Prévia do material em texto
TUTORIA 03 – DOENÇAS CONGÊNITAS 01 - COMPREENDER ACERCA DAS INFECÇÕES CONGÊNITAS (SÍFILIS) A. EPIDEMIOLOGIA (INCIDÊNCIA, PREVALÊNCIA E TRANSMISSÃO); A sífilis congênita é o resultado da disseminação hematogênica do Treponema pallidum a partir da infecção materna em qualquer estágio clínico da doença ou em qualquer idade gestacional. As ocorrências de sífilis congênita (SC) vêm crescendo consideravelmente no Brasil, de acordo com o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, em 2016 foram quantificados 19.846 casos de sífilis congênita em neonatos, tendo a incidência de 6,8 casos/1000 nascidos vivos, sendo 96,5% na primeira semana de vida (BRASIL, 2017). Este crescimento significativo pode ser gerado pelo aumento da utilização de testes rápidos, melhoramento do sistema de vigilância, ou pela redução do uso de preservativos e resistência a penicilina (BRASIL, 2017). A portaria nº 33, de 14 de julho de 2005 do Ministério da Saúde inclui sífilis em gestante na lista de agravos de notificação compulsória com o propósito de minimizar a transmissão vertical do T. pallidum, acompanhar e tratar a gestante com sífilis (BRASIL, 2006). A taxa de mortalidade fetal e perinatal por sífilis congênita continua elevada (40 a 50%) e a pesquisa da sífilis faz parte do screening pré-natal obrigatório para todas as gestantes que frequentam os serviços públicos de saúde, não se justificando a ocorrência de infecção congênita. A doença pode ser transmitida por via sexual, sendo que o contato com as lesões contagiantes pelos órgãos genitais é responsável por 95% dos casos de sífilis, (sífilis adquirida) e verticalmente pela placenta da mãe para o feto (sífilis congênita). A bactéria penetra a mucosa íntegra ou a pele lesionada e se dissemina pelo organismo. O contato hematogênico por trans- plante de sangue infectado e por via indireta, com objetos contaminados, são outras formas de transmissão que ocorrem mais raramente e tem pouco valor epidemiológico. O treponema é muito sensível à penicilina. A transmissão do agente se dá através da via transplacentária ou através da contaminação do bebê durante sua saída pelo canal de parto. O T. pallidum dissemina-se através da placenta, cordão umbilical, membranas e fluido amniótico para o feto. Ocasionalmente, o RN pode ser infectado pelo contato com lesão genital materna. As mães nas fases primária e secundária da doença apresentam risco de transmissão vertical de 70 a 100% dos casos, taxa que se reduz para 30% nas fases tardias (latente tardia e terciária). Apesar destes altos índices de transmissão neonatal,cerca de 50% das crianças infectadas não apresentarão qualquer sintoma clínico logo após o nascimento, e as manifestações poderão aparecer somente aos três meses. Transmissão Fetal Cerca de 1,6% das gestantes brasileiras têm VDRL positivo. A grávida infectada transmite o micro-organismo para o feto quanto mais precocemente tiver adquirido a doença. A transmissão fetal pode ocorrer ao longo de toda a gravidez, mas as chances são menores até o quarto mês e aumentam em direção ao termo, já que o fluxo placentário aumenta progressivamente até o terceiro trimestre. No feto, ele acomete inicialmente o fígado, para depois se disseminar para pele e mucosas, esqueleto, pulmões e sistema nervoso central. A pneumonia alba, uma lesão pulmonar que surge ainda no período fetal, é incompatível com a vida. Cerca de 40% dos casos de sífilis não tratada na gestação terminam em óbito fetal (abortamento espontâneo, natimorto) ou morte neonatal precoce. Estima-se que no Brasil a incidência de sífilis congênita seja de um caso para 1.000 nascidos vivos. A sífilis é causada por uma bactéria chamada Treponema pallidum, gênero Treponema, da família Trepo- nemactaceae. É facilmente destruído pelo calor, água e sabão, não resistindo muito tempo fora do seu ambiente (26 horas). B. QUADRO CLÍNICO; Quadro clínico materno: A lesão genital da sífilis primária é indolor e geralmente passa despercebida (sífilis primária). Após semanas ou meses, podem surgir lesões cutâneo-mucosas e, algumas vezes, manifestações sistêmicas (sífilis secundária). Em seguida, essas lesões desaparecem e inicia-se o estágio latente (sífilis terciária). SÍFILIS CONGÊNITA A sífilis congênita é dividida em precoce, quando as manifestações clínicas ocorrem após o nascimento até os dois primeiros anos de vida, e tardia, quando os sinais e sintomas ocorrem a partir dos dois anos de vida em diante. SÍFILIS CONGÊNITA PRECOCE Na sífilis congênita precoce, a hepatomegalia e esplenomegalia estão presentes na maioria dos casos, podendo ser acompanhadas por anemia, púrpura e icterícia com grande aumento de transaminases. Quanto mais precoces forem os sinais clínicos, maior a gravidade da doença, ocorrendo mortalidade de 25% nos filhos de mães não tratadas. Lesões Cutaneomucosas ● Pênfigo palmoplantar: apresentam-se como múltiplas lesões bolhosas cercadas por halo eritematoso. Constitui-se na lesão mais precoce e mais facilmente identificável, embora não seja muito frequente. Seu principal diagnóstico diferencial é com o impetigo estafilocócico. Este último poupa palmas e plantas e evolui em surtos repetidos enquanto a sífilis congênita tem um único surto. As lesões descamam em seguida. ● Sifílides: são lesões cutâneas que se apresentam como máculas, pápulas, vesículas e crostas, sendo as máculas e pápulas as mais frequentes. Localizam-se no dorso, nádegas e região das coxas. Quando as lesões são palmoplantares, há erupção vesicular de conteúdo líquido hemorrágico ou turvo, rico em treponemas. Condilomas planos: poderão ocorrer em torno de orifícios (ânus, vulva e boca), sendo pouco frequentes. Placas mucosas podem aparecer nos lábios, língua, palato e genitália. ● Paroníquia caracteriza-se por processo exfoliativo das unhas. ● Rinite (coriza sifilítica): geralmente ocorre após as manifestações cutâneas, na segunda ou terceira semana. Apresenta-se com secreção mucossanguinolenta ou purulenta, que traz desconforto para a mamada e respiração. Se houver lesão da cartilagem nasal, poderá aparecer posteriormente o nariz em sela, estigma da sífilis. A lesão inflamatória do trato respiratório poderá produzir também laringite e choro rouco no RN. Lesões Ósseas São as manifestações clínicas mais frequentes da SC. O acometimento é simétrico, localizado em ossos longos: rádio, ulna, úmero, tíbia, fêmur e fíbula. As lesões ósseas são autolimitadas, curando-se com ou sem tratamento. A osteocondrite metafisária é o sinal radiológico mais encontrado e constitui-se na lesão mais precoce, ocorrendo em cerca de 75-100% dos pacientes sintomáticos. É mais frequente nas metáfises do úmero, fêmur e tíbia, podendo ocorrer em outros ossos. As epífises são quase sempre preservadas. Quando a osteocondrite acomete metacarpos, recebe o nome de dactilite sifilítica. A osteocondrite metafisária caracteriza-se clinicamente por dor à manipulação e impotência funcional principalmente de membros superiores (úmero). O sinal de Wimberger visto na radiografia, caracteriza-se por uma rarefação localizada na margem superior interna da tíbia bilateralmente, tendo como significado uma inflamação da metáfise. A periostite é diagnosticada radiologicamente em torno da décima sexta semana. Caracteriza-se por um espessamento extenso e bilateral da cortical da diáfise (sinal do duplo contorno), podendo ocorrer fratura. A lesão, clinicamente, apresenta- se por dor ao movimento dos membros. Lesões Viscerais o Hepatite: sua ocorrência indica prognóstico mais reservado. Clinicamente manifesta-se por icterícia por deficiência de excreção da bilirrubina direta. Pode acompanhar-se de esplenomegalia e distúrbios hemorrágicos. o Baço: o aumento do baço é um dos achados mais frequentes na sífilis congênita, sendo junto coma hepatomegalia a mais comum manifestação visceral da doença. o Rim: a lesão renal poderá apresentar-se como síndrome nefrótica ou síndrome nefrítica associada a depósito de complexos imunes na membrana basal do glomérulo. Ela geralmente aparece em torno do segundo ao terceiro mês. O tratamento com penicilina se acompanhará de remissão do quadro renal. Sistema Hematopoiético A anemia hemolítica com Coombs negativo é um achado comum, sendo grave nas formas mais precoces da SC. Esta pode vir acompanhada de leucocitose com reação leucemoide e trombocitopenia. Alguns recém-nascidos podem apresentar um quadro dramático de Coagulação Intravascular Disseminada (CID) na fase final da doença. Eventualmente, notamos ao exame físico destas crianças linfadenopatia generalizada. Lesões Nervosas Em lactentes, observamos a meningite como forma mais comum de comprometimento do sistema nervoso. Mesmo sem clínica compatível, estas alterações aparecem entre o terceiro e sexto mês de vida; o LCR tem celularidade aumentada à custa de linfócitos, apresentando aumento de proteínas e VDRL positivo. No final do primeiro ano de vida poderá ser diagnosticada uma hidrocefalia obstrutiva, após cronificação do quadro meningovascular, com paralisia de pares cranianos (III, IV, VI e VII), hemiplegia e convulsões. Lesões Oculares Predomina a coriorretinite na fase aguda, com o fundo de olho apresentando um aspecto de “sal e pimenta” característico. Outras lesões apresentadas são a ceratite intersticial, glaucoma, catarata, uveíte, cancro nas pálpebras e atrofia ótica. Outras Lesões Miocardite, síndrome de má-absorção, desnutrição e falta de ganho ponderal no RN são outras manifestações clínicas da doença. SÍFILIS CONGÊNITA TARDIA Acima dos dois anos de idade os estigmas da doença são os principais fatores que auxiliam no diagnóstico. ● Sequelas da periostite na fase aguda: bossa frontal (fronte olímpica), espessamento da junção esternoclavicular (Sinal de Higoumenáki), arqueamento da porção média da tíbia (Tíbia em Sabre). ● Anormalidades dentárias: Dentes de Hutchinson e molares em formato de amora. Face: Maxilar curto; Nariz em sela, com ou sem perfuração do septo nasal; Rágades (por fissuras peribucais). ● Articulação de Clutton (derrame articular estéril nos joelhos). ● Ceratite intersticial, coroidite, retinite, atrofia óptica com possível evolução para cegueira. ● Lesão de 8º par craniano, levando à surdez e à vertigem. A SC poderá afetar a audição por lesão do VIII par, bi ou unilateral. É o componente mais raro da tríade de Hutchinson (ceratite, alterações dentárias e surdez). ● Hidrocefalia. ● Retardo mental. C. PATOGÊNESE ; Mãe:As espiroquetas são bacilos espiralados e flexíveis, móveis e delgados, anaeróbio facultativo, podendo ser visualizados na microscopia de campo escuro ou por imunofluorescência (LEVINSON, 2016). As espiroquetas penetram nas mucosas, principalmente após contato sexual, pelas pequenas erosões após o coito, produzem diversas lipoproteínas que ativam o sistema inume e causam a destruição local dos tecidos. Invadem o sistema linfático e se disseminam por via hematogênica. Se não tratada, causam infecção generalizada atingindo todos os tecidos do corpo (BRASIL, 2006; AVELLEIRA; BOTTINO, 2006; LINS, 2014; LEVINSON, 2016). Congênita: Após a invasão, as espiroquetas se aderem às células do hospedeiro facilitando a colonização da bactéria nos tecidos e órgãos do indivíduo. Esta técnica é mediada pelas adesinas, são complexos proteicos que estão na superfície do patógeno que se ligam a receptores de superfície da célula do hospedeiro, proporcionando a fixação das espiroquetas nas células do hospedeiro. Neste período, a motilidade e a produção de enzima metaloproteinase-1, que induz a quebra do colágeno, favorecem a sobrevivência da bactéria (CASAL; ARAÚJO; CORVELO, 2012). O desenvolvimento da resposta inume adaptativa induzida pelo T. pallidum são os responsáveis pelos sinais e sintomas clínicos na sífilis. A existência dos treponemas no organismo induz o recrutamento de células do sistema imunológico inato e adaptativo, que realizam diapese para o local da infecção (CASAL; ARAÚJO; CORVELO, 2012). Então, durante uma infecção ocorre o reconhecimento dos lipopetídeos do T. pallidum através das células dendríticas mediado pelo receptor TLR2 22 (Toll-like receptor 2). Posteriormente, as células dendríticas juntamente com os macrófagos, estimulam a produção de citocinas inflamatórias TNF- a (fator de necrose tumoral), IL-1, IL-6, IL-8, IL-12, que provocam uma resposta inflamatória severa (CASAL; ARAÚJO; CORVELO, 2012). Nas lesões primárias e secundárias da sífilis é observada a produção de interferon gama (IFN-g) e interleucina-2 (IL-2), responsáveis pelo estímulo dos macrófagos e reprodução de linfócitos T helper (CD4+) e linfócitos T citotóxicos (CD8+) Em circunstâncias normais, a própria unidade fetoplacentária secreta espontaneamente as citocinas anti-inflamatórias IL-10, IL-4 e o fator transformador do crescimento (TGF) para afastar qualquer efeito prejudicial da inflamação sistêmica ou local, inibindo a resposta celular citotóxica. Deste modo protege o feto de ser expulso, porém não é uma resposta humoral eficaz ao T. pallidum (WICHER; WICHER, 2001; BRASIL, 2006). D. DIAGNÓSTICO (DIAGNÓSTICO CLÍNICO E LABORATORIAL); Pesquisa Direta do Treponema Na pesquisa direta do treponema em técnica do campo escuro, o material deve ser colhido de lesões úmidas como as cutâneas e mucosas, do coto umbilical e das fossas nasais. Este exame precisa ser realizado por profissional experiente. Esta pesquisa negativa-se após o primeiro dia de tratamento. Reações Sorológicas para a Sífilis Esses testes têm como base a demonstração de anticorpos contra o treponema. Podem ser divididos em dois grandes grupos: TESTES NÃO TREPONÊMICOS: Os testes não treponêmicos empregam antígenos lipídicos não específicos, isolados a partir do coração de boi (cardiolipina). Assim, eles não são muito específicos, pois não avaliam anticorpos contra o treponema e sim contra o complexo lipídico que o treponema libera quando ele é lesado. Os dois tipos principais são: ● Fixação de Complemento: Wassermann e Kolmer. ● Teste de Floculação: VDRL e RPR (Reagina Rápida Plasmática). VDRL - Venereal Disease Research Laboratory O valor normal de seu resultado é a negatividade. Devemos lembrar que este teste tem reatividade observada para as duas imunoglobulinas IgG e IgM. Dessa forma, um teste não treponêmico positivo no RN não indica necessariamente infecção congênita, uma vez que a IgG materna ultrapassa a placenta (IgM não atravessa). Devemos suspeitar dessa condição sempre que o título de anticorpo encontrado no RN for igual ou inferior ao da mãe. Este deve ser repetido em 15 dias, caso haja títulos ascendentes a infecção ativa é provável. RN com títulos sorológicos superiores aos maternos provavelmente têm a infecção congênita. Tem chances de ser falso-positivo ou negativo. VDRL é que mede atividade da doença, ou seja, é um teste quantitativo. De acordo com o Ministério da Saúde, é indicado para o diagnóstico e seguimento terapêutico. TESTES TREPONÊMICOS: Tem como base o emprego do treponema ou de seus fragmentos como antígeno. São eles TPHA (Treponema pallidum Hemaglutination); FTA-Abs (Fluorescent Treponemal Antibody – Absorption) e ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay). São testes mais complexos e de maior custo. Detectam anticorpos específicos contra o treponema. São úteis para confirmação diagnóstica quando um teste reagínico for positivo. ● FTA-ABS (FLUORESCENT TREPONEMAL ANTIBODY ABSORPTION) São testes mais específicos, úteis na exclusão de resultados de VDRL falso-positivos. Detecta tanto anticorpos IgG quanto IgM, podendo, em caso de positividade, indicar apenas transferênciade anticorpos IgG maternos. Estes testes não são recomendados no RN e devem ser realizados apenas após 18 meses, quando os anticorpos adquiridos de forma passiva através da placenta não são mais detectáveis. ● O Ministério da Saúde preconiza o VDRL na primeira consulta pré-natal, idealmente no primeiro trimestre da gravidez, no início do 3º trimestre (28ª semana) e repetido na admissão para trabalho de parto ou aborto. Na presença de VDRL reagente, recomenda-se a realização de teste treponêmico confirmatório, e na sua ausência, considera-se um caso de risco para sífilis congênita qualquer titulação de VDRL materno para gestantes não tratadas ou tratadas inadequadamente. ● O VDRL deve também ser colhido do sangue periférico de todos os recém-nascidos (RN) caso o VDRL da mãe seja positivo em qualquer diluição. Nenhum RN deve receber alta do berçário antes do resultado do VDRL da mãe. ● Reações Sorológicas no Liquor Devemos realizar a punção lombar para investigação de comprometimento neurológico (60% dos casos assintomáticos) em todos os casos suspeitos de sífilis congênita. Sempre que o VDRL for positivo no líquido cefalorraquidiano, o RN deve ser considerado como portador de neurossífilis congênita. Entretanto o VDRL negativo pode não afastar neurolues. Na presença de pleocitose (> 25 hemácias/mm³), aumento das proteínas no LCR (> 150 mg/dl) ou de um LCR inconclusivo, o RN deve ser considerado como portador de neurossífilis. E. TRATAMENTO (MÃE E FILHO); A droga de escolha é a penicilina. O Treponema pallidum continua sensível a este fármaco. Devemos ter em mente que as formas mais comumente empregadas são a cristalina (sempre prescrita a RN internados) e a procaína. A penicilina benzatina é usada apenas em situações excepcionais e de baixo risco (vide adiante), pois não atravessa a barreira hematoencefálica. O RN com sífilis congênita precoce deve ser isolado, uma vez que as lesões cutaneomucosas são ricas em treponemas. Cerca de 24h após o início da terapêutica com penicilina, os RN não são mais infectantes. MANEJO DO RECÉM-NASCIDO No Período Neonatal A. Nos recém-nascidos de mães com sífilis não tratada ou inadequadamente tratada, independentemente do resultado do VDRL do recém-nascido, realizar: hemograma, radiografia de ossos longos, punção lombar (na impossibilidade de realizar este exame, tratar o caso como neurossífilis), e outros exames, quando clinicamente indicados. De acordo com a avaliação clínica e de exames complementares: A1. Se houver alterações clínicas e/ou sorológicas e/ou radiológicas e/ou hematológicas, o tratamento deverá ser feito com penicilina G cristalina na dose de 50.000 UI/kg/dose, por via endovenosa, a cada 12 horas (nos primeiros sete dias de vida) e a cada oito horas (após sete dias de vida), durante dez dias; ou penicilina G procaína 50.000 UI/kg, dose única diária, IM, durante dez dias; A2. Se houver alteração liquórica, o tratamento deverá ser feito com penicilina G cristalina 6, na dose de 50.000 UI/kg/ dose, por via endovenosa, a cada 12 horas (nos primeiros sete dias de vida) e a cada oito horas (após sete dias de vida), durante dez dias; A3. Se não houver alterações clínicas, radiológicas, hematológicas e/ou liquóricas, e a sorologia for negativa, deve-se proceder ao tratamento com penicilina G benzatina 7 por via intramuscular na dose única de 50.000 UI/kg. O acompanhamento é obrigatório, incluindo o seguimento com VDRL sérico após conclusão do tratamento. Sendo impossível garantir o acompanhamento, o recém-nascido deverá ser tratado com o esquema A1. B. Nos recém-nascidos de mães adequadamente tratadas: realizar o VDRL em amostra de sangue periférico do recém-nascido; se este for reagente com titulação maior do que a materna, e/ou na presença de alterações clínicas, realizar hemograma, radiografia de ossos longos e análise do LCR: B1. Se houver alterações clínicas e/ou radiológicas, e/ou hematológica sem alterações liquóricas, o tratamento deverá ser feito como em A1; B2. Se houver alteração liquórica, o tratamento deverá ser feito como em A2; C. Nos recém-nascidos de mães adequadamente tratadas: realizar o VDRL em amostra de sangue periférico do recém-nascido: C1. Se for assintomático e o VDRL não for reagente proceder apenas ao seguimento clinicolaboratorial. Na impossibilidade de garantir o seguimento 8 deve-se proceder o tratamento com penicilina G benzatina, IM, na dose única de 50.000 UI/kg. C2. Se for assintomático e tiver o VDRL reagente, com título igual ou menor que o materno acompanhar clinicamente (ver Seguimento). Na impossibilidade do seguimento clínico, investigar e tratar como A1(sem alterações de LCR) ou A2 (se houver alterações no LCR). OBSERVAÇÃO: O Ministério da Saúde recomenda que, na indisponibilidade de penicilina cristalina, penicilina G benzatina e penicilina G procaína, constitui-se uma opção terapêutica: Ceftriaxona 25-50 mg/kg peso/dia IV ou IM, por 10 a 14 dias. Após o Período Neonatal (a partir do 28º dia de vida) Crianças com quadro clínico e sorológico sugestivos de sífilis congênita devem ser cuidadosamente investigadas, obedecendo-se a rotina referida. Confirmando-se o diagnóstico, iniciar o tratamento, observando o intervalo das aplicações da penicilina G cristalina, que deverá ser de quatro em quatro horas, e da Penicilina G Procaína, de 12 em 12 horas, sem modificações nas dosagens descritas. Em RN sintomáticos adequadamente tratados no período neonatal, as manifestações clínicas resolvem-se em três meses. Nesses RN, os testes reagínicos devem declinar até a idade de 3 meses e negativar em até 6 meses. No entanto, a resposta sorológica pode ser mais lenta em crianças tratadas após o período neonatal. Títulos estáveis ou que mostrem elevação (de quatro vezes) sugerem falha terapêutica e a criança deve ser reavaliada e tratada. Se houver alterações liquóricas no início do tratamento, deve-se repetir o LCR 3 a 6 meses após o final do mesmo tratamento, para documentação da normalização desse exame. A persistência de alterações indica a necessidade de reavaliação clínica, laboratorial e terapêutica. Outras avaliações necessárias para a verificação da extensão do acometimento incluem exames oftalmológico (fundoscopia), neurológico e de acuidade auditiva periodicamente a cada 6 meses e até os 2 anos (ou mais se necessário). Seguimento Avaliações mensais até o sexto mês e bimensais do sexto ao 12° mês. ● Realizar VDRL com 1, 3, 6, 12 e 18 meses, interrompendo quando se observar negativação em dois exames consecutivos. ● Diante das elevações de títulos sorológicos, ou da sua não negativação até os 18 meses, reinvestigar o paciente e tratar. ● Recomenda-se o acompanhamento oftalmológico, neurológico e audiológico semestral por dois anos. ● Nos casos onde o LCR esteve alterado, deve- se proceder à reavaliação liquórica a cada seis meses, até a normalização do LCR. ● Nos casos de crianças tratadas inadequadamente, na dose e/ou tempo preconizados, deve-se convocar a criança para reavaliação clinicolaboratorial. Havendo alterações, recomenda- se reiniciar o tratamento da criança conforme o caso, obedecendo aos planos já descritos. Se os resultados forem normais, o seguimento é ambulatorial. Critérios de Cura A melhora clínica, radiológica e laboratorial com stituem critérios de cura. Os exames sorológicos negativam-se em torno de seis meses. Caso o VDRL continue reagente com 18 meses ou os títulos forem ascendentes, a criança deverá ser retratada. F. COMPLICAÇÕES; Sequelas neurológicas (déficit de aprendizado, retardo mental), deformidades ósseas e dentárias, surdez, perda visual podem ocorrer de modo insidioso e comprometer o desenvolvimento da criança. G. PREVENÇÃO; A prevenção da sífilis congênita insere-senas ações para prevenção das infecções sexualmente transmissíveis de maneira geral, nas medidas de identificação e no tratamento de gestantes infectadas por sífilis e na prevenção da reinfecção das mesmas. O risco de sífilis congênita é extremamente baixo se o tratamento da mãe for realizado de forma adequada durante a gestação. É preciso lembrar que a penicilina atravessa a placenta e pode levar à cura da infecção fetal. Se a sífilis não for tratada durante a gravidez, o risco de transmissão é próximo de 100% com 40% de óbitos fetais e neonatais. REFERENCIAS SILVA, Gláucia Cristina Barbosa. RODRIGUES, Fernando Fachinelli. Fisiopatologia da sífilis congênita. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 10, Vol. 04, pp. 122-136 Outubro de 2018 MEDCURSO/SANAR Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Atenção à saúde do recém-nascido: guia para os profissionais de saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. – Brasília : Ministério da Saúde, 2011. OBJETIVOS 06 - COMPREENDER ACERCA DAS INFECÇÕES CONGÊNITAS (HIV) A. EPIDEMIOLOGIA (INCIDÊNCIA, PREVALÊNCIA E TRANSMISSÃO); Com relação à infecção pelo HIV em gestantes, no último estudo em parturientes de 2010, observou-se uma prevalência de HIV de 0,38%. Aplicando essa prevalência ao número estimado de gestantes em 2012, obtém-se um total de 12.177 gestantes HIV positivas nesse ano. Cerca de 80% das infecções em crianças ocorrem através da Transmissão Vertical. TRANSMISSÃO O nível de carga viral do vírus (CV-HIV) é um dos fatores mais importantes associados ao risco de transmissão vertical (TV) do HIV e auxilia nos seguimentos e na definição da via de parto. a transmissão da mãe para o filho no momento do parto é a causa mais comum de infecção pediátrica pelo HIV. Entre 15 e 40% dos neonatos nascidos de mães infectadas pelo HIV não tratadas e que não amamentam são infectados. Os índices de transmissão pela amamentação podem ser de até 30 a 40% e estão associados à carga viral de HIV sistêmico. A taxa de transmissão vertical é inferior a 1% em gestantes em uso de antirretrovirais que mantêm níveis de CV-HIV abaixo de 1000 cópias/mL, sendo, portanto, muito baixa quando a CV estiver indetectável. Intrauterina Acredita-se que a maioria das transmissões intrauterina do HIV ocorra durante o terceiro trimestre. Pensa-se que os mecanismos de transmissão estejam relacionados à quebra da integridade da placenta, levando a microtransfusões de sangue materno virêmico através da placenta para o feto. Intraparto Postula-se que a transmissão durante o parto ocorra através do contato das membranas mucosas do bebê com o vírus HIV no sangue e secreções durante o processo de nascimento. Na ausência de tratamento antirretroviral, a duração da ruptura da membrana superior a quatro horas tem sido associada ao aumento do risco de transmissão. Além disso, as microtransfusões na placenta durante as contrações de parto também provavelmente contribuem para o risco aumentado de transmissão durante o período de parto e parto. O mecanismo de transmissão do HIV através do leite materno não foi totalmente elucidado. O RNA do HIV pode ser detectado no colostro e no leite materno, mas alguns estudos sugerem que as células infectadas pelo HIV no leite materno podem desempenhar um papel mais importante na transmissão vertical do que o vírus sem as células. Além disso, a porta de entrada do HIV no lactente não foi definida, mas pode incluir os tecidos intestinal ou tonsilar. Violações na integridade epitelial intestinal ou comprometimento das junções celulares intestinais (por exemplo, entre células epiteliais ou dendríticas) podem permitir a entrada do vírus. Os bebês que são infectados pela amamentação têm níveis mais altos de lipopolissacarídeo, sugerindo que a integridade intestinal comprometida pode facilitar a transmissão. Carga viral: A infecção neonatal é de cerca de 1 % com menos de 400 cópias/mL e mais de 30% quando os níveis de RNA viral materno foram superiores a 100.000 cópias/ml. B. QUADRO CLÍNICO; Sem tratamento, o curso clínico da infecção pelo HIV é mais rápido na criança em relação ao adulto, em consequência da imaturidade imunológica. A infecção é, em geral, assintomática no período neonatal e o risco de progressão é inversamente correlacionado à idade da criança, ou seja, os mais jovens estão sob maior risco de progressão rápida. Aos 12 meses, aproximadamente 50% das crianças desenvolvem imunossupressão moderada ou grave, e 20% delas, imunossupressão grave. A progressão da doença e infecções oportunistas podem ocorrer nessas crianças mesmo quando apresentam contagens normais de células TCD+. A história natural da doença segue 3 padrões distintos de evolução em crianças: progressão rápida, normal e lenta. ● O padrão de progressão rápida ocorre em cerca de 20 a 30% das crianças não tratadas, que evoluem com quadros graves no 1º ano de vida e podem morrer antes dos 4 anos. Inicialmente, podem surgir sinais e sintomas inespecíficos, como dificuldade em ganhar peso, febre, adenomegalia, hepatoesplenomegalia, anormalidades neurológicas, anemia, plaquetopenia, diarreia prolongada, infecções bacterianas de repetição e candidíase oral de difícil controle. o Imunodeficiência grave: Infecções oportunistas, como pneumonia por Pneumocystis jirovecii, micobacteriose atípica, candidíase oral ou sistêmica, infecções crônicas ou recorrentes por citomegalovírus (CMV), toxoplasma, vírus varicela zóster e herpes simples, são frequentes entre as crianças com imunodeficiência grave. o Nos pacientes com o padrão de progressão normal (70 a 80% dos casos), o desenvolvimento dos sintomas pode iniciar-se na idade escolar, com tempo médio de sobrevida de 9 a 10 anos (dados prévios à disponibilidade de terapia específica). o O padrão de progressão lenta ocorre em uma porcentagem pequena (seja realizada o mais breve possível. A documentação da sororreversão da criança não infectada pelo HIV deve ser realizada com uma sorologia para HIV não reagente após 18 meses. Em caso de crianca que nao recebeu a profilaxia, recomenda-se que a CV seja realizada imediatamente apos a identificacao do caso. Se o resultado for acima de 5.000 copias/mL, repete-se o exame em seguida e, se o resultado do segundo exame se mantiver acima de 5.000 copias/mL, considera-se a crianca infectada. Se o resultado do primeiro exame for de ate 5.000 copias/mL, a segunda CV deve ser repetida com intervalo minimo de quatro semanas e, caso o resultado seja de ate 5.000 copias/mL, considera-se a crianca sem indicio de infecção. AMAMENTAÇÃO: Nas consultas, é importante que o profissional de saúde confirme que a criança não foi amamentada (AMAMENTAÇÃO É CONTRAINDICADA PARA MULHERES INFECTADAS PELO HIV). Para as crianças que foram amamentadas, deve-se orientar a imediata interrupção da amamentação, a realização do exame de CV-HIV e o início da profilaxia (PEP) simultaneamente à investigação diagnóstica. Também se recomenda a realização imediata da CV duas semanas após o início da PEP, repetindo-se o exame seis semanas após o início da PEP. Caso o resultado fique acima de 5.000 cópias/mL, repete-se o exame imediatamente e, caso o resultado do segundo exame se mantiver acima de 5.000 cópias/mL, considera- -se a criança infectada. Se o resultado do primeiro exame for de até 5.000 cópias/mL, a segunda CV-HIV deve ser repetida com intervalo mínimo de quatro semanas e, caso o resultado seja de até 5.000 cópias/mL, considera-se a criança sem indício de infecção. Obs: Em RN sintomáticos, a CV pode ser colhida a qualquer momento. Notificação: A criança exposta ao HIV durante a gestação ou parto, ou que tenha sido amamentada por mulher infectada pelo HIV, deve ser notificada como “criança exposta”. Não há necessidade de aguardar o resultado da sorologia para a notificação. Encerra-se o caso quando o resultado da sorologia estiver disponível após os 18 meses. D. MANEJO, TRATAMENTO E PROFILAXIA (MÃE FILHO) MEDIDAS DE PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL Testagem do HIV A testagem para HIV deve ser realizada no primeiro trimestre, idealmente na primeira consulta do pré-natal, no início do terceiro trimestre de gestação, e na admissão da mulher na maternidade, hospital ou casa de parto, podendo ainda ser feita em qualquer outro momento em que haja exposição de risco ou violência sexual. TESTE DE CARGA VIRAL: A realização imediata do teste de carga viral (CV) do HIV está indicada após a confirmação da infecção pelo HIV, pois o nível da carga viral do vírus é um dos fatores mais importantes associados ao risco de transmissão vertical do HIV e auxilia no seguimento e na definição da via de parto. CONTAGEM DE TCD4+: A contagem de linfócitos TCD4+ deverá ser realizada na primeira consulta de pré-natal e pelo menos a cada três meses durante a gestação para gestantes em início de tratamento. TARV A TARV está indicada para toda gestante infectada pelo HIV, independentemente de critérios clínicos e imunológicos, e não deverá ser suspensa após o parto, independentemente do nível de linfócitos TCD4+ no momento do início do tratamento. A TARV deve ser iniciada na gestante antes mesmo de se terem os resultados dos exames de linfócitos TCD4+, CV-HIV e genotipagem – principalmente nos casos de gestantes que iniciam tardiamente o acompanhamento pré-natal –, com o objetivo de alcançar a supressão viral o mais rapidamente possível. O esquema preferencial de tratamento para gestantes deve ser: Tenofovir (TDF) + Lamivudina (3TC) + Raltegravir (RAL). A associação tenofovir/lamivudina (TDF/3TC) é a preferencial nas gestantes infectadas pelo HIV. Após resultado da genotipagem, a TARV de 2ª escolha para gestantes em início de tratamento deve ser: Tenofovir (TDF) + Lamivudina (3TC) + Efavirez (EFV) VIAS DE PARTO Mulheres com carga viral desconhecida ou > 1.000 cópias/ ml após 34 semanas de gestação: a cesárea eletiva a partir da 38ª semana de gestação e a administração de zidovudina (AZT) intravenoso no parto diminuem o risco de transmissão vertical do HIV; Mulheres em uso de ARV e com supressão da carga viral sustentada: caso não haja indicação de cesárea por outro motivo, a via de parto vaginal é indicada, com uso de TARV por via oral, como utilizado regularmente; Mulheres com carga viral● Convulsões febris; ● Alterações cardíacas: As alterações cardíacas relacionadas à exposição aos ARV variam desde miocardiopatia assintomática até quadros de insuficiência cardíaca grave. As crianças expostas aos ARV intraútero estão sob risco potencial de toxicidade e de alterações cardíacas. ● Redução dos níveis séricos de insulina no RN: uso dos inibidores de protease tem sido relacionado ao surgimento de intolerancia a glicose e casos de diabetes. RAS do HIV na gestante: Nesse intuito, preconiza-se que as gestantes diagnosticadas com HIV sejam acompanhadas pelo médico obstetra no pré-natal de alto risco ou Serviços de Atenção Especializada, a fim de garantir que a gestante chegue no final da gestação com carga viral indetectável, diminuindo assim o risco de transmissão vertical da doença. Se forem assistidas pelo Sistema Único de Saúde, devem manter o vínculo com a Atenção Básica. No caso de gestantes com imunossupressão mais grave e infecções oportunistas, o manejo dessas condições será realizado mediante o auxílio do infectologista ou clínico com experiência no tratamento de pessoas que vivem com HIV. PREVENÇÃO REFERÊNCIAS: SANAR; Tratado de Pediatria da SBP; Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Manejo da Infecção pelo HIV em Crianças e Adolescentes. Brasília : Ministério da Saúde, 2018. Fonte: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/protocolo-clinico-e-diretrizes-ter apeuticas-para-manejo-da-infeccao-pelo-hiv-em-criancas-e