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AULA 1 
BIOENERGIA 
Prof. Marcos Baroncini Proenca 
 
 
2 
BIOMASSA E BIOENERGIA 
CONVERSA INICIAL 
É fundamental para qualquer gestor, nos dias de hoje, estar cada vez mais 
ciente das possibilidades da geração e do uso de fontes de energias alternativas 
e sustentáveis, levando em conta os dois maiores problemas do sistema produtivo 
mundial: 
1. Consumo de energia; 
2. Geração de efluentes e resíduos industriais. 
O consumo de energia nos coloca frente a um grande desafio, pois sua 
oferta não está mais apresentando condições de fazer frente à demanda 
crescente de nossa civilização, o que a tornará cada vez mais escassa e cara. 
Quanto à geração de efluentes e resíduos industriais, é de amplo conhecimento 
que esses poluentes vêm contribuindo para efeitos danosos na nossa biosfera, 
afetando diretamente a litosfera, a hidrosfera e a atmosfera, por isso sua 
destinação e seu tratamento correto são cada vez mais exigidos, seja pelos 
órgãos fiscalizadores ou pelo mercado consumidor. 
Assim, seja por questões econômicas, seja por consciência ambiental, 
torna-se relevante aos gestores terem uma visão atenta quanto às possibilidades 
da conversão de efluentes ou resíduos em fontes de energia, com foco estratégico 
nos benefícios tangíveis e intangíveis que possam agregar às empresas nas quais 
prestam serviços. 
É nesse contexto que a biomassa e sua conversão em bioenergia vêm 
adquirindo crescente importância no cenário estratégico mundial. Nesta disciplina 
serão fornecidos fundamentos que permitam uma imersão inicial nesse assunto, 
para que o gestor possa ter uma visão crítica e assertiva sobre a identificação das 
oportunidades de uso da biomassa para a geração de bioenergia. 
TEMA 1 – CONCEITUANDO A BIOMASSA 
Todo recurso de origem orgânica, sólida ou pastosa que seja renovável e 
possa ser convertido em algum tipo de combustível ou diretamente em energia é 
chamado de biomassa. É interessante observar que a biomassa não é 
necessariamente um resíduo de um processo, e pode ser gerada para essa 
finalidade. 
 
 
3 
Assim, a biomassa atinge todos os produtos florestais, madeireiros, têxteis 
agroindustriais, pecuários, além dos rejeitos e lixos urbanos. A primeira biomassa 
(até hoje usada para a geração de energia) foi a lenha. Na Primeira Revolução 
Industrial, era a fonte de energia principal para a geração do vapor que movia as 
indústrias. Depois disso, foi e vem sendo amplamente usada em termoelétricas. 
Segundo o Boletim de Informações Gerenciais da Agência Nacional de 
Energia Elétrica – Aneel (2018), a biomassa é uma matriz energética que, no 
nosso país, responde pela potência instalada de 14.548.593 kW em 
termoelétricas. Para uma potência total de termoelétricas instaladas de 
41.593.113 kW, temos a biomassa como responsável por aproximadamente 35% 
desse tipo de geração de energia. 
A Figura 1 apresenta alguns detalhamentos sobre as termoelétricas: 
Figura 1 – Informações gerenciais sobre as termoelétricas 
 
 
 
4 
 
Fonte: Aneel, 2018. 
TEMA 2 – EVOLUÇÃO DO USO DA BIOMASSA 
Desde o período Paleolítico (aproximadamente 30.000 a.C), o homem de 
Cro-Magnon usava a biomassa para a geração de calor e luz, pelo domínio que 
adquiriu de fazer fogo com o uso de resina. A partir desse momento, passou a 
fazer mais atividades após o pôr-do-sol, lançou-se a maiores distâncias e 
começou a se desenvolver e dominar o meio ambiente, desenvolvendo também 
tecnologias rudimentares. 
No período Neolítico (entre 10.000 a.C e 5.000 a.C), aprendeu a estocar 
biomassa para a geração de energia (Figura 2). Esse foi um período de 
desenvolvimento muito importante, pois nele, entre outras coisas, o homem 
aprimorou diversas ferramentas rudimentares e criou a agricultura e a pecuária, 
deixando de ser nômade para começar as primeiras comunidades (Farias; Sellitto, 
2011). 
Figura 2 – Arte rupestre representativa do período Neolítico 
 
Crédito: gerasimov_foto_174/Shutterstock. 
 
 
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A partir de então, a biomassa não seria mais usada apenas como fonte de 
energia para aquecimento, passando também a ser fundamental no 
desenvolvimento de artefatos de cerâmica. Na Idade do Cobre (3.000 a.C a 1.200 
a.C), no Ocidente, a biomassa passou a ter importância fundamental para a 
humanidade, pois começaram a ser feitos os primeiros artefatos de metal para 
arados, em substituição à pedra polida, foram forjados os primeiros artefatos 
bélicos e cunhadas as primeiras moedas, em fornos desenvolvidos para isso. 
Nessa época, o uso de cavalos permitiu que comunidades distantes 
recebessem madeira e produtos, dando origem ao comércio. Como a madeira era 
abundante, não havia qualquer necessidade de manejo ou silvicultura. 
Permeando esses dois períodos (entre 6.000 a.C e 2.000 a.C), o uso do gás 
natural como fonte de energia para manter aceso o “fogo eterno”, o principal 
símbolo da seita religiosa na Pérsia, deu início ao uso de gás para gerar fogo. 
Em 307 a.C, na Dinastia Chin, a cidade de Sichuan teve um elaborado 
sistema usando bambus e betume para levar o gás natural para sua iluminação 
(Aquino et al., 2014), o que propiciou o entendimento do uso de outra fonte que 
não a madeira para a geração de energia. Mais adiante no tempo, no Oriente, 
especificamente na Dinastia Han (206 a.C a 220 d.C), houve o primeiro manejo 
florestal visando à produção de lenha para a geração de energia e de madeira 
para construção, tendo, assim, estabelecida oficialmente a importância da 
biomassa no âmbito estratégico de uma nação. 
No Ocidente, a silvicultura só começou a ser fundamentada na Idade Média 
(século V ao século XV), nos feudos. Depois, entre os séculos XV e XVIII, 
notadamente na Alemanha, as bases científicas da silvicultura foram 
desenvolvidas, dada sua dependência da madeira para os processos de 
mineração e refino de minérios. A partir dessa época, o carvão vegetal passou a 
substituir os troncos de madeira nos processos de fundição e geração de calor. 
No século XVII, especialmente na Inglaterra, a quantidade de madeira 
usada principalmente na construção da frota de navios provocou o esgotamento 
dessa biomassa, gerando a consolidação do carvão para a geração de energia. 
Nesse período, era uma fonte abundante e barata, mas, com o aumento de seu 
uso, foi ficando de exploração mais difícil, pela necessidade de buscar em 
camadas cada vez mais profundas, abaixo da superfície, nas minas de carvão 
mineral. Na Europa do século XIX, em especial na Alemanha, a lenha era mais 
valiosa do que hoje é o petróleo, o aço e diversos commodities (Carvalho, 2014). 
 
 
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Cabe fazer um parêntese para discorrer sobre os estudos do uso de 
biomassa para a geração do biogás, cujo primeiro registro foi feito por Jan Baptista 
van Helmont, em 1630, que observou a geração de gás combustível por 
decomposição da biomassa. Esses estudos evoluíram até a geração e o uso de 
biogás a partir de matéria orgânica, para ser utilizado no sistema de iluminação 
da cidade de Exerter, na Inglaterra, em 1895 (Aquino et al., 2014), na Primeira 
Revolução Industrial. 
Com a Revolução Industrial, o uso inicial da biomassa foi bastante 
intensificado, principalmente nas máquinas de tear movidas a vapor (Figura 3). 
Entretanto, com a evolução das tecnologias e dos processos de fabricação, assim 
como seus produtos e sistemas de transportes, a biomassa começou a ser 
preterida, sendo, então, substituída quase totalmente por combustíveis de origem 
fóssil, notadamente o carvão mineral e o petróleo (Farias; Sellitto, 2011). 
Figura 3 – Máquinas de tear da Revolução Industrial 
 
Crédito: Everett Historical/Shutterstock. 
Soma-se a esses combustíveis o crescente uso da eletricidade, cujo 
interesse dos industriais da metalurgia, especificamente com relação à 
galvanoplastia (iniciada no século XIX), tomou força a partir das descobertas de 
Thomas Edison e Werner Siemens, consolidando-se com a invençãodo motor de 
corrente alternada por Nikola Tesla, um verdadeiro marco que a levou em grande 
escala para as indústrias (Carvalho, 2014). 
Durante quase um século, a biomassa teve seu uso reduzido 
industrialmente a caldeiras e geração de energia em poucas termoelétricas, cujo 
uso foi preterido em favor do crescimento das usinas hidroelétricas e mesmo da 
introdução de usinas nucleares. No Brasil, isso não ocorreu de forma significativa. 
 
 
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Até a década de 1970, mais especificamente até 1972, a madeira representava a 
principal fonte de energia do país, principalmente pelo uso de seu derivado, o 
carvão vegetal, nas siderúrgicas nacionais. 
Sua produção em escala industrial começou no século XIX, em Minas 
Gerais, devido à escassez do carvão mineral e à abundância de madeira nativa, 
que passou a ser usada para essa finalidade. Hoje, 30% do carvão usado na 
siderurgia nacional é vegetal, o que lhe confere o terceiro lugar da fonte de energia 
mais usada no país, atrás apenas do petróleo e da energia elétrica (Rodrigues et 
al., 2016). 
No mercado internacional, o que prevaleceu foi o uso de combustíveis 
fósseis. Porém, com a crise do petróleo de 1973, devido aos conflitos entre Israel, 
Egito e Síria (Guerra de Outubro) – nos quais pela primeira vez os países árabes 
usaram o boicote do fornecimento do petróleo como arma para forçar um acordo 
de paz que também contemplasse seus interesses –, e 1978, com o conflito entre 
Irã e Iraque, houve uma reconsideração sobre a sustentabilidade do uso de 
combustíveis fósseis, abrindo internacionalmente uma agenda com vistas a sua 
substituição por outras formas de combustíveis, o que novamente levou a 
biomassa a ter seu uso cada vez mais intensificado (Farias; Sellitto, 2011). 
No Brasil, esse contexto levou à criação do Programa Nacional do Álcool 
(ProÁlcool), em 1975, visando diminuir nossa dependência do petróleo e suas 
consequências em nossa economia, uma vez que, nessa época, importávamos 
cerca de 80% do petróleo consumido no país (Michellon; Santos; Rodrigues, 
2008). Depois da crise de 1978, houve a intensificação desse programa, e, com 
isso, foi incorporado o uso do bagaço de cana também como biomassa de 
importância estratégica para nossa economia. 
Embora tenha entrado num período de declínio nas décadas de 1980 e 
1990, sendo quase extinguido, esse programa voltou a crescer e se consolidar a 
partir de 2003, em função de estudos que levaram a uma maior conscientização 
ambiental mundial e sustentabilidade energética, alavancada principalmente 
pelos estudos relacionados ao efeito estufa. O catalisador desse crescimento foi 
sem dúvida a assinatura do Protocolo de Kyoto pelo Brasil em 1998. 
Sob esse mesmo enfoque, foi criado em 2004 o Programa Nacional do 
Biodiesel (PNB), visando substituir parcela do diesel consumido no país em 
transportes urbanos, rodoviários de passageiros e cargas, além de sistemas 
geradores de energia com motores estacionários e equipamentos rurais e tratores, 
 
 
8 
por biodiesel. Assim, biomassas vegetais e animais, bem como resíduos 
industriais e urbanos, também entraram na matriz energética nacional, com 
destaque para o óleo de soja, de mamona, de canola, de girassol, de algodão e 
de palma, além do sebo animal e do óleo residual de fritura de uso doméstico, 
comercial e industrial (Cardoso; Shikida; Finco, 2017). 
Embora na Índia e na China, nos anos 1950 e 1960, foi iniciado um 
programa de geração de energia usando o biogás com desenvolvimento de 
tecnologia própria, no Brasil essa forma de bioenergia chegou a ser testada no 
Nordeste na década de 1970, com um programa de instalação de biodigestores, 
mas seus resultados não foram considerados satisfatórios e o programa foi 
encerrado. Após a 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção-Quadro 
das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), em Paris (2015), 
começaram a ser implementados novamente programas de incentivo à produção 
do biogás, e hoje se tem a consciência de que esse tipo de bioenergia crescerá 
exponencialmente no Brasil. 
O Brasil é visto como o país de maior potencial para isso, devido à grande 
produção de biomassa necessária para essa finalidade. Em 2017, com a criação 
do RenovaBio, um programa de incentivo à matriz de biocombustíveis, estimou-
se que ocorra um grande crescimento desse setor energético. 
O biogás tem seu principal uso na queima doméstica, mas há estudos para 
substituir o GNV e também ser usado em motogeradores de eletricidade (Milanez 
et al., 2018). Portanto, resíduos agrícolas e pecuários, bem como resíduos 
orgânicos de aterros sanitários, indústrias de alimentos e mesmo da indústria 
madeireira e silvicultura, passaram a incorporar nossa biomassa para a produção 
de energia. 
Fica claro, portanto, que o uso da biomassa sempre esteve bastante 
presente na história da humanidade e certamente estará cada vez mais como 
matriz energética estratégica mundial. Também é possível concluir que o Brasil é 
um país rico em biomassa e que tem um imenso potencial para se tornar um 
expoente mundial na sua exploração para gerar energia. 
TEMA 3 – CONCEITUANDO A BIOENERGIA 
A bioenergia pode ser entendida como toda forma de energia obtida por 
meio da conversão da biomassa. Hoje, é de grande valor estratégico mundial, e 
nela se inserem o vapor, a bioeletricidade e os biocombustíveis. 
 
 
9 
Segundo Nota Técnica de setembro de 2018 emitida pela Empresa de 
Pesquisa Energética (EPE), afiliada ao Ministério de Minas e Energia do Governo 
Federal, referente ao Plano Nacional de Energia – 2050 ([S.d.]) – PNE 2050 –, a 
estimativa do potencial de geração de bioenergia no Brasil atingirá 530 milhões 
de toneladas equivalentes de petróleo (tep). Uma vez que 1 tep equivale a 11, 63 
x 103 kWh, a oferta atingirá 6.163.900 kWh, ou seja, 6,16 GWh (Figura 4). 
Figura 4 – Projeção PNE 2050 referente à produção de bioenergia 
 
Fonte: EPE, [S.d.]. 
É interessante observar na Figura 4 como a bioenergia está fortemente 
relacionada aos setores agrícola e florestal do Brasil. Somando as projeções de 
produção de bioenergia referentes ao manejo florestal sustentável, biomassa 
florestal convencional, palhas e pontas de cana, caldo para etanol, bagaço de 
cana e resíduos agrícolas, temos 444 milhões de tep, o que corresponderá a 
aproximadamente 84% da geração da bioenergia no país. 
Isso sem levar em conta as gorduras de origem vegetal para a produção 
do biodiesel e os resíduos sólidos de origem agrícola e agroindustrial presentes 
na fração orgânica dos Resíduos Sólidos Urbanos (RSU). Em um cenário de 
demanda de energia final previsto para o Brasil, até 2050, de 562 milhões de tep, 
conforme gráfico apresentado na Figura 5, correspondendo a aproximadamente 
6,54 GWh, há uma projeção de que a bioenergia atenderá até 94% da demanda 
de consumo (Brasil, 2018). 
 
 
 
10 
Figura 5 – Evolução do consumo de energia final até 2050 
 
Fonte: Brasil, 2018, p. 12. 
TEMA 4 – EVOLUÇÃO DA BIOENERGIA 
A primeira forma da bioenergia, que vem dos primórdios da humanidade, 
no período Paleolítico, mas que ainda segue sendo usada, é o calor. Este pode 
ser proveniente principalmente da queima da madeira, do biogás e do carvão. 
Usado inicialmente para a cocção dos alimentos e para aquecer, passou a ser 
adotado para gerar uma segunda fonte de bioenergia, o vapor. 
Muito embora a primeira máquina a vapor tenha sido desenvolvida por 
Heron de Alexandria no século III a.C, seu desenvolvimento efetivo foi feito no 
século XVII, para solucionar o problema de inundação nas minas de carvão e de 
minérios da Inglaterra, sendo iniciado por Denis Papin e otimizado por Thomas 
Severy. Entretanto, foi com a bomba a vapor proposta por Thomas Newcomen 
que o problema foi solucionado, solução esta que não foi definitiva. 
Com o aumento da profundidade das minas, a eficiência dessa máquina 
teve de ser melhorada.Foi aí que James Watts aumentou drasticamente sua 
eficiência por uma nova concepção dos cilindros, o que permitiu que o vapor fosse 
usado para mover não só bombas, mas também máquinas, navios e locomotivas, 
impulsionando a Primeira Revolução Industrial (Farias; Sellitto, 2011). Até hoje o 
vapor é de extrema importância para a indústria, a geração e a cogeração de 
energia elétrica. 
A geração de eletricidade pela biomassa ocorre em termoelétricas. A 
primeira termoelétrica do Brasil foi construída por ordem de Don Pedro II, em 
Campos dos Goytacazes, RJ, com capacidade de geração de energia suficiente 
para iluminar a Estação Central da Estrada de Ferro Dom Pedro II, que hoje é a 
Central do Brasil (Marcolin, 2005). 
 
 
11 
Com a implementação de usinas hidrelétricas e nucleares, as 
termoelétricas foram descontinuadas. Porém, com a crescente demanda 
energética necessária para o desenvolvimento do país, em 24 de fevereiro de 
2000 o então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso assinou o 
Decreto n. 3.371 (Brasil, 2000), que criou o Programa Prioritário de 
Termeletricidade, visando ampliar a matriz energética com termoelétricas a gás 
natural. 
Esse programa previa a implantação de 53 usinas por iniciativa privada, a 
partir de incentivos. Estão operando 22, das quais 12 são da Petrobras (Viegas et 
al., 2018). Pelo fato de não haver oferta grande de gás natural, sendo a maior 
delas feita pela Petrobras, as usinas termelétricas vêm sendo usadas como 
suporte para as hidrelétricas, tendo sido fortemente usadas nos períodos de seca 
entre 2013 e 2015. 
Com um forte impulso nas pesquisas para a cogeração de eletricidade do 
setor sucroalcooleiro, a bioeletricidade vem ganhando força com o uso do bagaço 
de cana como combustível de termelétricas. Soma-se a isso o uso de lenhas de 
florestas energéticas, que são florestas plantadas apenas para serem usadas em 
termelétricas. Assim, conforme já comentado no Tema 3, o PNE estima que a 
bioeletricidade seja responsável por mais de 80% da energia elétrica produzida 
no Brasil. 
O uso de biocombustíveis não representa qualquer novidade, uma vez que 
estes podem ser definidos, conforme o World Business Council for Sustainable 
Development (WBCSD), como combustíveis sólidos, líquidos ou gasosos 
provenientes da biomassa (Farias; Sellitto, 2011), e sempre caminharam com a 
história da humanidade. O principal biocombustível nacional é o álcool 
combustível. 
Em 1933, quando foi criado o Instituto do Açúcar e do Álcool pelo então 
Presidente Getúlio Vargas, o intuito foi destinar parte da cana-de-açúcar para a 
produção de álcool anidro, que seria usado como complemento à gasolina 
(Carvalho, 2014). O programa ProÁlcool intensificou essa meta, e, hoje, com os 
carros Flex e com o Programa RenovaBio, o álcool está vivendo uma nova onda 
de crescimento. 
Na sequência do álcool vem o carvão vegetal, que tem 70% de sua 
produção destinada à siderurgia, correspondendo a 30% do consumo de 
combustível para a produção do ferro gusa (Oliveira, 2011). Crescendo na matriz 
 
 
12 
energética nacional vem ainda o biodiesel, que, desde a criação do Programa 
Nacional de Produção e uso do Biodiesel pelo então presidente Luís Inácio Lula 
da Silva, vem tendo um aumento consistente em sua produção, chegando a um 
crescimento de 26% em 2018 (Nascimento, 2018). 
Por último, temos o biogás, que está na fase inicial de implementação e 
desenvolvimento, mas tem o maior potencial de crescimento. Esse potencial se 
justifica porque ele se configura como uma solução eficiente para a diminuição de 
emissão dos gases responsáveis pelo efeito estufa, uma vez que se transforma a 
partir de resíduos de agricultura, pecuária, silvicultura, urbanos e industriais de 
forma controlada, usando equipamentos chamados de biodigestores. 
É um combustível de grande espectro de aplicação, pois pode ser usado 
para a geração de energia elétrica em termoelétricas e motogeradores, bem como 
diretamente em veículos urbanos, rodoviários e também rurais, como 
motobombas e até tratores. Contribui ainda para a sustentabilidade, uma vez que, 
com a sua geração, os biodigestores também produzem biofertilizante, o qual, por 
ser rico em micronutrientes, é bastante recomendado para a fertilização de solos. 
Outros fatores que contribuem para seu potencial de crescimento são a 
variedade e a disponibilidade da biomassa, e também a facilidade do processo de 
sua geração, uma vez que este já ocorre naturalmente devido à degradação da 
matéria orgânica por micro-organismos. 
Pelo que foi apresentado até aqui, é inegável que a bioenergia vem 
crescendo no Brasil e no mundo, e ainda que ocupará certamente no futuro a 
posição de protagonista entre as fontes de energia a serem usadas pela 
humanidade. Em função disso, também vale observar que o Brasil tem todas as 
condições de se tornar líder na geração e na distribuição desse tipo de energia. 
TEMA 5 – FUNÇÃO ESTRATÉGICA DA BIOMASSA E DA BIOENERGIA 
Estamos entrando em uma nova era da economia mundial, denominada 
bioeconomia, e a função estratégica da biomassa e da bioenergia está 
profundamente atrelada a ela. Em 1971, os estudos do economista romeno 
Nicholas Georgescu-Roegen, que propôs um modelo econômico baseado na 
ecologia e na sustentabilidade, alicerçaram os conceitos da bioeconomia (Silva; 
Pereira; Martins, 2018). 
Embora ainda não haja consenso sobre a real definição da bioeconomia, 
termo criado pelos economistas e professores Juan Enriquez e Rodrigo Martinez, 
 
 
13 
de acordo com o relatório da Organização de Cooperação de Desenvolvimento 
Econômico (OCDE) publicado em 2006 (citado por Nunes; Lehfeld, 2017), há uma 
expectativa de que movimente 300 bilhões de euros em 2030. Ainda nesse 
relatório, a bioeconomia foi definida como “a parte das atividades econômicas que 
capturam valor a partir de processos biológicos e biorrecursos para produzir 
saúde, crescimento e desenvolvimento sustentável” (Nunes; Lehfeld, 2017, p. 
951). 
Na Quarta Revolução Industrial, e, consequentemente, nova revolução 
econômica, a sua principal caraterística será a de ser uma economia baseada na 
substituição de recursos não renováveis por renováveis, além de recursos 
gerados pela transformação de resíduos em produtos de base biológica e de 
bioenergia (Silva; Pereira; Martins, 2018). Segundo o comunicado da Comissão 
do Parlamento Europeu (European Commission, 2012), a bioeconomia envolve 
conhecimentos em biomassa renovável, biotecnologias e integração em todas as 
aplicações. 
Dentro desse novo paradigma, abrem-se excelentes oportunidades para o 
amplo crescimento econômico do Brasil, pois, no que se refere aos 
conhecimentos de biomassa renovável, temos um grande acervo de pesquisas e 
desenvolvimento voltados a essa área, alicerçados principalmente pelas 
pesquisas do ProÁlcool, do PNB e do RenovaBio. Somos detentores de tecnologia 
de ponta na produção do álcool combustível, cujas pesquisas incentivadas pelo 
setor sucroalcooleiro nos levam à excelência nessa área de conhecimento. 
Esse setor vem incentivando fortemente estudos para a cogeração de 
energia usando o bagaço de cana-de-açúcar. Temos também importantes 
desenvolvimentos referentes à transformação da biomassa vegetal, animal e de 
resíduos urbanos e industriais em biodiesel, e somos detentores mundiais do 
conhecimento da redução do minério de ferro para a produção do ferro gusa 
usando o carvão vegetal. 
Nossas termoelétricas vêm gradativamente incorporando biomassas, como 
lenha de florestas energéticas, biogás e resíduos da indústria madeireira, como 
insumos para a produção de energia elétrica. Porém, o maior potencial do país 
quanto aos conhecimentos de biomassa renovável está no desenvolvimento 
tecnológico voltado para a produção do biogás, partindo de resíduos agrícolas, 
pecuários, industriais e urbanos. 
 
 
14 
Com relação àsbiotecnologias, temos importantes estudos no 
desenvolvimento de produtos farmacêuticos, micro-organismos, ou mesmo 
variedades de plantas e vegetais melhorados geneticamente, nos quais não nos 
aprofundaremos aqui, pois não são nosso foco. Na integração de todas as 
aplicações, que envolve produtos básicos e de saúde, indústria e meio ambiente, 
nosso crescimento estará atrelado a políticas de incentivo à pesquisa e ao 
desenvolvimento, principalmente do setor público, além do apoio do setor privado. 
No documento da Confederação Nacional das Indústrias (CNI, 2014) 
intitulado Bioeconomia: oportunidades, obstáculos e agenda, são apontados dois 
passos fundamentais para a inserção e o crescimento do Brasil na bioeconomia: 
1. A necessidade de segurança jurídica para as empresas, por meio de um 
marco regulatório que permita que a bioeconomia seja efetivamente 
implementada no país, possibilitando práticas de governança, incentivos, 
cooperação internacional e competitividade, para que desenvolvimentos 
nas áreas de biomassa e biotecnologia possam gerar produtos 
competitivos nos mercados interno e externo. 
2. A necessidade de fortalecimento científico e tecnológico, principalmente 
voltado à biologia molecular, seja por programas de incentivos públicos ou 
privados à pesquisa e à inovação tecnológica, voltados a instituições 
nacionais ou internacionais. 
Também são recomendadas outras medidas, como incentivos para que as 
pequenas e médias empresas que trabalhem com biomassa e biotecnologia 
possam se desenvolver financeiramente, ampliação da oferta de programas de 
graduação e pós-graduação, bem como intercâmbios, com foco nos três setores 
da bioeconomia, aumento de investimentos governamentais para recuperação, 
modernização e ampliação de laboratórios universitários e centros de pesquisa 
nas áreas do conhecimento da bioeconomia, ampliação e adequação de linhas de 
fomento aos novos negócios da bioeconomia com recursos públicos ou privados, 
entre outras. 
Assim, sabe-se que os olhos do mundo estão voltados à capacidade do 
Brasil de desenvolvimento nos três setores da bioeconomia. A importância 
estratégica da biomassa e da bioenergia se justifica plenamente como alavanca 
propulsora que levará ao nosso protagonismo econômico dentro dessa nova 
Revolução Industrial. 
 
 
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Latinoamericana, p. 1-22, out. 2018. 
	BIOMASSA E BIOENERGIA
	CONVERSA INICIAL
	É fundamental para qualquer gestor, nos dias de hoje, estar cada vez mais ciente das possibilidades da geração e do uso de fontes de energias alternativas e sustentáveis, levando em conta os dois maiores problemas do sistema produtivo mundial:
	1. Consumo de energia;
	2. Geração de efluentes e resíduos industriais.
	O consumo de energia nos coloca frente a um grande desafio, pois sua oferta não está mais apresentando condições de fazer frente à demanda crescente de nossa civilização, o que a tornará cada vez mais escassa e cara. Quanto à geração de efluentes e re...
	Assim, seja por questões econômicas, seja por consciência ambiental, torna-se relevante aos gestores terem uma visão atenta quanto às possibilidades da conversão de efluentes ou resíduos em fontes de energia, com foco estratégico nos benefícios tangív...
	É nesse contexto que a biomassa e sua conversão em bioenergia vêm adquirindo crescente importância no cenário estratégico mundial. Nesta disciplina serão fornecidos fundamentos que permitam uma imersão inicial nesse assunto, para que o gestor possa te...

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