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gente criando o futuro
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Diretor-presidente Jânyo Diniz
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ASSISTA
Indicação de filmes, vídeos ou similares que trazem informações comple-
mentares ou aprofundadas sobre o conteúdo estudado.
1
CITANDO
Dados essenciais e pertinentes sobre a vida de uma determinada pessoa
relevante para o estudo do conteúdo abordado.
1
CONTEXTUALIZANDO
Dados que retratam onde e quando aconteceu determinado fato;
demonstra-se a situação histórica do assunto.
1
CURIOSIDADE
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1
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tratado.
1
DICA
Um detalhe específico da informação, um breve conselho, um alerta, uma
informação privilegiada sobre o conteúdo trabalhado.
1
EXEMPLIFICANDO
Informação que retrata de forma objetiva determinado assunto.
!
EXPLICANDO
Explicação, elucidação sobre uma palavra ou expressão específica da
área de conhecimento trabalhada.
Unidade 1 - Aspectos gerais da Psicopatologia
Objetivos da unidade ........................................................................................................... 12
Definição e evolução histórica da Psicopatologia ....................................................... 13
Raízes históricas da Psicopatologia ......................................................... ................... 13
Definição de psicopatologia .......................................................................................... 14
Saúde e doença em Psicopatologia ................................................................................. 16
Conceito de normalidade .............................................................................................. 16
Critérios de normalidade ................................................................................................ 17
Etiopatogenia em Psicopatologia ..................................................................................... 19
Determinismos biológicos e o papel do meio ............................................................ 20
Fatores de risco e de proteção para a saúde mental .............................................. 21
O estudo das funções psíquicas ........................................................................................ 26
O psicodiagnóstico .......................................................................................................... 27
A entrevista ..................................................................................................................... 28
O exame psíquico ........................................................................................................... 31
Sintetizando ........................................................................................................................... 36
Referências bibliográficas ................................................................................................. 37
Unidade 2 - Funções psíquicas elementares e transtornos psicopatológicos
Objetivos da unidade ........................................................................................................... 40
Funções psíquicas elementares ........................................................................................ 41
Alterações na consciência e na atenção .................................. ................................. 41
Alterações na orientação e nas vivências de espaço e tempo .............................. 45
Alterações na memória, na afetividade e na inteligência ........................................ 47
Alterações na vontade e no agir .................................................. ................................. 52
Funções psíquicas superiores ........................................................................................... 55
Alterações na linguagem .............................................................. .... ........................... .. 56
Alterações no pensamento e no juízo de rea lidade .................................................. 57
Semiologia médica e psicopatológica ............................................................................ 59
Semiologia médica ........................................................................................................ .. 59
Nosologia e semiologia psicopatológica .................................................................... 60
Transtornos psicopatológicos ou psiquiátricos ............................................................. 62
Descrição dos transtornos psicopatológicos ............................................................. 62
Sintetizando ........................................................................................................................... 67
Referências bibliográficas ................................................................................................. 68
Unidade 3 - Tratamento das psicopatologias, as neuroses, a ilusão e as alucinações
Objetivos da unidade ........................................................................................................... 70
Ambiente psiquiátrico e tratamento das psicopatologias ...................... ..................... 71
Tratamento farmacoterápico .................................................................... ..................... 72
Eletroconvulsoterapia ..................................................................................................... 72
Tratamentos psicoterápicos .......................................................................................... 73
O contexto social e familiar no desenvolvimento das psicopatologias .................... 77
Influência familiar no desenvolvimento das psicopatologias .................................. 77
Rede de apoio e cuidados na comunidade ................................................................. 78
Neuroses e tratamento ........................................................................................................ 79
Causas possíveis das neuroses ............................................................... .. ................... 80
Diferenças entre a neurose e a psicose na infância ................................................ 82
Tratamento das neuroses ............................................................................ ................... 85
Ilusão e alucinação .............................................................................................................. 86
Ilusão e pareidolia ........................................................................................................... 86
Alucinações e sinestesia ............................................................................................... 88
Sintetizando ........................................................................................................................... 91
Referências bibliográficas .................................................................................................92
Unidade 4 - Distimia, esquizofrenia, transtorno de personalidade antissocial e
abordagens atuais de tratamento
Objetivos da unidade ........................................................................................................... 95
Transtorno depressivo persistente (distimia) ................................................................. 96
Causas e diagnóstico ...................................................................................................... 97
Esquizofrenia ou espectro da esquizofrenia ................................................................... 98
Tinns r!P. P.sn11imfrP.ni::i .. ......................................... ................... . ............... lílíl
Causas e diagnóstico .................................................................................................... 101
Tratamento e prognóstico ............................................................................................ 103
Transtorno de personalidade antissocial (TPAS) ......................................................... 105
Causas e prevalência ................................................................................................... 106
Diagnóstico e tratamento ............................................................................................. 107
Abordagens atuais e alternativas para o tratamento das psicopatologias ............... 109
Hospital-dia psiquiátrico .............................................................................................. 112
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) ................................................................. 113
Trabalhos comunitários e alternativas de tratamento ............................................ 114
Sintetizando ................................... ...................................................................................... 116
Referências bibliográficas ............................................................................................... 117
Olá, estudante! Seja bem-vindo!
A Psicopatologia é essencial para o trabalho em saúde mental, seja em con-
sultórios ou em serviços de tratamento, pois apesar de ser considerada uma
área autônoma, a Psicopatologia faz interface e fundamenta a prática de pro-
fissionais de saúde mental, como psicólogos, psiquiatras, neuropsiquiatras, te-
rapeutas ocupacionais, enfermeiros e assistentes sociais.
A Psicopatologia é a ciência que trata dos transtornos mentais, suas causas,
mudanças estruturais e funcionais e formas de sua manifestação. Esta ciência
compreende a ordenação dos fenômenos psicopatológicos, a nosologia psi-
quiátrica, a semiologia psiquiátrica, a etiopatogenia dos transtornos mentais
no desenvolvimento humano e a análise dos fatores de risco e de proteção
para a saúde mental.
Além disso, ela é usada para analisar as formas de tratamento psicológico
do paciente psiquiátrico e conhecer a importância do contexto social e familiar
no desenvolvimento das psicopatologias.
Ao longo deste curso, vamos apresentar os conceitos centrais da Psicopa-
tologia e as ideias sobre normalidade e patologia, além de analisar as funções
mentais e suas alterações. Por fim, vamos conhecer algumas psicopatologias,
como neurose, esquizofrenia, transtorno de personalidade antissocial e os
transtornos mentais que ocorrem na infância e na adolescência, assim como
os contextos de tratamento das psicopatologias (o hospital-dia, o Centro de
Atenção Psicossocial e os trabalhos em comunidades).
PSICOPATOLOGIA •
A professora Juliana Zantut Nutti é
doutora (2001) e mestre (1996) em Edu-
cação pela Universidade Federal de São
Carlos - UFSCAR, e é graduada em Psi-
cologia pela Universidade Federal de
Uberlândia (1989).
É autora de materiais didáticos instru-
cionais desde 2016, com diversas pro-
duções realizadas para uma série de
disciplinas de cursos de Graduação e
Pós-Graduação na modalidade de edu-
cação à distância. Atua como coorde-
nadora de cursos de especialização em
Psicopedagogia Clínica e Institucional
desde 2001. É docente de diversos mó-
dulos em cursos de Pós-Graduação na
área de Psicopedagogia, sendo docente
do Ensino Superior desde 1999.
Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/8740276268617428
Dedico esse trabalho aos meus sobrinhos-netos Nicolas e Julian. Que eles se
desenvolvam em uma sociedade digna e promovedora de saúde mental.
Dedico-o, também, aos profissionais da área de saúde mental que auxiliam as
pessoas que sofrem de enfermidades mentais e são excluídas socialmente.
UNIDADE
~
~
---• ---
PSICOPATOLOGIA •
ser
educacional
Objetivos da unidade
Conhecer a definição e a evolução histórica da Psicopatologia;
Discutir os conceitos de normalidade e patologia em Psicopatologia;
Analisar a etiopatogenia e as formas de estudo das funções psíquicas.
Tópicos de estudo
Defin ição e evolução histórica
da Psicopatologia
Raízes históricas da Psicopatologia
Definição de psicopatologia
Saúde e doença em Psicopatologia
Conceito de normalidade
Critérios de normalidade
Etiopatogenia em Psicopatologia
Determinismos biológicos e o
papel do meio
Fatores de risco e de proteção
para a saúde mental
O estudo das funções psíquicas
O psicodiagnóstico
A entrevista
O exame psíquico
PSICOPATOLOGIA •
••
Definição e evolução histórica da Psicopatologia
A Psicopatologia é uma área científica que estuda o transtorno mental nos
seguintes aspectos: suas causas; as alterações estruturais e funcionais relaciona-
das ao quadro; métodos de investigação; e formas de manifestação, como sinais
e sintomas.
Os transtornos mentais se manifestam por meio do comportamento, cogni-
ção e experiências subjetivas anormais (CH ENIAUX, 2015). Sua evolução histórica
está ligada à Medicina e aos estudos da Filosofia, da Psicologia e da psicanálise .
••
Raízes históricas da Psicopatologia
O termo psicopatologia foi usado pela primeira vez por Jeremy Bentham,
em 1817, porém Esquirol e Griesinger, a partir da publicação de seus trabalhos
na França, em 1837, e na Alemanha, em 1845, respectivamente, são os f unda-
dores oficiais dessa área (CHEN IAUX, 2015).
As raízes históricas da Psicopatologia estão na tradição médica, o que a levou,
em sua evolução, à observação longa e cuidadosa de um número considerável
de pessoas com transtornos mentais. Por outro lado, a Psicopatologia também
decorre da área humanista, como a Filosofia, a Literatura, as artes e a psicaná-
lise, que veem no transtorno e no so-
frimento mental formas de expressão
e de reconhecimento das dimensões
humanas que, sem a ocorrência desses
fenômenos, permaneceriam ocultas.
Um dos maiores representantes da
área de Psicopatologia é o fi lósofo e
psiquiatra alemão Karl Jaspers (1883-
1969), que afirmava que a Psicopatolo-
gia é uma ciência básica que dá apoio
O tJ.:>1'1UIOll 10, C \..UJV \..VI II IC\,.II I I CI llU C
aplicado a uma prática profissional e
social concreta (DALGALARRONDO,
2019). Figura 1. Karl Jaspers.
PSICOPATOLOGIA •
Oficialmente, a área de Psicopatologia nasceu e evoluiu a partir da prática
psiquiátrica, que é uma especialidade médica que utiliza esses conhecimentos
como os seus fundamentos.
••
Definição de psicopatologia
A palavra psicopatologia significa, etimologicamente, o discurso ou saber
(logos) sobre o sofrimento (pathos) da mente (psykhé) (CECCARELLI, 2005). A
área da Psicopatologia estuda uma variedade de transtornos mentais que são
considerados como "vivências, estados mentais e padrões comportamentais
que apresentam, por um lado, uma especificidade psicológica (as vivências dos
doentes mentais (sic) possuem dimensão própria, genuína, não sendo apenas
'exageros' do normal)" (DALGALARRONDO, 2019, p. 27).
De forma mais ampla, a Psicopatologia é considerada como o conjunto de
conhecimentos sistemáticos e elucida-
tivos referentes ao adoecimentomen-
tal do ser humano que, por ser uma
área científica, não atribui critérios de
valor nem de moralidade, nem pos-
sui dogmas e/ou verdades absolutas
sobre as enfermidades mentais. Ao
psicopatologista cabe a observação,
identificação e compreensão dos ele-
mentos do transtorno mental, rejei-
tando-se os dogmas religiosos, filo-
sóficos, psicológicos ou biológicos, já
que o conhecimento buscado deve ser
permanentemente revisto e reformulado (DALGALARRONDO, 2019).
,
Portanto, a Psiquiatria representa a aplicação prática da Psicopatologia,
mas se utiliza do conhecimento de outras disciplinas científicas. Também di-
fere da Neurologia e da Psicologia, pois é uma ciência autônoma, apesar de se
beneficiar das tradições dessas duas áreas. As relações entre a Psicopatologia
e a Psicologia possuem três classificações, de acordo com Sonenreich e Bassitt
(1979), conforme se vê no Quadro 1:
PSICOPATOLOGIA •
QUADRO 1. RELAÇÕES ENTRE A PSICOPATOLOGIA E A PSICOLOGIA
~
r
1. Psicopatologia como a
patologia do psicológico:
a Psicopatologia f vista
como uma subdisclplina da
Psicologia geral e estuda os
fen&nenos anormais.
....
2. Psicopatologia como a psicologia
do patológico:
a Pskopatologla fuma dlnda
audnoma que estuda as~
quantitativas do normal. Essa f a
dasslfkação mais utllzada.
3. Psicopatologia como
semiologia psiquiátrica:
a Psicopatologia se restringe ao
estudo dos sintomas e sinais dos
transtornos pslqui.icos.
Ainda sobre as relações da Psicopatologia com as outras áreas de conheci-
mento, ela se relaciona a variadas abordagens e referenciais teóricos.
Para Cheniaux (2015, p. 19), "não há apenas uma psicopatologia: são várias".
Assim, elas podem ser divididas em dois grupos: explicativas e descritivas. As
psicopatologias explicativas são baseadas nos modelos teóricos, em estudos ex-
perimentais e procuram esclarecer sobre a etiologia (conjunto de prováveis cau-
sas) dos transtornos mentais. Elas podem seguir uma abordagem psicodinâmica
(por exemplo, a psicanálise), cognitiva, existencial, biológica ou social.
No grupo das psicopatologias descritivas estão as linhas que enfatizam ades-
crição e a categorização das experiências anormais, de acordo com a informação
dada pelo paciente e pela observação clínica de seu comportamento. É baseada
na semiologia (ciência que estuda os símbolos e signos) e apoia a psiquiatria clíni-
ca, como é o caso da psicopatologia fenomenológica. No entanto, explicar e des-
crever são comportamentos complementares, pois somente se pode
explicar algo que já foi descrito previamente. Em síntese, a Psicopa-
tologia é uma área científica que estuda os transtornos
mentais, sua etiologia, sinais e sintomas e as alterações
estruturais e comportamentais produzidas no indi-
víduo. É autônoma, mas dialoga e apoia o trabalho
prático do psiquiatra e de outros profissionais de
saúde mental.
PSICOPATOLOGIA •
••
Saúde e doença em Psicopatologia
Uma das discussões mais complexas na Psicopatologia envolve os critérios
de saúde e doença, isto é, de normalidade e de patologia em saúde mental.
A distinção do que se considera como o normal e patológico em Medicina é
imprecisa e até mesmo na Psiquiatria e na Psicopatologia, em que se uti lizam
cotidianamente os termos, são questionados.
••
Conceito de normalidade
Cheniaux (2015) cita três critérios de normalidade: o subjetivo, o estatís-
tico e o qualitativo. De acordo com o critério subjetivo, considera-se como
doente quem está sofrendo ou se sente doente. No critério estatístico ou
quantitativo, considera-se normal o que é comum ou que está significante-
mente próximo da média. No critério qualitativo, o normal é considerado
como aquilo que é adequado a um padrão funcional considerado como ideal.
Um dos principais estudos sobre o conceito de normalidade em Psicopato-
logia foi realizada por Canguilhem, na obra O normal e o patológico, publicada
em 1943. O autor apresenta duas concepções distintas sobre os transtornos:
na primeira, apresenta a relação saúde-doença sob o ponto de vista quanti-
tativo e, na segunda, sob o ponto de vista qualitativo. A doença, sob o ponto
de vista quantitativo, se diferencia do estado de saúde normal quando há
uma perturbação no grau ou quantidade de
equilíbrio do corpo: o organismo irá buscar
o retorno ao estado quantitativo de equi-
líbrio, ou seja, a normalidade, anulando a
doença e atingindo a cura (CANGUILHEM,
2009).
Sob o ponto de vista qualitativo, saúde e
doença são tratados como estados distintos,
não tendo um grau específico de diferença entre
um e outro. A doença é pensada como algo que
transforma o indivíduo e que o faz ser diferente
do indivíduo anterior.
PSICOPATOLOGIA •
••
Critérios de normalidade
Existem vários critérios de normalidade em Psicopatologia, como se pode verifi-
car a seguir (DALGALARRONDO, 2019):
• Normalidade como a ausência de doença: de acordo com esse critério, a
saúde é a ausência de sintomas, sinais ou doenças. O indivíduo considerado normal
é aquele que não é portador de nenhum transtorno mental definido. Esse critério é
considerado significativamente falho, pois se define a saúde não pelo que ela é, mas
sobre o que falta ao indivíduo para ser normal;
• Normalidade ideal: a normalidade é vista de forma utópica, pois se estabe-
lece uma norma idealizada do que se considera suspostamente como sadio e mais
evoluído, utilizando critérios socioculturais e ideológicos arbitrários e, às vezes, dog-
máticos e doutrinários;
• Normalidade estatística: o conceito de normalidade é considerado como
aquilo que se observa mais frequentemente na população em geral e se aplica a
fenômenos quantitativos. Sendo assim, os indivíduos que se encontram nos extre-
mos das curvas de distribuição normal (curva de Gauss) passam a ser considerados
anormais ou doentes. Esse critério também é considerado falho, pois nem sempre
fenômenos muito frequentes são um sinal de normalidade e seus extremos são
anormais. Exemplos: cáries dentárias, uso abusivo de álcool, sintomas ansiosos e
depressivos leves, entre outros;
· Normalidade como bem-estar: critério definido pela Organização Mundial
de Saúde (OMS) que concebe a saúde como o completo bem-estar físico, mental e
social e não como ausência de doença. Esse conceito também é alvo de críticas por
_,._, .... ._ .... ,. ,._.,, .__.._, •• ''".r ..... _. _,....,J._ ... " ..... , •' , ....... _. "._._,,._. ._ •• ''t"'' _._.,_,_., ,.,_. .... ._ ...... _. • ._ ......... , • ...... ......... ._b....,' , ....
de utopia, pois poucas pessoas se classificariam na categoria de saudáveis;
• Normalidade funcional: está fundamentada no critério da funcionalidade da
pessoa.já que enquanto o fenômeno patológico é disfuncional a ponto de produzir
sofrimento à própria pessoa e/ou ao seu grupo social;
• Normalidade como processo: nesse critério, a normalidade é vista de forma
dinâmica, não estática, considerando os aspectos dinâmicos do desenvolvimento
psicossocial, de estruturações e reestruturações ao longo da vida e de crises e mu-
danças próprias do ciclo de desenvolvimento humano. Este critério é muito aplicado
na psiquiatria infantil, do adolescente e do idoso;
PSICOPATOLOGIA •
• Normalidade subjetiva: utiliza-se a perspectiva subjetiva do sujeito como
o principal indicador de determinação do estado de saúde. É falho porque as
pessoas em algumas fases de transtorno mental podem se sentir muito bem e
saudáveis, mas na verdade possuírem um quadro psicopatológico grave;
• Normalidade como liberdade: muito usado na linha fenomenológica e
existencial, que entende o transtorno mental como perda da liberdade exis-
tencial, como um constrangimento do ser, fechamento e limitação das possibi-
lidades de existência;
• Normalidade operacional: é um critério arbitrário, com fins pragmáticos,
em que as definições de normal e patológico são decididaspor especialistas
a priori, e, posteriormente, tenta-se atuar com esses critérios, consciente de
suas possíveis consequências. O normal é visto como uma idealização deter-
minada por médias aritméticas ou por estatísticas. No caso dos transtornos
mentais, as estatísticas somente podem ser usadas para um certo número de
pessoas, mas são aplicadas a um indivíduo.
GRÁFICO 1. CURVA DE GAUSS
~
Fonte: Shutterstock. Acesso em: 30/06/2021 (Adaptado'
A finalidade dos critérios de normalidade e doença não é a de
não emitir julgamento de valor, mas de se verificar a fun-
cionalidade da sua utilização para análise em fenôme-
nos, levando-se sempre em conta a posição filosófica do
profissional.
PSICOPATOLOGIA •
ASSISTA
Para compreender melhor os critérios de normalidade e
doença, assista ao vídeo do canal Doxa e Episteme, Histó-
ria da Loucura na Idade Clássica Michel Foucault resumo,
sobre a obra do filósofo Michel Foucault. Nele, vemos um
resumo de como o autor estudou a loucura e os critérios
de normalidade no decorrer da Idade Clássica.
Pode-se concluir que os critérios de normalidade e de patologia, ou anor-
malidade, em Psicopatologia são variados em função de fenômenos específi-
cos com os quais se atua e das opções filosóficas e técnicas do profissional de
saúde mental.
Em alguns casos, podem ser utilizadas as associações de vá-
rios critérios de normalidade ou doença, de acordo
com os objetivos pretendidos. O uso desses crité-
rios exige que os profissionais de saúde tenham
uma postura crítica e reflexiva, pois o que se
chama de normal e patológico deve ser conti-
nuamente estudado.
Etiopatogenia em Psicopatologia
••
Para discutir a etiopagenia, que é o estudo das causas das doenças e dos
mecanismos patogênicos que atuam para desenvolvê-las, deve-se compreender
a relação entre desenvolvimento humano, saúde e transtorno mental.
A área da Psicopatologia que estuda os mecanismos de etiopatogenia é a
psicopatologia desenvolvimental, que é uma área dinâmica e em evolução, cons-
truída a partir da obra de T. Achenbach, Developmental
Psychopathology, publicada em 1974, e dos trabalhos
de Sroufe, Cicchetti e Rutter.
A psicopatologia desenvolvi mental engloba vi-
sões sociais, genéticas e desenvolvi mentais e anali-
sa hipóteses por meio de métodos epidemiológicos e
estatísticos, a fim de entender as origens e o curso dos
transtornos mentais (POLANCZYK, 2009).
PSICOPATOLOGIA •
Os estudos da área da psicopatologia desenvolvimental enfatizavam, ini-
cialmente, o processo de desenvol-
vimento e os transtornos mentais da
infância, mas passaram a invest igar a
continuidade dos transtornos entre a
infância, a adolescência e a idade adul-
ta, além de realizar estudos sobre a
alta proporção de adultos com trans-
tornos mentais já existentes na ado-
lescência.
Os achados das pesquisas com a
abordagem desenvolvimental inte-
gram a epidemiologia, genética, neu-
ropsicologia e estudos de exames de
neuroimagem, demonstrando elevado
potencial para a compreensão das origens dos transtornos mentais.
Portanto, a psicopatologia desenvolvimental é um modelo conceituai do
qual se desenvolvem estratégias de investigação científica e modelos teóricos,
elaboram-se abordagens para a compreensão do como e porque determina-
dos indivíduos são mais propensos a desenvolverem transtornos mentais do
que outros (POLANCZYK, 2009).
••
Determinismos biológicos e o papel do meio
Sobre as determinações biológicas, a influência ambiental e o papel do
meio nos transtornos, a psicopatologia desenvolvimental afirma existir um
consenso entre os pesquisadores de que é a inter-relação entre os fatores
biológicos e as características ambientais que estão na origem dos transtor-
nos mentais. Entre os fatores biológicos, destacam-se a carga genética do
indivíduo, e, no contexto ambiental, o cuidado parental, os relacionamentos
interpessoais e a exposição a eventos estressares.
Os principais achados da psicopatologia desenvolvi mental sobre a origem
dos transtornos mentais, de acordo com Polanczyk (2009), estão listados no
Quadro 2:
PSICOPATOLOGIA •
QUADRO 2. ACHADOS DA PSICOPATOLOGIA DESENVOLVI MENTAL SOBRE OS
TRANSTORNOS MENTAIS
~
Existe uma continuidade no
processo de desenvolvimento dos
transtornos mentais, pois o efeito
das experiências prévias vividas
pelos indivíduos permanece no
decorrer do seu desenvolvimento.
O momento de desenvolvimento
em que o indivíduo se encontra
é um fator fundamental para a
compreensão de todos os outros
fatores envolvidos na determinação
do transtorno mental.
Todos os indivíduos possuem uma
tendência inata de se adaptarem
bem ao seu meio ambiente, mas
se o ambiente é patológico, a
adaptação também será.
Os transtornos mentais devem
ser interpretados e analisados
em relação ao contexto em que o
indivíduo está inserido.
Fatores de risco e de proteção para a saúde mental
•
Para compreendermos o papel dos fatores de risco e de proteção no de-
................. 1 •• - ....................................... , ,.J,.. ....................... 1 .......................... .... ,.. .................... , ........ ,,.. ............................... - ,... ........................... ..-
preender o que é o desenvolvimento humano. Segundo Xavier e Nunes (2015,
p. 17), o desenvolvimento humano "é um terreno vasto, cuja natureza central é
a de descoberta, mudança, avanços, novas aquisições e crescimento".
O processo de desenvolvimento ocorre a cada momento, desde a con-
cepção do indivíduo até a sua morte e se relaciona à vida cotidiana, indo da
aquisição da fala, passando pelo processo de aprendizagem escolar, pelas
transformações físicas da adolescência, até as mudanças biopsicossociais da
vida adulta e do processo de velhice.
O desenvolvimento gera mudanças profundas, especialmente nas duas
primeiras décadas de vida, as quais resultam em avanços significativos nas di-
mensões neuropsicomotora, cognitiva, afetiva, comportamental, social, den-
tre outras, com vários níveis de complexidade. O estudo do desenvolvimento
humano analisa os marcos maturativos universais, como as transformações
físicas e hormonais características da puberdade, que irão ocorrer em todos
os indivíduos, independente da sua cultura.
PSICOPATOLOGIA •
Entretanto, devido à singularidade dos seres humanos, as diferenças indivi-
duais precisam ser consideradas no estudo do desenvolvimento. Isso significa
que cada adolescente vive as mudanças corporais de uma maneira única e irá
atribuir-lhes um significado específico de acordo com as suas experiências. As
três principais concepções ou correntes explicativas do desenvolvimento nas
ciências humanas são:
· Inatismo: parte da ideia de que as situações que ocorrem depois do nas-
cimento não são importantes e pouco interferem no desenvolvimento. As qua-
lidades e capacidades básicas de cada ser humano, como a personalidade, va-
lores, hábitos, crenças, a forma de pensar e a conduta social, já estão prontas
e em sua forma final no nascimento, não sofrendo quase nenhuma ou pouca
diferenciação ao longo do desenvolvimento (XAVIER; NUNES, 2015). O papel do
ambiente seria, portanto, não interferir ou interferir minimamente no proces-
so do desenvolvimento natural da pessoa. As origens do inatismo podem ser
encontradas, por um lado, na teologia (na ideia de destino individual determi-
nado pela graça divina) e, por outro, em um entendimento incorreto das con-
tribuições da proposta evolucionista de Darwin, da embriologia e da genética
(como as mudanças no desenvolvimento das espécies que decorrem de va-
riações hereditárias no qual o papel do ambiente seria limitado). A concepção
inatista produziu uma abordagem autoritária e até pessimista para a educação
de crianças e adolescentes, pois se o ser humano já nasce pronto, só se pode
aprimorar o que ele é ou virá a ser. O ditado "pau que nascetorto morre torto"
expressa a concepção inatista, que aparece ainda hoje nas escolas, camuflada
pela ideologia das aptidões, da prontidão e do coeficiente de inteligência (QI)
(XAVIER; NUNES, 2015);
• Empirismo ou ambientalismo: a concepção empirista/ambientalista atri-
bui questões filosóficas a partir do comprometimento científico. O empirismo
busca refletir o sobre o comportamento a partir de uma análise científica, par-
tindo de problemas específicos de laboratório e aplicáveis a como o mundo
é conhecido (BATISTA, 2007). Esta concepção deriva do empirismo, _....
que é a corrente filosófica que enfatiza a experiência senso-
rial como a única fonte do conhecimento, e que é possível
identificar, controlar e manipular os fatores que estão as-
sociados a essas experiências.
PSICOPATOLOGIA •
Na Psicologia, o maior defensor do empirismo é o estadunidense B. F. Skin-
ner, que se preocupou com a criação da filosofia do behaviorismo radical e, a
partir dela, o desenvolvimento da ciência do comportamento, a qual analisa o
comportamento humano sem descartar aspectos como raciocínio, desejos, fan-
tasias e sentimentos, classificando-os como comportamentos internos. Na con-
cepção de Skinner, o papel do ambiente é tão importante quanto a maturação
biológica, distinguindo, neste ponto, da corrente filosófica do empirismo;
· Interacionismo: para essa concepção, o desenvolvimento é decorrente do
processo da constante interação entre sujeito e objeto. O sujeito tem um papel
ativo na incorporação das estruturas cognitivas aos dados do ambiente, modi-
ficando-as para criar estruturas cada vez mais complexas que lhe permitem o
domínio do ambiente e a sua transformação (XAVIER; NUNES, 2015). O desenvol-
vimento da aprendizagem é fruto desse processo que ocorre no sujeito através
da interação com o ambiente, em que as estruturas vão sendo construídas. Os
estímulos e as informações a que os indivíduos estão expostos vão sendo pro-
cessados através de um processo de construção, o que torna essa perspectiva
também denominada como construtivismo. Várias correntes aparecem nesta
tendência interacionista, com implicações importantes para o entendimento do
desenvolvimento, do ensino e da aprendizagem. Uma delas é a que vem sen-
do denominada de sociointeracionista
construtivista (ou construtivismo so-
ciointeracionista) e que envolve uma in-
terrelação entre as concepções de Pia-
get e Vygotsky (XAVIER; NUNES, 2015).
O conhecimento é um processo social-
mente construído. Através da intera-
ção do sujeito com o outro, torna-se
possível a incorporação dos conheci-
mentos sistematizados e o reconheci-
mento de sua determinação histórica,
ao mesmo tempo em que esse mesmo
sujeito se reconhece como participante
do processo histórico de produção do
conhecimento.
Figura 2. B. F. Skinner (1904-1990), fundador do behav,o-
rismo r ad,cal.
PSICOPATOLOGIA •
A compreensão sobre as concepções explicativas do desenvolvimento hu-
mano auxiliam no estudo sobre os tatores de risco e de proteção na determi-
nação da saúde e do transtorno mental na infância e adolescência, pois esses
fatores são extremamente importantes para a compreensão da trajetória de
vida do sujeito em momentos posteriores de seu desenvolvimento.
Estudos epidemiológicos apontam que há entre 10% e 20% de probabili-
dade de haver o desenvolvimento de
transtorno mental entre crianças e
adolescentes, o que chama a atenção
para a importância da identificação
desses fatores e para a necessidade
de identificação e tratamentos preco-
ces de transtornos nesses momentos
do desenvolvimento.
Estudos e intervenções voltadas
para o público infanto-juvenil revelam
que os fatores envolvidos no desen-
volvimento e na trajetória da saúde mental dessa população são denominados
fatores de risco e fatores de proteção.
Os fatores de risco para a sa úde mental de crianças e adolescentes seca-
racterizam como eventos ou características de desenvolvimento que aumen-
tam as chances da ocorrência de desfechos negativos em saúde mental em
fases posteriores da vida e em diferentes domínios, como na vida afetiva, aca-
dêmica, profissional e financeira. Também estão associados ao maior uso de
serviços e de substâncias na fase adulta (ZAYAT et ai., 2018). A maior parte das
evidências científicas sobre fatores de risco para a saúde mental na infância e
adolescência é originada de estudos longitudinais, realizados em países desen-
volvidos, e foram pesquisados nos ambientes em que essas populações mais
circulam, como no contexto familiar, escolar e comunitário.
Os fatores de risco na infância e adolescência mais citados na literatura in-
cluem a existência de transtornos mentais maternos, o pertencimento à famí-
lia, a residência em bairros de nível socioeconômico baixo, a exposição a dife-
rentes formas de violência e o uso de práticas parenta is negativas e/ou cuidado
parental empobrecido.
PSICOPATOLOGIA •
O nível socioeconômico familiar baixo implica na escassez de recursos mate-
riais, sociais e financeiros e no acesso limitado ou insuficiente a serviços, aumen-
tando a vulnerabilidade na infância e adolescência. Há evidências de que o nível
socioeconômico familiar baixo aumenta o risco de desenvolvimento de todos
os tipos de psicopatologias na infância, como a hiperatividade, problemas emo-
cionais, problemas de relacionamento entre pares e de conduta. A moradia em
bairros com piores condições socioeconômicas na infância também é apontada
como um fator de risco para taxas mais elevadas para a ocorrência de transtor-
nos psiquiátricos na infância (ZAYAT et ai., 2018).
A exposição a diferentes formas de violência é frequentemente associada ao
risco aumentado para psicopatologias na infância e adolescência. Em geral, as
diferentes formas de exposição à violência podem ser classificadas em física, psi-
rnlAair;::1 c::,:1v11;::iil t:l n,:::::.alia8nri.::::a A ,::::.vnnc:::ir3n .::::inc::: rnnflitnc f;::amili;::iin::>c C:::,:::l rnnfio11r;::a
como uma forma de violência doméstica.
Um estudo longitudinal realizado por 17 anos revelou que a convivência e
a comunicação entre pais e filhos permeadas por críticas, gritos e discussões
foram definidas como uma forma de exposição aos conflitos familiares, e que
quanto maior a frequência e a precocidade de exposição aos conflitos familiares,
pior será o desfecho de saúde mental na vida adulta. As práticas parentais utili-
zadas pelos pais na criação de seus filhos são o conjunto de estratégias usadas
para o cuidado e a socialização durante a infância e adolescência. Práticas paren-
ta is negativas de ambos os pais agem como um dos fatores de risco para a saúde
mental na infância e adolescência (ZAYAT et ai., 2018).
Apesar disso, muitos indivíduos que são expostos a esses fatores de risco
parecem lidar bem e resistir às consequências prejudiciais desses fatores, indi-
cando que essa adaptação positiva é um importante processo que os mantêm
protegidos de um transtorno de saúde mental e que podem contar com fatores
que os auxiliam no desfecho positivo.
Já os fatores de proteção são definidos como as características, eventos
ou experiências que atenuam o impacto das experiências adversas ou fatores
de risco, diminuindo a probabilidade de ocorrência de desfechos negativos ou
aumentando a chance de desfechos positivos. Portanto, os fatores de risco e
proteção costumam estar interrelacionados e formam um sistema complexo e
interdependente.
PSICOPATOLOGIA •
Destacam-se enquanto fatores de proteção, a qualidade das interações so-
ciais e do ambiente de desenvolvimento na infância e adolescência (ZAYAT et ai.,
2018). Assim, é a qualidade do fator investigado que irá determinar o impacto
no bem-estar na saúde mental de crianças, adolescentes e de futuros adultos.
As práticas parentais, quando negativas, acarretam prejuízos para a saúde
mental. Se forem positivas,serão benéficas para o desenvolvimento na infância
e adolescência (ZAYAT et ai., 2018). Entre as práticas interpretadas como positi-
vas, temos a permissão de autonomia supervisionada ao adolescente, a com-
preensão, o cuidado e o ser solícito e generoso com o filho.
Outros fatores de proteção podem ser o suporte social materno, que pode
aumentar a sensação de bem-estar da mãe e permitir respostas mais adaptati-
vas frente a eventos estressantes; e a residência, durante a infância, em bairros
com maiores níveis de participação em atividades sociais, esportivas e culturais
(ZAYAT et ai., 2018).
••
O estudo das funções psíquicas
A alteração patológica das funções psíquicas e a desorganização mental po-
dem levar a pessoa à incapacidade de exercer ou exercer de modo disfuncio-
nal (com dificuldade) os seus papéis sociais e as atividades do cotidiano, causa
sofrimento psicológico a ela e às pessoas ao redor (DALGALARRONDO, 2019).
Os transtornos mentais são con- 1
dições que devem ser diagnosticadas
por profissionais de saúde capaci-
tados para essa tarera e que seJam
treinados para o uso de métodos
específicos de estudos das funções
psíquicas alteradas. A seguir, iremos
abordar as principais características
do psicodiagnóstico, da entrevista e
do exame psíquico, que são métodos
que auxiliam o estudo ou avaliação
das funções psíquicas dos pacientes
da área de saúde mental.
O psicodiagnóstico
PSICOPATOLOGIA •
••
A psicologia clínica desenvolveu o psicodiagnóstico, que é um instrumento
auxiliar ao diagnóstico psicopatológico e que o psicólogo e demais profissio-
nais da área de saúde mental podem utilizar, desde que sejam devidamente
capacitados. Porém, de acordo com o Conselho Federal de Psicologia, quando
utilizado pelo psicólogo, considera-se que esse profissional deve:
Construir argumentos consistentes da observação de fenômenos
psicológicos; empregar referenciais teóricos e técnicos pertinentes
em uma visão crítica, autônoma e eficiente; atuar de acordo com
os princípios fundamentais dos direitos humanos; promover a rela-
ção entre ciência, tecnologia e sociedade; garantir atenção à saúde;
respeitar o contexto ecológico, a qualidade de vida e o bem-estar
dos indivíduos e das coletividades, considerando sua diversidade
(CFP, 2019, p. 2).
A aplicação dos testes projetivos para o conhecimento da estrutura de per-
sonalidade é um dos procedimentos mais utilizados na avaliação psicodiagnós-
tica. No Brasil, a compra, aplicação e análise da maioria desses testes é restrita
a psicólogos. Um dos testes projetivos mais usados é o teste de Rorschach (tes-
te das manchas).
Figura 3, Exemplo de placa de Rorschach. Fonte Shutterstock. Acesso em 30/06/2021.
PSICOPATOLOGIA -
Podem-se, ainda, ser usados os testes de apercepção temática (TAT), de
relações objetais de Phillipson, das pirâmides de Pfister e o desenho da casa-
-árvore-pessoa (HTP). A escolha dos testes dependerá do conhecimento e da
experiência do profissional. Para o rastreamento de possíveis alterações cere-
brais, há a possibilidade de usar os testes de Bender e testes neuropsicológicos
direcionados e destinados à detecção de alterações cognitivas mais específicas
(DALGALARRONDO, 2019).
••
A entrevista
O principal instrumento de avaliação do paciente em Psicopatologia é a en-
trevista. Entrevistar é considerada uma arte a ser adquirida apenas por meio
do treinamento supervisionado e com a experiência prática, mas assistir a au-
las e vídeos sobre entrevistas e estudar textos sobre o assunto pode auxiliar
o iniciante.
A técnica e a habilidade em realizar entrevistas são atributos funda-
mentais e insubstituíveis do profissional de saúde em geral e de saú-
de mental em particular. Tal habilidade é, em parte, aprendida e, em
outra, intuitiva, patrimônio da personalidade do profissional, de sua
sensibilidade nas relações pessoais (DALGALARRONDO, 2019, p. 66).
É por meio de uma entrevista tecnicamente bem realizada que o profissio-
nal irá obter as informações necessárias para emitir uma hipótese diagnóstica
clínica e sistematizar a intervenção e o planejamento terapêutico mais adequa-
do ao caso (DALGALARRONDO, 2019).
A entrevista é um dos pilares da prática profissional em saúde mental, por-
que o profissional consegue extrair conhecimentos relevantes do encontro
com o paciente e pode agir de forma útil e criativa, possibilitando
a realização de duas etapas importantes da avaliação.
A primeira etapa é a anamnese, que é o nome
dado ao histórico dos sinais e sintomas que o
paciente apresenta ao longo de sua história de
vida, dos seus antecedentes pessoais e fami-
liares e de seu contexto social. A segunda etapa
é o chamado exame psíquico ou mental.
EXPLICANDO
PSICOPATOLOGIA •
Entre os manuais de psiquiatria, não existe uma uniformidade ou padronização
absoluta quanto à estrutura da anamnese, pois algumas informações podem
se adequar a mais de um item desse instrumento, sendo a sua divisão arbitrá-
ria e convencional. A anamnese psiquiátrica deve fornecer elementos para a
formulação de uma hipótese diagnóstica e identificar os fatores que podem
ter causado o transtorno, precipitando-o e perpetuando-o.
De acordo com Cheniaux (2015), os objetivos básicos da entrevista para a
obtenção de dados psiquiátricos são: a formulação de um diagnóstico, de um
prognóstico e o planejamento terapêutico.
Sobre a entrevista inicial, ela é considerada um momento essencial no diag-
nóstico e no tratamento em saúde mental. Dalgalarrondo (2019) adverte que
o primeiro contato, se for bem conduzido, deverá produzir uma sensação de
confiança no paciente em relação ao alívio de seu sofrimento. A entrevista ini-
cial mal realizada, no entanto, em que o profissional é negligente ou hostil com
o paciente, em geral, são seguidas de abandono do tratamento.
Assim, é a partir da entrevista que irá se estabelecer ou não a chamada
aliança terapêutica entre médico e paciente. De acordo com Zuardi e Loureiro
(1996), existem diferentes tipos de entrevistas que podem ser agrupadas em:
abertas, estruturadas e semiestruturadas.
Na entrevista aberta não há um roteiro pré-determinado a ser seguido, o
que permite ao entrevistado falar mais livremente, determinando o curso da
entrevista. Este tipo de entrevista permite um
acesso mais fácil ao material inconsciente,
através da observação da ordem em que os
assuntos são comunicados pelo paciente,
a associação que faz entre esses, as inter-
rupções e as respostas emocionais. As prin-
cipais desvantagens são: a pouca possibilidade
de concordância entre os diferentes entrevistado-
res; a dificuldade para formulação de diagnósticos
consistentes, em razão de uma investigação as-
sistemática dos sintomas; e o tempo imprevisto
de realização.
PSICOPATOLOGIA •
Nas entrevistas estruturadas a obtenção das informações, o sequencia-
mento das perguntas e os registros dos resultados são sempre pré-determina-
dos. Os formulários das entrevistas contêm glossários que descrevem os ter-
mos empregados. A principal vantagem desse tipo de entrevista é elevar o grau
de confiabilidade do diagnóstico psiquiátrico, facilitando a concordância entre
os diferentes entrevistadores. A pequena flexibilidade desse tipo de entrevista,
em determinadas circunstâncias, pode prejudicar a colaboração do paciente.
As entrevistas semiestruturadas têm um nível de estruturação maior ou
menor de acordo com a entrevista, possibilitando maior flexibilidade na se-
quência e/ou formulação das perguntas do que nas estruturadas. Estas entre-
vistas têm níveis elevados de confiabilidade (ZUARDI; LOUREIRO, 1996).
A entrevista pode ocorrer no momento da internação do paciente, seja vo-
luntária ou involuntária, na consulta ambulatorial, ao responder a uma soli-
citação da enfermaria de um hospital geral, no domicílio de um paciente e,
eventualmente, em via pública.
Deveser realizada, preferencialmente, em ambiente fechado, com isola-
mento acústico e sem interrupções. Ao iniciar, é essencial a apresentação do
profissional, a explicação sobre os objetivos da entrevista e a obtenção do con-
a entrevista, deve-se entrevistar os familiares ou pessoas de seu convívio que
possam oferecer as informações, preferencialmente, com a concordância e a
presença do paciente (CHENIAUX, 2015).
De qualquer modo, sempre existem algumas regras básicas que devem
ser seguidas. No início da entrevista, recomenda-se deixar o paciente falar
livremente para, posteriormente, perguntar sobre temas mais específicos e/
ou assuntos duvidosos. Também é necessário saber quando e de que forma
interromper a fala do paciente, sem cortar o seu fluxo de comunicação, e não
permitindo que ele seja muito minucioso ou prolixo, o que pode prejudicar a
obtenção dos dados da história clínica. O importante é saber como controlar e
dirigir a entrevista. Não se deve formular perguntas de maneira mecânica ou
monótona, mas em forma de um diálogo informal (CHENIAUX, 2015).
Deve-se evitar o uso de perguntas sugestivas e que podem ser respondidas
de forma monossilábica (sim, não ou talvez). Assim, em vez de perguntar "você
está deprimido hoje?", pergunte: "como você está se sentindo hoje?".
PSICOPATOLOGIA •
Também não é adequado aceitar expressões usadas no cotidiano como: es-
tou nervoso, estou tenso ou tenho pânico, mas deve-se pedir ao paciente que
explique o que isso significa de uma forma mais abrangente, com suas pró-
prias palavras. Outro aspecto importante sobre o manejo da entrevista é se
certificar de que o paciente está compreendendo o significado das perguntas,
utilizando uma linguagem acessível, evitando termos médicos e de uso restrito
(CHENIAUX, 2015).
DICA
Uma dica importante sobre o manejo da entrevista é evitar a realização
de muitas anotações ou de digitação constante no computador, pois isso
transmite ao paciente que as anotações são mais importantes que a pró-
pria entrevista. O profissional precisa observar se isso incomoda o pacien-
te, e diminuir esses comportamentos {DALGALARRONDO, 2019).
••
O exame psíquico
Nos serviços de saúde pública, a falta de tempo dos profissionais, o excesso
de trabalho, o estresse e as condições físicas de atendimento precárias são
condições adversas para a realização de entrevistas. O profissional de saúde
pode ficar impaciente para ouvir as pessoas com queixas pouco precisas, os
chamados poliqueixosos, e acabarem rejeitando os pacientes que são mais va-
gos ou que são desorganizados psíquicamente. Porém, nesse tipo de atendi-
mento, a resiliência do entrevistador é mais do que necessária.
Mesmo que o profissional não tenha mais do que alguns minutos para en-
trevistar, deve tentar ouvir e examinar o doente com respeito e criar um clima
de confiança, a fim de propiciar o início de um vínculo e um atendi-
mento de boa qualidade. Nem sempre é a quantidade de tempo
com o paciente que conta, mas sim a qualidade da
atenção dispensada pelo profissional. A comu-
nicacão não verbal tem muita imoortância.
pois inclui "uma carga emocional do ver e ser
visto, do gesto, da postura, das vestimentas,
do modo de sorrir ou expressar sofrimento"
(DALGALARRONDO, 2019, p. 69).
PSICOPATOLOGIA •
Desse modo, a primeira impressão produzida pelo paciente no entrevistador é
o produto de uma mistura de fatores, como a experiência do profissional, a trans-
ferência que o paciente estabelece com ele, os aspectos contratransferenciais do
entrevistador e os valores pessoais e julgamentos que o profissional realiza, mes-
mo que se esforce para que isso não ocorra.
Sobre os processos de transferência e contratransferência, estudados por Sig-
mund Freud, são considerados fundamentais para o profissional realizar entre-
vistas de forma mais consciente e habilidosa, pois fazem com que ele entenda
determinados comportamentos dos pacientes de forma menos ingênua e mais
aprofundada.
Como transferência, entendem-se as atitudes e sentimentos do paciente com
origens inconscientes, isso inclui sen-
timentos positivos, como confiança,
amor e apego, e negativos, como raiva,
desconfiança e hostilidade. Tais senti-
mentos, de acordo com Freud (1986),
têm origem inconsciente em eventos
da história de vida do paciente e fazem
com que, no caso, o profissional de saú-
de passe a ocupar, no presente, o lugar
que o pai ou a mãe ocupavam no pas-
sado. Como o paciente não tem cons-
ciência desse processo, considera esses
sentimentos como experiências reais e
não como reflexos ou repetições de sen-
t imentos do seu passado. Figura 4 s,gmund Freud fundador da psicanálo ,e.
Para Jung (2013), a transferência é a projeção que o paciente faz, de forma in-
consciente, na figura do médico, dos afetos básicos que nutria pelas figuras signi-
ficativas de sua vida. Este é um fenômeno geral, não exclusivo da relação analítica,
que pode ser observado nas relações íntimas entre duas pessoas.
No caso do atendimento em saúde mental, o paciente projeta no médico e em
outros profissionais, de forma inconsciente, os sentimentos que nutria por seus
pais na infância. Pode sentir que o médico age como um pai severo, cruel e autor i-
tário e que a enfermeira é como uma mãe carinhosa e preocupada, por exemplo.
PSICOPATOLOGIA •
A contratransferência, por sua vez, é a transferência que o profissional
estabelece com os pacientes da mesma maneira que o paciente, inconscien-
temente, com sentimentos que ele, o profissional, nutria no passado por pes-
soas significativas de sua vida (DALGALARRONDO, 2019).
Isso explica o porquê de alguns pacientes despertarem sentimentos de
raiva, medo, piedade, carinho e repulsa nos profissionais de saúde, sem mo-
tivos mais concretos. Quando essas reações contratransferenciais são iden-
tificadas, o profissional de saúde deve estar consciente de que elas são ori-
ginadas de seus conflitos pessoais, a fim de que ele lide com elas de forma
mais objetiva.
Passaremos, agora, a analisar os aspectos do chamado exame psíquico,
que pode ter as denominações de exame do estado mental, exame mental,
exame psicopatológico ou exame psiquiátrico.
O exame psíquico é um dos principais instrumentos para a realização do
diagnóstico em psiquiatria e visa o estabelecimento de um diagnóstico psi-
quiátrico, criação e desenvolvimento de aliança de trabalho e prognóstico do
paciente. No exame psíquico, examina-se, de forma isolada, cada f unção psí-
quica do paciente, para depois formular-se a análise do todo psíquico (DAL-
GALARRONDO, 2019).
A Psicopatologia importa-se, fundamentalmente, com a forma de cada
função psíquica. Os conteúdos têm uma importância secundária. Por exem-
plo, a forma de um livro é aquilo que faz com que o reconheçamos e saibamos
que se trata de um livro (que é a essência do objeto), o conteúdo é aquilo que
define tal livro (a sua mensagem).
Assim, o exame psíquico é uma forma de abstração da realidade e da tota-
lidade do psiquismo humano, ao decompor a totalidade psíquica em concei -
tos operativos para formular, mais tarde, os quadros nosológicos, ou seja, os
quadros classificatórios e explicativos da doença. O exame psíquico se inicia
no primeiro contato com o paciente, antes da obtenção dos dados de identi-
ficação. O profissional experiente é capaz de realizar a maior parte do exame
do estado mental simultaneamente à coleta da história do transtorno dopa-
ciente. No modelo méd ico, a história sempre é vista como algo subjetivo, mas
o exame psíquico, assim como o exame físico da Medicina Geral, é considera-
do um método objetivo de avaliação.
PSICOPATOLOGIA •
Na avaliação psiquiátrica, o que é observado pelo examinador representa
o exame psíquico e as expressões de como o paciente se refere, bem como se
elas são mais apropriadas à história do transtorno do que ao exame psíquico.
QUADRO 3. ROTEIRODE EXAME PSÍQUICO
~
1. Aspecto geral: cuidado pessoal, trajes, postura, mímica e atitude global do paciente.
2. Nível de consciência.
3. Orientação alo e autopsiqu1ca.
4. Atenção.
5. Memória (fixação e evocação).
6. Sensopercepção.
7. Pensamento (curso, forma e conteúdo).
8. Linguagem.
9. Inteligência.
10. Juízo de realidade.
11. Vida afetiva.
12. Volição.
13. Psicomotricidade.
14. Consc1ênc1a e valoração do eu.
15. Vivência do tempo e do espaço.
16. Personalidade.
17. Sentimentos contratransferenciais.
18. Crítica em relação a sintomas e insight.
19. Desejo de aJuda.
20. Tratamento voluntário ou involuntário.
Apesar de alguns aspectos do exame psíquico serem subjetivos, como a
análise dos processos de pensamento, isso também ocorre no exame físico.
Por exemplo, há elementos subjetivos relacionados diretamente às manipu-
lações do examinador no exame físico, como dor à palpação abdominal e a
pesquisa da sensibilidade térmica do paciente. Porém, as vivências internas
e subjetivas dos pacientes são expressas em seu comportamento não verbal
e verbal, passando a ser observáveis e passíveis de descrição por outras pes-
soas, o que as torna objetivas.
PSICOPATOLOGIA •
Jaspers (1979) relata a ausência de fidedignidade em relatos de muitos pa-
cientes, afirmando que os doentes histéricos não merecem confiança e que a
maioria das autodescrições psicopáticas deve ser considerada de modo crítico.
Afirma, também, que as pessoas com psicopatologias podem relatar o que se
espera deles para serem agradáveis ou quando notam interesse do médico por
algum tema específico.
No exame psíquico devem ser descritas as alterações presenciadas apenas
durante a entrevista, pois é comum que a sintomatologia psiquiátrica mude
de um momento para outro. Porém, nos casos em que a sintomatologia é in-
termitente, como em pacientes com alucinações e alterações do nível de cons-
ciência, é necessário fazer um exame psíquico mais amplo, com mais de uma
observação e com intervalos de horas, ou, às vezes, de dias, entre um e outro
exame.
Na redação do exame, deve-se descrever as condições em que se realizou
o diagnóstico, se foi no domicílio do paciente, em consultório ou ambulatório,
no leito do hospital e se havia mais alguém presente. É importante entender
que há uma influência mútua entre as funções mentais, e que a subdivisão
dessas funções é meramente didática, pois as funções psíquicas são avaliadas
de forma praticamente simultânea. Além disso, as funções psíquicas podem
alterar-se quantitativa ou qualitativamente.
Além do registro das alterações psicopatológicas das funções psíquicas,
deve-se descrever, no exame, como estão as funções mentais
preservadas. Não devem ser consideradas as possíveis causas
das alterações, mesmo que haja hipóteses. Para a
avaliação de algumas funções, como a memória,
orientação e inteligência, devem ser realizadas
perguntas específicas ou, até mesmo, testes. A
redação do exame psíquico deve se restringir à
descrição dos fenômenos observados, sem o uso
de termos técnicos.
Sintetizando
PSICOPATOLOGIA •
•
A Psicopatologia é a área interdisciplinar do conhecimento que trata dos
transtornos mentais, suas causas, mudanças estruturais, funcionais e formas de
manifestação.
Historicamente, a área de Psicopatologia se desenvolveu por meio da Medi-
cina, da qual herdou a preocupação com a observação cuidadosa das pessoas
com transtornos mentais e de áreas humanistas, como a Filosofia, a Literatura,
as artes e a psicanálise. Por isso, concebe o transtorno e o sofrimento mental
como expressões da humanidade que permaneceriam desconhecidas se esses
fenômenos não se manifestassem.
Os conhecimentos da Psicopatologia são essenciais para o trabalho na área
de saúde mental, pois dão o fundamento para a prática de psicólogos, psiquia-
tras, neuropsiquiatras, terapeutas ocupacionais, enfermeiros e assistentes so-
ciais. Os conceitos de saúde e doença e os critérios para determinar a normalida-
de e a patologia são complexos, pois tratam de aspectos subjetivos, estatísticos
e qualitativos.
Sobre a etiopatogenia ou análise do conjunto de causas dos transtornos men-
tais, há consenso de que é a interrelação entre os fatores biológicos e as carac-
terísticas ambientais que originam os transtornos mentais. Os fatores biológicos
são relacionados especialmente à herança genética do indivíduo, e o contexto
ambiental se relaciona aos fatores de risco e de proteção para o desenvolvimen-
to de transtornos mentais.
Na avaliação do paciente com transtornos mentais utilizam-se, dentre outros
procedimentos, o psicodiagnóstico, a entrevista e o exame psíquico.
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UNIDADE
~
~
PSICOPATOLOGIA •
ser
educacional
Objetivos da unidade
Conhecer tanto as funções psíquicas elementares quanto as superiores,
bem como os conceitos, tipos, alterações quantitativas e qualitativas e a inter-
relação entre elas;
Entender os conceitos dos transtornos das funções psíquicas elementares e
superiores;Estudar as diversas classificações e definições dos transtornos
psicopatológicos.
Tópicos de estudo
Funções psíquicas elementares
Alterações na consciência e na
atenção
Alterações na orientação e nas
vivências de espaço e tempo
Alterações na memória, na
afetividade e na inteligência
Alterações na vontade e no agir
Funções psíquicas superiores
Alterações na linguagem
Alterações no pensamento e
Semiologia médica e
psicopatológica
Semiologia médica
Nosologia e semiologia psico-
patológica
Transtornos psicopatológicos ou
psiquiátricos
Descrição dos transtornos psi-
copatológicos
PSICOPATOLOGIA •
••
Funções psíquicas elementares
De acordo com Dalgalarrondo (2019), o estudo das funções psíquicas ele-
mentares e de suas alterações é um
procedimento artificial que permite
maior aprofundamento nos fatos da
vida psíquica normal e patológica, bem
como na autonomia dos fenômenos.
Estuda-se de forma autônoma as
funções psíquicas elementares, como
a consciência, a atenção e a memória.
Entretanto, não existem funções isola-
das nem alterações psicopatológicas
compartimentalizadas; a pessoa adoece em sua totalidade.
Alterações na consciência e na atenção
••
A palavra consciência vem do latim, cum scientia, que deriva da tradução da
palavra grega syneidesis. Cum scientia significa "uma ciência acompanhada de
outra ciência, ou uma relação cognoscitiva com" (CHENIAUX, 2015, p. 38).
Para Cheniaux (2015), consciência é a capacidade de termos um caráter
neurológico, o que nos permite captar informações do ambiente e orientar-nos
adequadamente. Em outras palavras, trata-se da lucidez. O autor ainda afirma
que podemos considerá-la como o processo de coordenação e síntese de toda
a atividade psíquica.
A psicologia a define como:
a dimensão subjetiva da atividade psíquica do sujeito que se volta
para a realidade. Na relação do Eu com o meio ambiente, a consciên-
cia é a capacidade do indivíduo de entrar em contato com a realidade,
perceber e conhecer os seus objetos (DALGALARRONDO, 2019, p. 88).
A consciência nos permite estabelecer contato com a realidade e acessar o
conhecimento dos fenômenos internos e externos. Suas alterações fisiológicas
normais decorrem do sono, sonho e cansaço físico e mental. Já as alterações
patológicas se dividem em quantitativas e qualitativas.
PSICOPATOLOGIA •
reza e a forma como uma pessoa
experimenta fenômenos psíquicos
variam. Sua linguagem, pensamento
e emoções podem se tornar pouco
compreensíveis e suas percepções se
confundem. Além disso, torna-se difí-
cil se atentar a algo de maneira fixa e
duradoura e, ainda, é possível perder
a orientação temporal e espacial.
As alterações patológicas quan-
titativas podem ocorrer em quadros
neurológicos e psicopatológicos, com
diminuição progressiva do nível de
consciência e da vigilância. Em casos
graves, é possível que a pessoa entre em coma profundo, sem resquício de
atividade consciente.
Podemos classificar os graus de rebaixamento da consciência em:
· Obnubilação: diminuição ou rebaixamento da consciência. Seu grau
de seriedade varia entre leve e moderado. No exame psíquico, o paciente
aparenta estar desperto, mas a clareza em sua percepção diminui, sua com-
preensão se torna lenta e ele tem dificuldade em se concentrar. Além disso,
não integra as informações sensoriais vindas do ambiente adequadamente;
· Sopor: estado sob o qual há turvação da consciência. É necessário des-
pertar o paciente com um estímulo enérgico e, às vezes, doloroso. Apesar de
sonolento, o paciente pode reagir defensivamente de modo involuntário; e
• Coma: maior grau de rebaixamento do nível de consciência, onde não
há atividade voluntária consciente ou, sequer, indícios dela. Entretanto, há
sinais neurológicos, como movimentos oculares errantes e tremor
de pálpebras (nistagmo).
Já no caso das alterações qualitativas, Dalgalarrondo
(2019) aponta que as variações se relacionam à ampli-
tude do campo de consciência. Em outras palavras, en-
quanto uma parte está normal, outra se altera.
PSICOPATOLOGIA •
QUADRO 1. ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DE CONSCIÊNCIA
Alteração qualitativa
Estado crepuscular
Estado segundo
~
Descrição
Presente na epilepsia e na histeria, trata-se do estreitamento do nível
ou campo da consciência. A pessoa demonstra falta de vinculação
com o mundo exterior, não fala ou fala pouco e parece estar
psiquicamente "ausente".
Estado patológico transitório parecido com o estado crepuscular.
Caracteriza-se por uma atividade psicomotora coordenada, porém
estranha à personalidade do sujeito acometido. É possível usar os
termos "estado segundo" e "estado crepuscular" de forma indistinta,
mas, geralmente, usa-se o primeiro termo para casos de natureza
psicogenética e produzida por fatores emocionais, como choques
emocionais intensos. Já o estado crepuscular possui causas orgânicas,
como intoxica ões e traumatismo craniano.
Dissociação da
consciência
Transe
Semelhante ao sonho e desencadeada por situações significativas,
conscientes ou inconscientes, essa divisão do campo da consciência
leva à perda da unidade psíquica. Ocorre em quadros histéricos de
tipo dissociativo.
Estado de dissociação da consciência semelhante ao "sonhar
acordado". Entretanto, há atividade motora automática e
estereotipada, acompanhada de suspensão parcial dos movimentos
voluntários. Apesar de comum nos contextos religiosos e culturais,
como no espiritismo kardecista, nas religiões afro-brasileiras e
religiões evangélicas pentecostais e neopentecostais, não se deve
confundir o transe espiritual com o psicopatológico.
Fonte DALGALARRONDO, 20 9, p. 99 (Adaptado).
Cheniaux (2015) define a ideia de atenção como o direcionamento da
consciência ou estado de concentração da atividade mental em relação a um
determinado objeto ou assunto.
Em termos simples, a atenção é a capacidade de se concentrar de forma
espontânea ou ativa. Mais detalhadamente, trata-se do processo psicológico
elementar, onde a atividade psíquica se concentra sobre um determinado es-
tímulo, seja sensação, percepção, afeto ou desejo, de modo que os conceitos
e elaborações das percepções e do pensamento se fixem, definam-se, selecio-
nem-se e representem-se.
Existem duas formas básicas de atenção:
• Voluntária: deriva de um esforço intencional e consciente do indivíduo
em relação a um estímulo ou objeto; e
PSICOPATOLOGIA •
· Espontânea (passiva ou involuntária): reação automática, não consciente
e não intencional do indivíduo em relação aos estímulos; basicamente, são as
características desses estímulos que a determinam. Por exemplo: alguns objetos
despertam nossa atenção mais que outros. Essa é a tendência natural da ativida-
de psíquica de se orientar para os estímulos sensoriais e sensitivos do ambiente.
O grau de concentração da atenção sobre determinado objeto depende do
interesse, estado de ânimo e condições gerais do psiquismo do indivíduo. O in-
teresse e o pensamento dirigem a atenção, bem como a intensidade com a qual
a pessoa a emprega.
Para Dalgalarrondo (2019), as alterações da atenção interferem no proces-
so de aprendizagem. Entretanto, elas tendem a ser secundárias e decorrem da
perturbação de outras funções, das quais o funcionamento normal da atenção
depende. Alguns exemplos dessas perturbações são: cansaço; estados tóxicos;
e estados patológicos que determinam a incapacidade de concentrar a atenção.
QUADRO 2. ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DE ATENÇÃO
Alteração qualitativa
Hipoprosexia
Aprosexia
~
Descrição
Rebaixamento da capacidade de concentração, o que aumenta a
fadiga e enfraquece a atenção. Comum nos estados infecciosos, na
embriaguez alcoólica, nas psicoses tóxicas, na esquizofrenia e nos
estados depressivos.
Total perda da capacidade de atenção, independentemente da
intensidade dos estímulos utilizados para ativá-la.
obstinação indeterminadassobre objetos.
Fonte· DALGALARRONDO, 2019, p. 105. {Adaptado).
No exame psíquico da concentração e da atenção, o profissional de saúde deve:
• Observar se o paciente está disperso ou atento e como ele se comporta em
relação ao que acontece no ambiente;
• Descrever se o paciente responde às perguntas prontamente ou se é neces-
sário repeti-las várias vezes;
• Pedir ao paciente que realize operações aritméticas simples, como "2+2=?"
ou que enumere os meses e dias da semana em ordem normal ou inversa, o que
exigirá mais atenção.
PSICOPATOLOGIA •
••
Alterações na orientação e nas vivências de espaço e tempo
O conceito de orientação se refere à capacidade do indivíduo de se situar
em relação ao ambiente e a si mesmo. Essa função deriva da integração de
outras funções psíquicas, como: percepção; atenção; memória; pensamento;
inteligência; e afeto.
Para Cheniaux (2015), ela resulta da atividade de apreensão (apercepção),
que representa a capacidade de inter-relacionamento das percepções em dar
sentido às informações perceptivas de um contexto. Por exemplo: quando ve-
mos um extenso gramado na tela da TV com algumas marcações brancas, duas
traves, uma bola e homens de uniformes correndo, entendemos que se trata
de uma partida de futebol.
Existem dois tipos de orientação:
• Autopsíquica: refere-se à própria pessoa . Consiste em elementos da
consciência e do Eu. Permite a pessoa a capacidade de fornecer dados de sua
identificação, saber quem é, qual é o seu nome, idade, nacionalidade, profis-
são, estado civil e outros dados;
· Alopsíquica: refere-se ao meio externo e se subdivide em:
· Temporal : permite ao indivíduo saber o dia da semana, do mês e ano
em que se encontra. No desenvolvimento infantil, adquirimos esse tipo
de orientação alopsíquica depois da espacial;
• Espacial: possibilita a pessoa saber onde se encontra. Por exemplo: no
caso de uma internação, a pessoa sabe se está em um hospital e qual é
o seu nome, bem como o nome da rua, do bairro e da cidade;
· Quanto às pessoas: permite reconhecê-las e identificá-las corretamente;
• Situacional: orienta quanto aos motivos pelos quais estamos em de-
terminado lugar e quanto à relação que temos com as pessoas do lo-
cal. No caso de uma internação, o indivíduo sabe que está num hospital
como paciente e que um médico o examinará. Este tipo de orientação se
relaciona com os outros e com a orientação autopsíquica.
Cheniaux (2015) afirma que os distúrbios de orientação podem ser parciais
ou totais. Ainda, os efeitos sobre os diferentes tipos não ocorrem de maneira
uniforme, uma vez que um t ipo pode se alterar enquanto outro se preser-
va. Um bom exemplo de um distúrbio parcial se dá na orientação temporal:
o paciente sabe dizer qual é o mês e o ano atuais, mas não é capaz de especi-
ficar o dia do mês ou da semana. Se o distúrbio fosse total, ele desconheceria
todos os dados. A orientação no tempo é mais frágil e se altera mais precoce-
mente do que a espacial, pois exige renovação constante.
Também é possível dividir as alterações da orientação alopsíquica em:
· Quantitativas: é o caso das desorientações, que resultam do prejuízo
da atividade de a percepção e, consequentemente, dificultam a capacidade do
indivíduo em apreender as informações sensoperceptivas. Essas alterações
produzem uma sensação de perplexidade e estranheza em relação ao mundo
externo;
• Qualitativas: as falsas orientações são um bom exemplo. Mais comple-
xas, envolvem o rebaixamento do nível de consciência e a presença de distúr-
bios sensoperceptivos.
Para examinar a orientação alopsíquica, basta solicitar ao paciente que diga
a data do dia do atendimento ou que identifique o local da entrevista e as pes-
soas presentes. Se, durante a entrevista, seu comportamento indicar desorien-
tação, não é preciso avaliá-lo.
Na orientação temporal, espera-se que o paciente consiga ordenar crono-
logicamente as informações solicitadas; especialmente, as mais recentes. Um
erro de um ou dois dias quanto à data é normal, mas um erro grosseiro ao in-
formar a idade, por exemplo, significa uma desorientação no tempo. Conforme
Cheniaux (2015), ao final da entrevista, pode-se pedir ao paciente que faça uma
estimativa de quanto tempo se passou desde seu início.
A avaliação mais precisa da orientação espacial envolve o questionamento
ao paciente sobre o trajeto de casa até o hospital e vice-versa, considerando-se
que ele conheça o local onde se encontra. Ressalta-se que uma desorientação
espacial dentro da própria casa é mais grave do
que em um local desconhecido, como a enfer-
maria de um hospital.
Avalia-se a orientação do paciente sobre a
situação e outras pessoas com base em seu com-
portamento, como, por exemplo, se ele entende o
que ocorre ao seu redor, pela observação do seu relaciona-
mento com os familiares e se os reconhece como tais.
PSICOPATOLOGIA •
É importante detalhar as alterações mais comuns da orientação alopsíquica
em alguns transtornos mentais:
• Demência: a primeira orientação a se perder é a temporal. Com a pro-
gressão do quadro, os outros tipos sofrem gradualmente até que se chegue na
autopsíquica. Falsas orientações podem ocorrer devido ao rebaixamento do
nível de consciência e de a percepção. Já a desorientação se deve aos déficits
dade de apreensão ou a percepção. As informações mais facilmente fixadas são
as que despertam o interesse e possuem uma maior carga emocional. Elas têm
um caráter de novidade, associam-se aos conhecimentos já adquiridos e usam
mais de um canal sensorial ao mesmo tempo; por exemplo, a visão e a audição.
A fase de conservação, conhecida como retenção ou armazenamento, refe-
re-se à manutenção de informações fixadas, mesmo que elas ainda estejam em
estado de latência. Para Cheniaux (2015), as informações conservadas sofrem
um processo de desintegração ao longo do tempo, o que leva à sua perda; das
recentes para as antigas, das complexas para as simples e das menos organiza-
das para as mais organizadas.
A fase de evocação, denominada rememoração ou recuperação, significa
o retorno espontâneo ou voluntário das informações armazenadas na cons-
ciência. Os fatores afetivos podem influenciar a evocação, como é o caso da
angústia. Por isso, esquecemos o que nos desagrada mais facilmente. Porém,
a evocação de uma ideia nunca é idêntica à imagem perceptiva fixada. Afinal,
cada vez que evocamos uma imagem, a reconstruímos com alterações.
PSICOPATOLOGIA •
A classificação das memórias se dividem em:
• Sensorial, icônica, imediata ou de curtíssimo prazo: são as que têm mais
uma função da atenção do que da memória, pois duram menos de um segundo
e permanecem ativas o quanto for necessário, para que a percepção ocorra. Elas
são frágeis e possuem capacidade muitíssimo limitada;
• De curto prazo ou recente: são as que possuem capacidade de armazena-
mento bem limitada e duram o período de segundos a alguns minutos. O conceito
de memória "de trabalho" corresponde à memória de curto prazo e se refere ao
armazenamento temporário de informações para a realização de tarefas cogniti-
vas. Conforme Cheniaux (2015), esse tipo de memória é essencial para a fixação e
evocação. Além disso, é necessária para as atividades cognitivas, como compreen-
são, raciocínio, tomada de decisões e planejamento de ações;
· De longo prazo ou remota: são as que têm o objetivo de armazenar perma-
nente as informações fixadas há alguns minutos, o que possibilita sua evocação
por muitos anos ou, até, pela vida toda. A capacidade de armazenamento dessas
memórias é enorme. Dividem-se em:
· Explícitas: contêm informações sobre o mundo e são acessíveis à cons-
ciência. É possível evocá-las voluntariamente e expressá-las em palavras; e
• Implícitas: referem-se à aprendizagem sobre "como fazer as coisas". Re-
sultam na melhora do desempenho de uma atividade que precisa de infor-
maçõesde experiências anteriores. São memórias automáticas e reflexas,
impossíveis de se expressar em palavras. Além disso, independem da re-
cuperação consciente das experiências que produziram tal aprendizagem.
Cheniaux (2015) aponta as alterações quantitativas da memória. São elas: am-
nésia, hipomnésia e hipermnésia. Respectivamente, elas significam a abolição, a
diminuição e o aumento da capacidade de memória. Já as alterações qualitativas
resumem-se à alomnésia e à ilusão de memória, que ocorrem quando as recor-
dações de um evento real se deturpam ou se distorcem involuntariamente. Essa
alteração ocorre com frequência em casos de: delirium; demência; estados crepus-
cu1ares; mania; e esqu1zorrenia.
A paramnésia, também chamada de alucinação de memória, é uma recorda-
ção de algo que não ocorreu realmente. Ou seja, trata-se de uma falsa lembrança,
mesmo que, para o paciente, pareça verdadeira. Em virtude dos processos deliran-
tes, essa alteração é frequente na esquizofrenia.
PSICOPATOLOGIA •
O popular déjà vu (já visto) ocorre quando o indivíduo tem a impressão de já ter
vivenciado uma situação inteiramente nova. É o que acontece, por exemplo, quan-
do visitamos um lugar pela primeira vez e temos a sensação de que já estivemos
lá. Já no caso do jamais vu (nunca visto), ocorre o oposto: trata-se da ausência da
sensação de familiaridade mesmo diante de uma situação vivenciada várias vezes
no passado. Um exemplo clássico é o caso de alguém não reconhecer a própria
mãe ou pai. Estes dois fenômenos podem ocorrer na epilepsia do lobo temporal,
na esquizofrenia, em transtornos de ansiedade e, até mesmo, em pessoas sem
transtornos.
É possível avaliar a memória do paciente com um diálogo simples e com a cole-
ta dos dados da anamnese. Afinal, essas situações permitem que se estime tanto
a capacidade de evocação quanto a precisão de detalhes dos fatos da ordenação
cronológica.
A forma como o paciente lida com questões do cotidiano indica se há déficit
mnêmico. Alguns cenários exemplares são: perda frequente de objetos; repetição
de ideias ao longo de diálogos sem senso crítico; dificuldade em localizar o próprio
leito na enfermaria ou em lembrar o nome do médico, no caso de pacientes inter-
nados; desorientação no tempo e no espaço; e falso reconhecimento de pessoas.
É possível, ainda, testar a memória de fixação. Para isso, basta fazer uma apre-
sentação de numerais, palavras ou sílabas desconexas ao paciente, seja de forma
verbal ou visual. Ele deve repeti-los duas vezes seguidas. Entre as duas repetições,
introduz-se uma atividade interferente, como solicitar a memorização de uma se-
gunda série ou a realização de um teste de concentração.
Cheniaux (2015) apresenta outros testes, como o da evocação de dados recen-
tes ("quem é o presidente do Brasil?" ou "o que você comeu ontem no almoço?")
ou a de dados remotos, como questões sobre informações autobiográficas, com
respostas confirmadas por familiares ou pelos registros do prontuário.
Para Dalgalarrondo (2019), a afetividade é um termo amplo que envolve di-
versas modalidades de vivências afetivas, como o humor, emoções e sen-
timentos. O autor define o conceito como "a qualidade e o tônus emo-
cional que acompanha uma ideia ou representação mental"
(DALGALARRONDO, 2019, p. 157). Em outras palavras, tra-
tam-se dos componentes emocionais de uma ideia. O termo
designa qualquer estado de humor, sentimento ou emoção.
PSICOPATOLOGIA •
V \.,('UcJUIU J 11\U::>LICI cJ::> ClllC::ICl)'Ut:::> t-J::>ILU...,CILUIU51LCI::> UCI CIICLIVIUCIUC IIICII::> 11c::-
quentes nos quadros de transtornos psiquiátricos.
QUADRO 3. ALTERAÇÕES PSICOPATOLÓGICAS DA AFETIVIDADE
Alterações
Apatia
Hipomodulação do
afeto
Inadequação do afeto
ou paratimia
Pobreza de
sentimentos e
distanciamento afetivo
Embotamento afetivo
e devastação afetiva
Sensação de falta de
sentimento
Labilidade afetiva e
incontinência afetiva
~
Descrição
Rebaixamento da excitação afetiva. Apesar de ser característico
dos quadros depressivos, ocorre de forma inespecífica em vários
transtornos mentais.
Dificuldade ou incapacidade para a modulação de uma resposta
afetiva coerente com a situação, o que leva a uma rigidez na relação
do paciente com o ambiente.
Reação incoerente dos afetos às situações e conteúdos ideat1vos.
Revela desarmonia da vida psíquica e contradição entre as ideias e
afetos.
Comum nas demências e em alguns tipos de esquizofrenia, trata-
se da diminuição das vivências afetivas, com pouca capacidade de
mudanças e variações afetivas.
Frequente em casos de esquizofrenia, significa a ausência de
qualquer tipo de experiência afetiva. É possível constatá-la com base
na postura e atitude do paciente.
Incapacidade de sentir emoções. O paciente percebe as emoções de
forma clara e dolorosa e se refere à condição como um '"vazio". Pode
ocorrer em quadros depressivos graves.
Comum em esquizofrenias, referem-se a mudanças súbitas de humor
e sentimentos, com oscilações inesperadas de um estado afetivo para
outro. Na incontinência afetiva, o indivíduo não consegue conter suas
reações afetivas.
Fonte: OALGALORRONDO. 2019. p. 164. (Adaptado)
Dalgalarrondo (2019, p. 277) define inteligência como "o conjunto das habili-
dades cognitivas do indivíduo, a resultante, o vetor final dos diferentes proces-
sos intelectivos". Ela envolve: capacidade de identificar e resolver problemas do
cotidiano; reconhecimento adequado das situações vividas; e busca de soluções
para responder os desafios da adaptação biológica, social e cultural. As alterações
incluem casos de deficiência intelectual, anteriormente denominado retardo men-
tal, que se classificam em nível leve, moderado e grave.
Estas alterações dificultam o pensamento
abstrato e incapacitam a pessoa de se plane-
jar e prever as consequências das próprias
ações. Além disso, falta flexibilidade cogni-
tiva e há dificuldade tanto em aprender com
os erros quanto em desenvolver estratégias
cognitivas diferentes. Outros transtornos men-
tais associados à deficiência intelectual são: os de
comportamento; de desenvolvimento global; au-
tismo; e epilepsia .
PSICOPATOLOGIA •
.... .. ..... _ _________ _
Alterações na vontade e no agir
O conceito de conação se refere ao conjunto de atividades psíquicas dire-
cionadas para a ação, vontade ou o ato de agir. Ele inclui as funções conativas,
os impulsos e a vontade.
Os impulsos, chamados de estados motiva cio na is ou pulsões, representam
um estado interno e afetivo. Eles induzem o indivíduo a agir com o objetivo de
satisfazer uma necessidade especialmente orgânica ou biológica. Entretanto,
não se deve confundi-los com instintos, que consistem em "predisposições
inatas à realização de comportamentos complexos e estereotipados, compar-
tilhados pelos animais de uma mesma espécie e que servem à conservação da
vida ou à perpetuação da espécie" (CHENIAUX, 2015, p. 155).
Por vontade, entende-se o processo psicológico de escolha consciente en-
tre diversas possibilidades de ação. É uma elaboração cognitiva, realizada a
partir dos impulsos e influenciada por fatores intelectuais e socioculturais.
O processo volitivo ou "da vontade" se divide em quatro fases:
1. Intenção ou propósito: intimamente relacionada aos impulsos, apresen-
ta-se como uma tendência à ação;
2. Deliberação ou análise: ponderação consciente a respeito das alterna-
tivas de ação. Nesta fase, o indivíduo analisa os aspectos positivos e negativos
de alguma atitude a se tomar, bem como possíveis implicações de cada uma;
3. Decisão: escolha de uma dessas alternativas;
4. Execução: fase referente à atividade psicomotora.
PSICOPATOLOGIA •
As alterações quantitativas da conação ou da vontade são: hipobulia e abu-
lia. Respectivamente, significam a redução e a abolição da atividade conativa.
Em ambos os casos, existe uma sensação de indisposição, desânimo oufalta
de energia. Também é possível observar: diminuição ou perda de iniciativa;
espontaneidade; interesse pelo mundo externo; dificuldade em transformar
decisões em ações (indecisão); e inibição da psicomotricidade. Essas alterações
acontecem frequentemente em casos de depressão e esquizofrenia, mas tam-
bém podem aparecer em alguns cenários de demência ou quando há crônico
uso de medicamentos neurolépticos.
Alguns impulsos específicos enfraquecem na presença de distúrbios como
a anorexia, que diminui ou, até mesmo, acaba com o apetite. Alterações na
sede, na libido e no sono (insônia) também são debilitantes e ainda podem cau-
sar déficits nas tendências naturais à satisfação das necessidades biológicas.
Já a hiperbulia se refere ao sentimento subjetivo de energia e disposição.
Ela ocorre principalmente em transtornos maníacos. Nesses casos, a iniciativa,
espontaneidade e o interesse do indivíduo em relação ao meio ambiente au-
mentam consideravelmente. Também é comum observar muita desinibição e
um aumento da psicomotricidade do sujeito.
Cheniaux (2015) relaciona a intensificação de impulsos específicos a um au-
mento patológico do apetite. É o caso da bulimia, por exemplo. Relacionada à
hiperfagia (ingestão excessiva de alimentos) e à obesidade, essa intensificação
é comum em: distúrbios hipotalâmicos; síndrome de abstinência do uso de an-
fetamina; casos de depressão; e alguns quadros de ansiedade.
f"'\ 1 lltJCI .:» V I 110, lal I IUCI 11 '-' 1011 ICJUCl uc IClGII 510, UIL. 1 C.:»tJCI lV ov .:»VI I V CA'-C.:».:>IVV e
surge em casos depressão. Além disso, é um efeito colateral de medicamentos
benzodiazepínicos, antipsicóticos e antidepressivos. Já o desejo sexual pato-
logicamente aumentado é típico de casos de man ia; para homens, chama-se
satiríase e para mulheres, ninfomania.
Atos impulsivos
Para Cheniaux (2015), atos impulsivos são abruptos, incontroláveis e des-
providos de objetivo consciente. Nesses cenários, o indivíduo descarta as eta-
pas de deliberação e decisão do processo vo litivo e vai direto para a ação. Os
atos ocorrem em função do aumento da impulsividade e do enfraquecimento,
seja da inibição ou do refreamento.
PSICOPATOLOGIA •
Não há planejamento de intenção, deliberação e decisão ao realizá-los;
tratam-se de impulsos patológicos ou, ainda, de uma incapacidade de tolerar
frustração. É importante destacar, aliás, que essas ações se tornam patológi-
cas quando o observador não consegue compreendê-las. Alguns exemplos de
comportamentos com essa característica são: heteroagressivos (direcionados
a um objeto externo); autoagressivos (direcionado à própria pessoa); atos sui-
cidas; e ataques de hiperingestão alimentar, como no caso de bulimia nervosa.
É importante destacar que não se premedita comportamentos heteroa-
gressivos impulsivos. Muitas vezes, não há motivação específica; eles simples-
mente acontecem. Os casos mais graves podem resultar em homicídios.
Figura 2. Heteroagress,v,dade. Fonte: Shutterstock. Acesso em: 21/08/2021
Este tipo específico de ato impulsivo é mais frequente em: transtornos de
personalidade antissocial, borderline ou explosiva, e em alguns casos de surto
esquizofrênico.
Atos compulsivos
Esses atos se resumem a ações motoras complexas que envolvem outras
mais simples ou, ainda, rituais complexos. Existe um sentimento de descon-
forto subjetivo e uma tentativa de resistir à ação, mas um intenso alívio após
realizá-la, frequentemente associado a ideias obsessivas. -
PSICOPATOLOGIA -
Observando o comportamento do indivíduo, sua iniciativa, esponteinada-
de, interesse e capacidade de tomar decisões, é possível examinar psíquica-
mente a conação. O grau de cooperação do paciente na entrevista fornece ele-
mentos para que se identifique alterações. Um bom exemplo é o negativismo,
isto é, a resistência não deliberada, imotivada ou incompreensível em atender
solicitações externas.
••
Funções psíquicas superiores
Existem três funções desse tipo: linguagem, pensamento e juízo de realidade.
Em sua forma verbal, a linguagem é uma atividade especificamente humana e a
mais característica de nossas atribuições mentais. Considerada como o principal
instrumento de comunicação dos seres humanos, é fundamental na elaboração
e expressão do pensamento.
As funções da linguagem são:
1. Função comunicativa: garante a socialização do indivíduo;
2. Suporte ao pensamento: em sua forma evoluída, possibilita o pensamen-
to lógico e abstrato;
3. Instrumento de expressão: expõe os estados emocionais e as vivências
tanto internas quanto externas do ser humano;
4. Afirmação do Eu: auxilia na afirmação e instituição das oposições entre o
Eu e o mundo, o "tu" ou os outros; e
5. Dimensão artística ou lúdica: ajuda o indivíduo a elaborar e a expressar
a estética, o dramático, o sublime e o terrível. Trata-se da linguagem poética e a
literatura.
A linguagem também é um sistema de signos arbitrários, como o sistema lin-
guístico e as palavras. Estes adquirem significados específicos por conta de um
sistema de convenções historicamente determinado. Portanto, linguagem é uma
criação social dos indivíduos e dos grupos humanos.
O pensamento se forma a partir de elementos sensoriais, os quais fundamen-
tam o processo de pensar. Em outras palavras, tratam-se de imagens perceptivas
e de sua representação mental ou ideal. De acordo com Dalgalarrondo (2019), o
pensamento se constitui em conceito, juízo e raciocínio. Para o autor, as dimen-
sões do processo de pensar englobam três aspectos do pensamento. São eles:
PSICOPATOLOGIA •
• Curso: maneira como ele flui, ou seja, como sua velocidade e seu ritmo se
dão ao longo do tempo;
· Forma: estrutura básica, formada pelos diversos conteúdos e interesses do
indivíduo; e
· Conteúdo: temas, assuntos, crenças e preocupações, ou seja, o que fun-
damenta o pensamento. Por quanto mais temas o indivíduo se interessar, mais
conteúdos terá.
•
Alterações na linguagem
Essas alterações se relacionam a transtornos psiquiátricos primários.
A logorreia aumenta exageradamente a produção da linguagem verbal e a
acelera. Essa aceleração se chama taquifasia, que se associa a quadros de ma-
nia e leva a um fluxo incessante de palavras e frases, o que pode resultar em
perda da lógica no discurso. Já a loquacidade aumenta a fluência verbal, mas
sem essa perda.
A bradifasia é a alteração oposta à taquifasia. Ela leva o paciente a falar va-
garosamente, com as palavras seguindo umas às outras lentamente e com difi-
culdade. Associa-se a quadros depressivos graves, estados demenciais e esqui-
zofrenia crônica.
O mutismo diz respeito à falta de resposta verbal por parte do paciente que,
mesmo capaz, não responde ao entrevistador. Existem vários fatores cruciais
associados a essa condição, desde os neurobiológicos até os psicogênicos. Nos
transtornos psiquiátricos, apresenta-se como uma forma de negativismo verbal.
É possível observá-lo em casos de esquizofrenia catatônica e depressão grave.
Existe uma vertente dessa alteração, chamada mutismo seletivo. Comum
na infância, suas causas geralmente envolvem: dificuldades de relacionamento
familiar; conflitos interpessoais; frustrações; medos; ansiedade social; e timidez
intensa.
EXPLICANDO
É possível tratar essa condição com terapia cognitiva-comportamental. O
mutismo seletivo se refere a um distúrbio de ansiedade na infância, cuja
característica principal é a recusa em falar com algumas pessoas.
PSICOPATOLOGIA •
Tanto a perseveração quanto a estereotipia verbal são condições em que
há "repetição automática de palavras ou trechos de frases, de modo estereotipa-
do, mecânico e sem sentido" (DALGALARRONDO, 2019, p. 240).
Por fim, têm-se a ecolalia: a repetição da última ou das últimas palavras ditas
pelas pessoas do ambiente. Por exemplo, frente à pergunta "qual é o seu nome?",
o paciente fala: "nome, nome, nome".É comum na esquizofrenia catatônica .
••
Alterações no pensamento e no juízo de realidade
O processo de pensamento é a maneira como uma pessoa associa as ideias.
Divide-se em modo lógico (coerente) e ilógico (incoerente). Algumas alterações
psicopatológicas afetam a forma do pensamento. São elas:
• "Fuga" de ideias: o indivíduo não consegue ter um pensamento lógico por
muito tempo;
• Neologismo: criação de palavras inexistentes na linguagem com o objetivo
de se referir às suas próprias ideias;
• Lentificação ou aceleração do pensamento: opostos relacionados ao rit-
· "Roubo" de pensamento: sensação de que seres ou entidades se apossam
das suas ideias.
Já as alterações referentes ao conteúdo do pensamento se relacionam às
crenças, assuntos, temas, preocupações e obsessões da pessoa; são os chama-
dos delírios. De forma geral, tratam-se de falsos juízos de realidade. Juízo, por
sua vez, é a afirmação de uma relação entre dois conceitos. Sua função básica é
formular uma relação entre um sujeito e um predicado.
Cheniaux (2015) afirma que o delírio nada mais é do que uma alteração do
processo de formação de juízos de realidade, pois são eles que nos permitem
distinguir o que é real do que é fruto da imaginação. Vale a pena ressaltar que
nem todos os juízos falsos são patológicos. É o caso do erro, por exem-.
pio. O que diferencia os juízos dos delírios é a sua origem, seja ela:
ignorância; julgamento apressado; ou premissas fa lsas. É pos-
sível corrigir um juízo falso com dados da realidade, mas não
um delírio. Este se caracteriza pela certeza subjetiva e abso-
luta e mesmo fatos não são capazes de modificá-lo.
PSICOPATOLOGIA •
Cheniaux (2015) divide os delírios em: ideias delirantes, que ocorrem na ima-
ginação do indivíduo; e percepções delirantes, que são verdadeiras, mas a pes-
soa as interpreta de forma anormal. O Quadro 4 classifica os delírios de acordo
com os temas de seu conteúdo.
QUADRO 4. CLASSIFICAÇÃO DO CONTEÚDO DE ALGUNS DELÍRIOS
Delírios
De referência
De prejuízo
De perseguição
Erótico
De ciúmes ou de
infidelidade
De grandeza ou de
enormidade
De ruína ou niilista
Conteúdo
Forma mais comum, em que a pessoa julga que tudo o que ocorre ao
seu redor diz respeito a ela. Para esse indivíduo, tudo que ocorre se
deve a ele e. mais, objetiva comunicar-lhe algum tipo de mensagem.
Esse tipo de delírio tem conteúdo de perseguição e ameaça.
Pensamento recorrente de que tudo o que acontece com a pessoa
obJet1va prejudicá-la. ofendê-la ou constrangê-la perante outros.
Interpretação recorrente de que fatos inofensivos são sinais de
ameaça ou perseguição. Começa com um sentimento sinistro de
perseguição (tensão de delírio) e se transforma na interpretação
concreta de que algo persegue o indivíduo ou que ele é uma vítima de
um complô.
O indivíduo se sente amado por alguém que conhece
superficialmente. O fato dele não assumir esse outro por laços de
família ou posição social justifica o delírio. É possível que ideias de
perseguição acompanhem essa alteração, que é mais frequente em
mulheres.
A pessoa se convence da infidelidade do(a) parceiro(a) mesmo sem
provas reais ou indícios para tal. É mais comum em homens, que
acusam suas parceiras de vida de serem "desregradas".
O indivíduo superestima a si mesmo. Pode se sentir "o escolhido",
que realizará feitos fantásticos.
A pessoa não vê nada em s1 além de sua impotência, nulidade ou
perda. Vive em um mundo de desgraças e se sente condenada à
miséria. Acredita que ela e sua família passarão fome e que o futuro
somente lhe reserva sofrimentos e fracassos. Em casos extremos,
o paciente acredita estar morto, que o mundo inteiro ruma à
destruição ou que todos já estão mortos.
O indivíduo afirma ser ou estar em comunhão permanente com Deus,
Jesus, um santo poderoso ou um demônio. O paciente sente que tem
Hipocondríaco
mensagem religiosa fundamental.
A pessoa acredita ter uma doença grave e incurável, estar
contaminada por um vírus mortal ou, ainda, de que morrerá em
breve em decorrência de um câncer, mesmo que não haJa evidências
que assim indiquem.
Fonte. DALGALARRONDO, 20 9, p. 203. (Adaptado).
PSICOPATOLOGIA •
••
Semiologia médica e psicopatológica
Para Dalgalarrondo (2019), a semiologia, em um sentido geral, é a ciência dos
signos e não se restringe apenas à medicina, psiquiatria ou psicologia. O autor a
entende como um campo de grande relevância seja para o estudo de: linguagem,
no caso da semiótica linguística; música (semiologia musical); artes; e quaisquer
outros campos de conhecimento e atividades humanas que estudam a interação
e a comunicação entre duas pessoas por meio de um sistema de signos .
••
Semiologia médica
Essa vertente da medicina estuda os sintomas e os sinais das enfermida-
des. Ao dominá-la, o profissional de saúde torna-se capaz de: identificar as
alterações físicas e mentais; classificar os fenômenos; e estabelecer diagnós-
ticos e intervenções terapêuticas adequadas a cada caso. A semiologia geral,
por outro lado, não se relaciona a essa área, pois o signo transcende a esfera
da linguagem. Afinal, ele inclui comportamentos não verbais, como gestos,
atitudes e sinais matemáticos ou musicais.
O signo é o elemento central da semiologia. Trata-se de um tipo de sinal
ou um estímulo emitido pelos objetos do mundo. Portanto, tem significado. A
fumaça sinaliza fogo, por exemplo, e as cores vermelho, amarelo e verde nos
semáforos, mensagens que regulamentam o trânsito.
1 2 3
Figura 3: Semáforo ou farol de trânsito. Fonte: WIKIMEDIA, 2007. Acesso em: 21/08/2021
PSICOPATOLOGIA •
Voltando à semiologia médica, enquanto a febre pode sinalizar uma infecção, a
fala extremamente rápida e fluente pode indicar a aceleração do pensamento em
alguns quadros maníacos. Os signos das dimensões médica e psicopatológica da
semiologia indicam a existência de sofrimento mental, transtornos e patologias.
De acordo com Dalgalarrondo (2019), os sinais comportamentais objetivos são
os signos de maior interesse para a psicopatologia e o profissional de saúde pode
verificá-los ao observar o paciente diretamente. Além disso, o autor afirma que é
possível reconhecer os sintomas do indivíduo. Para isso, basta se atentar tanto ao
que ele vive subjetivamente e relata quanto às suas queixas e narrativas, indepen-
dente da forma como são experimentadas e comunicadas.
Há outra definição de sintomas e sinais. Nesse caso, os objetivos, observa-
dos pelo examinador, diferenciam-se dos subjetivos, percebidos somente pelo
paciente. Os dados elementares de doenças, provocados pelo examinador, são
os sinais. É o caso do reflexo de Babinski no recém-nascido, por exemplo. Nesse
exame, o profissional de saúde pressiona o espaço abaixo dos dedos do pé para
que o reflexo se manifeste.
Já o símbolo é diferente de um signo ou sinal. O elemento significante e o ob-
jeto ausente, ou seja, seu significado, distinguem-se em aparência e não possuem
relação de contiguidade. Em outras palavras, não há relação direta entre eles. Há,
porém, uma relação dada de forma convencional e arbitrária. Um bom exemplo é
o conjunto de letras agrupadas "C-A-S-P.:: e o objeto "casa": não existe semelhança
visual ou qualquer outro tipo de relação além da estabelecida por convenção.
O sentido e o valor de um símbolo dependerão somente das relações que ele
mantém com elementos de outro sistema simbólico, uma vez que eles dependem
da ausência ou presença de outros símbolos, cujos significados se aproximem ou
sejam antagônicos ao primeiro.
••
Nosologia e semiologia psicopatológica
Dado que a psicopatologia é a ciência que estuda as anormalidades psíqui-
cas do ser humano, é possível diagnosticar as enfermidades por diversos meios.
Segundo Dalgalarrondo (2019), o diagnóstico sindrômico parte da avaliação dos
sinais e sintomas e os encaixa em um todo coerente. O objetivo é estabelecer,entre eles, um significado que revelará possíveis causas da doença em questão.
PSICOPATOLOGIA •
Um dos pilares da medicina moderna é a nosologia, que trata das enfermi-
dades em geral e as classifica do ponto de vista explicativo. Já a psicopatologia
nosológica fenomenológica se baseia na descrição dos fenômenos psíquicos
à medida que são observados e relatados. O principal objetivo da fenomeno-
logia é descrever o que o indivíduo vive e relata sem nenhuma interpretação
do profissional. Para Dalgalarrondo (2019), a semiologia psicopatológica estuda
os sinais e sintomas dos transtornos mentais e se relaciona intimamente com
a linguística.
Sintomas médicos e psicopatológicos possuem dupla dimensão, pois atuam
como signos. Quando relatados pelo paciente, por seu meio cultural ou pelo
médico, passam a ser "símbolos linguísticos". Ao receber determinado nome,
arbitrário. Ele faz parte de uma cultura e é preciso compreendê-lo no contexto
de um sistema simbólico.
EXEMPLIFICANDO
É possível compreender a forma com que a psicopatologia interpreta o signo
linguístico em universo cultural com base na maneira com que os pacientes
descrevem a sensação de angústia. Os sintomas físicos se manifestam pela
sensação de mãos geladas, tremores e aperto na garganta, o que indica dis-
função do sistema nervoso autônomo. Alguns pacientes podem descrevê-los
como uma "gastura", por exemplo. O sentido e o valor de um símbolo depen-
derão somente das relações que ele mantém com elementos de outro sistema
simbólico, uma vez que eles dependem da ausência ou presença de outros
símbolos, cujos significados se aproximem ou sejam antagônicos ao primeiro.
Figura 4. Compreendendo o contexto de um sistema simbólico. Fonte: Shutterstock. Acesso em: 22/08/2021
PSICOPATOLOGIA •
••
Transtornos psicopatológicos ou psiquiátricos
Apesar de os sistemas de classificação de doenças, DSM-IVe CID-10, iden-
tificarem e descreverem os transtornos mentais específicos de forma clara,
Dalgalarrondo (2019) afirma que a perspectiva sindrômica é muito útil para a
avaliação diagnóstica.
Os sinais e sintomas que ocorrem de forma recorrente em um indivíduo
se chamam transtornos psicopatológicos. Causados por diversos fatores, é
possível observá-los na prática clínica cotidiana.
EXPLICANDO
Identificar os transtornos psicopatológicos é a primeira etapa para orien-
tar a observação psicopatológica dos sinais e dos sintomas dos pacientes.
É necessário organizar e caracterizar os sinais e sintomas em situações
clínicas, de modo que se formule hipóteses diagnósticas em relação aos
transtornos mentais específicos, de acordo com os sistemas internacio-
nais de diagnóstico e classificação (DSM-IV e CID-10).
••
Descrição dos transtornos psicopatológicos
Dalgalarrondo (2019) classifica os transtornos psiquiátricos em 11 catego-
rias, cada uma com características e aspectos centrais próprios.
Transtornos ansiosos
Dividem-se em dois grandes grupos:
1. Quadros em que a ansiedade é constante e permanente, como na ansie-
dade generalizada, livre e flutuante; e
2. Quadros em que há crises de ansiedade abruptas com variação de inten-
sidade, como as crises de pânico. Vale a pena ressaltar que, caso elas ocorram
de modo repetitivo, denominam-se "transtorno de pânico".
Transtornos depressivos
O humor triste e a falta de energia mental, conhecida como desânimo, são
os sinais e sintomas mais característicos desses transtornos. Entretanto, ainda
existe uma multiplicidade de sintomas, relativos tanto à autovaloração quanto
à vontade e psicomotricidade envolvidas. Em casos graves de depressão, po-
dem aparecer sintomas psicóticos, como delírios e alucinações. Ainda, é pos-
sível observar alteração psicomotora marcante, como lentificação ou estupor.
PSICOPATOLOGIA •
Estes transtornos são um problema de saúde pública. Afinal, dentre as
condições de saúde mental alterada, a depressão é a principal causa de inca-
pacidade.
Transtornos maníacos
Na maioria dos casos, as funções psíquicas do paciente se aceleram inten-
samente, chamados de taquipsiquismos. São eles: falar em excesso ou em ve-
locidade excessivamente rápida; irritabilidade; e euforia. Para Belmaker (2004
apud DALGALARRONDO, 2019), a alegria patológica (euforia) e a expansão do
eu (e lação) são os sintomas básicos da condição maníaca.
Dentro dos transtornos maníacos, os subtipos bipolares apresentam mais
distinções em relação aos sintomas. Esses transtornos levam a episódios de
mania e depressão durante um certo tempo, mas se alternam com períodos de
remissão, sem sintomas mais intensos. Esses subtipos são:
· Transtorno bipolar t ipo 1: episódios depressivos que variam de leves a
graves, intercalados com fases de remissão e mania;
• Transtorno bipolar tipo li: episódios depressivos que variam de leves a
graves, intercalados com fases de remissão e hipomania;
• Transtorno afetivo bipolar de tipo ciclador: episódios depressivos que
variam de leves a graves, intercalados com fases de remissão, mania e com
períodos de tempo mais curtos entre eles. O paciente deve apresentar, no mí-
nimo, quatro episódios de mania e depressão em um período de 12 meses.
Quadros neuróticos
Esses quadros se dividem em transtornos fóbicos, obsessivos, histéricos e
de conversão somática.
De acordo com Dalgalarrondo (2019), o DSM-IV
suprimiu o conceito de neurose e o substituiu
por transtornos: de ansiedade generalizada;
de pânico; de estresse pós-traumático; fóbi-
cos; obsessivo-compulsivos; dissociativos; con-
versivos; e de somatização. Na CID-10, por outro
lado, o conceito permanece. Para o autor, a angústia
se encontra no cerne da neurose e leva à vivência
dos conflitos humanos fundamentais de maneira do-
lorosa e recorrente.
PSICOPATOLOGIA •
Transtornos de agitação e de estupor e lentificação psicomotora
Tratam-se de transtornos de agitação psicomotora e de estupor e lentifica-
ção psicomotora. É possível observar: aceleração acentuada da esfera motora;
aumento da excitabilidade; e agitação de andar de um lado para outro, gesticu-
lar muito ou inquietar-se constantemente.
Transtornos psicóticos
A principal forma de psicose é a esquizofrenia. Os sintomas dos quadros do
espectro dessa e outras psicoses incluem: alucinações; delírios; pensamento
desorganizado; e comportamentos bizarros, como fala e risos imotivados. O
sintoma mais comum é a paranoia, como nas ideias delirantes e nas alucina-
ções auditivas de conteúdo persecutório (perseguição). Ao contrário de outros
quadros, como demência, delirium ou deficiência mental grave, esses casos
apresentam uma profunda desorganização tanto da vida mental quanto do
comportamento.
Transtornos relacionados ao consumo de alimentos
Transtornos alimentares, como a anorexia nervosa, caracterizam-se pela
perda de peso autoinduzida e pela abstenção da ingestão de alimentos que
engordam. Ainda, é possível observar comportamentos específicos, como: au-
toindução de vômitos; exercícios físicos em excesso; e uso de anorexígenos ou
diuréticos. Normalmente, o objetivo consiste em alcançar padrões de magreza
e há um medo intenso e patológico de se sentir ou parecer gordo(a).
Para Wadden (1995 apud DALGALARRONDO 2019), a distorção da imagem
corporal é a principa l característica da anorexia nervosa, pois, apesar de a
pessoa estar muito magra, percebe-se como muito gorda. Esse transtorno,
no caso do subtipo purgativo, envolve a ingestão compulsiva de alimentos,
seguidos de vômitos e/ou outros métodos compensatórios. Uma multiplici-
dade de fatores influencia na instalação e na manutenção dos transtornos
alimentares, dos quais os principais são: genéticos; psicológicos; familiares;
e socioculturais.
Transtornos relacionados a substâncias psicoativas
Caracterizados pela relação particular que se desenvolve entre
indivíduos e substâncias que agem especificamente sobre
o psiquismo e o sistema nervoso central,os quadros des-
se tipo de transtorno são:
PSICOPATOLOGIA •
• Intoxicação: condição específica que altera comportamentos, capacidade
mental, nível de consciência e outros aspectos cognitivos. Além disso, substân-
cias psicoativas causam beligerância, agressividade e instabilidade de humor;
• Abuso: de acordo com a Organização Mundial da Saúde (1993 apud DAL-
GALARRONDO, 2019), o uso nocivo de uma substância psicoativa se refere a
lica e bronquite por tabagismo, quanto mental, como a depressão associada ao
consumo de álcool; e
• Dependência: o termo "fissura" (craving, em inglês) se refere ao desejo
incessante e intenso de usar uma substância. "Tolerância" diz respeito à dimi-
nuição do efeito dela após o uso repetido devido à necessidade do organismo
de ingerir doses cada vez maiores para experimentar o mesmo efeito.
Cada substância produz diferentes sinais e sintomas de abstinência. Entre-
tanto, é comum observar: ansiedade; inquietação; náuseas; tremor; sudorese;
convulsões; coma; e, em casos extremos, morte.
Parafilias
De acordo com Brown (2019), os transtornos parafílicos são considerados
como as fantasias, impulsos ou comportamentos recorrentes, intensos e ex-
citantes sexualmente que levam ao sofrimento ou à incapacitação e que en-
volvem objetos inanimados, crianças ou outros adultos não consentidores,
causando sofrimento e/ou humilhação de si mesmo ou do parceiro, com alto
potencial de ocorrência de dano.
O padrão de excitação sexual perturbado geralmente apresenta-se muito
bem desenvolvido antes da puberdade. Pelo menos três processos estão en-
volvidos:
• Entende-se que a ansiedade ou traumas emocionais precoces podem in-
terferir no desenvolvimento psicossexual adequado (BROWN, 2019);
• O padrão adequado de excitação é substituído por outro e, em alguns
casos, por exposição precoce a experiências com alta carga sexual, reforçando
experiências de prazer sexual;
• A excitação sexual adquire elementos simbólicos e condi-
cionados, como no caso do fetiche, que é um objeto de ex-
citação escolhido devido a uma associação à curiosidade,
desejo e excitação sexual.
•
PSICOPATOLOGIA •
Em geral, as parafilias são muito mais comuns entre os homens, sendo as
mais comuns:
• Pedofilia;
• Voyeurismo;
• Exibicionismo;
• Transtorno masoquista sexual;
• Transtorno sadista sexual.
Parafilias como a pedofilia e a necrofilia, além de todas que envolvam o não
consentimento da outra parte envolvida, são ilegais e podem levar à prisão
(BROWN, 2019).
Transtornos relativos ao sono
De acordo com Tavares (2007 apud DALGALARRONDO, 2019), o padrão e a
necessidade de sono variam bastante entre os indivíduos. Afinal, alguns se sen-
tem descansados dormindo cinco horas por noite e outros precisam de mais
de dez horas de sono para se sentirem ativos durante o dia. A Classificação
Internacional dos Transtornos do Sono (ICSD-2) lista mais de 80 transtornos do
sono. Entretanto, é possível organizá-los em três eixos:
• 1nsornas, n1persornas a1urnas (excesso ae sono) e movimentos anormais
no decorrer do sono;
• Apneias do sono e outras alterações respiratórias e de sistemas funcionais
durante o sono; e
• Parassonias (sonambulismo) e outras alterações do ritmo sono-vigília.
Transtornos neurocognitivos
Os transtornos demenciais, confusionais agudos (delirium) e psico-orgâni-
cos possuem uma etiologia orgânica identificável. É a psicopatologia que as
estuda, pois suas manifestações clínicas se constituem, predominantemente,
em sintomas mentais e comportamentais.
PSICOPATOLOGIA •
Sintetizando •
Conforme Dalgalarrondo (2019) demonstra, vimos que a psicopatologia es-
tuda as funções psíquicas elementares e suas alterações a fim de compreender
profundamente os processos que fazem parte da vida psíquica, tanto patológica
quanto normal, bem como da autonomia e da inter-relação desses fenômenos
no comportamento do indivíduo. Entende-se como elementares as seguintes
funções psíquicas: consciência; atenção; orientação e vivência de espaço e tem-
po; e vontade e o ato de agir dos indivíduos, bem como suas respectivas altera-
ções patológicas, isto é, disfuncionais.
A fim de organizar a apresentação das funções psíquicas, distinguimos as
funções elementares das superiores, as quais incluem linguagem, pensamento
e juízo de realidade. Além disso, analisamos detalhadamente suas respectivas
alterações patológicas.
Também abordamos a semiologia médica e psicopatológica. Com base nos
ensinamentos de Dalgalarrondo (2019), definimos semiologia como a ciência
que estuda os signos e símbolos. Ela não se restringe apenas à psiquiatria ou à
psicologia; na verdade, ela é muito importante na área da linguagem semiótica
linguística, nas artes e em qualquer área que estude comunicação por meio de
um sistema de signos.
Por fim, apresentamos os principais transtornos psicopatológicos ou psiquiá-
tricos, com definições e descrições de cada uma.
PSICOPATOLOGIA •
Referências bibliográficas •
BROWN, G. R. Visão geral dos transtornos parafílicos. Manual MSD, Tennessee, jul.
2019. Disponível em: <https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtor-
nos-psi q u i%C3%A 1 tri cos/sexual ida d e-di sforia-de-g%C3%AA nero-e-par afilias/vis%-
C3%A3o-gera l-d os-transtornos-par af%C3%AD l icos>. Acesso em: 28 set. 2021.
CHENIAUX, E. Manual de psicopatologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.
DALGALARRONDO, P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. Por-
to Alegre: Artmed, 2019.
PSICOPATOLOGIA •
UNIDADE
ser
educacional
Objetivos da unidade
Analisar as formas de tratamento das psicopatologias no ambiente psiquiátrico;
Discutir o contexto social e familiar no desenvolvimento das psicopatologias;
Conceituar as neuroses;
Conceituar as diferenças entre sintomas neuróticos e psicóticos na infância;
Identificar a ilusão e a alucinação;
Tópicos de estudo
Ambiente psiquiátrico e
tratamento das psicopatologias
Tratamento farmacoterápico
Eletroconvulsoterapia
Tratamentos psicoterápicos
O contexto social e familiar
no desenvolvimento das
psicopatologias
Influência familiar no
desenvolvimento das
psicopatologias
Rede de apoio e cuidados na
comunidade
Neuroses e tratamento
Causas possíveis das neuroses
Diferenças entre a neurose e a
psicose na infância
Tratamento das neuroses
Ilusão e alucinação
Ilusão e pareidolia
Alucinações e sinestesia
PSICOPATOLOGIA •
••
Ambiente psiquiátrico e tratamento das psicopatologias
Ao longo do tempo, avanços extraordinários ocorreram no tratamento das
psicopatologias. O tratamento com internação em longo prazo em hospitais
psiquiátricos foi sendo, paulatinamente, substituído pelo tratamento ambula-
torial, com a internação restrita a períodos mais curtos de tempo.
Atualmente, o tratamento dos transtornos psicopatológicos apresenta altos
índices de recuperação em comparação com o tratamento de outras patolo-
gias. De acordo com First (2020), os métodos de tratamento dos transtornos
psicopatológicos são classificados em:
• Tratamentos somáticos;
• Tratamentos psicoterapêuticos.
Os tratamentos somáticos são aqueles que se realizam por meio do uso
de medicamentos, eletroconvulsoterapia (em casos específicos) e terapias que
estimulam o funcionamento adequado do sistema nervoso, como a estimula-
ção magnética do crânio e do nervo vago.
Os tratamentos psicoterapêuticos incluem a psicoterapia individual; a
psicoterapia de grupo, familiar e/ou conjugal; e as técnicas de psicoterapia cog-
nitivo-comportamentais (FIRST, 2020).
Em geral, sugere-se uma abordagem terapêutica para transtornos psico-
patológicos que englobe o tratamento medicamentoso e a psicoterapia. Isso é
considerado mais eficiente do que os métodos de tratamento isolados.
Os orofissionais caoacitados oara o tratamento dos transtornos osicooa-
tológicos são os psiquiatras, psicólogos clínicos, enfermeiros psiquiátricos,terapeutas ocupacionais e assisten-
tes sociais. Porém, no Brasil, os psi-
quiatras são os únicos profissionais
com permissão legal para prescrever
medicações. Os demais profissionais
da saúde mental (especialmente os
psicólogos) atuam com a realização de
psicoterapia e no suporte para o aten-
dimento das pessoas com transtornos
psicopatológicos.
Tratamento farmacoterápico
PSICOPATOLOGIA •
••
No tratamento farmacoterápico há a prescrição de medicamentos psicoativos,
que são considerados muito eficazes no tratamento psicopatológico. Os profissio-
nais mais indicados nesse tipo de tratamento são os médicos psiquiatras.
A prescrição dos medicamentos usados no tratamento psiquiátrico é feita de
acordo com o transtorno diagnosticado. Para tratar a depressão, por exemplo, são
utilizados os medicamentos antidepressivos. Os mais usados são os inibidores sele-
tivos de recaptação de serotonina (ISRSs), como a fluoxetina, a sertralina, a paroxeti-
na e o citalopram. Outras categorias de antidepressivos são os:
• Inibidores de recaptação de serotonina-noradrenalina (IRSNs), como a venla-
faxina, a duloxetina ou a desvenlafaxina;
• Inibidores de recaptação de noradrenalina-dopamina, como a bupropiona.
Na categoria de antidepressivos tricíclicos estão a amitriptilina e a nortriptilina,
que são menos usados para o tratamento da depressão devido aos seus efeitos
colaterais desfavoráveis. Porém, esses medicamentos podem ser utilizados se opa-
ciente tiver alguma dor crônica que interfira nas atividades do cotidiano e do traba-
lho, já que os antidepressivos tricíclicos ajudam a aliviar alguns tipos de dores.
Os medicamentos antipsicóticos atualmente mais utilizados no tratamento inicial
das psicoses (antipsicóticos atípicos ou de 2ª geração) são o aripiprazol, a asenapina,
a cariprazina, a lurasidona, a olanzapina, a quetiapina, a risperidona e a ziprasidona.
Os medicamentos ansiolíticos, como o clonazepam, o lorazepam e o diazepam, são
utilizados para o tratamento do transtorno de ansiedade, transtorno de pânico e
fobias.
Os medicamentos estabilizadores de humor, como o lítio, a carbamazepina e o
topiramato, são usados para o tratamento dos transtornos bipolares.
••
Eletroconvulsoterapia
A eletroconvulsoterapia é um tratamento em que são colocados eletrodos
na cabeça do paciente, que está sob efeito de anestesia, para que sejam aplica-
das descargas elétricas no seu cérebro, a fim de induzir uma convulsão breve.
Apesar de controversa, essa técnica demonstra eficácia para o tratamento da
depressão severa.
PSICOPATOLOGIA •
A maioria das pessoas tratadas com a eletroconvulsoterapia apresentam
perda temporária da memória. De acordo com especialistas, a eletroconvulso-
terapia é um método seguro e a utilização de anestésicos e relaxantes muscu-
lares reduz os riscos para o paciente (FIRST, 2020).
Outras terapias de estimulação do cérebro são a estimulação transcraniana
magnética repetitiva e a estimulação do nervo vago. Elas envolvem a aplicação
de ímãs ou implantes que irão atingir o nervo vago. O efeito dessa estimulação
pode levar à liberação de neurotransmissores, auxiliando no controle do hu-
mor e aliviando os sintomas de depressão. Esses métodos podem ser benéfi-
cos para pessoas com depressão severa e que não respondem ao tratamento
medicamentoso ou psicoterápico.
••
Tratamentos psicoterápicos
Os avanços no tratamento realizado por meio de psicoterapias se inten-
sificaram ao longo do século XX. O ambiente de empatia e aceitação criado
pelo psicoterapeuta e a utilização de técnicas psicoterápicas específicas são
considerados eficazes para o tratamento das pessoa com transtornos psico-
patológicos.
A identificação da origem dos transtornos de comportamento e a busca de
estratégias e alternativas para enfrentá-los são as bases das psicoterapias. O
desenvolvimento do autoconhecimento, da intuição cognitiva e emocional e o
aumento da capacidade de introspecção auxiliam a pessoa a mudar suas ati-
tudes diante dos conflitos psíquicos e permite uma qualidade de vida mais sa-
tisfatória. Sendo assim, considera-se que os tratamentos psicoterápicos sejam
muito eficazes para uma grande variedade de transtornos psicopatológicos.
A psicoterapia não se restringe às pessoas que sofrem de transtornos men-
tais. As pessoas sem essa condição usam desse tratamento para se conhece-
rem melhor e enfrentarem os problemas do cotidiano, como dificuldades no
trabalho, problemas em relacionamentos afetivos, luto por entes queridos ou
pela descoberta de uma doença crônica. A terapia de grupo, a terapia conjugal
e a terapia familiar são muito utilizadas e eficientes.
Segundo First (2020), os tipos de psicoterapias em saúde mental podem ser
classificados conforme o Quadro 1:
QUADRO 1. TIPOS DE PSICOTERAPIA
~
Psicoterapia cognitivo-comportamental
Psicoterapia interpessoal
Psicanálise
Psicoterapia psicodinâmica
PSICOPATOLOGIA •
s1co erap1a e apoio
Fonte. FIRST, 2020. (Adaptado).
Adiante, iremos apresentar as principais características dos tipos de psico-
terapias.
Psicoterapia cognitivo-comportamental
A psicoterapia cognitivo-comportamental parte do pressuposto de que os
comportamentos inadequados são uma consequência de processos educati-
vos incorretos e/ou inadequados para a resolução dos problemas cotidianos.
Uma das principais premissas da psicoterapia cognitivo-comportamental é que
a maneira de sentir e de se comportar é determinada pelo modo como a pes-
soa interpreta as experiências vividas.
O objetivo da psicoterapia cognitivo-comportamental é auxiliar a pessoa a
identificar as distorções do seu pensamento e as maneiras como elas ocasio-
nam os problemas na sua vida cotidiana. Por exemplo, se uma pessoa pensar
de forma radical, poderá estipular para si mesma que se não for um sucesso
total, então será um fracasso total.
A partir da identificação das suas crenças fundamentais, o paciente apren-
de a pensar de forma diferente sobre as suas experiências, o que o auxilia a
reduzir sintomas que vem experienciando e o leva a uma melhora no seus com-
portamentos e sentimentos.
A psicoterapia cognitivo-comportamental implica na aplicação de um nú-
mero de intervenções com o objetivo de ajudar a pessoa a desaprender os
comportamentos inadequados e aprender comportamentos adequados .
Psicoterapia interpessoal
A psicoterapia interpessoal foi, inicialmente, utilizada como
um tratamento psicológico para a depressão. Tem como obje-
tivo aumentar a qualidade dos relacionamentos afetivos da
pessoa deprimida, enfatizando:
• Sofrimentos não resolvidos;
•
PSICOPATOLOGIA •
• Conflitos que ocorrem quando a pessoa desempenha papéis diferentes
das expectativas do seu contexto pessoal e social, como quando a mulheres-
pera ser mãe e/ou dona de casa e percebe que terá que trabalhar fora da sua
residência para ser a principal fonte de sustento da família, por exemplo;
• A necessidade de transição entre papéis sociais, como no caso da aposen-
tadoria de profissionais ativos;
• Dificuldade para estabelecer uma comunicação adequada com as outras
pessoas.
O psicoterapeuta interpessoal irá auxiliar o seu paciente a mudar e melho-
rar os seus comportamentos no contexto interpessoal, a superar o isolamento
social e a reagir de uma forma diferente nos relacionamento com as pessoas.
Psicanálise
A psicanálise é considerada como a forma mais antiga de psicoterapia e foi
desenvolvida pelo médico austríaco, Sigmund Freud, entre o final do século XIX
e o início do século XX.
Na psicanálise tradicional, a pessoa em psicoterapia deita-se em um divã no
consultório do psicoterapeuta, em consultas que acontecem de quatro a cinco
vezes por semana.
Figura 1. O divã do consultório de Freud em Viena (Áustna). Fonte: FIASCHETTI, 2021.
Por meio da técnica criada por Freud, chamada
de conversação livre ou livre associação, a pessoa
fala aopsicoterapeuta o que lhe vem à mente.
O tratamento procura auxiliar a pessoa a com-
preender como os conflitos inconscientes e os
padrões de relacionamentos interpessoais do seu
passado estão se repetindo no momento presente.
O psicanalista ajuda a pessoa a desenvolver formas mais adapta-
das de agir em suas relações pessoais e profissionais.
PSICOPATOLOGIA •
Um dos pilares desta abordagem é a relação inconsciente que se estabe-
lece entre paciente e terapeuta.
EXPLICANDO
Na psicanálise, acredita-se que entre o paciente e o psicanalista, os dois
personagens centrais do processo psicoterápico, estabelece-se um tipo
de relação inconsciente denominada de transferência. A ideia da transfe-
rência é a de deslocar sentimentos e conflitos de uma pessoa para outra,
atribuindo um significado especial à essa pessoa. Na relação terapeu-
ta-paciente, a transferência se produz quando o desejo de se relacionar
afetivamente do paciente se liga a um elemento particular, que é a figura
do terapeuta.
Psicoterapia psicodinâmica
A abordagem ou psicoterapia psicodinâmica é fundamentada na psicanáli-
se e enfatiza a identificação de padrões inconscientes de pensamentos, senti-
mentos e comportamentos do indivíduo. Nesse modelo de psicoterapia, a pes-
soa costuma ficar sentada, em vez de ficar deitada no divã e há uma média de
uma a três sessões por semana. Há menor ênfase no relacionamento entre o
paciente e o terapeuta.
Psicoterapia de apoio
~
cio~~;;~~~~~~~;;m~p~a;i:-~~~r:~ o~;a·~;:~;~: ·:~t:r:~::·t~a.~~ ·_·-_ · ~_·~~111F
Estimula-se a expressão dos sentimentos e o supor-
te na solução de problemas cotidianos, sendo mais
voltada à resolução de questões presentes, de forma
mais breve.
PSICOPATOLOGIA •
O contexto social e familiar no desenvolvimento das
psicopatologias
••
A família é a primeira institu ição socializadora do indivíduo. Ela tem um va-
lor e impacto indiscutível na formação das pessoas, sobretudo quando crian-
ças. A organização familiar sofreu grandes transformações com o passar dos
anos, mas não modificou o seu valor social, pois a família ainda é considerada
como a base da sociedade (ANDRÉ; BARBOZA, 2018).
o
\
CURIOSIDADE
Antigamente, a organização familiar se constituía apenas no que ficou
conhecido como "família tradicional" (pai, mãe e filhos biológicos).
Entretanto, esse é um conceito equivocado que, ao longo dos anos, vem
sendo modificado, dada a melhor compreensão do que é a organização
familiar. A família atual é organizada de diversas formas. Ela pode ser
composta por pessoas do mesmo sexo nas figuras paternas, por parcei-
ros divorciados que já trazem consigo filhos de outros casamentos, por
mulheres independentes que decidiram criar seus filhos sem a presença
de um pai, por um pai solteiro ou viúvo e seus filhos, por avós e netos
etc. (ANDRÉ; BARBOZA, 2018).
Independentemente do seu formato, a família desempenha um papel es-
sencial no desenvolvimento dos seres humanos e é considerada a principal
agente de conexão entre o indivíduo e a sociedade.
É o espaço no qual o indivíduo aprende a se relacionar socialmente .
com o outro e lhe são transmitidos valores morais que o prepa-
ram para o futuro (ANDRÉ; BARBOZA, 2018). É o lugar para a
aquisição de dimensões internas e para a vivência de rela-
ções afetivas profundas (ALARCÃO, 2000).
••
Influência familiar no desenvolvimento das psicopatologias
Além do contexto biológico envolvido na determinação dos transtornos psi-
copatológicos, é no contexto familiar que se encontram a maioria dos fatores
de risco e de proteção ligados à saúde mental de crianças, adolescentes e, pos-
teriormente, adultos.
PSICOPATOLOGIA •
Fatores de risco são os eventos que aumentam a probabilidade do apa-
recimento de transtornos mentais no desenvolvimento após a infância,
além de levarem a prejuízos nas dimensões afetiva, acadêmica, profissio-
nal e da vida adulta, aumentando a chance do uso de substâncias psicoati-
vas na adolescência e vida adulta (ZAYAT et ai., 2018).
Os fatores de risco na infância e adolescência mais comumente asso-
ciados ao desenvolvimento de psicopatologias são os transtornos de saú-
de mental da mãe biológica; o pertencimento do indivíduo a um contexto
familiar e/ou de moradia em bairros de nível socioeconômico baixo; a ex-
posição a formas de violência psicológica, sexual e negligência; e o uso de
práticas parentais negativas e/ou falta de cuidado parental.
Jovens que desenvolvem relações de confiança e aproximação com os
pais, apresentam níveis maiores de bem-estar psicológico e menor sin-
tomatologia ansiosa e depressiva (SCHIFFRIN et ai., 2014 apud CORREIA;
MOTA, 2017, p. 255).
••
Rede de apoio e cuidados na comunidade
A coesão e apoio familiar auxiliam no desenvolvimento pessoal e possi-
bilitam o processo de autonomia e independência (CORREIA; MOTA, 2017).
A segurança, estabilidade e afetividade no contexto familiar contribuem
positivamente para o desenvolvimento psicológico. A ausência de relações
estáveis, afetivas e disponíveis e a alta frequência de conflitos conjugais,
familiares e acontecimentos estressantes são considerados fatores de ris-
co para a saúde mental, funcionamento e ajustamento psicológico dos jo-
vens (LARKIN; FRAZER; WHEAT, 2011 apud CORREIA; MOTA, 2017, p. 266).
Porém, não é sempre que as famílias se constituem em uma rede de
apoio funcional e satisfatória. Pesquisas sobre estratégias de enfrenta-
mento entre crianças institucionalizadas e crianças que viviam com as fa -
mílias não encontraram diferenças na busca de apoio social e em ações
agressivas. Em alguns casos, as instituições pesquisadas pareciam ter me-
lhores condições físicas e organizacionais e contavam com profissionais e
rotinas que estabeleciam redes sociais de apoio mais fortes e adequadas
do que as das famílias (CORREIA; MOTA, 2017).
PSICOPATOLOGIA •
O desenvolvimento de estratégias apropriadas de enfrentamento dos
conflitos é influenciado, de forma geral, pelo tipo de relação afetiva estabe-
lecida, coesão, segurança e ausência ou pouca frequência de discórdia na
família e nas instituições. Esses aspectos são os fatores de proteção para
a saúde mental do indivíduo e favorecem o desenvolvimento de habilida-
des sociais e da capacidade de adaptação às situações cotidianas (CORREIA;
MOTA, 2017).
A ausência de redes de apoio social e de cuidados da comunidade, que
promovam a superação do estresse, a capacidade de resolução de confli-
tos e o estabelecimento de uma dinâmica familiar saudável, levam as fa-
mílias a desenvolverem padrões de relacionamento pouco funcionais, com
existência de maus-tratos à criança, violência doméstica, maior tendência
de abuso de substâncias e conflitos diversos. As instituições públicas ou
privadas, em especial a escola, possuem um importante papel como rede
de apoio direta ou indireta, por meio do oferecimento de programas de
educação familiar.
As políticas públicas para a promoção da saúde devem considerar os
fatores de risco e estimular a formação de redes de apoio na própria co-
munidade ou em centros de atendimento à população, em especial na es-
cola, que ocupa um lugar de destaque nas sociedades contemporâneas
(CORREIA; MOTA, 2017).
••
Neuroses e tratamento
As neuroses são transtornos que se caracterizam pela existência de con-
flitos intrapsíquicos que irão inibir e perturbar as condutas sociais, produ-
zindo uma perturbação do equilíbrio interno do indivíduo e alterações em
seu sistema de relacionamento adequado com a realidade (EY, 1974 apud
DALGALARRONDO, 2019).
Dalgalarrondo (2019), adverte que apesar da tendência atual de se aban-
donar o termo neurose, como ocorre no DSM- V, esse termo ainda é útil e
permite uma compreensão adequada para um número significativo de indi-
víduos que apresentam sintomas de ansiedade, angústia, fobias, obsessões
e hipocondria.
PSICOPATOLOGIA •
EXPLICANDO
O conceitode neurose foi substituído no Manual Diagnóstico e Estatístico
de Transtornos Mentais (DSM-V) pelos termos transtornos de ansieda-
de generalizada; transtornos de pânico e de estresse pós-traumático;
transtornos fóbicos e obsessivo-compulsivos; e transtornos dissociativos,
conversivos e de somatização.
De modo geral, neurose se refere a uma variedade de problemas psíquicos
que se caracterizam pela ausência ou pouca capacidade do indivíduo em se
adaptar e responder satisfatoriamente às demandas do seu meio, sem que
haja a perda da sua noção de rea lidade.
Causas possíveis das neuroses
O termo neurose foi usado pela primeira vez pelo médico es-
cocês William Cullen, ao descrever as chamadas afecções ner-
vosas, porém foi Sigmund Freud quem trouxe uma explicação
e tratamento revolucionários para essa condição, por meio da
recém-criada psicanálise (MABILDE, 2018).
••
• Ao tratar os pacientes neuróticos, Freud descobriu diversas causas relacio-
nadas às neuroses, atribuindo uma natureza essencialmente psíquica à essa
psicopatologia. Para Freud, as neuroses são constituídas por fatores que se
complementam e que possuem uma maior ou menor participação no seu re-
-··••-...J- ,-...,. &-•---- -----•-..J ......... --- r ........... ..J .............................. ...J ........... -..-:.- .............. ,.. ...J ... ,. ---··-----
estão no Quadro 2:
QUADRO 2. FATORES DETERMINANTES DA NEUROSE SEGUNDO FREUD
~
Pré-condição ou predispos ição: se refere à const1tu1ção do individuo, sendo que a
hereditariedade tem um papel fundamental nesse fator.
Causas concorrentes ou auxiliares: agentes situacionais que funcionam como
desencadeadores da neurose que estava oculta, como as perturbações emocionais ocasionais, o
esgotamento físico, as intoxicações, os acidentes traumáticos e a sobrecarga intelectual.
Causas específicas: a neurose tem uma causa especial relacionada à vida pulsional do sujeito,
ligada a um distúrbio sexual e/ou agressivo atual ou, mais frequentemente, de fatos passados
da vida. Os fatos sexuais e/ou agressivos se referem a abusos, seduções ou fantasias sexuais
e/ou agressivas que ocorreram na infância e foram reprimidas por serem consideradas
inadequadas no julgamento moral do individuo e sua cultura (superego).
Fonte: MABILDE 2018. (Adaptado).
PSICOPATOLOGIA •
Portanto, a concepção psicanalítica define a neurose como a afecção
de origem psicológica em que os sintomas funcionam como a expressão
simbólica de conflitos psíquicos que têm as suas raízes na história pessoal,
constituindo-se um compromisso entre o desejo e os mecanismos de defe-
sa inconscientes, e implica na existência de um superego internalizado que
levaria o ego a mobilizar constantes defesas frente a impulsos reprimidos
(ROCHA, 1985).
Segundo Rocha (1985), sintomas de nível neurótico na infância podem
ser confundidos com os sintomas relacionados ao nível adaptativo e reativo,
como se vê no Quadro 3:
'
1
QUADRO 3. SINTOMAS DO NÍVEL ADAPTATIVO E REATIVO
No nível adaptativo
No nível reativo
Os sintomas indicam que a criança ainda não possui o equipamen-
to neurofisiológico ou a maturação psicológica necessárias para a
realização daquilo que uma criança mais velha já é capaz de fazer.
Por exemplo, andar ou falar antes do período adequado.
Os sintomas são uma forma de reação a pressões, exigências ou
solicitações inadequadas do ambiente sobre a criança. Por exemplo.
ler e escrever antes do período adequado.
Fonte ROCHA, 1985, p. 35. (Adaptado).
Portanto, os sintomas relacionados ao nível neurótico têm uma incidência sig-
nificativamente inferior em relação aos sintomas relacionados ao nível adaptativo
e reativo, especialmente em crianças até os quatro anos.
Se a condição para o aparecimento de sintomas de nível neurótico é a
presença de superego predominante, só se pode falar em neurose após o pe-
ríodo edipiano, na fase de latência ou na puberdade, ou seja, após os quatro
ou cinco anos. Os principais critérios para se determinar um sintoma no nível
neurótico são:
QUADRO 4. CRITÉRIOS PARA DETERMINAÇÃO DE UM SINTOMA NO NÍVEL NEURÓTICO
Persistência: Os sintoma deve ser persistente, mesmo que as condições ambientais já tenham
sido modificadas.
Distanciamento do contexto: não devem existir relações estreitas entre o sintoma e as
pressões amb1enta1s ou determinados momentos.
Fonte: ROCHA, 1985, p. 49. (Adaptado)
PSICOPATOLOGIA •
Iremos, agora, realizar uma comparação entre o comportamento de uma
criança sem neurose, uma criança neurótica e uma psicótica, em relação a al-
gumas funções psicológicas e ao comportamento de brincar.
••
Diferenças entre a neurose e a psicose na infância
Existem diferenças entre a neurose e a psicose que podem ser observa-
das em sinais e sintomas no comportamento, ainda na infância. A identificação
desses sintomas auxi lia na avaliação e intervenção precoces (ROCHA, 1985).
Vamos analisar as diferenças entre o comportamento de uma criança sem con-
dição neurótica, uma neurótica e uma criança psicótica em alguns aspectos do
comportamento:
Adequação à realidade: é a capacidade de entender e responder adequa-
damente à realidade:
• Normal: capacidade adequada de adaptação;
• Neurótica: reconhecimento parcial da realidade e distorções em função
dos conflitos neuróticos;
· Psicótica: falta de adequação por ausência de discriminação da realidade.
Escolha de brinquedos e brincadeiras: é a modalidade de seleção dos ob-
jetos lúdicos:
• Normal: em função de necessidades e interesses próprios da idade;
• Neurótica: é determinada pelos seus conflitos neuróticos;
• Psicótica: responde a uma intenção de natureza psicótica, sem contato
com a realidade, às vezes, nem preferindo brinquedos, mas objetos.
Capacidade simbólica: é a forma de expressar os sentimentos, pensamen-
tos e desejos através de sistemas simbólicos:
• Normal: é capaz de expressar as fantasias através da atividade simbólica
com muita riqueza de opções;
• Neurótica: compulsão à repetição, pois não diversifica as possibilidades
de expressão;
• Psicótica: atuação direta das fantasias, pois não difere a fantasia da realidade.
Modalidade de brincadeiras: são os tipos de brincadeiras preferidas:
· Normal: escolha de brincadeiras com riqueza de opções e de forma fluida,
não rígida;
PSICOPATOLOGIA •
• Neurótica: escolha das brincadeiras em função das defesas e dos confli-
tos predominantes;
• Psicótica: escolha das brincadeiras de forma estereotipada e rígida.
Tolerância à frustração: é a capacidade de tolerar o fato de não satisfazer
uma necessidade:
• Normal: apresenta capacidade adequada de tolerância;
• Neurótica: apresenta baixo limiar de tolerância;
• Psicótica: apresenta mínima ou nenhuma capacidade de tolerância.
Os sintomas neuróticos se organizam e se manifestam por meio da ansieda-
de, da angústia, das fobias e das obsessões (AJURIAGUERRA; MARCELLI, 1986).
A ansiedade é o estado afetivo
penoso associado aa uma atitude de
expectativa de um acontecimento im-
previsto, mas vivenciado como desa-
gradável. A angústia é a sensação de
extremo desconforto acompanhada
de manifestações somáticas, como su-
dorese, taquicardia, aumento da pres-
são arterial, dentre outras. As fobias
são os temores não justificados de um
objeto ou de uma situação potencial-
mente não perigosa, mas cujo con-
fronto com a pessoa gera intensa reação de angústia e ansiedade.
As obsessões são os pensamentos injustificados, imotivados e persistentes
cujos conteúdos são, em geral, ligados a questões religiosas, de natureza física
ou espiritual, além das preocupações constantes com a simetria e organização
dos objetos e em que se predomina a dúvida em detrimento de respostas e
soluções práticas. A ansiedade e angústia são consideradas as portas de entra-
da da maioria das condutas psicopatológicas relacionadas à neurose, especial-
mente na infância (AJURIAGUERRA; MARCELLI,1986).
É possível avaliar a angústia na criança lactente e pequena? Sim. É possível
constatar a angústia nessas circunstâncias, mas isso dependerá da observação
e da empatia do adulto. Em geral, o pânico na criança se apresenta conforme
o Quadro 5:
PSICOPATOLOGIA •
QUADRO 5. FORMAS DE EXPRESSÃO DO PÂNICO NA CRIANÇA PEQUENA
~
Distúrbios do tônus muscular (apresenta hipertonia, ou rigidez muscular).
Hipervigilância (apresenta o semblante imóvel, como que congelado).
lmob1hdade ou gesticulação anárquica.
Incapacidade de encontrar atitude confortável no colo de adulto.
Distúrbios do sono (terror noturno).
Fonte AJURIAGUERRA; MARCELLI. 1986, p. 619. (Adaptado,.
A ansiedade crônica ou hiperansiedade é observada na criança que vive
permanentemente com um sentimento vago de apreensão, como se algo terrí-
vel fosse acontecer. A crise de angústia aguda ou o ataque de pânico apresenta
um início espontâneo e inesperado e caracteriza-se por:
QUADRO 6. SINAIS DE ANGÚSTIA AGUDA OU DE PÂNICO
Sinais somáticos: palpitação, taquicardia, sensação de sufocamento, dores torácicas,
abdominais e náuseas.
Sinais motores: agitação excessiva ou prostração.
Sinais vasomot ores: suores, fogachos e calafrios.
Sinais psíquicos: sensação de estranhamento, de perda de referências, medo de morrer e
de enlouquecer.
Fonte. AJURIAGUERRA MARCELLI. 1986, p. 624. (Adaptado).
Em geral, quanto menor a criança. mais var iados serão os sintomas somáti-
cos. A criança em pânico parece muito aterrorizada e não atende à argumenta-
ção dos adultos, só se acalmando na presença dos pais, principalmente, antes
dos sete ou oito anos.
À medida em que fica mais velha (em torno dos 11 ou 12 anos), a criança já
apresenta maior capacidade de exteriorizar a angústia, não falando sobre ela,
mas a demonstrando com crises de cólera, atitudes de exigências insaciáveis,
fugas e distúrbios de comportamento diversos (AJURIAGUERRA; MARCELLI,
1986).
Ainda que o início da angústia seja abrupto e espontâneo, ele está frequen-
temente associado a um acontecimento e/ou pensamento que precede a crise
e que, geralmente, tem relação com a ideia de separação das pessoas amadas.
PSICOPATOLOGIA •
Sobre as fobias na infância, as mais recorrentes são as fobias sociais, que são
os medos irracionais e persistentes de situações nas quais a criança está exposta
à observação de outras pessoas. As primeiras manifestações das fobias sociais na
criança podem ser o medo da interrogação oral na aula, o medo de ir à lousa e o
medo de falar diante de estranhos.
A forma mais elaborada de fobia social é a fobia escolar, quase sempre acom-
panhada de uma inibição da criança (como a submissão excessiva, a extrema obe-
diência, o isolamento social), mas que posteriormente podem se transformar em
autoritarismo e dominação na escola e em outros ambientes, como sua casa.
São casos diferentes dos medos, que são acontecimentos comuns no decorrer
do crescimento, como o medo do escuro, de pequenos animais, de animais que
mordem, de estranhos, de fantasmas ou do bicho-papão.
A partir dos oito anos, a criança passa a apresentar o medo existencial (como o
medo da morte), que surge diretamente ou expresso sob formas indiretas (como o
medo de ficar doente) (AJURIAGUERRA; MARCELLI, 1986). Os fatores que intervêm
nos medos infantis, conforme o Quadro 7, são:
QUADRO 7. FATORES RELACIONADOS AOS MEDOS INFANTIS
~
Sentimento de preservação do eu: ausente em crianças que se colocam em situações de perigo.
Clima familiar: como no medo de animais que foi induzido por familiares que forçaram a cri-
ança a se confrontar com o obJeto do medo.
Aprendizagem: o comportamento de medo pode ser reforçado após a primeira experiência
vivida e se tornar repet1t1vo.
Fonte: ROCHA, 1985, p. 55. (Adaptado!
•
Tratamento das neuroses
As neuroses são tratadas com a realização de psicoterapias e o uso de medicações,
se necessário. A psicoterapia cognitiva-comportamental é bastante indicada para o
tratamento das neuroses e aux111a na mudança do autoconce1to da pessoa e na busca
de novas formas de entender os pensamentos e lidar com o sofrimento emocional.
O tratamento psicanalítico objetiva analisar a personalidade do paciente na busca
dos conflitos inconscientes e reprimidos que estariam na base da formação dos sin-
tomas. O método inclui a análise da relação psicanalista-paciente, sonhos e fantasias
inconscientes expostas nas sessões (MABILDE, 2018).
PSICOPATOLOGIA •
••
Ilusão e alucinação
A ilusão, a pareidolia, a alucinação e a sinestesia representam as alterações
qualitativas da sensopercepção.
DIAGRAMA 1. ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DA SENSOPERCEPÇÃO
Alterações qualitativas
da sensopercepção
Fonte CHENIAUX, 2021 , p. 62. (Adaptado).
í
[
1
Ilusão
Pareidolia
1
Alucinação
Sinestesia
1
Ilusão e pareidolia
Alucinação verdadeira
t Pseudoalucinação Alucinose
•
Segundo Cheniaux (2021), ilusão provém da palavra latina ilusionem, que
significa engano, fantasia, miragem, logro ou ludibrio. Assim, a ilusão diz res-
peito a uma senso percepção de uma imagem real e que é substituída por outra
imagem percebida de uma maneira deformada, ou seja, ilusória. A imagem ilu-
sória é projetada e aceita como realidade, não sendo influenciada pela vontade
do indivíduo, ou seja, se impõe à percepção. A ilusão ocorre tanto em pessoas
com transtornos mentais quanto nas que não possuem.
As ilusões são classificadas em desatenção, catatímicas e oníricas. Na ilu-
são por desatenção, os elementos representativos são colocados de forma a
completar ou corrigir os estímulos externos escassos ou incorretos. Por exem-
plo, quando completamos automaticamente uma frase ouvida de forma frag-
mentada ou corrigimos as falhas de impressão na frase de um livro. Ao se pres-
tar atenção, a ilusão desaparece.
Na ilusão catatímica há a deformação do objeto a partir de um desejo ou
temor intenso, como no caso de uma pessoa apaixonada que falsamente reco-
nhece a pessoa amada em estranhos que cruzam rapidamente com ela na rua
(CHENIAUX, 2021).
PSICOPATOLOGIA •
A ilusão onírica relaciona-se ao rebaixamento do nível
de consciência, como no caso do delirium. Essas ilusões
são, em geral, visuais e se associam a fenômenos alu-
cinatórios. Por exemplo, um paciente em estado de
obnubilação, internado em uma UTI pode "ver" no pes-
coço do médico que o atende uma cobra em vez de um
estetoscópio (CHENIAUX, 2021).
Parei do lia
O termo pareidolia foi criado por Karl Jaspers e se origina no grego: para
(ao lado) e eidos (figura) (CHENIAUX, 2021). O fenômeno da pareidolia ocorre
quando uma imagem fantástica é projetada no ambiente e criada intencional-
mente pelo indivíduo a partir de percepções reais de elementos sensoriais in-
completos. Um exemplo comum de pareidolia é encontrar figuras humanas,
animais e objetos em nuvens, manchas, fogo, relevos naturais, ou ouvir músi-
cas em ruídos monótonos como o bater de martelos.
Figura 2 Pare1dolia com a face humana em Marte Fonte: REDD, 20' 2
A pareidolia não é uma sensopercepção patológica e se relaciona à ativi-
dade da imaginação. Mesmo que a pareidolia esteja incluída na categoria de
ilusão, se diferencia desta, pois o indivíduo está consciente da ausência de rea-
lidade e de sua influência sobre a formação da imagem.
Alucinações e sinestesia
A palavra alucinação tem ori-
gem no latim, alucinare, significando
enlouquecido ou privado de razão
(CHENIAUX, 2021 ). A alucinação é
definida como uma percepção sem
objeto, como uma percepção com a
ausência de estímulos externos cor-
respondentes ou, ainda, como a in-
PSICOPATOLOGIA •
••
ternret;:ic:;io rle 11m ohieto mie. rle fato. n;io está no c:;:imno nerc:entu;:il rlo
indivíduo (DEL NERO, 1997 apud CHENIAUX, 2021).
As alucinações não são decorrentes das transformações das percepções
reais e essa é a principal diferença entre elas e as ilusões.Porém, a distinção
entre alucinações e ilusões não uma questão simples. Os órgãos sensoriais
recebem constantemente os estímulos externos e a atenção não é capaz de
remover as alucinações, como ocorre com as ilusões causadas pela desa-
tenção e as catatímicas. Assim como ocorre com as imagens de um sonho,
as alucinações ocorrem simultânea e paralelamente às percepções reais. Os
três tipos de vivências alucinatórias são:
· Alucinações verdadeiras: apresentam as características de uma per-
cepção real, como a corporeidade e a localização no espaço externo. São ex-
tremamente convincentes, isto é, aceitas facilmente pelo juízo de realidade,
mesmo que pareçam estranhas ou especiais;
• Pseudoalucinações: esses tipos de alucinação são também chamados
de alucinações psíquicas ou alucinações aperceptivas. São diferentes das
alucinações verdadeiras porque não apresentam corporeidade nem locali-
zação no espaço interno, mas podem se parecer muito com a imagem per-
ceptiva real e com a imagem representada. São plenamente convincentes.
As pseudoalucinações ocorrem nas modalidades visual e auditiva, e os pa-
cientes relatam que percebem com os olhos (ou ouvidos) internos, ou seja,
dentro da mente. São muito comuns na esquizofrenia, mas podem ocorrer
em quadros em que há alteração da consciência, como no de/irium e nos
estados crepusculares;
PSICOPATOLOGIA •
• Alucinoses: assim como nas alucinações verdadeiras, o objeto percebi-
do é localizado no espaço externo, mas a diferença em relação às alucinações
verdadeiras se dá por elas serem mais passíveis de serem criticadas pelo indi-
víduo, que reconhece o fenômeno como estranho ou patológico. Ocorrem em
momentos de lucidez e podem ser chamadas de alucinações neurológicas, pois
estão relacionadas a distúrbios orgânicos, como lesões cerebrais, intoxicações
por alucinógenos (LSD e mescalina), em focos epilépticos, na enxaqueca e no
fenômeno do membro fantasma em amputados.
Tipos de alucinações e modalidades sensoriais
As alucinações são classificadas de acordo com os órgãos sensoriais pelas
quais são percebidas e podem ser visuais, auditivas, olfativas, gustativas, cutâ-
neas, cenestésicas (ou viscerais) e cinestésicas. As alucinações visuais podem
ser simples, contendo apenas uma forma de sensação, como as fotopsias (cla-
rões, chamas e pontos brilhantes).
As alucinações visuais complexas envolvem figuras, objetos, pessoas, cenas
paradas ou em movimento. Incluem figuras e imagens de pessoas (vivas ou mor-
tas; conhecidas ou desconhecidas), de partes do corpo (como órgãos genitais, ca-
veiras, olhos assustadores e cabeças disformes), de entidades (como o demônio,
santos ou fantasmas), de animais ou crianças (DALGALARRONDO, 2019).
As alucinações visuais são muito comuns no delirium e na intoxicação por
alucinógenos, mas pouco comuns na esquizofrenia e nas psicoses afetivas. As
alucinações auditivas são as mais comum ente relatadas e podem ser simples,
LUITlU dS dLUdSllldS lSUflS ue LUlllUIUUS, eSLdllUUS, SIIVUS, SlflUS e LdlTlJJdlrHldS/ e
complexas, como as audições de palavras e frases, chamadas de alucinações
auditivo-verbais.
As alucinações auditivo-verbais são as mais comuns nos transtornos psico-
patológicos, e a audição das vozes pode ser muito clara ou pouco compreen-
sível para a pessoa. As vozes podem se dirigir diretamente ao indivíduo ou
serem ouvidas em forma de diálogos, se referindo ao paciente
terceira pessoa. O conteúdo das vozes, em geral, é ofensivo e
ameaçador ao paciente e em tom de comando (alucinações
imperativas). As alucinações auditivas são muito comuns
na esquizofrenia, na alucinose alcoólica, em psicoses afe-
tivas e em outros quadros psicóticos.
Alucinações olfativas e gustativas são menos co-
muns e, em geral, estão associadas entre si. O pa-
ciente relata, nessas alucinações, experimentar,
na maioria das vezes, um odor ou gosto desagra-
dável (de fezes, lixo, animais mortos ou veneno).
Essas alucinações podem resultar em uma recusa
sistemática de alimentos chamada de sitiofobia. São
mais comuns na esquizofrenia e em crises epilépticas.
PSICOPATOLOGIA •
Nas alucinações cutâneas incluem-se as sensações de toque, sensações
térmicas, dolorosas e hídricas (ou de umidade). Os pacientes relatam sentir
queimaduras, espetadas, choques ou a movimentação de pequenos animais
(em geral insetos) sobre ou sob a pele. Ocorrem com mais frequência no deli-
rium tremens e na intoxicação por cocaína ou anfetamina.
As alucinações cenestésicas (ou viscerais) são as sensações localizadas nos
órgãos internos, em que os pacientes relatam que seus corpos parecem estar
sendo atingidos por irradiações ou descargas elétricas; que seus órgãos geni-
tais estão sendo tocados; que o cérebro está encolhendo; ou que há bichos
dentro do seu abdômen. São comuns na esquizofrenia.
Alucinações cinestésicas são as falsas percepções de movimento de todo
o corpo ou só de uma parte. O paciente, apesar de estar imóvel, tem a sen-
sação de que está afundando no leito, girando, voando, dobrando as pernas
ou se elevando. As alucinações psicomotoras verbais são formas especiais de
alucinações cinestésicas em que, embora esteja calado, o paciente sente os
músculos do aparelho fonador se movimentando como se alguém estivesse
falando por ele. São comuns na esquizofrenia catatônica, no delirium tremens e
em quadros de etiologia orgânica.
Sinestesia
A sinestesia é o estado em que um estímu lo sensorial em uma modalida-
de é percebido como uma sensação em outra modalidade, como no caso de
se ver sons e de se ouvir cores. Essas alucinações combinadas ocorrem com
maior frequência nos transtornos com alteração do nível de consciência, na
esquizofrenia, em crises graves de mania e em psicoses em geral. Ocorre com
muita frequência na intoxicação por alucinógenos (LSD e mescalina) (DALGA-
LARRONDO. 20191.
PSICOPATOLOGIA •
Sintetizando •
Nesta unidade, vimos que, no ambiente psiquiátrico, o tratamento das psi-
copatologias pode ser rea lizado por meios farmacoterápicos ou medicamen-
tosos; pelo uso da eletroconvulsoterapia, que é um método controverso, mas
que pode trazer benefícios ao tratamento de casos específicos como a depres-
são severa; e por meio do tratamento psicoterápico.
Em relação ao tratamento psicoterápico, ele se dá por meio de diversas
abordagens, em geral, realizadas por psicólogos. Discorremos sobre as abor-
dagens mais utilizadas, como a psicanálise, a abordagem psicodinâmica e a psi-
coterapia cognitivo-comportamental.
No que diz ao desenvolvimento de psicopatologias, sabemos que, além de
possíveis determinações biológicas (fatores genéticos), a influência da família e
da cultura é fundamental. Por isso, a rede de apoio e cuidados na comunidade
é tão necessária. Ela proporciona a formação familiar e educacional acerca da
prevenção dos transtornos mentais.
Acerca das neuroses e seu tratamento, foi descrito o conceito de neurose,
as suas possíveis causas e as principais diferenças entre a neurose e a psicose.
Abordamos, sobretudo, essas patologias na infância.
Foram, também, apresentados os conceitos de ilusão e alucinação, assim
como as principais diferenças entre eles. Além disso, foram apresentadas as
definições de pareidolia e os diversos tipos de alucinação.
PSICOPATOLOGIA •
Referências bibliográficas •
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PSICOPATOLOGIA •
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UNIDADE
~
~
PSICOPATOLOGIA •
ser
educacional
Objetivos da unidade
Definir as características do transtorno depressivo persistente (distimia), do
espectro da esquizofrenia e do transtorno de personalidade antissocial (TPAS);
Analisar as causas, diagnóstico, prognóstico e tratamentos da distimia, do
espectro da esquizofrenia e do transtorno de personalidade antissocial (TPAS);
Discutir as abordagens atuais e alternativas para o tratamento das
psicopatologias, como o hospital-dia, o Centro de Atenção Psicossocial e os
trabalhos comunitários.
Tópicos de estudo
Transtorno depressivo persistente
(distimia}
Causas e diagnóstico
Esquizofrenia ou espectro da
esquizofrenia
Tipos de esquizofrenia
Causas e diagnóstico
Tratamento e prognóstico
Transtorno de personalidade
antissocial (TPAS)
Causas e prevalência
Diagnóstico e tratamento
Abordagens atuais e alternati-
vas para o tratamento das psico-
patologias
Hospital-dia psiquiátrico
Centros de Atenção Psicossocial
(CAPS)
Trabalhos comunitários e alter-
nativas de tratamento
PSICOPATOLOGIA •
••
Transtorno depressivo persistente (distimia)
O transtorno depressivo persistente, ou distimia, é a consolidação do cha-
mado transtorno depressivo maior crônico e do transtrorno distímico, que
estão definidos no DSM-V (APA, 2014). No DSM-V, está classificado na catego-
ria 300.4, correspondente ao F34.1 da Classificação Internacional de Doenças
(CID-1 O). Esse transtorno se caracteriza pela presença dos seguintes sintomas:
A. Humor deprimido na maior parte do tempo, indicado pelo relato subjeti-
vo ou pela observação realizada por pessoas do convívio, num período de dois
anos ou mais. Nas crianças e adolescentes, o humor se apresenta irritável e
com duração mínima de um ano;
B. Enquanto em depressão, há a presença de duas (ou mais) das caracterís-
ticas a seguir:
• Apetite diminuído ou alimentação excessiva;
• Insônia ou hipersonia;
• Baixa energia ou fadiga extrema;
• Baixa autoestima e autoconceito;
• Nível reduzido de concentração pobre e dificuldade em tomar decisões;
• Sentimentos de falta de esperança.
C. Em um período de dois anos (para crianças ou adolescentes, um ano)
desde o início dos sintomas, o indivíduo não fica sem apresentar sintomas dos
itens A e B por mais de dois meses (APA, 2014).
Além desses critérios, são considerados:
• Os sintomas de determinação de um transtorno depressivo maior podem
ser presentes por dois anos;
· Anão apresentação de episódio maníaco ou
hipomaníaco e o não preenchimento dos crité-
rios para transtorno ciclotímico;
• Os sintomas não são mais explicados
pela existência de um transtorno esquizoafe-
tivo, outro transtorno do espectro da esquizo-
frenia, e um outro transtorno psicótico especifi-
cado, ou transtorno do espectro da esquizofrenia, e transtorno
psicótico não especificado;
PSICOPATOLOGIA •
• Os sintomas não devem ser uma reação aos efeitos fisiológicos de uso
de substâncias (drogas e/ou medicamentos) ou relacionados a outra condição
médica (hipotireoidismo);
• Os sintomas causam significativo sofrimento e/ou alto prejuízo no funcio-
namento social, profissional, escolar e outras áreas da vida do indivíduo .
••
Causas e diagnóstico
Assim como nos demais transtornos psicopatológicos, as causas do trans-
torno depressivo persistente (distimia) estão relacionadas a fatores genéticos
- ........ , .... ,_,,,.. ..... _, \'"''' --· '/' --- ............. , _ __, .... _ ··----- ,... .......... --- ------···---·· .. ,·-·· .. -- ----------
transtorno são:
· Genéticos e fisiológicos: existência de alta proporção de parentes de 1°
grau com o transtorno e implicações em regiões cerebrais (córtex pré-frontal
e hipocampo};
· Temperamentais: níveis elevados de afetividade negativa ("neuroticis-
mo"), maior gravidade de sintomas, funcionamento global prejudicado e pre-
sença de transtornos de ansiedade ou transtorno da conduta;
• Ambientais: eventos estressantes, como perda ou separação dos pais.
O transtorno depressivo persistente apresenta um início precoce (infância,
adolescência ou início da idade adulta) e um curso crônico. As consequências
funcionais do transtorno depressivo persis-
tente se relacionam ao grau do transtorno,
assim como a repercussão no funciona-
mento social e profissional, que é va-
riada (APA, 2014).
Tratamento
Sobre o tratamento do transtorno de-
pressivo persistente, ele é realizado por
meio da combinação de medicamentos antide-
pressivos e tratamento psicoterápico. Nesse
contexto, faz-se necessário analisar o espec-
tro da esquizofrenia, outrora identificado ape-
nas como esquizofrenia.
Esquizofrenia ou espectro da esquizofrenia
PSICOPATOLOGIA •
••
A definição da esquizofrenia, os sintomas mais fundamentais e característi-
cos e o que lhe é mais específico são temas atuais de discussões na área de Psi-
copatologia. De forma geral, a esquizofrenia é um transtorno mental caracteri-
zado por perda severa de contato com a realidade, presença de alucinações, em
especial auditivas, delírios (fa lsas convicções), pensamentos e comportamentos
automatizados, expressão empobrecida de emoções, baixa motivação, déficit
cognitivo e dificuldades para engajamento em comportamentos diários, no cam-
po profissional, interpessoal, familiar e nos autocuidados (TAMMINGA, 2020).
Para Dalgalarrondo (2019, p. 328), a esquizofrenia é "a principal forma de psi-
cose, por sua frequência e sua importância clínica". A esquizofrenia é um termo
bastante amplo e inclui uma diversidade de transtornos associados, o que é de-
signado como um espectro. O DSM-V (APA, 2014) classifica o que se chama de
esquizofrenia na categoria "espectro da esquizofrenia e outros transtornos psi-
cóticos". Na categoria estão a esquizofrenia, os transtornos psicóticos e o trans-
torno de personalidadeesquizotípica, que pertencem a essa categoria por haver
a presença de alterações em um, ou mais, dos cinco domínios como delírios,
alucinações, pensamento ou discurso desorganizado, comportamento motor
desorganizado ou anormal (como na catatonia) e sintomas negativos (APA, 2014).
No espectro da esquizofrenia, há alta incidência de sintomas paranoides como
ideias delirantes e alucinações auditivas com conteúdo persecutório (persegui-
ção e ameaça).
PSICOPATOLOGIA •
É possível observar, em alguns casos, uma profunda desorganização da vida
psíquica e do comportamento, contudo diferem dos quadros de demência, deli-
rium ou de deficiência intelectual severa. Os sintomas do espectro da esquizofre-
nia indicam uma alteração profunda na relação eu-mundo, com um dano severo
nas delimitações entre o eu e o mundo e uma significativa perda da dimensão da
intimidade. Alguns sintomas da esquizofrenia são bastante significativos para a
realização do diagnóstico, com ênfase nos "sintomas de primeira ordem", identi-
ficados pelo psiquiatra Kurt Schneider (1887-1967) e relatados por Dalgalarrondo
(2019) como:
1) Percepção delirante: percepção normal ressignificada de maneira delirante,
ocorrendo de forma simultânea ao ato perceptivo, de forma abrupta, como uma
"revelação";
2) Alucinações auditivas características: audição de vozes que criticam e/ou
ordenam as ações do indivíduo;
3) Eco ou sonorização do pensamento: o indivíduo "escuta" seus pensamentos
como se estivessem sendo falados para ele;
4) Difusão do pensamento: sensação de que seus pensamentos são ouvidos
pelos outros, quando ocorrem;
5) Roubo do pensamento: vivência alterada, na qual o indivíduo tem a sensação
de que o seu pensamento é extraído ou "roubado" da mente;
6) Vivências de influência corporal ou ideativa: são dois tipos significativos
de vivências de influência. As vivências de influência corporal são experiências
em que o indivíduo sente que há a força, em geral, de um ser externo, que age e
influencia o corpo e as funções dos seus órgãos, enquanto as vivências de in-
fluência sobre o pensamento são as sensações de que há algo influenciando os
pensamentos do indivíduo, que crê recebê-los de fora ou que estão sendo coloca-
dos em seu cérebro.
Portanto, a esquizofrenia é caracterizada por sintomas psicóticos, como delírios,
alucinações, pensamentos e fala desorganizados, comportamento considerado ina-
dequado, além do comprometimento cognitivo envolvido na esquizofrenia, que leva
a dificuldades de atenção, uso do raciocínio abstrato e resolução de situações/pro-
blemas. A gravidade do comprometimento cognitivo determina uma incapacidade
global em pessoas com esquizofrenia e muitas delas ficam desempregadas e têm
.----- --- ,---- '·-·" ......... --· ·------ --··. ·-·· .... _. -- --- .--------- \ ., ......... ·-· ., ------,·
PSICOPATOLOGIA •
••
Tipos de esquizofrenia
De acordo com a Classificação Internacional de Doenças - CID-10, da Orga-
nização Mundial de Saúde (WHO, 2019), os quatro tipos de esquizofrenia estão
dentro da categoria geral F20 (esquizofrenia).
QUADRO 1. TIPOS DE ESQUIZOFRENIA DE ACORDO COM A CID-10
F20.0 - Esquizofrenia
paranoide
F20.1 - Esquizofrenia
hebefrênica
F20.2 - Esquizofrenia
catatônica
F20.4 - Esquizofrenia
indiferenciada
Fonte WHO. 2019. (Adaptado).
Presença de ideias delirantes um tanto estáveis, relacionadas à
perseguição, acompanhadas de alucinações (em especial as auditivas)
e de alterações patológicas de percepções. Há perturbações de afeto,
conação e linguagem. Os sintomas catatônicos são ausentes ou
discretos.
Proeminente perturbação de afetos e presença de ideias
delirantes. porém as alucinações são pontuais e fragmentadas.
O comportamento é irresponsável, imprevisível e a presença de
"maneirismos" é frequente. O afeto é superficial e inadequado ao
contexto. O pensamento é desorganizado e o discurso incoerente,
além da tendência ao isolamento social. A hebefrenia é diagnosticada
apenas em adolescentes e em jovens adultos.
Quadro dominado por distúrbios psicomotores severos, que se
alternam entre extremos, como a hipercinesia e o estupor ou a
obediência automática e o negativismo. Atitudes e posturas que
os pacientes são estimulados a tomar são sustentadas por longos
períodos, como ficar em pé por horas. O
aparece em combinação com um estado oniroide (sensação de
sonho) com alucinações vívidas. Há manifestações como catalepsia,
catatonia, flexibilidade cérea e estupor catatônico.
Afecções de cunho psicótico que preenchem os critérios diagnósticos
gerais para a esquizofrenia, mas não se enquadram nos subtipos
incluídos nas categorias de F20.0 a F20.2 ou que exibem padrões
de mais de uma dessas categorias, mas sem predominância de
naturezas diagnósticas.
EXPLICANDO
O fenômeno catatônico não ocorre apenas na esquizofrenia, mas também
nos transtornos de humor (transtorno bipolar), na síndrome neuroléptica
maligna, no mal de Parkinson, na síndrome serotoninérgica, no transtorno
do espectro autista (TEAI, na deficiência intelectual, na síndrome de Tou-
rette, na epilepsia, nos traumatismos cranioencefálicos, entre outros.
PSICOPATOLOGIA •
••
Causas e diagnóstico
Não existem causas exatas conhecidas da esquizofrenia, mas as pesquisas indi-
cam que há uma combinação de fatores hereditários e condições ambientais. Nas
...,.,...,.,.,......,,. ,..., ,,... ..... ,...,.,., ,,..,._, ,,._ ..... ,..,...rT,.....,.:t-,... ... ,..., , ;,.._.,.:::::,,... ,..,..._.. ,..,.,... , ,;..,,,....ç,..,.....,.;..., ht.,... ,..;.,.,..,... ,.J,.. ,..,... ..
ca de 10% de desenvolvimento do transtorno em comparação com o risco de 1%
existente na população geral. Um irmão gêmeo cujo outro gêmeo tenha esquizofre-
nia apresenta risco maior, em torno de 50%, de desenvolvimento do quadro.
A esquizofrenia também pode ter causas biológicas, já que está relacionada
a alterações no funcionamento do cérebro e a determinados fatores externos,
como os fatores de risco para o desenvolvimento e a vivência de situações es-
tressantes de porte elevado e, ainda, o uso de substâncias tóxicas. De modo
geral, há fatores que levam a uma maior vulnerabilidade da esquizofrenia, des-
critos no Quadro 2.
QUADRO 2. FATORES DE VULNERABILIDADE PARA A ESQUIZOFRENIA
~
Problemas ocorridos no decorrer desenvolvimento
intrauterino e após o nascimento:
Infecção pelo vírus influenza na mãe durante o 2° trimestre da
gravidez;
Anoxia severa (falta de oxigênio no momento do parto);
Baixo peso ao nascer e incompatibilidade do tipo de sangue
entre mãe e filho.
Fonte: TAMMINGA, 2020, p. 1 (Adaptado).
Predisposição genética.
Infecções no cérebro.
Uso de substâncias tóxicas
no início da adolescência, em
especial alucinógenos.
Em relação ao diagnóstico da esquizofrenia, deve haver observação clínica
e exames psiquiátricos, realizados por um médico psiquiatra que também ana-
lisa exames de laboratório e de imagem. Em relação aos exames laboratoriais,
eles descartam a presença de transtornos por uso de substâncias ou de outros
quadros de ordem neurológica ou hormonal que levam ao desenvolvimento de
sintomas psicóticos, como tumores cerebrais, epilepsia do lobo temporal, doen-
ças da tireoide, doenças autoimunes, doença de Huntington, doenças hepáticas,
efeitos colaterais de medicamentos e deficiências de vitamina, que devem ser
descartados.
PSICOPATOLOGIA •
Os exames de diagnóstico por imagem do cérebro (tomografia computa-
dorizada ou ressonância magnética)
descartam tumores cerebrais. O mé-
dico psiquiatra estabelece uma hipó-
tese diagnóstica a partir da avaliação
abrangente do histórico da pessoa e do
exame dos sintomas. A esquizofrenia é
diagnosticada quando certos critérios
estão presentes:
• A presença de dois ou mais sin-
tomas característicos, como delírios,
alucinações, fala e comportamento
desorganizado, bem como os sintomas negativos, que são apresentados,sem
desaparecimento, no mínimo, por seis meses;
• Os sintomas acima causam significativa deterioração e prejuízo no desem-
penho na vida profissional, escolar, social e familiar.
Além disso, os dados fornecidos pela família, amigos e escola são importan-
tes para estimar o início das alterações. No que se refere à correlação com com-
portamentos agressivos ou violentos, as pessoas que têm mais probabilidade de
praticar esses atos:
• Usam álcool ou entorpecentes;
• Apresentam delírios persecutórios;
• Têm alucinações com conteúdo de comando para praticar atos violentos;
• Não tomam os medicamentos prescritos.
No entanto, mesmo levando em conta os fatores de risco, os médicos consi-
deram difícil prever com precisão se uma determinada pessoa com esquizofre-
nia pode ou não cometer um ato de violência.
CURIOSIDADE o
\ Apesar da maioria das pessoas leigas crer que indivíduos esquizofrêni-
cos apresentam riscos altos para comportamentos violentos, na reali-
dade, tais riscos são pequenos. Pessoas com o quadro de esquizofrenia
costumam ser bem menos violentas, estatisticamente, do que pessoas
sem o transtorno.
PSICOPATOLOGIA •
••
Tratamento e prognóstico
De acordo com Tamminga (2020), o tratamento da esquizofrenia é realiza-
do por meio da combinação de:
• Medicamentos antipsicóticos;
• Tratamento psicoterápico;
• Cuidados especializados e recuperação psicossocial.
De modo geral, os objetivos do tratamento da esquizofren ia são:
• Redução da gravidade dos sintomas psicóticos;
• Diminuição da frequência de apresentação dos sintomas e da deteriora-
ção ou prejuízo das funções associadas;
• Oferecimento de apoio e de possibilidades de condições para que a pes-
soa atue da melhor forma possível em seus contextos de vivência.
Os medicamentos antipsicóticos, os tratamentos para a reabilitação de fun-
ções, as atividades de suporte comunitário e a psicoterapia são componentes
principais do tratamento. O oferecimento de informações aos familiares sobre
sintomas e tratamento da esquizofrenia (a chamada psicoeducação familiar)
auxilia na prestação de apoio aos profissionais de saúde mental na manuten-
ção do contato com a pessoa com esquizofrenia. Os cuidados especializados e
a recuperação psicossocial incluem o treinamento da resiliência, a psicoterapia
pessoal e fami liar, as atividades para trabalhar com a disfunção cognitiva e o
emprego assistido. Em relação aos medicamentos antipsicóticos, eles se mos-
tram eficazes para reduzir ou eliminar sintomas como delírios, alucinações e
pensamento desorganizado.
Os medicamentos antipsicóticos têm efeitos colaterais significativos, como
sonolência, rigidez muscular, tremores, movimentos involuntários,
ganho de peso e inquietação. Medicamentos mais recentes (os
rh-.rn-.rlr.r- rir. "rnn11nrl-. n,...,.. .... ,..:::;,..u\ r-=ír. m""lie- ,..,...,-,...jt,-.rlnr-
e têm menos probabilidade de causar efeitos em
comparação aos medicamentos antipsicóticos de
"primeira geração". Assim que os sintomas ime-
diatos e mais graves são reduzidos, o uso con-
tínuo dos medicamentos antipsicóticos diminui a
probabilidade de novos episódios psicóticos.
PSICOPATOLOGIA •
A psicoterapia não reduz os sintomas da esquizofrenia, apesar de sua utilida-
de para estabelecer uma relação de colaboração entre pacientes com esquizofre-
nia, familiares e equipe médica. Por meio da psicoterapia, o paciente compreende
e aprende a manejar sua condição, tomando os medicamentos antipsicóticos con-
forme prescrição médica e lidando com eventos estressantes, que podem agra-
var o transtorno. A boa relação entre terapeuta e paciente é determinante para a
eficácia do tratamento. A atividade de psicoeducação é oferecida ao paciente e a
seus familiares para o ensino de estratégias, a fim de lidar com a condição, evitan-
do a ocorrência de novos surtos. Assim como em todas as outras condições psico-
patológicas, a detecção e o tratamento precoce da esquizofrenia são as principais
diretrizes para o acompanhamento e prognóstico de tal condição.
O prognóstico do tratamento das pessoas com esquizofrenia depende da ade-
rência ao tratamento e do uso adequado dos medicamentos. O tratamento sem
medicamentos resulta em cerca de 70 a 80% de reincidência de novos episódios
durante o primeiro ano posterior ao diagnóstico. O uso contínuo de medicamen-
tos reduz a porcentagem para 30% e, na maioria dos casos, diminui os sintomas.
Embora cientes dos benefícios das medicações, metade das pessoas com es-
quizofrenia não toma os medicamentos prescritos de maneira regular, pois po-
dem não aceitar ou não reconhecer a existência do transtorno, enquanto outras
param de usá-los devido aos desagradáveis efeitos colaterais. A aderência ao tra-
tamento melhora se esses obstáculos são superados e, caso as reações adversas
aos medicamentos sejam o principal problema, é necessário alterar para outros
medicamentos. Em longo prazo, o prognóstico da esquizofrenia tem uma variação:
• Um terço das pessoas alcança melhora significativa e duradoura;
• Um terço alcança melhora moderada com recidivas da doença intermitentes
e alguma incapacidade residual;
• Um terço apresenta invalidez grave e permanente.
Assim, o percentual de pessoas com esquizofrenia que apresenta o
mesmo desempenho anterior à condição esquizofrênica fica em torno de
15%. O bom prognóstico do tratamento da esquizofrenia está
associado a fatores elencados no Quadro 3. Um fato interes-
sante é que o prognóstico para homens é pior do que para
mulheres, pois elas são mais aderentes ao tratamento com
os medicamentos antipsicóticos.
PSICOPATOLOGIA •
QUADRO 3. FATORES NO PROGNÓSTICO DA ESQUIZOFRENIA
~
Início dos sintomas de forma mais súbita.
Inicio dos sintomas em idade mais avançada.
Bom nível de habilidades cognitivas e sociais antes do início do dignóstico.
Comprometimento cognitivo leve.
Poucos sintomas negativos, como redução das demonstrações de emoções.
Período mais curto entre o primeiro episódio psicótico e o início do tratamento.
Fonte. TAMMINGA, 2020, p. 1. (Adaptado).
••
Transtorno de personalidade antissocial (TPAS)
O transtorno de personalidade antissocial está inserido nos transtornos de
personalidade do grupo B, que engloba personalidades, de forma patológica,
erráticas, emocionais ou dramáticas. Toda essa diversidade de categorias possui
comportamentos comuns e outros mais específicos característicos a cada qua-
dro. A relação entre os quadros dá-se em relação ao fato de que em todos há um
desvio significat ivo de comportamentos no que tange às normas sociais estabe-
lecidas pela sociedade e que, após experiências
adversas e de punição sobre esses comporta-
mentos, o mesmo desvio se mantém.
Em alguns casos, há uma baixa tole-
rância à frustração, ideação violenta, mas
silenciosa, agressividade em atos planejados
com antecedência e alta tendência em culpar
terceiros pelos seus atos. De acordo com Skodol
(2019, p. 1), a psicopatia, agora denominada como
transtorno de personalidade antissocial (TPAS) é
um "padrão generalizado de descaso com as con-
sequências e direitos dos outros".
PSICOPATOLOGIA •
Pessoas com TPAS cometem atos de caráter ilegal, fraudes, além de serem
exploradoras e imprudentes em relação ao ganho pessoal e a atividades praze-
rosas. Não demonstram sinais de remorso, mesmo tendo consciência do grau de
prejuízo e de sofrimento da consequência de seus atos para si e para as pessoas
ao seu redor. Em geral, usam justificativas racionais (racionalização) para seus
comportamentos, como imaginar que "perdedores merecem perder" e que "o
mundo é dos espertos", uma forma de culpabilizar as vítimas.
Apresentam descaso pelos outros e pela lei, destruindo propriedades, as-
sediando pessoas e roubando-as. Enganam e/ou manipulam as pessoas para
alcançar seus objetivos, como dinheiro, poder e sexo (SKODOL, 2019). Como pes-
soas 1mpu1s1vas e naocons1aeram as consequenc1as para a sua segurança etou
dos outros, podem trocar de emprego, casa ou relacionamento de forma súbita,
além da tendência a dirigirem embriagadas em alta velocidade, o que faz com
que se envolvam em acidentes com frequência.
São irritáveis e agressivos, iniciando ataques violentos e/ou abusando de côn-
juges ou parceiros. Nas relações sexuais, tendem a ser irresponsáveis, exploran-
do o parceiro e não permanecendo em regime de monogamia (SKODOL, 2019).
Pacientes com transtorno de personalidade antissocial tendem a apresentar um
autoconceito elevado, sendo teimosos, autoconfiantes e/ou arrogantes. Há uma
falsa crença de que todas as pessoas com TPAS são charmosas e inteligentes, po-
rém, apesar da facilidade em aprender demonstrações emotivas e afetivas pela
observação, há uma porcentagem significativa de pessoas com esse transtorno
com QI abaixo da média, e, nestes casos, há maior prevalência da violência, e não
da manipulação.
••
Causas e prevalência
O transtorno de personalidade antissocial é mais frequente em homens do
que em mulheres, apresentando proporção de 6 para 1. Na etiologia, que con-
siste em um conjunto de causas, há um forte componente hereditário. O trans-
torno de personalidade antissocial parece ser mais comum em parentes de 1°
grau de pessoas com o transtorno do que na população geral (SKODOL, 2019). O
risco de desenvolver esse transtorno aumenta tanto em filhos adotivos quanto
biológicos de pais com esse transtorno.
PSICOPATOLOGIA •
Há ainda um mecanismo orgânico de agressividade impulsiva, que está re-
lacionada com o funcionamento anormal do transportador de serotonina. Os
fatores ambientais, como abuso sexual na infância, também contribuem para
o desenvolvimento do transtorno de personalidade antissocial. A prevalência
parece diminuir com a idade, mas isso pode sugerir apenas que os pacientes
aprenderam, ao longo do tempo, a autocontrolar seus impulsos ao observar
comportamentos socialmente aceitos.
A maioria dos pacientes apresenta abuso de drogas e, aproximadamente,
metade das pessoas que usam fármacos irão atender aos critérios diagnósticos
para o transtorno de personalidade antissocial (SKODOL, 2019). Assim, pessoas
com transtorno de personalidade antissocial também podem apresentar trans-
torno de controle de impulsos, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
(TDAH) ou transtorno de personalidade borderline.
••
Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico do TPAS é realizado por critérios clínicos, da mesma maneira
que ocorre nos demais tipos de avaliação em psicopatologia. Para o diagnóstico
do transtorno de personalidade antissocial, os pacientes devem ter um despre-
zo constante pelos direitos dos outros e, ainda, a presença de três ou mais dos
fatores expostos no Quadro 4.
"UAUKU 'l. LKI I l:KIU) l'AKA U UIA\JI\IU) I ILU UU l l'A)
Desprezar a lei, indicado por atos repetidamente cometidos, que são motivo de detenção.
Ser enganador, indicado por mentiras repetidas, uso de pseudônimos ou ludibriar os outros
para ganho pessoal ou por prazer.
Agir impulsivamente ou não planejar com antecedência.
Ser facilmente irritado ou agressivo. indicado por brigas físicas constantes ou agressão a outros.
De forma imprudente, desprezam sua segurança ou a segurança dos outros.
Agir consistentemente de forma irresponsável, indicado por deixar um emprego sem planos
para outro ou não pagar contas.
Não sentir remorso, indicado pela indiferença ou racionalização da agressão ou maus-tratos de
animais ou outras pessoas.
Fonte SKODOL, 2019. (Adaptado).
PSICOPATOLOGIA •
Além disso, é um dado importante que esses pacientes tenham tido
transtorno de conduta antes dos 15 anos de idade. O transtorno de perso-
nalidade antissocial deve ser diferenciado dos seguintes transtornos:
· Transtorno por abuso de drogas: analisar se a impulsividade e a ir-
responsabilidade, nesse caso, são resultantes do uso de fármacos ou do
transtorno de personalidade antissocial, o que é difícil, mas é possível por
meio da revisão da história de vida do paciente para verificar os períodos
de sobriedade;
• Transtorno de conduta: o transtorno de conduta apresenta um pa-
drão generalizado semelhante ao de violação de normas sociais e leis, po-
rém é o diagnóstico adequado a menores de 18 anos, visto que transtor-
nos de personalidade só podem ser diagnosticados oficialmente na vida
adulta;
• Transtorno de personalidade narcisista: esses pacientes são explora-
dores e egocêntricos, mas não tendem a ser agressivos e fraudadores, como
no caso das pessoas com o transtorno de personalidade antissocial;
• Transtorno de personalidade borderline: esses pacientes são mani-
puladores, mas geralmente o fazem para que sejam cuidados, pois, ao con-
trário do que ocorre no TPAS, são extremamente sensíveis emocionalmente.
O tratamento do TPAS envolve a psicoterapia, comportamental ou cog-
nitivo-comportamental, o uso de medicamentos antipsicóticos e antide-
pressivos. Não existem evidências de que tratamentos específicos levem a
melhorias em longo prazo. O tratamento busca alcançar objetivos em curto
prazo, como distanciar-se de atos ilegais, em vez de mudar a personalidade
do paciente (SKODOL, 2019).
Pacientes agressivos, com proeminente impulsividade e humor variável,
beneficiam-se da psicoterapia cognitivo-comportamental ou do uso de fár-
macos, como o lítio e os inibidores seletivos da recaptação da serotonina
(ISRS). A psicoterapia analítico-comportamental com pacientes infratores
visa ensinar novos repertórios comportamentais, desenvolvendo novas
maneiras de se relacionar ao beneficiar-se dos aprendizados ofertados pelo
meio em vez de aprender por meio de métodos coercitivos (ROCHA, 2012, p.
43). A partir de agora, iremos abordar sobre as formas atuais de tratamento
aas ps1copaco1og1as, espec1a1meme no comexw oras11e1ro.
PSICOPATOLOGIA •
••
Abordagens atuais e alternativas para o tratamento
das psicopatologias
Em uma breve recuperação histórica sobre a questão do tratamento
das psicopatologias no Brasil, vemos que, no final dos anos 1970, ficou
demonstrada a necessidade urgente de desenvolvimento de uma política
nacional de saúde mental. Até esse período, o tratamento psiquiátrico das
psicopatologias era baseado, essencialmente, na internação do paciente
em manicômios (em número significativamente alto), os quais apresenta-
vam baixo nível de qualidade nos cuidados e alta ocorrência de violações
de direitos humanos.
A Reforma Psiquiátrica no Brasi l iniciou-se a partir do surgimento do
"movimento sanitário", nos anos 1970, em prol de uma mudança nos mo-
delos de atenção e gestão das práticas em saúde, com a defesa da saúde
coletiva, a equidade na oferta dos serviços e o protagonismo de trabalha-
dores e usuários dos serviços de saúde na gestão e produção de tecnolo-
gias de cuidado (BRASIL, 2005).
O processo de Reforma Psiquiá-
trica Brasileira estava inscrito em
um contexto internacional de mu-
danças pela superação da violência
asilar e do modelo de assistência
centrado no hospital psiquiátrico,
além da luta pelos direitos dos pa-
cientes psiquiátricos. A reforma nos
serviços de saúde mental no Brasil
era absolutamente indispensável e
urgente diante de um sistema con-
siderado arcaico nos países desen-
volvidos. Vale destacar que uma das
mais importantes precursoras da
de si nstitucionalização psiquiátri-
ca no Brasil foi a médica psiquiatra
Nise da Silveira .
Figura 1. Estatua em homenagem à Dra. N1se da
Silveira. em Maceió (AL Fonte: Shutterstock. Acesso em:
17/09/2021
PSICOPATOLOGIA •
A Dra. Nise da Silveira integrou, em 1944, o corpo clínico do Centro Psi-
quiátrico Nacional Pedro li, no Rio de Janeiro, e se opôs às novas técnicas para
tratar os internos, como a eletroconvulsoterapia, e se recusou a usar camisas
de força e isolamento nos internos. Ao se indispor comseus colegas psiquia-
Lld::. ::.uurt: lldldlllt:IILU::., IUI lldll::.lt:IIUd f.ldld u ::.t:LUI Ut: Lt:ldf.lld ULUf.ldLIUlldl,
que era uma área desprezada e sem recursos.
Foi a partir daí que Nise da Silveira começou a revolucionar o tratamen-
to dos transtornos mentais, junto com o colega médico Fábio Sodré, ao ofe-
recer aos pacientes pincéis, tintas e telas brancas. Os pacientes esquizofrê-
nicos ficaram livres para se expressar por meio da arte e, frequentemente,
pintavam mandalas. O resultado foi surpreendente, pois, além de os indi-
víduos apresentarem melhoras nos sintomas e comportamentos erráticos,
pintavam verdadeiras obras de arte.
ASSISTA
Para saber mais sobre a Ora. Nise da Silveira, assista ao filme Nise: o coração
da loucura, de 2016. Nele, é apresentada a sua história enquanto uma médica
psiquiatra alagoana, contrária aos tratamentos convencionais da esquizofre-
nia nos anos 1950, que é isolada pelos outros médicos. Ela assume o setor de
terapia ocupacional de um hospital psiquiátrico, onde inicia uma nova forma
de tratamento com os pacientes, por meio do amor e da arte.
As obras dos pacientes foram reunidas no Museu de Imagens do Incons-
ciente e ganharam projeção internacional.
Figura 2. Obra de um paciente com esquizofrenia. no acervo do Museu de Imagens do Inconsciente. Fonte: BIERNATH. 2017.
PSICOPATOLOGIA •
Voltando ao processo de desenvolvimento de desinstitucionalização psi-
quiátrica, esse foi muito significativo.já que entre 2001 e 2014, houve uma re-
dução drástica no número de leitos em hospitais psiquiátricos: de 53.962, em
2001, para 25.988, em 2014. Essas mudanças já haviam começado na década
de 1960 e, no final da década de 1970, deram início ao Movimento da Luta
Antimanicomial no Brasil.
CONTEXTUALIZANDO
Em 18 de maio é comemorado o dia do Movimento da Luta Antimanicomial,
que lutou, e ainda luta, para que todo cidadão tenha direito fundamental à
liberdade, à vida em sociedade e aos cuidados e tratamentos sem que tenha
que renunciar à sua cidadania. O lema do movimento é "por uma sociedade
sem manicômios" e categorias profissionais, associações de usuários e fa-
miliares e outros segmentos da sociedade defendem a utilização do modelo
de atenção em saúde mental em serviços abertos e comunitários, a fim de
se buscar a garantia da cidadania das pessoas com transtornos mentais e
de seus familiares.
Após auditorias realizadas pelas autoridades, houve o fechamento de vá-
rios hospitais psiquiátricos, que apresentavam requisitos mínimos de qua-
lidade de atendimento e/ou que tinham sido denunciados por violações de
direitos humanos. A internação deixa de ser realizada de forma costumeira,
e outros serviços, como as residências terapêuticas, que abrigam até oito pa-
cientes, passam a ser um recurso importante para a desinstitucionalização
de pacientes de longa permanência.
O desenvolvimento da pol ítica de saúde mental no Brasil está associado
à criação do Sistema Único de Saúde (SUS), à mobilização de profissionais de
saúde mental e a mudanças sociais e culturais da sociedade brasileira. A par-
tir da criação do SUS, há o desenvolvimento de uma política de saúde mental
mais inovadora com a criação de novas modalidades de tratamento
das psicopatologias, como os hospitais-dia, os Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS) e outros projetos para o atendimento
dos pacientes fora do contexto da institucionalização
de usuários de longa permanência, que ficam restri-
tos a casos específicos e em períodos mais breves de
tempo, principalmente no sistema público de saúde.
PSICOPATOLOGIA •
••
Hospital-dia psiquiátrico
Embora os hospitais-dia psiquiátricos existam no Brasil desde a década
de 1960, foi a partir de 1992 que passaram oficialmente a serem possibili-
dades de atendimento em saúde mental, com diretrizes estabelecidas para
credenciamento de serviços e o ressarcimento de internações pelo Ministé-
rio da Saúde. O hospital-dia psiquiátrico é uma forma de tratamento e um
serviço de reabilitação, que oferece acolhimento e apoio psicoemocional a
pessoas com limitações funcionais consequentes de transtornos psicopato-
lógicos e com dificuldades para se reinserirem e se readaptarem ao contex-
to sociofamiliar (LIMA; BOTEGAB, 2001).
Os pacientes atendidos em hospitais-dia psiquiátricos independem de
faixa etária e diagnóstico psiquiátri-
co, e o atendimento é indicado para
os pacientes que tenham dificuldade
de reabilitação sociofami liar, profis-
sional e de estabelecimento de roti-
nas. O hospital-dia psiquiátrico, que
é uma forma de internação parcial,
oferece uma variedade de serviços.
O tratamento no hospital-dia psi-
quiátrico é realizado por uma equipe
multidisciplinar composta por psi-
quiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais, farmacêuticos, nutricionis-
tas, fisioterapeutas e enfermeiros, que atuam em saúde mental. De acordo
com Lima e Botegab (2001), os hospitais-dia psiquiátricos oferecem os se-
guintes serviços:
• l ldlc:llllt'IILU:) Ollt'IIICILIVU:) CI IIU:)tJILGIIILCl',,-CIU tJ:>l\,iUICILIILCl 1
• Continuidade à internação fechada;
• Extensão ao tratamento ambulatorial;
• Reabilitação e apoio a pacientes crônicos.
Abordaremos, a seguir, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como
outra abordagem alternativa ao tratamento dos transtornos psicopatológi-
cos, sem necessidade de internação.
PSICOPATOLOGIA •
••
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)
A Reforma Psiquiátrica Brasileira, consolidada pela Lei n. 10.216/2001, insti-
tuiu que a atenção a pessoas com transtornos mentais e com problemas con-
sequentes do abuso e/ou dependência de álcool e outras drogas deve ocorrer
em serviços comunitários de saúde mental, preferencialmente, para alcançar o
modelo de atenção aberto que garanta a livre circulação das pessoas com trans-
tornos mentais pelos serviços, comunidade e cidade (GOVERNO DO ESTADO DA
BAHIA, s.d.). Os Centros de Atenção Psicossocial se caracterizam por serem:
pontos de atenção estratégicos da RAPS: serviços de saúde de ca-
ráter aberto e comunitário constituídos por equipe multiprofissional
que atua sob a ótica interdisciplinar e realiza prioritariamente atendi-
mento às pessoas com transtornos mentais graves e persistentes e
às pessoas com sofrimento ou t ranstorno mental em geral, incluindo
aquelas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e ou-
tras drogas, em sua área territorial, sejam em situações de crise ou
nos processos de reabili tação psicossocial (Brasil, 2011) e são substi-
tutivos ao modelo asilar (GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA, s.d.).
Os CAPS foram criados para atender às principais necessidades de cuidados
dos pacientes com transtornos mentais graves e persistentes. A partir de 2002,
novas modalidades de CAPS começaram a ser criadas, dentro das políticas de
saúde mental do SUS, sempre com o objetivo de atender as populações com
necessidades específicas. Assim, foram criados, por meio da criação da Rede de
Atenção Psicossocial (RAPS), os CAPS i, para atendimento específico a crianças
e adolescentes, e os CAPS ad, para o atendimento de pacientes com transtor-
nos decorrentes do uso de álcool e/ou com dependência de outras substâncias.
--
QUADRO 5. MODALIDADES DE CAPS NO BRASIL
~
Modalidades de CAPS
Atendimento a todas as faixas etárias, para pessoas com transtornos mentais
graves e persistentes e uso de substâncias psicoativas, e que atende em cidades
ou regiões com, pelo menos. 15 mil habitantes.
Atendimento a todas as faixas etárias. para transtornos mentais graves e
persistentes e uso de substâncias psicoativas, que atende em cidades ou regiões
com, pelo menos, 70 mil habitantes.
PSICOPATOLOGIA •
--• -
Atendimento a crianças e adolescentes, para transtornos mentais graves e
persistentes e uso de substâncias psicoativas, que atende em cidades ou regiões
com, pelo menos, 70 mil habitantes.
Atendimento a todas as faixas etárias,sendo especializado em transtornos pelo
uso de álcool e outras drogas, atende em cidades ou regiões com, pelo menos,
70 mil habitantes .
Atendimento com até cinco vagas de acolhimento noturno e observação;
para todas as faixas etárias; transtornos mentais graves e persistentes e uso de
substâncias psicoativas, que atende em cidades ou regiões com, pelo menos, 150
mil habitantes.
Atendimento com 8 a 12 vagas de acolhimento noturno e observação;
funcionamento 24 horas; para todas as faixas etárias; transtornos pelo uso de álcool e
outras drogas, atende em cidades ou regiões com, pelo menos, 150 mil habitantes.
Fonte. Governo do Estado da Bahia. s.d. (Adaptado).
De acordo com a Portaria n. 336/2002, a assistência prestada ao paciente nos CAPS
Ili inclui, além de acolhimento noturno e refeições diárias, as seguintes atividades:
a - atendimento individual (medicamentoso, psicoterápico, orienta-
ção, entre outros);
b - atendimento grupos (psicoterapia, grupo operativo, atividades de
suporte social, entre outras);
c - atendimento em oficinas terapêuticas executadas por profissio-
nal de nível superior ou nível médio;
d - visitas e atendimentos domiciliares;
e - atendimento à família;
f - atividades comunitárias enfocando a integração do doente men-
tal na comunidade e sua inserção familiar e social (BRASIL, 2002).
Além do atendimento nos CAPS e nos hospitais-dia psiquiátricos, há alter-
nativas para o tratamento de pessoas com transtornos psicopatológicos, que
veremos a seguir.
••
Trabalhos comunitários e alternativas de tratamento
Se não houver a possibilidade e/ou a necessidade de atendimento do pa-
ciente com transtornos psicopatológicos nos hospitais-dia psiquiátricos e
CAPS, há alternativas no contexto da Atenção Básica em saúde. No Brasil, a
Atenção Básica é desenvolvida de forma próxima à vida das pessoas e deve ser
o contato preferencial dos usuários, ou seja, a entrada e o centro de comunica-
ção com toda a rede de Atenção à Saúde.
PSICOPATOLOGIA •
Em 2008, foram criados os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF),
pelo Ministério da Saúde, para apoiar a Atenção Básica no Brasil e ampliar as
ofertas de saúde na rede, aumentando a resolutividade, a abrangência e o ob-
jetivo das ações. Já o Consultório na Rua, criado em 2011, busca ampliar o
acesso da população em situação de rua aos serviços de saúde e oferecer aten-
ção integral à saúde para essa população em condições de vulnerabilidade e
com vínculos familiares interrompidos ou fragilizados.
O tratamento psicossocial dos pacientes na comunidade faz com que os
familiares se tornem os principais envolvidos em seu cuidado. Os tratamentos
psicossociais são importantes, pois as medicações têm uma ação limitada na
recuperação do funcionamento social e, quando estabilizado, o paciente preci-
sará de ajuda para lidar com as mudanças de vida e, de forma geral, precisará
de ajuda para voltar aos estudos e trabalho, bem como na reorganização das
suas atividades da vida diária e autocuidados. Em geral, os trabalhos de apoio
comunitário na área de saúde mental oferecem serviços que permitem às pes-
soas com transtornos, como a esquizofrenia, viver da forma mais independen-
te possível.
PSICOPATOLOGIA •
Sintetizando •
Nessa unidade, foram abordados o transtorno depressivo persistente, ou
distimia, a esquizofrenia, o transtorno de personalidade antissocial e as aborda-
gens atuais de tratamento das psicopatologias. A distimia é caracterizada pela
presença de humor deprimido constante, com a duração de dois anos ou mais.
Em crianças e adolescentes, o humor irritável se dá por um período mínimo de
um ano.
No espectro da esquizofrenia, os sintomas centrais são a perda acentuada de
contato com a realidade, alucinações (especialmente auditivas), delírios, pensa-
mento desorganizado e comportamento automatizado, baixa expressão emo-
cional, motivação baixa, déficit cognitivo e prejuízo no desempenho nos campos
profissional, interpessoal, familiar e de autocuidados.
Ainda não existem causas definitivas da esquizofrenia, mas há a indicação
da combinação de fatores hereditários e condições ambientais. A Classificação
Internacional de Doenças (CID-10) lista quatro tipos de esquizofrenia, que são as
esquizofrenias paranoide, hebefrênica, catatônica e indiferenciada.
Vimos que o transtorno de personalidade antissocial (TPAS) apresenta-se
como um padrão geral de descaso do indivíduo com as consequências e direitos
dos outros. As pessoas com transtorno de personalidade antissocial tendem a
cometer atos ilegais e fraudulentos, não demonstram sentimentos de remorso,
das pelos seus atos.
No que diz respeito às abordagens atuais e alternativas para o tratamento
das psicopatologias, a Reforma Psiquiátrica no Brasil levou a um novo modelo
de atendimento em saúde mental a partir da criação do SUS, dos hospitais-dia
psiquiátricos, dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e outros modelos de
atendimento de pacientes psiquiátricos fora da institucionalização de longa per-
manência.
Destacou-se, ainda, que a Atenção Básica em saúde no Brasil deve ser a for-
ma preferencial de atendimento aos usuários na rede de Atenção à Saúde. Por
fim, vimos que os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) ampliam ofertas
de saúde, abrangência e objetivo das ações, e o Consultório na Rua aumenta o
acesso da população em situação de rua aos serviços de saúde.
PSICOPATOLOGIA •
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