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PATOLOGIAS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL Autoria: Suzy Nyhiara Amorim Estevam Indaial - 2019 UNIASSELVI-PÓS 1ª Edição Impresso por: CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Marcelo Bucci Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2019 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. ES79p Estevam, Suzy Nyhiara Amorim Patologias do sistema nervoso central. / Suzy Nyhiara Amorim Estevam. – Indaial: UNIASSELVI, 2019. 112 p.; il. ISBN 978-85-7141-378-8 ISBN Digital 978-85-7141-379-5 1.Sistema nervoso - Doenças. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 618.928 Sumário Apresentação .................................................................................5 CAPÍTULO 1 Introdução ao Sistema Nervoso ................................................7 CAPÍTULO 2 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso ........................41 CAPÍTULO 3 Outras Doenças do Sistema Nervoso .....................................81 APRESENTAÇÃO Caro aprendiz, Seja bem-vindo ao módulo Patologia do Sistema Nervoso. Este livro tem o propósito de oferecer a você conhecimento sobre as afec- ções que acometem o Sistema Nervoso, levando-o a uma reflexão crítica sobre a repercussão dos danos aos comportamentos humanos. O livro está dividido em três capítulos, cada qual com objetivos, conteúdo, atividades de estudo, dicas, sugestões e recomendações. Vamos estudar um dos componentes do Sistema Nervoso – SN, o Sistema Nervoso Central. Vamos percorrer a organização do Sistema Nervoso Central – SNC para compreendermos como suas estruturas e funções podem ser afetadas durante o processo de desenvolvimento. Utilizaremos uma das seções do último capítulo para conhecermos também as doenças que afetam o Sistema Nervoso Periférico. No Capítulo 1 trataremos da organização funcional do SNC e dos tipos de lesões existentes, chamando a atenção para um tipo específico de lesão, a lesão neuronal, bem como as alterações funcionais decorrentes desse dano. No Capítulo 2 falaremos sobre as doenças degenerativas e heredodegene- rativas do SNC, a saber: Esclerose Múltipla, Doença de Parkinson, Doença de Huntington e Doença de Alzheimer. . No Capítulo 3, apresentaremos outras doenças do SN, tais como: Epilep- sia, doenças infecciosas do SN, malformações congênitas e anormalidades do desenvolvimento e algumas doenças que afetam especificamente o Sistema Nervoso Periférico. Esse módulo o auxiliará em sua trajetória como profissional da Neuropsicolo- gia, permitindo uma visão interdisciplinar em relação às enfermidades do Sistema Nervoso que acometem o ser humano. A repercussão dessas patologias no com- portamento dos nossos pacientes nos convoca a discussão sobre os caminhos que precisaremos percorrer em favor daqueles. Desejamos que você desenvolva boa leitura e que aproveite as indicações de leitura para aprofundar o conhecimento referente ao tema. Anote as dúvidas que tiver e repasse à tutoria. Bom estudo! Profa. Suzy Nyhiara Amorim Estevam CAPÍTULO 1 Introdução ao Sistema Nervoso A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: • compreender a estrutura neuronal; • conhecer a organização morfofuncional do sistema nervoso; • citar as lesões que afetam o sistema nervoso; • identificar estruturas neuroanatômicas em exames de neuroimagens sem alte- rações; • diferenciar as lesões que afetam o sistema nervoso. 8 Patologias do Sistema Nervoso Central 9 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO O sistema nervoso, juntamente a outros sistemas do corpo humano, contribui para a manutenção do equilíbrio do nosso meio interno e nos permite interagir de forma eficiente com o meio ambiente. Devido à complexidade desse sistema, quando ocorre uma lesão, as repercussões dependerão da característica da lesão (tamanho, local e tipo) e podem causar mudanças significativas na vida do indiví- duo. As lesões podem ter origem abrupta, por meio de um trauma, como uma con- tusão, ou em uma desordem cerebrovascular, como uma isquemia, mas podem também ocorrer de forma crônica, como é o caso das doenças degenerativas do sistema nervoso central. Essas alterações podem ser identificadas por meio da investigação do neu- ropsicólogo em parceria com outros profissionais. Ao que compete ao neuropsicó- logo, este conta com instrumentos, cujos resultados agregados a sua expertise, permitirão suprir as deficiências dos exames laboratoriais e de neuroimagem no esclarecimento de possíveis déficits funcionais existentes. O neuropsicólogo inse- rido nas equipes multidisciplinares pode avaliar o antes e o depois de uma inter- venção cirúrgica, pode documentar a evolução das desordens cerebrais, além de contribuir para o planejamento de estratégias para melhorar a vida dos pacientes tornando-a mais satisfatória. Este capítulo dará base a você para estudar nos capítulos seguintes as do- enças decorrentes das alterações estruturais e funcionais do sistema nervoso central. E você já poderá refletir sobre como sua formação será eficiente na inter- pretação e no levantamento diagnóstico dessas enfermidades, além de aprimorar sua percepção sobre o caminho a seguir no processo de avaliação, habilitação e reabilitação neuropsicológicas. 2 ORGANIZAÇÃO FUNCIONAL DO SISTEMA NERVOSO Foi tudo muito rápido. Por volta das 16h30 de uma tarde quente de 1848, em Vermont, Estados Unidos, um acidente que durou alguns segundos fez de um capataz da construção civil uma das figuras chaves para a compreensão do cérebro humano. Não foi, é claro, um acidente qualquer – mas um daqueles que hoje valeria as manchetes dos programas populares. Phineas Gage (esse é o nome do rapaz) tinha 25 anos e trabalhava no assentamento de trilhos na região de Cavendish, no auge da construção das ferrovias na América. É claro que havia pedras no caminho, rochas que obstruíam a passagem dos trilhos e precisavam sair dali. Para removê-las, Gage seguia um méto- 10 Patologias do Sistema Nervoso Central do cuidadoso: fazia um buraco na rocha para colocar pólvora, cobria-a com uma camada de areia, socava tudo com um cabo de ferro, acendia o rastilho, corria e pronto: a rocha explodia em uma nuvem de pedrinhas. Naquela tarde do dia 13 de setembro, porém, Gage negligen- ciou um detalhe: a areia. Quando socou o bastão diretamente sobre a pólvora, uma explosão fez com que o ferro em forma de lança entrasse pelo lado esquerdo da sua face, atraves- sasse a base do crânio e saísse como um projétil pelo topo da cabeça (Figura 1). “Acidente Horrível” foi a manchete do jornal Boston Daily Courier, uma semana depois da explosão. Com o título “Passagem de uma barra de ferro através da cabeça”, o artigo do Boston Medical and Surgical Journal da época re- latava que, depois de cair no chão e sofrer convulsões, Gage recobrou a consciência e, em pouco tempo, voltou a andar e a falar como antes. Pela extensão da ferida e perda de massa encefálica, sua sobrevivência parecia impossível. Imagine a surpresa dos amigos quando ele retornou ao normal. Como se veria mais tarde, não tão normal assim. Alguns meses após o acidente, os médicos e os amigos de Gage notaram algumas mudanças no comportamento dele. Conhecido até então como um trabalhador amigável, solidá- rio e persistente, ele agora se revelara insuportávelcom os colegas, além de caprichoso, arrogante e impaciente com as ordens dos superiores, comportando-se, às vezes, como uma criança birrenta. O acidente mudou até o seu linguajar: deixou de lado sua postura austera e respeitosa e passou a falar tanta baixaria que nenhuma mulher era recomendada a ficar perto dele. Demitido por indisciplina, passou a cuidar de cavalos em algumas propriedades – sem jamais conseguir um emprego fixo. Chegou a tornar-se atração, de circo, mostrando para o público as marcas da ferida, assim como o ferro que lhe atra- vessara a cabeça, no Museu de Barnum, em Nova York. O mé- dico que acompanhava o caso, na época, dizia que o bastão passou a ser uma espécie de companheiro inseparável. Depois de trabalhar algum tempo no Chile como cocheiro, voltou aos Estados Unidos para viver com a mãe em San Francisco, onde morreu no dia 21 de maio de 1861, aos 38 anos, sem di- reito a nenhuma nota no jornal. Se não fosse por seu médico, doutor Harlow, o acidente seria esquecido. Indignado por não ter estudado o cérebro de Gage (só soube da morte do paciente quatro anos depois do enterro), ele pediu à irmã de Gage que o corpo fosse exumado para que o seu crânio fosse preservado. Apesar de o acidente ter sido há mais de 150 anos, até hoje o caso é usado por neurologistas para ilustrar como um dano físico no cérebro pode alterar a personalidade de uma pessoa. Num estudo recente na Universidade de Iowa, imagens com- putadorizadas mostraram que a área afetada pelo bastão foi o córtex pré-frontal – camada externa do cérebro logo abaixo da testa, responsável por nossa capacidade de sentir emoções. Quando essa região é atingida, os neurologistas dizem que os pacientes se tornam indiferentes, distantes e passam a ter difi- culdades para tomar decisões (essa seria a razão da mudança de caráter de Gage). Quem hoje visita o Warren Medical Museum, na Escola de Medicina de Harvard, em Boston, Estados Unidos, pode ver o crânio e o bastão de ferro que pertenceu ao homem que fez muito pela neurologia – sem nunca ter lido um só livro sobre o assunto (SUPERINTERESSANTE, 2002). 11 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 Apesar da amplitude e gravidade do trauma, o trabalhador permaneceu consciente durante todo o período de transporte até a estalagem em que foram prestados os primeiros socorros. O que chamou a atenção, porém, foram os com- portamentos apresentados por ele após alguns meses. FIGURA 1 – IMAGEM DO CRÂNIO DE PHINEAS GAGE APÓS ACIDENTE FONTE: http://bit.ly/32j1bzP. Acesso em: 6 fev. 2019. Para compreender a repercussão dos danos sobre os comportamentos de Gage, é necessário que conheçamos essa estrutura que chamamos de cérebro. O cérebro ou telencéfalo faz parte de um sistema: o sistema nervoso. Porém, o cérebro é apenas uma das estruturas que compõem esse sistema. Quando você lê ou ouve a expressão “sistema nervoso”, de que definição ou imagem você lembra? Você pensa nas partes que compõem esse sistema ou pensa nas funções que essas partes em conjunto executam? Se você recorreu à primeira definição, visualizando o sistema nervoso pelas partes que o compõem, você fez uma classificação anatômica. Se você visualizou o sistema nervoso em razão de alguma função desempenhada pelo conjunto de suas partes, você fez uma classificação funcional. O sistema nervoso é responsável pelo controle e integração geral das ativi- dades sensitivas, motoras e comportamentais do organismo e todas as estrutu- ras que o formam atuam de forma conjunta. Dessa forma, as classificações têm objetivo meramente didático. A classificação anatômica considera a disposição das estruturas macroscópicas do sistema nervoso e sua relação com o esqueleto (PROSDÓCIMI; SCHMIDT, 2017). 12 Patologias do Sistema Nervoso Central Pela classificação anatômica, o sistema nervoso é dividido em sistema nervo- so central – SNC e sistema nervoso periférico – SNP. Pela classificação funcional, é dividido em: sistema nervoso somático – SNS e sistema nervoso visceral – SNV. A Figura 2 apresenta a divisão esquematizada da classificação anatômica do sistema nervoso: FIGURA 2 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA CLASSIFICAÇÃO ANATÔMICA DO SISTEMA NERVOSO FONTE: Melo (2010) Você consegue identificar essas estruturas? Anote nas linhas a seguir as es- truturas do SNC representadas pelas cores da imagem: FIGURA 3 – FACE LATERAL DO HEMISFÉRIO CEREBRAL E DO TRONCO ENCEFÁLICO. AS DIFERENTES CORES DAS REGIÕES CORRESPONDEM ÀS ÁREAS ESTRUTURAIS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL FONTE: Adaptado de https://www.auladeanatomia.com/novosite/ sistemas/sistema-nervoso/. Acesso em: 27 fev. 2019. As estruturas que você acabou de apontar são componentes do encéfalo, uma das partes do Sistema Nervoso Central – SNC. O encéfalo é o conjunto 13 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 de estruturas nervosas no interior do crânio. É dividido em telencéfalo (cérebro), diencéfalo, cerebelo e tronco encefálico. O tronco encefálico, por sua vez, é dividi- do em mesencéfalo, ponte e bulbo. O SNC é composto também pela medula espinal. A medula espinal e seus respectivos revestimentos formados pelas meninges e as raízes dos nervos es- pinais estão localizadas no interior do canal vertebral. As principais funções da medula espinal são a condução de impulsos e a integração de reflexos. A medula espinal propicia os meios de comunicação para (vias aferentes) e do (vias eferen- tes) encéfalo através das fibras nervosas. O encéfalo e a medula espinal são revestidos por três membranas menínge- as: pia-máter, aracnoide-máter e dura-máter (Figura 4) (AFIFI; BERGMAN, 2017). FIGURA 4 – DISTRIBUIÇÃO DAS MENINGES ENCEFÁLICAS E MENINGES ESPINAIS FONTE: https://midia.atp.usp.br/impressos/redefor/EnsinoBiologia/ Fisio_2011_2012/Fisiologia_v2_semana02.pdf. Acesso em: 6 fev. 2019. O Sistema Nervoso Periférico – SNP é formado por todas as estruturas que estão fora do Sistema Nervoso Central – SNC: nervos, gânglios e terminações nervosas. Os nervos são cordões esbranquiçados formados por vários axônios; gânglios, por um acúmulo de corpos de neurônios fora do sistema nervoso; e ter- minações nervosas, estruturas altamente especializadas na captação de estímulos (PROSDÓCIMI; SCHMIDT, 2017). Os nervos conectados à medula espinal são de- nominados espinais e os que são conectados ao encéfalo, cranianos (Figura 5). 14 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 5 – SISTEMA NERVOSO CENTRAL E PARTES PROXIMAIS DO SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO FONTE: Spencer (1991, p. 357) Neste capítulo, daremos ênfase ao conhecimento da organização do Siste- ma Nervoso Central – SNC. As estruturas que compõem o SNC são o encéfalo e a medula espinal. Dessas estruturas, a mais complexa é o encéfalo, formado pelo 15 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 diencéfalo, telencéfalo, tronco encefálico e cerebelo (Figura 6). Para alguns auto- res, o cérebro é composto pelo telencéfalo e pelo diencéfalo. Porém, em conside- ração à nomenclatura anatômica atual, vamos nos referir apenas ao telencéfalo quando utilizarmos a terminologia cérebro (MELO, 2010). FIGURA 6 – FACE LATERAL DO HEMISFÉRIO CEREBRAL E DO TRONCO ENCEFÁLICO. AS DIFERENTES CORES DAS REGIÕES CORRESPONDEM ÀS ÁREAS ESTRUTURAIS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL FONTE: Adaptado de https://www.auladeanatomia.com/novosite/ sistemas/sistema-nervoso/. Acesso em: 7 fev. 2019. O telencéfalo (cérebro) possui dois hemisférios, direito e esquerdo, que são ligados pelo corpo caloso. Em sua superfície são dispostos os giros e estes são delimitados pelos sulcos. A parte externa, composta pela substância cinzenta, for- ma o córtex cerebral, a maior parte do volume total do cérebro. No córtex cerebral estão concentrados os corpos celulares dos neurônios com seus respectivos den- dritos. A substância branca é constituída pelos axônios mielinizados. No córtex, os impulsos sensoriais tornam-se conscientese podem ser inter- pretados, originando as percepções. Nele são programadas as respostas motoras e deflagrados os impulsos para que os movimentos voluntários se efetivem. É também a sede dos processos psíquicos complexos, como pensamento, raciocí- nio, criatividade, emoções, memória, inteligência e linguagem. Pelo fato de estar relacionado fundamentalmente às funções cognitivas, nesta região do encéfalo ocorre grande parte dos eventos relacionados à formação das memórias. O córtex cerebral é dividido em lobos frontal, parietal, temporal e occipital (Figura 7). O lobo frontal é responsável pelo movimento dos olhos, pela memória, 16 Patologias do Sistema Nervoso Central capacidade de julgamento e controle do comportamento. O lobo parietal, que fica logo atrás do lobo frontal, controla a noção de espaço e as sensações. O lobo temporal controla a linguagem, desempenha importante papel nas emoções e au- xilia a memória. E o lobo occipital interpreta o que vemos. FIGURA 7 – DIVISÃO SISTEMÁTICA DAS ÁREAS DO CÓRTEX CEREBRAL FONTE: https://www.infoescola.com/anatomia-humana/ lobos-cerebrais/. Acesso em: 7 fev. 2019. O diencéfalo é a região central do encéfalo coberto pelos hemisférios cere- brais, exceto em sua parte ventral. As estruturas que compõem o diencéfalo são o tálamo, hipotálamo, epitálamo e subtálamo (Figura 8) (PROSDÓCIMI; SCHIMI- DT, 2017). • Tálamo: retransmite os impulsos sensoriais vindos da periferia para o córtex cerebral. O tálamo atua na percepção da dor e na fisiopatologia da dor cen- tral e de outras dores crônicas, também processa informações motoras. • Hipotálamo: é muito importante para a regulação da homeostase do orga- nismo, regulando a fome, saciedade, sede e temperatura. É quem controla o sistema nervoso autônomo e o funcionamento hormonal do corpo. Além disso, funciona como relógio biológico, regulando os ritmos circadianos. • Epitálamo: tem como principal estrutura a glândula pineal, uma via de co- municação entre o sistema límbico, núcleos da base e outras áreas do encéfalo que parece estar envolvida na indução do sono. • Subtálamo: está localizado em uma zona entre o diencéfalo e o mesencé- falo, tem papel na regulação da motricidade. É uma das regiões afetadas na doença de Parkinson. 17 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 FIGURA 8 – DIAGRAMA ESQUEMÁTICO MOSTRANDO AS SUBDIVISÕES DO DIENCÉFALO EM CORTE SAGITAL MEDIANO FONTE: Adaptado de https://www.auladeanatomia.com/novosite/ sistemas/sistema-nervoso/. Acesso em: 27 fev. 2019. O tronco encefálico conecta a medula espinal com as demais estruturas en- cefálicas. Esta estrutura é dividida em bulbo, mesencéfalo e ponte, e é responsá- vel pelo controle da frequência cardiorrespiratória, habilidades motoras, equilíbrio, vômito, tosse, deglutição, despertar e tônus muscular. Todas estas estruturas são formadas pela unidade funcional do sistema ner- voso, o neurônio (Figura 9). Tem a capacidade de recepcionar, processar e enviar informações a outros neurônios e responder ao meio através de estruturas do or- ganismo, como o músculo, por exemplo. É responsável pela comunicação celular ao produzir e receber sinais que podem ser transmitidos a outras células por meio de sinapses. O neurônio é dividido em corpo celular (pericário), encontrado em grande quantidade na substância cinzenta, e nele encontra-se o núcleo. Ligado ao corpo celular está o axônio, geralmente envolvido pela bainha de mielina que é interli- gada pelos nódulos de Ranvier. Os axônios podem ser mielínicos ou amielínicos. Em ambos os casos contam com células de suporte: células de Schwann no sis- tema nervoso periférico e oligodendrócitos no sistema nervoso central. A mielina é um composto lipoproteico que cobre o axônio. Em axônios sem mielina, a con- dução nervosa é lenta. Os dendritos são, em sua maior parte, prolongamentos curtos e são especializados na recepção dos estímulos, seja de outros neurônios, de receptores sensoriais ou do meio ambiente. 18 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 9 – ESTRUTURA DE UM NEURÔNIO DO SNP COM DEFINIÇÃO DE SUAS PARTES FONTE: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ax%C3%B3nio. Acesso em: 8 fev. 2019. A espessura da bainha de mielina está relacionada à transmissão do impul- so nervoso: quanto mais espessa, maior a velocidade. Disso decorre o fato de os axônios amielínicos transmitirem impulso mais lentamente. A mielinização dos neurônios ocorre de forma acentuada durante os últimos meses de desenvolvi- mento fetal e ao longo dos dois primeiros anos de vida pós-natal. Em determi- nadas áreas do cérebro, como o córtex cerebral, a mielinização pode ser consi- derada completa apenas na vida adulta. Uma vez diferenciados e maturados, os neurônios começam a se interligar, formando os circuitos neuronais por meio da formação das sinapses. A partir desse momento, cada nova experiência captada pelo sistema sensorial estará criando novos circuitos cerebrais ou modificando os circuitos já existentes. Os neurônios são classificados, de acordo com sua estrutura, em multipola- res, pseudounipolares e bipolares. Os neurônios multipolares possuem um único axônio e vários dendritos. Estão presentes em grande quantidade no encéfalo e na medula espinal, são o tipo mais comum no organismo e correspondem fun- cionalmente a neurônios eferentes (motores) e neurônios de associação (inter- neurônios). Os pseudounipolares são os que têm um só prolongamento dividido em dendrito e axônio e correspondem a neurônios aferentes (sensitivos) e ficam, em geral, no sistema nervoso periférico. Já os bipolares possuem um axônio e um dendrito de tamanhos semelhantes e são o tipo mais raro de neurônios. Os neurônios são especializados em realizar a indução e condução do im- pulso nervoso. Isso ocorre por meio das sinapses, que podem ser elétricas ou químicas. As sinapses elétricas são responsáveis pela sincronização e grupos de 19 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 neurônios, porém não são comuns no sistema nervoso de mamíferos. As sinap- ses químicas dependentes de neurotransmissores são as mais comuns no orga- nismo. Os neurotransmissores são substâncias liberadas pelos neurônios para dar continuidade ao impulso ou produzir uma resposta por um órgão efetuador (PROSDÓCIMI; SCHIMIDT, 2017). Os neurotransmissores são fundamentais para o funcionamento do organis- mo e podem influenciar no processo de recuperação celular. São eles: • acetilcolina; • monoaminas (noradrenalina, adrenalina, dopamina, serotonina); • glicina; • GABA (ácido gama aminobutírico); • ácido glutâmico; • peptídeos. Você sabe a relação do exercício físico com a liberação de en- dorfina? Que tipo de neurotransmissor é a endorfina e como ela atua no organismo? Escreva uma síntese do que você encontrou (Dê pre- ferência para pesquisas em livros e sites com cunho científico, por exemplo, Google Acadêmico, Scielo e Pubmed). O sistema nervoso também é composto pela neuróglia ou célula da glia. A glia tem várias funções: fornece suporte estrutural para os neurônios, nutre e atua na orientação do crescimento neuronal, protege o sistema nervoso de agentes infectantes e participa da transmissão do impulso. Existem células da glia com formas e funções distintas. São a macróglia (astrócitos e oligodendrócitos), micró- glia e células ependimárias. Os astrócitos mantêm e regulam o líquido extracelular e influenciam a transferência das informações no sistema nervoso. Os oligoden- drócitos são responsáveis pela formação da bainha de mielina, uma camada de isolamento ao redor dos axônios no sistema nervoso central. As micróglias são células pequenas que atuam na remoção de restos celulares durante o desenvol- vimento normal do sistema nervoso. As células ependimárias revestem o interior dos ventrículos encefálicos e o canal central da medula espinal. Elas produzem, 20 Patologias do Sistema Nervoso Central monitoram e auxiliamna circulação do líquido cerebrospinal, e também formam a barreira hematoencefálica. Além da classificação anatômica, há a classificação funcional. Esta divide o sistema nervoso em Sistema Nervoso Somático (SNS) e Sistema Nervoso Visce- ral (SNV). O Sistema nervoso somático e o sistema nervoso visceral compõem o sistema nervoso periférico. A classificação funcional destaca as partes do sistema nervoso que atuam em conjunto para conclusão de uma tarefa, ou seja, um circui- to neural que evidencia um comportamento específico, por exemplo, a percepção visual (MARTIN, 2014). O sistema nervoso somático é a porção consciente do sistema nervoso, pois é aonde chegam os estímulos por vias aferentes e que podem desencadear respostas voluntárias por vias eferentes. Já o sistema nervoso visceral ou au- tônomo é relacionado à porção inconsciente. Os estímulos também chegam por vias aferentes, porém com informações inconscientes que promovem respostas involuntárias por vias eferentes. A região eferente do SNV corresponde ao siste- ma nervoso autônomo que controla o funcionamento visceral do organismo por meio dos sistemas: simpático, parassimpático e entérico. Esses sistemas têm funções antagônicas, ou seja, um corrige os excessos do outro. Por exemplo, se um aumenta as batidas do coração, o outro diminui o ritmo das batidas. O SNP autônomo simpático mobiliza o organismo a responder em situações de estresse. É responsável por acelerar os batimentos cardíacos, aumentar a pressão arterial e pela ativação do metabolismo, por exemplo. Já o SNP autônomo parassimpáti- co estimula o relaxamento do organismo. A Figura 10 apresenta as funções do sistema nervoso simpático e parassim- pático sobre alguns órgãos do corpo humano. 21 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 FIGURA 10 – FUNÇÕES DO SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO SIMPÁTICO E PARASSIMPÁTICO SOBRE ALGUNS ÓRGÃOS E SISTEMAS DO CORPO HUMANO FONTE: https://www.infoescola.com/anatomia-humana/lobos-cerebrais/. Acesso em: 7 fev. 2019. O sistema nervoso entérico é uma rede de neurônios que integram o siste- ma digestivo e é formado principalmente pelos plexos mioentérico e submucoso. Pode funcionar de modo independente, mas os sistemas nervosos autônomo sim- pático e parassimpático podem ativar ou inibir suas funções. Observe que falamos de partes, ou seja, estruturas, e um objetivo enquanto função da parte. Fizemos uma síntese da divisão do sistema nervoso para permi- tir que você consiga perceber de forma intuitiva a localização funcional. Partimos da compreensão da estrutura do sistema nervoso para melhor visu- alização, assimilação e identificação de cada parte no momento que estivermos falando sobre as lesões e correspondentes patologias. 22 Patologias do Sistema Nervoso Central Atividades de estudo: 1 Cite qual a área estrutural do sistema nervoso de Phineas Gage foi afetada pela barra de ferro durante o acidente. 2 Qual o lobo encefálico que foi mais afetado pelo acidente de Phi- neas Gage? 3 LESÕES ENCEFÁLICAS Os modelos que correlacionam as lesões cerebrais e as disfunções cogniti- vas por elas provocadas, os modelos anatomoclínicos, são a base da Neuropsi- cologia como área de estudo. Parente e Fonseca (2007) afirmam que as funções cerebrais apresentadas antes das lesões são, nesse modelo, o parâmetro para compreender as disfunções que estas causam e podem ser correlacionadas às áreas afetadas. Em síntese, parte-se da disfunção para inferir sobre o funciona- mento normal e associa-se uma observação anatômica a uma observação funcio- nal. Lembra-se de Phineas Gage? Gage que, antes do acidente, era reconhecido por ser trabalhador, disciplinado e gentil, passou a ser visto como uma pessoa arrogante, desrespeitosa e foi por vezes comparado a uma criança birrenta. Se- gundo o modelo anatomoclínico, a lesão de Gage permitiu elencar as disfunções apresentadas e correlacionar às áreas que foram lesionadas, e a partir destas definir os comportamentos esperados quando em pleno funcionamento. Transcre- vemos aqui uma parte do texto que introduzimos este capítulo: Apesar de o acidente ter sido há mais de 150 anos, até hoje o caso é usado por neurologistas para ilustrar como um dano físico no cérebro pode alterar a personalidade de uma pessoa (associação de uma observação anatômica a uma observação funcional). Num estudo recente na Universidade de Iowa, imagens computadorizadas mostraram que a área afetada pelo bastão foi o córtex pré-frontal (área afetada) – camada externa do cérebro logo abaixo da testa, responsável por nossa capacidade de sentir emoções (observação funcional). Quando essa região é atingida, os neurologistas dizem 23 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 que os pacientes se tornam indiferentes, distantes e passam a ter dificuldades para tomar decisões (disfunções causadas pela lesão no córtex pré-frontal). FONTE: Adaptado da revista SUPERINTERESSANTE (2002, grifo nosso) Uma lesão pode ser inata, ocorrendo antes ou durante o nascimento, como é o caso da paralisia cerebral, ou pode ser adquirida, após o nascimento, como é o caso do traumatismo cranioencefálico. A lesão encefálica adquirida é qualquer dano físico ao tecido nervoso e pode ser classificada de acordo com a repercussão do dano. Se a lesão acontece no momento do trauma, é uma lesão primária. Se ocorrer algum tempo depois, é uma lesão secundária. A lesão primária pode ser decorrente de impacto (deformação, fratura, penetração) ou impulso (aceleração ou desaceleração). O que as lesões primária e secundária têm em comum é o fato de haver alteração na estrutura dos neurônios e uma descontinuidade de axônios centrais ou periféricos. A lesão encefálica traumática, também conhecida como lesão intracraniana ou traumatismo cranioencefálico (TCE), pode ser classificada de acordo com o grau de gravidade, o tipo da lesão (interno ou externo) e outros fatores, como a localização da lesão. Há traumatismos em que não ocorrem ferimentos no crânio ou a fratura existente não altera a estrutura óssea. Esses são os traumatismos cranioencefálicos fechados. Exemplos deles são as concussões ou lesões que se manifestam por edema ou hemorragia. Quando há alteração na estrutura do crânio são chamados traumatismos abertos. O traumatismo cranioencefálico – TCE é definido como: (...) qualquer lesão decorrente de um trauma externo, que tenha como consequência alterações anatômicas do crânio, como fratura ou laceração do couro cabeludo, bem como o comprometimento funcional das meninges, encéfalo ou seus vasos, resultando em alterações cerebrais, momentâneas ou permanentes, de natureza cognitiva ou funcional (MENON et al., 2010, p. 1638 apud MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2015, p. 13). Essa lesão é causada por um golpe na cabeça ou pelo movimento brusco da cabeça para frente e para trás. O tecido cerebral pode ser rasgado, esticado, pe- netrado, machucado ou ficar inchado. O oxigênio pode não conseguir passar para as células do encéfalo e pode haver sangramento. As causas comuns incluem: acidentes automobilísticos, agressão, quedas, acidentes esportivos, violência do- 24 Patologias do Sistema Nervoso Central méstica e bebês sendo sacudidos. Os efeitos podem ser temporários ou perma- nentes, e variam de lesão leve, como um acidente durante um jogo de futebol, a uma lesão muito grave que pode causar perda prolongada de consciência. Além da lesão causada no cérebro pelo trauma inicial, as lesões primárias, existem efeitos secundários que podem surgir posteriormente, tais como: sangramento, contusões, falta de oxigênio e aumento da pressão intracraniana. Quanto aos tipos de traumas, as alterações na estrutura do neurônio ou axô- nio podem abranger apenas uma área (lesões focais) ou todo o cérebro (lesões difusas). As lesões primárias decorrentes do trauma craniano são focais quando o trauma é causado diretamente no crânio. Exemplos de lesões focais são as contusões,lacerações, hematomas subdural e peridural e hemorragias intracra- nianas, que podem ser subaracnóideas e intraparenquimatosas. As lesões difusas são causadas por danos diretamente ao tecido nervoso. São as lesões axonais difusas, hipóxico-isquêmicas, hemorragias, edemas e rupturas da barreira hema- toencefálica (GALLEGO et al., 2018). 3.1 LESÕES FOCAIS • Contusão: A contusão cerebral é uma lesão grave do cérebro que advém de um impacto forte na cabeça, como é o caso dos acidentes de trânsito ou queda de altura. Os lobos frontal e temporal são as regiões do cé- rebro que normalmente são as mais afetadas. Os danos dependem da área afetada e podem causar edemas ou hemorragias e são considera- das mais graves quando estão associadas às fraturas do crânio e podem agravar as lesões secundárias (Figura 11). FIGURA 11 – IMAGEM DEMONSTRATIVA DE UMA CONTUSÃO REPRESENTADA PELA SETA 2 FONTE: http://bit.ly/2XW1ZeG. Acesso em: 8 fev. 2019. 25 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 • Laceração: Lesão decorrente de dano provocado ao tecido cerebral por penetração de um objeto ou rompimento do tecido cerebral. • Hematoma Epidural: Decorrente do acúmulo de sangue entre a dura-má- ter e o crânio. É uma lesão secundária devido a sangramentos. De acor- do com o Ministério da Saúde (2015), os sintomas clássicos são: perda intermitente de consciência, sendo que o intervalo de lucidez pode variar de minutos a horas, obnubilação, hemiparesia contralateral ao trauma, dilatação pupilar ipsilateral. • Hematoma subdural: Lesão que ocorre no espaço entre a dura-máter e a aracnoide gerando sangramento nesta região. Podem ser classificados como: agudos (composto por coágulo e sangue em período inferior a 24 horas), subagudos (composto por sangue e fluido no período de 2 a 14 dias), crônicos (presença de fluido em período acima de 14 dias). • Hematoma intracerebral: são decorrentes de traumatismos cranioence- fálicos graves e são causados no interior do encéfalo. Alguns sintomas são: sonolência, paralisia e comprometimento da fala. O acúmulo de lí- quido no encéfalo lesionado é uma das causas da maioria das mortes decorrentes de traumatismos. Devido aos danos causados, a interven- ção cirúrgica não é indicada, uma vez que o alcance da região afetada pelo médico contribui para que haja grandes repercussões sobre o fun- cionamento do órgão. • Hemorragias intracranianas: é um sangramento entre a camada aracnoi- de e a pia-máter (veja a Figura 4). Devido ao fato de o sangue não se concentrar em apenas um local, não é chamado de hematoma. Na Figura 12 você poderá observar os tipos de hematomas que podem aco- meter o encéfalo em decorrência de uma hemorragia. FIGURA 12 – TIPOS DE HEMATOMAS CAUSADOS NOS ESPAÇOS MENÍNGEOS DA REGIÃO CRANIOENCEFÁLICA FONTE: Adaptado de http://bit.ly/2YIgIqO. Acesso em: 20 fev. 2019. 26 Patologias do Sistema Nervoso Central 3.2 LESÕES DIFUSAS • Concussão: trauma gerado por alteração no movimento da cabeça ou pancada e afeta todas as áreas do cérebro. Normalmente gera perda de consciência, porém a recuperação neurológica ocorre completamente. É considerada uma lesão encefálica leve, porém pode levar ao desenvolvi- mento de sequelas como epilepsia e perda de memória. Em algumas si- tuações, a concussão cerebral pode ser acompanhada de uma contusão (Figura 13). FIGURA 13 – IMAGEM DEMONSTRATIVA DE UMA CONCUSSÃO REPRESENTADA PELO EVENTO 1 FONTE: http://bit.ly/2XW1ZeG. Acesso em: 8 fev. 2019. • Lesão axonal difusa: é a lesão causada aos axônios devido à rotação do encéfalo durante o trauma. Não é muito visível em um exame de ima- gem, podendo ser diagnosticada pela presença de pequenos pontos de hemorragia próximo ao núcleo da base. É a lesão mais comum associa- da ao TCE e pode resultar em um déficit maior, mesmo que sem lesão hemorrágica em grande escala. • Hemorragia intraventricular: está associada a traumatismos graves e à presença de hematomas intraparenquimatosos. • Isquemia: redução importante no fluxo sanguíneo normal do tecido ce- rebral. Pode afetar todo o encéfalo ou atingir áreas focais (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013). A lesão encefálica também pode ocorrer quando há uma redução (hipóxia) ou falta no suprimento de oxigênio (anóxia) para o cérebro. As células do cére- bro são sensíveis aos efeitos da restrição no fornecimento de oxigênio e podem 27 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 morrer dentro de minutos. O resultado imediato da restrição severa de oxigênio é frequentemente coma e, em casos muito graves, a morte cerebral. As causas incluem acidente vascular cerebral, quase afogamento, ataque cardíaco, over- dose de drogas, estrangulamento, asma grave, acidentes envolvendo anestesia e inalação de monóxido de carbono e envenenamento. A hipóxia também pode ocorrer como uma lesão após um TCE, por exemplo, quando há perda de sangue resultando em pressão arterial baixa, ou como resultado de inchaço que restringe o suprimento de oxigênio para áreas do cérebro. A circulação cerebral é diminuída pelo aumento da pressão intracraniana. Outro tipo de lesão que ocorre no encéfalo é o decorrente de um acidente vascular cerebral (AVC). Define-se acidente vascular cerebral (AVC) como um dé- ficit neurológico agudo durando mais de 24 horas, de etiologia cerebrovascular. É dividido em AVC isquêmico (causado por oclusão ou estenose vascular) e AVC hemorrágico (causado por ruptura vascular, resultando em hemorragia intraparen- quimatosa e/ou subaracnoide). O AVC isquêmico corresponde a 87% de todos os casos de AVC, ao passo que o AVC hemorrágico corresponde a cerca de 10% e a hemorragia subaracnoide a 3%. O acidente vascular cerebral isquêmico é causado pela obstrução ou redu- ção brusca do fluxo sanguíneo em uma artéria do cérebro, o que causa a falta de circulação vascular na região. Pode ser provocado por uma trombose cerebral por meio da formação de um coágulo de sangue que se forma em uma artéria em direção ao encéfalo. O acidente vascular cerebral hemorrágico acontece quando um vaso se rompe espontaneamente e há extravasamento de sangue para o inte- rior do cérebro. • Causas de acidente vascular cerebral: o Embolia – é onde um trombo (tecido adiposo, bolha de ar ou coágulo de sangue) se forma nos vasos sanguíneos encefálicos bloqueando o fluxo de sangue. Ainda, os coágulos podem se formar em outras par- tes do corpo e, ao se romperem, são transportados pela corrente san- guínea, podendo se alojar em vasos sanguíneos encefálicos menores. o Trombose – quando um coágulo de sangue se forma numa artéria principal em direção ao encéfalo. o Hemorragia – é um acidente grave. Existem dois tipos que podem cau- sar um derrame. Uma hemorragia intracerebral é causada por uma artéria que rompe e vaza sangue diretamente para o encéfalo. Uma hemorragia subaracnoide ocorre na superfície do encéfalo e o sangue preenche o espaço ao redor do encéfalo e cria pressão (PROSDÓCI- MI; SCHMIDT, 2017). 28 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 14 – IMAGEM ESQUEMÁTICA DE UM ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL DO TIPO TROMBOSE FONTE: https://www.tuasaude.com/trombose-cerebral/. Acesso em: 8 fev. 2019. Há também um número de condições degenerativas que envolvem compro- metimento cerebral. O mais comumente conhecido destes são esclerose múltipla, doença de Parkinson e doença de Alzheimer. Na esclerose múltipla, há a destruição da bainha de mielina e degeneração axonal de forma que ocorrem lesões dispersas no sistema nervoso central. A mielina é um revestimento de lipídios que age de for- ma semelhante ao isolamento plástico na fiação elétrica. A causa exata é desconhe- cida e não há cura, embora existam tratamentos que possam reduzir os sintomas. A doença de Parkinson – DP é uma doença degenerativa que causa altera- ções motoras devido à morte dos neurônios dopaminérgicos da substância nigra, localizada no mesencéfalo (Figura 15). FIGURA 15 – DESENHO ESQUEMÁTICOAPONTANDO A SUBSTÂNCIA NIGRA NA REGIÃO DO MESENCÉFALO FONTE: Adaptado de http://bit.ly/2Jr4MV3. Acesso em: 7 fev. 2019. 29 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 Por haver um desequilíbrio na atividade neurotransmissora, os neurônios pós-sinápticos não gerarão o impulso nervoso. As alterações não estão restritas à substância nigra e podem estar presentes em outros núcleos do tronco cerebral, córtex cerebral e mesmo neurônios periféricos. Exemplos de alterações motoras na DP são: acinesia, rigidez, tremor e instabilidade postural. Segundo Barbo- sa e Sallem (2005), pelo menos dois desses componentes são necessários para a caracterização da síndrome. Por não se restringirem à substância nigra, o proces- so degenerativo pode evidenciar outros sintomas não motores como depressão, distúrbios do sono, depressão, ansiedade e demência. A causa exata da doença de Parkinson é desconhecida e o maior fator de risco é o aumento da idade. Alterações motoras da Doença de Parkinson (BARBOSA; SAL- LEM, 2005, p. 160): Tremor: no Parkinson ocorre preferencialmente no repouso e aumenta durante a marcha. Acinesia: diminuição ou lentidão na iniciação e execução dos movimentos voluntários e automáticos. Bradicinesia é a lentidão na execução dos movimentos e hipocinesia é a diminuição dos movimentos. Rigidez: resistência à movimentação do membro afetado e pode ser contínua ou intermitente. Instabilidade postural: decorre da perda de reflexos de readaptação postural. A doença de Alzheimer – DA é o tipo mais comum de demência, representan- do cerca de 50% a 75% de casos de demência em todo o mundo (AIHW, 2012). Acredita-se que a doença seja multifatorial, ou seja, pode ter várias causas. A doença de Alzheimer caracteriza-se, histopatologicamente, pela perda sináptica e pela morte neuronal observada nas regiões cerebrais incluindo o córtex cerebral e o hipocampo. Ocorre depósito de fibras amiloides nas paredes dos vasos sanguí- neos do parênquima cerebral. Esse depósito está associado a vários tipos de pla- cas senis, acúmulo da proteína tau e formação de novelos fibrilares, perda neuro- nal (Figura 15) e sináptica, ativação da glia e inflamação. Os genes podem estar envolvidos, principalmente no tipo genético, que acomete pessoas de 40-50 anos, no entanto, a incidência é baixa. Placas e emaranhados no cérebro geralmente se desenvolvem mais tarde na vida e geram problemas com memória de curto prazo, desorientação, alterações de humor e questões comportamentais. Os sintomas já começam antes da formação da placa beta-amiloide (DAMASCENO, 1999). 30 Patologias do Sistema Nervoso Central A Figura 16 apresenta imagens obtidas através de ressonância magnética que demonstram a perda neuronal em regiões do cérebro envolvidas com a me- mória e aprendizagem em paciente diagnosticado com a DA (imagens da direita), comparativamente a um cérebro de indivíduo normal (imagens da esquerda). FIGURA 16 – IMAGENS OBTIDAS EM EXAMES DE RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DE UM PACIENTE SAUDÁVEL (IMAGEM ESQUERDA) EM COMPARAÇÃO A UM PACIENTE DIAGNOSTICADO COM PROVÁVEL DOENÇA DE ALZHEIMER FONTE: Mattson (2004, p. 631) Para melhor compreensão da fisiopatologia da Doença de Al- zheimer, pesquise sobre o que são as fibras amiloides e proteína tau e sua repercussão sobre a doença de Alzheimer. Os efeitos em longo prazo de uma lesão encefálica são diferentes para cada pessoa e irão variar dependendo do tipo, da natureza e da localização da lesão. Por exemplo, enquanto danos como a doença de Parkinson e esclerose múltipla geralmente impactam capacidade do corpo de controlar o movimento, outras le- sões cerebrais, como um acidente vascular cerebral ou um trauma, podem ter maior impacto na cognição, personalidade e comportamento. Com os dados causados ao cérebro em suas mais diversas formas (traumas e AVC, por exemplo) pode ocorrer morte neuronal relacionada tanto à lesão pri- mária quanto à secundária. 31 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 Lesão primária é qualquer dano físico ao tecido nervoso que acontece no momento do trauma. Lesão secundária é qualquer dano físico ao tecido nervoso que ocorre depois de certo tempo da ocorrência do trauma. Exemplo: O trauma encefálico decorrente de um projétil de arma de fogo é a lesão primária. Os danos que podem advir do trauma com projétil, como hemorragia e trombose, são a lesão secundária. Segundo De Oliveira, Salina e Annunciato (2001, p. 7), a lesão pode promo- ver a morte do neurônio, pode ter danificado o axônio, porém o corpo celular está íntegro ou o neurônio pode estar em um estágio de excitação diminuído. Estes autores citam que os mecanismos de reparação e reorganização do SNC ini- ciam-se logo após a lesão e permanecem por muito tempo, variando de meses a anos, pois apesar das perdas e da pouca capacidade de recuperação e/ou rege- neração do neurônio, o tecido nervoso tem a capacidade de alterar as conexões, promovendo caminhos alternativos para as sinapses. Mecanismos de reparação do SNC Brotamento: capacidade do SNC de criar novas vias e com isso aumentar a rede de inervação e recuperação das áreas lesionadas. Regeneração axonal: se a célula neuronal sobreviver à lesão axonal, o corpo celular começa a se regenerar. A lesão mais agressiva ao neurônio é sua ruptura completa, pois o axônio deixa de ser nutrido pelo corpo neuronal e isso afeta seu desenvolvimento e ma- nutenção. Dessa forma, o axônio degenera. A membrana do corpo neuronal, por sua vez, responde a esse processo com uma inflamação, levando a um edema e consequente atrofia dos neurônios. Nesse momento é possível verificar a exten- são da lesão e suas consequências (PEIXOTO, 2015). No Quadro 1 apresentamos algumas funções pelos quais os lobos, cerebelo e tronco encefálico são responsáveis. Verifique na coluna do meio – cérebro sau- dável – o que é esperado de um organismo sem apresentação de lesões. Na colu- na da direita – lesões cerebrais – listamos as alterações que podem ser acontecer quando um indivíduo tem o tecido neuronal lesionado. 32 Patologias do Sistema Nervoso Central QUADRO 1 – LISTA COM OS LOBOS DO ENCÉFALO E AS FUNÇÕES NORMAIS E AS QUE PODEM OCORRER COM AS LESÕES FONTE: Adaptada de Melo (2010). 4 LESÕES NA MEDULA ESPINAL As lesões medulares compõem desordens neurológicas que comprometem as funções motoras, sensitivas e autonômicas, implicando perda parcial ou total dos movimentos voluntários ou da sensibilidade em membros superiores e/ou in- feriores e alterações no funcionamento dos sistemas urinário, intestinal, respira- tório, circulatório e reprodutivo. São lesões decorrentes da transecção dos nervos motores e sensoriais da medula espinal com manifestações clínicas de acordo com o nível e extensão da lesão. 33 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 Segundo Prosdócimi e Schmidt (2017), o nível de lesão envolve a altura da le- são. Se a lesão é cervical há comprometimento dos membros superiores, tronco e membros inferiores. São lesões nos segmentos C1, C2, C3, C4, C5, C6 ou C7. Se a lesão é torácica, com comprometimento dos segmentos T1, T2, T3, T4, T5, T6, T7, T8, T9, T10, T11 ou T12, os membros inferiores e o tronco podem ter sua funciona- lidade afetada. As lesões lombares, nos segmentos L1, L2, L3, L4 ou L5, compro- metem os membros inferiores. Os membros inferiores também são afetados pelas lesões sacrais que envolvem os segmentos S1, S2, S3, S4 ou S5 (Figura 17). FIGURA 17 – SEGMENTOS DA MEDULA ESPINHAL FONTE: http://bit.ly/2G5B4my. Acesso em: 2 mar. 2019. Prosdócimi e Schmidt (2017) afirmaram que a transecção da medula espinal resulta em perda de toda sensibilidade e todos os movimentos voluntários abaixo do nível da lesão e elencaram as consequências das lesões da medula espinal de acordo com os segmentos medulares atingidos: • C1 – C3: ausência de funções abaixo do nível da cabeça e necessidade de um ventiladorpara manter a respiração; 34 Patologias do Sistema Nervoso Central • C4 – C5: paciente ficará quadriplégico, ou seja, sem função dos mem- bros superiores e inferiores, porém haverá respiração; • C6 – C8: ocorrerá perda da função da mão, porém o paciente conseguirá se alimentar sozinho ou impulsionar uma cadeira de rodas; • T1 – T9: paraplegia, ou seja, paralisia dos membros inferiores; • T10 – L1: preservação de considerável parte da função muscular das pernas, podendo necessitar de órteses curtas para caminhar. A lesão medular também deve ser analisada quanto a seu grau ou extensão: • Completa: não há atividade motora voluntária nem sensibilidade do nível da lesão até o segmento Sacral S4-S5. • Incompleta: há atividade motora voluntária parcial e sensibilidade parcial até o segmento sacral S4-S5. Desta forma podem existir tanto lesões altas incompletas como lesões baixas completas. Níveis de lesão cervicais: Tetraplégico: indivíduos portadores de grande comprometimento dos membros superiores. para baixo. Tetraparético: indivíduos portadores de comprometimento leve dos membros superiores para baixo. Níveis de lesão torácicos ou lombares: Paraplégico: indivíduos portadores de grande comprometimento dos membros inferiores. Paraparético: indivíduos com comprometimento leve dos mem- bros inferiores. Nas lesões completas existem perda sensitiva e paralisia motora total abaixo do nível da lesão devido à interrupção completa dos tratos nervosos. Em uma lesão incompleta estão preservados grupos musculares e áreas sensitivas que não foram afetados. 35 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 Também em relação aos graus da lesão, são identificadas algumas síndro- mes medulares (PROSDÓCIMI; SCHMIDT, 2017): • Síndrome centromedular: os membros superiores são mais afetados que os membros inferiores; • Síndrome Brown-Séquard: apenas um lado da medula é seccionado re- sultando em perda motora e proprioceptiva homolateral à lesão e perda da sensibilidade térmica e dolorosa contralateral à lesão; • Síndrome medular anterior: ocorre perda motora e da sensibilidade tér- mica e dolorosa estando preservada a propriocepção; • Síndrome medular transversa: lesão acima do cone medular com perda motora (paralisia espástica) e sensitiva completa (anestesia superficial e profunda); • Síndrome do cone medular: lesão da medula sacral e das raízes lom- bares com perda motora (paralisia flácida) e sensitiva dos dermátomos lombossacros correspondentes; • Síndrome da cauda equina: lesão de raízes lombossacras abaixo do cone medular com perda motora (paralisia flácida) e sensitiva correspon- dentes às raízes lesionadas. A lesão medular pode ter causas de origens traumáticas ou não traumáticas. Entre as causas de etiologia traumática, as mais frequentes estão relacionadas a acidentes automobilísticos, ferimentos por armas de fogo, mergulho em águas rasas, acidentes esportivos e quedas. Entre essas causas, os ferimentos pene- trantes por arma de fogo produzem lesões graves com perda de substância, fís- tulas, infecções e meningites. Já as causas das lesões não traumáticas podem estar relacionadas a tumores, infecções, alterações vasculares, malformações e processos degenerativos ou compressivos. A instalação da lesão medular pode ser abrupta, originando o quadro clíni- co denominado choque medular; ou progressiva, cujas alterações surgem gradu- almente. No choque medular observa-se paralisia flácida e anestesia abaixo do nível da lesão, além de alterações esfincterianas, sexuais e na termorregulação. Se a lesão comprometer segmentos cervicais ou torácicos altos, também podem ocorrer problemas respiratórios. O quadro pode variar quanto a sua duração e não é possível estabelecer qual será o prognóstico funcional do paciente até que se supere a fase aguda. O prognóstico funcional será determinado após a fase aguda e incluirá as determinações do nível e grau da lesão e a avaliação dos comprometimentos das funções motora e sensitiva (CEREZETTI et al., 2012). A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacio- nados à Saúde – versão 10 (CID 10) descreve as doenças da medula espinal conforme numeração a seguir: 36 Patologias do Sistema Nervoso Central (G80-G83) Paralisia cerebral e outras síndromes paralíticas (G80) Paralisia cerebral (G80.0) Paralisia cerebral quadriplégica espástica (G80.1) Paralisia cerebral diplégica espástica (G80.2) Paralisia cerebral hemiplégica espástica (G80.3) Paralisia cerebral discinética (G80.4) Paralisia cerebral atáxica (G80.8) Outras formas de paralisia cerebral (G80.9) Paralisia cerebral não especificada (G81) Hemiplegia (G81.0) Hemiplegia flácida (G81.1) Hemiplegia espástica (G81.9) Hemiplegia não especificada (G82) Paraplegia e tetraplegia (G82.0) Paraplegia flácida (G82.1) Paraplegia espástica (G82.2) Paraplegia não especificada Paralisia de ambos os membros inferiores SOE Paraplegia (inferior) SOE (G82.3) Tetraplegia flácida (G82.4) Tetraplegia espástica (G82.5) Tetraplegia não especificada Quadriplegia SOE (G83) Outras síndromes paralíticas (G83.0) Diplegia dos membros superiores (G83.1) Monoplegia do membro inferior (G83.2) Monoplegia do membro superior (G83.3) Monoplegia não especificada (G83.4) Síndrome da cauda equina (G83.8) Outras síndromes paralíticas especificadas Paralisia de Todd (pós-epiléptica) (G83.9) Síndrome paralítica não especificada LESÃO MEDULAR TRAUMÁTICA: Recuperação Neurológica e Funcional Disponível em: http://bit.ly/32kZYbd 37 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 Atividades de estudo: 1 Quais as cinco causas de lesão encefálica citadas neste capítu- lo? 2 O que você entende sobre reversibilidade ou irreversibilidade da lesão encefálica? 3 A lesão da medula espinhal é um dos mais graves acometimen- tos que pode afetar o ser humano e com enorme repercussão física, psíquica e social. Chamamos de lesão medular toda injúria às estruturas contidas no canal medular (medula, cone medular e cauda equina), podendo levar a alterações motoras, sensitivas, autonômicas e psicoafetivas. Sobre Lesão Medular, assinale a al- ternativa CORRETA. a) ( ) O quadro clínico geral inicial é denominado de choque me- dular, caracterizado por paralisia flácida e anestesia abaixo e aci- ma do nível da lesão. b) ( ) Para caracterizar e homogeneizar as sequelas da Lesão Medular Traumática, mundialmente é padronizado a utilização da ASIA (American Spinal Injury Association) que indica os múscu- los-chave para o nível motor e os dermátomos ou pontos-chaves sensitivos para o nível da sensibilidade. c) ( ) A escala de Frankel determina o grau da lesão medular, onde a lesão é classificada de completa a incompleta, recebendo as letra de A a E, significando a letra A função motora e sensitiva normais. d) ( ) Na lesão medular completa no nível C8 o paciente apre- senta preservação total dos membros superiores permitindo total independência nas atividades diárias, manejo da cadeira de ro- das e condução de veículos adaptados. e) ( ) Lesão Medular de C6 causa o comprometimento do mús- culo diafragma levando este paciente à total dependência da res- piração assistida. 38 Patologias do Sistema Nervoso Central 5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Iniciamos este capítulo falando sobre Phineas Gage, o capataz que em de- corrência de um acidente teve uma lesão no córtex pré-frontal e a despeito da amplitude do trauma, teve como consequência mudanças de comportamento que afetaram seu convívio social e alteraram toda a sua rotina de vida. Gage nos per- mite visualizar que as lesões não têm consequências apenas a nível biológico, mas também a nível comportamental. Este capítulo teve por objetivo levar você a compreender a estruturas ence- fálicas nos quesitos anatômicos e fisiológicos para, a partir dessa unidade básica do sistema nervoso, conhecer sua estrutura e sua organização morfofuncional em um organismosaudável. Conhecendo o sistema nervoso e suas estruturas, você foi conduzido a estudar as lesões que acometem esse sistema, tanto suas causas quanto os tipos de lesões. Espera-se que você consiga iniciar sua trajetória enquanto neuropsicólogo(a) alicerçando seu conhecimento sobre as estruturas cerebrais. Esse conhecimento norteará você durante um processo de investigação e avaliação neuropsicológi- cas. Permitirá que contribua dentro de uma equipe multidisciplinar para habilitar e reabilitar os pacientes que estiverem sob sua responsabilidade. É palpável a complexidade do sistema nervoso. As informações aqui apre- sentadas foram sintéticas para levá-lo à construção desse conhecimento e insti- gá-lo em busca de aprofundamento do tema. Nos capítulos posteriores falaremos sobre as patologias do sistema nervoso central diferenciando-as quanto às áreas e intersecções entre elas diante dos danos apresentados. Revise o material e anote suas dúvidas. Esse material norteará sua leitura dos próximos capítulos. REFERÊNCIAS AFIFI, A. K.; BERGMAN, R. A. Neuroanatomia funcional: texto e atlas. São Paulo: Roca, 2017. AIHW. Australian Institute of Health and Welfare. Disability in Australia: acquired brain injury, Bulletin 55, Canberra: AIHW, 2007. AIHW. Australian Institute of Health and Welfare 2012. Dementia in Australia. Cat. n. AGE 70. Canberra: AIHW, 2012. 39 Introdução ao Sistema Nervoso Capítulo 1 ANGHINAH, Abrão. Recuperação espontanea da função nas lesões do sistema nervoso central Spontaneous recuperation of function in central nervous system lesions. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, v. 33, n. 4, p. 363-375, 1975. BARBOSA, E.R.; SALLEM, F. A. Z. Doença de Parkinson – Diagnóstico. Rev Neurociencias, 13(3): 158-165, 2005. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE, SECRETARIA DE ATENÇÃO À SAÚDE, DEPARTAMENTO DE AÇÕES PROGRAMÁTICAS ESTRATÉGICAS. Diretrizes de atenção à reabilitação da pessoa com traumatismo cranioencefálico, 2015, p. 15-24. CAVALCANTE, Rodrigo. Phineas Gage. Abril, São Paulo, 31 dezembro 2002. Disponível em: https://super.abril.com.br/historia/phineas-gage/. Acesso em: 20 jan. 2019. CEREZETTI, Christina Ribeiro Neder et al. Lesão medular traumática e estratégias de enfrentamento: revisão crítica. O mundo da Saúde, v. 36, n. 2, p. 318-326, 2012. DAMASCENO, Benito Pereira et al. Envelhecimento cerebral: o problema dos limites entre o normal e o patológico. Arquivos de Neuropsiquiatria, 57(1): 77- 83, 1999. DE OLIVEIRA, C. E. N.; SALINA, M. E.; ANNUNCIATO, N. F. Fatores ambientais que influenciam a plasticidade do SNC. Acta Fisiátrica, v. 8, n. 1, p. 6-13, 2001. GALLEGO, Isabel Cristina Rojas et al. Fisiopatologia do dano cerebral e traumatismo encéfalo craniano. CES Medicina, v. 32, n. 1, p. 31-40, 2018. LANDEIRA-FERNANDEZ, J.; SILVA, T. A. Intersecções entre psicologia e neurociências. Rio de Janeiro: MedBook, 2007. MARTIN, J. H. Neuroanatomia: texto e atlas. Porto Alegre: AMGH Editora, 2014. MATTSON, Mark P. Pathways towards and away from Alzheimer's disease. Nature, v. 430, n. 7000, p. 631, 2004. MELO, S. R. Neuroanatomia: pintar para aprender. São Paulo: Roca, 2010. PARENTE, M. A. M. P.; FONSECA, R. P. Substratos neurais da linguagem e seus fatores biológicos e sociais. In: Jesus Landeira-Fernandez; Maria Teresa Araújo Silva. (Org.). Intersecções entre psicologia e neurociências. Rio de Janeiro: MedBook, 2007, p. 189-215. 40 Patologias do Sistema Nervoso Central PEIXOTO, Regina Mendonça. Lesões encefálicas: definições, perspectivas e repercussão social. Dissertação. Belo Horizonte, 29p. 2015. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/BUOS- AAAQB2/vers_o_final___tcc.pdf?sequence=1 Acesso em: 2 fev. 2019. SCHMIDT, A. G.; PROSDÓCIMI, F. C. Manual de neuroanatomia humana: guia prático. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2017. CAPÍTULO 2 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes obje- tivos de aprendizagem: Saber: • conceituar as doenças neurodegenerativas; • descrever os sintomas de cada patologia. Fazer: • diferenciar as doenças neurodegenerativas das demais afecções do Sistema Nervoso; • correlacionar as patologias com os sintomas apresentados pelo paciente. 42 Patologias do Sistema Nervoso Central 43 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 1 CONTEXTUALIZAÇÃO No Capítulo 1 elencamos algumas estruturas que compõem o sistema ner- voso, falamos sobre sua divisão em sistema nervoso central e sistema nervoso periférico, bem como das lesões que podem acometer essas estruturas. As lesões que acometem o sistema nervoso podem ser de toda ordem: traumas, acidentes vasculares, mutações gênicas, malformações genéticas e tumores, por exemplo. No Capítulo 2 falaremos sobre as doenças degenerativas e heredodegene- rativas do SNC, a saber: Esclerose Múltipla, Doença de Parkinson, Doença de Huntington e Doença de Alzheimer. As doenças degenerativas decorrem de um processo de deterioração de uma área, estrutura ou órgão e as doenças heredo- degenerativas são as que advêm de um processo genético cuja deterioração é progressiva. A doença de Parkinson e a doença de Huntington têm regiões semelhantes afetadas, porém, decorrentes de diferentes causas. A doença de Parkinson não tem suas causas específicas, apesar de inferências à contribuição da genética e do ambiente. Já a doença de Huntington tem seu componente genético bem definido e o curso da doença é melhor especificado. A esclerose múltipla é uma doença autoimune, onde o sistema imunológico ataca as células nervosas promo- vendo a deterioração da substância branca do sistema nervoso central. A doença de Alzheimer, por sua vez, também tem causas multifatoriais e está relacionada às alterações na constituição da proteína tau e ao acúmulo de placas senis re- sultando em perdas encefálicas em diversas regiões do sistema nervoso levando inicialmente à demência, seu sintoma mais evidente. A esclerose múltipla tem incidência na faixa etária de 20 a 40 anos, a doença de Huntington, em média a partir dos 40 anos, a doença de Parkinson, por volta dos 50 anos e a doença de Alzheimer, a partir dos 65 anos de idade. Apesar do termo associado ao processo de envelhecimento, a esclerose múltipla é a única que não faz parte desse processo. O termo “estar esclerosado” é leigamente utili- zado para referenciar o processo demencial. Este processo, no entanto, é encon- trado predominantemente na doença de Alzheimer e como quadros secundários, nas doenças de Huntington e no Parkinson. Citamos neste capítulo as principais doenças neurodegenerativas e não temos a pretensão de esgotar o assunto. O objetivo é provocar você, aprendiz, a pensar sobre o curso dessas doenças e permitir que avalie os quadros apresentados pelos seus pacientes por meio de uma visão multidisciplinar em uma atuação interdiscipli- nar. Permitir que compreenda a influência do componente biológico sobre os com- portamentos e correspondentes alterações destes no processo avaliativo. 44 Patologias do Sistema Nervoso Central 2 ESCLEROSE MÚLTIPLA A esclerose múltipla – EM é uma doença autoimune, progressiva e de etio- logia desconhecida que afeta o sistema nervoso central. As células T ativadas atravessam a barreira hematoencefálica para iniciar uma resposta inflamatória que conduz à desmielinização e lesão axonal. Esta doença se caracteriza pela desmielinização da substância branca (Figura 1) do sistema nervoso central, ou seja, da medula e do encéfalo (SILVA; NASCIMENTO, 2014). Autoimune: Doença em que o sistema imunológico do corpo ataca células saudáveis do próprio organismo. Na esclerose múltipla, o sistema imunológico destrói a cobertura lipídica das células nervo- sas, a bainha de mielina. Células T: Também chamadas de Linfócitos T (derivadas do timo), as células T são um grupo de glóbulos brancos que atuamma- tando as células infectadas e coordenando a resposta imunitária. FIGURA 1 – APRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA SUBSTÂNCIA BRANCA E CINZENTA NO ENCÉFALO FONTE: http://bit.ly/2XJFRVM. Acesso em: 25 fev. 2019. 45 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 A desmielinização é a perda da bainha de mielina que envolve os neurônios e isso promove a destruição dos axônios prejudicando assim a condução dos im- pulsos nervosos. Bainha de mielina: A mielina é um composto lipoproteico que cobre o axônio. A espessura da bainha de mielina está relacionada à transmissão do impulso nervoso: quanto mais espessa, maior a velo- cidade. Disso decorre o fato dos axônios amielínicos transmitirem im- pulso mais lentamente. A mielinização dos neurônios ocorre de forma acentuada durante os últimos meses de desenvolvimento fetal e ao longo dos dois primeiros anos de vida pós-natal. Em determinadas áreas do cérebro, como o córtex cerebral, a mielinização pode ser considerada completa apenas na vida adulta. No Capítulo 1 falamos sobre o neurônio e suas partes (Figura 2). Vamos relembrar a constituição do neurônio para melhor visualização da localização da bainha de mielina e compreensão quando ocorre seu comprometimento e resulta na esclerose múltipla. O neurônio é dividido em corpo celular (pericário), encontrado em grande quantidade na substância cinzenta, e nele encontra-se o núcleo. Ligado ao corpo celular está o axônio, geralmente envolvido pela bainha de mielina que são interli- gadas pelos nódulos de Ranvier. Os axônios podem ser mielínicos ou amielínicos. Em ambos os casos contam com células de suporte, ou seja, mesmo quando não possuem a bainha de mielina, os neurônios têm o suporte das células de Schwann no sistema nervoso periférico e dos oligodendrócitos no sistema nervoso central. FIGURA 2 – ESTRUTURA DE UM NEURÔNIO DO SNP COM DEFINIÇÃO DE SUAS PARTES FONTE: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ax%C3%B3nio. Acesso em: 8 fev. 2019. 46 Patologias do Sistema Nervoso Central A EM é considerada uma das doenças neurológicas mais frequentes em jo- vens adultos, com ocorrência entre os 20 e 40 anos e maior frequência entre as mulheres (SÁ, 2009). A etiologia da doença é desconhecida, mas há hipóteses relacionadas à predisposição genética aliada a algum fator ambiental. Dessa for- ma, a presença da doença na família aumenta a possibilidade de nova ocorrência (REZENDE; ARRUDA, 1996). 2.1 TIPOS DE ESCLEROSE MÚLTIPLA A doença tem um curso que altera entre remissões e recorrências, variando de paciente para paciente de acordo com a fase em que se encontra. Segundo Lublin e Reingold (1996, p. 908-909), há quatro tipos de esclerose múltipla e são caracterizadas pelo curso e desenvolvimento da doença: • Esclerose Múltipla Recidivante Remitente ou surto-remissiva; • Esclerose Múltipla Secundária Progressiva; • Esclerose Múltipla Primária Progressiva; • Esclerose Múltipla Primária Recidivante ou surto-progressiva. A esclerose múltipla recidivante remitente é caracterizada por episódios agudos de comprometimento neurológico, com duração de no mínimo 24 horas, e pelo retorno recorrente dos sintomas da doença após a recuperação ou ocor- rência de sequelas entre períodos da doença sem progressão da mesma. Um surto é seguido por um período de recuperação quando há poucos (ou nenhum) sintomas, chamado de remissão. O intervalo entre os surtos é de, em média, 30 dias. A doença não piora durante esses intervalos. Após 10 a 20 anos, esse tipo de esclerose geralmente muda para um tipo diferente, a esclerose múltipla secun- dária progressiva, que se caracteriza pela piora (progressão) da doença apesar da diminuição das recaídas. Na esclerose múltipla secundária progressiva, há progressão dos sinto- mas com ou sem surtos ocasionais. Então, um paciente com a forma surto remis- siva da esclerose múltipla evolui para a forma secundária progressiva. Observe que no tipo surto remissivo, os surtos “vão e vêm”, há recuperação parcial ou total dos sintomas, porém não há progressão do sintoma. A segunda forma, secundária progressiva, é a progressão dos sintomas que outrora apenas “iam e vinham”. Na esclerose múltipla primária progressiva há uma evolução progressiva desde o início da doença, sem surtos e com possíveis melhoras. A esclerose múltipla primária recidivante apresenta incapacidade desde seu aparecimento e progride com o passar do tempo. Há surtos agudos, com ou sem recuperação total. 47 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 A doença afeta as funções motoras, cerebelares (comprometimento do equi- líbrio e da coordenação), do tronco encefálico (capacidade de falar, deglutir etc.), sensitivas (sensação de dormência ou formigamento de alguma parte do corpo), viscerais (comprometimento esfincteriano e disfunções sexuais), visuais (acuida- de visual, diplopia e escotomas) e mentais (alterações do humor, depressão e an- siedade). Quanto à alteração das funções mentais, a presença de sintomas carac- terísticos da EM, como fadiga e alteração do apetite, pode dificultar o diagnóstico do quadro depressivo. Ademais, euforia, delírios e alucinações são manifestações psiquiátricas raras nos pacientes com EM. Você sabia? No dia 2 de abril de 2018, o Ministério da Saúde (OMS) aprovou o protocolo clínico e as diretrizes terapêuticas da Esclerose Múltipla – EM por meio da Portaria Conjunta nº 10. Esse documento surgiu da necessidade de atualização dos parâmetros sobre a esclerose múl- tipla no Brasil e as diretrizes para diagnóstico, tratamento e acompa- nhamento dos indivíduos com esta doença. Os protocolos dispostos na Portaria levaram em consideração o consenso técnico-científico existente e seguiram padrões de qualidade e precisão para sua indi- cação. Por meio da Portaria: Art. 1º Fica aprovado o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuti- cas – Esclerose Múltipla. Parágrafo único. O Protocolo objeto deste artigo, que contém o conceito geral da esclerose múltipla, critérios de diagnóstico, critérios de inclusão e de exclusão, tratamento e mecanismos de regulação, controle e avaliação, disponível no sítio http://portalms.saude.gov.br/ protocolos-e-diretrizes, é de caráter nacional e deve ser utilizado pe- las Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Mu- nicípios na regulação do acesso assistencial, autorização, registro e ressarcimento dos procedimentos correspondentes. Art. 2º É obrigatória a cientificação do paciente, ou de seu res- ponsável legal, dos potenciais riscos e efeitos colaterais relacionados ao uso de procedimento ou medicamento preconizado para o trata- mento da esclerose múltipla. Art. 3º Os gestores estaduais, distrital e municipais do SUS, con- forme a sua competência e pactuações, deverão estruturar a rede assistencial, definir os serviços referenciais e estabelecer os fluxos para o atendimento dos indivíduos com essa doença em todas as etapas descritas no Anexo desta Portaria. 48 Patologias do Sistema Nervoso Central 2.2 DIAGNÓSTICO Para diagnóstico são realizados: • ressonância magnética; • exames laboratoriais (exames de anti-HIV e VDRL e dosagem sérica de vitamina B12) no sentido de excluir outras doenças com sintomas seme- lhantes à EM. Deficiência de vitamina B12 ou infecção pelo HIV (o vírus HIV pode causar uma encefalopatia com imagens à RM semelhantes às que ocorrem na EM); • o exame do líquor para excluir outras doenças quando houver dúvida diagnóstica; • Potencial Evocado Visual será exigido quando houver dúvidas quanto ao envolvimento do nervo óptico pela doença. De acordo com a Portaria nº 10 (OMS), o diagnóstico obedece aos critérios de McDonald (2001) revisados por Polman et al. (2005) na análise da ressonância magnética: QUADRO 1 – CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DA ESCLEROSE MÚLTIPLA SEGUNDO MCDONALD (2001) REVISADOS POR POLMAN ET AL. (2005) Apresentação Clínica Dados adicionais necessário para o diagnóstico de esclerosemúltipla 2 ou mais surtos mais evidência clínica de duas ou mais lesões Apenas uma ou duas lesões sugestivas de EM à ressonância magné- tica – RM 2 ou mais surtos mais evidência clínica de uma lesão Disseminação no espaço, demonstrada por RM com critérios de Barkho- ff, presença de pelo menos três das quatro características a seguir: (a) pelo menos uma lesão impregnada pelo gadolínio ou pelo menos nove lesões supratentoriais em T2; (b) pelo menos três lesões periventriculares; (c) pelo menos uma lesão justacortical; (d) pelo menos uma lesão infratentorial; ou RM com duas lesões típicas e presença de bandas oligoclonais ao exame do líquor; ou Aguardar novo surto. 1 surto mais evidência clínica de duas lesões Disseminação no tempo, demonstrada por RM após três meses com novas lesões ou pelo menos uma das antigas impregnada pelo gado- línio; ou aguardar novo surto. 1 surto mais evidência clínica de uma lesão Disseminação no espaço, demonstrada por RM com critérios de Barkhoff ou RM com duas lesões típicas e presença de bandas oligo- clonais no exame do líquor e disseminação no tempo, demonstrada por RM após três meses com novas lesões ou pelo menos uma das antigas impregnada pelo gadolínio; ou aguardar novo surto. FONTE: Polman et al. (2005, p. 843-845) 49 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 Gadolínio: agente de contraste paramagnético utilizado na res- sonância magnética. Para auxiliar a compreensão do Quadro 1, sugiro que realize pesquisas so- bre as regiões da substância branca em que evidenciam as lesões encefálicas utilizadas para diagnóstico: espaços periventricular, supratentorial, justacortical e infratentorial da substância branca. Após estabelecimento do diagnóstico, é analisado o estágio em que a do- ença se apresenta por meio da Escala Expandida de Incapacidade – Expanded Disability Status Scale (EDSS) (KURTZKE, 1983). Essa escala é muito utilizada para avaliação da esclerose múltipla. Possui 20 itens com pontuações variando de 0 a 10. Permite avaliar o estágio em que a doença se apresenta e também monitorar o paciente. Por meio dessa escala são avaliadas as funções: piramidais (relacionadas à capacidade motora), cerebelares (relacionados a realização de movimentos), tronco cerebral (capacidade de falar, deglutir etc.), sensitivas (redu- ção ou perda da sensibilidade), vesicais (sintomas urinários com ou sem incon- tinência), visuais (alteração visual), mentais (humor, pensamento e memória) e outras funções analisadas durante a avaliação. A disposição dessa Portaria permite refletir sobre a importância do conheci- mento sobre a doença que aqui tratamos. 2.3 AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DA ESCLEROSE MÚLTIPLA A avaliação neuropsicológica é um instrumento que permite conhecer o pa- ciente de forma mais ampla quando do diagnóstico da esclerose múltipla. É possí- vel analisar as funções executivas, as manifestações psiquiátricas e os prejuízos na memória, atenção, linguagem, velocidade de processamento de informações e elencar as capacidades que estão preservadas ou que demandam planos de intervenção específicos. Há, no entanto, grande carência de instrumentos neurop- sicológicos validados para o público brasileiro. Barroso et al. (2013) realizou um estudo com 24 pacientes com diagnóstico de EM, com faixa etária média de 40 anos. Utilizou uma bateria de avaliação com- posta por: 50 Patologias do Sistema Nervoso Central • teste do relógio; • questionário de queixa de memória; • testes de listas de palavras – recordação imediata e recordação tardia; • testes práticos de função frontal; • bateria de avaliação da memória de trabalho validada por alunos da Uni- versidade Federal de Minas Gerais (BAMT-UFMG); e • Multiple Sclerosis Functional Composite Measure (MSFC). A Bateria de avaliação da memória de trabalho (BAMT – UFMG) e a Multi- ple Sclerosis Functional Composite Measure (MSFC) foram desenvolvidos para a avaliação da memória e das funções executivas de pacientes com EM e encon- tram-se validados para o Brasil. Os resultados do estudo mostraram que a forma surto-remissiva foi a mais prevalente no grupo estudado. A avaliação neuropsicológica indicou algum pre- juízo nas funções executivas de planificação, organização espacial, evocação e aprendizagem. Outros sintomas encontrados foram a dificuldade em deambular e no controle dos membros superiores. Apesar de realizarem a tarefa, houve dificuldades de compreensão e baixos resultados nos testes que envolveram resolução de contas matemáticas e reten- ção de informações numéricas simultaneamente. Durante o processo de avalia- ção, a BAMT – UFMG conseguiu avaliar dificuldades significativas na memoriza- ção, porém gerou fadiga nos pacientes devido à extensão do tempo de realização das atividades. Atividades de estudo: 1 Defina com suas próprias palavras o que é a esclerose múltipla. 2 Quais os tipos de manifestação da esclerose múltipla? Especifi- que a ocorrência ou não de surtos e a evolução da doença em cada uma delas. 3 Pesquise outros instrumentos de avaliação neuropsicológicos utiliza- dos para auxiliar o diagnóstico e tratamento da esclerose múltipla e correlacione os construtos do instrumento com os sintomas da EM. 51 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 3 DOENÇA DE PARKINSON Descrita pela primeira vez em 1817 por James Parkinson, a doença de Parkinson é uma doença progressiva com sintomas relacionados a alterações motoras. A doença de Parkinson – DP é a segunda doença neurodegenerativa mais comum e envolve hipocinesia, hipertonia plástica, tremores de repouso e instabilidade postural. Apesar de, tradicionalmente, entendida como um distúrbio do movimento, a DP também apresenta sintomas não motores tão incapacitantes quanto os sintomas motores. É uma doença em que há degeneração dos neurônios responsáveis pela produção da dopamina. Esses neurônios têm seus corpos celulares na substân- cia negra (ou nigra) (Figura 3) e projetam seus axônios para todo o encéfalo e alguns deles, para os núcleos da base. Quer saber mais sobre a dopamina? Sugerimos a leitura do Capítulo 12 do livro Princípios de Farma- cologia: a base fisiopatologia da Farmacoterapia: STANDAERT, D.; GALANTER, Joshua M. Farmacologia da neurotransmissão dopaminérgica. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatologia da Farmacoterapia, p. 166-185, 2009. Você poderá encontrá-lo também em: http://bit.ly/2xPYAQc 3.1 ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA Não compreendemos totalmente os motivos pelos quais os neurônios do- paminérgicos ficam disfuncionais, acabando por morrer. Estudos (O’SULLIVAN; SCHMITZ, 2004; PINHEIRO, 2002) apontam vários fatores que podem desenca- dear a doença e eles podem ser ambientais, genéticos ou alterações no envelhe- 52 Patologias do Sistema Nervoso Central cimento, mas a associação nem sempre é clara, o que faz com que não seja ainda possível prever o aparecimento da doença. A combinação entre a predisposição genética e a presença de fatores tóxicos ambientais é considerada como o fator etiopatogênico mais importante (SOUZA, 2011). Ainda assim, o único fator de ris- co definitivo para o aparecimento de DP é o envelhecimento. No entanto, apesar do declínio nos níveis de dopamina estriatal com o envelhecimento fisiológico, este processo é distinto das alterações neuropatológicas que se verificam na DP. A substância negra é rica em melanina. O que ocorre é a despigmentação do sistema dopaminérgico juntamente com os neurônios de melanina. Infere-se a partir disso que, quanto mais clara a substância negra, maior é a perda da dopa- mina e consequentemente, a degeneração dos neurônios dopaminérgicos que se projetam para o estriado. Com a ausência de dopamina, essa região sofre alterações e por ter papel fundamental na manutenção do circuito motor subcortical que controla uma sé- rie de atividades automáticas, os comportamentos motores passam também a ser afetados.Um exemplo da repercussão do funcionamento do circuito motor é quando quero pegar um livro em cima da mesa. De forma consciente, realizo a ação. Nesse momento quem está ativo é o circuito motor cortical. Mas quando ca- minho e falo ao celular, o ato de trocar de passos sem estar atento a isso envolve os circuitos motores subcorticais. Quando falta dopamina, a realização de ações simultâneas fica comprometida. Observe na Figura 4 as áreas envolvidas no processo de estabelecimento da doença de Parkinson e a repercussão das alterações sobre alguns comportamentos: 53 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 FIGURA 4 – DESCRIÇÃO DAS ALTERAÇÕES NAS ÁREAS E ESTRUTURAS ENVOLVIDAS NA DOENÇA DE PARKINSON FONTE: http://bit.ly/2JBoOg0. Acesso em: 20 mar. 2019. 3.2 SINAIS E SINTOMAS MOTORES Os principais sintomas neurológicos encontrados em pacientes com DP são: • Bradicinesia (redução ou perda dos movimentos voluntários); • tremor de repouso; • rigidez; • instabilidade postural. Com a evolução da doença, algumas complicações podem aparecer decor- rentes da combinação dos sintomas típicos: • Oligocinesia – pobreza de movimentos; • Hipocinesia – redução na velocidade, alcance e amplitude dos movimentos; 54 Patologias do Sistema Nervoso Central • Acinesia – dificuldade em iniciar o movimento; • perda de espontaneidade da expressão facial; • alterações musculoesqueléticas como contraturas, fadiga, desenvolvimento de posturas fixas anormais; • distúrbios de marcha; • disfunção da deglutição e da comunicação; • distúrbios visuais e sensório-motores; • alterações cardiopulmonares. 3.3 SINAIS E SINTOMAS NÃO MOTORES • Alterações cognitivas e comportamentais: Valcarenghi (2018) afirma que o declínio intelectual não é evidenciado na do- ença de Parkinson. Porém, Caixeta e Ferreira (2012) defendem que há alterações cognitivas na DP. Para saber mais: GALHARDO, Mônica Maria de Azevedo Mello Carvalho; AMA- RAL, Ana Karênina de Freitas Jordão do; VIEIRA, Ana Cláudia de Carvalho. Caracterização dos distúrbios cognitivos na doença de Parkinson. Revista Cefac, v. 11, n. 2, 2009. • Alterações do sono, da sensibilidade dolorosa, sexuais e autonômicas Estudo de caso Mark S, um homem de 55 anos de idade, procura o seu médico depois de perceber um tremor na mão direita, que apareceu gradualmente nesses últimos meses. Constatou que ele consegue manter a mão imóvel enquanto se concentra nela, mas que o tremor reaparece rapidamente se ele se distrai. Sua caligrafia tornou-se pequena e difícil de ler, e ele está tendo dificuldade em usar o mouse do computador. A esposa queixa-se de que ele deixou de sorrir e que o seu rosto 55 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 se tornou inexpressivo. Declara também que o marido está andando mais lenta- mente e que tem dificuldade em acompanhar o ritmo com que ela anda. Ao vê-lo entrar no consultório, o médico do Sr. S percebe que está andando curvado, com marcha curta e desajeitada. Ao exame físico, o médico constata que o Sr. S apre- senta aumento do tônus e rigidez em roda dentada nos membros superiores, par- ticularmente do lado direito; além disso, é significativamente mais lento do que o normal na execução de movimentos alternados rápidos. O médico conclui que os sinais e os sintomas do Sr. S mais provavelmente representam os estágios iniciais da doença de Parkinson e prescreve então uma prova terapêutica de levodopa (STANDAERT; GALANTER, 2009, p. 166). Atividade de Estudo: Leia atenciosamente o caso do Sr. Mark, descreva os sinais e sinto- mas relacionados no texto e aponte quais são motores e quais são não motores. 3.4 ESTÁGIOS DA DOENÇA DE PARKINSON A doença de Parkinson passa por alguns estágios. Aqui utilizaremos a escala Hoehn & Yahr para melhor compreensão da evolução da doença. Veja a seguir o Quadro 2: QUADRO 2 – ESTÁGIOS DA DOENÇA DE PARKINSON DE ACORDO COM A ESCALA HOEHN & YAHR Escala Hoehn & Yahr Características clínicas Estágio 1 Doença unilateral Estágio 1,5 Doença unilateral e axial Estágio 2 Doença bilateral sem instabilidade postural Estágio 2,5 Doença bilateral Instabilidade postural ligeira com recuperação no teste de retropulsão Estágio 3 Doença bilateral Instabilidade postural ligeira Independência física 56 Patologias do Sistema Nervoso Central Estágio 4 Dificuldade significativa na marcha e estabilidade postural Capaz de deambular sem ajuda Estágio 5 Incapaz de deambular sem ajuda Confinado a cadeira de rodas ou cama FONTE: Adaptado de Shenkam et al. (2001) 3.5 DIAGNÓSTICO Apesar do conhecimento sobre a neuroquímica e dos mecanismos fisiopa- tológicos da DP, não há registro de nenhum marcador biológico que possa ser utilizado no seu diagnóstico. Ademais, os exames de imagem são inespecíficos. Dessa forma, as manifestações clínicas são a principal ferramenta de diagnóstico dessa doença (GALHARDO; AMARAL; VIEIRA, 2009). 3.6 TRATAMENTO • Tratamento farmacológico de sintomas motores: 1. Dopaminomiméticos – Exemplo: levodopa. 2. Inibidores enzimáticos (que atrasam a degradação da dopamina) – Exem- plo: rasagilina, selegilina e entacapone). 3. Antagonistas da via do glutamato – Exemplo: amantadina. 4. Antagonistas da via da acetilcolina ou anticolinérgicos: biperideno e o trihexifenidilo. • Tratamento farmacológico de sintomas não motores; o Tratamento cirúrgico, duodopa e apomorfina. o Psicoterapia. o Reabilitação neuropsicológica. 1. https://super.abril.com.br/saude/parkinson-por-dentro-do-mis- terio/ 2. https://drauziovarella.uol.com.br/envelhecimento/doenca-de- -parkinson-2/ 57 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 Atividades de estudo: 1 A doença de Parkinson está entre as doenças neurodegenerati- vas mais comuns. Analise: I. A rigidez muscular é caracterizada pela resistência ao movimento passivo. II. A taquicinesia é a característica mais comum da doença de Parkinson, que ocasiona a rapidez exacerbada dos movimentos ativos. III. Níveis séricos elevados de dopamina estão associados à Doença de Parkinson. IV. A instabilidade postural e o tremor estão entre as manifestações clínicas principais. É correto o que consta em: a) ( ) I, II e III, apenas. b) ( ) I, II, III e IV. c) ( ) I e IV, apenas. d) ( ) I e III, apenas. e) ( ) I e II, apenas. 2 Paciente de 72 anos, sexo masculino, foi encaminhado à fisiote- rapia com Doença de Parkinson. Algumas características da pa- tologia foram observadas pelo fisioterapeuta em sua avaliação. Em relação à Doença de Parkinson, assinale V para Verdadeiro e F para Falso: ( ) Tremor de repouso, Instabilidade Postural, Bradicinesia e Rigidez são características dos pacientes com Parkinson. ( ) Incoordenação motora e depressão podem ser manifestações se- cundárias da Doença de Parkinson. ( ) A rigidez é uma manifestação clínica mais característica do Parkinson, podendo não estar presente na fase inicial da doença. ( ) Um dos primeiros sintomas da Doença de Parkinson é o Tremor de Repouso, que diminui ou desaparece com o início do movi- mento, acometendo principalmente os membros. a) ( ) F – V – V – V b) ( ) V – F – V – V c) ( ) V – V – V – V d) ( ) V – V – F – V e) ( ) V – F – F – V 58 Patologias do Sistema Nervoso Central 3 Sobre doença de Parkinson podemos AFIRMAR corretamente a alternativa: a) ( ) A doença de Parkinson (DP), ou Mal de Parkinson, é uma do- ença degenerativa, crônica e progressiva, que acomete em geral pessoas idosas. Ela ocorre pela perda de neurônios do SNC em uma região conhecida como substância negra. b) ( ) Os neurônios dessa região sintetizam o neurotransmissor ace- tilcolina, cuja diminuição nessa área provoca sintomas principal- mente motores. c) ( ) A progressão dos sintomas é usualmente rápida e a velocida- de com que essa progressão se desenvolve é bastante variável em cada caso. Os primeiros sintomas da DPtêm início de modo quase imperceptível e progridem rapidamente o que faz com que o próprio paciente ou seus familiares não consigam identificar o início preciso das primeiras manifestações. d) ( ) Os principais sintomas motores se manifestam por tremor, rigidez muscular, aumento da velocidade dos movimentos e dis- túrbios da marcha, mas não do equilíbrio. 4 A incidência da doença de Parkinson vem aumentando nas pes- soas acima de 65 anos. Leia as afirmativas abaixo e marque a opção CORRETA: I. A doença de Parkinson tem causa e cura conhecidas. II. Tremor, rigidez muscular e bradicinesia são manifestações clíni- cas motoras da doença de Parkinson. III. Levodopa-Carbidopa são fármacos utilizados no tratamento da doença de Parkinson. Em relação às afirmativas acima: a) ( ) Apenas a afirmativa I é correta. b) ( ) As afirmativas I e II são corretas. c) ( ) As afirmativas II e III são corretas. d) ( ) As afirmativas I e III são corretas. e) ( ) Todas as afirmativas são corretas. 59 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 4 DOENÇA DE HUNTINGTON Em 2007 foi ao ar a quarta temporada do seriado americano House e uma de suas principais personagens, Remy Hadley (vivida na ficção pela atriz Olivia Wilde), foi diagnosticada com a doença de Huntington – DH. Você se recorda? O seriado não esclareceu sua etiologia, porém mostrou que se tratava de uma doen- ça genética, degenerativa e ainda sem cura. George Huntington foi o precursor na observação das evidências clínicas dessa doença em 1872. George Huntington nasceu em East Hampton, Nova York, EUA, em 1850. Formou-se na Universidade de Columbia em 1871. Os relatos de casos de demência e coreia em pessoas de meia-idade chamaram a atenção do médico. Originada da palavra grega para “dança”, coreia se refere aos movimen- tos involuntários que estão entre os sintomas comuns da DH. Apesar de estudos anteriores aludindo à DH, os estudos de George Huntington caracterizaram com maior precisão os sintomas hoje inferidos à doença. No entanto, seus estudos ativeram-se aos sintomas e a descrição do estilo de vida das pessoas acometidas pela DH. Somente em 1993 que foi descoberta a mutação genética da proteína huntingtina responsável pelo desenvolvimento da DH. QUADRO 3 – SÍNTESE DA HISTÓRIA DE DESCOBERTA E EVOLUÇÃO DO CONHECIMENTO SOBRE A DOENÇA DE HUNTINGTON 1842 Primeira menção à doença. 1872 George Huntington deu a primeira descrição completa da doença baseada em seus estudos de diversas gerações de uma família que exibiu sintomas similares. 1911 Charles Elizabeth publicou o primeiro estudo em que analisou a genealogia de algumas famílias e esses dados foram usados para explicar as idades diferentes do início e a escala dos sintomas associados com o ambiente. 1983 Definição do gene causal. 1993 Descoberta do lugar exato do gene. 1996 Uso de ratos transgênicos para estudo da doença. 1997 Encontrados fragmentos transformados da proteína huntingtina (htt). Atualmente Exames de imagem auxiliam no diagnóstico da doença. FONTE: Januário (2011, p. 3-5) A doença de Huntington – DH ou Coreia é uma doença neurode- generativa, autossômica dominante, que se caracteriza pela perda da coordenação motora, alterações psiquiátricas, declínio cognitivo e de- mência progressiva. Conforme descrição de Afifi e Bergman (2017, p. 211), a DH é “um distúrbio de movimento caracterizado por contrações frequentes, repentinas, involuntárias, despropositadas e rápidas do tron- co, membros e cabeça, associados a expressões faciais”. A doença de Huntington – DH ou Coreia é uma doença neurodegenerativa, autossômica dominante, que se caracteriza pela perda da coordenação motora, alterações psiquiátricas, declínio cognitivo e demência progressiva. 60 Patologias do Sistema Nervoso Central Também caracterizada como uma doença heredodegenerativa, por se tratar de uma afecção que é herdada geneticamente e progressiva, a DH corresponde a perdas neuronais na região dos núcleos da base. Os núcleos da base são um grupo de núcleos interconectados e envolvidos em funções motoras e não mo- toras. São formados pelas seguintes estruturas: o núcleo caudado, o putâmem, o globo pálido, os núcleos subtalâmicos e a substância negra (Figura 5) (AFIFI; BERGMAN, 2017). FIGURA 5 – DESENHO ESQUEMÁTICO APONTANDO AS ESTRUTURAS QUE COMPÕEM OS NÚCLEOS DA BASE FONTE: http://bit.ly/30yWr7z. Acesso em: 22 mar. 2019. Você sabia que a doença de Huntington é apenas uma das va- riações do distúrbio chamado coreia? Há a coreia de Syndeham e a coreia de Huntington. A primeira, benigna e reversível, ocorre em crianças com complicações da febre reumatoide; a segunda, maligna, é um distúrbio genético e progres- sivo que acomete adultos. Ambas têm em comum a característica de apresentarem sintomas relacionados aos distúrbios de movimento. 61 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 As estruturas dos núcleos caudado e putâmen constituem o corpo estriado. Os primeiros são chamados também de estriado, estriado dorsal e neoestriado. O termo pálido e paeloestriado referem-se ao globo pálido. O termo sistema extra- piramidal refere-se aos núcleos da base e a algumas partes do tronco encefálico. Essas estruturas (Figura 6) têm importante papel no controle motor. São funda- mentais na execução automática do plano motor aprendido e na preparação para o movimento, de modo que quando lesionadas resultam em movimentos descoor- denados e desorganizados. FIGURA 6 – DIVISÕES DO CORPO ESTRIADO E NÚCLEO LENTIFORME FONTE: Oliveira (2015, p. 184) Os núcleos da base desempenham importante papel na execução automáti- ca do comportamento motor aprendido e na preparação para o movimento. Além do papel no controle motor, os núcleos da base auxiliam na função cognitiva, como por exemplo, a recuperação da informação episódica e semântica para a memória explícita e em tarefas implícitas que requerem iniciação ou modificação do programa central motor. Danos nessa região resultam em alterações nas tare- fas que requerem memória espacial e também têm sido associados a alterações do humor, bem como transtornos delas decorrentes, por exemplo, depressão e transtorno bipolar (AFIFI; BERGMAN, 2017). Em nível celular, há relatos de redução dos seguintes neurotransmissores e neuropeptídios: ácido gama–aminobutírico (GABA), acetilcolina, encefalina, subs- tância P, dinorfina e colecistocinina. A DH é correlacionada a um defeito genético no cromossomo 4 e associado à deterioração progressiva mental e cognitiva. A mutação consiste em repetições da sequência dos nucleotídeos CAG do gene HD (de Huntington Disease), que codifica a proteína huntingtina (Figura 7). 62 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 7 – DEFINIÇÃO DA PROTEÍNA HUNTINGTINA FONTE: http://www.ehdn.org/pt/about-hd/. Acesso em: 28 fev. 2019. A mutação da huntingtina (Figura 8) gera resíduos poliglutamínicos e essa toxicidade promove degeneração dos neurônios das regiões de sua maior con- centração. Em todas as doenças de poliglutaminas o processo patológico inicia- -se por uma disfunção neuronal causada pela proteína mutada, pelos fragmentos resultantes da proteólise, pela formação de agregados, pelo RNA, isto é, vários fatores todos contribuindo para a alteração da função celular. FIGURA 8 – ESQUEMA DE ALTERAÇÃO QUE OCORRE NA PROTEÍNA HUNTINGTINA POR MEIO DA MUTAÇÃO DO GENE HTT FONTE: http://www.ehdn.org/pt/about-hd/. Acesso em: 4 mar. 2019. 63 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 Os mecanismos fisiopatológicos estão associados à disfunção das regiões do estriado, córtex e do hipotálamo. A DH evidencia-se por meio de uma atrofia gradual do estriado (núcleo caudado e putâmen). A avaliação dos diferentes es- tágios pelos quais perpassa a doença é realizada pela escala desenvolvida por Vonsattel et al. (1985). As manifestações iniciais são sutis e apreendem alteraçõesmotoras e rela- cionadas ao humor, tais como irritabilidade e depressão. Na fase intermediária, a fala e a deglutição são afetadas e, na etapa avançada, há o agravamento até atingir o estado vegetativo. O óbito ocorre devido a problemas respiratórios decor- rentes de infecções ou problemas cardiovasculares. 4.1 DIAGNÓSTICO Segundo Gil-Mohapel e Rego (2011, p. 726), os critérios diagnósticos consi- deram: • Histórico familiar de DH; • Déficit motor progressivo associado a coreia ou rigidez sem outra causa definida; e • Alterações psiquiátricas com demência progressiva, sem outra causa. A anamnese considera o histórico familiar e os exames neurológicos, apesar de não serem suficientes para diagnóstico, permitem excluir outras doenças que possuam sintomas semelhantes. O teste genético também pode ser útil para con- firmar ou excluir o diagnóstico, mas sozinho não confirma se há manifestação da doença. A Figura 9 elenca alguns sintomas identificados na evolução da Doença de Huntington: 64 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 9 – SÍNTESE DOS SINTOMAS IDENTIFICADOS DA DOENÇA DE HUNTINGTON FONTE: http://www.ehdn.org/pt/about-hd/. Acesso em: 28 fev. 2019. 65 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 Atividades de estudo: 1 O que é a Doença de Huntington? 2 Por que a doença é denominada de Huntington? 3 Quais as áreas encefálicas afetadas pela Doença de Huntington? 4 O que causa a Doença de Huntington? 5 Com relação à Doença de Huntington (DH), assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) O tratamento da coreia na DH é feito com agonistas dopa- minérgicos, levando-se em consideração que haveria uma hipo- função dopaminérgica, ao menos relativa, contribuindo para os movimentos coreiformes. b) ( ) A característica anatomopatológica mais marcante na DH é a degeneração do núcleo subtalâmico, acompanhada de perda neuronal evidente no globo pálido medial e lateral. c) ( ) A penetrância na DH, definida como a proporção de portado- res do gene que realmente vão expressar a doença, é de 100%, assumindo que o indivíduo não morra precocemente de outras causas. d) ( ) O início da DH ocorre entre os 25 e 40 anos de idade, podendo, no entanto, apresentar-se mais tarde, em casos raros. Caracteri- za-se por demência progressiva, hipertonia muscular e movimen- tos coreiformes bizarros. e) ( ) Distúrbios de linguagem são comumente encontrados nos pa- cientes com DH e, em geral, são defeitos de nomeação e parafa- sias. Já as alterações da fluência verbal costumam ser incomuns. 5 DOENÇA DE ALZHEIMER A doença de Alzheimer – DA foi descrita inicialmente por um psiquiatra ale- mão, Alois Alzheimer, em meados de 1906. A doença de Alzheimer é a causa mais frequente de demência e, ao contrário das outras afecções do sistema nervoso 66 Patologias do Sistema Nervoso Central citadas neste capítulo, está diretamente relacionada com o processo de envelhe- cimento. Em 1940, a população brasileira era composta por 42% de jovens com me- nos de 15 anos enquanto os idosos representavam apenas 2,5%. No último Cen- so realizado pelo IBGE, em 2010, a população de jovens foi reduzida a 24% do total. Por sua vez, os idosos passaram a representar 10,8% do povo brasileiro, ou seja, mais de 20,5 milhões de pessoas possuem mais de 60 anos, isto representa incremento de 400% se comparado ao índice anterior. A estimativa é de que nos próximos 20 anos esse número mais que triplique (SDH, 2012). O aumento da população idosa chama a atenção para o consequente au- mento na incidência de demências. Para compreender essa relação, é necessário diferenciar o envelhecimento normal do patológico. O envelhecimento normal é caracterizado por ausência de doenças significativas e o patológico por envolver doenças que afetam desfavoravelmente o desenvolvimento biológico e psicológi- co do idoso (TEIXEIRA; NERI, 2008). De acordo com Hamdan (2008) os idosos saudáveis tendem a usar um maior número de palavras para descrever algo, descrever a função do objeto em vez de nomeá-lo, identificar de forma menos precisa os objetos e cometer erros de asso- ciação semântica, quando algo associado ao objeto é nomeado e não o objeto em si. Em outras palavras, podem apresentar uma lentificação do processamento de informação, uma menor capacidade de evocação na memória episódica, diminui- ção da capacidade de inibição e flexibilidade cognitiva. Já as alterações mais graves das funções cognitivas como a me- mória e atenção podem indicar o desenvolvimento de demência. A de- mência (DSM-V, APA 2013) é caracterizada por limitar progressivamen- te as atividades sociais, familiares e profissionais do indivíduo. Dentre as demências existentes, a mais comum é a Doença de Alzheimer. A Doença de Alzheimer é o distúrbio neurocognitivo caracterizado pela deterioração em áreas encefálicas que estão diretamente relacionadas a processos como memória, atenção e atividades da vida diária. Em 2012, a Organização Mundial de Saúde apresentou um rela- tório estimando que haja no mundo aproximadamente 35,6 milhões de pessoas com a Doença de Alzheimer. Comumente confundido com o envelhecimento normal, o diagnóstico da doença tende a ser tardio, dificultando o acompanhamento ao paciente e aos cuidadores. A Doença de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa caracterizada pela morte de células cerebrais com consequente perda das funções cognitivas, como A Doença de Alzheimer é o distúrbio neurocognitivo caracterizado pela deterioração em áreas encefálicas que estão diretamente relacionadas a processos como memória, atenção e atividades da vida diária. 67 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 a memória e atenção. A progressão dos sintomas varia de leve a grave e também de indivíduo para indivíduo. Os primeiros sintomas, que surgem usualmente em torno dos 65 anos, envolvem perda da memória recente e dificuldade de apre- ender novas informações (ABREU; FORLENZA; BARROS, 2005). A DA carac- teriza-se também pela preservação da memória para fatos remotos, ou seja, o estágio inicial da doença é marcado pela amnésia anterógrada (dificuldade de retenção de novas memórias). Apesar de não haver uma explicação para o surgimento da doença, sabe-se que algumas alterações são presentes, como a presença de placas senis advin- das do depósito de proteína beta-amiloide, anormalmente produzida, e os ema- ranhados neurofibrilares, frutos da hiperfosforilação da proteína tau. Outra alte- ração observada é a redução do número das células nervosas (neurônios) e das ligações entre elas (sinapses), com redução progressiva do volume cerebral. As fissuras e sulcos dos hemisférios cerebrais tornam-se mais evidentes em decor- rência da Doença de Alzheimer, devido a atrofia dos giros (AFIFI; BERGMAN, 2017) (Figura 10). Estudos recentes demonstram que essas alterações cerebrais já estariam instaladas antes do aparecimento de sintomas demenciais. Por isso, quando aparecem as manifestações clínicas que permitem o estabelecimento do diagnóstico, diz-se que teve início a fase demencial da doença (LADISLAU; GUI- MARÃES; DE SOUZA, 2015). FIGURA 10 – DESENHO COMPARATIVO DA ESTRUTURA DO ENCÉFALO SAUDÁVEL E DO ENCÉFALO COM DOENÇA DE ALZHEIMER EM ESTÁGIO AVANÇADO FONTE: https://www.alz.org/brain_portuguese/09.asp. Acesso em: 27 fev. 2019. 68 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 11 – IMAGEM DO ENCÉFALO SAUDÁVEL E DO ENCÉFALO COM DOENÇA DE ALZHEIMER EM ESTÁGIO INICIAL FONTE: Garrett et al. (2018, p. 253) As perdas neuronais não acontecem de maneira homogênea. As áreas co- mumente mais atingidas são as relacionadas à memória e funções executivas. Os danos afetam a memória, especialmente a memória semântica, e a capacidade de estabelecer comunicação com os familiares e cuidadores (CECATO, 2010). A memória é uma função cognitiva e apesar de algumas áreas encefálicas a ela associadas, é conhecido quepossui um funcionamento global no que diz res- peito à correspondência neurológica. Assim sendo, os estudos buscam indícios de correlatos no funcionamento cerebral para os comportamentos que tem sua observação prejudicada. Quando a perda de memória é vinculada à dificuldade ou perda da capacidade de reconhecimento, compreender como se dá o processo de reconhecer pode responder questionamentos sobre se há o reconhecimento mes- mo quando o idoso não consegue identificar ou nomear um familiar, por exemplo. Respostas afirmativas para esses questionamentos poderiam provocar mudanças nas relações entre o idoso e seus familiares, com repercussão sobre o cuidado promovido ao idoso. A Doença de Alzheimer é a principal doença neurodegenerativa devido ao grau de incidência entre os idosos. O diagnóstico é provável, pois somente pode ser realizado por meio de exame microscópico do tecido cerebral e que na maioria das vezes só ocorre em exames post mortem. A Doença de Alzheimer é a principal doença neurodegenerativa devido ao grau de incidência entre os idosos. 69 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 Souza e Teixeira (2014) afirmaram que a DA é uma doença multifatorial, po- rém para indivíduos que tenham um familiar de primeiro grau acometido pela do- ença o risco é muito maior do que para os demais. Dessa forma, há os casos de instalação precoce, ou seja, antes dos 60 anos, que advém de um padrão de herança autossômica dominante, e casos sem evidente padrão de herança fa- miliar com incidência mais tardia, comumente depois dos 65 anos. Herança autossômica dominante é aquela em que o afetado é heterozigoto para o gene mutado (Aa) e basta uma cópia do gene para desenvolver a doença, uma vez que o gene A é bastante raro na população e quase nunca serão encontrados afetados com o ge- nótipo AA. Os afetados (Aa) têm 50% de chance de ter filhos (Aa) também afetados pela doença (SMITH, 1999). A condição autossô- mica se refere ao fato de que o gene está presente em algum dos 22 pares de cromossomos autossômicos. Do ponto de vista neuropatológico, a DA é relacionada às alterações na pro- teína tau (emaranhados neurofibrilares) e ao acúmulo extracelular de placas senis (peptídeo beta-amiloide). Uma das principais hipóteses para a patogênese da DA sustenta que a produção em larga escala da beta-amiloide seria a responsável pelo desenvolvimento de lesões cerebrais e da demência. A compreensão da fisiopatologia da DA possibilitou definir os principais bio- marcadores para diagnóstico dessa doença por meio das variações da proteína tau e dos peptídeos beta-amiloides. O uso combinado desses biomarcadores do líquido cerebrospinal permite diferenciar com mais precisão os pacientes com DA dos pacientes controle. Estudar a doença de Alzheimer no laboratório tem sido difícil porque os mo- delos utilizados até agora não duplicam completamente a doença. Os ratos po- dem ser geneticamente modificados para produzir as placas amiloides, mas não os emaranhados neurofibrilares; e culturas de neurônios de cérebros de pacien- tes com Alzheimer produzem amiloide e tau, mas não as placas e emaranhados. Pesquisadores do Massachusetts General Hospital perceberam que as culturas líquidas bidimensionais usadas no laboratório são muito diferentes do ambiente gelatinoso do cérebro, então começaram a usar um gel tridimensional para cul- tivar suas culturas; a isso, eles adicionaram células-tronco que carregavam duas 70 Patologias do Sistema Nervoso Central variantes genéticas conhecidas por causar a doença de Alzheimer (CHOI et al., 2014). Após seis semanas, a cultura tinha tanto a amiloide típica quanto a forma tóxica de amiloide, e estava completa com placas e emaranhados. Quando eles bloquearam a formação de placas, obtiveram a primeira evidência direta de que a formação da placa é um precursor do desenvolvimento dos emaranhados pre- judiciais à sinapse. Os pesquisadores acreditam que esse avanço lhes permitirá rastrear centenas de milhares de novas drogas em potencial para o tratamento da doença de Alzheimer. 5.1 ASPECTOS COGNITIVOS E COMPORTAMENTAIS DA DOENÇA DE ALZHEIMER Segundo Teixeira, Dinis e Malloy-Diniz (2017), a doença de Alzheimer pode ser diferenciada em uma forma típica e em formas atípicas. A amnésia é a forma típica e é esperada na maioria dos pacientes e ocorre a partir dos 65 anos. Com a progressão das alterações neuropatológicas, evoluem também os sintomas cog- nitivos e comportamentais. Essa evolução leva a perda de autonomia e define a fase demencial da doença de Alzheimer. Essa fase é dividida em leve, moderada e grave. A fase leve caracteriza-se pela perda de memória para fatos recentes evidenciada pela incapacidade de re- ter informações novas, por exemplo, esquecer nomes de pessoas que acabou de conhecer ou onde guardou a chave do carro. Na fase moderada, a linguagem e as memórias recentes e remotas são afetadas. O paciente pode se perder dentro da própria casa ou ter dificuldades para se vestir ou higienizar-se. Na fase grave to- das as funções cognitivas estarão significativamente prejudicadas, a pessoa não anda, não se alimenta sozinha, fica totalmente dependente dos cuidadores, está sujeira a infecções, surgimento de feridas e problemas de circulação por passar muito tempo deitada ou sentada. Além das alterações cognitivas, a DA apresenta uma série de sintomas com- portamentais. Os mais frequentes são apatia, depressão e agitação/agressividade (TEIXEIRA; CARAMELLI, 2006). 71 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 5.2 AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA NA DOENÇA DE ALZHEIMER O Miniexame do Estado Mental é o instrumento mais utilizado na prática clí- nica para avaliação cognitiva dos pacientes com demência (TEIXEIRA; DINIS; MALLOY-DINIZ, 2017). É um instrumento breve e de fácil aplicação que apreende a investigação de diversas funções cognitivas como a orientação temporal e es- pacial, memória de registro e evocação, cálculo, linguagem e habilidade visuoes- pacial. O MEEM (Figura 12) é dividido em duas seções. A primeira requer apenas respostas verbais, cobrindo as áreas de orientação espacial e temporal, memória e atenção. A pontuação máxima nesta primeira parte é de 21 pontos. A segun- da parte do teste tem uma pontuação máxima de 9 e avalia as habilidades de nomeação, seguimento de comandos verbais e escritos, escrever uma sentença espontaneamente e copiar um desenho complexo (dois pentágonos). O teste não é cronometrado, e score abaixo de 23 é indicativo de declínio cognitivo (FOLS- TEIN; FOLSTEIN; MCHUGH, 1975). Outras baterias neuropsicológicas que são utilizadas para avaliação dos pa- cientes com DA: • Mattis Dementia Rating Scale (PORTO et al., 2003); • Consortium to Establish a Registry for Alzheimer’s Disease – CERAD (BERTOLUCCI et al., 2001); • Alzheimer’s Disease Assessment Scale-Cognitive Subscale (ADAS-Cog) (SCHULTZ; SIVIERO; BERTOLUCCI, 2001); • Montreal Cognitive Assessment (MEMORIA et al., 2013); • Addenbrooke Cognitive Examination (CARVALHO; BARBOSA; CARA- MELLI, 2010). 72 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 12 – MINIEXAME DO ESTADO MENTAL – MEEN (FOLSTEIN et al., 1975) FONTE: http://www.moreirajr.com.br/images/revistas/8/448/demem_f19.jpg. Acesso em: 1o mar. 2019. 73 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 Atividades de estudo: 1 A doença de Alzheimer é um distúrbio progressivo, afetando prin- cipalmente: a) ( ) A transmissão neuromuscular, a coordenação motora e a ca- pacidade intelectual. b) ( ) A capacidade intelectual e emocional e a coordenação dos movimentos coreiformes involuntários. c) ( ) Os centros cerebrais responsáveis pelo controle e regulação dos movimentos e bradicinesia. d) ( ) A memória, a cognição e a capacidade de autocuidado. e) ( ) A bainha de mielina, a capacidade intelectual e a transmissão neuromuscular.2 A respeito da doença de Alzheimer, assinale a afirmativa CORRE- TA. a) ( ) No início da doença, problemas motores e de marcha são co- muns. b) ( ) Na Doença de Alzheimer, alterações de humor não são co- muns. c) ( ) As tarefas cotidianas e familiares não costumam ser prejudica- das. d) ( ) Não têm ocorrido avanços significativos no diagnóstico precoce da Doença de Alzheimer. e) ( ) Exercícios de lógica, jogos mentais e exercícios físicos podem contribuir para o tratamento. 3 A Doença de Alzheimer vem se tornando comum na população, decorrente ao envelhecimento populacional. Sobre o Alzheimer, é CORRETO afirmar que: a) ( ) É uma doença do cérebro que provoca tremores e dificuldades para caminhar, se movimentar e se coordenar. b) ( ) É uma doença psiquiátrica endógena, que se caracteriza pela perda do contato com a realidade. A pessoa ouve vozes que nin- guém mais escuta e imagina estar sendo vítima de um complô diabólico. c) ( ) Tem início insidioso, perda de memória e declínio cognitivo progressivo. A pessoa apresenta dificuldade para lembrar-se de fatos recentes e para aprender coisas novas, e lembra-se de coi- sas que ocorreram em um passado mais distante. 74 Patologias do Sistema Nervoso Central d) ( ) É o estreitamento dos bronquíolos (pequenos canais de ar dos pulmões) que dificulta a passagem do ar provocando contrações ou broncoespasmos. As crises comprometem a respiração, tor- nando-a difícil. e) ( ) É uma doença psiquiátrica, que se caracteriza pela perda do contato com a realidade e fala desconexa. 4 Correlacione as doenças tratadas neste capítulo (Alzheimer, Parkin- son, Huntington e Esclerose Múltipla) apontando as semelhanças, diferenças e citando as áreas afetadas em cada uma delas. 6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Este capítulo teve por objetivo apresentar os conceitos das principais doen- ças neurodegenerativas do sistema nervoso central. Falamos sobre a esclerose múltipla, doença de Parkinson, doença de Huntington e doença de Alzheimer. O que estas doenças têm em comum é o fato de serem doenças que apresentam degeneração progressiva do sistema nervoso. São doenças cujos tratamentos são paliativos, pois não há ainda cura. Busca-se diagnosticar precocemente para promover intervenções que permitam melhor qualidade de vida para o paciente e seus cuidadores. A esclerose múltipla, com início entre os 20 e 40 anos, é uma doença inflama- tória, crônica e desmielinizante que destrói estruturas do sistema nervoso central por meio de um ataque do sistema imunológico às células nervosas. Apesar de o nome “esclerose” estar associado à expressão “estar esclerosado”, a doença não é uma doença do envelhecimento e a demência não está entre seus sintomas típicos. A doença de Parkinson surge em torno dos 50 anos de idade e tem como principal característica as alterações das respostas motoras, dentre as quais o tremor é o mais amplamente citado quando se fala na doença. A lesão que produz a doença de Parkinson difunde-se por todo sistema nervoso central, mas afeta de forma mais consistente os neurônios dopaminérgicos na substância nigra. A doença de Huntington, que surge por volta dos 40 anos, é uma doença cujo componente genético é evidente, ou seja, se há diagnóstico em algum dos pais, há 50% de chances de que um dos filhos tenha a doença. É uma doença que afe- ta os gânglios da base, com perdas neuronais significativas da área. Esse dano prejudica a capacidade motora, evidencia alterações no pensamento, julgamento 75 Doenças Degenerativas do Sistema Nervoso Capítulo 2 e memória e também pode incidir sobre o humor e as emoções do individua aco- metido por essa doença. A doença de Alzheimer, a causa mais comum de demência do mundo, é uma doença do processo de envelhecimento. Não basta envelhecer para ter, uma vez que há outros tipos de demência, como as resultantes do estilo de vida, acidentes vasculares e traumas, que podem acometer um indivíduo. O que se sabe sobre essa doença envolve o depósito de placas senis sobre os neurônios causando, por meios também metabólicos, a morte do neurônio. Com o avançar da doença, há significativa perda da massa encefálica. A progressão dessas doenças e a correspondente letalidade em que culmina o processo elevam a urgência do conhecimento por parte da comunidade científi- ca e dos profissionais da área da saúde acerca dessas doenças. O conhecimento é necessário para que o diagnóstico seja precoce e preciso, de modo a imple- mentar medidas interventivas de habilitação e reabilitação por meio da atuação do médico, psicólogo, neuropsicólogo e fisioterapeuta e áreas afins. No que tange à neuropsicologia, muito se tem feito para potencializar o pro- cesso de avaliação. A avaliação, que conta com entrevista e uso de baterias de testes e instrumentos psicológicos, tem sido meio importante para atuação inter- disciplinar com foco no paciente e na sua qualidade de vida, bem como na de seus cuidadores. Sugiro que retome os tópicos que não ficaram claros e utilize as ferramentas de busca (Scielo, Pubmed, Google Acadêmico etc.) e aprofunde seu conhecimen- to sobre essas afecções que acometem o sistema nervoso central. Busque tam- bém correlacionar as características das doenças aqui estudadas com os tipos de lesões que tratamos no Capítulo 1. No próximo capítulo, falaremos sobre outras afecções do sistema nervoso, citando também algumas doenças que acometem o sistema nervoso periférico. REFERÊNCIAS ABREU, Izabella Dutra de; FORLENZA, Orestes Vicente; BARROS, Hélio Lauar de. Demência de Alzheimer: correlação entre memória e autonomia. Archives of Clinical Psychiatry, v. 32, n. 3, p. 131-136, 2005. AFIFI, A. K.; BERGMAN, R. A. Neuroanatomia funcional. 2. edição. São Paulo: Roca, 2008. 76 Patologias do Sistema Nervoso Central ALMEIDA, Sara RM et al. Eficiência do treino de equilíbrio na esclerose múltipla. Fisioterapia em movimento, v. 20, n. 2, 2017. ALVES, Gabriel et al. 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Fazer: • diferenciar as afecções de acordo com a estrutura afetada; • correlacionar as doenças com os sintomas apresentados pelo paciente. 82 Patologias do Sistema Nervoso Central 83 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 1 CONTEXTUALIZAÇÃO No Capítulo 1 elencamos algumas estruturas que compõem o sistema ner- voso, falamos sobre sua divisão em Sistema Nervoso Central – SNC e Sistema Nervoso Periférico – SNP, bem como das lesões que podem acometer essas es- truturas. As lesões que acometem o sistema nervoso podem ser de toda ordem: traumas, acidentes vasculares, mutações gênicas, malformações genéticas e tu- mores, por exemplo. No Capítulo 2 falamos sobre as doenças degenerativas e heredodegene- rativas do SNC, a saber: Esclerose Múltipla, Doença de Parkinson, Doença de Huntington e Doença de Alzheimer. As doenças degenerativas decorrem de um processode deterioração de uma área, estrutura ou órgão e as doenças heredo- degenerativas são as que advêm de um processo genético e cuja deterioração é progressiva. No Capítulo 3 nosso foco é fazer um apanhado geral sobre as doenças que agridem o sistema nervoso seja por meio de infecções ou malformações congêni- tas e também falar de uma doença que tem prevalência considerável na popula- ção mundial, a epilepsia. Terminaremos o capítulo apresentando algumas doen- ças que comprometem a funcionalidade de estruturas vinculadas ao SNP. Quando falamos no Capítulo 1 sobre a estrutura do sistema nervoso foi pos- sível perceber quão complexa é a estrutura da qual estamos tratando durante todo esse módulo. E não se trata de uma complexidade apenas a nível estrutural. Já no Capítulo 2, ao tratarmos das doenças que afetam o SNC, você pôde identifi- car o quanto toda e qualquer alteração influencia diretamente a qualidade de vida do paciente e de seus cuidadores. Tudo isso porque o sistema nervoso está co- nectado a outros sistemas e seu funcionamento é afetado por essa relação. Lem- bra-se da doença de Parkinson ou da doença de Alzheimer? As alterações em determinadas regiões encefálicas são responsáveis por desordens na memória, na aprendizagem ou no comportamento motor, ou seja, múltiplas causas, regiões afetadas e consequências. Neste capítulo vamos voltar à origem do sistema nervoso e estudar doenças que começam na formação do sistema nervoso. Vamos falar sobre consequên- cias decorrentes de mudança na descarga elétrica das células nervosas. Também vamos falar sobre doenças que comprometem a periferia do organismo e outras que decorrem de infecções virais e bacterianas, por exemplo. Ao final deste capítulo, espera-se que você consiga visualizar de forma mais ampla o cenário composto pelo sistema nervoso no seu processo de interação com o ambiente interno e externo. 84 Patologias do Sistema Nervoso Central Não tenha receio em investigar e aprofundar o tema, refazer a leitura do ma- terial de apoio e de levar dúvidas para seus tutores. Vamos lá? 2 EPILEPSIA Epilepsia é uma palavra de origem grega que quer dizer “sur- presa”, “evento inesperado”. A epilepsia é conhecida pela medicina há séculos, porém, desde seu aparecimento tem sido relacionada, pelo senso comum, a possessões e maldições. O que ocorre, de fato, é a hiperexcitabilidade de um agrupamento de células nervosas que pro- move um conjunto de sinais e sintomas característicos. Dentre estes, os que são imediatamente relacionados à epilepsia são as convulsões ou a perda súbita de consciência. A epilepsia é um transtorno neurológico em que há predisposição em gerar crises epilépticas sem identificação das causas. Se as crises forem associadas exclusivamente a causas como febre, abstinência alcoólica ou abuso de drogas não são consideradas como indicativo de epilepsia. Na epilepsia ocorrem interrup- ções recorrentes e imprevisíveis do funcionamento normal do cérebro (FRANCIS- CO, 2008) e apresentam importantes consequências neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais. No entanto, nem toda convulsão é uma crise epiléptica e nem toda crise epiléptica denota epilepsia. Thurman et al. (2011, p. 5) definiram a crise epiléptica como a ocorrência transitória de sinais e/ou sintomas decor rentes de atividade neuronal síncrona ou excessiva no cérebro. Esses sinais ou sintomas incluem fenômenos anormais súbitos e transitórios, como alterações da consciência, ou eventos motores, sensitivos/sensoriais, autonômicos ou psíquicos involuntários percebidos pelo paciente ou por um observador. A ativação desordenada das células nervosas desencadeia manifestações clínicas que podem ser parciais ou totais (generalizadas). As que não se enqua- dram nesta divisão são as não classificáveis. Na Figura 1 é possível visualizar os três tipos de crises epilépticas e seus subtipos: Epilepsia é uma palavra de origem grega que quer dizer “surpresa”, “evento inesperado”. 85 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 FIGURA 1 – TIPOS DE CRISES SEGUNDO A CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DAS CRISES EPILÉPTICAS DE 1981 FONTE: Yacubian e Kochen (2014, p. 14) Assista à entrevista com a professora do Departamento de Fi- siologia e Biofísica do Instituto de Ciências Biológicas da Universida- de Federal de Minas Gerais – UFMG, Juliana Tavares: https://youtu. be/EN71Yhw8GnA. No quadro a seguir serão apresentadas algumas das principais característi- cas das crises epilépticas parciais e generalizadas: QUADRO 1 – PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DAS CRISES EPILÉPTICAS PARCIAIS E GENERALIZADAS Crises epilépticas Parciais (Focais ou Locais) Generalizadas Simples: manifestações motoras com iní- cio pelas mãos, pés ou face, sensoriais (dormência e formigamento, por exem- plo), palidez e sudorese ou transtornos psicológicos, com medo e ansiedade. Há preservação da consciência. Ausências: Comprometimento breve de consciência, com manifestações motoras sutis, aumento ou diminui- ção do tônus muscular e sinais autonômicos. As crises de ausência típica normalmente duram em torno de dez segundos, embora variem entre quatro e 20 segundos. Na ausência típica ocorre um estado confusional. https://youtu.be/EN71Yhw8GnA https://youtu.be/EN71Yhw8GnA 86 Patologias do Sistema Nervoso Central Complexas: com alteração da consciên- cia desde o início. Mioclônicas: ocorrem contrações musculares breves com duração menor que 200 milissegundos. Afetam grupos musculares diferentes e não são rítmicas. Secundariamente generalizadas: com alteração da consciência após o início parcial simples. Atônicas: ocorre perda do tônus postural, ocasionando a queda do paciente. Tônicas: A crise tônica consiste na contração muscular usualmente com duração superior a dez segundos. Po- dem ser breves e conscientes e longas e inconscientes. Tônico – clônicas: A crise tônico-clônica consiste nes- tas duas fases bem definidas. Na fase inicial, tônica, o paciente estende os membros supe riores e inferiores, mantendo os braços aduzidos e cruzados em frente ao corpo. Outra característica é o sinal de quatro (4) em que um dos braços fica estendido e o outro com o coto- velo dobrado e as mãos no sentido do braço estendido. As crises epilépticas focais são as que ocorrem em apenas um dos hemisférios. As generalizadas, as que ocorrem nos dois hemisférios. FONTE: Adaptado de Yacubian e Kochen (2014, p. 14) As crises epilépticas focais são as que ocorrem em apenas um dos hemisférios. As generalizadas, as que ocorrem nos dois hemisférios. É possível também compreender a epilepsia focando nos lobos encefáli- cos em que ocorrem. A epilepsia do lobo temporal é a forma mais comum de epilepsia no adulto e corresponde em sua maior parte às epilepsias focais. Já as epilepsias que ocor- rem no lobo frontal são as mais difíceis de diagnosticar, além da dificuldade em delimitar o local em que as crises originam. Estas, no entanto, são breves e apre- sentam início e final súbitos, com tendência à generalização secundária. Como diferenciar uma crise epiléptica da própria epilepsia? Em 2005, a International League Against Epilepsy (ILAE) propôs que a epi- lepsia requer a ocorrência de pelo menos uma crise epiléptica, desde que haja indícios de alterações eletroencefalográficas ou lesão cerebral (FISHER et al., 2005). Porém, em 2014, afirmou que a epilepsia é uma doença do sistema nervo- so caracterizada por uma das seguintes condições: • No mínimo duas crises não provocadas e com intervalo superior a 24 horas. • Uma crise não provocada e alta probabilidade de nova ocorrência. • Diagnóstico de uma síndrome epiléptica. 87 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 Síndrome epiléptica: é definida como um distúrbio epiléptico ca- racterizado por um con junto de sinais e sintomas que habitualmente ocorrem juntos. Os sinais e sintomas po dem ser clínicos (por exemplo, história,tipos de crises, modos de ocorrência das crises e achados neurológicos e psicológicos) ou alterações detectadas por exames complementares (eletroencefalograma, tomografia computadorizada e ressonância magnética do encéfalo) (FISHER et al., 2014). Em síntese, a crise epiléptica é a ocorrência transitória da síndrome epilép- tica e a epilepsia, a ocorrência persistente das crises epilépticas. Essa persistên- cia, porém, diz respeito à alta probabilidade de reincidência da crise. Não a sua ocorrência o tempo todo. Para esclarecer... A síndrome epiléptica é o conjunto de sinais e sintomas que são encontrados na crise epiléptica e caracterizam a ocorrência provável da epilepsia. Apesar de ser relacionada imediatamente à epilepsia, a síndro- me epiléptica por si só não garante o diagnóstico de epilepsia. Algumas dessas alterações são encontradas durante o sono e na síndrome de Landau-Kleffner, uma doença de causa desconhecida, porém associada à exposição a vírus ou ocorrência de traumatismo craniano. Para saber mais sobre a Síndrome de Landau-Kleffner: http:// epilepsia.org.br/wp-content/uploads/2017/05/Epilepsia-na-infancia- -Material-01.pdf 2.1 DIAGNÓSTICO O diagnóstico de epilepsia é concretizado por meio da anamnese. Deve-se determinar a idade de início dos sintomas, possível histórico familiar de epilepsia A síndrome epiléptica é o conjunto de sinais e sintomas que são encontrados na crise epiléptica e caracterizam a ocorrência provável da epilepsia. http://epilepsia.org.br/wp-content/uploads/2017/05/Epilepsia-na-infancia-Material-01.pdf http://epilepsia.org.br/wp-content/uploads/2017/05/Epilepsia-na-infancia-Material-01.pdf http://epilepsia.org.br/wp-content/uploads/2017/05/Epilepsia-na-infancia-Material-01.pdf 88 Patologias do Sistema Nervoso Central (alguns casos são relacionados à genética), frequência e intervalos entre as cri- ses e as demais situações associadas ao evento. Por meio de exames de imagem e de eletroencefalograma é averiguada a existência de malformações ou tumores do sistema nervoso central. Os registros apontam que as crises epilépticas são associadas à presença de traumatismo cranioencefálico, doenças genéticas, mal- formações corticais, infecções e tumores no sistema nervoso central. No entanto, a epilepsia não tem uma causa comum. Sua etiologia pode ser de ordem genéti- ca, metabólica ou estrutural e também de causa desconhecida. Você Sabia? No dia 26 de março é celebrado o Dia Mundial de Conscienti- zação da Epilepsia. Popularmente conhecido como Purple Day (Dia do Roxo), tem por objetivo conscientizar a população mundial sobre a síndrome. Essa data foi criada em 2008 por Cassidy Megan, uma criança na época com nove anos, que vivia em Nova Escócia, no Canadá, com a ajuda da Associação de Epilepsia da Nova Escócia (EANS). A menina escolheu a cor roxa para representar a epilepsia por causa da lavanda. Essa flor é geralmente associada à solidão, que representa os sentimentos de isolamento que muitas pessoas com epilepsia sentem. FONTE: https://www.epilepsiabrasil.org.br/noticias/purpla-day-dia-mundial- de-conscientizacao-da-epilepsia. 2.2 AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DA EPILEPSIA De acordo Teixeira e Caramelli (2010), a avaliação neuropsicológica no con- texto da epilepsia busca averiguar a presença e gravidade das alterações cog- nitivas, além de auxiliar na localização da região com predominância das crises epilépticas e sugerir os procedimentos terapêuticos. 2.3 TRATAMENTO Os medicamentos ministrados durante o tratamento da epilepsia têm por ob- jetivo bloquear as descargas elétricas anormais que ocorrem no sistema nervoso 89 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 e que são responsáveis pela manifestação da doença. Devido à imprevisibilidade da ocorrência das crises, os medicamentos têm que ser de uso regular e contínuo e com o devido acompanhamento médico. A adesão ao tratamento é fator crucial para o controle das crises. YACUBIAN, Elza Márcia Targas. Epilepsia e estigma. São Pau- lo: Casa Leitura Médica, 2010. Disponível em: http://bit.ly/2JB7vLU Atividades de estudos: 1 Para o diagnóstico de epilepsia, a ocorrência da crise epiléptica é um dos determinantes. Porém, nem toda crise epiléptica é epilep- sia. Explique com suas palavras essa frase. 2 Em sua opinião, como a atuação do neuropsicólogo em rede in- terdisciplinar pode beneficiar o paciente? 3 DOENÇAS INFECCIOSAS DO SISTEMA NERVOSO O sistema nervoso – SN tem características anatômicas e fisiológicas que oferecem proteção tornando-o menos suscetível às ações de agentes externos como traumas e infecções. Essa proteção é tanto estrutural quanto funcional. Es- truturalmente, o SN conta com proteção óssea (crânio e coluna vertebral). Funcio- nalmente, possui um sistema especializado de auto-regulação do fluxo sanguíneo cerebral e possui o líquor ou líquido cefalorraquidiano – LCR, que serve como amortecedor para o encéfalo e medula espinal e também fornece nutrientes e re- move os resíduos metabólicos do tecido nervoso. Apesar dessas características, o sistema nervoso pode vir a ser atingido por infecções. As infecções podem ser causadas por vírus, bactérias, fungos e, por 90 Patologias do Sistema Nervoso Central vezes, protozoários. A transmissão pode ocorrer por disseminação hematogêni- ca por meio de entrada pela circulação arterial após perfuração de um vaso e também por implantação direta do microorganismo em decorrência de trauma ou secundário à infecção de seio da face, dentes ou localização cirúrgica. Quais agentes etiológicos podem causar as infecções do sistema nervoso? 3.1 ENCEFALITES As infecções podem causar inflamação do encéfalo. A inflamação decorrente de infecção encefálica é chamada de encefalite. As inflamações mais comuns são as causadas por vírus. O vírus pode infectar o sistema nervoso diretamente. Há, porém, a possibilidade de a inflamação ser ativada por um vírus que causou infecção anteriormente ou por uma vacina que provoca reação do sistema imuno- lógico e este danifica o sistema nervoso. Se a medula espinal também for afetada, há o diagnóstico de encefalomielite. As infecções causadas por bactérias também podem causar infla- mação do sistema nervoso central. Além de vírus e bactérias, os pro- tozoários que causam a toxoplasmose ou malária podem desencadear a encefalite. Um caso raro é a encefalite que acomete pessoas com câncer, conhecida por encefalite paraneoplásica, uma resposta imuno- lógica ao tumor. Há vários tipos de encefalite: • Encefalite epidêmica • Encefalite La Crosse • Encefalite equina oriental • Encefalite do Nilo ocidental • Encefalite de St. Louis • Encefalite equina ocidental • Encefalite transmitida por carrapato • Encefalites por vírus: a) Vírus Chikungunya b) Vírus da encefalite japonesa c) Encefalite equina venezuelana d) Vírus Zika • Encefalite esporádica a) Vírus herpes simples b) Raiva c) HIV A inflamação decorrente de infecção encefálica é chamada de encefalite. 91 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 • Reativação de uma infecção anterior • Encefalite autoimune As encefalites têm manifestações clínicas que se iniciam na apresentação de sintomas digestivos ou outros similares aos sintomas de gripe, como tosse, febre, dor de garganta, nariz escorrendo, por exemplo. Outros sintomas característicos são a presença de cefaleia, confusão mental, paralisia, alteração da sensibilidade tátil e sonolência. Os sintomas apontam para a formulação da hipótese diagnóstica, porém o diagnóstico final ocorre por meio de exames de imagem e também pela punção lombar. Os exames de imagem buscam detectar alterações no encéfalo e ajudam na exclusão de doenças com sintomas semelhantes, como acidente vascular cere- bral ou tumor. É realizada uma punção lombar para obter uma amostra do líquido cefalorraquidiano, que passa pelas meninges (entre a aracnoide e pia-máter)que recobrem o SNC. Normalmente, o líquido cefalorraquidiano contém poucos gló- bulos brancos. Quando o encéfalo e as meninges estão inflamados, aumenta o número de glóbulos brancos no líquido cefalorraquidiano. Para o tratamento da encefalite são utilizados medicamentos antivirais, anti- bióticos, corticoides e outros fármacos que minimizem os sintomas, além de im- plementação de medidas interdisciplinares com atendimento promovido por psicó- logos, neuropsicólogos, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, por exemplo, que auxiliem o processo de reabilitação ou suporte de vida, quando necessário. 3.2 MENINGITE A meningite é o processo inflamatório que ocorre nas membra- nas que envolvem o encéfalo e a coluna vertebral. Essas membranas são as meninges (Figura 2). Quando a infecção é generalizada sobre o encéfalo, coluna vertebral e sobre as meninges, é chamada de me- ningoencefalite. A meningite é o processo inflamatório que ocorre nas membranas que envolvem o encéfalo e a coluna vertebral. 92 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 2 – DISTRIBUIÇÃO DAS MENINGES ENCEFÁLICAS E MENINGES ESPINAIS FONTE: http://bit.ly/2xTXXoK. Acesso em: 6 fev. 2019. Os principais agentes etiológicos são as bactérias, os vírus e os fungos. Ou- tros parasitas causadores das inflamações são o cisticerco e o Toxoplasma, res- ponsáveis pela cisticercose e toxoplasmose, dentro outros. O principal sintoma da meningite é a dor de cabeça associada com a rigidez do pescoço. Sintomas associados são febre, vômito e intolerância a ruídos altos e à luz. Cisticerco: É a larva gerada por ovos da Taenia solium, um pa- rasita comumente presente na carne de porco. Pessoas podem ingerir frutas, verduras e legumes contaminados pela Taenia solium, os ovos chegam ao intestino, rompem e liberam a larva (cisticerco) e estas atingem outros órgãos, inclusive o cérebro, pela corrente sanguínea. O processo de contaminação se inicia quando alimentos entram em contato com fezes humanas que possuem os ovos da Taenia solium. As meningites bacterianas caracterizam-se por um processo inflamatório do espaço subaracnóideo e das membranas aracnóide e pia-máter (Figura 4) que envolvem o encéfalo e a medula espinal (DE FARIA; FARHAT, 1999). 93 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 FIGURA 4 – MEMBRANAS DO SISTEMA NERVOSO POR MEIO DE UM CORTE ENCEFÁLICO FONTE: https://www.msdmanuals.com/Content/Images/no-copy.png. Acesso em: 20 mar. 2019. A meningite viral é uma alteração neurológica que geralmente evolui de forma benigna. Pode acometer pessoas de todas as idades, sendo mais comum em pes- soas menores de cinco anos (PERES et al., 2006). Os vírus que causam a menin- gite asséptica (como é chamada a meningite em que não há presença de pus) são: • Enterovírus; • Vírus do herpes simples; • Vírus transmitidos por mosquitos; • Vírus da coriomeningite linfocítica; • Vírus da imunodeficiência humana (HIV). 3.3 INFECÇÕES SUPURATIVAS FOCAIS AGUDAS As infecções supurativas focais agudas são resultantes de inflamações do sistema nervoso e são distinguidas pela região que a coleção purulenta é visu- alizada. Essas infecções atingem as membranas, assim como a meningite. No entanto, ao contrário da meningite, em que ocorre a inflamação da membrana completamente, quando a infecção se restringe a determinada área é chamada de empiema, processo inflamatório que preenche determinado espaço ou absces- so com pus, parecidos com furúnculos e que podem aparecer em qualquer parte do corpo, inclusive no encéfalo. 94 Patologias do Sistema Nervoso Central 3.3.1 Abscesso cerebral Resultado de uma inflamação encefálica que se torna necrótica e circundada por um edema (Figura 5). Trata-se de um encapsulamento por células da glia e fibroblastos. Pode ser causado por uma disseminação direta de infecções crania- nas (por exemplo, sinusite), por ferimentos que envolvem incisão do crânio (aci- dentes, agressão com instrumentos perfurocortantes ou procedimentos neuroci- rúrgicos), dentre outras causas. Para diagnóstico, não se realiza punção lombar, apenas exames de imagem. FIGURA 5 – ABSCESSOS CEREBRAIS VISUALIZADOS POR MEIO DE RESSONÂNCIA MAGNÉTICA FONTE: Adaptada de http://www.medicinanet.com.br/ imagens/20161109092416.png. Acesso em: 20 mar. 2019. 3.3.2 Empiema Subdural Localizado entre a dura-máter e a aracnoide (Figura 6), é uma constituição purulenta que resulta de uma infecção dos ossos cranianos. O empiema é menos comum do que o abscesso cerebral (BRAGA et al., 2006). 95 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 FIGURA 6 – EMPIEMAS SUBDURAIS VISUALIZADOS POR MEIO DE RESSONÂNCIA MAGNÉTICA FONTE: Adaptada de http://bit.ly/2Lr0uzA. Acesso em: 20 mar. 2019. 3.3.3 Abscesso Epidural Composição purulenta entre a dura-máter e os ossos do crânio, decorrentes de infecções (Figura 7). FIGURA 7 – ABSCESSOS EPIDURAIS VISUALIZADOS POR MEIO DE RESSONÂNCIA MAGNÉTICA FONTE: Adaptada de http://bit.ly/2SkwyWl. Acesso em: 20 mar. 2019. 96 Patologias do Sistema Nervoso Central Sobre a meningite, leia a entrevista com o Dr. Esper Kallás, mé- dico infectologista da Universidade Federal de São Paulo, em: https:// drauziovarella.uol.com.br/entrevistas-2/meningite-entrevista/ Atividades de Estudo: 1 Diferencie as encefalites e as meningites. _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ 2 Pesquise sobre a raiva e enquadre-a no tipo de infecção que aco- mete o sistema nervoso. Explique de forma resumida o que en- controu. _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ https://drauziovarella.uol.com.br/entrevistas-2/meningite-entrevista/ https://drauziovarella.uol.com.br/entrevistas-2/meningite-entrevista/ 97 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 3 Como o neuropsicólogo pode atuar diante de diagnósticos de in- fecções do sistema nervoso? _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ 4 MALFORMAÇÕES CONGÊNITAS E ANORMALIDADES DO DESENVOLVIMENTO Anomalia congênita é todo defeito funcional ou estrutural, presente no momento do nascimento ou que se manifesta em etapas mais avançadas da vida. As causas estão ligadas a eventos que precedem ao nascimento, podendo ser herdadas ou adquiridas. Os principais fatores etiológicos são representados pelas condições hereditárias (genéticas), exposição a subs- tâncias químicas(medicamentos, álcool e drogas ilícitas), infecções (cito- megalovirose, rubéola e toxoplasmose) e radiações, sendo na maioria das vezes por razões desconhecidas (DE MELO et al., 2010). De acordo com Castro et al. (2006), uma malformação congênita pode ser analisada conforme a gravidade. Nesse caso, é observado se há consequências que afetam a vida funcional e social do indivíduo. Esse tipo é o mais grave e onde se enquadram a anencefalia, hidrocefalia e a fenda labial e palatina. Quando não há alteração significativa para vida funcional do indivíduo, as malformações são consideradas de menor gravidade. Entre estas estão a clinodactilia do quinto dedo, polidactilia e prega simiesca. Algumas alterações podem ser estruturais, ou seja, há uma alteração cro- mossômica que afeta a formação de órgãos, peles e tecidos. Um exemplo dessa alteração é a Síndrome do Cri Du Chat ou Síndrome do miado de gato. Nesta sín- drome uma parte do cromossomo 5 é ausente (MACHADO et al., 2007). Outras alterações são decorrentes da formação disfuncional de algum membro, como é o caso do nanismo ou acondroplasia (MEDINA et al., 2008). Há também alterações Anomalia congênita é todo defeito funcional ou estrutural, presente no momento do nascimento ou que se manifesta em etapas mais avançadas da vida. 98 Patologias do Sistema Nervoso Central que são metabólicas, como é o caso da Síndrome da Rubéola Congênita (COSTA et al., 2013). Essas características de alterações podem apresentar-se conjunta- mente, sendo que algumas delas são hereditárias, passíveis de serem passadas à próxima geração. Essas malformações têm repercussões sobre o sistema nervoso, uma vez que a maioria delas resulta em deficiência intelectual e retardo no desenvolvi- mento. Apesar disso, falaremos neste momento daquelas que são específicas do sistema nervoso, ou seja, as que acontecem por defeitos no tubo neural, no pro- sencéfalo, no tronco cerebral e cerebelo, por falha de neurogênese (migração e diferenciação das células neurais). Faça uma pesquisa sobre a Organogênese do sistema nervoso. 4.1 DEFEITOS DE FECHAMENTO DE TUBO NEURAL (DFTN) As malformações congênitas podem decorrer devido a uma falha no fecha- mento do tubo neural na quarta semana da embriogênese e são causadas por multifatores. São associadas à falta de ácido fólico no primeiro trimestre de gesta- ção, a Diabetes mellitus materna, uso de medicamentos para o tratamento de epi- lepsia, obesidade materna, deficiência de zinco, entre outros. São considerados defeitos com alta gravidade devido às altas taxas de morbidade e mortalidade. Os tipos mais comuns são a anencefalia e a mielomeningocele ou espinha bífida. Na anencefalia há uma falha no fechamento da extremidade anterior do tubo neural e na mielomeningocele, a falha no fechamento é na extremidade caudal, gerando nesta a alteração na coluna vertebral. Há dois tipos de anencefalia: a meroacrania (Figura 8) e a holocrania (a anencefalia propriamente dita). Na primeira, há preservação de algumas funções vegetativas apesar da malformação do crânio e do cérebro anterior. Na segunda, há falha no fechamento da parte posterior do cérebro e a gravidade pode variar de um caso para outro. 99 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 FIGURA 8 – APRESENTAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO NORMAL E DOS DOIS TIPOS DE ANENCEFALIA FONTE: http://bio-neuro-psicologia.usuarios.rdc.puc-rio.br/embriologia- do-sistema-nervoso.html. Acesso em: 20 mar. 2019. A mielomeningocele é a forma mais leve dos defeitos de fechamento do tubo neural, podendo ocorrer em qualquer nível da coluna vertebral. Alguns casos são assintomáticos e outros estão associados a outras malformações em qualquer extensão do corpo. 4.1.1 Hidrocefalia Hidrocefalia (hidro = água + céfalo = cabeça) é uma condição que se carac- teriza pelo acúmulo do líquido cefalorraquidiano nos ventrículos cerebrais e no espaço subaracnoide entre as membranas aracnoide e pia-máter das meninges, cuja dilatação pode comprometer os ventrículos laterais. Pode ser congênita ou adquirida. 4.1.2 Malformação arteriovenosa A malformação arteriovenosa é uma lesão congênita derivada do desenvol- vimento anormal da vascularização circular fetal. É uma lesão rara, podendo ser assintomática. É diagnosticada durante o desenvolvimento, em qualquer idade, provocando diversas manifestações clínicas (hemorragia intracraniana ou epilep- sia são as mais comumente encontradas) (GUIOTOKU et al., 1999). 100 Patologias do Sistema Nervoso Central Diagnóstico de malformações congênitas: impactos sobre a saú- de mental de gestantes DA CUNHA, Ana Cristina Barros et al. Diagnóstico de malforma- ções congênitas: impactos sobre a saúde mental de gestantes. Estu- dos de Psicologia, v. 33, n. 4, p. 601-611, 2016. Disponível em: http://bit.ly/32BjQay Casais que recebem um diagnóstico de malformação fetal no pré-natal: uma reflexão sobre a atuação do psicólogo hospitalar MACHADO, Maria Eugênia da Costa. Casais que recebem um diagnóstico de malformação fetal no pré-natal: uma reflexão sobre a atuação do Psicólogo Hospitalar. Revista da SBPH, v. 15, n. 2, p. 85-95, 2012. Disponível em http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rsbph/v15n2/v15n2a07.pdf Atividades de estudo 1 Qual a diferença entre malformação congênita e adquirida? 2 Escolha uma malformação congênita do sistema nervoso e pes- quise sobre o papel da neuropsicologia em sua avaliação, diag- nóstico e acompanhamento. 5 DOENÇAS QUE AFETAM O SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO As manifestações clínicas dos distúrbios do sistema nervoso periférico – SNP apresentam sintomas motores, sensoriais e autonômicos de acordo com http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rsbph/v15n2/v15n2a07.pdf 101 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 as fibras nervosas afetadas e com a localização das lesões. Se afetam nervos (Figura 9) isolados, as doenças do SNP são chamadas de mo- noneuropatias. Se há um envolvimento difuso do SNP, são chamadas de polineuropatias. FIGURA 9 – DISPOSIÇÃO DOS NERVOS CRANIANOS NO SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO FONTE: https://brasilescola.uol.com.br/biologia/doze-pares- de-nervos.htm. Acesso em: 20 mar. 2019. As mononeuropatias cranianas podem surgir em qualquer nervo craniano in- dividualmente. Observe no Quadro 2, as possíveis causas e efeitos das lesões em cada um dos nervos descritos: QUADRO 2 – RELAÇÃO DAS POSSÍVEIS CAUSAS E EFEITOS DAS LESÕES NOS NERVOS CRANIANOS Se afetam nervos (Figura 9) isolados, as doenças do SNP são chamadas de mononeuropatias. Se há um envolvimento difuso do SNP, são chamadas de polineuropatias. Nervo craniano Efeitos da lesão Causas Olfatório (I) Perda da percepção do cheiro Traumatismo, meningioma da fenda olfatória Óptico (II) Perda da visão (monocular) Neurite óptica, tumor da hipófise, neuropatia óptica isquêmica, glioma do nervo óptico, doença de Leber 102 Patologias do Sistema Nervoso Central Oculomotor (III) Enfraquecimento da adução, elevação e depressão do olho Ptose Pupila dilatada e não reativa Traumatismo, isquemia microvascular, compressão por aneurisma ou massa, tumor ou AVC afetando o tronco encefálico, tumor orbital Troclear (IV) Enfraquecimento da depres- são e torção do olho Traumatismo, isquemia microvascular, tumor ou AVC afetando o tronco encefálico, tumor orbital Trigêmeo (V) Enfraquecimento do movi- mento de mastigação e outros movimentos mandibulares Perda da sensibilidade facial e do reflexo corneal Neuralgia do trigêmeo (tic douloureux), esclerodermia e outras doenças do tecido conectivo, tumor do osso petroso Abdutor (VI) Enfraquecimento da abdução do olho Traumatismo, pressão intracraniana elevada, isquemia microvascular, tumor ou AVC afe- tando o tronco encefálico, tumor orbital Facial (VII) Enfraquecimento de metade da face Perda do paladar Hiperacusia Paralisia de Bell, doença de Lyme, sarcoido- se, herpes zóster, tumorno ângulo cerebe- lopontino, tumor ou AVC afetando o tronco encefálico Vestibulococlear (VIII) Surdez unilateral Vertigem Nistagmo Neuronite vestibular, schwanoma acústico Glossofaríngeo (IX) Disfagia Enfraquecimento da elevação do palato Perda do reflexo da ânsia Doença neuronal motora, tumor no forame jugular, carcinoma nasofaríngeo, metástases para a base do crânio, neuralgia do glosso- faríngeo Vago (X) Disfagia Disartria Enfraquecimento da elevação do palato Perda do reflexo da ânsia Doença neuronal motora, tumor no forame jugular, metástases para a base do crânio, carcinoma nasofaríngeo Acessório (XI) Enfraquecimento dos múscu- los esternocleidomastoideo e trapézio Traumatismo (cirúrgico e outros), tumor no forame jugular Hipoglosso (XII) Enfraquecimento da língua Doença neuronal motora, tumor na base no crânio, traumatismo ou dissecção da artéria carótida FONTE: Adaptado de http://www.medicinanet.com.br/conteudos/acp- edicine/5390/doencas_do_sistema_nervoso_periferico_%E2%80%93_ colin_h_chalk.htm. Acesso em: 19 mar. 2019. 103 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 5.1 NEUROPATIA FACIAL O principal sintoma é a sensação de enfraquecimento unilateral da face, com surgimento repentino e que pode ser acompanhado de dor atrás da orelha. A neu- ropatia facial pode ser precedida de alguma infecção leve no aparelho respiratório superior. A maioria dos casos apresenta recuperação total, porém há alguns regis- tros de sequelas como espasmos hemifaciais, alteração do paladar ou paralisia facial total. 5.1.1 Neuralgia do trigêmeo A neuralgia do trigêmeo é uma síndrome de dor facial que acomete pacientes a partir da meia idade. Os sintomas envolvem dor intensa e espasmos que se manifestam várias vezes ao dia. A dor localiza-se na região maxilar e mandibular, sendo confundida com dor de dente. Há dificuldade na realização de exames em decorrência da dor e dos espasmos serem deflagrados pelo procedimento. 5.1.2 Neuropatia oculomotora As paralisias do III nervo craniano apresentam como sintomas usuais a diplo- pia (a percepção de duas imagens de um único objeto) e a cefaleia. O diagnós- tico diferencial é complexo, porém uma compressão do nervo por um aneurisma (ou alguma massa em crescimento) ou uma lesão que provoque isquemia são as principais relações estabelecidas para a ocorrência da doença. 5.2 MONONEUROPATIAS DE NERVOS DOS MEMBROS É uma doença de incidência comum decorrente de uma compressão mecâ- nica do nervo. 5.2.1 Síndrome do túnel do carpo A síndrome do túnel do carpo é causada pela compressão do nervo mediano quando este atravessa o túnel localizado no punho, que é formado pelos ossos do carpo ao nível inferior e pelo ligamento do carpo ao nível superior (Figura 10). 104 Patologias do Sistema Nervoso Central FIGURA 10 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO TÚNEL DO CARPO FONTE: http://ortomedicamooca.com.br/wp-content/uploads/2017/10/ tunel-do-carpo2-1.jpg. Acesso em: 19 mar. 2019. 5.2.2 Neuropatia ulnar A neuropatia ulnar resulta de uma compressão do nervo cubital ou nervo ul- nar (Figura 11). O nervo ulnar origina-se no plexo braquial, na região C8-T1 da coluna vertebral e desce pelo braço em linha contínua passando pelo cotovelo e seguindo em direção à mão onde ramifica para os músculos flexor ulnar do carpo e flexor profundo do 4º e 5º dedos. FIGURA 11 – APRESENTAÇÃO DO NERVO ULNAR EM TODA A SUA EXTENSÃO FONTE: http://fisioterapiaelainedaltoe.com.br/wp-content/ uploads/2016/01/ulnar.jpg. Acesso em: 21 mar. 2019. 105 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 Os pacientes apresentam diversos sintomas motores e sensoriais. O enfra- quecimento é um sintoma que acomete principalmente as mãos. O diagnóstico da doença e a localização da lesão são melhor proferidos a partir de exames eletro- fisiológicos e de imagem. Este tipo de neuropatia é causado por danos na região do cotovelo ou pela sustentação de peso nas mãos, como no uso de apoiador ou de bicicleta por tempo prolongado. Na maioria dos casos há recuperação, porém nos poucos casos em que os sintomas são progressivos, mesmo após terapia, passa-se a considerar procedimentos cirúrgicos. 5.2.3 Neuropatia do plexo braquial A neuropatia do plexo braquial (Figura 12) ou amiotrofia neurálgica manifes- ta-se por uma dor severa localizada no ombro e não há fator causador evidente. O quadro evolui apresentando enfraquecimento do braço, mas com tratamento a recuperação é gradual. Aponta-se a ocorrência de inflamação na região que justi- fique a dor, além de alguns casos da forma autossômica dominante caracterizada pela presença de dor e enfraquecimento recorrentes do braço. FIGURA 12 – APRESENTAÇÃO DO PLEXO BRAQUIAL FONTE: Adaptado de https://www.neurologica.com.br/Index/wp-content/ uploads/2018/10/lesoes-no-plexo-braquial.jpg. Acesso em: 21 mar. 2019. 106 Patologias do Sistema Nervoso Central 5.2.4 Neuropatia peroneal A neuropatia peroneal é o resultado de uma lesão no nervo peroneal (Figura 13). Os ramos peroneais distais são superficiais ao nível do tornozelo, onde às vezes são comprimidos por calçados apertados. FIGURA 13 – APRESENTAÇÃO DO NERVO PERONEAL EM TODA A SUA EXTENSÃO FONTE: https://image.slidesharecdn.com/auladedor-110209150454-phpapp02/95/ introduo-a-dor-33-728.jpg?cb=1298200484. Acesso em: 21 mar. 2019. 5.2.5 Meralgia parestésica A meralgia parestésica apresenta sintomas de perda sensorial, formigamento e hipersensibilidade sobre a região anterolateral da coxa e é atribuída à com- pressão do nervo cutâneo lateral (Figura 14), sendo comum em obesos devido à pressão no ligamento inguinal. 107 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 FIGURA 14 – APRESENTAÇÃO DO NERVO PERONEAL EM TODA A SUA EXTENSÃO FONTE: http://www.rbcp.org.br/imagens/v31n1a21-fig01.jpg. Acesso em: 21 mar. 2019. 5.2.6 Plexopatia lombossacral A plexopatia lombossacral tem como principal sintoma o aparecimento de dor contínua e severa na região anterior da coxa (Figura 15). As lesões dos nervos femoral, cutâneo lateral femoral e obturador, podem ocorrer após intervenções cirúrgicas pélvicas ou traumas. FIGURA 15 – APRESENTAÇÃO DOS PLEXOS LOMBAR E SACRAL NA REGIÃO ANTERIOR DA COXA FONTE: https://msdmnls.co/2K01rM7. Acesso em: 21 mar. 2019. 108 Patologias do Sistema Nervoso Central 5.3 POLINEUROPATIAS A polineuropatia é uma disfunção de vários nervos periféricos que podem advir de infecções, toxinas, medicamentos, câncer, deficiências nutricionais e ou- tras doenças. Pode ser aguda ou crônica e tem alguns sintomas comuns, como a alteração da sensação ou força nos membros superiores e inferiores. As polineuropatias, por possuírem sinais e sintomas semelhantes, dificultam a precisão do diagnóstico. Podem ser verificadas em pacientes com diabetes melittus, com insuficiência renal crônica, podem ser hereditárias e também imunoinflamatórias. Uma polineuropatia imunoinflamatória bastante conhecida é a síndrome de Guillain-Barré – SGB, também denominada polirradiculoneuropatia desmielini- zante inflamatória aguda. Uma pequena porcentagem dos diagnósticos dessa do- ença pode evoluir para uma polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica. Enquanto a SGB é um quadro que dura em torno de oito semanas, nesta última a fraqueza muscular progride por mais de oito semanas. Por ser uma reação au- toimune, há um ataque à bainha de mielina das células nervosas afetando a sen- sação e os reflexos do paciente. Avaliação e Reabilitação Neuropsicológica: desenvolvimento histórico e perspectivas atuais HAMDAN, Amer Cavalheiro; DE PEREIRA, Ana Paula Almei- da; DE SÁ RIECHI, Tatiana Izabele Jaworski. Avaliação e reabilita- ção neuropsicológica: desenvolvimento histórico e perspectivas atu- ais. Interação em Psicologia, v. 15, 2011. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/psicologia/article/download/25373/17001. Atividades de estudo1 Conceitue as mononeuropatias e as polineuropatias e dê um exem- plo de cada uma delas justificando sua resposta. _______________________________________________________ _______________________________________________________ https://revistas.ufpr.br/psicologia/article/download/25373/17001 109 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ 2 Visite o Quadro 2 e nomeie os nervos cranianos enumerados na figura a seguir: 3 Neste capítulo falamos sobre afecções diversas que acometem o sis- tema nervoso. Para você, como o neuropsicólogo pode atuar frente a estas doenças? Considere em sua resposta desde a avaliação até o processo de reabilitação. Faça um texto de 20 a 30 linhas. _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________ 110 Patologias do Sistema Nervoso Central 6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Ao longo dos capítulos deste livro percorremos a trajetória do conhecimento do sistema nervoso. Você e eu conhecemos algumas estruturas e constituições do sistema nervoso, suas divisões e suas afecções. Visualizamos doenças que são causadas durante a gestação e outras que se manifestam na interação com o meio. Você entrou em contato com conceitos técnicos que são comuns à área da Medicina, porém vistos durante algumas disciplinas no seu processo de formação em Psicologia. O objetivo deste livro foi exatamente conduzir você durante seus estudos de modo a ampliar sua visão sobre o complexo ser que busca na sua for- mação subsídios para auxiliá-lo em seus comportamentos. No Capítulo 1 elencamos algumas estruturas que compõem o sistema ner- voso, falamos sobre sua divisão em Sistema Nervoso Central – SNC e Sistema Nervoso Periférico – SNP, bem como das lesões que podem acometer essas es- truturas. No Capítulo 2 falamos sobre as doenças degenerativas e heredodegene- rativas do SNC, a saber: Esclerose Múltipla, Doença de Parkinson, Doença de Huntington e Doença de Alzheimer. No Capítulo 3 fizemos um apanhado geral sobre as doenças que agridem o sistema nervoso. Desejamos que sua leitura tenha perpassado pela atuação da neuropsicolo- gia frente ao paciente e aos seus familiares. Desejamos também que cada tema tenha suscitado em você o interesse em aprofundar seus estudos e em desenvol- ver conhecimento dentro de sua área. Ao final de cada capítulo há algumas referências como sugestão de leitura. Aproveite! REFERÊNCIAS BRAGA, Eustáquio de Carvalho et al. Enpiema subdoral secundário a sinusite de repetição. Pediatr. mod, p. 133-136, 2006. 111 Outras Doenças do Sistema Nervoso Capítulo 3 CASTRO, Martha Lopes Schuch de et al. Frequência das malformações múltiplas em recém-nascidos na Cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, e fatores sociodemográficos associados. Cadernos de Saúde Pública, v. 22, p. 1009- 1015, 2006. CHALK, Colin H. Acquired peripheral neuropathy. Neurologic clinics, v. 15, n. 3, p. 501-528, 1997. COSTA, Fernanda Alves Sousa et al. Síndrome da Rubéola Congênita: revisão de literatura. 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Estudo da lamotrigina em doentes epilépticos submetidos a monitorização vídeo-electroencefalográfica. Tese de Doutorado. 2008. GUIOTOKU, CÉSAR M. et al. Arteriovenous malformations of the central nervous system: a review of 53 cases. Arquivos de neuro-psiquiatria, v. 57, n. 2B, p. 452-456, 1999. HAMDAN, Amer Cavalheiro; DE PEREIRA, Ana Paula Almeida; DE SÁ RIECHI, Tatiana Izabele JAWORSKI. Avaliação e reabilitação neuropsicológica: desenvolvimento histórico e perspectivas atuais. Interação em Psicologia, v. 15, 2011. HAUSER, W. A. The natural history of drug resistant epilepsy: epidemiologic considerations. Epilepsy research. Supplement, v. 5, p. 25-28, 1992. 112 Patologias do Sistema Nervoso Central MACHADO, Maria Eugênia da Costa. Casais que recebem um diagnóstico de malformação fetal no pré-natal: uma reflexão sobre a atuação do Psicólogo Hospitalar. Revista da SBPH, v. 15, n. 2, p. 85-95, 2012. MACHADO, NCSS et al. 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