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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/281347015 Apostila de Oftalmologia UFPR Research · August 2015 CITATIONS 0 READS 735 1 author: Some of the authors of this publication are also working on these related projects: Doutorado em Clínica Cirúrgica View project Campbell-Walsh Urology View project Frederico Ramalho Romero Universidade Federal do Paraná 117 PUBLICATIONS 1,092 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Frederico Ramalho Romero on 30 August 2015. 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Cada órbita tem a forma de uma pirâmide quadrangular, com seu ápice posterior e sua base anterior. O periósteo das paredes continua-se com a dura-máter. Relações anatômicas Superior Fossa anterior do crânio Seio frontal Lateral Fossa temporal Anteriormente Fossa média do crânio Posteriormente Inferior Seio maxilar Medial Células etmoidais Seio esfenoidal A órbita comunica-se com a cavidade craniana por diversas aberturas. Figura 1 - Vista anterior da órbita OFTALMOLOGIA - 2 Bordas A borda da órbita é facilmente palpável e é formada principalmente por três ossos (frontal, zigomático e maxila). Ela pode ser convenientemente subdividida em quatro partes contínuas, cada uma das quais é freqüentemente referida como uma borda individual. Supra-orbital Formada pelo osso frontal Incisura supra-orbital Localiza-se na junção dos dois terços laterais com o terço medial da borda supra-orbital, dando passagem ao nervo supra- orbital e aos vasos para a fronte. Lateral Formada pelo processo zigomático do frontal e pelo processo frontal do zigomático Eminência orbital do osso zigomático Pode ser palpada in vivo e dá inserção ao ligamento palpebral lateral. Infra-orbital Formada pelo osso zigomático e pela maxila Forame infra-orbital Abre-se cerca de 1 cm abaixo desta borda e dá passagem ao nervo e à artéria do mesmo nome, para a face. Medial Formada pela maxila, pelo lacrimal e pelo frontal Canal nasolacrimal Formado lateralmente pela maxila e medialmente pelo osso lacrimal e pela concha nasal inferior É o nome dado à continuação da borda medial para baixo do soalho da órbita. Ele dá passagem ao ducto nasolacrimal do saco lacrimal para o meato inferior da cavidade nasal. Crista lacrimal anterior Dá inserção ao ligamento palpebral medial e ao orbicular do olho. Crista lacrimal posterior Dá inserção à parte lacrimal do orbicular, ao septo orbital e ao ligamento medial de detenção. Paredes Teto ou parede superior Tem forma triangular e é constituído pela lâmina orbital do osso frontal e pela asa menor do esfenóide Fossa da glândula lacrimal Localiza-se no ângulo anterolateral do teto. Fóvea troclear Pequena fossa no ângulo anteromedial que indica a inserção da tróclea do músculo obliquo superior. OFTALMOLOGIA - 3 Canal óptico Localiza-se no extremo posterior do teto, dando passagem ao nervo óptico, aos seus envoltórios meníngicos e à artéria oftálmica da fossa média do crânio. Parede lateral Tem forma triangular e é constituída pelo osso zigomático e pela asa maior do esfenóide com uma pequena porção do osso frontal Fissura orbital superior Comunica-se com a fossa média do crânio e dá passagem, principalmente, aos III, IV e VI nervos cranianos, aos 3 ramos do nervo oftálmico (primeira divisão do V par craniano) e às veias oftálmicas. Fissura orbital inferior Comunica-se com as fossas infratemporal e pterigopalatina, dando passagem, principalmente, ao nervo maxilar ou infra-orbital, ao nervo zigomático e à artéria infra-orbital. Soalho ou parede inferior Também tem forma triangular e é formado pela maxila, pelo zigomático e pelo palatino Sulco e canal infra-orbitais Dão passagem ao nervo e à artéria do mesmo nome, da fissura orbital inferior para o forame infra-orbital. Parede medial Quadrilátera, é formada pelo etmóide (lâmina orbital), lacrimal e frontal, com uma pequena porção do corpo do esfenóide Forames etmoidais anterior e posterior São pequenos orifícios na junção da parede medial com o teto da órbita que dão passagem aos nervos e às artérias do mesmo nome para a fossa anterior do crânio. Nervo oftálmico O nervo oftálmico (ou primeira divisão do nervo trigêmio) é um nervo aferente que supre o bulbo do olho e a conjuntiva, a glândula e o saco lacrimal, a mucosa nasal, o seio frontal, o nariz externo, a pálpebra superior, a fronte e o couro cabeludo. Ramos Passam através da fissura orbital superior e atravessam a órbita Lacrimal Glândula lacrimal Conjuntiva Cútis da pálpebra superior Frontal Nervo supra-orbital Continuação direta do frontal Fronte OFTALMOLOGIA - 4 Couro cabeludo Pálpebra superior Seio frontal Nervo supratroclear Fronte Pálpebra superior Nasociliar É o nervo sensitivo para o olho Ramo comunicante Gânglio ciliar Nervos ciliares longos Fibras simpáticas para o dilatador da pupila Fibras aferentes da coróide e da córnea Nervo infratroclear Pálpebras Cútis do nariz Saco lacrimal Nervo etmoidal posterior Seio esfenoidal Seios etmoidais Nervo etmoidal anterior É considerado a continuação do nasociliar Ramos nasais internos Ramo nasal externo Vasos oftálmicos Artéria oftálmica É um ramo da artéria carótida interna que se origina medialmente ao processo clinóide anterior. Ela se dirige para a frente e lateralmente, e atravessa o canal óptico, abaixo do nervo óptico. Primeiramente, ela é acompanhada pelo nervo nasociliar e, depois, pelo infratroclear. Próximo à parte anterior da órbita, ela se divide na artéria supratroclear e na dorsal do nariz. Ramos Artéria central da retina Ramo mais importante da oftálmica Vasculariza a retina Figura 2 - Conteúdo da órbita direita após a remoção da parte superior do osso frontal, mostrando o nervo oftálmico e seus ramos OFTALMOLOGIA - 5 Ramos temporais superior e inferior Ramos nasais superior e inferior Artérias ciliares posteriores longas Vascularizam o corpo ciliar e a íris Artérias ciliares posteriores curtas Irrigam a coróide Artéria lacrimal Vasculariza a glândula lacrimal, a conjuntiva e as pálpebras Ramo meníngico recorrente Artérias palpebrais laterais Ramos meníngicos Ramos musculares Suprem os músculos do bulbo ocular Artéria supra-orbital Vasculariza a pálpebra superior e o couro cabeludo Artéria etmoidal posterior Artéria etmoidal anterior Artérias palpebrais mediais Artéria supratroclear Artéria dorsal do nariz Figura 3 - Conteúdo da órbita direita após remoção da parte superior do osso frontal e secção dos músculos levantador da pálpebra superior, reto superior e oblíquo superior, revelando a artéria oftálmica e seus ramos OFTALMOLOGIA - 6 Veias oftálmicas A órbita é drenada pelas veias oftálmicas superior e inferior, que não têm válvulas. Elas estabelecem importantes comunicações com a veia facial, o plexo pterigoídeo e o seio cavernoso. Veia oftálmica superior É formada pela união das veias supra- orbital e angular Acompanha a artéria oftálmica, recebe tributárias correspondentes, atravessa a fissura orbital superior e termina no seio cavernoso. Veia oftálmica inferior Inicia-se como um plexo no soalho da órbita e termina no seio cavernoso, quer atravessando diretamente a fissura orbital superior quer indiretamente unindo-se à veia oftálmica superior. Veia central da retina Geralmente entra diretamente no seio cavernoso mas pode desembocar numa das veias oftálmicas. Veias vorticosas Drenam a coróide e perfuram a esclera obliquamente, terminando nas veias oftálmicas superior e inferior. Nervo oculomotor O nervo oculomotor (III par craniano), assim denominado por ser o principal nervo motor dos músculos oculares, inerva todos os músculos do bulbo do olho com exceção do oblíquo superior e do reto lateral. Ele se divide em ramos superior e inferior, que atravessam a fissura orbital superior. Ramo superior Reto superior Levantador da pálpebra superior Ramo inferior Reto medial Reto inferior Oblíquo inferior Este ramo emite uma comunicação parassimpática para o gânglio ciliar. Esta comunicação contém fibras motoras para o esfíncter da pupila (responsável pela miose) e para o músculo ciliar (acomodação visual). O nervo oculomotor contém fibras motoras, proprioceptivas, parassimpáticas (pré-ganglionares) e simpáticas (pós-ganglionares). OFTALMOLOGIA - 7 Nervo troclear O nervo troclear (ou IV par craniano) inerva somente o músculo obliquo superior do bulbo do olho e é assim denominado por causa da tróclea ou polia deste músculo. Nervo abducente O nervo abducente (ou VI par craniano) supre somente o músculo reto lateral do bulbo do olho e é assim denominado por causa de sua ação na abdução do olho. Como o nervo troclear, o abducente contém fibras motoras proprioceptivas e simpáticas (pós-ganglionares). Gânglio ciliar O gânglio ciliar é o “gânglio periférico do sistema parassimpático do olho”. Ele está situado posteriormente na órbita, lateralmente ao nervo óptico, medialmente ao músculo reto lateral e anteriormente ou lateralmente à artéria oftálmica. Músculos do bulbo do olho Os principais músculos que movimentam o bulbo do olho são os 4 retos e os 2 oblíquos. Estes 6 músculos esqueléticos estão inseridos na esclera, geralmente, por tendões brilhantes. Com exceção do oblíquo inferior, todos nascem da parte posterior da órbita. Figura 4 - Figura esquemática da inervação dos nervos oculomotor, troclear e abducente OFTALMOLOGIA - 8 Os 4 músculos retos nascem do ânulo tendíneo comum, que contorna o canal óptico e uma parte da fissura orbital superior, e se inserem na porção anterior da esclera. O obliquo superior parte do osso esfenóide acima e medialmente ao canal óptico, segue para a frente e, a seguir, alcança uma polia de cartilagem hialina conhecida como tróclea, que está inserida no osso frontal. Então, seu tendão volta-se lateralmente, para trás e para baixo, e insere-se no contorno posterolateral da esclera. O oblíquo inferior nasce na parte anterior da órbita, em uma depressão da face superior da maxila, lateralmente ao canal nasolacrimal, e dirige-se lateralmente, por baixo do olho, inserindo-se no contorno posterolateral da esclera. Os músculos do bulbo do olho são caracterizados por muitas pequenas unidades motoras, sendo que cada fibra nervosa supre cerca de 10 fibras musculares, enquanto a proporção é de cerca de 1:140 nos outros músculos esqueléticos. Cada movimento do olho tem participação de todos os músculos do bulbo ocular. Esses movimentos são efetuados por um aumento no tônus de um grupo de músculos e por uma diminuição no tônus dos músculos antagonistas. A ação de cada músculo é a seguinte: Reto lateral Abdutor Reto medial Adutor Reto superior Elevação do olho em abdução Intorção Torção interna Reto inferior Abaixamento do olho em abdução Extorção Torção externa Figura 5 - Músculos do bulbo ocular OFTALMOLOGIA - 9 Obliquo superior Abaixamento do olho em adução Intorção Obliquo inferior Elevação do olho em adução Extorção Nervo óptico O nervo óptico (ou II par craniano) é o nervo da visão. Ele tem 5 cm de comprimento e se estende entre o bulbo do olho e o quiasma óptico. A grande maioria das fibras do nervo óptico são aferentes e nascem da camada de células ganglionares da retina, cujos axônios convergem para o disco do nervo óptico e, então, perfuram as outras camadas da retina. Na órbita, o nervo óptico é envolvido pelos músculos retos e é cruzado superiormente pela artéria oftálmica e pelo nervo nasociliar. Inferomedialmente, ele é perfurado pela artéria e pela veia central da retina, que alcançam o disco do nervo óptico passando por dentro do nervo óptico. O nervo óptico sai da órbita e ganha a fossa média do crânio atravessando o canal óptico, quando ele se relaciona com as artérias carótida interna e oftálmica e com a hipófise. No quiasma óptico, as fibras do nervo óptico que provêm do lado medial ou nasal da retina e que, portanto, representam o lado lateral ou temporal do campo visual, cruzam obliquamente o plano mediano (decussam), continuando-se no tracto óptico para os corpos geniculados laterais do mesencéfalo. O nervo óptico é circundado, na órbita, por 3 bainhas que se continuam com as 3 meninges. Sua irrigação é feita pela artéria da retina e pelas artérias ciliares posteriores, oftálmica e hipofisial superior. Figura 6 - Movimentos executados por cada músculo do bulbo do olho OFTALMOLOGIA - 10 Pálpebras As pálpebras são duasdobras móveis, musculo- fibrosas, localizadas na frente de cada órbita, que tem a função de proteger o bulbo e proporcionar repouso do olho contra a luz. A pálpebra superior, mais extensa e mais móvel do que a inferior, encontra-se com esta nas comissuras medial e lateral do olho. O epicanto é uma prega cutânea que reveste a comissura medial em alguns povos, principalmente orientais, que podem, também, ter uma prega palpebronasal (“prega mongólica”) de cútis sobre a parte inferior da pálpebra superior. A rima palpebral é a abertura limitada pelas pálpebras superior e inferior. Ela varia de tamanho de acordo com o grau de “abertura do olho”. A borda livre de cada pálpebra possui duas ou três fileiras de pêlos chamados cílios. As glândulas ciliares nas proximidades são do tipo sudorífero e sebáceo. Próximo a sua extremidade medial, a borda livre de cada pálpebra apresenta uma abertura, o orifício lacrimal. As extremidades mediais das pálpebras superior e inferior delimitam uma área denominada lago lacrimal, cujo soalho apresenta uma pequena massa cárnea vermelha, a carúncula lacrimal. A carúncula fica numa dobra da conjuntiva chamada prega semilunar ou dobra semilunar. Cada pálpebra consiste de uma série de camadas. Da superfície para a profundidade, as camadas da pálpebra superior são: 1. Cútis e tela subcutânea A cútis é muito fina e a tela subcutânea, geralmente, não contém gordura. Figura 7 - Olho esquerdo com as pálpebras abertas Figura 8 - Olho direito com a prega palpebronasal Figura 9 - Figura esquemática da pálpebra OFTALMOLOGIA - 11 2. Plano muscular Músculo orbicular É inervado pelo VII par craniano A parte palpebral do orbicular do olho nasce do ligamento palpebral medial. Uma camada de tecido conectivo frouxo fica por trás do orbicular, permitindo que a pálpebra possa ser desdobrada cirurgicamente em uma porção anterior e outra posterior. Este plano pode, algumas vezes, ser reconhecido na margem livre da pálpebra por uma linha acinzentada. Músculo levantador da pálpebra superior É inervado pelo III par Origina-se na órbita, da asa menor do esfenóide, acima do canal óptico. Então, ele dirige-se para frente, acima do reto superior e do oblíquo superior, e termina em uma aponeurose que se insere principalmente na cútis da pálpebra superior (atravessando as fibras do orbicular), na frente do tarso e na borda palpebral superior. 3. Lâmina fibrosa Septo orbital O septo orbital é uma delgada membrana fibrosa presa em toda a borda da órbita. Tarso Figura 10 - Músculos que circundam o olho Figura 11 - Topografia do músculo levantador da pálpebra superior OFTALMOLOGIA - 12 Consiste em um tecido fibroso denso com algumas fibras elásticas com o objetivo de reforçar cada pálpebra. As extremidades lateral e medial dos tarsos estão ancoradas à borda da órbita pelos ligamentos palpebrais (ou társicos) lateral e medial. Os músculos társicos ou palpebrais são pequenas lâminas de músculo liso encontradas nas pálpebras. O músculo társico superior é inervado por fibras simpáticas e une o levantador da pálpebra superior a borda superior do tarso. Posteriormente, o tarso apresenta glândulas do tipo sebáceo, que podem ser vistas como listras amarelas através da conjuntiva. Figura 12 - Os tarsos e ligamentos palpebrais das pálpebras superior e inferior do olho direito Figura 13 - Corte longitudinal da pálpebra OFTALMOLOGIA - 13 4. Túnica mucosa A mucosa das pálpebras é chamada parte palpebral da conjuntiva. Na borda livre de cada pálpebra, ela se continua com a cútis. A irrigação sangüínea das pálpebras é feita principalmente pelas artérias palpebrais medial e lateral, ramos da oftálmica e lacrimal, respectivamente. As artérias palpebrais formam arcos nas pálpebras superior e inferior. As veias drenam para a oftálmica e para as veias da fronte e da têmpora. A inervação sensitiva das pálpebras superior e inferior é feita, predominantemente, pelos nervos supra-orbital e infra-orbital, respectivamente, isto é, a primeira e a segunda divisão do nervo trigêmio. Conjuntiva A conjuntiva é a delgada túnica mucosa que forra posteriormente as pálpebras e a frente do bulbo do olho. O saco da conjuntiva é o intervalo capilar, forrado pela conjuntiva, entre as pálpebras e o bulbo do olho. Para fins descritivos, a conjuntiva está dividida em partes palpebral e bulbar. A conjuntiva palpebral é muito vascularizada, tem coloração avermelhada e forra o dorso das pálpebras. Ela contém os orifícios dos canalículos lacrimais, pelos quais o saco da conjuntiva liga-se com o meato nasal inferior. A conjuntiva bulbar é transparente, incolor, permitindo à esclera mostrar a sua coloração branca. Sua parte periférica é frouxa, permitindo o livre movimento do bulbo do olho. Sua parte central é contínua com o epitélio anterior da córnea. A prega semilunar é uma dobra profunda da conjuntiva, localizada no ângulo medial do olho, profundamente à carúncula lacrimal. Ela intercepta corpos estranhos sobre a córnea e passa-os à região da carúncula lacrimal. Figura 14 - Conjuntiva OFTALMOLOGIA - 14 A conjuntiva é inervada pelos nervos infratroclear, lacrimal e ciliar. Os vasos da conjuntiva bulbar são claramente visíveis in vivo. Ela é vascularizada por um arco palpebral periférico, do qual emergem artérias conjuntivais posteriores que se curvam em torno do saco conjuntival; e pelas artérias ciliares anteriores, que nascem dos ramos para os retos, passam para diante, dão artérias conjuntivais anteriores e alcançam o grande círculo arterial da íris. As artérias conjuntivais anteriores e posteriores formam um plexo em torno da córnea. A conjuntiva palpebral é vascularizada pelo arco marginal da pálpebra. Aparelho lacrimal O aparelho lacrimal compreende a glândula lacrimal e seus ductos e as vias lacrimais (canalículos lacrimais, saco lacrimal e ducto nasolacrimal). Figura 15 - Aparelho lacrimal Figura 16 - Divisão estrutural da glândula lacrimal OFTALMOLOGIA - 15 A glândula lacrimal está alojada na fossa da glândula lacrimal, no ângulo anterolateral do teto da órbita (osso frontal). Ela repousa sobre o reto lateral e o levantador da pálpebra superior. Estruturalmente, a glândula lacrimal pode ser dividida em parte orbital e parte palpebral. Glândulas lacrimais acessórias podem ser encontradas. A glândula lacrimal é drenada por meio de uma dúzia de ductos lacrimais, todos atravessando a parte palpebral da glândula e abrindo- se no saco conjuntival superior. As lágrimas são secretadas pelas glândulas lacrimal e lacrimal acessória e têm o objetivo de manter a frente dos olhos úmida, evitando o dessecamento do epitélio anterior da córnea. As fibras secretoras da glândula lacrimal derivam do nervo petroso maior (ramo do facial) e do nervo do canal pterigoídeo. Elas fazem sinapse no gânglio pterigopalatino e são transportadas para a glândula como ramos orbitais do gânglio e por um filamento do zigomático para o nervo lacrimal. O canalículo lacrimal, um em cada pálpebra, tem cerca de 1 cm de comprimento e se inicia no orifício lacrimal. As lágrimas entram no canalículo, ao menos em parte, por capilaridade. O canalículo lacrimal abre-se na parte lateral do saco lacrimal, geralmente por meio de um seio comum. O saco lacrimal (1 a 1,5 cm de comprimento) continua-se com a extremidade superior do ducto nasolacrimal e está alojado na fossa do saco lacrimal, na margem medial da órbita (osso lacrimal e maxilar). A parte superior do saco está coberta, anteriormente, pelo ligamento palpebral medial. Figura 17 - Topografia da glândula lacrimal na órbita esquerda Figura 18 - Aparelho lacrimal OFTALMOLOGIA- 16 O ducto nasolacrimal (cerca de 2 cm de comprimento) estende-se da extremidade inferior do saco lacrimal até o meato inferior do nariz. Ele está situado em um canal ósseo formado pelo osso lacrimal, pela maxila e pela concha nasal inferior. Olho O olho ocupa um terço ou menos da cavidade orbital, mede 24 mm de diâmetro e compreende porções de 2 esferas, uma posterior (curvatura escleral), que abrange 5/6 da circunferência ocular, e outra anterior (curvatura corneal), com 1/6. Os pontos centrais das curvaturas escleral e corneal constituem o polo posterior e o polo anterior do bulbo do olho. O nervo óptico emerge um pouco medialmente a seu polo posterior. O diâmetro anteroposterior do bulbo pode ser maior (como na miopia) ou menor (como na hipermetropia) do que o normal (emetropia). Figura 19 - Secção horizontal esquemática através do bulbo do olho direito ao nível do disco do nervo óptico OFTALMOLOGIA - 17 O bulbo ocular tem 3 camadas concêntricas: 1. Túnica fibrosa externa Córnea Esclera 2. Túnica média Túnica vascular ou trato uveal Íris Corpo ciliar Coróide 3. Túnica interna Retina Túnica fibrosa externa Córnea É a parte anterior, transparente, da túnica externa do olho. Ela possui 0,5 mm de espessura no centro e 1 mm na periferia. A córnea consiste das seguintes camadas: 1. Epitélio anterior Do tipo estratificado escamoso não queratinizado 2. Lâmina limitante anterior Camada de Bowman 3. Substância própria Estroma 4. Lâmina limitante posterior Membrana de Descemet 5. Endotélio Camada única de células hexagonais achatadas Seu principal componente, a substância própria, é contínuo com a esclera e mantém-se transparente graças à desidratação fornecida por seus epitélios limitantes. O limbo da córnea compreende a região das junções conjuntivocorneal e esclerocorneal. A córnea é avascular e é nutrida por difusão da periferia ao longo da substância própria. Sua inervação é feita pelo nervo oftálmico (do V par craniano) por intermédio dos ramos ciliares. Figura 20 - Camadas da córnea OFTALMOLOGIA - 18 Esclera É a parte opaca, posterior, da túnica externa do olho. A parte anterior da esclera pode ser vista através da conjuntiva como o “branco do olho”. Externamente, a esclera está frouxamente unida com a fáscia bulbar por tecido episcleral e recebe os tendões dos músculos do bulbo ocular. Além disso, é atravessada pelas artérias e nervos ciliares e pelas veias vorticosas. Posteriormente, a esclera é perfurada pelo nervo óptico. A fáscia do bulbo é uma membrana fibrosa delgada que envolve o bulbo desde próximo a margem da córnea, na frente, até o nervo óptico, atrás. Ela é atravessada pelos tendões dos músculos extrínsecos e envia uma reflexão tubular ao redor de cada um desses músculos. O bulbo ocular é marcado na junção esclerocorneal por um ligeiro sulco. Posteriormente a este sulco, a esclera projeta-se parcialmente para formar uma protrusão chamada esporão escleral. Adjacente ao esporão, há um canal denominado seio venoso da esclera (canal de Schlemm), que corre ao redor do olho e é responsável pela drenagem do humor aquoso. Túnica média Coróide É uma camada marrom que forra a maior parte da esclera. A coróide apresenta as seguintes camadas: 1. Lâmina supracoroidea 2. Lâmina vascular As artérias da coróide são derivadas das artérias ciliares posteriores curtas. As veias do trato uveal drenam para as veias vorticosas Figura 21 - Vasos sangüíneos do bulbo do olho OFTALMOLOGIA - 19 3. Lâmina coriocapilar 4. Lâmina basal Une a coróide à retina Corpo ciliar É um espessamento na túnica vascular do bulbo ocular que se situa na frente da “ora serrata” da retina e liga a coróide com a íris. Como a coróide, o corpo ciliar inclui as lâminas supracoroidea, vascular e basal. Além disso, ele possui o músculo ciliar e os processos ciliares. O músculo ciliar é composto por fibras longitudinais e obliquas e é inervado por fibras parassimpáticas (nervos ciliares) e simpáticas. Os processos ciliares, em número de 70 mais ou menos, estão dispostos atrás da íris. Seus vasos são derivados do círculo arterial maior e drenam nas veias vorticosas. O corpo ciliar é forrado pela parte ciliar da retina, que consiste de duas camadas de epitélio, das quais a externa é intensamente pigmentada. Íris É um diafragma circular, pigmentado, localizado na frente do cristalino. Sua borda periférica ou raiz está ligada ao corpo ciliar, enquanto sua borda central é livre e limita uma abertura conhecida como pupila. A íris divide o espaço entre a córnea e o cristalino em uma câmara anterior e uma câmara posterior. A câmara anterior é limitada pela córnea e pela íris e por porções da esclera, corpo ciliar e cristalino. A câmara posterior é limitada pela íris, processos ciliares, zônula ciliar e cristalino. Ambas as câmaras estão cheias de humor aquoso. Figura 22 - Secção horizontal através da parte anterior do bulbo do olho OFTALMOLOGIA - 20 A face anterior da íris apresenta escavações chamadas criptas e, também, uma franja irregular conhecida como “collarette”. O ligamento pectinado da íris compreende algumas fibras, geralmente pouco desenvolvidas, no ápice do ângulo iridocorneal. O ângulo iridocorneal (entre a íris e a córnea), também é conhecido como ângulo da câmara anterior ou ângulo de filtração. Um defeito de uma parte da íris é designado coloboma. A íris consiste das seguintes camadas: 1. Mesotélio ? 2. Estroma Contém células pigmentadas (cromatóforos) A coloração da íris depende do arranjo e do tipo do pigmento e da textura do estroma. O estroma contém pouco ou nenhum pigmento em íris cinzentas ou azuis, enquanto os melanóforos são numerosos em íris castanhas. O pigmento existe relativamente menos ao nascimento, razão pela qual a íris em crianças é, geralmente, azul. Em albinos, o pigmento está ausente do estroma e do epitélio e a cor rósea da íris é devida ao sangue. 3. Camada muscular O esfíncter da pupila é formado por músculo liso, situa-se na parte posterior do estroma e é inervado por fibras parassimpáticas através dos nervos ciliares. A íris se contrai reflexamente quando a luz alcança a retina (reflexo luminoso) e durante a fixação de um objeto próximo (reação de acomodação). Sua contração resulta na constrição da pupila (miose). A atropina anula as ações do músculo ciliar e do esfíncter da pupila, os quais estão sob controle do parassimpático. O resultado é a impossibilidade de acomodação e, também, uma dilatação da pupila devido ao predomínio do dilatador da pupila. O dilatador da pupila consiste de fibras musculares lisas inervadas por fibras simpáticas dos nervos ciliares. Sua contração resulta na dilatação da pupila (midríase). 4. Parte irídica da retina A vascularização da íris deriva do grande círculo arterial da íris, situado realmente no corpo ciliar, que recebe sangue das artérias ciliares anteriores e posteriores longas e dá ramos para o trato uveal. Os ramos para a íris, juntamente com algumas veias satélites, formam um círculo vascular menor, inconstante e incompleto, na região do “collarette”. A íris é drenada pelas veias vorticosas. Túnica interna Retina A retina tem a forma de uma esfera que teve seu segmento anterior removido. A borda é de contorno irregular e é chamada de “ora serrata”. A continuação muito fina da retina em frente da “ora serrata” constitui as partes ciliar e irídica da retina. OFTALMOLOGIA - 21 A retina compreende 2 estratos, um externo, denominado extrato pigmentar, e outro interno, chamado estrato cerebral. O estrato pigmentar é aderente à coróide e contém grânulos de um pigmento denominado fucsina. Nos albinos, entretanto, os grânulossão desprovidos de cor. O estrato cerebral da retina consta essencialmente de 3 tipos de neurônios: 1. Estrato neuro-epitelial Consiste das partes externas de receptores especializados que reagem à luz, os cones e os bastonetes. Calcula-se que haja cerca de 125 milhões de bastonetes e cerca de 7 milhões de cones em uma retina humana. Os bastonetes são mais numerosos a 0,5 cm da fóvea, ao passo que os cones são mais numerosos na região da fóvea. No disco do nervo óptico não são encontrados receptores. Os bastonetes estão associados com a sensibilidade visual, isto é, com a visão em luz de baixa intensidade (ou visão escotópica), enquanto os cones estão associados com a acuidade visual e a visão das cores (ou visão fotópica). 2. Células bipolares Por meio de sinapses, unem os cones e bastonetes a células ganglionares. 3. Células ganglionares Constituem uma camada de neurônios multipolares, cujos axônios formam as fibras do nervo óptico. Figura 23 - Figura esquemática das camadas e das células que compõe a retina OFTALMOLOGIA - 22 Duas áreas especiais da retina requerem menção particular, a mácula e o disco do nervo óptico. A mácula (lútea), ou mancha amarela, é uma área pigmentada da retina, no lado temporal do disco do nervo óptico. Ela apresenta uma depressão, a fóvea central, cuja depressão central ou fovéola está situada lateral e usualmente próximo do nível da borda inferior do disco do nervo óptico. A mácula é visível devido a ausência, nessa região da retina, da maior parte das células retinianas, com exceção das neuro-epiteliais. A fóvea é avascular e é nutrida pela coróide. A fovéola contém cones, mas não bastonetes. Nesta, cada cone faz conexão com uma única célula ganglionar. Por isso, a fovéola é a região da retina de maior acuidade visual. O disco do nervo óptico (papila ou ponto cego), não possui receptores e consiste meramente das fibras do nervo óptico. Por essa razão, ele é insensível à luz. Está situado do lado nasal do polo posterior do olho e da fóvea central. Próximo ao seu centro, está presente uma depressão variável, chamada escavação do disco. A irrigação sangüínea da parte externa do estrato cerebral, incluindo os cones e os bastonetes, é feita pela lâmina coriocapilar da coróide, enquanto a parte interna é vascularizada pela artéria central da retina, ramo da oftálmica. A artéria central caminha no nervo óptico e aparece no disco do nervo óptico, onde se divide em ramos superior e inferior, cada um dos quais se divide, então, em ramos nasal e temporal. Os ramos da artéria central não se anastomosam entre si ou com qualquer outro vaso, caracterizando a artéria central como uma artéria terminal. As veias da retina acompanham mais ou menos as artérias e a veia central termina no seio cavernoso. Figura 24 - Secção horizontal através do ponto de saída do nervo óptico do bulbo do olho OFTALMOLOGIA - 23 Meios dióptricos do olho O aparelho dióptrico ou refrativo do olho compreende a córnea, o humor aquoso, o cristalino e o humor vítreo. Em repouso, o poder óptico do olho é de aproximadamente 60 dioptrias 1 , dos quais cerca de dois terços é dado pela superfície anterior da córnea. Humor aquoso Preenche as câmaras anterior e posterior do olho. Sua composição é, aproximadamente, aquela do plasma sem proteínas. 1 O poder de uma lente é medido em dioptrias. Uma dioptria é o inverso da distância focal de uma lente, em metros. Assim, uma lente de 2 dioptrias tem uma distância focal de 0,5 metro (N do A) Figura 25 - Vista esquemática dos vasos sangüíneos retinianos do fundo de olho direito OFTALMOLOGIA - 24 Ele é formado pelo epitélio dos processos ciliares, passa da câmara posterior para a câmara anterior através da pupila e é drenado em direção ao trabéculo e o canal de Schlemm, que conduz o fluido ao sistema venoso e as veias ciliares. Uma pequena quantidade de aquoso deixa o olho através dos vasos do trato uveal e da esclera (fluxo úveo-escleral). Cristalino A lente do olho é biconvexa e tem um diâmetro de 1 cm. Suas faces anterior e posterior são separadas por uma borda arredondada denominada equador, sendo a face posterior mais convexa do que a anterior. O cristalino consiste em: 1. Cápsula 2. Epitélio 3. Fibras da lente A parte central do cristalino, ou núcleo, é mais dura que a parte externa, ou córtex. O cristalino absorve grande parte da luz violeta e torna-se progressivamente amarelo e mais duro com a idade. A zônula ciliar, ou ligamento suspensor do cristalino, fixa a cápsula do cristalino ao corpo ciliar e à retina. Quando os objetos distantes são olhados, acredita-se que as fibras elásticas da lâmina supracoroidea puxam o corpo ciliar, mantendo as fibras zonulares sob tensão. Uma sucessão de fatos mais ou menos opostos tem lugar quando são olhados objetos próximos. Humor vítreo É uma massa gelatinosa, transparente, que preenche os 4/5 posteriores do bulbo ocular e é aderente à “ora serrata”. Sua composição lembra aquela do humor aquoso, mas contém um sistema de fibrilas colágenas e um mucopolissacarídeo denominado ácido hialurônico. O canal hialóide estende-se do disco do nervo óptico até o cristalino. Ele se inclina para baixo, no humor vítreo, mas sua posição se altera por movimentos do olho. Esse canal marca o local da artéria hialóidea no feto. Figura 26 - Meios dióptricos do olho Figura 27 - Cristalino OFTALMOLOGIA - 25 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Semiologia Introdução Muitas vezes, o clínico geral é o primeiro a examinar pacientes com queixas oculares. Por isso, todo médico deve saber como fazer um exame oftalmológico básico, obtendo e interpretando corretamente os dados clínicos fundamentais. Além disso, as doenças sistêmicas, com freqüência, provocam manifestações oculares que precisam ser reconhecidas para a compreensão integral do paciente. Em algumas ocasiões, a pronta identificação de um sintoma pode ser fundamental para o rápido encaminhamento do paciente ao oftalmologista, impedindo a perda, às vezes de modo irreversível, da visão. Identificação Os elementos de identificação são sempre importantes no raciocínio diagnóstico, salientando-se a idade, o sexo, a profissão e a procedência do paciente. Algumas afecções oculares ocorrem com mais freqüência em determinadas idades. Por exemplo, no recém-nascido, o glaucoma congênito deve ser diagnosticado precocemente para que haja um tratamento efetivo. O estrabismo aparece logo após o nascimento ou na infância. Certos tipos de neoplasias intra-oculares, como o retinoblastoma, aparecem mais freqüentemente na infância. Na adolescência, as causas mais freqüentes de diminuição da acuidade visual são os vícios de refração. No adulto, são mais comuns as lesões de origem profissional, as conjuntivites e as uveítes. Em torno dos 40 anos, aparece a dificuldade de visão para perto, denominada presbiopia, e em idades mais avançadas surgem a catarata, lesões vasculares e degenerativas da retina. A profissão deve ser sempre valorizada, pois alguns tipos de trabalho favorecem o aparecimento de certas afecções. Assim, as pessoas que trabalham em ambientes fechados e empoeirados têm maior tendência para apresentar blefarite e conjuntivite, e as pessoas que trabalham em locais com muito sol apresentam pterígio com mais freqüência. Sinais e sintomas Os principais sintomas das afecções oculares são: Sensação de corpo estranho Corpo estranho Cílios virados para dentro Conjuntivites Inflamação corneana superficial Abrasão corneana OFTALMOLOGIA - 26 Queimação ou ardência Erros de refração não corrigidos Conjuntivites Ceratites Sono insuficiente Exposição a fumaça, poeira e produtos químicos Síndrome de Sjögren Dor ocular Quando ocorre em afecção do globo ocular, é uma dor tipo visceral, que o paciente não consegue localizar muito bem. Ao contrário, quando sua origem é na pálpebra, ele é capaz de apontar com o dedo o local exato da dor. Inflamação da pálpebra Dacrioadenite Abscesso Periostite Conjuntivite aguda Esclerite Episclerite Corpo estranho Glaucoma agudo Uveíte anterior Sinusite Cefaléia A cefaléia de origem ocular é geralmente localizada na região frontal e se manifesta ao fim do dia, principalmente após trabalhos em que a visão de perto é muito solicitada. Erros de refração não corrigidos Processos inflamatórios dos olhos e dos anexos Prurido Alergia Erros de refração não corrigidos Lacrimejamento Conjuntivites Ceratites Obstrução da via lacrimal excretora Aumento da secreção por emoções Hipertireoidismo Dor ocular Corpo estranho Glaucoma congênito OFTALMOLOGIA - 27 Sensação de olho seco Síndrome de Sjögren Conjuntivite crônica Paralisia facial Xantopsia2 É o aparecimento de visão amarelada. Intoxicações medicamentosas Catarata Hemeralopia e nictalopia Os sintomas resultantes da adaptação visual deficiente são conhecidos por hemeralopia 3 e nictalopia 4 . A hemeralopia ou “cegueira noturna” caracteriza-se por uma função deficiente dos bastonetes. A nictalopia ou “cegueira diurna” é um sintoma muito mais comum e relaciona-se com uma deficiente função dos cones. As principais causas de hemeralopia são: Retinopatia pigmentar Miopia maligna Glaucoma em fase tardia Diminuição ou perda da visão Os pacientes descrevem a diminuição da acuidade visual de várias maneiras. Fatores emocionais podem induzir a exageros e o paciente pode relatar perda da visão quando, na realidade, houve apenas uma diminuição. Em contrapartida, o paciente pode não perceber um grave defeito visual, descrevendo-o como simples embaçamento. Por isso, queixas subjetivas de diminuição ou perda de visão devem sempre ser avaliadas por métodos objetivos. É importante esclarecer há quanto tempo o paciente vem notando alteração na sua acuidade visual, se houve diminuição lenta ou súbita, se não havia uma baixa da acuidade há mais tempo ou se só agora foi percebida. A perda da visão (amaurose 5 ) ocorre em um ou em ambos os olhos, podendo ser súbita ou gradual. As causas de perda súbita de visão unilateral são: Obstrução da veia central da retina Embolia na artéria central da retina Hemorragia vítrea ou retiniana Neurite óptica Papilite ou neurite retrobulbar Descolamento de retina envolvendo a mácula 2 De “xant(o)- = amarelo; -op(s)(i)- = visão; -ia = estado” (N do A) 3 De “hemero- = dia; -op(s)(i)- = visão; -ia = estado” (N do A) 4 De “nict(o)- = noite; -op(s)(i)- = visão; -ia = estado” (N do A) 5 De “amaúrosis = escurecimento, escuridão” (N do A) OFTALMOLOGIA - 28 Amaurose urêmica Perda total da visão por uremia Ambliopia tóxica Diminuição da visão por efeito tóxico do álcool metílico, quinina ou chumbo Endoftalmite embólica Trombose da artéria carótida interna Lesões traumáticas do nervo óptico Fratura do canal óptico As causas de perda súbita da visão bilateral são: Neurite óptica Amaurose urêmica Ambliopia tóxica Traumatismo craniano Histeria Enxaqueca oftálmica As causas de perda gradual da visão unilateral são: Erros de refração Afecções corneanas Afecções do trato uveal Glaucoma Afecções do vítreo Afecções da retina Lesões do nervo óptico A perda gradual de visão bilateral ocorre em quase todas as condições relacionadas no item anterior. Diplopia A diplopia pode ser monocular ou binocular. As causas de diplopia monocular são: Cristalino subluxado Catarata Coloboma da íris Descolamento de retina As causas de diplopia binocular são: Paralisia de um ou mais músculos extra-oculares Restrição mecânica Centralização imprópria dos óculos OFTALMOLOGIA - 29 Fotofobia Inflamação corneana Afacia Ausência do cristalino Irite Albinismo ocular Drogas Cloroquina e acetazolamida Nistagmo São movimentos repetitivos rítmicos dos olhos. O nistagmo pode ser caracterizado pela freqüência (rápido ou lento), pela amplitude (amplo ou estreito), pela direção (horizontal, vertical, rotacional) e pelo tipo de movimento (pendular, jerk). No nistagmo pendular, o movimento do olho em cada direção é igual. No jerk, há um componente lento em uma direção e um rápido na outra. O nistagmo pode ser causado por: Distúrbios oculares Estrabismo Catarata Coriorretinite Distúrbios neurológicos Escotomas O escotoma é uma área de cegueira parcial ou completa, dentro de um campo visual normal ou relativamente normal. Neste ponto a visão diminui apreciavelmente em relação à parte que o circunda. Um escotoma fisiológico é o ponto cego situado a 15 o para fora do ponto de fixação e corresponde à entrada do nervo óptico. Os escotomas podem ser unilaterais ou bilaterais e devem ser investigados quanto a posição, forma, tamanho, intensidade, uniformidade, início e evolução. Quanto à posição, os escotomas classificam-se em central, quando corresponde ao ponto de fixação; periférico, quando situado distante do ponto de fixação; e paracentral, quando situado próximo ao ponto de fixação. Com relação à forma, pode ser circular, oval, arciforme, cuneiforme, anular, pericecal e hemianóptico. O tamanho tem pouco importância, embora possa mostrar a gravidade da lesão. O mesmo escotoma pode variar de tamanho de um dia para o outro, dependendo da progressão da doença que o produz. Com relação à intensidade, varia da cegueira absoluta a um mínimo detectável de perda da acuidade visual. O início e a evolução podem ser de grande importância clínica, havendo diferenças marcantes entre as várias doenças. Alucinações visuais OFTALMOLOGIA - 30 Inspeção do globo ocular Devem ser observados: Cílios e sobrancelhas No local de implantação dos cílios, deve-se investigar a presença de hiperemia, escamas e úlceras, alterações comuns nas blefarites. Pálpebras Representam uma estrutura de proteção do globo ocular contra traumatismos e excesso de luz. Pela inspeção, investiga-se a cor, a textura, a posição e os movimentos das pálpebras, além de eventual presença de edema. A posição das pálpebras altera o tamanho das fissuras palpebrais, que devem ser simétricas. A margem palpebral deve recobrir a córnea na parte superior e inferior. A borda da pálpebra deve estar em aposição ao globo ocular e não invertida (entrópio) ou evertida (ectrópio). Figura 1 - Triquíase, acima e a direita; madarose, abaixo e a esquerda; e poliose, abaixo e a direita Procura-se ob- servar se os cílios estão virados para dentro (triquíase), se houve queda (madarose 1 ) ou se tornaram-se brancos (poliose). OFTALMOLOGIA - 31 Quando a pálpebra inferior não consegue cobrir a córnea surge o que se denomina lagoftalmia 6 , a qual aparece na paralisia facial, na exoftalmia e nas retrações cicatriciais. Na exploração da motilidade palpebral, é necessário ter em mente os três músculos que dela participam. O músculo orbicular, que é formado por fibras estriadas e inervado pelo nervo facial, faz a oclusão da pálpebra; o levantador da pálpebra superior, formado por fibras estriadas e inervado pelo nervo oculomotor, faz a elevação palpebral; e os músculos társicos, constituídos de fibras lisas einervados pelo simpático, participam da elevação palpebral. A paralisia do orbicular aparece na paralisia facial periférica e, como conseqüência, ocorre a impossibilidade de oclusão palpebral, surgindo, então, lagoftalmia e suas possíveis complicações corneanas. Além disso, a pálpebra inferior perde sua normal aposição ao globo ocular, provocando eversão do ponto lacrimal inferior com conseqüente lacrimejamento (epífora). 6 De “lag(o) = lebre; -oftalm(o) = olho; -ia = moléstia” (N do A) Figura 2 - Respectivamente, entrópio e ectrópio bilateral Figura 3 - Lagoftalmia OFTALMOLOGIA - 32 A paralisia do levantador da pálpebra superior leva à ptose, que pode ser congênita ou adquirida. A paralisia dos músculos társicos, que se acompanha de ptose palpebral parcial, faz parte da síndrome de paralisia do simpático cervical (síndrome de Horner), que é constituída por enoftalmia 7 , miose 8 e transtornos vasomotores. A eversão da pálpebra pode ser feita para se visualizar a conjuntiva palpebral, possibilitando evidenciar anemia, reação inflamatória, corpo estranho ou tumoração. Glândula lacrimal A inspeção da glândula lacrimal pode detectar aumento de volume da glândula lacrimal, que se situa na parte externa da pálpebra superior. Para se reconhecer pequenos aumentos de volume, é necessário levantar a pálpebra do paciente, pedindo-se a ele para olhar para baixo e para dentro. 7 De “en- = movimento para dentro; -oftalm(o) = olho; -ia = moléstia” (N do A) 8 De “mi(o)- = menor, menos; -ose = ação” (N do A) Figura 4 - Ptose congênita Figura 5 - Síndrome de Horner OFTALMOLOGIA - 33 Pela palpação avalia-se a consistência, a profundidade e a sensibilidade das glândulas lacrimais. A avaliação funcional do aparelho lacrimal, ou seja, a capacidade de secreção de lágrima, é realizada medindo-se a quantidade de lágrima produzida por unidade de tempo. Conjuntiva bulbar É uma membrana mucosa, transparente e fina. Por debaixo da conjuntiva, é possível, às vezes, observar-se alguns vasos calibrosos e tortuosos, os vasos episclerais e/ou esclerais. Excetuando-se esses vasos e eventuais depósitos de pigmentos, deve-se poder ver a esclera branca através da membrana transparente. Em cada lado do limbo, principalmente do lado nasal, uma pequena área elevada de cor amarelada (pinguécula) pode ser vista. Com a idade, ela vai tornando-se mais clara. Figura 6 - Figura esquemática dos vasos sangüíneos do olho Figura 7 - Pinguécula OFTALMOLOGIA - 34 A conjuntiva bulbar pode ser sede de nevus pigmentado ou, mais raramente, de lesão maligna (melanoma). Edema de conjuntiva (quemose) e hemorragia subconjuntival devem ser pesquisados, podendo fazer parte de lesões perioculares. Córnea A superfície corneana é tão lisa que qualquer alteração nessa membrana torna-se evidente com uma boa iluminação. Normalmente, ela apresenta um diâmetro horizontal de 11,7 mm e um diâmetro vertical de 10,6 mm. A presença de megalocórnea sugere glaucoma congênito. A microcórnea faz pensar em rubéola. Com a ajuda de uma lupa, pode-se constatar a presença de irregularidades epiteliais provocadas por corpo estranho. Pingando-se um colírio de fluoresceína na córnea, o corpo estranho cora-se de amarelo- Figura 8 - Nevus pigmentado, a esquerda; e melanoma maligno, a direita Figura 9 - Megalocórnea e micro- córnea Figura 10 - Corpo estranho corado por fluoresceína OFTALMOLOGIA - 35 esverdeado sob o uso de luz branca. Às vezes, torna-se difícil examinar a córnea pela presença de fotofobia ou blefaroespasmo 9 . Nessas condições convém instilar duas gotas de colírio anestésico para se obter a cooperação do paciente. A sensibilidade corneana é testada com o uso de fiapos de algodão, sempre comparativamente, antes da instilação do anestésico. Deve-se ter cuidado para não encostar nos cílios. Afecções da córnea, como a ceratite herpética, podem conduzir à perda de sensibilidade, havendo possibilidade de evoluir para uma úlcera corneana neuroparalítica. Câmara anterior Para o exame detalhado da câmara anterior, necessita-se da lâmpada de fenda, sendo, portanto, um exame da alçada do oftalmologista. Se esta não for disponível, o uso de lupa e lâmpada permitem ver a profundidade da câmara, a limpidez ou a nebulosidade do humor aquoso, a presença de sangue (hifema 10 ) e o acúmulo de exsudato celular (hipópio) no interior da câmara anterior. Íris e pupilas A cor, os desvios e os orifícios da íris e da pupila devem ser analisados conjuntamente, podendo ocorrer alterações congênitas, traumáticas ou cirúrgicas. Quando se observa aderência da íris com o cristalino, tem-se a sinéquia 11 posterior. Quando a aderência é entre a íris e a córnea, ela recebe o nome de sinéquia anterior. 9 De “blefar(o) = pálpebra; spasmós = contração súbita e involuntária dos músculos” (N do A) 10 De “hyphaimos = sangrento” (N do A) 11 De “synécheia = aderência” (N do A) Figura 11 - Hifema, a esquerda; e hipópio, a direita OFTALMOLOGIA - 36 As pupilas normais são redondas, localizadas centralmente e, na maioria das pessoas, de igual tamanho. No entanto, pupilas de tamanhos diferentes (anisocoria) são observadas em cerca de 25% da população normal. O diâmetro da pupila normal varia de 3 a 5 mm em um ambiente iluminado. Uma pupila menor que 3 mm está em miose e uma pupila maior que 7 mm está em midríase. A motilidade ocular intrínseca é testada através dos reflexos pupilares, que são testados da seguinte maneira. Com uma iluminação uniforme sobre a face do paciente, faz- se incidir um feixe luminoso sob um dos olhos. A pupila normal contrai-se vigorosa e rapidamente (reflexo fotomotor direto), mantendo esta contração. A pupila do outro olho deve contrair-se simultaneamente e com a mesma intensidade (reflexo fotomotor consensual ou indireto). O outro reflexo a ser investigado é o reflexo de acomodação. Para isto, aproxima-se um objeto até uma distância de aproximadamente 10 cm do olho. Neste Figura 12 - Respectivamente, sinéquia posterior e sinéquia anterior Figura 13 - Anisocoria OFTALMOLOGIA - 37 momento, ocorre uma miose bilateral, convergência dos olhos e acomodação. Cristalino O exame do cristalino é feito com a lâmpada de fenda, estando a pupila em midríase. Porém, na falta desta, o oftalmoscópio permite a observação de alterações mais grosseiras do cristalino. Quanto mais difícil for a visualização do fundo de olho através do cristalino, maior será a dificuldade de visualização do paciente. Isso pode ocorrer na catarata, quando há perda da transparência do cristalino. Acuidade visual A acuidade visual mede a atividade da mácula e é de grande importância, pois permite esclarecer se a queixa de perda de visão é procedente ou não. O exame deve ser feito em um olho de cada vez, com o outro ocluído. Deve-se evitar a compressão do olho ocluído para que não haja distorção da imagem quando o olho for examinado posteriormente. Caso o paciente use óculos, o teste deve ser realizado com e sem a correção. A tabela mais utilizada é a de Snellen, que é colocada a 6 metros do paciente. A essa distância os raios luminosos do objeto são quase paralelos e um olho normal não precisa fazer nenhum esforço de acomodação (focalizacão) para ver esses objetos com clareza. A tabela de Snellen é feita com letras de tamanhos graduados. A distância em que cada letra subentende um ângulo de 5 minutos é colocadaao lado, no cartaz. O olho normal observa uma letra inteira subentendendo um ângulo de 5 minutos, e quaisquer componentes da letra subentendendo 1 minuto, a uma distância de 20 pés ou 6 metros, Figura 14 - Tabela de Snellen OFTALMOLOGIA - 38 onde cada minuto vai sensibilizar apenas um cone da mácula. Assim, a acuidade visual normal é de 20/20 (em pés) ou de 6/6 (em metros). Se o paciente é capaz de ler somente a linha 20/30, registra-se esta visão. Se o paciente não consegue ler a maior letra (20/200), reduz-se a distância entre o paciente e a tabela pela metade e registra-se 10/200 ou reduz-se a distância a ¼ e registra-se 5/200. A visão através do buraco estenopeico é testada se o paciente não conseguir ler a linha de 20/30. Esse instrumento é capaz de corrigir qualquer erro de refração sem o uso de lentes. Com ele, um paciente com vício de refração deverá ler perto de 20/20. Se não houver melhora, deve-se suspeitar de outras causas para a diminuição da acuidade visual, como uma opacidade nos meios oculares ou patologias da mácula ou do nervo óptico. Se o paciente não consegue ler nenhuma letra, pode-se caminhar na direção do paciente até o momento em que este consiga identificar quantos dedos o examinador está mostrando (acuidade visual – dedos a 3 metros). Se ele não consegue fazer contagem de dedos, sua acuidade visual é testada em função do movimento da mão, para ver se percebe vultos. Se não percebe vultos, testa-se a percepção de luz. O registro da visão de perto mais usado é a tabela de Jaegger com graduações de j1, j2, j6. A distância ideal para leitura de perto é de 33 cm. Quando o paciente afasta a leitura, deve-se suspeitar de presbiopia. Quando o paciente aproxima muito a leitura, é provável que seja míope. Quando o paciente é analfabeto, o quadro é construído com objetos ou animais facilmente identificáveis. O encontro de distúrbios de acuidade visual exige uma completa investigação oftalmológica. Motilidade ocular extrínseca A posição do globo ocular é dada pelo funcionalmente harmônico dos vários músculos extra-oculares. Havendo predomínio de um deles, ocorre o estrabismo (desvio do olho do seu eixo normal), que pode ser horizontal (convergente ou divergente) ou vertical (superior ou inferior), da dependência do desvio ser numa ou outra direção. O exame se faz da seguinte maneira. Estando o paciente com a cabeça imóvel, o examinador incide um feixe de luz sobre as córneas, com uma lanterna colocada a 30 cm do olho do paciente, e observa a simetria do reflexo luminoso. A posição assimétrica indica desvio ocular. O reflexo do lado nasal indica estrabismo divergente. O contrário indica estrabismo convergente. A seguir, solicita-se ao paciente que desloque os olhos nos seguintes sentidos: Para esquerda Para direita Para cima e para esquerda Para cima e para direita Para baixo e para esquerda Para baixo e para direita OFTALMOLOGIA - 39 Deve haver concordância (paralelismo) no olhar. Cover-test A oclusão do olho fixador de um estrábico pode fazer com que a fixação passe a ser adotada pelo outro olho (estrabismo alternante). Com isso, o olho não ocluído faz um movimento para a fixação que pode determinar o tipo de estrabismo. No estrabismo convergente o olho se move para fora, enquanto no divergente ele se move para dentro. Quando o paciente alterna e mantém indistintamente a fixação em cada olho, o prognóstico é muito bom. Quando ele retoma a fixação do olho ocluído ao se retirar a oclusão percebe-se a dominância desse olho, e o estrabismo é considerado mais grave quanto maior for a dominância. Visão binocular A visão binocular serve para nos dar noção de tridimensionalidade. Ela é testada pedindo-se para o paciente tocar com a ponta de um dedo o dedo do examinador. Se não houver alteração de SNC, esse teste permite determinar uma ausência de percepção de profundidade. Visão de cores A visão normal das cores é imprescindível para certos trabalhos e pode sofrer alterações em algumas doenças, como nas deficiências nutricionais (avitaminose A), por ação de certas drogas (cloroquina), doenças do nervo óptico e doenças da mácula. Uma deficiência na identificação do vermelho (protanopsia) ou verde (deuteranopsia) ocorre em 4% dos homens e em 0,4% da mulheres. A deficiência nas cores azul (tritanopsia) ou amarelo (tetranopsia) é muito rara. Os principais testes para o estudo da visão de cores são: 1. Testes de confusão colorida Atlas de Ishihara 2. Testes de discriminação coloria Farnsworth 100 HUE 3. Testes de igualação de placas coloridas Anomaloscópio de Nagel Esses testes destinam-se a separar a visão normal da defeituosa, fazer uma avaliação qualitativa de acordo com o tipo de defeito e a análise quantitativa do grau de deficiência. Campimetria O objetivo da campimetria é determinar os limites externos da percepção visual pela retina periférica, assim como a qualidade de visão nessa área. Cada olho é examinado separadamente. No exame por confrontação, obtém- se um resultado grosseiro confrontando-se o campo visual do paciente com o campo visual do examinador, supondo-se que este tenha um campo visual normal. OFTALMOLOGIA - 40 O examinador cobre seu olho direito e o paciente o seu olho esquerdo. Fazendo-se movimentos com a mão ou com um objeto, confrontam-se os campos visuais, que é considerado normal se o paciente vir o alvo a 90 o temporalmente, 50 o nasalmente, 50 o para cima e 65 o para baixo. Repete-se o teste com o outro olho. Pela técnica de confrontação visual é possível detectar apenas alterações grosseiras no campo visual, causadas por doenças oculares como o glaucoma e a coriorretinite, ou doenças intracranianas, não sendo possível detectar pequenos escotomas. O exame através do perímetro é mais preciso, porém mais demorado, exigindo presença de equipamento especial para a sua realização. O perímetro é um aparelho em cujo centro o paciente fixa os olhos. Partem da periferia estímulos luminosos de intensidades e tamanhos diferentes, os quais o paciente deve identificar. Tonometria É a medida da pressão intra-ocular, constituindo o método mais importante para o diagnóstico e o acompanhamento do glaucoma. Variações fisiológicas ocorrem de indivíduo para indivíduo, de acordo com a idade, o dia e a hora de medição. Existem três tipos de tonometria, a digital, a de aplanação corneana e a de depressão corneana. A tonometria digital não é recomendada pois fornece apenas uma resposta muito grosseira quanto a diferenças de pressão entre os dois olhos. Pede-se ao paciente para olhar para baixo, sem fechar os olhos, e coloca-se os dedos indicadores sobre a pálpebra superior, exercendo pressão com um dedo de cada vez. O instrumento mais comumente usado é o tonômetro de aplanação, que é ligado à lâmpada de fenda e mede a força requerida para aplanar a área fixada da córnea. O tonômetro de Schiötz mede a quantidade de depressão corneana produzida por um peso ou força preestabelecida. Quanto menor a pressão ocular, menor a força necessária para deprimir a córnea. A faixa de pressão intra-ocular normal é de 10 a 24 mmHg. Oftalmoscopia Para realizar este exame, a pupila deve ser dilatada (com tropicamida ou fenilefrina), pois só assim pode-se examinar a periferia da retina. Na oftalmoscopia direta, para o exame do olho direito do paciente, o médico segura o instrumento com a mão direita usando o seu olho esquerdo. Com o dedo indicador, ele muda as lentes, até colocar em foco a retina. Para o exame do olho esquerdo, o processo é invertido. O fundo de olho normal é visto como um reflexo vermelho, denominado clarão pupilar. Entre o examinador e a retina, podem-se encontrar opacidades nos meios transparentes (córnea, cristalino e vítreo). O disco do nervoóptico é o primeiro elemento a ser examinado. Em condições normais, ele tem um diâmetro vertical um pouco maior do que o horizontal e uma coloração um pouco diferente da retina, com uma depressão mais clara no centro, a escavação fisiológica. Essa escavação deve ter, no máximo, metade do diâmetro do disco do nervo óptico. OFTALMOLOGIA - 41 No exame dos vasos sangüíneos, é necessário caracterizar as artérias e as veias. As artérias são de cor vermelho-clara, enquanto as veias são vermelho-escuras. A artéria é mais estreita, com um reflexo central mais brilhante. Visto que os vasos são transparentes, o que se observa, na realidade, é a coluna sangüínea no seu interior. O observador deve procurar estreitamentos focais ou generalizados das artérias, tortuosidades das veias, além de observar os cruzamentos arteriovenosos. Vasos sem noção de arquitetura são vasos da coróide que aparecem no fundo de olho de pacientes sem pigmentação retiniana (albinos). Os albinos não possuem mácula e enxergam muito mal. A área macular localiza-se no lado temporal a uma distância correspondente a dois diâmetros do disco do nervo óptico. É uma área mais escura do que a retina que a rodeia. Não possui vasos na sua parte anterior e sua nutrição é feita pela coróide. A área central da mácula, com um brilho característico, é a fóvea. Esta área é responsável pela visão central. Os campos retinianos devem estar isentos de hemorragia ou de manchas brancas ou escuras circunscritas. A oftalmoscopia indireta é feita exclusivamente pelo oftalmologista, que usa um aparelho especial que permite examinar a periferia da retina, região que a oftalmoscopia direta não consegue atingir. Lâmpada de fenda Envolve o exame das estruturas oculares externas e da parte anterior do olho até o vítreo anterior utilizando um microscópio especialmente projetado e uma fonte de luz. A biomicroscopia com uma lâmpada de fenda está indicada nos casos em que se deseja avaliar o segmento anterior do olho com uma visualização mais ampliada e melhor iluminada. O paciente e o examinador ficam sentados de cada lado da lâmpada. O paciente apoia o queixo sobre um suporte enquanto o examinador vê o olho através do microscópio. O uso de uma lente de Hruby permite visualizar o fundo de olho. Adaptando-se um tonômetro de aplanação sobre a lâmpada de fenda, pode-se fazer a medição da pressão intra-ocular. Angiografia retiniana Permite o diagnóstico de doenças retinianas, consistindo na introdução, na veia braquial, de um contraste com fluoresceína, seguido de fotografias em série do fundo de olho. Este exame tem grande utilidade na documentação de detalhes anatômicos do fundo de olho, fluxo de sangue e patologias corioretinianas. Ultra-sonografia Parte de um feixe de ultra-sons é refletida quando ele incide na interface de dois meios de densidades diferentes. O aparelho é formado por uma sonda de dupla OFTALMOLOGIA - 42 função, emissora e receptora, que, colocada sobre o olho, permite caracterizar a córnea, o cristalino e a retina. As principais indicações da ultra-sonografia oftálmica são: Biometria Avaliação vítreo-retiniana quando os meios oculares são opacos Leucocorias da infância Diagnóstico diferencial dos tumores intra-oculares Trauma Oftalmodinamometria A oftalmodinamometria é a técnica usada para medir a pressão sangüínea da artéria oftálmica. O aparelho comprime o globo ocular pela esclera, ao mesmo tempo que se faz a oftalmoscopia. A pressão diastólica da artéria central da retina corresponde ao início das pulsações nesta artéria. Continua-se a compressão do globo ocular até o desaparecimento das pulsações da artéria. O momento em que isto ocorre corresponde ao nível da pressão sistólica. Os níveis pressóricos da artéria oftálmica são de, aproximadamente, 80% dos da artéria braquial. OFTALMOLOGIA - 43 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Glaucoma Introdução O glaucoma abrange um complexo de entidades patológicas que têm, em comum, um aumento na pressão intra-ocular suficiente para causar degeneração do disco do nervo óptico e defeitos no campo visual. A incidência do glaucoma na população geral acima de 40 anos de idade é de 1,5%, sendo especialmente maior na raça negra. As pessoas dessa raça com idade entre 45 e 65 anos tem uma prevalência cerca de 15 vezes maior do que os brancos com a mesma idade. A principal ameaça do glaucoma crônico (ângulo aberto) é uma insidiosa perda visual, que varia desde um leve borramento até a cegueira completa. A doença é bilateral e deve ser geneticamente determinada, provavelmente por herança multifatorial ou poligênica. Em geral, o glaucoma infantil apresenta forma autossômica recessiva de herança, enquanto algumas síndromes específicas do glaucoma são transmitidas como doenças autossômicas dominantes. O glaucoma agudo (glaucoma de ângulo fechado) compreende menos de 5% dos casos. Na maioria dos casos, a cegueira pode ser evitada quando o tratamento é instituído precocemente. O tratamento do glaucoma deve ser feito pelo oftalmologista, mas todos os clínicos devem participar no diagnóstico, fazendo tonometria e oftalmoscopia como parte do exame clínico de rotina, particularmente em pacientes com história familiar de glaucoma. Classificação Glaucoma primário Glaucoma de ângulo aberto Também chamado glaucoma simples, glaucoma de ângulo largo ou glaucoma crônico simples É a forma mais comum Glaucoma de ângulo fechado Também chamado glaucoma congestivo agudo Agudo Subagudo ou crônico Iris plateau Glaucoma congênito Glaucoma congênito primário Glaucoma infantil Glaucoma associado a anomalias congênitas Glaucoma pigmentar Aniridia OFTALMOLOGIA - 44 Síndrome de Axenfeld Síndrome de Sturge-Weber Glaucoma infantil com desenvolvimento tardio Síndrome de Marfan Neurofibromatose Síndrome de Lowe Microcórnea e megalocórnea Glaucoma secundário Devido a alterações do cristalino Descolamento Intumescência Facolítica Síndrome exfoliativa Pseudo-exfoliação da cápsula do cristalino, glaucoma capsular Devido a alterações do trato uveal Sinéquia anterior periférica Ângulo fechado sem bloqueio da pupila Iridociclite Tumor Atrofia essencial da íris Síndrome córneo-endotelial Devido a trauma Hemorragia maciça dentro da câmara anterior Hemorragia maciça dentro da câmara posterior Laceração corneana ou límbica com prolapso da íris dentro do ferimento Retrodescolamento da raiz da íris acompanhando contusão (recessão do ângulo) Conseqüente a processos cirúrgicos Proliferação epitelial dentro da câmara anterior Falha na pronta restauração da câmara após extração de catarata Associados a rubeose Diabetes mellitus Oclusão da veia central da retina Associado a exoftalmo pulsátil Associado a corticosteróides tópicos Outras causas raras de glaucoma secundário Glaucoma absoluto O resultado final de qualquer glaucoma não controlado é um olho rígido, sem visão e, freqüentemente, doloroso OFTALMOLOGIA - 45 Fisiopatologia A pressão intra-ocular é determinada pelo índice de produção de humor aquoso pelo epitélio do corpo ciliar e pela resistência ao seu escoamento. O humor aquoso é um líquido claro que preenche as câmaras anterior e posterior do olho e que contém, em geral, os mesmos eletrólitos e componentes encontrados no plasma, apesar das suas concentrações serem diferentes. O esvaziamento da câmara anterior, seja por cirurgia, trauma ou durante condições inflamatórias intra-oculares, causa a formação de um humor aquoso semelhante ao plasma, apresentando uma concentração proteica muito mais alta que o aquoso normal. Ofluxo do humor aquoso é constante. Ele é formado pelo corpo ciliar, passa da câmara posterior para a câmara anterior através da pupila e é drenado em direção a malha trabecular e ao canal de Schlemm no ângulo iridocorneal da câmara anterior, que conduz o fluido ao sistema venoso. Uma pequena quantidade de aquoso deixa o olho através dos vasos do trato uveal e da esclera (fluxo úveo-escleral). Qualquer que seja o mecanismo da elevação da pressão intra-ocular, todos os tipos de glaucoma exercem os mesmos efeitos dentro do olho. Suas manifestações são influenciadas pelo curso da doença e pela intensidade da pressão intra-ocular. O maior mecanismo de perda visual no glaucoma é a atrofia celular ganglionar difusa, que conduz à escassez das camadas fibrosas nervosas e nuclear interna da retina e perda dos axônios do nervo óptico. O disco do nervo óptico torna-se atrófico com o aumento da escavação óptica. A íris e o corpo ciliar também tornam-se atróficos e o processo ciliar mostra degeneração hialina. Avaliação clínica do glaucoma Tonometria A tonometria é um método de mensuração da pressão intra-ocular usando instrumentos calibrados que aplanam (tonômetro de aplana-ção) ou identam (tonômetro de Schiötz) o ápice corneano. Uma vez que ambos os métodos necessitam tocar a Figura 1 - Fluxo do humor aquoso Figura 2 - Tonômetro de aplanação, a esquerda, e tonômetro de Schiötz, a direita OFTALMOLOGIA - 46 córnea do paciente, eles necessitam de anestésico tópico e desinfecção da ponta do instrumento antes do uso. Gonioscopia O ângulo iridocorneal da câmara anterior é formado pela junção da periferia da córnea e da íris, entre as quais encontra-se a malha trabecular. A configuração deste ângulo, isto é, se ele é largo (aberto), estreito, ou fechado, tem uma importante relação na saída do fluxo do humor aquoso. A abertura desse ângulo pode ser estimada pela iluminação oblíqua da câmara anterior com uma caneta luminosa ou pela observação, na lâmpada de fenda, da profundidade da câmara anterior periférica. Porém, a determinação do ângulo iridocorneal é melhor feita pela gonioscopia, que permite uma visualização direta das estruturas do ângulo, utilizando-se um aumento binocular e goniolentes especiais, do tipo Goldmann e Posner/Zeiss, por exemplo. Essas lentes têm ângulos de espelhos especiais que fornecem uma linha de visão paralela com a superfície da íris e direcionada para o ângulo. Depois da anestesia local, o paciente é posicionado na lâmpada de fenda e as goniolentes são colocadas no olho. Detalhes ampliados do ângulo iridocorneal podem ser vistos estereoscopicamente em torno dos seus 360 graus de circunferência. Se for possível visualizar completamente a extensão da malha trabecular, o esporão escleral e os processos da íris, o ângulo está aberto. Conseguindo-se ver apenas a linha de Schwalbe ou uma porção pequena da malha trabecular, significa que o ângulo está estreito. Quando não se consegue ver a linha de Schwalbe, o ângulo está fechado. Avaliação do disco do nervo óptico A atrofia óptica glaucomatosa produz alterações específicas dos discos ópticos, caracterizadas principalmente pela perda de substâncias do disco, Figura 3 - Gonioscopia Figura 4 - Visualização das estruturas do ângulo iridocorneal OFTALMOLOGIA - 47 detectável como alargamento da escavação do disco do nervo óptico, associada à sua palidez na área da escavação. Quando a escavação se desenvolve, os vasos retinianos sobre o disco são deslocados nasalmente. O resultado final da escavação é, então, chamado de cálice “panela de feijão”, no qual nenhum tecido neural é aparente. A “taxa escavação-disco” é uma maneira útil de registrar o tamanho do disco do nervo óptico em pacientes com glaucoma. A avaliação clínica do disco do nervo óptico pode ser realizada pela oftalmoscopia direta ou pelo exame com lentes de 70 dioptrias, as lentes Hruby, ou lentes de contato corneanas especiais que proporcionam uma visão tridimensional. Outras evidências clínicas de danos neuronais no glaucoma incluem a atrofia da camada de fibras nervosas da retina, que é detectada (sinal de Hoyt) oftalmoscopicamente e precede o desenvolvimento de alterações no nervo óptico. Exame do campo visual O exame regular do campo visual é essencial para o diagnóstico e seguimento do glaucoma. A perda do campo visual glaucomatoso não é específica, sendo semelhante a várias alterações do nervo óptico. Porém, o tipo da perda do campo, a natureza de sua progressão e a correlação com as alterações do disco do nervo óptico são características da doença. Várias maneiras de testar o campo visual do glaucoma incluem tela tangente, perímetro de Goldmann, análise do campo de Friedmann e perímetro automático. Figura 5 - Alargamento da escavação do disco óptico (A - Escavação; B - Disco óptico) OFTALMOLOGIA - 48 Glaucoma de ângulo aberto No mínimo 90% dos casos de glaucoma primário são do tipo de ângulo aberto (glaucoma crônico), que é bilateral, insidioso no aparecimento e de progressão lenta. Não há sintomas até que ocorra perda visual, freqüentemente muito tardia para se tentar salvar a visão. Entretanto, é da responsabilidade do médico diagnosticar o glaucoma antes que se processe a danificação irreversível do nervo óptico. O tratamento precoce evita ou adia a deterioração visual. Parece certo que o aumento da pressão intra-ocular seja causado pela interferência com o fluxo do humor aquoso, devido a alterações degenerativas no trabéculo, canal de Schlemm e canais adjacentes. A pressão elevada, causada tanto pela excreção defeituosa como pelo aumento na produção do humor aquoso, afeta primariamente a retina e o nervo óptico. Alguns autores também acreditam existir uma alteração degenerativa primária do nervo óptico causada por insuficiência vascular. Esse ponto de vista é sustentado pela observação de que, às vezes, a perda da função continua progredindo mesmo depois da pressão intra-ocular ter sido normalizada pelo tratamento. Quando a pressão permanece elevada, uma grande lesão afeta o olho. O nervo óptico sofre ou intensifica sua degeneração, assumindo freqüentemente uma aparência típica de escavação. Há degeneração das células ganglionares e fibras nervosas da retina. A íris e corpo ciliar tornam-se atróficos e os processos ciliares mostram degeneração hialina. Clinicamente, a perda visual é quase sempre um achado tardio. Embora a doença seja comumente bilateral, um olho é freqüentemente envolvido mais cedo e com mais gravidade do que o outro. Figura 7 - Aspecto microscópico da escavação óptica glaucomatosa Figura 6 - Exame do campo visual (A - Perímetro de Goldmann; B - Análise do campo de Friedmann; C - Perímetro automático) A B C OFTALMOLOGIA - 49 As alterações do disco do nervo óptico são achados precoces importantes. A margem temporal do disco do nervo óptico adelgaça-se e a escavação torna-se gradativamente mais larga e profunda. Os grandes vasos deslocam-se nasalmente e a área afetada do disco do nervo óptico torna-se atrófica (cinza clara ou branca em vez de rosada). A lâmina cribosa fica mais exposta. A pressão intra-ocular é elevada. O ângulo da câmara anterior pode ser normal à gonioscopia. A perda da função visual por glaucoma pode ser melhor determinada por estudos repetidos do campo visual. O objetivo do tratamento é facilitar a excreção do humor aquoso através dos canais de escoamento existentes, por meio de mióticos. A droga de escolha é a pilocarpina (1 a 4%, instilada em cada olho até 5 vezes ao dia). O carbacol (0,75 a 3%) pode ser útil quando a pilocarpina não está agindo ou quando o paciente é alérgico a ela. A pilocarpina e o carbacol são drogas colinérgicas. As drogas anticolinesterásicas,como o brometo de demecarium (Humorsol®, 0,06 e 0,25%) e o iodeto de echothiophato (Fosfolina®, 0,03 a 0,24%), são mióticos de ação mais prolongada. Em virtude do alto risco de complicações, os mióticos de ação mais prolongada são reservados para pacientes com glaucoma de ângulo aberto não candidatos a cirurgia ou que sejam afácicos. Os mióticos freqüentemente causam turvação temporária da visão, por uma a duas horas, após a sua instilação. Esse efeito colateral pode ser reduzido pelo uso do sistema de distribuição de uma membrana controlada (Ocusert®) que permite difusão contínua da droga ativa por aproximadamente uma semana. O maleato de timolol (Timoptic®, 0,25 e 0,5%), um bloqueador beta-adrenérgico de poucos efeitos colaterais, baixa a pressão intra-ocular pela diminuição da formação do humor aquoso. Ele pode ser usado isoladamente ou em associação com outras drogas. Todavia, devido aos seus graves efeitos colaterais, essa droga é contra-indicada em pacientes com doenças pulmonares obstrutivas crônicas ou com insuficiência cardíaca. Uma alternativa para o timolol no tratamento do glaucoma é o betaxolol (Betótico®), um bloqueador beta-adrenérgico com efeitos comparáveis na pressão intra-ocular, mas que tem a vantagem de agir seletivamente nos receptores beta1, reduzindo a possibilidade de efeitos colaterais. A epinefrina (0,5 a 2%, instilada 1 a 2 vezes por dia) diminui a produção do humor aquoso e aumenta o seu escoamento, tendo uma ação mais duradoura do que os mióticos e causando menos complicações. Por esses motivos, a epinefrina é freqüentemente usada como o primeiro medicamento no glaucoma de ângulo aberto, sendo associada mais tarde a outros medicamentos, se necessário. Os inibidores da anidrase carbônica, como a acetazolamida (Diamox®, 125 ou 250 mg, 4 vezes ao dia; ou Diamox Sequel®, 500 mg, 2 vezes ao dia), são usados no glaucoma de ângulo aberto quando os mióticos fortes e a epinefrina não controlam adequadamente a tensão intra-ocular. Figura 8 - Fundo de olho com escavação do disco óptico OFTALMOLOGIA - 50 Outros inibidores da anidrase carbônica incluem a diclorofenamida (Deramide®), a metazolamida (Neptazane®) e a etoxzolamida. A terapia de trabeculoplastia com laser pode ser usada como um auxiliar do tratamento clínico antes de se recorrer à cirurgia. Ela reduz a pressão intra- ocular em quase 25% em 80% dos pacientes. A cirurgia para o glaucoma de ângulo aberto deve ser feita se a pressão intra-ocular não puder ser mantida em níveis normais pelo tratamento clínico e se houver perda progressiva do campo visual com dano ao nervo óptico. Não há operação que seja uniformemente eficiente no tratamento do glaucoma de ângulo aberto. Dentre elas, incluem-se as operações filtrantes clássicas, trepanação, esclerectomia, esclerostomia térmica e trabeculectomia. Glaucoma de ângulo fechado O glaucoma de ângulo fechado (glaucoma agudo) ocorre quando há uma elevação repentina da pressão intra-ocular, causada por um bloqueio do ângulo da câmara anterior, na raiz da íris, provocando uma interrupção do escoamento do humor aquoso e causando fortes dores e repentina perda visual. Um surto agudo de glaucoma de ângulo fechado pode ocorrer apenas em um olho, no qual o ângulo da câmara anterior é, anatomicamente, estreito. Esta situação pode ser facilmente determinada pela avaliação da profundidade da câmara anterior, usando iluminação oblíqua de uma lanterna manual. A obstrução do ângulo da câmara anterior pode ocorrer tanto quando a íris tem uma área de contato muito grande com a superfície anterior do cristalino, quanto pelo aumento fisiológico nas dimensões do cristalino com a idade, que podem obstruir a livre passagem do humor aquoso da câmara posterior para a anterior. À medida que a pressão se eleva na câmara posterior, a íris é impulsionada para frente até ir de encontro ao trabéculo, impedindo o escoamento do humor aquoso e resultando em um glaucoma de ângulo fechado. Clinicamente, o glaucoma de ângulo fechado (agudo) é caracterizado por um repentino borramento de visão seguido de dor excruciante, localizada dentro e ao redor do olho, e a visão de um arco-íris ao redor das luzes. Freqüentemente há náuseas e vômitos. Outros achados incluem pressão intra-ocular extremamente elevada, uma câmara anterior rasa, córnea edematosa, acuidade visual diminuída (às vezes apenas limitada à percepção da luz), pupila fixa e moderadamente dilatada, e injeção ciliar. Os principais diagnósticos diferenciais do glaucoma de ângulo fechado são a irite e a conjuntivite agudas. A irite aguda causa mais fotofobia e menos dor do que o glaucoma agudo. A pressão intra-ocular é normal, a pupila apresenta-se contraída e a córnea não é edematosa. OFTALMOLOGIA - 51 Na conjuntivite aguda há pouca ou nenhuma dor e não ocorre perda visual. Verifica-se secreção no olho e uma conjuntiva intensamente inflamada, mas não há injeção ciliar. As respostas pupilares são normais, a córnea é clara e a pressão intra- ocular normal. A iridociclite com glaucoma secundário pode representar um difícil problema de diferenciação. É de muita utilidade a gonioscopia para definir o tipo de ângulo. Terapeuticamente, o glaucoma de ângulo agudo é considerado uma emergência cirúrgica em oftalmologia. Antes da cirurgia, todo esforço deve ser feito para reduzir a pressão intra-ocular por meios medicamentosos. A combinação de um agente osmótico (glicerol 50%, 1 ml/kg; ou manitol 20%, 1,5 a 3 g/kg), um miótico (pilocarpina 2%, 2 gotas a cada 15 minutos durante várias horas) e acetazolamida (500 mg, I.M.) é o tratamento médico de escolha. Pode-se administrar analgésicos sistêmicos (meperidina, 100 mg, I.M.) quando necessário, para aliviar a dor. Embora a intervenção cirúrgica possa ser adiada por várias horas para permitir o clareamento da córnea, a cirurgia é indicada quer a pressão possa ser reduzida ou não. O método mais seguro para vencer o bloqueio pupilar é a iridotomia por laser. Glaucoma crônico de ângulo fechado O glaucoma crônico de ângulo fechado (ou subagudo) é causado pelos mesmos fatores etiológicos que os do glaucoma agudo de ângulo fechado. A diferença está no fato de não haver bloqueio completo e repentino no escoamento do humor aquoso pela íris impulsionada contra o trabéculo. Figura 9 - Diagnóstico diferencial entre o glaucoma agudo, a esquerda, e a irite aguda, a direita Figura 10 - Resultado de uma iridotomia por laser OFTALMOLOGIA - 52 Clinicamente, os sintomas são mínimos ou ausentes. Surtos discretos e ocasionais de pressão intra-ocular elevada causam borramento transitório da visão, halos ao redor das luzes e, possivelmente, dor fraca dentro ou na região dos olhos. Ao exame, encontra-se uma câmara anterior rasa, pressão intra-ocular alta e um ângulo, gonioscopicamente, estreito. O tratamento é o mesmo do glaucoma de ângulo fechado. Após vencer o bloqueio pupilar com a iridectomia, o glaucoma residual deverá ser tratado da mesma maneira que o glaucoma de ângulo aberto. Glaucoma congênito primário O glaucoma congênito primário (glaucoma infantil) é uma forma de glaucoma com início no primeiro ano de vida. Um quarto dos casos já está presente ao nascimento e poucos são diagnosticados após o segundo ano de vida. O quadro patológico é produzido por uma cessação do desenvolvimento das estruturas do ângulo por volta do sétimo mês de vida fetal. A íris é hipoplásica e se insere na superfície trabecular em frente de um esporão escleral pouco desenvolvido. Clinicamente, o primeiro sintoma é a epífora. A fotofobia também pode estar presente. A pressão intra-ocular elevada é o principal sinal. A escavação glaucomatosa do disco do nervo óptico é uma alteração relativamente precoce e da maior importância. Os achados tardios incluemdiâmetro corneano aumentado (buftalmia 12 ), edema epitelial, ruptura da membrana de Descemet e profundidade da câmara anterior aumentada (associada a aumento geral do segmento anterior do olho), assim como edema e opacificação do estroma corneano. A íris insere-se anteriormente no trabéculo e não no corpo ciliar. Os princi- pais diagnósticos diferenciais do glaucoma infantil são a megalocórnea, o glaucoma secundário e a turvação traumática da córnea. A medida da tensão intra-ocular, gonioscopia e exame do disco do nervo óptico são a chave para o diagnóstico diferencial. 12 De “bu = boi; oftalmo- = olho; ia = estado” (N do A) Figura 11 - Buftalmia OFTALMOLOGIA - 53 Terapeuticamente, contrariamente ao glaucoma de ângulo aberto, em que o melhor tratamento é freqüentemente não cirúrgico, o glaucoma congênito primário deve ser tratado cirurgicamente para que se possa obter resultados duradouros. A goniotomia é a terapia de escolha. Quando repetidas goniotomias falham ou não são possíveis em virtude de turvação corneana, uma trabeculotomia externa é muitas vezes eficiente. Nos casos não tratados a cegueira ocorre precocemente. O olho sofre uma distensão marcante e pode até romper-se por um trauma secundário. A escavação glaucomatosa típica ocorre relativamente cedo, acentuando a necessidade de um tratamento eficaz e precoce. Quanto mais cedo se manifesta a doença, menos favorável é o prognóstico, uma vez que o aparecimento dos sintomas implica num defeito de drenagem mais grave. Glaucoma de baixa pressão Este termo engloba certas condições em que há evidência de dano glaucomatoso intra-ocular (escavação do disco do nervo óptico, defeitos de campo visual, etc.) com pressão intra-ocular normal ou baixa. A maioria de tais casos decorre das seguintes situações. Ocasiões em que algum tipo de glaucoma, geralmente secundário, causou alterações permanentes e então regrediu espontaneamente. A tonografia pode revelar redução na facilidade de escoamento. Como a pressão intra-ocular apresenta uma variação diária, ela pode estar normal em alguns momentos e elevada em outros. Por fim, uma variedade de casos mistos de danos ao nervo óptico e retina, incluindo doenças vasculares, congênitas e degenerativas, podem resultar em um “glaucoma de baixa pressão”. Glaucoma associado a anomalias congênitas Antigamente classificado como glaucoma juvenil, este amplo grupo de síndromes caracteriza-se pela elevação da pressão intra-ocular em pessoas abaixo dos 40 anos de idade. Glaucoma pigmentar OFTALMOLOGIA - 54 Esta síndrome parece ser, primeiramente, uma degeneração do epitélio pigmentar da íris e corpo ciliar. Os grânulos do pigmento liberam-se da íris como um resultado da fricção contra os agrupamentos que ficam sob as fibras zonulares, resultando na transiluminação da íris. O pigmento fica depositado na superfície corneana posterior (fuso de Krukenberg) e fica alojado nas malhas trabeculares, impedindo o escoamento normal do humor aquoso. O glaucoma pigmentar ocorre mais freqüentemente em homens míopes entre os 25 e 40 anos que tenham uma câmara anterior profunda com um ângulo anterior largo. As alterações pigmentares podem estar presentes sem glaucoma, mas tais pessoas devem ser consideradas como “suspeitas de glaucoma”. Este tipo de glaucoma responde ao maleato de timolol e à epinefrina. Os mióticos raramente podem ser usados nesses pacientes jovens por causa da miopia induzida. O prognóstico não é favorável se o processo for bastante grave a ponto de exigir uma operação filtrante. A trabeculoplastia com laser pode melhorar o prognóstico. Aniridia A principal característica da aniridia, como o próprio nome indica, é o vestígio da íris. Freqüentemente, pouco mais que a raiz da íris ou uma faixa delgada da íris estão presentes. Outras deformidades do segmento anterior do olho podem aparecer tais como a catarata congênita, distrofia corneana e hipoplasia da fóvea. Esta síndrome rara é determinada geneticamente, de maneira tanto autossômica dominante como recessiva. A visão é geralmente baixa. O glaucoma desenvolve-se, com freqüência, antes da adolescência e, em geral, é resistente ao tratamento médico ou cirúrgico. Quando a terapia médica é ineficaz, a goniotomia ou trabeculotomia podem, ocasionalmente, normalizar a pressão intra-ocular. Freqüentemente, as operações filtrantes são necessárias. Figura 22 - Fusos de Krukenberg (setas) Figura 13 - Aniridia OFTALMOLOGIA - 55 Trabeculodisgenesia iridocorneana (Síndrome de Axenfeld, Síndrome de Rieger, Anomalia de Peters) Estas raras afecções representam um conjunto de desenvolvimento imperfeitos das estruturas mesodérmicas do segmento anterior, resultando em desenvolvimento anormal do ângulo, íris e córnea. Às vezes, ocorrem alterações do cristalino. Estas doenças são, geralmente, de natureza genética, se bem que casos isolados tenham sido descritos. O glaucoma ocorre em, aproximadamente, 50% de tais casos. Como não há uma cirurgia realmente eficiente, eles são tratados como glaucomas de ângulo aberto. Operações filtrantes ou trabeculotomias devem ser tentadas se falhar o tratamento clínico. Glaucoma secundário A tensão intra-ocular elevada que ocorre como manifestação de doença intra-ocular é chamada glaucoma secundário. É difícil fazer uma classificação satisfatória dessas doenças. Além do tratamento da doença subjacente, várias drogas são valiosas no controle do glaucoma secundário. A redução da produção de humor aquoso com epinefrina, com ou sem inibidores da anidrase carbônica, é adequada. Nas elevações extremas indicam-se agentes osmóticos. OFTALMOLOGIA - 56 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Catarata Introdução A catarata é definida como uma opacidade do cristalino suficiente para perturbar a visão. As principais características da catarata são o edema do cristalino, alterações proteicas, crescente proliferação e ruptura da continuidade normal das fibras do cristalino. Em geral, o edema varia diretamente de acordo com o grau de desenvolvimento da catarata. Etiologia As cataratas podem ocorrer por diversas causas, mas geralmente estão associadas à idade. Estima-se que a sua incidência nos indivíduos com idade entre 65 e 74 anos seja de 50%, elevando-se para 70% naqueles acima dos 75 anos. Outras causas menos freqüentes de catarata incluem: Catarata da infância Catarata congênita Idiopática Doenças infecciosas - Rubéola - Herpes - Sífilis - CMV Doenças metabólicas - Galactosemia - Deficiência de galactoquinase - Hipoglicemia Síndromes - Síndrome de Marfan - Síndrome de Weill-Marchesani - Síndrome de Down - Síndrome de Werner - Síndrome de Lowe Síndrome óculo-cerebro-renal Catarata adquirida Traumatismos Uveítes Infecções oculares adquiridas Diabetes mellitus Drogas OFTALMOLOGIA - 57 Catarata traumática Atividades esportivas Corpo estranho Contusões Exposição ao calor “Catarata dos sopradores de vidro” Radiação Catarata secundária a doença intra-ocular Uveítes recorrentes graves Glaucoma Retinite pigmentar Descolamento de retina Catarata associada a doenças sistêmicas Diabetes mellitus Hipocalcemia Catarata tóxica Glicocorticóides Haloperidol Mióticos Ferro Cobre Catarata senil As cataratas relacionadas à idade são os tipos mais comuns de catarata, na qual a visão progressivamente turva e a distorção visual (os cantos retos parecem ondulados ou curvos) são, geralmente, os únicos sintomas. Paradoxalmente, embora a visão distante seja turva no estágio inicial de formação dacatarata, a visão para perto pode melhorar ligeiramente, de forma que o paciente conseguirá ler sem óculos. Essa “miopia artificial” ou “segunda visão” é proveniente do aumento no índice refrativo do cristalino nos estágios iniciais da doença. Infelizmente, a melhora da visão para perto é somente temporária, até que o núcleo se torne mais opaco. Outros sintomas que podem estar presentes incluem percepção de cor alterada, por amarelamento do núcleo do cristalino, clarão e diplopia monocular. Ao exame físico, o principal sinal observado nas cataratas é a leucocoria (“pupila branca”). Outros sinais menos comuns incluem a alteração do reflexo vermelho com o oftalmoscópio direto colocado em +4 dioptrias. Este exame revelará uma opacidade de lente negra contra uma coloração laranja-avermelhada do reflexo. Se, ao fixar o olhar para cima, a opacidade parecer mover-se para baixo, a opacidade é na parte posterior da lente; se a opacidade mover-se para cima, ela está na parte anterior da lente. Figura 1 - Leucocoria OFTALMOLOGIA - 58 Atualmente, não há tratamento médico para a catarata senil. A extração cirúrgica do cristalino está indicada quando existe prejuízo nas atividades normais do paciente ou na presença de glaucoma ou uveíte secundários. A catarata senil progride vagarosamente ao longo dos anos e a morte pode acontecer antes da necessidade da cirurgia. Se a cirurgia for indicada, a extração do cristalino melhora definitivamente a acuidade em 90% dos casos. Os pacientes restantes apresentam danos retinianos pré- existentes ou desenvolvem complicações pós-operatórias graves que impedem a melhora visual significante, tais como o glaucoma, descolamento de retina, hemorragia vítrea, infecção ou crescimento epitelial da câmara anterior. Catarata da infância As cataratas que ocorrem na infância podem ser classificadas em cataratas congênitas, presentes no nascimento ou que aparecem imediatamente depois do parto; e cataratas adquiridas, que ocorrem mais tarde e estão normalmente relacionadas a algum caso específico. Ambos os tipos podem ser unilaterais, bilaterais, parciais ou completas. Muitas cataratas congênitas são de causa desconhecida, mas provavelmente têm determinação genética. Outras são secundárias a doenças infecciosas ou metabólicas, ou ainda, associadas a diversas síndromes. As cataratas adquiridas surgem muito comumente por traumatismos, uveítes, infecções oculares adquiridas, diabetes mellitus e drogas. Clinicamente, a opacidade congênita do cristalino é comum e, muitas vezes, visualmente insignificante. Freqüentemente, a perda da acuidade visual ou da visão binocular é detectada pelos pais ou professores pela inabilidade da criança em enxergar o quadro negro ou ler com um só olho. A perda da noção de profundidade, isto é, a inabilidade de juntar ou chutar uma bola ou de tirar água de uma jarra e colocar em um copo, pode ser outro sintoma. Uma opacificação parcial ou fora do eixo visual que não influi significativamente na transmissão de luz não requer outro tratamento senão a observação da sua progressão. Todavia, as cataratas congênitas unilaterais que causam perda visual significante devem ser detectadas e tratadas precocemente devido ao grande risco de causarem ambliopia. As cataratas bilaterais simétricas exigem procedimentos menos urgentes, porém, uma demora imprudente pode resultar em ambliopia bilateral. As cataratas adquiridas não requerem o mesmo cuidado urgente (objetivando a prevenção da ambliopia) como a catarata congênita, porque as crianças são Figura 2 - Catarata congênita bilateral OFTALMOLOGIA - 59 maiores e o sistema visual já está mais maduro. Os procedimentos cirúrgicos baseiam-se na localização, tamanho e densidade da catarata. O prognóstico visual para pacientes infantis com catarata que precisam de cirurgia não é tão positivo como para pacientes com catarata senil. A ambliopia associada e anomalias ocasionais do nervo óptico ou da retina limitam o grau de visão útil que pode ser atingido por esse grupo de pacientes. Tratamento cirúrgico A cirurgia de catarata mudou dramaticamente nos últimos 20 anos, principalmente como resultado da cirurgia microscópica, melhor instrumentação, melhor material de sutura e refinamento das lentes intra-oculares. A extração intracapsular do cristalino consiste na remoção total do cristalino dentro da sua cápsula através de uma incisão de 140 a 160 graus no limbo superior. Na extração extracapsular também é realizada uma incisão limbar superior, mas a porção anterior da cápsula do cristalino é cortada e removida, permitindo que o núcleo e o córtex do cristalino sejam removidos do olho sem a remoção da cápsula posterior. Alguns pacientes que se submetem à extração extracapsular desenvolvem opacidade secundária da cápsula posterior, que pode ser tratada utilizando-se o neodimium: YAG laser, onde pulsos de energia laser criam uma abertura na cápsula posterior ao nível do eixo pupilar. A facofragmentação e a facoemulsificação com irrigação, aspiração ou ambas, são técnicas extracapsulares que se utilizam de vibrações ultra-sônicas para remoção do núcleo e do córtex através de uma pequena incisão limbar (2 a 5 mm), facilitando a cicatrização no pós-operatório. Recentemente, as operações extracapsulares têm substituído em grande porcentagem os procedimentos intracapsulares principalmente porque uma cápsula posterior intacta permite ao cirurgião inserir uma lente intra-ocular na câmara posterior. Além disso, a incidência de complicações pós-operatórias, como o descolamento de retina e o edema macular cistóide, é menor quando a cápsula posterior é mantida intacta. Existem muitos estilos de lentes, porém todas elas consistem em duas partes básicas, uma lente esférica e uma plataforma ou hápticos, para manter a posição da lente. O posicionamento da lente na câmara posterior é preferido sobre as lentes da câmara anterior devido à menor incidência de complicações na visão, como hiperemia, glaucoma secundário, edema macular e bloqueio pupilar. Contudo, os modelos de lentes de câmara anterior mais recentes têm reduzido a incidência dessas complicações. As lentes de câmara anterior são utilizadas em pacientes que se submeteram à cirurgia intracapsular ou em pacientes cuja cápsula posterior tenha sido inadvertidamente rompida na cirurgia extracapsular. No período pós-operatório, orienta-se o paciente a se movimentar com cautela e evitar fazer esforços ou levantar peso por cerca de um mês. O olho deve ser ocluído por alguns dias, porém, se estiver confortável, a oclusão pode ser removida no primeiro dia do pós-operatório e o olho protegido por óculos ou por um tampão durante o dia. À noite, é necessária uma proteção com tampão de metal durante várias semanas. OFTALMOLOGIA - 60 As contra-indicações à implantação de lentes intra-oculares incluem a uveíte recorrente, retinopatia diabética proliferativa, rubeosis iridis e glaucoma neovascular. Os pacientes com glaucoma de ângulo aberto e hipertensão ocular podem receber lentes intra-oculares, porém são preferíveis as lentes de câmara posterior. A idade é considerada por muitos uma contra-indicação relativa, porém pacientes cada vez mais jovens têm recebido lentes intra-oculares a cada ano. Uma alternativa para as lentes intra-oculares são as lentes de contato. Todavia, muitos pacientes mais velhos não toleram ou não conseguem colocá-las facilmente. Em situações raras, nas quais as lentes de contato ou as intra-oculares não podem ser utilizadas, são prescritos óculos para afácicos. OFTALMOLOGIA - 61 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Conjuntivites Introdução A inflamação da conjuntiva é um dos distúrbios oculares mais comuns, que pode variar em gravidade de uma ligeira hiperemia com lacrimejamento até uma sériaconjuntivite com secreção purulenta copiosa. Classificação Os principais tipos de conjuntivites são: Bacteriana Purulenta Hipergaguda Neisseria gonorrheae Neisseria meningitidis Neisseria gonorrheae kochii Aguda Mucopurulenta Staphylococcus aureus Streptococcus pneumonieae (Pneumococo) Climas temperados Haemophilus aegypitus (bacilos Koch-Weeks) Clima tropical Subaguda Haemophilus influenzae Climas temperados Crônica Incluindo blefaroconjuntivite Staphylococcus aureus Moraxella lacunata (diplobacilo de Morax-Axenfeld) Tipos raros Estreptococo Moraxella catarrhalis Coliformes Proteus Corynebacterium diptheriae Mycobacterium tuberculosis Viral Conjuntivite folicular viral aguda Febre faringoconjuntival devido a adenovírus tipo 3 e outros sorotipos Ceratoconjuntivite epidêmica devido a adenovírus tipos 8 e 19 Vírus herpes simplex Conjuntivite hemorrágica aguda devido a enterovírus tipo 70 OFTALMOLOGIA - 62 Conjuntivite folicular viral crônica Vírus do molusco contagioso Blefaroconjuntivite viral Varicela-Zoster vírus Vírus do sarampo Alérgica Reações de hipersensibilidade imediatas Humoral Conjuntivite “febre do feno” Pólen, grama, etc. Ceratoconjuntivite vernal Ceratoconjuntivite atópica Ceratoconjuntivite papilar gigante Reações de hipersensibilidade retardadas Celular Flictenulose Conjuntivite secundária leve ao contato Problemas de autoimunidade Ceratoconjuntivite seca associada a síndrome de Sjögren Penfigóide cicatricial Clamidiana Tracoma (Clamydia trachomatis serotipos A-C) Conjuntivite de inclusão (Clamydia trachomatis serotipos D-K) Linfogranuloma venéreo (Clamydia trachomatis serotipos L1-3) Outras Rickettsiana Fúngica Parasitária Química ou irritativa Associada a doenças sistêmicas Secundária a dacriocistite ou canaliculite Idiopática Manifestações clínicas O sintoma mais importante das conjuntivites é a sensação de corpo estranho no olho, uma sensação de coceira, ardor e fotofobia, que está freqüentemente associada ao inchaço e à hipertrofia papilar. Se houver dor, a córnea provavelmente está comprometida. Os principais sinais das conjuntivites são hiperemia, lacrimejamento, exsudação, pseudoptose, hipertrofia papilar, quemose, folículos, pseudomembranas e membranas, granulomas e adenopatias pré-auriculares. OFTALMOLOGIA - 63 A hiperemia é o sinal clínico mais facilmente visível da conjuntivite aguda. A vermelhidão é mais marcante no saco conjuntival, diminuindo em direção ao limbo. Uma hiperemia brilhante sugere conjuntivite bacteriana e uma aparência leitosa sugere conjuntivite alérgica. O lacrimejamento (epífora) é freqüentemente proeminente na conjuntivite e resulta da sensação de corpo estranho, ardor ou sensação de arranhadura ou coceira. Uma secreção escassa anormal de lágrimas sugere ceratoconjuntivite seca. A exsudação é uma característica de todos os tipos de conjuntivite aguda. Ela é escamosa e amorfa na conjuntivite bacteriana e em série na conjuntivite alérgica. A secreção das pálpebras ao despertar ocorre em quase todos os tipos de conjuntivite mas se a exsudação for abundante e as pálpebras estiverem firmemente grudadas, a conjuntivite é provavelmente bacteriana ou clamidiana. A pseudoptose é uma queda da pálpebra superior secundária à infiltração do músculo levantador da pálpebra superior. A condição é observada em vários tipos de conjuntivite graves como, por exemplo, no tracoma. A quemose corresponde ao edema conjuntival e geralmente sugere conjuntivite alérgica aguda. Figura 3 - Quemose Figura 1 - Hiperemia conjuntival Figura 2 - Lacrimejamento, exsudação e pseudoptose OFTALMOLOGIA - 64 Os folículos consistem em uma hiperplasia focal dentro da camada linfóide da conjuntiva que normalmente contém um centro germinativo. Clinicamente, podem ser detectados como uma estrutura arredondada, avascular, branca ou cinzenta. Eles são observados em muitos casos de conjuntivite viral, em todos os casos de conjuntivite clamidiana e em alguns casos de conjuntivite tóxica induzida por medicamentos tópicos como idoxuridine, dipivefrin e mióticos. Pseudomembranas e membranas são resultado de um processo exsudativo e diferem apenas em grau. Uma pseudomembrana é um coágulo na superfície do epitélio que, quando removido, deixa o epitélio intacto. Uma membrana é um coágulo envolvendo a superfície do epitélio que resulta em escoriação e sangramento quando removido. Estas estruturas podem acompanhar alguns tipos de conjuntivite viral e bacteriana ou ser conseqüência de queimaduras químicas, especialmente por álcali. A conjuntivite lenhosa é uma forma peculiar de recorrência de conjuntivite membranosa. Ela é bilateral, notada principalmente em crianças, predominantemente no sexo feminino, e pode estar associada a outros achados sistêmicos, inclusive nasofaringite e vulvovaginite. Os granulomas da conjuntiva geralmente são calázios, ou seja, uma inflamação crônica e estéril das glândulas sebáceas tarsais. Clinicamente, caracterizam-se pelo inchaço indolor localizado que se desenvolve no período de semanas. Flictênulas representam uma reação de hipersensibilidade tardia para antígenos microbianos. As flictênulas da conjuntiva inicialmente consistem em perivasculite com linfócitos dentro do vaso. Quando progridem para a ulceração da conjuntiva, a camada ulcerada tem muitos leucócitos polimorfonucleares. A linfadenopatia pré-auricular é um importante sinal de conjuntivite, especialmente a viral. Figura 4 - Folículos conjuntivais Figura 5 - Pseudomembranas Figura 6 - Calázio OFTALMOLOGIA - 65 Conjuntivite bacteriana As conjuntivites bacterianas podem ser classificadas como agudas ou crônicas. O estágio agudo pode ser autolimitado, dependendo do seu agente etiológico, com uma duração de até duas semanas se não for administrado tratamento adequado. As conjuntivites crônicas geralmente ocorrem em pacientes com obstrução do ducto nasolacrimal e dacriocistite crônica, mas também podem estar associadas a blefarite bacteriana crônica. Ela tem um aparecimento mais inócuo e uma evolução demorada. Clinicamente, a maioria dos casos de conjuntivite bacteriana apresenta-se por irritação e injeção bilateral, uma exsudação mucopurulenta que gruda as pálpebras ao despertar e, ocasionalmente, inchaço das pálpebras. A infecção normalmente começa em um olho e se espalha ao outro através das mãos, podendo ser disseminada a outras pessoas. Qualquer conjuntivite purulenta abundante requer investigação laboratorial e tratamento imediatos. Se houver qualquer demora, pode haver sérios danos oculares, inclusive a perda do olho. Laboratorialmente, os organismos podem ser identificados pelo exame microscópico de raspados conjuntivais corados pelo Gram e Giemsa, ou pela cultura. O Staphylococcus aureus é provavelmente a causa mais comum de conjuntivite bacteriana aguda e blefaroconjuntivite (crônica) no mundo ocidental. Na presença de N. gonorrheae ou N. meningitidis, a conjuntiva pode funcionar como uma porta de entrada, resultando em septicemia ou meningite. As principais complicações das conjuntivites bacterianas são as cicatrizes conjuntivais, que podem seguir tanto a conjuntivite pseudomembranosa como a membranosa, a ulceração corneana e a perfuração. O tratamento específico da conjuntivite bacteriana depende da identificação do agente microbiológico pelos exames laboratoriais, mas a antibioticoterapia empírica (cloranfenicol, colírio, 4 vezes ao dia por 7 dias; ou tobramicina, colírio, 4 vezes ao dia por7 dias, associados à pomada na hora de deitar) deve ser iniciada enquanto se aguarda o resultado laboratorial. Nas conjuntivites purulenta e mucupurulenta, o saco conjuntival deve ser irrigado com solução salina, quando necessário, para remover as secreções conjuntivais. Para prevenir o alastramento da doença, o paciente e a família devem ser instruídos para que haja atenção especial com a higiene pessoal. A conjuntivite bacteriana aguda é quase sempre autolimitada. Se não tratada, pode durar de 10 a 14 dias. Se tratada adequadamente, de 1 a 3 dias. As Figura 7 - Ulceração corneana pós-conjuntivite bacteriana OFTALMOLOGIA - 66 exceções são a conjuntivite estafilocóccica, que pode progredir para blefaroconjuntivite e entrar numa fase crônica; e a conjuntivite gonocóccica, que quando não tratada pode levar à perfuração corneana e endoftalmite. Se os esfregaços ou as culturas confirmarem a presença de espécies de Neisseria, aconselha-se a internação do paciente e a administração de uma terapia sistêmica. Conjuntivite viral A conjuntivite viral pode ser causada por uma ampla variedade de vírus. A febre faringoconjuntival é uma doença causada regularmente pelo adenovírus tipo 3 e ocasionalmente pelos tipos 4 e 7 que se caracteriza por febre de 38,3 a 40 o C, garganta dolorida e uma conjuntivite folicular em um ou ambos o olhos. Os folículos estão freqüentemente proeminentes tanto na conjuntiva quanto na mucosa faríngea. A doença pode ser unilateral ou bilateral. Injeção e lacrimejamento ocorrem com freqüência e podem ter ceratite epitelial superficial transitória e, ocasionalmente, alguma opacidade subepitelial. A linfadenopatia pré-auricular endurecida é caraterística. O diagnóstico laboratorial pode ser feito pela cultura do vírus em células HeLa e pela sua identificação por testes de neutralização. Quando a doença progride, ela também pode ser diagnosticada sorologicamente. Os raspados conjuntivais contêm predominantemente células mononucleares e nenhuma bactéria cresce em culturas. A febre faringoconjuntival é mais comum em crianças do que em adultos e pode ser transmitida em piscinas cloradas maltratadas. Não existe tratamento específico mas a conjuntivite é autolimitada, normalmente durando cerca de 10 dias. A ceratoconjuntivite epidêmica é causada por adenovírus tipos 8, 19 e 37 e normalmente é bilateral. O início freqüentemente acontece em apenas um olho e, como regra, o primeiro olho é mais gravemente afetado. No início, o paciente nota injeção, dor moderada e lacrimejamento, seguido em 5 a 14 dias por fotofobia, ceratite epitelial e opacidade subepitelial arredondada. Um gânglio pré-auricular macio é característico. O edema das pálpebras, quemose e hiperemia conjuntival marcam a fase aguda. Folículos e hemorragia subconjuntival freqüentemente aparecem em 48 horas. Pseudomembranas e ocasionalmente membranas podem ocorrer e serem seguidas por cicatrizes planas ou formação de simbléfaro. Na maioria dos casos, a conjuntivite dura de 3 a 4 semanas e cura sem deixar cicatrizes. Laboratorialmente, os vírus podem ser isolados em cultura de células e identificados através de testes de neutralização. Os raspados conjuntivais demonstram uma reação inflamatória mononuclear. Quando ocorrem pseudomembranas, os neutrófilos também podem estar proeminentes. Em adultos, a ceratoconjuntivite epidêmica limita-se à parte externa do olho, mas pode haver sintomas sistêmicos da infecção viral em crianças, como febre, dor de garganta, otite média e diarréia. A transmissão nosocomial durante o exame ocular acontece com freqüência através das mãos do médico, uso de instrumentos oftálmicos mal esterilizados ou uso de soluções contaminadas, particularmente anestésicos tópicos. Não existe tratamento específico para a ceratoconjuntivite epidêmica, mas compressas com água fria podem aliviar alguns sintomas. O uso de corticosteróides OFTALMOLOGIA - 67 durante a conjuntivite aguda podem prolongar o avanço do envolvimento corneano e devem ser evitados. Agentes antibacterianos devem ser administrados se ocorrer superinfecção bacteriana. Conjuntivite alérgica A conjuntivite alérgica, também conhecida como ceratoconjuntivite vernal, conjuntivite da primavera, conjuntivite de estação ou conjuntivite da febre do feno é uma doença bilateral que normalmente começa na pré-adolescência e termina depois de 5 a 10 anos, com uma incidência maior no sexo masculino do que no feminino. O paciente normalmente se queixa de coceira extrema, lacrimejamento, vermelhidão dos olhos e uma sensação freqüente de que os olhos parecem estar “afundando para dentro do tecido”. Em geral, esta condição é induzida por um alergeno específico, que podem ser pólens, inalantes e outras substâncias vegetais, assim como pêlos de animais e poeira. Freqüentemente existe história familiar de alergia. Ao exame físico observa-se uma leve injeção da conjuntiva palpebral e bulbar e, durante o ataque agudo, geralmente ocorre quemose grave. A conjuntiva palpebral superior freqüentemente apresenta papilas gigantes. Cada papila gigante é poligonal, tem um topo plano e contém tufo de capilares. Laboratorialmente, os raspados epiteliais revelam predominância de eosinófilos, muitos dos quais rompidos, liberando seus grânulos. Uma vez que a conjuntivite alérgica é autolimitada, a medicação usada para tratar os sintomas pode fornecer benefícios a curto prazo e prejuízos a longo prazo. O tratamento mais eficaz consiste na retirada do alergeno agressor, embora sua identidade seja geralmente difícil de se estabelecer. Os esteróides tópicos e sistêmicos aliviam a coceira mas podem ser gravemente prejudiciais devido a seus efeitos colaterais (ceratite por herpes simplex, glaucoma, catarata e outras úlceras corneanas oportunistas). O cromolyn tópico é um agente profilático útil em casos moderados ou graves. Vasoconstritores, compressas frias e pedras de gelo são úteis. Blefarite e conjuntivite por estafilococos são complicações freqüentes e devem ser tratadas. A recorrência é uma regra, especialmente no verão e na primavera, mas depois de inúmeras recorrências, as papilas desaparecem completamente, não deixando cicatrizes. OFTALMOLOGIA - 68 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Uveítes Introdução Uveíte é o termo geral utilizado para definir as inflamações do trato uveal. Quando a inflamação ocorre na porção anterior deste trato, isto é, na íris e/ou no corpo ciliar, ela é denominada uveíte anterior. Quando a inflamação ocorre no trato uveal posterior (coróide), ela é denominada uveíte posterior. As desordens inflamatórias do trato uveal normalmente são unilaterais, acometendo principalmente indivíduos entre os 20 e os 50 anos de idade. Embora o termo uveíte deva-se primariamente à inflamação desta estrutura vascular, as estruturas adjacentes, tais como a retina, a esclera e a córnea, também podem ser envolvidas secundariamente pelo processo inflamatório. Do ponto de vista anatomopatológico, as uveítes podem ser distinguidas em dois grandes grupos, as uveítes não granulomatosas, que ocorrem principalmente na porção anterior do trato uveal; e as uveítes granulomatosas, que podem envolver qualquer porção da úvea, com predileção pela parte posterior. A incidência das uveítes na população geral é de cerca de 15 pessoas a cada 100.000 habitantes em um período de um ano. Destes, 75% terão a variedade anterior e o restante terá a variedade posterior ou uma panuveíte. Etiologia Uveíte anterior Auto-imune Artrite reumatóide juvenil Espondilite anquilosante Síndrome de Reiter Colite ulcerativa Uveíte induzida pelo cristalino Sarcoidose Doença de Crohn Psoríase Figura 1 - Trato uveal OFTALMOLOGIA - 69 Doenças infecciosas Sífilis Tuberculose Lepra Herpes zoster Herpes simples Adenovírus Malignas Síndrome mascarada - Retinoblastoma - Leucemia - Linfoma maligno Outras Idiopáticas Uveíte traumática Descolamento de retina Iridociclite heterocrômica de Fuchs Gota Crise de glaucomatociclite Uveíte posterior Doenças infecciosas Vírus - Citomegalovírus - Herpes simples - Herpes zoster - Rubéola - HIV - Epstein-Barr vírus - Coxsackie vírus Bactérias - Mycobacterium tuberculosis - Brucelose - Sífilis - Nocardia sp. - Neisseria meningitidis - Mycobacterium avium-intracellulare - Yersinia sp. - Borrela sp. Causa doença de Lyme Fungos - Candida - Histoplasma - Cryptococus - Aspergillus OFTALMOLOGIA - 70 Parasitas - Toxoplasma - Toxocara - Cysticercus - Onchocerca Doenças não-infecciosas Auto-imunes - Doença de Behçet - Doença de Vogt-Koyanagi-Harada - Poliarterite nodosa - Oftalmite simpática Mais comum em homens devido à maior incidência de lesão penetrante - Vasculite retiniana Malignas - Sarcoma retiniano reticular - Melanoma maligno - Leucemia - Lesão metastática Etiologia desconhecida - Sarcoidose - Coroidite geográfica - Epiteliopatia placóide multifocal aguda - Retinopatia “birdshot” - Epiteliopatia do pigmento retiniano Uveíte anterior Classicamente, a uveíte anterior pode ser dividida em aguda ou crônica. A uveíte anterior aguda é geralmente não-granulomatosa e apresenta um início agudo com dor ocular, uma vez que existem fibras dolorosas na íris, injeção ciliar e fotofobia. A inflamação da íris ou do corpo ciliar, por si só, não embaçam a visão, a menos que o processo seja grave ou avançado o suficiente para causar turvação do humor aquoso, córnea ou cristalino. O exame da doença anterior do trato uveal é feito com lanterna e lupa ou com a lâmpada de fenda. Pode haver hiperemia pericorneana causada pela dilatação dos vasos sangüíneos do limbo. Depósitos finos de coloração branca podem ser vistos na superfície posterior da córnea e são denominados precipitados ceráticos (“PKs”). A pupila é miótica e pode-se observar uma coleção de células na câmara anterior, com ou sem exsudato fibrinoso. Na presença de sinéquia posterior, a pupila terá forma irregular. Figura 2 -Uveíte anterior OFTALMOLOGIA - 71 A uveíte anterior crônica pode ser tanto não granulomatosa quanto granunolamosa e geralmente não está associada a muita hiperemia. O paciente deve ser questionado sobre episódios anteriores de artrite e possíveis exposições a tuberculose, toxoplasmose e sífilis. A possibilidade remota de um foco distante de infecção no corpo também deve ser investigada. A investigação laboratorial extensiva normalmente não é indicada na uveíte anterior, particularmente se for granulomatosa ou se responder prontamente ao tratamento não específico. Os principais diagnósticos diferenciais da uveíte anterior são conjuntivite, ceratite ou ceratoconjuntivite e glaucoma agudo de ângulo fechado. Na conjuntivite, a hiperemia é usualmente difusa ou pode estar confinada apenas aos ângulos lateral e medial, mas não está primariamente limitada à área pericorneana como ocorre na uveíte anterior. Além disso, a conjuntivite pode manifestar uma descarga aquosa ou purulenta, prurido e sensação de corpo estranho; e normalmente não apresenta dor, visão turva, fotofobia ou injeção ciliar. Na ceratite ou ceratoconjuntivite, a visão pode estar turva e a dor e a fotofobia podem estar presentes. Alguns casos de ceratite podem estar associadas com a uveíte anterior verdadeira. No glaucoma agudo, a visão está marcadamente reduzida e a dor pode ser tão severa que os pacientes apresentam náuseas e vômitos. A pupila geralmente está dilatada e não reage ao estímulo luminoso, não existe sinéquia posterior e a córnea está difusamente embaçada. Como complicações, a uveíte anterior pode produzir sinéquia anterior periférica, impedindo o humor aquoso de fluir para o ângulo da câmara anterior e resultando em glaucoma. A sinéquia posterior pode causar glaucoma fazendo com que o humor aquoso se acumule atrás da íris, abaulando-a. A dilatação pupilar precoce e constante diminui a probabilidade de sinéquia posterior. A interferência com o metabolismo do cristalino pode causar catarata. O descolamento de retina ocasionalmente ocorre como resultado da tração da retina através do encolhimento do vítreo. Terapeuticamente, desde que a etiologia das uveítes é freqüentemente desconhecida, medidas não-específicas são geralmente utilizadas. Estas medidas incluem analgésicos sistêmicos para o alívio da dor, óculos escuros para a fotofobia, corticosteróides tópicos para reduzir a inflamação, e cicloplégicos midriáticos para dar conforto através do relaxamento do esfíncter da íris e do músculo ciliar e para prevenir sinéquia posterior. Em casos graves não responsivos, a injeção periocular de esteróides e, raramente, mesmo esteróides sistêmicos podem ser administrados. Com o tratamento, um ataque de uveíte anterior aguda normalmente dura alguns dias ou semanas. As recorrências são comuns. As uveítes crônicas duram de meses a anos, algumas vezes com remissões e exacerbações, podendo causar danos permanentes com uma perda visual marcante, apesar de um bom tratamento. Uveíte posterior Na doença limitada ao segmento posterior do olho, a doença granulomatosa é mais comumente vista. O início é mais insidioso com pouca ou nenhuma dor, fotofobia mínima e ausência de fluxo pericorneano. Devido a proximidade entre a coróide e a retina, a doença OFTALMOLOGIA - 72 coroidal quase sempre afeta a retina (corioretinite) e a resolução do processo resulta em uma cicatriz com um correspondente escotoma no campo visual. Se a área macular da retina estiver envolvida, a visão central estará prejudicada. O vítreo também pode tornar-se turvo como resultado da infiltração de células das porções inflamadas da coróide e da retina. O prejuízo da visão é proporcional à densidade da opacidade do vítreo e, se a mácula não estiver envolvida, a acuidade visual central poderá retornar ao normal a medida que a inflamação diminui. O exame da doença do trato uveal posterior é feito com o oftalmoscópio. Lesões ativas recentes da coróide e da retina aparecem como uma mancha branco- amarelada embaçada (devido a turvação do humor vítreo). Com o decorrer da cicatrização, o vítreo diminui o embaçamento e ocorre pigmentação gradativa das manchas. Laboratorialmente, os testes cutâneos para a tuberculose e a histoplasmose podem ser úteis, bem como os anticorpos contra a toxoplasmose. Com base nesses testes e na morfologia das lesões, é freqüentemente possível fazer um diagnóstico etiológico nas uveítes posteriores. Uma vez que seja possível realizar o diagnóstico provável da causa, um tratamento específico é indicado. Figura 3 - Uveíte posterior OFTALMOLOGIA - 73 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Toxoplasmose ocular Introdução A toxoplasmose é causada pelo Toxoplasma gondii, um protozoário intracelular obrigatório. Por causa da sua habilidade de infectar virtualmente qualquer célula nucleada, o T. gondii pode acometer uma grande variedade de órgãos do hospedeiro, incluindo o tecido linfático, os músculos esqueléticos, o sistema nervoso central, os pulmões, o coração, o trato gastrointestinal, o pâncreas, a pele, o fígado e os olhos. As lesões oculares podem ser contraídas no útero ou podem ocorrer depois de uma infecção sistêmica aguda. A toxoplasmose é a causa mais comum e retinocoroidite no nosso meio e acontece em cerca de um terço dos casos de uveíte posterior. Manifestações clínicas Os pacientes com retinocoroidite toxoplásmica apresentam história de visão de corpos flutuantes, visão turvae fotofobia. A lesão ocular consiste de áreas brancas e fofas de retinocoroidite focal necrótica que podem ser pequenas ou grandes e simples ou múltiplas. As lesões ativas podem ser adjacentes a cicatrizes retinianas rodeadas por edema retiniano. A vasculite retiniana pode ocorrer provocando hemorragia retiniana. A inflamação dá origem a células no vítreo e exsudação. Pode ocorrer edema macular cistóide. A iridociclite é vista freqüentemente em pacientes com retinocoroidite toxoplásmica. A pressão intra-ocular é variável, mas é importante observar que esta é uma das poucas uveítes que podem apresentar aumento da pressão intra-ocular. A cura da retinocoroidite é associada à diminuição das reações inflamatórias da íris, do corpo ciliar e do vítreo. A lesão retiniana desenvolve bordas bem delimitadas com proliferação de pigmentos. Laboratorialmente, os anticorpos anti-Toxoplasma podem ser detectados no soro pela reação de Sabin-Feldman, pela reação de fixação de complemento, pela reação de hemaglutinação, pelo teste de ELISA e pela reação de imunofluorescência indireta. Tratamento Pequenas lesões na periferia da retina que não estão associadas com muitas células no vítreo podem ser deixadas sem tratamento. O tratamento da retinocoroidite toxoplásmica pode ser iniciado através da administração simultânea de pirimetamina (75 mg/dia, V.O., durante dois dias consecutivos, seguida por 25 mg/dia, V.O., durante quatro semanas) e sulfadiazina (2 g de dose de ataque seguida por 1 g a cada 6 horas, V.O., por quatro semanas). OFTALMOLOGIA - 74 Uma alternativa ao tratamento da toxoplasmose ocular consiste na administração de clindamicina (300 mg de 8/8 horas por quatro semanas) associada a trisulfapirimidina (1 g a cada 8 horas, V.O., por quatro semanas). Outros antibióticos tem sido eficazes na toxoplasmose ocular, inclusive a espiramicina e a minociclina. A primeira pode ser particularmente útil durante a gravidez. A uveíte anterior associada a toxoplasmose ocular pode ser tratada com prednisolona (1%, em gotas oculares, três ou quatro vezes ao dia) e homatropina (5%, em gotas oculares, duas vezes ao dia). Maleato de timolol (0,25%, em gotas oculares) pode ser adicionado se a pressão ocular aumentar. Injeções perioculares de esteróides estão contra-indicadas. Corticosteróides sistêmicos, como a prednisona (1 a 1,5 mg/kg/dia, V.O., por quatro semanas), em conjunto com terapia antimicrobiana podem ser administrados se as lesões inflamatórias ameaçam a visão. Os corticosteróides não devem ser administrados sem cobertura antimicrobiana apropriada. OFTALMOLOGIA - 75 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Ceratocone e transplante de córnea Ceratocone É uma doença degenerativa infreqüente, geralmente bilateral, que pode ser herdada por um traço autossômico recessivo ou dominante, caracterizada por uma ectasia cônica (projeção) da córnea central, com adelgaçamento e cicatrizes resultando em perda indolor e progressiva da visão devido a um astigmatismo miópico irregular crescente. O ceratocone tem sido associado a inúmeras doenças, incluindo a síndrome de Down, dermatite atópica, retinite pigmentosa, aniridia, conjuntivite primaveril, síndrome de Marfan, síndrome de Alpert, doença de Addison, neurofibromatose e síndrome de Ehlers-Danlos. Os sintomas aparecem na segunda década e progridem de forma mais rápida na terceira década de vida embora, a qualquer momento, possa haver uma interrupção no avanço da doença. Clinicamente, o ceratocone apresenta-se por visão turva. Ao exame clínico, pode-se observar uma identação da pálpebra inferior quando o paciente olha para baixo (sinal de Munson), um reflexo irregular na retinoscopia e uma reflexão corneana distorcida com o disco de Plácido ou o ceratoscópio. O fundo de olho não pode ser visto nitidamente devido ao astigmatismo corneano. Figura 1 - Ceratocone Figura 2 - Sinal de Munson OFTALMOLOGIA - 76 Terapeuticamente, as lentes de contato rígidas melhorarão significativamente a visão nos estágios precoces da doença através da correção do astigmatismo irregular. O ceratocone é uma das indicações mais comuns para a ceratoplastia penetrante (transplante de córnea), pois ele geralmente atinge pacientes jovens bilateralmente. O transplante é indicado quando as lentes de contato não podem mais ser efetivamente utilizadas. Se o transplante for feito antes que ocorra um afinamento corneano extremo, o prognóstico é excelente, com 80 a 95% dos pacientes recuperando a visão para a leitura. Transplante de córnea O transplante de córnea (ceratoplastia) é indicado para diversas condições corneanas sérias como, por exemplo, cicatrização, edema, afinamento e distorção. O ceratocone é uma das indicações mais comuns para a ceratoplastia penetrante. O termo ceratoplastia penetrante indica a reposição de toda espessura da córnea. Ceratoplastia lamelar indica a reposição parcial da espessura da córnea. Como o número de células endoteliais da córnea diminui com a idade, os doadores mais jovens são preferidos para a ceratoplastia penetrante. Contudo, qualquer pessoa pode ser doadora de córnea, desde que tenha um número suficiente de células endoteliais. Devido ao rápido índice de morte endotelial, os olhos devem ser enucleados logo após a morte e refrigerados imediatamente. Em média, 6 horas após a morte a córnea ainda é aproveitável. Em dias frios este tempo pode se estender para até 24 horas. O transplante deve ser feito dentro de 48 horas após a sua retirada, preferencialmente em 24 horas. Meios de conservação modernos permitem o armazenamento mais prolongado. Para a ceratoplastia lamelar, as células endoteliais não são importantes. Assim, as córneas podem ser congeladas, desidratadas ou refrigeradas por mais tempo. Os defeitos de refração em vida do doador não passam para o receptor, exceto em astigmatismos de mais de 4,00 dioptrias. Algumas doenças transmissíveis, principalmente de etiologia viral (AIDS, hepatite B), contra-indicam a doação. Não há valor significativo na tipagem sangüínea no transplante de córnea pois a córnea é avascular. A rejeição e a dificuldade no controle do astigmatismo pós-transplante continuam sendo os principais problemas no manejo pós-operatório. OFTALMOLOGIA - 77 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Erros de refração Introdução Antigamente, acreditava-se que a imagem na retina era formada por elementos de duas lentes, a córnea, que contribuía com cerca de 43 dioptrias; e o cristalino, com 19 dioptrias. Mas isto é uma mera simplificação. Na realidade, o sistema óptico do olho humano é mais exatamente conceitualizado como um sistema de três lentes, a lente do humor aquoso, o cristalino e a lente vítrea. A própria córnea não tem quase nenhum poder de refração no sistema óptico, sendo importante somente na formação da curva anterior da lente do humor aquoso. O cristalino é um interessante componente óptico porque o seu índice de refração varia através da sua espessura, permitindo ao olho mudar o seu poder refrativo para focar um objeto (acomodação visual). O olho é considerado emétrope 13 quando os raios luminosos paralelos, partindo de um objeto a mais de 6 metros de distância, são focalizados no plano da retina quando o olho está completamente relaxado. A imagem é clara sem que haja necessidade de qualquer acomodação visual. A presença de erro refrativo, que ocorre quando a imagem não se forma sobre a retina, é denominada ametropia 14 . Miopia Miopia (hipometropia 15 ) é o estado no qual os raios luminosos provenientes do infinito (paralelos ao globo ocular) são focados pelo olho não acomodado antes da retina. Quando o olho é maior que o normal (24 mm), o erro é chamado miopia de eixo. Para cada milímetro adicional do comprimentodo eixo, o olho é aproximadamente 3 dioptrias mais míope. Quando os elementos refrativos do olho são mais refrativos do que a média, o erro é chamado miopia refrativa. Quando o objeto é trazido para uma distância menor que 6 metros, a imagem move- se para mais perto da retina e entra em foco. O ponto alcançado onde a imagem é focada na retina é chamado de “ponto distante”. Pode-se estimar a proporção da miopia calculando-se o recíproco do ponto distante. 13 De “emetr(o) = de justa medida; -ope = vista” (N do A) 14 De “a- = alterado; -metr(o)- = medição; -ope = vista; -ia = estado” (N do A) 15 De “hipo- = escasso; -metr(o)- = medição; -ope = vista; -ia = estado” (N do A) Figura 1 - Miopia OFTALMOLOGIA - 78 Clinicamente, o defeito visual para longe é a principal manifestação. Geralmente não há astenopia 16 . As crianças se desenvolvem em um mundo limitado, sem interesse por esportes. Ao exame, pode-se observar o fenômeno estenopeico, em que o paciente fecha as pálpebras de maneira a bloquear os raios luminosos periféricos, focalizando melhor a imagem. A miopia se desenvolve durante o crescimento, mas após os 25 anos ela varia muito pouco. Terapeuticamente, são usadas lentes divergentes (negativas) para corrigir a imagem na miopia. Quanto ao uso de lentes de contato, essas podem ser tanto gelatinosas quanto rígidas, de acordo com a adaptação do paciente. Hipermetropia A hipermetropia 17 (ou hiperopia 18 ) é o estado no qual o olho não acomodado foca a imagem atrás da retina. É o erro de refração mais freqüente, presente em praticamente todos os olhos ao nascimento. Ela pode ocorrer devido a um comprimento ântero-posterior menor que o normal (hipermetropia axial), como ocorre em certas desordens congênitas; ou por diminuição do índice refrativo do sistema de lentes do globo ocular (hipermetropia refrativa), como exemplificado pela afacia. Clinicamente, o paciente apresenta diminuição da visão para perto. Se ele lançar mão da acomodação, fazendo convergência com o seu cristalino, vai acabar enxergando como um indivíduo normal. Todavia, essa acomodação forçada pode provocar dor nos olhos, cefaléia e vômitos (astenopia). Nas grandes hipermetropias, principalmente em crianças que tem grande poder de acomodação, há associação com o estrabismo convergente adaptativo. Nesses casos, é importante o tratamento precoce para evitar o desenvolvimento de ambliopia. Terapeuticamente, utilizam-se lentes convergentes (positivas) para a correção da hipermetropia. Quanto ao uso de lentes de contato, essas podem ser tanto gelatinosas quanto rígidas, de acordo com a adaptação do paciente. 16 De “asten(o) = cansado ; -opsi(o)- = visão; -ia = estado” (N do A) 17 De “hiper- = excesso; -metr(o)- = medição; -ope = vista; -ia = estado” (N do A) 18 De “hiper- = excesso; -ope = vista; -ia = estado” (N do A) Figura 2 - Tratamento da miopia Figura 3 - Hipermetropia Figura 4 - Tratamento da hipermetropia OFTALMOLOGIA - 79 Astigmatismo Normalmente, a córnea apresenta diversos meridianos que se cruzam no seu centro e apresentam a mesma curvatura. No astigmatismo 19 , esses meridianos apresentam curvaturas diferentes, originando imagens com pontos focais múltiplos. Um dos meridianos pode ser emétrope e o outro hipermétrope ou míope, e assim por diante. O mais íngreme e o mais plano dos meridianos do olho geralmente estão formando um ângulo reto entre eles, resultando em um astigmatismo regular. Neste caso, os dois focos formados localizam-se na frente e atrás da retina, resultando num misto de miopia e hipermetropia. O ponto médio entre esses focos é chamado círculo de menor confusão de imagem. Com o uso de lentes cilíndricas, ambos os focos são deslocados para a retina, resultando em uma visão normal. As lentes de contato não dão bons resultados para o astigmatismo. A compensação sem as lentes é feita ajeitando-se o círculo de menor confusão sobre a retina. Essa condição também causa astenopia. Presbiopia A perda da acomodação pelo cristalino, que vem com a idade para todas as pessoas, é chamada de presbiopia 20 . Uma pessoa emétrope começará a perceber dificuldade para as letras pequenas ou distinguir objetos bem de perto com cerca de 44 a 46 anos. Isso piora na luz fraca ou de manhã bem cedo, ou quando a vista fica cansada. Muitos pacientes reclamam de sentirem sono quando lêem. Esses sintomas aumentam até cerca de 55 anos, quando se estabilizam. A presbiopia é corrigida pelo uso de uma lente convergente (positiva) para suprir a perda do poder de focar automático do cristalino. 19 De “a- = ausência; estigmat(o) = ponto; -ismo = condição patológica causada por” (N do A) 20 De “presbi(o) = velho; -ope- = vista; -ia = estado” (N do A) OFTALMOLOGIA - 80 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Oftalmologia pediátrica Retinopatia da prematuridade A retinopatia da prematuridade foi descrita pela primeira vez em 1942 por Theodore Terry, um patologista e oftalmologista do Texas. Ela é uma retinopatia vasoproliferativa que é a principal causa de cegueira infantil no mundo. Normalmente, a retina começa a ser vascularizada no segundo trimestre de gestação, centrifugamente ao nervo óptico. Os vasos retinianos alcançam a ora serrata nasal no oitavo mês e a ora serrata temporal no nono mês de gestação. Os principais fatores de risco para o desenvolvimento de retinopatia da prematuridade são: Criança prematura pesando menos de 1.500 gramas Idade gestacional precoce Particularmente abaixo de 28 semanas Administração de oxigênio prolongada Outros Acidose Apnéia Ducto arterial persistente Septicemia Hemorragia intracraniana Múltiplas transfusões de sangue Múltiplas gestações O quadro começa entre 2 e 4 semanas depois do nascimento e continua até que a retina esteja completamente vascularizada, até que as alterações da retinopatia da prematuridade tenham sofrido resolução espontânea ou até que um tratamento apropriado tenha sido realizado. Por isso, é recomendável que todos os bebês prematuros com peso inferior a 1.500 gramas e todos aqueles que receberam terapia suplementar de oxigênio prolongada devam ser investigados quanto a presença de retinopatia. O diagnóstico da retinopatia da prematuridade só pode ser feito com a oftalmoscopia indireta pois é impossível se avaliar a periferia da retina com o oftalmoscópio direto. A dilatação pupilar pode ser feita com o Cyclomydril® (ciclopentolato 0,2% e fenilefrina 1%). A retinopatia geralmente é bilateral, porém, muitas vezes ela é assimétrica. As alterações observadas podem ser classificadas da seguinte maneira: Estágio 1 – Nítida linha de demarcação na junção da retina avascular com a retina vascularizada Estágio 2 – Formação de uma dobra distinta pela proliferação capilar dentro da retina Estágio 3 – Proliferação fibrovascular extra-retiniana Estágio 4 – Descolamento de retina subtotal Estágio 5 – Descolamento de retina total OFTALMOLOGIA - 81 Dentre os exames complementares, a ultra-sonografia pode mostrar proliferação intravítrea e descolamento de retina; e o eletrorretinograma revela o estado do potencial elétrico retiniano. Os principais diagnósticos diferenciais da retinopatia da prematuridade são: Retinoblastoma Doença de Coats Doença de Norrie Persistência de vítreo primário hiperplásico Síndrome de Snead Hipoplasia vascular Catarata congênita Seu tratamento é baseado na classificação da doença. É importante notar que um significante número de pacientes com retinopatia da prematuridade tem regressão espontâneada doença. Alterações retinianas periféricas que indicam regressão incluem retina avascular, dobras periféricas e rupturas retinianas. Alterações associadas no polo posterior incluem retificação dos vasos temporais, estiramento temporal da mácula e tecido retiniano deslocado sobre o disco do nervo óptico. Outros achados oculares de regressão incluem miopia, estrabismo, catarata e glaucoma de ângulo fechado. Enquanto os estágios 1 e 2 da doença requerem apenas observação, os olhos com estágio 3 devem ser considerados para crioterapia transescleral ou fotocoagulação com laser. Cada tratamento deve ser realizado com assistência de um neonatologista experiente sob controle minucioso, porque os riscos de complicações sistêmicas sérias incluem parada respiratória e cardiorespiratória. A vitrectomia pode ser benéfica na doença cicatricial (estágios 4 e 5). Porém, ela deve ser reservada aos bebês com doenças graves em ambos os olhos. Ambliopia É a diminuição uni ou bilateral da acuidade visual na ausência de lesão orgânica ou com uma lesão orgânica desproporcional à intensidade da baixa visual. Para a maioria Figura 1 - Retinoblastoma OFTALMOLOGIA - 82 dos autores, a diferença de 0,3 (30%) da acuidade visual entre os dois olhos, ou uma acuidade visual igual ou inferior a 0,5 (50%), uni ou bilateral, descartada as causas orgânicas e refrativas, caracteriza a ambliopia. A ambliopia constitui um grave problema médico-social e sua prevalência é de 2,0 a 2,5% na população geral. Podemos classificar a ambliopia em: Ambliopia estrábica É a principal causa Há uma diminuição unilateral da acuidade visual resultante da prolongada fixação do olho dominante e da supressão das imagens do olho desviado. Ambliopia anisometrópica É causada pela inibição foveal resultante de imagens desfocadas oriundas do olho de maior ametropia. Ambliopia por privação Decorre de estímulos deficientes de luz e forma ou da privação de estímulos. Catarata congênita uni ou bilateral Leucoma corneano Ptose palpebral Ametropia elevada bilateral O desenvolvimento normal da visão binocular depende do estímulo constante, sincrônico e binocular das fóveas durante o período de maturação sensorial. A alteração de qualquer um desses fatores até os 8 anos de idade leva a uma microcelularidade, rarefação e atrofia dos corpos geniculados laterais correspondentes ao olho acometido, resultando em ambliopia. É por isso que devemos detectar e tratar precocemente a ambliopia, antes que se instaurem alterações estruturais irreversíveis dos neurônios dos corpos geniculados laterais. O diagnóstico da ambliopia fundamenta-se na existência da queda da acuidade visual sem lesão orgânica aparente. Os principais exames utilizados são a aferição da acuidade visual, cover-test, refratometria e oftalmoscopia. A avaliação da acuidade visual é o teste mais importante na detecção de ambliopia. O tratamento da ambliopia varia de acordo com as causas que a provocam. Na presença de anisometropias ou ametropias, realiza-se a correção óptica, associada ou não à oclusão, para propiciar uma imagem clara na fóvea. Nas ambliopias por privação, restabelece-se a transparência dos meios o mais precoce possível através de cirurgia e se associa à oclusão total cuidadosa do olho fixador. Na presença de ambliopia estrábica, a oclusão do olho fixador é o tratamento mais eficaz. A oclusão em tempo integral é mantida até que se iguale a visão nos dois olhos ou até que não seja demonstrada qualquer melhora da acuidade visual por um período de três meses. A oclusão deve ser controlada com rigor devido à ambliopia de oclusão que pode se desenvolver. OFTALMOLOGIA - 83 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ Oftalmologia Trauma ocular Introdução A estrutura da face e dos olhos é bem apropriada para proteger o olho de um traumatismo. O bulbo ocular é envolvido por uma estrutura óssea forte; as pálpebras podem se fechar rapidamente formando uma barreira contra corpos estranhos; e o olho pode tolerar bem um impacto leve sem resultar em lesão. Mesmo assim, os olhos e suas estruturas adjacentes podem sofrer danos causados por traumatismos, as vezes tão graves que a visão pode ser perdida e, em raras circunstâncias, o olho deve ser retirado. O trauma ocular é a causa mais comum de cegueira unilateral em crianças e jovens, especialmente nos homens. Os acidentes domésticos, assaltos violentos, explosões de baterias, ferimentos em esportes e acidentes com veículos motorizados são as circunstâncias mais comuns em que ele ocorre. Semiologia A anamnese deve incluir uma acuidade visual estimada previa ou imediatamente depois do prejuízo, avaliando a forma de início (lenta, progressiva ou repentina). O exame físico começa com a medida e a documentação da acuidade visual. Em seguida, deve-se realizar o teste de motilidade ocular, pesquisar a sensação cutânea periorbitária e procurar por defeitos na rima orbitária óssea. Se não houver disponível uma lâmpada de fenda, uma fonte luminosa, lupa ou oftalmoscópio direto com lente em +10 (números negros) podem ser utilizados para examinar as superfícies tarsais das pálpebras e o prejuízo do segmento anterior. A superfície corneana é examinada procurando-se corpos estranhos, ferimentos e abrasões. A conjuntiva bulbar é inspecionada para hemorragia, material estranho ou lacerações. A profundidade e a claridade da câmara anterior são observadas. O tamanho, tipo e reação luminosa da pupila devem ser comparados com o outro olho para verificar se um defeito pupilar aferente esta presente no olho prejudicado. Se o globo ocular não estiver danificado, as pálpebras, a conjuntiva palpebral e os fórnices podem ser examinados minuciosamente, inclusive através da eversão da pálpebra superior. O oftalmoscópio direto e indireto são usados para a observação do cristalino, vítreo, disco óptico e retina. Em todos os casos de trauma ocular, o olho aparentemente não prejudicado também deve ser cuidadosamente examinado. Traumatismo palpebral Na abrasão palpebral, a ferida deve ser irrigada com solução salina e coberta com pomada antibiótica e tampão esterilizado. O tecido que sofreu avulsão é OFTALMOLOGIA - 84 religado. Devido à excelente vascularização das pálpebras, existe uma boa chance de que não ocorra necrose isquêmica. As lacerações de espessura parcial das pálpebras que não envolvem a margem palpebral podem ser reparadas cirurgicamente da mesma maneira como em outras lacerações da pele. Todavia, as lacerações de espessura completa envolvendo a margem palpebral devem ser reparadas cuidadosamente para prevenir o notch da pálpebra e a triquíase. O reparo correto das pálpebras requer aproximação precisa da margem palpebral dilacerada, do tarso e da pele. Uma pomada antibiótica é, então, aplicada para reparar o tecido da pálpebra. Se o reparo primário não é efetuado dentro de 24 horas, o edema pode obrigar um fechamento tardio. Nesse intervalo, a ferida deve ser completamente limpa e antibióticos devem ser administrados. Depois que o edema desaparecer, o reparo pode ser realizado. As lacerações próximas ao canto medial freqüentemente envolvem o canalículo lacrimal. O reparo precoce é desejado, uma vez que o tecido se torna mais difícil de ser identificado e reparado pelo inchaço. As lacerações pontiagudas através do canalículo distal podem ser reparadas com uma haste de Veirs ou outras modificações. As lacerações canaliculares proximais ou avulsões requerem intubação nasocanalicular de silicone com sonda de Quickert. Vários métodos de intubação de um simples canalículo têm sido descritos como auxiliares para evitar o uso traumático e arriscado do uso de sondas pigtail. Traumatismo corneano Os corpos estranhos e a abrasão corneana causam dor e irritação que podemser sentidas durante o movimento do olho e das pálpebras, assim como os defeitos epiteliais corneanos. A fluoresceína pode corar a membrana basal exposta ao defeito epitelial evidenciando a saída do aquoso pelo ferimento (teste de Seidel positivo). Um padrão de marcas de arranhões verticais na córnea indica corpos estranhos embutidos na superfície conjuntival tarsal da pálpebra superior. As lentes de contato podem produzir edema da córnea. Terapeuticamente, um simples defeito epitelial corneano pode ser conduzido com pomada antibiótica e um curativo para imobilizar as pálpebras. Para remover corpos estranhos, um anestésico tópico pode ser administrado e uma espátula, uma agulha fina ou um cotonete umedecido podem ser usados para remover o material durante o exame com a lâmpada de fenda. Fragmentos metálicos podem ser removidos com aparelho a bateria e com ponta romba. Materiais inertes como vidro, carbono, etc. embutidos profundamente podem permanecer na córnea mas se houver necessidade de retirá-los ou se houver perda do aquoso requerendo sutura ou Figura 1 - Teste de Seidel positivo OFTALMOLOGIA - 85 cola cianoacrílica, o procedimento deve ser feito através de técnica microcirúrgica em uma sala de operações, onde a câmara anterior possa ser refeita. Após a remoção de um corpo estranho, pomada antibiótica deve ser instilada e o olho ocluído. O ferimento deve ser examinado diariamente para evidenciar uma infecção até que ele esteja completamente cicatrizado. Nunca administre solução de anestésico tópico para o paciente em uso contínuo depois de uma lesão corneana pois isso retarda a cicatrização, disfarça um dano posterior e pode levar à cicatrização corneana permanente. Além disso, o uso de anestésico crônico pode causar infiltração corneana e ulceração, que podem minimizar a aparência clínica de uma úlcera infecciosa. Os esteróides devem ser evitados enquanto existir um defeito epitelial. Traumatismos penetrantes & contusões do globo ocular A ruptura do globo ocular pode ocorrer como resultado de um ferimento por objeto penetrante pontiagudo ou força contusiva direta. O trauma direto produz um aumento da pressão intra-ocular e orbital, com deformação do globo. A descompressão rápida ocorre quando a parede do olho se rompe ou o conteúdo orbital herniado penetra no seio nasal (fratura blow out). O limbo superonasal é o local mais comum da ruptura do globo (efeito contragolpe). Geralmente, o prejuízo traumático direto tem um prognóstico pior do que os prejuízos penetrantes devido à incidência crescente de descolamento de retina e à avulsão do tecido intra-ocular. Enquanto muitas lesões penetrantes causam uma perda visual marcante, lesões devido a partículas pequenas de alta velocidade podem cursar apenas com uma ligeira dor e nebulosidade. Outros sinais incluem quemose hemorrágica, laceração conjuntival, uma câmara anterior rasa com ou sem uma pupila colocada excentricamente e hifema. A pressão intra-ocular pode ser baixa, normal ou raramente elevada. Além da ruptura da parede escleral, as forças contusivas do globo ocular podem resultar em desordens da motilidade, hemorragia subconjuntival, edema corneano, irite, hifema, glaucoma de ângulo fechado, ruptura do esfíncter da íris, iridodiálise, paralisia por acomodação, descolamento do cristalino e catarata. Os prejuízos ocorridos nas estruturas posteriores incluem hemorragias retinianas e vítreas, edema retiniano, perfurações retinianas, avulsões da base do vítreo, descolamento de retina, ruptura coroidal e contusão ou avulsão do nervo óptico. Exceto para ruptura envolvendo prejuízos do próprio globo ocular, muitos dos efeitos da contusão do olho não requerem tratamento cirúrgico imediato. Todavia, qualquer prejuízo grave o suficiente para causar hemorragia intra-ocular aumenta o risco de hemorragia secundária tardia e a possibilidade de glaucoma intratável e dano permanente do globo ocular. No fechamento das feridas do segmento anterior, devem ser utilizadas técnicas microcirúrgicas. Os ferimentos da esclera são fechados com pontos interrompidos e fios não-absorvíveis. OFTALMOLOGIA - 86 Corpos estranhos intra-oculares Em um paciente com queixa de visão turva ou desconfortável em um olho, a porção anterior do olho deve ser inspecionada com uma lupa ou lâmpada de fenda na tentativa de localizar o ferimento de entrada de um possível corpo estranho intra-ocular. O oftalmoscópio direto e indireto podem auxiliar na sua visualização. Um Raio-X do tecido peri-orbitário ou uma tomografia computadorizada podem ser realizados para verificar a presença de um corpo estranho radiopaco. A ressonância nuclear magnética é contra-indicada em corpos estranhos metálicos devido ao campo magnético produzido durante o exame, que pode fazer com que estes se tornem projéteis intra-oculares de alta velocidade com efeitos catastróficos. Os corpos estranhos que forem identificados e localizados dentro do olho devem ser removidos sempre que possível. As partículas de ferro ou cobre devem ser removidas para prevenir a desorganização tardia dos tecidos oculares de alterações tóxicas degenerativas (siderose do aço e calcose do cobre). Algumas das novas ligas são mais inertes e podem ser toleradas. Outros tipos de partículas, como vidro e porcelana, podem ser toleradas indefinidamente. Queimadura Exposição ocular a agentes químicos ou calor forte fazem com que as pálpebras se fechem rapidamente em uma reação reflexa para proteger os olhos da queimadura. Desta forma, eventualmente, somente as pálpebras podem estar queimadas. A gravidade do traumatismo, a intensidade da dor e a aparência das pálpebras dependem da profundidade da queimadura. Todas as queimaduras químicas dos olhos devem ser tratadas como emergências oftalmológicas. Figura 2 - Tomografia computadorizada evidenciando um corpo estranho na região posterior do olho direito Figura 3 - Queimadura química OFTALMOLOGIA - 87 A lavagem imediata com água deve ser iniciada no local da lesão antes que o paciente seja transportado. Qualquer corpo estranho óbvio também deve ser irrigado, se possível. Na sala de emergência, uma breve história e o exame precedem a irrigação copiosa das superfícies oculares, incluindo os fórnices conjuntivais. Um espéculo palpebral e infiltração de um anestésico local nas pálpebras pode ser necessário para dominar o blefaroespasmo pois, devido a intensidade da dor, o paciente tem uma tendência de manter os olhos fechados, aumentando o tempo de contato do agente químico com o olho. Os analgésicos e anestésicos tópicos e agentes cicloplégicos são sempre indicados. Use um aplicador tipo cotonete umedecido e um fórceps de joalheiro para remover partículas do fórnice. O pH da superfície ocular deve ser verificado colocando-se uma lâmina de papel indicador no fórnice. A irrigação é retomada se o pH não estiver entre 7,3 e 7,7. Depois da lavagem, recomenda-se aplicar uma pomada e algo que promova oclusão. Uma vez que os álcalis penetram rapidamente através do tecido ocular e são continuamente causadores de danos depois que o ferimento estiver iniciado, uma lavagem prolongada é necessária, acompanhada da verificação repetida do pH. Os ácidos formam uma barreira de precipitação de tecido necrótico que tende a limitar a penetração e o dano posteriores. As complicações das queimaduras por produtos químicos incluem glaucoma de ângulo fechado, cicatrizes corneanas, perfuração ocular, simbléfaro, entrópio, ceratite seca e cegueira. A competência da vasculatura escleral e conjuntival são de valor no prognóstico. Uma perda maior do epitélio perilimbal e conjuntival e da vasculatura escleral indicam um prognóstico precário. As queimaduras por calor das pálpebras são tratadas com antibióticos e tampõesesterilizados. Se o dano corneano for mantido, um inchaço palpebral extenso inicialmente torna a oclusão desnecessária. Depois de 2 a 3 dias, começa o entrópio e a retração palpebral. View publication statsView publication stats https://www.researchgate.net/publication/281347015