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Pedro Carlos Sam paio Garcia
45'"6789:;5'(?@A6Aa previsão de com petência norm at iva para o
órgão que se criava.
Em 1939, o Decreto- lei n. 1.237, de 1939, deu organização à Just iça do Trabalho,
com o órgão adm inist rat ivo, prevendo a com petência norm at iva para os Conselhos
Regionais do Trabalho, no julgam ento de dissídios colet ivos. O art . 94 do m encionado
Decreto- lei balizava o conteúdo dessas decisões ao estabelecer que "na falta de
disposição expressa de lei ou de cont rato, as decisões da Just iça do Trabalho deverão
fundar-se nos princípios gerais do direito, especialm ente do direito social, e na
eqüidade, harm onizando os interesses dos lit igantes com os da colet ividade, de m odo
que nenhum interesse de classe ou part icular prevaleça sobre o interesse público". É a
prim eira referência legal à solução dos conflitos de interesse pela Just iça do Trabalho,
que não se lim ita a um juízo legal, podendo a autoridade decidir por um juízo de
eqüidade.
Em 1946, a Const ituição que redem ocrat izou o País incorporou a Just iça do Trabalho
ao Poder Judiciário, m antendo o que já havia sido estabelecido no Decreto- lei n. 9.797,
do m esm o ano. Na Carta de 46, definiu-se a com petência da Just iça do Trabalho para
conciliar e j ulgar dissídios individuais e colet ivos do t rabalho, com expressa previsão,
no seu art . 123, § 2.º , de um poder norm at ivo, nos seguintes term os: "A lei
especificará os casos em que as decisões nos dissídios colet ivos poderão estabelecer
norm as e condições de t rabalho". A com petência norm at iva é agora expressa, ainda
que condicionada à previsão da legislação ordinária.
A Const ituição Federal de 1967, com a Em enda n. 1, de 1969, m anteve integralm ente
o texto da Carta de 1946, subst ituindo apenas o vocábulo "casos" pela palavra
"hipóteses". A Just iça do Trabalho m anteve sua com petência para estabelecer novas
condições de t rabalho, quando autorizada pela lei ordinária.
Na Const ituição Federal de 1988, significat iva alteração sofreu a regra que previa essa
com petência norm at iva. O art . 114 do novo texto const itucional dispõe sobre a
com petência da Just iça do Trabalho na solução dos conflitos colet ivos de t rabalho
dizendo, no seu § 2.º , que "recusando-se qualquer das partes à negociação ou à
arbit ragem , é facultado aos respect ivos sindicatos ajuizar dissídio colet ivo, podendo a
Just iça do Trabalho estabelecer norm as e condições, respeitadas as disposições
convencionais e legais m ínim as de proteção ao t rabalho".
A m odificação é significat iva. O poder norm at ivo, exercido nos casos especificados pela
lei, passaria apenas a respeitar as disposições convencionais e legais m ínim as.
Alargou-se o poder norm at ivo da Just iça do Trabalho, que agora tem apenas um lim ite
m ínim o a ser respeitado, ou perm anece ele ainda lim itado por out ros parâm et ros
fornecidos pelo ordenam ento jurídico. É essa a questão que esse t rabalho passa a
enfrentar.
M5')F'HACA7?F':9'B9:?8'698CD7AE9'69'FAF7?CD'L96F7A7;LA96DH'D67?8A98'D'4NOO
Não parece haver dúvida de que o poder norm at ivo da Just iça do Trabalho, nas
Const ituições de 1946 e 1967, com a Em enda n. 1, de 1969, sofr ia lim itações da lei
ordinária. A referência era expressa no texto const itucional, pois o legislador ordinário
ir ia especificar em que hipóteses a Just iça do Trabalho poderia criar novas norm as e
condições de t rabalho no julgam ento dos dissídios colet ivos.
Há que se considerar, no entanto, com o bem regist ra o Minist ro ORLANDO TEIXEIRA
DA COSTA, que "essas hipóteses jam ais foram sistem at icam ente enum eradas por
qualquer lei, o que levou os Tribunais a um esforço de pesquisa e de exegese, para
encont rar a autorização legislat iva quanto ao uso dessa com petência..." [ 7] . Em raras
oportunidades se encont rava lei t ratando da m atéria, podendo ser lem brada a regra do
art . 766 da CLT, quando se refere a "dissídios sobre est ipulação de salários", com o um
desses casos isolados em que o poder norm at ivo podia ser exercido por expressa
autorização da lei. Na m aioria dos casos, no entanto, a com petência norm at iva era
desenvolvida por um esforço de interpretação a fim de descobrir a autorização legal
necessária.
Essas dificuldades fizeram com que a dout rina apresentasse concepções diversas sobre
a lim itação do poder norm at ivo àquela época. Aproveitando-se do estudo aprofundado
da m atéria realizado pelo Professor e Magist rado PEDRO VIDAL NETO[ 8] , talvez quem
m ais tenha cuidado desse tem a sob o ângulo jurídico, verifica-se que parte
considerável da dout rina t inha a convicção de que o âm bito de atuação do poder
norm at ivo da Just iça do Trabalho era o m esm o das convenções colet ivas. Cita o
Professor Pedro Vidal Neto o entendim ento de Rezende Puech, para quem havia
ident idade do cam po de ação da convenção colet iva e da sentença norm at iva, pois
am bas cobriam a m esm a lacuna. Sustentava esse entendim ento o papel
desem penhado pelos dois m ecanism os de solução dos conflitos colet ivos de t rabalho,
j á que a sentença norm at iva era o sucedâneo da convenção colet iva m alograda. Dessa
form a, aquilo que poderia ser objeto de convenção colet iva tam bém poderia ser objeto
de decisão da Just iça do Trabalho. A autorização legal se encont rava exatam ente na
obrigatoriedade da negociação colet iva (art . 616 e parágrafos) para a instauração do
dissídio colet ivo.
Essa interpretação foi contestada por dout r inadores com o Wilson de Souza Cam pos
Batalha, Eduardo Gabriel Saad e Antonio Lam arca, que apresentavam concepção
rest r it iva do poder norm at ivo. Para Batalha, o poder norm at ivo estava rest r ito às
cham adas cláusulas salariais, com o as de reajustes e suas cláusulas acessórias,
concernentes à data-base, aos critérios aplicáveis aos em pregados adm it idos
posteriorm ente, à data de vigência e out ras da m esm a natureza. Segundo BATALHA,
citado por Pedro Vidal Neto, à Just iça do Trabalho "não foi deferida com petência para
fixar norm as além das norm as legais e m uito m enos para m odificar ou alterar
cláusulas dos cont ratos existentes ou do direito consuetudinário laboral" [ 9] .
LAMARCA, lem bra Pedro Vidal Neto, é taxat ivo: "o poder norm at ivo da Just iça do
Trabalho lim ita-se à cláusula salarial, porquanto o legislador não editou lei
regulam entadora, senão da parte salarial" [ 10] . Havendo polít ica salarial estabelecendo
índices oficiais de reajustes salariais, o poder norm at ivo é m eram ente adm inist rat ivo e
se rest r inge a atos hom ologatórios de índices oficiais.
A posição interm ediária parece que acabou prevalecendo na dout rina e na
jurisprudência. O próprio Professor PEDRO VIDAL NETO é defensor dessa concepção,
observando não ser possível a decisão da Just iça do Trabalho, de caráter heterônom o,
ter a m esm a extensão que o poder negocial das partes: "As partes podem ajustar
validam ente a concessão de núm ero indefinido de benefícios de toda a sorte, não
conferidas ao t rabalhador por lei. Não se vê com que fundam ento a sentença
norm at iva poderia im por benefícios cuja obrigatoriedade não é estatuída pela própria
lei e que não tenham sido voluntariam ente acatadados"[ 11] .
Por out ro lado, lem bra o em inente Professor, nem toda autorização legal está expressa
no ordenam ento jurídico. Afirm ando que o poder norm at ivo é um a m odalidade do
poder j urisdicional com um , quando orientado para o preenchim ento das lacunas do
ordenam ento jurídico, e fazendo uso da cham ada dout rina dos %-+&*&!$ (4%15'(,-!,
PEDRO VIDAL NETO delim ita a am plitude do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho
com o seguinte enunciado: "à Just iça do Trabalho cabe dar eficácia às norm as
t rabalhistas em vigor, aplicando-as e interpretando-as em conform idade com suas
finalidades e com os princípios do ordenam ento jurídico; em conseqüência, tem
com petência para dispor as norm as com plem entaresnecessárias à efet iva atuação do
direito posit ivo vigente"[ 12] . Trata-se de um com ando im plícito da norm a, que podia
ser revelado pelo poder norm at ivo, visando concret izar direitos previstos no
ordenam ento que encont ravam obstáculos para serem concret izados. É o esforço
herm enêut ico ressaltado por Orlando Teixeira da Costa, servindo o poder norm at ivo
para realizar o direito objet ivo.
A jurisprudência forneceu exem plos dem onst rando a preponderância desse
entendim ento. A estabilidade provisória da m ulher gestante foi consagrada em
sentenças norm at ivas com o m eio para assegurar à t rabalhadora o gozo da licença-
m aternidade prevista na lei. A fixação do adicional de horas ext ras na sentença
norm at iva tam bém era adm it ida, até pelo Suprem o Tribunal Federal, em razão de a lei
ut ilizar a expressão "pelo m enos", quando estabelece os percentuais para o t rabalho
ext raordinário. A estabilidade ao m enor em idade de alistam ento m ilitar, ao
t rabalhador acidentado, o abono de falta ao estudante nos dias de exam es escolares e
a com unicação escrita do m ot ivo da dispensa são exem plos da aceitação do critério
interm ediário defendido pela m aior parte de nossos dout rinadores.
O poder norm at ivo passou, assim , a ser exercido com o m ecanism o de integração da
lei, por autorização im plícita desta. Seus lim ites eram indefinidos, m as poderíam os
dizer que, ao cont rário do que estabelecia a Const ituição então vigente, eram eles
m uito m ais negat ivos do que posit ivos, não se adm it indo a com petência norm at iva da
Just iça do Trabalho apenas quando houvesse clara rest r ição legal.
P5'-'Q96F7A7;Ao direito fundam ental de que ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer algum a coisa senão em virtude de lei. O segundo estabelece que o
Congresso Nacional deve zelar pela preservação de sua com petência legislat iva em
face da at r ibuição norm at iva dos out ros Poderes. Resulta da interpretação desses dois
preceitos que, havendo texto de lei regulando determ inada m atéria, a com petência
norm at iva respeitará o com ando legal, não podendo am pliar nem reduzir a garant ia ali
estabelecida. Na ausência de texto legal, afirm a ROMITA, haverá o intérprete que
concluir pela im possibilidade do exercício do poder norm at ivo, diante de duas
considerações essenciais: "a) o Brasil se const itui em Estado Dem ocrát ico de Direito
(Const ituição, art . 1.º ) e este, com o se sabe, é o Estado que se subm ete à lei ( lei em
sent ido form al) ; b) no exercício da com petência norm at iva, o Judiciário Trabalhista não
pode, sem violação da ordem const itucional, usurpar a at r ibuição legislat iva do Poder
respect ivo, ante o respeito, que se lhe exige, ao disposto no art . 2.º da Const ituição,
segundo o qual os Poderes da União são independentes e harm ônicos ent re si" [ 22] .
Encerra ROMITA observando que o poder norm at ivo deve ser exercido "com respeito à
lei e nos lim ites im postos pela lei" [ 23] .
Tam bém OTÁVIO BUENO MAGANO considera o poder norm at ivo da Just iça do
Trabalho, na nova ordem const itucional, lim itado ao ordenam ento jurídico. Definindo
essa com petência especializada com o t ípica at ividade jurisdicional, pois do cont rário
estaria o Poder Judiciário invadindo área do Poder Legislat ivo, Magano afirm a que a
Const ituição de 1988 apenas ext inguiu a com part im entação do cam po de atuação do
poder norm at ivo que antes exist ia. Não há m ais que esperar o legislador ordinário
indicar qual a m atéria possível de ser decidida pela Just iça do Trabalho nos conflitos
colet ivos. A descom part im entalização "não significa, contudo, m udança na natureza da
at ividade, a cargo da Just iça do Trabalho, que cont inua a ser j urisdicional. Mais
porm enorizadam ente há de se dizer que ao julgar dissídios colet ivos de natureza
econôm ica, cabe- lhes apenas aplicar norm as latentes do ordenam ento jurídico"[ 24] .
São os com andos im plícitos da lei, que em basavam a atuação norm at iva da Just iça do
Trabalho ainda no sistem a const itucional anterior a 1988. Faz o Professor Magano
inclusive um a analogia com o poder regulam entar do execut ivo, que jam ais pode
confrontar a lei, lem brando estudo feito nesse sent ido pelo Minist ro do TST Manoel
Mendes de Freitas.
Com efeito, o Minist ro Manoel Mendes de Freitas, em interessante t rabalho, faz um a
análise com parat iva do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho e do poder
regulam entar do Chefe do Execut ivo, lem brando que o decreto regulam entar está, na
hierarquia das norm as, em posição inferior à da lei, não podendo conter disposições
que a cont rariem ou que tenham conteúdo inovador. No uso do poder regulam entar, o
Chefe do Poder Execut ivo lim ita-se a torná- las m ais claras e, portanto, de execução
m ais fácil. Quando se t rata de um regulam ento autônom o, a at ividade do Chefe do
Execut ivo é caracterist icam ente criadora, dest inando-se aos espaços vazios da lei.
Observa o Minist ro do TST que é sem elhante a natureza do poder norm at ivo da Just iça
do Trabalho. Destacando que essa at ividade norm at iva cont inua lim itada, pois não
pode ser exercida cont ra a lei, lem bra o em inente Magist rado que "o poder norm at ivo
da Just iça do Trabalho é excepcional, com o o é, tam bém , o poder norm at ivo do Chefe
do Poder Execut ivo da União, eis que envolvem am bos exercício de at r ibuições que são
t ípicas do Poder Legislat ivo. Basta, pois, que se considerem as razões da separação
dos poderes do Estado, para que se com preenda logo que é im possível o confronto
ent re os dois Poderes quando idênt ica a m atéria versada na at ividade norm at iva de
am bos"[ 25] .
Para o Minist ro MANOEL MENDES, no entanto, há um grande espaço regulam entador
para a atuação norm at iva da Just iça do Trabalho. Trata-se de um a at ividade "com
discreto conteúdo criador, na qual o j uiz do t rabalho, pelo seu conhecim ento
especializado e contato perm anente com os conflitos do t rabalho, fica em ót im a
posição para com pletar a legislação t rabalhista, explicitando-a e tornando-a ainda m ais
adequada às áreas específicas de cada categoria no período de interesse da decisão
norm at iva"[ 26] .
S5'-'T;8AFB8;:U6LAD
Com a Const ituição Federal de 1988, im ediatam ente Tribunais Regionais do Trabalho
passaram a atuar com o verdadeiros legisladores, anim ados pela corrente dout rinária
que viu nas m odificações do texto const itucional um a am pliação da at ividade
norm at iva da Just iça do Trabalho, lim itada agora apenas pelos patam ares m ínim os da
lei e das convenções colet ivas. Os benefícios concedidos em sentenças norm at ivas
foram inúm eros, m uitos referindo-se a m atérias expressam ente reguladas em lei.
O Tribunal Superior do Trabalho, m uito em razão de pressões da classe em presarial e
do próprio Execut ivo, vinha lim itando a concessão desses benefícios, com base m ais
em argum entos de oportunidade e conveniência do que em entendim entos rest r it ivos
quanto à atuação do poder norm at ivo pela Just iça do Trabalho. Apenas a t ítulo de
exem plo desse posicionam ento do TST, t rago a Em enta do Acórdão da SDC 0005/ 95,
no RO do DC n. 112.888/ 94.3, de 6.2.1995, cujo Relator foi o próprio Minist ro Manoel
Mendes de Freitas, na qual a m ais alta Corte t rabalhista entendeu que "não se afina
com as funções específicas da Just iça do Trabalho, ainda que no exercício do Poder
Norm at ivo (art . 114 da Carta Magna) , a tarefa de descobrir qual o índice correto,
j usto, equânim e, para o reajuste dos salários dos t rabalhadores. No período de
indexação da econom ia, lim itavam -se os Tribunais Trabalhistas à aplicação dos índices
oficiais. A part ir da Lei n. 8.030/ 90 e term inado o período de indexação, cabe às partes
interessadas estabelecer o reajuste, m ediante negociação colet iva ou valendo-se da
arbit ragem , sob pena de a Just iça do Trabalho estar cont r ibuindo para a volta à
indexação e para o desest ím ulo à com posição direta. Recurso ordinário provido para
afastar-se o reajuste com base no IPC"[ 27] .
Percebe-se nessa decisão do TST a preocupação com a indexação salarial e com a
com posição direta ent re as partes, sendo esses os fundam entos apresentados para a
lim itação do exercício do poder norm at ivo. Não havia, ainda, na jurisprudência, um a
clara tom ada de posição no tocante aos lim ites m ateriais da atuação norm at iva da
Just iça do Trabalho, tendo em vista a ordem const itucional estabelecida pela Carta de
1988.
O Suprem o Tribunal Federal, no entanto, a part ir de 1996, quando do julgam ento do
RE n. 197911/ PE, pela sua 1.ª Turm a, que teve com o relator o Minist ro Octávio
Gallot t i, fixou diret r izes diversas daquelas até então obedecidas nas decisões da
Just iça do Trabalho. Entendeu a m ais alta Corte do País ser a decisão da Just iça do
Trabalho, em sua com petência norm at iva, fonte subsidiária do direito, suscet ível de
operar apenas no vazio legislat ivo, sujeita à suprem acia da lei form al. Não pode a
sentença norm at iva invadir reserva legal específica, assegurada na própria
Const ituição, nem tam pouco cont rariar disposit ivo const itucional ou legal, ainda que
estabelecendo vantagens aos t rabalhadores.
A 2.ª Turm a do Suprem o Tribunal Federal, no julgam ento do RE n. 114836/ MG, cujo
relator foi o Minist ro Maurício Correa, adotou posição ainda m ais rest r it iva, pois decidiu
que a com petência norm at iva apenas pode ser exercida quando a lei expressam ente
perm it ir , sob pena de exorbitar a Just içado Trabalho de suas funções
const itucionalm ente definidas, invadindo área de atuação do Poder Legislat ivo.
O Suprem o Tribunal Federal, ao assim decidir, adotou a concepção rest r it iva do poder
norm at ivo da Just iça do Trabalho, com certeza entendendo ser preciso com pat ibilizá- lo
com a necessidade de preservar a com petência legislat iva do Congresso Nacional.
Cabe, no entanto, ressaltar que esse entendim ento cont raria a tese am pliat iva do
poder norm at ivo, defendida pela m aior parte da dout rina e por m uitos de nossos
Tribunais Regionais, cont rovérsia que, m esm o diante das recentes decisões do STF,
tem os certeza, não term inará tão facilm ente no âm bito da Just iça do Trabalho.
Por essa razão, para com pletar esse t rabalho, cum pre tentar encont rar fundam entos
para m elhor definir a delim itação m aterial do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho,
que nos perm itam concluir se está correta a orientação de nossa m ais alta Corte, ou se
é certa a tese daqueles que defendem um poder norm at ivo am plo. Para tanto, não há
com o deixar de exam inar a exata natureza dessa at ividade excepcional da Just iça do
Trabalho.
V5'*9:?8'698CD7AE9'W'T;8AF:Aa regra universal e aparece inesperadam ente um caso part icular que se
lhe escapa, é, então, legít im o – na m edida em que a disposição tom ada pelo legislador
é insuficiente e errada por causa do seu caráter absoluto – aplicar um correct ivo, para
abviar a esta om issão, prom ulgando o que o legislador teria no seu lugar e que teria
previsto na lei, se t ivesse t ido conhecim ento prévio do caso"[ 36] .
Vale a pena a longa citação quando se t rata de Aristóteles. Não posso, no entanto,
deixar de com pletá- la, com a afirm ação m ais conhecida do filósofo sobre o tem a, feita
logo a seguir, no m esm o texto, quando observa que "a eqüidade é justa e m elhor que
um a determ inada just iça; m as não é em sent ido geral, m as apenas naquilo em que,
pela sua form ulação absoluta, pode enferm ar de erro. A natureza essencial da
eqüidade é de ser ;C' L988?7AE9' DBHALD:9' [' H?A, na m edida em que a sua
universalidade torna esta incom pleta".
Não há na história da ciência do Direito, nas m ais variadas correntes filosóficas e
dout rinárias, quem apresente concepção m uito divergente dessa form ulada por
Aristóteles a respeito da eqüidade. S. Tom ás de Aquino, citado por Maria Helena Diniz,
filósofo conhecido por retom ar m uitos dos conceitos de Aristóteles a respeito da
Just iça, destaca que a lei não pode abranger todos os casos, pois os atos hum anos são
part iculares e cont ingentes, podendo variar no infinito, nada podendo fazer o legislador
a não ser legislar tendo em vista o que sucede com m aior freqüência. Em certos casos,
diz TOMÁS DE AQUINO, quando o caso concreto foge à finalidade da lei, "seria um m al
observar a lei estabelecida; nem seria, ao cont rário, bom , pondo de parte suas
palavras, observar o que reclam am a idéia de just iça e a ut ilidade com um . E com isso
se harm oniza a 8%(&(9"&(0, que nós cham am os de eqüidade"[ 37] . É a ponte que Tom ás
de Aquino estabelece ent re os princípios da razão e as necessidades concretas da vida
social.
O filósofo do direito Giorgio Del Vecchio, norm alm ente ident ificado à corrente de
pensam ento neokant iana, tam bém sustenta que o caráter genérico do Direito perm ite
o surgim ento de dificuldades na aplicação da norm a jurídica ao caso concreto. Lem bra
que o intérprete não deve ficar parado ante a let ra da lei e sim buscar, por um
t rabalho especial de aplicação e interpretação, o significado int rínseco da norm a, o seu
sent ido próprio. Da m esm a form a, acrescenta o jurista italiano, o intérprete deve ir
fundo ao caso concreto a que a norm a se aplicará. É nesse m om ento que se just ifica o
uso da eqüidade. "A eqüidade", afirm a DEL VECCHIO, "não quer a infração da norm a,
m as a sua adaptação às diversas circunstâncias de fato, pois só assim sat isfará o seu
fim e a sua função. Além disso, sem pre que faltar norm a aplicável, surgirá, em nom e
da eqüidade, a exigência im posta ao juiz de estabelecer um a nova norm a, adequada
ao caso não previsto pelo legislador" [ 38] .
Se exam inarm os o que diz um jurista que se afasta da lógica racional do Direito para
defender um a lógica do razoável, que MIGUEL REALE[ 39] prefere cham ar de lógica do
plausível, vam os verificar em Chaim Perelm an definições prat icam ente idênt icas para a
eqüidade. Perelm an busca dem onst rar que a regra de just iça é um a regra form al, o
que já se cham ou de just iça estát ica, pois de conform idade com a regra estabelecida
ou com o precedente reconhecido, sejam eles quais forem . A regra de just iça, por
exigir a uniform idade, conduz à previsibilidade e à segurança. Perm ite o
funcionam ento coerente e estável da ordem jurídica. Mas, lem bra PERELMAN, isto não
basta para sat isfazer a nossa necessidade de just iça. Ensina o filósofo que "a eqüidade
pode prevalecer sobre a segurança e o desejo de evitar conseqüências iníquas pode
levar o juiz a dar nova interpretação à lei, a m odificar as condições de sua aplicação.
Mesm o recusando ao juiz o direito de legislar, é-se obrigado a deixar- lhe, em nosso
sistem a, o poder de interpretação. Graças ao uso que dele fizer, o j uiz poderá, em
certos casos, não se contentar com a interpretação t radicional e com a aplicação
correta da lei, em conform idade com a regra de just iça"[ 40] .
Ent re nós, o grande civilista MIGUEL MARIA DE SERPA LOPES esclarece em seus
com entários à Lei de Int rodução ao Código Civil que a eqüidade se apresenta no plano
jurídico com t ríplice função; a eqüidade na elaboração das leis, na aplicação do Direito
e na sua interpretação. A eqüidade na elaboração da lei não é m atéria que se relacione
à atuação do Poder Judiciário. Nesse caso, a eqüidade atua "com o um a noção idealista,
im perando no espír ito do legislador para o fim de se cristalizar em norm as condizentes
com as necessidades sociais, com o equilíbrio dos interesses"[ 41] . É a idéia do
equitat ivo com o um a noção genérica e abst rata de just iça. Mas não é dessa eqüidade
que cuida a ciência jurídica e sim , com o lem bra Serpa Lopes, da eqüidade na aplicação
e na interpretação das leis.
O ilust re jurista assevera que o problem a da eqüidade aparece sob o aspecto de um
aparente conflito ent re sua noção e o direito posit ivo, cujo enunciado seria o seguinte:
"o direito posit ivo é corporificado sob a form a universal da norm a jurídica e esta,
m uitas vezes, pode se encont rar em conflito com os princípios justos, aplicada à
part icularidade de um dado caso"[ 42] . Ensina SERPA LOPES que o conflito, no entanto,
é apenas aparente, "pois no fundo, direito e eqüidade se polarizam num a só direção
idênt ica. Se o direito representa as justas exigências colet ivas, a eqüidade o com pleta,
tendo em vista as circunstâncias individuais" [ 43] . Não é um cam po para o livre arbít r io
do juiz, pois quando ut ilizada com o um elem ento interpretat ivo, a eqüidade "deve
buscar o sistem a que preside a lei, a própria idéia de lei e m ais part icularm ente do
inst ituto aplicável ao caso part icular, em conform idade com os dados m orais,
econôm icos, e não inspirações interiores, nascidas puram ente do sent im entalism o do
intérprete"[ 44] .
Com o se verifica em todas essas definições da eqüidade, serve ela ao aplicador do
Direito para buscar j ust iça no caso concreto. A eqüidade, com o m étodo de aplicação e
interpretação do Direito, ajusta-se com o inst rum ento próprio de atuação do Poder
Judiciário, nos seus objet ivos de encont rar na norm a genérica um a solução justa para
o caso part icular. É m ais um m eio de concreção do Direito e individualização da norm a.
Com o bem lem bra a Professora MARIA HELENA DINIZ, não é a eqüidade "um a licença
para o arbít r io puro, m as um a at ividade condicionada às valorações posit ivas do
ordenam ento jurídico"[ 45] .
O legislador, sim , age com liberdade, com absoluta discricionariedade. Seu lim ites
estão na Const ituição Federal, obra aliás criada por ele. O legislador faz opções
axiológicas, escolhe cam inhos, estabelece regras genéricas a serem obedecidas no
âm bito de sua vigência tem poral e terr itorial. Se usa da eqüidade, não é desta t ratada
na filosofia e ciência do Direito, m as apenas daquela relacionada a um a idéia abst rata
de equilíbrio.
O juiz, não. Sua liberdade não é a m esm a, o que é próprio do poder que exerce. A
eqüidade lhe fornece apenas m ais um m ecanism o para m elhor revelar o direito
existente e nunca para criá- lo arbit rariam ente. Pois a eqüidade, com o dem onst ra
MARIA HELENA DINIZ, "é um ato judiciário e não legislat ivo. É poder conferido ao
m agist rado para revelar o direito latente..." [ 46] , com pat ibilizando a norm a genérica ao
caso part icular.
O5'Q96LH;F=9'W'B9:?8'698CD7AE9'W'D7AEA:D:?'T;8AF:ALA96DH'9;'H?XAFHD7AED'W'F?;F'
HACA7?F'CD7?8ADAF
Diante do breve estudo feito no tópico anterior a respeito da eqüidade com o
m ecanism o de aplicação e interpretação doDireito, arr isco-m e a afirm ar que não há
uso da eqüidade no exercício do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho,
especialm ente dent ro da concepção am pliat iva de seus lim ites, defendida por parte da
dout rina após a Carta de 1988. O caráter genérico e abst rato da sentença norm at iva,
t ípico de um a lei, não se com pat ibiliza com a idéia de just iça para o caso concreto,
própria da eqüidade. Na sentença norm at iva, a Just iça do Trabalho cria direito novo,
com eficácia genérica no âm bito das categorias envolvidas no conflito de t rabalho. Age
o Juiz do Trabalho, nesse caso, m ovido por argum entos de oportunidade e
conveniência, com o arbít r io de um legislador. Não busca tem perar nem aplicar um
corret ivo à lei genérica na sua aplicação a um caso concreto, pois na atuação
norm at iva o Juiz do Trabalho cria a regra genérica, que depois será ou não bem
aplicada.
A dout rina, na realidade, vem ut ilizando a eqüidade com o um suporte para defender a
alegada natureza jurisdicional do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho. Mas a
incom pat ibilidade dessa at ividade legislat iva do Poder Judiciário com o uso da eqüidade
com o m ecanism o de aplicação e interpretação do Direito m e parece evidente, o que
revela bem com o o poder norm at ivo efet ivam ente escapa dos lim ites próprios de
atuação jurisdicional a que deveria se ater a Just iça do Trabalho.
Tais considerações a respeito da eqüidade m e convencem da absoluta necessidade de
lim itação m aterial do poder norm at ivo, para im pedir que ele invada a esfera de
atuação do Poder Legislat ivo, respeitando assim nosso sistem a const itucional que
preserva a separação de poderes, ou m elhor, a separação de funções no exercício do
poder estatal, pois na realidade esse poder é único. Reconheço m esm o o acerto das
posições defendidas pelo Professor Arion Sayão Rom ita, no art igo destacado, no
sent ido de que o poder norm at ivo não pode ser exercido onde haja expressa definição
legal, nem m esm o para assegurar m ais vantagens aos t rabalhadores, com o tam bém
não pode ser exercido no silêncio da lei, pois não pode o juiz legislar. A bem da
verdade, não há nenhum espaço para o poder norm at ivo no nosso sistem a
const itucional, nem naqueles cham ados com andos im plícitos da lei, pois tam bém aí o
Juiz do Trabalho não usa da eqüidade, j á que não decide casos part iculares e sim
elabora, com m eros argum entos de oportunidade e conveniência, norm as genéricas e
abst ratas, invadindo o cam po de atuação assegurado pela Const ituição Federal ao
legislador.
Por essa razão, a posição adotada pelo STF no estabelecim ento de lim ites ao poder
norm at ivo da Just iça do Trabalho, a m eu ver, se corrige os exageros da concepção
am pliat iva defendida por parte da dout rina, não resolve o problem a m aior, pois
sem pre que a Just iça do Trabalho estabelecer norm a genérica e abst rata na solução
dos conflitos econôm icos de t rabalho estará legislando e não julgando, invadindo o
terr itório do Poder Legislat ivo, definido na Const ituição Federal.
Concluo afirm ando que a verdadeira solução para a delim itação m aterial do poder
norm at ivo da Just iça do Trabalho é a sua sim ples ext inção, com pat ibilizando a
at ividade desse ram o do Poder Judiciário aos lim ites do exercício do poder j urisdicional,
ainda que em ações colet ivas com o nos dissídios colet ivos de natureza jurídica, quando
então sim , adotando m ecanism os de aplicação e interpretação do Direito, inclusive a
eqüidade, a Just iça do Trabalho procurará na norm a genérica a solução justa para o
caso concreto.
_______________________
[ 1] NASCIMENTO, Am auri Mascaro. :(*&(,-$;(.+('01. São Paulo: LTr, 1982. p. 238.
[ 2] :-$%-+&*$.-*40,(3-$+0$-. São Paulo: LTr, 1983. p. 154.
[ 3] ?%@$'(,@$:-$%-+&*$.-*40,(3-$+0$-@ p. 149.
[ 4] Do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho na Nova Const ituição. 27*, São Paulo, 1989, vol.
53, n. 11, p. 1.286.
[ 5] A$(.!,*"4&.,01(+0+&$+-$%*-'&!!-. São Paulo: RT, 1987. p. 164.
[ 6] :(*&(,-$;(.+('01$&$/-1&,(3-$+-$7*0#01>-. São Paulo: LTr, 1998. p. 351.
[ 7] Do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho na Nova Const ituição. 27*, São Paulo, 1989, vol.
53, n. 11, p. 1.287.
[ 8] $?%@$'(,@ :-$%-+&*$.-*40,(3-$+0$-. p. 146-149.
[ 9] BATALHA, Wilson de Souza Cam pos. A%"+ VIDAL NETO, Pedro. ?%@$'(,@ :-$%-+&*$.-*40,(3-$
+0$-. p. 148.
[ 10] LAMARCA, Antonio. A%"+ VIDAL NETO, Pedro. ?%@$'(,@ :-$%-+&*$.-*40,(3-$+0$-. p. 148.
[ 11] ?%@$'(,@ :-$%-+&*$.-*40,(3-$+0$-. p. 147.
[ 12] ?%@$'(,@ :-$%-+&*$.-*40,(3-$+0$-. p. 151.
[ 13] Do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho na Nova Const ituição. 27*, São Paulo, 1989, vol.
53, n. 11, p. 1.288.
[ 14] MARTINS FILHO, I ves Gandra da Silva. O dissídio colet ivo na nova ordem const itucional.
27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 2, p. 199-200.
[ 15] O dissídio colet ivo na nova ordem const itucional. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 2, p.
200-201.
[ 16] Poder norm at ivo da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 2. p. 160-162.
[ 17] Poder norm at ivo da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 2. p. 160-162.
[ 18] O dissídio colet ivo na nova Const ituição Federal. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 2, p. 12.
[ 19] O dissídio colet ivo na nova Const ituição Federal. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 2, p. 13.
[ 20] A com petência norm at iva da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 8, p.
909.
[ 21] A com petência norm at iva da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 8, p.
909.
[ 22] A com petência norm at iva da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 8, p.
909.
[ 23] A com petência norm at iva da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, p. 910-911.
[ 24] Poder norm at ivo da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, 1991, vol. 55, n. 9, p. 1.028.
[ 25] FREITAS, Manoel Mendes de. Poder norm at ivo da Just iça do Trabalho – poder regulam entar
do Chefe do Execut ivo – análise com parat iva. 27*, São Paulo, 1991, vol. 55, n. 5, p. 651.
[ 26] Poder norm at ivo da Just iça do Trabalho – poder regulam entar do Chefe do Execut ivo –
análise com parat iva. 27*, São Paulo, 1991, vol. 55, n. 5, p. 653.
[ 27] Acórdão ext raído da B&3(!,0 27*, São Paulo, 1995, vol. 59, n. 6, p. 821.
[ 28] ?%@$'(,@ Do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho. p. 145.
[ 29] ?%@$'(,@ Do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho. p. 145.
[ 30] VIDAL NETO, Pedro. ?%@$'(,@ :-$%-+&*$.-*40,(3-$+0$-. p. 135.
[ 31] Poder norm at ivo da Just iça do Trabalho. 27*, São Paulo, 1989, vol. 53, n. 2, p. 160-161.
[ 32] Do poder norm at ivo da Just iça do Trabalho.$27*, São Paulo, 1993, vol. 57, n. 3, p. 266-267.
[ 33] 2-'@$'(,@
[ 34] 2-'@$'(,@
[ 35] 2(3*-$C$D$:0$.br/ novo/ htm l/ fram e_art igos.htm