resulta em um aumento na força de compressão em partes da cartilagem articular em contato – os côndilos laterais do fêmur e da tíbia em alguém com genu valgo ou os côndilos mediais do fêmur e da tíbia em alguém com genu varo. Se a situação persistir, a cartilagem sobrecarregada pode so- frer erosão. Com o adelgaçamento da cartilagem, o grau de mal-alinhamento entre o fêmur e a tíbia aumenta. A remoção do menisco lateral ou medial pode levar a mesma cadeia de eventos: pressão excessiva em um lado da articulação, adelgaçamento gradual da cartilagem, e um aumento gradual no grau de varo ou de valgo (Yates e Jackson, 1984). Claramente, qualquer aumento no grau de varo ou de valgo dos joelhos durante a fase adulta pode causar alinha- mento anormal da patela; um aumento no varo pode causar alinhamento medial, e um aumen- to no valgo pode causar um alinhamento lateral. • Patela alta e patela baixa. O comprimento do ligamento patelar é determinante da altura da patela em relação à articulação tibiofemoral. Normalmente, a proporção do comprimento da patela ao ligamento patelar é de aproximadamente 1,0; a variação de mais de 20% nessa proporção é considerada anormal (Insall e Salvati 1971). Uma pro- porção de 0,8 ou menos é referida como patela alta – uma patela elevada –, e uma proporção de 1,2 é referida como patela baixa – uma patela rebaixada. A patela alta e a patela baixa estão associadas com uma incidência aumentada de síndrome de dor patelofemoral, que pode ser causada em parte por alinhamento anormalda patela (Insall e Salvati, 1971; Lancourt e Cristini, 1975; Kujala et al., 1987). • Borda lateral da superfície patelar. Mecanismos passivos e ativos restringem o movi- mento da patela. Os mecanismos passivos são o retináculo, suas inserções capsulares e o formato da articulação patelofemoral. Essa articulação tem um formato de V em secção transversa, que evita o movimento lateral da patela no sulco intercondilar (ver Figura 7.17a). O mecanismo ativo é a força de aposição exercida sobre a patela – a força que pressiona a patela no sulco intercondilar como resultado da contração dos múscu- los quadríceps. Quanto maior a força exercida pelo quadríceps e o grau de flexão do joelho, maior a força de aposição (Figura 7.19a). Entretanto, com a extensão do joelho, o ângulo entre o tendão do quadríceps e o ligamento patelar diminui de tal forma que a força de aposição sobre a patela diminui também. Na extensão completa do joelho, a força de aposição pode ser quase zero e, assim, a patela pode se deslocar lateralmente (Figura 7.19b). Nessa situação, uma das principais restrições que evita o deslocamento lateral da patela é a borda lateral da superfície patelar, que é mais proeminente anteri- ormente do que na borda medial (ver Figura 7.17b). Se a borda lateral da superfície patelar for menos proeminente que o normal, a patela pode se deslocar lateralmente na extensão completa do joelho (Kapandji, 1970). A luxação lateral freqüente da patela é referida como luxação recorrente da patela. Desequilíbrio de Forças no Quadríceps. Os quatro músculos do quadríceps (reto femoral, vasto lateral, vasto intermédio, vasto medial) puxam a patela em diferentes direções, mas em indivíduos normais o efeito global dos quatro músculos é uma tração mais ou menos vertical que produz o alinhamento normal da patela (Figura 7.20). A tendência do vasto lateral e, em menor grau, do reto femoral e do vasto intermédio para puxar lateralmente a patela é normal- mente balanceada pelo vasto medial. O vasto medial fica mais ativo durante os últimos 20° de extensão do joelho. Se não for alcançada a amplitude máxima de extensão do joelho, pode-se ESTRUTURA E FUNÇÃO DO SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO 217 desenvolver um desequilíbrio de forças entre o vasto medial e o vasto lateral; o vasto medial pode tornar-se relativamente mais fraco, resultan- do em deslocamento lateral e, por conseguinte, em alinhamento lateral da patela. Um corredor de longa distância que não estender completamente seus joelhos durante a fase de propulsão de cada passada é capaz de de- senvolver essa condição. A fraqueza de vasto medial está associada com uma incidência aumentada de síndrome de dor patelofemoral e de luxação lateral recorrente da patela (Kujala et al., 1986; Bose, Kanagasuntheram e Hosman, 1980; Cash e Hughston, 1988). Desequilíbrio de Forças nas Estruturas Fibrosas de Sustentação. O liga- mento patelar, o tendão do quadríceps e os retináculos medial e lateral são unidos pela cápsula articular e pela fáscia dos músculos que contro- lam o movimento do joelho. Em alguns indivíduos, as estruturas fibrosas em um lado da articulação, habitualmente do lado lateral, tornam-se mais espessas e mais curtas do que aquelas no outro lado e a patela é puxada para um lado, resultando em alinhamento anormal (Silver e Campbell, 1985; Micheli e Stanitski, 1981). Movimento Compensatório do Joelho Ocasionado por Movimento Anor- mal no Pé. Em atividades que envolvam carga, a pronação (ver seção seguinte) e a supinação do pé podem resultar, respectivamente, em rota- ção interna e rotação externa da tíbia com relação ao fêmur. A rotação interna da tíbia pode resultar em rotação medial simultânea e em desloca- mento medial da patela. Se, como acontece em muitos esportes, a pronação do pé estiver associada com atividade forçada do quadríceps, pode ocor- rer alinhamento anormal da patela por uma combinação de rotação medial e deslocamento medial da patela. Pode ocorrer síndrome de dor patelofemoral se tais movimentos ocorrerem com alta freqüência, como em corridas de longa distância ou saltando e caindo no voleibol. Figura 7.20. Forças ativas e passivas que agem sobre a patela. As forças ativas incluem o quadrí- ceps: RF – reto femoral; VL – vasto lateral; VM – vasto medial; VI – vasto intermédio. As forças pas- sivas incluem o LP – ligamento patelar; RL – reti- náculo lateral; RM – retináculo medial Figura 7.19. Efeito do ângulo da articulação do joelho sobre a aposição da patela; (a) joelho fletido em 45°; (b) extensão completa do joelho. ba RL RM L P Dica do professor Neste vídeo com conteúdo visual-informativo pode-se ver, de forma mais dinâmica, os conceitos trabalhados nesta Unidade de Aprendizagem. Alguns exemplos têm como objetivo auxiliar na compreensão da estrutura que forma o joelho, o papel do menisco, da cápsula articular, dos ligamentos e da patela, bem como as causas de alinhamento anormal desta estrutura. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/d71da5f0c5b3db6aa0d12b9982005cc7 Na prática O salto vertical é um dos principais aspectos da prática do voleibol. Este movimento é caracterizado por um movimento balístico de rápida ação muscular excêntrica seguida por contração concêntrica máxima e demanda grande capacidade de geração de força e trabalho da musculatura envolvida, principalmente do músculo quadríceps. Devido a esta demanda sobre o mecanismo extensor, desequilíbrios entre os músculos extensores e flexores podem se fazer presentes, levando à sobrecarga das estruturas musculotendíneas em torno da articulação do joelho. Esta demanda específica do voleibol sobre a articulação do joelho pode estar relacionada com a grande incidência de lesões nesta articulação. O aumento da probabilidade de lesões musculares e/ou articulares tem sido clinicamente apontado como consequência de diferenças anormais de torque entre agonistas/antagonistas e/ou grupos musculares contralaterais. A demanda imposta à articulação do joelho pela prática esportiva resulta em adaptações musculares específicas, podendo gerar desequilíbrios das forças que agem estática e dinamicamente em torno desta articulação. Esses desequilíbrios musculares podem predispor os atletas às lesões por produzirem elevados níveis de stress nos tecidos. Sendo assim, torna-se necessário o estabelecimento de parâmetros de função muscular relacionados a esta articulação, em atletas. Uma das principais formas de mensuração destes desequilíbrios musculares é através de avaliações isocinéticas. A partir desta avaliação são mensurados os torques agonistas e antagonistas dos músculos extensores e flexores de joelho, e, a partir da razão estabelecida, pode-se identificar o desequilíbrio. A principal forma de medida é a razão obtida entre o torque excêntrico dos flexores de joelho e o torque concêntrico dos extensores de joelho. Assim, verifica-se que valores entre 0,9 e 1,2 são considerados normais, ou seja, apresentando equilíbrio muscular. No entanto, valores inferiores a estes são relacionados a um aumento na probabilidade de lesões articulares (ruptura de ligamentos) e outras lesões musculares. Saiba + Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Avaliação muscular isocinética da articulação do joelho em atletas das seleções brasileiras infanto e juvenil de voleibol masculino Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Filme Cinesiologia do Joelho Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Futebol - Lesões de joelho e chuteiras com Dr. Joaquim Grava Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. http://www.scielo.br/pdf/rbme/v11n6/a05v11n6.pdf https://www.youtube.com/watch?v=W7uLv7Fkhzo https://www.youtube.com/watch?v=-sQvIDZ1_us