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ESTUDO DE CASO Direito Tributário Tributos em espécie Emerson Andena JU R0 29 0_ v1 .0 1. O caso Carlos Alberto e Ricardo Augusto são irmãos residentes em Montes Claros/MG, mas trilharam caminhos muito diferentes em suas vidas. O primeiro foi condenado por chefiar o tráfico de drogas na cidade. Não obstante a vantagem econômica tenha sido obtida por atividade ilegal, ela sofreu a incidência do Imposto de Renda (IR). Já o segundo, é administrador da empresa Cristal LTDA, sociedade empresarial que explora o ramo de fabricação de calçados. Em novembro de 2016, a empresa administrada por Ricardo Augusto adquiriu o estabelecimento empresarial da pessoa jurídica Luminus LTDA, que atuava na venda de peças de veículos automotores. O objetivo da empresa Cristal era utilizar o estabelecimento adquirido para realizar a venda dos sapatos que fabrica. Ocorre que a Cristal foi notificada, há três dias, acerca de duas Execuções Fiscais movidas contra ela pelo Município, referentes ao estabelecimento adquirido de Luminus. Na primeira, o Fisco está cobrando o pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) dos anos de 2014 e 2015. Sendo que foi apreendido pela Fazenda o estoque de calçados que havia na sede do estabelecimento, como meio coercitivo para exigir o pagamento do IPTU. A segunda Execução Fiscal trata da cobrança do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS - do ano de 2014. O Fisco municipal, nesse passo, ao promover fiscalização no estabelecimento adquirido pela Cristal, efetuou a cobrança da Taxa de Fiscalização de Localização. Para isso, usou como base de cálculo o número de empregados contratados pela empresa. Também foi realizada a cobrança da Taxa de Segurança contra incêndio, prevista na legislação estadual, cuja base de cálculo é de 1% do valor da área construída do estabelecimento. 2. Papel do aluno e sua participação na resolução do problema Você, consultor jurídico, foi contratado pelos irmãos para emitir parecer sobre as questões tributárias que estão enfrentando. Ricardo Augusto almeja saber se a empresa que administra é ou não responsável pelo pagamento do IPTU e do ICMS do estabelecimento que adquiriu e, caso não seja, qual a melhor forma para defender-se. Também deseja saber se a apreensão das mercadorias e a base de cálculo das Taxas de Fiscalização e de Segurança contra incêndio estão corretas. Carlos Alberto, por outro lado, tenciona saber se é possível a tributação sobre sua renda, uma vez que é proveniente da exploração do tráfico de drogas. Considere em seu parecer a lei, a jurisprudência e a doutrina atinentes aos temas. 3. Objetivos Gerais • Desenvolver a prática do autoaprendizado e do trabalho em equipe. • Planejar as atividades no tempo disponível. • Desenvolver a autonomia na realização de pesquisas. • Ser criativo na solução do desafio. Específicos • Retratar determinada situação jurídica hipotética capaz de instigar a reflexão do tema de forma ampla e profunda. • Promover a interpretação contextual, para que melhor se possa compreender a manifestação geral de um dado problema. • Estimular o desenvolvimento de raciocínio crítico e argumentativo. • Desafiar o aluno a identificar e avaliar a problematização e a propor solução. • Estudar contornos jurídicos da espécie tributária Taxa. • Compreender a responsabilidade tributária de adquirente de estabelecimento comercial. • Entender se a apreensão de mercadorias pode ser usada como meio coercitivo para o pagamento de tributos. • Analisar aspectos legais e doutrinários da tributação de atos ilícitos no Brasil. 4. Atividades Considerando as informações contidas no enunciado, este Estudo de Caso deve ser desenvolvido seguindo a etapa a seguir: a) Apoiar-se nas leituras complementares: ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário. 11. ed. rev. atual. e amp. Salvador: JusPodivm, 2017. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. BAALBAKI, Sérgio. Tributação Oriunda de Atos Ilícitos. FISCOSoft. Disponível em: . Acesso em: 28 jan. 2018. BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 2002. p. 613-615. BRASIL. Código Tributário Nacional (1966). Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Diário Oficial da União, Brasília, 27 out. 1966. Disponível em: . Acesso em: 28 jan. 2018. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais. Diário Oficial da União, Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: . Acesso em: 28 jan. 2018. http://www.fiscosoft.com.br/main_artigos_index.php?PID=159790&printpage=_ http://www.fiscosoft.com.br/main_artigos_index.php?PID=159790&printpage=_ http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm FISCHER, Douglas. Tributação em face de atos ilícitos. In: Revista Interesse Público, ano 8, n° 38, jul/ago. 2006. Porto Alegre: Notadez, 2006. MACHADO, Hugo de Brito. Hipótese de Incidência e Tributação de Ilícitos. In: Revista Fórum de Direito Tributário. n. 26, ano 3, jul/ago, 2005. Belo Horizonte. MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2011. PASSOS, Fábio Presoti. Da Tributação da Hipótese de Incidência Decorrente da Consequência Econômica do Ilícito Penal. E-Civitas - Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais do UNI-BH, Belo Horizonte. vol.VII, n. 1, jun. de 2014. Disponível em: . Acesso em: 28 jan. 2018 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional: anotações à Constituição, ao Código Tributário Nacional e às Leis Complementares 87/1996 e 116/2003. 6. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Atlas, 2017. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de execução fiscal: comentários e jurisprudência. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 19. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2013. 5. Resolução As taxas, segundo o art. 77 do CTN (bem como pelo inciso II do art. 145 da CF), são “cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições”, e “têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição”. Assim sendo, pode-se afirmar que as taxas são tributos vinculados a uma contraprestação estatal. http://revistas2.unibh.br/index.php/dcjpg/article/view/1149Da leitura do art. 77 do CTN, percebe-se claramente a existência de duas espécies de taxas: a taxa de fiscalização (ou taxa de polícia) e a taxa de serviço (ou de utilização). A taxa de fiscalização é cobrada em virtude do exercício, pela Administração Pública, do poder de polícia. Já a taxa de serviço é cobrada do contribuinte pela “utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível”. Serviço público específico é aquele no qual é possível distinguir quem é o seu beneficiário. Divisível é o serviço público “quantificável, que traz um benefício individualizado para o destinatário da ação estatal”1. No que concerne à composição da base de cálculo deste tributo, estipula o parágrafo único do artigo 77 do CTN que: “A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas”. A base de cálculo é o montante sobre o qual recai a alíquota, sendo usada para calcular o valor a ser pago pelo tributo. E conforme esclarece Hugo de Brito Machado Segundo2, “(...) deve sempre corresponder ao aspecto dimensível de seu fato gerador, vale dizer, deve corresponder à quantificação pecuniária de seu fato gerador”. Assim sendo, “as taxas devem ser cobradas em função do custo aproximado que a atividade representa para o Poder Público e do grau de utilização do contribuinte em relação a essa atividade”3. Em razão disso, é possível concluir que no caso em análise o uso do número de empregados como base de cálculo da Taxa de Fiscalização de Localização é inconstitucional. Tal parâmetro se desvincula completamente da efetiva atividade fiscalizatória, sendo um dado meramente objetivo que não reflete o ônus do poder público. 1 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 468. 2SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional: anotações à Constituição, ao Código Tri- butário Nacional e às Leis Complementares 87/1996 e 116/2003. 6. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2017. 3SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional: anotações à Constituição, ao Código Tri- butário Nacional e às Leis Complementares 87/1996 e 116/2003. 6. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Atlas, 2017. Entende dessa forma o Supremo Tribunal Federal, cuja jurisprudência é pacífica no sentido da inconstitucionalidade do uso do número de empregados como base de cálculo da Taxa de Fiscalização de Localização. Segundo o STF, trata-se de dado insuficiente para aferir o efetivo poder de polícia, conforme se denota do trecho a seguir4: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TAXA DE LICENÇA PARA LOCALIZAÇÃO, FUNCIONAMENTO E INSTALAÇÃO (TLIF). BASE DE CÁLCULO. NÚMERO DE EMPREGADOS. DADO INSUFICIENTE PARA AFERIR O EFETIVO PODER DE POLÍCIA. ARTIGO 6º DA LEI Nº 9.670/83. INCONSTITUCIONALIDADE. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DA CORTE. 1. A taxa é um tributo contraprestacional (vinculado) usado na remuneração de uma atividade específica, seja serviço ou exercício do poder de polícia e, por isso, não se atém a signos presuntivos de riqueza. As taxas comprometem-se tão somente com o custo do serviço específico e divisível que as motiva, ou com a atividade de polícia desenvolvida. 2. A base de cálculo proposta no art. 6º da Lei nº 9.670/83 atinente à taxa de polícia se desvincula do maior ou menor trabalho ou atividade que o Poder Público se vê obrigado a desempenhar em decorrência da força econômica do contribuinte. O que se leva em conta, pois, não é a efetiva atividade do Poder Público, mas, simplesmente, um dado objetivo, meramente estimativo ou presuntivo de um ônus à Administração Pública. 3. No tocante à base de cálculo questionada nos autos, é de se notar que, no RE 88.327/SP, Rel. Min. Décio Miranda (DJ 28/9/79), o Tribunal Pleno já havia assentado a ilegitimidade de taxas cobradas em razão do número de empregados. Essa jurisprudência vem sendo mantida de forma mansa e pacífica. Quanto à cobrança da Taxa de Segurança contra incêndio, verifica-se flagrante inconstitucionalidade. Isto porque se trata de serviço executado em benefício de toda a coletividade (uti universi), sem possibilidade de individualização dos respectivos usuários. Havendo, portanto, nítido desrespeito ao art. 145, II, da CF, bem como ao art. 77, do CTN. Recentemente, o STF5 emitiu decisão neste sentido, determinando, ademais, que a segurança pública deve ser sustentada por meio de impostos (e não por taxa)6. 4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário 554.951/SP. Relator: Dias Toffoli – Primeira Turma. Diário de Justiça Eletrônico: 19 nov. 2013. Disponível em: . Acesso em: 28 jan. 2018. 5BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 643247/SP. Relator: Marco Aurélio. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 19 dez. 2017. Disponível em: . Acesso em: 28 jan. 2018. 6Disponível em: . Acesso em: 28 jan. 2018. http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=4872334 http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=4872334 http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=313506186&tipoApp=.pdf http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=313506186&tipoApp=.pdf http://stf.jus.br/portal/jurisprudenciarepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=4084500&numeroProcesso=643247&classeProcesso=RE&numeroTema=16 http://stf.jus.br/portal/jurisprudenciarepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=4084500&numeroProcesso=643247&classeProcesso=RE&numeroTema=16 No mais, também é inconstitucional, no presente caso, a cobrança da Taxa de Segurança contra incêndio, uma vez que foi utilizado como base de cálculo um percentual sobre o valor da área construída do bem imóvel. Havendo, desta forma, identidade com a base de cálculo do IPTU e, consequentemente, desrespeito ao art. 77, parágrafo único, do CTN. No que se refere à responsabilidade tributária, a empresa que adquirir o estabelecimento comercial de outra poderá ou não se tornar responsável pelo pagamento dos tributos. Alguns fatores devem ser analisados para se aferir a responsabilidade do adquirente, tais como: espécie de tributo e continuidade da atividade empresarial. Primeiro, a respeito da responsabilidade pelo pagamento do IPTU, dispõe o art. 130 do CTN que: “os créditos tributários relativos a impostos, cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, subrogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação”. Destarte, como no caso em tela a cobrança é de imposto que recai sobre a propriedade (IPTU), depreende-se que a empresa Cristal possui responsabilidade tributária devendo efetuar o seu pagamento. Segundo, no que concerne ao ICMS, aduz o art. 133 do CTN que: “A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido,devidos até à data do ato”. Como no caso em análise a empresa Cristal não continuou a atividade comercial que era praticada pela empresa Luminus, não possui responsabilidade pelo pagamento do ICMS. A esse respeito, esclarece Eduardo Sabbag7 que: Com a aquisição do fundo de comércio ou do estabelecimento, por qualquer título (...), se o adquirente, pessoa física ou jurídica, continuar a respectiva exploração do empreendimento – como conditio sine qua non, sendo irrelevante o rótulo sob o qual dita exploração será continuada –, isto é, 7 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. beneficiando-se da estrutura organizacional anterior com a absorção da unidade econômica e da clientela do alienante, será possível a sua responsabilização pelos tributos devidos pelo sucedido até a data do ato traslativo, ainda que ele, o adquirente, não tenha tido nenhuma participação nos fatos que deram causa à obrigação tributária. Portanto, a responsabilidade dependerá, de fato, do rumo a ser tomado pelo adquirente (art. 133, caput, CTN): se antes havia uma “loja de eletrodomésticos” e, após, com a aquisição, abrir -se uma “oficina mecânica”, não se há de falar em responsabilidade do adquirente por sucessão. Assim, a unidade adquirente responde pelos tributos, nos casos de continuidade do empreendimento. Logo, como não há responsabilidade pelo pagamento do ICMS, a empresa Cristal poderá, após garantir o juízo, oferecer, em 30 dias, Embargos à Execução Fiscal (com fulcro no art. 16, da Lei n° 6830/80). No âmbito do qual cabe pedido de suspensão da execução fiscal, com base no art. 919, § 1º, do CPC, por já estar garantido o juízo e estarem presentes os requisitos para a concessão da tutela provisória, do art. 300, CPC (probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo). A empresa Cristal também poderá se defender por meio da Exceção de Pré- Executividade, que apresenta como vantagem não ser necessário garantir o juízo. Já que não há responsabilidade tributária do adquirente no caso, a referida empresa não é parte legitima na Execução Fiscal, tratando-se, dessa forma de matéria de ordem pública, cognoscível de ofício e que dispensa dilação probatória além da documental. No que tange à apreensão de mercadorias, como meio de viabilizar o pagamento de tributo, há clara inconstitucionalidade. Tal medida vai de encontro a princípios constitucionalmente consagrados, como liberdade do exercício econômico (art. 170, da CF), proibição ao confisco (150, IV) e devido processo legal (art. 5°, LVI). Merecendo destaque a Súmula 323 do STF, segundo a qual “é inadmissível a apreensão de mercadoria como meio coercitivo para pagamento de tributos”. Por outro giro, apresenta-se adequada a tributação da renda de Carlos Alberto. A compreensão de tal possibilidade jurídica perpassa pela temática da tributação de atos ilícitos no Brasil. Conforme esclarece Eduardo Sabbag8, tal matéria foi apresentada inicialmente por Amílcar de Araújo Falcão9, que em seu livro clássico “Fato gerador da obrigação tributária” afirmava estar correta a doutrina que defende a tributação irrestrita. Segundo este autor, a questão não pode ser entendida de outro modo, porque para a incidência tributária é irrelevante a validade ou nulidade, a juridicidade ou antijuridicidade do ato por meio do qual se concretiza o fato gerador. O posicionamento favorável à tributação dos atos ilícitos encontra amparo legal no art. 118 do CTN, que, para tal linha de pensamento, consagra o princípio do non olet. Com base neste princípio, a ilicitude do ato não prejudica a cobrança do tributo. Hugo de Brito Machado10 aduz que o artigo em comento deve ser interpretado sem se levar em conta a validade jurídica dos atos praticados pelo sujeito passivo ou por terceiros, bem como a natureza, se lícita ou ilícita, do objeto de tais atos, e dos efeitos jurídicos, se lícitos ou ilícitos. Devendo, ainda, serem abstraídos os efeitos jurídicos dos fatos efetivamente ocorridos. O princípio do non olet (também chamado de princípio da interpretação objetiva do fato gerador, ou pecúnia non olet) determina que o fato gerador deve ser analisado sem se levar em consideração a licitude ou a ilicitude da situação deflagradora. Tem como fundamentos primordiais o princípio da isonomia e o da capacidade contributiva. Viabiliza a tributação de qualquer um que pratique o fato gerador e, desta forma, possua capacidade contributiva, sem se importar com as circunstancias nas quais o fato imponível é concretizado. Neste sentido, para Ricardo Lobo Torres11, o non olet: 8FALCÃO apud SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 143. 9FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato Gerador da Obrigação Tributária. 7. ed. São Paulo: Noeses, 2013. [E- book]. 10MACHADO, Hugo de Brito. Hipótese de Incidência e Tributação de Ilícitos. In: Revista Fórum de Direito Tributário, n. 26, ano 3, jul/ago, 2005 Belo Horizonte. 11TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 19. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2013. p. 102. É princípio de justiça cobrar o imposto de quem tem capacidade contributiva, ainda que proveniente de jogo, do lenocínio ou de outra atividade proibida, sob pena de se tratar preferencialmente os autores de ilícitos frente aos trabalhadores e outros contribuintes com fontes honestas de rendimento. O princípio em epígrafe tem sua origem histórica12 ligada ao diálogo entre o Imperador Vespasiano e seu filho Tito. Fala-se que o imperador, ao ser indagado pelo filho sobre o porquê da tributação sobre os usuários de banheiros públicos, respondeu: “o dinheiro não tem cheiro”, ou seja, non olet. Como ressalta Amílcar de Araújo Falcão13, o imperador romano quis dizer que o dinheiro não tem cheiro, apenas importando para o Estado o emprego que fará de seus tributos e não a forma de obtê-los. Para o autor, na versão atual, a expressão perdeu o conteúdo cínico usado por Vespasiano e ganhou alto sentido ético, qual seja, o de atingir isonomicamente a capacidade econômica do contribuinte, sem preconceitos falsos ou ingênuos dominados de sentimentalismos piegas quanto à ilicitude da atividade que seja fato gerador do tributo. Para o Direito Tributário, com escopo no art. 118 do CTN, o que importa é a prática do fato gerador do tributo e não a circunstância em que isso ocorreu. Hugo de Brito Machado14 explica que a tributação dos atos ilícitos deve partir da diferenciação entre a hipótese de incidência e o fato gerador do tributo. Segundo ele, o legislador não pode definir uma hipótese de incidência tributária que tenha por elemento essencial a ilicitude, uma vez que o ato ilícito só pode ser elemento essencial na hipótese de incidência da norma punitiva. Assim, para ele, se a ilicitude é colocada como elemento essencial na hipótese de incidência da norma, a prestação correspondente é uma sanção e não um tributo. Entretanto, é possível a cobrança de um tributo que incida sobre um fato que seja, em regra, lícito, mas que seja praticado em circunstâncias que o tornam ilícito. 12PASSOS, Fábio Presoti. Da Tributação da Hipótese de Incidência Decorrente da Consequência Econômica do Ilícito Penal. In: E-Civitas - Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Geren- ciais do UNI-BH, vol. VII, n 1, jun. de 2014. Belo Horizonte. 13FALCÃO, Amílcarde Araújo. Fato Gerador da Obrigação Tributária. 7. ed. São Paulo: Noeses, 2013. p.62 [E-book]. 14MACHADO, Hugo de Brito. Hipótese de Incidência e Tributação de Ilícitos.In: Revista Fórum de Di-reito Tributário, n. 26, ano 3, jul/ago, 2005. Belo Horizonte. http:Il�citos.In Conforme leciona Hugo de Brito Machado15, se em uma situação fática, em que seja cometido um ato ilícito, existirem elementos capazes de concretizar uma hipótese de incidência tributária, certamente ocorrerá o fato gerador do tributo. Sendo este devido, porque a ilicitude é apenas circunstancial, ou seja, não é necessária para a concretização da hipótese de incidência tributária. A doutrina de Luciano Amaro16 aponta que ocorre tributação desde que a situação material corresponda à descrição da norma de incidência. E cita como exemplo um advogado que atue estando impedido, devendo pagar os tributos sob a atividade que exerce ou sobre a renda que aufira, mesmo diante da irregularidade de sua condição. Exemplificando a questão, Fábio Presoti Passos17 afirma que uma coisa é colocar como hipótese de incidência tributária a manutenção de casa de prostituição, o que não seria possível. Outra é admitir a cobrança de imposto de renda sobre os rendimentos avindos de tal atividade. Porque a hipótese de incidência do IR é “a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica, de renda ou proventos de qualquer natureza (CTN, art. 43)”, sendo irrelevante se esta aquisição se deu de forma lícita ou ilícita. O Superior Tribunal de Justiça entendeu, conforme se denota no trecho da ementa abaixo, em março de 2015, no julgamento do REsp 1467306/PR18, que, embora o tributo possa recair sobre o “produto patrimonial de uma atividade ilícita”, ele não pode ter como hipótese de incidência um ato ilícito. Desta forma, se o ilícito não for essencial à norma tributária, existirá a obrigação. [...] 3. Embora a regra de tributação possa atingir o produto patrimonial de uma atividade ilícita, ela não pode tomar como hipótese para a incidência do tributo uma atividade ilícita. Ou seja, se o ato ou negócio ilícito for subjacente à norma de tributação - estiver na periferia da regra de incidência -, surgirá a obrigação tributária com todas as consequências que lhe são inerentes. Por outro lado, não se admite que o ato ou negócio ilícito figure como elemento essencial da 15MACHADO, Hugo de Brito. Hipótese de Incidência e Tributação de Ilícitos. In: Revista Fórum de Di-reito Tributário, n. 26, ano 3, jul/ago, 2005. Belo Horizonte. 16AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 302. 17PASSOS, Fábio Presoti. Da Tributação da Hipótese de Incidência Decorrente da Consequência Econômica do Ilícito Penal.In: E-Civitas - Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenci- ais do UNI-BH, vol. VII, n 1, jun. de 2014. Belo Horizonte. 18BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1467306/PR. Relator: Humberto Martins- Segunda Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 24 mar. 2015. http:Penal.In norma de tributação. 4. "Assim, por exemplo, a renda obtida com o tráfico de drogas deve ser tributada, já que o que se tributa é o aumento patrimonial e não o próprio tráfico. Nesse caso, a ilicitude é circunstância acidental à norma de tributação. No caso de importação ilícita, reconhecida a ilicitude e aplicada a pena de perdimento, não poderá ser cobrado o imposto de importação, já que 'importar mercadorias' é elemento essencial do tipo tributário. Assim, a ilicitude da importação afeta a própria incidência da regra tributária no caso concerto [...]”. Também compartilha deste entendimento Eduardo Sabbag19, para quem as hipóteses de incidência das cobranças tributárias, previstas em lei, têm de ser relacionadas com atividades lícitas. Desse modo, a lei que institui um tributo não pode prever como hipótese de incidência um ato ilícito, porque esta se baseia em práticas lícitas. Ainda, segundo ele, a incidência do tributo sobre atividade ilícita não contraria o conceito de tributo, mas, na verdade, serve como forma de desencorajar a prática criminosa. O Estado não visa com essa cobrança enriquecer ilicitamente, mas sim atacar o principal objetivo do interesse criminoso, qual seja, a obtenção de lucro. A tributação das atividades ilícitas concretiza, nesse sentido, o princípio da igualdade20, uma vez que permite a tributação de todos aqueles que realizam o mesmo fato gerador, e possuem a mesma capacidade contributiva, independentemente da natureza jurídica do ato praticado. 19SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. 20Tratando da relação entre o princípio da isonomia e non olet, o Tribunal Regional Federal da 4ª região se posicionou em sede de Apelação criminal no sentido de que negar a cobrança das atividades ilícitas violaria a isonomia, porque contribuintes com a mesma capacidade contributiva seriam tratados de forma diversa. Ainda, na referida decisão o Tribunal afirmou que tal tributação não se constitui em sanção, mas sim em arrecadação decorrente da renda auferida não imposta se lícita ou ilícita. Cabe destacar trecho da ementa da decisão em comento: “[...] 1. Segundo a orientação jurisprudencial, é possível a tributação sobre rendimentos auferidos de atividade ilícita, seja de natureza civil ou penal; o pagamento de tributo não é uma sanção (art. 4º do CTN), mas uma arrecadação decorrente de renda ou lucro percebidos, mesmo que obtidos de forma ilícita. Precedentes [...] 3. Aquele que pratica atividades ilícitas ou imorais não pode invocar sua própria torpeza para se furtar ao pagamento de tributos a pretexto de que o fato gerador não se aperfeiçoaria diante das irregularidades por ele cometidas, consubstanciado no princípio pecunia non olet. 4. Afastar a incidência tributária, em tais casos, violaria o princípio da isonomia tributá- ria, pois àqueles contribuintes que possuem capacidade contributiva lastreada em prática lícitas não ha- veria exoneração do dever de recolhimento da exação, tratando desigualmente fatos geradores de obri- gação tributária (auferir rendas) em razão de sua procedência”. BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Re- gião). Processo - ACR 50070079620124047110 RS 5007007 – Sétima Turma. Relatora: Salise Monteiro Sanchotene - Sétima Turma. Porto Alegre, 28 ago. 2013. O Superior Tribunal de Justiça decidiu no julgamento do REsp 1208583/ES21, de relatoria da Ministra Laurita Vaz, que o non olet privilegia o tratamento igualitário entre as pessoas que tenham a mesma capacidade contributiva, independentemente da licitude ou ilicitude do rendimento. No caso em questão, a recorrente alegava que não tinha o dever de declarar o seu rendimento, uma vez que este era auferido com a atividade ilícita. Amparou sua defesa com base no direito de não produzir prova contra si mesma (princípio nemo tenetur se detegere). Entretanto, conforme ressaltou em seu voto22 a relatora, “a declaração de renda não implica autoincriminação, porque para o fisco pouco importa a origem da renda”, assim, “a necessidade de se recolher impostos surge com o fato de se auferir renda, pouco importando se essa renda é lícita ou ilícita, daí a incidênciado pecúnia non olet”. RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL.VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA.RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. O princípio nemo tenetur se detegere refere-se à garantia da não auto- incriminação, segundo o qual ninguém pode ser forçado, por qualquer autoridade ou particular, a fornecer involuntariamente qualquer tipo de informação ou declaração que o incrimine, direta ou indiretamente. Trata-se de princípio de caráter processual penal, já que intimamente ligado à produção de provas incriminadoras. Já o princípio pecunia non olet carrega consigo a ideia de igualdade de tratamento entre as pessoas que tenham capacidade contributiva semelhante, independentemente da maneira utilizada para alcançar essa disponibilidade econômica, isto é, não importa se o rendimentos tributáveis tenham ou não fonte lícita. Cuida-se de princípio de direito tributário. Tais princípios não se contrapõem, seja pela questão topográfica em que se encontram no direito, seja porque um não limita ou impossibilita a aplicação do outro, até mesmo porque o princípio pecunia non olet despreza a origem da fonte econômica tributável - se lícita ou ilícita. 21BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.208.583/ES. Relatora: Laurita Vaz– Quinta Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 11 dez. 2012. 22BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.208.583/ES. Relatora: Laurita Vaz– Quinta Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 11 dez. 2012. 2. A necessidade de se recolher impostos surge com o fato de se auferir renda, pouco importando se essa renda é lícita ou ilícita, não ensejando, por isso mesmo, qualquer ingerência no princípio da não auto-incriminação, do contrário dificilmente se vislumbraria a prática de crimes contra a ordem tributária, que geralmente estão ligados ao cometimento de outros delitos, como por exemplo, contra o sistema financeiro nacional. 3. Recurso especial desprovido. Quanto ao aspecto moral da tributação das atividades ilícitas, Andrei Zenkner e Cezar Roberto Bitencourt, citados por Douglas Fischer23, se posicionam contrariamente à tributação. Para os autores, a cobrança de tributos sobre atividades ilícitas seria imoral por parte do Estado, que ganharia dinheiro com a prática de um delito. Porém, segundo entendimento de Aliomar Baleeiro24 sobre a tributação de atividade ilícita: “O que importa não é o aspecto moral, mas a capacidade econômica dos que com ela se locupletam. Do ponto de vista moral, parece-nos que é pior deixá-los imunes dos tributos, exigidos das atividades lícitas, úteis e eticamente acolhidas”. Misabel Abreu Machado Derzi25, contrária à tributação dos atos ilícitos, afirma que não seria ético, por parte do Estado, cobrar tributos de bens e direitos que saiba terem origem criminosa. Porque, assim, a ilicitude seria legitimada, e o Estado estaria se associando aos delinquentes. Contudo, esclarece Fábio Presoti Passos26 que: “O fato de se tributar os valores obtidos ilicitamente não torna lícita a atividade que deu origem a esses ganhos. O Estado continua a censurar tais atividades e a punir os seus autores”. Ademais, segundo Passos, a função do direito tributário não tem os mesmos elementos da função do Direito Penal, assim: “O que se espera é que, caso fique configurada a hipótese de incidência e reste demonstrada a capacidade contributiva do sentenciado, sejam recolhidos os tributos devidos”. 23ZENKNER; BITENCOURT apud FISCHER, Douglas. Tributação em face de atos ilícitos. In: Revista Interesse Público, ano 8, n 38, jul/ago. 2006. Porto Alegre: Notadez. 24BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 1106. 25BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. 26PASSOS, Fábio Presoti. Da Tributação da Hipótese de Incidência Decorrente da Consequência Econômica do Ilícito Penal. In: E-Civitas - Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Geren- ciais do UNI-BH, vol. VII, n 1, jun. de 2014, Belo Horizonte. Para Misabel Abreu Machado Derzi27, os bens, valores e direitos oriundos de atividades ilícitas não devem ser tributados, uma vez que em tais situações deve ser apenas aplicada a pena de perdimento de tais bens, valores ou direitos. Compartilha desse entendimento Carla Dumont Oliveira, citada por Douglas Fischer28, para quem o Estado, em se tratando de atividades ilícitas, tem outros meios para punir o infrator, devendo sancionar tais atividades e declarar o perdimento de bens. Fábio Presoti Passos29, porém, tem outra posição sobre a questão da cobrança de tributo quando houver o perdimento de bens. O autor entende pela viabilidade do indivíduo permanecer sujeito à exação, mesmo quando lhe for determinado o perdimento de bens provenientes do crime. Segundo ele: Muitas vezes o Estado não consegue atingir todo o patrimônio do devedor somente com a sentença penal condenatória e, com isso, ele – Estado – estaria sendo prejudicado duas vezes, ou seja, na seara penal não conseguiria efetivar o perdimento dos bens do sentenciado e na esfera tributária deixaria de recolher os tributos devidos. Caso esse tributo não fosse exigido, o devedor poderia praticar seus atos ou realizar suas atividades em uma conjuntura de risco. Se o Estado o atingisse no âmbito penal e tributário, ele cumpriria a pena, talvez perdesse os bens e se tornaria devedor dos tributos devidos durante o tempo que se beneficiou dos bens ou valores. Caso o Estado não o atingisse com nenhuma coerção, o agente estaria sendo favorecido, pois, além de não recolher tributos em nenhum momento, o Direito Penal também não o sancionou. Mesmo que a seara penal não tenha efetividade, enquanto o agente se beneficiar dos valores ou bens decorrentes da prática delituosa, torna-se também devedor dos tributos. 27BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. 28OLIVEIRA apud FISCHER, Douglas. Tributação em face de atos ilícitos. In: Revista Interesse Público, ano 8, n 38, jul/ago. 2006. Porto Alegre: Notadez, 2006. 29PASSOS, Fábio Presoti. Da Tributação da Hipótese de Incidência Decorrente da Consequência Econômica do Ilícito Penal. In: E-Civitas - Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Geren- ciais do UNI-BH, vol. VII, n 1, jun. de 2014. Belo Horizonte. Conforme elucidado por Ricardo Lobo Torres30, bem como pelo STJ no julgamento do REsp 1208583/ES31, de relatoria da Ministra Laurita Vaz, a tributação dos atos ilícitos se coaduna com os princípios tributários, em especial os da igualdade e da capacidade contributiva. O princípio non olet impõe tratamento isonômico àqueles que praticam o mesmo fato gerador e possuem a mesma capacidade contributiva, independentemente da natureza jurídica do ato praticado. Em síntese, deve haver tributação sobre atividades ilícitas, mas quando a ilicitude ocorrer no momento de concretização do fato gerador. Não se admite que o legislador coloque a ilicitude na hipótese de incidência tributária. Mas, caso a prática de ato ilícito se verifiquena concretização do fato imponível, a cobrança deve incidir normalmente. Para o direito tributário, de acordo com o art. 118 do CTN, é irrelevante a natureza jurídica do ato praticado, importando tão somente a prática do fato gerador. Por fim, pode-se afirmar que a tributação da renda de Carlos Alberto está correta. O que está sendo tributado é a aquisição da disponibilidade econômica da renda, o aumento patrimonial, que constitui fato gerador do Imposto de Renda, e não a prática do ato ilícito (tráfico de drogas). 30 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 19. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2013. 31BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.208.583/ES. Relatora: Laurita Vaz– Quinta Turma. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 11 dez. 2012. Sem nome